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BRASIL,
ENQUANTO O ÔNIBUS
NÃO VEM
De
ROBERTO INNOCENTE
Preanunciados por um som de tambores entram os atores para o prólogo
PRÓLOGO
C: Cidadãos
S: Camponeses
M: Rapazes
A: Homens de negócios
R: Pobres e ricos
S: Brigas (PE-LE-JA)
M: Paixões
TODOS: Hein?
BB: É!
C: Venham mais perto deste palco cênico
TODOS: Brasil
BB: mas como eu, que sou Biro Biro, não tem igual.
R: E eu?
TODOS: E você?
TODOS: E daí?
R: Vualá!
TODOS: Ahhhhhh
M: Começa a representação
CANÇÃO
dá no mesmo porque
é o mesmo país
Brasil
C: Pare!!!!!
S: Paro?
C: Sim, pare!
S: Mas tava afinado Nho patrão, o Nho que vê? (Canta alto para derrubar o
patrão)
C: Ahhhh!!
S: O que aconteceu?
S: Não posso!
C: O que é isso?
C: Mataram o rei?
S: É louco.
C: E ande logo com este baú antes que eu lhe pregue na cara, uma sonora
bofetada.
S: Quem falou perna, sempre foi o braço! Quere ver (som racola + tamboro M)
C: Por quê?
S: Por que nessas alturas nos já devemos estar tudo amaldiçoado! depois de
ter raptado o último Indi...
C: Ah!
S: É!
C: Ah!
S: É?
C: Ah!
C: Asno, desgraça coisa nenhuma, aquele nada há de ser minha sorte, pois o
British Musean pagará uma fortuna por ele.
C: British Musean!
S: isso mesmo aí, pode até pagar, mas as forças da natureza, as almas do
mato e os espíritos dos antepassados hão de se vingar do senhor por ter
roubado o último índio da Floresta amazônica.
S: Que palavra?
C: Índio!
S: como?
S: Sim patrão!
S: Mas patrão eu tenho certeza que a gente veio de lá, e tem que ir para cá.
C: não, de cá para lá
S: de lá para cá
C: cá
S: lá
BB: Ai, ai, ai… pobre Pantaleão, quanta estrada! Um pobre velho caminhando
todo esse tempo para chegar num lugar onde não tem ninguém, não tem
ninguém? Não tem ninguém, não tem ninguém!
(saca o disfarce)
Eh, eh, não tem ninguém. Como digo, voltar aos clássicos é sempre a melhor
maneira quando se precisa fazer rastro! Que inferno todo esse povo no meu
encalço! E a policia, com toda a malandragem que tem por aí deveria ter outras
coisas a fazer que não ficar no meu pé… eis porque este país anda mal das
pernas! Eu conheço bem o Brasil… não se tem mais tranquilidade… não se
pode mais trampar em paz que na hora aparece alguém que começa a dar
tiros… não tem mais estilo, eis o problema!
Olha só: agora os homens (os porcos) estão atrás de mim só porque peguei
em empréstimo a pensão daquelas cinquenta velhinhas do prédio do Sol em
Copacabana. Qual o problema de se fazer um empréstimo? As velhinhas
estavam felizes… tava com o dinheiro na mão e não é que passo na frente do
Bar da Assunção? Eu não sei resistir a um dominó… perdi todo o dinheiro!
Então, além dos porcos atrás de mim tem também os credores… não tinha
jeito, só podia ir pra casa da Solange, aquela mina da Rua Joaquim da Silva na
Lapa. E não é que chega a mãe da boazuda dizendo que a mina tá esperando
um bacorinho meu? Grávida! E daí? “Você tem que casar com ela! ”Que é isso
minha Senhora, tá me estranhando”? Se eu tivesse que casar com todas as
moças que engravido, teria mais esposas que a torcida do Flamengo! Não
tinha outro jeito… o negócio era fazer rastro, dar um tempo… só podia ir
embora do Rio! Melhor assim, precisava mesmo tirar umas férias!
Está vindo alguém… será que é um x9? Melhor me esconder e ver quem é
antes de ter problemas… (esconde-se).
R: Deixa eu parar um pouco que não consigo mais caminhar… (deixa a mala)
Espera, melhor não deixar a mala sozinha com todos os ladrões que tem neste
país! (vai pegar a mala e deixa a sanfona) Oxe, agora esqueci a sanfona!
(deixa a mala e vai pegar a sanfona. Olha para a mala e fala) Quem mandou
você ficar aí? (pega a mala e a sanfona juntas) Oxe, fiquem aqui perto de mim!
Como dizia minha mãe, “um homem prevenido vale por dois”! Acho que tô pelo
menos na metade do caminho… (fala aos seus pés) confere? Confere! Oxe,
mas onde estou? Deixa ver o mapa… (abre a mala para pegar o mapa) Sorte
que tive a esperteza de comprar esse mapa em São Paulo! (com o mapa na
mão. Tenta ler) Ma… ma… ma… Espera, como era que a professora dizia? “MI
com I, MI”, “MO com O, MO”, “ME com E, ME”, “MA com A, MA”, ma-pa…
mapa do Brasil! Oxe, abre ainda mais? Oxe, ainda mais... Oxe, mais ainda!
Quantas palavrinhas… rio Amazonas… Rio de Janeiro… Rio Branco… Rio
Preto… Rio Grande… (pega no sono, cobre-se com o mapa. Acorda) Oxe, é
sempre assim, ler me dá sono! Vamos ver onde fica São Paulo (levanta com o
mapa, o mapa cai em cima dele. Começa a lutar com o mapa e o finaliza) Oxe,
que bicho este mapa! Eis São Paulo! Mas… como pode ser que está escrito
tão pequeno? São Paulo é muito maior! Acho que esse mapa tem alguns
erros… deixa ver a minha terra, o Ceará! Oxe, mas não é possível! Tá escrito
grande demais! Onde eu moro é uma aldeia com quatro casas… eu sabia que
não podia confiar naquele cara da rodoviária… (imitando o cara) “Pega o
caminho para o norte e quando encontrar o caminho para o leste tem a parada
de ônibus.” Faz seis meses que caminho e não encontrei nada! Nunca pensei
que voltar pra minha terra depois de vinte anos de trabalho seria tão difícil…
mas vou chegar lá!
R: O que foi?
BB: Ei Ei ei ei ei...
R: O que?
BB: Ih... A coisa tá feia. Este aqui é o Brasil.
BB: Bem se vê que o Senhor é uma pessoa inteligente, por nada burra e muito
acima da média.
BB: Ora, ora, não seja modesto, eu sei distinguir de longe uma pessoa
instruída de uma ignorante.
BB: Ora, o Senhor está a zombar de mim. Eu logo vi que o Senhor é uma
pessoa muito esperta.
BB: Quero dizer que o meu lema é: para tudo sempre se dá um jeitinho, por
isso sobre mim já escreveram até livro.
R: Livro?
R: Filmes?
BB: Novelas!
R: Novelas?
R: O que?
BB: Uma pessoa muito famosa, conhecida e, sobretudo, uma pessoa muito
procurada.
R: Procurado? Puxa que legal! Que sorte eu tive de encontrar uma pessoa
muito procurada.
BB: Infelizmente nesse mundo cão pra se fazer dinheiro é preciso trabalhar.
R: Isso mesmo!
BB: É, mas para abrir uma lanchonete é preciso só um muito só, e eu duvido
que o Senhor tenha esse dinheiro.
R: Eu tenho sim.
BB: Eu gostei muito do Senhor e quero lhe propor uma sociedade, o Senhor
entra com seu dinheiro e eu entro com a minha fama.
BB: Ora, não se preocupe, eu sou um homem muito altruísta. Vamos discutir os
detalhes. (Saem)
S: (cantarolando) Eu sabia que não era por aqui, que era por ali...
C: (puxa o baú. S cai) Não fale desse baú, não o olhe, não o aponte! Esse baú
não existe!
C: Pegue o baú!
S: Que baú?
C: Esse baú.
C: E isso existe?
BB: O que? Não paguei, não pago e não pagaria jamais. Eu, Biro Biro, o
malandro de Copacabana.
(Pausa)
(som galinhas)
Pi Pi Pi Pi Pi
J: Jurema, Janaína, cadê minhas galinha, vamos ver quem pôs ovo hoje, quem
pôs ovo hoje. Quem vai pra panela, quem não pôs ovo hoje vai pra panela.
Jurema, deixe-me ver, botô ovo hoje? Não boto? (chuta a galinha e xinga)
desgramada sem vergonha. Janaína, deixe-me ver, o quê? Tu também não
botô ovo? (chuta e escorrega pela rampa) (Sentada no chão): Papa que papiu,
nem as galinhas estão ajudando, que custa pôr um ovinho por dia, um ovinho
por dia é tudo que eu peço. Eu vô me embora, vô, vô me embora. Vai ser hoje
que eu vô me embora – Eu vô é me embora (cantando)! Cinqüenta anos,
cinqüenta anos cuidando dos filhos, cuidando do marido e tudo isso por quê?
Pra aquele sem vergonha do Januário de 1 2 3 de Oliveira 4. Desgramado,
cachorro, safado, sem vergonha, eu dô duro o dia inteiro, e ele só colchão e
fronha. Fazer o quê? Maldito dia que passou por aqui aquele rabo de saia de
20 anos, com aqueles peito empinado pra lua, aquela bunda de tanajura. O quê
que ela tem que eu não tenho? O quê que eu tenho que ela não tem? Deixe
pra lá, fazer o quê? É uma desgraceira atrás da outra, uma desgraceira atrás
da outra, 50 anos criando sozinha 12 filhos, quase 13, mas dando conta,
graças ao Bom Deus. Fazer o quê?
Galvez se embrenhou no mato, foi pro Acre. Tiradentes foi pra Minas, tô
preocupada com esse menino, nunca mais deu notícia. Cicinho foi pro Ceará e
viro padre, Graças a Virgem Minha Nossa Senhora. Tarsila tá em São Paulo,
não perde aquela mania de pintar pé grande que nunca vi. Dumonzinho foi o
primeiro a voar daqui, cientista, inventor o menino. Getúlio não, esse fui eu
mesma que pus pra correr. Vai mandar em outro lugar que quem manda aqui é
tua mãe. Assisinho largou o machado e pegou a caneta. Virou escritor. Anita foi
pro Sul. Ficou louca pelo italiano... o Garibaldi. Luís, ah, esse sim eu sinto
saudade, depois que foi embora nunca mais tocaram aqui um bom forró pé de
serra. Carminha se bandeou pro estrangeiro. Cheia de rebolado e fruta na
cabeça. Agora tá aí Miranda que era apegada por demais com Carminha
querendo imitar a irmã de qualquer jeito. Se ao menos passasse por aqui dois
pretendentes que prestassem, quem sabe assim a vida melhorasse ou não?
Cena 8 – Entram BB e R
BB: De maneira alguma minha Senhora. A gente logo vê que por trás dessa
carcaça pútrida, fedegosa, encarrilhada existe uma mulher.
BB: Eu sempre consigo ver o que tem por trás das aparências.
R: Precisamos saber onde a gente tá, porque como não pagamos a passagem
fomos jogados pra fora do ônibus.
BB: Mas era só pedir que eu teria pagado. A Senhora me desculpe, mas ele é
meio ingênuo e não entende nada.
R: Bairro?
BB: Cidade?
R: Estado?
J: Muita pergunta, eu não lembro mais de nada. Eu só sei que passa por aqui,
uma vez por semana, um ônibus que leva pra cidade.
BB: Ah não, isso de jeito nenhum. A Senhora não teria por acaso um quarto
para alugar?
BB: Filhas?
Cena 9 – Entram S e C
J: Eu sou a proprietária.
C: Como? Que absurdo! A Senhora é uma mulher!
C: Não! Absurdo é uma mulher ser dona de terras. (Sobe no baú) As mulheres
estão tomando conta deste país! Vou escrever ao rei...
S: Não, a Senhora não ligue que o meu patrão não sabe o que diz.
R: O que o Senhor quer dizer? Eu também trabalhei como servo por muitos
anos. É um trabalho como qualquer outro.
C: E quem é esse outro que se mete na minha conversa? Essa cara não me é
estranha...
C: Esse idiota aqui me fez perder o caminho. Onde fica o ponto de ônibus?
J: É aqui mesmo, mas passa só uma vez por semana. (som trompette) E
acabou de passar, mas se o Senhor quiser, posso te hospedar.
J: Vou falar para minhas filhas que preparem mais duas camas.
C: Duas camas?
J: Muito bem, então Biro Biro e Rosendo vão para o quarto da cá, capador vai
para o quarto de lá e o menino vem comigo.
S: Qualquer lugar que não seja com esse aí.
R: Essa aí!
BB: Como não existe? É um baú muito bonito. Com certeza tem uma coisa
muito importante dentro.
C: O primeiro que chegar perto do meu baú é um homem morto. Saci, pegue o
baú e se arranque!
C: Por quê?
R: Boca de siri?
J: Você é do Nordeste?
R: Sim, do Ceará!
A: O dinheiro é tudo.
A: Se compra sim.
M: Não.
A: Sim
M: Não.
A: Por quê?
Sonho com a presença dele, com os olhinhos dele, quero até beijar.
Mas o amor nunca se compra e tudo fica triste se ele não chegar,
Cena 11 – Entra J
J: Pupa que papiu. O que você tá fazendo aí deitada sua preguiçosa? Sempre
sonhando!
A: Preguiçosa!
M: Alucinada!
A: Da Miranda
M: Da Amarinda
J: Chega. Se esses quartos não tiverem pronto daqui 3 segundos, eu, eu, ai ai
ai ai ai. E que 3, que 2, que 1. Ahhhhhhhhh
Cena 12 – Entra BB e C
BB: Ahhh, você! Que feliz coincidência, não via a hora de falar com o Senhor.
C: Comigo?
BB: Queria levar um “téti a téti” com o Senhor sobre aquele assunto do bico
fechado.
C: Bico fechado?
C: Não entendo.
BB: Isso!
BB: Isso, o Senhor poderia me contar o que tem dentro desse baú.
S: Ah, que a Dona Josefina poderia ser uma ótima mãe… (batem de frente,
caem, cambalhota na rampa. Para R) Obrigado por ter me defendido contra o
meu patrão.
R: Não, os piores são aqueles que humilham, como aquele que me xingou, me
cuspiu e me espezinhou!
S: Não, não… piores são aqueles que maltratam, como aquele que me batia,
me chutava e me mordia!
R: Não! Os piores são aqueles que exploram como aquele que exigiu, não
pagou e me demitiu!
S: Seu idiota!
S: (irônico) É, a gente deveria se unir contra os patrões, né? Mas isso nunca
vai acontecer.
S: Força de quem?
R: Pelos patrões! “Vem, vamos embora que esperar não é saber. Quem sabe
faz a hora, não espera acontecer.” (2x) (S levanta hipnotizado e os dois
dançam)
S: Ah, que toda vez que isso aconteceu, me deram tantas pauladas que
amaciou o meu ímpeto.
É a gente não tem cara de panaca, a gente não tem jeito de babaca, a gente
não está com a bunda exposta na janela pra passar a mão nela
É
a gente quer valer o nosso amor
M: Não, não, não… o senhor é que toca muito bem! Você deve ser aquele
rapaz lá do Norte, Nordeste…
R: Sim, me chamo Rosendo! E você deve ser uma das filhas de Josefina.
M: Expira?
R: Inspira!
R: Você que é fofinha e gentil… (lazzo de repetição até que M bate o nariz na
cabeça de R)
M: O que é isso?
BB: O que?
M: Óh!
M: O senhor é costureiro?
M: Ahhhh (desmaia)
M: Não!
M: Como assim?
BB: Comissão de frente, 10. Recuo da bateria, 10. Harmonia, 10. Somando
todos os quesitos, você acaba de conseguir um Destaque no meu Desfile!
BB: (para M) Espere aqui. (para A) Quem seria esta maravilha da natureza?
A: Amarinda.
BB: Amarinda!!!
A: Acha?
M: Ôô!
BB: Não, eu só estou pedindo para ela não atrapalhar nosso ensaio. Espere.
BB: Ela fica enchendo meu saco com aquelas contas. Espere.
BB: Ela fica enchendo meu saco com aquela dança. Espere... (para M) Depois
vamos treinar um pouco de quadril. Espere... (para A) Você leva o currículo e
depois eu testo você.
J: Amarinda, Miranda, cadê essas duas que não fizeram nada o dia inteiro?
(Saem A e M)
BB: Eu sabia que essas duas gatinhas não resistiriam ao meu encanto.
J: Ta rindo do que?
J: Ajuda no que menino? Eu sei que você foge do trabalho como o diabo foge
da cruz.
S: É verdade.
J: Então...
S: Mas a Senhora tem que entender que tem trabalho que se trabalha porque
tem que trabalhar, tem trabalho que se trabalha porque se quer trabalhar, ou
seja, tem trabalho que é bom e se trabalha com gosto, mas tem aqueles outros
trabalhos que se trabalhar sem querer se trabalhar, mas que tem que trabalhar
do mesmo jeito. Entendeu?
J: Não.
J: Como assim?
J: É...
S: É...
S: Ninguém.
J: Achado no mato?
S: É, ela me levou pra casa dela, mas o marido dela não quis que eu ficasse.
J: Não quis?
J: Cidade grande?
J: Que perigo.
J: Meu Deus.
J: E foi...
S: Foi então que o Seu Capador, meu patrão, me encontrou no mato, e até
hoje eu trabalho pra ele.
S: É.
J: Fazer o que?
S: Preciso.
J: Mesmo?
S: Mesmo!
S: Ótimo!!!
S: Eu vou, mas o Senhor peça com educação senão eu conto pra minha mãe.
(Sai)
C: Ma...
C: Ma...
C: Pago!
A: Paga?
A: Quem me dera fosse, mas aqui não posso fazer nada. Ninguém entende
nada de negócios.
C: Eu entendo tudo.
A: Mesmo?
A: Um gênio?
A: Reconverter?
A: Açúcar?
A: E daí?
A: Pão de queijo?
C: Não, as pepitas. Mandamos todo o ouro para o exterior.
A: Que prejuízo.
A: Aleluia.
A: E daí?
A: A tapioca?
C: Não, o látex.
A: Borracha!
A: E daí?
A: E agora?
A: E daí?
A: Falou!
A: Sim.
A: Não.
A: E o que é?
C: Psiii (cochicho)
C: Não.
C: E daí?
A: Mulata.
C: E daí?
C: Ahhhh!!!! E daí?
C: Ótima idéia.
S: Que coisa mais estranha o discurso destes dois… raptar Miranda? E o pobre
do nada, que faz três dias que ta fechado no baú sem tomar um ar… (desmaia)
será que ainda tá vivo? E se eles raptarem a Miranda e jogarem ela dentro do
baú, aí sim que os dois não vão conseguir respirar mesmo. Preciso fazer
alguma coisa! Mas fazer o quê? Vou matar o seu Capador! Não, que vou sujar
a mão e ainda vou preso… Vou chamar a polícia! Não, que aqui não tem nem
orelhão… vou falar com os homens do Greenpeace! Não, ultimamente eles tão
muito ocupados com as baleias… Já sei! Vou libertar o nada (dança). E a
Miranda? Pra impedir que raptem a Miranda eu vou pedir a ajuda de alguém.
Cena 21 - Entra Miranda
S: Porque não! (puxa M para trás) Não é bom para uma moça ir no quarto de
um homem.
S: (ergue M no ombro) Mas a tua irmã é que nem o porco do meu patrão.
S: Não, meu patrão é um porco e sua irmã é como o porco do meu patrão.
S: Ih, Miranda eu não entendo nada de bicho, mas não vá para o quarto dele.
M: Sim, euzinha!
C: Não, não é possível! (para M) Você, não saia daí, não se mexa porque pode
extraviar. (M fica estática. C para S) Vamos pegar o ladrão com a boca na
botija!
S: Miranda!
M: Já posso me mexer?
M: Por quê?
BB: Minhoca?
BB: E daí?
J: Daí que o Senhor tá querendo fazer a mesma coisa com as minhas filhas.
J: Não foi o senhor que andou dizendo para Miranda ir dançar não sei onde?
J: E pra Amarinda calcular não sei o que na firma de não sei quem?
J: Mas o que?
BB: Mas é que eu só quero fazer alguma coisa boa com as suas filhas.
R: É que o Capador...
BB: Mas se o Capador não tem nada e a Miranda não tem nada, o que eu
tenho com isso?
R: Nada.
R: Ei, Malandro. A Miranda vai ser raptada, quem vai fazer isso é o Capador.
Já que você é meu amigo...
BB: Eu?
R: E sócio!
BB: Ahhh!!!
R: É!
R: Miranda?
M: Rosendo?
M: Como assim?
R: É muito perigoso.
R: Porque…
M: Por quê?
R: Porque…
M: Por quê?
R: Porque sim! Agora não posso explicar, se esconda em algum lugar, sei lá…
no guarda-roupa!
M: Você também quer me mandar pro guarda-roupa… eu achava que você era
diferente, que você fosse me dar carinho, mas você é igual a todos os homens!
(chora)
M: É!
R: Não é!
M: É!
R: Não é!
M: É!
R: Tá bom, é!
CANÇÃO DA NOITE
E a gente canta
E a gente chora
E a gente dança
Venerando a noite
Cena 26 – Entram Amarinda e Capador
S: E eu?
S: Mas que belezura, linda, se eu não soubesse que era você já estaria
apaixonado.
R: Porque não!
(Briga)
A: Trouxe o sonífero
C: Sim! (Saem)
(Saem)
Cena 34 – Miranda e Saci
M: Por quê?
S: Porque aqui tem um homem do saco que come moças! Volte pro guarda-
roupa!
M: Então eu vou!
R: Pobre Miranda!
C: Amarinda!
A: Capador!
A: Deu!
A: O ônibus chegar...
C: E ir embora!
A: Senhor Capador, eu fiz uns cálculos e vamos ganhar muito dinheiro.
C: Muito dinheiro!
C: Não me diga...
C: Por quê?
C: Oh yes!!!
C: Mulatas.
A: Crianças!
C: Crianças!
A: Órgãos!
C: Órgãos!
C: Calma!
A: O que foi?
Amarinda desmaia
C: O que foi?
S: (Assusta os dois e corre pelo palco) Patrão! O senhor não sabe o que
aconteceu, patrão! Aconteceu uma coisa terrível!
C: Cala a boca! Senão vai acordar todo mundo!
A: Posso estrangulá-lo?
S: eu não queria olhar patrão, eu nem gosto do seu baú... Só que ele começou
a dar uns pulos altos assim!
C: Não, não, não! Vamos fazer o seguinte: Vá lá buscar meu baú e traga aqui!
C: Por quê?
S: Não consigo nem olhar o seu baú, quanto mais pegar nele! (Lazzo: Não
vai?).
C: Pode estrangular!
S: Então eu vou!
A: Deve ser a louca da minha irmã que está ensinando o Índio a sambar!
C: Pode ser!
A: Posso estrangulá-lo?
C: Pode estrangulá-lo!
C: Boa pergunta.
C/A: Vá de reto!
C: Epa Rei.
C: Cala a boca! Pare com essa baboseira toda. E vocês dois voltem para o
baú!
C: Ah, que inferno! Se não voltarem para o baú vou chamar meu capataz
J/D: Vocês não vão chamar ninguém porque daqui a três segundos vocês vão
descer no inferno mais profundo. E que três, e que dois e que um...
C: Ai pelo amor de Deus seu demônio. Eu sempre fiz o mal e o senhor deveria
levar isso em consideração.
J/D: Verdade, mas isso é uma situação de mal com finalidade de bem, ou seja,
de bem com finalidade de mal (lazzo). Em suma, não tenho que dar satisfação
a ninguém. Eu sou o diabo e faço tudo do jeito que o diabo gosta. E que 3, e
que 2, e que 1...
A: Do Capador!
J/D: Do Capador?
A: Do Capador!
J/D: Jura por sua mãe que ficou corcunda de tanto criar você e seus irmãos?
A: Juro!
C: Seu demônio, mas que diabo você tem? Que inferno! Ah, me desculpe,
quem sabe não poderíamos conversar, eu poderia...
J/D: Calem a boca que isso aqui não é um debate público. O único jeito de
vocês dois não irem para o fogo do inferno é arrependerem-se e devolverem a
liberdade àqueles dois!
A: Eu também me arrependo.
C/A: O que?
A: Enganados?
S: Ô mãe, eles queriam vender o índio para o Bruto Musgo, mas eu libertei ele!
S: Mamãe!
J: Rosendo meu filho, não tem nada que você queira me dizer?
J: Tudo bem que já se viu de tudo nessa vida, mas casamento a três é demais.
BB: não foi isso que eu quis dizer. Tendo em vista que a Miranda dança e o
Rosendo toca, eles poderiam fazer uma dupla de sucesso. E eu poderia ser o
manager.
Todos: Anh?
BB: O empresário!
Todos: Ahhh!!!
C: Eu estou acabado, esse índio era minha última salvação porque na verdade
eu não tenho absolutamente nada!
Todos: Ohhhh!
A: E os seringais?
C: Desmatados!
A: E a serra?
C: Pelada!
A: E as usinas?
C: Falidas!
A: Não era exatamente um homem pobre que eu queria para mim, mas eu
gostei do senhor. Tive uma idéia.
C: Que idéia?
C: De maneira nenhuma, 20% para você e 80% para mim. Você tem que
entender...
A: Eu não tenho que entender nada.
(Discussão)
J: Chega!
J: Agora que todos têm em mente um futuro, tomem seu rumo que esse Brasil
é grande e tem lugar para todo mundo. Só não se esqueçam dessa história
porque o que aconteceu aqui não deve se repetir nunca mais.
S: 5 anos?
S: 10 anos?
S: 15 anos?
S: Ahhh, e depois?
FIM