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entrevista
Paulo Keller entrevista
Ricardo Gomes Lima
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Paulo - Primeiro eu queria que você me sição permanentes, como se dizia então, ter-
falasse sobre como surgiu o seu interesse mo que hoje passa a ser substituído por ex-
em estudar o artesanato? posição de longa duração. Aquele início dos
anos 1980 foi um momento de grande mu-
Ricardo - Esta é uma longa história. Parte dança na instituição, a antiga Campanha de
está narrada neste livro: Objetos - percursos Defesa do Folclore Brasileiro, posteriormen-
e escritas culturais que acabo de lançar pe- te transformada no INF, filiado à Funarte.
lo Centro de Estudos da Cultura Popular da Enfim, a instituição era conhecida como “a
Fundação Cultural Cassiano Ricardo, de São casa dos folcloristas”, do Movimento Folcló-
José dos Campos, SP. Como expliquei, o li- rico tão bem estudado pelo antropólogo Luis
vro fala de objetos artesanais e seus percur- Rodolfo Vilhena e exposto no livro Proje-
sos, da produção ao consumo, do mercado to e missão: o movimento folclórico bra-
local ao nacional, dos trânsitos pelo mun- sileiro. Era o espaço da tradição dos estudos
do rural e urbano, por pequenas e grandes que o folclore vinha empreendendo no Bra-
cidades, por feiras e museus. Paralelamen- sil desde a criação da Comissão Nacional de
te, narra também meu percurso pelo mun- Folclore, em 1947. Quando eu chego, foi em
do do artesanato. Eu me interessei pelo ar- meio, e em decorrência, de um processo de
tesanato muito cedo. O caminho dos obje- mudança conceitual da instituição, quer di-
tos se revelou para mim quando eu ainda era zer, naquele momento a vertente do folclo-
estudante. Fui fazer Ciências Sociais na UFF rismo deixava de ser ali tão forte e os proje-
e no segundo semestre da faculdade, fui es- tos institucionais passavam a ter a antropo-
tagiar no Setor de Etnografia do Museu Na- logia como linha mestra de orientação, ca-
cional da UFRJ. Eu adentrei naquele mun- pitaneada por Lélia Coelho Frota. Lélia as-
do dos objetos artesanais e o Setor de Etno- sume em 1982 e começa a levar antropólo-
grafia foi decisivo em minha vida. Porque eu gos para trabalharem ali; e eu vim especifi-
fiquei ali, embevecido por aquelas gavetas, camente para pensar a questão dos objetos e
aqueles armários repletos de milhares de ob- do Museu de Folclore que é uma das partes
jetos do mundo todo: dos esquimós e dos la- que compõem o CNFCP. Então é isso: assim,
pões, da África e da Oceania, dos índios bra- se deu meu envolvimento com o campo que
sileiros, dos então registrados genericamente vem desde aquele tempo, do estudante que,
como “índios brasileiros”, de diferentes po- de repente, se viu dentro do setor de etno-
vos da América Latina, da Ásia, do Japão... grafia de um grande museu, quase que por
Tudo ali me encantou e me fez ficar den- acaso, mas que ali se definiu para ele o mun-
tro daquele setor durante onze anos, convi- do dos objetos.
vendo com os objetos e com mestres como
Maria Heloísa Fénelon Costa, Berta Ribeiro e Paulo - Gostaria que você me falasse da
Luis de Castro Faria. Depois de onze anos de importância e da riqueza do artesanato
trabalho no Museu Nacional, fui convidado brasileiro da heterogeneidade e da diver-
por Lélia Coelho Frota, para vir para cá, pa- sidade do artesanato, o que você pode di-
ra o CNFCP, que à época se denominava Ins- zer sobre isto?
tituto Nacional do Folclore, o INF, para tra-
balhar na reformulação do Museu de Folclo- Ricardo - A riqueza do artesanato brasilei-
re Édison Carneiro, de suas galerias de expo- ro passa pela diversidade do fazer artesa-