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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
MESTRADO EM DESIGN
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

SÃO PAULO,
SETEMBRO /2012
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
MESTRADO EM DESIGN
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

SÃO PAULO,
SETEMBRO /2012
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE


DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu


em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design.

Orientadora Profa. Dra. Márcia Merlo

São Paulo, setembro/2012


UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE


Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design.

Examinador externo
Paulo Roberto Monteiro de Araújo, Doutor,
Universidade Presbiteriana Mackenzie

Examinadora Interna
Gisela Belluzzo de Campos, Doutora,
Universidade Anhembi Morumbi

Orientadora e presidente da banca


Márcia Merlo, Doutora,
Universidade Anhembi Morumbi

São Paulo, setembro/2012


Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução SAVANA LEÃO FACHONE
total ou parcial do trabalho sem autorização do autor.
Mestranda em Design pela Universidade Anhembi Morumbi.
Especialista em Artes Visuais pelo SENAC e graduada em Design de
Moda pela UNIC. Atua como pesquisadora em design e artesanato em
Cuiabá – MT (savanacool@gmail.com.br)

F127d Fachone, Savana Leão


Design e artesanato: o sentido do fazer manual na
contemporaneidade / Savana Leão Fachone. – 2012.
113f. : il.
Orientador: Profa. Dra. Márcia Merlo.
Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade
Anhembi Morumbi, São Paulo, 2012.
Bibliografia: f.103-113.
1.Design. 2. Artesanato. 3. Convergência. 4.Fazer manual. 5.
Contemporaneidade. I. Título.
CDD 741.6
DEDICATÓRIA

Ao meu marido, Flávio, por viabilizar a oportunidade de estudo e crescimento


intelectual e por acompanhar tudo de perto, sempre dando apoio
incondicional;

Aos meus filhos, William e Júlia, pela torcida e força nos momentos difíceis,
compreendendo os períodos de minha ausência;

À minha mãe, Graça, pelos sábios conselhos e por ser minha inspiração diária;

Aos meus irmãos, Sidney, Deivy e Manoela, pela simples existência;

À minha sogra, Ivone, por estar sempre por perto na minha ausência;

À dona Eliete e dona Tereza, por dedicar parte da vida a cuidar do meu lar.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos aqueles que contribuíram para a realização deste trabalho,


em particular:

Aos grandes e eternos amigos que fiz no mestrado em especial, a Juliana


Zanettini, Luci Sifuentes, Luisa Simão, Natalie Rodrigues, e Viviane de Moraes;

Aos queridos professores do mestrado, Profa. Dra. Gisela Belluzo, Profa. Dra.
Cristiane Mesquita, Profa. Dra. Kathia Castilho;

À Dra. Ana Cristina C. Gonçalves, pelo apoio incondicional nos tempos difíceis;

À minha orientadora, Prof. Dra. Marcia Merlo, pela paciência e dedicação;

Ao artesão Osmar, pela simplicidade e entusiasmo;

À Antonia, pela simpatia e cuidado


RESUMO ABSTRACT

Esta dissertação traz a análise de experiências que vinculam This paper provides an analysis of experiences that link work
práticas de trabalho e vivências cotidianas, tendo por objeto de practices and daily experiences, with the object of study is the
estudo o sentido do fazer artesanal na contemporaneidade. Para sense of craftsmanship in contemporary times. for this, two
isso, dois distintos contextos de produção são abordados: o different production contexts are discussed: the first is that of an
primeiro é o de um artesão ceramista pertencente à cidade de artisan potter belonging to the city of Cuiabá, Mato Grosso. The
Cuiabá, Mato Grosso. O segundo diz respeito ao trabalho de um second concerns the work of a designer with a studio potter in the
designer ceramista com ateliê na cidade de Nova Friburgo, Rio de city of Nova Friburgo, Rio de Janeiro. The study draws a parallel
Janeiro. O estudo traça um paralelo entre artesão e o designer, between artisan and designer, signaling the convergence points
sinalizando os pontos convergência entre os campos do design e between the fields of design and craft, identifying relationships
do artesanato, identificando relações híbridas (CANCLINI, 2008), hybrid (Canclini, 2008) in order to articulate the information from
no intuito de articular as informações oriundas de seus processos their production processes and verify development issues of its
de produção e verificar questões relacionadas ao desenvolvimento artifacts and the steps taken during the process of manufacturing
de seus artefatos no processo de fabricação artesanal, a fim de handcrafted in order to know and understand the meaning of
conhecer e entender o sentido do fazer manual nos dias atuais. craftsmanship today.

Palavras-chave: 1.Design. 2. Artesanato. 3. Convergência. 4.Fazer Keywords: 1.Design. 2. Craft. 3. Convergence. 4. Craftsmanship.
manual. 5. Contemporaneidade 5. Contemporaneidade.
(...) Não se deve tirar a conclusão de que minhas opiniões inspiram-se
em nostalgia de uma época que não pode mais voltar. Pelo contrário,
minhas opiniões sobre o trabalho estão dominadas pela nostalgia de
uma época que ainda não existe.

Harry Braverman, Trabalho e Capital Monopolista: A degradação do


trabalho no século 20, 1987
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................. 13
Capítulo 1 – Design, Sentido do Trabalho e Contemporaneidade 19

1.1 Para pensar o trabalho.............................................................................................................. 19


1.2 Algumas considerações sobre a história do trabalho............................................................... 22
1.2.1 O design, o trabalho e o movimento Art and Crafts............................................... 28
1.3 O sentido do trabalho humano: algumas transformações........................................ 30
1.3.1 A dimensão subjetiva do trabalho na contemporaneidade.................................... 33

Capítulo 2 – Design e Artesanato: Domínios do Fazer Humano 37

2.1 Design, artesanato e cultura material......................................................................................... 37


2.2 Design e artesanato: aproximações e distanciamentos.............................................................. 42
2.3 Perspectivas do artesanato na sociedade contemporânea........................................................ 52

Capítulo 3 – Design e Artesanato: O Fazer Manual na Contemporaneidade 59

3.1 Contexto cerâmico matogrossense: suas mudanças e ressignificações.................................... 61


3.1.1 O fazer cerâmico artesanal de Osmar Virgílio da Silva.......................................... 68
3.1.1.1 Primeiro encontro.................................................................................................. 71
3.1.1.2 Segundo encontro.................................................................................................. 82
3.2 Percurso criativo do designer ceramista Gilberto Paim................................................................ 89
3.3 O fazer artesanal: uma questão de resistência?............................................................................ 97

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................................................
100
REFERÊNCIAS.................................................................................................................................................... 103
LISTA DE FIGURAS Figura 32: Na fase da queima no forno que ele mesmo 87
construiu
Figura 1: Quadro de Charles Pearce, 1896. Detalhe do trabalho 23 Figura 33: Osmar, sua filha caçula e seu violão 87
Figura 2: Trabalho humano 31 Figura 34: Gilberto Paim 90
Figura 3: Os filtros do artista cuiabano Sebastião Silva 62 Figura 35: Uma imagem da amostra em Heidelberg, na
Figura 4: Cerâmica cuiabana 64 Alemanha. 91
Figura 5: Índio Bororo em traje ritualístico 64 Figura 36: Peças da coleção “A quatro mãos” 92
Figura 6: Santo São Gonçalo 64 Figura 37: Interior do ateliê de Gilberto e Elizabeth, em Nova
Figura 7: Cerâmica São Gonçalo Beira Rio 66 Friburgo 92
Figura 8: Artesãs de São Gonçalo Beira Rio 66 Figura 38: Gilberto e Elizabeth analisando as fotos da coleção 93
Figura 9: Osmar e Mestre Vitalino 70 Figura 39: Gilberto amassando a argila branca de porcelana 93
Figura 10: Fachada da casa do artesão Osmar 71 Figura 40: Piões de porcelana, Gilberto Paim, 2006 94
Figura 11: Fachada lateral direita da casa 72 Figura 41: Gilberto desenhando o objeto cerâmico 95
Figura 12: Jogo de chá feito por Osmar 72 Figura 42: Esboço da peça de Paim 95
Figura 13: Sala da casa do artesão Osmar 73 Figura 43: Umidificando a argila 95
Figura 14: Sala da casa do artesão Osmar 73 Figura 44: Na modelagem da argila 95
Figura 15: Oficina no fundo da casa do artesão 74 Figura 45: Levantando a argila no torno 96
Figura 16: O artesão trabalhando a argila no torno 75 Figura 46: Medindo a circunferência 96
Figura 17: O artesão e suas tarefas domésticas 76 Figura 47: Usando uma de suas ferramentas 96
Figura 18: Mulher do artesão Osmar 76 Figura 48: Encaixando a base da peça 96
Figura 19: Artesão Osmar no seu ofício 78 Figura 49: Objetos de cerâmicas espalhados pela casa de Paim 96
Figura 20: As mãos do artesão Osmar 79
Figura 21: Forno construído por Osmar 80
Figura 22: “Barro Vivo” Loja da família 81
Figura 23: Endereço da casa de Osmar 82
Figura 24: Osmar na frente da sua casa 83
Figura 25: “Milheiro de argila” 85
Figura 26: Explicando o novo processo 85
Figura 27: Quebrando o tijolo de argila não queimado 85
Figura 28: Mostrando o ponto da argila para o torno 86
Figura 29: Levantando a argila no torno 86
Figura 30: Modelando a argila no torno 87
Figura 31: Peças secando ao ar livre 87
13

INTRODUÇÃO do processo de produção de suas peças cerâmicas1, a fim de


conhecer e entender o sentido do fazer manual nos dias atuais.

Ao mesmo tempo, observa os saberes e fazeres que


Esta dissertação traz a análise de experiências que vinculam
integram o conjunto de habilidades para criação de artefatos
práticas de trabalho e vivências cotidianas, tendo por objeto de
cerâmicos, gerando oportunidades de ocupação e renda para
estudo o sentido do fazer artesanal como forma de resistência na
alguns trabalhadores e modo de vida para outros. Analisa,
contemporaneidade. Para isso, serão abordados dois contextos
também, as condições nas quais ocorre a assimilação desse saber
distintos de produção: o primeiro é o de um artesão residente em
por designers e outros profissionais, referenciando
Cuiabá, Mato Grosso. O segundo diz respeito ao trabalho de um
favoravelmente sua própria criatividade e sua produtividade.
designer ceramista, conhecido internacionalmente, que reside na
cidade de Nova Friburgo, Rio de Janeiro. A pesquisa foi limitada a estas duas situações devido à
necessidade de compreender a produção cerâmica artesanal
O estudo traça um paralelo entre artesão e designer,
contemporânea a partir dos contextos local e global,
sinalizando os pontos de convergência na questão do fazer
considerando similitudes nos modos de produção e com histórias
manual e os possíveis pontos de divergência entre os campos do
marcadas pelo fazer artesanal, que, em ambos os casos, revelam-
design e do artesanato. Identifica, também, relações híbridas
se como fundamental “modelador” da pesquisa.
(CANCLINI, 2008), no intuito de articular as informações oriundas

1
Quando falamos em cerâmica, o fazemos de forma concisa e a relacionamos
a objetos utilitários e artísticos, feitos artesanalmente.
14

No estudo do processo de produção da cerâmica artesanal Universidade de Cuiabá, minha experiência tem sido trabalhar
desenvolvida por Osmar Virgílio da Silva, artesão matogrossense, com artesãos, mais especificamente com famílias artesãs.
esta pesquisa objetiva compreender como se dão as interações
No início, tive a oportunidade de me relacionar com
entre sujeito artesão e artefato construído, e os passos
indivíduos e grupos que ainda trabalhavam e viviam sob lógicas
percorridos durante o processo de fabricação artesanal, a fim de
sociais e culturais diversas da cultura homogeneizante. Foi
conhecer e entender sua concepção nos dias atuais.
quando percebi a relação entre homem e trabalho num universo
Acreditamos que a atividade criativa do artesão e do ideológico que envolvia os processos de produção manual.
designer ceramista seguem metodologia projetual semelhante,
A dinâmica utilizada nos trabalhos que desenvolvíamos
mas o caráter empírico do primeiro gera, por vezes,
consistia em oficinas de artesanato organizadas pela instituição
discriminação.
de ensino e pelo poder público da cidade, numa parceria que
Decerto que nenhuma escolha é aleatória e todas elas têm buscava a autossuficiência dos artesãos e das comunidades
sua razão de ser. O esclarecimento dos motivos que provocaram artesanais locais através da comercialização de produtos. Esse
a opção pelo tema provavelmente pode contribuir para um maior tipo de oficina funcionava como catalisador de ideias, pois não
conhecimento da trajetória desta pesquisadora, pois eles derivam havia regra ou forma única de realizar as atividades – o objetivo
das experiências com artesãos durante a minha formação era despertar o sentimento de cidadania, estimular a
acadêmica, além das escolhas profissionais que levaram minha conscientização ecológica e proporcionar alternativas para
pesquisa na área de design para a discussão da relação com o geração de renda. Além da capacitação dos artesãos, as
artesanato. Desde a graduação em Design de Moda, na atividades tinham o intuito de despertar a criatividade para
confecção de peças originais, viáveis e de baixo custo. Neste
15

sentido, pensava-se a reconfiguração do produto pelo design a de obter reconhecimento – por muitos ou por muito tempo. É
fim de facilitar a sua inserção no mercado, além de dar corpo ao mais costumeiramente improdutivo, rotineiro ou pouco
papel social dos futuros designers. desafiador. A cerâmica é, sem dúvida, um tema relevante, como o
são todos aqueles que resultem numa obra e que envolvam um
Essa experiência despertou meu olhar analítico sobre o
criador.
artesanato como importante recurso de desenvolvimento, em
razão do impacto econômico que produz em determinadas O estímulo à promoção de atividades econômicas baseadas
regiões do país, pela demanda do mercado, a geração de no fazer manual ou em manufatura similar tem permitido a
ocupação e renda e o aproveitamento equilibrado dos recursos inclusão produtiva de segmentos populacionais menos
naturais. Ademais, a atividade ajuda a preservar as tradições favorecidos, particularmente aqueles retidos no conhecimento
locais e a fortalecer o sentimento de pertencimento. informal – aprendido em relacionamentos primários e
intergeracionais –, e o ensino formal, da lógica da educação para
Portanto, esta investigação representa o desdobramento de
o mundo do trabalho (MARINHO, 2007).
questões em torno do fazer artesanal como forma de resistência,
motivada por reflexões acerca do sentido deste trabalho nos A motivação também está na crença de que, com incentivo
tempos atuais. e valorização, é possível inserir a produção artesanal no sistema
produtivo, fortalecendo o desenvolvimento local com valor
A realização de um trabalho que seja útil para a sociedade
agregado a partir da associação dessa produção ao contexto
ajuda a viabilizar desenvolvimento, valorização, reconhecimento
sociocultural. Favorece, por conseguinte, a aceitação do
e, consequentemente, autorealização. Por outro lado, um
artesanato no mundo contemporâneo como mercadoria
trabalho em choque com valores pessoais tem mais dificuldade
diferenciada e de produção não massificada.
16

Assim, esta pesquisa orientou-se para a compreensão do experiências das trajetórias profissionais vinculadas à própria
fazer manual na contemporaneidade como processo de história social.
atribuição de significados, pautando a prática cerâmica do
Talvez a parte mais significativa deste projeto tenha sido a
artesão matogrossense Osmar Virgílio da Silva e do ceramista
coleta de depoimentos, que foram pontuados por sentimentos e
carioca Gilberto Paim, assim como questões pertinentes à vida e
confissões a respeito do trabalho e da vida, com detalhes acerca
ao processo produtivo de ambos. Acreditamos que investigação
das tradições, crenças, manifestações culturais e práticas de
sobre o sentido do trabalho manual leva a indagar se ainda há
trabalho.
espaço na vida contemporânea para esse tipo de atividade e
quais as garantias de sua permanência. Ao analisar o processo de construção de artefatos e seu
significado para os atores sociais envolvidos, revelou-se como
essas pessoas constroem e transformam suas histórias, suas
Caminhos de Pesquisa relações sociais e o sistema de representação que as orienta por
diferentes planos da vida social.
Na investigação empírica, feita no contexto do artesão
Osmar, adotou-se a abordagem qualitativa, que permite maior Alguns dilemas surgiram, centrados nas dificuldades
aprofundamento. Esse caminho possibilitou registrar a história de teóricas e práticas que geralmente aparecem em torno das
vida da família sob a forma de estudo de caso. Assim, buscou-se metodologias e das interpretações do cotidiano enfrentadas por
estabelecer uma relação entre o que foi apresentado pelo artesão pesquisadores que vivenciam a realidade da pesquisa de campo.
e o que foi pesquisado em relação ao designer ceramista e os
Os resultados dessa iniciativa foram organizados em três
contextos sociais em que se inserem, conseguindo reconstruir
capítulos:
17

O primeiro capítulo aborda o mundo do trabalho até a


contemporaneidade, observando a reestruturação produtiva e
cultural facultada pelo processo de industrialização acelerado
durante o afloramento da idade moderna, além de discutir a
divisão do trabalho e o aparecimento da figura do designer.

No segundo capítulo, é destacado o referencial teórico


central para o desenvolvimento da pesquisa sobre Design e
Cultura Material. Ali, é debatido o conceito de design que vem a
constituir um referencial teórico para estruturar a pesquisa
proposta.

No terceiro capítulo, dois contextos são analisados: de um


lado, o de Osmar Virgílio da Silva, seu cotidiano, o espaço da
produção e o sentido que o artesão dá ao seu trabalho,
juntamente com o contexto sociocultural cuiabano; de outro
lado, a experiência de Gilberto Paim e as maneiras de construir
seus artefatos na possibilidade de verificar como se dão as trocas
culturais entre ambos.
18

CAPÍTULO 1
19

sociedade capitalista. Suas ideias, cuja abordagem contribuiu para


desvendar a lógica dos processos sociais da época, também
CAPÍTULO 1 denunciavam as contradições básicas desse sistema (BERMAN,
1998).
DESIGN, SENTIDO DO TRABALHO E CONTEMPORANEIDADE
Em que pesem as mudanças e os problemas que afetam a
humanidade neste início do século 21, o pensamento do autor
Os novos métodos de trabalho estão
indissoluvelmente ligados a um determinado alemão voltou à ordem do dia. Entretanto, esse retorno só fará
modo de viver, de pensar e sentir a vida; não é
possível obter êxito num campo sem obter sentido se reconhecermos nessas mudanças novas pistas para a
resultados tangíveis no outro. análise dos desafios impostos pela contemporaneidade.
Antônio Gramsci, Maquiavel, a política e o
Estado Moderno (1976). Têm sido cada vez mais frequentes as pesquisas
relacionadas às novas direções dos estudos de Marx, cujas
determinações estruturais têm recebido considerável atenção no
1.1 Para pensar o Trabalho mundo acadêmico, embora ainda sejam objeto de intensas
disputas teóricas, segundo Alvaro Bianchi (2007), professor do
O retorno a Karl Marx no bojo desta dissertação é
Departamento de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências
necessário para refletir acerca das questões concernentes ao
Humanas da UNICAMP (IFCH) e diretor do Centro de Estudos Marxistas
trabalho. Ainda mais quando se compreende o fazer artesanal
(CEMARX).
como uma prática laboriosa. Assim, encaramos que um dos
objetos de análise daquele teórico do século 19 continua regendo O presente estudo traz à tona a valorização do sentido do
o cotidiano contemporâneo, na esfera do trabalho humano na trabalho humano – discussão relevante em dias atuais.
20

Diversos estudiosos da área têm dedicado anos de pesquisa O trabalho foi, na realidade, o personagem central na teoria
e nos auxiliam com suas contribuições, como: Albornoz (1986- marxista, não apenas com a emancipação da classe trabalhadora,
2004), Astrada (1968), Braverman (1981-1987), Huberman, mas com a libertação do homem em relação ao trabalho
(1976). Um dos aspectos que chama atenção é a existência de um alienante e explorador. Essas referências oportunizam o
ponto comum entre esses autores: em suas análises, todos eles entendimento entre homens, o sentido e o valor do trabalho.
tomam como referência a concepção de trabalho em Marx – uns
Na análise de Marx, encontramos o modo de produção
para questionar, outros para fundamentar suas posições.
capitalista e suas relações de produção e de circulação ou, em
A contribuição de Max não se restringe à análise das outras palavras, “a lei econômica do movimento da sociedade
relações de trabalho na sociedade capitalista, agregando moderna” (MARX, 2002, p. 18). Aqui, o teórico considera o
conceitos como: concreto e abstrato, morto e vivo, embora deixe trabalho em sua significação mais ampla, como possibilidade de
transparecer uma teoria antropológica do trabalho em vários de transformação da realidade natural e social. Para ele, os homens
seus textos (ALBORNOZ, 1986). produzem seus meios de vida e estabelecem relações sociais
baseadas nas condições materiais de sua existência. O estudo de
Max (2002) criticou o modelo de exploração do capitalismo,
qualquer sociedade pressupõe essas relações sociais como ponto
que vê a força de trabalho apenas como mercadoria. Destacou
de partida. Para ele, o trabalho é um processo ontológico:
que só o trabalho gerava riqueza, e quem a produzia não tinha
direitos, portanto, a história do homem consolidou-se na dos
Trabalho é um processo de que participam o
interesses opostos, subjacentes a toda relação social. A alta homem e a natureza, processo em que o ser
humano, com sua própria ação, impulsiona,
centralidade das atividades laborais na vida das pessoas, como
regula e controla seu intercâmbio material com
autoconstrução do ser humano, surge nesta concepção histórica. a natureza. Defronta-se com a natureza como
21

uma de suas forças. [...] atuando ainda sobre a interações sociais e culturais que marcaram sua eclosão, são
natureza externa e modificando-a, ao mesmo
tempo modifica sua própria natureza (MARX, sentidas e analisadas até os nossos dias.
2002, p. 211).
Nos limites desta pesquisa, optou-se por traçar um
Segundo Hobsbawn (1985) a base da teoria de Marx sobre o panorama a partir da Revolução Industrial, onde o trabalho foi
desenvolvimento social e econômico é a análise do homem como substituído por um modelo que se aproximasse da lógica de
animal social que, ao realizar o trabalho, cria e reproduz sua expansão do sistema capitalista, momento em que sociedade e
existência no cotidiano. Assim, percebe-se que a categoria acolhe comunidade se organizavam e se transformavam
uma definição de homem como sendo aquele que, para ser, constantemente.
necessita produzir os seus próprios meios de subsistência
Com essa perspectiva, de um lado representando um dos
material e simbólica.
enclaves econômicos do mundo atual, e de outro, estabelecendo
Nesta análise, é premente levar em conta os efeitos do diferentes padrões para a constituição de alianças produtivas nos
desenvolvimento tecnológico mundial, considerando que o territórios, há que se entender melhor o trabalho humano e suas
processo de adaptação das técnicas de produção material para a formas de institucionalização.
forma capitalista se deu sobre uma cultura de produção
Aceitando o desafio de refletir sobre essas questões, a
artesanal. Os traços fundamentais desse ajustamento definiram e
análise começou pela revisão dos conceitos básicos de trabalho, a
caracterizaram o Design e, principalmente, sua importância e
fim de embasar a reflexão proposta neste capítulo introdutório.
responsabilidade dentro do contexto socioeconômico e na
interação entre homem e trabalho. As mudanças estruturais que
ocorreram e os fatos geradores daquele cenário, além das
22

1.2 Algumas considerações sobre a história do trabalho


Com a Reforma Luterana Direito e dever ou um meio para a
salvação
A história do trabalho acompanha a história da própria
humanidade, adquirindo diferentes significados conforme a
Na Revolução Industrial Expressão da criatividade humana
cultura, os valores, a visão e o espírito de cada época. Segundo
Martins (1994), desde as primeiras sociedades humanas até os No início do século 20 A maior obsessão
dias atuais, o trabalho assumiria os seguintes significados.
Embora, não acreditamos que tenha sido dessa forma, tão Nos dias correntes Atividade em questionamento

categórica, colocamos na forma de tabela para melhor


No porvir Resgate de seu sentido original
visualização:

Tabela 1: Na tabela, a época e o significado dado ao trabalho. Fonte: acervo pessoal

Na reflexão de Carlos Astrada (1968), a ascendência


Na pré-história Uma atividade lúdica
etimológica da palavra “trabalho” em português, trabajar em
Na Antiguidade Maldição divina espanhol, como a do travailler francês e do travagliare italiano, é
o vocábulo latino tripaliare, do substantivo tripalium – aparelho
Nos primórdios do Forma de expiação do pecado de tortura formado por três paus onde eram amarrados os
Cristianismo original; meio de compaixão
condenados, gladiadores e escravos romanos. O trabalho tinha

No Cristianismo da Idade Remédio para as tentações conotação negativa e sua definição original influenciou alguns
Média idiomas de acordo com o contexto histórico e social.
23

O sentido do trabalho estava relacionado aos valores tempo, a palavra exprimiu uma experiência dolorosa de
religiosos da época, era visto como uma ocupação para livrar o padecimento, cativeiro, castigo, punição. Esta concepção atingia
indivíduo das possíveis tentações. Não propiciava satisfação aos o estatuto jurídico e político dos trabalhadores (BUENO, 1988).
trabalhadores, era realizado para atender aos objetivos da Igreja.
A valorização positiva do trabalho emergiu na Europa, dada
Era considerado uma punição para o pecado e, a partir dele, era
à capacidade de produção e a concepção de vida e sociedade
possível a purificação do corpo e alma (ALBORNOZ, 1986).
vivenciadas na época. As organizações produtivas conhecidas na
sociedade eram as corporações de ofício, que regulavam o
trabalho artesanal. Essas corporações garantiam a atividade aos
trabalhadores, inibindo a concorrência e controlando a qualidade
dos produtos. Elas conseguiam assegurar o crescimento da vida
urbana por meio do desenvolvimento comercial para a
emancipação das cidades incipientes (CARDOSO, 2008).

Essa atividade se caracterizava pela espontaneidade, na


medida em que os artesãos eram livres para organizar seu

Figura 1: Quadro de Charles Sprague Pearce, 1896. Detalhe do trabalho.


trabalho e tinham controle sobre todo o processo produtivo. Os
Fonte: www.apropucc.org.br. Acesso: 20/05/2012
artesãos “eram donos do espaço físico da produção, das
matérias-primas, dos meios de produção e, por último, podemos
O significado de sofrimento e de punição relacionado ao
dizer que eram senhores da totalidade do processo de trabalho”
termo trabalho perpassou a história da civilização e, por muito
(FORTY, 2007, pp. 67-68). Não havia separação entre saber e
24

fazer, entre concepção e execução. Além de se reconhecer no Estabeleceram-se também mudanças significativas na estrutura
produto do seu trabalho, o artesão tinha acesso a ele. da sociedade, entre as quais a revolução agrícola e o surgimento
das cidades (CARDOSO, 2008).
Nas relações de produção, as corporações eram regidas por
uma hierarquia piramidal. O topo era ocupado pelo mestre Com o aparecimento dos grandes centros, uma mudança
artesão, também proprietário das ferramentas, da matéria-prima importante ocorreu a partir da crescente migração do homem do
e dos produtos finais. A base era preenchida pelos aprendizes, campo para a cidade, atraído pela imagem de dinamismo da vida
que, em troca de seu trabalho, recebiam do mestre moradia, urbana e a possibilidade de ascensão social. Antes envolvidos
alimentação e vestuário (MACHADO, 2007). exclusivamente com os processos de produção agropecuária, os
recém-chegados passaram a se ocupar especialmente do
Mestres e aprendizes exerciam seus ofícios em todas as
comércio e da indústria. Esse movimento se ampliou até a
fases – da matéria-prima ao produto final. Dentro dessa
transformação do sistema de produção na sociedade industrial,
estrutura, não se realizava apenas uma atividade laboral;
em que o homem era essencialmente produtor (HUBERMAN,
desenvolviam-se habilidades que proporcionavam satisfação
1986).
pessoal (ALBORNOZ, 2004).
Nesse âmbito, o trabalho fora incorporado à ideologia
Com o passar do tempo, a introdução de novas tecnologias
burguesa como categoria universal e fundadora de toda a vida
aplicadas à produção e o aparecimento de ideologias ligadas ao
social, como atividade natural de produção e troca de valores de
progresso individual e social, o conceito de trabalho alterou-se. A
uso, necessária à reprodução material da vida em sociedade
ideia de tortura, maldição, castigo, deu lugar ao trabalho como
(BAUMAN, 2001).
fonte de realização, como meio de dignificação do indivíduo.
25

Entretanto, o marco das mudanças para os modelos de A consciência comum em relação às técnicas do processo
organização do trabalho e as atividades humanas como os produtivo diminuía, enquanto crescia a sua especialização. A
conhecemos hoje foi a Revolução Industrial, na Inglaterra do indústria buscava maior produtividade para atender à sociedade.
século 18, com mecanização dos meios de produção, oposição ao Dividir3 o trabalho e particularizar determinadas áreas do
modo artesanal – exclusivo, até então –, entre inúmeras processo de produção foi uma forma de aperfeiçoar o resultado
transformações agudas e definitivas. Este período de revolução final (HUBERMAN, 1986).
faz parte de um rol de mudanças ainda maior, conhecido como
A divisão do trabalho instituída nos processos de fabricação
Modernidade2, que transformou valores, rompendo com os
industrial superava o modo de produção artesanal. Não só o
costumes tradicionais.
trabalho foi dividido, mas a vida também. Segundo Forty (2007):
Essas mudanças dependeram muito menos de novas
A maior parte da produção e do comércio era
máquinas do que se costuma imaginar. Antes de tudo, deveram- realizada nas residências dos artesãos,
comerciantes ou profissionais envolvidos, e
se à organização do trabalho, à produção e à distribuição, ou seja, compreendia-se a casa como um lugar que
mudanças de ordem social, muito mais do que tecnológica incorporava o trabalho às atividades habituais de

(CARDOSO, 2008).

3
A expressão “divisão social do trabalho” é vista em estudos de diferentes
áreas do conhecimento humano, como economia, sociologia, antropologia,
2
Segundo Berman (1986), a Modernidade compreende um tempo histórico história etc. Porém, é empregado nesta dissertação no sentido utilizado por
que pode ser dividido em três fases: a primeira vai do século 16 ao 18 e é Marx (2002) para indicar o modo como o trabalho foi distribuído nas estruturas
marcada pelo período de transição; as pessoas iniciam a experiência com a socioeconômicas, no que tange a formação da força de trabalho. Essa divisão
vida moderna. A segunda fase, do final do século 18 ao início do 19, aflora os se dá entre quem concede e quem executa o trabalho, isto é, entre os donos
sentidos revolucionários nas pessoas, provocando mudanças nos meios sociais, dos meios de produção e os donos da força de trabalho. Para Marx, essa
pessoais e políticos. A grande mudança de valores, segundo o autor, acontece divisão sempre existiu, é inerente ao trabalho humano e diz respeito às tarefas
na terceira fase, e é marcada pela expansão da modernização no século 20. econômicas, políticas e culturais.
26

morar, comer, dormir e assim por diante (pp. 137- a lei geral da divisão capitalista do trabalho.
138). Esta não é a única força que atua sobre a
organização do trabalho, mas é certamente a
mais poderosa e a mais abrangente. Os seus
resultados, mais ou menos conseguidos em
A antiga relação individual do artesão com sua ferramenta todo o tipo de indústria e de ocupação, dão um
de trabalho ofuscou-se e os trabalhadores inseridos nas relações forte testemunho da sua validade. Ela molda
não apenas o trabalho, mas também as
de produção passaram a atuar frente às máquinas, divididos populações, pois a longo prazo leva à criação de
uma força de trabalho massificada e
hierarquicamente e organizados em unidades de produção. A desqualificada que é a característica principal
industrialização fragmentou o trabalho, dividindo-o em tarefas e das populações em países capitalistas
desenvolvidos (BRAVERMAN, 1987, pp. 82-83).
em responsabilidades. Isso possibilitou aos comerciantes exercer
o controle sobre o ritmo, o tempo e o volume da produção.
Braverman faz uma interessante atualização da análise de Marx: O trabalho se separava do resultado, num processo
apontado, por Marx, como alienação (HUBERMAN, 1986). O que
Cada uma das fases do processo de trabalho é
caracterizava a alienação não era a divisão do trabalho em si, mas
separada, tanto quanto possível, do
conhecimento especializado e da formação, e a redução das tarefas produtivas em parcelas sem significado ou
reduzido a uma simples operação. Enquanto
isso, as relativamente poucas pessoas que sem relação com o produto final do trabalho. Vale lembrar que
tiveram acesso ao conhecimento especializado
este mesmo autor considerava o capitalismo um moderno
e à formação, são libertadas, na medida do
possível, das obrigações relacionadas com as modelo de produção no que diz respeito à ampliação das forças
operações simples. Deste modo, todo o
processo de trabalho se enquadra numa produtivas, mas, ao mesmo tempo, pobre porque que se apoiava
estrutura que nos seus extremos polariza na exploração do trabalhador (BRAVERMAN, 1981).
aqueles cujo tempo é infinitamente valioso, e
aqueles cujo tempo quase nada vale.
Inclusivamente, poder-se-ia designar isto como
27

O trabalho industrial impunha uma cultura própria, de Com a sociedade industrial o trabalho torna-se
público, isto é, sai da esfera doméstica. A vida
economia de gestos, de produzir mais no menor tempo possível, passa a ser enquadrada pela obrigação/rotina
de acumulação de bens (CARDOSO, 2008). Uma cultura que ia da fábrica e ao escritório. Intensifica-se o
trabalho humano, racionaliza-se, maximizam-se
contra a cultura do campo, onde o trabalho, ainda que longo e as tarefas pela especialização. Eficácia e
rendimento máximo passam a ser as
cansativo, respeitava os ritmos naturais 4. coordenadas fundamentais da sociedade
produtiva (SEARA, 2003, p. 11).
A expectativa que se tinha com a fragmentação era de que
as tarefas, quando reduzidas no tamanho e na complexidade,
dentro de um processo, proporcionavam melhor desempenho O desenvolvimento prático do trabalho se acentuava no

quanto à quantidade produzida. Este aspecto diz respeito à sistema capitalista. O trabalho começava a perder seu caráter

eficiência que se conseguia em termos de volume no final da humanizador e se transformava em um instrumento de

produção dos artefatos. O trabalhador deveria adequar-se aos sobrevivência (ARRUDA, 2001), alterando valores substanciais

novos tempos. A quantidade e qualidade do trabalho produzido concernentes ao trabalho e seu significado.

não dependiam diretamente da capacidade do operário. Pela


Desse modo, a partir da análise de Forty (2007), que afirma
primeira vez, o processo produtivo saía das mãos do artesão e
que a história do design também é a história das sociedades, as
passava a ser de domínio das máquinas, ou seja:
explicações sobre suas mudanças devem apoiar-se, também, na
compreensão de como o design afetou os processos das
economias modernas e é afetado por eles 5.
4
O ritmo natural do tempo conhecido e vivido no campo era voltado para a
colheita e se resumia em dia e noite, ou ainda em estações do ano. A
distribuição do tempo, no decorrer do dia, acontecia de maneira natural. Até
5
mesmo os limites do corpo e da necessidade natural do trabalho, era o que Um episódio histórico importante sobre a divisão do trabalho humano e o
determinava o inicio e o fim das tarefas (CAMARGO, 1986). papel do designer foi o estabelecimento da Cerâmica Wedgwood, fundada na
28

1.2.1 O design, o trabalho e o movimento Arts and Crafts dentro do processo produtivo. O historiador Forty (2007, p. 50)
expõe que:
Com o conjunto de mudanças que se seguiram, as grandes
fábricas, aos poucos, foram tomando o lugar de pequenas Quando a manufatura foi dividida em processos
realizados por diferentes trabalhadores, foi
oficinas artesanais. Isso eliminava a necessidade de empregar necessário adicionar mais um estágio, o da
preparação de instruções para os vários
trabalhadores com alto grau de capacidade técnica. Era operários: na verdade, um estágio de design.
6
necessário apenas um “designer” , escolhido por suas
habilidades (CARDOSO, 2008).
Cardoso (2008) fala que os primeiros designers eram
É complexo falar de surgimento histórico para uma aqueles trabalhadores promovidos por questão de habilidade,
atividade como o design, pois se trata de concepção de produtos que passariam para uma posição de controle e concepção em
que satisfaçam as necessidades humanas. Entretanto, relação às outras etapas da divisão:
observamos que a divisão do trabalho é considerada um dos
Não era raro encontrar nas fábricas de
fatores de reconhecimento da prática projetual como atividade cerâmica, os modeladores, responsáveis pela
etapa de configuração de peças que seriam
produzidas, que tinham o controle sobre os
aspectos mais decisivos do processo produtivo.
Eles recebiam mais que o artesão comum,
Inglaterra em 1759 por Josiah Wedgwood. Por mais de dois séculos, a empresa entretanto, essa despesa era vista como
estabeleceu um padrão em todo o mundo para as louças finas e cerâmicas vantagem, visto que o emprego de um
decorativas (FORTY, 2007). profissional qualificado para elaborar o projeto
6
era garantia de maior aceitação comercial das
O termo designer é colocado entre aspas, por que na época não havia esta
peças (CARDOSO, 2008, p. 31).
denominação, sendo que a transformação dessa figura separado da
experiência produtiva e habilitado a gerar projetos, fez parte de um longo
processo histórico que teve seu início na organização das primeiras escolas de
design no século 19 (CARDOSO, 2008).
29

Assim, um dos aspectos mais interessantes da transição da Entretanto, à medida que esse sistema se desenvolvia, o
cultura artesanal para a cultura industrial foi o crescente uso de trabalho do designer passava a ser respeitado e influenciava o
projetos para uma produção em série. Mas, de acordo com desenvolvimento de inúmeros artefatos para a sociedade que
Margolin (2004, p. 43), "desde a Revolução Industrial, o crescia aceleradamente. Esse profissional adquiria grande
paradigma de design dominante tem sido o de desenhar para o importância para o mundo capitalista, trazendo implicações
mercado”, para atender uma necessidade imediata por significativas à cultura e à vida em sociedade (CARDOSO, 2008).
profissionais capazes de adequar os desejos do consumidor e os Porém, se o desenvolvimento tecnológico tornou possível a
objetos anteriormente manufaturados aos novos processos passagem gradativa do trabalho manual para o trabalho
industriais de fabricação. mecanizado; avanço nos índices de produtividade; redução de
custos e aumento dos lucros; a qualidade na criação e execução
O que confirma o que Heskett (1998) diz sobre o poder
dos produtos diminuiu, tornando apropriadas as ideias e
humano de controlar e dar forma ao seu ambiente a partir da 7
pensamentos do movimento conhecido como Arts and Crafts
indústria mecanizada, alterando quantitativa e qualitativamente a
(Artes e Ofícios).
vida humana. E ainda, sobre o design ter surgido da tradição
artesanal, mas ter se desenvolvido de tal forma que se tornou Esse movimento surgiu na Inglaterra, na segunda metade
cada vez mais distante de sua origem. Durante seu do século 19, com diversas organizações e oficinas voltadas para a
desenvolvimento, foi levado à atividade puramente artística, o
que "fez com que parecesse fútil e relegou-o à condição de mero
apêndice cultural" (FORTY, 2007, p.12). 7
A herança do movimento pode ser aferida até hoje em todo o mundo, pela
propagação de estúdios de cerâmica, tecelagem, joalheria e outros, e pela
organização de diversas escolas de artes e ofícios. In: Enciclopédia Itaú Cultural
Artes Visuais. www.itaucultural.org.br. Acesso: Acesso: 25/03/2011.
30

produção de artefatos de vários tipos em linha artesanal ou 1.3 O sentido do trabalho humano: algumas transformações
semiartesanal.
Pensar sobre o trabalho, hoje, é assumir uma postura

Os protagonistas John Ruskin e William Morris, além de teórica sobre a sociedade atual. Todavia, acreditamos que as
buscarem uma relação igualitária entre os trabalhadores mudanças expressivas por que passam as sociedades capitalistas,

envolvidos na produção, objetivavam a integração entre projeto e desde as últimas décadas do século 20, não se ajustam à ideia de

execução; a união entre o saber e o fazer; manutenção de ruptura com a sociedade dita moderna, do século passado. Assim,

padrões elevados em termos de qualidade de materiais; podemos pensar em transformações e continuidades, pois, como

revalorização das artes e dos ofícios; renascimento do artista afirma Harvey (2000), “[...] há mais continuidade do que

artesão, acreditando ser possível um mundo cunhado pelas mãos diferença [...]” (p. 111) nos movimentos históricos em curso.

humanas por meio do trabalho, preservado no seu sentido maior


No início deste capítulo, foram apontadas as
(BARATA, 2008), em contraposição à massificação industrial.
transformações pelas quais passou e passa o mundo do trabalho,

Ruskin pode ser considerado um dos pioneiros, que tem sido objeto de análise de diversas áreas do

influenciando pensadores e projetistas com suas ideias e conhecimento, como filosofia, psicologia, sociologia, antropologia

conceitos, ampliando consideravelmente seus argumentos e outras. Considerando as transformações contemporâneas,

durante todo o século 20. Ele se posicionava contra a divisão do vários autores, como Antunes (1999), Morin (2001) e Tolfo (2005)

trabalho e a “mecanização” do ser humano, por acreditar que os vêm investigando as implicações dessas mudanças e os sentidos e

frutos da produção em série não justificavam a perda do “espírito significados atribuídos ao trabalho hoje.

humano” (PINHEIRO, 2008).


31

Acreditamos, assim como Wanderley Codo (1999), que uma  O sentido que uma pessoa encontra na função exercida;
vida cheia de sentido em todas as esferas do ser social somente  O sentimento de responsabilidade em relação aos
poderá efetivar-se por meio da destruição das barreiras resultados obtidos;
existentes entre tempo de trabalho e tempo de não trabalho.  O conhecimento de seu desempenho no trabalho.
Uma vida cheia de sentido fora do trabalho supõe uma vida
Muitos estudos sobre sentidos e significados do trabalho
dotada de sentido dentro do trabalho. Quanto mais criativo e
vêm sendo realizados. Dentre as atuais pesquisas sobre o
completo for o trabalho, mais o homem cria-se a si mesmo.
assunto, destacam-se as de Hackman e Oldham (1976, apud
MORIN, 2001), que consideram um trabalho carregado de sentido
aquele se torna importante, útil e legítimo para quem o realiza.
Em relação às circunstâncias, os autores apresentam os seguintes
atributos ou dimensões principais do trabalho:

 A identificação com o trabalho, ou seja, atividade não


alienante, na qual o trabalhador consiga identificar todo o
processo, desde sua concepção até sua finalização;

Figura 2: Trabalho humano. Fonte: www.donizetimarcolino.blogspot.com.br.


 A multiplicidade de tarefas, trabalhos variados que
Acesso: 20/05/2012
possibilitem o uso de várias competências humanas;

De acordo com Morin (2001), há três circunstâncias


 Autonomia, ou seja, o grau em que o trabalho permite
importantes pessoais em relação ao trabalho:
liberdade individual, independência, poder de decisão
32

para planejá-lo e determinar os procedimentos para sua (importância atribuída a ele em determinado momento da vida
execução; da pessoa), normas sociais sobre o trabalho (derivadas de valores
morais relacionados ao trabalho) e resultados valorizados do
 A significação do trabalho, ou seja, o cumprimento do
trabalho (dimensão relacionada a motivações que levam a
trabalho com impacto positivo na vida de outras pessoas
trabalhar) (BLANCH, 2003; TOLFO & PICCININI, 2007).
seja no contexto do próprio ambiente ou na sociedade.
Além da diversidade de pontos de vista teóricos, os estudos
Assim, acreditamos que para pensar o sentido do trabalho,
empíricos nesse campo optam por usar ora a expressão sentidos,
além de levantarmos questões sobre a sociedade e sua
ora significados do trabalho, às vezes como sinônimos, às vezes
organização, sobre o funcionamento da economia, das relações
como conceitos diferentes. Para tanto, aqui serão tomadas como
laborais e de mercado, e questionar o modelo econômico
ponto de partida as seguintes concepções: os significados são
dominante, implica ainda discutir esses atributos.
como construções elaboradas coletivamente em determinado

No Brasil, muitos estudos sobre sentidos e significados do contexto histórico, econômico e social concreto. Já os sentidos

trabalho também vêm sendo concretizados com base nas são uma produção pessoal decorrente da apreensão individual

investigações desenvolvidas pelo Meaning of Work – MOW dos significados coletivos nas experiências cotidianas. É

(TOLFO et al., 2005) – um grupo internacional de pesquisadores importante ressaltar as transformações pelas quais passam os

que investiga a década de 1970 e o sentido e centralidade do sentidos e os significados, uma vez que são construídos em uma

trabalho em diversos países. relação dialética com a realidade. Considerando essa relação, a
análise dos sentidos produzidos pelos sujeitos deve sempre
Esses pesquisadores estabeleceram, a partir de estudos
empíricos, as seguintes dimensões: centralidade do trabalho
33

considerar seu vínculo com os significados produzidos significativas, afetando tanto as relações concretas, como as
coletivamente e vice-versa. (TOLFO et al., 2005). formas de ser dos sujeitos. Tais transformações apontam para a
necessidade de buscar estratégias de investigação capazes de
Apesar das diferenças, as duas abordagens compartilham a
apreender as complexas relações entre as dimensões subjetivas e
compreensão sobre a indissociabilidade entre sujeito e realidade,
objetivas do trabalho contemporâneo.
sendo os sentidos ou significados produzidos pelos sujeitos a
partir de suas experiências concretas. Neste tópico, procuramos abordar, brevemente, aspectos
relacionados ao trabalho e sua dimensão subjetiva, como forma
Do mesmo modo, também é importante considerar a
de obter um melhor embasamento teórico acerca das
articulação entre os processos identitários e de construção de
especificidades desta atividade, requisito indispensável para uma
sentidos pelos sujeitos em seu cotidiano de trabalho. A seguir,
análise do problema de pesquisa e para o alcance dos objetivos
apresentamos uma breve discussão teórica sobre processos
deste estudo.
identitários e suas relações com o trabalho contemporâneo,
como forma de subsidiar teoricamente as investigações O estudo de questões relativas à dimensão subjetiva dos
analisadas neste capítulo. trabalhadores constitui-se em um importante campo de
investigação para as diversas disciplinas que analisam o homem
em suas relações de trabalho. Entre as categorias teóricas para o
estudo da dimensão subjetiva nesse campo está a identidade.
1.3.1 A dimensão subjetiva do trabalho na contemporaneidade

A categoria identidade tem sido objeto de análise de


Consideramos importante assinalar que o contexto
diferentes estudiosos das ciências humanas, mas, desde as
produtivo contemporâneo vem passando por transformações
34

últimas décadas do século 20, sua capacidade explicativa para os alimentam, ao contrário, a experiência com a
deriva no tempo, de lugar em lugar, de
fenômenos humanos vem sendo fortemente questionada. Tal emprego em emprego (SENNETT, 2001, p. 27).
debate emerge no quadro das diversas crises que abalaram os
países capitalistas ocidentais (COUTINHO, 2009).
Neste sentido, compartilhamos do questionamento
De acordo com Sennett (2007), a noção de identidade no formulado por Sennet (2001) e reconhecemos que as formas
trabalho permeia a ideia de que, no capitalismo contemporâneo, atuais de relações do homem com o trabalho diminuem as
essa atividade reduz, em parte, as possibilidades de pessoas oportunidades de vínculos interpessoais com seu fazer e,
desenvolverem experiências e construírem uma narrativa consequentemente, reduzem as possibilidades de identificação
coerente para suas vidas. Este modo de produção desgasta o com os outros e com o sua atividade laborativa.
caráter do trabalhador, “[...], sobretudo aquelas qualidades de
caráter que ligam os seres humanos uns aos outros, e dão a cada É importante pontuar que o trabalho deve participar da

um deles um senso de identidade sustentável" (2001, p.27). sociedade como um elemento de equilíbrio e de desenvolvimento
para o indivíduo e lhe assegurar a inserção nos diferentes grupos
Em sua concepção, sob a lógica capitalista atual, este existentes na sociedade. Quando o trabalho alcança esses
mesmo autor questiona a natureza do trabalho, seus modos de objetivos, o trabalhador experimenta a conhecida satisfação e sua
organização e, principalmente, as relações interpessoais que os atividade passa a fazer sentido (ANTUNES, 1999).
trabalhadores estabelecem no contexto laboral.
A análise dessas experiências de pesquisa permitiu tecer
Como pode um ser humano desenvolver uma
narrativa de identidade e história de vida numa algumas considerações sobre as trajetórias identitárias de dois
sociedade composta de episódios e sujeitos, analisados no capítulo 3 desta dissertação, enquanto
fragmentos? As condições da nova economia
35

estratégia de investigação capaz de ressignificar o modo de


produção, a condição humana e as configurações do trabalho
manual contemporâneo.
36

CAPÍTULO 2
37

acontecimentos à sua volta. A cultura, especializada nos objetos


CAPÍTULO 2 produzidos por essas expressões, é chamada de cultura material.

DESIGN E ARTESANATO: DOMÍNIOS DO FAZER HUMANO Partimos do pressuposto de que o design é um dos campos
fundamentais na representação desse mundo material.
Artefatos, tal como palavras, são produtos da
atividade motora humana, [...]. A forma Acreditamos que sua tarefa se realiza por meio do diálogo e
resultante de qualquer artefato é a combinação
compreensão da trama cultural (BOMFIM, 1999). O artesanato se
de unidades estruturais – atributos – que
produzem um objeto com uma função apresenta como um dos principais delineadores do imaginário
específica na cultura que o engendrou.
desta mesma sociedade. Assim, o presente estudo propõe a
Berta Ribeiro, A linguagem Simbólica da Cultura
reflexão sobre o reencontro entre o projetar e o fazer, quando a
Material (1986).
cisão entre as áreas torna-se cada vez mais insignificante, pelo
domínio do fazer humano.
2.1 Design, artesanato e cultura material
A cultura envolve tanto as relações materiais como
Sabemos que a formação cultural de uma sociedade se dá imateriais de um grupo – corresponde ao intercâmbio entre o
por meio da produção de seus bens e valores, “e que, através das homem e o conjunto que abrange sua existência, desde a
coordenadas de tempo e espaço, caracterizam as identidades de construção do seu espaço até a relação com os artefatos do
seus membros” (CIPINIUK; PORTINARI; BOMFIM, 2008, p.61). O cotidiano. Essa afinidade se estabelece ao longo do tempo e não
artefato, por nascer dos saberes, dos costumes e das técnicas é estática; acompanha as modificações da sociedade de forma
acumuladas por gerações, é fruto desse processo, e se dinâmica e se transforma de acordo com as interações sociais.
desenvolve a partir do modo como o indivíduo absorve os
38

A partir de Malinowski (1970), compreende-se que cada Segundo Cardoso (1998, p. 20), o termo Cultura Material
cultura consiste em um todo coerente, um sistema equilibrado e originou-se no século 19, no estudo de artefatos de povos
funcional, formado por elementos interdependentes e ‘primitivos’. Hoje em dia, esse conceito ampliou-se para uma
harmonizados entre si, utilizados pelas pessoas como um meio de “maneira de melhor entender os artefatos que produzimos e
atender suas necessidades. É um sistema simbólico, característica consumimos, bem como a maneira em que estes se encaixam em
fundamental de atribuir significados e sentidos à vida de forma sistemas simbólicos e ideológicos mais amplos”. Até porque, os
ordenada, coerente e estruturada Além do conjunto completo objetos traduzem comportamentos, visões de mundo, valores
dos instrumentos e bens de consumo, consiste nos códigos dos estéticos e estágios tecnológicos que possibilitam uma leitura da
grupos, nas ideias e costumes, quer seja de uma cultura cultura em que estão inseridos (SANTOS, 2004).
primitiva8, quer seja de uma cultura complexa. Sua existência se
O conceito de cultura, como observamos, é dinâmico e
dá pela interação, na qual atuam os indivíduos (MALINOWSKI,
acolhe muitas leituras, conforme apontam os autores (LARAIA,
1976).
1986; ARANTES, 1990; SANTOS, 1997). Entretanto, não se
Contudo, é importante ressaltar que este campo deve pretende, nesta pesquisa, enveredar pelas inúmeras
examinar não o objeto material tomado em si mesmo, mas sim as considerações dos antropólogos, historiadores e estudiosos no
suas apropriações sociais, as técnicas envolvidas na sua assunto, embora sejam essenciais. Entre tantas definições
manipulação, a sua importância econômica e a sua necessidade conceituais existentes, adotamos a de Geertz, que se dedica a
social e cultural. desenvolver uma Fenomenologia da Cultura. Tal método seria
utilizado para analisar e descrever sua estrutura significativa do
8
O uso da expressão “cultura primitiva” segue a denominação de Malinowski estudo da percepção dos indivíduos nela presentes. Para tanto, o
(1976), e não é o que referencia a visão de cultura desenvolvida nesta
dissertação, a partir de Geertz (1973).
39

autor indica que o essencial é anotar e interpretar o discurso administração, renovação e reestruturação do
sentido.
social.

Geertz (1973, p. 15) diz: “acreditando, como Max Weber, Canclini combate as conceituações de apego idealista e

que o homem é um animal amarrado a teias de significados que afirma que, na sua tentativa de conceituar a cultura, não aposta

ele mesmo teceu, assume a cultura como sendo essas teias e sua na identificação do cultural com o ideal, nem do material com o

análise; portanto, não como uma ciência experimental em busca social, nem sequer pondera a análise desses campos

de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura do separadamente. Para ele, a cultura está ligada ao processo de

significado.” Motivado pela clássica sociologia de Weber, para desenvolvimento das sociedades humanas e acompanha o avanço

quem o homem só é capaz de viver em um mundo dotado de dos indivíduos e grupos sociais, expressando sua linguagem, seus

sentido, o autor entende a cultura como sendo a produção desse valores, sua identidade e por fim, seus artefatos. Nesse sentido,

sentido, o conjunto de significados que ele constrói em suas assim como Canclini, acreditamos que “certos objetos e práticas

interações cotidianas e que constitui a base organizada merecem ser especialmente valorizados porque representam

socialmente. descobertas para o saber, inovações formais e sensíveis, ou

Na opinião do antropólogo Néstor Canclini (1983, p. 29), o acontecimentos fundadores da história de um povo” (CANCLINI,
termo cultura é: 2003, p. 200).

Produção de fenômenos que contribuem,


mediante a representação ou reelaboração Por interagir com múltiplas formas de representações
simbólica das estruturas materiais, para a culturais, o artesanato se apresenta como um objeto oportuno de
compreensão, reprodução ou transformação
do sistema social, ou seja, a cultura diz respeito estudo da cultura material, assim como o design, que fornece
a todas as práticas e instituições dedicadas à
40

inúmeras possibilidades de pesquisa, principalmente relacionado atividades envolvidas na exploração do ambiente e na adaptação
a fatores socioeconômicos e culturais. ecológica; a utilidade e finalidade prática dos objetos e
instrumentos desenvolvidos, até elementos de ordem simbólica,
Para o historiador Rafael Cardoso (1998, pp. 17-19), “a
ligados a concepções religiosas, estéticas e filosóficas do grupo.
natureza essencial do trabalho do design não reside nem nos seus
Estes muitos fatores, ingredientes da fabricação, se articulam em
processos e nem nos seus produtos, mas em uma conjunção
torno de conhecimentos precisos, compartilhados pelos membros
muito particular de ambos; mais precisamente, na maneira em
de cada grupo e adquiridos ao longo de muitas gerações que os
que os processos do design incidem sobre seus produtos,
precederam.
investindo-os de significados alheios à sua natureza intrínseca”. E
continua, “do ponto de vista antropológico, o design é uma entre Esses objetos explicam comportamentos, visões de mundo,
diversas atividades projetuais, tais como as artes, o artesanato, a valores estéticos e a tecnologia empregada que permite uma
arquitetura, a engenharia e outras que visam à objetivação no seu leitura da cultura em que estão inseridos. Bomfim (1995), ao
sentido estrito, ou seja, dar existência concreta e autônoma a discorrer sobre o assunto, afirma que independente das funções
ideias subjetivas”. O autor ainda defende o uso da palavra imediatas às quais se presta, ele é capaz de portar informações a
artefato como resultado desse processo, pois o termo “[...] se respeito do desenvolvimento de uma sociedade, como o
refere especificamente aos objetos produzidos pelo trabalho momento social, político e econômico. Elencamos alguns tipos de
humano, em contraposição aos objetos naturais ou acidentais”. mensagens impressas nos artefatos, segundo Bomfim (1995, pp.
88-89):
Na produção dos artefatos, uma série de fatores interfere,
desde os recursos naturais disponíveis para utilização como  Sua própria composição (material, cor, textura, processo de
matérias-primas; o desenvolvimento de técnicas adequadas; as fabricação, tecnologia);
41

 Funções práticas (para que é usado); consideremos em seu contexto mais amplo e em sua qualidade
 Modos de uso (intuídos por meio do aprendizado e da de sistema, analisando as dimensões e as significações que nele
memorização de estereótipos); estão materializadas, revelando aspectos relacionados com a
 Valores estéticos (intuídos sensorialmente e interpretados tecnologia, a história do grupo, dentre outros.
conforme juízo de gosto ou da norma vigente);
Na verdade, é por meio de uma variedade de artefatos,
 Signos de uma cultura visual instituída (uma figura
como nos mostra Ribeiro (1986), que os grupos humanos
arredondada dá ares menos agressivos do que outra com
assimilam o seu meio, utilizando-se dele e imprimindo nele sua
ângulos agudos);
marca. Do mesmo modo, como o artefato é carregado das marcas
 Significados ideológicos (ideais políticos e religiosos).
deixadas pela cultura daqueles que o fabricaram e as trocas
culturais entre os povos são uma constante na história da
Por tudo isto, é importante a compreensão do estudo da
humanidade, caberia, também, pesquisar os efeitos dessas
cultura material de um determinado grupo social, posto que, por
relações nas disposições à mudança ou na inovação em sua
meio dele, podem-se fazer ligações com as condições de sua
produção.
fabricação, ou seja, com os recursos naturais e materiais
utilizados, com a organização do trabalho, com o aprendizado e o Seguindo este entendimento e percebendo a importância

aprimoramento das técnicas, com os conhecimentos sobre os da produção artefactual (RIBEIRO, 1989), passamos para as

meios e processos da transmissão deste saber dentro do grupo aproximações e os possíveis distanciamentos dos domínios do

onde é produzido. fazer humano: o design e o artesanato.

O conhecimento de um artefato requer, em suma, que o


42

2.2 Design e artesanato: aproximações e distanciamentos acreditando ser mais interessante a análise da subjetivação dos
significados e sua materialização em objetos.
Antes de embarcar na questão proposta, é importante
esclarecer que partimos do princípio de que pensar as O artesanato de modo geral tanto pode ser entendido como
aproximações é mais enriquecedor que medir as distâncias um modo de produção e de trabalho como uma forma de
(BARBOSA, 2003). Então, apresentamos uma possibilidade de manifestação cultural. Como um modo de produção, este
interpretação para o tema: entender o artesanato como uma processo manual, na realidade é o trabalho do artesão, que para
forma de design. sua realização “(...) põe em movimento as forças naturais
pertencentes a sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão,
Observamos que, na contemporaneidade, as fronteiras
a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua
entre as áreas do conhecimento humano se diluíram, mais ainda
própria vida” (MARX, 1983, p. 149). Neste caso, grande parte do
aquelas em que, por natureza, tem múltiplos aspectos, como no
desenvolvimento do ser humano está associada a sua capacidade
design e no artesanato (BORGES, 2011).
física e mental de transformação de seu entorno.

Diversos autores (BARDI, 1980; CANCLINI, 1983; CARDOSO,


No artesanato, podemos perceber características de outras
2008; CARNIATTO, 2008; DIAS, 2007; FRANÇA, 2005;
atividades cuja habilidade manual é fator decisivo para a
MAGALHÃES, 1977; MARINHO, 1999; MARTINS, 1975)
produção de artefatos como, por exemplo, a arte popular,
discorreram sobre a prática e a técnica do artesanato. Aqui,
trabalhos manuais e outras manifestações culturais. Estabelecer
pensamos nele em conexão com o design, independente da
diferenças entre os campos citados acima tem sido uma
apropriação dos modos de fazer ou da finalidade produtiva,
preocupação constante para profissionais que atuam nesses
programas, e também no meio acadêmico.
43

Esse conflito pode parecer, a princípio, irrelevante, mas sua seria “toda atividade que produz objetos e artefatos realizados
solução é essencial para uma atuação eficiente de programas de manualmente, ou com a utilização de meios tradicionais ou
apoio, desenvolvidos por instituições públicas e privadas9. rudimentares, com habilidade, destreza, apuro técnico, engenho
e arte” (SEBRAE, 2004, p. 1-2).
A necessidade de tais definições e conceitos visa orientar as
ações que podem ser realizadas por estas instituições. Porém, Nesse sentido, o autor aponta que existem diferenças entre
como falamos anteriormente, pensar neste assunto de modo atividades manuais e artesanato. Uma delas é que a primeira,
homogêneo, pré-estabelecido e determinado, é no mínimo, ter geralmente, é uma ocupação secundária, com o objetivo principal
uma visão ingênua do sistema cultural vigente. Isso porque de complementar a renda familiar, enquanto a segunda é a
conceituar a atividade artesanal, em qualquer período histórico atividade principal de quem o produz.
ou para qualquer finalidade, será sempre uma tarefa complexa.
É interessante apresentar a definição de artesanato
No Seminário Internacional “Design Sem Fronteiras”, adotada pela UNESCO/CCI em 1997:
realizado em Bogotá em 1996, do qual participou o Conselho
Produtos artesanais são aqueles confeccionados
Mundial de Artesanato – WCC10, integrou a equipe técnica um por artesãos, seja totalmente a mão, com o uso
de ferramentas ou até mesmo por meios
dos promotores do design e do artesanato no país, na época, mecânicos, desde que a contribuição direta
Eduardo Barroso Neto. No evento, ele propôs que artesanato manual do artesão permaneça como o
componente mais substancial do produto
acabado. Essas peças são produzidas sem
restrição em termos de quantidade e com o uso
9
Um exemplo bem conhecido no Brasil é o Artesanato Solidário/ARTESOL, que de matérias primas de recursos sustentáveis. A
foi concebido em 1998 como um programa social, e a partir de 2002, tornou-se natureza especial dos produtos artesanais
uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público). deriva de suas características distintas, que
10
podem ser utilitárias, estéticas, artísticas,
Sigla em inglês do Conselho Mundial de Artesanato.
44

criativas, de caráter cultural e simbólicas e  Arte popular: compreendida aqui como um conjunto de
significativas do ponto de vista social 11.
atividades poéticas, musicais, plásticas e expressivas que
mostra o costume e o modo de vida de um grupo de
12
O Sistema SEBRAE adota, segundo o Termo de Referência , determinado lugar;
alguns conceitos para melhor atuação dos seus programas de  Artesanato: refere-se a toda atividade produtiva que
apoio. As categorias são definidas de acordo com o processo de resulte em objetos e artefatos acabados, feitos
produção, origem, uso e destino. O interesse não é fazer uma manualmente ou com a utilização de meios tradicionais ou
extensa avaliação do uso de cada um desses conceitos, mas de tê- rudimentares, com habilidade, destreza, qualidade e
los em mente, segundo a perspectiva explicitada pelos autores criatividade;
referidos, para ajudar a compreender a dinâmica da temática  Trabalhos manuais: exigem destreza e habilidade, mas
artesanal: empregam moldes e padrões predefinidos. Não são
resultantes de processo criativo efetivo. É muitas vezes,

11 uma ocupação secundária que utiliza o tempo disponível


Definição adotada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura no International Symposium on crafts and International das tarefas domésticas ou um passatempo;
Markets, Manila, Filipinas, outubro de 1997.
 Produtos típicos: são, em geral, produtos alimentícios
12
Este Termo de Referência, além de delinear em breve panorama conceitual
da atividade, apresenta também um olhar sobre as tendências nacionais e processados segundo métodos tradicionais, em pequena
internacionais de incentivo aos empresários na utilização do Design como uma
ferramenta que possibilita a inclusão de micro e pequenas empresas, quanto escala, muitas vezes em família ou por um determinado
ao ciclo de vida de produtos e serviços a elas relacionados. Entendemos que o
grupo;
universo do Design interage fortemente com o universo dos negócios e que
ambos desenvolvem a partir da volatilidade do mundo contemporâneo frente  Industrianato: refere-se aos produtos semi-industriais e
às oportunidades de negócios, às mudanças comportamentais da humanidade.
Assim, ressaltamos a importância dos questionamentos a respeito dos industriais em grande escala, com utilização de moldes e
conceitos.
45

formas, máquinas e equipamentos de reprodução, com tradicionais da região onde são produzidos. São, em geral,
pessoas envolvidas e conhecedoras apenas de partes do resultantes de uma intervenção planejada de artistas e
processo; designers, em parceria com os artesãos, com o objetivo de
 Artesanato indígena: diz respeito aos objetos produzidos diversificar os produtos, porém preservando seus traços
no seio de uma comunidade indígena, por seus próprios culturais mais representativos;
integrantes. É, em sua maioria, resultante de uma  Artesanato conceitual: diz respeito aos objetos
produção coletiva, incorporada ao cotidiano da vida tribal, produzidos a partir de um projeto deliberado de
que prescinde da figura do artista ou do autor; afirmação de um estilo de vida ou afinidade cultural. A
 Artesanato tradicional: concebido aqui como um conjunto inovação é o elemento principal que distingue este
de artefatos mais expressivos da cultura de um artesanato das demais categorias. Por detrás desses
determinado grupo, representativo de suas tradições, produtos, existe sempre uma proposta, muitas vezes
porém incorporados à sua vida cotidiana. Sua produção é, explicitada por meio dos sistemas de promoção utilizados,
em geral, de origem familiar ou de pequenos grupos sobretudo aqueles ligados ao movimento ecológico
vizinhos, o que possibilita e favorece a transferência de (SEBRAE, 2004, p. 15).
conhecimentos sobre técnicas, processos e desenhos
Ao incorporar conceitos de definição tão duvidosa, o
originais. Sua importância e seu valor cultural decorrem
artesanato traz em si uma herança de questionamentos. Na
do fato de acompanhar histórias transmitidas de geração
verdade, essa abrangência, talvez incida em um dos maiores
em geração;
obstáculos enfrentados pelos programas de fomento, por gerar
 Artesanato de referência cultural: refere-se aos produtos
dúvidas a respeito do trabalho do artesão e do produto gerado
cuja característica é a incorporação de elementos culturais
por ele.
46

De acordo com Saul Martins (1971), essa confusão ocorre  Intenção estética: o fator estético é intrínseco à prática
porque o uso da expressão artesanato é recente e, muitas vezes, artesanal, embora não se deva igualar ao caráter
empresta o seu significado a atividades análogas, como já expressivo, emocional e cognitivo da obra de arte;
mencionamos. Jorge Chiti (2003), por sua vez, diz que a intenção  Acessibilidade e tangibilidade: as peças artesanais devem
de restringir a obra e a prática artesanal, que muitas vezes ser acessíveis a ponto de facilitar a sua utilização e o seu
discordam entre si ou se entrelaçam, vem da antropologia, do transporte manual;
folclore, da etnografia e da economia. O autor, depois de um  Durabilidade: o autor insere esse aspecto para afirmar
extenso estudo comparativo entre os diferentes tipos de que produtos comestíveis não podem ser considerados
artesanatos, concluiu que eles têm em comum os seguintes artesanato;
atributos:  Tipicidade: o artesanato se singulariza por estar
intimamente envolvido no universo de valores e
 Manualidade: as mãos podem até mesmo utilizar
tradições;
ferramentas ou meio mecânicos, desde que a sua atuação
 Tridimensionalidade: a obra artesanal costuma ser
táctil seja imprescindível para o acabamento da peça.
volumétrica (CHITI, 2003, p. 22).
 Funcionalidade: objeto de uso prático no cotidiano,
inclusive, associado a religiosidade, decoração dentre A partir destas características, Chiti (2003) define o
outras abordagens no campo simbólico; artesanato como uma produção uniformizada desenvolvida em
 Seriação: repetitividade das peças; ambiente doméstico ou não, que alia a capacidade criativa à
operacionalidade manual ou semimanual e que responde a uma
47

finalidade de uso prático e estético oferecido em mercados passaria a ser considerado quando o próprio designer atuasse
reduzidos. como um artesão (BRAGA, 2002) – papel esse importante na
história e na própria geração da tecnologia e do design, e que,
Já Baudrillard insere o artesanato na categoria de objetos
segundo o mesmo autor, o artesão seria qualificado como
que respondem ao propósito do testemunho, da lembrança, ou
produtor de um pré-design.14
seja, das qualidades de ordem tradicional e simbólica apesar de
pertencerem à modernidade. “A fascinação pelo objeto artesanal O pressuposto de que a atividade artesanal e a projetual
vem do fato de este ter passado pela mão de alguém cujo são incompatíveis ainda está arraigado em nossa cultura. Tais
trabalho ainda se acha nele inscrito: é a fascinação por aquilo que atividades parecem pertencer a mundos distintos, porque se o
foi criado [...]” (BAUDRILLARD, 2004, p.85). design é conceitual, generalista, voltado para a inovação, e a
produção é seriada e uniforme; o artesanato é manual,
Mas, para Canclini (1983), compreender a produção
especializado, sobrevivente, e resistente de outros tempos,
artesanal requer observância, principalmente, da prática que a
voltado para a produção em pequena escala com suas variações e
origina em seu processo de criação, porque, dependendo da
irregularidades (PAIM, 2009).
realidade social de quem a constrói, tal atividade ganha sentidos
diferentes. Assim também entendemos. Sabemos que, na atividade artesanal, também não pode
faltar projeto dirigido à produção em pequena escala, ao mesmo
O artesanato foi, durante muito tempo, negligenciado como
campo de atuação do design e, segundo Aloísio Magalhães13, só 14
A Bauhaus, uma das mais importantes escolas de design do mundo, por
exemplo, agregava ao ensino do design, o artesanato, por meio de oficinas.
Sua vida foi curta, mas o suficiente para revolucionar o pensamento do século
20, no campo da arte, do design, da indústria e da economia. A finalidade do
13
Foi um dos que não impunham fronteiras rígidas entre o design e o estudo era o conhecimento de todos os processos de produção, da matéria
artesanato. Disponível em: www.mamam.art.br. Acesso em: 22/05/2010. prima e principalmente das técnicas artesanais (BRAGA, 2002).
48

tempo elaborado e diversificado, para criação de novos produtos Verbo derivado do latim designare, o termo design abrange
na constante renovação de seu ofício. Uma atividade significativa significados de designar e de desenhar. “Trata-se de uma
do fazer artesanal que, infelizmente, não costuma ser atividade que gera projetos no sentido objetivo de planos,
considerada. esboços ou modelos”. Alguns autores optam por incluir na
discussão as diferenças entre arte, design e artesanato devido a
O design com a finalidade de conceber novos objetos e
certa conotação que este adquiriu na pós-industrialização e o
sistemas (CARDOSO, 2008) pode ser definido como o processo de
status de mercadoria que possa ter alcançado. Essa ligação do
formulação e justificação de uma proposta de ação capaz de levar
artesanato a produtos de mercado ocorreu, sobretudo, da divisão
à realização de um produto que atenda a uma necessidade
que houve entre artista, artesão e trabalhador fabril nos tempos
humana, assim como o artesanato. Ambos utilizam métodos e
da industrialização, já citado no capítulo anterior, onde o “artesão
técnicas que influenciam a criatividade e a produtividade.
passou a significar o trabalhador manual que desempenhava um

Contudo, a designer Heloísa Crocco (2000) chama nossa trabalho com instrumentos rudimentares” (QUEIROZ, 2004, p.15).

atenção para o fato de que o artesão é um conhecedor nato dos


O design busca hoje encontrar suas singularidades,
recursos materiais empregados nos artefatos e das tradições de
renovando-se esteticamente e trazendo elementos da cultura do
sua comunidade, destacando-se pela informalidade e o
país através de suas relações com as artes populares, de forma
empirismo no trabalho. Enquanto isso, os designers caracterizam-
que os produtos gerados por essas relações nos mostrem quem
se pela formação voltada para a lógica do mercado, tida como
somos e de que maneira podemos ter reconhecimento global por
fator fundamental para o desenvolvimento do produto industrial.
meio de nossas produções locais.
49

Dorfles (1991) alega que a diferenciação entre design e relacionadas à maneira como concebem os artefatos. Se o
artesanato é fundamental e que há uma clara diferença entre primeiro pensa e constrói o objeto com as mãos, ou até mesmo
ambos. No entanto, esta visão não é tão aceita. Design, arte e utilizando ferramentas e participando de todas as etapas da
artesanato têm muito em comum, e hoje quando, o design já produção, o segundo realiza um trabalho interdisciplinar no
atingiu certa maturidade, muitos designers começam a perceber desenvolvimento de produtos, em que as informações sobre o
antigas relações com o fazer artesanal (CARDOSO, 2008). Neste processo de produção, tecnologias, materiais, distribuição,
sentido, o artesanato se aproxima do design, do mesmo modo somam-se nas especificações projetuais, que resultam, na maioria
que o artesão, diante de mudanças no seu mercado, tende a das vezes, na produção por meio mecânico e seriado (DIAS,
adequar seu produto. Ou seja, diante das oportunidades, das 2007).
mudanças políticas e comerciais, o artesão também precisa
Atualmente, diante de mudanças no mercado, o artesanato
direcionar seu processo criativo. Assim como o designer.
se aproxima do design e tende a alterar seu produto de forma a
É perfeitamente possível identificar semelhanças adequá-lo. Ou seja, o artesão, assim como o designer, direciona
indissociáveis entre as atividades do design e do artesanato. seu processo criativo e utiliza o design, principalmente por meio
Ambas surgem de uma necessidade social e mantêm forte vínculo de programas de apoio ao artesanato, como forma de agregação
com o mercado. Tanto uma como a outra exercem papéis de valor cultural. Este artesanato que se apropria do design é
essenciais à cultura material15, ainda que guardem diferenças chamado por alguns autores de artesanato de referência cultural
ou artesanato contemporâneo (CARNIATTO, 2008).

15
De acordo com Coelho (1997), a cultura, hoje é pensada mediante duas
vertentes. Uma idealista quando ela é analisada de acordo com a diversidade entanto, conforme Canclini (1983), as duas vertentes não se encontram
de comportamentos e atos sociais. Outra materialista, analisada de maneira separadas, o que fortalece a ideia de retomarmos o debate acerca da cultura
ampla por meio da inserção de todas as construções de conhecimento. No material nesta dissertação.
50

Rafael Cardoso, em artigo publicado em 1998, fala da O trabalho artesanal surge no plano do fazer, no conhecer
inserção do design no mundo material e fetichizado, no qual nota técnicas e executar com as mãos o que é mais representativo no
a aproximação da arte com o artesanato. No entanto, coloca um cotidiano do artesão. Esse fazer manual e a liberdade para criar
distanciamento na forma de produção: artefatos são competências que foram, aos poucos, arrancadas
do homem moderno, com o advento da sociedade industrial.
O ato de projetar tem na sua essência um
componente básico de criação, de artifício, que Perante a máquina, a limitação do fazer humano foi recebida
não difere substancialmente daquele mesmo
positivamente, como resistência aos modos de produção
elemento factício (no sentido de feitura) que
está por trás do artesanato, da arte e até da artesanal em que o tempo e a mão decidem as etapas do
magia [...]. O que distingue o design de grande
parte do artesanato, da arte e – presumo eu – processo.
da magia, é que no design o fato material que
se pretende gerar não é feito pelo mesmo O objeto artesanal “é definido por uma dupla condição:
indivíduo que deu início ao processo ao
conceber a ideia [...]. Quero sugerir, portanto, primeiro, o fato de que seu processo de produção é, em essência,
que a atividade do design caracteriza-se mais
manual. São as mãos que executam basicamente todo o trabalho.
como um exercício de processos mentais
(artifício/engenho) do que de processos Segundo: a liberdade do artesão para definir o ritmo da
manuais (artes aplicadas ou plásticas,
propriamente ditas) [...] (CARDOSO, 1998, p.30). produção, a matéria-prima e a tecnologia que irá empregar, a
forma que pretende dar ao objeto, o produto de sua criação, de
seu saber, de sua cultura” (LIMA, 2005, p. 2).
Para Bonsiepe (2011) o design perdeu a sua substância no
momento em que passou a cuidar das superficialidades, Essa questão do “saber fazer” e seus vários aspectos surge,
colocando-se a serviço da beleza cosmética e de lucros fáceis do principalmente, nas comunidades, com os protagonistas desta
mercado. cultura material, a partir de um processo sucessivo de passagem
51

e transmissão de valores materializados no artefato. Mas existem que, para fazê-lo, utiliza basicamente as mãos.
Nesse sentido, diríamos que o objeto artesanal
contextos de práticas artesanais que representam quase a mesma é definido por uma dupla condição: primeiro, o
lógica produtivo-industrial. Por isso, a ideia de definir o artesão fato de que seu processo de produção é em
essência manual. São as mãos que executam
como detentor de saberes tradicionais enraizados ou perdidos basicamente todo o trabalho. Segundo: a
liberdade do artesão para definir o ritmo da
num passado distante oculta suas relações com a sociedade atual, produção, a matéria-prima e a tecnologia que
sua forma de ver, interpretar e sobreviver no mundo irá empregar a forma que pretende dar ao
objeto, produto de sua criação, de seu saber, de
(CARNIATTO, 2008), assim como definir o designer como sua cultura (p. 13-14).
possuidor de conhecimentos específicos e capacitado para
gerenciar a produção esconde suas afinidades com o fazer
Para o artesão ou designer que lida com a matéria argila,
artesanal.
por exemplo, como veremos no capítulo 3, as experiências com o

A relação do artesão com o artefato é estabelecida processo de execução da peça são tão importantes quanto o

essencialmente pelas mãos. A mão é o instrumento que edifica, resultado. A significação está na transformação da massa

modifica, aumenta ou diminui, incorpora sensações e emoções, cerâmica, nas marcas do fazer e do processar gestos

revela costumes, tradições, de modo que possamos observar transformadores deixados na matéria como intervenção de um

elementos tradutores da cultura local, a capacidade criativa e criador que agiu sobre o objeto. Isso está tanto para o artesão

diversas técnicas manuais que passam de geração em geração. como para o designer indistintamente.

Lima (2005) se refere ao artesanato como:

Produtos do fazer humano em que o emprego


de equipamentos e máquinas, quando e se
ocorre, é subsidiário à vontade de seu criador
52

2.3 Perspectivas do artesanato na sociedade contemporânea Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC),
lançado em 2004, que está promovendo, já há algum tempo, o
O Brasil é um país onde boa parte da população possui
cadastramento dos artesãos brasileiros. "[...] o artesanato
habilidades manuais, herdadas de culturas, como etnias
brasileiro é um segmento da economia cujo crescimento possui
indígenas, africanas, afrodescendentes, afro-brasileiras e outros
alto potencial de geração de trabalho e renda, de maneira
imigrantes que vieram compor o povo brasileiro em sua
descentralizada" (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
pluralidade cultural. Somando isto, a nossa riqueza e diversidade
Comércio, 2004, p. 25).
de matérias primas, aliadas às necessidades de sobrevivência e à
criatividade na confecção de artefatos resultaram em um fazer O documento do Ministério da Cultura intitulado “Economia
artesanal que se mostrou importante caminho para grupos da Cultura – um setor estratégico para o país”, escrito por Paula
excluídos16, na busca por trabalho e renda (MINISTÉRIO DO Porta, afirma que a atividade cultural mais presente nos
TRABALHO E EMPREGO). municípios brasileiros é o artesanato, com 64,3% (KELLER, 2011).

Entretanto, os números das atividades artesanais De acordo com essa fonte de dados, o envolvimento da
catalogadas são escassos e imprecisos. Cabe ressaltar aqui a cadeia produtiva, englobando o manejo da matéria-prima, a
iniciativa do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB) do produção, a divulgação e a comercialização do produto artesanal,
tanto no mercado interno quanto no internacional, demanda
16
Em termos de Brasil, a temática torna-se ainda mais relevante, dada a ações governamentais, pois além dos benefícios da ocupação e
diversidade de condições de nossa população e da urgência em pensarmos
renda, também a preservação da cultura é um elemento
soluções que deem conta de promover a cidadania. Programas de apoio ao
artesanato e a geração de renda, tem tido, nos últimos anos, uma grande relevante.
dimensão quer no campo da investigação quer no campo da aplicação,
segundo o Ministério do Trabalho e Emprego. Disponível em: www.mte.gov.br.
Acesso em: 16/10/2011.
53

Sem questionar, neste momento, a efetividade desses produção artesanal uma das molas propulsoras da economia local
programas de incentivo e modelos de organização produtiva e preparar o artesão para o mercado competitivo.
contemporânea, instalados no Brasil com maior força na última
No Estado de Mato Grosso, atualmente, cinco mil
década do século 20, este movimento tenta romper com a
profissionais estão cadastrados no Programa de Artesanato Mato-
predominância de métodos de trabalho, formas de gestão e de
grossense, como também no Sistema de Informações Cadastrais
relacionamentos, implantados a partir da Revolução Industrial
dos Artesãos do Brasil (SICAB), do Ministério do
(MARINHO, 2006). Assim, pode-se vislumbrar uma possibilidade
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). O
de emancipação econômica, capaz de conjugar aspectos sociais,
programa, de responsabilidade da Secretaria de Estado de
econômicos, culturais e históricos.
Indústria, Comércio Minas e Energia (SICME) desde 2005,
Nessa perspectiva, um número cada vez maior de desenvolve ações em todo o Estado por meio de assistência e
programas específicos,17 de promoção dessa diversidade cooperação técnica, cadastramento de entidades não
artesanal, é criado, no Brasil, com objetivo de gerar governamentais, como associações e cooperativas,
oportunidades, ocupação de mão de obra e geração de renda, cadastramento do artesão para emissão da Carteira de
além de ser uma opção estratégica para reduzir a pressão social Identidade do Artesão, capacitação, participação e divulgação em
causada pelo desemprego. Os programas objetivam tornar a feiras e eventos, regionais e nacionais 18, como é o caso do
artesão Osmar, estudado no capítulo 3.
17
Um exemplo é o Programa SEBRAE de Artesanato que busca fomentar
o artesanato de forma geral e integrada por meio de projetos que capacitam
artistas empreendedores e fomentam este mercado em cada estado do
país. As ações promovidas enfatizam a identidade cultural das comunidades e
suas habilidades, os resultados promovem melhoria da qualidade de vida e
18
amplia a geração de renda na região. Disponível em: www.sebrae.com.br. Secretaria de Estado de Indústria, Comércio Minas e Energia. Disponível em:
Acesso em 16/10/2011. www.sicme.mt.gov.br/. Acesso em16/10/2011.
54

O contexto atual, alicerçado na racionalidade econômica, Essas organizações, independente de sua magnitude,
autoriza-se pensar na economia de forma multidimensional, desempenham papel importante para as comunidades locais, em
principalmente quando ressurgem com vigor os debates acerca especial aquelas menos desenvolvidas e cuja população
das alternativas de produção – nas quais estão incluídas algumas apresenta menor poder aquisitivo. Trabalhar de forma
experiências que renascem com força em todas as partes do compartilhada acaba por proporcionar a pequenos produtores
mundo, em especial nos países em desenvolvimento onde casos artesãos maior chance de sobrevivência.
bem sucedidos são tomados como exemplo a ser disseminados,
Diante dessa realidade, a valorização do artesanato trouxe à
como respostas aos impactos exercidos pela globalização
tona a discussão de como o design, outro importante domínio do
competitiva e excludente e seus desdobramentos (MARINHO,
fazer humano, poderia intervir para promover o resgate do
2006).
artesanato, abrindo novos mercados, sem quebrar o vinculo do
Algumas experiências, coordenadas pelo Estado de Mato artesão com sua cultura. O papel do design nesse sentido é o de
Grosso, têm sido bem-sucedidas por serem capazes de promover redescobrir o fazer artesanal, orientar, identificar diferenciais,
a articulação da cadeia e dos seus agentes, de criar espaços planejar decisões e práticas que de fato possam contribuir para a
comuns de capacitação e comercialização de produtos e de produção e comercialização dos produtos artesanais
oferecer aos artesãos associados economia de escopo e de nos mercados nacionais e internacionais (FRANÇA, 2005).
escala. Uma experiência em espaços culturais deve ser destacada:
A Casa do Artesão19.

do Artesão. Em 15 de novembro de 1983, foi tombado pela Fundação Cultural


19
Funcionou como estabelecimento de ensino desde sua inauguração até o de Mato Grosso, passando a fazer parte do Patrimônio Histórico e Artístico
ano de 1975, quando em 15 de maio do mesmo ano, passou a abrigar a Casa Estadual. Disponível em: www.cultura.mt.gov.br. Acesso em: 10/10/2011.
55

A utilização do design como ferramenta para a criação de Percebemos o design em constante renovação, mais ou
produtos artesanais com características próprias tem sido uma menos livre e mais expressivo, dentro deste novo cenário
das principais ações dos programas junto às comunidades mundial, uma vez que começa a ter como referência maior a
artesanais, por meio da contratação de consultores para atuar riqueza e a expressividade de suas manifestações culturais. A
junto a esses grupos de artesãos, com vistas a uma produção que experiência brasileira é interpretada como um laboratório
combine com a abordagem iconográfica e comprometida, e com multicultural que antecipa localmente os efeitos da globalização
resgate da cultura regional, compondo uma coleção de acordo mundial. Este fato parece identificar o Brasil como tendo grandes
com tendências e demandas de mercado. possibilidades de respostas junto às novas questões e aos novos
desafios do mundo globalizado, no âmbito do design e do
Além desse caráter mercadológico, a contribuição do design
artesanato (DE MORAES, 2001).
para o artesanato pode ser a de melhorar o produto, no sentido
de buscar novos desenhos, pesquisar novos materiais e, também, É fato a importância do artesanato como meio de preservar
gerar projetos que tragam soluções e inovações, ou mesmo a cultura e as diferenças que caracterizam povos de todo o
correções de falhas, em conjunto com o artesão, no processo de mundo, e que estes são exatamente os aspectos que mais lhe
criação e fabricação de artefatos. agregam valor. Contudo, acreditamos que seja mais importante
encontrar as características do artesanato de acordo com cada
As estratégias de desenvolvimento devem ser atualizadas
região, identificar suas vantagens competitivas, sua unicidade,
para lidar com as mudanças culturais, econômicas, sociais e
seus processos e dinâmicas culturais, as redes de valor criadas e o
tecnológicas de grande alcance que estão transformando
valor agregado de seus produtos, ainda que, em diferentes ritmos
rapidamente o nosso mundo.
e mudanças, tantas vezes conflitantes, apontem o contrário. O
poder reconhecido pela economia, principalmente do Brasil, para
56

movimentar e afetar a vida social e política tem sido central para A indústria moderna está presa a estruturas rígidas de
a consolidação de sua importância na sociedade. produção e concentra-se em uma produção massificada que
mecaniza todos os processos, apagando os vestígios do trabalho
Entender as relações e os caminhos encontrados pelo
humano. Em contrapartida, o artesão tem a liberdade de dar
design contemporâneo é uma forma de compreender
qualidade e beleza aos produtos que confecciona de forma mais
possibilidades, além daquelas inicialmente conhecidas. Questões
artística, independente de uma tecnologia industrial – ao
culturais e sociais estão cada vez mais presentes nestes contatos
contrário, dispondo muito mais de sua habilidade manual e
e o design no Brasil está repleto de novas e boas possibilidades de
criativa.
crescimento.
Acerca da função do artesão na sociedade contemporânea,
Infelizmente, ainda surgem enunciados que consagram os
D’Ávila (1983) propõe uma discussão a “desindustrialização” de
produtos industriais da nossa época, enquanto os objetos de fora
alguns setores industriais para abrir oportunidades de emprego
desse campo são considerados produtos de baixa importância, ou
na área artesanal. Segundo o autor, alguns produtos como
valor. Paradoxalmente, também se realizam estudos apontando
sapatos, roupas, alimentos, móveis etc. podem ser produzidos de
para o crescimento dessa produção informal. Tal crescimento não
maneira artesanal, o que diminuiria a importação de insumos,
é insignificante e hoje, equivale ao da produção industrial
bens de produção e energia. Nesse sentido, o artesanato deve ser
(CIPINIUK, 2006). Os processos de globalização e as inovações
estimulado de maneira estratégica, em paralelo a outros sistemas
tecnológicas que o sustentam oferecem novas oportunidades.
de produção.
Porém, parece aumentar os riscos de dominação, desigualdade e
exclusão. Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, a produção
informal, além de atender ao consumo local, promove a
57

manifestação da cultura. O artesanato significa, neste caso, uma


solução socioeconômica e educacional. Sendo as faculdades
mentais e as habilidades manuais inerentes ao homem e sendo o
artesanato diretamente ligado à sua natureza criativa, o
artesanato não “desaparecerá com o desenvolvimento enquanto
o homem tiver cérebro e mão” (D’ÁVILA, 1983, p. 169).

Embora essa perspectiva seja limitada para a compreensão


da complexidade do artesanato e do design contemporâneo,
especialmente em sua relação com as novas tecnologias, ela
contribui para a superação da ideia de oposição existente em
ambas as atividades, herança deixada pela sociedade moderna, e
que passa a existir como um movimento de resistência (PAIM,
2009).
58

CAPÍTULO 3
59

Neste último capítulo, apresentamos uma análise do fazer


CAPÍTULO 3 artesanal na contemporaneidade, partindo do exame de dois
DESIGN E RESISTÊNCIA: O FAZER ARTESANAL NA contextos distintos. Iniciaremos com a análise empírica a partir do
CONTEMPORANEIDADE
estudo de caso do artesão mato-grossense, Osmar Virgílio da
Silva. O estudo foi pautado na fala do artesão e também no olhar
Diferentemente da máquina caracterizada pelo poder
ilimitado e produção infinita, a mão humana é limitada do observador – a pesquisadora. Entre os procedimentos
em tamanho, força, habilidade, resistência e
velocidade. Estes limites não apenas estabelecem a adotados, destacam-se o levantamento bibliográfico e o registro
escala dos objetos artesanais, mas por serem limites fotográfico. A teoria que sustenta a pesquisa provém dos estudos
partilhados por todos os humanos, artesãos ou não, nos
oferecem um sentido de como nos relacionar com culturais, por oferecer mais flexibilidade para tratar das relações
outras coisas no mundo, artificiais ou naturais. A mão
fornece uma medida básica universal do que constitui o entre culturas (CANCLINI, 2008).
humano em termos de escala, proporção, forma e
material; ela oferece um padrão para avaliar a Na segunda parte, passamos à análise do trabalho de
qualidade e diferenciar a abundância do excesso. Assim,
os artesanatos são um importante corretivo ou Gilberto Paim, ceramista e pesquisador conhecido
contrapeso à mentalidade institucional atualmente internacionalmente, com trabalhos expostos desde 1980 e ateliê
cada vez mais modelada pelo racionalismo mecânico-
técnico-científico, que tanto contribui para o na cidade de Nova Friburgo, RJ. Aqui, o estudo se baseia tanto em
desencantamento do mundo e das coisas que estão
nele; por desencanto entendo a eliminação da mágica e obras e textos publicados pelo pesquisador (que se dedica ao
mesmo da maravilha do mundo pela contabilização de estudo do design e do artesanato), como, em vídeos sobre seus
todas as ações e experiências em termos empíricos e
racionais. trabalhos, em sites especializados e conversas via correio

Howard Risatti, A Teoria do Artesanato (2007) eletrônico entre ele e a pesquisadora.


60

O estudo traça um paralelo entre o artesão e o designer mercado; seja da economia da cultura capitalista. Este ponto de
ceramista, sinalizando os pontos de convergência entre os vista orienta nossa investigação e nos dá elementos para pensar o
campos do design e do artesanato, no intuito de articular as enraizamento e o sentido do fazer artesanal.
informações a partir de seus processos de produção e verificar
Trata-se de conexões preliminares entre fatos observados
questões relacionadas ao desenvolvimento de suas peças
em uma experiência de campo e no levantamento documental e
cerâmicas. Acredita-se que o fazer manual do artesão segue uma
bibliográfico. Questões sobre o sentido do fazer artesanal na
metodologia projetual semelhante à do designer, mas por ter um
contemporaneidade. Aqui, o trabalho artesanal é compreendido
caráter empírico é, por vezes, discriminado.
como forma de resistência.
A pesquisa limitou-se a estas duas situações a fim de
Entretanto, para compreender essa produção artesanal de
compreender a produção cerâmica artesanal contemporânea em
maneira ampla, há que conhecer o entorno social onde está
dois contextos: um local e um global, embora com similitudes nos
inserida ou onde foi produzida. Segundo Canclini, é necessário
modos de produção e com histórias marcadas pelo fazer
observar os contextos e “situá-los na lógica atual das relações
artesanal, que se revelam como fundamental “modelador” da
sociais” (2008, p. 212). Atendendo sua sugestão, percebemos a
pesquisa.
forma como a atividade da cerâmica artesanal se reestrutura na
Partimos da perspectiva teórica que percebe o trabalho atualidade e no espaço em que se insere, nas dimensões social,
artesanal como parte da vida econômica contemporânea cultural e econômica, analisadas no percurso criativo do artesão
(SANTOS & RODRIGUEZ, 2002). As nossas questões de pesquisa se Osmar e do ceramista Paim.
colocam dentro de diversas problemáticas, seja do artesanato na
O estudo do cotidiano (CERTEAU, 1996) também é
sociedade contemporânea e suas relações com Estado e
importante instrumento de pesquisa, trazendo à discussão a
61

concepção dos movimentos de resistência de alguns grupos criação, uma vez que a cerâmica justifica seu valor como veículo e
tradicionalmente constituídos ante as forças hegemônicas de base material para a cultura e o conhecimento em toda época e
reprodução e de controle social da ordem capitalista dominante. lugar (FRADE, 1999).

Vale lembrar que a história do artesanato confunde-se com Consultando pesquisadores da região como, por exemplo,
a história do homem (CHITI, 2003), pois a necessidade de produzir ANDRADE, 2000; ARRUDA, 1989; JANUÁRIO, 1997; PALMA, 1986;
bens de uso rotineiro e ornamentos são expressão da capacidade TOREZAN, 2000, percebe-se que a maioria dedicou-se ao estudo
criativa e do trabalho. Porém, no formato como é pensado, da comunidade São Gonçalo Beira Rio, conhecida pela fabricação
produzido e consumido hoje, se assume como ferramenta da cerâmica artesanal. Então, essa pesquisa foi direcionada a
importante para o estudo da (re)formulação das relações ceramistas artesãos de fora dali. E assim, somaram-se
econômicas, políticas e sociais no setor. inquietações antigas a respeito desse saber fazer à proximidade
do processo produtivo, delineando-se o objeto desse estudo.

Cuiabá, capital de Mato Grosso, é conhecida como "cidade


3.1 Contexto cerâmico matogrossense: suas mudanças e
ressignificações verde" por causa da grande arborização e está cercada por três

Antes de mergulharmos nas pesquisas sobre o contexto grandes ecossistemas: a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. Além

cerâmico matogrossense e suas mudanças, vale mencionar o de estar próxima à Chapada dos Guimarães, é considerada a

porquê da escolha. Tendo passado grande parte da minha vida porta de entrada da Floresta Amazônica.

em Cuiabá, capital de Mato Grosso, convivi com artesãos, ouvi A cidade se conurba com o município de Várzea Grande.
suas histórias e suas experiências. Daí surgiu a ideia de estudar o Segundo o censo de 2010, a população é de 556.298 habitantes,
artesanato cerâmico enraizado neste contexto como trabalho e enquanto a população da conurbação ultrapassa os 800 mil. Já o
62

colar metropolitano chega a um milhão de habitantes20, sociocultural, revelada nos modos e fazeres distintos da arte
formando uma pequena metrópole no centro da América do Sul. local.
As manifestações artísticas são patrimônios incontestáveis
do local, cujas riquezas da fauna e flora ainda guiam o
imaginário21 popular. Frutas típicas da região saem dos quintais e
são vistas nas pinturas dos artistas cuiabanos. Os peixes,
capivaras, tuiuiús e onças pintadas refletem a beleza e
diversidade da região.

A economia, hoje, se baseia na agroindústria, com um


Figura 3: As obras – os filtros – do artista cuiabano Sebastião Silva. Fonte: distrito industrial de infraestrutura recente. Cultivam-se lavouras
www.rmtonline.globo.com/noticias. Acesso: 28 de março de 2011
de subsistência e hortifrutigranjeiros. A presença das indústrias

Cuiabá tem um histórico cultural marginalizado, distante do frigoríficas, de laticínios e derivados e o crescente mercado do

panorama global, e por isso bem característico. A cultura africana


e indígena são as mais fortes influências, presentes em todas as
manifestações artísticas. A população apresenta peculiaridades
que acabam por conferir à região uma grande diversidade 21
O conceito de imaginário é amplo e não pretendemos apresentar um
exaustivo estudo sobre o assunto. O que buscamos é fazer uma leitura que nos
ajude a pensar Imaginário Popular. O conceito formulado por Gaston
Bachelard (1884-1962) é utilizado nesta análise para pensar a cerâmica.
Contudo, tomaremos como base a linha de pensamento do antropólogo
20
Dados do censo 2010, publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Gilbert Durand (2004), que possui traços de natureza coletiva à medida que
Estatística. Disponível em: www.censo2010.ibge.gov.br. Acesso em: março de incorpora dimensões da vida social e da cultura e, também as reflexões sobre o
2011. imaginário do sociólogo Edgar Morin (1970).
63

turismo tem forte potencial de desenvolvimento, em função da sociedades antigas23, semelhantes às peças produzidas em São
capacidade empreendedora local22. Gonçalo Beira Rio. Algumas características presentes na
fabricação dessas cerâmicas, como a estética, estilo e
A diversidade regional também se revela nas manifestações
acabamento, são as mesmas utilizadas na cerâmica
culturais, com traços da cultura indígena e negra, em formato
matogrossense (SYMANSKI, 2010).
folclórico e artesanal.
A história urbana de Mato Grosso teve início em 1719. Seu
Segundo Lima (1975), o artesanato em Mato Grosso é
povoamento é decorrente da descoberta do ouro na região pelas
consequência da mistura de culturas ameríndias e européias, com
primeiras expedições de bandeirantes, que visavam capturar
ênfase na cultura ibérica, guardando semelhanças e refletindo a
índios24 para escravizá-los.
influência dos antepassados com características e aspectos
culturais típicos. Entretanto, um dos mais expressivos indicadores
desta diversidade encontra-se na cerâmica artesanal, favorecido
pela abundante disponibilidade de matéria prima na região.

Registros históricos comprovam que, em escavações nos


23
Os registros demonstram que indivíduos de diferentes regiões da África
sítios arqueológicos, foram encontrados objetos cerâmicos de utilizaram a cerâmica como veículo de expressão de identidades diversificadas.
Através desse material, eles reproduziram memórias e representações de sua
terra natal, reapropriando-se simbolicamente desses espaços (SYMANSKI,
2010).
24
Os Indígenas Bororo ou Coxiponé têm complexa organização social, rica
cultura material e elaborada vida cerimonial. Tal sociedade localiza-se no
22
Dados do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Urbano de Cuiabá. estado de Mato Grosso, com população estimada em 914 indivíduos
Disponíveis em: www.cuiaba.mt.gov.br. Acesso em: março de 2011. (BYINGTON 2006)
64

Segundo relatos de moradores da comunidade, um dos


primeiros ocupantes da área encontrou uma imagem de santo25
dentro do rio, que deu origem ao nome Arraial de São Gonçalo
Beira Rio, hoje bairro São Gonçalo Beira Rio (ROMANCINI, 2007).

Figura 4: Cerâmica cuiabana. Fonte: www.rotasedestinosdeviagem.blogspot.com.br


Acesso em: 06 de março de 2011

Figura 6: Santo São Gonçalo. Fonte: www.benditosanto.blogspot.com.br


Acesso em: 6 de março de 2011

25
São Gonçalo é um santo português de 1187. O culto foi permitido pelo papa
Figura 5:Índio Bororo em traje ritualístico. Fonte:www.flickr.com/photos/rodrigo_ono Júlio III, em 1551. Sua missão era zelar pela virtuosidade das mulheres e
Acesso: 28 de março de 2011 organizar danças nos dias de sábado até se casarem. A homenagem ao santo é
feita, na região, como pagamento de promessa (MAGALHÃES, 1995).
65

Nas proximidades do povoado, foi construída, em 1914, a âmbito do Ministério da Ação Social. Em 1995, o Ministério do
Usina de São Gonçalo, para produção de açúcar e álcool – grande Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior assumiu sua
responsável pelo crescimento do pequeno núcleo populacional. gestão. Atualmente, está sob a coordenação do Departamento de
Porém, a atividade não durou muito. Com o declínio da produção, Micro, Pequenas e Médias Empresas da Secretaria do
na década de 1930, a grande quantidade de argila acumulada às Desenvolvimento da Produção26.
margens do rio fez do artesanato de cerâmica o meio de vida de
A criação do Museu de Arte e Cultura Popular de Mato
grande parte da comunidade (ROMANCINI, 2007).
Grosso, em 1974, visava, especialmente, valorizar a cerâmica
O crescimento industrial delineou outra realidade para o produzida em São Gonçalo Beira Rio27.
artesanato, trazendo queda considerável no valor utilitário dos
Com a abertura do mercado turístico na região e tendo que
artefatos de barro. Nas primeiras décadas do século 20, essa
atender a demanda local e externa, a produção precisava crescer
atividade artesanal passou a sofrer grande influência dos
para enquadrar-se às exigências do novo mercado. Porém, o
aspectos econômicos mundiais e das novas práticas de consumo.
tempo da produção artesanal, a escassez da argila, a falta de
Na década de 1970, a produção da cerâmica artesanal viveu um
organização dos artesãos e a busca por segurança no trabalho
dos períodos mais críticos (ROMANCINI, 2007). Nos anos de 1980,
o Brasil percebeu a necessidade da valorização dos aspectos
culturais do país, promovendo programas de qualificação 26
O PAB cria ações que contribuem para o desenvolvimento e o
aproveitamento das vocações regionais e a geração de trabalho e renda.
profissional e de melhoria da comercialização do produto
Disponível em: www.mdic.gov.br. Acesso em: 19/03/11.
artesanal, além de um calendário nacional de eventos do setor. O 27
No MACAP existem exposições periódicas das cerâmicas da comunidade São
Programa do Artesanato Brasileiro foi criado nos anos 1990 no Gonçalo Beira Rio. Disponível em: www.rmtonline.globo.com. Acesso em:
19/03/11.
66

assalariado ameaçavam a atividade cerâmica. Diante da nova manutenção de suas atividades28. Nessa perspectiva, o artesão,
realidade econômica, social e cultural, os artesãos precisaram antes anônimo e isolado em uma pequena localidade, passava a
repensar o processo de produção e, principalmente, a interagir com “as indústrias culturais, o turismo, as relações
comercialização dos produtos. econômicas e políticas, o mercado nacional e transacional de
bens simbólicos” (CANCLINI, 2008, p. 245).

Figura 7: Cerâmica São Gonçalo Beira Rio. Fonte: www.mtonline.globo.com


Acesso: 28 de março de 2011 Figura 8: Artesãs de São Gonçalo Beira Rio. Fonte: www.turismorural.blogspot.com.br
Acesso em: 06 de março de 2011
Com as transformações na relação produção, circulação, e
consumo de peças cerâmicas, assim como as mudanças da
construção do seu valor simbólico, eles se viram forçados a 28
É o caso das Cooperativas e Associações de Artesanato. A Associação dos
Artistas Plásticos e Artesãos do Vale do Araguaia – Valearte – de Barra do
participar de associações que “garantiam” a sobrevivência e Garças, fica a 500 km de Cuiabá, Mato Grosso.
67

Nesse sentido, o modo do fazer cerâmico de São Gonçalo se artesanal. Esse fazer é diverso e rico, tanto pelas matérias primas
mantém, hoje, como herança, passada de mãe para filha, o que que emprega quanto pelas técnicas de produção, e também
evidencia a importância do papel desempenhado pelas mulheres. devido às realidades vividas por aqueles que o produzem.
O grupo doméstico é a estrutura fundamental tanto por ser a
Considerando a importância de compreender como a
unidade econômica de produção como por estabelecer a unidade
prática da cerâmica artesanal ocorre dentro deste cenário
política. Além de contribuir para aumentar a renda familiar, essa
contemporâneo, sujeito a constantes transformações sociais,
atividade estimula o convívio social entre os vizinhos,
culturais e econômicas, segue-se a apresentação do primeiro
fortalecendo os laços de solidariedade e reforçando o sentimento
contexto, o do artesão Osmar, tomado para o estudo de caso. Sua
de pertencimento. A divisão do trabalho é simples, uma vez que
importância reside no fato de ser depositário de um passado que
tem como único critério o gênero. Entretanto, há casos de
traz à tona vestígios tradicionais desse saber fazer, além de
presença masculina na produção – eles preparam o barro, ajudam
promover um debate em torno de questões relacionadas à
a dar acabamento, enformam e queimam as peças (PALMA,
existência contemporânea da atividade. Com isso, estabeleci
1986).
algumas conexões, articulando a teoria aos seus depoimentos.
Porém, em função dos “novos tempos”, os herdeiros deste
Essa pesquisa de campo, guiada pela curiosidade e intuição,
“saber fazer” rejeitam sua herança. Na maioria dos grupos, o
busca também provocar reflexões acerca das interferências e
papel do produtor é exercido pelo mesmo indivíduo por mais de
apropriações verificadas no diálogo de alguns saberes que
uma geração (ROMANCINI, 2007).
confluem na contemporaneidade: design, arte e artesanato. Até
Assim como Ricardo Gomes (2011), acreditamos que a porque como assinala Sylvia P. Alegre (1985):
riqueza do artesanato brasileiro deriva da multiplicidade do fazer
68

Toda discussão sobre fronteiras entre ‘arte’ e cerâmicas utilitárias e decorativas para armazenar, cozinhar,
‘artesanato’, entre‘artista’ e ‘artesão’, a partir
do discurso dominante, carece de sentido servir alimentos e para ornamentação. O próprio artesão Osmar,
dentro da perspectiva do indivíduo que exerce frequentemente, se reportava à raiz negra e indígena quando se
essa atividade, pois ele raramente separa a
instância do trabalho manual ou mecânico referia ao seu fazer.
(‘artesanal’) do trabalho intelectual e confere a
ambos igual dignidade (p. 10).
No campo científico, a cerâmica está ligada à mineralogia, à
arqueologia e às ciências antropológicas e tem diretas conexões
Estas e outras questões me guiaram de um contexto micro, com a arte. Mas, se na arte, os quatro elementos solicitam o
de caráter local, para um macro, até porque as identidades devaneio do artista, no ofício, liga-se às forças físicas do artesão
regionais, locais, colocam-se para o design como uma valiosa que age sobre a matéria argila e dá forma ao objeto cerâmico
fonte de matéria prima (RODRIGUES, 2005). artesanal (BACHELARD 1991).

A produção de artefatos a partir de argilas consiste na


fusão de terras e rochas que, quando amassadas, tratadas com
3.1.1 O fazer artesanal de Osmar Virgílio da Silva
água e colocadas em alta temperatura, secam, endurecem e se

A origem29 do fazer cerâmico está intimamente ligada ao transformam em cerâmica. Algumas peças são acromáticas;

costume indígena e, provavelmente, africano, de fabricar

29
É importante mencionar que ao se colocar origem, não há nenhum intuito
purista na análise, pois não acreditamos nessa experiência. O que se quer dizer
aqui é como foi contada a história e como este saber foi transmitido por
gerações passadas.
69

outras têm coloração obtida com o uso do próprio barro em que o conduziram para a cerâmica artesanal, gerando o único
estado líquido ou com pigmentos vegetais 30 para acabamento. meio de subsistência de sua família. O motivo da escolha dele
como principal informante do estudo se deu a partir do
Na cultura da cerâmica, os significados na história de vida
levantamento de dados sobre a cerâmica artesanal na região.
dos artesãos e seu valor simbólico se caracterizam pelas práticas
Quase todas as indicações convergiam para a comunidade
sociais de trabalho e pela elaboração sociocultural que se trava
ribeirinha tradicional, São Gonçalo Beira Rio. Mas algumas nos
na própria comunidade, alimentando a significação e a práxis do
conduziram ao artesão Osmar.
território.
Osmar Virgílio da Silva é artesão mato-grossense, tem 42
Seu processo de confecção implica em profundo
anos de idade, 22 de arte cerâmica. É casado com Lise e tem 3
conhecimento de tipos de argila e o modo correto de coleta e
filhos: a mais velha com 19, o do meio com 10 e a caçula com 2
armazenagem, além do domínio do processo de transformação
anos de idade. Nasceu em Poxoréu, interior de Mato Grosso, mas
da matéria bruta, para dar forma ao objeto. Além de métodos de
mora na capital, Cuiabá, há quase 20 anos. Seus pais são naturais
trabalho e processo de produção, esses objetos revelam rituais de
da cidade de Caruaru, Pernambuco.
vida, cuja natureza e significado procurei investigar.
Osmar não se insere no estatuto do artesão, razão mais
Este subitem começa pela revelação de aspectos biográficos
motivadora da investigação. Ele não tem tradição familiar no
desse artesão, suas escolhas pessoais e a trajetória profissional
artesanato; mantém-se na atividade há quase 22 anos; expõe
seus artefatos em feiras locais, geralmente como autor artesão,
30
Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimento, representando sua empresa “Barro Vivo”; fez dezenas de cursos
Louças, Sanitárias e congêneres – ANFACER. Disponível em:
www.anfacer.org.br. Acesso em: 19/03/11. técnicos na área; resvala no campo do Design quando ministra
70

oficinas para outros artesãos profissionais; tem inserções no centro da cidade. Batizou seu empreendimento de “Barro
midiáticas, já tendo concedido diversas entrevistas a jornais, Vivo” (Figura: 23), em referência aos quatro elementos da
revistas e programas de televisão locais – eis algumas natureza: terra, água, ar e fogo.
características desse profissional que foge ao estereótipo de
Embora enraizado em uma cultura local, a memória do
artesão tradicional, mas nem está fora do artesanato e nem do
artesão Osmar, ganha força no desenvolvimento das peças
design.
cerâmicas, dando lugar ao cruzamento de várias referências
culturais. No seu trabalho, faz questão de buscar referências nas
culturas mato-grossense e nordestina. Seu “sonho”31 é seguir os
passos de Mestre Vitalino32, artesão nordestino que retratava seu
cotidiano em esculturas de barro.

Dito isto, cabe refletir sobre o processo criativo e produtivo


de peças cerâmicas artesanais do artesão Osmar, que esta
Figura 9: Osmar e sua peça cerâmica. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011 e
pesquisadora pode acompanhar em visitas a sua casa que, não
Mestre Vitalino. Fonte: www.onordeste.com. Acesso: 16 de junho de 2011

31
É considerado o maior produtor individual de cerâmica O trabalho do “sonhador que modela” é analisado por Bachelard (1948)
como decorrente do movimento entre vontade (força contra a matéria) e
artesanal da região, e não participa da comunidade tradicional imaginação (imagens da intimidade).
local, nem de associações e cooperativas. Trabalha sozinho na 32
Vitalino Pereira dos Santos. Parte de sua obra pode ser contemplada
no Museu do Louvre em Paris. No Brasil, o maior acervo está em Recife,
produção, com a ajuda dos filhos na pintura de pequenas peças e Caruaru, onde ele morreu em 1963. Disponível em: www.itaucultural.org.br.
da mulher na venda dos objetos cerâmicos, no espaço que aluga Acesso em: 19/06/11.
71

por acaso, é também sua oficina, e a sua empresa “Barro Vivo”, o valor da atividade no dia a dia da família, compreendida e
entre novembro de 2010 e junho de 2011. representada, principalmente, a partir deste ofício como
sentimento de pertencimento ao lugar, rico em “construções
identitárias e projeções simbólicas” 33.

3.1.1.1 Primeiro encontro

Nosso primeiro encontro foi em novembro de 2010, porém,


devido à quantidade de peças que teria de produzir,
encomendadas para as comemorações de final de ano, não
poderia dar a atenção merecida aos trabalhos de campo. Mesmo
assim, pedi para acompanhá-lo no seu dia a dia. Osmar se
mostrou atencioso e pronto a contribuir com a pesquisa.

A câmera nos levou ao cotidiano do artesão, mostrando


imagens de sua casa e de sua oficina cerâmica. Osmar me contava
como o barro chegou às suas mãos e como descobriu, por acaso, Figura 10: Fachada da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal.
Novembro de 2010
o que queria fazer pelo resto da vida. Pude observar o movimento
da oficina e a rotina da família.
33
Expressão utilizada por Carvalho (2008) para indicar a construção da
Quem chega à sua casa tem a atenção voltada para a identidade social que se processa no âmbito das projeções simbólicas
profusão de objetos cerâmicos em todos os cantos, que atestam articuladas pelas práticas do cotidiano, com exaltação das diferenças culturais
dos grupos, apesar da força totalizante dos interesses econômicos decorrentes
da globalização.
72

Todo seu saber artesanal, suas experiências com o barro, domésticos e de decoração e nos ornamentos em potes,
suas técnicas, são empregados na produção de artefatos que ao moringas, vasos e filtros.
mesmo tempo são mediadores de relações sociais e serão
No entanto, a atividade nem sempre é desenvolvida ao
submetidos ao mercado.
longo de todo o ano, estando sujeita a períodos sazonais, em
razão da disponibilidade de matéria-prima e também da
demanda.

Figura 11: Fachada lateral direita da casa. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

Em seus trabalhos com carrancas, máscaras e figuras Figura 12: Jogo de chá feito por Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

humanas, observamos a inspiração em grafismos indígenas e Quando não há encomendas, Osmar cria novas peças, faz
referências africanas. O artesão dedica-se, também, à pesquisa de misturas com novos produtos, executa novos tratamentos na
referências regionais para seus objetos em argila, como utensílios argila. Além disso, trabalha com reaproveitamento de materiais,
como a fachada da casa feita com refugo de pastilhas e azulejos
73

recolhidos de uma casa em reforma. Ele comenta que existem Na estante improvisada na sala da casa, ficam expostos os
materiais e ferramentas em sua oficina que foram retirados de artefatos cerâmicos produzidos e não comercializados,
caçambas de entulho, recriadas e reaproveitadas. misturados a objetos industrializados, como um constante
processo de hibridização cultural que nasce da velha tensão entre
O trabalho se orienta para a produção de objetos de uso
tradicional e moderno (CANCLINI, 2008).
mais comum, seja em função utilitária, decorativa ou religiosa,
mas também existem objetos singulares, influenciados pelo Para Osmar, falar de sua peça é quase como falar dele

ambiente em que vive e pelo modo de vida da área cultural a que mesmo. Podemos percebê-lo por meio dos seus objetos,

pertence. confirmando o que diz Albornoz (2004, p.63): “a produção do


objeto pelo homem é ao mesmo tempo um processo de
autoprodução (...)”.

Figura 13: Sala da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

Figura 14: Sala da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011
74

Ele se sente herdeiro de uma tradição34 que lhe dá Na oficina erguida no quintal da casa, como se fosse sua
existência, mantendo-a por meio de repetições de modelos, extensão, observamos a produção de algumas peças cerâmicas.
fazendo com que os artefatos persistam no fluxo do tempo. É por Encontramos ali, na manufatura dos objetos do artesão, uma
meio dessas repetições, com variações imperceptíveis, que seu mistura de técnicas reminiscentes e outras tecnologias, como o
trabalho se torna parte da tradição local. torno elétrico.

O seu dia se organiza em torno desse fazer, uma vez que o


processo de produção é demorado e se estende ao longo de dias.
Consiste em extrair a argila de jazidas próximas à sua casa;
estocar em sacos úmidos para o equilíbrio do material orgânico;
compactar e dividir em bolas de argilas; modelar em torno
elétrico; secar à temperatura ambiente; e posteriormente
queimar em fornos intermitentes a uma temperatura de mais ou
menos 700ºC.

Figura 15: Oficina no fundo da casa do artesão. Fonte: Acervo pessoal. Os elementos naturais com que o artesão lida diariamente,
Novembro de 2010
como terra, água, ar e fogo em seus diversos estados, são

34
complexos, mas Osmar parece dominá-los. Acreditamos, assim
Entende-se tradição um conjunto de sistemas simbólicos que são passados
de geração a geração e que tem um caráter repetitivo. É considerada dinâmica como Bachelard (1991), que as realidades materiais oferecidas
e não estática, uma orientação para o passado e uma maneira de organizar o
pela natureza são convites para exercer nossas forças. O autor
futuro. Coordena à ação que organiza temporal e espacialmente as relações
dentro da comunidade (GIDDENS, 1997). afirma que:
75

(...) A realidade material nos instrui. De tanto No processo de construção do artefato cerâmico, as
manejar matérias muito diversas e bem
individualizadas, podemos adquirir tipos de atividades são muitas e necessitam não só de força física, mas de
flexibilidade e de decisão. Não só nos tornamos força técnica. Enquanto ele produzia, conversávamos sobre seu
destros na feitura das formas, mas também nos
tornamos materialmente hábeis ao agir no ofício e eu observava seu ritual.
ponto de equilíbrio de nossa força e da
resistência da matéria (p.21).
As técnicas e habilidades artesanais são aprendidas de
diversas formas, sendo frequente o aprendizado pelo
compartilhamento de experiências entre artesãos: o artesão que
assume o papel de mestre domina e repassa técnicas tradicionais
ou modernas a interessados. Também há casos de ensinamento
por consultores ou instrutores. Os contatos são sempre diretos,
estabelecendo um caráter de pessoalidade na relação ensino-
aprendizagem. As fontes mais reconhecidas de referência para o
trabalho do artesão são a matéria-prima existente na localidade,
a arte e a simulação da sua realidade cotidiana e social.

As técnicas da olaria, ele aprendeu com dois mestres, por


meio da troca e soma de conhecimentos, que se mantém viva
como um saber intimamente ligado à sua história. Ele menciona
Figura 16: O artesão trabalhando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal.
Novembro de 2010 um mestre nordestino e outro matogrossense que criaram, a
partir do ofício, uma verdadeira escola, passando suas técnicas
76

artesanais aos filhos e aprendizes, se deixando observar durante a tudo ao mesmo tempo. Enquanto a mulher tomava conta das
construção do artefato. Osmar compartilha dessa prática. Além vendas de suas peças cerâmicas no centro da cidade e a filha mais
de transmitir os ensinamentos para os filhos, procura ensinar velha seguia sua vida em um trabalho fora de casa, encarava com
artesãos iniciantes. naturalidade e se mostrava bem disposto ao serviço. Contudo, a
importância deste fazer na vida do artesão parecia subverter a
ordem natural das coisas.

Figura 17: O artesão e suas tarefas domésticas. Fonte: Acervo pessoal.


Novembro de 2010
Figura 18: Mulher do artesão Osmar, Lise. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011

Entretanto, os trabalhos na oficina se misturam com os


O fazer artesanal, assim compreendido, por um lado
afazeres da casa e algumas tarefas domésticas acabam sob sua
carrega em si um acúmulo de conhecimentos de ordem técnica e
responsabilidade. Tentando superar as condicionantes, era visível
material, necessários à sua concretização. Por outro, está
o esforço de Osmar em organizar o tempo, com ânimo de tocar
77

firmemente enraizado em um universo dos símbolos que Ao modelar o barro, suas ferramentas, anotações de
mobilizam o artesão na busca de significados (CRUZ, 2010). clientes, o aparelho de som e tudo a sua volta ganhava “cor de
barro”, alimentando a significação do cotidiano e a práxis de sua
Observando Osmar sentado em volta do torno35, observei
atividade. Ele parecia gostar desse cenário e dizia que o que mais
seu saber cerâmico ao moldar a argila, ao explicar cada fase do
o atraia era a possibilidade de trabalhar com as próprias mãos os
processo, na obtenção do material, na sua preparação, na
quatro elementos: água, terra, ar e fogo.
modelagem, no processo de secagem, na queima, onde se atinge
a transformação da argila em cerâmica. Sobretudo, as falas Sua fala era comovente e parecia querer provar sua paixão
corporais, quando seu corpo debruça sobre seu ofício, pela cerâmica:
multiplicando possibilidades para que sua história persista no Eu tinha outra profissão, mas larguei tudo
tempo. só pra fazer cerâmica... Disse que vou fazer
cerâmica independente de qualquer coisa.
Se não vender, eu vou fazer e quebrar...
O espaço da produção das peças era bastante úmido, pois
durante todo o processo de beneficiamento e modelagem, água Osmar disse que trabalhou em uma olaria antes de se
era adicionada à argila. Ele usava uma lona como avental para decidir pelo artesanato. Lá, aprendeu o processo de produção da
cobrir suas pernas e proteger as roupas da água que se soltava do cerâmica industrial. Disse que se sentia explorado e não tinha
torno em movimento. Mas o barro estava impregnado em todo o prazer em trabalhar. O gesto repetido do fazer cerâmico, do
espaço. cumprir as fases no tratamento da argila, da tecnologia do torno,
das ferramentas improvisadas, na intenção de dar forma ao
35
É um equipamento movido por tração humana ou eletricidade. Em estrutura informe, define um território que tem como primeira
de madeira com dois discos. Provavelmente uma das primeiras tecnologias
desenvolvidas para a produção em grande escala (TORTORI, 2008). característica uma “resistência” imediata e constante. No fazer
78

artesanal de Osmar, a matéria dura, resistente e sem forma encontro com a água, um novo corpo se forma e surgem novas
tornava-se plástica, flexível e criativa, assim como em Bachelard possibilidades de interação.
(1991). A partir do seu encontro com a água, um novo corpo se
forma e surgem novas possibilidades de interação.

O movimento de trabalho de Osmar contra a matéria


argila era intenso e apaixonado, parecia desafiar a força numa
atitude dinâmica e transformadora. Mas para o artesão, a
cerâmica é, antes de tudo, trabalho – tão complexo que
compreende um conhecimento amplo, que vai desde a matéria
prima até as questões de mercado. Este último, segundo ele,
ainda se apresenta como um grande desafio.

O gesto repetido do fazer cerâmico, do cumprir as fases no


tratamento da argila, da tecnologia do torno, das ferramentas
improvisadas, na intenção de dar forma ao informe, define um
território que tem como primeira característica uma “resistência”
imediata e constante. No fazer artesanal de Osmar, a matéria
dura, resistente e sem forma tornava-se plástica, flexível e
criativa, assim como em Bachelard (1991). A partir do seu
Figura 19: Artesão Osmar no seu ofício.
Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011
79

Para esse mesmo autor, a transformação acontece também


dentro do indivíduo, pois a matéria é oportunidade de realização
pessoal. E continua: “o artista do barro pratica sua arte sobre
uma matéria amorfa, submete essa matéria a certas restrições:
ele a despedaça e a modela, impondo-lhe limites” (p.53).

Depois de moldado e cortado na base até a forma de um


pequeno pote, a peça era colocada em uma bancada de madeira
improvisada, para “descanso” e secagem à sombra, dando corpo
Figura 20: As mãos do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010 a uma peça resistente. Segundo Osmar, o número de peças
deformadas e rachadas na fase da queima é menor nas
A mão do artesão foi descrita como uma importante
torneadas, pela ausência de arestas e vértices. Assim, formas
ferramenta, assim como em Bachelard (1991), para a realização
cônicas, cilíndricas, esféricas e ovais são recorrentes no universo
do seu trabalho. Calejada, com os dedos ressecados, unhas sujas
de uma boa produção cerâmica com o uso do torno (SILVA, 2008).
de barro, apresentava-se como configuração estética
manufatureira e um envolvimento físico integral, ou seja, de Neste primeiro encontro, não acompanhamos a fase da
36 queima, pois o forno, criado pelo próprio Osmar, estava ocupado:
corpo e espírito, na transformação da argila e “feitura” do
objeto cerâmico.
...Tô queimando uma fornada... Tá aceso
desde ontem e eu tô aqui cuidando...

36
Utilizamos o termo feitura empregado por Bachelard (1991), para
relacionarmos ao termo utilizado como tema deste capítulo – O fazer manual.
80

“fazer divino”, reunindo nele atributos como resistência,


paciência, deleite, autonomia, liberdade. Ao definir assim seu
trabalho, o artesão coloca-o em um patamar no qual o deleitável
adquire qualidade de insurgência, funcionando como
possibilidade de resistência.

Minhas primeiras impressões a respeito do fazer artesanal


do “sonhador que modela”, parafraseando o filósofo francês
Gaston Bachelard (2001), ainda não se encontravam
amadurecidas, mas estavam arquivadas na memória, no caderno
Figura 21: Forno construído por Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010 de campo e, também, nas gravações do percurso da pesquisa,
para futuras consultas. Entretanto, ao ouvi-la, novamente,

Na fase da queima, as peças são “enfornadas”, isto é, percebi na fala do artesão, a tal autonomia de que ele tanto

arrumadas dentro do forno e cobertas com cacos de cerâmicas falava:

que ele reaproveita para conservar o calor. Quando submetidas ...Eu produzo de tudo... Se eu chegar num
lugar que tem barro, eu vô cavando buraco
ao fogo em altas temperaturas, as peças adquirem a “resistência” e dali eu já faço tijolo, daí tiro a segunda
de mármore. camada e já faço a telha e depois na
terceira camada eu começo a fazer a
cerâmica... Domino tudo da cerâmica.
Mesmo com dificuldades comuns de uma atividade
considerada subalterna, com as limitações típicas de uma
produção artesanal, Osmar categorizou seu trabalho como um
81

Nessa definição polêmica, trabalho e modo de vida com as necessidades do seu contexto, mesmo que esteja inserido
parecem se alimentar de um processo particular, mesmo num universo sociopolítico-econômico globalizado.
participando da tão complexa relação – ser social e meio
Embora o dia a dia do artesão não passe intacto às
ambiente, como se na essência criadora do modelar o barro,
influências do sistema capitalista vigente, a importância e o valor
fosse possível reinventar o sentido do trabalho na
que ele dá ao seu trabalho, têm a capacidade de externar a
contemporaneidade.
riqueza do seu fazer artesanal e sua fração de contribuição social
na localidade. No entanto, trabalho como este pode ser
encontrado em diversas regiões do país ou do mundo, resistindo
aos apelos da massificação e produção em série, marcas da
sociedade industrial. Mas, em face das condições concretas
oferecidas pelo contexto no qual este trabalhador está inserido,
ele prova da essência criadora na arte e na vida.

Sua atividade artesanal não deixa de ter, em si, a


necessidade do comércio, assim como toda atividade análoga,

Figura 22: “Barro Vivo” Loja da família. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010 situação que, muitas vezes, permite a subalternidade social dos
artesãos trabalhadores frente ao lucro e ao acúmulo capitalista.
A atividade do artesão é um ofício, pois organiza e regula
Porém, isso não dá mostras de que o artesão cede passivamente
seu cotidiano e lhe confere legitimidade social (PERELMUTTER,
sem qualquer resistência. Na realidade, ele integra o sistema
2008). Sua oficina é regida por leis próprias e seu ritmo tem a ver
construindo sua inserção baseada em práticas sociais próprias de
82

valorização do seu trabalho, que se apoia em suas tradições, na restando poucos pontos de retirada e um barro de má qualidade,
sua cultura e nos projetos de vida. Isto é uma forma de dizia Osmar. Hoje, a população que vive no entorno sofre as
resistência. consequências de um processo de urbanização acelerada e
excludente, que, entre outras coisas, aumentou os índices de
degradação e escassez do ecossistema local.

3.1.1.2 Segundo encontro

Nosso segundo encontro foi em junho de 2011. Osmar


mencionava importantes mudanças no seu processo produtivo.
Algumas eram visíveis já na entrada da casa. Parecia ter
conseguido realizar seu sonho de transformar a oficina, em um
lugar aberto ao público interessado em conhecer seu ofício.
Porém, a situação era paradoxal. Em uma das conversas, várias
dificuldades sobre o processo de produção da cerâmica vieram à
tona, dificuldades não mencionadas por ele no primeiro Figura 23: Endereço da casa de Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

encontro.
Sua prioridade não era mais o mencionado sonho e sim
A preocupação era, especialmente, a respeito da extração desenvolver uma estratégia para assegurar a manutenção da sua
da matéria prima, que no início era feita nos barreiros próximos atividade. Isso implicava em adquirir argila garantindo matéria
de sua casa. No entanto, com o passar dos anos, o local se tornou prima suficiente para as necessidades da produção.
de difícil acesso pelo esgotamento dos depósitos naturais,
83

Osmar mencionou que adquiriu por um “bom preço”, tentativa de suprir necessidades básicas de sobrevivência. Assim,
alguns meses antes da nossa segunda visita, argila proveniente de na luta pela manutenção da atividade, o artesão buscou formas
uma olaria de cerâmica industrial da região, especializada na alternativas de produção. O investimento feito foi a maneira
fabricação de tijolos e telhas. Na verdade, consistia em um encontrada para dar continuidade ao ofício, sem que isso
“milheiro de argila”, ou seja, argila no formato de tijolos não acarretasse um “desvio do sentido” da atividade, ou seja, ele
queimados. Ele mencionou que estava experimentando a ideia de ainda era produtor de cerâmica artesanal.
trabalhar com uma matéria prima já processada, mais
homogênea, limpa e preparada para modelagem, e não expôs
dificuldades de adaptação. Pelo contrário, em suas palavras,
tratava-se de “barro bom”, e passou a descrevê-lo:

...Ele é passado em vários maquinários...


Tiram as impurezas que quebra a peça. É um
barro super amassado e dá essa qualidade no
trabalho. Se eu for fazer do barro in natura,
com ele bruto, chegar e cavar lá no chão,
peneirar, molhar, fazer as bolas dá muito
trabalho, produz pouco.

Figura 24: Osmar na frente da sua casa. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Embora o artesão tivesse dificuldade de expressar todos os


Era perceptível a melhora da situação econômica e social do
seus motivos, a compra da matéria prima parecia, também, estar
artesão, após a adequação no processo produtivo. A
ligada ao baixo preço final das peças e à grande concorrência na
84

disponibilidade da nova matéria prima ampliou os caminhos da A questão do tempo parece ser uma característica
produção, viabilizando um aumento considerável e uma nova intrínseca dos objetos feitos à mão. Assim diz Sennett (2009):
linha de produtos dentro de padrões técnicos, o que possibilitou
A lentidão do tempo artesanal é fonte de
sua inserção em alguns mercados antes inatingíveis. Segundo ele, satisfação: a prática se consolida, permitindo
que o artesão se aposse da habilidade. A
o prejuízo de peças quebradas, também diminuiu.
lentidão do tempo artesanal também permite o
A manutenção do novo investimento é conseguida a partir trabalho de reflexão e imaginação – o que não é
facultado pela busca de trabalhos rápidos
da venda de peças cerâmicas, em um processo constante, (p.328).
impulsionado pelo aumento da produção e a necessidade de
recursos. Quando precisa investir, ele produz, vende, compra O tempo necessário para a realização da experiência

matéria prima, produz novamente e comercializa, num ciclo artesanal não pode ser medido pelo modelo tempo comum nas

natural e necessário. Hoje, praticamente toda a argila utilizada na organizações industriais. Heliana Marinho (2006) diz:

produção advém de olarias industriais da região.


Há que se considerar que a produção de
produtos artesanais, além de utilizar baixa
Entretanto, o trabalho do artesão ainda se faz de forma tecnologia, surge de uma manifestação criativa,
individual ou coletiva, estimulada por relações
individual, em sua oficina, no fundo da sua casa. Continua
interpessoais. Tal processo produtivo sofre
obedecendo a um tempo que pode ser bastante extenso. Sua descontinuidade, pois é intercalado por outras
atividades, realizadas simultaneamente, que
jornada de trabalho está sujeita a muitas porosidades temporais. trazem satisfação pessoal. O alto nível de
envolvimento com o fazer, ou o executar o
Pode trabalhar por horas seguidas ou intercalar trabalho e
produto, talvez seja reflexo da linguagem
descanso, ou alternar com outras atividades, como tocar violão. simbólica e da materialização da experiência
humana. Assim sendo, o tempo artesanal
estabelece-se num cenário de conveniência e
85

de convivência, e não de segmentação e de


seriação (p.130).

As imagens a seguir mostram, resumidamente, o novo


processo de produção:

Figura 26: Explicando o novo processo. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 25: “Milheiro de argila”. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 27: Quebrando o tijolo de argila não queimado. Fonte: Acervo pessoal.
Junho de 2011
86

Figura 28: Mostrando o ponto da argila para o torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de Figura 30: Modelando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
2011

Figura 29: Levantando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011 Figura 31: Peças secando ao ar livre. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
87

Ao convidar Osmar para que falasse sobre o sentido do seu


trabalho, a expressão que mais ouvi foi autonomia e liberdade.
Entretanto, a maioria de suas descrições remetia a conceitos
amplos e interligados, por vezes confusos, mas as descrições de
vivências e experiências pessoais e profissionais possibilitaram
estabelecer algumas distinções.

Embora sua atividade possa ser percebida como regular ou


sistemática no sentido de sobrevivência profissional e não apenas
Figura 32: Na fase da queima no forno que ele mesmo construiu. Fonte: Acervo como um prazer vale indagar por quais critérios e valores Osmar
pessoal. Junho de 2011
define seu trabalho como livre e autônomo. O fato de “trabalhar
por conta própria”, não sujeito a horário fixo ou rígido de
trabalho, em contraste com outras atividades que já exerceu,
talvez explique de certa forma. Além disso, ele diz ser “patrão
dele mesmo”, fator que para ele marca a diferença entre sua
atividade e a exercida por sua filha, que trabalha fora de casa.

Para o artesão, o trabalho que faz sentido, visto como


sendo capaz de satisfazê-lo e ser útil para a sociedade, aparece
Figura 33: Osmar, sua filha caçula e seu violão. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011 como elemento fundamental em sua vida. Osmar sabe que o
sentido do ofício cerâmico está na intrínseca relação entre arte,
88

trabalho, existência e sobrevivência. Assim como, também, sabe e superficial. No domínio progressivo da arte
está embutida toda habilidade e toda a
que seus valores e princípios são fundamentais à sua vida. criatividade do artista. O reconhecimento desse
difícil processo por parte dos outros se reveste
O valor a que me refiro, contido no trabalho, é elemento por isso de fundamental importância para o
artista, pois do que o valor de troca, mais do
de peso no domínio do seu ato produtivo. Todavia, tal que valor de uso, o objeto encerra e contém
categorização não é algo que se limite ao mundo dos ceramistas, um valor moral do trabalho realizado (Ibid., p.
112).
visto que qualquer artesão a leva em sua arte, na condição de um
critério valioso, como revelado no estudo de Porto Alegre (1994):
Acredito que a relação estabelecida entre o artesão e seu
A ética do trabalho, quando orientada pelo
“espírito da arte”, envolve três aspectos
trabalho é algo que permeia todos os aspectos de sua existência.
particularmente importantes. Em primeiro A escolha da atividade artesanal parece se impor como uma
lugar, o trabalho torna-se o centro de toda a
vida do indivíduo [...] Em segundo lugar, o espécie de missão que se une a um desejo de transformar o
artista sente orgulho da profissão e da sua
cotidiano com sua própria mão. O trabalho artesanal pode
condição de autonomia. Finalmente, os
diferentes valores convergem para uma síntese melhorar o relacionamento entre as pessoas, favorecendo a
de relação com o trabalho e a obra produzida,
que se expressa na reputação do mestre (p. reciprocidade e o fortalecimento dos elos socioculturais. A
110). comunicação é estimulada pelo espaço em que as atividades são
desenvolvidas, permitindo a aproximação e o aumento dos
E continua: vínculos afetivos.
O aprendizado pode ser longo, a feitura do
objeto pode requerer um domínio de técnicas e Nesse sentido, o artesão é, portanto, um poeta que pensa
linguagem de materiais impossíveis de ser
adquirido por meio de um conhecimento rápido com as mãos. Se por um lado ele domina os conhecimentos
89

técnicos, por outro ele se entrega a devaneios e busca uma Passamos agora à análise do trabalho do ceramista, Gilberto
experiência nova na antiga arte de trabalhar o barro, matéria que Paim, no intuito de verificar, também, as diversas questões
ele conhece bem (BACHELARD, 1988). relacionadas aos referenciais de sua pesquisa e ao
desenvolvimento de suas peças cerâmicas.
Assim, é no fazer artesanal que o trabalho ainda parece
guardar conexões com seu sentido original, em que todos os
rituais que envolvem preparação e realização compreendem uma
3.2 Percurso criativo do ceramista Gilberto Paim
síntese entre técnica, arte e vontade (BACHELARD, 1991),
explicado pelo artesão como um anseio maior que se apossa dele. O presente subcapítulo traz o percurso criativo do
Quanto a isso, Octavio Paz comenta que “o objeto artesanal nos ceramista Gilberto Paim, com o propósito de analisar o processo
entra logo pelos sentidos, vivendo em cumplicidade conosco” de criação e produção de suas peças cerâmicas, que envolve
(PAZ, 1991, p. 50). planejamento; esboço da peça (Figura); estudo dos estilos;
conceitos, formas, texturas, cores e grafismos; e segue na
Embora revele acreditar em virtudes humanas e declare ser
confecção do artefato cerâmico de forma artesanal.
construtor de uma vida com sentido, mais gratificante e menos
sofredora, o artesão trabalha para obtenção do proveito O objetivo é a possibilidade de considerá-lo inserido no

econômico para a sobrevivência. O que o diferencia dos outros fazer artesanal contemporâneo, assim como se tentou inserir no

trabalhadores é o fato de atuar em relações sociais afetivas e design o trabalho do artesão exposto anteriormente – dois

afirmar ter preocupações com a comunidade, o território e o contextos distintos e distantes que se unem pelo interesse

meio ambiente; buscando a sobrevivência e a inserção produtiva comum nas possibilidades de criação e produção oferecidas pela
mais solidária, mesmo que trabalhe só (HABERMAS, 1973). cerâmica. Esses contextos são analisados com a finalidade de
90

pensar as cisões estabelecidas entre o artesanato e o design,


formadas por um pensamento tradicional, com características
positivistas, acreditando que as fronteiras entre esses campos são
cada vez mais tênues (ANTUNES, 2009).

Nesse sentido, dei início a uma série de buscas que


revelaram tanto as singularidades de cada área quanto a
contaminação mútua. Assim, utilizamos alguns textos que
descrevem o trabalho do ceramista, por exemplo, o da jornalista
e professora de História do Design na Faculdade de Campinas –
FACAMP, Ethel Leon. Alguns textos do próprio Paim sobre a
temática também são analisados, visando instigar a reflexão
teórica e prática sobre essa relação. Reflexões pertinentes ao
contemporâneo complexo no qual estamos imersos. Figura 34: Gilberto Paim. Fonte: www.casacomdesign.com.br
Acesso em: 20/11/11

Paim, além de ceramista, pesquisador e curador


independente, é doutor em Literatura Comparada pela UERJ (em Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, a 150
convênio com a École des Hautes Études en Sciences Sociales, de km da capital, foi o lugar que Paim escolheu para morar e
Paris) e autor de: “A cerâmica e a Horla (1991)”, “Beleza sob trabalhar. Junto com sua esposa, Elizabeth Fonseca, transforma a
suspeita (2000)” e artigos publicados em periódicos argila branca de porcelana – uma escolha do casal – em peças
especializados nacionais e estrangeiros.
91

cerâmicas, numa busca por equilíbrio e simplicidade. Juntos Já expuseram seus trabalhos em importantes mostras,
produzem objetos cerâmicos desde 1980. dentro e fora do Brasil 37.

Figura 36: Peças da coleção “A quatro mãos”. Disponível em:


www.gilbertoeelizabeth.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

37
Cerâmica Contemporânea, Paço das Artes, SP, 1983; Wilson & Gough,
Londres, 1990; A Cerâmica e o Horla, individual no MAM RJ, 1991; A Nova
Presença da Cerâmica, Paço Imperial, RJ, 1993; Artesãos do Brasil, Fundação
Figura 35: Uma imagem da amostra em Heidelberg, na Alemanha.
Fonte: www.casacomdesign.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011
Armando Álvares Penteado, SP, 2000; Cerâmica Brasileira, Construção de uma
Linguagem, Centro Brasileiro Britânico, SP, 2000; Mestres da Cerâmica, Espaço
Cultural dos Correios, RJ, 2001. No Rio de Janeiro e em São Paulo, suas peças
são expostas regularmente nas lojas Interni. Desde o início de 2004, os dois
ceramistas são representados pelas galerias Espasso de Nova York e Los
Angeles. Já expuseram duas vezes na galeria Marianne Heller, em Heidelberg,
considerada uma das melhores em cerâmica no mundo.
92

Seus artefatos parecem resgatar técnicas tradicionais, O casal parece não pensar na produção a partir do
caracterizados pela simplicidade das formas e exploração sensível mercado, assim, percebemos certo controle na produção e na
da superfície que aliado às novas tecnologias, parece combinar a gestão do tempo. Também parece não haver interesse na
uma experiência urbana do ceramista, adaptando objetos às produção seriada, o que, de certo modo, caminha no sentido do
necessidades dos dias atuais (LEON, 2007). ofício artesanal que os dois exercem. No entanto, preferem a
tecnologia de um forno elétrico no processo da queima das
peças, mas não dispensam as mãos no trabalho com a argila.

Figura 37: Interior do ateliê de Gilberto e Elizabeth, em Nova Friburgo. Fonte:


www.casacomdesign.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

Figura 38: Gilberto e Elizabeth analisando as fotos da coleção.


No ateliê, Paim desenvolve pesquisas técnicas e estéticas, Fonte: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011

ideias e experiências, que resultam nas mais variadas formas


cerâmicas. Sua atividade cotidiana parece partilhar de um universo em
que o trabalho garante a reprodução material, mas também
93

satisfaz o espírito, assim como para o artesão Osmar. Parece ser industriais e parecem demonstrar “a luta contra a tirania do
39
pensada e praticada como no passado, transmitindo as monótono” , num modo singular de projetar, modelar e
experiências para as gerações futuras, de acordo com o universo produzir.
paciente e meticuloso da atividade manual da cerâmica. A
imagem38 abaixo transmite essa atmosfera.

Figura 40: Piões de porcelana, Gilberto Paim, 2006. Foto: Rômulo Fialdini
Fonte: www.vitruvius.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

Figura 39: Gilberto amassando a argila branca de porcelana. Fonte: www.vimeo.com


Acesso em: 07 de outubro de 2011

Suas referências parecem conceber a cultura material de


forma mais livre. Seus objetos combinam aspectos artesanais e

39
Título do texto da Jornalista Ethel Leon, especializada em Design, docente em
38
Imagem retirada do vídeo de Nina Paim, intitulado: Gilberto Paim & Elizabeth História do Design e História do Design Brasileiro na Faculdade de Campinas –
Fonseca – Julho de 2011. Disponível em: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de FACAMP. É autora do livro Design Brasileiro Quem Fez, Quem Faz, Memória do
outubro de 2011. Design Brasileiro, 2005, Editora SENAC-SP.
94

A cerâmica de Paim parece ter mais afinidade com o


artesanato do que com o a concepção de design conhecida
atualmente. Segundo Leon (2007), ele vivem numa espécie de
ponto de contato entre os dois mundos. O do fazer manual que
segue teimosamente frente ao mundo industrializado. Repetindo
velhas formas de confecção da peça, numa espécie de reverência
aos mestres da cerâmica, independente de serem mãos de um
artesão ou de um designer.

Todos esses elementos certamente emolduraram a Figura 41: Gilberto desenhando o objeto cerâmico. Fonte: www.vimeo.com
Acesso em: 07 de outubro de 2011
produção material que conhecemos hoje. E o trabalho ou o fazer
que professa este caminho apresenta-se como um “reduto da
poesia” – o resultado são “poemas físicos”, cada vez mais
necessários na contemporaneidade. Os objetos de Paim nos
fazem reencontrar esse sentido tão distante, e ao mesmo tempo
tão próximo de nosso cotidiano (LEON, 2007).

Seguem algumas imagens do processo produtivo do fazer


artesanal de Paim:

Figura 42: Esboço da peça de Paim. Fonte: www.vimeo.com.


Acesso em: 07 de outubro de 2011
95

Figura 43: Umidificando a argila. Fonte: www.vimeo.com Figura 45: Levantando a argila no torno. Fonte: www.vimeo.com
Acesso em: 07 de outubro de 2011 Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 44: Na modelagem da argila. Fonte: www.vimeo.com Figura 46: Medindo a circunferência. Fonte: www.vimeo.com
Acesso em: 07 de outubro de 2011 Acesso em: 07 de outubro de 2011
96

Figura 47: Usando uma de suas ferramentas. Fonte: www.vimeo.com Figura 49: Objetos de cerâmica espalhados pela casa de Paim. Fonte: www.vimeo.com
Acesso em: 07 de outubro de 2011 Acesso em: 07 de outubro de 2011

Paim (2009) diz que embora os produtos industriais sejam


dominantes, os objetos artesanais continuam presentes e muitos
deles são feitos por artesãos contemporâneos, com formação
universitária em design ou não. Porém, esses artesanatos
modernos40 são percebidos com dificuldade no Brasil – razão para
nos debruçarmos sobre o tema cuja discussão parece distante,
mas surge comumente.

Figura 48: Encaixando a base da peça. Fonte: www.vimeo.com


Acesso em: 07 de outubro de 2011
40
Expressão utilizada por Paim ao se referir ao artesanato contemporâneo.
97

3.3 O fazer manual: uma questão de resistência? O fazer cerâmico artesanal dos casos analisados não se
caracteriza apenas pela fixação de uns poucos traços de
Ao contrário dos países em que o design e a arte se
identificação entre eles. Motivados pelo acesso e pelo uso, tanto
desenvolveram a partir da memória artesanal, como Itália, Japão
dos métodos projetuais quanto das disponibilidades técnicas e
e países escandinavos, essas atividades seguem caminhos
materiais, o artesão Osmar Virgílio e o ceramista Gilberto Paim
opostos no Brasil (BORGES, 2011). Na maioria das vezes, a arte
não apenas incorporaram ao seu trabalho as referências
está em condição de superioridade, seguida pelo design e por
artesanais como também, a partir dessas referências, recriaram
último o artesanato – renegado, ligado a tradições e desprovido
um modo particular de vida e trabalho. A engenhosidade
de criatividade.
presente em suas atividades conjuga domínio de técnicas,

Numa perspectiva histórica, como vimos no primeiro conhecimento da matéria prima, projeto e acima de tudo,

capítulo desta dissertação, o desenvolvimento de produtos até a resignação. Isso é um ato de resistência?

era da industrialização era caracterizado pelo fazer artesanal.


A resistência, conforme interpretação de Coelho (1997) está
Hoje, esses exemplos de produção, são alternativos e surgem
nos meios utilizados por comunidades na preservação das suas
como formas de estimular o surgimento de estruturas não
tradições e identidade. Ela ocorre no embate simbólico com a
convencionais de participação econômica, que fomentam a
cultura dominante. No caso, a luta seria contra os aspectos que
adesão de grupos e elementos ainda não absorvidos pelas
caracterizam o trabalho e suas relações e as formas de produção
correntes dominantes na geração de ocupação e renda
no mundo atual.
(MARINHO, 2006).
O trabalho e os sentidos que a ele são atribuídos na
sociedade contemporânea fazem jus a uma importante reflexão.
98

Ele continua como elemento central na vida da maioria dos [...] não só em função das condições oferecidas
no espaço de trabalho, mas fundamentalmente
indivíduos, mas na dimensão social, adquire maior amplitude, por porque o processo de formação percorrido pelo
parecer um elemento que deve contribuir para o indivíduo nas várias esferas da socialização está
tomado por valores vinculados à racionalidade
desenvolvimento não só de um grupo, mas da coletividade do equivalente: o homem é formado para
igualar-se aos outros; os espaços oferecidos
(ANTUNES, 1999). para a participação e discussão de ideias são
falsos. [...] Perde-se, então, a oportunidade
O trabalho é uma experiência social de resistência. Assim, desses espaços como possibilidades de avanço
das relações entre os homens, que sob a ótica
Cattani (1996) considera: da tecnologia, tendem a ser calculados e
mensurados segundo critérios de utilidade e
(...) as facetas essenciais do processo de lucro (p. 23).
socialização da construção identitária, das
formas de dominação e de resistência; enfim,
da dinâmica contraditória da economia de
mercado, têm sua origem nas situações laborais
Os dois casos representam os valores dos produtores com
e nas relações sociais estruturadas na atividade suas próprias visões de mundo, influenciados pelo ambiente e
produtiva (p.39).
modo de vida próprio da área cultural a que pertencem. O fazer
artesanal se apresenta, por meio de realizações, como um ritual,
Desse modo, o fazer artesanal tem encontrado meios para onde vida e trabalho se misturam e se organizam. Isto é, a vida
resistir ao achatamento da sociedade capitalista. Para alguns aparece na riqueza do ato produtivo e o trabalho incorpora um
artesãos e designers, isso se torna visível não só em seus modo de ser, estar e sentir o mundo (RAMALHO, 2010).
produtos, mas também em seu estilo de vida e trabalho, e em
suas relações sociais e de sobrevivência.

Maria Imbrizi (2005) ressalta:


99

A questão aqui defendida é a de que o fazer manual não frente à técnica e à lógica da produtividade, para não submeter-
representa mera estratégia de sobrevivência de grupos marginais se ao ritmo da máquina.
ao sistema. São esquemas de produção que transcenderam e se
mantêm vivos, paralelos ao processo de industrialização.
Matturana (2001) fala em forma de “emulação” ou de
“resiliência”41 frente ao modelo de produção econômica
dominante no mundo contemporâneo, surgindo como opção
amadurecida para o desenvolvimento local e territorial.
Entretanto, percebe-se que essas peculiaridades conquistadas
com o trabalho artesanal só são possíveis quando o artesão ou o
designer consegue ligar-se à fantasia de realizar um trabalho que
tenha expressão forte o bastante, como um ato de resistência,

41
Em ecologia, este conceito aplica-se à capacidade de um ecossistema
retornar a seu estado de equilíbrio dinâmico após sofrer alteração ou agressão.
A resiliência "é a medida da capacidade de um ecossistema absorver tensões
ambientais sem mudar seu estado ecológico, perceptivelmente, para um
estado diferente" (Zedler & Cooper, 1980). O termo, apesar de guardar uma
discussão a respeito de sua definição, vem sendo consensualmente utilizado
como a capacidade humana para enfrentar, vencer e ser fortalecido ou
transformado por experiências de adversidade. Disponível
em: www.redeambiente.org.br. Acesso em: 12 de maio de 2012.
100

CONSIDERAÇÕES FINAIS perspectiva foi empreendida com a finalidade de subsidiar a


análise do processo de investigação.

Diante do sistema econômico vigente, deparamos com uma Por isso, dois diferentes contextos de produção de cerâmica
sociedade sobrepujada pelo capital, na qual prevalece, em boa artesanal foram abordados: o primeiro, do artesão Osmar, que
medida, um pensamento que estimula os trabalhadores a mora em Cuiabá, Mato Grosso e o segundo, do ceramista Paim,
deixarem de ver o trabalho como uma parte prazerosa da vida, de Nova Friburgo, Rio de Janeiro.
encarando-o somente como meio de sobrevivência e acumulação
Como parte do método de investigação, foi realizado
de riquezas.
levantamento das condições da produção e do fazer artesanal,
Por outro lado, contrapondo as imposições do mundo do em visitas aos locais de produção e venda dos produtos
trabalho, observamos a possibilidade de realização humana pelo artesanais.
fazer (trabalho) artesanal, como forma de resistência a esse
O resgate das atividades artesanais apresenta uma
sistema, recorrendo a processos de criação/produção de
estrutura bem-sucedida, que renova processos laborais do
artefatos e refletindo no modo de vida e trabalho objetivados
passado e contribui para infinitas possibilidades de ser e estar no
neste fazer.
mundo, sobretudo quando tece sua análise sobre o fazer
Nesse sentido, a presente investigação percorreu trajetórias artesanal como forma de resistência. Por isso, é importante que
articuladas no campo teórico e empírico sobre o sentido do esses grupos produtivos se destaquem, na contemporaneidade,

trabalho artesanal na contemporaneidade. A sistematização do quando crenças e valores são (re)discutidos, para romperem com
referencial teórico e a consulta a autores fundamentados nessa as certezas que vigoraram na sociedade.
101

O modo de produção artesanal compõe uma estrutura da cultura industrial e seus referenciais mercadológicos são
econômica muito particular dentro do sistema que impera na isolados do conhecimento dos processos da cultura artesanal.
sociedade atual, funcionando como um dispositivo social
Desse modo, é na análise dos aspectos que caracterizam
diferenciado e essencial para a vida humana.
as relações e as formas de produção que encontramos meios de
Nessa perspectiva, há que perceber melhor qual o lugar da denunciar como as possibilidades de diferenciação do indivíduo
produção artesanal e qual o papel do design na vêm sendo logradas pela racionalidade tecnológica, o que aponta
contemporaneidade, pois é importante pontuar que o trabalho para a linha de pensamento de Certeau (1994) que entende que o
artesanal participa do processo de pertencimento de homem não é sujeito passivo à ordem dominante e resiste a ela,
determinado grupo social e também mantém os saberes e fazeres reinventando o seu cotidiano à sua maneira e segundo seus fins.
locais, fortalecendo elos culturais e sociais.
Assim, a reflexão sobre fazeres que guardam alguma
O design não existe se não houver a criação e a tecnologia. forma de resistência às imposições sociais de dominação,
Evidentemente estas questões são permeadas pela ação como o artesanato, em especial o artesanato cerâmico, em
projetual. Uma das implicações da criação é a produção de algo, contraposição às tendências que os tornam cada vez mais
um objeto, seja ele material ou imaterial. Esse objeto só toma estreitos e subvertidos aos valores da indústria – a
corpo, é materializado, torna-se realidade por meio da produção. produtividade e o lucro –, constitui-se como um importante
A produção só se realiza por meio do fazer (trabalho) e da momento do conhecimento e da intervenção do campo do
tecnologia. design.

Neste sentido, cabe a nós designers conhecer e levantar No entanto, talvez o que se deva ainda considerar como
discussões culturais locais. Pois hoje, as condições de produção possível resistência no fazer artesanal seja o fato de que os
102

artesãos insistem nesse ofício, mesmo sofrendo os efeitos de


expropriação e desumanização do mundo do trabalho, em
concorrência direta com produtos industriais. Ou melhor,
resistem nessa forma de trabalho, que ao menos mantém
vestígios de humanidade.
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