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Processual Penal pela Faculdade de Mato Grosso do Sul. Mestrando em Direito da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul. Professor de Direito Penal na Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul e Universidade Católica Dom Bosco. Palestrante e Consultor em Direito Penal. E-
mail: contato@marlonricardo.com.br
formulate and strengthen public policies in order to meet the strict needs of these
rights subjects, which hour were far from the State's view, considering that they
were fundamental rights brought by the Federal Constitution.
1 INTRODUÇÃO
Ao analisar o sistema carcerário brasileiro é notório o reflexo das
desigualdades de gênero. O modelo penitenciário assim como as políticas
penais são estruturadas por homens e para homens, não atendendo as
peculiaridades de gênero das mulheres encarceradas.
É preciso analisar o contexto social em que a mulher submetida ao
cárcere se insere, levando em consideração a maternidade, suas relações
familiares, razões que a levaram a integrar os dados estatísticos da criminalidade
e suas necessidades e peculiaridades biológicas.
Para tanto, as Regras de Bangkok, foi reconhecida como o principal
marco normativo internacional a tratar das peculiaridades de gênero do
encarceramento de mulheres, dando ênfase e prioridade as medidas não
privativas de liberdade, a fim de obstar a inserção de mulheres no sistema
penitenciário.
As Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e
medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras (Regras de
Bangkok) foram aprovadas na Assembleia Geral das Nações, em 2010,
abordando a discussão sobre as peculiaridades inerentes ao gênero feminino,
tendo como proposta principal estabelecer a prioridade de medidas alternativas
à prisão de mulheres. Ademais, as regras trazem atenção especial as mulheres
em situação gestante e maternal, prevendo a alternativa de regime domiciliar a
substituir o regime fechado para cumprimento de pena, possibilidade imposta
através do Marco Legal da Primeira Infância, no caso de mulheres gestantes e
mães de crianças de até 12 anos.
Embora o Brasil tenha participado ativamente da elaboração das Regras
de Bangkok, sua publicação oficial em português só aconteceu em 2016, com o
apoio do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e da Pastoral Carcerária,
os quais já eram reconhecidos historicamente pelo pleito de desencarceramento
de mulheres.
A tradução das Regras foi o marco inicial para implementação de
alternativas ao encarceramento no Brasil, porém, não é garantia de aplicação
em casos concretos. Logo, para que haja sua aplicação pelos poderes Judiciário
e Executivo é necessário que haja divulgação de qualidade com efetiva
participação estatal e também da sociedade civil.
2 REGRAS DE BANGKOK
As Regras de Bangkok foram aprovadas em 2010, pela Assembleia Geral
da ONU com o objetivo de estender o alcance das Regras de Tóquio3 (Regras
Mínimas para o Tratamento do Preso e as Regras Mínimas para a Elaboração
de Medidas não Privativas de Liberdade), sendo estas criadas em 1955 e
aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 1957, não considerando a
realidade da mulher encarcerada e suas necessidades inerentes ao gênero4.
Entre as diversas considerações trazidas, as Regras de Bangkok
apresentam diretrizes mínimas para o tratamento da mulher presa e medidas
não privativas de liberdade para as mulheres em situações estritas com a
maternidade, considerando o aumento alarmante do número de mulheres
encarcerada nos últimos anos e a falta de estrutura do sistema carcerário para
atender as demandas específicas às mulheres5.
Neste sentido, é evidente a influência patriarcal imposta ao sistema
penitenciário, o qual foi criado por homens e para homens, entretanto, as Regras
de Bangkok estabelece o dever de atender as necessidades das mulheres como
meio de garantir a igualdade material consagrada pela Constituição Federal de
1988, já em seu primeiro dispositivo:
2018, p. 18.
5 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Levantamento Nacional
Regra 2
2. Antes ou no momento de seu ingresso, deverá ser permitido
às mulheres responsáveis pela guarda de crianças tomar as
providências necessárias em relação a elas, incluindo a
possibilidade de suspender por um período razoável a medida
privativa de liberdade, levando em consideração o melhor
interesse das crianças.7
6 BRASIL. Câmara dos Deputados. Centro de Estudos e Debates Estratégicos. Primeira Infância:
Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Caderno de Trabalhos e Debates nº 11. Brasília:
SEGRAF, 2016, p.19
7 BRASIL. Câmara dos Deputados. Centro de Estudos e Debates Estratégicos. Primeira Infância:
Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Caderno de Trabalhos e Debates nº 11. Brasília:
SEGRAF, 2016, p.19
instalações para o cuidado das crianças a fim de possibilitar às
presas a participação em atividades prisionais.
3. Haverá especial empenho na elaboração de programas
apropriados para mulheres gestantes, lactantes e com filhos/as
na prisão.
4. Haverá especial empenho na prestação de serviços
adequados para presas que necessitem de apoio psicológico,
especialmente aquelas que tenham sido submetidas a abusos
físicos, mentais ou sexuais.8
Regra 64
Penas não privativas de liberdade para as mulheres gestantes e
mulheres com filhos/as dependentes serão preferidas sempre
que for possível e apropriado, sendo a pena de prisão
considerada penas quando o crime for grave ou violento ou a
mulher representar ameaça contínua, sempre velando pelo
melhor interesse do/a filho/a ou filhos/as e assegurando as
diligências adequadas para seu cuidado.11
8 Ibdem, p.31
9 BRASIL. Câmara dos Deputados. Centro de Estudos e Debates Estratégicos. Primeira
Infância: Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Caderno de Trabalhos e Debates nº 11.
Brasília: SEGRAF, 2016, p. 32-33.
10 Ibdem, p. 19
11 Ibdem, p. 35
A regra citada estabelece que nos casos de condenação de mulheres
gestantes ou com filhos sob sua responsabilidade e cuidado, deve ser
considerado o princípio do melhor interesse do menor, o que leva a preferir nos
referidos casos a concessão de medidas não privativas de liberdade, para que
seja garantido ao menor o vínculo familiar de mãe e filho.
Diante do exposto, conclui-se que o ordenamento jurídico brasileiro em
muito se assemelha as diretrizes e princípios das Regras de Bangkok, trazendo
como destaque o Código Penal, Código de Processo Penal, leis especiais e
decisões dos tribunais superiores, a serem analisados no presente trabalho.
15
CRISTINA TEIXEIRA, Maria ; FIGUEIREDO DE OLIVEIRA, Emilene. O direito fundamental
das presidiárias e seus filhos ao aleitamento materno. Revista do Curso de Direito da Faculdade
de Humanidades e Direito, São Paulo, v. 11 n.11 2014. p. 14.
16 BRITO (2011, p. 212) apud CRISTINA TEIXEIRA, Maria ; FIGUEIREDO DE OLIVEIRA,
Emilene. O direito fundamental das presidiárias e seus filhos ao aleitamento materno. Revista do
Curso de Direito da Faculdade de Humanidades e Direito, São Paulo, v. 11 n.11 2014. p. 14.
em prol da primeira infância, iniciado nos primórdios dos anos 2000 no Brasil 17,
promovendo por meio de políticas estratégicas o atendimento adequando às
crianças, considerando-as como sujeito de direitos fundamentais garantidos a
toda pessoa humana, contudo, levando em consideração as peculiaridades
quanto às formas de expressão, linguagem, compreensão da realidade que o
cerca, desenvolvimento corporal e biológico, entre outros.18
17 EGAS, Heloiza. O Marco Legal da Primeira Infância na perspectiva dos Direitos Humanos.
Parte II – Políticas Nacionais e Primeira Infância. p. 257
18 Ibdem, p. 260.
19 BARBOSA, Gabriela Urbano. Das novas hipóteses de prisão domiciliar com o advento da Lei
21 SILVA, Bruno César da. A prisão domiciliar como a melhor forma de garantir os direitos dos
filhos de mães presas no período da primeira infância. p. 279
22 Ibdem., p. 279.
23 BOWLBY, J. Cuidados maternos e saúde mental. São Paulo: Martins Fontes; 1981. p.225.
24 SILVA, op. cit., p.279.
25 BARBOSA, Gabriela Urbano. Das novas hipóteses de prisão domiciliar com o advento da Lei
Prevê ainda, a estrito modo, que o Estado deve fazer cumprir seu papel
em estabelecer essas garantias às mulheres submetidas ao cárcere, sem que
haja discriminação pelo estado de privação de liberdade:
28
Lei 13.257 de 8 de março de 2016: Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira
infância. Brasília: Senado Federal, 2016.
29
Ibdem.
Não aleatoriamente, o Marco Legal da Primeira Infância trouxe
modificações ao Código de Processo Penal, a fim de garantir um ambiente e
condições adequadas ao convívio familiar e social da criança, sem afetar o
poder-dever30 punitivo do Estado, trazendo alternativas às penas restritivas de
liberdade, condizentes com as orientações trazidas pelas Regras de Bangkok.
30 Nas palavras de Ishida: “O jus puniendi é o direito que tem o Estado de aplicar a pena cominada
no preceito secundário da norma penal incriminadora, contra quem praticou a ação ou omissão
descrita no preceito primário, causando um dano ou lesão jurídica. O jus puniendi pertence ao
Estado, como uma das expressões da soberania.”
31 _______. Código de Processo Penal. Decreto Lei nº 3.689 de 3 de outubro de 1941.
de inquérito policial as informações acerca da maternidade da mulher presa em
flagrante.32
4 CONCLUSÃO
Ao analisar a legislação brasileira em face da Doutrina da Proteção
Integral e do Princípio do melhor interesso da criança, percebe-se que antes
mesmo da participação ativa do Brasil como membro da ONU na criação das
Regras de Bangkok, estes princípios já integravam o ordenamento jurídico
brasileiro. Sendo inclusive direitos fundamentais trazidos pela Magna Carta de
1988.
32
33
SILVA, Bruno César da. A prisão domiciliar como a melhor forma de garantir os direitos dos filhos de
mães presas no período da primeira infância, p. 284.
alcançando os sujeitos de direitos que viviam as sombras, longe do olhar do
Estado.
ISHIDA, Válter Kenji. Processo Penal. 5° ed. Atlas, 2009. Disponível em:
<https://www.editorajuspodivm.com.br/cdn/arquivos/9f39e7955e77a12e0d8a10
1ab71153df.pdf> Acesso em: 14 abr. 2019.
VIEIRA, Cláudia Maria Carvalho do Amaral. Crianças encarceradas - a proteção
integral da criança na execução penal feminina da pena privativa de liberdade.
Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências
Jurídicas, Programa de Pós-Graduação em Direito, Florianópolis, 2013.
Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/122854>
Acesso em: 05 abr. 2019.