Você está na página 1de 34

54

3 REVISTA POP (1972-1979)

SOCIEDADE DE CONSUMO – FELICIDADE – VER MIRA P. INÍCIO P. 244

Neste capítulo apresento um panorama sobre a revista Pop, especialmente no


que diz respeito à sua produção, circulação e consumo como também as seções sobre
Moda e Beleza, que utilizarei como fontes para as análises da representação da noção de
juventude “cuca fresca”. Este capítulo foi elaborado, sobretudo, a partir de informações
encontradas nas edições da Pop, da pesquisa bibliográfica e de entrevistas realizadas
com três ex-diretores da revista, a saber, Thomaz Souto Côrrea, Leonel Kaz33 e Marilda
Varejão. Parte das edições da revista Pop foram encontradas no acervo da Biblioteca
Pública do Paraná; outras foram emprestadas do acervo particular do pesquisador Luís
Fernando Rabello Borges; algumas foram digitalizadas e enviadas por Wenilton Daltro,
autor do blog “Apólogo 11”, que exibe e discute reportagens sobre a Pop; e outras foram
adquiridas a partir do site Mercado Livre. As edições pertencentes ao acervo da
Biblioteca Pública e emprestadas por Luís Borges foram fotografadas e/ou fotocopiadas
por mim e pela designer Cristina Mosol, que me auxiliou neste processo. Mesmo faltando
algumas páginas e capas de certas edições, estas possibilitam acesso a maior parte das
informações que foram veiculadas pela Pop no período em que esteve em circulação.
Vale ressaltar que todas as capas faltantes foram encontradas na internet, sobretudo, no
site Mercado Livre. Algumas revistas emprestadas por Luís Borges e compradas por mim
apresentam rasgos e inscrições, resultantes da interação do público leitor com a revista.
A Pop, a primeira revista brasileira criada especificamente para a juventude, foi
editada mensalmente pela Editora Abril entre novembro de 1972 e agosto de 1979, em
plena Ditadura Militar, atingindo 82 edições ao total. A criação da revista Pop estava
relacionada a pelo menos duas novidades: a tendência internacional de segmentação do
mercado editorial e o fenômeno teenager34 (MIRA, 1997). Em 1972, Victor Civita,
fundador da editora Abril, líder do mercado de revistas na época, explicou a importância
comercial de se aderir à segmentação do mercado editorial, afirmando que a única

33Ainda estou aguardando seu envio do Termo de Cessão da entrevista.


34Adolescente, em português. O termo teenager se refere à palavra inglesa teen - forma flexionada de ten,
que segundo o Concise Oxford Dictionary, acrescenta-se aos numerais de três a nove para formar os
numerais de 13 (thirteen) a 19 (nineteen) (SAVAGE, 2009).
55

forma de manter uma grande empresa em crescimento era ir ao encontro de todos os


segmentos de mercado (EXPANSÃO, 1972 apud MIRA, 1997). A tendência internacional
de segmentação do mercado editorial modificou o modo como as revistas eram
produzidas até então. Publicações de variedades como O Cruzeiro, por exemplo, que
buscavam abranger a “família brasileira”, começaram a entrar em declínio com a
ascensão de periódicos voltados para públicos específicos (MIRA, 1997).
O grande fenômeno mundial da segmentação editorial, no que diz respeito à faixa
etária, foi a ampliação do mercado jovem. Esta expansão estava relacionada ao
fenômeno teenager, que diz respeito à mudança da percepção sobre os jovens enquanto
público consumidor (MIRA, 1997; ZIMMERMANN, 2013). Este fenômeno ganhou
visibilidade nos Estados Unidos, no segundo pós-guerra, por meio do entrelaçamento de
interesses econômicos e políticos do governo e do setor industrial. Por um lado, o
consumismo dirigido à juventude era uma forma de desvio à sua atitude questionadora
sobre os efeitos da Segunda Guerra Mundial e por outro, era um modo de escoar a
superprodução industrial estadunidense - fato que se relaciona, inclusive, à exportação
do fenômeno teenager para diversos países capitalistas (SAVAGE, 2009). A indústria
estadunidense de bens e serviços foi atraída pela população jovem, que atingiu um
contingente de 25 milhões de pessoas em meados dos anos 60 (SANT’ANNA, 2015). O
fenômeno também estava atrelado à prosperidade econômica de famílias
estadunidenses no período do segundo pós-guerra. Neste momento, parte da juventude
foi dispensada da tarefa de contribuir com a despesa doméstica, o que proporcionou à
população jovem maior acúmulo de capital econômico e tempo disponível (HOBSBAWM,
1995).
No Brasil, a juventude das camadas médias passou a ter certa margem para
gastos pessoais. Este evento estava associado, em parte, ao “milagre econômico”, que
propiciou que a população jovem se tornasse a primeira geração a receber “mesada” no
país. Além disso, o governo federal investiu no ensino superior, que consequentemente,
favoreceu maiores oportunidades para a juventude no mercado de trabalho (DUNN,
2016; PAIANO, 1994 apud MIRA, 1997). Logo, o poder de compra da juventude
brasileira das camadas médias estava atrelado não somente à “mesada” recebida dos
pais como também ao seu ingresso no mercado de trabalho. Na reportagem “Trabalhar
em butique é divertido!”, de março de 1978, veiculada na revista Pop, garotas de 14 a 21
anos das camadas médias urbanas contaram suas experiências como vendedoras em
56

butiques cariocas. Todas elas moravam com os pais e eram sustentadas por eles, logo,
supostamente, não teriam a “necessidade” de trabalhar. Entretanto, para essas moças, o
trabalho nesse tipo de ambiente não estava relacionado apenas ao recebimento do
salário, mas também ao status social que as butiques proporcionavam a elas: entrar em
contato com as últimas novidades da Moda, trabalhar em lugares “bacanas”, fazer
amigos e às vezes conhecer pessoas famosas. O ordenado, apesar de não ser suficiente
para elas se tornarem independentes financeiramente, permitia a compra de peças de
roupa, algumas inclusive na própria butique onde trabalhavam (POP, n° 65, 1978, p. 58-
61).
Motivada pela ascensão do poder aquisitivo das camadas médias e pela
relevância da juventude em termos demográficos - cuja população entre 15 a 24 anos
saltou de 8,2 milhões em 1940 para 18,5 milhões em 197035 - a indústria brasileira,
assim como a estadunidense, buscou, desde meados dos anos 1960, estimular o
consumo juvenil, na tentativa de constituir um novo segmento (MIRA, 1997;
ZIMMERMANN, 2013). No Brasil, foram criados bens culturais destinados ao público
jovem, que estavam associados, de certa forma, às culturas juvenis estadunidense e
inglesa. Filmes americanos como “O Selvagem” (1953), “Sementes da Violência” (1955) e
“Juventude Transviada” (1955) divulgaram modas associadas ao imaginário da
“juventude rebelde” como casacos de couro, camisetas, calças jeans, topetes, lambretas e
discos de rock, que influenciaram o mercado e a cultura jovem brasileira (KAMINSKI,
2018; BARROS, 2016). A “invasão inglesa” liderada pelos Beatles, que chegou
oficialmente ao país em 1963, após o lançamento nacional de seu primeiro compacto,
também inspirou a produção de bens culturais destinados à juventude brasileira. Neste
contexto, que presenciava ainda a popularização da televisão, foram lançados
programas especializados no rock para o público jovem. Em 1965, a TV Record lançou o
programa Jovem Guarda, liderado por Roberto Carlos, Wanderléa e Erasmo Carlos, que
inspirados no sucesso dos Beatles, colocaram no ar a versão brasileira do iê iê iê
(ZIMMERMANN, 2013). No final dos anos 1960, o Movimento Tropicalista, que teve
duração efêmera entre 1967 e 1968, sendo considerado, inclusive, a face nascente da
contracultura brasileira, ganhou visibilidade com o álbum “Tropicália ou Panis et
Circensis” e com o programa na TV Tupi intitulado “Divino, Maravilhoso”, do qual
participaram Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Jorge Ben e Os Mutantes. Suas

35 Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv6686.pdf> Acesso em: fev. 2018.


57

inovações estéticas e comportamentais promovidas, especialmente, no campo da música


e do figurino, influenciaram jovens de diferentes regiões do país, modificando o
consumo juvenil (KAMINSKI, 2018; BARROS, 2016).
Deste modo, a juventude brasileira passou a constituir um significativo mercado
de consumo de bens culturais desde a década de 1960. De acordo com uma pesquisa do
instituto Marplan, realizada em 1976, entre 30 a 40% das compras de itens como
motocicletas, gravadores, máquinas fotográficas, aparelhos de som foram realizadas por
jovens de 15 a 24 anos. A juventude comprou tantos discos de música, que transformou
o mercado fonográfico brasileiro em um dos maiores do mundo. Neste contexto, a
indústria cultural vivenciou um período de crescimento sem precedentes no país, onde
mais foram produzidos e difundidos bens culturais. Este fenômeno também estava
relacionado ao fato de ser o próprio Estado autoritário o promotor do desenvolvimento
capitalista e dos processos de modernização e racionalização da sociedade brasileira
(MIRA, 1997; NAPOLITANO, 2004).
O título original da revista era Geração Pop. De acordo com Thomaz Souto Côrrea
(2018), um dos idealizadores e primeiro diretor da publicação, inicialmente pensou-se
em utilizar apenas o termo “Pop”, mas na época a revista foi impedida de registrar a
marca. Em junho de 1975 (edição n° 32), após a cessão deste impedimento, a revista
passou a se chamar apenas Pop. Côrrea (2018) relatou que, a priori, a ideia do nome
“Pop” seria sua, embora não tenha certeza absoluta. O interesse inicial pelo título “Pop”
pode ser observado, inclusive, no próprio logotipo da revista, elaborado pelo francês
Richard Raillet, que atuou como o primeiro diretor de arte da publicação. O termo
“geração” foi apresentado com pouca ênfase visual, ocupando apenas uma fração do
espaço interno do primeiro “p” da palavra “Pop”, enquanto esta foi projetada com
grande apelo visual. Os três caracteres tipográficos do termo “Pop” foram todos
desenhados em caixa alta e com bastante peso visual, sendo este suavizado por suas
formas arredondas e pelo espaço vazio, também conhecido como “olho”, em formato
circular. As formas arredondadas e a ausência de serifas conferiram um valor mais
arrojado e informal ao logotipo. Na figura 4, apresento duas capas da Pop, a primeira
delas com o título original “Geração Pop” (n° 17) e a segunda, apenas com o termo Pop
(n° 43), que durou até o final da circulação do periódico.
58

Figura 4: Capas das edições n° 17 e n° 43 da revista Pop.


Fonte: POP, n° 17 e n° 43, respectivamente março de 1974 e maio de 1976. Acervo de Luís Borges e
Acervo pessoal.

Sendo assim, optei por utilizar apenas a palavra Pop para me referir ao título da
revista, além disso, como observou Borges (2003), a própria equipe editorial a citava
desse modo desde o início da publicação.
Como mencionado, a Pop foi a primeira revista brasileira voltada especificamente
para a juventude. No texto de abertura da edição n° 1, a Pop destaca essa singularidade:
“Este é o primeiro número da primeira revista da nossa idade. Feita especialmente para
você jovem de quinze a vinte e poucos anos de idade” (POP, n. 1, novembro de 1972, p.
12). Entretanto, segundo comentários de ex-leitores da Pop no blog Apólogo 1136, é
possível inferir que a idade do público leitor extrapolou a faixa etária sugerida pelo
periódico, sendo lido por pessoas ainda mais novas.
A Pop circulou pelas capitais e por outras cidades do interior do Brasil. As capas
da revista assinalam que em algumas cidades da região Norte, ela tinha um preço maior
devido a necessidade de transporte aéreo. Além disso, de acordo com as capas é possível
deduzir que a Pop também chegou a ser comercializada em Portugal, custando ainda

36Disponível em: <http://apologo11.blogspot.com/2009/07/uma-grande-revista-setentista-


geracao.html#comment-form>. Acesso em: mar. 2017.
59

mais caro. Inicialmente a revista Pop custava Cr$ 3,0037, valor que ao longo dos anos
aumentou gradualmente e de modo significativo, chegando a Cr$ 30,00 na sua última
edição, em agosto de 1979 (gráfico 1). Provavelmente, a variação nos preços da revista
Pop estava relacionada à inflação do período, que aumentou drasticamente no final da
década de 1970 (MUNHOZ, 1997)38.

Gráfico 1: Preços da revista Pop ao longo da sua existência.


Fonte: Maureen Schaefer França (2018).

De acordo com Mira (1997, p. 244), “a revista vendia em torno de 100 mil
exemplares mensais, uma tiragem bastante expressiva para época”. Um dos planos
utilizados para incrementar as vendas da revista Pop era presentear o seu público-leitor
com alguns tipos de brindes como pôsteres, estampas, violões e discos de música, cujos
anúncios eram apresentados com grande destaque nas capas. Além do mais, a Pop
também realizava concursos de fotografia, redação e desenho entre outros, cujas
premiações abrangiam viagens internacionais, volantes e até mesmo veículos de lazer e

37 Restabeleceu-se a denominação Cruzeiro em substituição ao Cruzeiro Novo. Durante a existência da


revista Pop, Cruzeiro foi a única moeda que esteve em circulação.
38 MUNHOZ, Dercio Garcia. Inflação brasileira: os ensinamentos desde a crise dos anos 30. Disponível

em:
<http://www.ie.ufrj.br/images/pesquisa/publicacoes/rec/REC%201/REC_1.1_03_Inflacao_brasileira_os_
ensinamentos_desde_a_crise_dos_anos_30.pdf>. Acesso em: jul. 2018.
60

transporte como barcos e motocicletas, conforme indicam as capas das edições n 10,
12, 15 e 20.
A revista Pop destinava-se, sobretudo, às juventudes das camadas médias. O
direcionamento às classes sociais mais abastadas pode ser observado inclusive, pelas
próprias premiações da revista: a priori, seria necessário ter um carro para utilizar o
volante ganho e resguardar o barco conquistado em alguma garagem/marina. Além do
mais, é possível notar a divulgação de locais, práticas e bens de consumo que sugerem
estilos de vida privilegiados. Na seção Popscope39 da edição n 22, por exemplo, há
notícias sobre a “badalação” do III Campeonato Nacional de Surf realizado na Barra da
Tijuca40, na época já considerada uma região nobre da cidade do Rio de Janeiro como
também sobre o Campeonato Universitário de Caça Submarina em Cabo Frio (RJ) -
prática esportiva que exige o uso de equipamentos caros (POP, n. 22, ago. 1974, p. 24-
25).
Com relação ao marcador raça/etnia, podemos inferir que a revista Pop foi
dirigida especificamente para garotas e garotos brancos. Esta questão pode ser notada
devido à presença massiva de representações de pessoas de pele clara nas capas, nas
publicidades, nas reportagens e nos editoriais de Moda da publicação. Além disso, a
representação dos corpos e os discursos verbais veiculados na revista também indicam
seu posicionamento heteronormativo. A partir do pressuposto da “naturalidade” da
heterossexualidade, a Pop representou apenas casais compostos por pessoas cisgêneras
e heterossexuais. Entretanto, assuntos relacionados à homossexualidade e à
bissexualidade também circularam no periódico, embora de maneira bem mais restrita.
Apesar da Pop se posicionar várias vezes a favor de um mundo “sem preconceitos”, estes
assuntos foram abordados por ela de modo diferenciado se comparados ao tratamento
dado às relações heterossexuais. Na reportagem “Maria Schneider: o símbolo sexual”
veiculada na edição 33, por exemplo, a Pop enfatizou o fato da atriz alemã estar se
relacionando com Lucia Garcia, uma manequim argelina. Contudo, a revista evitou

39“Mini-jornal com tudo – aqui você vai ficar por dentro das transas que estão acontecendo no mundo:
gente, notícias, dicas e tudo o que pode interessar a você” (POP, n 1, nov. 1972, p. 23).
40 O “plano piloto” da Barra da Tijuca foi criado pelo arquiteto e urbanista Lúcio Costa em 1969, o mesmo
autor do “plano piloto” de Brasília. Paralelamente a este projeto, novos caminhos ligando a Barra à Zona
Sul e à Zona Norte foram planejados, estimulando a compra de terrenos pelas camadas médias, que se
entusiasmaram pelo fato da região ser dificilmente acessada a partir do centro do Rio de Janeiro. Nos anos
1970, a Barra começou a se desenvolver urbanisticamente, quando surgiram os grandes condomínios de
edifícios de apartamentos e alguns shoppings, acessados, sobretudo, por meio de carros. Disponível em:
<http://www.riodejaneiroaqui.com/pt/barra-da-tijuca-historia.html>. Acesso em: jul. 2018.
61

utilizar termos como “(ex)-namorada” e “namoro”, substituindo-os respectivamente, por


“amiga” e “caso”, este último remetendo à ideia de aventura amorosa. Além disso, a
revista destacou que a atriz se relacionava indiferentemente com rapazes e garotas,
chegando a ter “um caso por semana”. Sendo assim, é possível deduzir, que a abordagem
escolhida pela Pop relacionou, nas entrelinhas, a sexualidade da atriz a um tipo de
subjetividade libertina, inconsequente e provocadora (POP, n. 33, jul. 1975, p. 48-49).
Ademais, é possível perceber que apesar da Pop apresentar notas e reportagens
sobre cidades de diversas regiões do país, houve uma divulgação muito mais ampla de
estilos de vida e de produtos jovens derivados das capitais São Paulo e Rio de Janeiro.
Sendo assim, é importante destacar que vários dos artigos de Moda divulgados pela Pop
não estavam disponíveis para compra em cidades do interior41, fora do eixo Rio-São
Paulo.
A revista Pop, que tinha em média 100 páginas, foi editada no formato 275 mm
por 210 mm, tendo uma altura um pouco menor do que a de uma folha tamanho A4.
Encadernada com grampo, a revista exibia capa e contracapa coloridas em papel liso
encorpado tipo couché. A maior parte das páginas da revista eram coloridas, sobretudo,
as publicidades de empresas anunciantes de maior poder aquisitivo e reportagens sobre
Moda, beleza, artistas, viagens e esportes. A revista Pop privilegiou o uso de fotografias,
embora ilustrações também fossem recorrentes. Ela abordou assuntos variados como
música, artes plásticas, cinema, teatro, televisão, literatura, turismo, Moda,
comportamento, sexualidade, esportes, cuidados com o corpo, espiritualidade,
astrologia, profissão, culinária, decoração de interiores e passatempos. Apesar do
sumário, da organização dos conteúdos e do nome das seções terem variado ao longo da
trajetória da Pop, de modo geral, os assuntos foram praticamente os mesmos até o final
da publicação. Conteúdos sobre política não eram comuns, pois de acordo com Thomaz
Souto Côrrea (2018), o público imaginado para a publicação não se interessava pela
temática.
Conforme os expedientes da revista é possível inferir que profissionais
reconhecidos e de diversas áreas passaram pela Pop. Na área musical, destacaram-se o
jornalista e produtor musical Nelson Motta (1944-); Big Boy (1943-1977) - jornalista,
radialista, apresentador de Tv e um dos DJs mais populares do período; o jornalista e

41Informação obtida em conversa informal com minha mãe, Eunice Schaefer, ex-leitora da revista Pop,
quando morava no interior do Paraná, na cidade de União da Vitória.
62

produtor musical Ezequiel Neves (1935-2010); e o cantor e jornalista Júlio Barroso


(1953-1984), que também atuou como DJ da discoteca carioca Dancin’ Days nos anos
1970. Mulheres também trouxeram colaborações para o conteúdo musical da Pop como
a artista Pink Wainer42 (1960-); as jornalistas Ana Maria Bahiana (1950-)43 e Scarlet
Moon (1950-2013); e Sonia Abreu, a primeira DJ do Brasil44. Os jornalistas e escritores
Caco Barcellos (1950-) e Caio Fernando Abreu (1948-1996)45 também realizaram
artigos e reportagens para a revista. Entre as/os artistas e designers envolvidos com o
layout da revista destacaram-se, ao longo da sua existência, Richard Raillet, Mário
Roitman (?-2015), Ana Dora Pártos, Jandira Lorenz Bieszczad, Carlos Grassetti46, Carlos
Alberto Gianotti, Sergio Vendramini e Samuel Caetano. Inicialmente, conforme o
expediente da edição 1, a redação da revista Pop ficava situada na cidade de São Paulo,
no prédio da editora e gráfica da Abril, localizado na Avenida Otaviano Alves de Lima, n°
800, perto da Marginal Tietê (POP, n. 1, nov. 1972, p. 12).
As mudanças que afetaram os aspectos materiais da publicação assim como as
pessoas envolvidas com a produção e a fotografia de Moda serão apresentadas a seguir,
de acordo com o período de gestão dos ex-diretores da revista Pop. As informações a
respeito dos profissionais de Moda foram obtidas a partir dos expedientes da Pop e por
meio da autoria dos conteúdos relacionados à Moda e aos cuidados com o corpo, embora
nem todos tenham sido assinados. A revista foi dirigida por seis pessoas ao longo da sua
existência: Thomaz Souto Côrrea, Gilberto di Pierro, Leonel Kaz, Marilda Varejão,
Octávio Chaves de Souza e Carlos Alberto Fernandes. Thomaz, que participou da criação
da publicação, foi responsável pela primeira e segunda edições da revista (novembro e
dezembro de 1972); Gilberto, mais conhecido como Giba Um, dirigiu a publicação por
mais tempo: da edição n° 3 a 28 (lançadas entre janeiro de 1973 e fevereiro de 1975);
Leonel coordenou a Pop entre as edições n° 29 a 47 (entre março de 1975 e setembro de
1976); Marilda, a única mulher que dirigiu a revista, foi encarregada pelas edições de n°
48 a 56 (entre outubro de 1976 e junho de 1977); Octávio gerenciou a publicação entre

42 Filha da modelo e atriz Danuza Leão e de Samuel Wainer, o fundador do jornal a “Última Hora”.
43 Autora do livro Almanaque Anos 70, que será utilizado no documento da tese.
44 Disponível em: <https://www.vice.com/pt_br/article/8xxy8a/sonia-abreu-ondas-tropicais-livro>.
Acesso em: jul. 2018.
45 “Quando Caio chegou à Pop era um jornalista experiente, um escritor premiado, dono de um texto

impecável, e vinha com a tarefa secreta de ‘profissionalizar’ a jovem e irrequieta redação da revista” (DIP,
2009, p. 27).
46 Também trabalhou na Playboy, sendo considerado por Marilda Varejão (2018), quarta diretora da

revista Pop, uma referência na equipe de design da Abril. Seu irmão, Omar Grassetti, atuou na revista
Capricho.
63

as edições n° 57 a 73 (entre julho de 1977 e novembro de 1978); e Carlos Alberto,


conhecido como Caloca, foi o último diretor da revista trabalhando entre as edições n°
74 a 82 (entre dezembro de 1978 e agosto de 1979) (gráfico 2).

Gráfico 2: Período de gestão de cada ex-diretor/a da revista Pop.


Fonte: Maureen Schaefer França (2018).

Thomaz Souto Côrrea (1935-), nascido em Mirassol (SP), é jornalista há mais de


60 anos e atualmente é vice-presidente do Conselho Editorial da Abril. Ele foi o primeiro
diretor da Pop e também um dos seus idealizadores, passando a atuar como diretor
editorial da Editora Abril até março de 1975, quando se tornou diretor das publicações
femininas47. Côrrea (2018) relatou que sonhou com a revista Pop e que no dia seguinte
enviou uma comunicação para Luís Carta (1936-1994), na época diretor da Abril,

47 Neste momento, de acordo com os expedientes da revista Pop, entende-se que as publicações da Abril
passaram a ser divididas em femininas e masculinas. Logo, pode-se notar, que apesar da Pop ser uma
revista dirigida tanto para garotas quanto para garotos, ela passa a ser classificada, dentro da concepção
da editora, como uma revista feminina.
64

lançando a ideia de uma “revista teen”, visto que naquele momento ainda não existia
nenhuma publicação dirigida especificamente ao público jovem no Brasil. Sua aposta era
fazer uma revista inovadora, voltada tanto para garotas quanto para garotos, que
tratasse de comportamento, música jovem e também de Moda teen, que segundo Côrrea
estava “muito na moda naquela época”. Côrrea comentou ainda que acreditava existir
um mercado para a revista Pop, sendo este composto por jovens das camadas médias,
que de acordo com suas palavras, “quer dizer um jovem consumidor”. Pois, a publicação
precisava ter boa vendagem, uma vez, que a Abril estava tentando romper em certa
medida, naquele momento, com os anunciantes, que sustentavam economicamente
parte da produção das revistas. Mas apesar da revista precisar ter boa circulação,
nenhuma pesquisa foi realizada com o público-alvo, que conforme Côrrea, era uma
prática ainda incomum naqueles anos. Sendo assim, as pesquisas geralmente eram feitas
nas bancas, de modo a avaliar se as publicações estavam vendendo ou não.
Côrrea enfatizou ainda que a revista Pop era uma fórmula editorial nova mesmo
em comparação com as revistas jovens estrangeiras de sucesso comercial como: a
estadunidense Seventeen (1944-), focada apenas no público adolescente feminino; e as
francesas Salut les Copains (1962-2006) - que apesar de ser dirigida para garotas e
garotos, se restringia apenas à música – e Mademoiselle Âge Tendre (1964-1974), que
também era destinada apenas às moças.
Durante sua direção, referente às edições 1 e 2 (novembro e dezembro de 1972),
destacaram-se as colaborações de produção de Moda de Christiane Fleury e de Maria
Luiza Fernandes e dos fotógrafos brasileiros José Antônio de Moraes, Bubby Costa,
Eduardo Clark e do inglês Roger Bester. A priori, Christiane Fleury48, criou conteúdos de
Moda apenas para a primeira edição da revista Pop. Fleury se formou em jornalismo
pela Sorbonne, trabalhando em Paris nas revistas Elle e Manchete no início dos anos
1970 e ao regressar ao Brasil passou a atuar como editora de Moda e Estilo na Editora
Abril, trabalhando para títulos como Noticiário da Moda, Claudia e Elle. Maria Luiza
Fernandes, também conhecida como Malu, trabalhou até a edição 46, em agosto de
1976. Christiane Fleury coordenou o Comitê de Moda da Abril durante vários anos, no
qual Malu passou a representar a Pop. Costanza Pascolato também integrou o Comitê de

48 Disponível em: <https://ecitydoc.com/download/entre-a-casa-e-sua_pdf>. Acesso em: mar. 2018.


65

Moda, sendo responsável pela revista Claudia, assim como Fernando de Barros,
incumbido da Moda masculina das revistas Quatro Rodas49 e Homem/Playboy50.
Sendo assim, de acordo com Kaz (2018), terceiro diretor da Pop, o Comitê de
Moda da Abril, do qual também participou durante algum tempo, era um dos meios
através dos quais ocorriam diálogos entre a equipe de Moda da Pop e profissionais da
área que atuavam em outras revistas da editora. A partir do Comitê de Moda,
profissionais da Abril tomavam conhecimento a respeito das novidades do universo da
Moda por meio de órgãos internacionais de informação sobre o mercado do vestuário
como GAP e Dépeche Mode. Além disso, também utilizavam serviços especializados em
notícias fornecidos por agências como a alemã Reuters e a espanhola EFE. Estas pessoas
também se informavam por meio de desfiles realizados no Salão de Prêt-à-Porter em
Paris e da empresa multinacional Rhodia S.A., cujos desfiles ocorreram naqueles anos na
Feira Nacional da Indústria Têxtil (FENIT). As novidades sobre Moda também eram
obtidas nas ruas, em festas e viagens à Nova Iorque e às capitais europeias, por exemplo.
Os fotógrafos supracitados trabalharam esporadicamente em diversas edições da
revista. José Antônio, foi um dos fotógrafos mais atuantes entre os anos 1960 e 1980,
realizando trabalhos para as revistas Claudia51 e Nova no início dos anos 1970 (ALI,
2009). Já Roger Bester também fotografou para Realidade (MELO, 2008). Entre eles,
ressalto Bubby Costa52, que nos anos 1970 também trabalhou para revistas masculinas
como Status e Playboy, e cujas fotografias de manequins femininos para a Pop tinham
cunho mais erótico e sensual.
Antes de Gilberto di Pierro (1942-) assumir a direção da revista Pop, dirigiu o
jornal Última Hora, colaborou na criação da revista Contigo! e atuou como redator-chefe
da Pop.53 Durante a sua gestão, entre janeiro de 1973 e fevereiro de 1975 (da edição 3 a
28), a revista Pop passou por algumas transformações que afetaram os aspectos
materiais da publicação, entre elas, destaco a criação do SuperPop e do HitPop. O
SuperPop foi produzido inicialmente em fevereiro de 1973 como uma edição extra da

49 Conforme os expedientes das revistas Pop e Quatro Rodas.


50 A revista Playboy foi impedida pela censura da Ditadura Militar de usar o título em questão, sendo
chamada inicialmente, em 1975, de Homem. Em 1978, a revista pode assumir seu nome original.
Disponível em: < https://extra.globo.com/tv-e-lazer/veja-cinco-curiosidades-sobre-revista-o-fundador-
da-playboy-21885641.html>. Acesso em: jul. 2018.
51 Conforme expedientes da revista Claudia.
52 Disponível em: <http://www.pedacodavila.com.br/materia/?matID=1442>. Acesso em: jul. 2018.
53 Disponível em: <https://blogprnewswire.com/2016/03/03/giba-um-jornalismo-economico-politico-e-

de-estilo-de-vida-2/>. Acesso em: mar. 2018.


66

revista Pop, a priori devido à sua boa aceitação pelo mercado consumidor: “A revista
Geração Pop foi tão bem aceita nos seus primeiros números, que a gente resolveu fazer
logo este SuperPop, um suplemento especial cheio de posters que são umas tremendas
curtições” (SUPERPOP, n 1, fevereiro de 1973, sem página).
Inicialmente o SuperPop foi vendido a Cr$ 4,00, chegando a ter um preço
superior do que a própria revista, que no período, custava Cr$ 3,00 (POP, n. 4, fev. 1973,
p. 36-37). A diferença de preço provavelmente estava atrelada à proposta do SuperPop,
constituído por nove pôsteres coloridos em grande formato, que eram vendidos
dobrados em formato de folder (figura 5). No verso dos pôsteres haviam conteúdos
divididos de acordo com as seguintes seções SuperJornal e Play-Pop. O SuperJornal
(figura 6) abordava assuntos sobre música, cinema, desenho animado, história em
quadrinhos, artes plásticas, turismo, esporte, lazer, Moda, comportamento e dieta
alimentar. Nesta seção, também eram divulgados os últimos lançamentos da indústria
musical, sob o título Hit-Pop, e anúncios de marcas de Moda, sob a denominação “Dicas
Pop”. Na seção Play-Pop (figura 7) foram veiculados jogos, tiras cômicas, horóscopo e
novidades sobre os “astros”. Possuo apenas duas edições digitalizadas do SuperPop, a
primeira, de fevereiro de 1973, e a quinta, de junho de 1973, sendo assim, é complicado
afirmar o período da sua extinção.
67

Figura 5: Pôster da cantora Gal Costa veiculado no SuperPop.


Fonte: SUPERPOP, n 1. Acervo de Wenilton Daltro.
68

Figura 6: Seção SuperJornal do suplemento SuperPop.


Fonte: SUPERPOP, n 1. Acervo de Wenilton Daltro.
69

Figura 7: Seção Play Pop do suplemento SuperPop.


Fonte: SUPERPOP, n 1. Acervo de Wenilton Daltro.

Já o suplemento HitPop, derivado da coluna Hit-Pop do SuperPop, foi lançado na


edição 12 em outubro de 1973, sendo proibido de ser comercializado separadamente da
revista Pop. Antes disso, o HitPop também já havia aparecido na edição 11 da Pop,
quando foi publicado em uma única página da revista (BORGES, 2003). A partir da
edição 12, o HitPop passou a ser editado em papel jornal em formato tablóide, com
muito mais conteúdo sobre música. Ele era vendido dobrado ao meio, dentro da revista
Pop (figura 8). Ao longo da existência da Pop, o HitPop passou por várias
transformações, chegando a configurar novamente as páginas da revista nas suas
70

últimas edições. Uma dessas mudanças, que será comentada posteriormente, passou a
relacionar, de certo modo, o HitPop ao público jovem masculino.

Figura 8: Suplemento HiTPop e capa da revista Pop.


Fonte: POP, n 21, jul. 1974. Acervo pessoal.

Também é importante pontuar que ao longo da gestão de Gilberto, algumas capas


enfatizaram, a partir de splashes ou de caracteres em caixa alta, assuntos marcadamente
relacionados às questões de gênero, rock e sexualidade por meio de chamadas como:
“Sexo e violência no som de Alice Cooper” (edição 3); “David Bowie: no palco não sou
homem, nem mulher” (edição 18); “Suzi Quatro: não sou garota, nem rapaz. Meu sexo é o
rock” (edição 24); e “O sexo no rock” (edição 28).
Durante a direção de Gilberto se sobressaiu mais uma vez Malu Fernandes como
editora de Moda. Neste período, Christiane Fleury e Fernando de Barros, que faziam
parte do Comitê de Moda da Abril, também prestaram serviços na área de Moda para a
Pop, mas apenas em poucas ocasiões conforme a própria revista. Além dos fotógrafos já
mencionados, tiveram trabalhos publicados nesta época, o espanhol Antonio Guerreiro,
o estadunidense David Drew Zingg (1923-2000), além dos brasileiros Dudu Tresca
(1949-), Chico Aragão (1949-) e Fernando Louza, que já gozavam de certo
reconhecimento no campo publicitário e editorial. Antonio Guerreiro trabalhou para
71

diversos periódicos nos anos 1970 como Pasquim, Setenta, Manchete, Vogue e Playboy,
sendo o autor da foto da capa do disco “Índia”, de Gal Costa, que foi censurada na época
pela Ditadura Militar54. Zingg, Aragão e Louza, que atuaram em várias edições da Pop,
também realizaram trabalhos para outras revistas da Abril naqueles anos como:
Realidade, Noticiário da Moda, Claudia e Nova55.
O jornalista Leonel Kaz, que já havia trabalhado no Noticiário da Moda, revista
voltada para o setor têxtil, assumiu a direção da Pop entre as edições 29 a 47 (entre
março de 1975 e setembro de 1976). Durante este período, a redação da Pop mudou de
endereço, passando a residir na Rua do Curtume, 585 - na Lapa de Baixo, um bairro
industrial da cidade de São Paulo. Ao longo da gestão de Kaz, as capas tornaram-se mais
ousadas do que de costume, destacando assuntos tabus por meio de chamadas como:
“Virgindade, sim ou não?” (edição 30); “O amor está mais livre?” (edição 31);
“Casamento já era?” (edição 32); “Vale tudo no namoro?” (edição 33); “Amor e sexo:
você sente prazer?” (edição 34); e “Timidez não está com nada: saia dessa!” (edição 44).
Estas capas (figura 9) retrataram casais heterossexuais em posturas mais liberadas,
dialogando com o relaxamento dos costumes promovido pelas relações entre a
contracultura, o feminismo de Segunda Onda, o movimento gay e o comércio de pílulas
anticoncepcionais. A nudez dorsal, comum aos garotos e as garotas, também pode ser
observada em algumas capas, embora a visualização dos seios tenha sido interditada por
meio de artefatos como quadros e toalhas. Além da nudez, o contato físico entre as
parelhas também é marcante nas fotografias, sugerindo que não se tratam de jovens
virgens, pois há intimidade sexual entre eles.

54 A solução encontrada pela gravadora foi envolver o álbum num plástico azul, gerando curiosidade e alta
vendagem. Disponível em: <https://revistatrip.uol.com.br/trip/antonio-guerreiro>. Acesso em: jul. 2018.
55 Disponível em: <https://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/o-registro-historico-do-brasil-nas-fotos-de-

david-drew-zingg>; <www.aragao.net>; <www.fernandolouza.com.br>;


<http://angeliretratosdavida.blogspot.com/2009/04/historia-da-moda-brasileira-by-marco.html>;
<https://cosmopolitan.abril.com.br/celebs/leao-o-homem-das-pernas-bonitas/>. Acesso em: jul. 2018.
72

Figura 9: Capas da revista Pop.


Fonte: POP, n 30, 31, 32, 33, 34 e 44, anos 1975 e 1976. Acervo pessoal.

Na percepção de Kaz (2018), muitos jovens compraram a revista justamente por


que não eram “pop”, o que o levou, inclusive, a cunhar a expressão: “Quem é pop, não lê
Pop”56.
Ou seja, quem lia Pop era, exatamente, o não-descolado, o-por-fora, o que
queria se entrosar e via na revista as dicas, os caminhos visuais, o up-to-date
das gírias para se manter atualizado. As pessoas compravam Pop não porque
elas já seriam pop, descolados, hippies, surfistas ou congêneres. Mas a revista
alimentava o sonho de muita gente que queria chegar lá (KAZ, 2018).

Por meio deste relato, Leonel Kaz marca a relação entre o termo pop e modos de
ser e estar no mundo conectados, de certa maneira, à contracultura. A sua declaração
reforça uma visão dicotômica a respeito das pressupostas pessoas “pop” e “não-

56 A palavra Pop, utilizada por Kaz para se referir à revista, foi sublinhada de modo a adequá-la à
linguagem já empregada no documento de qualificação, a fim de evitar dúvidas e imprecisões.
73

descoladas”, construindo hierarquias sociais entre elas, sugerindo que a identidade


“pop” seria um ponto de chegada a ser alcançado pela “evolução” de jovens “não-
descolados”. Além disso, ao mesmo tempo que Kaz parece ter uma visão essencialista a
respeito das identidades dos surfistas e hippies, propondo nas entrelinhas, que se
tratariam de pessoas naturalmente “descoladas”, por outro lado, sugere que as
identidades são construídas na interação com o mundo, uma vez, que jovens “por-fora”
precisariam se atualizar, acatando as dicas dadas pela revista, para “chegar lá”, ou seja,
para se tornarem pessoas “pop”. Ademais, ao pressupor que todos os surfistas e hippies
seriam “descolados”, Kaz simplifica o caráter múltiplo, complexo, contraditório e
mutável das identidades. Pois, surfistas e hippies não são necessariamente pessoas
“descoladas” e livre de preconceitos, podendo se identificar com posições-de-sujeito
conservadoras. Kaz também minimiza a variedade do público leitor, ao excluir a
possibilidade das pessoas supostamente “descoladas” não lerem a revista. Pois, de
acordo com o documentário Botinada (2006), João Gordo - vocalista da banda “Ratos de
Porão” fundada em 1981 – foi leitor da Pop durante sua adolescência, mesmo podendo
ter sido considerado uma pessoa “descolada”, por ter se envolvido com a cultura punk
no final dos anos 1970, estando esta conectada, de certo modo, à contracultura do
período.
Kaz (2018) relatou ainda que sempre gostou de trabalhar com pessoas com
pontos de vista distintos e que sua equipe era bastante eclética, incluindo, “um repórter
que se envolvia com drogas, um redator homossexual e outro semi-hippie”. Malu
Fernandes atuou como editora de Moda até a edição 46, deixando a revista um mês
antes da saída de Kaz. Na edição 47, Maria Aparecida Pinto da Silva, conhecida como
Cidinha, passou a representar a Pop no Comitê de Moda da Abril, embora já tivesse
trabalhado como produtora de Moda na edição 45. Em alguns expedientes, o próprio Kaz
configurou como interlocutor da Pop no Comitê de Moda, apesar de não existir nenhum
editorial de Moda assinado por ele. Márcia Peixoto e Silvia Adami, cujas biografias são
inexistentes na Internet, também fizeram colaborações pontuais.
Com relação aos fotógrafos, atuaram na Pop nesta época, o estadunidense
Michael Soluri, o italiano Ézio Vitale (1926-1991) e o carioca Luiz Garrido, além de
alguns já citados. Vitale mudou-se para o Brasil em 1972 continuando a carreira de
fotógrafo iniciada na Itália. Durante sua carreira, fotografou celebridades como Brigitte
Bardot, Twiggy, Kim Novak, Peter Fonda e Woody Allen, alguns deles, associados à
74

cultura jovem e à contracultura. Garrido, ao retornar ao Brasil, passou a se dedicar à


fotografia de Moda e publicidade, tendo realizado trabalhos para diversas revistas57.
A jornalista carioca Marilda Meireles Varejão (1943-)58 foi a única mulher a
dirigir a Pop, atuando entre as edições n° 48 a 56, publicadas entre outubro de 1976 e
junho de 1977. Ela também trabalhou como repórter e redatora nas primeiras oito
edições da revista, realizando reportagens sobre Orientação Profissional e Turismo.
Durante sua gestão, foi publicada pela primeira e única vez uma fotografia da equipe
responsável pela produção da Pop, cuja imagem apresenta anotações de uma ex-leitora
da revista (figura 10). De acordo com Varejão (2018) tratava-se de uma equipe jovem,
com alguns integrantes tendo apenas 20 e poucos anos de idade. Ela e Celso Kinjô, editor
executivo naqueles anos, eram as pessoas mais velhas da equipe, tendo 30 e poucos anos
de idade. Varejão (2018) relatou ainda que, apesar do material ser analisado por
Thomaz Côrrea Souto antes de ser publicado, sua equipe tinha certa autonomia. Sendo
assim, a publicação era feita, em certa medida, de jovens para jovens.

57 Disponível em: <https://www.stsenzatitolo.com/st/artist/ezio-vitale/>;


<http://iphotochannel.com.br/fotografia-contemporanea-2/fotografia-autoral-e-tema-de-bate-papo-
com-luiz-garrido-e-walter-thoms>. Acesso em: jul. 2018.
58 Trabalhou 28 anos na Editora Abril, tendo convivido com três gerações da família Civita (Victor,

Roberto e Giancarlo). Também realizou trabalhos para as editoras Bloch e Globo. Foi a primeira mulher
jornalista a trabalhar na revista Quatro Rodas (Abril) e a segunda a atuar na revista Manchete (Bloch),
depois da jornalista feminista Heloneida Studart. Dirigiu ainda a revista Pais & Filhos e atuou em outras
publicações como Claudia, Marie Claire e Criativa (VAREJÃO, 2018).
75

Figura 10: Equipe da revista Pop sob direção de Marilda Varejão.


Fonte: POP, n° 51, p. 3. Acervo pessoal.

Marilda também participou de um fenômeno marcante da história da mídia


impressa jovem brasileira: a transformação da Capricho na “revista da gatinha”, que
ocorreu em torno de 1977 ou 1978 (VAREJÃO, 2018). Depois de deixar a Pop, Marilda
assumiu a direção da Capricho após a saída de Regina Festa, sendo responsável pela
76

extinção das fotonovelas e pela sua modificação em uma publicação voltada


exclusivamente para o público feminino jovem59.
Durante a gestão de Marilda, a linguagem pop também passou a ser utilizada com
maior ênfase no logotipo, que desde o seu início, foi configurado com flexibilidade,
passando por mudanças de cor, preenchimentos em dégradé, e apresentando, de vez em
quando, linhas de contorno (outline). No entanto, nas capas das edições 48, 49, 50, 51,
52, 53, 54 e 56 foram acrescentados elementos figurativos e abstratos ao logotipo, que
evocaram uma imagem ainda mais descontraída, bem humorada e divertida. Como
preenchimento do logotipo foram usados pontos de retículas ampliados, fazendo
lembrar as texturas utilizadas pelo pintor estadunidense Roy Lichtenstein, em sua arte
pop inspirada em história em quadrinhos. Em outros casos, o desenho da letra “o” foi
transfigurado em objetos do cotidiano como: um enfeite de árvore de natal para uma
edição de dezembro; sol, guarda-sol e água de coco para números lançados durante a
primavera e o verão; e uma bola para uma edição que trazia um guia sobre ginástica,
cuja ilustração foi elaborada para interagir com a manequim retratada na capa da
revista. Em outra edição, o design do logotipo baseou-se na iluminação neon, que
articulado às posturas corporais e às roupas usadas pelo casal de manequins,
rememorou o ambiente das discotecas (figura 11).

59Varejão contou que a ideia era criar uma versão da revista Claudia para o público feminino jovem das
classes B e C, contendo orientações sobre Moda, decoração, culinária e um caderno de Tv (VAREJÃO,
2018).
77

Figura 11: Capas da revista Pop.


Fonte: POP, n 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54 e 56, anos 1976 e 1977. Acervo pessoal.

Na edição 48 da Pop, Hiluz del Priori, que trabalhava no Noticiário da Moda,


prestou colaboração na produção de Moda da revista Pop. Na mesma edição, Harumi
Zwetsch60 também atuou como produtora de Moda, aparecendo no Comitê de Moda da
Abril como representante da Pop. Entretanto, ela foi substituída por Beth Duran, já na
edição 49, que assumiu a liderança da produção de Moda da revista. Além delas,
trabalharam com conteúdo de Moda, a jornalista Gilda Chataignier61 e Isa Goldberg,
sobretudo, na seção “As coisas”62, cujas ilustrações de vestuário foram feitas por Antonio
Pereira da Silva. Chataignier também realizou trabalhos, ao longo da sua carreira, para
as revistas Manchete e Desfile da editora Bloch e para as publicações Claudia e
Manequim da Abril (CHATAIGNIER, 2010). Maria Eugenia Nardi e Lou Rangel também
colaboraram pontualmente como produtoras de Moda. Além dos fotógrafos Dudu Tresca

60 Na época provavelmente casada com Valdir Zwetsch, que atuou primeiramente no jornal HitPop e
depois como redator-chefe, sob a direção de Carlos Alberto Fernandes.
61 Fez colaborações nas revistas Manchete e Desfile da editora Bloch e nas publicações Claudia e

Manequim da Abril. Também assinou uma coluna na revista Vogue e ao longo da sua carreira entrevistou
pessoas como Chanel, Yves Saint Laurent e Mary Quant entre outros. In: CHATAIGNIER, Gilda. História da
Moda no Brasil. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2010.
62 Chamada inicialmente de “Popscope”, nesta seção era possível encontrar notícias a respeito das últimas

novidades referentes ao lazer, à Moda, à beleza e ao mundo dos “astros”.


78

e Chico Aragão, que já vinham trabalhando para Pop há alguns anos, também atuaram o
carioca Luiz Garrido (1945-) e A. Fratelli. Garrido atuou como correspondente da revista
Manchete no final dos anos 1960 e quando retornou ao Brasil, em 1971, passou a
trabalhar com fotografia de estúdio, nos campos editorial, de Moda e publicidade63.
O jornalista Octávio Chaves de Souza geriu as edições de n° 57 a 73, período
compreendido entre julho de 1977 e novembro de 1978. Antes de dirigir a publicação,
ele fez parte do seu grupo editorial, sendo responsável pelo conteúdo de Variedades. As
capas da Pop passaram por algumas modificações no início da gestão de Octávio. Até a
edição 57, lançada em julho de 1977, 79% as fotografias das capas da Pop eram
constituídas por casais de manequins, 16% por trios compostos por duas garotas e um
rapaz, 4% por grupos de amigos compostos por mais de 4 pessoas (incluindo tanto
garotas quanto garotos). Da edição 58 a 63, as capas foram configuradas a partir de
outras temáticas, fazendo uso de fotografias de atletas como os surfistas Daniel
Friedman e Pepê, este último campeão brasileiro de surfe na época; e também de
artistas da área musical como Ney Matogrosso, Rita Lee, Fafá de Belém, Peter Frampton,
Elvis Presley, Rod Stewart e As Frenéticas. Além de incorporar fotografias de atletas e
artistas, as capas também retrataram manequins, cuja função era apresentar as últimas
Modas e opções de lazer. A revista também passou por transformações no seu layout.
Com exceção da fotografia das Frenéticas, que ilustrou uma edição natalina, imagens de
atletas, artistas e manequins “dividiram” a mesma capa. Diferentemente das capas
anteriores a edição 58, cujas fotografias ocupavam toda a capa da revista, as capas dos
números seguintes passaram a ser configuradas com várias imagens organizadas
segundo uma estrutura. Sendo assim, apesar de poder ter reduzido seu impacto visual,
ao fazer uso de imagens em dimensões menores, a Pop oportunizou a visualização
prévia dos “melhores momentos” da edição, trazendo imagens sobre esporte, lazer,
Moda e o mundo musical (figura 12).

63 Disponível em: <https://www.escritoriodearte.com/artista/luiz-garrido>. Acesso em: jul. 2018.


79

Figura 12: Capas da revista Pop.


Fonte: POP, n 58, 59, 60, 61, 62 e 63, anos 1977 e 1978. Acervo pessoal.

Além disso, a capa da edição 64 foi a única, ao longo das 82 edições, a representar
a amizade entre duas garotas. Nela, as manequins foram fotografadas deitadas em uma
rede em poses descontraídas, vestindo camisetas compridas que deixaram grande parte
das pernas à mostra. Os corpos foram retratados em relação de proximidade, sugerindo
intimidade entre elas, a perna desnuda de uma das garotas, inclusive, chega a tocar as
nádegas da outra (figura 13).
80

Figura 13: Capa da edição n 64 da revista Pop.


Fonte: POP, n 64, fevereiro de 1978. Acervo pessoal.

Por outro lado, nenhuma capa retratou a amizade apenas entre garotos. As capas
que representaram a amizade foram construídas a partir de fotografias de grupos de
amigos constituídos tanto por garotos quanto por garotas. É possível que a ausência de
capas que ilustrassem a amizade masculina estivesse relacionada ao receio, consciente
ou não, da Pop a respeito desta poder conotar homossexualidade. Pois, diferentemente
da capa da edição 64, que retratou a amizade feminina, onde o toque e a intimidade
entre elas foram representados, nas capas que representaram a amizade, de maneira
geral, a proximidade entre os corpos masculinos foram evitados. Na capa da edição 4, as
garotas foram fotografadas tocando os braços e os ombros dos garotos com as mãos,
sugerindo carinho e intimidade, enquanto o toque corporal entre os rapazes foi
interditado. Na capa da edição 51, em que vários jovens foram retratados tomando
banho de sol na praia, os corpos masculinos foram distanciados enquanto os corpos
femininos foram aproximados (figura 14). Conforme Kimmel e Messner (1992 apud
LOURO, 2000), nas relações de amizade entre homens são mais frequentes os obstáculos
81

culturais à intimidade e à troca de confidências entre eles. Logo, a aproximação entre os


corpos masculinos, com a exceção de certos contextos onde o contato físico é justificado,
tende a ser vigiada e corrigida para que eles se enquadrem dentro das masculinidades
hegemônicas, a fim de serem reconhecidos como “verdadeiros” homens. Sendo assim, a
homofobia gera prejuízos afetivos e emocionais tanto para homens homossexuais
quanto para heterossexuais.

Figura 14: Capas das edições n° 17 e n° 43 da revista Pop.


Fonte: POP, n° 4 e n° 51, respectivamente fevereiro de 1973 e janeiro de 1977. Acervo de Luís
Borges e Acervo pessoal.

A Pop passou por uma transformação na edição 65, em março de 1978, que
perdurou até a sua extinção. Criada inicialmente com a proposta de ser uma publicação
voltada tanto para garotas quanto para garotos, a revista tratou assuntos
tradicionalmente vistos como de interesse masculino (futebol, por exemplo) e feminino
(Moda, por exemplo) como conteúdos “unissex”. A chamada da reportagem “Um volante
assim na máquina, já pensou?” – cuja temática poderia ser associada culturalmente
apenas aos garotos - não fez distinção de gênero: “A onda agora é volante esportivo.
Qualquer cara ou menininha quer ter um para equipar sua máquina” (POP, n. 10, p. 74-
76, agosto de 1973). Mas apesar de muitos assuntos terem sido abordados desta forma,
vários conteúdos não foram apresentados desta maneira. Algumas reportagens sobre
82

Beleza e a prática “Faça você mesmo”, por exemplo, consideraram apenas o público
feminino, reiterando relações históricas e culturais entre mulheres, aparência física e
aptidão manual (ILLOUZ, 2016 e CARVALHO, 2008).
Na edição 65, esta diferenciação de gênero, que ocorria em certa medida na
publicação, tornou-se bem marcada: a revista Pop passou a dividir espaço com a revista
Pop Garota. Enquanto a primeira passou a ser destinada ao público jovem masculino, a
segunda foi dirigida ao público jovem feminino. Sendo assim, o público leitor
encontrava-se diante de duas publicações em uma só revista: de um lado, a revista Pop;
do outro, virando-se a revista de ponta-cabeça, a Pop Garota (figuras 15 e 16). Contudo,
a paginação não foi alterada. Logo, enquanto a numeração da revista Pop começava,
geralmente, na página 3 a da Pop Garota se iniciava em torno da página 8064.

Figura 15: Capas da revista Pop Garota e Pop.


Fonte: POP, n 65, mar. 1974. Acervo pessoal.

64 Esta contagem chegou ao número 100, quando os suplementos voltaram a compor as páginas da revista.
83

Figura 16: Encontro das páginas das revistas Pop e Pop Garota.
Fonte: POP, n 65, mar. 1974. Acervo pessoal.

Na edição 65, um texto de apresentação veiculado na revista Pop Garota explicou


esta mudança:
Você, por acaso, já imaginou uma revista com reportagens dedicadas
exclusivamente às garotas? Pois é: a partir deste número, POP vai ser essa
revista. Aliás, você já deve ter notado uma porção de mudanças nela. A primeira
parte continua a mesma de sempre: muito som, ar livre, surf, altos visuais. Isso
até a metade. Depois é que entra a grande novidade: Pop Garota, uma outra
revista (com capa e tudo) que as gatinhas vão curtir a mil. Agora, as
reportagens de moda, saúde, beleza, serão muito mais completas, cheias de
dicas. E isso não é tudo. A gente vai falar também de garotas iguais a você, de
gente famosa, esporte, namoro, sexo, música e um montão de outras coisas que
você adora. Isso não significa, porém, que você deve ler apenas Pop Garota. Seja
curiosa (e quem não é?), vire a revista de cabeça para baixo (é divertido!) e
entre no papo dos gatões. Afinal, estar bem informada sobre eles talvez seja a
melhor arma na hora de conquistá-los. Experimente, vai ser legal! (POP, n 65,
mar. 1974, p. 82).

Conforme este trecho, a revista passou a associar assuntos sobre música, lazer e
esporte ao público leitor masculino e conteúdos sobre Moda, saúde, beleza e sexualidade
ao público feminino. Entretanto, a despeito deste trecho desconsiderar que os garotos
também poderiam se interessar por Moda e beleza, isto não se concretiza nas páginas da
revista, que trouxeram editoriais de Moda e reportagens sobre cuidados corporais
dedicados exclusivamente aos garotos. Ainda de acordo com este texto, é possível
84

deduzir o viés heterossexista65 da revista, que pressupôs que todas as leitoras seriam
heterossexuais. Além disso, apesar da Pop sugerir que as garotas deveriam se inteirar a
respeito dos supostos interesses masculinos para conquistar os garotos, a mesma
requisição não foi feita aos rapazes, os dispensando da tarefa de se informar sobre os
presumidos interesses femininos.
Esta distinção de gênero também parece ter sido replicada na composição do
suplemento da revista Pop, que até o momento se restringia apenas ao jornal HitPop.
Assim como a Pop, o HitPop passou a dividir espaço com o Jornal das Coisas (figura 17),
derivado da seção Popscope, presente nas páginas da revista desde a sua criação. O
Jornal das Coisas era dedicado à publicação das últimas novidades, sobretudo, ao meio
artístico, à Moda, ao lazer e à cultura. Logo, considerando a transplantação da dicotomia
de gênero da revista Pop e Pop Garota para a configuração do suplemento é possível
inferir que o Jornal das Coisas passou a ser associado ao público feminino e o HitPop, ao
masculino. Entretanto, a Pop Garota não limitou a leitura do HitPop aos rapazes
declarando às garotas: “Por fim, você ficará conhecendo o novo Jornal das Coisas e,
dentro dele, o novo HitPop – um barato!” (POP, n 65, p. 82, mar. 1974).

Figura 17: Capas do Jornal das Coisas e do HitPop, que compõem o mesmo suplemento.
Fonte: Suplemento da revista POP, n 74, dez. 1974. Acervo pessoal.

65“Quando a heterossexualidade é tomada como um dado, pressuposta ou esperada em teorias, normas


jurídicas ou mesmo em relações sociais cotidianas” (MISKOLCI, 2014, p. 14).
85

De acordo com Thomaz Souto Côrrea (2018), a marcação da diferenciação de


gênero na revista foi uma solução encontrada a respeito da solicitação das empresas
anunciantes. Apesar da alta vendagem da revista, esta não se sustentava
economicamente, inclusive, por se tratar de uma publicação mensal. Sendo assim, o
capital advindo das empresas anunciantes era imprescindível. Conforme relato do
primeiro diretor da Pop, muitas empresas estavam insatisfeitas com o caráter “unissex”
da revista, sentindo-se prejudicadas comercialmente, pois seus produtos eram dirigidos
somente para garotas ou para rapazes. Contudo, a estratégia de fazer duas revistas em
uma só, a priori, vista como uma solução para suprir as necessidades dos anunciantes,
tornar-se-ia o principal motivo da extinção da Pop, como será discutido posteriormente.
Beth Duran continuou configurando como representante da Pop no Comitê de
Moda da Abril até a edição n° 70. Além dela, Mônica Figueiredo contribuiu com
conteúdos sobre vestuário no Jornal das Coisas, no qual tinha liberdade para estabelecer
pautas e entrevistar pessoas. Mônica – filha do produtor e diretor de shows Abelardo
Figueiredo e de Laura, que tivera uma curta passagem pela televisão como
entrevistadora no programa feminino de Maria Teresa, na TV Tupi, dirigido por
Abelardo - entrou na Pop a convite de Thomaz Souto Côrrea, quando tinha acabado de
chegar de Londres (DIP, 2009). Maria Alice Teixeira Soares, Terezinha Galante, Helena
Montanarini, Márcia Peixoto, Ângela Marques da Costa e Maria Lucia Rangel também
produziram, eventualmente, conteúdos de Moda para a Pop. Com relação à fotografia de
Moda, destacaram-se os trabalhos de Dudu Tresca, do carioca Itaci Batista (1947-) e do
espanhol J. R. Duran (1952-), na época casado com Beth Duran. Batista mudou-se em
1972 para Paris onde trabalhou com fotografia de Moda para publicações editoriais e
marcas de cosméticos durante cinco anos. Retornou a São Paulo em 1977, fotografando
editorias de Moda para diversas revistas66. J. R. Duran, reconhecido pelos seus trabalhos
nas áreas de Moda e publicidade, chegou ao Brasil no começo dos anos 1970, aos 18
anos, trabalhando na Pop no início da sua carreira, após estagiar em um estúdio67.
Carlos Alberto Fernandes, conhecido como Caloca, foi diretor da Claudia
durante os anos 1970 e o último diretor da Pop, gerindo as edições de n° 74 a 82, entre
dezembro de 1978 e agosto de 1979. A equipe liderada por Fernandes também era
composta por pessoas jovens, conforme seu relato a respeito da Pop:

66 Disponível em: <http://www.confoto.art.br/fotografia/fotoclubes/sao-paulo/item/48-palestra-com-o-


fot%C3%B3grafo-itaci-batista.html>. Acesso em: jul. 2018.
67 Disponível em: <http://www.jrduran.com.br/news/arquivo/2004_07.php>. Acesso em: jul. 2018.
86

uma revista para jovens que eu dirigia com prazer, na alegria dos meus
quarenta anos, depois de ter dirigido, com igual alegria, uma revista para
senhoras pouco menos jovens. Era um descanso, uma verdadeira festa lidar
com aquela juventude cuja criatividade era preciso controlar com rédea curta
(apud DIP, 2009, p. 23).

A edição 82, de agosto de 1979, foi a última publicação da Pop, que foi
“substituída” pela Garota Pop, um revista autônoma, em formato menor, que a priori,
derivou da Pop Garota (figura 18). Apesar de ter se tornado uma revista “independente”,
a numeração da Garota Pop, continuou a seguir a da Pop, iniciando na edição 83. Possuo
apenas as edições 84 e 85 da Garota Pop, cujas informações escassas dificultam
conhecer seu período de circulação.

Figura 18: Diferenças de formato entre a revista Pop e a nova revista Pop Garota.
Fonte: POP, n 82, ago. 1979. Acervo pessoal.

A criação da revista Garota Pop foi anunciada pela própria Pop Garota:
Os tempos mudaram. Para acompanhar os novos tempos, as novas
transas...Vem aí a nova revista Garota Pop! Com novo formato para estar
sempre com você em todas as suas transas. A partir da próxima edição, Pop
também vai mudar! (POP, n. 82, ago. 1979, p. 83).

Sendo assim, a publicação não mencionou o fim da revista Pop, mas apenas que
ela passaria por alguma modificação, o que de fato não aconteceu. De acordo com
Thomaz Souto Côrrea (2018), as empresam anunciantes reclamaram na época que havia
sido um grande erro dividir a Pop em duas publicações, pois na percepção deles, ela
continuava funcionando como uma revista “mista”. Côrrea, relatou a sua maneira, a
87

reclamação dos anunciantes: “A gente não quer falar com metade da revista, a gente
quer falar com uma revista que seja (...) inteira”. Logo, as empresas queriam que suas
publicidades circulassem em revistas voltadas somente para o público feminino ou
masculino, o que nos leva a compreender, a priori, um dos motivos da criação da revista
jovem Garota Pop. Conforme Côrrea (2018), a Pop não encerrou suas atividades devido
a baixa vendagem, que aliás fechou “com um nível alto de circulação para época”, mas
em consequência da falta de anunciantes, pois a revista não se sustentava
economicamente, inclusive, por se tratar de uma publicação mensal.
Durante a gestão de Carlos Alberto, Marcia J. A. Gimenez assumiu a representação
da Pop no Comitê de Moda da Abril até a extinção da revista, continuando a trabalhar
como produtora de Moda na revista Garota POP, sob direção de Iara Rodrigues Martins.
Além dela, Maria Alice Teixeira, que atuou na seção Ideias Pop, e Ana Cláudia de Oliveira
também trouxeram colaborações no que se refere aos conteúdos sobre vestuário. Itaci
Batista e J. R. Duran continuaram a fotografar, ocasionalmente, os editoriais de Moda na
Pop, além do paulistano Clicio Barroso.
Portanto, de modo geral, destacaram-se ao longo da existência da revista Pop, as
produções de Moda de Malu Fernandes, Beth Duran e Marcia Gimenez. Apesar disso,
informações sobre a carreira delas são praticamente inexistentes. Questão que poderá
ser investigada com maior dedicação em um momento posterior, mas que está além dos
objetivos deste trabalho. Apesar da produção de Moda ter sido predominantemente
realizada por mulheres, com exceção de Fernando de Barros, com relação à fotografia
dos editoriais de Moda, não me defrontei com nenhum trabalho realizado por fotógrafas.
Além disso, é possível inferir que muitas das pessoas que trabalharam na revista Pop
faziam parte das camadas médias e abastadas do Brasil, tendo realizado cursos no
exterior.
A seguir exponho as seções e os conteúdos de Moda veiculados ao longo da
trajetória da revista Pop, que poderão ser utilizados como fontes para a análise da
representação da Juventude “cuca fresca” a partir da articulação entre Moda jovem e
práticas corporais.

Você também pode gostar