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PARA ALÉM DA HISTÓRIA: CAETANO RAPOSO E AS PANTONÎ DO

JABUTI
Sonyellen Fonseca Ferreira1
Devair Antônio Fiorotti2

EIXO TEMÁTICO:
RESUMO: A discussão acerca da complexidade das narrativas indígenas e de
sua classificação em gêneros é um dos motivos para que elas ocupem uma
espécie de deslugar dentro dos estudos literários. Outro motivo por vezes
apontado é o fato destas narrativas serem engendradas no cerne de culturas
que não conceberam o conceito de literatura, como o entendemos. Contudo,
nunca é bastante relembrar, principalmente no caso do povo Macuxi, que o
contato com o “branco” que dispõe desse conceito e dessa sistematização já se
faz desde o século XVIII. Além do que os povos reunidos sob a designação
pemon, como os Macuxi, dispõem de uma concepção que reúne, como nós
nomeamos, as narrativas de caráter mítico, lendário, fabular e mesmo histórico:
panton. Na língua indígena macuxi a palavra panton designa história, como
declara Severino Barbosa, habitante da comunidade indígena São Jorge,
quando interpelado a contar os mitos e lendas de sua comunidade (FIOROTTI,
2015, no prelo) “Ahn, panton, história, nós chamamos panton, panton” e também
como já indicado por Paulo Santilli (2001, p. 16), Frei Cesáreo Armellada nas
obras Tauron Panton (2012; 2013) e já dicionarizado (AMÓDIO & PIRA, 2007;
RAPOSO, 2008). Panton também é o que nomeia o projeto Panton Piá: Registro
e Análise na Terra Indígena do Alto São Marcos e Raposa Serra do Sol no qual
foram coletadas narrativas de 37 indígenas da região da TI Raposa Serra do Sol
e São Marcos. Desde 2007 o projeto é financiado pelo CNPq e vinculado à
Universidade Estadual de Roraima - UERR. A metodologia de coleta e trato com
as narrativas sustenta-se principalmente na História Oral (ALBERTI, 2004).
Projeto coordenado pelo prof. Dr. Devair Fiorotti e no qual foram coletadas as
oito narrativas do Jabuti de Caetano, objeto de análise desse trabalho. A partir
da concepção de panton e das relações contextuais literárias e sócio-históricas
estabelecidas pelas narrativas do Jabuti, ou Wayamurî pantonî em língua
Macuxi, é que desenvolve-se este trabalho, relações essas destacadas, em
especial, na utilização do termo “compadre” pelo narrador. A dimensão de
compadrio presente na palavra compadre surge ao longo das oito narrativas
contadas por Seu Caetano. O termo “compadre” é utilizado pelo Jabuti ao referir-
se à Onça e a derrotando. Presente na narrativa de Raposo, o termo mobiliza
toda uma gama de relações sócio-históricas e de poder estabelecidas a partir do
contato entre não-índios e índios que reconfigurou não apenas a divisão e
estabelecimento de produtividade de terras a partir da criação do gado, mas

1
Formada em Letras com Habilitação em Português-Inglês pela UFRR e mestre em Literatura, artes e
cultura regional pelo PPGL da mesma instituição. Sony.ferseck@gmail.com
2
UERR/ PPGL-UFRR
aspectos culturais pela introdução de dogmas cristãos, como o batismo. Com a
derrocada da Onça, do compadre, numa leitura simbólica, invertem-se as
relações historicamente estabelecidas entre não-índios e índios de predatismo e
exploração.

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