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M AR IA FR AN CA P IR ES
e n tr e p a p é is e vo z e s
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M AR IA FR AN CA P IR ES
Orientação
Profª. Ms. Odomaria Macedo
Projeto gráfico
Jane Aline Bastos
Capa
Leônidas Vidal
93 páginas: 14 cm x 21 cm
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SUMÁRIO
Prefácio 9
13 Apresentação
15 RASTROS
Uma pessoa entre papéis e vozes
78 Um caso de amor...
Agradecimentos 83
Bibliografia 85
Jornais 86
Revistas 87
Entrevistados 88
Créditos das fotografias 89
Os Cadern os de Maria 90
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PREFÁCIO: CARTA AO AMANHÃ
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- Professora adjunta da UNEB Departamento de Ciências Humanas Campus III. Mestra em Sociologia .
Especialista em Antropologia.
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APRESENTAÇÃO
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RASTROS
Um a pessoa entre papéis e vozes
Nem sabia que existia aquela sala ali, seguindo por um corredor
ao lado da biblioteca. Fomos levados para lá depois de escrever o
texto sobre a importância da pesquisa, na seleção para monitoria do
projeto O arquivoda profª Maria Franca Pires: memória ehistória cultural em
pesquisa na região de Juazeiro-BA .
Ao abrir a porta, inevitável não se incomodar com o cheiro for-
te de coisa antiga que veio logo invadir nossas narinas. Percorri o
espaço com um olhar de susto e curiosidade. Espalhados sobre a
mesa grande e pelas cadeiras que ocupavam parte da sala, estavam
papéis - muitos e indefiníveis de imediato.
Uma das concorrentes à monitoria de extensão desistiu logo,
tinha renite alérgica e, ao primeiro contato com aqueles materiais
amarelados e desgastados pela ação do tempo, pôs-se a espirrar.
Depois de sermos apresentados ao arquivo pela professora coor-
denadora do projeto - que nos falava enfática sobre o trabalho traba-
lhoso que teríamos pela frente - pensei:
- Mas que figura essa Maria eim! Guardar tudo isso... Será pra quê?
Qual era sua intenção? Quando começou a juntar essas coisas? Por que
guardava objetos tão incomuns como sacos plásticos e embalagens? E
esse sobrenome Pires ? Ai ai ai... Só falta descobrir que somos parentes!
Na hora não percebi o que acontecia, mas daquelas interrogações
firmou-se o laço que me prende até hoje ao mundo que é o arquivo
da professora Maria Franca Pires.
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- Sabe por quê? Porque Maria Pires era LOUCA por Juazeiro.
E ela me dizia: - Dinorah, eu sou de Remanso, mas eu me considero
juazeirense, eu quero bem a sua terra e acho que ela também é mi-
nha terra . Aí, eu confiei TUDO o que eu tinha a ela. Eu disse: -
Pois Maria, eu vou passar meu legado pra você! . E aí, num sabe, eu
passei TUDO, todas as minhas fotografias de família, dei tudo pra
Maria. Ave Maria! Onde ela sabia que tinha gente que soubesse da
história de Juazeiro ela estava presente lá!
O contato com Dinorah trouxe o mundo de Maria Pires -
antes distante, estático e sem vida - para bem perto de mim. Andar
por Juazeiro, inclusive passou a ser diferente. Olho, agora, para os
lugares e me demoro mais, contemplando os aspectos físicos da
cidade. Vou pensando: O que terá sido antes? . Os lugares agora
emanam histórias.
Além de identificar muitas pessoas que aparecem nas fotogra-
fias - seus nomes, sobrenomes e parentescos - Dinorah contribuiu
expressivamente indicando outras fontes que nos contariam outras
histórias - ou a mesma história vista por outros olhos, sentida de ou-
tro lugar.
- É bom vocês falarem com Lourdes Duarte, ela sabe TANTA
coisa de Maria Pires. Ela era a amiga mais chegada de Maria - esfrega
os dedos indicadores, naquele gesto conhecido que indica a proxi-
midade entre duas pessoas - Era ela e Terezinha, a primeira esposa
de doutor Dewilson. Eram as três, não se desligavam, eram as mais
amigas - recomenda Dinorah.
...
Aconchegados pelos sofás e cadeiras, a conversa rolou por horas,
interrompida só quando o estômago começou a roer provocado
pelo cheiro de comida quente vindo da cozinha. Era o meio do dia,
hora de voltar para casa, porém, ainda embebidos de história, tontos
de vida.
...
De Dinorah, voltamos às fotos e preenchemos muitas lacunas.
Outras tantas permaneceram. Mas a exposição Juazeiro Flashes de
Memória do A cervo de Maria Franca Pires nos trouxe outras vozes rele-
vantes, como a de Maria de Lourdes Duarte.
Esta se tornou nossa próxima fonte por três motivos: Lourdes
fora indicada por Dinorah como amiga íntima de Maria Pires;
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mundo tinha sua escola isolada - porque só existia grupo aquele das
Escolas Reunidas. Era escolinha aqui, escola acolá. E essa dificuldade,
muitas vezes, força a gente a descobrir as coisas né. Então, a gente se
juntava, conversava, tentava se ajudar... Também já vinha de uma
relação de família. Ninguém era de fora. Todas as professoras eram
da cidade. A grande maioria estudou em Petrolina. Aí já vinha aquele
laço de lá do Colégio. Já tinha aquela história. Conversa isso, conversa
aquilo... Maria Pires sempre teve belas idéias, muito criativa! - come-
çou assim a descrever-nos Maria...
...
Ainda quando digeríamos as informações do encontro com
Lourdes, eis que Antonila da França Cardoso aparece em Juazeiro.
Seu nome estava listado como uma possível pessoa a ser entrevistada,
já que realizara pesquisas com Maria Pires, em um certo período de
sua vida.
No entanto, não aparecia em nossa lista nos primeiros lugares,
por ser uma das pessoas que, não residindo em Juazeiro, aguar-
dávamos o soprar dos ventos do destino para que esses encontros
se realizassem. E, como se fez costume no caminho desse trabalho,
os ventos do destino a trouxeram para cá, por ocasião de seu
aniversário.
...
Cabelos arrumados, maquiagem leve, trajando um vestido azul
vivo em perfeita harmonia com a decoração de seu partamento
aconchegante, no décimo andar do edifício Champs Elysées, orla
fluvial da cidade - sofá e quadros azuis - Antonila delineia a Maria
que outrora conhecera, entre risos e reticências de sua memória
empolgante e cheia de detalhes vivos. À vista da varanda, o Nego
d Água escuta a prosa e o rio não deixa de correr.
Começou nos falando de sua infância...
- Eu vou começar da minha infância porque tem um aspecto
que foi marcante, que depois vai se encontrar com Maria Pires lá na
frente...
E contou-nos de uma época em que, em Juazeiro, havia um
divisor de águas entre católicos e não católicos - os protestantes.
Este pequeno grupo era então liderado pelo pai de Antonila, Antônio
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É tanto que meu tio Coló não veio ao casamento, porque estava com
poucos dias que ela tinha nascido - lembra Expedito.
Além do parentesco que os aproximava de Maria - primos por
parte do pai dela, Clodoaldo Pires da Costa, que era irmão da mãe de
Perpétua e Expedito, Adalgisa Beatriz de Almeida - eles moraram
muito tempo vizinhos à prima.
- Nós moramos no bairro Santo Antônio e em 1936 nós viemos
ali pra rua Conselheiro Luis Viana, na casa número 33. Depois, nós
passamos pra casa em frente, número 120. Posteriormente, nós
viemos pra casa 101, vizinha à casa de Maria Pires. Mas era uma
pessoa assim, não é porque seja parente não, mas era muito
competente né! - contou-nos Expedito com sua voz mansa e
memória privilegiada.
- E ela, morando ali vizinho à gente, os meninos que num
faziam as tarefas ela deixava lá em casa. Dizia: - Tia Gisa, eu vou
deixar fulano aqui com a senhora . Doutor Pedro Filho, com quem
eu fiz um tratamento agora, foi aluno dela. Aí Pedrinho, ficou muito
lá em casa! E ela deixava lá porque não fazia as tarefas, né Ela trabalhou
MUITO dando banca. Muito mesmo! - lembra Perpétua, entre risos
e embalos em sua cadeira de balanço.
A prima Perpétua se formou professora no Colégio Auxiliadora
no dia 04 de dezembro de 1949, dez anos e um dia depois de Maria
ser diplomada ali mesmo, naquela instituição de ensino. Começou
sua vida profissional lecionando dois anos em Paratinga, uma cidade
próxima a Bom Jesus da Lapa, e, logo após, retorna para sua cidade
natal, onde lecionou até se aposentar.
Trabalhou seis anos no Movimento de Educação de Base,
promovido pela Diocese de Juazeiro, na época em que era bispo
Dom Tomaz Guilherme Murphy - que foi nomeado a 16 de outubro
de 1962 o primeiro bispo daquela Diocese. O MEB funcionava em
Juazeiro através das chamadas Escolas Radiofônicas , as aulas sendo
transmitidas no período da noite, a partir das 18 horas pela Rádio
Emissora Rural de Petrolina.
Thomázia, sempre com os olhos brilhantes, conta de sua ami-
zade com Maria.
- Minha mãe era muito amiga da mãe deles, de Expedito,
Perpétua e tudo. E a gente era conhecido como se fossemos parentes
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As fo to grafias falam !
Do Carnaval de
Juazeiro em 1914;
da avenida
larga e calma
da orla
fluvial da
cidade;
do Portão da
Ponte, erguendo-se
receptivo;
dos paquetes
quebailavam
soberanos entre
Jo as e iro e
Petrolina. 4
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O legado de
Dinorah Mello!
À frente,
5 regendo coral de
professoras;
n o carn aval,
uma das
primeiras
mulheres a
co lo car as
pe rn as d e fo ra
em Juazeiro (a
primeira
agachada da esq.
p/ dir.);
e em um dos
cursos
promovidos
pela
Associação
de Pais e
Mestres .
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Iaby e Kyse,
A mem e divulguem a história da Bahia.
Um beijo da prima
Maria Pires.
...
Mês adorado
O mês de janeiro
Que em Juazeiro
Faz tudo andar
Inebriados nesta alegria
Que noite e dia nos faz vibrar
(Terno Ueianas Letra e Música de Edilberto Trigueiros)
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O dono da casa
É bom, ele dá
Garrafa de vinho
Doce de araçá
Entoemos a voz
A música e o som
Que o dono da casa
É franco ele é bom
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fofoca política; vim para Juazeiro, meu sonho de toda uma vida
de estudante. Muito obrigada senhores pessedistas daquela
época!
Assim Maria Franca Pires conseguiu seu grande sonho:
ficar junto de seu pai, junto de sua família.
- E desde de 1951, todo o meu campo de trabalho foi aqui
- conta Maria, referindo-se a Juazeiro.
É na cidade de Juazeiro que Maria vai ficar conhecida para
sempre como a professora Maria Franca Pires . Mesmo depois
de se aposentar e exercer outras funções que não a de educadora,
ainda assim, as matérias em jornais e revistas, e mesmo a
memória das pessoas, falam da professora Maria Franca Pires .
...
Naquele tempo, o nome das escolas era escolhido pelas
próprias professoras, assim como a sala e os móveis eram
também elas quem providenciavam. As professoras prestavam
concurso e, ao serem nomeadas para trabalhar pelo Estado,
ficavam encarregadas de toda a estruturação da escola.
- Eu que resolvesse meu problema. Era muito raro o
governo dar algum apoio. Pagava x pro aluguel da casa. Você
que fosse procurar sua sala de aula... Eu mesma a primeira
vez... - E onde eu vou botar essa escola pelo amor de Deus? .
Aí Deus me arranjou, me deu aquela que é esquina com a rua
da 28. Tinha uma sala grande na frente. Comprei as carteiras
todas. Feias! - lembra Lourdes Duarte.
A escola regida por Lourdes se chamava Padre Anchieta,
localizada na esquina da rua da 28, numa casa azul. Ela conta
que junto do salário das professoras já vinha o ticket referente
ao valor para o pagamento do aluguel da sala.
- Não era doação não, como é que se chama? Esqueci o
termozinho pra o aluguel da escola. Devia ser trinta reais,
quarenta... Agora, tinha a fiscalização da delegada escolar! Ela
ia às escolas, via as coisas...
Maria escolheu para a sua escola o nome Artur de Sales .
...
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pregadas. Fugiu uma linha do lugar: chega pra lá, chega pra cá!
Letra, comportamento, maneira de sentar. Muito, muito, muito
exigente! - lembra Lourdes.
Parte da memória das aulas e instantes vividos por Maria
Franca Pires na regência como professora primária ficou guardada
em seus cadernos. Num pequeno Diário de Classe , que resistira
ao tempo, está materializada uma história que aconteceu entre as
quatro paredes de sua sala de aula
Ali, nas páginas já um tanto amareladas e nas letrinhas
desenhadas com vagareza e cuidado pelos alunos, pude sentir os
vestígios de um tempo.
Cada dia, um aluno registrou no pequeno diário, datado do
ano de 1957, como transcorrera a aula, acrescentando ao relato
um desenho caprichoso e curiosidades da rotina escolar, como
no dia em que o aluno Carlos José Campelo Evangelista teve a
liberdade de registrar:
A professora passou exercícios e tomou lição de ponto. Mandou fazer
um álbum para entregar a nossas mães. Terminando de pregar as figurinhas,
Carlos Morgan derrubou a carteira de José Milton e a professora deu um
cocorote em Carlos Morgan e em mim quase que me mata de tapa .
...
- Eu me lembro quando ela começou... Menina, ela era terrível!
- diz Antonila, com uma risada longa. E continua:
- Ela dava uns esculachos nos alunos como se eles fossem
adultos. - Você não tem vergonha de vir pra escola com esse pé
sem lavar e num sei o que lá. Sua mãe é uma porca! Porque uma
mãe que tem um filho que vem pra escola desse jeito . Eu ficava
horrorizada! Com o tempo, ela adocicou!
- Ah, Maria Pires era uma professora muito competente,
muito respeitada... - Perpétua sorri ao descrevê-la assim - Por
que ela era enérgica! Num batia não! Mas a professora Maria Pi-
res era respeitada!
No Diário de Classe , estão presentes o lado enérgico
de castigar e exigir mas também aparece, naqueles relatos
infantis, o ambiente doce e aconchegante da escola e das aulas.
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Como numa certa manhã de agosto do ano de 1954. Os
alunos da Escola Artur de Sales já estavam acomodados em suas
carteiras de dois lugares - Maria Emília sentava-se sempre ao
lado de seu colega Edílson - e a professora Maria Franca Pires
regia sua aula como de costume.
De repente, o alto-falante fixado no poste da esquina vibra
pedindo atenção: O Presidente Getúlio Vargas suicidou-se! .
Anunciava.
Divulgada a sua morte, acontecida ao dia 24 de agosto, ela
alcançou o país numa onda de consternação e protesto. Milhares
de manifestantes choraram o presidente morto de forma trágica,
prestando-lhe homenagens em comícios e passeatas que
ocuparam ruas e praças, exigindo respeito à democracia do país.
Em Juazeiro, a notícia chegou com atraso, sendo transmitida
repetidas vezes pela ZYN-21-Rádio Juazeiro e repercutida pelos
serviços de alto-falantes espalhados pelas ruas. A cidade ficou
perplexa diante do acontecimento trágico e a ordem era para que,
em respeito e luto, as atividades fossem suspensas.
Rompendo o silêncio que se instaurou na sala de aula, a
aluna Maria Emília, impulsivamente, vibrou:
- Graças a Deus! Só assim tem um feriado nessa escola!
A professora Maria Franca Pires, ouvindo aquele comentário,
imediatamente voltou-se à aluna repreendendo sua atitude.
- Que ignorância! É o presidente da república!
E o sermão rendeu uma lição sobre patriotismo e respeito
aos símbolos nacionais que Maria Emília jamais esqueceria.
...
- Menina, Maria caiu em mim dos cachorros abaixo! Mas a
gente queria era folga, porque Maria Pires tinha aquele horário
rígido. A aula se começasse sete e meia, a gente tinha que estar lá
sete e meia. E saía onze e meia. Era tudo certinho! Mas também,
foi onde eu aprendi matemática e passei a gostar de matemática
foi com ela - recorda Maria Emília.
...
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...
Houve um tempo em Juazeiro em que as provas eram feitas
à mão pelas professoras. Chegava-se antes, as questões eram
escritas no quadro, depois é que se abria a sala para que os alunos
entrassem, copiassem e respondessem. Todo esse processo era
muito demorado e cansativo.
- Não havia livros didáticos para os alunos. Isso, também,
era muito difícil! Era tudo copiado. Professor chegava, dava a
aula dele e a gente copiava tudo. Alguns professores ditavam: -
Hoje nós vamos estudar... E todo mundo ta, ta, ta. E esperava
até que copiasse tudo - relata Antonila, entre os risos freqüentes
provocados pela lembrança.
- E Maria como presidente da Associação de Pais e Mes-
tres mandou comprar... Como é que chamava Thomázia? -
pergunta Perpétua.
- Mimeografo? - responde perguntado Thomázia.
- É. Mimeografo! Aí, ela como presidente da Associação de
Pais e Mestres, ela mandou buscar o mimeografo em Salvador e
passava as provas da gente. Aí, nós deixamos de ter o trabalho de
copiar aquela prova TODA na mão! - lembra Perpétua.
Antonila recorda que, na época, não existia xerox, nem nada
disso. Era mimeógrafo. Era a álcool. E, às vezes, se pusesse álcool
demais dava uma borradeira roxa na mão.
- E ela começou a imprimir as provas pros alunos da escola
dela. Foi quem primeiro imprimiu prova pra aluno! E as outras
escolas começaram a pedir e ela dizia assim: - Traga o papel .
Mas o álcool era dela, o tempo era dela...
Chegou a um ponto em que Maria estava rodando papel
de prova e também os pontos - o conteúdo das matérias que
era dado pelos professores e aos quais se cha-mavam pontos
- pra todas as escolas de Juazeiro.
- Começou aí a história de livro impresso. Mas, impresso de
mimeógrafo e era ela! E só dizia: - Tragam o papel! - revela
Antonila.
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Almoço das
professoras no
Clube Comercial
em 36/07/1959 (14).
O Diário de Classe
da Escola Artur de
Sales de 1957,
preservado no
arquivo de Maria
Pires (15).
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O trabalho na
Associação de Pais e
Mestres preservado
em fotos e
documentos
guardados no arquivo
de Maria.
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Curso de Literatura
Infantil com Corina
Ru iz e m 19 6 8 ( 16 e 17) ,
Curso de Organização
Familiar Maria Schimidt
em 1967 ( 18 e 19 ) e
Certificados (20 e 21).
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o cabelo arrumado, não sei que horas ela botava os bobis, porque
eu não me lembro dela de bobis, mas ela sempre tava com o
cabelo arrumado! E ela sempre dizia: - Vixe Maria, o cabelo já
ta enrolando! . E quando chovia fazia brincadeira: - O cabelo já
vai desmanchar. Num quero tomar esse chuvisco não, vai
desmanchar meu cabelo! .
E a descrição de Maria se estende aos acessórios e atitudes,
de modo que chego a visualizá-la tal qual delineia a memória de
Odó, como é chamada pelos amigos mais chegados.
- Gostava muito de usar colar! Uns colares de bolota, assim,
que pareciam os colares de minha mãe. Ela tinha vários colares
de bolota e brincos também de bolota. Ela era uma pessoa que
sempre estava bem vestida, bem arrumada. Era uma pessoa muito
altiva sabe. Muito altiva! Parecia uma mulher imbatível, em tudo!
Mas ela era uma pessoa também muito fácil de se envolver afeti-
vamente com as outras pessoas.
E continua.
- Maria Pires era de Remanso e ela fazia questão de dizer: -
Eu sou de Remanso, minha valentia é de Remanso! . Porque
naquele ABC do São Francisco, Remanso é chamado de
Remanso da Valentia . E ela tinha a valentia de Remanso, mas
era uma PAIXÃO por Juazeiro!
...
A notícia soou nas ondas do rádio: Um grande lago seria
construído e inundaria tudo .
No ano de 1972, o governo enviara pessoas às áreas que
seriam atingidas a fim de comunicar diretamente ao povo a
construção da grande barragem e suas conseqüências. Para
represar água e regularizar a produção de energia na Usina
Hidrelétrica de Paulo Afonso, o lago da barragem de Sobradinho
cobriria uma área de 4.214 quilômetros quadrados.
Assim, as cidades baianas de Remanso, Casa Nova, Pilão
Arcado e Sento Sé seriam invadidas pelas águas caudalosas do
Velho rio Chico e mais de 70 mil pessoas, atingidas e expulsas de
seus portos. As populações diretamente afetadas viviam um clima
de fim de mundo.
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Num desses dias em que se reuniam e discutiam sobre a
vida, a cidade e tantas outras coisas, Antonila junto com Maria
Pires, Joseph Bandeira, Marta Luz e Laíse Luna - entre outras
pessoas - conversavam sobre a maneira como iam se destruir as
quatro cidades, sem haver um mutirão cultural.
E aí pensavam:
- E a cultura dessas cidades vai submergir junto com a parte
física? E depois, o que se vai contar dessas cidades? E falavam
de Atlântida - Vai sumir, aí um dia vão dizer que é mentira, que
nunca existiu, vai se perder no tempo.
E, quando estavam devaneando em torno disso, filosofando,
Antonila mostrou-se revoltada com o descaso dos administradores
e disse:
- Eu não entendo porque é que o governo estadual não
manda uma equipe de professores e de pesquisadores fazer um
levantamento nessas cidades e registrar isso!? Isso é um absurdo!
E Maria:
- E porque você que está tão revoltada, não pega sua caneta
e seu caderno e vai fazer esse levantamento?
Antonila, espantada com aquele negócio retrucou:
- Eu?
E Maria:
- Sim! Seu irmão não tem um Jipe? Você não vive aí de Jipe
por esses interiores? Você tem máquina fotográfica e tem
gravador. Está esperando o quê pra fazer esse negócio? Você tem
obrigação de fazer isso Antonila, porque você tem capacidade!
E Antonila, então, muito obediente quando lhe dão ordens
assim, nesse tom, concordou:
- Tá bom!
E começou a fazer um levantamento de pesquisa que
posteriormente foi publicado em um livro com o nome Nosso
Vale, seu Folclore Beira Rio , com histórias das manifestações
folclóricas, religiosas, populares de Remanso, Sento Sé, Pilão
Arcado, Casa Nova, Petrolina, Santa Maria, Juazeiro, Maçaroca.
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O a rq u iv o d a
p rofe s s ora Ma ria Fra n ca Pire s : m e m ória e h is tória
cu lt u ra l e m p e s qu is a n a re giã o d e J u a z e iro-B a
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BIBLIOGRAFIA
LOPES, Eliane Marta Teixeira; FILHO FARIA, Luciano Mendes de; VEIGA,
Cynthia Greive (Orgs.). 500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte:
Autêntica, 2000. 2ª edição. 608p.
TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia. São Paulo: Editora UNESP:
Salvador-BA: EDUFBA, 2001.
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Jornais
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Revistas
Juazeiro ano 100: terra e povo num cântico de amor Revista comemorativa do
Centenário da Cidade.
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Entrevistados
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11, 12, 14, 22, 23, 24 - Acervo pessoal de Maria Tereza Dewilson Oliveira.
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A Autora
Contato: jhulypires@hotmail.com
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