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75 anos dos levantes antifacistas de 1935

75 anos dos levantes antifascistas de 1935. A ANL desempenhou um papel relevante na


mobilização de amplos segmentos da sociedade e da opinião pública brasileira em defesa das
liberdades públicas.

Por Anita Leocadia Prestes


Num período de intensa polarização política no cenário mundial, diante do avanço do fascismo em
nível internacional e do integralismo no âmbito nacional, a Aliança Nacional Libertadora (ANL),
criada em março de 1935, desempenhou um papel relevante na mobilização de amplos segmentos
da sociedade e da opinião pública brasileira em defesa das liberdades públicas, gravemente
ameaçadas pelos adeptos da Ação Integralista Brasileira (AIB), liderados por Plínio Salgado.
Nesse processo, a influência dos comunistas mostrou-se decisiva não só na formação da ANL e em
sua atividade legal, durante os meses de março a julho de 1935, como, principalmente, na
preparação dos levantes armados de novembro daquele ano, realizados sob as bandeiras da ANL. O
grande prestígio de Luiz Carlos Prestes – o Cavaleiro de uma Esperança que renascera com o
desgaste de Vargas após a “Revolução de 30” – foi um fator fundamental para a difusão e a
penetração, junto a amplos setores da sociedade brasileira, do programa anti-imperialista,
antilatifundista e democrático levantado pelo Partido Comunista do Brasil (PCB) e adotado pela
ANL.
A justeza desse programa se evidencia pela aceitação e a repercussão que obteve junto à opinião
pública democrática nacional. Como consequência, a ANL veio a transformar-se, em pouco tempo,
na maior frente única popular jamais constituída no Brasil. Seu lema: “Pão, Terra e Liberdade”,
inicialmente lançado pelo PCB, empolgou centenas de milhares de brasileiros.
Os comunistas, entretanto, cometeram um grave erro de avaliação ao caracterizarem a situação do
país, em 1935, como “revolucionária”, considerando que o desgaste do Governo Vargas seria tal
que as suas condições de governabilidade estariam esgotadas. Confundindo os desejos com a
realidade, os comunistas e muitos dos seus aliados superestimaram as possibilidades reais de
organização e mobilização das massas populares. Consideraram que havia chegado a hora de
levantar a questão do poder, lançando a consigna de um Governo Popular Nacional Revolucionário,
formado pela ANL, através de uma insurreição popular. A proposta dos comunistas, assumida pela
ANL, mostrou-se fantasiosa e, portanto, inexequível, resultando na derrota do movimento.
A inviabilidade de promover uma insurreição das massas trabalhadoras no Brasil, em 1935, aliada à
conjuntura de intensa agitação e efervescência política então presente nas Forças Armadas, induziu
os comunistas e seus aliados da ANL a sucumbirem à influência das concepções golpistas dos
militares, fortemente arraigadas no imaginário nacional. Tal fenômeno sobreveio, apesar dos
esforços desenvolvidos para organizar e mobilizar as massas, assim como das repetidas e insistentes
declarações do PCB, de Prestes e da ANL condenando o golpismo.
As Forças Armadas e, principalmente, o Exército passaram a ser vistos pelos comunistas e
aliancistas como o instrumento privilegiado para desencadear a almejada insurreição popular, na
medida em que a mobilização dos setores civis mostrava-se mais demorada e difícil. O
renascimento das concepções golpistas explica o caminho trilhado pela ANL: da amplitude inicial,
quando a entidade se manteve dentro da legalidade, ao radicalismo revelado com a eclosão dos
levantes armados de novembro de 35.
A persistência de tais concepções pode parecer fruto das influências tenentistas, supostamente
trazidas, tanto para o PCB quanto para a ANL, por L. C. Prestes e muitos dos elementos
provenientes do tenentismo. Sem negar tais influências, é necessário considerar que o próprio
tenentismo foi um movimento marcado pelo vigor das tendências golpistas, resultantes das
características do processo de formação da sociedade brasileira. Uma sociedade, na qual as classes
dominantes sempre tiveram força para impor aos setores populares um estado de desorganização e
desestruturação social, que viria a tornar-se um dos seus traços marcantes; uma sociedade
excludente, na qual não haveria canais para que as massas populares pudessem fazer valer seus
direitos e reivindicações. A expectativa de um golpe “salvador” seria a consequência natural de tal
estado de coisas.
Se, em 1935, o golpismo dos comunistas e de muitos dos seus aliados se revelou no fato de
haverem delegado aos militares o papel de detonadores da “insurreição das massas trabalhadoras”,
deve-se considerar que o conteúdo do programa então defendido - antiimperialista, antilatifundista e
democrático - era distinto das propostas tenentistas. Sejam as propostas liberais dos “tenentes” dos
anos 20, sejam as propostas autoritárias do tenentismo do início dos anos 30. Em 1935, os militares,
que iriam desencadear a insurreição projetada, não eram mais tenentistas, mas seguidores de
Prestes, que, desde seu Manifesto de Maio de 30, deixara de ser “tenente” para aderir às teses
levantadas pelos comunistas - as mesmas que seriam encampadas pela ANL.
Mas o revés do movimento antifascista no Brasil, em 1935, não se explica apenas pela influência
das concepções golpistas. O Governo Vargas pôde tirar partido de uma conjuntura internacional
favorável ao fascismo e aos regimes autoritários para, com o apoio da direita e brandindo as
bandeiras do anticomunismo, impor uma grave derrota às forças democráticas e progressistas do
país.
Anita Leocadia Prestes é professora do Programa de Pós-graduação em História Comparada de
UFRJ e presidente do Instituto Luiz Carlos Prestes.

FONTE : Brasil de Fato, edição 402, p. 7.

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