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1. CONSIDERAÇÕES PREAMBULARES
O presente estudo tem como escopo o tratamento dos contratos
atípicos ou inominados e sua disciplina no Código Civil de 2002.
Referido trabalho atentará para as normas gerais a que faz alusão tal
dispositivo, mais precisamente para alguns dos princípios gerais em matéria
contratual que visam a coibir os excessos de liberdade das partes contratantes,
que muitas vezes conduzem ao desequilíbrio das avenças e ao enriquecimento
de uma das partes do contrato.
Entretanto, como bem ressalta o ilustre Prof. Álvaro Villaça (op. cit., p.
138), a combinação em um, de dois ou mais contratos completos, "em que
circunstâncias sejam, não possibilita a consideração de cada avença como
típica, isso porque as prestações desses contratos mesclam-se em um todo,
sem possibilidade de separação. Todas as obrigações assumidas formam um
só contrato, misto, ensejando sua rescisão, por exemplo, o descumprimento
culposo de qualquer delas".
a lei necessita fixar moldes gerais para os contratos atípicos, a fim de que
a liberdade privada não vá além de seus limites.
Tem ele como tímida a disciplina dos contratos atípicos no art. 425 do
Código Civil de 2002, que, como mencionado, dispõe que "é lícito às partes
formular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste
Código".
E de fato lhe assiste razão. Todavia, resta claro que outra não pode ser
a interpretação do dispositivo senão a de que se aplicam aos contratos atípicos
os princípios gerais de direito contratual, entre os quais os inovadores
princípios da vedação à onerosidade excessiva, o da boa-fé objetiva e o da
função social do contrato, estes últimos, como se mencionará a seguir,
verdadeiras cláusulas gerais (7). Sem se olvidar, evidentemente, que as
contratações atípicas são válidas, ante o princípio da autonomia da vontade,
desde que não contrariem a lei, a ordem pública, os bons costumes e os
princípios gerais de direito.
Ocorre que, com o passar dos anos, a teoria da imprevisão acabou por
ser deixada de lado, em virtude das correntes individualistas que emergiram,
que a consideravam uma afronta ao princípio da obrigatoriedade dos contratos
(pacta sunt servanda).
A primeira palavra francamente favorável à tese, entre nós, foi de Jair Lins,
como desenvolvimento da teoria da vontade do negócio jurídico. Mas, em
princípio, a resistência de nossos tribunais foi total. Em 1930, veio a lume
famoso julgado de Nélson Hungria, abrindo a porta do pretório às novas
tendências do pensamento jurídico. E, depois deste, diversos outros surgiram,
ora admitindo em casos especiais a sua aplicação, ora aceitando-a em linhas
estruturais generalizadas.
Resta a esperança de que, já nos primeiros anos de vigência do
Código Civil atual, tal resistência deixe de existir de uma vez por todas, visto
que os arts. 478 a 480 do referido diploma consignam expressamente o
princípio da vedação à onerosidade excessiva, determinando que se resolva o
ajuste ou diminuam-se as prestações naqueles contratos em que eventos
supervenientes acarretem ônus excessivo para um dos contratantes.
4. CONCLUSÃO
Os contratos atípicos surgiram em razão da proliferação das
modalidades de negócios na sociedade moderna, decorrendo diretamente da
autonomia da vontade privada, em razão da qual às partes é conferida ampla
liberdade de regulamentação de suas avenças.
NOTAS
1. A Comissão Elaboradora do Projeto de Código Civil de 1975, projeto que deu
origem ao ora vigente Código Civil de 2002, tinha como diretriz a unificação do
direito obrigacional num único diploma legislativo. E assim o fez, disciplinando,
dentro do Livro I da Parte Especial (Livro das Obrigações), alguns contratos
tipicamente empresariais, e dedicando livro próprio para o chamado Direito de
Empresa, que contém regras de direito societário e do exercício da atividade
empresarial.
2. AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral dos contratos típicos e atípicos. São
Paulo: Atlas, 2002. p. 132.
3. Francesco Messineo classifica os contratos atípicos da seguinte
forma: contratos inominados em sentido estrito ou puros: (a) com conteúdo
completamente estranho aos tipos legais (por exemplo, contrato de garantia);
(b) com, somente, alguns elementos estranhos aos legais, enquanto outros,
com função prevalente, são legais (por exemplo, contrato de bolsa
simples); contratos inominados mistos: (c) com elementos todos conhecidos
(elementos legais), dispostos em combinações distintas (tomada mais de uma
das figuras contratuais nominadas), elementos que podem estar entre si em
relações de coordenação ou subordinação. Essa categoria é a mais numerosa,
integrada por contratos unitários. A causa do contrato misto é, igualmente,
mista, e advém de uma ou mais causas heterogêneas entre si. AZEVEDO, op.
cit., p. 135.
4. Idem, ibidem, p. 136.
5. GOMES, Orlando. Contratos. 17.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 103.
6. Nesse sentido, o Prof. Villaça acabou por formular um "Esboço de Anteprojeto
de Lei para regulamentação geral dos contratos atípicos", em que elenca
normas de caráter geral que visam a coibir os excessos de liberdade nocivos
ao equilíbrio econômico dos contratantes nos contratos atípicos.
7. O Prof. Álvaro Villaça Azevedo, reconhecendo a necessidade de aplicação aos
contratos atípicos das três inovações em matéria contratual, trazidas pela
teoria geral dos contratos do Código Civil de 2002 - todas analisadas no item 3
trabalho -, a elas faz alusão no art. 4º de seu "Esboço de Anteprojeto de Lei
para regulamentação geral dos contratos atípicos", cuja redação é a seguinte:
Art. 4º. "As partes devem utilizar-se do contrato atípico, segundo sua função
social, observando os princípios da boa-fé objetiva, desde o momento anterior
à formação do contrato até o posterior a sua extinção; o princípio da igualdade
entre as partes contratantes, e, principalmente, o da onerosidade excessiva
para que não exista enriquecimento injusto ou indevido". AZEVEDO, op. cit., p.
195.
8. WAYAR, Ernesto. in Derecho Civil - Obligaciones. Tomo I, p. 19. apud
MARTINS-COSTA, Judith. O Direito Privado como um "sistema em
construção": as cláusulas gerais no Projeto do Código Civil brasileiro. Jus
Navegandi, Teresina, abr. 2001. Disponível em
<http://www.1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=513> Acesso em: 07 jun. 2004.
9. MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica
no processo obrigacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 335.
10. BRASIL. Parecer Final do Relator ao Projeto do Código Civil. Senado Federal.
Brasília, DF, 8 dez. 1999. Disponível em <http://www.senado.gov.br/pareceres
leis/leis asp?Id=LEI%209887>. Acesso em: 22 mai. 2004.
11. REALE, Miguel. Visão Geral do Novo Código Civil. Jus Navegandi, Teresina,
abr. 2002. Disponível em:
<http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=2718>. Acesso em: 15 jun.
2004.
12. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 10.ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1995. p. 98.
13. A cláusula rebus sic stantibus entrou no direito moderno como teoria da
imprevisão (bastante difundida no Brasil por Arnoldo Medeiros da Fonseca),
teoria da base do negócio jurídico (Karl Larenz), e teoria da superveniência
(Osti). PEREIRA, op. cit., p. 99.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de Direito Civil: teoria geral das
obrigações. 9.ª ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.