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SUMÁRIO

SOCIOLOGIA - BREVE INTRODUÇÃO .......................................................................... 2

SOCIABILIDADE E SOCIALIZAÇÃO .............................................................................11

AUGUSTE COMTE ...........................................................................................................24

ÉMILE DURKEIN ...............................................................................................................27

MAX WEBER ......................................................................................................................33

KARL MARX .......................................................................................................................42

TRABALHO E SOCIEDADE ............................................................................................48

BRASIL: AS RAÍZES DO MUNDO DO TRABALHO ....................................................50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...............................................................................58

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Etapa 1
SOCIOLOGIA - Breve Introdução

A Sociologia estuda as
relações humanas nas diferentes
sociedades ao longo da História. E
a História de cada sociedade é a
história de todos nós...
O que vem primeiro, o
indivíduo ou a sociedade? Os
indivíduos moldam a sociedade ou
a sociedade molda os indivíduos? Em poucas palavras, podemos dizer que os
indivíduos e sociedade fazem parte da mesma trama, tecida pelas relações
sociais. Portanto, não há separação entre eles.
Nós, seres humanos, nascemos e passamos nossa existência em sociedade
porque necessitamos uns dos outros para viver. O fato de precisarmos uns dos
outros significa que não temos autonomia? Até que ponto dispomos de liberdade
para decidir e agir? Até que ponto somos condicionados pela sociedade? A
sociedade nos obriga a ser o que não queremos?
Reflita sobre este texto de Albert Camus,que salienta a importância de cada
um dentro da sociedade:

“Já se disse que as grandes ideias vêm ao mundo mansamente, como


pombas. Talvez, então, se ouvirmos com atenção, escutaremos, em meio ao
estrépito de impérios e nações, um discreto bater de asas, o suave acordar da
vida e da esperança. Alguns dirão que tal esperança, jaz numa nação; outros, num
homem. Eu creio, ao contrário, que ela é despertada, revivificada, alimentada por
milhões de indivíduos solitários, cujos atos e trabalho, diariamente, negam as
fronteiras e as implicações mais cruas da história. Como resultado, brilha por um

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breve momento a verdade, sempre ameaçada, de que cada e todo homem, sobre
a base de seus próprios sofrimentos e alegrias, constrói para todos.”

Para estudar essas questões, os sociólogos desenvolveram alguns


conceitos, como socialização, sociabilidade, contatos sociais, interação, convívio,
isolamento, relação, processo social, gerando assim uma infinidade de análises da
vida em sociedade. Nessa apostila estudaremos uma série desses conceitos e
buscaremos compreender a relação que existe entre o conhecimento sociológico e
o nosso cotidiano.

A palavra Sociologia

A palavra sociologia foi criada pelo pensador francês Augusto Comte em


1839 em seu curso de filosofia positiva. A palavra sociologia é híbrida, isto é, ela é
formada por duas línguas diferentes: Sócio do latim significa social ou sociedade,
logia do grego significa estudo, formando assim, o “estudo do social” ou “estudo
da sociedade”.

Conceitos de Sociologia

A Sociologia possui uma infinidade de conceitos para identificá-la e explicá-


la, diferenciando-a de outras ciências ou tipos de conhecimentos. Vejamos alguns
conceitos segundo alguns sociólogos: para Durkheim “a sociologia é a ciência das
instituições”; para L. Ward e W. G. Summer “a sociologia é a ciência da
sociedade”; para F. H. Gilddings “a sociologia é a ciência dos fenômenos sociais”.
Ela também já foi definida por Robert Park como “ciência do comportamento
coletivo”, por Small de “ciência das relações humanas”. Para Weber a “sociologia
é a ciência que procura uma compreensão interpretativa da ação social para a
partir daí chegar à explicação causal do seu sentido e dos seus efeitos”.

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Para alguns sociólogos brasileiros como Carlos Benedito Martins a
“sociologia é o resultado de uma tentativa de compreensão de situações sociais
radicalmente novas criada pela então sociedade capitalista”; para Costa Pinto a
“sociologia é o estudo científico da formação, organização e transformação da
sociedade humana”.

Objetivo, Objeto, Campo de Estudo e Importância.

O objetivo da Sociologia é aumentar ao máximo o conhecimento do homem


e da sociedade através da investigação científica.
O objeto de estudo da Sociologia são os fenômenos sociais, isto é, tudo
aquilo que se refere às relações entre as pessoas, suas questões nos seus grupos
sociais ou entre os grupos dinamizando a sociedade como um todo.
O campo de estudo da Sociologia é a sociedade como um todo, envolvendo
todas as suas particularidades, sejam em características políticas, econômicas,
sociais, culturais, históricas, etc.
A Sociologia é importante porque nos permite compreender melhor a
sociedade em que vivemos e, consequentemente, explicar e buscar soluções para
a complexidade das questões sociais. Assim a sociologia vem se tornando uma
ciência imprescindível para o conhecimento do mundo atual.

A Sociologia e as demais Ciências Sociais.

Com a complexidade do mundo social e o avanço do conhecimento, tornou-


se necessária uma divisão das ciências sociais em diversas disciplinas, com a
finalidade de produzir um conhecimento mais rigoroso e criterioso, facilitando a
sistematização do estudo e das pesquisas. Assim podemos destacar algumas
ciências sociais que contribuem para os estudos sociológicos e o entendimento do
mundo social:

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Economia – estuda as atividades ligadas à produção, distribuição, circulação
de bens e serviços;
Ciência política – estuda a distribuição do poder nas sociedades, bem como
a formação e o desenvolvimento das diversas formas de governos;
Antropologia – estuda e pesquisa as semelhanças e diferenças culturais
entre os vários agrupamentos humanos, assim como a origem e a evolução das
culturas.

O Conhecimento Sociológico

A Sociologia se baseia no conhecimento científico, por isso, utiliza-se das


regras metodológicas da ciência social como a pesquisa, a objetividade, a
observação, as entrevistas e os questionários.

O Ser Sociológico e o Ser Biológico

Observando a sociedade, percebemos que as pessoas caminham, correm,


dormem, respiram – isso é biológico (orgânico). Mas as pessoas também
cooperam umas com as outras no trabalho, recebem salários, descontam
cheques, entram em greve, estudam, namoram, casam, etc – isso é sociológico
(superorgânico); são essas atividades que fazem do homem um ser sociológico e,
que merecem toda a atenção da Sociologia enquanto ciência que busca a
compreensão e explicação dos diversos tipos de relações sociais.

Principais Temas Sociológicos

Como a sociedade é formada pelos diversos tipos de relações sociais, a


Sociologia se interessa por essas relações que dinamizam a sociedade, por isso,
seus principais temas se envolvem e se confundem dentro da complexidade das
relações sociais - dentro dos grupos sociais: da família, de amigos, do trabalho, da

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cultura, da ideologia, da cidadania, da política, da economia, isto é, em todos os
níveis de relações sociais.

A Sociologia em nosso cotidiano

A Sociologia convive constantemente em nosso dia a dia. Vivemos em


sociedade, estamos sempre nos relacionando com outras pessoas através dos
grupos sociais, quando não estamos em casa com o nosso grupo familiar,
estamos na rua com o grupo de amigos ou na escola nos relacionando com os
colegas, enfim estamos sempre nos relacionando socialmente. Fazemos parte de
um sistema estrutural e conjuntural no qual precisamos compreender e descobrir
que muitos fatos (“problemas”) que ocorrem em nossa vida diária estão ligadas às
condições sociais. É neste conjunto de relações sociais que a Sociologia busca
compreender e explicar a sociedade, nossa complexidade, antagonismo,
harmonia, crises, etc.

História do Pensamento Sociológico

A busca de compreensão e explicação da sociedade já existia desde a


Antiguidade, passando pelo Período Medieval e Idade Moderna, mas este
pensamento não tinha uma base sociológica, pois os filósofos dessa época
acreditavam que Deus e a natureza controlavam a sociedade. Teorizavam
modelos de sociedades ideais requisitando às pessoas que seguissem esses
modelos, por isso, durante todos esses períodos o pensamento sobre o social
estava influenciado por um caráter normativo (estabelecer regras para vida
social) e finalista (objetivo de uma organização social ideal), impedindo um
entendimento científico da realidade social. Outro fator que contribuiu para a
inexistência da sociologia foi o fato de que as sociedades pré-capitalistas eram
relativamente estáveis, o ritmo e o nível das mudanças eram razoavelmente

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lentos, não se percebendo a sociedade enquanto um “problema” merecedor de
análises e investigação minuciosa (científica).

Teorias que influenciaram na formação da Sociologia

Para a Sociologia se consolidar como ciência ela teve que abandonar seu
caráter normativo e finalista. Por isso, ela sofreu a influência de teorias e métodos
das ciências biológicas e naturais: a teoria evolucionista de Charles Darwin
(1809-1882), onde diz que ao longo de milhões de anos todas as espécies de
seres vivos evoluíram; a biologia foi outra ciência que influenciou na cientificidade
sociológica, através de Herbert Spencer (1820-1903), que criou uma sociologia
organicista onde se fazia uma analogia do organismo vivo com a sociedade.
Neste contexto foi fundamental aceitar a ideia de que os fenômenos sociais
obedecem à leis naturais, embora produzidas pelos homens, esta foi a importância
do positivismo que deu os primeiros passos para a cientificidade da sociologia.
Foi, por isso, também, que logo no seu início, a sociologia recebeu outros nomes
como fisiologia social (por Saint-Simon), ou física social (por Augusto Comte).
Outros teóricos fizeram suas interpretações sociais buscando dar à
sociologia um caráter de ciência, buscando a consolidação definitiva sobre um
conhecimento verdadeiro e importante para a sociedade; estes desenvolveram um
conhecimento científicossocial onde abrange todos os aspectos da sociedade,
utilizando-se de outras ciências sociais como a economia (produção material),
política (relações de poder), antropologia (aspectos culturais) e outras. Neste
processo foram importantes as contribuições de Karl Marx, Emile Durkheim e
Max Weber.

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Fatores Históricos

Os fatores ou transformações históricas que contribuíram para a


consolidação do capitalismo e o surgimento da Sociologia estão relacionados ao
contexto geral da transição do feudalismo para o capitalismo, onde podemos
destacar:

Os fatores históricos que vinham ocorrendo desde o século XVI, como:

Reforma Protestante (mudança religiosa), Formação dos Estados Nacionais


e o Absolutismo (mudança política e territorial), Grandes Navegações (mudança
geográfica), Humanismo/Renascimento (mudança cultural), Revolução Ciientífica
(mudança na ciência), Iluminismo (mudança ideológica).

Transformações socioeconômicas do século XVIII provocadas pela dupla


revolução:

Revolução Francesa representou a mudança políticajurídica na história das


sociedades ocidentais, baseado nos ideais iluministas de liberdade, igualdade e
fraternidade, a burguesia que já dominava o poder econômico reivindicava agora o
poder político, o que aconteceu durante a Revolução Francesa. Assim adotaram
novo regime político de representatividade política e sistemas econômicos
favoráveis aos seus interesses.

Revolução Industrial representou as transformações de mudança


socioeconômicas, com o surgimento das máquinas, com maior divisão técnica do
trabalho, com o aumento da produção, da urbanização, do êxodo rural; a
sociedade torna-se mais complexa e dinâmica, agravando-se também as questões
sociais, como: crescimento acelerado do desemprego, miséria, alcoolismo,
prostituição, etc.

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A Relação do Capitalismo com a Sociologia

O surgimento, a formação e o desenvolvimento da Sociologia estão


relacionados diretamente com a consolidação do capitalismo a partir da Revolução
Industrial e da Revolução Francesa do século XVIII, que criaram novas condições
sócioeconômicas e políticoideológica, que caracterizam a sociedade capitalista,
como o surgimento da indústria, da relação entre burguesia e operário, de regimes
políticos e leis burguesas.
O sistema capitalista possui uma estrutura social inédita na história da
humanidade, que nos instiga a uma reflexão sobre este sistema, suas
transformações, suas crises, seus antagonismos.
É dentro desse contexto que surge a necessidade de se compreender e
explicar essa nova realidade. Por isso, precisou-se de uma ciência que estivesse
voltada para essas transformações. A Sociologia constitui, em certa medida, uma
resposta intelectual às novas situações geradas pela nascente sociedade
capitalista industrial.

O indivíduo, sua história e a sociedade

O indivíduo nunca teve tanta importância nas sociedades como nos dias de
hoje. Quando analisamos as diversas formas de sociedade e como elas se
organizam historicamente, percebemos que só na modernidade a noção de
indivíduo ganhou relevância.
Entre os povos antigos, pouco valor se dava à pessoa única. A importância
do indivíduo estava inserida no grupo a que pertencia (família, Estado, clã, etc.)
Ex: nas tribos da antiguidade, mesmo com a diferença natural entre os indivíduos,
não havia hipótese de pensar em alguém desvinculado de seu grupo.
A ideia de indivíduo começou a ganhar força no século XVI, com a Reforma
Protestante (movimento religioso que falava que os homens tinham a imagem e
semelhança de Deus, isso significava que o indivíduo sozinho podia ter „‟poder‟‟)

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Mais tarde, no século XVIII, com o desenvolvimento do capitalismo e do
pensamento liberal, o individualismo firmou-se por completo, pois acreditava-se
que a felicidade se encontrava nos bens materiais e no trabalho.

Nossas escolhas, seus limites e repercussões

Quando nascemos já encontramos valores, normas, costumes e práticas


sociais. Também encontramos uma forma de produção de vida material que segue
parâmetros, muitas vezes, nada podemos fazer para mudar ou fugir das regras já
estabelecidas.
A vida em sociedade só é possível, portanto, porque as pessoas falam a
mesma língua, são julgadas por determinadas leis comuns, usam a mesma
moeda, além de terem uma história e alguns hábitos em comum, o que lhes dá um
sentimento de pertencer a determinado grupo.
A vida de um indivíduo está, de alguma maneira, condicionada por decisões
e escolhas que ocorrem fora de seu alcance. Portanto, as decisões que tomamos,
em nossas relações com outras pessoas, têm ligação com decisões que já foram
tomadas. Ex: quando se vota em um político representativo, o partido já o
escolheu para representar.
As decisões que a pessoa toma a conduzem a diferentes direções na vida.
Seja qual for , a direção seguida sempre será resultado das decisões do indivíduo.
As decisões de um indivíduo podem levá-lo a se destacar em certas
situações históricas, classificada como „‟vida notável‟‟. Podemos afirmar que não
existem determinismos históricos sociais que tornam alguns indivíduos mais
„‟especiais‟‟ que os outros, pois a história de uma sociedade é feita por todos que
nela vivem.
A sociedade não é um baile à fantasia, em que cada um pode mudar a
máscara ou a fantasia a qualquer momento. Desde o nascimento, estamos presos
às relações que foram estabelecidas antes de nós e que existem e se estruturam
durante nossa vida.

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SOCIABILIDADE E SOCIALIZAÇÃO

O filme “L‟Enfant Sauvage d‟Averyon”


(O Menino Selvagem de Averyon), de
Fraçois Truffaut, baseado num caso
verídico, relata a história de uma criança de
onze ou doze anos que foi capturada num
bosque, tendo vivido afastado da sua
espécie e ficando depois à guarda do Dr.
Jean Itard. Embora se pense que o menino
selvagem tenha sido abandonado no
bosque quando tinha quatro ou cinco anos,
altura em que já deveria dispor de algumas
ideias e palavras, em consequência do
começo da sua educação, tudo isso se
apagou da memória devido há cerca de sete anos de isolamento. Quando foi
capturado, andava como um quadrúpede, tinha hábitos anti-sociais, órgãos pouco
flexíveis e a sensibilidade embotada;, não falava, não se interessava por nada e a
sua face não mostrava qualquer tipo de sensibilidade. Toda a sua existência se
resumia a uma vida puramente animal.
Assim como no caso do menino de
Aveyron, a experiência das duas
crianças criadas entre lobos na Índia
mostra que os indivíduos só adquirem
características realmente humanas
quando convivem em sociedade com
outros seres humanos, estabelecendo
com eles relações sociais. Assim, o ato

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de tornar-se humano não ocorre naturalmente, ele ocorre durante os processos de
sociabilidade e socialização (processos distintos, mas complementares).
Aristóteles, que viveu entre 384 e 322 antes de Cristo, afirmava que o
homem é, por natureza, um animal social. Isso significa que a vida em grupo é
uma exigência da natureza humana. O homem necessita de seus semelhantes
para sobreviver, perpetuar a espécie e também para se realizar plenamente como
pessoa.
A sociabilidade - capacidade natural da espécie humana para viver em
sociedade - desenvolve-se pelo processo de socialização. Pela socialização o
indivíduo se integra ao grupo em que nasceu, assimilando o conjunto de hábitos e
costumes característicos desse grupo.
Participando da vida em sociedade, aprendendo suas normas, seus valores
e costumes, o indivíduo está se socializando. Quanto mais adequada é a
socialização do indivíduo, mais sociável ele poderá se tornar.

Contatos Sociais

O contato social é a base da vida social. É o passo inicial para que ocorra
qualquer associação humana. Ao dar uma aula o professor entra em contato com
seus alunos. Duas pessoas conversando estabelecem um contato social. A
convivência humana pressupõe uma série de diferentes contatos sociais. Os
contatos sociais podem ser:

Primários – são os contatos pessoais, diretos, face a face, e que têm uma
base emocional, pois as pessoas neles envolvidas compartilham suas
experiências individuais. São exemplos característicos de contatos sociais
primários os que ocorrem na família entre pais e filhos.

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Secundários – são os contatos impessoais, calculados, formais; são mais
um meio para atingir um determinado fim. Por exemplo, o contato do passageiro
com o cobrador do ônibus, apenas para pagar a passagem; ou o contato do
cliente com o caixa do banco ao descontar um cheque. São também considerados
contatos secundários os contatos mantidos através de carta, telefone, telegrama e
internet.

Reflexos dos Contatos Sociais Primários e Secundários

É importante destacar que as pessoas que têm uma vida baseada mais em
contatos primários desenvolvem uma personalidade diferente daquelas que têm
uma vida com predominância de contatos secundários. Um lavrador, por exemplo,
apresenta uma personalidade bastante diversa da de um executivo.

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Com a industrialização e a consequente urbanização diminuíram os grupos
de contatos primários, pois a cidade é a área em que há mais grupos nos quais
predominam os contatos secundários.

As relações humanas nas grandes cidades podem ser mais fragmentadas e


impessoais, caracterizando uma tendência aos contatos sociais secundários e ao
individualismo, pois a proximidade física não significa necessariamente
proximidade afetiva. A vida nas metrópoles, por exemplo, facilita os conflitos. Um
exemplo de individualismo cultivado nas grandes cidades são as brigas no
trânsito, cada vez mais frequentes, muitas com desfecho violento.

Convívio Social, Isolamento e Atitudes

A história demonstra que o convívio social foi e continua a ser decisivo para
o desenvolvimento da humanidade. As descobertas feitas por um grupo, quando
comunicadas às outras pessoas, tornam-se estímulo e ponto de partida para
aperfeiçoamentos e novas descobertas. Transmitidas de geração a geração,
esses conhecimentos compartilhados não perdem com a morte de seus
descobridores. No convívio social, o compartilhamento entre indivíduos se dá
pelos contatos sociais.
A ausência de contatos sociais caracteriza o isolamento social. Existem
mecanismos que reforçam o isolamento social. Entre eles estão as atitudes de
ordem social e as atitudes de ordem individual.
As atitudes de ordem social envolvem os vários tipos de preconceitos (de
cor, de religião, de sexo, etc.).
Uma atitude de ordem individual que reforça o isolamento social é a timidez.
O sociólogo Karl Mannheim considera que a timidez, o preconceito e a
desconfiança podem levar o indivíduo a um isolamento parcial semelhante ao
ocasionado de modo geral pelas deficiências físicas, quando os portadores são
segregados dentro de seu próprio grupo primário.

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A Importância da Comunicação

Há setecentos anos, Frederico II, imperador do Sacro Império Romano-


Germânico, efetuou uma experiência para determinar que língua as crianças
falariam quando crescessem, se jamais tivessem ouvido alguém falar, falariam
hebraico (que então se julgava ser a língua mais antiga), grego, latim ou a língua
de seu país?
Deu instruções às amas e mães adotivas para que alimentassem as crianças
e lhes dessem banho, mas que sob hipótese nenhuma falassem com elas ou perto
delas, O experimento fracassou, porque todas as crianças morreram (Paul B.
Horton e Chester L. Hunt. Sociologia. São Paulo, McGraw-Hill do Brasil, 1980. p.
77.).
Assim como a história de Victor de Aveyron, narrada no início de nossa
apostila, o fracassado experimento de Frederico lI mostra que a comunicação é
vital para a espécie humana e para o desenvolvimento da cultura.
O principal meio de comunicação do ser humano é a linguagem. Graças
à linguagem podemos transmitir pensamentos e sentimentos aos nossos
semelhantes, assim como nossas experiências e descobertas às gerações futuras,
fazendo com que os conhecimentos adquiridos não se percam.
Além da linguagem falada, o ser humano desenvolveu outras formas de
comunicação ao longo da História. Atualmente, fatos, ideias, sentimentos, atitudes
e opiniões são compartilhados por milhões de pessoas na maior parte do planeta,
graças aos meios de comunicação. Por essa razão, o especialista em
comunicação Marshall McLuhan afirmou que o mundo contemporâneo é uma
autêntica “aldeia global”, pois os meios de comunicação de massa moldam hoje as
ideias e opiniões de grupos cada vez maiores de indivíduos.

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Interação Social

Quando dá uma aula, o professor está em contato social com seus alunos e
estabelece comunicação com eles. Os alunos aprendem coisas; seu
comportamento, portanto, sofre uma modificação. Também o comportamento do
professor sofre modificações: sua explicação é diferente de uma classe para outra,
ele detém-se num ponto mais difícil e pode até mudar de opinião depois de uma
discussão em classe. Portanto, o professor influencia os alunos e também sofre
influência deles. Dizemos então que existe entre eles uma interação social.
O aspecto mais importante da interação social é que ela provoca uma
modificação de comportamento nos indivíduos envolvidos, como resultado do
contato e da comunicação que se estabelece entre eles. Desse modo, fica claro
que o simples contato físico não é suficiente para que haja uma interação social.
Por exemplo, se alguém se senta ao lado de outra pessoa num ônibus, mas
ambos não conversam, não está havendo interação social.
Os contatos sociais e a interação social constituem, portanto, condições
indispensáveis à associação humana. Os indivíduos se socializam através dos
contatos e da interação social.
A interação social pode ocorrer entre uma pessoa e outra, entre uma pessoa
e um grupo ou entre um grupo e outro:
pessoa pessoa

pessoa grupo

grupo grupo

Relação Social

A interação assume formas diferentes. A forma que a interação social


assume chama-se relação social. Um professor, dando aula, tem um tipo de
relação social com seus alunos - a relação pedagógica. Da mesma forma, uma

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pessoa comprando e outra vendendo estabelecem uma relação econômica. Além
dessas, as relações sociais podem ser políticas, religiosas, culturais, familiares,
etc.
A forma mais típica de interação social, como vimos, é aquela em que há
uma influência recíproca entre os participantes. Mas alguns autores falam em
interação social quando apenas um dos elementos influencia o outro. Isso
acontece quando um dos polos da interação está representado por um meio de
comunicação apenas físico, como a televisão, o livro, uma gravação. Assim é que,
quando um indivíduo assiste a um programa de televisão, ele pode ser
influenciado pelo programa, mas não o influencia. Ocorre, nesse caso, uma
interação não-recíproca. Neste tipo de interação, apenas um dos lados influencia o
outro.

Processos Sociais

Os alunos de uma escola resolvem fazer uma limpeza geral no salão de


festas para o baile de formatura. Organizam-se, um ajuda o outro e logo o trabalho
está acabado. Esse resultado foi possível porque houve cooperação. A
cooperação é um tipo de processo social.
A palavra processo designa a contínua mudança de alguma coisa numa
direção definida. Processo social indica interação social, movimento, mudança. Os
processos sociais são as diversas maneiras pelas quais os indivíduos e os grupos
atuam uns com os outros, a forma pela quais os indivíduos se relacionam e
estabelecem relações sociais.
Qualquer mudança proveniente dos contatos sociais e da interação social
entre os membros de uma sociedade constitui, portanto, um processo social.

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Tipos de Processos Sociais

No grupo social ou na sociedade como um todo, os indivíduos e os grupos se


reúnem e se separam, associam-se e dissociam-se. Assim, os processos sociais
podem ser associativos e dissociativos.
Os processos associativos estabelecem formas de cooperação,
convivência e consenso no grupo.
Já os dissociativos estão relacionados a formas de divergência, oposição e
conflito, que podem se manifestar de modos diferentes.
Os principais processos sociais associativos são cooperação, acomodação e
assimilação.
Os principais processos sociais dissociativos são competição e conflito.

Cooperação

A cooperação é a forma de interação social na qual diferentes pessoas,


grupos ou comunidades trabalham juntos para um mesmo fim. São exemplos de
cooperação: a reunião de vizinhos para limpar a rua, ou de pessoas para fazer
uma festa, mutirões de moradores para construir conjuntos habitacionais,
sociedades cooperativas, etc.
A cooperação pode ser direta ou indireta.
Cooperação direta compreende as atividades que as pessoas realizam
juntas, como é o caso dos mutirões.
Cooperação indireta é aquela em que as pessoas, mesmo realizando
trabalhos diferentes, necessitam indiretamente umas das outras, por não serem
autossuficientes. Tomemos o exemplo de um médico e de um lavrador: o médico
não pode viver sem o alimento produzido pelo lavrador, e este necessita de
cuidados médicos quando fica doente.

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Competição

No uso recente, competição é a forma de interação que implica luta por


objetivos escassos; essa interação é regulada por normas, pode ser direta ou
indireta, pessoal ou impessoal, e tende a excluir o uso da força e da violência”
(Dicionário de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, Editora da Fundação Getúlio
Vargas, 1987. p. 218).
A competição pode levar indivíduos a agir uns contra os outros em busca de
uma melhor situação. Ela nasce dos mais variados desejos humanos, como
ocupar uma posição social mais elevada, ter maior importância no grupo social,
conquistar riqueza e poder, vencer um torneio esportivo, etc.
Ora, nem todos podem obter os melhores lugares nas esferas sociais, pois
os postos mais importantes são em número muito menor que seus pretendentes,
isto é, são escassos. Assim, os que pretendem alcançá-los entram em competição
com os demais concorrentes. Nessa disputa, as atenções de cada competidor
estão voltadas para a recompensa e não para os outros concorrentes.
Há sociedades que estimulam mais a competição que outras. Entre as tribos
indígenas, por exemplo, as relações não são tão acentuadamente competitivas
como na sociedade capitalista. Esta última estimula os indivíduos a competirem
em todas as suas atividades – na escola, no trabalho e até no lazer -,
exacerbando o individualismo em prejuízo da cooperação.

Conflito

Quando a competição assume características de elevada tensão social,


sobrevém o conflito.
O conflito social é um processo social, pois provoca mudanças na sociedade.
Tomemos o exemplo dos negros norteamericanos. Depois de violentos choques
com a polícia durante os anos 1960, eles conseguiram ver reconhecidos seus
direitos civis. Passados mais de trinta anos, embora certas formas de racismo e

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discriminação ainda persistam nos Estados Unidos, o negro integrou-se, pelo
menos em parte, à sociedade norteamericana, permitindo, inclusive a primeira
eleição de um presidente negro americano. Outro exemplo mais recente foi a
mudança do governo no Egito graças à pressão popular.

Estratificação social

“Os sociólogos falam em estratificação social para descrever as


desigualdades que existem entre indivíduos e grupos nas sociedades humanas.
Pensamos frequentemente em estratificação em termos de riqueza ou
propriedade, mas ela também pode ocorrer com base noutros atributos como o
gênero, a idade, a filiação religiosa ou a patente militar.
Os indivíduos e grupos gozam de um acesso (desigual) às recompensas, de
acordo com a sua posição no esquema de estratificação. Assim, a forma mais
simples de definir a estratificação consiste em vê-la como um sistema de
desigualdades estruturadas entre diferentes agrupamentos de pessoas. Pode ser
útil pensar-se na estratificação como uma sobreposição geológica de camadas de
pedra sobre a superfície da terra. As sociedades podem ser vistas como
constituindo „estratos‟ hierarquizados, com os mais favorecidos no topo e os
menos privilegiados perto do fundo.»
(Anthony Giddens, Sociologia, 5ª edição, F. C. Gulbenkian, 2007, Lisboa,
pág. 284.)

A estratificação social indica a existência de diferenças, de desigualdades


entre pessoas de uma determinada sociedade. Ela indica a existência de grupos
de pessoas que ocupam posições diferentes. São três os principais tipos de
estratificação social:
 Estratificação econômica: baseada na posse de bens materiais,
fazendo com que haja pessoas ricas, pobres e em situação intermediária;

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 Estratificação política: baseada na situação de mando na sociedade
(grupos que têm e grupos que não têm poder);
 Estratificação profissional: baseada nos diferentes graus de
importância atribuídos a cada profissional pela sociedade. Por exemplo, em nossa
sociedade valorizamos muito mais a profissão de advogado do que a profissão de
pedreiro.
A estratificação social é a separação da sociedade em grupos de indivíduos
que apresentam características parecidas, como por exemplo: negros, brancos,
católicos, protestantes, homem, mulher, pobres, ricos, etc. A estratificação é fruto
das desigualdades sociais, ou seja, existe estratificação porque existem
desigualdades. Podemos perceber a desigualdade em diversas áreas:
 Oportunidade de trabalho
 Cultura / lazer
 Acesso aos meios de informação
 Acesso à educação
 Gênero (homem / mulher)
 Raça
 Religião
 Economia (rico / pobre)

A estratificação social esteve presente em todas as épocas: desde os


primeiros grupos de indivíduos (homens das cavernas) até os nossos tempos. Ela
apenas mudou de forma, de intensidade, de causa. A revolução industrial e a
transformação dos sistemas econômicos contribuíram para que as questões sobre
a desigualdade social fossem melhor visualizadas, discutidas e percebidas,
principalmente depois do advento do capitalismo, tornando-as mais evidentes.
Umas das características fundamentais que distingue nossa sociedade das
antigas é a possibilidade de mobilidade social. Diferentemente da sociedade
medieval na qual quem nascesse servo, morreria servo, e na qual não era
possível lutar por direitos e por uma oportunidade de mudar de classe. Na

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sociedade ocidental contemporânea, por exemplo, isto já é possível, e a
mobilidade social se dá especialmente como consequência dos investimentos em
educação, dos investimentos de formação e capacitação para o trabalho, que
podem vir tanto do Estado quanto da própria iniciativa social. Em muitas ocasiões,
a mobilidade social pode ser reivindicada por meio de movimentos sociais que, em
sua maioria, reivindicam legitimidade diante da posição marginal de poder em que
se encontram na sociedade. Só existe estratificação social porque ainda existe
desigualdade entre o homem, gerando assim a exclusão do indivíduo da
sociedade de modo geral. Com a eclusão desse indivíduo forma-se mais um ser
humano sem forças para lutar pelos seus direitos, desde muitos anos amparado
pela lei universal dos direitos humanos.

A estratificação social pode ser feita através de:


a)Castas: Um sistema de castas compõe-se de um número muito
grande de grupos hereditários, os papéis das pessoas é determinado por sua
ascendência, esse é um modelo de estratificação que não apresenta
nenhuma possibilidade de mudança de posição social, por isso é chamado
de fechado, a pessoa que pertence a uma casta só pode casar-se com um
membro da mesma casta. Ex. Na Índia a casta tinha caráter religioso.
b)Estamentos: Constitui uma forma de estratificação social com
camadas sociais mais fechadas do que as classes e mais abertas do que as
castas, por isso se diz que semi-aberto, são reconhecidos por lei e
geralmente ligados ao conceito de honra, o prestígio é o que determina a
posição da pessoa na sociedade. Ex.: Sociedade pré-capitalista.
c)Classes: Constitui uma forma de estratificação social onde a
diferenciação do indivíduo é feita de acordo com o poder aquisitivo, não há
desigualdade de Direito, pois, a lei prevê que todos são iguais, independente
de sua condição de nascimento, mas há uma desigualdade de fato, como é
facilmente percebível por todos. Ex.: Sociedades Capitalistas.

22
Correntes sociológicas

A Sociologia não é uma ciência de apenas uma orientação teórico-


metodológica dominante. Ela traz diferentes estudos e diferentes caminhos para a
explicação da realidade social. Assim, pode-se claramente observar que a
Sociologia tem ao menos três linhas mestras explicativas, fundadas pelos seus
autores clássicos, das quais podem se citar, não necessariamente em ordem de
importância:
(1) a positivista-funcionalista, tendo como fundador Auguste Comte e
seu principal expoente clássico em Émile Durkheim, de fundamentação
analítica;
(2) a sociologia compreensiva iniciada por Max Weber, de matriz
teórico-metodológica hermenêutico-compreensiva; e
(3) a linha de explicação sociológica dialética, iniciada por Karl Marx,
que mesmo não sendo um sociólogo e sequer se pretendendo a tal, deu
início a uma extensa linha de explicação sociológica.
Estas três matrizes explicativas, originadas pelos seus três principais autores
clássicos, originaram quase todos os posteriores desenvolvimentos da Sociologia,
levando à sua consolidação como disciplina acadêmica já no início do século XX.
Para compreender o surgimento da Sociologia como ciência do século XIX, é
importante perceber que, nesse contexto historicossocial, as ciências teóricas e
experimentais desenvolvidas nos séculos XVII, XVIII e XIX inspiraram os
pensadores a analisar as questões sociais, econômicas, políticas, educacionais,
psicológicas: com enfoque científico.
A Sociologia, ciência que tenta explicar a vida social, nasceu de uma
mudança radical da sociedade, resultando no surgimento do capitalismo.
O século XVIII foi marcado por transformações, fazendo o homem analisar a
sociedade, um novo “objeto” de estudo. Essa situação foi gerada pelas revoluções
industrial e francesa, que mudaram completamente o curso que a sociedade
estava tomando na época. A Revolução Industrial, por exemplo, representou a

23
consolidação do capitalismo, uma nova forma de viver, a destruição de costumes
e instituições, a automação, o aumento de suicídios, prostituição e violência, a
formação do proletariado, etc. Essas novas existências vão, paulatinamente,
modificando o pensamento moderno, que vai se tornando racional e científico,
substituindo as explicações teológicas, filosóficas e de senso comum.
Contra a revolução, pensadores tentam reorganizar a sociedade,
estabelecendo ordem, conhecendo as leis que regem os fatos sociais. Era o
positivismo surgindo e, com ele, a instituição da ciência da sociedade.
Foi dentro desse contexto que surgiu a Sociologia, ciência que, mesmo antes
de ser considerada como tal, estimulou a reflexão da sociedade moderna
colocando como “objeto de estudo” a própria sociedade, tendo como principais
articuladores Auguste Conte e Émile Durkheim.

AUGUSTE COMTE
A Filosofia Positivista

A filosofia positiva de Comte nega que a


explicação dos fenômenos naturais, assim
como sociais, provenha de um só princípio.
Esta visão positiva dos fatos desconsidera as
causas dos fenômenos (Deus ou natureza) e
pesquisa suas leis, vistas como relações
abstratas e constantes entre fenômenos
observáveis.
Para Comte, a Matemática, a Astronomia,
a Física, a Química e a Biologia, segundo
critérios histórico e sistemático, atingiram a
positividade. Assim como nessas ciências, a
sua nova ciência inicialmente chamada de

24
física social e posteriormente Sociologia, Comte usaria a observação, a
experimentação, a comparação e a classificação como métodos para a
compreensão da realidade social. Para o filósofo, os fenômenos sociais podem e
devem ser percebidos como os outros fenômenos da natureza, obedecendo à leis
gerais. Entrentanto, sempre insistiu e argumentou que isso não equivale a reduzir
os fenômenos sociais a outros fenômenos naturais. Dessa forma, para Comte há
um método geral para a ciência (observação subordinando a imaginação), mas
não um método único para todas as ciências; além disso, a compreensão da
realidade lida sempre com uma relação contínua entre o abstrato e o concreto,
entre o objetivo e o subjetivo.
Além da realidade, outros princípios caracterizam o Positivismo: o
relativismo, o espírito de conjunto e a preocupação com o bem público (coletivo e
individual). Na obra “Apelo aos conservadores”, Comte apresenta sete definições
para o termo “positivo”: real, útil, certo, preciso, relativo, orgânico e simpático.
Em resumo, Comte afirma que se deve conhecer a realidade para saber o
que acontecerá a partir de nossas ações, para que o ser humano possa melhorar
sua realidade. Dessa forma, a previsão científica caracteriza o pensamento
positivo.

“Os vivos são sempre e cada vez mais governados necessariamente pelos
mortos.”

Pode-se dizer que o conhecimento positivo busca “ver para prever, a fim de
prover” - ou seja: conhecer a realidade para saber o que acontecerá a partir de
nossas ações, para que o ser humano possa melhorar sua realidade.

A Lei dos Três Estados

A partir da percepção do progresso humano, Comte formulou a Lei dos Três


Estados. Observando a evolução das concepções intelectuais da humanidade,

25
Comte percebeu que essa evolução passa por três estados teóricos diferentes: o
estado „teológico‟ ou „fictício‟, o estado „metafísico‟ ou „abstrato‟ e o estado
„científico‟ ou „positivo‟, em que:
· No primeiro, os fatos observados são explicados pelo sobrenatural, por
entidades cuja vontade arbitrária comanda a realidade. Assim, busca-se o
absoluto e as causas primeiras e finais (“de onde vim? Para onde vou?”). A fase
teológica tem várias subfases: o fetichismo, o politeísmo, o monoteísmo.
· No segundo, já se passa a pesquisar diretamente a realidade, mas ainda há
a presença do sobrenatural, de modo que a metafísica é uma transição entre a
teologia e a positividade.
· No terceiro, ocorre o apogeu do que os dois anteriores prepararam
progressivamente. Neste, os fatos são explicados segundo leis gerais abstratas,
de ordem inteiramente positiva, em que se deixa de lado o absoluto (que é
inacessível) e busca-se o relativo. A par disso, atividade pacífica e industrial torna-
se preponderante, com as diversas nações colaborando entre si.
É importante notar que cada um desses estágios representa fases
necessárias da evolução humana, em que a forma de compreender a realidade
conjuga-se com a estrutura social de cada sociedade e contribuindo para o
desenvolvimento do ser humano e de cada sociedade.
Dessa forma, cada uma dessas fases tem suas abstrações, suas
observações e sua imaginação; o que muda é a forma como cada um desses
elementos conjuga-se com os demais. Da mesma forma, como cada um dos
estágios é uma forma totalizante de compreender o ser humano e a realidade,
cada uma delas consiste em uma forma de filosofar, isto é, todas elas engendram
filosofias.

26
Positivismo no Brasil

O lema “Ordem e Progresso”


na bandeira do Brasil é inspirado
pelo lema de Auguste Comte do
positivismo: L‟amour pour principe et
l‟ordre pour base; le progrès pour
but (“Amor como princípio e ordem
como base; o progresso como
meta”). Foi colocado, pois várias das
pessoas envolvidas no movimento
que depôs a monarquia e que
proclamaram a República eram
seguidores das ideias de Comte.

ÉMILE DURKEIN (1858-1917)

No pensamento durkeiniano a sociedade


prevalece sobre o indivíduo, pois quando este nasce
tem de se adaptar às normas já criadas, como leis,
costumes, línguas, etc.
O indivíduo, por exemplo, obedece a uma série
de leis impostas pela sociedade e não tem o direito de
modificá-las.
Para Durkein o objeto de estudo da Sociologia
são os fatos sociais. Esses fatos sociais são as regras
impostas pela sociedade (as leis, costumes, etc. que
são passados de geração a geração).
É a sociedade, como coletividade, que organiza,
condiciona e controla as ações individuais. O indivíduo

27
aprende a seguir normas e regras que não foram criadas por ele, essas regras
limitam sua ação e prescrevem punições para quem não obedecer aos limites
sociais.
Para o filósofo francês Emile Durkheim,na vida em sociedade o homem se
defronta com regras de conduta que não foram diretamente criadas por ele, mas
que existem e são aceitas na vida em sociedade, devendo ser seguidas por
todos.Seguindo essas ideias, Durkheim afirma que os fatos sociais, ou seja, o
objeto de estudo da Sociologia, são justamente essas regras e normas coletivas
que orientam a vida dos indivíduos em sociedade.
Esses fatos sociais têm duas características básicas que permitirão sua
identificação na realidade: são exteriores e coercitivos.

Exteriores, porque consistem em ideias, normas ou regras de conduta; foram


criadas pela sociedade e já existem fora dos indivíduos quando eles nascem.
Coercitivos, porque essas ideias, normas e regras devem ser seguidas pelos
membros da sociedade. Se alguém desobedece a elas, é punido pelo resto do
grupo.
Outro conceito importante para Émile Durkheim é o de instituição. Para ele,
uma instituição é um conjunto de normas e regras de vida que se consolidam fora
dos indivíduos e que as gerações transmitem umas às outras. Ex.: a Igreja, o
Exército, a família, etc.
As instituições socializam os indivíduos, fazem com que eles assimilem as
regras e normas necessárias à vida em comum.

28
http://fernandoscpimentel.blogspot.com.br/2010/02/sociologia-mapas-conceituais-basicos.html

O fato social é objeto central da teoria sociológica de Émile Durkheim,


constituindo-se em qualquer forma de indução sobre os indivíduos que é tida
como uma coisa exterior a eles, tendo uma existência independente e
estabelecida em toda a sociedade, que é considerada então como caracterizada
pelo conjunto de fatos sociais estabelecidos.
Também se define o fato social como uma norma coletiva com
independência e poder de coerção sobre o indivíduo.
Segundo Emile Durkheim, os Fatos Sociais constituem o objeto de estudo da
Sociologia, pois decorrem da vida em sociedade.O sociólogo francês defende que
estes têm três características:
 Coercitividade - característica relacionada com a força dos padrões
culturais do grupo que os indivíduos integram. Estes padrões culturais são fortes
de tal maneira que obrigam os indivíduos a cumpri-los.
 Exterioridade - esta característica transmite o fato desses padrões de
cultura serem “exteriores aos indivíduos”, ou seja, ao fato de virem do exterior e de
serem independentes das suas consciências.

29
 Generalidade - os fatos sociais existem não para um indivíduo
específico, mas para a coletividade. Podemos perceber a generalidade pela
propagação das tendências dos grupos pela sociedade, por exemplo.

Para Émile Durkheim, fatos sociais são “coisas”. São maneiras de agir,
pensar e sentir exteriores ao indivíduo, e dotadas de um poder coercitivo. Não
podem ser confundidos com os fenômenos orgânicos nem com os psíquicos,
constituem uma espécie nova de fatos. São fatos sociais: regras jurídicas, morais,
dogmas religiosos, sistemas financeiros, maneiras de agir, costumes, etc.
“É um fato social toda a maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de
exercer sobre o indivíduo uma coação exterior.”; ou ainda, “que é geral no
conjunto de uma dada sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria,
independente das suas manifestações individuais.” Ou ainda:Todas as maneiras
de ser, fazer, pensar, agir e sentir desde que compartilhadas coletivamente.
Variam de cultura para cultura e têm como base a moral social, estabelecendo um
conjunto de regras e determinando o que é certo ou errado, permitido ou proibido.
Existem também as correntes sociais, como as grandes manifestações de
entusiasmos, indignação, piedade, etc. Chegam a cada um de nós do exterior e
não têm sua origem em nenhuma consciência particular. Têm grande poder de
coação e são suscetíveis de nos arrastar, mesmo contra a vontade. Se um
indivíduo experimentar opor-se a uma destas manifestações coletivas, os
sentimentos que nega voltar-se-ão contra ele. Estamos então a ser vítimas de
uma ilusão que nos faz acreditar termos sido nós quem elaborou aquilo que se
nos impôs do exterior. Percebemos então que fomos sua presa, mais do que seus
criadores.
Analisando os fatos sociais chega-se à conclusão de que toda a educação
dada às crianças consiste num esforço contínuo para impor à criança maneiras de
ver, de sentir e de agir às quais ela não teria chegado espontaneamente. Segundo
Herbert Spencer, uma educação racional deveria deixar a criança agir com toda a
liberdade. Mas essa teoria pedagógica nunca foi praticada por nenhum povo

30
conhecido, não passa então de um desejo pessoal. A educação tem justamente o
objetivo de criar o ser social.
Não é a generalidade que serve para caracterizar os fenômenos
sociológicos. Um pensamento comum a todos ou um movimento por todos os
indivíduos não são por isso fatos sociais. Isso são só suas encarnações
individuais.
Há certas correntes de opinião que nos levam ao casamento, ao suicídio ou
a uma taxa de natalidade mais ou menos forte; estes são, evidentemente, fatos
sociais. Somente as estatísticas podem nos fornecer meios de isolar os fatos
sociais dos casos individuais. Por exemplo, a alta taxa de suicídio no Japão; não
são só fatos individuais e particulares que os levam ao suicidio. Toda cultura e a
educação deste país exerce grande diferença no pensamento do indivíduo na hora
de se suicidar. O mesmo caso particular de frustração do indivíduo, em outra
sociedade, poderia não o levar ao suicídio. Esse é um fato social, além de
psicológico.
O efeito de coação externa de um fato social é fácil de constatar quando se
traduz por uma reação direta da sociedade, como é o caso do direito, das crenças,
dos usos e até das modas.
Não podemos escolher a forma das nossas casas tal como não podemos
escolher a forma do nosso
vestuário sem sofrer algum
tipo de coação externa. Os
nossos gostos são quase
obrigatórios, visto que as
vias de comunicação
determinam de forma
imperiosa os costumes,
trocas, etc. Isso portanto
também é um fato social,
visto que é geral.

31
Contrariando Auguste Comte, não há um progresso, uma evolução da
humanidade, o que existe são sociedades particulares que nascem, desenvolvem-
se e morrem, independentemente umas das outras. Se, além disso, se considera
que as sociedades mais recentes continuam as que precederam, então cada tipo
superior poderá ser considerado como a simples repetição do tipo imediatamente
inferior. Um povo que substitui um outro não é apenas um prolongamento deste
último com alguns caracteres novos; é diferente, constitui uma individualidade
nova.

32
MAX WEBER

A Sociologia compreensiva ou
interpretativa de Max Weber dedica-se a
buscar compreender o significado, sentido
e motivação das ações sociais. Weber vê
como objetivo primordial da sociologia a
captação da relação de sentido da ação
humana, ou seja, chegamos a conhecer
um fenômeno social quando o
compreendemos como fato carregado de
sentido que aponta para outros fatos
significativos. As ciências naturais
procuram explicar as relações causais
entre os fenômenos, enquanto que as
ciências humanas precisam compreender
processos da experiência humana que são vivos, mutáveis, que precisam ser
interpretados para que se extraia deles o seu sentido. Ao aplicar o método da
compreensão aos fatos humanos sociais, Weber elabora os fundamentos de uma
sociologia compreensiva ou interpretativa. Abandona-se abordagem positivista
para estudar as ciências sociais.
O homem pode compreender suas próprias intenções pela introspecção. As
condutas humanas são singulares, em oposição à explicação causal dos fatos
sociais em Dürkheim.

Weber entende por ação social a conduta ou atividade humana que tem um
sentido subjetivo dado pelo próprio sujeito ou agente que espera um
reconhecimento social. Ex.Por que se comete um ato terrorista?

33
Tipos de ações sociais estabelecidas por Weber

Ação tradicional :motivada pelos costumes, tradições, hábitos, crenças,


quando o indivíduo age movido pela obediência a hábitos fortemente enraizados
em sua vida.

Ação afetiva: se fundamenta em sentimentos. Age afetivamente quem


satisfaz suas necessidades,seus desejos,sejam eles de alegria,de tristeza,de
vingança,de gozo. O que importa é dar vazão às paixões momentâneas.

34
Ação racional com relação aos fins: Avaliação da relação entre meios e
fins.
O indivíduo programa ,pensa e avalia as consequências dos seus atos.

Exemplos:
 Engenheiro que constrói uma estrada, onde a racionalidade é medida
pelos conhecimentos técnicos do indivíduo visando alcançar uma meta;
 “Se eu fizer isso ou aquilo,pode acontecer tal ou qual coisa;então
vamos ver quais as alternativas.”

Ação racional com relação a valores : Se fundamenta em convicções, tais


como o dever,a dignidade,a beleza,a piedade;sem levar em conta as
consequências previsíveis.

Exemplo:
 Indivíduo que prefere morrer a abandonar determinada atitude,
onde o que se busca não é um resultado externo ao sujeito, mas a fidelidade a
uma convicção;
“Eu acredito que a minha missão na Terra é fazer isso.”

Ao contrário de Durkheim, Weber não pensa que a ordem social tenha que
se opor e se distinguir dos indivíduos como uma realidade exterior a eles, mas que
as normas sociais se concretizam exatamente quando se manifestam em cada
indivíduo sob a forma de motivação.

Max Weber nunca diria, como Durkheim, que a curiosidade histórica deve
subordinar-se à investigação de generalidades. Quando o objeto do conhecimento
é a humanidade, é legítimo o interesse pelas características singulares de um

35
indivíduo, de uma época ou de um grupo, tanto quanto pelas leis que comandam o
funcionamento e o desenvolvimento das sociedades.
A ciência weberiana se define, assim, como um esforço destinado a
compreender e a explicar os valores aos quais os homens aderiram, e as obras
que construíram.

Resumo sobre a Sociologia em Max Weber

Osvaldo Lima
AÇÃO SOCIAL
O pensamento sociológico de Max Weber baseia-se na percepção de que
toda conduta humana é dotada de um sentindo subjetivo, de um significado
“interno” de cada indivíduo. Estes significados são os motivos que levam os
indivíduos, em sua particularidade e especificidade, a executarem essa ou aquela
ação dentro de uma sociedade em seu contexto histórico.
Sendo assim, a pesquisa social tem como objetivo buscar e compreender
essa ação social, sem julgamento de valores, mas visando coletar elementos que
possibilitem a construção de um conhecimento que permita uma explicação sobre
as diversas realidades sociais, da situação social e do entendimento das intenções
presentes em cada agir; significa afirmar que o individuo, movido pela sua

36
motivação e pelos valores sociais, produz um sentido para a sua ação social.
Neste sentido, o indivíduo passa a ser um agente social, e não simplesmente um
mero expectador.
Por isso, é de suma importância uma análise histórica. Na coleta de dados e
na tentativa de interpretação das fontes de pesquisa sobre o modo de vida de uma
determinada sociedade e do seu cotidiano, o pesquisador poderá ter uma
compreensão das diferenças sociais, na sua origem e formação. Estas pesquisas
servem como evidências para compreender a ação social dos indivíduos no seu
contexto historicossocial.
Com Max Weber, esse método compreensivo caracteriza a Sociologia como
uma ciência que tem por objetivo compreender claramente a conduta humana e
fornecer explicações das causas das ações dos indivíduos, em sua origem, bem
como, os efeitos na convivência coletiva, nas relações sociais dentro de cada
sociedade.

TIPOS DE AÇÕES SOCIAIS

Para Max Weber, essas ações sociais pode ser compreendida e classificada
através de quatro maneiras.

Desta maneira, ação social pode ser:

a)Racional com relação aos fins


É a ação que visa atingir um objetivo, uma finalidade, que é previamente
definida, analisada, identificando os meios necessários e adequados para alcançá-
los, bem como, as consequências envolvidas e os diferentes fins que podem gerar
entre si.

37
b) Racional com relação aos valores
É a ação orientada por princípios, a valores ligados à dignidade, à beleza, ao
dever, à crença religiosa, a uma causa. É uma ação marcada pela fidelidade as
suas convicções valorativas.

c)Afetiva
É a ação especificamente emotiva, determinada por afetos e estados
sentimentais. É a ação orientada pelas emoções imediatas, como: vários tipos de
paixões, raiva, ciúme, prazer, vingança.

d)Tradicional
É a ação motivada por hábitos e costumes que foram enraizados no
comportamento do indivíduo desde sua infância. A ação é tradicional porque
segue os estímulos habituais adquiridos pela convivência em família, em grupos
sociais específicos, entre outros.
É interessante perceber que os dois primeiros tipos são baseados em
elementos racionais: analisados, reflexivos, com resultados previstos. Enquanto
isso, as ações afetiva e tradicional podem ter resultados não pretendidos. Por
exemplo, motivado pelos afetos, acabar magoando a quem se ama. Outro
exemplo, seguir um hábito tradicional que não condiz com a realidade presente:
mulher só serve para cuidar da cozinha e das crianças.

Tipo Ideal

Em Max Weber, o “tipo ideal” trata de uma construção teórica sobre cada
sociedade analisada, a partir da ação social de cada indivíduo. Nesta construção,
o cientista social pode traçar um “modelo representativo”, destacando as
semelhanças e diferenças de cada sociedade. Evidenciando suas características
específicas, suas manifestações e identificando suas diferenças em relação aos
tempos e lugares distintos.

38
Não se trata de comparar para afirmar que esta ou aquela sociedade seja a
melhor. Mas se trata de um instrumento de análise científica que permite
conceituar os fenômenos sociais, bem como, as manifestações das diversas
formações sociais.

Relação Social

A relação social reflete a possibilidade de que os sentidos de uma ação


social, de um agente social, seja partilhada, de alguma forma, por um grupo social,
determinando uma conduta social, correspondendo às expectativas dos indivíduos
envolvidos.

Conforme o próprio Max Weber:


“A relação social diz respeito à conduta de múltiplos agentes que se orientam
reciprocamente em conformidade com um conteúdo específico do próprio sentido
das suas ações. Na ação social, a conduta do agente está orientada
significativamente pela conduta de outro ou outros, ao passo que na relação social
a conduta de cada qual entre múltiplos agentes envolvidos (que tanto podem ser
apenas dois e em presença direta quanto um grande número e sem contato direto
entre si no momento da ação) orienta-se por um conteúdo de sentido
reciprocamente compartilhado.” (COHN, 1997).

Estratificação Social

Para Max Weber, se os indivíduos são capazes de dar sentido à ação social
e partilham deste sentido, é necessário compreender como se estabelece os
mecanismos de distribuição de poder e riquezas no plano coletivo. Essa
distribuição chamamos de estratificação social.
Elas podem ser identificadas por:

39
a) Castas: quando o papel social é determinado pela herança do grupo
social a que pertence. Seu antecedente determina sua posição social, sendo
um sistema fechado, onde o indivíduo, geralmente, não tem possibilidade de
mudança. Ex.: na Índia, a pessoa que pertence a uma casta só pode casar
com um membro da mesma casta.
b) Estamentos: quando a divisão é realizada a partir de virtudes e
presítígios que determinam a posição da pessoa na sociedade e que são
reconhecidas por lei. É uma característica da sociedade medieval, onde os
indivíduos exerciam um “status” devido a sua honra, coragem, entre outros
elementos.
c) Classes: a divisão é feita de acordo com o poder aquisitivo dos
indivíduos. Apesar da igualdade de direitos defendida pela lei, existe
desigualdade social determinada pelo poder de consumo.
d) Partido: as diferenças presentes no interior de cada um destes
modelos, geram o poder partidário. O partido torna-se uma forma de
organização que visa influenciar sobre a direção e domínio de um grupo
social, a partir dos interesses e sentidos comuns ou divergentes dos
indivíduos presentes em uma sociedade.

Poder E Estado
O conceito de poder retrata a capacidade que um indivíduo ou grupo de
indivíduos têm de provocar a aceitação e o cumprimento de uma ordem – impor
sua própria vontade, mesmo diante de resistências. Poder e dominação estão
sempre ligados. A obediência do grupo acaba legitimando o poder instaurado à
dominação.
Essa dominação legitimada pode ser:

a) Dominação Legal – é aquela que parte da obediência às regras


estabelecidas pela lei, que determina a quem e em que medida deve
obedecer. Ex.: burocracia.

40
b) Dominação tradicional – é aquela que parte da obediência às
crenças e ordenações já estabelecidas pela tradição. Ex.: dominação
patriarcal.
c) Dominação carismática – é aquela que parte da obediência à
admiração e devoção afetiva a um indivíduo devido ao seu carisma. Ex.:
herói guerreiro, político demagogo.

O Estado é um instrumento de dominação do homem pelo homem. Para ele,


só o Estado pode fazer uso da força da violência, e essa violência é legítima
(monopólio do uso legitimo da força física), pois se apoia num conjunto de normas
(constituição).

A ÉTICA PROTESTANTE E ESPÍRITO DO CAPITALISMO

Em seus escritos, Weber busca investigar as razões do capitalismo ter se


desenvolvido inicialmente em países em que os hábitos e costumes estão
alicerçados no protestantismo. Apresenta a tese de que a tradição religiosa do
cristianismo católico estava acompanhada por um discurso que não tratava de
assuntos “mundanos”, inclusive da questão econômica.
Weber demonstra que alguns tipos de Protestantismo, principalmente o
Calvinismo, favoreciam o comportamento econômico racional e a valorização da
vida na terra. Para ele, o Calvinismo trouxe a percepção de que as habilidades
humanas são dons, dádivas divinas. Por isso, é necessário incentivá-las com a
finalidade de usufruir dos seus frutos. Associado ao racionalismo na ciência, as
novas formas de organização política, entre outros, essa perspectiva
éticarreligiosa favoreceu a emancipação do homem diante do mundo.
Max Weber percebe que nas famílias protestantes, os filhos eram educados
direcionados mais para os cálculos do que para os estudos humanísticos. Isso
favoreceu uma mentalidade voltada para o trabalho na fábrica e ao lucro. Um
conjunto de hábitos e costumes fundamentais e propícios ao espírito do

41
capitalismo. A motivação do protestante é o trabalho como dever e vocação. Sair
bem em uma profissão significa mostrar suas virtudes e vocações.

KARL MARX

Filósofo e economista, o judeualemão,


Karl Marx foi um dos maiores pensadores
do século XIX.
Marx tinha uma visão otimista dos
destinos da humanidade, acreditando ser
possível que na batalha final, os operários
venceriam os capitalistas por serem maioria
na sociedade. Com a vitória do proletariado
se construiria um mundo ideal, onde as
diferenças de classe tenderiam a
desaparecer, e a igualdade seria
estabelecida entre os homens.
Em seu Manifesto Comunista de 1848, afirma que: “os proletários nada têm
a perder, a não ser seus grilhões. E têm um mundo a ganhar”.
Para Marx, as lutas sociais decorriam da Revolução Industrial na Europa e
do conflito entre burgueses e trabalhadores.
A luta de classes sempre esteve presente na história da humanidade e
variava de acordo com época. Em sua obra “ O Capital”, Marx descreve o sistema
capitalista, sua evolução e suas transformações e prevê uma grande crise, uma
espécie de catástrofe geral da economia capitalista. Essa falência do capitalismo
ocorreria primeiramente nos países mais industrializados da Europa.
Contrariamente, a previsão marxista veio a triunfar na Rússia e na China, países
com economia essencialmente rural.
A teoria marxista é, substancialmente, uma crítica radical das sociedades
capitalistas. Mas é uma crítica que não se limita à teoria em si. Marx, aliás, se

42
posiciona contra qualquer separação drástica entre teoria e prática, entre
pensamento e realidade, porque essas dimensões são abstrações mentais
(categorias analíticas) que, no plano concreto, real, integram uma mesma
totalidade complexa.
O marxismo constitui-se como a concepção materialista da História, longe de
qualquer tipo de determinismo, mas compreendendo a predominância da
materialidade sobre a ideia, sendo esta possível somente com o desenvolvimento
daquela, e a compreensão das coisas em seu movimento, em sua inter-
determinação, que é a dialética. Portanto, não é possível entender os conceitos
marxianos como forças produtivas, capital, entre outros, sem levar em conta o
processo histórico, pois não são conceitos abstratos e sim uma abstração do real,
tendo como pressuposto que o real é movimento.
Karl Marx compreende o trabalho como atividade fundante da humanidade. E
o trabalho, sendo a centralidade da atividade humana, se desenvolve socialmente,
sendo o homem um ser social. Sendo os homens seres sociais, a História, isto é,
suas relações de produção e suas relações sociais fundam todo processo de
formação da humanidade.
Esta compreensão e concepção do homem é radicalmente revolucionária em
todos os sentidos, pois é a partir dela que Marx irá identificar a alienação do
trabalho como a alienação fundante das demais. E com esta base filosófica é que
Marx compreende todas as demais ciências, tendo sua compreensão do real
influenciado cada dia mais a ciência por sua consistência.

43
A Sociologia em Karl Marx

Segundo essa doutrina, toda e qualquer sociedade é determinada por suas


condições socioeconômicas, mas especificamente pela forma como ela organiza a
produção. Marx afirma ainda que os interesses que movem a sociedade são
materiais, traduzidos, em última instância, pelas necessidades de sobrevivência.
Partindo dessas concepções, o materialismo histórico interpreta a história
basicamente como uma luta de classes.
Para Marx, o modo de pensar do homem é condicionado pela sua situação
concreta. Dessa forma, o que impede o indivíduo de se realizar como ser humano
não são suas representações inadequadas sobre o mundo, mas suas condições
de vida opressivas. À medida que essas condições materiais mudarem, também o
modo de pensar mudará.
Com a defesa de tal posição, Marx contraria todos os filósofos do seu tempo,
afirmando que o fundamental não é interpretar o mundo, mas mudá-lo, transformá-
lo. Assim, não são as ideias que condicionam o mundo concreto, mas o inverso.
Essas concepções tiveram enorme repercussão a partir da segunda metade
do século XIX e influenciaram diretamente o pensamento e a produção intelectual
do século XX.
A realidade concreta é a realidade do ser humano. O indivíduo é um ser
profundamente marcado pela condição social, pela classe social a que pertence.
Segundo Marx, o desenvolvimento da história e da cultura se dá pelos
mecanismos materiais de produção e distribuição de mercadorias. A evolução
econômica determina a evolução social das classes e, por meio desta, a política.
Com base nessa perspectiva, ele tentou sistematizar uma prática política que
levasse a construção de uma sociedade sem classes.
Essa sociedade ideal, sem classes, se caracterizaria pela inexistência da
propriedade privada dos meios de produção, ou seja, ninguém deteria a posse
particular da terra, das ferramentas, das máquinas, das matérias-primas. O
trabalho de uns não poderia ser apropriado por outros para benefício particular,

44
resultando na exploração de um indivíduo sobre o outro. Consequentemente, não
ocorreria a acumulação de riqueza individual. Toda a riqueza produzida pelo
trabalho social seria propriedade de toda a sociedade e distribuída de acordo com
as necessidades individuais. O resultado seria a supressão do Estado e de toda
exploração e opressão inerente a ele.
Para apresentar a sistemática do funcionamento da sociedade, Marx faz uma
divisão entre a superestrutura e a infraestrutura. A infraestrutura é o conjunto das
condições econômicas, e a superestrutura são as instituições, a família, o Estado,
a ideologia e a cultura, que se desenvolvem adaptadas à infraestrutura, que, por
sua vez, depende da relação dos indivíduos com os meios de produção.
A superestrutura de uma sociedade depende, pois, de sua infraestrutura. Daí
a importância da questão economica para Marx: todas as mudanças significativas
em uma determinada sociedade necessariamente decorrem de mudanças na sua
organização econômica.
A importância da infraestrutura para a definição das formações sociais
(modos de produção) pode ser notada ao longo de toda a história da humanidade.
Assim, na fase primitiva, correspondente ao início da humanidade, não havia
divisão de classes sociais (pois inexistia propriedade privada); os bens eram
comuns e a atividade social era fundamentalmente dirigida para a existência do
grupo. Já as antigas sociedades escravistas se caracterizavam pela polarização
entre proprietários e escravos, sendo a propriedade privada e a cidadania um
privilégio exclusivo dos primeiros.
No período da Europa feudal, a exploração dominante foi entre o senhor
feudal e o servo, condição em que este, embora fosse formalmente livre, estava
submetida ao senhor pelas relações servis de produção.
Nas relações capitalistas de produção do período contemporâneo, os
individuos livres estabelecem uma relação mediada pelo mercado: aqueles que
não são donos dos meios de produção vendem a única coisa de que dispõem –
seu trabalho – em troca dos recursos necessários a sua sobrevivência. Daí Marx
afirmar que na sociedade capitalista é o capital que explora o trabalho.

45
O capitalismo, segundo Marx, se configurou plenamente a partir do século
XVIII (apesar de sua origem ser anterior), quando ocorre a Revolução Industrial,
iniciada na Inglaterra, de onde se propagou para outros países.
Sua essência era a busca incessante da reprodução e ampliação do capital,
meio pelo qual a burguesia – a classe social dominante – concentra poder. Nessa
busca, esse sistema econômico não vê nenhum impedimento político, moral ou
ético para expropriar o trabalhador de todos os seus atributos humanos.
CHALITA, Gabriel. Vivendo a Filosofia, São Paulo: Ed. Àtica, 2006. p. 340s.

Marx afirma que no processo de produção capitalista, o homem se aliena,


tornando-se mera peça da engrenagem produtiva. Ele não é mais dono dos seus
instrumentos de trabalho, o ritmo de produção não é imposto por ele e tampouco
domina o processo produtivo, ou seja, a divisão do trabalho. A principal
consequência desse processo é que o trabalhador não se reconhece no produto
que fez e, assim, perde sua identidade como sujeito.
A alienação do produto do trabalho conduz à alienação do homem. As
relações interpessoais em geral passam a ser mediadas pelas mercadorias e pelo
dinheiro. Até os próprios proletários adquirem caráter de mercadoria, pelo fato de
sua força de trabalho ser comercializada no mercado. O trabalhador torna-se um
ser privado de sua essência humana.
Entretanto, ao contrário de uma visão fatalista da história, em que essa
situação se repetiria ininterruptamente, Marx faz uso do materialismo dialético
para demonstrar como se daria a ruptura da ordem capitalista.
O trabalhador, mesmo vivendo individualmente essa dominação, como
integrante de uma classe social, poderia tomar consciência dessa situação de
opressão. A partir daí, se mobilizaria como classe para promover sua verdadeira
libertação por meio de uma revolução. Portanto, é da própria situação de
exploração que nasceria a força da classe operária.

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Para além da alienação econômica, há também a alienação religiosa. Marx
afirma que é preciso destruir a religião para que o homem se recupere a si próprio,
pois o único Deus do homem é o próprio homem.
A alienação religiosa faz com que o ser humano deixe de lutar pela melhoria
da sua condição social, acreditando estar em Deus a justificativa para a
desigualdade do mundo capitalista. Assim sendo, é Deus quem decide quem é
pobre ou rico, esvaziando de sentido a luta contra a desigualdade.
Marx mencionou ainda a alienação filosófica, que se expressa na forma de
encarar a filosofia como contemplação da realidade, que os filósofos designam por
metafísica. Para ele, a principal tarefa de toda e qualquer pessoa e, portanto,
também dos filósofos, é transformar o mundo, de modo a pôr fim à alienação
social e política. Ou seja: agir para erradicar a submissão da classe operária pelo
Estado burguês.
Marx considera essa a principal das tarefas do movimento socialista para
atingir o consumismo:
“[...] comunismo como superação positiva da propriedade privada, enquanto
autoalienação do homem, ou seja, como apropriação reta da essência humana por
meio de e para o homem. Por isso, considera-o como regresso – perfeito.
Consciente e dentro da riqueza total do desenvolvimento atual – do homem para si
mesmo enquanto homem social. Vale dizer humano. O comunismo é a verdadeira
dissolução do antagonismo entre o homem e a natureza, e entre o homem e o
homem. A verdadeira solução do conflito entre liberdade e necessidade. Ele é o
enigma decifrado da história, a verdadeira realização da essência do homem.”
A própria sociedade capitalista criaria as condições para a sua
autodestruição e o surgimento da sociedade comunista. Esta seria caracterizada
pela abolição da propriedade privada; pela igualdade, com a abolição das classes;
e pela justiça, pois a sociedade exigira de cada indivíduo um esforço proporcional
a suas forças e o retribuiria de acordo com suas necessidades. A partir desse
momento histórico, o processo dialético continuaria infinitamente, mas sem a luta
de classes: teria continuidade na luta do ser humano contra a natureza.

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Outro aspecto relevante do pensamento de Marx é o conceito de ideologia,
na visão marxista, a matéria é um dado primário que alimenta a consciência e esta
é considerada apenas um dado secundário, pois é reflexo da matéria. Assim, as
ideias expressas na arte, na filosofia, na literatura e na moral estão estritamente
relacionadas ao modo de produção econômica.

No entanto, Marx afirmou a existência de certa inversão na apreensão desse


processo: são as ideias e os valores que contribuem para que as defina certa
visão do mundo. Desse pressuposto decorre a afirmação do filósofo de que a
ideologia é uma falsa consciência do mundo. Revelar a ideologia burguesa era
equivalente a desvendar toda a lógica sobre o mundo burguês e, portanto,
contribuir para a revolução proletária.

TRABALHO E SOCIEDADE

O Trabalho nas sociedades modernas

Para entendermos as características do trabalho nas sociedades modernas,


devemos primeiro observar como se constituía nas sociedades pré-modernas.
Nas sociedades pré-modernas o trabalho não era o elemento central que
orientava as relações sociais. Existiam outros fatores mais importantes definidos
pela hereditariedade, religião, honra, lealdade ou posição social, que não eram
definidas pelo cargo na produção econômica.
Pelo contrário, o campo econômico e o trabalho eram desvalorizados,
considerado algo penoso, torturante ou castigo.
Nessas sociedades, o trabalho está relacionado à obtenção apenas do
necessário para manter o sistema funcionando, não existindo por isso a noção de
lucro e nem preocupações em otimizar as técnicas de produção.
Com a ascensão do capitalismo, a importância do trabalho foi aumentando e
ele foi se deslocando para a posição central da vida das pessoas. Com a

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necessidade dos capitalistas de recrutar pessoas para trabalhar em suas fábricas,
passou-se a difundir a ideologia de que o trabalho era algo positivo, bom para
todos.
Juntamente passou-se a acusar pessoas que não trabalhavam com termos
pejorativos a fim de constrangê-los socialmente e forçá-los a trabalhar.
As pessoas não estavam acostumadas a trabalhar com uma rotina mecânica,
milimetricamente calculada, pois o que determinava seu tempo de trabalho era a
natureza: as estações do ano, a chuva, o sol, o dia, a noite, etc. Foram
necessários séculos para disciplinar e preparar a sociedade para o trabalho
industrial diário e regular. Ex: Do século XVI até início do século XX existiu a
chamada “santa segunda-feira”. Devido a exaustiva jornada de trabalho, algo que
a sociedade não estava acostumada, não se trabalhava na segunda-feira e às
vezes se estendia até terça-feira.
Entre as mudanças que ocorreram nas formas de produção da idade média
para o capitalismo podemos citar:
 Casa e local de trabalho foram separados.
 Separaram o trabalho e seus instrumentos (que ficaram nas mãos dos
capitalistas).
 Tiraram a possibilidade do trabalhador conseguir a própria matéria-
prima.

Tudo passou a ser dos industriais e comerciantes que haviam acumulado


riquezas. Eles financiavam, organizavam e coordenavam a produção de
mercadorias, definiam o que produzir e em que quantidade.
A organização do trabalho passou da cooperação simples para manufatura e
dessa para a maquinofatura.
Cooperação simples: assim como nas formas de organizar o trabalho da
Idade Média (corporações de ofício), havia uma hierarquia entre o mestre e o
aprendiz. Ambos eram artesãos e conheciam todo o processo produtivo, do molde

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ao acabamento. A diferença é que eles estavam a serviço de um financiador que
lhe fornecia matéria prima e lhe dava algumas ordenanças.
Manufatura (ou cooperação avançada): o trabalhador continuava a ser
artesão, mas não fazia tudo do começo ao fim. Cada pessoa faz uma parcela do
produto em uma linha de montagem. O trabalhador perdeu o entendimento da
totalidade do processo de trabalho e também do seu controle. Só entendia, por
exemplo, da cola do sapato, pois era o que fazia o tempo todo.

Maquinofatura: o espaço de trabalho passou a ser a fábrica. Foi dispensado


o conhecimento que o trabalhador possuía sobre os produtos. A máquina passou
a fazer o serviço.

As habilidades profissionais perderam valor, só restou ao trabalhador vender


sua mão de obra.

BRASIL: AS RAÍZES DO MUNDO DO TRABALHO

Em relação à Europa, são radicalmente singulares e superficiais as raízes do


moderno mundo do trabalho brasileiro, gerado no contexto da civilização colonial e
imperial luso-brasileira. O desconhecimento dessa diversidade de qualidade tem
motivado profundas incompreensões, com importantes consequências na prática
teórica e social.
Até a Revolução Abolicionista, em 1888, o modo de produção escravista
colonial dominou as formas subordinadas de produção, pejando profundamente o
universo social, econômico, ideológico, etc. do Brasil. Além mesmo da vigência da
formação social escravista, o não-trabalho – e não o trabalho – foi expressão de
elevação e superação social.
Na escravidão, a ascensão do sopé ao cume da pirâmide social dava-se
através da metamorfose do trabalhador escravizado em escravizador. Mesmo que
esse movimento ascendente fosse numérica e economicamente desprezível, teve

50
importância socioideológica na consolidação da sociedade escravista, ao manter
via aberta aos explorados mais afortunados e empreendedores.

Escravidão urbana

No Brasil colonial e imperial, o trabalho livre foi uma singularidade. Como fora
habitual na Antiguidade e em Portugal, os escravizadores ensinavam ao cativo um
ofício para que fosse explorado diretamente, alugado ou mandado vender sua
habilidade pelas ruas e praças das aglomerações.
Não houve transposição da organização mesteiral portuguesa para o Brasil.
Ao contrário, houve transferência e radicalização da prática lusitana de utilizar a
mão de obra escravizada nos diversos misteres artesanais. Portanto, esse último
hábito social, subordinado em Portugal, assumiu caráter dominante no Brasil.
Até fins do Império, nos centros urbanos, os mestres compravam
trabalhadores escravizados, ensinavam-lhes os ofícios, viviam do esforço servil,
apartando-se crescentemente do trabalho produtivo. O número de cativos e o grau
de estranhamento ao trabalho determinavam a maior ou menor dignidade social
dos mestres.
O trabalhador escravizado era comumente alugado a privado ou ao Estado
pelo escravizador que recebia o valor total do arrendamento do cativo de aluguel.
Esse trabalhador era alimentado por seu senhor e, menos comumente, pelo
arrendatário, desinteressado na manutenção da sua força vital.
O cativo ganhador locomovia-se livremente pelas ruas das aglomerações
oferecendo produtos e serviços, sob a condição de pagar um ganho fixo – diário,
semanal, mensal – ao escravizador. Ele investia o obtido além do ganho em
alimentação, vestuário, pagamento de um alojamento, formação de um pecúli o,
etc.
Relativamente poucos ganhadores obtiveram a alforria através da compra da
liberdade. Em geral, quando isso ocorria, dava-se devido a uma singular
habilidade produtiva e parcimônia, após décadas de trabalho e poupança. A

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compra da alforria ensejava descapitalização do ganhador, quando declinava sua
capacidade produtiva. Ela permitia que o escravizador trocasse um produtor usado
por um novo.
A imensa maioria dos cativos ganhadores, de aluguel ou explorados
diretamente pelos escravizadores viveu e morreu sob as duras condições
escravistas da vida, em contexto que o trabalho era objetivação da exploração e
não de sua superação relativa.
No Brasil escravista, praticamente de 1532 a 1888, o mundo rural dominou
em forma substantiva o mundo urbano, social e economicamente subordinado.
Mesmo no século 18, durante o ciclo mineiro, a fazenda monocultura escravista
subordinou fortemente o universo sócio-produtivo escravista colonial.

Africanos escravizados

A partir dos anos 1570, a substituição da dominância da escravidão


americana pela africana introduziu forçosamente no Brasil de três a cinco milhões
de africanos arrancados do continente negro. Na África, esses trabalhadores
escravizados haviam sido pastores, artífices e sobretudo camponeses aldeões
livres. O tráfico constituiu a maior transferência forçada de trabalhadores da
história da humanidade.
A economia monocultura exportadora exigia que os produtores escravizados
conhecessem formas intensas de trabalho compulsório, organizado em equipe, a
fim de facilitar a feitorização do trabalho
No Brasil, a produção servil dominical autônoma de meios de subsistência
em parcelas cedidas pelos escravizadores foi fenômeno singular que tendia a
dissolver-se quando da expansão da produção escravista mercantil. O caráter
singular e a subordinação mercantil determinaram existência de um fenômeno que
se expressou na luta dos cativos pela liberdade e não pela terra.

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Brasil: a libertação do trabalho

O principal objetivo das massas escravizadas urbanas e rurais foi a


libertação do trabalho feitorizado, vetor e símbolo da submissão escravista. A
resistência ao trabalho alienado e a fuga foram importantes formas de luta servis.
Uma significativa parcela da população escravizada viveu permanentemente em
fuga, nas cidades e nos campos.
Os cativos lutaram para construir visões de mundo e laços familiares e
societários que se caracterizaram pela fragilidade e precariedade, já que
enquadrados por relações sociais despóticas e pelo baixo desenvolvimento das
forças produtivas, num contexto de escassa autonomia produtiva e societária.
No universo urbano e rural, o trabalho escravizado foi sempre visto como
vetor de alienação e não de emancipação. Poucos anos após o fim da escravidão,
o intelectual negro Manuel Querino procurou pioneiramente resgatar o caráter
progressivo e criativo do esforço do trabalhador escravizado na construção da
sociedade brasileira.

Formação do Moderno Operariado Urbano

O processo de industrialização do Brasil iniciou-se em fins do século 19, em


forma profundamente regionalizada, sobretudo através da exploração da força de
trabalho europeia imigrada especializada e semiespecializada e de trabalhadores
urbanos de origem nacional não-especializados. A produção fabril nacional iniciou-
se quando ainda dominavam as relações escravistas de produção, com
trabalhadores escravizados e livres. Não raro, estes últimos haviam sido ou
descendiam de trabalhadores escravizados.
Sobretudo após a fundação das primeiras organizações operárias, os
trabalhadores imigrados transpuseram práticas, expectativas e comportamentos
do mundo do trabalho europeu para as regiões em processo de industrialização,
socializando relativamente suas experiências com os trabalhadores nacionais,

53
apesar das diversidades nacionais, de língua, etc. Esse processo teve como base
e foi impulsionado pela mesma inserção sócio-produtiva.
A aceleração do processo de industrialização ocorrida durante a Grande
Guerra e após a crise mundial de 1929 – “industrialização por substituição de
importações” – ensejou a incorporação à produção industrial, primeiro dos
trabalhadores nacionais urbanos desempregados, a seguir de produtores
chegados do meio rural.
Os trabalhadores urbanos e rurais nacionais incorporados à produção tinham
vivido inseridos em forma mais ou menos diretas no universo escravista. Eram ex-
cativos, libertos, caboclos, etc. Quanto muito, haviam conhecido imperfeitamente a
propriedade e o domínio da terra, no contexto da rústica sociedade latifundiária
nacional, onde a aldeia camponesa quase inexistia.
A distribuição ou a venda financiada de pequenas glebas agrícolas a
alemães, italianos, poloneses, etc. imigrados ensejou produção economia
camponesa indipendente que, por décadas, manteve essas comunidades à
margem do mercado de trabalho livre urbano, já que detinham os fatores de
produção necessários à produção de meios de subsistência.

Submetidos historicamente à situação de sub-consumo, com escassa


experiência no mercado livre de trabalho, a proletarização significava para os
segmentos sociais urbanos e rurais nacionais incorporados à ordem industrial,
mesmo em forma precária e despótica, progressão social e econômica absoluta e
relativa.
Até certo ponto, no Brasil, para multidões de trabalhadores, em relação ao
passado, a proletarização constituiu uma espécie de ponto de partida zero. Ou
seja, o início de experiências de socialização por parte de comunidades
tendencialmente atomizadas no passado pela ordem escravista e pela sociedade
oligárquico-latifundiária.
Nesse sentido, ao contrário da Europa, a fábrica não foi o locus de
restauração e superação de cultura e valores societários pretéritos, mas o espaço

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de sua formação. Ao menos no que se refere às populações de origem nacional,
não efetuou a ressocialização industrial de comunidade urbana e rural de
produtores portadoras de sólidos valores e experiências societárias.
Nesse contexto, a fábrica produziu e produz a organização de consciência
societária sempre questionada, diluída e fragilizada pelo imenso exército de
reserva de origem urbano e rural
No Brasil, a construção do futuro parece exigir depuração do mundo do
trabalho das impregnações políticas, ideológica, social, etc. estranhas a ele.
Processo viabilizado com o fortalecimento, difusão e universalização dos seus
valores – plebeísmo; racionalismo; associativismo; coletivismo, etc. – no seio das
classes trabalhadoras através da organização autonômica e contraditória dos
trabalhadores ao capital – partidos políticos, associações sindicais, profissionais,
comunitárias, escolares, mídia, sociedades culturais, esportivas, etc.
Constitui momento fundamental desse processo a extensão dos valores, das
práticas e das formas de organização do mundo do trabalho às comunidades da
cidade e dos campos marginalizadas pela produção capitalista, na luta pela
destruição, anulação e mitigação das supervivências econômicas, políticas,
ideológicas, etc. pré-modernas e pré-capitalistas – desvalorização do trabalho,
latifúndio, elitismo, racismo, irracionalismo, individualismo, etc.
Processo que exige, na luta pela consecução de seus objetivos estratégicos,
a incessante mobilização das classes trabalhadoras e populares pela obtenção
dos direitos básicos elementares ao salário, à educação, ao lazer, etc., num aqui e
agora da vida social quotidiana que rompa radicalmente com o tradicional e
permanente reconhecimento retórico desses direitos e a postergação de sua
concessão para um futuro que jamais se materializa.
Mário Maestri,doutor pela UCL, Bélgica, professor do Curso de História e do
Programa de Pós-Graduação em História da UPF.

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Escolaridade e emprego no Brasil

A força de trabalho no Brasil, sob o ponto de vista da escolaridade, se


encontra ainda em uma posição muito frágil e atrasada em relação a outros
países, mesmo latinoamericanos. Em média o trabalhador brasileiro possui
apenas cinco anos de escolaridade, atrás de Argentina, Uruguai e Chile, apenas
para ficarmos na América do Sul. Esta característica, obviamente, coloca limites
aos avanços da qualidade e da produtividade, especialmente se considerarmos o
conteúdo atual do trabalho, que requer crescentemente, um trabalhador mais
preparado e qualificado.
Pesquisa recente do Banco Mundial aponta que, no Brasil, as pessoas com
curso superior têm 20% mais chance de obter um emprego, em relação às
pessoas que possuem apenas o curso elementar. Além disso, elas têm 38%
menos propensão a ficar desempregadas e, quando ficam, conseguem emprego
em um período seis vezes menor.
Do ponto de vista da renda também as vantagens da escolaridade no Brasil
são óbvias. A remuneração média cresce à medida que cresce a escolaridade. A
diferença do salário médio entre os trabalhadores analfabetos, e aqueles que têm
curso superior completo, é de 4,5 vezes entre os admitidos no mercado de carteira
assinada no Brasil. Entre os desligados do emprego essa diferença é ainda maior
(5,3), o que também revela que as empresas estão substituindo, no processo de
rotatividade, mão de obra mais cara por mais barata.
As dificuldades para inserção no mercado de trabalho, para quem tem
pouca ou nenhuma escolaridade, são crescentes. As exigências de maior
escolaridade vêm aumentando ano a ano, como mostra o perfil educacional dos
admitidos no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do
Trabalho e Emprego. Em 2002, 55,5% do pessoal admitido tinha até a 8ª série
completa. Esse, percentual cai para 52,91% em 2003 e, em 2004, atingiu 50,09%.
Nas faixas de menor escolaridade a queda foi ainda maior. Por outro lado,
aumentaram as chances de quem tem maior escolaridade. Em 2002, 4,53% dos

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postos foram abertos para quem tem curso superior completo, percentual que se
elevou para 5,06% em 2004.
Em função da elevada taxa de desemprego, as empresas aumentam as
exigências na seleção dos recursos humanos, fenômeno detectado em várias
pesquisas. Muitas empresas não estão mais admitindo candidatos sem o 1º grau
completo, e algumas já estão exigindo o 2º grau, ainda que para funções
relativamente simples. Os níveis de desemprego possibilitam às empresas fazer
exigências além daquelas realmente necessárias ao cargo.
O aumento da escolaridade dos trabalhadores é algo normal e, por si só,
positivo, pois indica, em termos genéricos, a melhoria da qualidade de vida na
sociedade. O grande problema é que no caso do mercado de trabalho brasileiro,
em regra, o fenômeno tem beneficiado predominantemente as empresas, já que o
salário médio vem decrescendo em termos reais. Portanto, as empresas vêm
empregando um trabalhador mais escolarizado, por um salário menor, situação
bastante cômoda, já que elas aumentam produtividade e qualidade sem adição
proporcional de custos.
Tanto a qualidade do produto quanto a produtividade do trabalho,
potencializadas pela maior escolarização, podem e devem crescer no Brasil, mas
estes avanços têm que significar ganhos efetivos para a sociedade como um todo.
Estamos agora em um momento de recuperação do emprego de carteira
assinada, porém estes empregos têm sido de escassa qualidade, com baixos
salários, jornadas extensas e alta rotatividade. A questão não é apenas ter um
emprego, mas ter um emprego que garanta sobrevivência digna e compatível com
os esforços de escolarização empreendidos pelo trabalhador.
Fonte: http://www.fetecsp.org.br

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