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Carlos Xavier
A Origem das mais emblemáticas iguarias portuguesas
Camilo e a Cozinha Tradicional Portuguesa oitocentista
O autor começa por alertar-nos para o facto de Camilo Castelo Branco não ser um
historiador, reconhecendo, todavia, que na sua obra literária existe uma longa série de
referências culturais, destacando-nos as gastronómicas que nos ajudam a compreender a
sociedade sua contemporânea. A sua pesquisa incidiu sobretudo em obras como Amor de
Salvação, contos das Novelas do Minho, como “O Cego de Landim”, Coração, Cabeça
e Estômago, A Brasileira de Prazins ou ainda nos Doze Casamentos Felizes.
Torgal chama desde logo a nossa atenção para as diferenças (quanto à hora do dia e à sua
composição) que as refeições tinham na época (almoço, jantar e ceia). Por exemplo, o
almoço tomava-se às sete horas da manhã na casa de Tomásia (Coração, cabeça e
estômago) e incluía sopa de ovos, salpicão, batatas ensopadas com toucinho e toucinho
cozido com batatas, adornados por uma colher de requeijão e tudo bem regado com vinho
fresco. Depois, na sua descrição, diz-nos que as pessoas gostavam de comer e muito. A
carne era preferida ao peixe, que era mais frequente como petisco ou merenda. Peixes do
rio, como as trutas e escalos eram comidos frequentemente fritos ou em escabeche. O
bacalhau era menos habitual que hoje em dia, e era conotado como alimento dos pobres.
Também havia linguados fritos ou “recheados au gratin”, em casa do Barão do Rabaçal
(A Corja), assim como sardinhas em escabeche, pescada cozida com cebolas, sável
assado, taínha, enguias e salmão.
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Em relação ao arroz de marisco, Torgal esclarece que, como dizia Camilo, este prato “já
fazia parte da tradição gastronómica nacional”, ainda antes de virem os “retornados” do
Ultramar invadi-lo de piri-piri. Também serviam já camarão com bacalhau e ovos e havia
pastéis e maionese de camarão.
O autor conclui a sua apresentação falando das sobremesas que faziam crescer água na
boca, dando primazia às seguintes: Cavacas de Romaria e Requeijão; Pastéis de
Guimarães e Forminhas de Braga; Castanhas de Ovos e Toucinho-do-céu; Aletria e
Regueifa Doce; Caldo de Leite e Talhadas de Abóbora; Creme, Doce de Calda e
Marmelada; Ovos em Fio; Castanhas e Doce de Ginja. Ainda refere as frutas, os
rebuçados de Avenca, as Queijada da Sapa, o Queijo Flamengo, as Rabanadas e os
Mexidos, entre outros.
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Em suma, é dito que um estômago bem alimentado em qualidade e quantidade “produz
um génio”. Faz ainda referência à ciência e arte da cozinha, adiantando que já nessa altura
estávamos perante bons gastrónomos. Convenhamos, bons de boca, que faziam por
salientar as boas e admiráveis gargantas gustativas.
Ceia! Que é isso nos nossos dias? Bom, para estes personagens não era só ceia, era muito
mais que isso; pequeno-almoço, almoço, lanche, jantar e ceia. Continuamos pois perante
estômagos bem regulados e cheios de energia e com muito génio, parecendo que o mundo
se acabava ou terminava naqueles dias da narrativa da história.
O autor faz menção à mulher do Porto. Segundo ele, não era elegante, comia bem e bebia
o seu Vinho do Porto. Todavia era perfeita, bela, porque a gordura na época era formusura
e os portugueses alimentavam-se essencialmente com carnes caseiras ou do campo e
raramente de peixe. Lá diz o velho ditado, peixe não puxa carroça!
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Dizer-se a uma senhora se se lembrava de determinada tarde com umas bela iguarias,
seria uma injúria para a dita “Baronesa”, embora ela reconhecesse saudades dessa época
de liberdade. Contudo, o importante era estar debaixo de uma parreira e alimentar o
estômago, com um belo peixe (de nome Sável, quase sempre) onde todos trabalhavam
para o efeito com as tarefas repartidas, cada um na sua especialidade, porque o pichel
“caneca esperava para matar a sede a seis ávidas gargantas do melhor produto vitivinícola,
nem o guardanapo era necessário, existindo a manga ou outro adereço do vestuário para
o efeito”.
Arroz de marisco! Pois claro, uma bela iguaria reconhecida nacionalmente e, porque não,
mundialmente. Como hoteleiro não considero importante a sua origem. Acho-a uma
excelente iguaria desde que bem preparada, e, já agora, esta coisa de retornados que me
deixa mal disposto é que eu também o sou, com orgulho! Tudo o que é arroz de marisco,
berbigões, polvo, de sardinha, de carqueja, são excelentes iguarias.
A origem desta deliciosa iguaria que dá pelo nome “Arroz de Marisco” teve origem,
segundo testemunhos, na praia da Vieira na Marinha Grande. Passou logo a uma iguaria
“nossa”! Que não restem dúvidas, pois foi vencedor na sua categoria no concurso das
Sete Maravilhas da Gastronomia. Genuinamente português e muito bom!
No que diz respeito às Tripas à Moda do Porto, tiveram origem na cidade que lhe dá o
nome e entraram em concurso das Sete Maravilhas da Gastronomia Portuguesa, iguaria
bem conhecida dos portugueses. Ora, Camilo, além de saber comer em qualidade e em
quantidade, tinha conhecimento da iguaria e origem, era, portanto, um bom gastrónomo!
Curiosa esta imagem deixada ao nosso Fiel Amigo “bacalhau” mencionado na mesa dos
pobres, bem ao contrário da época em que vivemos, essa iguaria que é confecionada mil
e umas maneiras que entrou nas Sete Maravilhas da Gastronomia, com diversos tipos de
confeção e muito apreciado pelo nosso povo português.
Em resumo, concluo que só quem não come e tem fome sofre de palidez.
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