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Códice Costa Matoso

Coleção das notícias dos primeiros


descobrimentos das minas na América que
fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo
ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que
tomou posse em fevereiro de, 1749,
&
vários papéis

A FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO


G n w e r n o etc M i n a s G e r a iK
3

MI3£ETRIANA
Série Obras de Referência

Códice Costa Matoso

Coleção das notícias dos primeiros


descobrimentos das minas na América que
fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo
ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que
tomou posse em fevereiro de 1749,
&
vários papéis

Coordenação Geral
L u c i a n o R a p o s o de A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos

Financiamento
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais

Apoio cultural
Biblioteca Mário de Andrade - São Paulo (SP)
Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais
Governador
ITAMAR FRANCO

Secretário d ç Estado do Planejamento e C o o r d e n a ç ã o GeraJ


ALUÍSIO EUSTÁQUIO DE FREITAS MARQUES

Presidente d a F u n d a ç ã o J o ã o Pinheiro
J O Ã O BATISTA R E Z E N D E

D i r e t o r do C e n t r o d e Estudos Históricos e Culturais


CARLOS RODRIGUES

Parle integrante d o projeto Códice Cosia Matoso, d a F u n d a ç â o j o ã o Pinheiro, esta


o b r a , editada n a atual gestão, teve início e foi desenvolvida n a gestão anterior: presi-
dente - R o b e r t o Borges Martins; diretora do C e n t r o de Estudos Históricos e Cultu-
rais - Elconora S a n t a Rosa.

Códice Gosta Matoso. Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das minas na
América quê fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvi dor-geral das do
Ouro Prelo, cie que tomou posse cm fevereiro de 1749, & vários papéis.. - Belo Hori-
zonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1999.
2v. : il. - (Coleção Mineiriana, Série Obras de Referencia).
Coordenação geral Luciano Raposo de Almeida Figueiredo e Maria Verônica Cam-
pos, estudo crítico Luciano Raposo cie Almeida Figueiredo.
Inclui índices.
ISBN- 85-85930-28-4-2v.

I . Brasil - História - "1500/1822".


II. Minas Gerais - História - " 1500/1822".

CDU 981.51 "1500/1822"


5

A Francisco Iglesias, um dos idealizadores da Coleção Mindriana.


7

IANA
Série Obras de Referência

Códice Costa Matoso

Coleção das notícias dos primeiros


descobrimentos das minas na América que
fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo
ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que
tomou posse em fevereiro de 1749,
&
vanos papeis

Volume 1

Coordenação geral
L u c i a n o R a p o s o de Almeida Figueiredo
M a r i a Verônica G a m p o s

Estudo crítico
L u c i a n o R a p o s o cie A l m e i d a Figueiredo

Sistema Estadual de Planejamento


F u n d a ç ã o J o ã o Pinheiro
C e n t r o de Estudos Históricos e Culturais
9

Coordenação Editorial
Eleonora S a n t a R o s a
Maria Verônica Campos

Editores
E m a n u e l Araújo
L u c i a n o R a p o s o d e A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos

Projeto gráfico e diagramação eletrônica


Sérgio Luz
Carlos W c y n e F. C o s t a

Capa e arte
W a g n e r Bottaro

Revisão
Afonso Celso G o m e s

Fotografia
Guilherme Maranhão
IANA
Série Obras de Referência

CONSELHO EDITORIAL
Afíonso Avila, Afíbnso R o m a n o de S.ant'Ana, A m í l c a r V i a n n a M a r t i n s F i l h o ,
Angela Gutierrez, A n t ô n i o Octávio C i n t r a , Aluísio P i m e n t a , A n g e l o O s w a l d o d e
Araújo S a n t o s , B e r n a r d o M a t a M a c h a d o , C e l i n a A l b a n o , G y r o S i q u e i r a , Glého
C a m p o l i n a Diniz,. D o u g l a s C o l e L i b b y , F á b i o L u c a s , F á b i o W a n d e r l e y R e i s ,
Fernando Correia Dias, G e r s o n de Britto Mello Boson, G u y de .Almeida,
H i n d e m b u r g o C h a t e a u b r i a n d Pereira Diniz, Isaías Golghcr, J a r b a s M e d e i r o s , J o ã o
A n t ô n i o d e P a u l a , J o s é A p a r e c i d o de Oliveira, J o s é B e n t o T e i x e i r a de Salles, J o s é
E r n e s t o Ballstaedt, J o s é Israel V a r g a s , J o s é M u r i l o d e C a r v a l h o , J ú l i o B a r b o s a ,
Lucília de A l m e i d a N e v e s D e l g a d o , Luis Aureliano G a m a A n d r a d e , M a r i a Efigênia
Lage d e R e s e n d e , M a r i a A n t o n i e t a Antunes. C u n h a , M i g u e l A u g u s t o Gonçalves
S o u z a , N o r m a de G ó e s M o n t e i r o , O t á v i o Soares D u l c i , O r l a n d o M . C a r v a l h o ,
P a u l o T a r s o Flecha de Lima, P a u l o R o b e r t o H a d d a d , P a u l o de T a r s o A l m e i d a
Paiva, Pio Soares C a n e d o , R o b e r t o Borges M a r t i n s , R o b e r t o B r a n t , R u i M o u r ã o ,
V e r a Alice C a r d o s o , Vivaldi M o r e i r a , W a l t e r M o r e i r a Salles.
11

Equipe técnica

Supervisão geral
Eleonora Santa Rosa

Projeto original
L u c i a n o R a p o s o cie A l m e i d a Figueiredo

Coordenação geral
Luciano R a p q s o de A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos

Estudo crítico
L u c i a n o R a p o s o de A l m e i d a Figueiredo

Fixação de normas e critérios editoriais


E m a n u e l Araújo

Fixação do texto final


Maria Verônica Campos

.Notas introdutórias aos documentos


L u c i a n o R a p o s o d e A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos
J o a c i Pereira F u r t a d o (aspectos discursivos)
Yêclda Dias L i m a (comentário paleográfico)

Notas de. rodapé


E m a n u e l Araújo
Maria Verônica Campos

Biografias
Iris K a n t o r

Glossário
Seleção de termos
E m a n u e l Araújo
L u c i a n o R a p o s o d e A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos
Redação dos verbetes
B r u n o Flávio L o n t r a Fagundes
L e a n d r o d e Araújo N u n e s
M a r i a do C a r m o A n d r a d e G o m e s
Maria Verônica C a m p o s
12

Modernização e atualização dos topónimos


M a r i a do C a r m o A n d r a d e G o m e s

Transcrição pakográjica
E d i l a n e M a r i a de A l m e i d a C a r n e i r o (coordenação)
M a r t a Eloísa M e l g a ç o Neves (coordenação)
Y ê d d a Dias L i m a (consultoria)
Carla Simone C h a m o n
M a r c o Antônio Marinho Vale Júnior
R o s a n a de Figueiredo Angelo

Modernização
B r u n o Flávio L o n t r a F a g u n d e s (coordenação)
E m a n u e l Araújo, (consultoria)
Edilane M a r i a de A l m e i d a C a r n e i r o

Trancrição pakográjica e modernização do espanhol


L e a n d r o de Araújo N u n e s

Transcrição pakográjica, modernização e tradução do latim


A n d r é D o m i n g o s dos Santos Alonso

Colação junto ao original na Biblioteca Mário de. Andrade/SP


Pnwieira colação
B r u n o Flávio L o n t r a Fagundes
Edilane M a r i a de Almeida C a r n e i r o
Maria Verônica Campos
Colaçãofinal
Maria Verônica Campos

Pesquisa
Minas Gerais
M a r i a V e r ô n i c a C a m p o s (coordenação)
M a r i a do C a r m o A n d r a d e G o m e s
M a r i a Elisa d e C a m p o s Souza
R a m o n F e r n a n d e s Grossi
L e a n d r o de Araújo N u n e s
V e r ô n i c a de Araújo N u n e s
G u s t a v o C a m p o s Vieira
Nívia T i r o n i Pinto
13

Rio de Janeiro
L u c i a n o R a p o s o de A l m e i d a Figueiredo (coordenação)
Gristine Abdalla
Flávia M a r i a dê C a r v a l h o
Gláucia T o m a s d e A q u i n o Pessoa
Juliana Bezerra de Menezes
Lúcia G a r c i a
Salvador
M a r i a do C a r m o A n d r a d e G o m e s
.São Paulo
Iris K a n t o r
Londres
L u c i a n o R a p o s o de Almeida Figueiredo
Portugal
Iris.Kantor
L u c i a n o R a p o s o de A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos

índices1

H e l e n a S c h i r m (coordenação)
índice antroponímico
L e a n d r o dc Araújo N u n e s
M a r i a do C a r m o Andrade. G o m e s
Maria Verônica Campos
Aline Costa de Q u e i r ó s (revisão)
índice toponímico
M a r i a do C a r m o A n d r a d e G o m e s
Aline C o s t a de Q u e i r ó s (revisão)
índice de assuntos
Helena Schirm
J o a c i Pereira F u r t a d o (aspectos discursivos)
M a r i a do C a r m o A n d r a d e G o m e s
Maria Verônica Campos

Normalização
Helena Schirm
14

Equipe de apoio

Digitação
Elen J a c q u e l i n e M o u r ã o Parreiras
J e s u s C o e l h o d a Silva N e t o

Apoio administrativo
L a u r o J o s é dos S a n t o s Teixeira
L u z i a Oliva Barros
Roseli d e A g u i a r

Banco de dados
L u d m i l a Azalim R o d r i g u e s d a Costa
15

Apresentação
A F u n d a ç ã o J o ã o Pinheiro (FJP), p o r i n t e r m é d i o do seu C e n t r o d e Estudos H i s -
tóricos e Culturais ( C E H C ) , t e m a satisfação de trazer a público o Códice Costa Matoso,
mais u m v o l u m e da C o l e ç ã o M i n e i r i a n a - S é r i e O b r a s d e R e f e r ê n c i a , p a r t e
integrante do seu projeto d e divulgação d e textos i m p o r t a n t e s p a r a a cultura e a
história de M i n a s Gerais.
O trabalho foi financiado pelo Ministério da C u l t u r a - P R O N A C e pela F a p e m i g
e m sua e t a p a de pesquisa, transcrição e m o d e r n i z a ç ã o . R e c e b e m o s , t a m b é m , o apoio
da Biblioteca M á r i o d e A n d r a d e , de São Paulo, e d a Assembléia Legislativa d o Esta-
do de M i n a s Gerais. N o processo de p r e p a r a ç ã o editorial e impressão c o n t a m o s , mais
u m a vez, c o m o auxílio financeiro d a . F a p e m i g .
O Códice Costa Matoso constitui-se de ] 39 d o c u m e n t o s manuscritos, 5 impressos e
1 registro cartográfico, todos reunidos pelo ouvidor C a e t a n o d a Costa M a t o s o , a
m a i o r p a r t e deles c o m p i l a d a entre 1 749 e 1752, p e r í o d o em q u e o c u p o u a O u v i d o r i a
d e O u r o P r e t o . Pode-se afirmar q u e sua a b r a n g ê n c i a geográfica c o n t e m p l a quase a
totalidade do território americano sob domínio português e m m e a d o s do século X V I I I ,
c o m dados sobre a Golônia do S a c r a m e n t o , o rio M a d e i r a , as T e r r a s N o v a s , os bispa-
dos do M a r a n h ã o e G r ã o - P a r á e a capitania de M i n a s Gerais, região esta p r e d o m i -
n a n t e n a d o c u m e n t a ç ã o coletada.
A impressão desta coletânea confere à. C o l e ç ã o M i n e i r i a n a mais u m a dimen-
são. Além de d a r continuidade ao objetivo de divulgar manuscritos inéditos e p o u c o
acessíveis aos pesquisadores, o tratamento editorial e a pesquisa q u e subsidiou a p u -
blicação tornar-se-ão parâmetros p a r a trabalhos congéneres: os índices, o glossário, as
biografias e as notas introdutórias aos documentos facilitam a leitura e orientam novas
p e s q u i s a s ; os critérios editoriais adotados^ a i m p o r t â n c i a c o n f e r i d a a aspectos
paleográficos, ortográficos, semânticos e discursivos contribuem decisivamente p a r a o
avanço d a edição de documentos históricos no país; o estudo crítico, de autoria do
prof. Luciano R a p o s o de Almeida Figueiredo, esclarece a trajetória do manuscrito e
do seu x:ompilador, b e m como o ambiente intelectual de sua época. Registre-se, ain-
da, q u e o projeto contou c o m especialistas r e n o m a d o s nas suas diversas áreas d e
atuação e pesquisadores da Fundação J o ã o Pinheiro, s o m a de esforços decisiva p a r a o
sucesso do empreendimento e p a r a a qualidade da edição.
Para além da importância das fontes reunidas nesta obra e de sua contribuição
p a r a b estabelecimento de parâmetros e metodologias de edição de documentos his-
tóricos, o C E H C / F J P acredita estar consolidando seu papel de centro catalisador,
p r o m o t o r e divulgador de pesquisas e de órgão realmente voltado p a r a a implantação
de políticas de preservação do patrimônio: cultural no Estado de M i n a s Gerais, ao
contribuir p a r a a maior longevidade de u m manuscrito ímpar p a r a a historiografia.

J O Ã O BATISTA REZENDE
Presidente da F u n d a ç ã o j õ ã o Pinheiro
16

Agradecimentos

R e c e b e m o s o apoio e a c o l a b o r a ç ã o de i n ú m e r a s pessoas e instituições. Algumas


nos a c o m p a n h a r a m ao longo de. diversos m o m e n t o s d a pesquisa, disponibilizando
recursos, sem os quais a finalização desta o b r a n ã o teria sido possível. A estes parcei-
ros a g r a d e c e m o s d e f o r m a especial:

Biblioteca Municipal Mário de Andrade


J o s é E d u a r d o Soares d e C a s t r o
Rizio B r u n o S a n t ' A n a
Muriel Scott

Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais


Centro de Atendimento ao Cidadão
R i n a l d o de M o u r a Faria
G e r a l d o Vitorino Freitas

Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa/MG


Seção de- Obras Raras
M a r i a d a Consolação Ferreira N u n e s
Geraldo. Cleto dc M i r a n d a
Gerson Alves d e Oliveira

Biblioteca José E..Mindlin.


J o s é E. Mindlin
Guita Mindlin
Cristina Antunes

Prodemge
Pedro Bueno

Instituto Camões - Lisboa


Cátedra Jaime Cortesão (IEA/USP - São Paulo)
J o s é J o b s o n d e A. A r r u d a N a s c i m e n t o

Upper Informática
17

A g r a d e c e m o s , a i n d a p e l a disponibilidade e c o l a b o r a ç ã o , às seguintes pesso-


}

as e instituições:

Alcir Pècora
Alexandre Silva Habib'
Ana Amélia Vieira Nascimento
Antonieta de Aguiar Nunes
Beatriz Ríçardiua de Magalhães
Bráulio CaSalarde
Caio César. Boschi
Carlos Magno Guimarães
Carmem Moreno
Carmêm Silvia Lemos
Diogo Ramada Curto
Eduardo França Paiva
Ernst Pijiiing
Evaldo Cabral de Mello
Francisco Betheiicourt
Friedrich E. Renger
Geraldo Mártires Coelho
Hélcio Vianna Barbosa
Helen Osório,
Helvécio Jesus de Resende Chaves
Ida Lewkowicz
Janete Grynberg
• Jairo Braga Machado
João Adolfo Hansen
João Medina
Joaquim Marçal Ferreira de Andrade
Joe Maldonado
Jose Gliitas
José Eduardo de Resende Chaves
José Sebastião Witter
José Tengarrinha
Júnia Ferreira Furtado
Laura de Mello e Souza
Lúcia Aparecida Soares
Luis Carlos Villalta
Márcia Moisés Ribeiro
Marcos Magalhães de Aguiar
Maria Carmem Lisita
Maria de Fátima Loureiro
Maria de Lourdes Henrique
Maria Helena Miranda
Maria José Elias
Maria Lúcia Perrone Passos
Maria Marlene de Souza
Maria Raimunda Araújo
Miracy Gustin
Monsenhor Flávio Carneiro Rodrigues
Norman Fiering
Odilon Nogueira de Matos
Paulo Bertran
Pedro Tóriima
Rita Tolentino
Roberto Kazuo Yokota
Ruth Villamarm Soares
SuelyPerucci
Sátiro Ferreira Nunes
Susan Danfórth
Tânia Porto Guimarães Veloso
Teresa Saraiva
Tiago Costa Pinto dos Reis Miranda
Wilma C. Teixeira Dias

Arquivo da Universidade de Coimbra


Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana
Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Mariana - UFOP
Arquivo Histórico do Estado de Goiás
Arquivo Histórico do Itamarati
Arquivo Histórico dq Museu <la Inconfidência - Casa.Setecentista de Mariana
uivo Histórico do Museu da Inconfidência — Casa Setecentista do Pilar de Ouro
Arquivo Histórico do Museu do Ourp - Casa Borba Gato
Arquivo Histórico Ultramarino
Arquivo Muncipal de Ouro Preto
Arquivo Municipal de São Paulo
Arquivo Nacional do Río de Janeiro
Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Arquivo Público, do Estado cia Bahia
Arquivo Público do Estado do Maranhão
Arquivo Público do Pará
Arquivo Público Mineiro
Biblioteca da Ajuda
Biblioteca da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Pauio
Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra
Biblioteca Municipal Batista Caetano
Biblioteca Nacional de Lisboa
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
Biblioteca Publica de Évora
British Museum
Brown University
CEMIG —Divisão de Documentação
Centro de Apoio à Pesquisa Sérgio Buarque de Holanda - USP
Centro de Estudos do Ciclo cio Ouro - ESAF
Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro
Instituto dc Estudos Brasileiros - USP
Instituto de Geocièncias Aplicadas
Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico' de Minas Gerais
Instituto Histórico e Geográfico Brasüeiro
Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais
Museu Paulista - USP
Museu Regional de São João del-Rei
Procuradoria Geral do Estado de Minas Gerais - Diretoria de Microfilmagem
The John Cárter Brown Library
19

Sumário

Apresentação • ^

Agradecimentos • 16

Lista de abreviaturas..... • 27

Critérios de normalização editorial - 29


Emanuel Araújo

Explicação sobre as notas introdutórias aos documentos .....35


Luciano Raposo de Almeida Figueiredo
Maria Verônica Campos

Estudo critico — Rapsódia para um bacharel • 37


Luciano Raposo de Almeida Figueiredo
Agradecimentos t ' ^8
1 "A mais fina das papas..." 39
2 De Setúbal a Vila Rica: aventura e travessia.,..,..... „,....,.....-.... 72
3 O ouvidor instruído • 131

Códice Costa Matoso. Coleção das notícias dos primeiros descobri-


mentos das minas na América que fez o doutor Caetano da Costa
Matoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que tomou posse
e m fevereiro de .1749, & vários papéis ., 155
1 Tabuada das latitudes dos principais portos, cabos e ilhas do mar do
sul na América austral e portuguesa pelos padres Diogo Soares e
Domingos Capaci, matemáticos régios no Estado do Brasil... 1.59
2 Noticias dos, primeiros descobridores das primeiras minas do ouro
pertencentes a estas Minas Gerais^ pessoas mais assinaladas nestes
empregos e dos mais memoráveis casos acontecidos desde os seus
princípios , ; 166
3 Relação tio princípio descoberto destas Minas Gerais e. os sucessos de
algumas coisas mais memoráveis que sucederam de seu princípio até
o tempo que as veio governar "o Excelentíssimo Senhor dom Brás da
Silveira , , < ; 194
4 [Relação de um morador de Mariana c de algumas coisas mais
memoráveis sucedidas] ; .203
5 [Dou parle do que vi e sei] £ -,, 210
6 [Noticias do que ouvi sobre ò princípio destas Minas] 216
7 Relação de algumas antiguidades das Minas. - > 219
20

8 [História do distrito do Rio das Mortes, sua descrição, descobrimento


das suas minas, casos nele acontecidos entre paulistas e emboabas e
ereção das suas vilas] 227
9 [Notícias do descobrimento das minas de ouro e dos governos políticos
nelas havidos] .-. ......¡ 243
10 [Informação das antiguidades da Cidade Mariana] 248
11 [Informação das antiguidades da freguesia de Guarapiranga] , ,...255
12 [Informação das antiguidades da freguesia cie Catas Altas] 261
13 [Informação das antiguidades da freguesia de Antonio Pereira] ... 268
14 História do distrito do Rio das Mortes, sua descrição, descobrimento
das suas minas^ casos nele acontecidos entre paulistas e emboabas e
ereção das suas vilas » .........................270
15 [Notícia de Manuel Nunes Viana] , ..,...,..294
16 Regimento ou instrução que trouxe Martinho de Mendonça de Piná
e de Proença * -. .......295
17 Regimento da capitação ; ..300
18 [Regimento original do superintendente, guardas-mores e mais oficiais
deputados para as minas de ouro que há nos sertões do Estado do
Brasil] , , 311
19 Carta de Sua Majestade « 324
20 Segunda carta de Sua Majestade , , -325
21 Terceira carta de Sua Majestade 327
22 Quarta carta de Sua Majestade , 328
23 Regimento dos ouviclores-gerais do Rio de Janeiro ..........................330
24 [Provisão do oficio He juiz da Coroa aos ouvidores-gerais] , 336
25 [Resolução para os ouvidores tirarem segundas devassas nos casos de
crime de morte] , .............................................................................338
26 [Resolução sobre procedimentos da ouvidoria no caso de recursos à
Relação da Bahia] . .....339
27 Regimento dos ouvidores de São Paulo 341
28 [Carta régia ao governador e capitâo-gen.eral de São Paulo e Minas
do Ouro sobre expulsão de. clérigos cias Minas] , ...................,...,-,..346.
29 [Carta régia ao governador e.capitão-general tia capitania do Rio de
Janeiro para, juntamente com o ouvidor-geral, examinar as certidões
de serviços] .-- 348
30 [Certidão de ordem régia proibindo õ provimento de cargos por quem
não tinha poder para os prover] 350
31 [Coleção abreviada da legislação e das autoridades de Minas Gerais] ..............352
.32 Cópia do que o povo das Minas, amotinado, pediu ao senhor general
dom Pedro de Almeida Portugal, conde de Assumar * 370
.33 [Inscrição enigmática formada em quatro regras para argumento de
serem também os sinas povoadores da América] ,,, „...., 374
34 Interpretação que deu b padre José Mascarenhas, lente de prima no
colégio cio Rio dc Janeiro, às letras cie eme se trata > 378
35 [Certidão de provisão a Manuel de Fonseca, secretário de governo,
de aposentadoria de 40 mil réis e. de outros 40 mil réis para papel e
tinta] 382
36 [Carta régia ao provedor .da Fazenda Real de Minas Gerais mandando
erigir na qualidade de vigararias vinte igrejas] : 384
21

37 [Ordem régia ao governador e capitão-general de Minas autorizando


que as câmaras da comaixa do Rio das Velhas destinassem ajuda de
custo a seus procuradores] 387
38 [Cópia de ordem régia ao governador e capitão-general de Minas
reiterando ordem de expulsão dos clérigos sem licença e frades e reco-
mendando que o bispo arbitrasse o número de clérigos necessários] 389
39 [Cópia de ordem régia ao governador e capitão-general de Minas
ordenando que avisasse aos ouvidores para prenderem clérigos, e frades
que estivessem na capitania sem licença] ..^ , 391
40 [Ordem régia para. o governador e capitão-general de Minas para
que se observasse na capitania o regimento dos carcereiros] - 392
41 [Gcrridão de Ordem régia proibindo o provimento de cargos por quem
não tivesse poder para os prover] - ; 394
42 [Ordem régia áo governador c capitão general do Rio de Janeiro
ordenando que se mantivesse o estilo de informarem os requerimentos
das partes pelos ouvidores- gerais] 396
43 [Cópia de ordem régia ao' governador & capitão-general do Rio de
Janeiro ordenando que informasse sobre a saída de clérigos das Minas
c a situação dos que neías assistiam] , • 398
44 Mapa tio ouro que tem entrado nas. casas de; Fundição e Moeda de
Vila Rica das Minas, desde 26 de agosto de 1724, dia em que princi-
piou o seu lavor a Gasa da Moeda, e a de Fundição em o primeiro de
fevereiro de [725, até o fim de. [utcompleío]' e dos rendimentos que
f

pertencem .â Fazenda Real: da senhoriagem e braçagem, quinto e


gastos que pagam as partes nas fundições dos seus ouros; ê das remes-
sas que se têm feito em todas as frotas para Lisboa e também do que
têm rendido de quinto as duas novas casas de fundição das comarcas
do Rio das Velhas e Rio das Mortes 400
45 Mapa de todo o ouro què entrou nas casas de Fundição e Moeda de
Vila Rica das Minas, desde 26 de agosto de 1724> dia em que princi-
piou o seu lavor a Casa da Moeda, e a de Fundição em o 1 de feverei-
5

ro de 1 725. era que teve princípio a cobrança do quinto; rendimento


dele e de tudo o mais pertencente à Fazenda Real; remessas que se
fizeram para Lisboa; e também do rendimento do quinto das duas
casas de fundição que se estabeleceram nas comarcas do Rio das Mortes
e Rio das Vellias, que tiveram princípio, a primeira, em 2 de julho de
1734 e, a segunda» em 12 do dito mês è ano, tudo por anos, como
abaixo se mostra ......403
46 Mapa dos negros que se capitaram desde que principiou a capitação
em cada uma das comarcas ,.,„........,.... .406
47 Ouro que tem rendido a capitação neste governa das Minas Gerais,
do primeiro de julho do ano de 1735 até o último de dezembro do
ano de 1749 ,• ; 414
48 Relação do rendimento que teve a Fazenda Real das Minas Gerais,.o
ano de 1749 , 416
49 Despesa que fez esta Provedoria das Minas Gerais em todo o ano de
"1749 , í ; s 418
Mapa do ouro que se remete ã el-rei,.nosso senhor,, pelo seu Conselho
Ultramarino, desta Provedoria da Fazenda Real das Minas Gerais, em
16 de março de 17.50, por ir na presente frota do Rio de
Janeiro do dito ano
[Papel acerea dos danos da capitação e de proposta de arrecadação
do real quinto do ouro por contrato] ,
[Cópia de carta dirigida a Gomes Freire de Andrade da parte de
Diogo dé Mendonça Corte-Real sobre providências e remessa de
material para implantação das casas de fundição] .-
[Papel feito acerca de como se estabeleceu a capitação nas Minas
Gerais e em que se mostra ser mais útil o quintar-se o ouro, porque
assim só paga o que o deve] ,
[Carta do Senado da Câmara de Mariana sobre representação contra
ã Lei Novíssima das Casas de Fundição]
[Voto do Senado da Câmara de Sabará para eleição de-procuradores
para representação contra a Lei Novíssima das Gasas de Fundição] ..
[Informação de homens bons acerca da Lei Novíssima das Casas de
Fundição] : :
[Carta do Senado da Câmara da vila de São José sobre representação
contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]
[Representação da Câmara de Vila Rica contra a Lei Novíssima das
Casas de Fundição] ,. -
;

[Carta do Senado da Câmara de Vila Nova da Rainha sobre repre-


sentação contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]
[Carta do Senado da Câmara de São João dei-Rei sobre representação
contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]
[Papel acerca do estabelecimento de. um seguro de escravos e suas
muitas utilidades]
[Parecer contra a capitação e as casas de fundição e pela imposição
de quantia equivalente ao quinto sobre os gêneros] ,
Por embargos dé nulidade ã ordem autuada e à determinação da
mesma, diz o capitão João de Sousa Lisboa, como caixa e administra-
dor do contrato dos dízimos reais destas Minas, para que se declare
que a dita determinação se não entende com o seu contrato, nem o
obriga a fazer seus pagamentos em ouro quintado e pelo modo mais
útil de. direito ..... ....................................................
Contratos dos dízimos de Vila Rica, Rio das Mortes e Sabará com o
Serro do Frio que se fizeram nó Conselho Ultramarino com o capitão
João de Sousa Lisboa, Pedro Teixeira de Carvalho e João de Siqueira,
por seu bastante procurador Francisco Antônio Rodrigues Feijó, por
tempo de três anos, que hão de principiar em dois de agosto de 1750,
em preço, todos os ditos três anos, de quarenta e quatro arrobas e seis
libras de ouro, livres para a Fazenda Real
[Memorial em que se mostra ser prejudicial o pagamento do contrato
das entradas de José Ferreira da Veiga em ouro quintado]
[Certidão da ordem régia de 13 de março de 1729 para que se não
pagasse com ouro quintado o preço dos contratos]
23

67 [Consulta do Conselho Ultramarino sobre p decreto de 3 de dezem-


bro de 1750 que lhe havia mandado formara minuta do regimento
das casas de fundição e a resolução que Sua Majestade tomou em 4 de
março de 17511 .." 581
68 Consulta do mesmo Conselho sobre a advertência que Sua Majestade
lhe. fez ( , 591
69 Aviso do secretário de Estado para o marquês de Penalva, presidente
do Conselho, que baixou com esta consulta 594
70 Mapa do ouro que tem entrado na Casa de Fundição de Vila Rica rio
primeiro ano do seu estabelecimento, que teve princípio em o l de2

agosto de. 1751 e findou em o último de julho de 1752 - ...596


;

71 Mapa geral do que renderam as reais casas de fundição das quatro


comarcas da capitania das Minas Gerais do l de agosto de 1751 até
s

31 de julho de 1752 , 598


72 Mapa do que renderam as reais casas de fundição das quatro comarcas
da capitania de Minas Gerais - segundo ano , 600
73 Mapa do que renderam as reais casas de fundição das quatro comarcas
da capitania das Minas Gerais - terceiro ano ....602
74 [Certidão de carta de Gomes Freire de Andrade sobre o requerimen-
to do contratador das entradas, José Ferreira da Veiga, cie pagamento
do seu contrato em ouro sem quintar e tio assento da junta de 17 de
setembro de 1751 sobre a matéria] , 604
75 [Carta de Gomes Freire de Andrade, encaminhando cópia de carta às
câmaras em que se ordenava a nomeação de procuradores para junta
sobre a forma de pagamento do quinto nos registros e das dívidas
morosas da capitação] -. ,609
76 [Carta de Gomes Freire de Andrade em que ordenava a nomeação
íle procuradores para junta sobre ã forma de pagamento do quinto
nos registros e das dividas morosas da capitação] 611
77 [Termo de, junta que se fez no palácio deste governo por ordem do
Ilustríssimo e Excelentíssimo senhor Gomes Freire de Andrade sobre
ser mais cômodo e conveniente pagar-se em ouro quintado nos regis-
tros e dívidas morosas da capitação ou satisfazerem os povos pela cota
o que faltar ao complemento das cem arrobas] - 613
78 Relação dos contratos e rendas que Sua Majestade tem nesta capita-
nia das Minas, sua origem, criação, aplicação e consignação na forma
da sua real ordem ., , 617
79 RemataçÕes que se fizeram no Conselho Ultramarino no ano de 1749 621
80 Propinas dos contratos das entradas 623
.81 [Propinas do contrato dos dízimos] 624
82 I Propinas pagas na. capitania das Minas Gerais] 626
83 [Rendimento dos ofícios de Vila Rica] , -.- ...629
84 [Catálogo de rendimentos cie ofícios em Minas Gerais] 630
85 [Anotações sobre nomeação de governadores e ministros e contingente
de ordenanças em Minas Gerais] , 642
86 Folha das propinas extraordinárias.'que vence o Senado da Câmara
desta vila pela festa da aclamação do muito alto e poderoso rei,, o
senhor dom José, o primeiro, este presente ano de 1751 645
87 [Rendimentos das câmaras da comarca cio Rio das Mortes] ; 647
24

88 Ofícios das Minas ,.. 648


89 Condições com que se rematou o segundo contrato da extração dos
diamantes — ; 650
90 Cópia da sentença sobre o requerimento das falhas de Pilões ,.. 658
91 [Cópia de carta régia ao governador e capitão-general do Rio de Ja-
neiro comunicando a criação do bispado de Mariana e recomendando
toda ajuda ao novo bispo] . , , , 660
92 Cópia da carta do Ilustríssimo e Reverendíssimo bispo destas Minas
ao Senado da Gamara da Cidade Mariana, recebida em 25 de agosto
de 1747 anos • 661
93 [Descrição das festividades da entrada do bispo de Mariana] „.,....:„,>„ , 663
94 Cópia de um edital de Sua Excelência Reverendíssima , ,664
95 [Ordem régia para que se publicasse o decreto de 19 de fevereiro de
1752 proibindo a execução e penhora de escravos e fábrica de minerar
dos miueiros proprietários de mais de 3U escravos] 666
96 Regimento de 10 efe outubro de 1754 sobre os emolumentos dos
ouvidores e mais justiças das comarcas de Minas Gerais ......667
97 Papel sobre o novo regimento retro ., 690
98 [Rol das pessoas de confissão e comunhão em diversas vilas de Minas
Gerais] „ ,-706
99 Rendimentos do bispado de Mariana, das chancelarias que se pagam
na Câmara e nas comarcas de Vila Rica^ Sabará, Rio das Mortes, Rio
Verde^ Pitaugui e Serro do Frio .70.8
100 [Informação sobre rendimentos do bispado de Mariana] - 715
101 [Papel acerca dos rendimentos do bispado de Mariana] -718
102 Rendimento do bispado de Mariana,, das chancelarias que se pagam
na Câmara e nas comarcas de Vila Rica, Sabará, Rio das Mortes, Rio
Verde, Pitangui e Serro do Frio ....722
103 [Borrão de mapa do rendimento do bispado de Mariana, das chance-
larias que se pagam na Câmara e nas comarcas de Vila Rica, Sabará,
Rio das Mortes, Rio Verde, Pitaugui e Serro do Frio] ,.. - 731
104 [Minuta de parecer do ouvidor da comarca de Vila Rica Caetano da
Costa Matoso sobre rendimentos do bispado de Mariana] - 737
105 [Borrão de mapa do rendimento do bispado de Mariana, das chance-
larias que se pagam na Câmara e nas comarcas de Vila Rica, Sabará,
Rio cias Mortes, Riu Verde, Pitangui e Serro do Frio] : , .743
106 Regimento do eclesiástico .... , .751
107 Acrescentamento que sé acha no regimento do auditório eclesiástico
que pertence ao escrivão da banca , 757
108 Rendimento cia Mitra do bispado de Mariana 758
109 [Modo e estilo de minerar nos morros de Vila Rica e de Mariana] 765
110 Cana-de-açúcar , 769
111 [Engenho de açúcar e aguardente, azeite cie mamona e farinhas de
mandioca e de milho] 773
112 Farinha de mandioca ou de pau 777
1.13. [Notícias das taquaras, dos cipós e das muitas comidas que se fazem
de milho nas Minas] ......782
114 [Lembranças, das ervas medicinais, dos cipós e das árvores, e paus
mais usuais no país das Minas] 786
25

115 Mapa do soldo que. vence a guarnição de dragões da capitania das


Minas Gerais, desde o posto de tenente de rnestre-de-campo general
a t e o de soldado .,794
116 [Excerto do termo de urna visita pastoral ã freguesia de Nossa Senhora
do Pilar do PitanguiJ ,. 795
117 [Excerto do termo dê uma visita pastoral à freguesia de São Miguel
do Piracicaba] 797
118 Memoria dos governadores que têm havido nesta capitania do Rio
de Janeiro desde o princípio de seu estabelecimento , 799
119 Relação dos ouvidores-gerais do Rio de Janeiro, tirada a lista dos
livros das comarcas que há no Senado da Câmara, no ano de 1752 800
120 Bispos que têm havido no Rio de Janeiro -. ,,..803
121 [Testamento de dom freí Antônio de Guadalupe] .....804
122 Catálogo das igrejas paroquiais do bispado do Rio de Janeiro , 809
123 [Inscrição comemorativa da primeira pedra lançada no alicerce do
convento da Ajuda] ., ....820
124 [Inscrição comemorativa da primeira pedra lançada no alicerce do
templo cie São Sebastião] , 821
125 Regimento, do ouvjdor-geral da cidade do Rio deJaneiro e repartição
do Sul, passado por Sua Majestade ao doutor João de Abreu e
Silva 824
126 Catálogo dos bispos do Brasil até o ano de 1676, em que o da Bahia
foi elevado a arcebispado „, ; 832
127 [Catálogos'de capitanias e donatários e de governadores e vice-reis
do Estado do Brasil e outros'apontamentos de leitura] .,. 835
128 Simão de Vasconcelos, na Vida do padre Abunda -. . , , 842
129 [História da Vila do Príncipe é do modo de lavar os diamantes e de
extrair o cascalho] , 845
1 30 Notícia dos marcos de Portugal cm os domínios austrais, dada por
Estêvão Pereira, natural do Rio de Janeiro, viajando por eles por um
voluntário extermínio e dando depois uma fiel conta do que viu en-
quanto por lá andou. A nau que fala neste papel se perdeu foi a primeira
que levou casais à Colônia [do Sacramento] 851
131 Cópia da carta que da cidade de Buenos. Aires escreveu o padre da
Companhia de Jesus Pedro Lago ao reverendo padre Antônio Galvão,
do colégio da Colônia [do Sacramento].... :....854
132 Resposta à dita carta que no Rio de Janeiro se mandou ao dito padre ; 855
1 33 Cópia de um papel feito por Antônio Pedro, governador que foi da
praça da Colônia [do Sacramento] 860
134 [Carta de. Marco Antônio de Azevedo Coutinho a Gomes Freire de
Andrade, sobre navegação do rio Madeira] ., :„ 864
135 [Carla de Marco Antônio de Azevedo Coutinho a João de Abreu
Castelo Branco sobre navegação do. rio Madeira] 866
136 Verdadeira notícia que deu Francisco Leme do Prado do que passou,
viu e experimentou na viagem que fez destas minas do Mato Grosso
pelo rio abaixo às missões dos padres da Companhia [de Jesus] do
reino de Castela, a que chamam Moxos, cujas pertencem à provincia
da cidade, de Lima, indo por companheiros Manuel Félix de Lima,
Joaquim Ferreira Chaves, Vicente Pereira de Assunção, Manuel de.
Freitas Machado, Mateus Correia Leme e João dos Santos Werneck,
paragens por onde não consta andasse pessoa portuguesa
137 Resposta [de Gomes Freire de Andrade ao secretário de Estado Marco
Antonio de Azevedo Coutinho sobre navegação do rio Madeira] .......
138 [Diário da jornada que fez o ouvidor Caetano da Costa Matoso para
as Minas Gerais] --; ,
139 Itinerário geográfico com a verdadeira descrição dos caminhos, es-
tradas, roças, sítios, povoações, lugares, vilas, rios, montes e serras
que há da cidade de São Sebastião do Rio dejaneiro até as Minas do
Ouro. Composto por Francisco Tavares de Brito. Sevilha. Na oficina
de Antônio da Silva. MDCCXXXII [1732]. Com todas as licenças
necessárias. •;
140 Relação dos efeitos e cabedal de que consta a carga dos vinte navios e
duas naus de guerra dc que se compõe a frota do Rio dejaneiro, que
de lá saiu em 2G de março e entrou no.porto dessa cidade cm 23 dé
junho de 1749, comandada por dom Manuel Henriques de Noronha
na nau Nossa Senhora das Necessidades, capitânia da frota
141 Relação dos efeitos de que se compõe a carga dos cinco navios que
Saíram do Maranhão e Grão-Pará em 28 de junho de 1749, que prin-
cipiaram a entrar no jiorto desta cidade de Lisboa desde 15 até 20 de
agosto de "1749
142 Relação do cabedal e efeitos de que consta a carga dos 39 navios
mercantes de que se compõe' a frota de Pernambuco* comboiados
pela nau dc guerra Nossa Senhora da Lampadosa, comandada pelo
capitão-de-mar e guerra José Gonçalves Lage, que saiu daquela praça
no primeiro de maio de 1749 e entrou no porto desta cidade cie Lis-
boa a 20 dejulho do mesmo ano. Lisboa, na oficina de Pedro Ferreira,
impressor da rainha Nossa Senhora. Ano de 1749. Com todas as
licenças necessárias
143 Descrição do bispado do Maranhão .,
144 Descrição cosmográfica por espaços geométricos do continente me-
diterrâneo das Terras Novas do bispado do Grão-Pará, confinantes
pela parte austral com o do Maranhão, pela meridional com o de:
Pernambuco e pela setentrional com o Rio de Janeiro, repartidas cm
seis paróquias, a beneplácito de seu Excelentíssimo e Reverendíssimo
senhor bispo dom frei Guilherme dc São José, do Conselho de Sua
Majestade ....^..Í.Í.. ,

145 Descrição do bispado do Grão-Pará , ,


27

Lista de abreviaturas

ACL A c a d e m i a das Ciências de Lisboa


A d d . .., Additional P a p e r s
AEAM. Arquivo Eclesiástico d a Arquidiocese d e M a r i a n a
AHCMM ...... A r q uivo Histórico da C â m a r a MunicpaJ d e M a r i a n a
AHM Arquivo Histórico Militar
AHMI A r q u i v o Histórico do M u s e u d a Inconfidência
AHU , , Arquivo Histórico U l t r a m a r i n o
AMOP A r q u i v o Municipal d e O u r o Preto
A N RJ Arquivo N a c i o n a l do R i o de J a n e i r o
ANTT Arquivo N a c i o n a l da T o r r e d o T o m b o
APM Arquivo Público M i n e i r o
APP , Arquivo Paroquial d a M a t r i z do Pilar d e O u r o P r e t o
AUC Arquivo d a U n i v e r s i d a d e de C o i m b r a
KA ,, Biblioteca d a Ajuda
BGUC Biblioteca G e r a l d a Universidade d e C o i m b r a
PJEM , imitl , mi , ,, Biblioteca J o s é E. Mindlin
PM i v. British M u s e u m
BMMA Biblioteca Municipal M á r i o de A n d r a d e
BNL , , Biblioteca N a c i o n a l de Lisboa
BNM Biblioteca N a c i o n a l de M a d r i
BNRJ ,,,, Biblioteca N a c i o n a l do R i o d e J a n e i r o
BPE ; Biblioteca Pública de É v o r a
BPMP Biblioteca Pública Municipal do P o r t o
CC * „. f ... C a s a dos C o n t o s
CMM.,... , , C â m a r a M u n i c i p a l dc M a r i a n a
CMOP „ C â m a r a Municipal dc O u r o P r e t o
CSM Casa Setecentista de M a r i a n a
CSPOP C a s a Setecentista do Pilar d e O u r o Preto
UiMss Í Divisão d e M a n u s c r i t o s
DM D e p a r t a m e n t qf M a n u s c r i p t s
IEB , Instituto dc Estudos Brasileiros
IHGB Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
MT „ M u s e u Paulista
SG • S e ç ã o Colonial
SC» • i Secretaria de G o v e r n o
SOR ; Seção d e O b r a ? R a r a s
SRM Seção de Reservados e M a n u s c r i t o s
UtOP Universidade Federal de O u r o Preto
USP , Universidade d e São Paulo
Critérios de normalização editorial
Emanuel Araúj o

Publicar u m t r e c h o de. d o c u m e n t o colonial, a íntegra de u m d o c u m e n t o ou u m


conjunto d o c u m e n t a l exige, p o r p a r t e do historiador {no caso c o m o seu editor), o p -
ções inequívocas c o n c e r n e n t e s ao t r a t a m e n t o q u e lhe será conferido. E m outras p a l a -
vras, p editor t e m d e decidir, de imediato, p o r u m a ou o u t r a forma sob a qual se d a r á
a p u b l i c a ç ã o : grosso m o d o , se fará u m a edição diplomática ou u m a edição crítica..No
p r i m e i r o caso, reproduz-se, t e o r i c a m e n t e c o m o m á x i m o de fidelidade possível, a
transcrição paleográfica d o texto original; no segundo, o texto sofre c o m p l e t a atuali-
zação ortográfica, c o m a devida sinalização do editor nò p r ó p r i o miolo do texto p a r a
indicar sua intervenção no original. A o p ç ã o n o caso da publicação do presente Códice
foi, s e m a m e n o r hesitação, pela edição crítica. U m filólogo c o m o J o s e p h M . Piei
adverte q u e a edição de u m escrito antigo " n ã o p o d e n e m deve ser c o n c e b i d a c o m o
exercício de paleografia, c o m r e p r o d u ç ã o servil de todos os p o r m e n o r e s gráficos, cau-
sais ou individuais d e q u e m redigiu ou copiou o códice, t r a b a l h o de que u m filólogo
n u n c a se p o d e r á , aliás, d e s e m p e n h a r tão b e m c o m o u m a m á q u i n a fotográfica" J As
m e s m a s ênfase e escolha e n c o n t r a m - s e e m Serafim da Silva N e t o , p a r a q u e m "hoje,
e m virtude dos progressos técnicos d a fotografia e d a r e p r o d u ç ã o fac-similada, a trans-
crição p u r a m e n t e diplomática é u m atraso, pois c o m ela ficamos s e m p r e n a estreita
d e p e n d ê n c i a do critério e d a perícia do editor, que, n o e n t a n t o , p o d e ler m a l e n ã o
c o m p r e e n d e r algumas palavras".^

R e c o m e n d a r - s e - i a a preservação integral do texto e m fac-símile se ele se desti-


nasse a estudos lingüísticos, o q u e n ã o acontece no caso presente, dirigido principal-
m e n t e ao historiador; A m b o s os tipos de edição p o d e m abrigar falhas de interpreta-
ç ã o paleográfica e d e transposição tipográfica, m a s n o q u e se refere á edição crítica
pelo m e n o s n ã o obriga o leitor a penoso esforço de c o m p r e e n s ã o e leva o texto ão
e n t e n d i m e n t o imediato d e todos.
Está claro q u e existem limites n a atualização gráfica, e c o m o se verá a seguir eles
i m p õ e m - s e q u e r n o t r a t a m e n t o d a d o , p o r exemplo., a Certos arcaísmos, quer no res-
peito a peculiaridades internas deste ou d a q u e l e d o c u m e n t o . ^ A l é m disso, p r o c u r o u -

^' PIEL, Joseph M. Livro de oficio,^ de Marco Tullio Cicerom, o qual tomou em linguagem o infante d. Pedro, duque
Coimbra: Actas Universitatís Conumbrigensis. 1948. p. xxxviii.
de Coimbra.
^- SILVA NETO, Serafim cia. Textos medievais portugueses e sms problemas. Rio dejaneiro: Casa de Rui
Barbosa, 1956. p. 21.
Grande parte dos critérios aqui adotados segiie os princípios sistematizados e desenvolvidos em
ARAUJO,. Emanuel. A construção do üm-o: princípios da técnica de editoração. 3. impr. Rio dejaneiro:
Nova Fronteira, 1995. Especialmente p. 229-268.
se m a n t e r p. espírito de c a d a texto ao aceitar, p o r exemplo, diferentes grafias possíveis
d e u m a m e s m a p a l a v r a , q u a n d o a i n d a hoje existente no léxico^como r e m a t a r / a r r e -
m a t a r , s e n t a r / a s s e n t a r , interpresa/entrepresa, e até n a variação rnaior de d e s c o r ç o a r /
d e s c o r o ç o a r / d e s a c o r o ç o a r / d e s a c o r ç o a r ; . desde q u e o sentido se mantivesse preserva-
do. T a m p o u c o se hesitou c m q u e b r a r q u a l q u e r r e g r a estabelecida p a r a a p r e s e n t e
e d i ç ã o , c o m vistas s o b r e t u d o à m a n u t e n ç ã o d a fidedignidade possível e à fluência d a
leitura. Seguem-se os principais critérios editoriais aqui utilizados.

I. D I S P O S I Ç Ã O M A T E R I A L D O S D O C U M E N T O S

1. N u m e r a ç ã o dos d o c u m e n t o s
E m b o r a n o Códice os d o c u m e n t o s n ã o estejam n u m e r a d o s , julgou-se o p o r t u n o
introduzir n e s t a edição tal seqüência c o m vistas a facilitar n ã õ só a consulta c o m o a
citação eventual e possíveis remissões internas.

2. A t r i b u i ç ã o de título
M u i t o s d o c u m e n t o s tiveram título atribuído pelos editores, o q u e se indica c o m
a sinalização c o n v e n c i o n a d a p a r a interpolação.

3. I n t r o d u ç ã o aos d o c u m e n t o s
V e r e m seguida aos presentes critérios editoriais 'Explicação sobre as notas
introdutórias aos d o c u m e n t o s ' , o n d e os editores explicitam a organização deste tópico.

4. Interpolações
As interpolações n o interior do texto dos d o c u m e n t o s foram utilizadas c o m a
finalidade de: acrescentar palavras que, n a construção do e n u n c i a d o , pu estão elípticas
ou, se expressas., ficaram m u i t o afastadas do t e r m o a q u e se referem. Elas t o r n a m
explícita, p o r e x e m p l o , p a l a v r a ou expressão q u e falta n a citação de instituições,
t o p ó n i m o s e a n t r o p ô n i m o s q u a n d o , referidos, p o d e m suscitar d ú v i d a sobre do q u e
ou de q u e m se trata: d o m Brás [Baltasar d a Silveira], C o m p a n h i a [ d e J e s u s ] , Conse-
lho [ U l t r a m a r i n o ] etc. N o entanto^ neste caso as interpolações se restringem à primei-
ra ocorrência no texto, p a r a se evitar o excesso delas.

5. Escólios
O s escólios (pequenas notas ou comentários n a m a r g e m do d o c u m e n t o , origina-
dos do p r ó p r i o autor.ou de outrem), sinalizados no texto p o r letras alfabéticas m i n ú s -
culas sobrepostas, f o r a m transferidos p a r a o r o d a p é d a p á g i n a , e m seguida a o c o r p o
d o t e s t o e a c i m a das notas editoriais.
6. N o t a s
As notas editoriais referem-se a breves e imediatos esclarecimentos dc m a t é r i a
q u e não c o m p o r t e e m glossário, sinalizadas no texto p o r n ú m e r o s arábicos sobrepos-
tos. C o m p a r e c e m n o r o d a p é da p á g i n a e m seguida aos escólios.

7. Acidentes de leitura
T o d o s os acidentes de leitura, vale dizer, palavras ou m e s m o trechos ilegíveis
pelo estado atual d o d o c u m e n t o , lacunas do original, p e r d a irrecuperável d e palavra
ou t r e c h o p o r r a s u r a ou d a n o físico c conjetura d o editor e m r a z ã o d e dúvida n a
leitura a c h a m - s e assinalados.com sinalização p r ó p r i a , listada a seguir* n o item V I I .

8. Glossário
P a r a n ã o sobrecarregar as notas c evitar repetições ou o excesso d e remissões,
optou-se por r e m e t e r p a r a u m glossário os arcaísmos semânticos e v o c a b u l a r e s (ver
abaixo, item II), assim c o m o d e t e r m i n a d o s termos técnicos, cargos e t c , o q u e se indi-
ca pelo sinal * anteposto à palavra ou expressão.

9. N u m e r a ç ã o d c fólios d o Códice
Foi levada e m c o n t a p a r a n u m e r a ç ã o dos fólios {recto e verso) a p a g i n a ç ã o cons-
tante do Códice, a lápis, no c a n t o superior de cada.fólio recto, q u e a p a r e c e c m seqüên-
cia e completa. N ã o foram considerados u m a s e g u n d a n u m e r a ç ã o , t a m b é m a lápis,
por ser incompleta; c o processo de chamnâeira ou reclamo, irregular ou eventual n o
Códice. Esta n u m e r a ç ã o vai indicada e n t r e colchetes na m a r g e m externa desta edição,
sinalizada c o m / / após a palavra em q u e ocorre c sem sinalização q u a n d o coincide
Com parágrafo, título ou subtítulo.

II. A R C A Í S M O S

1. Arcaísmos léxicos ou d e palavras


a) F o r a m atualizados ortograficamente os arcaísmos gráficos, isto c, palavras escri-
tas de forma diferente da atual: p o r exemplo, a l u g u e r / a l u g u e l , assítuou/situou.
b) F o r a m atualizados ortograficamente os arcaísmosfonéticos, isto c, palavras c o m
p r o n ú n c i a diferente da atual: p o r exemplo, cousa/coisa, d o u s / d o i s .
c) F o r a m preservados os arcaísmos semânticos, isto é, palavras ou expressões a i n d a
hoje vigentes, m a s c o m sentido diverso de seu p r i m e i r o significado: p o r e x e m p l o ,
a b o r t o , religião (ver glossário).
d) F o r a m preservados os arcaísmos vocabulares, isto c, palavras cujo significado
desapareceu p o r completo da.linguagem atual, substituídas p o r expressões ou sinôni-
m o s dc raiz diferente: por exemplo, lunar, encheio (ver glossário).
2. A r c a í s m o s sintáticos
a) A pontuação livre ou irregular, segundo os p a d r õ e s atuais, foi refeita n a m a i o r i a
dos casos, e m q u e n ã o havia dúvidas n o c o n c e r n e n t e à alteração do sentido d a frase.
b) Aparagrqfação foi alterada e m consonância c o m a seqüência lógica do conteú-
d o do texto.
ç) As concordâncias verbal e nominal foram efetuadas, a t e n t a n d o - s e p a r a as o c o r r ê n -
cias d e c o n c o r d â n c i a c o m a 'idéia' e p a r a as situações dc c o n c o r d â n c i a e n t e n d i d a
c o m o ' r e m o t a ' , q u a n d o os t e r m o s q u e c o n c o r d a m e n t r e si estão distantes do e n u n c i -
a d o ; e m alguns casos onde. tal c o n c o r d â n c i a , se m a n t i d a , prejudicaria a c o m p r e e n s ã o
do texto, usou-se o recurso d e a p r o x i m a ç ã o do vocábulo d i s t a n t e p e l a interpolação
devidamente, sinalizada.
d) F o r a m m a n t i d a s as regências c o m o a p a r e c e m no texto e respeitada a ocorrên-
cia ou a ausência das preposições; são p r e p o n d e r a n t e s os casos das preposições a, de,
em, exceção feita p a r a a crase, e m q u e se efetuou a correção segundo o p a d r ã o g r a m a -
tical atual..
e) Foi respeitada a colocação pronominal dos p r o n o m e s átonos, p r i n c i p a l m e n t e as
construções c o m o p r o n o m e posposto ao v e r b o (ênclise), de m a i o r recorrência n o
texto.
f) Foi m a n t i d a a ausência de, contração q u a n d o a preposição e o artigo a q u e se
relaciona n ã o se e n c o n t r a m aglutinados,, s o b r e t u d o nos de casos de em o, em a.

III. U S O D E M A I Ú S C U L A S

1. A n t r o p ô n i m o s
a) N o m e s ç sobrenomes: p o r exemplo, T o m é G o m e s M o r e i r a , M a n u e l N u n e s
Viana.
b) C o g n o m e s : p o r exemplo, J e r ô n i m o P o d e r o s o , Francisco P e q u e n i n o .
c) Alcunhas: p o r exemplo, C a t u r r a , J u a g u a r a .
d) N o m e s d e família: p o r e x e m p l o , os G u e r r a s , os R a p o s o s .

2. T o p ó n i m o s e locativos
Q u a l q u e r designativo oficial (por e x e m p l o . Vila Rica), exceção feita ao substan-
tivo q u e designa a espécie, grafado e m minúscula: p o r exemplo, vila d e São J o ã o del-
Rei, ou rio das M o r t e s q u a n d o acidente, p o r é m Rio das M o r t e s q u a n d o n o m e i a a
comarca.

3. Intitulativos
a) C o r p o político-jurídico o r g a n i z a d o , governo: p o r exemplo,. C o l ô n i a do Sa-
c r a m e n t o , C o r t e (indicando a sede do governo).
b) E n t i d a d e s e instituições civis e eclesiásticas: p o r e x e m p l o , C â m a r a d e Vila
Rica, Igreja, I n t e n d e n c i a , M i t r a .
c) D e n o m i n a ç õ e s dc emprego abstrato designando corpo governativo: por e x e m -
p l o , oficiais d e Justiça, oficiais d e G u e r r a .
d) Festividades ou c o m e m o r a ç õ e s tradicionais: p o r exemplo, Q u a r e s m a , S e m a -
na Santa.
0) Axiônimos d e eminência: p o r exemplo, Sua Majestade, Senhor, Excelentíssima,
f) H a g i õ n i m o s ( q u a n d o designativo de lugar ou coisa): p o r e x e m p l o , capela d e
São B a r t o l o m e u , altar de São Francisco.

IV, U S O D E M I N Ú S C U L A S

1. C a r g o s e títulos
a) Nobiliárquicos: p o r exemplo, c o n d e , rei, d o m .
b) A x i ô n i m o s correntes; p o r exemplo, senhor, vosmece (por vossa mercê).
c) Profissionais: p o r exemplo, general, doutor, juiz.
d) Eclesiásticos: p o r exemplo, p a d r e , frei, bispo.
e) Hagionímicos: por e x e m p l o , santo, são.

2. Intítulatívos gerais
a) N o m e s gentílicos de povos e grupos étnicos: p o r e x e m p l o , índios m u r a s ,
emboabas.
b) D o c u m e n t o s públicos: p o r exemplo, alvará, carta régia.
ç) U n i d a d e s político-administrativas: p o r exemplo, capitania, c o m a r c a .
d) Edificações de uso civil ou eclesiástico q u a n d o e m referência genérica ou
a p e n a s a o edificio: p o r e x e m p l o , c â m a r a s das comarcas, erigir casa d a m o e d a , igreja
de G u a r a p i r a n g a .

V. N U M E R A I S

A i n t e r v e n ç ã o editorial só ocorreu e m caso d e d e s d o b r a m e n t o do n u m e r a l p a r a


a fornia extensa, e n u n c a o c o n t r á r i o ; assim, o extenso no original foi r i g o r o s a m e n t e
m a n t i d o . E n t r e t a n t o , a regra geral p a r a o d e s d o b r a m e n t o de n u m e r a i s n ã o foi segui-
d a nos casos e m q u e significou beneficio p a r a melhor c o m p r e e n s ã o do texto; são
exemplos as tabelas, relações d e r e n d i m e n t o e alguns d o c u m e n t o s e m q u e o n ú m e r o
constitui o c e n t r o do e n u n c i a d o ç o motivo m a i o r da e x p l a n a ç ã o . N o s demais casos
d o e m p r e g o d e n u m e r a i s procedeu-se c o m o se segue.
1) As frações foram m a n t i d a s conforme o original.
2) Evitou-se o grafismo de percentagem (%), inexistente nos documentos. Foi m a n t i d a
a p e r c e n t a g e m conforme o original, q u a n d o h o m o g ê n e a ; q u a n d o mista, grafou-se.
e m n u m e r a l : p o r exemplo, 2 p o r 100 e m vez de 2 por cem.
3) A indicação de quantidades, q u a n d o abreviada, foi d e s d o b r a d a : p o r exemplo,
oitavas, libras, grãos.
4) Preservou-se n a s tabelas e relações de r e n d i m e n t o o grafismo de indicação
m o n e t á r i a (por exemplo, caldeirão [ t í ò u U ] , cifrão c o r t a d o [$] etc.), o q u e p e r m i t e
sua m e l h o r visualização q u a n d o reunidos.

VI. A B R E V I A T U R A S

As abreviaturas sofreram d e s d o b r a m e n t o , exceto as q u e i m p l i c a m e m i n ê n c i a ou


reverência.
1) Siglas simples, e m q u e o vocábulo é indicado a p e n a s p o r u m a letra: p o r exem-
p l o , d . / d o r n , S. (PauloJ/São (Paulo), q . / q u e .
2) Abreviações p o r suspensão ou a p ó c o p e , e m q u e falta o final do vocábulo: p o r
exemplo, M a j . / M a j e s t a d e , Igr./Igreja.
3) Abreviações p o r c o n t r a ç ã o ou síncope, em q u e faltam letras n o m e i o do vocá-
bulo: p o r exemplo, p t e / p á r t é , segte/seguinte.
4) Abreviações c o m letras superpostas, e m que à letra inicial ou :ao prefixo do
vocábulo se p r o p õ e sua última ou as últimas letras: p o r exemplo, g o v / g o v e r n a d o r ,
or

jjde/g r a n de.

VII. SINALIZAÇÃO E D I T O R I A L

[ilegível] — palavra ou trecho ilegível.


[sic] - c o m o está escrito no original.
[comarca?] — conjetura e m r a z ã o de dúvida n a leitura.
[comarca] — interpolação d o editor.
r c o m a r c a l — palavra, expressão, frase ou p e r í o d o interpolado e m virtude de
colação, isto ê, q u e p r o v é m d e cópia externa ao Códice e c o m p l e t a - o ou esclarece-o no
p o n t o assim indicado.
[—] - p e r d a irrecuperável de palavra ou trecho p o r r a s u r a ou d a n o físico.
[incompleto] — l a c u n a no original.
* vocábulo o u expressão constante do glossário.
Explicação sobre as notas introdutórias aos documentos
L u c i a n o R a p o s o de A l m e i d a Figueiredo
Maria Verônica Campos

As notas introdutórias t e m p o r objetivo oferecer subsídios aos leitores p a r a o


e n t e n d i m e n t o e a visão das potencialidades d e pesquisa dos diversos d o c u m e n t o s q u e
f o r m a m o Códice Costa Matoso. Procurou-se, nesse sentido,, apresentar p a r a c a d a p e ç a
d o c u m e n t a l u m s u m á r i o , a contextualização d a p r o d u ç ã o e d a inserção neste Códice e
os vínculos c o m o c o m p i l a d o r C a e t a n o d a Costa M a t o s o . A l é m disso, e n u n c i a m - s e a
autoria, o local d e p r o d u ç ã o , a d a t a e, q u a n d o é o caso, o destinatário d e c a d a u n i d a -
de, d a d o s m u i t a s vezes passíveis de correções, u m a vez q u e a pesquisa n ã o investiu d e
f o r m a sistemática na elucidação desses aspectos.
Q u a n d o pertinentes, indicam-se os aspectos discursivos relevantes, de a u t o r i a
de J o a c i Pereira F u r t a d o (JPF), q u e decerto p r o p o r c i o n a m chaves p a r a novas formas
de apreensão, do conjunto.
C o n s i d e r a n d o - s e a diversidade de caligrafias d o cimélio — u m i m p o r t a n t e ins-
t r u m e n t o p a r a paleógrafos n u m t r a b a l h o de classificação d e tipos do século X V I I I -
e a possibilidade de indicação d e intervenções de terceiros e do colecionador deste
Códice e m alguns d o c u m e n t o s , foi inserido u m c o m e n t á r i o paleográficq, d e autoria d e
Y e d d a Dias L i m a {YDL). A título de. ilustração, o c o m e n t á r i o é a c o m p a n h a d o d a
r e p r o d u ç ã o de u m fragmento do original, muitas vezes c o m a q u a l i d a d e c o m p r o m e -
tida devido à deterioração d o manuscrito.
Inventariou-se, ainda, a fortuna historiográfica dos manuscritos e impressos des-
te Códice, d e m o n s t r a n d o o c a r á t e r inédito do d o c u m e n t o — q u a n d o o. item n ã o e a p r e -
sentado — e a sua relevância p a r a historiadores. C u m p r e esclarecer q u e n ã o foi possí-
vel apresentar todos os autores q u e l i d a r a m c o m o Códice - foram referidos s o m e n t e
aqueles cuja contribuição historiográfica d e p e n d e u dos d o c u m e n t o s o r a publicados —
n e m t a m p o u c o r e c u p e r a r os debates historiográficos em t o r n o de fatos e d e versões
suscitadas p o r estes documentos, sobretudo em relação aos temas já consagrados.
A l g u m a s vezes., foi preciso c h a m a r a atenção p a r a critérios editoriais q u e fugiam
às n o r m a s gerais estabelecidas e d e v i d a m e n t e indicadas e m Critérios de apresentação
editorial, p o r E m a n u e l Araújo.
A p o n t o u - s e t a m b é m a existência d e cópias manuscritas e m arquivos e bibliote-
cas, c o m suas respectivas referências, b e m c o m o de cópias impressas. E m b o r a o le-
v a n t a m e n t o c u b r a muitas publicações e instituições, e v i d e n t e m e n t e m u i t a s versões
d e i x a r a m de. ser localizadas e referenciadas, tarefa quase impossível levando-se e m
c o n t a o n ú m e r o de arquivos e acervos sobre as mais diversas regiões a b r a n g i d a s pelos
145 d o c u m e n t o s deste Códice, o hábito de se fazer i n ú m e r a s cópias nos diversos níveis
d a estrutura burocrática portuguesa colonial e a multiplicidade de reproduções impressas.
37

Estudo crítico

Rapsódia para u m bacharel


Luciano R a p o s o cie A l m e i d a Figueiredo
Agradecimentos

G o s t a r i a d e registrar m e u r e c o n h e c i m e n t o à d e d i c a ç ã o e seriedade dos pesqui-


sadores envolvidos no projeto, q u e , a t u a n d o n o recolhimento d e m a t e r i a l nos arqui-
vos e bibliotecas, possibilitaram descortinar a trajetória de nosso b a c h a r e l : e m M i n a s
G e r a i s , M a r i a Eliza d e C a m p o s Souza, R a m o n F e r n a n d e s Grossi, V e r ô n i c a de A r a -
újo NuneSj G u s t a v o C a m p o s Vieira, Nívia T i r o n i P i n t o , q u e t r a b a l h a r a m sob a ori-
e n t a ç ã o d e M a r i a V e r ô n i c a C a m p o s , pesquisadora d e talento q u e M i n a s ocultou; no
R i o de J a n e i r o , Cristine Abdalla, Flávia M a r i a de C a r v a l h o , Gláucia Pessoa, J u l i a n a
Bezerra d e M e n e z e s c Lúcia Garcia; e m Salvador, M a r i a do. C a r m o A n d r a d e G o -
m e s ; e e m São Paulo e diversos arquivos d e Portugal, íris K a n t o r foi, ao longo de todo
o t e m p o do projeto, p a r c e i r a insuperável no e m p e n h o e nas descobertas.
A g r a d e ç o a Edilane C a r n e i r o e B r u n o Fagundes., q u e a c e i t a r a m q desafio a q u e
se r e c u s a r a m gerações de historiadores de perscrutar as e n t r a n h a s dessa i n c o m u m
massa d e variações paleográficas, caligráficas, estilos e léxicos, p a r a trazer seus misté-
rios c o m sensibilidade p a r a os leitores.
A . E m a n u e l Araújo, mestre e p a r c e i r o , e a todos os c o l a b o r a d o r e s p a r a as dife-
rentes áreas, J o a c i Pereira F u r t a d o , A n d r é Alonso, Y e d d a Dias L i m a , L e a n d r o d e
Araújo N u n e s q u e a c o r r e r a m c o m entusiasmo e fma erudição às p r o v o c a ç õ e s q u e a
p r e p a r a ç ã o dos manuscritos suscitou.
A N o r m a n Fiering, diretor da John Cárter Brown Libráry (Provide.nce, R h ode Island),
o n d e p u d e pesquisar graças a u m a bolsa da Lampadia Foundation, d e v o dias serenos,
c e r c a d o de sua fabulosa European Americana, q u e m e p e r m i t i r a m a c o m p a n h a r de p e r t o
o desenvolvimento do projeto. A i n d a e m Providence, a a n i m a d a convivência c o m
D i o g o R a m a d a C u r t o p r o p o r c i o n o u pontos de vista f u n d a m e n t a i s p a r a a análise
política coeva a o Códice.
A R o b e r t o Borges M a r t i n s , q u e e m todo o t e m p o de s u a gestão n a presidência
d a F u n d a ç ã o J o ã õ Pinheiro ofereceu incentivo e soube Compreender os inevitáveis
impasses d e u m projeto dessa e n v e r g a d u r a e. apoiou f i r m e m e n t e a sua realização. A
E l e o n o r a S a n t a R o s ã , e m cuja direção à frente d o C E H C / F J P escreveram-se p á g i n a s
perenes das publicações de fontes históricas deste país. S u a sensibilidade e respeito
profissional ao longo do projeto m e r e c e m todo r e c o n h e c i m e n t o . S e m seu e m p e n h o e
p r o v a s de confiança n ã o p o d e r í a m o s ter viabilizado vários recursos q u e i n t e g r a m esta
e d i ç ã o . A ela e a o e m p e n h o incansável d e M a r i a V e r ô n i c a C a m p o s ps possíveis m é -
ritos dessa p u b l i c a ç ã o devem ser creditados.
1 "A mais fina das papas..."

A n o t o r i e d a d e q u e alcançou entre estudiosos c o n t e m p o r â n e o s a coleção de p a -


péis reunidos p o r u m certo ouvidor d e c o m a r c a na capitania de M i n a s Gerais no
século X V I I I é difícil de explicar. Afinal, p o u c o se c o n h e c e sobre a totalidade do
conjunto d o c u m e n t a l desta coleção e m e n o s a i n d a sobre a biografia de seu compila-
d o r ou a trajetória desse çimélio. D i a n t e dessa estranha conjugação d e f a m a e obscu-
r i d a d e q u e cerca o Códice Costa Matoso^ torna-se necessário introduzir algumas p a l a -
vras a título d e contextualização.
Papéis soltos colecionados a o longo dos anos q u e c e r c a r a m o exercício d a magis-
tratura e m M i n a s Gerais pelo d o u t o r C a e t a n o da Costa M a t o s o e p o r ele r e u n i d o s
sob u m m e s m o m a ç o após seu r e t o r n o á Portugal,* e m 1752, o v o l u m e saiu de sua
livraria p a r a refazer nos dois séculos seguintes u m longo périplo de volta ao Brasil,
p a r e c e n d o ter ido e m busca de seus leitores prediletos. 2 P e r c o r r e r i a bibliotecas d e
outros letrados, leilões de livros raros e m Portugal e L o n d r e s , chegaria às m ã o s de u m
dos m a i o r e s bibliófilos brasileiros até, finalmente, alcançar a seção de manuscritos d a
Biblioteca M á r i o d e A n d r a d e , o n d e hoje repousa.
O p r i m e i r o anúncio público da existência dessa coletânea ocorre e m Portugal,
d u r a n t e a v e n d a , e m leilão, dos livros d a biblioteca do c o n d e d e A m e a l [João M a r i a

O Códice. Cosia Matoso compõe-seriV554 Fólios não-numerados originalmente em sua totalidade,


mas possuindo fólios modernamente numerados a lápis, no alto, à direita. A numeração de fólios
originais existente contempla apenas alguns segmentos dos manuscritos e as indicações modernas
a lápis apresentam variações eníre si, sendo apenas uma delas completa. O total de folhas escutas
no Códice é 1.072 (já descontadas as folhas em branco, em número aproximado de 40). Mede
32x22 cm {medida da capa) tratando-se de manuscrito iiifolio. Pouco mais adiante apresentaremos
s

maiores detalhes técnicos.


Tomo aqui certa liberdade de.compartilhar para a história deste Códice com a crença aprendida
pelo bibliófilo José Mindlin ao longo de seus muitos anos de buscas e leituras dclivros raros, para
quem ''A gente procura o livro êo livro procura a gente." Ver Uma vida mire. limos: reencontros çom
o tempo. São Paulo: EDUSP, Companhia das Letras. 1997. p. 54.
Na Biblioteca Mário de Andrade (São Paulo), Seção de Obras Raras c Especiais, integrando a
Coleção Félix Paclieco, o Códice possui o número de referência Ms D- l-a-43.
C o r r e i a Aires d e C a m p o s , 1847-1920), criterioso colecionador de antiguidades, e m
1924. 4

N a ocasião, o catálogo oferecia os manuscritos c o m o :

"Valiosa, coletânea de notícias históricas, econômicas e geográficas referentes à


região das Minas do Brasil, composta de vários estudos, relatórios, mapas, descri-
ções, planos, etc. Entre fl. 162 e 163, folha desdobrável com reprodução a tinta ver-
melha de u m a inscrição encontrada n u m a serra da comarca do R i o das Mortes,
seguindo-se u m estudo interpretativo dela. Entre 11. 510 e 511, incluem-se dois folhe-
tos: 'Itinerário geográfico do Rio de Janeiro até as Minas do O u r o ' , impresso em
Lisboa em 1732, e uma 'Relação da carga da frota do Rio de Janeiro', em 1749.
Entre fl. 528 e 529, contém-se um m a p a geográfico, desenhado à pena e colorido,
desdobrável, das Terras Novas do bispado do Grão-Pará. Códice de assinalado in-
teresse para a História da colonização, brasileira."'*

A p ó s o leilão e m C o i m b r a da.notável livraria, n o a n o seguinte, a coletânea d e


notícias históricas reapareceria e m Londres, sendo posta à v e n d a no catálogo da M a g g s
Brothers,^ booksellers by A p p o i n t m e n t to His Majesty K i n g G e o r g e V a n d H . R . H .
the Prince of Wales, tradicional estabelecimento de comércio de livros e manuscritos
portugueses. A i n d a q u e t i m i d a m e n t e e e m t o r n o de experts, c o m e ç a v a a vir a público
o c o n t e ú d o d o Códice. N a casa inglesa, é a n u n c i a d o n a q u a l i d a d e d e manuscripts relating
to the gold mines in Brazil?, descrito c o m o

"A remarkable collection of eighteenth-century manuscripts in portuguese,


relating to the gold and other mines in Brazil, comprising a manuscript m a p of mining-
districts in Para; tables showing the latitudes of the. principal ports in South America,
as compiled by padre Diogo Soares; a report of the first discovery of gold mines in
the district of Minas Geraes in 1693; transcript of Royal decrees; original letters and

O 1 conde de Ameal herda Vastíssima e rica biblioteca" formada por seu paijoão Correia Aires
B 1

de Campos, advogado ern Coimbra e renornado arqueólogo e prolífico historiador. O casamento


do conde com dona Maria Amélia de Sande Magalhães Mexia Salema parece ter sido decisivo
para a ampliação de seu acervo bibliográfico á medida que muitos dos novos títulos, originam-se
das bibliotecas de parentes letrados pela linha materna, entre eles João ejosé de Magalhães Mexia
Salema. A Hgacão destes últimos corh a Universidade de. Coimbra, onde João fora professor, pode
fornecer pistas sobre a história anterior do Códice Cosia Matoso. Grande enciclopédia portuguesa e brasileira.
Lisboa/Rio de Janeiro; Editorial Enciclopédia, [1967], V.. 1, p. (J83 e v. 2, p. 31 1-12; SANTOS,
José cios. Catálogo da notável e preciosa livraria (pie foi do ilustre bibliófilo eoimbrense conde do Ameal (João
Corrna Ayres de Campos). Porto; Tipografia da Sociedade de Papelaria, 192.4.
Idem p. 747. A Coleção das notícias dos descobrimentos [...] é indicada como u~ 2807.
t

BIBLIOTHECA Americana et PkUippim. Catalogue a 465. London; Maggs Bros., 1925. V. 4, p. 203,
9

ii. 2965.
numerous other documents, forming á very comprehensive dossier of the subject,
and collected by Dr. Gaetano da Costa Matoso, the ofíicial in charge of the mines in
1749." 7

A n a t u r e z a genérica d a descrição c o m q u e o d o c u m e n t o foi colocado à. v e n d a é


reveladora d a incerteza q u e p a i r a v a a respeito da i m p o r t â n c i a de seu c o n t e ú d o , con-
f i r m a d a pelo p r e ç o r e d u z i d o a n u n c i a d o ao público: 31 libras é 10 shillings, valor
b a i x o , s o b r e t u d o se c o m p a r a d o c o m outros códices no m e r c a d o . N ã o é difícil inferir
8

q u e n a c o m p o s i ç ã o deste valor estivesse refletida a dificuldade de avaliação, pois,


m e s m o p a r a u m m e r c a d o a c o s t u m a d o a lidar c o m manuscritos, a a p a r ê n c i a do livro
n ã o p r o p o r c i o n a v a confiabilidade a respeito d e sua relevância. S e m u n i f o r m i d a d e d e
caligrafia, destituído de u n i d a d e temática e de assinaturas valiosas, estufado d e p a -
péis sem simetria e m suas dimensões, c o m p o u c a e desconhecida iconografia e u m
o r g a n i z a d o r a n ô n i m o , o valor do Códice sustentava-se e m frágil expectativa. A l é m
disso, dividindo de m o d o b e m equilibrado d o c u m e n t o s diplomáticos e fontes n a r r a t i -
vas, os textos d o p r i m e i r o tipo e r a m e m sua m a i o r i a cópias simples e as p o u c a s cópias
autorizadas., e m geral traslados d e legislação p a r a M i n a s , n a d a t r a z i a m d e especial.
N o caso das fontes narrativas, e r a m p o u c o s os originais autógrafos, a i n d a assim de
difícil avaliação de sua i m p o r t â n c i a n a q u e l e m o m e n t o , m e n o s a i n d a os originais

Fotocópia deste texto aparçcç colada, à guarda do Códices além das seguintes informações: " 1749
A-D. [2966] [COSTA MATOCO [sic] (Dr. Caetano cia). ] Coleção das noticias dos primeiros descobri-
mentos das Minas na América que fez o doutor Caetano da Costa Matoco [sic] sendo ouvidor-geral das. do Ouro
Preto, de quê. tomou posse, emfcveràro de. 1749, / Portuguese Mariuscripts. / Thick folio, old vellum. /
(1749). L31 IOs"
Uma boa base de comparação é o preço com que foi adquirido por Félix Pacheco as Notícias das
minas de São Paulp. e dos sertões da mesma capitania, manuscrito de 1772, de autoria de Pedro Taques de
Almeida Paes Leme: Este manuscrito atinge 250 libras, oito vezes mais o preço do Códice. Costa
Matoso (dados obtidos no catálogo da livraria do dr. Félix Pacheco e nos arquivos da contabilidade
da Biblioteca Mário de Andrade). Convertendo-se o valor em libra à taxa de câmbio média entre
1.925 e ¡930 (I libra = 39S000 réis), o Códice alcançaria em moeda nacional o valor aproximado de
l:20ü$000 réis. Na época, este valor equivalia á oito meses de salário de um operário adulto da
América Fabril ou a um mês de remuneração de uni funcionário altamente especializado (biólogo)
da Brahma (estimativas com base em LOBO, Eulália Maria L., O Estado centralizado, a crise
econômica e o operariado, 1930-1936. In: LOBO, Eulália M, L. et al (Org.). Rio de Janàro operário.
Rio íle Janeiro; UFRJ, 1935, p. 92-94). Sequisennos estabelecer uma comparação com bens durá-
veis, o preço, pago pelp documento era próximo, em 1926, ao de um automóvel usado, conforme
anúncio no Jornal do Brasil,, em que se oferece por 1:5GO$000 um carro de fabricação Loreley
"funcionando perfeitamente". No entanto, o valor ficava muito aquém de automóveis de primeira
linha, como ó Studebaker6 cilindros, anuncíadopor 5:100$000 {Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 7
jan. 1926. p. 19). A despeito de tais demonstrações valorativa^ convém recordar que esse tipo de
cálculo nem sempre é praticado por bibliófilos e colecionadores, entre eles decerto Félix Pacheco.
Para estes a conta costuma ser outra, como bem explica Rubens Borba de Moraes: "Nunca me
arrependi de ter comprado um livro por um preço alto. Só me arrependo das obras que não com-
prei." Ver 0 bibliófilo aprendiz- 3. ed. Brasília: Briquet de Lemos; Rio de Janeiro: Casa da Palavra,
1998. p. 63.
heterógrafos presentes. T u d o isso contribuiu p a r a q u e a o b r a n ã o alcançasse u m "va-
lor comercial significativo, t e n d o e m vista a dificuldade d e uma, avaliação p o r p a r t e
da casa de leilões, m a s é possível acreditar t a m b é m q u e o estabelecimento atribuísse
a l g u m a i m p o r t â n c i a àquele conjunto formado p o r centenas de d o c u m e n t o s de valor
duvidoso; do contrário, poderia ter procedido à dispersão do material e comercializado
as peças s e p a r a d a m e n t e , ^
E m negociações que t r a n s c o r r e m e n t r e 1925 e 1930, o jornalista, político e
bibliófilo J o s é Félix Alves P a c h e c o , e m c o m p r a feita a M a g g s Bros., acrescenta mais
alguns volumes d e livros raros e manuscritos à sua p o r t e n t o s a e festejada Brasiliana,
p o r i n t e r m é d i o da aquisição da.Nolável coleção, 10 F r e q ü e n t a d o r assíduo do m e r c a -
do de livros europeus no entreguerras, Félix Pacheco vinha m o v e n d o sistemática c a m -
p a n h a p a r a trazer p a r a o Brasil ó m á x i m o possível de m a n u s c r i t o s a respeito d e seu
p a s s a d o . * Foi nesse m o m e n t o q u e este CÓdke, depois de p e r a m b u l a r p e l a E u r o p a ,
1

voltou p a r a o N o v o M u n d o , de o n d e saíra quase dois séculos atrás. ^


G u a r d a d o a sete chaves pelo bibliófilo, Félix P a c h e c o suspeitava sobre seu valor,
pois c o s t u m a v a assanhar Afonso d e E. T a u n a y p r o m e t e n d o - l h e facultar a consulta a o
m a n u s c r i t o logo q u e a História G e r a l das Bandeiras Paulistas, q u e este e n t ã o escre-
via, conseguisse c h e g a r à é p o c a do p o v o a m e n t o em M i n a s Gerais. O próprio T a u n a y ,
e m algumas ocasiões, relatou as provocações amistosas do jornalista:

^- José Mindlin, em comunicação pessoal por intermédio de Cristina Antunes, bibliotecária respon-
sável por seu acervo, esclareceu-nos a respeito da peculiaridade de transações envolvendo manus-
critos: "Ao contrário dos livros raros, o preço de um manuscrito inédito é absolutamente relativo,
dependendo do conhecimento daquele que vende a respeito da importância do documento para
uma avaliação mais correta.-No caso de um manuscrito em que não há outros exemplares disponí-
veis citados em outros catálogos, não se tem outro referencial a não ser os conhecimentos do com-
prador. A depender disto, o comprador pode pagar muito pouco por um códice importantíssimo
bu pagar caríssimo por uma cópia de menor importância." Acreditamos que, no caso da venda dp
Códke Costa Matoso pela Maggs ocorreu a primeira situação exposta. Expresso aqui meus agradeci-
mentos a essa amiga, que foi ímpar na colaboração para as pesquisas do projeto e ensinamentos a
respeito do universo dos colecionadores.
' 0- A transação entre ã. Maggs e Félix Pacheco transcorreu entre 1925 e 1930, uma vez que o cimélio
em discussão não mais aparece na edição de 1930 do catálogo de Hvros raros e documentos da
firma inglesa [BIBLIOTECA Brasiliense, Londres: Maggs Bros., 1930). A caixa vermelha em que o
original encontra-se até hoje açondictouadq na Bibiioteca Mário de Andrade foi especialmente
confeccionada pêlo leiloeiro londrino. Observe que a designação equivocaria Costa Matoço aparece
gravada nó invólucro.
'' • O próprio, admitia: "[••-] várias outras peças, manuscritas trouxemos para o Brasil, no pensamento"
de que aqui permaneçam e fiquem, esclarecendo pontos obscuros de nosso passado." PACHECO,
Félix. O valor imenso da Biblioteca Brasiliense. Jonía/íA? Comércio, Rio de Janeiro, 28 sct. 1930. p. 9.
Em algumas passagens deste texto tomo emprestado com certa sem-cerimônia o material de pes-
quisa sobre as circunstâncias da chegada do Códice em São Paulo e sua transferência para a Biblio-
teca Municipal de São Paulo levantado por íris Kantore sistematizado em seu ./Vã rota do Códice
Costa Matoso. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1997. Comunicação apresentada durante
XIX Reunião Nacional da Anpulc
"Várias vezes disse-nos Félix Pacheco, com a cordialidade extraordinária
que sempre nos demonstrou: 'quando você chegar com. a sua História das banderas à
fase do ouro de Minas Gerais, peça-me uma contribuição que eu lha porei à dispo-
sição, certo de que não a desdenhará, de todo', sublinhava malicioso.
E sorria quando retrucávamos/nos deixasse dar u m a espiadela', ao que afirma-
va não ser desdenhãvel, e piamente acreditávamos dever ser a mais fina das pa-
pas". l;1

A l g u m t e m p o depois, visitando c o m u m seleto g r u p o d e amigos a biblioteca d e


Felix P a c h e c o , T a u n a y n a r r a r i a seu primeiro c o n t a t o c o m o Códice. " Ç ç r t o dia e m sua
biblioteca, recordamos-lhe nossa curiosidade pelo c o n h e c i m e n t o d e t ã o a p r e g o a d a
p a p a finíssima [...]", q u a n d o aquele p a r e c e u despistar, dizendo: ' — E s p e r e u m p o u -
co, deixe-me tantalizá-lo alguns m o m e n t o s ' . E c o m e ç o u a nos fazer passar pelas m ã o s
jóias sobre jóias, da sua brasiliana formidável." O s visitantes e n c a n t a m - s e c o m as
desconhecidas preciosidades que.lhes c h e g a v a m às m ã o s , fascinados c o m a suntuosi-
d a d e das e n c a d e r n a ç õ e s , o b o m estado, dos exemplares raros e, depois de e x a m i n a -
r e m títulos surprendentes e e n c a n t a d o r e s , t ê m atendido o p e d i d o : "— V a m o s agora ao
,seu caso", teria r e s p o n d i d o Felix P a c h e c o , q u a n d o [...] trouxe-nos e n t ã o assaz boju-
M

do códice, coleção factícia d e m e a d o s d o século X V I I I , o r g a n i z a d o p o r u m ouvidor o


D r . C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o o n d e há maravilhosos d o c u m e n t o s sobre os p r i m e i r o s
anos do p o v o a m e n t o de M i n a s G e r a i s . " A coleção, p o r é m , p e r m a n e c e p o u c o t e m -
1 4

p o n a q u e l a Brasiliana. C o m a m o r t e de Félix Pacheco, e m 1935, p destino d e seu


valioso a c e r v o é, beneficiado pela política cultural q u e desde o início d o m a n d a t o d o
prefeito d e S ã o Paulo F á b i o P r a d o (1934-38) vinha-se consolidando. A criação d o
D e p a r t a m e n t o M u n i c i p a l d e C u l t u r a , dirigido p o r M á r i o d e A n d r a d e e o r i e n t a d o
p a r a u m projeto d e intervenção cultural envolvendo a r e o r g a n i z a ç ã o d a Biblioteca
M u n i c i p a l , a criação do Arquivo Histórico e a publicação de d o c u m e n t o s , constituía,
;

p a r t e d e u m a m p l o p r o g r a m a de resgate do p a t r i m ô n i o histórico.'-' Assim, logo e m


1935 seria sugerida pelo grupo de intelectuais q u e nele a t u a v a a c o m p r a do espólio d e
Félix P a c h e c o p e l a Biblioteca M u n i c i p a l de S ã o P a u l o , p o s t e r i o r m e n t e Biblioteca
M á r i o de A n d r a d e . A disputa seria a c i r r a d a , envolvendo o governo do Piauí, livreiros
do R i o de J a n e i r o e de L o n d r e s e a F a c u l d a d e de Letras d a U n i v e r s i d a d e do Brasil,
no Rio de Janeiro.

TAUNAY, Afonso de E. História geral das bandeiras paulistas. São Paulo: Imprensa Oficial, Museu
Paulista, 1948, V. 9, p. 91.
TAUNAY, Afonso dç E. Subsídios para a história do tráfico africano no Brasil. Anais do Museu
Paulista, São Paulo, t. 10, p. 189-19D, 1941.
KANTOR, íris, op. <:it. nota 12.
R u b e n s Borba de Moraes, n a qualidade de diretor da Biblioteca Municipal de
São Paulo, mobiliza-se j u n t o a o prefeito Fábio Prado p a r a garantir apoio â compra,
advertindo q u e "[...] essa riquíssima .coleção [...] n ã o p o d i a de m a n e i r a alguma ser
dispensada n e m e m b a r c a d a para Londres [•••]" ^ alertando p a r a o destino de muitos
)

espólios bibliográficos de i m p o r t a n t e s colecionadores. Após estudo meticuloso do


catálogo da coleção, realizado por Afonso T a u n a y e Rodolfo Garcia, chegou-se à
conclusão que seu valor estimado, seria .1.000 contos, de réis. ? Depois d e exaustivas
1

negociações, que c o m e ç a r a m c o m a oferta de 500 contos de. réis por todos os livros,
manuscritos e gravuras, o martelo foi batido p a r a Venda por 650 contos..^
Nascia c o m essa c o m p r a , e m 1936, o núcleo d a i m p o r t a n t e Brasiliana adqui-
rida p e l a Divisão de D o c u m e n t a ç ã o Histórica e Social d a Biblioteca M u n i c i p a l , o
q u e m o t i v o u briosos comentários do experiente T a u n a y , e m carta ao prefeito:

"Nas nossas bibliotecas até agora reinava a maior pobreza em relação aos livros
antigos do Brasil. Comprando a coleção Félix Pacheco V.Exa. incorporou à Bibliote-
ca Municipal n ã o só uma grande massa de raridades bibliográficas como ainda u m
conjunto de preciosos códices onde há inéditos de subida valia."' 9

Q u a n d o n a Biblioteca Municipal, T a u n a y revirava os manuscritos d o espólio e


manifestava o m e s m o enousiasmo do p r i m e i r o encontro:, " T i v e m o s o ensejo de deitar
os olhos a u m papel colecionado pelo inesquecível amigo q u e nos p r o p o r c i o n o u ver-
d a d e i r o sobressalto."-^ Referia-se, e n t ã o , . a o Códice Costa Matoso.^ F i n a l m e n t e , "a
mais fina das p a p a s " seria f r a n q u e a d a ao público, q u e , s e m d e m o r a , trataria de
apreciá-la.

BJEM, Arquivo pessoal de Rubens Borba de Moraes, Relatório enviado à prefeitura de São Paulo, s. d.
Idem.
A transação Leria enfrentado muitos complicadores: desde resistências no governo paulista com
gastos daquela magnitude até intensa concorrência das casas internacionais. Na opinião deTaunay,
a atuação do dr. Paulo Duarte teria sido fundamental para que o negócio fosse fechado (MP,
Coleção Afonso Taunay, Série Correspondência, pasta 156. Carta de Afonso de E. Taunay para Inesita,
29 de abril de 1936). A titulo de comparação, Taunay informa em carta para Júlio de Mesquita que
a compra da coleção Lamego teria custado 200 contos (MP, Coleção Afonso Taunay, Série Cor-
respondência, carta para Júlio de Mesquita FiUio, 14-outubro 1935).
MP, Coleção Afonso Taunay, Série Correspondência, pasta 101. Carla ao prefeito Fábio Prado, 12
set.l93G.
TATJNAY, Afonso de E., op.çit. nota 13, p. 91.
Sendo assim, Taunay, seu primeiro divulgador, teve a honra de batizar este cimélio. Embora esta-
beleça pequenas oscilações entre Códice Costa Matoso ou Códice Matoso na sua História geral das bandei-
ras paulistas, após esta publicação a historiografia cuidaria de consagrai' a primeira designação.
TAUNAY, Afonso de E, op. cit. nota 13.
E m gesto d e delicada h o m e n a g e m , T a u n a y escolheria p a r a divulgar p e r a n t e
o g r a n d e p ú b l i c o as primeiras passagens daqueles m a n u s c r i t o s j u s t a m e n t e n o J o r -
n a l do C o m e r c i o , p e r i ó d i c o q u e Félix P a c h e c o dirigira. L a n ç a , e m o u t u b r o de.
1936, breve artigo, c o m o título Uma preciosidade da Brasiliana de Félix Paçheco publi- >

c a n d o q u a d r o c o m o t o t a l d e e s c r a v o s e h o m e n s forros e n t r e 1 7 3 5 e 1 7 4 9 ,
registrados p a r a efeito d a c o b r a n ç a da capitação e m Minas. G e r a i s , 2 2
e, de j u n h o
d e 1946 a d e z e m b r o de 1947, diversos artigos c u i d a r i a m d e d i v u l g a r os d o c u -
m e n t o s c o n t a n d o a saga do p o v o a m e n t o de M i n a s pelos paulistas, n u n c a deixan-
do d e assinalar q u e o precioso cimélio p e r t e n c e r a à B r a s i l i a n a d o j o r n a l i s t a . ^ 3
E m b o r a p o s t u m a m e n t e , confirma-se a previsão q u e .lhe fizera o velho a m i g o a
respeito d a utilidade q u e a d o c u m e n t a ç ã o teria p a r a sua o b r a maior: e m sua His-
tória geral das bandeiras paulistas, o v o l u m e 9 e p a r t e do v o l u m e 10 seriam ilustrados
c o m passagens d o Códice?-^

TAUNAYj Afonso de E. Uma preciosidade da Brasiliana de Félix Pacheco. Jornal do Comércio, Rio
deJaneiro, 11 out, 1936. p. 3. Refere-se na presente edição ao documento de número 46.
Afonso de E. Taunay assina vários artigos publicados no Jornal do Comerció do Rio de Janeiro entre
junho de 1946 e dezembro de. 1947, onde publicava transcrições de documentos considerados
mais significativos ou produzia textos — muitos deles aproveitados em sua História geral das bandeiras
paulistas—sohrç a expansão paulista entremeados por trechos do Códice. O Jornal do Comércio publica
do autor os. seguintes títulos tias respectivas datas; "Ura cimélio de Félix Pacheco (As primeiras
descobertas do ouro em Minas Gerais)", I6jun.l946,p. 2; "Um cimélio de Félix Pacheco", 23jun.
1946, p. 2; "Um cimélio de Félix Pacheco (Relato de Bento Fernandes Furtado de Mendonça)",
30juti. 1946, p. 2; "Um cimélio de Félix Pacheco. Os primeiros ouros das Minas Gerais", 7 juí. 1946,
p, 2; "Um cimélio de Félix Pacheco (final do relato de Bento Fernandes Furtado de Mendonça)",
14 jul. 1946, p. 2; "Noticias dos primeiros anos das Minas Gerais . Relação de algumas antiguida-
des das Minas (papel da Brasiliana de Félix Pacheco)", 13 out. 1946, p. 2; "Um inédito da Brasiliana
de Félix Pacheco (Relação do princípio descoberto [...] Sr. Dom Braz Baltazar da Silveira) (Papel
das vizinhanças de 1750)", 1 dez. 1946, p. 2; "Depoimentos sobre os primeiros anos das Minas
Gerais. Dou parte do que vi e sei (papéis da Brasiliana de Félix Pacheco", 8 dez. 1946, p. 2; " Os
primeiros ouros das Minas Gerais":, 5 jan. 1947; "Mais ribeiros auríferos", 12 jan. 1947, p. 2;
"Ouro de lavagem e ouro de beta"., 19 jau. 1947, p. 2; "O primeiro guia turístico brasileiro impres-
so {raridade notável da Brasiliana de Félix pacheco)",. 26 jan. 1947, p. 2; "Lacuna da história do
ouro preenchida graças a um cimélio da Brasiliana de Félix Pacheco'^ 20 abr. 1947, p. 2; "História
do distrito do Rio das Mortes (manuscrito precioso e inédito da Brasiliana de Félix Pacheco)", 1
jun. 1947. p. 2.; " História do distrito do Rio das Mortes, sua descrição, descobrimento de suas
minas, casos nele acontecidos entre paulistas e emboabas e criação de suas vilas peio sargento-mor
José Alvares de Oliveira (manuscrito inédito da brasiliana de Félix Pacheco). II Paulistas e emboabas",
B jun. 1947, p- 2.; "História do distrito do Rio das Mortes pelo sargento-mor José Alvares de Olivei-
ra (1750) (manuscrito inédito da brasiliana de Félix Pacheco). III Assédio de São João del-Rei", 15
jun. 1947, p.. 2;. "Emboabas", 12 dez. 1947, p.. 2; "Vésperas de rompimento", 19 out. 1947, p. 2;
"Ouvidores metedíçòs", 26 out. 1947, p. 2; "Péssimas notícias do levantamento de Minas Gerais",
28 dez. 1947, p. 2; "Ruptura de hostilidades", 14 dez. 1947, p. 2.
TAUNAY, Afonso de E, op. cit. nota 13 e TAUNAY, Afonso de E. História geral das bandeiras paulistas.
São Paulo: Imprensa Oficial, Museu Paulista. 1949. V. 10^ Em 1953, Taunay publicaria esses e
outros documentos circunscritos à temática das bandeiras paulistas e do povoamento de Minas em
Relatos sertanistas. São Paulo: Martins, 1953.
A l é m d e T a u n a y , u m dos leitores de p r i m e i r a h o r a foi R o b e r t o S i m o n s e n ,
q u e , c o m diligência, transcreve, n o s idos d e 1936 — p o r t a n t o , logo depois de o
Códice d a r e n t r a d a Biblioteca Municipal d e S ã o P a u l o (atual Biblioteca M u n i c i p a l
M á r i o de A n d r a d e ) — dados econômicos do m a n u s c r i t o p a r a ilustrar seus cursos n a
Escola Livre de Sociologia e Política d e São P a u l o , os quais a p a r e c e r i a m n a edi-
ç ã o original d e H i s t ó r i a e c o n ô m i c a do B r a s i l . ^ Se a, a m o s t r a dos d o c u m e n t o s
publicados é p e q u e n a e m relação à prolificidade de T a u n a y , Simonsen, a o divul-
g a r a lista d e escravos e n t r e 1735 e 1749 e m M i n a s G e r a i s e. as três listas de.
p r o d u t o s exportados e m "1749 pelo* Brasilj ultrapassa certa t e n d ê n c i a d e valorizar
a d o c u m e n t a ç ã o sobre São P a u l o e sobre a colonização das M i n a s , aspecto q u e
desde e n t ã o m a r c a r i a as interpretações t o m a d a s a p a r t i r d o Códice.^
S u a r e p u t a ç ã o seria d o r a v a n t e c o n s t r u í d a s o b r e f u n d a m e n t o s .cercados d e
expectativas. Esfinge q u e n ã o s u p o r t a v a ser decifrada, a despeito do. desconheci-
m e n t o sobre seu verdadeiro c o n t e ú d o , sua o r g a n i z a ç ã o i n t e r n a e.^ m e s m o , sobre a
biografia do o r g a n i z a d o r , n e m p o r isso deixou d e s e m p r e m e r e c e r p a l a v r a s de
vivo e n t u s i a s m o , q u e p a s s a r a m a ecoar de m a n e i r a crescente. H i s t o r i a d o r e s q u e
sobre ele se d e b r u ç a r a m j a m a i s d e i x a r a m de registrar semelhantes e x p r e s s õ e s . ^
Afonso E. T a u n a y e m p r e s t a sua a u t o r i d a d e d e leitor pioneiro n o j u l g a m e n t o do
"inestimável precioso Códice Costa Matoso", d e c l a r a n d o e m s u a História geral das b a n -
deiras paulistas: "[...] p a r a a história dos primórdios d o o u r o e m M i n a s Gerais n u n c a
será e x a g e r a d o e n c a r e c e r o q u e r e p r e s e n t a a contribuição d e c o r r e n t e d o Códice Costa
Matoso [...]."
2S

íris Kantor localizou na Biblioteca da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo as
apostilas sem data do curso de História Econômica ministrado por Roberto Simonsen. Ali, segun-
do a autora, Simonsen faz referência ao Códice recém-adquirido pela municipalidade. Op, cit, nota
12, p. G.
Na presente edição, esses documentos são os de número 46, 140, 141, 142, respectivamente. Re-
gistre-se que Taunay, depois de publicar no Jornal do Comércio esta relação do número de escravos
em Minas^ apresentaria no Congresso de História Nacional do IIIGB de 1938 o? resultados de sua
pesquisa combase neste documento, publicados mais tarde em: TAUNAY, Afonso de E. Subsídios
para a história do tráfico africano no Brasil. Anais do Museu Paulista, $ão Paulo, t, 10, p.193, 1941.
O Códice não parece ter estado disponível aos seus contemporâneos do século XVIII.e, mesmo, do
século XIX, Diferente de alguns importantes textos então produzidos que circularam entre os
autores da época, como foi o relato de Bento Furtado, cuja cópia completa encontra-se nesta edi-
ção sob o número 2, e; as Informações dos minas de São Paulo e dos sertões da mesma capitania, de Pedro
Taques, que formaram a base do Fundamento histórico do poema Vila Rica de Cláudio Manuel da Cos-
ta).
28 De modo recorrente em passagens da obra {principalmente em seu v. 9), não poupa palavras de
encantamento : " [...] riquíssimo manancial representado pelo códice 41 da Biblioteca Municipal
de São Paulo, 0 Códice Costa Matoso, um dos mais preciosos ciméfios dentre os tantos que Félix
Pacheco soube descobrir para a constituição da sua opulentíssima Branliana", TAUNAY, Afonso
de E, op. ctí. nota 13, p. 461.
O notável Charles Boxer, q u e utilizou c o m o poucos informações e m a n a d a s
d o Códice Costa Mato$o e m sua clássica o b r a A idade de ouro do Brasil, salientaria q u e se
%

tinha ali u m "[...] inestimável repositório dos manuscritos originais sobre a história d e
Minas G e r a i s . " 2 9
Afonso E. T a u n a y empresta sua a u t o r i d a d e de leitor p i o n e i r o n o
j u l g a m e n t o do "inestimável precioso Códice Costa Matoso", d e c l a r a n d o n a s u a o b r a
História geral das bandeiras:paulistas: "[...] p a r a a história, dos p r i m ó r d i o s d o o u r o e m
M i n a s Gerais n u n c a será e x a g e r a d o e n c a r e c e r o q u e r e p r e s e n t a a contribuição de-
corrente do Códice Costa Matoso
O u t r o s j u l g a m e n t o s semelhantes a p a r e c e r i a m em seqüência: "Prestimoso", " p r e -
cioso cimélio setecentista m i n e i r o " , adjetivou J o s é Ferreira C a r r a t o 3 1
ao estudar as
informações a respeito d a igreja, e m M i n a s . " P r e c i o s o " é expressão q u e R o b e r t o
S i m o n s e n t a m b é m e m p r e g a e m sua História econômica do Brasil.'^ N o s anos recentes,
D o n a l d R a m o s , n a linhagem da historiografia n o r t e - a m e r i c a n a q u e utilizou esse acer-
vo, renovaria d j u l g a m e n t o a respeito, valorizando sua n a t u r e z a d e fonte t e s t e m u n h a l
direta: " T h i s collection of d o c u m e n t s is extremely i m p o r t a n t b e c a u s e it includes
accounts of t h e early history of the m i n i n g district written, in m a n y cases, by p e o p l e
w h o p a r t i c i p a t e d in the events they describe [ . . . ] . " 33

M a s se tantas palavras d e elogio v ê m r e c h e a n d o o curriculum do Códice, fica desde


logo p a t e n t e o contraste e n t r e tal entusiasmo e o reduzida n ú m e r o de seus d o c u m e n -
tos consultados ou p u b l i c a d o s . " A q u e se deve. atribuir sua utilização superficial,
34

depois d e mais d e seis décadas disponível n u m dos mais i m p o r t a n t e s acervos do Bra-


sil? A resposta a essa p e r g u n t a torna-se a i n d a mais c o m p l e x a q u a n d o se constata q u e

"Inestimável repositório cios manuscritos originais sobre a história de Minas Gerais (e de algumas
outras regiões do Brasil e do Maranhão-Pará também) colecionados por um juiz-de-fora de Ouro
Preto, entre 1749 e 1752." BOXER, Charles.R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de
uma sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional. 1969. p. 382.
De modo recorrente em passagens da obra {principalmente em seu v. 9), não poupa palavras de
encantamento : "[•••] riquíssimo manancial representado pelo códice 41 da Biblioteca Municipal
de São Paulo, q Códice Cosia Matoso, um dos mais preciosos cimélios dentre os tantos que Félix
Pacheco soube descobrir para a constituição da sua opulentíssima Brasiliana", TAUNAY, Afonso
de E, op. cit. nota 13, p. 461.
CARRATO, José Ferreira. Igreja, Iluminismo e escotas mineiras coloniais; notas sobre a cultura da decadênáa.
mineira.setecentista.. São Paulo: Nacional, 1968. p. 51.
SIMONSEN, Roberto C. História econômica do Brasil (1500/1820). 8. ed. São Paulo: Nacional,
1978. p. 296.
.RAMOS; Donald. A social history of Ouro Preto: stresses of dynámicurbanization in colonial Brazil,
1695-1726. Gaiuesvillc: Uníversity of Florida,1972. p. 434.
A reduzida parcela de material publicado poderá ser verificada nas notas introdutórias aos docu-
mentos, sobretudo na indicação das cópias impressas e cópias manuscritas, preparadas para esta
edição,
alguns dos arquivos c o m a d o c u m e n t a ç ã o afeta às temáticas conhecidas do Códice
p o s s u e m cópias disponíveis e m microfilmes ou e m p a p e l . 3 5

A distância e n t r e a riqueza de seu c o n t e ú d o , associada à facilidade de consulta,


e o tímido uso q u e tem merecido deriva das características intrínsecas do Códice. Elas
são, d e certo m o d o , idênticas às q u e i m p e d i r a m n a época d e sua v e n d a a definição de
u m valor mais justo. Suas dimensões, c o m 1.072 páginas escritas, de u m total 554
folhas i r r e g u l a r m e n t e n u m e r a d a s , a a p a r e n t e inexistência de o r d e n a ç ã o entre seus
d o c u m e n t o s e a caligrafia a p r e s e n t a n d o e n o r m e v a r i e d a d e 3 6
n ã o constituem elemen-
tos de somenos i m p o r t â n c i a . A o contrário, foi a r e u n i ã o d e todos esses aspectos q u e
t o r n o u este original p o u c o amistoso p a r a a maioria dos pesquisadores, a i n d a mais
pela inexistência d e instrumentos de busca eficientes. '' 3

S u a trajetória n a historiografia seria m a r c a d a a i n d a p o r u m a t e n d ê n c i a d e


desequilíbrio no q u e se refere à plenitude d e seu c o n t e ú d o , n a m e d i d a e m q u e valori-
z a r a m - s e d e m a s i a d a m e n t e os d o c u m e n t o s relativos a São P a u l o e a M i n a s Gerais,
deixando-se de lado riquíssimo m a n a n c i a l d e informações sobre o restante d a A m é r i -
ca portuguesa. N o b r e exceção àqueles q u e fizeram uso recortado do Códice seria Charles
Boxer. Se T a u n a y foi seu g r a n d e divulgador, e m b o r a ultrapassando m u i t o p o u c o da
d o c u m e n t a ç ã o d a G u e r r a dos E m b o a b a s (com o q u e associou o Códice e x a g e r a d a m e n t e
a este assunto), Boxer superou essa n o ç ã o , fazendo uso indiferenciado d e seus múlti-

No Arquivo Público Mineirq (Belo Horizonte), existe,- desde a década de 70, cópia em papel e em
microfilme do Códice (doado pelo Conselho de Extensão da UFMG). No Arquivo Nacional, encon-
tra-se, desde os anos 80 microfilme.com sua reprodução (microfilme 011.0-81). Em São Paulo, o
Centro de Apoio à Pesquisa em História Sérgio Buarque de. Holanda, vinculado ao Departamento
de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
também possui o microfilme (ref. 926), doado por Marcos Magalhães de Aguiar. No processo de
pesquisa para esta edição, íris Kantor localizou no MP, Coleção Afonso de E. Taunay, pasta 3, ref.
2395-2397, para surpresa geral, uma transcrição diplomática inédita ç incompleta do Códive solici-
tada por "dr. Taunay" a funcionados da Biblioteca Municipal de São Paulo em 18 de março de
1949, datilografada, 553 páginas. Tarquinio de Oliveira se utiliza de "uma boa reprografia do
precioso documentário" cedida por José Israel Vargas. OLIVEIRA, Tarquinio J.B. de (Org. e
análise). Erário Régis de. Franciuo A, Rebelo, Í768. Ed. fac-similar. Brasília: ESAF, 1976. p. 101, sendo
esta a mesma cópia microfilmada que seguiu para o acervo do Arquivo Público Mineiro. A biblio-
teca José Mindlin possui cópia parcial em papel doada peto mesmo Israel Vargas.
O leitor poderá encontrar adiante, nos comentários paleográficos da professora Y e d d a Dias Lima
aos documentos, o retrato dessa diversidade.
Apenas dois instrumentos são conhecidos, ambos lacunares. O primeiro deles, de Hélio Gravata,
acessível apenas àqueles que pesquisavam no Arquivo Público Mineiro [índice do Códice Costa Matoso.
Belo Horizonte: Arquivo Público Mineiro, [1977]) e, mais recentemente, o de Marcos Magalhães
de Aguiar {Indkt sekemnado do Cédke Costa Matoso — Biblioteca Mário de Andrade. São Paulo: s. 1993),
que gentilmente nos cedeu cópia nas primeiras horas deste projeto de edição.
pios d o c u m e n t o s e m vários de seus capítulos d e sua I d a d e de o u r o do B r a s i l . 38

M e s m o c o m todas essas dificuldades e equívocos, alguns d e seus documentos


f o r a m reveladores p a r a certas temáticas historiográficas, sendo e m alguns casos con-
siderados se n ã o fundadores a o .menos renovadores d e s t a s . 39
Assim se passa c o m as
interpretações a respeito dos conflitos e n t r e paulistas e forasteiros q u e m a r c a r a m os
primeiros anos d e conquista das M i n a s Gerais. A publicação, e m 1948, do v o l u m e 9
d a História geral das bandeiras paulistas ofereceu novos elementos ao t e m a , q u e v i n h a sem
m u i t a s novidades desde Sebastião da R o c h a Pita, p e r m i t i n d o intenso processo d e
r e n o v a ç ã o . ^ É sabido q u e a versão de T a u n a y a respeito d a G u e r r a dos E m b o a b a s e
da p r o e m i n ê n c i a dos paulistas — seja seu papel no pioneirismo d a descoberta do o u r o ,
seja a defesa de suas condutas n a G u e r r a dos E m b o a b a s —, escora-se nos relatos p r e -
sentes no Códice. Costa Matoso. E m b a s a d o nos d o c u m e n t o s e excertos publicados p o r
T a u n a y é q u e p a s s a r i a m a ser conduzidos os debates e as contribuições a respeito d o
tema. 4 1

C o m T a u n a y , desta forma, õ Códke Costa Matoso seria t r a n s f o r m a d o e m fonte


r e a n i m a d o r a de alguns dos mitos fundadores apropriados pelas historiografias paulista
e mineira. Ali se e n c o n t r a m a expedição d e A r z ã o , os detalhes da g u e r r a o p o n d o

Charles R. Boxer em outra ocasião apresentou o Códke Costa Matoso: "Esse códicefoi compilado em
1749-52, mas alguns daqueles cujas reminiscências são ali registradas, tinham chegado a Minas
Gerais antes do fim do século XVII e outros logo no início do século XVIII- Alguns desses relatos
foram transcritos por Taunay: Relatos Sertanistas (São Paulo, 1954), mas, infelizmente, com nu-
merosos erros de impressão, enganos e omissões. Fez ele muito melhor uso daquele inestimável
códice nos volumes IX e X de sua monumental História Geral das Bandeiras Paulistas, mas mesmo ali
nem sempre àk rclerências adequadas." Op. cit. nota 27, p. 59.
Em vista da complementaridade que o presente estudo guarda com a edição do Códice, preferimos,
a fim de evitar redundância, não apresentar aqui de modo exaustivo o uso de alguns de seus docu-
mentos pela historiografia, já quedas notas introdutórias especialmente preparadas para cada um
deles resgatam esse aspecto. O mesmo vale para certas referências bibliográficas e documentais
que jã constam nestes preâmbulos, explicativos, nos quais os diversos autores e suãs maiores contri-
buições serão lembrados.
PITA, Sebastião da Rocha. História da América portuguesa desde, o ano de. mil e quinlientos do seu descobrimen-
Lisboa Ocidental: Oficina de Joseph Antônio da Silva, 1 730.
to até o de mil e setecentos e vinte e quatro.
L. 9,p. 402-414. Destacaríamos ao longo do percurso historiográfico entre Pitta e Taunay o estudo
de.MELO, José Soares de Emboabas: crônica de uma revolução nativista. Documentos inéditos.
São Paulo: São Paulo Editora 1929 e artigo de CARDOZO, Manuel Soares, The Guerra dos
}

Emboabas, civil war in Minas Gerais, 1708-1709. Hispanic American Historical Remew, v. 22, n. 3, p.
470-492, 1942, ambos muito bem pesquisados. Para o papel representado pela utilização do Códice
por Taunay na renovação desses estudos, ver MATOS, Odilon Nogueira de. A Guerra dos
Emboabas, In: HOLANDA Sérgio Buarque de (Dir.) História geral da emlizaçao brasileira. Rio de
Janeiro: Difel, 1977. T. 1, v. l,p. 299. Sobre o tema, ver bibliografia selecionada por GRAVATA,
Hélio. Hélio Gravata: Resgate bibliográfico de. Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pi-
nheiro, CEHC, 1998, p. 98-108. Apesar desta longa tradição, o tema está estacionado desde então.
TAUNAY, Afonso de E, op. cit. nota L3; TAUNAY, Afonso de E, op. cit nota 23, v. 10; TAUNAY,,
Afonso de E, op. cit. nota 23, 1953.
paulistas e forasteiros, o p a p e l dos p r i m e i r o s g o v e r n a d o r e s p o r t u g u e s e s , a pacifi-
cação da região p o r obra de Antônio de A l b u q u e r q u e Coelho de Carvalho, o
i m p a c t o da covardia do g o v e r n a d o r do R i o de J a n e i r o após a invasão francesa e a
mobilização d e apoio e m M i n a s Gerais, o e n f o r c a m e n t o e violento castigo impos-
to a Filipe dos Santos.42
M a t e r i a l d e n a t u r e z a quantitativa, o Códice ofereceria subsídios imediatos p a r a a
historiografia econômica^ c o m destaque p a r a as informações sobre o total de escravos
e m M i n a s e o v o l u m e de o u r o a r r e c a d a d o pelo quinto. O cálculo do n ú m e r o de
escravos teria, c o m o j á p u d e m o s ver, S i m o n s e n , T a u n a y , M a u r í c i o G o u l a r t e Virgílio
de N o y a P i n t o . 4 3
e, mais tarde, B o x e r entre seus estudiosos. P a r a a estimativa da
p r o d u ç ã o do o u r o e do v o l u m e remetido p a r a a M e t r ó p o l e e m vários m o m e n t o s d o
século X V I I I , T a u n a y e Boxer t r a t a r a m apenas de u m a p e q u e n a p a r t e desse tipo d e
informação q u e habita no original.
A m a i s r e c e n t e i n v e s t i d a n o Códice p a r t i u d e estudiosos p r e o c u p a d o s e m
descortinar novos temas da história colonial, e m particular as disputas d e jurisdição
e n t r e o p o d e r real e a Igreja em M i n a s Gerais. A existência d e vasto material a respei-
to da estrutura financeira do bispado d e M a r i a n a , d e suas receitas e despesas, d a
legislação referente à j u s t i ç a e à ouvidoria t e m servido p a r a sustentar estudos c o m o os
d e M a r c o s M a g a l h ã e s de Aguiar e íris K a n t o r . 4 4

Se essas f o r a m temáticas cuja c o n s a g r a ç ã o d e p e n d e u d i r e t a m e n t e d o c o n t e ú d o


do Códice, o uso f r a g m e n t a d o de seus d o c u m e n t o s revelaria contribuições notáveis.

*• Alguns desses mesmos relatos, consultados cm outr;\sfontes,parecem ter servido de fontes para a
redação de ROCHA, José. Joaquim da, Geografia histórica da capitania de Minas Gerais. Descrição geográ-
fka.} topográfica, histórica e politica da Capitania de. Minas Gerais. Memória ht&tihka da sapitania de Almas
Gerais.Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, CEHCJ995; COELHO, José João Teixeira.
Instrução para o governo da capitania deMinas Gerais. Belo Horizonte; Fundação João Pinheiro, CEHC,
1994 e COSTA, Cláudio Manuel da. Fundamento Histórico do poema Vila Rica. In: PROENÇA
FILHO, Domício (Org.). A poesia dos inconfidentes: poesia completa de Ciáudip Manuel da Costa,
Tomás Antônio Gonzaga eAlvareiiga Peixoto. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 360-376 e
347-446.
4 3
- SIMONSEN, Roberto, op. cit nota 30; TAUNAY, Afonso de E., op. cit. nota 23; GOULART,
Maurício. A Escravidão Africaria no Brasil. 3. ed. São Paulo: Alfa Orneia, 1949. p. 142i PLNTO,
Virgilio de Noya. 0 ouro brasileiro e o comércio anglo-português. São Paulo: Nacional; Brasília: INL,
1979.
4
• AGUIAR, Marcos Magalhães de, Vila Rica dos confrades: sociabilidade confraria! entre negros e
mulatos no século XVIII. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1993. KANTOR, íris, Pacto
Festivo em Minas Colonial: & entrada triunfal do primeiro bispo na Sé de Mariana. São Paulo: Univer-
sidade de São Paulo, 1996,
A i n d a n o t e r r e n o das pesquisas sobre M i n a s , material do Códice ilustrou situ-
ações e n v o l v e n d o carestia, m o d a l i d a d e s d e c o n s u m o e tipos de a l i m e n t a ç ã o dos
h a b i t a n t e s . E n q u a n t o Sérgio B u a r q u e d e H o l a n d a 4 5
decifrou alguns d e seus re-
gistros p a r a descrever as comidas dos sertanejos, W a l d e m a r d e A l m e i d a B a r b o s a ê
Beatriz R i c a r d i n a M a g a l h ã e s r e c o r r e m a o Códice p a r a falar d a dieta d o s m i n e i -
r o s ^ e D o n a l d R a m o s conseguiria redigir a m p l o estudo sobre Vila R i c a a p a r t i r
4

d e i n ú m e r o s de seus d o c u m e n t o s . 4 7

A crítica heurística ao v o l u m e original p e r m i t e traduzir i m p o r t a n t e s definições a


respeito d e s u a n a t u r e z a . A d a t a ç ã o da e n c a d e r n a ç ã o , situada n o século X V I I I , con-
t e m p o r â n e a p o r t a n t o da p r o d u ç ã o dos documentos^ sustenta a convicção d e q u e o
e n c e r r a m e n t o destes papéis e m u m v o l u m e t e n h a sido u m a iniciativa c o n c l u í d a pelo
c o m p i l a d o r a i n d a e m v i d a . ^ , A confirmação dessa possibilidade t o r n a indiscutível a
4

existência de u m a ação voluntária da p a r t e deste p r e s i d i n d o a o r d e n a ç ã o e o e n c a d e -


a m e n t o d o m a t e r i a l . O m e s m o p o d e r í a m o s afirmar c o m respeito às características
caligráficas registradas n a l o m b a d a e n a página-título do Códice, pois é d a lavra d o
p r ó p r i o C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o a r e d a ç ã o do texto Vários papéis, q u e a p a r e c e n o

.HOLANDA, Sérgio Buarque de.. Metais e pedras preciosas. In: HOLANDA, op. cit. nota 38 e
HOLANDA, Sérgio. Buarque de, Caminlios e Fronteiras. 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras,
1994. p. L82.
BARBOSA, Waldemar de Almeida. A decadência das Minas e ftjuga da mineração. Belo Horizonte,
UFMG, Centro de Estudos Mineiros, 1971. p. 214; MAGALHÃES, Beatriz Ricardina de. A de-
manda do trivial. Revista Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, n. 65, p. 191,1987. Em Minas
Gerais o conhecimento do Códice de forma mais sistemática parece, ter estado associado ao Centro
de Estudos Mineiros, na década de 1970. Pesquisadores, e estudiosos como Francisco Iglesias, Síl-
vio Gabriel Diniz, Hélio Gravata, Cássio Lanari, Tarquinio de Oliveira, Afíbnso Avila, dentre
outros, investiam em um ambicioso projeto de publicações de documentos históricos e divulgação
de fontes relevantes para a história de Minas Gerais.
RAMOS, Donald, op. cit. nota 31.
Para a conclusão segura a respeito da datação da encadernação do Códice, apoiamo-nos em laudo
preparado por Guita Mindlin, a quem agradecemos pela inestimável colaboração: "O Códice possui
uma encadernação do século XVIII, portanto, contemporânea ao documento [...]. A encaderna-
ção é feita em pergaminho, muito fino (velino); b pergaminho é forrado com tecido apenas no
lombo (na parte interna do lombo); a encadernação não possui cabeceado. Para formar os cader-
nos, os documentos são costurados com fios de linha. Para formar o volume, os cadernos são
costurados com 4 tiras em pergaminho. O volume possui 4 tiras em pele curtida ao alúmen para
formar os fechos (amarras). O Códice possui vários tipos de papel, todos feitos á mão."
velino de sua l o m b a d a , e o título redigido n a folha d e a b e r t u r a do Códice.^ Alcan-
ça-se, p o r c o n s e g u i n t e , u m a p r i m e i r a certeza f u n d a m e n t a l : p a r t i u d e u m ato d e
v o n t a d e do antigo ouvidor das M i n a s a r e u n i ã o desses d o c u m e n t o s e m u m volu-
me. ^ u
A n a l i s a r e m o s o pleno significado disto m a i s a d i a n t e .
E e x t r e m a m e n t e difícil precisar a d a t a e m q u e a coleção foi c o n c e b i d a c o m o
tal. Q u a n d o C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o teria c o m e ç a d o a r e u n i r os d o c u m e n t o s
q u e iriam c o m p o r mais tarde o Códice? Q u a n d o , d a n d o p o r finda a tarefa d e j u n t a r
os papéis sobre o Brasil, teria decidido encerrá-lo?
N e n h u m a das perguntas p e r m i t e respostas exatas, e o ú n i c o c a m i n h o p a r a se
fixar sua cronologia e. tentar d a t a r os períodos e m q u e os diferentes d o c u m e n t o s teri-
a m sido trasladados p a r a leitura do colecionador. O p r i m e i r o impulso seria atribuir a
d a t a inicial d a f o r m a ç ã o do c o m p ê n d i o à s u a chegada, e m 1749, ao p o s t o de ouvidor
de Vila R i c a , q u a n d o feria s u p o s t a m e n t e c o m e ç a d o a reunir o material.-^ Reforça
essa definição o g r u p o inicial de d o c u m e n t o s sobre o p o v o a m e n t o das M i n a s , materi-
al q u e foi, ao q u e t u d o indica, d i r e t a m e n t e solicitado pelo ouvidor a antigos m o r a d o -
res assim q u e chega à região.
J á o e n c e r r a m e n t o do Códice o c o r r e c e r t a m e n t e e m Portugal, a l g u m t e m p o de-
pois de seu r e t o r n o do Brasil, e m 1752, q u a n d o passa a se dedicar à a d v o c a c i a . ^ A 5

fixação d e u m m o m e n t o exato p a r a a conclusão d a c o m p i l a ç ã o é tarefa a i n d a m a i s


ingrata. C o m o saber a d a t a e m q u e lhe chegou às mãos o último dos d o c u m e n t o s ,
diante d e u m universo tão g r a n d e d e material n ã o - d a t a d o ? C o m o supor q u a n d o o dr.

Desta vez, nutra especialista hábil e generosa concorreu para nos auxiliar. A professora Yêdda Dias
Lima redige o seguinte comentário paleográfico a respeito da lombada e página de título: "Escrita
moderna, bastarda do século XVIII, cursiva destrógrada, com traçado evoluído e personalizado,
identificável em muitos dos manuscritos do Códice, inclusive em rasuras efetuadas em escritas distin-
tas, de terceiro. Podemos identificada com autógrafos do titular, o ouvidor da Comarca de Ouro
Preto, Gaetano da Costa Matoso. Destacam-se, entre os caracteres, o "s" final, pendente, abaixo
da linha da escrita, com cauda prolongada, atingindo duas ou mais letras da palavra, terminando
em laçada, ou traço arredondado simples; o "p", com dupla haste inferior, destrógiro; o "d" de tipo
uncial, na maioria das vezes formando nexo, quando seg-uido de vogais. Abreviatura usual do
relativo "que" em que a indicação da abreviatura parte da haste inferior da letra, formando um
semicírculo envolvente."
A existência de outros códices que integrassem sua livraria reforça a evidência dessa vontade de
ordenar em volume especial todos os registros que acumulara sobre Minas e o Brasil. Também
atribuído a Caetano da Costa Matoso, foi localizado códice na Biblioteca Nacional de Lisboa,
trazendo composições latinas, que comentaremos no último segmento desse estudo (BNL, cód.
3786. Coleção de composições latinas, [254 fl.], onde suspeitamos existir ainda outros).
Alguns comentadores fixaram entre 1749 e 1752 a datação do Códice, entre eles BOXER, Charles
R., op. cit. nota 27, p. 59 e 382. Ao cuidadoso historiador Tarquinio de Oliveira não escaparia que
em 1754 "o ouvidor Matoso parece ter concluído seu intento", OLIVEIRA, TarquínioJ. B . , op- cit.
nota 33, p. 102.
Informações biográficas mais precisas sobre o período de Costa Matoso em Portugal após o retor-
no do Brasil encontram-se na parte 3 (0 ouvidor instruído) deste estudo.
M a t o s o resolveu e n c e r r a r e m u m v o l u m e e n c a d e r n a d o os papéis relacionados a o
Brasil?
È possível estabelecer, c o m g r a n d e m a r g e m de acerto, u m a periodização p a r a a
c o m p i l a ç ã o dos d o c u m e n t o s q u e iriam u m dia c o m p o r o Códice, Fixando q u a t r o fases
distintas e n t r e os a n o s 1745 e 1754.
A p r i m e i r a - 1745-1748 — p o d e r í a m o s c h a m a r d e p r e p a r a t ó r i a . C o m e ç a e m
1745, q u a n d o , desvencilhado do posto de j u i z de fora de Setúbal (1742-1745), o dr.
C a e t a n o passa a p r e p a r a r os planos de sua n o m e a ç ã o p a r a o Brasil, q u e ocorreria e m
agosto d e 1748, c o m a p a r t i d a p a r a os trópicos e m d e z e m b r o d a q u e l e m e s m o a n o .
P r e v e n i d o e desde j á r e c o n h e c i d o c o m o h o m e m meticuloso, o o u v i d o r p o d e r i a ter
r e u n i d o m a t e r i a l informativo a respeito da r e a l i d a d e q u e iria e n c o n t r a r n o além-
rnar.53 Nessa categoria estariam o Itinerário geográfico ( d o c u m e n t o 139), q u e possivel-
m e n t e foi lido e e s t u d a d o p a r a auxiliá-lo n a orientação d e sua v i a g e m pelos c a m i n h o s
de M i n a s , e as anotações feitas a partir de livros d e História d a A m é r i c a p o r t u g u e s a ,
d e n t r e eles A vida, do padre Almada de S i m ã o d e Vasconcelos ( d o c u m e n t o 128), alguns
dos relatos d e v i a g e m pelas zonas mais r e m o t a s do Brasil p o r t u g u ê s ( d o c u m e n t o s 1.30
a 137) e, m e s m o , os d o c u m e n t o s legais anteriores a 1748, c o m o várias das leis associ-
adas a seu oficio.

A segunda fase — 1749-1752 —, a mais fecunda de t o d a s , a q u a l se confunde c o m


a p a r t i d a do R i o p a r a M i n a s , e m j a n e i r o d e 1 749, e sua saída d e Vila R i c a , e m abril
d e 1752, seria identificada, através dos d o c u m e n t o s relativos a M i n a s G e r a i s . Ali,
beneficiado d a p r o x i m i d a d e c o m as fontes escritas e orais, c o m p u l s o u material n a r r a -
tivo, transcreveu papéis das c â m a r a s c Provedoria, obteve cópias de d o c u m e n t o s ecle-
siásticos. D e s t a e m p r e s a resulta o v o l u m e m a i o r de m a t é r i a do. Códice, d e m a r c a d o
desde o d o c u m e n t o 2 ao 116.
A terceira fase - e n t r e m a i o e s e t e m b r o de 1752 - apóia-se n a sua t e m p o r a d a n o
R i o de J a n e i r o . C o s t a . M a t o s o aproveita o tempo n a c i d a d e p a r a c o p i a r u m ou outro
registro disponível nos arquivos d a cidade, m o n t a n d o a seqüência do d o c u m e n t o 1.17
ao 126, e p a r a vasculhar os livros do S e n a d o , a fim de c o m p o r sua Relação dos ouvidores-
gerais do Rio de janeiro ( d o c u m e n t o 1 19) e transcrever o Regimento do ouvidor-geral da cidade
do Rio de janeiro ( d o c u m e n t o 125). Aí t a m b é m e n c o n t r a papéis g a r i m p a d o s e m fontes
eclesiásticas, ao transcrever trechos das Constituições primeiras do arcebispado da Bahia,
q u e resultariam n o Catálogo dos bispos ( d o c u m e n t o 126), e o Testamento de Domfrei Antônio
de Guadalupe ( d o c u m e n t o 121).

O leitor atento fará notar a presença de muitas cópias de documentos com datação anterior a
1 a l g u n s mesmo de épocas mais remotas, como 1G69. Constituem, porém, todos eles matéria
copiada no período em que reuniu informações para subsidiar sua atuação, como ouvidor de Vila
Rica.
A última e t a p a — 1752-1754 - transcorre desde seu r e t o r n o à M e t r ó p o l e até
a p r o d u ç ã o dos últimos d o c u m e n t o s q u e c o m p o r i a m o Códice: o Regimento de 10 de
outubro de 1754 sobre os emolumentos dos ouvidores e mais justiças das comarcas de Minas
Gerais ( d o c u m e n t o 96) e o Papel sobre o novo regimento retro, c o m e n t á r i o s d e Francisco
A n g e l o Leitão sobre o r e g i m e n t o ( d o c u m e n t o 97). N o p e r í o d o , confecciona, e m
1752,. rigorosa avaliação dos r e n d i m e n t o s d o b i s p a d o d e M a r i a n a ( d o c u m e n t o s
99-108) a t e n d e n d o às obrigações c o n t r a t a d a s c o m o rei e, c m 1753 « 1754, ad-
q u i r e os m a p a s d e a r r e c a d a ç ã o do q u i n t o e m M i n a s (documentos 70-73).
D e s t e m o m e n t o e m d i a n t e , o ouvidor p a r e c e e n c o n t r a r t e m p o e certa disponi-
bilidade p a r a t r a t a r d e m a n e i r a cuidadosa centenas destes diferentes d o c u m e n t o s
q u e v i n h a j u n t a n d o , ordená-los n a f o r m a final c o m q u e nos alcançou esse material e
a n o t a r alguns dados atualizados sobre a q u e l a colônia, c o m o os n o m e s dos governa-
dores n o m e a d o s p a r a o E s t a d o do Brasil desde sua p a r t i d a . ^ 5

A idéia de coleção preside á organização do Códice. A r e d a ç ã o do título Coleção


das noticias dos primeiros descobrimentos das minas na América quefez o doutor Caetano da Costa
Matoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Prelo, de que tomou posse emfevereiro de 1749 n a p r i m e i -
r a folha do original constitui, desde j á , indicativo dessa i n t e n ç ã o . Este e n u n c i a d o
a u t o r a l , c o n t u d o n ã o serve c o m o m e d i d a p a r a a totalidade d e seus d o c u m e n t o s ,
3

referindo-se a p e n a s aos relatos q u e f o r m a m u m " c a d e r n o " inicial d e 15 d o c u m e n t o s


(documentos 2 - 1 4 ) . 55

N a definição d e Rafael Bluteau, e m seu Vocabulário português e latino, a p a l a v r a


coleção significa " a j u n t a m e n t o ; coleção de várias cousas q u e se t e m lido e a n o t a -
do". 5 6
O Códice surge d i r e t a m e n t e dessa iniciativa de colecionar, atitude q u e n a q u e l e
m o m e n t o a t e n d i a às exigências do fazer historiográfico ditadas p e l a . A c a d e m i a R e a l
d e História. V e r e m o s mais adiante q u e a experiência u l t r a m a r i n a transfigura o letra-
do e m historiador, colecionando papéis, m e r g u l h a n d o onde- q u e r q u e estivesse - n a
cidade d o R i o de J a n e i r o ou e m M i n a s Gerais — nos depósitos de m e m ó r i a disponí-

No documento 118, Memória dos governadores que tem havido nesta capitania do Rio de Janeiro desde o princí-
as atualizações alcançam dom Luís de Vasconcelos e Sousa, que governa de
pio de seu descobrimento,
1779 a 1790.
Em virtude disto, optamos por agregar Vários papéis, escrito pelo próprio compilador na lombada,
ao título da presente edição, a fim de restaurar a concepção integral do Códice- Suspeitamos que
Caetano da Costa Matoso tenha se aproveitado na ocasião da encadernação de antiga folha de
abertura preparada quando começou a reunir ainda êm Minas Gerais o grupo de narradvas sobre
a descoberta e colonização da regiãp.
BLUTEAU, Rafael. YoiahnUirioportuguês e latino [...]. Coimbra . Colégio das Artes da Companhia de.
1

Jesus. V. 2,p. 373.


veis: l e m b r a n ç a s de antigos m o r a d o r e s , livros dos órgãos administrativos, c o m o a
Secretaria d e g o v e r n o , a P r o v e d o r i a d e F a z e n d a e o u t r o s . ^ '
N ã o teria sido o único a agir desta forma. D e n t r e outros, u m dos funcionários
coloniais que.se e s m e r a e m repetir a o r d e n a ç ã o d e . d o c u m e n t o s , e m o b r a d e d i c a d a a o
g o v e r n a d o r d e M i n a s , foi Francisco A. R e b e l o , q u e intitula seu t r a b a l h o c o m o Erário
Régio de S.M.F. Ministrado pela Junta da Real Fazenda de Vila Rica, t r a z e n d o a i n d a o a n ú n -
cio Coleção de notícias que conservem um mediano conhecimento da origem dos rendimentos e suas
distribuições, do seu princípio, aumento e declinação; mendigadas por unsfragmentos de outros livros
da Provedoria; a impulsos dõ infatigável zelo ê exquisiçào do limo. Exmo.. Sr. Luis Diogo Lobo da
Silva governador e capüão-general da capitania das Minas Gerais e presidente da Junta, escrita e
referendada pelo contador da mesma no ano de J76SA% A sutil diferença e n t r e a m b a s cole-
ções estava n o c a r á t e r encomiástico q u e possuía a do c o n t a d o r d a J u n t a d e F a z e n d a
d e Vila Rica, assim c o m o outras tantas q u e n a é p o c a se redigiram.
O q u e , p o r é m , diferencia o Códice Costa Matoso d e tantos outros q u e o r b i t a m p o r
bibliotecas, estantes d e colecionadores e casas d e leilões, e n t r e p a p é i s vendidos p o r
casas de n o b r e s e m dificuldade o u a n u n c i a d o s p o r agentes q u e r o n d a m os depósitos
d e livros de. órfãos e viúvas, buscado p o r bibliófilos caçadores de. raridades?
Códices manuscritos o c u p a v a m p a p e l d e destaque nas antigas bibliotecas pesso-
ais. S u a posse r e c o b r i a várias finalidades: desde r e u n i r de p r ó p r i o p u n h o m a t é r i a
literária da predileção de letrados até servir, sob a camuflagem d a e n c a d e r n a ç ã o , d e
disfarce p a r a textos impressos p r o i b i d o s p e l a censura.
Nessas livrarias, m a n u s c r i t o s d e v e r i a m estar e m l u g a r diferenciado com relação
aos livros impressos, constituindo o elemento mais p r ó x i m o d a p r i v a c i d a d e do possui-
d o r ao espelhar gostos, preferências, curiosidades, h o n r a s e m e r c ê s recebidas, além
de p o d e r e m se p r e s t a r c o m o fonte de orientação p a r a u m a a t u a ç ã o administrativa.
Alguns desses códices e r a m verdadeiros diários literários voltados p a r a a fruição
d e seus possuidores, refletindo tendências e predileções pela sátira, glosas, e p i g r a m a s ,
profecias, sonetos jocosos ou a m o r o s o s . H á u m a g r a n d e escala de variações nesse
tipo de livro. A maioria delas p r e s e n t e nas livrarias do Antigo R e g i m e e m Portugal
servia p a r a uso particular de h o m e n s cultos, q u e c o n s ü t u í a m copiadores p a r a os as-
suntos de seu interesse. Ali se transcrevia t o d o tipo d e d o c u m e n t o s , oficiais o u n ã o .
O u t r a s vezes tais copiadores r e p r o d u z i a m d o c u m e n t o s s e m a p r e o c u p a ç ã o d e se cons-

Trataremos mais adiante do tema da vinculação do Códice com os procedimentos historiográficos


do período.
Oliveira, Tarquinio J. B. de,op. cít. nota 33.
BM.DM, Add.,ii. 15195.
tituir e m cópias a u t o r i z a d a s (traslados o u cópias certificadas), b a s t a n d o , m u i t a s
vezes, q u e fossem cópias imitativas ou figuradas dos d o c u m e n t o s .
Muitos deles m i s t u r a v a m textos políticos pertinentes à função q u e exerciam c o m
narrativas, sátiras, proposições e outros tais. E m b o r a o d e s e m b a r g a d o r M a t i a s Pi-
nheirq tivçsse escrito Papéis políticos n a l o m b a d a de u m dos exemplares manuscritos d e
sua livraria, c o m o era previsível, ali se e n c o n t r a v a m t a n t o cópias d e d o c u m e n t o s ofi-
ciais sobre a negociação de p a z entre Portugal e H o l a n d a ou a Notícia dos sucessos e
expulsão dos p a d r e s da C o m p a n h i a d o Estado d o M a r a n h ã o [...] 1662 q u a n t o sátiras
e p r o p o s i ç õ e s . ^ Neste e noutros copiadores da livraria q u e p e r t e n c e r a ao
d e s e m b a r g a d o r j o ã o T a v a r e s d e A b r e u (que a adquirira de seu Colega M a t i a s Pinhei-
ro) as preferências estéticas e. o gosto p o r história militar se c o m b i n a r i a m nos Vários
:

papéis,, relações, composições poéticas, etc, relativos às vitórias alcançadas na índia, em 1746, por
dom Pedro Miguel de Almeida e Portugal, marquês de. Castelo Movo e. conde de Assumar, vice-rei da
India^ r e c h e a d o s d e panegíricos, versos e sonetos, e relações n a r r a n d o c a m p a n h a s
militares.

E x e m p l o p r i m o r o s o disto é o Códice Félix Machado, o u Coleção de ensaios sobre maté-


rias estéticas e políticas, com cópias de documentos oficiais e alguns originais, coligidos pelo genealogista
Félix José de Machado [...] [que] governou Pernambuco de 1711 a 1715.^ E m contraste a o
livro p r e p a r a d o pelo ouvidor C a e t a n o d a Costa M a t o s o , Félix M a c h a d o n ã o reuniu
e m seu c o p i a d o r muitas matérias, sobre o Brasil. Ao contrário, p o s s u i n d o p r e o c u p a -
ções mais p r ó x i m a s aos segmentos d a alta n o b r e z a m e t r o p o l i t a n a , os textos transcri-
tos reíletem a p r e o c u p a ç ã o do c o m p i l a d o r e m a c o m p a n h a r a situação i n t e r n a c i o n a l
n a segunda m e t a d e d o século X V I I e registrar d o c u m e n t o s relacionados à política
externa c o m a Inglaterra e a E s p a n h a , alguns deles discutindo temas d a politica euro-
péia e m forma d e prosa. E m segmento especial, d e n o m i n a d o Escritos em prosa, d e r r a -
m a prosas de c a r á t e r político, r o m â n t i c o e histórico, m o s t r a n d o a predileção d o cole-
c i o n a d o r pelo estilo. Félix M a c h a d o j u n t a a i n d a a m p l a legislação (parte dela impres-
sa), c o m o a lei p r a g m á t i c a de 1686, p r o i b i n d o o uso de guarnições d e o u r o e p r a t a , e
o r e g i m e n t o q u e os tabeliões das notas e d o judicial h ã o d e ter, c o n f o r m e a n o v a
r e f o r m a ç ã o das O r d e n a ç õ e s d o R e i n o u
O u t r a m o d a l i d a d e destes copiadores r e u n i a sob u m m e s m o v o l u m e d o c u m e n -
tos d e temática única, t r a z e n d o textos econômicos, o u políticos^ ou d e o u t r a espécie.

b 0
- "BM .DM,Add.,n. 15198. Papéis políticos, t. 6. 364 fl.
1

í;1
' "BM, DM, Add, n. 20-907.
.BM, DM, Add., a. 20966. Sou grato a Evaldo Cabral dc Mello por ter me chamado a atenção para
certa similitude, entre este códice do governador pernambucano e o do ouvidor mineiro.
63
- Idem.
Nessa classificação estariam reunidas, diversas viagens realizadas à A m é r i c a , c o m o
o códice Voyage up lhe river madeira in Brazil, q u e transcreve, d e n t r e outros, A tour up the
Madeira begun 25 sep.. 1749, Relação da guerra e sucessos de Mato Grosso desde o ano de, 1759 até
o ano de 1764 e Noticias do Lago Xaraies.^
A i m p o r t â n c i a q u e a p r e s e n ç a desse tipo d e livro m a n u s c r i t o alcançou n a cultu-
ra letrada do A n t i g o R e g i m e n ã o foi p e q u e n a . H á ocasiões e m q u e a confecção p r e -
tendeu servir de a g r a d o , oferecido a pessoas influentes, revestido d e a l g u m fim utilitá-
rio. C o m especial esmero n ã caligrafia, d i a g r a m a ç ã o e e n c a d e r n a ç ã o é q u e foi p r e p a -
r a d o o Várias resoluções tomadas cm consultas e decretos que principiou a extrair dos livros antigos
do desembargo do Paço Sebastião Ferreira de Castro e concluiu seu sobrinho José Ricalde Pereira de
Castro. Oferecidas ao limo. Exmo. Sr. Conde de Oeiras do Conselho de S. Majestade e seu secretário
de Estado dos Negócios do Reinou São patentes o zelo e o c a p r i c h o n a o r d e n a ç ã o de seu
c o n t e ú d o , e m q u e os t e m a s a p a r e c e m e m o r d e m alfabética e a c o m p a n h a d o s dos
textos das decisões judiciais t o m a d a s pelo T r i b u n a l e n t r e 1642 e 1699.
O Códice Costa Matoso está assim m u i t o distante de u m códice diplomático, livros
e m q u e se a s s e n t a v a m cópias d e d o c u m e n t o s o f i c i a i s 66
e q u e muitas vezes, refletindo
;

a indistiíição e n t r e público e p r i v a d o , i n t e g r a v a m essas livrarias pessoais daqueles


q u e serviram a o s o b e r a n o . Alguns exemplos notáveis são os livros de registro d e car-
tas do g o v e r n a d o r d o P a r á a Sebastião J o s é de C a r v a l h o e Mello, seu i r m ã o , e n t r e
1751 e 1 7 5 7 , ^ nos quais se e n c o n t r a m transcritas cópias d e toda a c o r r e s p o n d ê n c i a
t r o c a d a entre os irmãos e, ao m e s m o t e m p o , administradores das alternativas p a r a o
I m p é r i o b u s c a d a s n a q u e l a r e m o t a região.
D e o u t r a p a r t e , p o d e r i a m esses códices registrar os d o c u m e n t o s oficiais dirigidos
a funcionários, semelhantes a relíquias, e m vista d a c h a n c e l a reai, q u e c o n v e r g i a m ao
longo de d é c a d a s sobre u m fidalgo ou sua estirpe. Assim se verifica n o códice Cartas
d'el Rei a. Gaspar de Sousa, (1540-1626), em que se teve o cuidado de copiar todas as ordens,
honrarias, mercês, provisões de oficio dirigidas a Gaspar de Sousa anks e depois de ter servido como
governador geral do Brasil.^

BM, DM, Add., n. 15191.


BM, DM, Add., n. 209G0, 34011.
O termo "códice" conhece as seguintes definições: livro manuscrito ou livro que reúne documen-
tos manuscritos. CAMARGO, Ana Maria de Almeida e BELLOTTO, Heloísa Liberalli (Coord.)
Dicionário de terminologia arquivística. São Paulo: Associação dos Arquivistas Brasileiros,-Núcleo Regi-
onal de São Paulo, Secretaria do Estado da Cultura, 1996.. p. 16; BELLOTTO, Heloísa Liberalli.
Arquivos permanentes: tratamento documental, São Paulo: T.A. Queiroz, 1991. p. 65-66.

BM, DM, Add., n. 20996 e n. 20997, respectivamente.


PI. manuscrito inédito.
Se nesse caso os registros d e r i v a m d a p r o d u ç ã o d i r e t a do f u n c i o n á r i o , e m
g r a n d e n ú m e r o de ocasiões as autoridades, especialmente os o c u p a n t e s dos postos
d a alta magistratura, r e u n i a m e m seus livros farta transcrição de legislação neces-
sária a o exercício d e seu oficio ou a o seu c a m p o d e interesse, j u s t a m e n t e c o m o
o c o r r e , a i n d a q u e e m p e q u e n a escala, n o Códice Cosia Matoso. O célebre erudito
J o ã o P e d r o R i b e i r o ^ possuía e m s u a livraria alguns t o m o s cujas l o m b a d a s infor-
6

m a v a m Registro da Relação da Bahia, e m q u e estavam r e p r o d u z i d a s provisões, certi-


dões, cartas regias, acórdãos e a m p l a legislação sobre o Brasil d e s d e o século X V I I ,
c o m especial d e s t a q u e p a r a as matérias r e g u l a n d o a jurisdição dos o u v i d o r e s . ^
O c o n t e ú d o do Códice Cosia Matoso n ã o se afina, p o r é m , c o m n e n h u m a destas
classificações preliminares e mistura e m doses b e m equilibradas d o c u m e n t o s diplo-
máticos — aqueles de n a t u r e z a estritamente jurídica t r a t a n d o de relações político-
administrativas — e fontes narrativas — crônicas, ensaios, c o m e n t á r i o s , m e m ó r i a s .
A u m p r i m e i r o golpe de vista o e x a m e do códice original p o d e sugerir a idéia d e
u m a e n o r m e d e s o r d e m , sensação p a r a a qual c o l a b o r a m a m i x ó r d i a d e papéis, a
diferença de caligrafia e a mistura de assuntos. E s s a i m a g e m c o n t u d o se d e s m a n c h a à
m e d i d a q u e p e r c o r r e m o s c o m vagar a sucessão de seus" d o c u m e n t o s . Percébe-se, muito
a o contrário d a impressão inicial, u m cuidadoso esforço de classificação p o r g r u p o s
d e assuntos, d e n t r o dos quais prevalece certa o r d e n a ç ã o cronológica.
P e r c o r r e r o Códice à vol d^oiseau possibilita a a p r e e n s ã o da r e a l i d a d e vivenciada
p o r esse letrado p r o f u n d a m e n t e m a r c a d o pelo contexto e m q u e vivia, fosse nas M i n a s
ou fosse n a A m é r i c a p o r t u g u e s a . A figura do colecionador — p o r definição aquele q u e
n ã o a p e n a s coleta, m a s o r d e n a o material a d o t a n d o critérios seletivos n a distribuição
d e seus papéis — e m e r g e de m a n e i r a inconteste c o n f o r m e se v i s l u m b r a m seus sucessi-
vos núcleos temáticos, q u e descrevemos a seguir, c o m o u m a o b r a d e refinada classifi-
c a ç ã o . D e s t a f o r m a u m a breve exposição do contexto e m q u e f o r a m formulados os
textos, colecionados p o d e t a m b é m colaborar p a r a r e c o m p o r u m dos nexos desse m ú l -
tiplo repertório de d o c u m e n t o s sobre, a América.
G o m o o título Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das Minas da América
[...] a n u n c i a , os textos de u m primitivo p r i m e i r o caderno, t r a z e m a g r u p a d o s relatos.

Presbítero secular (1758-1839), era formado em cânones por Coimbra, onde fora professor cate-
drático. Considerado uma das maiores figuras mentais da segunda metade do século XVIII, foi
desembargador da Casa de Suplicação, conselheiro da Fazenda, censor régio do Desembargo do
Paço, membro da Academia das Ciências de Lisboa. Grande enciclopédia protitguesa e brasileira. Lisboa,
Rio dejaneiro: Editorial Enciclopédia, 1967, V. 25, p. 593-595.
BGUC Cód. 706,707,708, 709, 71, Livros de registo de provisões, regimentos etc. da Relação da Balúa,
dos descobrimentos de ouro na região do sertão de São Paulo (documentos 2-9 e 14).
Q p e q u e n o grupo das Informações q u e segue — prestadas por moradores, de Freguesias
circunvizinhas a Vila Rica: M a r i a n a , G u a r a p i r a n g a , Catas Altas e A n t ô n i o Pereira
(documentos 10-13) — c o m p l e m e n t a u m conjunto de m e m ó r i a s e testemunhos nar-
rando a formação d a região, o povoamento e a organização civil e eclesiástica,
O conjunto reúne relatos de testemunhas e, mesmo, de partícipes que,, trocando
a c a t a n a pela p e n a , escreveram sobre o nascimento das M i n a s e m que. o ouvidor
pisava no a n o de 1749, São narrados três movimentos decisivos p a r a a história da
região: as bandeiras paulistas, a G u e r r a dos E m b o a b a s e a instalação do controle real.
O desbravamento do sertão colonial inóspito pelos paulistas em busca de índios p a r a
cativar em suas lavouras de planalto em fins do século X V I movera os bandeirantes a
percorrer o território, animados p o r honras e mercês oferecidas pela Metrópole, que,
até ali negligente, decide investir n a experiência daqueles súditos n a m e s m a p r o p o r -
ção q u e decresciam as exportações coloniais. Dedicariam os bandeirantes seu faro n a
busca de fabulosos metais. O s rios da região n ã o decepcionam n e m o rei n e m t a m p o u c o
a sua grei, enchendo de ouro as mãos que. mergulhavam em suas frigidíssimas águas.
As notícias q u e se e s p a l h a m a c a b a m a t r a i n d o u m n ú m e r o elevado de sequiosos
mineradores de ocasião p a r a a área, os quais, nq mesmo ritmo q u e dividem as lavras
descobertas, t r a v a m duelos ê disputas. Algumas vezes sangrentas, as tensões e n t r e
paulistas e forasteiros — estes últimos, conhecidos sob a designação d e e m b o a b a —
forneceriam material p a r a a historiografia fabricar o t e m a da G u e r r a dos E m b o a b a s ,
mito fundador do nativismo. Sucessivos episódios de violência revelariam, de u m
lado, a convicção d a identidade dos súditos paulistas c o m o os primeiros descobrido-
res do tesouro, e p o r isso julgavam-se merecedores da primazia nos postos e nas datas
repartidas, e, de outro, ã força material dü grupo que invadiu a área, atropelando os
direitos de seus ocupantes originais. A tópica da fome e d a miséria, das violências q u e
sofriam diante dos índios, dos sacrifícios materiais que passavam alimentava e unia os
paulistas c o n t r a tantas insolências dos recém-chegados. N o rastro d a instabilidade
social e política q u e convulsiona aquele, pedaço da América portuguesa o p o d e r real
seguiria buscando Ordenar seus súditos à m e d i d a que se confirmava a generosidade
do veio ferido. G o v e r n a d o r e s seriam enviados p a r a fazer representar a p r o t e ç ã o e
b e n e v o l ê n c i a reais, sendo p o r é m mal recebidos pelos novos m o r a d o r e s a i n d a na
estrada. D o orgulho à dissimulação, os delegados reais a p r e n d e r a m q u e a negociação
era o melhor c a m i n h o para reinar sobre aqueles colonos. Se o governador d o m Rodrigo
é assassinado ao insistir e m avançar, a despeito da insegurança que existia e m M i n a s ,
d o m F e r n a n d o d e Mascarenhas deu meia volta q u a n d o se aproximava d a zona de
m i n e r a ç ã o , constrangido por a m e a ç a s de m o r t e . M a i s hábil e b e m t a l h a d o p e l a
r e a l i d a d e c o l o n i a l , A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e furaria a q u e l e i n t r i g a n t e b l o q u e i o
d e súditos leais, conseguindo chegar a o c o r a ç ã o das minas e n e g o c i a r o d e s a r m e
d a s r e s i s t ê n c i a s . A p a c i f i c a ç ã o d a G u e r r a dos E m b o a b a s c o n f u n d e - s e nesse
m o m e n t o c o m ps p r i m e i r o s p a s s o s do c o n t r o l e r e a l s o b r e as M i n a s , a f a s t a n d o
p o t e n t a d o s , o r g a n i z a n d o a estrutura politica sob vilas e c â m a r a s , p a t r o c i n a n d o a
r e p r e s e n t a t i v i d a d e , a n u n c i a n d o f o r m a s m a i s efetivas c o m q u e S u a M a j e s t a d e
d o r a v a n t e r e c e b e r i a o direito d o q u i n t o s o b r e o m i n é r i o e x t r a í d o . O c a m i n h o
a i n d a sè m o s t r a r i a l o n g o a t é aqueles súditos orgulhosos r e c o n h e c e r e m q u e sua
lealdade forjada n a opulência g a r a n t i d a ao s o b e r a n o n ã o era m a i o r q u e a delega-
ção real dos funcionários n o m e a d o s p a r a governá-los.
A o r g a n i z a ç ã o do p o d e r real através d e seus principais d o c u m e n t o s oficiais
destinados ou aplicáveis a M i n a s explica o g r u p o seguinte de d o c u m e n t o s (docu-
m e n t o s 16-31), c o m vários regimentos: do g o v e r n a d o r interino M a r t i n h o de M e n -
d o n ç a , d a c a p i t a ç ã o , dos superintendentes, dos ouvidores do R i o d e J a n e i r o e São
P a u l o . T r a t a - s e d e fontes d e t r a b a l h o do o u v i d o r n o m e a d o p a r a a c o m a r c a d e
V i l a R i c a , u m a vez q u e constituíam os fundamentos legislativos afetos à sua juris-
dição, c o m o os regimentos do R i o e São Paulo, q u e foram validados p a r a orientar
a o r g a n i z a ç ã o d a J u s t i ç a real e m M i n a s Gerais. Alguns textos e n t r e m e a d o s aos
r e g i m e n t o s p a r e c e m ilustrar ocorrências passadas n a c a p i t a n i a , a p r e s e n t a n d o os
dilemas dos antecessores e m seu c a r g o . Equilibravam-se a n o r m a e a p r á t i c a . O
d o c u m e n t o , q u e e n c e r r a a s e q ü ê n c i a , r e s u m i n d o a legislação e x a r a d a p a r a S ã o
Paulo o M i n a s Gerais, confirma tais p r e o c u p a ç õ e s .

U m a vez q u e o exercício da função d e J u s t i ç a no â m b i t o d a c o m a r c a de Vila


R i c a exigia õ c o n h e c i m e n t o das fontes legislativas q u e c e r c a v a m s u a atribuição, estas
a p a r e c e m r e p r o d u z i d a s c o m generosidade n o Códice. M a g i s t r a d o c o m especial a p e g o
às disputas forenses, os textos legais q u e p a v i m e n t a v a m a j u s t i ç a n a A m é r i c a p o r t u -
guesa e nas M i n a s Gerais constituiriam a r m a s decisivas c o n t r a as resistências de ou-
tras esferas d e p o d e r . Afinal, superadas as resistências das forças privadas q u e i m p e -
d i r a m nas primeiras décadas o pleno exercício d o p o d e r real, as disputas e n t r e p o d e -
res concorrenciais constituiriam novos p r o b l e m a s . A confusão d e jurisdição e n t r e o
p o d e r t e m p o r a l e o secular g a n h a r i a contornos d r a m á t i c o s a p a r t i r da d é c a d a d e
1740 c o m a criação do bispado d e M a r i a n a e c o m o esforço de ouvidores mais incisi-
vos e m afirmar os termos da jurisdição del-rei. Abre-se desta feita u m a t e m p o r a d a d e
desencontros a m i s t u r a r conflitos envolvendo c â m a r a s , m a g i s t r a t u r a local, p a d r e s ,
justiça eclesiástica, bispo e ouvidores71
A A m é r i c a em q u e pisava õ ouvidor p o r t u g u ê s mostrar-se-ia n a q u e l e m o m e n t o
objeto de outras formas d e inquietação. A o lado d a . m e m ó r i a legal q u e t e n t a v a re-
construir, a c e n d i a m - s e n a q u e l a p r i m e i r a m e t a d e do século X V I I I as buscas pelas
origens. U m d e s e n h o a c o m p a n h a d o de dois textos explicativos (documentos 33-34)

Sobre a organização da Justiça nas Minas, ver item adiante De Setúbal a Vila Rica.
i n t r o d u z e m u m a q u e b r a n a sucessão d e temas administrativos e jurídicos q u e se vi-
n h a configurando a o introduzir o t e m a históriço-teológico do p o v o a m e n t o d a A m é r i -
ca. O s f u n d a m e n t o s teológicos p r e v a l e c e m a o associar a p r e s e n ç a d e S ã o T o m é , in-
terpretação e m voga n a q u e l e m o m e n t o . ^ O exercício d a decifração d e enigmas,
caro aos antigos, a c a b a r i a p o r d e m o n s t r a r u m a persistente c o n t i n u i d a d e .
U m a série de cartas régias e m o r d e m cronológica r e ú n e (documentos 35-43)
fragmentos da ação dos ouvidores nas p r i m e i r a s décadas d a região, dedicados q u a s e
s e m p r e à política de expulsão dos p a d r e s . Parceiros sob o p a d r o a d o , Igreja e Estado
p a s s a r a m m o m e n t o s d e difícil c o m u n h ã o n a p r i m e i r a m e t a d e do século, e m q u e p r e -
valeciam jurisdições maldefmidas e direito costumeiro o r i e n t a n d o m u i t a s das ações
de g o v e r n o dos s ú d i t o s . ^ Agentes especialmente associados à instabilidade dos pri-
meiros t e m p o s nas Minas^ os p a d r e s enfrentaram d a p a r t e d a M e t r ó p o l e u m a a ç ã o
n o t a d a m e n t e c o n t r o l a d o r a . A c u s a d a ora de favorecer o c o n t r a b a n d o ^ o r a d e estimu-
lar a'sonegação do q u i n t o , o r a de trocar a batina p e l a bateia, a m u l t i d ã o de clérigos
q u e transitam pelas M i n a s q u e cresciam seria perseguida ate a expulsão daqueles sem
vínculos direto c o m o trabalho pastoral.
Se a instalação da J u s t i ç a significava o estabelecimento das condições d e p r o t e -
ção dos súditos pelo rei, a F a z e n d a n ã o seria i n s t r u m e n t o de g o v e r n o m e n o s efetivo.
T r a t a v a - s e d e transformar a riqueza q u e e x t r a í a m dos terrenos minerais e m receita
p a r a financiar o fausto j o a n i n o e a soberania p o r t u g u e s a e m u m século d e instabilida-
d e política e acesas disputas e n t r e as potências européias. O quinto q u e se recolhia
nas M i n a s foi-se constituindo, à m e d i d a q u e o I m p é r i o colonial p o r t u g u ê s se esfacela-
v a e a A m é r i c a tornava-se a p e d r a mais preciosa da coroa, n o principal i n s t r u m e n t o
de equilíbrio e c o n ô m i c o de Portugal.
As sucessivas m u d a n ç a s n o m é t o d o de c o b r a n ç a d o direito real e a vasta legisla-
ção repressiva c o n t r a o d e s c a m i n h o d e m o n s t r a r i a m o zelo real e m n ã o deixar e s c a p a r
c a d a o p o r t u n i d a d e q u e as m i n a s ofereciam. Constituindo o quinto u m a estimativa
p o r excelência, p a r a cujo cálculo c o n c o r r i a m m ú t u a s desconfianças de.lado a lado, o
estabelecimento das fôrmas de sua c o b r a n ç a confrontava colonos orgulhosos c o m a
M e t r ó p o l e necessitada. As três primeiras décadas assistiram a o predomínio, cios p r i -
meiros, q u e conseguiam, resistindo aos governadores, ouvidores e p r o v e d o r e s , nego-
ciar a o longo do período ofertas voluntárias a título de quinto, as quais iam a u m e n -
tando n a m e s m a proporção que os poderes locais p e r d i a m força diante do avanço d a

Mateus Saraiva, médico fomiado por Coimbra. Escreveu A voz evangélica de São Tomé, onde tenta
provar a. vinda destç apóstolo ao Brasil.
Sobre a perseguição aos padres em Minas e os conflitos entre Igreja e Estado, ver BOSCHI, Caio
C. Os leigos é o poder (irmandades leigas e política colonizadora em Minas Gerais). São Paulo: Ática,
1986,
organização administrativa de. el-rei. A afirmação plena da F a z e n d a R e a l atravessa
turbulências decisivas com a tentativa de implantação das casas de fundição e m 1719
(decreto real d e 11 d e fevereiro) e a c a b a p o r só o conseguir e m 1725. N a d é c a d a
seguinte, as intendências nas comarcas cuidariam de fundir ouro emitindo barras e
m o e d a s e m suas Casas de Fundição c de perseguir os descaminhos do metal, contan-
do c o m a militarização d a região, graças à presença d a C o m p a n h i a dos Dragões,
trazida por Assumar. A medida que se sucediam as frotas d e ouro p a r a Lisboa, conse-
lheiros e ministros mostravam-se inconformados c o m certa tendência de estabilização
nos valores d a arrecadação. Feitas diversas consultas, adotá-se proposta d o secretário
particular de d o m J o ã o V , Alexandre de G u s m ã o , de estabelecer novo m é t o d o de
c o b r a n ç a , através da capitação e censo d e indústrias. Seguros d e q u e a p o p u l a ç ã o
escrava e m Minas constituía a melhor m e d i d a da p r o d u ç ã o aurífera, depois de ouvir
as estimativas sobre seu n ú m e r o total, taxa-se. c a d a cabeça de escravo. R e v e l a n d o
inovação n o cálculo fiscal, o leque de contribuintes passa a a b r a n g e r n ã o apenas
mineradores m a s todos aqueles q u e direta ou indiretamente se beneficiavam do ouro
extraído. Passam a concorrer p a r a o quinto a população forra da capitania e os estabe-
lecimentos comerciais ou artesanais, conforme o t a m a n h o . O peso d a carga reacende
a adormecida insatisfação fiscal. Súplicas das câmaras chegariam a toda h o r a a o C o n -
selho. U l t r a m a r i n o r e c l a m a n d o , sob. o crivo d a retórica de sempre, da miséria e da
ruína e m que subsistiam, variando apenas os exemplos. A o lado dessas representa-
ções das c â m a r a s , tornou-se prática freqüente nas M i n a s redigirem-se propostas d e
súditos m o r a d o r e s nas M i n a s e n c a m i n h a d a s ao R e i pferecendo alternativas de m e -
lhorar a arrecadação do quinto,, o que t a m b é m n ã o passava d e u m a forma dissimula-
d a d e crítica à capitação. A elas se j u n t a v a m outros tantos alvitres, d e q u e foi especial-
m e n t e pródigo o período, demonstrando a natureza vital p a r a Portugal das condições
de obtenção do ouro brasileiro. O s resultados da arrecadação n ã o afastaram o fantas-
m a do c o n t r a b a n d o de ouro, o qual parecia ainda mais assustador. E m . 1750, p o r
decreto de 3 de dezembro, reintroduz-se o método d e Casas d e . F u n d i ç ã o desta vez ?

assegurando-se u m teto mínimo' d e 100 a r r o b a s / a n o , q u e seria garantido pela derra-


m a . As câmaras seriam n o v a m e n t e acionadas no e n c a m i n h a m e n t o dos protestos, q u e
desta vez a t a c a r i a m a violência q u e subsistia n a d e r r a m a . ^4

CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e.e Tratado de Madri (¡695/1735). Rio de Janeiro: Minis-
tério das Relações Exteriores, 1950. V. 1 e 2; FTCUEIREDO, Luciano R. de A. Tributação, soci-
edade e administração fazendária em Minas Gerais no século XVIII. Anuário do Museu da Inconfidên-
cia, Ouro Preto, v. .9, p. 111-120,1993; BOXER, Charles R., op. cit. nota 27, p, 210 e segs.; FON-
TES históricas do imposto de capitação. Revista do Arquivo Público Mineira, Belo Horizonte, ano 12, p.
605-676, 1907.
O equilíbrio entre receita e despesa era objeto de p e r m a n e n t e cuidado nas M i -
nas. O p r a g m a t i s m o metropolitano diante do ouro procurava evitar o perigoso cami-
n h o do excesso de gastos c o m a administração. Neste quadro, vitais iriam se t o r n a n d o
as informações sobre tais despesas e m diferentes planos, desde as câmaras até as agên-
cias d a C o r o a m o n t a d a s n a região. O problema c o m os contratadores, rendeiros p a r -
ticulares q u e se encarregavam da cobrança de certas fatias dos direitos reais, exemplifica
b e m os termos contraditórios e m q u e subsistia a F a z e n d a R e a l e m M i n a s . Afinal,
n u n c a c u m p r i a m o p a g a m e n t o fixado n a arrematação do contrato, abrindo mais u m
flanco na situação d e descalabro entre as expectativas e a efetiva a r r e c a d a ç ã o dos
rendimentos reais: m a p a s d e rendimentos do ouro quintado e relações de diversos
tipos de gastos — propinas, donativos - formam as duas faces do equilíbrio financeiro
desejado p a r a o b o m aproveitamento do excedente colonial.

A riqueza das M i n a s Gerais e a contabilidade da F a z e n d a R e a l sob a longa


era do q u i n t o m a i s os sucessos e dificuldades dos m é t o d o s d e sua a r r e c a d a ç ã o
e n t r e .1724 e 1751 c o n f i g u r a m a s e q ü ê n c i a d o s d o c u m e n t o s 4 4 a 9 0 . A o nos
a p r o x i m a r m o s do conjunto, é possível visualizar subgrupos, c o m o aquele r e u n i n d o
m a p a s de cobrança do quinto e rendimentos da Fazenda Real no período 1724-1751
(docuemntos 44-50), alguns textos de debate sobre a capitação (documentos 51-53) e
as súplicas das câmaras mineiras contra a d e r r a m a e a reinstalação das Casas de F u n -
dição a partir d a lei d e 3 de dezembro de 1750 (documentos 54-60), propostas parti-
culares de medidas que melhorassem o recolhimento (documentos 61-62), d o c u m e n -
tação sobre os contratos (documentos 63-66), principalmente t r a t a n d o de questões
legais suscitadas pelas alterações introduzidas c o m a lei de 3 d e d e z e m b r o de 1750.
D o c u m e n t o s sobre o' renclimento do quinto voltam a aparecer, desta vez retratando a
fase das casas de fundição nos seus primeiros anos de funcionamento, associados a
questões legais e críticas q u e o novo m é t o d o recebeu (documentos 67-77). Diversas
receitas e despesas da Fazenda Real determinadas p o r contratos e as propinas pagas,
textos de arrematações de contratos e m Minas, lista de diferentes cargos e postos n a
capitania formam o subgrupo final (documentos 78-90), em q u e a preocupação rela-
cionava-se à identificação e à demonstração das principais fontes de despesas e falhas
nas administração das expectativas de receita. A presença de u m a orientação histórica
p a r a o problema parece, estar presente com a Relação dos contratos e rendas [...] (documen-
to 78), e m que se apresentam a implantação e o desenrolar das principais fontes de
crédito, real.

A p a r t i r daí, desenrolam-se entre os d o c u m e n t o s 91 e 108 diversas matérias


sobre o b i s p a d o d e M a r i a n a , nos anos d e 1745 a 1 754, voltados p a r a sua fundação
e organização, m a s sobretudo perscrutando as condições financeiras e os rendimentos
que auferiam c o m os súditos mineiros, j á que a preocupação c o m a realidade finan-
ceira q u e cercava o bispado era atribuição do dr. C a e t a n o da Costa Matoso e m seu
exercício c o m o ouvidor de comarca. Protegidos por certa imunidade, a Igreja era vista
sob desconfiança q u a n d o se tratava de avaliar suas receitas. A retórica da opressão
dos fiéis súditos através de c o b r a n ç a s excessivas escondia o t e m o r diante d a con-
c e n t r a ç ã o d e riquezas e os prejuízos d a a r r e c a d a ç ã o dos cofres r e a i s . 7 5

A M i n a s Portugal atribuiu e m diferentes m o m e n t o s o p a p e l d e r e d e n ç ã o . Se


o o u r o fizera a M e t r ó p o l e r e e n c o n t r a r m a i o r conforto c o m gastos p a r a p r e s e r v a r
sua s o b e r a n i a , o fausto cortesão e o b e m - e s t a r dos vassalos, os f o r m u l a d o r e s da
política colonial sabiam-no fugaz. Assim, dos mistérios, d a fantasia e da e d e n i z a ç ã o
q u e cercava a n a t u r e z a tropical d a colônia, g r a d a t i v a m e n t e assistia-sè à afirmação
de u m m o d e l o p r a g m á t i c o . A sensibilidade p a r a a n a t u r e z a colonial o p e r a a r u p -
t u r a d a perspectiva e m i n e n t e m e n t e p r e d a t ó r i a das relações coloniais^ oferecendo
s o b a c o n t e m p l a ç ã o das viagens científicas e das p e s q u i s a s e x p e r i m e n t a i s u m a
n o v a d i m e n s ã o às alternativas econômicas. U m n o v o tesouro se d e s c o r t i n a v a . ^
As potencialidades econômicas d a n a t u r e z a e m M i n a s , d a m i n e r a ç ã o às ervas e
m a d e i r a s , cipós e b a m b u s , figuram no núcleo d e textos e n t r e d o c u m e n t o s 109 a 114,
à eles d e a l g u m a forma interligadas as descrições teratológicas d e .que trata os docu-
m e n t o s 116 e 117.
A t é este p o n t o o Códice Costa Matoso está d e m a r c a d o p o r t e m a e assunto de M i n a s
Gerais, r e u n i n d o tanto relatos históricos, d a d o s econômicos sobre a riqueza d a re-
gião, fontes legais de. trabalho d o ouvidor, assim c o m o u m p o u c o d e sua atividade
profissional c m pareceres e consultas q u e p r e p a r a e d e sua i m e n s a curiosidade. A
p a r t i r do d o c u m e n t o 118, até o final do Códice, abre-se vasto material m u i t o a l é m de
M i n a s t r a t a n d o d e outras regiões da A m é r i c a portuguesa. A i n d a assim, prevalece o
estabelecimento de divisões pelo seu compilador e m grupos temáticos. J u s t i ç a e Igreja
n o R i o d e J a n e i r o e n o Brasil estão representadas nos d o c u m e n t o s 118-126, Compre-
e n d e n d o as informações sobre titulares das posições n o g o v e r n o civil e eclesiástico
desde o século X V I , o r e g i m e n t o do ouvidor do R i o d e J a n e i r o (1669), a r e p r o -
d u ç ã o d e inscrições c o m e m o r a t i v a s d a fundação de templos religiosos do R i o de
Janeiro e o t e s t a m e n t o de d o m frei A n t ô n i o d e G u a d a l u p e .

Especialmente sobre o conflito de Caetano da Costa Matoso com o bispo de Mariana, ver AGUIAR,
Marcos Magalhães de,, vp. cil. nota 44; KANTOR, Tris, op. cit. nota 44.
MUNTEAL, Oswaldo. Uma sinfonia para o novo mundo. A academia Real das Ciências de Lisboa e os
caminhos da ilustração luso-brasileira na crise do antigo sistema colonial. Rio de Janeiro: Univer-
sidade Federal do Rio de Janeiro,1998; CALAFATE, Pedro. A idéia dg natureza nó século XVIII em
Portugal (1740-1800). Lisboa: Imprensa Nacional, Casa da Moeda, [1994]; ELLIOT, J. H. 0 velho
mundo e o novo, 1492-1650. Lisboa: Editorial Querco, 1984.
E m b o r a a cena m u d e de lugar, encontra neste p e q u e n o núcleo u m paralelo d o
m e s m o universo de preocupações demarcadas p a r a M i n a s Gerais. A presença neste
grupo de documentos sobre bispos, igrejas e assuntos eclesiásticos denuncia certa co-
nexão c o m a proposta real de d e s m e m b r a r o bispado do R i o de J a n e i r o e m dioceses,
cuja orientação dever-se-ia a Alexandre d e G u s m ã o c o m o ministro d o C o n s e l h o
Ultramarino. 7 7
A criação das prelazias d e Goiás e C u i a b á e m 1745 e a i n d a d a s
dioceses de São Paulo e M a r i a n a no m e s m o ano, com o reconhecimento oficial da
Igreja d e R o m a , assegurava, e m última instancia, o beneplácito da Santa Sé à expan-
são portuguesa p a r a além dos limites originais de Tordesilhas, espécie de uti possideüs
religioso ^ que tornava mais confortáveis as disputas que se configuravam com a Espanha.
7

A l a r g a n d o a tipologia d a d o c u m e n t a ç ã o , o g r u p o final n o Códice ( d o c u m e n -


tos 127-145) c o n t e m p l a a e x p a n s ã o do I m p é r i o p o r t u g u ê s n a A m é r i c a . Esta ex-
p a n s ã o a p a r e c e n o d o c u m e n t o inicial do g r u p o s o b a f o r m a d e a p o n t a m e n t o s
retirados d e leituras diversas sobre a História do Brasil, a Historia de M i n a s e a
conquista de s u a s regiões (documentos 127-129). A seguir, t o m a m c o r p o as des-
crições e os relatos d e viajantes e sertanistas, c o m u m p a d r ã o de n a r r a t i v a m u i t o
p r ó x i m o e n t r e si (com exceção dos d o c u m e n t o s 140-142), c o b r i n d o as r e m o t a s
regiões do sul, M a t o Grosso, M a r a n h ã o , T o c a n t i n s e Pará. Estas últimas estariam
vinculadas às questões de fronteira suscitadas pelo T r a t a d o de M a d r i . M i n a s G e -
rais e seus c a m i n h o s c o m p a r e c e m neste g r u p o através, de famoso relato impresso,
a o qual se credita, o papel de servir d e orientação p a r a a a p r o x i m a ç ã o das M i n a s ,
e do inédito diário de v i a g e m do c o m p i l a d o r d o Códice.
Este g r u p o agrega preciosos textos c o m p r o m e t i d o s c o m o f o r n e c i m e n t o d e in-
formações q u e instruiriam os articuladores portugueses d o T r a t a d o d e M a d r i . A pri-
m e i r a m e t a d e do século X V I I I assiste à elevação dos p r o b l e m a s decorrentes d a ex-
p a n s ã o p o r t u g u e s a p a r a além da. linha d e Tordesilhas à c o n d i ç ã o de questão diplo-
mática. A eclosão de conflitos n o u l t r a m a r (como o d o P r a t a e m 1735-1737) e n a
E u r o p a envolvendo as potências q u e disputavam o comércio colonial s o m e n t e t o r n a -
va mais clara à p r e m ê n c i a da busca d e u m n o v o a c o r d o diante d a c a d u c i d a d e d a
divisão estabelecida e m Tordesilhas. E m b o r a as negociações d e p r e p a r a ç ã o d o T r a -
tado d e M a d r i , iniciadas c o m a m o r t e d e Filipe V e m 1746, t e n h a m transcorrido sob
o m a n t o do sigilo, era ruidosa a mobilização através das c a m p a n h a s , rios e flores-
tas nos trópicos. I n q u é r i t o s são solicitados sobre todas as regiões litigiosas, e m q u e
se p e d i a m detalhes s o b r e possibilidades econômicas, defesa militar, características
n a t u r a i s , i n d i c a ç õ e s d e cálculo da p r o x i m i d a d e c o m os e s p a n h ó i s , c o n f o r m e se

77
- CORTESÃO, Jaime, op. cit. nota 72 v. 1, p. 680-682.
fc

7 8
- Ibid.
t o r n a v a clara a certeza de a c o r d o c o m .a E s p a n h a p a r a a definição das.fronteiras n a
A m é r i c a . Este n ú c l e o d e d o c u m e n t o s c o m b i n a a p r e o c u p a ç ã o e m r e c o n h e c e r o
p o t e n c i a l d e r i q u e z a s fora d o eixo das M i n a s G e r a i s e o c o n t r o l e territorial d e
áreas e m disputas q u e a n t e c e d e m o t r a t a d o de l i m i t e s . ^
A o sul d a A m é r i c a p o r t u g u e s a , a C o l ô n i a do S a c r a m e n t o , e m vista d e sua
privilegiada posição na bacia do Prata, o c u p a p a p e l de d e s t a q u e nas disputas c o m
os e s p a n h ó i s . F u n d a d a e m 1680, e d e s d e e n t ã o alvo d e investidas e o c u p a ç õ e s
militares, a p r a ç a tornar-se-ia, graças a u m a política de valorização e n c e t a d a des-
d e 1720 p o r d o m . J o ã o V , território d e agricultura, criação d e g a d o e projetos de
o c u p a ç ã o p o p u l a c i o n a l . S u a posição geográfica atrairia, p o r é m , a m p l o comércio
de c o n t r a b a n d o , a n i m a d o p e l a p r a t a q u e descia dos domínios e s p a n h ó i s . ^
A l é m das disputas entre espanhóis e p o r t u g u e s e s , o comercio da região c o n c e n -
trava forte p r e s e n ç a inglesa e a m p i a a t u a ç ã o dos jesuítas, considerados ali e m algu-
m a s ocasiões os m a i o r e s inimigos dos.portugueses*
A r e a colonial das mais susceptíveis n o q u a d r o internacional, as dificuldades
q u e c e r c a v a m a a d m i n i s t r a ç ã o deste v e r d a d e i r o presídio e r a m a m e n i z a d a s pelas
a u t o r i d a d e s , e m vista d e seu e n v o l v i m e n t o nas atividades de c o n t r a b a n d o . Esta
realidade pesou, s e m dúvida, nos protestos p o r p a r t e do g o v e r n a d o r A n t ô n i o P e d r o

A respeito da obra de George Juan e Antonio de Ulloa (A voyage to South-America: describing at large
the Spanish cities, towns, provinces [...] on the extensive Continent [...] Togetherwith the natural
history of the country. And an Account of their goid and silver mines [...] Translated from the.
original Spanish (by John Adams). 7 maps and plates. 2 vols London), Gox lembraria que o rei
espanhol teria estimulado seuS cientistas a realizarem expedições, dentre Outrasfinalidades,para
medir o grau de longitude em países do Peru equinocial. La Condamine, em 1747, faz o mesmo, a
mando do rei da França. Antonio de Ulloa, além de Spanish admiral, era também estatísitico. Ver,
por exemplo, dos mesmos Jorge Juan e Antonio de Ulloa, Relación histórica dei viage a la America
Meridional para medir alguiios grados de meridiano terrestre,y venir por ellos en conocimiento de la verdadera figura
y magnitud de la tierra[..,]. Madrid, e ainda Observaciones astronómicas)> phisicas, hechas de orden de S.
Magestadm Ver também a ésse mesmo respeito, Alexander von Humhqldt (embo-
los reynosdelPe.ru.
ra faça suas viagens em 1799-1804) e Bouqucr (que faa viagem em 1735, mas lè seu relato diante
da Academia das Ciências da França em 1744).
MONTEIRO, J. Costa Rego. A Colónia de Sacramento 1680-1777. Porto Alegre: Globo, 1937. 2v.;
CORTESÃO, Jaime, op. at. nota 72, v. 2, p. 507-542; v. 3, p. 551-57, v. 4; ALMEIDA, Luís
Ferrand de. Á Colónia do Sacramento na época da sucessão de Espanha. Coimbra: Imprensa de Coimbra,
1973; ALD EN, Dauril. Royal government in colonial Brazil. With special reference to the administration
of the Marquis of Lavradio Viceroy, 1769-1779. Berkeley: University of California Press, 1968. p.
E

66-96. Sobre presença dos jesuítas: LEITE, Serafim. Suma Histórica da Companhia de Jesus no Brasil
(assistência de Portugal). 1549-1760. Lisboa: Junta de Investigação do Ultramar, 1965; CORTE-
SÃO, Jaime. Manuscritos da Coleção De Angelis. Do Tratado de Madri à Conquista dos Sete Povos,
1750-1802. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1969; CORTESÃO Jaime. Manuscritos da Coleção
ile. Angelis. Tratado de Madri. Anteceden Ces. Colónia do Sacramento, 1669-1749. Rio de Janeiro:
Biblioteca Nacional, 1954; ALDEN, Dauril. Tlie makitig of enterprise. The Society of Jesus in Portu-
gal, its empire and beyond, 1540-1750. Stanford: Stanford University Press, 1996,
( d o c u m e n t o 133) c o n t r a a entrega desta região à soberania espanhola, d e t e r m i n a -
d a pelo T r a t a d o de M a d r i . 8 1

O u t r a zona d e fronteira q u e assume importância central girava e m t o r n o do


rio M a d e i r a e suas conexões c o m os rios A m a z o n a s , G u a p o r é e M a m o r é . ^ C o m 8

sua generosa r e d e d e rios, a região do e x t r e m o oeste t r a d i c i o n a l m e n t e m e r e c e r a


dc Portugal u m política d e p r e c a u ç ã o e proibições à livre circulação, e m vista d o
t e m o r d e q u e s u a n a v e g a ç ã o p r o p i c i a s s e o. c o n t r a b a n d o do o u r o q u e se v i n h a
e x p l o r a n d o m u i t o a l é m d e M i n a s Gerais, e m C u i a b á , G u a p o r é e G o i á s .
M e s m o assim, muitos expedicionários privados i g n o r a v a m s o l e n e m e n t e a proi-
bição da n a v e g a ç ã o fluvial entre P a r á e M a r a n h ã o e regiões das m i n a s d e t e r m i n a d a
pelo decreto de 27 d e o u t u b r o d e 1 7 3 3 , 8 3
q u e tentava i m p e d i r a c o m u n i c a ç ã o entre
o rio M a d e i r a e M a t o Grosso. O d e s b r a v a m e n t o dessa e n o r m e rede fluvial n o oeste
constituiu u m e m p r e e n d i m e n t o notável a o longo d a p r i m e i r a m e t a d e do século X V I I I .
A o arrepio d a lei, conseguiram estabelecer c o m u n i c a ç ã o e n t r e os g r a n d e s afluentes
d a bacia a m a z ô n i c a e d a platina.
O valor dos rios era ali estratégico e seu controle representava a sobrevivência
das atividades m i n e r a d o r a s e de vigilância sobre o destino dos metais. T r a t a v a - s e
a i n d a de b l o q u e a r o a v a n ç o espanhol.
A t e n t o ao significado d a região, Alexandre d e G u s m ã o , b e m e m p r e g a n d o sua
posição de secretário real» v i n h a h á a l g u m t e m p o estimulando a v i a g e m de. enviados
especiais p a r a c u i d a r de descrever o território p a r a o interior d e M i n a s . E l a b o r a , p a r a
tanto, u m inquérito geográfico, histórico, etnográfico e e c o n ô m i c o e r e c o m e n d a "es-
c r e v e r e riscar t u d o q u a n t o v i r " . ^ 4

Alguns d o c u m e n t o s deste núcleo (assim c o m o os 143-145) assemelham-se a


este i n q u é r i t o . ^ Ali se inquiria e m 14 itens sobre distâncias das principais vilas,
condições de. navegabilidade dos rios, n o m e s d e outros rios c o m os quais houves-
se confluência, estado dos índios, conflitos c o m eles, várias informações e m deta-

A resposta ao argumento está em GUSMÃO, Alexandre de. Obras. São Paulo; Cultura, 1945.
p.121-164.
if] _

DAVIDSON, David Michael. Rivers and empire: die madeira route, and die incorporation of die hrazilianfar
west, 1737-J #08, Vale; Yale University, 1970; ALD EN, Dauril (Ed.) Colonial roots of modem Brazil.
Berkeley; University of California Press, 1973; CORTESÃO,Jaime, op. cit. nota 72, v. 3, especial-
mente 639- 690).; MAGALHÃES, Basílio de. Expansão geográfica do Brasil colonial. 4. ed.: São Paulo:
Nacional , 1978. p. 165 e segs.; LAPA, José Roberto A, Economia colonial. São Paulo: Perspectiva,
1973. p. 15-110; op.. cit. nota 43. SOUTHEY, Robert. História do Brasil. Rio de Janeiro: Gamier,
1862. V.3, especialmente.
- BOXER, C, R, op. ck. nota 27, p. 283.
;3

1
' Carta de Alexandre deGusmãoaTomâsRubimdeBarrqsBarreto,Ii<;boa6jun.l743. Citada por
CORTESÃO, Jaime, op. cit. nota 72, v 3, p.. 656.
'- 5
Ibid. p. 660-663.
t
lhes sobre as missões, dentre elas nomes dos padres que a governam, afabilidade dos
padres e m dar ou n ã o hospitalidade, a r m a s existentes, se há p r e o c u p a ç ã o daqueles
habitantes c o m invasões e estado e m que se encontravam as casas,, e muitas o u t r a s , ^
O controle s o b r e o rio M a d e i r a , c o m o viria a ser c o n f i r m a d o pelo T r a t a d o de
M a d r i , p r o p i c i a v a o. estabelecimento d e u m a fronteira n a t u r a l c o m os espanhóis.
G u a p o r é e M a d e i r a , cachoeiras m o n u m e n t a i s , e r a m baliza n a t u r a l , c o m o dizia Ale-
x a n d r e d e G u s m ã o , p a r a c o n t e r o a v a n ç o espanhol.87 C u i d a v a - s e d e g a r a n t i r a
posse p o r t u g u e s a sobre esses rios, a fim de se r e s g u a r d a r e m definitivo as zonas de
mineração.
U m s u b g r u p o f o r m a d o p o r descrições dos c a m i n h o s p a r a M i n a s r e e n c o n t r a as
p r e o c u p a ç õ e s d o f o r m u l a d o r d o Códice c o m a região. Dois roteiros p a r a as m e s m a s
M i n a s e r a m , e m v e r d a d e , m u i t o diferentes entre si, pois se o p r i m e i r o é relato meticu-
loso e e x a t o o s e g u n d o g a n h a c o n t o r n o s d e folheto d e p r o p a g a n d a c r i v a d o d e
fantasias. O Itinerário geográfico retrata, a d e m a i s , a posição d e M i n a s n o a m p l o espa-
ço geográfico d a América, a p r e s e n t a n d o , a i n d a q u e d e forma imprecisa., acidentes
geográficos circunvizinhos. Seu espectro mais a m p l i a d o e c e r t a tônica d e p r o p a -
g a n d a das v a n t a g e n s da região das M i n a s subjacente a o texto a c a b a m p o r torná-lo
suspeito d e constituir p e ç a d e p r o p a g a n d a política e m m e i o às discussões e n t r e
E s p a n h a e Portugal, abertas d e s d e a G u e r r a d e Sucessão. I n t e g r a m , d e toda for-
m a , o conjunto voltado p a r a prever as informações sobre o Brasil q u e a M e t r ó p o -
le encontrava-se ávida p a r a receber.
A p r e s e n ç a d a relação de gêneros q u e o Brasil exportou através d e suas frotas
integra este núcleo, a t e n d e n d o à p r e o c u p a ç ã o de revelar a disponibilidade de alter-
nativas econômicas t a n t o de M i n a s q u a n t o d e outras regiões. Esse s u b g r u p o , e m b o r a
fuja do p a d r ã o d e relatos de viagens q u e m a r c a a seqüência, a ela se encaixa idealmente
q u a n d o visto sob o prisma da d e m o n s t r a ç ã o das potencialidades econômicas através
d a v a r i e d a d e de p r o d u t o s ali presentes nas frotas q u e s a e m de diferentes portos n o
a n o d e 1749. O c a c a u e o cravo, o u r o e m b a r r a e. d i a m a n t e s , pau-brasil e j a c a r a n d á ,
o doce e o m e l a ç o , escravos, café e salsa, d e v i d a m e n t e classificados e quantificados,
f o r m a m a m e l h o r síntese possível d a riqueza colonial, a l c a n ç a n d o sua f o r m a e senti-
do: o comércio d e e x p o r t a ç ã o .


- Ibid.

Ibid,p. 680. O cuidado com este circuito na conjuntura imediatamente anterior ao tratado de
limites aparece refletido na produção de vários outros relatos de. expedições pelo rio Madeira,
dentre eles, JVavegação feita da cidade do Grão-Parâ até a boca do rio da Madeira pela escolta que por este rio
subiu às minas do Mato gmsso, por ordem mui recomendada de SMFno ano de 1749, escrita por José Gonçalves da
Fonseca no mesmo ano. Ver ALMEIDA, Cândido Mendes de, (Gol. e anot.). Memórias para a história do
extinto estado do Maranhão, cujo território compreende hoje asproiiíncias do Maranhão, Piauí, Grão-Parâ eAmazo-
«aí.Rio de Janeiro: Typograíia do Comércio, 1860. V. 2, p. 268-416.
Se era rarefeita a expansão missionária ao longo do sul e extremo oeste, n a bacia
a m a z ô n i c a e regiões do n o r t e as missões p a r e c e r a m p r e e n c h e r todos os e s p a ç o s . ^
Conhecido como ciclo m a r a n h e n s e da expansão missionária na América, a generali-
zada e onipresente atuação das ordens religiosas e d a C o m p a n h i a de Jesus n o norte
constituiu obra impressionante. A evangelização do Grão-Pará e M a r a n h ã o seria en-
cetada ainda na primeira m e t a d e do século X V I I p o r franciscanos e carmelitas e n a
segunda m e t a d e c o m p l e m e n t a d a p o r capuchinhos, mercedários e. os indefectíveis j e -
suítas. Mais numerosos, estes últimos recebem a m a r g e m direita d o rio A m a z o n a s
(restritos à região sul do rio) n a repartição daquele território p r o m o v i d a pela C o r o a
entre 1693 e 1695 e m províncias missionárias entre as várias ordens, cabendo a mar-
gem esquerda (norte) aos capuchinhos e franciscanos e as confluencias dos rios Solimões,
N e g r o e. M a d e i r a aos c a r m e l i t a s , golpe sentido pelos jesuítas, q u e p e r d e r a m os
aldeamentos J á organizados e sua hegemonia política.

Se a região cm torno do Pará e M a r a n h ã o padecia de u m isolamento crônico


com relação à Metrópole, representado no limitado movimento comercial c o m aque-
les portos, n e m por isso deixava de sugerir preocupação, em vista da presença próxi-
m a de holandeses, espanhóis e franceses. A instalação das ordens, ao lado dos presídios
espalhados pela área, c u m p r i a assim papel estratégico d e vigilância. Através do es-
p r a i a m e n t o das missões, convertiam-se almas e barrava-se o avanço dos súditos d e
Castela. M o v i m e n t o verificado em várias de suas fronteiras, q u a n t o mais a
internacionalização se avizinhava mais Portugal se apegava aos projetos de posse.
Ademais, missionários das diferentes ordens, apoiados por governadores desejo-
sos d a expansão das potencialidades econômicas da região, e n c o n t r a m no território
amazônico amplas possibilidades. Ali os missionários fizeram as vezes d e bandeiran-
tes, a b r i n d o muitos dos caminhos terrestres q u e interligariam o n o r t e às áreas d o
nordeste, c a b e n d o aos religiosos o enfrentamento dos primeiros conflitos e negocia-
ções. Logo a ação missionária seria seguida por incursões d e caçadores de escravos.

LEITE, Serafim, Historia da Companhia de Jesus no Brasil. Lisboa: Portugália; Rio de Janeiro: Civiliza-
ção Brasileira, 1938-1950. V. 3 e 4; BOXER, Charles R. op. cit. nota 27, csp. p. 284-303;
f

HEMMING, John. Red gold. The conquest of the brazilian indianr. London: Papermac, 1987;
SWEET, David Graham. A rich realm of nature destroyed: the. middle amazon valley, 1640-1750.
Wisconsin: University of Wisconsin, 1974; CABRAL, Maria do Socorro Coelho. Caminhos do gado
(caminhos e ocupação do sul do Maranhão). São Luis; Sioge, 1992; GROSS, Sue E. A. The economic
life of the Estado do Maranhão e Grãõ-Pará, 1686-1751. Tulane University, 1969; MEIRELES, Mário.
História da Arquidiocese, de São Luís do Maraidião. São Luís: Universidade Federai do Maranhão, Sioge,
1977; PACHECO, Felipe Conduru. História eclesiástica do Maranlião. Maranhão: S.E.N.E.C., De-
partamento, de Cultura, 1969; BISPADO do Pará. Annaes da Bibllioleca e Archivo Publico do Pará,
Belém, 1,906; ALMEIDA, Cândido Mendes de. Direita civil eclesiástico brasileiro antigo e moderno e suas
relações com. o direito canónico. Rio de Janeiro: Garnier, 1866. 4 v.
O processo de ocupação acabava assumindo importância ainda mais significati-
va â vista das e n o r m e s dificuldades d e navegação costeira entre, o norte e o litoral
abaixo do cabo de São R o q u e , devido às correntes marítimas e aos ventos desfavorá-
veis. As interligações internas pelos rios acabariam p o r equilibrar estas dificuldades.
A a t u a ç ã o das ordens no M a r a n h ã o e G r ã o - P a r á reescreve, d e certa forma, a
história das missões, pois.implicou a afirmação de i n d e p e n d ê n c i a d a e m p r e s a espiri-
tual e a b u s c a de objetivos próprios. A a u t o n o m i a d e ação q u e a C o r o a assegurou às
ordens n a região p r o t e g e u o d o m í n i o português n a A m a z ô n i a , u m a vez q u e dos reli-
giosos d e c o r r i a m toda a d i n a m i z a ç ã o econômica envolvendo p r o d u ç ã o , trabalho e fé.
Ali as zonas de tensão entre as ordens religiosas e os colonos recrudesciam, e m
vista das limitadas o p o r t u n i d a d e s econômicas q u e o isolamento causava. E c o n o m i a
q u e se define pela coleta das drogas do sertão, sua força d e t r a b a l h o d e base e r a m os
índios q u e i n t e g r a v a m as e n t r a d a s q u e p e r i o d i c a m e n t e singravam os rios d a região. A
oposição aos jesuítas era p a r t i c u l a r m e n t e tensa, e m vista d a pressão dos colonos q ü e
i a m fazer resgates n o sertão..
D o s e m b a t e s e n t r e colonos carentes daquela m ã o - d e - o b r a e missionários intran-
sigentes e m defendê-la do cativeiro nasceu o regimento das missões do E s t a d o do
M a r a n h ã o e G r ã o - P a r á , q u e a C o r o a p r o m u l g o u e m 1686. A p r o d u ç ã o d e m ã o - d e -
o b r a p a r a os c o l o n o s e s t a b e l e c i a e x p e d i ç õ e s pacíficas ou f o r ç a d a s , as q u a i s
deslocariam os índios p a r a aldeias administradas pelas ordens religiosas. Instalados
e m aldeias nas v i z i n h a n ç a s dos colonos, p a s s a v a m a ser m ã o - d e - o b r a disponível
p a r a sustentar a e c o n o m i a colonial. Esses a l d e a m e n t o s missionários p o d i a m estar
a serviço exclusivo de. a l g u m a das o r d e n s religiosas (aldeias do serviço das ordens
religiosas), d a C o r o a (aldeias do serviço real), dos m o r a d o r e s (aldeias de r e p a r t i -
ção) ou estar isolados e m regiões r e m o t a s sem contato c o m os colonos. Q u a l q u e r
u m deles encontrava-se fiscalizado p o r a l g u m a das o r d e n s religiosas q u e dividiam
a região e b u s c a v a m a auto-suficiência. Surgia a c o m b i n a ç ã o de reserva d e m ã o -
d e - o b r a , catequese e t r a b a l h o p r o d u t i v o . P a r a a execução dos trabalhos espirituais
nessas aldeias os missionários reponsáveis p o r eles m o n t a v a m u m a infra-estrutura
q u e , d e n t r e outras instalações, incluía h o s p e d a r i a e enfermaria.

Fonte de muitos conflitos entre moradores, Estado e. Igreja, as ordens religiosas


exerciam o controle de cerca de 2 / 3 d a mão-de-obra n u m a zona de carência estrutu-
ral de força d e trabalho, e m vista do elevado preço ou proibição do escravo africano.
Ademais, a ação missionária em toda a região fora implantada estabelecendo-se certa
independência das aldeias e m relação à administração colonial, O processo significou
a expansão econômica colonial c o m base no trabalho das aldeias, o qual escapava do
controle metropolitano, d a administração colonial e das vinculações c o m os colonos,
A expectativa q u e a n a t u r e z a pródiga d a região sugeria se aliou a a b e r t u r a de
i n ú m e r a s alternativas d e comunicações fluviais a partir d e M a t o Grosso, resultando
n a valorização d a região, n a dedicada extração das drogas do sertão, n a pesca e n a
viração d e tartarugas, estas últimas destinadas a o c o n s u m o i n t e r n o .
T o d a , esta seqüência final d o G?¿ice. (documentos 130 a 145), articulada, c o m o
dissemos, à Tabuada de a b e r t u r a ( d o c u m e n t o 1), ajuda a formular u m retrato das
questões espaciais q u e v i n h a m o c u p a n d o a o r d e m do dia nas negociações q u e se
d e s e n r o l a m desde a m o r t e d e Filipe V, Relatos de expedições pelo rio M a d e i r a , des-
crições dos bispados e m terras setentrionais, as latitudes do rio d a P r a t a , estejam essas
indicações n a Tabuada dos padres matemáticos ou no Itinerário, são tributários d a polêmi-
ca e n t r e cartógrafos e ministros portugueses e espanhóis q u e v i n h a se d e l i n e a n d o
desde q u e G u i l l a u m e de Lisie publica e m Paris, no a n o d e 1722, u m m a p a d a A m é -
r i c a do Sul, o n d e o n o r t e do rio da P r a t a e o delta d o A m a z o n a s a p a r e c i a m a oeste d a
linha d e Tordesilhas.
O T r a t a d o de M a d r i , firmado e m 13 d e j a n e i r o de 1750 e ratificado e m seguida
pelos reis da E s p a n h a e d e Portugal, garantiu, d e n t r e outras coisas, p a r a Portugal: o
d o m í n i o sobre m a i o r p a r t e d a bacia a m a z ô n i c a ; a soberania sobre os distritos de o u r o
e d i a m a n t e s ; a g a r a n t i a da fronteira sulina c o m a aquisição dos Sete Povos das M i s -
sões; e a c o m u n i c a ç ã o fluvial c o m o M a r a n h ã o - P a r á , c o m a g a r a n t i a d e q u e navega-
ç ã o dos rios T o c a n t i n s , T a p a j ó s e M a d e i r a ficassem e m m ã o s p o r t u g u e s a s . As
negociações e m t o r n o da A m a z ô n i a t r a n s c o r r e r a m c o m mais t r a n q ü i l i d a d e .
N o sul, as negociações f o r a m mais difíceis. Portugal entrega S a c r a m e n t o e a
E s p a n h a entrega os territórios das missões jesuíticas nas bacias do U r u g u a i e P a r a g u a i .
O s d o c u m e n t o s q u e e n c e r r a m o Códice refletem u m a p a r t e do processo de b u s c a
p o r todo tipo de informações q u e m a r e o u a p r e p a r a ç ã o do T r a t a d o de M a d r i . Afinal,
a base das disputas territoriais entre E s p a n h a e Portugal n a A m é r i c a a p o n t a v a p a r a
q u e os ajustes fossem definidos nas d e m a r c a ç õ e s de fronteiras. C a d a u m conservaria
o q u e possuísse, fazendo-se ajustes sobre c a d a á r e a específica p a r a s a n a r as disputas.
O s preparativos sigilosos das negociações do T r a t a d o de M a d r i c o n t a r a m do lado
p o r t u g u ê s c o m a o b r a de colonização e n c e t a d a p o r sertanistas, b a n d e i r a n t e s , missio-
nários e presídios militares.
T)c certo m o d o , o g r u p o final d e d o c u m e n t o s se conecta ao p r i m e i r o d o c u m e n t o
do Códice. I m p e r c e p t i v e l m e n t e , p a r e c e ter havido u m sentido circular n o estabeleci-
m e n t o d a o r d e n a ç ã o do texto, pois depois d e p e r c o r r e r as regiões e m disputa pelo
T r a t a d o de M a d r i a o r e t o r n a r à a b e r t u r a do Códice h á o e n c o n t r o c o m o t r a b a l h o d e
m e d i ç ã o dos p a d r e s m a t e m á t i c o s q u e subsidiaram os trabalhos p a r a a definição d o
t r a t a d o d e limites.
Papéis q u e e m sua a p a r ê n c i a imediata sugeriam g r a n d e d e s o r d e m e s c o n d e m
u m a decidida vontade de ordenar. M e s m o a diversidade i n c o m u m dos tipos caligráficos
p r e s e n t e no cimélio retrata a dedicação do c o m p i l a d o r e m recolher registros d e ter-
ceiros sobre matérias d e seu interesse, e reforça seu e m p e n h o e m n ã o desperdiçar u m
instante sequer da experiência a m e r i c a n a p a r a colher informações sobre a adminis-
tração e as riquezas portuguesas, m e m ó r i a s de M i n a s e d e outros territórios e sobre a
n a t u r e z a d a A m é r i c a . D e s d e q u e d e s e m b a r c a n o Brasil, iria a p r o v e i t a r t o d a s as
o p o r t u n i d a d e s p a r a t o m a r notas, e n c o m e n d a r relatos, j u n t a r cópias, realizar trans-
crições e m arquivos. D e seu assento e m Vila R i ç a e d a cidade do R i o de J a n e i r o ,
o n d e viveria depois p o r m u i t o s meses, C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o e s t e n d e u suas
vistas, f i r m e m e n t e o r i e n t a d o pela sua formação letrada e senso de o p o r t u n i d a d e ,
a d o m i n a r a g r a n d e o b r a do I m p é r i o português n a A m é r i c a .

2 De Setúbal a Vila Rica: aventura e travessia

A m a n u t e n ç ã o de u m império colonial t o r n a v a a circulação de servidores atra-


vés de suas partes u l t r a m a r i n a s mais d o q u e u m a necessidade; era u m a exigência.
M o b i l i z a r q u a d r o s b e m - p r e p a r a d o s e atuantes, formados n a cultura d a lealdade a o
s o b e r a n o , p a r a figurar nas províncias distantes do R e i n o n a q u a l i d a d e d e represen-
tantes d o p o d e r real, dispensadores de Justiça, protetores c o n t r a as opressões e guer-
ras, p r o v e d o r e s d e benevolência e, q u e m sabe, fazendas e cabedais, constituía tarefa
imperiosa. P r o p o r c i o n a r segurança e p r o t e ç ã o aos súditos u l t r a m a r i n o s , p a r a q u e
sentissem d a f o r m a mais suave possível os rigores e o peso do afastamento do r e i ,
formava o desafio cotidiano c o m o qual l i d a v a m o p r ó p r i o rei e seus conselheiros.
O s c o m p r o m i s s o s , as obrigações e as expectativas i n e r e n t e s à d i m e n s ã o da
vassalagem q u e presidia as relações entre colônia e M e t r ó p o l e n ã o e l i m i n a v a m , con-
t u d o , u m a o u t r a dimensão de caráter pragmático', afinal, executar u m a b o a adminis-
t r a ç ã o nas províncias, assegurando o a t e n d i m e n t o às demandas^ c o n t o r n a n d o dificul-
d a d e s , afastando a m e a ç a s , estava n a o r d e m do dia, â m e d i d a q u e , no decorrer do
século X V I I I , Portugal transformava-se e m u m reino cujas finanças d e p e n d i a m c a d a
vez mais das receitas q u e d e s p o n t a v a m no horizonte do o c e a n o A t l â n t i c o . ^
V i r t u d e desejada p a r a os príncipes g o v e r n a r e m e c o n s e r v a r e m seus Estados,
a J u s t i ç a era p a r t e a i n d a mais i m p o r t a n t e n a b u s c a desse equilíbrio distante n o
g o v e r n o das colônias. D e s d e q u e b e m a d m i n i s t r a d a , c o n t o r n a v a - s e o t e m o r dos
efeitos da desafeição e ódio q u e vassalos n u t r i a m e m r a z ã o das "injúrias e violên-
cias c o m q u e são t r a t a d o s pelos governadores, d a iniqüidade c o m q u e são julgadas
as suas causas pelos ministros d a j u s t i ç a " , , conforme advertia, e m 1732, o conse-
lheiro do T r i b u n a l do U l t r a m a r A n t ô n i o R o d r i g u e s d a Costa, d o alto de sua ex-
periência e m lidar c o m as contestações q u e e s p o c a v a m n a A m é r i c a p o r t u g u e s a n a
p r i m e i r a m e t a d e d o século X V I I I .

GODINHO, Vitorino Magalhães. Ensaios II: sobre a História de Portugal. 2. ed. Lisboa: Sã da Costa,
1978. p. 52 e segs. Ver também MAGALHÃES, Joaquim Romero. A fazenda. In: MATTOSO,
José (Dir.) História de PortugaÇ Lisboa: Estampa, 1993.. V. 3, p. -92.
Esperava-se, dessa forma, q u e aqueles superiores n o m e a d o s p a r a os domínios
ultramarinos dispusessem de experiência prévia cumprida sob as vistas do rei. Nesse
aspecto^ a carreira daquele q u e ocuparia, a partir d e 1749, o lugar de ouvidor da
comarca de O u r o Preto e m Minas Gerais n ã o seria diferente. E m 1742, logo após se
desembaraçar dos exames e da leitura perante avaliadores do Desembargo do Paço, o
bacharel C a e t a n o da Costa Matoso foi n o m e a d o p a r a juiz de fora da vila de Setúbal,
passo inaugural n a sua atuação j u n t o a magistratura real. '-' N o desempenho de sua
9

p r i m e i r a função, o titular se sai b e m , m e r e c e n d o avaliação positiva p o r p a r t e dos


desembargadores q u e o examinaram. As carreiras, sob o espectro do Antigo Regime,
e r a m c u m p r i d a s sob cálculos e o reconhecimento de u m a b o a residência m a r c a r i a
pontos p a r a pleitear novas e melhores p o s i ç õ e s . 91

N a n o m e a ç ã o p a r a O u r o Preto, tornar-se-ia pública a i m p o r t â n c i a deste re-


c o n h e c i m e n t o : " H a v e n d o respeito a b o a informação q u e t e n h o das Letras, servi-
ços e p a r t e s q u e c o n c o r r e m no Bacharel C a e t a n o d a Costa M a t o s o e a o b e m q u e
m e serviu n o lugar de juiz de fora d a vila d e Setúbal d e q u e deu b o a residência.
H e i p o r b e m fazer lhe m e r c ê do. lugar d e ouvidor geral d a c o m a r c a d o o u r o p r e -
t o " , dizia a C a r t a R é g i a d a d a e m Lisboa aos 8 d e agosto de. 1 7 4 8 . ^ 9

O u t r a s formas d e r e c o n h e c i m e n t o , c o n t u d o , estavam ali invisíveis: a influência


d e seu tio e valedof M a n u e l M a d e i r a de Sousa, a d v o g a d o do T r i b u n a l d a Suplicação,
os estudos c u m p r i d o s e m C o i m b r a , a posição de familiar do S a n t o Oficio e a esmera-
d a qualificação o b t i d a de s u a f o r m a ç ã o jurídica, q u e vinha se t o r n a n d o evidente.
S e g u r a m e n t e , estas foram qualidades decisivas p a r a sua escolha p a r a o mais alto
posto da J u s t i ç a n a capitania mais rica do I m p é r i o .

"Dom João por graça [....] Faço saber a vós, Juiz, vereadores, procurador, Fidalgos, cavaleiros,,
escudeiros, homens bons e Povo da Vila de Setúbal [...] que havendo respeito as letras e mais partes
que concorrem no bacharel Caetano da Costa Matoso e que no de que o encarregar me servirá
como cumpre a meu serviço eboa administração dajustiça e haver lido no Desembargo do Paço e
íicar aprovado. Hei por bem fazer-lhe mercê cio lugar dejuiz de fora dessa vila por tempo de três
anos e. além deles p mais que houver por bem enquanto lhe não mandar tomar residência [...]
Lisboa, 16 de outubro de 1742". ANTT, Chancelaria de d. João V. Cód. 105 , fl. 134v.-135 Carta
dejuiz defora da vila de. Setúbal, 5 10.1742. No BNL, RES, cód. 1077. Catálogo alfabético dos ministros de
letras que semiram nestes reinos de Portugal e Algarve, seus domínios e conquistas ultramarinas, relações e tribunais,
copio nele. se adverte. Dos mais antigos até o presente de que se descobriu a noiíeia mais exata, 1763, o despacho
para o cargo dejuiz de fora data de 1744;
Poucos detalhes obtivemos a respeito do seu período de atuação em Setúbal. Consta, no entanto,
ter merecido uma boa residência em alguns documentos, dentre eles o que concede mercê como
ouvidor da comarca cie Ouro Preto. Sobre a formação dos agentes, a cultura polidea e a organiza-
ção do Estado em Portugal do Antigo Regime, ver CURTO, Diogo Ramada. A cultura política.
In: MATTOSOJosé (Dir.), op. cit. nota 37, v. 3,.p. 115-147.
ANTT, Chancelaria de d. João V, Próprios, B a C, n. 109, cód. 115, íl. 369. Ver também APM, SC
93,11.6.
Inaugurava-se, então, n a carreira calculada r u m o aos altos tribunais d a magistra-
tura a fase, talvez a mais arriscada, q u e deveria ser c u m p r i d a no ultramar. Havia,
p o r é m , as M i n a s no meio do caminho r u m o à necessária experiência colonial.
C o m o v i n h a sendo c o m u m , O u r o Preto passaria, e m 1749, a c o n t a r c o m u m
m e s m o funcionário p a r a cuidar das funções de Justiça e das disputadas r e n d a s e lití-
gios envolvendo h e r a n ç a s , viúvas e órfãos n o â m b i t o d a c o m a r c a . Assim, d i a n t e d a
v a c â n c i a do cargo de p r o v e d o r dos defuntos e ausentes da m e s m a c o m a r c a , o b a c h a -
rel aproveitou p a r a r e q u e r e r t a m b é m a m e r c ê d a serventia desse oficio. A n o m e a ç ã o
valia pelo t e m p o de três anos, o u mais se fosse necessário, d e v e n d o receber o m e s m o
v e n c i m e n t o q u e seu antecessor a título de ajuda d e custo, a c o n t a r desde o dia q u e
e m b a r c a s s e d a Corte.®^ A t e n d i d o através de provisão real de 12 d e agosto de 1748,
dois cargos vitais p a r a a administração que só p o d i a m ser p r e e n c h i d o s p o r ministros
d e letras ficavam o c u p a d o s de u m a só penada.® ^ 1

O cargo d e ouvidor reservado a o d o u t o r C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o , e m b o r a


possuísse sólida tradição n a A m é r i c a portuguesa, n ã o m e r e c e r a r e g i m e n t o especí-
fico p a r a r e g u l a r suas atribuições e m t e r r a s m i n e i r a s . ® D e s d e q u e o p r i m e i r o
5

o c u p a n t e d a função n a c o m a r c a de O u r o P r e t o b u s c o u e m consulta à M e t r ó p o l e
c o n h e c e r qual a fonte legal de seu ofício, o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o esclareceu q u e
p a r a aquelas ouvidorias b a s t a r i a m ser aproveitados os r e g i m e n t o s do R i o de J a -
n e i r o (1669) e d e S ã o P a u l o (1700), c o n c o m i t a n t e m e n t e . N a s M i n a s , esses regi-
m e n t o s serviriam c o m o aplicação geral d e princípios, u m a vez q u e certos disposi-
tivos c a r e c i a m d e a t u a l i d a d e , c o m o a q u e l e q u e d e t e r m i n a v a v i g i l â n c i a s o b r e
d o n a t á r i o s e m relação ao c u m p r i m e n t o d e suas cartas d e doação.®^

APM, SC 93,fl.6v.-7. [Provisão do Canalha Ultramarino, Lisboa, 16 de agosto de 1748],


94. ANTT,. Chancelaria de. d. João V, Próprios, B a C, n. 109. Ver também APM, SC 93, 7v.-8.
^~-
)
Sobre a gênese da função de ouvidor e suas atribuições, conforme ALDEN, Dauril, op. dt. nota 78,
1968, p. 431-432.
SOUZA, Maria Eliza de Campos. Ouvidoria: estrutura e legislação. Belo Horizonte: Fundação João
Pinheiro, 1997. Comunicação apresentada ÍIQXIX Simpósio Nacional de História.da Anpuh, em
julho de 1997, trabalho desenvolvido no âmbito do projeto çle preparação da edição do Códice Cosia
Matoso. A autora sistematizou com precisão as fontes legais e as atribuições dos ouvidores nas Mi-
nas Gerais, reconhecendo o papel de destaque representado pela experiência de Caetano da Costa
Matoso na definição da jurisdição da Justiça real na capitania. Para os regimentos de 1669 e de
1700, ver APM, SC. 01, íl. 70v.-74. Regimento dos ouvidores gerais do Rio de Janeiro. Lisboa, 11 de março
de 1669; APM, SC 01,fl.75~78v. Regimento dos ouvidores de São Paulo Lisboa, 4 de janeiro de 1700 ou
Códice Costa Matoso, documentos. 23, 125 (Rio de Janeiro) e 27 (São Paulo).
C u m p r i a aos ouvidores, p o r t a n t o , tratar dos feitos cíveis e crimes cuja a l ç a d a
n ã o alcançasse. 100 mil réis, d e v e n d o os valores a c i m a disso serem e n c a m i n h a d o s
p a r a o T r i b u n a l da R e l a ç ã o . O s crimes envolvendo escravos estavam e m s u a alçada,
p o d e n d o estabelecer quaisquer p e n a s , m e s m o as de m o r t e . Poderia j u l g a r e c o n d e n a r
h o m e n s b r a n c o s a p e n a d e d e g r e d o s e m consulta a outras instâncias. C u i d a v a m os
ouvidores d e c o m a r c a d e a c o m p a n h a r as apelações e agravos dos oficiais d a J u s t i ç a ,
d e passar cartas d e seguro semelhantes às dos corregedores, assim c o m o cartas nega-
tivas e confessativas. P o d i a m , ainda, j u l g a r c o m os adjuntos a necessidade d e liberda-
de d e presos e m casos d e defesa.'® 7

T a i s magistrados d i s p u n h a m de i m u n i d a d e inerente ao c a r g o , s e m q u e gover-


n a d o r e s ou c â m a r a s p u d e s s e m m a n d a r prendê-los, a n ã o ser e m caso d e flagrante. A
ele se s u b o r d i n a v a m os oficiais de J u s t i ç a e de G u e r r a , que. lhe deviam obediência.
Pelo r e g i m e n t o d e 1700, a s s u m i a m o oficio de j u i z dos Feitos da C o r o a nas vilas e
c o m a r c a s . O u v i d o r e s de c o m a r c a s e x e r c i a m a i n d a a. função d e corregedores das
comarcas, regulada por regimento próprio, cuidando da eleição dos juízes e oficiais
do concelho e inquirição anual dos oficiais de Justiça, d a fiscalização d a cadeia e
devassa dos carcereiros, da fiscalização dos forais, das rendas do concelho e posturas
d a câmara, verificando se havia usurpação dos direitos reais, da verificação das licen-
ças dos ofícios mecânicos e médicos, da zeladoria das benfeitorias sob sua jurisdição e
d a concessão de menos três audiências semanais. Estas vastas atribuições reproduziam
orientação das O r d e n a ç õ e s Filipinas praticada, e m b o r a sem muita h o m o g e n e i d a d e ,
e m Portugal.®8 S o m a n d o mais atribuições, ocorria nas M i n a s q u e a provisão dos
ouvidores vinha sendo quase sempre a c o m p a n h a d a da d e p r o v e d o r dos defuntos e

Os ouvidores das comarcas integram ainda às juntas de Justiça instituídas em 24 defevereirode


17.31 ao lado dò governador, juiz de fora da vila do Ribeirão do Carmo e provedor da Fazenda
para sentenciar a morte bastardos, carijós, negros e mulatos. COELHO, José João Teixeira, op. çit.
nota 40, p. 105.
Ver SILVA, Ana Cristina Nogueira da; HESPANHA, António Manuel. O quadro espacial. In:
MATTOSO,José fDir.), op. cit. nota 37. Através da caracterização desses autores muitas diferenças
podem ser estabelecidas entre a estrutura administrativa reinol e ultramarina.
ausentes, resíduos e capelas, assim c o m o á de provedor d a Fazenda.®® N ã o é difícil
avaliar a situação de sobreposição e concentração de funções nesse magistrado.' ^
D i o g o Pereira R i b e i r o de Vasconcelos, t r a t a n d o d e b e m p e r t o d a q u e l a épo-
ca sobre essas obrigações b e m b a l a n c e a d a s , c o m e n t a r i a :

" O ouvidor de Vila Rica exercita jurisdição ordinária, civil c criminal em seu
distrito, por bem do regimento dos ouvidores do Rio de Janeiro; serve de corregedor
e provedor da comarca, e m cuja qualidade lhe pertence a eleição dos oficiais da
câmara que também confirma, passando-lhes suas cartas de usança; toma contas
às câmaras da comarca e entende em tudo que lhe é concedido em seu regimento
n a ordenação do reino. C o m o provedor do resíduo, pede conta aos testamenteiros;
em provedor de ausentes arrecada as heranças dos finados, cujos herdeiros não são
da terra, conforme o regimento e provisões peculiares da Mesa da Consciência é
Ordens a este respeito. Conhece as causas contenciosas d a capitania relativa à
fazenda real em qualidade de juiz dos feitos [...]. E, também, juiz da coroa e
presidente das juntas dela, criadas nas cabeças das comarcas de Minas [...]."""

T a l v e z p o r enfeixar essa v a r i e d a d e d e funções foi q u e esse h i s t o r i a d o r , em


s u a definição seca, abreviasse tantas atribuições afirmando: " O ouvidor geral p r e -
side a toda a c o m a r c a . ' '02 1

'-
9
A partir da mudança no método de arrecadação do quinto, em 3 de dezembro de 1750, ganha,
através dos regimentos que regulam a nova forma de cobrança, novas atribuições no plano de
auxílio judicial ao intendente. SALGADO, Graça (Goord.). Fiscais e marinhos. A administração no
Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira; Brasüia: INL, 1985, p. 357-358; VAS-
CONCELOS, Diogo Pereira Ribeiro de. Breve descrição geográfica, física e política da capitania de Minas
Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, CEHC, 1994..ALDEN, Datiril, op. .cit. nota 78,
1968, p. 431 esegs.)
A descrição acimafoifeita com base no texto de Maria Eliza de Campos S o u 2 a , op, cit. nota 94, p.

7-11, que tomou os regimentos dos ouvidores de São Paulo e Rio de Janeiro como fonte dessas
atribuições. Para maior detalhamento das funções citadas, consultar o indefectível Fiscais e fneirinhós
(SALGADO, Graça. (Coord.), op. cit. nota D8. Sobre funções e cargos no Brasil Colônia, ver tam-
bém GARCIA, Rodolfo. Ensaio sobre a história política e administrativa do Brasil (1500-1810). 2. ed. Rio
de Janeiro: José Otympio; Brasília: INL, 1975. p. 32-42. Os ofícios próprios da "administração
periférica da Coroa", .segundo António Manuel Hespanha, "prolongamentos pelos quais a coroa
entrava em contato com as estruturas político-administrativas locais, nomeadamente concelhias",
têm sua jurisdição detalhadamente analisada na obrais véperas do Leviathan, Instituições políticas e.
poder político. Portugal - século XVII. Coimbra: Almedina, 1994. Ver para as atribuições dos
corregedores p. 200-205, dos provedores, ai incluídas não apenas as matérias de finanças, mas
também resíduos e pessoas coletivas como irmandades e concelhos, p.. 206-212. Já a situação dos
ouvidores de comarcas no reino descrita por Hespanha (p. 192-194) apresenta grandes contrastes
em relação à jurisdição e às atribuições que temos visto.
0
VASCONCELOS, Diogo Pereira Ribeiro de, op. cit. nota 97, p. 98-99. Embora esteja aquém do
L

período em foco, esta descrição funciona integralmente como apresentação para o cargo de ouvidor.
° - VASCONCELOS, Diogo Fereira Ribeiro de. op. çit. nota 97, p. 88.
2
S e g u n d o a m e s m a fonte, tal m a g i s t r a d o , a c u m u l a n d o a o seu o r d e n a d o d e
5 0 0 $ 0 0 0 réis os correspondentes às outras funções, incluindo as b r a ç a g e n s , próis e
percalços, t o t a l i z a v a de o r d e n a d o a n u a l 2:340$0Ü0 r é i s . 1 0 3
J á o autor a n ô n i m o d a
Descrição geográfica, topográfica, histórica e política da capitania das Minas Gerais (1781) fala de
u m r e n d i m e n t o anual de 1:898$ 169, fora a p r o p i n a s p o r ocasião das festas. 04- 1

P o r mais alto q u e fossem os salários do cargo, p o r maiores q u e p r o m e t e s s e m ser


os r e n d i m e n t o s indiretos angariados nas opulentas M i n a s do ouro e a expectativa de
r e c o n h e c i m e n t o p a r a carreiras talhadas n a adversidade do m u n d o colonial, elevada
vinha sendo n a m e s m a p r o p o r ç ã o a m a r g e m d e risco q u e a função ali encerrava. O s
titulares que a n t e c e d e r a m G a e t a n o da Gosta M a t o s o e m M i n a s p r o v o c a r a m freqüentes
d e s c o n t e n t a m e n t o s , c o n v e r t e n d o - s e e m elementos de sérias i n s t a b i l i d a d e s . ^ ^
Ouvidores estiveram e m Minas ao alcance d a m ã o dos grupos d e amotinados,
tornando-se e m muitas ocasiões alvo das revoltas q u e o c o r r e r a m . As m a r g e n s do
ribeirão do C a r m o , M a n u e l d a Costa A m o r i m — de q u e m o governador d o m Braz
Baltazar da Silveira reclamava que n ã o lhe obedecia as ordens —, a o redistribuir c o m
inabilidade as datas minerais e m Vila do C a r m o , e m 1713, provoca a ira daqueles
q u e ' n ã o foram contemplados, e m b o r a j á minerassem n a á r e a . 1 0 6
O ódio aos oficiais
de Justiça outras vezes poderia ser mais direto, circunscrevendo certa ritualística das
revoltas urbanas. Assim se passou c o m o ouvidor d a c o m a r c a M a r t i n h o Vieira, ao
t e m p o do conde d e Assumar, q u a n d o teve, e m 1720, sua casa esvedrada pelos a m o -
tinados de Vila Rica, que o p r o c u r a v a m p a r a matá-lo.'^7 Além d e a t a c a d o , a p a u t a

i 0 3
- Jbid.p. 100.

104. DESCRIÇÃO geográfica, topográfica, histórica e política da capitania das Minas Gerais. Revistado
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. 71, parte 1., p. 137, 1908,
Os conflitos envolvendo ouvidores nos primeiros tempos das minas do Ouro Preto, entre 1710 e
1720, podem ser estudados em RAMOS, Donald, op. cit. nota 31, p. 384 e segs., especialmente o
capítulo "Politicai conílict in an evolving society" e ANASTASIA, Carla M.Junho. Usurpação e
jurisdição; conflitos intra-autoridades nas Minas setecentistas. In: MARTINS, Ismênia de Lima et
al (Org.) História e cidadania. São Paulo: HumanJtas, FFLCH, USP, ANPUH, 1998. p. 133-152.
Uma fonte preciosa de narrativas sobre agressões e problemas que viveram os oficiais são os relatos
de antigos moradores, que constituem os primeiros documentos do Códice Costa Matoso, particular-
mente os documentos número 4, 5 e 7.
1
Sobre esse motim, ver ANASTASIA, Carla Maria Junho. Vassalos Rebeldes: violência coletiva nas
Minas na primeira metade do século XVIII. Belo Horizonte: Editora C/ Arte, 1998. p 17-19. Os
problemas sociais decorrentes da prática dajusdça pelos oficiais reais nas Minas conhecem lugar
especial nesse estudo, uma vez que classifica esse tipo de protesto como "reativos", já que pretendi-
am manter procedimentos costumeiros ameaçados.por estas autoridades. Ver, especialmente, p.
17-33.
^ ®J' Idem., p. 41. Ler aí também sobre a demanda de Manoel Mosqueira pelo lugar de ouvidor como
um dos objetivos da revolta, p. 47-48.
d e reivindicações critica vexações praticadas p o r oficiais de Justiça, d e n t r e elas as
prisões violentas e Os custos elevados. A p r e s e n ç a dessas d e m a n d a s nas reivindica-
ções e n c a m i n h a d a s p o r g r u p o s q u e se a r r i s c a r a m à p r á t i c a d a rebelião c o n t r a o
r e p r e s e n t a n t e m a i o r da justiça real n a capitania é p r o v a suficiente d e sua. impor-
t â n c i a política.
D o m L o u r e n ç o de Almeida, q u e governa M i n a s e n t r e 1721 e 1732, refere-se a
u m m o t i m q u e , diferentemente do q u e se assistira até ali, teria sido f o m e n t a d o pelo
o u v i d o r Luís Botelho de Q u e i r ó s e m S a b a r á , contrário ao g o v e r n a d o r , q u e p r e t e n d i a
m u d a r o m é t o d o d e a r r e c a d a ç ã o do quinto D o m L o u r e n ç o , e n f r e n t a n d o a velha
indisposição entre governadores e os ministros d a j u s t i ç a , n ã o conseguia entender-se
c o m aquele ouvidor, q u e tinha " g r a n d e r e p u g n â n c i a " e m lhe obedecer: "[...] m e diz
q u e n ã o estava a m i n h a o r d e m p a r a m e obedecer, n e m c o m o p r o v e d o r dos defuntos
e ausentes n e m c o m o o u v i d o r , p o r q u e estas d u a s jurisdições são isentas d a dos
Governadores".' * ^
P o r é m , n ã o e r a m estas notícias das agruras d e seus antecessores q u e i a m n a
:cabeça do b a c h a r e l q u a n d o viaja do R i o d e J a n e i r o p a r a o c u p a r seu p o s t o e m Vila
R i c a . E r a m b é m outras suas idéias. Desde a p a i s a g e m d a baía, estivera e n e b r i a d o
p e l a v a r i e d a d e das flores, dos bogaris e seu "especioso c h e i r o " e p e l a curiosidade c o m
os m a n g u e z a i s . A t r a v é s dos c a m i n h o s d e n t r o d a s e r r a , e s c a l a v a seus t r e c h o s
penhascosos, g u i a d o p o r sua bússola e p o r sua orientação d e cientista-diletante. S o b a
b r u m a das m o n t a n h a s e a intensidade das chuvas, q u e c a í a m e m p l e n o verão dos
trópicos, o r a seduzido p e l a diversidade d o i m e n s o a r v o r e d o , o r a s u r d o a n t e ao
terror c o m as trovoadas e seu estrondo c o m ecos horrorosos, o b a c h a r e l ilustrado
viveu r a r o s m o m e n t o s de. e n c a n t a m e n t o , sócio d e u m a n o v a sensibilidade q u e
nascia naquele s é c u l o . " '
M a s a o alcançar n a capital d e M i n a s o exercício d e suas funções, cedo C a e t a n o
colocou de lado o d e s l u m b r a m e n t o que: a viagem lhe despertara, substituído imedia-
t a m e n t e p o r forte irritação c o m o d e s c ô m o d o d i a n t e d a falta d e infra-estrutura
p a r a sua instalação. A o t e n t a r fixar-se e m Vila R i c a , a p r e c a r i e d a d e d a vida colo-
nial apresentava-se a o novo ouvidor. S e q u e r residências destinadas, p a r a a c o m o -
d a r a m a i o r a u t o r i d a d e judiciária da c o m a r c a foram p r o v i d e n c i a d a s . Seu testemu-

'- Ver Códice Costa Matoso, documento 31.


1
' Sobre o regimento dos salários, e nâO ser observado pelo ouvidor do Rio das Velhas ê muitas coisas
contra este ministro. [Carta do governador dom Lourenço dê Almeida ao rei. Vila do Carmo, 12-
4-1722], Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, n. 31, p. 123, 1980.
'- Sobre ajunta de Fazenda que se fez e forma em que o governador deve proceder a respeito dos
ouvidores que lhe desobedecem. [Carta do governador, dom Lourenço de Almeida ao rei. Vila do
Carmo, 14-4-1722]. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, n. 31, p. 125, 1980.
• Códice Casta Matoso, documento 138.
n h o a respeito d o m o m e n t o d a c h e g a d a a vila R i c a é enfático: " C h e g a n d o a ela o
a n o passado [1749], n e m achei p r o n t a s casas algumas p e l a C â m a r a p a r a a m i n h a
residência, sabendo-se q u ê eu v i n h a , n e m a l g u m a s despejadas, e m q u e m e a c o -
m o d a s s e [...],"' ^ O jeito foi p u l a r de u m c a n t o a o u t r o entre hospício d e religio-
sos e Casas d e particulares, "[...] tudo c o m d e s c ó m o d o n ã o p e q u e n o m e u , sendo o
m e s m o q u e t e m sucedido aos m e u s antecessores, a i n d a q u e n ã o c o m t a n t a especi-
alidade [..-]", diria. Assim q u e p ô d e , dispara cartas â M e t r ó p o l e r e c l a m a n d o das
condições q u e e n c o n t r a r a e a c u s a n d o a inexistência de recursos e estrutura p a r a
s u a i n s t a l a ç ã o . ^ Nesses primeiros m o m e n t o s n a Vila, j á se revela q u e a tolerân-
1

cia n ã o era a m a i o r q u a l i d a d e do novo ouvidor.


Desde q u e passara a serra da Mantiqueira, descortinar-se-ia u m a história que
iria confundir-se com a formulação do códice batizado c o m seu sobrenome. C o m e ç a -
v a m ali dias vertiginosos, tensões implacáveis e estranhamentos os mais diversos, q u e
certamente fariam-no ter saudades dos dias deixados p a r a trás e m Setúbal.
Constrangimentos se seguiriam. O próprio ato de posse do novo ouvidor p r o -
porcionou desconforto j u n t o aos oficiais da C â m a r a d e Vila Rica, u m a vez q u e o
ministro provocara dúvidas a respeito da precedência cerimonial frente ao juiz de fora
da vizinha C i d a d e de M a r i a n a . 114
" O novo ouvidor não se mostrara satisfeito c o m o
assento q u e lhe: era destinado n a ocasião, e p r e t e n d e n d o ver definida desde o a t o
inaugural da posse sua posição e a precedência de. seu cargo em. relação aos magistra-
dos ordinários do concelho exigia q u e o juiz d e fora se sentasse a sua d i r e i t a . ^ P o r 11

outro lado, o juiz ordinário via a cerimônia de forma distinta, a c r e d i t a n d o q u e a

APM, SC 92,fl.52. [Representação th ouvidor Caetano da Costa Matoso ao rei. Vila Rica, 15 defevereiro
de 1750}.
APM, SC.92, fl. 52. [Representação do ouvidor Caetano da Costa Matoso ao rei. Vila Rica, 15 de fevereiro de'
1750]. Em carta de lei, Lisboa, 4 de novembro de 1750, através do Conselho Ultramarino, seria
feíta consulta ao governador sobre a validade da representação do ouvidor, de 15 de fevereiro
daquele ano. Ver APM, SG 92, fl. 52. Sendo única a situação de inexistência do direito de aposen-
tadoria (hospedagem) através dos bens do concelho para ministros do Reino em Vila Rica, reivin-
dica: "A vista de tudo isto, parece que deve Vossa Majestade ser servido ordenar que a Câmara
desta vila tenha casas prontas para aposentadoria dos ouvidores dela, e mandar seja satisfeito pelos
bens do concelho da aposentadoria que se me deve desde o dia da posse poraquele arbítrio que no
estilo da terra Vossa Majestade entender proporcionado ao meu lugar, atendendo-o ser certo como
os oficiais da Câmara não ignoram, e maior aluguer das em que vivo, e com que são alugadas todas
nestas partes". APMj SC 92, íl. 52 [Representação do ouvidor Caetano da Costa Matoso aó rei. Vila Rica, 15
de fevereiro de 1750].
Os conflitos parece que começam cedo, pois já no início de fevereiro de 1749 Gomes Freire, do
Rio de Janeiro, despacha pedido de informações ao juiz de fora de Mariana a respeito de "queixa
que os moradores dessa comarca fizeram a Sua Majestade do ouvidor dela". APM, SC 93, íl. 20.
APM, SC 93, fl. 59v. Carta de lá de 7 de outubro de 1749.
p r e c e d ê n c i a do ouvidor só se estabeleceria depois d e ó juiz de fora dar-lhe posse,
A questão n ã o é sanada e m Minas e segue p a r a o Conselho U l t r a m a r i n o e o
Procurador da Coroa, em consulta. 1

O impasse vem a exigir decisão dos tribunais metropolitanos q u e favoreceram os


argumentos d a nova autoridade local. D o Reino viria a resposta impaciente do p r o -
curador desembargador J o ã o Antônio de Oliveira: "Ainda q u e o que serve de ouvidor
preceda aos juízes e m todos os atos, e m deixando de o ser deve ser precedido do juiz
ordinário n a sua jurisdição, porque, dada a posse ao novo ouvidor, ficava o que servia
c o m o particular e não tinha, j á lugar, e assim õ melhor meio era q u e n e m sindicante,
n e m ouvidor serventuário vá à Casa da C â m a r a d a r esta posse", a r r e m a t a n d o , "e se
ficavam evitando estas controvérsias inúteis.'" ''' 1

N u m a sociedade m a r c a d a pelo formalismo e pela visibilidade das posições sociais,


e m q u e os lugares cerimoniais e as precedências valiam poder, o q u e estava e m j o g o
ali e r a m menos as disputas mesquinhas e muito mais a conquista de espaços políticos
simbólicos. Neste sentido, todas as formas d e controle, e supremacia dos rituais simbó-
licos, sobretudo nas cerimônias públicas, foram objeto d a busca de afirmação, seja do
ouvidor, seja de diversas autoridades coloniais, sobretudo o n d e as jurisdições e r a m
mal definidas. ** N o ano seguinte ao de sua posse, obriga os oficiais d a C â m a r a de
11

Vila R i c a a . m u d a r e m antigo costume que adotavam desde a criação da Vila, q u a n d o


se. apresentavam e m suas funções ou nas cerimônias religiosas:

"Costumavam os oficiais dela, para todas as suas funções e as das igrejas, saírem
da Casa da C â m a r a com as suas varas de capa e volta e com o estandarte alvorado, è
c o m esta compostura iam assistir as ditas funções; e, finda elas com a m e s m a
ordena, se recolhiam e enrolavam o estandarte na Casa da C â m a r a . " " 11

T e n t a obrigar que, em vez de depositarem suas varas, capas e o estandarte após


as cerimônias n a C a s a d a C â m a r a , passassem a fazê-lo n a I g r e j a . ^ A o r d e m é rejei-
1

t a d a pela C â m a r a , q u e apela a o rei contra aquela inovação de estilo, defendendo a


continuação de u m a prática que se instalara "[...] desde a criação d a C â m a r a de Vila

' AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 56, doe. 15. [Caita do ouvidor Caetano da Costa Matoso,
Vila Rica, 18.2.1750] .
1
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 56, doe. 15. [Consulta do ConseUio Ultramarino. Lisboa,.
5.10.1750].
1 1 8
- Ver KANTOR, íris, op. cit. nota 44.
119- APM, CMOP 63, fl. 11. Registro de uma carta que o secretário de Estado Diogo de Mendonça Corte-Real
escreveu ao doutor ouvidor-geral desta Vila Rica.
APM, CMOP 63, 11. 11. Registro de uma carta que o secretário de Estado Diogo de. Mendonça Corte^Real
escreveu ao doutor ouvidor-geral desta Vila Rica.
R i c a até a g o r a [...]", e n q u a n t o o ouvidor c o b r a v a o c u m p r i m e n t o frio d a lei. ^ 1 1

O secretário d e Estado c o n t e m p o r i z a , t e n d e n d o a favorecer a decisão do ouvidor,


"[...] que sendo certo o uso q u e se. refere Vossa M e r c ê , faça conservar a m e s m a
C â m a r a nele [...]", endossaria Diogo d e M e n d o n ç a C o r t e R e a l , e m l 9
d e abril d e
1752, a p a r e n t e m e n t e a c e i t a n d o a m a i o r força d a lei positiva sobre o c o s t u m e . ' 2 2
D i s p u t a s dessa n a t u r e z a tornar-se-iam freqüentes.
Afirmação do p r i m a d o d o direito real sobre c o s t u m e , d e m o n s t r a ç ã o d a su-
p r e m a c i a d a m a g i s t r a t u r a letrada e real sobre os j u i z a d o s ordinários e, p o r ú l t i m o ,
imposição d a jurisdição do ouvidor sobre a c â m a r a , a ação e as atitaad.es de C a e t a -
no d a C o s t a M a t o s o e n s i n a r i a m o m u i t o q u e se escondia p o r trás de r e g r a s d e
cortesia é distinção.
C e d o , o e m p e n h o d o novo ouvidor n a construção d a jurisdição d a J u s t i ç a real
em M i n a s deixa d e l a d o o c a m p o dos formalismos p a r a c o m e ç a r a c u m p r i r as princi-
pais atribuições do m a n d a t o d e ouvidor da c o m a r c a , p r o v e d o r dos defuntos e ausen-
tes, c o r r e g e d o r d a c o m a r c a , q u a n d o e n t ã o formas diferenciadas d e resistências se
m a n i f e s t a r i a m . Elas d e s e n h a r i a m os círculos q u e C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o iria
atravessar nos p r ó x i m o s anos.
A t e n d e n d o à orientação do g o v e r n a d o r G o m e s Freire, depois de u m e n c o n t r o
q u e tiveram n o R i o d e J a n e i r o , trata i m e d i a t a m e n t e d e esclarecer suspeitas q u e cer-
c a v a m a a t u a ç ã o dos c o n t r a t a d o r e s e m M i n a s . Ali, confirma a situação q u e o gover-
n a d o r se referira: a c o b e r t a d o s pela lassidão d o p r o v e d o r d a F a z e n d a R e a l , os rendei-
ros, u s a v a m dessa instância p a r a c o b r a r dívidas q u e n a d a t i n h a m a ver c o m os
c o n t r a t o s . M e t i c u l o s o , o o u v i d o r e s t u d o u e m detalhes o p r o b l e m a , c h e g a n d o à
Conclusão d e q u e tornara-se c o m u m e m M i n a s a subdivisão d a a d m i n i s t r a ç ã o dos
contratos entre u m s e m - n ú m e r o de pessoas, inclusive c o m e r c i a n t e s , que
i n s t r u m e n t a l i z a v a m o p o d e r j u d i c i a l d a P r o v e d o r i a p a r a c o b r a r seus d e v e d o r e s ,
a c a b a n d o p o r serem "[...] executados p e l a dita.Provedoria c o m a c a p a da F a z e n d a
de. Sua M a j e s t a d e as dívidas de t a b e r n a s , açougues, e outras coisas [...]".^3

APM, SC .93, fl, '221-22 lv. [Carta do secretário de Estado Diogo de Mendonça Corte-Reala Gomes Freire de
Andrade,Lisboa, 1.4.1752].
APM, CMOP 63, fl. 11. Registro de uma carta que o secretário do Estado Diogo de Mendonça Corte Real
escreveu ao doutor oumdor-geral desta Vilã Rica. Essa regalia definida por esta provisão real estaria preser-
vada no início do século seguinte, de acordo com Diogo Pereira Ribeiro Vasconcelos, op. cit. nota
97, p. 96).
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, Minas Gerais, caixa 53, doe. 48. [Carta do ouvidor da comarca
de Vila Rica Caetano da Costa Matoso ao rei. Vila Rica, 9.3.1749]. A data desta carta - pouco mais de
um mês após sua posse e anterior ao provimento no cargo de ouvidor (que só ocorreria em agosto
daquele ano) — e a seriedade do problema - contratos reais representavam fatia privilegiada nas
receitas metropolitanas — denunciam certa ansiedade de Caetano da Costa Matoso cm mostrar
empenho.
D o s a n d o denúncias contra tais práticas de injustiça e danos ao projeto coloniza-
dor, causados pela generalização daquela prática, usava cores fortes p a r a criticar a
forma c o m o se sucediam tais execuções, q u a n d o "[...] se t e m extinguido muitos e
m u i t o s m i n e i r o s q u e e s t a v a m nas suas roças m i n e r a n d o e m utilidade dela, e d o
patrimônio de Vossa Majestade sendo vendidos seus escravos [.-.]"- O u , ainda, deslo-
cando produtores de sua faina e "[...] obrigando-os em tão grandes distâncias, c o m o
dos sertões destas Minas, a vir a este juízo defender-se fazendo despesas inexplicáveis
ou satisfazendo as dívidas p o r que n ã o são condenados e a exorbitância das custas
[...]". D e m o n s t r a n d o ter aprendido rápido os recursos retóricos e m voga, o n d e estava
presente certo tom de ruína iminente e destruição geral d e tudo q u e cercava as expec-
tativas metropolitanas, conclui: "[...] totalmente ficam os mineiros destruídos p o r q u e ?

a falta q u e hoje se experimenta de ouro faz expor os escravos e a fazenda a estas


execuções, q u e são a r r e m a t a d a s p o r u m diminuto preço, e assim vai ficando tudo
p e r d i d o , e os h o m e n s sem refúgio algum."'24

Parceiros poderosos no governo d a capitania, nos estertores da década de 40 do


século X V I I I , a i n d a n ã o se podia afirmar c o m segurança que e r a m serenas as relações
entre Estado e Igreja. O bispado de M a r i a n a , instituído e m 1745, c o m e ç a r a efetiva-
m e n t e a estruturar suas ações e sua política administrativa quase n a m e s m a época d a
chegada do ouvidor a Vila Rica. Poderes concorrenciais tornariam o final dos anos 40
C a década de 50 u m tempo d e profundas disputas. U m a fração desta instabilidade
seria vivenciada n a relação convulsionada e n t r e seus novos titulares, o bispo e o
ouvidor. A precedência d a ação secular sobre o território (que antecede m e s m o a
criação do bispado mineiro, u m a vez q u e j á sob o báculo do bispo do R i o de J a n e i r o
M i n a s fora terra de intensa ação e controle eclesiástico) garantiu o impacto das resis-
tências q u e as medidas tomadas pelo bacharel iriam encontrar.
A p o l ê m i c a e m t o r n o do controle das contas das i r m a n d a d e s , neste sentido,
constituiu capítulo í m p a r e decisivo n a definição sobre a q u e m cabia a função de
averiguar as despesas e as receitas das confrarias mineiras, prerrogativa q u e até ali a
Igreja exercera. Esse controle se traduzia n a verificação quanto aos gastos que vinham
s e n d o feitos, q u e deveriam estar d e acordo com as prioridades q u e prescreviam o
compromisso d a i r m a n d a d e . ^5 Através do auto de visita, ou t o m a d a d e c o n t a , a
1

AHU, .Com. Ultramarino; Brasil/MG, caixa 53, doe. 48. [Carla do ouvidor da comarca de Vila Rica
Caetano da Cosia Matoso ao rei. Vüa Rica, 9.3.749]. O autor, em seguida ao completo diagnóstico que
apresenta ao exame real, no qual não faltaram acusações mais sérias ainda contra os rendeiros,
recomenda que fossem proibidas as avenças e divisões dos contratos em partes.
Para a legislação portuguesa referente à fiscalização das contas das confrarias, ver BOSCH!, Caio
G. op. cit. nota 71, p. 123.
;
a u t o r i d a d e a u d i t a v a os livros internos, e s p e c i a l m e n t e os d e receitas e despesas,
avaliando, a c o r r e ç ã o de suas rotinas administrativas. ^ 6
G a e t a n o d a C o s t a M a t o s o , a o c o n v o c a r , n a q u a l i d a d e d e p r o v e d o r , as pri-
m e i r a s i r m a n d a d e s p a r a serem submetidas ao e x a m e de suas c o n t a s , suscita m a n i -
festações d e e s t r a n h e z a p o r p a r t e do bispo. '27 P o r o u t r o lado, o q u a d r o d e desor-
d e m e casuísmo i m p r e s s i o n a o ouvidor e m seu p r i m e i r o c o n t a t o c o m o vigário
geral e provisor d o bispado: são apresentadas i n ú m e r a s i r m a n d a d e s q u e , e m b o r a
t e n d o r e c e b i d o provisão d e ereçãô eclesiástica vários anos depois d e sua f u n d a ç ã o
p o r iniciativa de leigos, o vigário insistia n ã o p o d e r i a m ser consideradas seculares.
Casos semelhantes se s u c e d e m . O u t r a i r m a n d a d e a p a r e c e r i a c o m provisão de ere-
çãô p a s s a d a p o r u m vigário d e vara q u e sequer possuía jurisdição p a r a i s s o . . ' ^ O
conflito q u e se a n u n c i a v a j á fora e m v e r d a d e e n s a i a d o pelos titulares anteriores,
q u a n d o C a e t a n o F u r t a d o de M e n d o n ç a e o bispo d o m J o ã o da C r u z , n a d é c a d a
d e 4-0, h a v i a m tido entreveros e m virtude d a p o l ê m i c a . '29
As situações e r a m , àquela altura, mais confusas e o q u a d r o , d e total descalabro.
E m u m a p a s s a g e m de c a r t a q u e o p r o v e d o r e n c a m i n h a â M e t r ó p o l e t r a t a n d o d a

"[...] liberdade com que se atropela a jurisdição real, querendo que a eclesi-
ástica seja só a que domine, e que não haja outra qualidade de irmandades, senão
as eclesiásticas, excluindo-se d e todo as seculares, e p o n d o os vassalos e Vossa
Majestade em consternação de se sujeitarem e m tudo a jurisdição eclesiástica,
privando-os da liberdade [...]".

1 2 6 ;
Idem, p. 122,
'•^ Sobre essa disputa, ver AGUIAR, Marcos Magalhães de, op. cit. nota 44, p. I54T157. Ver Códice
Costa Matoso, documento 42.
* Da parte do provedor e ouvidor da comarca, a melhor narrativa das tentativas de acordo e de suas
dificuldades èncontra-se em AHU, Cons. Ultramarino,. Brasil/MG, caixa 55, doe. 33. [Carla âo
ouvidor da comarca de Vila Rica Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23.3.1750],
O conflito entre a jurisdição real e a eclesiástica que segue a fundação do bispado de Mariana é
tema notório na historiografia de.Minas. Nesse sentido, desde o cónego Raimundo Trindade e sua
monumental épassiona! Arckidiocese de Marlanna. Subsídios para a sua história. São Paulo: Escolas
Profissionais do Lyceu Coração de Jesus, 1928-29. 3 v., a briga entre Caetano, da Costa Matoso e
dom frei Manuel da Cruz tornou-se tema familiar nos estudos voltados para a história da Igreja e
do poder em Minas, em capítulo intitulado "Contrariedades sofridas por d. Frei Manuel da Cruz",
p. 121-222, Ver BOSCHI, CaioC.».^. cit. nota 71, p. 112 e segs.; AGUIAR, Marcos Magalhães
de, op. cit. nota 44, p. 153-175. Para estudo do conflito em torno das irmandades, verKANTOR,
íris, op. cit nota 44. Este estudo recupera conflitos que envolveram a instalação do bispado de
Mariana e passagens específicas do conflito entre o ouvidor e o bispo, tendo como base material do
Códice, principalmente o documento 99.
11n

• AHIJ, Conselho Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe. '33. [Carta do ouvidor da comarca de Vila Rica
Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23.3.1750],
D e fato, a sofreguidão episcopal p o r jurisdição se manifestara desde os p r i -
m e i r o s dias do b i s p a d o , q u a n d o , antes m e s m o d e o titular c h e g a r à c i d a d e , o
provisor e vigário geral L o u r e n ç o J o s é de Q u e i r ó s C o i m b r a p r e p a r a u m livro p a r a
se r e g i s t r a r e m os "[...] t e r m o s d e sujeição, e o b r i g a ç ã o d e t o d a s e q u a i s q u e r ir-
m a n d a d e s q u e p o r a u t o r i d a d e o r d i n á r i a se erigirem e c o n f i r m a r e m
A natureza da fundação das irmandades era questão fundamental. A depender
dela, seriam eclesiásticas ou seculares. N o primeiro caso, teriam sido fundadas sob
proteção d a Igreja e do bispado, devendo ter sua contabilidade c o n t r o l a d a pelo bis-
p a d o ; n o segundo, estariam as irmandades leigas e m sua fundação (mesmo q u e mais
tarde, p a r a aprovar seus compromissos, t e n h a m recorrido ao bispado), e que p o r isso
seriam do controle do provedor. Investigando essa situação, recolhendo notícias entre
os m o r a d o r e s , p e r c e b e q u e n e n h u m a das irmandades havia tido fundação q u e dei-
xasse de ser leiga, pois o bispado era distante n a época, m e s m o q u e t e n h a m recorrido
posteriormente à chancela eclesiástica.' 32 Assim., os dois lados esgrimiam argumenta-
ção histórica e m torno das circunstâncias de fundação das i r m a n d a d e s , ^ c a d a u m 1

valorizando a intervenção eclesiástica ou real na ereção da confraria. O provedor, j á


demonstrando e n o r m e habilidade neste tipo de disputa, conjugava o a t a q u e aos equí-
vocos cometidos diante da legislação c o m razões de natureza histórica p a r a derrubar
a a r g u m e n t a ç ã o episcopal.

A resistência do bispo e m r e c o n h e c e r isto confrontava até. m e s m o c o m a .le-


gislação q u e regulava o controle das contas das i r m a n d a d e s . S e g u n d o C o s t a M a t o s o ,
d i a n t e d a a r g u m e n t a ç ã o de n a t u r e z a legai, " N ã o quis o b i s p o e s t a r p o r c o u s a
alguma, n e m observar a dita o r d e m ; antes dizia q u e p a r a q u a l q u e r i r m a n d a d e ser
eclesiástica b a s t a v a ter c o m p r o m i s s o , a p r o v a d o p e l o o r d i n á r i o . " ^ Sua p o s t u r a
1

d e desrespeito a elas é o objeto preferido da luta do ouvidor:

• Citado por BOSCHI, Caio C , op. cit. nota 71, p. 115, que comenta "[...] enquanto as autoridades
metropolitanas se omitiam, as eclesiásticas, ao contrário, não se descuidavam em conquistar novas
subordinações." A trajetória do ouvidor e seu reflexo na documentação do Códice valorizam o papel
do Estado (e dos magistrados) cm oposição às prerrogativas dq bispado - alvo de críticas contun-
dentes, denúncias de extorsão financeira e excesso de poder, mesclado à injustiça, A interpretação
que valoriza a força da política regalista diante do apoio às. atitudes do magistrado (seja pelos votos
favoráveis as suas decisões seja pela delegação de poder para julgar as finanças do bispado) sai
daqui naturalmente privilegiada. O que não significa contudo desconsiderar as dinâmicas específi-
cas da expansão da estrutura eclesiástica e excessivo desdouro á presença e às demandas da Igreja,
instituição construtora da espiritualidade mineira e colonial, instrumento político decisivo que não
pode ser reduzido às críticas cjue a documentação valoriza.
• • Essa discussão foi consagrada BOSCHI, Caio C , op. cit. nota 71, p. 112 e aprofundada por AGUIAR,
Marcos Magalhães de, op. cit. nota 44 e KANTOR, íris, op. cit. nota 44, esp. p. 126-127.
AGUIAR, Marcos Magalhães de, op. cit. nota 44, p. 160.
'• AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe. 33.[Carta do ouvidor da comarca de Vila Rica
Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23.3.1750J
"Visto que não são bastantes tantas determinações quantas Vossa Majestade
tem dado para se evitarem estas discórdias, e pareceu-me que o único modo de evitar
que os eclesiásticos se intrometam mais em tomar contas e fazer suas as irmandades,
que só são da jurisdição de Vossa Majestade, era ordenar-se ao bispo fizesse entrega
de todas as irmandades quantas supusesse suas, m a n d a n d o a todos os provedores
tomem delas contas, porque eu tenho visto muitas que estão totalmente reputadas
eclesiásticas tendo claro princípio de que já eram irmandades ao tempo que se lhes
deu provisão de ereção eclesiástica, e pelo conhecimento q u e j á hoje tenho do país e
informe de todas as pessoas que ainda aqui h á do primeiro estabelecimento dele,
sei que não há uma única irmandade em toda esta capitania que não seja secular,
pois ficando os bispos no Rio de Janeiro em suma distância, quando a ele recorri-
a m j á era muitos anos depois de haver a tal irmandade, e comumente recorrido
com compromisso para se lhes aprovar, e então os obrigavam também a tirarem
provisão de ereção." ' 13 1

P a r a o n o v o p r o v e d o r a situação era inadmissível: o m o n o p ó l i o d o b i s p a d o so-


b r e os livros r e p r e s e n t a v a u s u r p a ç ã o d a jurisdição real, u m a v e z q u e n ã o h a v i a
dúvida e m s e r e m as i r m a n d a d e s congregações de."[...] irmãos leigos, p o r q u e esta-
va j á a jurisdição real [...]" J 3 6
O ouvidor, a o p e r c e b e r o vigor d a ofensiva, concilia, b u s c a n d o se r e s g u a r d a r
até o n d e n ã o fosse atingida sua delegação real, p a r a q u e , conforme confessa "[...]
se n ã o seguissem as desordens, q u e p r o c u r a v a evitar, e n ã o h a v e r m a i o r e s m o t i n s ,
e c o m u m b i s p o m e a q u i e t e i , ficando e m q u e eu d a r i a c o n t a d o q u e se t i n h a
p a s s a d o , e ele do q u e lhe p a r e c e s s e . " ' 3 7
C o m habilidade, t o m a v a p é d a situação,
a m p a r a d o s e m p r e no d o m í n i o das leis q u e r e g i a m o p r o b l e m a e n a expectativa do
apoio real n a r e s t a u r a ç ã o de sua jurisdição.

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe. 33. [Carta do ouvidor da comarca de Vila Rica
Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23.3.1750]. Essa esclarecedora carta de Caetano da Costa Matoso
descreve diversos expedientes jurídicos empregados pela Igreja para assegurar o controle sobre tais
contas.
APP, fl. 60v-63. Livro de receita e despesa da irmandade de Nossa Senhora do Pilar (1725-1789).
Citado por AGUIAR, Marcos Magalhães de, of}. cit nota 44, p. 161.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe. 33. [Carta do ouvidor da comarca de Vila Rica
Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23-3-1750].
Decide "[...] a não inovar em coisa alguma, buscado este sossegado meio de pôr na presença de
Vossa Majestade estes fatos, que o mesmo bispo não pode negar." Deixa vazar preocupação que se
repetisse o mesmo final que tivera o confronto entre seu antecessor quando a mesma polêmica
" [...] foi causa das desordens que houve entre o bispo antecessor deste e o ouvidor Caetano Furta-
do, de que sé seguiram tão perniciosas conseqüências, e talvez a morte daquele reto ministro pela
defesa da jurisdição de Vossa Majestade". AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe.
33. [Cartado ouvidor da comarca de Vila Rica Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23.3.1750].
O bispo, p o r seu t u r n o , r e c o m e n d a q u e c a d a i r m a n d a d e guardasse consigo,
seus livros até q u e chegasse a solução real p a r a aquela c o n t e n d a . A atitude d e m o v e
o m a g i s t r a d o d a sua c o n d u t a até ali serena e d u r a n t e a festa d e S a n t o A n t ô n i o ,
m a n d a três d e seus oficiais o c u p a r e m o a d r o d a S é d e M a r i a n a e, d i a n t e d o
Santíssimo^ p o u c o antes da saída d a procissão, intimida as i r m a n d a d e s aí presen-
tes p a r a q u e cumprissem c o m a o r d e m de e n t r e g a dos l i v r o s . 1 3 9

O conflito segue p a r a o T r i b u n a l do U l t r a m a r . N a sua a r g u m e n t a ç ã o , o bis-


p o defende a delegação eclesiástica q u e os vigários de v a r a p o s s u í a m n a ocasião
d a criação d e várias i r m a n d a d e s n o p a s s a d o d a capitania, o q u e assegurava s u a
jurisdição n ã o - s e c u l a r . 1 4 0

O bispo n ã o e n c o n t r a condescendência nesse T r i b u n a l , mais que. n u n c a ze-


loso d a jurisdição real, q u e subscreve os a r g u m e n t o s q u e defendia C o s t a M a t o s o :

"Parece se deve recomendar da parte de sua Majestade ao reverendo bispo de


M a r i a n a observar inteiramente o determinado na provisão de 12 de maio de 1744,
em que está juntamente resoluta esta matéria; porque as irmandades em que n o ato
da ereção não introduziu a [ilegível] do ordinário se não podem nunca reputar ecle-
siásticos n e m ficarem sujeitos à jurisdição estrita do bispo mais por aquilo que. a lei
lhe p e r m i t e . "
141

O C o n s e l h o r e a g e c o m c e r t a i n d i g n a ç ã o a o q u a d r o a t é ali d e s c r i t o p e l o
o u v i d o r , r e c o m e n d a n d o q u e se escreva a o bispo e m p r e g a n d o "[...] expressões
mais fortes p a r a q u e r e p r i m a aos seus ministros n ã o se i n t r o m e t a m n o q u e toca à
jurisdição real [...]" e p e d i n d o q u e fossem todas m e d i d a s mais d u r a s p o r " t o m a r
contas q u e lhe n ã o c o m p e t e m " , desrespeitando o q u e a legislação e as provisões
de S u a M a j e s t a d e p r e s c r e v i a m . ' ^
U m dos conselheiros vitupera e m seu p a r e c e r : "Esta m a t é r i a está mil vezes deci-
dida, s e m p r e d u v i d a d a pelo eclesiástico [...]." A m a i n a d a a fúria dos debates, p r o -

AEAM, Documentos sobre e de dom frei Manoel da Cruz, 1746-1751, fl. 61-64.Cartapara El rei
Nosso Senhor pelo Conselho Ultramarino 1751. Ver AGUIAR, Marcos Magalhães de, op. át.
nota 44, p. 159, que também comenta o caso. Embora o conflito entre ò ouvidor e b bispo alcan-
çasse enorme escala de gravidade, não foi esse o motivo da prisão de Gaetano da Costa Matoso,
conforme insinuou equivocadamente TRINDADE, Raimundo, op. cif. nota 126, p. 156-157, e
repetiram KANTOR, íris, op. cit. nota 44, p. 127 K Aguiar, Marcos Magalhães de, op. cit. nota 44 ,
p. 159, este último mais precavido.
Este e outros argumentos estão expressos na carta do bispo frei Manuel da Cruz ao. rei. Mariana
17.3.1750. AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe. 28.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, documento 28. [Parecer do ConseMio Ultramarino..

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 55, doe. 33. [Carta do ouvidor da Comarca de Vila Rica
Caetano da Costa Matoso. Vila Rica, 23-3-1750].
visão real d e 4 de j a n e i r o d e 1751 colocaria m n p o n t o final n o assunto decidindo
esse lance d a b a t a l h a a favor dos a r g u m e n t o s executados pelo n o v o p r o v e d o r . ' ^ 3
O desfecho e n c o n t r a explicação n o j u l g a m e n t o do historiador C a i o Boschi,
e m O s leigos e o p o d e r , q u a n d o d e f e n d e a c a r ê n c i a d e p o d e r d e j u r i s d i ç ã o d o
b i s p a d o e m M i n a s G e r a i s d e s d e os seus p r i m ó r d i o s ^ c h a m a n d o a a t e n ç ã o p a r a
i n ú m e r a s e v i d ê n c i a s d o p a p e l s u b o r d i n a d o q u e a instituição e p i s c o p a l p o s s u í a
d i a n t e d e u m E s t a d o inclemente c o m o exercício de suas atribuições — a p r o v a ç ã o
dos compromissos ou t o m a d a d e contas — e gastos financeiros excessivos.

" O espírito absolutista que presidiu a criação do bispado de M a r i a n a deu


mostras de sua força, prenunciando a política regalísta que se abateria sobre a vida
religiosa da Capitania, mais diretamente sobre as irmandades. El-rei dava sinais
de que não estava disposto a ceder seu poder também no que respeita aos negócios
espirituais."

E , mais adiante:

"Apesar de tudo, o que cumpre assinalar é que a Coroa n ã o transigiu em sua


jurisdição e em seu poder de interveniência nos assuntos religiosos. A prática colo-
nial demonstrou, em demasia, que o regime absolutista se fortaleceu e se tornou
onipresente. T a m b é m nessa matéria o regalismo se fez sentir. Inexoravelmente.
Vigilantemente." ' 144

A d e m a i s , n ã o devemos esquecer q u e aquele q u e controlava ps gastos através


da a u t o r i d a d e n a verificação dos livros das confrarias estabelecia u m expressivo
controle sobre os r u m o s das atividades coletivas daS i r m a n d a d e s , q u e — de m a n e i -
r a decisiva nas M i n a s — a g r e g a v a m e disciplinavam os súditos n a q u e l e país. E m

AEAM. W 24, íl. 10v.-11. Registro de uma provisão real, que -contém, resolução a respeita das irmandades.
1751. Ver também Provisão real de 4dejaneiro de 1751, idêntica à decisão acima, AEAM, W 24, Ü. 47-
47v. O monopólio sobre os livros das irmandades acaba por se inverter. Caetano da Costa Matoso,
depois de recolher todos os livros e compromissos, sem facultar a consulta a'qualquer autoridade
eclesiástica, dois anos após o conflito dc origem, parecia recomeçar que nova ordem real precisaria
restituir o equilíbrio, obrigando ao sucessor de Caetano da Costa Matoso, "[...] deixe ver os livros,
e tirar as clarezas necessárias para se conhecer a qualidade e natureza destas irmandades". AEAM,
W 24, íl, 18v. Registro de uma ordem real, em que se ordena ao ouvidor geral de Vila Rica e corregedor desta
comarca de Mariana deixe ver os livros das irmandades aos reverendos ministros eclesiásticos para deles se úrarem as
clarezas necessárias para o conhecimento da natureza delas. [10.5] 1753.

BOSCHI, Caio C , op. ciL nota 71, p. 91. As disputas pelo controle sobre a jurisdição secular ou
eclesiástica e sobre as irmandades através da aprovação dos compromissos e suas tomadas de con-
tas com sucessivas imposições do Estado aparecem para este autor como evidências de uma cam-
panha para "[.-.] desautorizar os atos praticados porautoridades eclesiásticas, a fim de permitir que
a Coroa pudesse se impor sobre as irmandades [...]", muito embora para esse autor o capítulo da
briga do bispo com o ouvidor ocupe tímido espaço,
M a r i a n a a seu t e r m o h a v i a cerca de 150 confrarias instaladas à q u e l a altura. As-
sim, longe de se tratar de questão m e n o r , disputava-se ali o exercício d a h e g e m o n i a
sob a p o p u l a ç ã o m i n e i r a .
D e m a r c a n d o u m a das faces da consolidação do controle d a C o r o a sobre a
capitania, a M e s a d e Consciência e O r d e n s notifica as i r m a n d a d e s q u e a p a r t i r d a
provisão de 8 d e m a r ç o d e 1765 estavam obrigadas a c o n f i r m a r e m seus c o m p r o -
missos n a q u e l e Tribunal.'"^5 A s s i m , p a r e c e indiscutível q u e , à c u s t a d e t o d o o
desgaste q u e representou, C a e t a n o da C o s t a M a t o s o foi o artífice q u e concluiu a
o b r a d e conquista d a jurisdição pelo P o d e r Real. A legislação p r o d u z i d a d u r a n t e
sua a t u a ç ã o e nos anos i m e d i a t a m e n t e seguintes r e g u l a n d o a p r e s e n ç a régia sobre
a jurisdição eclesiástica e m i n ú m e r a s esferas é p r o v a suficiente disto.
As incansáveis queixas do bíspo c o n t r a o ouvidor i r i a m m a p e a n d o e m deta-
lhes as áreas de conflitos c o m a J u s t i ç a civil. A m e d i d a q u e este a c u m u l a cargos e
funções, mais invasiva e conflituosa iriam se constituindo as relações e n t r e o bis-
p a d o e a J u s t i ç a n a capitania. A m i n u d ê n c i a dos assuntos e m disputa alcançava os
m a i s diversos fazeres. U m deles seria disparado c o m a i n t e r v e n ç ã o do ouvidor a
favor'do direito d e u m músico m u l a t o n ã o aceitar q u e fossem revistas suas p a r t i t u -
ras pelos revedores n o m e a d o s , c o n t r a r i a n d o , s e g u n d o o bispo, os r e g i m e n t o s até
ali o b e d e c i d o s .
P o r vezes, as decisões d a J u s t i ç a eclesiástica n o â m b i t o d a c o m a r c a d e Vila
R i c a s e r i a m frontalmente c o n t r a r i a d a s pelo ouvidor geral. A l g u m a s expulsões d e
clérigos m a l c o m p o r t a d o s d e t e r m i n a d a s p o r d o m frei M a n u e l são b a r r a d a s pelo
J u í z o dos Feitos d a Coroa.''*"'' N o exercício deste cargo n a c o m a r c a d e Vila Rica,
p r o t e g e r i a , e m 1 7 5 1 , o p a d r e J o s é N u n e s C o e l h o d a expulsão a q u e fora c o n d e -
n a d o p e l o bispo. O m e s m o ocorre c o m o p a d r e C o n s t a n t i n o d e S o u z a Pereira. O s
casos p r o v o c a m o c o m e n t á r i o á c i d o do bispo, d e n u n c i a n d o q u e "[...] t o d o s os
clérigos m a l p r o c e d i d o s a c h a m refúgios e p a t r o n o no ouvidor geral da dita c o m a r c a
de Vila Rica, p o r isso a ele r e c o r r e m [ . . . ] " 1 4 8
E concluía c o m ênfase m a s limita-
ções q u e isto representava p a r a sua missão s a n e a d o r a à frente d o b i s p a d o :

"Dessa forma, a Mesa de Consciência e Ordens passou a exercer efetivo controle sobre as irman-
dades." Idem, p. 116..
AEAM, Documentos sobre c. de dom frei Manoel da Cruz, 1746-1751, íl. 58-59. Carta para o mesmo
senhor pelo Conselho Ultramarino em ¡751.
Ver Códice Costa Matoso, doe. 28.

AEAM, Documentos sobre e de dom frei Manoel da Cruz, 1746-1751, fl. 54-55. Carta para o mesmo
senhor pelo Consellio Ultramarino 1751.
"[...Jporque está muito no princípio a fundação deste bispado, em q u e h á
muito que emendar, e corrigir, se faz preciso que os ministros de Vossa Majestade,
se não protegerem, ao menos [se não] oponham com frívolos pretextos às ordens
de Vossa Majestade na expulsão dos clérigos e às correções que dou aos eclesiásti-
cos". '14 1

Sob a perspectiva da luta episcopal contra a desordem entre os clérigos mineiros,


o cuidado do ouvidor e j u i z dos feitos da C o r o a em alargar sua jurisdição era i n c ô m o -
do obstáculo, desabafaria o bispo d o m M a n u e l a o inquisidor-geral de Portugal:

' ' O clima desta terra não é mau; são porém muito ruins os costumes, e abusos
nela introduzidos, e inveterados. V o u lhes fazendo guerra quanto posso, mas não
posso tanto quanto desejo. As maiores contradições que experimento são os eclesiás-
ticos, que, n ã o se emendando com as correções de [pai], se exasperam com os proce-
dimentos de juiz, desabafando a sua incorrigibiíidade em murmurações mentirosas e
falsos testemunhos, e agravando para a Coroa de Vila Rica, vizinha desta cidade
Mariana, achando no juiz dos feitos dela patrono certo como o é de todos os clérigos
mal-procedidos e revoltosos, e tão bem dos frades." 150

O ouvidor n ã o timbearía e m efetivar prisões^ sem se importar c o m vínculos ou


subordinações. Assim faz c o m o porteiro do juízo eclesiástico (e seu substituto t a m -
bém), deixando-o a ferros p o r 40 dias. C o m o n ã o poderia deixar de ser, o caso moti-
va sério protesto d a p a r t e do bispo, denunciando a invasão da "jurisdição eclesiásti-
ca". -''- E m outra ocasião, C a e t a n o foi acusado, de atropelar às imunidades eclesiásti-
1

cas, relacionadas à prisão de eclesiásticos, u m a vez q u e , segundo alega o bispo, os


carcereiros só p o d e r i a m receber padres presos c o m a autorização do juiz d e f o r a . ' 5 2

Pareciam infinitas as fontes de desavenças entre o bispo e o bacharel. Este fusti-


gava de todas as posições que ocupava a p a z episcopal, desejoso de corrigir tradicio-
nais condutas. A i n d a n a qualidade de juiz dos Feitos da Coroa, insiste até m e s m o e m

AEAM, Documentos sobre e.de dom frei Manoel da Cruz, 1746-1751, íl.. 54-55.. Carta para o mesmo
senhor pelo Conselho Uliramarmo 1751. Note-se que a participação do ouvidor.nas decisões sobre a
expulsão dos padres ç o que talvez explique a presença de documentos sobre a expulsão dos padres
nò Códice (entre eles os de número 27,. 37, 38 e 42). Sobre ò tema da expulsão dos padres, ver
Boschi, Caio C , op. cit. nota .71, p. 79-86.
AEAM, Documentos sobre e de dom frei Manoel da Cruz, 1746-1745, íl. 60. Para o Eminentíssimo
Senlwr Cardeal Cunha, inquisidor-geral do reino de Portugal em 1751.
O bispo pede providências, "[-..] para que não padeça *a jurisdição eclesiástica violências, ê os
vassalos de Vossa Majestade, vexações, sendo presos e retidos na cadeia tanto tempo sem culpas."
"Outra para o mesmo senhorpelo Conselho Ultramarino. 1751". AHMI, CSPOP, DomfreiManoel
da Cruz, copiador de cartas particulares. Mariana 1758-1762, íl. 128-128v.
AEAM,. documentos sobre e de, dom frei Manoel da Cruz, 1746-1751, 11. 66-68. Carta para o
Excelentíssimo Senhor General Gomes Freire de Andrade em 1751.
o b r i g a r a o b i s p o q u e escreva d e " m ã o p r ó p r i a " suas p e t i ç õ e s s e m r e c o r r e r a o
secretário. ^ 3 Aquele, alegava o juiz, era o estilo do reino, q u e deveria ser o b e d e -
cido nas Minas.154
M a s a v o r a c i d a d e c o m q u e o ouvidor a t a c a os confusos limites das jurisdições
n a capitania c h e g a a criar p a r a si situações de e m b a r a ç o j u n t o às autoridades m e -
tropolitanas. N u m a dessas passagens, q u a n d o d e n u n c i a c o n d u t a violenta d o vigá-
rio geral de M a r i a n a (seu p e r e n e desafeto) n o c u m p r i m e n t o d e u m a diligência do
bispo, o o u v i d o r sofreria e n t ã o d u r a r e p r e e n s ã o real. A c u s a d o d e f o r m u l a r falsa
a c u s a ç ã o e m d e n ú n c i a feita a o rei, este, depois de. considerar mais verdadeiros os
c o n t r a - a r g u m e n t o s do bispo, convocaria G o m e s Freire p a r a p u n i r C a e t a n o : " C h a -
m e a sua p r e s e n ç a o dito b a c h a r e l C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o e o r e p r e e n d a d a
m i n h a p a r t e pelos excessos e c o n t a s q u e t e m d a d o c o n t r a vós [bispo], t e n d o a
ousadia d e p ô r n a m i n h a real p r e s e n ç a u m a acusação falsa c o n t r a v ó s . " ^
A t e n a c i d a d e d a a t u a ç ã o d o b a c h a r e l motiva r e a ç ã o d o bispo, q u e c h e g a a p e d i r
s u a c a b e ç a , p o r i n t e r m é d i o d e justificação q u e e n c a m i n h a a G o m e s Freire, c o m
vários d o c u m e n t o s c o m p r o b a t ó r i o s p a r a q u e este recorresse a o rei, a fim d e v e r
r e s t a u r a d a a " i m u n i d a d e e l i b e r d a d e eclesiástica" e p u n i d o o m a g i s t r a d o . ^ A
exaltação que. esta p r e s e n ç a causava à dignidade episcopal levaria o bispo a pedir
a intercessão do secretário d e Estado d e Portugal j u n t o ao rei p a r a afastar C a e t a n o
d a C o s t a M a t o s o , m a n o b r a n d o c o m a troca d a n o m e a ç ã o d e T o m á s R u b i m de
S a b a r a p a r a M a r i a n a . E m agosto d e 1 7 5 1 , justificava o p e d i d o d e substituição
s e m rodeios;

AHMI, GSPOP, dom frei Manoel da Gruz, Copiador de cartas particulares, Ü. 128. Outra [caria]
para o mesmo senlior,pelo Conselho Ultramarino. 1751.
A ordem é motivo de nova querela, que subiria ao Conselho Ultramarino. Sem encontrar consen-
so nos pareceres do procurador da Coroa e da Fazenda, a decisão acaba sendo levada a Vossa
majestade. AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG^ caixa 59, doe. 66. [Consulta do ConseUio Ultrama-
rino, Lisboa, 11.3.1752],:
AEAM, W. 24, fl. 13v. Registro de uma real carta, na qual se participa à Sua Excelência da repreensão que se
manda dar a Caetano da Costa Matoso, ouvidor deVila Rica. Lisboa, 29.3.1752, Teria sido com indisfarçável
sadsfação que o bispo teria mandado trasladar para seus arquivos o Registro de uma real carta, na qual
se participa ã Sua Excelência Reverendíssima que ao ouvidor Caetano da Costa Matoso, como juiz
da Coroa ç seus adjuntos, se manda estranhar o excesso de condenarem ao reverendo doutor
vigário geral deste bispado sem quepara isto tivessem jurisdição alguma. 1752, Ver AEAM, W. 24,
fl. 16 Lisboa, 17.4.1752.
Referência a este processo consta no AEAM, documentos sobre e de Dom Frei Manoel da Cruz,
1746-1751, fl. 66-68. Carta para o Excelentíssimo Senhor General Gomes Fmu de Andrade em. 1751.
"[...] porque assim respirariam os seus vassalos da grande opressão que t e m
padecido e receberiam o maior bem da república, que é capaz, tendo juntamente
este bispado algum sossego da injusta guerra que o atual ouvidor Gaetano da Costa
Matoso tem feito àjurisdição Eclesiástica, como a Sua Majestade se tem manifestado
pelos'seus Tribunais." 1,17

Se até a essa altura as querelas pelo direito de controlar as contas das irmandades
e as disputas pelas prerrogativas sobre o destino, dos eclesiásticos p a r e c e m suficiente-
m e n t e acirradas, o p o d e r episcopal seria d e fato a r r a n h a d o a partir d a avaliação q u e o
ouvidor procede j u n t o às receitas e despesas do bispado. A fim d e instruir o pedido
real de informação sobre assunto tão meticuloso, agrega a m p l a contabilidade e m que
d e n u n c i a desmandos de Sua Eminência e variadas manifestações de venalidade n a
formação d a receita do bispado, q u e alcança, após correções dos valores originais, a
fabulosa cifra de 21:000^000 réis, concentrados no b i s p o . 1 5 8
As informações que ele
encontra de. gastos e receitas excessivas a c e n d e m o rastilho d a pólvora:

" T o d o este rendimento é mais que excessivo para qualquer bispo que se trata
com a.decência devida a sua pessoa e o seu caráter, e muito mais para o bispo atual,
pois indecente e indignamente vive não só no trato demasiadamente econômico d a
sua pessoa e de sua família mas ainda no trato exterior para a conservação do
respeito do seu lugar, que de. nenhuma forma concilia [...] 1 5 y

Deixa escapar mesmo sua vocação reformista q u a n d o , depois de denunciar u m


sem-número de abusos, pontifica: "[...] aquele bispado necessita de u m a cuidadosa e
p r o n t a reforma, ãcudindo-se à tanta desordem quanto p a d e c e m os moradores daque-
la c a p i t a n i a [ . , . ] " . 1 6 0
E m v i r t u d e desse envolvimento, o Códice Costa Matoso r e ú n e
precioso núcleo de documentos sobre o tema. Afinal, cumpria a o ouvidor atender a
Provisão real q u e ordenava que investigasse os rendimentos d o b i s p a d o . ' ^

• .AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 58, doe. 51. [Cartado bispa de. Mariana, para o Secretário
de Estado, solicitando intercedessejunto.ao rei, afim de se alterar a nomeação de Tomás Rubim de Barros Barreto do
Rego, de ouvidor da vila do Sabará para Vila Rica, suspendendo-se desse modo Caetano da Costa Matoso, que fazia
afrontas àjurisdição eclesiástica. Mariana, 5.8.1751].
'*- Códice Costa.Matoso, documento. 108. Ver, ainda, documento 99 e 102.
documento 104, citado por AGUIAR, Marcos Magalhães de, op. cit. nota 44, p.
'* Códice CostaMatoso,
!

158. Ver também KANTOR, íris, op. cit, nota 44, p. 127).
'• Citado por AGUIAR, Marcos Magalhães de, op. cit. nota 44, p. (59 e KANTOR, íris, op. cit. nota
44, p. 127.
• Ver Códice Costa Matoso, documento 104. Apesar de não estar mais no cargo quando redige este
documento, o texto é um implacável exame dos excessos de receita que o bispado concentra e da
opressão que a população mineira sofria.
Essa v e e m ê n c i a d a ofensiva do ouvidor c o n t r a a liberalidade nas contas das
i r m a n d a d e s e t a m b é m nas contas do bispado e d a M i t r a p a r e c e ter sido alimenta-
d a pelas decisivas críticas c o m q u e , d é c a d a s antes, d o m Luís d a C u n h a atacava a
Inquisição e a multiplicação d e s o r d e n a d a de conventos, mosteiros c o m remessas in-
cessantes d e recursos p a r a R o m a , além das excessivas manifestações piedosas e n t r e os
portugueses.' 6 2
A leitura de sua instrução política, escrita e m 1737 pelo estrangeirado
c o m p a s s a g e m p o r C o i m b r a , dificilmente escaparia das vistas d o e s t u d a n t e de leis
C a e t a n o da C o s t a M a t o s o . Possivelmente,, teria s e d i m e n t a d o algumas das certezas
q u e c o n d u z i r i a m sua insistência pela reforma n a administração dos recursos eclesiás-
ticos nas M i n a s . O a m b i e n t e n a península g e r a d o pelos duros a t a q u e s d e d o m Luís
d a C u n h a aos efeitos nefastos d o clero e d a religião e m Portugal decerto agiu p a r a
galvanizar certo anticlericalismo q u e explodiria e m M i n a s a o se d e p a r a r c o m a
;

t e n d ê n c i a do b i s p a d o e dos bispos e m m o n o p o l i z a r r e n d a s e p o d e r .

Nesse tortuoso processo d e consolidação d a jurisdição real, atitudes e decisões


do ouvidor assumiram forma estranha e m alguns episódios. Afmal, se atacava, feroz e
meticulosamente, a liberalidade das receitas do bispado, p a r e c i a p a r a d o x a l q u e de-
fendesse a m a n u t e n ç ã o da cobrança de propinas anuais pelos oficiais da C â m a r a de
Vila Rica, sobretudo q u a n d o tal p r o c e d i m e n t o contrariava as determinações reais.
M a s foi exatamente isto que fez o ouvidor em 1751, q u a n d o , diante d a contestação
que m o v e m esses oficiais a certa ordem real que tabelava suas propinas, d á despacho
q u e permite à C â m a r a continuar a cobrá-las dos bens do Conselho. Seu gosto pelos
debates forenses custaria caro. Depois de extensa discussão nas instâncias coloniais e
metropolitanas, sairia chamuscado por demonstrar estranhável desprezo n a execução
da ordem, ao defender o embargo da redução das propinas e tolerar que continuasse
a ser cobrada contrariamente à ordem r é g i a . ' ^ A l é m d a a c u s a ç ã o , o rei m a n d a q u e
o o u v i d o r e os oficiais r e p o n h a m as p r o p i n a s c o b r a d a s i n d e v i d a m e n t e . " ^
O u t r o s conflitos envolvendo as relações entre ouvidor e C â m a r a a respeito do
exercício de jurisdição e d a venalidade dos cargos iriam antagonizar o magistrado e a
C â m a r a d e M a r i a n a em torno da disputa pelas rubricas nos livros oficiais. T u d o co-
m e ç a e m m a r ç o de 1752, q u a n d o a C â m a r a de M a r i a n a providencia a c o m p r a de
u m novo livro p a r a escrever os capítulos das correições que se faziam e m audiência da
C â m a r a , u m a vez q u e j á n ã o restava muito espaço naquele q u e estava e m uso. U m

" CARDOSO, Manoel. The .internationalism of the portuguese Enlightenment: the role of the
Estrangeirado, e.l700-c.l750. In; ALDRIDGE, A. Owen (Ed.) The ibero-american Enlightenment.
Urbana: University of Illinois Press, 1971. p. 141-207.
'- APM,CMOP5L,fl. 138.
'• APM, CMOP63, fl. l29-I29v. Registro de uma ordem de Sua Majestade que Deus guarde remetida ao doutor
Caetano da CostaMatoso, ouvidor geral que foi de Vila Rica, a respeito de se não receberem os embargos das propinas
anuais. Lisboa, 15.6.1752.
livro idêntico deveria ser e n t ã o c o m p r a d o , a t e n t a n d o - s e a i n d a p a r a "[...] n ã o p r e -
j u d i c a r a q u e m toca as suas rubricas [ . . . ] ' \ 1 6 5
A seguir, t r a t a m d e deixar p r o n t o e
d e v i d a m e n t e r u b r i c a d a s todas suas p á g i n a s p e l o j u i z d e fora, n a q u a l i d a d e d e
presidente d a C â m a r a , p a r a o p r o n t o uso.
A diligência dos camaristas e n c o n t r a oposição n o ouvidor geral, q u e i m p e d e
q u e se l a n c e m os capítulos d a correição neste livro e suspende a necessidade d a r u b r i -
ca do juiz d e fora, o b r i g a n d o q u e p r e p a r e m u m o u t r o livro, n o qual e n t ã o seriam
redigidas as correições, dessa vez assinado e r u b r i c a d o p o r ele n a condição d e ouvidor.
Zeloso d e sua jurisdição e, c o m o v e r e m o s , de seus r e n d i m e n t o s , a r g u m e n t a r i a q u e n o
novo livro ficaria escrito "o q u e eu determinasse nos capítulos da c o r r e i ç ã o " e, u m a
vez q u e "[...] assinam os ouvidores p r i v a t i v a m e n t e n ã o p o d i a n e m devia ser rubrica-
d o s e n ã o pelos m e s m o s , e n ã o p e l o dito m i n i s t r o inferior deles [...]". J u s t i f i c a
desta forma sua o r d e m d e m a n d a r p r e p a r a r u m outro livro p o r ele assinado. *? 1 6

O o u v i d o r t o m a r a a q u e l a decisão r e s p a l d a d o e m p r o v i s ã o d e seu r e m o t o
antecessor, M a n u e l M o s q u e i r a d a R o s a , que, e m correição realizada e m 1715, deci-
de q u e os livros d e l a n ç a m e n t o de contas fossem todos n u m e r a d o s e r u b r i c a d o s pelo
provedor da c o m a r c a . 1 6 7

Nesta função, d e t e r m i n a , através d e p r o v i m e n t o j u n t o às contas d a C â m a r a ,


q u e o d i n h e i r o gasto n a c o m p r a , e q u i v o c a d a d o p r i m e i r o livro e n a s r u b r i c a s
indevidas n ã o deveria sair dos b e n s do concelho, e sim r a t e a d o e n t r e os oficiais.
D i a n t e desse c o n s t r a n g i m e n t o e iminente prejuízo financeiro, rebelam-se c o n t r a a
d e t e r m i n a ç ã o do m a g i s t r a d o e e n c a m i n h a m r e c l a m a ç ã o ao rei d e f e n d e n d o o uso
costumeiro, "[...] pois estamos certos q u e nos h á de conservar n a posse e c o s t u m e
c o m q u e foi c r i a d a esta c i d a d e [ . . . ] " . 1 6 8

A disputa acirra a inimizade entre C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o e o juiz d e fora


é prçsidente. d a q u e l e S e n a d o , q u e e s t r a n h a a exigência do corregedor. A força do
costume seria mais u m a vez elevada à c o n d i ç ã o de lei:

"Desde que nessa cidade houve Câmara, foram sempre os livros de que na
mesma se tem usado rubricados pelos juízes ordinários, enquanto n ã o havia juízes de
fora, que estes seguiram o mesmo, rubricando, como presidentes do Senado, todos
os livros que servem para escritas da mesma C â m a r a [...] lG!J

165. A P M ) CMM. 18,11. 117. Termo de acórdão e vereação, 15.3.1752.


166. A P M j CMM. 19, fl. 43v.-45
-- AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 60, doe. 11. [Informação prestada pelo ouvidor de Vila Rica
I67

Francisco Angelo Leitão. Mariana, 30.9.1753].


168. APM^ gQ _ 4 d 26 (documentação não encadernada). [Representação dos oficiais da Câmara de
j cx j o c

Mariana, 2.9.1752].
169. H U , Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 60, doe. 11, [Carta
A dojuiz defora epresidente do Senado da
Câmara de Mariana. Mariana, 24 de abril de 1752].
Essa b a t a l h a , após vagarosas consultas aos tribunais, seria p e r d i d a alguns depois
pelo criterioso o u v i d o r . * ^ 7

O conflito i n a u g u r a , p o r é m , novas m e d i d a s reais d e controle sobre o expediente


c a m e r á r i o . A C o r o a , alertada p a r a o descontrole e m q u e a n d a v a m os p a p é i s das
c â m a r a s — fonte de muitas desigualdades e d e s m a n d o s —, a b r e intensa c a m p a n h a
d e a c o m p a n h a m e n t o dos livros d e c â m a r a e m todas as M i n a s . Assim, através de
C a r t a R é g i a a o g o v e r n a d o r da capitania de M i n a s , é m a n d a d o verificar que. livros
e e m q u e q u a n t i d a d e existem nas c â m a r a s , assim c o m o os e m o l u m e n t o s das rubri-
cas q u e v i n h a m sendo p a g o s . ' ^ Exigira-se declaração dos juízes e ministros q u e
r u b r i c a r a m os livros das c â m a r a s , e os e m o l u m e n t o s pagos p o r tais r u b r i c a s . As
câmaras d e Vila Rica, Vila Nova da Rainha, Vila do Príncipe e Serro do Frio, São
J o ã o e São J o s é del-Rei, M a r i a n a , Caeté, Sabará mobilizam-se, a partir d e fevereiro
de 1755, p a r a oferecer à Metrópole relação circunstanciada dos livros e m seu p o d e r e
d a contabilidade das rubricas e s e u s beneficiários. -^ A venalidade, livremente prati-
17

c a d a nas rubricas, regras, assinaturas e despachos, p a r a muito além de desenharem as


folhas dos códices das câmaras, assegurava a obtenção de ganhos indiretos dos ofici-
ais, favorecimentos e abuso de poder, O s conflitos do bacharel e m M a r i a n a e Vila
R i c a a c a b a m p o r se tornar u m a experiência;central n a longa luta p a r a a subordinação
das câmaras ao p o d e r real. Assim, as alegações contra as violações, do costume perpe-
tradas pelo ouvidor-geral, desde a precedência n a ocasião da posse do magistrado até
o caso das rubricas nos livros da C â m a r a d e M a r i a n a , traduziam as resistências dos
oficiais d o concelho às ameaças a sua autonomia jurisdicional q u e vereadores e juízes
ordinários pretendiam resguardar da submissão e m progresso à magistratura real. P o r
tradição, o costume respaldava e m Portugal a a u t o n o m i a c o n c e l h i a . ^ l7

Quando já estava longe do cargo, decisão real, depois de consulta ao seu sucessor ê aos procurado-
res da Fazenda e Coroa, condena a mudança introduzida por Caetano, chegando a obrigado a
restituir os emolumentos recebidos pelas rubricas. Ver APM, CMM. 19,. íl. 21 lv.-212. Registro de
uma ordem de Sua Majestade que Deus guarde remetida ao doutorjuiz de fora desta Cidade Silvério Teixeira a
respeito de. um livro que rubricou para o doutor ouvidor mandar escrever os capítulos da correição, 8.7.1754. A
polêmica parece se esgotar com a decisão real. Mas não. O ex-ouvidor, de sua parte, resolve pro-
cessar a Câmara, a fim de reaver as rubricas e assinaturas das correições largadas no livro da
discórdia. Ver AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 68, doe. 82.. Requerimento de Caetano da
Costa Matoso, ouvidor de Vila Rica, pedindo para que lhe seja pago pela Câmara da Cidade de Mariana o que üie
devem pelos semiços prestados em correição. Lisboa, 15-3-1756.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 60, doe. 11. [Carta régia de 26.12.1755.] A medida
havia sido ordenada por provisão do Conselho Ultramarino de 8 de julho de 1754.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 60, doe. 11. Listas com descrições detalhadas dos
livros das câmaras mineiras que compõem os anexos 11 a 40 de Consulta do Conselho Ultramarino, s.d.
Ver a este respeito, a instigante discussão encaminhada por HESPANHA, Antônio Manuel, op. cit,
ndta 100, p. 362-380.
C o n t u d o , sob as densas relações entre, a a u t o r i d a d e real e as c â m a r a s , a a n á -
lise de sua a t u a ç ã o c o m o c o r r e g e d o r j u n t o à C â m a r a d e M a r i a n a , através dos
p r o v i m e n t o s lavrados nos livros d a C â m a r a , revela facetas a i n d a mais i m p o r t a n t e s
d e sua a t u a ç ã o . Sobressai sua volúpia d e p ô r e m o r d e m as contas, gastos, dividas
q u e possuía o concelho. E x a m i n a todas as contas e luta p e l a sua clareza. N a c o r r e i ç ã o
de j u n h o d e 1749, c o m b a t e gastos excessivos, c o m o o das ceras d a s festas e o
p a g a m e n t o e x a g e r a d o pelos, sermões. Através d a ação j u n t o à C â m a r a m u n i c i p a l ,
d e n u n c i a desordens na administração das finanças, pressiona p o r ajustes nas con-
tas e m a i o r e m p e n h o n a c o b r a n ç a dos foros a t r a s a d o s , r e v e l a n d o - s e u m zeloso
auditor sobre os gastos d a república nas M i n a s .
Esteve longe d e ser u m c o r r e g e d o r tolerante ou c o n d e s c e n d e n t e : c o n d e n a a
displicência dos v e r e a d o r e s , a p o u c a diligência do p r o c u r a d o r do c o n c e l h o , c h e -
g a n d o m e s m o a a m e a ç a r a t o m a d a de bens dos vereadores "[...] c o m p e n a d e se
h a v e r p o r seus b e n s o seu imposto [...]", c o m o faz e m 1749, ou a f i r m a n d o q u e
"[...] p a g a r ã o os v e r e a d o r e s atuais p e l a sua fazenda t o d a a falta [...]", c o m o n a
correição de 1750) q u e persistissem n a negligência d a c o b r a n ç a dos foros devidos
ao c o n c e l h o . ^ C o m a r e p e t i ç ã o das i r r e g u l a r i d a d e s q u e a c o m p a n h a v a n o seu
1 7

triénio d e a t u a ç ã o , acrescidas d e novos motivos p a r a glosas, c o m o o excesso d e


p r o p i n a s p a g a s aos v e r e a d o r e s nas festividades o u a q u a n t i d a d e d e c e r a g a s t a , 1 7 5

a a m e a ç a se c u m p r e . N o texto da correição d e 1 7 5 1 , m a n d a q u e se p r o c e d a con-


tra os b e n s dos vereadores, " p a r a p o r eles ser satisfeita a C â m a r a " . A b r o n c a al-
c a n ç a as faltas recorrentes dos v e r e a d o r e s às sessões:

"Sou também informado por queixas que se passam semanas sem que haja
u m a vereação padecendo as partes pela pouca observância que os vereadores d ã o
ao qne são obrigados estando pelas suas roças e por onde lhes parece sem satisfa-
zerem ao que, devem. E para que cessem as mesmas, ordeno que de hoje em diante
assistam indefectivelmente todas as semanas nos dias determinados, pela lei [...] 17(1

Dilemas do p o d e r local q u e se c o m p l i c a v a m diante daquele oficial de Justiça.


E m sua fúria r e g u l a d o r a , c h e g a a suspender o p r o c u r a d o r do concelho Francisco
G o m e s d a C r u z d a C â m a r a de M a r i a n a do direito de se c a n d i d a t a r a q u a l q u e r das
ocupações d a r e p ú b l i c a . 1 7 7

74: UF o P , AHCMM, códice 201,11. 11.3-lÍ3v).


^~' "[...] inexplicável a liberdade, com que se despende cera, a quem a quer chegando-se a fazer dela a
>

despesa de 788 oitavas sem que nesta matéria haja o mínimo zelo, e se satisfaça a obrigação de
cada um, e para que nesta forma.haja mais conhecimento ordeno, que daqui em diante se não
distribua em cada uma das festividades de câmara se não a cera precisa [...]". UFOP, AHCMM,
cód. 679,11. llv.-12v.
76. UFOP, AHCMM, cód. 679, fl. 1 lv.-12v.
77
- UFOP, AHCMM, cód.. 705, fl. 10.
N a s correições desse tipo que. seguem nos anos seguintes de. 1750 e 1 7 5 1 , os
inquiridos silenciariam diante das p e r g u n t a s feitas pelo m e s m o corregedor. G o m o
é difícil d e crer q u e a c o m u n i d a d e passasse a viver e m estado d e t a m a n h a perfei-
ção q u e n ã o tivesse q u a l q u e r p r o b l e m a nas suas p o n t e s , nos c a l ç a m e n t o s , p r o b l e -
m a s de preços ou de abastecimento {dentre os muitos q u e p o d e r i a m e m e r g i r nesse
tipo de questionário), o silêncio dos v e r e a d o r e s p o d e ser t o m a d o c o m o m e d i d a
p a r a o estado d e ânimos e m q u e se e n c o n t r a v a a relação e n t r e o u v i d o r e os " h o -
m e n s b o n s " da C i d a d e . ' ^7

M e s m o assim, C a e t a n o n ã o esmorece. O vigor c o m q u e insiste e m corrigir e


d e n u n c i a r as. irregularidades p o r ocasião das correições d a C â m a r a d e M a r i a n a
m a n t é m - s e inabalável ao longo dos anos. N o s e g u n d o a n o d e correição, i m p a c i -
e n t e c o m as d e s o r d e n s n a a d m i n i s t r a ç ã o dos b e n s do c o n c e l h o , a p l i c o u d u r o s
corretivos aos v e r e a d o r e s . R e s p o n d i a à lassidão Com q u e sua o r d e m á respeito
desse m e s m o assunto fora t r a t a d a n o a n o anterior. D e p o i s d e a p o n t a r u m a série
de erros n a contabilidade das dividas e negligência n a c o b r a n ç a dos foros atrasa-
dos q u e e r a m devidos ao concelho " M a t o s o " , c o m o e n t ã o assina os t e r m o s , a t a c a
os v e r e a d o r e s : "Pois é coisa indigna q u e e n t r e m e saiam todos os v e r e a d o r e s sem
e m tal c u i d a r e m senão p a s s a n d o as tais dividas d e u n s aos outros s e m pejo de u m a
correição, j á q u e o n ã o h á nas consciências na falta d a o b r i g a ç ã o . " 1 7 9
Através de
freqüentes glosas às contas apresentadas, p r o c u r a corrigir os equívocos nas contas
a p r e s e n t a d a s p e l a C â m a r a . Rejeitou p o r diversas vezes n ú m e r o s q u e n ã o fecha-
v a m , revelando-se através dessa faceta de contabilista m i n u d e n t e o desejo d e ajus-
tar os desvios e a negligência nos gastos.

O q u a d r o seria contrastante c o m o q u e se passa e m O u r o P r e t o , o n d e , c o m o


v e r e m o s a d i a n t e , s u a a t u a ç ã o c o m o c o r r e g e d o r dos trabalhos d a C â m a r a é ativa, e
e m diversas d e suas d e m a n d a s é a t e n d i d o pelos oficiais.
D e resto, sua a t u a ç ã o j u n t o às c â m a r a s seria m a r c a d a pelo e x t r e m o c u i d a d o
c o m t u d o aquilo q u e parecesse dizer respeito a o "[.--] b e m d o serviço de S u a Majes-
t a d e e b e m c o m u m destes p o v o s " . N a q u a l i d a d e d e juiz d o t o m b o d a c i d a d e de
M a r i a n a , além de ouvidor e c o r r e g e d o r d a c o m a r c a , o r d e n a q u e se demarcasse a
s e s m a r i a d a c i d a d e , t o m b a n d o e d e m a r c a n d o p e s s o a l m e n t e seus limites c o m o

ta. UFOP, AHCMM, cód. 680, íl. 114-155v. Audiência da correição à Câmara desta Cidade Mariana o presen-
e UFOP, AHCMM, cód. 680, íl. 115-1 !5v. Audiência da correição à Câmara desta cidade
te ano de 1750.
Mariana o presente ano de 1751-
179. UFOP, AHCMM, códice 201, A. 131-131 v.
procurador do Senado. D e i x a a tarefa i n a c a b a d a , n o e n t a n t o , era virtude de
seu a f a s t a m e n t o p r e c o c e . ^ 1 1

A t e n t o aos detalhes, logo se a p e r c e b e d e q u e os oficiais m e c â n i c o s d e Vila


R i c a se a p r o v e i t a v a m do t e m p o e m q u e a C â m a r a estava o c u p a d a c o m os t r a b a -
lhos d a correição a partir de j u n h o e d e i x a v a m d e tirar j u n t o a o S e n a d o a s e g u n d a
licença a n u a l a q u e e r a m obrigados p ô r lei. I m e d i a t a m e n t e , m a n d a q u e os oficiais
d a C â m a r a r e m e d i a s s e m i s t o . ^ Zeloso e m velar pelo b e m público e assegurar a
1 8

condição d e vida d a c o m u n i d a d e , revê multas excessivas, concede flexibilidade no


p a g a m e n t o dos capitães do m a t o p a r a defender as vila dos calhambolas, ataca a ine-
ficiência na administração local, determina a contruçâo de pontes p a r a a comodidade
dos moradores. ]\j ag correições do ano seguinte, cuida de nivelar as calçadas, m a n -
da prover a C â m a r a de material .condignos a sua função — castiçais de p r a t a e m vez de
latão, u m cofre para os pelouros, cortinado de damasco p a r a os painéis de retrato de
Sua Majestade - e ataca o sem-número de problemas q u e as vilas coloniais suporta-
vam. Latinista aplicado, foi, possivelmente, c o m especial carinho que tratou d e aten-
der, c o m o "estipêndio q u e parecesse preciso", à d e m a n d a do reverendo Augustinho
d e Matos, mestre de Latim d a vila, que requeria algum vencimento pelo seu trabalho.
Compreensivo, apoiaria plenamente "as razões que e x p u n h a " , assegurando q u e , sem
dúvida, deveria "[...] haver c o m mais facilidade q u e m ensine com melhor capacidade
e instrução de gramática os filhos desta v i l a . " ' ^ N ã o descuida m e s m o d a a d m i -

180. APM, CMM. 18, fl. 100.. Termo de acórdão e vereação, 4.1.1752. Alguns meses depois, a execução
desta ordem esbarra com um problema inusitado: o arrematante dos marcos de pedra foge sem
completar o serviço, deixando apenas seis marcos prontos, ainda assim sem estarem colocados nos
lugares determinados pelo doutor ouvidorjuiz do tombo. APM, CMM- 18,.fL 119v. Termo de acórdão
e veimção, 19.4.1752. Em setembro, a demarcação e o tombo estavam concluídos, constando que,
na qualidade de juiz do tombo, Caetano recebera, entre rubricas, juramento aos louvados e assina-
turas, a quantia de 1:.343$430 réis. APM, CMM. 19, fl. 43v.-45. Registro de duas certidões que passei por
ordem dos senhores do Senado da Câmara que foram remetidas com a conta acima e atrás por duas vias. Certidão
passada a 4.9.1752.
lul. ]Xje p i (Ipixa de cobrar pelos arbitramentos que faz aos oficiais encarregados do tombo,
m D r s s o

«esperando auferir cerca de 2:55 05^281 réis, fora o valor do salário por dias trabalhados, que espera-
va que a Camara definisse. Ver APM, SG, cx. 4 doe. 26 (documentação não encadernada). Repre-
scnlãção dos oficiais da Câmara de Mariana, 2.9.1752.
182;. APM, CMOP 22 fl. 106-107v. Auto de correição que íéz o doutor Caetano de Costa Matoso
;

ouvidor-geral, e corregedor desta comarca do Ouro Preto aos oficiais da Câmara desta vila p pre-
sente ano de .1749. Resultado dessa intervenção, o Senado, em obediência ao provimento do
corregedor, lançaria edital obrigando a revisão das aferições e retirada de novas licenças. APM,
CMOP 54,11, 192v. [Registro de vários editaÍs,-5.7A74%
183, APM, CMOP 22,11. 106-107v. Auto de correição quefez o doutor Caetano de Costa Matoso, ouvidor-geral e
corregedor desta comarca do Ouro Freto, aos oficiais da Câmara desta vila o presente ano de 1749.
184, APM, CMOP 22, fl. 108v-l 1 l.Auta de correição que faz o doutor Caetano da Costa Matoso, ouvidor geral e
corregedor desta comarca de Ouro Preto, aos oficiais da comarca desta mia em o presente ano de 1750.
nistração dos enjeitados, criticando as excessivas despesas com o t e m p o que ficavam
c o m as amas, reduzindo o período e o valor pago pela a m a m e n t a ç ã o . Desconfiado,
m a n d a q u e se p r e p a r e u m livro p a r a o registro dos expostos q u e e r a m sustentados
pela C â m a r a , em q u e se pudesse controlar melhor os gastos, e incentiva a averigua-
ç ã o d a existência d e parentes, coibindo o p a g a m e n t o a pessoas c o m recursos q u e
c o b r a v a m d a C â m a r a pelas crianças expostas às suas p o r t a s . ^ E m Vila Rica, Caeta-
1

n o ataca a ineficiência do sistema de contratos p a r a a m a n u t e n ç ã o e reparos d a cida-


d e . P a r a o ouvidor, o contratador "[...] n u n c a h á d e fazer as obras e m prejuízo seu, e
isto se experimenta, p o r q u e calçadas, e tudo o mais se conserva n o estado, e q u ê se vê
chegando ao estado d e merecer u m a inteira reforma por se lhes n ã o ter acodido nas
ocasiões precisas [...]". Diante da situação, sugere q u e a C â m a r a assuma o s e r v i ç o . 186

Além disso, sobressai o cuidado com a forma c o m o e r a desembolsado o dinheiro


público, atento p a r a que obras e reformas no equipamento u r b a n o fossem realizadas
c o m material sólido, a fim de n ã o exigir e m poucos anos novas d e s p e s a s . 1 8 7
Em
inúmeras vezes, denunciou as condições aceitas pela C â m a r a nas arrematações neces-
sárias às obras nas vilas.
Q u a l q u e r q u e fosse o c a m p o de atuação de Caetano, o que. diferencia sua carrei-
r a e m Minas é a plenitude.com que ele se investe nas funções q u e ocupa, seja n a de
ouvidor, corregedor ou provedor. Sobressai ainda n a figura de C a e t a n o u m ordenador
incansável, aquele c o m vocação p a r a pôr tudo e m ordem. O rigor c o m q u e busca
fazer c u m p r i r ps termos da lei e a ordenação quase obsessiva que p r o c u r a imprimir
aos registros financeiros j u n t o às instâncias administrativas e m que atua iriam confron-
tar c o m a forma displicente q u e tomava quase sempre a administração dos gastos n a
América portuguesa. Seu zelo o levaria a velar, até mesmo, aspectos de extrema minúcia
nos atavios da C â m a r a de M a r i a n a , c o m o obrigar aos displicentes vereadores q u e
g u a r d e m q sinete "[...] em u m a gaveta n a C a s a da C â m a r a , debaixo d e chave, que
terá o m e s m o escrivão [...]", m a n d a n d o ainda que, conforme "as disposições da lei",
o vereador mais velho viesse a se responsabilizar pela sua g u a r d a . 1 8 8

Apesar d e seu extremo cuidado c o m a administração dos recursos dos concelhos


que lhe e r a m afetos, o ouvidor de Vila Rica de m o d o algum esteve disciplicente com
os ganhos q u e poderia auferir n a sua atuação ultramarina. Se nos. primeiros meses
reclama ao rei pela falta de aposentadoria ou recursos que cobrissem as suas despesas

APM, CMOP 22, íl. 112. Auto de Corráçao que faz o doutor Caetano da Costa Matoso, ouvidor-geral e
corregedor desta comarca do Ouro Preto, aos oficiais da Câmara desta vila em o presente ano de 1751,
186- APM, CMOP 53, fl. 115-115v.
187. N . ntido, é lapidar o provimento de 7 de maio de 1749 com que responde ao Senado da
( s s e se

Câmara de Ouro Preto sobre as obras da fonte de António Dias e as festas de santa Isabel e anjo
Custódio. Ver APM, CMOP 54, 1!. 185v.-186v. Registro de uma carta que o doutor provedor da comarca
escreveu ao Senado da Camara.
1 8 8
- APM, CMM 18, fl. 74. Acórdão de 3 'dejulho de 1751.
d e aluguel^ c a d a u m a d e suas atividades profissionais seria fonte d e g e n e r o s o s
p a g a m e n t o s . A C â m a r a de M a r i a n a acerta o p a g a m e n t o d e 1855S655 réis p a r a sua
a p o s e n t a d o r i a e pelas festas q u e a s s i s t i r a . 189
N o a n o seguinte, seria c o n t e m p l a d o
c o m u m total d e 1 0 4 S 2 2 5 réis e n t r e a p o s e n t a d o r i a e r e s í d u o das c o n t a s . N e s t a
ocasião, cuidaria de. fazer retornar aos cofres do S e n a d o 4Ò$000 q u e teria recebido
indevidamente nas correições de 1749 e 1750, correspondente à r e m u n e r a ç ã o .adota-
da pelo ouvidor q u e o antecedeu pela preparação dos capítulos da correição, que, n o
entanto, teria sido e m b a r g a d a pelo soberano, "[...] é o motivo p o r que o dito ouvidor
mais b e m informado os r e s t i t u i u . " . 190
Igualmente construtivo foi o episódio seme-
l h a n t e , desta vez j u n t o à C â m a r a de; Vila R i c a , q u a n d o o r d e n a q u e se a b a t a d o
p a g a m e n t o q u e lhe devia a C â m a r a 20$000 p o r u m a festa a que n ã o compareceu,
por estar e m M a r i a n a realizando c o r r e i ç ã o . 191
N e m p o r isso se. deve julgar qualquer
atitude d e desprendimento da p a r t e do ouvidor. R e c e b e das c â m a r a s p o r diversas
vezes ajudas de custo de 80 oitavas de ouro p e x por assistir às funções camerárias,
mais 80 oitavas d e ouro pelas despesas c o m o luto do funeral do s o b e r a n o , 1 9 2
ilus-
trando-se aqui a p e n a s algumas das fontes d e r e n d a do ouvidor. C a e t a n o d a Costa
Matoso, além dos emolumentos que recebe no exercício do cargo, depois de afasta-
do, n ã o descansa enquanto n ã o resgata as dívidas das câmaras de. Vila Rica e M a r i a n a .
S u a m á g o a c o m M i n a s Gerais n ã o se, estende aos ganhos q u e fizera p o r m e r e c e r .
Depois de. muito insistir j u n t o à C â m a r a de M a r i a n a p a r a receber pelo trabalho de
execução do t o m b o d a sesmaria sem ser atendido, apela ao rei dizendo-se perseguido
por Silvério Teixeira, seu inimigo de velha data, com g r a n d e influência naquela cida-
de. A c a b a conseguindo resgatar, somadas às rubricas, assinaturas e j u r a m e n t o s dos
louvados, dois contos, quinhentos e cinqüenta mil, duzentos e oitenta e u m réis, mais
quarenta oitavas d e ouro "[...] pelo trabalho que teve e m ajudar a fazer a demarca-
ç ã o " . ^ A C â m a r a de M a r i a n a encontrava-se i n a d i m p l e n t e c o m seu ex-corregedor,
1 9

APM, CMM 18,fl.30, Termo de acórdão e. vereação, 8.8.1750.


•* APM, CMM 18, fl. 73. Termo <k acórdão e vereação, 2.7.1751. Em 1752, o dispêndio se repetiria,
pagando-se seis oitavas e rim quarto de ouro pelas casas de aposentadoria do ouvidor conforme
APM, CMM. 18, fl. 126. Termo de acórdão e vereação, 10.6.1752.
• ACMOP.v.2., 1750-1754, fl. \2-l2v. Aulo de vereação, 21.7.1751,.

• Cifras tomadas em várias passagens dos'autos de vereação do APM, CMOP 56, fl. 115v.-117v.
'* AHU, Cons. Ultramrmo, Brasii/MG, caixa 65, doe. 42. [Requerimento de Caetano da Costa Matoso,
ouvidor de Vila Rica. pedindo para ser pago pela conta da contadoria no que respeita as assinaturas e rubricas a que
Em seu apelo, contrapõe os sacri-
km direito e pelos dias empregues na execução do tombo de uma sesmaria].
ficios que fizera para execução do trabalho e sua "pouca ambição, que tinha e é notória" ao não
procurar receber imediatamente os emolumentos. Verídico ou não esse desprendimento, o fato é
que o provedor da Fazenda encarregada de contabilizar suas dividas salienta que pelos oitenta e
irove dias de trabalho gastos na medição "se lhe não acham contados salário algum". AHU, Cons.
Ultramarino, Brasil/MG, caixa 65, doe. 42. Auto de exame. Provedor da Fazenda real, Domingos
Pinheiro, 10.10.1753.
q u e , j á do o u t r o lado do Atlântico, resolveu 'processá-la p a r a q u e recebesse pelas
rubricas nas correições n o livro da discórdia.
O posto u l t r a m a r i n o na magistratura era posição delicada. O r e c r u t a m e n t o
de funcionários dispostos a o c u p a r cargos e m a m b i e n t e s e n c a r a d o s c o m o inóspi-
tos a t e n d e u a a l g u m a n e g o c i a ç ã o , e m q u e se m i s t u r a v a m formas a m p l i a d a s d e
v e n a l i d a d e , c o r r u p ç ã o consentida p a r a c o m p e n s a r os baixos salários e as agruras e
i n c ô m o d o s enfrentados no cargo. ^ T a l forma d e v e n a l i d a d e fazia p a r t e d a con-
d u t a d e q u a l q u e r f u n c i o n á r i o colonial, inclusive d o o u v i d o r d e V i l a R i c a . E m
vista disto, t r a n s c o r r e o longo e m b a t e e m t o r n o do direito de os ouvidores recebe-
r e m u m a o i t a v a d e o u r o pela r e n o v a ç ã o das licenças dos oficiais m e c â n i c o s ou
pelo direito de t r a b a l h a r e m e m lojas abertas. M a n d a t á r i o d a J u s t i ç a e m M i n a s , a
h a b i l i d a d e d o ouvidor p a r a i n t e r p r e t a r as leis serviria p a r a sustentar essas espécies
de ganhos.
D e s d e 1747, os oficiais da C â m a r a d e Vila R i c a a d v e r t i a m o rei sobre os p r e ç o s
extorsivos c o b r a d o s pela J u s t i ç a n a capitania. E m carta d e 13 d e abril, falavam d a
"[..,] c o n s t e r n a ç ã o e m q u e se vêem estes povos c o m as avultadas espórtulas q u e le-
v a m os ouvidores e m suas correições [...]", referindo-se especificamente à obrigação
d e todos q u e tivessem loja ou oficio a o p a g a m e n t o d e u m a oitava d e o u r o p e l a
licença. O c a r á t e r odioso dessa taxa derivava da obrigatoriedade, c o n t r á r i a a o q u e
p r e s c r e v i a o r e g i m e n t o , c o m q u e t o d o s t i n h a m d e p a g á - l a , e n ã o a p e n a s os
t r a n s g r e s s o r e s . ^ Através do seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , G o m e s F r e i r e é instado
1 6

a o p i n a r a respeito logo n o a n o s e g u i n t e . ^ 1 7

O montante totalizava, segundo o contador de Vila Rirá, 1017 oitavas e 3/4 de juramentos; rubri-
cas de livros e assinaturas. AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 68, doe. 82. [Requerimento de
Caetano da Costa Matoso, ouvidor de Vila Rica,, pedindo para que lhe, seja pago pela Câmara da Cidade de
E, muito embora a segunda residência
Mariana o que üie devem pelos serviços prestados em correição].
tivesse empenho especial em averiguar se Gaetano da Gosta Matoso dedicara-se ao comércio, não
encontrando elementos desabonadores á respeito, é bastante provável quê Caetano não tenha
fugido à regra de ouro das carreiras ultramarinas: auferir todo o tipo de recurso disponível de obter
na passagem pela colônia. No mercado colonial, funcionários não raro tornar-se-Íam investidores,
aproveitando-se da dinâmica da economia. Assim ainda confinado no Rio de Janeiro, Caetano
recebe em setembro de 1752, em Lisboa, através de Seu procurador é tio doutor Manuel Madeira
de Sousa, dois contos quinhentos e sessenta mil réis (2:560&00ü réis.), letras: que lhe devia o
contratador de diamantes Felisberto Caldeira Brant e seus sócios. Anais da Biblioteca,Nacional, Rio de
Janeiro, v. 80, p. 165,. 1960. Agradeço ajúnia Ferreira Furtado essa referência.
Sobre o tema da integridade das autoridades reais e as tênues fronteiras entre práticas legais e
ilegais no Brasil Colônia o trabalho de Ernst Pijning constitui consulta obrigatória. Ver PIJNING,
Ernst. Controllingcontraband: mentality, ecoiiomy and society in eighteenth- ceiitury. Rio de Janeiro.
Maryland:Johns Hopkins University, 1997.
APM, SC 92, doe. 17. [Carta dos oficiais da Câmara de Vila Rica, 1.3.4.1747}.

APM, SC 92, doe. 17. [Carta de lei, 3.8.Í748].


D e c i s ã o a respeito arrasta-se até a c a r t a d e lei d e 6 d e o u t u b r o d e 1 7 5 0 ,
dirigida a o g o v e r n a d o r d a capitania, q u e e x a r a decisão, após consulta ao p r o c u -
r a d o r d a F a z e n d a e d a C o r o a , a f i r m a n d o n ã o ter f u n d a m e n t o a c o b r a n ç a d e u m a
oitava d e o u r o n a r e n o v a ç ã o das licenças dos oficiais m e c â n i c o s p a r a p o d e r e m
t r a b a l h a r ou t e r e m lojas a b e r t a s , u m a vez q u e , s e g u n d o o texto, "[.--] n ã o d e v e m
p a g a r custas q u a n d o n ã o h á r a z ã o p a r a s e r e m c o n d e n a d o s . " E x t o r s ã o é a p a l a v r a
e m p r e g a d a p a r a referir-se a essa c o b r a n ç a , d e v e n d o o g o v e r n a d o r c o i b i r essa
prática.
O m e s m o resultado é c o m u n i c a d o aos oficiais d a C â m a r a de V i l a R i c a , p o r
p r o v i s ã o régia d e 26 d e o u t u b r o de, 1750, e m q u e o r d e n a a o g o v e r n a d o r q u e
m a n d e p u b l i c a r "[...] q u e se n ã o deve p a g a r coisa a l g u m a de rever semelhantes
documentos." 1 9 9

M a s o p r o c e s s o n ã o se e n c e r r a r i a aí. O s ouvidores d e Vila R i c a e S a b a r á


resolvem argüir a execução d a q u e l a o r d e m c o m o g o v e r n a d o r , q u e é obrigado a
c o n v o c a r u m a j u n t a de ministros, e e n c a m i n h a m a i n d a r e p r e s e n t a ç õ e s s o b r e o
m e s m o teor ao r e i . ^ 0 E n q u a n t o a g u a r d a m resposta a sua tentativa d e i m p u g n a ç ã o ,
insistem e m c o b r a r pelas licenças e vistorias, r e s g u a r d a n d o e m depósito o m o n -
tante a r r e c a d a d o . G o m e s Freire a t e n d e à decisão d a j u n t a e m a n t é m os termos d a
o r d e m real. D a sua p a r t e , o s o b e r a n o consulta seus p r o c u r a d o r e s d a F a z e n d a e d a
C o r o a , q u e t ê m opinião divergente d a d o ouvidor de Vila R i c a . A impertinência
deste exalta o rei, q u e , a c o m p a n h a n d o essas reações, e s t r a n h a a atitude j u s t o d e
seus ouvidores, d e q u e m devia esperar "[...] s e m p r e p r o c u r a r q u e se c u m p r a m as
m i n h a s reais ordens, provisões" e " m u i t o mais e m estarem d e â n i m o d e Jhe frus-
t r a r e m o efeito a n i m a n d o - s e a dizerem n a sua c o n t a q u e , sem e m b a r g o d a dita
provisão e d e estar p u b l i c a d a , h a v i a m de c o n t i n u a r a c o b r a n ç a . " O s o b e r a n o aca-
b a p o r elogiar a atitude de G o m e s Freire, q u e n ã o cedera, e exige mais u m a vez
q u e n a residência se averigúe o p r o c e d i m e n t o d a q u e l e s o u v i d o r e s . ^ 20

A discussão e m torno da questão é b e m aproveitada pela C â m a r a de M a r i a n a


em sua celeuma c o m o ouvidor. C o m senso de oportunidade, p r e p a r a colérica repre-
sentação ao rei, e m 5 de j u n h o de 1751, pintando com cores de despotismo os h o r r o -
res praticados pelo ouvidor e m sua decisão de n ã o respeitar a determinação real:

APM, SC 93, fl. 47-47v. Carta de lei, Lisboa, 6.10.1750. Cópias dessa carta são distribuídas para
todos os capitães-mores da capitania. Ver APM, SC 93, fl. 54. Ordem régia ao governador da capitania,
6.4.1752.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, cód. 241, fl. 339v. [Provisão régia através do Conselho UUramarino.
Lisboa 26.10.-1750].
ANRJ, DjMss, cód, 80, v. 9,fl.54v-55. Sobre os wvidom da capitânia das Minas Gerais levarem uma oitava
de ouro de cada licença.que as pessoas de loja aberta ou oficial de seu oficio lhes apresentam em correição, 24.5.1751.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, cód. 241, fl. 356. [Provisão régia pelo Conselho Ultramarino ao governa-
dor Gomes Freire. Lisboa, 7.2.1752] .
"Pois ao mesmo tempo cpie Vossa Majestade por sua real grandeza os quer
aliviar de u m tributo injusto os ministros os querem obrigar a pagá-lo, tirania é, e
n ã o pequena! Porém, como eles nesta capitania são, ou querem ser senhores abso-
lutos, o b r a m tudo quanto a sua cabeça lhes incita, sem temor de Deus n e m o
respeito às leis de Vossa Majestade, nem ato pouco guardam decoro ao Governa-
dor e Gapitãp General." ^

Aproveitam-se do ensejo p a r a a p o n t a r c o m o fonte de injustiça a pressão q u e os


ouvidores exerciam n a verificação das contas das c â m a r a s q u e d e i x a v a m seus ofi-
ciais intimidados, r e c l a m a m assim q u e as "[...] violências q u e fazem os ouvidores
aos povos é p o r t e m o r das glosas q u e d e ordinário lhes fazem nas. contas, q u e d ã o
das despesas das o b r a s públicas [.-..] ",203 g k G t a ] c e n á r i o d e h o r r o r e opressão
q u e t i n h a nos o u v i d o r e s e m seu d e s m e d i d o p o d e r ã r a z ã o d e t u d o , os oficiais
a p r o v e i t a m a ocasião p a r a afastar os negócios d e sua C â m a r a d o controle desses
m a g i s t r a d o s . P e d e m q u e tais ministros n ã o o c u p a s s e m o l u g a r p o r mais de três
anos e q u e se. c o m p r o m e t a m a restituir as glosas injustas q u e praticassem nas con-
tas das c â m a r a s . *2 0

N a provisão especialmente dirigida " p a r a o ouvidor geral d e Vila R i c a " a res-


peito d o tema, rei e conselheiros u l t r a m a r i n o s c a r r e g a m n a força das p a l a v r a s e das
ordens:

"Me pareceu dizer-vos que devendo vós sempre procurar se cumprirem as


minhas ordens e provisões, faltastes a vossa obrigação em impugnares a referida
de 26 de outubro de 1750 pretendendo que o governador deixasse de observar, e
muito mais em estares de ânimo de lhe frustrares o efeito animando-se a dizeres n a
vossa conta que sem embargo da dita provisão, e de estar publicado havíeis de
continuar a cobrança pondo o seu procedido em depósito pelo que se vos ordena
que quando assim o tenhais feito mandeis restituir às partes o dinheiro depositado;
ordenando-vos outrossim a vós abstenhais de continuar nesta violència.' ,1!0j

202. AHU, Cons. Ulu amariiio, Brasil/MG, caixa 58, doe. 41. Representação da
-
Câmara da Cidade de Mariana
ao rei dando conta da desobediência de alguns ouvidores de Minas Gerais relativamente ao cumprimento da provisão
régia de 26 de. outubro de ¡750 a respeito das correições.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 58, doe. 41. Representação da Câmara da Cidade de Mariana
ao m dando conta da desobediência de alguns ouvidores de Minas Gerais relativamente ao cumprimento da provisão
régia de 26 de outubro de 175Q a respeito das correições.
Aspecto que possivelmente contribuiu para indispor os oficiais mecânicos com a figura do ouvidor
foi sua intervenção pela maior atuação dos almotacés em Mariana, que decerto pesou no controle
dos oficiais. Ver UFOP, AHCMM, eód. 660, íl. 9v.-10.
205. AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, cód.'241, fl. 357v. [Provisão régia através do Conselho Ultramarino ao
ouvidor de Vila Rica, Lisboa, 7.2.1752]. Texto idêntico merece o ouvidor de Sabará Teodoro de
Abreu Bernardes.
O caso, e x p o n d o o o u v i d o r a u m a oposição frontal a o rei, é r e v e l a d o r das
d e l i c a d a s relações e n t r e a j u r i s d i ç ã o dos oficiais e o p o d e r d o rei sob o a n t i g o
regime e m Portugal. T o c a v a n o e n t e n d i m e n t o , escorado e m d o u t r i n a q u e só viria
a a l t e r a r e m fins do século X V I I I , q u e o p u n h a b a r r e i r a s à i n t e r v e n ç ã o real n o
c o t i d i a n o d a jurisdição dos oficiais. S e g u n d o M a n u e l H e s p a n h a :

" T u d o isto, combinado com a incerteza doutrinal e legal, com ã delonga dos
processos judiciais e com as chicanas e dilações que aí podiam ser artificialmente
introduzidas, possibilitava ao oficial negar ou remeter p a r a as calendas gregas o
cumprimento de diretivas vindas de cima. O seguimento de alguns processos deste
tipo de que a literatura nos deixou registro é suficiente p a r a nos mostrar d u m a
forma plástica o grau de independência prática gozado pelos oficiais." m>

O debate e m torno do p a g a m e n t o da oitava de ouro pela correição às lojas e


ofícios mecânicos, até ali limitado à troca d e papéis* e argumentos jurídicos, g a n h a as
ruas e assume contornos de desordem social. O bacharel, protegido pela imunidade
do cargo, cultivado nas leis e n o direito, vê desabar seu m u n d o d e papel. N o final de
maio de 1751, divulga edital d u r a n t e correição e m M a r i a n a insistindo q u e os oficiais
mecânicos pagassem u m a oitava de ouro pelas licenças renovadas, q u e ficariam e m
depósito até q u e chegasse a decisão final d e Sua Majestade a respeito do a s s u n t o . 207

O confiante bacharel parecia acreditar n a sua capacidade de suportar o debate jurídi-


co sobre os direitos que possuía ao emolumento. Sua principal justificativa p a r a n ã o
c u m p r i r de imediato a o r d e m era mais u m a vez relacionada à jurisdição. E m sua
interpretação, o Conselho Ultramarino, através de provisão sem a devida aprovação
real, h ã o dispunha de p o d e r p a r a suspender tais e m o l u m e n t o s . ^ Confiava a i n d a
20

q u e havia informado à Metrópole a respeito d e suas razões p a r a discordar daquela


determinação, que julgava "[...] era atropelada e. desatendida a Justiça que entendia
assistir-lhe [*..]". Ademais, enquanto aguardava julgamento da questão, preçavera-se
m a n d a n d o q u e os e m o l u m e n t o s recebidos fossem depositados até. q u e seus a r g u -

HESPANHA, António Manuel, op. àt. nota 100, p. 503.


O relato mais detalhado das circunstâncias do motim encontra-se em AHU, Cons. Ultramarino,
Brasil, Códice 244 , fl. I29v.-I3I. {Consulta do Conselho Ultramarino. Lisboa, 10.2.1752]. Os argu-
mentos tanto do ouvidor quanto do governador (chamado a dar seu parecer) instruem o parecer
final. Versão bem mais resumida e parcial encontra-se em AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice
241,,fl, 364v, [Provisão régia através do Conselho Ultramarino. Lisboa, 6.4.1752],
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, cód. 244 , fl. 131, [Consulta do Conselho Ultramarino. Lisboa,
10.2.1752] .
m e n t o s estivessem julgados e chegasse a decisão n a p r ó x i m a f r o t a . " A c r e d i t a v a
2 0

estar, dessa forma, suficientemente r e s g u a r d a d o .


Longos dias se passam sem que qualquer u m dos oficiais mecânicos d a cidade
aparecesse p a r a cuidar d a licença, até q u e n o dia 7 de j u n h o , "[...] m a n c o m u n a d o s ,
u m a quantidade deles subiram a sua sala levando consigo o p r o c u r a d o r do concelho
dizendo não queriam estar pelo q u e lhes m a n d a v a no edital [...]". E m vista d a forma
c o m o se c o n d u z i r a m n a q u e l e p r o t e s t o , e m q u e " o m o d o d e r e q u e r e r e r a d e
amotinadores e desobedientes", o corregedor faz valer suas prerrogativas p r e n d e n d o
três dos que considera "cabeças daquela plebe", d e t e r m i n a n d o q u e fossem levados
naquela m e s m a tarde p a r a a cadeia mais segura e m Vila Rica. N o c a m i n h o p a r a a
prisão, n p v a surpresa: a escolta,, é atacada, p o r vários h o m e n s "[...] e, c o n v o c a n d o
outros c o m a voz de viva o povo, entraram a ajuntá-los p a r a que, c o m efeito, violen-
tamente e c o m armas, tirarem os ditos presos das mãos d a Justiça." N ã o esperavam,
contudo, a reação audaz do ouvidor, que, ao saber do q u e estava ocorrendo, parte às
carreiras e m seu cavalo, conseguindo desbaratar os atacantes e fazer c o m que os pre-
sos chegassem à cadeia de Vila R i c a . 2 1 0

E n t e n d e n d o ter ocorrido ali o grave crime de "[...] sublevação, desobediência e


m o t i m " , n a qualidade de ouvidor geral, n ã o desperdiça a o p o r t u n i d a d e p a r a abrir
u m a devassa, e m q u ê investiga e arrola os envolvidos naquelas horas mmultuadas de
desordem. C u m p r i r i a o receituário de a p o n t a r naquele m o v i m e n t o a possibilidade
de "conseqüências perniciosas [...]", referindo-se a o p e r m a n e n t e temor de descontro-
le social que pairava diante d e qualquer explosão de insatisfação. Legitimava, assim,
sua atitude de prender os "motores" p a r a servir de exemplo aos d e m a i s . ^
N a carta que escreve ao rei, alguns dias a seguir do protesto, o ouvidor parece
antecipar sua p r ó p r i a defesa diante da instabilidade causada pela s u a insistência e m
cobrar emolumentos. E m sua ótica, o movimento de M a r i a n a n ã o poderia ter "des-
culpa alguma";, pois afinal não praticara qualquer tipo dp violência contra .os oficiais.
E, reconhece, "[...] ainda q u a n d o fosse injusto o seu m a n d a d o , deviam o b e d e c e r a

O relato mais detalhado das circunstâncias do. motim encontra-se em AHÜ, Cons. Ultramarino,
Brasil, Códice 244 , fi. 129v.-131. [Consulta do Conselho Ultramarino, Lisboa, 10.2.1752]. Os argu-
mentos tanto do ouvidor quanto do governador (chamado a dar seu parecer) instruem o parecer
final.. Versão bem mais resumida e parcial encontra-se em AHU* Cons, Ultramarino, Brasil, Códice
241, fl. 364v. [Provisão régia através do Conselho Ultramarino, Lisboa, 6.4.1752].
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 244 , fl. 130. [Consulta do Conselho Ultramarino, Lisboa, 10
de fevereiro de 1752].
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 244 , fl. 130-130v. [Consulta do Conselho Ultramarino, Lis-
boa, 10 de fevereiro de 1752].
ele, e m u i t o mais e m correição, e m q u e tinha t o d a a j u r i s d i ç ã o [ . . . ] " . 2 1 2
Mais u m a
vez o b a c h a r e l resguardava-se n a interpretação d a lei.
S u b l i n h a r i a a t e m p o a qualidade s e m p r e inquieta dos m o r a d o r e s d e M i n a s :

"[,..] esta desordem só procedera daquela vil qualidade de h o m e m que entre


todas as terras d a q u e l a capitania foram sempre conhecidos por malévolos, e
revoltosos, e os primeiros mentores dos levantes que nela tem havido." 213

Q u a n d o o caso c h e g a à M e t r ó p o l e , a reação é f r a n c a m e n t e desfavorável a o


ouvidor. O s tumultos e crises sociais envolvendo a Justiça no passado recente naquele
país de instáveis súditos esgotara qualquer condescendência c o m esse tipo d e risco
político. P a r a o procurador d a Fazenda, "[...] e r a m igualmente culpados o ouvidor e
os m o r a d o r e s d e M a r i a n a [...]", O primeiro p o r q u e , afinal de contas, dera motivo
p a r a a desordem ao descumprir a isenção prevista, n a lei real; os segundos, pelo insul-
to a u m ministro e pela tentativa d e tirar presos sob custódia da Justiça real. U m a
avaliação positiva sobre a atuação do ouvidor ("bem p r o c e d i d o e desinteressado e
q u e só procedera p o r u m escusado capricho") favorece o tom condescendente com
1

que esse p r o c u r a d o r afirma n ã o considerá-lo "digno de. castigo". Por outro lado, lhe
parecia justo livrar d a prisão os réus, sugerindo que fosse, dada o r d e m p a r a soltá-los
pelo próprio o u v i d o r . ^ J á o p r o c u r a d o r d a C o r o a n ã o demonstrava tanta tolerân-
21

cia, p e d i n d o q u e fosse dada u m a reprimenda severa ao ouvidor pela sua imprudência


e "teimosa liberdade" n a execução da provisão do concelho. "* A p a r e c e a i n d a no
21

processo carta d e G o m e s Freire, e m que relata o acontecido, a l e g a n d o q u e t e n t a r a

No entanto, sua defesa maior, aquilo que.parecia aliviar sua consciência, era o fato de a mesma
ordem que proibira os emolumentos determinava que se o ouvidor entendesse por bem continuar
a cobrados poderiam os atingidos queixar-se na sua residência. Esse parecia-lhe o direito que dis-
punham os grupos afetados, e não p direito de se amotinar: "assim não tinham outro recurso e
deviam satisfazer ao seu mandato, e usar daquele meio no caso que ele o percebesse, e muito
menos não percebendo ele cousa alguma" AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 244 , fl. 130v.
[Consulta do Conselho Ultramarino, Lisboa, 10 de fevereiro de 1752] .
3
- AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 244, fl. 130v. [Consulta do Conseüio Ultramarino, Lisboa, 10
de fevereiro de 1752].
4- Essa proposta de soltar os presos de delito tão sério é cercada de dissimulação: "que como não era
conveniente dar-se uma idéia de impunidade, e tolerância em semelhante figura de delito, parecia
a ele, procurador da Fazenda, seria melhor servir-se Vossa Majestade declarar que por algumas
justas razões há por bem perdoar a estes réus o maior castigo que mereciam ordenando que sejam
logo soltos pelo mesmo ouvidor". AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 244, fl. 130v. [Consulta
do Conselho Ultramarino, Lisboa, 10 de fevereiro de 1752].
5
- AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Cód. 244,11. 130v-131. [Consulta do Conselho Ultramarino, Lisboa,
10 de fevereiro de 1752].
d e m o v e r o o u v i d o r d a q u e l a c o b r a n ç a , m a s , "[...] c o n h e c e n d o a fortaleza d o seu
espírito, ficava c o m p o u c a esperança de que. ele mudasse, a d e t e r m i n a ç ã o [„.]".216
O parecer-final do Conselho U l t r a m a r i n o , c o m sugestões expressas d o conse-
lheiro F e r n a n d o J o s é M a r q u e s Bacalhau, r e c o m e n d a a o rei que o r d e n e ao governa-
dor q u e c h a m e o ouvidor a sua presença e o r e p r e e n d a s e v e r a m e n t e p o r aqueles
procedimentos, q u e nova devassa seja tirada e remetida a o Conselho U l t r a m a r i n o ,
q u e os presos sejam soltos e que traga aquela ocorrência p a r a a r e s i d ê n c i a . ' 2 7

Depois de t u d o isso, d o m J o s é desautoriza p o r completo as atitudes d e C a e -


t a n o . N a p r o v i s ã o e s p e c i a l m e n t e dirigida ao o u v i d o r iria l e m b r á - l o , s e m m e i a s
p a l a v r a s , d e q u e j á o havia p r o i b i d o de receber a oitava de. o u r o pelas licenças.
Subscreve decisão do C o n s e l h o U l t r a m a r i n o o r d e n a n d o que. os réus fossem i m e -
d i a t a m e n t e soltos c que a devassa fosse r e m e t i d a p a r a avaliação n a C o r t e . ' ^ 2

A explosão de u m tumulto daquele dirigido contra u m ministro do rei pelas ruas


e estradas d e cidade de moradores tão reconhecidamente leais n u m a época e m q u e
M i n a s j á parecia definitivamente pacificada soava, a princípio, c o m o manifestação
e x t e m p o r â n e a de rebeldia. Configura-se aqui a m e s m a natureza das revoltas tão fre-
qüentes n o Antigo R e g i m e , e m q u e u m emissário do p o d e r real q u e intervém no
cotidiano de u m a c o m u n i d a d e é a p r o x i m a d o da i m a g e m de. traidor da v o n t a d e do
soberano perante os direitos do grupo. A atitude d e traição q u e parecia envolver o
ouvidor que desrespeitava e resistia às leis sagradas do soberano e oprimia seus súdi-
tos congregaria a t u r b a e a empurraria p a r a a sedição. Essa configuração do protesto
esteve facilitada pelo agravamento do conflito com o governador. Desde: sua carta em
resposta à decisão real de 26 d e o u t u b r o d e 1750, e m q u e insistira n o direito de
receber tais emolumentos, Gomes Freire fora acusado pelo ouvidor de executar com
"desordem e p a i x ã o " as medidas determinadas pelo rei através de b a n d o q u e fizera
precipitar os â n i m o s . ^ Mais, denuncia q u e o c u l p a d o d a d e s o r d e m teria sido o
2

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Côd. 244, fl. 131. [Consulta do Conselho Ultramarino! Lisboa, 10 de
fevereiro de 1752].
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Cód. 244, fl. 131. [Consultado Conselho Ultramarino, Lisboa, 10 de
fevereiro de. 1752], José de Souza Azevedo Pizarro Araújo refere-se à ordem de 6 de abril de 1752,
em que foram perdoados pelo rei "os réus que foram em Mariana à casa do ouvidor Caetano Costa
Matoso dizer, por modo amotinado, que não estavam por um edital do clito ministro, etc, Se deter-
minando ao governador que mandasse chamar aquele ministro e da parte de S. Majestade lhe
estranhasse a desordem com que se houve no edital referido.'", na obra Memórias Históricas do Rio de
Janeiro. Rio dejaneiro: Imprensa Nacional, 194G, V. 8, t. 2. p. 290.

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Cód. 241, fl. ,364y. [Provisão régia através do Conselho Ultramarino,
Lisboa, 6.4.1752]. Gomes Freire mantinha-se informado sobre, os rumos do caso recebendo notíci-
as das decisões. Ver carta com notificação dessa decisão. AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice
241, fl..365v.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Cód. 244, fl. 130. [Consulta do 'Conselho Ultramarino, Lisboa, 10 de
fevereiro de 1752].
p r ó p r i o governador, q u e estaria movendo c a m p a n h a d e desmoralização e "pública
p a i x ã o " c o m q u e " a n i m a r a aos h o m e n s àquele excesso" q u a n d o teria c h e g a d o a
desautorizar o ouvidor ao garantir que os presos só ficariam encarcerados até G o m e s
Freire chegar à c a p i t a n i a . 220
Desde então, p a r e c e q u e os termos dessa convivência
tornar-se-iam precários.
A a t u a ç ã o do ouvidor C a e t a n o d a Costa M a t o s o e m M i n a s Gerais ia sendo,
assim, m a r c a d a por inúmeras disputas judiciais, e m que, a m p a r a d o pelos seus amplos
c o n h e c i m e n t o s de leis, p r o c u r a v a definir novos p a d r õ e s hierárquicos e restaurar a
plenitude dó p o d e r real, até ali esfacelado pelas jurisdições costumeiras. N o último
ano d e seu m a n d a t o , aquela que parecia ser mais u m a das batalhas jurídicas envol-
vendo o incansável ouvidor de Vila Rica acaba p o r g a n h a r u m desfecho impensável.
A o contraditar o Tribunal da Relação da Bahia, sua impertinência semeada e m terras
coloniais colheria grossa tempestade: o ouvidor enfrentaria o derradeiro constrangi-
m e n t o d e ser afastado do cargo, preso, p o r muito p o u c o n ã o sendo encarcerado e
acorrentado, e remetido p a r a o Rio, de onde precisaria fugir p a r a a Corte e m busca
de defesa.
Ao dar u m despacho em processo que corria na Justiça de Vila R i c a envolvendo
o julgamento a. respeito de violências cometidas por escravos do capitão-mor Antônio
G o m e s dos Reis, mais u m a batalha judicial parecia recomeçar. O juiz ordinário de
Vila Rica (com q u e m a n d a v a e m briga) nega o provimento. Ó capitão-mor apela ao
T r i b u n a l d a Relação da Bahia e sua Mesa acata o provimento do capitão-mor, segui-
do de outro que, estranhamente, condenava C a e t a n o às custas dos autos.
D i a n t e d a sentença a seu respeito, o letrado profere despacho afirmando q u e
n ã o iria cumpri-la, pois, conforme alegaria, "[...] ou era falsa, ou falsa devassa e m q u e
se fundara, p o r q u e d a original, que se achava naqueles autos, constava o contrário do
que dizia a sentença, e igualmente por causa d a condenação das custas, e m q u e duvi-
dava naquele caso a jurisdição p a r a fazer-se, e muito mais c o n c o r r e n d o dolo m e u ,
n e m prejuízo ou queixa da p a r t e . " ' As divergências chegavam novamente n o c a m -
2 2

p o predileto do b a c h a r e l : a i n t e r p r e t a ç ã o das leis. C o n t u d o , n ã o deixa d e t o r n a r


público, e m audiência, o despacho d a Relação, chegando a dar vistas do processo aos
réus.
M a s a M e s a do T r i b u n a l discorda d a forma c o m que fora conduzido o processo
e e n c a m i n h a requerimento — " u m requerimento petulante", no dizer do ouvidor —
afirmando q u e n ã o c u m p r i r a a sentença daquele T r i b u n a l , d e v e n d o , e m caso d e
d ú v i d a , ter r e c o r r i d o p e l o s meios o r d i n á r i o s . Esse r e q u e r i m e n t o é a n e x a d o aos

'• AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Cód. 244, fl. 130. [Consulta do Consedio Ultramarino, Lisboa,
10.2.1752].
• AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658. [Representação, do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
autos, do processo e, e m seguida, proferido acórdão ("acórdão m e n o s ajustado", con-
forme Caetano) m a n d a n d o que se passasse carta a o juiz ordinário de Vila Rica para
que intimasse ô ouvidor a cumprir os termos do acórdão era três dias; caso contrário,
fosse notificado p a r a comparecer p e r a n t e a M e s a do T r i b u n a l da Relação e m seis
meses. N a d a disso ocorrendo, m a n d a v a o Tribunal d a Relação q u e lhe remetesse o
ouvidor preso p a r a julgamento. C o m o se vê, o caso g a n h a r a contornos g r a v e s . 2 2 2

O ouvidor recebe a intimação e p r e p a r a recurso alegando as razões de direito


que tivera p a r a n ã o c u m p r i r a sentença do T r i b u n a l . Aproveita-se da ocasião p a r a
protestar contra a forma como estava sendo tratado ao ser confrontado p o r u m juiz
leigo, ainda mais que a ameaça de prisão contrariava frontalmente o decreto d e 21 de
abril de 1751, q u e proibia quê ministros fossem presos n o exercício de sua jurisdição.
P a r a q u e isto ocorresse, era necessário ser suspenso antes p o r Sua Majestade, Encami-
n h a esse despacho p a r a mesa sem tomar qualquer atitude a respeito do caso.
O despacho é anexado aos autos e, a o invés de se transformar ein mais u m a das
arrastadas batalhas jurídicas que tanto o agradavam, o Tribunal profere sentença su-
mária o r d e n a n d o que o ouvidor fosse» preso e remetido à Mesa. Pesaria a acusação de
"[...] pela formal desobediência e injúria com que deixara d e c u m p r i r os despachos
delas t . . . ] " . 2 2 3

As circunstâncias da prisão do ouvidor revelam o grau que alcançou a tensão em


torno de sua figura; M e s m o desconcertado c o m as incorreções jurídicas q u e assumiu
o processo, n e m em seu pior pesadelo o ouvidor poderia supor o q u e iria acontecer.
Deixemos para o próprio ofendido n a r r a r o surpreendente desfecho. Após che-
gar a carta de prisão d a Relação às mãos do juiz ordinário:

"Estes foram pedir ajuda de braço militar a quem governava as armas n a falta
de governador, e não duvidando dar-lha, sabendo para o que era, com ela capitães-do-
mato, negros, com espadas nuas, t cães de fila me cercou as casas às dez horas do dia
vinte e oito de abril passado, a tempo que eu estava bem sossegado no meu despacho,
e assim atropeladamente e com motim me subiram pela escada acima até o meu
aposento, dizendo-me que eu estava preso a ordem de Sua Majestade. Vendo-me
assim cercado entre sentinelas com baionetas cravadas dentro do meu próprio aposen-
to, e da mesma sorte as minhas casas, e alterado o povo, porque não se originasse dali
alguma maior desordem, cedi à violência debaixo d e protestos de n ã o poder ser
preso, e o mais que a seu tempo farei ce.rto."^ 4

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
AHU, Cons. Ultramarino., Brasil/RJ, Castro e Almeida, n, 15658. [Representação do ouúdor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
A forma c o m o o c o r r e r a a prisão j á lhe p a r e c e r a a b s u r d a . P o r é m , p o r m u i t o
p o u c o outros abusos estiveram na iminência de acontecer. O " i n í q u o j u i z " quise-
ra trancafiá-lo n a cadeia pública sob g u a r d a de sentinelas, p r o c e d i m e n t o inaceitá-
vel p a r a c o m u m "ministro d e el-rei". N ã o c o n s e g u i n d o , pôs sentinelas g u a r d a n -
d o as p o r t a s d e seu g a b i n e t e , i m p e d i n d o q u e t r a b a l h a s s e nas suas funções d e
o u v i d o r . D e p o i s de dez dias sofrendo "[...] inexplicáveis violências e grassarias
q u e n ã o sofre n e m se fazem a u m h o m e m particular, e m e n o s a u m ministro d a
m i n h a g r a d u a ç ã o [...]", é m a n d a d o p r e s o p a r a o R i o d e J a n e i r o sob escolta d e
dois oficiais de J u s t i ç a e soldados. Por m u i t o p o u c o n ã o p e r c o r r e o c a m i n h o " [ - . ]
c o m grilhões nos pés e u m a c o r r e n t e a o pescoço [ . . . ] " . ^ 22

Depois d e oito dias de u m a j o r n a d a a m a r g a , esvaziada de q u a l q u e r dos e n c a n -


tos q u e o c o m o v e r a m n a c h e g a d a a M i n a s , c h e g a a o R i o de J a n e i r o , o n d e é e n t r e g u e
aos c u i d a d o s do ouvidor da c i d a d e , q u e c o n c e d e q u e circulasse livremente.
O ouvidor iria, e m b o r a somente meses mais t a r d e , q u a n d o o p r o b l e m a j á se
precipitara, d e n u n c i a r a c h i c a n a d a q u e l a fase d o processo, m i s t u r a n d o a m a r g u r a ,
r a n c o r , suspeita de interesses pessoais, m á fé e incorreções. E m sua r e p r e s e n t a ç ã o
ao g o v e r n a d o r , diria:

"Fez horror este procedimento tão violento, e muito mais quando era público
movê-lo menos a Justiça que o poder, ou riquezas da parte, e fazendo-me notavel-
mente sensível pela inteireza com que servi a Sua Majestade, não foi menos vendo
alterada a forma de. proceder, ê que assim se estava por u m a simples queixa d a
parte contra a autoridade, e crédito de u m ministro, sem ser ouvido, m a n d a d o
notificar, e também prender por u m juiz leigo, e meu inferior, sendo todos estes
procedimentos contra direito, e o da prisão expressamente proibido pelas ordens
do mesmo senhor, enquanto exercia o meu l u g a r . " m>

A prisão n ã o era tudo q u e o destino lhe reservara, pois p e r m a n e c e r i a exilado n o


R i o de J a n e i r o p o r vários meses, p r o i b i d o de e m b a r c a r p a r a a C o r t e . D o R i o , faz
i n ú m e r o s r e q u e r i m e n t o s a o chanceler d a M e s a d o T r i b u n a l d a R e l a ç ã o t e n t a n d o

AHU, Cons.. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752], Em carta do juiz de fora de Mariana, Silvério
Teixeira, de 8 de agosto de 1 752, a violência do capitão e juiz Manoel Rodrigues de Almeida na
prisão aparecia assim justificada: "[...] ainda que se lhe queira arguir civilidade na diligência, não
foi mais do que um receio das violências, com que a muitas ordens de Vossa Majestade lhe negou
o dito ministro a devida execução [..,]". AHU,. MG/caixa 60, doe. 30. Idem AHU, Cons. Ultra-
marino, Brasil/MG, caixa 52, doe. 30. Para além da violência que se passava, a situação da prisão
de um magistrado naqueles termos constituía forte agressão aos predicados de honra que pauta-
vam õ cargo. Sobre a concepção honorária do oficio ver HESPANHA, António Manuel, op. cit.
nota 100, p. 503-504.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658, [Representação do ouvidor Caetano
da. Costa.Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
e m b a r g a r aquela decisão, d e m o n s t r a n d o a falta d e J u s t i ç a e arbitrariedades c o m e -
tidas. N e s s a s i t u a ç ã o , fica p u r g a n d o m a i s d e u m a n o , p e d i n d o f i n a l m e n t e q u e
pudesse e m b a r c a r p a r a o R e i n o , a fim de se defender j u n t o ao rei.
D o R i o , p o u c o mais resguardado p o r algum respeito que encontra do ouvidor
local, redobraria suas disputas c o m os magistrados d a Relação. C o n s u m a d a sua pri-
são, C a e t a n o da Costa M a t o s o p a r e c e reorientar seus ataques d e n a t u r e z a forense
p a r a o T r i b u n a l da Relação. A m e d i d a q u e o tempo passa, a u m e n t a seu desespero
c o m a p e r m a n ê n c i a q u e se eternizava, t e m e n d o as acusações q u e estariam sendo
preparadas sem sua presença n o Reino. N a cidade, busca apoio a sua causa de retornar
de imediato p a r a defender-se. Pessoalmente, escreve r e q u e r i m e n t o s a o g o v e r n a d o r
do. R i o , juiz ordinário de Vila Rica., chanceler do T r i b u n a l d a R e l a ç ã o . ' ' 22

N u m lance de habilidade, C a e t a n o da Costa Matoso procura escapar da


v i a g e m à B a h i a e do enfrentamento direto c o m a M e s a d o T r i b u n a l d a R e l a ç ã o ,
p e d i n d o p a r a q u e seu caso tramitasse n a N o v a R e l a ç ã o , a p r o v e i t a n d o - s e d a re-
cente instalação do T r i b u n a l d a R e l a ç ã o no R i o d e J a n e i r o . Visivelmente, p r e t e n -
dia ter novos juízes e escapar d e ser j u l g a d o p o r aqueles d e s e m b a r g a d o r e s que, n o
seu m o d o d e ver, v i n h a m s u s t e n t a n d o t o d a a p e r s e g u i ç ã o c o n t r a ele. Faz a i n d a
p e t i ç ã o a o j u i z d e Vil a R i c a t e n t a n d o convencê-lo d e q u e e x e c u t a r a u m a o r d e m
n u l a , p o s t o q u e s e m a s s i n a t u r a d o vice-rei, c u m p r i d a d e m o d o e x t r e m o e s e m
respeitar o p r a z o de seis meses previstos p a r a recorrer às d e t e r m i n a ç õ e s d a Rela-
ção. C o m esses a r g u m e n t o s , p e d i a q u e fosse passada c a r t a sustatória d a sua prisão.
O s p e d i d o s e n c o n t r a m acolhida n o juiz de Vila Rica, q u e credita J u s t i ç a às argu-
m e n t a ç õ e s , m a s e s b a r r a n a intransponível oposição dos d e s e m b a r g a d o r e s d a N o v a
R e l a ç ã o v i n d o s d a B a h i a . A decisão mais u m a v e z é a r g u i d a p o r C a e t a n o d a
C o s t a M a t o s o , q u e alega ter sido c o n t r a r i a d o o n o v o r e g i m e n t o d a R e l a ç ã o do
R i o d e J a n e i r o , u m a vez q u e a jurisdição impedia a t u a r e m e m processos d a R e l a -
ção. C o n c l u i desgostoso: " F i c a r a m s endo m e u s juízes p a r a s u s t e n t a r e m a ilegiti-
m i d a d e do procedimento que tinham comigo o b r a d o . " ^ 2 2

Q u a t r o meses após sua p r i s ã o , C a e t a n o da. Costa M a t o s o m u d a d e estratégia e,


i m p a c i e n t e c o m a p r o l o n g a d a espera a q u e estava s u b m e t i d o , a l e g a n d o prejuízos
materiais e ultrajes na sua prisão, e n c a m i n h a petição ao chanceler d a M e s a d a R e l a -
ção oferecendo-se p a r a ir a B a h i a defender-se p e r a n t e o Tribunal,, m e s m o n ã o reco-
n h e c e n d o o direito d e ser julgado p o r ela, t e n d o e m vista a n o v a jurisdição estabelecida
p e l a criação d a R e l a ç ã o do R i o . ^ 2 2

• Ver referências em AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658.[Representa-


ção do. ouvidor Caetano da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
• AHU, Cons, Ultramarino, Brasil/RJ,. Castro e Almeida, n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio,. 22 de setembro de 1752].
'• A referência a esta petição encontra-se em AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida,
n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
A d e m o r a n a sua p e r m a n ê n c i a n o R i o a t e n d i a interesses m u i t o claros, "[...]
q u e r e n d o se c o n t i n u e sobre, m i m aquelas grandes violências q u e t e n h o p a d e c i d o ,
ficando n o Brasil p a r a c u i d a r e m e m a d i a n t a r n a p r e s e n ç a d e S u a M a j e s t a d e a
desculpa a o seu m e n o s ajustado p r o c e d i m e n t o , antes de ser ouvida a m i n h a quei-
xa, s e g u r a n d o p u b l i c a m e n t e q u e n ã o h ã o d e fazer essa ofensa aos seus c o m p a -
n h e i r o s d a R e l a ç ã o d a B a h i a , e m se m e deferir nesta e o u t r a s m a i s r a z õ e s q u e
fazem h o r r o r a J u s t i ç a e a p i e d a d e [...]", segundo seu j u l g a m e n t o . 2 3 0

A p e l a à a u t o r i d a d e d e M a t i a s C o e l h o d e Sousa, que, e m s e t e m b r o , conside-


r a n d o q u e "[...] o m e s m o bacharel era estimada d e todos não só pelas suas letras
m a s a i n d a p e l a s u m a i n t e i r e z a d e J u s t i ç a e i n d e p e n d ê n c i a c o m q u e servira ao
m e s m o s e n h o r , de q u e tinha boas p r o v a s [...]", 31 intervém a seu favor p a r a q u e
2

pudesse p a r t i r p a r a 0 R e i n o . D e n u n c i a v a e m carta a D i o g o de M e n d o n ç a C o r t e
R e a l as violências e injustiças praticadas n a q u e l a situação c o n t r a o b a c h a r e l :

"[...] eu devia acudir ao dito bacharel pela Justiça que lhe assistia, e se lhe
denegava, e violência que tinha padecido, e ainda mais ficava padecendo, parado,
e perdido no Brasil, e com mais razão quando a sua pretensão era justificada de
direito, em entender por este meio recorrer ao soberano, das injustiças com que era
tratado [ . . . ] " . m

A conclusão d a disputa e de tanta angústia alcança desfecho c o m p l e t a m e n t e


destoante p a r a a figura r e t a do bacharel: foge e m s e t e m b r o d a prisão p a r a o R e i -
n o , o n d e " [ - - ] c o n c l u i u as suas d e p e n d ê n c i a s , m o s t r a n d o os j u s t o s m o t i v o s das
suãs operações, q u e f o r a m a t e n d i d o s c o m a liberdade q u e logra [ . . . ] " . ^ 33

A fuga p a r a a C o r t e , neste sentido, representa mais do q u e u m gesto inespe-


r a d o d e q u e m se esperava irrestrita lealdade aos princípios d e legalidade — lem-
b r e m o s q u e p a r a se livrar d e sentinelas n o R i o assina p e r a n t e o ouvidor d o R i o
c o m p r o m i s s o d e b e m p r o c e d e r —; ela foi a consciência da impossibilidade de. p e r -
m a n e c e r fiel a u m a orientação legalista q u a n d o a realidade a seu r e d o r d e s m o r o -
nava ao peso d e pressões políticas, interesses pessoais e cruentas disputas
juridicionais q u e a distância colonial e m relação ao m o n a r c a favorecia.

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, 15658. [Representação do ouvidor Caetano da
Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, 15657-15658. [Representação do ouvidor Cae-
tano da CostaMatoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/ RJ, astro e Almeida, 15657-15658. Carta de Matias Coelho de Sousa
paraDiogo de Mendonça Cor tê-Real. Rio,27 de setembro de 1752.
São imprecisos os detalhes sobre sua fuga para o Reino. Esta referência, que se encontra no BNL,
RES, çód. 1077, íl. 106v. Catálogo Alfabético dos ministros de leiras que serviram nestes reinos de Portugal e
Algarve, seus domínios e conquistas ultramarinas, relações e tribunais, como nele se adverte. Dos mais antigos até o
presente de que sé descobriu a notícia mais exata, 1763 ? foi a única que obtivemos.
D o R i o d e J a n e i r o , e n q u a n t o buscava meios de se defender e escapar r u m o à
C o r t e , 0 ex-ouvidor d e n u n c i a c a m p a n h a d e perseguição q u e sofria: a f o r m a c o m o
t r a n s c o r r e r a sua suspensão do cargo, as humilhações a q u e fora s u b m e t i d o diante d a
truculência d a sua prisão, os erros do processo judicial, a intransigência d a M e s a d a
R e l a ç ã o . E m relato d e d e s a b r i d a f r a n q u e z a a o g o v e r n a d o r d o R i o d e J a n e i r o ,
n a q u e l e m e s m o ano, n ã o esconde a decepção de ser s u b m e t i d o a t a m a n h a s p r o -
vas d e aviltamento, u m a vez q u e servira a S u a - M a j e s t a d e c o m h o n r a e absoluto
d e s i n t e r e s s e . " T u d o ali concorria p a r a reforçar sua c o n d i ç ã o de perseguido p o r
234

interesses poderosos, a q u e m i n c o m o d a r a c o m sua a t u a ç ã p . E m m e i o aos brados,


d e d i c a certa p a s s a g e m à d e n ú n c i a d e mais u m a violência q u e estaria prestes a
sofrer: sua residência vinha sendo tirada à revelia, u m a vez q u e se e n c o n t r a v a " e m
t a n t a distância d a q u e l a v i l a " . ^ A referência a esse p r o c e d i m e n t o tinha u m a ra-
2

z ã o especial de ser n a trajetória do ouvidor; afinal, desde q u e p u s e r a os pés e m


Vila R i c a n ã o d e v e ter d e m o r a d o p a r a p e r c e b e r q u e dificilmente sairia c o m a
residência e x e m p l a r , c o m o lhe o c o r r e r a e m Setúbal. 2
-^

C o n f o r m e sucediam os enfrentamentos nas M i n a s , c r u z a v a m o Atlântico despa-


chos, e m b a r g o s , provisões reais. Através d o tribunal do U l t r a m a r , ia s e n d o n o m e s m o
c o m p a s s o e m b a ç a d a a folha d e serviços do ouvidor. E m i n ú m e r a s das decisões reais
q u e e s t r a n h a v a m as atitudes do magistrado, invariavelmente repetia-se o vaticínio

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida^ n. 15658. [Representação do ouvidor Caetano
da Costa Matoso. Rio, 22 de setembro de 1752].
A residência "era exame ou informação que se tirava do procedimento dos governadores, capitães-
mores e magistrados a respeito do modo por que procediam nas cousas de seu oficio durante ó
tempo que residiam na terra onde o exerciam. Dar residência equivalia a prestar contas de atos
exercidos em virtude do ofício; tirar residência significava examinar ou informar-se, uma autorida-
de, em geral magistrado, a respeito dos atos de outra, governador, capitão-mor, provedores, ouvidores
e outros funcionários de inferior hierarquia." GARCIA, Rodolfo, op. cit. nota 98, p. 61. O autor
discute, ainda que brevemente, os fundamentos da residência na legislação portuguesa.. Ver p. 61 -
2. Sobre o mesmo expediente^ ver SUBTIL, José Manuel Louzada Lopes. 0 Desembargo do Paço
(1750-1833). Lisboa: Universidade Autônoma de Lisboa, 1996. 2 v„ p, 311-316. ParaHESPANHA,
António Manuel, op. cit. nota 100, p. 519, tais inspeções nos'ofícios da administração real periférica
(não chegando a atingir os tribunais superiores) eram "[...] um processo de controle interno do
corpo de letrados [...] [e] jogavam a fundo todas as solidariedades corporativas."
d e que. d a q u e l a m a t é r i a dever-se-ia. " d a r c o n h e c i m e n t o n à r e s i d ê n c i a . " 2 3 7
A ri-
gor, isto n ã o representava q u a l q u e r tipo d e demérito prévio - a r e c o r r ê n c i a c o m
q u e isso a c o n t e c i a a p e n a s s u b l i n h a v a , a d e p e n d e r do estilo do f u n c i o n á r i o , sua
v o c a ç ã o p a r a t o m a r decisões polêmicas —, m a s criava a i n c ô m o d a o b r i g a t o r i e d a d e
d e ser a q u e l e assunto r i g i d a m e n t e a u d i t a d o p o r u m m a g i s t r a d o e m seguida a o
e n c e r r a m e n t o d e suas funções.
E m b o r a se tratasse de situação c o n s t r a n g e d o r a , c o m visível intuito a m e a ç a -
dor a c o n t i n u i d a d e de carreiras mais ambiciosas, a freqüência c o m q u e isso ocor-
reu fez p e r d e r seu efeito, a l é m d e p r o d u z i r u m a residência t r a b a l h o s a p a r a o juiz
s i n d i c a n t e e n c a r r e g a d o . D e o u t r a p a r t e , o o u v i d o r , n a c e r t e z a d e q u e sofreria
sindicância, soube usar a seu favor as o r d e n s d e q u e suas atitudes iriam constar d a
sua p r ó p r i a residência c o m o u m a r g u m e n t o a favor d a correção das posições q u e
t o m a v a . Basta p a r a isso l e m b r a r m o s que no ápice d a crise era t o r n o d a cobrança,
d e oitavas p a r a .rever as licenças C a e t a n o usou h a b i l m e n t e da residência, t e n t a n d o
se r e s g u a r d a r , a f i r m a n d o q u e q u a l q u e r ' u m dos q u e se sentissem p r e j u d i c a d o s
p o d e r i a m se q u e i x a r n a s u a ~ r e s i d ê n c i a . ^
23

Amiúde^ as intervenções do ouvidor de Vila Rica resultaram nesse tipo de advertência. Dentre
outros conflitos pessoais de certa gravidade, como aquele quê o indispôs com Valentim Ribeiro da
Silva, quando chegavam ao julgamento real, justificavam que as queixas constassem para serem
averiguadas nas residências. O rei determina a Caetano da Costa Matoso que "[...] admitais as
queixas e ações que o suplicante tiver contra o dito ministro sindicado na residência que lhe tirareis
[...]",AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 241, fl. 362, em ordem de 8 de março de 1752.
Com teor'idêntico, seria AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 241, fl. 365v. Ordem a Diogo
Cotrim para na residência de Caetano da Costa Matoso tomar conliecimento do motim e prisão de oficiais mecânico.
A insistência de continuar recebendo emolumentos da renovação das licenças dos oficiais mecâni-
cos gera semelhante: recomendação real â Gomes Freire, ao declarar, em tom ameaçador, que
"[...] aos seus siudicaiites.se fiá de ordenar que na sua residência averigúem o como procederam
nesta parte e que achando-os em culpa lha formem [...]",, AHU, Cons. Ultramarino, Brasil,
Códice241, fl. 356. Provisão régia, 7.2.1752 . O polêmico embargo que Caetano da Costa Matoso
coloca à decisão real que regulava as propinas dos oficiais das câmaras insta dom José, através do
Conselho Ultramarino, a declarar que na "[..] vossa residência se há de tomar conhecimento desta
matéria [...]". APM, CMM. 19, fl. 138v. Provisão régia, 15.6.1752. As ordens para.verificação de
certas condutas na residência de funcionários não invalidava que ao fim de seu mandato outras
recomendações orientassem uma devassa em sua atuação. Assim se passa com o ouvidor, cujo
sindicante na segunda residência recebe ordens expressas de informar a respeito de várias de suas
condutas, Ver AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 62, doe. 109. Carta de João Cardoso de
Azevedo, desembargador sindicante, informando ao rei sobre as averiguações feitas acerca dos excessivos despachos que
as custas dos bens do concelho se temfeito e/n Vila Rica, por mandado do ouvidor Caetano da Costa Matoso. Vila
Rica, 26.7.17.53.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Códice 244 , fl. 130v. [Consulta do Conselho Ultramarino, Lisboa, 10
de fevereiro de 1752] .
A tarefa mostrou-se á r d u a e delicada p a r a o sindicante n o m e a d o p a r a tirar a
residência. E r a elevado nas Minas o clima de tensão e m torno d a administração do
m a g i s t r a d o , o q u e tornava o processo, q u e d e p e n d i a de interrogatórios a diversas
pessoas, u m exercício de e n o r m e habilidade p a r a se filtrar possíveis maledicências dos
testemunhos. Á r d u a era a tarefa ainda e m função do volume de queixas que se fizer
r a m à sua atuação. Interesses pessoais contrariados ou dúvidas e m a n a d a s das hierar-
quias superiores com sua atuação, tudo merecia constar da investigação.
O s conselheiros ultramarinos parecem sentir o clima e prenunciar o q u e estava
p a r a acontecer. Soa estranho que a data d a O r d e m régia n o m e a n d o o desembargador
sindicante e o r d e n a n d o a residência anteceda e m p o u c o mais de três semanas sua
prisão, p o r o r d e m da R e l a ç ã o . ^
23

D e qualquer m o d o , e m finais de julho de 1752, o desembargador encarregado


D i o g o C o t r i m d e Sousa chegava a Vila R i c a p a r a dar início ao p r o c e s s o . ^ Se a
2

r a p i d e z d a n o m e a ç ã o de u m sindicante responsável p o r p r o c e d e r a residência do


ouvidor aparentava diligência, as coisas se mostrariam complicadas, O processo n ã o
chegaria a b o m termo, sendo necessário m e s m o se tirar u m a segunda residência. O
primeiro sindicante n ã o consegue executar corretamente o trabalho de averiguação.
As condições e m Minas, c o m o reclamara à distância o ouvidor, n ã o favoreceram o
b o m desempenho do desembargador. O encerramento das investigações, e m agosto
daquele mesmo ano, parece ter sido precoce p a r a tantos rancores latentes. O exame
da investigação pelas autoridades metropolitanas acaba p o r r e c o m e n d a r "nova resi-
dência", A o passar pelas m ã o s do p r o c u r a d o r da F a z e n d a , várias das dúvidas lhe
p a r e c e m sanadas, m a s prevalece entre os conselheiros ultramarinos e procuradores a
opinião d e q u e algumas explicações ficaram p o r ser dadas, sobretudo e m vista das
petições q u e c h e g a v a m da. p a r t ç do juiz de fora d e M a r i a n a e do. bispo, os quais,
parecendo n ã o descansar e n q u a n t o n ã o comprometessem de vez a carreira de Caeta-
n o , são desmascarados pelo procurador da Fazenda, cujas controvérsias transpiravam
d a documentação. M e s m o assim, defende a realização de n o v a residência, a fim de
esclarecer sobre o a r r o m b a m e n t o d a cadeia d e M a r i a n a p r o m o v i d o pelo ouvidor

A execução cie residência aos provedores e oficiais dos defuntos e ausentes fora definida por resolu-
ção régia de 4-12-17.50. Ver APM, CMOP 37, fl. 43v Registro dos itens da residênáa do doutor Caetano da
Costa Matoso [..,]. Ordem, régia de 2 de abril ordena ao desembargador Diogo Cotrim Sousa tirasse
residência ao bacharel Caetano da Costa Matoso. Na ordem, busca-se saber se o sindicado exerceu
o comércio. E pedida uma residência separada para o cargo de provedor dos defuntos, ausentes,
capelas e resíduos. Q registro dos itens e os interrogatórios relacionados a esta parte da residência
foram feitos em outubro ém Vila Rica.Ver os itens desta residência, em APM, CMOP 37, fl. 43v.-
4Ç.
APM. CMOP 63, fl.35. Registro de uma caria que o doutor Diogo Cotrim de Sousa escreveu ã este Senado,
Sabará, 16.7.1752. O juiz sindicante encarregado de realizar a residência do ouvidor avisa de
Sabará que sua chegada provável ocorreria 22 de julho do ano de 1752.
e os habituais problemas ligados ao descumprimento das ordens relativas à cobrança
das oitavas pelas licenças e às propinas que recebiam os oficiais das c â m a r a s . 2 4 4

A razão d e u m a segunda residência seria, assim, justificada pela impossibilidade


de que a primeira delas tivera d e explicar várias das ocorrências que deveriam ter sido
a v e r i g u a d a s . 4 M a s deveria a i n d a averiguar as denúncias especialmente e n c a m i -
2 2

n h a d a s pelo juiz de fora de M a r i a n a , assim como reexaminar "todo o procedimento


do s i n d i c a d o " . ' N a s m ã o s do investigador, chega u m e n o r m e v o l u m e d e acusa-
24 3

ções, denúncias de todos os tipos, p o n t o s obscuros, casos rumorosos. O s três anos


passados desde o afastamento do sindicado p a r e c e m possibilitar u m j u l g a m e n t o mais
sereno sobre, os casos. Mais q u e isto: tirada n a " s u a distante ausência", a segunda
residência consegue alvejar a carreira do ouvidor.
A o longo de pouco mais de u m ano, cerca de 150 testemunhos, tratando d e 43
capítulos que detalhavam inúmeras possibilidades d e m á conduta e desmandos tanto
n a esfera civil q u a n t o eclesiástica, mais d e u m a centena de documentos apensos a o
processo, decerto volumosíssimo, acaba por contar a história do ouvidor a
contrapelo. '*' '
2 4

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, cód. 244, fl. ! 3SV.-139. [Consultado Conselho Ultramarino, Lisboa 7-
6-1753].
Para segunda residência, é nomeado o desembargador Manuel da Fonseca Brandão, por Provisão
régia de 23 de julho de 1754, encarregado de cuidar de vários itens que não teriam sido apropriada-
mente tratados, dentre eles a suspeição que pesava sobre as declarações do juiz de.fora de Mariana,
reconhecidamente um inimigo Fidagal da ouvidor. Na impossibilidade de este ütular e de o substi-
tuto indicado, o desembargador Inácio da Cunha Toar, enfrentarem a tarefa (prognóstico que aliás
se confirmaria), ficava Gomes Freire autorizado a nomear outro desembargador. APM, SC í 05, fl.
198. Sobre ãs primeiras dificuldades para a instalação dessa residência, ver, ainda, AHU, Cons.
Ultramarino, Brasil/MG, caixa 67, doe. 29. Carta do desembargador Manoel Fonseca Brandão dirigida ao
rei respondendo à ordem que llie foi dada para tirar residência ao bacharel Caetano da Costa Matoso
J relativa ao
Rio dejaneiro, 24.2.1755. O desembargador
tempo em que serviu o lugar de ouvidor da comarca de Vila Rica.
alega problemas de saúde e aponta uma série de dificuldades para a execução da ordem decorrente
da falta de clareza quanto às despesas a serem empreendidas. Esclarecimentos são prestados em
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, cód. 239, fl. 198v-200. Consulta do Conselho Ultramarino de 27 de
março de 1756. Em 1755 a 2 de setembro, do Rio Grande, Gomes Freire tomava ciência da decisão
que lhe cabia. Ver APM, SC 105, fl. 193. A ele coube a nomeação do desembargador João Cardo-
so de Azevedo.
Ver o preâmbulo da segunda residência feita pelo desembargador João Cardoso de Azevedo, Vila
Rica, 15 dejaneiro de 1757, em AHU, Cons. Ultramarino., Brasil/MG, caixa 71, doe. 13.
Apesar dos esforços da equipe depesquisa envolvida no projeto, foi debalde a localização do pro-
cesso integral das residências do ouvidor na Bahia, no Rio dejaneiro, em Minas Gerais ou em
arquivos portugueses. Conseguimos obter a súmula final da segunda residência feita pelo
desembargador João Cardoso de Azevedo. Vila Rica, 15 dejaneiro de 1757. Ver AHU, Cons.
Ultramarino, Brasil/MG, caixa 71, doe. 13. Registro aqui o agradecimento à Sr" Dr Maria de a

Lourdes Henriques e à Sr" Dr Teresa Saraiva pelo empenho em localizar o processo nos Arquivos
a

Nacionais/Torre do Tombo.
116

A c u s a ç õ e s q u e até ali s o a v a m c o m e n o r m e g r a v i d a d e , d e n ú n c i a s s u p o s t a -
m e n t e cobertas d e certeza, culpas a p a r e n t e m e n t e inescapáveis q u e t r a n s p a r e c e m
n o vigor flamejante dos libelos acusatórios a o ouvidor d e s m a n c h a m - s e nessa n o v a
residência, q u a n d o certezas t o r n a m - s e dúvidas vagas e a d e b i l i d a d e das p r o v a s
a p r e s e n t a d a s revela-se u m c o n t u n d e n t e registro da força dos r u m o r e s .
Supostos desvios i m p u t a d o s a o ouvidor, c o m o a c o n t u m á c i a d e prisões ile-
gais e sem culpa formada, p r e v a r i c a ç ã o , a p r o v e i t a m e n t o do cargo, suspensões de
m a g i s t r a d o s , d e m o l i ç ã o de casas, e m b a r g o s , c o r r u p ç ã o , f a v o r e c i m e n t o d e p o s i -
ções a protegidos seus, glosas indevidas, abuso de poder,, perseguição aos desafetos,
calote e muitas outras acusações f o r m a m u m inventário de vexações e despotismo.
N o e n t a n t o , essa sucessão de d e s m a n d o s e c o m p o r t a m e n t o s cruéis, cristalizada no
arsenal d e denúncias, disparadas p e l a sua legião de o p o n e n t e s , bispo, juízes ecle-
siásticos e civis, camaristas, c o n t r a t a d o r e s e u m a m u l t i d ã o de outros desafetos, vai
d a n d o lugar a u m a realidade inversa. Eles n ã o se sustentam q u a n d o t e s t e m u n h a s
são ouvidas, e os casos são c u i d a d o s a m e n t e repassados após o t r a b a l h o dos inter-
rogatórios, confronto d e versões e análise dos d o c u m e n t o s . A devassa v a i d e s m o n -
t a n d o os frágeis alicerces das culpas a t r i b u í d a s a C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o ou
fazendo finalmente prevalecer o sentimento corportativo.
A m e d i d a q u e o d e s e m b a r g a d o r sindicante percorre, o s e m - n ú m e r o d e acusa-
ções,, ao lado dos ódios pessoais, e m e r g e m falta de p r o v a s , t e s t e m u n h o s a n c o r a d o s e m
b o a t o s e interesses econômicos, como. o daqueles contrariados p o r suas intervenções
p a r a as melhorias u r b a n a s e m Vila R i c a e M a r i a n a , c o m o os d o n o s de terrenos
d e s o c u p a d o s e d e casas demolidas.
A c a d a u m a das a c u s a ç õ e s , d e p o i s de e x a m i n a r p a p é i s e t e s t e m u n h o s , o
s i n d i c a n t e c o n c l u í a f a v o r a v e l m e n t e ao ouvidor. C a s o r e p r e s e n t a t i v o envolveu a
s e n t e n ç a c o n t r á r i a q u e este d e r a a u m certo M a r c o s M e n d e s ; s e n t e n ç a suspeita,
pois teria sido d a d a a fim de favorecer u m seu c a m a r a d a , m a s q u a n d o o p r ó p r i o
M a r c o s a p a r e c e p e r a n t e o sindicante j u r a o contrário do q u e se dizia, a i n d a "[...]
a b o n a n d o a o m e s m o sindicado p o r u m dos m e l h o r e s ministros dos q u e e m 20
anos tinha nesta c o m a r c a c o n h e c i d o " .
P e r c o r r e o t o m final d a residência a figura dos p o d e r o s o s q u a n d o escapa d o
j u l g a m e n t o final do d e s e m b a r g a d o r sindicante a ardência d e gênio c o m q u e se devo-
tara a e n c a r a r "poderosos, pessoas revoltosas e trapaceiros", c o m o u m a das p o u c a s
ressalvas q u e c a b i a m a sua c o n d u t a . N o contexto das M í n a s , n a m e t a d e do século,
poderosos j á n ã o se referem mais aos p o t e n t a d o s q u e a t a z a n a r a m a coroa nas p r i m e i -
ras d é c a d a s do território. A referência p a r e c e g u a r d a r certa sutileza: qs poderosos
q u e C a e t a n o .enfrenta são as forças concorrentes à fixação da jurisdição da J u s t i ç a
real. 2 4 5

'• Sobre "poderosos", ver SOUZA, Laura de Mello ern Desclassificadas do ouro. A pobreza mineira no
século XVffl. Rio dejaneiro: Graal, 1982. p. 137-140; RAMOS, Donald, op.àt nota31,p. 158-174.
O c u p a m especial atenção do sindicante as denúncias do arqui-rival de C a e t a n o
da Costa M a t o s o , o juiz de fora de M a r i a n a , cujos cinco contos, de t a m a n h a gravida-
de, ajudaram a fazer merecer outra residência. Ali, Silvério Teixeira reunira todo seu
fel: denunciava o ouvidor por ter desrespeitado a ordem que proibia receber as oita-
vas de ouro pela revista das licenças, ter m a n d a d o prender todos os seus desafetos d a
cidade de M a r i a n a . O passar dos anos ali não tinha arrefecido a sede de vingança.
M a s a investigação desmonta o castelo de cartas p r e p a r a d o pelo juiz de fora. Diante
das acusações diversas centradas na cobrança ao arrepio d a lei das oitavas pela reno-
vação das licenças, fica provado pelo sindicante que, de fato, C a e t a n o da Costa Matoso
havia depositado os valores recebidos enquanto a questão estava e m litígio e, c o m a
decisão real,, restituirá aos mercadores as quantias indevidamente pagas. A respeito do
m o t i m decorrente desta cobrança, q u e o juiz p r o c u r a desqualificar c o m o tal a o afir-
m a r que os grupos que tentaram libertar os presos no caminho entre M a r i a n a e Vila
R i c a estavam apenas a c o m p a n h a n d o - o s p o r curiosidade, fica asseverada a real vio-
lência do protesto. M e s m o a atitude d e C a e t a n o da Costa Matoso de m a n d a r q u e 12
soldados de ordenança o acompanhassem p a r a livrar da cadeia os oficiais da C â m a r a
presos pelo juiz de fora, e m b o r a t r a t a d a c o m o excesso^ foi justificada, posto q u e a
prisão n ã o conhecera sustentação legal. O u t r a s acusações contra a conduta do ouvidor
a c a b a m se volatizando sob o reconhecimento pelo sindicante d a recíproca inimizade
e n t r e os dois e das p e r m a n e n t e s p r o v a s de p o u c a civilidade, u m a vez q u e sequer
trocavam cumprimentos.

M e s m o o caso entre q magistrado e o T r i b u n a l d a Relação, que motiva a prisão


do ouvidor p o r n ã o c u m p r i r a sentença do T r i b u n a l d a R e l a ç ã o , o sindicante d a
residência assegura, depois d e consultar a d o c u m e n t a ç ã o do processo, q u e C a e t a n o
da Costa M a t o s o "cumprira inteiramente" todas as exigências legais.
C a r g o cujo exercício atrai legiões d e contrariados, ainda mais q u a n d o conduzi-
do c o m mão-de-ferro, tais acusações p o v o a m críticas q u e c h e g a v a m à M e t r ó p o l e
daqueles q u e se valiam do direito q u e os vassalos d a América d i s p u n h a m de encami-
n h a r súplicas d i r e t a m e n t e a o s o b e r a n o . Nesses a m b i e n t e s d e intensos e m b a t e s
interpessoais, torna-se sempre difícil assegurar-se d e q u e tais denúncias, carregadas de
dramaticidade e exageros, n ã o e r a m instrumentalizadas p o r facções rivais a fim d e
atingir o contendor.
P a r a além das disputas interpares, as inimizades que o cargo atraía faziam surgir
denúncias de despotismo e excesso de sua jurisdição. Alguns supostos agravados pela
ação "despótica" do ouvidor conseguiriam q u e seus apelos chegassem à M e t r ó p o l e .
Apesar do alcance d a queixa ao soberano feita por u m "[...] vassalo oprimido c o m o
procedimento de u m apaixonado ministro [...]", seu efeito parece mais ser o de causar
p e q u e n o s abalos n a carreira do magistrado.
U m a das inimizades mais notórias foi c o m o soldado Valentim Ribeiro d a Silva.
O caso q u e chega ao T r i b u n a l do U l t r a m a r c o m forte conteúdo dramático (como era
c ú m u m a esse tipo de processo) n a r r a violências cometidas pelo ouvidor e m Vila R i c a
contra duas mulheres solteiras forras q u e teriam sido espancadas e feridas p o r oficiais,
sob ordens do Ouvidor, "[...] c o m tal excesso que, executando pessoalmente aquela
violência, deixou as ditas mulheres p o r mortas no maior silêncio da noite [».]". Teria,
a seguir, desconfiado que o furriel da C o m p a n h i a dos Dragões Valentim Ribeiro d a
Silva aconselhara as mulheres p a r a q u e recorressem ao juiz ordinário. Diante disso,
m a n d a prendê-lo por quatro meses, sem culpa formada, segundo a l e g a v a . ^ O caso 24

vazaria na residência, m e s m o p o r q u e o rancoroso Valentim Ribeiro d a Silva insistiria


nas queixas, até q u e o Conselho U l t r a m a r i n o resolvesse p o r m a n d a r através de or-
d e m ã o sindicante d a residência incluir seu c a s o . 2 4 7

A súmula final dessa residência nada mais é que u m retrato do contraste entre a
vasta g a m a de acusações feitas p o r personagens atingidos pelas intervenções do ouvidor
e- a sentença d a lisura do p r o c e d i m e n t o do magistrado, q u e vai d e r r u b a n d o u m a a
u m a . C a e t a n o escapa incólume. N a distância entre o volume de denúncias ferinas e a
sentença final do sindicante, encontra-se a exata m e d i d a dos interesses contrariados e
a inexorável vocação de Justiça do ouvidor.
P a r a a carreira de C a e t a n o , essa auditoria em sua atuação^ ao contrário do q u e se
previa, e m vista d e tantos despachos o r d e n a n d o q u e seus atos constassem e m sua
residência, a c a b a p o r se constituir no libelo de sua inocência. A figura do ouvidor que
emerge é a de um h o m e m justo e p r o b o . M e l h o r sintetizado e m u m dos primeiros
parágrafos d a residência:

"[...] por todas as testemunhas se manifesta ter servido o sindicado o dito lugar
com bom procedimento, fazendo a todos Justiça com inteireza, prontidão, e desinte-
resse, sem que por si ou interposta pessoa fizesse gênero algum de negócio, sendo de
bom acolhimento para as partes, que despachava com muita brevidade; por sem bem
letrado e muito expedito, fazendo finalmente as obrigações do seu ofício com grande
atividade e reto na administração da Justiça e muito limpo de, mãos confessado, ainda
pelos próprios inimigos [...]

Se residências serviam aos olhos d a Metrópole c o m o instrumentos de. avaliação


e, ainda mais, averiguações de certo m o d o intimidatórias à prevaricação de seus fun-
cionários, toda essa certeza parecia se d e s m a n c h a r diante d a distância dos súditos
moradores da colônia em relação ao rei. U m a s das mais duras críticas à idoneidade

'• APM, SC 92, doe. 55. Despacho do conselheiro Joaquim Manuel Lopes.de Lavre. AHU, Cons.
Ultramarino, Brasil/MG, caixa 64, doe, 32. Requerimento de Valentim Ribdro da Silva pedindo que se, lhe
faça a rnercê de nomear um juiz para dar curso ao libelo que interpôs contra o bacharel Caetano da Costa Matoso,
ouvidor na comarca de Vila Rica do Ouro Preto. s.d.

'» AHU, Cons. Ultramarino, Brasil, Gód, 241, ÍL 362.


'• AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG, caixa 71, doe. 13. Segunda residência feita pelo desembargador
João Cardoso de Azevedo. Vila Rica, 15.1.1757.
das residências foi legada pela C â m a r a de M a r i a n a , e m u m a Representação ao rei,
e m j u n h o de 1751. N o auge d a crise c o m o ouvidor, o d o c u m e n t o , p a r a além d e
descortinar c o m especial agudeza as delicadas relações entre c â m a r a s e ouvidores,
deixa v a z a r sérios senões à eficácia desses processos. O documento, e m b o r a suspicaz
diante d a desgastada relação com Caetano da Costa Matoso, retrata a suposta opres-
são de "miseráveis vassalos longe da proteção de Vossa Majestade" diante de ouvidores
que

"[...] das residências fazem pouco caso, porque todas vão subornadas, por se-
rem tiradas por ministros que vêm para os mesmos lugares, e neles se não admitem
queixas, e somente j u r a m os seus sequazes, e para este efeito elegem procuradores,
que há uns de guarda na porta do Sindicante, para não entrarem as queixas, e se por
desgraça entrou algum o sindicante lhe não toma a queixa [...]". 240

E m M i n a s , a manifestação da desconfiança popular sobre a idoneidade das resi-


dências parecia ser u m prolongamento de u m tipo de queixa persistente, ocorrendo
de m o d o muito semelhante u m século antes, sob os primeiros raios da Restauração,
nas cortes d e 1641, os povos p e d e m ao rei que mandasse

"[...] dar ordem com que as residências, que até agora tomavam os letrados uns
aos outros, as não tomem, como até aqui se fazia, pelos inconvenientes que nisso há,
e se tirem suspeitas que, sendo todos de u m a profissão', dissimularão as culpas que
acharem — e que estas residências se tomem por pessoas leigas, que tenham a qualida-
de que para tal caso se requerem. "' 25l)

D e outra parte, os resultados da residência oferecem, indiretamente, possibilida-


de de enxergarmos u m a dimensão peculiar dessa sociedade, a qual, indiscutivelmen-
te, contou p a r a o desgaste da figura do ouvidor: o p o d e r dos r u m o r e s . T o r n o u - s e
notório e m Vila Rica q u e o ouvidor de noite açoitara pessoalmente e c o m e n o r m e

E prossegue o texto propondo: "Isto só se podia evitar sendo estas devassas tiradas em parte públi-
ca, e não em casa do sindicante, e o papel em quê se escrevessem vir rubricado por um ministro que
Vossa Majestade por isso elegesse, e ser numerado, ç o sindicanteficarpbrigado a remeter todo o
papel que acrescesse porque usam de ordinário a escrever em dois papéis, em um ó dito da teste-
munha que favorecesse o sindicado e em outro o dito do queixoso, e para encherem o número das
boas e suprir a falta dos queixosos, mandam vir pessoas postas de mão para completar." AHU,
Çons. Ultramarino. Brasil/MG, caixa 58, doe. 41. Representação da Câmara da Cidade de. Mariana ao rei
dando conta da desobediência de alguns ouvidores de Minas Gerais relativamente ao cumprimento da provisão régia
E crível que o sindicante neste caso, se não guardasse
de 26de outubro de 1750, a respeito das correições.
isenção, ao menos tendesse a ser menos tolerante com Caetano da Costa Matoso, sobretudo pelo
fato de ele ter sido nomeado por Gomes Freire, com quem o ouvidor entrara em rota de colisão.
Ver APM, SC 105,11. 193.
Cap. LX dos povos, J. J. A. S., 36. Citado por HESPANHA, António Manuel, op. cit. nota 100, p.
520.
120

violência algumas prostitutas c o m as quais se indispusera. O motivo d e ato tão igno-


minioso havia sido o desaforo d e terem usado d a c a m a do ministro c o m u m de seus
criados, q u a n d o aproveitaram p a r a roubar o dono d a casa. Pior que tudo isso (e que
parecia ser o que causara o maior ódio ao ouvidor), saíram gabando-se e m público
dizendo q u e de agora em d i a n t e qualquer u m que quisesse algum despacho poderia
procurá-las, em u m registro b e m - h u m o r a d o que contrastava c o m a sisudez do magis-
t r a d o . N a conclusão da residência, o sindicante, diante do caso, n ã o consegue u m a
alma sequer q u e testemunhasse ter visto a cena, e m b o r a q u a s e todos os 150 testemu-
nhos se referissem ao caso. A geral fama assumia contornos d e v e r d a d e . * 25

A figura do ouvidor que emergia desses r u m o r e s parecia ter predileção pelos


açoites públicos, pois t a m b é m de ouvida geral n ã o foram poucos os q u e afirmaram
q u e m a n d a r a p r e n d e r e açoitar alguns mulatos forros e escravos "[...] pela malignida-
d e desenvoltura e, descortesia c o m q u e t r a t a v a m aos h o m e n s b r a n c o s , c o s t u m a d a
nesta qualidade d e gente [ . . . ] " . 252
Preconceito e boato apareciam reunidos p a r a con-
firmar supostas verdades. O u t r o caso do mesmo tipo fala de u m h o m e m , sobrinho de
u m p o t e n t a d o local, que, fora visto ser preso p o r o r d e m do ouvidor e m virtude de
"[...] n ã o tirar o chapéu a o sindicado vendo-o na janela das casas e m q u e assistia." -' 2 3

E n ã o p o d e r i a m faltar suspeitas picantes com relação às suas condutas amorosas. C h e -


ga ao desembargador a infoiiriação de que C a e t a n o da Gosta M a t o s o teria tido ami-
zade ilícita com a. mulher do seu fiel escrivão, Pedro de L i m a C u r a d o . N a averigua-
ção, mais u m a vez, o caráter de boato p a r a a notícia se confirma, q u a n d o três testemu-
nhos d e p õ e m a respeito de ouvida v a g a . 2 5 4

O s boatos q u e e m e r g e m n a devassa d a residência c o n t a m u m a outra história;


projetam n a mentalidade coletiva certezas que pareciam vestir perfeitamente no figu-
rino do ouvidor: zelo pelo exercício de sua jurisdição, aversão pela desordem, vee-
m ê n c i a n a execução das prisões, zelo pela hierarquia e pelos rituais, austeridade.
Essas eram, sim, suas qualidades assumidas ao longo de sua c o n d u t a e m Minas. O
r u m o r recriava o m u n d o pelo avesso,

• AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG Caixa 71, doe. 13. [Segutida residência] feita pelo desembargador
João Cardoso de Azevedo. Vila Rica, 15 de janeiro de 1757.
• AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG Caixa 71, doe. 13. [Segunda residência] feda pelo desembargador
João Cardoso de Azevedo. Vila Rica, 15 de janeiro de 1757.
AHU, Cons.. Ultramarino, Brasil/MG Caixa 71, doe. 13. [Segunda residência] feita pelo desembargador
João Cardoso de Azevedo. Vila Rica, 15.de janeiro de 1757,
'- AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG Caixa 71, doe. 13. [Segunda, residência] feita pelo desembargador
João Cardoso de Azevedo. Vila Rica, 15 dejaneiro de 1757..
"Só falam n a dita ardência de gênio e atividade p a r a os p o d e r o s o s . " 2 5 5
Com
essas palavras, o desembargador q u e fizera a sindicância p a r a tirar a segunda residên-
cia p a r e c i a buscar justificar o rosário d e acusações i m p u t a d a s à a t u a ç ã o d o d o u t o r
C a e t a n o da Costa Matoso nas Minas.
A frase encerra aspectos q u e , a esta altura, n ã o possuem originalidade p a r a o
leitor paciente que chegou até aqui. Aquilo que cumpre reter é a percepção de q u e os
traços de sua personalidade e e m p e n h o profissional n ã o tiveram significados despre-
zíveis p a r a e n t e n d e r os conflitos que se sucederam n a capitania. A o contrário, e m
Minas, a atividade d o bacharel cumpria u m a experiência d e lealdade ao rei aprendi-
da nos bancos d e Coimbra. N a q u e l a Universidade, e m grande p a r t e graças às lições
ensinadas pelo jurista espanhol Francisco Suárez, e m fins do século X V I I , o j o v e m
estudante de leis entendeu c o m os jesuítas d o Colégio de São Paulo q u e magistrados
e r a m funcionários d o rei, e n ã o funcionários civis. Seu p o d e r provinha d a C o r o a , e
não d a c o m u n i d a d e a q u e s e r v i a . ^ Esse princípio, q u e de resto sustentava a subor-
25

dinação d a burocracia a o rei, norteou a ação d o intrépido ouvidor n o ultramar. A


ascensão dos letrados e m Portugal ocupara papel fundamental, u m a vez que a execu-
ção de u m a política de bem-estar dos súditos vai d e p e n d e n d o e m larga m e d i d a de
u m a b ó a justiça do rei. N a s palavras d e S t u a r t Schwartz, " A magistratura tinha-se
t o r n a d o a espinha dorsal do governo real tanto n a s colônias q u a n t o n a M e t r ó p o -
le." 2 5 7
L e m b r e m o s a i n d a q u e a seleção dos ouvidores pelo D e s e m b a r g o d o P a ç o
assegurava a confirmação de u m critério profissional nesta escolha, j á q u e guardava
certa independência e m relação à realeza. Magistrados, m e s m o e m sua extrema leal-
dade a o rei, seguiram caminhos próprios o n d e o domínio pleno dos segredos e dos
m e a n d r o s d a legislação favorecia certa tendência à a u t o n o m i a . N ã o seriam assim
estranhas ao p a d r ã o de c o n d u t a desse g r u p o , e m q u a l q u e r l u g a r d o I m p é r i o q u e
fosse^ as atitudes q u e Caetano d a Costa Matoso tomou.

Estaria forjada a têmpera q u e o ouvidor Costa Matoso empregaria para enfren-


tar bispos, governadores, juízes ordinários, desembargadores d o T r i b u n a l d a Rela-
ção, conselheiros ultramarinos. Nascia, à beira do M o n d e g o , a altivez que se revelaria
nos magistrados de Minas, inaugurando u m a conexão q u e seria ainda muitas vezes
percorrida.
Até aqui quase sempre vistas c o m o provas de sua ardência de gênio, e m virtude
do e m p e n h o q u e dedicava ao c u m p r i m e n t o de seus princípios, e atividade p a r a os
poderosos, e m decorrência dos interesses locais que contrariava, os ouvidores " p r o -

255. AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/MG Caixa 71, doe. 13. [Segunda residência] feita pelo desembargador
João Cardoso de Azevedo..Vila Riea, 15 de janeiro de 1757.,
SCHWARTZ, Stuart B. Burocracia e sociedade no Brasil colonial. A Suprema Corte da Bahia e seus
juízes: 1609-1751. Perspectiva, 1979. p. 61.
- Idem, p. 57.
2 5 7
c u r a v a m i m p o r o domínio d a coroa", conforme j á salientou M a r c o s Magalhães de
A g u i a r ^ e m afirmação que, de certa, forma, sintetiza as interpretações correntes so-
25

b r e a ação d a justiça real nos primeiros tempos de Minas.


S e é inegável q u e agiam neste intuito, parece lícito considerar ainda que, inte-
grando a administração periférica, as iniciativas desses ouvidores traduziam o reforço
à tendência de a u t o n o m i a desse grupo c o m sentido decisivamente corporativo. A o
l a d o d a missão d e i m p o r às formas d a justiça real estava t a m b é m o e m p e n h o da
magistratura letrada e m definir aquilo que António M a n u e l H e s p a n h a e m sua crítica
ao p a r a d i g m a estadualista assim iluminou: "[...] o c o r p o dos oficiais deve ser visto
nesta época, n ã o c o m o u m instrumento n a disponibilidade d e u m q u a l q u e r outro
p o d e r político, m a s c o m o u m centro a u t ô n o m o de p o d e r " . ^
2

N a s terras mineiras n a primeira m e t a d e do século X V I I I estaria sendo travada


u m a luta que trazia prolongamentos do século anterior, e m que a magistratura letrada
construía com tenacidade as condições de sua autonomia corporativa sob as institui-
ções do Antigo Regime português. T a l era a base q u e orientava o acirrado grau de
conflito que envolveu a atuação d e C a e t a n o da Costa Matoso introduzindo na mes-
m a p r o p o r ç ã o desequilíbrios c o m tão largo espectro: fricções c o m a administração
eclesiástica (tomada de conta das irmandades, julgamento sobre expulsão de padres;
desentendimentos c o m outros segmentos da aministração civil real, c o m o o governa-
dor; pressão sobre p p o d e r e a a u t o n o m i a concelhia (precedência da magistratura
local, rubricas nos livros); desequilíbrios intracorporativos q u e se e n c a m i n h a m e m
duas direções: a submissão da magistratuta local e suas leis costumeiras e a preserva-
ção de prerrogativas j u n t o a alta magistratura colonial (Tribunal d a Relação).
Se cumpria firmes orientações, protegido pela a u t o n o m i a da corporação a que
pertencia, e lhe sobravam erudição, formação jurídica e conhecimento p a r a interpre-
tar leis, faltavam-lhe, p o r é m , certo p r a g m a t i s m o e dissimulação p a r a conduzir sua
carreira a grande distância do soberano. E m sua prática é gosto de bacharel, ã manei-
ra desabrida, c o m q u e enfrentava autoridades de igual o u m a i o r quilate q u e o seu,
apenas assegurado pela força das leis que interpretava e executava, revelou toda sua
fragilidade q u a n d o se viu c e r c a d o pelos soldados e cães, e x t e r m i n a d o das M i n a s ,
destituído d o oficio que vinha o c u p a n d o e levado preso p a r a a cidade do Rio, onde
viveria meses, d e autêntico exílio.
A franca animosidade com o bispo de M a r i a n a n ã o obedecia a cuidados reco-
mendáveis à b o a razão política, ainda então q u a n d o se vivia e m domínios coloniais,
c o m o soube orientar G o m e s Freire a seu irmão, J o s é Antônio Freire de A n d r a d e , e m
sua Instrução de fevereiro de 1752. Passando n a ocasião o posto d e lugar tenente do

AGUIAR, Marcos Magalhães de, op.cit. nota 73. p. 154.


259
-- HESPANHA, António Manuel, op\. cit nota 100, p. 276.
governo d e M i n a s , r e c o m e n d a v a , então: "Deveis concorrer p a r a o gosto do bispo,
fazendo-lhe tudo o q u e n ã o p o d e ofender a vossa consciência e a vossa h o n r a . " C o m
os padres, advertia q u e todo o cuidado era pouco: "[...]a todos os eclesiásticos deveis
tratar com grande atenção e respeito, e c o m o não são vossos súditos, contemporalisai-
os [sic], pois t o m a m sobrada liberdade e m m u r m u r a r , e às vezes sem temor d e falta-
r e m à verdade e à religião", concluindo c o m u m conselho q u e n ã o poderia ser segui-
do pelo ouvidor: "o menos trato e a m e n o r atenção com esta gente é o mais próprio
meio d e viver c o m eles", * 26t

M e s m o a recomendável boa convivência com G o m e s Freire entraria e m colap-


so. A antipatia c o m o ouvidor seria assunto de diversas recomendações nas Instruções,
onde, c o m inegável tranquilidade, diz a o irmão: " D o ouvidor d e Vila R i c a j á vos
disse o seu caráter, é c o m o entendo lhe chega o sucessor n a frota, p o u c o o t e m p o o
tratareis",, sem deixar de advertir q u e adote "política de q u e ele se n ã o queixe d e
vós",261
A troca d o m é t o d o d e c o b r a n ç a do quinto p a r a o das Casas d e F u n d i ç ã o e
d e r r a m a asseguraria novos ingredientes a essa hostilidade, pois os ouvidores e m Mi-
nas são colocados sob suspeita, associados ás resistências, à implantação das casas de
fundição e à d e r r a m a . 2 6 2
O elo entre G o m e s Freire e o ministro Sebastião J o s é de
Carvalho apostaria nesse envolvimento. O temor das atitudes de C a e t a n o da Costa
Matoso vai se. delineando nesse contexto de arrecadação do quinto, em que pesavam
os riscos políticos que implicavam a derrama. A introdução desse recurso fiscal trans-
feria p a r a os poderes locais parte substancial da responsabilidade c o m a arrecadação
do quinto, pois se as intendências e casas de fundição vinculavam-se à esfera do p o d e r
real a repartição do déficit anual daquele direito ficaria à cargo das câmaras, q u e se
viam às voltas c o m a obrigação d e distribuir o ônus e cobrá-lo. O s primeiros anos do
novo sistema p r o p o r c i o n a m grande instabilidade nas autoridades metropolitanas, c o m
a certeza do sucesso d e u m método que, em larga medida, dependia d a aceitação dos

INSTRUÇÃO e norma que deu o Ilmo..e Exmo. Sr. Conde de Bobadela a seu irmão, o preclaríssimo
sr. José Antonio Freire de Andrada, para o governo de Minas, a quem veio suceder pela ausência
de seu irmão, quando passou ao sul (1752). Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, v. 4, p.
729-730,. 1899.
INSTRUÇÃO e norma que deu o limo. e Exmo. Sr. Conde de Bobadela a seu irmão, o preclaríssimo
Sr. José Antonio Freire de Andrada, para o governo de Minas a quem veio suceder pela ausência de
seu irmão, quando passou ao sul (1752). Revista do Arquivo, Publico Mineiro, Belo Horizonte, v. 4, p.
729-730, 1899.
As relações com o conde de Bobadela já teriam se complicado. A altivez do ouvidor é motivo de
queixa do governador general certa vez quando este, depois de não ver atendido um pedido de
informação que fizera ao ouvidor, queixa-se dizendo "não ser seu súdito". AHU Cons, Ultramari-
S

no, Brasil/MG, caixa 71, doe. 13. [Segunda residência] feita pelo desembargador João Cardoso de Azevedo.
Vila Rica,. 15.1.1757.
124

colonos.. Nesse contexto, t u d o faz crer que a p r e s e n ç a d e magistrados altivos, q u e


por muito menos costumavam argüir as ordens reais, poderia c o m p r o m e t e r o projeto
maior d a F a z e n d a real. Recursos legais, embargos, e n c a m i n h a m e n t o d e representa-
ções ao soberano configuravam u m a luta surda nos bastidores entre os oponentes ao
sucesso d a d e r r a m a e das Casas d e F u n d i ç ã o e os principais executores d a política
colonial. E o temor d e que as câmaras mineiras estivessem sendo instruídas p o r magis-
trados c o m p r o m e t i d o s g a n h a v a espaço. Valia, p o r t a n t o , a advertência q u e faria o
governador ao subscrever as palavras de seu secretário a respeito dos ouvidores: "Tor-
no a segurar que as câmaras quase sempre seguem, a p r o v a m e fazem o q u e lhe influem
os ouvidores, e se n ã o vierem zelosos, p r u d e n t e s e desinteressados o d a n o q u e se
segue é considerável [ . . . ] " . ^ .Desta vez, nas resistências aos impostos que e n t r a n h o u
a prática políüca nas Minas, temia-se mais os. advogados q u e as turbas de amotinados
q u e destruía papéis e atacava autoridades.
D i a n t e do b r a d o concertado das c â m a r a s mineiras c o n t r a o n o v o m é t o d o , a
figura dos ouvidores seria definitivamente colocada n a m i r a das s u s p e i t a s . 264
Sob a
desconfiança d e estarem alinhados entre aqueles q u e se o p u n h a m à implementação
das casas de fundição e d e r r a m a , em carta a G o m e s Freire, Sebastião J o s é de Carva-
lho manifesta estranheza diante de tantas representações de várias comarcas contra as
novas medidas, suspeitando q u e alguns dos magistrados fossem os responsáveis p o r
esses requerimentos. M a s vaticina que:

"[.,.] logo a inconstância dos povos se h á de sossegar sem tanto descômodo de


[ilegível] principalmente se os ouvidores e mais ministros de Justiça forem dos que Sua
Majestade costuma escolher, pois que aqui consta que o orgulho de alguns destes que
têm esta profissão, a demarcada influência que todos eles têm nas câmaras, são as
causas ocultas que produzem fenômenos semelhantes às representações de que falei
acima."**

N a correspondência trocada, a desconfiança c o m a figura dos ouvidores foi se


consolidando. Ali, a preocupação com as representações das câmaras a o rei ocupava
especial destaque. Esse recurso q u e as câmaras d i s p u n h a m de petição direta ao rei
criava situações delicadas, n a m e d i d a e m que, sob intenso jogo de barganhas e nego-
ciações daqueles primeiros anos de implantação das casas de fundição, ele segurava a

ANRJ, cód. 80, vai* 9, fl. 73-73v. [Cartas de Gomes Freire] para o Secretário deíEstado Sebastião José de
Carvalho e Melo sobre várias matérias pertencentes a capitania de Minas Gerais. Rio de Janeiro, 17.1.1752.
Códice Costa Matoso, documentos 54 -60.
AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15199. Carta de Sebastião José de Carvalho
20.9.1751.
para Gomes Freire.
remessa da arrecadação n a esperança de alcançarem a benevolência real. D i a n t e dis-
so, G o m e s Freire tentava reagir d e p r o n t o , t r a t a n d o de d e m o v e r a e s p e r a n ç a dos
insatisfeitos ao tornar logo público q u e Sua Majestade "reprovara as representações
das câmaras", tendo ordenado quê fizesse á cobrança das cem arrobas. Se n ã o fosse
esta reação, explicava ao secretário de Estado, "iam p a r a n d o as Casas d e Fundição",
convictos de q u e estavam os mineiros "[...] n a infalível esperança de Sua Majestade
atender as suas representações, e nesta segura opinião tem retido e m si o ouro até a
chegada da frota [ . . . ] " 266

D i a n t e disso, n ã o é, difícil saber se a estranha e s u m á r i a o r d e m d e prisão do


T r i b u n a l d a Relação contra C a e t a n o da Costa Matoso e a imposição d e u m período
d e "silêncio no seu exílio em terras, cariocas teriam, sido ou n ã o atitudes premeditadas.
O curto-circuito que ocorreria còm à prisão de u m ouvidor-geral de comarca p a r e c e
ter se originado n a suspeita de seu envolvimento c o m os protestos das c â m a r a s minei-
ras a partir da lei sobre a cobrança dos quintos de 1750. S u a intervenção, e m b o r a não
tenha ferido os direitos legais de sua função, feriu de morte as expectativas urgentes de
ganhos e rendimentos oriundos da economia colonial. P a r a a Metrópole, que depen-
dia Cada vez mais do ouro gerado na América portuguesa, as querelas jurídicas no
terreno da tributação deveriam ser estancadas sob o risco dos embargos das causas e
das representações virem a bloquear o necessário ingresso do n u m e r á r i o d a F a z e n d a
real e do bispado mineiro.
A presença da persona, mesmo alguns meses, após o afastamento do ouvidor d e
Vila Rica, e m j u n h o de 1752, e. sua prisão n o R i o d e J a n e i r o m a n t i n h a m acesa a
indisposição de G o m e s Freire. Referindo-se ao episódio e m que o ouvidor a r r o m b a -
ra a cadeia de M a r i a n a , o c o n d e envenenaria a imagem do ouvidor, agora j u n t o a
Diogo dc M e n d o n ç a , c o m graves acusações, ao afirmar que quase conseguira ali " u m
c o m p l e t o l e v a n t a m e n t o n a q u e l e p o v o " , n ã o fosse a interferência d o j u i z d e fora..
Reforçando as motivações de caráter pessoal na c o n d u t a do magistrado diria: "[...]
p o r q u e [a] força c o m que aquele ministro vexa é excessiva; c o m o n ã o foi despachado
n a R e l a ç ã o , o u r e c o n d u z i d o c o m o esperava, seguro n a p r o t e ç ã o de seus g r a n d e s
valedores."
E concluía sua obra de detração c o m u m apelo q u e se repetia:

"[...] rogo aos reais pés de Sua Majestade é que no tempo que for servido
mandar-me o sirva desta parte e me não dê semelhantes gênios a sofrer; os discursos,

ANRJ, cód. 80, vol. 9, fl. 73. [Cartas de Gomes Freire]para o secretário de Estado Sebastião José de Carvalho
e Melo sobre várias matérias pertencentes a capitania de.Minas Gerais. Rio de Janeiro, 17.1.1752.
126'

os termos agravantes porque este ministro falava seria difícil os sofresse governador,
que não houvesse pesado tanto como eu a ruína que trazem questões e parcialidades." 267

E m hora tão delicada, parecia ir-se tornando premente o afastamento de ouvidores


renitentes. A habilidade de G o m e s Freire estava ali e m erigir h a persóna de Gosta
M a t o s o a figura que orientaiia dali e m diante n a política de nomeações p a r a o ultra-
m a r magistrados subordinados aos governadores.
Por outro lado, se a formação jurídica ajuda a explicar a trajetória do ouvidor,
transformações mais amplas se desenrolavam n a aclministração d a Justiça d a América
portuguesa, que, c o m o n ã o poderia deixar de ser, atingiam M i n a s e m cheio. Desde
finais do século X V I I , inaugurava-se nova orientação p a r a a Justiça colonial, c o m a
gradativa introdução de magistrados reais profissionais p a r a atuar no âmbito local sob
u m a estrutura administrativa p e r m a n e n t e , pretendendo-se q u e estes funcionários tra-
zidos de Portugal p o r n o m e a ç ã o real estivessem livres das pressões locais. E m toda a
América, a n o m e a ç ã o de ouvidores p a r a as capitanias tendeu a representar a sentença
de morte n a autonomia das câmaras, u m a vez q u e esses magistrados possuíam entre
suas funções o a c o m p a n h a m e n t o das atividades dos concelhos. A obra d e limitação
d a autonomia das câmaras ficaria ainda mais sedimentada c o m as nomeações de juiz
de fora p a r a o ultramar, desde então, os responsáveis pela presidência dos trabalhos
das câmaras principais, e m lugares outrora ocupados pelos juízes ordinários. ^8 Suce- 2

dem-Se n o m e a ç õ e s p a r a juízes de fora e m cidades c o m o O l i n d a , R i o de J a n e i r o e


Salvador. As capitanias g a n h a m ouvidores gerais, e Minas, a partir de 1714, ostenta
ouvidores e m q u a t r o d e seus distritos (Vila Rica, S a b a r á , R i o das M o r t e s e S e r r o
Frio), além do juiz de fora e m Ribeirão do C a r m o e u m magistrado no posto d e
intendente geral p a r a as minas d e cliamante. 2
A o perspicaz Rodolfo G a r c i a n ã o
escapa com essa operação a reformulação d e u m p a d r ã o do exercício do Direito:

AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Castro e Almeida, n. 15558-15560. Oficio do governador Gomes
Freire de Andrade. Rio Grande de São Pedro, 2.6.1752. Não seria a única vez que aproveitaria para
fazer esse tipo de referência ao ameaçador magistrado. Em carta escrita em julho do ano seguinte
para Sebastião José de Carvalho e Mello mostrar-se-ia incomodado com a presença do bacharel,
ainda que preso: "O ouvidor que foi de Vila Rica Caetano da Costa Matoso, se não mudar de
conduta é incapaz de se lhe. fiar o governo dos homens; se tivera achado partido era Vila Rica
haveria feito na ocasião das juntas sensível desordem," AHU, Cons. Ultramarino, Brasil/RJ, Cas-
tro e Almeida, n. 16126. Carla particular de Gomes Freire de Andrade para Sebastião José de Carvalho e Mello.
Colônia, 28.7.1753.
ALDEN, Dauril, op. clt. nota 78, 1968, p. 423-4). Ver também, para uma probleniaüzação em
torno das atribuições judiciais das câmaras, WEHLING, Arno. Atividade judiciária das câmaras
municipais na colônia — nota prévia. In: Colóquio de Estudos Históricos Brasil Portugal. Belo Horizonte:
.PUC/MG, 1994. 161-174; RUSSEL-WOOD, A. J. R. O governo na América portuguesa: um
estudo de divergência cultural. Revista de História, São Pauto, v. 55, rí. 109, p. 25-79, 1977.
SCHWARTZ, SluartB., op. cit. nota 255, p. 205-6.
" O juiz de fora era geralmente letrado, ou antes nutrido no direito romano,
legislação muito patrocinada pelos príncipes, por causa do predomínio que lhes asse-
gurava no Estado, ao. revés do juiz ordinario, que administrava Justiça ãos povos,
tendo em vista o direito costumeiro, os forais, que não podiam ser do agrado do poder
real, nem dos juristas romanos a seu soldo." " 27

O fato de esses novos magistrados serem reinóis, acrescido ao fato d e subtraírem


funções dos juízes ordinários, de serem letrados e de se instalarem e m postos de maior
p o d e r e controle frente à c â m a r a e aos juízes locais contou certamente p a r a antipatizá-
los c o m a comunidade, o n d e i a m trabalhar.
Assim, conflitos entre ouvidores e juízes ordinários refletiam, e m última análise,
a continuidade d e u m a centralização do p o d e r metropolitano n a colônia através das
instâncias j u d i c i á r i a s . ' J u í z e s ordinários t ê m sua a t u a ç ã o restringida d i a n t e dos
2 7

ouvidores e, ainda, juízes de fora. A magistratura real, profissional, letrada e coimbrã


vinha e m u m processo firme de subordinação da baixa magistratura colonial:

"Melhor conhecimento da legislação e da jurisprudência e maior identificação


com os objetivos das autoridades administrativas levavam a um confronto relativa-
mente freqüente como demonstra a documentação, quer com as câmaras como u m
f

todo, quer com seus juízes ordinários."^ 72

A iniciativa de introduzir magistrados profissionais consegue definir u m a estrutu-


ra judiciária mais firme, m a s inaugura fricções entre esse grupo, c o m o vimos, alimen-
tado p o r certa altivez gestada nós bancos de C o i m b r ã , è outros funcionários d a admi-
nistração colonial, discutindo decisões do T r i b u n a l d a Relação e atacando governa-
dores. Conflitos c o m o os que viveu C a e t a n o d a Costa Matoso nas Minas j á v i n h a m
desde, h á m u i t o se repetindo e m outras praças, n ã o raro p e s a n d o sobre os juízes a
pecha de protegidos do Desembargo do Paço " E m 1725, o vice-rei do Brasil, C o n d e
dê Sabugosa, queixou-se a o Conselho Ultramarino das ' d e s o r d e n s d o o u v i d o r ge-
1

ral d a P a r a í b a , dos ' a b s u r d o s ' dos magistrados d e Alagoas e Sergipe d'el R e i , dos

'- GARCIA, Rodolfo, op. cit. nota 98, p, 35.


• Neste particular, o processo de centralização da política colonial parece não guardar correspon-
dência com o Reino, onde, a se tomar a crítica de Antônio Manuel Hespanha à historiografia lusa
de sentido "estadualista", a nomeação de corregedores e juizes de fora não se revertiam a favor do
fortalecimento do poder da coroa. Op. cil. nota 100, p. 196-205
'• WEHLING, Arno, op. cit. nota~265,p. 168.
'excessos' do o u v i d o r geral d e S ã o Paulo e do c a s a m e n t o ilegal d o m a g i s t r a d o real
do Rio de J a n e i r o . " , compila Stuart S c h w a r t z . ^ 2

Dessa forma o cenário administrativo com o qual C a e t a n o da Costa Matoso se


3

d e p a r o u e m Vila R i c a combinava elementos q u e v i n h a m se processando h á algum


t e m p o e outros q u e apareciam quase naquele m e s m o instante. Se os ouvidores desde
fins do século anterior j á haviam se tornado os principais instrumentos de subordina-
ção das câmaras, que até ali se aproveitaram o quanto p u d e r a m da o n d a de autono-
m i a concedida n a esteira da Restauração, p o r outro lado delineava-se a disputa d e
jurisdição e n t r e a J u s t i ç a real e o p o d e r eclesiástico. O conflito, q u e alguns juízes
ordinários, devidamente a m p a r a d o s pelas Ordenações Filipinas, j á haviam e m datas
remotas enfrentado, reaparece sob novas cores no e m b a t e entre o ouvidor de comarca
e o bispo de M a r i a n a . Vale de qualquer m o d o p a r a esse período a assertativa de. A r n o
Wehling, q u e Caio Boschi j á adiantara:

"Tal procedimento legal [a restrição da interferência eclesiástica na jurisdição


dos juízes ordinários] derivava da política absolutista de eliminar ou confinar a ação
concorrente dos poderes senhoriais e eclesiásticos, exacerbando-se nas épocas de cen-
tralização e mais acentuado regai ismo."^ 74

Por outro lado, o espectro de venalidade que rondava os ofícios reais na Améri-
ca portuguesa n ã o eximia de forma alguma aqueles q u e ocupavam os cargos d a j u s -
tiça. E m alguns momentos, o exercício da Justiça pareceu ocupar muito mais o p r o -
g r a m a político dos reis e d e seus tribunais do que constituir u m a prática levada a b o m
termo p o r seus administradores. Muitos desses funcionários c u i d a r a m de aproveitar a
o p o r t u n i d a d e q u e a proximidade efêmera dos negócios coloniais lhes oferecia p a r a
estabelecer fontes de rendimentos e x t r a s . ' ' T r a t a n d o dos oficiais de J u s t i ç a n o m e a -
2 5

dos' p a r a os postos no u l t r a m a r , T o m é Pinheiro d a V e i g a colocava a situação d e

SCHWARTZ, Stuart B. op, cit. nota 255, p. 185. Outros maus exemplos de ouvidores e magistra-
:

dos portugueses assim como os atritos entre autoridades locais e juízes da Relação e as dificuldades
da administração da Justiça na Bahia colonial, podem ser encontrados também em RUSSELU-
WOOD, A.J..R. Fidalgos efilantropos. A Santa Casa de Misericórdia da Bahia, 1550-1755. Brasília:
Edunb, 1981. p. 185-203. e FIGUEIREDO, Luciano Raposo de Almeida. Revoltas, fiscalidade e.
identidade na América portuguesa: Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais, 1640-1761.São Paulo: Uni-
versidade de São Paulo, 1996, p. 295-306.
WEHLING, Arno. op. cit. nota 265. A historiografia portuguesa recente tem sido crítica com rela-
ção a esse esquema interpretativo. Ver, dentre outros, MONTEIRO, Nuno Gonçalo. Os conce-
lhos e as comunidades. In: Mattoso, José (Dir.), op. cit. nota 37, p. 303-331.
O tema é objeto de amplos estudos de Eriist Pijning: Conflicts in the portuguesé colonial
administration: trial and errors of Luís Lopes Pegado e Serpa, provedor-mor da Fazenda Real in
Salvador, Brazil, 1718-1721. In: Colonial Latin American Historical Rana», 2:4, p. 403-423, 1993 e
Controlling contraband: mentality, economy and society in eighteenth-century, Rio de Janeiro.
Baltimore: Thejohns Hopkins University, 1997.
forma crua ao dizer "[.. J que o juiz de fora q u e vai ao R i o de J a n e i r o n ã o o leva o zelo
e ânimo d e ir fazer Justiça aos moradores, senão de c o m o h ã o de trazer as caixas d e
açúcar, dinheiro e t a b a c o . " 2 7 6

Seria insuficiente e n t e n d e r os conflitos e desgastes desse ministro a partir das


disputas d e jurisdição, antipatías pessoais ou de sua obstinação, e m b o r a esses elemen-
tos t e n h a m contado p a r a a crise de forma determinante. N e m sua história seria única,
n e m sua experiência p o d e r i a ser e n t e n d i d a apenas a partir de suas manifestações
aparentes e cores locais. E m verdade, a execução da Justiça no ultramar (assim como,
de resto, todas as esferas executivas da política colonial) encontrar-se-ia condicionada
p o r u m complexo q u a d r o e m que, concorriam contradições inerentes ao Reino c o m o
venalidade, as querelas de jurisdição, as superposições de f u n ç õ e s , 277
q u e apareciam
potencializadas n a colônia e ainda mais nas regiões de colonização recentes, o n d e
presidiam padrões de sociabilidade diferenciados, rebaixamento de hierarquias, u m
q u a d r o a g u d o de poderes concorrenciais, p o d e r c o n c e n t r a d o e m poderosos locais,
dificuldades materiais p a r a o exercício dos ofícios e, n o c a m p o das disputas legais,
ferrenhas disputas p o r jurisdições respaldadas no direito costumeiro.

A experiência pessoal d e alguns desses funcionários e m postos u l t r a m a r i n o s


mostraria que se. encontravam espremidos entre os deveres dos cargos e as limitações
q u e a colonização portuguesa criara, cobrando n a conta de suas vidas e trajetórias a
fatura de suas próprias contradições. O m o d o como se processou e vinha se proces-
sando no Império colonial português a conquista dos territórios, o n d e à concessão d e
prerrogativas iniciais aos agentes colonizadores sucedem firmes esforços de controle e
reparação pelo Estado colonizador e m u m movimento de "colonização dos colonos",
tornava a r d u a m e n t e negociada ã imposição do P o d e r Real e m sua plenitude. Esta
tensão está longe d e se limitar a o alvorecer das conquistas ultramarinas, m a s ressurge
tantas vezes quantas se reinforça este p a d r ã o de conquista e novos fossem os territórios
a se conquistar pela grei. Compreende-se a impossibilidade, muitas vezes, do simples
cumprimento dos regimentos dos cargos no Brasil colônia, fazendo parecer u m a rea-
lidade inalcançável o m o m e n t o ideal em q u e regimentos seriam cumpridos in totum
no desejado engate do sucesso do controle imperial sobre a colônia.
Dessa trajetória conturbada de u m magistrado colonial, o que emerge, pelo seu
caráter elucidativo, n ã o são os conflitos locais, mas a freqüência das indisposições do
ouvidor c o m a Metrópole. Desgastado c o m as maiores autoridades coloniais, civis e
eclesiásticas, sob desconfiança no Brasil e no reino, alvo da alta magistratura n a Rela-
ção, desgastado c o m o Conselho Ultramarino, antipatizado c o m as câmaras, objeto

'* BNL, Res., cód. 7627, fl. 149. Governador do Rio de Janeiro sobre [maus?] ministros letrados, Lisboa,
14.9,1653.
* SUBTIL, José Manuel Louzada Lopes, op. cit. nota 235; HESPANHA, Antônio Manuel, op. ãt.
nota 100.
130

d e p r e o c u p a ç ã o d o n o v o m i n i s t r o r e a l , sob t o d a a d e s c o n f i a n ç a q u e o c e r c a r a ,
o u s a r a a i n d a m a i s : interferir n a e x p e c t a t i v a das r i q u e z a s coloniais q u e a n o v a
f o r m a de c o b r a n ç a do quinto a n i m a v a . Elas d e s e n h a m a s indefinições e os limites
d a o r d e n a ç ã o colonizadora diante tanto do b a c h a r e l , cuja cultura letrada a r g u i a as
o r d e n s reais e sua execução, q u a n t o do ouvidor, q u e restaura a jurisdição real. A
a m b i g ü i d a d e dessas circunstâncias - d i t a d a pelos limites da c o n d i ç ã o colonial —
c o n d u z i u o o u v i d o r a o exílio.
V e r d a d e i r o arquétipo d a complexidade e das armadilhas d a administração da
Justiça n a colônia, e m sua trajetória o doutor C a e t a n o d a Costa Matoso, seu titular
m á x i m o na c o m a r c a de Vila Rica, n ã o foi capaz de perceber q u e certo p a d r ã o d e
tolerância, negociação e b a r g a n h a presidia a estabilidade da o r d e m institucional. O
território colonial, sobretudo as montanhas de Minas Gerais, definia-se por u m outro
ritmo. Vila R i c a n ã o era definitivamente Setúbal, o n d e C a e t a n o fez seu aprendizado
como delegado real, p r ó x i m a d a Corte, ao alcance do braço secular, onde as hierar-
quias e ordenações estavam cristalizadas havia centúrias. A o r d e m política e m Vila
R i c a estava assentada e m terreno movediço, tantas vezes a o sabor d a vontades de
alguns, onde o braço temporal exigia muita negociação p a r a se afirmar, o n d e poderes
concorriam predatoriamente, c o m o o universo que os cercava.
O s papéis reunidos n a Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos da minas na
América quefez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que tomou
posse em feveráro de. 1749, códice q u e o leitor finalmente lerá adiante, n a d a mais são do
que o m a p e a m e n t o dessa insensatez. Paradoxos de u m a paisagem e n g a n a d o r a , Vila
R i c a n ã o estava assentada nas areias de Setúbal, mas sua crosta férrea escondia estru-
turas movediças.
Até aqui seguimos os tortuosos passos do magistrado e m Vila Rica (e no Brasil?)
que, m u n i d o de u m zelo até ali poucas vezes visto entre os Ocupantes do posto, con-
tribuiu para definir a jurisdição d a ouvidoria real e m Minas. Ataca a autonomia dos
oficiais das c â m a r a s que lhe e r a m afetas, firma a precedência d a magistratura real
sobre a local, limita a muito custo a jurisdição do bispado sobre a espinhosa questão
das i r m a n d a d e s , perscruta as finanças episcopais oferecendo ão s o b e r a n o subsídios
p a r a u m a reforma da estrutura financeira que, até ali, se traduzia e m fonte de poder e
injustiça aos olhos do magistrado régio.
Se tudo isto transcorre dentro do irresistível e m p e n h o da política regalista e m
submeter poderes concorrenciais, esta razão n ã o é suficiente p a r a explicar u m grupo
de atitudes, a p a r e n t e m e n t e insensatas, desafiando decisões régias — c o m o o episódio
das oitavas cobradas aos oficiais mecânicos - , confronto c o m tribunais superiores —
coloniais e reinóis. — e insubmissão ao governador da capitania.
E, c o m o veremos adiante, seria preciso deslindar sua formação de h o m e m letra-
do, vis-à-vis c o m o papel da magistratura neste período decisivo da formação d o abso-
lutismo e m Portugal p a r a q u e n ã o apenas possamos c o m p r e e n d e r suas atitudes n o
exercício de suas funções m a s , e m u m m e s m o m o v i m e n t o , n o s a p r o x i m e m o s do
sentido pleno que assumiu o repertório de notícias que coleciona.
3 O ouvidor instruído

A passagem d e C a e t a n o d a Costa Matoso pelo país das Minas configurou u m a


p e q u e n a p a r t e de sua longa trajetória de vida, m a r c a d a pelo esforço acadêmico e pela
luta p o r posicionamento n a burocracia, por afirmação profissional c o m o a d v o g a d o
n a Corte e pelos exercícios eruditos.
M u i t o s a n o s antes, n a Vila d e A l c o b a ç a , o vigário d a p a r o q u i a l igreja d o
Santíssimo Sacramento J o s é de Almeida B r a n d ã o anotava que " E m três d e novembro
d e mil setecentos e quinze batizei e pus os Santos óleos a Caetano, filho d e J o ã o d a
Costa e de C a t a r i n a de Souza, sua mulher [...]"» h á duas gerações instalados naquelas
terras. 2 7 8
Sua ascendência enquadrava-se n u m dos escalões mais numerosos d a p o -
pulação do reino português, sendo seu pai oficial de oleiro e seu avô de p e d r e i r o . ^ 2

As posses d a família n ã o pareciam ser consideráveis, havendo registro d e q u e possuíam


"algumas fazendas, de q u e v i v e m " . 2 8 u
Se n ã o dispunha de condição privilegiada, ao
menos em seus antepassados, a se tomar pelas declarações de "pessoas cristãs velhas
legais e fidedignas", n ã o se conhecia a presença de "raças infectas", de cristão novo,
m o u r o , mulato ou q u e tivesse qualquer p r o b l e m a c o m o Santo Oficio. Pôde, dessa
forma, se considerar como "inteiro e legítimo c r i s t ã o " . * 28

Seus tenros anos são vividos ao lado dos pais e m Alcobaça, o n d e vários vizinhos
confirmariam q u e p u d e r a m o "ver criar e m casa d e seus pais de p e q u e n o " , ^ 2 2
antes
q u e s u a vida tomasse rumos mais grandiosos.
Ainda em seus dias de juventude, agregaria ão seu sobrenome o 'Matoso', q u e
herda d e sua avó paterna, reconhecida n a comunidade e m q u e vivia c o m o " a M a t o s a " ,

* ' ANTT, Habilitações tio Santo Ofício. Maço 2, doe. 32. [Habilitação de Caetano da Costa Matoso],
:/0

[Certidão de batismo do pretendente]. O pai e a mãe contavam então com 27 e 28 anos, respectivamente.
279. ANTT, Habilitações do Santo Oficio. Maço 2, doe. 32 {Habilitação de Caetano da Costa Matoso].
[Diligência do comissário José de Almeida Brandão, .1736].
ANTT, Habilitações do Santo Ofício. Maço 2, doe. 32 [Habilitação de Caetano da Costa Matoso],
.Informações de limpeza de sangue de caetano da Costa Matoso, estudante da Universidade de Coimbra, soltdro,jilko
de João da Costa, natural da vila de Alcobaça e morador nesta cidade de Lisboa. [...] carta em 22 de junho de 1736.
281. ANTT, Habilitações do Santo Ofício. MaÇo 2, doe. 32. [Habilitação de Caetano da: Costa Matoso].
Informações de limpeza de sangue de Caetano da Costa Matoso, estudante da Universidade de Coimbra, solteiro,
filho de João da Costa, natural da vila de Alcobaça e morador nesta cidade d&. Lisboa. [...] carta em 22 de junho de
1736.
282
' Dessa forma se referem ao grau de conhecimento com sua família várias das testemunhas convocadas
no processo de habilitação. Ver ANTT, Habilitações do Santo Oficio. Maço 2, doe. 32. [Habilita-
ção de Caetano da Costa Matoso],
pelo excesso de pêlos. A alcunha acabaria valendo como sobrenome de seu n e t o . * " 2

Se do tronco p a t e r n o emprestou o sobrenome, sua carreira seria definitivamente im-


pulsionada pelo a p a d r i n h a m e n t o de seu tio por p a r t e materna, M a n u e l M a d e i r a d e
Sousa, e m certa ocasião descrito c o m o o "[...] famigerado Patrono das causas Foren-
ses n a Casa de Suplicação, donde e esse toda a parte foram dignamente respeitados os
seus sábios d o c u m e n t o s . " ' * C u m p r i n d o ã c o n d u t a típica dos magistrados q u e bus-
28

c a v a m formas de autoperpetuação, alça p sobrinho de origem humilde à condição de


seu protegido, proporcionado-lhe estudos básicos em Lisboa até o e n c a m i n h a m e n t o
p a r a o estudos das leis em C o i m b r a . ^ 2

N a década d e 30, estuda e m Lisboa até 1735 n a Aula do Real Mosteiro, onde
a p r e n d e os "princípios g r a m a t i c a i s " . 286
D a n d o mostras de sua aplicação nos estudos
latinos, seria então consagrado, e m 1734, com o primeiro prêmio n a segunda classe
c o m a composição Frequentior tsi infdix, quam jèlix jòrhma> assinada p o r C a i e t a n u s d a
Costa M a t t o s o . 2 8 7

Nos anos e m que estuda no Real Mosteiro e cursa a Universidade d e Coimbra,


C a e t a n o da Costa Matoso viveria sob o teto d e seu tio, sendo p o r ele a m p a r a d o . E m
sua vida n a Corte^ tivera bons procedimentos, a julgar pelos testemunhos d á vizi-

283. Antónia Resende era conhecida como a Matosa em vários depoimentos sobre a família que são
colhidos. Conforme alguns dicionários portugueses, "matosa" não passa de adjetivo feminino de
"matoso", antiga alcunha que se refere a alguém "[...] provavelmente nascido de abundância do
sistema piloso [,..]. De alguém que tem o cabelo por cortar, e muito crescido, dizemos ainda hoje
que tem uma mata na cabeça [...]". SILVA, Antônio de Morais, Grande Dicionário da Língua Portugue-
sa. 10. ed. Lisboa: Confluência, 1954. V. 6, p. 587. O mesmo falam outros dicionários, dentre eles
MACHADO, José Pedro. Dicionário onomástico etimológico da língua portuguesa. Lisboa: Editorial Con-
fluência, 1984. V. 2, p. 963.
Natural de. Alcobaça, Manuel Madeira de Sousa (1697-1757) era formado em Direito Civil na
Universidade de Coimbra e advogado em Lisboa. No processo de leitura de bacharéis a que se
submete em 1725 consta eme seu pai estava entre as pessoas principais da Vila de Alcobaça e quê
seu tio, Manoel Lopes Madeira, servira a Sua Majestade em muitos lugares de letras. ANTT,
Leitura de Bacharéis, letra M, maço 25, doe. 14. Para registro de sua produção intelectual ver
SILVA., Francisco Inocêncio. Diáonário Bibliográfico Português. Lisboa: Imprensa Oficial, 1859. T. 6,
p. 43. Fico grato a Júnia Furtado pela pesquisa destas referências biográficas. BNL,. RES, cód.
1077, fl. 106v. Catálogo Alfabético dos ministros de letras que serviram nestes reinos de Portugal e Algarve, seus
domínios e conquistas ultramarinas, relações e tribunais, como nele se adverte. Dos mais antigos até o presente de que
se descobriu a noticia mais exata, 1763 foi a única que obtivemos.
Stuart B. Schwartz comenta: "Nos fins do século XVI, a magistratura dnha se tornado uma classe
semi-autônoma e um tanto auto-perpetuadora, geração sucedendo geração a serviço do rei". Op.
cit. nota 255.
286. g]\jL- RES, cod. 1077. Catálogo alfabético dos ministros de letras que serviram nestes reinos de Portugal e
Algarve, seus domínios e conquistas ultramarinas, relações, e tribunais, como nele se adverte. Dos mais antigos até o
presente de que se descobriu a notícia mais exata, 1763, fl. 106v.
287. BNL, RES, cód. 3786 [microfilme], fl. 56-56v. Coleção de composições latinas.
nhança, o n d e era conhecido dentre, os moradores, e até o sapateiro das redondezas o
considerava c o m o

"[...Jpessoa de bons procedimentos, vida e costumes, e capaz de dar boa conta


de todo o negócio de importância e segredo que lhe for encarregado. Vive limpamente,
e com bom trato, e dizem ser a expensas do dito seu tio; não tem mais ocupação que
a de seguir a Universidade de, Coimbra [...] e não se sabe tenha cabedal ainda algum
de seu [...] sabe ler e escrever e ê bom estudante; e terá até vinte, e seis anos de idade,
é solteiro; e não se sabe tenha filho algum ilegítimo; nem que o mesmo nem ascendente
algum seu fosse preso nem penitenciado pelo Santo. Oficio." 288

M o r a n d o e m Lisboa, passava as férias "na sua pátria", p a r a o n d e fazia planos d e


se fixar depois de acabar os cursos no Colégio de Santo A n t ã o , e m Lisboa, centro
jesuíta de excelência e formador tanto de clérigos como de capitães e desembargadores.
M a s considerava Alcobaça seu domicílio p e r m a n e n t e . ^ 2

O tio n ã o apenas lhe garantia domicílio e sustento; iria t a m b é m lhe patrocinar a


carreira. E m 1735, encerraria seus estudos menores e se lançaria e m novos e m p r e e n -
dimentos. Neste ano, sua influência de parentesco seria fundamental p a r a duas con-
quistas q u e t e r i a m c o m o p o n t o de partida o prestígio e a carreira de M a n u e l M a d e i r a .
A primeira delas seria a candidatura à posição de familiar do Santo Oficio, no a n o de
1735. Depois d e correrem todas as diligências sobre a pureza de várias de suas gera-
ções, de se c o m p r o v a r a inexistência de c o n d e n a ç õ e s nas esferas judiciais e de se
ouvirem e m segredo "pessoas cristãs velhas legais e fidedignas" a respeito do candida-
to, C a e t a n o d a Costa Matoso alcança a n o m e a ç ã o p a r a a função n o a n o seguinte. A
despeito de todo o aparente rigor do processo (onde o ofício de oleiro d e seu pai e o
de pedreiro de seu avô p a r e c e m n ã o importar ao Santo Oficio), deve ter contado de
m a n e i r a especial o parentesco com o dr. M a n u e l M a d e i r a de Sousa, este familiar ao
Santo O f í c i o . 2 9 0

A segunda conquista seria o ingresso no curso de leis da Universidade de C o i m b r a ,


escolha que teria sido m a r c a d a pela decisão de. seu t i o . 2 9 1

- ANTT, Habilitações do Santo Oficio. Maço 2, doe. 32 [Habilitação de Caetano da. Costa Matoso],
[Exame de capacidade Jeito pelo comissário Manuel Goncalvez Souto, Lisboa ocidental, 30 de janeiro de 1736].
• ,ANTT, Habilitações do Santo Oficio, maço 2, doe. 32. [Habilitação de. Caetano da Costa Matoso]¡
[Carta de Caetano da Costa Matoso ao presidente do Tribunal do Santo Oficio, Lisboa ocidental, 5.6.1736]. Ao
final desta carta, Caetano da Costa Matoso pede mercê para que sua indicação de familiar seja em
Alcobaça, "[..je não nesta Corte aonde só tem assistido por ocasião dos seus estudos [...]".
'• ANTT, Habilitações do Santo Oficio, maço 2, doe. 32 [Habilitação de Caetano da Costa Matoso].

• Na diligência feita para o candidato, um dos depoentes esclarece que Caetano da Costa Matoso,
no inicio de 1736, seguiria a.Universidade de Coimbra, na Faculdade de Leis, ''por seu tio assim o
querer". Depoimento de Manuel José Amado. Ver ANTT, Habilitações do Santo Ofício, maço 2,
doe. 32 [Habilitação de Caetano da Costa Matoso].
134

E m primeiro de outubro d e 1735, "Caetano da Costa Matoso, filho d e J o ã o d a


Costa, natural de Alcobaça, c o m certidão de Lógica", assinava o livro de matrícula do
Instituías, o n d e estudou quatro meses d e Teologia e dois d e Leis no Colégio de São
Paulo, j u n t o a muitos outros, antes de se decidir pelo curso de Theologia, G a n o n e ,
Leis ou M e d i c i n a . 2 9 2
Esteve dispensado do estudo de Lógica por j á ter cursado esta
disciplina entre 1734 e 1735, no Colégio d e Santo A n t ã o . ^ 2 9

N o s quatro anos seguintes, 1736-1740, a cada primeiro d e outubro, o estudante


de Leis renovaria c o m regularidade sua matrícula nos cursos da Universidade, obten-
do aprovação e m todos os anos letivos, à m e d i d a que vários estudantes i a m deixando
o curso. 2 9 4
E m maio d e 1740, faz seu ato de bacharel, apresentando seu ponto e se
defendendo d a arguição de seus mestres, obtendo a p r o v a ç ã o g e r a l . ^ M e s m o ba-
29

charelado, faltava c u m p r i r o t e m p o p a r a a formatura. Valendo-se da obtenção de


duas mercês reais de tempo p a r a p o d e r se formar, a primeira de seis e a seguinte de
dois m e s e s , 2 9 6
e cursando mais dois meses de Cânones, consegue apressar sua forma-
tura e m Leis p a r a j u n h o d e 1 7 4 1 . 2 9 7

Assim c o m o p a r a C a e t a n o d a Costa Matoso, a magistratura vinha servindo p a r a


muitos grupos sociais intermediários c o m o ü m meio de ascensão s o c i a l . ^ O título 29

2 9 2
- AUC, Matrículas, ano de ] 735 para 1736, £1. 293.
^- AUC, Prova de. Cursos, ano de 1737 para 1738, íl. 91 v. Os jesuítas, responsáveis pelo ensino,
29

dispunham do privilégio de seus alunos levarem em conta a freqüência em Latim e Filosofia nos
estudos em Coimbra, DIAS,José Sebastião da Silva. Portugal e a cultura européia (séculos XVI a
XVIII). Btblos, Lisboa, v. 28, p. 286, 1952.
AUC, Matrícula, 1736, Leis, letra C, fl. 270; Matrícula, 1737, Leis, letra C, íl. .280; Matrícula,
1738, Leis, letra C, fl. 263; Matrícula, 1739, Leis, letra C, fl. 275;Matrícula, 1740, Léis^, letra C, fl.
275; Livro de Prova de Cursos, ano de 1735 para 1736, ano.de 1737 para 1738, ano de 1738 para
1739, ano de 1739 para 1740. Percebe-se um alto índice de evasão de alunos no confronto entre os
livros dos primeiros anos e os últimos. A disciplina de Leis era ensinada em seis meses nos dois
primeiros anos e quatro nos dois anos seguintes.
295. AUC, Livro de autos e graus do ano de 1739 para 1740, fl. 134v. Infelizmente, não foi possível
conhecer o ponto que lhe foi arguido.
- AUC, Prova de Cursos, ano de 1739 para 1740, fl. 82.
2 9 6

2
^7. AUC, [Certidão de formatura em Leis, 3.6.1741]. Sobre a organização dos cursos na Universida-
de, ver ESTATUTOS da Universidade ck Cotmí>ra(1653). [Ed. fac-similar. Universidade de Coimbra:
1987].
'298- Tomando como amostragem a origem social do grupo de magistrados estudados por Stuart B.
Schwartz, uma parte ínfima provinha de famíliasfidalgas(8%); quase um terço (28%) eram prove-
;

nientes de "gente principal";filhosde funcionários públicos perfaziam 11 %.. O grupo mais expres-
sivo era formado por filhos de advogados, burocratas e filhos de letrado. Comentando, "Filhos
seguiam as pegadas dos pais nas universidades c ã serviço do rei encontrando,freqüentemente,o
caminho aberto pelos conselbos e nepotismo paternos." Op. cil., nota 255, p. 228^9.
habilita C a e t a n o d a Costa M a t o s o p a r a o ingresso n o serviço r e a l . " A c i m a disso,
2 9

C o i m b r a , como vimos, preparava o magistrado ostensivamente p a r a servir ao Estado:

"As necessidades do governo e os objetivos e políticas particulares d a Coroa


exerceram influência na natureza e conteúdo da educação universitária em Portu-
gal. O estudo de Direito de u m ponto de vista técnico mais que preparava o estu-
dante p a r a o exercício de sua profissão e para o ingresso no serviço real; inculcava
nele t a m b é m u m complexo p a d r ã o de ações e critérios aceitos. E m Coimbra, a
formação era Direito era u m processo de socialização destinado a criar u m senso
de lealdade e obediência ao rei."'"'"

A p r e p a r a ç ã o p r o p i c i a d a p e i a U n i v e r s i d a d e g u a r d a v a fidelidade aos Estatu-


tos d e 1653, q u e c o m b i n a v a a formação e m Leis c o m p estudo do D i r e i t o R o m a -
no e C a n ó n i c o e aos c o m e n t a d o r e s medievais de m a i o r c o n s i d e r a ç ã o . E m
C o i m b r a , valo rizavam-se, d e u m l a d o , os exercícios d e m e m ó r i a , e m q u e o estu-
d a n t e tornava-se capaz de d e c o r a r trechos das fontes jurídicas, e, d e o u t r o , a h a -
bilidade de p o n t u a r as a r g u m e n t a ç õ e s c o m citações cultas e referências clássicas.
A r o t i n a dos c o m e n t á r i o s dos professores-repetidores n ã o deixava m u i t o e s p a ç o
p a r a d e b a t e e leituras d i v e r g e n t e s . ^ 1
E c o m tal formação q u e o bacharel se defrontaria c o m as futuras adversidades
c o m o servidor real.
P a r a aqueles q u e alimentavam projetos d e servir à m o n a r q u i a , o último a n o d o
curso havia sido dedicado à p r e p a r a ç ã o p a r a os exames e averiguações q u e futura-
mente iriam avaliar suas pretensões. 3 ° A seguir, conquistada a titulação e m Direito
2

p o r C o i m b r a , (1741), o b a c h a r e l de Alcobaça iria d a r início aõ processo j u n t o a o


D e s e m b a r g o do Paço, q u e conduzia cuidadosa investigação sobre as referências aca-
dêmicas e pessoais do postulante.
E m b o r a e m seu processo de candidatura n ã o tivesse encontrado obstáculos q u a n t o
a idade, pureza de sangue, conduta pessoal e formação acadêmica, C a e t a n o esbarrou
n a exigência p a r a a magistratura de antepassados que n ã o se ocupassem d e ofícios
mecânicos. A dificuldade seria contornada possivelmente p o r obra mais u m a vez d e

Sobre título da magistratura, Universidade de Coimbra e formação dos magistrados, ver


SCHWARTZ, Stuart B., op. dl. nota 255, p. 55 e segs. Sobre universidade e formação dos magis-
trados, em especial aqueles que serviram no Tribunal de Relação da Bahia, ver p. 230 e segs.
30
° - SCHWARTZ, Stuart B., op. dl. nota 255, p. 60.
3° • Sobre o papel de Coimbra diante das mudanças do saber e do poder em Portugal, ver GOUVEIA,
1

António Camões. Estratégias de interiorização da disciplina. In: MATTOSO, José (Dir.), op. dt.
nota 40, v. 4, p. 415-449. Ver especialmente p. 424-445.
3 0 2
- Ver, a respeito, SCHWARTZ, Stuart B., op. dt. nota 255, p. 61 e segs.
seu influente padrinho. Assim, depois de u m período de mais de u m ano assistindo a
a u d i ê n c i a s d a C a s a de S u p l i c a ç ã o , 3 0 3
é submetido, ainda em 1741, a exame de
Direito, c o m sua leitura, p e r a n t e os avaliadores do D e s e m b a r g o do P a ç o , ' * p r o v a 30

que, habilitava os bacharéis p a r a o desempenho das magistraturas letradas, t a m b é m


c h a m a d a s lugares de l e t r a s . ^ 3

Depois de ter sido aprovada sua leitura, as portas estavam abertas p a r a a nomeação,
e m 1742, p a r a o, lugar d e juiz d e fora da vila de Setúbal, o n d e são dados os primeiros
passos n a b u r o c r a c i a . ^ Sua b o a atuação n o cargo o faz m e r e c e d o r d e u m a b o a
3

residência, m a r c a n d o pontos p a r a pleitear novas e melhores p o s i ç õ e s ^ ' 0 7

Desde meados do século X V I , e m Portugal, os letrados, tendo alcançado grande


afirmação social e política, t e n d e m a assumir características de casta, a u t o p e r p e t u a n d o
se nos cargos judiciais e postos administrativos através de casamentos e ligações fami-
liares. Seguidores aparentados, após tirarem o curso de Leis, avançavam nos postos
d o serviço r e a l . A v o c a ç ã o d e C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o p a r a a m a g i s t r a t u r a
correspondia a u m p a d r ã o que desde o fim do século X V I vinha se afirmando na
magistratura real: seu sentido de autoperpetuação, com geração sucedendo geração
nos postos d a administração j u d i c i á r i a . ^ D e n t r e alguns pré-requisitos q u e estabe-
3

ANTT, Leitura de Bacharéis, maço n 3, doe. 50. Stuart Schwartz afirma que apesar de üs filhos de
2

artesãos e negociantes não poderem teoricamente entrar no serviço real eles estiveram presentes
dentre os magistrados que serviram na Bahia. Op. dt. nota 255, p. 229 e 231. Esclarece que esta
condição, assim como a de bastardo, era facilmente contornada. Idem, p, 232.
304. "Tojo ( processo de investigação e exame era conhecido como leitura dos bacharéis, que
e s s e e S C

na avaliação de Stuart B. Schwartz. "[...] supostamente, assegurava, para á Coroa, magistrados


:

profissionais competentes de origem social relativamente homogênea e cuja ortodoxia religiosa e


política era digna de confiança/'. Op. cit. nota 255, p . 62.
305. HESPANHA, António Manuel, op. cit. nota 100, p. 62, sobre procedimentos para designação do
corpo de magistrados.
306. "Dom João por graça [...]. Faço saber a vós juiz, vereadores, procurador,fidalgos,cavaleiros, escu-
deiros, homens bons e povo da vila de Setúbal [...] que havendo respeito as letras e mais partes que;
concorrem no bacharel Caetano da Costa Matoso e que no de que o encarregar me servirá como
cumpre a meu serviço c boa administração da Justiça e haver lido no Desembargo do Paço ç ficar
aprovado. Hei por bem fazer-íhe mercê do lugar efe juiz de fora dessa vila por tempo de três anos e
além deles q mais que houver por bem enquanto lhe não mandar tomar residência [...]. Lisboa, 16
de outubro de 1742". ANTT, Chancelaria de d. João V, 1. 105,11. 134v.-135. Carta dejuiz defora da
vila de Setúbal, de 5 dê outubro dé 1742- O Catálogo alfabético dos ministros de letras que serviram nestes
reinos de Portugal e Algarve, seus dommios e conquistas ultramarinas, relações e tribunais, como nele se adverte. Dos
/7ó"5(BNL, RES, cód. 1077) informa que
mais antigos até o presente de que se descobriu a notícia mais exata.
o despacho para o cargo de juiz de fora data de 1744, quando teria começado de fato a exercer o
posto em Setúbal. No cód. 1079, fl. 311, isto é confirmado.
•• Poucos detalhes obtivemos a respeito do seu período de atuação em Setúbal.
3 0 8
- Ibid. p. 58.
leciam diferenças entre a importância d a posição e m disputa, c o m o os graus universi-
tário obtidos e a idade, estava u m que pesava de forma especial: a vinculação familiar
c o m algum funcionário c o m b o a folha d e serviços prestados a o R e i ^ 0 9

Se até ali o bacharel vinha cumprindo u m p r o g r a m a d e mobilidade profissional


dentro da carreira que normalmente o levaria a posições nos altos tribunais, n a volta
do Brasil cie rompe, esse ciclo e passa a se dedicar à advocacia, a c a b a n d o por se tornar
" g r a n d e advogado n a Corte".^10
A vida do bacharel poderia ser assim dividida:
1715-1735 —• Infância e primeiros estudos (Alcobaça e Lisboa).
1736-1741 — Formação acadêmica na Universidade de Coimbra (Coimbra e Lisboa).
1742-1752 — Carreira na magistratura régia (Setúbal e. Vila Rica, em Minas Gerais).
1753-1787? — Advocacia, família, estudos históricos e composições latinas (Lis-
b o a e O t a , no Alenquer).
A volta p a r a o Reino e a liberdade fizeram-no dedicar-se ao trabalho de advoga-
do, d o r a v a n t e responsável pelo seu sustento material. N ã o descuraria, c o n t u d o , de
u m a outra dimensão da vida: a constituição de u m a farnília. N a década de 60, despo-
sa d o n a Leonor Clara J o a q u i n a de Sousa. O casamento, p o r razões q u e desconhece-
mos, fora de consciência, o que significou que n ã o c u m p r i r a m as formalidades legais
prescritas. A i n d a naquela década nasceria o primeiro filho do casal: Aniceto Fortunato,
batizado e m 21-4-1769 c o m o filho de pais i n c ó g n i t o s . E m 1775, a situação d o
casamento seria regularizada, celebrando-se finalmente o sacramento do m a t r i m ô -
nio, 3 1 2
A situação d e Aniceto F o r t u n a t o t a m b é m sofreria m u d a n ç a s , t o r n a n d o - s e
filho l e g í t i m o .

309
- Und.p. 13-14.
3 l a
BNL, côcl. 1079,11. 311. Sobre carreiras de magistradps, ver S C H W A R T Z , Stuart B., op. cit nota
255, p. 223-250.
ANTT. Justificações Ultramarinas (África), Autos dejustificação e habilitação de dona Leonor Clarajoaqtãna
de .Sousa para a herança de Seu filho Aniceto Fortunato da Costa Matoso falecido em Moçambique. Pedida de
íl. 33. Aniceto
certidão do assento de batismo de Aniceto, registrado com pais incógnitos em 21 de abril de 1769,
Fortunato morre de "[...] uma febre de tão má qualidade que decidiu em três dias [...]", conforme
seu irmão explica na carta em que comunica a morte a dona Leonor, em carta de Moçambique, a
18 de outubro de 1814]. Ver ANTT,Justificações Ultramarinas (África). Autos de justificação ê habili-
tação, de dona Leonor Clara Joaquina de Sousa para a herança de seu filho Aniceto Fortunato da Costa Matoso
falecido em Moçambique.

^ - AIYTT, Justificações Ultramarinas (África). Autos


2
dejustificação e habilitação de dona Leonor Clarajoaquina
de .Sousa para a herança de seu filho Aniceto Fortunato da Costa Matoso falecido em Moçambique. [Assento de
casamento,"7.8.1775], fl. 32..
T •'• O destino do coronel Aniceto Fortunato foi falecer em 14 de março de 1814 em Moçambique,
onde se. casara com Maria Sebastiana de Meneses, tendo sido para lá transferido como militar. Dos
filhos do dr. Caetano viviam em Moçambique. Aniceto, Urbano e, ao que parece, Caetano.
Maximiano vivia em Lisboa. Urbano teria tido três filhos, ao que parece nascidos em Moçambique:
Gilberto, Aniceto e Marcos. Caetano também se casa, mas até 1814 ainda não tem filhos. Todos
vivem em Moçambique. (Citado em carta, fl. 46v).
As pistas sobre a descendência são p o u c o fecundas. Sabe-se q u e outros filhos
vieram: U r b a n o Antônio da Costa Matoso, batizado e m 1777, M a x i m i a n o d a Costa
Matoso e C a e t a n o d a Costa M a t o s o . * ^ Dos três filhos, que seguem p a r a M o ç a m b i q u e
3

n e n h u m prossegue na. magistratura. .Dois deles a d o t a r a m o c a m i n h o das armas, che-


g a n d o Aniceto F o r t u n a t o à p a t e n t e d e coronel e U r b a n o A n t ô n i o à d e major.315
U r b a n o , q u e atinge a patente d e major graduado e o posto de ajudante de ordens do
governo de M o ç a m b i q u e , é agraciado c o m o hábito da o r d e m de Avis e m 1830.^16
Se as desventuras paternas na América p r o d u z i r a m u m desencanto com as pers-
pectivas de atuação n o serviço real, parecem n ã o ter abalado sua sede de estudos e
leituras. Nas Minas, a elaboração d a Coleção de notícias refletem hábitos d e invesrigador
e as anotações o esmero de u m agudo a p o n t a d o r . . E m Portugal, o bacharel continuou
a cultivar seu gosto pelas letras, insistindo n a condição de leitor ávido e curioso que j á
se revelara. Praticaria ,seus exercícios de h o m e m letrado indiferente ás. limitações da
ortodoxia cultural e religiosa q u e o Santo Oficio e o Estado insistiam àquela altura e m
preservar, tanto assim q ü e logo q u e se desvencilha das acusações q u e trouxera d o
3

ultramar e torna-se público o resultado da segunda residência (1757), n ã o vacila e m


dar entrada j u n t o à Sua Santidade, em R o m a , com u m pedido p a r a ler livros proibi-
dos. A súplica foi atendida e m agosto de 1758, depois de ser verificada da parte do
suplicante "instrução e c a p a c i d a d e " . * S u a busca p o r c o n h e c i m e n t o nesses livros
3 7

p r o i b i d o s n ã o cessa, e d é c a d a s depois, e n c o n t r a r í a m o s p e d i d o d e r e n o v a ç ã o d a
dispensa outrora c o n c e d i d a . * 3 8

O nome de Urbano aparece requerendo uma certidão de óbito do irmão (major e ajudante de
ordens do governo de Moçambique). Maximiano vivia em Lisboa. Aparece passando uma procu-
ração para sua mãe. Caetano, citado na carta de Urbano. Ver ANTT, Justificações Ultramarinas
(Africa), Autos de justificação e luibilitação de dona Leonor Clara Joaquina de Sousa para a lierança de seu filho
Aniceto Fortunato da Costa Matoso falecido em Moçambique, íl. 35, 39-39v, e 46, respectivamente.
^' Um deles, que herda o nome do pai, parece também herdar algo de seu ânimo. Escapa do comen-
tário fraterno em uma das cartas à mãe que "[...] O Caetano anda feito um filósofo pirômeo [sic] ,
e não há sol qué õ aquente porque trabalha muito, e ainda não viu o fruto dos seus trabalhos ora é
pena [,..]" Ver ANTT, Justificações Ultramarinas (África). Autos de justificação e habilitação de dona
Leonor Clara Joaquina de Sousa para a herança de. seu filho Aniceto Fortunato da Costa Matoso falecido em
Moçambique. [Carta de Urbano a Maximiano. Moçambique, 6.12.1816], íl. 5üv.
6
- ANTTj Hábito da Ordem de Avis, letra C, maço l,doc. 17.
7>
ANTT, Real Mesa Censória, caixa 113. Requerimentos pafa possuir livros proibidos (1773, 1774,
[...] 1825). [Certidão de Domingos Francisco de Aragão, presbítero secular. Lisboa, 15.3.1766].
®' ANTT, Real Mesa Censória, caixa 113. Requerimentos para possuir livros proibidos (1773, 1774,
[...] 1825). Devo essa referência a Luís Carlos. Villalta, que de suas pesquisas em Lisboa me enviou
esse "elo perdido" quando o projeto dessa edição ainda engatinhava. O pedido, feito em virtude do
extravio da autorização anterior, revela antes de mais nada certo zelo em não esbarrar com proce-
dimentos legais.
D e sua livraria n ã o se conhece n o t í c i a , ^ 3
m a s ^ás pedidos e a p r e p a r a ç ã o do
códice sobre o Brasil atestam suficientemente sua curiosidade intelectual. N o mesmo
sentido, a existência de outro códice de sua lavra, recheado d e formulações latinas
sobre a Antigüidade clássica, é prova reveladora de sua e r u d i ç ã o . 3 2 0
Estadioso siste-
mático^ C a e t a n o d a Costa M a t o s o voltaria a cultivar e m seu regresso ao R e i n o a
afeição de juventude por textos latinos. E m seu códice. Coleção de composições latinas,^^
poderíamos enxergar mesmo o universo de. temas, a natureza das preocupações e os
gêneros literários q u e comporiam o c a m p o cultural do h o m e m setecentista.
A luz do resgate d e fatos e personagens da Antigüidade clássica, o compilador
Caietanus da Costa M a t t o s o reuniu sob o emprego sistemático, mas n ã o exclusivo, do
latim temáticas variadas q u e escorrem desordenadas pelas folhas manuscritas, n u m a
mixórdia d e estilos e gêneros: odes latinas a valer, sonetos e epigramas. D e c o m u m ,
p a r e c e ser a n a t u r e z a desse códice, pois além do exercício de erudição através do
r e c u r s o a o l a t i m a a n t i g ü i d a d e a q u i é t o m a d a c o m o p r e t e x t o de n a r r a t i v a , d e
ensinamentos diante dos desafios morais do seu tempo. O códice, n a livraria, funcio-
n a c o m o u m Oráculo. T e r i a sido ainda obra p á r a consulta de u m erudito que compila
n u m porta-retrato matéria de suas diversões prediletas, sua coleção particular de ditos
práticos, sonetos de grande beleza, trechos copiados de autores mais queridos
D a preferência pela Antigüidade clássica emergem u m sem-número de persona-
gens, guerras e flores (fl. 100-101 v. - Querunturjhres, quod omnem solam pukhritudinem mica
dies cotifteiat) em sonetos, oitavas e décimas, frases, poesias, ditos e reflexões e lições de
seus maiores sábios (íl. 97-99 — Tempestiva felicítate inuenit, fl. 168-184v. — Ditos de sábios
ardigos; fl. 200-200v. — Sentenças das obras de Séneca).
T e m a s épicos, c o m o gigantes, tempestades (fl. 120-120V. — Tempestatis descriptió),
naufrágios, monstros, a fúria da erupção de vulcões (fl. 112-113v - Incommwii incendio
eximiae pietatis adolecens pairem [summ aetate?] gravem kumeris. impositum per mediasflammas
eripuit, fl. 121-121v. —Improvisam incendiam^..]), terremotos, inclusive u m dos ocorridos
em Portugal [fl. 154 — Terrae motus qui kalendis JVovembris anno 7755[...]) p o v o a m a ima-
ginação desse colecionador.
A estética do épico é recurso empregado p a r a tratar d a descrição do trabalho nas
plantações açucareiras no Brasil (fl. 58-67 — Descriptió épica molis sacckareos a R.P. Pmdentio
de Amaral Soãeiatis Jesua Provinciae Brasiliae Labórala) ou a p r o p ó s i t o do s a g r a d o (fl.
.136-140 — Descriptió épica corticis Eucharistici. a Pe. Ant. Vieira).

Não aparece relacionada no inquérito da Real Mesa Censória. Tampouco foi localizada qualquer
referência a ela nos inúmeros catálogos de livrarias portuguesas pesquisados.
BNL, RES, cód. 3786 Coleção de composições latinas. [254Í1.]. O crédito da descoberta deste códice
deve-se a Maria Verônica Campos, que ainda atestou a certeza da autoria..
BNL, RES, cód. 3786, Coleção de composições latinas. [254Q.]
Certos expedientes de colecionador presentes n o Códice Cosia Matoso reaparecem
a q u i revelando traços da p e r s o n a l i d a d e d e seu formulador. U m deles refere-se à
?

v o c a ç ã o sistematizadora dos elementos, mensuráveis, classificáveis. Assim, reúne-se


q u a d r o d e distâncias das cidades européias (fl. 157 — Gazeta de Madrid de 3 d e J a n e i r o
de 1773); listam-se as ordens religiosas e militares (fl. 221v-222v — Religiões de Portugal;
fl. 222v-224v — Ordens militares' que houve e que há neste Reino); indexam-se os assuntos das
obras, como a de Virgílio (fl. l-8v — índice das cousas mais insignes, de Virgilio), ou outras
(fl.. Í65 - Teatro de los Dioses) p a r a eventual consulta, dentre muitos outros (íl. 186v.-
189- Brazões ou símbolos dos imperadores do Oriente e ocidente). T a m b é m esse códice é suporte
ideal p a r a registrar trechos d e leituras feitas (fl. 160 - M a n u e l de Faria e Souza. Europa
Portuguesa. T o m . 1, parág; 1) e a confecção d e efemérides e m ensaio de historiador-
diletante (fl. 2 1 3 - 224v — Notícias várias e raras).

M a s é a pátria o lugar desse todo e d e t u d o . Portugal, reafirmado nas transcrições


de poetas de preferência (fl. 12-13 — Varias cousas tiradas do poeta Camões), e m b o r a n e m
sempre consagrados, nas versões latinas e m composições dedicadas a personagens da
história portuguesa e à própria nação (fl. 68-80 — Poema latim da Batalha de Ourique e,
outros; fl. 81v.-87 ; Poema inte regallum, germanum et Luzüamtm in militia qn. 1735; fl. 105-
... - Breve Lusitaniae Carmen sui voti perfeciione exultantis), nos inevitáveis e n c ó m i o s e
panegíricos a autoridades ou familiares (íl. 123-123v. — Apollo Auguslini Gomes Guimarens
facundiam praedkat, et dignas Laudes tribuil; fl. 158v. - Soneto ao Sr. Dr. Manuel. Madeira de
Sousa, incomparável jurisconsulto ulissiponensi em louvor da apologia feita ao Exmo. conde de Unhão,
na pertensãq do ducado de Aveiro; fl. 159-159y. —Elegia a Sebastião José de Carvalho, marquês de
Pombal no seu retiro da corte: ano de 1777).
A profissão t o m a d a c o m o exemplo dos antigos n ã o é desprezada, e m b o r a n ã o
encontremos especificamente nesse volume de sua biblioteca u m a participação con-
tundente de textos jurídicos que com toda a certeza freqüentavam muitas outras par-
tes. H á espaço p a r a avaliações de n a t u r e z a legal sobre a tirania dos m o n a r c a s e o
a r r o l a m e n t o dos principais legisladores da Antigüidade, (fl. 17 — Legisladores)?'^

- Se tomarmos como verdadeira a critica desabrida que faz Antônio Barnabé de Eíescano à conduta
e à formação dos advogados em Portugal, algumas das passagens desse códice pareciam cumprir a
função de registro de fragmentos de textos jurídicos clássicos que seriam empregados para orna-
mentar as argumentações em juízo, conforme lição que se ensinava na Faculdade de Leis de Coimbra.
"Os advogados jjorque defendendo alguma causa, que versa sobre ponto incerto da jurisprudên-
cia, Ok Grande Deus! têm excelente, ocasião de fazerem fortuna, mostrando ao público os seus
talentos. Logo todo o seu trabalho e estudo consistem em andarem esquadrinhando pelas suas
livrarias, ainda mais no seus autores razões, e autoridades para ferirem com elas ps olhos dos juízes
[...]", Demétrio Moderno, ou bddiógrafo jurídico português. Lisboa: Oficina de Lino da Silva Godinho,
1781. p. 118.
C o n t u d o , seria n o escrito d a l o m b a d a d o códice, saído d o p u n h o e d a v o n t a -
de do c o m p i l a d o r , q u e o significado m a i o r desse m a t e r i a l estaria d e m o n s t r a d o :
Coleção de composições latinas. R e c u r s o das classes letradas do Antigo R e g i m e , o latim
seria aqui exercitado à exaustão, e m p r e g a d o e m escolares exercícios d e t r a d u ç ã o
p a r a o p o r t u g u ê s , e vice-versa, ou e m composições p r e m i a d a s d e seus p a r e s j u v e -
nis e a de s u a p r ó p r i a lavra (fl. 56-56v — Frequentior est irifelix, quam felixfortuna). Sob
o u t r a forma, a p a r e c e r i a n o e n u n c i a d o de certo utilitarismo, corno n a relação d e
expressões vocabulares latinas (fl. 3 2 - 4 5 — Eloqüentes modos de falar na língua latina),
c o m o n u m disfarçado dicionário ou e m frases latinas de a u t o r e s clássicos. O fecho
se faz c o m o registro cuidadoso de u m t r a t a d o d e retórica (fl 23-30 — Index rhetoricus
tramitem inligüans ad eloquentiam, de autoria do padre Diogo da Câmara, da Companhia). 3 2 3

T o d o s esses exercícios d e atualização d e seu códice latino c o m b i n a m c o m a


i m a g e m q u e se t e m do .magistrado depois de sua t u m u l t u a d a p a s s a g e m pelo Brasil
e de defesa j u n t o à C o r t e , m a r c a d a pelo exercício d a advocacia, leituras e estudos,
O s dias apressados da vida h a corte ficariam p a r a trás e m d a t a p r ó x i m a a 1760^
q u a n d o , c o m a m o r t e de seu valedor, m u d a - s e p a r a O t a , ^ n o Alenquer. N a q u e -
3 2

la d e r r a d e i r a ocasião sua vida p a r e c i a c o n d i c i o n a d a p o r seu tio, d e q u e m t o r n a r -


se-ia h e r d e i r o . 3 2 5
Ali vai batizar o filho U r b a n o A n t ô n i o , cuja escolha d o p a d r i -
n h o , o m a r q u ê s de Belas, indica o b o m nível de suas relações s o c i a i s . ^ 32

Todavia, foi h o próprio corpo do códice organizado a partir de sua experiência


e m Minas q u e C a e t a n o da Costa Matoso inscreveu as marcas de sua erudição. O s

À sisudez do erudito escaparia, ainda que ínfima, uma ponta de humor provável de Caetano da
Costa Matoso em breve momento do Soneto jocoso, fl. 149v.-150.
"Soneto Jocoso
Gosta de carne impura o povo escuro,/ pelo que será bom, e santo zelo,/ daquela proibida carne
abstê-lo./ Com os pôr a todos a bacalhau puro./ E posto que ouçais clamar, que é duro,/ e que tal
bacalhau por ser de pêlo/ lhes foi, que o que eles tem pior cabelo/ com a correção avante ide
seguro:/ Não o percais senhor por mal cozinhado,/ usais para eles de tempero esperto/ porque são
de má boca, e gosto mau;/ [ilegível] os há a bacalhau já enfastiado,/ não tendes os três paus acolá
perto,/ ponde-os por variar a peixe pau.- ' 1

-^4- Informa o BNL— RES, çod. 1077. Catálogo alfabético dos ministros de letras que serviram nestes
reinos de Portugal e Algarve, seus domínios e conquistas ultramarinas, relações e tribunais, como
nele se adverte. Dos mais antigos até o presente de que se descobriu a notícia mais exata, 1763:
"Por morte de seu tio mencionado se retirou do domicílio da corte para b lugar de Ota", fl. 106v.
• Há uma complicação judicial sobre o pagamento de foro de terrenos em Lisboa que o ex-ouvidor
vendera após o terremoto. No processo, Caetano da Costa Matoso aparece como herdeiro de seu
tio. Trata-se possivelmente da casa em que habitavam. Ver ANTT, Inspeção dos bairros. Rossio,
maço 28,ri.40 e Rossio, maço 39, n.10.
0
• ANTT Justificações Ultramarinas (Africa). Autos de justificação e habilitação de dona Leonor Clarâjoaquina
de Sousa para a Imrança de seu jilfio Aniceto Fortunato da Costa Matoso falecido em Moçambique. [Certidão de
batismo de Urbano Antônio da Costa Matoso, novembro de 1777].
textos e observações q u e interpõe, a iniciativa de p r e p a r a r u m a coleção e o p r o g r a m a
o r d e n a d o r desse material t e s t e m u n h a m u m a . m e n t e afinada c o m a alta cultura d e
Portugal n o período.
U m dos estímulos determinantes presentes n a p r e p a r a ç ã o d a coleção d e docu-
mentos foram as orientações d a Academia R e a l d a História Portuguesa, fundada e m
1720 p o r d o m J o ã o V . 3 2 7
A A c a d e m i a R e a l divulga e m t o d o o p a í s princípios
noimativos do trabalho historiográfico, recomenda e veta autores, agrega sócios p o r
todo o território, subordina a si as informações dos arquivos do reino e a conservação
dos m o n u m e n t o s a n t i g o s . ^ A iniciativa integra e potencializa u m a efervescência
32

mais vasta que vinha constituindo-se desde os finais d o século anterior, q u a n d o e m


1696 o conde d a Ericeira promovia conferências discretas e. eruditas através d e tertú-
lias e debates, apresentação de estudos históricos e filológicos e a a b o r d a g e m d e p r o -
blemas científicos. A multiplicação de academias c o m o lugares d e debates filosóficos
e científicos sobre Filologia e História ocupa u m papel decisivo n a dinamização inte-
lectual e estímulo à sociabilidade e m Portugal n a primeira m e t a d e d o século e m que,
o ouvidor d e Vila Rica fora educado; e m "[...] u m poderoso movimento que as faz
multiplicar e, sobretudo, q u e as transforma, d e simples companhias privadas reunin-
do doutos, e m instâncias d e consagração m u n d a n a e erudita, que atribuem prêmios e
q u e se e m p e n h a m n a publicação d e suas obras coletivas [...]". 9 A consolidação d e 32

u m m o d e l o , o crescimento d o público leitor, e m b a l a d o pelo n a s c i m e n t o d o gosto


pela História, p r o p a g a d o entre grupos sociais diversificados e incorporando estratos
médios d a p o p u l a ç ã o , 3 3 0
e o desenvolvimento d e novas formas d e patrocínio oficia-
lizadas sob o Estado criam u m ambiente favorável p a r a consagrar os esforços do in-
vestimento historiográfico.

U m a das Orientações centrais da Academia dizia respeito a u m amplo esforço d e


reunião d e informações disponíveis e m todo o reino através d a p r e p a r a ç ã o d e inqué-
ritos a serem respondidos p o r várias entidades, c o m o arcebispos e bispos, cabidos,
ordens religiosas, câmaras, igrejas e provedores das c o m a r c a s . ^ Esse passou a ser o
33

m o t o q u e mobiliza as atividades d o s sócios e o canal p o r o n d e se p r e t e n d i a q u e


chegassem as notícias d e fontes autênticas que iriam permitir a r e d a ç ã o d a História

327... Ver DIAS, José Sebastião da Silva. op. cit. nota 288, p. 308.
3^8. MOTA, Isabel ferreira da. Os historiadores e o campo historiográfico na primeira metade do
século XVIII, Revista de Historia das Idéias, Lisboa., v. 18, p. 170-171,1996. A autora explora nesse
estudo aspectos fundamentais da constituição do campo historiográfico em Portugal: a sociabilida-
de literária e erudita, o estatuto econômico e social dos autores, a configuração dos públicos.
329, MOTA, Isabel Ferreira, op. cit. nota 328, p. 168. Sobre essas academias^ ver p. 168.
: m
- Ibid.\i. 172.
3 3 1
• CHORÃO, Maria José M. Bigotte, Inquéritos promovidos pela coroa no século XVIII. Revista de
História Econômica e. Social, Lisboa, v. 21, p. 94, 1987.
Eclesiástica c a Secular do reino e suas conquistas prevista nos Estatutos ( 1 7 2 1 ) . 3 3 2

As p e r g u n t a s a s e r e m a t e n d i d a s f o r m a m u m p r o g r a m a d e t e m a s , d e interesses
estruturadores d a função historiográfica, o q u e fica p a t e n t e no e x a m e da orienta-
ção p r e s e n t e n a Memóiia das notícias que El-rei Nosso Senhor ordena se dêem à Academia
Real da História Portuguesa de todos os cartórios e. Arquivos do Reino?^ A divisão maior
estabelecia instâncias administrativas, como arcebispados e bispados, cartório da câ-
m a r a eclesiástica, cabidos das catedrais, religiões (inclui as O r d e n s e conventos), câ-
m a r a s das vilas ê provedorias das comarcas, q u e ficavam responsáveis pelo atendi-
m e n t o aos grupos de perguntas do que poderia vir a "servir à história". O espectro era
bastante vasto, percorrendo questões ligadas propriamente à História Eclesiástica, c o m o
" Q u a n d o , e por q u e m foi fundada essa catedral, e as Colegiadas, paróquias, ermidas,
e capelas dessa diocese?"^ " Q u e bispos coadjutores houve nessa igreja?", " Q u e ren-
das tem essa Igreja, em q u e consistem, se tem, ou teve alguma jurisdição temporal?",
" Q u e extensão teve, e, tem o seu distrito?", " Q u e paróquias tem, e q u e n ú m e r o de
fregueses?", " Q u e procissões se fazem n a cidade p o r costume, ou voto, e qual foi a sua
origem?" ou, ainda, "Inventário de todos os testamentos dos bispos", "Inventário dos
livros de colações e provimentos de igrejas, com os anos e m q u e c a d a u m acaba, e
começa". As religiões solicitava-se " Q u e m a n d e m a notícia dos ritos antigos, relíqui-
as, milagres, e mais cousas notáveis de cada mosteiro", dentre outros pedidos. N a q u i -
lo que cabia às câmaras, constava que "Devem dar notícia das aldeias do termo, do
n ú m e r o dos vizinhos q u e tem, e mais cousas notáveis q u e nelas h á [...]" e., ainda,
" D e v e m d a r notícia se há nessa terra pessoas curiosas q u e t e n h a m memórias antigas
ou livros m a n u s c r i t o s t o c a n t e s à história e a n t i g ü i d a d e dela, e q u e m s ã o " . D a s
provedorias das comarcas, a Academia Real d e m a n d a v a , d e n t r e outros assuntos, o
" I n v e n t á r i o de todas as instituições d e m o r g a d o s , capelas, confrarias, i r m a n d a d e s ,

Decreto, pelo qual Sua Majestade foi servido confirmar os Estatutos da Academia. Lisboa ociden-
tal, 4.1.172!. Publicado em SILVA, Manoel Telles da. História da Academia Real da História Portugue-
sa. 1727 Lisboa: Oficina dejoseph Antonio da Silva, 1727. p. 45-54.
Idem p. 69-81. Publicado também em Chorão, op. át. nota 331, p. 125-130. A promulgação de
legislação complementar iria concorrer para a formação de elementos para a redação da História
portuguesa: Aviso de 16 de março de 1721 para que os Acadêmicos da Academia Real possam
examinar e tirar cópias dos livros de Torre do Tombo; Aviso de 18 de março para que se tirem do
arquivo as cópias que os acadêmicos requisitarem; Aviso de 20 de agosto de 1721, sobre a conser-
vação e coleção de antigüidades e monumentos; Decreto de 20 de outubro de .1721 para que o
guarda-mor nomeie oito oficiais por tempo de um ano para copiarem para a Academia; Aviso de
11 de dezembro de. 1722 para que continuem por um ano ps oficiais que tiram cópias para a
Academia; Aviso de 18 de setembro mandando readmitir os oficiais que tiravam cópias no arquivo
para a Academia; Aviso de 22 de outubro de 1726 abonando ordenado dos eme no arquivo tiram
cópias para Academia. PJVARA, Joaquim Heliodoro da. Cunha. Catálogo dos Manuscritos da Biblio-
teca. Pública Eborense. Lisboa,. 1850,
144

hospitais e mais legados, e lugares pios de sua jurisdição, declarando-se q u e m foram


os instituidores, e m q u e era ou a n o , e q u e m são hoje os a d m i n i s t r a d o r e s " , " Q u e
m a n d e m com grande cuidado trasladar os letreiros dos romanos, godos, ou mouros,
copiando as letras q u e se p o d e r e m ler, c o m as mesmas regras, c o m os mesmos pontos,
c o m as m e s m a s figuras, e mais circunstâncias que tiverem [...]"; " Q u e avisem das
pessoas curiosas, q u e t e m notícias e m e m ó r i a s antigas, ou livros manuscritos, q u e
c o n d u z a m à história, e dos lugares, e aldeias d a sua comarca com a sua situação,, e se
neles h á algumas antigüidades notáveis."334
Essé a m p l o questionário da Academia, voltado p a r a instâncias do governo civil
e eclesiástico do reino, ganharia u m a versão dirigida a o investigador diletante q u e
viajasse p o r q u a l q u e r p a r t e do m u n d o . O trabalho intitulado Peregrino instruído, de.
M a n u e l Gaetano de Sousa, transforma qualquer parte do globo passível de fornecer
informações ao conhecimento histórico e qualquer viajante curioso e letrado e m seu
historiador. Este vasto painel de perguntas procurava orientar, desta vez aos viajantes
desejosos de se t o r n a r e m colaboradores, o levantamento das informações considera-
das mais importantes para a constituição de uma memória de Portugal e seus domínios.^5

" O peregrino instruído.


Devem aqueles que por meio das viagens querem conhecer utilmente o mundo
infonnar-se em cada lugar do estado natural e moral dele.
Conhecerão o estado natural tomando notícia da qualidade do clima, do terre-
no, dos campos, dos montes, dos rios, das fontes, dos frutos, dos gados, dosminerais,
das aves e dos peixes.
Conhecerão o estado moral de cada lugar, tomando notícia do número dos
fogos, dos habitadores, dos edifícios públicos, particulares; do estado eclesiástico, po-
lítico e militar, e econômico.

Esse guia d e questões a serem pesquisadas p o r aqueles q u e buscassem visitar


novas regiões voltava-se p a r a a produção de u m conhecimento útil do m u n d o e esta-
belecia de m o d o objetivo aquilo que deveria ser buscado pelos peregrinos que.vagas-

3 3 4
- SILVA, Manuel Telles da, op. cit. nota 332,.p. 69-81.
335. BM, DM, Add., n.l5193, íl. 237-245. Peregrino inst / ruído / Modo / com que se deve informar,
todo / o sujeito que fizer giro pela / Europa, e mais partes / do Mundo. / Mandado fazer na
ocasião / que sua Majestade o Senhor / Rei Dom João o Quiri / to./ Na / o / casião / que esteve
para ir incógnito, ver / as Cortes estrangeiras. Manuel Caetano de Sousa. Ver artigo de MOTT,
Luís. O peregrino Instruído, A propósito de um formulário etnográfico do século XVIII. Separata da
Boletim Cultural da Junta Distrital de Lúboa, Lisboa, série III, n. 75-78, p. 3-21, 1971-1972. O docu-
mento c reproduzido às páginas 12-21. A Biblioteca Nacional de Lisboa. Reservados, possui o
referido documento no códice 618 (íl,. 1 -8} e 694 (11. 259-264v.), sendo o primeiro deles ó original
autógrafo do padre dom Manuel de Sousa, segundo afirma Luís Mott. (p. 4-5).
3 3 6
- BM, DM, Add.,,n. 15193,11.238
sem p o r novas terras,, c o m 212 perguntas divididas c m blocos: " Q u a n t o ao estado
natural"., " Q u a n t o ao estado m o r a l " , " Q u a n t o ao estado eclesiástico", " Q u a n t o a o
estado político", " Q u a n t o ao estado militar", " Q u a n t o ao estado econômico".
Modelos normativos p o r excelência, n ã o deve causar espanto q u e m u i t a s das
respostas às perguntas formuladas em ambos os inquéritos estejam presentes no Códice
Costa Matoso. As respostas, ecoando d e m a n e i r a cristalina, revelam a herança das orien-
tações d a A c a d e m i a n a coleção p r e p a r a d a pelo b a c h a r e l d e Alcobaça, fazendo-se
ultrapassar o significado básico de. simples registro de memórias d e temas e processos
vividos q u a n d o atuava nas Minas do Brasil. E m u l a n d o n o ultramar os procedimentos
dos sócios d a Academia, o Códice Costa Matoso afirma-se t a m b é m c o m o fruto de u m
exercício d e erudito.
E m ação n o Brasil, vasculhando arquivos de c â m a r a s , provedorias, igrejas e a
m e m ó r i a dos antigos moradores de q u e m esteve " t o m a n d o notícias", o ouvidor ins-
truído buscava e m Minas e no R i o de J a n e i r o conhecer utilmente o m u n d o . C o m p r e -
ende-se a p a r t i r desse estímulo a composição d o Códice c o m a p r e s e n ç a de certas
temáticas que o percorre. Desnecessário correlacionar ao pedido que faziam
os inquéritos acadêmicos de informações sobre a história d a organização religiosa,
q u e se consubstanciam nas perguntas sobre a extensão dos distritos, o u as paróquias,
ou o n ú m e r o d e seus fregueses e limites e n t r e as dioceses, os d o c u m e n t o s q u e o
o u v i d o r r e ú n e Com informações sobre " a n t i g ü i d a d e s " d e várias freguesias, c o m o
Mariana, Guarapiranga, Catas Altas e Antônio Pereira (documentos 10-13), ou asso-
ciar as d e m a n d a s por "[...] pessoas curiosas q u e têm notícias, e memórias antigas, ou
livros manuscritos q u e c o n d u z a m à história, e dos lugares, e aldeias de sua c o m a r c a
com a situação, e se neles há algumas antigüidades notáveis [ . . . ] " , 337
que p r e g a v a m o
estatuto d a Academia c o m as JVoticias dos primeiros descobridores das primeiras minas do ouro
[...] (documento. 2), a Relação de algumas antigüidades das Minas (documento 7) ou, mes-
m o , qualquer dos papéis q u e formam os relatos sobre o povoamento das M i n a s (do-
cumentos 2-9 e 14). T a m b é m dispensável é associar os pedidos de traslado de letrei-
ros de primitivos conquistadores à Inscrição enigmática formada erri quatro regras [...] (docu-
m e n t o 33), ou m e s m o lembrar q u e a presença de u m a transcrição do Testamento de dom
frei Antônio de Guadalupe (documento 121) atendia à o r d e m idêntica de se fazer u m
"Inventário d e todos os testamentos dos bispos'\ As semelhanças de temas como estes
p o d e r i a m se repetir ad nauseum, revelando na figura do ouvidor u m historiador dili-
gente em atender às d e m a n d a s da prática h i s t o r i o g r á f i c a . ^
33

• SII.VA, Manoel Teles cia, op. cit. nota 332, p. 69-81.


'• A Força da orientação da Academia acaba por propiciar a produção ampla de documentos com a
mesma tipologia, presentes no Códice, mas também facilmente encontráveis em arquivos portugue-
ses e brasileiros. São os casos dos catálogos de governadores e bispos, das inscrições rupestres,
memórias, notícias e informações. :
146

Se o sucesso da A c a d e m i a R e a l fixava n o r m a s e certa metodologia, ela p o r ou-


tro lado ampliava as o p o r t u n i d a d e s p a r a a afirmação social q u e se a b r i a m c o m o
fortalecimento d a carreira de historiador. A A c a d e m i a p r o v o c a o a p r o f u n d a m e n t o e
a consagração das práticas clientelares c o m a n d a d a s , agora, p o r u m m e c e n a t o d e Es-
t a d o , e a p r o d u ç ã o historiográfica e erudita a g u a r d a desde e n t ã o , c o m especial í m p e -
to, as retribuições através d e cargos, posições, s u s t e n t o . S o b esse novo q u a d r o , o
t r a b a l h o historiográfico passara a ser função q u e nobilita aquele q u e o d e s e m p e n h a ,
c o n f o r m e a v a n ç a a presença d a A c a d e m i a R e a l da História e difunde-se p o r novos
grupos sociais o gosto pela História, e a História g a n h a v a e m valor social e prestí-
gio. 3 4 0

V i s t o dessa forma, o colecionador C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o estaria a m e i o


c a m i n h o entre os letrados e os novos doutos, p a r a usar a distinção estabelecida p o r
Isabel M o t a a o se referir à figura dos historiadores q u e n a s c e m n o século X V I I I e
a t r i b u e m dignidade e valorização da função c o m o intelectuais eruditos.341 M a s algu-
m a diferença deve-se fazer notar. T r a t a - s e p r e c i s a m e n t e do a p r o v e i t a m e n t o q u e faz
d a experiência u l t r a m a r i n a . A c o m p a n h a n d o d e m u i t o p e r t o esse novo m e r c a d o d e
o p o r t u n i d a d e s , alguns funcionários reais nas colônias h a b i l m e n t e saberão transfor-
m a r sua passagem p o r essas terras e m u m diferencial expressivo, a fim de investirem
n a p r o d u ç ã o historiográfica sobre as conquistas. Aliam, desde então, o sabor d e curi-
osidade c o m os fatos do u l t r a m a r , c o m a sagração oportunista dos faustos d a e x p a n -
são do Império^ n a b u s c a d e p r o m o ç ã o , prestígio, r e c o n h e c i m e n t o . B e m administra-
da, a c a r r e i r a u l t r a m a r i n a p o d e r i a reverter sofrimento e privações de u m triénio e m
benesses literárias p a r a o resto de u m a vida, possibilitando a realização do objetivo d e
"converter o seu estatuto de historiador e m estatuto s o c i a l " . 3 4 2

C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o poderia, a princípio, ser a p r o x i m a d o à p l ê i a d e d e


historiadores nascidos nas colônias ou que ali h a b i t a m q u e tiram proveito dos servi-
ços prestados n o a l é m - m a r p a r a p r o d u z i r obras. U m n o v o m e r c a d o de expectativas
se abria, m a r c a d o p o r sacrifícios e limitações, é b e m v e r d a d e , m a s promissor e m vista
das o p o r t u n i d a d e s de se p r o d u z i r conhecimentos, colecionar notícias e descrições
originais, graças a o contato c o m u m M u n d o N o v o . Esses são atributos de u m seleto
g r u p o q u e converte a experiência colonial e m algo além de receitas p a r a o p a t r i m ô n i o ,
ou expectativas de posições mais elevadas. O desejado c o n h e c i m e n t o das
potencialidades coloniais - sua n a t u r e z a , glórias do p o d e r p o r t u g u ê s - a b r e c a m i n h o
p a r a u m a consagração n o universo das letras.

339. MOTA, Isabel Ferreira da. op. cit nota 328, p. 169.
340
< Idem,p. 172-3..
3 4 L
Ibld.,p. 174.
3 4 2
- IbÍd. . i? 182-3.
O esquema parece perfeito, sobretudo se a p r o x i m a r m o s sua atuação daqueles
dedicados a - M i n a s , c o m o Cláudio M a n u e l d a Costa, c o m seu Fundamento histórico,
introdução ao p o e m a Vila Rica, Bento Furtado, Pedro Dias Paes L e m e e, m e s m o , os
autores de fim do século X V I I I que escreviam por obrigação profissional — o melhor
exemplo é J o s é J o ã o Teixeira Coelho. E n t r e eles estão J o s é R o d r i g u e s d e A b r e u
( l 6 8 2 - c a . l 7 5 2 ) , q u e esteve n o Brasil p o r oito anos, a p a r t i r d e 1705, t e n d o viaja-
d o c o m o g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e e d a e x p e r i ê n c i a escrito Relação
das minas brasüicas,^^
U m r e t r a t o d o sucesso d o m o d e l o d e s i s t e m a t i z a ç ã o e e m p r e e n d i m e n t o
historiográfico das academias transpareceria n a estruturação de academias n o ultra-
m a r — dentre elas, a Academia Brasílica dos Renascidos, e m 1759 — q u e galvanizam
estratégias e condutas e procuravam repetir o modus operandi de suas similares do reino,
como n o estabelecimento d e certa orientação temática, ainda q u e a d a p t a d a à realida-
de do N o v o M u n d o , e n a realização de conclaves. Acadêmicos, letrados m o r a d o r e s
da América portuguesa, foram eleitos p a r a a m a r sob recortes regionais conforme p r o -
víncias (Pará e M a r a n h ã o ) e distritos da capitania de Minas Gerais (Cidade M a r i a n a ,
São J o s é , Vila R i c a , S a b a r á e R i o das Velhas, Vila do Príncipe e S e r r o do Frio),
h a v e n d o nomes destinados à elaboração d e memórias temáticas (índios, agricultura,
história natural, dentre, outras) e as inescapáveis m e m ó r i a s das ordens r e l i g i o s a s . ^ 3

C o n t u d o n ã o encontramos o n o m e do ouvidor de Vila R i c a inscrito e m qualquer das


Academias — n e m n o Reino e tampouco no Brasil — , o q u e p a r e c e afastá-lo d e u m a
Sociabilidade elementar àqueles q u e p r e t e n d i a m c u m p r i r certos passos n a carreira.
M e s m o a Academia dos Seletos, que se reuniu e m 1752 n o Rio de J a n e i r o , m o m e n t o
e local e m que C a e t a n o da Costa Matoso se encontrava, não parecia atraí-lo p a r a um
envolvimento d i r e t o . ^ 3 4

SOUSA, J. G. Pinto de. Biblioteca histórica de Portugal e. seus domínios ultramarinos: na qual se contêm várias
histórias daquele e. destes manuscritas e impressas,, em prosa e em verso, só e juntas com as de outros Estados, escritas
[_...]. Lisboa: Typographia Chalcógraphica [...] do Arco do Cego,
por autores portugueses e estrangeiros
1801. p. 44. Esta, poucas vezes citada, constitui valioso acervo de referências bibliográficas sobre a
produção historiográfica nos séculos XV ao XVIII, dedicada ao Império português. A existência
da Relação das minas brasílicas é um mistério. Contudo, ao que parece, parte do texto foi publicada
cm seu livro Histologia medica, editado em Lisboa, em três partes lançadas em 1723, 1745 e 1742.
Sobre José Rodrigues de Abreu (ou Avreu), doutor em medicina,físico-mordas armadas e médico
de domjpão V, ver Grande enciclopédia portuguesa e brasileira. Lisboa, Rio dejaneiro: Editorial Enci-
clopédica Ltda, [1967]. V. l,p. 122.
BPE, Cod. CIX/1-18, Academia Brasílica do Renascidos, 1759. Sobre o movimento de criação das
academias no Brasil ver MARCHANT, Alexander. Aspecls of the Enlightenment in Brazil. In:
WHITAKER, Arthur P. (Ed.) Lalin America and Üie Enlightenment. New York: D. Appleton Century,
.1942. p. 95-118.
Ver relação destes membros em MORAES, Rubens Borba de. BibUograjia brasileira do período coloni-
al. São Paulo: IEB, 1969, p. 317-323. Sobre o tema consultar FERREIRA, João Palma. Academias
literárias dos séculosXVIIe XVIII. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1982.
148

O u t r a m a r c a de e r u d i ç ã o e s t a m p a d a n o Códice filia-se a o critério de eleição


t e m á t i c a d a d o c u m e n t a ç ã o p r e s e n t e , q u e a c o m p a n h a certo p a d r ã o d a p r o d u ç ã o
historiográfica d o p e r í o d o . N e s s a s o b r a s q u e t o m a m a c o l ô n i a c o m o t e m a h á ,
v i n c u l a d o m a i s o u m e n o s d i r e t a m e n t e às o r i e n t a ç õ e s d a A c a d e m i a R e a l , u m a
c o m b i n a ç ã o das exigências eruditas do t r a b a l h o historiográfico q u e vinha se deli-
n e a n d o c o m o a p r o v e i t a m e n t o de temáticas associadas a o m e i o colonial - o escra-
v o , a n a t u r e z a , a sujeição, a m o r a l religiosa, o herismo c o n t r a invasores.
E m b o r a apresentando variações de estrutura, estilo narrativo e maior ênfase e m
u m a ou o u t r a razão explicativa (sob u m movimento p e n d u l a r entre a mítica, a reli-
gião e a razão pragmática), h á u m modelo presente, nos textos das primeiras histórias
dedicadas à América portuguesa — dentre eles, Pero d e Magalhães G a n d a v o , Gabriel
Soares d e Sousa, Fernão Cardim, frei Vicente do Salvador^ " — e nas obras de finais 40

do século X V I I e p r i m e i r a m e t a d e d o século X V I I I , c o m o A m b r ó s i o F e r n a n d e s
B r a n d ã o , Antonil, Sebastião d a R o c h a Pita e N u n o M a r q u e s P e r e i r a . ^ 34

E m muitos deles e n c o n t r a r e m o s a consagração em, capítulos ou a apresenta-


ç ã o d e m a n e i r a esparsa a o l o n g o das o b r a s d e p a s s a g e n s d e d i c a d a s à n a t u r e z a
colonial, à c a t a l o g a ç ã o dos titulares do g o v e r n o civil e eclesiástico, às m e m ó r i a s
d a legislação p o r t u g u e s a e à descrição s u m á r i a das capitanias d o Brasil.
As afinidades eletivas do códice p r e p a r a d o p o r Costa M a t o s o r e c o r r e m a esse
m e s m o p a d r ã o t e m á t i c o . Estão presentes no Códice os t e m a s q u e c o m p u n h a m o
p r o g r a m a básico das o b r a s históricas n o p e r í o d o , d e v i d a m e n t e m a t i z a d a s pelo
r e p e r t ó r i o de assuntos coloniais.
V e m o s , assim. Sebastião da R o c h a Pita, e m sua História da América portuguesa^
discorrer no livro primeiro sobre "Distâncias das suas costas, r u m o s e ventos d a sua
navegação" e "Extensão de seu continente", onde reunia elementos sobre as dimen-
sões espaciais do Brasil, especialmente d e sua c o s t a . ^ C o m sentido muito próximo,
34

encontramos c o m o documento d e abertura do Códice Costa Matoso a Tabuada das latitu-


des dos principais portos, cabos e vilas do mar do sul na América austral e portuguesa [....]

GANDAVO, Pero de Magalhães. Tratado da Terra do Brasil; História da Província Santa Cruz. (1576).
Belo Horizonte, Itatiaia/Sâo Paulo, Edusp, 1980; SOUSA, Gabriel Soares, Tratado descritivo do
Biasilan 1587. (1587). 5. ed. São Paulo: Nacioaul; Brasília: INL, 1987; CARDIM, Fernão. Tratados
da terra cgente do Brasil. Belo Horizonte; Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980; SALVADOR, frei Vicente
do.História do Brasil: 1500-1627. (1627) 7. ed. Belo Horizonte: Itatiaia- São Paulo: Edusp, 1982.
BRANDÃO, Ambrósio Fernandes. Diálogo das Grandezas do Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1977;
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasü. (1711). 3. ed. Belo Horizonte; Itatiaia, 1982;
PITTA, Sebastião da Rocha. História da América portuguesa. (1730) Belo Horizonte: Itatiaia; São
Paulo: Edusp, 1976; PEREIRA, Nuno Marques. Compêndio narrativo do peregrino da América. (1728). 7.
ed. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 1988. 2 v.
PITTA, Sebastião da Rocha, op. cit. nota 347, p. 20-2 1.
(documento 1), p r e p a r a d a pelos padres matemáticos. F r e q ü e n t e era a presença e m
obras sobre o Brasil de descrições das capitanias formadas. Elas a p a r e c e m e m G a n d a v o
(Das capitanias e povoações de portugueses que há nesta província, capítulo I I I ) , ^ e m trechos 34

dos Diálogos das Grandezas do Brasil, de Ambrósio Fernandes Brandão (Diálogo primei-
ro ^350 e r n Sebastião d a .Rocha Pita, Livro Primeiro (Fundações das outras províncias que
compreende a portuguesa América [...]),*^ e n ã o faltaria dentre os papéis q u e recolhe o
ouvidor de V i l a R i c a ao registrar a p o n t a m e n t o s de leitura d e certa o b r a c o m tais
informações (doe 128). O u t r o t e m a q u a s e obrigatório dessas o b r a s , referente ao
patrimônio régio n a colônia, suas receitas, minas de ouro e metais preciosos — u m dos
exemplos encontramos e m Sebastião da R o c h a Pita, Livro segundo, c o m Rendas destas
províncias para a coroa lusitana [...] —352 r i a objeto de muitas das séries q u e formam o
s e

Códice, c o m o os m a p a s do ouro e as relações de rendimentos (documentos. 44-50, 70-


73). O u t r o exemplo notável dessa afinidade estaria n a listagem n o m i n a l dos bispos
q u e a t u a r a m no Brasil, presente seja n o Compêndio narrativo do peregrino da América?^ seja
n o compêndio do bacharel, o Catálogo dos bispos do Brasil [...] (documento 126).

D e m a n e i r a a b u n d a n t e c o m p a r e c e r i a m nesses t r a t a d o s históricos m a t é r i a s
relacionadas à n a t u r e z a a m e r i c a n a , tema que n e n h u m historiador q u e se prezasse
poderia prescindir. Assim, pode-se facilmente colher, no que se refere à utilidade q u e
possuíam as árvores e plantas do Brasil, os capítulos d e frei Fernão C a r d i m , -Daí árvores
de fruto e Das árvores que servem para madeira'?^ outros e m Gabriel Soares de Sousa, Das
árvore? reais e paus de lei, e [.,.] diferentes propriedades dos cipós e folhas úteis;^^ de frei Vicente
do Salvador, Livro primeiro, Das árvores agrestes do Brasil'^^ de Antonil, em sua. o b r a
Cultura e opulência do Brasil [...] (cap. 7, dedicado às madeiras); e d e Sebastião da R o c h a
Pita, Livro Primeiro, As suas ervas, flores, árvores e frutas assim naturais como estrangeiras,^
dentre outros. A natureza mineira estaria representada nas folhas do Códice e m Notícias
e lembranças das taquaras ou canas montanhesas que se acham pelos, sertões dessas Minas e de
alguns cipós e seus préstimos (documento 113) e Arvores mais usuais e paus de que mais se usa
deles ( d o c u m e n t o 114). O uso m e d i c i n a l dos p r o d u t o s d a n a t u r e z a , assim c o m o
p a r a a l i m e n t a ç ã o , constituía igualmente m a t é r i a s d a preferência desses cronistas:

3 4 9
- GANDAVO, Pero de Magalhães, op. cit nota 346, p. 24-62.
3 5 ( 1
BRANDÃO, Ambrósio Fernandes, op. cit. nota 346, p. 24-62.
351. piTTA, Sebastião da Rocha, op. cü. nota 347, p. 45-78.
3 5 2
' Idem.
353. PEREIRA, Nuno Marques, op. cit. nota 34?, p. 61-
3 5 4
- CARDIM, Fernão, op. cit. nota 346, p. 35-37 e 40, respectivamente.
3 5 : )
' SOUSA, Gabriel Soares^, cit. nota 346, p. 211 epassim.

• - SALVADOR, frei Vicente do, op. cit. nota 346.


356

357. piTTA, Sebastião da Rocha, op. cit. nota 347, p. 19-47.


G a n d a v o , em Tratado da Terra do Brasil, tratado segundo, livro quarto, intitulado Dos
mantimentos da terra 358
e e m História da província Santa Cruz, capítulo V , Das plantas, manti-
mentos e frutas que, ha nesta província{^ o frei Vicente do Salvador, Livro primeiro, tam-
b é m chamaria Do mantimento do Brasil.^® Sob o m e s m o c a m p o d e interesse, C a e t a n o
da Costa Matoso reuniria Farinha de mandioca ou de pau (documento 112) e JVotuHas [...]
das' muitas comidas que se fazem de milho nas Minas (documento 113). O s mesmos autores
reservariam passagens p a r a se dedicar a o uso medicinal das ervas. Assim, temos Das
árvores que servem para medicinas (frei Fernão Carclim); * Das ervas que servem para mezinhas
36

(frei F e r n ã o Cardim); Das árvores e ervas medicinais e outras qualidades ocultas (frei Vicente do
Salvador, Livro p r i m e i r o ) ; ^ Das árvores medicinais (Gabriel Soares de Sousa); Das ervas
3

medicinais (Gabriel Soares de S o u s a ) , 3 6 3


com o correspondente e m M i n a s Lembranças
das ervas mais medicinais [...] (doe 114), dentre outros.

Confrontadas essas afinidades eletivas c o m os d o c u m e n t o s do Códice^ torna-se


evidente q u e seu compilador buscou em certa medida reproduzir o modelo, sem ter,
p o r é m , limitado-se a ele.
M u i t o além das orientações acadêmicas q u e participam d a seleção dos docu-
m e n t o s q u e coleciona, o desenho completo do Códice — c o m o u m espelho d e seu
formulador — n ã o ficaria completo sem se tomar outros fundamentos intelectuais ali
presentes.
Mais do que os pressupostos acadêmicos, as questões mais amplas ah documen-
tadas relaeionavam-se com sua formação acadêmica e cultural e m Portugal da primei-
r a m e t a d e do século XVTH.
Afinal, as predileções q u e o ouvidor d e Vila Rica revela e m seu repertório e r a m
herdeiras dos esforços de r e n o v a ç ã o cultural q u e atingiam o R e i n o desde fins do
século X V I I . As tertúlias promovidas n a A c a d e m i a e m torno do conde da Ericeira
incentivavam a crítica à escolástica, a realização d e experimentos científicos, sua dis-
cussão, e a manipulação de. instrumentos físicos e a s t r o n ô m i c o s . 364
D e outra parte, n a
q u a l i d a d e d e e s t u d a n t e no Colégio dos jesuítas, beneficiou-se d a r e n o v a ç ã o q u e
a l c a n ç a estas escolas n o c o m e ç o do século X V I I I . 3 6 5
N ã o é difícil s u p o r q u e a

3 5 S
- GANDAVO, Pero de Magalhães, op. cd. nota 346, p. 48-49.
3 5 9
' Idem, p.95-102.
3 6
° - SALVADOR, frei Vicente do, op. cú. nota 346, p. 68-70.
3 6
*- CARDIM, Fernão, op. çit. nota 346, p, 42-44.
3 6 2
- SALVADOR, frei Vicente do, op. at, nota 346, p. 67-68.
3 6 3
- SOUSA, Gabriel Soares, op. át. nota 346, p.202 e 206, respectivamente,
364. DIASJosé Sebastião da Silva, op. át. nota 288, p. 314.
3 6 5
- /éiV/.p. 316-319.
c u r i o s i d a d e é o interesse pe]a o b s e r v a ç ã o a d v e n h a m d a e d u c a ç ã o em m e i o dos
p a d r e s d a C o m p a n h i a , pois se isto soa contraditório, H e r n â n i C i d a d e esclarece-
ria: " E a m e r a c o m p r e e n s ã o das realidades práticas q u e explica q u e , s e n d o e m
P o r t u g a l verbosos escolásticos, sejam n a í n d i a colecionadores d e flora e, e m P e -
quim, astrônomos e m a t e m á t i c o s . " 3 6 6

E m meio à obscuridade q u e parecia cercar o ensino e o p e n s a m e n t o n a Univer-


sidade d e C o i m b r a , somente o bafejar desses novos ares p o d e explicar a formação de
u m espírito curioso e investigativo q u e o Códice Costa Matoso revela d e seu compilador.
Até o n d e nos foi possível saber, o e s t u d a n t e de Leis d e v e ter sido a l c a n ç a d o p o r
alguns esforços de revisão da escolástica q u e m a r c a m os anos 4 0 n a Universidade de
C o i m b r a . O b r a s e n t ã o l a n ç a d a s d e f e n d e m formas de p e n s a r alternativas q u e se
apoiavam n a experimentação e n a razão, deixando p a r a traz a metafísica d a escolástica.
Dois importantes expoentes nesse m o v i m e n t o são M a n u e l de A z e v e d o Fortes, q u e
publica Lógica racional, geométrica e analítica (1744), e o oratoriano J o ã o Baptista, c o m
Pkilosophia aristotélica restituía (1748). ^ A estes, n a defesa da experiência, se j u n t a r i a m
36

nomes c o m o Rafael J31uteau ê o padre T e o d o r o de Almeida, ainda longe do espírito


da reforma dos estatutos de 1772 e m que estas idéias constituiriam m o e d a corrente.
O t e m p o e m q u e estudou e viveu, C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o c o n h e c e u rea-
lidades culturais m a r c a d a s p o r ambivalências:

"[...] E enquanto se discutia a alma, as substâncias e outras coisas eruditas n a


clausura da universidade ou nos centros de ensino religioso, os palácios e as cortes
aplaudiam e riam õ burlesco do teatro de ópera e a novidade das experiências da física
de salão. [...J Estes são alguns dos parâmetros do movimento cultural de 1620 a 1807.
Em grandes linhas, eles constituem-se em torno de u m pilar, a escolástica recuperada,
pilar em que assenta todo o edüieio que o racionalismo e o experimentalismo procu-
ram renovar, em afirmação da laicidade do Poder e dos sistemas de saber." 1

C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o a p a r e c e , assim, m a r c a d o p o r tais p a r â m e t r o s .
O s m a i o r e s responsáveis, p o r é m , pelo m o v i m e n t o d e r e n o v a ç ã o p o r t u g u e s a
s e r i a m os estrangeiros e estrangeirados. J o s é Sebastião d a Silva Dias associaria seu
p a p e l a u m " d e s p e r t a r d a curiosidade intelectual n o p a í s " n o princípio do século
XVIII.. 3 6 9
D e m a r c a n d o p r i m e i r o impulso d a influência dos estrangeiros sobre a
cultura p o r t u g u e s a n a p r i m e i r a m e t a d e do século X V I I I I , q u a n d o e n t ã o se m o n t a

36
^ J
CIDADE, Hernâni, Lições de cultura è literatura portuguesas. 7. ed. Coimbra: s.n., 1959. V. 2, p. 316-
317.
3 6 7
' GOUVEIA, António Camões, op cit. nota 296, p. 426-7.
3 6 B
- Lbid. p 429-3Q.
369. pIAS, José Sebastião da Silva, op. cit. nota 288, p. 328. Sobre o terna, ver p. 329 e segs.
u m verdadeiro "teatro de u m a luta entre o elemento cosmopolita e o elemento se-
dentário da n a ç ã o " , estaria a chegada dos jesuítas italianos J o ã o Batista C a r b o n e e
Domingos Capacci e m 1722. Suas presenças n ã o apenas dinamizam a cultura cientí-
fica n o país m a s a t u a m b e m próximo ao estudante q u e a c o m p a n h a a m o n t a g e m e o
funcionamento do observatório astronômico feito no Colégio dos jesuítas. É decerto
nesse c a m p o q u e reside e m parte o interesse demonstrado e m sua viagem pelo Brasil
p o r matérias científicas q u e c o m p a r e c e m e m diversos documentos do Códice.^®
D o s estrangeirados p a r e c e ter absorvido outros c a m p o s d e interesse e, m e s -
m o , incentivo p a r a ação. A p o s t u r a q u e a d o t a d o m Luis d a C u n h a c o m o estimulador
do p e n s a m e n t o d a r e f o r m a da C o r t e , do exército> do e n s i n o , dos t r i b u n a i s , d a
a d m i n i s t r a ç ã o pública, ''-
3 1
t a m b é m alcançou de a l g u m a f o r m a C a e t a n o e m seus
dias d e estudante. O m e s m o , e m b o r a e m o u t r o c a m p o , se p o d e dizer a respeito do
p a p e l dos estrangeirados n a m e d i c i n a n o p e r í o d o , s o b r e t u d o se t o m a r m o s c o m o
referência os médicos j u d e u s Isaac de Sequeira S a m u d a e J a c o b d e C a s t r o S a r m e n t o ,
q u e se refugiam n a I n g l a t e r r a m a s que, através de contatos intensos e de p u b l i c a -
ções d e tratados sobre a n a t o m i a e doenças, forçam u m a r e n o v a ç ã o nessa discipli-
na. 3 7 2
E, assim, p r o v á v e l q u e o resgate p r o m o v i d o através d e sua c o l e ç ã o das.
práticas curativas e das anoma lias e n c o n t r a d a s e m M i n a s , c o m o o m e n i n o gigante
e u m a c r i a n ç a q u e fora c a p a z d e gerar muitos filhos, estejam relacionadas a esse
tipo d e curiosidade i n t e l e c t u a l . 3 7 3

N u m a "formosa q u i n t a " , o ex-ouvidor passou seus últimos dias, n o final d a


d é c a d a d e 1790, q u a n d o possivelmente ocorreu s u a m o r t e . 3 7 4
O retiro q u e e n c o n -

3.70. Refiro-me à Tabuada das latitudes [...] (documento 1), feita pelo mesmo padre com quem possivel-
mente conviveu em seus dias de estudante de primeiras letras; aos registros sobre técnicas de pro-
dução mineral (documentos 109 e 128) è agrícolas (documentos 110 e 111).
• DIAS, José Sebastião da Silva, op. cit. nota 288, p..322 esegs.
3 7 1

372
- Ibiã. p. 325-328.
3 7 3 ,
Os documentos que aqui me refiro são o 114, 116 c 117. Ver nas notas introdutórias aos documen-
tos outros que tratam de práticas curativas.
3 7 4 ,
A despeito dos esforços nos arquivos portugueses, não pudemos localizar nenhuma informação
precisa sobre a data ou razão da morte de Caetano da Costa Matoso. Nada conseguimos nos
registros paroquiais concentrados no ANTT, Aquilo de seguro que podemos afirmar é que sua
morte Ocorre entre 1787 c 1818, sendo a primeira data correspondente à indicação mais avançada
entre todos os anos que assinala Costa Matoso em sua Coleção de composições latirias (BNL, RES, cód.
3786) e ã última data relativa ao pedido de herança que faz Leonor Clara Joaquina de Sousa de seu
filho morto em Moçambique. Suspeitamos, porém, que sua vida não tenha ultrapassado a década
de 1790, uma vez que, cuidando de atualizar seus dados sobre o Brasil, registra no Códice Costa
Matoso (documento118) o governo de dom Luís de Vasconcelos e Sousa, mas não o de seu sucessor.
t r o u p a r e c i a c u m p r i r u m ideal d e exílio voluntário e m u m afastamento o n d e mis-
t u r a v a a p a z p a r a o refinamento intelectual nos estudos sobre A n t i g ü i d a d e clássi-
ca, L a t i m e Direito, c o m o distanciamento d a C o r t e e. a aversão a serviços reais, a
despeito d e seus atributos. Essa ú l t i m a impressão a p a r e c e n o a u t o r d o C a t á l o g o
d e ministros, a o afirmar q u e "[...] seria b e n e m é r i t o ministro e m t o d o o lugar q u e
fosse o c u p a d o , e d i g n a m e n t e escolhido."375

A conduta administrativa do ouvidor geral da c o m a r c a de Vila Rica e m M i n a s


Gerais e a formulação de u m a coleção de notícias da América portuguesa constituem
experiências extremas. E vizinhas. Assim como C a e t a n o Costa Matoso expandiu ao
limite seu p o d e r de firmar jurisdições n a aventura da travessia ultramarina, a reunião
d o conjunto de documentos atendeu a u m "sonho de u m a taxonomia totalizante",
m o v i d o p o r u m a " p a i x ã o pelo exaustivo", c o m o M i c h e l de C e r t e a u certa vez se
r e f e r i u - ^ . As experiências d a a v e n t u r a e d a cultura n ã o p o d e m p o r t a n t o estar aí
dissociadas. N a qualidade, de autêntica m a n d a l a de seu compilador e seu t e m p o , o
conteúdo do Códice revela dimensões q u e se superpõem, caudatários do dever oficial
c o m o ouvidor-geral, provedor e juiz da comarca, d a lealdade de magistrado a o sobe-
r a n o e a seus pares, e da curiosidade, da erudição, do a m o r à observação e do culto d a
ciência. D e v e m assim ser consideradas como u m a chave d a fortuna p a r a compreen-
der u m h o m e m e sua época, c o m as ambigüidades, impasses e mistérios que, afinal,
constituem o terreno irredutível (e irresistível) da História.
A reunião de diretrizes condicionadas péla realidade colonial e pela originalida-
d e do N o v o M u n d o e m correspondência c o m a sensibilidade aos p a d r õ e s eruditos
correntes na E u r o p a induz à reflexão sobre as razões q u e impossibilitaram o compila-
dor de transformar essas volumosas notícias e m u m a obra histórica. Se, ao q u e parece,
n ã o lhe faltava erudição, p o r q u e C a e t a n o d a Costa Matoso n ã o seguiu adiante e, ao
m o d o de alguns de seus companheiros d e toga, levou u m pouco mais além as orien-
tações da Academia real da História e transformou seu bosquejo e m obra histórica?
Q u e m sabe poderia perseguir mesmo u m a história épica das Minas d e ouro? Por que
se limita a insistir no papel de colecionador insaciável^ cuidando d e m a n t e r sua o b r a
atualizada até o fim de seus dias? T e r i a se desiludido com a carreira n a magistratura
real após tantos dissabores no Brasil? T e r i a lhe faltado u m n o m e a q u e m dirigir u m
encómio?

J
- BNL, RES, cód. 1077. Catálogo alfabético dos ministros de letras que serviram nestes reinos de Portugal e
Algarve, seus domínios e conquistas ultramarinas, relações, e tribunais, como nele se adverte. Dos mais antigos até o
presente de que se descobriu a noticia mais exata, 1763. fl. 107.
CERTEAU, Michel de. A escrita àa Plistôria. Rio de Janeiro; Forense-Universitária, 1932. p. 82.
Essas perguntas, p o r é m , subordinadas a razões de caráter pragmático q u e irre-
sistivelmente somos induzidos a associar diante de conteúdo tão rico — pela erudição
subjacente ao espírito do colecionador e pelo valor das informações ali reunidas sobre
a América n ã o são capazes de atender ao estímulo vital que. gerou o livro, alguns
séculos depois celebrizado c o m o Códice Costa Matoso. Seu sentido se recolhe à cultura
típica dos magistrados, u m a vez q u e aí se vislumbram procedimentos de. n a t u r e z a
corporativa q u e e m p r e e n d e a magistratura letrada a m e a ç a d a ante as tendências de
fortalecimento do p o d e r da coroa. Se, c o m o j á vimos Stuart Schwartz assinalar, a
expansão de u m corpo de letrados sobre as posições administrativas constituiu o retra-
to do papel que este grupo representava p a r a a política do Estado m o d e r n o , ^ ? p o r
outro lado, c o m o v e m l e m b r a n d o António M a n u e l Hespanha, o corporativismo des-
te m e s m o grupo soube reverter este processo a favor do fortalecimento d a rede b u r o -
crática. 3 7 8
Neste sentido, os magistrados estariam desde o século X V I I b u s c a n d o
adquirir o controle d e mais u m instrumento fundamental d e governo: a informação
sobre o país. A r e u n i ã o contínua, incessante de papéis c o m u m repertório d e
informações sobre a América, atendia à sede de informação sobre o I m p é r i o q u e
deveria estar à disposição das necessidades da corporação a q u e pertence, antes do
q u e ao rei. A própria rota que seguiu o Códice, durante muito tempo tendo estado e m
grandes bibliotecas d e magistrados até ser finalmente despojado n a casa d e leilões
londrina, indica a força da tradição de sua vinculação corporativa.
A p r e p a r a ç ã o d e u m repertório d e valiosas notícias s o b r e a A m é r i c a p o r t u -
guesa, a b r a n g e n d o m e m ó r i a s , d o c u m e n t o s jurídicos e m a p a s é, pois, herdeira d a
;

c o n t i n u i d a d e dessa c o n c e p ç ã o c o r p o r a t i v a dos m a g i s t r a d o s . Foi e m a t e n d i m e n t o


a esse objetivo q u e o c o l e c i o n a d o r realizou seu intento c o m especial sagacidade,
s a b e n d o dirigir a coleta de informações àqueles temas d e g r a n d e significado nos
dias q u e c o r r i a m : o acesso às minas, as terras e m disputa c o m a E s p a n h a , as rique-
zas e x p o r t a d a s , os r e n d i m e n t o s d a F a z e n d a real e d o bispado m i n e i r o ,
A vocação q u e é desfechada (e m o l d a d a ) pelo p a r a d i g m a d a A c a d e m i a por-
tuguesa de História é b a r r a d a pelos limites corporativos d a magistratura. O Códice
é e n t e n d i d o , assim, n ã o u m projeto i n t e r r o m p i d o m a s c o m o a exata expressão do
a l c a n c e d a q u e l a p r o d u ç ã o intelectual letrada.
A originalidade deste seu perfil esteve sustentada n a c o m b i n a ç ã o r a r a (que o
Códice acaba por ser o resultado) dessas características e propriedades, a princípio anta-
gônicas, que r e ú n e m o espírito inquieto do cientista-diletãnte, o historiador erudito, o
magistrado n a m a n u t e n ç ã o de suas prerrogativas, o colecionador de inquéritos, todos
perfis p r o v o c a d o s pela vertigem d a decisiva p r i m e i r a m e t a d e do século X V I I I n a
América e nas Minas, vocações amalgamadas no Códice Costa Matoso.

SCHWARTZ, Stuart E., op. cit. nota 255.


HESPANHA, António Manuel, op. cit. nota 100.
Idem, p. 199.
155

Códice Gosta Matoso

Coleção das notícias dos primeiros


descobrimentos das minas na América que
fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo
ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que
tomou posse em fevereiro de 1749,
&
vários papéis
157

Coleção das notícias dos primeiros


descobrimentos das minas na América que
fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo
ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que
tomou posse em fevereiro de 1749
Tabuada das latitudes dos principais portos,
cabos e ilhas do mar do sul na América austral
e portuguesa pelos padres Diogo Soares e
Domingos Capaci matemáticos régios
}

no Estado do Brasil

T á b u a de latitudes das capitanias do Rio de Janeiro, São


Paulo e Minas Gerais, tomadas em diversos momentos da missão
dos jesuítas matemáticos nomeados por dom J o ã o V para a reali-
zação de mapas da marinha e do sertão do Estado do Brasil, e m
1729. Devido ao procedimento de ocultar os resultados, as longi-
tudes, normalmente graduadas tomando-se como referencial o
meridiano de Paris, foram relacionadas ao meridiano do Rio de
Janeiro e elaborou-se u m a tábua de latitudes em substituição aos
usuais quadros de longitudes. O s dados operados serviram de base
para outras expedições de demarcação territorial na segunda me-
tade do setecentos.
Deve-se ressaltar a incorreção n a grafia dos topónimos, na
denominação das capitanias e na atribuição do título 'comarcas' a
divisões administrativas correspondentes aos termos das vilas de
Minas Gerais, excetuadas Rio das Mortes e Serro Frio.
Espectador da preparação e movimentação da missão de ne-
gociação do Tratado de Madri nos primeiros anos da década de
1750j o ouvidor Caetano da Costa Matoso teve acesso ao docu-
mento provavelmente nesse momento.
As latitudes antecedem u m grupo de notícias sobre o desco-
brimento de Minas Gerais, padrão dos relatos eruditos do gênero,
caracteristicamente introduzidos pela indicação de coordenadas
geográficas, e denotam o objetivo de formar u m a 'coleção', ou
seja, "ajuntamento; coleção de várias coisas que se tem lido e ano-
tado".
Autoria, l o c a l e data: Diogo Soares e Domingos Capaci;
capitanias do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais; 1730-
1737.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, bastarda do
século XVIII, cursiva, com alguma regularidade e ligeira inclina-
ção no traçado para a direita. C h a m a m a atenção o desenho e o
ductus das maiúsculas, com traços horizontais de enfeite e duplica-
ção de hastes; o " d " é uncial, formando nexo quando seguido do
"e"; o " h " tem a forma do " E " arredondado; " s " final pendente,
com meia laçada à esquerda ou à direita. E m b o r a de traço mui-
to distinto d a página de título, traz peculiaridades que a reme-
tem à autoria de Gaetano da Costa Matoso. Registram-se rasuras.
Utilização d e traços de guarda antecedendo as colunas numéri-
cas. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : F o r a m suprimidas as g u a r d a s e
indicada em rodapé a grafia original atualizada dos topónimos
muito divergentes dos levantados pela pesquisa.
Cópia manuscrita:
I H G B , lata 66, dòc. 2 1 . TABUADA de longitudes e latitudes de grande
parte do Brasil observadas pelos astrônomos empregados na dentarca-

T A B U A D A S de longitudes e latitudes de grande,parte do Brasil.


Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de J a -
neiro., t, 45, v. 1, p. 121-149, 1882. Com variantes quanto à
ordem dos lugares e às medidas das latitudes.
L E I T E , Serafim. Padre Diogo Soares. Matemático,, astrônomo e
geógrafo de Sua Majestade no Estado Imperial do Brasil (1684-
1748). Brotéria, Lisboa, n. 45, p. 596-604, 1947.

C a p i t a n i a d o N o r t e d o Espírito S a n t o , pela costa,


s e g u n d o as o b s e r v a ç õ e s d o s a n o s d e 1 7 3 0 e 1 7 3 1

S a n t a C a t a r i n a d e M o z , último *termo p a r a o norte 21-20-18


P a r a í b a d o Sul 21-38-44
cabo de São T o m é , 21-59-00
praia de Carapebus , 22-14-35
M a c a é e ilha d e S a n t a n a 22-21-25
c i d a d e d e C a b o Frio 22-52-37
Saquarema .-. *. 22-58-20
Maricá , 23-00-37
R i o de J a n e i r o , 22-55-20
aldeia d e M a n g a r a t i b a 22-57-05
vila de A n g r a dos Reis 22-59-01
ilha G r a n d e , n a p r a i a V e r m e l h a , ... 23-09-24
vila de Parati, último t e r m o p a r a o sul 23-12-42
161

C a p i t a n i a d e S ã o P a u l o , p e l a c o s t a , s e g u n d o as o b s e r v a ç õ e s d o s a n o s d e
1735, 1 7 3 6 e 1737

vila d e U b a t u b a , último *termo p a r a o n o r t e 23-24-15


vila de S ã o Sebastião 23-48-11
fortaleza d e S a n t o Amaro y na b a r r a d e Santos 23-59-37
vila d e São V i c e n t e 23-58-42
vila de Santos 23-56-20
vila d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d e I t a n h a é m 2 4 - 1 1-06
vila d e I g u a p é , o mesmo
vila d e C a n a n é i a , o mesmo
vila d e P a r a n a g u á , 25-29-53
b a r r a de G u a r a t u b a o mesmo
rio de Saí o mesmo
vila do R i o d e São Francisco 26-13-18
e n s e a d a de [ I t a p o c u ] 1
26-47-54 [ fl. 2 v . ]
e n s e a d a do rio de Itajaí 26-56-24
e n s e a d a e rio de C a m b o r i ú - G u a m e 27-00-24
B a i t e p e r á , p o n t a do rio e e n s e a d a das G a r o u p a s , 27-05-24
vila e ilha de S a n t a C a t a r i n a 27-34-41
C a m p i n h a s de B i r a q u e r a » , • 28-08-43
vila de L a g u n a 28-30-40

T á b u a d a s l a t i t u d e s d a s p r i n c i p a i s c i d a d e s vilas, l u g a r e s ,
3

p o r t o s , cabos, rios e ilhas d a A m é r i c a austral e p o r t u g u e s a ,


s e g u n d o as o b s e r v a ç õ e s d o s d i t o s p a d r e s

C a p i t a n i a d o R i o de J a n e i r o , pela costa e.sertão

S a n t a C a t a r i n a de M o z , último t e r m o d a costa p a r a o norte 21-20-18


b a r r a do P a r a í b a do Sul 21-38-44
vila de São Salvador, n o m e s m o rio , - , ; 21-44-58
aldeia dos Goitacases 21-50-58
c a b o de São T o m é ....................21-59-00
p r a i a de C a r a p e b u s 22-14-35

No original, Tapacróia.
162

M a c a é e ilha de S a n t a n a . . . , . , . , . 22-21-25
aldeia d e C a m p o s Novos .......................................................................22-41-10
vüa de Macacu 22-41-12
aldeia d e São B a r n a b é , n a e n s e a d a do rio ; 22-43-46
aldeia d e S ã o P e d r o , n a e n s e a d a d e C a b o Frio 22-50-57
fazenda de S a n t a C r u z „ 22-52-03
c i d a d e de C a b o Frio 22-52-37
*passagem do P a r a í b a p a r a as M i n a s e *termo p a r a o sertão 22-09-16
R i o d e J a n e i r o e cidade d e São Sebastião 22-55-20
freguesia de S a q u a r e m a ,. , 22-58-20
aldeia d e M a n g a r a t i b a , na enseada d a ilha G r a n d e , ••• 2 2 - 5 7 - 0 5
vila d e A n g r a dos Reis 22-59-01
freguesia de M a r i c á 23-00-37
ilha G r a n d e , n a p r a i a V e r m e l h a 23-09-24
vila d e Parati, último t e r m o d a costa p a r a o sul 23-12-42

[ fl- 3 ] Capitania das Minas Gerais do O u r o Preto e D i a m a n t e s , pelo sertão

C o m a r c a de Vila R i c a e O u r o Preto

p a s s a g e m de P a r a b u c o , último t e r m o d o sertão p a r a o sul 22-00-00


p a s s a g e m do rio d e C a r a n d a í e ' e n g e n h o de M i g u e l d a Costa 20-57-52
*registro da B o r d a do C a m p o 21-15-34
arraial do Suaçuí, t e r m o p a r a o rio das Mortes 20-37-14
p a s s a g e m das C o n g o n h a s , na C o n c e i ç ã o 20-32-14
p a s s a g e m das C o n g o n h a s , no Peixoto , 20-31-49
e n g e n h o do * c a p i t ã o - m o r M a n u e l de Seixas „ 20-34-14
e n g e n h o do c a p i t ã o - m o r D o m i n g o s M o r e i r a - 20-31-50
arraial das C o n g o n h a s 20-30-00
arraial do O u r o B r a n c o 20-29-45
arraial d e Nossa S e n h o r a da Soledade 20-29-34
arraial d a Itatiaia 20-28-30
Chiqueiro 20-28-52
arraial de S a n t o A n t ô n i o do M o r r o 20-27-30
arraial de Lavras N o v a s , 20-26-41
Vila R i c a d o O u r o Preto , 20-23-56
arraial d a C a c h o e i r a 20-22-04
163

arraial de S ã o B a r t o l o m e u 20-21-03
m o r r o da Itabira 20-17-59
G a r a v a t o , último *termo p a r a o n o r t e 20-16-07

Comarca do Ribeirão do Carmo e M a t o Dentro

Ribeirão do C a r m o 20-21-27
arraial de São Sebastião . ; 20-19-58
arraial de São C a e t a n o 20-19-58
arraial do B o m J e s u s d e F u r q u i m 20-20-00
arraial de A n t ô n i o Pereira 20-17-58
b a r r a d o G u a l a x o e passagem do G u a l a x o d o Sul 20-30-14
arraial d e G u a r a p i r a n g a ; =
. 20-40-40
arraial d o Pinheiro < 20-32-05
arraial dos C a m a r g o s „ 20-15-13 [ -
ü 3 v
-1
arraial do Inficionado 20-09-58
arraial das C a t a s Altas e [termo?] p a r a o C a e t é 20-04-54

Comarca do Caeté

vila d o C a e t é 19-54-49
arraial de S a n t a B á r b a r a 19-56-48
b a r r a do C a e t é , 19-57-55
arraial do B r u m a d o 19-58-13
arraial de S ã o M i g u e l 19-54-03
R i o d e São Francisco-Mirim 19-55-33

Comarca do Sabará

G a r a v a t o , último t e r m o p a r a o sul 20-16-07


ribeiro dos M a c h a d o s , 20-06-45
arraial dos R a p o s o s 19-57-15
vila do S a b a r á 19-52-36
Roça Grande , 19-53-48
Contagem 19-52-03
Curral del-Rei , •> 19-56-03
arraial das C o n g o n h a s 19-59-32
lavras do * d e s e m b a r g a d o r D i o g o C o t r i m d e Sousa 19-47-22
164

arraial d e Santa Luzia 19-45-38


c o n v e n t o das M a c a ú b a s 19-41-11
T r ê s Barras , 19-26-20
Taquaraçu. • 19-36-00
Taquaraçu-Mirim 19-09-40
Rotação 19-17-22
rio do C i p ó , último * t e r m o p a r a o norte 19-00-00

C o m a r c a do Pitangui

vila d o Pitangui 19-41-07


B e r n a r d o Vieira 19-59-59
T e n e n t e Borba . 19-58-24
E n c r u z i l h a d a , passado o córrego das G u a r d a s „ 19-46-00
"passagem do P a r a p p c b a 19-00-12
[fl. 4 ] Pompeu.. ....19-21-57
As Almas • 18-53-27
Prazeres 18-37-47
Morro da Garça 18-34-18
arraial d e S a n t o A n t ô n i o - 18-42-27
Riacho Fundo 19-52-12
Rodeador, ... 19-05-27 .
Pega-Bem ............................... 19-15-37
Sete L a g o a s 19-25-57
Buritis 19-37-12
Bento Gonçalves 19-46-27
Itatiaiuçu - 19-10-57
Vera Cruz 20-03-29
Paraopeba • 20-10-00

C o m a r c a do Serro do Frio e M i n a s N o v a s

serra d a L a p a 19-06-40
p é d a serra 1
8 - 5 1 -00
Paraúna 18-38-33
arraial do Milho Verde 18-29-03
arraial d o Tijuco ™ • 18-14-03
Caeté-Mirim : 18-04-30
passagem do Jequitinhonha ; 18-07-56
Ribeiro Manso 18-03-18
165

C a p ã o Grosso , 17-51-36
pé do m o r r o •. 17-41-36
Curralinho 17-34-48
vila de, Nossa S e n h o r a d o B o m Sucesso do F a n a d o . 17-14-48
Chapada 17-06-37
Á g u a Suja „.„ , 16-59-08
Contagem .... 16-47-36
*passagem do J e q u i t i n h o n h a , 16-44-12
m o r r o de I t a c a m b i r a 17-15-55
córrego de São D o m i n g o s 16-48-42
p a s s a g e m d o rio de Sucuruí 17-00-27 [fl. 4v. ]
* e n g e n h o de P e d r o P a u l i n o 17-06-27
Olhos d'Ágüa 17-21-30
Caiçava.,.1... 17-11-00
Santana , - - 17-1 1-30
Bigodes, último ' t e r m o p a r a o sertão da Bahia • 17-31-15
Vila d o Príncipe 18-37-28
arraial dos C ó r r e g o s 18-55-27
arraial de N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , 19-04-39
arraial do M o r r o de G a s p a r Soares 19-14-58
arraial de Itaverava , 20-39-50

C o m a r c a d o R i o das M o r t e s

C a t a s Altas d a N o r u e g a . . 20-40-30
Lagoa Dourada 20-55-22
passagem de Camapuã.... 20-42-20
vila d e S ã o J o s é 21-05-30
Prados 20-58-00
vila de São [João] del-Rei' 2
21-07-40
rio das M o r t e s P e q u e n o 21-10-50
rio G r a n d e , nas passagens 21-19-20
Encruzilhada da Aiuruoca , , 21-50-55
arraial de A i u r u o c a 21-57-56
arraial da L a g o a 22-02-00
arraial de B a e p e n d i 21-55-56
[São G o n ç a l o ] 5
22-06-42

No original,.Vila de São José del-Rei.


No Original, Sango.
166

R i o V e r d e ..... , 22-17-57
serra d a M a n t i q u e i r a , último *termo p a r a o sul 22-30-00

Capitania de São Paulo, pelo sertão

arraial d a P i e d a d e .,. 22-41-30


vila d e G u a r a t i n g u e t á .........v.......-.. T 22-46-OQ
vila d e P i n d a m o n h a n g a b a 22-55-00
[íl. 5 ] vila de T a u b a t é 22-55-00
vila de M o g i 23-29-50
aldeia de Nossa S e n h o r a d a Graça.,..., 23-25-34
aldeia e capela de T i e t ê 23-30-24
c i d a d e de São P a u l o 23-33-10
vila d e P a r n a í b a 23-32-06
fazenda d e A r a ç a r i g u a m a t 23-31-06
vila de S o r o c a b a 23-31-14
vila de I t u 23-27-02
no sítio d e P e d r o s a .- 2 3 - 4 8 - 2 0
fazenda de I t a n g u á 24-01-14
vila d e C u r i t i b a 25-25-43

• 2<

[fl. 7 ] Notícias dos primeiros descobridores das primeiras


minas do ouro pertencentes a estas Minas Gerais, pessoas mais
assinaladas nestes empregos e dos mais memoráveis casos
acontecidos desde os seus princípios

Relato de u m paulista desde os primeiros registros de ocorrên-


cias de ouro em Minas Gerais, a partir de 1693, ao início dos confli-
tos entre paulistas e ernboabas,, incluindo menção à descoberta do
Brasil, a expedições de busca de minerais ao longo dos séculos
X V I e XVII e ao bispado de dom frei Manuel da Cruz, empossado
em 1748. Dividido em quatro partes, encadeia, nas três primei-
ras, os descobridores e descobrimentos dos principais núcleos
auríferos, de acordo com a seqüência de serras e bacias hidro-
gráficas, num movimento pendular entre o geográfico e o cronoló-
gico; na última, centra-se n a figura de Borba Gato e no assassi-
nato de d o m Rodrigo Castelo Branco, com seus desdobramentos.
Aspectos relevantes são as descrições de migrações, de crises de
abastecimento e de técnicas de mineração. Sua tônica é franca-
mente favorável aos paulistas e descobridores, com ênfase n a idéia
de sacrifício, e crítica em relação aos "filhos de Portugal".
Constitui tipologia documental complementar a certidões
atestando fidelidade, lealdade, serviços prestados e cargos ocu-
pados por determinado súdito, para a obtenção de mercês e pri-
vilégios junto à Coroa.
O interesse do ouvidor em reunir relatos sobre o povoa-
mento de Minas Gerais, seja por exigências do cargo ou por seu
perfil intelectual, coincide com o falecimento dos remanescentes
dos primeiros povoadores de Minas e a com fixação de suas
reminiscências sob a forma escrita, colecionadas por particula-
res. A anotação feita pelo ouvidor ao final do texto denota seu
objetivo de formar u m a 'coleção', ou seja, "ajuntamento; cole-
ção de várias coisas que se tem lido e anotado".
Autoria, local e data: Bento Fernandes Furtado; Minas
Gerais; ca. 1750.
U s o n a h i s t o r i o g r a f i a : O documento marca, de forma
indireta, toda a historiografia sobre acontecimentos do início d a
colonização do território de Minas Gerais por três vias: foi fonte
p a r a a r e d a ç ã o do Fundamento histórico, introdução a o p o e m a
Vila Rica, de Cláudio Manuel da Costa (Ouro Preto: Tipografia
Vila Rica, 1897); por este meio e por cópias que circulavam nas
mãos de particulares,, subsidiou a redação de memórias no final
do século XVIII e início do X I X ; Manuel Pires da Silva Pontes
publicou-o em versão resumida ( P R I M E I R O S descobridores das
minas do ouro n a capitania de Minas Gerais. Revista do.Arquivo
Público Mineiro, Belo Horizonte, t. 4, v. 1, p . 83-98, 1889).
Divulgador do. relato, Afonso E. de T a u n a y c o m e n t a - o
longamente, defendendo a autoria de Bento Fernandes Furtado
(História geral das bandeiras paulistas. São Paulo: I m p r e n s a Ofi-
cial, Museu Paulista, 1948. V. 9, p. 101-109); buscando definir
sua originalidade, compara e discute suas várias apropriações e
outras cópias idênticas, além d e esclarecer variados detalhes a
respeito dos integrantes das bandeiras (v. 9, p. 104} e indicar
alguns possíveis erros de transcrição {v. 9, p. 109). Dentre outros
documentos do Códice, que mencionam os conflitos entre paulistas
e reinóis, obtém nele matéria para a sua reconstituição de episó-
dios da Guerra dos Emboabas, o caráter dos personagens, suas
principais ações, as atitudes dos líderes emboabas, as reações
dos paulistas, a atuação dos governadores, a fundação de vilas e
de diversas biografias (v. 9, p. 449-641 e, ainda que muito me-
nos freqüente, 1949, v. 10, p. 3-234). José Ferreira Carrato ser-
ve-se deste testemunho para argumentar a favor do papel desta-
cado dos comerciantes no povoamento de Minas Gerais [Igreja,
Iluminismo, e escolas mineiras coloniais: notas sobre a cultura da
decadência mineira setecentista. São Paulo: Nacional, Edusp,
1968. p . 3 e 8). Charles Boxer utiliza-o para analisar a migração
descontrolada dos primeiros anos e a crise de abastecimento e de
mão-de-obra (A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de
u m a sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969. p .
70). Augusto de Lima Júnior o adota para ressaltar o povoamen-
to instantâneo e a opulência dos primeiros anos de Minas Gerais
(A capitania das Minas Gerais. 3. ed. Belo Horizonte: Instituto de
História, Letras e Artes, 1965. p. 43-45). Donald Ramos baseia-
se no documento nas descrições de descobertas de ouro, crise de
abastecimento e carestia e implantação de autoridades n a re-
gião mineradora (A social history of Ouro Preto: stresses of dynamic
urbanization in colonial Brazil, 1695-1726 Gainesville: University
T

of Florida, 1972, p . 6-99, passim).


A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato com características do gê-
nero epidítico ou demonstrativo da oratória, ã narrativa descre-
ve, erigindo em tópica, a ação de bandeirantes, tipificados como
heróis, cujos feitos são recompensados com o sucesso na busca
de minerais preciosos: a luta contra os aborígenes, estereotipa-
dos como ameaçadores e ferozes; a natureza local, estereotipada
como rude e inóspita, constituindo-se como obstáculo, cuja su-
peração integra a ação heróica dos bandeirantes; ç o elogio da
virtude (encomio) dos que se e m p e n h a m no avanço colonizador
(entendido como o " b e m c o m u m " que os esforços individuais
devem almejar) nas áreas de mineração — avanço providencial-
m e n t e retribuído q u a n d o as personagens situam seus esforços
acima da ambição pessoal —, segundo lugares-comuns tradicio-
r nais do retrato biográfico encomiástico. A atuação da divina
providência, distribuindo prêmios e castigos, constitui-se em tó-
pica relativa ao avanço ou ao prejuízo da expansão colonial nas
JL- f- áreas de mineração e. evidencia também, sempre como tópica, a
vontade de Deus escolásticamente inscrita na ordem das coisas e
f f * *
profeticamente figurada nos fatos e na natureza. A vituperação
dos "ingratos filhos da Europa", visando mobilizar a repulsa do
leitor, efetiva-se pela constituição dos reinóis como tipos viciosos,
cujo ódio, ambição e inveja são contrastados com a caracteriza-
ção virtuosa de personagens paulistas. (JPF)

C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna. Q u a n t o à
tipologia, é bastarda italiana, do tipo chanceleresca, bastante
r e g u l a r i z a d a e c a l i g r a f a d a , q u e lhe confere o a s p e c t o de
semicursiva. Nela, destacam-se as hastes superiores verticais,
arrematadas por olhos destrógiros horizontais, arredondados e
cheios, que embelezam o texto, as quais a p a r e c e m alternadas
com hastes verticais simples, levemente inclinadas para a direi-
ta; as hastes inferiores apresentam o mesmo processo de feitura.
Esta letra c h a m a a atenção pelo cuidado das iniciais maiúscu-
las, ricas em volutas e laçadas. Mesmo o sinal de nasalização de
vogais (o til} é feito com esmero, em meia voluta; os dois "ss"
apresentam-se como variação do "s" caudado: o primeiro longo
(semelhante ao " f m a s sem o traço horizontal), seguido de u m
" s " curto, arredondado. Acentua-se a cursividade no folio 27,
Nas duas últimas linhas do último parágrafo (fólio 29) e nota
final altera-se a escrita com letra personalizada e evoluída, idên-
tica à d á página do título, portanto da autoria de Caetano da
Costa Matoso, que efetua várias rasuras (fólios 12v., 13, I4v.^
16v., 23). (YDL)
Cópias impressas:
P R I M E I R O S descobridores das minas do O u r o na capitania de
Minas Gerais. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo H o r i -
zonte, t; 4, v. 1, p . 83-98, 1899. Versão resumida por Manuel
Pires da Silva Pontes.
U M C I M E L I O de Felix Pacheco. Jornal do Comércio, R i o de
Janeiro, 16 jun. 1946, p. 2; 23 jun. 1746, p . 2; 3 0 j u n . 1946,
p. 2; 7 jul. de. 1946, p. 2; 14 jul. 1946, p. 2.
T A U N A Y , Afonso de E. Documentos inéditos sobre as primei-
ras descobertas do ouro em Minas Gerais. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 4 4 , p . 329-
352, 1948.
T A U N A Y , Afonso de E. Relatos sertanistas. São Paulo: Martins,
1953. p . 21-57.

N a é p o c a de 1693, veio A n t ô n i o R o d r i g u e s de A r z ã o , n a t u r a l d a vila, hoje


c i d a d e , d e S ã o P a u l o , h o m e m s e r t a n e j o , c o n q u i s t a d o r do ' g e n t i o dos
sertões d a C a s a da Casca, c o m outros muitos naturais das outras vilas de.
S e r r a A c i m a , e m cuja p a r a g e m esteve a q u a r t e l a d o alguns a n o s , de o n d e faziam
e n t r a d a s e assaltos a o gentio mais p a r a o c e n t r o do sertão. E v e n d o p o r aquelas
veredas alguns ribeiros c o m disposição de ter o u r o , p e l a experiência q u e t i n h a das
p r i m e i r a s m i n a s q u e se t i n h a m descoberto e m São P a u l o , C u r i t i b a e P a r a n a g u á ,
q u e a i n d a hoje existem d a n d o suas *faisqueiras e a u m e n t a d a p o v o a ç ã o , c o m ' m i -
nistros de J u s t i ç a e estendida c o m a r c a d e "ouvidoria, fez algumas experiências nos
tais ribeiros c o m uns p r a t o s d e p a u ou de estanho, e foi a j u n t a n d o algumas 'faís-
cas q u e p ô d e a p a n h a r c o m aqueles débeis instrumentos c o m q u e p o d i a fazer, s e m
f e r r a m e n t a a l g u m a d e m i n e r a r , e j u n t o u três 'oitavas d e o u r o .
E m t e m p o q u e acossado do gentio q u e o c o m b a t i a c o m m u i t a fúria e m a i o r
falta de m a n t i m e n t o s , r o m p e u o sertão p a r a a p a r t e d a c a p i t a n i a do Espírito S a n -
170

to, o n d e c h e g o u e s c a p a n d o de g r a n d e s perigos do "gentio, fomes e esterilidades,


c o m c i n q ü e n t a e t a n t a s pessoas q u e o a c o m p a n h a v a m , e n t r e b r a n c o s e "carijós
[ fl. 7v. ] domésticos de sua a d m i n i s t r a ç ã o e dos mais c o m p a n h e i r o s , nus e / / e s f a r r a p a d o s ,
sem pólvora n e m c h u m b o , q u e e o único r e m é d i o c o m q u e os sertanistas socor-
r e m as faltas d e víveres, c o m a g r a n d e inteligência e t r a b a l h o q u e a p l i c a m c a ç a n d o
as aves e feras d o sertão p a r a se sustentarem. A C â m a r a d a dita vila tinha, c o m o
nos mais portos de. m a r , o r d e m d e S u a Majestade de q u e semelhantes conquista-
dores e diligentes de descobrimentos de haveres fossem socorridos de todo o n e -
cessário de q u e carecessem, r a z ã o p o r q u e a C â m a r a d a q u e l a vila lhes assistiu c o m
t o d o o vestuário e p r o v i m e n t o p a r a se r e f o r m a r e m c o m t o d a a g r a n d e z a , e m satis-
fação das ordens de S u a M a j e s t a d e , q u e n a q u e l e t e m p o m u i t o favorecia aos vassalos
q u e o serviam e m semelhantes empregos.
Fez p a t e n t e A n t ô n i o R o d r i g u e s de A r z ã o as três "oitavas de o u r o q u e levava
a o " c a p i t ã o - m o r regente,-' e delas m a n d a r a m fazer d u a s m e m ó r i a s , q u e u m a ficou
a o dito c a p i t ã o - m o r e o u t r a ao dito A r z ã o . E q u e r e n d o este, a i n d a q u e enfermo e
m a l t r a t a d o dos trabalhos passados do sertão, t o r n a r a e n t r a r pelo m e s m o c a m i n h o
p o r o n d e saiu a conquistar o gentio e a estabelecer as m i n a s c o m mais reforçadas
diligências, o n ã o p ô d e fazer p o r n ã o a c h a r n a q u e l a vila q u e m quisesse a c o m p a n h á -
lo. P a r a reforçar o p o d e r d e q u e carecia, se resolveu a passar p o r m a r ao R i o de.
J a n e i r o , e dali p a r a São Paulo. C h e g a d o q u e fosse, se lhe alterou a e n f e r m i d a d e ,
d e sorte q u e o pôs e m perigo de m o r t e — q u e se lhe seguiu —, e desesperado d a
e m p r e s a q u e j á n ã o p o d i a conseguir deu c o n t a dela a u m c u n h a d o seu c h a m a d o
B a r t o l o m e u B u e n o , q u e se a c h a v a b a n i d o p o r haver p e r d i d o todo o seu cabedal a
*jogos d e p a r a r . Ágil p a r a s e m e l h a n t e s diligencias e interessado a m e l h o r a r de
f o r t u n a m a i s p e l o t r a b a l h o que. p e l o j o g o , Se a r m o u e dispôs p a r a a e m p r e s a ,
c o n v o c a n d o mais c o m p a n h e i r o s p o d e r o s o s , q u e foram Miguel d e Almeida, Anto-
nio d e A l m e i d a e outros d e q u e n ã o h á l e m b r a n ç a , n a era d e 1697, e n c a m i n h a n -
do a sua j o r n a d a p a r a a dita C a s a d a Casca q u e até hoje está p o r descobrir, p o r
dois motivos: o p r i m e i r o , p o r q u e esta diligencia teve o u t r o efeito, c o m o a d i a n t e
d i r e m o s ; o s e g u n d o , p o r q u e está p o v o a d o de b r a v o s e orgulhosíssimos gentíos,

[ fl. 8 ] q u e t ê m i m p e d i d o várias diligências q u e se lhes / / t ê m feito p o r o u t r o s b a n d e i -


rantes. Estes, c o m o dizíamos, i n d o n a m e s m a diligência descobrir a C a s a d a C a s -
ca, a c h a r a m mostras d e o u r o n a p o v o a ç ã o q u e hoje é c h a m a d a Itaverava, q u e j a
e n t ã o assim a d e n o m i n a v a o gentio — é v o c á b u l o de "língua brasílica q u e q u e r
dizer pedra luzente. F i z e r a m seu arraial n a q u e l e lugar e u m a p e q u e n a p l a n t a d e u m
"alqueire de milho, q u e era o c o m q u e se a c h a v a m . E v e n d o q u e o sertão d a C a s a
d a C a s c a era m u i t o a g r o e falto d e víveres silvestres, p o r s e r e m t u d o m a t o s e
aspérrimas b r e n h a s , e falto do mais favorável género de caças, c o m o v e a d o s , antas,

João Velasco çlç Molina.


171

e m a s , porcos monteses e m a i s gêneros d e animais, e m e l silvestre, q u e pelos c a m -


pos gerais e r a m mais a b u n d a n t e s d o q u e pelos sertões d e m a t o s incultos m o n t a -
n h o s o s e p e n h a s c o s o s , se r e s o l v e r a m a p a s s a r a t r o p a p a r a a p a r t e d o rio d a s
V e l h a s , o n d e p o d i a m passar à *montaria c o m mais descanso e m e n o s t r a b a l h o ,
e n q u a n t o v i n h a m as *novidades do triste *alqueire d e milho q u e h a v i a m p l a n t a -
do c o m a l g u n s l e g u m e s . C h e g a d o q u e fosse o t e m p o e m q u e c o n s i d e r a v a m os
m a n t i m e n t o s e m t e r m o s de suprir, p a r a fazerem mais experiência n o m e s m o lugar
e c o n t i n u a r a diligência principal, q u e era a d a C a s a d a C a s c a , e c h e g a d o s q u e
fossem d e volta ao lugar d a Itaverava, depois, de passados seis meses d e m o n t a r i a ,
j á n o a n o d e 1698, c o l h e n d o ós m a n t i m e n t o s , fizeram mais reforçadas experiências
n o m e s m o lugar e, a c h a n d o o u r o c o m mais conta, fizeram novas roças e avisaram
a seus p a r e n t e s e amigos a São Paulo e às vilas p a r a q u e viessem p a r a estabelece-
r e m m i n a s e a m p l i a r e m os descobrimentos e c o n t i n u a n d o c o m as diligências d e
socavar e l a v r a r e m alguns bocados.
A este t e m p o , saíam o *coronel Salvador Fernandes F u r t a d o d e M e n d o n ç a , o
' c a p i t ã o M a n u e l G a r c i a V e l h o e outros sertanistas c o n q u i s t a d o r e s dos m e s m o s
"gentios e p o v o a d o r e s das vilas seguintes d a de São Paulo p a r a o leste desta p a r t e ,
pela m e s m a p a r a g e m d a Itaverava, o n d e os descobridores e s t a v a m c o m bastantes
gentios q u e traziam conquistados de / / o u t r a s partes do m e s m o sertão do C u i e t é e [ íl. 8v. ]
rio D o c e (cuieté q u e r dizer mato verdadeiro, sem mescla de campo algum), e m largueza de
muitos centos d e *léguas até a costa do m a r , que corre desde o R i o de J a n e i r o até
a B a h i a . E t o p a n d o estes sertanistas c o m estes novos mineiros, quis o sobredito
Miguel d e A l m e i d a m e l h o r a r das a r m a s inferiores q u e trazia c o m e t e n d o troca de-
iMs c o m as q u e trazia o coronel Salvador F e r n a n d e s F u r t a d o , e lhe p r o m e t e u d e
:

volta p o r u m a *cravina e u m a *catana t o d o o ouro q u e se houvesse tirado e n t r e os


d a sua comitiva. C o n v e i o o dito coronel n o trato, n ã o p o r interessado n o negócio,
senão p o r socorrer a q u e m ficava e n t r e g u e a mais perigos c o m m e l h o r e s a r m a s .
Deu-se busca a o ouro, q u e havia a p o u c a experiência e m e n o s agilidade d a q u e l e
t e m p o extraído entre os intervalos do divertimento d a caça e outros e m p r e g o s n e -
cessários aos sertanejos p a r a o a l i m e n t o e c o n s e r v a ç ã o d a vida, e se n ã o a c h o u
senão doze "oitavas dc o u r o , q u e recebeu o dito coronel de volta das a r m a s q u e
deixava a o satisfeito m i n e i r o . E c o n t i n u a n d o viagem p a r a a vila d e T a u b a t é , sua
p á t r i a , c o m a r c a de São P a u l o , c o m os gentios q u e levava j á domésticos, c o m os
mais d a c o m p a n h i a do dito capitão M a n u e l G a r c i a Velho, o q u a l , a m b i c i o n a n d o o
q u e r e r ser ele o p r i m e i r o possuidor" do ouro que daquelas minas se tirava, cometeu
ao dito coronel dar-lhe pelas ditas doze oitavas de ouro duas índias das mais formosas
que, a sua escolha, no seu lote se achasse; e, c o m efeito, escolheu o dito coronel u m a
mocetona d e vinte e quatro anos^ p o u c o mais ou menos, com u m a filha de onze p a r a
doze, que, catequizadas^ se batizaram, a m ã e com o n o m e de A u r o r a e a filha c o m o
de Célia, que há poucos anos m o r r e u n a vila do Pitangui, e m casa d e u m a filha do
dito coronel, a q u e m transferiu a sua administração.
172

C h e g a d o s que foram estes sertanejos à vila de T a u b a t é , d o n d e e r a m naturais,


[fl. 9 ] e n t r e outros p a r e n t e s e amigos, e m o r a d o r e s , os veio visitar Carlos / / P e d r o s o d a
Silveira, h o m e m principal d a q u e l a vila, de b o a n o t a , e n g e n h o e c a p a c i d a d e p a r a
todo o emprego de,negócios de maior porte das "repúblicas. E a c h a n d o a novidade
d o novo descobrimento d e ouro d a Itaverava, e h a v e n d o a si as ditas doze "oitavas
q u e se a c h a v a m n a m ã o do sobredito M a n u e l G a r c i a V e l h o , m a r c h o u c o m elas
p a r a o R i o d e J a n e i r o , e d a n d o conta delas e, do n o v o descobrimento d e ouro ao
"governador,2 q u e então era o antecessor de A r t u r de Sá e Meneses, foi b e m rece-
bido do governador e p r e m i a d o c o m u m a patente d e *capitão-mor d a dita vila d e
T a u b a t ê e c o m "provisão de "provedor dos quintos, c o m o r d e m p a r a assentar "casa
d e fundição n a m e s m a vila, por ser das primeiras e m que desembocava do, digo, o
c a m i n h o q u e vinha do sertão da situação das minas, t e m p o e m q u e , c o m o aviso
q u e havia enviado o descobridor Bartolomeu Bueno a seus parentes e amigos, c o m o
fica dito, h a v i a m estes e muitos de todas as mais vilas c o n c o r r i d o p a r a as novas
minas. E j á concorria ouro p a r a a Casa d e Fundição, e havendo-se provido t a m b é m
a G a r c i a R o d r i g u e s V e l h o p o r * g u a r d a - m o r geral das repartições dos ribeiros e
"datas e ao dito "coronel Salvador Fernandes F u r t a d o p o r "escrivao-geral das m e s -
m a s repartições e ribeiros descobertos.

E c o m o , c o m a m u i t a gente q u e c o n c o r r i a d e t o d a s a q u e l a s vilas e costas do


m a r circunvizinhas, se n ã o p o d i a m a c o m o d a r todos os m i n e i r o s n o s p o u c o s desco-
bertos q u e h a v i a , p o r f o r ç a , h o u v e e n t r e eles desuniões, r a z ã o p o r q u e , c o m p e t i n d o
e m u l a ç õ e s uns c o m os o u t r o s , se t r a n s m o n t a r a m p o r vários r u m o s , a n i m a d o s c o m
as e s p e r a n ç a s de q u e p o d i a c a d a u m descobrir m i n a s de q u e se a p r o v e i t a s s e m c o m
o t r a b a l h o p r ó p r i o . D e i x a n d o a divina p r o v i d ê n c i a a o desvelo d a q u e l e s a n i m o s o s
vassalos da C o r o a p o r t u g u e s a , q u e p r e t e n d i a e n r i q u e c e r c o m os haveres ocultos
[ fl. 9v. ] p o r a q u e l a s largas e a s p é r r i m a s m o n t a n h a s , q u e a p o d e r / / d e p e r i g o s , fomes, sedes
e t r a b a l h o s r o m p e r a m aqueles fragosos m o n t e s e incultas b r e n h a s , n ã o só p a r a u t i -
lidades deles c o m o t a m b é m p a r a o g r a n d e a u m e n t o d a m o n a r q u i a p o r t u g u e s a , foi
servido guiá-los e d e p a r a r - l h e s os haveres q u e se e n c o b r i a m e m tão d i l a t a d o m a p a ,
c o m o é a g r a n d e extensão d e sertão t ã o dilatado d a p o v o a ç ã o destas M i n a s . O
p r i m e i r o q u e d e u a p ú b l i c o ou a o "manifesto o seu d e s c o b r i m e n t o foi M i g u e l
G a r c i a , t a u b a t e a n o — q u e se r e p a r t i u p e l a m a i o r p a r t e dos seus "paisanos pelo
dito c o r o n e l S a l v a d o r F e r n a n d e s , c o m assistência do g u a r d a - m o r - , d e cujo n o m e
ficou d e n o m i n a d o o rio c h a m a d o M i g u e l G a r c i a , q u e c o n t i n u a n d o sua c o r r e n t e
r e c e b e n d o mais b r a ç o s c o m c o n t i n u a d a s "faisqueiras, n ã o a u m e n t o u só ds con-
v e n i ê n c i a s , s e n ã o t a m b é m as suas á g u a s , até e n c o n t r a r - s e f a z e n d o b a r r a n o ri-
beirão do C a r m o , levando sempre faisqueiras de ouro a unir-se c o m aquela
c o r r e n t e m a i s rica de q u e e m seu lugar se d a r á notícia.

Sebastião de Castro e Caldas.


173

Logo n o m e s m o t e m p o , saiu à luz A n t ô n i o Dias, n a t u r a l t a m b é m d a vila d e


T a u b a t é , c o m o d e s c o b r i m e n t o do O u r o Preto e A n t ô n i o Dias, lugares a m b o s e m
q u e se a c h a situada Vila R i c a — q u e c o m p r e e n d e n d o A n t ô n i o Dias, d e n o m i n a ç ã o
q u e lhe ficou de seu p r ó p r i o descobridor - , q u e se r e p a r t i r a m p e l o "coronel Sal-
v a d o r F e r n a n d e s F u r t a d o , *escrivão-geral, c o m o está dito, c o m comissão do *guar-
d a - m o r , q u e , p o r ser paulista e fazer p u n d o n o r d e n ã o assistir e m descobrimentos
e ter j á notícia de outros q u e os seus patrícios h a v i a m feito, o fez p o r interposta
pessoa do seu escrivão, c o m o p o r ser h o m e m d e b o a n o t a n a p r u d ê n c i a , p o r evitar
a l g u m distúrbio q u e p o d i a h a v e r entre os descobridores, pelas razões q u e a d i a n t e
diremos..
A o m e s m o t e m p o , n a v i z i n h a n ç a destes riquíssimos c ó r r e g o s , d e s c o b r i u o
r e v e r e n d o p a d r e J o ã o d e F a r i a Fialho, n a t u r a l / / d a ilha d e S ã o Sebastião, q u e [fl. 1 0 ]
tinha v i n d o p o r "capelão das tropas t a u b a t e a n a s , o córrego c h a m a d o P a d r e Faria,
d e n o m i n a ç ã o d e r i v a d a d e seu p r ó p r i o n o m e , a q u a l situação c o m p r e e n d e a ex-
tensão de Vila R i c a . E t a n t o este descoberto c o m o os m a i s sobreditos f o r a m d e
riquíssimas "pintas, q u e se r e p a r t i r a m pelos ditos t a u b a t e a n o s , q u a s e e x c l u i n d o
aos paulistas, q u e p o u c o s , p o r a m i z a d e , e n t r a r a m nas repartições, q u e e n t r e estes
e a q u e l e s h a v i a u m a q u a s e a d v e r s ã o s i m p á t i c a , p r o c e d i d a d e s e r e m ps d e São
Paulo d e vila m a i o r e c o m p o s t a de h o m e n s ricaços e de elevados p u n d o n o r e s e
aqueles d e vila mais p e q u e n a e m e n o s poderosos, dotados p o r é m d e alentados e
s u p e r a b u n d a n t e s brios, r a z ã o p o r q u e , n ã o q u e r e n d o utilizar-se dos d e s c o b r i m e n -
tos dos paulistas, se a r r o j a r a m c o m t o d o o e m p e n h o a fazer este, e n ã o g o s t a r e m
d e q u e aqueles lograssem dos seus. M a s aqueles, levados dos seus brios e p u n d o -
nores, fizeram o m e s m o c o m n ã o m e n o s capricho e e m p e n h o , e fizeram os desco-
b r i m e n t o s q u e se seguem.
O u t r o [ B u e n o ] , F r a n c i s c o B u e n o d a Silva, p r i m o d o p r i m e i r o e x p l o r a n t e
descobridor d e Itaverava, q u e ficou desprezado e deixado p o r a q u e l e t e m p o p o r -
q u e a g r a n d e z a dos novos descobrimentos havia convidado aos h o m e n s c o m mai-
ores conveniências, subindo a g r a n d e serra c h a m a d a hoje o m o r r o d e Vila R i c a e
m u i t o t e m p o o d e P a s c o a l d a Silva, m ã e e f o n t e de o n d e n a s c e r a m estes ricos
córregos j á descobertos, e voltando-o ao p o e n t e — q u e j á e r a m vertentes do rio das
Velhas, cabeceiras d o rio d e São Francisco, q u e d e s e m b o c a n a B a h i a caudaloso,
c o m muitas "léguas d e foz, e aqueles córregos, cabeceiras do rio D o c e , q u e desá-
g u a n a capitania do Espírito S a n t o , n ã o m e n o s agigantado nas suas correntes.
descobriu o dito B u e n o segundo o córrego c h a m a d o O u r o Bueno e o d o rio das / / [ fl. 10v. ]
Pedras, de grandiosas e avultadas pintas, q u e , c o n v i d a n d o seus amigos e p a r e n t e s
paulistas, l a v r a r a m o p o u c o q u e p u d e r a m , d e i x a n d o o mais e m a i s rico p a r a os
vindouros, c o m o o t e m p o m o s t r o u nos muitos q u e e n r i q u e c e r a m n a q u e l e s ribei-
ros, e a i n d a hoje c o n t i n u a m neles "faisqueiras o c u p a n d o mineiros.
A o m e s m o t e m p o q u e o dito B u e n o descobriu estes ribeiros: e convidou aos
amigos e p a r e n t e s , c o m o está dito, entre estes convidou a o *alcaide-mor J o s é d e
174

C a m a r g o Pimentel p a r a lavrar de m e i a u m a g r a n d i o s a "pinta q u e t i n h a nas "datas


q u e lhe c o u b e . E n t r e os q u a i s , B u e n o e C a m a r g o , s u c e d e u u m caso d i g n o d e
m e m ó r i a , e m a b o n o d a l i b e r a l i d a d e d e u m e m a i s a v a r e z a do o u t r o . É o caso
(ainda q u e cause d i g r e s s ã o a o fio d a história).
3

A t e m p o q u e o dito C a m a r g o e B u e n o estavam "lavando à "bateia u m a "cata


e m q u e assistia o B u e n o a m a n d a r tirar "cascalho e m q u e de fora se estava v e n d o
luzir o o u r o , e o C a m a r g o n a lavagem, afastado trinta ou q u a r e n t a passos do sócio
c o m u m t a c h o a o p ê de si, o n d e os lavadores l a n ç a v a m o o u r o q u e nas bateias
a p u r a v a m e m u m " t a n q u e de á g u a q u e p a r a isso estava p r e p a r a d o , c h e g o u u m a
m u l h e r p o b r e c o m u m a m e n i n a órfa, sua filha, a p e d i r u m a esmola pelo a m o r d e
D e u s . O C a m a r g o , q u e era h o m e m p o d e r o s o , liberal e d e generosos lanços go-
v e r n a d o s p o r m u i t o b o m j u í z o e e n t e n d i m e n t o , d e q u e era m u i t o b e m d o t a d o ,
m e t e u a m ã o n o t a c h o è q u a n t o p ô d e a b r a ç a r c o m as grandes m a n o p l a s q u e t i n h a
do o u r o q u e estava j á n o tacho, m a n d a n d o estender a m a n g a d a "camisa a m u -
lher, lhe l a n ç o u nela o o u r o q u e p ô d e c a b e r n a m a n o p l a d a . O sócio, q u e estava
n o t a n d o a q u e l a l i b e r a l i d a d e do precioso m e t a l e m q u e ele t a m b é m t i n h a igual
p a r t e , e s t r a n h a n d o - l h e a a ç ã o , lhe disse: " D e v a g a r , q u e isso t a m b é m é nosso!"
R e s p o n d e u o liberalíssimo C a m a r g o : " E v e r d a d e , q u e faltava lá t a m b é m o seu
[ fl. 1.1 ] q u i n h ã o . " E m e t e n d o / / s e g u n d a vez a m a n o p l a c o m m a i s e m p e n h o de tirar
mais, o lançou na manga, receptáculo da primeira liberalidade, em forma que
levou a m e n d i g a n t e m a i s d e dois "arráteis de ouro p a r a socorro d a sua p o b r e z a ,
nas m a n o p l a d a s d a liberalidade c a m a r g u e s a .
E é muito justo q u e , antes que passemos a d a r notícia dos m a i s descobrimentos
e seus operários, demos do q u e fez este famoso paulista, e m t u d o generoso, e. c o m fim
glorioso e v e n t u r o s o p o r sua m o r t e .
Deste lugar d e o n d e t i r a r a m grosso cabedal se r e c o l h e r a m p a r a São P a u l o , a
suas casas, fugindo das g r a n d e s fomes q u e p a d e c i a m p o r falta de m a n t i m e n t o s ,
q u e c h e g o u a l g u m p o u c o q u e houve d e m i l h o , pelos poucos q u e n o passado a n o
h a v i a m p l a n t a d o p a r a sustentar os muitos q u e h a v i a m c o n c o r r i d o à fama q u e re-
t u m b a v a das g r a n d e z a s de o u r o q u e se t i n h a d e s c o b e r t o , a t r i n t a e a q u a r e n t a
"oitavas o "alqueire d e m i l h o , e. o do feijão a setenta e oitenta; e os c a m p o s e
m o n t a n h a s j á estéreis de caças e víveres silvestres, q u e o m u i t o p o v o q u e p o r todas
as p a r t e s p e n e t r a v a tinha destruído e c o n s u m i d o . D e sorte q u e , n a distância de
trinta e q u a r e n t a dias d e j o r n a d a q u e havia das M i n a s a São P a u l o , p a r t i a m sem
p r o v i m e n t o a l g u m , e m u i t o s a c a b a r a m de fome, s e m r e m é d i o , e h o u v e tal q u e

Digressão retoricamente prevista como artifício que visa evitar monotonia na descrição sucessiva
de achados auríferos e da fundação de povoados, neste caso, introduzindo pequeno episódio (seqüên-
cia de atos com unidade — começo, meio e fim - dentro de uma ação maior) também de fundo
moralista. [JPF)
175

m a t o u ao seu c o m p a n h e i r o p o r lhe t o m a r c o m a sua *tenaz d e p a u u m a p i p o c a d e


milho q u e do seu b o r r a l h o saltou p a r a o do o u t r o , dos p o u c o s grãos q u e c a d a u m
t i n h a p a r a alimentar a vida n a q u e l e dia, aprovando-se, p o r este caso, c o m realida-
d e , o p r o v é r b i o c o m u m de q u e a fome n ã o t e m lei.
D e s t e perigo inevitável se retirou o nosso *alcaide-mor C a m a r g o p a r a S ã o
Paulo, n o a n o d e 1700 (verdadeiramente nesta terra a era d o u r a d a e p a r a P o r t u -
gal o d e m a i o r felicidade), c o m a sua comitiva e escravatura, c o m o faziam os mais
mineiros q u e h ã o t o m a v a m a resolução d e se transmontarem pelo sertão dentro / / [ Q* 1 - ]
i V

e c a m p o s gerais a p r o c u r a r os lugares m a i s desertos, m e n o s c o m b a t i d o s e mais


férteis d e víveres silvestres n a e n t r a d a do a n o d e 1700. E n o princípio d o v e r ã o
deste m e s m o a n o v o l t a r a m o u t r a vez os retirados p a r a São P a u l o e os refugiados
nas m o n t a n h a s , a t e m p o q u e j á os m a n t i m e n t o s p l a n t a d o s n o d e 1699 e s t a v a m
capazes de socorrer no d e 1700. Entre estes veio o nosso alcaide-mor, p r e v e n i d o
p a r a fazer t a m b é m diligência de descobrimentos. E, c o m efeito, p a s s a n d o a mes-
m a serra q u e da p a r t e d o p o e n t e , vertente do rio das V e l h a s , havia d a d o a p r i m e i -
ra g r a n d e z a , q u e c o m o B u e n o h a v i a m tirado, p a r a a p a r t e d o nascente, seguindo
a m e s m a serra, à vista dela, q u e vai fazer n a sua p o n t a a situação das C a t a s Altas,
e m m e i o da sua distância, descobriu u m ribeiro c h a m a d o o C a m a r g o , h e r d a n d o
d o seu d e s c o b r i d o r o seu glorioso apelido, d a n d o e m satisfação d e sua g e n e r o s a
diligência h a v e r e s d e o u r o q u e a i n d a hoje d u r a m , Conservando p o v o b a s t a n t e ,
q u e f o r m a u m a freguesia d e b o m r e n d i m e n t o eclesiástico. Depois d e d a r a parti-
lhas este, d e s c o b r i m e n t o e lavrar as suas *datas pelo m o d o d a q u e l e t e m p o , a p r o -
v e i t a n d o só o fáci] e. deixando o m e l h o r e mais custoso p a r a os vindouros, conti-
n u o u a p e n e t r a r o sertão à p a r t e oriental, s e g u i n d o o rio P i r a c i c a b a — q u e é o
m e s m o q u e dizer lugar onde o peixe chega vindo das barras do mar e dali não passa a subir para
cima, por impedidos das cachoeiras muito altas, que não podem avançar —, p e l o q u a l r i o
foi v e n d o algumas *faisqueiras limitadas, até c h e g a r ao lugar o n d e hoje, digo, se
descobriu u m ribeiro p e q u e n o , b r a ç o do m e s m o P i r a c i c a b a , q u e c o r r e d a p a r t e
e s q u e r d a d a s u a c o r r e n t e d e u m a s assinaladas s e r r a s , q u e d e m u i t o l o n g e u m
altivo pico q u e levanta ao céu serve d e sinal d a q u e l e lugar c o m o p a d r ã o q u e D e u s
quis p ô r p a r a ser b u s c a d o e a c h a d o pelo tal / / p a d r ã o , c o m b o a s e g r a n d i o s a s [ fl. 12 ]

' p i n t a s , o n d e se situou e fez *capela com a invocação d e São Miguel e se a d m i n i s -


t r a r a m s a c r a m e n t o s p o r u m *capelão q u e consigo trazia.
N e s t e lugar viveu alguns anos bastantes a c o m p a n h a d o de dois filhos h o m e n s ;
e c o m o a sua idade e a providência d o altíssimo j á o c h a m a v a m p a r a o descanso
p r o m e t i d o aos b o n s , l h e d e s t i n o u u m a e n f e r m i d a d e q u e logo o a m e a ç o u c o m
perigo de vida. N e s t e t e m p o se e m p e n h a v a o capelão a q u e fizesse seu t e s t a m e n t o
n a o u m a só, m a s m u i t a s vezes, a q u e ele respondia c o m a l g u m a p a i x ã o , dizendo
n ã o carecia de testamento, p o r q u e o q u e ele possuía era p a r a p a g a r o que devesse
e o q u e sobrasse era d e sua m u l h e r e filhos, os quais e s t a v a m p r e s e n t e s e e r a m
capazes de s u a administração^ r a z ã o p o r q u e lhe rogava o n ã o amofinasse c o m tal
176

t e s t a m e n t o é n ã o agravasse mais a sua enfermidadcj a qual s e m e m b a r g o q u e ia


e m crescimento c a d a vez mais; o *capelão, ainda que p o u c o satisfeito de recusar o
d o e n t e f a z e r s e u t e s t a m e n t o , c o n t i n u o u a a d m o e s t á - l o p a r a se c o n f e s s a r e
s a c r a m e n t a r - s e , a o q u e r e p u g n o u m u i t a s vezes, d i z e n d o n ã o e r a a i n d a t e m p o , e
q u a n d o o fosse ele teria o c u i d a d o de o c h a m a r . C o m cuja resposta se afligiu e
desconsolou m u i t o o capelão, s u p o n d o a o enfermo i m p e n i t e n t e ou renitente, v e n d o
a d o e n ç a e m crescimento c a d a vez mais. O t e m p o , p o r é m , ou o sucesso, m o s t r o u
o c o n t r á r i o , c o m evidência d e mistério superior, m e r e c i d a talvez d e a l g u m a devo-
ç ã o particular d a r a i n h a dos anjos, M a r i a Santíssima. E foi o caso.
C h e g a n d o u m dia de s á b a d o , m u i t o antes q u e rompesse o dia, se p ô s a p é e
se vestiu c o m u m dos melhores Vestidos q u e tinha, e pôs cabeleira e o e s p a d i m à
cinta (e n ã o cause isto m a r a v i l h a p a r a aquele t e m p o , e m q u e t o d o s os mais h o -
[ fl. 12v. ] m e n s se / / t r a t a v a m p a r c a m e n t e c o m os vestuários sertanistas, e esse s e m p r e ves-
tido c o m o n a C o r t e , c o m vestidos ricos) e m a n d o u dizer ao capelão, a o r o m p e r d o
dia, q u e era t e m p o d e ouvir confessar e s a c r a m e n t a r , o q u e ouviu o capelão c o m
j ú b i l o s d e alegria, v i n d o p r o n t a m e n t e , e o confessou, p e r c e b e n d o c o m t o d a a
perfeição, j u í z o e talento de corte, c o m o se n ã o estivesse t a n t o t e m p o enfermo. E
m a n d o u a r m a r altar no m e s m o aposento o n d e disse missa, e a ouviu o enfermo d e
j o e l h o s , e r e c e b e u o s a c r a m e n t o . A c a b a d o o ato, se despiu e, deitando-se n a c a m a ,
p e d i u a o c a p e l ã o lhe assistisse c o m c u i d a d o , q u e era c h e g a d o o t e m p o d a sua
p a r t i d a ; e e n t r o u n a agonia, a c a b a n d o a vida c o m graves d e m o n s t r a ç õ e s d e p r e -
d e s t i n a d o , q u e sem d ú v i d a o seria, pois era h o m e m c a r i t a t i v o , d e b o m â n i m o ,
liberal e de b e m fazer, isento d e soberanias, a q u e inclina a riqueza, e respeito q u e
s e m p r e logrou e m sua vida.

C o n t i n u a - s e c o m as n o t í c i a s d o s m a i s d e s c o b r i d o r e s q u e f o r a m a m p l i a n d o os
descobrimentos e das pessoas mais assinaladas neste exercício p a r a tanto
b e m c o m u m e aumento de toda a monarquia portuguesa

N o m e s m o a n o d e 1700, T o m á s L o p e s d e C a m a r g o , p a r e n t e c o n t í g u o d o
* a l c a i d e - m o r J o s é d e C a m a r g o P i m e n t e l , d e s c o b r i u o u r o e m o m o r r o d e Vila
R i c a , q u e a o depois s e n h o r e o u a a m b i ç ã o do *mestre-de-campo Pascoal d a Silva,
cujo n o m e ficou suposto naquele; e a este e x e m p l o se foi e s t e n d e n d o o p o v o p o r
[ fl. 13 ] ele, e até hoje está p o v o a d o e t e m d a d o consideráveis / / m i l h õ e s d e c a b e d a l e
m u i t a s ' c a p e l a s fundadas nele.
Seguindo o m e s m o m o r r o , à m a r g e m pela p a r t e oriental, mais c h e g a d o , p o -
r é m , à serra, c a m i n h o u Bento Rodrigues, taubateano, e descobriu o lugar t a m b é m
hoje c h a m a d o B e n t o R o d r i g u e s , havido d e seu p r ó p r i o d e s c o b r i d o r , distante d o
O u r o P r e t o q u a t r o p a r a cinco *léguas, q u e deu grosso cabedal, e a i n d a hoje está
d a n d o , com povoação de u m a famosa capela, continuando seus haveres pela m e s m a
177

serra, oride hoje h á várias lavras, c o m o são as do 'coronel J o ã o Rodrigues Fraga, o


' c a p i t ã o J o ã o F a v a c h o , transferido n o capitão G a e t a n o Ferreira Fialho p o r v e n d a
que lhe fez p o r 50 mil ' c r u z a d o s , e outros vários, q u e estão descavando os m o n t e s ,
m i n a n d o penhascos e cortejando o coração d a terra p a r a haver os seus haveres.
S e g u i n d o este m e s m o [rumo?], à m a r g e m da m e s m a serra, o capitão Salva-
d o r de F a r i a A l b e r n a z , n a t u r a l d a vila de T a u b a t é - h o m e m dos principais dela e
d e b o a n o t a , fervoroso e m obras de c a r i d a d e , c o m suficiente luz d a m e d i c i n a , q u e
socorria naqueles desertos a muitos p o b r e s e enfermos carecidos d e r e m é d i o s , de
q u e ele a n d a v a sempre b e m p r o v i d o , a l é m das ervas e raízes p a r a vários a c h a q u e s
d a n a t u r e z a h u m a n a q u e cria esta misteriosa terra, d e q u e ele tinha c o n h e c i m e n t o ,
e n a sua c o m p a n h i a , c o m g r a n d e despesa d a s u a fazenda, s u s t e n t a v a a m u i t o s
reinóis q u e , d e s a m p a r a d o s , p e r e c i a m entregues à miséria e necessidades d a q u e l e
t e m p o , t r a t a n d o , c u r a n d o deles c o m a m a i o r e m a i s b e m o r d e n a d a c a r i d a d e e m
suas enfermidades até s a r a r e m aqueles a q u e m D e u s queria estender a vida e d a r
fim aos q u e completavam o / / decretado dela e adiante duas "léguas do lugar [ fl. 13v. ]
do C a m a r g o , j á referido, descobriu vários córregos ricos, c h a m a d o s Passa D e z e
Inficionado, q u e hoje é u m a famosa p o v o a ç ã o c o m r e n d o s a vigararia e t e m con-
t i n u a d o c o m os r e n d i m e n t o s de seus haveres, a p r o f u n d a n d o a o c e n t r o d a t e r r a e
pelos m o r r o s d a n d o o u r o , o mais subido e m 'quilates de todos os ouros d e outras
partes.
C o r r e n d o os tempos e m 1709 p a r a 1710, h o u v e o pernicioso " l e v a n t a m e n -
t o , de q u e e m seu lugar d a r e m o s notícia, dos ingratos filhos d a E u r o p a c o n t r a os
f a m o s o s d e s c o b r i d o r e s destes h a v e r e s , p a r a r e m é d i o d e tantos desvalidos e u r o -
p e u s e c o n t r a os paulistas, n ã o m e n o s e m p r e g a d o s nos m e s m o s descobrimentos e
beneficios aos m e s m o s ingratos, n o m e este d e paulistas odioso e n t r e aqueles q u e
os n ã o p u d e r a m imitar n e m deixar de receber destes os favores, q u e os constituí-
r a m ingratos, p r ó p r i a s ações a q u e a r r o j a a inveja, e m q u e m n ã o p e r m a n e c e m
m e r e c i m e n t o s é s o b r a a a m b i ç ã o d e s e n h o r e a r o alheio p o r m e i o s violentos ou
m e n o s razoáveis.
Este b o m h o m e m , Salvador d e Faria, era possuidor de boas lavras e ' d a t a s
de terras minerais, c o m o descobridor, a l é m de estar imenso povo a c o m o d a d o p o r
aqueles ribeiros, seus descobertos desde o t e m p o das partilhas. H a v i a muitos reinóis
q u e , invejosos, a p e t e c i a m o logro d a q u e l a s l a v r a s , e t e n d o a o c a s i ã o do geral
l e v a n t a m e n t o q u e f u l m i n a r a m c o n t r a os paulistas, t i v e r a m p r ó x i m a o c a s i ã o d e
lograr o seu intento; p o r q u e este era n a t u r a l d e T a u b a t é , c o m a r c a d e S ã o P a u l o , e
g e r a l m e n t e os n a t u r a i s d e S e r r a A c i m a , r e p u t a d o s p o r paulistas^ e m p r e g o d o ve-
n e n o s o a r p ã o do ódio e a m b i ç ã o , a r g u i r a m culpas fantásticas a este b o m / / h o - [fl. 1 4 ]
m e m e o p r e n d e r a m , r e m e t e n d o - o p a r a o R i o d e J a n e i r o , o n d e , d a n d o - l h e as
bexigas, m o r r e u delas e m casa p r ó p r i a , o n d e as justiças lhe d e r a m h o m e n a g e m
p o r n ã o levar culpa f o r m a d a . E c o m a sua ausência e m o r t e lhe t i r a r a m as datas
178

p o r devolutas, c o r a n d o o r o u b o c o m c a p a de justiça, l o g r a n d o p o r este m o d o o


ódio o seu e m p r e g o e a a m b i ç ã o o seu desejo. Suposto, e n t r e muitos ingratos, se
a s s i n a l a r a m o u t r o s p r i m o r o s a m e n t e agradecidos,
N o a n o d e 1702, c o r r e n d o a m e s m a m a r g e m da serra duas "léguas a d i a n t e
p a r a a m e s m a p a r t e oriental, o n d e faz p o n t a a serra, nos córregos q u e dela nas-
cem,, descobriu o "licenciado D o m i n g o s Borges, n a t u r a l de São P a u l o , o u r o c o m
m u i t a c o n t a , q u e foi r e p a r t i d o pelos m i n e i r o s d e s a c o m o d a d o s , e ficou p o v o a d o
a b u n d a n t e m e n t e , q u e hoje é o famoso arraial das C a t a s Altas, c o m freguesia p o -
p u l o s a , V i g a r a r i a colada de m u i t o r e n d i m e n t o e p e r m a n e c e em. lavras. Proveio-
lhe o n o m e d e C a t a s Altas p o r h a v e r e m os mineiros seguido as lavras dos córregos,
b u s c a n d o suas cabeceiras, seguindo as *pintas q u e i a m l a v r a n d o , e q u a n t o mais
c h e g a v a m à serra mais crescia a altura da terra q u e c a v a v a m , ficando as p a r e d e s
das *catas c o m altura impraticável nas mais partes, n a q u e l e t e m p o .
V o l t a n d o a m e s m a serra, à p a r t e do n o r t e , distância d e duas léguas, desco-
briu Antônio Bueno o ribeiro intitulado B r u m a d o , p o r não corresponder com
r e n d i m e n t o igual à g r a n d e z a q u e dele se esperava, m a s s e m p r e foi r e n d e n d o o
q u e b a s t a v a p a r a ser p o v o a d o , que. está boje c o m u m a * capela f o r m o s a e b e m
o r n a d a , assistida d e muitos m o r a d o r e s . E voltando a m e s m a serra a d i a n t e desco-
[ 11. 14v. ] briu o dito A n t ô n i o B u e n o , distância de u m a légua, o rio q u e se / / intitulou S a n t a
B á r b a r a , q u e ficou p o v o a d o , d e sorte q u e hoje é u m a famosa freguesia c o m V i g á -
rio c o l a d o , e o rio c o r r e n d o p a r a o n a s c e n t e até e n c o n t r a r - s e c o m P i r a c i c a b a ,
d e s c o b r i m e n t o d o f a m o s o * a l c a i d e - m o r C a m a r g o , c o m o fica d i t o , e. está t o d o
p o v o a d o , seguindo a m b o s j u n t o s suas correntes, f o r m a n d o u m caudaloso rio até o
lugar d e A n t ô n i o D i a s , é c h e g a a p o v o a ç ã o até j u n t a r este rio c o m o rio D o c e ,
a

q u e v e m j á i n c o r p o r a d o cora os rios P i r a n g a , Miguel G a r c i a e ribeirão d o C a r m o ,


q u e todos j u n t o s v ã o f o r m a n d o o g r a n d e c o r p o d o rio D o c e , c o m os mais que, p a r a
baixo, vai recebendo. Abaixo desta barra, o n d e se j u n t a m estes rios acima declara-
dos, cinco dias de navegação, faz b a r r a da p a r t e do sul o rio do Cuieté, novo desco-
b r i m e n t o nestes anos, feito p o r Pedro de C a m a r g o , u m dos filhos q u e naquele tem-
p o a c o m p a n h a v a ao dito alcaide-mor, c o m o está dito, cujo descoberto, ao presente,
está c o m p o u c o rendimento, m a s p r o m e t e avultadas esperanças p a r a as cabeceiras
do m e s m o rio, nas serras grandiosas d o n d e nasce, e outros mais rios que, p o r ocupa-
das d o *gentio b r a v o e m e n o s possibilidade do descobridor, se n ã o conquista ou
p o r q u e D e u s é servido reservá-lo p a r a m e l h o r t e m p o do g o v e r n o do sereníssimo
senhor rei d o m J o s é , que Deus guarde, incorporando-se este descobrimento c o m o
inculto d a C a s a d a Casca, c o m cujas partes corresponde às cabeceiras e serras d o
Cuieté pelo larguíssimo sertão q u e h á entre estas Minas e a costa do Brasil.

" Descoberto pelo mesmo Antônio Dias que descobriu Antônio Dias, de Vila Rica, o qual era taubateano.
a
179

C o n t i n u a m - s e a s n o t í c i a s d e d e s c o b r i m e n t o s q u ê se s e g u i r a m [ fl. 15 ]
aos primeiros q u e d e i x a m o s n o s t e r m o s d e Vila R i c a

V o l t a n d o agora a o P a d r e Faria, o n d e deixamos as notícias d o úitírno descoberto


d a q u e l a v e r t e n t e , se c o n t i n u a r a m os seguintes:
N o a n o d e 1 7 0 1 , m a n d o u o *coronel Salvador F e r n a n d e s F u r t a d o de M e n -
d o n ç a , n a t u r a l d a vila d e T a u b a t é ^ c o m o está dito, a seu filho, o coronel B e n t o
F e r n a n d e s F u r t a d o , descobrir o ribeiro d e Nossa S e n h o r a do B o m Sucesso, q u e o
intitularam assim p o r ser invocação d a S e n h o r a m u i t o d a sua devoção q u e se ve-
n e r a p o r p a d r o e i r a d a m a t r i z d a vila d e P i n d a m o n h a n g a b a - q u e significa lugar de
fazer anzóis —, a qual vila é d a c o m a r c a de S ã o P a u l o , o qual ribeiro é o n d e e m b o c a m
todos os córregos j á ditos d o O u r o Preto, A n t ô n i o Dias e P a d r e Faria, e é o c h a m a -
d o Passa D e z , q u e t a n t a s vezes se p a s s a v a antes d e c h e g a r ao O u r o P r e t o , e é
m a r a v i l h a r a r a de notar q u e este n ã o m o s t r o u n e m t e m m o s t r a d o "faísca d e o u r o
e m si, senão depois de receber estes córregos ricos p a r a baixo. E p o r q u e d o lugar
o n d e os recebe c a m i n h a p o r entre Fechos d e m o r r o s e p e n h a s c o s , d e s p e n h a d o p o r
perigosas cachoeiras, n ã o houve q u e m se animasse a c o m e t e r aqueles perigos p a r a
o examinar., C o m efeito, passadas estas cachoeiras c o m g r a n d e s perigos e t r a b a -
lhos, se r e c o n h e c e u q u e e n t r e estes labirintos perigosos tinha c a p a c i d a d e s de p r o -
duzir o u r o , q u e nelas descobriu o dito coronel grandiosas pintas e se d e u a parti-
lhas p o r / / inumerável p o v o , q u e acudiu a elas p o r "editais q u e m a n d o u fixar o [ fl. 15v. ]
*mestre-de-campo dos "auxiliares D o m i n g o s d a Silva B u e n o , p r o v i d o n o v a m e n t e
p o r *guarda-mor das terras minerais c o m jurisdição cível e crime p o r A r t u r d e Sá e
M e n e s e s , " g o v e r n a d o r e n t ã o d o R i o d e J a n e i r o , S ã o P a u l o e M i n a s , n a s quais
partilhas teve "data a Augusta Majestade de el-rei d o m P e d r o II, nosso senhor, d e
gloriosa m e m ó r i a , à escolha d o s m e l h o r e s e mais peritos "ministros, q u e o dito
g u a r d a - m o r m a n d o u lavrar pelo "alcaide-mor J o s é d e C a m a r g o Pimentel p o r con-
ta d e S u a M a j e s t a d e , q u e teve avultadíssimo r e n d i m e n t o . E n a m e s m a f o r m a fize-
r a m grandíssimas conveniências os q u e nele tiveram terras, d u r a n d o m u i t o s anos
sua riqueza, p o r terra e veios d e água, q u e até hoje conserva mineiros a relavrar o
lavrado c o m r e n d i m e n t o das conveniências presentes.
N o a n o d e 1699, havia J o ã o L o p e s de L i m a , natural de S ã o P a u l o , h o m e m
d e b o a n o t a e ágil p a r a s e m e l h a n t e s e m p r e s a s , p r o c u r a n d o o d e s e m b o q u e d o
ribeiro p e n h a s c o s o , q u e veio a ter a d e n o m i n a ç ã o d o B o m Sucesso, e m 1 7 0 1 ,
c o m o fica dito. D a q u e l e d e s e m b o q u e p a r a b a i x o , e n t r o u a e x a m i n a r c o m g r a n d e
t r a b a l h o , à resistência, e foi a c h a n d o "faisqueiras à m a r g e m , p o r algumas p a r t e s
d o rio q u e a c a p a c i d a d e deixava p e n e t r a r , p o r q u e o r i o ia c r e s c e n d o e m á g u a s
c o r r e n t e s e r á p i d a s , e os d e s m o n t e s q u e a n a t u r e z a dos m o n t e s , c o m as a n u a i s
e n c h e n t e s ia l a n ç a n d o s o b r e a f o r m a ç ã o dos "cascalhos, f a z e n d o m a i s difícil o
c h e g a r às formações sem os i n s t r u m e n t o s / / m i n e r a i s q u e o t e m p o foi d e s c o b r i n d o [ fl. 16 ]
e a inteligência dos h o m e n s i n v e n t a n d o ; viu, c o n t u d o , coisa c a p a z d e p a r t i l h a s .
180

D e u a o ^manifesto e m 1700, e c o n c o r r e u inumerável p o v o a elas; t i v e r a m todos


" d a t a s c o m e x t e n s ã o a seu gosto, q u e , h o j e , pelas e s t r a d a s , d e * c a r r o a m a i o r
p a r t e , até a b a r r a de G u a r a p i r a n g a , q u e significa um pássaro de plumas encarnadas, q u e
significa g u a r á vermelho — é este rio principal corpo de que se c o m p õ e o rio D o c e —,
são, d e Vila R i c a até esta b a r r a , dezesseis ou dezoito *Iéguas e, pelas voltas q u e o
rio dá, m a i s d e trinta. E se d e n o m i n o u ribeirão de N o s s a S e n h o r a d o C a r m o , p o r
ser i n v o c a ç ã o de d e v o ç ã o do d e s c o b r i d o r ou p o r q u e e m s e m e l h a n t e dia c h e g o u
ou d e s c o b r i u o • l u g a r de m e l h o r c a p a c i d a d e , q u e é hoje o d a C i d a d e M a r i a n a ,
c o m magníficos e suntuosos templos e sé catedral c o m amplíssimo b i s p a d o p a r a o
seu p r i m e i r o "bispo., q u e é o Excelentíssimo Reverendíssimo d o m frei M a n u e l d a
C r u z , d e raríssimas v i r t u d e s e excelentes p r e n d a s v e r d a d e i r a m e n t e d e p r í n c i p e ,
q u e é dos q u e estima o m u n d o .
E s t e n d e r a m - s e os m i n e i r o s a o c u p a r o l u g a r das suas d a t a s p o r t o d a esta
distância, e c a d a u m fazendo as suas roças nos lugares q u e p o r sorte lhes c o u b e -
r a m . E feitas elas, se r e t i r a r a m , uns à " m o n t a r i a e outros aos p o v o a d o s , pela gran-
d e falta d e m a n t i m e n t o s , q u e c h e g a r a m estes a tal valor q u e a q u a r e n t a "oitavas o
"alqueire de m i l h o se n ã o a c h a v a é o feijão a d o b r a d o p r e ç o , q u e n a q u e l e s tem-
p o s s e m p r e assím se regulava.
[ ff 16v. ] N o seguinte a n o , q u e foi o d e 1 7 0 1 , j á c o m os / / m a n t i m e n t o s e m termos d e
q u e os seus novos frutos p u d e s s e m a l i m e n t a r aos m i n e i r o s , a c a d a u m sobre as
suas roças e datas d e r e p a r t i ç ã o , v o l t a r a m ao ribeirão do C a r m o a colher os m a n -
timentos ç à lavrar as suas datas. P o r é m , a c h a r a m g r a n d e dificuldade e m as lavrar,
p o r q u e a l é m d e ser o ribeirão j á caudaloso e m águas e d e r á p i d a c o r r e n t e , c o m
p o ç o s m u i t o fundos e todo c o m formações e "desmontes altos antes d e c h e g a r às
formações de "cascalho e "piçarra, q u e é a última c a m a do o u r o p a r a o c e n t r o e
o n d e m o s t r a a s u a m a i o r c o n t a , e os mineiros, a c o s t u m a d o s a lavrar os córregos
p e q u e n o s c o m facilidade e m a i o r e s *pintas, " d e s a c o r ç o a n d o d o m u i t o t r a b a l h o
c o m q u e p o d e r i a m tirar o u r o a i n d a do mais fácil d e algumas p a r t e s dele, f o r a m
despejando todos, buscando, uns os ribeiros j á descobertos e mais fáceis, c o m o os
q u e se. t ê m referido, e outros c o m e m p e n h o de descobrir ou fazer novos descober-
tos. Ficou, enfim, t o d a a distância referida q u a s e deserta, só c o m alguns p o u c o s
q u e , d e estância e m estância, a c h a r a m n o rio alguns p o u c o s , digo, itaipavas, q u e
são aquelas p a r a g e n s e m que os rios c o r r e m mais espraiados p o r c i m a dos casca-
lhos, c o m m e n o s fundo d e suas c o r r e n t e s , e nestas p a r t e s a c h a r a m "faisqueiras
que, fincando estacas de p a u e m m e i o das c o r r e n t e s do rio, e n c o s t a d o s a eles,
p u d e s s e m m e r g u l h a r c o m as "bateias e: tirar debaixo d a água cascalho e p i ç a r r a ,
s e m ter d e s m o n t e q u e i m p e ç a , p o r q u e n a q u e l a s p a r a g e n s o r á p i d o das correntes
as n ã o d e i x a m p a r a r q u a n d o v ê m c o r r i d o s dos m o n t e s c o m as i n u n d a ç õ e s das
[ fl. 17 ] * invernadas. / / Estes se c o n s e r v a r a m e m algumas partes q u e a c h a r a m desta consti-
tuição de formações d e rios e cascalhos, c o m o foi no lugar d a C i d a d e [ M a r i a n a ]
alguns, São Sebastião outros e os mais nas Lavras Velhas, Crasto e F u r q u i m , estes,
181

c o m o seu custoso e p e n o s o trabalho, entregues à fome e a o rigor dos mais p e n e -


trantes frios q u e p a d e c i a m no insuportável frigidíssimo regelo d a constituição d e
q u e e r a m as á g u a s do c a r m e l i t a n o rio, p o r c o r r e r a m a i o r p a r t e p o r cavernosos
penhascos, a s s o m b r a d o de altíssimos montes, m a t o s e arvoredos, q u e a o depois se
descortinaram, facilitando o [caminho] que hoje serve, que ainda feitas as estradas a
p o d e r de ferro e instrumentos n ã o p o d e u m cavaleiro d a r passo p a r a u m lado ou
o u t r o q u e n ã o seja c o m p e r i g o d e d e s p e n h a r - s e aos abismos, os mais profundos
precipicios e perigos de vida.
T ã o forte e i n s u p o r t á v e l era o frio das á g u a s d o r i b e i r ã o q u e e r a p r e c i s o
e n t r a r nele pelas dez h o r a s d a m a n h ã e sair dele pelas três d a tarde, e mais t a r d e ,
p o r q u e fora destas horas era insuportável o frio. E nestas p o u c a s h o r a s q u e gasta-
v a m neste exercício, " m e r g u l h a n d o , t i r a n d o "cascalho e " l a v a n d o , faziam os es-
cravos p a r a seus senhores três e q u a t r o "oitavas d e o u r o d e "jornal, fora o q u e
p a r a si r e s e r v a v a m p a r a c o m e r e b e b e r , de q u e m u i t o c a r e c i a m , além d a r a ç ã o d e
seus s e n h o r e s .
C o r r e n d o esta n o t í c i a e de q u e p o r t e r r a , pelos *tabuleiros altos, fora d a
f o r m a ç ã o do rio, e m seco, se descobriu cascalho ç *desmontes e d e s m o n t a n d o à
3

*bateía a t e r r a e lavando c o m ela os cascalhos faziam a m e s m a / / utilidade, cor- [ A- l^v. ]


r e n d o a fama, t o r n a r a m p a r a ele muitos dos q u e h a v i a m despejado e milhares dos
vindouros, c o n c o r r e n d o d a Bahia, P e r n a m b u c o , R i o d e J a n e i r o , São P a u l o , costa
do m a r , e novatos vindos nas frotas de Portugal p a r a o Brasil, e f o r a m n o v a m e n t e
p o v o a n d o c o m m u i t a força o desertado rio c a r m e l i t a n o . E fazendo todos c o n v e n i -
ência, se foi a v u l t a n d o a p o v o a ç ã o e descobrindo aquela corrente de ouro defen-
dida de cristalinas correntes das soberbas e caudalosas águas.
E n t r e aqueles que n ã o t e m e n d o a fome e trabalhos q u e oferecia a assistência
do rio do C a r m o foi o "coronel Salvador F e r n a n d e s F u r t a d o d e M e n d o n ç a . Depois
d e lavrar ô mais fácil das "datas que teve no seu descoberto do B o m Sucesso, c o m o
e m seu lugar dissemos, deixando o mais difícil, q u e ao depois enriqueceu a muitos,
veio a descobrir e situar-se o n d e hoje está f u n d a d a a freguesia d e São C a e t a n o ,
n a q u e l e t e m p o c h a m a d o M o r r o G r a n d e , e feitas as roças veio a q u a r t e l a r - s e n o
arraial c h a m a d o o d e C i m a da C i d a d e M a r i a n a , p o r ser lugar mais c ô m o d o p a r a
passar a *invernada, tirando a l g u m ouro p a r a sustentar-se e aos seus escravos c o m .
m a n t i m e n t o s de q u a t r o e cinco oitavas o '"alqueire, e n q u a n t o os seus, q u e h a v i a
p l a n t a d o no tal sítio, q u e ao depois foi de São C a e t a n o , o socorressem.
E neste lugar do Arraial de C i m a fez a p r i m e i r a "capela q u e h o u v e e m t o d a
a p o v o a ç ã o do c a r m e l i t a n o rio, c o m licença a m p l a q u e t i n h a d o Excelentíssimo
R e v e r e n d í s s i m o d o m Francisco d e São J e r ô n i m o , d e saudosa m e m ó r i a , "bispo do
R i o d e J a n e i r o , São / / P a u l o e M i n a s , c o m o e n t ã o era, p a r a p o d e r a r m a r "altar
[fl. 1 8 ]
portátil e m q u a l q u e r p a r t e e erigir capelas o n d e q u e r q u e fosse necessário p a r a se
administrar todos os s a c r a m e n t o s aos católicos q u e o p r o c u r a s s e m n a q u e l e s deser-
tos, q u e e n t ã o o e r a m p e l o *capelão q u e consigo trazia. C o m efeito, assim se
c o n t i n u o u o sacrifício d a missa e confissões n a q u e l a capela, e n q u a n t o o
182

excelentíssimo "bispo, a t e n d e n d o a q u e a p o v o a ç ã o se ia e s t e n d e n d o e estabele-


c e n d o , a r o g o s d o dito "*coronel e m a i s p o v o , p r o v e u d e v i g á r i o a o r e v e r e n d o
p a d r e M a n u e l Brás, q u e n a dita *capela exerceu b a s t a n t e t e m p o o seu oficio de
vigário e n q u a n t o se fabricou matriz, q u e a o depois ficou sendo, até hoje, d o R o -
sário dos P r e t o s , depois q u e se fez a q u e está hoje s e r v i n d o d e sé, o n d e h o u v e
t a m b é m u m a capelinha d e A n t ô n i o Pereira M a c h a d o , o n d e dizia missa frei A n t ô -
n i o d o R o s á r i o , religioso carmelitano, q u e e r a tão p e q u e n a q u e só c a b i a m o altar
dentro dela e o "acólito p a r a ajudar a missa, a qual estava no pado que hoje serve à sé.
P a s s a d o o i n v e r n o e s p c o r r e n d o j á os m a n t i m e n t o s a prescrita opressão d a
fome, se recolheu o dito coronel a sua roça d o M o r r o G r a n d e e fabricou o u t r a
capela, c o m invocação d a S e n h o r a d o L o r e t o , q u e t a m b é m , a u m m e s m o t e m p o ,
p r o v e n d o S u a Excelência R e v e r e n d í s s i m a [ d o m Francisco d e S ã o J e r ô n i m o ] a o
r e v e r e n d o p a d r e M i g u e l R e b e l o d e Alvim p o r vigário d e S ã o S e b a s t i ã o , S u m i -
d o u r o , B r u m a d o , S ã o G a e t a n o e F u r q u i m , n ã o houve o u t r a capela neste dilatado
distrito o n d e sé desse princípio à administração dos s a c r a m e n t o s senão nesta, pelo
p a d r e F r a n c i s c o Gonçalves, "capelão d o dito coronel, p o r o r d e m d o dito vigário
Alvim, q u e ao depois, digo, ao m e s m o t e m p o fundava matriz n o F u r q u i m , q u e a o
[ fl. 18v. j depois, crescendo a povoação e habitadores / / e m tão largo distrito,, repartiu Sua
Excelência Reverendíssima esta dilatada freguesia e m quatro, q u e foram: F u r q u i m ,
São Sebastião, S u m i d o u r o e São C a e t a n o , p r o v e n d o p a r a esta de São C a e t a n o a o
reverendo p a d r e M a n u e l Pires de C a r v a l h o , q u e n a dita capela exerceu a o c u p a ç ã o
de vigário de S ã o C a e t a n o , e n q u a n t o se n ã o erigiu matriz e m lugar conveniente a o
povo, tal e qual igual a o estado daquele t e m p o , e n q u a n t o se n ã o formou o magní-
fico e suntuoso templo q u e hoje serve.
Nestes m e s m o s princípios, q u e f o r a m n a e r a d e 1702 p a r a o d e 170'í n ã o }

d e s c a n s a n d o o dito coronel c o m diligências de a m p l i a r d e s c o b r i m e n t o s , m a n d o u


a seu filho Bento F e r n a n d e s F u r t a d o a b a n d e i r a r p a r a a p a r t e d o sul d o ribeirão d o
C a r m o , pelo sertão incógnito q u e se achava entre o R i b e i r ã o e G u a r a p i r a n g a , e
g a s t a n d o m e s e s n e s t a diligência descobriu várias "faisqueiras pelos lugares c h a -
m a d o s P i n h e i r o , R o c h a , B a c a l h a u , Pirapetinga; e v o l t a n d o c o m soldados e escra-
vos e m rede., picados d e cobras e bichos venenosos, c o m m u i t o t r a b a l h o , fomes e
riscos d e vida, n ã o d e u a partilhas estes descobrimentos p o r serem as "pintas limi-
t a d a s . S e g u i n d o , p o r e m , as suas p i c a d a s , f o r a m e n t r a n d o o u t r o s m i n e i r o s q u e ,
l a v r a n d o estas faisqueiras, f o r a m a c h a n d o a u m e n t o nelas, r a z ã o p o r q u e f o r a m
p o v o a n d o sítios, arraiais, capelas, freguesia, c o m m u i t a utilidade dos povos e d a
R e a l . F a z e n d a de S u a Majestade.
D o s mais q u e n a desertação p r i m e i r a d o ribeirão d o C a r m o se e m p e n h a r a m
t a m b é m e m descobrimentos foi J o ã o de Siqueira Afonso^ q u e descobriu o S u m i -
d o u r o , à p a r t e d o sul d o dito rio, c o m opulência n a s pintas e conveniências, q u e
[ fl. 19 ] hoje é / / freguesia c o m t e m p l o majestoso dedicado à S e n h o r a S a n t a n a , conserva-
d o ate o p r e s e n t e t e m p o c o m lavras p e r m a n e n t e s .
183

N o m e s m o t e m p o , descobriu J o ã o Pedroso, paulista, o B r u m a d o , d a m e s m a


p a r t e d o sul, p a s s a n d o u m a serra q u e divide vertentes e n t r e S u m i d o u r o e B r u m a d o ,
e c a m i n h a n d o a m b o s juntos se m e t e m e m o rio M i g u e l Garcia, e todos j u n t o s n o
ribeirão d o C a r m o , e m meio da freguesia d o F u r q u i m . E t o m o u este a d e n o m i n a -
ção de B r u m a d o p o r n ã o corresponder seu rendimento a o q u e p r o m e t i a nas mostras
a o descobridor, m a s s e m p r e se povoou, d a n d o conveniências aos m o r a d o r e s até o
presente, c o m três. capelas eretas pelos mesmos m o r a d o r e s , ricamente o r n a d a s , e m
distâncias convenientes à concorrência do m e s m o p o v o p a r a a recepção dos sacra-
mentos.
G u a r a p i r a n g a foi descoberto pelo m e s m o J o ã o de Siqueira Afonso, t a u b a t e a n o ,
distante à m e s m a p a r t e d o sul do ribeirão do C a r m o 12 *léguas pelo sertão dentro,
vencido t u d o p e l o incansável espírito deste sertanista d e a m p l i a r d e s c o b r i m e n t o s ,
n ã o se satisfazendo d o n ã o menos rico que durável S u m i d o u r o . É este rio hoje t o d o
p o v o a d o c o m amplíssima freguesia, com igreja matriz suntuosa e b e m o r n a d a , c o m
arraial de bastantes vizinhos, que vivem das "faisqueiras do m e s m o rio, q u e até hoje
existem.
O rio das M o r t e s , q u e fica à p a r t e do p o e n t e d e Vila Rica, na estrada q u e vai
p a r a S ã o P a u l o , foi descoberto p o r T o m é Portes del-Rei, n a t u r a l d a vila de T a u b a t é ,
p a s s a d o s b a s t a n t e s a n o s d e p o i s dos m a i s d e s c o b r i m e n t o s , n ã o p o r q u e estivesse
r e m o t o , senão p o r q u e D e u s foi servido dilatar p o r mais t e m p o o a m p l i a r / / seus [ fl. 19v. ]
haveres, pois este rio se passa, p r i m e i r o , v i n d o de São Paulo, cinco dias d e viagem
c o m u n s antes de chegar a Vila R i c a , e p o r ele p a s s a r a m todos os m a i s descobrido-
res j á referidos, s e m fazer nele e x p e r i ê n c i a a l g u m a . E n a m e s m a f o r m a , o dito
Portes, q u e , situando-se n a m e s m a ' p a s s a g e m , viveu anos de fabricar m a n t i m e n -
tos p a r a v e n d e r aos m i n e i r o s q u e p a s s a v a m p a r a as M i n a s o u v o l t a v a m p a r a os
p o v o a d o s , fazendo neste negócio altíssimas fortunas, até q u e , pelos cascalhos q u e
se d e s c o b r i a m pelos b a r r a n c o s do rio, fazendo experiência neles, descobriu o u r o .
E logo pelo ribeirão q u e ao p é da m e s m a passagem fazia b a r r a fez o m e s m o , q u e
sê p o r t o u c o m tal g r a n d e z a q u e á m a r g e m dele se formou u m a taí p o v o a ç ã o q u e
é hoje a vila de São J o ã o del-Rei, cabeça de c o m a r c a , c o m grandiosos templos e
amplíssimo *termo, c o m u m a p o n t e real n a passagem, q u e r e n d e à R e a l F a z e n d a
e m suas r e m a t a ç õ e s trienais consideráveis c ô m p u t o s .

A P o n t a do M o r r o , hoje c h a m a d a vila d e São J o s é , q u e se a c h a situada a l é m


do rio, à p a r t e do n a s c e n t e , ficando-lhe São J o ã o à p a r t e do p o e n t e , c o m o rio e m
meio, descobriu, pelo m e s m o tempo, J o ã o de Siqueira Afonso, t a u b a t e a n o j á
referido nos m a i s d e s c o b r i m e n t o s q u e fez. E p a s s a d o s m a i s a n o s , d e s c o b r i u a
A i u r u ò c a , pelo sertão q u e e n t ã o era a p a r t e do sul d a e s t r a d a q u e vai p a r a S ã o
P a u l o , três dias d e j o r n a d a afastado p a r a a q u e l a p a r t e de S ã o J o ã o del-Rei, nas
c a b e c e i r a s d o rio G r a n d e , p r i n c i p a i s vertentes d o n d e se f o r m a o g r a n d e , rio d a
P r a t a , q u e se. manifesta c o m q u a r e n t a léguas de foz n a N o v a C o l ô n i a . A i u r u o c a ,
v o c á b u l o d e ' l í n g u a brasílica, q u e r dizer n o nosso / / i d i o m a casa de papagaios, [ fl. 20 ]
184

a l u d i n d o a u m p e n h a s c o r e d o n d o e e l e v a d o aos ares s o b r e u m dos m a i s altos


m o n t e s d a q u e l e l u g a r , e m q u e os p a p a g a i o s faziam m o r a d a n a q u e l e t e m p o e m
q u e os "gentios h a b i t a v a m aqueles lugares. Este lugar d e A i u r u o c a é u m a famosa
freguesia, c o m d u a s "capelas suas filiais, assistidas d e g r a n d e c o n c u r s o d e m o r a d o -
res e assistentes mineiros, c o m disposições d e duráveis m i n a s , p o r assim o p r o m e -
t e r e m as constituições de suas c o n t i n u a d a s serras e ribeirões c o m "faisqueiras d e
ouro.
A n t ô n i o Soares d e u m a i o r salto, mais c o m p r i d a e laboriosa diligência à p a r t e
do n o r t e , q u e c h e g o u ao S e r r o do Frio — n o m e q u e os portugueses t r a d u z i r a m e m
língua p r ó p r i a , sendo q u e n a "gentílica é Ivituruí, q u e q u e r dizer serro do frio, alu-
d i n d o a o m u i t o e regelado frio q u e faz pelo c u m e d a q u e l a serra, c o m frigidíssimos
ventos pelo seu dilatado c u m e , p o r o n d e passa o c a m i n h o q u e hoje serve e e n t ã o
servia aos gentios e sertanistas, q u e p a r a se passar, n ã o sendo a o meio-dia, m o r r i a m
entanguidos, e quase u m m ê s de v i a g e m n a q u e l e t e m p o — e descobriu o u r o c o m
g r a n d e c o n t a , p a r a o n d e c o n c o r r e u g r a n d e p a r t e do p o v o d e s a c o m o d a d o , p o v o -
a n d o - o e p o n d o - o c u l t i v a d o c o m o está, e hoje c o m m a i o r e s h a v e r e s e ínclitas
opulências de finíssimos e preciosíssimos d i a m a n t e s , constituídos e m real "contra-
to d e milhões d e "cruzados. D o seu d e s c o b r i d o r lhe proveio o n o m e a u m a das
serras d a q u e l e c o n t i n e n t e , e m q u e a c h o u mais avultadas conveniências e nela se
situou, o qual lugar se intitulou m o r r o d e A n t ô n i o Soares, e m cujos d e s c o b r i m e n -
[ fl. 20v. ] tos foi p a r c i a l c o m A n t ô n i o R o d r i g u e s d e A r z ã o , d a / / m e s m a a s c e n d ê n c i a d o
p r i m e i r o A r z ã o , q u e faleceu antes de lograr os princípios q u e deu a estes descobri-
m e n t o s n o sertão d a C a s a d a Casca, c o m o está dito n o princípio destas notícias,
s e n d o a m b o s estes descobridores paulistas.

D a m e s m a sorte, mais encostado à p a r t e do noroeste, m e n o s distância e n t r e o


S a b a r a e S a n t a B á r b a r a , descobriu o " s a r g c n t o - m o r L e o n a r d o N a r d e s , paulista,
associado c o m u n s fulanos d a G u e r r a , ^ naturais d a vila de Santos, o lugar o n d e se
acha situada a Vila Nova da R a i n h a do C a e t é , b e m administrada de rigorosa
justiça que, p o r a n t o n o m á s i a , d i z e m os "chacorreiros q u a n d o q u e r e m p r a g u e j a r a
a l g u m m a l p r o c e d i d o : " Q u e a justiça do C a e t é lhe caia!"
N e s t e s t e r m o s foram c o n t i n u a n d o descobrimentos e lavras de " m e r g u l h o no
ribeirão do C a r m o e custosos cercos e m algumas partes do r i o e os d e terra, a p o d e r
d e b r a ç o , n o d e s m o n t a r dos "tabuleiros de formações altas e n a m e s m a forma o
m o d o d e lavrar nos mais d e s c o b r i m e n t o s , c o n f o r m e a constituição e c a p a c i d a d e
deles, c o m mais o u menos trabalho, c o n c o r r e n d o inumerável p o v o d e várias partes
d o Brasil e e m m a i o r q u a n t i d a d e filhos d e P o r t u g a l , c a m i n h a n d o u n s p a r a este,
outros p a r a aquele lugar, digo, é diferentes lugares d e minas, os mais deles, pobres,

Antônio Leme da Guerra ejoão Leme da Guerra,


185

só c o m suas pessoas c o m o seu limitado "trem às costas, a n i m a d o s mais do interesse


q u e p r e t e n d i a m q u e das suas posses, e muito mais confiados n a c a r i d a d e , a m o r e
zelo c o m q u e os paulistas, n a t u r a l m e n t e mais inclinados a fazer benefícios d o q u e
recebê-los, os r e c e b i a m a m o r o s a m e n t e , d a n d o c a m a e m e s a a u n s , a o u t r o s / / [fl. 21 ]
m a n t i m e n t o s , e a todos lavras nas suas próprias, c o m aquela liberalidade e g e n e r o -
so â n i m o de q u e n a t u r a l m e n t e são dotados, granjeando p o r este m o d o , n o a g r a d e -
c i m e n t o d e alguns mais gratos, os n o m e s de pais e p a t r o n o s benfeitores q u e , n a
v e r d a d e , os e n r i q u e c e r a m c o m o m e s m o que a sua fortuna os tinha c o n v i d a d o .
Assim se f o r a m a u m e n t a n d o as p o v o a ç õ e s , os lucros e m crescido a u m e n t o ,
p o r q u e n o lavrar e abrir as terras é q u e se d e s e n t r a n h a m os seus haveres. Assim foi
crescendo o negócio de escravos, gados, cavalgaduras, fazendas e mais víveres d e
toda a sorte, c o n d u z i d o s c o m o m a i o r t r a b a l h o a q u e obriga o interesse aos h o -
m e n s , servindo e n t ã o n a q u e l e s princípios d e c o n d u t o r e s as m e s m a s cervizes h u -
m a n a s , p o r q u e , as das bestas a i n d a não. t i n h a m p a s s a g e m franca c o m o a o depois
tiveram, f r a n q u e a d o s e cultivados os c a m i n h o s .

N o t í c i a s d o d e s c o b r i m e n t o d o rio d a s V e l h a s

D e s d e o d e s c o b r i m e n t o d o Brasil, q u e foi feito p o r P e d r o Alvares C a b r a l , e m


vida d o sereníssimo rei d o m M a n u e l , de gloriosa m e m ó r i a , c o m o testificam vários
historiadores deste d e s c o b r i m e n t o e povoações, se t i n h a m feito várias diligências
p o r m a n d a d o dos m e s m o s reis a descobrir os haveres d e o u r o , p r a t a e mais metais
e p e d r a s p r e c i o s a s q u e se c o n s i d e r a v a m nestes c o n t i n e n t e s d o Brasil, d u r a n d o
estas diligências até o a n o d e 1518,^ t e m p o a i n d a d a sujeição de P o r t u g a l a Castela,
/ / e n c a r r e g a d a s a d o m F r a n c i s c o de S o u s a , " g o v e r n a d o r e n t ã o d o E s t a d o d o [fl. 21v. ]
Brasil, e a Salvador C o r r e i a dq Sá, que,fizeram c o m todo o c u i d a d o . E n ã o desco-
b r i n d o os mais e m p e n h a d o s e p o d e r o s o s sertanistas, à custa d a F a z e n d a R e a l ,
coisa a l g u m a q u e c o r r e s p o n d e s s e aos interesses d a M a j e s t a d e , s e n ã o a l g u m a s
"faisqueiras p o r P a r a n a g u á , Curitiba e J a r a g u á , nas p a r t e s d e São P a u l o , foi servi-
d a á Majestade reinante conceder aos vassalos q u e nas ditas m i n a s e d e s c o b r i m e n -
tos quisessem t r a b a l h a r e descobrir mais o fizessem, p a g a n d o - l h e s o m e n t e o q u i n -
to e concedendo-lhes graves privilégios, c o m o se p o d e ver e m u m "alvará q u e se
a c h a registrado nos livros q u e serviam de registros d e *leis extravagantes, n a T o r r e
do T o m b o de Lisboa, desde 1613 até 1637, à folha 9 7 , q u e se n ã o t e m observado
nestas M i n a s p o r incúria dos m o r a d o r e s o n ã o r e q u e r e r e m .
D a m e s m a sorte, depois d a a c l a m a ç ã o do sereníssimo rei d o m J o ã o I V , d e
a m á v e l e s a u d o s a m e m ó r i a , nosso famoso r e s t a u r a d o r d a sujeição d e Castela, se

A data correta é 1618, quando o regimento das minas do Brasil deixou a cargo dos vassalos a busca
de metais preciosos, com a promessa de mercês ê privilégios aos descobridores.
186

c o n t i n u a r a m p o r seu m a n d a d o e seus sucessores as m e s m a s diligências, c o m o o


fizeram e n c a r r e g a n d o a F e r n ã o Dias Pais, h o m e m paulista, rico, a l e n t a d o sertanista,
c o m g r a n d e c a p a c i d a d e e agilidade p a r a semelhantes empresas, as diligências das
esmeraldas e p e d r a s preciosas de que havia notícias h a v e r nestes sertões ao n o r t e
e leste de S ã o P a u l o , c o m p a t e n t e de g o v e r n a d o r e a d m i n i s t r a d o r das esmeraldas,
c o m * p o d e r d e "soga e " c u t e l o . C o m efeito, e n t r o u n e s t a d i l i g ê n c i a p a r a este
sertão de e n t r e o S e r r o do Frio e a costa do m a r , a c o m p a n h a d o d e m u i t o s seus
confederados e d e seu g e n r o M a n u e l d e B o r b a G a t o .
E t e n d o descoberto b o m princípio delas, se resolveu o dito g o v e r n a d o r r e c o -
[ fl. 22 ] lher-se a São P a u l o , deixando o seu g e n r o M a n u e l de B o r b a / / G a t o n o rio das
V e l h a s fazendo plantas d e m a n t i m e n t o s , p a r a os a c h a r p r o n t o s q u a n d o voltasse a
c o n t i n u a r c o m as suas diligências c o m m a i o r vigor, c o m as o r d e n s q u e d e el-rei
tivesse, pois ia c o m t e n ç ã o d e m a n d a r a seu filho G a r c i a R o d r i g u e s Pais, q u e ao
depois veio a ser possuidor d a P a r a í b a do C a m i n h o N o v o do R i o de J a n e i r o , c o m
seu i r m ã o , o p a d r e J o ã o Leite d a Silva, q u e , c o m efeito, m a n d o u n a p r i m e i r a
"frota q u e do R i o p a r t i u p a r a Lisboa, levando estes as p r i m e i r a s mostras das es-
m e r a l d a s a S u a M a j e s t a d e , d e i x a n d o n a m e s m a p a r a g e m do rio das V e l h a s , e m
p o d e r do dito seu g e n r o , m u i t a pólvora, c h u m b o e ferramentas d e m i n e r a r , c o m
r e c o m e n d a ç ã o g r a n d e a seu g e n r o n a g u a r d a destes p e t r e c h o s , p a r a os ter seguros
n a sua volta.
Antes de c h e g a r a frota a Portugal e el-rei ouvir aos enviados d e F e r n ã o Dias
e ver as mostras q u e lhe i a m de F e r n ã o Dias, digo, das esmeraldas, d e s p a c h o u a
d o m R o d r i g o p a r a São P a u l o , e n c a r r e g a n d o - l h e o d e s c o b r i m e n t o de metais e das
m e s m a s esmeraldas. E c h e g a n d o a São P a u l o , c o n v o c o u a vários paulistas, c o m o
foram Matias Cardoso, Domingos do Prado, J o ã o Saraiva de Morais, e outros
vários sertanistas, c o m o M a n u e l Francisco, p a i d e Salvador C a r d o s o , D o m i n g o s
do P r a d o , p a i d e J a n u á r i o C a r d o s o , e deixou d e a c o m p a n h a r F e r n ã o Dias Pais,
p o r q u e estava e s p e r a n d o a resolução e o r d e m de el-rei pelos seus. sobreditos envi-
ados.
[ fl. 22v. ] E c h e g a n d o d o m R o d r i g o c o m s u a comitiva a São P a u l o , digo, a o rio das
V e l h a s , n a v i z i n h a n ç a o n d e estava o dito B o r b a , a c h a n d o - s e c ó m p o u c o p r o v i -
m e n t o de. pólvora, c h u m b o , f e r r a m e n t a d e m i n e r a r e q u e r e n d o valer-se dos q u e
t i n h a e m g u a r d a o dito B o r b a p a r a c o n t i n u a r a s u a viagem sertão d e n t r o , este se
escusou de d a r coisa alguma, pois estava e s p e r a n d o a seu sogro F e r n ã o Dias Pais
p a r a fazerem as m e s m a s diligências q u e , p o r o r d e m d e S u a M a j e s t a d e , t i n h a m d e
c o n t i n u a r , p o r h a v e r e m d a d o c o n t a a S u a Majestade nas p r i m e i r a s m o s t r a s q u e
h a v i a m a c h a d o , e n ã o era b e m viesse seu sogro c o m novas o r d e n s q u e Sua M a j e s -
t a d e m a n d a s s e e se achasse sem õ p r o v i m e n t o que tinha deixado seguro e a ele e m
g u a r d a deles; c o m cuja resposta se a l t e r a r a m ps paulistas c o n t r a o seu *paisano e
disseram a o g o v e r n a d o r d o m R o d r i g o q u e eles iriam tirar à força d e a r m a s os tais
p r o v i m e n t o s d e q u e c a r e c i a m . A o q u e r e s p o n d e u o g o v e r n a d o r , n a q u e l e princí-
p i o d e ruína, p r u d e n t e m e n t e , q u e n ã o era j u s t o forçar aquele h o m e m a servi-los
c o m o q u e se p o d i a , à b o a m e n t e , alcançar pelos termos políticos e corteses, e q u e
ele o faria, c o m o o fez, a c o m p a n h a d o só de dois pajens. E r e p u g n a n d o o dito
B o r b a a t o d a s as instâncias de d o m R o d r i g o , [este] se a p a i x o n o u , d e sorte q u e ,
l e v a n t a n d o - s e , o a m e a ç o u q u e m a n d a r i a b u s c a r , q u e r ele quisesse o u n ã o , as
coisas d e q u e carecia p a r a o serviço real. C o m vozes alteradas, ouvidas estas d e
dois pajens d o dito B o r b a , s u p o n d o a seu a m o ultrajado, t o m a r a m o passo a d o m
R o d r i g o e o m a t a r a m c o m dois tiros a o m e s m o t e m p o disparados, e m a t a r i a m aos
pajens d e d o m R o d r i g o se n ã o a c u d i r a / / o dito B o r b a , c o m g r a n d e e s p a n t o e [ fl. 2 3 ]
pesar seu, a o estrondo das a r m a s .
C h e g a n d o as notícias ao "arraial e alojamento de d o m R o d r i g o ê dos paulistas
q u e o a c o m p a n h a v a m , se p u s e r a m estes e m a r m a s p a r a c o m e t e r a o B o r b a e
esquartejá-lo, c o m o j u r a v a m . Este, v e n d o q u e , sem dúvida, o a c o m e t i a m e q u e se
a c h a v a c o m p o u c a s forças p a r a defender-se d e tão s u p e r i o r p o d e r , salvo se p o r
a l g u m ardil q u i m é r i c o c o m q u e pudesse e n g a n a r e " e m b e l e c a r aos c o n t r á r i o s o
fizesse. C o m efeito^ c o m o h o m e m a g u d o d e e n g e n h o e v a l o r o s o p o r n a t u r e z a ,
saiu c o m u m , o mais p r o p o r c i o n a d o q u e p o d i a h a v e r p a r a o i n t e n t o , e foi q u e dos
p o u c o s c a m a r a d a s e índios q u e c o m ele se a c h a v a m r e p a r t i u p o r d u a s ou três
partes, dos c a m i n h o s q u e faziam e n t r a d a p a r a o l u g a r d o sítio, pelos altos dos
m o r r o s , e c a r r e g a n d o as a r m a s c o m pólvora, tal m a n d o u q u e atirassem salvas e
t o c a s s e m b u z i n a s e caixa d e g u e r r a q u e r e p r e s e n t a s s e m q u e p o r t o d a s a q u e l a s
partes e n t r a v a m força de esquadrões de gente que supusessem os inimigos q u e e r a
c h e g a d o o " c a p i t ã o - m o r e g o v e r n a d o r F e r n ã o Dias Pais, q u e ficara à p a r t i d a deles
a p a r e l h a n d o g r a n d e s tropas d e p a r e n t e s e amigos poderosos p a r a o a c o m p a n h a -
r e m . Surtiu e saiu o p r o j e t o c o m vigoroso efeito n a i m a g i n a ç ã o dos c o n t r á r i o s ,
q u e à q u e l a m e s m a noite despejaram o sítio, t e m e n d o ter o p o d e r de F e r n ã o Dias
Pais sobre si pelo q u e t i n h a m a m e a ç a d o e q u e r i d o forçar a seu g e n r o , e c o m e t e -
r a m o sertão dos C u r r a i s , q u e é hoje, e até agora n ã o t o r n a r a m a S ã o P a u l o , de
e n v e r g o n h a d o s deste caso. E p o v o a r a m o s e r t ã o , / / o c u p a d o s e m criar g a d o s , [ fl. 23v. ]
mais p o r alta p r o v i d ê n c i a divina q u e acerto do j u í z o dos h o m e n s , pois é hoje geral
sustento e m a n t e n ç a do g r a n d e p o v o desta M i n a s os gados q u e d e s d e e n t ã o cria-
r a m , servindo d e g r a n d e a u m e n t o d e cabedais p a r a eles e a S u a M a j e s t a d e nos
reais "contratos dos c a m i n h o s que a b r i u Francisco de A r r u d a C a b r a l , t a u b a t e a n o ,
p a r a e n t r a r e m os primeiros gados p a r a estas M i n a s , a i n d a q u e n o princípio i m p e -
dido p a r a se n ã o extraviar p o r ele o o u r o e m p ó q u e n a vila de T a u b a t é se fundia
e p a g a v a o "quinto a Sua Majestade. A necessidade, p o r é m , q u e h a v i a dos gados
p a r a o sustento das M i n a s reformou este projeto c o m outras disposições q u e evi-
tassem o d a n o e franqueassem o proveito.
Retirados q u e fossem os inimigos de M a n u e l d e B o r b a G a t o , e n t r o u n a des-
confiança, digo, e chegadas as notícias q u e teve d e que era falecido seu sogro F e r n ã o
Dias Pais, a t e m p o que chegavam as novas ordens d e S u a Majestade pelos enviados,
188

corn a qual m o r t e e a d e d o m R o d r i g o ficavam e m silêncio os d e s c o b r i m e n t o s ,


e n t r o u n a desconfiança d e q u e , infalivelmente, seria p r o c u r a d o das justiças c o m
violentas o r d e n s de S u a M a j e s t a d e p a r a ser p u n i d o pela m o r t e de d o m R o d r i g o .
A i n d a q u e sem culpa total sua, t o m o u o acordo de retirar-se p a r a o centro do sertão
d o rio D o c e . E fazendo-se parciais c o m o *gentio, aos quais domesticou a sua obe-
diência, e ficou entre eles, respeitado c o m o cacique, q u e é o m e s m o q u e príncipe
s o b e r a n o entre eles. E ali viveu b a r b a r a m e n t e , sem concurso d e sacramento algum
entre eles, digo, naquele m o d o d e vida, n e m comunicação c o m mais criaturas deste
[ fl. 24 ] m u n d o e m 16 anos, até q u e , doído do m a ú estado da sua / / consciência, se comu-
nicou c o m seus parentes e m São Paulo, p o r enviados secretos d e tão r e m o t o e dis-
t a n t e lugar, p a r a lhe d a r e m notícia se era ou n ã o p r o c u r a d o p o r o r d e m de S u a
Majestade^ e sendo destes avisado q u e não; antes, el-rei e s t r a n h a r a o p r o c e d i m e n t o
de q u e com ele t i n h a m usado q u e r e n d o forçá-lo contra razão, o que, suposto, n u n c a
era conveniente se facilitasse a aparecer e m p a r t e o n d e escandalizasse a justiça de
S u a M a j e s t a d e , m a s q u e p r o c u r a s s e l u g a r r e t i r a d o dos p o v o a d o s d o n d e pudesse
receber os sacramentos e estivesse acautelado. C o m este esforço de m e l h o r a p a r a o
seu c u i d a d o , se recolheu p a r a a c o m a r c a de S ã o P a u l o , p a r a a vila q u e é hoje- d e
P i n d a m o n h a n g a b a , e m u m a p a r a g e m e n t r e as serras do M a r e a p o v o a ç ã o c h a m a d a
Paraitinga, rio q u e forma o c h a m a d o d a P a r a í b a , se situou, t r a z e n d o do m e s m o
sertão g r a n d e n ú m e r o de gentios, q u e lhe serviam de escolta, e t e n d o a t u a l m e n t e
"atalaias q u e segurassem a s u a vivenda. Assim se t o r n o u ao g r ê m i o d a Igreja e
j u n t o u sua m u l h e r e filhos, e viveu bastantes anos c o m sossego n a q u e l e lugar.
Pelos anos d e mil seiscentos e n o v e n t a e t a n t o s , t e m p o e m q u e c o r r i a m as
"patacas castelhanas d e 750 ["réis], houve queixa dos povos a S u a M a j e s t a d e d e
q u e qs malévolos ladrões "cerceavam estas m o e d a s , q u e e r a m rústicas no feitio, c o m
g r a n d e prejuízo do geral comércio, ficando diminutas n o peso c o m a falta q u e lhe
faziam os cerceios, e q u e corresse a peso o dinheiro p a r a evitar esta malícia e se
desse providência fazendo m o e d a "serrilhada, que n ã o consentisse cerceio s e m ser
manifesto. M a n d o u S u a Majestade, c o m efeito, corresse a peso o tal dinheiro en-
q u a n t o se fabricava novos cunhos de m o e d a serrilhada n a forma p r o p o s t a ; e m a n -
[ fl. 24v. ] dou / / p r o m u l g a r , p o r "decreto seu e m todas as colónias, vilas, cidades dos seus
domínios, assim se praticasse.
C h e g o u este d e c r e t o a S ã o P a u l o e mais vilas, q u e , p e s a n d o as m o e d a s os
m o r a d o r e s , havia tal m o e d a q u e n ã o pesava a m e t a d e de seu valor, m o t i v o p o r
q u e r e p u g n a r a m a q u e c o r r e s s e o d i n h e i r o a p e s o , p o r q u e se p o u c o d i n h e i r o
h a v i a p o r terras tão p o b r e s , m a i s p o b r e s ficariam c o m tal d i m i n u i ç ã o n o p o u c o
q u e possuíam. E assim ficaram c o r r e n d o as tais p a t a c a s n o seu valor d e 7 5 0 , q u e r
pesassem o u n ã o o tal valor, e pelo c o n t r á r i o nas mais partes, q u e ficou observado
o d e c r e t o , n a m e s m a forma d a substância dele.
N e s t e m e i o t e m p o , h o u v e ocasião d e S u a M a j e s t a d e , e m c o n s e l h o , ser-lhe
necessário fazer m e m ó r i a das vilas e cidades dos seus domínios, p o r r a z ã o q u e lha
189

conviria p a r a o m e l h o r governo delas. E p e g a n d o o ' s e c r e t á r i o d e E s t a d o n a lista


delas, foi n o m e a n d o as q u e se ofereceram; e c h e g a n d o a de S ã o P a u l o , passou p o r
alto. P e r g u n t o u S u a Majestade p o r q u e r a z ã o passava a q u e l a vila p o r alto. R e s -
p o n d e u o secretário; " P o r q u e , senhor, aquelas vilas n ã o são d e Vossa M a j e s t a d e ,
pois se o fossem, o b e d e c e r i a m aos ' d e c r e t o s q u e Vossa Majestade m a n d o u expe-
dir p a r a todas as p a r t e s p a r a q u e corressem as ' p a t a c a s castelhanas a peso, p a r a
obviar o s e r e m ' c e r c e a d a s ; e sendo e m todas o b e d e c i d o , nesta foi d e s p r e z a d o . " ,
m o t i v o q u e incitou a S u a M a j e s t a d e a m a n d a r logo a A r t u r d e Sá e M e n e s e s ,
' g o v e r n a d o r q u e e n t ã o estava s e n d o d o R i o , S ã o P a u l o e M i n a s (que j á e n t ã o
concorria dos p r i m e i r o s descobrimentos bastante cópia de o u r o q u e t i n h a c h e g a -
d o às mãos d a Majestade).
N o a n o d e 1 6 9 9 , subiu A r t u r de Sá e / / Meneses a São P a u l o a e x e c u t a r as
6
[ fl. 25 ]
ordens, q u e e r a m p a r a e x a m i n a r a r a z ã o d a q u e l a rebeldia, e a c h a n d o culpados os
castigasse e fizesse observar o decreto. C o m efeito, subindo a S ã o P a u l o , e x a m i -
n a n d o a c a u s a s o b r e d i t a , lhe r e s p o n d e r a m as ' c â m a r a s q u e a r a z ã o fora s e r e m
aquelas t e r r a s m u i t o p o b r e s d e d i n h e i r o , e c o r r e n d o o p o u c o q u e h a v i a a p e s o ,
estando c o m o estava n o v a o r d e m , digo, n a verdade, d i m i n u t a nele p o r causa dos
cerceios, ficariam mais p o b r e s e m u i t o prejudicados os q u e p o s s u í a m o p o u c o q u e
havia; e q u e , p o r n ã o h a v e r e m tido providência, se t i n h a m conservado assim, m a s
q u e e s t a v a m p r o n t o s p a r a o q u e S u a M a j e s t a d e ordenasse. E m última conclusão
da m a t é r i a , assentou e n t ã o A r t u r de S á recolher o dinheiro todo e. p a s s a r p a r a a
fábrica da n o v a m o e d a ' s e r r i l h a d a , a q u e e n t ã o se tinha j á p r i n c i p i a d o a fabricar
c o m o real c u n h o d o s e n h o r rei d o m P e d r o II.
C o n h e c e n d o os p a r e n t e s e amigos de M a n u e l de B o r b a G a t o a b o a n a t u r e z a ,
p r u d ê n c i a , afabilidade e carinhoso trato d e A r t u r de. Sá, se a n i m a r a m a conversá-
lo no sucesso d a m o r t e de d o m R o d r i g o e a expor-lhe o p e n o s o desterro p a r a os
sertões d e u m vassalo b o m servidor d e el-rei c o m o e r a M a n u e l d e B o r b a G a t o ,
n ã o sendo t o t a l m e n t e c u l p a d o d a m o r t e de d o m R o d r i g o pelas circunstâncias d e
seu a c o n t e c i m e n t o . Nestas práticas, c o n h e c e r a m o b o m â n i m o do fidalgo e q u e ,
s e m d ú v i d a , o favoreceria se o chegasse a ver. E c o m este p r o j e t o a v i s a r a m a
M a n u e l de B o r b a G a t o q u e e r a m de p a r e c e r viesse a São P a u l o e n q u a n t o o fidal-
go estava retido, e u m a noite se lhe botasse aos pés e l h e propusesse a sua causa e
m e n o s c u l p a / / q u e teve n a q u e l e sucesso, q u e o a c h a v a m de â n i m o a favorecê-lo. [ fl. 25v. ]
C o m efeito, e n t r e t e m o r e s e receios, se, resolveu M a n u e l d e B o r b a a s e g u i r o

A datil correta da viagem é 1697; tinha como objetivo pacificar o "motim das patacas", reação dos
paulistas à lei de 4 de abril de 1688, que regulamentou o padrão monetário na América portuguesa
e fixou o grão de ouro em vintém e a oitava em mil e quinhentos réis, sensível redução do valor
nominal das moedas. Em 1699, realizou segunda viagem a São Paulo para discutir a primazia
requerida pelos paulistas na distribuição das lavras do sertão dos Cataguases.
190

c o n s e l h o ; e c h e g a d o a S ã o P a u l o e m o c a s i ã o o p o r t u n a , era u m a n o i t e , a h o r a s
c o m p e t e n t e s , se l a n ç o u aos pés de A r t u r d e Sá, q u e j á estava b e m i n f o r m a d o e o
recebeu c o m carinhosa afabilidade. E estando mais livre do susto, o aflito m o n t a -
nhês e temeroso vassalo se declarou e x p l a n a n d o o caso c o m suas circunstâncias e
q u e se Sua Senhoria, e m n o m e d e Sua Majestade, lhe desse p e r d ã o do suposto e
imaginado crime q u e se lhe imputava, descobriria e faria ^manifesto u m a s minas de
o u r o c o m grandeza tal q u e serviria de grandes aumentos à C o r o a n o r e n d i m e n t o de
seus "quintos e a u m e n t o de seus povos, que até ali tinha oculto p o r viver retirado
pelos sertões, temeroso das justiças e da indignação de S u a Majestade.
C o m d e m o n s t r a ç õ e s de g r a n d e gosto, o l e v a n t o u nos b r a ç o s A r t u r d e S á e
lhe p r o m e t e u , e m n o m e d e S u a M a j e s t a d e , o p e r d ã o se, c o m efeito, desse, a o
manifesto tal d e s c o b r i m e n t o ; e desde logo s e g u r a v a p a r a q u e passeasse n a sua
pátria livremente e se p r e p a r a s s e logo p a r a o a c o m p a n h a r a estabelecer as ditas
m i n a s e. d e s c o b r i m e n t o s que. as q u e r i a ir estabelecer, e e n t ã o d a r c o n t a a S u a
Majestade do p e r d ã o que p r o m e t e r a e m seu n o m e e m r e c o m p e n s a do serviço q u e
aquele vassalo lhe fizera c o m aqueles descobrimentos, p a r a q u e , a o m e s m o t e m -
p o q u e desse o p e r d ã o , achasse m e r e c i m e n t o s p a r a a q u e l a e mais mercês.
Lançou-se c o m o h u m i l d e rato o G a t o aos pés d o seu benfeitor, a g r a d e c e n d o
a p r o m e s s a d o p e r d ã o , suposto sempre receoso p o r ser condicional, m a s a n i m a d o
[ fl. 26 ] da certeza com que / / cumpriria à condição, manifestando o o u r o que tinha
descoberto n o rio das V e l h a s n o t e m p o e m q u e esteve no lugar e m q u e o achou
d o m R o d r i g o , q u e s e m p r e o teve o c u l t o p o r alta p r o v i d ê n c i a d o c é u p a r a lhe
servir d e l i v r a m e n t o n a q u e l e t e m p o .
Logo s e m mais d e m o r a , se dispôs, a j u d a d o de amigos e p a r e n t e s e p e l a p r ó -
p r i a possibilidade dos muitos índios q u e t i n h a de sua a d m i n i s t r a ç ã o e muitos q u e
o m e s m o g o v e r n a d o r tirou das aldeias domésticas de São P a u l o p a r a o a c o m p a -
n h a r e m . E p a r t i r a m n o princípio do a n o d e 1700 p a r a as M i n a s , q u e j á estavam
estas G e r a i s c o m b a s t a n t e s m i n e i r o s . E p a s s a n d o p o r elas, b u s c a n d o a I t a b i r a ,
c h e g a r a m a o rio das V e l h a s , no qual rio m o s t r o u *pintas b o a s , e e m vários braços
d o m e s m o , q u e se d e n o m i n a v a m o S a b a r á , n o m e "gentílico a u m a s e r r a q u e
a c o m p a n h a este r i b e i r o , o u dele b r o t a , e d e s á g u a n o rio das V e l h a s , e. o u t r o s
muitos, c o m o o ribeiro do Inferno, p o r ir s u b m e r g i n d o , e m partes, p o r cavernas
profundíssimas d e p e d r a s , o G a i a e os mais q u e ficaram sem n o m e .
R e p a r t i u - s e p o r m u i t o s mineiros q u e c o n c o r r e r a m , e e n t r e estes h o u v e al-
g u n s q u e a m p l i a r a m , d e s c o b r i n d o n a q u e l e s c o n t o r n o s r i b e i r o s de. o u r o , c o m o
foram os R a p o s o s , R i o A c i m a , q u e até hoje está p o v o a d o c o m vigararia, ps G u e r -
ras, n a t u r a i s d e Santos, o C a e t é , o n d e se fundou a Vila N o v a d a R a i n h a , e n o
S a b a r á , a g r a n d e Vila R e a l , cabeça de c o m a r c a , c o m a opulência q u e hoje se vê,
c o m "ministros seculares e eclesiásticos, c o m magníficos templos e famosas casas.
N a repartição, t o m o u o g o v e r n a d o r A r t u r de Sá e M e n e s e s *datas p a r a si, n o
.[ A. 26v. ] lu gar q u e lhe assinalou o G a t o , / / e nelas, dizem, tirou trinta e tantas *arrobas d e
o u r o , c o m q u e foi muito rico p a r a Lisboa.
191

D e u conta A r t u r de Sá a S u a Majestade do p e r d ã o que, e m seu n o m e , p r o m e -


tera a M a n u e l de B o r b a G a t o pela m o r t e de d o m R o d r i g o q u e se lhe arguia e d a
satisfação q u e dera o dito G a t o à condição das minas q u e p r o m e t e r a d e ouro que,
c o m efeito, e r a m p a r a muitos aumentos e r e n d i m e n t o s d a C o r o a , c o m o p r o m e t i a o
q u e t i n h a visto. C o n f i r m o u S u a M a j e s t a d e o p e r d ã o e lhe fez m a i s a m e r c ê d a
p a t e n t e d e "tenente-general de u m a das p r a ç a s m a r í t i m a s q u e p r i m e i r o vagasse,
segundo as l e m b r a n ç a s .
J á sossegado, livre e p r e m i a d o d a generosa m ã o d e el-rei d o m P e d r o II, o
nosso tenente-general M a n u e l d e B o r b a G a t o m a n d o u vir a sua família p a r a o rio
das V e l h a s e dois g e n r o s q u e t i n h a , n a t u r a i s d a ilha d e S ã o M i g u e l , A n t ô n i o
T a v a r e s e Francisco de A r r u d a . Estes t i r a r a m t a n t o c a b e d a l q u e e m p o u c o s anos se
p a s s a r a m à p á t r i a e f u n d a r a m , c a d a u m , seu " m o r g a d o , e vivem regalados c o m os
m i m o s e.fertilidade da pátria. U m sobrinho dos m e s m o s casou c o m a última filha
q u e tinha o dito tenente-general e se aproveitou c o m m a i o r grandeza dos m e s m o s
haveres, retirando-se c o m eles p a r a a m e s m a pátria, c o m o o fizeram muitos nestes
m e s m o s lugares.
A c a b a d a s da maior g r a n d e z a as lavras e j á diminuto dos grandes cabedais q u e
tinha adquirido, o tenente-general M a n u e l de B o r b a G a t o se retirou p a r a u m sítio
q u e tinha fundado e m P a r a o p e b a , rio fértil de peixe, boas terras de m a n t i m e n t o s —
o n d e viveu muitos anos, j á muito diminuto de / / bens, c o s t u m a d a conclusão dos [ fl. 27 ]
desta terra, e neste lugar faleceu de i d a d e d e n o v e n t a anos p a r a cima, n o a n o d e
1734, c o m mostras d e predestinado três dias de viagem do S a b a r â p a r a a p a r t e d o
p o e n t e , â m a r g e m d o rio P a r a o p e b a , q u e é o m e s m o q u e no c a m i n h o do R i o d e
J a n e i r o se passa c o m o m e s m o n o m e , q u e recebendo mais á g u a se faz, j á naquela
altura, caudaloso e se vai ajuntar com o rio das Velhas, e ambos juntos a o rio de São
Francisco, a u m e n t a n d o g r a n d e m e n t e as suas caudalosas correntes. Este fim teve
aquele famoso sertanista e n ã o m e n o s c a p a z p a r a as cortes p e l o b o m e n g e n h o e
capacidade de q u e era dotado.
C o n t i n u a r a m as lavras do S a b a r á , digo, d o rio das V e l h a s , S a b a r á e m a i s
ribeiros referidos n a m e s m a f o r m a q u e os d a c o m a r c a d e V i l a R i c a e R i o das
M o r t e s , l a v r a n d o - s e o m a i s fácil e possível à p o u c a e x p e r i ê n c i a e possibilidade
d a q u e l e t e m p o , c o m o está dito. E assim c o n t i n u o u n a m e s m a f o r m a o m o d o d e
lavrar, à "bateia e d e "mergulho nos m a i o r e s ribeiros, c o m o n o ribeirão do C a r m o ,
rio das M o r t e s e rio das Velhas, e à força d e b r a ç o nos ribeiros mais p e q u e n o s , p o r
espaço d e bastantes anos, até q u e pelos de 1707, p o u c o mais o u m e n o s , i n v e n t o u
o artificio dos mineiros lavrar e d e s m o n t a r as terras c o m á g u a superior aos "tabu-
l e i r o s a l t o s , a p r e n d i d o d o n a t u r a l efeito q u e f a z e m as á g u a s n o t e m p o das
"invernadas das chuvas, e c a v a n d o as terras descobriam cascalhos nos lugares mais
b a i x o s e neles, e m p a r t e , o u r o , à reflexão q u e f i z e r a m n e s t a o b r a n a t u r a l d a s
águas, d e lugares / / superiores conduzindo-as p o r "oliveí a outros p a r a , artificio- [ fl- 27v. ]
s ã m e n t e , ajudados d e alavancas e instrumentos d e cavadeiras de ferro, ajudar as
águas a desfazerem a terra p a r a ser c o n d u z i d a p o r ela até d a r nos rios d e m a i o r
192

p o t ê n c i a q u e as c o n d u z a até os m a i o r e s e até o m a r , d e i x a n d o descoberto cascalho


sem impedimento.
Logo se c o m u n i c o u g r a n d e m e n t e a t o d a s as p a r t e s o invento, d e q u e f o r a m
usando todos, conduzindo custosas águas, desfazendo penhascos, c o r t a n d o montes,
fazendo p a s s a g e m de j i r a u s altíssimos d e m a d e i r a de lei p a r a passar p o r bicas, e
outros p o r "alcatruzes, ou bicas fechadas, descendo e subindo c o m elas até p o d a s
nos lugares q u e dessem ouro, pois n ã o são gerais as minas q u e o dão, senão certos
e m q u e se a c h a disposição ou o n d e D e u s foi servido criá-lo, q u e p a r a o descobrir e
a c h a r é necessário g r a n d e desvelo, despesa e trabalho, c o m "fábrica d e escravos q u e
trabalhem.
C o m este n o v o m o d o e laborioso invento se fertilizaram n o v a m e n t e as m i -
n a s , c r e s c e n d o as conveniências, as p o v o a ç õ e s e c o n c u r s o d e negócios d e escra-
vos, gados, c a v a l g a d u r a s e fazendas d e t o d o g ê n e r o , c o m q u e o c o m é r c i o geral-
m e n t e se estendeu desde este r e m o t o clima até a F r a n ç a e H o l a n d a .
Neste estado se a c h a v a m as m i n a s , c o r r e s p o n d e n d o o r e n d i m e n t o ao custoso
t r a b a l h o dos m i n e i r o s c o m rendosas conveniências, a u m e n t a n d o d e c a d a vez mais
[ fl. 28 J o c o n c u r s o dos. negócios e do / / p o v o , e do povo d e várias p a r t e s , e m a i o r m e n t e
filhos de Portugal, entre os quais v i e r a m muitos que, sendo mais ardilosos p a r a o
n e g ó c i o , q u i s e r a m i n v e n t a r " c o n t r a t o s d e vários g ê n e r o s p a r a , m a i s d e p r e s s a e
c o m m e n o s t r a b a l h o , e n c h e r e m as medidas a q u e aspiravam da incansável a m b i -
ç ã o , c o m o foi u m religioso trino, cujo n o m e n ã o faltará q u e m diga,'' c o m o u t r o
religioso c h a m a d o frei C o n r a d o , q u e e m p r e g a r a m , u m e o u t r o , três a r r o b a s d e
o u r o e m fumos de t a b a c o q u e atravessaram os negociantes antes de e n t r a r e m nas
M i n a s . E p o n d o e m g r a n d e falta d a q u e l e g ê n e r o , i n t e n t a r a m p ô r p o r "contrato
r e m a t a d o , p a r a v e n d e r e m a q u a t r o e a cinco "oitavas a "vara, sendo q u e a u m a e
d u a s e r a o seu c o m u m p r e ç o , o q u e d e f e n d e r a m os paulistas e filhos d e S e r r a
A c i m a , p o r q u e era a q u e l e g ê n e r o coisa q u e os negros, índios, bastardos e b r a n c o s
g a s t a v a m s e m m e d i d a , e sendo p o r c o n t r a t o e estanco os p o r i a m e m c o n s t e r n a ç ã o
p e n o s a q u e , c o m efeito, n ã o c o n s e g u i r a m , a i n d a q u e p a r a o efeito se h a v i a m
e m p e n h a d o interessados de P o r t u g a l , digo, d e filhos d e P o r t u g a l , q u e j á faziam
figura d e p o d e r e respeito.
V e n d o estes e os mais interessados frustrado o projeto d e sua a m b i ç ã o , entra-
r a m e m o u t r o mais danoso e prejudicial ao c o m u m alimento e principal subsistên-
cia dos mineiros p a r a se m a n t e r e m e m seus laboriosos serviços d e m i n e r a r , q u e
[ fl. 28v. ] era d e p ô r p o r c o n t r a t o / / a s c a r n e s d e v a c a nos cortes e m t o d o s os arraiais e
lugares das M i n a s . D e f e n d e r a m os paulistas e alguns dos mais b e m - i n t e n c i o n a d o s

• Frei Francisco de Meneses.


193

reinóis q u e o n ã o c o n s e g u i s s e m , m o t i v o s estes p o r q u e f o r a m c o n c e b e n d o u m
ó d i o m o r t a l a q u e l e s a m b i c i o s o s a estes defensores d o b e m p ú b l i c o e g e r a l d e
todos os habitantes, q u e q u e r i a m fossem oprimidos c o m tão pernicioso e n r e d o d e
ambição.
F o m e n t o u este ó d i o , c o m m a i s vigor, o p o d e r e r e s p e i t o q u e os p a u l i s t a s
l o g r a v a m c o m o pessoas principais e fundadoras das povoações, e a u m e n t a d o s e m
r i q u e z a s e v e n e r a ç õ e s dos favorecidos, causas q u e a u m e n t a m a inveja e confir-
m a m o mais fino e inveterado ódio. N ã o h á dúvida q u e e n t r e muitos paulistas q u e
o b s e r v a v a m pacíficos, h u m a n a d o s ao b o m trato e favor dos reinóis, r e c o l h e n d o -
õs e m suas c o m p a n h i a s , f a v q r e c e n d o - o s e m t u d o e a u m e n t a n d o - o s dos b a i x o s
p r i n c í p i o s c o m q u e às M i n a s c h e g a v a m , h a v i a , c o n t u d o , a l g u n s p a u l i s t a s q u e ,
levados d e u m a s o b e r a n i a d e respeito, q u e r i a m tributos d e a d o r a ç õ e s , c o m o era
sobre todos J e r ô n i m o P e d r o s o , c o m o foi notório, e seu i r m ã o V a l e n t i m P e d r o s o
d e B a r r o s , suposto este m a i s p o r elevados brios e c a p r i c h o s d e p r í n c i p e q u e d e
m a l d a d e . E c o m o n a q u e l e t e m p o n ã o havia mais justiça q u e o * m e s t r e - d e - c a m p o
dos "auxiliares D o m i n g o s d a Silva B u e n o , q u e era * g u a r d a - m o r e / / *superinten- [ fl. 29 ]
dente c o m jurisdição no cível e crime p o r A r t u r d e Sá e M e n e s e s , " g o v e r n a d o r d o
R i o , S ã o P a u l o e M i n a s , e m distrito tão dilatado c o m o o das q u a t r o c o m a r c a s ,
c o m o hoje estão repartidas, n ã o p o d i a esta só cabeça, estando e m q u a l q u e r p a r t e ,
a c u d i r a tão r e m o t o s m e m b r o s ; p r e c i s a m e n t e havia d e h a v e r falta d e j u s t i ç a nas
mais p a r t e s , r a z ã o p o r q u e , h a v e n d o dúvidas ou c o b r a n ç a s , se valiam dos respei-
t a d o s q u e m a i s v i z i n h o s se a c h a v a m e, p e l o m e s m o m o d o , os c o n t r o v e r s o s se
valiam de o u t r o s , afetando razões e a d u l a n d o motivos q u e obrigassem a defesa,
m u i t a s vezes, d e sem-razões, d o n d e se originavam a r m a d a s e contendas, extraordi-
nárias, d e f e n d e n d o c a d a u m aos seus afilhados c o m o m a i o r e m p e n h o d e c a p r i -
c h o s e, p u n d o n o r e s , t u d o o c a s i o n a d o pelos m e s m o s filhos d e P o r t u g a l . N ã o se
d u v i d a q u e e n t r e tantos b o n s havia alguns m a u s , p r i n c i p a l m e n t e m u l a t o s , b a s t a r -
dos e 'carijós, q u e alguns insultos faziam, c o m o os m a u s fazem a i n d a n a s cortes
e n t r e a Majestade e as Justiças, q u a n t o mais e m u m sertão o n d e , s e m controvérsia,
campeava a liberdade s e m 8
sujeição a n e n h u m a lei n e m j u s t i ç a s e n ã o a n a t u r a l ,
o b s e r v a d a dos b o n s .

Seguem-se as notícias das causas e motivos q u e h o u v e p a r a o geral l e v a n t a -


m e n t o e "sublevação universal dos naturais do reino de Portugal c o n t r a os paulistas
e naturais d e t o d a a Serra Acima.

A partir deste ponto, letra de Caetano da Costa Matoso.


194

>3«

[ fl. 30 ] Relação do princípio descoberto destas Minas Gerais


e os sucessos de algumas coisas mais memoráveis que sucederam
de seu princípio até o tempo que as veio governar o
Excelentíssimo Senhor dom Brás da Silveira

Narrativa de bandeiras realizadas em. fins do século XVII


pelo sertão paulista em busca de índios p a r a escravizar, da abertu-
ra de caminhos pelo sertão da Bahia pelos criadores de gado e
dos descobrimentos de ouro e povoamento inicial na região das
minas.-Destacam-se os principais, personagens envolvidos nesses
acontecimentos, descrevendo as ocorrências de conflitos e vio-
lências entre os primeiros povoadores e aqueles que chegam em
seguida à região com a ocorrência de algumas mobilizações
militares. Trata-se das resistências iniciais a o estabelecimento
de autoridades portuguesas n a região até a pacificação dos con-
flitos e implantação do governo de Antônio de Albuquerque Co-
elho de Carvalho em 1710.
O interesse do ouvidor em reunir relatos sobre o povoa-
mento de Minas Gerais, seja por exigências do cargo ou por seu
perfil intelectual, coincide com o falecimento dos remanescentes
dos' primeiros povoadores de Minas e a fixação de suas reminis-
cências sob a forma, escrita, colecionadas p o r particulares. A
anotação feita pelo ouvidor ao final do texto denota seu objetivo
de formar u m a 'coleção', ou seja, "ajuntamento; coleção de vá-
rias coisas que se tem lido e a n o t a d o " e os dados constantes
foram retirados dos documentos 14 e 15.
Autoria, l o c a l e data: Anônimo; Minas Gerais; ca. 1750.
U s o n a historiografía: Dentre outros documentos da sé-
rie de relatos presentes neste Códice que mencionam os conflitos
entre paulistas e reinóis, Afonso de E. T a u n a y obtém nele maté-
ria para sua reconstituição das descrições e episódios da Guerra
dos Emboabas, do caráter dos personagens, de suas principais
ações, das atitudes dos líderes emboabas, das reações dos paulistas,
dos procedimentos dos governadores envolvidos, da fundação de
vilas e de diversas biografias (História geral das bandeiras paulistas.
São Paulo: Imprensa Oficial, Museu Paulista, 1948. V . 9, p.
449-641 e, ainda que muito menos freqüente, 1949, v. 10, p . 1-
26 e p. 3-234). Neste autor, a compilação das várias acepções de
'emboaba' encontra aqui u m a de suas fontes (v. 9, p. 478), assim
como dados únicos da biografia de Manuel Nunes Viana (v. 10,
195

p . 109-120). D o n a l d R a m o s extrai informações sobre detalhes


das construções para descrever a formação urbana de Vila Riça,
reconstituição d a G u e r r a dos Emboabas, n o m e a ç ã o e atuação
de autoridades (A social kistqry of Ouro Preto: strésses of dynamic
urbanization in colonial Brazil, 1695-1726. Gainesville: TJniversity
of Florida, 1972. p . 99-147, passim). Mafalda P . Zemela empre-
gou as descrições de fome e carestia extremas nos primeiros tem-
pos das Minas para sublinhar as dificuldades do abastecimento
(0 abastecimento da capitania das Minas Gerais no século XVIII.
São Paulo: Hucitec, Edusp, 1990. p. 134). T a u n a y j á havia feito
o mesmo (v. 9, p. 237). Charles R. Boxer encontra no documento
elementos sobre a migração descontrolada, as crises de abasteci-
mento e de mão-de-obra nos anos inciais da exploração arurífera
(A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de u m a sociedade
colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969. p . 70-71); e para a
atuação de Antônio de Albuquerque no enfrentamento d a oposi-
ção dos paulistas a sua autoridade (p. 101). S. Suanes utiliza-o
n a r e m o n t a g e m da G u e r r a dos E m b o a b a s (Os. emboabas. São
Paulo: Brasiliense, [1959]. p . 157, 262, 276).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : A relação apresenta característi-
cas do gênero demonstrativo ovj epidítico da oratória, sendo in-
tegrado por dois episódios (seqüência de atos c o m unidade —
começo, meio e h m — dentro de u m a ação maior). (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a do século
XVIII, tipo bastarda italiana, com hastes superiores levemente
inclinadas para a direita, em laçadas cheias; as hastes, inferiores
são sinistro giras, arredondadas, terminando t a m b é m por laça-
das cheias. Apresenta u m " C " com largo movimento circular,
abaixo da linha da escrita; "r" redondo de u m só traço. Abrevi-
aturas usuais por contração, com ponto abreviativo e letras so-
brepostas; na sílaba "ta", também sobreposta, movimento de la-
çada, formando ligatura. E m nota final (fólio 34-34v.), altera-se
a escrita, com traçado evoluído e personalizado, idêntica à d a
p á g i n a do título; p o r t a n t o da autoria de C a e t a n o d a C o s t a
Matoso. (YDL)
Cópias impressas:
U M I N É D I T O da brasiliana de Felix Pacheco. Jornal do Co-
merão, Rio de Janeiro, \ - dez. 1946. p . 2.
T A U N A Y , Afonso d e E. Documentos inéditos sobre as primeiras
descobertas do ouro em Minas Gerais. Revista do Instituto His-
tórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 44, p . 353-359,
1948.
T A U N A Y , Afonso de E. Relatos sertanistas. São Paulo: Martins,
195?. p . 61-70.
196

S
u c e d e u q u e v i n d o os paulistas n a q u e l e t e m p o fazerem e n t r a d a ao *gentio
a estas partes p a r a o c o n d u z i r e m p a r a São P a u l o p o r negócio e se servirem
dele, c o n d u z i n d o os d e m e n o s i d a d e p o r m e l h o r se lhes d o m a r e p ô r d o -
m é s t i c o , e c h e g a n d o a p r i m e i r a e s q u a d r a ou b a n d e i r a a o ribeiro q u e hoje c h a -
m a m O u r o B r a n c o e C o n g o n h a s do C a m p o , aí a c h a r a m algumas "faíscas de ouro
nas areias do ribeiro e, l a v a n d o - o e m pratos de p a u , o l e v a r a m p a r a São P a u l o ,
o n d e se verificou ser o u r o . E c o m esta notícia t o r n a r a m c o m mais p o d e r a fazer
e n t r a d a a o m e s m o gentio, e m e l h o r p r e p a r a d o s p a r a extrair o u r o se o achassem
c o m mais a b u n d â n c i a , e c o m efeito seguiram a m e s m a "derrota. E c o m a m e s m a
b a n d e i r a v i e r a m n ã o só paulistas c o m o t a m b é m filhos de P o r t u g a l e R i o d e J a n e i -
r o , p e l a notícia q u e se espalhou d o o u r o q u e se t i n h a descoberto. E, c o m efeito,
c h e g a d a q u e foi a b a n d e i r a ao tal ribeiro das C o n g o n h a s , nele ficou a l g u m a gente
e a mais entrou p a r a este O u r o P r e t o , o n d e a c h a r a m o u r o de m a i s c o n t a e t i r a r a m
u n s duas "libras, outros três, e alguns q u a t r o , e c o m aquele q u e c a d a u m se a c h a v a
t o r n a v a m p a r a S ã o Paulo a c o m p r a r escravos e refazer-se d o mais necessário p a r a
t o r n a r e m p a r a as m e s m a s minas; e n ã o t r a t a r a m , desse t e m p o e m d i a n t e , a p r o c u -
rar gentio.

E logo c o m as mais certas notícias d o d e s c o b r i m e n t o , se abriu c a m i n h o d e


S ã o P a u l o p a r a este O u r o Preto e do R i o de J a n e i r o , a q u e c h a m a m o C a m i n h o
V e l h o , e depois o N o v o , p o r o n d e hoje é o mais p e r t o . E e m p o u c o s anos foi t a n t a
a c o n c o r r ê n c i a d e gente, e se foram e s t e n d e n d o seguindo este c ó r r e g o do O u r o
P r e t o rio abaixo, q u e t o d o levava o u r o , a q u e hoje c h a m a m ribeirão d a C i d a d e
M a r i a n a , q u e t e m sua n a s c e n ç a neste m o r r o d e Vila R i c a ; e outros se f o r a m situ-
a n d o pelo rio das Velhas, q u e corre pela o u t r a p a r t e deste m e s m o m o r r o e segue
pela Vila Real d o S a b a r á p a r a o de São Francisco, q u e t a m b é m t e m este rio das
V e l h a s suas cabeceiras deste m o r r o de Vila Rica. E p o r serem estes dois rios d a
m a i o r "faisqueira se p o v o a r a m mais depressa e se foi a l a r g a n d o os v i n d o u r o s e
d e s c o b r i n d o o u t r o s rios e c ó r r e g o s q u e p o v o a v a m , a c h a n d o neles faisqueiras d e
o u r o ; e logo t a m b é m se p o v o o u o rio das M o r t e s , p o r se a c h a r o u r o d e c o n t a no
rio e t a m b é m e m u m m o r r o contíguo ao m e s m o rio. E assim se foram e s t e n d e n d o
e r o m p e n d o m a t o s , e a b r i n d o picadas de c a m i n h o s os h o m e n s , e situando-se o n d e
a c h a v a m conveniência.

E c o m notícias de h a v e r o u r o nestas m i n a s e p o v o a ç ã o d e gente, v i e r a m d o


sertão d a B a h i a a b r i n d o picadas e t r a z e n d o a l g u m g a d o p a r a elas, e o g r a n d e p r e ç o
p o r q u e v e n d i a m a cabeça, q u e era a m e i a libra d e o u r o naqueles princípios, os
a n i m a v a à esterilidade do c a m i n h o , n o q u a l m o r r e u m u i t a gente n a q u e l e t e m p o : d e
d o e n ç a s e à necessidade, e outros q u e m a t a v a m p a r a os r o u b a r n a volta, q u e levavam
[ fl. 3Üv. ] o o u r o , e a i n d a os c a m a r a d a s / / q u e i a m j u n t o s fazer seu negócio ou d e r e t i r a d a c o m
a l g u m o u r o m a t a v a m u n s aos o u t r o s p e l a a m b i ç ã o d e f i c a r e m c o m ele, c o m o
s u c e d e r a m m u i t o s casos destes; e p e l o t e m p o e m d i a n t e se f o r a m franqueando
mais os c a m i n h o s c o m a m u i t a gente q u e p a r a elas veio de t o d a A m é r i c a , Bahia,
197

P e r n a m b u c o , R i o de J a n e i r o e São P a u l o , e t a m b é m do sertão, q u e é m u i t o exten-


so e t e m m u i t a gente. E fizeram arraiais o n d e a c h a v a m m e l h o r e s conveniências,
q u e alguns são hoje vilas, c o m o seja esta Vila Rica, a C i d a d e M a r i a n a , d u a s n o
R i o das M o r t e s , a do S a b a r á , C a e t é , Pitangui, S e r r o do Frio.
E n a q u e l e t e m p o h a v e n d o povoações e a r r a i a i s f u n d a d o s , veio t a m b é m do ser-
tão o *capitão-mor M a n u e l N u n e s V i a n a d a sua fazenda c h a m a d a a T á b u a , o n d e
vivia a dispor os seus gados e m i n e r a r c o m os escravos q u e t r o u x e , e c h e g a d o q u e foi
se situou n o arraial d o C a e t é , o n d e hoje é Vila N o v a d a R a i n h a . E nesse t e m p o
t a m b é m h a v i a outros arraiais, c o m o eira n o S a b a r á , o n d e hoje é vila, R i o das M o r t e s ,
o n d e t a m b é m são vilas, e esta d e Vila R i c a .
E sucedeu naquele tempo pedir u m h o m e m p o b r e e m b o a b a a outro paulista
u m a e s p i n g a r d a e m p r e s t a d a , e t e n d o esta d e s c a m i n h o e m m ã o d o dito e m b o a b a ,
q u e n a q u e l e t e m p o c h a m a v a m os paulistas aos reinóis e m b o a b a s , lha quis p a g a r
p o r sete *oitavas, p r e ç o q u e t i n h a c u s t a d o a dita a o p a u l i s t a . E n ã o q u e r e n d o
este aceitar mais q u e a sua p r ó p r i a e s p i n g a r d a , se foi v a l e r o reinol do c a p i t ã o -
m o r M a n u e l N u n e s V i a n a , p a r a q u e c h a m a s s e o tal paulista p a r a q u e aceitasse o
valor d a d i t a e s p i n g a r d a pu o u t r a ; e s a b e n d o o p a u l i s t a q u e o r e i n o l se t i n h a
v a l i d o d o c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s , se foi t a m b é m valer d e o u t r o p a u l i s t a ,
por nome Jerônimo Poderoso, 1
p o r este ter t a m b é m b a s t a n t e s e s c r a v o s , e n a -
quele t e m p o q u e m t i n h a vinte ou trinta era respeitado e n t r e os m a i s . E logo n o
d o m i n g o seguinte, indo à missa à igreja d o C a e t é , q u e nesse t e m p o era c o b e r t a
d e c a p i m , o c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s V i a n a , aí se a c h a v a m 0 p a u l i s t a d a
espingarda e J e r ô n i m o Poderoso, e falando o capitão-mor ao paulista a que
aceitasse o p r e ç o das sete oitavas q u e lhe t i n h a c u s t a d o a e s p i n g a r d a , e q u a n d o
assim n ã o quisesse, fosse a sua casa e, e n t r e o i t e n t a q u e ele. t i n h a , escolhesse a
q u e lhe p a r e c e s s e , q. n a d a dos p a r t i d o s a c e i t o u o p a u l i s t a , e só q u e lhe h a v i a
e n t r e g a r o r e i n o l a sua p r ó p r i a e s p i n g a r d a . / / E, a o m e s m o t e m p o , o d i t o [ A . 31 ]

J e r ô n i m o P o d e r o s o disse a o c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s V i a n a q u e o e m b o a b a ,
seu afilhado, havia entregar â p r ó p r i a espingarda. E r e s p o n d e n d o - l h e o dito
c a p i t ã o - m o r q u e n ã o p o d i a ser, p o r ter l e v a d o d e s c a m i n h o , c o m m a i s a l g u m a s
p a l a v r a s se r e t i r a r a m p a r a suas casas d e s s a b o r e a d o s .
E c o m este sucesso c o r r e u notícia q u e J e r ô n i m o P o d e r o s o q u e r i a d a r u m a
a b a l r o a d a à casa d e M a n u e l N u n e s V i a n a , o n d e se a c h a v a o reinol h o m i z i a d o . E c o m
esta n o v a c o n c o r r e r a m os mais reinóis à casa do dito c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s

Jerônimo Pedroso de. Barros, por alcunha 'Poderoso'. A variação de apelidos (Poderoso/Pedroso), de
características (respeitado/malvado) e de ações atribuídas (comparar a caracterização da persona-
gem no documento 7) à personagem indica a multiplicidade de apropriações impessoais e coletivas de
dados da murmuração local conforme objetivos diversos de persuasão. Assim, o nome 'Valentim
Pedroso^ se levadas em conta as atitudes qué lhe são imputadas pelo narrador, tanto pode ser mera
coincidência quanto adequação do apelido ao comportamento da personagem. (JPí^
198

V i a n a , p o r ser casa forte e ter u m g r a n d e p á t i o c o m *estacada à r o d a , p a r a q u e , n o


caso q u e viesse o paulista J e r ô n i m o Poderoso c o m a b a l r o a d a , c o m o c o s t u m a v a m
fazer c o m paulistas, "carijós e pretos, se d e f e n d e r e m de d e n t r o d a estacada, p o r
ser e m m u i t o m e n o s p o d e r o dos reínóis q u e o dos paulistas. E passados dois dias
de recolhidos, c h e g o u u m a notícia do arraial do P o m p e u , q u e ficava e n t r e o C a e t é
é S a b a r á , q u e ú m paulista c h a m a d o J o s é P o m p e u t i n h a m a n d a d o m a t a r u m reinol
e q u e logo o fizeram era pedaços. E s a b e n d o à certeza os reinóis q u e se a c h a v a m
j u n t o s e m casa do *capitão-rnor M a n u e l N u n e s V i a n a , s a í r a m e m d e s t a c a m e n t o
n u m a e s q u a d r a e foram a o dito arraial e m a t a r a m ao dito P o m p e u p e l a m o r t e q u e
t i n h a feito. E h o u v e a l g u m a s m o r t e s a paulistas q u e o d e f e n d i a m , E c o m este
sucesso ficaram os paulistas i n t i m i d a d o s , d i z e n d o q u e os e m b o a b a s e s t a v a m le-
v a n t a d o s c o n t r a eles.
E chegados os reinóis d o arraial do P o m p e u a o do C a e t é , m a n d o u o capitão-
m o r M á r i u e l N u n e s V i a n a e m b a i x a d a a o paulista J e r ô n i m o P o d e r o s o d i z e n d o se
q u e r i a o desafio c o m q u e o a m e a ç a v a *só p o r só q u e pusesse o d i a e h o r a no
c a m p o q u e ele d e b o a v o n t a d e se a c h a r i a a recebê-lo, ao q u e r e s p o n d e u o dito
paulista J e r ô n i m o Poderoso q u e sim, q u e r i a o desafio, p o r é m q u e n ã o havia u s a r
d e estocadas n e m cuteladas, só sim tocar u m a espada n a o u t r a c o m as p o n t a s p a r a
o ar. M a s o d i t o c a p i t ã o - m o r lhe t o r n o u a m a n d a r dizer q u e n ã o sabia esse j o g o de
[ fl. 31v. ] e s p a d a e q u e saía, p o r é m , à f o r t u n a do q u e elas dessem; e s e m p r e t o r n o u / / a
repetir o paulista J e r ô n i m o P o d e r o s o d i z e n d o n ã o q u e r i a p e n d ê n c i a , e assim se
ficariam c o m mostras de ficarem e m p a z . P o r é m , s e m p r e ó c a p i t ã o - m o r M a n u e l
N u n e s saiu a o * c a m p o da m e s m a vila, e os reinóis q u e e s t a v a m e m s u a casa o
s e g u i r a m formados e m b o a o r d e m ; e depois de estarem n o c a m p o , t o r n o u a m a n -
d a r dizer o dito c a p i t ã o - m o r a J e r ô n i m o Poderoso q u e ele se a c h a v a a esperá-lo
d e t o d a a forma q u e quisesse. E s e m p r e saiu o dito J e r ô n i m o P o d e r o s o c o m a sua
gente q u e se lhe t i n h a a g r e g a d o , e cie tinha convidado todos a r m a d o s , e se p u s e -
r a m longe e afastados do p a r t i d o do c a p i t ã o - m o r . E m a n d o u dizer a este q u e n ã o
q u e r i a m a i s desafio n e m p e n d ê n c i a e q u e se recolhesse S u a M e r c ê c o m a sua
gente q u e ele t a m b é m faria o mesmo* e, c o m efeito, se r e c o l h e r a m c o m a gente
q u e se a c h a v a c a d a u m o n d e estava.
E c o m o os reinóis se a c h a v a m j u n t o s e m casa d o c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s
V i a n a , c o n s u l t a r a m o m o d o c o m o se h a v i a m d e sair do v e x a m e dos paulistas, das
insolências e m o r t e s q u e faziam e estavam e x p e r i m e n t a n d o os reinóis c a d a dia; e
a j u s t a r a m e m fazer c o r p o d e gente e vir t r a z e n d o até c h e g a r a o C a m p o destas
M i n a s G e r a i s , o n d e c h a m a v a m arraial da C a c h o e i r a ; e assim o fizeram, t r a z e n d o
todos os reinóis e os mais n ã o sendo paulistas, e todos v i e r a m d e b o a vontade.. E
chegados q u e f o r a m a o arraial d a C a c h o e i r a , o n d e se j u n t a r a m cinco ou seis mil
armas, fizeram c o n s e l h o os m a i s p o d e r o s o s e e l e g e r a m seis eleitores p a r a q u e
estes, a votos, fizessem g o v e r n a d o r q u e os governasse, e, c o m efeito, n o m e a r a m
ao dito c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s V i a n a . E aceitando este o cargo de governa-
199

dor, e logo n o m e o u secretário, capitão da g u a r d a e *cabos m a i o r e s e m e n o r e s . E


se d e s p e d i r a m logo o r d e n s p a r a p r e n d e r e m alguns paulistas q u e t i n h a m a r m a s d e
fogo, p a r a q u e as e n t r e g a s s e m , e t o m a r aos m a i s as q u e t a m b é m t i n h a m , p a r a
assim a t a l h a r o d a n o q u e p o d e r i a m c o m elas fazer, E , c o m efeito, f o r a m d u a s
Companhias a p r e n d e r u m paulista q u e m o r a v a no m o r r o de Vila R i c a , q u e era o
mais p o d e r o s o , p o r n o m e D o m i n g o s da Silva M o n t e i r o , o q u a l p r e n d e r a m e seus
a l e g a d o s e lhe t o m a r a m / / a s a r m a s , q u e s e r i a m q u a r e n t a ou c i n q ü e n t a , e foi [ fl. 32 ]
d e t e r m i n a d o pelo g o v e r n a d o r M a n u e l N u n e s V i a n a p a r a o S a b a r a ; e f o r a m t a m -
b é m a p r e n d e r o u t r o paulista p o d e r o s o q u e m o r a v a n o B o m Sucesso, a r r a b a l d e
d e Vila Rica, p o r n o m e B a r t o l o m e u B u e n o Feio, q u e estes dois e r a m insolentes, e
c o m a sua prisão ficaram todos os mais tímidos e f o r a m d e s e r t a n d o p a r a S ã o P a u l o
os mais deles, e os dois t a m b é m o fizeram pelos m a n d a r e m p a r a o S a b a r a e lá
ficarem e m sua liberdade. E chegados q u e foram a S ã o Paulo os q u e saíram destas
M i n a s e c o m os mais naturais q u e lá se a c h a v a m , fizeram conselho a fazerem u m
g r a n d e exército e v i r e m restaurar o u t r a vez as M i n a s .
E depois de i r e m os ditos paulistas para S ã o P a u l o , ficou g o v e r n a n d o c o m o
g o v e r n a d o r o dito " c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s V i a n a e. sossegados os insultos e
m o r t e s q u e se faziam.
E m o m ê s d e m a i o d e 1709, subiu a estas M i n a s o s e n h o r d o m F e r n a n d o
M a r t i n s M a s c a r e n h a s , " g o v e r n a d o r q u e era do R i o d e J a n e i r o a t e m p o q u e os
paulistas se t i n h a m retirado p a r a São Paulo, e c h e g a n d o ao R i o das M o r t e s tirou
os postos q u e e s t a v a m d a d o s p e l o g o v e r n a d o r M a n u e l N u n e s V i a n a e os d e u a
a l g u n s paulistas q u e t i n h a m ficado e a filhos do R i o d e J a n e i r o . E v i n d o esta
n o t í c i a a o g o v e r n a d o r M a n u e l N u n e s , m a n d o u este o c a p i t ã o Brás F e r n a n d e s
R o l a c o m c a r t a a o s e n h o r d o m F e r n a n d o d i z e n d o n ã o era c o n v e n i e n t e S u a Se-
n h o r i a tirar os postos aos reinéis e dá-los a paulistas e cariocas. E o s e n h o r d o m
F e r n a n d o m a n d o u "encostar a "gineta a o capitão Brás F e r n a n d e s R o l a p o r n ã o
ter p o d e r quem lha dera, e n ã o cedeu da s u a opinião. E daí a p o u c o s dias veio o
dito s e n h o r d o m F e r n a n d o do R i o das M o r t e s p a r a estas M i n a s G e r a i s , e t e n d o a
notícia da s u a vinda o f o r a m esperar os povos a o C a m p o o n d e c h a m a m o R o d e i o :
g r a n d e n ú m e r o de gente e os cabos sem insígnias, e só M a n u e l N u n e s V i a n a foi
c o m o seu *bastão alvorado c o m o *capitão-mor d a vila do P e n e d o , e, lhe foi logo
falar ao s e n h o r d o m F e r n a n d o a sua b a r r a c a e lhe dissera q u e a q u e l e p o v o estava
de â n i m o a o n ã o deixar e n t r a r p a r a estas M i n a s a ele n ã o e x c e d e r d e sua o p i n i ã o
e m tirar os postos / / q u e estavam dados e dá-los a o u t r e m . E c o m o n ã o e x c e d e u [ fl. 32v. ]
da opinião, p e d i u três dias p a r a se retirar ao seu g o v e r n o do R i o d e J a n e i r o , e e m
dois se retirou.
C h e g a d o q u e foi a o R i o de J a n e i r o , chegou a "frota, e o veio r e n d e r p s e n h o r
A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e . E depois de t o m a r posse do g o v e r n o , t e n d o notícia do
estado destas M i n a s , subiu a elas s e c r e t a m e n t e c o m algumas pessoas de sua g u a r -
da, n ã o d e i x a n d o passar n e n h u m a pessoa a d i a n t e , e c h e g o u ao Arraial V e l h o do
200

C a e t é pelas q u a t r o h o r a s d a t a r d e , e aí se a r r a n c h o u . E logo c o r r e u á notícia d é


sua c h e g a d a , e, o veio visitar logo o g o v e r n a d o r M a n u e l N u n e s V i a n a , q u e ficava
perto, E n o s egundo dia m a n d o u dizer o s e n h o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e ao dito
g o v e r n a d o r M a n u e l N u n e s q u e c o n v i n h a ao serviço d e S u a M a j e s t a d e q u e d e n t r o
e m três dias despejasse as M i n a s e fosse p a r a as suas fazendas d o sertão, o q u e
assim o fez, q u e despejou d e n t r o dos três dias. E logo se e n t e n d e u ser ciente o
s e n h o r " g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e q u e o p o v o do S a b a r á estava meio
l e v a n t a d o c o n t r a o * c a p i t ã o - m o r M a n u e l N u n e s V i a n a , seu g o v e r n a d o r eleito,
p o r este q u e r e r q u e n e n h u m a s pessoas tivessem cortes d e g a d o s senão s o m e n t e se
cortasse os seus q u e lhe v i n h a m do sertão.
E daí a p o u c o s dias foi o dito s e n h o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e a o S a b a r á , e
logo veio p a r a estas M i n a s Gerais, e assistiu p r i m e i r o e m S a n t o A n t ô n i o da C a s a
B r a n c a n o C a m p o , e depois e n t r o u n o arraial do O u r o P r e t o , e o l e v a n t o u p o r
Vila R i c a , e depois a vila do R i b e i r ã o , m a s os "camaristas de Vila R i c a se descui-
d a r a m e m levantar "pelourinho e. o fizeram p r i m e i r o os do R i b e i r ã o , e p o r esta
r a z ã o ficou s endo vila mais antiga, e depois a do S a b a r á , Vila R e a l , e do C a e t é ,
Vila N o v a d a R a i n h a , e depois as do R i o das M o r t e s , vila de S ã o J o ã o e vila de
São J o s é ; e as mais se fizeram, c o m o seja, Pitangui e S e r r o do Frio.*-
E depois, p a s s a d o p o u c o t e m p o d e feitas as vilas o u levantados os arraiais vilas,
c h e g o u n o t í c i a a o s e n h o r " g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e a estas M i n a s
[ fl. 33 ] q u e / / v i n h a m . o s paulistas c o m u m g r a n d e exército d e São P a u l o c o m oito o u dez
mil h o m e n s c o m seu g o v e r n a d o r , q u e diziam e r a u m A m a d o r B u e n o , e. muitos
"cabos e u m "clérigo j á eleito p o r eles p o r b i s p o . E c o m esta n o t í c i a p a r t i u o
s e n h o r g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e a ter-lhe e n c o n t r o a o c a m i n h o , e
c h e g a n d o a e n c o n t r á - l o s n a e s t r a d a d e G u a r a t i n g u e t á , e t o p a n d o - o s , disse a o s
cabos q u e todos e r a m vassalos d e el-rei d e Portugal, e quisessem r e t r o c e d e r o u t r a
vez p a r a S ã o P a u l o , e q u e ficava p o r sua c o n t a d a r p a r t e a S u a M a j e s t a d e , e q u e
ele m a n d a r i a t o m a r c o n h e c i m e n t o d e alguns desacatos q u e se lhe tivessem feito e
castigar os delinqüentes, o q u e eles n ã o q u i s e r a m de n e n h u m a sorte d e m i t i r n e m
retroceder, m a s , antes, pela língua da t e r r a , disseram ps cabos: " M a n d e m o s m a t a r
este p u t o e m b o a b a ! " E c o m o o s e n h o r g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e tinha
g o v e r n a d o o M a r a n h ã o , sabia a língua, e u m frade q u e o a c o m p a n h a v a , ^ e disse
logo o frade a o s e n h o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e ; " V a m o s seguindo v i a g e m . " E se
f o r a m d e s p e d i n d o c o m b o a m a r c h a , e c a m i n h a r a m de dia e d e n o i t e , e se reco-

* O governador Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho erigiu as vilas do Ribeirão do Carmo,


Vila Rica e Sabará, em 1711. Dom Brás Baltasar da Silveira criou São João del-Rei em 1713, Vila
do Príncipe c Vila Nova da Rainha em 1714 e Pitangui em 1715. Dom Pedro de Almeida Portugal
a vila de São José, em 17.18.
'- Ò mercedário frei Miguel Ribeiro.
201

l h e u a o B a n a n a l q u e foi d e M a t i a s Baltasar, e m Parati, e daí logo m a n d o u p r ó p r i o


ao R i o das M o r t e s dizendo se fortificassem p o r q u e os paulistas v i n h a m c o m g r a n -
d e exército t o m a r despique, e ele q u e os n ã o p ô d e fazer retirar.
C h e g o u este aviso e m seis dias, e logo os m o r a d o r e s d o R i o das M o r t e s se
c o m e ç a r a m a fortificar f a z e n d o u m a fortaleza d e p a u - a - p i q u e c o m seu fosso d e
terra, e se r e c o l h e r a m a ela os m o r a d o r e s , q u ê estes só t i n h a m trezentas e tantas
a r m a s . E d e n t r o de poucos dias chegou o exército dos paulistas e p u s e r a m cerco à
fortaleza; e os dela se defendiam c o m tiros q u e d e s c a r r e g a v a m q u e p o u c o s ofendi-
a m , p o r ficarem de longe os cercados. E faziam os paulistas a m p a r o d e u m a igreja
q u e estava p e r t o da fortaleza. E os reinóis, c o m o estavam a peito c o b e r t o d e n t r o
d a dita fortaleza, lhes n ã o faziam m a l as b a l a s , e alguns tiros e m p r e g a v a m e m
a l g u m do c e r c o q u e se a c h a v a a tiro descoberto. E antes do dito exército c h e g a r à
dita / / fortaleza, d e s p e d i r a m p r ó p r i o os reinóis do R i o das M o r t e s a o O u r o P r e t o [ fl. 33v. ]
p e d i n d o socorro p a r a i m p e d i r e m o passo a o exército q u e traziam Os paulistas, q u e
se dizia se c o m p u n h a de sete mil e tantas a r m a s e muitos índios d e arcos. E c o m
este aviso s a í r a m os m o r a d o r e s do O u r o P r e t o e R i b e i r ã o p a r a os C a m p o s d a
C a c h o e i r a , n ã o ficando pessoa alguma, e logo fizeram fortaleza p a r a se defende-
r e m , e se d e s p e d i r a m setecentas a r m a s e m socorro dós sitiados d o R i o das M o r t e s ,
e c h e g a r a m a t e m p o q u e os paulistas d n h a m c h e g a d o h a v i a três ou q u a t r o dias e
t i n h a m a dita fortaleza e m cerco, e tinha h a v i d o m u i t o tiro d e p a r t e a p a r t e . E
a c h a n d o - s e j á os reinóis faltos d e á g u a d e n t r o da fortaleza, fizeram conselho a q u e
n o dia s e g u i n t e s a i r i a m fora todos d a fortaleza os q u e se a c h a s s e m c a p a z e s d e
a r m a e e s p a d a p a r a fazerem a l a r g a r o dito cerco e se p o d e r e m p r o v e r d e á g u a
e n q u a n t o n ã o c h e g a v a o s o c o r r o q u e e s p e r a v a m das M i n a s G e r a i s ; e o m e s m o
conselho sucedeu fazerem os *cabos paulistas a q u e , n o seguinte dia d e m a n h a ,
d a r e m assalto â fortaleza e se a p o s s a r e m dela antes q u e chegasse o socorro q u e
e s p e r a v a m os reinóis das Gerais.
E n a m e s m a t a r d e dos dois conselhos, tanto dos sitiados c o m o dos d e fora,
saiu u m c a b o paulista dos d e fora a fazer u m a e s c a r a m u ç a defronte d a fortaleza,
e m o c a m p o , m o n t a d o e m b o m c a v a l o , c o m seu " c a p o t e b e r n e , o dito paulista
a m e a ç a n d o q u e no dia seguinte s e r i a m assaltados d a fortaleza. E a o t e m p o q u e
a n d a v a n a e s c a r a m u ç a , u m reinol lhe a t i r o u u m tiro c o m b a l a c o m u m a a r m a
c o m p r i d a , e logo caiu m o r t o d o cavalo. E com este sucesso e d a noticia d e vir
p e r t o j á o s o c o r r o aos sitiados, p o r espia q u e t r a z i a m os m e s m o s paulistas, n ã o
t r a t a r a m d e d a r o assalto à fortaleza p r e t e n d i d o , m a s antes, n a q u e l a m e s m a noite,
se r e t i r a r a m p a r a São P a u l o a t o d a pressa, c a r r e g a n d o os feridos, q u e se dizia
s e r e m v i n t e e t a n t o s , e o u t r o s tantos m o r t o s , q u e e n t e r r a r a m n o c a m p o , e n t r e
b r a n c o s e "carijós. E d a fortaleza só m o r r e u u m b r a n c o e u m p r e t o , e três o u
q u a t r o feridos. / / E no dia p r e t e n d i d o do assalto, pelas n o v e h o r a s do dia, c h e g o u [ fl. 34 ]
o socorro aos reinóis sitiados., e c h e g a d o q u e foi tiveram a notícia d e q u e n a q u e l a
m e s m a noite t i n h a d e s e r t a d o o exército dos paulistas. E s e m p r e este s o c o r r o d e
202

gente c o m os mais da fortaleza seguiram o exército p a u l i s t a do R i o das M o r t e s até


A i u r u o c a , q u e são três dias de viagem, m a s c o m o os paulistas c a m i n h a v a m d e dia
e noite lhes n ã o d e r a m a l c a n c e .
E depois deste sucesso^ t o r n o u o s e n h o r " g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e
C o e l h o d e C a r v a l h o subir d o R i o d e J a n e i r o a estas M i n a s [ p a r a ] governá-las,
ficando g o v e r n a n d o a cidade do R i o de J a n e i r o o *mestre-de-campo Francisco de
C a s t r o d e M o r a i s , e t a m b é m veio o p r i m e i r o "ministro p a r a este O u r o P r e t o , q u e
foi o d o u t o r M a n u e l d a C o s t a d e A m o r i m , c o m a m e r c ê d a " b e c a , p o r ser o
p r i m e i r o q u e criou o lugar de "ouvidor e era n a t u r a l d e Vila do C o n d e . E depois
d e estar o dito s e n h o r g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e p e r t o d e dois a n o s
nestas M i n a s governando-as e m p a z , chegou a notícia do R i o d e J a n e i r o ter che-
g a d o o francês, s e g u n d a vez, a t o m á - l o , e l h e p e d i a m o fosse s o c o r r e r l e v a n d o
socorro de gente, e veio u m h o m e m p o r n o m e M a r c o s d a Costa c o m este aviso, e
logo o s e n h o r g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e fez gente e levou consigo mil
e tantas a r m a s e deixou o r d e m p a r a ir mais socorro; e, c o m efeito, foi, m a s q u a n d o
c h e g o u o ú l t i m o s o c o r r o a o R i o d e J a n e i r o se, a c h a v a feita a p a u t u a ç ã o c o m o
francês de lhe d a r e m seiscentos mil "cruzados p a r a largar a terra, além do s a q u e
q u e h a v i a m feito. E, a o depois, se seguiu vir p a r a estas M i n a s o s e n h o r d o m Brás
d a Silveira por' g o v e r n a d o r .

E m b o a b a s c h a m a v a m aos. do R e i n o , p a l a v r a q u e q u e r dizer galinha com *cal-


ças. O V i a n a retirou-se p a r a os Currais d a Bahia, o n d e tinha as suas roças, e dali
[ fl. 34v. ] passou a o R e i n o , o n d e o infante d o m Francisco o i n t r o d u z i u a el-rei / / e, p o r '
intercessão dele e dispêndio g r a n d e d e m i l cruzados, foi p e r d o a d o dos delitos p o r
q u e fora capitulado destas M i n a s , e d e mais se lhe fez m e r c ê do h á b i t o de Cristo e
d a p r o p r i e d a d e , e m s u a vida, do "oficio d e "escrivão d a O u v i d o r i a do S a b a r á , e
outras mais mercês.^

Neste parágrafo, letra de Caetano da Costa Matoso.


[Relação de um morador de Mariana
e de algumas coisas mais memoráveis sucedidas]

Narrativa de acontecimentos que se passam principalmente


em Mariana e Vila Rica entre 1712 e 1721, tendo como fio con-
dutor os conflitos entre., as autoridades portuguesas enviadas para
o governo da capitania — com ênfase nos ouvidores e nos gover-
nadores — e as resistências promovidas por seus moradores de
melhor condição econômica. Percorre os atritos entre paulistas e
reinóis, seus principais episódios é a ação dos governadores da
capitania em relação à situação de conflito.
O documento, aproximado de uma memória, parece ter sido
encomendado pelo ouvidor Caetano da Costa Matoso, nos primei-
ros anos de sua atuação como ouvidor de Vila Rica (1749-52), a
antigos moradores de diferentes vilas capazes de testemunhar so-
bre os acontecimentos ocorridos no início da ocupação do territó-
rio das Minas Gerais. O interesse do ouvidor e m reunir relatos
sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exigências do car-
go ou pelo seu perfil intelectual, coincide com o falecimento dos
remanescentes dos primeiros povoadores de Minas e a fixação de
suas reminiscências sob a forma escrita, colecionadas por particu-
lares.
Autoria, l o c a l e data; Anônimo; Mariana; ca. 1750.
U s o n a historiografia: Dentre outros documentos da sé-
rie de relatos presentes neste Códice que mencionam os conflitos
entre paulistas e reinóis, Afonso de E. T a u n a y obtém neste docu-
mento matéria para sua reconstituição das descrições e episódios
da Guerra dos Emboabas, o caráter dos personagens, suas princi-
pais ações, as atitudes dos líderes e m b o a b a s , as reações dos
paulistas, os procedimentos dos governadores envolvidos, a his-
tória da fundação de vilas e diversas biografias (História geral
das bandeiras paulistas. São P a u l o : I m p r e n s a Oficial, M u s e u
Paulista, 1948. V. .9, p. 449-641 e, ainda que muito menos fre-
qüente, 1949, v. 10, p . 3-234). O mesmo autor, com este docu-
mento, trouxe novas versões para o debate sobre o suplício de
Filipe dos Santos (v. 10, p. 171-174), A análise dos conflitos en-
volvendo as autoridades judiciais narrados neste documento sus-
tenta a interpretação de Donald Ramos (A social history of Ouro
Preto: stresses of dynamic urbanization ín colonial Brazil, 1695-
1726. Gainesville: University of Florida, 1972. p. 384 e segs.) e
sobre a ação do conde de Assumar e das autoridades portugue-
204

sas contra os interesses dos grupos locais. Charles Boxer utiliza-


o como argumento favorável à pacificação de Minas Gerais por
Antônio de Albuquerque (A idade de ouro do Brasil; dores de cres-
cimento de uma sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional,
1969. p . 99), para ressaltar diferenças culturais entre paulistas e
reinóis (p. 188) e p a r a a reconstituição d a revolta de 1720 (p.
212). :

A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O relato, na primeira pessoa, ini-


cia-se in media res ("no meio dos acontecimentos") segundo re-
gras do gênero epidítico ou demonstrativo d a oratória, que prevê
a alteração deliberada dos eventos da história, recuperando as
ações anteriores por analepse. N a primeira p a r t e do relato, a
insolencia dos paulistas constitui-se em tópica de vituperação
r e c o r r e n t e neste e e m relatos seguintes sobre a G u e r r a dos
E m b o a b a s . N o t a r passagens e m q u e a p r u d ê n c i a é topo d a
tradição clássica reapropriada nos séculos X V I I e X V I I I como
correlato político d a mediocridade (aristotélicamente entendi-
da como a moderação q u e , enquanto virtude intelectual, deve
orientar as ações). Perceber ainda que a vituperação de perso-
nagens, visando mobilizar a repulsa moral do leitor, efetiva-se
mu pela constituição de tipos viciosos, sobre os quais se aplicam
tópicas como a da ambição e a da inveja. QPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna de início do
século X V I I I , bastarda regularizada e caligráfica. Destacam-se
as maiúsculas, em módulo grande, cujas hastes são providas de
laçadas mediais. Estas t a m b é m são usadas nas hastes do "d"
minúsculo, que se torna arredondado e levemente inclinado para
a esquerda, e nas inferiores do "g". O " p " e o " q " minúsculos
terminam nonnalmente em laçadas horizontais. O ditongo " a o "
apresenta forma especial, de nexo, pela utilização de laçada su-
p e r i o r que termina abaixo da Unha, c o m o vírgula invertida.
(YDL)'

E
[ fl. 36 ] ^ n t r e i e m Vila R i c a n a e r a d e 1 7 1 2 , t e n d o m o d e r n a m e n t e c h e g a d o p o r
"ouvidor-geral e c r i a d o r o " d e s e m b a r g a d o r M a n u e l d a G o s t a A m o r i m , o
(qual achei m u i t o desassossegado p o r se ter sublevado c o n t r a ele esta C i d a d e
[ M a r i a n a ] , e e n t ã o vila. P o r q u e h a v e n d o u m a sociedade q u e t i n h a m e t i d o u m a
á g u a no A r r a i a l d e C i m a dela p a r a extração do o u r o , d e s u n i r a m - s e os sócios e
q u i s e r a m a p a r t a r - s e r e p a r t i n d o - s e a á g u a , e n ã o p o d e n d o a c a b a r esta p a r t i l h a
e n t r e si, p o r ser a á g u a m u i t o p o u c a , r e c o r r e u u m deles, T i m ó t e o Saraiva, ao
ouvidor, p a r a vistoria, interessando n a á g u a q u e lhe coubesse a o p a d r e trino frei
J e r ô n i m o S o d r é , c o n h e c i d o p o r g r a n d e amigo d o ouvidor, a o qual a c o m p a n h o u
n a vistoria c o m p o u c a dissimulação, p o r q u e j u n t a m e n t e t r o u x e n e g r o s e "bateias
205

p a r a e n t r a r e m logo a desfrutar a b o a fama d a lavra, ao q u e se o p u s e r a m os mais


sócios, n ã o c o n s e n t i n d o q u e se fizesse a vistoria; e p o r q u e o *escrivão instou q u e
se fizesse, lhe a p o n t o u u m dos sócios u m a pistola e lhe e r r o u fogo, e indo-se os
mais sócios a l t e r a n d o , se despediu o "ouvidor c o m os q u e o a c o m p a n h a v a m .
E sabendo-se e m Vila R i c a o sucesso, p o r si, p o r seus oficiais e amigos, se lhe
v i e r a m oferecer muitos "magnates c o m a r m a s e negros p a r a v i r e m a esta vila p r e n -
d e r e m aqueles desobedientes e seus escravos. E, n o m e s m o t e m p o , estes, q u e p o r
seus amigos e espias s a b i a m de t u d o o q u e lá se passava {como lá o q u e se passava
cá), a m o t i n a r a m ;o p o v o desta vila, a uns p o r sua v o n t a d e e interesse q u e t i n h a m
nas "faisqueiras q u e lhe r e d u n d a v a m d o serviço d a q u e l a lavra e a outros q u e , p o r
força, faziam sair d e suas casas c o m as a r m a s c o m q u e se a c h a v a m , fazendo-os
assistir n o a d r o d a capela de N o s s a S e n h o r a do R o s á r i o , p a r a a qual c o n d u z i a m
p ó l v o r a , c h u m b o e m a n t i m e n t o , e e s p e r a v a m socorro dos a r r e d o r e s .
E r a m m u i t o s , c a d a dia, os correios e [pauteações?] p a r a Vila R i c a e d e lá
p a r a esta, p o r é m n u n c a se ajustaram, e assim se f o r a m d e s m a n t e l a n d o e, u l t i m a -
m e n t e , f a l t a n d o - l h e s os s o c o r r o s das p e s s o a s m a i s p o d e r o s a s d e s t e t e r m o , se
a u s e n t a r a m p a r a longes; e p o r q u e ficou u m c h a m a d o o G o i r a , o p r e n d e r a m e m
Vila R i c a , e p o r h o r r o r o s e n t e n c i o u o o u v i d o r à forca e, c o m u t a n d o - l h e a sen-
t e n ç a e m d e g r e d o , o deteve n a c a d e i a . V i n d o - l h e sucessor, "ministro do segun-
do "banco, M a n u e l M o s q u e i r a da R o s a , nas costas daquele "desembargador
A m o r i m , lhe s o l t a r a m o p r e s o , q u e l h e m e t e u m u i t o susto p o r q u e t i n h a a f a m a
d e m u i t o d e l i b e r a d o . E assim / / s e e m b o s c o u o C o i r a ; e t e n d o notícia d e q u e [ fl. 36v. ]
u m dos q u e n a vistoria a c o m p a n h a r a m o o u v i d o r ( q u e m e p a r e c e e r a escrivão
das execuções), l h e fez u m a cilada e o m a t o u n a c o m a r c a d o R i o das V e l h a s . E
vindo à notícia do c o n d e de Assumar, que tinha sucedido n o governo a d o m
Brás d a Silveira, o m a n d o u p r e n d e r antes q u e fizesse m a i s m o r t e s , c o m o t i n h a
e m u m rol de. sete o u oito, c o m a c o n d i ç ã o q u e se resistisse o m a t a s s e m , o q u e
assim s u c e d e u , p o r q u e resistindo o m a t a r a m . N a q u e l e t e m p o d a * s u b l e v a ç ã o ,
e s t a v a d o m B r á s d a Silveira e m S ã o P a u l o t o m a n d o posse d o g o v e r n o , c o m o
t a m b é m fez o seu sucessor, e daí p o r d i a n t e se dividiu c o m g o v e r n o s e p a r a d o .
C o m a q u e l e ouvidor A m o r i m v i e r a m mais dois d e s e m b a r g a d o r e s , f u l a n o p a r a
1

a O u v i d o r i a d ò S a b a r á e fulano B a r a c h o ^ p a r a a do R i o das M o r t e s , e m o r r e n d o n o
R i o de J a n e i r o o do S a b a r á , disse A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e a o B a r a c h o q u e fosse
residir n a c o m a r c a do R i o das Velhas, p o r ser m a i o r e mais orgulhosa e revoltosa,
o q u e assim fez, p a r e c e q u e p o n d o os olhos m a i s n a c o n v e n i ê n c i a q u e n a lei,
p o r q u e u l t i m a m e n t e foi necessário " d e c r e t o d e el-rei p a r a r e v a l i d a r q u a n t o ele
t i n h a d e s p a c h a d o , e n o R i o das M o r t e s ficou servindo o "juiz ordinário.

• João de Morais Sarmento.


-•• Gonçalo de Freitas Baracho.
206

Antes destes governos e estes "ministros, t i n h a h a v i d o o " l e v a n t a m e n t o dos


filhos do R e i n o c o m os paulistas, p r i n c i p i a d o p o r M a n u e l N u n e s V i a n a , filho d a
vila d e V i a n a , q u e e n t r e eles era respeitado, c o m V a l e n t i m P e d r o s o , n a t u r a l d e
São P a u l o , a m b o s ricos e p o d e r o s o s . E v e n d o os paulistas q u e n ã o só os p r o c u r a -
v a m p a r a os m a t a r e correr, senão t a m b é m p a r a lhes t i r a r e m os sítios c o m m a n t i -
m e n t o s , criações e a r m a s , f o r a m fugindo p a r a P a r a t i , e j u n t o s c o n c o r d a r a m v o l t a r
p a r a o R i o das M o r t e s a t o m a r e m - n o e sitiarem-se nele. E c o m esta notícia se
p r e p a r a r a m os filhos do R e i n o e m u m r e d u t o d e "faxina, n o q u a l o b r o u m u i t o a
disposição d e M a n u e l Dias d e M e n e s e s e o u t r o s q u e o a c o m p a n h a r a m , p o r q u e
deles se d e f e n d e r a m até q u e os paulistas M e s c o r ç o a r a m e se r e t i r a r a m , e f o r a m -
se i n c o r p o r a r c o m d o m F e r n a n d o , p a r e c e - m e q u e M a s c a r e n h a s , ^ q u e , g o v e r -
[ fl. 37 ] n a n d o / / n o R i o d e J a n e i r o , se p ô s a c a m i n h o c o m u m a c o m p a n h i a p a g a e
crescida, e v i n d o c o m ele até o R i o das M o r t e s , c u i d o u q u e o b r a v a m e l h o r e m
favorecer aos paulistas n ã o só c o m o descobridores das m i n a s q u e estavam desco-
b e r t a s , m a s t a m b é m p a r a q u e c o n t i n u a s s e m e m descobrir mais; c o m e ç o u a fazer-
lhes muitos agasalhos e a premiá-los c o m p a t e n t e s d e infantaria d a * o r d e n a n ç a , e
c o m eles m a r c h o u p a r a estas M i n a s G e r a i s c o m t e n ç ã o d e restituir-Ihes alguns
b e n s q u e lhes t i n h a m u s u r p a d o e u l t i m a m e n t e conservá-los n o seu a n t i g o p o d e r
e desbarates.
P o r é m , c h e g a n d o esta notícia a estas M i n a s G e r a i s e c o n h e c e n d o M a n u e l
N u n e s V i a n a os gênios insolentes dos paulistas, assim p o r seu discurso c o m o p o r
rogos dos reinóis q u e se faziam p r o n t o s p a r a o a c o m p a n h a r e m e m q u a l q u e r fun-
ç ã o , ajuntou m u i t a s gentes e a r m a s , e m a r c h o u p a r a o C a m p o c h a m a d o d a C a -
choeira, e impediu-lhes a e n t r a d a sem a t e n ç ã o a alguns protestos. E v o l t a n d o d o m
F e r n a n d o as costas c o m toda a sua comitiva, os reinóis, c h a m a d o s pelos paulistas
' e m b o a b a s ' p o r d e s p r e z o , q u e n a sua l í n g u a q u e r dizer galinhas *calçudas, o q u e
i m i t a v a m pelos "calções q u e u s a v a m de rolos, seguiram-nos e m distância q u e n ã o
fossem vistos. E t e n d o n o c a m i n h o notícia q u e os paulistas, j á desconfiados d a
e s p e r a n ç a q u e t i n h a m de d o m F e r n a n d o e de se p o d e r e m conservar, m e t e r a m - s e
e m u m g r a n d e e e m b o s c a d o m a t o , a q u e c h a m a m " c a p ã o , n o qual os investiram
e m a t a r a m , até os q u e se t i n h a m subido a árvores e escondido n o denso delas; e o
resto, d e s e n g a n a d o , foi-se p a r a São Paulo a m e a ç a n d o q u e i a m fazer gente p a r a se
v i r e m "despicar, o q u e n ã o fizeram, ou p o r n ã o h a v e r a q u e l a q u a n t i d a d e d e q u e
necessitavam o u t a m b é m p o r h a v e r e n t r e eles u m c a t ã o , fulano Feio,^ pelo q u a l
disse A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e , c o n v e r s a n do-o, q u e se t o d o s tivessem o seu dis-
curso n ã o haveria n o m u n d o t a n t a confusão.

Dom Fernando Martins Mascarenhas de Lencastre,.


Provavelmente, Bartolomeu Bueno Feio.
207

S u c e d e n d o n o g o v e r n o d o R i o d e J a n e i r o A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e a este
d o m F e r n a n d o , levanta-se o S a b a r á c o n t r a M a n u e l N u n e s V i a n a , q u e i n t e n t a v a
q u e n ã o houvesse cortes de g a d o mais q u e p o r sua conta, o q u a l l e v a n t a m e n t o
lhe t i n h a m o v i d o o vigário q u e e n t ã o "paroquiava, p o r n o m e o p a d r e C a m p o s , a
quem acompanhou a maior parte daquele povo; / / e j á apeado [Manuel Nunes [ fl. 37v. ]
V i a n a ] d a s e n h o r i a e d o n o m e d e g o v e r n a d o r , q u e n o l e v a n t a m e n t o geral lhe
d a v a m , o q u e ele q u e r i a conservar, foi logo avisado A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e , e
depressa se.pôs a c a m i n h o . E c o m b a r b a crescida e e m *calção e Vestia, e n t r o u n o
S a b a r á c o m ã c o m p a n h i a de u m só escravo, e a p e a n d o - s e d e s c o n h e c i d o à p o r t a
d e M a n u e l N u n e s V i a n a se descobriu, e p e r s u a d i u q u e se fosse p a r a u m a das suas
fazendas dos C u r r a i s , o q u e fez d e s e n g a n a d o , e ficaram as M i n a s e m m a i o r sossego.
E c o m este.e c o m m u i t o e n t e n d i m e n t o e p r u d ê n c i a , m a n d a n d o c h e g a r a sua famí-
lia e o * m e s t r e - d e - c a m p o G r e g ó r i o d e C a s t r o e alguns ""oficiais c o m q u e t i n h a
saído do R i o de J a n e i r o , se fez b e n q u i s t o , respeitado e o b e d e c i d o , d e t e n d o - s e e m
c a d a c o m a r c a o t e m p o necessário p a r a erigir vilas, criar as c â m a r a s e suciar os
h o m e n s . N a s vilas, pôs os apelidos q u e a i n d a hoje conservam, e sobre eles os d e
A l b u q u e r q u e , q u e o p o v o aceitou c o m alvoroço, m a s n ã o el-rei, q u e os r e p r o v o u
e m a n d o u q u e se n ã o c h a m a s s e m A l b u q u e r q u e .

N a s " c â m a r a s , o r d e n o u q u e servissem e m igual n ú m e r o reinóis e paulistas, o


q u e assim se o b s e r v a v a , p o r é m n ã o d u r o u m u i t o s a n o s q u e , c o m o os p a u l i s t a s
e r a m p o u c o s os q u e ficaram, e a i n d a estes e s t r a n h a v a m a vizinhança daqueles, e m
q u e a c h a v a m diferentes costumes e desconfiavam q u e se rissem dos seus, f o r a m
d e s e r t a n d o , de q u e se descobriu Pitangui, c o m tão g r a n d e f a m a n o princípio d e
m u i t o o u r o q u e e n t e n d e r a m lho i a m os reinóis t o m a r , e assim se q u i s e r a m t a p a r
c o m trincheiras e fazer c o r p o de g u a r d a q u e até ele c h e g a s s e m c a r r e g a ç õ e s e o
g u a r d a desse p a r t e p a r a as v i r e m c o m p r a r . E m a n d a n d o próprios a o R i o d e J a n e i -
r o c o m súplicas a o " g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e — p a r a a q u a l c i d a d e
t i n h a ido c o m socorro de gente a defendê-la de u m a a r m a d a francesa q u e a t o m o u
do governo d e Francisco de C a s t r o de M o r a i s , q u e se houve, tão frouxo e falto d e
disposição n e s t a ocasião c o m o se t i n h a h a v i d o n a de u m a n o a t r á s , e m q u e d a
m e s m a n a ç ã o t i n h a d e s e m b a r c a d o a gente d e cinco naus, q u e nas ruas d a c i d a d e
p r o c u r a v a m mais as "tavernas q u e a forma, e assim ficaram todos cativos e a m a i o r
p a r t e m o r t o s —, n u n c a lhes deferiu / / as suas súplicas p o r q u e q u e r i a m a i s suciar [ fl. 38 ]

q u e separar.
Pouco d u r o u esta a m b i ç ã o nos paulistas, p o r q u e n ã o d u r o u a q u e l a g r a n d e z a ,
q u e a i n d a q u e e m u m a "cata a h o u v e m o n s t r u o s a p a r a o paulista D o m i n g o s do
P r a d o , e m q u e tirou m u i t a p e d r a cristalizada tão crivada d e o u r o q u e escondia a
cor d a p e d r a , d e q u e fez u m g r a n d e m o n t e e depositou e m u m r a n c h o c o m u m a
cortina n a p o r t a , e a q u e m lhe ia p e d i r lha mostrasse, havia dizer-lhe q u e q u e r i a
ver a púrpura, n o m e q u e p o r g r a n d e z a ele lhe t i n h a posto, e e n t ã o lhe m a n d a v a
d a r " c o n g o n h a , "pito e " c a ü m p u e r a , e os d a v a p o r regalados, e eles, d e a g r a d e c i -
208

d o s , o a p e l i d a v a m p o r monarca. E tanto foi crescendo nesta p r e s u n ç ã o que, v i n d o p


c o n d e d e A s s u m a r a este g o v e r n o e c o n h e c e n d o q u e ali se ia c r i a n d o u m a fera,
q u e p e l a fé q u e os paulistas t i n h a m n a sua t e m e r i d a d e lhe p o d e r i a fazer a l g u m
insulto n a c o m a r c a do S a b a r á , d e t e r m i n o u m a n d á - l o p r e n d e r c o m algumas gentes
d a q u e l a c o m a r c a , *capitães-do-mato e u m a t r o p a d e soldados "dragões. E c o m o
nesta precisa diligência n ã o p ô d e haver t a n t o segredo p o r respeito dos sertanistas
q u e d a limitada trilha faziam estrada p a r a aquele c o r p o passar, p r e p a r o u - s e a q u e -
le P r a d o e m u m r e d u t o b e m e n t r i n c h e i r a d o de "faxina, c o m espias e ciladas p o r
u m l a d o do c a m i n h o , das quais feriram algumas pessoas d a " o r d e n a n ç a e m q u e
e n t r o u o "alferes dos dragões M a n u e l de Barros G u e d e s , e m a t a r a m alguns escra-
vos e o d r a g ã o Lopo d e tal. E c h e g a n d o a tiro do r e d u t o , fugiu o dito P r a d o c o m
a g e n t e q u e lhe o b e d e c i a - assim forros c o m o cativos c o m as suas a r m a s , e a
p ú r p u r a convertida e m m o e d a q u e t i n h a m a n d a d o fazer à B a h i a — p a r a u m sertão
m a i s distante e incógnito d a q u e l e estado.

A q u e l e "ouvidor M o s q u e i r a era muito ambicioso, e q u e i x a n d o - s e ao c o n d e


d e A s s u m a r , e hoje m a r q u ê s d e Alorna, q u e a C â m a r a q u e estava servindo o n ã o
deixava fazer C â m a r a nova, q u e a todos os n o m e a d o s lhe v i n h a c o m e m b a r g o s —
p o r fora, se m u r m u r a v a que d e todos os novos interessava "peitas vindas p o r m ã o
d e u m filho q u e trouxe consigo, frade b e n t o frei.Pedro —, r e s p o n d e u a o ouvidor
q u e logo a faria, p a r a o q u e u s o u d a m á x i m a d e q u e e r a m u i t o a b u n d a n t e d e
[ íl. 38v. ] c h a m a r u m dos "juízes e dar-lhe u m a / / carta q u e a levasse ao R i o das M o r t e s e
q u e n ã o voltasse sem sua o r d e m , e a o o u t r o q u e levasse J o s é G u r g e l — q u e p o r
régulo tinha fugido do R i o de J a n e i r o p a r a estas M i n a s , e m q u e o p r e n d e u — ao
R i o d e J a n e i r o e que lá lhe m a n d a r i a dizer o q u e havia de fazer, e d a m e s m a sorte
a u m "vereador p a r a o S a b a r á , e a o " p r o c u r a d o r p a r a o S e r r o do Frio, e ao "escri-
v ã o , de q u e m se s u p u n h a muitos ardis e falsificações na escrita, m a n d o u - o p r e s o
p a r a a cadeia do S a b a r á , e a o ouvidor q u e fizesse c â m a r a nova. P o r é m , sabendo ao
depois q u e o filho frade tinha aceitado "oitavas de. o u r o dos juízes e C â m a r a nova,
m a n d o u o frade p a r a o R i o das M o r t e s a c o m p a n h a d o d o "tenente-general M a n u e l
d a C o s t a Fragoso, os quais, passando p e l a p o r t a de J o ã o d e M e l o F e r n a n d o , n a r u a
Direita d e V ü a Rica, p e r g u n t o u ao condutor: " Q u a n d o h á d e ir o p a i ? " , e sendo
graça p a r e c e u profecia, p o r q u e n ã o se passou m u i t o t e m p o que o ouvidor caísse n a
a m b i ç ã o do p a r t i d o q u e lhe fazia u m " c o n t r a t a d o r d e g a d o , q u e l h e d a r i a u m a
" a r r o b a d e o u r o c a d a a n o se fizesse q u e ele tivesse só cortes d e g a d o n a q u e l a vila,
p o r cujo e s t a n q u e q u e ele intentou lhe fez p a r t e d o p o v o , u m a noite, u m "motim
n a sua p o r t a e n ã o se retirou sem ele c e d e r do intento, a q u e se seguiu vir-lhe p o r
sucessor o ouvidor M a r t i n h o Vieira, e aquele ir-se p a r a a Itatiaia, c o m m u i t o n e -
gro, a fazer u m a lavra e m u m a s "datas q u e tinha t o m a d o . M a s n ã o lhe a c h a n d o
t a n t o lucro c o m o n o lugar d a "ouvidoria, era tal a sua cobiça que s e m p r e esperou
q u e e m a l g u m a envolta tornasse p a r a o lugar. Q u i ç á teria notícia d e q u e i n d o o
franciscano frei P e d r o do M o n t e Sião d a r as b o a s vindas a o o u v i d o r M a r t i n h o
Vieira, lhe p e r g u n t o u : " Q u e lhe p a r e c e a Vossa M e r c ê estas gentes das M i n a s ? " ,
lhe r e s p o n d e u ; " P a r e c e - m e tudo gentinha''. R e s p o n d e u - l h e o frade: "Livre D e u s a
Vossa M e r c ê de a ver junta!". E n ã o se passou m u i t o t e m p o q u e , e m u m a noite, lhe
subiram peia escada u m *rancho de m a s c a r a d o s a r m a d o s p a r a o m a t a r e m , e n ã o o
a c h a r a m , p o r q u e u m do ajuste o tinha avisado q u e se retirasse, o q u e fez p a r a u m a
"capoeira o n d e hoje é a capela d e Santa Quitéria. E aqueles se t o r n a r a m a rasgar-
lhe a *livraria e a p r e g o a r os autos, e deitá-los pela j anela abaixo, e retirados p a r a o
m o r r o m a t a r a m o q u e tinha revelado o segredo.
E c o m o a u m mal se seguem muitos, destes dois c o m e ç a r a m a a m o t i n a r / / o [ fl. 39 ]
p o v o assim n o m o r r o , q u e era m u i t o , c o m o o d a vila, q u e seria e n t ã o m e t a d e d o
q u e t e m hoje. E assim n e n h u m estava seguro e m sua casa, p o r q u e o faziam sair
dela p o r força o u p o r v o n t a d e , n o t i c i a n d o pretextos e projetos c o n t r a o "ouvidor
e contra o "governador, misturando muitas mentiras c o m poucas verdades, de
cujas s e m e n t e s h á a i n d a hoje nestas M i n a s , e m cujas escolas se p r a t i c a m a i s a
d o u t r i n a d e M a q u i a v e l q u e a de Cristo.
A a m b i ç ã o d o M o s q u e i r a se ajuntou a d e Sebastião d a Veiga C a b r a l q u e r e r
ser g o v e r n a d o r das M i n a s , p o r q u e j á n e s t e t e m p o o o u v i d o r M a r t i n h o V i e i r a
t i n h a p a r t i d o p a r a o R i o d e J a n e i r o , p o r conselho do g o v e r n a d o r , e o M o s q u e i r a
m e t i d o seus d e p e n d e n t e s , t a m b é m m a s c a r a d o s , e n t r e o m a i o r t u m u l t o , q u e u n s
p e r g u n t a s s e m : " Q u e m h á de ser o u v i d o r ? " E aqueles r e s p o n d i a m : " O M o s q u e i r a ! " .
E Sebastião d a Veiga — p r e s u m i n d o q u e o g o v e r n a d o r t o m a r i a os seus conselhos
de q u e lhe entregasse o governo e fosse p a r a São P a u l o , q u e assim n ã o q u e b r a v a
h o m e n a g e m e q u e , sossegado o p o v o , o avisaria p a r a t o r n a r p a r a o governo, e o
c p n d e de A s s u m a r sendo p o r Sebastião d a Veiga, d e cujo gênio ardiloso e orgu-
lhoso tinha m u i t a s notícias, mais o lograva e estripava do q u e lhe d a v a crédito -
t a m b é m tinha m e t i d o seus m a s c a r a d o s , que, p e r g u n t a n d o q u e m havia d e ser g o -
v e r n a d o r , r e s p o n d e s s e m : " O Veiga!".
D u r o u esta i n q u i e t a ç ã o alguns dias, a t é q u e a q u e l e p o v o se resolveu a vir
i n c o r p o r a d o , e a m a i o r p a r t e dele atropelado, a esta C i d a d e r e q u e r e r a o governa-
d o r q u e n ã o "aboletasse os soldados das duas "tropas d e d r a g õ e s p o r casa dos
paisanos, n e m assentasse as "casas de fundição; assim lhe p r o m e t e u . M a s t o r n a n -
do p a r a Vila R i c a q u e seriam seiscentos h o m e n s , p a r e c i a q u e ficavam sossegados,
m a s c o m o se e n v o l v i a m tensões p a r t i c u l a r e s , c u i d a r a m e m novos p r o j e t o s p a r a
d e i t a r e m o g o v e r n a d o r fora do governo, p o r q u e j á se n ã o fiavam q u e ele os n ã o
castigasse. E os cabeças faziam tão certo o expulsá-lo d o g o v e r n o q u e r e p a r t i a m
pelos c o m p a n h e i r o s mais eficazes e mais orgulhosos as j u d i c a t u r a s das M i n a s e
"ofícios d e l a . U l t i m a m e n t e f o r a m c a n s a n d o e " d e s c o r ç o a n d o , v e n d o p r e s o s os
c a b e ç a s e a i n d a alguns d e longe, e u l t i m a m e n t e e m c o r r e n t e s r e m e t i d n s p a r a o
R i o d e J a n e i r o , e u m Filipe dos Santos, q u e n ã o cessava d e a m o t i n a r os m o r a d o -
res d o C a m p o , foi p r e s o , a r r a s t a d o e e n f o r c a d o , t e n d o j á sido as v i v e n d a s d o
m o r r o d e ViJa R i c a q u e i m a d a s ; e d e todo este t r a b a l h o do c o n d e d e A s s u m a r se
p o d e dizer l i v r e m e n t e q u e o c o n d e cavou a v i n h a e d o m L o u r e n ç o d e A l m e i d a
colheu as uvas etc.
[Dou parte do que vi e sei]

Relato testemunhal de u m emboaba que toma como ponto


de referência os acontecimentos n a região do Rio das velhas e a
ordenação política e judicial levada a cabo por diferentes gover-
nadores e ouvidores desde a administração de Artur de Sá e
Meneses até cerca de 1749 sob G o m e s Freire, a despeito das
resistências de grupos poderosos. A narrativa destaca a atuação
de Manuel Nunes Viana nos conflitos entre paulistas e emboabas
e as iniciativas a d m i n i s t r a t i v a s do g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e
Albuquerque Coelho de Carvalho para ordenar as Minas. Paten-
te ainda foi a preocupação de e n u m e r a r nomes e períodos de
administração de, governadores e d e ouvidores das diferentes
comarcas.
A notícia, aproximada de u m a memória, dirigida ào juiz dos
órfãos de Sabará, Francisco de Seixas Brandão, parece ter sido
encomendada pelo ouvidor Gaetano da Costa Matoso, nos primei-
ros anos de sua atuação como ouvidor de Vila Rica (1749-52), a
antigos moradores de diferentes vilas capazes de testemunhar so-
bre os acontecimentos ocorridos no início da ocupação do territó-
rio das Minas Gerais. O interesse do ouvidor ern reunir relatos
sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exigências do car-
go ou pelo seu perfil intelectual, coincide com o falecimento dos
remanescentes dos primeiros povoadores de Minas e a fixação de
suas reminiscências sob a forma escrita, colecionadas por particu-
lares.
A u t o r i a , l o c a l e data: André Gomes Ferreira; Sabará;
ca. 1750.
D e s t i n a t á r i o : Francisco de Seixas Brandão.
U s o n a historiografia: Dentre outros documentos da sé-
rie de relatos presentes neste Códice que mencionam os conflitos
entre paulistas e reínóis, Afonso de E. T a u n a y obtém nele maté-
ria para sua reconstituição das descrições de episódios da Guer-
ra dos Emboabas, do caráter dos personagens e suas principais
ações, das atitudes dos líderes emboabas, das reações dos paulistas,
dos procedimentos dos governadores envolvidos, da história da
fundação de vilas e de diversas biografias (História geral daí ban-
deiras paulistas. São Paulo: I m p r e n s a Oficial, M u s e u Paulista,
1948. V. 9, p . 449-641 e, ainda que muito menos freqüente,
1949, v. 10, p. 3-234). Charles Boxer encontra na fonte elemen-
tos da parcialidade de Borba Gato no confisco de paulistas (A
idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de u m a sociedade
colonial. 2. ed. São Paulo; Nacional, 1,969. p. 86) e da pacifica-
ção de Minas Gerais por Antônio de Albuquerque (p. 99). S.
Suanes utiliza-o na remontagem da Guerra dos Emboabas (Os
emboabas. São Paulo: Brasiliense, [1959]. p . 157, 266, 271).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O narrador deste autoclassificado
tratado constitui a persona de alguém que teria vivido nos pri-
meiros tempos da mineração, provavelmente objetivando infor-
m a r a elaboração de relatos, conforme se verifica nos documen-
tos anteriores, apesar das discrepâncias de episódios (o que pode
evidenciar a aplicação de tópicas sobre dados da m u r m u r a ç ã o
local, conforme os objetivos dos diversos discursos). O autor re-
corre à afetação de humildade ou de autodesqualificação como
artificio retórico que objetiva obter a condescendência do leitor.
(fPf}
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, semicursiva,
híbrida e personalizada. O " s " minúsculo apresenta forma espe-
cial, em ângulo aberto, terminando em laçada cheia, sempre
abaixo da linha da escrita. Guriosa a letra " F " , grafada sempre
como maiúscula, mesmo e m sílabas mediais de palavras, com
haste que ultrapassa a linha da escrita, para baixo, terminando
em laçada cheia, no que corresponde ao " s " usado e m todo o
texto; na parte superior do " f o traço em meia voluta também
ultrapassa a linha. Freqüência do uso do "y" no lugar da semivogal
"í" e com o sinal diacrítico. O "d" ê do tipo uncial, (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Foi mantido o título atribuído por
Afonso de E. T a u n a y .
Cópias impressas:
D E P O I M E N T O S sobre os primeiros anos das Minas Gerais.
D o u p a r t e do que vi e sei (papéis d a Brasiliana de Félix
Pacheco). Jornal do Comércio, Rio de. J a n e i r o , 8 dez. 1946. p .
2.
T A U N A Y , Afonso de E. Documentos inéditos sobre as primei-
ras descobertas do ouro e m Minas Gerais. Revista do Institu-
to Histórico e Geográfico de São Paulo, São P a u l o , v. 44, p .
360-362, 1948.
T A UNA Y,. Afonso de E. Relatos- sertanistas. São Paulo: Martins,
1953. p. 70-74. Versão incompleta.
212

[ fl. 40 ] S e n h o r , dou p a r t e do q u e vi e sei.


E m o m ê s d e d e z e m b r o d e 1706^ anos, c h e g u e i a estas m i n a s d o R i o das
V e l h a s , o n d e estou v i v e n d o até agora, e n ã o h a v i a mais q u e três freguesias e m
t o d o o * t e r m o desta vila d e S a b a r á : R o ç a G r a n d e e R a p o s o s e o m e s m o S a b a r á .
Estas três t i n h a m vigários e os mais arraiais t i n h a m "clérigos, q u e diziam missa nos
terreiros aos m o r a d o r e s , q u e os r a n c h o s e r a m d e c a p i m e *beira no c h ã o . A r m a -
v a m altares c o m estacas e t a p a d o s c o m esteiras de t a q u a r a , diziam missa, confessa-
v a m e "desobrigavam. Depois se repartiram a d e R a p o s o s [e] se fizeram três fregue-
sias: S a n t o Antônio, R i o Acima; R i o das Pedras, C o n g o n h a s d o Sabará; S a n t o An-
tônio d a M o u r a r i a do Arraial Velho. Foi o primeiro vigário o p a d r e Francisco d e
Oliveira B a r b o s a , o P e q u e n i n o , q u e n ã o h a v i a capela n e m o r a t ó r i o . E u m a n d e i
fazer a capela t a p a d a e fechada c o m p o r t a e coberta de capim, q u e n ã o havia ainda
t e l h a . E s t e v e três anos por vigário, entrou outro, e o Pequenino foi ao R i o de J a n e i -
ro. O senhor bispo lhe deu "provisão q u e fosse levantar igreja n o C u r r a l del-Rei, e
fez-se vigário, e foi o primeiro.

A justiça que achei nestas m i n a s d o S a b a r á e R i o das Velhas foi o *tenente-


general M a n u e l de B o r b a G a t o , q u e era "superintendente destas m i n a s . H o m e m
paulista, repartia as lavras do ouro p o r sortes de terra e veio d'água, c o m o m a n d a v a
o r e g i m e n t o , confiscava todos os *comboios q u e v i n h a m d a B a h i a e dos sertões,
boiadas, cavalos e negros, e tudo o mais q u e se a p a n h a v a t u d o se confiscava, até
ouro q u e ia p a r a os sertões e Bahia se arrematava p a r a el-rei. Esta era a ocupação
q u e tinha o superintendente Borba; t a m b é m havia contendas, e c o m o juiz supremo
deferia a t o d o s c o m m u i t o a g r a d o e desejava f a v o r e c e r os confiscados. T i n h a
"meirinho e "escrivão e muita gente p a r a as diligências dos confiscos; muitos livra-
v a m e muitos confiscavam.
[ fl. 40v. ] E j á c h e g a n d o eu a estas / / Minas, m e disseram q u e tinha vindo A r t u r de Sá e
Meneses, "governador do R i o de J a n e i r o , a estas Minas, de visíta, c o m o r d e m de el-
rei, e assim foi. E o Borba, s e m p r e fazendo a sua justiça c o m o superintendente e
juiz.
M a s c o m o g o v e r n a d o r , M a n u e l N u n e s V i a n a , feito pelo p o v o , lhe tirou a
jurisdição q u e t i n h a e fez outros superintendentes, escrivão e m e i r i n h o . E isto fez
M a n u e l N u n e s V i a n a depois q u e t o m o u a posse d o g o v e r n o , q u e antes e r a m as
c o n t e n d a s d e V a l e n t i m Pedroso e seu i r m ã o J e r ô n i m o Pedroso c o m M a n u e l N u n e s
V i a n a , e m b o a b a s e paulistas q u e t u d o a n d a v a m a r r u i n a n d o u n s c o n t r a o u t r o s ,
q u e s e r i a m u m a s guerras civis se D e u s n ã o a c u d i r a c o m a sua p i e d a d e . A c u d i u o
t e n e n t e - g e n e r a l M a n u e l d e B o r b a G a t o c o m mais d e duzentos h o m e n s a r m a d o s e
se a c a m p o u n o " c a m p o d o C a e t é , d o n d e h a v i a m d e d a r a b a t a l h a os paulistas

Considerando-se os dados referidos no relato, provavelmente a data da chegada dp forasteiro é 1709.


c o m M a n u e l N u n e s V i a n a [e] e m b o a b a s , q u e todos e s t a v a m p r e p a r a d o s . M a n -
d o u o * t e n e n t e - g e n e r a l e m b a i x a d a aos seus p a r e n t e s paulistas q u e e s t a v a m n a -
quele * c a m p o e s p e r a n d o p o r ele e m a n d o u o u t r o e m b a i x a d o r p a r a M a n u e l N u n e s
V i a n a . U n s e outros se a c h a r a m j u n t o s e se fizeram as pazes públicas c o m m u i t a
alegria d e todos.
E c o m o os paulistas viviam desconfiados dos e m b o a b a s , m a q u i n a v a m algu-
m a traição p a r a se v i n g a r e m .
Achava-se nestas m i n a s do S a b a r á frei Francisco, religioso trino e fidalgo d a
C a s a de. Á g u a s Belas; e c o m o era oposto aos paulistas p o r a l g u m a s desatenções
q u e lhe fizeram n o O u r o P r e t o , a c h o u ocasião, m u i t o a sua v o n t a d e , p a r a se vin-
gar deles, / / c o m o assim o fez: ajuntou u m *troço d e gente g r a n d e e o r e p a r t i u e m [ fl. 41 ]
duas tropas, u m a pelo S a b a r á acima até o M a t o D e n t r o , a q u e os paulistas e n t r e -
gassem as a r m a s , e outra t r o p a pelo rio das Velhas acima até a C a s a B r a n c a . Assim
as e n t r e g a v a m , e outros i a m fugindo.
E indo seguindo as tropas sua "derrota, u m a pelo S a b a r á e o u t r a pelo rio das
Velhas acima, c h e g a r a m dois h o m e n s a r m a d o s a p é aos R a p o s o s dizendo q u e os
paulistas t i n h a m q u e i m a d o r a n c h o s e m a t a d o a l g u m a gente n o S a b a r á e q u e acu-
dissem. C o m o a t r o p a ia de m a r c h a j á n o ribeirão do M a i a , a d i a n t e dos R a p o s o s ,
foi u m h o m e m de cavalo p a r a d a r p a r t e . V i r a r a m p a r a trás, c h e g a r a m a o arraial dos
Raposos, e c o m o era m e n t i r a d o r m i r a m as gentes n o Raposos e n o outro dia parti-
r a m p a r a o C a e t é , o n d e assistia M a n u e l N u n e s V i a n a ; e c o m o estava j á eleito p o r
governador do povo destas Minas, fez sua [repugnância?] sempre, aceitou o posto.
Muitos queriam ser, m a s o frade tinha m u i t a gente *per se e boa, e m a q u i n a v a t u d o
o q u e queria. M a s c o m o o frade tinha ido p a r a o R i o d e J a n e i r o nesta ocasião q u e
M a n u e l N u n e s V i a n a foi fazendo muitos absurdos e conveniências, Jogo desgosta-
r a m os conselheiros e os povos do S a b a r á e fizeram conselhos p a r a o p r e n d e r e
remetê-lo a el-rei ou matá-lo.

R e s o l v e r a m os p r u d e n t e s q u e n ã o se fizesse n a d a até vir os p r ó p r i o s q u e


m a n d a r a m a p " g o v e r n a d o r dp R i o d e J a n e i r o , d o m F e r n a n d o : q u e viesse logo
p a r a o S a b a r á , q u e o q u e r i a m m e t e r de posse d o seu governo. Pois M a n u e l N u n e s
lhe i m p e d i u a posse na Itatiaia c o m a gente d o O u r o [Preto] / / e R i b e i r ã o e d e [ fl. 41v. ]
S a b a r á . Só dois h o m e n s f o r a m c o m ele; os m a i s t o d o s e s t a v a m remissos. D e u s
a c u d i u logo c o m o r e m é d i o q u e cheguei.
L o g o , o g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r v a l h o , q u e en-
trou nestas m i n a s d o S a b a r á no a n o d e 1709 escoteiramente c o m u m "capitão d e
infantaria, o B a r b a l h o , dois soldados d e p r a ç a e u m "ajudante e q u a t r o criados d e
c a v a l o e c h e g o u a o A r r a i a l V e l h o d e C a e t é s e m se c o n h e c e r , p e d i u p o u s a d a .
C o m o estava d e s p o v o a d a d e gente, havia m u i t a s casas e todas e s t a v a m fechadas,
e só ali m o r a v a o coronel A n t ô n i o de M i r a n d a , m a n d o u despregar u m a p o r t a d a
m e l h o r casa p a r a se recolher o dito h ó s p e d e . R e c o l h i d o , logo se soube q u e m era,
214

e logo p e d i u u m h o m e m p a r a m a n d a r a M a n u e l N u n e s a e m b a i x a d a , c o m o foi,
q u e d e n t r o e m três dias despegasse as M i n a s , q u e assim c o n v i n h a a o serviço de
D e u s e d e el-rei. Veio d e noite o dito N u n e s falar a o dito g o v e r n a d o r , lhe p e d i u
n o v e dias p a r a se ir. D e u - l h o s . E foi-se. Esteve o dito A l b u q u e r q u e três dias no
C a e t é , estando p a r a o a c o m p a n h a r m u i t a gente p a r a vir p a r a o S a b a r a ' n ã o quis
q u e viesse gente do C a e t é , só Luís do C o u t o e seu i r m ã o . O M a n u e l N u n e s queria
vir, C o e l h o n ã o quis, despediu-se dele e lhe disse q u e n ã o faltasse a o q u e t i n h a
dito.
E veio p a r a S a b a r a , e esteve dia e m e i o , e foi seguindo sua d e r r o t a p a r a O u r o
Preto e R i b e i r ã o , e lã fez a p r i m e i r a vila, a s e g u n d a do O u r o P r e t o , a terceira do
[ fl 42 ] S a b a r a , a q u a r t a do C a e t é , / / a quinta R i o das M o r t e s . ^ Estas fez logo o governa-
d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e n o p r i m e i r o a n o q u e c h e g u e i às. M i n a s , que. m e
p a r e c e foi n o a n o de. 1709 ou 1710.
E neste t e m p o , p o u c o mais ou m e n o s , veio fazer esta vila d o S a b a r a e logo
fez. *juízes e "vereadores e " p r o c u r a d o r p o r votos dos eleitores, que. o dito s e n h o r
assistiu a dita eleição. O p r i m e i r o j u i z foi o " c a p i t ã o - m o r C l e m e n t e Pereira d e
A z e v e d o , filho do R i o d e J a n e i r o ; seu c o m p a n h e i r o , o * s a r g e n t o - m o r J o s é Q u a -
r e s m a , filho d e Lisboa; v e r e a d o r , o * m e s t r e - d e - c a m p o , A n t ô n i o P i n t o d e M a g a -
lhães; p r o c u r a d o r , o "capitão J o ã o Soares d e Miranda.-* O s mais n ã o m e l e m b r o .
O "escrivão d a C â m a r a , L o u r e n ç o d e Sousa R o u s a d o ; "tabelião, o "licenciado
M a n u e l Esteves d e Sousa. Estes foram as primeiras justiças q u e h o u v e nesta vila
d o S a b a r a . E f o r a m s e m p r e feitas p o r eleição, até agora.
O p r i m e i r o o u v i d o r q u e veio a esta vila foi o " d e s e m b a r g a d o r G o n ç a l o d e
Freitas B a r a c h o , p o r m e r c ê q u e lhe fez o g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e
C o e l h o d e C a r v a l h o , p o r ter m o r r i d o o q u e v i n h a p a r a esta vila n o R i o de J a n e i -
ro, q u e o l u g a r do B a r a c h o era do R i o das M o r t e s , e serviu o a n o d e setecentos e
doze e treze. V e i o o d e s e m b a r g a d o r Luís Botelho d e Q u e i r ó s e t o m o u posse, e o
B a r a c h o foi p a r a o s e u lugar do R i o das M o r t e s . Luís Botelho d e Q u e i r ó s m o r r e u
a 4 d e n o v e m b r o d e 1716, está e n t e r r a d o n a igreja g r a n d e . O s e g u n d o ouvidor
q u e veio foi B e r n a r d o Pereira de G u s m ã o ; terceiro ouvidor, J o s é d e Sousa Valdezj

O governador Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho erigiu as vilas do Ribeirão do Carmo,


Vila Rica e Sabará, em 1711. Dom Brás Baltasar da Silveira criou São João del-Rei em 1713,"Vila
do Príncipe e Vila Nova da Rainha em 1714 c Pitangui em 1715. Dom Pedro de Almeida Portugal
a vila de São José, em 1718.
A primeira Câmara de Sabará era composta por: José Quaresma Franco, juiz mais velho, e Lourenço
Pereira de Azevedo. Coutínho, juiz mais moço; vereadores Antônio Pinto de Carvalho Rodrigues,
Domingos Dias da Silva Júnior, João Soares de Miranda; procurador Francisco Mateus Rondon.
215

q u a r t o , M a t i a s P e r e i r a d e Sousa; q u i n t o , o " d e s e m b a r g a d o r D i o g o C o t r i m d e
Sousa; sexto Baltasar d e M o r a i s S a r m e n t o ; sétimo, o d e s e m b a r g a d o r J o s é T e l e s
d a Silva; oitavo, S i m ã o Caldeira; / / n o n o , J o ã o Alves; e agora esse s e n h o r * q u e [ fl. 42v. ]
está servindo, q u e são dez.
O s primeiros "governadores que v i e r a m p a r a as M i n a s foram; o A n t ô n i o d e
A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r v a l h o — e n t r o u n o a n o d e 1709 nestas M i n a s s e m
s a b e r e foi logo a o C a e t é direito, o n d e assistia M a n u e l . N u n e s V i a n a , q u e e r a
g o v e r n a d o r eleito pelo p o v o , e lhe m a n d o u dizer q u e logo l o g o despegasse das
M i n a s d e n t r o e m três dias, q u e assim c o n v i n h a ao serviço de D e u s e de S u a M a -
j e s t a d e , q u e D e u s g u a r d e ; o b e d e c e u à o r d e m do novo g o v e r n a d o r e lhe veio falar
e pedir-lhe q u e lhe desse n o v e dias p a r a m a n d a r b u s c a r cavalos e mais aprestos
p a r a a v i a g e m e assim concedeu-lhe o dito t e m p o , e se foi e m b o r a p a r a o rio d e
3

São Francisco, p a r a a sua fazenda d a T á b u a , e n ã o veio mais às M i n a s e n q u a n t o


g o v e r n o u o A l b u q u e r q u e e d o m Brás d a Silveira, q u e foi o s e g u n d o governa-
dor; o terceiro, o c o n d e d o m P e d r o de A l m e i d a — neste t e m p o veio M a n u e L N u n e s
e seu p r i m o às M i n a s o q u a r t o g o v e r n a d o r , d o m L o u r e n ç o d e A l m e i d a , esteve
n o v e a n o s s e r v i n d o ; o q u i n t o , o c o n d e das Galveias; o sexto, o s e n h o r G o m e s
5

Freire, q u e p o u c o faltará p a r a ajustar catorze, anos d e seu governo.


E o q u e sei, e vi, e c o n h e c i . V o s s a M e r c ê aceite a m i n h a v o n t a d e , q u e é
m u i t o g r a n d e d a r gosto e m t u d o o q u e p u d e r . Fez este t r a t a d o c o m essa clareza
p a r a V o s s a M e r c ê tirar o q u e lhé parecer. A i n d a q u e vai m a l a r r u m a d o e escrito,
m a n d e Vossa M e r c ê pelo a sua v o n t a d e .
O Serro Frio era desta c o m a r c a . O d e s e m b a r g a d o r Luís Botelho d e Q u e i r ó s [ fl. 4 3 ]
foi lá repartir o ribeiro de S a n t o A n t ô n i o e S ã o Francisco, q u e é h o j e o T i j u c o , e.
fazer vila e c o r r e i ç ã o . A i n d a n ã o havia d i a m a n t e s . N ã o estou l e m b r a d o o a n o ,
p a r e c e - m e q u e foi n o a n o de 1715 ou 1714.^ Fez-se t u d o c o m m u i t a festa.
O p r i m e i r o "ouvidor q u e foi p a r a o S e r r o Frio foi o d e s e m b a r g a d o r A n t ô n i o
R o d r i g u e s B a n h a , filho d a B a h i a e filho d o d e s e m b a r g a d o r e o u v i d o r D e c r i m
D a r a l e s a m , d a Bahia, q u e se c h a m a v a o B a n h a , q u e a m b o s conheci, e descobriu
os d i a m a n t e s n o seu t e m p o , q u e se regalou; o segundo ouvidor foi A n t ô n i o Ferreira
do V a l e , filho do d e s e m b a r g a d o r A n d r é Leitão de M e l o , filho d a Bahia, t a m b é m
levou m u i t o d i a m a n t e . E o q u e posso dizer. A s mais justiças q u e s e g u i r a m até
agora, todas foram feitas p o r eleição dos ouvidores q u e serviram.
Fez este p a p e l assim p a r a Vossa M e r c ê ver e tirar o q u e for p a r a seu e m p e -
n h o , q u e desejava ser a guia p a r a o saber a r r u m a r . E a Vossa M e r c ê g u a r d e D e u s

João de Sousa Meneses Lobo.


Dom Lourenço de Almeida governou de 8 de agosto de 1721 a I de setembro de 1732,portanto onze
e

anos.
A Vila do Príncipe foi criada em 29 de janeiro de 1714.
216

m u i t o s a n o s , c o m o desejo. S e n h o r d o u t o r *juiz dos órfãos F r a n c i s c o d e Seixas


Brandão.

D e Vossa M e r c ê ,

muito v e n e r a d o r e m a i s obrigado criado,

A n d r é G o m e s Ferreira

• 6<

[Notícias do que ouvi sobre o princípio destas Minas]

N a r r a t i v a que. descreve, c a r a c t e r í s t i c a s das b a n d e i r a s


paulistas de apresamento de fins do século X V I I , roteiros e orga-
nização. Breves referências a contatos das bandeiras com indí-
genas aparecem associadas à descoberta de ouro. Citam-se os
principais moradores de Vila Rica e arraiais circunvizinhos, a
carestia e a precariedade material. A cronologia do relato se
encerra com a expulsão do governador d o m Fernando Martins
Mascarenhas de Lencastre, referenciada n u m a sucinta descrição
da ocorrência de conflitos com paulistas.
O relato, aproximado de uma memória, parece ter sido en-
comendado pelo ouvidor Caetano da Costa Matoso, nos primei-
ros anos de sua atuação como ouvidor de. Vila Rica (1749-52), a
antigos moradores de diferentes vilas capazes de testemunhar so-
bre os acontecimentos ocorridos no início da ocupação do territó-
rio das Minas Gerais. O interesse do ouvidor em reunir relatos
sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exigências do car-
go ou pelo seu perfil intelectual, coincide com o falecimento dos
remanescentes dos primeiros povoadores de Minas e a fixação de
suas reminiscências sob a forma escrita, colecionadas por particulares.
Autoria, l o c a l e data: Anônimo; Vila Rica; ca. 1750.
U s o n a historiografia: Afonso E. T a u n a y transcreve parte
desta notícia para ilustrar os primeiros tempos de Minas (Histó-
ria geral das bandeiras paulistas. S ã o P a u l o : I m p r e n s a Oficial,
Museu Paulista, 1948. V. 9, p . 137-138). Serve-se desta fonte
Charles R. Boxer para orientar sua descrição da organização do
controle político sobre a região das Minas (A idade de ouro do Bra-
217

sii. dores de crescimento de u m a sociedade colonial. 2. ed. São


Paulo; Nacional, 1969. p. 99, passim); para defender a priorida-
de paulista na ocupação de Minas Gerais (p. 59); a parcialidade
de Borba Gato nos confiscos de paulistas, (p. 86); a precariedade
das habitações incialmente e a introdução gradativa de materi-
ais duráveis nas construções (p. 72).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Depoimento em forma epistolar
que constitui a persona de alguém que, tendo vivido os primeiros
anos da mineração, provavelmente informa a elaboração de re-
latos, conforme se verifica em textos anteriores, fornecendo pro-
váveis dados d a murmuração local sobre os quais se aplicaram
tópicas. Observar que a precariedade material e o ambiente inós-
pito da mineração enunciados no próprio depoimento estão pre-
sentes em relatos anteriores, com características do gênero épi-
co, constituindo obstáculos a serem transpostos pela ação dos
primeiros colonizadores,, tipificada como heróica (ver documen-
tos 2 e 3). (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva re-
gularizada, bastarda do período barroco, com hastes inferiores
prolongadas era meia voluta sinistrógira e perfil ou laçada. As
hastes superiores, simples ou em olho, são destrógiras. Uso de
apóstrofo arredondado no lugar do til, m a r c a n d o nasalização.
Presença de abreviaturas correntes, com contração e letras sobre-
postas, antecedidas do ponto como sinal abreviativo, como em
"pied.''' , "m. ' \ N o fólio 45, nota na margem superior com letra
? l ,!

de terceiro, isto é, Caetano da Costa Matoso. Texto com numera-


ção corrida de 1-8. (YDL)

Senhor, [ fl. 44 ]

P o u c a notícia posso d a r , pela falta de discurso q u e n a q u e l e t e m p o tinha, p o r


vir m u i t o m e n i n o a estas M i n a s ; m a s p e l o q u e ouvia c o n v e r s a r o p a u l i s t a c o m
q u e m assistia, direi o q u e ouvia.
C o n t a v a o dito q u e c o s t u m a v a m estes a j u n t a r c i n q ü e n t a , ou sessenta, o u
mais pessoas, a q u e m c h a m a v a m b a n d e i r a s , p a r a c o r r e r e m a costa do m a r , desde
u m a p a r a g e m a q u e c h a m a m P a r a n a g u á até a c a p i t a n i a d o Espírito S a n t o , [a]
a p a n h a r e m "gentios p a r a se utilizarem deles, e r e p a r t i a m e n t r e todos o n ú m e r o
deles. C o m o dito gentio fabricavam redes d e algodão e p a n o s do m e s m o , d e q u e
vestiam. Pelo t e m p o adiante v e n d i a m os ditos p a n o s e redes, trigo e m a r m e l o s e m
u m a q u e está mais perto de São P a u l o , Santos, p o r q u e i a m e v i n h a m à dita vila
fazendas de Lisboa. Desta p a r a g e m c h a m a d a P a r a n a g u á , q u e hoje é vila, se seguiam
os lugares seguintes, q u e são: U b a t u b a , P a r a t i , ilha G r a n d e , q u e todas são vilas
hoje, s e n d o n a q u e l e t e m p o aldeias d e gentio.
218

C o m o distinguiram ò "gentio d a costa do m a r , p a s s a r a m a o sertão, sendo a


*matalotagem destes h o m e n s pólvora e c h u m b o , passando estes a vida de " m o n t a -
rias, a saber, todo o gênero de caças: antas, veados, macacos, quatis, onças, capivaras,
cervos; e aves: j a c u s , gaviões, p o m b a s e o u t r o s m u i t o s p á s s a r o s ; e m u i t a s vezes
cobras, lagartos, formigas e uns sapinhos q u e d ã o pelas árvores, e outrossim mais
u n s bichos m u i t o alvos, q u e se criam e m t a q u a r a s e e m paus p o b r e s .
Isto é o q u e respeita a caças e a bichos. V a m o s a o " c o n d u t o c o m q u e faziam
p a r a o sustento d e s t a [ i m u n d í c i e ? ] : mel de a b e l h a s , cocos, p a l m i t o s d e m u i t a s
castas^ o grelo de s a m a m b a i a , carás do m a t o , raízes d e p a u e outras m a i s varieda-
des q u e inventava a necessidade. N ã o lhes faltava peixe, p o r q u e t r a z i a m anzóis e
linhas, e este. peixe o coziam e m t a q u a r a s q u a n d o era m i ú d o , o grosso o assavam.
E n t r a r a m a conquistar desde São Paulo p o r esses lugares q u e hoje são vilas:
I t u , P a r n a í b a , [Mogi?], J a c a r e í , P i n d a m o n h a n g a b a , G u a r a t i n g u e t á , P i e d a d e . Pas-
sando ao sertão, d e r a m c o m u m a aldeia neste distrito d o R i o das M o r t e s , a q u e
c h a m a m C a t a g u a s e s , o n d e p r e n d e n d o m u i t o gentio do beiço e orelhas furadas e
[ fl. 44v. ] estes / / falaram p e r g u n t a n d o p o r q u e os perseguiam; se era pelo q u e t r a z i a m no
beiço e nas orelhas, q u e os largassem,.que lhes iriam mostrar. NãQ levados os paulistas
desta oferta, n u n c a deixaram de os p r e n d e r , e logo p a r a o R i o das M o r t e s foi u m a
b a n d e i r a c o m seu capitão c h a m a d o J a g u a r a , q u e n a língua dos "carijós é cachorro. A
este m o s t r o u u m dos capitães do gentio o ouro no capim, e m folhetas, e outro, c o m o
grãos d e m u n i ç ã o . Feita esta diligencia nestes dois lugares, e n t r a r a m p a r a este O u r o
Preto até. o F u r q u i m , até d o n d e dou notícia, p o r a n d a r e m c o m p a n h i a de u m dos
paulistas.
E só posso dizer q u e nesta Vila R i c a , q u e n ã o tinha mais m o r a d o r e s q u e o
" c o r o n e l F r a n c i s c o do A m a r a l e seu s o b r i n h o B e n t o d o A m a r a l , a igreja e r a m
q u a t r o forquilhas, forrada de esteiras d e t a q u a r a e c o b e r t a d e p a l h a ; e m A n t ô n i o
D i a s só h a v i a u m c o r t e d e c a r n e d e u m h o m e m c h a m a d o H e n r i q u e L o p e s ; a
c i d a d e q u e c h a m a m M a r i a n a tinha o u t r a "capela do m e s m o feitio; mais a b a i x o
m o r a v a , e m São C a e t a n o , u m coronel q u e só a sua capela era c o b e r t a d e p a u s d e
palmitos e m l u g a r de telha; seguia-se logo o u t r o paulista, Francisco d e Oliveira;
logo u m m e r c a d o r d a vila d e S a n t o s c h a m a d o o Castro,* logo u m p a r d o m u i t o
rico q u e tirava o u r o e m tachos, M a n u e l de L i m a ; logo abaixo o u t r o paulista n ã o
m e n o s rico, Alberto Dias; logo abaixo u m filho d e Lisboa, J o s é R a b e l o P e r d i g ã o ,
t a m b é m riço; logo abaixo u m paulista, B e n t o Pires; logo abaixo o F u r q u i m .
N e s t e t e m p o custava u m "alqueire de milho 24 "oitavas, u m "barril d e doce,
q u e e r a g e n g i b r e p o r ser q u e n t e , u m a "libra d e o u r o ; assim era de a g u a r d e n t e ,
v i n h o , sal; u m a galinha, duas e três oitavas; u m a libra d e t o u c i n h o , oitava e meia;

No original, Crasto, povoador que daria origem ao topónimo Crasto, atual povoado do distrito de
Furquim.
219

dez ou doze b a n a n a s , u m a . V e r d a d e é que naquele t e m p o dava u m negro d e


"jornal 16 "oitavas e o o u r o era a m o n t e s , m a s t a m b é m as m o r t e s a c h u m b o e d e
corruções e r a m muitas, todos os dias.
C o m e ç a r a m os paulistas ã descobrir ouro e a fazer fazendas p o r esses c a m p o s
p a r a m e t e r e m neste O u r o P r e t o / / m a n t i m e n t o s . A u m e n t a r a m - s e as f a z e n d a s , [ fl. 45 ]
veio v i n d o m u i t a g e n t e , até q u e se l e v a n t a r a m os h o m e n s d e L i s b o a c o n t r a os
paulistas, q u e os d e r r o t a r a m , de sorte q u e ficaram senhores, e tão soberbos fica-
r a m q u e c o r r e r a m c o m o " g o v e r n a d o r do R i o de J a n e i r o , q u e veio a estas M i n a s
a

a p a z i g u a r , e n o C a m p o lhe f o r a m ao e n c o n t r o , q u e escapou p o r milagre, deixan-


do a sua comitiva muitos dias atrás p a r a p o d e r escapar, p o r q u e o alarido c o m q u e
lhe t o m a r a m os passos foi tão excessivo d e caixas, clarins e m u i t o s mil n e g r o s
a r m a d o s de espadas, "catanas e a r m a s de fogo q u e , a i n d a q u e tivesse esforço p a r a
resistir ao í m p e t o dos n e g r o s , n ã o e s c a p a v a dos infinitos b r a n c o s q u e e r a m ou
e s t a v a m c o m o leões.

. 7<

Relação de algumas antiguidades das Minas [ fl. 47 ]

Este documento n a r r a alguns acontecimentos e m Minas


desde o governo de Artur de Sá e Meneses (1697-1702), com a
primeira intervenção na região por autoridade régia até o gover-
no interino de M a r t i n h o de M e n d o n ç a de Pina e de Proença
(1735-38). Neste contexto, enuncia a ocorrência de conflitos en-
tre as primeiras autoridades e os moradores mais b e m situados,
além de detalhar alguns episódios que opõem paulistas e reinóis,
suas lideranças eformas de mobilização. Situa a ação governativa
oscilando entre o fracasso de d o m Fernando Martins Mascarenhas
de Lencastre e as conquistas políticas de Antônio de Albuquerque
Coelho de Carvalho, detalhando as formas de negociação então
conduzidas. A ação das autoridades reais n a região enfatiza a
instalação das primeiras vilas e a intervenção dos ouvidores, que
enfrentam enorme pressão da parte dos moradores. C o m ênfase
nestes aspectos, equilibra a apresentação da evolução d a cobran-
ça do quinto e as diferentes formas de resistência, cujo ponto
alto teria sido a revolta de Vila Rica.

a
- Dora Fernando Martins Mascarenhas de Lencastre.
220

O relato, aproximado de u m a memória, p a r e c e ter sido


encomendado pelo ouvidor Caetano d a Costa Matoso, nos pri-
meiros anos de sua atuação como ouvidor de Vila Rica (1749-
52), a antigos moradores de diferentes vilas capazes de testemu-
nhar sobre os acontecimentos ocorridos no início da ocupação
do território das Minas Gerais. O interesse do ouvidor em reu-
nir relatos sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exi-
gências dp cargo ou pelo seu perfil intelectual, coincide com o
falecimento dos remanescentes dos primeiros povoadores de Minas
e a fixação d e suas r e m i n i s c ê n c i a s s o b a f o r m a e s c r i t a ,
colecionadas p o r particulares. O s escólios com o seu nome e os
de dois ouvidores seus sucessores patenteiam o seu empenho em
formar u m a 'coleção', ou seja, "ajuntamento; coleção d e várias
coisas que se tem lido e anotado", mesmo após o seu retorno a
Portugal.
Autoria, local e data: Anônimo; Vila Rica; ca. 1750.
U s o n a historiografia: Dentre outros documentos d a sé-
rie de relatos presentes neste Códice que mencionam os conflitos
entre paulistas e reinóis, Afonso de E. Taunay obtém neste docu-
mento matéria para sua reconstituição das descrições e episódios
da Guerra dos Emboabas, o caráter dos personagens, suas princi-
pais ações, as atitudes dos líderes e m b o a b a s , as reações dos
paulistas, o procedimento dos governadores envolvidos, a história
da fundação de vilas e diversas biografias (História geral das ban-
deiras paulistas. São Paulo: Imprensa Oficial, M u s e u Paulista,
1948. V. 9, p. 449-641 e, ainda que muito menos freqüente, 1949,
v- 10, p. 3-234); recorre a esta narrativa para descrever as atitudes
de Manoel de Borba Gato (v. 9, p. 168-169). Outro episódio aqui
narrado que Taunay aproveitou foi o da ameaça ao superinten-
dente José Vaz Pinto (v. 9, p. 407). Taunay, com este documento,
trouxe novas versões para o debate sobre o suplício de Filipe dos
Santos (v. 10, p. 171-174). Donald Ramos baseia-se no documen-
to para discutir implantação de autoridades n á região mineradora,
poder local e resistência dos potentados (A social history of Ouro
Preto: stresses of dynamiç urbanization in colonial Brazil, 1695-
1726. Gainesville: Umversíty of Florida, 1972. p. 72, 75 e 113 ). S.
Suanes utiliza-o na remontagem da Guerra dos Emboabas (Os
emboabas. São Paulo: Brasiliense, [1959].. p . 160).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato com características do gê-
nero epidíticó ou demonstrativo da oratória, a narrativa descre-
ve, erigindo em tópica, a ação de bandeirantes tipificados como
heróis, cujos feitos são recompensados com o sucesso na busca
de minerais preciosos. A variação da descrição de alguns dos
episódios apresentados no texto adiante — como o bloqueio a
dom Fernando Martins Mascarenhas de Lencastre e a chegada
de Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho a Caeté - , se
comparada às versões de outros documentos deste grupo, indica
a multiplicidade de apropriações impessoais e coletivas de dados
da murmuração local, conforme objetivos diversos de persuasão
quanto a vícios ou virtudes da personagem Manuel Nunes Viana.
Observar ainda que a precariedade material do povoado, enun-
ciada pelo próprio narrador, está presente em relatos anteriores
como obstáculos a serem transpostos pela ação dos primeiros
colonizadores, tipificada como heroica. O relato, atribuindo ati-
tudes ardilosas às personagens do conde de Assumar e de Martinho
de Mendonça de Pina e de Proença, provavelmente se apropria
de dados da murmuração local objetivando produzir efeitos de
vituperação das personagens segundo a voz de interesses feridos
que se fazem representar, anônima e coletivamente, através do
narrador. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva re-
gularizada, bastante caligrafada, bastarda do período barroco,
com hastes inferiores longas, em meia voluta sinistrógira. As has-
tes superiores são cheias, com laçada. Uso do "y" como semívogal
nos ditongos. Freqüência de abreviaturas por contração e letras
sobrepostas, antecedidas de ponto como sinal abreviativo, como
em "Gov. " ", 'Taz.' *". O relativo "que" aparece abreviado n a
ll r 1

forma comum tironiana, com meia voluta envolvendo a letra. A


nasalização é marcada por apóstrofo redondo sobre a letra. Pre-
sença do circunflexo, com o valor de tonicidade do a, como em
"Sâ". O texto, contido entre molduras, apresenta notas margi-
nais, de traço mais cursivo. Numeração corrida de 1-8. O s três
últimos escólios, com letra de terceiro, isto é, Caetano da Costa
Matoso. (YDL)
Cópia impressa:
N O T I C I A S dos primeiros anos das Minas Gerais. Relação de
algumas antiguidades das M i n a s {papel d a Brasiliana de
Félix Pacheco). Jornal do Comércio, Rio de J a n e i r o , 13 dez.
1946, p. 2.

N ã o h á d ú v i d a q u e f o r a m os paulistas os p r i m e i r o s d e s c o b r i d o r e s deste
continente das M i n a s , e depois q u e a c h a r a m nelas o u r o v i e r a m c o n c o r r e n -
d o reinóis e brasileiros, e assim se foram p o v o a n d o d e uns e outros e des-
c o b r i n d o m a i s t e r r a s , até q u e a M a j e s t a d e d e d o m P e d r o , o s e g u n d o , m a n d o u or-
d e m ao senhor Artur de Sá e Meneses, "governador da cidade do Rio de J a n e i -
r o , p a r a q u e viesse visitar este n o v o d e s c o b r i m e n t o e e s t a b e l e c e r n e l e a l g u m a
forma de governo.
Veio, c o m efeito, o dito governador; e discorrendo p o r todos os arraiais des-
tas M i n a s , no d o S a b a r ã , q u e e n t ã o era o mais p o v o a d o , fez alto c o m a d e m o r a d e
.222

alguns dias. N a d a estabeleceu sobre o g o v e r n o , m a s só r e c o m e n d o u a o p a u l i s t a


M a n u e l de B o r b a G a t o q u e confiscasse os "comboios d e fazendas q u e viessem d a
B a h i a , f a z e n d o - ó , p a r a este efeito, " s u p e r i n t e n d e n t e , e logo se r e c o l h e u a o seu
governo do R i o . O dito B o r b a exerceu o lugar d e s u p e r i n t e n d e n t e c o m zelo notá-
vel do serviço d e el-rei, p o r q u e confiscou muitos c o m b o i o s d e fazendas vindos da
Bahia, cujos confiscos, reduzidos e m o u r o , r e m e t i a p a r a a F a z e n d a R e a l do R i o
c o m o t a m b é m o p r o d u t o das r e m a t a ç õ e s das "datas de m i n e r a r q u e p e r t e n c i a m a
el-rei, e estas r e m a t a ç õ e s e aqueles confiscos r e n d e r a m , n o t e m p o do B o r b a , p a r a
c i m a de oito "arrobas, q u e as r e m e t e u p o r u m J o ã o M a r t i n s , e foi o p r i m e i r o o u r o
q u e el-rei teve destas M i n a s .
[ fl. 47v. ] Depois disto, m a n d o u S u a Majestade ao " d e s e m b a r g a d o r J o s é V a z Pinto p o r
s u p e r i n t e n d e n t e - g e r a l e a estabelecer o "regimento de m i n e r a r p a r a g o v e r n o dos
mineiros. Este ministro esteve nestas M i n a s dois anos e m e i o , e de a l g u m a forma
desgostoso se retirou p a r a o R i o d e J a n e i r o . A ocasião do desgosto foi o q u e r e r ele
tirar devassa d e u m a m o r t e , e m a n d o u - l h e dizer o paulista V a l e n t i m P e d r o s o q u e
a n ã o tirasse, p o r q u e se o fizesse lhe p o d e r i a custar a vida, e r e s p o n d e n d o o minis-
tro q u e a devassa infalivelmente a havia de tirar, t o m o u o tal paulista a r m a s e se
p ô s e m t e r m o s d e ir d e s c o m p o r ao "ministro, p o r é m a c u d i u M a n u e l de B o r b a
G a t o s e r e n a n d o t u d o , e m forma q u e se n ã o passou dos a m e a ç o s ,
O dito d e s e m b a r g a d o r deixou os seus p o d e r e s d e s u p e r i n t e n d e n t e e m todo o
distrito d o S a b a r á ao dito M a n u e l de B o r b a e, n a p a r t e das Gerais, n a p a r a g e m
c h a m a d a C a c h o e i r a , a Baltasar d e G o d ó i , t a m b é m paulista. Neste m e s m o t e m p o ,
veio o " c ó n e g o G a s p a r R i b e i r o , d a sé d o R i o d e J a n e i r o , p r i m e i r o "visitador-
geral das M i n a s , e c h e g a n d o ao S a b a r á teve a notícia q u e d a B a h i a v i n h a outro
visitador e q u e e s t e j a se a c h a v a n o S e r r o d o Frio, d o n d e logo m a n d o u c o m p e n a s
d e e x c o m u n h ã o p a r a q u e se retirasse p a r a o seu a r c e b i s p a d o , p o r q u a n t o estas
M i n a s p e r t e n c i a m a o b i s p a d o d o R i o , p o r serem os seus descobridores paulistas e
d o dito b i s p a d o . R e t i r o u - s e , c o m efeito, o tal visitador d a B a h i a e ficou o dito
c ó n e g o R i b e i r o , n o q u e fez u m g r a n d e serviço a o seu b i s p a d o e a estas M i n a s ,
p r o v e n d o - a s d e vigários.
C o m esta a d m i n i s t r a ç ã o de justiça se g o v e r n a r a m estas M i n a s alguns a n o s ?

p o r é m .sempre os paulistas, c o m o mais poderosos, d o m i n a v a m t u d o e. faziam in-


sultos, t r a t a n d o c o m g r a n d e desprezo aos reinóis. E u m i r m ã o de V a l e n t i m Pedroso,
c h a m a d o J e r ô n i m o P e d r o s o , era d e tão p o u c a r a z ã o e de c o r a ç ã o t ã o m a l v a d o
q u e p o r u m reinol lhe n ã o q u e r e r v e n d e r u m a e s p i n g a r d a p r e t e n d e u t o m a r - l h a
v i o l e n t a m e n t e . P o r é m , t e n d o disto noticia, M a n u e l N u n e s V i a n a r e c o l h e u a si o
reinpl e m a n d o u dizer a o paulista q u e se queria a e s p i n g a r d a q u e a fosse b u s c a r a
[ fl. 48 ] sua casa, / / p o r q u e ele o ficava esperando. E d e m a t é r i a tão leve se o r i g i n a r a m
tais desordens, q u e a n ã o ser o dito V i a n a h o m e m de g r a n d e valor, n ã o só a ele
h a v i a m os paulistas de m a t a r m a s a todos os reinóis, p a r a ficarem s e n h o r e s das
M i n a s , q u e este e r a o seu i n t e n t o , m a s saiu-lhe f r u s t r a d o , p o r q u a n t o o V i a n a
agregou â si m u i t a gente e c o m ela se defendeu b e l a m e n t e dos paulistas.
223

V e n d o os reinóis q u e d e s a g r e g a d o s de M a n u e l N u n e s V i a n a p o d e r i a m ser
enxovalhados pelos paulistas, resolveram-se a a c l a m a r p o r seu g o v e r n a d o r a o dito
V i a n a , o q u e logo aceitou, c o m j u r a m e n t o d e b e m os g o v e r n a r e de defendê-los
do rigor dos paulistas. E t o m a n d o posse do governo, q u e lha d e r a m n a f o r m a do
estilo, ficou s e n d o l e g i t i m a m e n t e g o v e r n a d o r das M i n a s p o r eleição e a c e i t a ç ã o
do p o v o , e. logo a t e n d e n d o a o governo elegeu p a r a todos os arraiais superinten-
dentes e p r o v e u postos, e desta forma ficou t e m i d o dos paulistas, e os refreou d e
a l g u m m o d o dos seus insultos, e ps fez retirar p a r a as suas fazendas de S ã o Paulo.
D o referido teve n o t í c i a o s e n h o r d o m F e r n a n d o M a r t i n s M a s c a r e n h a s d e
L e n c a s t r e , " g o v e r n a d o r do R i o de J a n e i r o , e e n t r o u a dizer q u e M a n u e l N u n e s
V i a n a era régulo e q u e todos os q u e o seguiam desleais à Majestade. E c o m outras
a r e n g a s deste teor, t o m o u a resolução d e vir às M i n a s a a p e a r d o g o v e r n o a o
V i a n a (dizia ele) e a p ô r d e posse aos paulistas das M i n a s , p o r q u e e r a m os desco-
b r i d o r e s e m a i s leais a el-rei. V e i o , c o m efeito, o dito s e n h o r d o m F e r n a n d o e
esteve alguns dias n o R i o das M o r t e s , e e n c o n t r a n d o - s e c o m o V i a n a n o R o d e i o
d a Itatiaia n ã o se atreveu a dizer-lhe coisa a l g u m a , m a s antes o V i a n a lhé disse,
i n d o a c u m p r i m e n t á - l o , q u e S u a S e n h o r i a se retirasse p a r a o seu g o v e r n o p o r -
q u a n t o o p o v o das M i n a s o n ã o queria. E, c o m efeito, t o d a a gente q u e estava d e
g u a r d a a o dito V i a n a c l a m a v a c o m vozes descompostas: " F o r a d o m F e r n a n d o e
v e n h a o n o s s o g o v e r n a d o r ! " , d a n d o a este m u i t o s vivas, e d e s c o m p u s e r a m a o
s e n h o r d o m F e r n a n d o , o qual logo se retirou p a r a o seu governo. E o dito V i a n a
ficou g o v e r n a n d o as M i n a s c o m geral aceitação d e todos, e c o m luzido a c o m p a -
n h a m e n t o as c o r r e u todas, recolhendo-se a sua casa, q u e era n o C a e t é .
V e i o p o r g o v e r n a d o r do R i o d e J a n e i r o Q s e n h o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e , [ fl. 48v. ]
e sendo ciente do q u e se passava nas M i n a s fez u m a "junta, e m q u e foram c h a m a -
dos todos os "prelados e " h o m e n s b o n s d a q u e l a cidade sobre se era c o n v e n i e n t e
q u e ele viesse às M i n a s : u n s disseram q u e sim e outros, ou a m a i o r p a r t e deles,
d i s s e r a m q u e n a q , s e m e m b a r g o d o q u e resolveu-se o s e n h o r A l b u q u e r q u e e m
fazer v i a g e m , d i z e n d o aos c o n v o c a d o s q u e assim e n t e n d i a ser d o serviço de S u a
M a j e s t a d e , a q u e m daria c o n t a . E p a r t i n d o logo, escoteiramente, c h e g o u c o m tal
cautela e segredo ao C a e t é q u e n i n g u é m soube q u e ele ali estava, senão q u a n d o
m a n d o u c h a m a r a M a n u e l N u n e s V i a n a e lhe intimou, d a p a r t e d e S u a Majesta-
de, o m u i t o q u e i m p o r t a v a ao seu real serviço q u e ele se recolhesse p a r a as suas
fazendas dos C u r r a i s , a o q u e p r o n t a m e n t e o b e d e c e u o dito V i a n a , r e t i r a n d o - s e
logo.
S e m m a i s d e m o r a , foi m a r c h a n d o o s e n h o r A l b u q u e r q u e p a r a o S a b a r á ,
o n d e esteve alguns dias e a p r o v o u t u d o q u a n t o a respeito do g o v e r n o havia feito
o V i a n a . E s e m inovar coisa a l g u m a , p a r t i u p a r a o R i o das M o r t e s e ali teve a
n o t í c i a d e q u e ps paulistas v i n h a m c o m u m p o d e r o s o exército a c o n q u i s t a r as
M i n a s . E b u s c a n d o o r u m o p o r o n d e os tais v i n h a m , chegou a encontrar-se c o m
eles n a vila d e G u a r a t i n g u e t á e logo lhes m a n d o u d i z e r q u e s u s p e n d e s s e m os
224

passos, p o r q u a n t o a g u e r r a q u e p r e t e n d i a m c o n t r a os reinóis era injusta, p o r q u e


u n s e o u t r o s e r a m vassalos de u m a m e s m a m o n a r q u i a , e q u e d a sua p a r t e ficava o
a c o m o d a r tudo e m f o r m a q u e todos ficassem b e m . P o r é m , os paulistas r e s p o n d e -
r a m p o r p r o c u r a d o r e s , q u e p a r a este fim n o m e a r a m , d i z e n d o q u e as M i n a s lhes
p e r t e n c i a m p o r serem conquistas suas e q u e n ã o p o d i a m c e d e r d o senhorio delas.
V e n d o o s e n h o r A l b u q u e r q u e a c o n t u m á c i a dos paulistas, despediu logo u m
p r ó p r i o p e l o C a m i n h o N o v o aos " s u p e r i n t e n d e n t e s das M i n a s , avisando-os e m
c o m o n ã o p u d e r a a c o m o d a r aos paulistas e q u e infalivelmente v i n h a m a fazer-
[ fl. 4 9 ] lhes guerra, à vista do q u e p r e p a r a r a m - s e / / o s reinóis fazendo u m a fortaleza n o
R i o das M o r t e s e, recolhidos nela, e s p e r a r a m a n i m o s a m e n t e aos paulistas, os quais,
passados alguns dias, c h e g a r a m e, p o n d o sítio à tal fortaleza, m a n d a r a m dizer aos
sitiados q u e se entregassem. P o r é m , estes o n ã o fizeram; antes, sim, lhes resistiram
c o m m u i t o valor, até q u e das M i n a s Gerais e seu centro veio u m p o d e r o s o exérci-
to a socorrê-los, do q u e t e n d o notícia os paulistas n ã o so logo l e v a n t a r a m o sítio
q u e r e g u l a r m e n t e h a v i a m p o s t o à fortaleza m a s t a m b é m d e s o r d e n a d a m e n t e fugi-
r a m , e u m a g r a n d e p a r t e do seu exército foi destruída e d e s b a r a t a d a pelo socorro
das G e r a i s .
D o referido d e r a m os s u p e r i n t e n d e n t e s p a r t e a o s e n h o r A l b u q u e r q u e , o
q u a l j á se a c h a v a n o R i o d e J a n e i r o , e p o r molesto m a n d o u e m seu lugar p a r a as
M i n a s a G r e g ó r i o d e C a s t r o , * m e s t r e - d e - c a m p o d a q u e l a p r a ç a , p a r a o b v i a r al-
g u m a s d e s o r d e n s q u e p u d e s s e m a c o n t e c e r . P o r é m , l o g o n o a n o d e 1710 veio
o r d e m d e S u a M a j e s t a d e p a r a q u e o dito s e n h o r A l b u q u e r q u e viesse governar,*
e t o m a n d o a sua posse no m e s m o a n o q u e lha d e r a m e m S ã o P a u l o , prosseguiu
v i a g e m p a r a as G e r a i s , e n o R i b e i r ã o fez a s u a assistência, e ali c o n v o c o u a
t o d o s os principais destas M i n a s e lhes p a t e n t e o u as o r d e n s d e el-rei q u e t i n h a
p a r a l e v a n t a r vilas, o q u e todos a b r a ç a r a m , ficando m u i t o c o n t e n t e s p o r v e r e m
q u e só assim ficaria b e m estabelecida a j u s t i ç a ,
A p r i m e i r a vila q u e levantou o s e n h o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e foi o Ribei-
r ã o , c o m o título de Nossa S e n h o r a d o M o n t e do C a r m o , e depois foi esta c o m o
título de Rica, n o m e q u e se l h e deu p e l a opulência dos seus m o r r o s e córregos do
O u r o P r e t o e A n t ô n i o D i a s , n o m e s q u e t a m b é m t o m a r a m q u a n d o se descobri-
r a m , este p o r ser o seu d e s c o b r i d o r c h a m a d o A n t ô n i o Dias, h o m e m mestiço, e
a q u e l e p e l o o u r o q u e p r o d u z i a ser p o u c o r e s p l a n d e c e n t e e d e u m a c o r q u a s e
p r e t a , s e n d o , aliás, no " t o q u e , depois d e b u r n i d o , o m e l h o r .
A l é m d a p o n t e do O u r o P r e t o , o n d e hoje está u m a oficina d e caldeireiro, era
[ fl. 49v. ] / / a única casa de telha q u e havia nesta vila, e nela fez o s e n h o r A l b u q u e r q u e os

* • Antônio de Albuquerque, nomeado governador da capitania do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas
em março de. 1709, foi pouco depois nomeado governador da capitania de São Paulo e Minas do
Ouro, criada por provisão régia de 9 de novembro de 1709. Tomou posse em São Paulo a 12 dejunho
de 1710.
225

p r i m e i r o s oficiais d a C â m a r a e dela se serviram e n q u a n t o se n ã o fez casa p r ó p r i a


d a C â m a r a . E o n d e hoje é p r a ç a era m a t o m u i t o b a s t o , e p o r p i c a d a s q u e p o r
entré ele sé fez foi o dito " g o v e r n a d o r c o m os "oficiais d a C â m a r a a m a n d a r p ô r o
" p e l o u r i n h o , assinalando o lugar o n d e hoje está a "capela d e S a n t a R i t a p a r a a
C a s a d a C â m a r a , q u e logo se e n t r o u a fazer. A esta m e s m a p a r a g e m c o n c o r r e u o
p o v o , r e q u e r e n d o ao g o v e r n a d o r os m o r r o s d a v i z i n h a n ç a d a vila p a r a "faisqueira
dos seus escravos, e assim lhe deferiu o dito g o v e r n a d o r , o r d e n a n d o aos " g u a r d a s -
m o r e s q u e n ã o dessem "datas nos ditos morros, n e m houvesse repartições e q u e
q u a l q u e r q u e quisesse t r a b a l h a r neles adquirisse seu d o m í n i o p o r posse, e d e s t a
seria s e n h o r p a r a a lavrar e v e n d e r . E d a q u i se ficou c h a m a n d o a o distrito d e Vila
R i c a , e t o d a a sua c o m a r c a , M i n a s Gerais, p o r serem os seus m o r r o s "realengos e
gerais p a r a t o d o s . a

P o r sucessor do s e n h o r A l b u q u e r q u e veio o s e n h o r d o m Brás d a Silveira, o


qual fez, n o a n o d e 1714, u m a "junta a respeito do meio c o m q u e se h a v i a m d e
c o b r a r os reais "quintos; e nela se resolveu, e assim se observou, q u e se seguras-
s e m trinta "arrobas de o u r o p a r a el-rei e q u e estas se lançassem pelos escravos q u e
houvesse e o q u e a c a d a u m tocasse isso pagassem, ficando a execução desta dili-
gência p o r c o n t a das " c â m a r a s . Logo n o a n o seguinte fez o u t r a j u n t a , p r o p o n d o
q u e t i n h a o r d e m d e S u a M a j e s t a d e p a r a l a n ç a r os quintos p o r "bateias, e neste
m e i o h o u v e r e p u g n â n c i a e m u i t o m a i o r nos m o r a d o r e s do S a b a r á , p o r q u e i n d o o
dito s e n h o r d o m Brás a propor-lhes o m e s m o , todos lhe r e p u g n a r a m , e o p o v o se
a m o t i n o u d e f o r m a q u e se o g o v e r n a d o r se n ã o r e t i r a p a r a V i l a R i c a h a v e r i a
" m o t i m g r a n d e ; e a i n d a n a retirada, v i n d o ele p e r n o i t a r aos R a p o s o s , à casa d e
u m J o ã o L o b o , ali o p e r s e g u i r a m , cercando-lhe as casas é c l a m a n d o c o n t r a ele, d e
sorte q u e foi preciso retirar-se p o r u m a j a n e l a . Enfim, escapou desta, c h e g a n d o a
esta vila c o m b o m sucesso, p o r é m c o m a c o r d o de se p a g a r e m os quintos n a f o r m a
d a resolução d a p r i m e i r a j u n t a , e assim se p a g o u e m t o d o o t e m p o d o seu g o v e r n o . ^
Foi sucessor d o dito s e n h o r d o m Brás / / o s e n h o r d o m P e d r o d e A l m e i d a e [ fl. 50 ]
P o r t u g a l , c o n d e de Assumar. E este g o v e r n a d o r c o b r o u o q u i n t o p e l a m e s m a for-
m a dita, c o m a diferença, p o r é m , de se segurar p a r a el-rei 42 a r r o b a s , e h o u v e d e
a c r é s c i m o 12. E o m e s m o c o n d e fazia o l a n ç a m e n t o , d a n d o - l h e os " p r o v e d o r e s
q u e ele fez p a r a este fim as listas dos escravos, e os m e s m o s p r o v e d o r e s c o b r a v a m
e faziam entrega d e t u d o ao dito c o n d e . c

N o a n o de 1720, p r e t e n d e u o c o n d e p ô r a "casa d a m o e d a e o o u r o a 1.200


["réis a "oitava], p o r é m a isto r e p u g n a r a m todos, e o p o v o , a p o i a d o d o favor d e

O primeiro "ouvidor-geral desta vila foi o doutor Manuel da Costa de Amorim, com "beca.
O segundo ouvidor foi o doutor Manuel Mosqueira da Rosa, sem beca, como todos os mais que se
seguem â margem.
O doutor Martinho Vieira, terceiro ouvidor.
226

alguns grandes, se alterou n a noite d e São P e d r o do m e s m o a n o , c l a m a n d o pelas


ruas desta vila "Viva o povo!", e c o m este " m o t i m se a j u n t o u u m fatal *troço d e
gente e foram ao R i b e i r ã o , o n d e estava o c o n d e , c o m intento de, o d e s c o m p o r e m .
P o r é m , ele, c o m semblante agradável, lhes disse q u e se n ã o q u e r i a m a "casa d a
m o e d a q u e se n ã o p o r i a e q u e estava p r o n t o p a r a fazer o q u e eles quisessem; e
c o m esta idéia sossegou o p o v o . E logo, c o m simulação e cautela, e n t r o u o c o n d e
a i n d a g a r q u e m e r a m os m o t o r e s e c a b e ç a s , e a c h o u ser o p r i n c i p a l Filipe dos
S a n t o s , a q u e m m a n d o u p r e n d e r ; e fazendo-lhe s u m á r i o , foi s e n t e n c i a d o a ser
a r r a s t a d o à c a u d a d e u m cavalo e depois esquartejado. Assim se e x e c u t o u pelas
r u a s d e s t a vila, e os q u a r t o s se d i v i d i r a m pelas e s t r a d a s e a c a b e ç a se p ô s n o
"pelourinho. E c o m o rigor deste castigo e várias prisões q u e fez, atemorizou-se o
p o v o , de sorte q u e m a n d a n d o o m e s m o c o n d e fazer u m "levante fictício, n i n g u é m
saiu a ele.

T a m b é m houve motivo p a r a o c o n d e e n t e n d e r q u e Sebastião d a V e i g a C a b r a l


e Pascoal da Silva e r a m motores do levante, e p r e n d e n d o a a m b o s os r e m e t e u p a r a
Lisboa, e a i n d a q u e t a n t o u m c o m o o o u t r o e s t a v a m inocentes, a sua facilidade
e m se c o m u n i c a r e m c o m os cabeças d e u causa p a r a a sua p e r d i ç ã o . El-rei logo
m a n d o u retirar ao conde, p r o v e n d o no governo ao senhor d o m L o u r e n ç o de
A l m e i d a , e este g o v e r n a d o r pôs a C a s a da M o e d a c o m a felicidade q u e n i n g u é m
l h e r e p u g n o u . E p o s t o o o u r o a 1.200 — assim se c o b r o u o real " q u i n t o alguns
[ fl. 50v. ] anos —, o dito s e n h o r d o m L o u r e n ç o fez u m a j u n t a , / / p r o p o n d o nela q u e à vista
do m u i t o o u r o q u e saía p a r a fora sem ser q u i n t a d o q u e m e l h o r era q u e as " c â m a -
ras se obrigassem a segurar p o r c o n t a do quinto cem "arrobas d e o u r o e q u e ele
p o r i a o ouro a 1.320 "réis. O b r i g a r a m - s e as c â m a r a s às ditas c e m a r r o b a s , p o r é m
o r e n d i m e n t o d a C a s a da M o e d a c h e g o u n a q u e l e a n o a cento e q u a t o r z e a r r o b a s ,
e q u e r e n d o as c â m a r a s q u e as 14 arrobas de acréscimo ficassem e m a r r e c a d a ç ã o
p a r a o p a g a m e n t o v i n d o u r o , p o r q u e p o d e r i a faltar, o dito g o v e r n a d o r n ã o c o n -
veio, m a n d a n d o t u d o p a r a el-rei. E assim se d e s o b r i g a r a m as c â m a r a s , e ficou
s e m p r e o o u r o ^ c o m valor d e 1.320 réis, e assim esteve e m t o d o o t e m p o d o seu
g o v e r n o e no d o seu sucessor. e

S u c e d e u ao dito s e n h o r d o m L o u r e n ç o o s e n h o r c o n d e das G a l v e i a s / e n o
g o v e r n o deste s e n h o r veio M a r t i n h o d è M e n d o n ç a a p ô r a "capitação n a f o r m a
q u e está; e p o r q u e o c o n d e d u v i d a v a a q u e a dita se pusesse,^ o m a n d o u el-rei

O Loureiro foi o quarto "ouvidor e morreu nesta vila sem chegar a servir o lugar mais que seis meses;
o doutor Antônio Berquó del-Rio, "provedor da Fazenda Real, serviu em lugar do Loureiro três anos,
foi o quinto ouvidor; õ doutor João Pacheco foi o sexto ouvidor.
e
' O doutor João de Azevedo Barros, sétimo ouvidor.
O doutor Sebastião da Silveira Machado, oitavo ouvidor.
S- O doutor Fernando Leite Lobo, nono ouvidor.
retirar, d a n d o - l h e o vice-reinado d a Bahia, vindo p o r seu sucessor o s e n h o r G o -
m e s Freire d e A n d r a d e , q u e p o r ausencia deste s e n h o r g o v e r n o u o dito M a r t i n h o
de M e n d o n ç a , o qual, p r i m e i r o q u e pusesse a "capitação, c o r r e u todas estas M i -
nas induzindo* o p o v o p a r a a c e i t a r e m o q u e hoje t a n t o os v e x a , e p a r a m a i o r
1

confusão e n t r a v a nas escolas p e d i n d o aos rapazes q u e fizessem o seu n o m e , p o r -


q u e q u e r i a ver qual escrevia m e l h o r , e c o m tais assinados se recolheu a esta vila
fazendo o m e s m o nas escolas dela. E depois disso fez u m a "junta, n a qual p r o p ô s
q u e o p o v o p e q u e n o d e todas as M i n a s p e d i a a c a p i t a ç ã o , c o m o se via dos seus
assinados. E t r a z e n d o o r d e m de el-rei p a r a q u e se n ã o excedesse d e cinco "oitavas
1

p o r c a d a escravo, d e t e r m i n o u o dito M e n d o n ç a (visto se arbitrar n a tal j u n t a q u e


pagasse c a d a escravo q u a t r o oitavas e três quartos) q u e estas se h a v i a m d e d a r e m
dois p a g a m e n t o s e q u e q u e m n ã o pagasse o p r i m e i r o até 15 de m a r ç o e o s e g u n d o
até 15 de s e t e m b r o ' p a g a r i a "meia p a t a c a d e m u l t a d e c a d a "matrícula. E assim
v ê m todos a p a g a r hoje cinco oitavas e u m q u a r t o , p o r q u e facilmente n ã o p o d e m
acudir aos p a g a m e n t o s , sendo isto a m a i o r v e x a ç ã o do p o v o destas M i n a s , k
que
[ d e s a m p a r a n d o - a s ? ] D e u s p a r a a m p a r o dos p o r t u g u e s e s , h o j e as v e m o s ser d e -
s a m p a r o p r i m e i r a m e n t e e m u i t o pior p a r a os q u e as t ê m p o r p á t r i a etc}

[História do distrito do Rio das Mortes, sua descrição,


descobrimento das suas minas, casos nele acontecidos entre
paulistas e èmboabas e ereção das suas vilas]

Narrativa sobre a descoberta de ouro em São J o ã o del-Rei


e m 1704, as hostilidades e disputas entre paulistas e reinóis, os
combates entre os mesmos nos meses de outubro e novembro de
1709, as estratégias de defesa dos emboabas, a atuação de Antô-

O doutor Caetano Furtado de Mendonça, décimo "ouvidor.


O doutor José Antônio de Oliveira Machado, 1 I . e

Doutor Caetano da Costa Matoso.-


Doutor Francisco Angelo Leitão.
O doutor José Pio Ferreira Souto.

* Neste e nos dois escólios seguintes, letra de Caetano da Costa Matoso.


nio de Albuquerque Coelho de Carvalho, a elevação do arraial a
vila, as provas de lealdade e obediencia de seus moradores du-
rante a invasão do Rio de J a n e i r o pelos franceses em 1711 e
durante a revolta de 1720 e m Vila Rica. Sua tônica é franca-
mente favorável aos portugueses, pela ênfase na idéia de sacrifi-
cio. Encarregado da demarcação de limites entre as capitanias
dé Minas Gerais e São Paulo, e m 1748, o ouvidor d a comarca
do Rio das Mortes, Tomás Rubim de Barros Barreto do Rego,
solicitou a memoria provavelmente para subsidiar sua ação, pro-
cedimento de praxe em missões do gênero.
O interesse do ouvidor em reunir relatos sobre o povoa-
mento de Minas Gerais, seja por exigências do cargo ou pelo
seu perfil intelectual, coincide corn o falecimento dos remanes-
centes dos primeiros povoadores de Minas e a fixação de suas
reminiscências sob a forma escrita. Versão do documento 14
deste Códice, resumida, ao que tudo indica, por Caetano da Cos-
ta Matoso, com a supressão dos nomes de alguns personagens,
inclusive do autor do documento, do exórdio e de trechos que
ultrapassavam dados históricos locais, indício de racionalidade,
de objetividade e de seu empenho e m formar u m a 'coleção', ou
seja, "ajuntamento; coleção de várias coisas que se t e m lido e
anotado'*.
Autoria, l o c a l e data: José Álvares de Oliveira; S ã o j o ã o
dei-Rei; ca, 1750.
D e s t i n a t á r i o : T o m á s Rubim de Barros Barreto do Rego.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento apresenta caracte-
rísticas do gênero epidítico ou demonstrativo da oratória: elogia
a riqueza local; tipifica como heróica a ação dos e m b o a b a s ,
particularmente n a luta contra os paulistas, desqualificados por
tópicas de vítuperação e ferocidade e pela atribuição de temeri-
dade (vício forte, segundo classificação aristotélica; p o r t a n t o ,
passível de punição); justifica a reação violenta dos emboabas e
a derrota e covarde fuga dos paulistas como punição por seus
vícios; e louva a lealdade dos habitantes da região. A identifica-
ção do narrador como participante dos fatos que relata visa pro-
duzir o efeito de maior credibilidade a sua narrativa. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, tipificada
do barroco, regularizada e caligrafada, cursiva e veloz, com tra-
çado evoluído e personalizado, de módulo pequeno. Hastes supe-
riores destrógiras do tipo da bastarda italiana, como do "1" e do
"d"; este último t a m b é m pode ser do tipo uncial com volteio
sinistrógiro; haste do " p " dupla, oblíqua e retilínea; "f' e m haste
simples, com traço horizontal ascendente e sinuoso; grupo "st"
forma ligatura, com o " s " sigmático, unido à primeira das has-
tes duplas do ' V ; A partir do fólio 61v. a letra, com o mesmo
;

traçado, se torna mais cursiva e de módulo maior. H á evidênci-


as de que se trata de letra de Caetano da Costa Matoso. O texto
apresenta chamadeira. (YDL)
229

Critérios editoriais: A partir do documento 14 deste Códice,


foram feitas colações de palavras essenciais à compreensão do
texto. As substituições de vocábulos e as supressões foram preser-
vadas.
Cópias impressas:
H I S T Ó R I A do distrito do Rio das Mortes. Jornal do Comércio,
Rio de Janeiro, l j u n . 1947, p. 2; 8 jun. 1947, p. 2; 15 jun.
9

1947, p. 2.
T A U N A Y , Afonso de E. Documentos inéditos sobre as primei-
ras descobertas do ouro em Minas Gerais. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 44, p . 367-
391, 1948.
T A U N A Y , Afonso de E. Relatos sertanistas. São Paulo: Martins,
1953. p. 89-119

N
a p a r t e oriental d a A m é r i c a q u e corre do e q u i n ó c i o p a r a o m e r i d i a n o , [ fl. 52v. ]
d o m i n a a C o r o a p o r t u g u e s a aquela g r a n d e p o r ç ã o d e terra q u e se esten-
d e do rio d e V i c e n t e Pinzón, q u e d e m o r a ao n o r t e do das A m a z o n a s —
d e m a r c a ç ã o ajustada n o T r a t a d o d e U t r e c h t p a r a divisão dos limites d e C a i e n a ,
d a obediência de F r a n ç a , dos limites d o G r ã o - P a r á , d a obediência de Portugal —
até o sul do rio d a Prata, e m t a n t a distância q u a n t a o p a d r e Bluteau diz nas suas
Prosas^ se dá de longitude desde Portugal à cidade d o G r ã - C a i r o , incluindo e m si
o G r ã o - P a r á , M a r a n h ã o , C e a r á , P a r a í b a , P e r n a m b u c o , Bahia, Espírito S a n t o , R i o
d e J a n e i r o , Santos e R i o G r a n d e , com u m s e m - n ú m e r o de lugares e vilas adjacen-
tes e o mais q u e c o n t i n u a até a C o l ô n i a do S a c r a m e n t o e t u d o m e l h o r c o n h e c i d o
d e b a i x o do n o m e d e Brasil, l o g r a n d o desde o r e i n a d o d o s e n h o r e rei J o ã o , o
q u a r t o , o honorífico título d é p r i n c i p a d o .
A este pois espaçoso e dilatado c o n t i n e n t e - q u e p u d e r a ser m a i o r se assim
c o m o as m a i s nações c u i d a m e m estender os seus d o m í n i o s c u i d a r a a n a ç ã o p o r t u -
guesa e m s e n h o r e a r e conservar o q u a n t o a fortuna .na A m é r i c a lhe t r i b u t o u p a r a
dilatação d a sua m o n a r q u i a e g r a n d e z a de seu i m p é r i o — quis á Divina P r o v i d ê n -
cia, além das preciosidades q u e p r o d u z , e n r i q u e c e r n ã o só c p m . m i n a s d e d i a m a n -
tes, topázios e mais p e d r a s preciosas m a s d e ouro, q u e p o r espaço d e q u i n h e n t a s
*léguas, q u a s e e m q u a d r o , se está extraindo e m muitas partes, cuja insaciável fome

• BLUTEAU, Rafael. Prosas portuguesas, recitadas em diferentes congressos acadêmicos, pelo padre
dom Rafael Bluteau. Parte primeira e parte segunda. Lisboa Ocidental: Oficina de Joseph Antônio
da Sylva, 1727-1728.
230

d e todos os mortais obrigou e obriga a tanta gente q u e se c o m p õ e hoje este vasto


"país e "provincia das M i n a s de muitos lugares, vilas e d a C i d a d e M a r i a n a c o m
governo eclesiástico, e assim t a m b é m d e militar e político, p o r q u e se divide e m três
governos e varias comarcas c o m "ouvidorias e "câmaras, sendo u m a das ditas a do
R i o das M o r t e s , p o v o a d a dentro d a extensão de quase sessenta "léguas d e várias
freguesias e duas vilas: a de São J o s é , menos de u m quarto de légua desviada d o rio
[ íl. 52v. ] de q u e a c o m a r c a t o m a o n o m e p a r a a p a r t e / / d o nascente, situada e m u m arraial
q u e j á dos p r i m e i r o s anos deste século se c o m p u n h a , c o m sua "capela d e S a n t o
A n t ô n i o , d e alguns m o r a d o r e s q u e p o r vários ribeiros m i n e r a v a m , e dista cinco
quartos de légua, p o u c o mais ou menos, p a r a o rio abaixo até o p o r t o que c h a m a m
R e a l , pelo "contrato da sua passagem; e p o u c o mais de. m e i a légua d o dito rio p a r a
a p a r t e do p o e n t e está a vila de S ã o J o ã o del-Rei, n o l u g a r do arraial q u e teve
princípio n o a n o de 1705, a o qual se deu o n o m e de Arraial N o v o , p o r posterior a o
arraial d a o u t r a p a r t e .
Este pois Arraial N o v o , e novo e m t u d o , n ã o só pelos novos descobrimentos
m a s p o r se a c h a r o u r o e m seus m o r r o s t a n t o à flor d a terra q u e s e m p r e foi novida-
d e a i n d a p a r a os mineiros mais investigantes, a o p e d e u r a destes e de m a i s opi-
nião se assentou, d a p a r t e do nascente, n a vizinhança d e u m ribeiro q u e hoje corta
a vila pelo m e i o , e sobre a estrada q u e v e m de p o v o a d o p a r a as M i n a s Gerais e se
distingue c o m o n o m e de C a m i n h o V e l h o d o novo c a m i n h o , q u e d e p r ó x i m o se
tinha aberto e m direitura ao R i o de J a n e i r o . E o ouro q u e agora dos ditos m o r r o s
e córregos q u e deles saem se tira c o m limitação e assaz dificuldade e n t ã o se extraía
c o m t a n t a facilidade e g r a n d e z a q u e e m b r e v e t e m p o se fez u m arraial de bastan-
tes m o r a d o r e s paulistas e e m b o a b a s , n o m e este q u e , p o r a b j e ç ã o , d e u a altivez
dos n a t u r a i s à submissão dos forasteiros. Deste dito A r r a i a l N o v o , ou nova p o v o -
ação, se t r a t a r á neste papel dos sucessos e tragédias q u e nele e n a sua vizinhança
se e x e c u t a r a m , e d a e m u l a ç ã o c o m q u e p o r bocas de fogo d i s p u t a r a m entre si as
insolências dos paulistas e as desesperações dos e m b o a b a s , e dos m a i s aconteci-
m e n t o s e ações q u e e m m e m ó r i a pelos muitos anos gasta das l i m a d u r a s do t e m p o
a i n d a se c o n s e r v a r e m , o q u e tudo se reserva p a r a seu lugar. E assim, v o l t a n d o ao
princípio desta n o v a p o v o a ç ã o , ou Arraial N o v o , terão t a m b é m c o m ele princípio
os sucessos a c o n t e c i d o s pelo d e c u r s o d e v á r i o s t e m p o s e o c o r r ê n c i a d e a l g u n s
anos.
S e n d o n o a n o d e 1704 p a r a o de 1705 descobertas as ditas m i n a s e noticia-
[ fl. 5 3 ] dos os tais d e s c o b r i m e n t o s , a c u d i r a m / / logo paulistas ê t a u b a t e a n o s , t a m b é m
tidos p o r paulistas, c o m o todos naturais de S e r r a A c i m a , p r e z a n d o - s e muito deste
n o m e , e n a q u e l e t e m p o p o r h o r r e n d o , fero, ingente e temeroso, e a p o d e r a n d o - s e
d e t o d o o d e s c o b e r t o c o m o c o s t u m a v a m e m todas as m i n a s , p o r q u e e m t o d a s
p u n h a m e d i s p u n h a m despoticamente pelo d i t a m e de "assim q u e r o , assim O m a n -
d o , e à r a z ã o p r e v a l e c e a v o n t a d e " , ao qual t u d o estava sujeito, e n ã o só a eles
c o m o t a m b é m aos. c o t i d i a n o s a t r e v i m e n t o s d e s e u s b a s t a r d o s , " c a r i j ó s e
231

* t a p a n h u n o s às *lojas e "vendas dos m e r c a d o r e s e "tratantes. C o m o a tal notícia,


pelos sinais e disposições q u e se t i n h a m visto e observado p o r t o d o o descoberto e
alguns e x a m e s feitos, se espalhasse assaz encarecida, c o n c o r r e u à r e p a r t i ç ã o b a s -
t a n t e gente de u m e o u t r o p a r t i d o , lisonjeados das boas esperanças s e m p r e c o m -
p a n h e i r a s de todos os mineiros (ainda q u e m u i t a s vezes m a l o g r a d a s esperanças);
p o r é m estas, pelo t e m p o a d i a n t e , c o r r e s p o n d e r a m c o m o p r ê m i o a o t r a b a l h o d e
muitos e e m várias p a r t e s c o m grandezas m e n o s esperadas.
F e i t a à r e p a r t i ç ã o e i n t e i r a d o s õs paulistas c o m o d o m i n a n t e s m u i t o a sua
satisfação, t a n t o no. m e l h o r dos m o r r o s c o m o do ribeirão de São Francisco X a v i e r ,
q u e corre p o r detrás dos ditos m o r r o s da p a r t e do p o e n t e , p a r a l a v r a r e m e v e n d e -
r e m , o mais se repartiu pelos mais conforme a sorte de c a d a u m . C u i d a r a m logo os
e m b o a b a s d e formar arraial e fazer r a n c h o s , ditas assim as casas d e v i v e n d a p o r
serem l e v a n t a d a s de taipa d e m ã o c o m c o b e r t u r a d e p a l h a e, ao m e s m o t e m p o ,
e r i g i r a m sua "capela;, c o n s t r u í d a dos m e s m o s materiais, q u e se d e d i c o u a N o s s a
S e n h o r a do Pilar, auxílio e p r o t e t o r a q u e então foi do dito arraial e agora o é d a vila.
E os paulistas, p o r se afastarem d a vizinhança dos h o m e n s , p o r q u e só as faziam c o m
as feras, pela semelhança dos corações, se a r r a n c h a r a m pelo a r r a b a l d e / / e m m o r a - [ fl. 53v. ]
das d e espaçosas v a r a n d a s , a fim de ostentarem os seus grandes cabides de a r m a s ,
fatos indicantes das suas dissimuladas proezas, força c o m q u e c a d a u m deles afetava
o ser u m A d a s ^ dos e m b o a b a s .
Assim principiou e cresceu a p o v o a ç ã o , e c o m ela os insultos e insolências
dos paulistas, estímulo principal do q u e a d i a n t e se verá. E p o r n ã o ofender m u i t o
ôs ouvidos dos b o n s c o m o malefício dos m a u s , fique c o m o n o e s q u e c i m e n t o a
relação das m o r t e s q u e se faziam, q u e p a r a se c o m e t e r e m n ã o era necessário qual-
q u e r e m b o a b a c a i r — b a s t a v a t r o p e ç a r —, fazendo t a n t o a p r e ç o d a v i d a d e u m
e m b o a b a c o m o à d e u m c a c h o r r o de. q u e nasceu o dito vulgar: ouvindo-se qualquer
tiro, lã morreu cachorro ou emboaba. F i q u e m t a m b é m c o m o e m e s q u e c i m e n t o as
repetidas "assuadas q u e pela m e n o r desconfiança v i n h a m d a r à p o v o a ç ã o , e n t r a n -
d o p o r ela c o m g e n t e " a r m i g e r a d a , e o s e n h o r n a frente, d e p é d e s c a l ç o , e m
ceroulas a r r e g a ç a d a s , "catana "talingada, " p a t r o n a cingida, pistolas n o cinto, faca
n o peito, "clavina sobraçada, e n a cabeça ou " c a r a p u ç a de r e b u ç o ou c h a p é u d e
a b a caída, e a spm de caixa e çlangor d e t r o m b e t a , v o z e a n d o : " M o r r a m e m b o a b a s ! " .
E n ã o só c o m estas tumultuosas amotinações m a s c o m as bravezas d e u m c h a m a -
do J a g u a r a , q u e é o m e s m o q u e cachorro bravo, q u e q u a n d o se e m b r i a g a v a e r a m
poucos os alpendres e p e q u e n a s as ruas do arraial p a r a semear d e c h u m b o a p u r o s

Na mitologia grega, íillip de Japeto e Climenes. Fez com os titãs uma guerra contra Júpiter. Vencido,
foi condenado á sustentar perpetuamente o céu sobre os ombros. Outra tradição afirma que havendo
negado asilo Atlas a Perseu, lhe fez este mirar a cabeça de Medusa, com o que metamorfoseou-se em
montanha sobre a qual repousa o céu com seus astros. No documento 14, o autor refere-se a Atila.
232

tiros. O s p o b r e s m o r a d o r e s , tímidos a q u a l q u e r p r e s s e n t i m e n t o d e s e m e l h a n t e s
b a r b a r i d a d e s , n ã o se d a n d o p o r seguros e m suas casas, fechadas as p o r t a s , busca-
v a m os esconderijos dos m o r r o s , e assim a r m a d o s d e paciência e c o n f o r m a n d o - s e
c o m o t e m p o p o r presos das suas conveniências i a m b e b e n d o pelo vaso d o sofri-
[ fl. 54 ] m e n t o todos os dias mil sustos, / / até q u e os estômagos, d e m a s i a d a m e n t e reple-
3

tos, v o m i t a r a m vinganças.
E n t r e estes turbulentos h o m e n s q u e p o r este distrito assistiam havia urn J o s é
M a c h a d o , h o m e m m a u p o r n a t u r e z a , p o r inclinação insolente, q u e , a c o m p a n h a -
d o de u m "carijó m a t a d o r p o r oficio e de u m " b a c a m a r t e b e m " a t a c a d o , fiado e m
u m tio, h o m e m dos principais, contados e r a m os dias q u e n ã o a n d a s s e pela p o v o -
a ç ã o i n s u l t a n d o os m o r a d o r e s , p e l o q u e se fez d e t o d o s a b o r r e c i d o e
e n t r a n h a v e l m e n t e o d i a d o . E sendo e m j u n h o de 1707, e m a n t e v é s p e r a s d e São
P e d r o , o levou o destino à casa de u m D o m i n g o s R i b e i r o , a q u e m , d e p o i s d o
a t r e v i m e n t o d e e n t r a r nela o u s a d a m e n t e ^ o d e s c o m p ô s , pelo q u e o dito R i b e i r o ,
i n c i t a d o , p e g o u e m u m a a r m a , e. os vizinhos q u e p r e s e n c i a r a m , o b r i g a d o s d o
e s c â n d a l o , a sua i m i t a ç ã o p e g a r a m nas suas, à vista d e cuja deliberação, c o n h e -
c e n d o o dito M a c h a d o e m si sua a r r o g â n c i a sem vigor p a r a resistir e seu " b a c a m a r t e
s e m p r é s t i m o p a r a o defender, m u i t o a pressa se retirou p a r a a casa d e u m ferreiro,
p a r a a qual o m e s m o tio, vindo acudir-lhe se recolheu fugindo, p o r a c e n d e r c o m
a m e a ç o s o q u e e m tal c o n j u n t u r a devia a p a g a r c o m rogos. E assim, p o r n ã o p o u -
p a r e m inimigos que-lhes p o d i a m vir a c a b a r n a s m ã o s , p u s e r a m togo à casa, e os
dois, tio e s o b r i n h o , fugindo deste fogo, foram m o r r e r e m outro^ p o r q u e , à saída
d a dita casa, d e s c a r r e g a r a m sobre eles tantos tiros q u e ficaram, d e sorte q u e p o d i -
a m lastimar à m e s m a ira aqueles estragos d a cólera.

Esta resolução t o m a d a pelos e m b o a b a s do R i o das M o r t e s e d o Arraial N o v o ,


a i n d a q u e agitada pela cegueira d e sua c o m p a i x ã o , s e m p r e foi a q u e d e u princípio
p a r a a d i a n t e todo o "país das M i n a s e d e Serra A c i m a c o n h e c e r v e r d a d e i r a m e n t e
a seu v e r d a d e i r o senhor, até e n t ã o m e n o s c o n h e c i d a a sua g r a n d e z a e muito p o u -
c o t e m i d a a sua justiça. Desafogados os â n i m o s d a refrega p a s s a d a , e n t r a r a m e m
[ fl. 54v. ] reflexões, t e n d o p o r certa a v i n g a n ç a e p o r duvidosa defensa; e assim / / como
c o r p o s e m c a b e ç a , se d i v i d i r a m , b u s c a n d o c a d a u m o m e l h o r c a m i n h o d a s u a
s e g u r a n ç a , exceto alguns d e mais distinção, q u e se p a s s a r a m d e o u t r a p a r t e do
r i b e i r o e defronte da p o v o a ç ã o se m e t e r a m e m u m a casa q u e f i z e r a m forte. E
revestidos d e brio se dispuseram a esperar a invasão dos paulistas, q u e t i n h a m p o r
s e m d ú v i d a , s e g u n d o seu violento p u n d o n o r n ã o ficar s e m u m e x e m p l a r castigo
u m tão grave delito. V i e r a m , c o m efeito, i n c o r p o r a d o s . E a c h a n d o a p o v o a ç ã o

3, Referência à libação, cerimônia histórica e religiosa dos antigos pagãos que consistia em encher um
vaso de vinho, derramado sobre o altar em que se faziam os sacrificios e oferecê-lo aos ídolos, como
forma de atenuar os sofrimentos.
233

d e s e r t a m a s a casa d a o u t r a p a r t e g u a r n e c i d a , v o l t a r a m , disfarçando a sua b o a


v o n t a d e , dizendo q u e aquela diligencia n ã o se e n c a m i n h a v a a o u t r o fim m a i s q u e
o d a r sepultura aos m o r t o s .
P a s s a d a esta ação, a p o u c o s dias depois v i e r a m c h e g a n d o alguns dos m o r a -
dores, b e m a r r e p e n d i d o s de n ã o a c o m p a n h a r e m os q u e ficaram, c o m o t a m b é m
os mais q u e , restituídos ao arraial e suas casas, existiram a d i a n t e s e m p r e constan-
tes e c o m cautela, f u n d a d a n a desconfiança dos paulistas, q u e n a t u r a l m e n t e con-
servam as brasas d o ódio debaixo das cinzas do disfarce. E assim c o n t i n u a r a m p o r
largo t e m p o sem haver descuido nesta dilação; antes, se avivava c a d a vez mais a
vigilância a respeito das contínuas tropas dos paulistas q u e c h e g a v a m a estes distri-
tos retirados dos e m b o a b a s , q u e depois do sucedido neste arraial t i n h a m m u d a d o
as M i n a s d e s e m b l a n t e e eles d e c o n d i ç ã o , t a n t o q u e , m o v e n d o - s e p e l o S a b a r á
certas diferenças e n t r e eles e paulistas, se. lhes o p u s e r a m , d e sorte q u e ficando estes
m e n o s airosos, e n v e r g o n h a d a sua alta p r e s u n ç ã o , antes que. e x p e r i m e n t a s s e m mais
a l g u m *desar, a b a l a r a m p a r a este R i o das M o r t e s , e j u n t o s o n d e c h a m a m o C ó r r e g o ,
lugar d a o u t r a p a r t e d o rio q u e fica e n t r e as d u a s vilas, de o n d e , o b s e r v a n d o õ
vigilante c u i d a d o e constância firme dos e m b o a b a s , ofereceram p o r várias / / ve- [ fl. 55 ]

zes proposições p a r a u m a amigável correspondência, preliminares q u e n ã o f o r a m


aceitas. E assim se foram uns e outros e n t r e t e n d o , n e m amigos n é m inimigos, até
o fim d o a n o de 1708.
A q u a n t i d a d e d e paulistas que despejavam daquelas p a r t e s das G e r a i s p a r a
esta do R i o das M o r t e s deu e m q u e c u i d a r a o g o v e r n a d o r das M i n a s , l e v a n t a d o
pelos p o v o s delas, M a n u e l N u n e s V i a n a , e aos seus a d j u n t o s , p o r q u e c o m o os
paulistas se i a m queixosos, u n i d o s , m u i t o b e m p o d i a m i n t e n t a r sobre os p o u c o s
e m b o a b a s d e q u e c o n s t a v a m as p o v o a ç õ e s do R i o das M o r t e s , p o r m o d e r n a s ,
aqueles malefícios q u e lhes sugerisse o seu s e n t i m e n t o . E p a r a evitar este golpe,
a c o r d a r a m fazer logo p ô r e m m a r c h a u m d e s t a c a m e n t o de duzentos h o m e n s , p o u c o
m a i s ou m e n o s , os quais c h e g a r a m a este arraial e m d e z e m b r o d o dito a n o d e
1708, d e b a i x o do c o m a n d a m e n t o d e u m B e n t o de A m a r a l C o u t i n h o , o q u a l os
governava n o poslo de sargento-mor de batalha, também criado pelo povo, h o -
m e m grave e valoroso, p o r é m c o m a l g u m t a n t o d e cruel. C e r t o s os paulistas d a
c h e g a d a desta gente, logo se dividiram e m " m a n g a s e b u s c a r a m c o m m u i t a pressa
as e m b o s c a d a s dos matos. E sabendo-se q u e u m a destas se tinha m e t i d o da o u t r a
p a r t e do rio das M o r t e s , coisa de *légua e m e i a ao r u m o do n o r t e , e m u m c a p ã o
{nome q u e pelos n a t u r a i s se d á a q u a l q u e r p o r ç ã o d e m a t o , m a i o r ou m e n o r ,
s e n d o s e p a r a d o p o r todas as partes de outro mato) c o m u m c a b o insolentíssimo e
blasfemo d a Majestade, o dito A m a r a l passou o rio c o m a sua gente e a l g u m a d o
arraial, e c h e g a n d o à vista pôs sítio a o dito c a p ã o . E os paulistas, c o m o q u e n a d a
t e m i a m , t e m e r a r i a m e n t e p e g a r a m n a s a r m a s , d e r a m tiros e f e r i r a m a l g u n s / / [ fl. 55v. ]
e m b o a b a s , causa p o r q u e os m a i s , cheios de cólera, a p e r t a r a m o Y o r d ã o . E g a n h a d o
234

o m a t o , p u s e r a m os paulistas as a r m a s e m terra e p e d i r a m quartel; e sendo levados


à p r e s e n ç a do c o m a n d a n t e foram m o r t o s a s a n g u e frio (tirano m a s s a c r e e í m p i a
e x e c u ç ã o a b o m i n a d a de todos os q u e se t ê m p o r próximos!). Alguns dias depois
desta ação c r u e n t a , d e t e r m i n o u o dito A m a r a l retirar-se, c o m o c o m efeito se pôs
e m m a r c h a d e volta destas m i n a s p a r a as Gerais.
C h e g a d o s a o R i o d e J a n e i r o , os repetidos ecos dos a c o n t e c i m e n t o s das M i -
nas fizeram n a q u e l a c i d a d e u m tal estrondo q u e se viu precisado o " g o v e r n a d o r
d o m F e r n a n d o M a r t i n s M a s c a r e n h a s de Lencastre subir a elas, o q u e a toda pressa
p ô s p o r o b r a . E avizinhando-se deste arraial n o m ê s d e abril de 1709, além d a sua
comitiva, escoltado de duas c o m p a n h i a s de infantaria, os m o r a d o r e s o foram es-
p e r a r . E depois de o salvarem c o m u m a descarga de tiros o c o n d u z i r a m à casa d a
sua a p o s e n t a d o r i a , a q u a l ficava d a o u t r a p a r t e do r i b e i r o , c o n t r á r i a ao
e n t r i n c h e i r a m e n t õ q u e o receio fez levantar no c o r p o da p o v o a ç ã o , fortalecido e
f r a n q u e a d o n a m e l h o r forma q u e o permitiu a disposição do t e r r e n o , o n d e se fez
c o m seu fosso e p o n t e levadiça, q u e n a ocasião estava c o m b a n d e i r a s de a r m a s
reais e m u m dos â n g u l o s e n v e r g a d a , d e o n d e se d e r a m r e p e t i d a s c a r g a s a s u a
c h e g a d a e se lhe fizeram "luminárias três noites sucessivas. E assim foi recebido
c o m estas demonstrações de súditos a seu g o v e r n a d o r e lugar-tenente d a Majesta-
de, a cuja voz os m o r a d o r e s d o R i o das M o r t e s , desde o seu estabelecimento até o
p r e s e n t e , ; s e m p r e se s u j e i t a r a m c o m o b o n s v a s s a l o s , e as s u a s o r d e n s , s e m
repugnância, sempre obedeceram.

N o quarto dia d e sua chegada, pediu aó reverendo vigário agradecesse d a sua


[ fl. 56 ] p a r t e aos seus fregueses aquele obséquio, e no m e s m o dia, de m a n h ã , / / m a n d o u
lançar u m " b a n d o pelo qual o r d e n a v a q u e todos os m o r a d o r e s , às duas horas d a
tarde, se achassem no terreiro de seu quartel, p a r a o n d e c o n c o r r e r a m prontamente,
os dois partidos, que, guiados pela antipatia dos gênios, se e n c a m i n h o u c a d a u m
p a r a o seu lado. E a p a r e c e n d o o g o v e r n a d o r , fez a todos s u a prosa: e s t r a n h a n d o
semelhantes revoluções e contendas, c o m o se n ã o fossem todos portugueses, vassalos
do m e s m o príncipe, e assim o q u e o trouxera às M i n a s era o sossegar os m o r a d o r e s
delas, p a r a o que, n ã o p o d e n d o ouvir a todos, nomeassem os paulistas e forasteiros
seus p r o c u r a d o r e s p a r a q u e entre si satisfizessem queixas e, esquecidos do passado,
assentassem e m u m m o d o de viverem e m b o a h a r m o n i a , e que a ele fizessem aque-
les r e q u e r i m e n t o s q u e entendessem ser necessários p a r a c o n c o r d â n c i a dela q u e a
todos deferiria.
Feitos os p r o c u r a d o r e s (sendo o q u e escreve este papel u m deles), t r a t a r a m de
se ajuntar e m várias conferências, propondo-se nelas aqueles pareceres q u e m e l h o r
ajustavam p a r a o fim p r e t e n d i d o , caindo todo o cuidado e trabalho desta diligência
sobre os p r o c u r a d o r e s e m b o a b a s (os quais n ã o d e i x a r a m d e p e r c e b e r , desde seu
princípio, ser trabalho perdido). C o n t u d o , p o r é m , c o n t i n u a r a m as sessões; e findas
estas foi levada a conclusão do tratado pelos mesmos p r o c u r a d o r e s ao governador,
235

de q u e fez b o a aceitação e a teve por n ã o p e q u e n o serviço do soberano, c o m o o dito


' g o v e r n a d o r expressou nas patentes de "capitães de "auxiliares q u e e m r e c o m p e n s a
deu aos tais procuradores. E assim concluídos alguns negocios, principalmente este
d e sua m a i o r obrigação e cuidado (que os procuradores e m b o a b a s n u n c a d e r a m p o r
firme, c o m o adiante se verá), determinou o governador a sua p a r t i d a p a r a as Minas
Gerais, e deixando formadas cinco c o m p a n h i a s , q u a t r o d e p é e u m a d e cávalos, e
p o r "cabo delas, c o m o posto de "sargento-mor, a u m A m b r o s i o C a l d e i r a B r a n t ,
homem grave e de atenções, o qual depois- teve patente d e *mestre-de-campo, em
cuja casa tinha feito / / a sua assistência. E n a despedida,, c o m o era voz constante [ fl. 56v. ]
que aqueles povos das Gerais o n ã o p r e t e n d i a m admitir, muitos, sujeitos deste distri-
to se lhe ofereceram pedindo-lhes concedesse a h o n r a de o a c o m p a n h a r e m n a oca-
sião, o q u e ele agradeceu m a s n ã o aceitou, e assim se pôs a c a m i n h o p a r a as ditas
minas, e os paulistas p a r a as vilas d e São Paulo, n ã o muito contentes d o g o v e r n a d o r
p o r q u e c o m o cavalheiro devia atender p a r a a qualidade deles, paulistas, ultrajada e
c o m o governador castigar severamente a baixa plebe dos e m b o a b a s , p a r a satisfação
d o seu respeito p e r d i d o .
A vista destes movimentos indicativos d a p o u c a fé dos paulistas, j á nas confe-
rências conhecida, se aplicaram todos os m o r a d o r e s à última construção do entrin-
c h e i r a m e n t o , com a fervorosa assistência do capitão d e auxiliares J o s é M a t o l , que o
era pelo m e r e c i m e n t o de, t a m b é m ser u m dos procuradores, o qual depois subiu a
sargento-mor, p o r cujas persuasões e, grande, trabalho se tinha principiado e conse-
guido a sua fatura, d e q u e j á se. tratou, a n t e v e n d o pelo s e u b o m e n t e n d i m e n t o e
previsto discurso o q u a n t o necessitava o arraial d e ser fortificado p o r estar e m u m a
b a r r e i r a exposto a qualquer invasão dos paulistas. E assim, a o t e m p o q u e estes che-
g a r a m , q u e n ã o tardou m u i t o , q u a n d o p r e s u m i a m que o m e s m o era chegar, ver q u e
vencer, e n c o n t r a r a m c o m u m a p o v o a ç ã o q u e era aberta p a r a as suas correrias, p r a ç a
fechada p a r a as suas entradas, obstáculo a seus intentos, m u r a l h a oposta aos desígnios
c o m q u e v i n h a m a m e a ç a n d o e x t i n g u i r das M i n a s t u d o q u e tivesse n o m e d e
emboaba.
N a e n t r a d a d o m ê s d e o u t u b r o d e 1709 e n t r o u neste distrito, de volta das
Minas Gerais, o governador Antônio de A l b u q u e r q u e Coelho de Carvalho, o
q u a l t i n h a v i n d o suceder a o g o v e r n a d o r d o m F e r n a n d o n o g o v e r n o d o R i o d e
J a n e i r o e M i n a s , a c o m p a n h a d o / / somente de u m "ajudante, u m "sargento e três [fl. 57 ]
soldados. E n c a m i n h a n d o - s e p a r a a igreja, depois de o r a r à R a i n h a dos Anjos, à
p o r t a d a dita fez sua fala a todos, r e p r e e n d e n d o semelhantes alterações, as quais
r e d u n d a v a m e m desserviço do s o b e r a n o e p e r d i ç ã o dos m o r a d o r e s d o " p a í s , e
assim q u e tratassem c o m sossego das suas conveniências c o m o mineiros e deixas-
s e m o "oficio de soldados. D a q u i foi c o n d u z i d o p a r a a m e s m a a p o s e n t a d o r i a e m
q u e assistiu seu antecessor, e nas conversas q u e pelos dias a d i a n t e teve c o m os
p r i n c i p a i s dos m o r a d o r e s lhes disse n ã o t e m e s s e m os p a u l i s t a s , s e g u r a n d o - l h e s
236

q u e os n ã o h a v i a m vir inquietar, p o r q u e tinha m a n d a d o a São P a u l o u m religioso


d a C o m p a n h i a [ d e J e s u s ] , fulano d e Almeida,'*' n a t u r a l d a m e s m a vila, p a r a os
1

dissuadir dos seus projetos, a n t e p o n d o - l h e s o c r i m e e m q u e p o r q u a l q u e r a t e n t a -


d o p o d e r i a m i n c o r r e r . P o r é m , c o m o viu q u e estas asseverações n ã o faziam i m -
pressão e m â n i m o s c o m r a z ã o desconfiados, p o r t e r e m m e l h o r c o n h e c i m e n t o dos
paulistas do q u e ele, g o v e r n a d o r , despachou u m p r ó p r i o a o sítio c h a m a d o Pouso
Alto, cinco dias d e v i a g e m deste arraial, e m q u e era m o r a d o r u m e m b o a b a confi-
dente (porque os mais dos casados, c o m o este, e r a m de Serra A c i m a , fel pela enxertia
d e g e n e r a v a m d e serem e m b o a b a s ) , é a resposta q u e teve foi certificar-lhe q u e a
m a i o r p a r t e das paulistas se a c h a v a e m G u a r a t i n g u e t á , última vila no c a m i n h o de
São Paulo p a r a as Minas, distante deste R i o das M o r t e s oito dias d e j o r n a d a , e q u e
já t i n h a m algumas tropas mais avançadas. O "governador, despedindo-se logo dos
m o r a d o r e s e r e c o m e n d a n d o - l h e s tratassem das suas lavras s e m susto, p o r q u e sem
dúvida h a v i a fazer retroceder os paulistas, se pôs a c a m i n h o e levou mais e m sua
c o m p a n h i a u m dos m o r a d o r e s p ô r n o m e Estêvão R o d r i g u e s , h o m e m resoluto e
diligente; e chegando-se a avistar com os paulistas n a dita vila n ã o lhe sucedeu c o m o
cuidava, antes experimentou algumas desatenções, e v e n d o q u e n ã o cediam d a sua
rebelação fez c o m cautela descer, à toda a pressa, o dito Estêvão Rodrigues ao R i o
d e j a n e i r o , r e c o m e n d a n d o - l h e q u e c o m a m e s m a subisse ao R i o das M o r t e s , p a r a o
[ fl. 57v. ] q u e / / lhe d e u c a r t a p a r a o *mestre-de-campo q u e g o v e r n a v a e m sua ausência,
pela qual lhe m a n d a v a assistir e se lhe passassem o r d e n s p a r a , n o c a m i n h o , t o m a r
aqueles cavalos q u e fossem necessários p a r a a sua posta, ficando ele, governador,
c o m u m notável cuidado de que os paulistas p o d e r i a m a p a n h a r os m o r a d o r e s des-
cuidados pela sua promessa.

D ê dia e d e noite c a m i n h o u o dito Estêvão R o d r i g u e s , e c h e g a n d o a o R i o


das M o r t e s e m u m a j á b e m t a r d e expôs o q u e fica dito. R e c e b i d a a notícia, se. fez
a v i s o a t o d o s os m o r a d o r e s d o d i s t r i t o p a r a se v i r e m c h e g a n d o p a r a o
e n t r i n c h e i r a m e n t o e q u e t r o u x e s s e m t u d o o q u e nele se p u d e s s e r e c o l h e r , s e n d o
principal o m a n t i m e n t o . Cuidou-se t a m b é m e m recolher p a r a ele as m u n i ç õ e s d e
g u e r r a e b o c a q u e se a c h a r a m pelo arraial. Ao dito aviso, a c u d i r a m tanto do A r r a i -
al V e l h o c o m o d a P o n t a d o M o r r o (lugar este q u e fica d a o u t r a p a r t e do rio, p a r a
a b a n d a do nascente m e i o dia de viagem), e assim todos aqueles q u e se l e m b r a -
vani d e ser e m b o a b a s , p o r q u e n ã o faltou q u e m , esquecido do tal apelido, buscas-
se o refúgio que. o m e d o n a q u e l a ocasião a c o n s e l h a v a . J u n t o s os m o r a d o r e s de
fora e os d o arraial, se fez resenha, e constava a lista dos b r a n c o s de duzentos e
sessenta, p o u c o m e n o s , e a dos n e g r o s d e p e r t o d e q u i n h e n t o s , e alguns destes
c o m a r m a s , dos quais se formou u m a c o m p a n h i a q u e se. entregou a um.forro, c o m

• O nome do jesuíta enviado a São Paulo era Simão de Oliveira.


237

q u e m fez m u i t o b e m sua obrigação e foi u m dos feridos, e os m a i s se a r m a r a m d e


foices de roçar e paus de p o n t a .
E s t a n d o assim todos j u n t o s , desde o princípio de n o v e m b r o d e 1709, e m q u e
t i n h a c h e g a d o o dito Estêvão R o d r i g u e s , até 10 d o dito m ê s , e p r e m e d i t a d a s p o r
estes dias as j o r n a d a s dos paulistas, a i n d a q u e vagarosas s e m p r e t a r d a v a m , e su-
p o n d o - s e pela t a r d a n ç a q u e p o r a l g u m incidente se t e r i a m a r r e p e n d i d o , se despa-
c h o u u m p r ó p r i o a o dito PoUso Alto, o qual, a dois dias d e viagem, t o p o u c o m os
paulistas, os quais, a p a n h a n d o - o e a c h a n d o - l h e u m a c a r t a q u e levava escondida,
o assassinaram. / / E q u a n d o foi aos 13 dias, b o t a r a m - s e três cavaleiros a descortinar [ fl. 58 J
c a m p o , q u e os avistaram quase u m dia de viagem; e n o de 14 d o dito m ê s saiu d e
m a n h ã a c o m p a n h i a d e cavalos fora, e t o p a n d o de súbito c o m eles, p o u c o mais d e
tiro d e "clavina, a i n d a voltou a t e m p o e c o m t a n t a ligeireza q u e , d a n d o - l h e s os
paulistas u m a descarga, a p e n a s feriram u m soldado.
E m quarta-feira, 14 de n o v e m b r o d e 1709, pela u m a h o r a p a r a as d u a s d a
tarde, foram vistos os paulistas; e além de dois próprios que j á se t i n h a m d e s p a c h a d o
p a r a as M i n a s Gerais a i m p l o r a r socorro, se expediu nesta ocasião o u t r o , c o m a
certeza d e estarem j á os paulistas sobre o arraial c o m o corpo de mais de dois mil
c o m b a t e n t e s , p o d e r formidável a respeito das p o u c a s forças q u e se a c h a v a m n o
e n t r i n c h e i r a m e n t o , e assaz d e b a i x o de evidente p e r i g o , p o r este estar d e m u i t a s
p a r t e s c o n d e n a d o , pelo q u e t o r n a v a m a i m p l o r a r o seu auxílio, e c o m p r e s t e z a ,
p o r q u e nela estava o livramento daqueles poucos defensores, os quais, a c o m p a n h a -
dos d e seu b r i o , a c u d i r a m a seus postos p a r a resistirem a q u a l q u e r invasão dos
paulistas, q u e debaixo de u m estandarte g r a n d e e n c a r n a d o (que se disse trazia a
efígie de São Paulo) e do m a n d o de u m chefe p o r n o m e A m a d o r B u e n o , m a r c h a -
v a m e m u m a coluna b e m formada, c o r o a n d o os m o r r o s fronteiros. E c h e g a n d o à
casa d o *sargento-mor, *cabo dos e m b o a b a s , a o c u p a r a m p a r a q u a r t e l d a corte;
dela d e s c e n d o p a r a o ribeiro se dividiram e m dois "cordões: u m q u e se estendeu
pelo dito ribeiro, a m p a r a d o do seu b a r r a n c o p a r a f o r m a r e m cerco à p r a ç a , e o outro
subiu o m o r r o d a "espalda, b u s c a n d o u m a a b e r t a q u e descia p a r a o terreiro d a
igreja, e b a i x a n d o p o r ela n o dito terreiro da igreja fez alto a v a n g u a r d a . E fechado
o cerco se j u n t o u o seu conselho de guerra, do qual se expediu u m clérigo, c u n h a d o
do dito sargento-mor, q u e , c h e g a n d o a fala, p e d i u queria falar a seu c u n h a d o , c o m o
falou, dizendo q u e suposto o motivo / / daquele a r m a m e n t o d n h a sido p a r a castigar [ fl. 58v. ]
o caso d o c a p ã o , contudo q u e aqueles cabos se desejavam ver c o m ele, e q u e n ã o
era desacerto assim fosse, p o r q u e da prática que tivessem poderia m u i t o b e m resul-
tar a l g u m a concordata conveniente a todos. H o u v e votos p r ó e contra.

C o n t u d o , descida, a p o n t e , saiu o s a r g e n t o - m o r c o m a l g u n s sujeitos q u e o


q u i s e r a m a c o m p a n h a r , e a. p o u c a s palavras q u e p o d e r i a haver d e p a r t e a p a r t e , se
deu u m tiro d e pistola, ou fosse p o r o r d e m ou p o r descuido. T a n t o q u e foi ouvi-
d o , o s a r g e n t o - m o r e os c o m p a n h e i r o s v i r a r a m costas e, "cosidos c o m a terra, m a i s
q u e depressa se r e c o l h e r a m . E a esta fugida p r i n c i p i a r a m os paulistas a d a r repeti-
238

das descargas e g a n h a r t e r r e n o . N e s t a ocasião se distinguiu u m M a n u e l D i a s d e


Meneses, h o m e m grave e destemido, p o r q u e a c o n t e c e n d o cair a p o n t e , d e p a n c a -
da, e ter levado a corda p o r q u e se suspendia, à qual se n ã o p o d i a chegar, o dito,
a t o d o risco, perfilado c o m u m esteio e m q u e batia, a m e s m a subiu, e lançando-se
a ela a trouxe consigo. E l e v a n t a d a a dita p o n t e ficou a p o r t a fechada, q u e n ã o
d a v a p o u c o c u i d a d o o estar a b e r t a (bisonho a c o n t e c i m e n t o q u e b e m p o d e r i a ser
infausto aps e m b o a b a s se nos paulistas fosse o valor mais natural).
C o n t i n u a n d o estes o fogo s e m oposição, e n t e n d e r a m seria p o r m e d o d a p a r -
te dos e m b o a b a s , e assim se foram a v a n ç a n d o p a r a a trincheira. E os e m b o a b a s ,
c o m o a m a i o r p a r t e das suas a r m a s e r a m curtas, estavam e s p e r a n d o q u e eles c h e -
gassem; e t a n t o q u e os t i v e r a m a tiro, d e r e p e n t e lhes d e r a m u m a descarga p o r
toda a "cortina. E n a m e s m a ocasião u m dos m o r a d o r e s q u e se a c h a v a c o m u m a
e s p i n g a r d a c o m p r i d a fez p o n t a r i a ao "alferes da b a n d e i r a , q u e estava n o c e n t r o
do e s q u a d r ã o , o qual logo caiu c o m a m e s m a b a n d e i r a , e t u d o caiu p a r a mais se
n ã o levantar. A r r i m a d o s os e m b o a b a s o u t r a vez ao p a r a p e i t o p a r a d a r e m a segun-
d a descarga, v i r a m o terreiro e v a c u a d o e os paulistas espalhados d a n d o seus tiros
[ fl. 59 ] d e detrás das casas e d a igreja. E tanto que c e r r o u a noite, / / divididos e m "troços,
se i n t r o d u z i r a m n a m e s m a igreja e nas casas eminentes a o e n t r i n c h e i r a m e n t o , de
o n d e se recebia g r a n d e d a n o , p r i n c i p a l m e n t e os q u e g u a r n e c i a m o p a r a p e i t o q u e
c a í a s o b r e o r i b e i r o , p o r q u e e r a m v a r a d o s pelas costas. E o u t r o n ã o m e n o r se
e x p e r i m e n t a v a , c o m o e r a a falta de á g u a , a o que' t u d o se d e u a q u e l a p r o v i d ê n c i a
q u e permitia a ocasião, p o r q u e p a r a este se abriu u m p o ç o q u e a 18 "palmos d e
f u n d o d e u a l g u m a á g u a q u e supriu, e p a r a o o u t r o se fez u m r e p a r o d e c o u r o s
q u e , senão d e todo, e m m u i t a p a r t e o evitou.
N o t e m p o q u e os paulistas p e r s i s t i r a m n o b l o q u e i o , três vezes m a n d a r a m
dois "clérigos p o r emissários a p e r s u a d i r a entrega das a r m a s , e este e r a o principal
p o n t o das suas p r e t e n s õ e s , e q u e e n t r e g u e s estas ficaria t u d o o p a s s a d o e m u m
p e r p é t u o e s q u e c i m e n t o . E treplicando n a terceira e última vez q u e v i e r a m nesta
m e s m a p r o p o s i ç ã o , a c r e s c e n t a d a c o m u m m o d o d e sentimento dos m o r t o s e feri-
dos c o m q u e s a b i a m se a c h a v a m os e m b o a b a s e os q u e p o d e r i a h a v e r se n ã o
cedessem d e sua i m p r u d e n t e e p e r t i n a z t e i m a , ao q u e r e s p o n d e u (o q u e escreve
este p a p e l , p o r ser p a r a as tais conferências n o m e a d o ) , q u e q u a n t o ao falar n a
e n t r e g a das a r m a s j á e r a ocioso, p o r q u e desde a p r i m e i r a vez se dissera q u e as
a r m a s e r a m d e el-rei ç n ã o se p o d i a m e n t r e g a r sem o r d e m do g o v e r n a d o r , q u e as
tinha m a n d a d o m a r c a r c o m a m a r c a q u e c o s t u m a m ter as a r m a s do dito senhor;
q u a n t o mais q u e prescindindo de ser isto assim, todos os q u e se a c h a v a m n a q u e l e
presídio estavam de â n i m o de largar as a r m a s d e suas m ã o s j u n t o c o m a m e s m a
vida; e q u a n t o aos m o r t o s e feridos n ã o era tão g r a n d e o n ú m e r o c o m o eles julga-
v a m , e q u e fosse e muitos mais q u e houvesse n ã o faziam falta pelos muitos defen-
sores d e q u e constava aquele "presídio^ e todos firmes n a resolução de m o r r e r e m
ou ficarem b e m .
239

N o q u a r t o dia d a e s t a d a dos p a u l i s t a s , q u e e r a o dia d e s á b a d o , dois / / [ fl. 59v. ]


sujeitos, u m "ajudante do "presídio p o r n o m e Francisco Barreto d e F a r i a e outro
u m "alferes d a c o m p a n h i a d a P o n t a do M o r r o p o r n o m e D o m i n g o s G o n ç a l v e s ,
a m b o s de â n i m o intrépido, c o m o m o s t r a r a m desde o princípio deste conflito, de
dia e de n o i t e j á r o n d a n d o , j á a c u d i n d o o n d e era necessário, se a j u s t a r a m c o m
m a i s a l g u n s a m b i c i o s o s de. n o m e a f a z e r e m , n a m a d r u g a d a d e d o m i n g o , u m a
saída c o m o p r o j e t o d e desalojar os paulistas, q u e i m a n d o - l h e s as casas d e o n d e
faziam c o n t í n u o fogo ao seu salvo e c o m grave risco dos defensores, p a r a a q u a l
diligência, j á n a m a d r u g a d a deste m e s m o dia, tinha saído u m c o r p o d e gente q u e
se recolheu c o m p o u c o efeito e c o m alguns feridos. E s t a n d o os ditos p r e p a r a d o s e
vigilantes e s p e r a n d o a h o r a d e t e r m i n a d a p a r a a empresa, r e p a r o u - s e q u e , p a r a o
m e i o d a iioite^ tinham-se cessado d ê todas as partes os tiros, e tendo-se p o r novida-
de se suspendeu a diligência, e estando c o m b o a vigia se deu fé q u e n o horizonte
dos m o r r o s fronteiros se divisavam uns movimentos, e clareando a m a n h ã se veio
n o c o n h e c i m e n t o serem os paulistas q u e i a m de retirada. Fazendo-se conselho so-
bre o repente, s e m p r e a desconfiança fez assentar q u e aquela retirada b e m p o d e r i a
ser p a r a p ô r a eles, e m b o a b a s , e m descuido e [vir apanhá-los] p o r *interpresa, p a r a
o q u e s e m p r e e r a acerto desassombrar o e n t r i n c h e i r a m e n t o dos "padrastos a q u e
estava exposto, q u e i m a n d o - s e todas as casas e a m e s m a igreja, p o r q u e assim se
ficava e m c a m p o descortinado e c o m menos risco d e "defensa, caso q u e eles inten-
tassem segunda invasão, o q u e p r o n t a m e n t e se pôs p o r obra.
M a s desvaneceu-se este cuidado c o m a notícia d e q u e eles, c o m v e r g o n h o s a
fugida, seguiam o c a m i n h o de p o v o a d o . B e m p o d e r i a ser esta apressada fuga p o r
a l g u m aviso q u e recebessem de que a gente das M i n a s Gerais v i n h a c o m acelera-
da m a r c h a a socorrer o R i o das M o r t e s . Fosse pelo motivo q u e fosse, eles, paulistas,
sem p a s s a r e m do R i o das M o r t e s , depois d e q u a t r o dias / / e q u a t r o noites d e [ fl. 6 0 ]
m a r c i a l c o n t e n d a , desfeito o bloqueio, d e r a m costas, d e i x a n d o a b a t i d a pela fuga
a q u e l a s o b e r b a c o m q u e , altivos, e n t r a r a m a ela, tendo-se c o m p r o m e t i d o , extin-
tos os e m b o a b a s d e todas as M i n a s , c a p i t u l a r e m c o m o s o b e r a n o sobre o g o v e r n o
delas ser m u i t o a seu arbítrio. J u n t o c o m a q u e d a d a s o b e r b a p e r d e r a m t a m b é m o
respeito do seu h o n r o s o n o m e depois d e tantos anos pelas suas insolências a d q u i -
rido.
F u g i r a m os paulistas. D a p e r d a q u e e x p e r i m e n t a r a m n ã o se s o u b e . A q u e
tiveram os e m b o a b a s foi a d e p e r t o de oitenta, entre m o r t o s feridos, e e n t r e estes
dois "oficiais, u m alferes e o "capitão J o s é M a t o l , o q u a l r e c e b e u d u a s feridas,
u m a n a c a b e ç a , d e m e n o s c u i d a d o , e o u t r a no peito, q u e lhe passou a "espalda,
perigosa p a r a ele e d e s e n t i m e n t o p a r a todos, p o r q u e todos r e c o n h e c i a m q u e a
sua salvação e d e todas as M i n a s estivera n a q u e l e tal ou q u a l " a n t e m u r a l q u e a
sua atividade fez levantar. Dois ou três dias depois d a fugida dos paulistas, c h e g o u
a gente das M i n a s G e r a i s , q u e c o m apressada m a r c h a os s e g u i r a m a fim d e lhe
a l c a n ç a r e m a r e t a g u a r d a e os p i c a r e m nela; m a s , a c h a n d o nas passagens dos rios
240

as c a n o a s desfeitas e as pontes cortadas, v o l t a r a m e, a p o u c a d e t e n ç a neste distrito,


se e n c a m i n h a r a m p a r a o seu. A o m e s m o t e m p o , c h e g o u do R i o d e J a n e i r o , m a n -
d a d o p e l o g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e , u m "capitão de cavalos q u e ti-
n h a servido n a C o l ô n i a [do S a c r a m e n t o ] e dois g r a n a d e i r o s c o m u m caixão d e
g r a n a d a s , e n ã o foi p o u c a fortuna q u e chegasse este p e q u e n o socorro a t e m p o q u e
os paulistas t i n h a m desertado, q u e do c o n t r á r i o , c o m o os ditos t r a z i a m p a t r u l h a s
a v a n ç a d a s pelos c a m i n h o s , era infalível o cair-lhes nas m ã o s , e vistos os p e t r e c h o s ,
estava neles f o r m a d a e b e m p r o v a d a a culpa p a r a e x e c u t a r e m nos p o b r e s h o m e n s
as leis do seu refinado ódio.
P a s s a d a s estas tribulações, s e m p r e os â n i m o s d e m u i t o s m o r a d o r e s m e n o s
a r r a i g a d o s e m a i s imaginativos ficaram vacilantes, os quais, v e n d o - s e sem casas
e m q u e se r e c o l h e s s e m , d e t e r m i n a v a m [ir fazê-las] p a r a p a r t e o n d e estivessem
[ fl. 60v. ] m e n o s expostos e vivessem c o m mais sossego, o q u e n ã o custou / / p o u c o a ata-
l h a r , pela perniciosa c o n s e q ü ê n c i a q u e desta m u d a n ç a se seguia, c o m o era ficar a
p o v o a ç ã o quase deserta. E e m t e m p o d e tantos receios e p a r a os dissuadir d o seu
i n t e n t o c o m a l g u m m o d o d e s e g u r a n ç a , se d e t e r m i n o u , n a v a r g e m do p o r t o d a
Passagem, q u e é u m largo c a m p o sobre o rio das M o r t e s , fabricar u m a fortaleza
c a p a z d e assistirem nela m u i t o a sua v o n t a d e e seguros d e q u a l q u e r invasão, a n t e -
p o n d o - l h e s as conveniências q u e p e r d i a m das boas lavras destas m i n a s q u e c o m
t a n t o risco de v i d a t i n h a m defendido. C o m efeito, c o n d e s c e n d e r a m e pôs-se p o r
o b r a a fatura d a fortaleza, a q u a l o c a p i t ã o J o s é M a t o l , m e i o convalescido, foi
d e l i n e a r d e figura p e n t á g o n a .
N e s t e t e m p o , chegou u m "corpo de gente q u e saiu d o R i o das V e l h a s c o m
s o c o r r o a este R i o das M o r t e s , e v e n d o estes h o m e n s d e s v a n e c i d o o objeto q u e
a b a l o u d e tão longe se. ofereceram p a r a ajudar a o b r a d a dita fortaleza, e m q u e se
e m p r e g a r a m p o r alguns dias. E despedindo-se dois pedreiros q u e t r a z i a m consigo
c o m s u a s " r e c a m a r a s fundidas n o R i o das V e l h a s , os d e i x a r a m p a r a q u a n d o e
o n d e fosse necessário servirem-se deles. J á d e n t r o da dita fortaleza e s t a v a m bas-
tantes moradores quando correu voz que tinha vindo n o m e a d o o governador
A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e p a r a o ser das, M i n a s e S ã o P a u l o , p a r a o n d e j á t i n h a
s u b i d o . E c o m esta c e r t e z a sossegou t u d o , e o a r r a i a l se f o r m o u d e n o v o e se
povoou como dantes.
Seguiu-se o t e m p o , e estes m o r a d o r e s v i v e n d o n a sua t r a n q ü i l i d a d e e nela
t r a t a n d o das suas conveniências, q u a n d o , e m s e t e m b r o de 1 7 1 1 , veio u m a carta
d o " g o v e r n a d o r , q u e se a c h a v a nas M i n a s G e r a i s , a u m D a m i ã o d e O l i v e i r a
"capitão m a n d a n t e d e u m dos terços do R i o d e J a n e i r o , q u e depois subiu a "mes-
tre-de-campo desta comarca, a quem o mesmo governador Antônio de
A l b u q u e r q u e t i n h a posto neste distrito p o r " s u p e r i n t e n d e n t e dele —, n a qual lhe
dizia q u e u m a inimiga e s q u a d r a francesa t i n h a e n t r a d o à b a r r a do R i o d e J a n e i r o
[ fl. 61 ] e p r e t e n d i a descer / / abaixo c o m a gente das M i n a s e m socorro d a q u e l a p r a ç a ,
p a r a o q u e lhe o r d e n a v a puxasse pela gente q u e mais pudesse, e c o m toda brevi-
241

d a d e possível o fosse e s p e r a r n a B o r d a d o C a m p o , p a r a o n d e ele, " g o v e r n a d o r ,


havia m a r c h a r c o m a gente das M i n a s Gerais. Manifesta a carta, todos aqueles a
q u e m o b r i o fez t r a z e r à m e m ó r i a o q u a n t o é d e c o r o s o m o r r e r p e l a p á t r i a se
ofereceram logo p a r a a tal expedição, e prestes sem d e m o r a os q u e h a v i a m m a r -
c h a r , q u e n ã o f o r a m p o u c o s , a respeito do que p e r m i t i a m as p e q u e n a s povoações
deste R i o das M o r t e s . E c o m seus escravos a r m a d o s p u x o u p o r eles o dito D a m i ã o
d e Oliveira e se pôs a c a m i n h o p a r a o n d e o d e t e r m i n a v a a o r d e m . J á p e r t o d a
B o r d a do C a m p o , se e n c o n t r o u c o m a r e t a g u a r d a o g o v e r n a d o r , q u e descia c o m a
gente das M i n a s Gerais. C h e g a d o s ao posto e m q u e h a v i a m fazer alto, se dilatou
nele o g o v e r n a d o r u m dia, e s p e r a n d o pela gente d o R i o das V e l h a s , e j u n t o s os d e
u m a s e outras m i n a s fez r e s e n h a de todos, e fazendo-lhes s u a fala a c a b o u d i z e n d o
q u e esperava o b r a s s e m c o m o d e v i a m , o q u e m u i t o lhes r e c o m e n d a v a . P o s t a d e
p a r t e esta diligência, o r d e n o u a forma d a m a r c h a p a r a o c a m i n h o . E assim a b a l a n -
do do C a m p o , c o m p a n h i a p o r c o m p a n h i a , e n t r a r a m n o m a t o .
Depois d e os paulistas s e r e m r e c h a ç a d o s pelos e m b o a b a s deste R i o das M o r -
tes, notícia q u e o g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e r e c e b e u c o m gosto, p o r
assim ver c a s t i g a d o o a t r e v i m e n t o c o m q u e d e s p r e z a v a m as suas a d v e r t ê n c i a s ,
s e m p r e o dito g o v e r n a d o r m o s t r o u a estes seu a g r a d o , e m u i t o mais e m esta oca-
sião da descida p a r a o R i o d e J a n e i r o , a g r a d e c e n d o - l h e s a p r o n t i d ã o q u e d e m u i -
tos n ã o t i n h a e x p e r i m e n t a d o nas M i n a s Gerais. E recebendo-se depois destas ações
u m a c a r t a p o r "alvará de l e m b r a n ç a , q u e está l a n ç a d a n o livro p r i m e i r o do regis-
tro d a C â m a r a , à folha trinta, verso, p o r q u e Sua M a j e s t a d e foi servido p o r grati-
ficação h o n r a r este distrito, dizendo nela aos "oficiais da C â m a r a do R i o das M o r -
tes, q u e a i n d a n ã o havia, m e r c ê a l c a n ç a d a p e l a p a r t e q u e / / 0 dito g o v e r n a d o r [ fl. 61v. ]
deu destes m o r a d o r e s , d e q u e entre os mais fazia opinião, c o m o d o dito alvará se
colhe.
E m princípio d o mês de d e z e m b r o de 1713, entrou neste arraial o g o v e r n a d o r
d o m Brás Baltasar d a Silveira, que veio suceder a Antônio de A l b u q u e r q u e d e C a r -
valho no governo de São Paulo e Minas. E a c h a n d o j á nele p o r primeiro "ouvidor-
geral a o " d e s e m b a r g a d o r G o n ç a l o d e Freitas B a r a c h o lhe o r d e n o u q u e fizesse
"pelouros c formasse a C â m a r a desta vila, a q u e deu o título d e S ã o J o ã o del-Rei,
cujo auto de levantamento foi e m oito do dito m ê s e a n o , e acha-se lavrado no livro
p r i m e i r o d o registro desta C â m a r a , à folha 3 7 , assinado p e l o dito g o v e r n a d o r e
ouvidor. C r i a d a a dita vila c o m a sua governança, se passou p a r a as M i n a s Gerais, a
q u e m , d e p o i s d o seu t e m p o , veio s u c e d e r o c o n d e d e A s s u m a r , d o m P e d r o d e
Almeida Portugal, que, vindo d e São Paulo, passou p a r a esta vila e foi assistir nas
M i n a s Gerais. A este g o v e r n a d o r fizeram os m o r a d o r e s d a o u t r a p a r t e do rio das
M o r t e s vários requerimentos p a r a q u e criasse e m vila ao Arraial V e l h o , a q u e defe-
riu, o r d e n a n d o ao doutor ouvidor-geral, q u e então era Valério d a Costa Gouveia,
p a r a eleger a C â m a r a d a vila, a q u e se deu o n o m e d e São J o s é . E p o r este se a c h a r
molesto e. impedido, foi o "juiz ordinário desta vila d e São J o ã o del-Rei o "coronel
242

Antônio de Oliveira Leitão c o m o *ouvidor-geral erigir a vila de São J o s é , e m vinte


e oito d e j a n e i r o d o a n o d e 1718. C o n t r a este " g o v e r n a d o r , n o a n o d e 1720, se
sublevaram os povos do O u r o Preto, e o p u s e r a m e m tal consternação q u e escreveu
a o dito ouvidor Valério da Costa Gouveia p a r a q u e palpasse os ânimos destes m o -
radores se p o r i a m dúvida e m o receber, p o r q u e ele estava d e t e r m i n a d o a retirar-se.
p a r a este distrito caso que aquela alteração n ã o sossegasse, A resposta q u e teve foi
q u e n ã o só o receberiam m a s se fosse necessário se p o r i a m a c a m i n h o p a r a irem
assistir a Sua Senhoria, afeto ê deliberação a que, depois de a p a g a d o aquele incên-
dio tumultuoso, respondeu c o m u m a carta cheia de aggra, *inquam, cheia d e agrade-
cimentos a todos e a c a d a u m e m particular, escrita e m Vila Rica e m 10 d e agosto d e
1720, e acha-se no livro segundo do registro da C â m a r a , à folha 7 3 .
[ fl. 62v. ] C o m este. e s e m e l h a n t e s p r o c e d i m e n t o s se s o u b e r a m os m o r a d o r e s do R i o
das M o r t e s distinguir, seguindo s e m p r e a p a r t e de seus g o v e r n a d o r e s , o b e d e c e n -
do às suas ordens c o m o do s o b e r a n o , d e o n d e e m a n a m , c o n f o r m a n d o - s e e m t u d o
c o m as suas d e t e r m i n a ç õ e s , a q u e n e m eles, n e m p o r seus p r o c u r a d o r e s , q u e m u i -
tas vezes se a c h a r a m em 'juntas na presença dos tais governadores, j a m a i s i m p u g -
n a r a m n e m m o v e r a m a m e n o r dúvida, e de n e n h u m a sprte a c o b r a n ç a dos reais
"quintos, q u e aceitaram p o r "bateias no governo d e d o m Brás Baltasar da Silveira
(de q u e foi p r o v e d o r p a r a c o b r a n ç a deles o q u e escreveu este. p a p e l , p o r provimento
do dito governador e do c o n d e d o m Pedro de Almeida). C o m o t a m b é m estiveram
pela C a s a de Fundição q u e nesta vila estabeleceu o g o v e r n a d o r d o m L o u r e n ç o de
Almeida e ultimamente, pela "capitação, q u e de presente p a g a m obedientes e c o m o
5

p o d e m , e n ã o m e n o s se singularizaram e m todos os tempos n o respeito e atenções a


seus ministros.

E s t ã o n a r r a d a s todas as tragédias, casos acontecidos e ações executadas neste


distrito e arraial, hoje vila d e São J o ã o del-Rei, desde o seu principio até. o gover-
n o do c o n d e d o m P e d r o , segundo, os vislumbres q u e a i n d a existem n a m e m ó r i a
d e q u e m este escreveu, t u d o e o mais q u e fica dito até o p r e s e n t e d e d u z i d o p o r
a q u e l a o r d e m e n a m e l h o r f o r m a q u e seu l i m i t a d o t a l e n t o o s o u b e escrever e
:

tosco estilo expressar.


• 9 <

[Notícias do descobrimento das minas de ouro


e dos governos políticos nelas havidos]

Notícia de forasteiro que chega ao Rio de Janeiro em 1692


e viaja para Minas por volta, de 1.698, com ênfase, nos principais
descobrimentos e descobridores, n a mobilidade geográfica da
população, n a carestia e crises de abastecimento nas Minas e
nos caminhos, nos conflitos entre paulistas e rcinóis n a região de
O u r o Preto e Mariana, n a atuação de autoridades e governado-
res, incluindo Martinho de Mendonça de Pina e de Proença, e
nos efeitos e reação contra a implantação dá capitação, e m 1736,
associada a decadência e crise econômica.
O relato parece ter sido encomendado pelo ouvidor Gaeta-
n o da Costa Matoso, nos primeiros anos de sua atuação como
ouvidor de Vda Rica (1749-52), a antigo morador capaz de tes-
temunhar sobre a ocupação do território das Minas Gerais. O
interesse em reunir' notícias sobre o povoamento de Minas Ge-
rais, seja por exigências do cargo ou pelo seu perfil intelectual,
coincide com o falecimento dos remanescentes dos primeiros
povoadores de Minas e a fixação de suas.reminiscências sob a
forma escrita, colecionadas por particulares.
Autoria, l o c a l e data: Anônimo; Minas Gerais; ca. 1750.
U s o n a h i s t o r i o g r a f i a : Afonso de E: T a t m a y emprega
este documento para corroborar a data da descoberta das pri-
meiras minas no sertão de São Paulo (História geral das bandei-
ras paulistas. São Paulo: Imprensa Oficial, Museu Paulista, 1948.
V. 9, p. 87) e p a r a descrever os primeiros trabalhos de minera-
ção no ribeirão do C a r m o (v. 9, p. 120-122). Dentre outros docu-
mentos da série de relatos presente neste Códice que mencionam
os conflitos entre paulistas e reinóis, Afonso de E. T a u n a y obtém
neste documento matéria para sua reconstituição das descrições
e episódios da G u e r r a dos Emboabas^ o caráter dos persona-
gens, suas principais ações, as atitudes dos líderes emboabas, as
reações cios paulistas, o procedimento dos governadores envolvi-
dos, a história da fundação de vilas e diversas biografias (v. 9, p .
449-641 e, ainda que muito menos freqüente, 1949, v. 10, p. 3 -
234).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato em forma epistolar e na
primeira pessoa do singular, antecedido por u m a protestação e
com aplicação das tópicas da animosidade dos paulistas e da
244

atuação da divina providência, distribuindo prêmios e castigos,


evidenciando a vontade de Deus escolásticamente inscrita n a or-
dem das coisas e profeticamente figurada nos fatos e n a nature-
za. N a variação da versão do episódio da chegada do governa-
dor Antônio de Albuquerque a Minas e de seu encontro com
Manuel Nunes Viana (ver documento 7), b e m como n a atribui-
ção de atitudes ardilosas às personagens do conde de Assumar e
de Martinho de Mendonça de Pina e de Proença, provavelmente
se apropria de dados da murmuração local objetivando produzir
efeitos de vituperação das personagens segundo a voz de interes-
ses feridos que se fazem representar, anônima e coletivamente,
através do narrador, JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , bastarda
do século X V I I I , bastante personalizada. M e r e c e m registro a
forma especial: do conectivo " e " sempre redondo, em módulo
maior que a escrita; o "t" e o "1" minúsculos em dois traços que
formam ângulo agudo no ápice; o " h " igual ao " E " redondo; o
" f minúsculo com traço horizontal em meia voluta, que se acopla
à letra seguinte; uso do " s " c a u d a d o , simples ou duplo (neste
caso, o segundo " s " é pendente, na forma de simples vírgula).
Uso normal de abreviaturas em nomes próprios e comuns; desta-
ca-se, no entanto, abreviatura especial de "camas", com o " G "
em m ó d u l o grande, ultrapassando a linha d a escrita, com as
letras "as' inclusas. (YDL)
Cópia impressa:
TAUNAYj. Afonso de E. Documentos inéditos sobre as primei-
ras descobertas do ouro e m Minas Gerais. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 44, p . 362-
365, 1948.

[ fl. 64 ] M e u senhor,

Protesto q u e no q u e nesta escrita falar n ã o é m i n h a v o n t a d e


o f e n d e r a D e u s n e m ao p r ó x i m o , e c o m o n ã o s o u v e r b o s o n ã o
direi coisa c o m a l i n h o . Vossa M e r c ê lha e m e n d a r á e r e l e v a r á o
q u e for m a l s o a n t e , q u e o faço o b r i g a d o d a o b e d i ê n c i a , e p a r a
enfiar o q u e t o s c a m e n t e disser. C o m e ç o p e l a m i n h a c h e g a d a a o
R i o d e J a n e i r o , q u e foi e m m a r ç o de 1692, t e m p o q u e teria vinte.

N a q u e l e t e m p o e r a m u i t o limitado o R i o d e J a n e i r o ; n e m h a v i a notícia de
m i n a s mais q u e u m a limitação e m P a r a n a g u á , p o r t o d e m a r , abaixo de Santos, e
245

q u e m d o negócio trazia d e lá c e m "oitavas v i n h a rico. M a s isso era j á feito e m


obras.
D a í a cinco ou seis anos se publicou q u e os paulistas u n h a m descoberto m u i -
to o u r o o n d e c h a m a v a m os Cataguases, m a s q u e era ouro b r a v o (a q u e c h a m a -
v a m o u r o m u l a t o , q u e é ouro preto), e c o m o depois d e fundido se fazia e m p e d a -
ços, pelo n ã o s a b e r e m o dosar, o v e n d i a m os paulistas a p r e ç o d e cinco *tostões e
a 640 ["réis], q u e assim o d a v a m e m seus p a g a m e n t o s , d o n d e ficou c h a m a r - s e
a i n d a hoje a u m " q u a r t o "meia p a t a c a .
C o m esta notícia d e grandezas, quis logo vir às M i n a s , m a s n ã o o fiz p o r falta
de m a n t i m e n t o s nos caminhos e c a m a , de q u e m o r r i a muita gente, o q u e consegui
e m c o m p a n h i a d e A n t ô n i o R o d r i g u e s d e Sousa, p a r t i n d o d o R i o d e J a n e i r o e m
m a r ç o de 1698 ou 1699. E c h e g a m o s a 12 de j u l h o do dito a n o , c o m viagem d e
alguns dois meses, pela g r a n d e aspereza dos c a m i n h o s , t e m p o e m q u e se estava
esperando " g u a r d a - m o r p a r a se repartir o ribeirão do C a r m o , e p o r o r d e m ou co-
missão d o g u a r d a - m o r geral veio M a n u e l L o p e s de M e d e i r o s , e se r e p a r t i u e m
s e t e m b r o d o dito a n o , p a r a o q u e se t i n h a d e s p e j a d o d e g e n t e o O u r o P r e t o e
A n t ô n i o Dias e o P a d r e Faria.. E era tal a falta de m a n t i m e n t o s q u e se v e n d i a no
Ribeirão u m "alqueire d e milho p o r vinte "oitavas, e de farinha p o r 32, e d e feijão
por .32, u m a galinha por 12 oitavas, u m cachorrinho ou gatinho, 32, u m a "vara d e
fumo, 5 oitavas, u m p r a t o p e q u e n o d e estanho cheio d e sal p o r 8, e t u d o o mais à
este respeito, p o r cuja causa e fome m o r r e u muito "gentio, / / " t a p a n h u n o s e "carijós, [ fl. 64v. ]
p o r c o m e r e m bichos de taquara, q u e p a r a os comer é necessário estar u m tacho no
fogo b e m quente, e ali os v ã o b o t a n d o ; os q u e estão vivos logo b o l e m c o m a q u e n -
t u r a e são os bons, e se se c o m e algum q u e esteja m o r t o é v e n e n o refinado.
R e p a r t i d o q u e foi o R i b e i r ã o , c o m o se n ã o p o d i a tirar o u r o c o m facilidade,
desertou a m a i o r p a r t e da gente p a r a O u r o P r e t o e A n t ô n i o Dias e P a d r e Faria,
p o r q u e nesse t e m p o ficou tudo deserto, e só j u n t o d o n d e é hoje a igreja estava u m
r a n c h o e outros o n d e é, hoje a de A n t ô n i o Dias. E logo se descobriu o ribeiro d e
A n t ô n i o Pereira Dias, filho de Parati, e o B r u m a d o do S u m i d o u r o , p o r J o ã o Pedroso,
paulista; o que c h a m a m o R o c h a , p o r A m a r o d a R o c h a , paulista; o Pinheiro, p o r
M a r c e l o Pinheiro, paulista; este Itacolomi ou G u a l a x o , p o r J o ã o de M e l o , paulista;
o ribeirão d o C a r m o , p o r João Lopes d e L i m a , paulista; São Bartolomeu, p o r Dionísio
d a Costa, de Santos; O u r o Preto, n ã o sei q u e m foi; Antônio Dias, p o r u m Antônio
Dias, q u e depois descobriu o outro corgo do m e s m o n o m e a q u e c h a m a m o Colé-
gio; Bento Rodrigues, u m t a u b a t e a n o do m e s m o n o m e ; o Inficionado, Sebastião de
Siqueira e o coronel J o ã o da Veiga. E se foram seguindo S a b a r a b u ç u , q u e [é] hoje
o S a b a r á , e todos os mais, advertindo q u e o Ribeirão se descobriu e repartiu desde
o M a t a c a v a i o s , digo, a b a r r a até o córrego dos M o n s u s . E t o c a n d o - n o s a m i m e
A n t ô n i o R o d r i g u e s d e Sousa e outros c a m a r a d a s as nossas "datas o n d e lavrou o
246

defunto D o m i n g o s Pinto, nos M o n s u s , as n ã o quisemos ver p o r dizer e r a m n a capi-


tania do Espírito Santo. E depois foi descobrindo t o d o o R i b e i r ã o , q u e f o r a m as
melhores minas q u e houve n e m h á de haver.
E u fiz q u a t r o viagens a estas M i n a s , e m q u e gastei alguns três anos p e l a difi-
c u l d a d e d o c a m i n h o , e v i m a ficar cá e m 1702, e e m t o d o este t e m p o n ã o se
p r e s u m i a haver o u r o no rio das Mortes, só .sim m o r a v a ali u m paulista p o r n o m e
[ fl. Ç5 ] T o m é Portes, q u e v e n d i a m a n t i m e n t o s aos / / passageiros e era o s e n h o r da c a n o a
d e p a s s a g e m , e depois q u e suas a m a s e pajens o m a t a r a m , se descobriu ouro c o m
grandeza.
A J u s t i ç a q u e naqueles t e m p o s havia era o * g u a r d a - m o r substituto, o "mes-
t r e - d e - c a m p o D o m i n g o s da Silva B u e n o , q u e a presente, se é a i n d a vivo, é clérigo
nestas M i n a s , h o m e m sem d ú v i d a b e n e m é r i t o d e g r a n d e s e m p r e g o s , m a s n a q u e l e
t e m p o m a l se p o d i a ser j u i z c o m tais " m o r d o m o s , pois n ã o se e x e c u t a v a m suas
ordens. E p a r a a b o n o ou clareza disto, logo q u a n d o viemos, c o m p r o u u m p o b r e
u m c a p a d o p o r c e m "oitavas de o u r o p a r a seu negócio, e antes d e o m a t a r a n d a -
r a m mais ligeiros os escravos de u m paulista p o r n o m e P e d r o d e M o r a i s . E quei-
xando-se o d o n o do c a p a d o a o dito paulista, lhe r e s p o n d e u q u e se ele, s e n h o r do
c a p a d o , justificasse e m c o m o os seus escravos o t i n h a m m o r t o , o p a g a r i a . Fez o
p o b r e d o h o m e m sua justificação p e r a n t e o g u a r d a - m o r [ v e r b a l m e n t e ? ] , o q u a l
m a n d o u se pagasse o dito furto. E i n d o o pobre, a pedir-lhe, as ditas c e m oitavas de
o u r o , lhe r e s p o n d e u q u e q u a n d o disse q u e justificasse fora só p o r ter u m a d e m a n -
d a c o m ele. Assim ficaram até hoje.
O p r i m e i r o "ministro de J u s t i ç a q u e a Majestade d p s e n h o r rei d o m P e d r o ,
d e s a u d o s a m e m ó r i a , m a n d o u a estas M i n a s p o r " s u p e r i n t e n d e n t e foi o d o u t o r
J o s é V a z P i n t o , q u e tinha a c a b a d o de ouvidor no R i o d e J a n e i r o . E j á c o m "beca
d e " d e s e m b a r g a d o r chegou, c o m efeito, ao S a b a r á , n a R o ç a G r a n d e , o n d e assis-
tiu alguns t e m p o s . E c o m o antes disto havia e era p r o i b i d o v i r e m "comboios d a
Bahia, exceto g a d o dos Currais, com p e n a de [confisco?], aqueles paulistas de mais
suposição q u e t i n h a m esta i n c u m b ê n c i a p a r a confiscar m e t i a m a uns p a r a d e n t r o
livres e outros e r a m confiscados, e logo ali repartiam as fazendas c o m os seus solda-
dos. E q u e r e n d o o dito ministro t o m a r c o n h e c i m e n t o disto, e outras [coisas], se
c o m e ç a r a m ã r e m e x e r os paulistas, d e sorte q u e o b o m d o u t o r anoiteceu ali m a s n ã o
[ fl. 65v. ] a m a n h e c e u . / / E lhe valeu muito u m paulista, seu amigo, q u e c o m gente e armas o
levou até G u a r a t i n g u e t á .
C o m e ç o u o "levante c o n t r a os paulistas e m o u t u b r o d e 1708 e d u r o u mais
d e u m a n o . E c o m o h a v i a notícia de q u e eles q u e r i a m vir t o m a r v i n g a n ç a das
M i n a s , foi preciso aos m o r a d o r e s do R i b e i r ã o fazerem sua "estacada e a n d a r e m
s e m p r e c o m r o n d a s e vigilância. O s do O u r o P r e t o retiraram-se p a r a a C a c h o e i r a
do C a m p o , o n d e fizeram seu r e d u t o o u fortaleza, q u e n ã o d e u p e q u e n a p e r d a
esta m u d a n ç a .
247

E s t a n d o isto nestes termos e haver j á algumas c o n t e n d a s entre M a n u e l N u n e s


V i a n a e outros mais possantes, se resolveu d o m F e r n a n d o , g o v e r n a d o r do R i o d e
J a n e i r o , a vir às M i n a s a p a z i g u a r ou castigar ós d e l i n q ü e n t e s d o "levante. V e i o
pelo R i o das M o r t e s , d a n d o satisfação aos paulistas q u e havia d e castigar. E cor-
r e n d o este b o a t o p o r cá, p a r t i u u m b o m p é de exército a t o m a r - l h e o p a s s o , d o n d e
se t o r n o u p a r a o R i o d e J a n e i r o .
A este governo Veio render Antônio d e A l b u q u e r q u e , o qual, sendo informado
destas, coisas, proibiu a que n ã o partisse n e m viesse n i n g u é m p a r a as Minas; m a n -
dou c a n t a r u m a missa a Nossa S e n h o r a d o Pilar e se pôs a c a m i n h o c o m 12 h o m e n s ,
a q u e m c h a m a v a c o m p a n h e i r o s , e p e n e t r o u as M i n a s até o Sabará, sem ser sentido,
o n d e assistia o g o v e r n a d o r M a n u e l N u n e s Viana, o n d e teve c o m ele suas congratu-
lações; e segurando-lhe os bons ofícios q u e havia d e fazer c o m Sua Majestade pela
sujeição dos paulistas, tão desejada do dito m o n a r c a , que, m a n d a n d o naqueles prin-
cípios várias c o m p a n h i a s de infantaria p a r a g u a r n i ç ã o d a q u e l a p r a ç a d o R i o d e
J a n e i r o , se lhe fez queixa q u e os soldados d e s a m p a r a v a m a p r a ç a e fugiam p a r a a
serra, assim d i z e m q u e r e s p o n d e r a o dito senhor q u e os deixassem ir p o r q u e n ã o
estavam perdidos.
E depois d e o dito A l b u q u e r q u e dispor as coisas necessárias / / a m e l h o r gover- [ fl. 66 ]
n o , se partiu p a r a este Ribeirão; e dispostas as coisas mais precisas, se p ô s a c a m i n h o
p a r a São Paulo a a c o m o d a r os paulistas, c o m os quais encontrou e m G u a r a t i n g u e t á ,
c o m o seu general A m a d o r Bueno da Veiga, e não os p ô d e reduzir a q u e voltassem,
m a s , antes, entre si c o m e ç a r a m a falar pela "língua da terra q u e m e l h o r era matá-lo.
M a s c o m o o dito [Albuquerque] t i n h a estado e m o M a r a n h ã o e sabia m u i t o b e m a
língua, lhes disse fácil era m a t a r u m h o m e m , m a s q u e esperassem a revolta. E c o m o
t i n h a m os paulistas t o m a d o os caminhos das Minas, foi forçoso b o t a r c o m g r a n d e
pressa n o P i o d e J a n e i r o aviso p a r a se acudir c o m aviso ao R i o das M o r t e s , q u e
e r a m os q u e primeiro haviam de sentir o golpe. Foi ó aviso tão veloz q u e q u a n d o
eles estavam e m meio c a m i n h o já o aviso estava no R i o das M o r t e s , q u e tiveram
t e m p o d e fabricar u m a fortaleza e m que. lhes resistiram. E vendo [os paulistas] q u e
n ã o faziam coisa de proveito e r e c e a n d o o socorro das Gerais, se foram mais q u e
depressa fazendo as insolencias que p o d i a m . E o A l b u q u e r q u e b r e v e m e n t e t o r n o u
p a r a as M i n a s , o n d e fez vilas, até q u e foi acudir a invasão dos franceses ao R i o de
J a n e i r o , e depois t o r n o u .
D o m Brás Baltasar da Silveira foi " g o v e r n a d o r m u i t o a m a d o d o p o v o . A t é
q u e veio d o m P e d r o , c o n d e d e A s s u m a r . E no " l e v a n t a m e n t o q u e h ú u v e c o n t r a
ele, se h o u v e tão astuto q u e , p a r a q u e b r a r o p e r d ã o geral q u e d e u , se v a l e u d a
traça de o q u e b r a r e p r e n d e r "clérigos, e frades, e "ouvidor, e seculares, e a r r a s a r
e q u e i m a r casas, e arrastar Filipe dos Santos pelas ruas, e enforcar, e esquartejar.
V e i o o s e n h o r d o m L o u r e n ç o de A l m e i d a , q u e foi o t e m p o m a i s feliz q u e
t i v e r a m as M i n a s , p o r q u e corria o o u r o e m p ó a 1.320 ["réis a " o i t a v a ] , m u i t a
" m o e d a e "dobrões de o u r o , e m u i t a p r a t a e cobre. / / M a s atrás d a b o n a n ç a veio [ fl. 66v. ]
248

a t o r m e n t a , p o r q u e veio o s e n h o r c o n d e das Galveias. E c o m o o j u s t o L o t , 1


o
m a n d o u D e u s e a M a j e s t a d e retirar p o r n ã o ver a b r a s a r e m - s e as M i n a s n o incên-
dio c m q u e as p ô s o servo e açoite d e D e u s , M a r t i n h o d e M e n d o n ç a .
E n o mais de governos políticos e civis e eclesiásticos, só V o s s a M e r c ê p o d e
d a r v e r d a d e i r a i n f o r m a ç ã o , c o m o p a l a c i a n o e ciente, q u e eu n ã o m e esquece o
dito d o ciente escritor A n t ô n i o d e Sousa d e M a c e d o , 2 o n d e diz q u e o rei e m o n a r -
ca é Sol q u e alumia, influi no seu reino, m a s q u e se n ã o h á d e c h e g a r t a n t o a ele
q u e se a b r a s e , n e m tão l o n g e q u e se gele. P o b r e s e miseráveis M i n a s q u e , p o r
mais q u e c l a m e m o s , n ã o são ouvidos tantos gemidos. D e u s , s o b r e t u d o .

> 10 «

[Informação das antiguidades da Cidade Mariana]

História da Cidade Mariana, introduzida pela indicação


de coordenadas geográficas e descrição física do sítio. Fornece
dados sobre estrutura administrativa, criação do bispado de
Mariana, igrejas, capelas e seminário, demografia e tributação,
englobando fatos desde o descobrimento de ouro no ribeirão do
Carmo, em data imprecisa, no final do século X V I I , ao reinado
de dom José, iniciado em 1750. Adaptada à realidade colonial,
corporifica informação semelhante aos inquéritos promovidos
em Portugal pela Academia Real de História Portuguesa, a par-
tir de 1721, com recolhimento de dados de fontes autênticas e
marcados pela objetividade.

Lot, personagem bíblico (Gênese, 19:1-29). Socloma, lugar habitado por ímpios perante Deus, havia
sido salva, certa feita, da destruição divina por intervenção de Abrão, tio de Lot, que o queria
preservar. Veio, porem, o dia em que Deus resolveu destruir aquela terra de ímpios. Mas, para
preservar Ix)t, único habitante daquelelugar justo perante Deus, mandou dois anjos para avisá-lo de
que saísse a tempo de salvar-stí da destruição. Os anjos avisaram a Lot c sua esposa que enquanto
saíssem não deviam olhar para a cidade em destruição. Deus, então, fez cair sobre Sodoma e
Gomorrá uma chuva de fogo e de enxofre. Mas enquanto fugia, a esposa de Lot olhou para trás t

descumprindo o que lhe haviam dito os anjos e, em castigo, foi transformada numa coluna de sal.
O trecho citado encontra-se nã obra Eva e Ave ou Maria biunfante [...]. Primeira e segunda partes.
Lisboa Ocidental: Antônio Craesbeeck de Mello, 1676. p. 179.
249

D o c u m e n t o redigido a partir de dados obtidos j u n t o aos


relatos e notícias coligidos no Códice, aos livros do Senado d a
C â m a r a de M a r i a n a , em especial o livro hoje pertencente ao
A H M I , CSM, r e i 02, e obsevação direta, com lacunas de dados
de difícil acesso. Pode ter sido elaborado para referendar pare-
cer sobre o rendimento do bispado de Mariana, a cargo de Cae-
tano da Costa Matoso. O interesse do ouvidor em reunir relatos
sobre o povoamento de Minas Gerais, seja p o r exigências do
cargo ou por seu perfil intelectual, denota seu objetivo de formar
u m a 'coleção', ou seja, "ajuntamento; coleção de várias coisas
que se tem lido e anotado".
A u t o r i a , l o c a l e data: C a e t a n o da Costa M a t o s a ;
Mariana; ca. 1750.
U s o n a historiografia: José Ferreira Carrato encontra neste
documento informações sobre a forma de organização do Semi-
nário de Nossa Senhora d a Boa Morte, nos moldes dos colégios
da Companhia de Jesus (Igreja, Iluminismo e escolas mineiras coloni-
ais: notas sobre a cultura da decadência mineira setecentista. São
Paulo: Nacional, Edusp, 1968. p. 106-107). Charles Boxer utiliza-
o para demonstrar os danos das atividades agrícolas e mineradoras
ao meio ambiente (A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento
de u m a sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969. p.
60) e a pacificação de Minas Gerais por Antônio de Albuquerque
(p. 99). O testemunho desse documento a m p a r a Valdemar de
Almeida Barbosa na afirmação da prioridade de J o ã o Lopes de
Lima n a descoberta do Ribeirão do C a r m o (História de Minas.
Belo Horizonte: Comunicação, 1979. V. 1, p. 101 e Dicionário
histârico-geográfir-0 de Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1995.
p. 195). Donald Ramos baseia-se no documento p a r a discutir o
abastecimento e os caminhos (A social history of Ouro Preto; stresses
of dynamic urbanization in colonial Brazil, 1695-1726. Gainesville:
University of Florida, 1972. p . 25), movimentos migratórios dos
mineradores (p. 30) e conflitos da Guerra dos Emboabas (p. 98).

Aspectos discursivos: Por acumulação e detalhamento


de itens, o texto se constitui como descrição elogiosa da Cidade
M a r i a n a , com aplicação de diversas tópicas: tópicas clássicas
do locus amenus ("lugar ameno"), da natureza inóspita e da pre-
c a r i e d a d e m a t e r i a l dos p r i m e i r o s a n o s d a m i n e r a ç ã o e
encomiásticas louvando sobretudo a lealdade dos habitantes da
Cidade. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna bastarda do
século XVIII, cursiva e bastante personalizada. Presença do " d "
do tipo uncial, do "s" pendente com haste prolongada à esquerda
em meia voluta, do "y" nos ditongos, com valor da semivogal. As
hastes inferiores são duplas, em formato de forquilha. Uso nor-
mal de abreviaturas, entre as quais se destaca o sufixo "to", q u a n d o
250

sobreposto, em movimento rodado, muito rápido, constituindo


u m a ligatura. O sinal de abreviatura, aparentemente o til, é for-
m a d a em laçada {aproximando-se do "e"). G r u p o "st" em ligatura.
Fólios 70-70v, 72v.-73v. mudança de tinta e possivelmente de pena,,
alterando pouco o traçado da letra, que pode ser identificada como
a de Caetano da Costa Matoso. (YDL)

[ íl. 67 ] t stá o R i b e i r ã o d o C a r m o , hoje C i d a d e M a r i a n a , a o sul d a equinocial e m


T~\ 20 graus e 2 4 m i n u t o s d e latitude è 340 graus e 15 m i n u t o s d e longitude,
-M.—^contando esta do m e r i d i a n o d a ilha do F e r r o , pela estimação q u e lhe de-
r a m os m a t e m á t i c o s antigos e a p r o v a d a pelos r e v e r e n d o s p a d r e s D i o g o S o a r e s e
D o m i n g o s C a p a c i , d a C o m p a n h i a de J e s u s , q u a n d o , p o r o r d e m d e S u a Majestade,
v i e r a m observar as alturas dos lugares das costas do m a r e continente d o Brasil no
a n o d e [incompleto].
Saindo-se do R i o d e J a n e i r o pelo c a m i n h o q u e h á d e p r e s e n t e p a r a a dita
c i d a d e , se a p a r t a a " d e r r o t a do m e r i d i a n o do lugar d a p a r t i d a , pelo q u a r t o círculo
d a r e d u ç ã o , 3 graus,, p o u c o mais ou m e n o s , t o m a n d o - s e p o r diferentes r u m o s , p o r
c a u s a das serras, m o n t e s e rios, c o m distância d e 74 "léguas, v i n d o a d e m o r a r - s e o
R i o d e J a n e i r o p o r linha reta a o r u m o do sueste, c o m 3 g r a u s e 14 m i n u t o s d e
leste, e m r a z ã o d e estar aquele p o r t o e m 23 graus d e latitude ao sul e .342 graus e
22 m i n u t o s d e longitude, s egundo a dita estimação o u fantasia antiga.
E a q u e l a n o v a c i d a d e m u i t o a l e g r e e a p r a z í v e l , d e s c o b e r t a dos m o n t e s e
serras, q u e suposto c o r r e m e m seu circuito é e m distância de m e i a légua, d e sorte
q u e a d e i x a m e m u m vale vistoso.
[ íl. 67v. ] A p a r t e d o n a s c e n t e e p o e n t e c o r r e m dois p e q u e n o s rios, vertentes das mes-
m a s serras, q u e n a falda d a C i d a d e [ M a r i a n a ] fazem b a r r a c o m o c e l e b r a d o R i -
b e i r ã o . Este se e s p r a i a , e m t e m p o d e secas, e m u m a l a r g u í s s i m a e b e l a p r a i a ;
q u a n d o n a estação das chuvas, é u m dos mais soberbos e a b u n d a n t e d e águas q u e
t e m todas as M i n a s , áo m e s m o passo q u e suas principais cabeceiras, q u e são õs
m o r r o s de Vila Rica, distam somente d a C i d a d e duas léguas.
O clima é ú m i d o e q u e n t e , e p o r isso m u i t o saudável, e nele p r e v a l e c e m as
idades largos anos,
Foi este sítio d e s c o b e r t o n o m e s m o t e m p o e m q u e se p r i n c i p i o u a e x t r a i r
o u r o n o m o r r o do P a d r e F a r i a , è m Vila R i c a . S e u d e s c o b r i d o r foi u m paulista
c h a m a d o J o ã o L o p e s d e L i m a , assistente n o dito m o r r o , que, e m b a n d e i r a d o c o m
o u t r o s d e s c o b r i d o r e s , desceu a o ta l r i b e i r ã o , c o m q u a t r o dias d e j o r n a d a (que.
t a n t o e r a m necessários n a q u e l e t e m p o , p o r causa dos g r a n d e s m a t o s q u e i m p e d i -
a m a certeza e b r e v i d a d e do c a m i n h o , s e n d o q u e depois a freqüência dos v i a n -
d a n t e s o p u s e r a m t ã o c ô m o d o e breve, q u e e m m e n o s d e d u a s h o r a s se v e n c e m
[ íl. .68 ] hoje as p e q u e n a s duas léguas q u e distam Vila R i c a / / d a C i d a d e . M a r i a n a ) .
251

Conseguido o descoberto do ribeirão com o evento do ouro, a grandeza


m u i t o m a i o r do q u e as suas e s p e r a n ç a s lhes p o d i a m p r o m e t e r fez c o m q u e se
e s p a l h a s s e a n o t í c i a d e t ã o o p u l e n t o d e s c o b e r t o e q u e c o m ela c o n c o r r e s s e m
m u i t o s m i n e i r o s a tal r i b e i r a òu r i b e i r ã o , e n t r e os quais foi r e p a r t i d o e m m e d i -
ções certas e t e r m i n a d a s p a r a c a d a u m m i n e r a r , cuja p a r t i l h a foi feita pelo *guar-
d a - m o r M a n u e l L o p e s d e M e d e i r o s , n o m e a d o pelo g o v e r n a d o r d e S ã o P a u l o ,
A r t u r d e Sá.
Logo, o dito J o ã o L o p e s d e L i m a fez levantar u m a "capela feita de r a m o s d e
p a l m i t o e nela colocou u m a i m a g e m d e Nossa S e n h o r a do C a r m o , d e q u e m era
m u i t o d e v o t o , e d a q u i ficou o n o m e à q u e l e sítio d a R i b e i r a , o u R i b e i r ã o , d e
Nossa S e n h o r a do C a r m o (e outros d i z e m q u e p o r s e r feito o descoberto e m dia
d a m e s m a S e n h o r a c o m o título ' d o C a r m o ' } , e n a dita capela i n s t i t u í r a m p o r
"capelão u m religioso d a m e s m a o r d e m q u e a c o m p a n h o u a b a n d e i r a .
F o r a m c o n c o r r e n d o muitos mineiros, assim paulistas c o m o reinóis, ao m e s m o
passo q u e a opulência do descobrimento ia e n r i q u e c e n d o / / as primeiras notícias. [ fl. 68v. ]
N ã o se o c u p a v a m n a eleição dos aposentos n e m n a m e l h o r i a dos sítios, p o r q u e ,
c o m o o seu desígnio só era a extração do ouro o n d e ele se descobria, ali fabricavam
os seus r a n c h o s o u choças de "beira n o c h ã o , feitos de p a l h a de palmito, o n d e eles
e os negros se recolhiam p a r a , c o m mais facilidade, se p e r m u t a r e m p a r a diferentes
p a r a g e n s , segundo os descobertos q u e a p a r e c i a m c o m m e l h o r conta.
D u a s vezes esteve este sítio d e s a m p a r a d o : a p r i m e i r a , p o r c o n c o r r e r a m a i o r
p a r t e d a gente p a r a o d e s c o b e r t o do R i b e i r ã o A b a i x o , d e q u e d e u n o t í c i a u m
paulista, fulano R o d o v a l h o , 1
q u e a n d a n d o escondido pelos m a t o s p o r c a u s a d e
dívidas,, c o m o dito descoberto se utilizou a si,, a seus credores e a todos q u e a ele
concorreram,
F o r a m , c o n t i n u a n d o o u t r o s p o v o a d o r e s até a o t e m p o e m q u e este sítio do
R i b e i r ã o foi a c o m e t i d o e s a q u e a d o p e l o s a g r e g a d o s d e M a n u e l N u n e s V i a n a ,
reinol q u e , do R i o das V e l h a s , Veio e m seguimento de V a l e n t i m P e d r o s o , paulista,
d e q u e nasceu o p r i m e i r o " l e v a n t a m e n t o das M i n a s e n t r e os reinóis e p a u l i s t a s ,
e x p e r i m e n t a d o c o m m a i o r ruína e fatalidade n a vila do O u r o P r e t o / / e R i o das [ fl- 69v. ]
Mortes.
Sossegados estes povos c o m o governo do dito M a n u e l N u n e s V i a n a , a q u e m
l e v a n t a r a m p o r g o v e r n a d o r , se foi e s t a b e l e c e n d o o a r r a i a l d o R i b e i r ã o e nele
edificaram u m a "ermida (que hoje existe n a administração dos p r e t o s , i r m ã o s d e
N o s s a S e n h o r a d o R o s á r i o ) , o n d e d e p o i s foi a p r i m e i r a igreja c o n s t i t u í d a p o r
freguesia e o p r i m e i r o vigário dela o p a d r e M a n u e l Brás.
E s t a n d o as M i n a s governadas p o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e C o e l h o de C a r -
valho, lhe o r d e n o u Sua Majestade q u e criasse n a capitania das M i n a s as vilas q u e
lhe p a r e c e s s e m convenientes, c o m faculdade de p r o v e r os "ofícios necessários p a r a

* • Provavelmente, Antônio Pires Rodovalho.


252

o b o m e c o m u m r e g i m e d a "república, o q u e assim e x e c u t o u , p r i n c i p i a n d o pelo


distrito e arraial do R i b e i r ã o , e e m "junta geral de 8 de abril d e 1 7 1 1 , c o m assis-
t ê n c i a dos m o r a d o r e s e pessoas principais do dito arraial, o d e c l a r o u e levantou
p o r vila d o R i b e i r ã o d e Nossa S e n h o r a d o C a r m o , e o s m o r a d o r e s lhe acrescenta-
r a m o a p e l i d o d e A l b u q u e r q u e . E elegeu p a r a "oficiais d a C â m a r a os sujeitos
[ fl. 69v. ] m a i s c a p a z e s e a d e q u a d o s / / p o r v o t o s d e t o d o s , d e q u e o p o v o ficou m u i t o
satisfeito e m u i t o mais p o r p r o v e r nos ditos lugares, assim reinóis c o m o paulistas,
n a f o r m a q u e Sua Majestade lhe t i n h a o r d e n a d o .
P o r carta d e 31 de j u l h o do dito a n o d e 1 7 1 1 , d e u a C â m a r a c o n t a a el-rei de
ser esta a p r i m e i r a vila q u e foi ereta, i m p e t r a n d o a confirmação e os privilégios d a
C â m a r a da cidade do P o r t o , a q u e o m e s m o senhor foi servido responder, h a v e n -
d o p o r c o n f i r m a d a a d i t a vila, p o r é m s e m o título d e A l b u q u e r q u e , e q u e se
p u d e s s e i n t i t u l a r leal vila. E q u a n t o aos privilégios, e s p e r a v a q u e os oficiais d a
C â m a r a obrassem c o m tal a m o r e fidelidade e m o seu real serviço q u e m e r e c e s -
s e m lhos concedesse iguais aos q u e p o d i a m esperar d a s u a real g r a n d e z a .
Foi crescendo a p o v o a ç ã o desta vila do C a r m o e igualmente avantajando-se
o seu g o v e r n o político, de sorte q u e , especializando-se e n t r e as mais p o v o a ç õ e s ,
m e r e c e u mostrar-se s e m p r e a g r a d e c i d a a Majestade, expressando p o r muitas car-
tas escritas à C â m a r a o q u a n t o se dava p o r b e m servido do fervoroso zelo e lealda-
[ fl, 70 ] d e / / c o m q u e a m e s m a se empregava no real serviço do m e s m o senhor e do b e m
p ú b l i c o . E do m e s m o m o d o os "governadores n u n c a d e i x a r a m d e publicar e en-
g r a n d e c e r a maioria e distinção c o m que, entre as mais vilas, esta se realçava n o b o m
regime d a república e p r o n t a c o b r a n ç a dos reais "quintos q u e t o c a v a m d a sua repar-
tição, sem violência n e m a m e n o r queixa do povo, q u e tanto a este respeito c o m o
e m todos os negócios públicos sempre se conteve fiel, pacífico e obediente às deter-
m i n a ç õ e s dos superiores.
B e m se a s s i n a l a r a m estes p r e d i c a d o s n a ocasião e m q u e e s t a vila serviu de
refúgio a o Ilustríssimo e Excelentíssimo d o m Pedro de A l m e i d a , e n t ã o c o n d e de
A s s u m a r , g o v e r n a d o r destas M i n a s , m a r q u ê s de Castelo N o v o e hoje m a r q u ê s de
A l o r n a , o q u a l , n a " s u b l e v a ç ã o dos m o r a d o r e s d e Vila R i c a n o a n o d e 1720,
a c h o u n a lealdade do p o v o c a r m e l i t a n o a s e g u r a n ç a q u e n ã o t i n h a nas outras vilas
dó seu g o v e r n o .
[ fl. 70v. ] Até o anó de 1731, ocuparam / / o s empregos da república na administração
da J u s t i ç a "juízes ordinários, e p o r representação q u e a C â m a r a fez a Sua M a j e s t a d e
p e d i n d o - l h e "juiz d e fora, foi o m e s m o s e n h o r servido m a n d a r criar o lugar p e l o
d o u t o r A n t ô n i o Freire d a F o n s e c a O s ó r i o , q u e t o m o u posse e m 13 d e j u l h o do
dito a n o , sucedendo-lhe o d o u t o r J o s é Pereira de M o u r a , o d o u t o r J o s é C a e t a n o
G a l v ã o , o d o u t o r Francisco Ângelo Leitão e o d o u t o r Silvério T e i x e i r a , j u i z d e
fora atual. A n d a u n i d o ao dito lugar o do "juiz dos órfãos e "provedor dos ausentes,
capelas e resíduos.
C o m p õ e - s e o S e n a d o d a C â m a r a d e u m presidente, que. é o juiz de fora, três
"vereadores, u m " p r o c u r a d o r , q u e i g u a l m e n t e vota, u m "escrivão, u m "contínuo
253

ou "porteiro e u r a "tesoureiro. D e dois era dois meses elegem "almotacés. R e n d e


o p a t r i m ô n i o d a C â m a r a dezoito a t é vinte mil "cruzados, p r o d u t o do "contrato de
aferição dos gados q u e e n t r a m , " r e n d a d a cadeia e do "ver e "foros q u e se p a g a m
das p r o p r i e d a d e s sitas n a m e i a "légua d e "sesmaria q u e Sua Majestade lhe confe-
riu.
A p r o p o r ç ã o d o r e n d i m e n t o é r e g u l a r m e n t e à despesa q u e faz a C â m a r a [fl. 71 ]
t o d o s os a n o s e m gastos ordinários, o b r a s públicas d e calçadas, fontes e p o n t e s ,
s e n d o estas as q u e m a i s d e s p e n d e m , p o r s e r e m m u i t a s n o " t e r m o , e t o d a s d e
m a d e i r a , q u e c o n s o m e m i m p o r t a n t e cabedal, e e m diante serão m u i t o m a i s custo-
sas, e m r a z ã o d e e s t a r e m j á m u i t o distantes as b r a ú n a s , s o m e n t e p r ó p r i a s p a r a
semelhantes obras.
O "auditório das Justiças compõe-se do "juiz d e fora, a q u e a n d a a n e x o o dos
"órfãos e P r o v e d o r i a dos Defuntos e Ausentes, Capelas e Resíduos; u m "escrivão
das execuções; dois "tabeliães., u m dos órfãos, outro d a Provedoria; u m "tesourei-
ro d a m e s m a e u m " p r o m o t o r ; u m " i n q u i r i d o r , " d i s t r i b u i d o r e " c o n t a d o r ; u m
p o r t e i r o e seis "oficiais d a vara; quinze "letrados e outros tantos "requerentes. O s
"ofícios, confere-os Sua Majestade p o r três anos p o r "donativo. O juiz d e fora t e m
q u a t r o c e n t o s mil "réis pagos pela F a z e n d a R e a l , oitenta mil réis dos bens do "con-
celho p a r a sua "aposentadoria, e p o r nova o r d e m foram "coartadas as "propinas
d a C â m a r a , d e sorte q u e f o r a m taxadas e m cento e sessenta m ü réis p o r a n o a o
juiz d e fora presidente e a c a d a u m dos oficiais.
Foi S u a M a j e s t a d e servido, p o r decreto / / de 23 d e abril d e 1745, criar esta L Um
' -1
vila n o v a c i d a d e c o m n o m e d e C i d a d e M a r i a n a , n o m e a n d o logo p a r a p r i m e i r o
"bispo deste n o v o b i s p a d o d a s M i n a s a d o m frei M a n u e l d a C r u z , m o n g e d a
preclaríssima o r d e m d e São B e r n a r d o e q u a r t o bispo q u e era do M a r a n h ã o .
Foi causa desta criação a g r a n d e distância q u e h á desta c a p i t a n i a das M i n a s à
c i d a d e do R i o d e J a n e i r o , capital do antigo b i s p a d o d e dilatada extensão, m o t i v o
p o r q u e se n ã o aproveitava t o d a a m e d i c i n a eclesiástica p o r c h e g a r m e n o s vigoro-
sa, o q u e obrigou à p i e d a d e católica d a M a j e s t a d e , o s e n h o r d o m J o ã o , o q u i n t o ,
de gloriosa m e m ó r i a , p e d i r a Sua S a n t i d a d e a divisão d a q u e l e b i s p a d o , c r i a n d o
mais dioceses: u m a n a capitania d e São Paulo e o u t r a n a das M i n a s .
N o dia 15 d e o u t u b r o de 1748 e n t r o u a q u e l e "prelado n e s t a c i d a d e e e m 2 7
de n o v e m b r o do dito a n o fez pública "entrada, cuja celebridade se executou c o m
a especialíssima p o m p a , q u e refere a história desta criação intitulada Áureo Trono
Episcopal, colocado nas Minas do Ouro, autor a n ô n i m o . D a m e s m a história consta / /
2
^ ^" ^ *
a criação do "cabido e dos mais ofícios eclesiásticos d a sé e do auditório.

ÁUREO Trono Episcopal, colocado nas Minas do Ouro ou notável notícia breve da criação do novo
bispado marianense, da sua felicíssima posse e pomposa entrada do seu meritíssimo primeiro bispo e
da jornada que fez do Maranhão o Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor dom frei Manuel da
Cruz, com a coleção de algumas obras acadêmicas e outras que se fizeram na dita função, autor
anônimo. Lisboa: Oficina de Miguel Manescal da Costa, 1749.
254

Destinou-se p a r a igreja d a sé a m a t r i z d a C i d a d e , intitulada N o s s a S e n h o r a


da C o n c e i ç ã o , e depois d e elevada a catedral ficou c o m o título de Nossa S e n h o r a
d a A s s u n ç ã o . E t e m p l o d a m a i o r g r a n d e z a e r e g u l a r i d a d e d e t o d o s os mais das
M i n a s , Sustenta-se o c o r p o d o edificio e m q u a t r o colunas p o r b a n d a e nos vãos d e
seis "capelas, a l é m das duas do "cruzeiro.
Foi feita a o b r a desta igreja de esmolas do p o v o , q u e i m p o r t a r a m e m m a i s d e
c e m mil "cruzados, e a i n d a n ã o está a c a b a d a . M a s j á S u a M a j e s t a d e , o s e n h o r
d o m J o s é , o p r i m e i r o , foi servido o r d e n a r à sua última perfeição à custa d a sua
Real Fazenda.
Principiou-se a igreja e m o a n o [incompleto], p o u c o distante do lugar e m q u e
estava a igreja velha, q u e era a m a t r i z , j á depois d e ter servido de p r i m e i r a fregue-
[ fl. 72v. ] sia a capela d e Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , / / d a a d m i n i s t r a ç ã o d o pretos.
A t é a criação d a sé teve tantos, [incompleto] vigários, s e m p r e foi de a v u l t a d o
r e n d i m e n t o , e hoje, p e l a decadência das terras, terá de seis p a r a sete. mil cruzados.
Foi constituído e m lugar d e "vigários colados u m " c u r a c o m seu "coadjutor.
T e m esta freguesia seis p a r a sete mil almas.
P a r e c e q u e se v ã o a u m e n t a n d o os edificios.
H á d e n t r o d a C i d a d e três capelas. U m a d a S e n h o r a S a n t a n a , c o m casas de
" r o m a g e m , e m q u e a n t i g a m e n t e se r e c o l h i a m infinitos d e v o t o s , q u e d e p a r t e s
m u i t o distantes v i n h a m a n t i g a m e n t e de r o m a r i a a visitar á m e s m a s a n t a e l h e
d e i x a v a m copiosíssimas esmolas, c o m q u e foi feita a capela e as ditas hospedarias
e u m " r e c o l h i m e n t o , o n d e , e m a l g u m t e m p o , se c l a u s u r a v a m a l g u m a s m u l h e r e s
vivendo c o m o recolhidas debaixo d a administração e regência d o "ordinário. T a m -
b é m a n e x o à dita c a p e l a se c o n s e r v o u a l g u n s anos hospital. O u t r a c a p e l a é de
[ fl. 73 ] Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , / / p e r t e n c e n t e aos p r e t o s , c o m o j á se disse; t e m seu
" c a p e l ã o e " i r m a n d a d e dos p r e t o s . A o u t r a c a p e l a é de S ã o G o n ç a l o , t a m b é m
com irmandade e capelão.
A n d a - s e n a disposição d e se fazer u m a igreja de Nossa S e n h o r a do Rosário à
custa d a m e s m a i r m a n d a d e dos pretos. O u t r a semelhante o b r a t e m d e t e r m i n a d o o
" p r e l a d o , colocada a o s e n h o r São P e d r o .
Estabeleceu o m e s m o p r e l a d o d e n t r o da C i d a d e u m seminário de estudos d e
G r a m á t i c a e M o r a i , a d q u i r i n d o p a r a a dita casa m u i t a s esmolas, legados e doa-
ções. V ã o e n t r a n d o vários seminaristas c o m certa p o r ç ã o a n u a l p a r a seu sustento.
São regidos p e l o r e v e r e n d o p a d r e J o s é N o g u e i r a , d a C o m p a n h i a d e J e s u s , q u e
veio do Colégio do R i o d e J a n e i r o p a r a reitor e mestre d a dita casa. F r e q ü e n t a m as
classes m u i t o s estudantes c o m os m e s m o s estatutos dos colégios d a C o m p a n h i a ;
espera-se q u e Sua M a j e s t a d e facultará o residirem mais mestres da m e s m a C o m -
p a n h i a . A b r i r a m - s e aqueles estudos e m [incompleto] do a n o d e 1748.
[ fl. 73v. ] N o a n o d e 1750 se d e u princípio a u m a igreja p e r t e n c e n t e ao m e s m o semi-
n á r i o , d e d i c a d a a Nossa S e n h o r a da Assunção.
H á n a m e s m a C i d a d e u m a C a s a R e a i , o n d e se. p a g a m as "capitações a S u a
M a j e s t a d e , respectivos à dita c i d a d e e s e u " t e r m o . P r e s i d e - l h e u m "intendente
255

"letrado, u m "fiscal, u m "escrivão, u m "ajudante, u m "tesoureiro e u m " m e i r i n h o ,


é q u a t r o s o l d a d o s d e " d r a g õ e s , d e s t i n a d o s p a r a as o r d e n s q u e se e x p e d e m d a
m e s m a I n t e n d ê n c i a . T ê m servido nela três i n t e n d e n t e s : o p r i m e i r o , fulano d e
Sousa Rafael,3 o d o u t o r A n t ô n i o de S o u s a de M a c e d o e, p r e s e n t e m e n t e , o d o u t o r
D o m i n g o s P i n h e i r o . R e n d e a capitação d a C i d a d e e seu t e r m o t a n t o [incompleto] e
se registra ter tantos [incompleto] pretos.
T e m o t e r m o d a C i d a d e tantas [incompleto] freguesias c o m seus arraiais b a s t a n -
t e m e n t e p o v o a d o s , a saber:
O arraial d e S ã o Sebastião, q u e dista da C i d a d e u m a "légua
S ã o C a e t a n o , três
F u r q u i m , cinco
Sumidouro, uma e meia [ fl- 74 ]
São J o s é d a Barra, n o v e
Piranga, sete e m e i a
C a m a r g o s , duas
I n f i c i o n a d o , cinco
C a t a s Altas, seis e m e i a
A n t ô n i o Pereira, duas.

> li <
[Informação das antiguidades da freguesia de Guarapiranga]

Resposta a inquérito do Senado da C â m a r a de M a r i a n a


dirigido a moradores antigos de diversas freguesias que, ao que
parece, deveria versar sobre descoberta de ouro e primeiros
povoadores, origem toponímica, população, igrejas e capelas,
seus eclesiásticos e, rendimentos, irmandades, limites, áreas p o -
voadas e atividades econômicas. T e m como datas limites os anos
de 1693 e de 1749. Adaptado à realidade colonial, corporifica
informação semelhante aos inquéritos promovidos e m Portugal
pela Academia Real de História Portuguesa, a partir de 1721,
com recolhimento de dados de fontes autênticas e marcados pela
objetividade,

Rafael da Silva e Sousa.


256

O documento pode ter sido elaborado para referendar pa-


recer sobre o rendimento do bispado de M a r i a n a , a cargo de
Caetano da Costa Matoso. O interesse do ouvidor em reunir
relatos sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exigencias
do cargo ou por seu perfil intelectual, coincide com o falecimen-
to dos remanescentes dos primeiros povoadores de Minas e a
fixação de suas reminiscencias sob a forma escrita, colecionadas
por particulares.
A u t o r í a , l o c a l e d a t a : Luís José Ferreira de Gouveia;
Guarapiranga; 10.12.1750.
D e s t i n a t a r i o : Senado da C á m a r a de Mariana.
U s o n a historiografia: Afonso E. T a u n a y usa este depo-
i m e n t o ã o se referir à n o m e a ç ã o do p r i m e i r o p a d r e p a r a
G u a r a p i r a n g a (História geral das bandeiras paulistas. São Paulo:
Imprensa Oficial, Museu Paulista, 1948. V. 9, p. 403).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Descrição, ou seja, "definição im-
perfeita. Representação, ou pintura, de alguma coisa com pala-
vras" (BLUTEAU, Rafael. Vocabulário português e tòmo [...]. Coimbra:
Colégio das Artes da Companhia de Jesus, 1713. V. 3, p. 115),
que retoricamente constitui-se como ecfrase. Relato em forma
epistolar que constitui dados p a r a a freguesia de Guarapiranga.
Descreve e elogia sobretudo o e m p e n h o colonizador dos seus
habitantes e solicita- favores das autoridades p a r a a região. A
luta contra os aborígenes, estereotipados como ameaçadores e
ferozes, constitui-se em tópica heroificante da ação dos coloni-
zadores. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o gráfico: Escrita moderna cursiva e bas-
tante regularizada. As minúsculas redondas, c o m o " a " , " e " e
"o", com traços bastante definidos e regulares. Apresenta o " s "
caudado quando seguido de " s " simples, pendente e curto; o " s "
final d e sílaba ou de palavra pode ser t a m b é m alongado, e m '
forma de bastão. O " p " e o " q " possuem haste dupla, çle forma
angulosa e sinistrógira. O sinal abreviativo aparece e m meio
círculo, como prolongamento das letras. Abreviaturas usuais, com
utilização do ponto. Texto autógrafo. (YDL)
Cópia impressa:
T A U N A Y , Afonso de E. Documentos inéditos sobre as primei-
ras descobertas do ouro em Minas Gerais. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 44, p . 366,
1948. Cópia incompleta.
257

S e n h o r d o u t o r p r e s i d e n t e e mais senhores do S e n a d o : [ A- 75 ]

N a forma q u e Vossas M e r c ê s m e o r d e n a m , a c h o q u e em 1691 saiu d e S ã o


Paulo u m a b a n d e i r a d e paulistas, p o r "capitães dela Francisco R o d r i g u e s Sirigueio
e A n t ô n i o Pires R o d o v a l h o , c o m um roteiro p a r a i r e m à C a s a d a C a s c a , e p o r ele
c h e g a r a m a este rio de G u a r a p i r a n g a n o m e s m o a n o e se a r r a n c h a r a m em u m a
"capoeira do "gentio à beira-rio, e m o qual d e s c o b r i r a m o u r o , e em u m c ó r r e g o
q u e nele faz b a r r a . E t e n d o dúvidas entre si, m a t a r a m ao dito capitão Sirigueio e
a u m seu filho, p o r n o m e A n t ô n i o R o d r i g u e s Sirigueio, causa p o r q u e se desfez a
b a n d e i r a e m d u a s e se r e t i r a r a m . E m o a n o d e 1 6 9 3 , t o r n o u a vir c o m o u t r a
b a n d e i r a o dito capitão A n t ô n i o Pires R o d o v a l h o , e c h e g a n d o à m e s m a p a r a g e m
l h e p u s e r a m o n o m e Sirigueio, pelas m o r t e s , e s e m p r e conservou o m e s m o n o m e
a t é o presente. Logo p a s s a r a m p a r a baixo u m a "légua, a c h a n d o as capoeiras d o
gentio de u m a e o u t r a b a n d a do rio; fizeram nelas roças e ao m e s m o t e m p o desco-
b r i r a m o u r o e m u m c ó r r e g o q u e a ele faz b a r r a . E i n d o t r a b a l h a n d o , a c h a r a m
vários ossos de gente e n t e r r a d a , r a z ã o p o r q u e lhe p u s e r a m o [nome] córrego das
Almas, e formaram u m arraialzinho, e foram trabalhando no córrego. E como
n a q u e l e t e m p o havia m u i t o pássaro v e r m e l h o n o rio, e p e q u e n o s , intitularam a o
rio G u a r a p i r a n g a , q u e é o q u e q u e r d i z e r este n o m e (guará, vermelho, p i r a n g a ,
pequeno), e l h e ficou o n o m e a este distrito dos ditos pássaros.
E m 1694, se abriu o c a m i n h o do S u m i d o u r o p o r B e r n a r d o de C h a v e s C a b r a l
é seus irmãos I n á c i o M o r e i r a , J o ã o de G o d ó i e c u n h a d o , o "sargento-mor Luís d e
Barros F r a n c o . C h e g a n d o ao dito córrego nele t r a b a l h a r a m , e c o m os q u e h a v i a e
mais paulistas q u e se a j u n t a r a m fizeram u m a "capela ou oratório com a. i n v o c a ç ã o
d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , e m q u e lhe dizia missa u m frade terceiro p o r
n o m e frei J o s é d e J e s u s , p o r a l c u n h a o C a t u r r a .
N o a n o seguinte d e 1695, fizeram igreja c o m a m e s m a invocação d e Nossa
S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o . P o r ser este sítio m u i t o infestado de sezões e ter m o r r i d o
m u i t a gente e despejado o u t r a , veio p o r vigário p a r a ela, p o r provisão do s e n h o r
bispo d o R i o de J a n e i r o , o p a d r e R o q u e Pinto d e A l m e i d a , / / e a b e n z e u e foi [ fl. 75v. ]
caso milagroso q u e logo q u e foi b e n z i d a e os ares cessaram as sezões, s a r a n d o os
q u e as t i n h a m , e ficou este distrito mais sadio das M i n a s . A este veio suceder o
p a d r e d o m J o s é D o m - D o m , castelhano; a este, o p a d r e J o s é d e M o r a i s ; a este, o
p a d r e A n d r é da Silva Ribeiro; a este, o u t r a vez o p a d r e d o m J o s é D o m - D o m ; a
este, o p a d r e M a n u e l d a C r u z ; a este, o p a d r e G a s p a r M a r c a n t e ; a este, o p a d r e
A n t ô n i o de, S i q u e i r a Q u e n t a l ; a e s t e s u c e d e u , e m 1 7 2 4 , o p a d r e M a n u e l Fris
T e n r e i r o , "colado; este se recolheu p a r a o R e i n o e m 1736, veio p o r " e n c o m e n -
d a d o o p a d r e M a n u e l R i b e i r o G u i m a r ã e s ; a este sucedeu o p a d r e J o ã o B a r b o s a
M a c i e l ; a este s u c e d e u o p a d r e Luís P i n t o d e S ã o J e r ô n i m o , a este o " c ó n e g o
magistral M a n u e l d e P i n h o C a r d i d o , q u e existe.
T e m esta freguesia 5.200 pessoas, de c o m u n h ã o 3.630, r e n d e a o vigário d e
cinco p a r a seis mil "cruzados p o r a n o . T ê m - s e feito três igrejas, todas à custa dos
m o r a d o r e s . A q u e existe t e m d e c o m p r i d o até o arco 90 "palmos, d e l a r g u r a 4 2 ; a
"capêla-mpr, d e c o m p r i d o 4 1 , d e largo 30; as duas sacristias, de c o m p r i d o 6 1 , d e
258

l a r g u r a 2 5 ; a casa d o "consistório, p o r d e t r á s d a igreja, d a m e s m a l a r g u r a , d e


s o b r a d o c o m três janelas. T e m q u a t r o " i r m a n d a d e s de compromisso: a d e Nossa
S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , ereta e m m a i o d e 1718 pelo s e n h o r "bispo d o m Francisco
d e S ã o J e r ô n i m o ; a d o Santíssimo, ereta p o r compromisso, q u e até aí era devo-
ç ã o , e m m a i o d e 1744, pelo s e n h o r d o m frei J o ã o d a C r u z ; a das Almas, ereta e m
s e t e m b r o d e 1727 p e l o s e n h o r d o m frei A n t ô n i o d e G u a d a l u p e ; a d e N o s s a
S e n h o r a d o R o s á r i o dos P r e t o s , e r e t a e m 1745 p e l o s e n h o r d o m frei J o ã o d a
C r u z . T e m seis [sic] altares: altar-mor, Almas, S e n h o r a S a n t a n a , S e n h o r a do R o s á -
rio, S e n h o r dos Aflitos. Está esta igreja e m u m n o b r e terreiro, c o m o cemitério à
r o d a , n o meio do arraial. Este se c o m p õ e d e duas ruas p a r a a p a r t e do rio e u m a
p a r a sair do terreiro p a r a fora, p a r a a p a r t e d a estrada, c o m vinte e cinco m o r a d a s
d e casas d e s o b r a d o , 55 t é r r e a s , c o m c a p a c i d a d e p a r a se fazer u m a p o v o a ç ã o
m u i t o g r a n d e pelo terreno, águas, m u i t a terra p a r a m a n t i m e n t o s e o rio q u e passa
pelo p é dele, navegável p o r toda a freguesia. Esta, do q u e está p o v o a d o , t e m do
[ fl. 76 ] Pirapetinga — divisa d a c o m a r c a , " t e r m o e freguesia, p o r repartição q u e fez / / o
" g u a r d a - m o r B e r n a r d o de C h a v e s C a b r a l e m 1715, p o r o r d e m do Excelentíssimo
S e n h o r d o m Brás, "governador q u e era nestas M i n a s — até o arraial 3 "léguas, q u e
hoje p e r t e n c e m a ela, deste ao v ã o g r a n d e do rio, n a lavra de A n t ô n i o d e T o r r e s
C h a v e s , 20; t e m d e c o m p r i d o 2 3 . D e G a s p a r J o s é , v i n d o d a C i d a d e [ M a r i a n a ] ,
a o arraial, 3, e do arraial a o X o p o t ó 6; são 9 de largo, o n d e mais.
;

C o m p õ e - s e esta freguesia d o R i o d e Pirapetinga, d a b a n d a d e c á , de lavras e


roças e u m a "capela do r e v e r e n d o p a d r e frei Francisco de J e s u s M a r i a , religioso
trino, c o m a invocação de Nossa S e n h o r a dos R e m é d i o s , ereta e m 1749, e m q u e
ele diz missa, e n a sua falta a m a n d a dizer a sua custa, feita à imitação d a g r a n d e z a
d a sua "religião e generoso â n i m o . Neste, se m e t e o ribeirão d o M a c u c o , p o v o a d o
d e roças e lavras, e m q u e a principal é d e Antônio Lopes da Silva, o ribeirão d o
C a c h o r r o , p o v o a d o da m e s m a forma, o ribeirão R e a l , p o v o a d o n a m e s m a forma,
e m q u e está a capela de Nossa S e n h o r a d a Oliveira e São P e d r o , q u e reedificou a
s u a c u s t a o * m e s t r e - d e - c a m p o P e d r o d a Fonseca N e v e s e teve a s u a e r e ç ã o e m
1708 e reedificação e m 1726; t e m "capelão, q u e p a g a m os m o r a d o r e s a sua custa.
Neste, se m e t e 0 de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , p o v o a d o d e lavras e roças, e d a
m e s m a sorte o c h a m a d o Piçarrão. A b a i x o está o c h a m a d o Sirigueio, e m q u e eu
hoje assisto, e, abaixo u m a légua, o arraial; deste, p a r a baixo u m a légua, faz b a r r a
o rio Pirapetinga, q u e p o r ele a c i m a está p o v o a d o até às cabeceiras, q u e são seis
léguas, e m q u e t e m algumas lavras p o r terra e duas *rodas n o rio, u m " e n g e n h o
d e c a n a de bois d e Silvestre d a Silva, outro é d a viúva q u e ficou d o s a r g e n t o - m o r
D o m i n g o s Teixeira. A q u i se divide e m dois braços: e m u m t ê m lavras e roças os
"sargentos-mores A n t ô n i o Luís d e M i r a n d a e G r e g ó r i o d e M a t o s , n o o u t r o t e m
l a v r a e c a p e l a d o p a d r e Baltasar de A b r e u N o v a i s , c o m a i n v o c a ç ã o d e N o s s a
S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , ereta e m 1733, e m q u e diz missa d e g r a ç a aos m o r a d o r e s .
T e m o u t r a c a p e l a d e N o s s a S e n h o r a d a P i e d a d e , e r e t a e m 1733; t e m c a p e l ã o ,
[ fl. 76v. ] p a g o pelos m o r a d o r e s , e t e m esta fazenda seu e n g e n h o d e á g u a , pilões / / e * m o -
259

inho, q u e é d e M i g u e l D i a s de Sousa. A c i m a , o u t r a fazenda, de P e d r o d a M o t a e


M a n u e l C a r v a l h o , n a m e s m a forma, e p a r t e c o m a freguesia d a Itatiaia. N e s t e rio
se m e t e o ribeirão c h a m a d o Paciência, p o v o a d o d e lavras e roças, o B a c a l h a u , n a
m e s m a f o r m a . A o p é dele,, e m 1719, l e v a n t o u ' c a p e l a o p a d r e E u g ê n i o , c o m a
invocação de S a n t o A n t ô n i o ; depois se formou arraial c h a m a d o B a c a l h a u . C o m -
põe-se d e casas d e s o b r a d o 4, térreas 3 3 ; a r r u i n o u - s e a capela, os m o r a d o r e s a
fizeram d e n o v o a sua custa, c o m a m e s m a invocação, e p a g a m a dois "capelães.
V i n d o deste arraial p a r a o d a Piranga, está o u t r a capela, ereta pelo p a d r e M a n u e l
d e B i t e n c o u r t e m 1720, c o m a invocação d e N o s s a S e n h o r a d o R o s á r i o , e m q u e
ele diz missa de g r a ç a aos m o r a d o r e s . M a i s a d i a n t e o u t r a , c o m a i n v o c a ç ã o d e
S a n t a Q u i t é r i a , q u e os m o r a d o r e s a fizeram a sua custa e m 1717; t e m c a p e l ã o ,
p a g o a sua custa; p e r t o dela faz b a r r a deste rio o córrego c h a m a d o J o s é D i a s , o do
Peixe e outro de p o u c a e n t i d a d e , p o v o a d o s d e roças e lavras até os C a r i o c a s , q u e
divide a freguesia da do S u m i d o u r o p e l o Pinheiro, q u e é "légua e m e i a deles a o
arraial. T o r n a n d o à b a r r a deste rio, é a p a r a g e m c h a m a d a o C a l h a m b a u , n o m e
q u e t o m o u d o m o r a d o r dela; está a capela de S a n t o A n t ô n i o , ereta pelo "capitão
A n t ô n i o Alvares Pereira a sua custa e m 1728; t e m capelão, p a g o à custa dos m o -
r a d o r e s , e t u d o até a q u i p o v o a d o d e roças e lavras n o rio, c o m a l g u m a s " r o d a s
nele. A b a i x o , três léguas, está o ribeirão d a T a p e r a , p o v o a d o d e roças, q u e n ã o t e m
ouro. Abaixo, está a fazenda que fez o tenente J o ã o Ferreira d a Silva, c o m capela
ereta e m 1742, c o m invocação de São J o ã o ; tem capelão, pago à custa dos m o r a d o -
res. Abaixo, u m a légua, o ribeirão do Bacalhau, p o v o a d o d a b a r r a p a r a cima duas
léguas de roças e lavras, até aqui toda a beira do rio p o v o a d a e daí até o vão g r a n d e
p o u c a povoação, p o r incapacidades. E finda n o dito v ã o a freguesia, isto até aqui se
e n t e n d e d a b a n d a do arraial.

D a o u t r a b a n d a do rio, do dito vão g r a n d e até à b a r r a / / do rio T u r v o , está [ fl. 77 ]


despejado p o r c a u s a do "gentio. N a b a r r a deste rio, está u m " e n g e n h o de c a n a de
bois do p a d r e M a n u e l da Silva Borges e lavra, e n ã o estão muitos nele p o r causa
das mortes q u e o gentio fez a brancos e negros. C o r r e n d o rio acima, defronte d a
b a r r a do Bacalhau, está o sargento-mor Miguel Pires, c o m roda. Dali até a . b a r r a do
X o p o t ó , q u e são quatro léguas, e p o r este acima outras q u a t r o , q u e estava p o v o a -
d o , h o j e está d e s e r t o p o r c a u s a d e o g e n t i o ter a s s o l a d o t u d o e q u e i m a d o u m
e n g e n h o q u e nele estava. A c i m a está a p o v o a ç ã o c h a m a d a d e Brás Pires, c o m
capela que. ele e seus genros a fizeram a sua custa, e m 1738, c o m a invocação d e
Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , e t e m capelão, p a g o pelos m o r a d o r e s . D e s t a p o v o a ç ã o
p a r a cima t e m alguns m o r a d o r e s e m distância de três e q u a t r o léguas. T o r n a n d o à
b a r r a deste rio pelo d a Piranga acima, até defronte do arraial, são roças e lavras d e
p o u c a entidade. Defronte do arraial está o e n g e n h o de bois d e J e r ô n i m o C a r v a l h o ;
acima, o de Francisco de Faria e Seixas, d a m e s m a forma, e lavras n o rio. Passa-se
este p o r u m a p o n t e de 220 "palmos q u e o p o v o m a n d o u fazer a sua custa. A c i m a
desta está o e n g e n h o de bois e lavras do reverendo p a d r e Félix Simões d e Paiva;
260

á c i m a , a fazenda d e D o m i n g o s C o e l h o e Antonio C a r v a l h o , q u e consta d e "enge-


n h o de água, pilões, " m o i n h o , nobres casas, p o n t e de 192 p a l m o s , feita p o r q u e m
lhe vendeu a fazenda, c o m j i r a u e m c i m a d e sessenta "palmos d e altura p a r a passar
água p a r a " r o d a e lavra. N e l a se m e t e u m ribeirão p o v o a d o , três "léguas de roças.
Por d e t r á s destas fazendas vai o ribeirão d o Peixe, p o v o a d o d e r o ç a s e lavras e m
distância p o r ele acima de seis léguas, q u e faz b a r r a n o d a Piranga, acima do salto
d a dita fazenda, pela beira d o rio até o v a r a d o u r o , roça de p o u c a entidade. N o dito
v a r a d o u r o t e m p o n t e d e c i n q ü e n t a p a l m o s de comprido,, feita pelos m o r a d o r e s e
e n g e n h o d o m e s t r e - d e - c a m p o P e d r o d a F o n s e c a N e v e s , d e á g u a e pilões e m o i -
n h o ; acima, duas roças. E findou a freguesia defronte d o Pirapetinga.

[ fi. 77v. ] R e s u m o dela

T e m tido 12 "vigários de provisão, três igrejas feitas à custa dos m o r a d o r e s ,


u m "colado, t e m 5.200 pessoas, r e n d e cinco p a r a seis mil "cruzados p o r a n o , t e m
sete. "capelas c o m "capelães pagos pelo p o v o , três os d o n o s , e n g e n h o s d e á g u a
q u a t r o , d e bois seis, d e pilões dez, roças q u i n h e n t a s , mais vinte ou m e n o s , arraiais
dois.
A causa d e esta freguesia n ã o ser m a i o r d o T r i p u í p a r a d e n t r o t e m sido o
"gentio, q u e n ã o s o m e n t e [não] deixa e n t r a r a d e s c o b r i m e n t o s c o m o a r r a s a m o
q u e j á está p o v o a d o , e é l á s t i m a o ver a c o n s t e r n a ç ã o e m q u e se vai p o n d o e q u e
b r e v e m e n t e ficará s e m q u e se possa suster, p o r q u e estão os m o r a d o r e s d e sorte
q u e a g o r a , p o r seis "vinténs, meias "oitavas, foram declarados u m a " m á q u i n a d e
m o r a d o r e s p o r "monitorio do vigário Luís Pinto de S ã o J e r ô n í m o fora as p e n h o -
3:

ras q u e m a n d o u fazer p o r várias "parcelas e outras pela "fábrica. J á este a n o f o r a m


muitos declarados duas vezes, está p a r a se declarar o u t r o m o n i t o r i o do p a d r e J o ã o
B a r b o s a M a c i e l , q u e a sua b o n d a d e o t e m s u s p e n d i d o , m a s cá está dentro.. Estão
do r e v e r e n d o vigário q u e existe a m e a ç a d o s q u e n ã o p a g a n d o até o fim d o m ê s
q u e passou os declara, e se isto sucede e as " i r m a n d a d e s o fazem pelo q u e se lhe
deve, n ã o h á mais r e m é d i o q u e fechar-sè a igreja, p o r q u e r a r o ficará q u e se n ã o
declare.
Esta p a r t e d o u a Vossas M e r c ê s p a r a q u e , c o m o cabeças do p o v o q u e veio
c h o r a r s o m e n t e r e m é d i o , l h e d ê e m p r o v i d ê n c i a q u e lhe p a r e c e r , q u e se eles se
p u d e s s e m alargar p a r a o sertão n ã o seria tanta necessidade, n e m os b o t a r i a m fora
d o g r ê m i o d a Igreja. Se. se abrisse o c a m i n h o p o r esta freguesia p a r a o R i o d e
J a n e i r o p e l o X o p o t ó , ela e S u a M a j e s t a d e , q u e D e u s g u a r d e , [e essa?] c i d a d e
t e r i a m g r a n d e s interesses pelas "faisqueiras e fazendas q u e h a v e r i a , e pela brevi-
d a d e c o m q u e o c a m i n h o fica seria utilidade g r a n d e . Vossas M e r c ê s d e t e r m i n a r ã o
o q u e forem servidos, q u é a m i m m e toca estar s e m p r e p r o n t o p a r a t u d o o q u e for
do serviço d e S u a M a j e s t a d e , q u e / / D e u s g u a r d e muitos a n o s . G u a r a p i r a n g a , 10 [ fl. 78 ]
de d e z e m b r o d e 1750 a n o s .

D e Vossas M e r c ê s ,

m u i t o certo e fiel c r i a d o ,

Luís J o s é Ferreira d e G o u v e i a

• 12 <

[Informação das antiguidades da freguesia de Catas Altas]

Resposta a inquérito dó Senado da C â m a r a de M a r i a n a


dirigido a moradores antigos de diversas freguesias que, ao que
pareee, deveria versar sobre descoberta de o u r o e primeiros
povoadores, origem toporrímica, população, igrejas e capelas, seus
eclesiásticos e rendimentos, irmandades, limites, áreas povoadas e
atividades econômicas. Adaptado à realidade colonial, corporifica
informação semelhante aos inquéritos promovidos em Portugal
pela Academia Real de História Portuguesa, a partir de 1721,
com recolhimento de dados de fontes autênticas e marcados pela
objetividade.
O documento pode ter sido elaborado para referendar pare-
cer sobre o rendimento do bispado de Mariana, a cargo de Caeta-
no da Costa Matoso. O interesse do ouvidor em reunir relatos
sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exigências do car-
go ou pelo seu perfil intelectual, coincide com o falecimento dos
remanescentes dos primeiros povoadores de Minas e a fixação de
suas reminiscências sob a forma escrita, colecionadas por particu-
lares.
Autoria, l o c a l e data: José de Lemos Gomes; Catas Al-
tas; 3.12-1750-
D e s t i n a t á r i o : Senado da. C â m a r a de Mariana.
U s o n a historiografia: Afonso E. T a u n a y usa este depoi-
m e n t o a o se referir à n o m e a ç ã o d o p r i m e i r o p a d r e p a r a
G u a r a p i r a n g a (História geral das bandeiras paulistas. São Paulo:
Imprensa Oficial, Museu Paulista, 1948. V. 9, p. 403). Charles R.
Boxer atribui a data de I de novembro de 1750 ao documento (A
a

Idade de Oura do Brasil: dores de crescimento de u m a sociedade


colonial. 2 ed. São Paulo: Nacional, 1969. p. 198-199).
262

A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato e m forma epistolar que


constitui dados para a memoria da freguesia de Catas Altas. A
afetação de humildade ou de autodesqualificação de seu autor é
artificio retórico que objetiva obter a condescendência do leitor.

C o m e n t a r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna cursiva re-


gularizada do século XVIII, inclinada para a direita. Predomi-
na o uso moderno do hífen no final de linhas. Presença de "f'
sempre duplicado, com hastes inferiores e superiores muito am-
plas, das quais se origina o traço horizontal, em continuo, resul-
tando em movimentos de volutas semicirculares. O "y", com si-
nal diacrítico, substitui o i" nos ditongos e hiatos. O " h " tem a

forma do " E " redondo. N o ditongo " ã o % o " o " é uncial, ascen-
dente, com laçada, terminando abaixo da linha da escrita e m
forma de cajado invertido. Texto autógrafo. (YDL)

[ fl. 79 ] S e n h o r e s do S e n a d o da sempre leal C i d a d e M a r i a n a :

P e l a o r d e m q u e r e c e b i d e J o ã o d a C o s t a A z e v e d o , "escrivão desse n o b r e
S e n a d o , p a r a q u e , p o r meio de u m a fiel e exata i n f o r m a ç ã o , lhes fizesse a s a b e r
das antiguidades desta freguesia das C a t a s Altas, isto é, e m q u e t e m p o se desco-
briu o sítio q u e hoje é arraial, d o n d e lhe veio o n o m e de C a t a s Altas, p o r q u e m foi
descoberto e outras coisas mais, c o m o consta d a m e s m a o r d e m , p a r a cujo efeito
p r o c u r e i pelos meios q u e m e foram possíveis saber à certeza, s e m e m b a r g o q u e
a i n d a nessas p o u c a s pessoas q u e se a c h a m a i n d a neste "país e q u e s ã o dos mais
antigos, n ã o deixa d e h a v e r v a r i e d a d e nos p a r e c e r e s . C o n t u d o , a c h e i q u e o sítio
q u e hoje é arraial fora d e s c o b e r t o no a n o d e 1703 pelo " c a p i t ã o M a n u e l D i a s ,
[ t a u b a t e a n o ? ] , e a causa de se lhe p ô r o n o m e de C a t a s Altas foi p o r se d a r e m
"catas d e tirar o u r o mais altas do q u e até ali se t i n h a p r a t i c a d o e m u m córrego
j u n t o do m e s m o arraial da p a r t e do nascente, ao q u e ficaram c h a m a n d o até hoje
o córrego das C a t a s Altas, e j u n t a m e n t e ficou o dito n o m e apelido a t o d a a fregue-
sia, a q u a l se a c h a c o m a altura de vinte graus, d e z m i n u t o s e q u a t r o segundos d a
linha p a r a o sul, s e g u n d o afirmou u m m a t e m á t i c o q u e S u a M a j e s t a d e m a n d o u
m e d i r as terras desta capitania e t o m a r as alturas das p o v o a ç õ e s , o q u e fez neste
arraial das C a t a s Altas e m 27 de fevereiro de 1733.
O p r i n c í p i o d a igreja foi u m a " c a p e l i n h a c p b e r t a de p a l h a b a r r e a d a até o
m e i o das p a r e d e s somente, a qual se fundou d a o u t r a b a n d a d o córrego, j á dito,
c h a m a d o das C a t a s Altas, e nela o u v i r a m missa esses poucos m o r a d o r e s q u e h a -
via, a qual dizia u m "clérigo c h a m a d o M a n u e l A n t ô n i o Casafinho, n a t u r a l que.
dizem ser d e Casal d e P e d r o , em Portugal.
263

Desta p a r a g e m se m u d o u a dita igreja - a qual t a m b é m se n ã o s a b e o t e m p o


que. existiu — p a r a a p r a i a j u n t o do rio / / q u e desce do m o r r o c h a m a d o do B o m [ fl. 79v. ]
J e s u s , o n d e se conservou a l g u m t e m p o , p o r é m c o m m a i s a l g u m asseio, a i n d a q u e
p o u c o ; depois se m u d o u mais p a r a cima, p a r a fora d a p r a i a , o n d e se fez c o b e r t a
t a m b é m de p a l h a , m a s t o d a b a r r e a d a e fechada, sendo o defunto D o m i n g o s M e n -
des o q u e t o m o u a sua c o n t a a tal m u d a n ç a e a sua custa, segundo dizem.
N o lugar e forma referida se conservou a dita igreja até o a n o d e 1710, e m
q u e se d e t e r m i n a r a m os m o r a d o r e s ã fazer a dita igreja c o b e r t a de. telha e c o m
toda a perfeição q u e lhes foi. possível. E m t o d o este t e m p o , desde o a n o d e 1703
até o d e 1710, e r a m * desobrigados os m o r a d o r e s deste sítio p o r dois reverendos
sacerdotes v i n d o s do R i o d e J a n e i r o c o m o r d e m d o p r e l a d o - e c o m e ç a n d o n a
freguesia q u e hoje é A n t ô n i o P e r e i r a p o r t o d o este M a t o D e n t r o até S ã o J o ã o ,
a r m a n d o "altar portátil o n d e lhes era necessário a d m i n i s t r a r os s a c r a m e n t o s , d e
q u e levavam a "oitava d e o u r o p o r c a d a pessoa q u e c o m u n g a v a e m e i a pelos q u e
n ã o e r a m de c o m u n h ã o —, d e cujos n o m e s n ã o h á q u e m se l e m b r e .
A p r i m e i r a i m a g e m q u e se colocou n a dita igreja — t a m b é m se n ã o sabe e m
q u a l delas, m a s tem-se p o r m a i s c e r t o ser n a ú l t i m a n o m e a d a , p o r ter j á m a i s
Capacidade p a r a isso — foi d e N o s s a S e n h o r a da C o n c e i ç ã o , a qual deu A n t ô n i o
Alvares, o V e l h o , e debaixo d e tão s o b e r a n o patrocínio se alistaram os m o r a d o r e s
desta freguesia, t o m a n d o - a p o r p a d r o e i r a .
A s e g u n d a i m a g e m foi santo A n t ô n i o , a qual deu o "sargento-mor A n t ô n i o
Ferreira Pinto.
A terceira foi o S e n h o r Crucificado, q u e deu o "capitão D o m i n g o s Vieira d e
Macedo.
Estas foram as primeiras imagens q u e se c o l o c a r a m n a n o v a igreja, e m q u e se
c e l e b r a r a m os ofícios divinos c o m a solenidade possível até o a n o de 1739, q u e se
fez a t r a s l a d a ç ã o do Santíssimo / / S a c r a m e n t o e d e todas as s a g r a d a s i m a g e n s [ fl. 80 ]
p a r a a nova matriz, q u e hoje existe.

D o s vigários q u e t e m tido esta freguesia

l- Foi o r e v e r e n d o p a d r e A n d r é do C o u t o Leite,, n a t u r a l d a freguesia d e


S ã o Salvador d e T r i a m u n d o , " t e r m o e bispado d a cidade do P o r t o , ó qual se
diz viera no a n o de 1710 a ,ser p á r o c o d e s t a freguesia. E d e a d v e r t i r q u e
afirmam alguns sujeitos q u e antes do sobredito t i n h a h a v i d o o u t r o e q u e r e m
seja o p r i m e i r o , m a s c o m o n ã o h á q u e m se l e m b r e de seu n o m e n e m e m q u e
a n o existiu,, fique s e m p r e n a i n c e r t e z a se foi ou n ã o , e fique p s o b r e d i t o
A n d r é do C o u t o Leite n a opinião de p r i m e i r o .
2 9
Foi o r e v e r e n d o p a d r e A n t ô n i o d e A n d r a d e , n a t u r a l d o R i o de J a n e i r o . .
3 5
Foi o r e v e r e n d o padre. Francisco C o r r e i a d a C u n h a , n a t u r a l d e P o n t e d e
Lima.
264

4- Foi o r e v e r e n d o p a d r e A n t ô n i o Pestana C o i m b r a , b a c h a r e l f o r m a d o nos


sagrados cânones, n a t u r a l d e C o i m b r a .
5 S
Foi o r e v e r e n d o p a d r e J o s é de M a c e d o N e t o , b a c h a r e l f o r m a d o nos sa-
grados c â n o n e s , n a t u r a l dos *coutos d e Alcobaça.

T o d o s os sobreditos f o r a m "vigários e n c o m e n d a d o s .

6- Foi o r e v e r e n d o p a d r e D o m i n g o s Luís d a Silva, b a c h a r e l f o r m a d o nos


sagrados c â n o n e s , vigário colado, cuja posse t o m o u n o princípio d e fevereiro
d e 1725 até o a n o d e 1 7 4 1 , e m q u e se a u s e n t o u c o m licença p a r a Lisboa, sua
p á t r i a , e até o presente n ã o consta q u e t e n h a desistido.
7 9
Foi o r e v e r e n d o p a d r e M a n u e l da C r u z , b a c h a r e l f o r m a d o nos sagrados
c â n o n e s , n a t u r a l d e Sul-de-Feira, vigário e n c o m e n d a d o desta freguesia, cuja
posse t o m o u e m 1 7 4 1 .
[fl. 8Qv. ] 8 Q
Foi o r e v e r e n d o p a d r e J o s é d e M a c e d o N e t o , j á n o m e a d o , s e g u n d a / /
vez e n c o m e n d a d o desta freguesia, cuja posse t o m o u e m 1744.
9 5
Foi o r e v e r e n d o p a d r e A n t ô n i o J o s é de M o u r a , n a t u r a l d a freguesia das
Lages, j u n t o d a A m a r a n t e , vigário e n c o m e n d a d o desta freguesia, cuja posse
t o m o u e m j u l h o d e 1746.
10 e
Foi o r e v e r e n d o p a d r e J o s é d e M a c e d o N e t o , j á a c i m a n o m e a d o , tercei-
r a v e z v i g á r i o e n c o m e n d a d o d e s t a freguesia, cuja p o s s e t o m o u e m 2 9 d e
j a n e i r o d o a n o de 1747.
11 Q
F o i o r e v e r e n d o p a d r e A n t ô n i o R i b e i r o R a n g e l , b a c h a r e l f o r m a d o nos
s a g r a d o s c â n o n e s , n a t u r a l da c i d a d e d o P o r t o , vigário e n c o m e n d a d o desta
freguesia, cuja posse t o m o u e m 3 d e m a r ç o d e 1748.
12 9
Foi o r e v e r e n d o p a d r e M a n u e l R i b e i r o T a b o r d a , vigário e n c o m e n d a d o
desta freguesia, cuja posse t o m o u e m 28 d e j a n e i r o d e 1750; existe d e p r e -
sente.

O r e n d i m e n t o q u e t ê m os reverendos p á r o c o s ao presente p o d e r á ser de três


até q u a t r o mil "cruzados, uns anos p o r outros, p o r q u e n ã o t ê m r e n d i m e n t o certo.
A igreja n o v a serve de m a t r i z e se principiou a fazer n o a n o de 1730. C u s t o u
o seu t o d o setenta mil c r u z a d o s , e x c e t u a n d o as o b r a s d e " t a l h a dos altares, q u e
estas fizeram as " i r m a n d a d e s c "confrarias, c a d a u m a a sua, a sua custa. C o n c o r -
r e u p a r a esta despesa a i r m a n d a d e d o Santíssimo S a c r a m e n t o , t o m a n d o a s u a
c o n t a assistência à dita o b r a até se findar, e j u n t a m e n t e c o n c o r r e u c o m a m a i o r
i m p o r t â n c i a d e seu custo; c o n c o r r e r a m t a m b é m as mais i r m a n d a d e s , c a d a u m a
c o m o q u e p ô d e , e j u n t a m e n t e os m o r a d o r e s , c o m o q u e lhe c o u b e p o r l a n ç a m e n -
to. É o b r a grandiosa, t a n t o n a g r a n d e z a c o m o n a p l a n t a é o r n a t o , q u e se n ã o é
u m a das m e l h o r e s desta capitania n ã o sei se h a v e r á q u e m a exceda.
265

H á d e n t r o d a m a t r i z cinco " i r m a n d a d e s d e c o m p r o m i s s o , a saber: a d e N o s s a


S e n h o r a d a Conceição^ p a d r o e i r a d a freguesia, â do Santíssimo S a c r a m e n t o , a de
São M i g u e l e Almas, a d e S ã o / / G o n ç a l o , a de Nossa S e n h o r a d a Assunção; e [ fl. 81 ]
três "confrarias: a de Nossa S e n h o r a do Rosário dos Brancos, a d a S e n h o r a S a n t a n a ,
a de S a n t o A n t ô n i o .

1 §
Foi e r e t a a i r m a n d a d e de N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , p a d r o e i r a d a
freguesia, c o m c o m p r o m i s s o a p r o v a d o n o a n o d e 1725. T e m u m a " c a p e l a
d e missas no dia do s á b a d o , a l a d a i n h a c o m solenidade e n o v e n a n a m e s m a
forma, i m e d i a t a a o dia 8 de d e z e m b r o , t u d o p o r t e n ç ã o dos irmãos d a dita
i r m a n d a d e . São "capelães os "párocos da freguesia.
2 â
Foi ereta a i r m a n d a d e d o Santíssimo S a c r a m e n t o c o m c o m p r o m i s s o a p r o -
v a d o no a n o d e 1 7 2 1 . T e m u m a capela de missas todas as quintas-feiras p o r
t e n ç ã o dos seus irmãos vivos e defuntos. São capelães os reverendos p á r o c o s .
3 §
Foi ereta a i r m a n d a d e d e São Miguel e Almas c o m c o m p r o m i s s o a p r o -
v a d o no a n o de 1716; t e m u m a capela d e missas todas as segundas-feiras do
a n o , d e q u e é o capelão o r e v e n d o p á r o c o . T e m o u t r a capela d e missas todos
os dias do a n o pelas do p u r g a t ó r i o , q u e se p a g a do r e n d i m e n t o d a "bacia, d e
q u e é capelão de p r e s e n t e o r e v e r e n d o p a d r e J o s é de M a c e d o N e t o .
4- Foi ereta a i r m a n d a d e d o glorioso São G o n ç a l o c o m c o m p r o m i s s o a p r o -
v a d o n o a n o de 1 7 4 3 , cuja s a g r a d a i m a g e m tinha sido colocada nesta igreja
n o a n o d e 1730.
5- Foi ereta a i r m a n d a d e d e Nossa S e n h o r a da Assunção c o m c o m p r o m i s s o
a p r o v a d o n o a n o d e 1743; são os seus irmãos os h o m e n s p a r d o s e p a r d a s q u e
t o m a r a m a sua conta o o r n a t o da capela e a festejam no seu dia.
6- Foi ereta a confraria da i r m a n d a d e do R o s á r i o dos B r a n c o s n o a n o d e
1727 p o r frei J e r ô n i m o de M o n t e - R e a l , religioso c a p u c h i n h o , m i s s i o n á r i o
apostólico q u e a erigiu c o m a u t o r i d a d e apostólica, ficando a n e x a à confraria
do R o s á r i o d e R o m a , c o m as m e s m a s graças e indulgências q u e à d e R o m a
são concedidas. S e r v e m à dita S e n h o r a os seus / / confrades, q u e s a e m p o r [ fl. 81v. ]
eleição q u e se publica n a p r i m e i r a d o m i n g a de o u t u b r o ; n ã o p a g a m anuais
n e m m e s a d a c e r t a . T e m u m a c a p e l a d e missas t o d o s os d o m i n g o s e dias
santos p o r t e n ç ã o dos irmãos confrades e benfeitores. É festejada a S e n h o r a
n o seu dia; faz-se procissão de terço p e l a r u a nas p r i m e i r a s d o m i n g a s dos
meses. E capelão o r e v e r e n d o p a d r e J e r ô n i m o d a Fonseca Alvares.
1 %
F o i ereta a confraria d a gloriosa S e n h o r a S a n t a n a n o a n o d e 1749 foi
c o l o c a d a a sua i m a g e m nesta m a t r i z e m 1 7 4 1 . T e m u m a c a p e l a d e missas
todas as terças-feiras d o a n o , q u e m a n d a m dizer os seus devotos.
&- Foi ereta a confraria do glorioso S a n t o A n t ô n i o d e Lisboa e m 1749. Foi
colocada a sua i m a g e m imediata à da p a d r o e i r a d a freguesia.
266

H á nesta freguesia 4 5 0 vizinhos, segundo consta do *rol d a Q u a r e s m a deste


p r e s e n t e a n o d e 1750, e m q u e se " d e s o b r i g a r a m 3.838 pessoas, e n t r e b r a n c o s ,
p a r d o s e pretos. E n t r e este n ú m e r o c o m u n g a r a m 2.744 pessoas. H á n a freguesia
oitenta casais livres.
T e m este arraial 302 "fogos, a saber: n a r u a Direita, b a i r r o de S a n t a Q u i t é r i a ,
r u a de S ã o Miguel, r u a d a P r a i a e n o bairro da B o a Vista. T e m o arraial, p e l a r u a
Direita, q u e corre do sul q u a s e p a r a o p o e n t e , p e r t o de meio q u a r t o d e "légua d e
comprido.
H á n e s t a freguesia n o v e "capelas, cujas invocações são N o s s a S e n h o r a d o
R o s á r i o dos P r e t o s , s a n t a Q u i t é r i a , são B e n t o , são C r i s t ó v ã o , são F r a n c i s c o das
C h a g a s , S a n t a n a , s a n t o A n t ô n i o , s ã o Francisco das C h a g a s , N o s s a S e n h o r a d a
Conceição. T o d a s são filiais desta matriz, as quais se e x p õ e m c o m o se segue:

[ fl. 82 ] l â
A capela d e Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , sita n o arraial, q u e / / f o i a m a -
triz velha, serve da " i r m a n d a d e dos pretos, c o m " c o m p r o m i s s o a p r o v a d o n o
a n o d e 1743. A c h a m - s e colocados n a dita capela: Nossa S e n h o r a d o R o s á -
rio, são B e n e d i t o , s a n t a Efigênia e santo E l e s b ã o . T e m " c a p e l ã o , q u e é o
r e v e r e n d o p a d r e Francisco Alvares Passos.
2 ã
A capela de S a n t a Q u i t é r i a sita n o princípio d o arraial d a p a r t e do sul e
fora d a r u a Direita. Foi o seu f u n d a d o r Paulo d e A r a ú j o de A g u i a r n o a n o d e
1728 e o m e s m o é seu a d m i n i s t r a d o r . A o p r e s e n t e n ã o t e m capelão.
3- A capela do glorioso p a t r i a r c a são B e n t o , n o sítio do *capitão-mor Bento
F e r r a z L i m a , q u e foi o seu f u n d a d o r n o a n o de 1718 e é o seu a d m i n i s t r a d o r ,
cujo capelão é o r e v e r e n d o p a d r e A n d r é C o r r e i a V e l h o .
4- A capela do glorioso são Cristóvão, n o sitio d o B a n a n a l , m e i a légua d o
arraial, de q u e foram fundadores o r e v e r e n d o p a d r e A n t ô n i o N e t o Ferreira e
seu i r m ã o o capitão J o s é N e t o d e S o u s a n o a n o d e 1729. H o j e t e m aplicados
os m o r a d o r e s do M o r r o d'Água Q u e n t e , e o sobredito p a d r e A n t ô n i o N e t o
Ferreira é seu capelão.
5 %
A c a p e l a d o glorioso p a t r i a r c a são Francisco, das C h a g a s , n o sítio d e
Rafael J o ã o , e m I t a p a n h o a c a n g a , n o m e s m o r u m o d o sul, u m a l é g u a do
arraial. F o r a m seus fundadores o "sargento-mor A n t ô n i o Ferreira Pinto e o
capitão D o m i n g o s Vieira d e M a c e d o , n o a n o de 1718. E seu a d m i n i s t r a d o r
Rafael J o ã o e é c a p e l ã o õ r e v e r e n d o p a d r e A n t ô n i o J o s é G o m e s .
6- A capela d a gloriosa S e n h o r a S a n t a n a , u m a légua ao n o r t e d o arraial, no
sítio d e M a n u e l d e M a t o s M o r e i r a , seu a d m i n i s t r a d o r . Foi seu f u n d a d o r o
c a p i t ã o T o m é F e r n a n d e s d o V a l e n o a n o d e 1730. A o p r e s e n t e n ã o t e m
s

capelão.
7- A capela de S a n t o A n t ô n i o d e Lisboa,, n o sítio de J o s é Gonçalves L i m a ,
c o m p o u c a diferença d a de S a n t a n a , a c i m a dita, no r u m o e distância. F u n d a -
r a m vários m o r a d o r e s d a q u e l e distrito n o a n o d e 1735, os quais de p r e s e n t e
são seus aplicados. E seu capelão o r e v e r e n d o p a d r e Vicente Luís d e Sá.
267

8- A "capela do glorioso patriarca são Francisco das C h a g a s , n o sítio / / d o [ fl. 82v. ]


B r u m a d i n h o . Foi seu f u n d a d o r o r e v e r e n d o p a d r e M a n u e l J o ã o V a z , n o a n o
de 1706. São seus aplicados os m o r a d o r e s daquele c o n t o r n o . E seu "capelão
o r e v e r e n d o p a d r e Filipe d e C e r q u e i r a T á v o r a .
9- A c a p e l a d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o n o sítio d e M a n u e l P e r e i r a
Bastos e seus sócios. Foi seu fundador o "capitão F e r n a n d o B i c u d o de A n d r a d e
n o a n o d e 1711. E seu capelão o r e v e r e n d o p a d r e J o s é d e Caldas B a r b o s a .

1 Q
C o n s t a o sítio do B r u m a d i n h o e S u m i d o u r o d e 26 m o r a d o r e s aplicados
à sobredita capela de São Francisco.
2 5
O sítio d a C a c h o e i r a , d e 27 m o r a d o r e s aplicados à capela a c i m a dita d e
Santo Antônio.
3 Q
C o n s t a o sítio d o P i r a c i c a b a d e 16 m o r a d o r e s . N ã o t e m c a p e l a a q u e
sejam s e n ã o a matriz, digo, a q u e sejam aplicados senão a matriz.
4 9
O sítio do I t a p a n h o a c a n g a ^ M a c a q u i n h o e M a t o Grosso, d e 13 m o r a d o -
res aplicados à capela d e São Francisco.
5- C o n s t a o arraial do M o r r o d ' A g u a Q u e n t e d e 42 m o r a d o r e s . Principiou
a povoar-se n o a n o de 1728, q u a n d o se descobriu o o u r o [no] m e s m o m o r r o
d e q u e t o m o u o n o m e e j u n t a m e n t e de u m olho d ' á g u a q ü e nele nasce q u e n -
te ém todas as estações do a n o , a qual, dizem os mestres d a m e d i c i n a , passa
por minas de antimônio e que é b o a p a r a várias enfermidades. Os quais
:

s o b r e d i t o s m o r a d o r e s são aplicados à capela de, S ã o C r i s t ó v ã o d o [ B a n a -


nal?].

T e m esta freguesia q u a t r o "léguas e meia de c o m p r i d o , a saber: do sítio d e


A n t ô n i o F e r r e i r a Fialho até este arraial três léguas e deste a r r a i a l até o ú l t i m o
m o r a d o r desta freguesia, p a r a a b a n d a do B r ú m a d o , o n d e m o r a d o r desta fregue-
sia, u m a l é g u a e m e i a , digo, p a r a a b a n d a do B r u m a d o , o n d e m o r a o ú l t i m o
m o r a d o r desta freguesia, u m a légua e meia, advertindo q u e esta légua e m e i a fica
quase t o d a d e n t r o d o t e r m o da Vila N o v a da R a i n h a , p o r q u e a divisão dos "ter-
m o s faz-se pelo córrego c h a m a d o d a Piçarra, o qual fica u m q u a r t o de légua [de]
distância deste arraial, T e m d e l a r g u r a esta freguesia três léguas, p r i n c i p i a n d o n o
p é d o morro o n d e está o arraial até o *engenho d e P e d r o Francisco d e C a r v a l h o ,
j u n t o ao rio Piracicaba.
T e m nestes limites de freguesia [oito?] e n g e n h o s reais, e m q u e / / se fazem [ fl. 83 ]
alguns açúcares e se destilam aguardentes de cana, e três "engenhocas d a m e s m a , e
18 engenhos de pilões, e m q u e se fazem as "farinhas d e milho, q u e é o p ã o do país.
F o r a dos sítios n o m e a d o s h á vários sítios de que parece escusado fazer m e n ç ã o .
P a r t e esta freguesia pela p a r t e do sul c o m a freguesia d e Nossa S e n h o r a d e
N a z a r é do Inficionado e pela p a r t e do n o r t e c o m a freguesia de S ã o M i g u e l e d e
Santa Bárbara.
268

Sirva d e r e m a t e a esta relação a colocação das duas últimas imagens q u e se


c o l o c a r a m n a m a t r i z desta freguesia; a s a g r a d a e s e m p r e v e n e r a n d a i m a g e m d o
S e n h o r de Bouças, q u e u m seu g r a n d e devoto e a sua custa m a n d o u vir d o R e i n o
r e t r a t a d a *vera effigie p e l a q u e e m M a t o s i n h o s se venera, d e q u e segundo a c o m u m
t r a d i ç ã o foi artífice o santo N i c o d e m u s , a q u a l c h e g o u a esta freguesia e m 5 de
o u t u b r o d e 1748 e se colocou n o altar d e São M i g u e l e Almas e m 26 d e m a i o d e
1749, c m nicho s e p a r a d o p a r a o intento, o n d e está debaixo de cortina q u e se a b r e
q u a n d o é preciso; e a sagrada i m a g e m do arcanjo são Miguel, fabricada de novo
e c o m m u i t a v a n t a g e m à q u e do m e s m o arcanjo se v e n e r o u desde o princípio de
sua " i r m a n d a d e .
M u i t o h a v i a q u e dizer d e a t o tão plausível e d e v o t o , m a s fique p a r a q u e m
m e l h o r o souber expor, q u e eu só fico p e d i n d o a D e u s q u e dê. a Vossas M e r c ê s
paciência p a r a q u e n ã o façam caso dos m e u s erros.
S ã o as notícias que acheí d e antiguidade d a freguesia e j u n t a m e n t e do q u e é
a o p r e s e n t e q u e possa informar a Vossas M e r c ê s . C a t a s Altas, 3 de d e z e m b r o d e
1750 a n o s .

J o s é de L e m o s G o m e s

• 13 <

[Informação das antiguidades da freguesia de Antônio Pereira]

Resposta a inquérito do Senado da C â m a r a de M a r i a n a


dirigido a moradores antigos de diversas freguesias que, ao que
tudo indica, deveria fornecer dados sobre descoberta de ouro e
primeiros povoadores do sítio, origem do seu topónimo, popula-
çãOj igrejas e capelas, seus eclesiásticos e rendimentos, irmanda-
des, limites, áreas povoadas e atividades econômicas. Adaptado
à realidade colonial, corporifica informação semelhante aos in-
quéritos promovidos em Portugal pela Academia Real de Histó-
ria Portuguesa, a partir de 1721, com recolhimento de dados de
fontes autênticas e marcados pela objetividade.
O documento pode ter sido elaborado para referendar pa-
recer sobre o rendimento do bispado de M a r i a n a , a cargo de
C a e t a n o da Costa Matoso. O interesse do ouvidor em reunir
relatos sobre o povoamento de Minas Gerais, seja por exigências
269

do cargo ou pelo seu perfil intelectual, coincide com o falecimen-


to dos remanescentes dos primeiros povoadores de Minas e a
fixação de suas reminiscencias sob a forma escrita.
Autoria, l o c a l e data: Anônimo; Antonio Pereira; ca. 1750.
D e s t i n a t á r i o : Senado d a C â m a r a de M a r i a n a .
C o m e n t a r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna cursiva, re-
gularizada e bastante caligrafada, de extrema clareza p a r a a leitu-
ra. O "d" minúsculo em duas formas: de haste retilinea e uncial.;
" s " final, às vezes medial, pendente, com traço alongado, em
forma d e cajado, sinistrógiro, ao qual.se assemelha a haste infe-
rior do " p " e do " j " ; estes podem ter também a haste com laçada
ampla, sob parte d a palavra. Abreviaturas correntes nos nomes
próprios. (YDL)

F oi descoberto o sítio, q u e hoje é arraial, h a v e r á p o u c o mais ou m e n o s cin-

q ü e n t a a n o s . D o n d e l h e veio o seu n o m e foi do seu m e s m o descobridor se


c h a m a r A n t ô n i o P e r e i r a M a c h a d o , p a i do defunto "escrivão d a C â m a r a
[ fl. 85 ]

desta C i d a d e [ M a r i a n a ] . D a q u i ou dele veio a c h a m a r - s e arraial de A n t ô n i o Pereira.


C r i o u - s e esta freguesia h a v e r á t r i n t a a n o s , p o u c o m a i s ou m e n o s , e f i z e r a m a
igreja m a t r i z o p o v o a sua custa, e t e m p o r invocação e. orago Nossa S e n h o r a d a
Conceição.
O primeiro vigário q u e teve foi o p a d r e J o ã o d e A n d r a d a e Góis; o segundo foi
o p a d r e J o s é Rodrigues d a Costa; o terceiro foi o p a d r e G a s p a r de Fontes C o e l h o ; o
q u a r t o foi o p a d r e P e d r o V a z Dias; o quinto, o p a d r e C a e t a n o C o r r e i a Botelho; o
sexto, o p a d r e Francisco Borges; o sétimo, o p a d r e Julião N u n e s dos Reis; o oitavo,
o p a d r e Gaspar de Fontes Coelho; o n o n o , o *cônego D o m i n g o s Lopes; o décimo,
o p a d r e G a s p a r de Fontes Coelho; o u n d é c i m o , o p a d r e Luís Pereira; o d u o d é c i m o ,
o cónego S i m ã o C a e t a n o ; o décimo-terceiro, o p a d r e M a n u e l d a C r u z e M e l o ; o
d é ç i m o - q u a r t o , p p a d r e G a s p a r dos Reis d a Silveira. T o d o s estes vigários são en-
q u a n t o os senhores reverendíssimos bispos q u e r e m , p o r n ã o s e r e m "colados.
R e n d e líquido d u z e n t a s e c i n q ü e n t a "oitavas, p o u c o mais o u m e n o s , exceto
o r e n d i m e n t o das suas o r d e n s .
T e m esta freguesia q u a t r o " i r m a n d a d e s eretas pelo eclesiástico, a saber: a d o
Santíssimo S a c r a m e n t o , a do S e n h o r d o Bonfim, a das Almas e a d e N o s s a S e n h o -
r a do R o s á r i o dos Pretos. T e m esta freguesia três "capelas, u m a d e i n v o c a ç ã o d e
s a n t o A n t ô n i o , de q u e [é] a d m i n i s t r a d o r J o ã o T e i x e i r a d e C a r v a l h o , o u t r a d e
i n v o c a ç ã o d e N o s s a S e n h o r a da N a t i v i d a d e , de q u e é a d m i n i s t r a d o r o " t e n e n t e
Matias Pinto de Gouveia, e outra de invocação da Senhora Santana, de que é
a d m i n i s t r a d o r o "capitão D o m i n g o s L o p e s d a C r u z . E n e n h u m a t e m " c a p e l ã o ,
p o r n e n h u m dos a d m i n i s t r a d o r e s os p o d e r e m sustentar.
O s sítios q u e t e m a freguesia são os seguintes: o sítio d e M a r c o s B a r b o s a , o
sítio de J o s é d a C o s t a M a c h a d o , o sítio d e A n t ô n i o d a Silva B a r r o s , o sítio d o
270

"tenente M a t i a s Pinto, o sítio de, P e d r o d a Costa, o sítio d e A n d r é d a Costa, o sítio


d e E l e u t é r i o C a l d e i r a , o sítio do "licenciado J o ã o da Silva, o sítio d o " c a p i t ã o
A n t ô n i o F e r n a n d e s , o sítio d e M a n u e l R o d r i g u e s C o e l h o , o sítio do "tenente J o s é
G o n ç a l v e s de M a t o s , o sítio do "alferes J o ã o d e Sousa, o sítio de C l e m e n t e dos
B a n h o s , o sítio de Silvestre C o r r e i a , o sítio de J o s é d e M o r a i s , o sítio do defunto
" a j u d a n t e M a n u e l do R e g o , o sítio do capitão D o m i n g o s Lopes, o sítio d o *sar-
g e n t o - m o r J o s é d a Silva Preto, o sítio d e J o ã o M u n i z , o sítio d e M a n u e l F e r r e i r a
d o V a l e , o sítio d e Luís da Costa, o sítio d o p a d r e G a s p a r d e Fontes, o sítio de
C r i s p i a n o B o r g e s , o sítio d e S e b a s t i ã o d e L i m a , o sítio d e J o ã o G o n ç a l v e s d e
A r a ú j o , o sítio d e J o ã o T e i x e i r a de C a r v a l h o , q u e p o u c o v a l e m .
[ fl. 85v. ] T e m a freguesia d e extensão, p o r u m a b a n d a , duas "léguas, p o u c o mais ou
m e n o s , e pelas outras três p a r t e s u m a , p o u c o mais ou m e n o s .
T e m esta freguesia 157 "fogos. H á nela mil pessoas, 750 de c o m u n h ã o , 250
q u e n ã o c o m u n g a m , entre b r a n c o s e pretos.

> 14 <

[ fl. 86 ] História do distrito do Rio das Mortes, sua descrição,


descobrimento das suas minas, casos nele acontecidos entre
paulistas e emboabas e ereção das suas vilas

Narrativa sobre a descoberta de ouro em São J o ã o del-Rei


e m 1704, as hostilidades e disputas entre paulistas e reinóis, os
combates entre os mesmos nos meses de outubro e novembro de
1709, as estratégias de defesa dos emboabas, a atuação de Antô-
nio de Albuquerque Coelho de Carvalho, criação da vila, provas
de lealdade e obediência de seus moradores durante a invasão do
Rio de Janeiro pelos franceses em 1711 e durante a revolta de
1720 em Vila Rica, Inclui-se descrição da tormenta enfrentada
por Pedro Alvares Cabral n a viagem de descoberta do Brasil em
1500. Sua tônica é francamente favorável aos portugueses, com
ênfase na idéia de sacrifício, e crítica em relação aos paulistas.
Encarregado d a expedição de demarcação de limites en-
tre as capitanias de Minas Gerais e de São Paulo, o ouvidor da
comarca do Rio das .Mortes, solicitou o documento provavel-
mente para subsidiar sua ação, procedimento de praxe em mis-
sões do gênero.
O interesse do ouvidor em reunir relatos sobre o povoa-
mento de Minas Gerais, seja por exigências do cargo ou por seu
perfil intelectual, coincide com o falecimento dos remanescentes
dos primeiros povoadores de Minas e a fixação de suas reminis-
cências sob a forma escrita, colecionadas por particulares.
Autoria, l o c a l e data: José Alvares de Oliveira; São J o ã o
del-Rei; ca. 1750.
D e s t i n a t á r i o : T o m á s Rubim de Barros Barreto do Rego.
U s o n a historiografia: Afonso de E. T a u n a y sublinha o
caráter dos taubateanos com passagens extraídas do material
adiante; usa o relato para atenuar o número de paulistas mortos
no massacre do Capão da Traição, polemizando com
historiadores mineiros ao defender que os emboabas presentes
e r a m poucos e de baixa condição (História geral das bandeiras paulistas.
São Paulo: Imprensa Oficial, Museu Paulista, 1948. V. 9, p. 552);
dentre outros documentos da série de relatos presentes neste Códice
que mencionam os conflitos entre paulistas e reinóis, obtém ma-
téria para sua reconstituição das descrições e episódios da Guer-
r a dos E m b o a b a s , o caráter dos personagens, suas principais
ações, as atitudes dos líderes emboabas e as reações dos paulistas,
os procedimentos dos governadores envolvidos, a história da fun-
dação de vilas e diversas biografias (v. 9, p. 449-641 e, ainda que
muito menos freqüente, 1949, v. 10, p. 3-234). Charles R. Boxer,
a partir deste documento, discute os ânimos acirrados e o arse-
nal de armas exibidos por paulistas (A idade de ouro do Brasil: dores
de crescimento de uma sociedade colonial. 2. ed. São Paulo:
Nacional, 1969. p, 85); a atrocidade do episódio do C a p ã o d a
Traição (p. 89); reconstitui os combates entre reinóis e paulistas,
(p. 102); e a atuação de dom Fernando Martins Mascarenhas de
Lencastre (p. 95). S. Suanes utiliza-o na remontagem da Guerra
dos Emboabas (Os emboabas. São Paulo: Brasiliense, [1959]. p. 97,
215, .224, 275, 300).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O texto é precedido por u m exórdio
que, conforme as normas retóricas clássicas, visa obter a simpatia
do destinatário do discurso e contém duas partes: proposição (enun-
ciado do tema ou assunto) e divisão (enumeração das partes do
discurso e da trajetória a seguir pelo autor). Neste caso, conforme
as regras retóricas, contém ainda a aplicação de tópicas caracte-
rísticas do gênero encomiástico. A identificação do narrador como
participante dos fatos que relata visa produzir o efeito de maior
credibilidade a sua narrativa. Ó documento apresenta caracterís-
ticas do gênero epidítico ou demonstrativo da oratória: elogia a
riqueza local; tipifica como heróica a ação dos emboabas, parti-
cularmente na luta contra os paulistas, desqualificados por tópicas
de vituperação e ferocidade e pela atribuição de temeridade (vício
forte, segundo classificação aristotélica; portanto, passível de pu-
nição); justifica a reação violenta dos emboabas e a derrota e
272

covarde fuga dos paulistas como punição por seus vícios; e louva a
lealdade dos habitantes da região. O narrador introduz o elogio
do lugar em modo encomiástico e com a aplicação de tópicas
poéticas do locus amenus ("lugar ameno"). £JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna regulariza-
d a e caligrafada. Apresenta capitular no título, com arabescos e
volutas, muitas maiúsculas iniciais de parágrafo em importantes
capitulares. M a n t é m a ligatura "st" com movimento circular n a
haste superior do "t", O "d" minúsculo uncial e de largo traço,
alterna com o "d" retüíneo, terminado por movimento circular e
perfil. " A " maiúsculo com apex em forma a r q u e a d a . M e s m a
letra do documento 5- O texto possui página de título, (YDL)
Cópias impressas:
H I S T O R I A do distrito do R i o das Mortes. Jornal do Comércio,
Rio d e j a n e i r o , 1 jun. 1947, p . 2; 8 j u n . 1947, p. 2; 15 jun.
1947, p. 2.
T A U N A Y , Afonso de E. Documentos inéditos sobre, as primeiras
descobertas do o u r o em M i n a s G e r a i s . Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 44, p. 367-
391, 1948.
T A U N A Y , Afonso de E. Relatos sertanistas. São Paulo: Martins,
1953. p. 89-119.

[ fl. 87 J / V o s e n
h o r d o u t o r T o m á s R u b i m d e B a r r o s B a r r e t o do R e g o ,
/ \ ineritíssimo *ouvidor-geral e " c o r r e g e d o r d a c o m a r c a d o
JL \ji.io das M o r t e s e nela "juiz dos feitos d a C o r o a , "superin-
t e n d e n t e das t e r r a s e á g u a s m i n e r a i s , " p r o v e d o r dos defuntos e
ausentes, capelas e resíduos e "auditor-geral d a gente de g u e r r a .

Aos pés de Vossa M e r c ê , sábio, erudito e benéfico "ministro, e m cujas m ã o s


se vê e m p u n h a d a a v a r a de Nêmesis,* s e m p r e b r a n d a m a s n u n c a torcida, e delas
p e n d e a b a l a n ç a de T ê m i s , ^ em q u e p o n d o Vossa M e r c ê o p e s o de sua

Na mitologia grega, Nêmesis personifica a correção divina (castigo e vingança) a que estão sujeitos
todos os mortais que se erguem acima da sua própria condição, despertando a inveja dos deuses e
abalando o equilíbrio cósmico. No texto, avara de Nêmesis, "sempre branda mas nunca torcida", do
doutor Tomás Rubim, em cujas mãos vai empunhada, é o instrumento com que exerce a justiça
entre todos os mineiros e miseráveis, com igualdade e comiseração, distribuindo-a como correção dos
excessos humanos que podem causar O desequilíbrio e a discórdia nas Minas..
Na mitologia grega, Témis, uma das esposas de Zeus, é a deusa da lei. Era representada com ama
venda nos olhos e uma balança na mão, simbolizando a imparcialidade dos julgamentos.
273

c o m i s e r a ç ã o , sem faltar a justiça, c o m o b o m e reto "ministro, a faz s e m p r e inclinar


p a r a a p i e d a d e , t e n d o - a p a r a c o m os miseráveis, c o m p o n d o a u n s e v a l e n d o a
outros, r e q u i n t a n d o a sua b o n d a d e no desprezo d a p r ó p r i a conveniência, c o m o a
gratidão n ã o só destes assevera m a s t a m b é m aqueles m i n e i r o s q u e Vossa M e r c ê ,
logo q u e e n t r o u n a c o m a r c a e t o m o u inteiro c o n h e c i m e n t o do estado dela, con-
v o c o u , ajustando c o m p a n h i a s p a r a fazerem serviços e v i r a r e m rios, a j u d a n d o as
despesas q u a n d o as n ã o d e s p e n d i a d e t o d o , sem mais interesse q u e o fervoroso
desejo d e q u e se extraísse o u r o p a r a a u m e n t o d a c o m a r c a e d e s e m p e n h o d o s
m e s m o s mineiros, virtudes estas q u e c a d a u m a d e *per se se faz m e r e c e d o r a d e u m
elogio a q u e n ã o p o d e c h e g a r todo o m e u e n c a r e c i m e n t o .
A o s pés d e V o s s a M e r c ê , t o r n o a dizer, m e p o n h o , e n a s m ã o s d e V o s s a
M e r c ê este p a p e l e m q u e ofereço a história do distrito do R i o das M o r t e s , sua
d e s c r i ç ã o , d e s c o b r i m e n t o d e suas m i n a s , casos nele a c o n t e c i d o s e civil d i s p u t a
entre paulistas e e m b o a b a s , r e p r e s e n t a d a no teatro do Arraial N o v o , e r è t o depois
a vilã d e São J o ã o del-Rei. E n ã o duvido se pudesse "invenir sujeito q u e p o r fazer
p a p e l no m e s m o teatro e ser ciente d e todos os fastos d a história [a] expusesse c o m
m a i s e l e g â n c i a aos olhos d e V o s s a M e r c ê , p o r é m n ã o m a i s v e r d a d e i r a e s e m
hipérboles q u e a f a ç a m f a b u i o s a n e m seus acontecimentos p o r m e l h o r seria e s e m
episódios q u e a s u j e i t e m a crítica, e p e r d o e m - m e os "aristarcos; só sim aos lacônicos
p e ç o relevem a cacofonia das frases / / e a grosseria d o estilo, p o r q u e estando a [ fl. 87v. ]
m i n h a m e m ó r i a tão defecada, é por isso esquecida dos preceitos d a retórica, q u e
p o d e p r o d u z i r o m e u e n t e n d i m e n t o s e n ã o toscos discursos?
E p o r esta confissão q u e faço, p e ç o e confio n a s u m a discrição e p r u d ê n c i a d e
Vossa M e r c ê . D e s c u l p a r á o q u e n a história p a d e c e r censura, n ã o t a n t o pelo t r a b a -
lho q u e tive d e d e s e n t e r r a r d a sepultura d e u m a i g n o r â n c i a q u a s e invencível o
q u e nela se c o n t é m m a s pela g r a n d e v o n t a d e q u e s e m p r e m e assistiu d e d e s e m p e -
n h a r n a m e l h o r f o r m a q u e m e fosse possível o m a n d a t o d e Vossa M e r c ê . E j u n t a -
m e n t e seja-me t a m b é m desculpada a negligência d a d e m o r a , a t e n d e n d o aos anos
que conto, p o r q u e em semelhante idade tudo é melancolia, nada sangue, tudo
pituíta, n a d a bilia.^ D e u s a Vossa M e r c ê dilate os anos de vida c o m as p r o s p e r i d a -
des q u e deseja este, d e V o s s a M e r c ê mais v e n e r a d o r e h u m i l d e criado.

J o s é Alvares d e Oliveira.

O autor refere-se, decerto, a sua condição de homem de idade em que existir é esperar ofimda vida,
já destituída de emoções e fortes sentimentos. Este sentimento estariafiguradonas palavras 'pituita*
(excremento humano que escorre dentro do corpo, em senüdo figurado, resignação, melancolia,
sentimentos de pessoa velha) e 'bilia' (relativo a bílis, em sentido figurado, sangue, indignação e ira,
sentimentos de pessoa com vitalidade e vigor).
274

[ fl. 88 ] História d o distrito do R i o das M o r t e s , sua descrição,


d e s c o b r i m e n t o das suas m i n a s , casos nele acontecidos entre paulistas
e e m b o a b a s e e r e ç ã o d a s s u a s vilas

N a p a r t e o r i e n t a l d a A m é r i c a q u e c o r r e do e q u i n ó c i o p a r a õ m e r i d i a n o ,
d o m i n a a C o r o a p o r t u g u e s a a q u e l a g r a n d e p o r ç ã o d e t e r r a q u e se e s t e n d e d o
rio d e V i c e n t e P i n z ó n , q u e d e m o r a a o n o r t e d o dos A m a z o n a s — d e m a r c a ç ã o
a j u s t a d a n o T r a t a d o d e U t r e c h t p a r a a divisão dos limites d o G r ã o ^ P a r á , d a
o b e d i ê n c i a d e P o r t u g a l — até o sul d o rio d a P r a t a , e m t a n t a distância q u a n t o o
p a d r e B l u t e a u diz nas suas Prosas^ sé d á de l o n g i t u d e d e s d e P o r t u g a l à c i d a d e d o
G r ã - C a i r o n o E g i t o , i n c l u i n d o e m si p m e s m o G r ã o - P a r á , M a r a n h ã o , C e a r á ,
P a r a í b a , P e r n a m b u c o , B a h i a , Espírito S a n t o , R i o d e J a n e i r o , S a n t o s , R i o G r a n -
de e o mais que continua até a Colônia do Sacramento, com inumeráveis povo-
a ç õ e s , g r a n d e p l u r a l i d a d e d e vilas e várias cidades, s e m falar nas ilhas a d j a c e n -
tes e as mais q u e p e r t e n c e m a este c o n t i n e n t e , e t u d o m e l h o r c o n h e c i d o d e b a i -
xo d o n o m e d e Brasil.
N o m e este de Brasil q u e n ã o deixarão de c e n s u r a r os reparativos p o r se p r e -
ferir o n o m e de u m p a u , a i n d a q u e precioso, a o do sacrossanto M a d e i r o d a C r u z ,
p r i m e i r o n o m e q u e ao d e s c o b r i m e n t o d a A m é r i c a p o r t u g u e s a pôs P e d r o Alvares
C a b r a l q u a n d o , no a n o de 1501,~* p a s s a n d o à í n d i a p o r "cabo d e treze n a u s a o sul
d a linha, lhe sobreveio u m a t o r m e n t a tão rija que, crescendo p o r h o r a s , a m e a ç a v a
naufrágios, p o r q u e , além de a chuva ser u m dilúvio tal q u e p a r a efluir a q u e caía
[ íl. 88v. ] d e n t r o nas n a u s e r a m estreitos c a n o s os * i m b o r n a i s , e os t r o v õ e s e r a m / / tão
contínuos e tão rasgados e c o m tanta repetição de "fuzis q u e a gente se considera-
v a cega e, p e l o i n c e s s a n t e do e s t r o n d o , a t u r d i d a . O m a i s e r a q u e o m a r , pelo
impetuoso do v e n t o , se alterava c o m o n d a s tão e m p o l a d a s que se a v i z i n h a v a m às
n u v e n s , e o ar, c o n d e n s a d o e t e n e b r o s o , f o r m a v a t ã o g r o s s a s n u v e n s q u e se
" p r o p i n q u a v a m às ondas. E assim j u n t o s estes alimentos, e c a d a u m de *per se, se
e m p e n h a v a m n a s u b m e r s ã o d a q u e l a armada^ p o r q u e se e m b r a v e c i a m e m t a n t a
m a n e i r a e c o m t a n t a s o b e r b a q u e se faziam intoleráveis, e t a n t p q u e à s o b e r b a do
a r cede o m e s m o Sol d e i x a n d o encobrir as luzes p a r a fazer t u d o trevas, de sorte
q u e se n ã o j u l g a v a se e s p u m a v a m as n u v e n s ou se r e l a m p e j a v a m as o n d a s . As
naus, entre m o n t a n h a s de m a r , ainda q u a n d o arfavam, m a l se viam; isto d e dia,
q u e d e n o i t e , p o r intervalos, se divisavam, p o r q u e as luzes dos faróis e r a m m e t e -

BLUTEAU, Raphael. Prosas portuguesas, recitarias em diferentes congressos acadêmicos pelo padre
dom Rafael Bluteau. Parte primeira e parte segunda. Lisboa Ocidental; Oficina de Joseph Antônio
daSylva, 1727-1728.
Alguns autores dos. séculos XVI, XVII e XVIII atribuíam o ano de 1501 como o da descoberta do
Brasil.
275

oros q u e a p e n a s a l u m i a v a m q u a n d o j á p o r interpolação das o n d a s d e s a p a r e c i a m ,


O "santelmo j á a p a r e c e n d o no convés p a r a alijar, c o m o se fez d e t u d o q u e se
a c h o u n o m e s m o convés, e e n t r e p o n t e s j á a p a r e c e n d o n o s vôos dos "mastaréus
p a r a a r r e a r . E supostos os "joanetes se t i n h a m d e s a p a r e l h a d o e as gáveas i a m a
m e i a haste e metidas nos "rizes, f o r a m d e t o d o a r r e a d a s ao soco e ferrado o p a n o ,
ficando c o m " m e z e n a e "traquete " a m o r a d o p o r b o m b o r d o , p a r t e d e o n d e v i n h a
a t o r m e n t a , f o r a m forcejando pela m e s m a "derrota q u e t r a z i a m antes do t e m p o -
ral. P o r é m , n ã o p o d e n d o j á c o m ele, p e l o m u i t o q u e t i n h a c r e s c i d o , a g e n t e ,
a q u e b r a n t a d a das fainas e vigílias q u e semelhantes ocasiões t r a z e m consigo, e o
m a i s e r a c o m as b o m b a s n a m ã o e desfalecidos de forças p e l o p o u c o s u s t e n t o ,
p o r q u e as escotilhas e "gazalhados tudo ia fechado. O fogão c o m o se n ã o h o u v e -
ra, a respeito das ["carrancas?] do m a r , q u e a l c a n ç a n d o u m a s às outras e b a t e n d o
nó costado, e n t r a v a m p o r u m b o r d o e saíam pelo outro.

M e t e r a m de a r r i b a d a e, c a r r e g a d o o t r a q u e t e a c i m a e "ferrada a " m e z e n a ,
a p e r t a r a m as "enxárcias, atesaram os "estais p a r a segurança dos mastros e mastaréus;
e p a r a segurança das vergas reforçaram as "ostagas e p a s s a r a m "bocas e m ajuda aos
"enxertários. T u d o se fazia necessário a respeito do vento q u e tão furiosamente as
suavizava pelas "entenas q u e as queria levar diante de si. E seguro o leme c o m força
de "talhas, p a r a que c o m o bater n ã o aluísse a "cadaste, d e r a m p o p a ao t e m p o , e
c o m ela íoram "correndo à árvore seca, m a s s e m p r e p o r debaixo d o m a r , p o r q u e
este, encapelando-se por c i m a da "grinalda, alagava t u d o da p o p a à p r o a , e c o m o
t a n t o p o r este a-balo c o m o pelos b a l a n ç o s das n a u s se n ã o via fixo o r u m o q u e
l e v a v a m p o r variar a agulha, e m e n o s se sabia a altura, que p o r falta do Sol n ã o
tinha, uso o astrolábio. T o d o s esmorecidos, e desmaiados todos, e mais m o r t o s do
que vivos, tinha c a d a u m p a r a si q u e ã m e s m a n a u / / e m q u e iam era féretro q u e o [ fl. 89 ]
levava p a r a a sepultura. E q u a n d o menos conta faziam das vidas, do cesto da gávea
gritou o gajeiro: " T e r r a pela proa!", e c o m o o t e m p o r a l os ia e m p u r r a n d o p a r a o
rolo d a costa p o r falta de governo, desfizeram os bolsos do traquete e, b r a c e a n d o
p o r estibordo, f o r a m c o s t e a n d o a dita terra, e. d a n d o vista de u m a " a b r a e u m a
e n t r a d a , p u s e r a m p r o a a ela, e a t o d o o risco, sem sondar, a e n t r a r a m , e fixas as
a m a r r a s n a "abita; "desaboçadas as âncoras, d e r a m f u n d o u
S u r t a e a n c o r a d a a a r m a d a n a q u e l e desconhecido p o r t o , lhe p u s e r a m o n o m e
de S e g u r o , q u e a i n d a hoje conserva e t o d a a sua capitania. E logo os a r g o n a u t a s ,
s a l t a n d o e m t e r r a , a i n t i t u l a r a m de S a n t a C r u z , cuja á r v o r e b e n d i t a p l a n t a r a m
e n t r e as formosas q u e a terra p r o d u z , p a r a q u e o frondoso de seus r a m o s servisse
de "dossel àquela soberania, e. foi levantado este " t r a n s u n t o n ã o p o r sinal d e q u e
ali t i n h a m a p o r t a dos cristãos m a s p a r a q u e a todo o t e m p o servisse d e p a d r ã o p o r

Episódio constituído por tópicas características do subgénero épico-marítimo, de sólida tradição na


poesia portuguesa. (JPF)
276

q u e constasse q u e tal d e s c o b r i m e n t o pertencia àquela nação, cujo escudo se esmalta


c o m as chagas q u e n a q u e l e patíbulo r e c e b e u n a sua morte, o a u t o r d a vida. A o p é
dela se l e v a n t o u altar e se celebrou o santo sacrifício d a missa, p a r a consolação d e
todos è b ê n ç ã o d o novo *país, ação n a t u r a l d a catolicidade dos portugueses, ofici-
a d a e m q u a l q u e r p a r t e o n d e os a p o r t a v a m seus cristãos atrevimentos. R e p a r a d a s ,
enfim, as naus do g r a n d e destroço recebido de tão procelosa t e m p e s t a d e e posta
d e V e r g a d'alto c o m o p a n o n a verga, levadas as â n c o r a s , se fizeram à vela, u m a
delas d e aviso p a r a P o r t u g a l e p a r a o I n d o s t ã o as outras.
Visto se deixar n o e s q u e c i m e n t o o p r i m e i r o n o m e p o s t o à n o v a terra, b e m
p o d i a m os primeiros íncolas, c o n t i n u a r ã o os censores, dá-la a c o n h e c e r ao m u n d o
debaixo d a régia inscrição d e N o v a Lusitânia o u N o v o Portugal, assim c o m o p e l a
o c o r r ê n c i a dos t e m p o s as outras nações, cheias d e j a c t â n c i a , r e n o v a r a m [nas suas
colônias?] o n o m e das suas m o n a r q u i a s , c o m o os castelhanos n o golfo d o M é x i c o
a N o v a E s p a n h a , os franceses n a Virgínia a N o v a F r a n ç a e os ingleses n a T e r r a do
L a b r a d o r a N o v a B r e t a n h a ou N o v á Inglaterra, a fim d e e n g r o s s a r e m pelos títulos
o o b j e t o d a s suas c o n q u i s t a s a o j u í z o d o m u n d o e t e r e m e n t r a d a n a f a m a d e
descobridores, m e r c ê q u e no C a m p o do O u r i q u e só aos portugueses foi conheci-
d a e pelo m e m o r á v e l infante d o m H e n r i q u e III, filho d o s e n h o r rei d o m J o ã o , o
p r i m e i r o , posta e m p r a ç a e p o r ele m a n d a d a executar. M a s os antigos p o r t u g u e -
ses, c o m o n a sua singeleza n ã o t i n h a lugar a v a i d a d e , a c o m o d a r a m - s e c o m a natu-
[ fl. 89v. ] r a l i d a d e d a t e r r a / / d o Brasil q u e , d e s d e o r e i n a d o do s e n h o r rei d o m J o ã o , o
q u a r t o , logra o honorífico título d e p r i n c i p a d o .
A este pois espaçoso e dilatado continente — q u e p u d e r a ser m a i o r se assim
c o m o as m a i s nações c u i d a m e m estender os seus domínios, cuidara a n a ç ã o por-
tuguesa e m s e n h o r e a r e c o n s e r v a r o q u a n t o a f o r t u n a n a A m é r i c a lhe t r i b u t o u
p a r a dilatação d e sua m o n a r q u i a e g r a n d e z a d e seu império — quis a Divina P r o -
v i d ê n c i a , a l é m das p r e c i o s i d a d e s q u e p r o d u z , e n r i q u e c e r n ã o só c o m m i n a s d e
d i a m a n t e s , topázios e m a i s p e d r a s preciosas m a s d e o u r o , q u e p o r espaço de qui-
n h e n t a s léguas, q u a s e em q u a d r o , se está extraindo e m m u i t a s p a r t e s , cuja insaci-
ável fome do todos os mortais obrigou e obriga a tanta gente q u e se c o m p õ e hoje
este vasto país e "província das M i n a s de muitos lugares, vilas e d a C i d a d e M a r i a n a
c o m g o v e r n o eclesiástico, e assim t a m b é m de militar e político, p o r q u e se divide
e m três governos e várias c o m a r c a s c o m "ouvidorias e " c â m a r a s , sendo u m a das
ditas a do R i o das M o r t e s , p o v o a d a d e n t r o d a extensão de q u a s e sessenta "léguas,
d e v á r i a s freguesias e d u a s vilas: a d e São J o s é , m e n o s d e u m q u a r t o d e légua
desviada do rio de q u e a c o m a r c a toma o n o m e p a r a a p a r t e do nascente, situada e m
u m arraial q u e j á dos primeiros anos deste século d e oitocentos se c o m p u n h a , c o m
sua capela de Santo Antônio, de alguns moradores q u e p o r vários ribeiros minera-
v a m , e dista cinco quartos d e légua, p o u c o mais ou m e n o s , p a r a rio abaixo até o
p o r t o q u e c h a m a m Real, pelo "contrato da sua passagem; e, p o u c o mais de m e i a
légua do dito rio p a r a a p a r t e d o poente está a vila de São J o ã o del-Rei, n o lugar do
arraial q u e teve princípio n o a n o de setecentos e cinco, a o qual, p o r posterior ao
arraial d a o u t r a p a r t e , se deu o n o m e de Arraial N o v o .
Este pois A r r a i a l N o v o , e n o v o e m t u d o , n ã o só pelos novos d e s c o b r i m e n t o s
m a s p o r se a c h a r o u r o e m seus m o r r o s t a n t o à flor d a terra q u e s e m p r e foi novida-
de a i n d a p a r a os mineiros mais investigantes, a o p é d e u m destes e de mais opi-
nião se assentou, da p a r t e d o nascente, n a vizinhança de u m ribeiro q u e hoje c o r t a
a vila pelo m e i o , e sobre o c a m i n h o q u e v e m de p o v o a d o , c a m i n h o antiquíssimo
q u e s e m p r e s e g u i r a m as b a n d e i r a s dos sertanistas p a r a o sertão dos Gataguases até
o fim do século d e setecentos, q u e deste t e m p o p o r diante o m e s m o c a m i n h o , q u e
só era trilhado dos sertanistas, se fez u m a estrada freqüentada de m u i t a gente t a n t o
de S e r r a A c i m a c o m o de Serra Abaixo. / / E suposto desta a o princípio, m o r r e s s e [ fl. 90 ]
b a s t a n t e p a r t e , u n s e n c o n t r a n d o a m o r t e n a agrestidão de tal c a m i n h o e o u t r o s n a
maleficência dos n a t u r a i s , c o n t u d o , n ã o se escusavam d o convite q u e lhes faziam
as m i n a s d e n o v o d e s c o b e r t a s n o m e s m o sertão dos C a t a g u a s e s , n o m e q u e nos
p r i m e i r o s anos tiveram, c h a m a d a s M i n a s Gerais pela extensão das q u e depois se
foram descobrindo, a q u e t a m b é m pelo t e m p o a d i a n t e se lhes foi a c o m o d a n d o o
n o m e do sítio d e seu d e s c o b r i m e n t o . E c o m o a riqueza delas a n i m a v a a o c o m é r -
cio e este se fazia, c o m risco, do R i o d e J a n e i r o p o r m a r p a r a P a r a ü , e desta vila
c o m o t r a b a l h o d e subir a serra e m e t e r - s e n e s t a e s t r a d a , se d e t e r m i n o u a b r i r
c a m i n h o e m d i r e i t u r a das ditas M i n a s a o R i o de J a n e i r o , c o m o d e p r ó x i m o se
tinha e x e c u t a d o , o qual se distinguiu c o m o n o m e de C a m i n h o N o v o deste anti-
go, q u e ficou sendo o C a m i n h o V e l h o .
E o o u r o q u e agora dos ditos m o r r o s e córregos q u e deles saem se tira c o m
limitação e c o m assaz dificuldade então se extraía c o m tanta facilidade e g r a n d e z a
q u e e m breve t e m p o se fez u m arraial d e bastantes m o r a d o r e s paulistas e e m b o a b a s
(nome este que, por abjeção, deu a altivez dos naturais à submissão dos forasteiros).
Deste dito Arraial N o v o , ou nova p o v o a ç ã o , se tratará neste papel: dos sucessos e
tragédias q u e nele e n a sua vizinhança se executaram, e da emulação c o m q u e p o r
bocas d e fogo disputaram entre si aâ insolências dos paulistas e as desesperações dos
e m b o a b a s , e dos mais acontecimentos e ações q u e e m m e m ó r i a , pelos muitos anos
gasta das limaduras do t e m p o ainda se conservarem, o q u e t u d o se reserva p a r a seu
lugar. E assim voltando a o princípio desta nova p o v o a ç ã o , o u Arraial N o v o , terão
t a m b é m c o m ele princípio os sucessos acontecidos pelo decurso d e vários tempos e
ocorrência de alguns anos.
S e n d o n o a n o d e 1704 p a r a o de 1705 descobertas as ditas m i n a s e noticiados
os tais descobrimentos, a c u d i r a m logo paulistas è t a u b a t e a n o s , t a m b é m tidos p o r
paulistas, c o m o todos os naturais d e S e r r a A c i m a , p r e z a n d o - s e m u i t o deste n o m e
e n a q u e l e t e m p o p o r horrendo, fero, ingente e temeroso, e a p o d e r a n d o - s e d e t o d o o
d e s c o b e r t o c o m o c o s t u m a v a m e m todas as m i n a s , p o r q u e e m t o d a s p u n h a m e
d i s p u n h a m d e s p o t i c a m e n t e pelo d i t a m e d e assim o quero, assim o mando, e à razão
prevalece a vontade!, à q u a l t u d o estava sujeito, e n ã o só a eles c o m o t a m b é m aos
278

cotidianos atrevimentos de seus bastardos, "carijós é " t a p a n h u n o s às "lojas e *vendas


dos m e r c a d o r e s e "tratantes. C o m o a tal noticia, pelos sinais e disposições q u e se
t i n h a m visto e observado p o r t o d o o descoberto e alguns exames feitos, se espalhasse
assaz e n c a r e c i d a , c o n c o r r e u à r e p a r t i ç ã o b a s t a n t e gente de u m e o u t r o partido,,
[ fl. 90v. ] lisonjeados das b o a s e s p e r a n ç a s , s e m p r e c o m p a n h e i r a s d e todos / / os mineiros,
a i n d a q u e m u i t a s vezes mal logradas esperanças; p o r é m estas, pelo t e m p o adiante,
c o r r e s p o n d e r a m c o m o p r ê m i o a o t r a b a l h o d e m u i t o s e e m várias p a r t e s c o m
g r a n d e z a s m e n o s esperadas de alguns.
F e i t a á r e p a r t i ç ã o e i n t e i r a d o s Os paulistas c o m o d o m i n a n t e s m u i t o a s u a
satisfação, t a n t o n o m e l h o r dos m o r r o s c o m o do ribeirão S ã o F r a n c i s c o X a v i e r ,
q u e corre p o r detrás dos ditos m o r r o s da p a r t e do p o e n t e , p a r a l a v r a r e m e v e n d e -
r e m , o mais se repartiu pelos mais conforme a sorte de c a d a u m . C u i d a r a m logo
os e m b o a b a s de formar arraial e fazer ranchos (ditas assim as casas d e vivenda p o r
serem levantadas d e taipa d e m ã o c o m c o b e r t u r a d e palha) e, a o m e s m o t e m p o ,
erigiram sua "capela, c o n s t r u í d a dos m e s m o s m a t e r i a i s , q u e se d e d i c o u a N o s s a
S e n h o r a do Pilar, auxílio e p r o t e t o r a q u e e n t ã o foi do dito arraial e a g o r a o é d a
vila. E os paulistas se a r r a n c h a r a n ! p o r fora, b u s c a n d o s e m p r e a v i z i n h a n ç a do
m a t o , p a r a se c o m u n i c a r e m c o m as feras de q u e m h e r d a v a m os corações, e n a -
quelas p a r t e s q u e m e l h o r se lhes ofereciam a o g ê n i o l e v a n t a r a m suas m o r a d a s
c o m espaçosas v a r a n d a s p a r a pérgulas de seus passeios e a r m a m e n t ó r i o s , e m q u e
o s t e n t a v a m g r a n d e s cabides de a r m a s p o r fastos indicantes das suas dissimuladas
p r o e z a s , farsa c o m q u e c a d a u m deles afetava o ser u m Atila'' dos e m b o a b a s .

Assim p r i n c i p i o u e cresceu a p o v o a ç ã o , e c o m ela os insultos e insolências


dos paulistas, estímulo principal do q u e adiante se verá. E p o r n ã o ofender m u i t o
os ouvidos dos b o n s c o m o malefício dos m a u s , fique c o m o n o e s q u e c i m e n t o a
relação das mortes q u e se faziam, q u e p a r a se c o m e t e r e m n ã o era necessário qual-
q u e r e m b o a b a cair — b a s t a v a t r o p e ç a r - , f a z e n d o t a n t o a p r e ç o d a vida d e u m
e m b o a b a c o m o á de u m c a c h o r r o , d e q u e nasceu o dito vulgar: ouvindo-se qualquer
tiro, lá morreu cachorro, ou. emboaba. F i q u e m t a m b é m c o m o e m e s q u e c i m e n t o as
repetidas "assuadas q u e pela m e n o r desconfiança v i n h a m d a r à p o v o a ç ã o , e n t r a n -
d o p o r ela c o m gente a r m i g e r a d a , e o s e n h o r n a fronte d e p é descalço e m ceroulas
d e a l g o d ã o a r r e g a ç a d a s a o cós, " c a t a n a "talingada, " p a t r o n a cingida, pistolas n o
cinto, faca n o peito^ "clavina s o b r a ç a d a e n a c a b e ç a ou " c a r a p u ç a de r e b u ç o ou
c h a p é u de a b a caída, ao som de caixa e clangor d e trombeta, v o z e a n d o " M o r r a m
emboabas!". E n ã o só c o m estas tumultuosas a m o t i n a ç õ e s m a s c o m as bravezas de

Rei dos hunos (406-453), sinónimo de conquistador imbatível. Entre suas tantas conquistas, Átila
tornou-se supremo na Europa Central, dominou os territórios entre o mar Cáspio e o Reno; sitiou
Orleans, tia Gália; durante vários anos, atacou a península Balcânica, ameaçando Constantinopla
e atacou a Itália, onde saqueou Milão e a Lombardia Ocidental. De suas conquistas, bravura tí
intrepidez lhe veio o cognome de Flagelo de Deus.
279

u m t a u b a t e a n o c o g n o m i n a d o J a g u a r a , q u e p e l a "língua d a terra é o m e s m o q u e
cachorro bravo, o qual q u a n d o se e m b r i a g a v a / / t o m a v a p o r e m p r e s a o fazer-se p ô r [ fl. 91 ]
a cavalo e, a r m a d o c o m os seus escravos, e n c a m i n h a r - s e p o r distância de mais de
u m a "légua p a r a este arraial, e entrava p o r ele d a n d o mostras d e sua b e b a c i d a d e
pelas b o c a s d e suas espingardas, s e m e a n d o as ruas d e c h u m b o , e p e l a sua m e s m a
b o ç a c o m tais latidos q u e o m e s m o era o J a g u a r a neste arraial q u e o G é r b e r o n o
inferno, e e m t u d o o m e s m o , p o r q u e se o C é r b e r o ^ n o inferno e r a faminto das
almas o J a g u a r a nas M i n a s o era das vidas, e m q u e cevava a s u a fome e a d e
alguns amigos q u e se q u e r i a m valer d a sua b o a v o n t a d e . O s p o b r e s m o r a d o r e s ,
t í m i d o s a q u a l q u e r p r e s s e n t i m e n t o dessas r e p e t i d a s i n g r e s s õ e s i m p e t u o s a s e
vozeadas, n ã o se d a n d o p o r seguros e m suas casas, fechadas as p o r t a s , b u s c a v a m o
esconderijo dos m o r r o s , e assim a r m a d o s de p a c i ê n c i a e c o n f o r m a n d o - s e c o m o
t e m p o p o r presos das suas conveniências i a m b e b e n d o pelo vaso do sofrimento^
t o d o s os dias mil sustos, até q u e os e s t ô m a g o s , d e m a s i a d a m e n t e r e p l e t o s , lhes
c h e g o u a h o r a d e v o m i t a r e m vinganças.
E n t r e estes turbulentos h o m e n s q u e p o r este distrito assistiam, havia u m J o s é
M a c h a d o , h o m e m m a u p o r n a t u r e z a , p o r inclinação insolente, que, a c o m p a n h a -
do d e u m "carijó m a t a d o r p o r ofício e d e u m " b a c a m a r t e b e m " a t a c a d o , fiado e m
u m tio c h a m a d o S i m ã o Pereira de F a r o , h o m e m dos principais e n t r e os paulistas,
Contados e r a m Os dias q u e n ã o andasse p e l a p o v o a ç ã o insultando os m o r a d o r e s ,
p e l o q u e se fez d é t o d o s a b o r r e c i d o e é n t r a n h a v e l m e n t e o d i a d o . E s e n d o e m
j u n h o de 1707j e m antevésperas de S ã o P e d r o , p r a z o d e t e r m i n a d o p a r a o A t r o p o ^
m e t e r a t e s o u r a a o fio d e s u a vida, o levou o destino à casa d e u m D o m i n g o s
R i b e i r o , a q u e m , depois do a t r e v i m e n t o de e n t r a r nela o u s a d a m e n t e , o descom-
p ô s , p e l o q u e o dito R i b e i r o , incitado, p e g o u e m u m a a r m a , e os vizinhos q u e
p r e s e n c i a r a m , obrigados do escândalo, a sua i m i t a ç ã o p e g a r a m nas suas, à vista de
cuja deliberação, c o n h e c e n d o o dito . M a c h a d o e m si a a r r o g â n c i a sem vigor p a r a
resistir e seu b a c a m a r t e s e m préstimo p a r a o defender, m u i t o a pressa se retirou
p a r a a casa de u m ferreiro, p a r a a qual o m e s m o tio, vindo acudir-lhe, se r e c o l h e u

Na mitologia grega, Cérbcro era um cão de três cabeças e cauda em forma de serpente que guardava
a porta do inferno.
Referência à libação, cerimônia histórica e religiosa dos antigos pagãos que consistia em encher um
\ aso de rinho, derramá-lo sobre o altar em que se faziam os sacrifícios ç oferecê-lo aos ídolos como
,

forma de atenuar os sofrimentos.


Na mitologia grega, Atropo era uma fias meras (parcas em Roma), personificação do destino de
cada ser humano;filliasde Zeus e. de Têmis. Observavam os mortais, cujo destino estava gravado
sobre ferro c. bronze, ê nada podia alterá-lo. Atropo, na realidade, é mera que tece ò fio que mede a
duração da vida de cada um dos mortais, enrolado por Cloto e cortado por Laquese. No texto, José
Machado tem o seu dia marcado, em junho de 1707, quando Laquese (ç não Atropo) iria, irremedi-
avelmente, meter a tesoura e cortar o fio de. sua vida.
280

fugindo, p o r a c e n d e r c o m a m e a ç o s o q u e e m tal c o n j u n t u r a devia a p a g a r c o m


rogos. E assim, p o r n ã o p o u p a r e m inimigos q u e lhes p o d i a m vir a c a b a r nas m ã o s ,
p u s e r a m fogo à casa, e os dois, tio e sobrinho, fugindo deste fogo, foram m o r r e r
e m o u t r o , p o r q u e , à saída da dita casa, d e s c a r r e g a r a m sobre eles tantos tiros q u e
ficaram de sorte q u e p o d i a m lastimar a m e s m a ira aqueles estragos d a cólera.
[ fl. 91v. ] Esta resolução / / t o m a d a pelos e m b o a b a s do R i o das M o r t e s e do Arraial
N o v o , a i n d a q u e a g i t a d a pela cegueira da sua p a i x ã o , s e m p r e foi a q u e d e u prin-
cípio p a r a a d i a n t e todo o país das M i n a s e d e Serra A c i m a c o n h e c e r verdadeira-
m e n t e a seu v e r d a d e i r o s e n h o r , até e n t ã o m e n o s c o n h e c i d a a sua g r a n d e z a e m u i -
to p o u c o t e m i d a a sua justiça. Desafogados os â n i m o s da refrega p a s s a d a , entra-
r a m e m reflexões t e n d o p o r c e r t a a v i n g a n ç a e p o r d u v i d o s a defensa; e assim
c o m o c o r p o s e m cabeça, se dividiram, b u s c a n d o c a d a ura o m e l h o r c a m i n h o d a
sua segurança, exceto alguns de mais distinção, q u e se p a s s a r a m d a o u t r a p a r t e d o
r i b e i r o e defronte d a p o v o a ç ã o se m e t e r a m e m u m a casa q u e fizeram forte. E
revestidos d e b r i o se dispuseram a esperar a invasão dos paulistas, q u e t i n h a m p o r
s e m d ú v i d a , s e g u n d o seu violento p u n d o n o r n ã o ficar sem u m e x e m p l a r castigo
u m tão g r a v e delito. V i e r a m , c o m efeito, i n c o r p o r a d o s , e a c h a n d o a p o v o a ç ã o
d e s e r t a m a s a casa d a o u t r a p a r t e g u a r n e c i d a v o l t a r a m , d i s f a r ç a n d o a s u a b o a
v o n t a d e , dizendo q u e aquela diligência n ã o se e n c a m i n h a v a a o u t r o fim mais q u e
a d a r sepultura aos m o r t o s .
P a s s a d a esta a ç ã o , a p o u c o s dias depois v i e r a m c h e g a n d o alguns dos m o r a -
d o r e s , b e m a r r e p e n d i d o s d e n ã o a c o m p a n h a r e m os q u e ficaram, c o m o t a m b é m
os mais. E todos, restituídos a o arraial e suas casas, existiram a d i a n t e s e m p r e cons-
tantes, m a s c o m cautela, f u n d a d a n a desconfiança dos paulistas, q u e n a t u r a l m e n t e
c o n s e r v a m as brasas d o ódio debaixo das cinzas do disfarce. E assim c o n t i n u a r a m
p o r largo t e m p o sem h a v e r descuido nesta dilação; antes, se avivava c a d a vez mais
a vigilância a respeito das c o n t í n u a s t r o p a s de paulistas q u e c h e g a v a m a estes
distritos retirados dos e m b o a b a s daquelas p a r t e s do R i o das V e l h a s , q u e depois
do sucedido neste arraial t i n h a m m u d a d o as M i n a s d e s e m b l a n t e e os e m b o a b a s
de c o n d i ç ã o , t a n t o q u e , m o v e n d o - s e pelo S a b a r á o u C a e t é certas diferenças entre
eles e p a u l i s t a s , se lhes o p u s e r a m , d e sorte q u e f i c a n d o estes m e n o s airosos e
e n v e r g o n h a d a s u a alta p r e s u n ç ã o , antes q u e experimentassem mais a l g u m *desar,
a b a l a r a m p a r a este R i o das M o r t e s e, j u n t o s o n d e c h a m a m o C ó r r e g o , lugar d a
o u t r a p a r t e do rio q u e fica e n t r e as duas vilas, d o n d e o b s e r v a n d o o vigilante c u i d a d o
e c o n s t â n c i a firme dos e m b o a b a s , ofereceram p o r várias vezes proposições p a r a
u m a amigável c o r r e s p o n d ê n c i a , p r e l i m i n a r e s q u e n ã o f o r a m aceitas. E assim se
foram uns e outros e n t r e t e n d o , n e m amigos n e m inimigos, até o fim do a n o d e mil
setecentos é oito.
[ fl. 92 ] A q u a n t i d a d e dos paulistas q u e despejavam d a q u e l a s p a r t e s das Gerais p a r a
esta do R i o das M o r t e s deu e m q u e cuidar ao g o v e r n a d o r das M i n a s , l e v a n t a d o
p e l o s p o v o s delas, . M a n u e l N u n e s V i a n a , e aos seus a d j u n t o s , p o r q u e c o m o ps
281

paulistas s a í r a m queixosos, unidos, m u i t o b e m p o d i a m i n t e n t a r sobre os p o u c o s


e m b o a b a s d e q u e c o n s t a v a m as p o v o a ç õ e s do R i o das M o r t e s , p o r m o d e r n a s ,
àqueles malefícios q u e lhes sugerisse o seu s e n t i m e n t o . E p a r a evitar este golpe,
a c o r d a r a m fazer logo p ô r e m m a r c h a u m d e s t a c a m e n t o de duzentos h o m e n s , p o u c o
m a i s ou m e n o s , q u e c h e g a r a m a este a r r a i a l e m d e z e m b r o do dito a n o d e mil
setecentos e oito, debaixo d o c o m a n d a m e n t o de u m B e n t o do A m a r a l C o u t i n h o ,
q u e os g o v e r n a v a n o p o s t o d e s a r g e n t o - m o r d e b a t a l h a , t a m b é m c r i a d o p e l o p o v o ,
h o m e m grave e valoroso, p o r é m c o m a l g u m t a n t o d e cruel. C e r t o s os paulistas d a
c h e g a d a desta gente, logo se dividiram e m " m a n g a s e b u s c a r a m c o m m u i t a pressa
as e m b o s c a d a s dos m a t o s . E sabendo-se q u e u m a dessas se t i n h a m e t i d o d a o u t r a
p a r t e d o rio das M o r t e s coisa d e "légua e meia a o r u m o d o n o r t e , e m u m c a p ã o ,
n o m e q u e p e l o s n a t u r a i s se d á a q u a l q u e r p o r ç ã o d e m a t o , m a i o r ou m e n o r ,
sendo s e p a r a d o p o r todas as p a r t e s d e o u t r o m a t o , c o m u m c a b o p o r n o m e G a b r i e l
de Góis, insolentíssimo e blasfemo d a Majestade, o dito A m a r a l p a s s o u o rio c o m
a sua gente e a l g u m a do arraial, e c h e g a n d o à vista p ô s sítio, a o dito c a p ã o . E os
paulistas, c o m o q u e n a d a t e m i a m , t e m e r a r i a m e n t e p e g a r a m nas a r m a s , d e r a m
tiros e feriram alguns e m b o a b a s , causa p o r q u e os mais, cheios de cólera, a p e r t a -
r a m o " c o r d ã o . E g a n h a d o o m a t o p u s e r a m os paulistas as a r m a s e m terra e pedi-
r a m quartel; e sendo levados à p r e s e n ç a do c o m a n d a n t e foram m o r t o s a s a n g u e
frio (tirano m a s s a c r e e í m p i a e x e c u ç ã o a b o m i n a d a d e t o d o s os q u e se t ê m p o r
próximos). Alguns dias depois desta ação c r u e n t a , d e t e r m i n o u o dito A m a r a l reri-
rar-se, c o m o c o m efeito se p ô s e m m a r c h a de volta destas m i n a s p a r a as Gerais.
C h e g a d o s a o R i o d e J a n e i r o os repetidos ecos dos a c o n t e c i m e n t o s das M i -
nas, fizeram n a q u e l a c i d a d e u m tal estrondo q u e se viu precisado o " g o v e r n a d o r
d o m F e r n a n d o M a r t i n s M a s c a r e n h a s de Lencastre subir a elas, o q u e a toda p r e s s a
pôs p o r o b r a . E avizinhando-se a este arraial n o m ê s de abril d e 1709, além d a sua
comitiva, escoltado d e duas c o m p a n h i a s d e infantaria, os m o r a d o r e s o f o r a m es-
perar; e depois d e o salvarem c o m u m a descarga de tiros o c o n d u z i r a m à casa d a
sua a p o s e n t a d o r i a , que ficava d a o u t r a parte do ribeiro contrária ao
e n t r i n c h e i r a m e n t o q u e o receio fez levantar n o c o r p o d a p o v o a ç ã o , fortificado e
f r a n q u e a d o n a m e l h o r forma q u e / / o p e r m i t i u a disposição do t e r r e n o , o n d e se [fl. 92v. ]
fez c o m seu fosso e p o n t e levadiça, q u e n a ocasião estava c o m b a n d e i r a d e a r m a s
reais e m u m dos ângulos e n v e r g a d a , d o n d e se d e r a m repetidas cargas a sua chega-
d a e se lhe fizeram "luminárias três noites sucessivas. E assim foi r e c e b i d o c o m
estas d e m o n s t r a ç õ e s dos súditos a seu g o v e r n a d o r e lugar-tenente d a M a j e s t a d e , a
cuja voz os m o r a d o r e s d o R i o das M o r t e s , d e s d e o seu e s t a b e l e c i m e n t o a t é o
p r e s e n t e , s e m p r e se sujeitaram c o m o b o n s vassalos, e as suas o r d e n s , sem r e p u g -
nância, sempre obedeceram.
N o q u a r t o dia d e sua c h e g a d a , p e d i u a o r e v e r e n d o vigário agradecesse d a
sua p a r t e a seus fregueses aquele obséquio, e n o m e s m o dia, d e m a n h ã , m a n d o u
l a n ç a r u m " b a n d o pelo q u a l o r d e n a v a q u e todos os m o r a d o r e s , às duas h o r a s d a
232

t a r d e , se a c h a s s e m n o terreiro d o seu quartel, p a r a o n d e c o n c o r r e r a m p r o n t a m e n -


te os dois p a r t i d o s , q u e , guiados p e l a antipatia dos génios, se e n c a m i n h o u c a d a
u m p a r a o seu lado. E a p a r e c e n d o o ' g o v e r n a d o r , fez a todos sua prosa: estra-
n h a n d o semelhantes revoluções e contendas, c o m o se n ã o fossem todos p o r t u g u e -
ses, vassalos d o m e s m o príncipe, e assim o q u e o t r o u x e r a às M i n a s era o sossegar
os m o r a d o r e s delas, p a r a o que, n ã o p o d e n d o ouvir a todos, n o m e a s s e m os paulistas
e forasteiros seus p r o c u r a d o r e s p a r a q u e entre si satisfizessem queixas, esquecidos
d o p a s s a d o , assentassem e m o m o d o de viverem e m b o a h a r m o n i a , e q u e a ele
fizessem aqueles r e q u e r i m e n t o s que entendessem ser necessários p a r a c o n c o r d â n -
cia deles, q u e a todos deferiria.
Feitos os p r o c u r a d o r e s d a p a r t e dos paulistas J o s é M o r e i r a e J o s é Pires d e
Almeida, ç d a p a r t e dos emboabas J o s é M a t o l e J o s é Alvares d e Oliveira (que é o
q u e escreve este papel), t r a t a r a m de se ajuntar e m várias conferências, propondo-se
nelas aqueles pareceres q u e melhor ajustavam p a r a o fim pretendido, caindo t o d o o
cuidado e trabalho desta diligência sobre os procuradores e m b o a b a s , os quais n ã o
d e i x a r a m de perceber, desde seu princípio, ser trabalho perdido. C o n t u d o , p o r é m ,
c o n t i n u a r a m as sessões. E findas estas, foi levada a conclusão do t r a t a d o pelos mes-
m o s p r o c u r a d o r e s a o governador, de que fez b o a aceitação e o teve p o r n ã o p e q u e -
no serviço do soberano, c o m o o dito governador expressou nas patentes d e "capi-
tães d e "auxiliares que e m r e c o m p e n s a deu aos tais procuradores. E assim concluí-
dos alguns negócios e principalmente este de sua maior obrigação e cuidado (que os
p r o c u r a d o r e s e m b o a b a s n u n c a d e r a m por firme, c o m o adiante se verá), determinou
o governador a sua partida p a r a as Minas Gerais, e deixando formadas cinco c o m -
p a n h i a s , q u a t r o de p é e u m a de cavalos, a q u e deu p o r capitães: à c o m p a n h i a d e
cavalos, J o ã o Antunes Maciel, paulista d e nascimento, m a s "aborto daquela n a t u r e -
za, p o r q u e s e m p r e se d e u aos e m b o a b a s ; às c o m p a n h i a s d e p é , S i m ã o Alvares
Mousinho e J o ã o Rodrigues de Carvalho, com patentes da "ordenança, e a José
M a t o l e José Alvares de Oliveira, c o m patentes de auxiliares, e m gratificação / / d a
[ fl. 9 3 ] p r o c u r a d o r i a , e aos paulistas as mesmas, q u e r e c e b e r a m corteses, m a s escusando-se

do exercício delas c o m o pretexto d e se recolherem p a r a suas casas (se é q u e n ã o


iludiram de se lhes conferir u m posto q u e todos os brancos e bastardos d e S e r r a
A c i m a logram, ou impresso c o m o caráter de batismo ou h e r d a d o d e seus avós) e
p o r "cabo deles, c o m o posto d e "sargento-mor, a u m Ambrósio C a l d e i r a B r a n t ,
h o m e m grave e de atenções, o qual depois teve patente d e *mestre-de-campo, e m
cuja casa tinha feito a sua assistência o m e s m o governador. E n a despedida, c o m o
era voz constante q u e os povos das M i n a s Gerais o n ã o p r e t e n d i a m admitir, muitos
sujeitos deste distrito se lhe ofereceram pedindo lhes concedesse a h o n r a d e o acom-
p a n h a r e m n a ocasião, o que ele agradeceu m a s n ã o aceitou, e assim se pôs a c a m i n h o
p a r a as ditas minas, e os paulistas p a r a a vila de São Paulo, m a l contentes do governa-
dor porque, como cavalheiro, devia atender para a qualidade deles, paulistas, ultraja-
283

da, e, c o m o "governador, castigar severamente a b a i x a plebe dos e m b o a b a s , p a r a


satisfação do seu respeito perdido.
A vista destes m o v i m e n t o s indicativos d a sua p o u c a fé, j á nas conferências
conhecida, se a p l i c a r a m todos os m o r a d o r e s à última construção do
e n t r i n c h e i r a m e n t o , c o m a fervorosa assistência d o " c a p i t ã o J o s é M a t o l , o q u a l
depois subiu a " s a r g e n t o - m o r , p o r cujas p e r s u a s õ e s e g r a n d e t r a b a l h o se t i n h a
p r i n c i p i a d o e c o n s e g u i d o a s u a fatura, d e q u e j á se t r a t o u , a n t e v e n d o p e l o seu
b o m e n t e n d i m e n t o e previsto discurso o q u a n t o necessitava o arraial de ser forti-
ficado p o r estar e m u m a b a r r e i r a e x p o s t o a q u a l q u e r i n v a s ã o dos paulistas. E
assim, a o t e m p o e m q u e estes c h e g a r a m , q u e n ã o t a r d o u , q u a n d o p r e s u m i a m q u e
o m e s m o e r a 'chegar, ver, q u e vencer', e n c o n t r a r a m c o m u m a p o v o a ç ã o q u e éra
a b e r t a p a r a as suas correrias, p r a ç a fechada p a r a as suas e n t r a d a s , obstáculo a seus
intentos, m u r a l h a oposta aos desígnios c o m q u e v i n h a m a m e a ç a n d o extinguir das
M i n a s t u d o q u e tivesse n o m e de e m b o a b a .

N a e n t r a d a do m ê s d e o u t u b r o d e 1709 e n t r o u neste distrito, de volta das


M i n a s G e r a i s , o g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r v a l h o , q u e
veio suceder a d o m F e r n a n d o n o g o v e r n o d o R i o d e J a n e i r o e M i n a s , a c o m p a -
n h a d o s o m e n t e d e u m "ajudante, u m "sargento e três soldados. E e n c a m i n h a n d o -
se p a r a a igreja, depois d e o r a r à R a i n h a dos Anjos, à p o r t a d a dita fez suá fala a
todos, r e p r e e n d e n d o semelhantes alterações, as quais r e d u n d a v a m e m desserviço
do s o b e r a n o e p e r d i ç ã o dos m o r a d o r e s d o país, e assim q u e tratassem c o m sossego
das suas conveniências c o m o mineiros e deixassem o "ofício d e soldados. D a q u i
foi c o n d u z i d o p a r a a m e s m a a p o s e n t a d o r i a e m q u e assistiu seu antecessor, e nas
conversas q u e pelos dias a d i a n t e teve c o m os principais dos m o r a d o r e s , lhes disse
n ã o t e m e s s e m os p a u l i s t a s , a s s e g u r a n d o - l h e s q u e os n ã o h a v i a m vir i n q u i e t a r ,
p o r q u e tinha m a n d a d o a São Paulo u m religioso d a C o m p a n h i a [de J e s u s ] , fula-
n o d e A l m e i d a , * ' n a t u r a l d a m e s m a vila, p a r a os dissuadir dos seus p r o j e t o s ,
antepondo-lhes o crime em que p o r qualquer atentado p o d e r i a m incorrer. P o -
r é m , c o m o viu q u e essas asseverações n a o f a z i a m i m p r e s s ã o e m â n i m o s , c o m
r a z ã o desconfiados p o r t e r e m m e l h o r c o n h e c i m e n t o dos paulistas do q u e ele, go-
v e r n a d o r , d e s p a c h o u u m p r ó p r i o a o sítio c h a m a d o o P o u s o Alto, q u a t r o dias d e
v i a g e m deste a r r a i a l , e m q ú e e r a m o r a d o r u m e m b o a b a confidente ( p o r q u e os
mais, dos casados c o m o este; e r a m d e Serra A c i m a , e p e l a enxertia d e g e n e r a v a m
de s e r e m emboabas), e a resposta / / q u e teve foi certificar-lhe q u e a m a i o r p a r t e [ fl. 93v. ]
dos paulistas se a c h a v a e m G u a r a t i n g u e t á , última vila n o c a m i n h o d e S ã o Paulo
p a r a as M i n a s , distante deste R i o das M o r t e s oito dias de j o r n a d a , e q u e j á t i n h a m
a l g u m a s tropas m a i s a v a n ç a d a s . O g o v e r n a d o r , despedindo-se logo dos m o r a d o -

O nome do jesuíta enviado a São Paulo era Simão de Oliveira.


284

res e r e c o m e n d a n d o - l h e s tratassem das suas lavras sem sustos, p o r q u e sem dúvida


havia fazer r e t r o c e d e r os paulistas, se pôs a c a m i n h o e levou mais e m sua c o m p a -
n h i a u m dos m o r a d o r e s p o r n o m e Estêvão R o d r i g u e s , h o m e m resoluto e diligen-
te. E c h e g a n d o - s e a vistar c o m os paulistas n a dita vila n ã o lhe s u c e d e u c o m o
c u i d a v a , antes e x p e r i m e n t o u a l g u m a s desatenções. E v e n d o q u e n ã o c e d i a m d a
sua rebelião, fez c o m cautela descer, a t o d a a pressa, ao dito Estêvão R o d r i g u e s ao
Rio d e J a n e i r o , r e c o m e n d a n d o - l h e q u e c o m a m e s m a subisse a o R i o das M o r t e s ,
p a r a o q u e lhe d e u c a r t a p a r a o *mestre-de-campo q u e g o v e r n a v a e m sua ausên-
cia,, p e l a q u a l lhe m a n d a v a assistir e se lhe passassem o r d e n s p a r a n ó c a m i n h o
t o m a r aqueles cavalos q u e fossem necessários p a r a a sua p o s t a , ficando ele, "go-
v e r n a d o r , c o m u m notável c u i d a d o de que: p o d e r i a m a p a n h a r os m o r a d o r e s des-
c u i d a d o s p e i a sua p r o m e s s a .
D e dia e d e noite c a m i n h o u o dito Estêvão R o d r i g u e s , e c h e g a n d o a o R i o
das M o r t e s e m u m a j á b e m t a r d e expôs o q u e fica dito. E r e c e b i d a a notícia, se fez
a v i s o a t o d o s os m o r a d o r e s d o d i s t r i t o p a r a se v i r e m c h e g a n d o p a r a o
e n t r i n c h e i r a m e n t o e q u e trouxessem t u d o o q u e nele se pudesse recolher, sendo
principal o sustento; cuidou-se t a m b é m e m recolher p a r a ele as m u n i ç õ e s de guer-
r a e b o c a q u e se a c h a r a m pelo arraial. A o dito aviso a c u d i r a m t a n t o d o Arraial
V e l h o c o m o d a P o n t a do M o r r o , M a n u e l Dias de Araújo, ' c a p i t ã o d e u m a n o v a
c o m p a n h i a q u e se t i n h a l e v a n t a d o n a q u e l e lugar q u e fica d a o u t r a p a r t e do rio
p a r a a b a n d a d o nascente m e i o dia d e viagem, e assim mais todos aqueles q u e se
l e m b r a r a m d e ser e m b o a b a s , p o r q u e n ã o faltou q u e m , esquecido d o tal apelido,
buscasse, o refúgio q u e o m e d o n a q u e l a ocasião aconselhava. J u n t o s os m o r a d o r e s
d e fora e os do arraial, se fez resenha, e constava a lista dos b r a n c o s de duzentos e
sessenta, p o u c o mais ou m e n o s , e a dos negros d e p e r t o d e q u i n h e n t o s , e alguns
[ íl. 94 ] destes c o m a r m a s , dos quais se formou / / u m a c o m p a n h i a q u e se e n t r e g o u a u m
forro p o r n o m e L o u r e n ç o d a M o t a , c o m os quais fez m u i t o b e m á sua obrigação e
foi u m dos feridos; e os m a i s se a r m a r a m d e foices d e r o ç a r e p a u s d e p o n t a
tostada.
E s t a n d o assim todos j u n t o s , desde o princípio de n o v e m b r o d e 1709, e m q u e
tinha c h e g a d o o dito Estêvão Rodrigues, até dez do dito mês, e p r e m e d i t a d a s p o r
estes dias as j o r n a d a s dos paulistas, a i n d a q u e vagarosas s e m p r e t a r d a v a m , e su-
p o n d o - s e pela t a r d a n ç a q u e p o r a l g u m incidente se t e r i a m a r r e p e n d i d o , p a r a nos
l i v r a r m o s d a q u e l e c u i d a d o se d e s p a c h o u u m p r ó p r i o a o P o u s o Alto, o qual aos
dois dias d e v i a g e m t o p o u c o m os paulistas, os quais, a p a n h a n d o - o e a c h a n d o - l h e
u m a carta q u e levava escondida, o assassinaram. E q u a n d o foi aos treze dias, se
b o t a r a m três cavaleiros a descortinar o c a m p o , os quais os avistaram q u a s e u m dia
d e viagem. E n o de q u a t o r z e d o dito m ê s saiu de m a n h ã a c o m p a n h i a de cavalos
fora, e t o p a n d o de súbito c o m eles p o u c o m a i s de tiro d e "clavina, a i n d a voltou a
t e m p o e c o m t a n t a ligeireza q u e , d a n d o - l h e s os paulistas u m a descarga, a p e n a s
feriram u m s o l d a d o .
285

E m q u a r t a - f e i r a , q u a t o r z e d e n o v e m b r o d e 1 7 0 9 , p e l a u m a h o r a p a r a as
duas d a t a r d e , f o r a m vistos os paulistas. E além de dois p r ó p r i o s q u e j á se t i n h a m
d e s p a c h a d o p a r a as M i n a s G e r a i s a i m p l o r a r socorro, se e x p e d i u n e s t a ocasião
o u t r o , c o m a certeza de estarem j á os paulistas sobre o arraial c o m u m c o r p o d e
mais d e dois mil c o m b a t e n t e s , p o d e r formidável, a respeito das p o u c a s forças q u e
se a c h a v a m n o e n t r i n c h e i r a m e n t o e assaz debaixo de evidente perigo, p o r estar de
m u i t a s p a r t e s c o n d e n a d o , p e l o q u e t o r n a v a m a i m p l o r a r o seu auxílio, e c o m
p r e s t e z a , p o r q u e n e l a estava o l i v r a m e n t o daqueles p o u c o s defensores, os quais,
a c o m p a n h a d o s do seu b r i o , a c u d i r a m c o m seus "capitães aos postos q u e aos ditos
capitães estavam assinalados e d e q u e eles c o m m u i t o valor e g r a n d e resolução se
t i n h a m e n t r e g u e p a r a d e f e n d e r e m e resistirem a q u a l q u e r invasão dos paulistas,
fazendo c a d a u m deles m e n o s estimação da vida q u e do n o m e . E assim a r r i m a -
d o s , c a d a u m a s e u p o s t o : n a p a r t e q u e ficava s o b r e o r i b e i r o , n o â n g u l o r i o
abaixo, c o m a sua c o m p a n h i a , o capitão J o s é M a t o l ; e c o m a sua, no â n g u l o rio
a c i m a , o capitão J o s é Alvares d e Oliveira; e n a "cortina q u e corria / / d e u m a o [ fl. 94v. ]
outro â n g u l o , estava o capitão J o ã o R o d r i g u e s d e G a r v a l h o c o m a sua; e e m u m
m e i o " b a l u a r t e q u e o l h a v a p a r a a p a r t e d a igreja e s t a v a m o c a p i t ã o d e cavalos
J o ã o A n t u n e s Maciel e o capitão S i m ã o Alvares M o u s i n h o , q u e o c u p a v a m c o m as
suas c o m p a n h i a s e se estendiam pela cortina do seu lado direito e d o e s q u e r d o até
a p o r t a ; e desta p a r a à p a r t e do posto do capitão J o s é Alvares de Oliveira estava
c o m a sua c o m p a n h i a o c a p i t ã o M a n u e l Dias d e A r a ú j o , ficando d e r e s e r v a o
*sargento-mor A m b r ó s i o C a l d e i r a B r a n t c o m alguns c o m p a n h e i r o s , todos c a p a -
zes d e a c u d i r e m o n d e se fizessem necessários.
D e s t a sorte g u a r n e c i d a a circunvalação, se e s p e r a r a m os paulistas, q u e debai-
xo de u m e s t a n d a r t e e n c a r n a d o (que se disse trazia a figura d e S ã o Paulo) e do
m a n d o de u m chefe p o r n o m e A m a d o r B u e n o , m a r c h a v a m e m u m a c o l u n a b e m
:

f o r m a d a , c o r o a n d o os m o r r o s fronteiros. E c h e g a n d o à casa d o s a r g e n t o - m o r
A m b r ó s i o C a l d e i r a B r a n t , a o c u p a r a m p a r a q u a r t e l d a corte, e d e s t a d e s c e n d o
p a r a o ribeiro se dividiram e m dois "cordões: u m q u e se estendeu pelo dito ribeiro
acima, a m p a r a d o do seu b a r r a n c o p a r a f o r m a r e m cerco à p r a ç a , e o o u t r o subiu o
m o r r o da "espalda, b u s c a n d o u m a a b e r t a q u e descia p a r a o terreiro da igreja, e
b a i x a n d o p o r ela no dito terreiro fez alto a v a n g u a r d a . E fechado o c e r c o se j u n t o u
o seu conselho d e guerra, d o qual se expediu u m clérigo p o r n o m e G r e g ó r i o d e
Sousa, c u n h a d o do dito s a r g e n t o - m o r . E c h e g a n d o à fala p e d i u q u e r i a falar a seu
c u n h a d o , c o m o falou, d i z e n d o q u e suposto o m o t i v o d a q u e l e a r m a m e n t o t i n h a
sido p a r a castigar o caso d o c a p ã o , c o n t u d o q u e aqueles "cabos se desejavam v e r
c o m ele, e q u e n ã o era d e s a c e r t o assim fosse, p o r q u e d a p r á t i c a q u e tivessem
p o d e r i a m u i t o b e m resultar a l g u m a c o n c o r d a t a conveniente a todos. H o u v e votos
p r ó e contra.
C o n t u d o , descida a p o n t e , saiu o s a r g e n t o - m o r c o m alguns sujeitos q u e o
q u i s e r a m a c o m p a n h a r e, a p o u c a s palavras q u e p o d e r i a h a v e r d e p a r t e a p a r t e se
•286

d e u u m tiro de pistola, pu fosse p o r o r d e m ou p o r descuido. T a n t o que. foi ouvi-


d o , o * s a r g e n t o - m o r e os c o m p a n h e i r o s v i r a r a m costas e, "cosidos c o m a terra,
mais q u e depressa se r e c o l h e r a m . E a esta fugida p r i n c i p i a r a m os paulistas a d a r
repetidas descargas e g a n h a r terreno. E e m esta ocasião se distinguiu u m M a n u e l
Dias d e M e n e s e s , h o m e m g r a v e e d e s t e m i d o , p o r q u e a c o n t e c e n d o cair a p o n t e ,
d e p a n c a d a , e ter levado a c o r d a p o r q u e se suspendia, à q u a l se n ã o p o d i a chegar,
o d i t o , a t o d o o risco, perfilado c o m u m esteio e m q u e b a t i a , a m e s m a p o n t e
subiu, e l a n ç a n d o - s e a ela trouxe consigo a dita corda. E l e v a n t a d a a dita, ficou a
p o r t a fechada, q u e n ã o dava p o u c o cuidado o estar a b e r t a (bisonho a c o n t e c i m e n -
to q u e b e m p o d e r i a ser infausto aos e m b o a b a s se nos paulistas fosse o valor mais
natural).
C o n t i n u a n d o estes o fogo sem oposição, e n t e n d e r a m seria p o r m e d o d a p a r -
te dos e m b o a b a s , e assim se foram a v a n ç a n d o p a r a a trincheira. E os e m b o a b a s ,
[ fl. 95 ] c o m o a m a i o r p a r t e das suas a r m a s e r a m curtas, estavam e s p e r a n d o / / q u e eles
chegassem; e t a n t o q u e os tiveram a tiro, de r e p e n t e lhes d e r a m u m a descarga p o r
t o d a a "cortina d a q u e l a p a r t e d a igreja. E n a m e s m a ocasião u m q u e se a c h a v a
c o m u m a espingarda c o m p r i d a fez p o n t a r i a a o "alferes d a b a n d e i r a , q u e estava n o
c e n t r o do e s q u a d r ã o , e d i s p a r a n d o - a deu c o m ele do cavalo e m t e r r a , q u e caiu
c o m a m e s m a b a n d e i r a . E c o m o a q u e d a n ã o foi de cair p a r a levantar, a b a n d e i r a ,
depois de a r r a s t a d a , n ã o se viu mais tremular, e o alferes, depois d e caído, teve a
certeza d e n ã o viver. A r r i m a d o s os e m b o a b a s o u t r a vez ao p a r a p e i t o p a r a d a r e m
a s e g u n d a descarga, v i r a m o terreiro e v a c u a d o e os paulistas espalhados d a n d o
seus tiros de detrás das casas e d a igreja. E t a n t o q u e cerrou a noite, divididos e m
"troços, se introduziram na m e s m a igreja e nas casas eminentes ao e n t r i n c h e i r a m e n t o ,
de o n d e se r e c e b i a g r a n d e d a n o , p r i n c i p a l m e n t e os q u e g u a r n e c i a m o p a r a p e i t o
q u e caía sobre o ribeiro, p o r q u e e r a m v a r a d o s pelas costas; e, o u t r o n ã o m e n o r se
e x p e r i m e n t a v a , c o m o era a falta de água, a o q u e t u d o se d e u a q u e l a providência
q u e permitia a ocasião, p o r q u e p a r a este se abriu u m p o ç o q u e a 18 "palmos d e
fundo d e u a l g u m a á g u a q u e supriu, e p a r a o o u t r o se fez u m r e p a r o de c o u r o s
q u e , senão de t o d o , e m m u i t a p a r t e o evitou.
N o t e m p o q u e os paulistas p e r s i s t i r a m no b l o q u e i o , três vezes m a n d a r a m
dois clérigos p o r emissários a persuadir a entrega das a r m a s , e este era o principal
p o n t o das suas p r e t e n s õ e s , e q u e e n t r e g u e estas ficaria t u d o o p a s s a d o e m u m
p e r p é t u o e s q u e c i m e n t o . E t r e p l i c a n d o n a terceira e última vez q u e v i e r a m , esta
m e s m a proposição acrescentada c o m u m m o d o d e s e n t i m e n t o dos m o r t o s e feri-
dos c o m q u e s a b i a m se a c h a v a m os e m b o a b a s e os q u e p o d e r i a h a v e r se n ã o
cedessem de sua i m p r u d e n t e e p e r t i n a z teima. A o q u e r e s p o n d e u o "capitão J o s é
Alvares d e Oliveira, p o r ser p a r a estas conferências o n o m e a d o , q u e q u a n t o a o
falar n a entrega das a r m a s j á era ocioso, p o r q u e desde a p r i m e i r a vez se dissera
q u e as a r m a s e r a m de el-rei e se n ã o p o d i a m e n t r e g a r sem o r d e m do " g o v e r n a d o r ,
q u e as t i n h a m a n d a d o m a r c a r c o m a m a r c a q u e c o s t u m a m ter as a r m a s d o dito
senhor;, q u è q u a n t o mais q u ê p r e s c i n d i n d o d e ser isto assim, todos os q u e se a c h a -
v a m n a q u e l e "presídio e s t a v a m d e â n i m o d e largar as a r m a s d e suas m ã o s j u n t o
c o m a m e s m a vida; e q u a n t o aos m o r t o s e feridos n ã o e r a tão g r a n d e o n ú m e r o
c o m o eles j u l g a v a m , e q u e fosse e m u i t o s m a i s q u e houvesse n ã o f a z i a m falta
pelos muitos defensores d e q u e constava aquele presídio e todos firmes n a resolu-
ç ã o d e m o r r e r e m ou ficarem b e m .
N o q u a r t o dia d a e s t a d a dos paulistas, dois sujeitos dos q u e t i n h a m ficado n a
reserva c o m o "sargento-mor, u m "ajudante do presídio p o r n o m e Francisco B a r r e t o
d e F a r i a e o u t r o u m "alferes d a c o m p a n h i a / / d a P o n t a do M o r r o p o r n o m e [ fl. 95v. ]
D o m i n g o s Gonçalves, a m b o s de â n i m o intrépido, c o m o m o s t r a r a m desde o p r i n -
cípio deste conflito, d e dia e d e noite j á r o n d a n d o e j á a c u d i n d o o n d e era neces-
sário, se a j u n t a r a m c o m mais alguns ambiciosos de n o m e a fazerem, n a m a d r u g a -
da do d o m i n g o , u m a saída c o m o projeto d e desalojar os paulistas, q u e i m a n d o -
lhes as casas d e o n d e faziam c o n t í n u o fogo a seu salvo e c o m g r a v e risco dos
defensores, p a r a a qual diligência, j á n a m a d r u g a d a deste m e s m o dia, t i n h a saído
u m c o r p o d e gente q u e se recolheu c o m p o u c o efeito e c o m alguns feridos. E s t a n -
do os ditos p r e p a r a d o s e vigilantes e s p e r a n d o a h o r a d e t e r m i n a d a p a r a a e m p r e s a ,
r e p a r o u - s e q u e , p a r a o m e i o d a n o i t e , t i n h a m - s e cessado d e t o d a s as p a r t e s os
tiros, e tendo-se p o r novidade se suspendeu a diligência, e estando c o m b o a vigia
s é d e u fé q u e n o oriente dos m o r r o s fronteiros se divisavam uns m o v i m e n t o s . E
c l a r e a n d o a m a n h ã se veio no c o n h e c i m e n t o serem os paulistas q u e i a m d e retira-
d a . Fazendo-se conselho sobre o r e p e n t e , s e m p r e a desconfiança fez assentar q u e
aquela r e t i r a d a b e m p o d i a ser estratagema p a r a p ô r a eles, e m b o a b a s , e m descui-
do e [vir apanhá-los] p o r "inteq^resa, p a r a q u e s e m p r e era acerto d e s a s s o m b r a r o
e n t r i n c h e i r a m e n t o dos " p a d r a s t o s a q u e estava e x p o s t o , q u e i m a n d o - s e t o d a s as
casas e a m e s m a igreja, p o r q u e assim se ficava e m c a m p o d e s c o r t i n a d o e c o m
m e n o s risco a "defensa, caso q u e eles intentassem s e g u n d a invasão, o q u e p r o n t a -
m e n t e se pôs p o r obra.
E depois de t u d o q u e i m a d o e r e d u z i d o a cinzas se desvaneceu este c u i d a d o
c o m a notícia de q u e eles, c o m v e r g o n h o s a fugida, seguiam o c a m i n h o d e p o v o a -
d o . T a l v e z seria tão a p r e s s a d a fuga p o r a l g u m aviso q u e r e c e b e s s e m d e q u e a
gente das M i n a s Gerais vinha c o m acelerada m a r c h a a socorrer o R i o das M o r t e s ,
e t a m b é m p o d e r i a ser a l é m do d e s e n g a n o e m q u e e s t a r i a m pelas respostas n ã o
esperadas d e sua soberba ou p o r d i m i n u i ç ã o dos c o m b a t e n t e s m o r t o s e feridos, o u
p o r t e r e m c o n c e b i d o a l g u m t e m o r de q u e os e m b o a b a s e n t r a r i a m n a resolução d e
s a í r e m do r e d u t o e levarem a todo o risco t u d o a ferro e fogo, p e l a deliberação
q u e t i n h a m visto nos poucos q u e no s á b a d o t i n h a m saído, q u e suposto m a l execu-
t a s s e m a o r d e m q u e l e v a v a m , c o m o j á se disse, s e m p r e h a v i a m d e d a r a l g u m
c u i d a d o (e se assim o p r e m e d i t a r a m n ã o os e n g a n o u o p e n s a m e n t o ) , p o r q u e assim
havia s u c e d e r pela falta q u e se ia e x p e r i m e n t a n d o nas m u n i ç õ e s , p r i n c i p a l m e n t e
n a d e g u e r r a , q u e j á se repartia c o m c u i d a d o e mais r e g r a q u e n o princípio.
288

[ fl. 96 ] Fosse pelo motivo q u e fosse, o certo é q u e c h e g a r a m os / / paulistas a o distri-


to d o R i o das M o r t e s e d o A r r a i a l N o v o o s t e n t a n d o , altivos, o insuperável d e seu
g r a n d e exército a r m a d o e posto em c a m p o p a r a dissolução das M i n a s e destruição
dos e m b o a b a s , p o u c o atrás d e s p r e z a d o , [abjeto?], a i n d a dos seus escravos; a g o r a ,
h o r r o r o s o escândalo das suas pessoas e d a sua g r a n d e z a , a empossar-se do esbulho,
diziam eles, q u e o d e m a s i a d o a t r e v i m e n t o dos e m b o a b a s lhes t i n h a feito, p o r é m
t e n d o j á p o r sem d ú v i d a q u e n e m a força do seu p o d e r n e m das suas proposições
o b r a v a m n e m o b r a r i a m n a d a naqueles poucos e m b o a b a s n o breve r e d u t o d a q u e -
le e n t r i n c h e i r a m e n t o ; a n t e s , pelo c o n t r á r i o , os e x p e r i m e n t a v a m c a d a v e z m a i s
incontrastáveis. D e todo d e s e n g a n a d o s , depois d e q u a t r o dias e q u a t r o noites d e
m a r c i a l c o n t e n d a , desfeito o b l o q u e i o , d e r a m costas a o e n t r i n c h e i r a m e n t o , dei-
x a n d o aos pés de seus defensores aquela soberba c o m q u e , altivos, e n t r a r a m a ele,
t e n d o - s e c o m p r o m e t i d o , extintos os e m b o a b a s d e t o d a s as M i n a s , c a p i t u l a r e m
c o m o s o b e r a n o sobre o governo delas ser m u i t o a seu arbítrio. J u n t o ç o m a q u e d a
d a s o b e r b a p e r d e r a m t a m b é m o respeito do seu h o r r o s o n o m e depois d e tantos
anos pelas suas insolências a d q u i r i d o .
F u g i r a m os paulistas. D a p e r d a q u e e x p e r i m e n t a r a m n ã o se s o u b e . A q u e
tivemos- os e m b o a b a s foi a de p e r t o de oitenta, e n t r e m o r t o s e feridos, e, destes,
dois "oficiais, u m "alferes e o "capitão J o s é M a t o l , q u e r e c e b e u duas feridas, u m a
n a c a b e ç a , d e m e n o s cuidados, e o u t r a n o peito, q u e lhe passou a "espalda, p e r i -
gosa p a r a ele e d e s e n t i m e n t o p a r a todos, p o r q u e todos r e c o n h e c i a m q u e a sua
salvação e de todas as M i n a s estivera n a q u e l e tal ou qual. " a n t e m u r a l q u e a sua
atividade fez levantar. Dois ou três dias depois da fugida dos paulistas, c h e g o u a
g e n t e das M i n a s Gerais, q u e c o m a p r e s s a d a m a r c h a os s e g u i r a m , a fim d e lhes
a l c a n ç a r e m a r e t a g u a r d a e os p i c a r e m nela; mas, a c h a n d o nas passagens dos rios
as c a n o a s desfeitas e as pontes cortadas, v o l t a r a m e, a p o u c a d e t e n ç a neste distrito,
se e n c a m i n h a r a m p a r a o seu. A o m e s m o t e m p o , c h e g o u do R i o d e J a n e i r o , m a n -
d a d o pelo " g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e , L e o n e l d a G a m a , c a p i t ã o d e
cavalos q u e t i n h a servido n a C o l ô n i a [do S a c r a m e n t o ] c o m c o n h e c i d o valor n o
g o v e r n o d e S e b a s t i ã o d a V e i g a C a b r a l , e dois g r a n a d e i r o s c o m u m c a i x ã o de
[ fl. 96v. ] g r a n a d a s , e n ã o foi p o u c a fortuna q u e chegasse este p e q u e n o / / socorro a t e m p o
q u e os paulistas t i n h a m desertado, q u e do contrário, c o m o os ditos t r a z i a m p a t r u -
lhas a v a n ç a d a s pelos c a m i n h o s , era infalível o cair-lhes nas m ã o s , e vistos os p e t r e -
chos, estava neles f o r m a d a e b e m p r o v a d a a c u l p a p a r a e x e c u t a r e m nos p o b r e s
h o m e n s as leis do seu refinado e intestino ódio.
Passadas essas tribulações, s e m p r e os â n i m o s de m u i t o s m o r a d o r e s m e n o s
arreigados e mais maginativos ficaram vacilantes, os quais, vendo-se sem casas e m
q u e se recolhessem, d e t e r m i n a v a m [ir fazê-las] p a r a p a r t e o n d e estivessem m e n o s
expostos e vivessem c o m m a i s sossego, o q u e n ã o c u s t o u p o u c o a a t a l h a r , p e l a
perniciosa conseqüência q u e desta m u d a n ç a se seguia, c o m o e m ficar a p o v o a ç ã o
quase deserta. E e m t e m p o de tantos receios — p o r q u e sempre e n t e n d e m o s q u e os
289

paulistas, p o r n ã o ficarem c o m o vergonhoso n o m e de fracos, h a v i a m buscar todos


os caminhos do seu "despique —, e p a r a dissuadir os ditos m o r a d o r e s d o seu intento
c o m algum m o d o d e segurança, se determinou, na v a r g e m d o p o r t o da Passagem,
q u e e u m largo c a m p o sobre o rio das M o r t e s , fabricar u m a fortaleza c a p a z d e
assistirem nela muito a sua vontade e seguros de qualquer invasão, antepondo-lhes
as conveniências q u e p e r d i a m das boas lavras destas minas q u e c o m tanto risco d e
vida t i n h a m defendido. C o m efeito, condescenderam e pôs-se p o r o b r a a fatura da
fortaleza, a qual o capitão J o s é Matol, m e i o convalescido das feridas, foi delinear d e
figura p e n t á g o n a .
N e s t e t e m p o , c h e g o u u m c o r p o d e gente q u e saiu d o R i o d a s V e l h a s e m
socorro a este R i o das M o r t e s , e v e n d o estes h o m e n s desvanecido o objeto q u e os
a b a l o u de tão longe se ofereceram p a r a a j u d a r a o b r a d a dita fortaleza, e m q u e se
e m p r e g a r a m p o r alguns dias. E despedindo-se dois pedreiros q u e t r a z i a m consigo
c o m suas " r e c a m a r a s fundidas n o R i o das V e l h a s , os d e i x a r a m p a r a q u a n d o e
o n d e fosse necessário servirem-se deles. J á d e n t r o d a dita fortaleza e s t a v a m bas-
tantes m o r a d o r e s , q u a n d o c o r r e u voz q u e t i n h a v i n d o n o m e a d o o " g o v e r n a d o r
A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e p a r a o ser das M i n a s de São Paulo, p a r a o n d e j á tinha
subido. E c o m esta certeza sossegado t u d o , o arraial se formou d e n o v o e se p o -
voou como dantes.
Seguiu-se o t e m p o , / / e estes m o r a d o r e s vivendo n a sua t r a n q ü i l i d a d e e nela [ fl. 97 ]
t r a t a n d o das suas conveniências, q u a n d o , e m s e t e m b r o de 1 7 1 1 , veio u m a c a r t a
do g o v e r n a d o r f q u e neste t e m p o se a c h a v a n a s M i n a s Gerais, a u m D a m i ã o d e
O l i v e i r a - " c a p i t ã o m a n d a n t e de u n s dos terços do R i o d e J a n e i r o , q u e depois
subiu a *mestre-de-campo desta c o m a r c a , a q u e m o m e s m o g o v e r n a d o r A n t ô n i o
de A l b u q u e r q u e t i n h a posto neste distrito p o r " s u p e r i n t e n d e n t e dele —, n a q u a l
lhe dizia q u e u m a inimiga e s q u a d r a francesa t i n h a e n t r a d o a b a r r a d o R i o d e
J a n e i r o e p r e t e n d i a descer a b a i x o c o m a gente das M i n a s e m s o c o r r o d a q u e l a
p r a ç a , p a r a o q u e lhe o r d e n a v a puxasse pela gente q u e mais pudesse, e c o m t o d a
b r e v i d a d e possível o fosse e s p e r a r n a B o r d a d o C a m p o , p a r a o n d e ele, g o v e r n a -
dor, h a v i a m a r c h a r c o m a gente das M i n a s G e r a i s . Manifesta a c a r t a , t a n t o os
capitães c o m o todos aqueles a q u e m o brio fez t r a z e r à m e m ó r i a o q u a n t o d e c o r o -
so é m o r r e r pela pátria se ofereceram logo e se fizeram p r o n t o s p a r a a tal expedi-
ç ã o , c prestes s e m d e m o r a os q u e h a v i a m m a r c h a r , q u e n ã o f o r a m p o u c o s , a
respeito do q u e p e r m i t i a m as p e q u e n a s povoações deste R i o das M o r t e s ; e c o m
seus e s c r a v o s a r m a d o s , p u x o u p o r eles o dito D a m i ã o d e O l i v e i r a , é se p ô s a
c a m i n h o p a r a o n d e o d e t e r m i n a v a a o r d e m . J á p e r t o d a B o r d a d o C a m p o , se
e n c o n t r o u c o m a r e t a g u a r d a o g o v e r n a d o r , q u e descia c o m a g e n t e das M i n a s
Gerais. C h e g a d o s a o posto e m q u e h a v i a m fazer alto, se dilatou nele, o governa-
dor, u m dia e s p e r a n d o p e l a gente do R i o das Velhas. E j u n t o s os d e u m a s e outras
290

M i n a s fez r e s e n h a d e todos, e fazendo-lhes sua fala a c a b o u d i z e n d o q u e esperava


obrassem c o m o deviam, o q u e muito lhes r e c o m e n d a v a . Posta de p a r t e esta dili-
gência, o r d e n o u a forma da m a r c h a p a r a o c a m i n h o , e assim a b a l a n d o d o C a m -
po, companhia por companhia, entraram no mato.
D e p o i s d e os paulistas serem r e c h a ç a d o s pelos e m b o a b a s deste R i o das M o r -
tes, notícia q u e este " g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e r e c e b e u c o m gosto,
p o r assim ver castigado o atrevimento c o m q u e d e s p r e z a r a m as suas advertências,
s e m p r e o dito g o v e r n a d o r m o s t r o u a estes m o r a d o r e s seü a g r a d o , e m u i t o mais e m
esta ocasião d a descida p a r a o R i o de J a n e i r o , louvando-lhes a p r o n t i d ã o q u e d e
muitos n ã o tinha e x p e r i m e n t a d o nas M i n a s Gerais. E recebendo-se depois destas
[ fl. 97v. ] ações u m a carta p o r "alvará d e l e m b r a n ç a , / / escrita e m Lisboa, e m 29 de outu-
b r o d e 1712, q u e está l a n ç a d a n o livro p r i m e i r o d o registro d a C â m a r a , à folha
3 0 , p o r q u e S u a Majestade foi servido p o r gratificação h o n r a r este distrito dizendo
n e l a aos "oficiais d a C â m a r a d o R i o das M o r t e s , q u e a i n d a n ã o h a v i a , m e r c ê
a l c a n ç a d a pela p a r t e q u e o dito g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e d e u destes
m o r a d o r e s , d e q u e entre os m a i s faziam opinião, c o m o do dito alvará se colhe.
E m princípio do mês de d e z e m b r o d e 1713, e n t r o u neste arraial o governa-
d o r d o m Brás Baltasar d a Silveira, que veio suceder a A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e n o
g o v e r n o de S ã o Paulo e M i n a s ; e a c h a n d o j á nele p o r p r i m e i r o "ouvidor-geral a o
" d e s e m b a r g a d o r G o n ç a l o d e Freitas B a r a c h o lhe o r d e n o u q u e fizesse "pelouros e
formasse a C â m a r a desta vila, a q u e d e u o título d e S ã o j o ã o del-Rei, cujo auto d e
l e v a n t a m e n t o foi e m oito d o dito m ê s e a n o , e se a c h a l a v r a d o n o livro p r i m e i r o
d o registro d a dita C â m a r a , à folha 37, assinado pelo dito g o v e r n a d o r e ouvidor.
C r i a d a a vila c o m a sua g o v e r n a n ç a , se passou p a r a as M i n a s G e r a i s , a q u e m ,
depois d e seu t e m p o , veio suceder o c o n d e d e A s s u m a r , d o m P e d r o d e A l m e i d a
P o r t u g a l , q u e , v i n d o d e S ã o P a u l o , passou p o r esta vila e foi assistir nas M i n a s
Gerais. A este governador fizeram os m o r a d o r e s d a outra p a r t e d o rio das Mortes
vários requerimentos p a r a q u e criasse e m vila ao Arraial Velho, q u e deferiu, orde-
n a n d o a o d o u t o r ouvidor-geral, q u e e n t ã o era V a l é r i o d a C o s t a G o u v e i a , p a r a
eleger a C â m a r a d a vila, a q u e se d e u o n o m e d e S ã o J o s é ; e p o r este se a c h a r
molesto e impedido, foi o "juiz ordinário desta vila de S ã o j o ã o del-Rei, o "coronel
Antônio d e Oliveira Leitão, c o m o -ouvidor-geral, erigir a dita vila de São J o s é , e m
vinte e oito de j a n e i r o do ano de 1718. C o n t r a este governador, n o a n o de 1720, se
sublevaram os povos do O u r o Preto, e o p u s e r a m e m tal consternação q u e escreveu
u m a carta ao dito Valério d a Costa G o u v e i a p a r a qué*palpasse os â n i m o s destes
m o r a d o r e s se p o r i a m dúvida e m o receber, p o r q u e ele estava d e t e r m i n a d o a retirar-
se p a r a este distrito caso q u e aquela alteração n ã o sossegasse. A resposta q u e teve foi
q u e n ã o só o r e c e b e r i a m m a s se fosse necessário se p o r i a m a c a m i n h o p a r a vir
assistir a S u a Senhoria, afeto e deliberação a que, depois d e a p a g a d o aquele incên-
dio tumultuoso, respondeu c o m u m a carta cheia de agradecimentos a todos e a c a d a
291

um e m particular, a qual carta foi escrita e m Vila / / Rica, e m d e z d e agosto d e [ fl. 9 8 ]


1720, e se a c h a n o livro segundo do registro d a C â m a r a , a folha 7 3 .
C o m este e semelhantes procedimentos se souberam os m o r a d o r e s do R i o das
Mortes distinguir, seguindo sempre a p a r t e dos "governadores, o b e d e c e n d o as suas
ordens c o m o d o soberano, d e onde e m a n a m , conformando-se e m t u d o c o m as suas
d e t e r m i n a ç õ e s , a q u e n e m eles, n e m p o r seus p r o c u r a d o r e s , q u e m u i t a s vezes se
a c h a r a m e m "juntas n a presença dos tais governadores, j a m a i s i m p u g n a r a m n e m
m o v e r a m a m e n o r dúvida, e d e n e n h u m a sorte às cobranças dos reais "quintos, q u e
se aceitaram p o r "bateias no governo d e d o m Brás Baltasar da Silveira. E n a m e s m a
j u n t a que p a r a esta c o b r a n ç a se fez convieram seus procuradores n a composição das
cargas p a r a a u m e n t o dos ditos quintos, e p o r resolução t o m a d a n a m e s m a ocasião,
se c o m e t e u a esta C â m a r a o estabelecimento do p r i m e i r o "registro n a B o r d a do
C a m p o p a r a d a r entrada às ditas cargas e por ela se c o b r a r o seu imposto, diligência
q u e c o m toda a p r o n t i d ã o m a n d o u esta C â m a r a p ô r p o r o b r a p a r a q u e n ã o p a d e -
cesse d e m o r a o serviço de el-rei, e m o r d e m à cobrança d e sua R e a l F a z e n d a ; c o m o
t a m b é m estiveram pela C a s a d e Fundição que nesta vila estabeleceu o g o v e r n a d o r
d o m L o u r e n ç o d e Almeida, e ultimamente pela "capitação, q u e de presente p a g a m
obedientes e c o m o p o d e m , e n ã o menos se singularizaram e m todos os tempos no
respeito e atenções a seus ministros.
Estão n a r r a d a s todas as tragédias, casos acontecidos e ações e x e c u t a d a s n o
distrito e Arraial N o v o d o R i o das M o r t e s , hoje vila de S ã o J o ã o del-Rei, desde o
seu p r i n c í p i o a t é o g o v e r n o d o c o n d e d o m P e d r o , s e g u n d o os v i s l u m b r e s q u e
a i n d a existem e se c o n s e r v a m n a m i n h a m e m ó r i a , t u d o e o mais q u e fica dito até
o presente, deduzido por aquela o r d e m e n a melhor forma que m e u limitado
talento o soube escrever e tosco estilo exprimir.
C o m o o Arraial N o v o do R i o das / / Mortes deu o assunto desta história e m [ fl. 98v. ]
q u e dele se trata e dos seus distúrbios antes d e ser vila, n ã o m e p a r e c e u alheio d a
m e s m a história o descrever dele m e s m o u m breve m a p a e seus progressos, depois
de o ser.
Subiu o Arraial N o v o do R i o das Mortes a vila d e São J o ã o del-Rei, a qual
consta de presente d e quinhentos "fogos c o m p o u c a diferença, o r n a d a de três igre-
jas, q u a t r o "capelas, três oratórios q u e a enobrecem, a matriz d a invocação d e Nossa
S e n h o r a do Pilar, nossa s e m p r e p r o t e t o r a , f u n d a d a n o c o r a ç ã o d a vila c o m o
"frontispício p a r a a principal rua, q u e c h a m a m r u a Direita, t e m p l o formoso c o m
sete capelas cobertas de p r i m o r o s a "talha, q u a t r o delas b e m d o u r a d a s . A m a i o r é
c a p e l a nobilíssima e n e l a se a d o r a o s a n t u á r i o ; seu p a v i m e n t o é g u a r n e c i d o d e
perfeitas grades b e m torneadas, que f o r m a m o "cruzeiro e duas "coxias, dentro das
quais ficam os altares todos; t e m dois b e m proporcionados púlpitos — l u g a r a q u e
t ê m subido famosíssimos e n g e n h o s , e neste t e m p o sobe a ele o nosso digníssimo
vigário, o reverendo d o u t o r Matias Antônio Salgado, licenciado e m Teologia, m e s -
tre e m Artes, bacharel formado e m C â n o n e s , "vigário colado nesta matriz de São
292

J o ã o del-Rei, oráculo dos púlpitos de Lisboa, corifeu dos pregadores daquela C o r -


t e , o u t r o C r i s ó s t o m o , ^ p o r q u e só p o r u m a b o c a d e o u r o sai o q u e m u i t a s vezes
temos ouvido, e ela c o m tanta energia t e m p r e g a d o , o sublime d o seu estilo n ã o é
m e n o r n a oratória q u e n a prédica, c o m o p o d e m a b o n a r as orações fúnebres dos
dois oficios q u e nesta matriz se fizeram por exéquias à Majestade do senhor rei d o m
J o ã o , p quinto, q u e D e u s haja: o primeiro p o r obrigação d a C â m a r a ; o segundo p o r
u m a espontânea vontade do nosso reverendo vigário e a sua custa l e m b r a d o e agra-
decido ao beneficio d a Igreja, recebido d a m e s m a Majestade, p a r a o q u e fez levan-
tar u m *cenotáfio elevado, d e sorte q u e o pavilhão q u e o cobria se segurava e m
u m a das linhas d a igreja p o r figura oitavada e piramidal de u m a idéia admirável, e
tão admiravelmente o r n a d o com específicos emblemas que, sem ofensa d o da Artemisa
na Caria, 1 3
se p o d i a transferir dele p a r a este a singularidade de maravilha do m u n -
d o — e u m g r a n d e coro a p a i n e l a d o e c o m sua *talha assentado sobre três arcos
abatidos q u e sustentam [duas?] colunas e duas [meãs?] d a o r d e m jónica. Cinge a
igreja u m a *cimalha real d a o r d e m "compósita e as suas p a r e d e s a b r a ç a m duas
linhas d e ferro b e m p i n t a d a s c o m p e n d u r a d o s d e florões d o u r a d o s . E t u d o isto
cobre a volta do teto da "capela-mor e igreja c o m especiosas p i n t u r a s . D e fora, é
a c o m p a n h a d a de duas torres, q u e se elevam e m b o a p r o p o r ç ã o c o m suas pirâmides
e cúpulas, a q u e r e m a t a m duas grimpas d e cobre d o u r a d a s , a q u e os embates dos
[ fl. 9 9 ] ventos fazem girar p a r a m o s t r a r e m a todos / / o s r u m o s sua grandeza e galhardia.

Sustentam estas quatro sinos, passando d e quarenta "arrobas o m a i o r das ditas tor-
res. Se seguem, pelo c o m p r i m e n t o da igreja, duas galerias d e janelas d e sacada, d e
u m a e o u t r a parte, c o m "casas que servem de "consistórios das "irmandades, e nas
paredes d a capela m a i o r duas sacristias, u m a dos reverendos p a d r e s e o u t r a d a ir-
m a n d a d e do S e n h o r . Seu a d r o [*cordeia?] c o m a m e s m a rua, delineado p o r b o a
arquitetura, c o m duas entradas que sobem a u m tabuleiro d a p o r t a principal. T u d o
e o Calvário da C r u z , q u e nele se respeita, fabricado d e cantaria. N a s entradas d a
m e s m a rua Direita estão as duas igrejas: d a p a r t e esquerda, a de Nossa S e n h o r a do
M o n t e do C a r m o e d a p a r t e direita da m e s m a matriz, a de Nossa S e n h o r a d o Rosá-
rio dos Pretos, o l h a n d o u m a p a r a outra, c o m a matriz e m meio, fazem u m a vistosa
perspectiva.. N a m e s m a rua, defronte d a cadeia, está o oratório d e Nossa S e n h o r a d a
P i e d a d e , e m q u e se diz missa aos presos. N a r u a d a P r a i n h a está o oratório das
almas, e m q u e aquela vizinhança canta e m louvor d a M ã e de D e u s suas ladainhas.

Refere-se ajoão Crisóstomo (354-407 A.D), bispo de Constantinopla. Tido como o mais eloqüente
pregador de sua época, era, por isso, chamado de. Boca de Ouro, e entre os seus temas preferidos
estavam a denúncia contra o luxo, a defesa da educação e o cuidado com os pobres.
Artemisa, célebre rainha da Caria, provinda da Ásia Menor. Quando morreu seu esposo, o rei
Mausolo, mandou construir um túmulo tão magnífico que se tornou uma das sete maravilhas do
mundo.
293

N o m o r r o d a "espalda d a vila, n a sua costaneira, está a C a p e l a de Nossa S e n h o r a


das Mercês, feita pela figura do P a n t e ã o ou R o t u n d a de R o m a . ' * D a o u t r a p a r t e d a
1

vila estão as "capelas d e São C a e t a n o e a de Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o , e e m


m e i o à casa d a venerável O r d e m T e r c e i r a d e São Francisco e n o arrabalde o n d e
c h a m a m o B a r r o V e r m e l h o está o oratório d e Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o , m o n u -
mentos todos eretos pela católica devoção deste povo e p o r ele c o m zelo assistidos e
c o m notável asseio tratados.
N o largo p o r detrás d a m a t r i z se levanta o P a ç o do C o n c e l h o , ou C a s a d e
C â m a r a , cujos "oficiais q u e t ê m servido e servem são dignos de t o d o o respeito e
v e n e r a ç ã o . Seus m o r a d o r e s são d e t r a t a m e n t o grave; graves nas pessoas e s e m
afetação, e m t u d o graves e c o m civilidade. E cortejada d e u m ribeiro, q u e p e l o
m e i o d a vila, p o r debaixo d e duas p o n t e s , c o r r e n d o , busca os pés d e t o d a a s u a
vizinhança, q u e r e n d o m o s t r a r pelas correntes q u e arrasta o q u a n t o afeta ser seu
escravo, a q u e m , liberal, oferece n a s areias q u e Java o o u r o q u e consigo traz. P o r
todas essas circunstâncias se faz a vila de São J o ã o del-Rei do a g r a d o de todos, e
d e toâos m a i s apetecida p o r h a b i t a d a pelo excelente clima d e q u e goza, a q u e n ã o
fazem inveja os c e l e b r a d o s d e C á p u a , n a Itália, n e m o d a Tessália, n a G r é c i a ,
p o r q u e é l a v a d a d e "rocios v e n t o s q u e a " f a v o n e i a m , cujos ares r e c e b e m seus
h a b i t a n t e s vitais e r e s p i r a m p u r o s . U l t i m a m e n t e , é a vila de. S ã o J o ã o d e l - R e i
m u i t o p a r t i c u l a r *per se e pelo n o m e q u e tem, c o m o é o do m a i o r nascido e d o rei
mais / / católico. T e m a vila de São J o ã o del-Rei O u v i d o r i a d e q u e se h o n r a , p e l a [ fl. 99v. ]
q u a l se faz c a b e ç a de c o m a r c a c o m seu "ouvidor-geral, "escrivão, " i n q u i r i d o r e
"meirinho-geral c o m seu escrivão. E s c r e v e m neste j u í z o , d e mais do seu escrivão
p r ó p r i o , o escrivão das execuções, o dos ausentes e t a m b é m o "tabelião, c o m o n o
j u í z o ordinário; t e m "juiz dos órfãos e juiz do eclesiástico c o m seus oficiais, a l é m
dos q u e h á q u e c h a m a m oficiais d e c a m p o . U l t i m a m e n t e , t e m a C a s a R e a l d a
I n t e n d ê n c i a , d e q u e muito se autoriza, e compõe-se este tribunal de u m presiden-
te, h o m e m d e letras, u m fiscal, u m escrivão c o m seu "ajudante, u m "tesoureiro e
u m m e i r i n h o do t r i b u n a l , a o q u a l se v ã o p a g a r os "quintos.

* Finis

Vasto edifício circular encimado por uma cúpula, situado 110 Campo de Marte; era templo consa-
grado ajúpicer. Foi construído por Agripa no tempo de Augusto [27 a.C.].
294

> 15 «

[Notícia de Manuel Nunes Viana]

Sucinta informação biográfica sobre Manuel Nunes Viana,


desde sua passagem por Salvador (ca. 1680), de onde segne para
o sertão, até alcançar Minas, e a partir daí vivendo entre Portu-
gal e Bahia.
D e cunho eminentemente biográfico - e, nesta condição,
peça única em todo o conjunto do Códice —, tal notícia sobre figu-
ra de destaque nos conflitos ocorridos nas primeiras décadas de
Minas assume natureza complementar ao conjunto de relatos
sobre eles. Parece também ter sido formulado atendendo a enco-
menda do compilador do Códice.
Autoria, l o c a l e data: Anônimo; Minas Gerais; ca. 1750,
U s o n a historiografia: A. J . R. Russell-Wood emprega
informações deste documento para ilustrar a trajetória de Ma-
nuel Nunes Viana e seu papel desempenhado n a política metro-
politana de controle sobre Minas Gerais (Manuel Nunes Viana:
paragon or parasite of empire. The Américas. A Quarterly Review
of Inter-American Cultural History, W a s h i n g t o n , v. 87, p. 4 7 9 -
498, Apr. 1981). Charles Boxer retira do manuscrito dados para
a reconstituição da trajetória de Manuel Nunes Viana (A idade
de ouro do Brasil: dores de crescimento de u m a sociedade coloni-
al. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969. p. 87).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se d e breve caracterização
heroificante d a personagem Manuel Nunes Viana, em que se lhe
atribui algumas das virtudes retomadas em documentos anterio-
res. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a do século
XVIII, apesar de pouco caligrafada, apresenta clareza. C h a m a m
a atenção: o "s" duplo, simplificado para dois únicos traços, para-
lelos e levemente sinistrógiros e o uso de dois pontos coraó sinal
abreviativo em nomes próprios e comuns, como "cid:'' 1

circunflexo marca tonicidade, como em "fêz". (YDL)

A
[fl. 100 ] notícia q u e t e n h o d e M a n u e l N u n e s V i a n a é q u e , c h e g a n d o n o v a t o à
cidade d a Bahia, sucedeu ter u m a p e n d ê n c i a c o m dois ou mais h o m e n s ,
-na q u a l , quebrando-se-lhe a espada pelas guarnições, se defendeu c o m o
seu c h a p é u n a m ã o , d e sorte q u e c h e g o u a concluir u m e tirar-lhe a e s p a d a d a
m ã o , e c o m ela m a t o u a u m e se ocultou, d e cujo sucesso, t e n d o o " g o v e r n a d o r
295

d a q u e l a c i d a d e notícia, o m a n d o u ir a sua p r e s e n ç a p a r a o ver; e p e d i n d o - l h e o


dito V i a n a q u e o valesse, deu-lhe várias cartas d e favor p a r a o sertão, o n d e fez
n u m e r o s a s façanhas e se o p u l e n t o u , d e sorte q u e c h e g o u a ser a c l a m a d o nestas
M i n a s pelo p o v o p o r g o v e r n a d o r delas, e i n d o p a r a a B a h i a daí passou a Lisboa,
e v o l t a n d o p a r a a dita B a h i a trouxe várias mercês q u e lhe fez S u a M a j e s t a d e , e n t r e
as quais foi a de *alcaide-mor d e u m a das vilas, *mestre-de-campo e o "oficio d e
"escrivão d a O u v i d o r i a d a vila do S a b a r á .

• 16 «

Regimento ou instrução que trouxe [ fl. 102 ]


Martinho de Mendonça de Pina e de Proença

Contendo ordens particulares ao comissário Martinho de


Mendonça, que tinha a missão de implantar a cobrança do quin-
to por capitação e regulamentar a extração dos diamantes em
Minas Gerais, o documento sintetiza a política metropolitana e
reúne diretrizes para fomentar novos descobrimentos auríferos,
a abertura de novas vias de comunicação fluviais e o combate ao
descaminho do ouro pela rota da Costa da Mina e à falsificação
de moedas,
De interesse no final da década de 1740 e início d a de
1750, pelas discussões travadas e m torno da capitação, alterna-
tivas existentes, decisão de reinstalação de casas de fundição em
Minas Gerais e implicações da medida, o regimento informaria
a participação de C a e t a n o d a Costa M a t o s o nas j u n t a s p a r a
discussão do tema.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Rei [Alexandre de Gusmão]; Lis-
boa; 30.10.1733.
D e s t i n a t á r i o : Martinho de M e n d o n ç a de Pina e de Pro-
ença.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O regimento ou instrução obede-
ce à estrutura convencional dos documentos similares da época:
endereçamento, breve saudação, detalhamento das instruções e
data, prevalecendo a forma imperativa da linguagem. {JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna bastarda do
século XVIII de documentos barrocos, com amplas hastes pen-
dentes sinistrógiras e hastes superiores em meia voluta e perfil.
296

Mantém o nexo "st", sendo que a primeira destas letras é roda-


da, isto é, u m " s " sigmático. O " o " minúsculo é aberto. O " h "
tem a forma do " E " redondo, mas não se isola, ligado por traço
ascendente á letra anterior. Letra de copista. Numeração corri-
d a de 1 a 5, que continua no documento 17 e no primeiro fólio
do documento 18 (fóliol 17). {YDL)
Critérios e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir da
matriz da cópia do Códice (APM, SC 02, fl. 137-140) e restringi-
ram-se aos termos que comprometiam o significado e o entendi-
mento do texto, mantidas as pequenas variantes introduzidas
pelo copista.
Cópias manuscritas:
APM, SC 0 1 , Íl.l02-106v.
A P M , SC 02, 11. 137-140.
A P M , SC 105, 11. 29-33.
I H G B . "Academia Real das Sciêncías" f. 174. ?

ACL, Série Vermelha, mss. 90, p. 161-163 (cit. B O S C H I , Caio


César. Fontes, primárias para a história de Minas Gerais em Portugal
Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, C E H C , 1998. p. 20).
B P M P , cód. 296, n 5, p . 22-25 (cit. B O S C H I , Caio César.
e

Fontes primárias para a história de Minas Gerais em Portugal.


Belo Horizonte: Fundação J o ã o Pinheiro, C E H C , 1998. p. 87).
Cópias impressas:
R E G I M E N T O ou instrução... Revista do Arquivo Público Minei-
ro, O u r o Preto, v. 3, p. .85-88, 1898.
C O R T E S Ã O , J a i m e (Org.). Alexande de Gusmão e o Tratado de
Madri (1750). Rio de Janeiro: Ministério das Relações Exte-
riores, Instituto Rio Branco, 1950. T . l , pt. 2: Obras várias
de Alexandre de Gusmão, p. 105-109.

M a r t i n h o d e M e n d o n ç a de Pina e d e P r o e n ç a . E u , el-rei, vos envio m u i -


to s a u d a r . H a v e n d o escolhido a vossa pessoa p a r a passardes às capita-
nias do E s t a d o do Brasil a diligências d o m e u real serviço, s o u servido
m a n d a r - v o s d a r a instrução seguinte.
A p r i m e i r a diligência q u e nas M i n a s deveis fazer é informar-vos m i u d a m e n t e
do n ú m e r o d e escravos q u e nelas p o d e haver, tanto pela opinião das pessoas mais
práticas e verdadeiras c o m o pelos róis d o donativo q u e se m a n d a r ã o p r o c u r a r , en-
c a r r e g a n d o - s e aos "ministros d a J u s t i ç a e "oficiais d a " c â m a r a q u e i n f o r m e m do
n ú m e r o de todos e t a m b é m daqueles q u e , p o r a l g u m privilégio ou o u t r o motivo,
n ã o foram inclusos nestes róis, e procurareis saber, p o u c o mais ou m e n o s , os e m p r e -
gos dos escravos, se são mineiros, se roceiros, e m q u e sítios e p o r q u e espaço d e
t e m p o c o s t u m a m estes minerar.
297

E p a r a p o d e r d e s u s a r p a r a este fim dos "róis dos confessados, buscareis d e


c a m i n h o a o "bispo d o R i o d e J a n e i r o e falareis c o m os "comissários do S a n t o
Oficio, "párocos e religiosos q u e forem convenientes, e n c a r r e g a n d o - l h e s , d a m i -
n h a p a r t e , a v e r d a d e a o segredo nas matérias q u e o p e d i r e m .
Visitareis n o R i o de J a n e i r o a C a s a d a M o e d a e examinareis os materiais e [ fl. 102v. ]
instrumentos, dela d i s p o n d o c ò m o g o v e r n a d o r e " p r o v e d o r da dita os a u m e n t o s
q u e f o r e m necessários nela, p a r a se r e p o r n o estado q u e c o n v é m a o m e u real
serviço. E d e t u d o m e dareis c o n t a e fareis q u e se suspenda, até novo aviso vosso
das M i n a s , a remessa dos materiais q u e h o u v e r e m d e ir p a r a elas, ficando e n t r e -
t a n t o e m b o a a r r e c a d a ç ã o , e m p o d e r do p r o v e d o r d a F a z e n d a d a q u e l a c i d a d e ,
r e c o m e n d a n d o q u e se c o n s e r v e m b e m c o n d i c i o n a d o s .
Referireis ao " g o v e r n a d o r das M i n a s diferentes arbítrios e pareceres q u e t ê m
h a v i d o sobre a a r r e c a d a ç ã o dos "quintos e sobre os meios d e conservar a r e p u t a -
ção dos d i a m a n t e s , e se conferirão c o m todos os mais q u e se descobrirem p a r a q u e
se escolha a l g u m q u e , sendo justo e conforme as regras d a e q ü i d a d e , possa utilizar
a m i n h a R e a l F a z e n d a e facilitar a sua c o b r a n ç a , d e sorte q u e se faça c o m a m e n o r
v e x a ç ã o q u e for possível.
P a r a este efeito, c h a m a r á o g o v e r n a d o r a u m a "junta d e " p r o c u r a d o r e s das
vilas c a b e ç a s d e c o m a r c a s e das m a i s q u e for c o s t u m e c h a m a r e m s e m e l h a n t e s
ocasiões, p a r a q u e , o u v i n d o o q u e r e p r e s e n t a r e m e fazendo as conferências neces-
sárias, se escolha a l g u m meio q u e p a r e ç a mais conveniente a o m e u serviço, e logo
se execute provisionalmente, e n q u a n t o eu o a p r o v o / / e n ã o m a n d o o c o n t r á r i o . [ fl. 103 ]
C o m estes p r o c u r a d o r e s se deve t r a t a r o negócio d e m a n e i r a q u e o desejo dos
m e s m o s povos justifique t o d a a resolução q u e se t o m a r , e assim deve evitar qual-
q u e r c o n s t r a n g i m e n t o ou sugestão a t u d o q u e p o d e r i a fazer m e n o s l e g í t i m o a
m o d o d e m o v e r os seus ânimos a a d e r i r .
D e v e - s e r e c o m e n d a r às " c â m a r a s q u e elejam p a r a p r o c u r a d o r e s pessoas ze-
losas, desinteressadas, e seria c o n v e n i e n t e q u e viessem instruídas n a m a t é r i a q u e
se lhes deve p r o p o r , explicando-se-lhes, p r i m e i r o , as razões q u e h á p o r u m a e
o u t r a p a r t e nos arbítrios q u e o c o r r e r a m , fazendo u m extrato de todos os pareceres
d e q u e levais cópia, t e n d o a m e s m a p r e c a u ç ã o de evitar t u d o q u e p o d e d i m i n u i r
a liberdade d e p r o p o r e m os seus pareceres.
. D e t o d o s os a r b í t r i o s q u e t ê m o c o r r i d o , p a r e c e o m a i s c o n v e n i e n t e o d e
u m a " c a p i t a ç ã o geral de todos os escravos e u m a c o n t r i b u i ç ã o p r o p o r c i o n a l aos
lucros q u e se fazem nas M i n a s , sem d e p e n d ê n c i a de escravos, ficando os d e m a i s
direitos a n t i g o s e m seu vigor. Se este a r b í t r i o for p e d i d o p e l o s p o v o s o u nele
c o n v i e r e m l i v r e m e n t e , se p r o c u r a r á r e g u l a r o p r e ç o d a c a p i t a ç ã o , d e sorte q u e
p r o d u z a q u a n t i a e q u i v a l e n t e aos q u i n t o s q u e d e v e m p a g a r . P o r é m , q u a n d o p a -
reça j u s t o e necessário m o d e r a r / / ou tirar d e t o d o a l g u m destes direitos, c o n t r i - [ fl. 103v. ]
b u i n d o - s e c o m m a i o r p r e ç o d e c a p i t a ç ã o o e q u i v a l e n t e , se p o d e r á fazer. M a s
q u a n t o aos "dízimos, se n ã o d e v e m c o m u t a r , s e n ã o e m caso q u e n ã o haja o u t r o
e x p e d i e n t e , e s e m p r e será c o m as cláusulas necessárias.
298

R e c o m e n d o - v o s q u e se n ã o c o n c e d a p e r d ã o geral e m n e n h u m caso, s e n ã o
q u a n d o p a r e ç a a b s o l u t a m e n t e o p o r t u n o e necessário, e x c e t u a n d o s e m p r e os deli-
tos d e levantar casa d a m o e d a e d e falsificação, "cerceio e d i m i n u i ç ã o d e m o e d a ,
b a r r a e "bilhetes, e de usar nesta m a t é r i a d a m o d e r a ç ã o necessária, c o n c e d e n d o -
se p o r diferentes graus, a saber: p e r d o a r a p e n a corporal d o delito, c o n c e d e r espa-
ço a o p a g a m e n t o dos direitos fraudados e, u l t i m a m e n t e , p e r d o a r p a r t e d a dívida
dos m e s m o s direitos aos q u e o f r a u d a r a m .
Q u a n t o aos d i a m a n t e s , se e x e c u t a r á o q u e vai d e t e r m i n a d o p o r o r d e m Tque
p a r a i isso m a n d o a o c o n d e das Galveias e pelo " r e g i m e n t o q u e se m a n d a p a r a
execução da "matrícula, se n ã o o c o r r e r e m t ã o urgentes causas p a r a se suspender a
e x e c u ç ã o q u e p a r e ç a indispensável antes d e l a d a r - s e - m e c o n t a , e neste caso se
[ fl. 104 ] [ t o m a r ã o ! os arbítrios / / mais convenientes a o b e m do comércio d a q u e l e g ê n e r o
e à m i n h a F a z e n d a ; e no caso n ã o esperado d e se t e m e r a l g u m t u m u l t o ou princí-
p i o de "sedição, se p o d e r á p r o c e d e r c o n t r a os culpados pela v e r d a d e sabida, sem
figura a l g u m a de j u í z o e c o m a execução militar; e h a v e n d o indícios c o n t r a algu-
m a pessoa eclesiástica, se r e m e t e r á e m custódia a o seu p r e l a d o .
P r o c u r a r e i s informar-vos do lugar e sítio mais c ô m o d o p a r a assistência dos
futuros "governadores e do m o d o e despesa c o m q u e se lhes possa fazer habita-
ç ã o , que. c o m a p a r ê n c i a de casa t e n h a segurança e utilidade d e fortaleza.
D a r e i s providências a q u e se consertem as b a r c a s p a r a a p a s s a g e m dos cava-
los, à custa d e q u e m direito for, no rio e m q u e se p a g a "passagem.
D a r - m e - e i s c o n t a se será c o n v e n i e n t e q u e nas M i n a s se e s t a n q u e a l g u m gê-
n e r o ou " d r o g a ou se reservem alguns sítios minerais d e ouro ou d i a m a n t e s .
Avisar-me-eis d e t u d o q u a n t o vos p a r e c e r q u e é c o n v e n i e n t e q u e c h e g u e à
m i n h a real notícia. E se o c o r r e r caso e m q u e haja falta d e "ministro ou "oficial
s e m suspeita e vos p a r e c e r necessário p e r g u n t a r d e s , s u m á r i a o u d e v a s s a m e n t e ,
[ fl. 104v. ] a l g u m a s t e s t e m u n h a s ou escreverdes vós seus / / ditos, e p e r g u n t a n d o a o u t r a s
p e s s o a s , o p o d e r e i s fazer e n t e n d e n d o q u e assim c o n v é m a o m e u serviço. E o
m e s m o podereis m a n d a r fazer pelas pessoas q u e vos p a r e c e r , e p a r a t u d o o sobredito
vos d o u t o d o o p o d e r e fé pública necessária, c o m o t a m b é m ás pessoas q u e vós
nomeareis.
Assistireis às d e m a r c a ç õ e s das terras minerais dos d i a m a n t e s d o S e r r o do Frio,
n ã o sendo a vossa presença mais necessária em o u t r a p a r t e .
T o m a r e i s i n f o r m a ç ã o e x a t a dos sítios e m q u e h á notícias ou indícios d e se
p o d e r e m d e s c o b r i r novas m i n a s d e o u r o o u p e d r a s preciosas e se c o m a l g u m a
m á q u i n a ou artificio se p o d e m facilitar as suas lavras.
I n f o r m a r - v o s - e i s d e t o d a s as p a r a g e n s e m q u e se d e s c o b r e m c r i s t a i s ,
calcedônias, ágatas e outras p e d r a s d e estimação q u e se possam descobrir n a A m é -
rica, e das "drogas de preço q u e se possam e n c o n t r a r naquelas partes, e se c o n v é m
reservá-las a proveito da C o r o a .
P r o c u r a i alcançar notícia do curso dos rios navegáveis q u e s a e m das M i n a s ,
d a p r o f u n d i d a d e e mais circunstâncias dos seus "álveos, declividade, c a c h o e i r a s .
299

v a r a d o u r o s e p o r t o s e m q u e d e s a g u a m , / / e se nas suas vizinhanças h á m a t o s q u e [ fl. 105 ]


p o s s a m d a r m a d e i r a p a r a e m b a r c a ç ã o , d a n d o providência a q u e se conservem, e
conferindo c o m o " g o v e r n a d o r e "ministros p a r a d a r - m e c o n t a se c o n v é m a n i m a r
alguns m o r a d o r e s ao descobrimento d a navegação p a r a as M i n a s p o r estes rios, e
e x p o n d o - m e as utilidades q u e daí p o d e r ã o resultar à m i n h a F a z e n d a e aos povos.
Informaí-vos a c a u t e l a d a m e n t e d a distância a q u e ficam das últimas p o v o a -
ções ou lavras algumas nações européias o u b á r b a r a s e d o seu p o d e r e desígnios.
Se p a r e c e r c o n v e n i e n t e o c u p a r a l g u m sítio, disporeis q u e , c o m p r e t e x t o d e
roças, se t o m e posse p o r p a r t e da m i n h a C o r o a ,
Informar-vos-eis d a necessidade e uso dos escravos d a C o s t a d a M i n a , dos
d a n o s q u e causa a q u e l e c o m é r c i o e meios p a r a se evitarem.
Fareis as j o r n a d a s q u e p a r e c e r convir a o m e u real serviço, p r o c u r a n d o infor-
m a r - v o s d a c a p a c i d a d e e mais circunstâncias das pessoas q u e m e servem ou m e
p o d e m servir.
E m todos os negócios de q u e m e derdes conta, interporeis o vosso p a r e c e r e
referireis o d e outras pessoas inteligentes.
Confio d e vós / / q u e usareis s e m p r e d a q u e l a m o d e r a ç ã o e s u a v i d a d e q u e [ fl. 105v. ]
é c o n v e n i e n t e e q u e nos casos e m q u e for n e c e s s á r i o m o s t r e i s t o d o o v i g o r e
resolução.,
A g o v e r n a d o r e s e ministros tratareis c o m a q u e l e r e s p e i t o q u e se d e v e aos
lugares q u e o c u p a m , de sorte q u e o vosso e x e m p l o acrescente e n t r e os m o r a d o r e s
d a A m é r i c a a v e n e r a ç ã o c o m q u e os d e v e m tratar.
A c h a n d o q u e é c o n v e n i e n t e ao m e u serviço fazer l a n ç a r a l g u m " b a n d o , ou
publicar a l g u m a o r d e m , ou t o m a r outro expediente, o representareis a o governa-
d o r e advertireis aos finais! ministros q u e me. servem, aos quais t e n h o o r d e n a d o
q u e a t e n d a m muito a o q u e p o r m e u serviço lhe disserdes.
S e n d o necessário, se vos m o s t r a r ã o e m todos os cartórios è secretarias todos
os papéis m a i s ocultos, sem e m b a r g o de quaisquer o r d e n s q u e e m c o n t r a r í o haja.
Executar-se-á, e n q u a n t o eu n ã o m a n d a r o c o n t r á r i o , aquela p r o v i d ê n c i a q u e
o c o n d e g o v e r n a d o r das M i n a s , ouvindo o vosso p a r e c e r e das mais pessoas inte-
ligentes, / / der sobre a c o b r a n ç a dos "quintos, sem e m b a r g o d e q u a i s q u e r leis ou [ fl. 106 ]
"decretos, cujo efeito neste caso hei p o r s u s p e n d i d o p r o v i s i o n a l m e n t e p a r a esse
fim e n q u a n t o n ã o t o m a r resolução.
O c o r r e n d o caso em q u e seja necessário fazer-se-me aviso p r o n t o , o g o v e r n a -
dor do R i o de J a n e i r o expedirá e m b a r c a ç ã o , passando p a r a isso as ordens necessá-
rias.
E m caso d e vosso falecimento ou total i m p e d i m e n t o , ficará esta instrução Te
osl m a i s p a p é i s d e m e u s s e r v i ç o s q u e vos h o u v e r e m s i d o e n c a r r e g a d o s a o
" d e s e m b a r g a d o r Rafael Pires P a r d i n h o . Escrita e m Lisboa ocidental a 30 de outu-
b r o de 1733.
Rei.
300

• 17 «
[ íl. 106v. ] Regimento da capitação

Regimento baseado no projeto elaborado por Alexandre de


Gusmão em 1733, continha, em primeira versão, de 2 de julho
de 1735, apenas 28 parágrafos, aumentados p a r a 41 com auxi-
lio do intendente de Sabará. Regulamentava a cobrança do quinto
por capitação — matrícula de escravos, escrituração, fiscaliza-
ção, penas e punições à sonegação e à inadimplência implan-
tada em Minas Gerais por Gomes Freire de Andrade e Martinho
de Mendonça de Pina e de Proença em julho de 1735. Vigorou
até 1750, embora nunca tenha sido oficialmente aprovado pela
Coroa.
Documento de interesse no final da década de 1740 e ini-
cio d a de 1750 pelas discussões travadas em torno da capitação,
alternativas existentes, decisão de reinstalação de casas de fundi-
ção em Minas Gerais e implicações da m e d i d a , informaria a
participação de Caetano da Costa Matoso nas juntas para dis-
cussão do tema. Era, ainda, base legal para despachos, parece-
res e sentenças do ouvidor envolvendo problemas fazendários e
fiscais.
A u t o r i a , l o c a l e data: Gomes Freire de Andrade; Vila
Rica; P.7.1735.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O presente regimento obedece à
estrutura convencional dos documentos similares da época." pri-
meiro parágrafo como u m a espécie de exórdio seguido dos de-
mais, que detalham normas, prevalecendo a forma imperativa
da linguagem. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográJGco: Escrita moderna bastarda do
século X V I I I , bastante regularizada. C o m iniciais dotadas de
volutas e arabescos; por exemplo, o " M " e o "A" trazem apex em
forma de voluta. O "d" uneial, quando no inicio de linha, ocupa
parte da margem, com volteio amplo à esquerda. O ponto-e-
vírgula é usado, às vezes, em lugar do ponto abreviativo. O " s "
final de palavra se assemelha ao "z" [zeta), de ampla cauda. Le-
tra de copista idêntica à do documento 16. Numeração corrida
de 6 a 17, em continuação à do documento 16. {YDL}
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir d a
matriz da cópia do Códice (APM, SC 02, fl. Í44v.-152) e restringi-
ram-se aos termos que comprometiam o significado e o entendi-
mento do texto, mantidas as pequenas variantes introduzidas
pelo copista.
301

Cópias manuscritas:
APM, SC 02, ü. 132-137. Minuta.
APM, SC 02, íl. 140-144. C o m 28 parágrafos.
APM, SC 02, ff. 144v.-152.
A H M , 2- Divisão, l Seção, sala A, caixa 1, n. 6 (citado p o r
â

Ü O S C H I , Caio. Fontes primárias fiara a história de Minas Gerais


em Portugal. Belo Horizonte: Fundação J o ã o Pinheiro, 1998. p .
26).
Cópia impressa:
R E G I M E N T O da capitação. Revista do Arquivo Público Mineiro,
O u r o Preto, v. 3, p. 37-44, 1898.

S
e n d o o r d e n a d o q u e p a r a m e l h o r a r r e c a d a ç ã o dos " q u i n t o s p o r m e i o d a
"capitação e m q u e se c o m u t o u aquele direito se assinassem, e m c a d a capita-
nia, os limites certos e m q u e se deve p a g a r , e q u e e m c a d a distrito haja u m
j u í z o d e "intendência c o m jurisdição privativa e m todas as matérias q u e p e r t e n c e -
r e m à dita c a p i t a ç ã o , hei p o r b e m q u e toda a p r á t i c a e a r r e c a d a ç ã o dela se execute
n a f o r m a d o ' r e g i m e n t o seguinte:

3*

A o dito " g o v e r n a d o r se r e m e t e r á todos os anos, pelo C o n s e l h o U l t r a m a r i n o ,


n ú m e r o c o n v e n i e n t e de "bilhetes e x a t a m e n t e c o n t a d o s e fechados, os q u a i s ele
t a m b é m r e m e t e r á p o r c o n t a aos "intendentes q u a n d o for t e m p o d e abrir a "matrí-
cula, ficando o m e s m o g o v e r n a d o r obrigado a r e m e t e r o u t r a vez a o dito C o n s e l h o
os bilhetes q u e h o u v e r e m sobejado e d a r c o n t a d e tantas vezes a i m p o r t â n c i a d a
c a p i t a ç ã o q u a n t o s f o r e m os bilhetes q u e r e m e t e r d e m e n o s , e a m e s m a c o n t a
d a r ã o os i n t e n d e n t e s ao g o v e r n a d o r .

2"

H a v e r á e m c a d a distrito u m i n t e n d e n t e , a q u e m e s t a r ã o sujeitos assim os


"oficiais d a m a t r í c u l a c o m o t o d o s os m o r a d o r e s pelo q u e t o c a às d e p e n d ê n c i a s
dela, e o i n t e n d e n t e d e p e n d e r á das o r d e n s d o g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e r a l , e
assim t a m b é m h a v e r á u m "fiscal, u m "escrivão, u m "tesoureiro e u m " m e i r i n h o , e
o n d e estes oficiais n ã o b a s t a r e m / / p a r a a expedição necessária h a v e r á t a m b é m [ fl. 107 ]
u m "ajudante d o escrivão.

a. Este parágrafo é o terceiro, e abaixo vai o segundo.


b. Este é o parágrafo segundo.
302

N o princípio d e j a n e i r o e j u l h o d e c a d a a n o se abrirá a "matrícula, e nela se


m a t r i c u l a r ã o todos os escravos pelos "bilhetes do a n o p a s s a d o ou listas e m q u e se
d e c l a r e m o n o m e e sítio d e m o r a d a dos d o n o s e os n o m e s , s o b r e n o m e s e p á t r i a
dos escravos, e n o mais q u e p e r t e n c e r à formalidade d a m a t r í c u l a , e se observará
o m é t o d o q u e abaixo se declara.

N e s t a matrícula geral dos escravos se p a g a r á p o r c a d a u m duas "oitavas e doze


"vinténs de ouro p o r cada seis meses, sem exceção alguma pelo estado ou qualidade
dos donoSj, n e m p e l a o c u p a ç ã o ou m e n o s p r é s t i m o dos escravos, p o r q u e só serão
excetuados os crioulos ou mulatinhos nascidos dentro d a (capitania! das M i n a s q u e
n ã o p a s s a r e m de catorze anos. Se antes deles seus d o n o s os o c u p a r e m e m m i n e r a r
ou e m outro exercício de igual conveniência ou fadiga, neste caso p a g a r ã o c o m o os
d e m a i o r i d a d e . E t a m b é m serão excetuadas as negras cativas q u e estiverem nas
[ fl. 107v. ] "vendas e tiverem p a g o o q u e lhes toca, n a forma do ajuste feito / / c o m os procu-
radores das "câmaras.

P a r a d a r expedição à matrícula, estarão n a "casa da intendência, a u m a m e s a ,


o "intendente, "fiscal e "escrivão e, a o u t r a , o "tesoureiro, assistindo o "meirinho,
e os soldados, s e n d o necessários p a r a evitar confusão. C a d a u r a dos d o n o s , ou
seus p r o c u r a d o r e s , a p r e s e n t a r á a o i n t e n d e n t e os "bilhetes ou listas, pelas quais o
escrivão e n c h e r á os claros dos novos bilhetes e o fiscal os assentará e m o livro d a
m a t r í c u l a e n o alfabeto, dando-se-lhe u m bilhete q u e diga " a "fuão tantos bilhe-
tes", c o m o q u a l irá à m e s a do tesoureiro, q u e , r e c e b e n d o a sua i m p o r t â n c i a , p o r á
n o m e s m o bilhete " p a g o u fuão tantos b i l h e t e s " e. o f i r m a r á c o m a sua r u b r i c a ,
t e n d o c u i d a d o d e r e c e b e r o o u r o l i m p o , s e m m i s t u r a n e m falsidade, e de n ã o
r e c e b e r ouros de t o q u e n o t o r i a m e n t e baixo» senão às pessoas dos distritos e m q u e
se n ã o t i r a o u t r o m e l h o r .

O fiscal p o r á n o livro das matrículas, n a "regra q u e c o m e ç a " m a t r i c u l o u " ,


[ fl. 108 ] n o m e e m o r a d a / / dos d o n o s , e n a s adições p a r a b a i x o , n a r e g r a q u e c o m e ç a " u m
escravo", p o r á o n o m e e s o b r e n o m e , p á t r i a e idade d e c a d a e s c r a v o , d a m e s m a
sorte q u e vai nos bilhetes, n u m e r a n d o - o s c o m os n ú m e r o s consecutivos, e p o n d o
"vazia" n a r e g r a q u e c o m e ç a "matriculou' e n q u a n t o c o n t i n u a r e m os escravos d o
1
303

m e s m o d o n o . E n a ú l t i m a s e m e l h a n t e , depois d o ú l t i m o a s s e n t o dos escravos


d a q u e l e d o n o , h a v e r á d e escrever o n o m e do o u t r o d o n o q u e se seguir, c o m e ç a n -
do d e novo os n ú m e r o s d a m a r g e m c o m o escrito d o "tesoureiro, q u e g u a r d a r á o
"intendente p a r a a sua conta. E n t r e g a r á aos donos os "bilhetes r u b r i c a d o s e p r o -
c u r a r á o i n t e n d e n t e e "fiscal q u e n ã o p a s s e m dois escravos d o m e s m o d o n o sem
a l g u m distintivo ou a l c u n h a q u a n d o t e n h a m o m e s m o n o m e , p á t r i a e i d a d e ,

S e n d o caso q u e se e n c o n t r e a l g u m bilhete ou certidão d a " i n t e n d ê n c i a falso


ou falsificado, se fará a p r e e n s ã o nos culpados, fazendo-se, p a r a m e l h o r averigua-
ç ã o , e x a m e p a r a c o r p o de delito, c o m sumário d e t e s t e m u n h a s , e se tirará "devas-
sa *ex-offiào e se c o n d e n a r ã o os culpados e m dez anos d e d e g r e d o p a r a São T o m é ,
í

e lhes serão confiscados seus b e n s , n ã o t e n d o d e s c e n d e n t e s o u a s c e n d e n t e s , d e


cuja s e n t e n ç a só h a v e r á apelação p a r a o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o .

9 [fl. 108v. ]

A "matrícula estará a b e r t a somente dois meses, q u e n o fim dos quais se cer-


rará ? d e i t a n d o riscas d o alto a baixo pelos assentos q u e r e s t a r e m p o r e n c h e r n a
p á g i n a p r i n c i p i a d a , e n o fim dela p o r ã o o i n t e n d e n t e , fiscal e tesoureiro as suas
rubricas, s e m ser necessário mais t e r m o d e e n c e r r a m e n t o , c o n t i n u a n d o n a o u t r a
p á g i n a os assentos dos q u e depois vierem matricular e p a g a r a m u l t a , e d a m e s m a
sorte se e n c e r r a r á de t o d o n o fim q u a n d o se e n t r a r e m devassa e "correição.

10

O s escravos adventícios, isto é, os q u e d e n o v o c h e g a m aos ditos distritos dos


p o r t o s de m a r ou p a r t e s e m q u e n ã o h á "capitação, serão seus d o n o s obrigados a
m a t r i c u l á - l o s d e n t r o d e dois meses depois q u e e n t r a r e m n a s M i n a s , p a g a n d o o
q u e *pro rata tocar até o fim d a q u e l a m a t r í c u l a , e r e c e b e n d o , e m lugar d e bilhete
i m p r e s s o , s e m e l h a n t e d e m ã o , r u b r i c a d o p e l o i n t e n d e n t e , fiscal e t e s o u r e i r o , e
f a z e n d o - s e assento e m livro à p a r t e . E o m e s m o se p r a t i c a r á c o m os fugidos e
presos q u e os donos r e c u p e r a r e m . / / depois pelo decurso d o t e m p o , p r e c e d e n d o [ fl. 1 0 9 ]
exata informação. C o m declaração, p o r é m , q u e às pessoas q u e vinte dias antes d e
se e n c e r r a r a m a t r í c u l a a p r e s e n t a r e m n a i n t e n d ê n c i a m e m ó r i a dos escravos q u e
t r a z e m fugidos, t e n d o m a t r i c u l a d o s os m a i s , se lhes n ã o l e v a r ã o e m o l u m e n t o s
alguns pelas justificações. E aos q u e até esse t e m p o n ã o tiverem m a t r i c u l a d o , se
levará irremissivelmente d e justificação de c a d a escravo assinatura e inquiridoria
pelo i n t e n d e n t e , a s s e n t a d a e escrita p e l o escrivão. E o fiscal q u e h o u v e r vista p a r a
i m p u g n a r a justificação levará o e m o l u m e n t o q u e c o s t u m a levar o " p r o c u r a d o r d a
304

F a z e n d a . E o m e s m o se p r a t i c a r á c o m os adventícios, n ã o c o n s t a n d o q u e São
"boçais.

11

T o d o o escravo q u e se descobrir s o n e g a d o será p e r d i d o p a r a a F a z e n d a R e a l


se a sonegação se descobrir pelas diligências *ex-officio, E sendo p o r d e n ú n c i a , se
aplicará a o d e n u n c i a n t e , n o caso q u e se possa fazer dele a p r e e n s ã o , dando-se-lhe
u m a certidão, p a r a lhe servir d e título. N o caso, p o r é m , q u e h o u v e r p r o v a d e
a l g u m ou alguns sonegados e m q u e se n ã o p o d e r á fazer a p r e e n s ã o , se seqüestra-
[ fl. 109v. ] rao outros / / tantos aos donos, nos quais se n ã o fará execução s e m ser ouvido ou
a s u a revelia c o n d e n a d o , no qual caso se n ã o a d m i t i r á apelação, s e n ã o n o efeito
devolutivo, p a r a o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o . E os escravos q u e se d e s c o b r i r e m sone-
gados p o r via d e d e n ú n c i a q u e d e r e m eles de si ou d e algum seu "conservo, se lhe
p a s s a r á grátis carta d e alforria e m m e u n o m e pelo "intendente ou "ministro p e -
r a n t e q u e m se descobrir a sonegação, as quais ficarão registradas nas intendências.

12

T o d a s as pessoas livres, européias ou a m e r i c a n a s , q u e se a c h a r q u e p o r suas


m ã o s t r a b a l h a m extraindo ouro nas M i n a s serão obrigadas a a p r e s e n tarem-se nas
i n t e n d ê n c i a s e p a g a r e m " c a p i t a ç ã o , eles o u seus a d m i n i s t r a d o r e s , e, d a m e s m a
s o r t e , t o d o s os n e g r o s e n e g r a s livres e t o d o s os m u l a t o s e m u l a t a s forras q u e
n a s c e r a m escravos e, c o m o roceiros ou mineiros, n ã o tiverem escravos; e todas as
pessoas q u e e x e r c i t a r e m "oficios, p a r a o q u e h a v e r á livro s e p a r a d o e se lhes d a r ã o
"bilhetes de paga. E todos os sobreditos q u e se n ã o manifestarem e p a g a r e m serão
e x t e r m i n a d o s das M i n a s e c o n d e n a d o s e m c e m "oitavas p a r a a F a z e n d a ReaL ou
denunciante.

13

D a m e s m a s o r t e , serão o b r i g a d a s a m a n i f e s t a r e m - s e t o d a s as pessoas q u e
[ fl. 110 ] tiverem "lojas, "vendas, / / boticas, cortes de c a r n e , p a g a n d o a capitação q u e lhes
foi repartida, a saber, d o z e oitavas as lojas grandes, oito as m e d i a n a s e as v e n d a s ,
e q u a t r o os mascates e lojas pequenas., d e q u e se fará assento e m livro s e p a r a d o e
se d a r ã o bilhetes de p a g a aos q u e vierem manifestar-se.

14

P a r a se saber a q u e classe p e r t e n c e m as lojas, se t o m a r á informação, debaixo


d e j u r a m e n t o , a d u a s pessoas inteligentes. E se n a " c o r r e i ç ã o se a c h a r q u e os
305

d o n o s as " c a p i t a r a m e m classe m e n o r do q u e devia ser, se lhe fará p a g a r o excesso


e m d o b r o , s e m m a i s o u t r a p e n a . E as "lojas e m q u e se v e n d e r p o r m i ú d o a l g u m a
coisa comestível d e v e r ã o , a o m e n o s , ser r e p u t a d a s c o m o " v e n d a s , e d a m e s m a
sorte as boticas, cortes de c a r n e , "casas d e pasto e estalagens.

15

Q u e m , depois de dois meses a o t e m p o q u e j á estiver c e r r a d a a "matrícula, se


vier manifestar ou m a t r i c u l a r seus negros p a g a r á de m u l t a , e m p e n a d o dolo ou
afetada negligência, a d é c i m a p a r t e do q u e dever p a g a r . E, assim, p a r a a c o n t a dos
" i n t e n d e n t e s , lhe fará c a r g a mais a d é c i m a p a r t e d o q u e i m p o r t a r e m as adições
dos livros, depois d e c e r r a d a / / a matrícula. [A- 110v. ]

16

S e n d o caso q u e n o último t e r m o v e n h a alguém manifestar seus escravos s e m


ouro p a r a pagar a capitação apresentando penhores bastantes a contento do
i n t e n d e n t e e tesoureiro, será admitido à matrícula e se lhe d a r ã o "bilhetes. E n o
caso q u e os p e n h o r e s sejam d e ouro ou p r a t a lhe p o d e r á d a r o i n t e n d e n t e a l g u m
3

t e r m o b r e v e q u e n ã o exceda do t e m p o e m q u e h á d e d a r conta. E sendo os p e -


n h o r e s tais q u e neles possa haver risco, logo serão r e m a t a d o s , s e m figura de j u í z o
n e m mais processo q u e u m t e r m o conciso de a r r e m a t a ç ã o e u m bilhete p a r a servir
d e título a ô a r r e m a t a n t e , q u e t u d o se fará grátis pelo q u e toca à " i n t e n d ê n c i a e
s o m e n t e p a g a r ã o as p a r t e s os "pregões a o "porteiro.

17

N o s últimos dois meses d e c a d a semestre e n t r a r á o i n t e n d e n t e e m "correição


c o m os seus "oficiais, c o m e ç a n d o no lugar d a sua residência e depois i r á p o r todos
os outros sítios e arraiais a q u e for possível c h e g a r n o dito t e m p o . E lhe n ã o sendo
possível ir a t o d o s , a l t e r n a r á , de sorte q u e , p a r a n ã o ficar l u g a r n e n h u m s e m
correição, vá p r i m e i r o aos lugares q u e lhe faltaram nas correições a n t e c e d e n t e s .

18 [fl. 1 1 1 ]

O i n t e n d e n t e e seus oficiais e os soldados q u e o a c o m p a n h a r e m p a r a s u a


segurança e respeito n ã o o b r i g a r ã o aos m o r a d o r e s a lhes d a r e m c a m a n e m m a n t i -
m e n t o s alguns; antes, p a g a r ã o t u d o pelo p r e ç o d a t e r r a , exceto o c a p i m p a r a os
cavalos, q u e p o r c o s t u m e ê direito real, e m r e c o n h e c i m e n t o do d o m í n i o das terras
d a r e m - s e aos cavalos dos "ministros e soldados. E se d e i x a r e m d e p a g a r a l g u m a
coisa ou a e x t o r q u i r e m , serão castigados c o m o se v i o l e n t a m e n t e a r o u b a s s e m . E
p o d e r á 0 i n t e n d e n t e n a correição segunda do a n o c o n t i n u a r nela Tosi dias q u e lhe
306

p a r e c e r d o m ê s de j u l h o , a t e n d e n d o a q u e é t e m p o mais c ô m o d o , d i m i n u i n d o o
t e m p o da "correição do fim do a n o , e m q u e as c h u v a s o r d i n a r i a m e n t e dificultam
as j o r n a d a s .

19

Nesta correição, p r o c u r a r á averiguar o "intendente se houve alguns sonegados,


t o m a n d o informações ocultas e t i r a n d o "devassa p o r itens s e p a r a d o s de todas as
diferentes parcelas d a "capitação, p e r g u n t a n d o às testemunhas q u e lhe p a r e c e r , li-
vres ou cativas, e n ã o m a n d a r á escrever o dito d e todas as q u e n ã o d e p u s e r e m coisa
alguma. Esta devassa se escreverá e m livro rubricado pelo intendente, q u e todos os
[ fl. 11 lv. ] dias fará declaração ou p r o n ú n c i a dos sonegantes, / / p o n d o a d a t a do dia por exten-
so e d a n d o vista ao fiscal p a r a requerer contra eles. E fará p ô r e m lugar público as
listas dos escravos, "vendas, "lojas e "ofícios de c a d a arraial ou freguesia p a r a que
todos saibam se houve algum sonegado e o possam denunciar.

20

S e n d o suspeita q u e p o d e r á haver a l g u m escravo sonegado, m a n d a r á vir p e -


r a n t e si o d o n o c o m todos os escravos e "bilhetes, e lhes p a s s a r ã o m o s t r a declaran-
d o a todos os n o m e s e s o b r e n o m e s dos q u e se a c h a m " m a t r i c u l a d o s , e explican-
do-lhes q u e , d e n u n c i a n d o a l g u m "conservo q u e ficasse s o n e g a d o , ficam livres.
P a r a esta diligência, p r o c u r a r á ir às m e s m a s lavras e roças, e n ã o os c h a m a n d o d e
m a i o r distância q u e u m a "légua p a r a lhe d a r e x p e d i ç ã o no m e s m o dia, p o r q u e
fazendo-os vir d e m a i s longe ou dilatando-os m a i s t e m p o , além d e v e x a ç ã o das
partes, se dava t e m p o aos donos p a r a sugestões e cautelas.

21

A i n d a n o ato d a c o r r e i ç ã o , p o d e r ã o a d m i t i r à m a t r í c u l a e manifestação os
[ fl. 1 1 2 ] q u e n ã o / / tiverem p a g o e vierem c o m o u r o p a r a p a g a r e m , p o r é m n ã o lhes vale-
r ã o os bilhetes p a r a evitar as p e n a s se, q u a n d o se p a s s a r a m , houvesse j á d e n ú n c i a
ou constasse a s o n e g a ç ã o p e l a devassa, p a r a cujo efeito, n o m e s m o bilhete im-
presso, se p o r á a d a t a do dia c o m a firma do i n t e n d e n t e , "fiscal, "escrivão e "te-
soureiro, nos q u e a p a s s a r e m depois d e a b e r t a a devassa e correição. E se p o r ã o
"editais do dia e m q u e h á d e principiar,

22

A principal obrigação do fiscal é. vigiar c o m o " p r o c u r a d o r d a F a z e n d a R e a l


q u e n ã o haja sonegados e eme, h a v e n d o - o s , se lhes i m p o n h a m as p e n a s d o "regi-
307

m e n t o . P a r a este efeito, cotejará os "róis dos p á r o c o s e n ú m e r o dos escravos q u e


c o n s t a r e m pelo alfabeto da "matrícula passada c o m o n ú m e r o dos q u e se m a t r i c u -
l a r a m pelos m e s m o s donos, p a r a saber, no caso e m q u e haja d i m i n u i ç ã o , q u a n t o s
f o r a m os falecidos e q u a n t o s os q u e p a s s a r a m a novos senhores, p a r a v e r se estes
os m a t r i c u l a r a m . E o m e s m o fará a respeito das *lojas, "vendas e "ofícios, confe-
r i n d o os livros c o m as listas q u e h ã o de ter dos registros das casas pelas licenças e
aferições q u e nelas se c o s t u m a m registrar e, b u s c a n d o os livros, p r i m e i r o q u e haja
a l g u m p r o c e d i m e n t o c o m os sonegantes / / p a r a ver, p r i m e i r o , se c o m efeito h o u - [ fl. 112v. ]
ve s o n e g a ç ã o ,

23

Q u a n d o a l g u m escravo, p o r v e n d a ou outro q u a l q u e r título, passar a n o v o se-


n h o r , terá este c u i d a d o d e saber se está m a t r i c u l a d o , h a v e n d o assim o "bilhete. E
q u a n d o n ã o o esteja, matriculá-lo-á d e novo p o r evitar as p e n a s d e s o n e g a d o . E os
tutores, c u r a d o r e s , administradores e p r o c u r a d o r e s ou caixeiros t e r ã o c u i d a d o d e
m a t r i c u l a r os escravos q u e t i v e r e m e m seu p o d e r e a d m i n i s t r a ç ã o , pois n ã o o
f a z e n d o e m t e m p o hábil e s e n d o os escravos s o n e g a d o s t o m a d o s p o r p e r d i d o s ,
além d a p e r d a q u e d e v e m p a g a r aos constituintes, pupilos e outras pessoas cujos
b e n s a d m i n i s t r a r e m , p a g a r ã o d a sua fazenda o d o b r o d a "capitação sonegada.

24

As pessoas q u e saírem dos distritos das, M i n a s ou delas m a n d a r e m escravos


levarão os bilhetes q u e lhes t o c a r e m d a q u e l a m a t r í c u l a , p a r t i n d o depois de c e r r a -
da, ou [os] d a a n t e c e d e n t e , se p a r t i r e m e n q u a n t o estiver a b e r t a , p o r q u e n ã o os
e x i b i n d o p e r a n t e os g u a r d a s ou justiças lhes serão t o m a d o s p o r p e r d i d o s p a r a a
F a z e n d a R e a l , d e q u e logo d a r á / / a m e t a d e a o d e n u n c i a n t e , h a v e n d o - o . [ fl. 1 1 3 ]

25

N e n h u m escravo, a i n d a q u e d o e n t e d e q u a l q u e r e n f e r m i d a d e , é isento d e
p a g a r capitação. P o r é m , c o m o se r e c o r r e u a favor dos inválidos^ q u e seus d o n o s
s u s t e n t a m s e m lhes fazer serviço algum, c o m o os cegos, os totalmente aleijados o u
doentes d e d o e n ç a p e r p é t u a e incurável q u e d e t o d o os incapacite, tomar-se-lhes-
ã o a rol no t e m p o d a matrícula p a r a se averiguar n a correição. E n o caso q u e nela
se a c h e ser falsa a d e c l a r a ç ã o dos d o n o s e q u e os p r e t e n d i d o s inválidos fizeram
a l g u m serviço, se lhes i m p o r ã o as p e n a s dos sonegados, sem se lhes admitir escusa
a l g u m a ou p r o v a e m c o n t r á r i o . E n e s t a m a t é r i a d e v e p r o c e d e r o " i n t e n d e n t e e
"fiscal c o m o m a i o r rigor e vigilância, c o m o t a m b é m no q u e toca aos adventícios
e fugidos.
308

26

S e r ã o o b r i g a d o s ps "oficiais d a " m a t r í c u l a a b u s c a r nos livros dela t o d a a


c l a r e z a q u e v e r b a l m e n t e lhes r e q u e r e r q u a l q u e r pessoa ou escravo a fim de d a r
a l g u m a d e n ú n c i a . E h a v e n d o pejo no "intendente p o d e r ã o r e q u e r e r as p a r t e s a o
"ouvidor ou "juiz, q u e i n t e r p e l a r ã o a o "fiscal q u e e x i b a os livros, s e m q u e , p o -
[ fl. 11.3 v. ] r é m , haja / / d e sair de sua m ã o ou do fiel a q u e m os entregar.

27

O i n t e n d e n t e n ã o m a n d a r á passar certidão a l g u m a dos livros d a "intendên-


cia sem p r e c e d e r d e s p a c h o do " g o v e r n a d o r c o m justificação p l e n a das causas p o r
q u e se r e q u e r , d a qual justificação h a v e r á vista o fiscal p a r a a i m p u g n a r p r i m e i r o
q u e o i n t e n d e n t e a j u l g u e p o r [sentençal, d e q u e se l e v a r ã o os e m o l u m e n t o s
ordinários, p a r a q u e se n ã o faça a l g u m a fraude c o m as ditas certidões.

28

O s oficiais d a m a t r í c u l a n ã o levarão e m o l u m e n t o a l g u m fora dos casos e m


q u e n e s t e " r e g i m e n t o lhes são c o n c e d i d o s , e nestes os n ã o p e r d o a r ã o às p a r t e s
p o r q u e se assinalam c o m o e m p e n a d e a l g u m a fraude p r e s u m i d a q u e se i n t e n t a
evitar. E p o r este motivo se e n t r e g a r ã o os papéis Tcontadosl a o tesoureiro p a r a os
e n t r e g a r à p a r t e , r e c e b e n d o as custas, p a r a depois as r e p a r t i r c o n f o r m e o q u e tocar
a o i n t e n d e n t e , fiscal e "escrivão.

29

E m todos os despachos d e denunciações, manifestações e declarações se p o r á


[ fl. 114 ] p o r extenso a d a t a do dia, p a r a q u e n ã o possa ser a l t e r a d a / / o u falsificada, e
h a v e n d o dúvida q u a l se p r o c e d e u , se a d e n ú n c i a , se a manifestação, p o r t e r e m a
d a t a do m e s m o dia, se j u l g a r á a favor da manifestação, p o r ser mais favorável aos
réus.

30

O fiscal c o p i a r á , p o r si ou p e l o " a j u d a n t e d o e s c r i v ã o , c o m o r d e m d o
i n t e n d e n t e , os livros da matrícula, p a r a ficar u m a cópia n a i n t e n d ê n c i a e ir o u t r a
p a r a o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o . N o t e m p o da "correição, irá o original, p a r a nele
se m a t r i c u l a r e m os q u e d e n o v o se a p r e s e n t a r e m , e a cópia ficará a o o u v i d o r ou
juiz, p a r a p o d e r tirar as clarezas q u e p e d i r e m os q u e q u i s e r e m tirar d e n ú n c i a , m a s
n ã o p o d e r ã o m a n d a r passar certidões; e caso q u e se passem., n ã o terão fé a l g u m a .
309

31

O " i n t e n d e n t e será s e m p r e pessoa d e respeito, c a p a c i d a d e e zelo, e além do


q u e l h e está e n c a r r e g a d o terá especial c u i d a d o de q u e as b a l a n ç a s e m a r c o s d a
"intendência se c o n s e r v e m iguais, justos e fiéis, e o o u r o se p e s e e x a t a m e n t e , sem
prejuízo das p a r t e s n e m d a F a z e n d a Real.

32

O "fiscal d e v e ser pessoa d e atividade / / e inteligência p a r a p o d e r suprir, e m [ fl. 114v. ]


caso d e necessidade, a falta ou i m p e d i m e n t o do i n t e n d e n t e . Escreverá os livros d a
m a t r í c u l a geral e as suas c o p i a s , e h a v e r á pelos bens dos s o n e g a d o s , depois d e
p a g a r e m p a r a a m i n h a F a z e n d a a q u a n t i a q u e deviam, o u t r o t a n t o e m p e n a d a
s o n e g a ç ã o . P o r é m , os escravos e m a i s c o n d e n a ç õ e s q u e p o r este " r e g i m e n t o se
n ã o a p l i c a m a d e n u n c i a n t e s s e r ã o aplicados p a r a a F a z e n d a R e a l e serão carrega-
dos e m livros a o *tesoureiro.

33

O "escrivão escreverá nas "devassas^ de q u e n ã o h a v e r á e m o l u m e n t o a l g u m ,


e nas justificações, das q u a i s d a r á vista a o fiscal a n t e s d e as fazer c o n c l u s a s o
i n t e n d e n t e ; escreverá os "bilhetes e listas q u e se tiverem p o r o r d e m d o i n t e n d e n t e
e t u d o o mais q u e este lhe o r d e n a r p a r a a p r o n t a expedição d a "matrícula.

34

O "ajudante escreverá e m livro s e p a r a d o os assentos das pessoas livres q u e


p o r r a z ã o d e seus "oficios, "vendas, "lojas p a g a m "capitação n a f o r m a deste "regi-
m e n t o e lhes p a s s a r a os bilhetes; e, d a m e s m a sorte, fará os assentos e bilhetes dos
escravos adventícios e fugidos, seus alfabetos e os d a m a t r í c u l a geral / / nos livros [ fl. 1 1 5 ]
p a r a isso d e p u t a d o s , e m c a d a "regra, o n o m e do d o n o , lugar da sua assistência e
n ú m e r o dos escravos, e as folhas dos livros d a matrícula; e escreverá o mais q u e
lhe o r d e n a r o i n t e n d e n t e p a r a a p r o n t a expedição das partes.

35

O tesoureiro será pessoa inteligente n o c o n h e c i m e n t o do o u r o , q u e r e c e b e r á


b e m limpo e sem mistura n e m falsidade, e n ã o r e c e b e r á ouro d a B o r d a d o C a m -
p o , C o n g o n h a s do S a b a r a e Pitangui, e ouros semelhantes d e b a i x o t o q u e , s e n ã o
das pessoas q u e assistirem nos ditos sítios ou lá tiverem m i n e r a n d o seus escravos,
q u e se g u a r d a r á e r e m e t e r á s e p a r a d a m e n t e ; e o o u r o d e seu r e c e b i m e n t o se fecha-
310

r á n a "casa da intendencia e m cofre d e três chaves, de q u e u m a estará n a m ã o do


' i n t e n d e n t e , o u t r a n a do "fiscal e o u t r a n a do "tesoureiro.

36

O " m e i r i n h o assistirá n a casa d a i n t e n d ê n c i a p a r a l i m p a r o o u r o n a m e s a do


tesoureiro e estar p r o n t o p a r a o mais q u e lhe o r d e n a r o i n t e n d e n t e .

[fl. U 5 v . ] 37

P a r a "oficiais das "intendências se escolherão pessoas q u e e s c r e v a m e c o n -


t e m b e m e d e s e m b a r a ç a d a m e n t e , e q u e sejam pessoas zelosas e c o m a t i v i d a d e
necessária p a r a a e x p e d i ç ã o b r e v e q u e se r e q u e r nestes "ofícios. E e x e r c i t a n d o -
os c o m o d e v e m serão c o n s e r v a d o s e a d i a n t a d o s e a t e n d i d o s , e os q u e se a c h a -
r e m frouxos e p o u c o ativos m a n d a r á logo o " g o v e r n a d o r tirar sem o u t r o e r r o ou
c u l p a m a i s q u e a frouxidão. N o t e m p o q u e c o n c o r r e m u i t a gente à ^matrícula,
assistirão t o d o dia e p a r t e d a n o i t e q u e o r d e n a r o i n t e n d e n t e . N o d e c u r s o d o
a n o , irão t o d o s os dias q u e n ã o forem feriados e assistirão três h o r a s d a m a n h ã e
três d a t a r d e n a casa d a i n t e n d ê n c i a , e e m caso d e d o e n ç a d a r ã o logo p a r t e a o
i n t e n d e n t e p a r a m a n d a r substituir os seus lugares; e c o n t i n u a n d o a d o e n ç a d a r á
o intendente parte ao governador.

38

E m todo o caso q u e o governador considerar dolo, descuido culpável da p a r t e


do intendente ou seus oficiais, p o d e r á o governador m a n d a r fazer sumário de teste-
m u n h a s pela pessoa que lhe parecer e n o m o d o q u e a c h a r mais conveniente ao m e u
serviço. E o m e s m o governador, parecendo-lhe, p o d e r á c h a m a r à relação os "minis-
[ fl. 1 1 6 ] tros d e Vila R i c a e Ribeirão do C a r m o e os mais q u e / / forem necessários p a r a se
vencer p o r três votos conformes, p r o n u n c i a n d o e sentenciando os réus e executando
as suas sentenças, e e x c e t u a n d o s o m e n t e a d e " m o r t e n a t u r a l , d a n d o - m e d e t u d o
conta e m a n d a n d o cópia dos autos a o Conselho U l t r a m a r i n o .

39

T o d o s os dias, depois de a c a b a d o nas intendências o despacho e expediente


o r d i n á r i o , se p e s a r á o ouro que n a q u e l e dia tiver recebido o tesoureiro; e l a n ç a n -
do-se e m c o n t a pelos seus "bilhetes d e recibo, fazendo-se d e c l a r a ç ã o e m u m ca-
d e r n o do q u e crescesse ou faltasse c a d a dia, pela diferença o r d i n á r i a e m q u e p e s a r
p o r j u n t o ou p o r m i ú d o , e n o fim de c a d a s e m a n a se p o d e recensear a c o n t a pelos
assentos dos livros e t a m b é m pelos bilhetes q u e se tiverem distribuído.
311

40

H a v e n d o e m a l g u m a i n t e n d ê n c i a p a r t e tão distante q u e seja m u i t o dificultoso


dar-se-lhe a e x p e d i ç ã o o r d i n á r i a , se d a r á c o n t a a o " g o v e r n a d o r , a p o n t a n d o - s e -
lhe as providências mais convenientes e praticáveis, p a r a q u e ele possa t o m a r Ibl
expediente q u e mais / / convier ao m e u serviço, c o m o t a m b é m n o caso e m q u e , [CL 116v. ]
p o r a l g u m incidente, se r e p u t e necessário a n t e c i p a r ou r e t a r d a r o t e m p o d e a b r i r
ou fechar a " m a t r í c u l a ou e n t r a r e m n a "correição, o q u e n ã o fará sem motivos
u r g e n t e s e a b s o l u t a m e n t e necessários.

41

Antes d e e n t r a r e m correição, r e m e t e r ã o os "intendentes ao g o v e r n a d o r u m


m a p a exato e distinto c o m o n ú m e r o de escravos, "lojas, "vendas, "oficios e forros
q u e se tiverem m a t r i c u l a d o ; e no fim d e c a d a semestre a cópia dos livros, o resto
dos "bilhetes e a i m p o r t â n c i a d a " c a p i t a ç ã o , m u l t a s o u c o n d e n a ç õ e s , p a r a l h e
m a n d a r p a s s a r "portaria d e recibo q u e lhe sirva de descarga, c o m o se fosse quita-
ç ã o p o r m i m assinada, n ã o ficando os intendentes obrigados a d a r e m o u t r a algu-
m a c o n t a m a i s q u e a q u e p o r este "regimento lhes h á d e t o m a r o g o v e r n a d o r .

G o m e s Freire d e A n d r a d e

- 18 -
[Regimento original do superintendente, guardas-mores e mais
oficiais deputados para as minas de ouro que há nos sertões do
Estado do Brasil]

O documento foi elaborado tomando por base minuta de


Artur de Sá e Meneses de 3 de março de 1700. Resguardava pri-
vilégios da Coroa e objetivava conter os mineiros poderosos, ani-
mar novos descobrimentos, facilitar a ação fiscal e a tributação.
Ordenava apenas a extração do ouro de aluvião, momento especí-
fico da mineração no tocante ao tipo de exploração e às técnicas
utilizadas. Caracterizado pela instituição do superintendente, com
funções fazendárias e judiciárias, além das atribuições inerentes
ao cargo, este regimento é marco na implantação de autoridades
na região mineradora. Vigorou até 1803, a despeito de diversas
tentativas de reformas.
Base legal p a r a despachos, pareceres e sentenças do ouvidor
Gaetano da Costa Matoso, a reforma do regimento, solicitada
pelas câmaras de Minas Gerais, foi objeto de consulta do Conse-
lho Ultramarino em 1751, com a solicitação de parecer a buro-
cratas e autoridades da capitania.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 19.4.1702.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de regimento que obe-
dece à estrutura convencional dos documentos similares d a épo-
ca: primeiro parágrafo como u m a espécie de exórdio seguido
dos demais, que detalham normas, prevalecendo a forma impe-
rativa da linguagem. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita m o d e r n a regulariza-
da do século XVIII, bastarda e caligrafada. Apresenta capitula-
res trabalhadas, com volutas e arabescos, em módulo grande. A
tonicidade de vogais é marcada, irregularmente, o r a com o cir-
cunflexo, ora com ó acento a g u d o . As hastes inferiores são
simplificadas, isto é, se apresentam como traços únicos e quase
retos, inclinados p a r a a esquerda, n a maioria das letras, salvo no
"s" final, que m a n t é m amplo movimento p a r a a esquerda, e m
meia voluta (semelhante ao " z " = zeta). Letra de copista idêntica
à do documento 16. N ú m e r o 18 colocado n a margem superior
direita do fólio 117, em continuação à numeração dos documen-
tos 16 c 17. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir d a
matriz da cópia do Códice (APM, SC 02, fl. 111-114v. e 121-123)
e restringiram-se aos termos que comprometiam o significado e
o e n t e n d i m e n t o do t e x t o , m a n t i d a s as p e q u e n a s v a r i a n t e s
introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
APM, S C 0 1 , fl. 33v-43.
APM, SC 0 1 , fl. 78v.-88v.
APM, SC 0 2 , fl. 76V.-82.
APM, SC 02, fl. 111-114v.efl. 121-123 (continuação do fl. 114v.)
A H U , Cons. Ultram., Brasil/MG, cx. 1, doe. 2.
BNRJ, DiMss, 2, 1, 3, n 1. 9

I H G B , lata 7 1 , doe. 18.


B M M A , S O R . Informações das minas de São Paulo e dos sertões
da sua capitania desde o ano de 1597, até o presente de 1772, com
relação cronológica dos administradores delas. T e x t o do linhagista
Pedro Taques de Almeida Paes Leme.
ANRJ, Coleção Governadores do Rio de Janeiro, 1, X V , fl. 2v.
U S P / I E B , Coleção Lamego, cód. 26, A8, fl. 14v.-28v.
B G U C , S R M , cód. 452. fl. 66-72.
313

Cópias impressas:
M E N D O N Ç A , Marcos Carneiro. Século XVIII, século pombalino do
Brasil. Rio de Janeiro: Xerox, 1989. p. 79-85.
L E M E , Pedro T a q u e s de Almeida Paes. Notícias das Minas de
São Paulo e dos sertões da mesma capitania. São Paulo: Comis-
são do TV Centenário da Fundação de São Paulo, [1954]. p .
189-198.
R E G I M E N T O do superintendente, guarda-mor e mais oficiais
das minas de ouro que h á nos sertões do Estado do Brasil.
Documentos Interessantes, São Paulo, v. 5 1 , p . 74-88, 1930.
E S C H W E G E , W. L. von. Pluto Brasiliensis. São Paulo: E D U S P ,
Belo Horizonte: Itatiaia, 1979. V. 1, p. 94-102.

R e g i m e n t o original dos " s u p e r i n t e n d e n t e s , " g u a r d a s - m o r e s e m a i s *ofici-


ais d e p u t a d o s p a r a as M i n a s do O u r o , assinado p o r S u a M a j e s t a d e , q u e
se g u a r d a n a Secretaria deste g o v e r n o , do q u a l se d e v e m tirar t o d o s os
traslados necessários, e n ã o do q u e a t r á s se a c h a registrado à folha 77, p o r ser
[ fl. 1 1 7 ]

c o p i a d o d e u m traslado q u e se achava viciado e m algumas partes, p o r cuja causa


fiz registrar neste livro õ dito r e g i m e n t o p r ó p r i o e original, d o n d e somente com
t o d a a certeza se p o d e m tirar os ditos t r a s l a d o s . 1

E u , el-rei, faço saber aos q u e este m e u regimento virem q u e , p o r q u a n t o p a r a


a b o a direção e g o v e r n o das gentes q u e t r a b a l h a m nas M i n a s q u e h á nos sertões
d o Brasil, a q u e m a n d o assistir Os "ministros d e p u t a d o s e necessários p a r a elas, é
necessário q u e estes t e n h a m r e g i m e n t o , l h o m a n d e i d a r n a f o r m a seguinte:

O s u p e r i n t e n d e n t e p r o c u r a r á saber, c o m t o d o o c u i d a d o , se h á discórdias
e n t r e os mineiros ou outras pessoas q u e assistirem nas ditas M i n a s d e q u e resultem
p e r t u r b a ç õ e s e n t r e aquelas gentes e p o r á t o d a a diligência e m as atalhar; e n o caso
q u e lhe p a r e ç a ser necessário m a n d a r p r e n d e r a a l g u m a ou a l g u m a s das pessoas
q u e forem m o t o r e s d e semelhantes desordens, o fará, e os n ã o soltará s e m p r i m e i -
ro fazerem t e r m o de n ã o " e n t e n d e r e m u m c o m o o u t r o , e t e n d o c o m e t i d o c u l p a
p o r q u e a l g u m m e r e ç a m a i o r castigo / / p r o c e d e r á c o m o for direito. [ fl. 117v. ]

Referência ao atual APM, SC 02, fl. 76v.-82, que registra, com erros, cópia do regimento.
314

2- o

E m o dito "superintendente chegando às Minas, deve logo e x a m i n a r os ribei-


ros que estão descobertos, a riqueza deles e se a "pinta é geral. E depois de ter feito
este e x a m e , saberá se estão muito distantes uns dos outros, e no caso q u e as distân-
cias sejam de sorte q u e o *guarda-mor os n ã o possa repartir assistindo a todas as
repartições, n o m e a r á guardas-menores p a r a íhaver d e asl ir fazer naquelas partes
q u e lhes for o r d e n a d o , g u a r d a n d o as ordens que p a r a isso lhes forem dadas.

3 e

H a v e n d o a l g u m a dúvida entre os mineiros sobre a m e d i ç ã o das "datas, en-


t e n d e n d o p e r t e n c e r - l h e s m a i s t e r r a , q u e r e n d o e n t r a r pelas d a t a s dos v i z i n h o s ,
r e c o r r e r ã o a o s u p e r i n t e n d e n t e ou g u a r d a - m o r , a q u e l e q u e estiver mais p e r t o , q u e
lhe m a n d e n o v a m e n t e m e d i r as datas q u e lhes f o r a m d a d a s , p a r a q u e c a d a u m
fique c o m a q u e lhe toca, e eles lhas m a n d a r ã o m e d i r (no caso q u e seja necessário),
p o r n ã o estar a p r i m e i r a m e d i ç ã o feita c o m clareza.

4- o

E p o r q u e m u i t a s vezes t e m sucedido esbulhar a l g u m p o d e r o s o a u m p o b r e


o u miserável e m p a r t e da sua d a t a , p o r a a c h a r c o m p i n t a rica, e convir m u i t o
[ fl. 118 ] c o n s e r v a r a c a d a u m n o q u e lhe p e r t e n c e , q u a n d o isto / / s u c e d a r e c o r r e r á o
e s b u l h a d o a o s u p e r i n t e n d e n t e , q u e , ouvidas as p a r t e s v o c a l m e n t e , i n t e i r a d o d o
esbulho q u e se lhe fez, o fará restituir. E q u a n d o n ã o possa e m p r e s e n ç a das p a r t e s
logo averiguar a q u e l a questão, a d m i t i r á o e s b u l h a d o a justificar o tal esbulho e,
justificado, o fará restituir a sua data^ e t e n d o j á l a v r a d o algumas "braças d e terra
d o e s b u l h a d o , lhe fará restituir t o d a a p e r d a e d a n o q u e nisso lhe tiver d a d o , q u e
se liquidará pelo r e n d i m e n t o das braças n a m e s m a d a t a , d a n d o - s e a o esbulhado
pelas b r a ç a s q u e lhe t o m a r e m o u t r o t a n t o c o m o i m p o r t a r e m outras tantas braças
q u e l a v r a r d a m e s m a data, e e m p e n a do esbulho se l h e fará satisfazer isso q u e se
liquidar em dobro.

5- o

O superintendente, tanto q u e t o m a r c o n h e c i m e n t o dos ribeiros, o r d e n a r á ao


g u a r d a - m o r q u e faça medir o c o m p r i m e n t o deles p a r a saber as b r a ç a s q u e t ê m e,
feito, saberá as pessoas q u e estão presentes e os negros q u e c a d a u m tem, [toman-
d o ! disso informações certas, e o r d e n a r á ao g u a r d a - m o r faça.a repartição das datas,
d a n d o , e m p r i m e i r o lugar, d a t a à pessoa q u e descobriu o ribeiro, a qual lhe h á de
d a r n a p a r t e a o n d e ele a p o n t a r , e logo repartirá o u t r a d a t a p a r a a m i n h a F a z e n d a
315

n o rriàis b e m p a r a d o d o dito / / ribeiro, e a o d e s c o b r i d o r d a r á logó o u t r a *data [ fl. 118v. ]


conio l a v r a d o r e m o u t r a q u a l q u e r p a r t e q u e ele apontar, p o r convir que os desco-
bridores sejam e m t u d o favorecidos e esta m e r c ê os a n i m e a fazer muitos descobri-
mentos. E n o caso q u e u m descobridor descubra quatro ribeiros, n o ultimo se lhe
d a r ã o duas [sic] datas, duas c o m o descobridor e duas c o m o lavrador, c o m declara-
ç ã o , p o r é m , q u e as d u a s q u e d e n o v o se lhe c o n c e d e m serão tiradas p o r sorte,
c o m o neste capítulo vai d e t e r m i n a d o se d ê e m aos lavradores, e as mais datas repar-
tirá o * g u a r d a - m o r , regulando-se pelos escravos q u e c a d a u m tiver, q u e e m che-
g a n d o a d o z e escravos ou d a í p a r a c i m a fará r e p a r t i ç ã o d e u m a d a t a d e t r i n t a
"braças Conforme o estilo. E àquelas pessoas q u e n ã o c h e g a r e m a ter d o z e escravos
lhes serão r e p a r t i d a s duas b r a ç a s e m e i a p o r c a d a escravo, p a r a q u e i g u a l m e n t e
fiquem todos l o g r a n d o da m e r c ê q u e lhes faço. E p a r a q u e n ã o haja queixa n e m
dos pobres n e m dos ricos, p o r dizerem q u e n a repartição houve dolo repartindo-se a
uns m e l h o r sítio q u e outros p o r a m i z a d e ou respeito, o g u a r d a - m o r m a n d a r á fazer
tantos escritos quantas / / forem as pessoas c o m q u e m se houver de repartir e, c o m o [ fl. 119 ]
n o m e d e c a d a u m , os deitará e m u m vaso, embaralhados; p o r u m m e n i n o d e m e n o r
idade q u e se a c h a r m a n d a r á tirar c a d a u m dos escritos. E o p r i m e i r o q u e sair lhe
assinará a sua data logo n a q u e se seguir à q u e n a forma deste capítulo se tiver d a d o
ao descobridor c o m o lavrador; e pela m e s m a o r d e m se irão seguindo as demais q u e
forem saindo, e nas datas d e cada u m a pessoa se p o r ã o marcos, p a r a q u e n ã o possam
vir e m dúvida a p a r t e q u e lhe for assinada, e t a m b é m se p o r ã o marcos n a que tocar à
m i n h a Fazenda.

6 a

E p o r q u e m u i t a s vezes sucede l e v a r e m os descobridores e m sua c o m p a n h i a


pessoas q u e os a j u d a m a descobrir os ribeiros, e p o r h a v e r m u i t a gente c o m q u e m
repartir as datas, ficando fora as pessoas q u e as a j u d a r a m a descobrir, e p o r respei-
tos se r e p a r t e m a outros, o r d e n o q u e as pessoas q u e a c o m p a n h a r e m ao dito des-
c o b r i d o r e n t r e m n a repartição do tal ribeiro c o m as datas q u e lhe tocar.

70

E p o r q u e é m u i t o prejudicial repartirem-se aos poderosos e m c a d a ribeiro q u e


se descobre sua data, ficando p o r esta causa muitos p o b r e s sem ela, e sucede ordina-
riamente, p o r n ã o p o d e r e m lavrar tantas datas, v e n d e r e m - n a s aos pobres ou esta-
r e m m u i t o t e m p o p o r lavrar, o q u e n ã o é s o m e n t e e m prejuízo de m e u s vassalos
m a s t a m b é m dos meus "quintos, pois p o d e n d o - s e tirar logo se dilatam / / c o m se [ fl. 119v. ]
n ã o lavrarem as ditas datas, h a v e n d o ficado muitos dos meus vassalos sem elas. P o r
evitar estas injustiças se n ã o d a r á s e g u n d a d a t a a pessoa a l g u m a s e m q u e t e n h a
lavrado a primeira. E s t a n d o , p o r é m , todos os mineiros a c o m o d a d o s e h a v e n d o mais
terra p a r a repartir, e n t ã o se a t e n d e r á aos q u e tiverem mais negros, p o r q u e t e n d o
.316

mais dos doze pertencentes à p r i m e i r a *data se fará c o m eles a repartição n a forma


do capítulo quinto deste "regimento, dando-se duas "braças e m e i a a c a d a negro. E
c o n s t a n d o t a m b é m ao " g u a r d a - m o r q u e c a d a u m dos mineiros t e m lavrado a sua
data, aquele q u e a tiver lavrado, e h a v e n d o terra p a r a repartir, a repartirá n o v a m e n -
te c o m ele, n a forma q u e fica dito.

8*

E n o Caso q u e a l g u m dos m i n e i r o s n ã o p r i n c i p i e a l a v r a r as datas q u e lhe


forem d a d a s d e n t r o d e q u a r e n t a dias, o " s u p e r i n t e n d e n t e o r d e n a r á ao *guarda-
m o r q u e , c o m o "escrivão das M i n a s , veja ás ditas datas, e a c h a n d o - a s intactas fará
t e r m o d e vistoria, e m q u e o escrivão p o r t a r á p o r fé e m c o m o e s t a v a m intactas, o
q u a l t e r m o assinará o g u a r d a - m o r c o m as t e s t e m u n h a s q u e se a c h a r e m presentes,
q u e s e m p r e serão a o m e n o s d u a s . E ouvida a p a r t e p o r contestação s o m e n t e , as
j u l g a r á p o r perdidas p a r a a m i n h a F a z e n d a , e h a v e n d o d e n u n c i a n t e s se lhes d a r á
[ fl. 1 2 0 ] a terça / / p a r t e ; e as partes q u e ficarem p a r a a m i n h a F a z e n d a se desfrutarão n a
f o r m a das q u e lhe forem repartidas, a d v e r t i n d o , p o r é m , q u e p o d e r á m u i t a s vezes
suceder p a r a r e m c o m as lavras das m i n a s o u n ã o p r i n c i p i a r e m a lavrar p o r esta-
r e m m u i t o distantes; e m tal caso, se lhes n ã o tirarão as ditas datas p o r devolutas, e
o m e s m o se e n t e n d e r á se se deixar lavrar p o r " i n v e r n a d a , faltar de m a n t i m e n t o ou
saúde.

9-o

E p o r q u e pelo regimento d a m i n h a F a z e n d a é proibido se interessem nela os


"ministros e "oficiais dela, c o m o t a m b é m os da J u s t i ç a , pelos prejuízos q u e disso
se s e g u r a m , o r d e n o q u e n e n h u m dos ministros ou oficiais d e p u t a d o s p a r a a d m i -
nistração das ditas M i n a s ou o u t r o d e q u a l q u e r p r o e m i n ê n c i a q u e seja possa, p o r
si ou p o r e n t r e p o s t a pessoa, haver d a t a nas ditas M i n a s n e m ter nelas o u t r o inte-
resse mais q u e o salário o r d e n a d o neste regimento, e o q u e o contrário fizer p e r -
d e r á o p o s t o , l u g a r ou "oficio q u e tiver e será c o n d e n a d o n o q u e i m p o r t a r o
r e n d i m e n t o d a d a t a ou interesse q u e tiver e m tresdobro p a r a a m i n h a F a z e n d a , e
h a v e n d o d e n u n c i a n t e se lhe d a r á a terça p a r t e . E o s u p e r i n t e n d e n t e ou g u a r d a -
m o r q u e tal d a t a d e r ou r e p a r t i r p e r d e r á o ofício e p a g a r á o r e n d i m e n t o e m d o b r o ,
a p l i c a d o n a f o r m a a c i m a dita, e h a v e n d o interposta pessoa terá a m e s m a p e n a
[ fl. 120v ] T i m p o s t a ao g u a r d a - m o r , o q u a l , n ã o s a b e n d o d a interposição e conluio, / / será
dele r e l e v a d o . E f a z e n d o a l g u m dos ditos m i n i s t r o s ou oficiais p a r c e r i a c o m o
m i n e i r o a q u e m for r e p a r t i d a d a t a , h a v e r ã o u m e outros as p e n a s c o n t e ú d a s n a
O r d e n a ç ã o , livro 5 , título 7 1 , parágrafos 6 , 7 , e se tiverem p a r c e r i a p a g a n d o
Q 9 3

c a d a u m dos parceiros t o d o o r e n d i m e n t o d a data, c o m p e r d a do posto, lugar ou


oficio q u e t i v e r e m .
317

10 a

E p o r q u e é j u s t o q u e o " s u p e r i n t e n d e n t e , * g u a r d a - m o r e seus "oficiais te-


n h a m c o m o d a m e n t e d e q u e v i v a m , s e g u n d o a q u a l i d a d e d o lugar, t r a b a l h o d e
suas ocupações, terá o s u p e r i n t e n d e n t e d e o r d e n a d o , e m c a d a u m a n o , três mil e
q u i n h e n t o s " c r u z a d o s , o g u a r d a - m o r dois mil c r u z a d o s , o " m e i r i n h o e "escrivão
d a " s u p e r i n t e n d ê n c i a q u i n h e n t o s c r u z a d o s c a d a u m , e sendo necessário fazer-se
a l g u m g u a r d a - m e n o r e m a l g u m a ocasião se lhe d a r á de o r d e n a d o mil c r u z a d o s
c a d a a n o , e n o caso q u e este seja feito p o r t e m p o l i m i t a d o v e n c e r á o o r d e n a d o
*pro rala do t e m p o q u e servir a respeito dos ditos mil c r u z a d o s . E p o r q u e estes
o r d e n a d o s os d e v e m p a g a r os mineiros, pois a respeito d a sua conservação e utili-
d a d e fui servido criar estes "ofícios, c a d a u m a das pessoas a q u e m se r e p a r t i r e m
"datas d a r á p a r a os salários dos ditos oficiais a d é c i m a p a r t e do p r e ç o p o r q u e se
a r r e m a t a r a d a t a q u e p e r t e n c e a m i n h a F a z e n d a , sendo a d a t a q u e se der a c a d a
u m igual n a m e d i d a a q u e p e r t e n c e r / / a m i n h a F a z e n d a , p o r q u e sendo a d a t a [ fl. 121 ]
è m m e n o s q u a n t i d a d e se fará a c o n t a a respeito das "braças, p a r a q u e assim fi-
q u e m todos c o n t r i b u i n d o i g u a l m e n t e .

II 9

S o u informado q u e algumas pessoas v e n d e m as datas q u e lhes foram repar-


tidas a fim de as p o d e r e m ter e m m e l h o r ribeiro, o q u e é c o n t r a a igualdade c o m
q u e as m a n d o r e p a r t i r a t o d o s os m e u s vassalos. M a n d o q u e n e n h u m a p e s s o a
possa v e n d e r n e m c o m p r a r s e m e l h a n t e s d a t a s , m a s q u e todos desfrutem as q u e
lhes forem repartidas, c o m o a c i m a fica o r d e n a d o , e fazendo o contrário o c o m p r a -
d o r seja c o n d e n a d o n o r e n d i m e n t o q u e tiver a dita d a t a e o v e n d e d o r e m o u t r o
t a n t o , t u d o aplicado n a forma acima dita n o capítulo 9 . P o r é m , n o caso q u e for
5

r e p a r t i d a a l g u m a d a t a a q u e m n ã o possa desfrutar, p o r lhe falecerem ou faltarem


os escravos q u e t i n h a , nesse caso a p o d e r á v e n d e r , f a z e n d o p r i m e i r o c e r t o a o
s u p e r i n t e n d e n t e a causa q u e t e m p a r a fazer a dita v e n d a , o q u a l lhe c o n c e d e r á
licença p a r a o p o d e r fazer, p o r é m lhe n ã o d a r á n o v a data, n e m o g u a r d a - m o r lhe
r e p a r t i r á s e m lhe constar t e m novos escravos c o m q u e a desfrute.

12 e

E sucedendo fazerem-se alguns descobrimentos e m partes m u i t o r e m o t a s das


e m q u e assistir o superintendente ou g u a r d a - m o r , o descobridor o fará logo a sa-
b e r / / a o superintendente, p a r a que m a n d e o g u a r d a - m o r fazer repartição das datas [ fl. 121v. ]
n a f o r m a que lhe é o r d e n a d o , e n ã o p o d e n d o o g u a r d a - m o r ir fazer a dita repartição
n o m e a r á o superintendente u m g u a r d a - m e n o r q u e a vá fazer, e n u n c a , e m n e n h u m
caso, p o d e r ã o os descobridores fazer a repartição e m outra forma. E n ã o d a n d o os
318

descobridores a dita p a r t e ao "superintendente, ocultando o tal descobrimento, se


lhes n ã o d a r ã o "datas a l g u m a s ; antes, as q u e se lhes h a v i a m d e d a r se d a r ã o às
pessoas a q u e dela relatar o tal descobrimento q u e se tinha ocultado.

13*

O " g u a r d a - m o r terá u m livro r u b r i c a d o pelo s u p e r i n t e n d e n t e , e m q u e fará


assento d e c a d a u m dos ribeiros que se descobrirem, c o m título à p a r t e do dia, mês e
a n o e m q u e se descobriu, do dia em q u e se repartiram as datas, fazendo-se declara-
ção das pessoas a q u e m se r e p a r t i r a m , "braças de terra que se d e r a m a c a d a u m ,
confrontações e marcos q u e se lhes p u s e r a m , e d e tudo se fará fazer termo, e m q u e
assinará o g u a r d a - m o r e c a d a u m dos mineiros a q u e se repartir a data.

14 a

E p o r q u e m u i t a s pessoas d a B a h i a ou d a q u e l e distrito t r a z e m ou m a n d a m
gados p a r a se v e n d e r e m nas M i n a s , de que se p o d e seguir o "descaminho de meus
"quintos — p o r q u e , c o m o o q u e se v e n d e é a t r o c o do o u r o e m p ó , t o d a a q u e l a
[ íl. 122 ] quantia se h á de d e s e n c a m i n h a r — / / e p o r q u e esta matéria é de tão danosas conse-
qüências, é preciso q u e neste p a r t i c u l a r haja toda a cautela, pelo q u e o r d e n o a o
superintendente, g u a r d a - m ó r ou m e n o r o u outro qualquer "oficial q u e tendo notí-
cia t e m chegado algum gado às M i n a s façam logo notificar à pessoa ou pessoas q u e
o t r o u x e r e m p a r a Tquel v e n h a m dar "entrada das cabeças, digo, q u e trazem, e ocul-
t a n d o algumas p a g a r ã o o seu valor "anoveado e serão presas e castigadas c o m as
p e n a s impostas aos que d e s c a m i n h a m m i n h a F a z e n d a , o q u e t u d o se lhes declarará
q u a n d o os notificarem p a r a d a r e m entrada. E o superintendente saberá o preço p o r
q u e v e n d e m o dito g a d o p a r a , conforme a isso se c o b r a r e m os "quintos do o u r o
?

q u e se lhe d e r e m p a g a m e n t o , n ã o se fazendo este c o m o u r o j á q u i n t a d o . E esta


c o b r a n ç a fará o superintendente com o seu "escrivão, que fará termo e m u m livro
q u e p a r a isso terá, rubricado pelo dito superintendente, Tem q u e l se fará declaração
dos quintos q u e se c o b r a m , d e q u e pessoa, de o n d e é natural, o qual termo assinará
o dito superintendente c o m a pessoa q u e pagar os ditos quintos, e se lhe lerá primeiro
q u e o assine. E n ã o p e r m i t i r á o dito s u p e r i n t e n d e n t e q u e p o r a q u e l a s p a r t e s se
i n t r o d u z a m negros alguns, p o r q u e se deve praticar inviolavelmente a proibição e
taxa q u e t e n h o ordenado,, p a r a q u e só pelo R i o de J a n e i r o p o s s a m e n t r a r os tais
negros, na forma que tenho m a n d a d o .

15 9

E n o caso q u e os donos d e g a d o digam que q u e r e m vir p a g a r os quintos aos


oficiais de São Paulo ou T a u b a t é , e m tal caso os deixarão vir, tomando-lhes, primeiro,
319

fiança de c o m o h ã o de p a g a r os ditos 'quintos nas ditas "oficinas, a qual fiança / / s e f fl. 122v. ]
lhes t o m a r á s e g u r a e a b o n a d a n a q u e l a q u a n t i a q u e os q u i n t o s q u e deve p a g a r
i m p o r t a r e m , e o fiador n ã o será desobrigado daquela sem mostrar c o m o a pessoa
fiada t e m p a g o os ditos quintos, e n ã o d a n d o a dita fiança quintará c o m o fica ordenado
no capítulo precedente.

16 a

P o d e t a m b é m suceder q u e algumas pessoas q u e assistem d a q u e l a s p a r t e s das


M i n a s p o r seu negocio particular q u e i r a m ir buscar g a d o aos C u r r a i s dó distrito d a
Bahia. L e v a n d o o u r o e m p ó p a r a o c o m p r a r e m , o registrarão e p a g a r ã o os quintos
q u e d e v e r e m e se lhes d a r ã o as a r r e c a d a ç õ e s necessárias. E a c h a n d o - s e sem elas,
será confiscado t o d o o u r o q u e levarem p a r a m i n h a F a z e n d a , e d a a r r e c a d a ç ã o dos
ditos quintos e do o u r o q u e l e v a m se fará t e r m o , e dele se lhes d a r á "guia e m q u e
se declare a q u a n t i d a d e do o u r o q u e leva e d e c o m o fica q u i n t a d o .

17«

N e n h u m a pessoa do distrito d a Bahia p o d e r á levar às M i n a s pelo c a m i n h o do


sertão outras fazendas ou género q u e n ã o sejam gados; e q u e r e n d o trazer outras
fazendas, as n a v e g u e m p e l a b a r r a d o R i o de J a n e i r o e as p o d e r ã o c o n d u z i r p o r
T a u b a t é ou São P a u l o , c o m o fazem os mais, p a r a q u e desta sorte se evite o levarem
ouro e m p ó , e eles ficam fazendo o seu negócio c o m o fazem os mais vassalos. E o
"superintendente e *guarda-mor terão muito cuidado e m lançar das M i n a s todas as
pessoas q u e / / nelas n ã o forem necessárias, pois estas só servem de "descaminhar os [ fl. 123 ]
quintos e de gastar os m a n t i m e n t o s aos q u e lá são precisos, c o m o t a m b é m n ã o
consentirão nelas outras pessoas q u e vierem do distrito d a B a h i a pelo sertão c o m
outras fazendas q u e n ã o for gado.

18 9

S u c e d e , d e s c o b r i n d o - s e ribeiros, p e d i r e m os descobridores dias p a r a o exa-


m e deles, o q u e p r o c u r a m c o m dolo, a fim de os m i n e r a r e escavar; e depois d e
t e r e m tirado o precioso, d ã o c o n t a a o s u p e r i n t e n d e n t e e g u a r d a - m o r , e m q u e a
m i n h a F a z e n d a e m e u s vassalos ficam prejudicados. E p o r evitar este d e s c a m i n h o ,
o s u p e r i n t e n d e n t e lhes c o n c e d e r á só oito dias p a r a o e x a m e , e n o caso q u e exce-
d a m o t e m p o c o n c e d i d o p e r d e r ã o as " d a t a s q u e d e v i a m d e ter n a q u e l e ribeiro
c o m o d e s c o b r i d o r e l a v r a d o r ; p o r é m , se o ribeiro for m u i t o dilatado e as *catas
m u i t o fundas, p a r e c e n d o ao s u p e r i n t e n d e n t e se n ã o p o d e r á fazer o e x a m e e m tão
poucos dias, ficará n a sua eleição conceder-lhes os q u e lhe p a r e c e r convenientes.
320

19 9

C o m o sucede q u e os ribeiros são t ã o ricos q u e e n t r a a s u a r i q u e z a m u i t a s


" b r a ç a s pela terra d e n t r o , h a v e n d o pessoas q u e t e n h a m ficado s e m "data, p e d i n -
do-a nas s o b r e q u a d r a s , se lhes repartirá n a m e s m a f o r m a q u e í t e n h o l disposto no
capítulo q u i n t o . P o r é m , n o caso q u e todos estejam a c o m o d a d o s c o m datas e aca-
b a n d o d e l a v r a r a d a t a q u e lhes tocou, p o r ter notícia q u e a l g u m a d a t a das r e p a r -
[ fl. I23v. ] tidas a outras / / pessoas é de. "pinta rica e p o r isso pedir-se lhes dê a s o b r e q u a d r a
dela, e m tal caso se lhes n ã o d a r á , p o r q u e essa p e r t e n c e a o q u e lavrou ou está
l a v r a n d o a tal d a t a d e q u e se p e d e a s o b r e q u a d r a .

20 Q

Descobrindo-se a l g u m ribeiro e m q u e , p o r r a z ã o d a m u i t a gente q u e h á c o m


q u e m se repartir as datas, n ã o p o s s a m estas ser daquele t a m a n h o e m q u e se t e m
m a n d a d o repartir, e m tal caso o "superintendente o r d e n a r á a o " g u a r d a - m o r q u e
faça a r e p a r t i ç ã o conforme os negros q u e c a d a u m tiver, e ele a fará c o m tal igual-
d a d e q u e fiquem todos satisfeitos, ou sejam p o b r e s ou p o d e r o s o s , a i n d a q u e p a r a
isso seja necessário fazer a m e d i ç ã o p o r "palmos; m a s s e m p r e a r e p a r t i ç ã o se fará ?

e m q u a l q u e r forma q u e seja disposta, p o r sorte neste " r e g i m e n t o .

21°

O s u p e r i n t e n d e n t e t e r á m u i t o c u i d a d o de e x a m i n a r se nas M i n a s assistem
ourives o u o u t r o a l g u m "oficial q u e faça fundição d e o u r o ou exercite o "ofício d e
ourives, e os q u e souber a n d e m nas ditas M i n a s lhes fará t o m a r t o d o o o u r o q u e
tiverem p a r a a m i n h a F a z e n d a , digo, e será aplicado p a r a a m i n h a F a z e n d a , e o
m e s m o será a c h a n d o - s e ouro, a i n d a q u e seja de partes, e os fará e x t e r m i n a r das
ditas M i n a s , p a r a q u e n ã o t o r n e m mais aos lugares e m q u e se fabricarem as minas,
[ fl. 124 ] e o m e s m o se observará c o m os m o r a d o r e s q u e t ê m ourives / / escravos seus nas
ditas M i n a s .

22 9

E p o r q u a n t o as datas q u e p e r t e n c e r e m à m i n h a F a z e n d a se deve ter nelas toda


a b o a a r r e c a d a ç ã o , e tem m o s t r a d o a experiência os vários "descaminhos q u e tem
havido neste particular, a q u e é preciso acudir c o m remédio, m a n d o ao superinten-
dente que p o n h a n a p r a ç a as datas que p e r t e n c e m à m i n h a F a z e n d a p a r a se a r r e m a -
t a r e m a q u e m mais der, e a n d a r ã o e m "pregão n o v e dias, e o escrivão t o m a r á os
lanços q u e c a d a u m lhes d e r e, ao m e s m o t e m p o , m a n d a r á p o r todas as p a r t e s
circunvizinhas p o r o n d e se m i n e r a r p ô r t a m b é m as ditas datas e m p r e g ã o p a r a q u e
321

v e n h a à notícia de todos p a r a p o d e r e m lançar nelas e rproçurarál q u e todos possam


livremente lançar nas ditas *datas, sem respeito a l g u m aos poderosos, q u e fará cas-
tigar c o m o m e r e c e r e m no caso que, p o r algum m o d o , i m p e ç a m aos lançadores q u e
quiserem lançar nas ditas datas, fazendo sobre isso os autos q u e lhe p a r e c e r e m ne-
cessários. E no caso q u e n ã o haja lançadores que lancem p r e ç o equivalente nas ditas
datas, o "superintendente as m a n d a r á lavrar p o r conta d e m i n h a F a z e n d a , p a r a o
q u e p u x a r á pelos índios que lhe forem necessários e lhes p a g a r á pela m i n h a Fazen-
d a o m e s m o q u e lhes c o s t u m a m p a g a r os particulares q u a n d o os servem, e n o m e a r á
pessoa q u e assista à dita lavoura que t e n h a inteligência e b o m p r o c e d i m e n t o , e lhe
n o m e a r á u m "escrivão, pessoa fiel e desinteressada, a q u e m d a r á p o r ele u m livro
n u m e r a d o e rubricado, e m que lançará, p o r dias, t o d o ouro que naquele dia / / s e [ íl. 124v. ]
tirar e quantos índios n o m e s m o dia "batearam, de q u e fará termo e assinará c o m a
pessoa q u e assistir â dita lavoura.

23 a

T e m sucedido haver algumas dúvidas entre os descobridores q u e descobrem o


rio principal e outros que descobrem alguns riachos q u e v ê m d a r no primeiro que se
descobriu. E m tal caso, sendo os riachos p e q u e n o s p e r t e n c e r ã o estes descobrimen-
tos a o primeiro descobridor q u e descobriu o rio principal; p o r é m , se os tais riachos
forem g r a n d e s , posto q u e v e n h a m d a r n o rio principal j á descoberto estes, e n t ã o
pertencerá à pessoa q u e os descobrir a data q u e se c o s t u m a d a r aos descobridores
dos ditos rios.

24 5

E p o r q u e m e t e m vindo à notícia q u e nos ribeiros q u e se r e p a r t e m se a c h a m


algumas enseadas e p o n t a s q u e se r e p a r t i r a m até agora pelas voltas q u e faz o dito
ribeiro, o q u e é prejudicialíssimo, o r d e n o ao dito " g u a r d a - m o r q u e a r e p a r t i ç ã o
q u e fizer dos ditos ribeiros a faça p e l a t e r r a firme, e n ã o p e l a s voltas dos rios,
l a n ç a n d o u m a linha reta p a r a fazer a tal repartição, e n a terra q u e ficar fora d a
q u a d r a p a r a a p a r t e do rio p o r causa das voltas q u e faz se p r a t i c a r á o m e s m o q u e
fica dito nas s o b r e q u a d r a s q u e ficam p a r a o "sertão das datas.

25 9

P a r a evitar os " d e s c a m i n h o s q u e p o d e h a v e r / / n a m i n h a F a z e n d a , assim [ 125 ]


nos " q u i n t o s c o m o e m t u d o o m a i s q u e m e p e r t e n c e r t o c a n t e às M i n a s , o s u p e -
r i n t e n d e n t e , t o m a r á as d e n u n c i a ç õ e s q u e se lhe d e r e m n ã o só e m p ú b l i c o , m a s
t a m b é m t o m a r á as q u e lhe d e r e m e m s e g r e d o , e e m u m a s e o u t r a s g u a r d a r á as
disposições d e D i r e i t o e o q u e se c o n t é m neste " r e g i m e n t o , c o m o t a m b é m o q u e
é. d a d o à A l f a n d e g a d e s t a c i d a d e e m s e m e l h a n t e s d e n u n c i a ç õ e s . E as m e s m a s
322

d e n u n c i a ç õ e s p o d e r ã o t o m a r os "ouvidores da c o m a r c a d e S ã o P a u l o e R i o d e
J a n e i r o , no caso q u e as p a r t e s as q u e i r a m d a r , p o r lhes ficar m a i s c ô m o d a s p e -
r a n t e eles, e os l i v r a m e n t o s lhes d a r á o " s u p e r i n t e n d e n t e , p a r a [o] q u e os ditos
o u v i d o r e s lhes r e m e t e r ã o os traslados dos autos.

E o superintendente n o m e a r á h a s ditas M i n a s u m a pessoa das mais principais e


a b o n a d a s q u e nelas assistirem p a r a ser "tesoureiro dos "quintos e mais dinheiro ou
coisas q u e nas ditas Minas se houverem de cobrar p a r a a m i n h a Fazenda, p a r a o que
h a v e r á u m livro d a receita e, despesa, rubricado pelo dito superintendente, e m q u e se
assentarão, pelo escrivão da "superintendência, todas as receitas e despesas q u e se
fizerem, e o mesmo será t a m b é m tesoureiro do q u e se h á de cobrar p a r a o salário dos
"ministros. E o dito tesoureiro t e r á de o r d e n a d o três mil "cruzados, q u e lhe será
[ íl. 125v. ] p a g o n a m e s m a forma e pelo m e s m o rendimento q u e / / se m a n d a r p a g a r aos mais
ministros e "oficiais q u e assistem nas ditas Minas. E sendo caso q u e as "dízimas das
"datas n ã o c h e g u e m aos salários, dos ministros e "oficiais referidoSj se lhes perfarão
p o r m i n h a F a z e n d a e pelos quintos q u e m e pertencem.

27 a

D o livro q u e h á d e ter o " g u a r d a - m o r p a r a a r e p a r t i ç ã o das datas, p a r a ter


c u i d a d o de fazer c o b r a r tudo o q u e i m p o r t a r assim à d a t a q u e for r e p a r t i d a p a r a a
m i n h a F a z e n d a , pelo p r e ç o e m q u e for a r r e m a t a d a , c o m o à dízima das mais datas,
p a s s a r á p a r a u m livro q u e terá o tesoureiro-geral das M i n a s p o r receita p o r l e m -
b r a n ç a todas as datas, repartições q u e se fizerem, c o m toda a c l a r e z a e n a forma
q u e n o livro do g u a r d a - m o r se a c h a r e m escritas. E ñas c o n t a s q u e d e r o dito
t e s o u r e i r o se fará conferência d e a m b o s os livros, p a r a m e l h o r justificação das
ditas contas.

2S°-

E p o r q u e o dito tesoureiro n ã o p o d e r á assistir e m todos os ribeiros^ ele n o -


m e a r á dois "fiéis, se p a r e c e r e m precisos, p a r a m e l h o r e x p e d i e n t e das c o b r a n ç a s ,
b o a a r r e c a d a ç ã o d a m i n h a F a z e n d a e alívio das p a r t e s , e a c a d a u m se d a r ã o
q u i n h e n t o s cruzados pela forma acima dita,

29*

E p a r a a b o a a r r e c a d a ç ã o dos quintos q u e p e r t e n c e m à m i n h a F a z e n d a , t o d o
o o u r o que sair das ditas M i n a s sairá c o m registro, p a r a o q u e o s u p e r i n t e n d e n t e
[ fl. 126 J terá u m livro p o r ele / / r u b r i c a d o e assinado, e m q u e pelo seu "escrivão se fará
323

t e r m o , c o m d e c l a r a ç ã o d a pessoa q u e registra o o u r o , dos " m a r c o s ou "oitavas


q u e registra, d a "oficina dos "quintos p a r a o n d e o leva a q u i n t a r , do dia, m ê s e
a n o e m q u e faz o dito registro, o qual t e r m o assinará o dito s u p e r i n t e n d e n t e c o m
a tal pessoa q u e registrar o o u r o . E do dito t e r m o lhe m a n d a r á o dito *superinten-
dente d a r u m a "guia p o r ele assinada dirigida p a r a a oficina dos quintos q u e tiver
d e c l a r a d o n õ dito t e r m o , n a qual irá declarado o peso do o u r o q u e leva, d e q u e
h á d e p a g a r os quintos. E as pessoas q u e n ã o registrarem o dito o u r o q u e l e v a r e m
das M i n a s , sendo a c h a d a s s e m o q u i n t a r ou registrar, antes ou depois d e c h e g a r ás
casas dos q u i n t o s , o p e r d e r ã o p a r a m i n h a F a z e n d a , e além disso h a v e r ã o as mais
p e n a s e m q u e i n c o r r e m os q u e " d e s c a m i n h a m os m e u s direitos. P o r é m , s u c e d e n -
do q u e a l g u m a s pessoas t e n h a m levado o u r o das M i n a s sem guia n e m registro,
n ã o lhe t e n d o sido a c h a d o , o. p o d e r ã o manifestar e m q u a l q u e r casa dos quintos
q u e t e n h o o r d e n a d o p a r a as ditas M i n a s .

30 a

E p o r q u e a experiência t e m m o s t r a d o q u e o " g o v e r n a d o r do R i o de J a n e i r o ,
c o m assistência das M i n a s , falta n e c e s s a r i a m e n t e a q u e deve fazer n a c i d a d e de
São Sebastião, d a qual se n ã o deve a p a r t a r sem ocasião q u e i m p o r t e mais a m e u
serviço, lhe o r d e n o q u e n ã o possa ir às ditas M i n a s / / sem especial o r d e m m i n h a , [ A- 126v. ]
assim ele c o m o os mais q u e lhe s u c e d e r e m , salvo p o r u m acidente tal q u e a n ã o
possa e s p e r a r e q u e se lhe d a r i a e m culpa se a ela c o m p r o n t i d ã o n ã o acudisse.

31 2

O s u p e r i n t e n d e n t e terá toda a jurisdição o r d i n á r i a cível e crime d e n t r o dos


limites dessas M i n a s , q u e pelas m i n h a s leis e "regimentos é d a d a aos "juízes d e
fora e "ouvidores-gerais das c o m a r c a s do Brasil, naquilo e m q u e se p u d e r a c o m o -
dar, e à m e s m a a l ç a d a q u e aos. ditos ouvidores é o u t o r g a d a . E n ã o íobstantel q u e
a n ã o h á nos pleitos d a m i n h a F a z e n d a , h a v e n d o respeito à distância das M i n a s , a
terá neles até í c e m l mil "réis, e nos q u e e x c e d e r e m a sua alçada d a r á a p e l a ç ã o é.
agravo p a r a a R e l a ç ã o da Bahia, nos casos e m q u e c o u b e r e m .

32 Q

E p o r q u e o s u p e r i n t e n d e n t e das M i n a s , c o m a experiência da assistência d e -


las, p o d e r á a c h a r q u e neste regimento faltam algumas coisas q u e sejam conveni-
entes à b o a a r r e c a d a ç ã o d a m i n h a F a z e n d a e a d m i n i s t r a ç ã o delas, d a r á c o n t a d o
q u e lhe p a r e c e r se deve acrescentar n ó regimento, c o m o t a m b é m a d a r á se a c h a r
q u e alguns capítulos dele p o d e m ser inconvenientes; e q u a n d o t o t a l m e n t e a exe-
cução deles seja prejudicial a o fim q u e se p r e t e n d e , m e d a r á c o n t a , s u s p e n d e n d o
a m e s m a execução.
324

[fl. 1 2 7 ] Este "regimento hei p o r b e m e m a n d o se c u m p r a e g u a r d e i n t e i r a m e n t e c o m o


nele se c o n t é m , sem dúvida n e m e m b a r g o a l g u m , e q u e r o q u e valha, posto q u e
seu efeito h a j a de d u r a r m a i s d e u m a n o e d e n ã o p a s s a r p e l a C h a n c e l a r i a s e m
e m b a r g o d a O r d e n a ç ã o d o livro 2 , títulos 39 e 4 0 , e m contrário. M a n u e l G o m e s
9

d a Silva o fez e m Lisboa a dezenove de abril de mil setecentos e dois. O secretário


A n d r é Lopes d e L a v r e o fez escrever. R e i .

• 19 .

Carta de Sua Majestade

Legislação complementar ao regimento anterior, este do-


cumento constitui u m a declaração sobre a forma de distribuição
de datas aos sócios dos descobridores e de concessão de data ao
superintendente e ao guarda-mor em cada novo descobrimento,
uma forma de estimulai- a busca de novas lavras e a diligência de
burocratas n a sua repartição e de implantar mecanismos de con-
trole da burocracia n a região mineradora.
O regimento e a legislação complementar constituíam base
legal para despachos, pareceres e sentenças envolvendo terras
minerais do ouvidor Caetano da Costa Matoso. A sua reforma,
pedida pelas câmaras de Minas Gerais, foi objeto de consulta do
Conselho Ultramarino em 1751, com a solicitação de p a r e c e r a
burocratas e autoridades da capitania.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 7.5.1703.
D e s t i n a t á r i o : José Vaz Pinto.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á í í c o : Escrita m o d e r n a regulariza-
da do século XVIII, bastarda e caligrafada. Apresenta capitula-
res trabalhadas, com volutas e arabescos, em módulo grande. A
tonicidade de vogais é marcada, irregularmente, ora com a cir-
cunflexo, o r a c o m o acento a g u d o . As hastes inferiores são
simplificadas, isto é, se apresentam como traços únicos e quase
retos, inclinados para a esquerda, na maioria das letras, salvo no
"s" final, que mantém amplo movimento p a r a a esquerda, em
meia voluta (semelhante ao "z" = zeta). Letra de copista idêntica
à do documento 16. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 0 1 , fl.4W.
325

A P M , SC 0 1 , H. 87v.
A P M , SC 02, fl.82.
APM, SC 02,11. 123.
ANRJ, Coleção Governadores do Rio dê Janeiro, 1, X V , fl. 2v.
U S P / I E B , Coleção Lamego, cód. 26, A8, fl. 8v.-9.
Cópias impressas:
L E M E , Pedro T a q u e s de Almeida Paes. Noticias das Minas de
São Paulo e dos sertões da mesma capitania. São Paulo: Comis-
são do IV Centenário da Fundação de São Paulo, [1954]. p .
201.
R E G I M E N T O do superintendente, guarda-mor" e mais oficiais
das minas de ouro que há nos sertões do Estado do Brasil.
Documentos Interessantes, São Paulo, v. 5 1 , p . 89, 1930.

*T " * V e s e m b a r g a d o r J o s é V a z P i n t o . E u , el-rei, vos e n v i o m u i t o s a u d a r .


I I M a n d a n d o v e r e m " j u n t a p a r t i c u l a r alguns m e i o s q u e se m e a p o n -
-M—J t a r a m p a r a a a r r e c a d a ç ã o dos "quintos, s e n d o u m deles n ã o se assi-
n a r n o " r e g i m e n t o q u e m a n d e i fazer p a r á u s a r d e s dele n a s u p e r i n t e n d ê n c i a das
M i n a s d e q u e vos t e n h o e n c a r r e g a d o " d a t a s aos sócios dos d e s c o b r i d o r e s , fui
s e r v i d o r e s o l v e r q u e , a l é m d o q u e se d e t e r m i n a n o c a p í t u l o sexto d o m e s m o
r e g i m e n t o , se d ê a c a d a u m dos sócios dos d e s c o b r i d o r e s cinco " b r a ç a s d e r e p a r -
tição a sua escolha depois d e s e g u n d a d a t a do d e s c o b r i d o r , e e n t r a r ã o d e p o i s n a
r e p a r t i ç ã o q u e lhes t o c a r a c a d a u m deles c o m o m i n e i r o s . E depois destas b r a ç a s
q u e se h ã o d e d a r a c a d a u m dos sócios, escolhereis u m a d a t a , q u e t a m b é m vos
c o n c e d o , e o u t r a a o " g u a r d a - m o r , q u e ele escolherá, p o r q u e assim / / o hei p o r [ fl. I27v. ]
b e m , e q u e c o m estas d e c l a r a ç õ e s se g u a r d e o capítulo sexto d o dito r e g i m e n t o .
Escrita e m L i s b o a a 7 d e m a i o d e 1703. R e i .

• 20 «

Segunda carta de Sua Majestade

Legislação complementar ao regimento anterior, este docu-


mento constitui uma permissão ao superintendente p a r a mine-
rar, bem como ao tesoureiro, guarda-mor e demais oficiais, ces-
sando o disposto no regimento sobre concessão de proventos aos
oficiais e sobre contribuição dos mineiros para o pagamento de
tais proventos. Esta reforma da legislação recentemente criada
326

decorria d a posição oscilante da Coroa no tocante aos mecanis-


mos de controle da burocracia na região mineradora.
O regimento e. a legislação complementar constituíam base
legal para despachos, pareceres e sentenças envolvendo terras mi-
nerais do ouvidor Caetano da Costa Matoso, A sua reforma, pedi-
da pelas câmaras de Minas Gerais, foi objeto de consulta do
Conselho Ultramarino em 1751, com a solicitação de parecer a
burocratas e autoridades da capitania.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 7.5.1703.
D e s t i n a t á r i o : José Vaz Pinto.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a regulariza-
da do século XVIII, bastarda e caligrafàda. Apresenta capitula-
res trabalhadas, com volutas e arabescos, em módulo grande. A
tonicidade de vogais é marcada, irregularmente, ora com o cir-
cunflexo, ora com o a c e n t o a g u d o . As hastes inferiores são
simplificadas, isto é, se apresentam como traços únicos e quase
retos, inclinados para a esquerda, na maioria das letras, salvo no
"s" final, que m a n t é m amplo movimento p a r a a esquerda, em
meia voluta {semelhante ao "z" = zeta). Letra d e copista idêntica à
do documento 16. (YDL)'
Cópias manuscritas:
APM, SC 0 1 , fl. 4W.-42.
APM, SC 0 1 , fl. 88.
APM, S C 02, fl. 82.
APM, SC 02, fl. 123.-123v.
ANRJ, Coleção Governadores do Rio de Janeiro, 1, X V , fl. 2v.
B G U C , SRM, cód. 452, fl. 72v.-73.
Cópias impressas:
LEME, Pedro Taques de Almeida Paes. Notícias das Minas de São
Paulo e dos sertões da mesma capitania. São Paulo: Comissão do
IV Centenário da Fundação de São Paulo, [1954]. p. 205.
PvEGIMENTO do superintendente, guarda-mor e mais oficiais
das minas de ouro que h á nos sertões do Estado do Brasil. Docu-
mentos Interessantes, São Paulo, v. ,51, p. 90, 1930.

* Tl "*V e s e m b a r g a d o r J o s é V a z Pinto. Eu, el-rei, vos envio m u i t o s a u d a r . F a z e n -


II II do-se-me p r e s e n t e pelo m e u C o n s e l h o U l t r a m a r i n o as dúvidas q u e se vos
JL—J ofereceram a alguns capítulos do " r e g i m e n t o q u e m a n d e i fazer p a r a
dele usardes n a "superintendência das Minas do O u r o de q u e vos t e n h o encarrega-
do e m a n d a n d o - a s ver e m "junta particular, fui servido permitir (sem e m b a r g o do
q u e está disposto nos capítulos n o n o e d é c i m o do dito r e g i m e n t o ) q u e a l é m do
o r d e n a d o d e c l a r a d o nele possais m i n e r a r c o m o as mais pessoas q u e assistem nas
M i n a s sem diferença a l g u m a e usar das mais conveniências q u e as m i n a s d ã o de
327

si, e a m e s m a p e r m i s s ã o c o n c e d o a o " g u a r d a - m o r , "tesoureiro e m a i s "oficiais,


s e m se lhes d a r o r d e n a d o a l g u m d a F a z e n d a R e a l , c o m o antes se lhes d i s p u n h a no
"regimento, c o m o q u e fica cessando o disposto nele sobre o q u e d e v i a m contri-
b u i r os mineiros c a d a u m a respeito d a sua "data p a r a o p a g a m e n t o dos tais o r d e -
n a d o s , d e q u e vos aviso p a r a q u e o tenhais e n t e n d i d o e nesta forma façais p r a t i c a r
esta m i n h a "resolução. Escrita e m Lisboa a 7 d e m a i o d e 1703. R e i

> 21 -

Terceira carta de Sua Majestade [ fl. 128 ]

Legislação complementar ao regimento anterior, este docu-


mento constitui u m a permissão ao desembargador José Vaz Pin-
to para nomeação de guardas-substitutos e seus escrivães p a r a
assistência dos descobertos distantes com a conveniência de mi-
nerar em substituição ao ordenado que antes se lhes taxava. Esta
reforma da legislação recentemente criada decorria da posição
oscilante da Coroa no tocante aos mecanismos de controle d a
burocracia n a região mineradora.
O regimento e a legislação complementar constituíam base
legal p a r a despachos, pareceres e sentenças envolvendo terras
minerais do ouvidor Gaetano da Costa Matoso. A sua reforma,
pedida pelas câmaras de Minas Gerais, foi objeto d e consulta do
Conselho Ultramarino em 1751, com a solicitação de parecer a
burocratas e autoridades da capitania.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 7.5.1703.
D e s t i n a t á r i o : José Vaz Pinto.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita m o d e r n a regulariza-
da do século XVIII, bastarda e caligrafada. Apresenta capitula-
res trabalhadas, com volutas e arabescos, em modulo grande. A
tonicidade de vogais é marcada, irregularmente;, ora com o cir-
cunflexo, ora com o acento a g u d o . As hastes inferiores são
simplificadas, isto é, se apresentam como traços únicos e quase
retos, inclinados para a esquerda, na maioria das letras, salvo no
" s " final, que m a n t é m amplo movimento p a r a a esquerda, em
meia voluta (semelhante ao " z " = zeta). Letra de copista idêntica
à do documento 16. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, SC 0 1 , fl. 42.
328

APM, SC 0 1 , il. 88.-88v.


APM, S C 02, fl. 82--82v.
APM, SC 02, fl. I23v.
ANRJ, Coleção Governadores do Rio de Janeiro, 1, X V , fl. 2v.
U S P / I E B , Coleção Lamego, cód. 26, A8, fl. 7v.-8.
B G U C , S R M , cód. 452, fl. 72v.-73v.
Cópias impressas:
L E M E , Pedro T a q u e s de Almeida Paes. Notícias das Minas de
São Paulo e dos sertões da mesma capitania. São Paulo: Comis-
são do IV Centenário da Fundação de São Paulo, [1954], p .
209.
R E G I M E N T O do superintendente, guarda-mor e mais oficiais
das minas de ouro que há nos sertões do Estado do Brasil.
Documentos Interessantes, São Paulo, v. 5 1 , p . 9 1 , 1930.

"Tl e s e m b a r g a d o r J o s é V a z Pinto, E u , el-rei, vos envio m u i t o s a u d a r . P o r


II D r e c o n h e c e r a impossibilidade do * g u a r d a - m o r p o d e r assistir e a c u d i r
.JL J as p a r t e s tão distantes, c o m o as e m q u e ao m e s m o t e m p o se t r a b a l h a
nas M i n a s , e m q u e p o d e ser necessária a s u a assistência, m e p a r e c e u conceder-lhe
q u e possa n o m e a r "guardas-substitutos seus q u e assistam nas p a r t e s m a i s distan-
tes, e t a m b é m "escrivães q u e sirvam c o m eles, os quais g u a r d a s e seus escrivães
p o d e r ã o ter a m e s m a c o n v e n i ê n c i a d e m i n e r a r e as m a i s q u e se c o n c e d e m a o
g u a r d a - m o r e m lugar do o r d e n a d o q u e antes se lhe taxava n o "regimento, d e q u e
vos aviso p a r a o t e r d e s assim e n t e n d i d o , e o g u a r d a - m o r m a n d o d e c l a r a r p e l a
p e r m i s s ã o q u e lhe c o n c e d o p a r a q u e possa u s a r dela. Escrita e m Lisboa a 7 d e
m a i o d e 1703. R e i .

• 22 <

Quarta carta de Sua Majestade

Legislação complementar ao regimento anterior, este do-


cumento constitui u m a declaração sobre como lavrar as datas da
Coroa. Esta reforma da legislação recentemente criada decorria
d a posição oscilante da C o r o a no tocante aos mecanismos de
controle da burocracia n a região mineradora.
329

O regimento e a legislação complementar constituíam base


legal para despachos, pareceres è sentenças envolvendo terras
minerais do ouvidor Caetano da Costa Matoso. A sua reforma,
pedida pelas câmaras de Minas Gerais, foi objeto de consulta do
Conselho Ultramarino em 1751, com a solicitação de parecer a
burocratas e autoridades da capitania.
Autoria, l o c a l e d a t a : Rei; Lisboa; 7.5.1703.
D e s t i n a t á r i o : José Vaz Pinto.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna regularizada
do século XVIII, bastarda e caligrafada. Apresenta capitulares tra-
b a l h a d a s , c o m yolutas e a r a b e s c o s , e m m ó d u l o g r a n d e . A
tonicidade de vogais é marcada, irregularmente, ora com 0 cir-
cunflexo, ora c o m o a c e n t o a g u d o . As hastes inferiores são
simplificadas, isto é, se apresentam como traços únicos e quase
retos, inclinados p a r a a esquerda, n a maioria das letras, salvo no
"s" final, que m a n t é m amplo movimento p a r a a esquerda, em
meia voluta (semelhante ao "z" — zfita)- Letra de copista idêntica à
do documento 16. (YDL)
Critérios e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir da
matriz da cópia do Códice (APM, SC 02, fl. 123-123v.J e restringi-
ram-se aos termos que comprometiam o significado e o entendi-
mento do texto.
Cópias manuscritas:
APM, S C 0 1 , f l . 4 1 v . - 4 2 .
A P M , SC 0 1 , fl. 88,
APM, SC 02, fl. 82.
APM, SC 02,' fl. 123-123v.
ANRJ, Coleção Governadores do Rio de Janeiro, 1, X V , fl. 2v.
B G U C , S R M , cód. 452, fl. 72v.-73v.
Cópias impressas:
L E M E , Pedro Taques de Almeida Paes. Notícias das Minas de São
Paulo e dos sertões da mesma capitania. São Paulo: Comissão do
IV Centenário da Fundação de São Paulo, [1954]. p . 213.
R E G I M E N T O do superintendente, guarda-mor e mais oficiais
das minas de ouro que há nos sertões do Estado do Brasil. Docu-
mentos Interessantes, São Paulo, v. 5 1 , p. 92, 1930.

* Tl "V esembargador J o s é V a z Pinto. Eu, el-rei, vos envio muito saudar. Fazen-
11 D do-se-me p r e s e n t e pelo m e u C o n s e l h o U l t r a m a r i n o as dúvidas q u e se
jL S vos ofereceram a vários capítulos do "regimento que m a n d e i fazer p a r a
dele usardes n a "superintendência das Minas do O u r o de q u e vos t e n h o encarrega-
do, e m a n d a n d o - a s ver e m a "junta particular, p o r se lhes reconhecer, c o m o apontais,
e a impossibilidade e g r a n d e prejuízo q u e resultaria à Fazenda Real de se minerarem
as "datas por conta da mesma Fazenda quando se não possam arrematar por lanço / / [ fl. 128v. ]
330

conveniente, c o m o dispõe o capítulo 22 do dito "regimento, m e p a r e c e u o r d e n a r -


vos que n o caso suposto d e thãol se a c h a r pessoa q u e queira lançar n a ditas "datas
preço conveniente as deis a q u e m as "fabrique d e meias, fazendo os gastos e m mine-
r a r todos p o r sua conta, e do o u r o q u e se tirar m e t a d e p a r a ele e a o u t r a p a r a a
F a z e n d a Real; e p a r a se m i n e r a r e m estas datas n a referida forma, as dareis às pessoas
q u e forem de melhor consciência e m a i o r crédito e d e q u e m entenderes podeis fiar
c o r r e s p o n d a m pela sua parte c o m Tal fidelidade q u e se deve, e c o m esta "declaração
m a n d o se observe o dito capítulo 22 do regimento. Escrita e m Lisboa a 7 d e maio de
1703. R e i .

• 23 «

[ fl. 129 ] Regimento dos ouvidores-gerais do Rio de Janeiro

Diploma destinado a instruir a atuação de u m ouvidor es-


pecífico, traçando detalhadamente suas atribuições, competên-
cia e alçada. Esse procedimento era característico da Coroa por-
tuguesa, que adaptava os padrões administrativos metropolita-
nos à realidade colonial e criava mecanismos de controle da bu-
rocracia, baseados na lealdade, n a confiança e na vigilância re-
cíproca entre seus membros.
Este regimento, aliado ao dos ouvidores de São Paulo, ori-
entou e ordenou a atuação dos ouvidores no território de Minas
Gerais a partir de 1711, acrescido da prerrogativa de tirar de-
vassas de m o r t e exemplo dos muitos casos em que a legislação
r

personalizada assumia caráter perene e era estendida a outros


burocratas e áreas da América portuguesa.
A u t o r i a , l o c a l e data: Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa,
11.3.1669.
D e s t i n a t á r i o : J o ã o de Abreu e Silva.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "regi-
m e n t o " é "Governo. Direção" (Vocabulário português e latino [...].
Lisboa: Oficina d e Pascoal da Silva. V. 7, p . 199). O presente
regimento, cujo narrador fala n a primeira voz, é precedido por
breve exórdio, onde também consta o destinatário — tratado n a
segunda pessoa do plural e é composto por "capítulos", onde
se detalham as instruções, prevalecendo a forma imperativa na
linguagem e a construção de períodos pela c o m b i n a ç ã o de
hipotaxe e parataxe, típica dos discursos jurídicos ou legislativos.
(JPFj
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a regulariza-
da, bastarda e documental do século X V I I I . Uso d e capitulares
com volutas e arabescos. Hastes inferiores simplificadas, ocasio-
nalmente utiliza o " s " final caudado, pois prevalece o " s " pen-
dente, em forma de vírgula. O relativo "que" aparece abreviado,
com laçada na cauda ascendente, terminando em forma de pon-
to de interrogação. Este t a m b é m é utilizado como sinal de nasa-
lização. O "f" minúsculo começa por Baste dupla, ascendente, e
tem seu traço horizontal de corte em sucessivas laçadas. O "r"
minúsculo alterna entre o redondo e o e m forma de martelo.
Letra de copista idêntica à do documento 16. (YDL)
Critérios editoriais: As colações foram feitas a partir da
matriz da cópia do Códice (APM, SC 02, ü. 100-102v.) e restringi-
ram-se aos termos que comprometiam o significado e o entendi-
mento do texto, mantidas as pequenas variantes introduzidas pelo
copista.
Cópias manuscritas;
APM, SC 0 1 , fl. 70v.-74.
A P M , SC 02, fl.l00-102v.

E u , o príncipe, c o m o regente e g o v e r n a d o r dos reinos d e Portugal e Algarve,


faço s a b e r a vós, "licenciado J o ã o de A b r e u e Silva, q u e o r a m a n d o p o r
"ouvidor-geral d o R i o de J a n e i r o e sua r e p a r t i ç ã o d o Sul n o E s t a d o d o
Brasil, q u e e m servir o dito cargo e administrar justiça tenhais a f o r m a seguinte:

Capítulo 1

Residireis d e o r d i n á r i o n a c i d a d e d e São Sebastião d o R i o d e J a n e i r o , p o r


ser p o v o mais f r e q ü e n t a d o e a principal cidade d a q u e l a r e p a r t i ç ã o , e n o m e i o dela
q u e fica mais a c o m o d a d o p a r a as partes i r e m r e q u e r e r sua justiça, d o n d e ireis u m a
vez e m vosso triénio visitar as capitanias de vossa repartição e fareis nelas "correição,
u s a n d o e m todas o q u e p o r seu "regimento u s a r a m os "corregedores das c o m a r c a s ,
tirado no q u e p o r este regimento se vos o r d e n a r o u t r a coisa.

Capítulo 2

N a s visitas e correições q u e fizerdes, procurareis o q u e , c o n f o r m e o Direito,


vos p a r e c e r é necessário e fazem os corregedores das c o m a r c a s , e vos informareis
se os " d o n a t á r i o s u s a m de mais p o d e r e s e jurisdição do q u e lhes são c o n c e d i d o s
p o r suas doações, "provisões m i n h a s e forma da O r d e n a ç ã o , e n ã o lhe consentireis
o contrário, e m e dareis c o n t a do q u e nisso a c h a r d e s c o m o mais q u e vos p a r e c e r
necessário prover-se, d a n d o as trazõesl q u e p a r a isso h á , q u e remetereis a o C o n -
selho U l t r a m a r i n o , a o secretário dele.
332

Capítulo 3

[ íl. 129v. ] Visitareis as m i n a s do o u r o d e S ã o P a u l o , / / o r d e n a n d o q u e delas se tire


o u r o e se freqüentem e p o n h a m e m b o a a r r e c a d a ç ã o os direitos d a m i n h a F a z e n -
da, e m e avisareis do estado q u e estão e do que, é necessário prover-se.

Capítulo 4

N a s t e r r a s o n d e estiverdes e q u i n z e "léguas a o r e d o r , c o n h e c e r e i s d e a ç ã o
n o v a n o cível e crime, e tereis n o cível, d e alçada, até c e m mil *réis sem apelação
n e m a g r a v o , e s e n d o mais q u a n t i a dareis a p e l a ç ã o e a g r a v o p a r a a R e l a ç ã o d a
Bahia, r e q u e r e n d o as p a r t e s .

Capítulo 5

E p o r q u e aos "ouvidores das capitanias tenho c o n c e d i d o até vinte mil réis d e


a l ç a d a , a p e l a n d o as p a r t e s deles o u a g r a v a n d o n a vossa r e p a r t i ç ã o , t o m a r e i s co-
n h e c i m e n t o e despachareis c o m o for justiça, d a n d o a p e l a ç ã o e agravo p a r a a R e -
lação do Brasil no q u e n ã o c o u b e r n a vossa alçada.

Capítulo 6

N o s casos-crimes dos escravos e índios, tereis alçada e m todas as p e n a s , degre-


dos é açoites q u e aos malfeitores pela O r d e n a ç ã o são postos; e nos casos de morte,
julgareis c o m o "governador e "provedor da Fazenda, até m o r t e inclusive, e no q u e
e m q u e dois c o n f o r m a r e m poreis a sentença e a dareis a execução s e m apelação
n e m agravo.

Capítulo 7

N o s casos dos p e õ e s b r a n c o s livres e m q u e pelas O r d e n a ç õ e s é p o s t a p e n a


[ fl. 130 ] até cinco anos d e d e g r e d o , despachareis p o r vós só; e h a v e n d o d e ser / / c o n d e n a -
dos c o m " p e n a Tvill, c o m o açoites ou "baraço e p r e g ã o , ou e m caso q u e , p r o v a d o ,
m e r e ç a p e l a lei " m o r t e n a t u r a l ou civil ou c o r t a m e n t o d e m e m b r o , despachareis
c o m o governador e provedor d a Fazenda, e sendo todos conformes poreis a
sentença e se d a r á a execução sem apelação n e m a g r a v o , e n ã o sendo conformes
as p a r t e s p o d e r ã o apelar, e n ã o t e n d o p a r t e apelareis p e l a Justiça.

Capítulo 8

N o s crimes das pessoas nobres, "moços da c â m a r a de m e u serviçOj cavalheiro


fidalgo e dali p a r a cima, despachareis da m e s m a m a n e i r a c o m os dois adjuntos nos
casos e m q u e a O r d e n a ç ã o p õ e p e n a até seis anos d e degredo, e n ã o sendo todos
conformes dareis apelação e agravo p a r a a Relação do Brasil; e os crimes maiores
e m q u e a O r d e n a ç ã o dá maior p e n a , despachareis p o r vós, c o m apelação p a r a a dita
Relação.
333

Capítulo 9

E s u c e d e n d o q u e ali esteja o * p r o v e d o r - m o r dos defuntos e a u s e n t e s , será


adjunto nos ditos feitos c o m o "governador, e n ã o estando será o p r o v e d o r - m o r
d a F a z e n d a , e faltando a m b o s será adjunto o p r o v e d o r d a F a z e n d a d a dita capita-
nia, e p a r a assim j u l g a r d e s vos ajuntareis n a *casa d a c â m a r a .

C a p í t u l o 10

C o n h e c e r e i s das apelações e agravos q u e se tirarem dos "juízes ordinários d e


vossa r e p a r t i ç ã o e os despachareis s e m a p e l a ç ã o n e m agravo n o q u e c o u b e r e m
vossa a l ç a d a .

C a p í t u l o 11

E assim t a m b é m conhecereis dos q u e se tirarem dos "juízes / / dos órfãos, n ã o [ fl. 130v. ]
estando nessa repartição o p r o v e d o r da c o m a r c a , p o r q u e ã ele, e n ã o a o p r o v e d o r
n o m e a d o pela Mesa da Consciência, pertence o conhecimento dos ditos agravos.

C a p í t u l o 12

Sereis "auditor dos soldados dos "presídios q u e atualmente servirem n a milí-


cia, pagos e ocupados nela; e nos crimes os despachareis c o m o governador, e n ã o
c o n c o r d a n d o chamareis a o provedor d a F a z e n d a , e n ã o estando n o distrito o prove-
dor d a c o m a r c a ou d a F a z e n d a na forma referida se despacharão c o m o acima se vos
ordena.

C a p í t u l o 13

E p o r q u e m u i t a s vezes h á d ú v i d a e n t r e o "ouvidor-geral e o p r o v e d o r d a
F a z e n d a , q u e r e n d o c a d a qual a m p l i a r sua j u r i s d i ç ã o , j u l g a r e i s t o d a s as c a u s a s ,
assim d e h o m e n s d o m a r c o m o dos m a i s q u e n ã o t o c a r e m a m i n h a F a z e n d a ,
p o r q u e dessas é juiz o dito p r o v e d o r .

C a p í t u l o 14

D a r e i s c a r t a s p a r a as justiças de vossa r e p a r t i ç ã o g u a r d a r e m as "cartas d e


seguro dos "clérigos d e o r d e n s sacras ou "beneficiados e p a r a se lhes g u a r d a r e m as
sentenças p o r q u e forem livres diante do seu juiz, e isto sendo-vos p o r eles r e q u e -
rido n a f o r m a d a O r d e n a ç ã o , livro p r i m e i r o , título sete, p a r á g r a f o 32.

C a p í t u l o 15

A l é m das cartas d e s e g u r o , q u e c o m o " c o r r e g e d o r d a c o m a r c a p o d e i s p a s -


sar, as passareis n a vossa / / r e p a r t i ç ã o sobre as resistências e m o r t e s , n a f o r m a [ fl. 131 ]
d a O r d e n a ç ã o d o livro p r i m e i r o , título 7-, p a r á g r a f o 1 1 , q u e r sejam negativas
ou confessativas, até a q u a r t a c a r t a s o m e n t e , e levareis as a s s i n a t u r a s q u e l e v a m
334

os " c o r r e g e d o r e s d a s c o m a r c a s , salvo a q u e l a s e m q u e eles t ê m q u a t r o " r é i s ,


p o r q u e , como naquele Estado é m e n o r m o e d a u m "vintém, hei p o r b e m que a
levéis d e a s s i n a t u r a .

C a p í t u l o 16

E q u e o "governador ou *capitâo-mor n ã o possa m a n d a r soltar presos alguns


q u e o forem p o r m a n d a d o da Justiça n e m libertar homiziados alguns, e sendo p o r
c a u s a das guerras necessário lançarem-se "bandos p a r a os homiziados criminosos
a c u d i r e m a "defensão e r e p a r o da terra p o r causa d e inimigos, hei p o r b e m q u e os
ditos b a n d o s se n ã o l a n c e m senão consultando-os convosco o g o v e r n a d o r , e e n t ã o
se l a n c e m e m n o m e d e a m b o s , e d i s c o r d a n d o será terceiro o a d m i n i s t r a d o r ou
q u e m seu cargo servir, e o q u e dois a c o r d a r e m se g u a r d a r á , nos quais b a n d o s se
excetuarão os crimes de lesa-majestade, m o e d a falsa, sodomia, resistência e alguns
culpados e m crimes q u e p a r e ç a escandaloso a n d a r e m livres, e Fdelinqüindol alguns
debaixo d o b a n d o sejam logo presos e castigados, e h a v e n d o dúvida sobre a valida-
d e dos b a n d o s conhecereis d a validade deles, n a forma do vosso "regimento, p a r a
[fl. 131v. ] / / s e d e t e r m i n a r e m c o m os adjuntos, n a forma atrás declarada:

C a p í t u l o 17

N ã o p o d e r á o governador-geral, capitão-mor o u " c â m a r a , n e m o u t r a pessoa,


tirar-vos do dito cargo, prender-vos ou suspender-vos, e fazendo-o vos n ã o dareis
p o r suspenso e os prendereis, e a o governador ou c a p i t ã o - m o r "emprazareis p a r a
d i a n t e dos " c o r r e g e d o r e s d o c r i m e d a C o r t e , e f a z e n d o autos dos excessos q u e
convosco tiverem. E m a n d o aos "oficiais d a Justiça e G u e r r a vos o b e d e ç a m nisso,
c o m p e n a de suspensão d e seus 'oficios e das mais p e n a s q u e h o u v e r e m p o r m e u
serviço. E sendo caso {o q u e n ã o espero) q u e cometais a l g u m crime ou excesso q u e
p a r e ç a deverdes ser deposto antes da "residência, farão disso a u t o s , q u e vós n ã o
impedireis, e m o s r e m e t e r ã o a Conselho U l t r a m a r i n o , c o m clareza do delito, p a r a
e u m a n d a r o q u e h o u v e r p o r m e u serviço; e nas residências dos g o v e r n a d o r e s e
capitães-mores se p e r g u n t a r á p o r isso.

C a p í t u l o 18

E sendo q u e cometais a l g u m excesso, o q u e n ã o será tão grave, q u e p o r ele


mereçais p e n a d e m o r t e , e n t ã o somente podereis ser p r e s o n o flagrante, e de o u t r a
maneira não.

C a p í t u l o 19

N a s p e n a s q u e puserdes tereis alçada até vinte mil réis, livro e m q u e se c a r r e -


g u e m e "tesoureiro destas despesas, e este dinheiro se n ã o g a s t a r á senão p o r m a n -
[ fl. 132 ] d a d o s vossos. E q u a n d o / / o * p r o v e d o r - m o r d a F a z e n d a for t o m a r c o n t a s , lhas
d a r á o dito tesoureiro destas despesas, digo, pelo livro e; m a n d a d o s , e o q u e sobe-
j a r se e n t r e g a r á a o "almoxarife, lançando-Ihe e m receita.
335

Capítulo 20

E sendo-vos p o s t a Tsuspeiçãol, e n ã o vos d a n d o p o r suspeito, a p a r t e q u e a


p u s e r depositará q u a t r o mil "réis de c a u ç ã o , e j u l g a n d o - s e q u e n ã o p r o c e d e p e r -
d e r á a m e t a d e dela p a r a os presos pobres, e j u l g a n d o - v o s p o r n ã o suspeito p e r d e -
rá a c a u ç ã o toda t p a r a os presos 1

C a p í t u l o 21

R e m e t e r e i s a suspeição, p a r a a julgar, ao " p r o v e d o r - m o r d a c o m a r c a , estan-


do no distrito, e n ã o estando aos defuntos e ausentes ou o u t r o j u l g a d o r "letrado,
estando nela, e n ã o h a v e n d o a o "juiz mais velho do a n ó atrás, e n ã o o h a v e n d o
ou s e n d o suspeito será o s e g u n d o j u i z , e assim p o r d i a n t e até o v e r e a d o r m a i s
m o ç o , ao q u a l se n ã o p o d e r á p ô r suspeição. E o tal juiz ou "vereador d e s p a c h a r á
as suspeições t o m a n d o p o r adjunto o letrado m a i s antigo do "auditório, g u a r d a n -
d o e m t u d o a f o r m a d a O r d e n a ç ã o d o livro t e r c e i r o , título 2 1 , d a s suspeições
postas aos j u l g a d o r e s .

Capítulo 22

E sendo a dita suspeição posta fora do R i o d e J a n e i r o , o n d e é vosso domicí-


lio, n ã o e s t a n d o n e n h u m dos s o b r e d i t o s n o distrito ireis p r o c e d e n d o n a c a u s a
e n q u a n t o d u r a r a suspeição, t o m a n d o p o r adjunto ao j u i z mais velho, / / e s e n d o [ n. 132v. ]
suspeito tomareis o s e g u n d o , e sendo suspeito t a m b é m ou n ã o [o] h a v e n d o ireis
t o m a n d o até o v e r e a d o r mais m o ç o , a o qual se n ã o p o d e r á p ô r suspeição. E t u d o
o p o r vós c o m o dito adjunto feito e j u l g a d o n o processar d a dita suspeição será
firme e valioso. E estando p r e p a r a d a , a remetereis n a forma referida a q u e m c o m -
p e t e o h a v ê - l a d e j u l g a r . E s e n d o j u l g a d o p o r n ã o suspeito ou sendo p a s s a d o o
t e m p o da suspeição, ireis só c o m a causa p o r d i a n t e c o m o se vos n ã o fora posta a
s u s p e i ç ã o , f a z e n d o disso d e c l a r a ç ã o n o feito. E s e n d o j u l g a d o p o r suspeito, se
t o m a r á a c a u ç ã o à p a r t e e sé elegerá o j u i z n a forma d a O r d e n a ç ã o .

Capítulo 23

Sendo doente o "ouvidor letrado posto p o r m i m ou impedido de m a n e i r a q u e


n ã o possa servir, servirá o j u i z mais velho de ouvidor, o qual servirá d u r a n t e seu
i m p e d i m e n t o , e falecendo ou sendo impedido, de sorte q u e haja d e d u r a r mais de
seis meses seu i m p e d i m e n t o , p r o v e r á o "governador-geral do Estado a pessoa q u e
mais suficiente parecer p a r a o dito cargo pelo t e m p o q u e lhe parecer, e d u r a r á seu
p r o v i m e n t o e n q u a n t o d u r a r o dito i m p e d i m e n t o . E o governador ou "capitão-mor
dará logo conta a o governador-geral p a r a q u e parecendo-lhe m a n d a r prover o faça,
e t a m b é m m e d a r á c o n t a pelo Conselho U l t r a m a r i n o , p a r a eu m a n d a r / / o q u e [fl. 133 ]
houver p o r m e u serviço, e o ouvidor-geral q u e servir d e "serventia íusarál da m e s m a
jurisdição e alçada. E sendo o impedimento do proprietário justo, levará ele o orde-
n a d o p o r inteiro, e n ã o o sendo ou faltando e m todo levará somente o "serventuário
a m e t a d e do o r d e n a d o , c o m o se faz e m Angola.
336

C a p í t u l o 24

E ( m a n d o l a todos os m e u s " d e s e m b a r g a d o r e s , " c o r r e g e d o r e s , "ouvidores,


•juízes, justiças, "oficiais a q u e este "regimento o u traslado dele e m pública f o r m a
for m o s t r a d o e o c o n h e c i m e n t o dele p e r t e n c e r o c u m p r a m e g u a r d e m e façam
i n t e i r a m e n t e c u m p r i r e g u a r d a r sem dúvida n e m e m b a r g o a l g u m , e se registrará
n o livro dos registros d o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o e Casa d a Suplicação e C â m a r a
da c i d a d e de Salvador, B a h i a de T o d o s os Santos, e o p r ó p r i o se p o r á n o cartório
d a C â m a r a do R i o de J a n e i r o p a r a a todo o t e m p o constar dele. Francisco d a Silva
o fez e m Lisboa a 11 d e m a r ç o d e 1669. O secretário M a n u e l B a r r e t o d e S a m p a i o
o fez escrever. Príncipe.

> 24 <

[Provisão do ofício de juiz da Coroa aos ouvidores-gerais]

Provisão do oficio de juiz da Coroa aos ouvidores-gerais,


e v i t a n d o - s e , assim, eventuais conflitos d e j u r i s d i ç ã o e n t r e
ouvidores e eclesiásticos.
Diante das disputas do ouvidor com o bispo e com os ma-
gistrados eclesiásticos, tais decisões régias envolvendo definições
sobre a jurisdição secular diante da eclesiástica parecem ter ser-
vido como referências legais para pareceres, despachos e senten-
ças do ouvidor Caetano da Costa Matoso.
Autoria, l o c a l e data: Príncipe; Lisboa; 22.5.1674.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "provi-
s ã o " é "Patente, alvará, ou tíuúo, com que alguém é provido em
algum benefício, ou oficio. [...] Provisão de el-rei è u m a ordem
que el-rei m a n d a pelos tribunais a algum ministro inferior para
informar, etc. H á outras provisões em que o desembargador do
Paço dispensa em n o m e de el-rei e m algumas leis; outras são
provisões de mercês, passadas pelo dito tribunal, ou qualquer
outro secular, ou eclesiástico. [...] Comumente falando, por esta
palavra provisão se entende a n o m e a ç ã o , eleição, presentação,
confirmação, instituição e colação de um beneficio" (Vocabulário
português e latino [...]. Lisboa: Oficina d e Pascoal da Silva. V. 6,
p. 808}. QTF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a regulariza-
da, bastarda e documental do século XVIII. Uso de capitulares
337

com volutas e arabescos. Hastes inferiores simplificadas, ocasio-


nalmente utiliza o " s " final caudado, poís prevalece o " s " pen-
dente, e m forma.de vírgula. O relativo "que" aparece abreviado,
com laçada na cauda ascendente, terminando em forma de pon-
to de interrogação. Este t a m b é m é utilizado como sinal de nasa-
lização. O "f' minúsculo começa por haste dupla, ascendente, e
tem seu traço horizontal de corte em sucessivas laçadas. O "r"
minúsculo alterna entre o redondo e o em forma de martelo.
Letra de copista idêntica à do documento 16. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 0 1 , fl. 74.
A P M , SC 02, fl.l02v.

E u , o p r í n c i p e , c o m o regente, e g o v e r n a d o r destes r e i n o s d e P o r t u g a l e
Algarve, faço saber aos q u e esta m i n h a "provisão v i r e m q u e , t e n d o respei-
to a o q u e se m e r e p r e s e n t o u p o r p a r t e dos "oficiais d a C â m a r a do R i o d e
J a n e i r o , e m r a z ã o das dúvidas q u e de o r d i n á r i o s u c e d e m n a q u e l a c a p i t a n i a sobre
m a t é r i a s d e j u r i s d i ç ã o e n t r e os "ouvidores-gerais / / e os " p r e l a d o s eclesiásticos, [ fl. 133v. ]
p o r se n ã o h a v e r c o n c e d i d o p o d e r é f a c u l d a d e a q u e m haja d e resolver estas
dúvidas, de q u e se segue proceder-se a declarações e censuras e interditos, e fica-
r e m m e u s vassalos s e m o r e m é d i o de q u e necessitam n o espiritual, h e i p o r b e m
q u e os ouvidores-gerais d a dita capitania d o R i o d e J a n e i r o sirvam j u n t a m e n t e d e
"juízes d a C o r o a , p a r a c o m isso se evitarem semelhantes controvérsias, p e l o q u e
m a n d o a o " g o v e r n a d o r d a dita capitania, mais "ministros e pessoas a q u e p e r t e n -
cer t e n h a m e n t e n d i d o o q u e p o r esta o r d e n o e a c u m p r a m e g u a r d e m n o q u e lhes
tocar m u i t o i n t e i r a m e n t e c o m o nela se c o n t é m sem dúvida a l g u m a , a qual valerá
c o m o "carta e n ã o p a s s a r á p e l a C h a n c e l a r i a , s e m e m b a r g o d a O r d e n a ç ã o do livro
s e g u n d o , títulos 39 e 4 0 e m contrário, e se passou p o r duas vias, Pascoal d e Aze-
v e d o a fez e m L i s b o a a 22 de m a i o d e 1674. O secretário M a n u e l B a r r e t o d e
S a m p a i o a fez escrever. Príncipe.
338

25

[Resolução para os ouvidores tirarem segundas devassas


nos casos de crime de morte]

Ato legislativo que ampliava as atribuições dos ouvidores do


Rio de Janeiro estipuladas no regimento de 1669, mecanismo de
transformação de diplomas legais específicos e personalizados em
genéricos e abrangentes.
Integra grupo de legislação compilada tanto por exigências
do cargo de ouvidor como por interesse no tema da ampliação das
atribuições que os magistrados reais no Brasil passavam a ter, so-
bretudo em atividades de vigilância e controle, e nos rendimentos
que com as novas tarefas passavam a merecer.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 17.11.1710.
D e s t i n a t á r i o : Roberto C a r Ribeiro.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento apresenta forma
epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie de
exórdio, na primeira pessoa do singular, o emissor expõe a ordem,
sempre de forma imperativa, e encerra o texto com a data. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna regularizada,
bastarda e documental do século XVIII. Uso de capitulares com
volutas e arabescos. Hastes inferiores simplificadas, ocasionalmente
utiliza o " s " final caudado, pois prevalece o " s " pendente, em for-
m a de vírgula. O relativo "que" aparece, abreviado, com laçada
na cauda ascendente, terminando em forma de ponto de interro-
gação. Este também é utilizado como sinal d e nasalização. O
"f' minúsculo começa por haste dupla, ascendente, e tem seu
traço horizontal de corte em sucessivas laçadas. O "r" minúsculo
alterna entre o redondo e o em forma de martelo. Letra de copista
idêntica à do documento 16. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, SC 0 1 , fl. 74-74v.
APM, S C 0 2 , f l . I02v.-103.

oberto C a r Ribeiro. E u , el-rei, vos envio m u i t o saudar. H a v e n d o visto a


vossa representação sobre ser conveniente q u e nessa capitania se execute a
íesma o r d e m q u e m a n d e i passar aos * ouvidor es-gerais d e P e r n a m b u c o
p a r a tirarem segundas "devassas d e c a d a m o r t e q u e sucedesse n a sua comarca, p o r
[ fl. 134 ] serem nessa muito contínuos os delitos e as devassas tiradas pelos / / m e s m o s "juízes,
d e q u e m c o s t u m a m haver sempre queixas, e declarando-se p o r é m seus livramentos
h a v i a m d e p a r a r e n q u a n t o sé n ã o tirava a segunda "devassa, ainda q u e estivessem os
réus presos, m e p a r e c e u resolver q u e os "ouvidores-gerais dessa capitania rirem se-
gundas devassas, assim c o m o tenho permitido aos de P e r n a m b u c o , o q u e se enten-
derá somente a respeito dos "juízes ordinários e n o caso e m que ao t e m p o q u e os
ouvidores e n t r a r e m a tirar segunda devassa n ã o estiverem j á os réus sentenciados
pela q u e tiverem tirado Os juízes ordinários, de q u e vos aviso p a r a terdes entendido
esta m i n h a "resolução, q u e mandareis registrar nas partes necessárias p a r a q u e seja
publicada aos vassalos sucessores e a executem c o m o p o r esta vos ordeno. Escrita e m
Lisboa a 17 d e n o v e m b r o d e 1710. Rei. Miguel Carlos.

• 26 «
[Resolução sobre procedimentos da ouvidoria no caso de recursos
à Relação da Bahia]

Ato legislativo que ampliava as atribuições dos ouvidores


diante de magistrados eclesiásticos. Legislação complementar ao
regimento de 1669, exemplifica o mecanismo de transformação
de diplomas legais específicos e personalizados em genéricos e
abrangentes,
Integra grupo de legislação compilada tanto por exigênci-
as do cargo de ouvidor como por interesse no tema da amplia-
ção das atribuições que os magistrados reais no Brasil passavam
a ter, sobretudo em atividades de vigilância e controle, e nos
rendimentos que com as novas tarefas passavam a merecer. Di-
ante das disputas do ouvidor com o bispo e com os magistrados
eclesiásticos, tais decisões régias envolvendo definições sobre a
jurisdição secular diante da eclesiástica parecem ter servido como
referências legais para pareceres, despachos e sentenças do ouvidor
Caetano da Costa Matoso.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 17.11.1710.
D e s t i n a t á r i o : Roberto C a r Ribeiro.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O d o c u m e n t o apresenta forma
epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie
de, exórdio, na primeira pessoa do singular, o emissor expõe a
ordem, sempre de forma imperativa, e encerra o texto c o m a
data. (JPF)
340

C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna regulariza-


da, bastarda e documental do século XVTIL Uso de capitulares
com volutas e arabescos. Hastes inferiores simplificadas, ocasio-
nalmente utiliza o " s " final caudado, pois prevalece o " s " pen-
dente, e m forma de vírgula. O relativo "que" aparece abreviado,
com laçada, na cauda ascendente, terminando em forma de pon-
to de interrogação. Este também é utilizado como sinal de nasa-
lização. O "f' minúsculo começa por haste dupla, ascendente, e
tem seu traço horizontal de corte em sucessivas laçadas. O "r"
minúsculo alterna entre o redondo e o em forma de martelo.
Letra de copista idêntica â do documento 18. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, S C 0 1 , f l . 74v.-75.
A P M , S C 02, fl. 103.

* ^ " ~ " " " ^ uvidor-geral d a capitania do R i o d e j a n e i r o . E u , el-rei, vos envio m u i t o


I I saudar. H a v e n d o visto a r e p r e s e n t a ç ã o q u e m e fizeram os "oficiais d a
^w-^ C â m a r a dessa cidade sobre o d e t r i m e n t o q u e e x p e r i m e n t a m esses m o -
r a d o r e s c o m a dilação do recurso p a r a o D e s e m b a r g o d o P a ç o d a B a h i a q u a n d o
p a s s a d a s as cartas e n ã o c u m p r i d a s pelo "ministro eclesiástico se passe c e r t i d ã o
[ fl. 134v. ] p a r a o assento e se devia declarar ao tal j u i z a e m b a r c a ç ã o e m q u e for p a r a //
n o m e a r p r o c u r a d o r q u e assista n a Bahia a o tal assento, aliás, se t o m e a sua revelia,
e q u e e n q u a n t o se n ã o t o m a r o assento, sendo sobre preso, se possa soltar debaixo
d e fiéis carcereiros, fui servido resolver q u e nos recursos d a C o r o a q u a n d o o j u i z
eclesiástico n ã o d e r c u m p r i m e n t o à última carta e p o r isso se haja d e passar certi-
d ã o p a r a , no D e s e m b a r g o do P a ç o d a B a h i a , se t o m a r assento, o "escrivão d a
C o r o a notifique logo o j u i z eclesiástico p a r a ir assistir a o assento à Bahia, se qui^
ser, e q u e desta notificação passe certidão, q u e irá i n c o r p o r a d a aos a u t o s , p o r q u e
desta sorte se p o u p a a dilação q u e h á e m ir p r i m e i r o à B a h i a p e d i r carta p a r a a
notificação e, d e p o i s d e feita, i r e m os a u t o s , o q u e n ã o é c o n v e n i e n t e t a n t o à
jurisdição secular c o m o eclesiástica. E q u a n t o a s e r e m soltos os presos sobre fiéis
carcereiros, m e p a r e c e u se n ã o p o d i a deferir, d e q u e vos aviso p a r a terdes enten-
dido a "resolução q u e tomei nesta matéria, d e q u e m a n d o d a r notícia ao "gover-
n a d o r - g e r a l d a Bahia p a r a assim o fazer executar. Escrita e m Lisboa a 27 d e j a n e i -
ro de 1711.

Rei.
341

27

Regimento dos ouvidores de São Paulo [fl. 1 3 5 ]

Diploma legal destinado a instruir a atuação de u m ouvidor


específico, traçando detalhadamente suas atribuições, competên-
cia e alçada. Esse procedimento era característico da Coroa por-
tuguesa, que adaptava os padrões administrativos metropolitanos
à realidade colonial e criava mecanismos de controle da burocra-
cia baseados n a lealdade, na confiança e n a vigilância recíproca
entre seus membros.
Este regimento, aliado ao dos ouvidores do R i o de Janeiro,
orientou e ordenou a atuação dos ouvidores no território de Mi-
nas Gerais a partir de 1711, acrescido apenas da prerrogativa
de tirar devassas de morte, exemplo dos muitos casos em que a
legislação personalizada assumia caráter p e r e n e e era
complementada e estendida a outros burocratas e áreas da Amé-
rica portuguesa.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 4.1.1700.
D e s t i n a t á r i o : Luís Peleja.
U s o n a historiografia: Donald Ramos discute a fragilida-
de do p o d e r real nos primeiros anos da exploração aurífera a par-
tir das atribuições fixadas pelo regimento aos ouvidores (A social
history of Ouro Preto: stresses of dynamic urbanization in colonial
Brazil, 1695-1726. Gainesville: University of Florida, 1972. p. 114-
115).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "regimen-
to" é "Governo. Direção" (Vocabulário português e latino [...]. Lis-
boa: Oficina de Pascoal da Silva. V. 7, p. 199). O presente regi-
mento, cujo narrador fala na primeira voz, é precedido por breve
exórdio, onde também consta o destinatário — tratado n a segunda
pessoa do plural - , e é composto por "capítulos", onde se deta-
lham as instruções, prevalecendo a forma imperativa n a lingua-
gem e a construção de períodos pela combinação de hipotaxe e
parataxe, típica dos discursos jurídicos ou legislativos. {JPF}
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna regularizada,
bastarda e documental. Uso de capitulares com volutas. Hastes
inferiores simplificadas, com exceção do " s " caudado, por vezes
presente. O sinal de nasalização assemelha-se a u m ponto de in-
terrogação sobre a letra. E também usado na abreviação do relati-
vo "que". Letra de copista idêntica à do documento 16. (YDL)
Critérios editoriais: As colações foram feitas a partir d a
matriz da cópia do Códice (APM, S C 02, fl. 103-105) e restringi-
342

ram-se aos termos que comprometiam o significado e entendi-


mento do texto, mantidas as pequenas variantes i n t r o d u z i d a s
pelo copista.
Cópias manuscritas:
A P M , S C 0 1 , f l . 75-78v.
APM, SC 02, fl. 103-105.

E u , el-rei, faço s a b e r a v ó s , "licenciado L u í s Peleja, q u e o r a m a n d o p o r


"ouvidor d a vila d e São Paulo e sua c o m a r c a n o Estado d o Brasil, q u e e m
servir o dito cargo useis d o "regimento seguinte:

1
Residíreis n a viía d e S ã o P a u l o , p o r ser a p a r t e mais a p t a e a c o m o d a d a p a r a
as p a r t e s irem r e q u e r e r sua justiça, e fareis as "correições d a dita vila e sua c o m a r c a ,
q u e p e l a m a r i n h a c o m e ç a r á d a vila de Santos e a c a b a r á n a ú l t i m a p o v o a ç ã o d a
p a r t e do sul, e pelo sertão c o m p r e e n d e r á as vilas circunvizinhas à de S ã o P a u l o d a
m e s m a c a p i t a n i a e o. q u e mais h o u v e r p o v o a d o p a r a o sul, u s a n d o nela, e m t u d o
o m a i s , do r e g i m e n t o dos "corregedores e "provedores das c o m a r c a s , inserto n a
O r d e n a ç ã o n o q u e n ã o e n c o n t r a r n o disposto neste r e g i m e n t o . E m u i t o p a r t i c u -
l a r m e n t e vos informareis se os "donatários u s a m d e mais p o d e r e s e jurisdição dos
q u e lhes são concedidos p o r suas doações, e "provisões m i n h a s , e f o r m a d a O r d e -
n a ç ã o , e outrossim sabereis se os eclesiásticos u s u r p a m m i n h a jurisdição, e a u n s e
[ fl. 135v. ] outros n ã o consentireis q u e o façam / / e m e dareis c o n t a do q u e nisso a c h a r d e s e
o b r a r d e s e do mais e m q u e vos p a r e c e r necessário prover-se, d a n d o as razões q u e
p a r a isso se vos oferecerem, e t u d o isso m e enviareis pelo m e u C o n s e l h o U l t r a m a -
rino.

C o n h e c e r e i s p o r ação n o v a nessa vila e seu " t e r m o , assim n o c r i m e c o m o n o


cível, e tereis n o cível a l ç a d a até c e m mil "réis nos bens móveis e oitenta nos d e
raiz, sem apelação ou agravo p a r a a R e l a ç ã o d a Bahia, e p o r q u e a alguns ouvidores
dos d o n a t á r i o s t e n h o c o n c e d i d o alçada até vinte mil réis, e passado, digo, apelan-
do as p a r t e s deles nas causas d e m a i o r q u a n t i a n ã o tomareis c o n h e c i m e n t o delas,
p o r q u e p e r t e n c e m d i r e i t a m e n t e à R e l a ç ã o d a Bahia, p a r a o n d e as p a r t e s p o d e r ã o
apelar. N o s fidalgos tereis p o d e r e alçada p a r a os d e g r e d a r d e s até dois anos p a r a
fora d e vila e t e r m o , ou p a r a outros q u a i s q u e r lugares d a vossa c o m a r c a , e nos
cavaleiros e escudeiros, a i n d a q u e sejam de l i n h a g e m , tereis p o d e r e a l ç a d a p a r a
os d e g r e d a r d e s até q u a t r o a n o s p a r a os ditos lugares, e nos "ofícios m e c â n i c o s e
p e õ e s q u e n ã o f o r e m d e " s o l d a d a vos d o u p o d e r e a l ç a d a p a r a os d e g r e d a r d e s
p a r a õs ditos lugares até cinco anos, e os p e õ e s de soldada q u e a n d a r e m a soldada
343

e outros q u e g a n h a r e m dinheiro p o r sua " b r a ç a g e m tereis p o d e r e a l ç a d a p a r a os


m a n d a r d e s açoitar e d e g r e d a r até seis anos p a r a os / / ditos lugares, e sendo casos [ fl. 136 ]
de furtos os podereis degredar p a r a as "galés p o r m e t a d e do dito t e m p o , e assim vos
dou toda a alçada sobre escravos e m todo o crime que cometerem, tirando os casos
e m q u e é posta p e n a d e *morte natural, e nos e m q u e n ã o for posta a dita p e n a
dareis vossas sentenças à e x e c u ç ã o sem a p e l a ç ã o n e m a g r a v o , e sendo furtos os
podereis d e g r e d a r p a r a galés p o r quatro anos.

D o s quais p o d e r e s e alçada usareis c o m e t e n d o as sobreditas pessoas tais casos


e m q u e p o r b e m d e m i n h a s O r d e n a ç õ e s estão postas as ditas p e n a s , das q u a i s
dareis vossa s e n t e n ç a a execução sem apelação n e m a g r a v o , e só nos crimes e m
q u e p o r m i n h a s O r d e n a ç õ e s é p o s t a m a i o r p e n a das d e c l a r a d a s a c i m a , e b e m
assim nas m a i s pessoas q u e a c i m a n ã o são c o n t e ú d a s sentenciareis c o m o vos p a r e -
cer justiça, até m o r t e n a t u r a l , inclusive, d a n d o apelação e agravo p a r a a R e l a ç ã o
d a Bahia, e apelareis p o r p a r t e d a J u s t i ç a nos casos e m q u e a ela h á lugar, e b e m
assim podereis p ô r p e n a s até q u a n t i a d e dez "cruzados q u a n d o vos p a r e c e r neces-
sário, p o r é m só p o r b e m d a Justiça, e dá-las a execução s e m a p e l a ç ã o n e m a g r a v o .

D o u - v o s p o d e r p a r a q u e possais d a r "cartas d e seguro e m casos de m o r t e e d e


resistência, s e n d o negativas, as quais irão dirigidas p a r a vós c o m o as p a s s a m , os
ditos corregedores do crime d a C o r t e . E assim mais / / passareis as ditas cartas d e [ fl. 136v. ]
outros casos q u e forem m e n o s dos a c i m a declarados, e b e m assim podereis p a s s a r
carta d e seguro confessativa, alegando-vos p a r a isso tais razões as pessoas q u e as
p e d e m q u e lhas devais c o n c e d e r . E sendo e m casos que, p r o v a d o s , m e r e ç a m m o r t e
n a t u r a l , as passareis à vista d a "devassa se ela n ã o e n c o n t r a r a defesa alegada, o
q u e assim hei p o r b e m , h a v e n d o respeito à distância q u e h á dessa vila à R e l a ç ã o
d a Bahia,

Podereis d a r carta d e finta até a q u a n t i a de c i n q ü e n t a "cruzados p a r a as coi-


sas q u e f o r e m necessárias n a f o r m a das O r d e n a ç õ e s E x t r a v a g a n t e s , e isto c o m
p a r e c e r do "governador-geral d o Estado do Brasil, a qual "finta se l a n ç a r á pelos
m o r a d o r e s c o n f o r m e as fazendas q u e tiverem, e far-se-á livro, q u e rubricareis, e m
q u e o d i n h e i r o das ditas fazendas se c a r r e g a r á e m receita; e depois d e feitas as
coisas p a r a q u e as ditas fmtas se l a n ç a r a m tomareis contas delas, e a c h a n d o q u e se
n ã o g a s t a r a m c o m o d e v i a m , c o m o é a q u i l o p a r a q u e f o r a m l a n ç a d a s , as fareis
p a g a r às pessoas q u e forem c u l p a d a s no tal "descaminho.

T o m a r e i s as d e n u n c i a ç õ e s q u e vos d e r e m d e a l g u m a s p e s s o a s q u e d e s e n -
c a m i n h a r e m o o u r o aos meus / / "quintos, o u as tais d e n u n c i a ç õ e s se façam e m [A- 137 ]
344

público ou e m segredo, e n o caso q u e tenhais a l g u m a s notícias d e q u e a l g u m a s


pessoas o " d e s c a m i n h a m fareis disso a u t o e p r o c e d e r e i s nele f a z e n d o t o d a s as
diligências p o r averiguar a v e r d a d e , e a c h a n d o alguns culpados nos ditos
descaminhos dos "quintos q u e as partes são obrigadas a p a g a r a m i n h a F a z e n d a os
p r o n u n c i a r e i s , e c o m as culpas os remetereis a b o m r e c a d o a o " p r o v e d o r d a mi-
n h a F a z e n d a , " s u p e r i n t e n d e n t e das m i n a s do R i o d e J a n e i r o , p a r a q u e lhe d ê
l i v r a m e n t o n a forma de m i n h a s ordens. E nas denunciações tomareis as t e s t e m u n h a s
q u e os d e n u n c i a n t e s n o m e a r e m , e segundo o q u e constar d e seus ditos procedereis
n a f o r m a a c i m a d e c l a r a d a , e as buscas e outras diligências d a v e r d a d e , digo, q u e
vos r e q u e r e r e m fareis o q u e vos convier a m e u serviço e m e l h o r a v e r i g u a ç ã o d a
v e r d a d e . E a c h a n d o ouro d e s c a m i n h a d o p o r quintar, o fareis logo p ô r e m arreca-
d a ç ã o até p o r final sentença se j u l g a r se é o u n ã o é p e r d i d o p a r a q u e se e n t r e g u e
a q u e m pela dita sentença tocar.

7
E p o r q u a n t o pelas vexações q u e m e u s vassalos q u e vivem nas terras d o ultra-
m a r p a d e c e m c o m a j u r i s d i ç ã o dos "ministros eclesiásticos de q u e a l c a n ç a m tão
tarde o recurso, b u s c a n d o - õ neste R e i n o , e convir q u e nas ditas p a r t e s haja minis-
[ íl. 137v, ] tro q u e a c u d a às ditas vexações, c o m o neste / / R e i n o o h á c o m o "juízes dos feitos
d a C o r o a , hei p o r b e m e vos m a n d o q u e vos façais de j u i z dos feitos da C o r o a
nessa vila e c o m a r c a ; procedereis n a forma e m q u e neste R e i n o p r o c e d e m os ditos
juízes e possais p r o v e r os agravos interpostos dos ministros eclesiásticos. E p a r a
q u e p o r este m e i o se possa a d m i n i s t r a r j u s t i ç a c o m q u i e t a ç ã o , hei p o r b e m q u e
vós, c o m a l g u m "letrado j u i z h a v e n d o - o , e n ã o o h a v e n d o c o m o u t r o q u a l q u e r
l e t r a d o ou b a c h a r e l , a i n d a q u e seja a d v o g a d o , n ã o o sendo n a m e s m a causa, e
n ã o h a v e n d o a l g u m destes c o m o j u i z ordinário mais velho q u e nesse t e m p o for
. d a dita vila e c o m o vigário da m a t r i z dela, q u e t a m b é m será a d j u n t o c o m o
letrado h a v e n d o - o , e c o m o adjunto c o m eles procedereis nas ditas causas; e sendo
i m p e d i d o o juiz o r d i n á r i o mais velho do p r é s e n t e a n o , será o juiz mais velho do
a n o p a s s a d o ; e s e n d o o u t r o s s i m o vigário d a m a t r i z , será o v i g á r i o q u e for d a
igreja mais vizinha, e e m caso q u e os primeiros e m p a t e m n a m e s m a forma serão
adjuntos, no caso do e m p a t e , os segundos n o m e a d o s p a r a q u e a d e t e r m i n a ç ã o se
v e n ç a p o r três votos conformes.

Levareis as assinaturas q u e p o d e m levar os "corregedores das c o m a r c a s p o r


[ íl. 138 ] b e m do seu "regimento / / e O r d e n a ç ã o , c o m declaração q u e pelas assinaturas de
q u e se c o s t u m a m levar q u a t r o "réis leváreis u m " v i n t é m , visto n ã o h a v e r nessa
vila e c o m a r c a m o e d a de c o b r e n e m o u t r a q u e c o r r e s p o n d a a m e n o s e visto t a m -
b é m a carestia d a terra; e nos casos cíveis, podereis levar t a m b é m assinaturas n a
f p r m á q u e l e v a m neste R e i n o os corregedores do cível d a C o r t e , e i n d o fora d a
345

c i d a d e fazer diligência a r e q u e r i m e n t o das partes e m causa, c o m o vistoria e outras


semelhantes, hei p o r b e m q u e leveis dois mil "réis p o r dia.

E n ã o p o d e r á o "governador da vila de Santos n e m outra a l g u m a pessoa, p o r


maior posto que tenha, tirar-vos n e m suspender-vos do vosso cargo e n q u a n t o eu n ã o
m a n d a r o contrário. E sendo caso (o q u e n ã o espero) q u e cometais algum crime ou
excesso p o r q u e p a r e ç a ao dito governador que deveis ser deposto, fará o dito auto
c o m o "escrivão p a r a constar das culpas q u e se vos p u s e r e m , os quais autos r e m e t e r á
c o m carta sua p a r a m a n d a r o q u e eu h o u v e r p o r m e u serviço. E outrossim n ã o
t o m a r á c o n h e c i m e n t o das causas que correm ante vós ou vós sentenciares, n e m ain-
d a c o m titulo de forças ou Outro qualquer pretexto, p o r q u a n t o / / d e vós só p o d e [ fl. 138v. ]
haver apelação e agravo p a r a a Relação d a Bahia, c o m o acima fica dito. E nas "resi-
dências dos governadores ou outros quaisquer ' c a b o s maiores se p e r g u n t a r á se exce-
d e r a m o c o n t e ú d o neste capítulo.

10
E as sentenças q u e p o r vós h o u v e r e m de passar sejam feitas e m m e u n o m e e
assinadas p o r vós e. seladas c o m os selos de m i n h a s a r m a s , e servireis d e "chanceler d a
O u v i d o r i a , e tereis e m vosso p o d e r o dito selo p a r a c o m ele selares as ditas cartas e
sentenças, das quais se p a g a r ã o e a r r e c a d a r ã o p a r a a m i n h a F a z e n d a os direitos
c o n f o r m e se p a g a m n a C h a n c e l a r i a da C o r t e , do q u e tereis certidão do escrivão dela,
os quais direitos se c a r r e g a r ã o sobre o tesoureiro da chancelaria, e n ã o o h a v e n d o
sobre r e c e b e d o r d e m i n h a F a z e n d a pelo escrivão dela. E outrossim selareis todos os
p r o v i m e n t o s dos "ofícios q u e o g o v e r n a d o r do Estado do Brasil fizer, segundo o seu
"regimento, de q u e p a g a r ã o os providos, e fareis c o b r a r os direitos q u e d e v e r e m
c o n f o r m e o livro das avaliações dos ditos direitos, e u m e o u t r o r e n d i m e n t o se
i n c o r p o r a r ã o c o m o mais de m i n h a F a z e n d a p a r a satisfação dos "filhos d a folha,
e n q u a n t o ele n ã o / / chegar a seus p a g a m e n t o s e eu n ã o m a n d a r o contrário. r fl_ 139 ]

II

Servireis d e " a u d i t o r d a g e n t e de g u e r r a , o b s e r v a n d o o seu r e g i m e n t o , e a


final s e n t e n c i a r e i s os casos-crimes c o m o g o v e r n a d o r d a vila d e S a n t o s , d a n d o
a p e l a ç ã o e a g r a v o p a r a o a u d i t o r - g e r a l d o E s t a d o d o Brasil n o s casos q u e n ã o
c o u b e r e m e m vossa a l ç a d a p o r p a r t e d a J u s t i ç a [e] nos e m q u e ela h o u v e r lugar,
t e n d o neste j u í z o a m e s m a a l ç a d a q u e a c i m a se vos c o n c e d e , assim e m c r i m e s
Como e m cíveis.

12
E vos m a n d o q u e deste p o d e r e alçada useis e n q u a n t o n a vila de São Paulo e
sua c o m a r c a andares e n ã o t o m a r posse o vosso sucessor. E p a r a q u e o dito p o d e r e
346

alçada seja notório a todas as pessoas d e vossa jurisdição, logo q u e chegardes à dita
vila de São Paulo, primeiro q u e useis dele, apresentareis este "regimento n a C â m a -
ra d a dita vila e notificareis tudo o que nele se c o n t é m aos "juizes e "oficiais dela, e
o fareis registrar no livro d a dita C â m a r a , p a r a q u e a todo o t e m p o conste do p o d e r
e alçada q u e vos tenho d a d o . E m a n d o ao "governador e capitão-generaí do Estado
do Brasil e aos mais governadores e "capitães-mores que n a dita vila e sua c o m a r c a
[ fl 139v ] ' ^ n o u v e r
' e
k e m
assim aos juízes, "vereadores e "provedores do concelho d a dita
vila e das mais anexas, e aos fidalgos, cavaleiros e escudeiros, " h o m e n s b o n s e mais
pessoas q u e vos deixem u s a r do p o d e r è alçada q u e p o r este regimento assim vos
dou, sem nisso ser posta dúvida ou embargo alguns, p o r q u a n t o assim o hei p o r b e m
da J u s t i ç a e m e u serviço. E este valerá, posto q u e seu efeito haja de d u r a r mais d e u m
ano, s e m e m b a r g o d a O r d e n a ç ã o do livro s e g u n d o , título q u a r e n t a e m contrário.
M a n u e l G o m e s d a Silva o fez e m Lisboa, f4l de j a n e i r o de 1700. O secretário
A n d r é Lopes de Lavre o fez escrever.

Rei.

28
[Carta régia ao governador e capitão-general de São Paulo
e Minas do Ouro sobre expulsão de clérigos das Minas]

Cópia com valor documental de ordem régia que determi-


na ao governador a execução da expulsão de todos os clérigos
sem vínculos com paróquias e frades de Minas Gerais, advertin-
do o bispo do Rio de Janeiro da desatenção por ter concedido
licenças a clérigos suspeitos de mal procedimentos para se dirigi-
rem para a região ao arrepio das ordens anteriores. A primeira
ordem régia sobre o tema data de 1705 e seria repetida ao longo
de todo o século XVIII, especialmente após motins e denúncias
de envolvimento de religiosos no descaminho do ouro e falsifica-
ção de moedas.
Integra grupo composto por ordens t cartas régias, anteri-
ores à criação do bispado de Mariana, destinadas à expulsão de
clérigos das Minas Gerais. Diante das disputas do ouvidor com
o bispo e os magistrados eclesiásticos, tais decisões régias envol-
vendo definições sobre a jurisdição secular diante da eclesiásti-
347

ca, especificamente associadas à punição de clérigos, parecem


ter servido como fontes de referências legais.
A u t o r i a , l o c a l e data: Rei; Lisboa; 9.6.1711.
Destinatário: Antônio de Albuquerque Coelho de Carva-
lho.
U s o n a historiografia: Charles Boxer utiliza o documento
ao discutir o perfil da população das Minas nos primeiros anos
da exploração aurífera, a grande mobilidade social e o compor-
tamento de autoridades e eclesiásticos (A idade de ouro do Brasil:
dores do crescimento de uma sociedade colonial. 2, ed. São Pau-
lo: C o m p a n h i a Editora Nacional, 1969. p. 76).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O d o c u m e n t o apresenta forma
%/êMLékeui epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie
de exórdio, na primeira pessoa do singular, o emissor expõe a
ÊDTR/4 ordem, sempre de forma imperativa, e encerra o texto com a
data. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna regularizada
e caligrafada do século XVIII, apresenta clareza absoluta de tra-
çado. Utiliza o "d" uncial, com volteio, mas sem exagero, que
alterna com o retilíneo. Uso de virgula como nos textos modernos,
mas a mantém antes do " e " conectivo. Este é feito em módulo
grande, circular, p a r a diferenciar-se do "e" normal da escrita. Le-
tra de copista, com anotação e assinatura autografa do secretário
de governo.

Cópia [fl. ,142]

A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r v a l h o . Eu, el-rei, vos envio m u i t o


s a u d a r . H a v e n d o visto a c o n t a q u e m e destes d e o *bispo d o R i o d e
J a n e i r o n ã o ter ido n e m m a n d a d o às M i n a s , c o m o se lhe e n c o m e n d o u ,
n e m e x e c u t a d o a o r d e m p a r a n ã o irem a elas eclesiásticos sem e m p r e g o ou présti-
m o de missionários, antes, hoje com mais largueza, havia c o n c e d i d o licenças s e m
exceção d e sujeitos, sendo muitos deles frades e "clérigos de r u i m p r o c e d i m e n t o ,
revoltosos e a i n d a cúmplices n o "levantamento dos reinóis c o m os paulistas e orde-
nados p o r se livrarem d a Justiça e muitos frades apóstatas, q u e todos são perniciosos
nas M i n a s , m e p a r e c e u ordenar-vos n ã o consintais q u e nas M i n a s assista frade al-
g u m ; antes, os lanceis fora, a todos, p o r força e c o m violência se p o r o u t r o m o d o
n ã o quiserem sair, e o m e s m o executáreis c o m aqueles "clérigos q u e n ã o tiverem
ministério d e "párocos n o m e a d o s pelo "ordinário. E a o bispo m a n d o e s t r a n h a r o
p r o c e d i m e n t o q u e tem tido neste particular. Escrita e m Lisboa a nove d e j u n h o de
mil setecentos e o n z e . R e i . D o m M i g u e l C a r l o s . P a r a o " g o v e r n a d o r e c a p i t ã o -
general de São Paulo e Minas. E n ã o se continha mais e m a dita o r d e m q u e se a c h a
348

nesta Secretaria, a qual fiz trasladar p o r m a n d a d o do Excelentíssimo S e n h o r general


G o m e s Freire de A n d r a d e . Vila Rica, seis de janeiro de mil setecentos e cinqüenta
anos. O "secretário do governo a fez trasladar e assinou.

J o s é C a r d o s o Peleja.

29

[Carta régia ao governador e capitão-general da capitania do


Rio de Janeiro para, juntamente com o ouvidor-geral,
examinar as certidões de serviços]

Cópia sem valor documental de ordem dirigida ao gover-


nador do Rio de Janeiro e extensiva ao ouvidor-geral da capita-
nia, implicava a ampliação das atribuições dos ouvidores-gerais,
que atuariam como adjuntos do governador no exame e verifica-
ção da veracidade das certidões de serviço apresentadas.
Integra grupo de legislação compilada tanto por exigênci-
as do cargo de ouvidor como por interesse no t e m a da amplia-
ção das atribuições que os magistrados reais no Brasil passavam
a ter, sobretudo e m atividades de vigilância e controle e nos ren-

li dimentos que com as novas tarefas passavam a merecer.


Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboaj 17.1.1713.
D e s t i n a t á r i o : Antônio d e A l b u q u e r q u e C o e l h o de C a r -
valho.
uni ath A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento apresenta forma
epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie
de exórdio, na primeira pessoa do singular, o emissor expõe a
ordem, sempre de forma imperativa, e encerra o texto c o m a
data. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna regulariza-
da e caligrafada do século X V I I I , d o c u m e n t a l . Capitulares
simplificadas. Utilização do "y" com valor de semivogal nos di-
tongos. T r a z pontuação moderna: dois pontos, vírgula, ponto-e-
vírgula, salvo o ponto final, registrado em duas linhas paralelas,
oblíquas [ / / ] ; o ponto é usado como sinal abreviativo, colocado
embaixo das letras sobrepostas, como em "L."", "Gen.* ". (YDL) 1

Cópia manuscrita:
A P M SC 0 1 , fl.170v.-171.
S
349

Cópia [fl. 1 4 3 ]

* o v e m a d o r e capitão-general d a capitania do R i o de J a n e i r o , amigo, eu,


I _ . el-rei, vos envio m u i t o saudar. P o r m e ser presente q u e , s e m e m b a r g o
V f c ^ J I d a lei passada p a r a os governadores, c o m os *ouvidores-gerais, examina-
r e m a v e r d a d e dos fatos das certidões dos serviços havidos p o r verdadeiros [que] se
r e m e t e s s e m p e l a secretaria d o m e u C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , ficando l a n ç a d o s nas
notas, se n ã o r e m e d e i a o d a n o de haver nas tais certidões falsidade e n ã o convir
dissimular c o m o remédio sem que se faça pública a tal falsidade pelo descrédito
que se h á de seguir às pessoas q u e tiverem passado as tais certidões, que s e m p r e são
de m a i o r g r a d u a ç ã o pelos postos que o c u p a m , fui servido resolver q u e j u n t o s os tais
papéis de c a d a p r e t e n d e n t e se a u t u e m e se examine a v e r d a d e deles, e n u m e r a d a s
e r u b r i c a d a s as folhas pelo ouvidor-geral lhes faça e n c e r r a m e n t o e m que declare
havê-los visto e que assim se lancem nas notas e se r e m e t a m . E q u e o ouvidor-geral
faça depois u m a relação de todos os serviços que n a *frota ou navio particular q u e
e m outra q u a l q u e r ocasião se r e m e t e r e m declarando quais são as certidões falsas ou
verdadeiras, acusando-as p o r suas folhas ou n ú m e r o s pela m e m ó r i a que a o t e m p o
do e x a m e h á de deixar p a r a se ver a tal relação a o t e m p o do despacho dos tais
pretendentes. E o governador fará a m e s m a relação s e p a r a d a m e n t e , depois de "con-
certados os papéis e encerrados n a forma referida. Ordeno-vos que assim o executeis 1

pela p a r t e q u e vos toca, e ao ouvidor-geral dessa capitania se o r d e n a o m e s m o , p o r


ser justo se atalhe o dar-se o p r ê m i o a q u e m o n ã o m e r e c e , pelas d a n o s a s c o n s e -
q ü ê n c i a s que disto se seguem a o m e u serviço. Escrita e m Lisboa a 17 de j a n e i r o de
1713. R e i . P a r a o governador e capitão-general do Rio de J a n e i r o . J o ã o Teles d a
Silva. Alexandre d a Silva Correia. J o s é Ferreira da Fonte. Esta carta de Sua Majes-
tade m a n d o u o Excelentíssimo Senhor general G o m e s Freire d e A n d r a d e buscar à
Secretaria d o R i o de J a n e i r o p o r certidão e registrar n o livro misceláneo e m 22 de
n o v e m b r o de 1738.
• 30 «

[Certidão de ordem régia proibindo o provimento de cargos por


quem não tinha poder para os prover]

Decisão do rei p r o i b i n d o q u e os ouvidores-gerais das


comarcas d e Minas passassem provisão de ofícios públicos de
curta validade (um mês ou dois) e determinando a anulação da
concessão e punições para aqueles que a recebessem e para os
ouvidores quê a concedessem serii que para isto tivessem autori-
dade.
Instrumento revelador da subordinação dos ouvidores à ori-
entação real, a circunstância e m que ocorre a., reprodução desse
documento — feita do livro original do Senado da C â m a r a de
Mariana pelô escrivão da Ouvidoria, atuando sob ordens de Cae-
tano da Costa Matoso — revela o interesse direto do colecionador
nas disputas por autoridade travadas com os ministros da Justi-
ça. Cópia idêntica à do documento 4 1 ,
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa
ocidental; 3.7.1739,
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento apresenta forma
epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie
de exórdio, na primeira pessoa do singular, o emissor expõe a
ordem, sempre de forma imperativa, e encerra o texto com a
data. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á ü c o : Escrita moderna híbrida de
encadeamento, documental do século X V I I I . Bastante cursiva,
as letras são emendadas por movimentos circulares: o "d" uncial
fecha-se em semicírculo; as hastes inferiores do " p " e do " s "
caudado, por exemplo, ultrapassam a linha da escrita em curvas
ascendentes, As vogais minúsculas tornam-se muito semelhan-
tes, em função do movimento circular q u a n d o de sua feitura.
Linha de guarda n a margem inferior; rubrica em arabesco nas
margens inferior e superior. C o m assinatura d o escrivão d a
Ouvidoria. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, C M M 15, fl. 10-1 lv.
APM, SC 68, fl. 17v.
APM, SC 68, fl. 26v.
APM, SC 69, fl. 2 1 .
I H G B , Lata 100, pasta 2, p. 59. Avisos, provisões e cartas régias dirigidas
aos governadores das capitanias de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janei-
ro: 1704 a 1767.
351

P e d r o d e L i m a C u r a d o , "escrivão d a O u v i d o r i a G e r a l e C o r r e i ç ã o d a
c o m a r c a d e Vila R i c a d e Nossa S e n h o r a d o Pilar do O u r o Preto etc. Aos
q u e a p r e s e n t e certidão virem, certifico e p o r t o fé q u e pelo d o u t o r C a e t a n o
d a C o s t a M a t o s o , "ouvidor-geral e "corregedor desta c o m a r c a , m e foi a p r e s e n t a -
[fl. 144 ]

d o o livro oitavo, 1 q u e serve d e registro nesta cidade no S e n a d o d a C â m a r a dela,


e m o q u a l , às folhas dez verso até folha o n z e , se a c h a registrada a "provisão d o
teor e forma s e g u i n t e : D o m J o ã o , p o r graça de D e u s , rei de P o r t u g a l e d o Algarve,
a

d ' a q u é m e d ' a l é m m a r , e m África s e n h o r de G u i n é etc. Faço saber a vós, "gover-


n a d o r e capitão-general da capitania das M i n a s , q u e se viu a vossa c a r t a d e sete d e
d e z e m b r o d o a n o p a s s a d o , e m q u e dáveis conta q u e alguns dos ouvidores-gerais
das c o m a r c a s d e seu governo se i n t r o m e t e m a passar p r o v i m e n t o s , p o r u m e dois
meses, aos "oficiais d e J u s t i ç a d e sua / . / c o m a r c a s e m a t e n d e r e m a q u e n ã o só [ fl. 144v. ]
p e l o " r e g i m e n t o dos g o v e r n a d o r e s do R i o de J a n e i r o , q u e eu m a n d e i observas-
sem os dessas M i n a s , lhes é p e r m i t i d o p a s s a r e m provisões p o r serem, digo, provi-
sões p o r seis meses a todos os oficiais d e J u s t i ç a e F a z e n d a d e seu g o v e r n o n e m
r e p a r a r e m n o prejuízo q u e se p o d e seguir á b o a a r r e c a d a ç ã o dos "novos direitos e
"terças p a r t e s d a avaliação dos ditos ""ofícios, p o r n ã o haver nas c o m a r c a s a q u e l a
f o r m a l i d a d e q u e se p r a t i c a a Vila R i c a , d o n d e está a P r o v e d o r i a , e x p o n d o - m e
q u e os ditos "ministros se d e f e n d e m e m q u e pelas leis do R e i n o lhes é p e r m i t i d o
p r o v e r e m alguns ofícios pelo dito t e m p o , estando-Ihes esta f a c u l d a d e d e r r o g a d a
nessas M i n a s p o r o r d e m m i n h a d e dezoito de j a n e i r o de mil setecentos e trinta e
seis, o q u e s e n d o visto m e p a r e c e u ordenar-vos q u e sendo a l g u m oficial p r o v i d o
p o r q u e m n ã o t e m p o d e r p a r a p r o v e r faça-se p r o c e d e r c o n t r a o n u l a m e n t e / / [ fl. 145 ]

p r o v i d o c o m as p e n a s dos q u e servem ofício público sem carta n e m p r o v i m e n t o , e


aos ouvidores m a n d o se d ê e m e m c u l p a nas suas "residências estes p r o v i m e n t o s
nulos q u e fizessem. El-rei, nosso senhor, o m a n d o u pelos doutores J o s é I n á c i o d e
A r o u c h e e T o m é G o m e s M o r e i r a , conselheiros de seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e
se passou p o r duas vias, M a n u e l P e d r o de M a c e d o R i b e i r o a fez e m Lisboa oci-
dental a três d e j u l h o de mil setecentos e trinta e nove. O secretário M a n u e l C a e -
t a n o L o p e s de L a v r e a fez escrever, e assinou o conselheiro M a r t i n h o de M e n d o n -
ça. T o m é G o m e s M o r e i r a . M a r t i n h o de M e n d o n ç a d e P i n a e de P r o e n ç a . A n t ô -
nio A m a r o d e S o u s a C o u t i n h o .
E n ã o se c o n t i n h a m a i s e m a dita provisão, q u e aqui b e m e fielmente e n a
v e r d a d e fiz t r a s l a d a r d a p r ó p r i a . Vila do C a r m o , vinte de abril d e mil setecentos e
q u a r e n t a anos. E u , P e d r o D u a r t e Pereira, escrivão da C â m a r a , q u e o fiz / / escre- [ fl. 145v. ]
ver e subscrevi e assinei. P e d r o D u a r t e Pereira.

A
' Provisão

• Atual APM, CMM 15, fl. lOrllv.


Passo o referido n a v e r d a d e , ern fé de que passei a presente p o r o r d e m vocal
d o dito d o u t o r *ouvidor-geral e a o dito livro m e r e p o r t o e m fé e de q u e a presente
subscrevi é assinei nesta C i d a d e M a r i a n a aos vinte é seis dias do m ê s de j u l h o de
mil setecentos e q u a r e n t a e n o v e anos. E eu, P e d r o de L i m a C u r a d o , "escrivão
q u e o subscrevi, assinei e "concertei.

Pedro de L i m a C u r a d o .

C o p i a d a p o r m i m escrivão.
P e d r o de L i m a C u r a d o .

• 31 «

[Coleção abreviada da legislação e das autoridades de Minas Gerais]

A partir da leitura de maços e livros da Secretaria de Go-


verno, das câmaras de Vila Rica e de Mariana e da Provedoria
da Rt:al Fazenda, foi elaborada pelo ouvidor Caetano da Costa
Matoso esta "coleção", isto é, "ajuntamento; coleção de varias
cousas que se tem lido e anotado", de ementas de diplomas le-
gais, sem qualquer ordem ou critério visível, exceto a sua se-
qüência dentro de m a ç o ou livro. Ressalte-se o interesse pela
posse de autoridades, criação de vilas, expulsão de religiosos,
côngruas, proventos de ofícios públicos, tributação, motins.
Para além de demandas do cargo e de conflitos nos quais
se envolveu e m Minas Gerais, o documento é revelador do perfil
intelectual do ouvidor, u m leitor e colecionador que reúne inte-
resses da cultura jurídica e de u m acadêmico historiador. As
anotações com os nomes de seus dois sucessores imediatos pa-
tenteiam o seu empenho em continuar a coleção mesmo após o
seu retorno a Portugal. Alguns documentos listados foram copia-
dos integralmente no Códice {documentos 24, 28, 32).
Autoria, l o c a l e data: Caetano da Costa Matoso; Minas
Gerais; 1749-1752.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Coleção de dados administrati-
vos e resumos de documentos oficiais, provavelmente destinada
a convalidar ou informar a constituição de relatos. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
século XVIII. N ã o regularizada, nem caligrafada, mas mostrando
353

evolução pessoal de escrita muito veloz, n u m texto que podería-


mos chamar de "rascunho", corri rasuras interlineares. Apresen-
ta particularidades: semelhança no traçado do " s " final caudado
com o " z " , ambos feitos com traço quase vertical, descendo em
cauda alongada e fechada em laçada; "d" do tipo uncial muito
rápido, interligando-se à vogal seguinte; haste inferior do " p " em
dois tempos, formando forquilha. Fólios 148-148v. e 153 mesma
letra, grafada com tinta e pena diferentes. Fólios 155-155v. em
módulo maior. Letra de Caetano da Costa Matoso. (YDL)

N ú m e r o [—] [fl. 1 4 6 ]

"Provisão d o governo de São Paulo e M i n a s a d o m Brás Baltasar d a Silveira,


p a s s a d a e m 12 d e s e t e m b r o de 1712, c o m ajuda de custo d e 2 mil "cruzados todos
os a n o s , o q u e n ã o serviria de exemplo aos mais.
O s "secretários do g o v e r n o , c o m 600 mil "réis de o r d e n a d o e o t r e s d o b r o das
assinaturas e papéis d o q u e leva o do R i o d e J a n e i r o , p o r provisão de 5 d e agosto
de 1712, cujo "regimento foi d a d o p o r provisão d e 15 d e j a n e i r o d e 1689.
P o r provisão d e 3 d e fevereiro d e 1709 foi criado o lugar [de "ouvidor] nas
M i n a s do O u r o e nele p r o v i d o M a n u e l d a C o s t a de A m o r i m , "juiz d e fora q u e
tinha sido d a ilha de São Miguel, c o m a m e s m a jurisdição q u e o o u v i d o r do R i o
de J a n e i r o e, a l é m dela, a concessão de q u e j u n t o c o m o " g o v e r n a d o r e c o m os
dois ouvidores d o R i o das M o r t e s e S e r r o do Frio, q u e t a m b é m d e n o v o m a n d a v a
criar, p u d e s s e m c o n d e n a r , até a m o r t e inclusive, os negros e índios, e lhe foi feita
a m e r c ê c o m a " b e c a d e " d e s e m b a r g a d o r e o r d e n a d o d e 600 mil réis e m c a d a
a n o , e dos m a i s e m o l u m e n t o s e a s s i n a t u r a s levaria e m d o b r o d o q u e os m a i s
ouvidores das conquistas, e q u e d a n d o b o a "residência lhe faria m e r c ê d e b e c a n a
B a h i a sem c o n c u r s o , e e m 28 d e setembro de 1711 l h e foi c u m p r i d a esta m e r c ê
pelo g o v e r n a d o r A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r v a l h o .
Provisão de 19 d e fevereiro d e 1 7 1 1 , p o r q u e foi criado de n o v o o lugar d e
o u v i d o r do R i o das M o r t e s e p r o v i d o riele o doutor G o n ç a l o de Freitas B a r a c h o ,
c o m o m e s m o o r d e n a d o d e 6 0 0 mil réis, C u m p r i d a p o r d o m Brás B a l t a s a r d a
Silveira a 28 de d e z e m b r o d e 1 7 1 3 .
Provisão d e 15 de j a n e i r o de 1715, p o r q u e foi provido no lugar d e ouvidor-
geral do rio do O u r o Preto [sic] a M a n u e l M o s q u e i r a d a R o s a n a f o r m a e [com?]
a jurisdição do antecessor.
Luís Botelho d e Q u e i r ó s , p r i m e i r o ouvidor do R i o das V e l h a s e m 1713.
Provisão d e 15 de d e z e m b r o d e 1714, p o r q u e foi p r o v i d o Valério d a C o s t a
d e G o u v e i a e m ouvidor-geral d o R i o das M o r t e s .
354

"Provisão d e 3 de j u n h o de, 1718, p o r q u e foi p r o v i d o J e r ô n i m o C o r r e i a d o


A m a r a l e m "ouvidor do R i o das M o r t e s .
" C a r t a del-rei a o " g o v e r n a d o r , p o r q u e foi n o m e a d o " s u p e r i n t e n d e n t e das
casas d e fundição das M i n a s E u g ê n i o Freire d e A n d r a d e , d e 11 d e m a i o de 1719.
Provisão d e 18 de m a r ç o de 1720, p o r q u e foi n o m e a d o ouvidor do R i o das
V e l h a s J o s é d e S o u s a Valdez.
" R e g i m e n t o d a "capitação feito p o r M a r t i n h o de M e n d o n ç a , c o m d a t a d e 27
d e m a r ç o d e 1734.
E m 18 d e agosto d e 1 7 2 1 , n a igreja do O u r o P r e t o e p r e s e n ç a dos "oficiais
d a C â m a r a , d e u a d o m L o u r e n ç o d e A l m e i d a posse d o governo das M i n a s d o m
P e d r o d e Almeida, c o n d e d e Assumar, q u e todos assinaram.
A n t ô n i o Freire d a F o n s e c a O s ó r i o , p r i m e i r o "juiz d e fora d e M a r i a n a e m
1731.
N o p r i m e i r o d e j u l h o de 1 7 3 5 , n o p a l á c i o d o g o v e r n a d o r , q u e e n t ã o e r a
G o m e s F r e i r e , e p e r a n t e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a {que veio m a n d a d o a esta e
outras mais diligências), f o r a m c h a m a d o s os " p r o c u r a d o r e s d a C â m a r a d a vila do
[ íl. 146v. ] R i b e i r ã o , os p r o c u r a d o r e s d e Vila^Ráca, os d a vila do S a b a r á , / / os d a vila d e São
J o ã o del-Rei, o d a vila do C a e t é , os d a Vila do Príncipe, os da vila d e S ã o J o s é , o
d a vila do Pitangui, e todos v o t a r a m e m q u e a "capitação q u e n a q u e l a "junta se
estabelecia fosse p a g a n d o c a d a escravo n e g r o 4 "oitavas e 3 / 4 , os negros forros o
m e s m o e d a m e s m a sorte os "ofícios; as "lojas grandes 24 oitavas, as m e d í o c r e s 16
oitavas, as inferiores 8 oitavas e q u e as negras cativas e q u e estivessem nas "vendas
n ã o p a g a r i a m mais d e c a p i t a ç ã o q u e 16 oitavas p o r si e pelas v e n d a s , e q u e as
v e n d a s p a g a s s e m a 16 oitavas; q u e n ã o p a g a r i a m os negros, n e g r a s , m u l a t o s e
m u l a t a s forros p o r si m a s só pelos escravos q u e t i v e r e m , e se d e c l a r o u q u e d a
c a p i t a ç ã o dos escravos se e n t e n d e e m toda a capitania das M i n a s , o q u a l ajuste
aceitou o g o v e r n a d o r e M a r t i n h o de M e n d o n ç a , d e q u e se fez o dito t e r m o , q u e
todos assinaram.
N o p r i m e i r o d e s e t e m b r o d e 1732, n a igreja m a t r i z d e A n t ô n i o D i a s , e m
p r e s e n ç a dos oficiais d a C â m a r a , d e u o g o v e r n a d o r d o m L o u r e n ç o d e A l m e i d a
p o s s e deste g o v e r n o a A n d r é d e M e l o e C a s t r o , c o n d e das Galveias, q u e t o d o s
assinaram.
A 2 6 d e m a r ç o d e 1735, n a igreja de A n t ô n i o Dias, e m p r e s e n ç a dos oficiais
d a C â m a r a , d e u o g o v e r n a d o r A n d r é d e M e l o , c o n d e das Galveias, posse deste
g o v e r n o a G o m e s Freire de A n d r a d e , q u e todos a s s i n a r a m , cujo g o v e r n o se lhe
conferiu p o r carta d e d a t a d e 4 d e j a n e i r o de 1735, e p o r o u t r a d e d a t a d e 12 de
m a r ç o d e 17 36 se lhe o r d e n o u q u e n a sua ausência nas M i n a s deixasse., o g o v e r n o
a M a r t i n h o de M e n d o n ç a .
C a r t a d e 9 de n o v e m b r o d e 1709, p o r q u e foi n o m e a d o o g o v e r n a d o r q u e
a t u a l m e n t e e r a n o R i o d e J a n e i r o , A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r v a -
lho, p o r governador de São Paulo e Minas, p a r a o n d e passaria, elegendo p a r a
355

r e s i d ê n c i a a p a r t e q u e l h e p a r e c e s s e m a i s c o n v e n i e n t e , o r d e n a n d o - s e - l h e fun-
dasse a l g u m a s p o v o a ç õ e s , e q u e pelo q u e r e s p e i t a v a aos "quintos d o o u r o q u e
se a r r e n d a s s e m p o r c o m a r c a s , fazendo-se d e c a d a u m a u m a r r e n d a m e n t o p e l o
m e n o s t e m p o q u e p u d e s s e ser, c o n t a n t o q u e n u n c a passasse d e dois a n o s , e q u e
p u d e s s e l e v a n t a r " c a s a de fundição. E p a r a q u e p u d e s s e m e l h o r e x e c u t a r t u d o ,
se lhe o r d e n a v a levantasse logo u m r e g i m e n t o d e infantaria d e l o t a ç ã o d e 4 0 0
a t é 5 0 0 p r a ç a s e q u e p u d e s s e , p o r a q u i d a r , n o m e a r p a r a ele os "oficiais
necessários, e x c e t o "coronel, q u e seria c o n s u l t a d o .
" C a r t a d e 27 d e d e z e m b r o de 1709, p o r q u e foram p e r d o a d o s os m o r a d o r e s
das M i n a s a respeito dos "levantamentos c o m os paulistas.
C a r t a d e 9 de j u n h o d e 1 7 1 1 , p o r q u e se declarou ao g o v e r n a d o r das M i n a s
q u e , visto q u e o "bispo do R i o de J a n e i r o n ã o tinha executado a o r d e m p a r a q u e
n ã o fossem frades n e m "clérigos sem e m p r e g o às M i n a s , os expelisse p o r força e
c o m violência, q u a n d o d e o u t r a sorte n ã o quisessem sair.
" P o r t a r i a d e 2 0 de abril d e 1703, p o r q u e se fez m e r c ê a G a r c i a R o d r i g u e s
Pais d e u m a vila n a p a r a g e m do P a r a í b a d o Sul pelo serviço de a b r i r o c a m i n h o
das M i n a s , q u e até aquele a n o h a v i a feito.
E m 1713 foi n o m e a d o p a r a "ouvidor do R i o das V e l h a s F e r n ã o P e r e i r a d e
Vasconcelos,
C a r t a de 16 d e n o v e m b r o de 1714, p a r a q u e a c o b r a n ç a dos quintos fosse
p o r "bateia, e m 12 ou 10 "oitavas.
"Provisão d e 4 d e j u n h o d e 1718, p o r q u e se o r d e n o u q u e o o r d e n a d o d e
" g o v e r n a d o r fosse d e 8 mil "cruzados, o de ouvidor d e 5 0 0 mil "réis e o d e "secre-
tário do g o v e r n o de 4 0 0 mil, e q u e se. pagassem e m m o e d a .
Provisão de .16 de abril d e 1738, p o r q u e foi c r i a d a casa d e misericórdia e
hospital e m Vila Rica.
"Lei d e 20 d e m a r ç o d e 1720, p o r q u e se p r o í b e q u e n i n g u é m [passe] a o
Brasil s e m passaportes, s e n ã o as pessoas providas e m cargos públicos.

N ú m e r o 20 [fl. 1 4 7 ]

L e i d e 10 d e m a r ç o d e 1720, p o r q u e é confiscado t o d o o o u r o q u e passa


p a r a o R e i n o sem ser registrado.
Provisão d e 12 d e j a n e i r o d e 17,19, p o r q u e foi criada a vila d e S ã o J o s é do
R i o das M o r t e s .
P r o v i s ã o d e 14 de j a n e i r o d e 1719, p o r q u e se excluiu a p r e t e n s ã o q u e o
g o v e r n a d o r , c o n d e d e A s s u m a r , teve de querer, c o m dois assessores, c o n h e c e r das
s e n t e n ç a s e m a i s d e s p a c h o s dos "juízes o r d i n á r i o s e ouvidores n a m e s m a f o r m a
q u e c o n h e c e m os g o v e r n a d o r e s d e A n g o l a , e se l h e disse q u e n ã o e r a d a s u a
profissão o j u l g a r d e causas e q u e q u a n d o os "ministros faltassem e m fazer justiça
l h e dessem c o n t a , deixando-os c o m a s u a jurisdição.
356

" C a r t a de 11 de j a n e i r o de 1719, p o r que se p e r d o o u a alteração que causou


a c o b r a n ç a dos "quintos d o p o v o d a vila d e Nossa S e n h o r a d a P i e d a d e do Pitangui,
e s t r a n h a d o - s e m u i t o a o c o n d e d e A s s u m a r ter-lhe p e r d o a d o s e m d a r p a r t e , e que
n u n c a fizesse o u t r a s e m e l h a n t e e só e m caso ajustado, e q u e n ã o admitisse de
novo o p r o m e t e r - s e e m seu n o m e .
*Lei d e 11 d e fevereiro d e 1719, p o r q u e se p r o í b e q u e n e n h u m a p e s s o a
possa levar o u r o p a r a fora das M i n a s , e m p ó ou e m b a r r a , sem ser fundido nas
casas, reais d e fundição das m e s m a s M i n a s .
"Provisão d e 16 de fevereiro d e 1718, p o r q u e se m a n d a d a r a c a d a "pároco
200 m i l "réis d a F a z e n d a R e a l , e q u e n ã o p o d e r i a m levar de " c o n h e c e n ç a u m a
"oitava d e c a d a pessoa e m e i a d e c a d a u m a de confissão, e que. o "bispo d o R i o
fizesse u m a t a x a ç ã o m o d e r a d a d o que d e v i a m levar.
P r o v i s ã o d e 8 de fevereiro d e 1719, p o r q u e se m a n d o u erigir "casas d e
fundição a o n d e seria m e t i d o todo o ouro e aí p a g o o q u i n t o , e teria c a d a oitava o
valor de 1.400 d o q u e entrasse e o valor de 1.000 réis c a d a oitava de o u r o e m p ó
q u e servisse p a r a o c o m é r c i o , permitindo-se usar dele.
Provisão d e 17 d e fevereiro d e 1720, p o r q u e foi c r i a d o " o u v i d o r p a r a o
S e r r o do F r i o , e d e s m e m b r a d o d a O u v i d o r i a d o R i o das V e l h a s , e n o m e a d o
A n t ô n i o R o d r i g u e s B a n h a , e que fosse desta capitania.
C a r t a de 26 d e m a r ç o d e 1721, p e l a q u a l se m a n d o u a d o m L o u r e n ç o fizesse
" r e g i m e n t o c o m dois o u v i d o r e s q u e tivessem a c a b a d o dos salários d a J u s t i ç a e
F a z e n d a , e o q u e se assentasse se desse logo provisionalmente a execução, e q u e
d e t u d o se desse conta.
C a r t a de 26 d e m a r ç o d e 1721, p o r q u e foi cometida a "residência do c o n d e
d e A s s u m a r , c o m o g o v e r n a d o r de: S ã o Paulo e M i n a s , a Rafael Pires P a r d i n h o ,
o u v i d o r de S ã o Paulo.
"Alvará de 26 d e m a r ç o d e 1 7 2 1 , p o r q u e el-rei. c o n f i r m o u o p e r d ã o q u e
c o n c e d e u o c o n d e de A s s u m a r sobre a alteração do p o v o d e Vila R i c a .
A 2 4 de m a r ç o de 1730 foi criado o lugar d e "juiz d e fora d o R i b e i r ã o .
P r o v i s ã o d e 4 d e n o v e m b r o d e 1732,, p o r q u e se e s t r a n h a e p r o í b e aos
governadores n o m e a r e m ajudantes e escreventes, p o r ser r e s e r v a d a esta jurisdição
a el-rei.
Provisão p o r que se dá p a r t e ter-se m a n d a d o erigir e criado n o dia 3 d e j u l h o
d e 1734 u m a "relação p a r a o R i o d e J a n e i r o c o m dez " d e s e m b a r g a d o r e s , incluin-
d o o " c h a n c e l e r , e que tinha a m e s m a alçada e os m e s m o s o r d e n a d o s e "propinas
q u e a d a Bahia, e que v ã o as apelações p a r a a Suplicação.
C a r t a d e 23 d e abril de 1745, p o r que [foi] criada cidade a vila do R i b e i r ã o
d o C a r m o , chamãndo-se-lhe C i d a d e M a r i a n a .
E m 1752 se criou a R e l a ç ã o do R i o d e J a n e i r o c o m dez d e s e m b a r g a d o r e s ,
c o m o chanceler, sendo o m e s m o e m t u d o q u e a da Bahia, e t o m o u posse e m u m
s á b a d o dia 15 d e j u l h o do m e s m o a n o .
357

M a r t i n h o Vieira, terceiro "ouvidor d e Vila [Rica] e m 2 8 d e n o v e m b r o d e


1718.
J o ã o Lopes L o u r e i r o , [ n o m e a d o ] e m 21 d e agosto d e 1 7 2 1 , q u e faleceu logo
depois q u e t o m o u posse, e n o m e o u d o m L o u r e n ç o , g o v e r n a d o r q u e e n t ã o e r a ,
e m seu lugar a o "provedor d a F a z e n d a , A n t ô n i o B e r q u ó del-Rio, e m 16 d e feve-
reiro de. 1722, cuja n o m e a ç ã o se l h e e s t r a n h o u / / e r e v a l i d a r a m os processos. [ fl. 147v. ]
J o ã o P a c h e c o Pereira, n o m e a d o e m 9 d e j u n h o de 1723.
J o ã o d e A z e v e d o Barros, n o m e a d o e m 22 de m a r ç o de 1728.
Sebastião d e S o u s a M a c h a d o , [ n o m e a d o ] e m 7 de fevereiro d e 1731. E a 24
d e o u t u b r o d e 1 7 3 3 , escreveu S u a M a j e s t a d e a F e r n a n d o L e i t e L o b o , o u v i d o r
q u e e r a d o R i o de J a n e i r o , p a r a q u e fosse a Vila R i c a t o m a r c o n h e c i m e n t o das
culpas de q u e era arguido, e q u e , s u s p e n d e n d o - o , entrasse a servir o dito c a r g o
c o m o lugar de p r i m e i r o " b a n c o p o r t e m p o de três a n o s .
C a e t a n o F u r t a d o d e M e n d o n ç a , p r o v i d o e m 14 de o u t u b r o d e 1739 e t o -
m o u posse e m 10 d e m a r ç o d e 1740.
J o s é A n t ô n i o d e Oliveira M a c h a d o , posse e m 5 de o u t u b r o d e 1744.
C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o , posse e m 12 de fevereiro de 1749 e p r o v i d o e m
3 d e agosto.
Francisco A n g e l o Leitão, posse e m 28 de agosto de 1752.
J o s é Pio F e r r e i r a S o u t o , posse [incompleto].
"Provisão d e 13 d e m a i o d e 1722, p o r que. se m a n d o u a o p r o v e d o r d a F a - [ fl, 1 4 8 ]
z e n d a , B e r q u ó , m a n d a s s e u m a relação distinta das " p r o p i n a s q u e se l e v a m das
a r r e m a t a ç õ e s dos "contratos q u e se a r r e n d a m nas M i n a s d e c l a r a n d o ô q u e c a d a
u m d e *per se leva e c o m q u e o r d e m . N ã o h o u v e r e s o l u ç ã o n e s t a m a t é r i a , m a s
t a m b é m p o u c o depois se e n t r a r a m a fazer as a r r e m a t a ç õ e s dos contratos no C o n -
selho U l t r a m a r i n o .
Provisão d e 2 de m a i o de 1747. Sou servido declarar q u e dos contratos q u e
se a r r e m a t a s s e m nessas M i n a s se devem as p r o p i n a s aos p r o v e d o r e s q u e fazem as
a r r e m a t a ç õ e s e q u e pelo t r a b a l h o delas as t ê m vencido, p o r é m pelo q u e respeita
às a r r e m a t a ç õ e s q u e se c e l e b r a m nesta C o r t e se h ã o d e satisfazer a o t e m p o e m q u e
os " c o n t r a t a d o r e s t o m a r e m posse d a a d m i n i s t r a ç ã o d o c o n t r a t o , p a g a n d o - s e aos
provedores q u e o forem n a q u e l e t e m p o . E assim se deve observar c o m o p r o v e d o r
atual, p r a t i c a n d o - s e o m e s m o c o m os "oficiais d a P r o v e d o r i a , o b s e r v a n d o - s e o
m e s m o p a r a o futuro.
P r o v i s ã o d e 28 d e fevereiro d e 1720, p o r q u e , r e q u e r e n d o a C â m a r a d e
M a r i a n a se ampliasse nestas M i n a s as leis d e se d a r o dinheiro a j u r o de 6 Vi p o r
100, se lhe n ã o deferiu a este respeito, fazendo-se dele consulta.
"Carta de 16 de m a r ç o de 1731, p o r q u e se n ã o convém no ajuste q u e fez d o m
L o u r e n ç o n o descoberto dos diamantes a 5 mil "réis p o r c a d a escravo, p o r serem
maiores as conveniências. N a muito a b u n d â n c i a de diamantes, se o r d e n a se suspen-
da este ajuste findo o a n o dele e m a n d a se d ê e m de a r r e n d a m e n t o as terras, rece-
358

bendo-se p o r equivalente do *quinto preço do a r r e n d a m e n t o , c o m o se pratica nas


m i n a s das índias e nas d e H o l a n d a Oriental, e q u e p a r a este a r r e n d a m e n t o se esco-
lhessem dois ou três ribeiros p a r a se a r r e n d a r e m , proibindo-se fora deles o u t r a ex-
tração c o m graves p e n a s , cujo a r r e n d a m e n t o se faria p o r u m ou dois anos, e n ã o
h a v e n d o lançadores se lavrariam u m o u dois ribeiros p o r c o n t a d a F a z e n d a R e a l ,
proibindo-se q u e o u t r a q u a l q u e r [pessoa] possa trabalhar, c o m a p e n a d e degredo
de dez anos p a r a Angola e confisco d e todos os seus bens; foi p u b l i c a d a e m 7 d e
j a n e i r o d e 1732. N i n g u é m quis a r r e m a t a r , n a incerteza de que, medindo-se as terras
às "braças, poderia n ã o h a v e r nelas diamantes. E p o r q u e ficara i m p e d i d a a extra-
ção, prejudicado o público, q u e se retirava do Serro, e j u n t a m e n t e el-rei, saiu no dia
22 d e abril d e 1732 outro " b a n d o , que visto o d a n o q u e se seguia à F a z e n d a R e a l e
vassalos fazia continuar ele, governador d o m L o u r e n ç o , o u t r a vez a m e s m a "capitação
[ fl. 148v. ] dos escravos, visto se lhe dava p o r c a d a u m / / 20 mil p o r a n o e q u e só p o r u m se
verificaria aquele ajuste de, q u e dava conta a el-rei.
"Provisão d e 13 d e n o v e m b r o d e 1 7 3 2 , p o r q u e os "juízes o r d i n á r i o s n ã o
l e v e m salários e q u e dos taxados aos "ouvidores e juízes de f o r a se n ã o c o b r e m
q u i n t a d o s , m a s sim à r a z ã o d e 1,320 ["réis a "oitava], n a f o r m a do " r e g i m e n t o ,
q u e era o valor d o o u r o q u e corria n o a n o d e 1721, e m q u e . s e fez.
Provisão d e 24 d e d e z e m b r o d e 1734, p o r q u e se m a n d a q u e — p e l a r a z ã o d e
p e r t e n c e r e m a o rei as minas dos d i a m a n t e s a c h a d o s nos seus domínios, d a m e s m a
f o r m a q u e as dos mais metais, e q u e pelo c o s t u m e dos domínios e m q u e se a c h a m
os d i a m a n t e s são p a r a o s o b e r a n o reservados os d e m a i o r g r a n d e z a , e q u e a i n d a
nas terras e m q u e p e r m i t i a a extração dos d i a m a n t e s — ficassem reservados p a r a a
s u a F a z e n d a os q u e forem de peso de vinte "quilates ou daí p a r a c i m a e q u e as
pessoas q u e os a c h a s s e m os entregassem logo d e n t r o de trinta dias nas "casas d e
fundição o u aos *ministros vizinhos p a r a os r e m e t e r e m a elas, fazendo-se a u t o d e
t u d o p e l o seu "escrivão, q u e seria remetido ao g o v e r n a d o r . E sendo os ditos dia-
m a n t e s entregues e manifestados p o r q u a l q u e r escravo, ficaria forro e se lhe passa-
ria, e m n o m e do rei, carta d e alforria pelo ministro ou " s u p e r i n t e n d e n t e a q u e se
fizesse a e n t r e g a e se daria a o senhor do n e g r o 4 0 0 mil réis pelo seu valor, pagos
da sua F a z e n d a , e s e n d o p o r h o m e m livre feita a dita e n t r e g a se lhe d a r i a m os
ditos 4 0 0 mil reis; e q u e os ditos d i a m a n t e s q u e d a q u i e m d i a n t e n ã o fossem
entregues ficassem perdidos p a r a a F a z e n d a R e a l e m q u a l q u e r m ã o e m q u e forem
a c h a d o s , e se p o d e r i a d e n u n c i a r q u e m os tinha c o m 400 mil réis p a r a o d e n u n c i -
ante s e n d o livre, e s e n d o escravo terá a l i b e r d a d e c o m o a c i m a , e se d e n u n c i a r seu
s e n h o r t e r á a l i b e r d a d e e m a i s 200 mil réis, e o s e n h o r n a d a , t u d o d e p o i s d e
p r o v a d o e sendo a c h a d o s oS d i a m a n t e s q u e se d e n u n c i a r e m .
[ fl. 149 ] "Alvará d e 4 d e m a r ç o d e 1 7 1 7 , p o r q u e se o r d e n o u tivesse o "secretário
deste g o v e r n o 600 mil [réis] c a d a a n o , e pelo q u e respeita aos p a p é i s q u e escrever
levasse o tresdobro d o q u e c o s t u m a v a levar o secretário do R i o de J a n e i r o .
Alvará d e 16 d e fevereiro de 1716, p o r q u e se m a n d o u d a r d e " c ô n g r u a aos
"párocos 200 m i l réis.
" A l v a r á d e 4 d e j u n h o d e 1 7 1 8 , p o r q u e se m a n d o u q u e o o r d e n a d o d e
" g o v e r n a d o r fosse d e oito mil "cruzados sendo d e dez, e o dos *ouvidores a 500
mil "réis sendo d e 600 mil réis, e o d e "secretário d e 4 0 0 mil réis s e n d o d e 6 0 0
mil réis, e q u e os ditos o r d e n a d o s se p a g u e m e m m o e d a , o q u e se p r a t i c a r i a c o m
os sucessores de todos os atuais, e n ã o c o m eles e n q u a n t o servissem.
Alvará de 20 d e m a i o d e 1719, p o r q u e se d e c l a r o u q u e as d u a s t r o p a s d e
cavalos "dragões, c a d a u m a de 60 h o m e n s , q u e se t i n h a m c r i a d o fossem p a g o s ,
assim soldados c o m o oficiais, pelo soldo e m q u á d r u p l o do q u e v e n c e m os q u e ser-
v e m n o R e i n o , menos a "arca e contrato, q u e deixou a o arbítrio d o governador p a r a
deixá-la aos "capitães ou à conta d a F a z e n d a R e a l , e ficou nesta última p a r t e , e assim
se observa e declarou fossem os ditos soldos pagos a m o e d a , e n ã o a "oitavas.
O p r i m e i r o ouvidor do S e r r o do Frio, A n t ô n i o R o d r i g u e s B a n h a , p r o v i d o n o
princípio do a n o d e 1720.
A l v a r á d e 16 d e m a i o d e 1722, p o r q u e se a u m e n t a r a m m a i s q u a t r o mil
c r u z a d o s aos oito q u e Unha d e r e n d a o g o v e r n a d o r , ficando c o m d o z e , q u e a i n d a
hoje conserva, d a n d o a r a z ã o d e ser j u s t o q u e os q u e servem nas c o n q u i s t a s t e ;
n h a m soldos c o m q u e p a s s e m c o m o d a m e n t e .
A l v a r á d e 31 d e o u t u b r o d e 1722, p o r q u e se a u m e n t a a o " p r o v e d o r m a i s
u m "conto d e réis d e ajuda de custo, além dos 600 mil réis q u e j á t i n h a d e o r d e -
n a d o , p a r a se t r a t a r c o m a decência precisa e p o r ser j u s t o q u e os q u e servem nas
conquistas t e n h a m c o m q u e passar c o m o d a m e n t e .
P o r "decreto d e 18 d e m a i o de 1722 se o r d e n o u se n o m e a s s e m as "serventias
dos "ofícios das M i n a s (menos os d e r e c e b i m e n t o ) e se p a g u e m deles as "terças
partes.
"Provisão d e 18 d e abril d e 1722, p o r q u e se declara q u e o "auditor-geral é
a q u e l e o u v i d o r e m cuja c o m a r c a residir o general.
P o r decreto d e 5 d e j u n h o d e 1722 foi d a d o o oficio de "escrivão d a O u v i d o r i a
d e V i l a R i c a a A l e x a n d r e d e G u s m ã o e seu i r m ã o B a r t o l o m e u L o u r e n ç o d e
G u s m ã o , sendo duas p a r t e s p a r a este e u m a p a r a aquele.
Provisão d e 12 d e m a i o de 1723, p o r q u e se m a n d o u r e m a t a s s e m e m Lisboa
os " c o n t r a t o s .
P o r decreto de 6 de d e z e m b r o d e 1731 se m a n d o u se t o r n a s s e m a a r r e m a t a r
nestas M i n a s as "rendas.
Alvará d e 16 de m a r ç o d e 1731, p o r q u e se o r d e n o u q u e e m c a d a u m a das
c o m p a n h i a s se a u m e n t a s s e m q u a r e n t a soldados, e m a t e n ç ã o a ser preciso a c u d i r
às novas m i n a s d o S e r r o do Frio.
Provisão d e 21 de abril de 1733, p o r q u e se o r d e n a se p a g u e aos "ministros
do C o n s e l h o [ U l t r a m a r i n o ] e mais "oficiais as "propinas dos contratos q u e a q u i se
a r r e m a t a r e m c o m o se lá o fossem.
Alvará de 29 d e o u t u b r o d e 1733, p o r q u e se r e g u l a r a m os o r d e n a d o s dos
"intendentes e mais oficiais p a r a a "capitação: o intendente 1 conto e 600 mil, "fiscal
500 mil, 600 mil o escrivão, 400 mil o "tesoureiro e 200 mil réis o "meirinho.
360

" D e c r e t o d e 3 de j a n e i r o de 1735, p o r q u e se m a n d a p a g a r o m e s m o o r d e n a -
d o d e " g o v e r n a d o r das M i n a s a G o m e s Freire, q u e m a n d a i n t e r i n a m e n t e substi-
tuir a o c o n d e das Galveias, c o m e ç a n d o à vêncê-lo do d i a q u e e n t r a r n o distrito da
capitania até a o e m q u e sair dela.
"Alvará d e 21 de m a r ç o d e 1734, p o r q u e se d ã o livres os escravos dos ecle-
siásticos, g o v e r n a d o r e s e "ministros.
[ fl. 149v. ] Certidão d e 1714 do escrivão da F a z e n d a d a Bahia, e m que se dão nas festivi-
dades áo governador 9 "arrobas de "cera, a o "proyedor-mor 4 arrobas e meia etc.
D e c r e t o de 3 de fevereiro d e 1741, p o r q u e se m a n d o u se dessem por "donativo
os "ofícios.
"Provisão d e 13 d e agosto de 1738, p o r q u e se m a n d o u fazer a o b r a deste
palácio, p o r se dizer q u e custaria 20 mil "cruzados e p o r se d i z e r q u e n a . f o r m a q u e
se a p o n t a v a ficava u m a c o m p a n h i a de cavalos, g o v e r n a d o r , "provedoria, "inten-
dência, a r m a z é n s e secretaria debaixo de u m a g u a r d a , a q u a l se segurava c o m u m
r e d u t o d e q u a t r o peças q u e a q u i há; s e m haver o u t r a a l g u m a o r d e m , se foi conti-
n u a n d o a o b r a à disposição do g o v e r n a d o r , q u e passou de c e m mil c r u z a d o s , e só
de c a n t a r i a se p a g a r a m a m e d i ç ã o 19 mil e 500 cruzados.
[ fl. 150 ] Alvará d e 27 d e o u t u b r o d e 1733, p o r q u e se p r o í b e abrirem-se novos cami-
n h o s ou picadas p a r a quaisquer minas, t a n t o q u e nelas se tiver j á d a d o f o r m a d a
a r r e c a d a ç ã o d a F a z e n d a R e a l , e sendo preciso se lhe faça p r e s e n t e c o m a p e n a
m e s m a dos q u e " d e s e n c a m i n h a m o u r o .
Alvará d e 26 d e m a r ç o d e 1 7 2 1 , p o r q u e se o r d e n a q u e os escravos q u e se
c o m p r a r e m fiados p a r a m i n e r a r e se n ã o p u d e r e m p a g a r no t e m p o c o m i n a d o p o r
faltarem as "faisqueiras se avaliem p o r dois h o m e n s peritos, e os credores os to-
m e m pela avaliação no caso q u e os lanços que levarem e m p r a ç a n ã o c h e g u e m à
avaliação, t u d o feito e m beneficio dos mineiros e p o r a t e n ç ã o à g r a n d e diminui-
ção p o r q u e lhes e r a m a r r e m a t a d o s , n ã o p o d e n d o pagá-los.
Provisão d e 24 d e fevereiro d e 1720, p o r q u e se o r d e n a sejam s u m á r i a s as
c a u s a s das t e r r a s e á g u a s m i n e r a i s , p e l o g r a n d e p r e j u í z o q u e resulta d e s e r e m
o r d i n á r i a s e estarem,, c o m as apelações e mais d e m o r a s , e m p a t a d o s os serviços e
extração do o u r o .
Lei de 10 d e m a r ç o d e 1720, p o r q u e se m a n d a confiscar t o d o o o u r o , b a r r a
ou dinheiro q u e foi do Brasil sem ser registrado.
Provisão d e 18 de fevereiro d e 1719, p o r q u e se m a n d a r a m e x t e r m i n a r das
M i n a s todos os ourives e pessoas q u e tivessem exercido este ofício d e n t r o d e três
meses, c o m a p e n a de confiscação de bens e seis anos d e d e g r e d o p a r a á í n d i a , e
p o r provisão d e 18 d e j u n h o de 1725 foi declarada esta o r d e m , dizendo-se q u e se
n ã o e n t e n d i a daqueles q u e t i n h a m sido ourives e j á n ã o u s a v a m dos ofícios e só
e x e r c i a m o m i n e r a r ou o u t r a o c u p a ç ã o .
Provisão d e 16 de maio de 1722, p o r q u e se fez caso de "devassa o fabricar-
se o u r o falso e q u e os "ouvidores a tirem e se p r o c e d a n a forma d a O r d e n a ç ã o ,
livro 5, título [57?].
361

"Provisão d e 9 d e m a i o d e 1725 ao "ouvidor do O u r o P r e t o , p o r q u e se lhe


o r d e n a n ã o consinta q u e as pessoas q u e e m "ofícios vierem p r o v i d a s v e n d a m as
"serventias.
Provisão d e 4 de n o v e m b r o d e 1726, p o r q u e se o r d e n a q u e os "juízes ordi-
nários e seus "oficiais v e n ç a m c a m i n h o s das diligências a q u e forem sendo m a i s d e
u m a "légua.
Provisão d e 16 de m a r ç o d e 1729, p o r q u e se p r o í b e se n ã o rifem fazendas
a l g u m a s e q u e se d e n u n c i e dos q u e g a n h a r e m as ditas rifas a q u e p e r c a m o valor
delas, m e t a d e p a r a o d e n u n c i a n t e e a o u t r a p a r a a F a z e n d a R e a l , e se repetiu p o r
carta d e 15 d e abril de 1732.
" C a r t a d e 8 de fevereiro d e 1730, p o r q u e se r e p e t e a expulsão dos ourives e
se p r a t i q u e m as o r d e n s q u e h á e a "resolução d e 4 d e m a i o d e 1 7 1 3 .
"Alvará d e 8 d e fevereiro de 1730, p o r q u e se p r o í b e n ã o c o r r a n a s M i n a s
o u r o e m p ó , m a s sim e m b a r r a s e m o e d a .
" B a n d o de d o m L o u r e n ç o d e A l m e i d a d e 26 d e m a r ç o d e 1730, p o r q u e
d e c l a r a q u e o r d e n a n d o - l h e / / Sua M a j e s t a d e , e p o r carta de sua m ã o real, fizesse [ fl. 150v. ]
a r r e m a t a r os " q u i n t o s p o r " c o n t r a t o s , p a r a v e r se se e v i t a v a m os g r a n d e s
" d e s c a m i n h o s d o o u r o e m grave prejuízo d e sua F a z e n d a , e q u e p o n d o "editais
p a r a d a r a execução esta o r d e m , v e n d o q u e os lanços e r a m m u i t o d i m i n u t o s e e m
m a i o r prejuízo, sendo a i n d a mais prejudiciais as condições q u e p r o p u n h a m e ser
g r a n d e o r o u b o q u e se fazia d o ouro s e m p o d e r evitar-se pelo dito b a n d o , decla-
rava q u e t o d a a pessoa q u e levasse o u r o à C a s a d e F u n d i ç ã o p a g a r i a s o m e n t e p a r a
el-rei 12 p o r 100 e q u e este a b a t i m e n t o dos 8 p o r 100 se observaria e n q u a n t o o
m e s m o s e n h o r n ã o m a n d a s s e o contrário, a q u e m d a v a p a r t e , o q u e se n ã o a b r a -
çou, antes m a n d o u r e n d e r a o g o v e r n a d o r .
C a r t a d e 17 d e n o v e m b r o de 1710 p a r a o R i o d e J a n e i r o , e m q u e se o r d e n a
a todos os ouvidores-gerais tirem "devassa dos casos de m o r t e , sem e m b a r g o d e as
t e r e m tirado os juízes ordinários, p e l a r a z ã o de s e r e m contínuos os delitos e malti-
r a d a s as devassas pelos ditos juízes e p o u c o c u i d a d o n o castigo.
Alvará p o r resolução d e p r i m e i r o d e m a r ç o de 1732, p o r q u e se p r o í b e q u e
saiam do Brasil m u l h e r e s sem licença d e el-rei.
P r o v i s ã o d e 27 d e j u n h o d e 1 7 3 3 , p o r q u e se m a n d o u q u e os " s u p e r i n -
tendentes q u e t i n h a m dezoito "oitavas d e c a d a vistoria e seis oitavas d e c a m i n h o
tivessem dez oitavas de vistoria e q u a t r o oitavas d e c a m i n h o ; a o "escrivão, q u e
t i n h a 9 p o r vistoria e d e c a m i n h o 3, fique c o m 2 d e c a m i n h o e 5 d e vistoria; aos
"guardas-mores, q u e t i n h a m 12 d e vistoria e de c a m i n h o 4, fiquem e m 6 d e visto-
ria e d e c a m i n h o 3; os seus escrivães, q u é t i n h a m 6 d e vistoria e d e c a m i n h o 2,
fiquem e m 3 de vistoria e de c a m i n h o as m e s m a s 2; e q u e a c â m a r a , nas vistorias
q u e faz d e n t r o d a vila, de q u e t i n h a 32, fique e m 16, e q u e e m t u d o o m a i s se
observasse o " r e g i m e n t o .
Provisão de 11 de m a r ç o de 1738, p o r q u e se p r o í b e q u e os "ministros das
conquistas tirem e n q u a n t o servem certidões e atestações e m seu a b o n o , e q u e a
362

semelhantes papéis se n ã o a t e n d a n o livramento das culpas q u e tiverem nas "resi-


dências, e q u e só possam tirar certidões d o q u e constar de autos.
"Provisão d e 16 de fevereiro de 1718, p o r q u e se declara q u e , a t e n d e n d o a
c o n t a que d e r a m os "oficiais d a C â m a r a de Vila Rica no a n o de 1716, a 6 d e j u l h o ,
e m c o m o p r o v e n d o o "bispo d o R i o vigararia nestas M i n a s desde o princípio delas e
a a m b i ç ã o d e c a d a u m introduzira que as pessoas de c o m u n h ã o pagassem c a d a u m a
pela "desobriga u m a "oitava e as de confissão meia, sem mais o r d e m q u e a das suas
vontades, e q u e fazendo p o n d e r a ç ã o nestes excessos a c h a m importar as desobrigas
tanto c o m o os "quintos, e que neles se devia dar providência, visto lha n ã o ter d a d o
o bispo, a q u e m se recorrera por vezes. E sendo igualmente a m u i t a r e n d a dos "pá-
rocos causa dos seus muitos excessos e m a u s procedimentos, e talvez piores q u e os
seculares, e q u e a l é m disto s e n d o as ditas igrejas do " p a d r o a d o real, n ã o devia
"apresentá-las o bispo, m a s sim Sua Majestade, como costumava nas mais partes da
América, e que, além disto, se. seguia que, c o m o os. de. c o m u n h ã o p a g a v a m a u m a
oitava, c u i d a v a m e m d a r logo c o m u n h ã o aos negros ainda sem toda a instrução n a fé
p a r a q u e mais lhes rendessem, e a t e n d e n d o a tudo, e se se terem d a d o aos reis, seus
predecessores, a investidura dos "dízimos pelos S u m o s Pontífices c o m a obrigação
d e ter cuidado no b e m espiritual das almas e sustentar q u e m as pastoreie, se ordena-
va se dessem d a sua F a z e n d a 200 mil réis d e "côngrua a c a d a p á r o c o e q u e ao bispo
se o r d e n a v a fizesse logo u m a taxa de e m o l u m e n t o s m o d e r a d a , a t e n d e n d o a dita
c ô n g r u a , t e n d o cuidado n ã o e x c e d a m os p á r o c o s a dita taxa, e fazendo-o p r o c e d a
Tseveramente c o n t r a os culpados, d a n d o 1 conta d a taxa q u e fizer.
[ fl. 151 ] J o s é Pereira de M o u r a , "juiz p o r provisão de 23 d e o u t u b r o de 1733 e c u m -
p r i d a e m 23 de j u l h o d e 1734, r e c o n d u z i d o p o r decreto de 17 d e abril d e 1738,
registrada e m 5 de j a n e i r o d e 1739.
E m 30 de j u n h o d e 1735, no palácio d e Vila Rica, e m p r e s e n ç a d o governa-
d o r G o m e s Freire, M a r t i n h o d e M e n d o n ç a e " p r o c u r a d o r e s das " c â m a r a s destas
M i n a s , se fez t e r m o d a m u d a n ç a d a c o b r a n ç a dos q u i n t o s p o r " c a p i t a ç ã o nos
escravos e m lugar dos q u e se c o b r a v a m pelas "casas d e fundição; q u e pelos p r o c u -
radores das c â m a r a s d a Vila do Príncipe, S a b a r a e C a e t é , ou Vila N o v a d a R a i n h a
foi i m p u g n a d o , j u l g a n d o m a i s c o n v e n i e n t e a c o b r a n ç a pelas casas d e f u n d i ç ã o ,
m a s ficaram vencidos e m votos. E o m o d o d a c o b r a n ç a da capitação foi n o m e s m o
dia feita p o r t e r m o n a f o r m a seguinte: c a d a escravo 4 oitavas e 3 / 4 , os negros
forros o m e s m o , e d a m e s m a forma os "ofícios; as "lojas g r a n d e s a vinte e q u a t r o
oitavas, as m e d í o c r e s a dezesseis oitavas e as inferiores a oito oitavas; as negras
cativas q u e estivessem e m "vendas dezesseis oitavas s o m e n t e *per se e v e n d a , e q u e
as v e n d a s p a g a s s e m a dezesseis oitavas.
Por "portaria de d o m L o u r e n ç o de Almeida, governador destas M i n a s , d e 18
d e j u n h o de 1726, resolveu o m e s m o q u e por ser mais conveniente ao serviço d e el-
rei q u e ele, g o v e r n a d o r , fosse residir e m Vila R i c a , o n d e h a v i a m a i s p o v o e se
a c h a v a m os "ministros todos e as casas da m o e d a e fundição, e visto q u e t a m b é m era
363

d e p o v o bastante, a vila do C a r m o e p r e c i s a v a d e q u e m a regesse, elegia p a r a a


governar o *capitão-mor d a m e s m a Rafael da Silva e Sousa, e foi este o primeiro
*juiz ordinário desta vila e m 1715.
"Provisão d e 14 de m a r ç o de 1744 e registrada e c u m p r i d a e m o u t u b r o do
mesmo ano.
" C a r t a d e 2 3 d e abril d e 1745, p o r q u e foi c r i a d a c i d a d e c o m o n o m e d e
M a r i a n a a vila do R i b e i r ã o do C a r m o , a t e n d e n d o a ser a mais antiga das M i n a s e
q u e r e r el-rei nela erigir sé e residência d e "bispo, q u e t e m p e d i d o .
E m 1711 criou A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e , p r i m e i r o " g o v e r n a d o r de M i n a s ,
algumas vilas e fez eleger "vereadores, q u e t u d o lhe foi a p r o v a d o p o r c a r t a d e el-
rei d e 31 d e o u t u b r o d e 1 7 l 2 .
0 R i b e i r ã o foi criada p r i m e i r a vila p o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e e m 1711 e
p o r carta de 14 de abril d e 1712 foi confirmada p o r el-rei, ficando c o m o n o m e d e
Vila de Nossa S e n h o r a do C a r m o somente, e n ã o t a m b é m c o m o título de
A l b u q u e r q u e n o fim, o q u e assim declarou a o r d e m .
A n t ô n i o C o r r e i a e J o s é M a s c a r e n h a s f o r a m os dois p a d r e s d a C o m p a n h i a
[de Jesus] q u e v i e r a m p a r a estas M i n a s e m c o m p a n h i a do g o v e r n a d o r c o n d e d e
.Assumar.
C a r t a p o r q u e foi criado o lugar d e juiz d e fora d o R i b e i r ã o e p r o v i d o nele
A n t ô n i o Freire d a F o n s e c a O s ó r i o , c o m p r o m e s s a d e lugar d e p r i m e i r o " b a n c o
sem c o n c u r s o , t e n d o j á dois lugares servido, e t e m d a t a de 2 3 d e j a n e i r o d e 1731
e registrada e m 10 de j u l h o d e 1 7 3 1 .
E m 10 d e o u t u b r o de 1744 t o m o u posse o d o u t o r J o s é C a e t a n o G a l v ã o d e
juiz [de fora]. E m 1748 lhe sucedeu o d o u t o r Francisco  n g e l o Leitão. E m m a i o
d e 1751 lhe sucedeu o d o u t o r Silvério Teixeira.
"Alvará d e 12 d e j u l h o de 1712, p o r q u e se o r d e n a q u e n a falta d e "ouvidor [ fl. 152 ]
nas terras e m q u e n ã o h á juiz d e fora sirva o seu lugar o juiz o r d i n á r i o e n a falta
deste o v e r e a d o r mais velho.
Provisão d e 19 de d e z e m b r o de 1748, p o r q u e se o r d e n a q u e os ^intendentes
da "capitação substituam os lugares dos ouvidores nas suas faltas n ã o h a v e n d o nas
terras, ou c o m a r c a s juízes de fora.
Provisão de 21 d e fevereiro d e 1729, p o r q u e se declara tinha a C â m a r a d e
M a r i a n a o p r i m e i r o lugar nas "juntas e m q u e c o n c o r r e r c o m as outras.
Provisão d e 24 de fevereiro d e 1 7 3 1 , p o r q u e se m a n d a se faça j u n t a nesta
vila c o m os q u a t r o ouvidores, " p r o v e d o r d a F a z e n d a e juiz d e fora do R i b e i r ã o ,
n a p r e s e n ç a do g o v e r n a d o r , e q u e nela se sentenciassem, s e m a p e l a ç ã o e a g r a v o ,
a t é à m o r t e inclusive, os b a s t a r d o s , "carijós, n e g r o s e m u l a t o s , e q u e h a v e n d o
e m p a t e decida o g o v e r n a d o r .
C a r t a d e 24 de o u t u b r o d e 1733, p o r q u e se o r d e n a a F e r n a n d o Leite L o b o ,
ouvidor-geral d o R i o d e J a n e i r o , passe a esta c o m a r c a e t o m e c o n h e c i m e n t o das
culpas d e q u e era arguido o ouvidor dela, Sebastião d e S o u s a M a c h a d o , q u e se
lhe expressavam, e q u e , s u s p e n d e n d o - o , entrasse a servir o seu lugar p o r t e m p o
.364

d e três a n o s c o n c e d e n d o - l h e p e i a dita carta toda a jurisdição necessária e n q u a n t o


;

n ã o c h e g a v a m os d e s p a c h o s q u e se l h e m a n d a v a m e x p e d i r e s e r v i r i a c o m
"predicamento de primeiro "banco.
"Provisão de 12 de d e z e m b r o de 1734, p o r q u e se d e c l a r a q u e , a t e n d e n d o -
se às representações das c â m a r a s destas M i n a s n a g r a n d e v e x a ç ã o q u e p a d e c i a m
n a dilação dos recursos à Bahia, se erigisse no R i ó d e J a n e i r o u m a "relação c o m a
m e s m a a l ç a d a q u e a da Bahia e q u e o distrito dela seria d e t u d o o q u e ficasse p a r a
a p a r t e d o Sul até o rio d a P r a t a e d e t u d o o q u e tocasse a M i n a s .
P r o v i s ã o d e 18 d e agosto d e 1739, p o r q u e se d e c l a r a q u e n ã o p o d e m os
" o u v i d o r e s s e n t e n c i a r d e *per se c o m apelo p a r a a B a h i a os m u l a t o s , "carijós e
negros, m a s só e m "junta, p a r a q u e seja m a i s p r o n t o o castigo.
" D e c r e t o de 18 d e m a i o d e 1722, e m q u e se o r d e n a q u e as p r o p r i e d a d e s dos
"ofícios q u e d e n o v o se h a v i a m c r i a d o nas c o n q u i s t a s d o Brasil e dos q u e p a r a
a d i a n t e se criassem (exceto os de recebimento) se provessem p o r "donativo p a r a a
F a z e n d a R e a l e q u ê e n q u a n t o n ã o t i v e s s e m p r o p r i e t á r i o c o n t r i b u í s s e m os
"serventuários no fim do a n o c o m a terça p a r t e do q u e d e n t r o dele rendessem.
D e c r e t o de 2 d e d e z e m b r o d e 1740, p o r q u e se o r d e n a q u e a dita contribui-
ç ã o do d e c r e t o a c i m a q u e se p r a t i q u e t a m b é m [nas] "serventias dos ofícios e m
q u a l q u e r t e m p o criados q u e estivessem vagos ou v a g a r e m e estiverem e m termos
d e se p r o v e r e m , e n q u a n t o S u a M a j e s t a d e fosse servido, p o s t o q u e n o t e m p o do
sobredito decreto tivessem ou depois dele h a j a m tido p r o p r i e t á r i o s .
Provisão d e 19 de s e t e m b r o d e 1742, q u e serão p o r correntes as "residências
dos "ministros d o Brasil s e m certidão d a R e l a ç ã o d a Bahia, p o r q u e conste t e r e m
c u m p r i d o as o r d e n s dela.
[ fL 152v. ] P o r decreto d e 14 de m a r ç o d e 1743 se m a n d o u q u e os ofícios d e justiça se.
conservassem n o estilo e m q u e se a c h a v a m q u a n d o se a r r e n d a r a m sem inovação
a l g u m a , regulando-se os e m o l u m e n t o s pelos regimentos a p r o v a d o s e n a falta pelo
c o s t u m e , e q u a n d o houvesse a l g u m a coisa q u e nesta m a t é r i a se precisasse d e p r o -
vidência, se l h e fizesse p r e s e n t e , e q u e s o b r e isto se p e r g u n t a s s e n a s residências
dos ministros.
Provisão d e 12 d e maio d e 1744, p o r q u e se o r d e n a aos ouvidores n ã o sen-
t e n c i e m os recursos c o m o "juízes da C o r o a s e m adjuntos, c o m o até ali se observa-
v a , e q u e fossem adjuntos dois ministros "letrados atuais q u e o g o v e r n a d o r n o m e -
asse e n t r e os desta vila e R i b e i r ã o , e n a sua [falta] alguns a d v o g a d o s d e b o a cons-
ciência ou eclesiástico f o r m a d o , a q u e m daria j u r a m e n t o .
Provisão de 2 9 de m a i o d e 1744, p o r q u e se o r d e n a sirvam os sindicantes os
lugares dos ouvidores n o m ê s d a residência, a i n d a q u e esteja p r e s e n t e o o u v i d o r
d e novo p r o v i d o , o q u e se n ã o praticaria assim se se m a n d a s s e tirar segunda resi-
dência a t e m p o q u e o seu sucessor tiver j á d e posse, p o r n ã o ser j u s t o largar o lugar
p e l a c u l p a d o seu antecessor.
365

*Provisão d e 31 de d e z e m b r o d e 1735, p o r q u e se m a n d o u q u e c o m o n ú -
m e r o de q u a t r o "ministros j u n t a m e n t e se fizesse nesta vila "junta e m q u e se sen-
tenciasse à m o r t e os negros, m u l a t o s e "carijós, e q u e estes fossem o o u v i d o r , o
juiz d e fora do Ribeirão e os dois q u e se achassem mais p r ó x i m o s , q u e o governa-
d o r c o n v o c a r i a e presidiria p a r a d e s e m p a t e .
Provisão de 4 de setembro de 1748, [por que] se m a n d o u se praticasse a "reso-
lução acima d e 12 de m a i o de 1744 tanto n o R i o de J a n e i r o e São P a u l o c o m o e m
todas as M i n a s , e q u e os ouvidores n ã o sentenciem d e *per se só os recursos, e q u e
declarava m a i s q u e nas c o m a r c a s e m q u e houver "juízes de fora, "intendentes ou
"provedores d a F a z e n d a "letrados se e n t e n d a m estes n o m e a d o s p a r a adjuntos dos
ouvidores, é nas c o m a r c a s e m q u e faltarem n o m e i e m os ouvidores a d v o g a d o s d e
consciência ou a l g u m eclesiástico letrado, e p o r atenção à brevidade q u e se requer
nos recursos [ordena?] q u e os ouvidores p r e p a r e m os autos de per se sós, c o m o se
pratica n o j u í z o d a C o r o a do Porto, e q u a n d o os eclesiásticos d e m o r e m d a r os autos
e as respostas se defira aos recursos sem os ditos autos e só c o m certidão de [notifica-
ção?] d e c o m o lhos pediu primeira e segunda vez, e q u e q u a n d o o escrivão h o u v e r
de passar certidão d e n ã o cumpridas as cartas notifique logo aos juízes eclesíáticos
p a r a irem ou m a n d a r e m - n o s fazer assento n o D e s e m b a r g o d a Bahia, c o m o j á estava
d e t e r m i n a d o pelas resoluções d e 25 d e m a i o d e 1744 e 27 d e j a n e i r o d e 1 7 1 1 , e
q u e estas se observassem, assim c o m o o "decreto d e 13 d e [setembro?] d e 1706,
q u e dispõem q u e os juízes eclesiásticos s u s p e n d a m nos procedimentos logo q u e lhes
forem intimados os recursos.
Provisão d e 19 d e d e z e m b r o d e 1748, p o r q u e se o r d e n a q u e os intendentes
sirvam os lugares dos ouvidores nas suas faltas n ã o havendo na c o m a r c a juízes d e fora.
A 18 d e j u n h o d e 1720 t o m o u p o s s e o s e n h o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e [ fl. 1 5 3 ]
C o e l h o d e C a r v a l h o , " g o v e r n a d o r q u e erà da c a p i t a n i a do R i o d e J a n e i r o , n a
C â m a r a d a vila d e São Paulo (depois foi cidade) do governo d a q u e l a capitania e
d a destas M i n a s , então unida, de que se fez termo n a m e s m a C â m a r a n o dito dia etc.
E m 1713 t o m o u posse, e m São P a u l o , o s e n h o r d o m Brás Baltasar d a Silveira
d a q u e l e e deste g o v e r n o .
E m 1717 t o m o u posse, n a m e s m a cidade, o s e n h o r d o m P e d r o d e A l m e i d a
dos m e s m o s g o v e r n o s .

Vila Rica [fl. 1 5 4 ]

D o m P e d r o d e Almeida, c o n d e d e Assumar, sucessor d e d o m Brás, n o m e a d o


g o v e r n a d o r d e São Paulo e M i n a s d o O u r o p o r três anos, c o m o r d e n a d o d e dez
mil "cruzados, p o r provisão de 3 d e m a r ç o de 1717, d e q u e fez preito e h o m e n a -
g e m nas m ã o s de el-rei a 12 d e abril do dito a n o , de q u e se fez assento n o livro das
h o m e n a g e n s , o q u e assinou c o m o m a r q u ê s d e F r o n t e i r a , d o m L o p o de A l m e i d a .
366

Publicou u m * b a n d o e m 29 de d e z e m b r o d e 1717 p a r a q u e os mineiros n ã o


p u d e s s e m j u n t a r a r m a s e traze-las sem o r d e m sua, p e n a d e s e r e m havidos c o m o
régulos e " l e v a n t a d o s [e] i n c o r r e r e m c o m o tais n a s p e n a s d a lei, a l é m d e lhes
s e r e m seqüestradas suas fazendas; e p a r a q u e n i n g u é m fizesse couto d e suas casas
c o m a p e n a d e incorrer nas [culpas] d o criminoso q u e recolhessem, p r o c e d e n d o -
se i g u a l m e n t e c o n t r a a m b o s , além de c o n d e n a ç ã o arbitrária; e p a r a q u e n e n h u m
n e g r o , m u l a t o , "carijó, b a s t a r d o p u d e s s e m trazer a r m a s n e m "bastões c o m a p e n a
d e serem açoitados pelas r u a s públicas.
P u b l i c o u o u t r o b a n d o , p a s s a d o n a vila do C a r m o (hoje c i d a d e ) , a 2 3 d e
j a n e i r o de 1718, sobre a desigualdade do l a n ç a m e n t o dos "quintos, manifestando
uns c o m v e r d a d e os seus escravos e outros o c u l t a n d o muitos deles, pois se. p a g a v a
p o r escravos.
P u b l i c o u o u t r o n a m e s m a vila, a 16 d e m a r ç o d e 1718, e m q u e o r d e n o u q u e
e m c a d a u m dos distritos das M i n a s houvesse u m " p r o v e d o r dos quintos c o m seu
"escrivão, n o m e a ç ã o sua, q u e tivesse u m livro r u b r i c a d o pelo "ouvidor d a c o m a r c a
e nele se assentassem todos os negros e carijós dos m o r a d o r e s das m i n a s de c a d a
distrito, c o m p e n a d e p e r d i m e n t o dos negros q u e n ã o dessem ao manifesto.
P u b l i c o u o u t r o n a m e s m a vila, a 27 d e j u n h o d e 1718, p a r a que, n i n g u é m
tivesse "engenhos d e estilar a g u a r d e n t e , e os q u e os tivessem os demolissem den-
tro d e seis meses, p e n a d e demolição e mil "oitavas d e o u r o .
A 2 d e agosto de 1718, n a m e s m a vila, p u b l i c o u u m a d e c l a r a ç ã o do lança-
m e n t o dos quintos, e m q u e tocava p a g a r , p o r c a d a n e g r o , a duas oitavas e m e i a
pelos m e i o s dos ditos p r o v e d o r e s n o m e a d o s .
Publicou o u t r o n a dita vila, n o p r i m e i r o de o u t u b r o d e 1718, p a r a q u e toda
a pessoa q u e dele alcançasse a l g u m despacho o manifestasse à p a r t e c o n t r á r i a p a r a
sobre eles p o d e r e m alegar a sua justiça, c o m p e n a do p e r d i m e n t o d o direito dele
e c i n q ü e n t a oitavas.
E m agosto d e 1718 se descobriu n o C a m p o p e d r a capaz, d e q u e se entrou a
fazer cal, fazendo-se até a q u i casas de b a r r o .
Publicou o u t r o b a n d o n a dita vila, a 26 de n o v e m b r o de 1718, p a r a a c o b r a n -
ça dos quintos, q u e pela forma q u e lhe tinha d a d o havia principiar a cobrarem-se
no primeiro d e janeiro seguinte sé lhe n ã o desse princípio senão d e 15 de abril p o r
diante.
Publicou outro e m Vila Rica, a 20 d e d e z e m b r o de 1718, p a r a q u e q u a l q u e r
[pessoa] pudesse c o m a r m a s a t a c a r os "quilombos dos p r e t o s , e a p r e e n d ê - l o s , e
matá-los se. resistissem, sem q u e os senhores deles lhes p u d e s s e m p e d i r o d a n o .
P u b l i c o u s e g u n d o b a n d o n a vila do C a r m o , e m 2 4 de m a r ç o d e 1719, c o m
m a i o r e s p e n a s , p a r a q u e os n e g r o s , m u l a t o s , c a t i v o s o u forros [não] p o s s a m
t r a z e r a r m a s de n e n h u m a q u a l i d a d e .
Publicou o u t r o , a som de caixa, n a vila do C a r m o , a 5 d e j u n h o d e 1719, e m
q u e dizia q u e S u a M a j e s t a d e , p o r o r d e m d e 17 d e fevereiro do dito a n o , l h e
o r d e n a v a fizesse saber q u e todas as pessoas q u e se quisessem opor às p r o p r i e d a d e s
367

de q u a l q u e r "ofício das M i n a s d a n d o "donativo p a r a a F a z e n d a d o dito s e n h o r


p u d e s s e m r e q u e r e r pelo C o n s e l h o U l t r a m a r i n o .
Publicou outro n a dita vila, a 18 de j u l h o de 1719, q u e se p u b l i c a v a a lei d e
11 de fevereiro de 1719, p o r q u e S u a Majestade proibiu a forma d a c o b r a n ç a dos
"quintos e o r d e n o u se fizesse "casa d a m o e d a .
Publicou o u t r o e m Vila R i c a , n o p r i m e i r o d e s e t e m b r o d e 1719, p a r a q u e ,
d e n t r o de dois meses, saíssem das M i n a s os religiosos e mais eclesiásticos q u e n ã o
tivessem i n c u m b ê n c i a a l g u m a , p o r se j u l g a r n ã o ser c o n v e n i e n t e às M i n a s .
Publicou o u t r o e m Vila B i c a , a 21 de n o v e m b r o de 1719, p o r q u e o r d e n a v a
morresse " m o r t e n a t u r a l t o d o negro q u e fosse a c h a d o no m a t o fora d a obediência
de seu s e n h o r e q u e n e n h u m n e g r o ou negra pudesse ter escravo seu, e o q u e o
tivesse o vendesse d e n t r o d e dois meses, c o m p e n a de os p e r d e r e m .
E s c r e v e u d a vila d o C a r m o u m a c a r t a à C â m a r a d e V i l a R i c a , e m 30 d e
j u n h o de 1720, e m q u e lhe e s t r a n h a o n ã o a t a l h a r e m o " l e v a n t a m e n t o e "motins
d a dita vila, e q u e cuidassem c o m os h o m e n s b o n s e m apaziguá-los. O levanta-
m e n t o foi n o m e i o d a p r a ç a de Vila R i c a , n a noite d e 28 d e j u n h o , e saiu c o m
u m a p r o p o s t a e m q u e dizia n ã o c o n s e n t i a m nas casas d e fundição, d a n d o a r a z ã o
q u e c o r r e n d o o o u r o q u i n t a d o p a r e c e oneroso aos comerciantes q u e e n t r a m nas
M i ñ a s c o m as suas carregações, das quais t ê m p a g o os direitos à F a z e n d a R e a l ,
q u e sejam obrigados a q u i n t a r o o u r o q u e r e c e b e r e m do p r o d u t o delas e t a m b é m
p o r q u e , t e n d o a m a i o r p a r t e dos m o r a d o r e s e m p r e g a d o considerável c a b e d a l e m
roças, " e n g e n h o s e lavras, d e cujo o u r o e m p r e g a d o t ê m p a g o quintos, e que. q u e -
r e n d o vendê-las v ê m a p a g a r novos quintos d a dita v e n d a , ê q u e a l é m disso fazia
a F a z e n d a R e a l g r a n d e despesa c o m estas casas, cuja utilidade era incerta. A 29 d e
j u n h o d e 1720, se fez j u n t a pelo c o n d e , c o n v o c a n d o os " p r o c u r a d o r e s das c â m a -
ras e "provedores d a F a z e n d a R e a l e mais pessoas principais, e se assentou, p o r
t e r m o , q u e se suspendesse n a lei e se desse p a r t e a S u a Majestade dos inconveni-
entes q u e havia, e se assentou q u e as c â m a r a s cobrassem os quintos, p a r a o q u e se
lhes deu u m a forma.
À C â m a r a d e Vila R i c a escreveu el-rei carta, c o m d a t a de 3 d e j a n e i r o d e
1721, d a n d o - l h e p a r t e de q u e t i n h a feito m e r c ê d o governo das M i n a s , s e p a r a d o
d o de São P a u l o , a d o m L o u r e n ç o de Almeida.
A 20 d e agosto do dito a n o , e m Vila Rica, fez publicar u m " b a n d o e m q u e
p u b l i c a v a a lei d e 26 de m a r ç o / / d e 1 7 2 1 , p o r q u e S u a M a j e s t a d e o r d e n a se [ fl. 154v. ]
avaliassem os escravos dos mineiros nas a r r e m a t a ç õ e s , visto q u e nelas se v e n d i a m
p o r d i m i n u t o p r e ç o e n o prejuízo [público?].
Foi p r o v i d o d o m L o u r e n ç o p o r três a n o s , p o r "provisão de 2 3 de s e t e m b r o
d e 1720, c o m o governo só das M i n a s , e 8 mil "cruzados d e o r d e n a d o , e t o m o u
h o m e n a g e m a 2 d e m a r ç o d e 1721, q u e assinou c o m o c o n d e de Avintes e P e d r o
Alvares C a b r a l . A 2 d e j u l h o de 1 7 2 1 , escreveu carta à C â m a r a de q u e ali estava
p r o v i d o neste g o v e r n o e q u e fazia j o r n a d a .
Passou "provisão ao d o u t o r A n t ô n i o B e r q u ó del-Rio, q u e servia d e " p r o v e -
d o r d a F a z e n d a , p a r a q u e servisse de "ouvidor, visto q u e tinha morrido o p r o p r i e t á -
rio, d o u t o r J o ã o Lopes L o u r e i r o , e os povos r e q u e r i a m se n o m e a s s e ouvidor "le-
t r a d o , e m 16 de fevereiro d e 1722.
Publicou u m " b a n d o , a 27 d e abril de 1722, p a r a q u e n ã o houvesse vendas
de coisa a l g u m a n o m o r r o do O u r o [ P r e t o ] , pelo prejuízo q u e c a u s a v a n a
desinquietação dos p r e t o s c o m as pretas, e deferiu o r e q u e r i m e n t o q u e nesta p a r t e
lhe faziam o p o v o e C â m a r a .
Publicou o u t r o , a 27 de agosto, e m que proibia aos negros facas e porretes,
c o m p e n a d e prisão e o k o "oitavas p a g a s d a cadeia.
Publicou o u t r o n a vila d o C a r m o , a 13 d e d e z e m b r o de 1722, p o r q u e proi-
bia a todos q u e recolhessem religiosos, c o m p e n a de os levarem ao R i o d e J a n e i r o
e outras mais p e n a s .
A 2 5 de outubro de 1722., convocou, n a igreja de Santa Quitéria, aos "procura-
dores das c â m a r a s , provedores d a F a z e n d a , p r o c u r a d o r d a C o r o a e m a i s pessoas
principais, e n a presença de todos expôs a o r d e m p o r q u e Sua Majestade m a n d a v a
se estabelecesse "casas da m o e d a e fundição nestas M i n a s , n á f o r m a o r d e n a d a , e m
q u e c o n c o r d a r a m todos, s e m e m b a r g o d e algumas dúvidas q u e lhes n ã o deixaram
p r o p o r , e, ofereciam mais d o z e "arrobas d e ouro além das 25 q u e p a g a v a m p a r a q u e
se lhes n ã o pusesse casas de m o e d a pelos danos que lhes causavam..
A 17 de. d e z e m b r o de 1722, p u b l i c o u u m "regimento p a r a os "capitães-do-
m a t o a respeito dos negros q u e fogem p a r a o m a t o a seus senhores.
Publicou o u t r o b a n d o , a 16 de m a r ç o d e 1724, e m q u e p u b l i c a v a u m a "or-
d e m , de 18 d e fevereiro de 1719, p o r q u e Sua Majestade o r d e n a v a q u e todos os
ourives e pessoas q u e tiveram estes "ofícios fossem expulsos do distrito das M i n a s
d e n t r o d e três meses, p o r prejudiciais à F a z e n d a , c o m p e n a d e confiscação d e bens
e seis anos d e d e g r e d o p a r a a í n d i a .
Publicou o u t r o , c o m d a t a d e 29 de abril de 1724, p o r q u e p r o i b i a á negros,
m u l a t o s , cativos e forros t r a z e r e m facas de p o n t a e a r m a s de fogo.
O u t r o , a 4 d e j u n h o de 1729, e m q u e proibia as rifas.
" C a r t a de el-rei ã C â m a r a , c o m data de 29 de m a r ç o d e 1732, p o r q u e lhe d á
p a r t e ter n o m e a d o p o r "governador a A n d r é de Melo e Castro, conde das Galveias.
Publicou u m b a n d o , e m 3 d e n o v e m b r o d e 1732, e m q u e d e n o v o proibia as
v e n d a s d o M o r r o , pelas desordens q u e delas se seguiam.
Publicou o u t r o , e m 4 d e setembro d e 1732, p o r q u e publicava a o r d e m q u e
trazia d e S u a Majestade p a r a q u e os "quintos se lhes p a g a s s e m a 20 p o r 100 e n ã o
d e o u t r a sorte, visto q u e d o m L o u r e n ç o os t i n h a reduzido a 12 p o r 100.
Publicou outro, a 2 de maio de 1733, em que publicava a o r d e m de Sua
M a j e s t a d e p o r q u e p r o i b i a " d o b r õ e s d e 12-800 ["réis], e q u e se n ã o lavrasse
m o e d a m a i o r q u e a de 6 . 4 0 0 , e q u e n e m m o e d a s d e 4 . 8 0 0 , e q u e e m l u g a r de
" c o r d ã o se usasse nelas d e "serrilha.
369

G o m e s Freire d e A n d r a d e , " g o v e r n a d o r das M i n a s , escreveu d e Vila P i c a à


C â m a r a , c o m d a t a de 15 d e m a i o de 1736, u m a c a r t a e m q u e avisava q u e p o r
serviço de el-rei se r e d r a v a ao R i o d e J a n e i r o e q u e , n o e n t a n t o , largava o g o v e r n o
das M i n a s a M a r t i n h o d e M e n d o n ç a d e P i n a e d e P r o e n ç a , n a f o r m a q u e S u a
M a j e s t a d e lho o r d e n a v a , cuja o r d e m foi p a s s a d a a 12 d e m a r ç o d e 1736, e q u e
governasse n a sua ausência,, m a s c o m s u b o r d i n a ç ã o às suas ordens.
E m 22 d e m a r ç o de 1720, se m a n d o u erigir "casa d a m o e d a . [ fl. 155 ]
E m 2 d e d e z e m b r o de 1720, se criou novo g o v e r n a d o r d e S ã o P a u l o , separa-
d o do das M i n a s .
E m 26 d e m a r ç o d e 1 7 2 1 , se m a n d o u devassar dos "motins e " l e v a n t a m e n -
tos q u e fizeram n o a n o a n t e c e d e n t e os m o r a d o r e s de Vila R i c a , o b r i g a n d o a o
g o v e r n a d o r d o m P e d r o , c o m a r m a s , lhes concedesse p e r d ã o d e se t e r e m levanta-
d o e i r e m à vila do R i b e i r ã o a p r o p o r - l h e c o n d i ç õ e s sobre as a r r e c a d a ç õ e s dos
"quintos, e p a r a esta "devassa se n o m e o u o b a c h a r e l Rafael Pires P a r d i n h o , o u v i d o r
q u e e n t ã o era d e São Paulo, c o m o r d e m de p r o n u n c i a r e p r e n d e r os culpados até
d e z dos m a i s c r i m i n o s o s , q u e r e m e t e s s e a o R i o e daí a Lisboa, c o m o r d e m a o
g o v e r n a d o r d o m L o u r e n ç o q u e se n ã o procedesse a ela n o caso q u e visse se p o d i -
a m seguir m a i o r e s alterações e q u e e n t ã o se m a n d a s s e p r o c e d e r a ela n o R i o d e
J a n e i r o e a i n d a aí se faria se se entendesse q u e n ã o p o d i a c a u s a r a l t e r a ç ã o nas
M i n a s . E c o m o o dito o u v i d o r t a m b é m teve o r d e m p a r a sindicar d o dito d o m
P e d r o , cuido q u ê n ã o tirou â devassa e só sindicou, e m q u e levou meses.
P o r o r d e m d e 21 d e m a i o d e 1722, se o r d e n o u q u e os "serventuários q u e se
n o m e a s s e m n o s "ofícios d e J u s t i ç a p a g a r i a m , n o fim d o a n o , a " t e r ç a p a r t e d o
r e n d i m e n t o p a r a a F a z e n d a Real.
E a 29 de janeiro de 1726, se ordenou se não tirasse ao que rendessem 200 mil "réis.
E m m a r ç o d e 1727, se o r d e n o u se n ã o r e m a t a s s e m cá os "contratos, e só s i m
n o C o n s e l h o do U l t r a m a r .
E m 24 d e j u n h o de 1711, se o r d e n o u a o g o v e r n a d o r q u e p a g a s s e m direitos
os gados q u e viessem d a B a h i a p a r a estas M i n a s , assim c o m o t i n h a d e t e r m i n a d o
pagassem os escravos q u e entrassem p a r a elas.
E m 1712, f o r a m r e m a t a d o s os "dízimos p o r mais de c e m mil *cruzados.
E m 1 7 1 3 , ajustou o g o v e r n a d o r d o m Brás os quintos e m 30 " a r r o b a s , e d a n -
do disto c o n t a se lhe o r d e n o u , p o r c a r t a d e 16 d e n o v e m b r o d e 1714, q u e os
ajustasse p o r "bateias d e dez "oitavas a o m e n o s c a d a u m a p o r ser mais convenien-
te; e, haver m e n o s " d e s c a m i n h o , cuja o r d e m n ã o d e u à execução; e os povos n ã o
quiseram d a r mais q u e as trinta arrobas até q u e v i n d o no a n o d e 1715 p o r gover-
n a d o r d o m P e d r o é q u e r e n d o praticá-la se l e v a n t a r a m os p o v o s , p r i n c i p a l m e n t e
os do S a b a r a e C a e t é , e o n ã o conseguiu, continuando-se o p a g a m e n t o dos q u i n -
tos pelas m e s m a s trinta arrobas.
E m 1719, 11 de fevereiro, se publicou u m a lei p a r a q u e se fizessem casas d e
fundição nas M i n a s , nos sítios c o n v e n i e n t e s , e q u e se reduzisse a b a r r a s t o d o o
370

[ ft. 155v. ] o u r o , e q u e o n ã o pudesse, haver / / e m p ó fora das M i n a s à r a z ã o d e dez "tostões


p o r "oitava.
P o r "carta d e 4 de j u l h o d e 1718, se d e t e r m i n o u q u e o soldo do "general das
M i n a s fosse d e 8 mil "cruzados, t e n d o sido d e dez até aquele t e m p o , e hoje t e m
doze, fora as "propinas, e aos três "ouvidores d e Vila R i c a , R i o das V e l h a s e R i o
das M o r t e s tivessem 500 mil "réis, t e n d o até ali 600 mil, pela r a z ã o de e s t a r e m
m e n o s caros os m a n t i m e n t o s .

• 32 «

[11. 157 ] Cópia do que o povo das Minas, amotinado, pediu ao senhor
general dom Pedro de Almeida Portugal, conde de Assumar

Transcrição abreviada do "Termo que se fez sobre a pro-


posta do povo de Vila Rica na ocasião e m que veio amotinado à
vila do C a r m o " , este texto traz variadas demandas de grupos
formados por grandes mineradores, contratadores, setores soci-
ais intermediários e militares, sendo tanto portugueses, mineiros
e paulistas, que são encaminhadas através de amotinamento ao
conde de Assumar, governador d a capitania de São Paulo e Minas
do O u r o . O motivo central da sublevação merece destaque na
exigência de abertura do documento, quando rejeita as casas de
fundição e moeda. Outros temas associados à crítica à fiscalidade,
seja exercida por contratadores, câmaras ou pela Fazenda Real,
merecem destaque no conjunto, emergindo ainda propostas rela-
cionadas a problemas n a administração militar e nas práticas
vexatórias da Justiça. Como era tradicional nesse tipo de revol-
ta, o encerramento alude ao compromisso de perdão que deveria
ser concedido pela autoridade coagida pela mobilização popular
que oferecia essa pauta de demandas.
Essa pauta de reivindicações parece servir de subsídio para
alguma possível narrativa da história de Minas a ser preparada
pelo colecionador, que deveria repassar suas ocorrências mais
significativas. F a t o b a s t a n t e c é l e b r e p a r a m o r a d o r e s e
governantes da capitania das Minas, o episódio ocupou na me-
mória cios contemporâneos lugar de u m divisor de águas como
exemplo de firmeza e rigor na atuação do governador conde de
Assumar na busca da imposição da autoridade real sobre os gru-
371

pos de interesse da elite local. É perceptível certo vínculo com o


documento anterior, cuja conclusão trata da revolta de 1720 em
Vila Rica, podendo-se mesmo suspeitar de u m a sequência orde-
nada voluntariamente pelo compilador. Corroborando esta sus-
peita, deduz-se que esta é cópia abreviada, provavelmente p o r
solicitação de C a e t a n o da Costa Matoso, do termo registrado
na Secretaria de Governo de Minas Gerais, destituída em rela-
ção ao original do termo de abertura, das fórmulas empregadas
para indicar o atendimento de c a d a u m a das d e m a n d a s pelo
governador, das 27 asssinaturas, apresentando a i n d a ligeiras
modificações na sua ordenação.
A u t o r i a , l o c a l e data: José Peixoto da Silva; Vila Rica;
28.6.1720.
D e s t i n a t á r i o : D o m Pedro Miguel de Almeida Portugal.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento, que introduz as
reivindicações que transcreve sem qualquer tipo de exórdio, apre-
senta semelhanças com as formas discursivas dos regimentos (ver
documentos 16, 17, 18, 23 e 27), prevalecendo o modo imperati-
vo e a construção de períodos pela combinação de hipotaxe e
parataxe. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva do
século XVIII. Evidencia escrita veloz, não regularizada, apesar
do bom desenho dos " s " caudados, da presença da forma tironiana
do "que" abreviado (isto é, com o "q" envolto em semicírculo da
abreviatura) e da presença de pontuação moderna: dois pontos,
vírgula, ponto-e-vírgula e ponto final. (YDL)
C r i t é r i o s editoriais: As colações foram feitas a partir da
matriz da cópia do Códice (APM, SC 06, fl. 95-96v.) e restringi-
ram-se aos termos que comprometiam o significado é entendi-
mento do texto, mantidas as. supressões e p e q u e n a s variantes
introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
A P M , SC 06, fl. 95-96v.
"BNM, MSS 7544, fl. 47-48v.
Cópias impressas:
ANASTASIA, Carla M . J u n h o . Vassalos rebeldes: violência coleti-
va nas Minas na primeira metade do século X V I I I . Belo H o -
rizonte: C / A r t e , 1998. p. 141-143.
A Z E V E D O , José Afonso Mendonça de (Cop. e anot.). Documen-
tos do Arquivo da Casa dos Contos (Minas Gerais). Rio de Janei-
ro: Imprensa Nacional, Biblioteca Nacional, 1945. p . 129-
130. Publicação parcial.
BARBOSA, Waldemar de Almeida. História de Minas. Belo Hori-
zonte: Comunicação, 1979. V . 1, p. 139-141.
C A R V A L H O , Feu de. Ementário da história de Minas. Felipe dos
Santos Freire na sedição de Vila Rica 1720. Belo Horizonte:
Edições Históricas, [1930]. p. 99-104.
V A S C O N C E L O S , Diogo de. História antiga das Minas Gerais Rio
de Janeiro: Imprensa Nacional. 1948. V. 2, p. 378-381.
V A S C O N C E L O S , Salomão de. Verdades históricas. Belo H o r i -
zonte: Apolo, 1936. p. 14-17.
V E I G A , José Pedro Xavier da. Efemérides Minaras. Belo H o r i -
zonte: Fundação J o ã o Pinheiro, C E H C , 1998. V. 1 e 2, p.
602-603.

P r i m e i r a m e n t e , n ã o c o n s e n t e m e m "casas d e f u n d i ç ã o , c u n h o s e m o e d a .
N ã o c o n s e n t e m e m "contrato novo a l g u m q u e n ã o esteja e m estilo até o
presente.
N ã o c o n s e n t e m q u e se p a g u e o "registro d a B o r d a do C a m p o , pelo d e s c ó m o d o
q u e dá, sô sim t r a g a "bilhete c a d a qual das cargas q u e trouxer p a r a delas p a g a r
m e i a " o i t a v a p o r "seco e " m e i a p a t a c a p o r " m o l h a d o a o n d e c a d a u m for s u a
direita descarga, p a r a o q u e se elegerão cobradores e levarão recibo p a r a se des-
c a r r e g a r e m n p dito registro.
E , outrossim, levarão pelos negros a oitava e m e i a p o r c a d a u m , e q u e r e m
segurar a Sua M a j e s t a d e , q u e D e u s g u a r d e , as trinta " a r r o b a s de o u r o , l a n ç a n d o -
se a c a d a n e g r o u m a oitava e meia; e n o caso q u e esta n ã o chegue, se o b r i g a m a
inteirá-las, p a r a o q u e contribuirão as "lojas e "vendas c o n f o r m e a falta q u e h o u -
v e r p a r a a dita c o n t a , de sorte q u e n ã o passem d e cinco oitavas c a d a u m a , p a r a
cuja c o b r a n ç a elegerão as c â m a r a s dois h o m e n s e m c a d a arraial ou os q u e neces-
sário forem.
Q u e r e m q u e toda a pessoa q u e ocultar negros ou q u a i s q u e r escravos fiquem
confiscados p a r a a F a z e n d a R e a l , o q u e t a m b é m c o m p r e e n d e os "quintos d o p r e -
sente a n o , p a r a o q u e se deve fazer novo l a n ç a m e n t o , p a r a nesta forma se c o b r a r
d e q u e m n ã o tiver p a g o e se r e p o r aos q u e j á p a g a r a m o excesso d a dita u m a
oitava e m e i a p o r c a d a escravo.
Q u e r e m p a r a serviço d e D e u s e de Sua M a j e s t a d e , q u e D e u s g u a r d e , e conser-
v a ç ã o d a "república q u e n e n h u m n e g r o n e m n e g r a se a r r e m a t e n a p r a ç a pelos
preços tão diminutos c o m o se t e m visto, m a s sim se avaliem p o r dois "louvados d e
sãs consciências e q u e os a c r e d o r e s os t o m e m pelas avaliações q u a n d o n ã o haja
a r r e m a t a n t e s , o q u e t a m b é m se observará nas p r o p r i e d a d e s ou casas.
Q u e r e m t a m b é m se d ê "regimento p a r a os salários dos "escrivães, "tabeliães,
" m e i r i n h o s , "alcaides e assinaturas d e "ministros, "oficiais, m a i o r e s e menores^ e
este seja pelo do R i o d e J a n e i r o , de sorte q u e se lá forem q u a t r o "vinténs de p r a t a
n ã o d u v i d a m q u e cá sejam d e o u r o , e o m a i s a este respeito p a r a nesta f o r m a se ;

evitarem os excessos tão exorbitantes c o m o e x p e r i m e n t a m todos.


N ã o consentem que o "aferidor leve peso de ouro p o r outro tanto de cobre, e
c o m o isto sejam condições d o "senado, p o r ser contrato seu e m q u e o povo n u n c a
373

experimentou conveniência, q u e só a fim de ser o "contrato alto fazem 0 "regimento


caro e m prejuízo d o povo, c o m o é: de m a r c a r somente u m a b a l a n ç a e m a r c o u m a
"oitava e m e i a e d e revista u m a oitava e de "tirar a "olho a b a l a n ç a u m a oitava,
fazendo mais milagres que santa Luzia, d a n d o olhos q u a n d o q u e r e m , fundados n o
interesse. E e a este respeito as mais medidas, p a r a o q u e se lhe d ê regimento útil
p a r a o povo.
N ã o c o n s e n t e m ao "escrivão da " c â m a r a se d ê u m a oitava e m e i a p o r licença
e m e i a p o r registro d e "aferição, p o d e n d o ficar p a g o c o m m e i a oitava.
T a m b é m n ã o c o n s e n t e m a o escrivão d a " a l m o t a ç a r i a l e v a r m a i s d e m e i a [ fl. 157v. ]
p a t a c a p o r t o d o s os g ê n e r o s q u e q u a l q u e r p e s s o a a l m o t a ç a r , c o m o se o b s e r v a
nessa vila d o C a r m o , p o r se evitar as c o n d e n a ç õ e s q u e se fazem a o p o v o .
Q u e r e m q u e as c o m p a n h i a s dos "dragões c o r r a m à custa d o seu soldo, e n ã o
à custa do p o v o .
Q u e r e m q u e os s e n h o r e s d o " s e n a d o m o d e r e m as c o n d e n a ç õ e s tão
exorbitantes q u e c o s t u m a m fazer sem regimento n e m lei.
Q u e r e m q u e as calçadas das ruas, o n d e forem necessárias, se façam à custa d a
c â m a r a , e n ã o do p o v o , q u e lhe n ã o c o m e as r e n d a s .
E, outrossim, os ditos senhores p a s s e m p o r a n o as licenças assim de contratos
d e g a d o c o m o dos mais negócios, p o r lhe ser de m u i t o prejuízo t i r a r e m - n a s todos
os meses.
E, p o r final conclusão d e t u d o , q u e r e m q u e Vossa Excelência lhes c o n c e d a ,
e m n o m e de S u a Majestade, que D e u s g u a r d e , p e r d ã o geral selado c o m as a r m a s
reais registrado n a S e c r e t a r i a deste g o v e r n o , C â m a r a e mais p a r t e s necessárias,
p u b l i c a d o a som d e caixa pelos lugares públicos, e esta p r o p o s t a se registrará n a
Secretaria deste governo e livros d a C â m a r a .
Q u e r e m q u e os "contratadores dos "dízimos n ã o usem dos seus privilégios p a r a
c o b r a r e m as suas dívidas executivamente, senão d u r a n d o o t e m p o d o c o n t r a t o , e
q u a n d o seja necessário mais algum t e m p o o governo lho concederá a seu arbítrio.
R e q u e r e m mais q u e n e n h u m "ministro faça vexações a o p o v o c o m seus des-
p a c h o s violentos, p r o c e d e n d o a prisão e fuga sem as circunstâncias do direito, e
que e m t u d o se observe c o m ele a lei do R e i n o ,
E q u e os "oficiais d e J u s t i ç a , q u a n d o forem fazer diligências a várias pessoas,
r e p a r t a m as custas c o n f o r m e o regimento p o r c a d a u m a delas e s e m p r e i m p l o r a m
o p e r d ã o , o q u e t u d o c o n c e d e u 0 Excelentíssimo S e n h o r , fazendo "junta c o m as
pessoas mais principais d a vila e seu distrito, e o m a n d o u publicar p o r seu " b a n d o
a som d e caixa e registrada c o m tudo o mais, etc.
i- 33 «

[Inscrição enigmática formada em quatro regras para argumento


de serem também os sinas povoadores da América]

Desenho em cores reproduzindo inscrição rupestre com qua-


tro linhas encontrada em 1738 em u m a gruta n a capitania de Minas
Gerais (onde hoje é São T o m é das Letras), acompanhado de texto
com legenda descrevendo o hieróglifo. Informa sua localização e
seu aspecto associando-o à lenda de são T o m é no povoamento
original da América portuguesa e apresentando sua interpreta-
ção, segundo a qual considera os desenhos como símbolos cristãos
a partir da mitologia bíblica. Comenta ainda o trabalho de outros
intérpretes dedicados a essa inscrição.
A compilação deste documento, provavelmente, é decorrên-
cia da atuação da Academia dos Felizes no Rio de Janeiro, entre
1747 e 1750.
Documento revelador da proximidade do compilador do
Códice com os procedimentos, historiográficos è seu diálogo com
os temas e interpretações correntes dos historiadores contemporâ-
neos, sobretudo porque a decifração e o registro de. inscrições cons-
tituíam u m dos temas prediletos da Real Academia de História
Portuguesa (caro era especial a Rafael Bluteau). Ao que parece, o
padre Manuel da Nóbrega foi o primeiro a expor a idéia de u m a
primeira evangelização da América portuguesa p o r são T o m é ,
debate ainda corrente, entre os letrados moradores do Brasil na
p r i m e i r a m e t a d e do século X V I I I . P o d e t a m b é m t r a d u z i r
envolvimento com exercícios de decifração de enigmas praticados
entre círculos de eruditos. Associado ao documento seguinte.
ániqmalica fo Autoria, l o c a l e data: anônimo; não identificado; ca. 1747.
Mi Ojjiri^j f,íiyad&U> J A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : D o c u m e n t o constitui, provavel-
ki, Jihfcr/Ü Otdiftiatfáfn mente, notícia de algo ''memorável" conforme o conceito de his-
tória da época. Segundo Rafael Bluteau, "história" é "Mais par-
\m.i, .ijc'Á.rrM Jcdiu
ticularmente", "narração de cousas memoráveis que têm aconte-
r Oittm ifutht ttofh^ Jei
•UL. ftndíifi>ent(<. nao* cido em algum lugar, em certo tempo e com certas pessoas, ou
n a ç õ e s " (Vocabulário português e latino [...]. C o i m b r a : Colégio
das Artes da C o m p a n h i a de Jesus. V. 4, p . 39). A leitura de
sinais d a presença da divina providência evidencia a vontade de
¥fJv*Âuütm rtíy, t ou Deus escolásticamente inscrita na ordem das coisas e profetica-
(• j • ' mente, figurada nos fatos ç na natureza. J P F )
• •-• * JÍ *• i C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna extremamen-
te r e g u l a r i z a d a e c a l i g r a f a d a , pausada*, t i p o d e e s c r i t a
humanística itálica, que se apresenta como legenda de transcri-
375

ção enigmática, desenhada a cores e m quatro linhas ou regras.


Primeira linha da legenda, em módulo maior, distinguindo ple-
namente maiúsculas e minúsculas. Uso de pontuação moderna.
(YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : E m virtude de suas dimensões, a
reprodução em cores do desenho original encontra-se no encarte
do presente volume.
376

[ íl. 159 ] W nscrição enigmática f o r m a d a e m q u a t r o ' r e g r a s c o m caracteres r o m a n o s (ou


I latinos) e sinenses (ou chineses) dos antiquíssimos, p a r a a r g u m e n t o d e serem
-A_ t a m b é m os sinas p o v o a d o r e s d a America, e c o m hieroglíficos históricos e ale-
góricos iluminados d e v e r m e l h o (no q u e a i n d a d ã o a conhecer), q u e se descobriu
ou se fez mais notória neste a n o de 1738, c m u m a erigida p e d r a e impressos nela,
d a serra Itaguatiara, n a A m é r i c a portuguesa (isto é, p e d r a l a v r a d a ou riscada, im-
posição a n t i q u í s s i m a a l u d i n d o às letras e figuras simbólicas designadas), a q u a l
serra segué o curso do norte p a r a o d o sul pela c o m a r c a d o R i o das M o r t e s , oito
dias d e viagem o lugar da capital das M i n a s Gerais, Vila R i c a , calculada e m vinte
graus (com p o u c a maioria) ao sul d a equinocial (buscando-o a o poente) p r ó x i m o ,
e n a iminência d a referida serra, às ribeiras do rio V e r d e , vizinho das d o rio Ingaí
q u e c e r c a m a referida serra c m q u e se deixou a inscrição, p a r a q u e c m u m a r o c h a
ficasse m o n u m e n t o m e m o r á v e l à católica posteridade, c o m o fim principal (entre
outros q u e historia) d e conhecer-se a p r o m u l g a ç ã o d a lei d a g r a ç a futurizada (e j á
c h e g a d o o legislador divino) p e l a A m e r i c a p o r t u g u e s a , p o v o a d a p o r israelitas e
sinas e p o r u m dos apóstolos de Cristo, são T o m é , c o m grandes f u n d a m e n t o s n ã o
só históricos, pelas tradições dos naturais que. o p e r s u a d e m pelo estilo c o m q u e
n o t o r i a m e n t e as c o n t a v a m e o u t r a s de outros fins m u i t o m e m o r á v e i s , m a s t a m -
b é m p o r vocábulos, q u e c o m relevante p r o p r i e d a d e o q u e r e m fazer certo, c assi-
n a t u r a s i m p r e s s a s , q u e c o n c i l i a m a o m e s m o fim u m g r a n d e a s c e n s o , e depois
elevadíssimas razões morais d e d u z i d a s d a lição s a g r a d a (sem violência) q u e ani-
m a m a aqueles princípios e m o d e r n a m e n t e a d e s i g n a d a inscrição, explicando t a m -
b é m o fruto q u e fizera a missão evangélica n a A m é r i c a p o r t u g u e s a , pela sepultura
q u e explica, ficara n o referido lugar p a r a u m professor d a lei evangélica c m q u e ,
s i m b o l i c a m e n t e c o n t a , florescera pelo i n t e r p r e t a d o d a r e g r a terceira e s e p u l t a d o
n o a n o 19° desta idade sexta (ou sétima, c o m o q u e r e m outros cronológicos, p a r -
tindo a terceira e m duas) feita à época, ou p o n t o fixo d o a n o 34 do nascimento e
o primeiro em q u e saíram d a capital d a J u d é i a os apóstolos de Cristo a pregar o
Evangelho, u n s ficando n a Palestina largos anos pelas m u i t a s sinagogas e o u t r o s
viajando logo com os 72 discípulos q u e a este fim e n t r a r a m t a m b é m no C e n á c u l o '
(ou C a s a d e M a r i a , m ã e d e J o ã o Marcos) p a r a a ilustração divina, por preceito d e
seu divino m e s t r e o v i a j a r e m , q u a n d o lhes a p a r e c e u e m u m a d e v á r i a s vezes,
q u a n d o j á impassível e glorioso (Marcos 6,7, Lucas 10,1). C a l c u l o o referido d e -
d u z i d o i n t e r p r e t a t i v a m e n t e d a regra segunda, q u e c o n t a a cronologia d a história,
no q u e insinua u m a elevadíssima idéia c m domínios e n t ã o sem cultura literária, e
m u i t o mais p r i n c i p a l m e n t e (para a g r a n d e p r o b a b i l i d a d e d e ser feita a inscrição

Grande edifício no monte Sião com uma igreja e convento, construídos, segundo a tradição, no
mesmo local em que Cristo realizou a Ultima Ceia.
p o r são T o m é o u o discípulo q u e da J u d é i a t r o u x e r a pelo preceito d e saírem d e
dois e m dois) o n o t a d o interpretativamente no n ú m e r o dos hieroglíficos históricos
d a m o r t e de Cristo é m se v e r e m n a r e g r a q u a r t a só dois, p a r e c e n d o q u e h a v i a m d e
estar três (pelo q u e se viu), u m a c r u z q u e simboliza o R e d e n t o r e duas a D i m a s e
G e s t a s , j á f u t u r i z a d o p o r Isaías (53,12), e t a m b é m n o t a d o a idéia r e l e v a n t e n a
figura delas, e c o m elevadíssimo f u n d a m e n t o o lugar e m q u e estão postas, e n ã o
n a *regra p r i m e i r a , e m q u e p a r e c e h a v i a m estar designadas, o n d e se a c h a o u t r a
c r u z c o m diversa figura, e n e c e s s a r i a m e n t e p e l o q u e a l e g ó r i c a m e n t e simboliza,
c o n s p i r a n d o t u d o r e c i p r o c a m e n t e p a r a o referido discurso, e t a m b é m do auxílio
q u e d á a lição dos caracteres, c o m o elementares uns, c o m o científicos (ou iniciais)
outros (ou alguns), e d a classe d a aritmética t a m b é m outros, a o uso dos r o m a n o s
p r a t i c a d o n a Palestina (ou J u d é i a ) d o m i n a d a destes e d o n d e s a í r a m os apóstolos.

T o d a a referida interpretação insinua, e m u m a dilatada dissertação c o m estilo


crítico a duvidar e anticrítico e m largas páginas p a r a vigorar o i n t e r p r e t a d o , o d o u t o r
M a t e u s Saraiva, cavaleiro professo n a o r d e m de Cristo, *físico-mor das tropas d e
S u a M a j e s t a d e n o " p r e s í d i o do R i o d e J a n e i r o , e sócio d a R e a l S o c i e d a d e d e
L o n d r e s , s e m o â n i m o , p o r é m , d e m o s t r a r s e r e m místicas as referidas letras e
figuras simbólicas p a r a se lhes d á r culto a l g u m ou r e v e r ê n c i a , c o m o se fossem
e x a m i n a d a s p e l a S a n t a Sé Apostólica, m a s sim c o m o coisas q u e fazem p e s o , p o n -
d e r a ç ã o ou reflexão, segundo a b o a fé dos escritores pelos referidos princípios,
D a referida inscrição se a c h a recitada a notícia, no t o m o das Coleções p a r a a
A c a d e m i a R e a l da História Portuguesa do a n o d e 1730, pelo a c a d ê m i c o M a r t i n h o
d e M e n d o n ç a , n a conferência de 13 d e abril, p o r é m s e m inteligência a l g u m a , e
e m 1738, m a i s p e r s u a d i d a a v e r d a d e d e a c h a d a a inscrição a c i m a d e s i g n a d a e
fielmente c o p i a d a d o original p e l a o r d e m d o g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e ral d a
"província d o R i o d e J a n e i r o e M i n a s G e r a i s , G o m e s F r e i r e d e A n d r a d e , q u e
p o s i t i v a m e n t e m a n d o u a o l u g a r p a r a o fazer, ciente d a referida v e r d a d e , s e n d o
p r i m e i r o e x a m i n a d a e s t a p e l o r e v e r e n d o p a d r e frei M i g u e l d e S a n t a B á r b a r a ,
religioso franciscano, "definidor d a sua província d a C o n c e i ç ã o , q u e t e m a capital
n a c i d a d e do R i o d é J a n e i r o , o n d e se a c h a neste p r e s e n t e a n o d e 174-7, o q u a l
p a d r e foi c o m o coronel B e n t o F e r n a n d e s F u r t a d o (assistente e m S ã o C a e t a n o ,
arraial das M i n a s Gerais) à referida serra c o m o fim d e e x a m i n a r a v e r d a d e , q u e
a c h o u , e p o r ele designadas as figuras hieroglíficas e caracterizadas as letras, a rogo
do s o b r e d i t o i n t é r p r e t e .
378

34

[ fl. 160 ] Interpretação que deu o padre José Mascarenhas, *lente de prima
no colégio do Rio de Janeiro, às letras de que se trata

Explicação erudita e teológica da inscrição rupestre


reproduzida no documento anterior. N o esforço da decifração
desse enigma, desenvolve sete argumentos tratando de deduções
bíblicas, d a numerologia n a Antiguidade clássica e da cultura
dos índios no Brasil e seus ritos fúnebres. A decifração de três
das quatro linhas do desenho, sustentada n a mitologia bíblica,
n a paleografia e na cultura indígena, tenta demonstrar que o
desenho teria sido feito quando da pregação de são T o m é em 54
d.C. j u n t o à gruta em que foi encontrado.
A compilação deste documento, provavelmente, é decorrên-
cia da atuação d a Academia dos Felizes no Rio de Janeiro, entre
1747 e 1750.
Esse tipo de informação poderia decorrer do interesse n a
reunião de bases históricas sobre o povoamento do continente ame-
ricano. Representa ainda u m registro do diálogo com os temas e
interpretações correntes dos historiadores contemporâneos, sobre-
tudo porque a epigrafia constituía u m dos temas prediletos da Real
Academia de História Portuguesa {caro e m especial a Rafael
Bluteau). Assim, pode também traduzir envolvimento com exer-
cícios de decifração de enigmas praticados entre círculos de erudi-
tos. Por outro lado, na primeira metade do século XVIII, os deba-
tes sobre a presença de são T o m é n a América constituía t e m a
corrente entre os letrados moradores do Brasil. Associado ao do-
cumento anterior.
Autoria, l o c a l e data: padre José Mascarenhas; Rio de J a -
neiro; 11.8.1747.
D e s t i n a t á r i o : padre Francisco Xavier.
U s o n a historiografia: Adriana Romeiro, a título de ilus-
trar a produção intelectual do padre José Mascarenhas, valoriza
no documento a passagem de são T o m é por Minas, quando te-
ria pregado para os índios em 54 d.C. (Um visionário na corte de d.
João V: revolta e milenarismo nas M i n a s Gerais. C a m p i n a s :
Unicamp, 1996. p. 185).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "inter-
pretação" é "Explicação, tradução" (Vocabulário português e latino
[...]. Coimbra: Colégio das Artes da Companhia de Jesus.. V. 4,
• M <4V«Uftl p. 171). O texto mobiliza argumentação teológica visando per-
suadir quanto a o significado dos caracteres que interpreta. A
t m « ^ ti mm* leitura de sinais da presença da divina providência evidencia a
vontade de Deus escolásticamente inscrita n a ordem das coisas e
profeticamente figurada nos fatos e na natureza. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna sernicursiva
do século X V I I I . A c e n t u a m - s e : " d " u n c i a l de h a s t e c u r v a
sinostrógira, que quando ocorre n a primeira linha do parágrafo
se torna desproporcional em semicírculo ornado de muitas volutas;
* "s" caudado em forma de "z"; "y" usado como semivogal, tam-
bém com cauda; "1" com orelha cheia; "h" em forma de " E " re-
dondo; grupo "lh" formando ligatura e traço do "1" final muito
próximo do "h" do texto. (YDL)

M u i t o r e v e r e n d o p a d r e mestre d e c a n o Francisco Xavier:

O n t e m , quinta-feira, q u e se c o n t a r a m 18 do corrente m ê s de. agosto, vi, e a


p r i m e i r a v e z , n a m ã o d o d o u t o r M a t e u s S a r a i v a , n o s s o m é d i c o , o p a p e l dos
c a r a c t e r e s q u e a p a r e c e r a m esculpidos e m u m a p e d r a o u c a m p a n a e n t r a d a d e
u m a furna e m a c o m a r c a do R i o das M o r t e s . O c o r r e u - m e logo a i n t e r p r e t a ç ã o
deles, p o r versado n o país e costumes destes "gentios do Brasil, e c o m o c o m u n i -
c a n d o - o a Vossa Reverendíssima m e disse q u e a pusesse e m p a p e l , p a r a o q u e m e
emprestou um "transunto das m e s m a s letras. P a r a obedecer a Vossa
R e v e r e n d í s s i m a , p o n h o a q u i o m e u p a r e c e r e i n t e r p r e t a ç ã o , e p a r a ser m e l h o r
e n t e n d i d o se há, d e supor;

P r i m e i r o , q u e os novos convertidos à fé d e Cristo se c h a m a v a m germina jidei}


ou germina Crucis Christin é isto t ã o vulgar q u e faria injúria aos ouvintes se alegasse
autores p a r a isso.

Germens da fé.
Germens da cruz de Cristo.
380

S e g u n d o , q u e os antigos, antes das datas, ou contas, p a r a se saber o a n o e m


q u e escreviam, p u n h a m A . D . , q u e q u e r dizer Anna Domini, o u s o m e n t e N , q u e
q u e r [dizer] JVativitatis, isto é, a n o d o n a s c i m e n t o do S e n h o r — Anna Nativitatis
Domini.

T e r c e i r o , q u e os antigos latinos, c o m o n ã o t i n h a m os algarabismos ou alga-


rismos q u e hoje temos e d e i x a r a m os m o u r o s e m E s p a n h a p o r letras a q u e d e r a m
valias, se e x p l i c a v a m c o m o , *verbi gratia, a o " C " d e cento, ao " D " de q u i n h e n t o s ,
a o " M " d e mil, a o " L " d e c i n q ü e n t a , a o " V " de cinco e a o " X " d e dez. P o r é m , se
os n ú m e r o s de u n i d a d e , q u e e r a m u m " I " , i a m ligados ou l e v a v a m p o r c i m a ou
p o r baixo o u a d i a n t e u m a letra d e m a i o r valia, esses n ú m e r o s ligados valiam, c a d a
u m , o valor dessa letra maiúscula, verbigratia, flíílM 3
valiam cinco mil,
p o r q u e a letra " M " e m c i m a ou e m baixo ou a d i a n t e vale mil; se fosse " X " valia
5 0 , p o r v a l e r o " X " d e z . L i g a d a s as u n i d a d e s , v a l i a m s o m e n t e a s u a u n i d a d e
n u m é r i c a , verbi gratia, I I I I v a l i a m s o m e n t e q u a t r o . P i c r o Valeriano,^" p a g . 3 5 7 ,
r e g r a 22. Sic habet, in aegyptiaco vero signo superior illa linea producía ostendere videtur, licet
una lantum signóla sil "X", lamen sibi umtates addiscere^

[ Q u a r t o ] , os h e b r e u s , c o m o traz o eruditíssimo Bluteau,^ faziam o " c " desta


sorte " ^ " e depois d a c o m u n i c a ç ã o c o m os latinos assim o u s a v a m , o n d e p a r a
[ fl. 160v. ] escreverem " c e " p u n h a m x " , fazendo do " c " e " h " u m só caracter, q u e p a r e c e / /

" x " , d o n d e veio o a n t i q u a r o faxit, e p a r a os gregos o " x " é " c " , c o m a expiração
7

d o " h " , e algumas vezes se a c h a e m escrituras antigas o " x " p o r " c e " .

3
- No original, mX\, LLUJ, {TtTi .
^- Nasceu em Belluno no ano de 1477 e faleceu em Pádua uo ano de 1558. Organizou a compilação
mais completa sobre as escritas hieroglíficas, uma espécie de dicionário traduzido para o francês e
italiano, tratando dos hieróglifos egípcios, simbolismo das lápides e dos besLiários (Dialogo deite volgar
língua y hieroglyphica, Basiléia, 1556 e Hieroglyphica sivc de sacris Egyptiorum aliarumque gentium literís,
1556).
J
• Considera-se- no verdadeiro sinal egipicio parece mostrar que aquela linha seja alongada ainda que
apenas a que esteja asinalada seja "x", podendo contudo acrescentar unidade a si..
BLUTEAU, Rafael. Prosas portuguesas, recitadas em diferentes congressos académicos, pelo padre,
dom Rafael Bluteau. Parte primeira e parte segunda. Lisboa ocidental: Oficina de Joseph Antônio
da Sylva, 1727-1728.
^ • Forma latina arcaica equivalente à forma clássica fecerit.
Q u i n t o , q u e os "gentios d a A m é r i c a t i n h a m p o r nomes próprios ou n o m e d a
flor ou d e peixe, ervas, p a u s [nativos?] dos mais célebres do seu país, e p o r translação
o u "facécia c h a m a n d o - s e o p a i c o m o n o m e d a flor ou erva c h e i r o s a [nativa?]
c h a m a v a m aos filhos r a m i n h o s ou grelos dessa flor ou e r v a , e p o r isso d i z i a m
*xeremi *caá, *ambiquira, m e u s grelos, m e u s r a m i n h o s , m e u s filhos.

Sexto, q u e os índios do Brasil se e n t e r r a v a m e m u m a s "talhas c o m p r i d a s e


s e m b o j o , d e b o c a l a r g a , p a r a c a b e r p o r ela o c a d á v e r , e p o r fora, d e r e l e v o ,
d e b u x a v a m suas p r o e z a s , c o m o eu vi n a cidade d e São P a u l o a o fazer a c a d e i a
n o v a j u n t o a o c o n v e n t o dos c a p u c h o s ; e estas t a l h a s , c h a m a v a m i g a ç a b a s o u
camucins, ficavam c o m as bocas de fora cobertas c o m u n s "alguidares e c o m u m e n t e
se p u n h a m e m furnas, o n d e se a j u n t a v a m a fazer seus p r a n t o s o u " c a p i r o n ; e
h a v e n d o d e se m u d a r e m ou vir o inimigo, c o b r i a m d e terra as ditas b o c a s d a s
t a l h a s , sepulturas dos m o r t o s , costume d e se sepultarem e m talhas q u e os egípcios
faziam, c o m o mostra K i r c h e r , e pelas bocas das ditas talhas n u m e r a v a m os sepul-
8

tados; e v i n d o a l g u m p a r e n t e ou hóspede de longe a visitá-los, p r i m e i r o lhes i a m


m o s t r a r as sepulturas, e aí faziam o p r a n t o e o capiron, e depois festejavam aos
h ó s p e d e s , c o s t u m e este q u e a i n d a [há] nas aldeias d e p r i m e i r o p r a n t e a r e m aos
m o r t o s do q u e festejarem aos hóspedes.

Sétimo, q u e os antigos, algumas vezes, c o m o a i n d a hoje a p a r e c e m e m algu-


m a s p i n t u r a s , só p i n t a v a m d u a s cruzes, p o r n ã o p i n t a r e m a d o m a u l a d r ã o , e
a c h a n d o - s e duas cruzes s e m p r e se e n t e n d e a cruz de Cristo.

O q u e posto,

a "regra p r i m e i r a q u e r dizer:

Crucis Christi germina? ou Fidei Christi germina}® d e q u e s i m b o l i c a m e n t e são


significativos os q u a t r o r a m i n h o s ;

" Polígrafo alemão, nasceu em Geisa em 1601 e faleceu em Roma no ano de 1680. Ingressou na
ordem dos Jesuítas em 1618. Estudioso da cultura, religião e costumes do Egito antigo e sobretudo
de interpretação dos hieróglifos e dos monumentos antigos. Suas principais obras s3o: Sepecula
melitmses encydka, 1638; Língua aegyptiaca restituta, Roma, 1664.
Germens da cruz de Cristo.
O- Germens da fé de Cristo.
382

a "regra segunda:

[ fl- 1 6 1 ] Nativitatis (id est anno Nativitatis Domini) quarto supra quinquagesimum}' / / porque
as q u a t r o u n i d a d e s n ã o estão ligadas c o m " X " a d i a n t e , q u e vale dez, e p o r isso
v a l e m 50, e o c ô m p u t o é de 54 anos d o nascimento d e Cristo.

a regra terceira:

Jacet, 2 está e n t e r r a d a a flor, q u e é o p a i e se p a r e c e c o m u m a s flores vermelhas


1

q u e eu vi n o R i o das M o r t e s e está e n t e r r a d o , e p o r isso deitado, e n ã o e m p é c o m três


filhos, cujas bocas das "talhas a p a r e c e m de fora c o m o os O O O , e ficaram dois
desta família vivos, significados nos dois r a m i n h o s q u e a i n d a estão d e c a b e ç a le-
v a n t a d a c o m o a d o r a n d o d u a s cruzes, e isto p o r são T o m é , p o r m o n u m e n t o q u e
n a e r a d e 6 8 , q u e fazia n a de C r i s t o 54 e depois d a A s c e n s ã o d o S e n h o r 2 0 ,
p r e g a r a nessa furna a q u a t r o e n t e r r a d o s cristãos e dois vivos c o m a fé d a cruz d e
Cristo. O " x " d a r e g r a terceira é " c " e ' n", e faz " c e " , a cruz é "t".

O padre José Mascarenhas

35

[Certidão de provisão a Manuel de Fonseca,


secretário de governo, de aposentadoria de 40 mil réis
e de outros 40 mil réis para papel e tinta]

Provisão régia estipulando elevação d e proventos p a r a o


secretário de governo da capitania de Minas Gerais. A conces-
são de proventos, regulamentada p a r a os diversos cargos, era
complementada por legislação personalizada, que permitia a re-
muneração de acordo com atributos pessoais, especificidades lo-
cais e poder de influência n a Corte. Os cargos administrativos

^'' Do nascimento (isto é, no ano do nascimento do Senhor) 54 anos.


- Jaz.
l 2
383

do território de Minas Gerais foram objeto de diplomas especi-


ais, consideradas a carestia local e as despesas com transporte.
O interesse nesse registro, feito pelo escrivão da Ouvidoria,
cumprindo ordens do titular do cargo, está associado ao objetivo
de instruir processo em que o próprio ouvidor demandava paga-
mento de aposentadoria, logo após sua chegada a VUa Rica.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa ocidental; 12.3.1717.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Cópia de documento provavelmen-
te destinado a convalidar ou informar a constituição de relatos.
A presente transcrição de certidão compreende u m a declaração
introdutória e outra encerrando a cópia. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á i i c o : Escrita m o d e r n a híbrida de
encadeamento, do século XVIII, documental, muito veloz, m a n -
tém o "s' caudado, hastes inferiores do "p" em dois movimentos,
com laçada inferior e abrindo em forma de ' V n a direção da
letra que lhe segue; "r" de dois traçados: em forma de martelo e
redondo, como o ró grego. Linha de guarda na margem inferior;
rubrica em arabesco nas margens inferior e superior. C o m assi-
natura do escrivão da Ouvidoria. Letra idêntica à do documento
30. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, S C 0 1 , fl. &V.-9.
A P M , S C 02, fl.30v.
APM, SC 02, fl.31v.

jedro d e L i m a C u r a d o , *escrivão d a O u v i d o r i a G e r a l e C o r r e i ç ã o , n e s t a [ fl. 162 ]


Vila R i c a de N o s s a S e n h o r a do Pilar do O u r o P r e t o e sua c o m a r c a etc.,
certificó e p o r t o fé q u e p r o v e n d o u m livro d e registro q u e serviu n a Secre-
taria deste g o v e r n o d e se registrarem nele *provisões e o r d e n s reais, nele, à folha
trinta, verso, se a c h a registro de u m a o r d e m d e S u a Majestade, q u e D e u s g u a r d e ,
d a qual o r d e m o seu teor é o seguinte:

Ordem

Eu, el-rei, faço saber aos que esta m i n h a provisão [virem] que, tendo conside-
r a ç ã o ao q u e se m e representou p o r p a r t e d e M a n u e l d e Fonseca, *secretário do
g o v e r n o de São P a u l o , digo, do g o v e r n o da capitania de São Paulo e M i n a s , e m
r a z ã o da despesa q u e há d e fazer c o m aluguel de casas e c o m p r a de t u d o o q u e é
necessário p a r a u m a secretaria, e n ã o ser justo q u e saia do seu o r d e n a d o , principal-
m e n t e sendo ele destinado p a r a o seu sustento e naquelas / / partes n ã o ser o q u e [fl. 162v. ]
basta a respeito da carestia da terra e m a n t i m e n t o s , e p o r ser a seu favor o exemplo
do q u e se concedeu a o secretário do Rio d e J a n e i r o , s e p a r a d a m e n t e , p a r a as referi-
das despesas, sendo terra mais b a r a t a , m e pedia lhe destinasse p a r a elas a p o r ç ã o
384

q u e fosse servido, e tendo a t u d o respeito, e ao q u e respondeu o m e u "procurador


d a C o r o a , digo, p r o c u r a d o r d a Fazenda, hei por b e m fazer m e r c ê ao dito M a n u e l
d e Fonseca d e q u e se lhe d ê e m p a r a " a p o s e n t a d o r i a de casas q u a r e n t a mil "réis
c a d a a n o e outros q u a r e n t a mil *réis p a r a papel e tinta da m e s m a secretaria, pelo
q u e m a n d o a o m e u " g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e r a l da c a p i t a n i a d e S ã o P a u l o e
M i n a s e mais "ministros e pessoas q u e tocar c u m p r a m e g u a r d e m esta m i n h a "pro-
visão e a façam c u m p r i r e g u a r d a r inteiramente c o m o nela se contém, sem dúvida
alguma, a qual valerá c o m o carta, sem e m b a r g o d a O r d e n a ç ã o d o livro s e g u n d o ,
[ íl. 163 ] título quarenta, e m contrário, / / e se passou p o r duas vias, u m a só h a v e r á efeito e
p a g o u d e "novo direito vinte mil réis, q u e se c a r r e g a r a m ao "tesoureiro J o s é Correia
de M o u r a , à folha duzentos, c o m o constou do seu conhecimento e m forma registra-
do no registro geral, à folha duzentos e doze. Miguel d e M a c e d o Ribeiro o fez e m
Lisboa ocidental a doze d e m a r ç o de mil setecentos e dezessete, o secretário A n d r é
Lopes de Lavre o fez escrever. Rei.
E se n ã o c o n t i n h a mais e m a d i t a " p r o v i s ã o , d i g o e m o registro d a d i t a
?

provisão, c o m cujo teor a q u i passei a presente p o r m a n d a d o do d o u t o r C a e t a n o


d a C o s t a M a t o s o , "ouvidor-geral e "corregedor desta c o m a r c a , e a o dito livro q u e
entreguei a o "secretário deste g o v e r n o , A n t ô n i o d e Sousa M a c h a d o , m e r e p o r t o
e m fé d e q u e o escrevi e assinei n e s t a Vila R i c a d e Nossa S e n h o r a do Pilar do
O u r o P r e t o aos dezesseis dias d o m ê s d e m a r ç o d e mil setecentos e q u a r e n t a e
[ íl. 163v. ] n o v e anos. P e d r o d e L i m a C u r a d o , / / escrivão q u e o escrevi e assinei.

Pedro de Lima Curado

C o p i a d o p o r m i m escrivão.
Pedro de Lima Curado.

36

[Carta régia ao provedor da Fazenda Real de Minas Gerais


mandando erigir na qualidade de vigararias vinte igrejas]

Cópia sem valor documental de determinação real orde-


n a n d o a promoção de vinte igrejas mineiras, devidamente dis-
criminadas, à condição de vigararia com título colativo, regu-
lando-se o pagamento de côngruas aos respectivos párocos. Ane-
385

xo a o texto oficial, nota sumária informando que em 1750 o


ouvidor de Vila Rica ofereceu informações que propiciaram a
elevação de mais 28 igrejas e m Minas à mesma condição.
O trecho final do documento busca sublinhar uma passa-
gem de sucesso na ação adiriinistratíva do ouvidor, ao passo que
o documento oficial tem associação com ela, além de refletir a
preocupação com a jurisdição do Estado na obra de organiza-
ção eclesiástica da capitania.
Autoria, l o c a l e data: Rei; Lisboa; 16.2.1724.
D e s t i n a t á r i o : Antônio Berquó del-Rio.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento apresenta forma
epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie
de exórdio, n a primeira pessoa do singular, o emissor expõe a
ordem, sempre de forma imperativa, e encerra o texto com a
data. (JPf)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna cursiva ve-
loz, documental do século XVIII, destrógrada. Presença do " s "
caudado e de u m " s " final com cauda curta, em forma de anzol.
N o fólio Í64v., último parágrafo com letra cursiva e personifica-
da, de terceiro, isto é, de Caetano da Costa Matoso. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, SC 05, Ü. 13.
A P M , SC 20, fl. 110-111.
APM, SC 23, fl. 37-37v.
APM, C C 1047, fl.2-2v.
I H G B , Lata 100, pasta 2, p . 25. Avisos^ provisões e cartas régias
dirigidas aos governadores das capitanias de São Paulo, Minas Ge-
rais é Rio de Janeiro: 1704 a 1767,
Cópias impressas:
M A P A das vigarias coladas em 1724. Revista do Instituto Históri-
co e. Geográfico de Minas Gerais, Belo Horizonte, v. 6, p . 428-
429, 1959.
T R I N D A D E , Raimundo. Instituições de igrejas no bispado de Mariana.
Rio de J a n e i r o : Ministério da Educação e Saúde, S P H A N ,
1945. p . 11-12.
T R I N D A D E , Raimundo. Arquidiocese de Mariana: subsídios para
sua história. São Paulo: Escolas Profissionais do Liceu Cora-
ção de Jesus, 1928. V . 1, p. 35-36.

o v e d o r d a F a z e n d a R e a l d a c a p i t a n i a das M i n a s . E u , el-rei, vos envio [ fl. 1 6 4 ]


nuito s a u d a r . S e n d o - m e presente que, além das 13 igrejas q u e o "cabido
sede v a c a n t e d o R i o de J a n e i r o j u n t a m e n t e c o m o " g o v e r n a d o r q u e foi
dessas M i n a s , o c o n d e de Assumar, a p o n t a r a m p a r a *vigararias coladas n o distrito
delas, h á nele o u t r a s igrejas q u e , p e l o alto r e n d i m e n t o e n ú m e r o d e fregueses,
386

m e r e c e m i g u a l m e n t e ser eretas e m vigararias, h o u v e p o r b e m o r d e n a r q u e a dita


ereção se faça n a forma do m a p a q u e c o m esta se vos r e m e t e , assinado pelo secre-
tário de m e u C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e q u e as vinte igrejas nele expressadas sejam
e r e t a s e m v i g a r a r i a s c o m a n a t u r e z a e a q u a l i d a d e d e "beneficios [anuais?] e
amovíveis a o m e u arbítrio, posto q u e sejam d a d a s e m "título colativo, e a c a d a
u m d o s vigários se p a g a r ã o e m c a d a u m a n o p e l a m i n h a F a z e n d a d u z e n t o s mil
*réis d e " c ô n g r u a , n a forma das m i n h a s o r d e n s , e aos mais "párocos das o u t r a s
igrejas q u e n ã o serão "coladas, m a s "curatos anuais, a p a g a r e m os fregueses se-
g u n d o a t a x a a r b i t r a d a pelo "cabido e o estilo o b s e r v a d o nos m a i s curatos dos
m e s m o b i s p a d o ; e p a r e c e u - m e o r d e n a r - v o s lanceis n a folha eclesiástica as ditas
c ô n g r u a s , n a forma d e m i n h a "resolução, p a r a s e r e m p a g a s aos providos nos tais
benefícios. Escrita e m Lisboa a 16 de fevereiro de 1724. R e i - J o ã o Teles d a Silva
e TAntônio R o d r i g u e s d a C o s t a etc.

[ fl. 164v. ] A igreja d a vila d o R i b e i r ã o do C a r m o


A igreja d a vila de São J o ã o del-Rei
A igreja de S a n t o A n t ô n i o da vila d e São J o s é do R i o das M o r t e s
A igreja d e Vila N o v a d a R a i n h a d o C a e t é
A igreja das C a t a s Altas
A igreja [da Vila] do Príncipe do S e r r o do Frio
A igreja de Nossa S e n h o r a de N a z a r é da C a c h o e i r a
A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a Piedade do Pitangui
A igreja d e G u a r a p i r a n g a
A igreja de B o m J e s u s do F u r q u i m
A igreja do O u r o B r a n c o
A igreja do R i o das P e d r a s
A igreja d e Vila R e a l do S a b a r á
A igreja de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o de A n t ô n i o Dias
A igreja m a t r i z de Vila R i c a do O u r o P r e t o
A igreja d e S ã o Sebastião
A igreja de S a n t a B á r b a r a
A igreja d e S ã o B a r t o l o m e u
A igreja dos R a p o s o s
A igreja do B o m R e t i r o

N o a n o d e 1750, d e u o "ouvidor d e Vila R i c a , C a e t a n o d a G o s t a M a t o s o ,


c o n t a p a r a se h a v e r d e p r o v e r e colar 28 igrejas de M i n a s , a l é m destas vinte, e c o m
efeito assim se m a n d o u n o a n o seguinte, p r o v e n d o e c o l a n d o nelas os "clérigos
q u e e l e g e r a m p o r concurso q u e delas se fez n a M e s a da C o n s c i ê n c i a . 1

1 • Neste parágrafo, letra cie Caetano da Gosta Matoso.


387

37 «

[Ordem régia ao governador e capitão-general de Minas


autorizando que as câmaras da comarca do Rio das Velhas
destinassem ajuda de custo a seus procuradores]

Cópia com valor documental de determinação régia autori-


zando as câmaras de Sabará e de Vila Nova da Rainha, comarca
do Rio das Velhas, a destinarem ajudas de custos de quatro oita-
vas de ouro por dia a seus procuradores q u a n d o estes fossem
atuar nas juntas convocadas pelos governadores.
De modo indireto, essa ordem real trata de assunto próxi-
m o à polêmica em que o ouvidor se envolve sobre a ordem real
reduzindo as propinas pagas aos oficiais das câmaras de Vila
Rica e Mariana. Através da datação em que é m a n d a d a fazer
essa cópia (26.11.1751), pode-se.supor que estivesse servindo para
instruir a discussão sobre os ganhos dos oficiais das câmaras de
Minas. Talvez este documento servisse ainda de ilustração do
tipo de gastos praticados pelas câmaras.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa
ocidental; 23.10.1726.
D e s t i n a t á r i o : governador e capitão-general d a capitania
de Minas Gerais d o m Lourenço de Almeida.
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna regularizada
e caligrafada do século X V I I I , documental. Presença d o "d"
uncial, que ultrapassa a margem esquerda quando no início de
linha, formando voluta; do " s " caudado, usado como letra inicial
de palavra; "F' minúsculo com traço horizontal e m voluta. Utili-
zação de vírgula, ponto-e-vírgula e ponto final. Letra de copista,
com anotação e assinatura autografa do secretário de governo.
N o fólio I65v., anotação de registro, com letra de terceiro. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , S C 29, fl. 28.
A P M , C M O P 60, f. 99V-100.
B G U C , S R M , cód. 452, fl. 135.
388

[ fl. 165 ] Cópia

D o m J o ã o , p o r g r a ç a d e D e u s , rei d e Portugal e do Algarve, d ' a q u é m e d ' a l é m


m a r , e m Africa, s e n h o r de G u i n é etc, F a ç o saber a vós, d o m L o u r e n ç o de Almeida,
* g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e r a l d a c a p i t a n i a das M i n a s , q u e o "ouvidor-geral d a
c o m a r c a d o R i o das V e l h a s , M a t i a s P e r e i r a d e S o u s a , r e s p o n d e u , e m c a r t a d e
vinte d e m a i o deste presente a n o , à o r d e m q u e lhe foi sobre informar n o requeri-
m e n t o q u e fizeram os "oficiais d a C â m a r a de Vila N o v a d a R a i n h a a respeito d e
se d a r e m ajudas d e custo aos " p r o c u r a d o r e s das " c â m a r a s n a o c a s i ã o e m q u e
fossem assistir às "juntas, d o n d e fossem c h a m a d o s pelos g o v e r n a d o r e s dessas M i -
nas, d e c l a r a n d o a q u a n t i a de "oitavas q u e se lhes devia arbitrar p o r dia, represen-
t a n d o - m e q u e lhe p a r e c i a j u s t o q u e assim aos d a dita vila c o m o aos d e Vila R e a l
se desse a c a d a u m q u a t r o oitavas p o r dia q u a n d o fossem às M i n a s Gerais a vosso
c h a m a d o ou a r e q u e r i m e n t o preciso e necessário das m e s m a s c â m a r a s , pois estas
lhes n ã o d ã o n a q u e l a c o m a r c a , e m t o d o a n o , " p r o p i n a a l g u m a c o m q u e se possa
suprir ou suavizar a q u e l a despesa, p o r é m q u e se lhes h a v i a consignar t e m p o certo
e l i m i t a d o p a r a q u e p o s s a m fazer c o m b r e v i d a d e os negócios das c â m a r a s , pois se
p o d e r ã o d e m o r a r mais p a r a os seus m e s m o s negócios à custa delas; m e p a r e c e u
dizer-vos q u e assim à dita C â m a r a c o m o às mais d a q u e l a c o m a r c a d o R i o das
V e l h a s , sou servido q u e d o r e n d i m e n t o delas se possa constituir p o r dia q u a t r o
oitavas de o u r o aos ditos p r o c u r a d o r e s q u a n d o fossem à p r e s e n ç a dos g o v e r n a d o -
res a seu c h a m a d o nos dias q u e ali se d e t i v e r e m , e p a r a q u e sejam m e n o s vos
o r d e n o façais t o d o o possível p o r n ã o c o n v o c a r as ditas c â m a r a s mais q u e p a r a
aqueles negócios q u e forem mais precisos, pertencentes a o m e u real serviço ou a
beneficio das m e s m a s c â m a r a s , p o r q u e n ã o h a v e n d o necessidade t ã o u r g e n t e os
n ã o convoqueis, e p a r a q u e lhes satisfaçam as c â m a r a s a dita a j u d a d e custo, q u e
vós lhes m a n d a r e i s passar certidão d o t e m p o que aí g a s t a r a m e foi necessário p a r a
a conferência dos ditos negócios a q u e forem, de q u e vos aviso p a r a q u e assim o
t e n h a i s e n t e n d i d o . El-rei, nosso s e n h o r , o m a n d o u p o r A n t ô n i o R o d r i g u e s d a
C o s t a e o d o u t o r J o s é de C a r v a l h o A b r e u , conselheiros d o seu C o n s e l h o U l t r a -
m a r i n ó , e se p a s s o u p o r d u a s vias. A n t ô n i o d e S o u s a P e r e i r a a fez e m L i s b o a
ocidental, e m vinte e três de o u t u b r o d e mil setecentos [e] vinte e seis. O "secretá-
rio A n d r é L o p e s d e Lavre a fez escrever. A n t ô n i o R o d r i g u e s d a C o s t a . J o s é d e
C a r v a l h o A b r e u . O secretário d o governo a fez copiar e assinou.

J o s é C a r d o s o Peleja

[ fl. 165v. ] Registrado n o livro q u e serve d e registro


n o S e n a d o à folha 9 9 e folha 1 0 0 . 1

Vila R i c a , 26 d e n o v e m b r o de 1 7 5 1 .

'• Atual APM,CMOP 60, fl. 99v-100.


• 38 «
[Cópia de ordem régia ao governador e capitão-general de Minas
reiterando ordem de expulsão dos clérigos sem licença e
recomendando que o bispo arbitrasse o número de clérigos
necessários ]

Cópia com valor documental de ordem real recomendando


ao bispo do Rio de Janeiro que formulasse lista com o número de
clérigos necessários para cada igreja nas Minas Gerais e expul-
sasse os demais, com a ajuda do governador. E m vista dos pro-
blemas associados à presença dos padres em Minas, reforçaria
ordens anteriores, que vinham sendo negligenciadas, de expul-
são do clero regular, frades e ordens terceiras. A primeira ordem
régia sobre o tema data de 1705 e seria reiterada ao longo de
todo o século X V I I I , especialmente após motins e denúncias de
envolvimento de religiosos no descaminho do ouro e n a falsifica-
ção de moedas.
tá Vfoi4 Integra grüpò composto por ordens e cartas régias, anteri-
ores à criação do bispado de Mariana, destinadas à expulsão de
clérigos das Minas Gerais. Diante das disputas do ouvidor com
o bispo e os magistrados eclesiásticos, tais decisões régias envol-
vendo definições sobre a jurisdição secular diante da eclesiásti-
ca, especificamente associadas à punição de clérigos, parecem
punru í/tt. ter servido como fontes de referências legais.
Autoria, l o c a l e data: Conselho TJItrmarino; Lisboa oci-
dental;^^.1732.
D e s t i n a t á r i o : dom Lourenço de Almeida.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna regulariza-
da e caligrafada, documental. C o m traços de escrita redonda,
muito clara, evidenciando o "ductus" de todas as letras. O ponto
de fuga, quando em final de linha, prolonga-se em meias volutas,
completando o espaço e igualando a m a r g e m direita. Letra de
copista, com anotação e assinatura autografa do secretário de
Governo. Letra idêntica à do documento 27. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, SC 35, fl. 127-128.
A P M , S C 36, fl. 20v.
I H G B , Lata 100, pasta 2, p. 41-42. Avisos, provisões e cartas régias
dirigidas aos governadores das capitanias de São Paulo, Minas Gerais e Rio
de Janeiro: 1704 a 1767.
390

[fl. 1 6 6 ] Cópia

D o m J o ã o , p o r g r a ç a d e D e u s , rei de Portugal e Algarve, d ' a q u é m e d'além


m a r , e m Africa s e n h o r d e G u i n é etc. F a ç o saber a vós, d o m L o u r e n ç o d e A l m e i d a ,
" g o v e r n a d o r e capitão-general d a capitania das M i n a s , q u e h a v e n d o visto a vossa
carta de cinco d e j u n h o d o a n o passado a respeito d a g r a n d e p e r t u r b a ç ã o q u e os
"clérigos fazem nessas M i n a s , i n s i n u a n d o - m e que, sem e m b a r g o d e q u e eu havia
o r d e n a d o a o " c a b i d o do R i o d e J a n e i r o m a n d a s s e sair delas a t o d o s os clérigos
q u e aí n ã o fossem necessários, n ã o tivera observância esta o r d e m e havia crescido
g r a n d e m e n t e o n ú m e r o deles; e suposto q u e o "bispo n ã o tinha m a n d a d o suspen-
d e r das o r d e n s a todo o clérigo q u e sem licença sua passasse a essas M i n a s , n a d a
b a s t a v a p a r a eles deixarem de. estar nelas c o n t i n u a n d o os seus excessos, pelo q u e
os dçvia e u m a n d a r despejar dessas M i n a s e d a m e s m a sorte aos frades, p o r haver
aí t a m b é m m u i t o s d e m a u p r o c e d i m e n t o . N e s t a c o n s i d e r a ç ã o , h o u v e p o r b e m ,
p o r "resolução de treze deste p r e s e n t e m ê s e a n o , e m consulta d o m e u C o n s e l h o
U l t r a m a r i n o , r e c o m e n d a r ao dito bispo q u e , visto n ã o ter sido b a s t a n t e a o r d e m
q u e e x p e d i referida p o r vos, arbitre o n ú m e r o de clérigos d e q u e necessita c a d a
igreja, escolhendo p a r a o serviço delas os mais capazes, d e q u e vos r e m e t e r á lista,
m a n d a n d o sair dessas M i n a s todos os mais, pedindo-vos p a r a isso ajuda, e assim
vos o r d e n o lhe deis t o d a a necessária; e q u a n t o aos regulares, sou servido se exe-
c u t e m as o r d e n s q u e h á . El-rei, nosso s e n h o r , o m a n d o u p o r G o n ç a l o M a n u e l
G a l v ã o de L a c e r d a e o d o u t o r A l e x a n d r e M e t e l o d e Sousa e M e n e s e s , conselhei-
ros do seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e se passou p o r duas vias. J o ã o T a v a r e s a fez
e m Lisboa ocidental, a dezesseis de fevereiro d e mil setecentos e trinta e dois. O
s e c r e t á r i o . M a n u e l C a e t a n o Lopes de.Lavre a fez escrever. G o n ç a l o M a n u e l Galvão
[ fl. 166v. ] d e L a c e r d a , A l e x a n d r e M e t e l o / / d e Sousa e M e n e s e s . E n ã o se c o n t i n h a mais
e m a dita o r d e m q u e se a c h a nesta Secretaria, a qual fiz trasladar p o r m a n d a d o do
Excelentíssimo S e n h o r g e n e r a l G o m e s Freire d e A n d r a d e . V i l a R i c a , seis d e j a -
neiro de mil setecentos e c i n q ü e n t a anos. O "secretário do g o v e r n o a fez trasladar
e assinou.

J o s é C a r d o s o Peleja
• 39 <

[Copia de ordem régia ao governador e capitão-general de Minas


ordenando que avisasse aos ouvidores para prenderem clérigos e
frades que estivessem na capitania sem licença]

Cópia com valor documental de determinação ao governa-


dor da capitania de Minas, condicionada à aprovação do bispo do
Rio de Janeiro, para que avisasse os ouvidores que prendessem
clérigos e frades sem licença régia para estarem nas Minas ou
aqueles sem vínculos certos com igrejas, que deveriam ser reme-
tidos ao bispo, A primeira ordem régia sobre o t e m a data de
1705 e seria reiterada ao longo de todo o século XVIII, especial-
mente após motins e denúncias de envolvimento de religiosos no
descaminho do ouro e n a falsificação de moedas.
Integra grupo composto por ordens e cartas régias, anteri-
ores à criação do bispado de Mariana, destinadas à expulsão de
clérigos das Minas Gerais. Diante das disputas do ouvidor com o
bispo e os magistrados eclesiásticos, tais decisões régias envolven-
t/tâthr /// do definições sobre a jurisdição secular diante da eclesiástica, es-
pecificamente associadas à punição de clérigos, parecem ter ser-
vido como fontes de referências legais. A alusão ao papel dos
ouvidores n a ordem de prisão dos clérigos reafirma, nesse âmbito,
as prerrogativas da justiça secular.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa
ocidental; 21.2.1738.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna regularizada,
caligráfica e documental do século X V I I I . Capitular e maiúsculas
com volutas e e m módulo grande. Uso de " r " em forma de marte-
lo e redondo, como o ró grego. O ponto de fuga das letras que
terminam a linha, em movimentos circulares, completa o espaço
até a margem direita. O hífen aparecerepresentado pelo sinal de
igual. Presença do " s " caudado. Letra de copista, com anotação
e assinatura autografa do secretário de governo. Letra idêntica à
do documento 28. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 63, fl. 29.
I H G B , L a t a 100, pasta 2, p. 5 1 . Avisos, provisões e cartas regias
dirigidas aos governadores das capitanias de São Paulo, Minas. Gerais e Rio
de Janeiro: 1704 a 1767.
392

[íl. 167] Cópia

D o m J o ã o , p o r g r a ç a d e D e u s , rei d e Portugal e do Algarve, d ' a q u é m e d além


5

m a r , e m Africa s e n h o r d e G u i n é etc. F a ç o saber a vós, " g o v e r n a d o r d a capitania


das M i n a s , q u e p o r ser c o n v e n i e n t e a m e u serviço m e p a r e c e u ordenar-vos q u e se
o r e v e r e n d o "bispo do R i o de J a n e i r o vos d e r comissão p a r a m a n d a r d e s p r e n d e r
todos os *clérigos e frades q u e n ã o tiverem licença m i n h a p a r a assistirem n o distri-
to dessas M i n a s n e m tiverem o c u p a ç ã o a l g u m a e m igreja, c o m o se lhe t e m r e c o -
m e n d a d o , vós, c o m t o d o p c u i d a d o , aviseis aos "ouvidores os p r e n d a m e r e m e -
t a m à o r d e m do r e v e r e n d o bispo p a r a se evitarem as p e r t u r b a ç õ e s q u e fazem, d e
q u e se r e p e t e m c o n t i n u a m e n t e q u e i x a s . El-rei, nosso s e n h o r , o m a n d o u pelos
doutores M a n u e l Fernandes Vargues e Alexandre Metelo de Sousa e Meneses,
conselheiros d o seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e se passou p o r duas vias. J o ã o T a v a r e s
a fez e m Lisboa ocidental a vinte e u m d e fevereiro de mil setecentos e trinta e oito.
O secretário M a n u e l C a e t a n o Lopes de Lavre a fez escrever e assinou. O conselhei-
ro T o m é G o m e s M o r e i r a , A l e x a n d r e M e t e l o de Sousa e M e n e s e s , T o m é G o m e s
Moreira. E n ã o se continha mais e m a dita o r d e m q u e se a c h a nesta Secretaria, a
qual fiz trasladar p o r m a n d a d o do Excelentíssimo Senhor general G o m e s Freire de
A n d r a d e . Vila Rica, seis d e j a n e i r o de mil setecentos e cinqüenta anos. O "secretá-
rio do governo a fez trasladar e assinou.

J o s é C a r d o s o Peleja

40

[Ordem régia para o governador e capitão-general de Minas


para que se observasse na capitania o regimento dos carcereiros]

Cópia sem valor documental de determinação real m a n -


dando estender p a r a ã capitania de Minas Gerais o regimento
dos carcereiros, convertendo para o destino de Angola a pena de
degredo ali estabelecida, e encarregando os governadores do
Brasil pela sua execução.
Associa-se aos temas da administração judicial da capita-
nia, servindo o regimento dos carcereiros como fonte legal para
regular as questões referentes ás prisões executadas pelo ouvidor.
393

A inserção deste documento èm u m grupo de assuntos eclesiásti-


cos faz crer que ele instruísse especialmente as prisões de padres,
procedimento que envolveu tantos conflitos de jurisdição com o
bispado.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
24.4.1738.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a híbrida de
encadeamento, muito veloz e irregular, inclinada à direita. Pre-
sença do " s " caudado, seguido do " s " pendente; do " s " sigmático,
intermediário e final; do "s" final e m cauda simples e sinistrógira.
Ponto d e fuga do "r" final em haste ascendente, curva; elementos
que aproximam a escrita à de Caetano da Costa Matoso. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 62, 11. 26v.
APM, SC 63, fl. 76.
I H G B , L a t a 100, pasta 2, p.56. Avisos, provisões e carias régias
dirigidas aos governadores das capitanias de São Paulo, Minas Gerais
e Rio de Janeiro: 1704 a 1767.

D o m J o ã o etc. F a ç o saber ao " g o v e r n a d o r e capitão-general d a c a p i t a n i a


das M i n a s q u e p o r ser conveniente a m e u serviço fui servido d e t e r m i n a r ,
p o r "resolução de 9 deste p r e s e n t e m ê s e a n õ , e m consulta d o m e u C o n -
selho U l t r a m a r i n o , q u e nessa capitania se observe o "regimento dos carcereiros,
[ fl. 172 J

d e 28 d e abril d e 1681, c o m declaração q u e o d e g r e d o q u e o m e s m o r e g i m e n t o


i m p õ e p a r a o E s t a d o do Brasil, se deve p r a t i c a r nele p a r a o reino d e A n g o l a , e
outrossim sou servido encarregar-vos e aos mais g o v e r n a d o r e s das capitanias do
m e s m o Estado o q u e n o m e s m o regimento se e n c a r r e g a ao r e g e d o r d a Suplicação
e a o g o v e r n a d o r do P o r t o , d e q u e vos aviso p a r a q u e assim se execute esta m i n h a
o r d e m e a fazerdes p u b l i c a r e registrar n a s p a r t e s e m q u e convier. El-rei, vosso
s e n h o r , m a n d o u p o r A l e x a n d r e M e t e l o e T o m é G o m e s , conselheiros do seu C o n -
selho U l t r a m a r i n o . A n t ô n i o d e Sousa P e r e i r a a fez e m Lisboa a 2 4 d e abril d e
1 7 3 8 . O s e c r e t á r i o M a n u e l C a e t a n o L o p e s de L a v r e a fez escrever e assinou o
conselheiro J o s é I n á c i o d e Araújo.

J o s é Inácio Tomé Gomes


• 41 «
[Certidão de ordem régia proibindo o provimento de cargos
por quem não tivesse poder para os prover]

D e c i s ã o do rei p r o i b i n d o q u e os óuvidores-gerais das


comarcas de Minas passassem provisão de ofícios públicos de cur-
ta validade (um mês ou dois) e determinando a anulação da con-
cessão e punições p a r a aqueles que ã recebessem e p a r a os
ouvidores que a concedessem sem que para isto tivessem autori-
dade.
Instrumento revelador da subordinação dos ouvidores à ori-
entação reah a circunstância em que ocorre a reprodução desse
documento - feita do livro original do Senado da C â m a r a de
Mariana pelo escrivão da Ouvidoria, atuando sob ordens de Cae-
tano da Costa Matoso - revela p interesse direto do colecionador
nas disputas por autoridade travadas com os ministros da Justi-
ça. Cópia idêntica à do documento 30.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa
ocidental; 3.7.1739.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento apresenta forma
epistolar. Após endereçamento, breve saudação e u m a espécie de
exórdio, n a primeira pessoa do singular, o emissor expõe a ordem,
sempre de forma imperativa, e encerra o texto com a data. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna híbrida de
encadeamento, documental, com letras minúsculas de módulo
regular, inclinadas sobre a linha. Apresenta hastes inferiores lon-
gas, que envolvem a linha seguinte: no "d", de forma uncial, com
orelha alargada; no "s", caudado duplo e com laçada n a haste
inferior. Linha de guarda na margem inferior; rubrica em arabesco
nas margens inferior e superior. C o m assinatura do escrivão da
Ouvidoria. Letra idêntica à do documento 30. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, C M M , 15, fl. 10-1 lv.
APM, SC 68, fl. 17v.
APM, SC. 68, fl. 26y.
APM, SC 69, fl. 21.
I H G B , L a t a 100, pasta 2, p. 59. Avisos, provisões e cartas régias
dirigidas aòs governadores das capitanias de São Paulo,. Minas Ge-
rais e Rio de Janeiro: 1704 a. 1767,
395

P e d r o d e L i m a C u r a d o , "escrivão d a O u v i d o r i a G e r a l e C o r r e i ç ã o n e s t a
c o m a r c a de Vila R i c a d e Nossa S e n h o r a d o Pilar d o O u r o P r e t o etc. A o s
q u e a p r e s e n t e certidão virem, certifico e p o r t o fé q u e pelo d o u t o r C a e t a n o d a
C o s t a M a t o s o , "ouvidor-geral e "corregedor desta c o m a r c a , m e foi a p r e s e n t a d o o
[ fl. 173 ]

livro o i t a v o , 1
q u e serve d e registro n o S e n a d o d a C â m a r a desta C i d a d e , e m o
qual, às folhas dez verso até folha onze, se a c h a registrada a "provisão do teor e
f o r m a s e g u i n t e : D o m J o ã o , p o r g r a ç a d e D e u s , rei d e P o r t u g a l e d o A l g a r v e ,
a

d ' a q u é m e d ' a l é m m a r , e m África s e n h o r d e G u i n é etc. F a ç o s a b e r a vós, "gover-


n a d o r e capitão-general d a capitania das M i n a s , q u e se viu a vossa c a r t a de sete d e
d e z e m b r o do a n o p a s s a d o , e m q u e dáveis c o n t a q u e alguns dos ouvidores-gerais
das c o m a r c a s desse g o v e r n o se i n t r o m e t e m a passar p r o v i m e n t o s , p o r u m e dois
meses, aos "ofícios de J u s t i ç a d e sua c o m a r c a / / s e m a t e n d e r e m a q u e n ã o só pelo [ A- 173v. ]
"regimento dos g o v e r n a d o r e s do R i o de J a n e i r o , q u e eu m a n d e i observassem os
dessas M i n a s , lhes é p e r m i t i d o passar provisões p o r seis meses a todos os "oficiais
de J u s t i ç a e F a z e n d a d e seu g o v e r n o n e m r e p a r a r e m no p r e j u í z o q u e se p o d e
seguir à b o a a r r e c a d a ç ã o dos "novos direitos e "terças p a r t e s d a a v a l i a ç ã o dos
ditos ofícios p o r n ã o h a v e r nas c o m a r c a s a q u e l a f o r m a l i d a d e q u e se p r a t i c a e m
Vila R i c a , o n d e está a Provedoria, e x p o n d o - m e q u e os ditos "ministros se defen-
d e m e m q u e p e l a lei do R e i n o lhes é p e r m i t i d o p r o v e r e m alguns ofícios pelo dito
t e m p o , estando-lhes esta faculdade d e r r o g a d a nessas M i n a s p o r o r d e m m i n h a d e
dezoito de j a n e i r o de mil setecentos e t r i n t a e seis, o q u e sendo visto m e p a r e c e u
ordenar-vos q u e sendo a l g u m oficial p r o v i d o p o r q u e m n ã o t e m p o d e r p a r a p r o -
ver faça-se p r o c e d e r / / c o n t r a o n u l a m e n t e p r o v i d o c o m as p e n a s dos q u e servem [ fl. 174. ]
ofício p ú b l i c o sem c a r t a n e m p r o v i m e n t o , e aos ouvidores m a n d o se d ê e m e m
c u l p a n a s suas " r e s i d ê n c i a s estes p r o v i m e n t o s n u l o s que, fizerem. El-rei, n o s s o
senhor, o m a n d o u pelos doutores J o s é Inácio de A r o u c h e e T o m é G o m e s M o r e i r a ,
c o n s e l h e i r o s d e seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e se p a s s o u p o r d u a s vias. M a n u e l
P e d r o d e M a c e d o R i b e i r o ã fez e m Lisboa ocidental a três de j u l h o d e . m i l sete-
centos e trinta e n o v e . O secretário M a n u e l C a e t a n o Lopes d e L a v r e a fez escre-
ver, e assinou o conselheiro M a r t i n h o de M e n d o n ç a . T o m é G o m e s M o r e i r a .
M a r t i n h o d e M e n d o n ç a de P i n a e de P r o e n ç a . A n t ô n i o A m a r o de Sousa C o u t i n h o .
E n ã o se c o n t i n h a mais e m a dita provisão, q u e a q u i b e m e fielmente e n a v e r d a d e
fiz trasladar d a p r ó p r i a . Vila do C a r m o , vinte d e abril d e mil setecentos e q u a r e n t a
anos. E u , P e d r o D u a r t e Pereira, escrivão d a C â m a r a , q u e a fiz escrever e subscrevi
e assinei. / / P e d r o D u a r t e P e r e i r a . Passo o referido n a v e r d a d e , e m fé d e q u e [ fl. 174v. ]
passei a p r e s e n t e p o r o r d e m vocal do dito d o u t o r ouvidor-geral e ao dito livro m e

Provisão

Atual APM, CMM 15, fl. 10-1 lv.


396

r e p o r t o e m fé d e q u e a p r e s e n t e subscrevi e assinei n e s t a C i d a d e M a r i a n a aos


vinte e seis dias do m ê s de j u l h o d e mil setecentos e q u a r e n t a e n o v e a n o s . E u ,
P e d r o de L i m a C u r a d o , "escrivão q u e o subscrevi e assinei e "concertei.

Pedro de Lima C u r a d o

C o p i a d a p o r m i m escrivão
P e d r o de L i m a C u r a d o

. 42 «

[Ordem régia ao governador e capitão general do Rio de Janeiro


ordenando que se mantivesse o estilo de informarem os
requerimentos das partes pelos ouvidores-gerais]

Cópia sem valor documental de ordem ao governador de


Minas para preservar processualística quanto à forma como os
ouvidores-gerais informavam os requerimentos das partes atra-
vés de despachos nas petições, recomendando ainda que repre-
endesse conduta do ouvidor-geral de Vila Rica Caetano Furtado
de Mendonça pela tentativa de alterá-la. Anexo, ementa de or-
dem régia ao governador para que o provimento de ofícios fosse
feito por pessoas idôneas.
A referência ao desempenho das funções de antecessor de
Caetano da Costa Matoso nó cargo serve para instruir sua condu-
ta, especialmente no que diz respeito aos despachos de requeri-
mentos judiciais.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
12.12.1741.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a com a pre-
sença de duas caligrafias independentes. A dp texto, cursiva do
século X V I I I , não regularizada, apresenta o " s " final de pala-
vras pendente, abaixo da linha da escrita, em traço vertical, in-
clinado para a esquerda. As maiúsculas são pronunciadas, com
orelhas à esquerda; o "1", simples ou duplo, formado por haste
simples vertical, também com leve inclinação à direita. Poucas
abreviaturas: em nomes próprios e formas de tratamento; o rela-
397

tivo "que", aberto como o "u", com haste em forquilha que se


prolonga, formando laçada p a r a marcar o sinal de abreviação.
A partir da indicação de assinaturas e de nota fora do texto, n a
m a r g e m inferior, letra cursiva e personificada de Gaetano da
Gosta Matoso. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 68, fl. 52v.-53.
A P M , SC 77, fl. 78.

o m J o ã o etc. F a ç o saber a vós, G o m e s Freire d e A n d r a d e , " g o v e r n a d o r e [ fl. 176 ]


capitão-general d a c a p i t a n i a d o R i o de J a n e i r o c o m o g o v e r n o das M i -
nas, q u e se viu a vossa carta de dois de j u l h o deste p r e s e n t e a n o , e m q u e
dáveis c o n t a q u e , sendo estilo estabelecido n a criação dessa c a p i t a n i a das M i n a s
c o m o nas m a i s d o E s t a d o i n f o r m a r e m os r e q u e r i m e n t o s das p a r t e s os "ouvidores-
gerais p o r d e s p a c h o d a d o nas petições, e n t r a n d o a servir d e ouvidor-geral de V i l a
R i c a , G a e t a n o F u r t a d o de M e n d o n ç a duvida d a r resposta n a f o r m a p r a t i c a d a , q u e
v e n d o q u e vos m a n d e i s informar os ditos r e q u e r i m e n t o s c o m u m a carta, c o m o se
p r a t i c a no R i o d e J a n e i r o , e visto o mais q u e insinuáveis nesta m a t é r i a , m e p a r e -
ceu o r d e n a r - v o s conserveis o estilo q u e a c h a r d e s no vosso g o v e r n o , d e c l a r a n d o -
vos q u e o o u v i d o r n ã o fez b e m em q u e r e r alterá-lo, p o r q u e , t e n d o r a z ã o p a r a o
fazer, devia p r i m e i r o d a r - m e c o n t a e esperar resolução dela. Eí-rei, nosso senhor,
o m a n d o u pelos d o u t o r e s T o m é G o m e s M o r e i r a [e] M a r t i n h o d e M e n d o n ç a d e
P i n a e d e P r o e n ç a , conselheiros d o seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e se passou p o r
d u a s vias. P e d r o A l e x a n d r i n o d e A b r e u B e r n a r d e s a fez e m L i s b o a aos 12 d e
dezembro de 1741.

T o m é Gomes Moreira 1
Martinho de M e n d o n ç a

"Provisão d e 14 de m a r ç o de 1743, p o r consulta, e m q u e se o r d e n a a o go-


v e r n a d o r , q u e a i n d a p o r "donativos n ã o p r o v a os "ofícios e m pessoas q u e n ã o
f o r e m idôneas, p a r a o q u e se informarão dos requisitos dos p r o v i d o s pelos "minis-
tros p e r a n t e q u e m deve servir.

'• A partir desta assinatura, letra de Caetano da Costa Matoso.


• 43 «
[Cópia de ordem régia ao governador e capitão-general do Rio de
Janeiro ordenando que informasse sobre a saída de clérigos das
Minas e a situação dos que nelas assistiam]

Cópia com valor documental de pedido régio de informa-


ção ao governador d a capitania de Minas sobre o fato de a visita
episcopal ali realizada ter atendido recomendação de retirar clé-
rigos sem ocupação pastoral. Pede a i n d a relação de todos os
padres conforme as freguesias e suas respectivas funções.
Integra grupo composto por ordens e cartas régias, anteri-
ores à criação do bispado de Mariana, destinadas à expulsão de
clérigos das Minas Gerais. Diante das disputas do ouvidor com o
bispo e os magistrados eclesiásticos, tais decisões régias envolven-
do definições sobre a jurisdição secular diante da eclesiástica, es-
pecificamente associadas à punição de clérigos, parecem ter servi-
do como fontes de referências legais. Este documento deve ter sido
utilizado no seu parecer sobre á criação de vigararias em Minas
Gerais.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho Ultramarino; Lisboa;
28.4.1744.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade,
C o m e n t á r i o p a l e p g r á f i c o : Escrita m o d e r n a do século
X V I I I , bastante regularizada, destrógrada. Destacam-se: a for-
m a do conectivo " e " , redondo, em módulo maior que o das ou-
tras letras; o " s " pendente, com cauda arredondada; o "d" mi-
núsculo uncial; o "h" minúsculo em forma do " E " redondo ; uso
da cedilha e do til; as maiúsculas são simples, algumas apresen-
tam apex, como o " M " e o "R"; o ponto de fuga no final de linha
regulariza o espaço em relação à margem. Letra de copista, com
anotação e assinatura autografa do secretário de governo. Letra
idêntica à do documento 28. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 45, fl. 1 1 - l l v .
APM, S C 68, fl. 78.
I H G B , Lata 100, pasta 2, p. 67. Avisos, provisões e cartas régias dirigidas
aos governadores das capitanias de São Paulo, Minas Gerais e.Rio de Janei-
ro: 1704 a 1767.
399

Cópia [fl. 1 7 7 ]

D o m J o ã o , p o r graça de D e u s , rei de Portugal e d o Algarve, d ' a q u é m e d ' a l é m


m a r , e m África s e n h o r d e G u i n é etc. F a ç o saber a vós, G o m e s Freire d e A n d r a d e ,
" g o v e r n a d o r e capitão-general d a capitania do R i o d e J a n e i r o c o m o governo das
M i n a s Gerais, q u e eu sou servido ordenar-vos informeis se n a "visita q u e o reve-
r e n d o "bispo dessa capitania fez no distrito das M i n a s m a n d o u sair dele os "cléri-
gos desnecessários a o serviço da igreja n a f o r m a q u e eu t e n h o r e c o m e n d a d o ; e,
outrossim, vos o r d e n o m a n d e i s u m a relação dos clérigos q u e h á e m c a d a u m a das
freguesias das M i n a s e do e m p r e g o eclesiástico q u e nelas têm, e m q u e se exerci-
t a m estes e os m a i s clérigos q u e n e l a assistem. El-rei, nosso s e n h o r , o m a n d o u
pelo d o u t o r Rafael Pires P a r d i n h o e T o m é J o a q u i m da Costa C o r t e - R e a l , conse-
lheiros d o seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , e se passou p o r duas vias. P e d r o J o s é C o r -
reia a fez e m Lisboa a vinte e oito d e abril d e mil setecentos e q u a r e n t a e q u a t r o .
O secretário M a n u e l C a e t a n o Lopes de Lavre a f e z escrever. Rafael Pires P a r d i n h o ,
T o m é J o a q u i m da Costa Corte-Real.
E n ã o se c o n t i n h a mais e m a dita o r d e m q u e se a c h a nesta Secretaria, a q u a l
fíz t r a s l a d a r p o r m a n d a d o d o Excelentíssimo S e n h o r g e n e r a l G o m e s F r e i r e d e
A n d r a d e . Vila R i c a , seis de j a n e i r o d e mil setecentos e c i n q ü e n t a anos. O "secre-
tário do governo a fez trasladar e assinou.

J o s é C a r d o s o Peleja
400

• 44 <

[ fl. 179 ] Mapa do ouro que tem entrado nas *casas de Fundição e Moeda
de Vila Rica das Minas, desde 26 de agosto de 1724, dia em que
principiou o seu lavor a Gasa da Moeda, e a de Fundição em o
primeiro de fevereiro de 1725, até o fim de [incompleto]; e dos
rendimentos que pertencem à Fazenda Real: da ^senhoriagem e
*braçagem, *qumto e gastos que pagam as partes nas fundições dos
seus ouros; e das remessas que se têm feito em todas as *frotas para
Lisboa e também do que têm rendido de quinto as duas novas casas
de fundição das comarcas do Rio das Velhas e Rio das Mortes

M a p a contábil apresentando os valores relativos aos rendi-


mentos do ouro n a Casa de Fundição de Vila Rica, entre agosto
de 1724 e j u n h o de 1735. Os valores são distribuídos mensal-
mente e apresentados conforme o total bruto recebido, o quinto
de 12% extraído, a parcela correspondente à senhoriagem e
braçagem, o peso das barras, o quinto de 12% sobre elas, con-
tendo ainda as despesas com todo o processo de fundição.' Todos
os valores são somados mês a mês, alcançando-sc o total para
cada u m dos itens acima, correspondente a todo o período de
funcionamento da Gasa de Fundição de Vila Rica. As duas últi-
mas colunas apresentam os valores totais do ouro remetido nas
frotas para o Reino, em dinheiro e em barra, entre 1725 e 1736,
da mesma Casa de Fundição. Ò montante do valor remetido em
dinheiro e em barra pelas casas de fundição de Sabará e de São
J o ã o del-Rei aparece agregado ao final do quadro, colaborando
para a soma total dos valores remetidos para o Reino em dinhei-
ro e em barra na frota de 1736.
Informações obtidas provavelmente d a Provedoria d a Fa-
zenda Real de Minas Gerais. Forma, ao lado de outros, um grupo
de documentos com a contabilidade d a riqueza mineral e seu ren-
dimento para a Fazenda do rei durante o funcionamento das ca-
sas de fundição. A operação de totalização dos valores para todo o
período pode ser indicativo do esforço de se avaliar as vantagens
desse sistema de cobrança do quinto e para subsidiar críticas ao
fim do sistema de capitação. Vinçula-se ao documento 45.
Autoria, l o c a l e data: Provedoria da Real Fazenda de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; ca. 1751.
401

U s o n a h i s t o r i o g r a f i a : Afonso de E. Taunay emprega


os dados deste quadro de arrecadação complementando-os com
estimativas de períodos mais recuados (História geral das bandeiras
paulistas. São Paulo: Imprensa Oficial, Museu Paulista, 1949. V.
10, p. 206). j
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna tipo bastar-

• íir át mê da italiana, bastante regularizada e clara no enunciado d» mapa e


legendas das colunas. Maiúsculas com apex, entre as quais se des-
tacam o "R." redondo, de orelha ampla à esquerda, e o "Q" de
forma uncial, semelhante ao "G". Texto com muitas rasuras. Ta-
belas em algarismos arábicos, com o uso do caldeirão [CTJ. Apre-
senta marcas de lacre. (YDE)

2o «_
Critérios e d i t o r i a i s : Foram suprimidas as guardas e as
indicações de correções dos valores. As abreviaturas de unidades
de peso foram mantidas modernizadas e os erros de cálculo, cor-
rigidos.
Mapa do ouro que tem entrado nas *casas de Fundição e Moeda de Vila Rica das Minas, desde 26 de agosto de 1724, dia em que principiou o seu lavor a Gasa da Moeda, e a de Fundição em
o primeiro de fevereiro de 1725, até o fim de [incompleto]; e dos rendimentos que pertencem à Fazenda Real: da *senhoriagem e *braçagem, *quinto e gastos que pagam as partes nas fundições dos seus ouros;
e das remessas que se têm feito em todas as *frotas para Lisboa e também do que têm rendido de quinto as duas novas casas de fundição das comarcas do Rio das Velhas e Rio das Mortes
403

> 45 <
Mapa de todo o ouro que entrou nas *casas de Fundição e Moeda [ fl. 180 ]
de Vila Rica das Minas, desde 26 de agosto de 1724, dia em que
principiou o seu lavor a Casa da Moeda, e a de Fundição em o l 9

de fevereiro de 1725, em que teve princípio a cobrança do quinto;


rendimento dele e de tudo o mais pertencente à Fazenda Real;
remessas que. se fizeram para Lisboa; e também do rendimento do
*quinto das duas casas de fundição que se estabeleceram nas
comarcas do Rio das Mortes e Rio das Velhas, que tiveram
princípio, a primeira, em 2 de julho de 1734 e, a segunda, em 12
do dito mês e ano, tudo por anos, como abaixo se mostra

M a p a contábil apresentando, anualmente, valores distribuí-


dos entre 1724 (agosto) e 1735 (¡unho) correspondentes ao movi-
mento da Casa de Fundição e Moeda de Vila Rica, onde se indi-
cam, em 8 colunas, o peso total do ouro transformado em moe-
das, o quinto de 12% dele recolhido, os gastos com senhoriagem
e braçagem, o total do peso das barras de ouro que entram n a
Casa da Moeda, o quinto de 12% daí retirado e, ainda, as despe-
sas feitas nos trabalhos de fundição do ano. Indicam-se, em duas
colunas, os totais das remessas de dinheiro e de ouro em barra e
e m pó feitas a partir da Casa de Fundição e M o e d a de Vila Rica
para Lisboa na frota de 1736. As informações p a r a o ano de 1735
(Janeiro a junho) aparecem distribuídas mensalmente, porém in-
completas. O s valores correpondentes a cada u m dos itens acima
enunciados aparecem somados a cada cinco anos, completándo-
se ao final a totalização dos montantes para todo o período 1724-
1735. Acompanha breve comentário com interpretação.
Informações obtidas provavelmente d a Provedoria da Fa-
zenda Real de Minas Gerais. Forma, ao lado de outros, u m grupo
de documentos com a contabilidade da riqueza mineral e seu ren-
dimento para a Fazenda do rei durante o funcionamento das ca-
sas de fundição; é u m quadro resumo do documento 44. A opera-
ção cie totalização dos valores p a r a todo o período p o d e ser
indicativo do esforço de se avaliar as vantagens desse sistema de
cobrança do quinto e para subsidiar críticas ao fim do sistema de
capitação.
A u t o r i a , l o c a l e data: Provedoria da Real Fazenda de
Minas Gerais; Vila Rica; ca. 1751.
404

C o m e n t á r i o p a i e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
século XVIII, regularizada e destrógrada, bastante pessoal. Pre-
sentes o "d" uncial; dois tipos de "f' minúsculo, com laçada, ora
destrógira, ora sinistrógira, formando o traço horizontal, muito
veloz; abreviatura do " q " usual e as demais com o ponto abreviativo
e letras sobrepostas, como em "L. " " (=Lisboa). Algarismos arábi-
5 1

cos com traço moderno e bem definido. Uso do caldeirão [tTJ.


(YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : F o r a m suprimidas as g u a r d a s e
indicadas abreviadas as unidades de peso correspondentes a cada
coluna.
Cópias impressas:
B O X E R , C- R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de
uma sociedade colonial. 2. ed, São Paulo: Nacional, 1969. p.
347.
T A U N A Y , Afonso de E. Lacuna da história do ouro preenchida
graças a u m cimélio da Brasiliana de Félix Pacheco. Jornal do
Comércio, Rio de Janeiro, 20 abr. 1947, p . 2.
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1725; ora que lc\'c princípio a cobrança do "quinto; rendimento dele e de tudo o mais pertencente à Fazenda Real;
remessas r¡ue se lizeram para Lisboa; e também do rendimento, do quinto das duas casas de fundição, que se estabeleceram nas comarcas do Rio das Mortes e Rio das
Velhas, que tiveram princípio, á primeira,. Pm 2 de julho de 1734 c, a segunda, em 12 do dito mês e ano, ludo por anos, tomó abaixo se mostra

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406

• 46 -

[ fl. 181 ] Mapa dos negros que se capitaram desde que principiou a
capitação em cada uma das comarcas

Relação dos números totais de escravos negros e popula-


ção forra nas duas matrículas anuais da capitação entre 1735 e
1749, de acordo com os totais das comarcas mineiras e algumas
de suas vilas e do sertão.
Forma, ao lado de outros, u m grupo de documentos com a
contabilidade do rendimento proveniente do quinto para a Fazen-
da do rei. O s números serviriam possivelmente para subsidiar
debate sobre a conveniência ou não da suspensão do método de
capitação. A seriação desses dados durante quase todo o período
permitiria, uma avaliação global do funcionamento do método de
arrecadação do quinto. Vincula-se ao documento seguinte.
Autoria, l o c a l e d a t a : Provedoria da Real Fazenda de
Minas Gerais; Vila Rica; ca. 1751.
U s o n a historiografia: Afonso de E. Taunay divulgou esse
documento, conseguindo avançar os indicadores demográficos a
respeito da população escrava nas vilas de Minas até o a n o de
1735 (Diogo de Vasconcelos oferecera números p a r a até 1718 e
Salomão de Vasconcelos para até 1728). Tomando, os números de
1735 deste "recenseamento dos pretos", observa que a população
triplica desde 1718, indicador do vigor dos trabalhos de minera-
ção (Subsídios para a história do tráfico africano no Brasil. Anais
do Museu Paulista, São Paulo, tomo 10, p. 193 e passim, 1941; His-
toria geral das bandeiras paulistas. São Paulo: Imprensa Oficial, Museu
Paulista, 1948. V. 9, p. 300 e 1949; v. 10, p 75-76). O tratamento
dos dados deste mapa por Maurício Goulart (que, segundo Sérgio
Buarque de Holanda, foi quem o localizou) permitiu a revisão dos
dados sobre escravos em Minas, que até ali eram contabilizados
em dobro por Eschewege, que desconhecia serem os números apre-
sentados equivalentes a duas matriculas semestrais (A escravidão afri-
cana, no Brasil. 3. ed. São Paulo: Alfa Omega, 1949. p. 141). Mafalda
Zemela encontra nessa fonte a totalização do número de escravos
trabalhando por ano em Minas, embora advirta que número tão
elevado não foi sustentado todos os anos (Q abastecimento da capitania
das Minas Gerais no século XVIII. 2. ed. São Paulo: Huçitec, 1990.
p.108-109). O elevado número de escravos presente nesse docu-
mento serve ainda para Virgílio Noya Pinto sublinhar o vigor do
tráfico, capaz de sustentá-lo (0 ouro brasileiro e o comercio anglo português.
São Paulo: Nacional, 1972. p. 58). Charles Boxer utiliza-o para a
obtenção de. dados demográficos (¿4 idade de ouro do Brasil; dores de
407

crescimento de u m a sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacio-


nal, 1969. p. 195)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva do sé-
culo XVIII,. caligrafada e destrógrada. Maiúsculas com cabeço em
forma de meio círculo e volutas. Uso do "d" uncial minúsculo, til no
sufixo "ao", acento agudo no "a" final tônico e pontos de fuga em
final de linha ascendente Números arábicos arredondados cóm per-
fil. Utilização de traços de guarda nos enunciados de colunas. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : F o r a m suprimidas as guardas.
Cópias impressas:
BOXER, Charles R. A idade de. ouro do. Brasil: dores de crescimento
de unia sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969.

(S/T «s.
144 p. 351-355.
OUVEIRA, Tarquinio J.B. de (Org. e análise). Erário Régio de Fran-
cisco A. Rebelo, 1708. Edição fac-similar. Brasília: ESAF, 1976.
p. 109.
SlMONSF.N, Roberto C. História econômica do Brasil (1500/1820). 8.
ed. Sào Paulo: Nacional, 1978. p. 296-287. Publicação parcial.
T A U N A Y , Afonso de E. Lacuna da história do ouro preenchida
graças a um cimélio da Brasiliana de Félix Pacheco. Jornal do
Comércio, Rio de Janeiro, 20 abr. 1947, p. 2.
TAUNAY, Afonso de E, Subsídios p a r a a história do tráfico africa-
;

no no Brasil. Anais do Museu Paulista, São Paulo, tomo 10, p.


193 e passim, 1941.

Seis m e s e s d e 1 7 3 5
T e v e princípio a "capitação n o primeiro de julho de 1735

Vila R i c a 2 0 , 8 6 3 escravos 3 1 6 forros


Cidade Mariana 2 6 . 8 9 2 escravos 176 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 4 0 0 escravos 1 4 4 forros
Sabará 2 4 . 2 8 4 escravos 5 7 6 forros
S e r r o Frio 1 0 . 1 0 2 escravos 2 0 8 forros

A n o de. 1736
Primeira "matrícula

Vila R i c a 2 0 . 9 0 4 escravos 2 8 9 forros


Cidade Mariana 2 6 . 7 5 2 escravos 181 forros
S abará 2 4 . 2 8 4 escravos 4 8 3 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 4 7 1 escravos 1 5 9 forros
Serro Frio 8 . 9 8 8 escravos 1 7 8 forros
Sertão 3 . 3 3 1 escravos 9 4 forros
408

[fl. 18Iv. ] Segunda "matrícula

Vila R i c a 2 1 . 1 5 8 escravos 870 forros


Cidade Mariana 26.828 escravos 757 forros
Sabara 2 3 . 7 4 6 escravos 919 forros
S e r r o Frio 8 . 3 2 9 escravos 330 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 6 2 9 escravos 521 forros

A n o d e 1737
Primeira matrícula

Vila R i c a 2 1 . 4 0 5 escravos 2 4 1 forros


Cidade Mariana 2 6 . 5 8 4 escravos 1 9 3 forros
Sabará 2 3 . 9 3 7 escravos 8 1 3 forros
S e r r o Frio 8 . 4 7 4 escravos 1 3 3 forros
R i o das M o r t e s 1 4 , 7 1 6 escravos 1 2 9 forros
Sertão 2 . 8 7 7 escravos 3 4 forros

Segunda matrícula

V ü a Rica 21.171 escravos 227 forros


Cidade Mariana 26.684 escravos 184 forros
[fl. 1 8 2 ] R i o das M o r t e s 15.083 escravos 153 forros
Sabará 27.972 escravos 531 forros
Serro Frio 8.274 escravos 139 forros

A n o d e 1738
Primeira m a t r í c u l a

Vila R i c a 21.012 escravos 223 forros


Cidade Mariana 26,532 escravos 184 forros
R i o das M o r t e s 15.096 escravos 138 forros
Sabará 28.082 escravos 516 forros
S e r r o Frio 8,166 escravos 107 forros
Sertão 2.719 escravos 38 forros

Segunda matrícula

Vüa Rica 20.959 escravos 208 forros


Cidade Mariana 26.432 escravos 197 forros
R i o das M o r t e s 15.532 escravos 139 forros
Sabará 29.695 escravos 466 forros
S e r r o Frio 8.198 escravos 109 forros
409

A n o d e 1739 [ fl. 182v. ]


Primeira "matrícula

Vil a R i c a 2 0 . 8 8 3 escravos 192 forros


Cidade Mariana 2 6 . 5 4 5 escravos 2 1 9 forros
S abará 2 2 . 9 3 1 escravos 2 8 8 forros
R i o das M o r t e s 1 5 . 2 8 1 escravos 1 2 8 forros
S e r r o Frio 8 . 2 1 6 escravos 111 forros
Sertão 8 . 1 5 4 escravos 3 6 forros

Segunda matrícula

Vil a R i c a 2 1 . 0 3 8 escravos 2 0 6 forros


Cidade Mariana 2 6 . 1 7 1 escravos 2 2 7 forros
S abará 2 2 . 2 7 4 escravos 2 6 3 forros
R i o das M o r t e s 1 5 . 1 8 2 escravos 122 forros
S e r r o Frio 8 . 2 6 6 escravos 1 0 5 forros

A n o d e 1740
Primeira matrícula

Vila R i c a 2 0 . 6 6 7 escravos 188 forros


Cidade Mariana 2 6 . 0 8 2 escravos 254 forros
Sabará 2 2 . 3 9 2 escravos 243 forros
R i o das M o r t e s 1 5 . 3 0 1 escravos 170 forros
S e r r o Frio 8 . 0 6 3 escravos 93 forros
Sertão 2 . 1 2 7 escravos 2 0 forros

Segunda matrícula

Vila R i c a 2 1 . 1 6 5 escravos 1 8 7 forros


Cidade Mariana 2 6 . 1 3 1 escravos 2 1 4 forros
Sabará 2 2 . 1 2 7 escravos 2 1 2 forros
R i o das M o r t e s 1 5 . 3 0 2 escravos 1 2 8 forros
S e r r o Frio 8 . 1 6 6 escravos 9 0 forros

A n o d e 1741
Primeira matrícula

Vila R i c a 21.171 escravos 1 8 3 forros


Cidade Mariana 26.149 escravos 2 3 6 forros
Sabará 22.495 escravos 2 0 9 forros
R i o das M o r t e s 13.303 escravos 1 2 5 forros
S e r r o Frio 8 . 2 0 6 escravos 9 7 forros
410

S e g u n d a "matrícula

Vila R i c a 21.451 escravos 172 forros


[fl. 183v. ] Cidade Mariana 25.750 escravos 239 forros
Sabará 22.369 escravos 200 forros
R i o das M o r t e s 15.328 escravos 113 forros
Serro Frio 8.316 escravos 86 forros
Sertão 1.498 escravos 7 forros

A n o de 1742
P r i m e i r a matrícula

Vila R i c a 21.492 escravos 219 forros


Cidade Mariana 25.491 escravos 252 forros
Sabará 22.335 escravos 217 forros
R i o das M o r t e s 15.331 escravos 1 11 forros
S e r r o Frio 8.123 escravos 80 forros
Sertão 1.356 escravos 19 forros

S e g u n d a matrícula

Vila Rica 21.561 escravos 247 forros


Cidade Mariana 25.425 escravos 252 forros
[fl. 1 8 4 ] Sabará 22.277 escravos 213 forros
Rio das M o r t e s 15.342 escravos 1 11 forros
S e r r o Frio 8.135 escravos 62 forros

A n o de 1743
P r i m e i r a matricula

Vila Rica 21.673 escravos 236 forros


Cidade Mariana 25.495 escravos 260 forros
Sabará 22.148 escravos 216 forros
R i o das M o r t e s 15.380 escravos 117 forros
Serro Frio 8.009 escravos 55 forros
Sertão 1.719 escravos 7 forros

Segunda matrícula

Vila R i c a 21.746 escravos 238 forros


Cidade. Mariana 24.820 escravos 254 forros
Sabará 22.740 escravos 221 forros
Rio das M o r t e s 15.340 escravos 1 21 forros
[fl. 184v. ] Serro Frio 7.513 escravos 41 forros
411

A n o d e 1744
Primeira " m a t r í c u l a

Vila R i c a 2 1 . 4 0 3 escravos 2 5 1 forros


Cidade Mariana 2 4 . 4 4 8 escravos 2 4 8 forros
S abará 2 2 . 1 4 6 escravos 2 3 7 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 9 2 3 escravos 1 1 9 forros
S e r r o Frio 7 . 1 0 6 escravos 5 7 forros
Sertão 1.349 escravos 3 forros

Segunda matrícula

Vila R i c a 2 0 . 4 8 8 escravos 2 4 0 forros


Cidade Mariana 2 3 . 7 6 8 escravos 2 5 3 forros
S abará 2 0 . 2 7 1 escravos 2 1 9 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 6 9 1 escravos 111 forros
S e r r o Frio 6 . 8 2 8 escravos 4 8 forros

E n t r o u nestes seis meses a p a g a r o P a r a c a t u , p o r ir p a r a lá a I n t e n d ê n c i a , e


até lá p a g a v a p o r sertão.

Paracatu 5 . 9 4 6 escravos 5 6 forros

A n o d e 1745 [fl. 1 8 5 ]
Primeira matrícula

Vila R i c a 2 0 . 1 6 8 escravos 2 4 5 forros


Cidade Mariana 2 3 . 4 3 8 escravos 2 3 2 forros
Sabará 2 0 . 2 5 3 escravos 2 3 5 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 4 2 0 escravos 120 forros
S e r r o Frio 6 . 9 3 5 escravos 5 0 forros
Paracatu 8 . 5 4 8 escravos 8 1 forros
Sertão 1.604 escravos 6 forros

Segunda matrícula

Vila R i c a 2 0 . 0 3 6 escravos 2 3 1 forros


Cidade Mariana 2 3 . 1 5 3 escravos 2 0 1 forros
Sabará 2 0 . 2 4 2 escravos 2 5 4 forros
R i o das M o r t e s 1 4 . 4 1 0 escravos 9 9 forros
Serro Frio 6 . 9 4 3 escravos 4 9 forros
Paracatu 7 . 6 3 2 escravos 6 9 forros
412

[fl. 185v. ] A n o d e 1746


Primeira "matrícula

Vüa Rica 1 9 . 9 3 2 escravos 2 3 5 forros


Cidade Mariana 22.891 escravos 229 forros
Sabará 20.490 escravos 276 forros
R i o das M o r t e s 13.900 escravos 117 forros
S e r r o Frio 6.952 escravos 50 forros
Paracatu 7.581 escravos 74 forros
Sertão 1.582 escravos 4 forros

Segunda matricula

Vila R i c a 19.584 escravos 226 forros


Cidade Mariana 22.665 escravos 240 forros
Sabará 2 0 . 7 0 6 escravos 2 5 8 forros
R i o das M o r t e s 13.662 escravos 112 forros
S e r r o Frio 6.952 escravos 50 forros
Paracatu 7.203 escravos 71 forros

[fl. 1 8 6 ] A n o de 1747
Primeira matrícula

Vila R i c a 16.893 escravos 2 2 1 forros


Cidade Mariana 21.866 escravos 241 forros
Sabará 20.919 escravos 290 forros
R i o das M o r t e s 1 3 . 6 1 9 escravos 1 3 3 forros
Serro Frio 6 . 9 6 8 escravos 6 5 forros
Paracatu 6.620 escravos 8 3 forros
Sertão 1.085 escravos 4 forros

Segunda matrícula

Vi la R i c a 1 9 . 5 4 1 escravos 2 0 8 forros
Cidade Mariana 2 1 . 5 5 0 escravos 2 5 3 forros
Sabará 2 1 . 0 9 4 escravos 2 8 7 forros
R i o das M o r t e s 13.518 escravos 112 forros
S e r r o Frio 6 . 9 4 5 escravos 4 9 forros
Paracatu 6 . 7 2 5 escravos 6 7 forros
413

A n o de 1748 [ fl. 186v. ]


Primeira * m a t r í c u l a

Vila R i c a 1 9 . 1 6 2 escravos 2 0 8 forros


Cidade Mariana 21.331 escravos 235 forros
Sabará 20.740 escravos 267 forros
R i o das M o r t e s 13.584 escravos 124 forros
S e r r o Frio 7.005 escravos 71 forros
Paracatu 6.412 escravos 59 forros
Sertão 1.465 escravos 4 forros

Segunda matrícula

Vila R i c a 19.064 escravos 206 forros


Cidade Mariana 20.792 escravos 2 3 3 forros
Sabará 20.183 escravos 249 forros
R i o das M o r t e s 13.518 escravos 107 forros
S e r r o Frio 6.988 escravos 65 forros
Paracatu 6.223 escravos 58 forros

A n o de 1749
P r i m e i r a matrícula

Vila R i c a 1 8 . 7 3 9 escravos 189 forros


Cidade Mariana 2 0 . 5 3 9 escravos 2 4 4 forros
Sabará 20.838 escravos 284 forros
R i o das M o r t e s 13.711 escravos 103 forros
S e r r o Frio 6 . 9 8 0 escravos 7 2 forros
Paracatu 6.019 escravos 62 forros
Sertão 1.460 escravos 7 forros

Segunda matrícula

Vila R i c a 1 8 . 2 9 3 escravos 182 forros


Cidade Mariana 20.014 escravos 230 forros
Sabará 20.819 escravos 280 forros
R i o das M o r t e s 13.715 escravos 105 forros
S e r r o Frio 6 . 9 7 5 escravos 5 1 forros
Paracatu 5 . 5 2 1 escravos 6 0 forros
414

• 47 -

[ íl. 189 ] Ouro que tem rendido a capitação neste governo das
Minas Gerais, do primeiro de julho do ano de 1735
até o último de dezembro do ano de 1749

O quadro indica os valores totais da arrecadação anual d a


cobrança da capitação em Minas Gerais entre 1735 e 1750, discri-
minados em oitavas, com sua correspondência era arrobas. Ao Fi-
nal, aparece a totalização do rendimento por todo o período entre
1735 e 1749.
Forma, ao lado de outros, u m grupo de documentos com a
contabilidade do rendimento proveniente do quinto para a Fazen-
da do rei. O s números serviriam possivelmente.para subsidiar de-
bate sobre a conveniência ou n ã o da suspensão do método de
capitação. A seriação desses dados durante quase todo o período
permitiria uma avaliação global do funcionamento do método de
arrecadação do quinto. Vincula-se ao documento anterior.
Autoria, local e d a t a : Provedoria da Real Fazenda de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; ca. 1751.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna caligrafada do
século XVIII. Salientam-se as maiúsculas, com apex em forma de
volutas e meio círculo; hastes inferiores prolongadas e uso do " s "
caudado duplo. Números arábicos modernos e definidos, cheios e
arredondados; o número " 8 " tem aspecto particular, com apex em
forma de meia lua. Utilização de traços de guarda antecedendo a
primeira coluna numérica. (YDL)
Critérios editoriais: Foram suprimidas as guardas.
C ó p i a s impressas:
B O X E R , Charles R. A idade de ouro da Brasil: dores de cres-
cimento de uma sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional,
1969. p. 348.
OLIVEIRA, Tarquinio J . B . de (Org. e análise). Erário Ré-
gio de Francisco A..Rebelo, 1768. Brasília: ESAF, 1976. p. 110. Edi-
ção fac-similar.
Ouro que tem rendido a capitação neste governo da§ Minas Gerais, do primeiro de julho do ano de 1735 até,o último de dezembro do ano de 1749
oitavas grãos. arrobas libras. oitavas grãos

Rendeu a segunda matrícula de 1735 e a primeira de 1736 517.723 46 que são 126 12 91 46

Rendeu a segunda matrícula de 1736 279.796 42 que são 68 9. 116 42

Renderam as duas matrículas do ano de 1737 549.312 28 que são 134 3 64 28

Rendeu todo o ano de 1738 550.464 60 que são 134 12 64 60

Rendeu todo o ano de 1739 541.600 00 que são 132 7 32 00

Rendeu todo o ano de 1740 538.143 00 que são 131 12 31 00

Rendeu todo o ano de 1741 539.396 00 qué são 131 22 04 00

Rendeu todo o ano de 1742 536.302 00 que são 130 29 110 00

Rendeu todo o ano de 1743 531.012 00 que são .129 20 68 00

Rendeu todo o ano de 1744 .527.028 00 que são 128 21 52 Oí)

Rendeu todo ò ano de 1745 541.901 00 que são 132 9 77 00

Rendeu todo o ano de 1746 535.666 00 que são 130 24 114 00

Rendeu todo o ano de 1747 525.418 00 que são 128 8 106 00

Rendeu todo o ano de 1748 511.528 00 que são 124 28 40 Õ0

Rendeu todo o ano de 1749 509.692 00 que são 124 13 124 00

Rendeu todo o ano de 1750 114 arrobas e 907 oitavas 7.734.983 32 que são 1.888 13 71 32

Tem rendido a 'capitação dús escravos, do primeiro de juího do ano de 1735 até o último de dezembro de 1749, sete 'contos, setecentos é trinta t quatro mil,
novecentas e oitenta e três 'oitavas e trinta e dois 'grãos de ouro, que são, em 'arrobas, mil oitocentas e oitenta e oito, treze 'libras, setenta e uma oitavas e trinta
e dois grãos de ouro, como acima se vê.

I m p o r t a a capitação do a n o d e 1750 114 arrobas e 9Õ7 oitavas. 1


[ fl. 189v

Nas duas anotações com o rendimento do ano de 1750, fl. 189 e I89v., letra de Caetano da Costa Matoso.
416

> 48 «

[ fl. 190 ] Relação do rendimento que teve


a Fazenda Real das Minas Gerais, o ano de 1749

M a p a discriminando as receitas da Provedoria da Fazenda


Real de Minas Gerais, provenientes da arrematação de contra-
tos, provimento de ofícios públicos, novos direitos, donativos,
terças partes e obras pias. Desde [ 738, eram elaborados, anual-
mente, três quadros com a contabilidade da Provedoria da Fa-
zenda Real de Minas Gerais: as receitas, as despesas, e o ouro
que se remetia à Real Coroa, com a respectiva conversão do
peso em ouro em valores monetários, e vice-versa. Associa-se,
portanto, este quadro aos documentos 49 e 50.
O ouvidor Caetano d a Gosta Matoso recebeu o conjunto de
documentos, ao que tudo indica, para a elaboração de parecer so-
bre irregularidades na Provedoria da Real Fazenda de Minas Ge-
rais e a possibilidade de sua extinção.
Autoria, l o c a l e data: Provedoria da Real Fazenda de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, caligrafada
e destrógrada do século XVIII, com importantes capitulares enfei-
tadas por arabescos e volutas no início do título e dos itens. Uso do
duplo "1"; o primeiro em dois traços, formando ângulo, o segundo
com ampla orelha; do V duplo caudado e hastes inferiores cur-
vas. M a r c a m o texto as abreviaturas de "réis", com "r roulé" segui-
do de "es" sobrepostos, formando nexo; de "grãos" com a m a r c a
da abreviatura na haste inferior em trabalhada voluta dupla, segui-
do de " o " (uncíal, aberto) e "s"( sigmático), também formando nexo.
Uso de números arábicos redondos e do cifrão cortado [$] (for-
m a intermediária entre o caldeirão e o cifrão moderno). Sinais
de guarda nas colunas numéricas. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : F o r a m suprimidas as guardas. A s
abreviaturas das unidades de peso foram mantidas.
Cópia manuscrita:
A P M , C C 2015, fl.37.
417

arrobas libras oitavas grãos


Pelos ' c o n t r a t o s das "entradas d o R i o de J a n e i r o , S ã o
Paulo e d o sertão da Bahia e P e r n a m b u c o , rematados n o
C o n s e l h o U l t r a m a r i n o a Francisco Ferreira da Silva, o
trienio q u e t e v e p r i n c í p i o e m o I d e o u t u b r o de 1 7 4 8 e h á
o

d e findar e m o ú l t i m o d e s e t e m b r o d e 1 7 5 1 , p o r 9 2
' a r r o b a s d e o u r o p e l o trienio, t o c a a o a n o d e 1 7 4 9 30 21 42 48
P e l o s três c o n t r a t o s d o s ' d í z i m o s d a s q u a t r o c o m a r c a s
destas M i n a s e sertão delas, que rematou n o C o n s e l h o
Ultramarino Francisco Teixeira Duarte, procurador do
c a p i t ã o M a n u e l Ribeiro dos Santos, o trienio que teve
p r i n c í p i o e m o 1" d e a g o s t o de 1 7 4 7 e h á d e findar e m
ú l t i m o d e j u l h o d e 1 7 5 0 e m p r e ç o d e 4 4 arrobas e 5 'libras
d e o u r o n o trienio, t o c a a o a n o de 1 7 4 9 14 23 00 00
P e l o c o n t r a t o das ' p a s s a g e n s d o rio d a s M o r t e s , r e m a t a d o
n o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o a j o ã o de S o u s a L i s b o a , o triénio
q u e Leve p r i n c í p i o e m o 1" d e j a n e i r o d e 1 7 4 8 e h á d e lindar
e m o último de d e z e m b r o dé 1750, em preço de
19:5Q0áíQ00 réis p e l o trienio, q u e e m ' o i t a v a s são 1 3 . 0 0 0
oitavas e t o c a a o a n o d e 1 7 4 9 4 . 3 3 3 oitavas e 2 4 ' g r ã o s ,
q u e era arrobas s ã o 01 01 109 24
P e l o c o n t r a t o das p a s s a g e n s d o rio G r a n d e q u e se r e m a t o u
nestas Minas p o r u m a n o a B e n t o Soares d e Sousa, e m
p r e ç o de l:900âS000 réis, q u e e m oitavas s ã o 1.266 o i t a v a s
e 4 8 grãos 00 09 114 48
P e l o c o n t r a t o das p a s s a g e n s d o rio V e r d e , q u e se r e m a t o u
n e s t a s M i n a s p o r u m a n o a o t e n e n t e J o ã o d e Siqueira, e m
p r e ç o d e 80s3000 réis, q u e e m oitavas são 5 3 oitavas e 2 4
grãos 00 00 53 24
P e l o c o n t r a i o das p a s s a g e n s d o s rios d e S ã o F r a n c i s c o ,
P a r a c a t u , U r u c u i a , J e q u i t a í , rio das V e l h a s , d e s d e a c a s a
d e A l e x a n d r e d e S o u s a até o n d e Faz barra o rio d e S ã o
F r a n c i s c o , e t a m b é m as p a s s a g e n s d o rio P a r a o p e b a ,
rematado n o Conselho Ultramarino a J o ã o Francisco, o
triénio q u e teve p r i n c í p i o e m o 1" d e j a n e i r o d e 1 7 4 8 e h á
d e findar e m o ú l t i m o de d e z e m b r o d e 1 7 5 0 , e m p r e ç o d e
6 : 0 0 0 $ 0 0 Q réis p e l o triénio, q u e e m oitavas são 4 . 0 0 0
oitavas e t o c a a o a n o d e 1 7 4 9 1.333 oitavas e 2 4 grãos q u e
são 00 10 53 24
Soma 47 02 117 24

P e l o s ' n o v o s direitos d o s 'ofícios, d o 1" d e m a r ç o d e 1 7 4 9


até 10 d e m a r ç o d e 1 7 5 0 2 . 0 0 6 a r r o b a s e 4 2 grãos 00 15 86 42
Pelas 'terças partes dos ditos n o referido t e m p o 4.086
arrobas e 5 grãos 00 31 118 05
P e l o s ' d o n a t i v o s d o s ditos n o referido t e m p o 1.426 arrobas
e 4 8 grãos 00 11 018 48
[Soma] 48 29 84 47

S o m a a o t o d o o r e n d i m e n t o e são 4 8 a r r o b a s , 29 libras, 84 oitavas e 4 7 grãos.


418

• 49 «

[ íl. 191 ] Despesa que fez esta Provedoria das Minas Gerais
em todo o ano de 1749

M a p a discriminando as despesas da Provedoria da Real Fa-


zenda de Minas Gerais, decorrentes da folha de pagamento de ofí-
cios de governo, fazenda, militares e de côngruas, da manutenção
da tropa regular e de gastos extraordinários. Desde 1738, eram
elaborados, anualmente, três quadros com a contabilidade da
Provedoria da F a z e n d a Real de Minas Gerais: as receitas, as
despesas, e o ouro que se remetia à Real Coroa, com a respecti-
va conversão do peso em ouro em valores monetários, e vice-
versa. Associa-se, portanto, este quadro aos documentos 48 e 50.
O ouvidor Caetano da Costa Matoso recebeu o conjunto de
documentos, ao que tudo indica, para a elaboração de parecer so-
bre irregularidades na Provedoria da Real Fazenda de Minas G e -
rais e a possibilidade de sua extinção.
Autoria, l o c a l e data: Provedoria da Real Fazenda de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; 1750
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna, caligrafada
e destrógrada do século XVIII, com importantes capitulares enfei-
tadas por arabescos e volutas no início do título e dos itens. Uso do
duplo T ' , o primeiro em dois traços, formando ângulo, o segundo
L

com ampla orelha; do " s " duplo caudado e hastes inferiores curvas.
Marcam o texto as abreviaturas de "réis", com "r roulé" seguido
de "es" sobrepostos, formando nexo; de "grãos" com a marca da
abreviatura na haste inferior em trabalhada voluta dupla, seguido de
" o " (uncial, aberto) e "s"{sigmático), também formando nexo. Uso
de números arábicos redondos e do cifrão cortado [$] (forma inter-
mediária entre o caldeirão e o cifrão moderno). Sinais de guarda
nas colunas numéricas. Letra idêntica à do documento 46. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s ; As colações de perdas irrecuperáveis
ou lacunas do original foram feitas a partir da matriz da cópia des-
te Códice (APM, C C 2015, fl.37v.-39) e não foram indicadas nas
colunas numéricas. Foram suprimidas as guardas.
Cópia manuscrita:
APM, C C 2015, fl.37v.-39.
Cópia impressa:
B O X E R , C. R. A idade de ouro do Brasil: dores d e crescimento de
uma sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: NacionaL 1969. p .
349-350.
A o * g o v e r n a d o r e capitão-generab, d e seu sol-
d o d e 7 m e s e s e 17 d i a s , c o n t a d o s d e 14 d e
m a i o até o ú l t i m o d e d e z e m b r o d e i 7 4 9 . « 3:026$666

Ao dito, de ajuda de custo p a r a a j o r n a d a q u e fez


à c a p i t a n i a de Goiás 1:600$000

> 4:979^998
A o ' s e c r e t á r i o , q u e foi A n t ô n i o de Sousa M a c h a -
d o d e seu o r d e n a d o d e 8 meses e 25 dias, conta-
3

dos do I a
d e j u n h o d e 1748 até 25 de fevereiro
d e 1749 294ÀSE444

A o dito, de aluguel de casas, p a p e l , tinta e lacre


p a r a ò e x p e d i e n t e d a Secretaria n o dito t e m p o

A o *tenente de m e s t r e - d e - c a m p o general F r a n -
cisco A n t ô n i o C a r d o s o d e M e n e s e s e S o u s a de}

seu soldo de 7 meses e 8 dias, contados d e 23 de


d e z e m b r o de 1748, dia e m q u e sentou p r a ç a , até
o último d e j u l h o de 1749, e c a p i m p a r a o cavalo
e m q u e esteve m o n t a d o e m o dito t e m p o . . . 686$933

A o dito, d e ajuda de custo pela j o r n a d a d e Goiás, > 2:182^133


a q u e a c o m p a n h o u o dito g o v e r n a d o r e capi-
tão-general 600^000

A õ *ajudante d e t e n e n t e B e r n a r d o d a Silva Fer-


r ã o , d e seu soldo e c a p i m p a r a o cavalo e m q u e
está m o n t a d o e m 1 a n o , findo no último de.outu-
b r o de 1749 , 895^200
A o * ouvido r-geral q u e foi d a c o m a r c a do O u r o
Preto J o s é A n t ô n i o de Oliveira M a c h a d o , de
o r d e n a d o de 8 m e s e s contados, do l 9
de j u n h o
d e 1748 até o último de j a n e i r o d e 1749 .333^333

A o o u v i d o r - g e r a l q u e foi d a c o m a r c a d o R i o
das V e l h a s J o ã o Álvares Simões, d e o r d e n a d o
d e 1 a n o , 5 meses e 10 dias, findos e m 10 d e
fevereiro de 1749 ; 722^222
> 2:263^888

A o ouvidor-geral d a c o m a r c a do R i o das M o r -
tes T o m á s R u b i m d e B a r r o s Barreto, d e o r d e -
n a d o d e 5 meses, c o n t a d o s d e 14 d e m a i o d e
1747, e m q u e se e m b a r c o u n a c i d a d e d e Lis-
b o a p a r a vir servir o dito lugar, até 13 d e outu-
bro d o m e s m o ano, e de 2 anos que tiveram
p r i n c í p i o e m 21 de n o v e m b r o d o m e s m o a n o
e m q u e t o m o u posse até 20 do dito d e 1749.... 1:208^5333

A o "juiz d e fora d a C i d a d e M a r i a n a Francisco


Angelo Leitão, d e o r d e n a d o d e 1 a n o , findo e m 400$000
13 d e m a i o d e 1749

A o "intendente da Fazenda R e a l da C i d a d e
M a r i a n a D o m i n g o s Pinheiro, de o r d e n a d o e aju-
d a d e custo d e 1 a n o , findo no último de j u n h o d e
1749 2:100^000
A o ' i n t e n d e n t e d a F a z e n d a R e a l q u e foi d a
c o m a r c a do R i o das Velhas M a t e u s F r a n c o Pe-
reira, de o r d e n a d o d e 7 meses e 16 dias e ajuda
d e custo, findos e m 16 de fevereiro d e 1749 1:254$444

A o i n t e n d e n t e da F a z e n d a R e a l de P a r a c a t u , o
*capitão-mor Rafael d a Silva e Sousa, d e o r d e -
n a d o e ajudas de custo d e 1 a n o , findo n o último
d e d e z e m b r o d e 1748 2:100$000 > 4:344^720

A o 'escrivão q u e foi d a F a z e n d a R e a l C o n s t a n -
tino d a M o t a Silva, de. o r d e n a d o d e 7 meses e
20 dias, findos e m 30 d e j u l h o d e 1748 319$444

A o escrivão q u e foi d a F a z e n d a R e a l D o m i n -
gos d e A b r e u , d e o r d e n a d o d e 16 m e s e s e 4
dias, findos e m 3 d e d e z e m b r o de 1749 670$832

A o "porteiro, "guarda-livros e "selador q u e foi


da F a z e n d a R e a l M i g u e l d a C o s t a P e r e i r a , de
seu o r d e n a d o d e 2 anos e 19 dias, findos e m 3
de n o v e m b r o de 1747 54^860

A o p o r t e i r o , guarda-livros e selador d a Fazen-


da R e a l Florentino J o s é d a Silva, d e o r d e n a d o
de 1 a n o , findo e m 9 d e n o v e m b r o de 1749 . 250$000
> 929^860

A o "meirinho d a F a z e n d a R e a l M a n u e l de Oli-
veira Santos, d e o r d e n a d o d e 1 a n o , findo e m 21
d e j a n e i r o d e 1749 250^000

A o escrivão q u e foi d o m e i r i n h o d a R e a l F a -
z e n d a M a n u e l d a Costa Lima, d e o r d e n a d o d e 1
a n o e Vs, findo e m 10 d e j a n e i r o de 1748 375^000
422

Ao *ajudante do governo do expediente da


c a p i t a ç ã o G a s p a r dos Reis e Silva, de o r d e n a d o e
ajuda de custo d e 1 ano, findo e m 17 d e m a i o de
1749 ,., 600^000

Ao *fiscal q u e foi d a I n t e n d ê n c i a d e VUa R i c a


Francisco de C a s t r o Gosta, de o r d e n a d o e aju-
d a de custo d e 10 meses e 22 dias, findos e m
22 d e m a i o d e 1749 636^666

> 2:436^666
A o fiscal d a Intendência da C i d a d e M a r i a n a Félix
M a r i n h o de M o u r a , de o r d e n a d o e ajuda d e cus-
to de 6 meses, findos no último de d e z e m b r o d e
1748 400^000

Ao fiscal d a I n t e n d ê n c i a d a c o m a r c a do R i o das
V e l h a s Francisco X a v i e r F e r r a z de Oliveira, de
o r d e n a d o e ajudas de custo de 1 a n o , findo no
último d e j u n h o de 1749 , 800^000

S o m a e passa n a volta f 19:637^265

[fl. 191v..] V e m a s o m a d a l a u d a retro 19:637^265

A o fiscal d a I n t e n d ê n c i a d o P a r a c a t u M a n u e l
Isidoro da Silva, d e o r d e n a d o e ajudas de custo
d e 1 a n o , findo no último de d e z e m b r o de 1748 800$000

A o *escrivão q u e foi d a I n t e n d ê n c i a d a Vila R i c a


M a n u e l d a Silva N e v e s , de o r d e n a d o e ajudas de
custo d e i a n o , findo n o último d e j u n h o d e 1749 700$000

> 2:325^000
A o escrivão q u e foi d a I n t e n d ê n c i a d e Vila R i c a
L u i s d e M e n d o n ç a C a b r a l , de o r d e n a d o d e 3
meses, findos n o último d e setembro de 1749 ... 125$000

A o escrivão d a I n t e n d ê n c i a d a C i d a d e M a r i a n a
N u n o Alves Pereira d e A m o r i m , d e o r d e n a d o e
ajudas d e custo d e 1 a n o , findo n o último d e j u -
n h o de 1749 700^000
A o "escrivão d a I n t e n d ê n c i a d a c o m a r c a do R i o
das V e l h a s J o s é Pereira d a Fonseca, de o r d e n a d o
e ajuda d e custo de 1 a n o , findo no ú l t i m o d e
j u n h o d e 1749 700^000

Ao escrivão da I n t e n d ê n c i a do P a r a c a t u Bento
C o e l h o de Araújo, de o r d e n a d o e ajudas de custo
de 1 a n o , fmdo n o último de d e z e m b r o d e 1748 700^000
> 2:560^000
A o "tesoureiro d a I n t e n d ê n c i a de Vila R i c a J o ã o
de Melo F e r n a n d o , d e o r d e n a d o e ajudas de cus-
to d e 1 a n o , findo n o último de s e t e m b r o d e 1749 580$000

A o tesoureiro q u e foi d a I n t e n d ê n c i a d a Cida-


d e M a r i a n a Luís d e M e n d o n ç a C a b r a l , d e or-
d e n a d o e ajudas d e custo d e 1 a n o , findo n o
ú l t i m o de j u n h o d e 1749 58Òá5ÒOO

Ao tesoureiro da Intendência da comarca do


R i o das V e l h a s A n d r é M o r e i r a d e C a r v a l h o ,
d e o r d e n a d o e ajudas de custo de 1 a n o , findo
no ú l t i m o d e j u n h o de 1749 580^000

A o tesoureiro d a I n t e n d ê n c i a de P a r a c a t u An-
tônio C o r r e i a da R o s a , de. o r d e n a d o e ajudas de > 1:249*000
custo de I a n o , findo n o último d e d e z e m b r o de
1749 580^000

A o "ajudante da Intendência de Vila Rica Silvério


Anacleto Vilar e Sousa, de. ordenado d e 2 meses e
29 dias, findos no último de setembro de 1749 ... 89$000
Ao "ajudante q u e foi da Intendência da C i d a d e
M a r i a n a José Soares de Brito, de ordenado de 11
meses e 20 dias, findos em 20 de j u n h o de 1749... 350^000

A o a j u d a n t e d a I n t e n d ê n c i a d a c o m a r c a do R i o
das V e l h a s Luís J o s é Pinto C o e l h o , de o r d e n a d o
d e 1 a n o , findo n o último d e j u n h o d e 1749 ..,„ 360$000 > 1:070^000

A o ajudante q u e foi d a I n t e n d ê n c i a de P a r a c a t u
T o m á s A n t ô n i o Pizarro d e Araújo e Sousa, de
o r d e n a d o de 1 a n o , findo no último de d e z e m b r o
d e 1748 360^000

A o *meirinho d a I n t e n d ê n c i a d e Vila R i c a D o -
m i n g o s d e M o r a i s , d é o r d e n a d o è ajuda d e custo
de 1 a n o , findo n o último d e j u n h o de 1749 3.2QáSGOO

A o m e i r i n h o dito da m e s m a I n t e n d ê n c i a , d e aju-
d a d e custo do dito t e m p o p o r l i m p a r o o u r o n a
dita e assistir ao peso do q u e v e m das mais inten- > 760$000
dências 120^000

A o m e i r i n h o da I n t e n d ê n c i a d a C i d a d e M a r i a n a
D o m i n g o Bernardes C a r d o s o , de o r d e n a d o e aju-
das de custo de 1 a n o , findo no último de j u n h o
d e 1749 320^000

A o m e i r i n h o q u e foi da I n t e n d ê n c i a d a c o m a r c a
do R i o das Velhas J o s é de Oliveira, de o r d e n a d o
e ajudas d e custo de 6 meses, findos n o último de
d e z e m b r o d e 1748 160$000

A o m e i r i n h o q u e foi d a I n t e n d ê n c i a d o P a r a c a t u
Silvestre T e i x e i r a d a Costa, d e o r d e n a d o e aju- > 540^000
das d e custo de 1 a n o , findo n o último d e d e z e m -
b r o d e 1748 320&QOO

A o m e s m o m e i r i n h o , d e a j u d a d e custo p e l o
t r a b a l h o d e ir a o sertão fazer a c o b r a n ç a dos
reais quintos 60$0QÜ
425

A o "escrivão d a I n t e n d ê n c i a Comissária d a Vila


d e P i t a n g u i T o m á s d e A q u i n o C é s a r d e Azeve-
d o , de o r d e n a d o e ajudas d e custo d e 8 meses e
29 dias, findos n o último d e j u n h o de 1749 313$055

Ao escrivão q u e foi d a I n t e n d ê n c i a dos D i a m a n -


tes d a c o m a r c a do Serro Frio Francisco M a l h e i r o > 938*054
d e A r a ú j o , d e o r d e n a d o d e 6 meses e 7 dias, fin-
dos e m 7 d e j a n e i r o d e 1749 311 $ 6 6 6

A o escrivão atual d a dita I n t e n d ê n c i a Sebastião


de S a m p a i o S a n d e , de o r d e n a d o de 6 meses e 8
dias, findos n o último de j u n h o de 1749 313*333

S o m a e passa e m fronte 29:079*319

V e m a s o m a d a l a u d a e m fronte 29:079*319 [ fl. 192 ]

Ao "tesoureiro d a I n t e n d ê n c i a dos D i a m a n t e s d a
c o m a r c a d o S e r r o Frio d e sobre-salário a o orde-
n a d o q u e v e n c e de 2 anos, findos n o último d e
d e z e m b r o de 1748 192*000
> 3:192*000
A o Excelentíssimo e Reverendíssimo "bispo d a
C i d a d e M a r i a n a d o m frei M a n u e l d a C r u z , d e
sua " c ô n g r u a de 3 anos, findos e m 14 d e d e z e m -
bro de 1748, 3:000*000

Âs "dignidades, "cónegos e mais "ministros da


catedral d a dita C i d a d e , de suas c ô n g r u a s de 9
meses e 2 4 dias, c o n t a d o s de 7 de d e z e m b r o de
1748 até fim de setembro d e 1749 3:904*475
> 4:104*475
A ò "vigário colado d a m a t r i z d e Nossa S e n h o r a
d o Pilar d o O u r o Preto P e d r o L e ã o de Sá, de
sua c ô n g r u a d e 1 a n o , findo e m 20 de d e z e m -
b r o d e 1749 200*000
426

A o "vigário colado d a m a t r i z d e Nossa S e n h o -


ra d a C o n c e i ç ã o d e A n t ô n i o Dias Félix Simões
de Paiva, de sua "côngrua d e l a n o , findo e m 9
de s e t e m b r o d e 1 7 4 8 ; 200^000
> 400$000
A o vigário colado d a m a t r i z de N o s s a S e n h o r a
do B o m Sucesso d o C a e t é H e n r i q u e P e r e i r a ,
de sua c ô n g r u a d e 1 a n o , findo e m 2 6 d e abril
de 1749 200^000

A o vigário colado d a matriz d e S a n t o A n t ô n i o ,


Ribeirão de Santa Bárbara M a n u e l de Sousa
T a v a r e s , de sua c ô n g r u a de 2 a n o s , findos e m
1 6 d e o u t u b r o de 1 7 4 9 400^000

A o vigário c o l a d o d a m a t r i z de Nossa S e n h o r a
da Conceição do Rio de Pedras J o ã o Soares
> 800$000
B r a n d ã o , d e sua c ô n g r u a de 1 a n o , findo e m 7
de s e t e m b r o de 1749............................... 200$000

A o vigário colado da m a t r i z de S a n t o A n t ô n i o
do O u r o B r a n c o R o m ã o F u r t a d o de M e n d o n ç a ,
de s u a c ô n g r u a d e 1 a n o , findo e m 4 d e m a i o
de 1749 200$000

A o vigário e n c o m e n d a d o q u e foi d a freguesia


da C i d a d e M a r i a n a J o s é Matias de Gouveia,
de c ô n g r u a q u e se lhe m a n d o u p a g a r de 2 anos,
1 m ê s e 3 dias, p o r o r d e m d e S u a M a j e s t a d e . 418^333

S o l d o dos *òficiais e s o l d a d o s ' d r a g õ e s d e 1


a n o , findo n o último d e j u l h o de 1749 9:104^735 >I 317I»165W
5 :

Soldos q u e se p a g a r a m fora d e m o s t r a e ajuste d e


fardamentos t 2:800^520

"Pão d e m u n i ç ã o p a r a os soldados e milho p a r a


os cavalos 2:993^577
H o s p i t a l d e soldados „ 1:070*390

Sustento d e cavalos q u e f o r a m m a n d a d o s e m vá-


rias diligências do serviço 1:754*015
> 5:308*967

F e r r a g e n s e curas de.cavalos 1:603*312

Consertos d e selas ? 881 * 2 5 0

C o m p r a de ' b o r r a c h a s p a r a as remessas do ouro,


caixões p a r a ele ir, couros, pregos e tachas 361*312

A carpinteiros e pedreiros de várias o b r a s e con-


sertos q u e se fizeram 1:153*187

C o n s e r t o s d e a r m a s p a r a as tropas , 12'/> > 8 : 2 1 3 ^ 9 7 7 V,

C o n d u ç ã o do o u r o p a r a o R i o d e J a n e i r o e dos
'bilhetes p a r a as intendências , 789$291

"Capitações q u e se restituíram aos eclesiásticos,


"oficiais e "ministros 5:601 $ 3 7 5

Restituições de "novos direitos e "terças p a r t e s às


pessoas q u e os p a g a r a m p r i m e i r o e n ã o serviram
todo o t e m p o das provisões 248*687

C o m p r a de cavalos p a r a o serviço das tropas ... 1:798*875

> 5:I59$I7I
C a p i m q u e se d e s p e n d e u c o m os cavalos das t r o -
pas de. dragões 2:241*843

Despesas miúdas, d e todas as intendências 333$937 %

Despesas m i ú d a s d a F a z e n d a R e a l 535*829
A o " m e s t r e ferreiro M a n u e l J o ã o M a l t a , d e 5
grades d e ferro p a r a o n o v o palácio e t r a b a l h o
d e as assentar ., 692$671

Despesa com o destacamento no Paracatu 8:863$250 >49:555$921

Pelo q u e se d e u a o " c o n t r a t a d o r dos d i a m a n t e s o


"capitão Felisberto C a l d e i r a Brant, na forma das
condições do "contrato 40:000^000

S o m a e são 121:130^996 *

"arrobas 'libras oitavas


Q u e , r e d u z i d o a o u r o de 1.500 "réis p o r "oitava, são 19 22 1 14
429

• 50 <
Mapa do ouro que se remete a el-rei, nosso senhor, pelo seu [fl. 193 ]
Conselho Ultramarino, desta Provedoria da Fazenda Real das
Minas Gerais, em 16 de março de 1750, por ir na presente *frota
do Rio de Janeiro do dito ano

M a p a discriminando as remessas de ouro à Coroa feitas pela


Provedoria da Real Fazenda de Minas Gerais, origem das verbas e
sua conversão em dinheiro. Desde 1738, e r a m elaborados, anual-
mente, três quadros com a contabilidade da Provedoria da Fazen-
da Real de Minas Gerais: as receitas, as despesas, e o ouro que
se remetia à Real Coroa, com a respectiva conversão do peso e m
ouro e m valores monetários, e vice-versa. Associa-se, portanto,
este quadro aos documentos 48 e 49.
O ouvidor Caetano da Costa Matoso recebeu o conjunto de
documentos, ao que tudo indica, p a r a a elaboração de parecer so-
bre irregularidades na Provedoria da Real Fazenda de Minas G e -
rais e a possibilidade de sua extinção.
Autoria, l o c a l e data: Provedoria d a Real Fazenda de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; 1750.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, caligrafada
e deslrógrada do século XVIII, com importantes capitulares enfei-
tadas por arabescos e volutas no início do título e dos itens. Uso do
duplo "1", o primeiro em dois traços, formando ângulo, o segundo
com ampla orelha; do " s " duplo caudado e hastes inferiores cur-
vas. M a r c a m o texto as abreviaturas de "réis", com "r roulé" segui-
do de "es" sobrepostos, formando nexo; de "grãos" com a marca
da abreviatura na haste inferior em trabalhada voluta dupla, segui-
do de " o " (uncial, aberto) e " s " (sigmático), também formando nexo.
Uso de números arábicos redondos e do cifrão cortado [$] (for-
m a intermediária entre o caldeirão e o cifrão moderno). Sinais
de guarda nas colunas numéricas. Letra idêntica à do documen-
to 46. (YDL)
Critérios editoriais: As colações de perdas irrecuperáveis
e lacunas do original foram feitas a partir da matriz da cópia do
Códice {APM, C C 2015, il.39v.) e n ã o foram indicadas q u a n d o
nas colunas numéricas. Foram suprimidas as guardas.
Cópia manuscrita:
A P M , C C 2015, fl. 39v.
430

oitavas graos dinhe

16.099 24 Dezesseis mil, noventa c nove "oitavas e vinte e quatro "grãos de ouro
e m p ó , pertencentes a esta Provedoria da Fazenda Real das Minas
Gerais, que se remeteram para o Rio dc Janeiro era 19 de janeira d e
1750, incluídas nos dois milhões, que a 1.500 "réis por oitava importa
em 24:149^000
59.264 4 Cinquenta e nove mil, duzentas e sessenta c quatro oitavas e quatro grãos
de ouro em pó, pertencentes a esta Provedoria da Fazenda Real das
Minas, que se remetem também para ir na presente 'frota, que a 1.500
réis por oitava importa em 88:8962083 2/6
26.666 4 8 Vinte e seis mil, seiscentas C sessenta c.scis oitavas e quarenta e oito grãos
de ouro, que sc remetem desta Provedoria, e m um conhecimento can
forma que recebeu IJ "contratador dos. diamantes, õ capitão 1'eiisberto.
Caldeira Brant, na forma de suas condições 40:000¡S000
102.030 153:0453*083 2 / 6

Redução a dinheiro Pela maneira seguinte: Redução a oitavas


137:877 Pertencente;; do que ficou do produto dos dois
"contratos, dos caminhos d o Rio de Janeiro,
São Paulo e sertão da Bahia c Pernambuco dc
1 ano dos dilos contratos, ] 25.610 oitavas e 4fi
grãos, das quais despenderam 33.692 oitavas e
48 grãos por não chegarem as mais rendas dos
contratos dos "dízimos e "passagens, às
140:49521479 \/s
< despesas da Provedoria e são [em] oitavas
Pertencente ao 1 por 1(10 para a obra pia de 1
91.918 0

1.256 23
2oi moo Pertencente às munições ordinárias do dito
tempo O > 93.663 47
533á»00 P e r t e n c e n t e às "propinas dos s e n h o r e s
"ministros do Conselho 355 24
"Terças Partes
l/li Pertencente às lei^ças parles dos "olicios do 1" de
ti-.V2.9miH março de 1749 até hm de dezembro do dito ano.
Pertencente às terças partes dos oíícios do 1" 4.086 5
de janeiro até. 10 de março de 1750
I "Novos Direitos!
Pertencente aos novos direilos do 1" de março
3:009¿8873 de 1749 até fim dc dezembro do dito ano
Pertencente aos novos direitos do 1" dejaneiro 2.006 42
ali! 10 dc março de 1 750
i "Donativos I
Pertencente aos donativos dos olicios do l u

2:140*000 março até o fim de dezembro de 1749


Pertencente aos donativos dos oiicios dol" de 1.426 48
janeiro até 10 dc março de I 750

'JÜOAUOO A nitregav ao tesoureiro do C o n s e l h o


Ultramarino pela assistência que fez ao tenente
de "dragões Henrique Carlos de Sousa c
Magalhães de seu soldo de 16 meses, contados

<
do 1" dejunho de N 748 até fim de setembro
l:270á¡625 de 1749 a (¡0 mil réis por niêsl 640 0
200áí>O0 A entregar ao dito tesoureiro por outra tanta
quantia Com que assistiu ao baeharcljoâo de
Sousa Meneses, "ouvidor-geral do Sabarã 133 24 i
i iom 25
¡ De propinas para os senhores ministros do ^ 847 06
Conselho Ultramarino pela remataçno do
coniralo das passagens do rio Grande, feita
nesta* Minas no anq dc 1748 ao capitão João
de Sousa Lisboa, c no ano de 1749 a Bento
Soares de Sousa 73 54
¡53:045ál083 Soma 102.030 04

Que são 24 ["arrobas], 2í) ['libras], 14 [miavas] e 4- l^rãos]


- 51 «

[Papel acerca dos danos da capitação e de proposta


de arrecadação do real quinto do ouro por contrato]

Parecer sobre proposta anônima com 17 cláusulas de arre-


cadação do quinto por contrato, por oito anos, no valor de 16
milhões de cruzados, discutida no Conselho Ultramarino e m de-
zembro de 1747. A arrecadação do quinto por arrendamento,
aventada diversas vezes ao longo do século XVIII, era pleiteada
geralmente por grandes contratadores associados e, muitas vezes,
de forma sincrónica a representações das diversas câmaras de Minas
Gerais contra o sistema de cobrança vigente.
Baseado em teorias corporativas do poder real, seu autor dis-
cute princípios do direito tributário,, historia a tributação do ouro
em Minas Gerais, aponta irregularidades e arbitrariedades na im-
plantação da capitação e defende as casas de fundição.
Documento d e interesse no início da década de 1750, pelas
discussões travadas em torno da capitação, alternativas existentes,
decisão de reinstalação de casas de fundição em Minas Gerais e
implicações d a medida, informaria a participação de Caetano da
Costa Matoso nas juntas para discussão do tema.
Autoria, l o c a l e data: desembargador frei Sebastião Pe-
reira de Castro; Lisboa, 12.12.1747.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O texto, constituído por estruturas
discursivas características da jurisprudência da época, mobiliza
argumentação jurídica contra a cobrança do direito real dos quin-
tos pela capitação ou por contrato de arrendamento. O documen-
to compreende exórdio onde se expõe brevemente a matéria do
discurso, expõe a fundamentação jurídica da posição q u e defen-
de, historia o estado da questão, contrapõe a lei vigente à proposta
divergente e finaliza com argumentação favorável à sua posição (o
que inclui elenco de casos que sustentam sua defesa). O narrador
constitui como tópicas; a leitura de sinais da presença da divina
providência, que evidencia a vontade de Deus escolásticamente
inscrita na ordem das coisas e profeticamente figurada nos fatos e
n a natureza.; a desigualdade entre o esforço dos mineiros na ex-
ploração aurífera e os lucros que obtêm da empresa, objetivando
comover (moveré) o leitor e m favor da causa que defende; a tirania
e o terror tipificados como características inerentes ao sistema de
cobrança de impostos a que se opõe, enfatizando as conseqüências
maléficas da manutenção de tal sistema; a vituperaçâo, caracte-
rística que tipifica os governadores Martinho de M e n d o n ç a e
432

Gomes Freire de Andrade como tirânicos e cruéis, comparando


suas ações com as disposições do Direito, a q u e se acrescenta a
caracterização dos personagens como ardilosos. O parecer final
sobre o sistema de recolhimento do quinto emprega o artificio do
uso favorável das palavras de u m oponente d a tese. {JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a caligrafada
do século X V I I I , bastante personalizada. Destacam-se o uso do
"s" de cauda simples, com formato de cajado ou traço simples,
sinistrógrado, "d" uncial, em ligatura com as vogais; "d" cortado
por traço horizontal {com valor de De latino, nas citações; estas
fornecem muitos tipos de abreviatura, nos títulos de obras e no-
mes de autores, sempre com o uso do ponto sinalizando as abrevi-
ações. Letra de Caetano d a Costa Matoso. (YDL)
C r i t é r i o s editoriais: Os escólios, incorporados ao texto no
original, foram deslocados com o objetivo de facilitar a leitura e
seguindo indicação de cópia d a BNL, cód. 6980, fl. 164-197, As
colações foram feitas a partir da mesma cópia e restringiram-se
aos termos que comprometiam o significado e o entendimento do
texto, mantidas as pequenas variantes introduzidas pelo copista.
Cópia manuscrita:
BNL, cód. 6980, fl. 164-197.

[ fl. 194 J À í n d a q u e m e p a r e c e n ã o só j u s t o m a s necessário p a r a c o n s e r v a ç ã o das


m i n a s d o Brasil q u e o direito real dos "quintos devido a S u a M a j e s t a d e
.do o u r o q u e nelas se extrai se n ã o cobre pela "capitação q u e e m j u l h o d e
1735 i n t r o d u z i r a m G o m e s F r e i r e d e A n d r a d e e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , n ã o
posso convir q u e o referido direito se c o n t r a t e p o r a r r e n d a m e n t o e m u i t o m e n o s
c o m a m a i o r p a r t e das condições q u e os suplicantes p r o p õ e m . Antes, estou p e r s u -
a d i d o q u e o m e l h o r m e i o d e se fazer esta c o b r a n ç a é o estabelecido pelo c o n d e
das Galveias e m 20 e 24 de m a r ç o de 1734, q u e consistia e m s e g u r a r e m aqueles
povos à F a z e n d a d e S u a Majestade cem "arrobas d e o u r o e m c a d a u m a n o , livres
d e todos os gastos, e além delas t u d o o mais q u e os quintos produzissem. E d e fato
i m p o r t o u o r e n d i m e n t o deles, d e 22 de m a r ç o de 1734 a t é o u t r o tal dia do a n o d e
1735, 137 a r r o b a s de o u r o , alguns "marcos, "onças e "oitavas.
P o r q u a n t o posto q u e os direitos reais e a i n d a os tributos l e g i t i m a m e n t e impostos
(isto é, c o m j u s t a c a u s a , p r o p o r ç ã o às faculdades dos vassalos,' m o d e r a ç ã o e tal
a 3 0

Perez, adtit. cod. de anou. et tribuí., n 11; Pprtug-, de donat.,lÍb. 1, cap. 24, n 96;Molin. dejust.
s Q

et jur., dísp. 667, n l:


9

Kloch.; de erar., lib. 2, cap. 51, riel, cap. 52 a n 1, et de contrib., cap. 17, et DD. s. n l.
B 3 9

Perez, ad. tit. cod. de anon. et tribut., ti 15 e 16; Kloch,, de erar., n 51 e 52.
9 B
433

igualdade q u e n ã o fiquem mais gravados os p o b r e s q u e os ricos") se d e v a m c o b r a r


i n t e i r a m e n t e , p o r q u e h a v e n d o falta n a a r r e c a d a ç ã o deles n ã o terão os príncipes os
e

meios necessários p a r a a defesa das m o n a r q u i a s respectivas, conservação da g r a n d e -


za conveniente a o sublime estado e m q u e D e u s os p ô s / d e v e fazer-se a c o b r a n ç a s e m
injustiça ou violência e d e m o d o q u e se n ã o a r r u i n e m os Estados e o m e n o s q u e for
possível se v e x e m os devedores.S
D e s t a m o d e r a ç ã o se c o n s i d e r a m , e n t r e todos os vassalos, mais dignos os m i n e i -
ros, p o r q u e , e n r i q u e c e n d o aos seus príncipes e repúblicas,* / / são o r d i n a r i a m e n t e
1
[ fl. 194v. ]
pobríssimos, levando-os [a] este infortúnio g a s t a r e m q u a n t o p o d e m h a v e r e m r o m -
p e r p e n h a s c o s , a r r a s a r m o n t e s e m u d a r rios, trabalho e despesa a q u e o r d i n a r i a m e n -
1

te n ã o c o r r e s p o n d e m os frutos q u e conseguem, ou p o r q u e n ã o a c h a m o m e t a l q u e
p r o c u r a m ou p o r q u e o q u e d e s c o b r e m é m u i t o p o u c o J
E p o r q u e t e n d o os príncipes, e m b o a opinião, obrigação d e j u n t a r tesouros p a r a
q u e p r o n t a m e n t e possam expedir os negócios d a sua m o n a r q u i a n a p a z e n a g u e r r a
sem q u e lhes seja necessário g r a v a r os seus vassalos c o m novos tributos,' n ã o h á m e i o 1

mais p r o p o r c i o n a d o p a r a conseguir este fim q u e p r o c u r a r se l a v r e m as m i n a s j á des-


cobertas e se d e s c u b r a m outras d e novo,^ arbítrio q u e se n ã o p o d e p r a t i c a r s e m se
favorecerem os mineiros.
Este é o f u n d a m e n t o p o r q u e os reis de Castela têm, a c e r t a d a m e n t e , o r d e n a d o
aos "ministros das suas índias incitem c o m p r ê m i o s aos m o r a d o r e s delas a t r a b a -
lhar no descobrimento de novas minas e no exercício das j á descobertas, 111
e posto
q u e dos m e t a i s q u e se e x t r a e m t e n h a m o direito d o * q u i n t o , nas m i n a s n o v a -
n

m e n t e descobertas se c o n t e n t a m c o m a sétima, oitava ou d é c i m a p a r t e , e muitas


vezes c o m a v i g é s i m a . 0

Molin., de just. et jur., disp. GG8, n l; Petr. Greg., de republ.,lib. 3, Cap 5, n 16.
9 e

e
- L, omnes3, alias 4, L. omnes4, alias 5; Cod. deanon. et trib.,ubiLuc, dePen. et Amaya, n 4; Petr. 9

Greg., de rep.,lib. 3, cap. 1, i i 1.


s

^ 1. 1, §8, causa 20, ss", de quaest. Novel 54, cap. 2; Kloch., de Contrib., cap. 16,n 46e 174et de aerar.
9

iib. 2, cap. 80, i i 19.


e

1. 1,L. nemo 2, cod. de exact trib.; Kloch., de aerar., Iib. 2, cap. 51, n 6, et cap. 50, et 52, et desup.
9

exact., i i 4-
e

1. 1, cod. de metalar.; Solorz. tom. 2, de jur. Ind., Iib. 1, cap. 13, ir 57, etlib. 5, cap. 1, n 20; Port.,
9 9

de donat., Iib. 3, cap. 12, n 14.


e

l
- Solorzan., dejur. Ind., Iib. 1, cap. 13, n 50, et DD. n 8.
B fi

J- Cassan., in Cathol. glon mund., p. 11, consid. 38; Scalon., Gazoph. reg., Iib. 2, cap.l, n 4. 9

k
- Petr. Greg., de rep., Iib. 3, cap. 9; Solorz., dejur. Ind., tom. 2, lib. 1, cap. 13, n 29. 9

I* Idem Solorz., n 33, 34, et 87; Kloch., de aerar., cap. 27, n 10, 13, lib. 2.
9 B

m
* ;
Idem Solorz., tom. 2, lib. 5, cap. un., n 23.
s

n
- Idem Solorz., dicto cap. un., n 9; Scalon., Gazoph. reg., lib. 2, p. 2, cap. 1.
s

°- Idem Solorz., n 9; Ídem Scalon., dicto cap. I , n 4.


9 9 a
434

N ã o e s q u e c e u esta política nestes reinos, p o r q u e a O r d e n a ç ã o m a n d a p r e m i -


ar aos q u e d e s c o b r e m novas minasP e o "regimento destas dispõe se a t e n d a m n a
r e p a r t i ç ã o d a s lavras, a i n d a c o m p r e f e r ê n c i a às q u e d i s p u n h a sè r e s e r v a s s e m à
F a z e n d a Real.*!
Pelo c o n t r á r i o , q u a n d o os mineiros são tratados c o m violência ou injustiça t e m
sucedido, p o r m u i t a s vezes, desvanecerem-se as minas, " e p o s t o q u e Solorzano atri-
1

b u a este sucesso a castigo d e D e u s , é certo q u e e m todos os casos e m q u e os mineiros


forem pelo referido m o d o vexados se h ã o d e a c a b a r as minas, p o r q u a n t o , a i n d a q u e
[ fl. 195 ] nelas se n ã o e x t i n g a m as veias, n e c e s s a r i a m e n t e / / h ã o de ficar inúteis p o r falta d e
q u e m os t r a b a l h e .
P o r q u e c o m o p a r a descobrir n o v a s r n i n a s e t r a b a l h a r nas j á descobertas se ne-
cessita d a g r a n d e despesa e t r a b a l h o , j á referidos e advertidos pelo "alvará de 8 de
agosto de 1618, destituídos os mineiros pelas vexações, violências e injustiças, e a i n d a
q u e pelos tributos d e s p r o p o r c i o n a d o s dos cabedais necessários, p r e c i s a m e n t e h ã o d e
d e s a m p a r a r as m i n a s j á descobertas e deixar d e p r o c u r a r outras novas, n ã o só c o m
insigne prejuízo do seu príncipe e "república, m a s a i n d a c o m evidente perigo de
3

se d e s p o v o a r e m e p e r d e r e m as terras e m q u e as m i n a s são sitas. 1

P o r q u a n t o assim c o m o as m i n a s b e m cultivadas são causa d e se f u n d a r e m novas


p o v o a ç õ e s e de se a m p l i a r e m as j á fundadas, 11
destituídas estas de operários, necessa-
riamente h ã o d e cessar as povoações novas e desertarem-se as j á estabelecidas.
D e q u a n t o s m e i o s se t ê m p r a t i c a d o n a c o b r a n ç a dos " q u i n t o s e a i n d a d e
q u a n t o s se t ê m l e m b r a d o , c o n t a n d o e n t r e eles os q u e oferecem os suplicantes, o
mais útil à F a z e n d a de Sua Majestade e m e n o s p e s a d o aos mineiros é o estabele-
cido pelo c o n d e das Galveias, q u e deixo a p o n t a d o c o m o se faz certo, conferindo
uns c o m outros, p a r a o q u e os referirei pela o r d e m dos t e m p o s .
N o alvará de 8 d e agosto de 1618 se d e t e r m i n o u q u e n a c a p i t a n i a d e S ã o Paulo
v

ou de São V i c e n t e houvesse u m a feitoria e m q u e residisse u m "tesoureiro c o m seu


" e s c r i v ã o , q u e l a n ç a r i a e m livro os q u i n t o s do o u r o , p r a t a e m a i s m e t a i s , e o
"provedor, q u e seria "superintendente dela, faria p a g a r os quintos a todos os la-
v r a d o r e s das m i n a s e tiraria "devassa c a d a seis meses dos q u e , sem os p a g a r , *de-
s e n c a m i n h a v a m Ouro ou o u t r o q u a l q u e r metal.

P- Ord., lib. 2, tit. 34, hi princ; Portg., de donat., lib. 3, cap. 12. n 14. B

^ Regimento das Minas, parágrafos 5 e 6.


- Idem Solorz., tom. 2, cap. 16", n 4, 10, 13, et 14, et lib. 5, cap. l , n 2 1 .
r a fl

- Xloch., dç aerar.,"lib. 2, cap. 27, pto. 7, et 28, 29,30,31, 32, 33, et 34; idem Solorz., dicto cap. 13
s

a 4. 3

^ Idem Solorz., ubis. n 6, 14,15, c 19; idem Kloch., n 13.


9 9 a

u
- Idem Kloch., dicto n 13. 9

- Nos números 14, 15 e 1G.


v
435

M u i t o s anos depois se d e u o u t r o "regimento a estas M i n a s , q u e , s e m fazer


m e n ç ã o do referido "* alvará, dispôs se registrasse o o u r o q u e saísse delas e m livro
n u m e r a d o e r u b r i c a d o p e l o * s u p e r i n t e n d e n t e , d e c l a r a n d o - s e , n o t e r m o d o regis-
tro o n o m e d a pessoa q u e registrava, o dia, mês e a n o e m q u e se fazia o registro e
a q u a n t i d a d e d o o u r o r e g i s t r a d o e a *oficina p a r a o n d e se l e v a v a a * q u í n t a r ,
e n t r e g a n d o - s e à dita pessoa u m a *guia c o m todas / / a s declarações r e f e r i d a s . w
[ fl. 195v. ]
Concluía a referida disposição i m p o n d o a todas as pessoas q u e extraíssem ouro
das M i n a s sem q registrar e quintar, além do perdimento dele, todas as mais p e n a s
dos q u e *descaminham direitos reais, c o m a declaração dc q u e o p o d e r i a m manifes-
tar, sem as incorrer, e m q u a l q u e r casa dos quintos antes de c o m ele serem apreendi-
dos, e o r d e n a n d o que o superintendente tomasse as denunciações q u e lhe dessem,
e m público ou e m segredo, g u a r d a n d o em u m a s e outras as disposições de Direito,
o d e t e r m i n a d o naquele regimento e no da Alfandega desta c í d a d e , e q u e as mes- x

m a s denunciações p o d e r i a m t a m b é m t o m a r os 'ouvidores da c o m a r c a d e São P a u -


lo e R i o de J a n e i r o , r e m e t e n d o os tratados a o superintendente p a r a d a r livramento
aos culpados.
Mostrando, p o r é m , a experiência não bastava a providência do regimento
p a r a evitar q u e o o u r o se extraísse das M i n a s s e m p a g a r quintos, se o r d e n o u a o
' g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e d e C a r v a l h o fizesse q u e a dita c o b r a n ç a se
executasse p o r *bateias, i m p o n d o - s e a c a d a u m a delas a c o n t r i b u i ç ã o a n u a l q u e
parecesse j u s t a , o q u e n à v e r d a d e era u m a *capitação posta sobre c a d a u m dos
escravos q u e t r a b a l h a v a m n a s M i n a s , p o r ser certo q u e c a d a u m a das b a t e i a s é
servida p o r u m só escravo.
E p o s t o q u e o dito g o v e r n a d o r ajustasse esta f o r m a d e p a g a m e n t o c o m a
C â m a r a d e S ã o P a u l o p e l o assento d e 17 d e j u l h o d e 1710, r e s e r v a n d o às das
M i n a s o arbítrio d a q u a n t i d a d e , foi tão m ó d i c a as e m q u e estas c o n v i e r a m q u e
ficava o p r o d u t o desta contribuição m u i t o inferior a o q u e se c o b r a v a pelos quin-
tos e p o r esta r a z ã o se p r o c e d e u no ajuste, d e i x a n d o a c o b r a n ç a dos quintos n o
;

m e s m o estado e m q u e se achava.y
E posto q u e sucedendo-lhe no governo d o m Brás Baltasar d a Silveira, tratas-
se n o a n o d e 1714 de e x e c u t a r o referido projeto, só conseguiu dos p o v o s q u e ,
l e v a n t a d o s os *registros e c o r r e n d o o o u r o l i v r e m e n t e , p a g a r i a m , e m l u g a r dos
quintos, trinta *arrobas de. o u r o p e l o dito a n o de 1714, q u e se t i r a r i a m p o r *fmta,
e q u e d a n d o ele, g o v e r n a d o r , c o n t a a Sua Majestade, se praticaria n o s anos futu-
ros o q u e o m e s m o s e n h o r o r d e n a s s e . 2

w
" Regimento das Minas, parágrafos 25 e 29.
x
- Nos capítulos 97, 98 el03.
>'• Assento do 10 de dezembro de 1710.
z
- "Carta de Sua Majestade de 12 de novembro de 1714.
436

[ íl. 1 9 6 ] E n t r o u o a n o de 1715, e não tendo o "governador recebido resposta da


c o n t a q u e havia d a d o , r e n o v o u p a r a o m e s m o a n o o ajuste q u e se havia p r a t i c a d o
n o a n t e c e d e n t e , e a r e s p e i t o dos povos o r d e n o u q u e os "ouvidores r e p a r t i s s e m
pelas " c â m a r a s a q u a n t i a q u e c a d a u m a devia p a g a r , ficando p o r c o n t a delas p ô r
p r o n t a a q u e se lhe a r b i t r a s s e . aa

T e n h o p o r certo q u e n a s conferências q u e o g o v e r n a d o r teve c o m os povos


se a p o n t o u t a m b é m o arbítrio d e q u e os "quintos se p a g a s s e m p o r c o n t r i b u i ç ã o
i m p o s t a sobre os gêneros q u e se i n t r o d u z i a m nas M i n a s , p o r q u e n a "carta d e 12
de n o v e m b r o d e 1714 n ã o só se r e p r o v a o ajuste das trinta "arrobas, c o m o funda-
m e n t o de q u e , fazendo-se a r e p a r t i ç ã o p o r "finta, a l é m da desigualdade q u e h a v e -
ria d e se fintar e m m a i s q u e m devia p a g a r m e n o s , se e x c e d e r i a o c ô m p u t o d a
i m p o r t â n c i a , c o m o d e o r d i n á r i o sucedia.
M a s se declarava q u e o s e g u n d o m o d o de c o b r a n ç a , q u e consistia e m se p a g a -
r e m os quintos pelos negros e cargas q u e se i n t r o d u z i a m nas M i n a s , além d e ser
i m p r ó p r i o , se v i n h a , p o r este novo tributo, a gravar o comércio, h a v e n d o - s e p o r ele os
q u i n t o s d o o u r o q u e os mineiros t i n h a m obrigação d e p a g a r , ficando, p o r este m o d o ,
o m e s m o comércio impossibilitado p a r a admitir a l g u m e n c a r g o ou subsídio q u e , c o m
j u s t a causa, se lhe impusesse p a r a a c u d i r à necessidade p ú b l i c a do R e i n o o u defesa
das Conquistas.
C o n c l u i n d o u l t i m a m e n t e q u e o m e i o mais n a t u r a l e r a c o b r a r e m - s e os quintos,
p a g a n d o - s e p o r c a d a negro m i n e i r o , se n ã o as "oitavas q u e era o b r i g a d o a p a g a r ,
ao m e n o s as e m q u e p o r "avença se ajustassem, Ficando os m i n e i r o s favorecidos
no p a g a m e n t o dos quintos e a F a z e n d a R e a l m e n o s p r e j u d i c a d a , d e i x a n d o n o
arbítrio do g o v e r n a d o r o ajuste, c o n t a n t o q u e de c a d a n e g r o m i n e i r o se pagassem,
e m c a d a a n o , a o m e n o s doze oitavas, m a s q u e , antes d e fazer o dito ajuste, faria
cálculo do n ú m e r o dos n e g r o s q u e havia nas M i n a s , e se pelas oitavas q u e d e c a d a
u m se havia d e p a g a r ficava a F a z e n d a R e a l a v u l t a d a o u c ó m prejuízo.
R e c e b i d a esta carta, r e p a r t i u o g o v e r n a d o r d o m Brás d a Silveira as diligências
[ fl. 196v. ] p a r a introduzir o p a g a m e n t o dos quintos / / p o r "bateias, e p r o p o n d o aos povos a
n o v a o r d e m q u e a c a b a v a d e receber foi u n i f o r m e m e n t e rejeitada a n o v a f o r m a d e
p a g a m e n t o , p o r assento de 13 d e m a i o de 1715.
P a r a justificar a repulsa^ ofereceram os povos u m p a p e l e m q u e diziam era im-
possível e c o n t r a a r a z ã o p a g a s s e m os h o m e n s o q u e n ã o deviam, q u e e r a m mais
obrigatórios os "dízimos, e n ã o se d e v i a m senão depois de recolhidos os frutos, e
j a m a i s se v i r a se p a g a s s e m d í z i m o s d o q u e se n ã o p l a n t o u n e m c o l h e u , e q u e
s e n d o esta r e g r a c e r t a n ã o havia f u n d a m e n t o p a r a p a g a r e m q u i n t o s os h o m e n s
que não tiravam ouro.
Q u e o p a g a m e n t o dos quintos se fundava n a obrigação de vassalos, m a s n ã o
c o n c o r d a v a m q u e a n d a n d o a m a i o r p a r t e dos m i n e i r o s e m d i l a t a d o s serviços,

Assento de 3 de janeiro de 17Í5.


437

e n t r a n d o neles e m p e n h a d o s e a c r e s c e n t a n d o o e m p e n h o c o m os gastos d o susten-


to e f e r r a m e n t a , atrás de u m a e s p e r a n ç a q u e , d e i x a n d o b a l d a d o o t r a b a l h o e as
despesas, algumas vezes p r o d u z i a muito p o u c o e m u i t a s n a d a , n ã o h a v i a m o t i v o
p a r a os o b r i g a r e m à nova f o r m a de p a g a m e n t o ; antes, se se intentasse obrigá-los,
d e i x a r i a m d e i n t e n t a r os ditos t r a b a l h o s e d e s a m p a r a r i a m os principiados, e se se
n ã o r e t i r a s s e m p a r a os p o v o a d o s m u d a r i a m d e t r a t o , n a c o n s i d e r a ç ã o q u e e m
breves anos v e r i a m r e m a t a d o s e m p r a ç a os seus escravos p o r c o b r a n ç a violenta.
Q u e n o C o n s e l h o [ U l t r a m a r i n o ] faltava a experiência d a q u e l e m o d o d e vida
do dilatado t e r r e n o das M i n a s , dos g r a n d e s e m p e n h o s dos m i n e i r o s , das m o r t e s
c o n t i n u a d a s , fugidas e d o e n ç a s dos escravos, das repetidas m u d a n ç a s dos m o r a d o -
res, q u e hoje se a c h a v a m n a q u e l a vila, a m a n h ã n o S a b a r a e n o o u t r o dia n ã o
a p a r e c i a m ; hoje e r a m mineiros e l a v r a v a m nesta p a r a g e m , a m a n h ã e m o u t r a , e
n o o u t r o dia i a m p a r a a roça, e n o outro p a r a o p o v o a d o ; hoje t i n h a m u m n e g r o ,
a m a n h ã c o m p r a v a m vinte, n o o u t r o dia v e n d i a m dez, e n o o u t r o lhes a d o e c i a m
três, e no o u t r o dia lhes fugiam q u a t r o , e p o u c o seria o t e m p o p a r a t i r a r e m licença
p a r a as m u d a n ç a s , justificações e fugidas, certidões d e m o r t e s , vistorias d e d o e n -
ças, e n t r a d a s de c o m p r a s , p a r t e das v e n d a s e o o u r o p a r a p a g a r estas diligências; e
desta i g n o r â n c i a p r o c e d i a insistir-se n o / / arbítrio p r o p o s t o . [ fl. 197 }
Q u e os mineiros s e m p r e p a g a v a m os *quintos, p o r q u e t o d o o o u r o q u e tira-
v a m era p a r a c o m p r a r e m o q u e lhes e r a necessário, e q u e m v e n d i a s e m p r e salva-
va n o p r e ç o a i m p o r t â n c i a dos quintos e a reservava, d e m o d o q u e , desde o prin-
cípio das M i n a s , s e m p r e p a g o u os quintos q u e m levou o o u r o aos p o v o a d o s , e a
m a i o r p a r t e do q u e nestes se j u n t a v a p r o c e d i a d o q u e os negros furtavam e gasta-
v a m e m se enfeitar, e c o m o t o d o o o u r o ia aos m e r c a d o r e s , q u e i n d i s t i n t a m e n t e
v e n d i a m a b r a n c o s e a n e g r o s , eles d e v i a m p a g a r os q u i n t o s , c o m o s e m p r e se
praticara.
Q u e a n o v a f o r m a d a c o b r a n ç a n ã o c o n c o r d a v a c o m o p r e s e n t e estado das
M i n a s ; antes, destruiria nelas a m e l h o r p o r ç ã o d o d o m í n i o real, p o r i a e m contin-
gência a F a z e n d a de S u a Majestade, a r r u i n a r i a os povos. J á c o m a leve notícia do
n o m e de *bateias se r e t i r a v a m e m g r a n d e n ú m e r o , e os q u e ficaram fizeram súpli-
ca a todas as c â m a r a s , considerando-se perdidos p o r e m p e n h o s q u e ficariam p o r
satisfazer, os credores queixosos, as esperanças frustradas e os trabalhos b a l d a d o s .
Q u e n a c a r t a de Sua Majestade se dizia ser n a t u r a l o p a g a m e n t o d o o u r o p o r
bateias, e assim p a r e c i a , m a s era nas e m q u e se a c h a v a o u r o , e q u e eles e s t a v a m
p r o n t o s a p a g a r os quintos q u e devessem, m a s q u e , pelas razões p o n d e r a d a s , era
impossível pagá-los p o r bateias.
S e m e m b a r g o d a referida c o n t r a d i ç ã o , fez o *governador tal força p a r a p ô r
e m p r á t i c a o p a g a m e n t o dos quintos p o r bateias q u e c h e g o u a estabelecê-lo pelo
assento d e 18 d e m a r ç o d e 1715, q u e se n ã o chegou a executar p o r se l e v a n t a r e m
algumas vilas das M i n a s , incidente q u e o obrigou a c e d e r e estar pelo ajuste das
trinta "arrobas anuais, fato q u e lhe foi a p r o v a d o p o r c a r t a de 4 d e m a r ç o d e 1716.
438

Esta m e s m a forma d e c o b r a n ç a se continuou no t e m p o d o ^governador d o m


P e d r o d e Almeida, c o n d e de Assumar, q u e sucedeu a d o m Brás n o a n o de 1717,
p a g a n d o os m o r a d o r e s , e m c a d a u m ano, mais algumas "arrobas d ê ouro c o m q u e
o dito conde fez acrescentar esta c o n t r i b u i ç ã o , ab
p a r a p a g a m e n t o d a qual se serviam
[ fl. 197v. ] os m o r a d o r e s d e u m a c o n t r i b u i ç ã o i m p o s t a / / sobre os gados v a c u n s , cavalos e
mulas, escravos e mais gêneros "molhados e "secos q u e e n t r a v a m n a s M i n a s , q u e
teve o r i g e m d o a s s e n t o q u e os p o v o s fizeram c o m o g o v e r n a d o r A n t ô n i o de
A l b u q u e r q u e d e C a r v a l h o p a r a do p r o d u t o dela saírem os o r d e n a d o s dos "minis-
tros e as despesas do g o v e r n o . ac

E p o s t o q u e d a n d o conta o g o v e r n a d o r fosse S u a M a j e s t a d e servido admitir


s o m e n t e a l g u m a imposição m o d e r a d a sobre os gados, * p a s s a d o a l g u m t e m p o se
ac

o r d e n o u q u e , ouvidos os povos, se admitisse nos mais gêneros, p a g a n d o - s e p o r c a d a


escravo, cavalo ou m u l a sem sela duas "oitavas d e o u r o , p o r c a d a boi ou v a c a u m a
oitava, e p e l a *fazenda seca oitava e. meia, pelo peso d e duas a r r o b a s . a e

P o r é m desta contribuição se n ã o serviu Sua Majestade até o a n o d e 1719, e m


q u e m a n d o u d a r providência p a r a se separar do p a g a m e n t o dos "quintos, c o m o
q u a l , até e n t ã o , a n d o u misturado, ^ e nela consiste, p r e s e n t e m e n t e , o i m p o r t a n t e
31

"contrato a q u é c h a m a m das "passagens ou "entradas.


N o m e s m o a n o de 1719, pela lei de 11 de fevereiro, se d e t e r m i n o u se n ã o co-
b r a s s e m mais pelo referido ajuste das a r r o b a s de o u r o os quintos, e q u e p a r a arreca-
d a ç ã o destes se erigissem nos sítios mais convenientes "casas d e fundição, e m q u e
se reduzisse a b a r r a s todo o o u r o q u e se extraísse das M i n a s , e se n ã o p o d e r i a levar
e m p ó fora delas m a s só nas ditas b a r r a s , m a r c a d a s n a f o r m a d e c l a r a d a n a referida
lei. E q u e só nas M i n a s p o d e r i a correr o u r o e m p ó e os m o r a d o r e s delas c o m e r c i a r
c o m ele e n t r e si, à r a z ã o de dez "tostões a oitava, e q u e as b a r r a s fundidas n a
s o b r e d i t a f o r m a c o r r e r i a m n a s M i n a s à r a z ã o de 1.400 "réis a o i t a v a , s e n d o d e
vinte e dois "quilates, crescendõ-lhe e diminuindo-Ihe o valor à p r o p o r ç ã o do q u e
tocasse. C o n c l u i a dita lei d a n d o t e m p o c o n v e n i e n t e p a r a se erigirem as casas d e
fundição e c o n s u m i r o o u r o e m p ó q u e fora das M i n a s se a c h a v a disperso, e c o m
as p e n a s e cautelas q u e p a r e c e r a m convenientes p a r a a observância d a m e s m a lei.
N á c a r t a p o r q u e o g o v e r n a d o r , o c o n d e de Assumar, deu c o n t a d e haver execu-
t a d o a dita lei, r e p r e s e n t o u seria m u i t o conveniente q u e nas M i n a s se erigisse casa
[fl. 1 9 8 ] d a m o e d a , p r o i b i n d o - s e / / a i n d a , d e n t r o delas, o uso d o o u r o e m p ó , e s e n d o
a p r o v a d a a p r o p o s t a se m a n d o u erigir por "carta d e 19 de m a r ç o d e 1720, o q u e ,

Como consta da *lei de 11 de fevereiro de 1719.


Assento de 17 de junho de 1710.
Por carta de 24 de julho de 1711.
Carta de 1 de fevereiro de 1713.
B

Pela lei de 11 de fevereiro de 1719.


439

c o m efeito, se fez, ficando o p a g a m e n t o dos "quintos na m e s m a f o r m a e m q u e o


havia posto a lei d e 11 d e fevereiro d e 1719.
Esta forma d e p a g a m e n t o , q u e p r e c i s a m e n t e consistia e m se p a g a r nas *casas
d e fundição o q u i n t o do o u r o q u e se extraía das M i n a s n a forma d a TOrdenação,
*alvará e * r e g i m e n t o l , S c o n t i n u o u n o resto do governo do c o n d e d e A s s u m a r , e
a

e m todo o d e d o m L o u r e n ç o de Almeida, e e m p a r t e [do] do c o n d e das Galveias,


até q u e , h a v e n d o informação certa d e *descaminho d e o u r o e m p ó , casas d e m o -
e d a e b a r r a s falsas, se serviu S u a M a j e s t a d e d e m a n d a r às M i n a s M a r t i n h o d e
M e n d o n ç a c o m o r d e n s dirigidas a o c o n d e das G a l v e i a s p a r a q u e , e v i t a d o s os
d e s c a m i n h o s e falsidades, se cobrassem i n t e i r a m e n t e os quintos, d e i x a n d o n a es-
c o l h a dos povos o arbítrio q u e parecesse mais eficaz.
Mostra-se o sobredito d a proposta que e m 20 de m a r ç o de 1734 fez e m n o m e
de Sua Majestade o c o n d e das Galveias, e m presença d e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a ,
aos "procuradores dos povos das Minas, e m a qual, depois d e se intimar a necessidade
que havia de evitar os roubos q u e se faziam à Fazenda Real no descaminho do ouro,
se freprovaval c o m o indigno o meio de se abater o quinto, p o r p o u c o eficaz; o de se
acrescentarem as penas aos "descncaminh adores do ouro, p o r menos bastante; o de
se acrescentarem "cabos e "ministros, por depender d a fidelidade dos soldados e "ofi-
ciais de Justiça e trazerem g r a n d e despesa à Fazenda Real e vexação aos vassalos fiéis.
P o r p o u c o c o n v e n i e n t e o d e c o b r a r os q u i n t o s p o r " c o n t r a t o , p o r q u a n t o ,
a i n d a q u e estes cresciam c o m o t e m p o , h a v i a m os " c o n t r a t a d o r e s d e p e d i r condi-
ções e x o r b i t a n t e s e prejudiciais à q u i e t a ç ã o dos p o v o s , e e m c o n s e q ü ê n c i a aos
interesses d e Sua. Majestade;, p o r desigual a d e i m p o r q u a n t i a e q u i v a l e n t e n o s
gêneros usuais q u e se c o n s o m e m nas M i n a s , p o r q u e n ã o t e n d o eles c o n e x ã o i m e -
diata c o m a extração d o ouro p a g a r i a m a i o r q u a n t i a q u e m mais deles necessitasse.
Q u e p a r e c i a m mais a c o m o d a d o s os meios q u e t i r a v a m a ocasião dos principais
d e s c a m i n h o s , p o s t o q u e n ã o livres d e inconvenientes^ p o r q u e o proibir-se absoluta-
m e n t e t o d o o c o m é r c i o d o ouro em p ó tinha m o s t r a d o a experiência ser m o r a l m e n t e
impossível, a i n d a h a v e n d o mais casas de fundição.
T e r S u a M a j e s t a d e e m c a d a lavra u m comissário / / q u e logo q u e sair o o u r o d a [ fl. 198v. ]
terra o t r o q u e t i n h a u m inconveniente, q u e era p e n d e r d a fidelidade desses comissá-
rios, q u e s e m p r e estavam sujeitos a enganos sobre a qualidade e l i m p e z a do o u r o q u e
se havia d e trocar.
Proibir-se nas M i n a s , t o t a l m e n t e , o uso d a m o e d a , p a r a q u e c o m ela se n ã o
c o m p r e o u r o p a r a o d e s c a m i n h o , e c o r r e r s o m e n t e barras c o m guia e o u r o e m p ó

Ord.,lib. 2, Ut. 34, § 4, alvará de 8 de agosto de 1616 e regimento das Minas, §§14, 15, 16, 24 e 25.
1

A partir deste ponto, o copista equivocou-se ao referir a data do alvará de 8 de agosto de 1618,
grafado como 1616, erro verificável também na cópia daBNL, cód. 6980, fl. 164-197.
440

p a r a as. c o m p r a s ordinárias evitariam a extração d e parcelas g r a n d e s e d a r i a p r o v a


legal c o n t r a os *comboieiros q u e trocassem as b a r r a s p o r o u r o e m p ó p a r a o "de-
s e n c a m i n h a r e m , m a s t i n h a d i n c o n v e n i e n t e do e m b a r a ç o q u e e x p e r i m e n t a r i a m
os passageiros q u e entrassem e saíssem das M i n a s .
Repartir-se Ta q u a n t i a l equivalente aos "quintos p o r *capitaçao igual a todos
os escravos e a l g u m a p r o p o r c i o n a d a aos lucros q u e se fazem n a s M i n a s s e m de-
p e n d ê n c i a dos escravos, c o r r e n d o o o u r o pelo seu valor intrínseco até aos p o r t o s
d o m a r , t i n h a as conveniências de valer mais o o u r o aos m o r a d o r e s das M i n a s três
"tostões p o r *oitava, d e ser favorável aos m i n e i r o s q u e t e n d o m e d i a n a f o r t u n a
p a g a r i a m pela capitação m e n o s do q u e d e v i a m de quintos, e n ã o era exorbitante
aos r o c e i r o s , q u e p o d i a m r e g u l a r , s e g u n d o ela, o p r e ç o dos m a n t i m e n t o s e se
u t i l i z a r i a m d a m a i o r i a do o u r o e m p ó q u e lhe fosse à m ã o , v i v e n d o todos sem
receio d e p e r d e r e m suas vidas p o r seus devedores serem presos e confiscados pelo
d e s c a m i n h o do o u r o ; tinha, p o r é m , o inconveniente a respeito dos m i n e i r o s q u e
faziam serviços baldados p o r n ã o e n c o n t r a r e m *pinta rica q u e satisfizesse a despe-
sa, a q u e crescia a dívida da capitação dos seus escravos.
E p o s t o q u e S u a M a j e s t a d e p u d e s s e estabelecer este o u o u t r o s e m e l h a n t e
m o d o d e c o b r a n ç a dos quintos, fora servido, p o r sua real clemência, ouvir a seus
fiéis vassalos, e q u e s e g u n d o a c o n v e n i ê n c i a destes se executasse ou deixasse d e
e x e c u t a r este último arbítrio d a capitação sem d e t r i m e n t o d a F a z e n d a d o m e s m o
;

s e n h o r , e q u e e r a m elés, *procuradores, c h a m a d o s p a r a q u e , s e g u n d o suas con-


veniências, dissessem p q u e lhes p a r e c i a mais conveniente a o serviço de S u a M a -
j e s t a d e e b e m c o m u m dos m o r a d o r e s daquelas M i n a s .
S o b r e esta p r o p o s t a a s s e n t a r a m c o n f o r m e m e n t e os ditos p r o c u r a d o r e s q u e
d e se executar a capitação resultaria g r a n d e prejuízo e v e x a ç ã o a todos os m o r a d o -
[fl. 199 ] res das M i n a s , especialmente aos mineiros q u e n ã o e n c o n t r a s s e m p i n t a / / rica, e
os impossibilitaria e m p r e e n d e r serviços largos o u dificultosos, p r o s s e g u i r os d e
p o u c o r e n d i m e n t o e intentar o d e s c o b r i m e n t o de novas m i n a s , a c r e s c e n d o à gran-
d e d e s p e s a n e c e s s á r i a p a r a Q s o b r e d i t o , q u e m u i t a s vezes ficava b a l d a d a , a d a
capitação d e todos os escravos.
Q u e s e n d o a c o b r a n ç a dos quintos n a "casa d e fundição a m a i s n a t u r a l e
suave, e pelo costume quase insensível, seria m u i t o violenta a da capitação n a q u e l e
país, cujos m o r a d o r e s indiretamente p a g a v a m sem vexação grandes somas, e fcoml
grande, trabalho e dificuldade as contribuições diretas, posto que m o d e r a d a s .
M a s q u e p a r a p r o v a d e sua o b e d i ê n c i a ofereciam segurar o r e n d i m e n t o d e
c e m *arrobas de o u r o e m c a d a u m a n o pelos quintos* livres d e despesas, p a g a n -
do-se estes nas casas de fundição, n a f o r m a q u e se a c h a v a estabelecido, de m o d o
q u e , n ã o c h e g a n d o o p r o d u t o dos quintos às cem a r r o b a s p r o m e t i d a s , se inteiraria
esta q u a n t i a pelos p o v o s seus constituintes, e e x c e d e n d o seria o acréscimo p a r a
S u a M a j e s t a d e e q u e , aceita esta oferta, devia ele, c o n d e " g o v e r n a d o r , ouvidas
pessoas inteligentes, d a r a providência necessária p a r a se evitarem d e s c a m i n h o s .
441

E m 24 d e m a r ç o do dito a n o de 1734 p r o p ô s o c o n d e " g o v e r n a d o r a M a r t i n h o


de M e n d o n ç a e a outros muitos q u e se a c h a v a m presentes o p a r e c e r c o n f o r m e dos
p r o c u r a d o r e s dos povos, e p o r q u e n o caso d e eles n ã o c o n v i r e m n a " c a p i t a ç ã o ,
quisera S u a M a j e s t a d e q u e ele, g o v e r n a d o r , ouvido o p a r e c e r d e pessoas inteli-
gentes, desse p r o v i d ê n c i a sobre, a c o b r a n ç a dos "quintos, s e m e m b a r g o d e quais-
q u e r "leis o u " d e c r e t o s e m c o n t r á r i o , cujo efeito h a v i a p r o v i s i o n a l m e n t e p o r
suspenso, os j u n t a r a p a r a d a r e m o seu p a r e c e r nesta m a t é r i a .
V o t a r a m todos c o n f o r m e m e n t e q u e era muito difícil evitar os "descaminhos
e n q u a n t o nas M i n a s corresse n o m e s m o t e m p o o u r o e m p ó e m o e d a c o m q u e ele
se pudesse c o m p r a r , p o r q u e esta ocasião facilitava os r o u b o s , q u e se (ajudavam 1
n a natural situação d o "país, do a t r e v i m e n t o , e interesse e a d e r ê n c i a s dos "passado-
res c o m alguns habitantes. E p o r q u e era m o r a l m e n t e impossível proibir-se t o d o o
c o m é r c i o d e o u r o e m p ó , p o r q u a n t o , a l é m de outros inconvenientes, ficariam s e m
meio a l g u m p a r a c o m p r a r o necessário os negros e h a b i t a n t e s q u e viviam t i r a n d o
o o u r o e m lavras r e m o t a s , e n t e n d i a m q u e o r e m é d i o mais eficaz p a r a evitar os
d e s c a m i n h o s / / d o o u r o era cessar logo n a q u e l e g o v e r n o a fábrica d a m o e d a , e [ fl. 199v. ]
logo q u e se achasse extraída a q u e corria (para o q u e lhes p a r e c i a b a s t a n t e o t e r m o
d e seis meses, c o n t a d o s do dia do " b a n d o q u e n a c o n f o r m i d a d e deste assento se
devía publicar), proibir-se t o d o o uso dela, r e d u z i n d o - s e n a "casa d e fundição o
o u r o das p a r t e s a b a r r a s , c o m "guias q u e nos anos futuros d e v i a m vir d e Lisboa,
impressas c o m a r m a s e o r n a t o s q u e i m p e d i a m o falsificá-las, d a n d o - s e p a r t e desta
resolução a todos os governadores vizinhos p a r a f a z e r e m pública nos seus gover-
n o s , d e m o d o q u e se n ã o i n t r o d u z a m nestes n o v a s q u a n t i a s d e m o e d a , c o m o
s u c e d e u n o s a n o s d e 1 7 2 9 e 1 7 3 0 , d a n d o - s e c o m isso o c a s i ã o a o s g r a n d e s
d e s c a m i n h o s q u e se e x p e r i m e n t a r a m .

Q u e faltando a m o e d a n ã o p o d e r i a m os "comboieiros, autores d a m a i o r p a r t e


dos d e s c a m i n h o s , c o m p r a r c o m b a r r a s o u r o e m p ó , n e m os mineiros vendê-lo, e
q u a n d o o fizessem as m e s m a s barras e guias descobririam os "desencaminhadores. E
este arbítrio é conforme a resolução p o r q u e Sua Majestade m a n d o u extinguir a fábri-
ca d a m o e d a , e tira toda a ocasião de se poder cometer e ainda intentar nas M i n a s o
delito d a m o e d a falsa e evita à Fazenda Real u m a despesa tão grande c o m o inútil.
Q u e c o m o S u a M a j e s t a d e m a n d a r a àquelas M i n a s os digníssimos d o u t o r e s
Francisco Pereira d a C o s t a e J o ã o Soares T a v a r e s c o m o r d e n a d o s d e "intendentes
d a " c a p i t a ç ã o , a eles se p o d i a e n c a r r e g a r a intendência dos quintos e d e s c a m i n h o s
d o o u r o , assinando a u m a c o m a r c a do S a b a r a e a o u t r o a d o R i o das M o r t e s , p o r
o n d e e n t r a m e s a e m os comboieiros c o m o o u r o d e s e n c a m i n h a d o , p a r a q u e , c o m
todo o c u i d a d o , p r o c u r a s s e m evitar descaminhos e castigassem os c u l p a d o s , e in-
formando-se dos registros d a i m p o r t â n c i a das carregações e "comboios, e se seus
d o n o s s a í a m c o m o p r o d u t o delas e m b a r r a s c o m guias, e se estas ficavam ou
t o r n a v a m a e n t r a r n o país, p a r a v i r e m n o c o n h e c i m e n t o dos d e s e n c a m i n h a d o r e s ,
p o r m e i o das "devassas q u e h a v i a m d e tirar, t e n d o p o r oficiais u m " m e i r i n h o e
442

u m "escrivão, e q u e o m e s m o fariam no Serro d o F r i o o * d e s e m b a r g a d o r Rafael


Pires P a r d i n h o e n a c o m a r c a d e Vila R i c a o d o u t o r A n t ô n i o B e r q u ó d e l - R i o ,
[ fl. 200 ] evitando-se / / a despesa d e mais intendentes e oficiais escusados.
Q u e Tol comércio d e n t r o das M i n a s se executava c o m o d a m e n t e e s e m e m b a -
raço c o m b a r r a s c o m *guias, q u e seriam a m o e d a d e m a i o r peso e valor; c o m o u r o
e m p ó , c o m o q u a l c o m p r a v a m o necessário todos os negros e a m a i o r p a r t e dos
b r a n c o s ; e c o m a m o e d a d e p r a t a , c o b r e e a i n d a d e o u r o , até oitocentos *réis, d e
q u e , p a r e c e n d o necessário, se p o d i a fabricar q u a n t i a conveniente, ficando s e m p r e
n o c u i d a d o dos "ministros a v e r i g u a r e m se estas espécies se a u m e n t a v a m p o r m o d o
ilícito. Estes m e s m o s meios serviam à c o m o d i d a d e dos passageiros e e n c a r r e g a n -
do-se aos "contratadores dos c a m i n h o s tivessem n o s *registros as espécies necessá-
rias p a r a t r o c a r e m as q u e n ã o são p e r m i t i d a s aos q u e e n t r a m e s a e m das M i n a s ,
t a x a n d o - s e a q u a n t i d a d e d o o u r o e m p ó ou m o e d a o r d i n á r i a q u e , s e g u n d o a
comitiva e b a g a g e m , havia d e ser permitido levar e trazer até o registro, além d a
m o e d a d e p r a t a e c o b r e , cujo transporte sempre ficava p e r m i t i d o .
Q u e o a u m e n t o ou m u d a n ç a q u e era necessário fazer n o n ú m e r o e situação das
g u a r d a s se devia conferir c o m pessoas inteligentes e práticas n o "país, c o m o t a m -
b é m os meios c o m q u e se d e v i a m a n i m a r os h a b i t a n t e s a evitar e d e s c o b r i r os
" d e s c a m i n h o s ê o m o d o c o m q u e d e v i a m ser castigados os " d e s e n c a m i n h a d o r e s ,
até p e n a de m o r t e exclusive, p o r q u e esta, e n t e n d i a m , se n ã o p o d i a i m p o r senão
p o r S u a M a j e s t a d e , j u l g a n d o ser de seu serviço, p o r q u e eles a p r o v a v a m t o d o s
q u a n t o s meios se excogitassem, n ã o resultando deles d e m a s i a d a despesa à Fazen-
d a R e a l , e m b a r a ç o a o comércio ou vexação aos povos.
Q u e t o d o o sobredito faria público o c o n d e " g o v e r n a d o r p o r u m " b a n d o , e
c o m o S u a M a j e s t a d e m a n d a v a fazer e m c a d a c a b e ç a d e c o m a r c a u m a "casa d e
f u n d i ç ã o , e r a c o n v e n i e n t e se erigisse logo u m a n o S a b a r a e o u t r a n o R i o das
M o r t e s , c o m s u b o r d i n a ç ã o aos "intendentes respectivos.
Acrescentou M a r t i n h o de M e n d o n ç a q u e o artigo e m q u e se havia assentado
d e q u a n t o s ele até aquele t e m p o tivera notícia era o mais conforme às reais inten-
[ 11. 200v. ] ções d e S u a Majestade, p o r ser o mais justo e o q u e m a i s / / c o n c o r d a v a c o m as
regras d a e q ü i d a d e e c o m m e n o s vexação dos povos a u m e n t a v a a F a z e n d a R e a l e
tirava as ocasiões d e falsidades, descaminhos e fraudes.
N a c o n f o r m i d a d e do referido assento, m a n d o u o c o n d e g o v e r n a d o r p u b l i c a r
o b a n d o de 7 d e abril d e 1734 e, d a p a r t e de S u a M a j e s t a d e , m a n d o u cessar a
fábrica d a m o e d a e q u e as p a r t e s q u e m e t e s s e m o u r o n a C a s a d e F u n d i ç ã o o
tirariam e m b a r r a s , q u e c o m guias c o r r e r i a m livremente no comércio.
Q u e passados seis meses se n ã o p o d e r i a m fazer p a g a m e n t o s e m m o e d a n e m
c o r r e r o u t r a de o u r o q u e a de quatrocentos e oitocentos réis, debaixo d e p e n a de
p e r d i m e n t o dela e d e se p r o c e d e r a seqüestro c o n t r a os transgressores, segundo as
circunstâncias d o caso, c o m o t a m b é m c o n t r a os "passadores do o u r o , ficando e m
seu vigor todas as p e n a s impostas n a "lei de 11 d e fevereiro d e 1719.
443

Q u e i n c o r r e r i a m nas m e s m a s p e n a s os q u e p a r a o referido " d e s c a m i n h o con-


corressem d e q u a l q u e r m o d o , e as pessoas q u e t e n d o notícia d e a l g u m a p o r ç ã o d e
o u r o q u e se p r e t e n d e s s e p a r a fora das M i n a s levar s e m p a g a r "quintos e a n ã o
d e n u n c i a s s e m às justiças s e r i a m e x t e r m i n a d a s d a q u e l e g o v e r n o p o r t o d a vida e
castigadas a arbítrio, s e g u n d o as circunstâncias do caso.
Q u e se lhe daria p a r t e das pessoas infamadas nos referidos crimes, a i n d a q u e
c o n t r a elas n ã o houvesse p r o v a judicial, p a r a , e x a m i n a d o s os indícios, se p r o c e -
desse c o n t r a elas a e x t e r m í n i o d a q u e l e g o v e r n o , as quais, t o r n a n d o a ele depois
d e e x t e r m i n a d a s , i n c o r r e r i a m n a s p e n a s da dita lei de 1719.
Q u e e n c a r r e g a v a a todos os "oficiais das " o r d e n a n ç a s c u i d a d o p a r t i c u l a r so-
b r e esta m a t é r i a e lhes concedia, no caso d e c o m as suas diligências fazerem a l g u m
confisco, a i n d a p o r parcelas q u e p a r a a F a z e n d a R e a l a o m e n o s i m p o r t e m duas
" a r r o b a s d e o u r o , os privilégios de milícias p a g a s ; e q u e aos "juízes o r d i n á r i o s ,
"oficiais das " c â m a r a s e mais pessoas habitantes nas M i n a s , a q u e m fazia a m e s m a
r e c o m e n d a ç ã o , m a n d a r i a passar certidão p a r a q u e , segundo a q u a l i d a d e das suas
pessoas, p u d e s s e m r e q u e r e r a sua M a j e s t a d e as h o n r a s e m e r c ê s q u e o m e s m o
s e n h o r c o s t u m a v a fazer a q u e m o servia c o m zelo e fidelidade, e ele, c o n d e "go-
v e r n a d o r , os preferiria n o p r o v i m e n t o dos cargos públicos e honrosos.
Q u e a t o d a s as pessoas p o r cuja i n d ú s t r i a / / s e Fizessem t o m a d i a s d e o u r o [ íl. 201 ]
" d e s e n c a m i n h a d o se daria a m e t a d e e às q u e denunciassem a terça p a r t e ; q u e os
escravos q u e d e n u n c i a s s e m seus senhores, q u e se à dita d e n u n c i a ç ã o se seguisse
confisco, ficariam forros e se lhes daria carta d e alforria e m n o m e d e Sua Majesta-
d e e a terça p a r t e do ouro confiscado.
Q u e as pessoas q u e tendo a p r e e n d i d o os "passadores se ajustassem c o m eles
s e r i a m castigadas c o m as p e n a s impostas aos " d e s e n c a m i n h a d o r e s do o u r o , e p o r -
q u e as q u a n t i a s da m o e d a q u e s u b i a m d a p a r t e d o m a r p a r a as M i n a s se o r d e n a -
v a m à c o m p r a d o o u r o e m p ó p a r a o levar d e s e n c a m i n h a d o , n e n h u m a p e s s o a
p o d e r á m e t e r m o e d a dos, "registros p a r a dentro p a s s a d o o t e m p o d e c l a r a d o , d e n -
tro d o qual se daria providência necessária p a r a a c o m o d i d a d e dos passageiros, e
todo o q u e contraviasse seria castigado c o m o p a s s a d o r d o o u r o .
Este arbítrio foi f o r m a d o à s e m e l h a n ç a do " e n c a b e ç a m e n t o das "sisas, por^
q u e d a m e s m a sorte q u e as c â m a r a s deste R e i n o s e g u r a r a m p a g a r a o p a t r i m ô n i o
real, e m c a d a u m a n o , certa e d e t e r m i n a d a q u a n t i a , a i n d a q u e o r e n d i m e n t o das
sisas q u e a n t e c e d e n t e m e n t e se c o b r a v a p e l a F a z e n d a R e a l fosse i n f e r i o r , ^ d o
m e s m o m o d o , as c â m a r a s das M i n a s s e g u r a r a m a Sua M a j e s t a d e pelos quintos d o
o u r o , e m c a d a u m a n o , c e m a r r o b a s dele, posto q u e o q u e se cobrasse dos quintos
n ã o chegasse livre de gastos à dita q u a n t i a .

Como consta do mesmo "regimento, cap. 34, 35 e 45.


444

E a i n d a q u e esta obrigação das c â m a r a s das M i n a s diferisse d a dos "encabe-


çamentos — e m q u e nestes se cometeu a cobrança das "sisas às *câmaras respectivas, 31

e q u a n d o o r e n d i m e n t o das sisas importa mais q u e a q u a n t i d a d e do "cabeção, n ã o


se e n t r e g a m os sobejos aos almoxarifes de Sua Majestade, m a s se reservam p a r a as
faltas dos anos futuros, J e n ã o os h a v e n d o d e m a n d a d o do m e s m o s e n h o r e consen-
a

timento dos povos respectivos, se d e s p e n d e m e m obras pias e públicas pela "extra-


v a g a n t e de 24 d e j u n h o de 1713 - e n a obrigação q u e as c â m a r a s das M i n a s fize-
[ íl. 20 lv, ] r a m , a c o b r a n ç a dos "quintos devia ser feita nas "casas / / reais de fundição e correr
p o r conta dos "ministros e "oficiais d e Sua Majestade, e todo o ouro q u e se cobrasse
a l é m das c e m " a r r o b a s , livres d e gastos, ficava c e d e n d o a favor d a F a z e n d a do
m e s m o senhor, e esta diferença n ã o só destruía a semelhança p o n d e r a d a m a s fazia
•muito mais útil este arbítrio à F a z e n d a d e Sua Majestade do q u e n a verdade o é o
e n c a b e ç a m e n t o das sisas.

P o r q u e nos e n c a b e ç a m e n t o s das sisas só segura S u a M a j e s t a d e a i m p o r t â n c i a


d o c a b e ç ã o d e c a d a u m a das c â m a r a s , e neste arbítrio ou neste c o n t r a t o feito pelas
c â m a r a s das M i n a s n ã o só segurava, e m c a d a u m a n o , c e m arrobas d e o u r o livres d e
t o d a a despesa, de m o d o q u e e m n e n h u m t e r m o p o d i a receber m e n o s , m a s fazia seus
todos os acréscimos q u e produzisse o r e c e b i m e n t o dos quintos.
N o efeito, p o r é m , teve esse arbítrio n ã o s e m e l h a n ç a m a s i d e n t i d a d e c o m o
e n c a b e ç a m e n t o das sisas, p o r q u e , assim c o m o p o r este cessaram t o t a l m e n t e as quei-
xas q u e havia n ã o só dos " d e s c a m i n h o s das sisas m a s dos conluios p a r a se n ã o
p a g a r e m e as vexações q u e c o m os "rendeiros delas p a d e c i a m os povos, do m e s -
m o m o d o , p r a t i c a d o o referido arbítrio, sein vexação ou queixa dos p o v o s , veio a
i m p o r t a r o r e c e b i m e n t o dos quintos m u i t o m a i s d o q u e se tinha c o b r a d o nos anos
a n t e c e d e n t e s e do q u e p r e s e n t e m e n t e p r o d u z a "capitação.
P o r q u e , p r i n c i p i a n d o a executar-se e m 22 de m a r ç o de 1734, r e n d e r a m as casas
d e fundição até o u t r o tal dia do a n o d e 1735, livres de t o d a despesa, 137 a r r o b a s Tde
o u r o , q u e v a l e m dois milhões e c e n t o e l n o v e n t a e dois mil " c r u z a d o s , n ã o fazen-
d o a c o n t a aos " m a r c o s , "onças e "oitavas q u e no m e s m o a n o i m p o r t o u d e mais o
r e c e b i m e n t o dos quintos.
J u s t a m e n t e se esperava rendesse mais n o a n o q u e teve princípio e m 22 de m a r ç o
d e 1735, p o r q u e e m três meses q u e nele d u r o u esta f o r m a de c o b r a n ç a i m p o r t o u o
r e n d i m e n t o das casas d e fundição, livres de gastos, 4 3 a r r o b a s d e o u r o , sem e m b a r g o
d e q u e muitos, e s p e r a n d o a capitação j á neste t e m p o i m i n e n t e , retiveram e m si o
o u r o e m p ó sem o m e t e r n a s referidas casas, d e m o d o q u e , p u b l i c a d a a capitação,
saiu g r a n d e cópia dele p a r a os portos d o m a r .

^ Pelocap. 11, 12 e 15.


J-
a
Como se mostra da sentença que traz Peg.', ad ord., lib. 1, tit. 18, § 14, glos. 16, n 79. Q
445

M a s i m p e d i u - l h e o progresso o c a p r i c h o d e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , q u e , [ fl. 202 ]


servindo-se d a ocasião de p a s s a r o c o n d e das Galveias p a r a "vice-rei d a B a h i a ,
t r a t o u j u n t o c o m G o m e s Freire d e A n d r a d e , q u e sucedeu n o g o v e r n o das M i n a s ,
de. introduzir a "capitação, q u e v i e r a m depois das diligências q u e se a p o n t a r ã o e m
lugar mais o p o r t u n o a conseguir.
P o r q u e e m 29 de j u n h o d e 1735 fizeram, s e m i n t e r v e n ç ã o d e *ministro al-
g u m , aos " p r o c u r a d o r e s das c â m a r a s das M i n a s a p r o p o s t a q u e m u i t a p a r t e dos
m o r a d o r e s lhe h a v i a m r e p r e s e n t a d o , p o r p e t i ç õ e s , ser-lhe m u i t o c o n v e n i e n t e se
comutasse o direito real dos "quintos e m a c a p i t a ç ã o dos escravos, p o r q u e p o r este
meio se livrava a F a z e n d a R e a l d e "descaminhos e os m o r a d o r e s e c o m é r c i o dos
danos q u e p a d e c i a m , o r d e n a n d o - l h e s votassem sobre a capitação e q u a n t i a dela,
o q u e satisfizeram convindo n a c a p i t a ç ã o , c o m a declaração q u e a S u a Majestade
ficava livre o reassumir, todas as vezes q u e lhe parecesse, o direito dos quintos e
aos povos o de. r e p r e s e n t a r a S u a Majestade o u t r o m é t o d o d e c o b r a n ç a n o caso de
m o s t r a r a experiência prejudicial o d a capitação.
Em o l e
d e j u l h o d o a n o de 1735, tratando-se d a q u a n t i d a d e d a c a p i t a ç ã o , se
assentou q u e c a d a escravo n e g r o pagasse q u a t r o "oitavas e três q u a r t o s d e o u r o , e
o m e s m o os negros forros e os "ofícios, as *lojas g r a n d e s 24 oitavas, as medíocres
16 e as inferiores 8, q u e as negras cativas q u e estavam nas "vendas p a g a r i a m 16
oitavas *per se e pela v e n d a ; q u e as vendas p a g a r i a m 16 oitavas e q u e os negros e
negras, m u l a t o s e m u l a t a s forros q u e tivessem escravos p a g a r i a m p o r estes, e n ã o
p o r si; e se declarou q u e este ajuste c o m p r e e n d i a toda c a p i t a n i a das M i n a s Gerais,
e nesta forma o a c e i t a r a m G o m e s Freire d e A n d r a d e e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a ,
n a consideração d e q u e Sua Majestade assim o haveria p o r b e m .
N ã o sem g r a n d e erro de Direito se c h a m o u ao sobredito ajuste, tanto nos assentos
referidos c o m o no "regimento da c a p i t a ç ã o , comutação, q u e i m p o r t a e significa o
m e s m o q u e permutação,^ q u e n ã o podia resultar / / d a convenção celebrada, p o r q u e [ fl. 202v. ]
n e n h u m contrato p o d e validamente subsistir faltando-lhe os requisitos sustancialmente
necessários p a r a ele se c o n t r a i r , al
e sendo d a sustância d a p e r m u t a ç ã o o dar-se m u -
t u a m e n t e pelos contraentes u m a coisa p o r o u t r a , a m
d a p a r t e d e Sua M a j e s t a d e se
n ã o d a v a coisa alguma, senão aos mineiros q u e tivessem a fortuna de a c h a r ouro.
P o r q u e o q u e se d a v a d a p a r t e d e Sua Majestade consistia e m o direito real dos
quintos, pagando-se-lhe, e m lugar dele, o tributo pessoal d a c a p i t a ç ã o , e a o direi-
to real dos quintos só estavam obrigados os mineiros q u e e m efeito tirassem o u r o
das m i n a s , 3 1 1
e d e n e n h u m a sorte os q u e n ã o l a v r a m m i n a s , e a i n d a os mineiros

ak Yoet.,adPand.,lib. 19, tit. 14, vr ljLexic. Calvin., verbopermutare.


5

a
'- Usualtl., ad Donel., lib. 15, cornent, let. a, cap. 1.
" - 1.1, § 2 ss., de rer. perm.; Colleg. Argent., lib. 19, Pand., tit. 4, thes. 1; Voet. dicto tit. 4, n 1.
Am e

Ord., lib, 2, tit. 34, § 4, alvarà de 8 de agosto de 1616 [sic], regimento das Minas § 14, 15, 16,24 e 25.
446

q u e t ê m a infelicidade de n ã o a c h a r o u r o , p o r n ã o h a v e r *lei ou " r e g i m e n t o q u e


os obrigue a p a g a r coisa a l g u m a .
M a s c o m o q u a n d o nos contratos q u e se c e l e b r a m i n t e r v ê m pactos e circuns-
tâncias contrárias à n a t u r e z a deles m a s capazes d e os fazer passar a diversa espécie
d e c o n t r a t o , t o m a m o n o m e do c o n t r a t o a q u e p a s s a m , a o
p o d i a a q u e l e ajuste
p a s s a r a " n o v a ç ã o , pela qual n ã o só u m a o b r i g a ç ã o se p o d e transferir e m o u t r a
d i v e r s a , P m a s t o m a r e m sobre si as pessoas q u e a c e l e b r a m a i n d a as obrigações
a

a l h e i a s , l se o n ã o i m p e d i r a o falar no m e s m o ajuste o m ú t u o e livre consenti-


ac

m e n t o das partes, sem o q u a l n ã o p o d e subsistir c o n t r a t o a l g u m 5


a r
acrescendo n o
de q u e se t r a t a a circunstância d e S u a M a j e s t a d e haver deixado no livre arbítrio
dos p o v o s a escolha do meio d e se c o b r a r e m os quintos c o m a inteireza necessária.
[ fl. 203 ] P o r q u a n t o e m p e n h a d o s M a r t i n h o d e M e n d o n ç a e G o m e s Freire / / e m transfe-
rir o direito real dos "quintos n o tributo pessoal da "capitação, e t e n d o a certeza,
p e l o q u e tinha m o s t r a d o a experiência nos anos d e 1715 e 1734 c o m os "gover-
n a d o r e s d o m Brás d a Silveira e c o n d e das Galveias, q u e os povos v o l u n t a r i a m e n -
te n ã o h a v i a m convir n a q u e l a f o r m a d e c o b r a n ç a , t r a t a r a m d e lhe e x t o r q u i r o
c o n s e n t i m e n t o n ã o só p o r m e d o grave e capaz de. cair e m varões constantes q u e
n ã o s o m e n t e se diz intervir q u a n d o é d e m o r t e , a s
tormento do corpo e prisão,
p r i n c i p a l m e n t e s e n d o e x e c u t a d a e m c á r c e r e p r i v a d o e ilícito, c o m i n a ç ã o d e
degredo, a t
p e r d a de h o n r a e suspeita d e p e r d a de t o d o s os b e n s . a u

M a s t a m b é m q u a n d o o superior m a n d a executar a l g u m ato ao inferior, conclu-


são q u e p r o c e d e s e m dificuldade q u a n d o d a execução resulta prejuízo a q u e m a faz
ou i n t e r v é m rogos i m p o r t u n o s , p o r q u e os rogos d e q u e m p o d e m a n d a r , sendo i m p o r -
tunos, são, n a c e n s u r a d e direito, violência g r a n d e , p r i n c i p a l m e n t e se a pessoa q u e
m a n d a for rija e austera e os súditos se a c h a r e m a m e d r o n t a d o s c o m preceitos p e n a i s . a v

M a s p o r dolo q u e resulta todas as vezes q u e as p a r t e s q u e v o l u n t a r i a m e n t e n ã o q u e -


r i a m c o n t r a t a r f o r a m levadas a fazê-lo, p e r s u a d i d a s d e algum e n g a n o . a w

a o
- 1. 1, § si vestimenla, 8, ss.; deposit.,, 1. si ut certo, 5, ss.; comod., 1. poliendo, 22, ss.; de prescript, verb.
vin.jde pact., cap. 9 ri 9; Uzuald. ad Donel.Jib. 15, cap. 1, let. a.
?
e

a
P' 1. 1, §1,1. 2, ss.; de novat., § Praeterea, 3; Inst. cjuib. mod. tolet. obiig.
ac
l- 1. 1, ss.; de novat., dicto §. Praeterea; Donel., lib. 16, com, cap. 20..
1.1, § 3; 1. juris gentium, 7. in priuc, et § 1, ss,; de pact., 1. novare, 20, ss.; de novat., 1-fin.,cod. eodem;
Done!., lib. 12, com. cap. 7.
a s :
1. nee timore, 7, § 1; 1. cum carcerem, 22; I. fin., § fin., ss.. Quod met. cans.
a t
Colleg. Argent., lib. 4, Pand. tit. 2, thes. 6.
au
- Rot., rec.,.p. 8, dec. 17, et dec. 214, n 5, et dec. 273, n 2, et p. 12, dec. 23, n l l .
s e a

av
- Garc, de nobilit., glos. 17,3, n° 13; Rot., p. 8, rec, dec. 17, n 15; Valenz., cons. 87, n 40, c 41;
B a

Salgad., de protect., p. 3, cap. 3, n 30. 9

aw
- 1. elenganter, 7, ss., de doL; Usuald. ad Donel., lib. 12, com. cap. 7, let. D.
447

P o r q u a n t o t e n d o a t e r r a d o os povos c o m as prisões e. confiscações q u e eles


m e s m o s h a v i a m e x e c u t a d o n o R i o de J a n e i r o , se serviram da ocasião de se desco-
brir e m V i l a R i ç a u m a p e q u e n a b a r r a d e o u r o falsa, fabricada n ã o p o r m i n e i r o s
o u m o r a d o r e s das M i n a s m a s p o r uns ladrões traficantes s e m mais cabedais q u e os
furtados n o exercício d a q u e l a fábrica, e p e r t e n c e n d o o c o n h e c i m e n t o deste c r i m e
somente aos "ministros a q u e m Sua Majestade o havia encarregado, sem q u e
o u t r a a l g u m a p e s s o a n e l e se p u d e s s e i n t r o m e t e r , a x
M a r t i n h o d e M e n d o n ç a se
i n t r o m e t e u a juiz privativo do dito crime, a b s u r d o d e q u e n a s c e r a m outros muitos.
P o r q u e n ã o p o d e n d o ministro algum, exceto o caso de flagrante delito, p r e n -
d e r p e s s o a a l g u m a sem q u e / / p e r a n t e ele se a c h e l e g i t i m a m e n t e i n d i c i a d a d e [ fl. 203v. ]
c u l p a e p r o n u n c i a d a a p r i s ã o , y n e m p o r si só p r o c e d e r c o n t r a os réus a t o r t u r a ,
a

porque a O r d e n a ç ã o a z
n ã o fiou diligência tão violenta de u m só h o m e m , a i n d a
sendo este c o r r e g e d o r d a C o r t e , n e m e m termos alguns principiar as causas crimi-
nais pelo t o r m e n t o , ^ n e m p r o c e d e r a t o r m e n t o q u a n d o o crime se a c h a legitima-
a

m e n t e p r o v a d o , * m a s só q u a n d o os réus se a c h a r e m l e g i t i m a m e n t e i n d i c i a d o s ,
0 1

m e d i n d o - s e os graus do t o r m e n t o pela q u a l i d a d e dos indícios se n ã o h o u v e r o u t r o


m e i o de se p r o v a r e m os c r í m e s , ^ e a i n d a nestes t e r m o s se deve p r e c e d e r à t o r t u r a
c

s e n t e n ç a q u e a d e t e r m i n e , q u e antes de se executar se intime ao réu. * DC

E n e m a i n d a assim usar de t o r m e n t o s p o r q u e se e x p u n h a m os réus a p e r d e r


a vida, n e m daqueles q u e p a r e c e m excogitados mais p e l a tirania q u e pela r a z ã o ,
m a s s o m e n t e dos c o m u m e n t e p r a t i c a d o s pelos juízes, a q u e m n ã o t e m d e s a m p a -
rado a clemência, be
n e m fazer, n o a t o da t o r t u r a , aos réus p e r g u n t a s sugestivas,
isto é, p e r g u n t a s sobre matérias d e q u e os réus n ã o estão indiciados, o u especiais,
m a s perguntá-los g e r a l m e n t e pelo crime o u crimes d e q u e c o n t r a eles h á indícios, ^ 0

m e d i n d o - s e a t o r t u r a pelas forças, saúde, sexo e i d a d e dos réns, pelo q u e , à execu-


ç ã o d o t o r m e n t o d e v e m assistir m é d i c o e "cirurgião, p a r a informar aos ministros
se o réu,°g sem perigo d e vida, está c a p a z de o s o f r e r DU
e, a i n d a p r a t i c a d a s todas

^ Althn., de nullit. sent., tom. l,rubr. 9, q. 2, a, n 1, et n 21, a 22.


e 9

y-
a
1. nulius, 2, i. 3; cod.de exhib. reis; Peres, adeundemtitulum, n 1; Ladoc.,prax. rer. crím., cap. 14, n 4.
s s

'
a z
Lib. l,.tit. 7,§17.
-
b a
1.1, L, de minore, 10,§ nec debet, 4, ss,; de quaest.,.1. milites, 8,,§ 1, cod.,. eodem tit.
kk- 1. edictum, 8; 1. Divus, 9, ss.; de quaest.
-
b c
Dieta Ord., lib. 1, tit. 7,§ 17.
-
b d
Ciar-, lib. 5, §. ím., q. 64, 26;Caren., de offic. Inquis., p. 3, tit. 10, n 160.
n
9 9

^ Ladoc, prax. rer. crim., cap. 17, n 17. 9

D 1 ,
1. 1, § qüaestionem, 21, ss.; de quaest. ubi Gothofr., n- 21; Farin., de indic. et tortur., cap. 4, n 84. 9

b
§-. 1. de minore, 10,§ tormenta, 3; 1., quaestione 7, ss., de quaest.; idem Ladoc, cap. 27, n 2 9

t)h
- Costa, Prática das alçadas, n .l 19,. e
448

estas circunstâncias, n a d a p r o v a a confissão dos réus feita n o t o r m e n t o se eles, fora


d o lugar dele e livres de t o d o o temor, v o l u n t a r i a m e n t e a n ã o ratificarem.' 31

[ fl. 204 ] M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , sem c u l p a a l g u m a ou indícios p r o v a d o s , fez p r e n -


d e r a m u i t a s pessoas n a c a d e i a e alguns n a casa dele, M e n d o n ç a , o n d e m e t e u a
m u i t o s e m t o r m e n t o s tão esquisitos q u e n ã o l e m b r a r ã o a tirania daqueles juízes a
q u e m os digníssimos d o u t o r e s a c u s a m de cruéis, e x e c u t a n d o diligência t ã o p e r i -
gosa, sem intervir a l g u m a das referidas circunstâncias, e c o m tal excesso q u e u m
n e g r o , c o m o t e m o r d e se lhe r e p e t i r e m , se m a t o u c o m u m a faca; u m h o m e m
b r a n c o faleceu do rigor dos t o r m e n t o s ; u m a m u l h e r m e r e t r i z , depois de ter supor-
t a d o alguns, p r e t e n d e u enforcar-se p o r n ã o e x p e r i m e n t a r o u t r o s ; ^ a u m h o m e m
c a s a d o fez d a r t o r m e n t o , s e m m a i s c r i m e q u e c o n s t a r t i n h a e m seu p o d e r u n s
escritos de dívida p e r t e n c e n t e s a u m confiscado> e se lhe m a n d o u b u s c a r a casa,
p a r a o q u e os executores l a n ç a r a m fora dela a m u l h e r deste miserável.
D e s c o m p ô s alguns eclesiásticos e a outros prendeu^ e a u m h o m e m perigosa-
m e n t e d o e n t e fez b u s c a r â casa e c o n d u z i r à c a d e i a , d e s p r e z a d o o risco d e lhe
apressar a m o r t e ; fez fechar e m Vila R i c a e R i b e i r ã o muitas lojas d e m e r c a d o r e s ,
p o n d o - l h e s g u a r d a s d e soldados, sem c o n t r a eles h a v e r p r o v a ou indício.
Nestas circunstâncias, fizeram M a r t i n h o d e M e n d o n ç a e G o m e s Freire intro-
d u z i r nas conversações q u e S u a M a j e s t a d e desejava c o m e m p e n h o o estabeleci-
m e n t o d a "capitação e q u e este e r a o único m e i o d e os h o m e n s d e negócio das
M i n a s e R i o de J a n e i r o se livrarem d a r u í n a q u e lhes estava e m i n e n t e , p o r todos
se a c h a r e m c o m p r e e n d i d o s n o c r i m e d e " d e s e n c a m i n h a r o u r o e fabricar b a r r a s
falsas, e q u e os m o r a d o r e s das M i n a s m o s t r a r i a m ser vassalos fiéis se pedissem a
capitação.
A esta diligência acrescentaram m a n d a r fazer petições e m n o m e dos povos, e m
as quais se p e d i a a capitação, e entregando-as a pessoas d a sua confiança lhes d e r a m
a comissão d e as f a z e r e m assinar p o r todas as pessoas q u e lhes fosse possível; e
[ fl. 204v. ] v o l t a n d o as petições assinadas, e n t r a r a m a p u b l i c a r q u e os p o v o s p e d i a m / / a
capitação, e p r o c e d e r a m aos assentos de 29 d e j u n h o e do 1- d e j u l h o de 1735,
E p o r q u e nos referidos assentos se n ã o falou n a i m p u n i d a d e dos crimes d o
" d e s c a m i n h o do o u r o e b a r r a s falsas c o m q u e t i n h a m p e r s u a d i d o os povos a pedir
a capitação e eles instavam p e l a satisfação d a p r o m e s s a n o assento de 30 de j u l h o
d e 1735,2 p r o m e t e u o g o v e r n a d o r G o m e s Freire r e p r e s e n t a r esta m a t é r i a a sua
M a j e s t a d e . N ã o c o n s t a o fizesse antes q u e os r é u s q u e c h e g a r a m a ser p r e s o s ,
todos e m larga p r i s ã o , s e g u i r a m os seus l i v r a m e n t o s , alguns c o m culpas graves,

- Ciar., lib. 5, § fm., q. 64, n 14; Caren., de ofTic. Inqins., p. 2, tit. 11,n. 174.
bl a

kj • Como consta por autos e informações de pessoas que. naquele tempo lá se achavam.

A data correta é 30 de junho de 1735.


449

m a s tão m a l f o r m a d a s e c o m tais defeitos q u e se lhes n ã o p o d i a i m p o r a p e n a


o r d i n á r i a , o u t r o s c o m indícios leves e outros n o t o r i a m e n t e i n o c e n t e s . ^
N ã o é admissível o a r g u m e n t o d e que, os contratos feitos p o r m e d o e a i n d a
p o r dolo n ã o são nulos *ipso jure, p o s t o q u e se d e v a m r e s c i n d i r , ^ p o r q u e as o r d e n s
q u e G o m e s Freire e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a t i n h a m p a r a introduzir a "capitação
e r a m só no caso e m q u e os povos, livre e e s p o n t a n e a m e n t e , consentissem nela, e
q u a n d o os atos q u e r e q u e r e m c o n s e n t i m e n t o e s p o n t â n e o e livre são c e l e b r a d o s
p o r m e d o grave são ipsojure n u l o s . ^ m

M a s ainda prescindindo das referidas ordens e admitido o a r g u m e n t o , vinha o


negócio a ficar nos m e s m o s t e r m o s , p o r q u e c o m o a a ç ã o q u e a S u a M a j e s t a d e
resultava d a referida novação p a r a cobrar a capitação e m lugar do direito real dos
"quintos estava sujeita, c o m o se reconhece no argumento, à exceção do m e d o e do
dolo, p o r q u e n e c e s s a r i a m e n t e se devia rescindir, vinha e m efeito a n ã o ter ação
a l g u m a p a r a cobrar a capitação, p o r q u e o m e s m o é n ã o ter ação q u e tê-la sujeita a
exceções legítimas.' 511

P o r é m , c o m o n a " n o v a ç ã o de q u e se trata fosse S u a M a j e s t a d e c o n t r a e n t e [ fí. 205 ]


pelas interpostas pessoas d e G o m e s F r e i r e e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , e todos os
contratos celebrados pelo príncipe sejam d e b o a fé, a i n d a q u a n d o p o r sua n a t u r e -
za devessem ser d e direito estrito,* foi a referida n o v a ç ã o s e m controvérsia ipso
50

jure n u l a , visto intervirem nela n ã o só m e d o , m a s dolo.


P o r q u a n t o a i n d a q u e seja controverso se os contratos celebrados p o r m e d o são
ipsojure nulos, foi opinião dos maiores digníssimos doutores d a jurisprudência q u e ,
sendo de b o a fé, p a d e c i a m esta f o r t u n a , ^ e n ã o houve d o u t o r que duvidasse se os
contratos de b o a fé e r a m ipsojure nulos q u a n d o o dolo havia d a d o causa a eles.**!
E o q u e é mais q u e t o d a a pessoa q u e a d q u i r e a l g u m a coisa p o r c o n t r a t o
c e l e b r a d o p o r m e d o , n ã o só grave m a s a i n d a leve, ou a q u e d e u causa o dolo, está
o b r i g a d a , n o foro d a consciência, a r e s t i t u í - l a . br

bk
- Como consta dos mesmos autos dos livramentos que vieram à Relação.
b
' ' ]. si mulier, 21, § simetu, 4, ss, quod met. caus.; I. si quis, 36, ss.; de verbor. obligat., Gönz., in cap.
1; de his quo vi, n 16 e 17.
9

b m
- Idem Gönz., ditto n 17.9

b n
- 1. nihil interest, 112; 1. non vidctur 13; 1. non videtur, 51; 1. Marcelus 66, ss., de reg.jur., Everard in
dicta I., 13, ubi Gothofred.
b o
- Valasc, Cons. 132, n SiPortug., de donat., lib. 2, cap. 11, n 14.
9 B

b
P- Ex I. nihil consensui, 116, ss.; de.de reg.jur.; Bart., inl. metu, 19,§ volenti, n 2, ss.; quod met. caus.;
a

Donel., lib. 12,com. cap. 7; Cujac, lib. 11, Pauli ad edict.; ml. simulier, 21, ss,; quod met. caus.; 1.
si quis, 36, ss.; de verbor. oblig.; Petr. Greg., lib. 21, syntam., cap. 2, n 3; Jacob Gothofr., in dicta 1.
s

nihil consensui.
b
9- 1. qui cum tut.orib., § 9, § qui per falatiam, 2, ss.; de transact.; 1. eleganter, 7, de dol.; Donel., lib. 12,
com. cap. 7, ubi Usuald, lit. d.
br
- Palau, opus morale, tit. 1, tract. 2, disp. 1, punct. 8, n 1, e 5; La Croix, theolog. mor., lib. 3, p. 2, n
9 9

642; Rabell., de obligat, just., lib. 1, q. 6, sect. 2, n 5 e 9.


a
450

E p o s t o q u e q u a n d o o p r í n c i p e celebra a l g u m c o n t r a t o q u e se e n c o n t r a c o m
á s leis seja visto d i s p e n s a r n e l a s , ^ esta d o u t r i n a só p r o c e d e q u a n d o o p r í n c i p e
s

sabia q u e c o n t r a t a v a c o n t r a as l e i s , ^ p o r q u e Sua Majestade, nas o r d e n s q u e d e u


p a r a o estabelecimento do m e i o p a r a se c o b r a r e m i n t e i r a m e n t e os "quintos, tão
l o n g e esteve d e m a n d a r q u e se obrigassem os povos a pagá-los p o r "capitação q u e
deixou n o livre arbítrio dos m e s m o s povos a escolha d o m e s m o m e i o .
N e m a dita conclusão t e m lugar q u a n d o o c o n t r a t o q u e se p r e t e n d e confir-
[ il, 205v. ] m a r c o n t é m injustiça ou i n i q ü i d a d e . b u
/ / E o c o n t r a t o p o r q u e se m u d o u a co-
b r a n ç a d o direito real dos quintos, restrito p r e c i s a m e n t e aos mineiros q u e tiravam
o u r o , a o tributo pessoal d a c a p i t a ç ã o , q u e c o m p r e e n d e a todos os m o r a d o r e s das
M i n a s , posto q u e n ã o sejam mineiros, e a estes q u a n d o t ê m a infelicidade d e n ã o
a c h a r o u r o , a l é m d a i n i q ü i d a d e do m e d o e dolo c o m q u e foi c e l e b r a d o , c o n t é m
è m si injustiça grave.
P o r q u e é injustiça g r a n d e m u d a r as contribuições reais e m tributos pessoais
ou, pelo contrário, os tributos pessoais e m contribuições r e a i s , ^ p o r q u e , c o m o as v

contribuições reais respeitam ao p a t r i m ô n i o , sem atenção a l g u m a às pessoas, e os


tributos pessoais respeitam às pessoas,* ™ sem atenção a l g u m a a o p a t r i m ô n i o ,
3 b x
se
O direito ou contribuição real se transferir n o tributo pessoal ou o tributo pessoal se
m u d a r e m direito ou c o n t r i b u i ç ã o real, se p e r v e r t e o estado d a "república c o m
desigualdade e injustiça g r a n d e , DV
q u e consiste e m obrigar a m a i o r p a r t e dos povos
a o q u e n ã o devem e outros menos do q u e devem, segundo a n a t u r e z a d a contribui-
ção ou tributo, e n o casó presente, p a g a r e m os q u e n ã o são mineiros e os q u e õ são
s

e n ã o a c h a m ouro pelos q u e o descobrem a i n d a e m q u a n t i d a d e Igrandel. ,


Esta a r a z ã o p o r q u e no g r a n d e n ú m e r o d e m i n a s q u e se a c h a m descobertas,
e h á notícia se d e s c o b r i r a m depois q u e os p r í n c i p e s respectivos p e r m i t i r a m aos
seus vassalos t r a b a l h a r livremente nelas, posto q u e lhes impusessem contribuição,
n u n c a esta consistiu e m capitação ou o u t r o a l g u m tributo pessoal, m a s e m presta-
[ fl. 206 ] ção real a r b i t r a d a à p r o p o r ç ã o do ouro ou metal q u e se t i r a v a , bz
/ / e p o r que Sua
Majestade, n a carta de 12 d e n o v e m b r o d e 1714, r e p r o v o u o arbítrio d e c o b r a r os

b s
- Port., de donat, lib. 2, cap. 11, u 18.
B

~
bt
1. quidam, 57, ss.; de rejudie; 1. donationes, 26; cod. de donat., int. Portug. S , ã

-
b u
Mult. Larr., alleg. 23, n 9, Portug., ubi S . , n 18 e 19.
a 3 a

-
b v
Petr. Greg., de rep., Iib. 3, cap. 5, n 15 e 16.
B

b w
- KIoch., de aerar., lib. 2, fcap. 8, n 8; Idem Kloch., cap. 2, n* 1, lib. 3.
H

-
b x
Kloch., lib. 2, cap. 79, n 27; idem Petr. Greg., lib. 3 , cap. 2,. n 10, et cap. 5, n 1, et 17.
9 fl 9

tay.
Petr. Greg., de rep., Hb. 3, cap. 5, n 15, et 16.
a

b z _
1.1, cod. de metal.; 1. 3, cod. Tlieodos.. de metal, et metalar., ubi Jacob Goth., ord., lib. 2, tie, 34, §
4,. *alvará de 8 de agosto de 1616 [sic], *regimento das minas §14, 15, 16, 24, e 25, Solorz., dejur.
Ind., tom. 2, Hb. 5, cap. un., n 14, e 23; Portug., de donat., lib. 2, cap. 12, n 17.
a 9
451

"quintos p o r tributo imposto sobre os negros e mais fazendas q u e se introduzissem


nas M i n a s .
A i n d a cresceu mais a injustiça, p o r q u e nos assentos d e 29 d e j u n h o e 1 Q
de
j u l h o d e 1735, e m q u e se estabeleceu a "capitação, n ã o se declarou o t e m p o e m
q u e havia ser p a g a m a s só q u e se havia p a g a r c a d a a n o a quantia arbitrada, e c o m o
os casos omissos nos c o n t r a t o s ficam n a disposição de d i r e i t o , c a
segundo o qual
satisfazia q u e m pagasse a capitação dentro no a n o respectivo , k pelo q u e se lhes n ã o c

podia antecipar o t e m p o do p a g a m e n t o n e m p ô r p e n a se n ã o satisfizessem d e n t r o


do t e m p o a n t e c i p a d o , e m e n o s a d a confiscação dos escravos d u r a n t e o t e r m o d o
referido a n o .
Porque não s e p o d e impor pena sem c u l p a , cc
e n e n h u m a t i n h a m os obrigados à
capitação e m dilatar a satisfação dela o t e m p o de u m a n o , q u e lhes era p e r m i t i d o p o r
direito, e p o s t o q u e os devedores d a F a z e n d a R e a l p o s s a m ser citados j u n t a m e n t e
p a r a p e n h o r a e r e m a t a ç ã o dos p e n h o r e s , n ã o p o d e s e m e s t a s o l e n i d a d e ser
e x e c u t a d o s , d n e m vendidos os p e n h o r e s sem a n d a r e m e m p r a ç a os dias d e t e r m i n a -
c

dos p e l a r i e i l ?
ce
tratando-se a execução e m f o r m a q u e n ã o haja nela v i o l ê n c i a . ^
N e m as p e n a s a i n d a legitimamente impostas se p o d e m executar s e m senten-
ça declaratória, S d a qual se deve d a r a p e l a ç ã o e m u m e o u t r o efeito, i n t e r p o n d o -
C

a a p a r t e a g r a v a d a , b e p o s t o q u e q u a n d o se t r a t a d a c o b r a n ç a d e tributos n ã o
c

t e n h a lugar a a p e l a ç ã o mais q u e n o efeito d e v o l u t i v o , 01


n ã o se p o d e negar neste,
a i n d a no caso de se a c h a r expressamente proibida, J devendo-se e n t e n d e r p e r m i -
c

tida e m u m e o u t r o efeito e e m todos os casos e m q u e expressamente se n ã o a c h a r


proibida. k c

E n ã o se p o d e n d o n e g a r às pessoas q u e p a g a m t r i b u t o c e r t i d ã o dos livros


deles p a r a m o s t r a r e m t e r e m satisfeito e, o q u e é m a i s , o e x a m i n a r e m pelos mes-
mos livros se, c o m efeito, t ê m o u n ã o p a g o , c l
/ / G o m e s Freire, n o " b a n d o q u e fez [ A. 206v. ]

* I. quod sinolet, 31, § qui assidua, 20, ss.; de aedilit. edict.; Moliii., dejust. etjur., disp., 260, n 1.
ca 9

1. nisi, 3, cod. deexact.; 1. missi, cod. Theodos., de exact., ubi Gothofr.


- Barb., axiom. 181,n 1.
cc s

- Ord. lib. 2, tit. 53, § 1.


c d

- Ord., lib. 2, tit. 53, § l e 2 .


ce 9 B

** 1.1, cod. de exact.; Peres, ad eundem,titulum,n 5 e 6, et ad I tit. cod. de superact., n 4


c 9 9

S- Salgad., de reg. proct., p. 3, cap. 7, n 2, et 12; Boler., de decoct., tit. 5, q. 25, a, n 10.
C a 9

1. si qua poena, 244, ss., de verb, sign.; I. multos, 25, ss., deappellat.; Perigr., dejur. Fise.,lib, 4 tit. s

8, n 2.s

- Peg., cap. 15, for. n 68.


ci 9

J- Idem Peg., n 247.


C 9

- Idem Peg., n 46
ck 5

1. nee. casas, 2; cod. de discuss., lib. 10, ubi Amaya.


c l i
452

lançar e m Vila R i c a e m 11 d e j u l h o d e 1735, m a n d o u se abrisse a "matrícula dos


escravos e m a i s pessoas e coisas, d e q u e se havia p a g a r a "capitação n o dia 14 do
dito m ê s , q u e d u r a r i a p o r todo o agosto, e q u e n o m e s m o t e m p o d a m a t r í c u l a se
p a g a s s e a m e t a d e d a capitação a respeito dos seis meses q u e h a v i a m de a c a b a r n o
último d e d e z e m b r o daquele a n o , e sujeitou e x p r e s s a m e n t e à c a p i t a ç ã o os negros
e negras, m u l a t a s e mulatos, forros e roceiros q u e n ã o tivessem escravos.
O r d e n o u , outrossim, q u e os q u e n ã o satisfizessem à m a t r í c u l a dos escravos
e m os p r i m e i r o s dois meses d e c a d a s e m e s t r e p a g a r i a m d e p e n a m a i s a d é c i m a
p a r t e d a c a p i t a ç ã o d e v i d a ; e q u e n o q u i n t o e sexto m ê s se e x a m i n a r i a os q u e
t i n h a m s o n e g a d o escravos, e os c o n d e n o u n o p e r d i m e n t o deles e n o d o b r o d a
c a p i t a ç ã o ; q u e se depois d o t e m p o d e t e r m i n a d o viesse a l g u m a pessoa m a t r i c u l a r
o seu escravo sem t r a z e r o u r o m a s p e n h o r e s , estes se v e n d e r i a m s e m figura de
j u í z o e sem custas.
C o m este *bando c o n c o r d a o "regimento q u e , e m n o m e d e S u a Majestade,
o r d e n o u c o m M a r t i n h o d e M e n d o n ç a p a r a a c o b r a n ç a d a c a p i t a ç ã o , d e q u e só
n o t a r e i alguns dos lugares q u e se n ã o a c h a m c o m p r e e n d i d o s no dito b a n d o . D e -
t e r m i n a , pois, n o parágrafo 1-, q u e os q u e s o n e g a r e m escravos os p e r d e r ã o p a r a a
F a z e n d a R e a l ou p a r a o d e n u n c i a n t e , se o houvesse, m a s q u e , n ã o a p a r e c e n d o os
escravos s o n e g a d o s , se t o m a r ã o aos d o n o s outros tantos, e p o s t o q u e neste caso
m a n d e q u e sejam ouvidos, n ã o lhes c o n c e d e a p e l a ç ã o , s e n d o c o n d e n a d o s , m a i s
q u e n o efeito devolutivo e p a r a o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o .
N o s parágrafos 25 e 26, m a n d a d a r g r a t u i t a m e n t e aos d e n u n c i a n t e s todas as
clarezas q u e p e d i r e m dos livros d a matrícula e nega-as aos q u e p a g a r a m a capitação
sem d e s p a c h o do g o v e r n a d o r , a q u e deve p r e c e d e r sentença de justificação das cau-
sas p o r q u e se p e d e , j u l g a d a p o r sentença p e l o " i n t e n d e n t e , o u v i d o o "fiscal, d e
q u e se p a g a r ã o os salários ordinários, q u e é o m e s m o q u e negá-las.
N o parágrafo 1 1 , e s t e n d e a capitação às pessoas européias e a m e r i c a n a s , p o s t o
q u e livres, se p o r sua m ã o extraírem o u r o das m i n a s , e deixadas as m u i t a s incoerên-
cias e e n c o n t r o s q u e nele se o b s e r v a m , é certo q u e n e m este r e g i m e n t o n e m o b a n d o
d e G o m e s Freire p o d i a m servir de r e g r a p a r a a c o b r a n ç a da capitação.
[ fl. 207 ] P o r q u e os tributos n ã o se c o b r a m segundo o c a p r i c h o ou arbítrio dos "minis-
tros e "governadores, m a s s e g u n d o as leis e regimentos confirmados pelo p r í n c i p e , c m

sem e m b a r g o do q u e u m e o u t r o se a c h a m p o r confirmar, se t e m e x e c u t a d o c o m
tal e x a ç ã o q u e os p e n h o r e s se r e n d e m logo, r e p u t a n d o - s e o o u r o l a v r a d o p o r d o z e
"tostões, e n a c o m a r c a do S a b a r á n ã o se r e c e b i a m os p e n h o r e s sem o valor deles
e x c e d e r a q u a n t i a devida.
Confiscam-se os negros q u e se n ã o m a t r i c u l a m n o t e m p o d e t e r m i n a d o , posto
q u e os d o n o s tivessem o i m p e d i m e n t o d a d o e n ç a ou o u t r o qualquer, a i n d a daqueles

1. 1, cod. de superind., ubi Per. n 9. 9


453

q u e , conforme o direito, d e s o b r i g a m d e c o m p a r e c e r p e r a n t e os magistrados, sen-


d o c i t a d o s o u c h a m a d o s ; o b r i g a m - s e os p o b r e s d e u m e o u t r o sexo a p a g a r a
"capitação, a i n d a q u a n d o se sabe q u e uns p e d e m pelo a m o r d e D e u s p a r a satisfa-
z e r e m e outros u s a m m a l d e si p a r a t e r e m c o m q u e p a g a r .
R e m a t a m - s e aos mineiros os escravos necessários p a r a a cultura das m i n a s , p o n -
do-os, p o r esta forma d e p r o c e d e r , e m termos d e n ã o p o d e r e m subsistir, p o r n ã o
h a v e r q u e m fie deles, p o r lhes faltarem os meios d e p a g a r e m , q u e consistiam n o
exercício de m i n e r a r , d o qual a o m e n o s tiravam o fruto d e conservar a e s p e r a n ç a d e
q u ê a c h a r i a m o u r o c o m q u e entretivessem seus credores, q u e n ã o p o d e m conservar
e x e c u t a d o s n a referida forma, p o r n ã o p o d e r e m m i n e r a r sem escravos.
E, sem e m b a r g o d e todos estes excessos praticados n a c o b r a n ç a d a c a p i t a ç ã o ,
n ã o p r o d u z esta e m c a d a u m a n o 124 "arrobas de o u r o (que s e m p r e e r a m m e n o s
q u e 137 q u e e m u m a n o p r o d u z i u o o u r o dos "quintos q u e se c o b r o u n a f o r m a
estabelecida pelo c o n d e das Galveias), p o r q u a n t o posto q u e se assente p r o d u z a
c a p i t a ç ã o as referidas 124 arrobas n ã o é assim c o m o se afirma.
P o r q u e p a r a G o m e s Freire, executor deste tributo, persuadir o referido rendi-
m e n t o , faz p a g a r os "intendentes e mais pessoas q u e se o c u p a m n a c o b r a n ç a d a
capitação n a Provedoria d a F a z e n d a das M i n a s , e c o m o obriga aos eclesiásticos a
p a g a r e m a capitação dos seas escravos q u e n ã o m i n e r a m , c o m o fundamento d e que
ficando escravos nas Minas sem p a g a r capitação se abriria c a m i n h o a q u e se escusas-
s e m muitos c o m fraude, p a r a satisfazer a disposição de direito que escusa aos eclesiás-
ticos de pagarem tributos / / q u e n ã o sejam encargos reais, lhes m a n d a satisfazer pela [ fl. 207v. ]
m e s m a Provedoria d a F a z e n d a o q u e pela referida forma lhes tira pela capitação,
fazendo maior o rendimento deste tributo com o q u e tira a Sua Majestade d e outra
"estação.
E se este negócio b e m se e x a m i n a r , a capitação, que j á d á p e r d a a Sua Majesta-
de, h á de vir a arruinar a Fazenda do m e s m o senhor n a melhor parte, p o r q u e o m a i o r
r e n d i m e n t o q u e os príncipes t ê m nos seus "países e m q u e h á m i n a s n ã o consiste
n o direito real dos quintos q u e delas p e r c e b e m , m a s nos direitos das fazendas q u e
por ocasião das mesmas minas nelas se i n t r o d u z e m e mais utilidades q u e por ocasião
delas lhes r e s u l t a m , c n
s e n d o , e n t r e t o d a s , a principal fo p r o v e i t o ! q u e resulta ao
público de se descobrirem novas minas e t r a b a l h a r e m as j á descobertas, c o m o se
considerou no "alvará de 8 d e agosto de 1616 [sic], e fica p o n d e r a d o n o princípio.
Esta verdade se vê c o m toda a clareza nas nossas Minas, p o r q u e delas depen-
dem, neste R e i n o , o "contrato do consulado d a saída, no R i o d e J a n e i r o e Bahia, o
contrato da dízima das alfandegas, e m todos os portos [marítimos! do Brasil, impor-
tante tributo dos escravos q u e se introduzem nas mesmas M i n a s , o importante contra-
to das entradas e ainda, o dos "dízimos e o rendimento do q u e p r o d u z e m as "serventias
?

Solorz., de jur. Iridiar., tom. 2, lib. 5, cap. un., n 52. e


454

e ' t e r ç a s p a r t e s dos "ofícios, cuja conservação e a u m e n t o t o d o p e n d e d a prosperi-


d a d e dos mineiros e conservação e a u m e n t o das minas.
P o r q u e se os mineiros n ã o tiverem c o m que c o m p r a r escravos, fazendas e m a n -
timentos, n e m deste R e i n o se h ã o dc remeter p a r a o Brasil fazendas e m q u a n t i d a d e
tal q u e nele acrescentem ou conservem o rendimento do "consulado da saída e nas
alfândegas da América o cio "contrato d a dízima; n e m das costas da África introduzir
n o Brasil a g r a n d e quantidade d e negros que c o n s o m e m as Minas e nelas p a g a m os
direitos das "entradas e nos portos marítimos os costumados; .nem nas M i n a s h ã o de
e n t r a r gados, fazendas ou m a n t i m e n t o s q u e p a g a m e n t r a d a s ; n e m fabricarem-se
lavouras de q u e se p a g u e m "dízimos; n e m os ofícios de Justiça e F a z e n d a produzi-
r e m r e n d i m e n t o considerável, p o r q u e o n ã o t e m o n d e h á pobreza, e, ultimamente,
[ fi.- 208 ] faltará / / a "capitação, p o r q u e se continuar h á de faltar q u e m a pague.
P o r q u a n t o é certo q u e a capitação arruina .aos mineiros e minas: a estas por-
q u e , c o m o j á se n o t o u , n ã o as p o d e h a v e r s e m h a v e r m i n e i r o s q u e as l a v r e m ;
àqueles, p o r q u e todos os que se. rcxercitaml neste oficio e n t r a m nas nossas M i n a s
p o b r e s . E p o s t o q u e a c h a v a m q u e m lhes fiassem escravos, m a n t i m e n t o s e os m u i -
tos i n s t r u m e n t o s necessários p a r a m i n e r a r , na e s p e r a n ç a o r d i n a r i a m e n t e vã de
t i r a r e m o ouro, e p o r este m o d o , q u a n d o t i n h a m a fortuna de o a c h a r , se faziam
h o m e n s de cabedais, c o m q u e p a g a v a m os "quintos e satisfaziam aos seus credo-
res. E os que n ã o tiravam ouro, c o m o não e r a m obrigados a p a g a r quintos, entreti-
n h a m - s e a si e a seus credores c o m a esperança dc a c h a r ouro c m o u t r a parte, p a r a
o q u e e m p r e e n d i a m novos serviços, trabalhos e descobrimentos, c o m g r a n d e utili-
d a d e do público e do comércio.
E c o m o pela capitação são obrigados a p a g a r , tirem ou n ã o tirem ouro, e sem-
p r e antes d e se tirar, pela antecipação com q u e sempre.se t e m c o b r a d o e p a r a satisfa-
ção dela, lhes r e m a t a m os escravos mineiros, ficam eles n ã o só p e r d i d o s , m a s todos
aqueles q u e lhes h a v i a m fiado escravos, m a n t i m e n t o s , i n s t r u m e n t o s e r o u p a s , e im-
possível h a v e r mineiros novos, p o r se lhes tirarem o meio d e se estabelecerem.
N ã o é m e n o r o d a n o q u e pela capitação se faz aos mineiros j á estabelecidos,
p o r q u e se t r a b a l h a r e m nas minas j á descobertas e exaustas a p e n a s tirarão c o m q u e
p a g a r a c a p i t a ç ã o e sc e m p r e e n d e r e m d e s c o b r i r m i n a s n o v a s Ou t r a b a l h o s
dificultosos e m q u e se faz g r a n d e despesa e g a s t a m m u i t o a n o s , c o m o h ã o d e
p a g a r a c a p i t a ç ã o n o p r i n c í p i o d e c a d a seis meses, n e c e s s a r i a m e n t e se h ã o d e
a r r u i n a r antes d e descobrirem os descobrimentos e trabalhos.
Pela utilidade pública q u e se considera n a cultura dos c a m p o s , se a c h a deter-
m i n a d o e m D i r e i t o q u e os colonos ou l a v r a d o r e s se n ã o h ã o d e i n q u i e t a r p e l o
p a g a m e n t o dos tributos em forma que sejam o b r i g a d o s a d e s a m p a r a r a
agricultura,™ e c o m o a utilidade pública q u e resulta de se l a v r a r e m as m i n a s seja

]. colonos, 15, cocí, ele agrie et sensil.; Solorz. de jur. Ind., tom 2, lib. 1, cap. 3, n° 84.
455

tão considerávelj c o m o j á se p o n d e r o u , j u s t a m e n t e p r e t e n d e m os m o r a d o r e s das


M i n a s , e m súplica q u e h á anos p e n d e n o / / C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , n ã o a isen- [fl. 208v. ]
ç ã o d e p a g a r os "quintos do o u r o q u e t i r a r e m m a s q u e eles se n ã o c o b r e m p e l a
"capitação, q u e os a r r u i n a e destrói, p r i n c i p a l m e n t e a c h a n d o - s e j á m u i t o d i m i n u -
to o p r o d u t o d a capitação, p o r q u e a remessa q u e se fez n o a n o p a s s a d o de 1746 e
p e r t e n c i a a o q u e findou no último d e j u l h o do m e s m o a n o n ã o se c o m p u n h a só
do o u r o p e r t e n c e n t e a o a n o q u e tinha a c a b a d o , m a s do o u r o q u e se t i n h a c o b r a d o
p e r t e n c e n t e a o a n o q u e principiou n o p r i m e i r o d e j u l h o do dito a n o e h a v i a de
a c a b a r no ú l t i m o d e j u n h o deste a n o de 1747, de q u e se m o s t r a a d i m i n u i ç ã o q u e
t e m tido, a qual h á de crescer à p r o p o r ç ã o q u e forem faltando os mineiros.
C o m o f u n d a m e n t o d e q u e o "país das M i n a s se a c h a a r r u m a d o e deserto
pela capitação e os mineiros e m p e n h a d o s e perdidos, p o r destituídos de ^fábricas,
negros e serviços, oferecem os suplicantes contratar os quintos do ouro que se extrair
e m todas as minas da América dois milhões, e m cada u m ano, livres d e toda a despesa.^
P e r s u a d e m a conveniência deste "contrato e m a F a z e n d a R e a l se livrar d a
despesa q u e faz c o m os "intendentes e mais "oficiais da capitação, além dos livros
e "bilhetes q u e vão desta C o r t e , q u e , j u n t o c o m a das restituições q u e se fazem aos
eclesiásticos, a v a l i a m e m 5 0 0 mil "cruzados, q u e a h a v e r e m de sair d a c a p i t a ç ã o a
d i m i n u i r i a m consideravelmente. M a s s e m p r e Sua Majestade sente este d a n o , p o r -
q u e toda aquela despesa sai d e sua F a z e n d a p r e s e n t e m e n t e p o r diversas "estações,
e t a n t o v i n h a o m e s m o s e n h o r a l u c r a r c o r r e n d o as despesas p o r c o n t a deles,
" c o n t r a t a d o r e s , q u e livres delas oferecem os ditos dois milhões.
P r e t e n d e m , p o r é m , na quinta condição, que, respeitando a g r a n d e decadência
e m que as Minas se acham, por estarem os mineiros destituídos d e fábricas e serviços
de m i n e r a r e necessitarem d e anos p a r a a refazerem, se lhes dissimule, nos primeiros
três anos, se sucederem faltar de pagar, e m cada u m deles, dez ou vinte "arrobas de
ouro, visto se a c h a r a Fazenda Real assistindo, p o r empréstimo, ao contratador dos
diamantes pela Provedoria das Minas com 150 mil cruzados e m cada u m a n o .
Este arbítrio e p r o p o s t a só serve de justificar a necessidade q u e h á d e tirar a [ fl. 209 ]
c a p i t a ç ã o , p o r q u e o c o n t r a t a r a c o b r a n ç a dos direitos dos quintos seria a c a b a r d e
u m a vez c o m os povos das M i n a s , pelas grandes vexações q u e os contratadores das
*rendas reais fazem ordinariamente aos povos, c o m o t e m m o s t r a d o a experiência.
Porque, costumando se contratar o direito real das "sisas, foram tais e tantas as
vexações q u e os "rendeiros delas fizeram aos povos q u e p a r a os livrar delas foi neces-
s á r i o q u e o s e n h o r r e i d o m S e b a s t i ã o c e l e b r a s s e c o m eles q c o n t r a t o d ó
"encabeçamento, pelo qual se obrigou cada u m a das "câmaras a p a g a r e m c a d a u m

3. A partir deste parágrafo, o autor discute proposta anônima de arrendamento da arrecadação do


quinto, por oito anos, no valor total de dezesseis milhões de cruzados, encaminhada ao Conselho
Ultramarino em 1747. Ver BNL, cód. 6980, fl. 215-220.
456

a n o ao p a t r i m o n i o real certa e determinada quantia, t o m a n d o p o r sua c o n t a a co-


b r a n ç a das "sisas, c a d a u m n o seu território. P E estabelecendo-se nas cortes do a n o
C

de 1645 o tributo das "décimas p a r a defesa deste R e i n o , nas guerras d a feliz aclama-
ção d o s e n h o r rei d o m J o ã o , o q u a r t o , se declarou logo que o dito tributo se n ã o
poderia arrendar, p o r n ã o acrescentar moléstia aos p o v o s . 9 E Sua Majestade, nas
c

ordens q u e m a n d o u a o conde das Galveias p a r a estabelecer forma p a r a q u e os quin-


tos se cobrassem inteiramente, reprovou, p o r pouco conveniente, o de cobrar os "quintos
p o r " c o n t r a t o , p o r q u a n t o a i n d a q u e estes c r e s c i a m c o m o t e m p o , h a v i a m os
"contratadores pedir condições exorbitantes e prejudiciais à quietação dos povos e,
e m conseqüência, aos interesses do mesmo senhor, e n ã o h á fundamento p a r a Sua
Majestade aprovar agora o que então, c o m justíssima r a z ã o , reprovou, muito especi-
almente vistas as condições c o m q u e os suplicantes p r e t e n d e m esté contrato,-

Pela p r i m e i r a c o n d i ç ã o , oferecem dois milhões e m c a d a u m a n o , livres das


despesas, p o r todas as m i n a s d a A m é r i c a j á descobertas e q u e p e l o t e m p o adiante
se descobrirem, e m q u e se c o m p r e e n d e m n ã o só as M i n a s Gerais m a s as d e Goiás
e C u i a b á e outras quaisquer q u e a p a r e c e r e m d u r a n t e o t e m p o do seu c o n t r a t o .
[ fl. 209v. ] P o r é m , é certo q u e só as / / M i n a s Gerais r e n d e r a m mais n o a n o q u e c o r r e u
de 22 d e m a r ç o d e 1734 até o u t r o tal dia de 1735, e m q u e se observou o m o d o d e
c o b r a n ç a estabelecido pelo c o n d e das G a l v e i a s , p o r q u e p r o d u z i r a m os q u i n t o s
delas c e n t o e t r i n t a e sete " a r r o b a s d e o u r o , alguns " m a r c o s , "onças e "oitavas,
q u e só as a r r o b a s v a l e m dois milhões e 192 mil "cruzados.
M a s q u a n d o n ã o produzisse mais q u e as c e m a r r o b a s d e o u r o q u e as " c â m a -
ras das M i n a s se o b r i g a r a m a fazer certas a sua M a j e s t a d e e m c a d a u m ano, livres
d e despesas, q u e v a l e m u m m i l h ã o e 6 0 0 mil c r u z a d o s , s e m p r e e r a mais q u e o
q u e os suplicantes oferecem, visto n ã o se c o m p r e e n d e r e m n a s c e m a r r o b a s d e
o u r o q u e as c â m a r a s das M i n a s Gerais ofereciam as d e Goiás e C u i a b á , q u e os
suplicantes q u e r e m incluir no p r e t e n d i d o c o n t r a t o , e q u e as M i n a s Gerais, p a r a o
p a g a m e n t o d a q u e l a s c e m a r r o b a s , n ã o p e d i a m a sua M a j e s t a d e isenção a l g u m a
d e o u t r o s direitos n e m p r e j u d i c a v a m a c o n t r a t o a l g u m d a F a z e n d a R e a l ; p e l o
c o n t r á r i o , os suplicantes p e d e m isenção de direitos e p r e j u d i c a m ã outros c o n t r a -
tos reais, c o m o se v e r á e m seu lugar, v i n d o , p o r este m o d o , a tirar a S u a Majesta-
d e , p o r outras *estações, p a r t e considerável do q u e l h e p r o m e t e m ,
N a condição segunda, p r e t e n d e m n o m e a r todos os oficiais das "casas de fun-
d i ç ã o , e x c e t o os " s u p e r i n t e n d e n t e s , d e v e n d o - s e c o n t e n t a r c o m os "oficiais q u e
h a v i a m d e t r a b a l h a r , p o r q u e o "escrivão e " m e i r i n h o q u e h ã o d e servir c o m o
s u p e r i n t e n d e n t e d e v e m ser n o m e a d o s p o r S u a Majestade, pelos g r a n d e s inconve-
nientes q u e resultarão às partes d e o serem pelo c o n t r a t a d o r .

C
P' Como consta do "alvará de 16 dc dezembro de 1566 por que o dito senhor confirmou o ^regimento
dos encabeçamentos
cc
l' Como consta do 'regimento das 'décimas, título 4, parágrafo 13.
457

N a terceira condição, p r e t e n d e m se lhes dê livres nas alfandegas e "entradas


das M i n a s a "água-forte^ e " s o l i m ã o , e " c a d i n h o s , e o m a i s n e c e s s á r i o p a r a a
fundição d o o u r o , e q u e e m t o d a a A m é r i c a se p r o í b a o uso e negócio dos ditos
gêneros. A p r i m e i r a p a r t e desta c o n d i ç ã o é r e q u e r i d a c o m g r a n d e dolo, p o r q u e as
p a r t e s q u e v ã o levar o u r o às "casas de fundição são as q u e p a g a m estes materiais
pela p a r t e respectiva a o o u r o q u e se lhes funde e p e l o p r e ç o q u e eles d e v e m ter
n a s M i n a s , e m q u e e n t r a m os direitos q u e t ê m p a g o , t a n t o n a s a l f â n d e g a s / / [ fl. 210 ]
c o m o nas e n t r a d a s , e é c o n t r a toda r a z ã o p r e t e n d e r e m q u e S u a M a j e s t a d e lhes
p e r d o e os direitos q u e eles h ã o de c o b r a r das partes.
E t a m b é m a dita condição prejudicial a Sua Majestade nas alfândegas e nas
e n t r a d a s das M i n a s , das quais se a c h a m c o n t r a t a d o s os d a alfândega d o R i o d e
J a n e i r o e o das e n t r a d a s , q u e h a v i a m de diminuir se se concedesse a p r e t e n d i d a
isenção.
A s e g u n d a p a r t e é prejudicial ao "contrato real do solimão, q u e necessaria-
m e n t e h á d e d i m i n u i r m u i t o se se lhe t i r a r a extração p a r a o Brasil, q u e n ã o é
j u s t o , especialmente fora das M i n a s , p r i v a r destes materiais, n e m d e oficiais q u e
f a b r i q u e m o u r o e p r a t a , n e m u l t i m a m e n t e fazer, a favor dos suplicantes, u m m o -
nopólio destes gêneros e m toda a América, c o m o eles, suplicantes, p r e t e n d e m p o r
esta c o n d i ç ã o sem coisa a l g u m a q u e o justifique.
E a isenção que pretendem de "propinas^ é e m prejuízo dos "ministros e "oficiais.
N ã o h á razão q u e p e r s u a d a a espera q u e p r e t e n d e m na condição quinta,^ n e m
faz força o a r g u m e n t o do empréstimo feito ao "contratador dos diamantes, p o r q u e
este os n ã o p o d e tirar sem fazer g r a n d e despesa dos serviços a s u a custa, p a g a m e n t o
das pessoas q u e t r a b a l h a m n a q u e l a I n t e n d ê n c i a e c o m p r a d e escravos mineiros e
ferramentas necessárias, e os suplicantes p r e t e n d e m , injustamente, q u e o seu contra-
to principie depois de Sua Majestade lhes p ô r p r o n t a s as casas p a r a fundição.
S o b r e a sexta c o n d i ç ã o , p a r e c e que, de, q u a l q u e r m o d o q u e se c o b r a r e m os
6

"quintos, s e m p r e é conveniente haja mais casas d e fundição o n d e forem necessá-


rias. As p a r t e s q u e forem q u i n t a r o u r o se lhes h á d e d a r "guia, c o m o s e m p r e se fez,
e as c i r c u n s t â n c i a s q u e d e n o v o se a p o n t a m p a r e c e m b e m p o r dificultarem as
falsidades e t r a z e r e m m a i o r expedição p a r a as p a r t e s . Estas guias se h ã o d e e n t r e -
gar às pessoas a q u e , p o r q u a l q u e r m o d o , se e n t r e g a r e m as b a r r a s , e u l t i m a m e n t e
n a casa d a m o e d a e m q u e se r e d u z i r e m a dinheiro.

Além do já referido, os contratadores pretendiam íicar isentos de pagamento de propinas do contrato.


Estipulava a condição quinta que os contratadores, durante os três primeiros anos, não estariam
obrigados à integralização da cota anual do contrato. Os valores remanescentes desse período
seriam pagos no decorrer dos cinco anos seguintes.
Estabelecia o fornecimento de guia de quitação do quinto efiançaidônea do quíntuplo do valor do
ouro não quintado.
458

A fiança r e q u e r i d a é i m p r a t i c á v e l e d e s n e c e s s á r i a , p o r q u e é m o r a l m e n t e
[ fl. 2 I 0 v . ] impossível q u e a m a i o r p a r t e das pessoas q u e v ã o / / " q u i n t a r o u r o , q u e são os
"comboieiros e h o m e n s d e negocio, a c h e m nas M i n a s , o n d e n ã o estão estabelecidos,
fiadores p r o n t o s e p o r q u e , h a v e n d o a cautela necessária n o e x p e d i r das "guias e
t o m a n d o p o r p e r d i d o t o d o o o u r o q u e se a c h a r s e m elas, dá-se s u p e r a b u n d a n t e
p r o v i d ê n c i a p a r a . s e n ã o extrair o u r o sem p a g a r o q u i n t o , p o r q u e , a i n d a q u e seja
fácil fazer guias falsas, n ã o é dificultoso conhecê-las, a l é m de q u e as b a r r a s p a s s a m
p o r m u i t a s m ã o s , e q u e m fabricar u m a guia falsa h á d e escrever n e l a a pessoa q u e
lhe p a r e c e r , e h a v e n d o p r o c e d i m e n t o c o n t r a esta, vinha a ser castigado q u e m n ã o
tinha culpa. U l t i m a m e n t e , o proceder-se p o r u m a lista q u e o " c o n t r a t a d o r há de
m a n d a r às *casas da m o e d a , e m q u e p o d e escrever o q u e quiser, é. abrir o c a m i n h o
a muitas m a l d a d e s .
N ã o se p o d e obrigar os mineiros a n ã o t e r e m o u r o e m p ó e m seu p o d e r m a i s
d e dois meses, e m e n o s c o m as p e n a s c o n t e ú d a s n a c o n d i ç ã o s é t i m a , p o r n ã o
h a v e r nas M i n a s mais m o e d a s q u e o u r o e m p ó , e se os mineiros forem obrigados
a reduzi-lo a b a r r a n o dito t e r m o ficarão impossibilitados p a r a fazerem p a g a m e n -
tos m i ú d o s , e se a b r i r á c a m i n h o a d e n ú n c i a s injustas; n e m h â prejuízo e m q u e o
o u r o se d e t e n h a mais d e dois meses nas m ã o s dos mineiros e pessoas particulares,
c o m o n ã o .saia das M i n a s s e m p a g a r q u i n t o , n e m t a m b é m h á prejuízo n a d e m o r a ,
p o r q u e t o d o o o u r o q u e se extrai das M i n a s sai delas pelo comércio d e n t r o de u m
a n o , e q u e m o recebe fica o b r i g a d o a p a g a r o q u i n t o nas *casas de fundição, p a r a
o q u e o t o m a p o r m e n o s três "tostões e m c a d a "oitava,
A lista das fazendas r e q u e r i d a n a condição o i t o é desnecessária, p o r q u e os
7

suplicantes as p o d e m haver facilmente do registro das "entradas. A confiscação era


injusta, p o r q u e as fazendas q u e v ã o às M i n a s n ã o p a g a m quintos. A fiança é sem
fundamento pela m e s m a razão e impossível aos comboieiros, que a n ã o acharão nas
M i n a s , o n d e n ã o estão estabelecidos. Acresce que v e n d e m q u a s e t u d o fiado e, d e
ordinário, p e r d e m as dívidas p o r fugirem os compradores, e seria crueldade obrigá-
[ fl. 211 ] los a pagar quinto da fazenda que perderam. A lista dos devedores é desnecessária, / /
p o r q u e se n ã o p a g a quinto das dívidas, e admitido o q u e o suplicante requer nesta
condição se a r r u i n a r i a o comércio e as M i n a s , p o r q u e impondo-se às pessoas q u e
nelas m e t e m fazendas os encargos referidos nesta condição n ã o haveria q u e m lá as
metesse, e perderia Sua Majestade os contratos q u e d e p e n d e m das Minas e a estas,
p o r q u e n ã o p o d e m subsistir sem que de fora se lhe introduzam todos os gêneros.
S o b r e a c o n d i ç ã o n o n a , p a r e c e q u e os p a g a m e n t o s a troco d e fazendas se
8

façam livremente e m o u r o e m p ó e m toda a q u a n t i a , p o r q u e seria g r a n d e v e x a ç ã o

Os comerciantes, no máximo quinze dias após a entrada em Minas, dariam uma lista de todos os
gêneros e das negociações efiançasrespectivas já realizadas, sob pena de confisco do não expressado.
Os pagamentos em ouro em pó não poderiam ser superiores a vinte oitavas. A violação do valor
máximo implicava pena de dobro do valor do quinto; a contumácia implicaria, na segunda vez,
pena de triplo do quinto e,. na terceira vez, expulsão de Minas Gerais.
459

q u e os mineiros e roceiros q u e t r a b a l h a m distantes d a *casa de fundição n ã o c o m -


p r e m o q u e lhes é necessário n e m p a g u e m o q u e d e v e m s e m fundir p r i m e i r o o
o u r o , sendo i m p e r t i n e n t e o c o b r a r o *quinto dos mineiros ou das pessoas a q u e m
o d e r a m e m p a g a m e n t o . E sendo o o u r o e m p ó o dinheiro q u e h á nas M i n a s , e m
q u e h á casas d e fundição p o r tudo o mais ser p r o i b i d o , p o r é m é justo se p r o í b a a
c o m p r a do o u r o e m p ó q u a n d o p o r ele se d e r dinheiro.
Sobre: a c o n d i ç ã o 10,^ p a r e c e se o b s e r v e m as leis q u e h á n e s t a m a t é r i a , e
s e m p r e era injusto c o m p r e e n d e r n a s p e n a s as pessoas q u e se a c h a s s e m c o m os
p a s s a d o r e s d o o u r o p o r q u i n t a r , n ã o se p r o v a n d o q u e eles e r a m a o m e n o s
auxiliadores do "descaminho.
Sobre a condição l l , l t J
p a r e c e p o d i a c o n c e d e r - s e m e n o s erri q u a n t o t r a t a
dos q u e r e t ê m o u r o , p o r q u e nesta p a r t e se deve explicar p e l o q u e fica dito sobre
a condição nona.
S o b r e a c o n d i ç ã o 1 2 , " p a r e c e q u e os "ministros, n a "devassa geral q u e d e -
v e m tirar todos os anos, p e r g u n t e m pelas pessoas q u e o c u l t a m o u r o a o q u i n t o ou
q u e p o r q u a l q u e r o "passam p o r alto ou d ã o p a r a isso ajuda e favor; e q u e nas
"residências dos m e s m o s se p e r g u n t e se c u m p r e m c o m esta o b r i g a ç ã o e q u e os
ouvidores, nas "correições, e x a m i n e m se os "juízes ordinários satisfazem a ela. E isto
sobejava p a r a o q u e os suplicantes p r e t e n d e m , p o r q u e t u d o o mais q u e referem se
e n c a m i n h a a ter d e p e n d e n t e s os ministros, o q u e p o r n e n h u m m o d o c o n v i n h a .
O pedido, na condição 1 3 , 1 2
se podia conceder / / p o r q u e é o m e s m o q u e se [ fl. 211v. ]
p r a t i c a v a q u a n d o h a v i a casas d e fundição, exceto a faculdade q u e se p e d e p a r a
pessoas p a r t i c u l a r e s p r e n d e r e m e confiscarem, q u e n u n c a h o u v e n e m e r a r a z ã o
q u e se concedesse, pelos g r a n d e s inconvenientes e vexações q u e daí p o d i a m re-
sultar, e está b a s t a n t e m e n t e provido e m q u e as pessoas particulares d e n u n c i e m .
S o b r e a c o n d i ç ã o 1 4 , ^ p a r e c e se n ã o d e v i a m c o n c e d e r mais privilégios q u e
os d a d o s p e l a O r d e n a ç ã o aos " c o n t r a t a d o r e s das r e n d a s reais e q u e a c o b r a n ç a
dos quintos p o d e e deve fazer-Tsel via executiva, p o r é m c o m c o n t a líquida, c o m o
se observa n a c o b r a n ç a de todas as dívidas reais.

Estipulava á prisão e o confisco dos sonegadores do quinto, bem como de quem os auxiliasse ou
estivesse em sua companhia. O perdão dos incursos no crimeficariaa cargo dos contratadores.
' Os confiscos pertenceriam ao contratador, ficando este livre para ajustar com oficiais e denunciantes
1

a parte que lhes caberia.


• Os ministros e juízes ordinários seriam obrigados, nas devassas que tirassem, a perguntar sobre os
que sonegavam ou auxiliavam a sonegar o quinto, sob pena de se lhes dar em culpa e pagarem ao
contratador o prejuízo. .Os culpados nas devassas receberiam as penas impostas aos usurpadores da
Real Fazenda, além de pagamento de multa aos contratadores.
;
Estabelecia o auxílio a ser prestado por governadores, militares e particulares na fiscalização e
combate ao descaminho do ouro.
• Pedia os privilégios concedidos aos contratadores da Real Fazenda e a cobrança de dívidas dos
quintos pela via excecutiva.
460

A c o n d i ç ã o 15 n ã o t e m i n c o n v e n i e n t e . ^
S o b r e a c o n d i ç ã o i 6 , ^ p a r e c e q u e o dito "contrato, vista a s u a g r a n d e im-
p o r t â n c i a , n ã o p o d e ter s e g u r a n ç a , e s p e c i a l m e n t e h a v e n d o - s e d e p a g a r os dois
milhões oferecidos c a d a a n o e m u m só p a g a m e n t o , e esta r a z ã o só b a s t a v a p a r a se
n ã o admitir, a i n d a q u e nele n ã o h o u v e r a os g r a n d e s inconvenientes p o n d e r a d o s .
S o b r e a c o n d i ç ã o 1 7 , ^ p a r e c e q u e nas M i n a s n ã o p o d e h a v e r p r e s e n t e m e n -
te o u r o q u e deva "quintos, p o r q u e , c o m o os m i n e i r o s e mais m o r a d o r e s das M i -
nas são obrigados a p a g a r a "capitação antes d e a d e v e r e m , n ã o d e v e m quintos
pelo t e m p o q u e c o m p r e e n d e r os p a g a m e n t o s q u e tiverem feito, e as novas provi-
d ê n c i a s q u e os " g o v e r n a d o r e s e "ministros lhe d e r e m d e v e m ser reguladas pelas
leis e "regimentos, e n ã o pela a m b i ç ã o e apetite dos suplicantes.
Conferidos, assim, todos os arbítrios q u e se t ê m p r a t i c a d o n a c o b r a n ç a do
direito real dos quintos e a i n d a o q u e de n o v o se oferece, se p e r c e b e , c o m toda
a e v i d ê n c i a , q u e n e n h u m p o d e ser m a i s útil e c o n v e n i e n t e à F a z e n d a R e a l e
utilidade dos p o v o s q u e o estabelecido pelo c o n d e das Galveias e m 20 e 24 d e
[fl. 212 ] m a r ç o d e 1734> q u e j á fica e x p e n d i d o n o p r i n c í p i o . E p a r a o e n c o m e n d a r //
usarei s o m e n t e das palavras c o m q u e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a concluiu o voto q u e
sobre ele deu, a saber: q u e o dito arbítrio, d e q u a n t o ele até a q u e l e t e m p o tivera
notícia, era õ mais conforme às reais intenções de S u a M a j e s t a d e , p o r ser o m a i s
j u s t o e o q u e mais c o n c o r d a v a c o m as regras da e q ü i d a d e e. c o m m e n o s v e x a ç ã o
dos povos a u m e n t a v a a F a z e n d a R e a l e tirava a ocasião d e falsidades, "descaminhos
e furtos.

Solicitava o arrendamento do contrato a terceiro, no todo ou em parte.


Estabelecia o pagamento do contrato em qualquer provedoria e de propinas na Provedoria da Real
Fazenda de Minas Gerais.
Ordenava, arrematado o contrato, o lançamento imediato de bando concedendo dois meses para
manifesto do ouro e pagamento do quinto, além de bandos para outras providências necessárias, a
pedido do contratador.
> 52 <

[Cópia de carta dirigida a Gomes Freire de Andrade


da parte de Diogo de Mendonça Corte-Real
sobre providências e remessa de material para
implantação das casas de fundição]

Cópia sem valor documental de carta detalhando instruções


a Gomes Freire de Andrade p a r a a implantação das casas de
fundição. Tentava ordenar lacunas da lei de 3 de dezembro de
1750 que estabelecera o sistema e do regimento das intendências
e casas de fundição do ouro do Brasil, de 4 de março de 1751,
decisões a serem tomadas n o âmbito do p o d e r local, além de
comunicar a criação da Relação do Rio de Janeiro e remessa de
equipamento de descascar arroz e de semente d e pinhão.
Documento de interesse no início da década d e 1750, pelos
debates travados e m torno da capitação, alternativas existentes,
decisão de reinstalação de casas de fundição em Minas Gerais,
informaria a participação de Caetano da Costa Matoso nas juntas
para a discussão do tema.
Autoria, l o c a i e data: Diogo de Mendonça Corte-Real;
Lisboa; 21.3.1751.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna caligrafada
do século XVIII e destrógrada. A assinalar: o uso do "d" uncial"
com apex pronunciado em voluta; o "s" duplo caudado e penden-
te em forma de vírgula, alternando com o " s " de u m só traço,
t a m b é m pendente; " a " com ponto de fuga ascendente. Letra de
copista. (YDL)
Critérios editoriais: As colações foram feitas a partir de
cópia do APM, S C 93, fl. 74v.-76v. e restringiram-se aos termos
que c o m p r o m e t i a m o significado e o e n t e n d i m e n t o do texto,
mantidas as pequenas variantes introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
A P M , SC 93, fl. 74v.-76v.
A P M , S C 93, Íl.2l5v.-217v.
A P M , C C 1063, fl. 54-55.
A P M , C C 1087, fl. 20-2 lv.
462

[A- 213 ] Cópia

A dilação desta n a u neste p o r t o foi precisa p a r a , p o r ela, se r e m e t e r t u d o o


q u e é preciso p a r a se e s t a b e l e c e r e m as "casas d e fundição e, a o m e s m o t e m p o ,
p o d e r eu c o m u n i c a r a Vossa S e n h o r i a as resoluções q u e S u a M a j e s t a d e foi servi-
d o t o m a r p a r a q u e a execução d a lei de três de d e z e m b r o do a n o passado e do
" r e g i m e n t o das casas d e fundição, que a g o r a r e m e t o a Vossa S e n h o r i a , d e q u a t r o
d e m a r ç o presente, n ã o p a d e c e s s e m a m e n o r dúvida, o que. Vossa S e n h o r i a prati-
c a r á c o m a p r u d ê n c i a e experiência q u e todos r e c o n h e c e m e m Vossa S e n h o r i a e
d e q u e m o m e s m o s e n h o r faz toda a confiança.
C o m o se n ã o p o d e d a r princípio a o novo m é t o d o sem q u e se funda todo o o u r o
e m p ó q u e a t u a l m e n t e existe nas M i n a s e fora delas, é preciso q u e Vossa S e n h o r i a
m a n d e p ô r "editais, e m q u e dê o t e m p o p r o p o r c i o n a d o às distâncias das terras,
p a r a que, t o d a s as pessoas do seu g o v e r n o v ã o fundir o seu o u r o n a s casas d e
fundição respectivas e reduzi-lo a b a r r a s , p a r a q u e desta f o r m a n ã o fiquem preju-
dicados os q u e tiverem ouro e m p ó q u e j á tivessem p a g o o "quinto p e l a "capitação,
p o r cujo motivo m a n d a S u a Majestade os "fundidores e "ensaiadores e m esta n a u
p a r a se e s t a b e l e c e r e m , c o m a m a i o r b r e v i d a d e , e m Vila R i c a , S a b a r á , S e r r o do
Frio, R i o das M o r t e s e São P a u l o , c o m o t a m b é m e m Goiás e C u i a b á . E c o m o n ã o
c a b e n o t e m p o o p o d e r e m ir os "engenhos p a r a se m a r c a r e m as b a r r a s , se suprirá
c o m alguns q u e m e d i z e m h á n o Brasil o u c o m m a r c a s q u e , p o r providência, h ã o
d e levar d a q u i . E o m e s m o s e n h o r deixa a d ê Vossa S e n h o r i a a e x e c u ç ã o , c o m o
for mais condizente, p a r a a p r o n t a execução e m o d o d e evitar o falsificarem-se as
b a r r a s p a r a o futuro c o m esta p r o v i d ê n c i a q u e agora se dá.
Q u a n d o Vossa S e n h o r i a principiar a execução d o novo m é t o d o da c o b r a n ç a
dos quintos, deve ser depois d e findo o último semestre q u e estiver p r i n c i p i a d o da
c a p i t a ç ã o , visto se ter p a g o o quinto p o r aquele t e m p o , e a i n d a q u e a lei d e três d e
d e z e m b r o diga q u e cessa a capitação desde o dia d a sua p u b l i c a ç ã o nas cabeças das
c o m a r c a s das M i n a s , s u p õ e m termos hábeis e entende-se depois d e estabelecida a
[ fl. 213v, ] c o b r a n ç a dos quintos pelo n o v o m é t o d o / / nela p r o p o s t o e feita a diligência q u e
acima refiro d e fundir todo o o u r o em p ó q u e se tirou e n q u a n t o existia a dita capitação
e que j á tem pago o quinto.
Pelo disposto n a m e s m a lei, e m a q u a l se d e c l a r a q u e p a g a r ã o c e m " a r r o b a s
d e o u r o p o r " e n c a b e ç a m e n t o os m o r a d o r e s das M i n a s G e r a i s , estes são c o m p r e -
e n d i d o s só nesta "finta os das " c â m a r a s q u e o f e r e c e r a m , t o m a n d o o assento d e
24 d e m a r ç o d e 1734, q u e são das q u a t r o c o m a r c a s : V i l a R i c a , S a b a r á , R í o das
M o r t e s e S e r r o d o Frio.
A i n d a q u e n o r e g i m e n t o se m a n d a m fazer as d e s p e s a s p e l o s " t e s o u r e i r o s
das " i n t e n d ê n c i a s e casas de fundição das n o v a m e n t e estabelecidas, é S u a M a -
j e s t a d e s e r v i d o q u e V o s s a S e n h o r i a o r d e n e aos " p r o v e d o r e s d a F a z e n d a R e a l
q u e m a n d e m e n t r a r com o dinheiro necessário nos cofres dos tesoureiros das casas
463

d e fundição respectivas p a r a ps referidos p a g a m e n t o s d e o r d e n a d o s e despesas,


c a r r e g a n d o - s e e m receita aos m e s m o s t e s o u r e i r o s , e d a r e m c o n t a s c o m p a p é i s
c o r r e n t e s d a s u a despesa.
R e m e t o a Vossa S e n h o r i a a relação dos *ensaiadores, seus "ajudantes e dos
"fundidores e seus ajudantes q u e foram aprovados n a C a s a d a M o e d a , m a s c o m o
houve muitos e m p e n h o s p a r a fundidores, b o m será q u e Vossa Senhoria os m a n d e
praticar algumas fundições n a C a s a d a M o e d a dessa cidade, e se suceder achar-se
a l g u m q u e n ã o saiba este "ofício e h a v e n d o no R i o alguns capazes e melhores q u e
eles, os m a n d a r á Vossa Senhoria ir e m seu lugar e os mais m a n d a r á Vossa S e n h o r i a
p a r a este R e i n o e d a r á conta. E isto praticará t a m b é m Vossa Senhoria p a r a suprir a
falta de q u a l q u e r dos "oficiais q u e m o r r e r e m n a viagem. R e m e t o as relações dos
materiais e ferramentas q u e d a C a s a da M o e d a se m a n d a r a m entregar ao tesoureiro
do Gonselho U l t r a m a r i n o .
Sua Majestade foi servido criar u m a "relação n o R i o de J a n e i r o , p o r Resolu-
ç ã o q u e foi servido t o m a r e m 16 d e fevereiro passado, e m consulta do C o n s e l h o
U l t r a m a r i n o e D e s e m b a r g o do P a ç o , e p e l a p r i m e i r a frota i r á o " c h a n c e l e r / / [ fl. 2 1 4 ]
c o m oito " d e s e m b a r g a d o r e s feitos d e n o v o , a l é m d e dois q u e h ã o d e ir d a B a h i a
p a r a fundadores, e. e m u m a e o u t r a relação ordenou o m e s m o s e n h o r q u e houvesse
dez d e s e m b a r g a d o r e s e m c a d a u m a e q u e as despesas d a n o v a R e l a ç ã o d o R i o se
fizessem à c u s t a d a sua R e a l F a z e n d a , e n ã o à dos povos, c o m o se ofereciam.
Estando j á p a r a concluir esta carta, ocorreu-me prevenir a Vossa Senhoria que,
ainda q u e vão n o m e a d o s ensaiadores e fundidores p a r a o Cuiabá, é Sua Majestade
servido o r d e n a r - m e avise a Vossa Senhoria q u e o estabelecimento da "casa d e fundi-
ção do C u i a b á fique inteiramente n o arbítrio de Vossa Senhoria, j u l g a n d o se é ou
n ã o útil ou se b a s t a r ã o q u e v ã o só esses oficiais p a r a o b r a r e m c o m a direção d o
"ouvidor, p o r q u e aqui se e n t e n d e q u e aquelas m i n a s n ã o são tão a b u n d a n t e s q u e
m e r e ç a m a despesa que h á de fazer u m estabelecimento c o m o nas mais minas, p o r é m
Vossa Senhoria, como está mais perto, lhe dará a providência necessária.
Sua Majestade foi servido o r d e n a r q u e fosse nesta ocasião M a n u e l Francisco,
q u e foi fundidor e m várias casas d e fundição dessas M i n a s , p a r a q u e , c o m o p r á t i -
co, p o s s a i r estabelecer as casas d e fundição e visitar a forma c o m q u e se p r a t i c a m ,
c o m o t a m b é m p a r a estabelecer as lavagens das "escovilhas c o m o b o m m é t o d o e
m e n o s despesa, c o m o ele j á praticou. E Vossa S e n h o r i a m a n d a r á fazer estas dili-
gências o n d e e n t e n d e r ser necessária a sua assistência, p r á t i c a e experiência.
N o capítulo l , parágrafo 5~ se m a n d a observar os salários estabelecidos n a
9
f

"lei d e .3 d ç d e z e m b r o d o a n o passado c os outros estabelecidos n a "provisão d e 2


d e fevereiro de 1726, m a s c o m o nesta provisão n ã o se fala nos ensaiadores, é S u a
M a j e s t a d e servido q u e V o s s a S e n h o r i a lhes m a n d e d a r os o r d e n a d o s q u e v e n c i a m
q u a n d o os h o u v e nessas M i n a s , e aos seus ajudantes q u e se dê a m e t a d e , e q u e a
m e s m a m e t a d e d o q u e v e n c e r e m os f u n d i d o r e s se d ê aos seus a j u d a n t e s . Isto
c o m u n i c a r á V o s s a S e n h o r i a ao g o v e r n a d o r d e G o i á s p a r a m a n d a r / / p r a t i c a r [ fl. 214v. ]
464

c o m o lhe aviso. O s "ensaiadores q u e quiserem voltar p a r a este R e i n o , t e n d o pes-


soas h á b e i s q u e substituam os seus lugares, é o m e s m o s e n h o r servido q u e Vossa
S e n h o r i a se lhes d ê licença.
Q u a n t o aos "oficiais do "regimento, é t a m b é m o m e s m o s e n h o r servido q u e
Vossa S e n h o r i a lhes arbitre os o r d e n a d o s , de q u e d a r á c o n t a p o r esta Secretaria; e
q u e Vossa S e n h o r i a m a n d e registrar esta carta n a P r o v e d o r i a d a F a z e n d a e nas
"intendências.
R e m e t o a V o s s a S e n h o r i a os c o n h e c i m e n t o s dos " e n g e n h o s d e Tdescascarl
a r r o z , c o m o t a m b é m d e u m a "barrica d e p i n h ã o , p a r a se semear nas terras vizi-
n h a s a essa c i d a d e , p o r q u e nas M i n a s Tsei q u e l h á excelente m a d e i r a d e p i n h o .
A m u i t a dilação q u e t e m tido esta n a u , de q u e é c o m a n d a n t e d o m J o ã o d e
Lencastre, faz t e m e r q u e n ã o ache j á a "frota nesse p o r t o , m a s se n ã o estiver v e r á
Vossa S e n h o r i a se h á alguns cabedais q u e v e n h a m nela e o fará expedir p a r a q u e
volte p a r a este R e i n o .
T o d a s as pessoas reais g o z a m d e feliz saúde. D e u s g u a r d e a Vossa Senhoria.
Lisboa, 21 d e m a r ç o d e 1751 anos,

P . S . G o m o h o j e é a v é s p e r a da p a r t i d a d e s t a n a u e o " f u n d i d o r M a n u e l
Francisco t e m a n d a d o tão remisso q u e até a g o r a n ã o t e m a p a r e c i d o c o m provi-
m e n t o , s u p o n h o q u e n ã o irá.
R e m e t o a Vossa Senhoria seis exemplares do assento q u e se t o m o u e m 24 de
m a r ç o d e 1734, a i n d a q u e deles h a v e r á registro e m Vila R i c a . D i o g o d e M e n d o n -
ça C o r t e - R e a l .

S e n h o r G o m e s Freire de A n d r a d e .

53
[Papel feito acerca de como se estabeleceu a capitação nas
Minas Gerais e em que se mostra ser mais útil
o quintar-se o ouro, porque assim só paga o que o deve]

Parecer em defesa das casas de fundição apresentado em


j u n t a sobre m u d a n ç a do sistema de arrecadação do quinto do
ouro realizada em 6 de outubro de 1749 no Conselho Ultramari-
no. Objetivava contrapor-se ao de Alexandre de Gusmão, favo-
rável à manutenção da capitação.
Seus argumentos evidenciam o quadro econômico de Mi-
nas Gerais e as atividades de seus habitantes, os riscos e técnicas
d a mineração, os agentes comerciais e o descaminho do ouro, as
arbitrariedades ê irregularidades na implantação da capitação,
a violação de princípios do Direito Tributário inerente ao siste-
m a , associado a crise econômica e decadência.
Documento de interesse no início da década de 1750, pelos
debates travados em torno d a capitação, alternativas existentes,
decisão de reinstalação de casas de fundição em Minas Gerais,
que informaria a participação de Gaetano da Gosta Matoso nas
juntas para a discussão do tema.
Autoria, l o c a l e data: desembargador Tomé Gomes
Moreira; Lisboa; 1749.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Parecer de autoridade judicial so-
bre a taxação do ouro extraído em Minas Gerais, compreenden-
do exórdio (com tópicas encomiásticas) e extensa exposição de m o -
tivos e argumentos contra o sistema de capitação e a favor do de
casas de fundição. Observe-se o uso do silogismo como técnica de
argumentação e a constituição de tópicas de vituperação do siste-
m a de capitação, sobretudo como tirania, injustiça, ilegalidade,
violência e de efeitos fiscais danosos; da pequena m a r g e m de lucro
ou o empobrecimento dos mineiros, que os tipifica como vítimas
dos excessivos gastos com a extração aurífera, intensamente em-
pregadas objetivando comover (movere) o leitor em favor da causa
que defende. C o m o mesmo objetivo, o narrador constitui, por
tópicas de vituperação do tirano aplicadas a dados da m u r m u r a -
ção local, a caracterização dos tipos viciosos de Martinho de Men-
donça de Pina e de Proença é Gomes Freire de Andrade. (JPFl
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna tipo bastar-
da italiana do século XVIII, com perfil marcado. Presença d e ca-
pitulares em início de parágrafos, mas todas as maiúsculas apre-
sentam traçados importantes, com volutas e perfil. Entre as mi-
núsculas, o " o " aberto, o "d", o "h" em forma de " E " redondo são
do tipo uncial; o "f * com o corte horizontal em laçada dupla.
Marginália do íl. 215, na parte superior direita, com letra atual.
(YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir de
cópia da BNL, cód. 1570, fl. 344-369v. e restringiram-se aos
termos que comprometiam o significado e o entendimento do
texto, mantidas as pequenas variantes introduzidas pelo copista.
Foi mantido o título atribuído na mesma cópia.
Cópias manuscritas:
BNL, cód. 1570, fl. 344-369v.
BM, Add., n. 15198, fl. 306-359.
466

[fl. 2 1 5 ] Til Q u e r e n d o a real g r a n d e z a d e S u a M a j e s t a d e a t e n d e r à c o n s e r v a ç ã o e


sossego dos seus vassalos assistentes nas M i n a s e, a o m e s m o t e m p o , evitar os gran-
des " d e s c a m i n h o s d e sua R e a l F a z e n d a , p r o c u r o u eleger o m é t o d o mais conveni-
e n t e p a r a a c o b r a n ç a dos seus reais "quintos. E sendo esta m a t é r i a tão d e b a t i d a e
consultada por gravíssimos talentos, vista e e x a m i n a d a nos tribunais competentes,
Sempre se avaliou q u a l fosse o meio mais p r o p o r c i o n a d o p a r a , s e m opressão dos
povos, se executar a a r r e c a d a ç ã o . E suposto q u e , c o m sincera â n i m o e m e r a m e n t e
f u n d a d o n o zelo d o serviço real, se aconselhasse a S u a M a j e s t a d e o sistema d a
"capitação, foi este arbítrio, p e l a formalidade c o m q u e os executores o estabelece-
r a m , tão n o t o r i a m e n t e prejudicial q u e t o d a a sua execução é c o n t r a os preceitos
d a consciência e c o n t r a os d i t a m e s d a r a z ã o , o f e n d e n d o - s e as leis divinas, q u e -
b r a n t a n d o - s e as h u m a n a s , faltando-se à e q ü i d a d e e r e t i d ã o d a justiça, e x e c u t a n -
do-se v i o l ê n c i a s , o p r i m i n d o - s e os p o v o s e c a u s a n d o - s e a o m e s m o serviço real
d a n o s irreparáveis.

T21 T o d o s os referidos efeitos, c o m v e r d a d e sólida expendidos, os mostrarei exe-


cutados nos "países das M i n a s , e é fatalidade digna d a m a i o r lástima q u e , logran-
do o r e i n o d e Portugal u m dilatado i m p é r i o q u e e n c e r r a e m si t ã o copiosos tesou-
ros e t a n t a a b u n d â n c i a de preciosidades, cuja p e r d u r á v e l g r a n d e z a p o d i a fazer o
p a t r i m ô n i o real o mais o p u l e n t o e p o d e r o s o , aos vassalos ricos e n c h e n d o o co-
m é r c i o de lucros, incentivos q u e p o d i a m servir de e m u l a ç ã o e inveja a todas as
p o t ê n c i a s d a E u r o p a , a o m e s m o t e m p o , se veja t u d o c a m i n h a n d o p r e c i p i t a d a -
m e n t e p a r a a última ruína pelas perniciosas disposições de u m vassalo q u e passou
às M i n a s , q u e , c o n h e c e n d o impraticável o arbítrio q u e executa, estriba a sua for-
t u n a nas diligências de o estabelecer, apesar de tantos e tão repetidos clamores.
[ fl. 215v. ] T31 Consiste a m a t é r i a deste discurso e m m o s t r a r / / o s efeitos q u e t e m p r o d u z i -
do o sistema d a capitação estabelecido nas M i n a s p a r a a r r e c a d a ç ã o dos reais quintos,
e p a r a c o m individuação e x p e n d e r u m a m a t é r i a de tantas conseqüências se faz preci-
so e x p o r , e m p r i m e i r o l u g a r , as d u a s q u a l i d a d e s de t e r r a s q u e nos "países das
M i n a s c o s t u m a S u a Majestade c o n c e d e r aos seus vassalos.
141 P r i m e i r a m e n t e , as terras q u e se c h a m a m ' m i n e r a i s ' , e m q u e se descobre o
o u r o , q u e , c o n f o r m e as disposições d a lei e Direito, são do p a t r i m ô n i o real, as d á
e c o n c e d e Sua Majestade aos mineiros, distribuídas n a f o r m a d o seu "regimento,
c o n c e d e n d o - l h e s , p a r a si e seus h e r d e i r o s , q direito e a regalia d e as m i n e r a r
p a g a n d o ao dito s e n h o r o q u i n t o d e t o d o o o u r o q u e delas e x t r a í r e m ; e n e s t a
concessão, dirigida e r e g u l a d a pela lei, se envolve u m c o n t r a t o pelo q u a l fica o
mineiro c o n t r a i n d o a obrigação de m i n e r a r a terra e d e p a g a r o quinto d e todo o
o u r o q u e dela extrair e S u a Majestade fica o b r i g a d o à observância das "datas das
terras e lhe c o n c e d e c o m a referida contribuição, s e m alteração dela.
T51 A s e g u n d a q u a l i d a d e d e terras são as q u e servem p a r a a cultura dos m a n -
timentos, as quais S u a Majestade concede p o r "sesmaria aos m o r a d o r e s daqueles
países, c o n t r a i n d o estes a obrigação, p e l a dita m e r c ê , de p o v o a r e m e cultivarem as
467

ditas terras e p a g a r e m , d e todos os frutos q u e r e c o l h e r e m , os "dízimos q u e , p o r


g r a ç a d a Sé Apostólica, p e r t e n c e m a S u a Majestade, isto suposto.
T61 E sem dúvida q u e só os mineiros d e v e m ^quintos do o u r o q u e e x t r a í r e m
da t e r r a e os lavradores s o m e n t e d e v e m dízimos dos m a n t i m e n t o s e Tfrutosl q u e
r e c o l h e r e m . E se S u a M a j e s t a d e alterar esta f o r m a d e c o n t r i b u i ç ã o nas *datas e
"sesmarias concedidas aos mineiros e lavradores, fica, p o r conseqüência, faltando
à observância do seu contrato, celebrado conforme a fé pública d o seu "regimen-
t o , estabelecido pela disposição d a lei e segundo as regras d e Direito.
Í71 N ã o se p o d e duvidar q u e a o s o b e r a n o p o d e r d e S u a Majestade p e r t e n c e
d e t e r m i n a r a forma d a b o a a r r e c a d a ç ã o q u e deve haver nos seus reais quintos, m a s
esta deve ser / / r e g u l a d a e m t e r m o s q u e n ã o fique g r a v a d a a consciência n a desi- [ fl. .216 ]
g u a l d a d e d e p a g a r e m uns mineiros m a i s , outros m e n o s do q u e d e v e m , e de p a g a r e m
uns lavradores, dos frutos, n ã o somente dízimos, m a s t a m b é m quintos. E u l t i m a m e n -
te n ã o deve a contribuição dos quintos, i m p o s t a s o m e n t e pelas leis n a extração d o
o u r o , c o m p r e e n d e r g e r a l m e n t e a t o d o s os q u e n o m e s m o "país se o c u p a m e m
diversos ministérios, p o r q u e s e n d o assim fica p e r v e r t i d a a n a t u r e z a dos q u i n t o s
e m tributo, o q u e p a r e c e totalmente alheio d a real m e n t e d e S u a M a j e s t a d e .
f81 Depois d e e x p e r i m e n t a d o s vários arbítrios n a referida c o b r a n ç a q u ê a c o n s e -
lhou a S u a M a j e s t a d e o sistema d a "capitação p o r ú n i c o m e i o e mais seguro p a r a
arrecadação dos seus reais quintos e p a r a evitar o "descaminho deles, consistindo esta
e m se c o m u t a r e m os ditos quintos íhal contribuição geral de certo n ú m e r o d e "oitavas
por c a d a u m escravo d e u m e outro sexo, c o m p r e e n d e n d o t a m b é m a todos os forros
e forras, assim negros como mulatos, que assistissem nas Minas. E p a r a este estabele-
cimento se fez e m Lisboa u m regimento dirigido p o r tão singular método que nele se
a c h a expressada t o d a a formalidade necessária p a r a a sua b o a e x e c u ç ã o . M a s c o m o
t o d a a m á q u i n a deste projeto assentou e m f u n d a m e n t o s m e n o s v e r d a d e i r o s , p o r
falta d e p r á t i c a e experiência do país, p r e c i s a m e n t e h a v i a d e ser falível a sua s u b -
sistência, p o i s é c e r t o q u e , s e n d o falsas as p r e m i s s a s , as c o n s e q ü ê n c i a s h ã o d e
p a d e c e r o m e s m o defeito. E, p a r a m e l h o r se i n d a g a r a n a t u r e z a d o sistema d a
capitação, é preciso discorrer sobre os f u n d a m e n t o s e m q u e se estriba.
T91 Pelo q u e se vê e colhe do referido projeto, é principal f u n d a m e n t o deste
o entender-se q u e todos os escravos de., u m e o u t r o sexo q u e assistem nas M i n a s
m i n e r a m a t u a l m e n t e é, n o decurso d o a n o , c a d a u m d á á seu s e n h o r certo n ú m e r o
d e oitavas de o u r o , do qual os quintos q u e se d e v e m a S u a Majestade c o r r e s p o n d e m
à m a i o r i m p o r t â n c i a do q u e é a contribuição a r b i t r a d a n o sistema d a c a p i t a ç ã o , e
q u e sendo assim ficava sendo muito suave e útil aos p o v o s o referido arbítrio. M a s
este f u n d a m e n t o , q u e é a principal base desta idéia, é totalmente alheio da v e r d a -
de, e p a r a confirmação desta e x p o n h o n a f o r m a seguinte os m o r a d o r e s das M i n a s
e os diferentes ministérios e m q u e se o c u p a m os. seus escravos.
ri 04 P r i m e i r a m e n t e , os q u e vivem d e m i n e r a r e extrair o o u r o são todos os [ fl. 216v. ]
m i n e i r o s q u e t ê m lavras p r ó p r i a s , e m q u é seus escravos t r a b a l h a m , e o u t r o s q u e
468

v i v e m d e t r a z e r os seus escravos "faiscando, assim nos rios c o m o n a s lavras j á


desertas, q u e são c o m u n s a o p o v o , e c o m o todo o lucro do t r a b a l h o destes escra-
vos consiste n o o u r o q u e m i n e r a m é s e m d ú v i d a q u e d e t o d o o q u e e x t r a í r e m
d e v e m p a g a r o "quinto a Sua Majestade.
rill O s roceiros, o u l a v r a d o r e s , se o c u p a m s o m e n t e n a c u l t u r a das t e r r a s
p a r a a p r o d u ç ã o dos m a n t i m e n t o s , e n ã o d u v i d o q u e destes haja alguns q u e t a m -
b é m t e n h a m lavras de. o u r o , m a s c o m esta diferença: q u e os escravos q u e o c u p a m
e m m i n e r a r n ã o são os q u e t r a b a l h a m nas roças, p o r q u e p a r a o t r a b a l h o atual d e
u m e o u t r o exercício é necessário diferente n ú m e r o d e escravos, p o r q u e se deve
advertir q u e n o trabalho d a execução do ouro se o c u p a m t o d o a n o os escravos, e
estes se n ã o p o d e m divertir p a r a diferente serviço.
T121 V i v e m t a m b é m n a s M i n a s h o m e n s de t o d a a v a r i e d a d e d e "ofícios m e -
cânicos, uns solteiros e outros casados, e t o d o s estes t ê m escravos — q u e n ã o m i n e -
r a m e lhes n ã o são precisos — assim p a r a o serviço d o m é s t i c o das suas casas e
famílias c o m o t a m b é m p a r a os a j u d a r e m n o exercício dos seus ofícios.
T131 H á t a m b é m nas Miñas u m grande n ú m e r o d e "oficiais de Justiça e milita-
res, e ainda q u e alguns destes t e n h a m escravos de "faisqueira ou e m lavras de alguns
amigos, precisamente têm outros p a r a o seu atual serviço, p a r a o sustento dos cavalos
e p a r a os a c o m p a n h a r e m nas diligências d a administração da Justiça, e destes tais
escravos n ã o t ê m outro lucro mais que o referido serviço, c o m a pensão d e os susten-
tarem e os vestirem e c o m precisa necessidade deles p a r a a sua subsistência.
T141 H á t a m b é m nas M i n a s m u i t a q u a n t i d a d e d e "engenhos e m q u e se fabri-
c a m "aguardentes d a t e r r a e a l g u m açúcar, e nesta "fábrica se o c u p a g r a n d e n ú -
m e r o d e escravos s e m outro lucro do seu t r a b a l h o mais q u e o p r o d u t o das aguar-
dentes e a ç ú c a r q u e os senhores dos ditos e n g e n h o s v e n d e m .
ri 54 Existe t a m b é m nas M i n a s u m g r a n d e n ú m e r o de famílias casadas e c a d a
qual delas, c o n f o r m e a sua g r a d u a ç ã o , c o s t u m a ter o n ú m e r o d e negras e m u l a t a s
necessárias assim p a r a a c o m p a n h a r e m as suas m u l h e r e s c o m o p a r a t o d o o serviço
doméstico e p a r a a criação dos seus filhos, p o r ser este o estilo do "país, o n d e é
[fl. 217 ] impraticável / / haver criadas, n e m amas, nem mulher alguma branca que,
s a l a r i a d a s , se sujeitem a servir; e das ditas escravas n ã o r e c e b e m seus s e n h o r e s
lucro a l g u m m a i s q u e o referido serviço.
ri61 H á t a m b é m nas M i n a s u m g r a n d e n ú m e r o d e negras q u e c o s t u m a m
v e n d e r pelas ruas vários gêneros comestíveis, e estas, c o m u m e n t e , são escravas d e
famílias p o b r e s e d e m u l h e r e s viúvas e miseráveis q u e u n i c a m e n t e se s u s t e n t a m
do q u e fabricam pela sua indústria e v e n d e m pelas m ã o s das suas escravas, e n ã o
lhes b a s t a n d o m u i t a s vezes este trabalho p a r a o sustento m e n o s lhes b a s t a r á p a r a
p a g a r quintos.
n 71 Estas são as qualidades dos m o r a d o r e s q u e t ê m atual existência n a s M i -
nas, e p e l a diferença dos ministérios e m q u e se o c u p a m , e x p e n d i d a c o m t o d a a
v e r d a d e , se m o s t r a o g r a n d e n ú m e r o de escravos q u e h á nas M i n a s s e m m i n e r a -
469

r e m , p o r se o c u p a r e m e m diferentes serviços, consistindo nestes e e m t u d o o mais


q u e t e n h o referido a c o n s e r v a ç ã o das M i n a s e, p o r c o n s e q ü ê n c i a , o r e n d i m e n t o
dos reais " q u i n t o s , pois d e n e n h u m a sorte p o d e r i a m existir os m i n e i r o s se n ã o
houvesse n a q u e l a s p o v o a ç õ e s t u d o o de q u e necessitam p a r a a s u a existência.
P181 E sendo certo q u e a v e r d a d e i r a inteligência d o sistema d a " c a p i t a ç ã o ,
pelo q u e se m o s t r a do extrato dela, n e n h u m a o u t r a coisa é mais q u e u m a conven-
ção feita e n t r e S u a M a j e s t a d e e. os vassalos das M i n a s , c o m u t a n d o - s e os q u i n t o s
q u e d e v e m a o dito senhor n a contribuição d e certo n ú m e r o de "oitavas p o r c a d a
escravo e m c a d a u m a n o . E p a r a ser lícita e isenta d e t o d o o e s c r ú p u l o a d i t a
c o n v e n ç ã o , é preciso q u e somente seja c e l e b r a d a c o m aqueles q u e r e a l m e n t e são
devedores dos quintos, q u e são todos os q u e possuem escravos o c u p a d o s n a extra-
ção do o u r o , p o r q u e s o m e n t e nestes, v e r d a d e i r a m e n t e , h á q u e c o m u t a r , p o r q u e o
roceiro ou l a v r a d o r q u e s o m e n t e o c u p a os escravos n a cultura das terras e. p a g a
"dízimos a S u a M a j e s t a d e dos frutos q u e colhe n ã o p o d e s e r c o m p r e e n d i d o n o
tributo dos q u e m i n e r a m , n e m n a c o n v e n ç ã o d a c a p i t a ç ã o , p o r q u e n ã o m i n e r a n -
do o u r o n ã o d e v e m quintos, e n ã o d e v e n d o quintos n ã o h á neles q u e c o m u t a r .
ri 91 Este m e s m o a r g u m e n t o milita e m todas as pessoas q u e t e n h o referido
q u e n a s M i n a s p o s s u e m escravos o c u p a d o s e m diferentes m i n i s t é r i o s , e m q u e
i g u a l m e n t e fica s e n d o ilícita a c o n v e n ç ã o , pois é c e r t o , c o n f o r m e as r e g r a s d o
Direito, q u e p a r a p o d e r h a v e r / / esta q u a l i d a d e d e c o n v e n ç ã o ou transação deve [ fl. 217v. ]
ser c e l e b r a d a e n t r e a c r e d o r e devedor. E se Sua M a j e s t a d e , p o r n e n h u m princí-
p i o , é a c r e d o r d e quintos dos q u e n ã o m i n e r a m , e sendo a sua real [mente] dirigida
a c o b r a r s o m e n t e d a q u e l e s q u e , c o m o m i n e i r o s , são d e v e d o r e s d e q u i n t o s , fica
sendo i n c o m p a t í v e l e m u i t o alheio d a dita c o n v e n ç ã o c o m p r e e n d e r n e l a os q u e
n ã o são d e v e d o r e s .
r2Ql E, finalmente, esta capitação n e n h u m a o u t r a coisa é mais q u e u m tribu-
to pessoal, g e r a l m e n t e imposto a todos os escravos, disfarçado c o m a c a p a d e u m a
c o n v e n ç ã o , afirmando-se ser voluntária, a o m e s m o t e m p o q u e , p a r a se conseguir,
se excogitaram todos os meios da violência, c o m o a d i a n t e mostrarei. E esta gene-
r a l i d a d e de p a g a r e m t o d o s os escravos o m e s m o n ú m e r o d e o i t a v a s , c a s o m i l
vezes n e g a d o q u e fosse j u s t o perverter a n a t u r e z a dos quintos e m u m tributo pes-
soal, s e m p r e fica g r a v a d a a consciência n a desigualdade deste p r o c e d i m e n t o p o r
q u e p r e c i s a m e n t e h ã o d e p a g a r uns o q u e n ã o devem, outros m a i s d o q u e d e v e m
e outros m e n o s d o q u e devem.
r2ll O s q u e h ã o d e p a g a r o q u e n ã o d e v e m são n ã o s o m e n t e os roceiros e
todos os m a i s q u e t e n h o referido q u e t ê m escravos e n ã o d e v e m quintos p o r q u e os
não o c u p a m e m minerar, mas hão de t a m b é m pagar o que não devem muitos
mineiros a q u e m , muitas vezes, sucede t r a b a l h a r n o s serviços das lavras s e m p o d e -
r e m extrair u m a oitava de o u r o .
Í221 O s q u e h ã o de p a g a r mais d o q u e d e v e m são muitos m i n e i r o s q u e t ê m
lavras d e tão limitado r e n d i m e n t o q u e muitas vezes o o u r o q u e t i r a m n o decurso
de u m a n o , a b a ú d o o quinto q u e licitamente d e v e m , o q u e lhes fica líquido lhes
470

n ã o c h e g a p a r a a despesa q u e fizeram. E p a r a confirmação desta v e r d a d e e m a i o r


clareza d o q u e digo, figuremos u m caso: u m m i n e i r o q u e , * verti gratia, m i n e r a n d o
n a sua lavra tirou s o m e n t e , n o decurso d e u m a n o , 300 "oitavas d e o u r o è t e m
tantos escravos q u e lhe i m p o r t a a "capitação deles as m e s m a s 300 oitavas, precisa-
m e n t e as h á d e p a g a r a S u a Majestade e vem-lhe a d a r todo o o u r o q u e tirou e m
q u e n ã o s o m e n t e l h e leva os " q u i n t o s , m a s t a m b é m o p r i n c i p a l , e se p a g a s s e
s o m e n t e o q u i n t o d a lei, e r a m 60 oitavas p a r a S u a Majestade e 2 4 0 p a r a o m i n e i -
ro, c o m as quais p o d e r i a r e m e d i a r p a r t e das grandes despesas q u e faz, c o m o adi-
ante mostrarei. E assim deve ficar n a p o n d e r a ç ã o da real p i e d a d e d e S u a Majesta-
[ fl. 218 ] de o lastimoso estado e m q u e este mineiro e outros muitos q u e lá se a c h a r ã o / /
desta sorte (porque s e m p r e são mais os de m e n o s fortuna) ficam reduzidos e im-
possibilitados p a r a c o n t i n u a r e m n o exercício d e minerar^ c o m o t a m b é m a d i a n t e
mostrarei.
23 O s q u e p a g a m m e n o s do q u e d e v e m são aqueles m i n e i r o s q u e t ê m lavras
"pingues, e m q u e tiram muito o u r o , e p a r a m e l h o r m e explicar neste p o n t o figuro
o caso seguinte: u m m i n e i r o q u e t e m c i n q ü e n t a negros e m u m a b o a lavra, se teve
a felicidade d e tirar, n o d e c u r s o d e u m a n o , 5.000 o i t a v a s d e o u r o , d e v i a d e
q u i n t o s a S u a M a j e s t a d e , p e i a lei, 1.000 o i t a v a s d e o u r o e p e l a c a p i t a ç ã o , n a
f o r m a q u e se estabeleceu a q u a t r o oitavas e três quartos p o r c a d a escravo, p a g a o
dito m i n e i r o pelos c i n q ü e n t a q u e t e m 237 c i t a v a s e m e i a , e fica o dito m i n e i r o
l u c r a n d o o excesso q u e vai.deste n ú m e r o ao de 1.000 oitavas, q u e são 762 oitavas
e m e i a . E p a r a ressarcir esta d i m i n u i ç ã o d e n ã o p a g a r e m os mineiros ricos o q u e
j u s t a m e n t e d e v e m , h ã o d e p a d e c e r os m i n e i r o s p o b r e s , roceiros e todos os m a i s
m o r a d o r e s das M i n a s p a g a n d o injustamente pela c a p i t a ç ã o o q u e n ã o d e v e m ,
24 N ã o é m e n o s digno d e r e p a r o n ã o se advertir q u e este p r o j e t o d e p a g a r e m
igualmente todos os escravos p m e s m o n u m e r o de oitavas se e n c o n t r a t o t a l m e n t e com"
a f o r m a l i d a d e de todas as mais convenções e c o m as disposições d e todos os "re-
gimentos d e reais direitos, assim das alfândegas c o m o d e todos os tributos e i m p o -
sições q u e se a c h a m estabelecidos neste R e i n o .
2 5 P r i m e i r a m e n t e , nas M i n a s , n o m e s m o estabelecimento d a capitação e nas
o p e r a ç õ e s dos executores delas, temos o e x e m p l o q u e p r o v a a desigualdade e injusti-
ça d a capitação. D e t e r m i n a r a m os ditos executores q u e todas as "lojas d e m e r c a -
d o r e s p a g a s s e m c a p i t a ç ã o , a q u e d e r a m o a p e l i d o d e c e n s o , d i v i d i n d o as ditas
lojas e m três classes - m a i o r e s , m e d i a n a s e inferiores - , e d e t e r m i n a r a m q u e as
m a i o r e s p a g a s s e m 24 oitavas d e o u r o , as m e d i a n a s 16 oitavas e as inferiores, q u e
são "vendas e "tavernas, 8 oitavas. P o n h o d e p a r t e os f u n d a m e n t o s deste tributo,
n e m q u e r o ventilar se d e v e m p a g a r quintos a o m e s m o t e m p o q u e ps d o n o s das
lojas p a g a m s e p a r a d a m e n t e capitação dos escravos d o seu serviço e p a g a m outros
diferentes tributos dos lucros do seu comércio; q u e r o , s o m e n t e , q u e s t i o n a r os fun-
d a m e n t o s c o m q u e se regulou os p a g a m e n t o s de c a d a u m a das lojas. É s e m dúvi-
[ fl. 218v. ] d a q u e se a t e n d e u a q u e / / u m a s r e n d i a m mais d o q u e outras; l o g o , qual será a
471

r a z ã o p o r q u e , r e n d e n d o mais u m a s lavras do q u e outras e t i r a n d o m u i t a s vezes


u m m i n e i r o c o m vinte escravos m u i t o mais do q u e t i r a m outros c o m c i n q ü e n t a ,
h ã o de i g u a l m e n t e p a g a r todos os mineiros o m e s m o n ú m e r o d e "oitavas p o r c a d a
escravo? Se o m e r c a d o r p o b r e p a g a m e n o s do q u e o rico, o m i n e i r o p o b r e , p o r
q u e h á de p a g a r t a n t o ou mais d o q u e 0 rico? Digo mais, p o r q u e o m i n e i r o rico,
p e l a " c a p i t a ç ã o , p a g a m e n o s d o q u e deve e o p o b r e m a i s d o q u e d e v e , c o m o
acima exponho?
26 O u t r o exemplo temos nas m e s m a s Minas q u e confirma o m e u discurso: r e m a -
ta-se o "contrato idos dízimosl reais e entra logo o "contratador c o m os seus sócios
e administradores a fazerem geralmente "avenças c o m todos os roceiros e mais pes-
soas q u e d e v e m p a g a r "dízimos, e n ã o se regula o ajuste pelo n ú m e r o d e escravos
que c a d a u m tem, m a s celebra-se o preço d a avença conforme a qualidade d a roça
ou fazenda q u e c a d a u m cultiva, atendendo-se a o seu c o m u m r e n d i m e n t o , e assim
p a g a n d o uns mais e outros m e n o s p a g a m todos o que licitamente devem, e c o m esta
voluntária c o n v e n ç ã o ficam os contratadores livres d e todo o e n c a r g o . Nestes ter-
mos, desejara saber qual é a razão da diferença p a r a que se n ã o seguissem os m e s -
mos passos n a comutação dos "quintos e m capitação, porque se os contratadores dos
dízimos fazem avença particular com c a d a u m dos roceiros pela variedade do rendi-
mento das fazendas, q u e fundamento há ou pode haver p a r a q u e com os mineiros se
n ã o faça ajuste particular conforme a qualidade e rendimento das lavras que cada u m
tiver? Se m e disserem de que nós mineiros milita a razão de que quanto maior n ú m e r o
de escravos têm mais ouro recebe seu senhor e que todos tiram igual porção e que p o r
esta r a z ã o d e v e m igualmente ser tributados, este f u n d a m e n t o é quimérico e alheio
de toda a v e r d a d e , c o m o j á tenho exposto, e todos os q u e tiverem experiência das
M i n a s n ã o p o d e r ã o n e g a r q u e n a q u a l i d a d e das lavras Temi q u e c a d a um m i n e r a
consiste o muito ou p o u c o r e n d i m e n t o q u e cada escravo d á a seu senhor, pois é sem

/ / dúvida q u e m i n e r a n d o dez escravos e m u m a lavra cheia e a b u n d a n t e d e ouro e [ fl. 219 ]


outros dez, e ainda vinte, e m lavra de muito inferior r e n d i m e n t o , h á d e haver gran-
de diferença nos "jornais de uns e outros escravos, e esta verdade, digo, variedade de
rendimento se acha e x p e r i m e n t a d a a cada passo n a extração do ouro daqueles "países.
27 E q u a i i t o a o q u e digo de q u e o sistema d a c a p i t a ç ã o é c o n t r á r i o a t o d o s
os " r e g i m e n t o s , i m p o s i ç õ e s e t r i b u t o s d o R e i n o , n ã o n e c e s s i t a d e m a i s p r o v a
q u e os m e s m o s r e g i m e n t o s , e t u d o se a c h a r á r e g u l a d o c o n f o r m e o r e n d i m e n t o
das f a z e n d a s q u e c a d a u m t e m ou c o n f o r m e a a g ê n c i a e o oficio q u e exercita. E
esta d e s i g u a l d a d e e r e t i d ã o se n ã o a c h a n o sistema d a c a p i t a ç ã o , p e l o q u a l t a n t o
h á d e p a g a r o m i n e i r o p o b r e c o m o o r i c o , e n a m e s m a f o r m a t a n t o h ã o de p a g a r
os q u e t ê m escravos q u e n ã o m i n e r a m c o m o todos q u e se o c u p a m n o exercício
d e e x t r a í r e m p u r o , e esta desigualdade é n o t o r i a m e n t e injusta e m u i t o p r e j u d i -
cial à c o n s e r v a ç ã o das M i n a s .
28 P o d e r - s e - á dizer q u e o o u r o e m p ó q u e os m i n e i r o s e x t r a e m d a t e r r a
circula pelas m ã o s de todos os m o r a d o r e s das M i n a s , e q u e todos os q u e o rece-
472

b e m e m p ó e r a m obrigados a p a g a r "quintos dele, e q u e p o r ficarem l u c r a n d o os


ditos quintos c o m a "capitação devem, p o r esta r a z ã o , ser incluídos nela e tributa-
dos i g u a l m e n t e todos os seus escravos. M a s este f u n d a m e n t o é a p a r e n t e e m u i t o
alheio d a v e r d a d e , e c o m o a explicação dele p e r t e n c e a o u t r o lugar nele m o s t r a r e i
c o m toda a individuação q u e suposto o o u r o e m p ó nas M i n a s g i r a pelas m ã o s d e
todos os m o r a d o r e s os mineiros e r a m s o m e n t e os q u e p a g a v a m os quintos, e n e m
e n t ã o n e m a g o r a se utilizam deles os m o r a d o r e s .
29 T a m b é m se m e oferece dizer q u e a u m dos executores d a capitação ouvi
m u i t a s vezes defender p o r lícita a c o n v e n ç ã o dela, fazendo p a r i d a d e c o m os a r r e n d a -
m e n t o s das fazendas d e raiz, dizendo q u e assim c o m o nestas é contingente o lucro d o
r e n d e i r o , e q u e ou t e n h a muitos ou poucos lucros s e m p r e é obrigado a p a g a r o p r e ç o
d o a r r e n d a m e n t o , e q u e este s e m p r e fica sendo lícito, e sem o m e n o r escrúpulo o
r e c e b e o senhorio d a fazenda. Assim, pelo sistema e ajuste d a c a p i t a ç ã o fica s e n d o
lícito q u e o m i n e i r o p a g u e pelos seus escravos a q u a n t i a d e "oitavas a r b i t r a d a s ,
[ fl. 2 l 9 v . ] p o r q u e se uns / / anos ficar prejudicado e m outros p o d e r á ter tão g r a n d e rendi-
m e n t o q u e ficará n ã o s o m e n t e ressarcindo os prejuízos dos p a g a m e n t o s passados
m a s l u c r a n d o g r a n d e q u a n t i a de oitavas de o u r o .
30 O referido a r g u m e n t o , q u e só p o d e r á ter lugar a respeito dos mineiros, e h ã o
dos roceiros e mais m o r a d o r e s q u e o c u p a m os seus escravos e m diferentes serviços,
c o n t u d o , s e m p r e é i m p r ó p r i o , ainda q u e é desculpável o seu e r r o , p o r q u e n ã o p e r t e n -
ce ã sua profissão o saber distinguir a qualidade e n a t u r e z a de semelhantes contratos.
M a s p a r a l h e desvanecer a sua e r r a d a opinião é necessário r e s p o n d e r q u e h á u m a
g r a n d e e i n c o m p a r á v e l diferença entre os a r r e n d a m e n t o s das fazendas d e raiz e os
direitos ou quintos q u e se p a g a m das terras minerais. P a r a esta h á lei expressa q u e
d e t e r m i n a o p a g a m e n t o , n u n c a até a g o r a r e v o g a d a ou alterada; h á t a m b é m u m
" r e g i m e n t o c o m inviolável o b s e r v â n c i a p a r a a distribuição das t e r r a s . E p a r a o
p r e ç o q u e h á d e p a g a r o q u e a r r e n d a a fazenda d e raiz n ã o h á m a i s lei q u e a
c o n v e n ç ã o das partes: o r e n d e i r o vê e e x a m i n a a q u a l i d a d e d a fazenda q u e p r e -
t e n d e a r r e n d a r , f o r m a o seu conceito e v o l u n t a r i a m e n t e c e l e b r a o p r e ç o c o m o
d o n o dela. E c o m o esta c o n v e n ç ã o é regulada pelo arbítrio do r e n d e i r o , sem dolo
n e m c o n s t r a n g i m e n t o a l g u m d a p a r t e do s e n h o r i o , fica sendo lícita e livre d e t o d o
o e s c r ú p u l o . Pelo c o n t r á r i o p r o c e d e n o caso do m i n e i r o , p o r q u e n a c o n v e n ç ã o
q u e ele faz c o m Sua Majestade só se ventila t e m o n ú m e r o d e escravos correspon-
d e n t e à q u a n t i d a d e de t e r r a s q u e p e d e p a r a as p o d e r m i n e r a r , e n ã o e n t r a e m
q u e s t ã o o q u e h á d e p a g a r , p o r q u e j á sabe q u e é o q u i n t o d e t o d o o o u r o q u e
extrair, d e t e r m i n a d o pela leí, e m tal forma q u e se n a d a tirar n a d a deve, p o r q u e a
c o n t r i b u i ç ã o dos quintos é real e d e n e n h u m a sorte p e n s ã o n e m tributo pessoal. E
se deve t a m b é m p o n d e r a r q u e suposto p o r direito se r e p u t e o o u r o fruto d a terra,
é c o m g r a n d e diferença dos mais frutos, p o r q u e estes espera r e c o l h e r o r e n d e i r o
n ã o s o m e n t e do t r a b a l h o d a cultura d a t e r r a m a s da v a r i e d a d e dos tempos d e q u e
d e p e n d e a suá p r o d u ç ã o , e o ouro existe j á criado n o c e n t r o d a terra; e n a incerte-
473

za d e o a c h a r , estriba o m i n e i r o as e s p e r a n ç a s d a sua u t i l i d a d e n o c o n t i n g e n t e
sossego de o h a v e r n a terra q u e m i n e r a , s e m q u e lhe aproveite a o c o r r ê n c i a favo-
rável do t e m p o , q u e t a n t o c o n d u z p a r a / / a criação e colheita dos mais frutos. [ fl. 220 ]
31 S e m dúvida q u e , p o r se estabelecer a "capitação c o m c o n s e n t i m e n t o v o -
luntário dos povos, ficou d e r r o g a d a á disposição d a lei e, p o r conseqüência, ficou
sendo lícita e j u n t o a c o n v e n ç ã o feita c o m S u a Majestade. A isto r e s p o n d o q u e
n ã o p o d i a h a v e r c o n s e n t i m e n t o voluntário h a v e n d o tantas violências e sugestões,
c o m o m o s t r a r e i e x p o n d o a forma c o m q u e se estabeleceu a c a p i t a ç ã o .
32 F i n a l m e n t e , c o m o todas as mais circunstâncias de q u e se c o m p õ e o siste-
m a d a capitação estão larga e d o u t a m e n t e p o n d e r a d a s nos muitos p a r e c e r e s q u e
se fizeram sobre a m a t é r i a , dela fica sendo supérfluo individuar as mais c o n t r a d i -
ções q u e e n v o l v e m o dito sistema, e assim e n t r e m o s a p o n d e r a r a f o r m a c o m q u e
se estabeleceu.
33 P r i m e i r a m e n t e , mostrarei q u e n a f o r m a c o m q u e se p r o c e d e u t o t a l m e n t e se
faltou aos preceitos das o r d e n s reais e mostrarei todos os efeitos q u e t e m p r o d u z i d o e
h á d e p r o d u z i r o estabelecimento q u e se fez d a capitação, e m notória r u í n a das M i -
nas e e m d e c a d ê n c i a dos reais "quintos.
34 Persuadindo-se S u a Majestade q u e o sistema d a capitação p o d e r i a ser o m e i o
mais seguro p a r a evitar os grandes r o u b o s q u e nos [""países! das M i n a s se faziam a
sua R e a l F a z e n d a c o m os " d e s c a m i n h o s dos quintos e suposto q u e o dito senhor,
c o m o rei e s o b e r a n o , f u n d a d o nos pareceres q u e se fizeram e m a p r o v a ç ã o do dito
sistema, o p o d i a logo estabelecer pela lei, e m t u d o quis a sua real g r a n d e z a , p a r a
s e g u r a n ç a d a s u a consciência, q u e o dito arbítrio se propusesse aos p o v o s , p a r a
q u e , c o n c o r r e n d o a sua aceitação e o seu voluntário c o n s e n t i m e n t o , ficassem des-
vanecidos os escrúpulos q u e sê a r g u i a m nos pareceres q u e e m c o n t r á r i o se fizeram
p o r pessoas q u e s o u b e r a m a n t e p o r a v e r d a d e a o interesse e lisonja.
35 P a r a o referido estabelecimento, foi Sua Majestade servido n o m e a r sujeito
q u e passasse às M i n a s , p a r a q u e j u n t o c o m o c o n d e das Galveias, " g o v e r n a d o r
delas, p r o p u s e s s e m aos povos o referido sistema d a capitação, r e c o m e n d a n d o c o m
m u i t a especialidade nas suas reais ordens q u e se n ã o usasse d e violência n e m d e
sugestão a l g u m a p a r a q u e fosse aceito, e q u e no caso q u e aos povos lhes parecesse
oneroso e c o m o tal o r e p u g n a s s e , p r o v i s i o n a l m e n t e se elegesse o u t r o meio q u a l -
q u e r q u e se julgasse mais / / conveniente p a r a a b o a a r r e c a d a ç ã o dos seus reais [ fl. 220v. j
q u i n t o s . P a r a este efeito, d e u S u a M a j e s t a d e a o dito sujeito t o d a s as o r d e n s e
p o d e r e s necessários, o q u a l usou deles n a f o r m a seguinte.
36 Assim q u e c h e g o u ao R i o de J a n e i r o , c o m u n i c o u ao g o v e r n a d o r G o m e s
F r e i r e d e A n d r a d e a comissão q u e levava. Este, q u e r e n d o ser p a r t i c i p a n t e das
felicidades q u e se e s p e r a v a m d o e s t a b e l e c i m e n t o d a c a p i t a ç ã o , a c o n s e l h o u a o
dito comissário q u e , s e p a r a d o da c o m p a n h i a dos "ministros q u e S u a M a j e s t a d e
m a n d o u , subisse p r i m e i r o p a r a as M i n a s e q u e dirigisse os seus p r o g r e s s o s e m
f o r m a q u e , p a r a o futuro, fossem a m b o s igualmente executores d a capitação.
474

37 P a r t i u , c o m efeito, o dito comissário p a r a as M i n a s , e c h e g a n d o a Vila


R i c a consultou c o m o c o n d e das Galveias, " g o v e r n a d o r delas, todas as comissões
q u e trazia e e n t r o u a p r a t i c a r a "capitação c o m as pessoas de m e l h o r experiência
do "país. C o r r e u as c o m a r c a s , e m q u e fez q u a n t a s diligências p o d i a h a v e r p a r a
c a b a l m e n t e c o n h e c e r o q u e e r a m a i s c o n v e n i e n t e . A isto se seguiu c o n v o c a r o
g o v e r n a d o r a u m a "junta os " p r o c u r a d o r e s das " c â m a r a s d e t o d a s as M i n a s , aos
quais, n a p r e s e n ç a do m e s m o comissário, p r o p ô s as ordens d e S u a Majestade c o m
a f o r m a l i d a d e q u e c o n s t a da cópia d a s u a p r o p o s t a , q u e se a c h a r á n o fim deste
discurso, s e n d o as razões e f u n d a m e n t o dela tão p r u d e n t e s c o m o filhos do g r a n d e
talento e c a p a c i d a d e do c o n d e das Galveias.
38 N e s t a j u n t a , e m q u e foram p o n d e r a d a s todas as dúvidas q u e se ofereceram
sobre o sistema d a capitação, dando-se i n t e i r a m e n t e c u m p r i m e n t o às reais ordens d e
Sua M a j e s t a d e , r e c o m e n d o u - s e e advertiu o c o n d e das Galveias aos p r o c u r a d o r e s das
c â m a r a s q u e , c o m p l e n a liberdade, votassem o q u e fosse mais c o n v e n i e n t e a o real
serviço e igualmente a o sossego e conservação dos povos. E p o r n ã o repetir o q u e
consta d a Cópia d a p r o p o s t a , nela se a c h a r á q u e t o t a l m e n t e se rejeitou o sistema d a
capitação, p o r m u i t o oneroso e pelas prejudiciais conseqüências q u e dele h a v i a m de
resultar. E todos, v o l u n t á r i a e u n i f o r m e m e n t e , v o t a r a m n o e s t a b e l e c i m e n t o das
"casas d e fundição, o n d e Sua M a j e s t a d e , sem violência e s e m o m e n o r escrúpulo,
c o b r a r i a os "quintos d e q u e m os devesse, e p a g a r i a c a d a u m o q u e l i c i t a m e n t e
• devia. E c u i d a n d o - s e , ao m e s m o t e m p o , n o s m e i o s mais eficazes p a r a evitar os
"descaminhos d a extração d o o u r o , sem dúvida, e x p e r i m e n t a r i a m os reais quintos
d e S u a Majestade u m g r a n d e a u m e n t o . E a experiência o m o s t r o u n o decurso de
[ fl. 221 ] u m a n o q u e as ditas / / casas d e fundição l a b o r a r a m , c o m o a d i a n t e mostrarei.
39 S e m e m b a r g o q u e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , q u e é o referido comissário,
assistiu n a dita j u n t a , a p r o v o u a resolução dela e assinou os t e r m o s q u e dela se
fizeram, e r e c o n h e c e u e publicou ser impraticável o sistema d a c a p i t a ç ã o , contu-
d o , c o m o n a e x e c u ç ã o d e l a estribava as e s p e r a n ç a s d a s u a felicidade, e v e n d o
t a m b é m que: as idéias e arbítrios dispostos e p r e m e d i t a d o s n o R i o d e J a n e i r o c o m
G o m e s F r e i r e d e A n d r a d e ficava t u d o sufocado c o m as p r u d e n t e s e a c e r t a d a s
disposições do c o n d e das Galveias, e m q u e m i g u a l m e n t e c o n c o r r e u o t e m o r de
D e u s e zelo do serviço real e a m o r d a conservação dos p o v o s , e n t r o u logo a sua
e m u l a ç ã o e a sua v a i d a d e a p r o c u r a r cavilosos meios de destruir as o p e r a ç õ e s do
c o n d e das Galveias, t o m a n d o p o r principal f u n d a m e n t o q u e os p o v o s q u e r i a m e
desejavam 'a capitação e q u e n a j u n t a q u e se. fizera i m p e d i r a o c o n d e aos h o m e n s
a liberdade e ó desejo q u e t i n h a m de votar nela, p e r v e r t e n d o a v e r d a d e q u e tinha
p r e s e n c i a d o . E c o m este f u n d a m e n t o , c o m p o s t o d e todas as m a i s q u i m e r a s q u e
lhe p a r e c e r a m , veio a conseguir o q u e desejava, q u e era ser ele e G o m e s Freire
únicos executores d a capitação e q u e S u a M a j e s t a d e cresse q u e ficava d e v e n d o a o
seu zelo e atividade o estabelecimento d a capitação. E c o m o neste t e m p o se a c h a v a m
j á laborando as casas de fundição, antes que chegasse à presença de Sua Majestade o
475

g r a n d e rendimento q u e produziam, cuidaram e m antecipar as suas informações p a r a


que S u a Majestade continuasse no e m p e n h o de estabelecer a "capitação.
4 0 J u s t a m e n t e p e r s u a d i a ao dito s e n h o r q u e os povos q u e r i a m ê desejavam a
capitação. E c o n c o r r e n d o , talvez ao m e s m o t e m p o , o e m p e n h o c o m q u e se afirmava
ser o m e i o m a i s s e g u r o p a r a a c o b r a n ç a dos r e a i s " q u i n t o s e p a r a e v i t a r os
"descaminhos deles, foi servido Sua M a j e s t a d e resolver q u e passasse G o m e s Freire
a g o v e r n a r as M i n a s e j u n t o c o m M a r t i n h o de M e n d o n ç a estabelecessem logo a
c a p i t a ç ã o , n a c o n s i d e r a ç ã o d a certeza c o m q u e o t i n h a m i n f o r m a d o d e q u e os
povos a q u e r i a m e desejavam p a r a seu sossego.
41 E r a preciso aos referidos dois sujeitos, assim e m oposição d o c o n d e das
Galveias, c o m o p a r a crédito d a s suas informações, estabelecerem a c a p i t a ç ã o e q u e
fosse, a o m e s m o t e m p o , r o g a d a e p e d i d a pelos povos. E p o n d o de p a r t e o t e m o r d e
D e u s , os encargos d e consciência, o prejuízo futuro d a F a z e n d a R e a l e destruição das
M i n a s , as violências e tiranias q u e havia p r o d u z i r u m arbítrio m a n i f e s t a m e n t e con-
trário a o estado / / do *país, esquecidos d e t o d o o referido e só l e m b r a d o s d a sua [ fl. 22 lv. ]
v a i d a d e , e n t r a r a m a executar os seus progressos n a forma seguinte.
Í421 Assim q u e o c o n d e das Galveias saiu das M i n a s , t o m o u posse do g o v e r n o
delas G o m e s Freire de A n d r a d e . Este e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a e n t r a r a m logo a
introduzir nas conversas o e m p e n h o , c o m q u e S u a Majestade desejava q u e os povos
a b r a ç a s s e m o estabelecimento d a capitação e q u e os vassalos das M i n a s m o s t r a r i a m a
sua fidelidade se fossem os m e s m o s q u e a pedissem. E nas m e s m a s práticas e n t r a r a m
a p o n d e r a r q u e os h o m e n s de negócio do R i o d e J a n e i r o e, i g u a l m e n t e , os das M i n a s
se p o d i a m c o n s i d e r a r p e r d i d o s e a r r u i n a d o s p o r se a c h a r e m t o d o s i n c u r s o s n o
d e s c a m i n h o do o u r o e fábrica de b a r r a s falsas, e q u e e r a m tantas as prisões e confiscos
q u e n i n g u é m vivia isento d e u m a total ruína, e q u e isto se confirmava j á c o m as
multiplicadas prisões feitas no R i o de J a n e i r o e M i n a s , e q u e o ú n i c o r e m é d i o q u e
havia p a r a sossego dos povos era a c e i t a r e m e p e d i r e m q u e se estabelecesse a capitação
e q u e esta p o d e r i a ser tão m o d e r a d a q u e ficasse sendo a todos m u i t o suave a sua
contribuição. B e m c o n h e c i a m os p r u d e n t e s e desinteressados o fim a q u e se dirigiam
estas práticas, ma,s é tão p o d e r o s o o respeito de u m g o v e r n a d o r q u e q u a n d o se e m p e -
n h a e m q u a l q u e r particular, a i n d a q u e n o t o r i a m e n t e injusto e c o n t r a a v e r d a d e ,
n i n g u é m se atreve a contradizê-lo, p o r q u e t e m m o s t r a d o a e x p e r i ê n c i a q u e dos
seus despóticos e absolutos p r o c e d i m e n t o s n ã o h á m a i s r e c u r s o q u e p a d e c e r as
suas violências. E suposto q u e todos c o n h e c i a m q u e n ã o era j u s t o q u e h a v e n d o
leis p a r a castigar l a d r õ e s e s e n d o só estes os q u e d e v i a m e x p e r i m e n t a r o r i g o r
delas, se pervertessem e m p a d e c e r e m os povos inocentes u m tão o n e r o s o j u g o e m
satisfação dos delitos q u e n ã o c o m e t e r a m .

4 3 I g u a l m e n t e c o n h e c i a m todos a injustiça das prisões e confiscos q u e G o -


m e s Freire alegava ter feito n o R i o de J a n e i r o . E p a r a p r o v a disto referirei o p r o -
c e d i m e n t o de u m a "devassa. Foi S u a M a j e s t a d e servido estabelecer u m a lei nos
p o r t o s do Brasil p a r a q u e as e m b a r c a ç õ e s q u e i a m c o m e r c i a r e resgatar escravos
476

dos p o r t o s e ilhas d a costa d a África n ã o levassem o u r o e m p ó ou l a v r a d o , n e m


[ fl. 222 ] m o e d a . D u v i d o u Luís V a i a , " g o v e r n a d o r do R i o d e J a n e i r o , se esta proibição / /
d o d i n h e i r o se e n t e n d i a t a m b é m p a r a as ilhas d e S ã o T o m é , C a b o V e r d e e as
m a i s p e r t e n c e n t e s a este R e i n o , e p a r e c e n d o 4 h e q u e n ã o e s t a v a m incluídas n a
p r o i b i ç ã o d a lei, c o n t i n u o u d e s p a c h a r as e m b a r c a ç õ e s , permitindo-lhes õ l e v a r e m
d i n h e i r o p a r a a referidas ilhas. C h e g o u G o m e s Freire a g o v e r n a r o R i o d e j a n e i - .
ro. E d u v i d a n d o os h o m e n s d e negócio d a q u e l a p r a ç a se ele executaria a dita lei
ou se lhe d a r i a a m e s m a inteligência de seu antecessor Luís V a i a , informando-se
do "secretário, este os p e r s u a d i u a q u e se n ã o alterava o d e s p a c h o das e m b a r c a -
ções e q u e p o d i a m livremente m a n d a r dinheiro p a r a as ditas ilhas. N e s t a b o a fé,
d e s p a c h a r a m as e m b a r c a ç õ e s , e fias buscas q u e lhes i a m d a r os "oficiais militares,
p o r o r d e m d o g o v e r n a d o r , s o b r e o o u r o e m p ó , m a n i f e s t a v a m os m e s t r e s das
e m b a r c a ç õ e s t o d o o dinheiro q u e levavam, a o q u e r e s p o n d i a m os oficiais q u e as
o r d e n s do g o v e r n a d o r n ã o p r o i b i a m o dinheiro, m a s sim o o u r o e m p ó , q u e era
s o m e n t e o q u e b u s c a v a m . E assim, n a fé pública destes despachos e destas ordens,
diligências e informações d o secretário & expressa permissão do g o v e r n a d o r , con-
t i n u a r a m os h o m e n s de negócio o seu c o m é r c i o . M a s q u a n d o m e n o s o imagina-
v a m , o r d e n o u G o m e s Freire a o "ouvidor tirasse u m a "devassa d o s q u e , n o seu
t e m p o , t i n h a m m a n d a d o dinheiro p a r a as ditas ilhas e entrou a confiscar aos mes-
m o s a q u e m p e r m i t i a o delito d e q u e os a r g u i a . T o d o o referido c o n s t a m a i s
l a r g a m e n t e dos processos dos seus livramentos, a q u e m o m e s m o o u v i d o r senten-
ciou soltos e livres, m a s s e m p r e p a d e c e r a m p e r d a s e d a n o s irreparáveis, assim e m
prisões c o m o e m sequestros injustos.

4 4 C o m estes e semelhantes p r o c e d i m e n t o s se p e r s u a d i a o c o n s e n t i m e n t o d a
"capitação, e neste m e s m o t e m p o sucedeu descobrir-se, ern Vila R i c a u m a b a r r i n h a
d e o u r o falsa, fabricada n ã o p o r m i n e i r o , roceiro n e m m o r a d o r estabelecido nas
M i n a s , m a s sim p o r uns ladrões traficantes sem mais cabedais q u e o q u e furtavam
pelas b a r r i n h a s q u e f a b r i c a v a m , talvez o r i g i n a d o este a t r e v i m e n t o dos m e s m o s
motivos d e q u e se o r i g i n a r a m outras semelhantes fábricas antigas q u e h o u v e . E
p e r t e n c e n d o o c o n h e c i m e n t o deste c r i m e aos "ministros e x p r e s s a m e n t e declara-
dos p o r S u a M a j e s t a d e , e n t r o u M a r t i n h o d e M e n d o n ç a a ser jui2 p r i v a t i v o d a
execução d e todas as diligências q u e p o r seu arbítrio se e x e c u t a v a m . E foram tais
os distúrbios, violências e excessos q u e se o b r a r a m q u e ainda os m a i s inocentes se
c o n s i d e r a v a m p e r d i d o s , p o r q u e se v i a m muitos, sem a m e n o r s o m b r a n e m indicio
a l g u m d e culpa, levados pelas ruas, postos e m ferros p a r a a c a d e i a e outros p a r a a
casa do m e s m o M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , o n d e fez cárcere p r i v a d o , e muitos, p o r
[ fl. 222v. ] / / sua o r d e m , p a d e c e r a m rigorosos t o r m e n t o s . E depois d e castigada assim a sua
inocência, e r a m soltos. E c h e g o u a t a n t o excesso e rigor nos tratos q u e u m n e g r o ,
s e n d o p r e s o p a r a q u e confessasse o q u e seu s e n h o r fazia, tal foi o excesso dos
açoites e tratos q u e lhe d e r a m q u e , receoso d a repetição deles c o m q u e o a m e a ç a -
r a m , d e u c o m u m a faca e m si, de q u e m o r r e u ; u m h o m e m b r a n c o p a d e c e u tão
477

rigorosos t o r m e n t o s q u e , c o m e ç a n d o a l a n ç a r s a n g u e p e l a b o c a , e m breves dias


acabou a vida; u m a m u l h e r - d a m a , p a r a q u e confessasse o n d e estava u m dos d e -
linqüentes q u e falava c o m ela, p o r mais q u e a miserável confessava e alegava q u e
n ã o sabia o n d e tal h o m e m assistia, foi m e t i d a e m rigorosos t o r m e n t o s , c o m tal
excesso q u e se quis enforcar; u m h o m e m casado, g e n r o do "ensaiador D o m i n g o s
T o m é , s e m m a i s c u l p a q u e c o n s t a r t i n h a e m seu p o d e r u n s escritos d e dívidas
pertencentes a u m confiscado q u e estava preso, foi t a m b é m m e t i d o a t o r m e n t o s , e
p a r a se lhe b u s c a r a casa lhe l a n ç a r a m a m u l h e r p e l a p o r t a fora aos e m p u r r õ e s ,
d e s c o m p o s t a — e de dia — esteve e m t e r m o s d e se lhe d a r c o m u m " b a s t ã o , s e m
m a i s c u l p a q u e dizer, c h e i a d e l á g r i m a s , q u e c r i m e t i n h a ela c o m e t i d o , ou seu
marido, p a r a e x p e r i m e n t a r tão g r a n d e excesso. Estes e outros m u i t o s p a d e c e r a m o
m e s m o rigor d e t o r m e n t o s , e seria dilatada u m a necessária escrita p a r a e x p e n d e r
as violências q u e se obraram, m a s s e m p r e c o m a cautela de serem estes p r o c e d i -
m e n t o s extraordinários, pois n a d a d o referido h á d e constar dos a u t o s , n e m q u e as
confissões e p e r g u n t a s se faziam c o m rigorosos tratos, p a r a q u e n a p r e s e n ç a dos
"ministros d e m a i o r a l ç a d a o n d e se julgassem os processos se n ã o estranhassem e
entrasse n a jurisdição d a a v e r i g u a ç ã o c o m q u e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a e r a j u i z
privativo destes a b s u r d o s , q u e assim se deve c h a m a r a s e m e l h a n t e s p r o c e d i m e n -
tos, pois n e m a i n d a o m e s m o "ministro d a "devassa devia d a r tratos p o r ser j u r i s -
dição p r i v a t i v a d o juízo s u p e r i o r , o n d e , só c o m o r d e m do r e g e d o r , *servata júris
ordine, se m a n d a p r o c e d e r a t o r m e n t o q u e a n t i g a m e n t e pelas leis se p e r m i t i a , q u e
j á hoje n ã o está e m juízo pelas fatalidades q u e p o r ele sucediam. N e m se a c h a r á
q u e pessoa a l g u m a , sem constar da devassa ou indícios q u e p o r direito se r e q u e -
r e m , fosse m e t i d a a t o r m e n t o , e s e m p r e a execução deste deve ser f o r m a l m e n t e e
d e t e r m i n a d a pelas leis. M a s foi tão despótica e absoluta a jurisdição d e M a r t i n h o
de M e n d o n ç a q u e t u d o r e g u l o u p e l a sua v o n t a d e e arbítrio, p a r a c o m o rigor d o
seu g o v e r n o conseguir o p r e m e d i t a d o n a sua idéia, s e m a t e n d e r a q u e destas e
outras m u i t a s incivilidades q u e se o b r a r a m se seguiram / / aos inocentes injustos [ fl. 223 ]
Castigos e d a n o s irreparáveis e aos d e l i n q ü e n t e s , pelas insanáveis n u l i d a d e s dos
p r o c e d i m e n t o s , u m a indubitável defesa, c o m o o está m o s t r a n d o a experiência.

45 F o r a m t a m b é m descompostos alguns eclesiásticos e outros presos c o m m a -


nifesto ultraje d o seu estado, U m h o m e m q u e se. achava g r a v e m e n t e enfermo e m
u m a c a m a , p o r se entender q u e n a sua casa se refugiava u m sujeito q u e se queria
p r e n d e r , n ã o obstante a exata diligência c o m q u e se lhe buscou a casa, da m e s m a
c a m a e no estado e m que estava, com grande perigo de sua vida, o fez conduzir p a r a
a c a d e i a . M u i t a s lojas de m e r c a d o r e s , assim d e Vila R i c a c o m o d e R i b e i r ã o d o
C a r m o , se m a n d a r a m fechar, pondo-se-lhes g u a r d a s d e soldados, s e m c o n t r a os
donos h a v e r p r o v a ou indício algum d e culpa. M a s todos estes estrondosos procedi-
m e n t o s se dirigiam a dispor os ânimos p a r a a capitação pretendida.
4 6 A o m e s m o t e m p o q u e se e x e c u t a v a m t o d a s as referidas diligências, se
c o n t i n u a v a m as práticas d o r e m é d i o da "capitação, r e p u t a n d o - s e p o r traidores d o
478

serviço real todos os q u e a contradissessem, insinuando-se t a m b é m q u e , estabelecida


a "capitação, ficariam cessando as "devassas e haveria u m p e r d ã o geral d e todos
os delitos cometidos sobre o " d e s c a m i n h o dós "quintos e fábricas d é b a r r a s falsas.
47 Dispostos assim os ânimos, se fabricaram petições feitas e m n o m e d o p o v o
e m q u e se p e d i a ao " g o v e r n a d o r a c a p i t a ç ã o , e estas se e n t r e g a r a m aos validos,
agregados e lisonjeiros de palácio, dando-se-lhes a i n c u m b ê n c i a d e as assinar p o r
todas as pessoas que fosse possível, remetendo-se outras semelhantes petições p a r a
as c o m a r c a s , p a r a se assinarem. E t u d o c o m o p o d e r e respeito do g o v e r n a d o r se
conseguiu, p o r q u e uns, rogados e persuadidos, e, outros, violentados c o m o t e r r o r
das referidas diligências, assinaram as ditas petições, e entregues estas ao governa-
d o r G o m e s Freire e a M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , p r i n c i p i a v a m a p u b l i c a r q u e os
p o v o s p e d i a m e r e q u e r i a m a c a p i t a ç ã o e q u e p a r a este efeito se faria logo u m a
"junta p a r a nela se concluir o seu estabelecimento, e q u e as "câmaras m a n d a r i a m ,
c a d a u m a , dois "procuradores p a r a assistirem e v o t a r e m n a dita j u n t a . Esta se deter-
m i n o u p a r a o dia 29 d e j u n h o d e 1735. E sendo a m a t é r i a que n a dita j u n t a se havia
d e p r o p o r d e tanta consideração e de tão graves conseqüências, se n ã o c h a m o u a
ela "ministro a l g u m de tantos q u e assistiam nas M i n a s n e m ao "provedor d a Fazen-

[ fl. 223v. ] da, e t u d o foi cautela p a r a q u e / / s e n ã o pervertesse o q u e se t i n h a forjado c o m as


diligências antecedentes. E assim vieram à dita j u n t a os "procuradores das c â m a r a s ,
p r e c e d e n d o p r i m e i r o serem os de Vila Rica, Ribeirão do C a r m o e R i o das Mortes,
escolhidos e assinalados n o q u e h a v i a m d e votar, e assim o m o s t r o u a experiência
p o r q u e só estes v o t a r a m , e m que aceitavam e c o n v i n h a m n a capitação, e pelo con-
trário v o t a r a m os do S a b a r a e Serro do Frio, que n ã o c o n v i n h a m n a capitação p o r
e n t e n d e r e m q u e era mais conveniente a existência das "casas de fundição.
4 8 E de advertir q u e sendo q u a t r o as c â m a r a s , a saber, Vila R i c a , R i o das
M o r t e s , S a b a r a e S e r r o do Frió, as p r i m e i r a s duas, p o r mais p r ó x i m a s a o p o d e r do
g o v e r n a d o r e p o r mais c o m b a t i d a s das sugestões, a c e i t a r a m a c a p i t a ç ã o e as outras
duas a i m p u g n a r a m , c o m o consta do t e r m o d a j u n t a , m a s n ã o se a t e n d e u a esta-
r e m e m p a t a d o s os votos dos p r o c u r a d o r e s , p o r q u e a l g u m a s c o m a r c a s m a n d a r a m
dois p r o c u r a d o r e s e o u t r a s s o m e n t e u m , sem se a t e n d e r q u e o p a r e c e r d e c a d a
u m a das c o m a r c a s , expressado p o r u m óu p o r dois p r o c u r a d o r e s , s e m p r e era u m
só v o t o .
4 9 A s s i n o u - s e , c o m efeito, o t e r m o de q u e ficava a c e i t a e e s t a b e l e c i d a a
capitação, c o m a cautela d e se n ã o falar nesta p r i m e i r a j u n t a n o n ú m e r o d e "oita-
vas d e o u r o q u e havia p a g a r c a d a escravo, p a r a q u e , ligados os h o m e n s c o m a
assinatura d o t e r m o da aceitação, ficassem obrigados a consentir n a exorbitância
do t r i b u t o .
50 N o dia seguinte se fez segunda j u n t a , p a r a nela se d e t e r m i n a r o n ú m e r o
d e oitavas q u e h a v i a m p a g a r os escravos, e depois d e v e n t i l a d a a m a t é r i a c o m
b a s t a n t e r e p u g n â n c i a dos p r o c u r a d o r e s , q u e j á r e c o n h e c i a m q u e n ã o havia o u t r o
r e m é d i o mais q u e c o n c o r d a r e m t u d o o q u e se lhes propusesse. E assim se assen-
479

tou q u e todos os escravos, m a c h o s e fêmeas, assim negros c o m o mulatos, p a g a r i -


a m q u a t r o "oitavas e três quartos de o u r o c a d a u m , e n a m e s m a f o r m a todos os
forros e forras q u e n ã o possuíssem escravos, p o r q u e , tendo-os, s o m e n t e p a g a r i a m
p o r eles e n ã o pela sua pessoa, e q u e n a m e s m a forma os q u e exercitam "ofícios
m e c â n i c o s p a g a r i a m , c a d a u m , p e l a sua pessoa, o m e s m o q u e p a g a u m escravo.
As "lojas g r a n d e s de m e r c a d o r e s p a g a r i a m vinte e q u a t r o oitavas, ficando s e m p r e
existindo os "dízimos e todos os mais tributos e direitos reais q u e h á nas M i n a s .
51 D o referido sobre a "capitação d e t e r m i n a d a / / se fez termo,, q u e assina- [ íl. 224 ]
r a m os ditos " p r o c u r a d o r e s . E l e m b r a d o s estes d a p r o m e s s a d o p e r d ã o geral, q u e
era u m a das circunstâncias c o m q u e se p e r s u a d i a a aceitação d a c a p i t a ç ã o , p e d i -
r a m n a m e s m a j u n t a q u e se lhes desse c u m p r i m e n t o a o referido p e r d ã o , e n t e n -
d e n d o q u e nos p o d e r e s d e M a r t i n h o d e M e n d o n ç a h a v i a t o d a a jurisdição q u e ele
publicava. M a s logo c o n h e c e r a m o e n g a n o , p o r q u e a resposta q u e se lhes d e u foi
q u e se fazia disso u m a r e p r e s e n t a ç ã o a Sua Majestade, e disto se fez terceiro t e r m o
(que a d i a n t e v a i t a m b é m copiado), s e m nele se d e c l a r a r a p r o m e s s a d o p e r d ã o ,
m a s sim q u e era r e q u e r i m e n t o dos p r o c u r a d o r e s , p a r a q u e se n ã o entendesse ou
soubesse q u e t a m b é m servira d e sugestão o e n g a n o do sossego dos povos n a sus-
p e n s ã o das "devassas e p e r d ã o geral p r o m e t i d o v o c a l m e n t e , e m n o m e d e S u a
M a j e s t a d e , c o m fé pública d a p a l a v r a d e u m "governador.
52 Esta é a forma c o m q u e se estabeleceu a capitação, referindo m u i t o s u m a -
r i a m e n t e as circunstâncias e violências q u e c o n c o r r e r a m p a r a o seu ajuste. E se a
c o m u t a ç ã o dos "quintos e m u m tributo geral só p e r s u a d i a ser lícito s e n d o aceito
c o m o u m voluntário c o n s e n t i m e n t o dos povos sem p r e c e d e r sugestão n e m o p e r a -
ção alguma q u e c o m e n g a n o , dolo ou terror violentasse as vontades dos vassalos, o
q u e S u a Majestade t a m b é m r e c o m e n d o u nas reais ordens, c o m o p o d e r ã o os execu-
tores deixar de ser argüidos do manifesto e n g a n o c o m q u e r e p r e s e n t a r a m a o dito
s e n h o r o v o l u n t á r i o c o n s e n t i m e n t o c o m q u e os p o v o s p e d i a m e r e q u e r i a m a
capitação? E n o que t e n h o expendido, m e p a r e c e m o s t r o c o m toda a evidência o
q u e p r o m e t i no parágrafo 3 1 . N ã o falo nos gravíssimos encargos de consciência c o m
que: ficam os ditos executores. N a s conseqüências que, mostrarei, resultam d a execu-
ção deste arbítrio, tao dignas de atenção q u e servem de h o r r o r aos q u e livremente,
nos "países das M i n a s , estão v e n d o e p o n d e r a n d o os justos c l a m o r e s dos efeitos
delas, os quais expenderei resumindo e individuando somente ps q u e são d e m a i o r
e n t i d a d e n a forma seguinte.

53 E sem dúvida q u e estabelecida a c a p i t a ç ã o , p e l a c o n t r i b u i ç ã o dela devi-


a m ficar todos os m o r a d o r e s das M i n a s isentos de p a g a r todos os antigos quintos,
p o r q u e estes se c o m u t a v a m n o referido t r i b u t o , e m e p a r e c e q u e , s e m d ú v i d a
a l g u m a , esta foi a real m e n t e de S u a Majestade. E n a m e s m a f o r m a d e v e m o s / / [íl. 224v. j
e n t e n d e r q u e foi o discurso q u e fizeram todos os "ministros d a C o r t e q u e v o t a r a m
n o referido sistema. A g o r a p e r g u n t o se s e r á fácil q u e S u a M a j e s t a d e e os ditos
ministros a c r e d i t e m q u e ps m o r a d o r e s das M i n a s n ã o s o m e n t e p a g a m a capitação
480

m a s i g u a l m e n t e p e r d e m os antigos "quintos. Este é o prejuízo m a i s sensível q u e


p r o d u z i u a "capitação e o mais dificultoso d e se acreditar e p e r c e b e r p o r todos os
q u e e s p e c u l a t i v a m e n t e d i s c o r r e m sem e x p e r i ê n c i a e p r á t i c a d a q u e l e s "países, a
qual é preciso explicar p a r a c o n t u n d e n t e p r o v a do referido prejuízo.
54 P r i m e i r a m e n t e , todos s a b e m q u e o valor intrínseco d e u m a "oitava d e
o u r o e m p ó se r e p u t a nas M i n a s c o m u m e n t e p o r quinze "tostões, e destes a q u i n t a
p a r t e , q u e são quinze [sic] tostões, é o quinto q u e pertencia a S u a Majestade. A
f o r m a c o m q u e a n t i g a m e n t e o u antes d a c a p i t a ç ã o se p a g a v a a o dito s e n h o r o
referido q u i n t o é a seguinte. E m t o d o s os países das M i n a s é estilo o b s e r v a d o
c o m p r a r e v e n d e r p o r n ú m e r o d e oitavas p e s a d a s , e n ã o p o r q u a n t i a d e d i n h e i r o ,
c o m o e m todas as mais partes e domínios deste R e i n o se pratica, isto suposto.
55 Q u e r u m m e r c a d o r nas M i n a s v e n d e r u m n e g r o a u m m i n e i r o , faz a sua
conta, *vefbi graiiã, q u e p a r a l u c r a r nele deve ser v e n d i d o p o r d u z e n t o s e q u a r e n t a
mil "réis. Ajustada assim esta c o n t a no conceito d o m e r c a d o r , diz ao dito m i n e i r o
q u e lhe n ã o p o d e d a r o dito n e g r o m e n o s d e d u z e n t a s oitavas d e o u r o . Nesta, j á o
m e r c a d o r sabe q u e e m c a d a u m a n ã o recebe p a r a si mais q u e doze tostões e q u e
no n ú m e r o das ditas duzentas oitavas fica r e c e b e n d o os seus d u z e n t o s e q u a r e n t a
mil réis, e c o m o o valor intrínseco d e c a d a oitava são quinze tostões, a m a i o r i a
que, vai de doze p a r a quinze é o quinto q u e o m i n e i r o p a g a a S u a Majestade p o r
m ã o do m e r c a d o r , n a f o r m a seguinte.
56 E r a o dito m e r c a d o r obrigado a ir m e t e r n a "casa d e fundição a dita parcela
d e o u r o , e depois d e fundida e reduzida a u m a b a r r a se lhe tirava do seu p r e ç o a
q u i n t a p a r t e p a r a Sua Majestade, que são quarenta oitavas, q u e , pelo valor intrínse-
co d e quinze tostões, ficavam a S u a Majestade, e m q u a r e n t a oitavas, sessenta mil
réis, q u e é o quinto, e a o m e r c a d o r cento e sessenta oitavas, que, a quinze tostões
c a d a u m a , são duzentos e q u a r e n t a mil réis, valor p o r q u e reputava o seu negro. E
[ fl. 225 ] nesta / / forma ficava p a g o o m e r c a d o r e satisfeito o quinto de Sua Majestade, q u e
o mineiro p a g a v a p o r m ã o do m e r c a d o r n a casa d e fundição.
57 Este m e s m o referido estilo se observou g e r a l m e n t e e n q u a n t o d u r a r a m as
casas d e fundição e m todo o c o m é r c i o das M i n a s , assim d e "fazendas secas c o m o
comestíveis, negros, cavalos, gados e todos os mais gêneros q u e lá se v e n d e m , e ven-
d e n d o s e m p r e todos p o r n ú m e r o d e oitavas, todos s a b i a m q u e e m c a d a u m a só rece-
b i a m d o z e tostões ê n e n h u m ignorava q u e a m a i o r i a dos três tostões era o q u i n t o
q u e r e c e b i a m d o m i n e i r o , p a r a n a casa d e fundição o p a g a r e m a S u a Majestade.
Esta era a forma do comércio e este o estilo c o m q u e se p a g a v a o quinto.
58 Agora, depois q u e se extinguiram as casas de fundição e se estabeleceu o
n o m e d a capitação, parecia justo e de razão que o mineiro ficasse c o m a maioria dos
três tostões e m c a d a oitava, p o r ser o a n t i g o q u i n t o , e c o m u t a r - s e este n a n o v a
c o n t r i b u i ç ã o d e q u a t r o oitavas e três q u a r t o s , q u e p a g a o dito m i n e i r o p o r c a d a
escravo q u e tiver. M a s n ã o sucede assim, e a r a z ã o é p o r q u e o m e r c a d o r continua a
v e n d e r o n e g r o pelo m e s m o n ú m e r o das duzentas pitavas; e sem a t e n d e r a q u e fica
481

agora c o m a m a i o r i a dos três *tostões e m c a d a u m a *oitava, q u e era o *quinto q u e


n a "casa de fundição ficava p a r a S u a Majestade, diz ao mineiro q u e ele v e n d e o seu
negro (ou q u a l q u e r outro gênero) p o r n ú m e r o de oitavas pesadas, e suposto recebe
e m c a d a u m a quinze tostões, vende pelo n ú m e r o que antigamente vendia e diz ao
mineiro q u e p o r m e n o s lho n ã o p o d e dar, e q u e a maioria dos três tostões q u e agora
recebe p a r a si é fortuna q u e veio ao comércio pela ' c a p i t a ç ã o . E venderem-se todos
os gêneros pelo m e s m o p r e ç o e pelo m e s m o n ú m e r o d e oitavas q u e antes d a capitação
se v e n d i a m é v e r d a d e que afirmarão todos os que tiverem experiência do *país das
Minas.
59 R e c o n h e ç o q u e j u s t a m e n t e m e p o d e r ã o argüir q u e é c o n t r a todos os ditames
d a r a z ã o q u e o m i n e i r o consinta e c o n v e n h a e m d a r ao m e r c a d o r c e m oitavas d e
o u r o , q u e a g o r a v a l e m c e n t o e c i n q ü e n t a mil *réis, p o r aquilo / / m e s m o q u e [ fl. 225v. ]
a n t i g a m e n t e d a v a as m e s m a s c e m oitavas, q u e e n t ã o só valiam p a r a o m e r c a d o r
c e n t o e vinte mil réis, e os trinta e r a m p a r a S u a M a j e s t a d e e a g o r a são p a r a ele. A
isto respondo q u e n ã o h a dúvida ser u m a g r a n d e iniqüidade, m a s irremediável p a r a
o mineiro e p a r a todos os m o r a d o r e s das M i n a s , p o r q u e nelas se c o m p r a t u d o fiado,
e esta é a causa de.se sujeitarem a toda a exorbitância dos preços, p o r q u e o mineiro
q u e necessita d o escravo, d o "vestido, d o comestível e de todos os m a i s g ê n e r o s
necessários p a r a a subsistência d a s u a pessoa, família e lavras n ã o t e m mais r e m é d i o
q u e sujeitar-se a p a g a r t u d o pelo n ú m e r o de oitavas q u e se lhe p e d e m , p o r q u e a
c i r c u n s t â n c i a d e ser fiado e m t o d a a p a r t e sujeita a v o n t a d e d o q u e c o m p r a ao
arbítrio do q u e vende.
60 A v i s t a d e tão sólida v e r d a d e , c o m o aqui t e n h o exposto, fica p r o v a d o o q u e
era tão dificultoso de se acreditar, e a o m e s m o t e m p o q u e Sua M a j e s t a d e lhe p a r e c e
q u e os seus vassalos das M i n a s ficaram aliviados dos antigos quintos, os p a g a m do-
b r a d o s , uns p a r a capitação a o dito s e n h o r e outro, q u e era o antigo, l h o leva sem
remédio o comércio, n a forma que tenho expendido.
61 Este m e s m o efeito e x p e r i m e n t a m os roceiros ou lavradores e todos os mais
m o r a d o r e s existentes nas M i n a s , p o r q u e suposto q u e dos seus m a n t i m e n t o s , frutos e
g a n â n c i a s dos seus ofícios r e c e b a m oitavas d e ouro c o m a referida m a i o r i a , esta a
p e r d e m q u a n d o d a s suas m ã o s p a s s a o o u r o à dos m e r c a d o r e s e " c o m b o i e i r o s ,
q u e lhe r e p u t a m s o m e n t e pelo valor de doze tostões a oitava. E assim n e n h u m dos
m o r a d o r e s das M i n a s , p o r cujas m ã o s circula o o u r o e m p ó , se utiliza d a m a i o r i a
do p r e ç o dele, a o mesmo t e m p o q u e todos ficam g e r a l m e n t e incluídos no tributo
d a capitação, e só o c o m é r c i o , o n d e sem dúvida vai p a r a r todo o o u r o das M i n a s ,
se fica utilizando d a m a i o r i a dos três tostões e m c a d a oitava, q u e são os antigos
quintos q u e se p a g a v a m a S u a Majestade.
1621 B e m sei q u e se p o d e r e s p o n d e r q u e a real m e n t e d e S u a M a j e s t a d e ,
n e m as suas reais o r d e n s se dirigem a semelhante efeito, n e m são causa d o referi-
d o p r e j u í z o , e q u e p o r c o n t a dos m i n e i r o s e m a i s m o r a d o r e s das M i n a s d e v e
c o r r e r o evitar a forma c o m q u e o c o m é r c i o lhes leva / / injustamente a m a i o r i a [ fl. 226 ]
482

d o o u r o . M a s a isto r e s p o n d o q u e se n ã o fora a capitação n ã o haveria esta iniqüi-


d a d e , e c o m a m a i o r i a do o u r o q u e a g o r a lhes leva o comércio p a g a r i a m a S u a
M a j e s t a d e os quintos q u e licitamente lhe d e v i a m , o q u e n ã o p o d e m evitar, p o r -
q u e p a r a a s u a subsistência os obrigava a sua necessidade a c o m p r a r e m fiado e
sujeitarem-se às exorbitâncias dos m e r c a d o r e s , q u e e r r o n e a m e n t e c o n s i d e r a m q u e
a m a i o r i a do o u r o foi pela "capitação cedida a favor do c o m é r c i o , e s e m o m e n o r
e s c r ú p u l o lhes p a r e c e q u e a "oitava d e o u r o , cujo v a l o r i n t r í n s e c o são q u i n z e
"tostões, a p o d e m r e p u t a r p o r d o z e q u a n d o a r e c e b e m . E , nestes t e r m o s , n ã o
considero o u t r o r e m é d i o aos miseráveis mineiros e m o r a d o r e s das M i n a s m a i s d o
q u e o s u p o r t a r e m o j u g o d a sua d e s t r u i ç ã o , digo, d a sua destruição 1 ou saírem
p a r a fora das M i n a s , c o m o em tão breve tempo tem j á feito u m g r a n d e n ú m e r o deles.
6 3 Este prejuízo, q u e t e n h o referido digno d e t o d a a p o n d e r a ç ã o e q u e t a n t o
envolve e e m b a r a ç a as consciências, p o d e r á ser p r a t i c a d o e ventilado o r e m é d i o dele
se nas "juntas q u e se fizeram fossem a elas c h a m a d o s e ouvidos alguns "ministros
c pessoas q u e c o m inteligência, v e r d a d e e desinteresse p u d e s s e m v o t a r n o q u e
fosse conveniente ao b e m c o m u m e ao serviço real, m a s n a referida conjuntura os que
o b r a v a m com verdade sólida e q u e costumavam em matéria de tão g r a n d e escrúpulo
votar c o m a sinceridade q u e p e d e m as leis divinas e h u m a n a s , estes se r e p u t a r a m p o r
suspeitos e foram arguidos p o r frouxos, n o t a d o s p o r p o u c o zelosos e u l t i m a m e n t e
excluídos, p a r a q u e se n ã o pervertesse as idéias de q u e m p r o c u r a v a ser ú n i c o n o
e s t a b e l e c i m e n t o dos arbítrios p e r n i c i o s a m e n t e e x e c u t a d o s c o m a e s p e r a n ç a dos
p r ê m i o s e a c r e s c e n t a m e n t o s q u e hoje p e r m i t e a fortuna a semelhantes serviços.
6 4 P a r a m e l h o r se p e r c e b e r o q u a n t o é digno d e a t e n ç ã o pagar-se hoje nas
M i n a s d u a s vezes os "quintos n a f o r m a q u e t e n h o exposto, se d e v e p o n d e r a r os
m u i t o s m i l h õ e s q u e n a q u e l e s "países e n t r a m todos os a n o s e m "fazendas secas,
comestíveis, escravos, gados e cavalaria, e t u d o isto r e d u z i d o a o u r o e m p ó : antes
d a c a p i t a ç ã o se fundia e m b a r r a nas "casas de fundição, o n d e ficavam os quintos
[ fl. 226v. ] d o referido o u r o , e S u a / / Majestade satisfeito d o q u e se lhe devia e os mineiros
e m o r a d o r e s livres de. o u t r a a l g u m a contribuição; agora, c o m o o c o m é r c i o extrai a
m e s m a i m p o r t â n c i a d e o u r o e m p ó e leva consigo o g r a n d e n ú m e r o d e a r r o b a s d e
quintos q u e p a g a v a m a S u a Majestade n a m a i o r i a que ilicitamente leva, é preciso
q u e os mineiros e m o r a d o r e s t e n h a m o u t r a t a n t a q u a n t i a de " a r r o b a s p a r a p a g a -
r e m o q u e i m p o r t a a capitação dos seus escravos. M a s o q u e deste impossível h á
d e r e s u l t a r é q u e ou o c o m é r c i o h á d e í p a d e c e r l e e x p e r i m e n t a r u m a g r a n d e
d i f i c u l d a d e n a s c o b r a n ç a s e p a g a m e n t o s das suas f a z e n d a s o u n a e x a ç ã o d a
c a p i t a ç ã o h ã o d e ser contínuas as execuções nos bens e escravos dos m o r a d o r e s das
M i n a s , c o m o j á m o s t r a a experiência, n a g r a n d e q u a n t i d a d e de p e n h o r e s q u e se
a c h a m nos cofres das "intendências, e muitos oferecendo j á os próprios escravos p a r a

No original, da sua destruição, digo, da sua destruhição.


483

p a g a m e n t o da "capitação. E q u a n d o isto sucedeu nos primeiros seis meses, q u e será


nos anos futuros, sendo j á igual o clamor do comércio n a dificuldade das suas co-
branças? P o r q u e c o m a preferência do p a g a m e n t o d a capitação se i m p e d e m as exe-
cuções das dívidas particulares e se vai u s a n d o d e todos os meios extraordinários
p a r a q u e d e n e n h u m a sorte se experimente diminuição n o r e n d i m e n t o d a capitação
e se v e n h a m a conhecer n a C o r t e as conseqüências dela.
65 Antes q u e c o n t i n u e a p o n d e r a r outros prejuízos e efeitos d a c a p i t a ç ã o , é
p r e c i s o d e s v a n e c e r a geral o p i n i ã o q u e n a C o r t e se faz das M i n a s e d o s seus
habitadores.
66 C h e g a m as "frotas do R e i n o , e à vista d a g r a n d e opulência d e o u r o q u e
t r a z e m , assim d e c o m é r c i o c o m o d e S u a M a j e s t a d e , j u s t a m e n t e se e n t e n d e q u e
e m u n s "países o n d e h á t a n t a r i q u e z a n ã o p o d e m d e i x a r d e s e r todos os seus
h a b i t a d o r e s ricos, opulentos e cheios d e g r a n d e fartura d e o u r o . Esta m e s m a opi-
nião se confirma c o m virem todas as frotas vários h o m e n s das M i n a s c o m cabedais.
U m a e o u t r a coisa se n ã o p o d e negar p o r q u e o m o s t r a a experiência. M a s disto se
n ã o segue ser v e r d a d e i r a a o p i n i ã o q u e se faz d a r i q u e z a dos m i n e i r o s e m a i s
m o r a d o r e s das M i n a s , m a s é t a n t o pelo contrário, q u e não h á países mais cheios / / [ fl. 227 ]
d e p o b r e z a e de miséria do q u e são os das M i n a s , e suposto se n ã o p o d e n e g a r o
m u i t o o u r o q u e delas se tirai deve p o n d e r a r - s e o g r a n d e n ú m e r o d e mineiros e a
i m e n s i d a d e de escravos q u e existem m i n e r a n d o , e t o d o o o u r o q u e t i r a m , espa-
l h a d o e dividido p o r tão excessivo n ú m e r o d e pessoas, a c a d a u m toca tão p o u c o
q u e a p e n a s lhe c h e g a p a r a as despesas, e p o r estas vai p a r a r infalivelmente a o
p o d e r dos m e r c a d o r e s , "comboieiros, "oficiais e traficantes, e destes passa às casas
d a m o e d a dos p o r t o s d o m a r , e nas frotas se t r a n s p o r t a p a r a este R e i n o , o n d e
avulta t a n t o p o r q u e v e m j u n t o o q u e n o decurso de u m a n o se extraiu das M i n a s e
a n d a v a dividido p o r tantas é tão diversas m ã o s . E se S u a M a j e s t a d e m a n d a s s e
averiguar a q u e m p e r t e n c e todo o o u r o q u e e n t r a nas ditas "casas d a m o e d a dos
p o r t o s d o Brasil p a r a se reduzir a dinheiro, a c h a r i a q u e t o d o é p o r c o n t a d o co-
m é r c i o e q u e n a d a p e r t e n c e aos mineiros, sendo c e r t o q u e estes n ã o c o n s e r v a m
o u r o a l g u m do q u e tiram p o r q u e todo c o n s o m e m nas despesas necessárias p a r a a
sua subsistência, e são m u i t o poucos aqueles q u e c o m p l e t a m e n t e p a g a m t o d o s os
e m p e n h o s q u e c o n t r a í r a m n o decurso d o a n o .
67 E q u a n t o aos h o m e n s q u e , saídos das M i n a s c o m c a b e d a i s , v ã o p a r a o
R e i n o nas frotas, o n d e c o m u m e n t e lhes c h a m a m ' m i n e i r o s ' , n a r e a l i d a d e o n ã o
são n e m f o r a m n u n c a , p o r q u e o exercício s o m e n t e consistiu n a traficância do
c o m é r c i o , e a d q u i r i n d o p o r este a riqueza c o m q u e se retiram, l e v a m t a m b é m o
apelido d e mineiros, cujo exercício n u n c a tiveram. N ã o duvido q u e alguns m i n e i -
ros se t e n h a m r e t i r a d o p a r a o R e i n o , m a s serão raríssimos, e a i n d a nas m e s m a s
M i n a s se n ã o a c h a r ã o vínte h o m e n s , assim de mineiros c o m o de roceiros, q u e se
a c h e m c o m cabedais líquidos e p r o n t o s p a r a se p o d e r e m retirar, e todos os mais
g e r a l m e n t e v i v e m cheios d e e m p e n h o s c o m q u e l a b o r i o s a m e n t e p a s s a m a vida.
484

6 8 E p a r a q u e m e l h o r se p e r c e b a m os f u n d a m e n t o s q u e h á p a r a os mineiros
s e r e m p o b r e s e v i v e r e m s e m p r e c o m e m p e n h o s , explicarei a f o r m a , t r a b a l h o e
despesa c o m q u e se extrai o o u r o d a terra, e a i n d a q u e seja dilatada esta n a r r a ç ã o ,
p o d e r á ser agradável p a r a os q u e t ê m experiência das M i n a s e lhes p a r e c e q u e a
extração do o u r o consiste só e m cavar a terra e recolhê-lo.
[ fl, 227v. ] 6 9 P r i m e i r a m e n t e , h á m i n e i r o s q u e t r a b a l h a m / / e m l a v r a s p r ó p r i a s , ou
j u n t o aos rios, aproveitando-se, das m e s m a s á g u a s deles ou e m diferentes terras,
q u e c o m u m e n t e são m o n t u o s a s , pu nas correntes dos m e s m o s rios.
70 O s q u e t o d o o a n o m i n e r a m j u n t o aos rios lhes é necessário, n o m e s m o
lugar d a lavra, assentar u m " e n g e n h o d e u m a r o d a e u m a " b o m b a p a r a continu-
a m e n t e ir e x a u r i n d o toda a á g u a d a terra, q u e p o r ficar p r ó x i m a a o rio está conti-
n u a m e n t e b r o t a n d o e é preciso esgotá-la p a r a , d a m e s m a t e r r a e do m e s m o l u g a r ,
se extrair o "cascalho e m q u e está o o u r o . Esta *fábrica de r o d a e b o m b a n ã o custa
m e n o s d e seiscentas oitavas d e o u r o p a r a c i m a . A o m e s m o t e m p o , é necessário
g r a n d e n ú m e r o d e negros p a r a " d e s m o n t a r a terra e tirar o cascalho, depois "lavá-
lo e, u l t i m a m e n t e , "apurá-lo. E necessário g r a n d e n ú m e r o d e e n x a d a s , alavancas,
"almocafres, c a v a d o r e s e "bateias.
71 O s q u e m i n e r a m e m diferentes terras distantes dos rios, depois q u e nelas
se descobre o o u r o , é necessário q u e t e n h a m u m rego d e á g u a , sem a qual se n ã o
p o d e m i n e r a r ; , s e a n ã o t ê m p e r t o , q u e v e n h a o seu n a s c i m e n t o superior, é preciso
buscá-la d e m a i o r distância e conduzi-la, abrindo-lhe regos p o r m o n t e s e p e n h a s -
cos, e e m m u i t a s p a r t e s o n d e se t o p a m vales lhes f o r m a m a n d a i m e s d e g r a n d e s
m a d e i r o s e, s o b r e estes, c a n o s d e t a b u a d o s p a r a a c o r r e n t e das á g u a s v e n c e r e
c h e g a r à altura d e outros m o n t e s sobre q u e a q u e r e m levar, ê isto n a distância d e
u m a , duas e três "léguas de rego, e m q u e se. faz u m a g r a n d e despesa, a respeito
dos g r a n d e s "jornais q u e naqueles "países c o s t u m a g a n h a r t o d o o g ê n e r o de "ofi-
ciais. E n a m e s m a f o r m a é e x o r b i t a n t e o p r e ç o d e t o d o s os m a t e r i a i s , e nestes
serviços d e c o n d u z i r as águas se gastam m u i t a s vezes dois e três anos, c o n f o r m e a
distância d e q u e ela vem. C o m esta água, ajudada d a arte, se d e s m o n t a a terra q u e
fica p o r c i m a da f o r m a ç ã o do cascalho, a qual m u i t a s vezes t e m mais d e c i n q ü e n t a
p a l m o s de altura p r i m e i r o do q u e se c h e g u e a ele. C o m a m e s m a á g u a se lava o
cascalho e se a p u r a o o u r o , sendo p a r a t u d o preciso os negros e os m e s m o s instru-
m e n t o s q u e t e n h o referido, a d v e r t i n d o q u e e m t o d o o t e m p o q u e g a s t a m n o ser-
viço d a c o n d u ç ã o das á g u a s e e m t o d a a m a i s fábrica n ã o t e m o m i n e i r o o u t r o
lucro mais q u e o t r a b a l h o e a g r a n d e despesa q u e faz n a contingência d o p o u c o ou
m u i t o o u r o q u e p o d e r á vir a tirar.

72 O s q u e m i n e r a m nas correntes dos m e s m o s rios no t e m p o e m q u e a c a b a m


[ fl. 228 ] as "invernadas c o s t u m a m a desviar / / a c o r r e n t e das m e s m a s águas, fazendo-lhe
cercos e estacadas d e m a d e i r a s , e n o lugar q u e fica e m seco a s s e n t a m o m e s m o
e n g e n h o de r o d a e b o m b a , q u e t u d o lhes custa u m a g r a n d e despesa, e e m todo o
t e m p o q u e d u r a o verão se o c u p a m os negros e m tirar cascalho e o v ã o p o n d o fora
485

dos rios e m m o n t e s , p o r q u e assim q u e e n t r a m as c h u v a s e n c h e m os rios e se


a r r o m b a m os cercos e os levam as correntes das águas, e j á n ã o p o d e l a b o r a r a
"fábrica, e p o r isso a p r o v e i t a m t o d o o t e m p o d a seca e m tirar o "cascalho e depois
e n t r a m a "lavá-lo. E fazendo t o d o este t r a b a l h o e despesa, sucede a muitos n ã o
t i r a r e m o u r o c o m q u e p o s s a m cobrir os gastos d a fábrica e outros levar-lhes o rio
a m e s m a " b o m b a e "roda, c o m cheia intempestiva e r e p e n t i n a , p e r d e n d o t u d o e
a t e m p o q u e n e m ao m e n o s t ê m visto o cascalho e m q u e está o o u r o .
73 O u t r a f o r m a h á t a m b é m de m i n e r a r , c o m o se vê n o m o r r o d e Vila R i c a , q u e ,
p o r n ã o ter águas n e m as p o d e r e m c o n d u z i r a ele pela sua e m i n ê n c i a , lhe fazem
b u r a c o s e m i n a s pela terra d e n t r o e m grandes distâncias, segurando-as c o m estaca-
das, e do c e n t r o delas v ã o t i r a n d o cascalho, e estes o l a v a m c o m águas d a c h u v a , q u e
ajuntam em "tanques.
74 E m t o d a s as referidas formas se e n c o n t r a m muitas vezes dificuldades e t r a b a -
lhos n ã o i m a g i n a d o s , q u e se facilitam e v e n c e m à custa d e novas despesas. E, final-
m e n t e , é o ú l t i m o m o d o d e m i n e r a r os q u e m a n d a m os seus n e g r o s a "faiscar,
assim pelos rios c o m o pelas lavras j á desertas, q u e são c o m u n s a o p o v o . E são
inumeráveis os escravos q u e a n d a m nestas "faisqueiras e o b s e r v a m e n t r e si u m tão
inviolável estilo que, a i n d a q u e u m n e g r o suceda d a r e m p a r a g e m q u e u m dia tire
d e z ou v i n t e "oitavas d e o u r o , n u n c a leva a seu s e n h o r m a i s q u e o *jornal d e
" m e i a p a t a c a , q u e é a q u a r t a p a r t e de. u m a oitava, e t u d o o m a i s distribui p o r
n e g r a s e " t a b e r n a s . E são prejuízos e furtos q u e os s e n h o r e s dos escravos n ã o
p o d e m evitar,, assim pela dificuldade de n ã o s a b e r e m o o u r o q u e eles tiram c o m o
pelo perigo q u e eles t ê m d e lhes fugirem, se os castigam. E p r e c i s a m e n t e se sujei-
t a m ao j o r n a l q u e v o l u n t a r i a m e n t e lhes q u e r e m d a r os escravos, e a i n d a m u i t a s
vezes c o m o c o s t u m a d o d e m e i a p a t a c a lhes faltam, u s a n d o de industriosas descul-
p a s q u e se n ã o p o d e m r e m e d i a r .
75 A vista d o q u e t e n h o referido, se p o d e inferir e p e r c e b e r q u a l é o t r a b a l h o e
quais as despesas c o m q u e os mineiros e x t r a e m o o u r o d a terra, e q u e m c o m curiosi-
d a d e p o n d e r a r o referido t r a b a l h o e l a n ç a r à c o n t a a i m p o r t â n c i a d a fábrica e instru-
m e n t o s de m i n e r a r a o sustento de u m tão g r a n d e n ú m e r o de negros e vestuário deles,
a despesa / / d a pessoa do m i n e i r o , d a sua casa e família, aos e m p e n h o s dos q u e [ fl- 228v. ]
d e v e m dos escravos, q u e a t u a l m e n t e c o m p r a m fiados a trezentos e q u a t r o c e n t o s
mil "réis c a d a u m , a o q u ê p e r d e m nos q u e fogem, a d o e c e m e m o r r e m , as despe-
sas de boticas, médicos e "cirurgiões, p o d e r á muito facilmente acreditar q u e são
m u i t o p o u c o s os m i n e i r o s q u e sejam d e s e m p e n h a d o s e q u e são m u i t o s os q u e
p o b r e m e n t e v i v e m e outros a q u e m sucede tirar tão p o u c o o u r o q u e a p e n a s c h e g a
p a r a suprir a u m a l i m i t a d a p a r t e d a s g r a n d e s despesas q u e n o d e c u r s o d o a n o
fizeram. E, finalmente, são as m ã o s dos mineiros e dos seus escravos u n s a q u e d u -
tos p o r o n d e p a s s a o o u r o p a r a o c o m é r c i o , e c o m o n ã o s e r á sensível a estes
h o m e n s o tributo d a "capitação, p o r q u e se até agora era certo o t r a b a l h o e d e s p e -
sa de m i n e r a r , é contingente o lucro do o u r o . N e s t a m e s m a contingência, suaviza-
486

v a m o p a g a m e n t o dos "quintos q u e só d e v i a m e só p a g a v a m d o q u e tiravam, m a s


a g o r a , estabelecida a "capitação, sendo certo o m e s m o t r a b a l h o e despesa, tirem
ou n ã o t i r e m o u r o , s e m p r e h ã o d e p a g a r o t r i b u t o q u e só d e v i a m d o o u r o q u e
extraíssem. E c o m o será possível acreditar-se q u e estes h o m e n s quisessem e pedis-
sem v o l u n t a r i a m e n t e u m arbítrio d e u m tributo geral q u e t a n t o Conduz p a r a a sua
destruição?
76 E u n ã o duvido q u e nas Minas haja algumas lavras de g r a n d e r e n d i m e n t o e
t a m b é m n ã o duvido que aos donos delas t e n h a muita conta e lhes sirva de grande
utilidade a capitação, c o m o j á expliquei no parágrafo 2 3 , m a s isto m e s m o a faz ser
injusta é totalmente contrária às leis divinas e h u m a n a s , pois p a r a ressarcir à F a z e n d a
Real o q u e p e r d e n o que estes tais mineiros lucram n a capitação, d a n d o muito m e -
nos do q u e o quinto do ouro q u e tiram, h ã o de p a g a r os mineiros pobres p a g a n d o
quinto sem tirar ouro, os roceiros p a g a n d o t a m b é m quintos devendo só "dízimos, e
h ã o de pagar os "oficiais mecânicos e todas as mais pessoas que tenho referido quintos
do ouro que não mineram. E, finalmente, a capitação só vem a servir d e grande conve-
niência p a r a os mineiros ricos, que são os menos, e d e total n ú n a p a r a os pobres, q u e
são os mais, p o r q u e a estes obriga a pagar o que n ã o devem e àqueles a acrescentar-
lhes os cabedais, isentando-os de pagar completamente os quintos que deviam pela lei.
77 N ã o é d e m e n o s consideração outro efeito ou prejuízo q u e d a capitação h á
d e resultar à conservação e a u m e n t o das M i n a s . T o d o s os que t ê m visto os "países
[ fl. 229 ] delas / / s a b e m q u e Sua Majestade t e m minas p a r a dilatados séculos, p o r q u e o q u e
está m i n e r a d o e as lavras q u e existem descobertas somente nas quatro c o m a r c a s de
q u e tratamos n ã o é o dízimo das "léguas d a terra do continente delas, n ã o falando
e m Goiás e C u i a b á . M a s c o m o as lavras existentes se extinguem, p o r q u e as terras
q u e se m i n e r a m , depois de extraído o primeiro ouro, n ã o t o r n a m a p r o d u z i r o u t r o ,
é preciso, p a r a conservação das M i n a s , c o n t i n u a r e m - s e novas lavras, e p a r a estas
fazerem-se novos serviços c o m as despesas e "fábricas q u e tenho referido, e sendo
certo q u e nos trabalhos dos novos serviços das lavras se gastam m u i t a s vezes dois
anos e e m outros mais, conforme a qualidade deles, s e m no decurso deste t e m p o
t e r e m os mineiros algum lucro mais q u e as excessivas despesas q u e fazem, n a espe-
r a n ç a da fortuna quê p o d e r ã o ter q u a n d o e n t r a r e m a m i n e r a r , c o m o será possível
q u e se q u e i r a m e x p o r os h o m e n s à c o n t i n u a ç ã o e habilitação de novas lavras p a -
g a n d o o tributo d a capitação d e todo o t e m p o e m q u e os seus escravos só t r a b a l h a m
e n ã o m i n e r a m ? E se ainda no t e m p o e m q u e atualmente extraem ouro, lhes é tão
oneroso o referido tributo, muito mais sensível e dificultoso lhes será n o tempo e m
q u e de n e n h u m a sorte p o d e m ter c o m q u e o pagar. E c o m o p o r este respeito se
impossibilitam os m i n e i r o s p a r a as t r a b a l h o s a s e m p r e s a s dos n o v o s serviços das
lavras, e m q u e só consiste o a u m e n t o e conservação das M i n a s , é infalível a deca-
dência delas, c o m o n o decurso dos anos m o s t r a r á a experiência.

78 Segue-se o m o s t r a r m o s a g r a n d e desigualdade c o m q u e os executores d a


c a p i t a ç ã o i m p u s e r a m e d i v i d i r a m este t r i b u t o , e p a r a m e l h o r se p e r c e b e r e m as
487

iniquidades dele iremos discorrendo pelas circunstâncias dos " b a n d o s q u e se l a n -


ç a r a m q u a n d o se estabeleceu, c o m o t a m b é m pelo "regimento q u e se observa nas
"intendências p a r a a c o b r a n ç a d a dita "capitação.
7 9 P r i m e i r a m e n t e , se assentou n a "junta q u e se fez q u e todos os escravos q u e
existissem nas M i n a s , d e u m e outro sexo, assim negros c o m o m u l a t o s , p a g a s s e m
todos os anos de capitação q u a t r o "oitavas e três quartos de o u r o . Esta resolução
se publicou p o r u m b a n d o e isto m e s m o d e t e r m i n a o n o v o r e g i m e n t o d a c a p i t a ç ã o
}

n o p a r á g r a f o q u a t r o . J á mostrei que, d e v e n d o s o m e n t e ser imposta / / nos escra- [ íl. 229v. ]


vos q u e se o c u p a m e m m i n e r a r , ficaram n a g e n e r a l i d a d e do r e g i m e n t o incluídos
todos os q u e nas M i n a s se o c u p a m e m diferentes ministérios.
80 E x c e d e u mais a referida g e n e r a l i d a d e a c o m p r e e n d e r o c o n t i n e n t e dos
sertões da c o m a r c a s do S a b a r á e S e r r o do Frio, j á fora dos "registros das M i n a s ,
o n d e n ã o h á terras minerais, m a s sim fazendas de gados, os quais se c o n d u z e m p a r a
as M i n a s . E q u a n d o e n t r a m dos registros p a r a dentro, p a g a m p o r c a b e ç a o tributo
q u e lhes está imposto, e a todos os escravos q u e existem nas fazendas d e gados sem
outro serviço mais que o de tratarem das suas criações se lhes impôs o tributo referido d a
capitação, c o m o se fossem escravos que extraíssem ouro de que se devessem "quintos.
81 Desta capitação q u e se impôs nos escravos dos sertões resultaram os "levan-
tes q u e neles houve. P o r se lhes n ã o admitir r e q u e r i m e n t o algum, tiraram-se "de-
vassas, h o u v e mortes, prisões e confiscos. P a d e c e r a m n ã o somente os delinqüentes
m a s t a m b é m muitos q u e de n e n h u m a sorte c o n c o r r e r a m p a r a os levantes, e sem
e m b a r g o d e se c o n h e c e r a violência e a injustiça d a c a p i t a ç ã o i m p o s t a nos ditos
sertões e dos grandes clamores q u e houve, se conserva o dito tributo, cobrando-se à
força d e a r m a s .
82 Depois que G o m e s Freire governa as capitanias das Minas e do R i o d e J a n e i r o ,
conserva atualmente soldados de cavalo nas roças do c a m i n h o das Minas até o R i o de
J a n e i r o p a r a a expedição das suas ordens, correndo c o n t i n u a m e n t e a posta d e u m a
p a r a o u t r a p a r t e , e são obrigados os roceiros, além das exorbitâncias e insolências q u e
p a d e c e m c o m a assistência dos soldados, a t e r e m u m escravo destinado atualmente
p a r a o sustento e trato do cavalo. E este negro q u e n ã o m i n e r a n e m se o c u p a e m serviço
algum de seu senhor, q u e o sustenta e lhe corre o risco a o seu valor, se deve e n t e n d e r se
ocupa no serviço real sem lhe p a g a r estipêndio algum. S e m e m b a r g o disto, p a g a seu
senhor capitação dele, p o r q u e o c o m p r e e n d e t a m b é m a generalidade do regimento, e
c o m o os executores d a capitação riscaram d a m e m ó r i a os escrúpulos d a consciência,
constituíram u m regimento q u e n ã o admite / / questionar-se p o r p e c a d o [extorquir- [ fl. 230 ]
sei à tirania e injustamente o alheio p a r a a u m e n t a r a F a z e n d a Real.
8 3 N o p a r á g r a f o 11 d o r e g i m e n t o se d e t e r m i n a q u e n a g e n e r a l i d a d e d a
capitação dos escravos fiquem c o m p r e e n d i d o s todos os negros e negras, m u l a t o s e
m u l a t a s q u e forem forros e n a s c e r a m e m cativeiro, d e q u e se l i b e r t a r a m , e q u e
assim p a g u e m a c a p i t a ç ã o e fique a sua pessoa isenta d o tributo. N ã o posso desco-
brir qual seja o f u n d a m e n t o q u e m e p e r s u a d a n ã o ser esta d e t e r m i n a ç ã o injusta e
488

n o t o r i a m e n t e contrária aos privilégios d a liberdade, p o r q u e s e n d o esta a q u e d e -


v i a isentar aos ditos forros d o tributo, vejo q u e só os livra dele o possuir escravos
p o r q u e ficam e q u i p a r a d o s a o m i n e i r o è a o roceiro. E assim d e v e m o s e n t e n d e r
q u e o forro, q u e sendo escravo sé libertou, sendo p o b r e fica r e p u t a d o p o r escravo,
sujeito a o t r i b u t o , e n ã o l o g r a os privilégios de livre, e s e n d o rico l o g r a a sua
pessoa t o d a a isenção. Explico-me m e l h o r : o q u e t e m posses e c a p a c i d a d e , este,
pela circunstância de rico, n ã o p a g a , e o q u e é p o b r e e miserável, p e l a sua i m p o s -
sibilidade, fica a sua pessoa t r i b u t a d a . Se m e disserem q u e os tais forros q u e n ã o
t e m escravos se o c u p a m e m m i n e r a r , e p o r q u e m i n e r a m d e v e m p a g a r ^capitação,
este discurso é t o t a l m e n t e alheio da v e r d a d e , p o r q u e e m s e m e l h a n t e t r a b a l h o só
p õ e m ã o s q u e m é escravo. P o d e r - s e - á dizer q u e os tais forros se e x e r c i t a m e m
diferentes ministérios e m q u e g r a n j e i a m c o m q u e p a g a r a c a p i t a ç ã o ; e m alguns
n ã o d u v i d o se verifique este discurso, m a s outros vivem d e esmolas e da sua in-
dústria, t u d o n o foro i n t e r i o r m e n t e alheio d e serem obrigados a p a g a r "quintos.
Q u a n t o m a i s , se o h o m e m b r a n c o q u e n ã o t e m escravos n e m "oficio é isento d o
tributo, qual será a diferença p a r a q u e o m u l a t o ou m u l a t a q u e é forra n ã o t e n d o
escravos n e m ofícios fique sujeito ao tributo q u a n d o e n t r e o h o m e m b r a n c o e o
escravo forro n ã o h á m a i s diferença q u é a p u r e z a ou i m p u r e z a do sangue? E se a
c a p i t a ç ã o é c o m u t a ç ã o dos quintos q u e c a d a u m deve, nos forros e forras q u e n ã o
p o s s u e m escravos, e p o r esta falta e sua p o b r e z a n ã o d e v e m quintos, p a r e c e q u e
n ã o havia neles q u e c o m u t a r , mas, p a r a q u e n ã o fiquem isentos d a generalidade,
d e t e r m i n a d a n a "junta, c o m u t a r - l h e s a i s e n ç ã o de livre e o privilégio d e p o b r e s
e m sujeição d e escravos, p a g a n d o c o m o tal o tributo, s e m mais f u n d a m e n t o q u e o
d e assistir nas M i n a s . M a s os efeitos q u e t ê m r e s u l t a d o desta i n i q ü i d a d e é n ã o
somente o obrigarem-nos a pagar o que não devem mas irem muitas mulheres
[ fl. 230v. ] destas p a g a r a c a p i t a ç ã o / / das esmolas q u e t i r a m , r e p a r t i n d o c o m a F a z e n d a
R e a l d o q u e p e d e m pelas portas p a r a r e m e d i a r a sua p o b r e z a ; outras v ã o p a g a r a
capitação c o m os brincos das orelhas e c o m as mais p r e n d a s q u e t ê m . E seja-me
lícito dizer q u e h o u v e c o m a r c a a cuja C a s a d a I n t e n d ê n c i a foi u m a m u l a t a forra
c o m u m a "peça d e " b r e t a n h a p a g a r a capitação, e d u v i d a n d o aceitar-se-lhe seme-
l h a n t e p e n h o r , d e c l a r o u q u é fora tal a sua miséria q u e n ã o t e n d o coisa a l g u m a
c o m q u e p o d e r p a g a r e temendo-se d a violência d a execução q u e havia d e p a d e -
cer fora n a noite a n t e c e d e n t e usar m a l de si a troco d a p e ç a de b r e t a n h a c o m q u e
vinha pagar.

84 N o parágrafo q u a t r o do "regimento são excetuadas as n e g r a s cativas q u e


assistissem n a s "vendas, pois estas, p a g a n d o o t r i b u t o q u e se lhes p ô s , ficam as
n e g r a s q u e nelas v e n d e m isentas d a capitação. M a s é d e g r a n d e p o n d e r a ç ã o q u e ,
o c u p a n d o - s e estas negras e m serviços d e g r a n d e utilidade p a r a seu senhqr, fiquem
livres do t r i b u t o , e q u e [o p a g u e o] m i n e i r o , o roceiro ou o u t r a q u a l q u e r pessoa
c a s a d a q u e tiver u m a ou duas escravas. Se m e disserem q u e n o tributo q u e p a g a a
v e n d a se inclui a capitação da negra, este f u n d a m e n t o se desvanece c o m v e r m o s
489

q u e todas as "vendas e "tabernas, assistindo nelas pessoa b r a n c a ou p r e t a , forra o u


cativa, p a g a m o m e s m o tributo. M a s o certo é q u e esta disparidade devia d e con-
sistir n a utilidade q u e resulta a o b e m c o m u m das M i n a s de h a v e r negras nas ditas
v e n d a s e t a b e r n a s , q u e se b e m se p o n d e r a s s e m as perniciosas c o n s e q ü ê n c i a s q u e
resultam d e h a v e r as ditas negras se p o r i a o m a i o r c u i d a d o e m o evitar.
85 T a m b é m é digno d e reparo q u e no parágrafo quatro d o "regimento sejam
excetuados d a "capitação ps crioulos e mulatínhos nascidos dentro d a capitania das
Minas q u e n ã o passarem de quatorze anos. Entro na dúvida se logram esta isenção
porque pela menoridade se julgam incapazes do trabalho d e minerar, m a s é sem dúvi-
d a ser esta a razão por q u e assim o declara o regimento devesse fazer diferença dos
nascidos nas Minas aos que forem naturais de diversas partes e entrarem nas Minas de
m e n o r idade de q u a t o r z e anos. E dúvida maior, pois n ã o sei qual seja a r a z ã o d a
diferença entre os naturais ou crioulos das Minas e os naturais d e Angola e d a Costa
d a M i n a , pois sendo todos da m e s m a idade ê sendo esta a q u e os isenta do tributo
pela incapacidade do trabalho, vem a militar e m todos os mesmos fundamentos e ficam
uns privilegiados / / e outros sujeitos ao tributo. M a s assim havia d e ser p a r a q u e n ã o [ fl> 231 ]
houvesse disposição que não padecesse iniqüidade e encargos de consciência.
86 Q u a n d o os tributos são estabelecidos nos m o r a d o r e s d e certos distritos,
vilas ou cidades, d e n e n h u m a sorte p a s s a m ou c o m p r e e n d e m aos q u e , transitori-
a m e n t e , v ê m às ditas terras t e n d o p seu domicílio e m lugares de o u t r a j u r i s d i ç ã o .
M a s esta r e g u l a r i d a d e se n ã o observa n a capitação, sem e m b a r g o d e q u e n a "jun-
ta q u e se fez se d e c l a r a v a q u e o s e u e s t a b e l e c i m e n t o c o m p r e e n d i a t a m b é m s o -
m e n t e aos m o r a d o r e s ou aos escravos destes q u e existissem n a jurisdição d a capi-
t a n i a das M i n a s ou aos q u e d e n o v o e n t r a s s e m nelas p a r a s e r e m v e n d i d o s aos
m o r a d o r e s , aos quais no regimento se d á o apelido de "adventícios". M a s é tanto
pelo contrário o que se observa e ampliou-se tanto a generalidade d a capitação q u e se
alguns moradores do Rio de J a n e i r o ou de qualquer outra capitania diferente passam
pelas Minas ou vão a elas a cobranças ou negócio, ainda q u e a d e m o r a seja de muitos
poucos dias, o escravo q u e leva p a r a o seu serviço q u a n d o sai p a r a fora das M i n a s , se
não mostra nos "registros onde assistem guardas o "bilhete de q u e p a g o u a capitação
do dito escravo, lho confiscam p a r a a Fazenda Real, e o m e s m o sucede se qualquer
escravo é m a n d a d o p o r seu senhor às Minas com u m a carta ou qualquer outro parti-
cular, é delas n ã o p o d e sair sem p a g a r a capitação.
87 D e t e r m i n o u - s e n a m e s m a j u n t a q u e as "lojas grandes d e m e r c a d o r e s pagas-
sem v i n t e e q u a t r o "oitavas d e o u r o d e c a p i t a ç ã o a respeito dos lucros das suas
fazendas. Agora, p a r a c o n h e c e r m o s a disparidade q u e há no tributo dos m e r c a d o -
res e dos roceiros, p o n d e r e m o s as circunstâncias d e u m e outro. T o d o s s a b e m q u e
os roceiros, q u e s o m e n t e vivem d a sua roça, n ã o t ê m o u t r o s lucros m a i s q u e os
m a n t i m e n t o s q u e v e n d e m , granjeados c o m o trabalho e agência dos seus escravos,
e destes m a n t i m e n t o s , p a g a n d o os "dízimos, t i n h a m satisfeito a c o n t r i b u i ç ã o q u e
licitamente d e v e m a Sua Majestade. Agora, d a m e s m a roça e dos m e s m o s escravos
490

p a g a m "quintos s e m serem mineiros, advertindo q u e os "dízimos só se p a g a m dos


frutos q u e colhem, e m tal forma q u e se os n ã o tiverem n a d a devem, e a "capitação,
[ íl. 231v\. ] sendo t a m b é m nos mesmos lucros / / dos m a n t i m e n t o s , ainda q u e ps n ã o t e n h a m
s e m p r e a p a g a m . V a m o s ao m e r c a d o r : este, tendo u m a *loja d e fazendas q u e im-
p o r t a cinqüenta mil "cruzados, n ã o t e m nela risco a l g u m e tem certos os excessivos
lucros q u e todps sabem sem mais trabalho q u e estar dentro e m sua casa v e n d e n d o
as fazendas, e p a g a a capitação com vinte.e quatro "oitavas d e o u r o . O roceiro que,
*verbi gratia, t e m vinte escravos c o m que trabalha n a sua roça, c o r r e n d o o risco aos
ditos escravos q u e c o m p r a p o r exorbitante p r e ç o , p o r q u e uns lhe m o r r e m , outros
lhe fogem, outros lhe a d o e c e m e alguns se aleijam, faz despesas de médicos, "cirur-
giões, boticas e ferramentas p a r a a cultura das terras, ê todos os lucros destas despe-
sas e do trabalho dos escravos são incertos e d e p e n d e m da contingência dos t e m p o s ,
e muitas vezes sucede haver a n o de esterilidade q u e n e m m a n t i m e n t o s colhe p a r a o
sustento d a sua família, e sem e m b a r g o de todos estes f u n d a m e n t o s h á de p a g a r ,
c a d a a n o , n o v e n t a e cinco oitavas de o u r o pela c a p i t a ç ã o d e seus vinte escravos.
Agora veja-se a diferença que h á nos p a g a m e n t o s arbitrados aos m e r c a d o r e s e aos
roceiros! Se m e disserem q u e o m e r c a d o r n ã o p a g a c o m o m i n e i r o e q u e só p a g a
m a n e i o d a sua loja, a m e s m a r a z ã o milita n o roceiro, p o r q u e este n ã o é m i n e i r o
n e m t e m o u t r a a g ê n c i a n e m outros lucros mais q u e os d a s u a r o ç a , e estes são
incertos e c o m o risco e despesa a q u e t e n h o referido, e sem e m b a r g o disto é tribu-
tado c o m g r a n d e exorbitância; e o m e r c a d o r , sem risco, sem despesa e c o m lucro
certo é tributado c o m tanta m o d e r a ç ã o , advertindo q u e o roceiro p a g a t a m b é m o
dízimo dos seus m a n t i m e n t o s . A r a z ã o desta desigualdade eu a n ã o p e r c e b o , talvez
p o r q u e n ã o alcança a m i n h a c o m p r e e n s ã o Os fundamentos e m q u e se estribaram as
consciências q u e r e g u l a r a m este arbítrio.

88 É preciso p o n d e r a r o m e s m o a r g u m e n t o entre os m o r a d o r e s e os mineiros


p a r a m o s t r a r a m e s m a desigualdade c o m q u e p a g a m . T e m u m m e r c a d o r nas M i n a s ,
verbi gratia, c i n q ü e n t a mil cruzados de fazenda e m u m a loja e v e n d e a m a i o r p a r t e
dela e m u m a n o sem mais despesa q u e a de sua pessoa ou de u m caixeiro, u m escravo
q u e o serve, u m a s casas q u e p a g a , os gastos dos transportes e os direitos das "en-
tradas. Salvo todos estes referidos gastos, o m e n o s q u e l u c r a n a fazenda é vinte p o r
c e m , q u e v e m a i m p o r t a r d e z mil c r u z a d o s d e " a v e n ç a s , e p a g a s o m e n t e d e
"capitação vinte e q u a t r o oitavas de o u r o e m c a d a a n o .
[ fl. 232 ] 8 9 U m mineiro que tem u m a lavra e nela cinqüenta escravos, s u p o n h a m o s q u e
i m p o r t a t u d o outros c i n q ü e n t a mil cruzados, corre a t u a l m e n t e o risco aos negros
c o m m o r t e s , fugidas e d o e n ç a s , despesa de "fábricas e i n s t r u m e n t o s d e m i n e r a r ,
sustento dos escravos e vestuário e da sua família. E notoriamente são sempre incertos
e contingentes os lucros da extração do ouro que poderá achar; e ou tire muito ou tire
pouco, ou nada, c o m o a muitos sucede, ficando baldada toda a sua despesa e trabalho,
sempre está obrigado pela capitação a p a g a r quatro oitavas e três quartos de ouro p o r
cada escravo, que nos cinqüenta v e m importar duzentas e trinta e sete "oitavas e meia.
491

Agora, pondere-se a desigualdade que há nos pagamentos do mineiro e do m e r c a d o r


e t a m b é m a certeza que há nos lucros do mercador, sem risco, e a contingência do ouro
que u m mineiro poderá tirar, com tanto risco e c o m tanta despesa.
90 B e m vejo q u e agora milita a r a z ã o e o f u n d a m e n t o d e q u e o m i n e i r o e
o b r i g a d o a p a g a r "quintos d o ouro q u e tira d a terra e q u e o m e r c a d o r n ã o deve
quintos d o lucro, e q u e se este p a g a s o m e n t e vinte e q u a t r o "oitavas é m a n e i o d a
sua agência, e q u e se o m i n e i r o p a g a a sobredita q u a n t i a de oitavas é p e l a c o m u -
t a ç ã o dos quintos e m "capitação. M a s p o n d o d e p a r t e o q u e j á t e n h o expressado
e e x p e n d i d o sobre ter sido voluntária, lícita ou injusta a dita c a p i t a ç ã o , r e s p o n d o .
91 Se o m i n e i r o p e l a c a p i t a ç ã o ficava desobrigado dos antigos quintos e, p o r
conseqüência, os devia ficar l u c r a n d o , pois nisto é q u e consiste e se e n t e n d e a v e r d a -
deira inteligência d a c o m u t a ç ã o , sucede, t a n t o pelo contrário, q u e os m e r c a d o r e s é
q u e r e c e b e r a m pela capitação esta utilidade, c o m u t a n d o - s e p a r a eles os antigos quin-
tos, c o m tão grandes encargos das suas consciências, l e v a n d o aos mineiros, n a trafi-
cância do seu c o m é r c i o , a maioria do o u r o , n a f o r m a q u e t e n h o dito n o parágrafo 2 3 .
E se esta utilidade, é o f u n d a m e n t o dos mineiros p a g a r e m a c a p i t a ç ã o c o m m a i o r
excesso do q u e os m e r c a d o r e s , sendo, eles os que. l o g r a m a referida conveniência,
p a r e c e alheio d e t o d a a e q ü i d a d e e c o n t r a os ditames da consciência q u e seja neles
m o d e r a d o o tributo e excessivo nos mineiros, q u e p o r tantos meios se c o n s i d e r a m
hoje vexados e exauridos das p o u c a s conveniências q u e l u c r a m c o m tão g r a n d e tra-
b a l h o e m a i o r e s despesas, c o m o tenho m o s t r a d o .
92 N ã o s o m e n t e se utilizaram os m e r c a d o r e s / / das "avenças q u e l u c r a m nas [ fl. 232v. ]
fazendas q u e v e n d e m e dos antigos quintos q u e injustamente l e v a m n a m a i o r i a
do o u r o , m a s a i n d a lhes cresce o u t r a c o n v e n i ê n c i a , talvez n ã o i m a g i n a d a pelos
q u e falam c o m experiência do país, e v e m a ser: r e c e b e m os m e r c a d o r e s o p r o d u -
to de todas as suas fazendas e m ouro e m p ó , e vindo c o m ele às "casas d a m o e d a
dos p o r t o s do Brasil p a r a o reduzir a dinheiro nelas se lhes fiinde o dito o u r o , e
pelo legítimo valor intrínseco q u e lhe dá o "toque no "ensaio r e c e b e m e m dinhei-
ro a i m p o r t â n c i a dele, e c o m o c o m u m e n t e todo o ouro, sendo ensaiado, excede o
valor de quinze "tostões p a r a c i m a e a l g u m chega a dezesseis tostões a oitava, e
a i n d a q u e n a q u e l e q u e é inferior n ã o haja m a i o r acréscimo q u e de u m o u dois
"vinténs e m c a d a oitava, e m tantos milhões q u e os mercadores tiram das M i n a s e m
o u r o e m p ó v e m a importar o referido lucro u m g r a n d e cabedal. E nesta considera-
ção se deve p o n d e r a r a desigualdade c o m q u e uns e outros são tributados, sendo a
capitação a origem d e tanta iniqüidade e causa total dos encargos e usuras c o m q u e
os m e r c a d o r e s hoje exercitam seu comércio.
9 3 Este m e s m o a r g u m e n t o q u e t e n h o feito dos m e r c a d o r e s p a r a os mineiros
e r o c e i r o s milita, i g u a l m e n t e , n a traficância e c o m é r c i o dos " c o m b o i e i r o s q u e
levam escravos às M i n a s a v e n d e r e nos q u e v ê m dos sertões d a B a h i a e P e r n a m b u c o
c o m gados e cavalarias, e e m todos os mais q u e nas M i n a s e n t r a m a n e g o c i a r e
s a e m c o m o seu p r o d u t o e m ouro e m p ó .
492

94 T a m b é m se a c h o u q u e era lícito q u e os "oficiais q u e e x e r c i t a m "oficios


m e c â n i c o s , p e l o c h a m a d o c o n s e n t i m e n t o c o m q u e se estabeleceu a " c a p i t a ç ã o ,
n ã o s e n d o o u v i d o s n e m d e v e n d o " q u i n t o s d o t r a b a l h o b r a ç a l d o s seus oficios, e
h a v e n d o alguns q u e m u i t a p a r t e do a n o n ã o t r a b a l h a m , p o r q u e e m s e m e l h a n t e
"país, d i z e m , n e m todos os ofícios p o d e m ter a t u a l e x e r c í c i o , s e m e m b a r g o d a
i n c e r t e z a d o seu lucro ficam incluídos n o t r i b u t o d a c a p i t a ç ã o , r e p u t a n d o - s e o
[ 11. 233 ] t r a b a l h o do seu ofício c o m o de / / escravo q u e m i n e r a , p a g a n d o a m e s m a q u a n t i a
de q u a t r o "oitavas e três quartos.
9 5 N o que, p o r m a i o r t e n h o exposto, se mostra o q u a n t o é o n e r o s a aos mineiros
e m o r a d o r e s das M i n a s a c a p i t a ç ã o , p e l a d e s i g u a l d a d e e excesso c o m q u e foi
e s t a b e l e c i d a . M a s a i n d a se faz m a i s intolerável p e l a p r á t i c a q u e o " r e g i m e n t o
m a n d a observar n a execução d a sua c o b r a n ç a , q u e é n a forma seguinte.
96 D e t e r m i n o u - s e q u e o p a g a m e n t o d a capitação de c a d a a n o se dividisse e m
dois quartéis, u m q u e se p a g a r i a e m j a n e i r o , abríndo-se a "matrícula n o p r i m e i r o
d o mês, e o s e g u n d o quartel e m j u l h o , abrindo-se t a m b é m a matrícula no p r i m e i -
ro d o dito m ê s .
97 A p r i m e i r a matrícula está a b e r t a desde o p r i m e i r o d e j a n e i r o até o último d e
fevereiro, e d e n t r o destes dois fneses são todos obrigados a p a g a r o p r i m e i r o quartel
da capitação, e todos os q u e faltam ao p a g a m e n t o se a d m i t e a p a g a r nos seguintes
dois meses, m a s j á incursos n a p e n a de p a g a r e m mais a d é c i m a p a r t e do q u e i m p o r t a
o p a g a m e n t o d a sua capitação p e l a d e m o r a que tiveram d e n ã o p a g a r e m nos p r i m e i -
ros dois m e s e s . Assim o m a n d a o " b a n d o q u e se l a n ç o u , assim o d e t e r m i n a o
r e g i m e n t o e assim se observa e executa.
9 8 Esta p r á t i c a é c o n t r á r i a a todas as disposições das leis e d e D i r e i t o e a
t o d o s os r e g i m e n t o s d a F a z e n d a R e a l , p o r q u e a lei d o R e i n o s o m e n t e m a n d a
p a g a r quintos do o u r o q u e se extrai da terra, e é certo q u e o p a g a m e n t o h á d e ser
depois d e e x t r a í d o , p a r a se s a b e r o q u e se d e v e . A g o r a , c o m u t a d o o q u i n t o e m
c a p i t a ç ã o , se lhe a c r e s c e n t a o g r a v a m e d e ser a d i a n t a d o , p o i s só n o fim d e seis
m e s e s é q u e se deve r e p u t a r v e n c i d o o dito q u a r t e l . M a s s e n d o está c i r c u n s -
t â n c i a o n e r o s a , a i n d a se faz m a i s sensível p e l a e x o r b i t â n c i a d e q u e , n ã o p a -
[ fl. 233v. ] g a n d o n o s p r i m e i r o s dois m e s e s e v i n d o a p a g a r nos dois seguintes, t e m p o / /
e m q u e a i n d a se considera o p a g a m e n t o a d i a n t a d o , j á incorre n a referida p e n a d e
p a g a r a c o n d e n a ç ã o d a d é c i m a p a r t e , p e l a d e m o r a de n ã o p a g a r nos p r i m e i r o s
dois m e s e s .
9 9 E m todos q u a n t o s regimentos h á dos direitos reais, tributos e imposições,
n e n h u m a o u t r a p e n a t ê m os q u e d e i x a m de p a g a r depois d e vencido o q u e devem
mais q u e s o m e n t e serem executados e p a g a r e m , q u a n d o m u i t o , as custas d a exe-
c u ç ã o . M a s esta prática, q u e é santa e justa, n ã o p o d i a admitir-se n e m ter lugar no
r e g i m e n t o da c a p i t a ç ã o , o n d e t u d o são violências e tiranias, p o r q u e n ã o se p o d e
descobrir f u n d a m e n t o q u e p e r s u a d a ser lícita u m a c o n d e n a ç ã o a u m h o m e m p o r
n ã o p a g a r a d i a n t a d o , e talvez o q u e n ã o deve.
493

100 N ã o se p o d e d u v i d a r q u e o o u r o nas M i n a s se tira p e l o m i ú d o , c o m


m u i t a d e m o r a e c o m m u i t a incerteza; e sendo assim, infalivelmente h á d e suceder
a m u i t o s n ã o t e r e m p r o n t o o p a g a m e n t o a d i a n t a d o n e m a c h a r e m q u e m lho e m -
preste, p o r q u e , c o m o todos vivem sujeitos a este tributo, c a d a u m c u i d a e m r e m i r
a sua v e x a ç ã o ; e sendo tão j u s t a ê tão desculpável a d e m o r a d e n ã o p a g a r a d i a n -
t a d o , fica logo i n c u r s o n a c o n d e n a ç ã o d a d é c i m a p a r t e , s e m g é n e r o a l g u m d e
r e c u r s o , n e m se lhe a d m i t e o m o s t r a r o u justificar as causas d a d e m o r a ; e sendo
esta t ã o desculpável nos q u e v ê m v o l u n t a r i a m e n t e p a g a r nos segundos dois m e -
ses, pois se n o s p r i m e i r o s o p u d e s s e m fazer n ã o se e x p o r i a m à c o n d e n a ç ã o d a
d é c i m a p a r t e q u e i r r e m e d i a v e l m e n t e p a g a m , c o n t u d o n ã o ficou sendo escrupulo-
sa a injustiça c o m q u e , sem serem ouvidos, são c o n d e n a d o s .
101 N o p r i m e i r o a n o d a " c a p i t a ç ã o , m o s t r o u logo a e x p e r i ê n c i a os efeitos
q u e p r o d u z i u esta impraticável c o n d e n a ç ã o , p o r q u e muitos, p o r se livrarem dela,
/ / n ã o t e n d o o u r o c o m q u e v i r e m p a g a r a c a p i t a ç ã o nos p r i m e i r o s dois meses, [ íl. 2 3 4 ]
v i e r a m c o m p e n h o r e s d e peças d e o u r o l a v r a d o , e estes, se os n ã o r e m i a m c o m
b r e v i d a d e , ficavam e m satisfação d o tributo. E n ã o s o m e n t e r e c e b i a m seus d o n o s
o p r e j u í z o d e p e r d e r e m o feitio m a s t a m b é m d a d i m i n u i ç ã o d o valor intrínseco
q u e lhe d á a lei, p o r q u e c a d a "oitava d e o u r o dos ditos p e n h o r e s se lhe r e p u t a v a
p a r a o p a g a m e n t o s o m e n t e p o r doze "tostões, e n a I n t e n d ê n c i a d a c o m a r c a do
S a b a r á h a v i a mais o excesso q u e nos p a g a m e n t o s q u e se fizeram c o m o u r o lavra-
do se h a v i a m d e receber algumas oitavas d e m a i s , c o m o f u n d a m e n t o d e ser p a r a
s e g u r a n ç a d o t e s o u r e i r o , c o m o se este, c o m tirar e m e t e r n o cofre o dito o u r o
l a v r a d o , p u d e s s e ter a l g u m a d i m i n u i ç ã o no p r e ç o dele.
102 P o n d e r e m o s as restituições q u e envolvem estes p a g a m e n t o s c o m p e n h o -
res. P r i m e i r a m e n t e , é s e m d ú v i d a q u e os q u e p a g a r a m c o m as suas p r e n d a s d e
o u r o , se o tivessem e m p ó , n ã o q u e r e r i a m r e c e b e r o p r e j u í z o d e p e r d e r e m os
feitios das suas p e ç a s d e o u r o , ter d i m i n u i ç ã o d e três tostões e m c a d a oitava e
d i m i n u i ç ã o no p e s o q u e se recebe d e mais p a r a s e g u r a n ç a d o "tesoureiro. E o q u e
é mais digno d e r e p a r o é q u e p a d e ç a u m h o m e m todos estes prejuízos p a r a p a g a r
o q u e n ã o deve, p o r q u e se n ã o p o d e d u v i d a r q u e o q u e n ã o t e m o u r o e m p o n ã o
deve "quintos, e o q u e n ã o deve quintos n ã o havia nele q u e c o m u t a r . E todos os
referidos encargos resultam d a injusta capitação aos quais estão obrigados os a u t o -
res e executores dela.
103 C o m o o r e n d i m e n t o d a capitação se r e m e t e todas as "frotas p a r a a C o r -
te, p a r a q u e n e l a se n ã o conhecesse a opressão q u e se p a d e c e u c o m os p a g a m e n -
tos dos p e n h o r e s , se f u n d i r a m estes e m b a r r a s d e o u r o , p a r a q u e se n ã o vissem
peças d e o u r o l a v r a d o nos p a g a m e n t o s d a capitação e se conhecessem as c o n t r á r i a s
conseqüências das utilidades c o m q u e se p e r s u a d i u este tributo.
104 A c a b a d o s os primeiros dois meses d a "matrícula e os segundos dois e m
q u e j á se p a g a c q m a referida c o n d e n a ç ã o / / d a d é c i m a p a r t e , se s e g u e m os [ fl. 234v. ]
ú l t i m o s dois, q u e são m a i o e j u n h o , e n o fim destes, s e n d o v e r d a d e i r a m e n t e o
t e m p o e m q u e está vencido o p r i m e i r o quartel d a c a p i t a ç ã o , j á neles se n ã o a d m i -
te p a g a m e n t o a l g u m , m a s d e t e r m i n a o " b a n d o e o " r e g i m e n t o q u e estes dois
494

últimos meses servirão somente para se "devassar dos que s o n e g a r a m negros à


"matrícula, que v e m a ser o m e s m o que. devassar de todos os que não pagaram
"capitação de todos os escravos que tinham, porque a matrícula não é anteceden-
te ao pagamento, mas, sim, no m e s m o instante e m que cada u m matricula o seu
escravo é logo obrigado a pagar a capitação dele, e a pena que se lhes impõe pela
devassa aos que n ã o têm p a g o é confiscação do escravo para a F a z e n d a R e a l e
pagar em dobro a importância da capitação.
105 E certo que ainda que houvesse dolo ou malícia e m deixar alguma p e s -
soa de matricular o seu escravo e pagar o tributo dele, se não devia julgar punível
até o último dia em que se vence o pagamento, e se estas penas se dirigem a evitar
o "descaminho nos que estão dentro do termo dos seis meses e m que se vence o
quartel e o p o d e m pagar, e se as penas se dirigem a Castigar os que sonegaram
negros à capitação, é a mesma exorbitância de impor u m a pena antes de conheci-
d a a culpa, porque nos últimos dois meses estão todos ainda dentro do termo de
poderem manifestar os seus escravos e pagarem o que devem.
106 Nestes sonegados manda o "regimento que se proceda por denúncia do
fiscal, o qual, pelos róis e clarezas que tem dos escravos que cada u m possui, logo
q u e acabam os primeiros quatro meses denuncia todos os que deixaram de pagar.
E é tão violento este procedimento que, dada a denúncia, está proferida a senten-
ça da confiscação dos escravos., e passada e m coisa julgada, sem apelação n e m
agravo. E suposto que nas denúncias dos mais graves delitos, c o m o são os de lesa-
majestade, se admite defesa e é o réu ouvido, nas denúncias da capitação se não
admite aos réus o mostrarem se tiveram justas causas para deixarem de pagar, nem
se considera impedimento nem impossibilidade alguma para o pagamento adianta-
do, ao mesmo tempo que são tão notórios os empenhos c o m que todos vivem.
[ íl. 235 ] 107 M a s para que se conheça que o fim destes / / injustos procedimentos
somente se dirige a aumentar o rendimento da capitação c o m iniqüidade e c o m
extorsões dos vassalos, se repare e pondere nas circunstâncias seguintes.
108 D i z o "bando e o regimento, n o parágrafo 20, c o m o nos aditamentos
q u e compôs ao regimento da capitação u m intendente da comarca do S a b a r á , que
todas as pessoas que nos últimos dois meses da devassa o u "correição vierem
pagar a capitação de alguns escravos se lhes aceite o Ouro, mas q u e estando j á
denunciadas incorram sempre nas penas, q u e são confiscação do escravo e pagar
a capitação e m dobro. D e m o d o que v e m u m h o m e m voluntariamente pagar
antes de finalizar o termo e m que se vence o p a g a m e n t o , e aceita-se-lhe este, e
porque o fiscal o tem j á denunciado p o r não ter pago adiantado, çonfiscam-se-lhe
os escravos dé que j á se lhe aceitou o pagamento e é executado para pagar mais a
capitação e m dobro. Se a F a z e n d a R e a l fica j á satisfeita pelo p a g a m e n t o feito
dentro do termo de seis meses e por ser oferecido voluntariamente se desvaneceu
o dolo que se podia presumir no devedor, qual será a causa pu qual o delito que
este h o m e m cometeu para lhe confiscarem os seus escravos? E se ele está incurso
495

nas referidas p e n a s e se p r o c e d e a elas, p a r a q u e se lhe aceita o p a g a m e n t o q u e


v o l u n t a r i a m e n t e faz? Este caso idêntico sucedeu n a c o m a r c a do S a b a r á a certo m o -
rador, que estando doente e n ã o p o d e n d o vir pessoalmente m a n d o u a u m seu amigo
que. assistia n a vila quatro escravos que tinha, e, j u n t a m e n t e , o ouro q u e i m p o r t a v a a
"capitação deles. Foi o dito amigo à casa do d e s p a c h o apresentar os escravos, e acei-
tou-se-lhe o ouro d a capitação deles, e depois confiscaram-se-lhe, os escravos, q u e ,
sendo q u a t r o , se a r r e m a t a r a m n a p r a ç a por cento e c i n q ü e n t a "oitavas, c o m o fun-
d a m e n t o d e q u e q u a n d o chegou j á estavam d e n u n c i a d o s , sem e m b a r g o de ser den-
tro dos seis meses, e veio o dono a p e r d e r o ouro que pagou e os próprios escravos.
109 O m e s m o s u c e d e u n o s e r t ã o d o S a b a r á . A n d a n d o o " i n t e n d e n t e e m
" c o r r e i ç ã o , a c h a r a m - s e u n s escravos q u e n ã o e s t a v a m m a t r i c u l a d o s . A c u d i u u m
h o m e m e m o s t r o u q u e aqueles escravos lhe p e r t e n c i a m p o r lhos t e r e m d a d o n o
d o t e d e s u a m u l h e r , e q u e n ã o t i n h a d ú v i d a a p a g a r / / a c a p i t a ç ã o deles dos [ A. 235v. ]
presentes seis meses, visto n ã o ter p a g o a pessoa e m cujo p o d e r existiam. R e s p o n -
d e u o i n t e n d e n t e q u e pagasse, sem lhe deferir a entrega dos escravos. R e p l i c o u o
h o m e m q u e se havia de. p e r d e r os escravos n ã o queria p a g a r o q u e n ã o devia. E,
finalmente, c o m a m e a ç o s d e vir o h o m e m p r e s o e m u m a corrente, foi o b r i g a d o a
p a g a r , m a s s e m p r e c o m a cautela de lhe n ã o d e c l a r a r se lhe havia d e e n t r e g a r os
escravos. P a g o u o h o m e m , e assim q u e se r e c e b e u o p a g a m e n t o se lhe confisca-
r a m os escravos.
110 R e p a r o q u e no parágrafolO do "regimento se d e t e r m i n a q u e no caso q u e
haja provas d e alguns escravos sonegados e n ã o se p o d e n d o nestes p r ó p r i o s fazer
a p r e e n s ã o , se faça seqüestro aos donos e m outros tantos, m a s q u e neles se n ã o faça
execução sem ser ouvido, e q u e terá somente apelação n o efeito devolutivo p a r a o
C o n s e l h o U l t r a m a r i n o . N ã o sei qual seja a r a z ã o d e diferença p a r a ser o réu ouvido
neste caso e o n ã o p o d e r ser q u a n d o se lhe faz a p r e e n s ã o nos p r ó p r i o s escravos
sonegados, p o r q u e e m todos t e m o réu o m e s m o d o m í n i o , e e m u m e o u t r o caso
p o d e ter justos fundamentos p a r a a sua defesa. M a s p o u c o i m p o r t a q u e o r é u neste
caso seja ouvido, p o r q u e sendo c o n d e n a d o e r e m a t a d o s os escravos p a r a a F a z e n d a
R e a l d e q u e lhe aproveita a apelação no efeito devolutivo p a r a o C o n s e l h o U l t r a -
m a r i n o ? P o r q u e , se nas Minas é dificultoso u m recurso p a r a a Bahia, pela distância
e pela despesa, m u i t o mais dificultoso e totalmente impraticável fica sendo p a r a o
Conselho U l t r a m a r i n o . E assim h a v e m o s de assentar que a prática deste regimento
é, totalmente contrária às leis do R e i n o e a todas as disposições d e Direito.
111 E p a r a m e l h o r p r o v a d é q u e neste regimento s o m e n t e se a m p l i a r a m os
procedimentos a favor das exorbitâncias e. violências d a capitação e restringiram e m
todo o recurso das partes, p o n d e r e m o s as contrárias determinações dos parágrafos
2 5 , 26 e 2 9 do dito regimento. N o parágrafo 25 se d e t e r m i n a q u e os "oficiais d a
"matrícula serão obrigados a buscar nos livros dela t o d a / / a clareza q u e verbal- [ fl. 236 ]
m e n t e lhes r e q u e r e r q u a l q u e r pessoa ou escravo a fim de d a r a l g u m a d e n ú n c i a , e
p o r esta diligência n ã o levarão e m o l u m e n t o algum. E n o parágrafo 26 se d e t e r m i n a
496

q u e o *intendente n a o m a n d e passar certidão a l g u m a às partes s e m q u e primeiro


justifiquem o p a r a q u e p e d e m a dita certidão, e d a dita justificação h á d e h a v e r vista
o *fiscal p a r a a i m p u g n a r , h á de sentenciâ-la o intendente, e c o m a sentença h á de
ir a o ' g o v e r n a d o r r e q u e r e r u m despacho p a r a o i n t e n d e n t e l h e m a n d a r passar a
d i t a c e r t i d ã o , e d e t o d a s estas diligências h á d e p a g a r a p a r t e os e x o r b i t a n t e s
e m o l u m e n t o s q u e se c o s t u m a m levar nas M i n a s , d e m o d o q u e a favor das denúncias
e da "capitação basta que a parte peça verbalmente dos livros qualquer certidão, e t ê m
o "ministro e mais "oficiais liberdade para lha passarem sem despesa alguma, e a favor
do recurso e defesa das partes n ã o p o d e haver certidão sem precederem as referidas
diligências e despesas, q u e são de qualidade que totalmente dificultam os meios q u e
e m todos os juízos e tribunais se observam a favor dos requerimentos das partes.
112 N o parágrafo 29 diz t a m b é m o "regimento q u e q u a n d o o i n t e n d e n t e for
p a r a a "correição ficará a cópia do livro d a "matrícula a o "ouvidor da c o m a r c a ou
ao "juiz o r d i n á r i o p a r a dele p o d e r m a n d a r p a s s a r t o d a s as c l a r e z a s q u e se lhe
p e d i r e m p a r a denúncias, m a s q u e de n e n h u m a sorte p o d e r á m a n d a r p a s s a r certi-
dões às partes, e q u e se as passar n ã o t ê m fé alguma, c o m q u e temos a q u i t a m b é m
restringida a fé dos d o c u m e n t o s públicos: se forem passados a favor d a capitação
t ê m crédito e m j u í z o e sendo a favor das p a r t e s é escopeta de Ambrósio.-^
113 D e t e r m i n a mais o " b a n d o e o r e g i m e n t o q u e os oficiais d e "ofícios m e -
cânicos q u e d e n t r o dos q u a t r o meses se n ã o manifestarem e p a g a r e m a capitação
de sua p e s s o a s e r ã o c o n d e n a d o s e m c e m "oitavas d e o u r o e e x t e r m i n a d o s p a r a
fora das M i n a s . A q u i temos o u t r a disparidade digna de p o n d e r a ç ã o , e v e m a ser o
[ fl. 236v. ] h o m e m q u e tiver u m escravo e o n ã o m a t r i c u l a r confisca-se-lhe / / o escravo e
p a g a a capitação e m d o b r o e n ã o tem mais p e n a alguma, e o oficial se n ã o p a g a r
a capitação d a sua pessoa é c o n d e n a d o e m c e m oitavas d e o u r o , q u e são c e n t o e
c i n q ü e n t a mil "réis, q u e é o q u e p o d e p r o d u z i r u m escravo confiscado e a r r e m a -
t a d o n a p r a ç a , e é d e g r e d a d o p a r a fora das M i n a s . N ã o sei qual seja a r a z ã o d a
diferença p a r a h a v e r d e g r e d o n o oficial e n ã o o h a v e r n o d o n o d o escravo q u e
c o m e t e a m e s m a culpa.
114 N o s m e r c a d o r e s d e "lojas e "vendas é m a i s crescida a c o n d e n a ç ã o , p o r -
q u e p a g a m d u z e n t a s oitavas e t ê m o m e s m o extermínio; E, finalmente, n ã o será
fácil q u e h o m e n s professores d e letras s a i b a m d a r inteligência às contradições des-
te r e g i m e n t o n e m p e r c e b e r os f u n d a m e n t o s das suas disposições, p o r q u e sendo
t u d o c o n t r a os ditames d a r a z ã o e c o n t r a os preceitos da justiça se deve atribuir
t u d o a u m a insanável loucura. E falo c o m esta l i b e r d a d e pela infalível certeza q u e
t e n h o d e q u e s e m e l h a n t e regimento n ã o foi até a g o r a a p r o v a d o p o r S u a Majesta-
d e n e m p e l o s m i n i s t r o s d e seus t r i b u n a i s , e s u p o s t o se o b s e r v a e se e x e c u t a é

Provavelmente, referência a santo Ambrósio, um dos mais ilustres padres da Igreja, reconhecido pela
defesa ardente da fé e dos bons costumes.,
497

p o r q u ê as c i r c u n s t â n c i a s d e q u e se c o m p õ e e os c l a m o r e s dos efeitos q u e t e m
p r o d u z i d o n ã o c h e g a m à real p r e s e n ç a de Sua Majestade.
115 P a r a todas as referidas c o n d e n a ç õ e s , extermínios e confiscações serve d e
culpa, c o n f o r m e d e c l a r a o "regimento^, a d e m o r a ou afetada negligência d e n ã o
v i r e m p a g a r n o t e r m o dos q u a t r o meses e sem e m b a r g o de se n ã o v e n c e r o p a g a -
m e n t o , c o m o t e n h o m o s t r a d o , senão n o fim dos seis meses se deve fazer a reflexão
q u e assim c o m o o r e g i m e n t o m a n d a "devassar aos q u e faltaram a o p a g a m e n t o ,
n ã o m a n d a n e m p e r m i t e averiguar-se se n a omissão h o u v e dolo ou afetada negli-
gência, n e m aos réus se a d m i t e defesa n e m p r o v a e m c o n t r á r i o . M á s faltar-se a o
p a g a m e n t o n o referido t e r m o p a r a se j u l g a r p o r p r o v a d a a c u l p a do dolo e ficar
j u s t a m e n t e c o n d e n a d o , se esta prática n ã o / / fosse dirigida p o r u m h o m e m leigo, [ fl. 237 ]
m a s sim p o r sujeito professor de letras, n ã o deixaria d e p o n d e r a r q u e , s e g u n d o as
disposições das leis e regras d e Direito, n ã o p o d e h a v e r c o n d e n a ç ã o d e p e n a sem
culpa p r o v a d a , n e m se p o d e negar ao réu a defesa, q u e é d e direito n a t u r a l . E p a r a
se j u l g a r q u e e m faltar à "matrícula ou a o p a g a m e n t o nela c o n s i g n a d o c o m e t e u
" m o r a culpável, deve o réu ser ouvido nas causas dela e s e n t e n c i a d o p e l a v e r d a d e
averiguada, pois é sem dúvida q u e p o d e haver muitos motivos q u e o isentem d a
culpa, p o r q u e o n ã o ter o p o b r e c o m q u e p a g a r a d i a n t a d o , o n ã o a c h a r q u e m l h o
empreste, o n ã o ter q u e v e n d e r p a r a r e m i r a o p r e ç o do tributo, a ocasião d e u m a
d o e n ç a e o u t r a s dificuldades invencíveis, t u d o são f u n d a m e n t o s q u e , p r o v a d o s ,
ilidem t o d a a p r e s u n ç ã o do dolo.
116 O s principais fundamentos p o r q u e se estabeleceu o sistema d a "capitação
foí p a r a se evitarem os g r a n d e s furtos e "descaminhos q u e se c o m e t i a m nos reais
"quintos d e S u a Majestade e ficar c e s s a n d o o a t r e v i m e n t o d e se c o m e t e r e m os
execrandos delitos de casas e fábricas d e m o e d a e barras falsas, c o m o t a m b é m alivia-
rem-se os povos das devassas, prisões e confiscos que c o n t i n u a m e n t e havia p o r causa
dos referidos delitos. M a s são tão contrários os efeitos da capitação produzidos dos seus
arbítrios que ficou servindo de prêmio e utilidade para os delinqüentes dos descaminhos
dos quintos e d e total ruína e castigo p a r a os inocentes, como irei m o s t r a n d o .
117 E público, notório e sabido de todos os q u e t ê m experiência das M i n a s
q u e nelas só c o m e t i a m os descaminhos os m e r c a d o r e s , "comboieiros e traficantes,
p o r q u e i n d o p a r a r a seu p o d e r t o d o o o u r o e m p ó q u e r e c e b i a m d o s m i n e i r o s ,
roceiros e mais m o r a d o r e s , r e c e b e n d o j u n t a m e n t e n a maioria do preço das oitavas
os quintos c o m obrigação de os i r e m p a g a r n a C a s a d e F u n d i ç ã o , m u i t o s destes
s a í a m p a r a fora das M i n a s levando o c u l t a m e n t e o o u r o e m p ó s e m p a g a r e m os
referidos quintos, e vindos p a r a os portos de m a r destes se conduzia p a r a a Costa d a
M i n a e se levava p a r a Lisboa oculto nas "frotas. / / E todos estes descaminhos trazi- [ fl. 237v. ]
a m a sua origem da extração q u e nas M i n a s se cometia c o m tanta liberdade, p e r m i -
tida talvez p o r pessoas a q u e m , p e l a o b r i g a ç ã o dos c a r g o s , p e r t e n c i a evitá-la. E
sendo os delinqüentes e transgressores das leis os mercadores, "comboieiros e trafi-
cantes, estes são os premiados e os q u e só recebem conveniências d a capitação. E os
498

prejuízos dela são p a r a os inocentes m o r a d o r e s , q u e n u n c a * d e s c a m i n h a r a m u m a


"oitava de o u r o . E p a r a m e l h o r se perceber qual é o castigo dos inocentes e qual o
p r ê m i o dos culpados m e explico na forma seguinte.
118 T o d o s os q u e até agora "extraíam p o r alto o o u r o e m p ó p a r a fora das
M i n a s furtavam a sua Majestade os seus reais "quintos, c o m risco d e prisões, con-
fiscos e degredos., A g o r a furtam as m e s m a s importâncias dos quintos aos mineiros,
roceiros e mais m o r a d o r e s , n a m a i o r i a q u e injustamente lhe l e v a m n o o u r o , s e m
risco, s e m p e n a , sem p a g a r e m tributo algum, permitindo-lhe a m e s m a "capitação
"a l i b e r d a d e d e ó p o d e r e m l e v a r é m p ó p a r a o n d e q u i s e r e m , e f i c a m n e s t a
f o r m a c o n t i n u a n d o n o s m e s m o s f u r t o s , livres e a b s o l u t o s dos p r o c e d i m e n t o s
q u e p e l a s leis m e r e c e m os l a d r õ e s , e o c a s t i g o d e s t e s se p e r v e r t e c o n t r a os
mineiros inocentes.
119 O s ditos mineiros, q u e são aqueles e m cujo t r a b a l h o consiste a conservação
dos seus reais quintos, p o r q u e do exercício d e m i n e r a r , da g r a n d e despesa d e escra-
vos, sustento deles e de toda a mais "fábrica, resulta o extrair-se o o u r o d a terra. E
m e r e c e n d o estes serem os favorecidos, são os castigados s e m culpa, ficando gravados
e m p a g a r duas vezes os quintos e e m p a g a r e m uns o q u e n ã o d e v e m e outros mais d o
que devem, como tenho mostrado.
120 D i z t a m b é m o " b a n d o q u e se declara a o p o v o q u e p o r r a z ã o da capitação
se n ã o p r o c e d e r á a prisão n e m a confisco c o n t r a pessoa a l g u m a . Esta disposição
o u foi lapso d a p e n a ou equivocação do escrevente, p o r q u e foi u m e n g a n o m a n i -
[ fl. 238 ] festo a o p o v o , pois / / s e executa o contrário do q u e se p r o m e t e u , p o r q u e vemos
q u e n o "regimento d a capitação h á "devassas, h á c o n d e n a ç õ e s injustas, h á confis-
cos s e m culpa e h á extermínios sem delitos. M a s o certo é q u e nesta p a r t e a v e r d a -
deira inteligência do b a n d o é q u e p o r ser v i r t u d e o castigar ladrões ficariam p e l a
c a p i t a ç ã o cessando os p r o c e d i m e n t o s q u e c o n t r a eles havia e ficariam c o m a liber-
d a d e d e c o n t i n u a r e m os mesmos furtos p o r t e r e m sido os transgressores das leis e
q u e só os mineiros, c o m o isentos d e t o d a a culpa nos d e s c a m i n h o s d o o u r o , fica-
r i a m sujeitos a novas devassas, c o n d e n a ç õ e s e m a i s p e n a s a q u e t e n h o referido.
121 N ã o se p o d e d u v i d a r q u e foi s e m p r e g r a n d e o d e s c a m i n h o q u e nas M i -
nas se c o m e t i a nos reais quintos e m u i t o mais e x e c r a n d o e gravíssimo era o delito
d e fabricar barras e m o e d a falsa, e tudo digno do mais rigoroso castigo. M a s se a
sua M a j e s t a d e fossem p r e s e n t e s os v e r d a d e i r o s m o t i v o s dos q u a i s se o r i g i n o u a
l i b e r d a d e e d e v a s s i d ã o c o m q u e n a s M i n a s se c o m e t e r a m os referidos delitos,
ficaria c o n h e c e n d o a q u e m devia as exorbitâncias c o m q u e t ã o p u b l i c a m e n t e se
defraudava á sua R e a l F a z e n d a . M a s n ã o p e r t e n c e a o p r e s e n t e discurso falar e m
m a t é r i a cuja averiguação é privativa ao s o b e r a n o p o d e r d e Sua Majestade.
122 E u n ã o d u v i d o q u e no arbítrio d a capitação haja a p a r ê n c i a d e se p o d e -
r e m evitar os descaminhos d a F a z e n d a R e a l , n a c o n s i d e r a ç ã o d e q u e , t e n d o S u a
Majestade certo o tributo de c a d a escravo, ficava cessando toda a fraude e t o d o o
d e s c a m i n h o q u e c o m e t i a m os q u e e x t r a i a m o o u r o e m p ó sem p a g a r e m os quintos
499

q u e d e v i a m . M a s p o u c o i m p o r t a q u e sé e v i t e m os " d e s c a m i n h o s c o m u t a d o o
" q u i n t o e m "capitação se desta se origina u m a g r a n d e d e c a d ê n c i a nas M i n a s e
u m a g r a n d e d i m i n u i ç ã o n o s r e n d i m e n t o s dos m e s m o s reais q u i n t o s , c o m o vai
m o s t r a n d o a experiência n a deserção q u e j á tem feito u m g r a n d e n ú m e r o d e m o -
r a d o r e s de todas / / a s c o m a r c a s das M i n a s , levando consigo os seus escravos, p o r [ fl. 238v. ]
ser intolerável o tributo d a c a p i t a ç ã o , e n a subsistência destes consiste o r e n d i m e n -
to dela. E s e m dúvida q u e n a d i m i n u i ç ã o deles h á o m e s m o r e n d i m e n t o de p a d e -
cer igual falta, e p a r a q u e m e l h o r se c o n h e ç a o q u a n t o é fantástico e q u i m é r i c o o
r e n d i m e n t o d a c a p i t a ç ã o , c o m b i n e m o s o r e n d i m e n t o q u e t i v e r a m as "casas d e
fundição e m u m a n o c o m o r e n d i m e n t o q u e teve o p r i m e i r o a n o d a c a p i t a ç ã o .
123 G o v e r n a n d o o c o n d e das Galveias as M i n a s , m a n d o u Sua M a j e s t a d e a elas
a M a r t i n h o d e M e n d o n ç a p r o p o r aos povos o arbítrio d a capitação. Rejeitou-se esta,
c o m o j á fica dito, p o r se j u l g a r prejudicial e onerosa, e e m seu lugar, c o n f o r m e as
o r d e n s reais, se estabeleceram três casas de fundição, u m a è m Vila R i c a , o u t r a n o
S a b a r á e o u t r a n o R i o das M o r t e s , extinguindo-se, a o m e s m o t e m p o , as casas d a
m o e d a q u e havia, e determinou-se q u e n ã o sairia o u r o e m p ó p a r a fora das M i n a s
sem ser fundido e m b a r r a s nas ditas casas de fundição, p a r a delas p a g a r e m os quintos
a S u a Majestade.
124 P a r a as referidas casas se m a n d a r a m uns "ministros q u e S u a M a j e s t a d e
n o m e o u p a r a "intendentes da sua Real Fazenda e p a r a c o m toda a vigilância
c u i d a r e m e m evitar a extração e saída do o u r o e m p ó p a r a fora das M i n a s . E foi tal
o c u i d a d o , z e l o e desinteresse c o m q u e p r o c e d e r a m q u e , p r i n c i p i a n d o as ditas três
casas de fundição a l a b o r a r e m 22 d e m a r ç o d e 1734, r e n d e r a m os quintos q u e
nelas se p a g a r a m , até 22 de m a r ç o d e 1735, cento e trinta e sete "arrobas de. o u r o ,
a d v e r t i n d o q u e este r e n d i m e n t o foi líquido d e t o d a s as despesas seguintes, q u e
são uns g r a n d e s o r d e n a d o s q u ç se p a g a r a m a u m g r a n d e n ú m e r o de "oficiais d e
q u e se c o m p u n h a c a d a u m a das ditas casas, assim p a r a d e s p a c h o , r e c e b i m e n t o e
e x p e d i ç ã o do o u r o , c o m o p a r a a "fábrica d a fundição e "ensaios dele. T i r a r a m - s e
t a m b é m todas as g r a n d e s despesas de carvão e mais materiais de q u e / / o o u r o [ fl. 2 3 9 ]
necessita p a r a a sua fundição e, a b a t i d a t o d a esta g r a n d e despesa, ficou líquido n o
r e n d i m e n t o d e u m a n o a referida q u a n t i a d e cento e trinta e sete a r r o b a s de o u r o
d e quintos.
125 M o s t r o u mais a experiência q u e c a d a vez seria mais o r e n d i m e n t o p o r -
que, c o n t i n u a n d o a l a b o r a r as ditas casas mais três meses, h o u v e nelas d e rendi-
m e n t o q u a r e n t a e três arrobas de ouro, e se continuassem i m p o r t a r i a o p r o d u t o d o
s e g u n d o a n o c e n t o e setenta e duas a r r o b a s , c o n d u z i n d o m u i t o p a r a o a u m e n t o
deste acréscimo as exatas diligências que os intendentes faziam p a r a q u e todo o ouro
e m p ó viesse às casas de fundição reduzir-se a barras p a r a p a g a r e m os quintos.
126. N a s casas d e fundição se c o b r a v a m os quintos de S u a M a j e s t a d e sem a
m e n o r s o m b r a d e violência e s e m opressão a l g u m a dos povos p o r q u e , e x e c u t a n -
d o os ministros as diligências necessárias p a r a evitarem a saída do o u r o e m p ó fora
500

das M i n a s , n ã o h a v i a o u t r a a l g u m a opressão senão ter as portas d a *casa d e fundi-


ção a b e r t a s p a r a receber o o u r o q u e a elas v i n h a , e r e d u z i d o a b a r r a s se c o b r a v a m
ôs "quintos q u é c a d a u m devia.
127 E de a d v e r t i r q u e n a c o b r a n ç a dos q u i n t o s das casas d e fundição n ã o
h a v i a e s c r ú p u l o n e m e n c a r g o a l g u m d a consciência, p o r q u e c a d a u m p a g a v a o
q u e l i c i t a m e n t e devia pelas leis, e p a g a v a q u a n d o os devia, e h ã o se p r o c u r a v a
pelo n ú m e r o d e m u i t o s ou p o u c o s escravos q u e c a d a u m tivesse, e só se p r o c u -
rava os q u e t i n h a m ou r e c e b i a m p a g a m e n t o s d e o u r o e m p ó p a r a q u e viessem a
fundi-lo e p a g a r dele os q u i n t o s q u e j u s t a m e n t e d e v i a m , e c a d a u m p a g a v a d o
m u i t o ou d o p o u c o q u e fundia, servindo a s u a v i d a d e desta c o b r a n ç a d e sossego
p a r a os povos e s e g u r a n ç a p a r a as consciências, c o m a c e r t e z a d e u m tão g r a n d e
rendimento, como mostrou a experiência.
128 P o n d e r e m o s a g o r a o r e n d i m e n t o d a " c a p i t a ç ã o c o m as circunstâncias
[ ff 239v, ] dele. R e n d e u o t r i b u t o / / d a c a p i t a ç ã o n o p r i m e i r o a n o c e n t o e vinte e cinco
"arrobas de o u r o , c o m p o u c a diferença, e v e m a faltar doze a r r o b a s de o u r o p a r a
c h e g a r a o r e n d i m e n t o das casas de fundição. E se deve fazer u m a g r a n d e reflexão
nos requisitos q u e c o n c o r r e m p a r a o p r o d u t o d a c a p i t a ç ã o c h e g a r ao r e n d i m e n t o
q u e teve e se deve t a m b é m p o n d e r a r o e n g a n o q u e se inclui n o dito r e n d i m e n t o .
129 P r i m e i r a m e n t e , p a r a o r e n d i m e n t o d a capitação ser n a f o r m a referida e
necessário n ã o s o m e n t e tributarem-se todos q u a n t o s escravos h á nas M i n a s , m a c h o s
e fêmeas, forros e cativos, m u l a t o s e negros, m a s t a m b é m foi preciso estender-se a
capitação aos sertões fora das M i n a s , o n d e n ã o h á terras m i n e r a i s e se c o b r a â força
de a r m a s ; foi m a i s necessário t r i b u t a r e m - s e as "lojas dos m e r c a d o r e s , "vendas e
" t a v e r n a s e todos os "ofícios m e c â n i c o s ; foi m a i s necessário g r a v a r e m - s e os h o -
m e n s c o m o p a g a m e n t o do tributo a d i a n t a d o , impondo-se-lhes, n a d e m o r a dele,
a c o n d e n a ç ã o d a d é c i m a p a r t e , n a certeza d e q u e o rigor desta c o b r a n ç a e a neces-
sidade de muitos os obrigaria a cair nas muitas c o n d e n a ç õ e s , e ficavam estas ser-
v i n d o d e a u m e n t a r o r e n d i m e n t o d a c a p i t a ç ã o , c o m b o a ou m á consciência. E
a i n d a assim, c o m toda a g e n e r a l i d a d e deste tributo e c o m o p r o d u t o dos referidos
requisitos, n ã o c h e g o u o r e n d i m e n t o d a c a p i t a ç ã o a o das casas d e fundição.
130 E q u a n t o ao e n g a n o q u e se envolve n o r e n d i m e n t o d a c a p i t a ç ã o , é d e
advertir q u e as c e n t o e trinta e sete a r r o b a s de quintos q u e r e n d e r e m e m u m a n o
as casas d e fundição são líquidas de todos os gastos e despesas a q u e referi. M a s
n ã o é assim n a capitação, p o r q u e os autores e executores dela, p a r a e n c o b r i r e m a
d i m i n u i ç ã o 'do seu r e n d i m e n t o , n ã o t i r a r a m deste as despesas q u e se fazem pelos
o r d e n a d o s dos "ministros e "oficiais das i n t e n d ê n c i a s , e c o m as " c o n d u ç õ e s d o
o u r o e mais gastos necessários p a r a a sua expedição, e d e t e r m i n a r a m q u e t u d o se
p a g a s s e p e l a P r o v e d o r i a d a F a z e n d a R e a l das M i n a s . G o m o n a C o r t e se p e r c e -
b e m estas i n d ú s t r i a s , b e m se c o n h e c e q u e r e n d e m e n o s a c a p i t a ç ã o setenta ou
[ íl. 240 ] oitenta mil / / "cruzados, q u e tantos se d e s p e n d e m p e l a P r o v e d o r i a d a F a z e n d a
R e a l nas referidas despesas d a capitação.
501

131 D e v e m a i s advertir-se a diferença q u e h á n o o u r o dos "quintos c o b r a d o


pela *casa de fundição, N o o u r o e m p ó q u e se c o b r a pela "capitação, a i n d a s e m
ter falsidade n e m m i s t u r a d e outro metal, infalivelmente n a fundição dele o m e -
nos q u e q u e b r a são três p o r cento, c t e n d o a l g u m a falsidade ou m i s t u r a d e o u t r o
metal, o q u e m u i t a s vezes se n ã o p o d e p e r c e b e r p o r m a i o r vigilância q u e haja n a
sua averiguação, é m a i o r a q u e b r a e diminuição, e assim, *verbigratia, c e m " a r r o b a s
d e o u r o e m p ó d a c a p i t a ç ã o n ã o são mais q u e n o v e n t a e sete, q u a n d o m u i t o , e
Cem a r r o b a s de o u r o das casas d e fundição são as m e s m a s c e m a r r o b a s , sem d i m i -
n u i ç ã o d e m e i a "oitava, p o r q u e nas ditas casas se c o b r a m os q u i n t o s d o o u r o
depois d e fundido e a p u r a d o , c o m o m a n d a a lei d o R e i n o . À vista desta infalível
v e r d a d e , se deve fazer u m a g r a n d e reflexão na diferença q u e h á e n t r e u m e o u t r o
rendimento.

132 E se S u a Majestade c o m m a i o r clareza quisesse saber o r e n d i m e n t o q u e


p e r d e de seus reais quintos c o m a existência d a capitação, o p o d i a averiguar s e m
dificuldade, p o r q u e m a n d a n d o vir u m a relação das casas d a m o e d a do R i o d e J a n e i -
ro, B a h i a e P e r n a m b u c o de t o d o o ouro q u e e m c a d a u m a n o v e m e m o u r o e m p ó nas
três "frotas do R i o , B a h i a e P e r n a m b u c o , a j u n t a n d o a estas relações o n ú m e r o das
a r r o b a s d o r e n d i m e n t o d a capitação e feita a c o n t a a i m p o r t â n c i a d o referido o u r o
t o d o q u e sai das M i n a s e m c a d a u m a n o , teria S u a M a j e s t a d e a certeza da g r a n d e
d i m i n u i ç ã o q u e t e m nos seus reais quintos, a d v e r t i n d o q u e se continuasse a existência
das casas de fundição, c o m a vigilância de se evitar a extração do o u r o e m p ó , t o d o ia
p a r a r às ditas casas, e nelas se c o b r a v a m os quintos sem d i m i n u i ç ã o a l g u m a , o q u e se
p r o v a c o m a experiência do r e n d i m e n t o delas e m u m a n o e do acréscimo q u e t i v e r a m
nos três meses q u e mais l a b o r a r a m .
133 B e m vejo q u e m e p o d e r ã o dizer q u e n a largueza e vastidão das M i n a s , p o r [ fl. 240v. ]
m a i o r q u e seja o c u i d a d o e a v i g i l â n c i a , se n ã ó p o d e m e v i t a r d e t o d o os
"descaminhos d o o u r o e m p ó . C o n c e d o q u e assim seja, a i n d a q u e nesta p a r t e n ã o
faz a r g u m e n t o n e m p r o v a a g r a n d e d e v a s s i d ã o e l i b e r d a d e c o m q u e nos a n o s
antecedentes se c o m e t i a m os descaminhos, p o r q u e p a r a estes c o n c o r r i a a p e r m i s -
são e c o n s e n t i m e n t o , e talvez o interesse dos m e s m o s q u e t i n h a m p o r o b r i g a ç ã o
evitá-los, e assim será e m q u a l q u e r ministério ou e m q u a l q u e r f o r m a d e c o b r a n ç a
se n ã o h o u v e r fidelidade nos q u e servem a Sua M a j e s t a d e , p o r q u e e m t u d o o dito
s e n h o r h á de e x p e r i m e n t a r os m e s m o s prejuízos.
134 E u q u e r o q u e s t i o n a r se n o a n o e m q u e existiram as casas de fundição
h o u v e descaminhos de o u r o e m p ó p a r a fora das M i n a s , a i n d a q u e p u d e r a afirmar
q u e se os h o u v e f o r a m m u i t o limitados, p o r q u e c a d a vez ia m o s t r a n d o m a i s a
experiência os meios d e os evitar c o m suavidade. M a s p o n d o d e p a r t e esta ques-
t ã o , n ã o se m e p o d e n e g a r q u e foi m a i o r o r e n d i m e n t o das casas d e fundição do
q u e o d a c a p i t a ç ã o , e assim quisera q u e m e r e s p o n d e s s e m à esta p e r g u n t a : q u a l é
mais c o n v e n i e n t e a Sua Majestade: ter u m g r a n d e r e n d i m e n t o d e quintos, a i n d a
q u e haja d e s c a m i n h o s , ou tê-lo c o m g r a n d e diminuição, s e m os ditos descaminhos?
502

A i n d a m e n ã o explico b e m : q u a l será mais ajustado c o m as leis divinas e h u m a n a s


e m a i s conveniente a o serviço d e D e u s e a o serviço real: u s a r d e u m arbítrio, a i n d a
q u e s e m " d e s c a m i n h o s , cujo r e n d i m e n t o é m u i t o inferior e c o n t é m e m si m e s m o
m a t é r i a d e restituição e muitos encargos de consciência, ou d e s p r e z a r o u t r o , a i n d a
q u e c o m descaminhos, c o m m u i t o m a i o r r e n d i m e n t o e nele s e m g ê n e r o a l g u m d e
escrúpulo n e m d e restituição? É supérfluo ventilar a resposta, p o r q u e se n ã o p o d e
n e g a r q u a l deve ser.
135 Q u e o arbítrio d a "capitação seja de m a i s inferior r e n d i m e n t o , está m o s -
[ fl. 241 ] t r a d o ; q u e seja m a t é r i a / / d e restituição p a g a r e m uns o q u e n ã o d e v e m e outros
mais do q u e d e v e m , n ã o se p o d e negar; q u e seja encargos de. consciência, c o n d e -
n a ç õ e s injustas, confiscações sem culpa, extermínios s e m delito, t a m b é m se n ã o
p o d e d u v i d a r ; que, seja erro manifesto estabelecer e conservar u m arbítrio cujos
efeitos se e n c a m i n h a m a u m a total destruição das M i n a s e a u m a n o t ó r i a d e c a d ê n -
cia dos reais "quintos, t a m b é m n ã o p a d e c e dúvida, p o r q u e o p r o v a a experiência
e o h á de confirmar o decurso do t e m p o , talvez j ã sem r e m é d i o .
136 Q u e o a r b í t r i o das "casas d e f u n d i ç ã o , a i n d a q u e c o m d e s c a m i n h o s ,
fosse m a i o r o seu r e n d i m e n t o , está p r o v a d o ; q u e c a d a vez havia d e crescer m a i s ,
assim o m o s t r o u a experiência; q u e n o dito r e n d i m e n t o n ã o h a v i a escrúpulo n e m
e n c a r g o de consciência, se justifica, p o r q u e nas ditas casas p a g a v a c a d a u m o q u e
devia p e l a lei; q u e esta c o b r a n ç a fosse suave aos povos, se confirma c o m c a d a u m
p a g a r q u a n d o devia, q u e era q u a n d o tinha ouro e m p ó ; q u e õs povos n ã o p a d e -
c i a m violências n e m opressões c o m a referida c o b r a n ç a , se justifica,, p o r q u e só
havia o p r o c e d i m e n t o de se "devassar de ladrões e castigar estes é virtude.
;

137 E preciso desvanecer e r e s p o n d e r a u m f u n d a m e n t o q u i m é r i c o c o m q u e m e


p o d e m argüir dizendo-se-me q u e n o t e m p o e m q u e existiam as casas d e fundição,
e s t a n d o M a r t i n h o d e M e n d o n ç a n a s M i n a s e os m a i s " m i n i s t r o s q u e S u a M a -
j e s t a d e m a n d o u , h o u v e infinitas "devassas d e d e s c a m i n h o s d e o u r o e fábricas
d e b a r r a s e m o e d a falsa e m u i t a s prisões e confiscos. M a s t u d o isto t e m fácil
r e s p o s t a e v e m a ser q u e as ditas devassas e m a i s p r o c e d i m e n t o s q u e h o u v e ,
t u d o foi d o s d e s c a m i n h o s , furtos e delitos dos a n o s a n t e c e d e n t e s , dos q u a i s
m a n d o u S u a M a j e s t a d e j por. o r d e m s u a , d e v a s s a r . E , f i n a l m e n t e , a i n d a que.
n a e x i s t ê n c i a das casas d e f u n d i ç ã o se c o m e t e s s e m a l g u n s dos referidos deli-
[ fl. 241v. ] tos, deve ponderar-se / / que nesta Corte, o n d e h á u m a "relação, tribunais,
m i n i s t r o s e u m t ã o g r a n d e n ú m e r o de "oficiais de J u s t i ç a , n e m p o r isso d e i x a m de
c o n t i n u a r delitos, furtos e d e s c a m i n h o s . M a s o r e m é d i o destes é e foi s e m p r e
c a s t i g a r e m - s e os d e l i n q ü e n t e s , e n ã o p e r v e r t e r e m - s e os p r o c e d i m e n t o s das leis
c o n t r a os inocentes.
138 F i n a l m e n t e , p a r e c e - m e q u e t e n h o m o s t r a d o a q u a l i d a d e d o t r i b u t o d a
capitação e forma c o m q u e se estabeleceu e os efeitos q u e p r o d u z i u , e se c o n t r a a
v e r d a d e d o q u e está e x p e n d i d o h o u v e r a m e n o r dúvida eu a n ã o terei e m respon-
d e r a ela incontinenti.
503

139 E s t a m o s chegados a o t e m p o e m que, pelas notícias q u e v ê m nas 'frotas,


m o s t r a a e x p e r i ê n c i a j á verificadas as l a s t i m o s a s c o n s e q ü ê n c i a s d o t r i b u t o d a
"capitação. Acha-se o c o m é r c i o do R i o de J a n e i r o e m u m a total d e c a d ê n c i a , e m -
p a t a d a a v e n d a è saída das fazendas, p o r q u e os m e r c a d o r e s existentes nas M i n a s ,
q u e todos v e n d e m os seus gêneros fiados, se lhes i m p e d e m as suas c o b r a n ç a s c o m
o r d e n s d o " g o v e r n a d o r , pelas quais se lhes n ã o p e r m i t e executar pessoa a l g u m a ,
p a r a q u e as c o b r a n ç a s d a capitação n ã o t e n h a m falência.
140 I m p e d i d o s , nesta forma, os ditos m e r c a d o r e s das M i n a s , c o m o n ã o p o -
d e m c o b r a r os p r o d u t o s das fazendas q u e v e n d e r a m , ficam impossibilitados p a r a
v i r e m ao R i o d e J a n e i r o a p a g a r o q u e d e v e m aos m e r c a d o r e s d a q u e l a cidade e
levar novas carregações d e fazendas p a r a as M i n a s , d e q u e se s e g u e m ficarem estes
c o m p gravíssimo d a n o d a p e r d a das suas c o b r a n ç a s é c o m o irreparável prejuízo
dos lucros cessantes d a suspensão e m q u e fica o seu comércio.
141 C o m o referido e m p a t e dos m e r c a d o r e s das M i n a s se segue a r u í n a dos d o
R i o d e J a n e i r o , p o r q u e faltando a estes a c o r r e s p o n d ê n c i a dos p a g a m e n t o s das fazen-
das q u e foram p a r a as M i n a s , faltam i g u a l m e n t e as remessas q u e d e v e m fazer p a r a
esta C o r t e . N e s t a se h ã o de p a d e c e r iguais prejuízos p o r serem c o n s e q ü ê n c i a q u e
todas t r a z e m a sua origem da suspensão e decadência do comércio das M i n a s , pois só
p a r a as suas dilatadas povoações é q u e p o d e m ter c o n s u m o os m u i t o s milhões de
fazendas q u e vão p a r a o R i o de J a n e i r o .
Í1421 T a m b é m se d e v e m p o n d e r a r os prejuízos q u e h á d e h a v e r nos "contra- [ fl. 242 ]
tos das e n t r a d a s das M i n a s , no d a dízima da Alfandega d o R i o de J a n e i r o e n o d a
s a í d a d o C o n s u l a d o desta C o r t e , p o r q u e , c o m o o r e n d i m e n t o deles d e p e n d e d a
freqüência do comércio das M i n a s , e este se a c h a c o m a d e c a d ê n c i a q u e é n o t ó r i a
p o r causa d a c a p i t a ç ã o , é infalível o a b a t i m e n t o q u e h ã o d e ter as futuras r e m a t a ç õ e s ,
c o m o b r e v e m e n t e m o s t r a r á a experiência e se verifica j á pelas g r a n d e s p e r d a s d e
q u e os " c o n t r a t a d o r e s se q u e i x a m .
143 U l t i m a m e n t e , p a r a desengano dos prejuízos q u e a Sua Majestade resultam
do estabelecimento da capitação, p o n d e r e m o s a utilidade q u e o dito s e n h o r teve agora
no novo descobrimento das minas do Paracatu, distrito d a c o m a r c a do Sabará. D i z e m
pessoas q u e lá se a c h a r a m q u e nas ditas minas se extraiu ouro c o m tanta a b u n d â n c i a
que n o decurso d e u m a n o passou d e oitocentas "arrobas; destas, pelos "quintos d a
lei, p e r t e n c i a m a Sua Majestade cento e sessenta arrobas. A g o r a p e r g u n t o se será
possível acreditar-se q u e o dito senhor n ã o teve r e n d i m e n t o algum d a referida extra-
ção de ouro. E u o mostro e provo clarissimamente. T o d o s os mineiros q u e concor-
r e r a m p a r a o dito descobrimento c o m os seus escravos haviam de ser m o r a d o r e s dos
que existiam nas Minas, f o r q u e e m h a v e n d o notícia de a l g u m npvo descobrimento
c o m fama de m u i t o ouro a cobiça dele m o v e logo os ânimos daqueles habitadores
a i r e m b u s c a r a sua m a i o r conveniência. Estes, levando consigo os seus escravos,
h a v i a m de p a g a r a capitação deles no distrito do novo descobrimento, e esta impor-
tância havia d e diminuir-se nas partes ou nas intendências de cujos distritos saíram
504

estes mineiros, e assim é s e m dúvida q u e p a r a a R e a l F a z e n d a d e S u a Majestade


ficou este d e s c o b r i m e n t o c o m o se o n ã o h o u v e r a , p o r q u e dele lhe n ã o r e s u l t o u
acréscimo algum n o r e n d i m e n t o d a "capitação, e p o r causa desta v e m Sua Majesta-
d e a p e r d e r , só n a q u e l a parte, cento e sessenta "arrobas d e "quintos, q u e são mais
d e dois milhões e quase dois e meio, dos quais lhe t o c a v a m oitocentas arrobas d e
o u r o q u e se e x t r a í r a m . E a i n d a q u e fosse m u i t o m e n o s , s e m p r e S u a M a j e s t a d e
p e r d e u os quintos do o u r o q u e se tirou e n ã o teve maior r e n d i m e n t o n a capitação,
p o r q u e a q u e se havia de p a g a r em u m a p a r t e se p a g o u e m o u t r a p o r ser tributo
r

[ fl. 242v. ] pessoal imposto / / nos escravos q u e se p a g a o n d e residem.


144 P a r a p r o v a do q u e digo no parágrafo 23 sobre, a disparidade q u e se origi-
n a d a capitação de p a g a r e m alguns mineiros ricos muito menos do q u e devem a Sua
Majestade pela lei, o q u e r o m o s t r a r c o m especialidade sucedido neste n o v o desco-
b r i m e n t o das minas do Paracatu. Entre os mineiros q u e nelas estiveram m i n e r a n d o
foram uns c h a m a d o s *N-N. Caldeira, ^ do Rio das Mortes, dos quais se afirma q u e
e m breve t e m p o t i r a r a m sessenta arrobas de. ouro. Destas, p e r t e n c i a m a Sua Majes-
tade, d e quintos p e l a lei^ doze arrobas d e o u r o , as quais, r e p u t a d a s pelo valor d e
quinze "tostões a "oitava, i m p o r t a m a dinheiro cento e oitenta e quatro, mil trezen-
tos e vinte "cruzados, o u setenta e três "contos, setecentos e vinte e oito mil "réis,
q u e é o m e s m o . Agora, vejamos a quantia c o m q u e p a g a r a m a Sua Majestade pela
" c a p i t a ç ã o : s u p o n h a m o s q u e [os] sujeitos m i n e r a v a m c o m c e m n e g r o s , q u e é o
m a i o r n ú m e r o q u e p o d i a m ter; destes, pelo t r i b u t o a n u a l d a c a p i t a ç ã o , d e v i a m
p a g a r p o r c a d a u m q u a t r o oitavas e três quartos de ouro, q u e nos c e m i m p o r t a m e m
c a d a u m a n o quatrocentos e setenta e cinco oitavas, q u e reduzidas a dinheiro são
Setecentos e doze mil e quinhentos réis; e c o m esta q u a n t i a q u e p a g a r a m ficaram
indevidamente l u c r a n d o cento e oitenta e dois mil e tantos cruzados pertencentes à
R e a l F a z e n d a de S u a Majestade; j u s t a m e n t e p o r q u e são quintos d o ouro q u e extra-
í r a m se n ã o h o u v e r a capitação. Finalmente, são incompreensíveis os prejuízos q u e
Sua Majestade recebe c o m o estabelecimento d a capitação, e tenho p o r sem dúvida
q u e lhe n ã o são notórios p o r q u e se c o m individuação se lhe manifestasse a v e r d a d e
n ã o deixaria d e d a r providência ao lastimoso estado das M i n a s e à ruína e decadên-
cia de seus reais quintos, q u e t u d o está m o s t r a n d o j á a experiência e o verifica a
diminuição do r e n d i m e n t o deles, e quanto mais se lhe dilatar o r e m é d i o mais cres-
cerão os prejuízos, advertindo q u e n o dilatado "país das M i n a s , a c a d a passo, p o -
d e m haver novos descobrimentos semelhantes aos d o Paracatu, e e m todos d u r a n d o
a capitação terá Sua Majestade a referida p e r d a nos seus reais quintos.

Desembargador T o m é Gomes Moreira.

Felisberto Caldeira Brant e Francisco Caldeira Brant.


505

• 54 «

[Carta do Senado da Câmara de Mariana sobre representação


contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]

Carta cios camaristas de Mariana informando aos de Vila


Rica o conteúdo de representação à Coroa contra a lei de 3 de
dezembro de 1750 que restabeleceu as casas de fundição em Mi-
nas Gerais. Embora referendassem a criação de casas de fundição,
divergiam n a forma de seu funcionamento e apresentavam alter-
nativa centrada em medidas contra o descaminho do ouro e de
restrição a sua circulação em pó e n a criação de moeda provincial.
O encaminhamento de representação contendo alternativa
ao sistema das casas de fundição ou corrigindo-o parcialmente pelo
governador e procuradores dos habitantes de Minas Gerais foi
facultado pelo capítulo 1 l da referida lei e desencadeou u m m o -
e

vimento de troca de correspondência entre as diversas câmaras,


centralizado por Vila Rica, com o argumento de garantir unifor-
midade nas solicitações. Destaque-se que a proposta d e Vila Rica
coadunava-se com a de postulantes a contratadores dos quintos.
Apesar disto, é possível divisar interesses e divergências regionais
nas r e p r e s e n t a ç õ e s e f e t i v a m e n t e e n c a m i n h a d a s à C o r o a .
Complementa os documentos 55 a 62.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir o original autógrafo e participar dos debates
dos camaristas e homens bons. Este documento informaria, ain-
da, sua participação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Senado da C â m a r a de Mariana;
Mariana; 21.4.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado da C â m a r a de Vila Rica.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Parecer em forma epistolar que ar-
gumenta em favor do restabelecimento do sistema de casas de fun-
dição para a arrecadação do quinto e que define normas para seu
funcionamento. Aplicação da tópica dos danos inerentes ao siste-
m a da capitação. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita m o d e r n a cursiva, do-
cumental do século XVIII, destrógrada. T e m as hastes inferio-
res em traço simples ou com perfil, o "d'* minúsculo uncial ou de
haste retilínea simples, " s " final em forma de zeta, pontos de fuga
prolongados em traços curvos ascendentes ou descendentes. Ca-
pitulares no título e início do texto. Assinaturas autografas. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, C M M 18, fl. 61v.-63.
A H U , Cons. Ultramarino, Brasil/MG, cx. 58, doe. 25.
506

[ fl. 2 4 3 ] S e n h o r e s do S e n a d o :

Agradecemos a Vossas Mercês a atenção de nos participarem o louvável zelo


do b e m público c o m q u e i n t e n t a m representar a Sua Majestade os grandes prejuí-
zos q u e se seguiram d a prática da Lei Novíssima d a Fundição, unida c o m o gravíssimo
ônus d a " d e r r a m a . E satisfazendo c o m o p a r e c e r q u e Vossas M e r c ê s nos p e d e m ,
assentamos expor ao m e s m o senhor que, c o m o a sereníssima Majestade d o s e n h o r
d o m J o ã o , o q u i n t o , de e t e r n a m e m ó r i a , n ã o foi servido aceitar a p r o m e s s a dos
povos do a n o d e 1734 — antes elegeu õ m é t o d o da "capitação q u e até aqui durou,
p a r e c e q u e p o r direito divino e positivo, c o m u m e do R e i n o —, n ã o estão os p o v o s
obrigados à dita promessa e menos depois d e exauridos do que possuíam c o m dezesseis
anos d a dita capitação.
É sim justíssimo q u e Sua Majestade restabeleça as suas reaís "casas d e fundi-
ç ã o , m a s sem i m p o r a seus vassalos a obrigação de lhe s e g u r a r e m as c e m *arrobas
pelo c o n t r a t o , q u e n ã o teve efeito n e m aceitação, n e m compelir a d a r e m - l h e con-
ta certa, pois, c o n f o r m e o direito e n a t u r e z a d a dívida, s o m e n t e são obrigados os
povos a p a g a r [a] S u a M a j e s t a d e dois d e c a d a dez, u m d e "dízimo e o u t r o pelo
r e c o n h e c i m e n t o d o senhorio. E assim d e v i d a m e n t e constituirá o m e s m o s e n h o r as
suas casas d e fundição p a r a q u e nelas se lhe satisfaçam os seus reais "quintos d e
t o d o o o u r o q u e nelas entrar, p o r q u e de. o u t r a sorte n ã o é q u i n t o m a s sim tributo,
[ fl. 243v. ] d e q u e Sua Majestade, p o r sua real g r a n d e z a , n ã o deve / / eximir. E p o r isto nos
n ã o a c o m o d a m o s a o arbítrio d e se s e g u r a r e m as c e m a r r o b a s n a s " e n t r a d a s e
o u t r o s "efeitos, p o r q u e a l é m d e ser t a m b é m falível t o d a a q u e l a firmeza q u e se
cuida d a r p o r este meio a o real q u i n t o d e S u a M a j e s t a d e , d e v e m o s c l a m a r n o foro
d a consciência c o n t r a o c ô m p u t o certo q u e se nos p e d e , pois h á d e vir t e m p o q u e
e m toda esta capitania se n ã o tirem c e m a r r o b a s d e ouro, s e g u n d o a decadência
q u e se e x p e r i m e n t a , as terras revolvidas e os rios i n t e i r a m e n t e t r a b a l h a d o s , e sem-
p r e os gêneros h ã o de ficar n o m a i o r a u g e d a carestia, p a g a n d o - s e neles p e r p e t u -
a m e n t e u m indevido tributo e m lugar do quinto do o u r o q u e se n ã o extrair.
P a r a se v e d a r e m os "descaminhos q u e possa h a v e r do o u r o e m p ó , n o s p a r e -
ce q u e são p r o p o r c i o n a d o s os meios de q u e se c o m p õ e m os capítulos seguintes,
além d e outros q u e se a p o n t a r e m , mais p r ó p r i o s e concludentes.
Estabelecerá S u a Majestade casa d a m o e d a e fundição nesta c o m a r c a e nas
mais só d e fundição.
I t e m , m a n d a r á o dito s e n h o r m e t e r nestas M i n a s u m m i l h ã o d e " m o e d a p r o -
vincial e m p r a t a e duzentos mil "cruzados e m c o b r e , e q u a n d o n ã o seja b a s t a n t e
as c â m a r a s p e d i r ã o as de q u e se necessitar.
I t e m , n ã o c o r r e r á a m o e d a do R i o de J a n e i r o .
I t e m , a p r a t a n o m e a d a n a m o e d a seguinte: 6 0 0 "réis, 300 réis, 150 réis; o
[ fl. 2 4 4 ] c o b r e , 20 réis, 10 réis, / / respeitando a "oitava a 1.200 réis.
I t e m , n ã o c o r r e r á o u r o e m p ó de n e n h u m a q u a l i d a d e , exceto os m i n e i r o s ,
q u e o p o d e r ã o ter e m suas casas.
507

I t e m , n ã o p a g a r ã o os mineiros a seus credores e m o u r o e m p ó , n e m os c r e d o -


res o r e c e b e r ã o de seus devedores, c o m as p e n a s q u e a S u a Majestade p a r e c e r .
I t e m , q u e n e n h u m m i n e i r o p o d e r á reter e m si o o u r o q u e tirar mais t e m p o
q u e o de seis meses, c o m p e n a s d e o p e r d e r sendo-lhe a c h a d o .
Item, q u e n ã o h a v e r á balanças d e pesar ouro e m todas as M i n a s e m n e n h u m
g ê n e r o de negócio, e m u i t o p r i n c i p a l m e n t e os "tratantes, q u e se c h a m a m m a s c a -
tes, e só sim os mineiros d o o u r o , p a r a o pesar e receber d e seus escravos.
Item, q u e h a v e r á e m todas as freguesias e arraiais h o m e n s b o n s e os d e m a i o r
conceito, eleitos pelas ' ' c â m a r a s , p a r a p o r eles se r e p a r t i r a dita " m o e d a provincial
c o n f o r m e o concurso da escravatura q u e h o u v e r n o seu distrito.
Item, q u e todos os escravos n ã o p o d e r ã o c o m p r a r c o m o u r o e m p ó , e só sim o
p o d e r ã o trocar nos arraiais o n d e h o u v e r a dita m o e d a .
Item, q u e t p d a a pessoa, d e q u a l q u e r q u a l i d a d e q u e seja, n ã o possa v e n d e r
g ê n e r o a l g u m aos escravos a troco de o u r o e m p ó , c o m p e n a d e p e r d e r o o u r o e m p ó
q u e se lhe a c h a r e as mais q u e S u a Majestade for servido impor.
Item, q u e nas ditas p e n a s n ã o serão c o m p r e e n d i d o s os escravos p e l a sua igno-
r â n c i a , n e m seus senhores.
Item, q u e / / toda a pessoa q u e se^ a c h a r c o m q u a l q u e r m o e d a provincial a [ fl. 244v. ]
levará à "casa d a m o e d a e fundição p a r a se t r o c a r e m m o e d a o u b a r r a , p a r a ficar
sujeito a o disposto n a lei, e assim t o r n a a dita m o e d a a recolher-se às reais casas e daí
às m ã o s dos "tesoureiros, p a r a a n d a r colhendo a si t o d o o o u r o m i ú d o dos escra-
vos, p a r a t o d o e n t r a r n a casa d a m o e d a e fundição.
I t e m , q u e os ditos tesoureiros q u e tiverem a m o e d a p r o v i n c i a l d a r ã o , p e l a
"oitava, a 1.200 [*réis], e a este respeito os pesos m i ú d o s .
Item, q u e os ditos tesoureiros, d e três e m três meses, irão d a r c o n t a dos ouros
t r o c a d o s n a real casa d a m o e d a ou fundição., h a v e n d o n e l a livros d e e n t r a d a e
saída, c o m títulos separados das freguesias e n o m e s dos tesoureiros, e estes p o d e r ã o
ter b a l a n ç a s aferidas e m suas casas p a r a r e c e b e r e m os ouros..
Item, q u e se n ã o p a g a r á ao "ensaiador d a casa d a m o e d a t a n t o d e ""ensaiar o
p o u c o ouro c o m o o m u i t o .
Item, i m p o r á Sua M a j e s t a d e graves p e n a s c o n t r a os traficantes d e trocar o u r o
c o m o p r e t e x t o d e o m e t e r e m n a casa, p o r q u e ã experiência m o s t r o u serem os m a i o -
res "passadores p o r alto, e s e m estes n ã o p o d e r ã o as casas falsas l a b o r a r .
I t e m , q u e isentará S u a Majestade os tesoureiros dos cargos do "concelho d e
serem soldados das " o r d e n a n ç a s / / d e p é ou d e cavalo, p r e m i a n d o - o s , sim, c o m [ fl. 2 4 5 J
as h o n r a s q u e for servido fazer-lhes.
I t e m , h a v e r á p a t r u l h a s d e d e z e m d e z "léguas, s e m q u e os "oficiais delas
d e t e r m i n e m p a r t e certa aos soldados q u a n d o estes suspeitem h a v e r "descaminhos
n o o u r o e m p ó , q u e e m tal caso d e v e m seguir a "tomadia.
Item, a todos os m o r a d o r e s do sertão, C a m i n h o N o v o e V e l h o n ã o só serão
p r e m i a d o s c o m m e t a d e d a t o m a d i a c o m o t a m b é m c o m h o n r a s e privilégios q u e
50.8

for servido, pois só estes são as verdadeiras "atalaias p a r a , p o r si e seus escravos,


vedarem o "descaminho do ouro em pó.
I t e m , q u e todos os "capitães das freguesias serão obrigados a saber e exami-
n a r q u a l q u e r d e s c a m i n h o de ouro q u e l e v a r e m os *comboÍeiros e mais "tratantes
n ã o indo e m direitura p a r a a "casa da m o e d a ou fundição, e sendo a c h a d o s e m
c a m i n h o contrário os p r e n d e r ã o c o m a " t o m a d i a p e r a n t e t e s t e m u n h a s e os leva-
r ã o presos p e r a n t e os "ministros c o m p e t e n t e s , c o m as p e n a s d e q u e o n ã o fazendo
assim d e s e r e m t i r a d o s dos seus postos e sujeitos, c o m o s o l d a d o s , aos c a p i t ã e s
n o v a m e n t e n o m e a d o s . E pelo c o n t r á r i o , e x e c u t a n d o ã s u a o b r i g a ç ã o , S u a Majes-
t a d e os habilitará e h o n r a r á c o m o p r ê m i o q u e m e r e c e r e m as suas diligências.
Item, q u e todos os comboieiros e mais tratantes q u a n d o saírem desta cidade,
[ fl. 245v. ] vilas e arraiais sejam obrigados a levar "guias dos capitães dos / / distritos d e o n d e
saíram, declarando-se nelas p a r a o n d e fazem viagem, l e v a n d o as ditas guias feitas,
q u e n ã o t e n h a o dito capitão mais t r a b a l h o q u e assiná-las.
I t e m , q u ê S u a M a j e s t a d e p r e m i a r á os seus l a v r a d o r e s do p u r o e roças q u e
t i v e r e m d e dez escravos p a r a cima, seus p r ó p r i o s , e se p a r e c e r s e r e m p o u c o s os
escravos p a r a o dito privilégio — m u i t o s m i n e i r o s , n o p r i n c í p i o d a " c a p i t a ç ã o ,
q u e p o s s u í a m c e m e mais escravos hoje m a l se a c h a m c o m dez, p o r m o r r e r e m
u n s e outros se r e m a t a r e m e m p r a ç a s pelas suas dívidas e m u i t o s q u e a n d a m e m
c ó r r e g o s c o m serviço a "talho a b e r t o —, a i n d a q u e n ã o c h e g u e m a este n ú m e r o ,
g o z a r ã o d o privilégio, q u e d e v e m o s p e d i r a S u a M a j e s t a d e , c o n c e d i d o aos l a -
v r a d o r e s de c a n a dos p o r t o s do Brasil, q u e é o de n ã o s e r e m e x e c u t a d o s n a s suas
"fábricas, e s o m e n t e n a terça p a r t e de seus r e n d i m e n t o s , a t e n t a à g r a n d e cons-
t e r n a ç ã o e m q u e se a c h a m os ditos l a v r a d o r e s c o m as e x e c u ç õ e s q u e se lhes
fazem n a s fábricas, de sorte q u e j á hoje n ã o h á a terça p a r t e q u e h a v i a a l g u m
t e m p o , n e m m i n e i r o s q u e p o s s a m fazer serviço d e custo e m e n o s f a z e r e m desco-
b e r t o s , pois s e m estas diligências se n ã o p o d e extrair o u r o d a t e r r a p o r estar t u d o
[ flv 246 ] hoje r e d u z i d o a u m a p o b r e "faisqueira, p o r falta / / d e meios.

I t e m , caso n e g a d o , pudesse ter lugar a p r o m e s s a d e 1734, estão m u i t o dife-


rentes estas M i n a s d a q u e l e t e m p o , pois delas saíram muitos m i n e i r o s p a r a os des-
c o b e r t o s das M i n a s N o v a s , P a r a c a t u , G o i á s , T o c a n t i n s , M a t o G r o s s o e o u t r o s
m u i t o s , a l é m d a g r a n d e m o r t a n d a d e de escravos, q u e s e n ã o p o d e r ã o suprir, su-
p o s t a a m u i t a p o b r e z a e m q u e se a c h a m estes povos.
Estes nos p a r e c e m q u e são os m e i o s mais c o m p e t e n t e s p a r a a s e g u r a n ç a e
b o a a r r e c a d a ç ã o dos reais "quintos. S u p o s t o q u e d a p a r t e dos vassalos está so-
m e n t e p a g a r e m o q u e d e v e r e m e da p a r t e do s o b e r a n o e do seu alto e s u p r e m o
p o d e r o a r b i t r a r os castigos e p e n a s c o n t r a os t r a n s g r e s s o r e s d a s s u a s leis e
" d e s c a m i n h o s da sua R e a l F a z e n d a , m a s c o m o seus fiéis e zelosos vassalos lhe
d e v e m o s p o n d e r a r os meios q u e e n t e n d e r m o s mais convenientes p a r a o a u m e n t o
d o seu R e a l E r á r i o .
509

Vossas M e r c ê s , c o m os seus a c e r t a d o s e p r u d e n t í s s i m o s d i t a m e s , seguirão o


q u e for m a i s conforme a o serviço d e D e u s , d e S u a M a j e s t a d e e beneficio destes
povos. D e u s g u a r d e a Vossas M e r c ê s muitos anos. M a r i a n a , / / e m C â m a r a d e 21 [ fl. 246v. J
d e abril d e 1 7 5 1 .

D e Vossas Mercês,
os mais afetuosos v e n e r a d o r e s .

Francisco  n g e l o Leitão J o s é d a Silva Pontes Francisco d a M o t a d e le-Roi


J o ã o Ferreira A l m a d a M a n u e l Alves d a Neiva.

55
[Voto do Senado da Câmara de Sabará
para eleição de procuradores para representação contra a
Lei Novíssima das Casas de Fundição]

Voto dos camaristas de Sabará informando a eleição de


procuradores p a r a o encaminhamento de representação ao rei
contra a lei de 3 de dezembro de 1750 que restabeleceu as casas
de fundição em Minas Gerais e solicitando a remessa da mesma
carta à C â m a r a de São J o ã o del-Rei.
O encaminhamento de representação contendo alternativa
ao sistema das casas de fundição ou corrigindo-o parcialmente
pelo governador e procuradores dos habitantes de Minas Gerais
foi facultado pelo capítulo 11 d a referida lei e desencadeou u m
movimento de troca de correspondência entre as diversas câma-
ras, centralizado por Vila Rica, com o argumento de garantir:
uniformidade nas solicitações. Destaque-se que a proposta de
Vila Rica coadunava-se com a de postulantes a contratadores
dos quintos. Apesar disto, é possível divisar interesses e divergên-
cias regionais nas representações efetivamente encaminhadas à
Coroa. Complementa os documentos 54 e 56 a 62.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir o original autógrafo e participar dos deba-
tes dos camaristas e homens bons. Este documento informaria,
ainda, sua participação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Senado da C â m a r a de Vila Real
de Sabará; Sabará; 5.4.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado da C â m a r a de Vila Rica.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva do-
cumental do século XVIII, destrógrada, no texto principal. Des-
pacho em m a r g e m esquerda, com letra diferente, em módulo
maior, mais regularizada e caligrafada. Assinaturas autografas.
(YDL)

[ 11. 247 ] S e n h o r e s do S e n a d o :

A h o n r a q u e Vossas M e r c ê s nos t ê m m o s t r a d o nos c o n v i d a a e n v i a r m o s o


nosso eleito v o t o , q u e n ã o difere d ó d e Vossas M e r c ê s , e j u n t a m e n t e , c o m o é
justo q u e n a C o r t e façamos p r o c u r a d o r e s , d a m o s p a r t e a Vossas M e r c ê s de q u e
temos feito eleição no r e v e r e n d o d o u t o r M a n u e l Freire Batalha, n o d o u t o r F r a n -
cisco X a v i e r R a m o s , n o r e v e r e n d o d o u t o r J o s é dos R e i s , e m J o ã o R o d r i g u e s
M o r e i r a e M a n u e l d e Passos Dias, e p a r a p r ê m i o deles t e m os nossos "comarcões
c o n c o r r i d o conforme os seus escravos, d a n d o p o r c a d a escravo u m "vintém; e n o
caso q u e Vossas M e r c ê s se n ã o ajustem c o m n o m e a r os m e s m o s , será p r e c i s o
r e c o m e n d a r aos seus q u e c o m u n i q u e m c o m os nossos, d e sorte q u e se n ã o encon-
t r e m nos r e q u e r i m e n t o s e informações. Ficamos p a r a servir a Vossas M e r c ê s , q u e
D e u s g u a r d e m u i t o s anos. Vila Real do S a b a r á e m C â m a r a a 5 d e abril d e 1751.

D e Vossas M e r c ê s ,
maiores veneradores e criados. 3

A n t ô n i o d e A m o r i m Soares Veríssimo F e r r e i r a M a r i n h o
J o s é B e r n a r d o d a Silveira J o ã o Pedro da C u n h a
José Ribeiro de Carvalho

Façam-nos Vossas Mercês a mercê enviar este maço para ó Rio das Mortes, com a melhor brevidade
que puderem, em ordem a conformarem-se conosco.
. 56 <

[Informação de homens bons acerca da


Lei Novíssima das Casas de Fundição]

Informação de homens bons de Vila Rica sobre a melhor


forma de arrecadação do quinto, por solicitação do Senado da
Câmara, para a obtenção de subsídios para representação à C o -
roa contra a lei de 3 de dezembro de 1750 que restabeleceu as
casas de fundição em Minas, procedimento usual e m tais situa-
ções. A proposta centra-se na defesa das casas de fundição, n a
associação da capitação com decadência econômica e crise n a
mineração, no rigor a ser imposto aos desencarninhadores de ouro
e na sua valoração pelo toque.
O encaminhamento de representação contendo alternativa
ao sistema das casas de fundição ou çorrigindo-o parcialmente
pelo governador e procuradores dos habitantes de Minas Gerais
foi facultado pelo capítulo 11 da referida lei e desencadeou u m
movimento de troca de correspondência entre as diversas câma-
ras, centralizado por Vila Rica, com o argumento de garantir
uniformidade nas solicitações. Destaque-se que a proposta de
Vila Rica coadunava-se com a de postulantes a contratadores do
quinto do ouro. Apesar disto, é possível divisar interesses e diver-
gências regionais nas representações encaminhadas à C o r o a .
Complementa os documentos 54, 55 e 57 a 62.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir a cópia do documento e participar dos de-
bates dos camaristas e homens bons; informaria, ainda, sua par-
ticipação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Antônio Ramos dos Reis, Manuel
Ferreira Agrelos, Antônio Francisco França, Domingos de Abreu
Lisboa, Manuel Dias d a Costa, Alexandre da C u n h a e Matos;
Vila Rica; 3.4.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado d a C â m a r a de Vila Rica.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Informação em forma epistolar
que argumenta e m favor do restabelecimento do sistema de ca-
sas de fundição para arrecadação do quinto. Compreende exórdio
(parágrafo 1), histórico do sistema de capitação e defesa das
casas de fundição (com suas normas de funcionamento). Aplica-
auLtr.TraoA «9 ção das tópicas: do " e m p e n h o " e empobrecimento dos mineiros
e de sua importância decisiva na produção das riquezas coloni-
ais; dos danos inerentes ao sistema da capitação; da importân-
cia central dos mineiros na produção das riquezas coloniais. J P í )
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , tipo bas-
512

tarda italiana do século XVIII, redonda e bastante regularizada


é caligrafada. C o m capitulares de laçadas e volutas amplas; " d "
uncia! terminando em meia voluta; " h " em forma de " E " redon-
do. (YDL)

[ fl. 248 ] S e n h o r e s do S e n a d o ;

S o m o s o b r i g a d o s , e m c u m p r i m e n t o do m a n d a d o d e Vossas M e r c ê s , a dis-
c o r r e r os meios q u e p a r e c e r e m mais a d e q u a d o s , n a c o n j u n t u r a p r e s e n t e , p a r a se
e x e c u t a r c o m ã m a i o r s u a v i d a d e o sistema e s t a b e l e c i d o n a L e i N o v í s s i m a das
F u n d i ç õ e s , e a t e n t o ao b e n i g n o indulto de S u a M a j e s t a d e , q u e foi servido facul-
t a r - n o s n o capítulo 11 d a m e s m a lei, c o m o t a m b é m a d e t e r m i n a ç ã o de V o s s a s
M e r c ê s , c h e i a d o zelo d o b e m p ú b l i c o e utilidade do R e a l E r á r i o , a q u e todos
desejamos contribuir c o m o fiéis vassalos, aplicamos as m a i o r e s diligências p a r a o
e x a m e e a v e r i g u a ç ã o d e p o n t o t ã o dificultoso, E c o n s i d e r a n d o esta m a t é r i a u m
confuso labirinto, dele só p o d e r e m o s sair c o m a luz d a o b e d i ê n c i a e fio do zelo
c o m q u e nos e m p r e g a m o s n o serviço de S u a M a j e s t a d e e utilidade dos povos a
q u e m Vossas M e r c ê s , c o m o tutores, p r o c u r a m o r e m é d i o .
P a r a p o n d e r a ç ã o do estado p r e s e n t e , será preciso fazer reflexão e t r a z e r à
m e m ó r i a o p a s s a d o em q u e se e x p e r i m e n t o u v a r i e d a d e d e sistemas n a a r r e c a d a -
ção d o real "quinto, e m q u e s e m p r e houve m u d a n ç a s , p o r q u e o "país e q u a l i d a d e
do negócio dele n ã o p e r m i t e firmeza.
Principiou a contribuição dos quintos, p o r ajuste c o m as "câmaras, a p a g a r e m
•30 " a r r o b a s a n u a l m e n t e , p o r n ã o se p o d e r d a r neste país f o r m a r e g u l a r em q u e se
tirasse i n t e i r a m e n t e o quinto; e e m fevereiro de 1714 h o u v e o ajuste d e 30 a r r o b a s
p o r a n o , q u e se l a n ç a r a m pelos escravos n a repartição do q u e tocava a c a d a c â m a -
ra. E p o r q u e e r a m p o u c o s os escravos p a r a tão g r a n d e impostura, se v a l e r a m d e
l a n ç a r nas "entradas dos c a m i n h o s u m t a n t o e m c a d a Carga das q u e e n t r a v a m p a r a
esta capitania, e assim se conservou até j a n e i r o de 1718, em q u e , n a e n t r a d a d o
g o v e r n o do c o n d e de Assumar, se l a n ç a r a m aos escravos 25 a r r o b a s , ficando livres
p a r a S u a M a j e s t a d e os c a m i n h o s , q u e , sendo i m p o s i ç ã o c o m q u e se c o n t r i b u í a
p a r a aliviar a dos escravos, se tirou aos povos, e convertendo-se e m "contrato p a r a
a C o r o a t e m c h e g a d o hoje a o r e n d i m e n t o d e 31 a r r o b a s a n u a l m e n t e . E a dos
escravos foi subindo, d e f o r m a que c h e g a r a m a p a g a r 37 a r r o b a s p o r a n o até o fim
d e 1724, e m q u e teve princípio e se estabeleceu a C a s a d e F u n d i ç ã o e M o e d a ,
c o m a q u a l t o d o s os b e m - i n t e n c i o n a d o s se satisfaziam, p o r ser a q u e l e o ú n i c o
m e i o d e p a g a r c a d a u m o q u e devesse. Utilizando-se do fruto d a C a s a da M o e d a ,
p o r q u e p a g a n d o - s e nela o o u r o p e l o " t o q u e c o n v i d a v a a m u i t o s a c o m p r a r e m
o u r o p a r a o r e d u z i r e m a m o e d a , e l u c r a n d o q u a n d o m e n o s u m "vintém e m cada
"oitava, faziam utilidade a o R e a l E r á r i o , c o m a u m e n t o seu. M a s c o m o n ã o h á
e s t a d o s e g u r o , e n t r a r a m a p e r t u r b a r e s t a b o a o r d e m e h a r m o n i a os " d e s -
c a m i n h a d o r e s d o o u r o e fabricadores de b a r r a s falsas, c a u s a n d o tão graves d a n o s
a o público n a geral c o m o ç ã o q u e h o u v e nesta capitania, sendo preciso o castigo
d a q u e l e s c u l p a d o s , m a s indispensável o p a r t i c i p a r e m dele os i n o c e n t e s , p o r q u e
u n s indiciados sem culpa, outros envolvidos e m negócios c o m os culpados e m u i -
tos p o r malévolos acusados, c h e g a r a m todos a e x p e r i m e n t a r ruínas, reduzindo-se
o *país, à q u a s e e x t e n s ã o , d e h o m e n s d e c r é d i t o , sem os quais se n ã o s u s t e n t a
negócio n e m se conserva "república a l g u m a .
N e s t e estado, a c h o u estes povos a p r i m e i r a notícia da "capitação n o a n o d e [ fl. 248v. ]
1734, e a i n d a q u e p a r e c i a m e n o s r i g o r o s a do q u e se e x p e r i m e n t o u fez u m tal
h o r r o r q u e obrigou os p o v o s à q u e l a p r o m e s s a de 100 "arrobas d e o u r o p o r u m
a n o , ficando livre p a r a S u a Majestade o acréscimo q u e h o u v e nas "casas d e fundi-
ção. L a b o r a r a m estas c o m felicidade, p o r q u e chegou seu r e n d i m e n t o a 136 a r r o b a s ,
e a i n d a assim n ã o foi aceita aquela promessa, q u e n o t e m p o p r e s e n t e se n ã o p o d e
sustentar. E p a r a se verificar esta b e m fundada dúvida, seja-nos lícito p o n d e r a r a
diferença de t e m p o a t e m p o e o sistema e m q u e d e p r e s e n t e se a c h a este país, n o
q u a l é m o r a l m e n t e impossível a s e g u r a n ç a das 100 a r r o b a s .
C o n s t a v a este p o v o d e m u i t o m a i o r n ú m e r o d e escravos q u e m i n e r a v a m ; e r a m
os "jornais m u i t o a v a n t a j a d o s aos q u e a g o r a se r e c e b e m , p o r q u e j á h á m u i t o s
mineiros, e a m a i o r p a r t e deles q u e se c o n t e n t a m c o m q u a t r o "vinténs de o u r o p o r
u m escravo e m c a d a dia. N ã o e n t r a m os escravos dos p o r t o s d e m a r , p o r q u e este
negócio se t e m e n c a m i n h a d o p a r a as m i n a s d e Goiás e outras do sertão, e m q u e
h á m a i o r fertilidade d e o u r o , e t e m sido tal a d e c a d ê n c i a q u e n ã o e n t r a a q u i n t a
p a r t e dos q u e e n t r a v a m e m outro t e m p o , p o r q u e t e m havido a m e s m a nas lavras
desta capitania, pois a l g u m o u r o que se tira ou é e m lavras velhas, lavradas duas e
três vezes, ou e m m o n t e s , c o m tal dificuldade q u e se n ã o c o n s e g u e serviços d e
m i n a s ou lavras sem despesa de m u i t o s anos; e nesta d e c a d ê n c i a , q u e é n o t ó r i a ,
s e m p r e t e m a m a i o r p a r t e os mineiros, p e l a evidente razão de n ã o h a v e r neste país
g é n e r o a l g u m q u e saia p a r a fora mais do q u e o u r o , e da m ã o do m i n e i r o , depois
de extraído c o m t a n t o t r a b a l h o , passa p a r a a dos "comboieiros d e escravos, m e r -
cadores de f a z e n d a s , "oficiais mecânicos, materiais p a r a as "fábricas e outras des-
pesas, d e sorte q u e n e n h u m do país se utiliza mais q u e d a sustança d o m i n e i r o ,
q u e p r o p r i a m e n t e c o m o nervos deste c o r p o o sustentam e a n i m a m .

N o t e m p o e m que se fez a q u e l a p r o m e s s a era livre a c o m a r c a do S e r r o do


Frio, e m q u e se tirava o u r o mais avultado do q u e e m q u a l q u e r das outras, p o r se
a c h a r m e n o s lavrada, e hoje, pela proibição e "contrato dos d i a m a n t e s , i m p e d i d a .
D e Goiás vinha m u i t o o u r o p a r a esta capitania, pela c o m u n i c a ç ã o q u e h a v i a d e
n e g ó c i o ; afiançava-se mais a p r o m e s s a das 100 a r r o b a s nas g u a r d a s q u e h a v i a
n a q u e l e t e m p o nos "registros e c a m i n h o s , esperando-se q u e n ã o só se conservas-
s e m estas m a s q u e se prevenissem m a i o r e s cautelas, q u e todas seriam d i m i n u t a s
p a r a se e v i t a r e m os muitos " d e s c a m i n h o s ; e, u l t i m a m e n t e , n ã o t i n h a m os povos
514

e x p e r i m e n t a d o o rigoroso j u g o d a *capitação q u e , rejeitada a q u e l a oferta das 100


" a r r o b a s , se estabeleceu n o a n o d e 1735, e no decurso de 17 anos t e m r e d u z i d o
estes p o v o s à i n c a p a c i d a d e de reintegrar aquela promessa, p o r q u e t e m despejado
m u i t o dos principais mineiros a viver nos portos do m a r , outros p a r a descobertos
novos, c o m o Goiás e minas d o sertão, q u e n ã o c o n t r i b u e m , p e l a distância e m q u e
estão, p a r a as ditas 100 a r r o b a s ; e c o m o nesta c a p i t a n i a e nas q u a t r o c o m a r c a s a
q u e c o m p r e e n d e a lei n ã o h á descobertos novos, n e m e s p e r a n ç a s de q u e se a u -
m e n t e a gente, m a s certeza m o r a l d e q u e se d i m i n u a , se faz totalmente impossível
q u e os p o v o s s e g u r e m as 100 a r r o b a s n a s " c a s a s d e f u n d i ç ã o , s u p o s t o s os
" d e s c a m i n h o s q u e são inevitáveis, p o r q u e neste sistema, a l é m d e outras contradi-
ções indissolúveis, obsta c o m o invencível o grave p r e j u í z o q u e e x p e r i m e n t a m os
[ fl. 249 ] p o v o s n a d i m i n u i ç ã o r e p e n t i n a de trezentos "réis / / e m c a d a "oitava d e o u r o ,
h a v e n d o de p a g a r forçosamente as dívidas vencidas e m ouro d e 1.200 réis, e este
p o n t o é tão digno d e p o n d e r a ç ã o q u e se deve refletir, e x a m i n a n d o as circunstân-
cias d e sua graveza c o m v e r d a d e incontestável.
T o d o s sabem q u e o sistema de negócio deste "país é muito diverso do q u e se
p r a t i c a e m o u t r a q u a l q u e r p a r t e , p o r q u e de q u a n t o s gêneros q u e nele e n c o n t r a m
n e n h u m se vende c o m ouro de contado, mas fiado p o r anos, d e tal sorte q u e do q u e
entra em u m a "frota se n ã o consegue líquido e m quatro e cinco anos, de q u e procede
estar se devendo ao negócio do Rio, Bahia e P e r n a m b u c o tanto cabedal que parece
impossível o pagar-se, o qual os moradores deste país t ê m e m p r e g a d o e m escravos,
materiais p a r a as "fábricas, vestuário e sustento. Estas dívidas, é forçoso pagá-las e m
puro de 1.200 réis, p o r q u e os credores n ã o têm obrigação de o receberem d e outro
m o d o , e p o r este infalível princípio o que se achar devendo quatro mil oitavas carece
de cinco mil p a r a pagar, e crescem sem remédio as dívidas.
E m 17 anos q u e d u r o u a "capitação ficaram todos exauridos, p o r q u e a desi-
g u a l d a d e d a q u e l a a r r e c a d a ç ã o e rigoroso m o d o de execução, m u l t a s e denúncias,
p a g a n d o o mineiro q u e n ã o tirava ouro e os escravos e escravas ocupados no preciso
serviço das casas e e m outros empregos sem lucro; os lavradores de víveres, p a g a n d o
dos escravos, a i n d a dos mais inúteis, lhes n ã o fica lucro p a r a p o d e r e m e m muitos
anos c o m p r a r u m escravo; os q u e h a v i a m têm envelhecido e dos p o r t o s d e m a r n ã o
v ê m , p o r q u e n ã o h á c o m q u e se c o m p r e m , e assim e m poucos anos se conhecerá a
última debilidade, e j á n o presente se a c h a reduzido este país a estado tão ínfimo
q u e n ã o p o d e r á este povo p o r m o d o a l g u m contribuir c o m " d e r r a m a , ficando o
o u r o e m p ó e m preço de mil e duzentos réis, que assim é antes de "quintado.
A vista das referidas ponderações, tendo excogitado o mais q u e foi possível o
m o d o de se m o d e r a r a lei e se utilize o R e a l Erário sem total destruição dos povos, e
valendo-nos de informações das pessoas mais inteligentes e espertas, no país, conclu-
ímos q u e n ã o h á m o d o mais justo p a r a Sua Majestade arrecadar o seu quinto do q u e
as casas de fundição. P o r é m , devem-se vedar os caminhos, de sorte que se evitem e
i m p e ç a m as muitas saídas q u e h á p a r a os portos de m a r e sertão, c o m duplicadas
guardas e cautelas, e aplicando-se c o m o maior rigor as penas da lei estabelecida, e
ainda a u m e n t a n d o as ditas penas tudo o possível p a r a q u e o justo t e m o r refreie os
515

atrevidos e cobiçosos do interesse de "desencaminharem ouro, p a r a cujas astúcias n ã o


basta o remédio que a m e s m a lei aplica no método dos "fiscais, p o r q u e a vastidão do
"país, c o m o infinito n ú m e r o de saídas tão remotas das vilas o n d e h ã o d e assistir os
fiscais, faz infrutuosas as cautelas d a lei, e sendo esta estabelecida, a benefício dos
vassalos que desejam contribuir a Sua Majestade c o m a liberalidade q u e os obriga o
seu paternal a m o r , devem t a m b é m experimentar o mais rigoroso castigo os que forem
causa d e se p e r d e r a boa h a r m o n i a e obediência devida ao nosso soberano m o n a r c a .
E n ã o s e n d o o m e s m o s e n h o r servido a d m i t i r esta p r o p o s i ç ã o q u e t e m p o r
fim o sossego p ú b l i c o , c o m a u m e n t o da R e a l F a z e n d a , e sendo precisados contri-
buir p o r o u t r o m o d o e m muitos q u e t e m o s excogitado, p a r e c e só t e m lugar con-
servar-se o o u r o no valor do seu "toque, c o m o ao p r e s e n t e está, e obrigarem-se às
" c â m a r a s das q u a t r o c o m a r c a s q u e h á n a capitania a perfazer o c ô m p u t o a n u a l de
100 " a r r o b a s d e o u r o , l a n ç a n d o pelos povos, c o m t o d a a i g u a l d a d e q u e possível
for, e m os escravos q u e houver, cabeças / / d e gados, cavalarias e bestas m u a r e s [ fl. 249v. ]
q u e e n t r a r e m pelos "registros, boticas, "cortes, "oficiais m e c â n i c o s e lojas d e m e r -
c a d o r e s d e "seco e " m o l h a d o s , e e m " a g u a r d e n t e d a t e r r a q u e se f a b r i c a r e m
território p e r t e n c e n t e a esta capitania. E, p o r este princípio, p a r e c e q u e consegue
a R e a l F a z e n d a g r a n d e utilidade e m escusar salários d e oficiais q u e h ã o de assistir
nas casas de fundição, q u e i m p o r t a m c a b e d a l e é inescusável despesa, h a v e n d o d e
çonservar-se p sistema das fundições, e sè D e u s p e r m i t i r que haja novos descobri-
m e n t o s neste país, n ã o se evita o m e i o d o a u m e n t o d a contribuição p a r a o R e a l
Erário, c o m o t a m b é m se h o u v e r tal decadência, q u e os povos n ã o possam contri-
buir c o m as 1Ò0 arrobas prometidas, se oferecem n a piedade de Sua Majestade, d e
q u e m devem esperar toda a comiseração e faculdade p a r a serem ouvidos, represen-
t a n d o o estado q u e fizer admissível a sua súplica.

E p o r q u e , c o m o se t e m p o n d e r a d o , são os mineiros os principais nervos des-


se c o r p o , e m cuja conservação consiste o a u m e n t o do país e i g u a l m e n t e o negócio
de todos os p o r t o s d o m a r do Brasil, p a r e c e q u e era n ã o só lícito m a s decoroso e
r e q u e r i m e n t o d e b o a s esperanças i m p e t r a r d e S u a Majestade o m e s m o privilégio
q u e o s e n h o r rei d o m P e d r o II, de gloriosa m e m ó r i a , foi servido c o n c e d e r aos
senhores d e " e n g e n h o d o R i o d e J a n e i r o , e m o r d e m a n ã o serem executados e m
suas "fábricas de m i n e r a r , m a s sim nos r e n d i m e n t o s .
E p o r q u e esperamos q u e o singular zelo e g r a n d e atividade de Vossas M e r -
cês h á d e s u p r i r o q u e a nossa diligência e o b e d i ê n c i a n ã o p o d e r ã o a l c a n ç a r ,
oferecemos n a m ã o d e Vossas M e r c ê s o nosso p a r e c e r , c o m o s o m o s a b r i g a d o s .
As pessoas d e Vossas M e r c ê s g u a r d e D e u s m u i t o s a n o s . V i l a R i c a , a 3 d e
abril d e 1 7 5 1 .

V e n e r a d o r e s de Vossas M e r c ê s ,
A n t ô n i o R a m o s dos Reis D o m i n g o s d e A b r e u Lisboa
M a n u e l F e r r e i r a Agrelos M a n u e l Dias d a C o s t a
A n t ô n i o Francisco F r a n ç a Alexandre da C u n h a e Matos
• 57 «

[Carta do Senado da Câmara da vila de São José sobre representa-


ção contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]

C a r t a dos camaristas d a vila de São J o s é c o m e n t a n d o o


teor da representação da C â m a r a de Vila Rica contra a lei de 3
de dezembro de 1750, referendando a proposta de comutação do
quinto por tributo sobre os gêneros que entrassem e m Minas
Gerais e. solicitando a instalação de casa da moeda naquela vila.
O encaminhamento de representação contendo alternativa
ao sistema das casas de fundição ou corrigindo-o parcialmente
pelo governador e procuradores dos habitantes de Minas Gerais
foi facultado pelo capítulo. 11 da referida lei e, desencadeou u m
movimento de troca de correspondência entre as diversas câma-
ras, centralizado por Vila Rica, com o argumento de garantir
uniformidade nas solicitações. Destaque-se q u e a proposta de
Vila Rica coadunava-se com a de postulantes a contratadores do
quinto do ouro. Apesar disto, é possível divisar interesses e diver-
gências regionais nas representações e n c a m i n h a d a s à C o r o a .
Complementa os documentos 54 a 56 e 58 a 62.
Pela posição q u e ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir o original autógrafo e participar dos deba-
tes dos camaristas e homens bons. O documento informaria,
ainda, sua participação nas juntas sohre o assunto.
Autoria, local e data: Senado d a C â m a r a da vila de São
José; vila de São Joséj 16.4.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado da C â m a r a de Vila Rica.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Parecer em forma epistolar quê
argumenta em favor do restabelecimento do sistema de casas de
fundição para a arrecadação do quinto e q u e propõe outras nor-
mas fiscais. Aplicação da tópica dos danos inerentes ao sistema
da capitação. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna bastarda do-
cumental, tipo imitativo da inglesa m o d e r n a magistral. Maiús-
culas com apex em forma de meia voluta; uso de cedilha, vírgu-
la, ponto-e-vírgula e abreviaturas por contração com letras so-
brepostas e sinalizadas pelo ponto. Assinaturas autógrafas no
final do texto. (YDL)
517

S e n h o r e s do S e n a d o : [ fl. 250 ]

C o m o m e s m o zelo c o m q u e Vossas M e r c ê s j u s t a m e n t e se m o s t r a m tão e m -


p e n h a d o s , c o m o d e v e m , a favor d o b e m c o m u m e u t i l i d a d e p ú b l i c a , t í n h a m o s
t a m b é m resolvido r e p r e s e n t a r a sua Majestade o deplorável estado destas M i n a s ,
a diferença d o p r e s e n t e t e m p o à q u e l e e m q u e a o m e s m o s e n h o r se o f e r e c e r a m
p o r *quinto as c e m "arrobas de o u r o — assim p e l a notável d i m i n u i ç ã o d a c o m a r c a
do S e r r o c o m o s u p e r v e n i e n t e " c o n t r a t o dos d i a m a n t e s , c o m o p e l a a u s ê n c i a d e
g r a n d e n ú m e r o d e seus m o r a d o r e s p a r a as m i n a s d e Goiás, q u e depois se a u m e n -
t a r a m e floresceram —, a v e x a ç ã o q u e aos povos se segue n a c o b r a n ç a d a infalível
" d e r r a m a p e l a facilidade dos " d e s c a m i n h o s , os prejuízos d a d i m i n u i ç ã o d o o u r o
p e l a u n i v e r s a l i d a d e dos e m p e n h o s e d e v e d o r e s e, finalmente, a g r a d e c e n d o s e m -
p r e à real g r a n d e z a de S u a Majestade o beneficio q u e fez a estas M i n a s e m dester-
r a r delas o insuportável j u g o d a "capitação, suplicar-lhe a c o m u t a ç ã o do m e i o d a
c o b r a n ç a , i m p o n d o - s e o dito quinto c o m a segurança das cem a r r o b a s e m todos os
"efeitos q u e pelos "registros e n t r a r e m nestas M i n a s , c o m o Vossas Mercês tão sabi-
a m e n t e p o n d e r a m e a c o r d a m , a c r e s c e n t a n d o só m a i s a i m p o s i ç ã o dos fumos e
"cachaças, / / diminuindo-se e m equivalente o m a i o r p r e ç o d o q u i n t o nas "entra- [ fl, 250v. ]
das dos mais efeitos, pois p a r e c e ser esta parcial c o m u t a ç ã o n ã o só mais suave pela
u r g e n t e necessidade do uso e c o n s u m o destes m a s a i n d a útil à escravatura, q u e é
a q u e m a i s c o n s o m e a q u e l e s , e n ã o m e n o s a seus s e n h o r e s , a t e n d e n d o a q u e
nestes dois efeitos se p o d e m , c o m m u i t a s u a v i d a d e , extrair p a r a c i m a d e v i n t e
a r r o b a s d e o u r o p a r a c o m p l e m e n t o das c e m q u e se o f e r e c e r a m , s e m q u e obste
d e p e n d e r esta imposição de diverso meio de c o b r a n ç a , p o r q u e facilmente se p o d e
fazer pelas " c â m a r a s respectivas e m todas as comarcas. E nos p a r e c e t a m b é m q u e
nos t e r m o s d e a d m i t i r - s e esta p r o p o s t a se suplique i n s t a n t e m e n t e p o r "casa d a
m o e d a nessa vila, ficando abolidas todas as casas d e fundição das m a i s c o m a r c a s ,
fazendo-se n a r e p r e s e n t a ç ã o a fácil c o n t a do q u e S u a M a j e s t a d e e m t o d a s elas
evita d e p a g a r d a sua R e a l F a z e n d a nos avultados salários d e "intendentes, "oficiais
e m a i s despesas.

J s t o é o q u e sentimos, de cujo a c o r d o nos p a r e c e está t a m b é m a C â m a r a d a / / [ fl. 251 ]


c a b e ç a d e s t a c o m a r c a , s e m e m b a r g o do q u e q u a n d o Vossas M e r c ê s e as m a i s
c â m a r a s destas M i n a s q u e i r a m só fazer a r e p r e s e n t a ç ã o n a f o r m a q u e n o s p r o -
p õ e m , e de u m p a p e l , aliás d o u t o , q u e acaso vimos e nos n ã o consta seja o formal
dos seus r e q u e r i m e n t o s , p o r d e v e r e m ser conformes os d e todas as c â m a r a s , p a r a
q u e a confusão e diversidade das súplicas n ã o faça n o conceito do s o b e r a n o m e -
n o s eficaz a g r a n d e j u s t i ç a e a m u i t a r a z ã o d o q u e l h e r e p r e s e n t a r m o s , t e m o s
d e t e r m i n a d o seguir e m t u d o as p r u d e n t e s propostas d e Vossas M e r c ê s , m a n d a n -
do-nos pelo p o r t a d o r fiel cópia da q u e p r e t e n d e m r e m e t e r e o n o m e do p r o c u r a -
d o r q u e e l e g e m p a r a este i m p o r t a n t e n e g ó c i o , q u e n ã o d u v i d a m o s ter a q u e l e s
p r e d i c a d o s q u e o m e s m o p e d e p a r a fazermos p r o c u r a ç ã o e r e m e t ê - l a a Vossas
518

Mercês, ou c o m o determinarem. E c o m aviso do concurso dessa C â m a r a , n ã o temos


dúvida, c o m proporção aos rendimentos, fazer a assistência necessária n a forma que
Vossas Mercês acordarem e m beneficio d a "república. Deus guarde a Vossas Mercês
muitos anos. Vila d e São J o s é , e m C â m a r a , aos 16 de abril de 1751.

[ fl. 251 v. ] D e Vossas M e r c ê s ,


m u i t o v e n e r a d o r e s criados

J o s é F e r r e i r a Vila N o y a
J o ã o d e Oliveira Luís C o e l h o Borges
José Lopes Bandeira D o m i n g o s B a r b o s a Pereira Gonçalves

58
[Representação da Câmara de Vila Rica contra a
Lei Novíssima das Gasas de Fundição]

Representação do Senado da Câmara de Vila Rica contra a


lei de 3 de dezembro de 1750 que suspendeu a cobrança do quinto
por capitação e reinstalou casas de fundição e m Minas Gerais.
Argumentação baseada na associação da capitação com crise eco-
nômica e decadência e nos reflexos da redução do valor do ouro de
1500 para 1200 réis estipulada pela referida lei n o q u a d r o de
endividamento generalizado, propõe a comutação do quinto por u m
tributo único sobre os gêneros que entrassem na capitania, caracteri-
zado como sistema menos oneroso e de mais fácil arrecadação.
O encaminhamento de representação, contendo alternati-
va ao sistema das casas de fundição ou corrigindo-o parcialmen-
te, pelo governador e por procuradores dos habitantes de Minas
Gerais, foi facultado pelo capítulo 11 da referida lei e desenca-
deou u m movimento de troca de correspondência entre as diver-
sas câmaras, centralizado por Vila Rica, com o argumento de
garantir uniformidade nas solicitações. Destaque-se que a pro-
p o s t a de Vila R i c a c o a d u n a v a - s e c o m a d e p o s t u l a n t e s a
contratadores do quinto do ouro. Apesar disto, é possível divisar
interesses e divergências regionais nas representações efetivamente
encaminhadas à Coroa. Complementa os documentos 54 a 57 e
60 a 62.
519

Pela posição q u e ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa


Matoso pôde coligir a cópia do documento e participar dos de-
bates dos camaristas e homens bons; informaria, ainda, sua par-
ticipação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Senado da C â m a r a de Vila Rica;
Vila Rica, 24.4:1751.
D e s t i n a t á r i o : Rei.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : R e p r e s e n t a ç ã o e m favor d a
reimplantação das casas de fundição e contra a instauração d a
derrama, em que se aplicam tópicas que caracterizam os mineiros
como vítimas de injustiças fiscais e da decadência financeira. Apli-
cação da tópica do "empenho" e empobrecimento dos mineiros. O
narrador (coletivo) constitui como tópica elogiosa as virtudes da
cobrança do quinto "nos gêneros que entram nas Minas". Aplica-
ção de tópicas de vitupe ração moral para caracterizar como vicio-
sa a arrecadação por contrato e de tópicas da injustiça inerente à
derrama e do "empenho" e ruína dos mineiros. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfiço: Escrita moderna bastarda do
século XVIII, bastante caligrafada. Presença do "f' com laçada
e meia voluta para formar o traço horizontal, " s " pendente d e
cauda longa, que alterna com o " s " típico caudado, de dupla
laçada, "g" minúsculo de dois olhos; maiúsculas capitulares en-
feitadas de volutas. A escrita se torna bem mais cursiva no de-
correr do texto (ver folio 255v.}. (YDL)
Cópia manuscrita:
APM, C M O P 60, fl. 54v.-59.

Senhor, [ fl. 252 ]

Vossa Majestade foi servido, por *alvará de 3 d e d e z e m b r o de 1750, aliviar a


opressão e m que estava o povo das Minas n a cobrança do real *quinto por "capitação,
cujo vexame b e m se reconhece e m o m e s m o alvará. Foi piíssima e santíssima a inten-
ção d e Vossa Majestade. Seja-nos, p o r é m , lícito, c o m a h u m i l d a d e e obediência d e
vassalos verdadeiros, expormos o gravíssimo prejuízo e eminente ruína q u e se segue
ao povo n a observância do dito alvará c o m ouro de doze "tostões e "derrama.
N ã o h á p r e v e n ç ã o , p e n a , n e m cautela q u e baste (suposta a malícia dos h o -
mens) p a r a se e v i t a r e m os desvios do o u r o , p o r q u e os desertos, sertões, v e r e d a s e
c a m i n h o s ocultos são infinitos. / / A necessidade, conveniência e ocasião desperta [ fl. 252v. ]
e facilita m a i s aos malévolos, cuja d e p r a v a d a m a l d a d e j á e m o u t r o t e m p o se e x p e -
rimentou nestas M i n a s , s e m q u e obstasse o h a v e r d o b r a d a s p e n a s , cautelas e p r e -
venções, sendo este u m dos principais motivos p o r q u e se m u d o u d o sistema d e
f u n d i ç ã o p a r a c a p i t a ç ã o , v e n d o - s e q u e d e n e n h u m m o d o se p o d i a t o t a l m e n t e
obviar o oculto " d e s c a m i n h o d o ouro e m p ó .
520

E a i n d a m o s t r a a experiência ser tal a a m b i ç ã o dos h o m e n s q u e pelo limitado


l u c r o d e u m p o r c e m estão c o m e t e n d o esta m a l d a d e , e se a o p é d a forca p o r
q u a l q u e r dinheiro se está furtando, c o m o é possível se evite nestas M i n a s a passa-
g e m d o o u r o c o m a conveniência d e três "tostões e m "oitava, o n d e estão e n t r a n d o
todos os dias sertanejos e "tratantes?
E se n a q u e l e t e m p o , t e n d o as M i n a s s o m e n t e três " e n t r a d a s e saídas e t e n d o
m e n o s p o v o a ç õ e s , se n ã o p o d i a evitar a q u e l e d e s c a m i n h o c o m três c o m p a n h i a s
d e "dragões, q u e será n o t e m p o p r e s e n t e , sendo multiplicadas as e n t r a d a s e saí-
das, h a v e n d o s o m e n t e u m a c o m p a n h i a — p o r q u e as d u a s estão, u m a d e g u a r d a
aos d i a m a n t e s , o u t r a e m Goiás — e c o m u n i c a n d o - s e estas M i n a s c o m o novo des-
c o b e r t o do P a r a c a t u e m sertões abertos?
N ã o há, S e n h o r , outro meio q u e d e todo possa evitar tão g r a n d e m a l senão
p o n d o - s e o o u r o pelo seu "toque, pois só tirada a causa cessarão tão abomináveis
efeitos. N ã o h a v e n d o conveniência, cessa o furto.
M a n d a Vossa Majestade, e m o fim d o capítulo p r i m e i r o do dito "alvará, q u e
a " d e r r a m a se faça à p r o p o r ç ã o dos b e n s , c o n t r a o q u e o b s t a m os justíssimos
c l a m o r e s d e todos os q u e n ã o furtam, fundando a sua q u e i x a e m q u e , s e n d o leais
vassalos, p a g a m n o m e s m o a n o d u a s vezes "quintos; u m a p o r q u e m e t e m o seu
o u r o n a "casa de fundição e lá se lhe tira o quinto; o u t r a p o r q u e , no fim do a n o ,
c o m a d e r r a m a , os t o r n a m a m u l t a r à p r o p o r ç ã o de seus bens.
Q u e i x a m - s e justissimamente os mineiros d e q u e , sendo eles os nervos q u e sus-
t e n t a m este c o r p o (por deles sair todo o o u r o q u e pelos mais gira), ficam os mais
a r r a s t a d o s e o p r i m i d o s tirando-lhes o quinto do o u r o q u e e x t r a e m e m u l t a n d o - o s
p u t r a v e z n o fim d o a n o c o m a d e r r a m a , q u e p o r força h á de ser m a i o r neles, c o m
a t e n ç ã o ao g r a n d e n ú m e r o d e escravos q u e são os b e n s das M i n a s , s e n d o certo q u e
m u i t a p a r t e destes estão d e v e n d o os m e s m o s escravos q u e p o s s u e m , p a r e c e n d o no
exterior rico o q u e n a realidade é p o b r e e vivendo c o m o p o b r e s m u i t o s q u e n a reali-
d a d e são ricos, m á x i m a m u i t o p r a t i c a d a nestas M i n a s , r a z ã o p o r q u e só anjos p o d e -
r ã o a c e r t a r n o equilíbrio e igualdade d a d e r r a m a .
Queixam-se, finalmente, todos os q u e n ã o furtam e m ver q u e p a g a m os ino-
centes pelos c u l p a d o s , d e cujo m a l resulta gravíssimo d a n o , c o m i m i n e n t e r u í n a
[ fl. 253 ] p a r a o futuro, pois a h u m a n a / / malícia m a i s depressa a b r a ç a o m a l do q u e o
b e m , cujo d a n o se faz digno d e p o n d e r a ç ã o , q u a n d o a i n c o m p a r á v e l p i e d a d e de
Vossa M a j e s t a d e o p e r m i t a .
E t a m b é m g r a n d e a q u e i x a e d e c o n s e q ü ê n c i a gravíssima o ver-se q u e nes-
tas M i n a s se c o m p r a m as l a v r a s , r o ç a s e escravos fiados, e t o d o o g ê n e r o d e
negócio é fiado, p o r três, q u a t r o e m a i s anos, d o q u e resulta estaf-se d e v e n d o aq
n e g ó c i o do R i o , B a h i a e P e r n a m b u c o a v u l t a d o c a b e d a l , q u e i m p o r t a e m m u i t o s
m i l h õ e s , pois, c o n t a d o s . E m u i t o p o u c o s serão os q u e nestas M i n a s n ã o d e v a m ,
cujas dívidas se h ã o d e p a g a r e m o u r o q u i n t a d o , pois os c r e d o r e s n ã o p o d e m ser
p r e j u d i c a d o s e m r a z ã o d e s e r e m as dívidas c o n t r a í d a s n o t e m p o q u e o o u r o
521

valia a 1.500 *réis [a "oitava], c a u s a p o r q u e infalivelmente c r e s c e m as dividas


25 p o r 100, e s e n d o tantos os devedores e t ã o a v u l t a d o o c a b e d a l q u e se d e v e ,
e v i d e n t e está o gravíssimo p r e j u í z o e e m p e n h o e m q u e ficam as M i n a s c o m a
r e p e n t i n a m u d a n ç a do o u r o d e 1.500 p a r a 1.200 réis.
E , S e n h o r , a coisa m a i s estimada a liberdade, e. até desta ficam p r i v a d o s os
m o r a d o r e s das M i n a s , vivendo sujeitos a inimizades, confiscos e repetidas buscas
nas e s t r a d a s e p o r t o s d e m a r e s , c o m as d e s o r d e n s q u e delas se s e g u e m . S ã o os
"oficiais das c â m a r a s u m a n o uns, o u t r o a n o o u t r o s , e estes t o d o s t ê m a m i g o s ,
p a r e n t e s , ódios e p a i x õ e s , q u a l i d a d e s q u e i m p o s s i b i l i t a m p a r a a i g u a l d a d e d a
" d e r r a m a , cujas dificuldades e prejuízos estão a m e a ç a n d o u m a total r u í n a , confu-
são e d e s o r d e m . n a observância do o u r o d e . d o z e "tostões e d e r r a m a .
E se h o u v e r q u e m diga q u e a r g u m e n t a m o s debaixo d e u m suposto a i n d a n ã o
p r a t i c a d o , pois se n ã o sabe q u e r e n d e r ã o as "casas d e fundição e se h a v e r á ou n ã o
d e r r a m a , a isto r e s p o n d e m o s q u e nestas q u a t r o c o m a r c a s n ã o h á descobertos n o -
vos n e m grandezas de ouro, e q u a n d o se ofereceram as cem "arrobas e m m a r ç o d e
I744I
estavam as Minas e m outro auge; nesse tempo não estava proibida a extração
do ouro n a maior e mais fértil parte da comarca do Serro do Frio, c o m o hoje está, p o r
causa dos diamantes e outras razões que, p o r evitar confusões, omitimos.
U l t i m a m e n t e , S e n h o r , são evidentes as diferenças d e t e m p o a t e m p o , r a z ã o
p o r q u e hoje n ã o p r o p o r i a m os p o v o s das M i n a s o m é t o d o restabelecido, n e m
p o d e n a t u r a l m e n t e praticar-se sem m a i o r v e x a m e do q u e a m e s m a "capitação.
R o m p e n d o , p o r é m , p o r todas festas dificuldades (como vassalos obedientíssi-
mos), fizemos logo p u b l i c a r q dito "alvará, q u e fica e m p r i n c í p i o d e p r á t i c a , e
estamos dispostos p a r a o fazer executar e n q u a n t o V o s s a Majestade n ã o m a n d a r o
contrário.
E só r e c o r r e m o s a o p a t e r n a l a m o r e real b e n i g n i d a d e d e V o s s a M a j e s t a d e
p a r a q u e , n a r e f o r m a d o restabelecido / / m é t o d o c o b r e m alento e se a n i m e m os [ fl. 253v. ]
p o v o s c o m a esperança de maiores lucros e conveniências, no q u e t a m b é m p a r a o
futuro resultará a u m e n t o ao R e a l E r á r i o .
E c o m o a i n c o m p a r á v e l p i e d a d e d e V o s s a M a j e s t a d e , n o c a p í t u l o 11 d o
m e s m o alvará, n o s faculta m e i o d e a p o n t a r m o s arbítrio, a p r o v e i t a n d o - n o s deste
altíssimo beneficio, e x p o m o s o q u e m a i s a b r a ç a o p o v o , s e m p r e j u í z o d o R e a l
Erário, antes sim c o m esperanças infalíveis d e m a i o r a u m e n t o .
O m é t o d o m a i s suave, útil, p e r m a n e n t e , d e leve ô n u s e fácil a r r e c a d a ç ã o
c o m q u e se p o d e c o b r a r o direito senhorial d o "quinto é nos gêneros q u e e n t r a m
nas M i n a s . E mais suave p o r q u e nele se c o b r a insensivelmente o q u i n t o , c o m -
p r a n d o todos o d e q u e necessita à p r o p o r ç ã o do q u e t ê m e do q u e p o d e m p ô r u m
só i m a g i n a d o excesso n o p r e ç o q u e , n a realidade, o n ã o é, c o m o logo se m o s t r a r á .

O ano correto é 1734.


522

É útil p o r q u e sendo a r r e m a t a d o o "contrato das e n t r a d a s n o a n o de 1718 p o r


o n z e " a r r o b a s d e o u r o c a d a a n o está hoje e m trinta, e c o m o o p r e s e n t e m é t o d o
segue a m e s m a n a t u r e z a fica-nos a esperança d e q u e s e m p r e v á e m a u m e n t o .
E p e r m a n e n t e p o r q u e a liberdade d o o u r o pelo seu valor é o q u e mais facilita o
c o m é r c i o , e e n q u a n t o h o u v e r o u r o nas t e r r a s h á d e h a v e r n e g ó c i o , h ã o d e vir
novos h a b i t a d o r e s , e u n s e outros m u l t i p l i c a m , e todos p r e c i s a m e n t e h ã o d e co-
m e r e vestir, e n ã o se p o d e n e g a r q u e e n q u a n t o h o u v e r h a b i t a d o r e s nas M i n a s h á
d e h a v e r negócio e " e n t r a d a s e, p o r c o n s e q ü ê n c i a , h á de ser p e r m a n e n t e este
método.
E seguro p o r q u e o c o n t r a t o das e n t r a d a s a n d a a o p r e s e n t e a r r e m a t a d o e m n o -
v e n t a a r r o b a s n o trienio, q u e c o r r e s p o n d e a trinta p o r a n o . P o r é m , p o r c o n t a feita,
r e n d e s e g u r a m e n t e trinta e cinco arrobas c a d a a n o . Isto suposto, p a g a n d o as fazen-
das q u e e n t r a m mais três partes de tributo p a r a o real q u i n t o , v e m este a r e n d e r n o
t e m p o p r e s e n t e cento e cinco a r r o b a s seguras c a d a a n o .
E leve p o r q u e e m se, pagar mais três partes de tributo nas entradas, c o m p a r a n d o -
se com o ouro "quintado, é aquele menos m a u , onde p a g a m todos sem q u e se possa
queixar n e n h u m a qualidade de pessoa, pois paga o "governador, "bispo, "ministros,
"clérigos, pobres e ricos à p r o p o r ç ã o do q u e p o d e m e do q u e c o m p r a m e gastam, e
todos estes l u c r a m logo três "tostões e m "oitava, a respeito do justo preço p o r q u e
hoje se v e n d e m as fazendas, e ficam c o m a liberdade e conveniência d o o u r o pelo
toque, o q u e melhor apontamos discorrendo por alguns gêneros.
P a g a nas e n t r a d a s u m a a r r o b a d e "fazenda seca três q u a r t o s de o u r o , q u e a
[ fl. 254 ] d i n h e i r o são 1.125 "réis. F a z e m o s , agora, e x e m p l o / / n e m d a f a z e n d a mais leve,
n e m mais pesada.
P a g a u m a a r r o b a d e " b a e t a os referidos três q u a r t o s , a c r e s c e n t a n d o - l h e o
triplo. N o suposto m é t o d o , acresce e m c a d a "côvado de b a e t a , p o r c o n t a regular-
m e n t e feita, oitenta réis, e sendo o p r e ç o vulgar e m é d i o d e c a d a côvado d e b a e t a
m e i a oitava, d e q u e v e m a o quinto cento e c i n q ü e n t a réis, nisto m e s m o e m u i t o
mais lucra o c o m p r a d o r n o quinto c o m o u r o de 1.500 réis, e m u i t o mais se l u c r a
nos gêneros mais leves e d e m a i s valor.
P a g a c a d a c a r g a de " m o l h a d o s m e i a oitava, q u e a d i n h e i r o são 750 réis. N o
s u p o s t o m é t o d o , a c r e s c e n t a n d o - l h e mais três p a r t e s , é oitava e m e i a d e m a i s , e
s e n d o o vulgar p r e ç o das cargas, u m a s p o r o u t r a s , n o v e mil réis, n ã o r e c e b e m
violência os c o m p r a d o r e s e m d a r e m mais a dita oitava e meia, q u e a d i n h e i r o são
2 . 2 5 0 , p o r q u e r e c e b e m a utilidade d o q u i n t o do o u r o de três tostões e m oitava.
P a g a c a d a negro duas oitavas, e acrescentando-lhe mais três p a r t e s , no supos-
t o m é t o d o , v e m a p a g a r m a i s seis oitavas. E sendo o p r e ç o vulgar e m é d i o d e c a d a
n e g r o nestas M i n a s d u z e n t a s oitavas, d e q u e v e m a o quinto q u a r e n t a , n ã o só n ã o
r e c e b e m d a n o os c o m p r a d o r e s e m d a r e m mais as referidas seis oitavas m a s a i n d a
ficam l u c r a n d o t r i n t a e q u a t r o , a respeito das q u a r e n t a oitavas do q u i n t o , e a q u i
c o m p e n s a m o s ás tênues diferenças d e alguns gêneros.
523

U l t i m a m e n t e , c o m p e n s a n d o - s e o l u c r o de três "tostões e m " o i t a v a c o m o


triplo, n o suposto m é t o d o , achar-se-á q u e é este m u i t o c o n v e n i e n t e . D i s c o r r e n d o
p e l a m a i o r p a r t e dos gêneros e a liberdade d o o u r o pelo intrínseco valor, é inesti-
mável p a r a q u i e t a ç ã o e sossego dos povos.
Ê de fácil a r r e c a d a ç ã o p o r q u e se p o d e a r r e c a d a r n a m e s m a f o r m a q u e o p r a t i -
c a m os " c o n t r a t a d o r e s e nas m e s m a s p a r a g e n s e c o m m e n o s despesa, p o n d o V o s -
sa Majestade nas M i n a s u m "intendente e c o m este u m "ajudante q u e seja b o m
caixeiro, u m a pessoa v e r d a d e i r a e m c a d a "registro, u m comissário n o S e r r o , o u t r o
n o P a r a c a t u p a r a c o b r a n ç a e vigia dos registros, u m c o b r a d o r n o S a b a r á , o u t r o n o
R i o das M o r t e s , o u t r o n o C a m p o . E c o m o a experiência t e m m o s t r a d o ser fácil a
c o b r a n ç a e m os c o n t r a t a d o r e s , seguindo o p r o p o s t o m é t o d o a m e s m a n a t u r e z a ,
n ã o se p o d e d u v i d a r da facilidade d a a r r e c a d a ç ã o , e assim se evitam muitos gastos
q u e se fazem c o m as "intendências e "casas de fundições.
P o r é m , d e n e n h u m a sorte è conveniente a o p o v o q u e a a r r e c a d a ç ã o se faça
p o r " c o n t r a t o , p o r q u e a a m b i ç ã o dos c o n t r a t a d o r e s e as c o n d i ç õ e s q u e se lhes
c o n c e d e m t ê m sido m u i t o prejudiciais.
A l é m d e q u e , v e m - n o s à m e m ó r i a o princípio p o r q u e foi i n t r o d u z i d o o c o n t r a t o
atual das e n t r a d a s , que, n a realidade, se pôs p a r a alívio d o m e s m o quinto, e assim se
p r a t i c o u d e s d e p a n o d e 1714 até / / o d e 1718, e m q u e o c o n d e de A s s u m a r , [ fl. 254v. ]
sendo " g o v e r n a d o r , fez d i s t i n t a m e n t e p a g a r o q u i n t o e r e d u z i u este t r i b u t o das
" e n t r a d a s a c o n t r a t o q u e hoje existe, s e m q u e nos seja compreensível a l c a n ç a r m o s
o f u n d a m e n t o d a tal s e p a r a ç ã o , e m p r e j u í z o d o p o v o , s e n d o , c o m o foi, a q u e l e
tributo das e n t r a d a s oferecido pelos m e s m o s p o v o s e m subsídio e p a r t e do q u i n t o ,
pelo q u e s e m p r e está c l a m a n d o o p o v o .
P o r cuja causa, p e d i m o s que, sendo aceito este m é t o d o , se faça a r r e c a d a ç ã o p e l a
R e a l F a z e n d a , e q u a n d o se n ã o aceite, conservando-sé o restabelecido m é t o d o das
casas d e fundição, neste caso seja-nos lícito dizer q u e , n a realidade, o q u e se deve
p a g a r é o " q u i n t a do o u r o , este pagucrse e m as casas d e fundição, s e m nos obrigar
a mais " d e r r a m a , sendo t o d o o a u m e n t o e falta p o r c o n t a do R e a l E r á r i o , e q u e m
o " d e s e n c a m i n h a r p a g u e c o m a p r ó p r i a vida a sua infidelidade.
Enfim, Senhor, se os conselheiros de Vossa Majestade deputados p a r a este im-
p o r t a n t e negócio a c h a r e m q u e as casas de fundição renderão as c e m "arrobas e q u e
n ã o haverá desvio do ouro, neste caso está muito e m termos a nossa súplica, enquan-
to pedimos q u e se tire o quinto do ouro q u é entrar nas ditas casas, q u e é o que, n a
realidade, se deve, sem que seja o povo obrigado a segurar, n e m sujeito à d e r r a m a .
E se a s s e n t a r e m e m q u e devemos segurar as c e m a r r o b a s , ficando sujeitos à
d e r r a m a , n e s t e caso r e s p o n d e m o s q u e assim a d e r r a m a , c o m o a * c a p i t a ç ã o , é
tributo, é q u e este se deve p ô r n a p a r t e m e n o s sensível e m q u e todos p a g u e m c o m
igualdade, p q u e s o m e n t e se p o d e p r a t i c a r nas e n t r a d a s , no suposto m é t o d o .
E a q u i seja-nos lícito t r a z e r m o s à m e m ó r i a aos m e s m o s d e p u t a d o s a i n c o m -
p a r á v e l p i e d a d e de Vossa Majestade e n q u a n t o r e c o m e n d a n o dito "alvará a igual-
524

d a d e d a " d e r r a m a , p a g a n d o c a d a u m à p r o p o r ç ã o do q u e tiver, o q u e s o m e n t e
p e l o p r o p o s t o m é t o d o se p o d e p r a t i c a r s e m q u e i x a d e n e n h u m a q u a l i d a d e d e
pessoa, pois todos p a g a m à p r o p o r ç ã o do q u e p o d e m e g a s t a m .
E satisfazendo as instâncias de algum imaginado acontecimento dos q u e quei-
r a m dizer que se p o u p a r ã o os gastos e q u e serão menos as "entradas das fazendas, e
q u e poderá vir t e m p o e m que nestas Minas se fabriquem linhos, lãs, p a n o s e outros
"efeitos, respondemos com muita brevidade q u e a o presente n ã o h á esperanças de
tal, e que a vaidade n ã o tem limite, e que e n q u a n t o houver o u r o as indústrias dos
homens só se o c u p a m e m ver o m o d o c o m o d h ã o de tirar das entranhas d a terra, e os
gastos são precisos e necessários, e j u n t a m e n t e o negócio das entradas.
E caso q u e este i m a g i n a d o sonho acontecesse p a r a o futuro, nesse t e m p o se
lhe p o d i a d a r r e m é d i o " q u i n t a n d o os m e s m o s efeitos n a c o n c o r r e n t e q u a n t i d a d e
e m q u e se visse d i m i n u i ç ã o às e n t r a d a s , e nesta resposta se dá c u r a a o m a l presen-
[ fl. 255 J té e p r o v i d ê n c i a / / p a r a o futuro.
Ultimamente, Senhor, c l a m a m estes povos por "casa da moeda. Esta é convenien-
te e d e muita utilidade ao povo e à Real Fazenda. A o povo p o r q u e gira o ouro, p á r a
n a terra mais facilmente se e m p ó está e todos se r e m e d e i a m , o que n ã o sucede no
tempo presente, pois todo vai p a r a a Casa do Rio de Janeiro, causa p o r q u e está tão
a b u n d a n t e e populosa aquela cidade, e se é b o m ou m a u era razão participassem todos.
Serve t a m b é m d e a u m e n t o a o R e a l E r á r i o , p o r q u e g i r a n d o a m o e d a h á m a i s
negócio, a n i m a mais aos h o m e n s e se multiplicam as p o v o a ç õ e s , fazendo diligência
p o r novos descobertos, e, p o r conseqüência, h á d e h a v e r mais e n t r a d a s , o q u e t u d o
resulta e m a u m e n t o d o real quinto no p r o p o s t o m é t o d o .
D i r - n o s - ã o q u e a i n d a se faz l e m b r a d a a m a l d a d e d e p r a v a d a dós q u e e m outro
t e m p o i n t e n t a r a m f a b r i c a r m o e d a , ao q u e satisfazemos c o m facilíssima resposta: tem-
nos m o s t r a d o a experiência q u e h á 17 anos e m q u e o o u r o está p e l o seu "toque
n u n c a nestas M i n a s n e m a i n d a se s o n h o u a fabricar tal falsidade de m o e d a , e a
r a z ã o é p o r q u e se tirou a conveniência à d e p r a v a d a malícia. D e sorte q u e n a q u e l e
t e m p o era o o u r o a 1.200 é t i n h a m a conveniência d e três "tostões e m "oitava;
p o r isso se inclinavam a furtar p o r aquele a b o m i n á v e l m e i o . P o r é m , depois q u e se
pôs o o u r o a 1.500 cessou a m a l d a d e e cessou o furto, pois claro está q u e tão fácil
lhe era fabricar a falsidade c o m o c u n h o d o R i o c o m o c o m o das M i n a s . A l é m d e
q u e , estão as M i n a s hoje mais governadas c o m o zelo dos " g o v e r n a d o r e s e a d m i -
n i s t r a ç ã o das justiças, e posto o o u r o pelo seu t o q u e cessa t o d a a p r e s u n ç ã o do
furto, e c o m o p r o p o s t o m é t o d o cessam a d e s o r d e m , confusão e c l a m o r d o p o v o .
A c h a r a m os d e p u t a d o s e conselheiros d e V o s s a M a j e s t a d e ser m a i s útil a
oferta q u e h á 17 anos t i n h a m feito os povos p o r q u e n ã o e x a m i n a r a m a diferença
e m u d a n ç a d e t e m p o a t e m p o , causa p o r que, o u t r a vez, r e c o r r e m o s ao p a t e r n a l
a m o r e real b e n i g n i d a d e de Vossa Majestade p a r a q u e , p o n d o os olhos d e p i e d a -
d e e m este p o v o das M i n a s , haja p o r b e m m a n d a r o u t r a vez rever e e x a m i n a r ,
a t e n t a e favoravelmente, esta m a t é r i a pelos m e s m o s conselheiros, pois i g n o r a m o s
525

haja lei, direito o u r a z ã o p a r a q u e n o m e s m o a n o p a g u e m os fiéis vassalos d u a s


vezes " c a p i t a ç ã o — u m a q u a n d o m e t e m o o u r o , o u t r a c o m a " d e r r a m a nem
p a r e c e j u s t o q u e p a g u e o inocente pelo culpado, o q u e n ã o furta pelo q u e furta, o
q u e n ã o p o d e pelo q u e p o d e , sendo os bens das M i n a s u m a a p a r ê n c i a d e escravos
e roças, q u e a m a i o r p a r t e se deve.
Enfim, Senhor, quanto ouro havia nestas Minas extraído todo se recolheu agora
à C a s a da M o e d a do Rio de J a n e i r o por causa da m u d a n ç a de 1.500 p a r a 1.200, e
pela lista d a m e s m a / / casa virá Vossa Majestade no último conhecimento da pobreza [ fl. 255v. ]
das Minas, pois sendo estas tão dilatadas e indo todo o ouro p a r a a dita C a s a (como
foi) p a r a lucrarem os três "tostões e m "oitava, lá se verá o cabedal que estas tinham,
n e m faça novidade o ir esta "frota importante, p o r q u e a causa é a m e s m a recontada de
ir todo o ouro p a r a fora para n ã o p e r d e r e m os três tostões e m oitava.
T o d o s r e c o n h e c e m o s q u e se d e v e o direito s e n h o r i a l d o s q u i n t o s , p o r é m
p a r e c e ser m u i t o c o n f o r m e à r a z ã o e Direito q u e se n ã o m u d e a n a t u r e z a d a coisa
e q u e se tire o m e s m o quinto pelo ouro q u e e n t r a r nas "casas d e fundições, s e m
q u e os povos fiquem sujeitos à d e r r a m a n e m a segurar q u a n t i a certa, e todos os
q u e t ê m m e l h o r experiência do "país assentam q u e a d e r r a m a h á d e causar m a i o r
estrago e v e x a m e q u e a p r ó p r i a capitação, p o r ser raio q u e c o m m a i o r violência
cai sobre os h o m e n s ricos, e o n d e n ã o h á estes n ã o p o d e m viver ós p o b r e s . E n o
caso d e h a v e r d e r r a m a e s e g u r a n ç a das c e m a r r o b a s , este tributo deve ser c o m
igualdade, o q u e s o m e n t e se p o d e p r a t i c a r no p r o p o s t o m é t o d o das " e n t r a d a s .
C o n t u d o p o r é m . S e n h o r , se a nossa infelicidade for tal (o q u e n ã o esperamos)
q u e n ã o sejam atendidas estas súplicas q u e e m n o m e deste p o v o r e p r e s e n t a m o s , per-
cam-se os bens e a p r ó p r i a vida, p o r é m e m nós s e m p r e será firmíssima a obediência,
c o n f o r m a n d o - n o s e m tudo c o m os infalíveis decretos d e Vossa M a j e s t a d e , q u e m a n -
d a r á o q u e for servido. Vila R i c a e m C â m a r a .

> 59 <

[Carta do Senado da Câmara de Vila Nova da Rainha sobre repre-


sentação contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]

Carta dos camaristas da Vila Nova da R a i n h a referendan-


do a proposta de Vila Rica de comutação do quinto por tributo
sobre os gêneros que entrassem em Minas Gerais contra a lei de
3 de dezembro de 1750 que reinstalou casas de fundição em
526

Minas Gerais e comunicando que aguardavam os termos da re-


presentação da cabeça da comarca do Rio das Velhas, Sabara,
para a remessa da sua.
O encaminhamento de representação contendo alternativa
ao sistema das casas de fundição ou corrigindo-o parcialmente,
pelo governador e por procuradores dós habitantes de Minas G e -
rais, foi facultado pelo capítulo 11 da referida lei e desencadeou
u m movimento de troca de correspondencia entre as diversas câ-
maras, centralizado por Vila Rica, com o argumento de garantir
uniformidade nas solicitações. Destaque-se que a proposta de Vila
Rica coadunava-se com a de postulantes a contratadores do quin-
to do ouro. Apesar disto, é possível divisar interesses e divergências
r e g i o n a i s nas r e p r e s e n t a ç õ e s e n c a m i n h a d a s à C o r o a .
Complementa os documentos 54 a 58 e 60 a 62.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o da Costa
Matoso pôde coligir o original autógrafo e participar dos debates
dos camaristas e homens bons. O documento informaria, ainda,
sua participação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Senado da C â m a r a de Vila Nova da
(tí&tfiftjr* Rainha; Vila Nova da Rainha; 18.5.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado d a C â m a r a de Vila Rica.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Parecer em forma epistolar favo-
rável ao restabelecimento das casas de fundição e da instituição d a
ftítnitfitjà
cobrança dos quintos nas "entradas e passagens" de Minas e con-
tra a derrama. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a bastarda do-
cumental, tipo imitativo da inglesa moderna magistral. Maiúscu-
las com amplas volutas; "d" uncial com haste em voluta preen-
chendo parte da margem direita. Assinaturas autografas. (YDL)

[ fl. 256 ] S e n h o r e s do S e n a d o :

N ã o p o d e m o s deixar d e r e c o n h e c e r a j u s t a r a z ã o q u e a Vossas M e r c ê s m o -
v e m p a r a a n o v a r e p r e s e n t a ç ã o q u e i n t e n t a m fazer a sua Majestade sobre a n o v a
lei respectiva ao estabelecimento d a "fundição e extinção d a c o b r a n ç a d a * c a p i t a ç ã o ,
q u e talvez resultaria d a v a r i e d a d e c o m q u é as *câmaras deste c o n t i n e n t e ate a g o r a
se h o u v e r a m nos meios q u e se p r o p u s e r a m p a r a a segurança dos reais "quintos do
m e s m o s e n h o r , q u e tantas vezes r e c o m e n d o u se assentasse n o mais c o n v e n i e n t e
p a r a a dita firmeza e m e n o s opressão dos povos.
E-nos p r e s e n t e o q u e Vossas M e r c ê s t ê m assentado a respeito d o m o d o d e
satisfazer os quintos a o m e s m o s e n h o r nas "passagens e " e n t r a d a s destas M i n a s ; e
nos p a r e c e , t a m b é m , o m o d o mais suave d o dito p a g a m e n t o , m e n o s o h a v e r "casa
d a m o e d a nas M i n a s , q u e d e n e n h u m a sorte j u l g a m o s conveniente, pelos g r a n d e s
d a n o s q u e r e s u l t a r a m q u a n d o as houve. Q u e q u a n t o ao o u t r o m e i o d e c o b r a r S u a
Majestade o p o u c o ou m u i t o q u e r e n d e r o seu "quinto, a i n d a q u e é j u s t o e c o n -
forme as suas leis, o consideramos difícil d e conseguir.
P o r é m , c o m o estamos obrigados a nos c o n f o r m a r c o m os p a r e c e r e s d a deter-
m i n a ç ã o d a c a b e ç a desta c o m a r c a , p o r evitarmos a v a r i e d a d e tão nociva q u e d o
c o n t r á r i o resulta, esta a i n d a n ã o assentou totalmente no m e i o q u e mais útil p a r e -
ce, p e l o q u e e s p e r a m o s , p o r instantes os faremos cientes, n a f o r m a q u e n o s r o g a m
p a r a tão a c e r t a d o intento.

D e u s g u a r d e a Vossas M e r c ê s muitos anos.


Vila N o v a d a R a i n h a , 18 d e abril de 1751 anos.

D e Vossas M e r c ê s ,
os m a i s afetivos v e n e r a d o r e s
M a n u e l d e Araújo Pereira Antônio Gomes de Lemos
Salvador Pereira d e M a c e d o M a n u e l Francisco N e t o

> 60 «
[Carta do Senado da Câmara de São João del-Rei sobre represen-
tação contra a Lei Novíssima das Casas de Fundição]

Carta dos camaristas da vila de São J o ã o del-Rei referen-


dando a proposta de Vila Rica de comutação do quinto por tribu-
to sobre os gêneros que entrassem em Minas Gerais, inclusive no
tocante à imposição sobre a aguardente, e contra a lei de 3 de
dezembro de 1750 que reinstalou casas de fundição e m Minas
Gerais; comunicava, ainda, voto de procurador e de rateamento
das despesas com a representação.
O encaminhamento de representação contendo alternativa
ao sistema das casas de fundição ou corrigindo-o parcialmente,
pelo governador e por procuradores dos habitantes de Minas Ge-
rais, foi facultado pelo capítulo 11 da referida lei e desencadeou u m
movimento de troca de correspondência entre as diversas câmaras,
centralizado por Vila Rica, com o argumento de garantir unifor-
midade nas solicitações. Destaque-se que a proposta de Vüa Rica
coadunava-se com a de postulantes a contratadores do quinto do
ouro. Apesar disto, é possível divisar interesses e divergências regi-
528

onais nas representações efetivamente encaminhadas à Coroa.


Complementa os documentos 54 a 59, 61 e 62.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o da Costa
Matoso pôde coligir o original autógrafo e participar dos debates
dos camaristas e homens bons. O documento informaria, ainda,
sua participação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Senado da C â m a r a da vila de São
J o ã o del-Rei, S ã o j o ã o del-Rei, 15.4.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado da C â m a r a de Vila Rica.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Parecer em forma epistolar em fa-
vor d a cobrança dos quintos nas entradas. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna semicursíva,
càligrafada e regularizada, documental do século XVIII, com tra-
ços da bastarda italiana. Destacam-se hastes superiores com apex,
em olho cheio, com movimento destrógiro; o "f' minúsculo tem
forma especial, semelhante a um " C " em módulo grande, ultra-
passando a linha da escrita, com traço em horizontal retilíneo; uso
do circunflexo como nasalização e de apóstrofo curvo como til.
" R " maiúsculo, mesmo em posição medial, com valor de duplo
"r". Uso de abreviaturas, especialmente nas palavras terminadas
e m "te" e "to", colocadas em sobreposição e rodadas, em Iigatura.
Assinaturas autografas. (YDL)

[ fl. 257 ] S e n h o r j u i z , vereadores e mais oficiais da C â m a r a :

R e c e b e m o s a [carta] de Vossas M e r c ê s d e cinco d o p r e s e n t e e ficamos m u i t o


satisfeitos q u a n d o vimos q u e seguiam o m e s m o m é t o d o p a r a p a g a m e n t o d o real
"quinto q u e a q u i t í n h a m o s assentado, d e q u e fazíamos tenção fazer aviso a Vossas
M e r c ê s p o r carta, q u e j á estava feita a t e m p o q u e fomos entregues d a sua.
S e m d ú v i d a q u e o m e l h o r m é t o d o , p o r mais suave, é o d a i m p o s i ç ã o das
cargas "secas e " m o l h a d a s e t a m b é m n o s n e g r o s , cavalos, fumos e " c a c h a ç a s , e
p a r a isto h a v e m o s pedir à Majestade q u e deixe à eleição das " c â m a r a s os gêneros
e m q u e h ã o d e p ô r a imposição, segurando-lhe as c e m "arrobas d e o u r o , p e d i n -
d o , a o m e s m o t e m p o , q u e p a r a c o m p l e m e n t o delas se i n c l u a m as q u e se p a g a m
nos registros, p o r ser a imposição dirigida a o m e s m o fim.
A q u i h á alguns escrupulosos q u e n ã o s e n t e m b e m n a imposição nas c a c h a -
ças, c o m o f u n d a m e n t o d e q u e depois ficará p o r " c o n t r a t o ; p o r é m é escrúpulo
a é r e o , p o r q u e m u i t o t e m p o h á q u e à Majestade se ofereceu isto p o r c o n t r a t o , q u e
aceitara se quisesse. E se n ã o p o d e fazer a r g u m e n t o c o n c l u d e n t e n a imposição das
cargas aplicada p a r a o q u i n t o , p o r q u e se ficou a dita imposição foi p o r os povos se
a c o m o d a r e m ; e a l é m disso, t a m b é m a M a j e s t a d e , se q u i s e r , p o d e , d e p o i s d e
estabelecida a fundição, m a n d a r se lhe p a g u e a " c a p i t a ç ã o dos n e g r o s , p o r q u e
esta n ã o é q u i n t o , e i m p o r t a m b é m tributo e m todos os mais gêneros.
529

Enfim, toda a forma do nosso requerimento h á de consistir e m q u e queremos


segurar as c e m *arrobas nos gêneros q u e nos parecer, a u m e n t a n d o ou diminuindo a
imposição, d e forma que todas as frotas h ã o de ir c o m p l e t a m e n t e as cem arrobas,
p a r a o que, se for necessário, se botará, logo no princípio do ano, u m a *derrama, isto
é, u m a meia ou terça "capitação, p a r a haver o ouro p r o n t o p a r a os anos seguintes
p a r a a l g u m a falta q u e haja, p o r q u e n a imposição n u n c a ao certo se p o d e r ã o perfazer
as cem arrobas p o r q u e u m a n o / / r e n d e r ã o mais, outro menos; ou, aliás, q u e fique [ fl. 257v. ]
o acréscimo d e uns anos p a r a outros, p o r q u e neste caso, vendo-se que a imposição
excede m u i t o as c e m a r r o b a s , se p o d e r á diminuir, d e sorte q u e n ã o é j u s t o n e m
conveniente que a Majestade fique com acréscimo e m detrimento e prejuízo dos povos.
E q u a n d o a Majestade n ã o esteja p o r este m é t o d o , q u e tire o "quinto q u e lhe é
devido, i m p o n d o todas as p e n a s aos "passadores, havendo casa da m o e d a nas Minas.
P a r a se r e p r e s e n t a r este r e q u e r i m e n t o à M a j e s t a d e n o s p a r e c e m u i t o b o m
p r o c u r a d o r o r e v e r e n d o d o u t o r J o s é de A n d r a d e ; e c o n t r i b u i r e m o s e m igual p a r t e
p a r a as d e s p e s a s c o m as m a i s c o m a r c a s , e t e n d o Vossas M e r c ê s o u t r o m e l h o r
p r o c u r a d o r , c o m aviso, faremos p r o c u r a ç ã o .
D e u s g u a r d e a Vossas M e r c ê s m u i t o s a n o s . Vila d e S ã o J o ã o d e l - R e i , e m
C â m a r a de 15 d e abril de 1751.

D e Vossas Mercês,
os mais afetivos v e n e r a d o r e s

Manuel Gomes Vogado A n t ô n i o T e i x e i r a d a Silva


D o m i n g o s Alvares C h a v e s Francisco R i b e i r o d e Sousa

61
[Papel acerca do estabelecimento de um seguro
de escravos e suas muitas utilidades]

Proposta anônima de estabelecimento de u m seguro sobre


os escravos de Minas Gerais destinado a cobrir os seus respecti-
vos valores em caso de fuga e financiar índios catequizados
especializados n a busca e apreensão dos fugitivos, u m mecanis-
m o de controle e. disciplina dos escravos e de aumento dos gan-
hos da Real Fazenda. Os escravos, caso capturados, para exem-
plo aos demais, teriam o tendão de Aquiles cortado, passariam
p a r a a tutela de administradores e seriam utilizados na busca e
extração de novos veios auríferos.
530

U m movimento de solicitação por camaristas de propostas


alternativas de tributação a homens bons e autoridades foi desenca-
deado em virtude do disposto no capítulo 11 da lei de 3 de dezem-
bro de 1750, que facultou ao governador e aos procuradores do
povo o encarninhamento de representação contendo alternativa ou
correções ao sistema das casas de fundição restabelecido pela refe-
rida lei. Complementa, portanto, os documentos 54 a 60 e 62.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o da Costa
Matoso pôde coligir a cópia do documento e participar dos deba-
tes dos camaristas, autoridades e homens bons; informaria, ainda,
sua participação nas juntas sobre o assunto.
Autoria, local e data: anônimo; Vila Real de Sabará; ca. 1751.
D e s t i n a t á r i o : não identificado.
U s o n a historiografia: Charles Boxer vale-se do documen-
to para discutir a posição oscilante da Coroa no controle da popu-
lação negra (A idade de ouro do Brasil; dores do crescimento de u m a
sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969. p . 192-
193).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Defesa, em forma epistolar, do sis-
tema do "seguro de escravos". O narrador tipifica o "gentio ne-
gro" através de tópicas que o caracterizam como irracional e
indómito, objetivando persuadir o leitor da eficácia dos métodos
de dominação que propõe. Aplicação da tópica da decadência de
Minas. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva do
século X V I I I , com amplas capitulares e maiúsculas em módulo
grande, com volutas que ultrapassam a escrita, nas margens e nas
linhas. O "s" caudado simples alterna com o redondo. (YDL)

[ fl. 2 5 8 ] Senhor doutor:

J u s t í s s i m o r e q u e r i m e n t o e m q u e se d á o m o d o m a i s v e r d a d e i r o p a r a fazer
renascer ou ressuscitar as M i n a s , q u e se a c h a m e m total r u í n a e últimos suspiros,
c l a m a n d o h á m u i t o s anos sem se lhes d a r r e m é d i o a sua ruína, t e n d o - o tão singu-
lar d e S u a M a j e s t a d e , q u e D e u s g u a r d e , e q u e r e n d o - l h e d a r s e m fraude d e sua
R e a l F a z e n d a n e m d e seus "contratos. M a s c o m o tal r e m é d i o são as utilidades tão
g r a n d e s e e m t a n t o n ú m e r o e se v e r ã o os, povos das M i n a s do estado e m q u e se
v ê e m , miseráveis, m u d a d o p a r a florente e c o m superiores lucros e a u m e n t o s p a r a
a real C o r o a e m u i t o serviço a D e u s , q u e p e r m i t a abrir as p o r t a s h á tantos anos
fechadas do b e m c o m u m e geral, c o m o e m p a r t e digo n o r e s u m o j u n t o .
E receberá mercê.

[ fl. 259 ] S e n h o r , são tão e tão lamentáveis os clamores q u e p a d e c e m os vexadíssimos


povos das M i n a s desde q u e são freqüentadas c o m o n ã o p o d e r ter d o m í n i o n a sua
531

f a z e n d a de. escravos, "gentilidades, negros q u e p a r e c e impossível o p o d e r c o m a


p e n a descrever t a n t a s crueldades, a q u e , p o r serviço d e D e u s e a u m e n t o grandíssimo
d a real. C o r o a e povos de t o d o o Brasil e R e i n o , deve S u a M a j e s t a d e a c u d i r c o m
o r e m é d i o pelo ter c o m t a n t a facilidade e tão singular, c o m o q u a l terá a estabili-
d a d e d e tão g r a n d e r e m é d i o a utilidade do m e l h o r d e oito milhões no l i m i t a d o
t e m p o d e q u a t r o a n o s , e se s e g u r a r n o v e milhões n ã o e r r a r e i . E suposto p a r e c e
m u i t o p a r a se t i r a r dos p o v o s , p o d e r e i s e g u r a r q u e sendo t ã o g r a n d e u t i l i d a d e ,
s e m a m a i s m í n i m a d e s p e s a d a R e a l F a z e n d a , é s u p e r i o r aos p o v o s , os q u a i s ,
p a g a n d o t ã o g r a n d e c a b e d a l , l u c r a m n o m a i o r valor d e c a d a escravo m u i t o mais
d o d o b r o d o q u e p a g a r a m , e t o d o o m i n e i r o e pessoas q u e t r o u x e r e m os seus
escravos a m i n e r a r ou nas "faisqueiras p o d e m m u i t o b e m p a g a r n o s p r i m e i r o s seis
meses e m a i s ficarem avantajados no lucro do m a i o r "jornal q u e s e m d ú v i d a h ã o
d e ter, c o m o m e l h o r a d i a n t e direi, e m t e r m o s d e q u e o q u e p a g a r trezentas "oita-
vas n o t e m p o d e q u a t r o anos l u c r a mais d e n o v e c e n t a s oitavas, e as m u i t a s mil
almas q u e o inferno traga subirão a o céu triunfantes e gloriosas n a f o r m a seguinte.

S e n h o r , h a v e r á e m t o d a as M i n a s mais d e [160?] mil escravos negros, e sendo


estes p o r j u s t a r a z ã o cativos, sem q u e n e n h u m / / deva ser forro p o r sua m á n a t u r e z a , [ fl. 259v. ]
quase todos hoje se c o n s i d e r a m forros p o r n ã o t e r e m o d o m í n i o q u e d e v i a m ter d e
q u e m os c o m p r a , pela m á r a z ã o n a t u r a l dos ditos "gentios, sendo estes a causa d a
p o b r e z a e miséria e m q u e se v ê e m todos os mineiros e toda a pessoa q u e os c o m p r a ,
e ser a terra e o m i n e r a r q u e se n ã o p o d e c o n t i n u a r s e m o tal gentio. E p a r a se vir n o
c o n h e c i m e n t o d e tão irracional gentio n e g r o , direi p a r t e d o q u e t e n h o visto e o u v i d o
c o m v e r d a d e dos casos.
A o p é d a vila do S a b a r á , h o u v e u m q u i l o m b o , seis "léguas fora d a vila, a o p é
d a estrada d o R i o d e J a n e i r o , e c h a m a d o do C u r r a l i n h o ou Palmital, nas cabecei-
r a s do rio d a P r a t a , q u e sai nos R a p o s o s . H o u v e o dito q u i l o m b o d e m a i s d e
trezentos negros; saiam à estrada e levavam p a r a o q u i l o m b o vinte e t r i n t a cavalos
c a r r e g a d o s d e "fazendas secas e m o l h a d a s e os negros novos e "ladinos q u e con-
d u z i a m , d e i x a n d o m o r t o s os c o n d u t o r e s . E sendo o d o u t o r Luís Botelho d e Q u e i r ó s
"ouvidor e o "capitão J o ã o V e l h o B a r r e t o "juiz ordinário, ajustaram e n t r e a m b o s
j u n t a r e m , c o m s e g r e d o , g e n t e s , é i n d o e m p e s s o a s c o m m u i t a g e n t e a o dito
q u i l o m b o e d a n d o - l h e cerco se m a t a r a m 98 e presos, vivos e feridos, 8 5 . Resolve-
r a m aqueles "ministros e mais pessoas q u e de tantas e m tantas "braças se fossem
m a t a n d o os presos, e cortando-Ihes as cabeças as f o r a m p o n d o e m p a u s p e l a dita
estrada, d e sorte q u e , p o r m e d i d a , t o c a r a m à vila [do S a b a r á ] três e d a vila até a
vila d o C a e t é cinco, p a r e c e n d o a t o d o s os d a q u e l a b á r b a r a s e n t e n ç a t e r e m feito
g r a n d e serviço a D e u s e à M a j e s t a d e e povos. M o s t r a r e i q u e só fizeram serviço
p a r a o inferno, t e n d o m o d o e meios p a r a o fazerem a D e u s , a o rei e a o p o v o .
Esteve a q u e l a estrada c o m sossego seis ou oito meses, e passados t o r n a r a m
h a v e r n e g r o s ladrões e m a t a n d o a n d a n t e s e r o u b a n d o . Fez a C â m a r a p a r t i d o a
u n s " c a p i t ã e s - d o - m a t o , c o m o a o V e l o s o , e i n d o c o m seus s o l d a d o s , m u l a t o s e
532

[ fl. 2 6 0 ] negros forros a n d a r a m muitos dias sem os p o d e r e m a c h a r . E, j á saindo, disse / /


u m s o l d a d o " t a p u i o a o seu " c a p i t ã o : " S a i a m o s pelo " q u i l o m b o v e l h o " . E v i n d o
s e m tal s u p o r e m n o m e s m o lugar é nas forquilhas velhas t o r n a r a m a fazer e cobrir
novos r a n c h o s , m a t a r a m 32, presos 19. E s e m p r e n a q u e l a p a r t e h o u v e , h á e have-
r á negros e n q u a n t o se lhes n ã o d e r o r e m é d i o justo.
P e r t o d a vila d o C a e t é , p a r a trás d a serra, p a r a a b a n d a do I t a m b é , h o u v e
o u t r o q u i l o m b o . M a n d a r a m p a r a lá o dito Veloso. T r o u x e d a p r i m e i r a vez seten-
ta m ã o s direitas p a r a a C â m a r a , c o n t r i b u t o a o p o v o lhe p a g a r setecentas "oitavas
— p o r c a d a m ã o dez oitavas — e presos bastantes — q u e n a q u e l e t e m p o c a d a preso
32 oitavas, E passados p o u c o s meses sucedeu o m e s m o q u e n o d o C u r r a l i n h o , e o
m e s m o n o s m u i t o s q u i l o m b o s d o M o r r o V e r m e l h o , e o m e s m o n o s do C u r r a l
d e l - R e i e m a t a s d e B e n t o P i r e s , e o m e s m o nas serras d e I t a b i r a , P a r a o p e b a e
Itatiaiuçu e serras do C a r a ç a e São B a r t o l o m e u e C a m p o s Gerais, q u e se lhes n ã o
p o d e d a r n ú m e r o n e m n o m e s a tantos, h a v e n d o tão singular r e m é d i o m u i t o con-
veniente p a r a D e u s [e] p a r a a Majestade; e m poucos anos, m a i s d e oito o u nove
milhões, sem a mais m í n i m a despesa d a R e a l F a z e n d a . A q u e os povos fizerem,
d e n t r o e m seis meses, o l u c r a m è m mais de d o b r o , a o "galarim, e é,
Senhor, n ã o t e m outro remédio, e só o singular de se estabelecer u m seguro,
p a g a n d o p o r c a d a escravo, por u m a vez somente, q u e é até m o r r e r , 15 "oitavas, e
[ fl. 260v. ] estas i m p o r t a r ã o os / / nove milhões. Parecerá a muitos, ignorantes d a razão, q u e se
se puser coisa às M i n a s q u e i m p o r t e nove milhões ficarão arrastadas. Pois, senhor, é
s e m dúvida q u e n e n h u m d e t r i m e n t o p o r s e m e l h a n t e m o d o d á às M i n a s todas o
p a g a r os nove milhões q u e i m p o r t a m o seguro dos negros q u e h á : os mineiros, sem
d e t r i m e n t o algum, p o d e m p a g a r as quinze oitavas p o r c a d a escravo nos primeiros
seis m e s e s . S u p o s t o q u e se d e v e d a r os q u a t r o a n o s a c a d a m e r c a d o r e aos
"combpieiros q u e os c o n d u z e m p a r a vender, p o d e m p a g a r t a m b é m do dia d a ven-
d a a seis meses, e m r a z ã o de q u e estes v e n d e m u m escravo p o r 180 oitavas n ã o
estando seguro, e o de 180 oitavas estando seguro se p o d e v e n d e r p o r 256 oitavas,
é p o r 15 do seguro lucram 76 oitavas.
S e n h o r , é d e saber, diz t o d o n e g r o q u e se c o s t u m a a fugir e a i n d a os q u e
ficam, "fugir", d i z e m eles, "fugir é b o m " , p o r q u e se os m a t a m lá n o m a t o , dizem,
" m o r é m o r é , m o r r e u , a c a b o u o cativeiro è foi descansar n a suã terra.". E p a r a isso
t ê m t o m a d o tal m o d o e os senhores m e d o d e os castigarem q u e n e m a d o u t r i n a
lhes e n s i n a m , E p a r a q r e m é d i o a tantos m a l e s direi, c o m o d i g o , q u e n ã o t e m
r e m é d i o senão estabelecendo-se o dito seguro, c o m o qual se s e g u e m as utilidades
seguintes e as mais que.se seguem, q u e são [muitas e muitas?]:
Segue-se o a u m e n t o p a r a a real C o r o a , q u e n ã o fugindo os n e g r o s n ã o have-
rá m i n e i r o p o b r e e se p a g a r ã o m u i t o s "quintos do m u i t o p u r o q u e se h á de tirar e
descobrir, e c o m o dito seguro serão tantas as utilidades q u e as n ã o p o d e r e i dizer
todas, p o r q u e se fazem incríveis, m a s sim as q u e digo p o r h o r a .
[fl. 261 ] E c o m o digo certo q u e , estabelecido o dito seguro, n ã o h a v e r á h o m e m que,
s e n d o m i n e i r o inteligente, n ã o p o d e r á ser p o b r e , só p o r justíssimo castigo de D e u s ,
p o r q u e o q u e faz s e r e m os mineiros p o b r e s é a falta d e d o m í n i o nos escravos, e
533

estes, p o r sua rústica n a t u r e z a [faltos?] d o juízo, s e m l e m b r a n ç a gentílica d o q u e


h á p o u c o saíram, antes q u e r e m m o r r e r aos tiros q u e a c o m o d a r e m - s e c o m o cati-
veiro q u e p o r j u s t a r a z ã o d e v e m ter.

Primeira utilidade

Assim, senhor, seguro c a d a n e g r o nas ditas quinze "oitavas, t o d o o q u e fugir


logo deve ser *rejetado de u m p é pelo n e r v o d o c a l c a n h a r , cujo rejeto será franquiar
u m a c o n t í n u a estrada p a r a o céu, será o fechar a do inferno e será o b e m c o m u m
e geral p a r a todos os viventes, t a n t o das M i n a s c o m o d e t o d o o Brasil e R e i n o . P o r
o rústico viver d e semelhante "gentilidade n ã o se. lhe p ô d e h á tantos anos a c e r t a r
r e m é d i o q u e lhe fosse útil, e só t e m m o s t r a d o a experiência e a l g u m e x e m p l o q u e
só o rejeto nos p é s , q u e lhes tira o m u i t o q u e c o r r e m , e só n ó c o r r e r b e m se fiam
e e n t r a n h a r - s e nos m a t o s , d o n d e só os "gentios "tapuios os t i r a m b e m , p o r serem
criados nos ditos m a t o s , e sem dúvida q u e rejetados q u a t r o c e n t o s negros se p o d e -
rá s e g u r a r o n ã o fugir m a i s n e g r o a l g u m , e desta p r i m e i r a utilidade se s e g u e m
m u i t a s e m geral: p a r a D e u s , p a r a el-rei e p a r a os povos, e direi p a r t e .

S e g u n d a utilidade

T a n t o q u e h o u v e r a l g u m n ú m e r o d e negros / / n o seguro, estes, suposto q u e [ fl. 26 lv. ]


rejetados, se entregarão a mineiros inteligentes e abastados, dos d e melhor n o m e s e
consciência, p a r a estes os m a n d a r e m administrar nas minas q u e h ã o d e d a r c o m eles
nas serras e montes onde houver experiência haver ouro, e se descobrirão c o m os rejetados
muitos haveres de ouro nas ditas serras. E descoberto qualquer descobrimento, p o d e r á
ao descobridor c o m os seus escravos d a r t a m b é m sua mina, sem prejuízo d a R e a l [Co-
r o a ] , dos rejetados e t a m b é m [dos] mais mineiros, sendo a maior [razão] d e c o m os
rejetados se fazerem muitos d e s c o b r i m e n t o s a de n ã o p a g a r e m deles *capitação,
n e m se lhes correr risco d a m o r t e , n e m dos p a g a m e n t o s . E c o m o n a d a corre risco,
p o r isso é a m a i o r razão d e se descobrir muito ouro c o m os ditos rejetados.

Terceira utilidade

Q u e sendo caso q u e , depois d e seguro, a toda [aquela?] pessoa q u e segurou


se lhe fugir a l g u m n e g r o , esta irá à casa dq seguro e e n t r e g a r á a certidão do n e g r o
fugido c o m quinze "oitavas passados oito dias, e e m lugar do n e g r o rejetado leva-
rá d a casa d o seguro o u t r o n e g r o . E a p a r e c i d o o q u e estava seguro, sendo rejetado,
se a pessoa q u e foi seu s e n h o r o quiser p a r a o conservar rejetado p a r a e x e m p l o
dos o u t r o s do dito s e n h o r , se lhe d e v e d a r p o r seu j u s t o p r e ç o , p o r t e m p o d e
q u a t r o anos ou c o n f o r m e o c o m p r a d o r for.

Q u a r t a utilidade

Q u e aos mineiros q u e se o c u p a r e m n a administração das m i n a s dos rejetados


se lhes p a s s a r ã o , e m c a d a u m a n o , certidão c o m o o c u p a d o s n o real serviço, e se
534

a l g u m a m i n a das dos *rejetados for m u i t o custosa é c a r e c e r d e despesas p a r a se


c o n t i n u a r c o m b o m e x a m e o p r o v e d o r do seguro lhe m a n d a r á assistir das outras
m i n a s q u e d e r e m j á o u r o c o m o necessário p a r a pólvora ou f e r r a m e n t a s .

[ t i 262 ] Q u i n t a utilidade

Q u e estabelecido o dito seguro, se h ã o de segurar todos os crioulos e m u l a t o s


nascidos e criados nas M i n a s , s e m ficar fora do seguro cativo a l g u m pelo m a u e x e m -
plo que. daí se segue e só assim t o m a r b o m m o d o e t e r m o à terra, vendo-se os mineiros
c o m d o m í n i o n a sua fazenda mais preciosa, q u e são os escravos, s e m as aflições q u e
p a d e c e m e n t r e tão rústicos "gentios.

Sexta utilidade

Q u e p a r a t e r r o r dos negros e d o s m u i t o s insolentes c r i m i n o s o s , d e v e S u a


Majestade m a n d a r vir para as Minas duzentos ou trezentos "tapuios cristãos batizados,
c o m seus "cabos dos mesmos, p o r é m com u m cabo branco, que n ã o faltam, dos q u e
lhes sabem a língua, p a r a b e m os governar, cujos tapuios batizados e b e m doutrina-
dos são muito necessários nas Minas, e c o m estes se seguem muitas utilidades p a r a
D e u s , p a r a o a u m e n t o d a real C o r o a e utilidades dos p o v o s : p a r a D e u s p o r q u e
estes tapuios farão q u e os tapuios bravos q u e a n d a m nos m a t o s vizinhos das M i -
nas se b a t i z a r ã o e t o r n a r ã o m a n s o s e descobrirão m u i t o s o u r o s e. t a m b é m farão
m u i t a s diligências d o real serviço; e p a r a os povos, q u e b a s t a r ã o os negros vê-los
nas M i n a s p a r a n ã o fugir mais negro algum, p o r q u e os tapuios farejam os negros
[ fl. 262v. ] s e m e l h a n t e os cães de perdizes / / farejam a caça. E p o r tão justas razões são muito
necessários os tapuios nas Minas, e o q u e as "câmaras hão de d a r a mulatos vadios e
negros forros o d ê e m aos tapuios, c o m os quais se seguem muitas utilidades.

Sétima utilidade

Depois d o dito seguro, sendo alguns mineiros, ou q u a l q u e r pessoa, executa-


dos nas M i n a s , e a execução for e m escravo, estando este seguro, s e m o risco de
fugir, s e m d ú v i d a os a v a l i a d o r e s os p o r ã o e m d o b r a d o v a l o r d o q u e a n t e s d e
seguro, p o r r a z ã o d e q u e o possuidor, e x e c u t a d o , t e n d o n e g r o q u e foge, se deixa
m e s m o executar p a r a n o m e a r à p e n h o r a os negros q u e fogem; e p o r isso os avali-
a d o r e s os p õ e m e m baixo valor, p o r q u e n a d a v a l e m pelo g r a n d e risco e vício d e
fujão, q u e se n ã o p o d e d a r valor a l g u m a n e g r o q u e foge; e p o r isso se r e m a t a m
escravos q u e , p o r n ã o estarem seguros, se r e m a t a m a 60 rml "réis, e se o q u e se
r e m a t a p o r 60 se r e m a t a r i a p o r 300 e s t a n d o seguro p o r 15 *oitavas, e assim que,
seguro, cresce n o valor d o d e d o b r o e m u i t o mais.

S e n h o r , é s e m d ú v i d a e s t a r e m os m o r a d o r e s das M i n a s e m t ã o m i s e r á v e l
estado q u e o n ã o posso referir, e n ã o p o d i a m c h e g a r a m a i o r miséria. Q u e m tal
c u i d a r a q u e h a v i a m d e ver e m terras de m i n a s tal clamor, t e n d o tão singular r e m e -
535

d i o q u e / / a m e l h o r j ó i a q u e p o d i a m possuir os povos se veja e m tão lamentável


; [ fl. 263 ]
ruína q u e se p o d e c o m p a r a r o u t r a s e g u n d a T r ó i a castigada? E p a r a t o r n a r a seu
antigo estado n ã o p o d e ser s e m se estabelecer o dito seguro, c o m o qual se alcan-
ç a r ã o as utilidades referidas e m u i t a s m a i s e m a i s superiores d o q u e se p o d e m
c o n s i d e r a r : a p r i m e i r a , d o d o m í n i o dos "gentios n e g r o s ; s e g u n d a , d o s m a i o r e s
"jornais destes; terceira, do a u m e n t o das terras; q u a r t a , dos muitos haveres q u e se
h ã o de descobrir c o m os rejetados, sem dúvida; quinta, das utilidades q u e se se-
g u e m aos administradores dos ditos "rejetados e a todos e m geral e m u i t o m a i s à
real C o r o a , a c a b a n d o - s e de todo o g r a n d e v e x a m e q u e p a d e c e m os p o v o s c o m os
ditos n e g r o s , q u e n ã o são s e n h o r e s de os p o d e r e m castigar, m e r e c e n d o - o t a n t o ;
sexta, e a m a i o r , de se a l a r g a r e m as terras p a r a a p a r t e o n d e h a b i t a m os gentios
"tapuios bravos, q u e c o s t u m a m q u e i m a r os sítios novos e m a t a r os b r a n c o s , e t u d o
d e i x a m e m c i n z a s , q u e i m a d o ; sétima, a q u a n t i d a d e dos t a p u i o s q u e se h ã o d e
b a t i z a r v i n d o os t a p u i o s m a n s o s p a r a as M i n a s ; oitava, q u e n ã o h a v e r á t a n t o s
vadios nas M i n a s fiados e m serem "capitães e * soldados-do-mato; n o n a , q u e fica-
r ã o livres os povos dos tributos que lhes b o t a m as " c â m a r a s p a r a salário dos ditos
vadios; d é c i m a , q u e se h ã o d e o c u p a r m u i t a q u a n t i d a d e de m i n e i r o s e m p r o v e d o -
res, tesoureiros e escrivães e p r o c u r a d o r e s d o dito seguro, dos q u a i s h a v e r á u m
p r o v e d o r - m o r , "ministro d e segundo ou / / terceiro lugar, pelo g r a n d e l u g a r q u e [fl. 263v. ]
há de o c u p a r e m ser p r o v e d o r - m o r . M u i t a s mais p o d e r i a dizer e se dirão conse-
g u i d o q u e seja o dito seguro.
N o a n o de 1735 o r d e n o u o "governador, q u e e n t ã o era o c o n d e das Galveias,
q u e p o r v e r as M i n a s m u i t o "sopeadas e vexadíssimas dos negros fugidos q u e se
ajuntassem as pessoas d e m e l h o r n o m e c mais antigos n a g o v e r n a n ç a p a r a assen-
t a r e m n o m e l h o r m o d o p a r a se d a r r e m é d i o p a r a n ã o h a v e r n e g r o s fugidos. E ,
ajuntando-se, v o t o u J o ã o Gonçalves Batista e T o m é Ferreira e outros q u e se devia
c o r t a r a m ã o direita a t o d o o n e g r o q u e fugisse; v o t a r a m o " c a p i t ã o - m o r D o m i n -
gos M o r e i r a e o capitão V i l a r i n h o e outros q u e se pusessem e m todas as freguesias
capitães e *soldados-do-mato, pagos pelos m o r a d o r e s e pelas c â m a r a s , e q u e estes
p r e n d e s s e m a todos os negros q u e n ã o trouxessem escritos d e seus d o n o s r e c o n h e -
cidos; v o t a r a m o c a p i t ã o - m o r Nicolau C a r v a l h o e o c a p i t ã o - m o r A n t ô n i o d a C o s -
ta R i b e i r o e o capitão Estêvão d e Sousa, " p r o c u r a d o r d a C â m a r a , e outros q u e a
t o d o n e g r o q u e a n d a s s e fugido fosse r e j e t a d o , q u e só a s s i m se l h e s p o d i a d a r
r e m é d i o e q u e se lhes n ã o p o d i a d a r outro; v o t a r a m os *juízes ordinários d o dito
a n o , D o m i n g o s de A b r e u e F e r n a n d o d a M o t a , q u e a todos os negros q u e a n d a s -
sem fugidos se lhes cortassem as cabeças à forca; e outros muitos, p o r diferentes
votos, n ã o e s t a n d o as M i n a s tão a t r o z m e n t e a t e n u a d a s / / c o m o estão a g o r a n o [ fl. 264 ]
t e m p o p r e s e n t e , e p o r n ã o c o n c o r d a r e m a s s e n t a r a m t o d o s q u e fossem t o d o s os
p a r e c e r e s a o dito g o v e r n a d o r c o n d e p a r a resolver o q u e lhe p a r e c e r m e l h o r . E
v e n d o o dito g o v e r n a d o r a v a r i e d a d e d e pareceres, c h e g a n d o aos votos dos juizes
A b r e u e M o t a , l e m b r a d o - l h e o tê-los p r e n d i d o no a u t o da posse p o r n ã o i r e m n a
f o r m a do estilo r e n d e r - l h e vassalagem, r a z ã o p o r q u e n ã o resolveu n a d a . P o r é m ,
e n t r a n d o o g o v e r n a d o r M a r t i n h o de M e n d o n ç a e a c h a n d o n a Secretaria qs ditos
536

votos e p r o p o n d o a o C o n s e l h o R e a l , resolveram e m conselho q u e a t o d o o n e g r o


q u e fugisse se lhe cortasse u m , digo, p r i m e i r o fosse m a r c a d o nas costas; s e g u n d a
vez, se l h e cortasse u m a orelha; e terceira, " m o r t e n a t u r a l p a r a s e m p r e , p a r a o q u e
veio u m a "provisão régia q u e , c o m o devido respeito, os s e n h o r e s conselheiros e
S u a Majestade n ã o s a b e m a rústica r a z ã o e viver dos negros, p o r q u e estes todos
são m a r c a d o s n a c a r a nas suas terras e q u a n t o s mais lavores t ê m m a i o r g a r b o e
fidalguia p a r a os ditos negros, e assim que j á se n ã o usa d e m a r c a r calos nas costas,
c o m o se m a n d o u n a dita provisão, p o r n ã o servir isso de e x e m p l o a l g u m .
E assim, s e n h o r , os negros, só o *rejeto e os "tapuios serão os m e i o s p a r a n ã o
h a v e r n e g r o s fugidos, e seguirão p o r isso infinitas utilidades p a r a a real C o r o a nos
p r i m e i r o s q u a t r o anos do m e l h o r de n o v e milhões, e o mais q u e se p o d e r á gastar
d o dito c a b e d a l p a r a n e g r o s n o v o s s e r ã o , q u a n d o m u i t o , e m m u i t o s a n o s , u m
[ ti. 264v, ] milhão. P o r / / rejetados q u a t r o c e n t o s ou q u i n h e n t o s negros, n ã o fugirá mais ne-
g r o a l g u m , e p o r acaso m u i t o r a r o fugirá a l g u m m u i t o b u g r e , o q u e a g o r a só
f o g e m os ladinos, e m u i t o s fogem só pelos d o n o s e s e n h o r e s lhes e n s i n a r e m a
d o u t r i n a cristã, e n e m isso são senhores d e fazer, o q u e n ã o fazem pelos conservar,
q u e até os c a s a m , e depois d e casados l a r g a m os filhos e m u l h e r e s e fogem. Assim
q u e t o r n o a dizer q u e n a vinda dos tapuios, mansos e b a t i z a d o s c o m a d o u t r i n a
dos p a d r e s d a C o m p a n h i a [de J e s u s ] , será bastante p a r a n ã o fugirem os negros e
se v e r ã o os p o v o s s u p e r i o r m e n t e a u m e n t a d o s , ricos e p o d e r o s o s , e se a l a r g a r ã o
p o r terras q u e estão e m p o d e r e d o m i n a d a s pelos "gentios tapuios bravos, e estes
r e c e b e r ã o m u i t o a s a n t a lei cristã, n o q u e se fará m u i t o serviço a D e u s , nosso
S e n h o r , o q u e t u d o se conseguirá c o m a v i n d a dos ditos tapuios cristãos e c o m o
rejeto dos n e g r o s q u e fugirem etc,

E receberá m e r c ê

62
[Parecer contra a capitação e as casas de fundição e pela imposição
de quantia equivalente ao quinto sobre os gêneros]

Parecer de burocrata sobre a melhor forma d e arrecadação


do quinto. Elaborado por solicitação dó Senado da C â m a r a para
a obtenção de subsídios para representação à Coroa contra a lei
de 3 de dezembro de 1750 que restabeleceu as casa de fundição
537

em Minas, ato usual e m tais situações. A proposta gira em torno


da defesa de u m tributo único sobre todos os gêneros que entras-
sem em Minas Gerais e d a associação dos sistemas de cobrança
por capitação e por casas d e fundição a carestia, decadência
econômica e crise na mineração.
U m movimento de solicitação p o r camaristas de propostas
alternativas de tributação a homens bons e autoridades foi de-
sencadeado em virtude do disposto no capitulo 11 da lei de 3 de
dezembro de 1750 que facultou ao governador e procuradores
do povo o encaminhamento de representação contendo alternati-
va ou correções ao sistema das casas de fundição restablecido
pela referida lei. Este parecer foi enviado à Corte anexo à repre-
sentação da C â m a r a de Sabará. Complementa os documentos
.54 a 6 1 .
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
M a t o s o p ô d e coligir a c ó p i a e p a r t i c i p a r dos d e b a t e s dos
camaristas e homens bons; informaria, ainda, sua participação
nas juntas sobre o assunto.
A u t o r í a , l o c a l e d a t a : Félix de Azevedo d a Fonseca;
Sabará; 26.4.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado d a C â m a r a da Vila Real de Sabará.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Parecer, n a primeira pessoa do
singular, em que se argumenta contra os sistemas de capitação e
casas de fundição para a cobrança do quinto. Compreende lon-
go exórdio em que se aplicam tópicas objetivando despertar a
piedade do rei. A afetação de humildade õu de autodesqualífi-
cação é artifício retórico que objetiva obter a condescendência
do leitor. Objetivando produzir efeitos de comiseração n o leitor,
observa-se a aplicação das tópicas dos danos inerentes ao siste-
m a de capitação e da ruína dos mineiros, extensiva aos roceiros
e homens de negócio; das tópicas da ilegalidade, da injustiça e
dos danos inerentes à derrama; da tópica do " e m p e n h o " e empo-
brecimento dos mineiros e de sua importância decisiva na pro-
dução das riquezas coloniais; da tópica da ruína das M i n a s .
Acrescenta-se a tópica do desconhecimento da matéria pelos que
fundamentam a legislação da cobrança do quinto. O narrador
constitui a ineficácia, injustiça e impraticabilidade da capitação
e das casas de fundição como tópica, objetivando persuadir o
leitor contra ambos os métodos. A leitura de sinais da presença
d a divina providência evidencia a vontade de Deus escolástica-
mente inscrita na ordem das coisas e profeticamente figurada
nos fatos e n a natureza. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
século X V I I I , com maiúsculas providas de apex em forma de
volutas, hastes inferiores moderadas, nas letras " g " e " p " , com
olhos cheios: "r" redondo em u m só traço ou e m forma de mar-
telo, arredondado. Uso de abreviaturas nas formas de tratamen-
538

to com ponto de abreviação e letras sobrepostas. Vírgulas e cedi-


lhas perpendiculares às linhas e inclinadas à direita. Primeira
linha com a mesma escrita m a s em módulo grande. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir de
cópia do A H U , Cons. Ultram., B r a s i l / M G , cx. 58, doe. 28 e
restringiram-se aos termos que comprometiam o significado e o
e n t e n d i m e n t o d o t e x t o , m a n t i d a s as p e q u e n a s v a r i a n t e s
introduzidas pelo copista.
Cópia manuscrita:
A H U , Cons. Ultram., Brasil/MG, cx. 58, doe. 28.

[ íl. 2 6 5 ] o m o
P i t ° q u e Vossas M e r c ê s m e i m p õ e m resulta exercício a m i -
r e c e

• n h a obediência, m e fica aquele sendo suave e só o faz p e s a d o o r e c o n h e -


^ ^ . ^ cer eu a d e b i l i d a d e do m e u t a l e n t o , assim p a r a l o u v a r o zelo c o m q u e
Vossas M e r c ê s se e m p r e g a m n a utilidade d o b e m p ú b l i c o c o m o p a r a d i s c o r r e r
sobre o m e i o m a i s c o n v e n i e n t e d e p a g a r o *quínto c o m s e g u r a n ç a d a F a z e n d a
R e a l e suavidade dos vassalos, m a t é r i a mais i m p o r t a n t e q u e p o d e vir à considera-
ção dos fiéis vassalos q u e h a b i t a m o s n e s t e *país das M i n a s e p a r a p r o v a d a m i n h a
o b e d i ê n c i a discorro assim.
E inquestionável a obrigação que temos de pagar o quinto ao soberano,
c o m o s e n h o r direto, e nesta consideração e d e n ã o h a v e r m e i o livre d e inconveni-
e n t e s , o u c o n t r a o E r á r i o R é g i o o u c o n t r a os vassalos, d e v e m o s eleger m é t o d o
mais distante destes inconvenientes, d e sorte, q u e c o b r e o s o b e r a n o o seu quinto e
nós l h o p a g u e m o s c o m mais suavidade nossa.
O s m é t o d o s q u e p a r a este fim até a g o r a se t ê m p r a t i c a d o t ê m sido dois, a
s a b e r , " c a p i t a ç ã o e f u n d i ç ã o , os quais s e m p r e n o s t ê m sido r e p u g n a n t e s , e d a
nossa r e p u g n â n c i a t e m resultado a m u d a n ç a d e capitação p a r a fundição e d e fun-
d i ç ã o p a r a c a p i t a ç ã o , e desta, u l t i m a m e n t e , p a r a a q u e l a , p o r v i r t u d e d a Novíssima
Lei d e 3 d e d e z e m b r o , q u e d e v e m o s o b s e r v a r c o m o fiéis vassalos. E desta sorte
temos a n d a d o c o m o entre Cila e C a r i b d e , * sem p o d e r m o s sacar deste estreito, e
c o m o o p r e c e i t o d a sobredita lei nos n ã o tira, antes nos m a n d a conservar nele, e

Cila e Caribde são personagens da mitologia grega, emboscados em cada um dos lados do estreito
de Messina, na Sicília, costa sul da Itália. Cila era um monstro em forma de mulher, que tinha a
parte inferior do corpo rodeada por seis cães ferozes que devoravam tudo o que lhes passava ao
alcance. Caribde, também em forma de mulher, era o monstro que absorvia três vezes por dia
grande quantidade de água do mar, arrastando para sua goela tudo o que flutuava. Terror do
antigos navegantes, quem escapasse do turbilhão de Caribde ia bater contra o rochedo de Cila,
originando deste fato a expressão "estar entre Cila e Caribde", isto é, estar entre um mal e outro,
utilizado aqui pelo autor para exprimir a situação em que se encontrava as Minas e os mineiros.
539

n a dita lei temos u m a manifesta p r o v a das pias intenções c o m q u e o s o b e r a n o nos


a n i m a a b u s c a r a sua real clemência e p r o t e ç ã o , a esta d e v e m o s r e c o r r e r p r o p o n -
do-lhe m é t o d o q u e nos seja mais suave e seguro a sua R e a l F a z e n d a e nos s a q u e
fora dos dois baixos de "capitação e "fundição e m q u e até agora nos conservamos.
B e m c o n h e ç o eu q u e as razões d e E s t a d o e políticas dos séculos e n c o n t r a m [ fl. 265v. ]
n o s s o b e r a n o s a m u d a n ç a r e p e n t i n a das leis, m a s c o m o t e m o s rei t ã o p i o , c o m o
manifestam os muitos t e s t e m u n h o s q u e nos t e m d a d o d a sua real clemência, estes
n o s d e v e m a n i m a r p a r a e s p e r a r m o s q u e a t e n d e r á b e n i g n o a nossa súplica, p r e -
z a n d o mais as m á x i m a s católicas do q u e as políticas contrárias às suas p i a s inten-
ções (por ser q u a l i d a d e d e t o d o o v a r ã o sábio m u d a r d e conselho), p a r a se c o m p a -
d e c e r dos nossos justos c l a m o r e s , m i t i g a n d o - o s c o m o u t r a lei q u e nos seja m a i s
suave e segura a sua R e a l F a z e n d a , conforme o m e i o q u e lhe p r o p u s e r m o s .
Este é o Aquiles^ c o m q u e nos p r e t e n d e m intimidar os maquiavelistas q u e só
v o t a m n a s matérias c o n f o r m e lhes dita a sua p a i x ã o ou o seu interesse, d e v e n d o -
se discorrer nas q u e p e r t e n c e m a causa c o m u m e d a C o r o a c o m religiosa p u r e z a ,
dizendo-nos aqueles q u e a nossa súplica h á d e ser c o n t r a d i t a d a p o r todos os " m i -
nistros que foram consultados e d e r a m seu p a r e c e r p a r a a resolução da Lei
Novíssima. P o r é m , m u n i d o s c o m o escudo d a fé, d e v e m o s n ã o desistir desta i m -
p o r t a n t e e m p r e s a , e s p e r a n d o v e n c e r a q u e l a dificuldade m e d i a n t e o excesso d e
p i e d a d e d o s o b e r a n o , p a r a o q u e nos n ã o d e v e m d e s a n i m a r as nossas p e q u e n a s
forças, pois m u i t a s vezes se vale D e u s de humildes instrumentos p a r a fazer osten-
t a ç ã o do seu i m e n s o p o d e r o b r a n d o admiráveis prodígios.
Nesta consideração, devemos, c o m joelho e m terra e profunda submissão,
a g r a d e c e r a o s o b e r a n o o excesso d e p i e d a d e e p a t e r n a l afeto c o m q u e , p o r m e i o
d a sua s e m p r e v e n e r a n d a lei, nos faz c o n h e c e r o q u a n t o deseja favorecer-nos e„ a o
m e s m o t e m p o , representar-lhe q u e a m e s m a lei q u e sua real clemência nos aplica
p o r r e m é d i o nos c o n d u z a m a i o r e s males, m o s t r a n d o ao dito s e n h o r os dois m é t o -
dos, d e c a p i t a ç ã o e f u n d i ç ã o , q u e e m t e m p o s a l t e r n a d o s até o p r e s e n t e se t ê m
p r a t i c a d o nestas M i n a s p a r a a c o b r a n ç a d o real q u i n t o , a saber: o p r i m e i r o , p o r
c a p i t a ç ã o , o u "bateias, estabelecido e m abril de 1714, c o m o q u a l c l a m a v a m os
povos; o s e g u n d o , p o r "casa d e fundição e m o e d a , estabelecido e m 1724, c o m o
q u a l m u l t i p l i c a r a m os povos os seus clamores; o terceiro, p o r casas d e fundição,
estabelecidas nas c a b e ç a s das c o m a r c a s e m 1734; e o q u a r t o , s e g u n d a vez, p o r
c a p i t a ç ã o , q u e teve p r i n c í p i o e m j u l h o d e 1 7 3 5 , c o m o q u a l os c l a m o r e s dos
vassalos c h e g a r a m a m a i o r excesso.
N e s t e p o n t o , d e v e m o s p e d i r a o dito s e n h o r nos preste a s u a real a t e n ç ã o [ fl. 266 ]
p a r a lhe r e p r e s e n t a r m o s q u e aqueles clamores q u e articulavam os vassalos c o n t r a

Filho de Tetis e de Peleu, foi o mais famoso dos heróis gregos da Ilíada. Quando nasceu, sua mãe o
mergulhou na lagoa Estígia, o que o tornou invulnerável, exceto no calcanhar, por onde ela o
segurou. Durante a Guerra de Tróia, Paris (ou Apolo disfarçado em Paris) matou Aquiles, ferindo-
o no calcanhar. Seu nome tornou-se em todas as línguas personificação de valentia.
540

o m é t o d o d a "capitação, duas vezes p r a t i c a d o , p r o c e d i a m d a desigualdade e mais


d u r e z a s q u e e n v o l v e m este m é t o d o , o b r i g a n d o - o s a p a g a r , d e r e p e n t e , g r a n d e s
somas q u a n d o n ã o t i n h a m u m a "oitava p a r a o cotidiano sustento, sendo obriga-
dos os d e c o n t r á r i a sorte a p a g a r aquilo c o m q u e d e i x a v a m d e contribuir os q u e
e x p e r i m e n t a v a m favorável.
D a m e s m a sorte, d e v e m o s r e p r e s e n t a r a o dito s e n h o r q u e aqueles clamores
q u e proferiam os vassalos c o n t r a o m é t o d o d a "fundição p r o c e d i a m d a b a i x a n o
v a l o r do o u r o e, c o n s e q ü e n t e m e n t e , d a a l t e r a ç ã o que. e x p e r i m e n t a v a m nos seus
e m p e n h o s e p r e ç o s dos gêneros; e p o r última c o n s e q ü ê n c i a , a falta d e l i b e r d a d e
c o m o p e r d a do m e l h o r b e m a cuja estimação n ã o corresponde t o d o o o u r o , ficando
sujeitos a várias extorsões dos inspetores, denúncias e "devassas, c o m o p o r t a aberta
p a r a satisfação do ódio e os "desencaminhadores e m ocasião p r ó x i m a p a r a os rou-
bos, t e n t a d o s d e m a i o r lucro, p o r cuja causa, a c a d a passo, se v i r a m a r r u i n a d o s
muitos vassalos e, c o n s e q ü e n t e m e n t e , outros q u e c o m eles t i n h a m contas q u e , aliás,
existiriam e fariam grandes utilidades à C o r o a e "república c o m outros comércios.
E m s e g u n d o lugar, d e v e m o s r e p r e s e n t a r a o dito s e n h o r a infalibilidade dos
" d e s c a m i n h o s do o u r o ao real "quinto pela situação do "país n o c e n t r o d o sertão,
c o m a extensão d e d u z e n t a s e tantas "léguas d e circunferência, p o r t o d a a p a r t e
com saídas francas por rumos desertos, sem poder causar temor aos
d e s e n c a m i n h a d o r e s o inconveniente de serem vistos ou e n c o n t r a d o s . F i n a l m e n t e ,
se se d e s c a m i n h a u m rolo d e t a b a c o , s e n d o coisa d e vulto e c h e i r o s a q u e p e l o
olfato se p o d e d a r n o c o n t r a b a n d o , e se o navio q u e e n t r a p e l a b a r r a d o T e j o
c a r r e g a d o de "drogas, o n d e logo se m e t e m g u a r d a s è o c e r c a m r o n d a s , assim p o r
m a r c o m o p o r terra, n ã o t e n d o mais q u e dois ' p ó r t a l o s , e n ã o obstante essa cau-
tela lhe s a c a m os contrabandistas fardos d e fazenda, ou seja p o r descuido ou p o r
s u b o r n o dos g u a r d a s , e nestes c o n t r a b a n d o s n ã o i n t e r e s s a m os c o n t r a b a n d i s t a s
m a i s q u e o direito das alfândegas, q u e n ã o t ê m c o m p a r a ç ã o c o m o interesse do
d e s c a m i n h o d o o u r o , e se, a i n d a , a o direito d e u m p o r c e m dos c o m b o i o s das
"frotas se d e s c a m i n h a d i n h e i r o , q u e o u r o se n ã o d e s c a m i n h a r á a o q u i n t o e m u m
país t o t a l m e n t e a b e r t o e d e q u e os contrabandistas t i r a m g r a n d e s interesses?

C o n t r a esta p o n d e r a ç ã o n ã o deve servir de a r g u m e n t o ò b o m sucesso q u e se


[ fi. 266v. ] e x p e r i m e n t o u c o m as casas d e fundição q u e se estabeleceram nas cabeças / / das
c o m a r c a s e m o a n o d e 1734, d e v e n d o assentar os contemplativos q u e aquele b o m
sucesso foi acidental, p o r q u e os infratores da lei se abstiveram p o r í n t e r i m dos seus
d e s c a m i n h o s , s u r p r e e n d i d o s d o t e m o r p â n i c o q u e lhes c a u s a v a m as exatas dili-
gências e c a p t u r a s q u e se aplicaram c o n t r a os d e s c a m i n h a d o r e s d o o u r o e m p ó e
f a b r i c a d o r e s d e casas falsas d e fundição e m o e d a , e se d e v e c o n s i d e r a r q u e se
a q u e l e m é t o d o continuasse, c o n t i n u a r i a m os d e s c a m i n h o s , ou p o r q u e afrouxari-
a m as diligências ou p o r q u e os infratores p e r d e r i a m (aquele p â n i c o , digo) aquele
t e m o r p â n i c o q u e t i n h a m c o n c e b i d o , e viria o E r á r i o R é g i o a e x p e r i m e n t a r os
m e s m o s prejuízos q u e e x p e r i m e n t o u nos anos a n t e c e d e n t e s .
541

D a impressão q u e s e m p r e fizeram, n o â n i m o d a M a j e s t a d e estes inevitáveis


inconvenientes, assim d o " d e s c a m i n h o d o o u r o c o m o dos c l a m o r e s dos vassalos,
t e m nascido a v a r i a ç ã o dos dois m é t o d o s e p r e ç o d o o u r o , p a s s a n d o d e "fundição
p a r a " c a p i t a ç ã o , e, c o n s e q ü e n t e m e n t e , o o u r o d e 1.500 p a r a 1.200 ["réis], sem
p r o d u z i r m a i s fruto q u e a p e r d i ç ã o dos vassalos n o a b a t i m e n t o e a l t e r a ç ã o d o
o u r o , sem se evitarem os descaminhos n e m cessarem os clamores dos povos.
N i n g u é m p o d e duvidar q u e a m o e d a c o r r e n t e das M i n a s são as "oitavas d e
ouro e m p ó , e t a m b é m é realmente certo que da m u d a n ç a da m o e d a resulta
p e r d i ç ã o sabida à terra o n d e isto sucede, à vista d o q u e c o m o n ã o c h o r a r e m o s a
nossa p e r d i ç ã o t e n d o e x p e r i m e n t a d o tantas m u d a n ç a s ?
E m confirmação desta v e r d a d e , c o m todo o reverenciai a c a t a m e n t o , d e v e m o s
r e p r e s e n t a r a o s o b e r a n o alguns casos e m figura q u e p a s s a m p o r nós e m realidade,
'verbi gratia: P e d r o deve a J o ã o 3 mil " c r u z a d o s , e e n q u a n t o a g o r a p a g a m o s o
q u i n t o p o r c a p i t a ç ã o e v a l e o o u r o a 1.500 c a d a o i t a v a , b a s t a m a P e d r o 8 0 0
oitavas p a r a p a g a r os 3 mil cruzados q u e deve a J o ã o , m a s c o m o n ã o teve o u r o
p r o n t o p a r a p a g a r a J o ã o antes de ter prática a Lei da Fundição lhe ficou crescendo a
dívida e lhe são necessárias mais 200 oitavas, que juntas às 800 fazem 1.000 oitavas,
p o d e n d o c o m aquelas 200 que lhe acrescem n o e m p e n h o pagar a outro credor. E p o r
evitar maior extensão, sirva este caso de exemplo p a r a todos os mais.
P a r a fazer m a i s manifesto o prejuízo q u e c a u s a a m u d a n ç a ou a b a t i m e n t o d o
p r e ç o do o u r o d e v e m o s representar ao s o b e r a n o q u e estas M i n a s sendo terra rica
pelo q u e e n c e r r a e m suas e n t r a n h a s são seus habitantes a gente mais e m p e n h a d a e
p o b r e q u e t e m t o d o o m u n d o p e l a r a z ã o n a t u r a l d e q u e a m a i o r p a r t e deles q u e
p a s s a m a elas v ê m tão destituídos d e meios c o m o q u a n d o saímos à p r i m e i r a luz
do v e n t r e d e nossas m ã e s ; e c o m o os tesouros q u e a terra e n c e r r a e m suas entra-
n h a s e n g a n o s a m e n t e n o s c o n v i d a m a p r o c u r á - l o s , a e s p e r a n ç a d e consegui-los
nos a n i m a a fazer g r a n d e s serviços, q u e a m a i o r p a r t e s a e m b a l d a d o s e d a q u i
resultam universais e m p e n h o s . A c r e s c e n d o o u t r a r a z ã o n a t u r a l p a r a se acreditar a
p o b r e z a dos habitantes, e consiste / / esta e m q u e a terra das M i n a s n e m p e r m i t e [ fl. 2 6 7 ]
fábricas n e m p r o d u z mais víveres q u e milho e feijão, e todos os m a i s gêneros d e
q u e necessitam os seus h a b i t a n t e s lhes v ê m de fora, e nas c o m p r a s destes c o n s o -
m e m q u a n t o o u r o p o d e m adquirir, e assim lhes passa este pelas m ã o s c o m o á g u a
p r e c i p i t a d a d e u m a p e n h a , e sendo isto certo c o m o é, considere-se a g o r a q u a l será
o e m p e n h o g e r a l das M i n a s e o q u a n t o fica c r e s c e n d o c o m a p r á t i c a d a Lei
Novíssima.

Nesta consideração, sem hipérbole, podemos representar ao soberano que


só esta c a p i t a n i a das M i n a s G e r a i s se a c h a e m p e n h a d a e m 50 m i l h õ e s , e p a r a
fazer verossímil este e m p e n h o , vamos b a t e n d o Tà p o r t a l d e todos q u a n t o s m i n e i -
ros nela h a b i t a m e p e r g u n t e m o s a c a d a u m se aquela lavra e "fábrica q u e possui é
sua, e dirão uns q u e a d e v e m toda, outros a m e t a d e , e outros q u e d e v e m mais d o
q u e possuem, sendo estes o m a i o r n ú m e r o , e finalmente a c h a r e m o s q u e é raríssimo
542

o q u e n ã o está e m p e n h a d o . S e voltarmos p a r a os roceiros, a c h a r e m o s o m e s m o ,


sem fingimento, e d a m e s m a sorte r e s p o n d e r ã o os m e r c a d o r e s , d i z e n d o u n s q u e
m e t e r a m n a sua loja, n a ocasião d a *frota, 5 mil "cruzados, outros 10 mil, outros
15 mil, outros 20 mil, outros 30 mil e t c , m a s q u e Ttudol c o m p r a r a m fiado e o
estão d e v e n d o à p r a ç a do R i o de J a n e i r o . Feita esta diligência, passemos a g o r a a
e x a m i n a r o e m p e n h o d e c a d a u m dos p a r t i c u l a r e s q u e n ã o são m i n e i r o s , n e m
r o c e i r o s , n e m h o m e n s de negócio, e r e s p o n d e r ã o o m e s m o . J u n t e m o s a g o r a este
e m p e n h o e m u m m o n t e e vamos a reparti4o por 500 homens, e feita a conta achare-
m o s q u e toca c o m m ã o larga a 100 mil cruzados de e m p e n h o a c a d a u m dos 500
indivíduos, e p r o v e r a a Deus que o que aqui vemos e m figura n ã o passasse n a realida-
de. O q u e suposto, 500 homens e m p e n h a d o s cada u m e m 100 mil cruzados fazem a
s o m a de 50 milhões, a cujo e m p e n h o acrescem 10 milhões e tantos d á de p e r d a a
prática d a Lei Novíssima c o m a baixa do ouro de 1.500 p a r a 1.200 e m c a d a "oitava.
O q u e procede talvez d e consultar esta matéria, a m a i s i m p o r t a n t e {tanto p a r a os
interesses d a Majestade c o m o p a r a a segurança da consciência), c o m sujeitos q u e só
v o t a r a m fundados e m u m a ligeira especulação e faltos d e prática, n ã o obstante terem
estado nas M i n a s alguns c o m empregos, cujo exercício lhes levou todo o t e m p o e
atenções sem refletirem nesta matéria senão n a ocasião que foram consultados.

A l é m dos sobreditos e m p e n h o s , devemos r e p r e s e n t a r ao s o b e r a n o q u e a m a i o r


p a r t e dos h a b i t a n t e s das M i n a s se a c h a m , de presente, e m p e n h a d o s n a i m p o r t â n c i a
d a " c a p i t a ç ã o das d u a s "matrículas d e 1750 e d a p r i m e i r a d o p r e s e n t e a n o d e
1 7 5 1 , e desta sorte d e v e m p o r c a d a n e g r o 7 oitavas fe m e i a l , cuja i m p o r t â n c i a ,
a t e n d e n d o aos p o u c o s q u e t ê m p a g o p o r racionável o r ç a m e n t o , h á d e i m p o r t a r
130 a r r o b a s de o u r o , as quais, é certo, se h ã o d e p a g a r e m o u r o e m p ó q u e a i n d a
[ fl. 267v~ ] se h á d e extrair d a t e r r a , pois o q u e estava e x t r a í d o , t a n t o p o r ocasião / / dos
p a g a m e n t o s d a frota c o m o p o r respeito à p r á t i c a d a lei q u e d i m i n u i 3 0 0 *réis e m
c a d a oitava, t o d o se e v a c u o u p a r a o R i o d e J a n e i r o , a i n d a o q u e estava e n t e s o u r a d o
e sem uso n a m ã o dos avarentos. E se esta g r a n d e p o r ç ã o d e ouro q u e se deve à
capitação se a c h a ainda nas entranhas d a terra e se há de pagar e m p ó sem entrar n a
fundição e concorrer p a r a o quinto, que ouro se poderá extrair além deste q u e haja de
entrar n a fundição, cujo quinto possa completar as c e m "arrobas determinadas n a lei?
E s e m dúvida q u e esta p o n d e r a ç ã o , a l é m d a infalibilidade dos "descaminhos dos
contrabandistas, faz mais certa m a i o r "derrama, que p o r natural raciocínio nos im-
p o r t a r á e m 50 arrobas no p r i m e i r o a n o é nos mais s u c e d e r á o m e s m o p o r causa
dos contrabandistas; e desta sorte p o d e m o s considerar q u e saímos d e u m m a l p a r a
o u t r o pior, pois além d e ficarmos s e m l i b e r d a d e t e m o s a p e r d a d e 300 réis e m
c a d a oitava, e sofrendo alteração n o p r e ç o dos gêneros., e e m c i m a d e todos estes
males a d e r r a m a , q u e é o m e s m o que capitação. E se nós l a m e n t á v a m o s os estra-
gos desta, q u e alívio p r e t e n d e m o s esperar e m tão multiplicadas queixas?

À vista do q u e , sendo certa c o m o é a d e r r a m a e c o n t r á r i a às pias intenções do


s o b e r a n o , pelo q u e t e m d e extorsiva aos vassalos, d e v e m o s r e p r e s e n t a r a o dito
543

s e n h o r a dificuldade q u e h á d e se l a n ç a r c o m i g u a l d a d e : p o r q u e p a r a ser p o r
c a p i t a ç ã o lá [vamos] e n c o n t r a r c o m o m a l q u e estamos l a m e n t a n d o c o m as chagas
a i n d a abertas e p a r a se l a n ç a r conforme os cabedais de c a d a u m , à imitação dos
quatro e meio por cem, como em Portugal, encontramos maior inconveniente
pela extensão e incompreensibilidade d o país, q u e n ã o p e r m i t e cabal n e m a i n d a
m e d i a n o c o n h e c i m e n t o dos cabedais de c a d a u m , m a i o r m e n t e nesta c o m a r c a q u e
c o n t é m 60 "léguas d e l a t i t u d e e 150 d e l o n g i t u d e , e m q u e fica c o m p r e e n d i d o o
arraial d o P a r a c a t u 120 léguas distante desta vila, a o n d e n ã o p o d e m ir "intendentes,
"ouvidores e "camaristas fazer o l a n ç a m e n t o n a forma d a lei; e a m e s m a dificulda-
de p a d e c e m as mais c o m a r c a s . E p o r esta causa h a v e r á n a " d e r r a m a a m e s m a ou
m a i o r desigualdade q u e t e m o s l a m e n t a d o n a c a p i t a ç ã o .
P o n d e r a d a s as dificuldades e desigualdades q u e p a d e c e a p r á t i c a d a d e r r a -
m a , q u a n d o n ã o seja p o r v o n t a d e , p o r falta d e c o n h e c i m e n t o d o s l a n ç a d o r e s ,
acresce o g r a n d e inconveniente d e se n ã o p o d e r saber o q u e falta p a r a c o m p l e -
m e n t o das c e m "arrobas senão n o fim d e c a d a u m a n o , e além d e ser impraticável
à c o m p r e e n s ã o h u m a n a e só possível às inteligências angélicas l a n ç a r c ô m p u t o
c e r t o q u e n e m falte n e m sobeje p a r a c o m p l e t a r as c e m a r r o b a s . C o m o esta co-
b r a n ç a se h á de fazer a t e m p o q u e v ã o os p r o d u t o s nas "frotas, *ex vi, ficamos
sujeitos a m a i o r e s extorsões e violências dos c o b r a d o r e s , cuja violência n ã o d a r á
lugar a q u e possamos p a g a r c o m o u r o , e d a r e m o s negros à p e n h o r a , e se e n c h e r ã o
as p r a ç a s sem h a v e r q u e m lance neles, p e l a d e c a d ê n c i a e m q u e se a c h a o país. E
a q u i t e m o s i n t r o d u z i d a u m a confusão n a " r e p ú b l i c a , os vassalos d e s t r u í d o s e o
E r á r i o R é g i o d a n i f i c a d o , s e n d o m a i o r e s os e s t r a g o s d e s t e m é t o d o q u e os d a
c a p i t a ç ã o , pois ao menos, a q u e l a nos n ã o tirava a liberdade, n e m d i m i n u í a o valor
do o u r o , n e m alterava o p r e ç o dos gêneros.
O h o r r o r d e tantos males e as pias intenções d o s o b e r a n o nos d e v e m incitar e [ fl. 2 6 8 ]
a n i m a r a p o n d e r a r ao dito s e n h o r , c o m o m a i s reverenciai a c a t a m e n t o , q u e se
consultar esta m a t é r i a c o m teólogos estes lhe h ã o d e d e c l a r a r q u e depois q u e os
vassalos fiéis e timoratos tiverem p a g o o "quinto d o seu o u r o n ã o é lícito obrigá-
los a p a g a r p o r d e r r a m a aquilo q u e os c o n t r a b a n d i s t a s r o u b a r a m , ficando, desta
sorte, p u n i d a a inocência, sendo esta dureza, e desigualdade m a i o r q u e q u a n t a s se
contemplam n a capitação.
D a m e s m a sorte, se consultarmos os juristas sobre o p o n t o d a p r o m e s s a q u e
e m 24 d e m a r c o d e 1734 fizeram os " p r o c u r a d o r e s das c â m a r a s a o c o n d e das
Galveias, g o v e r n a n d o estas M i n a s , p r o m e t e n d o fazer certo o n ú m e r o d e c e m a r r o b a s
e m q u e se funda a s e m p r e v e n e r a n d a lei, estes h ã o d e d e c l a r a r q u e este funda-
m e n t o é contrário às regras de Direito, t a n t o p o r q u e n a q u e l e t e m p o se a c h a v a m as
M i n a s e m m e l h o r estado, assim a respeito das m a i s "pingues "faisqueiras, c o m o
p o r q u e neste t e m p o se a c h a v a a capitania d e Goiás n a sua p r i m e i r a infancia, p a r a
o n d e , depois disso, t e m desertado g r a n d e n ú m e r o d e mineiros desta e, outrossim,
n o m e s m o t e m p o , estava franca a c o m a r c a do S e r r o do Frio, o n d e os m i n e i r o s
.544

faziam avultadas conveniências, assim nas lavras de o u r o c o m o d e d i a m a n t e s , q u e


e m b r e v e t e m p o ficaram cessando, e c o n s e q ü e n t e m e n t e devia cessar o efeito da-
quela p r o m e s s a , se é q u e n ã o foi sugerida pela política dos c o n t r a b a n d i s t a s p a r a
s u s p e n d e r e m o m é t o d o d a "capitação q u e se m a n d a v a praticar, c o m o qual lhes
cessava o lucro dos seus "descaminhos ou c o n t r a b a n d o s .
A l é m do q u e , sendo aquela p r o m e s s a ou c o n t r a t o celebrado e m 24 d e m a r ç o
d e 1734, c o m o fica dito, t e m p r e s c r i t o t a n t o p o r q u e t ê m p a s s a d o 17 anos sem
efeito e exercício c o m o p o r q u e expirou c o m a p r á t i c a do m é t o d o d a c a p i t a ç ã o , e
se n ã o devia restabelecer sem serem ouvidos n o v a m e n t e os p o v o s respectivos.
N a s presentes circunstâncias, resta p o n d e r a r m o s se nas m i n a s das mais capitanias
desta A m é r i c a p o r t u g u e s a , c o m o é Bahia, Goiás, S ã o Paulo e C u i a b á , se m a n d a
p r a t i c a r o m e s m o m é t o d o e, a o m e s m o t e m p o , o q u e n ã o p o d e executar-se, su-
postas as g r a n d e s distâncias p a r a a elas se c o n d u z i r e m os i n s t r u m e n t o s e materiais
n e c e s s á r i o s p a r a as " f u n d i ç õ e s , n e m d e p r e s e n t e , n e m d e f u t u r o , c o m o são
"cadinhos è "solimão, precisos e m todos os anos, o q u e p a d e c e g r a n d e dificulda-
de nas d u a s capitanias de Goiás e C u i a b á ; e p r a t i c a n d o - s e nestas o u t r o m é t o d o
q u e p e r m i t a t r a n s p o r t e d e o u r o e m p ó livremente, fica confundida a averiguação
dos contrabandos, q u e h ã o de crescer c o m m a i o r excesso à s o m b r a d a q u e l a permissão.
O q u e suposto d e v e m o s r e p r e s e n t a r ao s o b e r a n o é q u e a extração d o o u r o
nesta A m é r i c a se a c h a e m tal extensão e tão multiplicadas p a r a g e n s q u e n ã o p e r -
m i t e m a p r á t i c a do m é t o d o d e se Cobrar o "quinto p o r fundição, t a n t o pela r a z ã o
a c i m a p o n d e r a d a , das dificuldades das c o n d u ç õ e s dos i n s t r u m e n t o s e m a t e r i a i s ,
c o m o p e l a multiplicidade d e "casas d e fundição, q u e será preciso construírem-se
e m c a d a u m dos arraiais e m q u e se extrai o u r o , p o r m e d i a r e m g r a n d e s distâncias
e n t r e uns, e outros q u e dificultam o concurso das partes p a r a p o d e r e m levar o ouro
[ fl. 268v. ] a fundir / / de u m a a o u t r a p a r a g e m , c o m o é nesta c a p i t a n i a das M i n a s Gerais o
P a r a c a t u , e m distância de 120 léguas; n a capitania d a Bahia, as M i n a s N o v a s d o
F a n a d o , R i o d e C o n t a s e J a c o b i n a ; n a d e Goiás, M e i a P o n t e , Vila Boa, C r i x á s ,
T o c a n t i n s , S ã o Félix, A r r a i a s e N a t i v i d a d e ; n a de C u i a b á , s u a capital e M a t o
Grosso; n a de São P a u l o , P a r a n a p a n e m a . E p a r a se constituírem casas d e fundição
e m todos os arraiais, causa h o r r o r só o considerar a despesa q u e h ã o d e fazer; p a r a
se n ã o c o n s t r u í r e m , se facilita o d e s c a m i n h o t a n t o p o r falta destas c o m o p o r s e r e m
p a r a g e n s situadas no centro dos sertões.

D e s t a s dificuldades n a s c e m d e s i g u a l d a d e s , m u l t a n d o aos p o v o s e m m a i o r
q u a n t i a do q u e a c o m q u e p o d e m contribuir. Estas desigualdades p r o d u z e m os
clamores dos vassalos, dos clamores dos vassalos r e s u l t a m as a l t e r n a d a s m u d a n ç a s
q u e t e m o s e x p e r i m e n t a d o nos dois m é t o d o s até a g o r a p r a t i c a d o s , de c a p i t a ç ã o e
fundição, c o m cujas m u d a n ç a s temos sofrido gravíssimos prejuízos nas altas e bai-
xas d o o u r o , sendo os dois móveis destas m u d a n ç a s o q u e r e r o s o b e r a n o evitar os
d e s c a m i n h o s do o u r o feitos a sua R e a l F a z e n d a q u a n d o o q u i n t o se c o b r a p o r
f u n d i ç ã o e o q u e r e r r e m e d i a r os c l a m o r e s dos vassalos q u a n d o se c o b r a p o r
545

" c a p i t a ç ã o , e destes dois princípios p r o c e d e m os retrocessos d a leí do " q u i n t o ,


s e m n u n c a se descobrir m e i o q u e faça cessar u m e o u t r o inconveniente.
F i n a l m e n t e , devemos r e p r e s e n t a r ao s o b e r a n o q u e e n q u a n t o lhe for necessá-
rio, ou a seus "ministros, c o b r a r o "quinto d a m ã o dos vassalos das M i n a s , ou seja
sensivelmente p o r capitação ou visivelmente p o r "fundição, n u n c a se h ã o de evi-
tar os dois i n c o n v e n i e n t e s d e c o n t r a b a n d o e c l a m o r e s do p o v o . D i g o 'sensivel-
m e n t e p o r c a p i t a ç ã o p o r q u e c o m o os vassalos das M i n a s v i v e m c a r r e g a d o s d e
3

e m p e n h o s , v ã o a p l i c a n d o ã estes t o d o o o u r o q u e t i r a m , p a r a o q u e a i n d a lhes
n ã o chega, de sorte q u e q u a n d o os soldados lhes v ã o à p o r t a c o m as listas das
"intendências a pedir-lhes as somas respectivas, c o m o se a c h a m s e m o u r o p a r a o
dito p a g a m e n t o d e s a f o g a m a sua m á g o a e m clamores; digo 'visivel' e 'sensivel-
m e n t e ' p o r fundição p o r q u e q u a n d o levam às casas as parcelas d e o u r o , depois de
r e d u z i d o a b a r r a lhes vêem cortar aquela p o r ç ã o respectiva a o q u i n t o , e d a q u e l a
visibilidade lhes nasce u m a tal sensibilidade q u e lhes faz fazer tais movimentos c o m o
se fossem insultados de u m a g r a n d e Convulsão, e p o r se livrarem desta e tentados
c o m a ocasião do maior lucro se a n i m a m a o c o n t r a b a n d o .

C o m o d a repetida prática do m é t o d o q u e se m a n d a restabelecer (suposta a cir-


cunstância d e que o soberano, e m b o a consciência, nos n ã o deve obrigar à "derrama)
nestes termos n e m o dito senhor p o d e evitar os roubos feitos ao seu R e a l Erário nos
" d e s c a m i n h o s d o o u r o n e m nós d e v e m o s esperar m e l h o r f o r t u n a d o q u e a q u e l a
q u e j á c o m a dita prática e x p e r i m e n t a m o s e m outro t e m p o , e c o n s e q ü e n t e m e n t e
obrigados a continuar em maiores clamores, e se estes h ã o de servir d e objeto a sua
régia c o m p a i x ã o , nestes termos, a p e l a n d o p a r a ela, lhe devemos p r o p o r novo m é -
t o d o , alheio dos dois q u e j á t e m o s p r o v a d o p o r a l t e r n a d a s vezes, m a i s livre d e
inconvenientes, c o m q u e o R e a l Erário fique mais isento d e fraudes e nós sossega-
dos e c o m liberdade de p o d e r m o s usar do ouro livremente pelo seu intrínseco valor,
sem que nos sirva / / d e " r e m o r a ou e m b a r a ç o ao discurso o exemplo dos q u e até o [ fl. 269 ]
presente t ê m votado n a matéria do quinto, persuadidos q u e n ã o podia h a v e r outro
m é t o d o admissível e praticável além dos dois d e fundição e c a p i t a ç ã o até a g o r a
praticados c o m gravíssimo prejuízo nosso.
D e todos q u a n t o s a nossa aflição t e m excogitado, o m é t o d o q u e p a r e c e mais
suave e c o n v e n i e n t e t a n t o aos interesses do s o b e r a n o c o m o a o nosso sossego é o
i m p o r - s e q u a n t i a e q u i v a l e n t e a o q u i n t o e m t o d o s os g ê n e r o s q u e p a s s a m p a r a
d e n t r o das M i n a s pelos "registros, a q u e v u l g a r m e n t e c h a m a m " c o n t a g e n s , p o r
serem estas as b a r r a s p o r o n d e entra t u d o o d e q u e os h a b i t a n t e s necessitam, e ter
m o s t r a d o a experiência q u e este é o m e l h o r m e i o d e c o b r a r r e n d a s e contribuições
gerais, evitando-se c o m a insensibilidade o a m a r g o d a solução.
B o a p r o v a deste p e n s a m e n t o t e m o s n a q u e l a i m p o s i ç ã o q u e d e s d e abril d e
1714, p o r c o n v e n ç ã o dos povos, se a c h a estabelecida nas ditas c o n t a g e n s e m s u b -
sídio dos p r i m e i r o s quintos q u e se p r i n c i p i a r a m a p a g a r nestas M i n a s sendo "go-
v e r n a d o r d o m Brás Baltasar d a Silveira, a qual depois o c o n d e d e A s s u m a r d o m
546

P e d r o (com r e p u g n â n c i a da r a z ã o e dos povos) separou do "quinto, r e d u z i n d o - a a


"contrato no a n o d e 1718, d e cujo princípio ficou s e m p r e c o n s e r v a n d o o n o m e d e
c o n t r a t o dos quintos; e nesta misteriosa d e n o m i n a ç ã o temos u m forte f u n d a m e n t o
n ã o só p a r a m o s t r a r a p r o p r i e d a d e d o m é t o d o q u e p r o p o m o s p a r a se c o b r a r o
quinto p o r imposição e q u i v a l e n t e nos gêneros q u e p a s s a m pelas "contagens m a s
t a m b é m p a r a r e c o r r e r m o s à real clemência do s o b e r a n o — l e m b r a n d o - l h e o escrú-
p u l o c o m q u e â C o r o a , desde aquele t e m p o , está desfrutando este rédito aplicado
p a r a p " q u i n t o i m p o s t o n o s ditos gêrierps, d e p o i s d e t e r e m p a g o o direito d a
Alfândega n o R i o de J a n e i r o - e suplicarmos a sua inata p i e d a d e se digne reunir
a q u e l a i m p o s i ç ã o ou c o n t r a t o a o mais q u e se deve a c r e s c e n t a r aos gêneros q u e
e n t r a m pelas ditas contagens.
Conferindo-nos o dito s e n h o r a g r a ç a d a q u e l a r e u n i ã o , acha-se o dito c o n t r a t o
r e m a t a d o p o r tal p r e ç o q u e p a r e c e o dispôs misteriosamente assim a Divina Provi-
dência p a r a a p r á t i c a do m é t o d o p r o p o s t o , pois acrescendo o duplo à q u a n t i a respec-
tiva q u e p a g a m os gêneros a o c o n t r a t o , feita a sobredita r e u n i ã o q u e suplicamos,
n a t u r a l m e n t e v e m a c o m p l e t a r o n ú m e r o das cem "arrobas q u e d e t e r m i n a a Lei
Novíssima, o q u e se verifica vendo-se q u e aquele c o n t r a t o das e n t r a d a s está r e m a -
t a d o e m 35 a r r o b a s p o r a n o , q u e , reunidas ao d u p l o q u e se d e v e m a c r e s c e n t a r ,
fazem a s o m a d e 105 arrobas e m c a d a u m a n o , vindo deste m o d o a acrescer a i n d a
cinco arrobas.
Esta súplica d a r e u n i ã o é c e r t a m e n t e admissível, suposta a esterilidade das
"faisqueiras e dificuldades q u e e n c o n t r a m os mineiros n a extração do o u r o , p a r a a
qual lhes é preciso fazerem g r a n d e s despesas e m serviços à q u e n ã o c o r r e s p o n d e
m u i t a s vezes o l u c r o , *verbi gratia: p a g a a g o r a u m a c a r g a de m o l h a d o a o c o n t r a t o
m e i a "oitava, concedendo-se-nos a graça da r e u n i ã o , basta acrescentar-lhe o d u -
p l o e v i r á a p a g a r u m a oitava e m e i a ; p a g a u m a a r r o b a d e " f a z e n d a s e c a A !
?

a c r e s c e n t a n d o - l h e o d u p l o p a g a r á duas oitavas e A; p a g a u m n e g r o n o v o d u a s
l

oitavas, e acrescentando-lhe o duplo p a g a r á seis oitavas; p a g a u m b o i u m a oitava,


acrescentando-lhe o duplo p a g a r á três oitavas; p a g a u m cavalo duas oitavas, acres-
c e n d o - l h e o d u p l o p a g a r á seis oitavas. M a s se formos tão infelizes q u e n ã o m e r e -
[ fl. 269v. ] ç a m o s d a real clemência esta g r a ç a d a reunião, será / / preciso acrescentar àquela
contribuição q u e se a c h a estabelecida p o r c o n t r a t o o tresdobro respectivo a c a d a
g ê n e r o . E desta s o r t e se c o m p l e t a m as m e s m a s 105 a r r o b a s , i n d e p e n d e n t e s d a
contribuição q u e se a c h a estabelecida p o r contrato.
C o m o d e i x a m o s m o s t r a d o , a g r a n d e dificuldade q u e h á e m se p r a t i c a r o
m é t o d o d a c o b r a n ç a do quinto p o r fundição t a n t o nesta c o m o nas m a i s capitanias,
suposta a sua extensão e multiplicidade de p a r a g e n s e m q u e se extrai o u r o e gran-
des distâncias q u e m e d e i a m de u n s arraiais a o u t r o s e n ã o ser possível construi-
rem-se "casas d e fundição e m todos, c o n s e q ü e n t e m e n t e é preciso r e p r e s e n t a r a o
s o b e r a n o q u e , a o m e s m o t e m p o , se m a n d e p r a t i c a r o m e s m o m é t o d o de se c o b r a r
o quinto p o r contribuição nas "contagens e m todas as mais capitanias desta A m é -
547

rica o n d e d e presente h á e d e futuro se descobrirem m i n a s , p o r q u e desta sorte se


evita o inconveniente de cota respectiva, q u e d a r á ocasião a c l a m o r e s se se desco-
b r i r e m novas m i n a s e suceder d e s e r t a r e m m i n e i r o s d e u m a s p a r a o u t r a s , s e n d o
p r e c i s o aos m e n o s q u e ficam s u p l i c a r e m a b a t i m e n t o n a c o t a e ser n e c e s s á r i o
a u m e n t á - l a nas outras capitanias p a r a o n d e p a s s a m os desertores ou n ã o p a g a r e m
estes q u a n t i a p r o p o r c i o n a l , cujo inconveniente fica cessando m a n d a n d o - s e p r a t i -
car g e r a l m e n t e o p r e s e n t e m é t o d o e m t o d a s as mais c a p i t a n i a s , pois o q u e e m
s e m e l h a n t e caso diminuir e m u m a o cresce e m o u t r a .
D a m e s m a s o r t e se evita c o m o p r e s e n t e m é t o d o a c o n s i d e r á v e l d e s p e s a
d e m u i t a s "casas d e f u n d i ç ã o , q u e ficam c e s s a n d o , e, c o n s e q ü e n t e m e n t e , a q u e l a
feita ç m o r d e n a d o s d e " i n t e n d e n t e s , "oficiais, i n s t r u m e n t o s e m a t e r i a i s , o u
esta seja feita p e l a F a z e n d a R e a l ou à c u s t a dos vassalos, e j u n t a m e n t e a d e
novas tropas que é preciso criarem-se p a r a guarda dos "descaminhos do ouro,
que ficam cessando.
C o n t é m mais este m é t o d o a utilidade de tirar aos vassalos a causa d e seus c l a m o -
res, i m e d i a t a e inseparável dos dois m é t o d o s de capitação e fundição até agora prati-
cados. Digo 'inseparável' da capitação pela desigualdade e mais durezas q u e en-
volve, e i n s e p a r á v e l t a m b é m d o m é t o d o d a fundição p o r lhes tirar a l i b e r d a d e ,
diminuindo-lhes o valor d o o u r o e alterar-lhes o p r e ç o dos gêneros, circunstâncias
c o n t r á r i a s a o equilíbrio e m q u e se s u s t e n t a m as "repúblicas, e m p r o v a do q u e
d e v e m o s considerar q u e q u a n d o a oitava vale 1.500 "réis está e m equilíbrio c o m
o p r e ç o dos gêneros. Pondere-se agora q u e desconserto n ã o c a u s a r á e m u m a re-
pública a d i m i n u i ç ã o do valor do ouro e alteração nos p r e ç o s dos gêneros.
E m a b o n o do p r e s e n t e m é t o d o , d e v e m o s r e p r e s e n t a r a o s o b e r a n o q u e os
mineiros lavradores do o u r o são os q u e p a g a m todo o quinto c o m o atlantes-* desta
"república das M i n a s , pois sustentam o c o m é r c i o , as justiças de u m e o u t r o estado
e todas as "oficinas, assim n o b r e s c o m o m e c â n i c a s , de q u e v i v e m d e p e n d e n t e s ,
cuja d e p e n d ê n c i a lhes absorve t o d o o o u r o q u e e x t r a e m d a terra e a i n d a lhes n ã o
lhes chega, r a z ã o p o r q u e n ã o p o d e m conservar parcelas g r a n d e s d e o u r o p a r a q
d e s c a m i n h a r e m a o q u i n t o , n e m c o n t r a eles h o u v e e m t e m p o a l g u m suspeita. E
s e n d o p o r estas razões a classe d e vassalos m a i s fiéis e úteis f t a n t o ! à r e p ú b l i c a
c o m o ao R e a l E r á r i o , n ã o p a r e c e justo aniquilar-lhes as forças c o m m é t o d o q u e
lhes d i m i n u a o valor d o o u r o e lhes altere o p r e ç o dos gêneros e lhes a u m e n t e os
seus e m p e n h o s ; / / p o r cuja r a z ã o o p r e s e n t e m é t o d o é o mais suave, p o r q u e se [ fl. 270 ]

Na mitologia grega, Atlante ou Atlas era filho de Japeto e Climenes. Fez com os titãs uma guerra
contra Júpiter. Vencido, foi condenado a sustentar perpetuamente o céu sobre os ombros. Outra
tradição afirma que havendo negado asilo Adas a Perseu, lhe fez este mirar a cabeça de Medusa,
com o que metamorfoseou-se em montanha sobre a qual repousa o céu com seus astros. Compara-
se,, por vezes, a Atlante o indivíduo encarregado de suportar sozinho o peso de muitas e grandes
responsabilidades.
548

lhes a u m e n t a o p r e ç o dos gêneros n ã o lhes faz crescer o e m p e n h o n e m lhes faz


d i m i n u i r o valor do ouro,
E m c o m p a r a ç ã o da "capitação e "fundição, e m q u e os p a g a m e n t o s do *quínto
se f a z e m p o r j u n t o , c o n t é m o p r e s e n t e m é t o d o o u t r a r a z ã o de c o n v e n i ê n c i a n a
insensibilidade c o m q u e p o r meio dele se p a g a o quinto e m parcelas tão p e q u e n a s
q u e se n ã o p e r c e b e m , pois q u a n d o se m a n d a ao a ç o u g u e b u s c a r u m " q u a r t o d e
carne lá se p a g a certa porção d e quinto q u e m a l a p e r c e b e m , da m e s m a sorte quan-
d o se m a n d a à casa do taverneiro buscar u m "frasco ou "barril d e vinho o u azeite ou
outro qualquer gênero lá p a g a o u t r a parcela d e quinto insensivelmente, e d a m e s m a
sorte sucede nas lojas dos m e r c a d o r e s e n a s c o m p r a s dos negros novos, cavalos ê
t u d o o mais a este respeito.
F i n a l m e n t e , o p r e s e n t e m é t o d o , além d e ser livre das desigualdades q u e c o n t é m
o d a capitação e n ã o trazer consigo os d a n o s q u e nos causa o da fundição e a o E r á r i o
R é g i o {não sendo estabelecido p o r cota, d a qual p r o c e d e m m a i o r e s desigualdades do
q u e d a capitação), n a t u r a l m e n t e c o n d u z suavidade aos vassalos e s e g u r a n ç a à Fazen-
d a R e a l e, c o n s e q ü e n t e m e n t e , nos livra d a " d e r r a m a , motivo p o r q u e será o mais
p e r m a n e n t e e nos fará cessar os grandes prejuízos q u e nos t e m c a u s a d o a r e p e t i d a
m u d a n ç a dos dois j á praticados c o m a alteração e d i m i n u i ç ã o d o valor d o o u r o , e p o r
isso o m a i s conveniente.
P a r a o m é t o d o p r o p o s t o se fazer aceitável n a p r e s e n ç a d o s o b e r a n o e seus
"ministros d e v e m o s r e p r e s e n t a r a o dito s e n h o r q u e e m todas as q u a t r o p a r t e s do
m u n d o se n ã o a c h a r á "país c o m m e l h o r disposição p a r a a sua p r á t i c a d o q u e este,
p o r n ã o ter fábricas n e m p r o d u z i r gêneros q u e p e r m i t a m negócios d e p e r m u t a ç ã o
mais do q u e o u r o e necessitar q u e lhe v e n h a m todos os gêneros d e fora, nos quais
c o m o d a m e n t e se p o d e i m p o r a c o n t r i b u i ç ã o e q u i v a l e n t e a o q u i n t o nas " c o n t a -
gens ou "registros, q u e são as e n t r a d a s d e todo o c o m é r c i o .
C o n c o r r e m a i s a favor d o p r e s e n t e m é t o d o a circunstância d e n ã o p e r m i t i r
" d e s c a m i n h o s , c o m o o d a fundição, pois c o m o a contribuição equivalente a o q u i n t o
se h á d e i m p o r nos g ê n e r o s , e estes c o n s t a m d e fazendas q u e se c o n d u z e m e m
g r a n d e s t r o p a s de bestas d e " a l m o c r e v e s , g a d o s , cavalos, " c o m b o i o s d e negros,
n e n h u m destes gêneros se p o d e d e s c a m i n h a r q u e se lhe n ã o d ê n a trilha, n e m h á
notícia q u e e m t e m p o a l g u m se t e n h a m d e s c a m i n h a d o a o "contrato das e n t r a d a s
j á estabelecido.
Acresce mais n o p r e s e n t e m é t o d o a virtude d a igualdade c o m o requisito fun-
d a m e n t a l das leis, pois. p o r virtude dele p a g a r ã o todos o q u i n t o à p r o p o r ç ã o d a
sua fortuna: o p o b r e , q u e s e m p r e a t e m adversa, c o m p r a r á m e n o s e p o r isso p a g a -
r á m e n o s q u i n t o , e o rico c o m p r a r á m a i s e p o r isso p a g a r á m a i s q u i n t o , ê d a
m e s m a sorte os d e m e d i a n a fortuna,
P a r a m o s t r a r as utilidades do p r e s e n t e m é t o d o , figuraremos o p r e s e n t e caso:
c h e g a u m " c o m b o i e i r o a estás M i n a s c o m u m c o m b o i o d e n e g r o s novos, e n t r e
os q u a i s v ê m três d e igual b o n d a d e e p r e ç o . P a r a m e l h o r inteligência, d e v e m o s
s u p o r o *quinto p a g o p o r três m é t o d o s e e m diversos t e m p o s , a saber: hoje, / / [ A. 270v. ]
p o r " c a p i t a ç ã o , c o r r e n d o o o u r o a 1.500 "réis; a m a n h ã , p o r c o n t r i b u i ç ã o e q u i -
v a l e n t e i m p o s t a aos g ê n e r o s nas " c o n t a g e n s n a f o r m a do p r e s e n t e m é t o d o , e
v a l e n d o t a m b é m o o u r o a 1.500 réis; a o o u t r o dia, p o r " f u n d i ç ã o , v a l e n d o o
o u r o a 1.200 réis. E necessário advertir q u e os tais negros n e m são d e q u a l i d a d e
s u p r e m a n e m ínfima, m a s sim de m e d i a n a , cujo p r e ç o p o r c o m u m e s t i m a ç ã o é
dos q u e hoje se c o s t u m a m p ô r d u z e n t a s *oitavas. O q u e s u p o s t o , v a m o s a evi-
d e n c i a r o caso. V o u eu hoje, q u e se p a g a o q u i n t o p o r c a p i t a ç ã o , a c o m p r a r u m
dos três n e g r o s sobreditos a o " c o m b o i e i r o , e " p a t e a n d o o p r e ç o c h e g o a p r o m e -
ter a o c o m b o i e i r o d u z e n t a s "oitavas. Este faz a sua c o n t a e v ê q u e o n e g r o l h e
c u s t o u 160 m i l o u 170 mil réis n o R i o d e J a n e i r o ou B a h i a , e a j u n t a n d o a este
p r i m e i r o p r e ç o 30 mil réis q u e se a p l i c a m a c a d a n e g r o p a r a gastos d e c o n d u ç ã o
e d e s p a c h o s , v e n d o q u e nas d u z e n t a s oitavas q u e lhe ofereço t e m 300 mil réis e
lhe ficam 100 d e lucro, se resolve a v e n d e r - m e o tal n e g r o .

A m a n h a , q u e está o quinto imposto p o r contribuição nas contagens e o o u r o


c o r r e n d o a 1.500 réis, vou a q u e r e r c o m p r a r a o m e s m o comboieiro o segundo n e g r o ,
e p e d e - m e p o r ele 206 oitavas, cujo excesso ou m a i o r i a das seis oitavas p r o c e d e d a
contribuição do quinto; e c o m o estas c o m p r a s se fazem fiadas, e p o r esta causa se faz
m e n o s sensível o excesso,, ajusto c o m efeito P tal negro.
N o dia seguinte, q u e se p a g a o quinto p o r fundição e corre o o u r o a 1.200 réis,
y p u a q u e r e r c o m p r a r o terceiro negro igual e m b o n d a d e aos dois primeiros e p e d e -
m e o c o m b o i e i r o 250 oitavas p o r ele. E n t r o a e s t r a n h a r o excesso d i z e n d o q u e o tal
negro n ã o é m e l h o r q u e os dois antecedentes q u e m e v e n d e u , u m p o r 200 oitavas e
o u t r o p o r 206 oitavas, e r e s p o n d e - m e q u e q tal excesso p r o c e d e e m respeito do
quinto q u e el-rei lhe tira das 200 oitavas n a fundição, e c o m o eu c a r e ç o do n e g r o
n ã o t e n h o r e m é d i o senão c o m p r á - l o . Pergunta-se agora qual é m e l h o r m é t o d o : se
o d a c o n t r i b u i ç ã o , e m q u e só m e crescem 6 oitavas e m e fica c o r r e n d o o o u r o a
1.500 réis, o u o d a f u n d i ç ã o , c o m o q u a l m e c r e s c e m 50 o i t a v a s d o p r e ç o d o
n e g r o e m e fica v a l e n d o o o u r o a 1.200 réis e m e priva da liberdade?
P a r a satisfazer a d ú v i d a q u e p o d e m m o v e r os c o n t e m p l a t i v o s d i z e n d o - m e
q u e o q u i n t o d e 200 oitavas são 40 e n ã o 50 oitavas, p o r q u e el-rei n ã o tira s e n ã o
20 p o r 100, r e s p o n d o q u e q u a n d o o o u r o corre a 1.500 réis e t e n h o 100 oitavas
estas m e valem 150 mil réis, e tirado o quinto só m e ficam 80 oitavas, q u e v a l e m
120 mil réis, e fico p e r d e n d o .30 mil réis, e p a r a ressarcir a p e r d a d e 30 mil réis m e
são necessárias 25 oitavas d e valor d e 1.200 réis, r a z ã o p o r q u e o q u i n t o p a g o p o r
fundição causa aos vassalos a p e r d a d e 25 p o r 100.
T o d a s estas r a z õ e s d e conveniência n ã o só se d e s c o b r e m n o p r e s e n t e m é t o -
d o n a h i p ó t e s e d e q u e a m e n t e d a Lei N o v í s s i m a q u e se m a n d a p r a t i c a r é q u e o
o u r o c o r r a d e n t r o das M i n a s a 1.200 réis a n t e s d e q u i n t a d o , m a s t a m b é m se
d e s c o b r e m nele as m e s m a s u t i l i d a d e s , s e n d o a m e n t e d a s o b r e d i t a lei q u e o
p u r o v a l h a p a r a todos d e n t r o das M i n a s a 1.500 réis antes e depois d e q u i n t a d o ,
550

n a hipótese d e q u e c o m o os c o m e r c i a n t e s são q u e m e x t r a e m e l e v a m p a r a fora


das M i n a s a m a i o r p a r t e d o o u r o p o d e r ã o p r e v e n i r o valor d o " q u i n t o nas oca-
siões d a s v e n d a s , r e p u t a n d o p o r m a i o r e s p r e ç o s os seus g ê n e r o s , c o m o n o s fa-
z e m p e r c e b e r as p a l a v r a s p o r q u e se. explica a m e s m a lei n o c a p í t u l o q u i n t o ,
o n d e se d e t e r m i n a q u e o o u r o , ou seja e m b a r r a , e m p ó ou f o l h e t a , c o r r e r á
d e n t r o e fora das M i n a s pelo seu j u s t o valor, s e g u n d o o seu " t o q u e , s e m diferen-
[ fl. 2 7 1 ] ça. M a s isto, q u e p a r e c e fácil d e p r a t i c a r - s e n o s c o n t r a t o s futuros, / / padece
g r a n d e i n c o n v e n i e n t e n o s t r a t o s e dívidas j á contraídas, sobre o q u e se m o v e r ã o
m u i t a s e r e n h i d a s d e m a n d a s , q u e r e n d o os devedores d e dívidas antigas p a g a r e m
aos seus credores c o m o m e s m o n ú m e r o de "oitavas, l a n ç a n d o p a r a isto m ã o das
palavras d a lei n o dito capítulo, q u e p o r serem restritas e expressas n ã o a d m i t e m
i n t e r p r e t a ç ã o alheia do sentido literal. E, finalmente, nos referidos t e r m o s , a l é m
das p o n d e r a d a s d e m a n d a s , s e m p r e esta prática d a lei nos contratos j á celebrados e
dívidas contraídas induz prejuízo, ou p a r a os devedores òu p a r a os credores, e traz
p e r d a d a l i b e r d a d e aos vassalos e n ã o evita " d e s c a m i n h o s d o o u r o a o q u i n t o e
c o n s e q ü e n t e m e n t e n ã o livra aos vassalos d e " d e r r a m a .

N a s presentes circunstâncias, q u e m d u v i d a r á q u e o p r e s e n t e m é t o d o d a contri-


b u i ç ã o i m p o s t a p o r e q u i v a l e n t e n o s g ê n e r o s q u e e n t r a m pelas " c o n t a g e n s é o
m a i s s u a v e e c o n v e n i e n t e , p o i s n ã o tira a l i b e r d a d e aos vassalos, n ã o p e r m i t e
d e s c a m i n h o s , n ã o prejudica os tratos, n ã o a u m e n t a dívidas contraídas, n e m ocasi-
o n a d e m a n d a s , n e m prejudica aos devedores, n e m aos credores? E, finalmente, se
a m e n t e d a Lei Novíssima (pelo q u e respeita aos contratos e comércios futuros) é
q u e os comerciantes p a g u e m o quinto a t e n d e n d o a q u e p a r a ele se d e v e m p r e v e -
nir nos seus tratos, l e v a n t a n d o o p r e ç o aos gêneros à p r o p o r ç ã o do q u i n t o , b o m
p a t r o c í n i o t e m o m é t o d o p r o p o s t o n a m e n t e d a referida e s e m p r e v e n e r a n d a lei,
pois se c a d a casa d e h o m e m d e comércio h á de servir d e "registro e m q u e este, p o r
m e i o da alteração d o p r e ç o do gênero, c o b r e o quinto q u e h á d e p a g a r n a "fundi-
ç ã o , m u i t o mais s u a v e fica o m é t o d o de se i m p o r o quinto p o r c o n t r i b u i ç ã o nas
"contagens, pois são m u i t o m e n o s e m n ú m e r o q u e as casas de c o m é r c i o , e desta
sorte se evita a multiplicação d e entidades sem precisão.
P a r a o m é t o d o p r o p o s t o se fazer b e n q u i s t o e admissível e p o d e r m o s t r a r a
sua i g u a l d a d e , b o m e x e m p l o temos na contribuição q u e se. impôs e m alguns gê-
neros p a r a a c o n d u ç ã o d a g r a n d e o b r a das águas livres e m Lisboa, pois sendo a
C o r t e colégio d e h o m e n s d o u t o s e teólogos, achou-se q u e n ã o h a v i a m e i o m a i s
suave e igual p a r a c o b r a r d o p o v o a q u e l a i m p o r t a n t e s o m a d o q u e i m p o n d o - a
sobre certos gêneros, e o n d e todos p a g a m c o m igualdade e insensivelmente.
N ã o o b s t a n t e c o n t e r o m é t o d o p r o p o s t o as s i n g u l a r i d a d e s d a i g u a l d a d e e
c o n s e r v a r o o u r o n o seu i n t r í n s e c o v a l o r sem p r e j u d i c a r a p e s s o a a l g u m a n o s
tratos e contratos feitos * a parte antea, n e m aos q u e se fizerem * a parte postea, n e m
p e r m i t i r d e s c a m i n h o s (inevitáveis no d a fundição, e m q u e t a m b é m é inevitável o
prejuízo q u e causa aos tratos e p a g a m e n t o s vencidos, d e q u e as M i n a s se a c h a m
carregadas), c o n t u d o c o m o n ã o h á opinião, p o r sólida q u e seja, q u e n ã o p a d e ç a
c o n t r a d i ç ã o e p o d e r á o p o r - s e a crítica dos desafeiçoados d i z e n d o q u e n ã o deve
ser a d m i t i d o p o r n ã o ter a c o n t r i b u i ç ã o i m p o s t a n o s g ê n e r o s c o n e x ã o i m e d i a t a
c o m a extração do o u r o , e m tal caso se r e s p o n d e q u e t a m b é m a cultura dos víveres
n ã o t e m a dita c o n e x ã o imediata e c o n t u d o os escravos dos. roceiros e mais pessoas
q u e n ã o m i n e r a m t ê m p a g o até agora o "quinto c o m u t a d o e m "capitação.
Além desta resposta e x a b u n d a n t e , nos oferece o u t r a o m é t o d o d a Lei
N o v í s s i m a d a F u n d i ç ã o , p o n d e r a n d o - s e q u e este m é t o d o é t o t a l m e n t e sujeito a
" d e s c a m i n h o s , e p o r isso faz m o r a l m e n t e certa a " d e r r a m a , e sendo assim ou esta
seja / / l a n ç a d a p o r c a p i t a ç ã o o u p o r o u t r o q u a l q u e r m o d o é c e r t o q u e h á d e [ íl. 271v. ]
c o m p r e e n d e r a todos os m o r a d o r e s das M i n a s , a i n d a os q u e n ã o tiverem exercício
de m i n e r a r , e ficamos nos t e r m o s d e p a g a r todos q u i n t o p o r m e i o q u e n ã o t e m
c o n e x ã o c o m a extração do o u r o .
F i n a l m e n t e , q u a n d o o m é t o d o p r o p o s t o envolvesse circunstâncias contrárias
às pias intenções e retíssima consciência do s o b e r a n o (o q u e n ã o há) ficava salvo
t o d o o escrúpulo c o m a e s p o n t â n e a c o n v e n ç ã o dos vassalos respectivos e c o n t r a -
tantes.
P o r q u e p o d e r á a crítica dos desafeiçoados instar dizendo q u e o p r e s e n t e m é t o d o
faz subir os gêneros a m a i o r p r e ç o , e q u e p o r esta r a z ã o p o d e r ã o os h a b i t a n t e s das
M i n a s i n v e n t a r fábricas d e d i n h o e algodão e outras m a n u f a t u r a s s e q u e estas farão
q u e t e n h a m m e n o s c o n s u m o os gêneros estranhos, se r e s p o n d e e satisfaz a este escrú-
p u l o p o r muitos princípios: o p r i m e i r o m o s t r a n d o q u e essas tais fábricas n ã o p o d e m
ter exercício sem c o n c o r r e r o t r a b a l h o das mulheres, a q u e são p o u c o inclinadas as
d e s t a A m é r i c a , e d a m e s m a sorte os h o m e n s , elevando-se m a i s n a e x t r a ç ã o d o
ouro; o segundo ponderando-se que no tempo do método da Casa da M o e d a ,
e s t a b e l e c i d a nestas M i n a s e m o a n o d e 1724-, s u b i r a m os g ê n e r o s t a m b é m d e
p r e ç o à p r o p o r ç ã o d o quinto e n e m p o r isso se v i r a m estabelecidas estas imagina-
das fábricas, o q u e t u d o se confirma vendo-se q u e t e m o "país das M i n a s p e r t o d e
sessenta anos d e idade e até o p r e s e n t e se n ã o v i r a m tais fábricas.
E m último lugar se r e s p o n d e q u e q u a n d o se estabelecerem estas fábricas se
lhes p o d e d a r o r e m é d i o o u p r o i b i n d o - s e ou i m p o n d o - l h e s c o n t r i b u i ç ã o à p r o -
p o r ç ã o do q u i n t o . E p o r última satisfação se r e s p o n d e que, ou o quinto se c o b r e
p o r contribuição ou p o r "fundição, s e m p r e o p r e ç o dos gêneros h á d e ter a m e s m a
alteração, e sendo assim t ã o sujeito está u m m é t o d o c o m o o o u t r o a este i n c o n v e -
niente.
Se os desafeiçoados, afinando a sua crítica, disserem q u e c o m alteração d o
p r e ç o dos gêneros poderão os habitantes das Minas mudar de condição, absíen-
do-se d e luxos e profusão e finalmente "virando as casacas, se r e s p o n d e c o m o j á
p o n d e r a d o m é t o d o d a C a s a d a M o e d a e, u l t i m a m e n t e , t r a z e n d o à m e m ó r i a os
muitos estragos e prejuízos q u e causou o m é t o d o d a c a p i t a ç ã o , e q u e c o m todas
estas extorsões se n ã o v i r a m "vestidos virados, n e m abstinência de luxos e profu-
552

sãOj p o r q u e as influências d o o u r o i n t r o d u z e m espíritos g e n e r o s o s , o p o s t o s à


parcimônia.
N o caso q u e os antagonistas r e f o r c e m a sua i n s t â n c i a d i z e n d o q u e a m a i o r
contribuição q u e fica crescendo aos comerciantes fará suspender o giro e transpor-
te dos gêneros, p a r a satisfazer a esta objeção seja-nos lícito t o r n a r a l e m b r a r q u e a
t e r r a das M i n a s n ã o p r o d u z mais q u e milho e feijão e q u e todos os m a i s gêneros
lhe v ê m de fora, o q u e suposto d e v e m o s p o n d e r a r q u e as d u a s p r a ç a s , d o R i o d e
J a n e i r o e Bahia, são as caixas-gerais d e t o d o o comércio das M i n a s , assim desta
c o m o das m a i s capitanias, p a r a o n d e os comerciantes d ã o c o n s u m o à m a i o r p a r t e
dos seus g ê n e r o s , de sorte q u e assim c o m o as M i n a s são d e p e n d e n t e s das duas
p r a ç a s , d a m e s m a forma são estas d e p e n d e n t e s daquelas, e nesta c o n f o r m i d a d e se
r e s p o n d e q u e esta m ú t u a d e p e n d ê n c i a , p o r força, h á d e fazer girar o c o m é r c i o ,
[ fl. 272 ] servindo a necessidade das M i n a s de ímã / / p a r a atrair e a d a q u e l a s d e impulso

p a r a levar os gêneros, e p o r este m o d o n u n c a o comércio deixará de circular.


T o d a s estas e outras semelhantes instâncias ou p o d e m ser p a r t e d a e m u l a ç ã o
Ou de u m superficial discurso c o m q u e muitos se p o d e r ã o p e r s u a d i r q u e a p r á t i c a
do m é t o d o p r o p o s t o h á de fazer alterar mais o p r e ç o dos gêneros q u e o d a *fundi-
ç ã o , n ã o h a v e n d o causa p a r a m a i o r excesso e m u m m é t o d o q u e e m o u t r o , p o r q u e
os comerciantes o q u e h ã o d e alterar n o p r e ç o dos gêneros h á d e ser 20 p o r 100
q u e lhe acresce de quinto, e estes 20 p o r 100 t a n t o h ã o de alterar c o m a p r á t i c a do
m é t o d o da fundição c o m o c o m o d a contribuição, pois se n ã o d á m a i o r r a z ã o de
diferença.
S e n d o isto certo c o m o é, n ã o sei q u e e n t e n d i m e n t o h a v e r á tão c a s a d o c o m a s u a
opinião que não conheça maior excelência no presente m é t o d o do que n o da
fundição q u e se m a n d a praticar, p o r q u e este, se o o u r o h o u v e r d e c o r r e r a 1.500
"réis, c o m o e n t e n d e m muitos fundados n o capítulo quinto da Lei Novíssima, cau-
sa prejuízo e m todas as dívidas contraídas * a parte antea, ou este c e d a e m d a n o dos
d e v e d o r e s ou dos c r e d o r e s , e o m é t o d o p r e s e n t e n e m faz m o v i m e n t o a l g u m n o
valor do o u r o n e m causa prejuízo aos contratos antecedentes n e m subseqüentes, e
b a s t a esta excelência p a r a dever ser preferido a todos os mais.
P o n d e r a m alguns, fundados e m discursos abstratos, q u e a imposição d e c e m
"arrobas nos gêneros q u e e n t r a m pelas "contagens é peso grande, c o m o qual n ã o
p o d e q c o m é r c i o e q u e seria mais suave i m p o r a m e t a d e nos gêneros e [a] o u t r a
m e t a d e p a g a r - s e ou p o r fundição ou p o r "capitação, sem a d v e r t i r e m , sendo p o r
c a p i t a ç ã o , q u e a i n d a estamos l a m e n t a n d o os seus estragos e, sendo p o r fundição,
q u e b a s t a d i m i n u i r o valor d o o u r o c i n q ü e n t a réis e m c a d a "oitava p a r a c a u s a r
prejuízo, desordens no comércio e p a r a nos tirar a liberdade. F i n a l m e n t e , quisera
e u q u e os desta opinião m e dissessem se lançando-se o q u i n t o p o r m é t o d o bíforme
h á de vir o u t r a n a ç ã o estranha p a g a r a l g u m a dessas m e t a d e s o u se ps portugueses
q u e h a b i t a m o s nas M i n a s h a v e m o s d e p a g a r t u d o . E é sem dúvida q u e m e h ã o d e
r e s p o n d e r q u e nós, os mineiros portugueses, h a v e m o s d e p a g a r t u d o . Pois sendo
isto assim, n ã o será m e l h o r p a g a r t o d o o q u i n t o e m u m a só p a r t e q u e nos seja
mais suave e c o n v e n i e n t e , c o m o é nas "contagens?
P a r a a b o n o do p r e s e n t e m é t o d o se deve p o n d e r a r q u e s e n d o o c o m é r c i o o
n e r v o m a i s p r i n c i p a l d e todas as "repúblicas d o m u n d o , neste *país das M i n a s
sucede pelo c o n t r á r i o , pois n ã o é o comércio m a s , sim, os mineiros o n e r v o p r i n -
cipal desta república, e nesta consideração n ã o deve dizer-se q u e c o m a contribui-
ção d o q u i n t o fica o negócio c a r r e g a d o q u a n d o os mineiros são os q u e fazem e
s u s t e n t a m o c o m é r c i o , e nestes termos só favorecendo-se a estes p o d e r á florescer o
dito c o m é r c i o , e assim é, sem dúvida, q u e sendo o presente m é t o d o o mais favo-
rável aos mineiros, a o m e s m o passo q u e estes m e l h o r a r e m d e fortuna se a u m e n t a -
r á o dito c o m é r c i o c o m os p a g a m e n t o s mais p r o n t o s q u e os mineiros h ã o d e fazer
e, pelo c o n t r á r i o , se se aniquilarem os mineiros tirando-lhes as forças c o m a dimi-
n u i ç ã o d o valor do o u r o e alteração n o p r e ç o dos gêneros terá / / o c o m é r c i o u m a [ fl. 272v. ]
g r a n d e q u e b r a , pois se estes fazem e sustentam o comércio e n ã o p o d e m suprir aos
p a g a m e n t o s c o m o u r o de 1.500 "réis, c o m o suprirão m e l h o r c o m o u r o d e 1.200
réis e " d e r r a m a e m c i m a d e t u d o isto?

Além d o q u e , p a r a os comerciantes mais c o n t a lhes fará p a g a r o "quinto p o r


c o n t r i b u i ç ã o nas c o n t a g e n s d o q u e n a s "fundições, p o r q u e se n a q u e l a s h ã o d e
p a g a r m a i o r s o m a do q u e até a g o r a t a m b é m nestas p a g a m as m e s m a s n o q u i n t o
q u e d e i x a m e ficam evitando o inconveniente de f a z e r e m viagens e despesas e m
irem âs fundições q u i n t a r e tirar "guias.
O q u e , n ã o o b s t a n t e se h o u v e r a l g u m a d i m i n u i ç ã o n a c o n t r i b u i ç ã o p a r a
c o m p l e m e n t o das c e m " a r r o b a s , é n a t u r a l q u e esta n e m seja m u i t o p o n d e r á v e l ,
n e m p a s s e d o s e g u n d o até t e r c e i r o a n o , t e m p o q u e b a s t a p a r a a c i r c u l a ç ã o d o
c o m é r c i o se r e s t i t u i r a o seu n a t u r a l g i r o , e neste p e q u e n o i n t e r v a l o — d e v e m o s
e s p e r a r d a r e a ! g r a n d e z a a p i e d a d e d o s o b e r a n o — se s a t i s f a r á c o m o q u e
r e n d e r a c o n t r i b u i ç ã o , a t e n d e n d o a o m i s e r á v e l e s t a d o e m q u e se a c h a m as
M i n a s , c o n f o r m a n d o - s e c o m o q u e d i s p õ e a O r d e n a ç ã o d o R e i n o , l i v r o se-
g u n d o , título 3 4 , p a r á g r a f o 4.
Se é lícito fazer c o m p a r a ç ã o de coisas p e q u e n a s p a r a coisas g r a n d e s , b o m
e x e m p l o t e m o s p a r a p e r s u a d i r esta r a c i ó n a b i l i d a d e n o s m i n e i r o s , q u e q u a n d o
e n t r a m a fazer e dispor os seus serviços o fruto que c o l h e m são despesas. O u t r o
semelhante, e x e m p l o nos oferece o discurso e m o s e n h o r de u m a q u i n t a p l a n t a n d o
u m a árvore, a o qual é preciso p r i m e i r o beneficiá-la antes de colher fruto, a q u a l
depois de beneficiada p r o d u z e frutifica c o m m ã o tão liberal q u e n ã o só c o r r e s p o n d e
a o t e m p o p r e s e n t e m a s t a m b é m ao pretérito.
D a m e s m a sorte, a q u i n t a mais frutuosa d a C o r o a d e Portugal é este país das
M i n a s , e m q u e os mineiros são árvores racionais, os quais p a r a p o d e r e m frutificar
e m benefício do seu s o b e r a n o é preciso q u e este s e n h o r os cultive c o m seus b e n e -
fícios, influxos, favo r e c e n d o - o s e aliviando-os das opressões q u e t ê m p a d e c i d o
c o m as diversas práticas d a solução do q u i n t o , e desta sorte frutificarão politica-
554

m e n t e p o r m e i o de vários comércios, c o m q u e se a u m e n t a r ã o o r e n d i m e n t o das


alfandegas e outros contratos.
P a r a desvanecer o escrúpulo da d i m i n u i ç ã o q u e se p o d e considerar n a con-
tribuição i m p o s t a nas "contagens p o r equivalente a o " q u i n t o , e e s p e r a r m o s q u e
a q u e l e vá e m a u m e n t o , temos vários exemplos à flor d a terra e d e p o r t a s a d e n t r o
n e s t a m e s m a A m é r i c a , servindo-nos de p r o v a o *contrato d a dízima d a Alfandega
do R i o d e J a n e i r o , r e m a t a d o a p r i m e i r a vez e m o a n o d e 1721 p o r 2 4 3 mil "cru-
zados p o r a n o , q u e se a c h a hoje e m 500 mil c r u z a d o s p o r a n o ; o c o n t r a t o d o
t a b a c o d o R i o d e J a n e i r o , r e m a t a d o a p r i m e i r a v e z p o r 18 mil c r u z a d o s p o r a n o e
hoje p o r 30 mil c r u z a d o s p o r a n o ; o c o n t r a t o das p a s s a g e n s dos rios P a r a í b a e
P a r a i b u n a , r e m a t a d o a p r i m e i r a vez p o r 12 mil cruzados e hoje p o r 24; o c o n t r a t o
das c o n t a g e n s , " e n t r a d a s das M i n a s , r e m a t a d o a p r i m e i r a v e z e m 1718 p o r 11
"arrobas p o r a n o e hoje p o r 35 a r r o b a s p o r a n o .
[ fl. 273 ] A l é m destas provas incontestáveis, c o n c o r r e m três f u n d a m e n t o s e razões n a t u -
rais p a r a se n ã o dever esperar diminuição m a s , sim, a u m e n t o n o r e n d i m e n t o do quinto
p e l o m é t o d o p r o p o s t o : a p r i m e i r a é q u e estamos e m terras de m i n a s , o n d e p o d e h a v e r
novos e tais d e s c o b e r t o s q u e a t r a i a m a si, além d a q u e d e p r e s e n t e está, m u i t o
m a i s g e n t e d e n o v o , c o m o s u c e d e u c o m o P a r a c a t u ; a s e g u n d a consiste e m se
c o n s i d e r a r a m u i t a gente q u e todos os anos c o n d u z e m as "frotas do P o r t o e Lis-
b o a , a m a i o r p a r t e d a q u a l v e m p a r a as M i n a s ; a terceira r a z ã o consiste e m os
m u i t o s casais q u e j á hoje se a c h a m n a s M i n a s , e a l é m destes os m u i t o s filhos
adulterinos d e q u e a c a d a passo se v ê e m e m t u r m a s . E t o d a esta multiplicação d e
indivíduos faz multiplicar o c o n s u m o dos gêneros e igualmente a u m e n t a r o rendi-
m e n t o d a contribuição, d e sorte q u e e m m e n o s d e vinte anos r e n d e r á 130 a r r o b a s
esta capitania e as mais à p r o p o r ç ã o , e virá o s o b e r a n o , p o r m e i o deste m é t o d o , a
c o b r a r m u i t o m a i o r r e n d i m e n t o q u e pelo d a fundição, sem g r a v a m e n e m prejuízo
dos vassalos.

E, p o r é m , necessário r e p r e s e n t a r a o dito s e n h o r r e c o m e n d e aos g o v e r n a d o -


res das M i n a s f a ç a m o b s e r v a r n o seu inteiro vigor a lei q u e p r o í b e p o d e r e m - s e
l e v a n t a r " e n g e n h o s d e n o v o nas M i n a s .
O u t r o i n c o n v e n i e n t e se p o d e oferecer aos â n i m o s t i m o r a t o s d i z e n d o q u e o
c o n t r a t o das passagens ou e n t r a d a s das M i n a s se a c h a r e m a t a d o a J o s é Ferreira da
V e i g a p o r triénio q u e h á de ter princípio e m o p r i m e i r o de o u t u b r o do p r e s e n t e
a n o d e 1 7 5 1 , o q u e e n q u a n t o n ã o findar n ã o p o d e ter p r á t i c a o p r e s e n t e m é t o d o ,
p o r q u e faz e m b a r a ç o e prejuízo ao dito contrato. N ã o h á dúvida q u e esta objeção
é a mais forte q u e p o d e ocorrer, m a s n o excesso d e p i e d a d e c o m q u e o s o b e r a n o
nos d á a c o n h e c e r as suas retíssimas intenções temos a r g u m e n t o p a r a nos persua-
d i r m o s q u e os nossos suspiros m o v e r ã o ao seu real â n i m o p a r a a nossa c o m p a i x ã o
e e s p e r a r m o s r e m é d i o a este i n c o n v e n i e n t e , r e p r e s e n t a n d o a o dito s e n h o r q u e a
p r á t i c a d a Lei Novíssima d a F u n d i ç ã o nos é tão prejudicial q u e de u m só golpe
nos fulmina q u a t r o castigos gerais: o p r i m e i r o , a d i m i n u i ç ã o n o valor do o u r o , ou
555

se haja de e n t e n d e r q u e este h á d e correr a 1.200 *réis antes d e " q u i n t a d o ou a


1.500 réis, p o r q u e a i n d a nesta última inteligencia é inevitável o prejuízo p a r a os
c o n t r a t o s a n t e c e d e n t e s , ou este c e d a e m d a n o dos credores ò u dos devedores; o
segundo consiste n a infalível alteração do p r e ç o dos gêneros, pois é certo h á este
d e subir à p r o p o r ç ã o d a d i m i n u i ç ã o n o valor do o u r o ; o t e r c e i r o , n a p e r d a d a
l i b e r d a d e , p r i v a n d o aos vassalos de p o d e r usar d o o u r o l i v r e m e n t e , t r a n s p o r t a n -
d o - o p a r a q u a l q u e r p a r t e q u e lhe fazia c o n t a , deixando-os sujeitos a e x a m e s d e
i n s p e t o r e s , "devassas e d e n ú n c i a s ; o q u a r t o , s u j e i t a n d o - o s à " d e r r a m a q u ê os
" d e s c a m i n h o s p r o m e t e m infalível.
A vista destes perniciosos d a n o s , d e v e m o s p e r s u a d i r - n o s (suposta a real cle-
m ê n c i a e p o n d e r a d o s danos) q u e o dito s e n h o r , e x e r c i t a n d o c o n o s c o a s u a real
c o m p a i x ã o c o m o p a i piedoso dos seus vassalos, se d i g n a r á aplicar p r o n t a medici-
n a aos nossos males se nós lhe a p o n t a r m o s os meios p a r a o nosso r e m é d i o .
V á r i o s p o d e m ser os m o d o s c o m q u e r e m e d e i e os inconvenientes q u e faz o u [ fl. 273v. ]
p o d e fazer a o " c o n t r a t o a p r á t i c a d o m é t o d o p r o p o s t o . O p r i m e i r o consiste e m
q u e se o " c o n t r a t a d o r considerar a l g u m prejuízo e p r o t e s t a r "quita d e t e r m i n a r á o
s o b e r a n o q u e largue, o c o n t r a t o , p a g a n d o *pro rata o t e m p o respectivo q u e tiver
corrido até o e m q u e p r i n c i p i a r a a ter prática o presente m é t o d o e ficará c o r r e n d o
t a n t o a q u a n t i a p e r t e n c e n t e ao c o n t r a t o c o m o a contribuição respectiva a o q u i n t o
p o r c o n t a do m e s m o s e n h o r , e m a t e n ç ã o e m q u e a utilidade p ú b l i c a e b e m co-
m u m dos vassalos deve preferir ao [interesse] particular do c o n t r a t a d o r .
C o m o deixamos p o n d e r a d o q u e n o caso q u e a p r á t i c a do m é t o d o p r o p o s t o
cause a l g u m a suspensão e prejuízo a o t r a n s p o r t e dos g ê n e r o s , n ã o e x c e d e r á este
a o s e g u n d o e terceiro a n o , e q u e deste, e m diante irá o r e n d i m e n t o e m a u m e n t o .
Nesta racionável consideração consiste o segundo r e m é d i o e m p a c t u a r o s o b e r a n o
c o m o c o n t r a t a d o r atual n o v a r e m a t a ç ã o d o triénio seguinte p e l o m e s m o p r e ç o do
atual, u n i n d o d e s d e logo ao dito c o n t r a t o o acréscimo d o d u p l o e q u i v a l e n t e a o
q u i n t o , f i c a n d o a c r e s c i d o d e s d e logo o d u p l o nos p a g a m e n t o s d o c o n t r a t a d o r ,
vindo a ficar, p o r este m o d o , c o m o c o n t r a t o p o r seis anos, o q u a l p o d e aceitar este
p a r t i d o n a c o n s i d e r a ç ã o q u e c o m m ã o l a r g a ficará r e c o m p e n s a d a a i m a g i n a d a
d i m i n u i ç ã o do p r i m e i r o triénio c o m o m a i o r r e n d i m e n t o do s e g u n d o .
N o caso, p o r é m , d e o c o n t r a t a d o r n ã o q u e r e r aceitar a l g u m dos dois p a r t i d o s
a c i m a a p o n t a d o s , p o d e r á o s o b e r a n o m a n d a r c o b r a r a imposição equivalente ao
q u i n t o n a forma do presente m é t o d o , p o r c o n t a d a F a z e n d a R e a l , a t e n d e n d o aos
graves daños q u e faz a seus vassalos a p r á t i c a d a Lei Novíssima d a F u n d i ç ã o , a q u e
é preciso a c u d i r c o m p r o n t o r e m é d i o , n ã o obstante alguns protestos do c o n t r a t a d o r ,
sendo mais atendível d a real p i e d a d e os d a n o s gerais dos vassalos q u e o interesse
p a r t i c u l a r do c o n t r a t a d o r , e nesta hipótese se p o r á u m fiscal c o m u m escrivão nas
" c o n t a g e n s ou "registros m a i s p r i n c i p a i s , aos quais se d a r ã o dois livros, u m d e
e n t r a d a , o u t r o de saída, e n o de e n t r a d a se fará assento, p o r t e r m o , c o m o dia, m ê s
e a n o de todos os gêneros q u e e n t r a m pelas contagens, d e c l a r a n d o o n u m e r o d e
cargas d e *secos e " m o l h a d o s , negros, bois e bestas q u e p a s s a m q u e d e v a m p a g a r
556

c o n t r i b u i ç ã o , e os n o m e s dos " c o n d u t o r e s , n a m e s m a f o r m a q u e se p r a t i c a n o
* c o n t r a t o , cujo t e r m o assinará o dito fiscal, escrivão e c o n d u t o r . [Nos termos]
s u b s e q ü e n t e s q u e se fizerem nó m e s m o dia n ã o será necessário d e c l a r a r a d a t a d o
dia, e b a s t a r á dizer-se " e m o dito dia passou fulano e a c o b r a n ç a s " , e se fará n a
m e s m a f o r m a q u e se pratica n o contrato das m e s m a s "entradas ou nas alfandegas
e n o c o n t r a t o do t a b a c o , fiando-se p o r a l g u m t e m p o das pessoas d e a b o n o , e as
q u e o n ã o tiverem deixarão c a r r e g a r e m p e n h o r ; e o livro d a saída servirá p a r a
fazer c a r g a n o livro das obrigações dos c o m e r c i a n t e s e p a r c e l a s d e o u r o q u e se
r e m e t e r e m p a r a o tesoureiro-geral de Vila Rica.
N ã o p a r e c e i m p e r t i n e n t e o u sujeito a falências este m o d o d e c o b r a n ç a , cujo
escrúpulo se desvanece c o m o q u e a experiência m o s t r o u n a c o b r a n ç a d a capitação,
a qual c o m p r e e n d i a a todo o gênero d e pessoas, p o b r e s e ricos, e c o n t u d o isto se
[ fl. 274 ] c o b r a v a de todos c o m e x a ç ã o , o q u e se executará / / e m m e n o r n ú m e r o e sendo
os devedores pessoas d e m a i o r crédito e posses, quais são os comerciantes.
N a s "contagens d e mais inferior r e n d i m e n t o , o n d e o c o n t r a t a d o r t e m *fiéis,
b a s t a r á q u e se p q n h ã outro p o r p a r t e d a F a z e n d a R e a l , c o m os m e s m o s dois livros
d e e n t r a d a e saída, p a r a neles se l a n ç a r e m os termos n a f o r m a a c i m a dita, os quais
termos assinará o fiel d a F a z e n d a R e a l e c o n d u t o r e fiel do "contratador, e m lugar
d o fiscal.
N a c o m a r c a d e Vila R i c a , servirá d e i n t e n d e n t e o " p r o v e d o r d a F a z e n d a
R e a l , p o r ç p n t a d o qual c o r r e r á a c o b r a n ç a desse equivalente, q u e se recolherá
e m cofre s e p a r a d o , c o m três chaves, d e q u e terá u m a o p r o v e d o r , o u t r a o "escri-
v ã o d a F a z e n d a R e a l e o u t r a o "tesoureiro d a m e s m a ; e n a c o m a r c a d o S a b a r á se
conservará u m i n t e n d e n t e p a r a a m e s m a a r r e c a d a ç ã o , c o m u m fiscal q u e seja b o m
caixeiro e u m tesoureiro c o m cofre de três chaves, as quais terá u m a o i n t e n d e n t e ,
o u t r a o fiscal e o u t r a o tesoureiro.
N a c o m a r c a do S e r r o d o Frio, c o m o é d e m e n o s r e n d i m e n t o , servirá d e
i n t e n d e n t e o dos d i a m a n t e s , c o m o fiscal e tesoureiro d a m e s m a I n t e n d ê n c i a ; e n a
c o m a r c a do R i o d a s M o r t e s servirá d e i n t e n d e n t e o " o u v i d o r d a m e s m a , c o m
cofre, fiscal e tesoureiro, n a m e s m a forma a c i m a dita.
E m c a d a intendência desta h a v e r á dois livros, u m p a r a servir d e receita, e m
q u e se c a r r e g u e m , p o r t e r m o , as obrigações e créditos d e dívidas q u e os fiscais e
fiéis dos "registros h ã o de r e m e t e r p a r a se c o b r a r e m nas c a b e ç a s das c o m a r c a s
respectivas e t a m b é m p a r a neste se c a r r e g a r e m as parcelas d e o u r o q u e os fiscais e
fiéis dos registros r e m e t e r e m , e outro livro p a r a servir de carregar todas as parcelas
q u e e n t r a m n o cofre; e t a n t o estes livros c o m o os dos fiscais e fiéis dos registros
serão rubricados ou pelos ministros d o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o ou pelos i n t e n d e n t e s
respectivos.
O s i n t e n d e n t e s respectivos, à vista dos dois livros d a i n t e n d ê n c i a e dos q u e
h ã o d e servir aos fiscais e fiéis das contagens, t o m a r ã o a estes as contas, conferindo
os livros daã contagens c o m os das intendências e t a m b é m c o m os d o c o n t r a t a d o r ,
v e n d o se estão conformes as parcelas dos livros d a c o n t r i b u i ç ã o c o m as parcelas
d o "contrato p a r a se vir n o c o n h e c i m e n t o se h á ou n ã o fraude, e pelos livros das
intendências se t o m a r á c o n t a aos intendentes.
D e s t a sorte, só fica v e n c e n d o o r d e n a d o o i n t e n d e n t e do S a b a r a , e q u a n d o
este p a r e ç a t a m b é m desnecessário p o d e r á servir d e i n t e n d e n t e o "ouvidor d a m e s -
m a c o m a r c a , m a s n u n c a se p o d e r á escusar nela fiscal e tesoureiro p a r a o m e l h o r
êxito da c o b r a n ç a , satisfazendo-se este e. os mais ministros c o m u m a certidão d o
"general, n a e s p e r a n ç a e c o m p r o m e s s a de serem atendidos d a real g r a n d e z a p a r a
os seus d e s p a c h o s , declarando-Ihe logo o p r e d i c a m e n t o q u e h ã o d e ter.
Esta f o r m a d e a r r e c a d a ç ã o do " q u i n t o p o r c o n t r i b u i ç ã o se p r o p õ e p a r a o
t e m p o e d u r a n t e o a t u a l c o n t r a t o , q u e findo este s e m p r e se considera r p r e j u í z o l '
u m intendente-geral c o m u m fiscal t a m b é m geral q u e seja b o m caixeiro / / p a r a [ fl. 274v. ]
t o m a r as contas aos ministros das c o m a r c a s , fiscais e fiéis, dos registros n a forma
a c i m a e x p r e s s a d a c o m u m m e i r i n h o e seu escrivão, o q u a l i n t e n d e n t e - g e r a l e
fiscal, t a m b é m geral, t e r ã o a sua principal residência e m Vila R i c a e dali sairão
t o d o s os anos a recensear as contas pelos "registros, f a z e n d o c o n f e r ê n c i a n o s li-
vros. A esta intendencia-geral se recolherá, e m cofre d e três chaves, t o d o o rendi-
m e n t o d a c o n t r i b u i ç ã o , das quais terá o i n t e n d e n t e u m a , o u t r a o fiscal, o u t r a o
tesoureiro.
Esta s e g u n d a forma se p r o p õ e n o caso d e se q u e r e r c o b r a r a contribuição p o r
c o n t a da F a z e n d a R e a l . P o r é m , c o m o t e m m o s t r a d o a experiência q u e s e m e l h a n -
tes contribuições gerais t ê m mais segura e e x a t a a r r e c a d a ç ã o p o r c o n t r a t o , será
mais conveniente q u e esta se r e d u z a a c o n t r a t o , p r o t e s t a n d o os vassalos, h a b i t a n -
tes neste "país das M i n a s , q u e e m tal caso n u n c a o c o n t r a t o d a contribuição seja
r e m a t a d o c o m outras condições diferentes das c o m q u e se a c h a r e m a t a d o o atual
c o n t r a t o das e n t r a d a s a J o s é Ferreira d a Veiga, p o r q u e n ã o suceda h a v e r t e m p o e
c o n t r a t a d o r q u e , a c r e s c e n t a n d o condições onerosas aos vassalos, p r o m e t a m a i o r
p r e ç o e m prejuízo destes.
D a m e s m a sorte, d e v e m p r o t e s t a r os m e s m o s vassalos q u e e m n e n h u m t e m -
p o se p o d e r á l a n ç a r i m p o s t o aos g ê n e r o s d a t e r r a p r o d u z i d o s d e n t r o d a s atuais
d e m a r c a ç õ e s das " c o n t a g e n s , e q u e caso suceda m o v e r e m - s e circunstâncias q u e
o b r i g u e m a m u d a r a l g u m a das contagens p a r a lugar mais contíguo a o c e n t r o das
M i n a s n e m p o r isso os gêneros da terra p r o d u z i d o s n a distancia q u e ficar e n t r e o
lugar e m q u e de p r e s e n t e se a c h a m as contagens e aquele p a r a o n d e se m u d a r e m
p a g a r ã o coisa a l g u m a d e contribuição, e q u e as ditas m u d a n ç a s d e ^registros o u
c o n t a g e n s se n ã o p o d e r ã o fazer sem serem ouvidos os " p r o c u r a d o r e s das c â m a r a s
e ouvidores das c o m a r c a s respectivas, n a presença do general, c o m assistência d o
"provedor d a F a z e n d a R e a l , e do q u e c o n s u l t a r e m esperar resolução régia.
T a m b é m d e v e m os vassalos das M i n a s protestar a o s o b e r a n o q u e caso pelo
d e c u r s o do t e m p o se m o v a m c i r c u n s t â n c i a s o u casos fortuitos q u e o b r i g u e m a
eleger outro m é t o d o p a r a a c o b r a n ç a d o quinto, é m tal caso, logo q u e o u t r o dife-
558

r e n t e m é t o d o p r i n c i p i a r a ter p r á t i c a , ficará c e s s a n d o i n t e i r a m e n t e o efeito do


m é t o d o d a contribuição nas "contagens, cessando-se e abolindo-se totalmente este.
O m é t o d o p r o p o s t o p a r e c e o mais conveniente q u e d e v e m o s p ô r n a p r e s e n -
ç a d o s o b e r a n o e suplicar-lhe, c o m o mais p r o f u n d o a c a t a m e n t o , q u e , c o m o n a
C o r t e se p r o p u s e r a m doze m é t o d o s sobre a c o b r a n ç a d o *quinto, caso q u e este
q u e p r o p o m o s n ã o p a r e ç a aceitável, exercite o dito s e n h o r conosco os efeitos d e
sua real p i e d a d e , m a n d a n d o q u e se nos r e m e t a m cópias p a r a q u e , à vista deles,
p o s s a m o s eleger o q u e n o s p a r e c e r mais c o n v e n i e n t e p a r a a s e g u r a n ç a d a R e a l
F a z e n d a e s u a v i d a d e dos vassalos, suposto o estado atual das M i n a s .
E s t e é o m e u p a r e c e r e m e p e r s u a d o c o r r e r á livre d e s u s p e i t a p e l a s m ã o s
[ fl. 275 ] d o s q u e s o u b e r e m q u e h á 16 a n o s v e n ç o o o r d e n a d o / / d e el-rei n a c o b r a n ç a
d a " c a p i t a ç ã o e q u e n o v a m e n t e p o r b o n d a d e do " g e n e r a l d e s t a c a p i t a n i a es-
tou p r o m o v i d o p a r a e m p r e g o em q u e hei de vencer m a i o r o r d e n a d o c o m a
p r á t i c a d a L e i d a F u n d i ç ã o , v e n d o q u e sigo m é t o d o d i f e r e n t e , e m q u e n ã o
levo e s p e r a n ç a d e ter e m p r e g o e p o r isso c o n t r á r i o aos m e u s interesses, p r e f e -
r i n d o a estes o b e m p ú b l i c o dos vassalos e serviço d o m e u s o b e r a n o , p r o t e s -
t a n d o q u e estes dois p o n t o s indivisíveis d o m e u â n i m o são o n o r t e fixo a q u e
se e n c a m i n h o u este m e u d i s c u r s o .

Salvo *meliore judicio.


S a b a r á , 26 de abril d e 1751.

• 63 -

[ fl. 276 ] Por embargos de nulidade à ordem autuada e à determinação da


mesma, diz o capitão João de Sousa Lisboa, como *caixa e
administrador do *contrato dos dízimos reais destas Minas,
para que se declare que a dita determinação se não entende com o
seu contrato, nem o obriga a fazer seus pagamentos em ouro
quintado e pelo modo mais útil de direito

Embargo impetrado por ordem do contratador dos dízimos


de Minas Gerais no triénio 1750-1752, J o ã o de Sousa Lisboa,
contra lei de 3 de dezembro de 1750, que fixou a oitava de ouro
em 1200 réis, e a j u n t a de 19 de setembro de 1751, que determi-
nou o pagamento dos contratos reais em ouro quintado. O s ei-
559

xos da alegação são o princípio da irretroatividade d a lei, o


direito adquirido e os prejuízos ao contratador e aos lavradores.
Ações c o m o m e s m o teor f o r a m i n t e r p o s t a s p o r t o d o s os
contratadores de Minas Gerais. F o r m a processo com os docu-
mentos 64-66 e complementa os documentos 74-77.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir o documento, que informaria sua participa-
ção nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: J o ã o de Sousa Lisboa; Vila Rica;
ca. 1751.
D e s t i n a t á r i o : Provedoria da Real Fazenda de Minas G e -
rais.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O narrador constitui a ilegalida-
de, o prejuízo e a injustiça como tópicas de vituperação da de-
terminação que o embargante contesta. Note-se o emprego do
silogismo com técnica de argumentação. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
século XVIII, bastarda do período barroco, com hastes inferio-
res e superiores projetadas em volutas e laçadas. Destacam-se o
" c " , mesmo medial, em módulo grande e com laçada inicial,
acoplado à letra anterior; o "g" minúsculo com movimento em
semicírculo, ultrapassando o olho da haste, distinto do " q " que
termina em laçada horizontal. (YDL)

P r o v a r á consta d a dita o r d e m q u e nesta Provedoria se m a n d a observar sobre


o r e q u e r i m e n t o q u e fez o " c o n t r a t a d o r das e n t r a d a s dos c a m i n h o s p a r a
estas M i n a s p o r seu p r o c u r a d o r m a n d a r - s e q u e os p a g a m e n t o s dos "contra-
tos reais se façam e m o u r o " q u i n t a d o , o q u e , c o m o devido a c a t a m e n t o , n ã o p o d e
n e m deve p r a t i c a r - s e pelos p a g a m e n t o s d o e m b a r g a n t e , pelos f u n d a m e n t o s q u e
se s e g u e m :
P r o v a r á q u e o c o n t r a t o q u e o e m b a r g a n t e administra teve seu princípio n o
m ê s d e agosto d e 1750 e até o t e m p o d a o r d e m e m b a r g a d a passou u m a n o c o m
p o u c a diferença, e nesse t e m p o n ã o t e m recebido o e m b a r g a n t e d o dito c o n t r a t o
r e n d i m e n t o a l g u m d e q u e se utilizasse, p o r se n ã o t e r e m a c a b a d o d e recolher as
" n o v i d a d e s d e q u e os l a v r a d o r e s d e v e m "dízimos p a r a d a r e m seus róis d o q u e
d e v e m , q u e é a forma e m q u e se custeia o dito c o n t r a t o , e n ã o t e m o e m b a r g a n t e
e m si utilidade a l g u m a d o dito c o n t r a t o p o r cuja c o n t e m p l a ç ã o deva p a g a r o q u i n -
to nos seus / / p a g a m e n t o s , os quais, conforme a c o n d i ç ã o q u i n t a do seu c o n t r a t o , [ í l . 276v. ]
se n ã o v e n c e m senão passados dois anos, q u e se finalizam e m agosto d e mil sete-
centos e c i n q ü e n t a e dois, q u e e m b o a h o r a vier.
560

P r o v a r á q u e , n a forma d a m e s m a quinta condição, o e m b a r g a n t e e sócios n ã o


d e v e m p a g a r senão n a forma q u e r e c e b e r e m e, segundo a condição primeira, n ã o
deve haver alteração a l g u m a n o "contrato do e m b a r g a n t e , m a s guardar-se a obser-
vância q u e h o u v e até agora; e p o r b e m destas condições n ã o deve o e m b a r g a n t e
fazer p a g a m e n t o s e m ouro "quintado, p o r q u e será alterar a observância que h o u v e
até o presente,
P r o v a r á q u e a observância p r a t i c a d a até agora teve s e m p r e regulando-se p o r
direito divino e "constituições p o r o n d e se g o v e r n a este b i s p a d o , q u e dos frutos
q u e d e v e m "dízimo estes se cobrassem p e l a c o n t a d e dez, u m , q u e p o r essa r a z ã o
se c h a m a dízimo, e se houver d e cobrar-se q u i n t a d o é necessário q u e aos l a v r a d o -
res se p e ç a m d e dez três, a saber, u m do dízimo e dois dos quintos, o q u e p a r e c e
impossível, e n a v e r d a d e o é.
[ fl. 277 ] P r o v a r á q u e a a r r e c a d a ç ã o m u i t o a v u l t a d a dos d í z i m o s d o c o n t r a t o d o
e m b a r g a n t e consiste n o q u e v e m do sertão e se r e c e b e e m g a d o s e cavalos, e
v e n d e n d o - s e p o r estas M i n a s , p o r c a d a c a b e ç a p a g a o c o n t r a t a d o r duas "oitavas
d e q u i n t o s nos "registros, e do c r i a d o r deste g a d o n ã o se p o d e h a v e r o q u i n t o ,
p o r q u e e m p a g a r d e d e z cabeças u m a t e m satisfeito.
P r o v a r á q u e as c o n d i ç õ e s do c o n t r a t o d o e m b a r g a n t e n ã o lhe f a c u l t a m o
p o d e r ele o b r i g a r aos lavradores a q u e se " a v e n c e m c o m ele, m a s fica n o arbítrio
deles o q u e r e r e m fazê-lo o u n ã o , e x c e t u a d o s os d o s e r t ã o , q u e esses n u n c a se
a v e n ç a m c o m o c o n t r a t a d o r , d o n d e resulta a o e m b a r g a n t e o gravíssimo prejuízo
de q u ê , v e n d o os lavradores q u e a o r d e m e m b a r g a d a se h á de executar, todos se
r e t i r a m de avençar-se, p o r c o n h e c e r q u e os tais ajustes h ã o d e ser p e s a d o s c o m os
quintos, e oferecem a o e m b a r g a n t e c o n t r a t a d o r os dízimos dos frutos e m espécie,
c o m o os c o l h e m das suas lavouras.
P r o v a r á q u e , a c o n t e c e n d o o referido, q u e D e u s n ã o p e r m i t a , n ã o p o d e o
e m b a r g a n t e fazer os p a g a m e n t o s do seu c o n t r a t o q u e r e m a t o u pela imposição dos
quintos q u e n o v a m e n t e se lhe carrega sem os haver p r o m e t i d o n e m estipulado e m
[ fl. 277v. ] a l g u m a / / d e suas condições, vendo-se, d o auto d a s u a r e m a t a ç ã o e "alvará real
q u e o a p r o v o u , q u e à estipulação dos p a g a m e n t o s foi e m " a r r o b a s e "libras d e
o u r o c o m o peso de m a t é r i a preciosa, e n ã o c o m a t e n ç ã o à estimação variável do
mesmo ouro.
P r o v a r á q u e , n o s termos d a dita r e m a t a ç ã o do e m b a r g a n t e , satisfaz esta aos
seus p a g a m e n t o s c o m entregar o peso d e q u a r e n t a e q u a t r o a r r o b a s e seis fibras de
o u r o n a F a z e n d a R e a l s e m q u e p o s s a ser o b r i g a d o a p a g a r as oitavas d e q u e
a q u e l e peso d e o u r o consta pela estimação d e mil e q u i n h e n t o s ["réis a o i t a v a ] ,
c o m o n a o r d e m e m b a r g a d a se d e t e r m i n a , e d e direito se h á d e m o s t r a r q u e n ã o
p o d e sustentar-se c o n t r a as condições e resoluções, digo, condições do e m b a r g a n t e
e resoluções do m e s m o direito a dita o r d e m , o q u e deve julgar-se sem efeito.
P r o v a r á que, de mais do excesso q u e se i m p õ e a o e m b a r g a n t e n a dita o r d e m
sobre os p a g a m e n t o s d o seu c o n t r a t o pedindo-se-lhe o quinto deles, se l h e segue
561

dessa n o v a d e t e r m i n a ç ã o una g r a n d e a u m e n t o ñ a despesa n a custeação d o m e s m o


" c o n t r a t o , p o r q u e os c o b r a d o r e s e " a v e n ç a d o r e s q u e a n d a m p e l a s freguesias a
q u e são p r o p o s t o s , " a v e n ç a n d o e c o b r a n d o , n ã o h a v e n d o a v e n ç a s e d e v e n d o e m
tais t e r m o s ser a a r r e c a d a ç ã o e m frutos d o s "dízimos e m espécie, e t e n d o p o r
c o n s e g u i n t e d e conduzi-los às vilas e arraiais p a r a se d i s p o r e m e v e n d e r e m , / / [ fl. 278 ]
n e c e s s a r i a m e n t e crescendo-lhes o t r a b a l h o , h ã o d e q u e r e r d o b r a d o salário d a q u e -
le c o m q u e n o e s t a d o p r e s e n t e se a c o m o d a m , r e d u n d a n d o e m p r e j u í z o d o
e m b a r g a n t e este d a n o e v i d e n t e e d e m u i t a c o n s i d e r a ç ã o , p o r s e r e m m u i t a s as
pessoas q u e c o m aqueles empregos se o c u p a m n a custeação d o dito c o n t r a t o .
P r o v a r á q u e , p r a t i c a n d o - s e a dita o r d e m , a l é m d o i n c ó m o d o e prejuízo d a
relatada despesa, se segue o u t r o inconveniente d e igual d a n o , o q u a l é o fazer-se
necessário a o e m b a r g a n t e v e n d e r e m - s e os m a n t i m e n t o s q u e receber do dízimo a
m e n o s p r e ç o , p o r q u e a o m e s m o t e m p o a n d a m os lavradores v e n d e n d o os seus, e
estes os d i s p õ e m fiados aos seus fregueses, q u e t ê m justos a p r e ç o e t e m p o certo, e
o e m b a r g a n t e p a r a vendê-los c o m o p r e ç o à vista h á d e barateá-los d e necessida-
de, e se quiser a fiados vendê-los n ã o lhe será fácil a c h a r q u e m c o m p r e c o m receio
dê ser executiva a c o b r a n ç a , d a qual todos se desviam.
P r o v a r á q u e , p o r n ã o ter obrigação o e m b a r g a n t e de d a r ou p a g a r n a R e a l
F a z e n d a coisa a l g u m a mais q u e as ditas q u a r e n t a e q u a t r o " a r r o b a s e seis "libras
d e o u r o estipuladas n o auto d a sua r e m a t a ç ã o , se lhe fez c a r g a s o m e n t e d a q u e l e
peso de o u r o sobre o "tesoureiro da m e s m a F a z e n d a R e a l , p a r a havê-lo aos t e m -
p o s / / do seu v e n c i m e n t o do e m b a r g a n t e ou seus fiadores, e daí se manifesta q u e [fl. 278v. ]
n a d a mais deve pagar, e q u a n d o determinado na o r d e m e m b a r g a d a contra o
e m b a r g a n t e n ã o deve ter lugar.
P r o v a r á q u e o o u r o e m p ó ou e m massa se c o n s i d e r a m d u a s estimações: u m a
c o m o c o r p o precioso e estimável, prescindindo do c o m u m valor q u e n o c o m é r c i o
se lhe a t r i b u i , e o u t r a c o m o m a t é r i a s u b - r o g a d a a m o e d a c o r r e n t e , a q u e suas
vezes faz nesse "país c o m estimação pública e m q u e corre g e r a l m e n t e ; e t o m a n d o -
se n a p r i m e i r a e s t i m a ç ã o , c o m o n o a u t o d e r e m a t a ç ã o se t o m o u , n ã o t e m o
p r o m i t e n t e mais o b r i g a ç ã o q u e a de d a r o peso d e o u r o p r o m e t i d o , a i n d a q u e n o
c o m é r c i o as "oitavas, p o r o r d e m do s o b e r a n o , se a c h e m d i m i n u t a s n a e s t i m a ç ã o
vulgar, p o r q u a n t o .
P r o v a r á q u e a m a t é r i a do o u r o , c o m o c o r p o precioso e p r e s c i n d i n d o do v a l o r
i m p o s t o , c o m o se c o n s i d e r o u n a "junta, s e m p r e r e n d e p o r oitava mil e q u i n h e n t o s
"réis à S u a M a j e s t a d e , e n ã o t e m p r e j u í z o a F a z e n d a R e a l e m l h e p a g a r o
e m b a r g a n t e e m o u r o , p o r q u e o dito s e n h o r n ã o o " q u i n t a p o r n ã o ser o s e u
p a t r i m ô n i o sujeito à lei, q u e o m a n d a q u i n t a r nas "casas de f u n d i ç ã o , e s e r i a
circuito prejudicial à m e s m a / / F a z e n d a o o u r o q u e p o r "contrato nela se r e c e b e [ fl. 279 ]
q u a n d o o dito senhor n ã o carece de p a g a r a si m e s m o o quinto q u e dos mais recebe.
P r o v a r á q u e o considerar-se n a j u n t a q u e os q u i n t o s reais se d e s t i n a m a o
p r e s e n t e e m beneficio dos povos p a r a satisfazerem ao dito s e n h o r c e m a r r o b a s d e
562

o u r o a n u a i s e m q u e se a c h a m c o m u t a d o s os " q u i n t o s q u e se l h e d e v e m , n ã o
c o n c l u e m q u e deva o peso d e o u r o q u e o e m b a r g a n t e deve p o r sua r e m a t a ç ã o ser
q u i n t a d o à custa dele, p o r q u e t a n t o beneficio faz o dito s e n h o r a seus vassalos e m
aplicar ã sua contribuição ò quinto daquelas "oitavas, d e que se formam as quarenta
e quatro "arrobas e seis "libras, como e m lhes aplicar os trezentos "réis d e c a d a u m a ,
ficando-Ihe os mil e duzentos, p o r q u e sem se quintarem vale p a r a o dito senhor cada
oitava mil e quinhentos; e se d a sua real grandeza for, c o m o n a "junta se disse, q u e r e r
observar n o seu real p a t r i m ô n i o a sua lei nobilíssima, nessa forma fica c u m p r i n d o
s e p a r a n d o p a r a os quintos trezentos réis e m benefício dos p o v o s e r e c e b e n d o os
mil e duzentos, c o n t e n d o - s e a m b a s as parcelas e m c a d a oitava.
P r o v a r á q u e d a m e n t e d o dito s e n h o r s e m p r e foi q u e os seus "contratadores
d e "dízimos r e m a t a n d o p o r a r r o b a s de o u r o lhe p a g a s s e m no m e s m o g ê n e r o sem
[ fl. 279v. ] se lhes a u m e n t a r o valor d e l e , n o c a s o d e h a v e r / / d i m i n u i ç ã o n a e s t i m a ç ã o
extrínseca, n e m se lhe c a r r e g a r o q u i n t o do p r e ç o e s t i p u l a d o , c o m o se decidiu
b e m c l a r a m e n t e n a " o r d e m régia p o r [carta?] de treze de m a r ç o d e mil setecentos
e vinte e nove, que p o r certidão se junta, e nesses termos n ã o deve ter observância o
d e t e r m i n a d o n a q u e l a o r d e m e decidido n a j u n t a , pois o c u l a r m e n t e se vê q u e os
"ministros dela, valendo-se d a m e s m a ordem, parece a não leram c o m atenção, o que
b e m se depreende p o r dizerem q u e m a n d a expressamente que se p a g u e quintado o
p r e ç o d o contrato, o r d e n a n d o nela o dito senhor todo o contrário e admitindo so-
m e n t e se lhe p a g u e quintado, o que, de fato e sem ordem sua, os contratadores assim
t i n h a m cobrado, a qual exceção, p o r ter causal limitada e muito diversa d o c o r p o d a
dita o r d e m , n ã o p o d e derrogá-la, n e m o seu principal intento, q u e foi o estabele-
cer q u e se n ã o praticasse o q u e pela o r d e m e m b a r g a d a se d e t e r m i n a .
P r o v a r á q u e consta d a certidão q u e vai j u n t a , tirada dos livros d a receita q u e
serviram nos anos d e 1735 e 1736, carregar-se o o u r o à r a z ã o d e mil e duzentos
a o " t e s o u r e i r o [que] e n t ã o servia, p o r q u e assim c o r r i a n a q u e l e t e m p o , e nessa
f o r m a se r e c e b e r á d o c o n t r a t a d o r r e m a t a n t e , sem a u m e n t o a l g u m n e m alteração
[ fl. 280 ] respectiva a o q u i n t o , e a m e s m a alteração é p r o i b i d a / / p e l a p r i m e i r a c o n d i ç ã o
do c o n t r a t o d o e m b a r g a n t e , c o m o qual se deve p r a t i c a r o m e s m o q u e c o m a q u e -
les c o n t r a t a d o r e s se observou.
P r o v a r á q u e os "contratos dos príncipes são leis q u e n ã o a d m i t e m a m e n o r
m u d a n ç a n e m a l t e r a ç ã o , p o r se d e r i v a r e m d o direitp n a t u r a l e s e c u n d á r i o q u e
o b r i g a aos príncipes a s u a rigorosa observância e inteiro c u m p r i m e n t o , e t e n d o
estes p o r sua s o b e r a n i a t o d o o direito positivo a seus pés, o direito n a t u r a l lhes fica
s o b r e a c a b e ç a ; e t a n t a força t ê m os c o n t r a t o s dos p r í n c i p e s q u e p e l a s leis a o
depois constituídas n ã o p o d e m revogar aos contratos q u e , a n t e c e d e n t e s , [celebra-
r a m ? ] , c o m o e m seu lugar se h á d e m o s t r a r , p o r direito, e dele se consegue q u e o
e m b a r g a n t e n ã o deve ser o b r i g a d o a fazer seus p a g a m e n t o s e m o u r o q u i n t a d o ,
p o r q u e n o seu c o n t r a t o essa obrigação se n ã o c o m p r e e n d e u .
563

P r o v a r á q u e , suposto a lei de três d e d e z e m b r o de 1750 o r d e n e q u e t o d o o


o u r o se "quinte nas "casas de fundição, essa lei n ã o c o m p r e e n d e a o "contrato d o
e m b a r g a n t e p o r ser a n t e r i o r à m e s m a lei, e destas é p r ó p r i o d a r e m f o r m a aos
negócios futuros m a s n ã o olhar p a r a trás, n e m a dita lei / / se e n t e n d e c o n t r a os [ fl. 280v. ]
d e v e d o r e s q u e n ã o estão cursos e m * m o r a , pois d e v e n d o o b s e r v a r a lei régia,
p a g a n d o n a m o e d a q u e c o r r e e pelo seu valor ao t e m p o d o p a g a m e n t o , satisfazem
o q u e d e v e m , e p o r ser o dito s e n h o r n o caso p r e s e n t e [o credor?] e o legislador
q u e r e d u z i u o v a l o r d a s "oitavas d e mil e d u z e n t o s , faz p a r a s u a c o n t a a d i t a
d i m i n u i ç ã o , e n ã o p o d e o n e r a r ao d e v e d o r s e m m o r a , e m e n o s c o m aquilo q u e
;

n o c o n t r a t o se n ã o incluiu; daí se m o s t r a q u e a o r d e m e m b a r g a d a se n ã o d e v e
c u m p r i r e m prejuízo do e m b a r g a n t e n o seu c o n t r a t o , a o qual o dito s e n h o r n u n c a
se e n t e n d e q u e r e r d e r r o g a r n e m prejudicar a o direito p o r ele a d q u i r i d o p a r a ex-
clusão d o dito e n c a r g o d e p a g a r q u i n t a d o , s e m a q u a l e m n a d a p r e j u d i c a a o
e m b a r g a n t e a F a z e n d a Real.

Provará que, p e l a o r d e m e m b a r g a d a , cresceu ao contrato do e m b a r g a n t e de


encargo 8 "arrobas, 26 "libras, 12 "oitavas, 28 "grãos [e] 4 / 5 [de] grãos; p o r causa
deste a u m e n t o pretendido, cresce o prejuízo n a custeação do m e s m o contrato, que,
importando, d e presente, o melhor d e doze arrobas de ouro e m salários, administra-
dores, caixas e mais despesas, virá a d o b r a r e m outro tanto, pois ao presente s e m p r e se
vence ao *avençarem-se os lavradores sem o descômodo de r e c e b e r / / o e m b a r g a n t e [ fl. 281 ]
os frutos dos "dízimos n a m e s m a espécie; e n o caso contrário, a cuja contingência
a o r d e m e m b a r g a d a n a t u r a l m e n t e está d a n d o ocasião, será necessário c o n d u z i r os
m a n t i m e n t o s e m bestas p a r a o n d e c o m o d a m e n t e se d i s p o n h a m o u vendê-los a
p r e ç o d i m i n u t o e p o r m e n o s d o c o m u m , e p o r estes m o t i v o s se faz n o t ó r i o o
gravíssimo p r e j u í z o d o e m b a r g a n t e e m se lhe o r d e n a r q u e p a g u e q u i n t a d o , d a n -
do-se-lhe ocasião o u precisão d e fazer m a i o r e s despesas n a custeação do dito con-
trato q u e o c o r p o de todo ele.
P r o v a r á q u e , p e l a notícia d a o r d e m e m b a r g a d a , q u e t e m corrido p o r t o d a s
estas M i n a s , t ê m os lavradores suspendido a deliberação de se a v e n ç a r e m , e daí se
origina n ã o p o d e r o e m b a r g a n t e satisfazer os p a g a m e n t o s do seu c o n t r a t o n o t e m -
p o destinado pelas condições dele; e, ainda, revogando-se a dita o r d e m e j u l g a n -
do-se sem efeito, c o m o p e d e m as nulidades sobreditas, s e m p r e os lavradores, c h e -
gando-se aos [termos?] d e avença, h ã o seguir o receio d e o u t r a j u n t a n a diminui-
ção do q u e ajustarem, t u d o em prejuízo do contrato, da F a z e n d a Real e do
embargante.
P r o v a r á q u e , sendo as n o v e a r r o b a s e tantas libras acréscimo dos quintos das [ fl. 281v. ]
44 a r r o b a s e 6 libras nos quintos p r e t e n d i d o s q u a n t i a d e o u r o d e t a n t a suposição,
n ã o se deve q u e r e r que, se fosse d a m e n t e d o dito s e n h o r o ser dela e m b o l s a d o e
satisfeito, isso o deixasse d e se- d e c l a r a r n o a u t o da r e m a t a ç ã o e deixasse o seu
vigilantíssimo p r o c u r a d o r d a F a z e n d a de adverti-lo e m t e r m o s expressos, o q u e
n ã o h o u v e ; e o q u e no C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , p e r a n t e "ministros t ã o c o n s u m a -
564

dos e circunspectos e m tal matéria, se n ã o tratou, n ã o p o d i a m tratá-lo os "minis-


tros d a "junta, n e m c o m e n t á - l o p o r s u p l e m e n t o .
P r o v a r á q u e , p o r todo o alegado e f o r m a d e condições c o m q u e o e m b a r g a n t e
r e m a t o u , n ã o p o d e ter o b s e r v â n c i a a o r d e m e m b a r g a d a e se d e v e m c u m p r i r
inviolavelmente as condições do "contrato q u e se oferecem e m p r o v a do alegado,
e p o r ser r e c o m e n d a d o ao digníssimo d o u t o r " p r o v e d o r d a F a z e n d a R e a l a obser-
v â n c i a e c u m p r i m e n t o daquelas condições, r e c e b e n d o - s e e j u l g a n d o - s e os presen-
tes e m b a r g o s e d e t e r m i n a n d o - s e q u e [a] dita o r d e m n ã o p o d e ter efeito n e m p r e -
judicar ao embargante.
F a m a Pública.
[ fl. 282 ] P e d e r e c e b i m e n t o e c u m p r i m e n t o de justiça. E protesta p o r t o d o o necessário
e usar d e todos os meios c o m p e t e n t e s p a r a se isentar do p r e t e n d i d o e n c a r g o pelo
m e l h o r m o d o de Direito.
E custas.

• 64 <

[ fl. 283 ] *Contratos dos dízimos de Vila Rica, Rio das Mortes e Sabará
com o Serro do Frio que se fizeram no Conselho Ultramarino com
o capitão João dê Sousa Lisboa, Pedro Teixeira de Carvalho e João
de Siqueira, por seu bastante procurador Francisco Antônio
Rodrigues Feijó, por tempo de três anos, que hão de principiar
em dois de agosto de, 1750, em preço, todos os ditos três anos,
de quarenta e quatro *arrobas e seis *libras de ouro,
livres para a Fazenda Real

Contrato de arrematação dos dízimos da capitania de Minas


Gerais para o triénio 1750-1752 a J o ã o de Sousa Lisboa, que cons-
ta da fixação do seu preço, da forma de pagamento e arrendamen-
to, da sua contabilização e arrecadação e de procedimentos contra
os inadimplentes. Documento anexo a processo sobre pagamento
dos contratos reais após a lei de 3 de dezembro de 1750, que fixou
o valor do ouro èrn 1200 réis, e ajunta de 19 de setembro de 1751,
que detemiinou o pagamento dos contratos reais em ouro quintado.
Ações c o m o m e s m o teor f o r a m i n t e r p o s t a s p o r t o d o s os
contratadores de Minas Gerais. Forma processo com os documen-
tos 63, 65 e 66 e complementa os documentos 74-77.
565

Pela posição que ocupava, o ouvidor Gaetano d a Gosta


Matoso pôde, coligir o documento, que informaria sua participa-
ção nas juntas sobre o assunto.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
10.10.1749.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
século XVIII, bastarda do período barroco, com hastes inferio-
res e superiores projetadas em volutas e laçadas. Destacam-se o
" c " , m e s m o medial, e m m ó d u l o grande e com laçada inicial,
acoplado à letra anterior; o " g " minúsculo com movimento em
semicírculo, ultrapassando o olho da haste, distinto do " q " que
termina em laçada horizontal. Letra idêntica à do documento
63. (YDL)
Cópia manuscrita:
APM, C C 1063, fl. 75v.-80.
Cópias impressas:
A P M , SC 92, mss. 96.
AHTJ, Cons. Ultram., Brasil/MG, cx. 54, doe. 57.

A
no do n a s c i m e n t o de Nosso S e n h o r J e s u s Cristo de mil setecentos e q u a -
r e n t a e n o v e , aos d e z e n o v e dias d o m ê s d e a g o s t o d o d i t o a n o , n e s t a
C o r t e e c i d a d e d e Lisboa, nos Paços d e Sua Majestade e casa e m q u e se
faz o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , estando presentes os senhores conselheiros e o p r o -
c u r a d o r d a F a z e n d a dele, o d e s e m b a r g a d o r G o n ç a l o J o s é d a Silveira P r e t o , a p a -
receu o capitão Francisco A n t ô n i o R o d r i g u e s Feijó, p r o c u r a d o r b a s t a n t e do "capi-
tão J o ã o d e S o u s a Lisboa, P e d r o T e i x e i r a d e C a r v a l h o e J o ã o de Siqueira, p e l o
qual foi dito fazia l a n ç o (como c o m efeito fez) e m n o m e dos ditos seus constituin-
tes nos três "contratos dos dízimos de Vila Rica, R i o das M o r t e s , S a b a r á e S e r r o
do Frio p o r t e m p o d e três anos, q u e h ã o de ter princípio n o dia dois de agosto d e
1750 e h ã o d e findar e m outro tal dia d e 1753, p o r p r e ç o , c a d a u m / / dos ditos [fl. 283v. ]
três a n o s , de q u a t o r z e " a r r o b a s e vinte e q u a t r o *Iíbras d e o u r o , q u e fazem, e m
todo o triénio, q u a r e n t a e q u a t r o a r r o b a s e seis libras d e o u r o , livres p a r a a F a z e n -
d a de S u a M a j e s t a d e , a saber: pelos d e Vila R i c a seis a r r o b a s de o u r o c a d a a n o ,
pelos d o R i o das M o r t e s três a r r o b a s e m e i a e pelos do S a b a r á , S e r r o d o Frio e
sertão cinco a r r o b a s e oito libras, c o m as condições e obrigações do contrato atual,
declaradas n a forma d a cópia assinada pelos ditos senhores "ministros d o Conselho,
abaixo expressadas, e p a r a estas arrematações p r e c e d e r a m "editais e as mais solenida-
des q u e dispõe o "regimento, e se, lhes d e c l a r a r a m os "decretos d e S u a Majestade
sobre os conluios e companheiros e a "resolução do m e s m o s e n h o r d e vinte e sete
de s e t e m b r o de mil setecentos, e q u a r e n t a e seis, e d e u p o r fiador à " d é c i m a a o
566

c a p i t ã o P e d r o G o m e s M o r e i r a e será o b r i g a d o a d a r as fianças necessárias nas


p r o v e d o r i a s respectivas a este " c o n t r a t o .
1. C o m c o n d i ç ã o q u e eles, " c o n t r a t a d o r e s , r e m a t e m os ditos " d í z i m o s d e
Vila R i c a , R i o das M o r t e s , S a b a r á c o m Serro do F r i o p o r t e m p o d e três anos, q u e
h ã o de p r i n c i p i a r e m dois d e agosto de, 1750 e findar e m o u t r o tal dia de 1 7 5 3 , e
[ fl. 2 8 4 ] n o caso e m q u e este contrato se haja a r r e m a t a d o n a s M i n a s / / principiará q u a n d o
findar o q u e se a c h a r feito nelas, e m p r e ç o , c a d a u m a n o , de q u a t o r z e "arrobas e
v i n t e e q u a t r o " l i b r a s d e o u r o , livres p a r a a F a z e n d a R e a l , e p o d e r ã o eles,
c o n t r a t a d o r e s e seus sócios, h a v e r t u d o o q u e p e r t e n c e cobrar-se p a r a a m e s m a
R e a l F a z e n d a , conforme as "leis, "alvarás e "provisões p o r q u e se estabeleceram
estes direitos, c o m o até o p r e s e n t e se observa, sem alteração a l g u m a d e n t r o dos
ditos três anos, o q u e lhe fará c u m p r i r o " p r o v e d o r da F a z e n d a R e a l , d a n d o , digo,
das suas d e t e r m i n a ç õ e s , [dando] a p e l a ç ã o e agravo p a r a o j u í z o d o feitos d a Fa-
z e n d a d a R e l a ç ã o d a Bahia.
2. C o m c o n d i ç ã o q u e a o tesoureiro d a F a z e n d a R e a l se h á de c a r r e g a r e m
receita o p r e ç o deste c o n t r a t o p a r a dele d a r c o n t a e ter c u i d a d o d e c o b r a r aos
" q u a r t é i s n a f o r m a q u e n a c o n d i ç ã o q u i n t a se d e c l a r a , e será e x e c u t o r de s u a
receita, o b s e r v a n d o p q u e dispõe a O r d e n a ç ã o do R e i n o n o livro 2, título 5 3 , e
"regimento da F a z e n d a e C o n t o s sobre a forma d a a r r e c a d a ç ã o e m o d o das exe-
cuções, e das suas sentenças e despachos s o m e n t e se p o d e r á apelar e a g r a v a r p a r a
o j u í z o dos feitos da F a z e n d a d a C a s a d a Suplicação.
[fl. 284v. ] 3. C o m c o n d i ç ã o q u e eles, / / Contratadores e seus sócios, g o z a r ã o d e todos
os privilégios concedidos p e l a O r d e n a ç ã o do R e i n o e r e g i m e n t o d a F a z e n d a , n ã o
e s t a n d o d e r r o g a d o s e m p a r t e ou e m t o d o , e se lhes d a r á , pelo " g o v e r n a d o r e mais
"ministros d e J u s t i ç a , toda a ajuda e favor lícito e justo p a r a a c o b r a n ç a d e suas
dívidas d u r a n t e o t e m p o d e seu contrato.
4. C o m condição que p o r c o n t a deles, c o n t r a t a d o r e s , serão todas as despesas
feitas n a a r r e c a d a ç ã o das rendas e direitos, sendo s o m e n t e p o r c o n t a d a F a z e n d a
R e a l os o r d e n a d o s dos "oficiais n o m e a d o s p o r S u a M a j e s t a d e q u e tiverem "car-
tas, alvarás o u provisões suas, e n ã o p o d e r ã o eles, c o n t r a t a d o r e s , alegar p e r d a s
n e m u s a r d e e n c a m p a ç õ e s algumas, a i n d a nos casos q u e o r e g i m e n t o d a F a z e n d a
os a d m i t e , n e m pedir "quitas p o r casos alguns fortuitos, ou sejam sólitos ou insó-
litos, e c o n t r a o estipulado nesta condição se n ã o a d m i t i r á i n t e r p r e t a ç ã o a l g u m a , e
d a n d o eles, c o n t r a t a d o r e s , nesta C o r t e as fianças a este c o n t r a t o , s e m p r e serão
o b r i g a d o s a ter afiançado foul a d i a n t a d o u m quartel n a P r o v e d o r i a d a F a z e n d a
R e a l das M i n a s .
5. C o m c o n d i ç ã o q u e , e m virtude desta a r r e m a t a ç ã o , ficarão p e r t e c e n d o a
[ fl. 2 8 5 ] eles, / / contratadores, no tempo do seu contrato, os dízimos d e t u d o aquilo q u e e m
direito lhes deve p e r t e n c e r n a forma das "constituições p o r q u e aquele bispado se
governa, e o preço deste contrato o p a g a r ã o depois de passados dois anos, e findos
estes dois anos d e espera se repetirá o p r e ç o deste c o n t r a t o e m q u a t r o anos, aos
"quartéis, d e três e m três meses, sucessivamente, até realmente ser satisfeito o p r e ç o
dos três anos deste contrato, c o m declaração que n ã o p a g a r ã o mais "propinas q u e as
c o s t u m a d a s , e este p a g a m e n t o farão eles, c o n t r a t a d o r e s , e m o u r o o u m o e d a , n a
forma q u e o receberem.
6. C o m c o n d i ç ã o q u e p o d e r ã o eles, ' c o n t r a t a d o r e s , dividir estes "contratos
e m r a m o s , a r r e n d a n d o - o s ou traspassando-os e m q u e m lhes p a r e c e r , Ficando p o -
r é m eles e seus fiadores obrigados a t o d o o p r e ç o d o dito c o n t r a t o , e t a n t o eles
c o n t r a t a d o r e s c o m o seus sócios, fiadores e m a i s pessoas a q u e m traspassarem os
ditos r a m o s l o g r a r ã o d e todos os privilégios e isenções q u e pela O r d e n a ç ã o / / são [ fl. 285v. ]
concedidas aos "rendeiros das "rendas reais. E p a r a m e l h o r a r r e c a d a ç ã o dos ditos
" d í z i m o s p o d e r á n o m e a r u m ou dois " m e i r i n h o s e seus "escrivães, e p e l a s u a
n o m e a ç ã o lhes m a n d a r á o * p r o v e d o r d a F a z e n d a R e a l p a s s a r os p r o v i m e n t o s
necessários p a r a s e r v i r e m . E assim o " g o v e r n a d o r c o m o os m a i s " m i n i s t r o s d e
J u s t i ç a lhe d a r ã o t o d a a ajuda e favor.
7. C o m c o n d i ç ã o q u e serão obrigados todos os senhores d e " e n g e n h o e la-
v r a d o r e s q u e se. n ã o " a v e n ç a r e m a p a g a r pelas v e r d u r a s e m a n t i m e n t o s q u e gas-
t a m a n t e s d a sua colheita u m a "oitava de o u r o c a d a a n o p o r c a d a p e s s o a , q u e
r d e c l a r a r ã o l debaixo d o j u r a m e n t o dos Santos Evangelhos.
8. C o m c o n d i ç ã o q u e os s e n h o r e s d e e n g e n h o , lavradores e mais pessoas q u e
d e v e r e m dízimos p a g a r ã o de todos os frutos d e dez, u m , n a f o r m a das ditas "cons-
tituições, e os q u e se n ã o a v e n ç a r e m serão obrigados a recolher os dízimos e tê-los
b e m a c o n d i c i o n a d o s , d a n d o p a r t e a eles, c o n t r a t a d o r e s , p a r a s a b e r e m o q u e lhes
toca, e a t o d o o t e m p o lhes d a r ã o deles conta. E q u a n d o p o r culpa sua os d e i x e m
p e r d e r , serão obrigados a p a g a r / / a eles, c o n t r a t a d o r e s , ou o m e s m o n ú m e r o d e [ fl. 286 ]
m a n t i m e n t o s ou o seu j u s t o valor pelo p r e ç o q u e estiverem c o r r e n d o .
9. C o m condição q u e todas as pessoas q u e tiverem vacas d e leite e n ã o esti-
v e r e m a v e n ç a d a s p a g a r ã o a eles, c o n t r a t a d o r e s , pelo dízimo das crias o q u e for
j u s t o e r a z ã o , e o m e s m o se p r a t i c a r á c o m os q u e c r i a m p o r c o s d a m e s m a sorte q u e
é c o s t u m e . E sendo os criadores cativos, serão seus senhores obrigados à satisfação
dos ditos dízimos, assim das criações c o m o das p l a n t a s q u e c o s t u m a m ter.
10. C o m c o n d i ç ã o q u e c o b r a r ã o eles, c o n t r a t a d o r e s , os dízimos das m a d e i r a s
e das lenhas o q u e d e v e r e m , n a forma q u e se observa.
11. C o m c o n d i ç ã o q u e eles, c o n t r a t a d o r e s , se p o d e r ã o a v e n ç a r c o m as p a r -
tes, e p o r q u e estas, e m ódio e d a n o dos c o n t r a t a d o r e s , o n ã o q u e r e r ã o fazer, a fim
de q u e eles p e r c a m nos ditos frutos, serão notificadas as pessoas q u e o n ã o quise-
r e m fazer p a r a q u e n o m e i e m u m / / "louvado, e eles, c o n t r a t a d o r e s , n o m e a r ã o [ fl. 286v. ]
o u t r o , os quais, debaixo d o j u r a m e n t o dos Santos Evangelhos, a r b i t r e m o q u e se
deve p a g a r de dízimo, c o n f o r m e a qualidade da fazenda e os gêneros q u e n e l a há,
e q u a n d o os ditos l o u v a d o s se n ã o c o n f o r m a r e m o p r o v e d o r d a F a z e n d a R e a l
n o m e a r á terceiro ou d a r á p a r a isso comissão, o qual, j u n t o c o m os o u t r o s , d e b a i x o
do m e s m o j u r a m e n t o , decidirão o q u e se deve pagar.
568

12. C o m c o n d i ç ã o q u e p o d e r ã o eles, " c o n t r a t a d o r e s , c o b r a r todas as dividas


p r o c e d i d a s dos ditos "dízimos executivamente, c o m o F a z e n d a R e a l , p a r a o q u e o
" p r o v e d o r da F a z e n d a R e a l será seu juiz privativo assim nesta c o m o e m todas as
suas causas cíveis o u crimes, e n ã o serão c h a m a d o s a o u t r o a l g u m tribunal, b e m
e n t e n d i d o q u e isto só se e n t e n d e n a f o r m a d a Lei do R e i n o , lib. 2, tit. 6 3 , § 3, e
nas O r d e n a ç õ e s d a F a z e n d a , cap. 1 5 1 .
13. C o m c o n d i ç ã o q u e c o m o se t ê m feito várias olarias e m q u e se o c u p a m
m u i t o s e vários escravos, e nelas se fazem, p o r negócio, telha, tijolo e mais louça,
[ fl. 287 ] delas p a g a r ã o / / dízimo, c o m o fruto d a terra, d e c a d a dez, u m , n o caso q u e se
deva p a g a r e esteja e m uso.
14. G o m c o n d i ç ã o q u e , s e n d o necessário a eles, c o n t r a t a d o r e s , m a i s a l g u m a
c o n d i ç ã o p a r a m e l h o r a r r e c a d a ç ã o destes dízimos, a r e q u e r e r á a o p r o v e d o r d a
F a z e n d a R e a l , q u e lhes c o n c e d e r á o q u e for j u s t o e r a z ã o , n ã o e n c o n t r a n d o as
a c i m a declaradas, e p o d e r ã o ter "feitores e u m " m e i r i n h o , p a g a n d o - o s à sua custa,
p a r a o q u e se lhe p a s s a r ã o p r o v i m e n t o s pelo p r o v e d o r d a F a z e n d a R e a l .

E sendo visto pelos senhores conselheiros do C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , p r e s e n -


te o " d e s e m b a r g a d o r G o n ç a l o J o s é da Silveira P r e t o , p r o c u r a d o r d a F a z e n d a dele,
o Conteúdo nestes "contratos, condições e obrigações deles, o h o u v e r a m p o r b e m
e se o b r i g a r a m , e m n o m e d e Sua Majestade, a lhes d a r inteiro c u m p r i m e n t o , e o
dito c a p i t ã o Francisco A n t ô n i o R o d r i g u e s Feijó, p r o c u r a d o r b a s t a n t e dos referi-
dos capitão J o ã o d e S o u s a Lisboa, P e d r o T e i x e i r a d e C a r v a l h o e J o ã o de Siqueira,
q u e p r e s e n t e estava, disse os aceitava p a r a eles seus constituintes, ficando obriga-
[ fl. 287v. ] dos / / a c u m p r i r i n t e i r a m e n t e os ditos contratos n a f o r m a d a sua r e m a t a ç ã o , c o m
todas as condições e obrigações neles declaradas, e q u e n ã o c u m p r i n d o eles, e m
p a r t e ou e m t o d o , p a g a r i a m e satisfariam t o d a a p e r d a q u e a F a z e n d a d e S u a
M a j e s t a d e r e c e b e r p o r todos os seus b e n s , assim móveis c o m o d e raiz, havidos e
p o r h a v e r , os quais p a r a isso o b r i g a v a m , e p o r firmeza d e t u d o m a n d a r a m fazer
esse c o n t r a t o n o livro deles, e m q u e todos assinaram c o m o dito capitão Francisco
A n t ô n i o R o d r i g u e s Feijó c o m o p r o c u r a d o r bastante dos sobreditos c o n t r a t a d o r e s ,
d e q u e sê lhe d e u u m a cópia assinada pelos senhores d e s e m b a r g a d o r e s A l e x a n d r e
M e t e l o d e Sousa M e n e s e s e T o m é G o m e s M o r e i r a , conselheiros do dito C o n s e -
l h o U l t r a m a r i n o , A n t ô n i o d e C o b e l o s P e r e i r a , oficial d a S e c r e t a r i a d o m e s m o
C o n s e l h o , To fez! e m L i s b o a , a 10 de o u t u b r o d e 1749. O s e c r e t á r i o J o a q u i m
M i g u e l Lopes d e Lavre o fez escrever.

A l e x a n d r e Metelo d e Sousa e Meneses T o m é Gomes Moreira


T i r a d o d o livro segundo de contratos d a Secretaria do C o n s e l h o U l t r a m a r i -
n o , e m q u e esse se a c h a l a n ç a d o à folha 2 3 7 . Lisboa, 27 de o u t u b r o de. .1749.

J o a q u i m Miguel Lopes d e L a v r e
569

E u , e l - r e i , f a ç o s a b e r a o s q u e este m e u * a l v a r á v i r e m q u e , s e n d o - m e [ fl. 2 8 8 ]
p r e s e n t e os t r ê s " c o n t r a t o s a t r á s e s c r i t o s , q u e se fizeram no meu Conselho
U l t r a m a r i n o com o capitão J o ã o de Sousa Lisboa, Pedro Teixeira de Carva-
l h o e J o ã o d e S i q u e i r a , p o r seu b a s t a n t e p r o c u r a d o r , o c a p i t ã o F r a n c i s c o A n -
tônio R o d r i g u e s Feijó, d o r e n d i m e n t o dos "dízimos de Vila R i c a , R i o das
M o r t e s e S a b a r á c o m S e r r o d o F r i o , p o r t e m p o d e três a n o s , q u e h ã o d e t e r
p r i n c í p i o n o dia dois d e a g o s t o d e 1750, p o r p r e ç o , t o d o s os ditos c o n t r a t o s ,
e m t o d o o t r i e n i o , d e q u a r e n t a e q u a t r o " a r r o b a s e seis "libras d e o u r o livres
p a r a m i n h a R e a l F a z e n d a , c o m as c o n d i ç õ e s e o b r i g a ç õ e s e x p r e s s a d a s n o s
ditos c o n t r a t o s , h e i p o r b e m a p r o v a r e ratificar os m e s m o s c o n t r a t o s nas p e s -
soas d o s referidos c a p i t ã o J o ã o d e S o u s a L i s b o a , P e d r o T e i x e i r a d e C a r v a l h o
e J o ã o d e S i q u e i r a , e m a n d o se c u m p r a m e g u a r d e m i n t e i r a m e n t e c o m o neles
e e m c a d a u m a d e suas c o n d i ç õ e s s e c o n t ê m , p o r este a l v a r á q u e v a l e r á c o m o
" c a r t a e n ã o p a s s a r á p e l a C h a n c e l a r i a s e m e m b a r g o d a O r d e n a ç ã o , lib. 2 tit.
3 9 e 4 0 e m c o n t r á r i o . L i s b o a , a 10 d e o u t u b r o d e 1 7 4 9 .

Rainha

Alvará p o r q u e Vossa M a j e s t a d e h á / / p o r b e m a p r o v a r e ratificar, n a s p e s - [ fl. 288v. ]


soas d o c a p i t ã o J o ã o d e S o u s a L i s b o a , P e d r o T e i x e i r a d e C a r v a l h o e J o ã o d e
Siqueira, os três contratos q u e c o m eles se fizeram p o r seu b a s t a n t e p r o c u r a d o r , o
"capitão Francisco A n t ô n i o R o d r i g u e s Feijó, n o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , d o r e n d i -
m e n t o dos dízimos d e Vila R i c a , R i o das M o r t e s e S a b a r á c o m o S e r r o d o Frio
p o r t e m p o d e três anos, q u e h ã o de ter princípio n o dia dois de agosto d e 1750,
p o r p r e ç o , t o d o s os ditos contratos, e m t o d o o triénio, de q u a r e n t a e q u a t r o a r r o b a s
e seis libras d e o u r o , livres p a r a a F a z e n d a de Vossa M a j e s t a d e , c o m o neste se
declara, o qual n ã o passa pela C h a n c e l a r i a .
P a r a V o s s a M a j e s t a d e ver.

A l e x a n d r e M é t e l o de Sousa e M e n e s e s
T o m é Gomes Moreira

O secretário J o a q u i m Miguel L o p e s d e Lavre o fez escrever.

R e g i s t r a d o à folha 239 d o livro segundo de contratos d a Secretaria do C o n -


selho U l t r a m a r i n o . Lisboa, a 27 d e o u t u b r o d e 1749.

J o a q u i m M i g u e l Lopes d e L a v r e
A n t ô n i o d e Cobelos Pereira o fez.
570

• 65 «

[Memorial em que se mostra ser prejudicial o pagamento do con-


trato das entradas de José Ferreira da Veiga em ouro quintado]

Parecer do provedor d a Real F a z e n d a sobre o embargo


impetrado por ordem do contratador das entradas de Minas G e -
rais no triénio 1750-1752, José Ferreira da Veiga, contra a lei de
3 de dezembro de 1750, que fixou a oitava de ouro em 1200 réis,
e a j u n t a de 19 de setembro de 1751, que determinou o paga-
m e n t o dos contratos reais e m ouro quintado. O s argumentos
favoráveis ao contratador são o princípio da irretroatividade da
lei, a p r e r r o g a t i v a do direito a d q u i r i d o e os p r e j u í z o s a o
contratador e aos habitantes das Minas. F o r m a processo com os
documentos 63, 64 e 66 e complementa os documentos 74-77.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o da Costa
Matoso pôde coligir o documento, que informaria sua participa-
ção nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Luís Cardoso Metelo Corte-Real
da Cunha; Vila Rica; ca. 1751.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Defesa em forma epistolar contra
a forma de pagamento imposta ao contratador das entradas de
Minas. O narrador constitui a ilegalidade, o prejuízo e a injusti-
ça como tópicas de vituperação de tal determinação. Aplicação
das tópicas do "empenho" e empobrecimento dos mineiros, ine-
rentes à forma de pagamento que o narrador contesta. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
século XVIII, destrógrada, com hastes superiores e inferiores de
u m só traço, que definem a inclinação para a direita. Maiúscu-
las com volutas, "s" pendente em forma de "z". Uso de abrevia-
turas usuais, com letras sobrepostas e ponto abreviativo. (YDL)
Critérios editoriais: O s escólios, incorporados ao texto no
original, foram deslocados com o objetivo de facilitar a leitura.

[ fl. 289 ] Ilustríssimo e Excelentíssimo S e n h o r :

R e m a t a n d o Afonso G i n a b e l n o C o n s e l h o d e U l t r a m a r d a c i d a d e de Lisboa
os " c o n t r a t o s das e n t r a d a s p a r a estas M i n a s e m p r e ç o de 117 " a r r o b a s e u m a
"libra d e o u r o , e m 12 de agosto d e 1750, e tendo seu p r o c u r a d o r a l g u m a dúvida
571

n a f o r m a d o p a g a m e n t o , depois de várias informações, foi Vossa Excelência servi-


d o o r d e n a r - l h e q u e devia p a g a r e m o u r o " q u i n t a d o , p r e c e d e n d o o p a r e c e r d e
u m a "junta q u e Vossa Excelência convocou n o S e r r o do Frio, a q u a l d e c l a r a ç ã o e
o r d e m se faz impraticável pelo gravíssimo prejuízo do r e m a t a n t e e p o r se e n c o n -
t r a r o estipulado n a s suas condições, e m quais circunstâncias se v ê ex-precisado a
p ô r , n a p r e s e n ç a d e Vossa Excelência, este m e m o r i a l , p a r a q u e , p o n d e r a d o , a dita
d e c l a r a ç ã o se n ã o observe.
S ã o os "contratos dos príncipes leis, e suas condições c o m t a n t a eficácia q u e
os m e s m o s príncipes c o n t r a e n t e s n ã o p o d e m e n c o n t r a r n e m modificar o q u e neles
p r o m e t e r a m e e s t i p u l a r a m , e neles n a d a p o d e i n o v a r - s e . E q u a n d o n ã o é lícita
3 b

q u a l q u e r alteração a o príncipe n o seu c o n t r a t o , m e n o s é facultada a q u a l q u e r d e


seus s u b a l t e r n o s . E a d e c l a r a ç ã o n ã o s o m e n t e a l t e r a o c o n t r a t o c e l e b r a d o n a
¿

r e m a t a ç ã o q u e S u a M a j e s t a d e c o n f i r m o u de c e r t a ciência, "imo pottus e n c o n t r a


suas condições q u e , *ad ungueffi, se d e v e m c u m p r i r , c o m o delas se d e c l a r a .
T e m a dita declaração r e p u g n â n c i a d e fato e de direito c o m a r e m a t a ç ã o d e
q u e se trata, p o r q u e t e n d o acontecido nesta capitania p o r m u i t a s vezes a m u d a n ç a
n o valor extrínseco do o u r o , n u n c a n a a r r e c a d a ç ã o dos contratos r e m a t a d o s h o u -
v e a l t e r a ç ã o p o r c a u s a d a dita m u d a n ç a , m a s s e m p r e se r e c e b e u c o m o g ê n e r o
devido, tendo-se q u e a F a z e n d a R e a l n ã o t i n h a nisso prejuízo, o q u e é c o n s t a n t e
pelas cargas e recibos nos livros desta Provedoria.
T a n t o assim q u e , m o v e n d o - s e d ú v i d a no a n o d e 1727 s o b r e a p r e f e r ê n c i a [ fl. 289v. ]
dos c o n t r a t o s das e n t r a d a s r e m a t a d o s n o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o e nestas M i n a s
c ô m a c o n d i ç ã o d e p a g a r o r e m a t a n t e nelas e m o u r o q u i n t a d o , foi S u a M a j e s t a d e
servido, t e n d o e m mais a fé d o c o n t r a t o q u e a conveniência m a i o r , m a n d a r q u e a
r e m a t a ç ã o do C o n s e l h o prevalecesse e se cumprisse, e s t r a n h a n d o c o m o novo tri-
b u t o a c o n d i ç ã o d e p a g a r - s e q u i n t a d o , d o q u e oferece o r e m a t a n t e certidão, q u e
vai à folha [incompleto], n ã o se a c h a d e r r o g a d a p o r o u t r a a dita resolução real p a r a
q u e se preterisse n o p a r e c e r d a j u n t a e se encontrasse s e m motivos justos.
S e o r e m a t a n t e houvesse de p a g a r 117 "arrobas da sua r e m a t a ç ã o q u i n t a d a s ,
v i n h a m a acrescentar-se-lhe a o p r e ç o q u e estipulou mais d e 2 8 a r r o b a s d e o u r o , e
se t o r n a v a m as 117 a r r o b a s e m 145, o que. e n c o n t r a t o d a a b o a fé q u e nos c o n t r a -
tos dos príncipes s o b e r a n o s deve a b u n d a r ; e se houvesse o r e m a t a n t e d e c o b r a r
quintados os e m o l u m e n t o s do m e s m o c o n t r a t o , o alívio dos p o v o s a q u e n a j u n t a
se aludiu se convertia n o m a i o r g r a v a m e deles, sendo o prejuízo d o r e m a t a n t e o
mais avultado, p o r q u e d e v e n d o os viandantes 100 "oitavas d e direitos, p a r a p a g á -
las q u i n t a d a s , a l é m d a d e s p e s a d a "fundição lhes ficam delas 8 0 o i t a v a s , e o

Roland. a Valle, consil. 25, n. 35; Amaya, in leg. fin,, cod. de annon. et trib., libro 10, n. 2, 3, e 4.
Partium alterutra renuente, Pelaes de maior. Hispan. P. 1. q. 28, n. 14
Trasso, de patrón, regio, torri. 2, cap. 95, n. 9.
572

r e m a t a n t e , p a g a n d o quintos d a s u a r e m a t a ç ã o q u e n ã o estipulou n e m p r o m e t e u
c o m 28 "arrobas de o u r o , se a c h a prejudicado, e o n e r a d o e sujeito a " d e r r a m a ; e
os v i a n d a n t e s , v e n d o q u e a miséria d o "país n ã o d á Conveniência q u e faça c o n t a
e m m e t e r e m carregações, considerada a despesa dos direitos, h ã o d e p a r a r c o m o
seu tráfico, e ficarão c e s s a n d o os e m o l u m e n t o s dos "registros e o r e m a t a n t e e m
r u í n a , s e m r e m é d i o p a r a p o d e r satisfazer o p r e ç o e s t i p u l a d o , o q u e talvez n ã o
e x p e r i m e n t a r i a se n a " j u n t a b e m se p o n d e r a s s e m estes i n c o n v e n i e n t e s , a for-
m a d a d i t a r e m a t a ç ã o a p r o v a d a p o r S u a M a j e s t a d e e as c o n d i ç õ e s d a m e s m a ,
que n ã o d ã o lugar ao d e t e r m i n a d o , e declaração de Vossa Excelência que p o r
ele se r e g u l o u .
[ fl. 290 ] N a s O r d e n a ç õ e s d a R e a l F a z e n d a p r o í b e S u a M a j e s t a d e , t o m a r e m - s e nos
"contratos reais lanços c o m condições novas, pelos capítulos 10 e 5 3 , a i n d a q u a n -
do as condições novas n ã o sejam prejudiciais aos povos; e p o r ali b e m se infere,
p o r m a i o r i d a d e de r a z ã o , q u e n e n h u m a condição n o v a se p o d e i m p o r aos contra-
tos depois de perfeitos e m sua substância, p o r q u e o q u e n ã o deve antes de perfeito
p c o n t r a t o admitir-se n ã o deve depois de perfeito tolerar-se. E a d e c l a r a ç ã o q u e se
i m p u g n a , p r e j u d i c a n d o tão g r a v e m e n t e a o r e m a t a n t e e p o v o s , d á ocasião a cessar
a freqüência dos registros e a u m g r a n d e a b a t i m e n t o nas r e n d a s reais, q u e costu-
m a m a u m e n t a r - s e ao sentir dos políticos q u a n d o os tributos devidos à Majestade
se m o d e r a m ; l e o r e m a t a n t e , a todo o risco d a sua F a z e n d a , subiu os reais contra-
f

tos ao lanço de 117 a r r o b a s e u m a "libra d e o u r o , a q u e n u n c a c h e g a r a m , e o n e r á -


lo c o m mais 28 arrobas n ã o cabe n o possível, p o r justiça n e m e q ü i d a d e .
P o r q u e n a s e g u n d a c o n d i ç ã o do c o n t r a t o é facultado a o r e m a t a n t e p a g a r as
117 a r r o b a s e m puro e m p ó , e n ã o p o d e h a v e r disposição m a i s c l a r a c o n t r a o
p a r e c e r d a j u n t a , q u e , p o n d e r a n d o q u e t o d o o o u r o e m p ó se devia p a g a r q u i n t a d o
n a R e a l F a z e n d a levando-se às "casas de fundição, p a r e c e se olvidou d e ser per-
m i t i d o a o r e m a t a n t e p a g a r e m ouro e m p ó o p r e ç o do seu c o n t r a t o , sendo o u r o
e m p ó diverso d o fundido e q u i n t a d o , q u e só e m b a r r a se verifica e assim se lhe
c o n h e c e o "toque, c o m o insinua o capítulo 5 d a Lei Novíssima, de 3 de d e z e m b r o
de 1750, n a q u e l a cláusula "pelo justo valor q u e tiver, s e g u n d o seu t o q u e " .
Confirma-se ser impraticável a declaração q u e e m a n o u d a resolução e p a r e -
cer d a j u n t a c o m as disposições de direito, p o r q u e d e c l a r a n d o à r e m a t a ç ã o ser o
p r e ç o q u e o r e m a t a n t e deve p a g a r 117 a r r o b a s e u m a libra n ã o se disse n e m se
declarou q u e h a v i a m d e ser q u i n t a d a s p a r a a F a z e n d a R e a l e p o r q u e o " c o n d u t o r
d o dito c o n t r a t o n ã o deve p a g a r mais do q u e p r o m e t e u , n o q u e c o n c o r d a m os
[ fl, 290v. ] digníssimos d o u t o r e s citados n o conselho d a U n i v e r s i d a d e / / d e I n g o l s t á d i o , e e

r e m a t a n d o - s e p c o n t r a t o pelas ditas 117 a r r o b a s e. u m a libra d e o u r o n ã o tem o

Solorzano, emblem. Reg. Poüt., 84, ti, 16.


Referido por Manzio, tom. 3, Biblíot. aur., pag. 1113, n. 4.
573

r e m a t a n t e m a i s obrigação q u e a de p a g a r aquele n ú m e r o e peso, sem atender-se


ao seu v a l o r S
A r a z ã o d e s t a r e s o l u ç ã o consiste e m q u e n o o u r o se d ã o d u a s e s t i m a ç õ e s ,
u m a ativa e o u t r a passiva: a ativa é q u a n d o o o u r o i n t e r v é m nos c o n t r a t o s c o m o
p r e ç o c o m e n s u r a t i v o p e l o valor t a x a d o das m a i s coisas; a e s t i m a ç ã o passiva se
verifica q u a n d o n ã o i n t e r v é m o o u r o p o r e s t i m a ç ã o c e r t a , m a s c o m o m e r o
corpo e m e r o peso separado da estimação taxada,S donde infere" que o "con-
t r a t o e m q u e o o u r o se c o n s i d e r a c o m o p e s o , m a s s a e c o r p o se satisfaz c o m a
e n t r e g a d o m e s m o p e s o , c o r p o e m a s s a , o u a s u a e s t i m a ç ã o ativa p a d e ç a d i m i -
n u i ç ã o ou a u m e n t o , e n a c o n d u ç ã o do r e m a t a n t e intervieram, c o m o p a g a certa e
1

n ã o c o m o p r e ç o , as 117 " a r r o b a s e u m a "libra d e ouroy) q u e n ã o p o d e m ser


a u m e n t a d a s c o m acréscimo a l g u m e m a t e n ç ã o a ter n o c o m u m a b a t i m e n t o o o u r o
no valor extrínseco, p o r q u e a p r e s t a ç ã o d a p a g a q u e o r e m a t a n t e deve é feita a
S u a M a j e s t a d e , q u e n ã o fica obrigado a o preceito d a sua Lei Novíssima,* e q u a n - 1

d o o dito s e n h o r estipulou a r r o b a s d e o u r o n ã o quis q u e o r e m a t a n t e / / lhe [ fl. 291 ]


pagasse s e n ã o o dito peso e c o r p o , ! e isso m e s m o c o n t é m a c o n d i ç ã o d e p a g a r e m
ouro em pó.

A u t i l i d a d e d a F a z e n d a R e a l , n o caso e m q u e só p o d i a h a v e r d ú v i d a d e
q u e r e r o r e m a t a n t e p a g a r e m dinheiro, c o m o a dita s e g u n d a c o n d i ç ã o lhe faculta
esta, p e r s u a d i n d o ser-Ihe m a i s c ô m o d a a solução e m ouro e m p ó e n ã o ter lugar o
p r e ç o e m d i n h e i r o d o o u r o q u i n t a d o , p o r q u e q u a n d o se q u e r a t e n d e r à estimação
d a m o e d a , v a r i a d a no valor extrínseco ao t e m p o d a solução, deve respeitar-se o
seu c o m u m valor. 111
E desde agosto deste a n o se c o m p u t a m as "oitavas n a c o m u m

*- E isto é o que resolvem Berlichío practicabil., tom. 2, conclus. 36, n. 42-67; e 72; Panimol. de.
44, annot. 1, IL 12; Rosa. consult. 54. n. 18, ibi: Nisi Contrarium, cujas ad Novel. 4; Iuitin. tom.
2, col. 1036, Litéra H ; H a r p p r e c h t . , no princípio Inst. Guile., mod. re còntr. oblig., n. 245;
Alberto Bruno de augm. et demin. monet., particul. 6. ante, n. 4, ibi: quia in his; Torrevar., lib.
3, p. 2, tit. 12, q. 5 1 , n. 34; Anaclet., lib. 3 Decretal, tit. 2 3 , desolut. n. 3 2 ; Schmier Iurisprud.
1

can. civil., torn. 2, lib. 3, tract. 3, cap. 8, sect. 1, § 3, n. 36, e estes referem inumeráveis.
•S- Lutard., de Usur., q. 17, n. 20-21; Panimolle de., anotação 1, n. 8 e 9.
h
- Este doutor, n. 10.
E o leva n. 11, corn grande torrente de digníssimos doutores
J- Pacíoti., de locat. et conduct., cap. 2, n. 26, ideo.
k
Como leva Gonçalves da Silva, ad Ord., lib. 4, tit, 21, n. 73.
Retes, opusculor., lib. 7, cap. 1, conscctar. 2, n. 60 e 59.
m
* L. Sigués argentum cod. de d o n a t , ibi: Sive in ipsa aestimatione, quae pro massa nidi in illis locis
frequentata est;L. cum certum L. Titiae, §§ de auro, et arg. leg. Bartol. ibidem, Pinel, in Rubr. cod.
de rescind, vend., part. 1, cap. 3, n. 14, ibi: ut debitor massae auri etc tradit judicatum; Castell.,
controv.jur.,lib.4. cap. 10,n. 63;Berlic.h. Conclus, de 36, n. 5; Gob., de monet., q. 5, n. 1 et q. 6, n.
7; Larria, allegat. fiscal 84, n. 2 1 ; Retes, opuscul., lib. 7, cap. 1, consectar. 2 , n. 60; Amaya na L.
S

unica cod. de collât, aeris., n. 34; Zoef, lib. 12, Digest., tit. 1, n. 26; Weizegener, q. monet. 3, n. 5
574

estimação a 1.200 [*réis a *oítava], n ã o tendo princípio a obrigação d e "contrato


d o r e m a t a n t e senão do p r i m e i r o de. o u t u b r o do dito a n o e m diante.
Posto q u e suposto os digníssimos doutores façam c o m u m e n t e distinção e n t r e
o t e m p o d o contrato e d o p a g a m e n t o p a r a r e g u l a r e m p o r u m ou outro o p r e ç o d a
m o e d a , p r o c e d e m p e l a m a i o r p a r t e n a hipótese d e h a v e r o d e v e d o r r e c e b i d o o
q u e deve restituir, ou c o m o c o r p o estimável ou c o m o q u a n t i a p e c u n i á r i a definida
c o m a f o r m a pública; e n ã o fazendo n a *junta e m b a r a ç o esta distinção, s e m p r e os
ditos digníssimos doutores t ê m u n i f o r m e m e n t e q u e a m u d a n ç a n o valor extrínseco
faz q u e deve p a g a r o devedor segundo o valor d a m o e d a a o t e m p o d a solução, d e
sorte q u e d e v e n d o dez oitavas, q u e no valor extrínseco se v a r i a r a m , p a g a c o m d a r
[ fl. 291 v. ] dez oitavas, posto q u e agora m e n o s v a l h a m , " e q u e a m u d a n ç a n o valor, / / sem
d i m i n u i ç ã o n a substância e forma, seja a q u e acontece n a b o n d a d e e x t r í n s e c a . 0

A justiça d o r e m a t a n t e , p a r a ser relevado d a n o v a d e c l a r a ç ã o , p r o c e d e e m


t e r m o s m u i t o diversos dos q u e figuram os digníssimos d o u t o r e s n o d e v e d o r d o
e m p r é s t i m o o u d e o u t r o c o n t r a t o p e l o q u a l r e c e b e u , e a o d e p o i s sobreveio n a
m o e d a a m u d a n ç a n o valor, p o r q u e o r e m a t a n t e a i n d a n ã o recebeu coisa a l g u m a ,
e n a c o n d u ç ã o do real c o n t r a t o q u e r e m a t o u o princípio se verifica q u a n d o e n t r a
n a a d m i n i s t r a ç ã o , e esse é o princípio do contrato e o t e m p o dele,P e nestes t e r m o s
o t e m p o d o c o n t r a t o e o t e m p o d a solução v ê m a ser o m e s m o a r e s p e i t o d o
r e m a t a n t e , e e m u m e o u t r o n ã o deve p a g a r o u r o q u i n t a d o , p o r q u e estipulou
p a g á - l o e m p ó , n e m d i n h e i r o à r a z ã o d e 1.500,. se c o m ele satisfizer, p o r q u e a
oitava d e o u r o corre, e m u m e outro t e m p o do contrato e solução, a 1.200.
E faz m u i t o e m favor desta conclusão q u e a instituição e origem d o c o n t r a t o
real das e n t r a d a s nestas M i n a s foi u m r e c o n h e c i m e n t o o b s e q u i o s o c o m q u e os
vassalos de S u a Majestade p r o t e s t a r a m a sujeição e a m o r reverenciai a o seu sobe-
r a n o , constituindo, de seu c o n s e n t i m e n t o real, a cota d e trinta "arrobas d e o u r o
c o m q u e u n i f o r m e m e n t e c o r r e s p o n d e r a m p o r muitos anos e ao depois se a u m e n -
tou c o m a m e s m a origem. E p o r ser o p r o d u t o destes contratos satisfação e m q u e
os reais "quintos se estabeleceram, n ã o é congruente q u e sobre ela se c a r r e g u e m
outros quintos, p o r se n ã o d a r infinidade c o m gravíssimo d a n o do r e m a t a n t e e dos
mais vassalos d e S u a M a j e s t a d e , e se o dito s e n h o r quisera q u e o r e m a t a n t e os
pagasse das arrobas estipuladas, e era fácil o expressá-lo, e o n ã o o fazer é p r o v a
d e q u e n ã o quis, n e m o r e m a t a n t e o estipulou.

n
- Pacion., allegat. civil 128, n. 5, aonde de communi, Torre d. q. 51, n. 38; Harppr., loco super citato,
n. 210. Schmier d. § 3, n. 37- 38; Luca ad Gratiari. animad. vers. 51, sub. n. 8;Larreade. 13, sub.n.
4, ibi: Et quando. Carena, Resol. 113, n. I; Sabelli, Sum. diver., t. 3, §. moneta, n.l; Emerix, de.
Rotae Romanae, 8, n. 2.
°- Disse Martinho de Laude, Tr. de monet., n. 18; Weizegenero q. monet. 1, n. 2 e 5, apud. Manzio
post Constit. Carolinas, torn. 3, Biblioteca.
P- Pacion., delocat., cap. 23, n. 124-125,
575

O q u e m e l h o r se manifesta, p o r q u e as 28 *arrobas a q u e se estende o *quin- [ fl. 292 ]


to das 117 estipuladas n ã o e r a m coisa d e p o u c a e n t i d a d e p a r a q u e deixasse d e
declarar-se n o auto e i n s t r u m e n t o d a r e m a t a ç ã o circunstância t ã o essencialj e n o
*alvará p o r q u e o dito s e n h o r h o u v e p o r b e m confirmar a m e s m a r e m a t a ç ã o se
n ã o havia d e omitir, q u a n d o a p r o v i d a advertencia dos "ministros d a q u e l e C o n -
s e l h o d i t o u as c l á u s u l a s d o m e s m o t e r m o d a r e m a t a ç ã o c o m a s s i s t ê n c i a d e
vigilantíssimo p r o c u r a d o r régio, sem fazer-se m e n ç ã o de q u i n t o q u e a inteligencia
dos m i n i s t r o s d a *junta p e r s u a d i u a V o s s a E x c e l e n c i a , s e m r e p a r a r - s e q u e e m
m a t e r i a d e t a n t a p o n d e r a ç ã o n ã o expressada deviam, p o r direito, fazer interpreta-
ção e m favor d o r e m a t a n t e c o n d u t o r . ^ P o r é m , o seu contrário p a r e c e r n ã o deve
ser nocivo a o r e m a t a n t e j q u e n ã o fia d a r e t a i n t e n ç ã o d e Vossa Excelência susten-
tar u m p a r e c e r m a l f u n d a d o , sendo p r o c u r a d o p a r a d e t e r m i n a r - s e o j u s t o ? *maxime
vero, m o s t r a n d o - s e a insubsistência do m e s m o p a r e c e r , cuja n a t u r e z a n u n c a p o d e
excluir o mais a c e r t a d o , p o r q u e peritis peútiores inveniri possunt.^

N o p a r e c e r da j u n t a se p o n d e r o u q u e L o u r e n ç o d e A m o r i m , n o t e m p o d o
seu *contrato das e n t r a d a s , p a g a n d o a 1.200 p o r *oitava, s e m p r e v i e r a a p a g a r a
1.500, p o r q u e c o b r a n d o S u a M a j e s t a d e o seu q u i n t o n a C a s a d a M o e d a , q u e
e n t ã o l a b o r a v a , doze *tostões c o m três fazem quinze. Nesta conta, errou-se o su-
posto nos três tostões q u e Sua Majestade p e r c e b i a do seu q u i n t o , aplicando-os a o
p a g a m e n t o d o ^ c o n t r a t a d o r , o q u e n ã o p o d i a ser p o r q u e p a g a r i a este a o dito
}

s e n h o r c o m o q u e j á era seu n a r a z ã o d e q u i n t o , e c o m o o dito c o n t r a t a d o r só


tinha n a s oitavas d o seu p a g a m e n t o 1.200, s e m suprir *aliunde os 3 0 0 *réis n ã o
p o d i a vir a p a g a r e m c a d a oitava 1.500, e pelo e r r o ocular desta c o n t a se p o d e
conjeturar o q u a n t o foi acelerada e indigesta a resolução, pois se à F a z e n d a Real se
pagasse / / segundo a q u e l a conta, b o a a d a r i a o d o u t o r *provedor, e a c e r t a d o e r a [ fl. 292v. ]
q u e c o m tal c o m p u t a ç ã o se p a g a s s e m os o r d e n a d o s aos ditos ministros p a r a conta-
r e m c o m m a i s cautela, e m caso de t a n t o prejuízo.
T o m o u - s é p o r f u n d a m e n t o n o p a r e c e r d a j u n t a q u e devia o r e m a t a n t e p a g a r
q u i n t a d o , p o r q u e os quintos c e d i a m e m beneficio das c e m a r r o b a s q u e os p o v o s
das M i n a s s e g u r a r a m a S u a M a j e s t a d e , p e l o q u e e r a p r e c i s o q u e o r e m a t a n t e
pagasse quintos do p r e ç o de sua r e m a t a ç ã o . Este f u n d a m e n t o , e m q u e se u s o u d o
t e r m o 'preciso', q u e d e n o t a necessidade s e m a haver, pois n ã o consta d a r e m a t a ç ã o
n e m d ê suas condições, n a d a conclui p a r a a obrigação q u e Vossa Excelência foi
servido declarar, p o r q u e t e n d o o r e m a t a n t e a obrigação de p a g a r o u r o e m p ó pela
segunda c o n d i ç ã o n e n h u m prejuízo sente a F a z e n d a R e a l e m se lhe p a g a r n a q u e -
le g ê n e r o , p o r q u e as oitavas e m o u r o , segundo r e c o n h e c e r a m os consultores, sem-

Pacion., de locat., cap. 23, n. 145-149; Amaya na L. única Coei de collat. donat., Iib. 10, n. 22.

^• Ao perito, podem ser considerados os mais sábios,.


576

p r e r e n d e m 1.500 e v a l e m o m e s m o q u e se fossem " q u i n t a d a s , p o r q u e e m si


c o n t ê m o q u i n t o u n i d o c o m o m a i s q u e resta t i r a d o ele, e e m c o n c o r r e r a real
g r a n d e z a p a r a a c o n t r i b u i ç ã o d e seus vassalos c o m o excesso q u e v a i d e 1.200
p a r a 1.500 d a s ^oitavas, d e q u e se c o m p õ e m as 117 " a r r o b a s e u m a "libra d e
o u r o , i g u a l m e n t e se o s t e n t a magnífica c o m o se r e c e b e r a o q u i n t o delas, e p o r
cabal c o m p u t a ç ã o o c e d e r e m os quintos de S u a M a j e s t a d e e m benefício dos p o -
vos n a d a conclui p a r a o r e m a t a n t e dever p a g a r q u i n t a d o , s e m p a r a o fazer ter
obrigação d e fato n e m de direito, e fica q u e o f u n d a m e n t o d a resolução d a *junta
é a p a r ê n c i a s e m substância, q u e r e n d o a u m e n t a r o p a g a m e n t o estipulado n o a u t o
d a r e m a t a ç ã o , c o m t a n t o prejuízo do r e m a t a n t e . N ã o i g n o r a n d o os ditos "minis-
tros q u e a v o n t a d e d e S u a M a j e s t a d e é q u e o seu c o n t r a t o se observe e q u e e m
caso d ú b i o se julgasse c o n t r a o fisco, os soberanos mais católicos o instituíram. 1

[ íl. 293 ] M a i s se diz n o dito p a r e c e r d a j u n t a q u e S u a M a j e s t a d e é o p r i m e i r o //

[que] q u e r e deve observar a lei q u e p r o m u l g o u e m 3 de d e z e m b r o de 1750* e


supondo-se a indecência do t e r m o ' d e v e ' n o ' q u e r ' se incluiu a digna vox mmestatis
regnantis,^ e s endo s e m p r e a pessoa do p r í n c i p e e x c e t u a d a e m t o d a a sua disposi-
ç ã o , n o princípio se diz q u e o príncipe é sobre a lei, n ã o b e m se c o m p a d e c e ser
5 E

o superior sujeito ao inferior, e q u a n d o o dito s e n h o r quisesse m a n d a r q u i n t a r o


seu o u r o s e m prejuízo d e terceiro o p o d e r i a fazer, pois d a n d o - s e t a n t o c o n t r a o
r e m a t a n t e o m e s m o s e n h o r h á p o r b e m se e n t e n d a q u e n ã o p o d e tal f a z e r . u

N ã o se a c h a n d o n a resolução d a j u n t a coisa q u e pudesse fundá-la, c o m o e m


sua deliberação se p r o p u s e r a m a q u e m n ã o r e s p o n d i a u n s casos semelhantes, q u e
sendp tais c o m o se e n t e n d e u s e m p r e são m a n c o s , m a s se a f a z e n d a a r r e n d a d a se
v

n ã o entregasse c o m uso livre a o " c o n d u t o r no t e m p o q u e as oitavas valiam 1.500,


m a s q u a n d o c o r r i a m a 1.200, q u a l q u e r consulto diria q u e o c o n d u t o r só devia
oitavas deste p r e ç o , e nos m e s m o s t e r m o s n o c a v a l o ; se n o t e m p o d e 1.200 se
entregasse a o c o m p r a d o r , n ã o tinha este mais obrigação q u e a d e p a g a r p o r esse
p r e ç o . P o r é m , s e n d o u m a e o u t r a e n t r e g a n o t e m p o d e 1.500, a m b o s p o r esse
p r e ç o d e v i a m p a g a r , e o r e m a t a n t e p r i n c i p i a v a o seu c o n t r a t o e m o u t u b r o , e j á e m
agosto d e 1751 corria o our o no c o m é r c i o geral a 1.200, e p o r se d a r esta r a z ã o
diferente, n a d a c o n c l u e m estes a r g u m e n t o s .

Simanchas, catholicar. instit.j tit. 11, n. 54; Larrea, allegat. fiscal., in prooemio, n. 89
Portugal, de donat. reg., lib. 2, cap. 8, n. 36; na Ord., lib. 3, tit. 66.
Idem tradit Seoppa ad Grat, observat. 137, n. 14.
L. 2., § siquis a Principe, §§ nequid in loc. pub]., Gob. in leg.; Bene a Zenone, cod. de quadrien.
praescript., q. 2, n. 56; Sarmient. Selutar., lib. 1, cap. 8, n. 18.
Donde disse Raiphonstud, ad Decretal., lib. 1, tit. 2, § 12, n. 277 que as semelhanças não ocorriam.

Voz da majestade reinante.


577

P o n d e r o u - s e t a m b é m q u e o r e m a t a n t e n ã o tinha r a z ã o p a r a q u e r e r / / afas- [ fl. 293v. ]


t a r - s e d a dita lei d e 3 d e d e z e m b r o , q u e n o capítulo 5 o r d e n a q u e t o d o o o u r o se
r e c e b a *quintado n a R e a l F a z e n d a . P o r é m , a dita lei, c o m o foi posterior ao con-
trato e sua r e m a t a ç ã o , n ã o o d e r r o g o u n e m o p o d i a d e r r o g a r , w
e o príncipe, pro-
m u l g a n d o lei s o b r e o valor d a m o e d a , n ã o d e r r o g a os "contratos antes dela cele-
b r a d o s , e nesses t e r m o s a g e n e r a l i d a d e da dita lei n ã o d e r r o g o u a especial p e r m i s -
são q u e teve o r e m a t a n t e n a sua c o n d i ç ã o p a r a p o d e r p a g a r e m o u r o e m p ó o
p r o d u t o de sua r e m a t a ç ã o , e q u a n d o este se considerara sub ratione valoris impositfi
c o m se p a g a r a 1.200 se satisfazia, p o r assim correr q u a n d o a o b r i g a ç ã o teve p r i n -
cípio e o c o n t r a t o . x

M a i s se disse n a c o n s u l t a d a *junta q u e a c e r t i d ã o , folha 10, verso, dizia


expressamente q u e o o u r o devia pagar-se q u i n t a d o , e nela o q u e se disse foi q u e ,
h a v e n d o - s e c o b r a d o q u i n t a d o o o u r o dos ^registros d e fato, t a m b é m de fato se
devia assim p a g a r n a R e a l F a z e n d a , o q u e n ã o foi m a n d a r n e m a p r o v a r tal arreca- >
d a ç ã o . E p o r q u a n t o fica e x p e n d i d o , é s e m d ú v i d a q u e a p r u d e n t e c o m p r e e n s ã o
d e V o s s a Excelência se h á d e capacitar q u e a resolução d a dita j u n t a teve o *lunar
de q u e n o t o u as mais delas.y E sendo o fim d e Vossa Excelência c o n v o c a r a q u e l a
j u n t a , o q u e r e r a c e r t a r n o real serviço sem prejuízo de terceiro n ã o p o d e sustentar-
se a d e c l a r a ç ã o q u e dela e m a n o u , v e n d o - s e c l a r a m e n t e q u e a s e g u n d a c o n d i ç ã o
c o n c e d e o p a g a r e m o u r o e m p ó e q u e a r e m a t a ç ã o e *alvará régio n ã o falam e m
quintos alguns.
O p r e j u í z o d o r e m a t a n t e cresce mais e m se p r o i b i r / / o g i r a r o u r o a t é os [ fl. 294 ]
registros, p e l a d e m o r a q u e se causa aos v i a n d a n t e s , r e c e b e n d o p e r t o deles algu-
m a s *oitavas, sendo-lhes necessário v o l t a r e m com, elas à *fundição, s e n d o q u e a
Lei Novíssima o c o n c e d e livre até as ditas p a r a g e n s , e p a r a isso m a n d a p ô r nelas
*fiéis c o m dinheiro p r o n t o p a r a t r o c a r e m o ouro das p a r t e s q u e ali c h e g a r e m c o m
ele, e nos registros se n ã o deve i m p e d i r o p a g a r e m e m o u r o os direitos, pois nesse
g ê n e r o se lhe o r d e n a , n a sua c o n d i ç ã o , q u e o c o b r e o r e m a t a n t e p a r a assim o
p a g a r a S u a Majestade. A t e n d i d o a o q u e Vossa Excelência h á de h a v e r p o r b e m ,
c o m n o v a i n d a g a ç ã o d a v e r d a d e , declarar sem efeito a dita d e c l a r a ç ã o , m a n d a n -
do-se c u m p r a a r e m a t a ç ã o e suas c o n d i ç õ e s , p o r q u e j á e m sua o b s e r v â n c i a se
c a r r e g a r a m a o r e m a t a n t e , p o r seu p r o c u r a d o r , 95 * a r r o b a s q u e t o c a m a esta
P r o v e d o r i a sem m e n ç ã o de quintos, p o r se n ã o d e v e r e m .

Card. et Luca, deregalib., discurs. 129, ad finem; Torre, lib. 3, ver tit. 12, q. 51, n. 40; Gobío, de q.
2, iu56, e segundo a resolução de Larrea, de. 18, n.18.
Amato DummetOj de. Rotae Romanae, 745, n. 3, tom. 2; Leortard, de usur., q. 17, n. 26, et 29.
Guerr., demuner. Iud. orfan., p. I, rubr. n. 43.

Sob o cálculo do valor imposto.


578

• 66 «

[Certidão da ordem régia de 13 de março de 1729 para que se não


pagasse com ouro quintado o preço dos contratos]

Cópia sem valor documental de pedido de certidão, despa-


cho e certidão de ordem régia que estabeleceu a prevalência da
arrematação do contrato dos caminhos feita em Lisboa por M a -
nuel de Lima Pinto sobre a feita em Minas Gerais por Pedro d a
Gosta Guimarães e estabeleceu seu pagamento com ouro sem
quintar. Foi anexada pelo contratador dos dízimos de Minas
Gerais no triénio 1750-1752, J o ã o de Sousa Lisboa, a processo
sobre a forma de pagamento do seu contrato após a Ieí de 3 de
dezembro de 1750, que fixou a oitava de ouro e m 1200 réis, e a
junta de 19 de setembro de 1751, que determinou o pagamento
dos contratos reais e m ouro quintado. Ações com o mesmo teor
foram interpostas por todos os contratadores de Minas Gerais.
F o r m a processo com os documentos 63-65 e complementa os
documentos 74-77.
Pela posição que ocupava, o ouvidor Gaetano d a Costa
Matoso pôde coligir o documento, que informaria sua participa-
ção nas juntas sobre o assunto.
A u t o r i a , l o c a l e data: Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
13.3.1729.
C o m e n t á r i o pideográfico: Escrita m o d e r n a cursiva do
século XVIII, bastarda do período barroco, com hastes inferiores
e superiores acrescidas de volutas e laçadas. C h a m a a atenção a
feitura do " c " em módulo grande e com laçada inicial que se pren-
de à letra anterior e do "g" minúsculo com movimento em semicír-
culo, à esquerda, ultrapassando o olho da haste, diferente do "q",
que termina com laçada horizontal, usual nesta escrita. Letra de
copista, idêntica à dos documentos 63 e 64, anteriormente descri-
tos. (YDL)
Cópia manuscrita:
A H U , Cons. Ultram., Brasil/MG, cx. 63, doe. 76.

[ í l . 295 ] iz o *capitão J o ã o d e S o u s a L i s b o a , "caixa e a d m i n i s t r a d o r - g e r a l dos


reais "contratos dos dízimos desta capitania, q u e p a r a b e m d e sua justiça
ou de seus r e q u e r i m e n t o s , lhe é necessário q u e o *escrivão desta P r o v e d o r i a
579

lhe passe p o r sua certidão o teor d a o r d e m d e S u a Majestade de 13 d e m a r ç o d e


1729 proferida a respeito do * c o n t r a t o das e n t r a d a s .
P e d e a V o s s a M e r c ê lhe faça m e r c ê m a n d a r
p a s s a r a dita certidão c o m o requer.
E receberá mercê.

Passe do q u e constar.
Metelo Corte-Real

C a e t a n o J o s é V i e g a s cavaleiro professo n a O r d e m de C r i s t o , *escrivão d a


}

F a z e n d a R e a l e *matrícula d a gente de g u e r r a nesta capitania das M i n a s Gerais


etc. Certifico q u e , p r o v e n d o o livro p r i m e i r o d o registro d e o r d e n s reais q u e ser-
viu nesta Provedoria, e nele, às folhas setenta até folhas setenta e q u a t r o , se a c h a
registrada a *provisão q u e o suplicante r e q u e r , d a qual, d e v e r b o a v e r b o , o seu
teor é o seguinte:
D o m J o ã o , p o r g r a ç a d e D e u s , rei de P o r t u g a l e do / / Algarve, d ' a q u é m e [ fl. 295v. ]
d ' a l é m m a r , e m África s e n h o r de G u i n é etc. F a ç o saber a vós, A n t ô n i o B e r q u ó
del-Rio, *provedor d a F a z e n d a R e a l d a capitania das M i n a s , q u e , vendo-se o q u e
se m e r e p r e s e n t o u p o r p a r t e d e T o m á s Francisco, Tsóciol, *caixa e a d m i n i s t r a d o r
dos dois c o n t r a t o s dos c a m i n h o s N o v o e V e l h o do R i o d e J a n e i r o e d a B a h i a ,
P e r n a m b u c o e sertão p a r a essas M i n a s , r e m a t a d o s nesta C o r t e a M a n u e l d e L i m a
P i n t o , sobre a d e t e r m i n a ç ã o q u e se t o m o u d e q u e t o d o o r e n d i m e n t o destes con-
tratos se recolhesse nos cofres da F a z e n d a R e a l p a r a se e n t r e g a r a o suplicante n o
caso q u e prevalecesse a a r r e m a t a ç ã o feita nesta C o r t e , e q u e nos "registros assistis-
s e m feitores d o s u p l i c a n t e e d e P e d r o d a C o s t a G u i m a r ã e s , a q u e m se h a v i a m
r e m a t a d o nessas M i n a s os ditos contratos, c o m livros p a r a assentarem os direitos
q u e se p a g a v a m e despachos q u e pelas Tpartesl se faziam, conferindo s e m p r e u n s
c o m outros e assinando as conferências p a r a assim se saber a v e r d a d e d o r e n d i -
m e n t o dos ditos contratos e se evitarem c o n t e n d a s e prejuízo d a m i n h a R e a l F a -
z e n d a , o q u e t u d o se o b r a r a p e l o contrário, p o r q u a n t o os feitores fquel p o r p a r t e
do r e m a t a n t e desta C o r t e se n o m e a r a m p a r a os registros e conferirem os r e n d i -
m e n t o s foram c o m violência expelidos d a assistência p a r a q u e e s t a v a m propostos
e obrigados u n s a se / / r e t i r a r e m e outros a n ã o f a z e r e m instâncias p a r a as confe- [ fl. 296 ]
rências referidas, e os r e n d i m e n t o s dos ditos c o n t r a t o s , q u e se d e v i a m m e t e r fe
g u a r d a r ! nos cofres da F a z e n d a R e a l até se d e c i d i r e m as dúvidas, f o r a m absoluta-
m e n t e entregues a o a r r e m a t a n t e dessas M i n a s , c o n t r a o q u e estava d e t e r m i n a d o
p o r sentença vossa e eu havia resoluto, p o r o r d e m m i n h a d e q u a t o r z e d e fevereiro
do a n o p a s s a d o , q u e vos foi sobre este particular.

R e p r e s e n t a n d o - m e t a m b é m o suplicante a v e x a ç ã o q u e p a d e c e m esses p o -
vos e m os o b r i g a r e m a p a g a r os direitos devidos aos ditos c o n t r a t o s p o r p r e ç o d e
d i n h e i r o , e n ã o p o r ouro e m q u a n t i d a d e sem q u e seja fcoml o excesso d o *quinto,
580

proibindo-se p o r esse m o d o o correr nessas M i n a s o o u r o e m p ó , c o n t r a o q u e está


estabelecido, e p o r q u e os r e n d i m e n t o s q u e o r e m a t a n t e dessas M i n a s c o b r o u e
d e v i a m estar no cofre d a F a z e n d a R e a l i m p o r t a m oitenta e u m a mil novecentas e
trinta e quatro "oitavas d e ouro, e esta quantia pertence aos "contratos do suplicante,
se lhe deve a b o n a r no preço dos três anos d a sua r e m a t a ç ã o , fazendo-se repor nos
cofres ao introduzido rematante a dita importância, Sêrri q u e o suplicante e seus sócios
[ fl. 296v. ] sejam obrigados a fazerem mais p a g a m e n t o a l g u m d o resto do p r e ç o / / d a s u a
r e m a t a ç ã o e n q u a n t o p o r esta f o r m a n ã o for restituído o d a n o e se n ã o v e n c e r o
t e m p o *pro rata, n a forma das suas condições, q u e todas se d e v e m observar, p e d i n -
d o - m e q u e assim o m a n d a s s e executar.
E sendo visto O dito r e q u e r i m e n t o e d o c u m e n t o s q u e Pa elel se a j u n t a r a m e
a o q u e s o b r e este p a r t i c u l a r m e e s c r e v e s t e s , m e p a r e c e u d i z e r - v o s q u e aos
* c o n t r a t a d o r e s destes contratos se deve i n t e i r a m e n t e g u a r d a r o " p a c i o n a d o Temi
as condições, e nesta conformidade injustamente são obrigados a c o b r a r os direi-
tos r e m a t a d o s e m o u r o * q u i n t a d o , q u a n d o os tais direitos se e s t a b e l e c e r a m e m
o u r o p o r quintar, e se estipulou expressamente n a sua r e m a t a ç ã o n ã o alterariam
coisa a l g u m a da antiga c o b r a n ç a e forma dela, e c o m mais r a z ã o s e n d o a referida
a l t e r a ç ã o u m novo tributo a q u e eu n ã o obrigo aos m e u s p o v o s e s e m q u e eu fique
Tdefraudado nos m e u s l quintos, pois do m e s m o o u r o se Ime h á l d e vir a p a g a r no
t e m p o e m q u e p a r a se p o d e r extrair h á d e ser levado à Gasa d e F u n d i ç ã o n a forma
d e m i n h a s leis, antes do qual n e m h á c o b r a n ç a de q u i n t o s , n e m p r o i b i ç ã o p a r a
q u e d e n t r o dessas M i n a s se use do o u r o c o m o g ê n e r o , q u e era o festilol e m q u e se
[ fl. 297 ] a c h a v a / / q u a n d o estes direitos se estabeleceram. S e n d o m u i t o p a r a r e p a r a r q u e
s e n d o a c o b r a n ç a dos direitos r e m a t a d o s m u i t o m a i s útil para os c o n t r a t a d o r e s
efetuando-se e m o u r o q u i n t a d o , lhes queirais d a r c o n t r a v o n t a d e sua esta m a i o r
conveniência, a q u e eles r e p u g n a m , n ã o p o r rdesperdíciol m a s p o r q u e , sem dúvi-
da, a c h a m neste m o d o d e c o b r a n ç a a c o n t r a d i ç ã o e dificuldade d e q u e lhes negais.
E assim se vos d e c l a r a q u e visto, d e facto, se e s t a r e m c o b r a n d o os direitos e m
?

o u r o q u i n t a d o até o p r e s e n t e , assim r e s p e c t i v a m e n t e a o dito t e m p o d e v e m os


c o n t r a t a d o r e s fazer seu p a g a m e n t o , ou e m o u r o q u i n t a d o ou e m dinheiro, à r a z ã o
de mil e q u i n h e n t o s "réis c a d a "oitava, p o r q u e isso é o que e x p r e s s a m e n t e diz a
p r i m e i r a c o n d i ç ã o d o seu contrato.
E p e l o q u e respeita à a b o n a ç ã o q u e os ditos c o n t r a t a d o r e s r e q u e r e m d e todo
o r e c e b i m e n t o q u e os excluídos fizeram e m o p r e ç o do seu c o n t r a t o , sou servido
o r d e n a r - v o s q u e , e m inteira e efetiva execução das o r d e n s q u e se vos m a n d a r a m ,
embolseis aos suplicantes d e t o d o o p r o d u t o do seu c o n t r a t o , aliás o fareis pelos
vossos bens, ficando, além disso, o b r i g a d o a r e s p o n d e r pela culpa d e n ã o c u m p r i r d e s
as m i n h a s ordens n e m executardes aquela m e s m a f o r m a estabelecida p a r a a p r o n -
[ íl. 2 9 7 v . ] ta / / satisfação daqueles ' r e n d e i r o s a q u e m o c o n t r a t o pertencesse e se julgasse.
El-rei, nosso s e n h o r , o m a n d o u p o r A n t ô n i o R o d r i g u e s d a C o s t a d o seu
r

C o n s e l h o , e o d o u t o r J o s é C a r v a l h o A b r e u , conselheiro do seu C o n s e l h o U l t r a -
581

m a r i n o , e se p a s s o u p o r d u a s vias. D i o n í s i o C a r d o s o P e r e i r a a fez e m L i s b o a
ocidental, a [treze 1 d e m a r ç o de mil setecentos e vinte n o v e . O secretário A n d r é
Lopes de L a v r e a fez escrever. A n t ô n i o R o d r i g u e s d a Costa. J o s é C a r v a l h o A b r e u .
P o r d e s p a c h o do C o n s e l h o U l t r a m a r i n o d e dez d e m a r ç o d e mil setecentos e vinte
e nove. E t r a s l a d a d a a *concertei c o m a p r ó p r i a , a q u e m e r e p o r t o . Vila R i c a , 6 d e
j u l h o d e 1729 anos. A n t ô n i o das Neves C a r d o s o , *escrivão d a F a z e n d a R e a l des-
tas M i n a s a subscrevi. A n t ô n i o das Neves C a r d o s o . E se n ã o c o n t é m mais n o dito
registro a q u e m e reporto e dele passei a presente, p o r m i m subscrita e assinada
e m observância d o d e s p a c h o retro do d o u t o r Luís C a r d o s o M e t e l o C o r t e - R e a l d a
C u n h a . D a d a e p a s s a d a nesta Vila R i c a de Nossa S e n h o r a d o Pilar d o O u r o P r e t o
aos oito dias do m ê s / / d e o u t u b r o d e mil setecentos e c i n q ü e n t a e u m a n o s . [ fl. 298 ]

• 67 «
[Consulta do Conselho Ultramarino sobre o decreto de
3 de dezembro de 1750 que lhe havia mandado formar a minuta
do regimento das casas de fundição e a resolução que
Sua Majestade tomou em 4 de março de 1751]

Consulta em que o Conselho Ultramarino historia e anali-


sa a m i n u t a do regimento das casas de fundição feita pelos
desembargadores Francisco Pereira da Costa, M a n u e l Gomes
de Carvalho e Gonçalo José da Silveira Preto. Depreende-se das
entrelinhas e do parecer final u m a tentativa de impugnar a lei de
3 de dezembro de 1750 que reinstalou casas de fundição em
Minas Gerais, pelo que foi o Conselho severamente repreendido
na resolução régia de 4 de m a r ç o de 1751, que, simultaneamen-
te, aprovou o mesmo regimento. F o r m a u m processo com os
documentos 68 ç 69.
Documento de interesse no início da década de 1750, pelas
discussões travadas em torno da capitação, alternativas existen-
tes, decisão de reinstalação de casas de fundição em Minas G e -
rais, informaria a participação de C a e t a n o da Costa Matoso
nas juntas para discussão do tema.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
22.2.1751.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento aplica as tópicas
da injustiça, do prejuízo, da decadência do " e m p e n h o " e do em-
582

pobrecimento dos mineiros p a r a impugnar a instalação das ca-


sas d e fundição em M i n a s . A afetação de h u m i l d a d e ou de
autodesqualificação é artificio retórico que objetiva obter a con-
descendência do leitor. Aplicação de tópicas características do
gênero encomiástico. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva do
período barroco, com encadeamento aparente, e m virtude do
arredondamento e rapidez do movimento da escrita. Apresenta
o " s " caudado de haste dupla, mas com variação de. feitura; o
" h " minúsculo semelhante ao " E redondo, c o m laçada interme-
!>

diária e acoplado à letra que se segue; o " b " de duplo olho com
laçada; o " p " de haste dupla. Abreviaturas nas formas de trata-
mento, com utilização do ponto. (YDL)
Critérios e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir de
cópia da BNL, cód. 6979, n XIII, e restringiram-se aos termos
e

que comprometiam o significado e o e n t e n d i m e n t o do texto,


mantidas as pequenas variantes introduzidas pelo copista.
Cópia manuscrita:
BNL, cód. 6979, n XIII. a

[ fl. 299 ] * Ç o n s u l t a e m q u e satisfaz o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o a o q u e S u a M a j e s t a d e


o r d e n a s o b r e o ^ r e g i m e n t o d a s *casas d e f u n d i ç ã o d a s M i n a s e v a i o p l a n o
d o m e s m o r e g i m e n t o c o m os m a i s p a p é i s q u e se a c h a r a m

P
ela b r e v i d a d e c o m q u e p a r t i u a *frota e p o r n ã o h a v e r t o d a a i n s t r u ç ã o
necessária p a r a se formar os regimentos d e q u e se d e v e u s a r nas casas d e
fundição das M i n a s , foi Vossa Majestade servido, p o r seu real *decreto de
três d e d e z e m b r o d e 1750, q u e nas ditas casas se observassem i n t e i r a m e n t e todas
as ordens e resoluções q u e se p r a t i c a r a m nas q u e havia nas M i n a s antes do sistema
d a *capitaçao, e m t u d o o q u e n ã o fosse contrário à lei q u e h o u v e p o r b e m m a n d a r
publicar n o m e s m o dia, b a i x a n d o j u n t a m e n t e o p a p e l q u e os "intendentes d e v i a m
observar e n q u a n t o lhes n ã o dava regimento, o r d e n a n d o t a m b é m a este C o n s e l h o
q u e , o u v i n d o o Tprovedor d a C a s a l d a M o e d a e ás mais pessoas q u e lhe parecesse
e p r e f e r i n d o as o r d e n s q u e h a v i a nas casas a n t i g a s , l h e p r o p u s e s s e c o m m a i o r
b r e v i d a d e t u d o o q u e julgasse conveniente p a r a se f o r m a r e m os ditos regimentos
e, p a r a a vista d e t o d a s estas informações,, resolver V o s s a M a j e s t a d e o q u ê for
justo.
P a r a satisfazer a este real decreto de Vossa M a j e s t a d e , o r d e n o u logo o C o n -
selho a o p r o v e d o r d a C a s a da M o e d a e a o * d e s e m b a r g a d o r Francisco Pereira d a
C o s t a i n f o r m a s s e m d e c l a r a n d o t u d o o q u e lhes p a r e c e s s e c o n v e n i e n t e e q u e se
deve acautelar n o regimento q u e Vossa Majestade m a n d a fazer.
583

A esta o r d e m satisfez o dito d e s e m b a r g a d o r c o m a informação q u e sobe c o m


estas às reais m ã o s de Vossa Majestade.
E r e s p o n d e n d o o p r o v e d o r d a C a s a d a M o e d a a dita o r d e m p o n d o a l g u m a s
dificuldades p a r a a s u a e x e c u ç ã o , p o r q u e o C o n s e l h o e n t e n d e u q u e elas n ã o
d e v i a m e m b a r a ç á - l a s , lhe m a n d o u s e g u n d a , p e d i n d o - l h e logo a i n f o r m a ç ã o , d e
sorte q u e pudesse consultar a Vossa M a j e s t a d e este negócio a t e m p o d e ir [resolu-
t o ! n a n a u d e g u e r r a , a q u e r e s p o n d e u escusando-se d e r e m e t e r ao C o n s e l h o o
seu p a r e c e r , dizendo q u e o p a p e l q u e pelo C o n s e l h o se lhe r e m e t e u a respeito d o
"regimento das "casas / / de fundição se a c h a v a e m p o d e r do secretário d e E s t a d o , [ fl. 299v. ]
Diogo de M e n d o n ç a , Te e n t e n d i a ! q u e o dito secretário remeteria a o C o n s e l h o o
dito p a p e l p o r h a v e r t o m a d o a si o t r a b a l h o d e fazer o dito r e g i m e n t o .
Deste e m b a r a ç o q u e o C o n s e l h o e n c o n t r a v a p a r a satisfazer a o r d e m de V o s -
sa M a j e s t a d e , c o m o Vossa Majestade foi servido insinuar n o seu real "decreto, fez
aviso o m a r q u ê s d e Penalva, presidente deste C o n s e l h o , ao secretário d e E s t a d o ,
D i o g o d e M e n d o n ç a , p o r h a v e r feito p C o n s e l h o t u d o q u a n t o e s t a v a p e l a s u a
p a r t e p a r a c u m p r i r a dita o r d e m . E sendo presente a V o s s a Majestade o aviso do
dito p r e s i d e n t e , foi Vossa Majestade servido, p o r seu real decreto d e 9 d o c o r r e n t e
m ê s e ano, q u e os dois p r o c u r a d o r e s d a C o r o a e F a z e n d a desta r e p a r t i ç ã o formas-
s e m logo foi r e g i m e n t o das casas d e fundição das M i n a s , e c o m a m a i o r b r e v i d a d e
o remetessem a o C o n s e l h o p a r a o c o n s u l t a r e m a V o s s a Majestade, s e m q u e haja
d e m o r a , p o r ser assim c o n v e n i e n t e a o seu real serviço e b e m dos vassalos das
M i n a s , e p a r a q u e se possa r e m e t e r pelo p r i m e i r o c o m b o i o , d i g o , p e l o s e g u n d o
c o m b o i o d a "frota do R i o de J a n e i r o .
E m observância deste último decreto de Vossa Majestade, se d e u logo vista
dele a o p r o c u r a d o r d a F a z e n d a , j u n t o s t o d o s os d e c r e t o s , avisos e m a i s p a p é i s
q u e h á n e s t a m a t é r i a , a o q u e r e s p o n d e u e m o d i a 19 d o p r e s e n t e m ê s d i z e n d o
satisfaz à r e a l r e s o l u ç ã o d e V o s s a M a j e s t a d e c o m o p l a n o d o r e g i m e n t o q u e
r e m e t i a i n c l u s o , a s s i n a d o p o r ele e p e l o p r o c u r a d o r d a C o r o a , c o m q u e m o
c o n f e r i u , p a r a , c o m m a i s b r e v i d a d e , se d a r a e x e c u ç ã o o q u e V o s s a M a j e s t a d e
rdeterminaval. Q u e o Conselho o examinaria com circunspecção e acerto que
c o s t u m a e, a c r e s c e n t a n d o - o ou e m e n d a n d o - o n o q u e lhe p a r e c e s s e m a i s j u s t o
e c o n v e n i e n t e a o serviço d e V o s s a M a j e s t a d e } p o r i a o r e g i m e n t o n a s u a real
p r e s e n ç a , c o m a i n f o r m a ç ã o íel a c ó p i a d a s o r d e n s j u n t a s , q u e t u d o s o b e c o m
esta à s u a r e a l p r e s e n ç a .
E s e n d o t u d o visto, a o C o n s e l h o p a r e c e q u e este r e g i m e n t o p r o p o s t o pelos
p r o c u r a d o r e s régios está b a s t a n t e m e n t e conforme a lei de 3 d e d e z e m b r o p r ó x i m o
p a s s a d o e s o m e n t e / / lhe o c o r r e m os p o u c o s r e p a r o s seguintes. [ fl. 300 ]
N a s m i n a s d o g o v e r n o da B a h i a p a r e c e necessário h a v e r casa d e fundição,
p o r q u e a obrigação de t r a z e r e m o ouro à fundição n a q u e l a c i d a d e é m u i p e s a d a
p a r a os q u e q u i s e r e m das ditas m i n a s p a s s a r a P e r n a m b u c o o u a o u t r a s p a r t e s
diversas e d a r i a estímulo p a r a se multiplicarem os "descaminhos.
584

A o r d e m q u e n o capítulo segundo, parágrafo 12 d o *regimento se diz d a r ã o os


i n t e n d e n t e s aos *provedores dos *registros p a r a lhes m a n d a r e m todos os meses
(listai dos *comboieiros e comerciantes que p o r eles e n t r a r e m c o m declaração dos
negros, cavalos e cargas que introduzirem n e n h u m outro fim p o d e ter mais que. o d e
confrontarem os intendentes se o ouro que depois levam à *fundição aqueles trafi-
cantes corresponde a o valor do que tiverem introduzido, m a s esta diligência é p o r
muitas razões infrutífera e inútil a averiguação. Primeiramente p o r q u e nos registros
n ã o se reconhece n e m se avalia o que contêm as cargas, mas somente se fél carga d e
*seco ou d e * m o l h a d o , p a r a conforme a isto p a g a r , e. p o d e u m a c a r g a , sendo d e
fazenda preciosa, valer duzentas vezes mais do que outra que c o n t e n h a coisa gros-
seira, A m e s m a incerteza se considera nos escravos e cavalos, p o r q u e de uns a outros
p o d e ir diferença d e seis Tal oito tantos de valor. E m segundo lugar, c o m o t u d o nas
M i n a s se vende fiado a dois e três anos e ainda depois de Texpiradol o t e r m o se vai
c o b r a n d o as parcelas, n u n c a se p o d e cotejar a e n t r a d a das coisas c o m a saída fdõ
p r e ç o l delas. E m terceiro lugar, c o m o os traficantes, depois de e n t r a r e m no distrito
das M i n a s , g i r a m p a r a a venda dos seus "efeitos e m diversas c o m a r c a s Tel e m qual-
q u e r delas p o d e m cobrar e *quintar, fica sendo impossível a c a d a u m dos intendentes
e m particular a confrontação que se pretende.

N o m e s m o capítulo segundo, p a r á g r a f o doze, p a r e c e inútil o q u e dispõe, n ã o


h a v e n d o de d u r a r os *fiscais n o *oficio senão três meses, c o m o o r d e n a a lei, e q u e
[ fl. 30GV. ] seria m a i s a c e r t a d o / / d e t e r m i n a r q u e , r e c o n h e c e n d o o i n t e n d e n t e negligência
n o fiscal, d ê p a r t e a o *governador p a r a que logo faça eleger o u t r o e o Texcluídol
fique p r i v a d o do e m o l u m e n t o q u e lhe c o n c e d e a lei.
N o s capítulos c i n c o , seis e sete n ã o p a r e c e c o n v e n i e n t e e n c a r r e g a r só aos
i n t e n d e n t e s a escolha dos *oficiais, p o r ser esta disposição e m m e n o s d e c o r o d a
a u t o r i d a d e dos * g o v e r n a d o r e s , a q u e m até agora esteve c o m e t i d a até a n o m e a ç ã o
dos i n t e n d e n t e s subalternos e a todos os oficiais das i n t e n d ê n c i a s , e a g o r a , v e n -
do-se os m e s m o s g o v e r n a d o r e s excluídos desta inspeção, p o d e r ã o esfriar n o zelo
d a a r r e c a d a ç ã o . N e m é conveniente que os intendentes sejam os q u e a p r o v e m Te
elejam osl subalternos, q u e t a m b é m , p e l a sua p a r t e , d e v e m advertir e r e p u g n a r o
q u e os i n t e n d e n t e s m a n d a r e m c o m m e n o s acerto, p e l o o q u e , p a r e c e a o Conselho
q u e , sendo propostos estes oficiais pelas *câmaras, sejam escolhidos e a p r o v a d o s
pelos g o v e r n a d o r e s , q u e p o d e r ã o , q u a n d o lhes n ã o p a r e ç a m i d ô n e o s , m a n d a r
p r o p o r outros.
O parágrafo cinco do capítulo três da lei diz que no regimento se determinarão
os ordenados que hão de ter os r*fiscaisl dos registros, e a este p o n t o se n ã o satisfez no
presente plano, c o m o t a m b é m esqueceram os ordenados que h ã o de ter o *tesoureiro
e mais oficiais, aos quais, c o m o n ã o h ã o dç p o d e r receber coisa alguma das partes,
necessariamente se deve assinar emolumento pelo seu trabalho.
Q u a n d o Vossa Majestade, sem e m b a r g o do mais q u e abaixo se dirá, t e n h a
p o r conveniente que este regimento entre logo a pratiçar-se, n ã o p a r e c e a o C o n -
585

selho q u e se i m p r i m a , m a s só q u e se observe r i n t e r i n a m e n t e l , até q u e a experiên-


cia t e n h a m o s t r a d o se c o n v é m acrescentar-se ou e m e n d a r - s e e m a l g u m a p a r t e .
Isto é o q u e o C o n s e l h o e n t e n d e dever dizer a respeito d o q u e c o n t é m este
"regimento, p o r é m c o m o ele se n ã o dirige mais q u e a execução d a lei, e nesta se
[ r e p r e s e n t a m ! notáveis inconvenientes, n ã o seria a c e r t a d o d i s c o r r e r / / s o m e n t e [ fl. 301 ]
sobre os Imeios! d a execução Fe omitir! considerações p o r o n d e a m e s m a execu-
ção., c o n t r a as piíssimas intenções d e Vossa M a j e s t a d e , p o d e r á p a r e c e r c o n t é m
d u r e z a e dificuldade. S u p o n d o o C o n s e l h o q u e a o f o r m a r a dita lei n ã o s e r i a m
p r e s e n t e s a Vossa M a j e s t a d e várias circunstâncias cujo c o n h e c i m e n t o p e n d e d a
p r á t i c a do "país, as quais se tivessem c h e g a d o a sua real notícia [dissuadiriam 1
m u i t a s das disposições d a m e s m a lei, e n t e n d e ser d a s u a indispensável o b r i g a ç ã o
pô-las n a real p r e s e n ç a d e Vossa Majestade, p a r a q u e e m n e n h u m t e m p o se lhe
possa rdarl e m c u l p a o silêncio e m m a t é r i a s tão graves d a sua r e p a r t i ç ã o , n e m se
lhe a r g u a q u e passou i n a d v e r t i d a m e n t e pelas prejudiciais conseqüências q u e de-
via prevenir. H á mais t e m p o teria o C o n s e l h o satisfeito a esta o b r i g a ç ã o se n ã o
tivesse e n t e n d i d o q u e seria m a i s a p r o p ó s i t o fazer as suas reverentes r e p r e s e n t a -
ções q u a n d o subisse à real p r e s e n ç a d e V o s s a M a j e s t a d e este r e g i m e n t o , q u e se
lhe t i n h a o r d e n a d o e q u e se d e m o r o u pelas razões q u e ficam referidas.

D a s sobreditas conseqüências, u m a s respeitam a o prejuízo dos mineiros, ou-


tras o d a R e a l F a z e n d a e outras o Tdo! comércio e fdo sossegol público. Q u a n t o
a o prejuízo dos mineiros, c e r t a m e n t e n ã o seria p r e s e n t e a V o s s a M a j e s t a d e q u e
estes utilíssimos vassalos t a n t o q u e o " q u i n t o se c o b r a e m espécie n u n c a ficam
devedores, d e coisa a l g u m a a o R e a l E r á r i o p o r c o n t a d o direito d o o u r o , p o r q u e
[ t u d o ! o q u e e x t r a e m d a terra lhes n ã o corre mais Tnol comércio senão c o m a b a -
t i m e n t o d a q u i n t a p a r t e do seu intrínseco valor, p o r q u e eles, d a sua p a r t e , p a g a m
i n t e i r a m e n t e o q u i n t o d e todo o ouro q u e tiram, e só pela necessidade inevitável
d o comércio t r a s p a s s a m a outros o e n c a r g o d e levarem à "fundição o q u i n t o d o
seu o u r o . E c o m o n ã o são os mineiros os q u e depois e x t r a e m ò o u r o d o território
das M i n a s p a r a fora, senão os m e r c a d o r e s , "comboieiros e o u t r o s , sê segue q u e
n u n c a / / está pelos mineiros o ir m u i t o ou p o u c o o u r o às "casas d e fundição, n e m [ fl. 301v. ]
eles p o d e m ser de m a n e i r a a l g u m a responsáveis p e l a falta q u e se e x p e r i m e n t a r
nelas. E sendo assim q u e p o r causa desta falta d e t e r m i n a a lei u m a " d e r r a m a , e
suposto n ã o explique p o r Tquem! se h á d e r e p a r t i r , parece que h á de c o m p r e e n d e r
Tos mineiros, pois os n ã o excetua, e talvez c o m p r e e n d e r á l a eles s o m e n t e . S u c e d e -
rá q u e estes vassalos, depois de t e r e m p a g o Itudol q u a n t o deviam, virão a p a g a r
n o v a m e n t e p e l a c u l p a alheia, o q u e n ã o p o d e r á deixar d e parecer-lhes duríssimo,
assim c o m o se considera m u i t o alheio d a retíssima intenção d e V o s s a M a j e s t a d e ,
q u e c o m r a z ã o se p o d e duvidar se sendo i n f o r m a d o d a v e r d a d e desta circunstân-
cia t o m a r i a p o r p r i n c i p a l f u n d a m e n t o d a s u a lei o f u n d a m e n t o d e u m a , digo, o
m e i o d e u m a d e r r a m a q u e , c h e g a n d o o caso de executar-se, n ã o p o d e r á d e i x a r d e
ser o n e r o s a ,
586

Refere-se n a lei q u e este meio q u e foi p r o p o s t o pelos *procuradores d o p o v o


das M i n a s e c o m o tal se aceita p o r Vossa Majestade, m a s talvez se n ã o fez presente
a V o s s a M a j e s t a d e q u e o s e n h o r rei d o m J o ã o , o q u i n t o , q u e s a n t a glória haja,
rejeitou i m e d i a t a m e n t e aquela proposta, de sorte q u e fxcou c a d u c a c o m o se n u n c a
se houvesse feito, e sendo hoje diversos os m o r a d o r e s , p o d e r á parecer-lhes m e n o s
justo q u e Vossa Majestade os obrigue a estar pelo que p r o p u s e r a m os seus antecessores
e lhes foi rejeitado, m a i o r m e n t e sem se explicar primeiro aos mineiros presentes a
desigualdade a q u e os ditos p r o c u r a d o r e s , ou i n a d v e r t i d a m e n t e ou p o r n ã o serem
mineiros, sujeitaram naquele t e m p o os seus constituintes, e sem se s a b e r dos mes-
m o s mineiros presentes, no caso q u e aceitem a *derrama, se e n t e n d e m q u e ela seja
somente sobre eles ou sobre os mais m o r a d o r e s , q u e é o q u e n o t e r m o d e 1734 se
n ã o declarou e o q u e n ã o p o d e passar sem declaração, pois sem ela é inescusável a
injustiça d a d e r r a m a .

[ fl. 302 ] Esta a i n d a se fará mais sensível aos m i n e i r o s / / das G e r a i s q u a n d o v i r e m


q u e aos das o u t r a s m i n a s n ã o i m p õ e a lei q u e toca, d i g o , a lei c o t a c e r t a n e m
d e r r a m a , d o n d e n e c e s s a r i a m e n t e h á d e resultar g r a n d e desconsolação nos d a G e -
rais, q u e j u s t a m e n t e e n t e n d e r ã o n ã o serem m e n o s m e r e c e d o r e s q u e os outros d o
favor d e V o s s a M a j e s t a d e , n e m d e v e r p a r a este efeito servir-lhes d e p r e j u í z o a
oferta antiga dos seus antecessores, pois a i n d a q u a n d o tivesse c a d u c a d o n ã o p o d i a
obrigar aos v i n d o u r o s . E d a q u i p o d e r á suceder neles g r a n d e r e p u g n â n c i a se p a g a -
r e m a d e r r a m a q u a n d o se lhes impuser, e c o m o sendo constrangidos a p a g á - l a é
provável q u e p o r esta causa se m o v a m muitos dos mineiros das G e r a i s a p a s s a r e m
o seu domicílio p a r a as outras m i n a s . R e s u l t a r á t a m b é m q u e q u a n t o mais se for
d i m i n u i n d o o n ú m e r o deles nas G e r a i s , p r o p o r c i o n a l m e n t e e n t r a r á m e n o s o u r o
n a s *casas d e fundição delas, e a o m e s m o passo se a u m e n t a r á o e n c a r g o aos q u e
ficarem, pois o q u e faltar p a r a c o m p l e m e n t o das c e m "arrobas se h á d e r e p a r t i r só
pelos assistentes.

Pelo q u e toca à R e a l F a z e n d a , talvez n ã o foi p r e s e n t e a V o s s a M a j e s t a d e


q u ã o considerável virá a ser o d e t r i m e n t o dela, p o r q u e d e i x a n d o d e p a r t e a dife-
r e n ç a q u e havia d o atual r e n d i m e n t o das Gerais a cota das c e m a r r o b a s , p e r s u a d e -
se o C o n s e l h o q u e nas outras m i n a s p e r d e r á Vossa M a j e s t a d e a m a i o r p a r t e do
r e n d i m e n t o . A l é m disso, sentirá g r a n d e Tdesfalquel nos da *casa d a m o e d a e n o 1
p o r 100 e, p o r c o n s e g u i n t e , nos " c o n t r a t o s , p o r q u e estes p e r d e m d a c a r g a das
*frotas e esta d a remessa do o u r o .
T o d a s estas c o n s e q ü ê n c i a s p a r e c e m a o C o n s e l h o infalíveis p e l a facilidade
q u e h a v e r á p a r a se f r a u d a r o * q u i n t o . As o u t r a s vezes q u e este se c o b r o u e m
espécie e r a m gravíssimas as p e n a s , rigorosíssimos os exames *entrebidos d e todos
[ fl. 302v. ] os c a m i n h o s e atalhos, exceto três ou q u a t r o indispensáveis. / / Estreitou-se p o r
esta c a u s a o c o m é r c i o das ilhas e d a C o s t a d a M i n a , p r e n d e u - s e e confiscou-se
m u i t a g e n t e , m a n d a r a m - s e estar e m toda p a r t e "devassas a b e r t a s c o m d e n ú n c i a s
e m segredo, e apesar d e toda esta exação e cautela era c o n t í n u a a fraude. A t é se
587

p r o v o u o expediente d e reduzir o quinto a 12 p o r 100, ê depois d e dois anos d e


e x p e r i e n c i a só se c o n s e g u i u o d e s e n g a n o d e q u e o " d e s c a m i n h o e r a s e m p r e o
m e s m o , que não podia haver expedientes bastantes a impedi-lo e m u m género
tão fácil de t r a n s p o r t a r e esconder.
C o n f r o n t a , p o i s , o estado das coisas n a q u e l e t e m p o , à vista d o q u e se vai
construir a g o r a , c o m u m a simples p e n a do d o b r o , í c o m ol sertão d o Brasil t o d o
atravessado d e c a m i n h o s , c o m Tasl portas francas p a r a o desvio do o u r o pelas ilhas
e pela C o s t a d a M i n a , c o m o trânsito fácil p a r a m u i t o s estados q u e n a A m é r i c a
vizinha c o m os desta C o r o a , p a r e c e q u e assaz f u n d a m e n t o t e m o C o n s e l h o p a r a
r e c e a r q u e a m a i o r p a r t e do o u r o sairá sem ser " q u i n t a d o e deixará d e vir o 1 p o r
100 e às "casas d a m o e d a , e p o r c o n s e g u i n t e q u e será m u i t o m a i o r d o q u e se
i m a g i n a a p e r d a d e Vossa Majestade.
A l é m disso, se faz ela certa nestes primeiros anos p o r n ã o a c a u t e l a d o n a lei
u m p o n t o essencialíssimo, o qual p a r e c e Tdevial ser d e q u e se n ã o levantasse a
"capitação até q u e estivessem p r o n t a s e m todas as M i n a s todas as casas d e fundi-
ção, d i s p o n d o q u e e m todas estas Icasas n o m e s m o dial se começasse a fundir sem
"quinto o o u r o q u e j á se achasse extraído, q u e esta diligencia fou a d e u m "regis-
t r o ! se executasse [ t a m b é m c o n t e m p o r a n e a m e n t e ! nos portos d e m a r , c o m " b a n -
d o geral nos Estados do Brasil ou M a r a n h ã o , p a r a q u e d e n t r o e m u m t e r m o c e r t o
d e três ou q u a t r o fineses 1 / / acudisse à "fundição ou a o "registro o o u r o q u e se [ fl. 303 ]
achasse extraído, e q u e só depois d e Fexpirarl a q u e l e t e r m o cessasse a c a p i t a ç ã o , e
dali e m diante p o r t o d o o ouro q u e se achasse e m p ó fora dos distritos das M i n a s
se executassem as p e n a s d o "comisso. C o m o a lei n ã o levou esta providência, fsel
e m v i r t u d e d o q u e ela d e t e r m i n a se tiver l e v a n t a d o a c a p i t a ç ã o i m e d i a t a m e n t e
q u e se p u b l i c a r a lei, necessariamente h á de resultar q u e pela "frota do a n o q u e
v e m p o u c o o u n a d a h á d e receber a F a z e n d a de Vossa M a j e s t a d e p o r c o n t a dos
quintos, p o r q u e até se p o r e m p r o n t a s as casas d e fundição se h á d e passar m u i t o
t e m p o , m a i o r m e n t e nas m i n a s r e m o t a s . E se a i n d a a g o r a se n ã o d e r o r d e m e
t e m p o certo Fpara a diligência q u e fica delal, p o r dois ou três anos m a i s se estará
" d e s e n c a m i n h a n d o o o u r o i m p u n e m e n t e e c o r r e r á aos portos d o m a r c o m o p r e -
texto de ser extraído d e tais ou tais m i n a s e m t e m p o q u e a i n d a n ã o estava p o s t a
nelas a casa de fundição.

O u t r a p o r t a , p a r e c e , ficou aberta p a r a se fazer u m a c o n t í n u a fraude, p o r se


p e r m i t i r o c u r s o d o o u r o e m p ó fora dos territórios m i n e r a i s . Assim o i n d i c a o
capítulo cinco d a lei, dizendo q u e o o u r o e m p ó e folheta c o r r e r á fora das M i n a s
p e l o valor do "toque, d e r r o g a n d o a este fim a lei d e 1719, e m q u e t o t a l m e n t e se
p r o i b i a c o r r e r o u r o e m p ó fora das M i n a s . O m e s m o se d e d u z do p a r á g r a f o q u a r -
to, capítulo q u a r t o , desta Lei Novíssima, o n d e s u p õ e m q u e os q u e e n t r a m p a r a as
M i n a s p o d e r ã o levar d e fora delas o u r o e m p ó e expressamente [significai a m e s -
m a l i b e r d a d e o parágrafo três daquele capítulo q u a r t o , p e r m i t i n d o q u e dos terri-
tórios das M i n a s / / p a r a fora, a o n d e n ã o fpuderl c h e g a r " m o e d a provincial, q u e [ fl. 303v. ]
588

h á d e c o r r e r d e n t r o dos m e s m o s territórios, p o s s a m os viandantes, c o m benepláci-


to dos i n t e n d e n t e s , levar o u r o e m p ó p a r a os gastos d a j o r n a d a , e e m n e n h u m a
p a r t e acautela a lei a o n d e se h a v e r á d e ir *quintar Testei o u r o e m p ó q u e a n d a r
p o r fora dos distritos das M i n a s , n e m a o n d e se h á d e ir fazer o ^manifesto dele,
n e m q u a n t o t e m p o será lícito correr e m p ó . D a q u i resulta q u e se q u a l q u e r roceiro
d o c a m i n h o das M i n a s vier aos p o r t o s d o m a r c o m u m a ou duas *arrobas d e o u r o
e m p ó , n o caso q u e seja descoberto e i n q u i e t a d o , t e m p r o n t a Tal escusa, dizendo
q u e o j u n t o u d o q u e l h e p a g a r a m os v i a n d a n t e s pelos m a n t i m e n t o s e outras coisas
q u e lhes v e n d e u , e n ã o será possível provar-se-lhe o c o n t r á r i o . E q u a l q u e r o u t r a
p e s s o a a q u e m n o s p o r t o s do m a r se a c h e u m a grossa q u a n t i a d e o u r o e m p ó
r e s p o n d e r á q u e o j u n t o u d e diversas parcelas q u e e m virtude das disposições d a
lei supôs q u e p o d i a m c o r r e r livremente fora das M i n a s . Assim, fica p a t e n t e q u e
p o r m u i t o q u e seja o o u r o e m p ó q u e se ache n u n c a t e r ã o os intendentes e mais
*juízes f u n d a m e n t o b a s t a n t e p a r a o d e c l a r a r e m de *comísso. E , a i n d a , p a r a os
sujeitarem a o p a g a m e n t o do q u i n t o , será necessário i n t e r p r e t a r a lei p e l a inten-
ç ã o , p o r q u e nela n ã o v e m expresso.

Q u a n t o aos prejuízos do c o m é r c i o , suposta a facilidade d e fraudar o q u i n t o ,


são eles assaz evidentes, p o r q u e t o d o o o u r o [que] se e x t r a v i a r pelos c a m i n h o s
a c i m a m o s t r a d o s d e i x a r á de vir a o R e i n o e fará g r a n d e falta n o c o m é r c i o dele.
S e r ã o contínuos os e n g a n o s dos c o r r e s p o n d e n t e s q u e e m frecebendol o o u r o q u e
[ fl. 304 ] rdeveriaml m a n d a r a seus constituintes h ã o de e n t r a r / / n o desejo d e lucrar p a r a
si o q u i n t o d a q u e l e cabedal e lhes h ã o d e d a r satisfação c o m desculpas afetadas d e
*frota a frota, c o m o f r e q ü e n t e m e n t e sucedia antes do a n o de 1735 e a g o r a suce-
d e r á t a n t o mais f r e q ü e n t e m e n t e q u a n t o fica sendo m a i o r a rfacilidadel das fraudes
e ( m e n o r o prejuízol.
T a m b é m p a r e c e prejudicial a o sossego p ú b l i c o e alheio d a retíssima i n t e n -
ção d e Vossa M a j e s t a d e o q u e se d e t e r m i n a n o capítulo quinto d a lei m a n d a n d o
q u e d e n t r o e fora das M i n a s c o r r a o o u r o e m p ó e folheta pelo valor do seu *toque
s e m diferença a l g u m a , p o r q u e c o m o os q u e t r e c e b e r e m l nas M i n a s o o u r o e m p ó
t ê m a o b r i g a ç ã o d e p a g a r dele a q u i n t a p a r t e antes d e o l e v a r e m p a r a fora das
M i n a s segue-se q u e Tsel, p e l o teor do sentido literal deste capítulo, Tforeml obri-
gados a írecebê-lol pelo p r e ç o do t o q u e (que é o m e s m o q u e recebê-lo c o m o s e j a
fora q u i n t a d o ) n e c e s s a r i a m e n t e h ã o d e ressarcir-se deste prejuízo n o p r e ç o das
coisas q u e v e n d e r e m , e t a n t o mais [ p e r d e r á ! 0 m i n e i r o . E se o o u r o se d e r e m
p a g a m e n t o d e coisas j á vendidas antes d a p r á t i c a deste capítulo, segue-se q u e o
c r e d o r p e r d e r á s e m r a z ã o a q u i n t a p a r t e do q u e se l h e devia. E seja qual for a
i n t e r p r e t a ç ã o q u e se d ê a o m e s m o capítulo, e n t e n d e o C o n s e l h o q u e c e r t a m e n t e
p r o d u z i r á g r a n d e e m b a r a ç o n o comércio e d a r á ocasião a m u i t a s injustiças.
N i n g u é m i g n o r a q u a n t o i m p o r t a ao sossego p ú b l i c o e à c o r r e n t e z a do co-
m é r c i o q u e se a t a l h e m os crimes d e falsificação das b a r r a s e, ainda, q u e as p e n a s
d a m o e d a falsa q u e a lei lhe aplica p o d e r ã o i n t i m i d a r a alguns; c o n t u d o , a m a i o r
589

facilidade q u e h á p a r a falsificar b a r r a s d o q u e m o e d a (de q u e b a s t a p a r a p r o v a


A n t ô n i o Pereira, q u e a i n d a se a c h a p r e s o n o Bugio) e, p o r o u t r a p a r t e , a ineficácia
dos m e i o s / / q u e a lei a p o n t a p a r a se conseguir o castigo h ã o d e ( c o n v i d a r l a [ ü. 304v. ]
muitos a c o m e t e r este crime.
N o p a r á g r a f o q u a r t o d o capítulo s e g u n d o , o r d e n a a lei q u e t o d o s os a n o s
façam os "intendentes conferências dos "registros e as r e m e t a m a o C o n s e l h o p a r a
se a v e r i g u a r se íhál b a r r a s falsas. C o m o as providências q u e d a q u i p o d e m resultar
n ã o h ã o de ter efeito senão m u i t o t e m p o depois d e cometidos os crimes, é certo
q u e ficarão sendo inúteis, n ã o só p a r a a p r e e n d e r os "descaminhos m a s a i n d a p a r a
perseguir os réus, p o r q u e n e n h u m será t ã o d e s a c o r d a d o q u e falsificando a b a r r a
deixe d e p ô r n a "guia u m n o m e suposto, e assim q u a n d o , depois d e a v e r i g u a d o
pelas conferências q u e h o u v e falsidade, se for a buscar o autor pelo n o m e d a guia
será b a l d a d a toda a diligência, e p o d e r á suceder q u e p o n d o o falsário n a guia o
n o m e d e a l g u m a pessoa q u e exista v e n h a esta a ser v e x a d a s e m culpa.
P o r t o d a s as referidas c o n s i d e r a ç õ e s , p a r e c e a o C o n s e l h o q u e p a r a evitar
tantas opressões dos p o b r e s mineiros, tantas perdas d a R e a l F a z e n d a e tantos o u -
tros danos q u e p r u d e n t e m e n t e devem temer-se, e q u e sem d ú v i d a são m u i r e m o -
tos d a piíssima i n t e n ç ã o de V o s s a M a j e s t a d e , seria c o n v e n i e n t e I b r d e n a r V o s s a
M a j e s t a d e 1 p e l a n a u q u e está a p a r t i r q u e , a t e n d e n d o à d e m o r a imprevista q u e
i n e v i t a v e l m e n t e se e n t r e p ô s p a r a a e x p e d i ç ã o dos aprestos e o r d e n s necessárias
p a r a o estabelecimento das "casas d e fundição e ao d e m a s i a d o intervalo q u e p o r
essa causa h a v e r i a e n t r e a suspensão d a "capitação í o r d e n a d a l pela lei d e 3 d e
d e z e m b r o p r ó x i m o e a c o b r a n ç a efetiva d o quinto a todas as M i n a s , e outrossim
a t e n d e n d o q u e p a r a evitar as fraudes é conveniente reduzir-se p r i m e i r o a b a r r a s ,
c u n h a d a s e m fuml espaço de t e m p o determinado, todo o ouro q u e se a c h a r extraído,
p o r q u e só assim se poderá conhecer e p r o v a r / / depois qual é o o u r o descaminhado, [ fl. 3 0 5 ]
é Vossa Majestade servido que, sem e m b a r g o do q u e rfoil d e t e r m i n a d o n o p r e â m -
b u l o d a m e s m a lei, n ã o deixe d e c o n t i n u a r a c o b r a n ç a da c a p i t a ç ã o até q u e se
a c h e m prontas e m todas as Minas as casas de fundição, e nelas e nas casas d a m o e d a
da Bahia Te R i o de J a n e i r o 1 se r e d u z a a b a r r a todo o ouro q u e se a c h a r e m t e m p o de
quatro meses, s e m se levar por isso "quinto n e m outra a l g u m a despesa. E q u a n t o ao
p o r t o d e P e r n a m b u c o e outros mais, digo, e os mais o n d e n ã o h á casa d a m o e d a ,
traga a registro d e n t r o dos ditos q u a t r o meses todo o o u r o q u e se a c h a r n a q u e l e s
distritos, ficando g u a r d a d o e m cofre de três chaves p a r a se entregar às partes c o m
guias q u a n d o o quiserem e m b a r c a r p a r a este R e i n o , q u e só depois d e feita esta
diligência cesse a c o b r a n ç a d a c a p i t a ç ã o , e dali e m d i a n t e se t o m e p o r p e r d i d o
todo o o u r o q u e se a c h a r e m pó ou folheta fora dos territórios das M i n a s , e se
i m p o n h a aos extraviadores a p e n a d a lei, m a n d a n d o Vossa M a j e s t a d e , q u a n t o a
esta p a r t e , declarar p o r "alvará ou lei foi q u e n a sobredita foi c o n c e d i d o a respeito
d e correr o ouro em p ó fora das M i n a s , e q u e os g o v e r n a d o r e s c o m u n i q u e m e
ajustem entre sí o t e m p o e m que será conveniente começarem os ditos q u a t r o meses.
590

Entretanto, parece t a m b é m ao Conselho que, m a n d a n d o Vossa Majestade


p o n d e r a r todas as circunstâncias, digo, as conseqüências q u e ficam a p o n t a d a s , se
assentem nos mais expedientes fquel c o n v e n h a t o m a r e m tão i m p o r t a n t e e delica-
do n e g ó c i o p a r a q u e n ã o v e n h a a resultar d a e x e c u ç ã o d a lei m u i t o c o n t r á r i o
sucesso d o q u e V o s s a M a j e s t a d e c o m t a n t a b e n i g n i d a d e p a r a os seus vassalos
e n t e n d e u d e t e r m i n a r e m u t i l i d a d e deles.
S e m e m b a r g o , p o r é m , d o q u e fica exposto, pelo zelo do b e m do real serviço
[ fl. 305v. ] e d e c o n v e n i ê n c i a pública, o C o n s e l h o t e m / / p r e p a r a d o c o m a p r o n t i d ã o q u e
í r e q u e r i a l a sua Ibbediêncial t u d o o q u e Vossa M a j e s t a d e foi servido fencarregar-
lhel p a r a a e x e c u ç ã o deste negócio, e Vossa Majestade m a n d a r á o q u e for mais
conveniente.
A o conselheiro T o m é J o a q u i m d a Costa C o r t e - R e a l p a r e c e q u e o "regimen-
to q u e f o r m a r a m os p r o c u r a d o r e s d a C o r o a e F a z e n d a está regulado e c o n f o r m e
as reais intenções c o m q u e V o s s a M a j e s t a d e foi servido abolir, e m beneficio d e
seus vassalos, o sistema d a "capitação p e l a lei de 3 d e d e z e m b r o p r ó x i m o p a s s a d o ,
e b e m o r d e n a d o o serviço dos " i n t e n d e n t e s e "oficiais respectivos das "casas d e
fundição e i g u a l m e n t e b e m p o n d e r a d o q u e , n o caso d e q u e n a p r á t i c a do regi-
m e n t o haja coisa d e q u e necessite de se a m p l i a r ou restringir a l g u m parágrafo ou,
digo, algum capítulo ou parágrafo d o m e s m o r e g i m e n t o , o p o s s a m logo represen-
tar a Vossa M a j e s t a d e os "governadores e intendentes, p o r q u e m u i t a s vezes suce-
d e n ã o poder-se reduzir à p r á t i c a as coisas q u e r e p r e s e n t a m a b e m regulada espe-
c u l a ç ã o , pelo q u e se c o n f o r m a c o m os p r o c u r a d o r e s régios c o m a p r e d i t a cláusula
e só acrescenta q u e as casas d e fundição que. Vossa M a j e s t a d e m a n d a erigir l h e
p a r e c e m p o u c a s , p a r a o q u e , n a inteligência dele, conselheiro, as deve h a v e r e m
todos os sítios e m q u e se extrair o u r o , e isto p a r a o fim d e se a r r e n d a r e m a n u a l -
m e n t e os direitos senhoriais dos "quintos p o r c o m a r c a s as m i n a s estabelecidas e
s e p a r a d a m e n t e todos os n o v o s descobertos, p o r estar p e r s u a d i d o d e q u e só e m
este m é t o d o p r a t i c a d o e m todas as r e n d a s reais serão inteirados os direitos legiti-
m a m e n t e devidos a o R e a l E r á r i o d e Vossa Majestade.

A o conselheiro A n d r é M e t e l o d e Sousa e Meneses, s e m se afastar do v o t o do


C o n s e l h o , c o m q u e se conforma, t a m b é m lhe p a r e c e o m e s m o q u e ao conselheiro
[ fl. 3 0 6 ] T o m é J o a q u i m , / / e n q u a n t o se p e r s u a d e q u e só pelo m é t o d o do a r r e n d a m e n t o
d o q u i n t o se p o d e r á c o b r a r este direito real c o m a m a i o r j u s t i ç a e j u n t a m e n t e
conveniência d a F a z e n d a R e a l .
A o m a r q u ê s presidente parece que, posto q u e o Conselho obrasse nesta m a t é -
ria c o m a atividade r e c o m e n d a d a p o r Vossa Majestade e q u e o regimento se for-
masse e m breves dias pelos dignos p r o c u r a d o r e s régios n a c o n f o r m i d a d e d a Lei
Novíssima e: q u e fosse e x a m i n a d o c o m duas conferências c o m tal p o n d e r a ç ã o , c o m o
m o s t r a m as sólidas razões desta consulta, entende que a m e s m a brevidade, c o n t u d o ,
se fez. A diversidade dos arbítrios são motivos eficazes p a r a q u e Vossa Majestade,
ouvindo n o v a m e n t e pessoas práticas e inteligentes nesta matéria, se sirva de o r d e n a r
591

q u e se e m e n d e ou aprove este "regimento e q u e dele se façam as copias necessárias


de letra d e m ã o e se r e m e t a m aos "governadores e "intendentes, ordenando-se-lhes
q u e [interinamente! se governem p o r aquele regimento e informem c o m seu p a r e -
cer, declarando as dificuldades que h á e as q u e lhes focorrerem! p o d e r á h a v e r n a
sua execução e n a d a Lei Novíssima, e q u e c o m estas informações e à vista d e todos
os p a p é i s q u e h o u v e r s o b r e esta e s e m e l h a n t e m a t é r i a o C o n s e l h o consulte este
importantíssimo negócio, q u e necessita de m u i t o m a d u r a p o n d e r a ç ã o , sobre a qual
Vossa M a j e s t a d e resolverá o q u e for mais conveniente ao real serviço e b e m dos
povos, e e n t ã o se imprimirá o regimento q u e ficar servindo. N ã o interpõem p a r e c e r
sobre o t e m p o e m q u e h á d e acabar a "capitação, p o r q u e tendo d u r e z a e iniqüidade
este m o d o d e c o b r a n ç a dos "quintos lhe n ã o fica mais lugar do q u e o representar a
Vossa M a j e s t a d e o q u a n t o é preciso q u e v ã o c o m a m a i o r p r o n t i d ã o os oficiais e
aprestos p a r a / / a s "casas d e fundição p a r a que eles c o m e c e m a t r a b a l h a r e m tal [ fl. 306v. ]
t e m p o q u e n e m a F a z e n d a de Vossa M a j e s t a d e n e m os povos t e n h a m p r e j u í z o .
T a m b é m lhe p a r e c e útil e preciso haver mais casas de fundição e q u e se a r r e n d e m
os reais quintos, o q u e j á votou e m duas "juntas. Lisboa, 22 dito de 1751. Penalva.
M é t e l o . P a r d i n h o . G u s m ã o . C o r t e - R e a l . R a n g e l . Bacalhau.

"Despacho

Fui servido aprovar o regimento que formaram os procuradores d a C o r o a fe d a


F a z e n d a d e U l t r a m a r l e o m a n d o i m p r i m i r pela C h a n c e l a r i a - m o r d o R e i n o . E o
Conselho fique advertido q u e as suas mais óbvias e mais indispensáveis obrigações
consistem n o p r o f u n d o e s e m p r e inviolável respeito às m i n h a s leis e n a sincera e
vigilante e exata diligência e m p r o m o v e r e zelar a pontual observância do q u e elas
contêm, digo, o r d e n a m . Lisboa, 4 de m a r ç o de 1751. C o m a rubrica de S u a Majestade.

68
"Consulta do mesmo Conselho sobre a advertência
que Sua Majestade lhe fez

Consulta em que o Conselho Ultramarino responde à reso-


lução d e 4 de março de 1751, com justificativa da d e m o r a n a
elaboração do regimento das casas de fundição, demonstração
de não ter interesse na impugnação da lei de 3 de dezembro de
592

1750., afirmação da independência na elaboração de pareceres e


reiteração de obediência ao rei, devolvida sem despacho e ape-
nas com aviso de Diogo de M e n d o n ç a Gorte-Real. Forma u m
processo com os documentos 67 e 69.
Documento de interesse no início da década de 1750, pelas
discussões travadas em torno da capitação, alternativas existen-
tes, decisão de reinstalação de casas de fundição era Minas G e -
rais, informaria a participação de Gaetano da Gqsta Matoso
nas juntas p a r a discussão do tema.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Gonselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
9.3.1751.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : A afetação de humildade ou de
autodesqualificação é artificio retórico q u e objetiva obter a con-
descendência do leitor. Aplicação d e tópicas características do
gênero encomiástico. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á S c o : Escrita moderna, cursiva do
período barroco, com encadeamento aparente, em virtude do
arredondamento e rapidez do movimento da escrita. Apresenta
o " s " caudado d e haste dupla, mas com variação de feitura: o
" h " minúsculo semelhante ao " E " redondo, com laçada interme-
diária e acoplado à letra que se segue; o " b " de duplo olho com
laçada; o " p " de haste dupla. Abreviaturas nas formas de trata-
mento, com utilização do ponto. Letra idêntica à dos documen-
tos 67 e 69. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir de
cópia da BNL, cód. 6979, n XIV, e restringiram-se aos termos
9

que comprometiam o significado e o entendimento do texto,


mantidas as pequenas variantes introduzidas pelo copista.
Cópia manuscrita:
BNL, cód. 6979, n X I V . 9

P or "decreto d e 3 de d e z e m b r o p r ó x i m o passado foi Vossa M a j e s t a d e servi-


do q u e este C o n s e l h o lhe propusesse, t u d o o q u e j u l g a s s e c o n v e n i e n t e p a r a
se f o r m a r e m os "regimentos q u e se d e v e m u s a r nas "casas d e fundições e
"intendências das M i n a s . E satisfazendo o C o n s e l h o a este real d e c r e t o , p r o p ô s a
V o s s a M a j e s t a d e t u d o o q u e julgou conveniente a este fim e m u m a consulta, digo,
[fí. 307 ] e m c o n s u l t a d e 22 d o m ê s p r ó x i m o passado,, n a r e s o l u ç ã o d o q u a l h o u v e //
Vossa M a j e s t a d e p o r b e m r e s p o n d e r a o Conselho, a 4 do c o r r e n t e , q u e fora ser-
vido a p r o v a r o r e g i m e n t o q u e f o r m a r a m os p r o c u r a d o r e s d a C o r o a e F a z e n d a d o
U l t r a m a r e o [ m a n d a v a l i m p r i m i r pela C h a n c e l a r i a - m o r do R e i n o . E q u e o C o n -
selho fique advertido que as suas mais óbvias e m a i s [indispensáveis 1 obrigações
consistem n o p r o f u n d o e s e m p r e inviolável respeito às suas reais leis e n a sincera,
593

vigilante e e x a t a diligência e m p r o m o v e r e zelar a p o n t u a l o b s e r v â n c i a do q u e


elas o r d e n a m .
Esta real advertência, q u e recebe o C o n s e l h o c o m a m a i s p r o f u n d a h u m i l d a -
d e e r e c o n h e c e p o r u m ato d a real clemência de Vossa Majestade n ã o u s a r c o m o
ítribunall d e o u t r a d e m o n s t r a ç ã o mais severa — tendo-se p o s t o n a sua real p r e s e n -
ça q u e o C o n s e l h o faltara as suas obrigações d e receber c o m p r o f u n d o respeito às
suas leis, d i g o , reais leis e d e p r o m o v e r a s u a p o n t u a l o b s e r v â n c i a - , m a s p o r
crédito do m e s m o tribunal, p o r h o n r a d e seus *ministros e p o r zelo e conveniên-
cia do real serviço, se a c h a o m e s m o C o n s e l h o n a precisa obrigação de Tsel justi-
ficar n a p r e s e n ç a d e Vossa M a j e s t a d e , p a r a o q u e i m p l o r a a sua real c l e m ê n c i a
p a r a o ouvir e a t e n d e r e a sua retíssima justiça p a r a q u e a p r a t i q u e c o m este seu
tribunal e ministros de q u e se c o m p õ e .
Faltar c o m o p r o f u n d o respeito às soberanas leis d e Vossa M a j e s t a d e e n ã o
p r o m o v e r e zelar a s u a o b s e r v â n c i a é o mais t o r p e p r o c e d i m e n t o n o s vassalos,
e n o r m e nos q u e t ê m distintas o b r i g a ç õ e s , e n o r m í s s i m o nos m i n i s t r o s d o s t r i b u -
nais, q u e são d e s t i n a d o s p a r a fazer e x e c u t a r as m e s m a s leis, e s e n d o assim e m
todas as m o n a r q u i a s , / / seria mais escandaloso este p r o c e d i m e n t o n a c o r t e d e u m [ fl. 307v. ]
m o n a r c a tão p i o , tão c l e m e n t e , tão g e n e r o s o , c o m o testificam as gloriosas ações
q u e e n c h e r a m d e universal j ú b i l o e satisfação toda a m o n a r q u i a fel d e a d m i r a ç ã o
toda a E u r o p a .
Supor-se q u e os ministros deste C o n s e l h o são capazes d e i n c o r r e r e m e m tão
e n o r m e t o r p e z a é, sem dúvida, o motivo do mais p e n e t r a n t e sentimento c o m q u e
se a c h a m , e n o m e s m o t e m p o q u e se f c o n s i d e r a v a m n a l m a i o r felicidade p o r
servirem c o m gosto excessivo a u m m o n a r c a q u e a t e n d e ao serviço q u e se lhe faz,
e s a b e avaliar o trabalho de q u e m o serve, e c o m p r e e n d e o desvelo q u e é preciso e
se p r a t i c a neste R e i n o p a r a se expedirem, p o r ele, c o m retidão e a c e r t o , os m a i s
graves negócios, q u e p e l a n o v i d a d e de suas matérias necessitam d e particular apli-
cação e tão vigilante c u i d a d o q u e n ã o p e r m i t e aos seus ministros o desafogo, nerri
a i n d a o p o d e r e m a t e n d e r aos particulares das suas casas p o r n ã o faltarem Tàs obrí-
g a ç õ e s l e m q u e V o s s a M a j e s t a d e os t e m p o s t o d e q u e t i n h a m c o n c e b i d o j u s t a
e s p e r a n ç a de q u e à alta providência de V o s s a Majestade se l e m b r a r i a deles p a r a
os igualar aos m a i s tribunais q u e i g u a l m e n t e o servem. V e r e m - s e r e p u t a d o s n ã o
só p o r negligentes m a s c o m p r o c e d i m e n t o m e n o s sincero e c o m faltas nas suas
obrigações p a r e c e motivo bastante p a r a a sua m á g o a , q u e n ã o seria tão g r a n d e se
fosse c a p a z d e ocultar-se, n e m os ministros do C o n s e l h o Tteriaml a q u e l e zelo e
a q u e l a s i n c e r i d a d e q u e d e v e m p r a t i c a r n o real serviço e d e i x a r e m d e c l a m a r a
V o s s a Majestade pela restituição do crédito c o m q u e desejam de ficar capazes d e
c o n t i n u a r o seu real serviço.

B e m p o d e m os tribunais n ã o acertar nas consultas / / c o m a real providência [ fl. 308 ]


dos seus m o n a r c a s , ainda q u e se conformem, c o m o devem conformar c o m as reais
intenções q u e s e m p r e são dirigidas ao mais justo e mais conveniente, m a s n u n c a se
594

r e p u t o u delito o desacerto d e parecer q u e o n ã o seria m a s evidencia se n ã o admitis-


se Toutrol e m c o n t r á r i o . E dizendo o C o n s e l h o n o seu voto t u d o o q u e e n t e n d e
satisfaz a o fim p a r a que é destinado, ainda que não seja a p r o v a d o o seu parecer e
n e m os votos das consultas i m p e d e m as resoluções dos m o n a r c a s , q u e são somente
as q u e s a e m a público, ficando os votos e m segredo p o r muitas razões de E s t a d o
b e m manifestas.
Se o C o n s e l h o , pelo seu expediente, resolvesse alguns negócios c o n t r a o q u e
Vossa M a j e s t a d e t e m estabelecido pelas suas leis, "decretos ou "resoluções, digno
se fazia d e u m a severa d e m o n s t r a ç ã o , a i n d a q u e b e m p o d i a ser o seu e r r o p o r
ignorância, e n ã o p o r falta d e desejo d e a c e r t a r c o m a v o n t a d e e disposições de
Vossa Majestade. P o r é m , senhor, e m consultar o C o n s e l h o a Vossa M a j e s t a d e , o
q u e j u l g o u mais a c e r t a d o p a r a eficazmente se e x e c u t a r e m as suas reais intenções,
e n t e n d i a q u e fazia o q u e era obrigado e o m e s m o q u e Vossa M a j e s t a d e lhe o r d e -
n o u n o seu real decreto referido e t e m p r a t i c a d o este e os mais tribunais, a i n d a
s e m especial o r d e m , c o m o a q u e Ttevel o C o n s e l h o , e q u e desta o b e d i ê n c i a lhe
n ã o devia nascer u m efeito tão contrário à intenção c o m q u e se p r o c e d e u e d e q u e
l h e resulta u m a n o t a tão sensível q u e só Vossa M a j e s t a d e lhe p o d e r e m o v e r , t o -
[ fl, 308v. ] m a n d o a resolução q u e for servido, / / nascida t o d a d a sua i n c o m p a r á v e l justiça,
ficando Vossa Majestade p e r s u a d i d o d a r a z ã o c o m q u e o C o n s e l h o justifica o seu
p r o c e d i m e n t o e d a firme e s p e r a n ç a c o m q u e se a c h a d e q u e Vossa Majestade se
c o n f o r m a r á neste heróico ato de justiça c o m os mais q u e t e m p r a t i c a d o d e g e n e r o -
sidade e clemência. Lisboa, 9 de m a r ç o de 1751. Penalva. M e t e l o . P a r d i n h o .
Corte-Real. Henriques. Bacalhau. Rangel.

• 69 <
'Aviso do secretário de Estado para o marquês de Penalva, presi-
dente do Conselho, que baixou com esta consulta

Aviso de Diogo de Mendonça Corte-Real ao Conselho Ul-


ttumarino devolvendo sem despacho a consulta ém que o Conse-
lho responde à resolução de 4 de março de 1751, com justificati-
va da demora na elaboração do regimento das casas de fundi-
ção, demonstração de não ter interesse n a impugnação da lei de
3 de dezembro de 1750, afirmação de independência n a elabora-
ção de pareceres e reiteração de. obediência a o rei. F o r m a u m
processo com os documentos 67 e 68.
Documento de interesse no início da década de 1750, pelas
discussões travadas e m torno da capitação, alternativas existen-
tes, decisão de reinstalação de casas de fundição e m Minas Ge-
rais, informaria a participação de C a e t a n o d a Costa Matoso
nas juntas para discussão do tema.
Autoria, l o c a l e data: Diogo de M e n d o n ç a Corte Real;
Lisboa; 15.3.1751.
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna, cursiva do
período barroco, com encadeamento aparente, em virtude do
arredondamento e rapidez do movimento da escrita. Apresenta
o " s " caudado de haste dupla, mas com variação de feitura: o
" h " minúsculo semelhante ao " E " redondo, com laçada interme-
diária e acoplado à letra que se segue; o " b " de duplo olho com
laçada; o " p " de haste dupla. Abreviaturas nas formas de trata-
mento, com utilização do ponto. Letra idêntica à dos documen-
tos 67 e 69. (YDL)
Cópia manuscrita:
BNL, cód. 6979, n ô
XV.

S e n d o p r e s e n t e a S u a M a j e s t a d e a consulta de 9 do c o r r e n t e s o b r e a
b e n i g n a a d v e r t ê n c i a q u e o m e s m o s e n h o r se d i g n o u f a z e r a o C o n s e l h o
n a "resolução d e 4 d o c o r r e n t e , e m c o n s u l t a d e 22 d e fevereiro p r ó x i m o
p a s s a d o , o m e s m o s e n h o r foi servido o r d e n a r - m e q u e eu restitua a V o s s a Excelên-
cia a consulta sem d e s p a c h o e q u e à m a r g e m do seu registro se l a n c e este aviso, o
q u e V o s s a Excelência fará p r e s e n t e n o C o n s e l h o p a r a q u e assim se execute s e m
réplica. D e u s g u a r d e a Vossa Excelência. P a ç o , 22 d e m a r ç o de 1 7 5 1 .

Diogo de M e n d o n ç a Corte-Real

Ilustríssimo e Excelentíssimo s e n h o r m a r q u ê s d e Penalva, presidente.


596

• 70 <

[ íl. 309 ] Mapa do ouro que tem entrado na Casa de Fundição de Vila Rica
no primeiro ano do seu estabelecimento, que teve princípio em o
l d e agosto de 1751 e findou em o último de julho de 1752
9

Esta tabela indica cifras para o segundo, semestre de 1751


e primeiro de 1752, ficando à esquerda o volume mensal do ouro
que recebe a Gasa de Fundição e à direita o volume mensal
correspondente ao quinto arrecadado. As colunas referem-se às
medidas de marcos, onças, oitavas e grãos. O parágrafo sob o
quadro enuncia conversão dos valores totais para arrobas. Infor-
mações obtidas provavelmente da Provedoria da Fazenda Real
de Minas.
Forma, ao lado de outros, u m grupo de documentos com a
contabilidade da riqueza mineral e seu rendimento para a Fa-
zenda do rei. A operação de totalização dos valores para todo o
período pode ser indicativo do esforço de se avaliar as vantagens
desse sistema de cobrança do quinto pelas casas de fundição,,
parecendo servir p a r a subsidiar críticas ao fim do sistema de
capitação. A data final de suas informações, posterior ao afasta-
mento do compilador de seu posto e m Vila Rica, confirma que
permanece atento ao que ali passa. Vincula-se a o documento
UCJtltftatcrnt seguinte.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Provedoria da Real F a z e n d a de
Minas Gerais; Vila Rica; 1752.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna cursiva re-
donda, muito caligrafada e regularizada. Apresenta "d" uncial,
de haste simples, variedade de " s " redondo e pendente; maiúscu-
las com volutas e apex no título. Algarismos arábicos t a m b é m
arredondados, mesmo nas hastes e com perfil. Sinais de guarda
e m todas as colunas do mapa. (YDL)
Critérios editoriais: Foram suprimidos os sinais de guarda.
M a p a do ouro que tem entrado na Casa de Fundição de Vila Rica no primeiro ano do seu estabelecimento,
que teve princípio em o l d e agosto de 1751 e findou em o último de julho de 1752
9

marcos onças oitavas grãos marcos onças oitavas grãos quintos

1751 agosto 38 2 6 36 7 5 2 64 4

setembro no 1 4 51 22 0 2 37 1

outubro 215 4 3 31 43 0 7 06 1

novembro 182 7 5 42 36 4 5 66 0

dezembro 319 7 7 63 63 7 7 70 1

1752 janeiro 878 7 5 00 175 6 2 43 1

fevereiro 676 4 0 31 135 2 3 20 3

março 712 2 0 40 142 3 4 65 3

abril 764 0 4 42 152 6 4 35 3

maio 951 5 7 60 190 2 6 26 2

junho 1.190 5 3 00 238 1 0 43 1

julho 2.437 2 6 68 487 3 6 13 3

Total 8.478 5 0 32 1.695 5 6 60 3

Acréscimo 1 4 4 21 4

Líquido 1.697 2 3 10 2

Soma o principal que tem entrado oito mil quatrocentos e setenta e oito 'marcos, cinco *onças e trinta e dois 'grãos de ouro, que reduzido a 'arrobas
são cento e trinta c duas, quinze 'libras, emeo onças e trinta e dois grãos de ouro, de que fica pertencendo ao real 'quinto mil seiscentos e noventa e
cinco marcos, cinco onças, seis 'oitavas, sessenta grãos e três quintos de ouro ç o acréscimo um marco, quatro onças, quatro oitavas, vinte e um grãos
e quatro quintos de ouro, que reduzido a arrobas são vinte e seis e meia, u m marco, duas onças, três oitavas, dez grãos e dois quintos de ouro.
598

• 71 «

[ fl. 310 ] Mapa geral do que renderam as reais *casas de fundição das
quatro comarcas da capitania das Minas Gerais do
l de agosto de 1751 até 31 de julho de 1752
9

Esta tabela apresenta o rendimento do quinto n o primeiro


ano após o reestabelecimento da cobrança através das casas de
fundição. Reúne, no período entre l de agosto de 1751 e 31 de
s

julho d e 1752, os valores totais d a a r r e c a d a ç ã o conforme as


comarcas que possuíam casa de fundição — Vila Rica, Sabará,
Rio das Mortes e Serro Frio —, indicando-se da esquerda para a
direita para cada u m a delas os valores em marcos, onças, oita-
vas, grãos, quintos, a soma total com a inclusão de "acréscimo"
e "confiscos" e sua correspondência e m arrobas e seus desdobra-
mentos. Refere-se ainda às escovilhas obtidas nas Casas de Fun-
dição do Rio das Mortes e Serro do Frio. Apresenta os valores
do total arrecadado nas casas de fundição e m oitavas e arrobas.
O texto que acompanha a tabela confirma as cifras demonstra-
das e suas conversões e concluindo c o m a conversão p a r a réis.
Informações obtidas provavelmente da Provedoria da Fa-
zenda Real de Minas. Forma, ao lado de outros, u m grupo de
documentos com a contabilidade da riqueza mineral e seu rendi-
m e n t o p a r a a Fazenda do rei. A operação de totalização dos
valores para todo o período pode ser indicativo d o esforço de se

t avaliar as vantagens desse sistema de cobrança d o quinto pelas


casas de fundição, parecendo servir p a r a subsidiar críticas ao
fim do sistema de capitação. A data final de suas informações,
0 posterior ao afastamento do compilador de seu posto e m Vila
Rica, confirma que permanece atento ao que ali passa. T e m
continuidade no documento seguinte.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Provedoria da R e a l Fazenda de
0 21 t Minas Gerais; Vila Rica; 1752.
C o m e n t á r i o p a l e o g r a f i c o : Escrita m o d e r n a cursiva do
período barroco, regularizada e cáligrafada, destrógira e c ó m
hastes simplificadas, salvo do " s " pendente, que tem forma de
cajado. Números arábicos nas tabelas com perfil e traços arre-
dondados. (YDL)
Critérios editoriais: Foram corrigidos erros de cálculo.
Cópia manuscrita:
BPE, cód. £ 2 f f l l an. 37.
Cópia impressa:
MATHIAS, Herculano Gomes. Os mapas gerais dos quintos: u m
problema de autoria. Barroco, Belo Horizonte, n. 3, p. 39-40, 1971.
M a p a geral do q u e r e n d e r a m as reais *casas de fundição das q u a t r o c o m a r c a s da capitania
das M i n a s Gerais do I de agosto de 1751 até 31 de j u l h o d e 1752
o

Vila Rica marcos onças catavas grãos quintes soma de cada casa arrobas arráteis marcos onças oitavas grãcs quintos
quinto 1.965 5 6 60 3
acréscimo 1 4 4 21 4 1.969 5 0 11 0 26 17 1 5 6 60 3
confiscos 2 2 5 00 3
Sabará marcos onças oitavas gràce quintos
quinto 931 6 0 28 1 932 0 0 28 1 14 18 0 0 0 28 1
acréscimo 0 2 0 00 0
Rio das Mortes marcos onças oitavas gràos quintos
quinto 783 5 5 45 4
acréscimo 0 0 7 43 1 783 .7 5 36 0 12 7 1 7 5 36 0
confiscos 0 0 8 19 0
Serro do Frio marcos onças atavas grãcs quintos
quinto .138 7 6 12 3
acréscimo 0 0 2 00 0 139 1 3 30 3 2 5 1 1 3 30 3
confiscos 0 1 3 18 0
Somas 3.554 6 1 33 4 55 17 0 7 0 11 2
Escovilhas do Rio das Mortes 7 5 4 48 0 peso líquido
Escovilhas do Serro do Frio 2 3 3 24 0 arrobas arráteis marcos onças oitavas gràcs quintos
Soma total 3.564 7 1 33 4 55 22 0 7 1 33 4
Reduzido a oitavas são 228.153 oitavas, 33 grãos e 4 quintos
Explicação do peso
Soma todo o *quinto que renderam as quatro *casas de fundição desta capitania das Minas Gerais cinqüenta e cinco *arrobas, dezessete 'arráteis, sete *onças, onze
*grãos e dois quintos de ouro, a saber: a Casa de Fundição de Vila Rica, vinte e seis arrobas, dezessete arráteis, um "marco, cinco onças, seis *oitàvas, sessenta grãos
e três quintos de ouro; a do Sabará, quatorze arrobas, dezoito arráteis, vinte e oito grãos e um quinto de ouro; a do Rio das Mortes, doze arrobas, sete arráteis, um
marco, sete onças, cinco oitavas e trinta e seis grãos de ouro; e a do Serro do Frio, duas arrobas, cúico arráteis, um marco, uma onça, três oitavas, trinta grãos e três
quintos de ouro, que junto tudo faz a referida soma. Porém, como ao total peso se lhe ajuntaram as escovilhas da Fundição do Rio das Mortes, que são sete marcos,
cinco onças, quatro oitavas e quarenta e oito grãos de ouro, e juntamente as da Casa do Serro do Frio, que se mostra serem dois marcos, três onças, três oitavas e
vinte e quatro grãos de ouro, que líquidas são: 55 arrobas, 22 arráteis, 7 onças, 1 oitava, 33 grãos e 4 quintos; que reduzido tudo a dinheiro, com o valor de 1.500 *réis
a oitava, importa 342:230^160 réis.
600

• 72 «
[ fl. 311 ] Mapa do que renderam as reais *casas de fundição das quatro
comarcas da capitania de Minas Gerais — segundo ano

Esta tabela apresenta valores do quinto em separado para


cada u m a das casas de fundição de Minas no segundo ano de
arrecadação (1.8.1752 a 31.7.1753), indicando-se seus totais. I n -
corpora-se ainda a arrecadação correspondente ao primeiro e
ao segundo ano p a r a algumas das comarcas, procedendo-se à
soma parcial e total dos valores. Indica o rendimento do quinto
no ano fiscal anterior e a diferença com relação ao seguinte. A
esquerda, as cifras estão em marcos e seus desdobramentos; à
direita, em arrobas. O texto que segue a tabela descreve os valo-
res gerais apresentados e, sinalizando com certa preocupação
comparativa, confronta os rendimentos daquele ano com os do
que passou. Informações obtidas provavelmente d a Provedoria
da Fazenda Real de Minas.
Forma, ao lado de outros, u m grupo de documentos com a
contabilidade da riqueza mineral e seu rendimento para a Fa-
zenda do rei. A operação de totalização dos valores para todo o
período pode ser indicativo do esforço de se avaliar as vantagens
desse sistema de cobrança do quinto pelas casas d e fundição,
p a r e c e n d o servir p a r a subsidiar críticas a o fim do sistema de

>j 0 1I
capitação. A data final de suas informações, posterior ao afasta-
mento do compilador de seu posto e m Vila Rica, confirma que
permanece atento ao que ali passa. T e m continuidade no docu-
m****imento Jé seguinte.
• i tti*i*JMáJ
t

A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Provedoria da Real Fazenda de


Minas Gerais; Vila Rica; 1753-
C o m e n t á r i o p a l e o g r a f i c o : Escrita moderna cursiva, re-
gularizada e caligrafada. Traz hastes simples, salvo do "s", que
pode ser caudado duplo, simples, com haste em forma de caja-
do; o " R " repete o "r" minúsculo, redondo de u m só traço, com
haste alongada em forma de semicírculo. N ú m e r o s arábicos
modernos, ocasionalmente com perfd. (VDL)
Cópias manuscritas:
A H U , Gons. Ultram., Brasil/RJ, cx.69, doe. 16190.
A H U , Cons. Ultram., Brasil/RJ, cx.70,* doe. 16267.
A H U , Cons. Ultram., Brasil/RJ, cx.70, doe. 16278.
A H U , Cons. Ultram., B r a s i l / M G , cx.63, doe, 56.
A H U , Cons. Ultram., Brasil/MG, cx.63, doe. 57.
CXVT
BPE, cód. an. 37.
2-13
Cópia impressa:
MATHIAS, Herculano Gomes. Os mapas gerais dos quintos: u m
problema de autoria. Barroco, Belo Horizonte, n. 3, p. 39-40, 1971.
M a p a d o q u e r e n d e r a m as reais casas d e fundição das quatro comarcas d a capitania das M i n a s Gerais - segundo a n o
comarcas marcos onças oitavas grãos quintos arrobas arráteis marcos onças oitavas quintos
VlaRica
quinto 3.271 0 6 61 0 51 3 1 0 6 61 0
Saberá
quinto 1.747 0 3 36 0 27 9 1 0 3 36 0
Rio das Mortes.^
quinto 1.531 4 2 0 0
confiscos D 0 2 0 0 23 29 1 4 4 0 0
Serro Frio
quinto 349 1 1 0 0 5 14 1 1 1 0 0
soma 6.898 6 7 25 0 107 25 0 6 7 25 0
escovilhas
Vila Rica-Tano 26 2 7 0 0 25 1 0 6 36 0
segundo ano 24 5 7 36 0
Sabará- l°ano 11 4 5 18 0 13 0 0 0 54 0
segundo ano 14 3 3 36 0
Rio dasMortes-2 ano0
7 6 0 36 0 3 1 6 0 36 0
Serro Frb-2° ano 5 0 4 60 0 2 1 0 4 60 0
soma 89 7 4 42 0 1 12 1 7 4 42 0
soma total 6.988 6 3 67 0 109 6 0 6 3 67 0
rendeu o quinto no Fano 3354 7 0 11 2 55 17 0 7 0 11 2
houve de excesso no T ano 3.343 7 7 13 3 52 7 1 7 7 13 3
Em que se mostra importar o real "quinto seis mil oitocentos e noventa e oito "marcos, seis "onças, sete "oitavas e vinte e cinco "graos de ouro, que a "arrobas fazem cento
e sete, c vinte e cinco "arráteis, seis onças, sete oitavas e vinte é cinco grãos, e as "escovilhas que renderam as mesmas casas oitenta e nove marcos, sete onças, quatro oitavas
e quarenta e dois grãos de ouro, que a arrobas faz uma, doze arráteis, um marco, sete onças, quatro oitavas e quarenta ê dois grãos de ouro, em que entram as que renderam
as duas casas de Vila Rica e Sabará no primeiro ano do "encabeçamento que deixaram de se remeter a "frota passada.
Rendeu o quinto do primeiro ano cinqüenta e cinco arrobas, dezessete arráteis, sete onças, onze grãos e dois quintos de ouro. Houve de excesso no segundo cinqüenta e
duas arrobas, sete arráteis, um marco, sete onças, sete oitavas, treze grãos e três quintos.
Remetem-se na presente frota as cem arrobas do encabeçamento.
602

• 73 «

[ fl. 312 ] Mapa do que renderam as reais *casas de fundição das quatro
comarcas da capitania das Minas Gerais — terceiro ano

Esta tabela apresenta valores do quinto e m separado para


cada u m a das casas de fundição de Minas no segundo ano de
arrecadação {1.8.1753 a 31.7.1754), indicando-se seus totais. In-
corpora-se ainda a arrecadação correspondente ao primeiro e ao
segundo ano para algumas das comarcas, procedendo-se à soma
parcial e total dos valores. Indica o rendimento do quinto no ano
fiscal anterior e a diferença com relação ao seguinte. A esquerda,
as cifras estão em marco e seus desdobramentos; à direita, em
arrobas. O texto que segue a tabela descreve os valores gerais
apresentados e, sinalizando com certa preocupação comparativa,
confronta os rendimentos daquele ano com os do que passou. In-
formações obtidas provavelmente da Provedoria da Fazenda Real
fim/k». de Minas.
Forma, ao lado de outros, um grupo de documentos com a
Mi contabilidade da riqueza mineral e seu rendimento para a Fazen-
da do rei. A operação de totalização dos valores para todo o perí-
odo pode ser indicativo do esforço de se avaliar as vantagens desse
sistema de cobrança do quinto pelas casas de fundição, parecendo
servir para subsidiar críticas a o fim do sistema de capitação. A
data final de suas informações, posterior ao afastamento do com-
pilador de seu posto e m Vila Rica, confirma que permanece aten-
to ao que ali passa.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Provedoria d a Real Fazenda de
7 Minas Gerais; Vila Rica; 1754.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna cursiva, regu-
larizada e caiigrafada. Apresenta capitulares pronunciadas nos pa-
rágrafos, com traços diferentes para a mesma letra, caso do " R "
sempre redondo, mas ou com laçada ou pequeno olho no início do
traçado; do "E" com dupla voluta ou simples; o "d" e o "q" trazem
a haste retilínea, levemente inclinada para a direita, no formato da
bastarda italiana. Números arábicos modernos, ocasionalmente com
perfil e hastes a r r e d o n d a d a s . M e s m a escrita do d o c u m e n t o
anterior. (YDL)
Cópias manuscritas:
A H U , C o m . Gltram., Brasil/RJ, cx.76, doe. 17533.
BPE, cód. Çp^p an. 37.
Cópia impressa:
M A T H I A S , Herculano Gomes. O s mapas gerais dos quintos:
u m problema de autoria. Barroco^ Belo Horizonte, n. 3, p. 39-
40, 1971.
M a p a do q u e r e n d e r a m as. reais casas de. fundição das q u a t r c c o m a r c a s d a capitania das M i n a s Gerais - terceiro a n o
Comarcas marcos onças oitavas grãos quintos .arrobas anátek marcos onças oitavas grãos quintos
VJaRica
quinto 3.308 6 2 50 2 51 22 0 6 2 50 2
Sabará
quinto 2.217 3 6 36 0 34 21 1 2 1 42 0
confiscos 1 6 3 .6 o.
Rio das Mortes
quinto 1.715 3 0 0 0 26 25 1 3 0 0 0
SerroFrio
quinto 331 0 7 36 0 5 5 1 0 7 '36 .0
soma 7.574 4 .3 56 2 118 11 0 4 3 .56 2
escovilhas marcos onças oitavas grãos quintos
VaaRka 32 4 1 0 0 0 16 0 4 1 0 0
Sabará 20 0 0 0 0 0 10 0 0 0 0 0
RiodasMortes 7 4 1 43 0 0 3 1 4 1 43 0
SerroFrio 3 6 0 48 0 0 I 1 6 0 48 0
soma 63 6 3 19 0 0 .31 1 6 3 19 0
soma total 7.638 2 7 3 2 119 11 0 2 7 3 2
rendeu o 2° ano 6.898 6 7 25 0 107 25 0 6 7 25 0
houve de excesso no 3 U
675 5 4 31 2 10 17 1 5 4 31 2

Em que se mostra importar y real 'quinto, sete mil quinhentos setenta e quatro 'marcos,, quatro "onças, três "oitavas, cinqüenta e seis "grãos e dois "quintos, que fazem cento
e dezoito "arrobas, onze "arráteis, quatro onças, três oitavas, cinqüenta e seis grãos e dois quintos de ouro.
E as "escovilhas que renderam as mesmas casas sessenta e três marcos, seis onças, três oitavas e dezenove grãos de ouro,, que fazem trinta e um arráteis, um marco, seis onças,
três oitavas e dezenove grãos de.ouro.
Rendeu o quinto do segundo ano cento e sete arrobas, vinte e cinco arráteis, seis onças, sete oitavas, vinte e cinco grãos. E houve de excesso no terceiro dez arrobas,
dezessete arráteis, um marco, cinco onças, quatro oitavas, trinta e um grãos e dois quintos.
Remétem-sé as cem arrobas do encabeçamento.
604

• 74 <

[Certidão de carta de Gomes Freire de Andrade sobre o


requerimento do contratador das entradas, José Ferreira da Veiga,
de pagamento do seu contrato em ouro sem quintar e do
assento da junta de 17 de setembro de 1751 sobre a matéria]

Cópia incompleta de certidão de carta ordenando a decla-


ração e o cumprimento do termo da j u n t a de 17 de setembro de
1751, e m anexo, que estipulava o pagamento do contrato das
entradas de José Ferreira da Veiga em puro quintado ao prove-
dor da Fazenda Real de Minas Gerais. D o c u m e n t o solicitado
pelo contratador p a r a instrução de processo contra a decisão
estipulada pela lei d e 3 de d e z e m b r o de 1750 e reiterada n a
referida junta. Ações com o mesmo teor foram interpostas por
todos os contratadores de Minas Gerais. F o r m a processo com
os documentos 75-77 e complementa os documentos 63-66.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir o documento, que informaria sua partici-
pação nas juntas sobre o assunto.
A u t o r i a , l o c a l e data: Gomes Freire de Andrade; Tijuco;
2 2 . 9 . 1 7 5 1 . M a n u e l Francisco da Costa Barros; Tijuco;
20.9.1751.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento aplica as tópicas
d a ilegalidade, d a injustiça e do prejuízo p a r a argumentar con-
tra a isenção de pagamento do preço da arrematação de contra-
tos com o quinto, conforme solicitado pelo contratador. (JPÍ)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, letra cursiva
do século X V I I I , bastante caligrafada e com traço destrógiro.
D e traço simplificado, mas conserva o " s " caudado e o pendente
em forma de cajado; o " p " com haste d u p l a , e m f o r m a de
forquilha; o " y " usado como semivogal nos ditongos; o " 1 " de
haste simples, oblíqua. Escólio do fólio 317 com letra de tercei-
ro, isto é, Caetano da Costa Matoso. (YDL)
Cópias manuscritas;
A P M , C C 1063, íl. 85-87v.
A H U , Cons. Ultram., Brasil/MG, cx. 63, doe. 76.
605

C
a e t a n o J o s é Viegas, cavaleiro professo n a O r d e m de Cristo, *escrivão d a
F a z e n d a R e a l e *matrícula d a gente d e g u e r r a nesta c a p i t a n i a das M i n a s
Gerais etc. Certifico q u e p r o v e n d o o livro terceiro q u e nesta P r o v e d o r i a
d a F a z e n d a R e a l serve d e registro de o r d e n s reais nele, à foJha 85 até folha 8 7 , se
a c h a registrada a c a r t a do Ilustríssimo e Excelentíssimo *general G o m e s Freire d e
A n d r a d e e o assento d a "junta q u e o suplicante r e q u e r , d e q u e t u d o *de verbo ad
vèrbum e o seu teor é o seguinte:

Carta

C o m esta r e m e t o a Vossa M e r c ê os d o c u m e n t o s d o r e q u e r i m e n t o q u e p o r
seu p r o c u r a d o r b a s t a n t e fez J o s é Ferreira d a Veiga, p a r a efeito d e se l h e d e c l a r a r a
f o r m a c o m q u e deve c o n t i n u a r a receber os p a g a m e n t o s d o seu *contrato, sobre o
q u e , p o r ser m a t é r i a tão importantíssima, fiz *junta, cuja d e t e r m i n a ç ã o t a m b é m
r e m e t o p a r a q u e , sendo ciente o caixa, e m t u d o V o s s a M e r c ê a faça observar, e
registrada a fará Vossa M e r c ê passar à I n t e n d ê n c i a p a r a nela se observar o q u e
toca à *capitação.
T o d o o d i n h e i r o de p r a t a ou d e c o b r e q u e tiver c h e g a d o a essa R e a l C a s a
fará V o s s a M e r c ê c o n s e r v a r n a m e s m a até a m i n h a c h e g a d a a essa vila, c o m o
t a m b é m fará p ô r e m b a r r a b a s t a n t e s p a r c e l a s d e o u r o d e sessenta a t é c e m mil
*réis, p o r q u e c o n v é m m u i t o q u e estas se enviem aos *registros p a r a q u e , p o r falta
destas, n ã o s e j a m d e m o r a d o s os v i a n d a n t e s . D e u s g u a r d e a Vossa M e r c ê m u i t o s
anos. Tijuco, 22 de s e t e m b r o d e 1751. G o m e s Freire d e A n d r a d e . S e n h o r d o u t o r
*provedor Luís C a r d o s o M e t e l o C o r t e - R e a l d a C u n h a . C u m p r a - s e e registre-se.
Vila R i c a , 27 d e s e t e m b r o d e 1 7 5 1 . M e t e l o .

Cópia [fl. 315v. ]

T e r m o d e j u n t a q u e o Ilustríssimo e Excelentíssimo s e n h o r G o m e s Freire d e


A n d r a d e , ' g o v e r n a d o r e capitão-general desta capitania, m a n d o u a q u i se lançasse,
p o r se a c h a r e m Vila R i c a o livro dos t e r m o s d e j u n t a , o n d e este se deve l a n ç a r
logo q u e c h e g a r á referida vila

A o s dezessete dias d o m ê s de setembro de mil setecentos e c i n q ü e n t a e u m ,


n e s t e a r r a i a l d o T i j u c o , c o m a r c a d o S e r r o d o F r i o , e. casas d e r e s i d ê n c i a d o
Ilustríssimo Excelentíssimo G o m e s F r e i r e d e A n d r a d e , g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e -
n e r a l d o R i o d e J a n e i r o e M i n a s G e r a i s , o n d e eu, M a n u e l F r a n c i s c o d a C o s t a
Barros, secretário interino, fui vindo e presentes se a c h a r a m os d o u t o r e s J o s é P i n t o
de M o r a i s Bacelar, *ouvidor-geral desta c o m a r c a , S a n c h o d e A n d r a d e M a g a l h ã e s
e L a n ç õ e s , *intendente da D e m a r c a ç ã o D i a m a n t i n a , Félix d e A z e v e d o d a F o n s e -
ca, i n t e n d e n t e n o m e a d o d a c o m a r c a d o R i o das V e l h a s , e T o m á s R u b i m d e B a r -
ros Barreto., ouvidor-geral q u e foi da c o m a r c a do R i o das M o r t e s , aos quais o dito
606

Ilustríssimo e Excelentíssimo " g o v e r n a d o r e capitão-general p r o p ô s a petição j u n -


t a p o r seu p r o c u r a d o r J o s é Ferreira d a Veiga, dizendo q u e ele havia r e m a t a d o no
C o n s e l h o U l t r a m a r i n o o " c o n t r a t o das e n t r a d a s d e t o d a s as M i n a s e q u e este
h a v i a d e ter seu p r i n c í p i o e m o p r i m e i r o d e o u t u b r o d e 1751 a n o s , e q u e p a r a
c o b r a r os direitos n o s "registros d a s u a r e p a r t i ç ã o p e d i a - s e - l h e declarasse se os
devia cobrar "quintados p a r a assim os p a g a r à Real Fazenda.;, dizendo ultimamente e
requerendo a o doutor provedor d a Real F a z e n d a lhe decidisse a dita dúvida q u e este
a n ã o resolvera, suposto dava a entender que o suplicante havia d e p a g a r o preço da
arrematação c o m o quinto e que, com o m e s m o devia receber das partes nos registros,
[ fl. 316 ] sem atender q u e , pelo / / referido m o d o , se lançava u m novo tributo ao povo contra
a v o n t a d e do soberano, p o r cujo motivo m e requeria fosse servido ordenar q u e c o m
o suplicante se observasse o m e s m o que se havia praticado c o m o m e s m o contrato nos
anos d e 1734 e 1735, e m atenção às condições, ordens e mais documentos juntos e
resposta do "procurador da C o r o a e Fazenda, pelo q u e pretendia deferir a dita súpli-
ca c o m aquela retidão e acerto q u è era o b r i g a d o , sem prejuízo d a R e a l F a z e n d a
n e m dos vassalos d e S u a M a j e s t a d e , e q u e p a r a o dito efeito o n e r a v a a eles, ditos
"ministros, as suas consciências p a r a v i r e m e i n d a g a r e m c o m a precisa reflexão os
d o c u m e n t o s j u n t o s p o r p a r t e do suplicante e q u e , s e g u n d o estes e o q u e melhor
julgassem, dessem suas determinações p a r a se resolver n o que justo fosse.

C o m o t a m b é m se o último resto da "capitação q u e falta reçeber-se. do a n o d e


m i l setecentos e c i n q ü e n t a e do p r i m e i r o s e m e s t r e d o a t u a l se d e v e c o b r a r e m
o u r o q u i n t a d o ou oitava p o r oitava sem q u i n t o , ocorrendo-lhe^ p a r a esta dúvida,
ficar extinto todo o ouro q u e havia p a g o capitação, logo q u e , p o r u m " b a n d o , foi
p e r m i t i d o aos m o r a d o r e s desta capitania m e t e r e m seu o u r o livre n a "casa d e fun-
d i ç ã o pelo t e r m o d e u m m ê s , h a v e n d o t i d o a n t e s d e o t i r a r e m p a r a fora dela,
;

t o d o o t e m p o q u e c o r r e u depois d a p u b l i c a ç ã o d a lei d e três d e d e z e m b r o d e


1750 até o do dito b a n d o . E c o m o pelo referido sê vê e pela experiência q u e a o
p r e s e n t e n ã o h á e m estas M i n a s m a i s o u r o e m p ó q u e o e x t r a í d o do ú l t i m o d e
j u l h o e m d i a n t e , fica c o n h e c i d a m e n t e f r a u d a d o o p ú b l i c o se, r e c e b e n d o - s e as
dívidas reais e m o u r o e m p ó , esta g r a n d e p o r ç ã o passar fora deste g o v e r n o s e m
ficar q u i n t a d o , pois findo o a n o d o ajuste c o m os p o v o s , h ã o d e estes p r e c i s a m e n t e
refazer esta falta no excesso d a derrama, sendo o único o receber-se o ouro n a R e a l
F a z e n d a quintado ou com a v a n t a g e m do quinto, p a r a se satisfazer esta, incontinenti,
[ fl. 316v. ] as respectivas casas de fundição / / a q u e tocar e e m q u e se tirar pelas m e s m a s casas.
E vistos e e x a m i n a d o s pelos ditos ministros os d o c u m e n t o s d o suplicante J o s é
F e r r e i r a d a V e i g a , p o r todos u n i f o r m e m e n t e foi dito q u e a c e r t i d ã o à folha 3 e
folha 4, e m q u e o suplicante p r e t e n d e desonerar-se d e p a g a r à R e a l F a z e n d a o
o u r o q u i n t a d o , h a v e n d o - o assim m e s m o das p a r t e s , n a d a p r o d u z a seu favor,
antes [ c o n t r a p r o d u z e m ? ] , e m r a z ã o do q u e , d a certidão à folha 3 e folha 4, verso,
p l e n a m e n t e se p r o v a q u e L o u r e n ç o d e A m o r i m C o s t a r e m a t a r a o c o n t r a t o das
e n t r a d a s , p r i n c i p i a n d o s u a a d m i n i s t r a ç ã o no p r i m e i r o de o u t u b r o d e 1733 anos
até os fins de j u n h o d e 1 7 3 5 , q u e distam vinte e u m meses. Satisfez o r e m a t a n t e a
607

S u a M a j e s t a d e a *oitava d e o u r o à r a z ã o d e mil e duzentos *réis, t e m p o e m q u e


l a b o r a v a a C a s a d a M o e d a e nesta r e c e b i a o dito s e n h o r o seu " q u i n t o , e j u n t o
este a mil e duzentos réis p o r q u e o suplicante p a g o u c a d a u m a oitava s e m p r e , o
dito r e m a t a n t e veio a p a g a r a q u i n z e *tostões p o r oitava, e e x t i n t a a C a s a d a
M o e d a ficou o p r e d i t o r e m a t a n t e p a g a n d o c a d a oitava de o u r o à r a z ã o d e m i l e
q u i n h e n t o s réis, e p l e n a m e n t e se p r o v a d a c e r t i d ã o . E suposto q u e t a m b é m se
alegue pelo suplicante q u e n o t e m p o q u e a oitava d e o u r o valia a mil e duzentos
t a m b é m se recebia o u r o e m p ó n a R e a l F a z e n d a , n e m p o r isso se r e c e b i a p e r d a
a l g u m a , p o r q u e c o m u m e n t e s e m p r e a oitava de o u r o r e n d i a a mil e q u i n h e n t o s
réis e m u i t a s vezes excedia, e isso q u e e n t ã o se p r a t i c a v a a i n d a h o j e , se d e v i a
executar c o m o suplicante se os quintos n ã o cedessem e m benefício das c e m *arrobas
d e o u r o q u e estes povos s e g u r a r a m ao s o b e r a n o . E p o r isso é preciso q u e os seus
r e n d e i r o s lhe p a g u e m q u i n t a d o , c o m o e e x p r e s s a m e n t e o d e c l a r a a c e r t i d ã o à
a

folha 10 e esta m e s m a , injustamente p r e t e n d e o suplicante p e r v e r t e r a seu p a l a -


d a r , talvez / / q u e a g r a d e c i d o a o favor q u e o d o u t o r *procurador d a C o r o a lhe fez [ fl. 317 ]
n a p a r t e e m q u e r e s p o n d e q u e a R e a l F a z e n d a n ã o recebe prejuízo e m n ã o r e c e -
b e r o u r o q u i n t a d o . Assim seria n a hipótese de q u e S u a M a j e s t a d e p a g a v a nesse
o u r o , e p r e t e r i d a a lei e forma de se c o b r a r e m os quintos pelas respectivas *casas
d e fundição, o m a n d a s s e p a r a a C a s a d a M o e d a d o R i o de J a n e i r o . M a s o dito
senhor, c o m o legislador, é o p r i m e i r o q u e deve e q u e r observar a lei, fazendo q u e
t o d o o o u r o q u e se extrair, depois d e a b o l i d a a ' c a p i t a ç ã o , e n t r e n a s casas d e
fundição. E, finalmente, afirma o dito d o u t o r p r o c u r a d o r , e m sua resposta à folha
7, q u e o suplicante h á d e p a g a r c o m o gênero sem significação do valor. D u v i d a - s e
o f u n d a m e n t o m a s confia-se n a literatura do d o u t o r p r o c u r a d o r d a C o r o a , q u e se
Tício se fora aconselhar c o m ele, e x p o n d o q u e antes d a lei d e três d e d e z e m b r o
do p r e s e n t e a n o a r r e n d a r a a S i m p r ô n i o o seu Tprédiol p o r mil oitavas d e o u r o e
q u e este d u v i d a r a p a g a r - l h e à r a z ã o d e mil e q u i n h e n t o s réis c a d a oitava, p r e ç o
p o r q u e corria o o u r o n o t e m p o d a c o n t r a ç ã o e c o n t r a t o , com evidência d e v e m o s
crer q u e o p r e d i t o d o u t o r p r o c u r a d o r d a C o r o a h a v i a d e r e s p o n d e r q u e suposto
a r r e n d a s s e p o r oitavas q u e n u n c a devia satisfazer estas c o m o g ê n e r o , m a s c o m a
diferença d e serem r e p u t a d a s pelo valor q u e t i n h a m as oitavas n o t e m p o d o a r r e n -
d a m e n t o , e c o m a m e s m a i d e n t i d a d e se j u l g a n o c a s o d a q u e l e q u e v e n d e u o
cavalo p o r v i n t e oitavas de o u r o q u a n d o valiam a mil e q u i n h e n t o s c a d a u m a ,
obrigando-se o c o m p r a d o r a satisfazer trinta mil réis, e n ã o às vinte oitavas, p o r
h a v e r d i m i n u í d o o seu v a l o r . E s e n d o o e x p e n d i d o t ã o c e r t o c o m o d e direito
indubitável, n ã o p o d e duvidar-se q u e o m e s m o direito c o m p r e e n d e a o p r í n c i p e ,

Diz o contrário. 1

Escólio com letra de Caetanp da Costa Matosq.


608

q u e n ã o é d e deterior c o n d i ç ã o do vassalo, e q u a n d o o suplicante fosse c o m p e l i d o


a p a g a r o *quinto do seu o u r o teria r a z ã o , m a s n ã o t e m a l g u m a n a p r e t e n s ã o d e
q u e r e r afastar-se d a lei d e três d e d e z e m b r o de 1750, a qual, n o capítulo q u i n t o ,
[ fl. 317v. ] d e d u z i d o este d a o r d e m de treze d e m a r ç o d e 1720 anos, m a n d a / / q u e o o u r o se
r e c e b a n a R e a l F a z e n d a q u i n t a d o e q u e â m e s m a p a g u e q u i n t a d o , e finalmente o
c o b r a r S u a M a j e s t a d e o o u r o q u i n t a d o n ã o é novo tributo, antes c o n c o r r e p a r a o
alívio dos seus vassalos, p o r q u e esse m e s m o q u i n t o n ã o acresce e m utilidade d a
R e a l F a z e n d a , m a s sim õ cede e m favor e a u m e n t o das c e m *arrobas, e conse-
q ü e n t e m e n t e e m utilidade dos povos,
E isto m e s m o deve Sua Excelência m a n d a r p r a t i c a r c o m todos aqueles q u e
p o r q u a l q u e r título forem d e v e d o r e s à R e a l F a z e n d a , n ã o se r e c e b e n d o o u r o al-
g u m sem q u e seja q u i n t a d o , p o r forma q u e a malícia d e alguns q u e n ã o p a g a r a m
q u a n d o e r a m obrigados lhes n ã o resulte e m utilidade, o q u e assim a c o n t e c e r i a se
a R e a l F a z e n d a recebesse o u r o q u e n ã o fosse q u i n t a d o , e m r a z ã o d e q u e Pedro^
q u e devia à m e s m a R e a l F a z e n d a d u z e n t a s "oitavas d e "capitação d e seus escra-
vos, n ã o quis satisfazer e m t e m p o , c o m o era o b r i g a d o , sendo q u e n o m e s m o p r o -
d u z i a m as m e s m a s duzentas oitavas trezentos mil "réis, e n o presente t e m p o ficam
valendo duzentos e quarenta mil réis, o que tudo resultaria n ã o só e m grave prejuízo
d a Real F a z e n d a mas, sim, das cem arrobas q u e os povos são obrigados a contribuir
anualmente a Sua Majestade. E c o m o do referido p r o v é m d a n o irreparável aos vassalos
do m e s m o s e n h o r , p o r isso n ã o deve receber-se o o u r o c o m o g ê n e r o m a s , sim,
c o m a t e n ç ã o a o valor q u e tinha n o t e m p o d a c o n t r a ç ã o d a dívida.

F i n a l m e n t e , todos os devedores são obrigados a p a g a r a seus credores c o m o


o u r o , e este necessariamente h a v i a ser extraído dos minerais até o último de j u l h o
d o p r e s e n t e a n o , t e m p o e m q u e Sua M a j e s t a d e foi servido conferir t o d o o o u r o
livre a seus vassalos até o dito dia último d e j u l h o .
E q u e r e n d o os devedores p a g a r e m a seus credores c o m o dito o u r o , d e v e m
satisfazer-lhes p o r a q u e l e . m e s m o p r e ç o p o r q u e o r e c e b e r a m n a fundição e, q u a n -
do m e n o s , p e l o p r e ç o d e q u i n z e "tostões, e m q u e era r e p u t a d a c a d a oitava até o
[ fl. 318 ] p r e d i t o dia; / . / e q u e r e n d o os devedores satisfazerem c o m o u r o extraído do p r i -
m e i r o d e agosto e m d i a n t e , p r e c i s a m e n t e d e v e m p a g a r o q u i n t o , e d e direito se
d e v e à M a j e s t a d e in recognüione domínio^ m u i t o p r i n c i p a l m e n t e depois de abolida
a c a p i t a ç ã o p e l a lei d e três de. d e z e m b r o d e 1750, n a q u a l se d e t e r m i n a , p e l o
capítulo q u i n t o , q u e o o u r o deve correr segundo o seu "toque e q u e este n ã o p o d e
h a v e r sem q u e o o u r o esteja q u i n t a d o .
A vista das expendidas razões è outras q u e pela b r e v i d a d e se o m i t e m , somos
de p a r e c e r q u e ó Ilustríssimo e Excelentíssimo s e n h o r G o m e s Freire, d e A n d r a d e ,

No reconhecimento cio domíiiiq.


*governador e capitão-general desta capitania, deve m a n d a r sem d e m o r a q u e nas
*intendências se n ã o c o b r e o u r o q u e n ã o seja * q u i n t a d o e q u e o m e s m o obser-
v e m os "contratadores das "entradas e d e outros quaisquer "contratos, c o m decla-
r a ç ã o , p o r é m , q u e u n s e outros, assim contratadores c o m o "oficiais d e intendências,
r e c e b a m e m "dinheiro provincial ou e m b a r r a , qual as partes m a i s quiserem, p r a -
t i c a n d o - s e a m e s m a i g u a l d a d e n a P r o v e d o r i a d e Vila R i c a , p o r q u e deste m o d o
conseguirá o Ilustríssimo e Excelentíssimo S e n h o r o fruto q u e aspira o seu incansável
zelo, e m o r d e m a q u e as c e m "arrobas d e ouro q u e os povos p r o m e t e r a m a S u a
M a j e s t a d e d e se c o b r a r e m s e m a grave opressão d a " d e r r a m a , a o q u e nos persua-
d e m as astutas e vigilantes p r o v i d ê n c i a s q u e o m e s m o s e n h o r t e m i n t r o d u z i d o
p a r a q u e pelos sertões se n ã o extravie ouro a l g u m .
E sendo assim referido pelos ditos "ministros, m e m a n d o u o dito Ilustríssimo e
Excelentíssimo general G o m e s Freire d e A n d r a d e fizesse este t e r m o , q u e c o m S u a
Excelência assinaram, e eu, Manuel Francisco da Costa Barros, secretário interino, o
fiz. Tijuco, 20 de setembro de 1751. G o m e s Freire d e A n d r a d e . J o s é Pinto de Moraes
Bacelar. T o m á s R u b i m de Barros Barreto do R e g o . S a n c h o d e A n d r a d e Castro e
Lançoes. Félix d e Azevedo da Fonseca. N ã o se continha mais n a dita carta [e] cópia
do termo de "junta q u e aqui fiz registrar b e m e fielmente d a própria a q u e m e reporto
q u e a entreguei ao doutor "provedor. Vila Rica, 27 de setembro de 1751.^

> 75 «
[Carta de Gomes Freire de Andrade encaminhando cópia de carta
às câmaras em que se ordenava a nomeação de procuradores para
junta sobre a forma de pagamento do quinto nos registros e das
dívidas morosas da capitação]

C a r t a original autografa e n c a m i n h a n d o cópia d e carta


dirigida a todas as câmaras da capitania p a r a a nomeação de
procuradores para a j u n t a que discutiria a tributação do ouro
em pó nos registros e o pagamento das dívidas remanescentes d a
capitação em ouro quintado, conforme o estipulado n a lei de 3
de dezembro de 1750, a partir de agosto de 1751. Gomes Freire

Cópia interrompida no original.


610

enfatizava a derrama como inevitável caso os procuradores op-


tassem pelo ouro livre do quinto. A convocação decorria de re-
presentações das câmaras e as decisões foram anexadas à ação
do contratador das entradas, José Ferreira da Veiga, contra pa-
gamento dos contratos em ouro quintado. F o r m a processo com
os documentos 74, 76 e 77 e complementa os documentos 63-66.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso p ô d e coligir o original autógrafo, q u e informaria sua
participação nas juntas sobre o assunto.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Gomes Freire de Andrade; Vila
Rica; 9.11.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado d a C â m a r a de Vila Rica.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna bastarda do
século XVIII, imitativa d a monumental inglesa, de muita clare-
za na leitura. Apresente, ò " c " em módulo grande; o " p " com
perfil e haste em dois tempos, em forma de forquilha ou de u m só
t r a ç o , c o m o cajado; hastes d o " q " e m f o r m a de cajado ou
retilínea. Assinatura autografa. Registro com letra diferente da
do texto, cursiva usual redonda. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , C M O P 60, fl. 96v.-97v.
A H U , Cons. Ultram. , Brasil/MG, cx. 63, doe. 57

[ fl. 319 ]

v: "^"endo a r e p r e s e n t a ç ã o q u e Vossas M e r c ê s m e fizeram, m a n d e i avisar às


"câmaras desta capitania, expondo-lhe o q u e c o n t é m a cópia j u n t a . P a r a
o dia d e t e r m i n a d o , n o m e i e m Vossas M e r c ê s os " p r o c u r a d o r e s deste p o v o ,
c o m as circunstâncias e advertências q u e a m e s m a c ó p i a declara. D e u s g u a r d e a
Vossas M e r c ê s muitos anos. Vila R i c a a 9 de n o v e m b r o de 1 7 5 L

G o m e s Freire de A n d r a d e

S e n h o r e s "juízes e mais "oficiais d a C â m a r a


de Vila Rica

R e g i s t r a d o no livro do registro
à folha 9 6 , verso. Vila Rica.^

Atual APM, CMOP 60, fl.96v.


611

> 76 <
[Carta de Gomes Freire de Andrade em que ordenava a nomeação
de procuradores para junta sobre a forma de pagamento do quinto
nos registros e das dívidas morosas da capitação]

C a r t a dirigida a todas as c â m a r a s da c a p i t a n i a p a r a a
nomeação de procuradores para a j u n t a que discutiria a tributa-
ção do ouro em pó nos registros e o pagamento das dívidas re-
manescentes d a capitação em ouro quintado, conforme o estipu-
lado n a lei de 3 de dezembro de 1750, a partir de agosto de
1751. Gomes Freire enfatizava a derrama como inevitável caso
os procuradores optassem pelo ouro livre do quinto. A convoca-
ção decorria de representações das câmaras e as decisões foram
anexadas à ação do contratador das entradas, José Ferreira da
Veiga, contra pagamento dos contratos em ouro quintado. For-
m a processo com os documentos 74, 75 e 77 e complementa os
documentos 63-66.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso pôde coligir o documento, que informaria sua participa-
ção nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Gomes Freire de Andrade; Vila
Rica; 23.10.1751.
D e s t i n a t á r i o : Senado da C â m a r a de Vila Rica.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á í i c o : Escrita moderna, caligrafada
e regularizada, típica do período barroco, com "f" duplicado e
simples, com voluta no traço horizontal., "d" redondo e uncial;
"s" caudado, simples e de u m só traço sinuoso. Maiúsculas enfei-
tadas por volutas e aspirais. Letra de copista, com anotação de
registro. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, C M O P 60, fí. 96v.-97v.
A H U , Gons. Ultram. , Brasil/MG, cx. 63, doe. 57

Cópia [fl. 3 2 0 ]

P o r o r d e m real d e S u a Majestade se p e r m i t i u aos m o r a d o r e s desta capitania


o m ê s d e j u l h o p a r a m e t e r e m nas casas d e fundição, livre de *quinto, o o u r o q u e
tivessem deste t e m p o q u e se c o b r o u p o r "capitação, n ã o s e n d o j u s t o s e g u n d a vez
612

pagasse "quinto o m e s m o o u r o . C o m este indulto, ficou fundido t o d o o q u e havia


e m esta c a p i t a n i a e "manifesto. O q u e se tira do dito dia e m diante é o b r i g a d o a o
p a g a m e n t o d a n o v a f o r m a de Cobrança p o r q u e os povos o são à i m p o r t â n c i a das
cem "arrobas.
C o n s i d e r a n d o o referido e q u e o o u r o e m p ó q u e os "contratos são obriga-
dos a trazer à P r o v e d o r i a e o q u e falta d e recolher-se pela "capitação virá a sair
s e m se h a v e r p a g o dele q u i n t o aos p o v o s , o q u e , infalível, fará crescer o lança-
m e n t o p a r a satisfação do q u e faltar no fim do a n o a o c o m p l e m e n t o das c e m a r r o b a s ,
p u s esta d ú v i d a e m "junta de "ministros, e foram d e p a r e c e r q u e o ser incontestá-
vel q u e de todo o o u r o tirado do último d e j u l h o até o u t r o tal dia p e r t e n ç a dele o
q u i n t o a o alívio dos p o v o s , e i n d o s e m ser q u i n t a d o seria m a i o r o l a n ç a m e n t o .
A s s e n t a r a m se devia nos "registros c o b r a r q u i n t a d o , e nas "intendências n a m e s -
m a f o r m a se devia receber a capitação, c o m declaração, p o r é m , q u e tirado o quin-
to, fosse logo p a r a as arcas d o n d e se recolhe t o d o o o u r o q u e n a s "casas d e fundi-
ç ã o p r o d u z a c o b r a n ç a . E p a r a q u e j u n t a s estas parcelas livrassem os p o v o s do
l a n ç a m e n t o , o u o fizesse t ã o d i m i n u t o q u e lhes evitasse a r u í n a , m a n d e i n a
P r o v e d o r i a assim se executasse e nas intendências assim se cobrasse a capitação.

T e n h o agora algumas representações que m e p õ e m no conhecimento de


q u e n ã o p a r e c e este m e i o mais p r ó p r i o , e se a p r o v a p o r m e l h o r p a s s a r o o u r o dos
c o n t r a t o s sem se r e c e b e r dele o quinto, e o p a g a m e n t o d o resto d a c a p i t a ç ã o d a
m e s m a f o r m a p o s t o ao depois (como b e m r e c o n h e c e m ) v e n h a a ser m u i t o m a i o r o
l a n ç a m e n t o q u e se fizer aos m o r a d o r e s desta capitania.
As reais intenções d e S u a Majestade e o m e u desejo é q u e os m e s m o s p o -
[ fl. 320v. ] y o s , p o r seus / / " p r o c u r a d o r e s , e s c o l h a m dos dois m e i o s o q u e lhes for m a i s
c o n v e n i e n t e e, p a r a q u e se possa e x e c u t a r assim o aviso a Vossas M e r c ê s , q u e
c o n s i d e r a n d o esta m a t é r i a c o m o tão i m p o r t a n t e , e l e j a m dois p r o c u r a d o r e s , os
quais, instruídos do q u e e n t e n d e r e m m a i s j u s t o sobre as ditas formas de c o b r a n ç a ,
v e n h a m a esta vila, o r d e n a n d o - l h e s Vossas M e r c ê s estejam nela dia dezessete d e
n o v e m b r o , p a r a que, j u n t o s c o m os p r o c u r a d o r e s das mais vilas, d e c l a r e m o q u e
fescolhereml m a i s conveniente aos povos e a o b e m d a c o b r a n ç a das c e m arrobas.
E s p e r o q u e Vossas M e r c ê s n o m e i e m pessoas tão capazes q u e , p o n d e r a n d o
t u d o , resolvam o m e l h o r . D e u s g u a r d e a Vossas M e r c ê s . Vila R i c a a 2 3 d e outu-
bro de 1751.

R e g i s t r a d a no livro de registro à folha 96


e folha 9 7 , verso. Vila R i c a . l

1
• Atual APM, CMOP 60, fl.96v.-97v.
- 77 «

[Termo de junta que se fez no palácio deste governo por ordem do


Ilustríssimo e Excelentíssimo senhor Gomes Freire de Andrade
sobre ser mais cômodo e conveniente pagar-se em ouro quintado
nos registros e dívidas morosas da capitação ou satisfazerem os
povos pela cota o que faltar ao complemento das cem arrobas]

Assento de j u n t a sobre a tributação do ouro e m p ó nos


registros e o pagamento das dívidas remanescentes da capitação
em ouro quintado, conforme o estipulado na lei de 3 de dezem-
bro de 1750, a partir de julho de 1751. Referenda a posição do
governador Gomes Freire de Andrade no tocante à tributação
nos registros e contesta-o ao decidir-se pelo pagamento das dívi-
das remanescentes da capitação e m ouro sem quintar. A convo-
cação da j u n t a decorria de representações das c â m a r a s , e as
decisões foram anexadas à ação do contratador das entradas,
José Ferreira da Veiga, contra pagamento dos contratos em ouro
q u i n t a d o . F o r m a p r o c e s s o c o m os d o c u m e n t o s 7 4 - 7 6 e
complementa os documentos 63-66.
Pela posição que ocupava, o ouvidor C a e t a n o d a Gosta
Matoso pôde coligir o documento, que informaria sua participa-
ção nas juntas sobre o assunto.
Autoria, l o c a l e data: Gomes Freire de Andrade e procu-
radores dp povo; Vila Rica; 26.11.1751.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento aplica as tópicas
hf,C da ilegalidade, da injustiça e do prejuízo para argumentar con-
tra a isenção de pagamento do preço da arrematação de contra-
tos com o quinto, conforme solicitado por u m contratador. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , bastante
caligrafada e regularizada, típica do período barroco. Apresenta
vários tipos de "d": uhcial, com haste simples ou acoplada à letra
seguinte, no caso do " e " , sobretudo; "a" e " o " redondos e bem
definidos; " q " com haste em forma de cajado, " h " em forma de
" E " r e d o n d o . L e t r a d e copista, com a n o t a ç ã o e a s s i n a t u r a
autografa do secretário de governo. Letra idêntica à do docu-
mento 76. Segue-se anotação d e registro, com u m a terceira le-
tra, também regularizada e cursiva do período barroco. (YDL)
Cópias manuscritas:
APM, C M O P 60, fl. 97v.-99v.
A H U , Cons. Ultram,, Brasil/MG, cx. 63, doe, 57.
614

[fl. 3 2 1 ] Cópia

T e r m o d e *junta q u e se fez no palácio deste governo p o r o r d e m


do Ilustríssimo e Excelentíssimo s e n h o r G o m e s F r e i r e d e A n d r a d e ,
"governador e capitão-general desta e da capitania d o R i o d e J a n e i r o ,
c h a m a n d o os povos p a r a , p o r seus "procuradores, declararem se lhes é
m a i s c ô m o d o e conveniente pagar-se e m o u r o " q u i n t a d o nos "regis-
tros e dívidas m o r o s a s d a "capitação ou satisfazerem os p o v o s p e l a
cota o q u e faltar a o c o m p l e m e n t o das cem "arrobas, cuja determina-
ção d a j u n t a d u r a r i a até rea! resolução d e Sua Majestade, c o m o ao
diante se declara.

A o s dezoito dias do m ê s d e n o v e m b r o d e mil setecentos e c i n q ü e n t a e u m


se a c h a r a m presentes os p r o c u r a d o r e s d a C i d a d e M a r i a n a , o d o u t o r M a n u e l Brás
Ferreira e o "capitão A n t ô n i o Alvares Castro; os d e Vila R i c a , o "coronel M a n u e l
F e r r e i r a Agrelos e o d o u t o r J o s é Félix d a C o s t a ; os d e Vila R e a l d o S a b a r á , o
coronel Faustino Pereira d a Silva e o capitão Luís J o s é Souto; os d a vila d e São
J o ã o del-Rei, o d o u t o r A n t ô n i o J o s é de M e l o e o coronel C o n s t a n t i n o Alvares d e
Azevedo; os d e Vila N o v a d a R a i n h a , o capitão Paulo C a r n e i r o Vilar, J o ã o A n t ô -
nio P e r e i r a e o "sargento-mor Atanásio A n t ô n i o Pereira; os d a vila d e S ã o J o s é , o
"tenente-coronel C o n s t a n t i n o Alvares de Azevedo e o c a p i t ã o - m o r P e d r o T e i x e i r a
d e C a r v a l h o ; os da Vila d o Príncipe, o d o u t o r J o ã o T a v a r e s do A m a r a l e o d o u t o r
J o s é Félix d a C o s t a ; e os d a vila d e N o s s a S e n h o r a d a P i e d a d e d e P i t a n g u i , o
s a r g e n t o - m o r Francisco de Sousa P o n t e s e o capitão Miguel d e F a r i a M o r a t o , aos
quais, depois d e a p r e s e n t a r e m suas p r o c u r a ç õ e s pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo
s e n h o r g o v e r n a d o r e capitão-general, lhes foi dito que:

S e n d o S u a Majestade servido m a n d a r - l h e (à instância dos povos desta capi-


tania) abolisse e cassasse o m é t o d o d a c o b r a n ç a d o q u i n t o p o r c a p i t a ç ã o e se
seguisse a o d i a n t e a atual de "casas de fundição, p a r a ficar b e m c o n h e c i d o e sepa-
r a d o t o d o o o u r o q u e havia p a g o capitação e n ã o p a g a r s e g u n d a vez o q u i n t o , lhe
d e t e r m i n o u desse t e m p o p a r a se fundir sem tirar mais q u e a despesa dos materiais,
c o m o se p r a t i c o u n o mês de j u l h o deste presente a n o .
Incontestável é, depois de findo o dito mês, todo o ouro q u e ,sai d a terra nesta
c a p i t a n i a está o b r i g a d o a m e t e r - s e nas fundições p a r a ser q u i n t a d o , a beneficio
dos povos n o p a g a m e n t o das c e m arrobas estipuladas n a j u n t a d e mil setecentos e
trinta e q u a t r o anos e pela n o v a lei d e d e z e m b r o d e mil setecentos e c i n q ü e n t a .
As reais ordens de Sua Majestade e o desejo q u e s e m p r e t e m d e c u m p r i r sua
obrigação e m utilidade do público, e e m cumprimento do q u e o dito senhor tanto lhe
[ fl. 32 lv. ] / / recomenda no dar forma a e m b a r a ç a r a extração do ouro sem ser quintado, unido
ao requerimento d o "contratador das "entradas, q u e novamente deu princípio a seu
"contrato,, lhe fez ver que saindo no "registro algum ouro sem p a g a r quinto vinha e m
615

d a n o dos povos, sendo mais gravados n o lançamento d a "derrama saísse p o r "quintar


o ouro que esteve retido e m "mora dos q u e haviam faltado ao p a g a m e n t o da sua R e a l
Fazenda, n a qual era preciso se cobrasse n a forma q u e os mais credores têm hoje d e
cobrar suas dívidas.
C o n s i d e r a n d o todo o referido e a precisão d e deferir ao r e q u e r i m e n t o d o dito
"contratador, c h a m o u a "junta os q u a t r o "ministros q u e estavam e m o arraial d o
Tijuco, os quais, conformes, sentaram q u e a ser inquestionável q u e o ouro q u e d o
p r i m e i r o d e agosto e m d i a n t e se tirasse nesta capitania era d e v e d o r d o q u i n t o , e
sendo levado sem o p a g a r , infalível, viria a carregar a d e r r a m a nos povos; e q u e n a
dívida d a "capitação p a g a e m ouro e m p ó se seguia o m e s m o inconveniente; deste
r e p a r o e do q u e a m o r a havia constituído os devedores d a Real F a z e n d a e m obriga-
ção de p a g a r quintado, e r a m d e p a r e c e r q u e os arrendatários cobrassem q u i n t a d o e
p a g a s s e m q u i n t a d o ; e n a m e s m a f o r m a se cobrasse o q u e r e s t a v a a dever-se d e
capitação, declarando, p o r é m , q u e tanto o quinto do o u r o do p a g a m e n t o dos con-
tratos c o m o do resto d a capitação devia ficar nos cofres d a "fundição a beneficio dos
povos n o p a g a m e n t o das c e m "arrobas.
Esta d e t e r m i n a ç ã o , m a n d a d a praticar, foi recebida c o m diferentes sentimen-
tos, p o r q u e as " c â m a r a s d a C i d a d e M a r i a n a e desta vila lhe r e p r e s e n t a r a m p a r e -
cer-lhes i m p r ó p r i a ; p o r vários papéis q u e lhe e x p u s e r a m alguns "ministros, o " p r o -
c u r a d o r d a F a z e n d a e c o n t r a t a d o r , u n s q u e r e n d o m o s t r a r seria m e l h o r o lançar-se
aos povos n o fim d o a n o , p o r d e r r a m a , t u d o o q u e faltasse a o c o m p l e m e n t o d a
cota, outros p r o t e s t a n d o a observância d e suas condições e os d a R e a l F a z e n d a o
d a n o q u e ela v i n h a a p a d e c e r n ã o sendo a c o b r a n ç a d a dívida q u e está e m m o r a
e m o u r o q u i n t a d o . O resolveu fazer ciente a todas as c â m a r a s desta c a p i t a n i a p a r a
que, p o n d e r a d a tão i m p o r t a n t e m a t é r i a , m a n d a s s e m seus p r o c u r a d o r e s a esta j u n -
ta e nela d e c l a r e m o q u e e n t e n d e m mais conveniente n a f o r m a d e c o b r a r o u n ã o
quintado.
Vossas Mercês, c o m o p r o c u r a d o r e s pelos mesmos povos n o m e a d o s , terão b e m
e x a m i n a d o o q u e p o r u m a e outra p a r t e se toca, c o m c ô m o d o ou i n c ô m o d o , v e n d o
q u e h á partes interessadas q u e protestam, pois, t o m a n d o - s e a d e t e r m i n a ç ã o d e nos
"registros e n o resto d a capitação se n ã o cobrar e m ouro quintado, protesta o p r o c u -
r a d o r d a F a z e n d a pela c o b r a n ç a daquelas dívidas que estiverem e m m o r a à m e s m a
Fazenda.
E que posto nos registros em que se entra a cobrar n ã o haja esta, é conhecida a
m o r a dos q u e t ê m faltado ao p a g a m e n t o da capitação, a qual c o b r a d a sem ser o ouro
quintado / / se falta à forma e m que qualquer credor hoje está praticando, pois recebe [ fl. 322 ]
do seu devedor a "oitava de o u r o a mil e duzentos "réis, e seria coisa d u r a ficar o
príncipe de pior condição q u e seus vassalos, devendo ao menos fazer-se a c o b r a n ç a
das dívidas de sua R e a l F a z e n d a c o m o as dos m a i s credores, e q u e caso n a j u n t a
presente assim se determinasse poderia só ter efeito ficando reservado à real aprova-
ção d e Sua Majestade.
616

E p o r q u a n t o n o t e m p o q u e m e d e i a a s e r e m os d e v e d o r e s cientes d a r e a l
d e t e r m i n a ç ã o p o d e r á a l g u m h a v e r se a u s e n t a d o e levado seus escravos s e m h a v e r
satisfeito n ã o o *quinto q u e devia d a "capitação, p o r q u e a este n ã o são obrigados
os povos, m a s sim o d a " m o r a , n a d e m o r a de sua c o b r a n ç a se deve t o m a r seguran-
ça p o r u m t e r m o q u e declare caso S u a Majestade m a n d e receber q u i n t a d o , o n d e
se h á d e p e r c e b e r o q u e os ausentes deviam ter p a g o pela dita m o r a .
E resolvendo a *junta ser mais conveniente o observar-se a resolução t o m a d a
n a feita e m Tijuco, protesta o "provedor e " p r o c u r a d o r d a F a z e n d a , p o r seguran-
ça a o prejuízo sobreveniente aos "contratos e seus futuros a r r e n d a m e n t o s .
Vossas M e r c ê s t e r ã o b e m p o n d e r a d o , e p o n d e r e m o referido d e c l a r a n d o dos
dois m e i o s o q u e p o r m e l h o r escolhem p a r a se executar até real d e t e r m i n a ç ã o de
S u a Majestade, a q u e m fica reservado m a n d a r o q u e for servido, satisfazendo-se,
e n t r e t a n t o , às representações d a Provedoria d a R e a l F a z e n d a .
E ouvidos pelos ditos p r o c u r a d o r e s e b e m e x a m i n a d o t u d o , d e c l a r a r a m reco-
n h e c i a m q u e o o u r o tirado d o p r i m e i r o d e agosto e m diante n ã o devia sair dos
"registros s e m h a v e r p a g o o q u i n t o , pois os povos desta capitania, pelo t r a t o feito
e m a j u n t a d e vinte de m a r ç o de mil setecentos e trinta e q u a t r o , c o n t r a t a r a m o
p a g a m e n t o d o dito q u i n t o e m o n ú m e r o d e c e m " a r r o b a s d e o u r o aos p o v o s , e
c o n s e q ü e n t e m e n t e a eles está o b r i g a d o todo o o u r o q u e da t e r r a se extraísse, d p
p r i m e i r o d e agosto deste p r e s e n t e a n o a t é o último d e j u l h o d e m i l setecentos e
c i n q ü e n t a e dois.
E q u e p o n d e r a d o p o r seus constituintes, p o r u m a e o u t r a p a r t e , q u e o expos-
to p o r S u a Excelência haver j á feito ciente às "câmaras nas cartas e m q u e c h a m o u
a esta j u n t a , f o r a m d e parecer, todos u n i f o r m e m e n t e , que se n ã o cobrasse o resto
d a c a p i t a ç ã o q u e se a c h a v a d e v e n d o c o m o u r o q u i n t a d o , e se h o u v e s s e a l g u m
d e v e d o r q u e se ausentasse o u n ã o estivesse n o dia d e hoje falido, a o t e m p o q u e
S u a M a j e s t a d e for servido d a r sua real d e t e r m i n a ç ã o das pessoas q u e hoje s ã o
existentes nas M i n a s , a q u e faltar ao dito t e m p o o u estiver nela falido, ficam os
povos, seus constituintes, obrigados a ressarcir a p e r d a causada p o r se n ã o h a v e r
p e r c e b i d o a m o r a d o quinto das capitações, rateando-se e m c a d a vila pelos m o r a -
dores existentes. E d e c o m o assim o disseram, fez este t e r m o , e m q u e todos assina-
r a m c o m o Ilustríssimo e Excelentíssimo s e n h o r g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e r a l .
Vila Rica, dia e e r a citado supra.
[ fl. 322v. ] E outrossim mais disseram q u e pelo q u e toca a o s contratos q u e tiveram prin-
cípio d o d i a p r i m e i r o d e agosto d o p r e s e n t e a n o se cobrasse n a f o r m a d e suas
remataçõeSj e d e c o m o assim o disseram, assinaram. J o s é C a r d o s o Peleja, secretá-
rio do governo, o fiz escrever, G o m e s Freire de A n d r a d e . M a n u e l Brás Ferreira.
A n t ô n i o Álvares C a s t r o . J o s é Félix d a Costa. M a n u e l Ferreira Agrelos. F a u s t i n o
Pereira d a Silva. Luís J o s é S o u t o . A n t ô n i o J o s é d e M e l o . C o n s t a n t i n o Alvares de
A z e v e d o . P a u l o C a r n e i r o Vilar. J o ã o A n t ô n i o Pereira. P e d r o T e i x e i r a d e C a r v a -
l h o . C o n s t a n t i n o Álvares de A z e v e d o , J o ã o T a v a r e s d o A m a r a l . J o s é Félix d a
617

Costa. Francisco de Sousa Pontes. M i g u e l de F a r i a M o r a t o . O secretário de gover-


n o o fez copiar e assinou.

J o s é C a r d o s o Peleja

R e g i s t r a d o n o livro q u e serve d e
registro n o S e n a d o à folha 9 7 , verso, até
folha 9 9 , verso. V ü a R i c a , 26
d e n o v e m b r o d e 1751.*

> 78 <

Relação dos contratos e rendas que Sua Majestade tem nesta [fl.325 ]
capitania das Minas, sua origem, criação, aplicação e
consignação na forma da sua real ordem

Este documento historia todos os contratos existentes em


Minas Gerais, oferecendo dados sobre criação, ramos,
arrematação, extinção, alíquotas e consignação de verbas a par-
tir do governo de Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho
até 1739. O ouvidor Caetano da Costa Matoso acrescentou-lhe
dados sobre o contrato dos dízimos até o ano de 1752.
A vigilância que exercia junto às finanças d a comarca e a
preocupação em informar ao soberano sobre as receitas ultra-
marinas esclaressem o interesse nesta peça documental. Figura
juntq à série de papéis sobre contratos com informações varia-
das que instruiriam Caetano da Costa Matoso na preparação de
parecer sobre rendimentos dos contratos, missão que recebera
antes de partir de Portugal para Minas Gerais.
A u t o r i a , l o c a l e data: Provedoria d a Real Fazenda de
Minas Gerais; Vila Rica; ca. 1740.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva do
período barroco, pouco regularizada. Apresenta raros " s "

1 Atual APM, CMOP 60, fl.97v.-99v.


618

caudados; n a maioria são pendentes, abaixo da linha da escrita,


como virgulas; o "d" uncial alterna com o de formato bastardo,
o "f' minúsculo com perfil e haste alongada, com traço horizon-
tal e m laçada, m a s terminando em ângulo; o "y", usado como
semivogal, tem a haste inferior bifurcada; o "lh" tem o aspecto
de ligatura comum da época; o "1" com perfil e retilíneo, acoplado
a o " h " redondo (igual ao "E"). Último parágrafo com letra mais
cursiva, de Costa Matoso. (YDL)
Cópia manuscrita:
APM, C C 2015, íl. 9-IOv.
Cópia impressa:
B O X E R , C. R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento
de u m a sociedade colonial. 2- ed. São Paulo: Nacional, 1969.
p. 356-358,

" C o n t r a t o dos c a m i n h o s reais das e n t r a d a s

T e v e princípio este c o n t r a t o (que se divide e m dois r a m o s , a saber; do C a m i -


n h o N o v o e V e l h o do R i o d e J a n e i r o e São P a u l o e o u t r o d o c a m i n h o do sertão
}

d a B a h i a e P e r n a m b u c o ) e m virtude d e u m a "junta q u e , e m dezessete de j u l h o de


mil setecentos e dez, fizeram os povos de São Paulo e M i n a s , p o r o r d e m do *go-
v e r n a d o r e capitão-general A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e d e C a r v a l h o , sobre o m e i o
c o m q u e se devia estabelecer e a u m e n t a r a R e a l F a z e n d a p a r a assistência dos
o r d e n a d o s , soldos e mais despesas do governo, "ministros e "cabos de g u e r r a q u e
se erigiam, e m v i r t u d e de u m a c a r t a d e S u a M a j e s t a d e , c o m q u e se c o n c o r d o u
pôr-se e m cada carga de "fazenda seca que entrasse p a r a estas M i n a s quatro "oitavas,
nas d e "molhados duas, os escravos quatro, os mulatos seis, e m c a d a cabeça de g a d o
v a c u m u m a , de q u e dando-se conta a Sua Majestade, foi servido, p o r "carta de vinte
e quatro de julho de mil setecentos e onze, admitir somente a imposição m o d e r a d a
nos gados, e tornando o m e s m o senhor, e m abril de mil setecentos e treze, a m a n d a r
ouvir os mesmos povos, se veio depois a diminuir a dita contribuição a o estado e m
que ainda hoje se acha de p a g a r e m os escravos duas oitavas, os cavalos e mulas sem
sela duas oitavas, o gado v a c u m u m a oitava, as cargas de fazenda seca, c a d a duas
"arrobas, u m a oitava e meia e de m o l h a d o , c a d a carga, meia oitava.

D e s t a contribuição se a j u d a r a m os m o r a d o r e s das Minas p a r a perfazerem as


trinta arrobas d e ouro q u e p a g a v a m a Sua Majestade do real "quinto. [Em] n o v e m -
b r o d e mil setecentos e dezenove^ e m que pelo c o n d e de Assumar, d o m P e d r o d e
Almeida, se m a n d a r a m erigir as "casas d e fundição nestas M i n a s , separarem-se e
cobrarem-se pela R e a l F a z e n d a os ditos direitos dos caminhos dos referidos gêneros
e pela forma sobredita, e p o r q u e nesta Provedoria se n ã o a c h a m o termo de j u n t a ,
619

*carta de S u a Majestade e ordens sobreditas (e d e fora se h o u v e r a m estas clarezas) se


n ã o r e m e t e m as cópias.
O p r o d u t o deste " c o n t r a t o dos c a m i n h o s n ã o t e m / / c o n s i g n a ç ã o a l g u m a , [ íl. 325v. ]
pois suposto a sua criação fosse, c o m o a c i m a se vê, p a r a p a g a m e n t o dos soldos,
o r d e n a d o s e mais despesas, se passou este p a g a m e n t o p a r a o r e n d i m e n t o dos mais
c o n t r a t o s e se r e m e t e t o d o o deste a el-rei, nosso senhor, pelo C o n s e l h o U l t r a m a -
r i n o , exceto a l g u m a n o e m q u e o p r o d u t o dos mais contratos n ã o c h e g a p a r a as
despesas q u e a R e a l F a z e n d a c o s t u m a fazer, p o r q u e e n t ã o se e n t r a t a m b é m p e l o
r e n d i m e n t o d o dito c o n t r a t o , * ex-vi do capítulo 4 4 do "regimento dos " p r o v e d o -
res e " c o n t a d o r e s das M i n a s , n ú m e r o 1, e se a c h a à folha 6 9 , v e r s o , d o livro
p r i m e i r o d o registro.

C o n t r a t o dos dízimos reais

Divide-se este e m três r a m o s , a saber: d a c o m a r c a de Vila R i c a u m , da c o m a r c a


do R i o das M o r t e s o u t r o , e o terceiro das c o m a r c a s d o S a b a r á e S e r r o do F r i o .
T r a z e m sua origem dos do R i o d e J a n e i r o e t i v e r a m princípio nestas M i n a s e m
fevereiro de mil setecentos e quinze, e m v i r t u d e de u m t e r m o assinado pelo "go-
v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e r a l q u e foi destas M i n a s , d o m Brás Baltasar d a Silveira,
q u e se refere a u m a carta q u e ficou e m b r a n c o , c o m o se vê d a c ó p i a dela, q u e é
n u m e r o s e g u n d o e se a c h a à folha q u a t r o do livro p r i m e i r o das r e m a t a ç õ e s .
C o m o r e n d i m e n t o deste c o n t r a t o dos dízimos reais se satisfazem os soldos
d o g o v e r n a d o r e "tropas de dragões, e o r d e n a d o s e "côngruas dos "ministros d e
J u s t i ç a , p r o v e d o r e "oficiais d a F a z e n d a , dos vigários e mais despesas q u e p e l a
m e s m a F a z e n d a se m a n d a m fazer. P o r é m , n ã o c o n s t a d a o r d e m p o r q u e S u a
M a j e s t a d e foi servido m a n d a r fazer esta a p l i c a ç ã o , m a s se p e r c e b e p e l a j u n t a e
o r d e m p o r q u e se criou o contrato dos c a m i n h o s reais, c o m o atrás se refere.

C o n t r a t o das passagens do rio das M o r t e s

T e v e seu princípio n o a n o de mil setecentos e q u a t o r z e , e m v i r t u d e d e u m a


o r d e m real d e vinte e n o v e d e abril d e mil setecentos e o n z e , m a n d a d a a o gover-
n a d o r e capitão-general A n t ô n i o de A l b u q u e r q u e , e m q u e se lhe o r d e n a v a desse
t o d a ajuda e favor p a r a se p o r e m e m r e m a t a ç ã o as "passagens dos rios q u e v ê m
p a r a as M i n a s , a q u a l se n ã o e n c o n t r a nesta Provedoria n e m o u t r a alguma, e se
e n t e n d e seria p o r o r d e m do g o v e r n a d o r , assim c o m o agora se m a n d a m r e m a t a r
a l g u m a s passagens d e rios p o r se e n t e n d e r p o d e r ã o r e n d e r a l g u m a coisa p a r a a
R e a l F a z e n d a , e d a dita p a s s a g e m se c o s t u m a p a g a r a oitenta "réis e m d i n h e i r o
p o r c a d a pessoa e c e n t o e sessenta réis / / p o r cavalo q u e passa, c o m o c o n s t a d a [ íl. 326 ]
c o n d i ç ã o n ú m e r o três, livro das r e m a t a ç õ e s , folha 9 5 , verso.
T a m b é m o r e n d i m e n t o deste c o n t r a t o se aplica p a r a t o d a s as despesas d a
R e a l F a z e n d a , d a m e s m a f o r m a q u e o dos "dízimos reais, sem mais clareza.
620

*Contrato da p a s s a g e m do rio G r a n d e

T e v e princípio este c o n t r a t o n o a n o d e mil setecentos e q u a t o r z e , e se costu-


m a p a g a r q u a t r o V i n t é n s d e p r a t a c a d a pessoa, e p o r c a d a cavalo c o m c a r g a ou
s e m ela *meia p a t a c a d e p r a t a , e p o r c a d a c a r g a d e c a r r e g a ç ã o * d o b r a d e dois
vinténs d e p r a t a , e p o r c a d a boi m e i a p a t a c a , n a forma d a c o n d i ç ã o n ú m e r o q u a -
t r o , dito livro, folha 148.
T a m b é m t e m o seu r e n d i m e n t o a m e s m a aplicação.

Contrato da passagem do rio P a r a o p e b a

Este c o n t r a t o teve seu princípio e m o a n o de mil setecentos e vinte e q u a t r o e


c o s t u m a p a g a r c a d a pessoa q u e nele passa q u a t r o vinténs d e o u r o ou m e i a p a t a c a
d e p r a t a , e c a d a cavalo m e i a p a t a c a d e o u r o ou u m a " p a t a c a e m p r a t a , e c a d a
c a r g a q u a t r o vinténs de o u r o , c o m o m o s t r a a c o n d i ç ã o n ú m e r o cinco, dito livro,
folha 102, verso, e t e m o seu r e n d i m e n t o a m e s m a aplicação q u e os sobreditos.

C o n t r a t o das passagens d o rio das V e l h a s


chamadas Santo Hipólito, Piedade e Bicudo

T e v e s u a o r i g e m este c o n t r a t o n o a n õ d e mil setecentos e v i n t e e cinco, e


c o s t u m a p a g a r q u a l q u e r pessoa q u a t r o vinténs d e p r a t a , e seis vinténs c a d a cavalo,
e c a d a c a r g a d e p r e t o vinte *réis, e d e cavalo dois v i n t é n s , c o m o se vê d a s u a
c o n d i ç ã o n ú m e r o seis n o dito livro, folha 126.

Contrato da passagem de Baependi

T e v e princípio este contrato e m m ü setecentos e dezesseis, e n ã o teve subsis-


tência a l g u m a m a i s q u e o p r i m e i r o a n o , p o r n ã o c o n c o r r e r m a i s gente p e l a tal
passagem.

C o n t r a t o d a p a s s a g e m do rio J e q u i t i n h o n h a

T e v e seu princípio e m mil setecentos e vinte e cinco, e t a m b é m n ã o conti-


n u o u pela mesma razão.

[ fl. 326v. ] C o n t r a t o das passagens do rio de São Francisco

T e v e princípio e m vinte e nove d e setembro de mil setecentos e trinta e oito, de


q u e foi r e m a t a n t e Inácio Fagundes e outros ditos a Inácio d a C o s t a Neves, e m dito
dia.
621

"Contrato das passagens do rio Verde,


comarca do R i o das Mortes

T e v e princípio e m vinte d e abril d e mil setecentos e trinta e n o v e , r e m a t a d o


p o r três anos a M a n u e l de Sousa Vieira, e c o s t u m a p a g a r oitenta *réis d e p r a t a p o r
pessoa, e c e n t o e sessenta p o r cavalo, c o n d i ç ã o n ú m e r o [incompleto], folha 167.

O s c o n t r a t o s dos dízimos, desde a sua criação a t é o a n o d e 1728, a n d a r a m


s e m p r e s e p a r a d o s e sendo r e m a t a d o s c a d a u m *per se. N o p r i m e i r o d e agosto d e
1728 se r e m a t a r a m j u n t o s p o r três a n o s , q u e f i n d a r a m n o ú l t i m o d e j u l h o d e
1731. N o p r i m e i r o d e agosto de 1731 se t o r n a r a m a r e m a t a r pelo dito t e m p o , q u e
findou n o ú l t i m o d e j u l h o d e 1 7 3 4 . N o s a n o s d e 1734 até 1737 se t o r n a r a m a
r e m a t a r c a d a u m per se. N o a n o de 1738 se r e m a t o u p o r c o n t a d e el-rei, d e q u e foi
" a d m i n i s t r a d o r J o ã o F e r n a n d e s d e Oliveira, e d o a n o de 1739 a t é o a n o d e 1 7 5 2 ,
sempre têm ido unidos sem separação a l g u m a J

> 79 «

Rematações que se f i z e r a m no [ fL 327 ]


Conselho Ultramarino no ano de 1749

Relação dos vários contratos reais da América portuguesa


para o triénio 1749-1752, seguidos dos respectivos preços a se-
rem pagos pelos contratadores.
A vigilância que exercia junto às finanças da comarca e a
preocupação em informar ao soberano sobre as receitas ultra-
marinas esclarecem o interesse nesta peça documental. Figura
junto à série de papéis sobre contratos com informações varia-
das que instruiriam Caetano d a Costa Matoso n a preparação de
parecer sobre rendimentos dos contratos, missão que recebera
antes de partir de Portugal para Minas Gerais.
Autoria, local, data: Conselho Ultramarino; Lisboa; c a 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, regulariza-
da e caligrafada. A tonicidade de vogais é marcada com circun-
flexo ou acento agudo. As maiúsculas se destacam por volutas e
ductus marcado. O s números arábicos estão dotados de perfil e
apresentam traços horizontais arqueados. Uso do caldeirão. (YDL)

Neste parágrafo, letra de Caetano da Costa Matoso.


R e m a t a ç õ e s q u e se f i z e r a m n o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o n o a n o d e 1 7 4 9
"Arrobas 'Libras Arrobas Libras 'Oitavas 'Cruzados •Réis Réis

'Dízimos de Pernambuco 4713000 5Ü000 56:415Ü000


Itamaracá 26T50Ü0 30013000 32:10013000
Bahia 12515000 3OOÜ0OO 150:09015000
Santos e São Paulo 1915000 15015000 22:845T3000
Santa Catarina e Rio Grande 3:20015000 9:60013000
Ouro Preto 6 18 "1
Serro do Frio e Sabará. 5 8 15 % 271:87213000
Rio das Mortes 3 16 10 Vi J
Goiás 14215000 56:80013000
Piauí 5015000 20:800UOOO
*Passagens de Goiás 131 18Ü500
Rio Grande 1:25015000 3:61515000
Rio de São Francisco e suas anexas 1:50513000 4:51513000
Paraíba e Paraibuna 2915000 34:80013000
Rio das Mortes 14Ü000 10515000 17:11513000
'Dízimas da Relação, digo, da Chancelaria da
Relação da Bahia 1:62013000 4:860Ü000
Direitos dos 3.500 réis que pagam os escravos
em Pernambuco 1:20015000 3:600X3000
Dos 1.000 réis 50015000 1:50013000
Dos que vão de portos de mar para as Minas 37:050ü000 111:15015000
•Subsidio grande dos vinhos do Rio de Janeiro 4:100UOOO 12:30013000
Pequeno 2:70013000 8:10013000
•Aguardente do Reino 5:00015000 15:00013000
^Jeribitas 6:20015000 18:60013000
Azeite 2:80515000 8:41513000
Bebidas em Pernambuco 2:370U000 7:11013000
Açúcar no mesmo 1615000 6:40013000
Açúcar e tabaco de Itamaracá 2:010Ü000 6:03013000
"Entradas 117 1 718:84815000
623

• 80 «
*Propinas dos "contratos das entradas [ fl. 328 ]

Lista de ministros, autoridades e funcionários em Portugal e


em Minas com as respectivas quantias percebidas a título de p r o -
pinas por ocasião da arrematação do contrato do direito das en-
tradas em Minas Gerais.
A vigilância q u e exercia junto às finanças da comarca e a
preocupação em informar ao soberano sobre as receitas ultrama-
rinas esclarecem o interesse nesta peça documental. Figura j u n t o
à série de papéis sobre contratos com informações variadas que
instruiriam Caetano da Costa Matoso n a preparação de parecer
sobre rendimentos dos contratos, missão que recebera antes de
partir de Portugal para Minas Gerais.
Autoria, local, data: Provedoria da Fazenda Real de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, cursiva do
século XVIII. Com maiúsculas de volutas amplas; o ditongo nasal
" ã o " é feito em laçada dupla, produzindo ligatura em forma de
" C " com volutas. Números arábicos com apex , para o " 8 " e o
" 5 " . (YDL)

A o s e n h o r "general 1.2 0 0 "oitavas


Ao doutor "provedor... 800 oitavas
Ao doutor "procurador da Coroa e Fazenda 2 0 0 oitavas
A o *escrivão d a F a z e n d a 2 0 0 oitavas
A o "tesoureiro , 2 0 0 oitavas
A o seu "ajudante * 1 0 0 oitavas
A o "porteiro e " g u a r d a - l i v r o s . , 5 0 oitavas
Ao meirinho 5 0 oitavas
A o seu escrivão 5 0 oitavas
> 81 «

[Propinas do contrato dos dízimos]

Relações com valores correspondentes às propinas que one-


ravam a arrematação do contrato dos dízimos em Minas Gerais
para o triénio 1751-1754..Apresenta na primeira parte os valores
relativos a estas despesas c o n f o r m e as c o m a r c a s m i n e i r a s ,
totalizandò-se a soma final. N a segunda parte discrimina as quan-
tias gastas com ministros em Portugal e autoridades na capitania,
com a totalização destes gastos. Gaetano da Costa Matoso indica
em texto de encerramento as despesas específicas das propinas
que cabiam ao Gonselho Ultramarino.
A vigilância que exercia j u n t o às finanças da comarca e a
preocupação em informar ao soberano sobre as receitas ultrama-
rinas esclarecem o interesse nesta peça documental. Figura junto
à série de papéis sobre contratos com informações variadas que
instruiriam Caetano da Costa Matoso n a preparação de parecer
sobre rendimentos dos contratos, missão que recebera antes de
partir de Portugal para Minas Gerais.
Autoria, l o c a l , data: Provedoria da Fazenda Real de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva hí-
brida, com elementos da encadeada..Maiúsculas de amplas volutas
iniciais; " c " redondo, em forma de caracol. Números arábicos si-
nuosos, com apex. Uso do caldeirão. Arabesco separa o texto do
comentário, este em letra de Costa Matoso, no fl. 329, último pa-
rágrafo. (YDL)
625

"Propinas pagas em Lisboa do "contrato dos dízimos [ fl. 329 ]


que teve princípio n o l g
d e agosto d e 1751 anos

N a c o m a r c a d e Vila R i c a , c o m o consta d a conta


assinada pelo "corretor do "concelho ; 754U784
D a c o m a r c a do S a b a r á , c o m o consta d a conta do dito 727UI36
D a c o m a r c a d o R i o das M o r t e s , consta d a [conta] d o dito 662U624
P o r m a i s despesas feitas c o m p r o p i n a s d o "porteiro
e mais "oficiais agregados ao concelho 256X5200
2:399Ü744

Propinas pagas nas Minas

A o Ilustríssimo Excelentíssimo s e n h o r "general 1.800 "oitavas


Ao doutor provedor 1.200 oitavas
Ao procurador da Coroa 300 oitavas
A o escrivão d a F a z e n d a * 300 oitavas
A o dito d a escritura „ 192 oitavas
A o tesoureiro 300 oitavas
A o escrivão e m e i r i n h o da F a z e n d a 150 oitavas
A o c o n t a d o r e ajudante do tesoureiro 150 oitavas
A o p o r t e i r o e guarda-livros 7 5 oitavas
4 , 4 6 7 oitavas 6 : 7 0 0 C J 5 0 0

9:101X5244

C o m a advertência de q u e hoje se r e m a t a m estes contratos n o C o n s e l h o d o


U l t r a m a r , o n d e se l h e p a g a p o r este dos "dízimos 2:400X5744 e nas M i n a s se
levam as p r o p i n a s acima referidas tão-somente d e c u m p r i r os ^alvarás.*

Neste parágrafo, letra de Caetano da Costa Matoso.


• 82 «

[Propinas pagas na capitania das Minas Gerais]

Relação dos cargos que percebem propinas corresponden-


tes aos direitos reais arrematados (entradas, dízimos, passagens,
casamentos e nascimentos reais e diamantes), indicando-se os
respectivos valores em Minas Gerais relativos aos contratos ar-
rematados em 1749 e totais parciais conforme modalidade do
direito.
A vigilância que exercia junto às finanças da comarca e a
preocupação em informar ao soberano sobre as receitas ultrama-
rinas esclarecem p interesse nesta peça documental. Figura junto
à série, de papéis sobre contratos com informações variadas que
instruiriam Caetano da Costa Matoso n a preparação de parecer
sobre rendimentos dos contratos, missão que recebera antes de
partir de Portugal para Minas Gerais.
Autoria, local, data: Provedoria da Fazenda Real de Mi-
nas Gerais; Vila Rica; ca.1750.
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna, letra cursiva
destrógrada, bastante simplificada, m a s p e r m a n e c e m os " s "
caudados, de duplas laçadas, o " d " uncial, quando minúsculo; o
maiúsculo é redondo, com volutas. .Números arábicos, com hastes
inclinadas, só o " 5 " traz apex. Sinal de guarda na coluna numéri-
ca. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Foram suprimidas as guardas.
Cópia impressa:
B O X E R , C. R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de
u m a sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1969. p .
359.
627

Dois "contratos das entradas do C a m i n h o V e l h o e N o v o do R i o de J a n e i r o e [ fl. 330 ]


S ã o Paulo, e d o sertão da B a h i a e P e r n a m b u c o etc.

P a g a m o seguinte:

Ao " g o v e r n a d o r e c a p i t ã o - g e n e r a l -.- 1.200


A o " p r o v e d o r da F a z e n d a R e a l 800
A o " p r o c u r a d o r da C o r o a e F a z e n d a ..- 200
Ao "escrivão da F a z e n d a R e a l 200
A o "tesoureiro d a m e s m a 200
Ao seu "ajudante ........... i 100
Ao "porteiro, "guarda-livros e "solicitador d a F a z e n d a 50
Ao "meirinho 50
A o escrivão d o dito 50
2.850

O s três c o n t r a t o s dos dízimos, a saber, d a c o m a r c a d o O u r o P r e t o ,


do R i o das Mortes, R i o das Velhas e Serro do Frio.

A o g o v e r n a d o r e capitão-general , • 1.800
Ao provedor 1.200
Ao procurador „ 300
A o escrivão , 300
A o tesoureiro 300
A o seu ajudante 150
A o p o r t e i r o [e] guarda-livros 75
Ao meirinho .-- 75
A o s e u escrivão 75
4.275

O contrato das passagens do rio das M o r t e s

Ao general 384U000
Ao provedor 300ÜOOO
Ao procurador 75U000
Ao escrivão , ,. 75Ü00O
Ao tesoureiro , 75U000
Ao seu a j u d a n t e 37U500
Ao p o r t e i r o [e] guarda-livros 14U400
Ao meirinho 14Ü400
Ao seu escrivão 14Ü400
989Ü700
628

[ fl. 330v, ] O "contrato das passagens do rio G r a n d e

Ao "general ...................................................192ÜOO0
Ao "provedor,..., ., , , 150T5000
Ao "procurador. ..... 7 5 U 0 0 0
Ao "escrivão , „ .„ .„ 75UOOO
Ao "tesoureiro „.,..,.. 75'UOOO
Ao seu " a j u d a n t e , 37Ü500
Ao "porteiro [e] "guarda-livros 14U400
Ao "meirinho , 7Ü200
Ao s e u escrivão 7U200
633Ü300

O c o n t r a t o d o rio de São Francisco e suas anexas t e m as m e s m a s "propinas


q u e t e m o c o n t r a t o do rio G r a n d e .
O c o n t r a t o do rio V e r d e t e m a m e t a d e das ditas p r o p i n a s do rio G r a n d e .

P r o p i n a s p o r ocasiões de c a s a m e n t o s e n a s c i m e n t o s

Ao general , 180
Ao provedor •. .90
Ao "secretário 90
Ao procurador da Coroa 90
Ao escrivão 30
Ao tesoureiro 30
Ao seu ajudante ; 15
Ao p o r t e i r o [e] guarda-livros , 7 '/a
Ao meirinho 9 'A 4
Ao seu escrivão 7 '/a
549 'A 4

C o n t r a t o dos diamantes, cada triénio

Ao governador 600
Ao provedor < ; 400
Aó procurador ..........., .,,...^
f 100
Ao escrivão .„..., ........... 100
Ao tesoureiro 100
Ao seu ajudante , * 50
Ao porteiro , ........................25
Ao meirinho - 25
Ao seu escrivão , 25
1.425

E c o m o é r e m a t a d o p o r q u a t r o anos, se faz a c o n t a a respeito dos ditos.


629

• 83 «

[Rendimento dos ofícios de Vila Rica]

Relação dos oficios de Justiça e Fazenda na comarca de Vila

2
Rica providos normalmente por três anos, com indicação do valor
semestral dos donativos oferecidos pelos serventuários para cada
u m dos ofícios, assim como dos valores pagos pela contribuição da
terça parte dos rendimentos do cargo e dos novos direitos.
U m a vez que constituía atribuição do governador e do
ouvidor arbitrar o valor das terças partes e elaborar avaliações
sobre o rendimento dos oficios para a Coroa, trata-se aqui de
material voltado para as rotinas do magistrado.
¿fe Autoria, l o c a l , data: Provedoria d a Real Fazenda; Vila
Rica; ca. 1750.
^ ^ ^ ^ ^ C o m e n t a r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva do
período barroco, regularizada e caligrafada, destrógrada, com mai-
úsculas em volutas e arabescos acentuados, principalmente no " D "
e no " S " . Números arábicos com perfil e d e traços sinuosos. Uso
do caldeirão. Sinal de guarda na coluna numérica. (YDL)
C r i t e r i o s e d i t o r i a i s : Foram suprimidas as guardas.

Vila Rica* [fl. 331 ]

"Meirinho-geral, "donativo 15U000


"Terça parte , 100Ü000
" N o v o direito •. , , 20 "oitavas

S e u *escrivão, d o n a t i v o ,. .-. ...................^....5515000


T e r ç a parte 5 0 oitavas
Novo direito.... ,„,...,,..„„..> ,15 oitavas

M e i r i n h o d o c a m p o , donativo .....,.,..„... 5OU0O0


N o v o direito........... ,, ,„.„. 12 oitavas e m e i a
Terça parte ; , 14 oitavas e três q u a r t o s

Seu escrivão, d o n a t i v o „ , 45U000

Isto se entende em cada u m por seis meses.


630

*Terça p a r t e e *novo direito, o m e s m o q u e o "meirinho

Meirinho da Almotaçaria, donativo 31UO0O


Terça parte * 50 "oitavas
N o v o direito 15 oitavas

Seu "escrivão, d o n a t i v o , 47U000


T e r ç a p a r t e e novo direito, o m e s m o q u e o m e i r i n h o

M e i r i n h o das execuções, d o n a t i v o 32UOOO


Terça parte , 50Ü000

N o v o direito 15 oitavas

Seu escrivão, o m e s m o q u e o m e i r i n h o

"Alcaide n ã o t e m donativo
Terça parte 41 oitavas e três quartos
N o v o direito ...... 12 oitavas e m e i a

Seu escrivão, d o n a t i v o ; 54U000


T e r ç a p a r t e e novo direito, o m e s m o q u e o alcaide

M e i r i n h o dos ausentes, d o n a t i v o ,. 50U00O


Terça parte 44 oitavas
N o v o direito 12 oitavas e m e i a

Seu escrivão, donativo, o m e s m o


T e r ç a p a r t e e novo direito, t a m b é m o m e s m o q u e o m e i r i n h o .

• 84 «
[Catálogo de rendimentos de ofícios em Minas Gerais]

Ampla lista dos ohcios de Justiça e Fazenda providos nas vi-


las da capitania de Minas Gerais. Indica-se p a r a cada u m a das
vilas o ofício arrematado por serventuário, seu valor e a contribui-
ção correspondente às terças partes e novos direitos. Registra-se a
data do provimento no cargo.
631

U m a vez que constituía atribuição do g o v e r n a d o r e do


ouvidor arbitrar o valor das terças partes e elaborar avaliações
sobre o rendimento dos ofícios p a r a a Coroa, trata-se aqui de
material voltado para as rotinas do magistrado.
Autoria, l o c a l , d a t a : Provedoria da Real Fazenda; Vila
Rica; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á ü c o : Escrita moderna, caligrafada
e regularizada do século XVIII. Apresenta " R " em módulo gran-
de, redondo de um só traço; "A" maiúsculo com apex e m forma
de semicírculo lateral; " p " minúsculo com laçada horizontal pro-
nunciada. Uso do caldeirão. Cinco linhas finais, c o m letra de
Costa Matoso, distinta da do restante do texto. D o fólio 334 ao
339v. existe numeração original, a tinta m a r r o m escura, de 1 a
6. (YDL)

V ü a Rica do O u r o Preto [ fl. 332 ]

" T a b e l i ã o , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r "donativo de 3 : 6 0 0 U 0 0 0 ["réis], p a g a


de "terças p a r t e s 600 "oitavas e d e "novo direito 6 0 , c u m p r i d a a "provisão a 19
d e o u t u b r o d e 1745.

T a b e l i ã o , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo de 2 : 9 2 0 U 0 0 0 , p a g a d e terças


p a r t e s 6 0 0 oitavas e d e novo direito 60, c u m p r i d a a provisão e m 3 d e d e z e m b r o
d e 1744 a n o s .

" M e i r i n h o - g e r a l , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 1:190U000, p a g a


d e terças p a r t e s 300 oitavas e d e novo direito 30, c u m p r i d a a 30 d e o u t u b r o de
1745.

"Escrivão d a C â m a r a , r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e l:76OUOO0,
p a g a d e terças p a r t e s 31 oitavas e de n o v o direito 3 1 , c u m p r i d a a 3 de d e z e m b r o
d e 1744 a n o s .

" T e s o u r e i r o d a F a z e n d a R e a l , d a d o p o r 3 a n o s , p o r serviços, c u m p r i d a a
provisão a 16 d e agosto de 1746 anos.

T e s o u r e i r o dos ausentes, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e l:600UO00,


p a g a de terças partes 100 oitavas e d e novo direito 10.

" C o n t a d o r e "distribuidor, p o r 3 anos, p o r donativo de 2:0OOU0O0, c u m p r i -


d a a 5 de agosto d e 1747 a n o s .
632

"Escrivão dos órfãos, rematado p o r 3 anos, por "donativo de 2:3O0UO00, p a g a de


"terças partes 60 "oitavas e de "novo direito 6, cumprida a 6 de agosto d e 1747 anos.

[ fl. 3 3 2 v . ] "Porteiro e "guarda-livros d a F a z e n d a R e a l ^ r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o


d e 350X5000, c u m p r i d a a 29 de d e z e m b r o d e 1747 anos.

Escrivão d a F a z e n d a R e a l , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 6:550X5000,


p a g a d e terças partes 500 oitavas e d e novo direito 50, c u m p r i d a a 17 de s e t e m b r o
d e 1747 a n o s .

" M e i r i n h o da F a z e n d a Real, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo de


1:100X5000, p a g a d e terças p a r t e s 266 oitavas e de n o v o direito 4 8 , c u m p r i d a a
29 d e o u t u b r o d e 1747 anos.

Escrivão d o m e i r i n h o d a F a z e n d a R e a l , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo


de 1:150X5000, p a g a de terças partes 266 oitavas e d e novo direito 4 8 , c u m p r i d a
a 2 9 de o u t u b r o d e 1747 anos.

Escrivão das execuções, r e m a t a d o p o r donativo d e 3:950X5000, p o r 3 anos,


p a g a d e terças p a r t e s 400 oitavas e de novo direito 40, c u m p r i d a a "provisão a 3
d e agosto d e 1748 anos.

P o r t e i r o d a O u v i d o r i a , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo de 650X5000, paga


de terças partes 100 e d e novo direito 10, cumprida a 30 de agosto de 1748 anos.

Escrivão d a Almotaçaria, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo de 1:230X5000,


p a g a d e terças p a r t e s 200 oitavas e d e n o v o direito 2 0 .

[ fl. 333 ] "Inquiridor, "contador e "distribuidor d a Ouvidoria, r e m a t a d o por 3 anos, p o r


donativo de 1:406X5000, paga de terças partes 500 oitavas e de novo direito 50.

" T a b e l i ã o , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo de 4:060X5000, p a g a d e terças


p a r t e s 600 oitavas e de novo direito 60, cumprida a 18 de j a n e i r o de 1749 anos.

Escrivão da C â m a r a , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r 1:080X5000, p a g a d e terças


p a r t e s 310 e d e novo direito 3 1 , c u m p r i d a a 27 d e m a i o d e [1749?] anos.

Escrivão d a Ouvidoria, q u e serve por nomeação do procurador do proprietário.

I n q u i r i d o r , c o n t a d o r e distribuidor d o j u í z o o r d i n á r i o , r e m a t a d o p o r donativo
de 2:000X5000, c u m p r i d a a 5 d e agosto de 1747 a n o s , p a g a d e terças p a r t e s 400
oitavas e de novo direito 4 0 .
633

"Escrivão do m e i r i n h o - g e r a l , serve c o m provisão p e l a Secretaria, p o r "donativo


d e 45UO00, p a g a de "terças p a r t e s 3 0 0 "oitavas e d e "novo direito 30.

" M e i r i n h o das e x e c u ç õ e s , d a m e s m a s o r t e , p o r d o n a t i v o d e 32U0OO, d e


terças partes 300 oitavas e d e n o v o direito 30.

E s c r i v ã o d o dito m e i r i n h o , o m e s m o p o r d o n a t i v o 3215000, p o r 6 meses,


p a g a de terças p a r t e s 300 oitavas e d e n o v o direito 30.

Meirinho da Almotaçaria, com provisão pela Secretaria, por 6 meses, p o r


donativo d e 31UO0O, de terças p a r t e s 300 oitavas e de n o v o direito 30.

Escrivão d o m e i r i n h o d a A l m o t a ç a r í a , o m e s m o , p o r d o n a t i v o de 4 0 U 0 0 O ,
terças p a r t e s 3 0 0 oitavas, novo direito 30.

M e i r i n h o do c a m p o , p o r 6 meses, pela Secretaria, p o r donativo de 5 1 U 0 0 0 ,


terças p a r t e s 250 oitavas e novo direito 25.

E s c r i v ã o d o dito m e i r i n h o , c o m p r o v i s ã o p o r 6 meses^, p o r d o n a t i v o d e [ fl. 333v. ]


4 5 U 0 0 0 , terças p a r t e s 250 oitavas, novo direito 2 5 .

Escrivão de alcaide, com provisão de 6 meses, p o r donativo de 54UO00,


p a g a d e terças p a r t e s 250 é d e novo direito 2 5 .

M e i r i n h o d o "contrato das e n t r a d a s , c o m "provisão d e seis meses.

Escrivão do dito m e i r i n h o , o m e s m o .

M e i r i n h o d o contrato das passagens, c o m provisão d e seis meses.

Escrivão do dito m e i r i n h o , o m e s m o .

M e i r i n h o do c o n t r a t o dos dízimos, c o m provisão p o r 6 meses.

Escrivão do dito m e i r i n h o , d a m e s m a sorte.


634

Rendas que pertencem à Câmara 1

R e n d a d a "aferição e do *ver ,, 4 : 4 0 0 U 0 0 Ó "réis


R e n d a das "meias p a t a c a s , q u e é da " e n t r a d a dos gados^
a " m e i a p a t a c a p o r cabeça , ,,,.„,.... l:80O£J000 réis
R e n d a da "carceragem ... 3 O 4 Ü 0 0 0 réis

[fi. 3 3 4 ] Vila de São João del-Rei

" E s c r i v ã o d a O u v i d o r i a , foi r e m a t a d o e m L i s b o a , p o r 3 a n o s , p a g o u d e
"donativo 8 : 6 0 0 U 0 0 0 , p a g a d e "terças partes 300 "oitavas e d e "novo direito 30,
c u m p r i d a a "provisão a 29 de setembro de 1746 anos.

Escrivão das execuções, r e m a t a d o e m Lisboa, p o r d o n a t i v o d e 3 : 0 0 0 U 0 0 0 j


p a g a de terças p a r t e s 100 e d e novo direito 10 oitavas, p a g a de n o v o direito e m
Lisboa 3 7 U 5 0 0 .

Escrivão de alcaide, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 1O9U00O, p a g a


d e terças p a r t e s 120 oitavas e de novo direito 12.

" M e i r i n h o do c a m p o , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 2 0 0 U 0 0 0 , p a g a


de terças p a r t e s 150 oitavas e de n o v o direito 15, c u m p r i d a a p r o v i s ã o a 16 de
agosto de 1746 anos.

Escrivão dos órfãos, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 5 0 0 U 0 0 0 , p a g a d e


terças partes 60 oitavas e de n o v o direito 6, c u m p r i d a e m 16 de agosto de 1746
anos.

M e i r i n h o da Ouvidoria, r e m a t a d o p o r 3 anos, por donativo de 4 5 0 U 0 0 0 ,


p a g a d e terças p a r t e s 150 oitavas e d e novo direito 15.

Escrivão do meirinho do c a m p o , r e m a t a d o por 3 anos, p o r donativo de


200ÜOOO, p a g a de terças p a r t e s 150 oitavas e d e novo direito 15, c u m p r i d a e m
27 d e j a n e i r o de. 1747 anos.

S e g u n d o "tabelião, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o de 2:15OU00O, p a g a


d e terças p a r t e s 200 oitavas e d e novo direito 20, c u m p r i d a a 10 d e fevereiro d e
1747 a n o s .

Dados sobre rendimentos da Câmara de Vila Rica com letra de Caetano da Costa Matoso.
635

•Escrivão d o m e i r i n h o da O u v i d o r i a , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r "donativo d e


2 0 0 U 0 0 0 , p a g a d e "terças p a r t e s 150 "oitavas e d e "novo direito 15, c u m p r i d a a
10 de. fevereiro d e 1747 a n o s .

" M e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 2 0 0 U 0 0 0 , [ fl. 334v. ]


p a g a d e terças p a r t e s 150 oitavas e d e novo direito 15, c u m p r i d a a 28 d e s e t e m b r o
d e 1747 a n o s .

Escrivão do m e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e


24015000, p a g a d e terças p a r t e s 150 oitavas e d e n o v o direito 15, c u m p r i d a e m
14 de s e t e m b r o d e 1747 anos.

" T a b e l i ã o , r e m a t a d o e m Lisboa, p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o de 4:05015000,


terças p a r t e s 200 oitavas e n o v o direito 20, c u m p r i d a a 29 d e m a i o de. 1748 anos.

E s c r i v ã o d o m e i r i n h o dos a u s e n t e s , r e m a t a d o p o r 3 a n o s , e m L i s b o a , p o r
d o n a t i v o d e 2 5 0 Ü 0 0 0 , foi c u m p r i d a a "provisão e m 17 d e j u l h o d e 1748 a n o s .

Escrivão d a C â m a r a e A l m o t a ç a r i a , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e
96015000, p a g a d e terças p a r t e s o da A l m o t a ç a r i a 150 oitavas e d e n o v o direito
15 e o d a C â m a r a d e terças partes 100 oitavas e de novo direito 10.

"Inquiridor, " c o n t a d o r e "distribuidor, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p a g a de [ fl. 335 ]


d o n a t i v o 1:05015000, foi c u m p r i d a a provisão e m 11 de fevereiro d e 1749 a n o s .

P o r t e i r o , a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r 29015000 d e donativo, e d e terças p a r -


tes 40 oitavas e d e novo direito 4.

Cidade Mariana

M e i r i n h o d o c a m p o , a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 2 0 0 Í 5 0 0 0 , e
de terças p a r t e s 200 oitavas e de novo direito 20.

Escrivão d e alcaide, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 20015000, d e


terças partes 200 oitavas e d e novo direito 20, c u m p r i d a a 15 d e fevereiro de 1746
anos.

Inquiridor, c o n t a d o r e distribuidor, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p a g a de donativo


1:80015000, d e terças p a r t e s 300 oitavas e d e novo direito 30, c u m p r i d a a provi-
são a 22 d e o u t u b r o d e 1746 a n o s .
636

" T a b e l i ã o , de cujo ofício fez Sua Majestade m e r c ê a N a t á l i a G u e d e s , p o r 9


a n o s , q u e a c a b a m este de 1750.

"Escrivão dos órfãos, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r "donativo de 3:240X5000, de


"terças p a r t e s 50 "oitavas, de "novo direito 20.

Escrivão d e m e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e


230X5000, p a g a d e terças p a r t e s 2 0 0 oitavas e d e n o v o d i r e i t o 2 0 , c u m p r i d a a
"provisão a 5 d e n o v e m b r o de 1747 anos.

[ fl. 335v. ] " P o r t e i r o , a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 580UOO0, / / p a g a d e


terças p a r t e s 100 oitavas e d e novo direito 10, c u m p r i d a a p r o v i s ã o e m 29 d e
o u t u b r o d e 1747 anos.

Escrivão d a A l m o t a ç a r i a , a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 700X5000,


p a g a de terças partes 250 oitavas e. de novo direito 25.

Escrivão das execuções, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p a g a d e donativo 5:640X5000,


de terças p a r t e s 300 oitavas e d e novo direito 30, cuja provisão principiou e m j a n e i r o
de 1750.

Escrivão da C â m a r a , r e m a t a d o p e l a Secretaria p o r u m a n o , p o r d o n a t i v o de
80X5000 "réis, p a g a de terças partes 310 oitavas e d e novo direito 3 1 .

S e g u n d o t a b e l i ã o , d e q u e é p r o p r i e t á r i o o d o u t o r F e r n a n d o Luís P e r e i r a ,
donativo n ã o consta, p a g a d e terças p a r t e s 600 oitavas e d e novo direito 60.

M e i r i n h o das execuções, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 180X5000


réis, d e terças partes 200 oitavas e d e novo direito 20, c u m p r i d a a 5 d e n o v e m b r o
d e 1747 a n o s .

Vila de São J o s é

Escrivão das execuções, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o de 420X5000,


p a g a d e terças p a r t e s 100 oitavas e de novo direito 10, c u m p r i d a a provisão a 15
d e agosto d e 1745 anos.

"Inquiridor, " c o n t a d o r e "distribuidor, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo


d e 460X5000, p a g a de terças partes 60 oitavas e d e novo direito 6, c u m p r i d a a 15
d e agosto d e 1745 anos.
637

"Escrivão dos órfãos, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r "donativo d e 800UOOO, p a g a [ fl. 336 ]


d e "terças partes 60 "oitavas e d e "novo direito 6, c u m p r i d a a "provisão a 27 d e
agosto d e 1746 a n o s .

Escrivão d o m e i r i n h o do c a m p o , a r r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e
150UO00, p a g a de terças partes 60 oitavas e de novo direito 6, c u m p r i d a a 28 d e
s e t e m b r o de 1747 a n o s .

Escrivão d e alcaide, a r r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 12OU00O, p a g a


d e t e r ç a s p a r t e s 60 oitavas e d e n o v o direito 6, c u m p r i d a a p r o v i s ã o a 28 d e
s e t e m b r o d e 1747 a n o s .

" M e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 1 2 0 U 0 0 0 ,


c u m p r i d a a provisão e m 28 d e setembro de 1747 a n o s , p a g a de terças p a r t e s 60
oitavas e d e novo direito 6.

Escrivão do m e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o de


150UO00, p a g a de terças partes 60 oitavas e de novo direito 6, c u m p r i d a a 28 d e
s e t e m b r o de 1747 anos.

M e i r i n h o do c a m p o , rematado p o r 3 anos, p o r donativo de 120U000, p a g a d e


terças partes 60 oitavas e de novo direito 6, cumprida a 28 de setembro de 1747 anos.

Escrivão d a C â m a r a e A l m o t a ç a r i a , a r r e m a t a d o p o r donativo de I:610UO00,


p a g a o d a C â m a r a d e terças partes 100 oitavas e d e novo direito 10 e d a A l m o t a ç a r i a
40 e d e novo direito 4, c u m p r i d a a provisão a 21 d e j a n e i r o de 1749 anos.

Primeiro "tabelião, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo 2 : 7 5 0 U 0 0 0 , p a g a d e


terças partes 150 oitavas e d e novo direito 15, cumprida a 3 de agosto de 1747 anos.

S e g u n d o tabelião, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 2:350U0OO. [ fl. 336v. ]

Escrivão das execuções, a r r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e 6 0 0 U 0 0 0 ,


p a g a d e terças p a r t e s 100 oitavas e de novo direito 10.

Serro do Frio

" I n q u i r i d o r , " c o n t a d o r é "distribuidor, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o


d e 2 4 0 U 0 0 0 , p a g a d e terças p a r t e s c a d a a n o 300 oitavas e d e n o v o direito 3 0 ,
cumprida a l 9
de s e t e m b r o d e 1745 anos,
638

"Escrivão d e defuntos e ausentes e capelas, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r "donativo


d e 950T5000, p a g a d e "terças p a r t e s 200 "oitavas e d e "novo direito 20.

Escrivão das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 1:00015000,


p a g a d e terças p a r t e s 300 oitavas e de n o v o direito 30, c u m p r i d a a 16 d e agosto de
1 746.

"Tesoureiro dos ausentes, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 1:60015000,


p a g a de terças partes 400 oitavas e de novo direito 40, c u m p r i d a a 30 [incompleto]
d e 1746 anos.

Escrivão d a O u v i d o r i a , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 4:600Í5000,


p a g a de terças p a r t e s [700?] oitavas e de novo direito 70, c u m p r i d a a 10 d e setem-
b r o d e 1746 a n o s .

[ íl. 337 ] Escrivão dos órfãos, a r r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e 1:04015000,


p a g a d e terças p a r t e s 40 oitavas e de novo direito 4 0 , c u m p r i d a a 12 d e j u n h o d e
1747 a n o s .

E s c r i v ã o d a C â m a r a e A l m o t a ç a r i a , p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o 8:04015000,
p a g a d e t e r ç a s p a r t e s o d a C â m a r a 100 o i t a v a s e d e n o v o d i r e i t o 10 e o d a
A l m o t a ç a r i a 50 e d e n o v o direito 5, c u m p r i d a a 9 d e j u l h o de 1746 anos.

"Inquiridor, p o r 3 anos, p a g o u de donativo p o r 3 anos 250T5000, c u m p r i d a


a 3 0 d e d e z e m b r o d e 1748 anos.

" T a b e l i ã o c o m p r o v i s ã o p e l a S e c r e t a r i a , p a s s a d a a 3 d e j a n e i r o d e 1748
anos, p a g a d e terças partes 500 oitavas e de novo direito 50.

" M e i r i n h o - g e r a l , t e m p r o v i s ã o d e seis meses p o r d o n a t i v o d e 30Ü00O, d e


terças p a r t e s 300 oitavas e d e n o v o direito [incompleto].

Seu escrivão, de. terças partes e novo direito, o m e s m o .

M e i r i n h o das execuções, p a g a de terças p a r t e s 200 oitavas e d e n o v o direito


[incompleto].

Seu escrivão, o m e s m o .

M e i r i n h o d o c a m p o , p a g a d e terças p a r t e s 100 oitavas e de novo direito 10.

Seu escrivão, o m e s m o .
639

"Escrivão d e alcaide, q u e serve c o m provisão de seis meses, 1 2 U 0 0 0 , p a g a


de, "terças p a r t e s 100 "oitavas e d e "novo direito 10.

Seu escrivão, o m e s m o .

" M e i r i n h o d a Almotaçariaj d e terças p a r t e s 2 0 0 oitavas, d e n o v o direito 20. [ fl. 337v, ]

Seu escrivão, o m e s m o .

M e i r i n h o d a F a z e n d a R e a l , d e terças partes 100 oitavas, d e n o v o direito 10.

Seu escrivão, o m e s m o .

"Porteiro, d e terças p a r t e s 60 oitavas e de n o v o direito 6.

Sabará

Porteiro, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r "donativo d e 7 0 0 U 0 0 0 , d e terças p a r t e s


100 oitavas e de novo direito 10, c u m p r i d a a 23 d e agosto d e 1746 anos.

Escrivão do m e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r donativo d e


3 9 5 U 0 0 0 , d e terças p a r t e s 200 oitavas e de novo direito 20, c u m p r i d a a 30 d e
s e t e m b r o d e 1746.

M e i r i n h o d o c a m p o , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 2 8 0 U 0 0 0 , d ê
terças p a r t e s 2 0 0 oitavas e d e n o v o direito 20, c u m p r i d a a 30 d e s e t e m b r o d e
1746 a n o s .

M e i r i n h o das e x e c u ç õ e s , r e m a t a d o p o r d o n a t i v o d e [incompleto], d e terças


p a r t e s 200 oitavas e d e novo direito 20, c u m p r i d a a 30 d e setembro d e 1746 a n o s .

M e i r i n h o d a correição, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o de 400UOOO, d e [ fl. 338 ]


terças p a r t e s 200 oitavas e d e novo direito [incompleto], c u m p r i d a a 12 d e j u n h o
de 1745.

" T a b e l i ã o , a r r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e 3:8OOU000, d e terças


p a r t e s 600 oitavas e de novo direito 6 0 , c u m p r i d a a 29 d e o u t u b r o de 1747 anos.

Escrivão de alcaide, p o r 3 anos, p o r donativo de 3 0 0 U 0 0 0 , de terças p a r t e s


250 oitavas e d e novo direito 25, c u m p r i d a a 2 9 d e d e z e m b r o d e 1747 a n o s .
640

" I n q u i r i d o r , p o r 3 anos, p o r " d o n a t i v o de 2:80015000, d e "terças p a r t e s e


" n o v o d i r e i t o só p o r si n ã o sei; j u n t o c o m o d e " c o n t a d o r e " d i s t r i b u i d o r , está
avaliado e m 500 "oitavas e d e novo direito 50.

"Escrivão do m e i r i n h o d o c a m p o , r e m a t a d o p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e
430X5000, d e t e r ç a s p a r t e s 2 0 0 oitavas e d e n o v o direito 2 0 , c u m p r i d a a 8 d e
m a r ç o d e 1748 a n o s .

" M e i r i n h o - g e r a l , p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o de 580X5000, c u m p r i d a a 29 d e
o u t u b r o d e 1747 anos.

" T a b e l i ã o , p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e 4:300X5000, d e t e r ç a s p a r t e s 6 0 0
oitavas e d e n o v o direito 6 0 , c u m p r i d a a 23 de d e z e m b r o de 1748 anos.

Escrivão d a O u v i d o r i a geral, p o r 3 anos, p o r donativo 17:700X5000, d e ter-


[ fi. 338v. ] ças p a r t e s 1.400 oitavas e d e novo / / direito 140, c u m p r i d a a 30 d e d e z e m b r o d e
1748 anos.

Escrivão do meirinho-geral, p o r 3 anos, p o r donativo de, 550X5000, c u m p r i -


d a a 30 d e d e z e m b r o de 1748 anos.

Escrivão dos órfãos, p o r 3 anos, p o r donativo d e 3:650X5000, c u m p r i d a a 23


de j a n e i r o d e 1749 anos..

Escrivão d a C â m a r a e A l m o t a ç a r i a , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e
2:700X5000, de terças p a r t e s c a d a u m 200 oitavas e d e novo direito 20.

Vila N o v a da Rainha

Escrivão de alcaide, r e m a t a d o p o r .3 :anos, p o r 240X5000;, p a g a de terças p a r -


tes 100 oitavas e d e novo direito 10.

M e i r i n h o das execuções, p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e 240X5000, d e terças


p a r t e s 100 oitavas e de n o v o direito 10.

" P o r t e i r o , p o r 3 anos, p o r 100X5000, d e terças p a r t e s 40 oitavas e d e novo


direito 4.

[ fl. 339 ] Escrivão dos órfãos, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo d e 1:120X5000, p a g a


d e terças p a r t e s 50 oitavas e de novq direito 1 1 .
641

"Inquiridor, " c o n t a d o r e "distribuidor, p o r 3 anos, p o r "donativo de


5:05ÒUÒ0O, p a g a d e "terças p a r t e s 115 e d e novo direito I I "oitavas.

" T a b e l i ã o , p o r 3 a n o s , p o r d o n a t i v o d e 3 : 0 0 0 U Q 0 0 , d e terças p a r t e s 4 0 0
oitavas e d e novo direito 4 0 , c u m p r i d a a 20 de setembro de 1747 a n o s .

"Escrivão d a C â m a r a e Almotaçaria, p o r 3 anos, p o r donativo d e 2:0OOU00O


e de terças p a r t e s c a d a u m 50 oitavas e de novo direito 5.

" M e i r i n h o das execuções, r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 2 0 0 U 0 0 0 ,


p a g a de terças p a r t e s 100 oitavas e d e novo direito 10.

Escrivão do meirinho do c a m p o , r e m a t a d o p o r 3 anos, p o r donativo de


1 8 0 U 0 0 0 , p a g a d e terças p a r t e s 150 oitavas e d e novo direito 15.

Paracatu

"Porteiro, p o r 3 anos, p o r d o n a t i v o d e 5 0 0 U 0 0 0 .

M e i r i n h o d o c a m p o , p o r 3 anos, p o r 5 0 0 Ü 0 0 0 .

T a b e l i ã o , p o r 3 a n o s , r e m a t a d o p o r d o n a t i v o de 8:4OOUOO0, a v a l i a d a s as
terças p a r t e s j u n t o c o m o escrivão d a C â m a r a e A l m o t a ç a r i a , 4 0 0 oitavas e d e
n o v o direito 4.

Vila de Pitangui [ fl. 339v. ]

T a b e l i ã o , escrivão dos órfãos, d a C â m a r a e m a i s a n e x o s , r e m a t a d o s p o r 3


a n o s , p o r d o n a t i v o s d e 1:26013000, p a g a d e t e r ç a s p a r t e s o d a C â m a r a e
A l m o t a ç a r i a 50 oitavas e d e novo direito 5, o dos órfãos e seu escrivão, c a d a u m ,
40 oitavas e d e novo direito 4, o de tabelião 100 oitavas e de n o v o direito 10.

I n q u i r i d o r ^ c o n t a d o r e distribuidor, de terças p a r t e s 50 oitavas e d e n o v o


direito 5.

Escrivão de alcaide, t e m provisão de seis meses, p o r d o n a t i v o de 12UO00,


p a g a d e terças p a r t e s 60 oitavas e d e n o v o direito 6.
642

São R o m ã o

" T a b e l i ã o , "escrivão dos órfãos e m a i s a n e x o s , r e m a t a d o s p o r 3 a n o s , p o r


*•' "donativo d e 30015000, p a g a de "terças p a r t e s c a d a u m 100 "oitavas e d e "novo
direito 10.

Papagaio

T a b e l i ã o , escrivão d o s órfãos e m a i s a n e x o s , r e m a t a d o s p o r 3 a n o s , p o r
donativos d e 30015000, de terças partes, c a d a u m dos dois p r i m e i r o s , 60 oitavas e
d e n o v o direito 6.

M e i r i n h o e seu escrivão, p a g a m de terças partes, c a d a u m , 2 0 0 oitavas e de n o v o


direito 2 0 .

• 85 <

[Anotações sobre nomeação de governadores e ministros e


contingente de ordenanças em Minas Gerais]

Relações dos contingentes militares, seus postos e número


de homens instalados em distritos de Minas Gerais, contendo
ainda breves textos sobre a organização militaf, fiscal, adminis-
trativa e judiciária inicial.
Envolve preocupação programática do compilador em reu-
nir informações que compreendessem o estado político e militar
da América portuguesa, sendo marcante o esforço de se fazer
registrar a memória dessas ocorrências.
Autoria, l o c a l , d a t a : Caetano da Costa Matoso; Minas
Gerais; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c ó : Escrita moderna, cursiva do
século XVIII, destrógrada, veloz e com traços individualizados:
o grupo "lh" em que a primeira letra corresponde a vírgula na
haste d a segunda, formando ligatura; a sílaba final "te" em pala-
vras com abreviatura, partindo em volteio da letra anterior; abre-
viatura do " q u e " com dupla haste, t e r m i n a d a por voluta
643

sinistrógira; abreviatura especial para "homens", com o ponto


de abreviação sob apostrofe de nasalização, que tem a forma de
"s" em traço sinuoso. Presença de muitos tipos de "s" minúsculo:
caudado de dupla orelha, redondo, pendente, em forma de vírgu-
la e em forma de cajado. (YDL)

Vila de São José [ fl. 343 ]


T e m " c a p i t ã o - m o r e três c o m p a n h i a s , c o m 230 h o m e n s

Freguesia das C o n g o n h a s
C a p i t ã o - m o r , c o m três c o m p a n h i a s , c o m 300 h o m e n s

Carijós
C a p i t ã o - m o r , c o m u m a c o m p a n h i a d e 250 h o m e n s

Borda do Campo
C o m c a p i t ã o - m o r e u m a c o m p a n h i a de 70 h o m e n s

Itaverava
C o m c a p i t ã o - m o r , c o m duas c o m p a n h i a s , c o m 150 h o m e n s

Serro do Frio
C o m c a p i t ã o - m o r e q u a t r o c o m p a n h i a s , c o m 300 h o m e n s

P o r o r d e m de 9 de n o v e m b r o d e 1709, n o m e o u Sua M a j e s t a d e A n t ô n i o d e
A l b u q u e r q u e C o e l h o , " g o v e r n a d o r do R i o , p a r a g o v e r n a d o r de São P a u l o e M i -
nas, o r d e n a n d o - l h e q u e fundasse algumas povoações nas M i n a s , p a r a q u e as pes-
soas vivessem r e g u l a d a s c o m s u b o r d i n a ç ã o às Justiças, e desse ajuda aos "minis-
tros eclesiásticos, e, pelo q u e respeitava à a r r e c a d a ç ã o dos "quintos, se a r r e n d a s -
s e m p o r c o m a r c a s ou distritos pelo m e n o s t e m p o q u e pudesse ser, c o n t a n t o q u e
n ã o passassem d e dois anos, e que, p a r a m e l h o r a r r e c a d a ç ã o deles, lhe d a v a p o -
der p a r a estabelecer "casas de fundição, o r d e n a n d o levantasse u m r e g i m e n t o d e
infantaria d e q u a t r o c e n t o s até q u i n h e n t o s praças, c o m liberdade d e n o m e a r todos
os oficiais necessários, exceto coronel, c h a m a n d o igualmente paulistas c o m o reinóis.
E m fevereiro de 1 7 1 1 , f o r a m n o m e a d o s três ministros p a r a as M i n a s , q u e
f o r a m os p r i m e i r o s .
E m 29 de abril de 1711, se o r d e n o u a o g o v e r n a d o r A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e
pusesse em a r r e c a d a ç ã o as "passagens dos rios d o c a m i n h o das M i n a s , a i n d a e m
terras d o n a t á r i a s .
644

[ fl. 343v. ] G o m e s F r e i r e de A n d r a d e foi n o m e a d o p a r a g o v e r n a r as M i n a s e m 4 d e


janeiro de 1735.

Ordenanças

C i d a d e [ M a r i a n a ] e seu * t e r m o
T e m " c a p i t ã o - m o r , * s a r g e n t o - m o r e " a j u d a n t e , q u e g o v e r n a m 15 c o m p a -
nhias, q u e t ê m 1.600 h o m e n s .
N o m e s m o "termo e arraial das C a t a s Altas h á c a p i t ã o - m o r e sargento-maior,
q u e g o v e r n a m duas c o m p a n h i a s de duzentos h o m e n s , a m b a s .

Vila Rica
T e m c a p i t ã o - m o r e sargento-maior, c o m três c o m p a n h i a s d e n t r o d a vila d e
600 homens.

T e r m o d a vila

Cachoeira
T e m c a p i t ã o - m o r e s a r g e n t o - m a i o r , c o m d u a s c o m p a n h i a s d e 250 h o m e n s ,
u m a do dito arraial, o u t r a de Santo A n t ô n i o .

ítabira
T e m c a p i t ã o - m o r , c o m u m a c o m p a n h i a d e 160 h o m e n s .

São Bartolomeu
T e m c a p i t ã o - m o r , c o m duas c o m p a n h i a s , c o m 200 h o m e n s .

O u r o Branco
C a p i t ã o - m o r , c o m u m a c o m p a n h i a d e 150 h o m e n s .

Itatiaia
C a p i t ã o - m o r , c o m u m a c o m p a n h i a d e 90 h o m e n s .

Sabará
T e m " c o r o n e l , c a p i t ã o - m o r , " s a r g e n t o - m o r , c o m 19 c o m p a n h i a s , q u e , p o r
todas, t ê m o n ú m e r o de 1.400 h o m e n s .
645

São J o ã o del-Rei
T e m *capitão-mor, c o m 4 c o m p a n h i a s , c o m 300 h o m e n s .
A freguesia d e B a e p e n d i t e m c a p i t ã o - m o r , c o m duas c o m p a n h i a s , c o m 180
homens.
N a freguesia de A i u r u o c a h á u m c a p i t ã o - m o r , c o m duas c o m p a n h i a s , c o m
150 h o m e n s .

• 86 «

Folha das propinas extraordinárias que vence o Senado da Câmara [fl.344 ]


desta vila pela festa da aclamação do muito alto e poderoso rei, o
senhor dom José, o primeiro, este presente ano de 1751

Acórdão d a C â m a r a de Vila Rica com as propinas extra-


ordinárias a serem pagas aos camaristas, oficiais e ao ouvidor
Caetano da Costa Matoso pela participação na festa de aclama-
ção do rei dom José e ordem de pagamento ao tesoureiro dos
valores estipulados.
Este documento seria instrumento de C a e t a n o da Costa
Matoso contra acusação de gastos excessivos nas exéquias de
dom J o ã o V e na aclamação de d o m José f, feita pelo procurador
da C â m a r a de Vila Rica, Manuel da Costa Coelho, e para soli-
citar a n ã o devolução de propinas pagas indevidamente pelas
câmaras de Minas Gerais nos anos de 1750 e 1751.
Autoria, l o c a l e data: Senado d a C â m a r a de Vila Rica;
Vila Rica; 1751,
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita m o d e r n a , letra
caligrafada e híbrida do período barroco, com maiúsculas provi-
das de amplas volutas. Apresenta o "d" uncial e o bastardo itali-
ano; " e " conectivo em caracol de módulo grande. Algarismos
romanos com hastes arqueadas e presença do caldeirão, t a m -
b é m com voluta. O texto final do fólio 345 apresenta m a i o r
cursividade, com letra do tipo de encadeamento moderado. Conta
com assinatura autografa. (YDL)
646

A o d o u t o r *ouvidor-geral e "provedor desta c o m a r c a ,


C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o , duzentos e q u a r e n t a mil "réis . 240U000

A o "juiz o r d i n á r i o mais velho, o "tenente J o ã o d e Siqueira,


[duzentos e q u a r e n t a mil réis] , 240U000

A o juiz o r d i n á r i o , o d o u t o r J o s é M a d u r e i r a Belo de
C a r v a l h o , duzentos e q u a r e n t a mil réis , 240U000

A o " v e r e a d o r mais velho, o capitão C u s t ó d i o d e Sá Ferreira,


duzentos e q u a r e n t a mil réis 240U000

A o v e r e a d o r M a n u e l Gonçalves d e Oliveira, duzentos


e q u a r e n t a mil réis 24OU000
1:200Ü000

[fl. 344v. ] Vaie a lauda retro , .., .1:200ÜOOO

A o v e r e a d o r , o d o u t o r J o ã o Pita Loureiro, duzentos e


q u a r e n t a mil réis , , e 240U000

A o " p r o c u r a d o r d a C â m a r a , o capitão J o s é C o r r e i a M a i a ,
duzentos e q u a r e n t a mil réis 240U000

A o "escrivão d a C â m a r a , M a n u e l R o d r i g u e s F r a n c o ,
duzentos e q u a r e n t a mil réis 240U000

A o ^tesoureiro d o S e n a d o , o alferes A n t ô n i o F e r r e i r a d a Silva,


c e n t o e vinte mil réis 120U000

A o "porteiro e "guarda-livros do S e n a d o , Filipe d e Oliveira dos


Santos, trinta mil réis 3OUO0O

A o "alcaide desta Vila, A n t ô n i o J o s é Ferreira, trinta mil réis 3OU000


2:100ü000
647

O *juiz V e r e a d o r e s e " p r o c u r a d o r d o S e n a d o d a C â m a r a q u e servimos o


f [ fl. 345 ]
presente a n o p o r eleição etc.

M a n d a m o s a o "tesoureiro deste S e n a d o , "alferes A n t ô n i o Ferreira d a Silva,


que, visto este n o seu m a n d a d o , indo p o r nós assinado e m seu c u m p r i m e n t o , satis-
faça pelas r e n d a s dos bens deste "concelho às pessoas conteúdas n a folha retro as
quantias q u e a c a d a u m pertence, q u e tudo importa dois *contos e c e m mil *réis, e a

c o m quitação, digo, e com recibo, digo, dois contos e cem mil réis, a qual q u a n t i a se
lhe levará e m conta nas q u e der todas as vezes q u e mostrar firma das pessoas q u e
receberem, cuja firma será ao p é d a parcela que a cada u m toca n a dita folha atrás
declarada, e eu, M a n u e l Rodrigues Franco, escrivão da C â m a r a , q u e o escreve.

Siqueira. Sá. Oliveira. Pita. Maia.

• 87 «

[Rendimentos das câmaras da comarca do Rio das Mortes]

Relação dos rendimentos das vilas de São J o ã o del-Rei e de


São José, compostos por: aferição de pesos e medidas, pela tri-
butação do gado destinado aos cortes de carne, carceragem, fo-
ros, acrescida de informação das receitas auferidas no exercício
do ofício de escrivão das respectivas câmaras.
Considerando-se que constava dentre as atividades dos
ouvidores elaborar avaliações sobre o rendimento das câmaras,
trata-se aqui de material voltado para as rotinas do magistrado.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : anônimo; c o m a r c a dp R i o das
Mortes;. 1751.
D e s t i n a t á r i o : Caetano da Costa Matoso.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, caligrafada
e regularizada do século X V I I I . T r a z maiúsculas em m ó d u l o
grande, ornadas p o r amplas volutas; vários tipos d e "s" final:
r e d o n d o , p e n d e n t e simples c o m cajado, e m forma d e " z " ,
caudado; "d" minúsculo uncial, com voluta que se acopla ao "e'*;
"f' minúsculo duplo; sinal de nasalização retilíneõ, em posição
horizontal ou vertical à letra. (YDL)

2:100ÜOOO.
648

[fl. 3 4 6 ] R e n d i m e n t o d a C â m a r a d a v i l a d e S ã o J o ã o este a n o d e 1 7 5 1

R e m a t o u - s e "aferição e m . . . 946 "oitavas


As "cabeças e m 856
A "cadeia e m , 100
O s "foros e m 148
2.05Q oitavas

R e n d i m e n t o d a C â m a r a d a vila d e S ã o J o s é e s t e a n o d e 1 7 5 1

R e m a t o u - s e a aferição e cabeças e m ..2.155 oitavas


A cadeia e m ,. 60
T e r á d e foros q u e se n ã o r e m a t a r a m , 20
2.235 oitavas

Isto é o q u e as " c â m a r a s das d u a s vilas t ê m d e r e n d a c a d a a n o , mais d e z


m e n o s dez, e n ã o sei q u e t e n h a m mais n a d a etc.
E c o m o n ã o sei se Vossa M e r c ê p e d e o r e n d i m e n t o das c â m a r a s ou d a "escri-
v a n i n h a delas, t a m b é m tirei i n f o r m a ç ã o d o q u e r e n d e m p o r "escrivães q u e j á
serviram, e dizem q u e o de São J o s é h á d e r e n d e r três mil "cruzados e o d e São
J o ã o u m '"conto d e réis etc.
É o q u e neste particular posso a Vossa M e r c ê dizer etc.

• 88 <

[ fl. 347 ] Ofícios das Minas"

Listas discriminando para as diversas vilas de Minas Gerais


os respectivos ofícios de Justiça e Fazenda. Oferecem perspecti-
vas de ganhos para a Fazenda Real, pois as serventias destes
ofícios eram arrematadas por triénios.

A
- Por "decreto de 18 de fevereiro de 1741 se mandaram rematar todos os ofícios.
649

U m a vez q u e constituía atribuição do governador e do


ouvidor arbitrar o valor das terças partes, trata-se aqui de mate-
rial voltado para as rotinas do magistrado.
A u t o r i a , l o c a l , d a t a : C a e t a n o d a Costa M a t o s o ; Vila
Rica; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva do
século X V I I I , pouco regularizada, m a s bastante personalizada.
Maior cursividade no "d" minúsculo uncial com orelha superior,
que forma ligatura com as vogais seguintes; vários tipos de " s "
minúsculo: redondo, pendente com volteio em forma de cajado e
caudado com laçada; "g" minúsculo com duplo olho e perfil; " p "
minúsculo de dupla haste, em forquilha; ponto de fuga do "a" e
" e " finais de palavra em curva ascendente. Letra de Caetano da
Costa Matoso. (YDL)

Vila R i c a - "porteiro, "solicitador e "guarda-livros da F a z e n d a Real; "escrivão


d a C â m a r a ; escrivão d a A l m o t a ç a r i a ; escrivão d o meirinho-geral; " m e i r i n h o das
execuções; escrivão d o meirinho das execuções; meirinho da Almotaçaria; seu escri-
vão; m e i r i n h o do c a m p o ; seu escrivão; escrivão d o alcaide; porteiro dos juízos; es-
crivão d a F a z e n d a Real- "tesoureiro dela; meirinho d a F a z e n d a Real; seu escrivão.

C a r m o - escrivão d a C â m a r a ; m e i r i n h o d o c a m p o ; seu escrivão; escrivão do


alcaide.

S a b a r á - e s c r i v ã o d o m e i r i n h o - g e r a l ; m e i r i n h o d o c a m p o ; s e u escrivão;
m e i r i n h o das execuções; seu escrivão; escrivão d o alcaide; porteiro dos "auditórios.

Vila N o v a d a R a i n h a do C a e t é - m e i r i n h o do c a m p o ; seu escrivão; m e i r i n h o


das execuções; seu escrivão; escrivão do alcaide; p o r t e i r o dos auditórios.

Vila do P i t a n g u i - escrivão do alcaide.

Arraial d e S ã o R o m ã o - "tabelião do público e escrivão dos órfãos.

S e r r o d o Frio
Vila d o P r í n c i p e - escrivão da C â m a r a e A l m o t a ç a r i a ; escrivão dos órfãos;
inquiridor, distribuidor e contador; meirinho-geral; meirinho do campo; seu escrivão;
escrivão do alcaide; meirinho d a F a z e n d a Real; seu escrivão; porteiro dos auditórios.

Vila d e S ã o J o ã o - escrivão dos órfãos; meirinho-geral; seu escrivão; m e i r i n h o


do c a m p o ; seu escrivão; m e i r i n h o das execuções; seu escrivão; escrivão do alcaide;
p o r t e i r o dos auditórios.
650

Vila de São J o s é - "escrivão dos órfãos; escrivão das execuções; "inquiridor,


"contador e "distribuidor; "tabelião do público; "meirinho d o c a m p o ; seu escrivão;
meirinho das execuções; seu escrivão; escrivão d o alcaide; "porteiro dos "auditórios.

• 89 «

[ fl. 348 j Condições com que se rematou o segundo contrato


da extração dos diamantes

Instrumento legal regulando através de 22 parágrafos os


direitos e ãs obrigações a serem cumpridas entre a Fazenda real
e o contratador dos diamantes J o ã o Fernandes de Oliveira no
período de janeiro de 1744 a dezembro de 1747. O contrato
celebrado, em suas diversas cláusulas, regulamentava e m deta-
lhes os procedimentos quanto à extração dos diamantes, desde
condições de pagamento, regiões de mineração e emprego de
escravos.
Texto legal, parece subsidiar a preparação de parecer rela-
cionado aos direitos dos contratadores. Vinculado ao documen-
to seguinte.
Autoria, l o c a l , data: Conselho Ultramarino; Lisboa; 1743.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á í i c o : Escrita moderna, cursiva ve-
loz do século X V I I I , pouco regularizada e destrógrada. C o m
maiúsculas capitulares em módulo grande: " S " destrógiro, com
volutas amplas e laçadas, "P" com laçadas e volutas sobrepostas,
de traços sinistrógiros e destrógiros, "Q_" semelhante ao " g " uncial
(com formato de C, provido de haste inferior e laçada horizon-
tal). As minúsculas apresentam variedade de "s", " p " com haste
em forma de cajado, "f' de haste superior dupla e m ângulo e
traço horizontal em voluta ascendente. Sinal de nasalização ver-
tical. E m página solta, fólio 355v, anotação bibliográfica com
letra de Gaetano da Costa Matoso. (YDL)
C r i t é r i o s editoriais: Deslocamento de texto e colação fei-
tos a partir da cópia do APM, C C 1048, fI.179-183v. e restritos
aos termos que comprometiam o entendimento, mantidas as pe-
quenas variantes introduzidas pelo copista. Anotação bibliográ-
fica de Caetano da Costa Matoso apresentada c o m a escólio ao
final deste documento.
651

Cópia manuscrita:
A P M , C C 1048, ü,179-183v.
Cópia impressa:
D O D E S C O B R I M E N T O dos diamantes diferentes métodos
e

que se têm praticado na sua extração. Anais da Biblioteca Naci-


onal äo Rio de Janeiro, Rio d e j a n e i r o , v. 80, p. 145-152, 1960.

- 1*-

S e r á r e m a t a d a a extração dos d i a m a n t e s p o r c o m p a n h i a p e l o t e m p o d e q u a -
t r o a n o s , q u e t e r á p r i n c í p i o e m o p r i m e i r o d e j a n e i r o d e 1744 e findará e m Q
ú l t i m o d e d e z e m b r o d e 1747. O s "contratadores p o d e r ã o m i n e r a r c o m o n ú m e r o
de seiscentos escravos, e n t r a r estes nos serviços q u e rfarãol no q u e n ã o for notori-
a m e n t e inútil o u impossível, p r i n c i p i a n d o n o rio J e q u i t i n h o n h a nos seus "tabulei-
ros, v e r t e n t e s , veio d e á g u a e " g u a p i a r a s , sendo o p r i m e i r o serviço n a lavra do
M a t o , e dela c o n t i n u a r ã o os mais alternativamente c o m o se p r a t i c a m i n e r a r pelo
m e s m o rio até s e r e m findos os q u a t r o anos d a p r e s e n t e r e m a t a ç ã o , e se n o dito
t e m p o c h e g a r e m à b a r r a d o ribeirão do I n f e r n o ou do rio das P e d r a s p o d e r ã o
c o n t i n u a r o serviço p o r u m deles, o q u e m e l h o r lhe parecer,

P o d e r á a c o m p a n h i a trabalhar, n o t e m p o d a seca ou das águas, nos "corgos


q u e p e l a e x t e n s ã o dos serviços forem [ e n t r a n d o ! n o rio, e q u a n d o as á g u a s lhe
e m b a r a c e m os serviços nos ditos corgos p o d e r á continuá-los nos de S a n t a M a r i a ,
no do B o m Sucesso, C a f u n d ó , nas guapiaras do ribeirão do Inferno e n o C u r r a l i n h o
e suas v e r t e n t e s , e se for necessário, p o r n ã o h a v e r serviços reais b a s t a n t e s n a s
terras d e m a r c a d a s pela c o n t i n u a ç ã o dos anos, se lhe concede u m ou dois n o ribei-
r ã o do Inferno, o n d e for justo.

-3*-

Q u e além dos escravos "capitados pela I n t e n d ê n c i a dos D i a m a n t e s n ã o p o -


d e r á haver nos serviços a l g u m o u t r o , e a c h a n d o - s e será confiscado, exceto u m q u e
se p e r m i t e , c a p i t a d o n a I n t e n d ê n c i a d o O u r o , p a r a o serviço / / d o m é s t i c o d e [ fl. 348v. ]
c a d a u m dos administradores e feitores b r a n c o s e q u a t r o p a r a cozinheiros e m a i s
diligências de c a d a u m dos serviços reais. M a s se estes m i n e r a r e m n o serviço ou
forem t r a b a l h a n d o neles, i n c o r r e r ã o nas p e n a s impostas aos Tquel f u r t i v a m e n t e
e x t r a í r e m d i a m a n t e s , p a r a o q u e o " i n t e n d e n t e ou "oficiais d e g u e r r a e " c a b o s
652

farão repetidas diligências, inquirições e revistas. M a s dos escravos "capitados p o -


d e r á a c o m p a n h i a m a n d a r q u a t r o a descobrir os "corgos q u e d e s a g u a m e m o rio,
n a p a r t e q u e os serviços se fazem.

Q u e os escravos permitidos à c o m p a n h i a p a r a o lavor dos d i a m a n t e s n ã o sejam


obrigados, no t e r m o de q u a t r o anos, à capitação do o u r o , e sendo S u a Majestade
servido p a g u e m s e m p r e as q u a t r o "oitavas e três quartos n a sua respectiva "inten-
d ê n c i a se a b a t e r á esta i m p o r t â n c i a do p r e ç o p o r q u e se h o u v e r e m c a p i t a r n a [dos]
Diamantes.

P o r q u e é fatível q u e a l g u m dos escravos c a p i t a d o s fuja, a d o e ç a ou m o r r a


fugindo, serão obrigados os a d m i n i s t r a d o r e s ou feitores a dar, n o t e r m o d e q u a -
r e n t a e oito h o r a s , c o n t a a o "intendente, c o m o n o m e e mais sinais do tal escravo,
d e c l a r a n d o q u e m é seu senhor, p a r a q u e as g u a r d a s dos "dragões e as da m e s m a
c o m p a n h i a o b u s q u e m , e n a m e s m a f o r m a d a r á p a r t e logo q u e o escravo volte a o
serviço, a o q u e t a m b é m serão obrigados os g u a r d a s ou soldados q u e os p r e n d e -
r e m , d a n d o - s e - l h e o j u r a m e n t o . E n c o n t r a n d o estes o n e g r o , lhe m a n d a r ã o d a r
d u z e n t o s açoites e o e n t r e g a r ã o no serviço a q u e tocar, p a g a n d o o "feitor a o solda-
do q u e o p r e n d e r o q u e o r d i n a r i a m e n t e se pratica c o m negros fugidos. E logo q u e
o feitor h o u v e r d a d o p a r t e n a I n t e n d ê n c i a d e h a v e r fugido o n e g r o , se p o r á n o t a
n o assento dele, a q u a l se l e v a n t a r á c o m a p a r t e d e h a v e r v o l t a d o a o serviço.
P o r é m , se os g u a r d a s e n c o n t r a r e m negros m i n e r a n d o nas terras proibidas, haven-
[ fl. 349 ] do os feitores faltado a d a r p a r t e da sua ausência, serão confiscados n a forma / /
q u e ao p r e s e n t e se pratica. O s escravos q u e a d o e c e r e m n o serviço serão levados
ao hospital q u e a c o m p a n h i a tiver neste arraial, e d a n d o - s e p a r t e a o i n t e n d e n t e
m a n d a r á logo o seu "escrivão e x a m i n a r se o escravo é dos capitados, o q u e cons-
t a r á pelas confrontações d o "bilhete d a "matrícula ç pelo j u r a m e n t o do adminis-
trador. E o dia q u e o escravo estiver c a p a z de voltar ao serviço, se a p r e s e n t a r á a o
i n t e n d e n t e p a r a lhe m a n d a r p ô r n a m a r g e m d o seu assento a alta e. saída do hos-
pital. E ps dias q u e Os escravos fugidos ou doentes tiverem p e r d i d o o serviço se
ressarcirão à c o m p a n h i a n a forma seguinte: no fim de c a d a u m m ê s , m a n d a r á o
i n t e n d e n t e tirar do assento dos negros fugidos e doentes a c o n t a das suas falhas, e
c o m certidão delas feita pelo escrivão e firmada pelo i n t e n d e n t e r e q u e r e r á a c o m -
p a n h i a ao "general m a n d e p ô r u m a "portaria q u e expresse o referido n a certidão,
q u e n o m ê s seguinte se lhe p e r m i t a , além dos seiscentos escravos d e sua r e m a t a ç ã o ,
os q u e b a s t a r e m p a r a r e e n c h e r as ditas falhas, e os concedidos p e l a p o r t a r i a t r a b a -
l h a r ã o s o m e n t e até se c o m p l e t a r a p e r d a q u e resultou d a fugida ou d o e n ç a dos
653

escravos, m a s n ã o t e r á efeito e n q u a n t o o " i n t e n d e n t e lhe n ã o p u s e r o " c u m p r a -


se" e ficar registrada n a I n t e n d ê n c i a , de cujo dia e m d i a n t e se lhe fará a c o n t a .
M o r r e n d o a l g u m escravo, será obrigado o a d m i n i s t r a d o r ou "feitor a m a n d á - l o a
este arraial p a r a se enterrar, e x a m i n a n d o , p r i m e i r o , n a f o r m a q u e se a p o n t a c o m
os d o e n t e s . O i n t e n d e n t e fará recolher o "bilhete do escravo defunto e metê-lo e m
linha, c o m certidão do escrivão p a r a a c o n t a dos de q u e estiver e n t r e g u e , e p o n d o -
se d e c l a r a ç ã o ao m o r t o no assento d a "matrícula se abrirá título a o u t r o escravo,
dando-se-lhe n o v o bilhete. E caso q u e o rio leve a l g u m negro do t r a b a l h o c o m a
força d a á g u a , passará o i n t e n d e n t e a o serviço p a r a e x a m i n a r o sucesso, e verifica-
d o , c o m c e r t i d ã o do escrivão, se recolherá o bilhete do escravo m o r t o , d a n d o - s e
o u t r o ao n o v o escravo, c o m as prevenções a c i m a ditas.

-6 -S

Q u e p o s t o haja dois ou três r e m a t a n t e s neste "contrato, lhes sejam p e r m i t i d o


dividi-lo e m coartos, isto é, e m três ou q u a t r o p a r t e s , d a n d o fianças seguras e m
/ / c a d a u m a delas, à satisfação do "general, do i n t e n d e n t e e " p r o v e d o r d a F a z e n - [ fl. 349v. ]
da R e a l , ficando t o d o s os q u e nele tiverem "praças obrigados a p a g a r à F a z e n d a
R e a l , c o n t u d o , a i m p o r t â n c i a d a dita p a r t e , p o d e n d o c o b r a r o q u e p o r seus sócios
p a g a r e m c o m o dívida d a F a z e n d a R e a l , e daí e m d i a n t e f i q u e m os r e m a t a n t e s
desobrigados nas p a r t e s d e q u e tiverem feito trespasse.

-7 -9

Q u e m o r r e n d o a l g u m dos sócios, n ã o p o d e r ã o , pelo j u í z o dos ausentes o u o u t r o


a l g u m , ser a r r e c a d a d o s ou v e n d i d o s os escravos q u e se lhe a c h a r e m n a c o m p a -
n h i a , e os m a i s bens q u e o defunto tiver ficarão e m depósito n o j u í z o e m q u e se
l h e i n v e n t a r i a r e m até se findar o t e m p o d a sociedade. M a s se os h e r d e i r o s antes
disso ajustarem contas c o m a c o m p a n h i a , se n ã o fará retenção a l g u m a n a h e r a n ç a ,
m e n o s nos negros, os quais d e v e m ficar n a c o m p a n h i a até o fim do q u a r t o a n o , e
h a v e n d o livro q u e p e r t e n ç a a o defunto o m a n d a r á o i n t e n d e n t e e n t r e g a r a q u e m
t o c a r , c o m os escravos i n v e n t a r i a d o s . P o r é m , s e n d o a c o m p a n h i a , e m a l g u m a
p a r t e , c r e d o r a a o defunto, f a r á o i n t e n d e n t e v e n d e r a " p r e g ã o os escravos q u e
necessário for p a r a seu p a g a m e n t o .

-8 -9

Q u e se fará l a n ç a r " b a n d o nesta capitania e n a do R i o de J a n e i r o q u e declare


q u e t o d a pessoa q u e tiver d i a m a n t e s b r u t o s os r e m e t a p a r a a cidade de Lisboa n a
p r i m e i r a "frota, e os q u e forem a c h a d o s depois d e l a p a r t i r se confiscarão p a r a a
c o m p a n h i a , d a n d o esta a m e t a d e a q u e m os d e n u n c i a r , e deste b a n d o f a r á o
654

"general ciente a o s e n h o r "vice-rei deste E s t a d o , p e d i n d o - l h e q u e , a t e n d e n d o à


u t i l i d a d e e s e g u r a n ç a d a F a z e n d a de S u a M a j e s t a d e , q u e i r a m a n d a r p r a t i c a r o
m e s m o nos m a i s governos dela, e h a v e n d o q u e m d e n u n c i e nas s e g u i n t e s "frotas
pessoa q u e leve ou r e m e t a p a r a a C o r t e diamantes brutos se„ lhe t o m e sua d e n ú n -
cia, t a n t o n o Brasil c o m o n o R e i n o , e p r o v a d o q u e seja se observe o disposto neste
capítulo.

Q u e se conservará nas terras d e m a r c a d a s e nas m a i s e m q u e se e n t e n d e r esta


p r o i b i ç ã o a g u a r d a d e "dragões q u e a t u a l m e n t e h á ou m a i o r , q u a n d o a o general
[ fl. 350 ] p a r e ç a / / necessário, e se observarão as p e n a s q u e ao p r e s e n t e estão impostas e as
mais q u e lhe p a r e c e r necessário.

- 10 - â

Q u e fazendo-se as "presas pelos g u a r d a s s e m h a v e r d e n ú n c i a d e p a r t e d a


c o m p a n h i a , será a m e t a d e p a r a a F a z e n d a R e a l e [a] o u t r a m e t a d e p a r a os solda-
dos e "oficial q u e a fizer. P o r é m , se h o u v e r d e n u n c i a n t e , p o s t o q u e seja a presa
feita pelos soldados, tocará u m a p a r t e dela à c o m p a n h i a e o u t r a a o d e n u n c i a n t e e
a terceira ao " c a b o e soldados q u e fizerem a p r e s a , e s e m p r e q u e os a d m i n i s t r a d o -
res r e q u e i r a m se dê busca ou faça a l g u m e x a m e o fará assim executar o c o m a n d a n t e .

Q u e toda a pessoa q u e nas terras n ã o tiver "oficio n e m cargos, cujas pessoas


v u l g a r m e n t e se c h a m a m traficantes, saiam, n o t e r m o d e dois meses, da dita de-
m a r c a ç ã o , e o q u e depois for e n c o n t r a d o nela p a g a r á d a cadeia c e m "oitavas de
o u r o , p e l a p r i m e i r a vez e sairá fora da c a p i t a n i a e p e l a s e g u n d a se lhe s e n t a r á
p r a ç a p a r a a N o v a C o l ô n i a , R i o G r a n d e o u ilha d e S a n t a C a t a r i n a . E t o d a s as
pessoas q u e d e n o v o vierem a este arraial ou terras d e m a r c a d a s t e n h a m obrigação
d e ir, e m t e r m o de. seis dias, à p r e s e n ç a do "intendente d a r c o n t a do oficio, n e g ó -
cio o u d e p e n d ê n c i a q u e a elas o traz e a p r e s e n t a r á j u n t a m e n t e o o u r o q u e tiver d e
c a b e d a l , p a r a que, e x a m i n a n d o tudo, c o m licença do i n t e n d e n t e , possa residir, e
faltando a d a r esta c o n t a serão r e p u t a d o s c o m o traficantes.

- 12 - §

Q u e h a v e n d o suspeita c o n t r a a l g u m a pessoa deste arraial o u distrito de ser


c o m p r a d o r ou extraidor de diamantes, d a r ã o os administradores conta ao intendente,
o qual, tirando informação secreta e sendo pelas testemunhas culpado, a sentenciará
655

na forma d a lei e " b a n d o s . P o r é m , n ã o t e n d o inteiras p r o v a s m a s só suficientes


indícios, o fará despejar das terras d e m a r c a d a s s e m o u t r a / / p e n a , pela p r i m e i r a [ fl. 350v. ]
vez, e t o r n a n d o ã elas será remetido preso à sua custa à o r d e m do "general, o q u e ,
c o m m a i o r cuidado, se praticará com aqueles q u e têm "lojas de fazenda, "vendas ou
"tabernas.

- 13 - 9

Q u e h a v e n d o novos descobertos d e d i a m a n t e s n o c o n t i n e n t e deste g o v e r n o ,


sejam logo p r o i b i d o s , t o m a n d o - s e as providências necessárias e observando-se as
p e n a s q u e neste distrito são impostas, sem q u e possa permitir-se a e x t r a ç ã o , e m
n e n h u m a f o r m a , n o t e m p o deste a r r e n d a m e n t o . E caso q u e S u a M a j e s t a d e seja
servido m a n d a r abrir m i n a s d e d i a m a n t e s e m o u t r o governo, ficará à eleição d a
c o m p a n h i a c o n t i n u a r ou desistir deste "contrato, findo q u e seja o a n o atual, fican-
d o desde j á desobrigado a p a g a m e n t o a l g u m posterior a o dito a n o .

-14 - 9

Q u e todos ps d i a m a n t e s e ouro extraído nos serviços se recolherão e m u m cofre


d a c o m p a n h i a , q u e estará no d a R e a l F a z e n d a , n a I n t e n d ê n c i a dos D i a m a n t e s ,
c o m três chaves, das quais g u a r d a r á u m a o "intendente e as duas as pessoas q u e a
c o m p a n h i a d e t e r m i n a r . D e s t a caixa serão remetidos os d i a m a n t e s e m o u t r a mais
p e q u e n a n a " c o n d u t a q u e levar o o u r o d a "capitação, sendo f e c h a d a c o m duas
chaves, das quais o i n t e n d e n t e r e m e t e r á u m a a Vila R i c a , à m ã o d o g o v e r n a d o r ,
e m bolsa fechada, e a o u t r a se e n t r e g a r á à pessoa q u e a c o m p a n h i a escolher p a r a
ir ao R i o d e J a n e i r o ; e e n t ã o se coserá a caixa e m c o u r o cru p a r a ser r e m e t i d a c o m
t o d a a s e g u r a n ç a à dita c i d a d e , escoltada pelas m e s m a s g u a r d a s q u e leva u m a
capitação de c a d a u m a n o , e o intendente d a r á c o n t a a o general das "oitavas d e
p e d r a s q u e v ã o n a caixa, do peso, qualidade delas. O ouro q u e se tiver extraído e
estiver n a I n t e n d ê n c i a , disporá dele a c o m p a n h i a c o m o lhe p a r e c e r , d e i x a n d o n a
caixa as clarezas necessárias p a r a a c o n t a dos interessados.

- 15 - â

N a Gasa dos Contos do R i o de J a n e i r o se entregarão os d i a m a n t e s e m p e q u e -


nas caixas aos oficiais.// e c o m a n d a n t e s das naus de guerra. A c a d a u m dos c o m a n - [ fl. 351 ]
dantes se. e n t r e g a r á u m a das chaves, e metidas as ditas caixas nas [naus] a pessoa
n o m e a d a pela c o m p a n h i a r e m e t e r á as mais chaves, c o m seus c o n h e c i m e n t o s cor-
rentes, aos p r o v e d o r e s , digo, p r o c u r a d o r e s eleitos n a C o r t e d e Lisboa, os quais,
p a i a r e c e b e r e m os diamantes, p a g a r ã o logo a importância do a n o vencido ou d a r ã o
fianças a satisfazerem no t e r m o de q u a t r o meses, e n ã o d a n d o a dita fiança ficarão
656

os d i a m a n t e s n a C a s a d a M o e d a , de o n d e os ditos caixas os p o d e r ã o v e n d e r n a
p r e s e n ç a d e u m "ministro q u e Sua M a j e s t a d e lhes d e p u t a r , satisfazendo do seu
p r o d u t o o q u e d e v e r e m à R e a l F a z e n d a do dito senhor. P o r é m , se findos os q u a t r o
meses n ã o estiver feita a v e n d a dos diamantes, será d a real g r a n d e z a d e Sua Majes-
tade o p e r m i t i r m a i s p r o r r o g a ç ã o de t e m p o , c o m declaração q u e n a p r i m e i r a "frota
q u e voltar do R i o de J a n e i r o p a r a a C o r t e n ã o será obrigada a c o m p a n h i a a p a g a -
m e n t o a l g u m , se. n ã o tiver findo o p r i m e i r o a n o d e seu "contrato, e. caso se n ã o
tirem diamantes e m algum dos quatro anos e m tal q u a n t i d a d e q u e segure o paga-
m e n t o vencido, satisfará a c o m p a n h i a c o m o u r o e m p ó , e m Vila R i c a , o q u e se
e n t e n d e r virá a faltar e m Lisboa p a r a completar o p a g a m e n t o , segurando-se sempre
n a avaliação dos d i a m a n t e s q u e forem r e m e t i d o s v a n t a g e m aos q u e r e s t a r e m à
F a z e n d a Real. E p a r e c e n d o à c o m p a n h i a fazer seu p a g a m e n t o ou p a r t e dele nesta
capitania, se lhe aceitará e m ouro e m p ó n a forma q u e n a F a z e n d a R e a l se pratica.

- 16 - §

Q u e se a c h a n d o a l g u m a p e d r a g r a n d e , n ã o t e n h a vigor, e m t o d o , a lei d e
vinte e q u a t r o d e d e z e m b r o d e mil setecentos e t r i n t a e q u a t r o , e s o m e n t e seja
o b r i g a d a a c o m p a n h i a , c o m as p e n a s d a dita lei, a a p r e s e n t á - l a p a r a proferir a
F a z e n d a R e a l p r e ç o p o r p r e ç o a q u a l q u e r o u t r o c o m p r a d o r , e ficará logo a sua
i m p o r t â n c i a inclusa n o p a g a m e n t o q u e a c o m p a n h i a dever.

- 17 - 3

Q u e será juiz privativo dos interessados, no que toca à c o m p a n h i a , o


" i n t e n d e n t e dos d i a m a n t e s , n a f o r m a q u e o é o "provedor d a F a z e n d a R e a l nas
m a i s r e n d a s reais.

- 18 - §

[ fl. 351v. ] T i r a r á o i n t e n d e n t e todos os anos u m a "devassa n ã o só / / neste arraial m a s


nas m a i s terras d e m a r c a d a s , e m q u e inquirirá d a e x t r a ç ã o e fraude q u e tiverem
feito os m o r a d o r e s das ditas terras se os interessados n a c o m p a n h i a , seus adminis-
t r a d o r e s ou feitores f r a u d a r a m a m e s m a d a n d o ou v e n d e n d o os d i a m a n t e s ou
fazendo o u t r o a l g u m negócio e m d a n o dele ou d a F a z e n d a R e a l . E p a r e c e n d o a o
"general m a n d a r tirar mais a l g u m a devassa ou r e q u e r e n d o - l h e a c o m p a n h i a , d a r á
as o r d e n s ao ministro q u e entender.

- 19 - §

S e n d o n e c e s s á r i a m a i s a l g u m a coisa, d i g o , cláusula, a l é m das e x p r e s s a d a s


p a r a a g u a r d a das terras d e m a r c a d a s , a expressará o general, sendo-lhe r e q u e r i d a
e e n t e n d e n d o - a necessária.
657

-20 - 3

Q u e faltando-se a o estipulado nestas condições, justificando-se o prejuízo n a


forma d a lei, se lhe leve e m c o n t a a c o m p a n h i a n o q u e dever, e t e n d o j á p a g o se l h e
t o m a r á a m e s m a importância.

Seguem-se as duas condições acrescidas ao dito "contrato.

-21--

Q u e se l h e d a r á p o r esta P r o v e d o r i a o p r é s t i m o d e c e n t o e c i n q ü e n t a m i l
"cruzados, q u e ele, r e m a t a n t e , r e c e b e r á e m c a d a u m dos ditos q u a t r o a n o s p a r a
c u s t e a m e n t o d o m e s m o c o n t r a t o , sendo o b r i g a d o o dito J o ã o F e r n a n d e s d e Oli-
veira a p a g a r esta, q u a n t i a p e l a v e n d a dos d i a m a n t e s q u e se v e n d e r e m , p e r t e n c e n -
tes a c a d a u m dos respectivos anos q u e a receber.

- 22 - §

Q u e se lhe. c o n c e d e m , findo este segundo c o n t r a t o , três meses p a r a "lavarem


o "cascalho q u e se r e s t a r e m d a extração d o último a n o , s e m prejuízo d o c o n t r a t o
futuro, c o m o n ú m e r o dos escravos q u e forem necessários p a r a a dita l a v a g e m ,
p a g a n d o o q u e d e v e r *pro raia d o t e m p o q u e o n ú m e r o d o s escravos a q u e se
obriga p o r esta . / / segunda r e m a t a ç ã o . a
[ fl. 352 ]

Servidão: Ve. Molin. et just. etjur. tract.2, disp. 34 et 35 et Ve. Barb. et QÍíic. et pot A. copisc. p . 1, [ fl. 355v. ]
tit. 3, cap. n" 37. Cor Fejoo tom. 7, disc. 3. Povoação da América: Fejoo tom. 3, disc. 15. Cienc. et
çort. tom. 2, cap. 5. O padrq Simão Marques da Companhia dous tom. de Brasília Pontifícia.*

Indicações de bibliografia com letra de Caetano da Costa Matoso.


658

• 90 <

[ fl. 356 ] Cópia da sentença sobre o requerimento das falhas de Pilões

Sentença exarada pelo intendente dos diamantes Sancho de


Andrade Castro e LançÕes refutando impugnação encaminhada
pelo terceiro contratador dos diamantes, Felisberto Caldeira Brant,
a respeito das falhas de escravos doentes, fugidos ou mortos que
atuavam na demarcação dos rios Claro e Pilões, em Goiás. A
decisão toma por base a cláusula 5~ do contrato e a resolução
régia de 28 de janeiro de 1741, que determinavam que as faltas de
negros na extração diamantina deveriam ser cobertas no mês ime-
diato à ocorrência.
Este documento, com data posterior ao afastamento de Gae-
tano da Costa Matoso de seu posto em Vila Rica, demonstra
que seu compilador permanecia atento ao qüe ali se passava e
interessado no escândalo envolvendo o contratador no roubo do
cofre da Intendência do Serro Frio, em julho de 1752.
A u t o r i a , l o c a l , d a t a : Sancho de A n d r a d e Castro e
Lanções; Tijuco; 24.5.1752.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, cursiva do
século XVIII, bastante regularizada e caligrafada, com angulação
p e q u e n a à direita. Destacam-se; o " h " minúsculo em forma de
" E " redondo, em módulo grande; o " q " abreviado, com laça-
das inferior e superior em volteio intermediário; o " c " minúscu-
lo, também em módulo grande, alternando entre o simples, em
forma de semicírculo e com volutas; u "f' de dois olhos, com
movimento ascendente; " s " minúsculos de vários formatos: re-
dondo, pendente em forma de " z " , em u m a só linha, sinuosa,
com laçada, aproximando-se do " S " . Marginália com letra de
Caetano da Costa Matoso, fólio 356. (YDL)
Cópia manuscrita:
A H U , Gons. Ultram., Brasil/MG, cx. 60, doe. 29.

V isto c o m o o e m b a r g a n t e seja obrigado a m e t e r nos serviços todos os n e -


gros q u e b a s t e m p a r a s u p l e m e n t o das falhas q u e se averiguar e justificar
lhe são devidas, e isto ou sejam repartidas p o r todos eles ou e m u m só, e
desse mais ou m e n o s t r a b a l h o , e ainda prejuízo, seja de seu c u i d a d o e diligência o
evitá-lo, é igualmente o deste j u í z o evadir todos os danos q u e p o d e m c o n c o r r e r à
F a z e n d a R e a l , d e cujo p r o c e d i m e n t o se n ã o p o d e s e g u i r i n c o n v e n i e n t e a o
659

e m b a r g a n t e o b s e r v a n d o - s e - l h e , sem violência, as condições d o seu " c o n t r a t o . E


c o m o c o n f o r m e o q u e se estipulou, c o n c e d e u e aceitou n o t r a t a d o q u i n t o de sua
r e m a t a ç ã o , é q u e n o fim d e c a d a u m m ê s se tire d o assento dos negros fugidos e
doentes a c o n t a das suas falhas, p a r a logo n o m ê s seguinte se lhe a b o n a r e m , a d m i -
tindo-se-lhe q u a n t o s negros b a s t e m p a r a as p r e e n c h e r , cuja p o n t u a l o b s e r v a ç ã o se
r e c o m e n d a m u i t o n a resolução q u e S u a M a j e s t a d e foi servido t o m a r e m 28 d e
j a n e i r o d e 1741 e m consulta do seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o sobre ser c o n v e n i e n t e
se p r e e n c h a m os dias q u e faltarem logo n o m ê s adiante, a fim d e se evitar q u e os
dias p e r d i d o s no t e m p o das águas se refaçam n o das secas, e m q u e os "jornais são
mais úteis, n ã o p o d e o contrário ser atendível, obstando-lhe j u n t a m e n t e o n ã o se
t o m a r o u t r o a c o r d o a l g u m no ajuste q u e p o r o r d e m d o m e s m o s e n h o r celebrou o
s e n h o r "general c o m o p r o c u r a d o r do e m b a r g a n t e e m 21 d e m a r ç o p r ó x i m o p a s -
sado sobre o v e n c i m e n t o e p a g a das falhas d e Pilões neste c o n t i n e n t e . a
Porquanto
a i n d a q u e n o sobredito ajuste se tomasse a l g u m a resolução sobre o m o d o e t e m p o
e m q u e se lhe d e v i a m satisfazer e n ã o fosse r e v o g a d a a forma q u e d á a c o n d i ç ã o
quinta, p o r o n d e claramente, se c o n h e ç a q u e a o t e m p o da sua d e r r o g a ç ã o e r a S u a
Excelência i n f o r m a d o do q u e nela se c o n t i n h a , ficava n ã o o b r a n d o coisa a l g u m a ,
e m d a n o d a F a z e n d a R e a l , n ã o se fazendo expressa m e n ç ã o d a substância dela
c o m o ú n i c a / / lei do caso p r e s e n t e . E suposto q u e o a t r a s a m e n t o das m e s m a s [ fl- 356v. ]
falhas pudesse resultar dos motivos q u e alega n o p a r á g r a f o terceiro d a i m p u g n a ç ã o
o e m b a r g a n t e , estes se d e s v a n e c e m c o m os q u e refere o fiscal n a sua sustentação à
folha [incompleto], verificados p e l o q u e se d e c l a r a n a c e r t i d ã o à folha [incompleto],
q u e o m e s m o oferece, e m cujos termos julgo a c o m i n a ç ã o p o r sentença, q u e m a n -
do se c u m p r a e g u a r d e c o m o n e l a se c o n t é m e seja s e m custas. O escrivão passará
logo p o r c e r t i d ã o t o d o este p r o c e s s o p a r a m e e n t r e g a r . T i j u c o , 2 4 d e m a i o d e
1752. S a n c h o d e A n d r a d e C a s t r o e Lanções.

Que importam 83.500 Vi oitavas. 1

Escólio com letra de Caetano da Costa Matoso.


660

• 91 «

[Cópia de carta régia ao governador e capitão-general


do Rio de Janeiro comunicando a criação do bispado de Mariana
e recomendando toda ajuda ao novo bispo]

Cópia sem valor documental de ordem real transmitida ao


governador da capitania de Minas Gerais preparando a chega-
da do novo bispo.
Mesmo referindo-se a período anterior à posse do bispo de
Mariana, este diploma real integra o grupo de documentos com
informações sobre dom frei Manuel da Cruz, com o qual Caeta-
no da Costa Matoso viveria grandes desentendimentos.
A u t o r i a , l o c a l , d a t a : R a i n h a ; Lisboa; 21.4.1746.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita m o d e r n a , regulariza-
da e caligrafada do século XVIII, do tipo bastardo italiano, com
hastes superiores terminando em orelhas cheias e hastes inferio-
res alongadas, em forma de cajado ou semicírculo; " p " com per-
fil e haste sinistrógira em u m ou dois traços; "r" finais e m forma
de "v", com ponto de fuga em pronunciada meia voluta ascen-
dente. (YDL)
Cópias manuscritas:
AEAM, W 24, fl 5.
APM, SC 45, fl. 100.
APM, SC 86, fl. 65.
BNL, mss. 71, n. 8.
Copia impressa:
T R I N D A D E , Raimundo. Arquidiocese- de Mariana: subsídios para
sua história. São Paulo: Escolas Profissionais do Liceu Cora-
ção de Jesus, 1928. V. 1, p. 99-100.

G
[ fl. 357 ] ornes Freire de A n d r a d e , " g o v e r n a d o r e capitão-general d a c a p i t a n i a d o
. R i o d e J a n e i r o c o m o governo das M i n a s Gerais. A m i g o , eu, el-rei, vos
envio m u i t o saudar. C o n s i d e r a n d o a g r a n d e necessidade q u e t i n h a m os
m o r a d o r e s d a C i d a d e M a r i a n a e suas a n e x a s de pasto espiritual, a q u e n ã o p o d i a
a c u d i r o "bispo do R i o d e J a n e i r o , p e l a s g r a n d e s distâncias, q u e h á d e u m a s a
outras povoações, fui servido recorrer à S u a S a n t i d a d e p a r a q u e dividisse o dito
661

b i s p a d o , c r i a n d o u m novo *bispo n a m e s m a C i d a d e M a r i a n a , e p o r q u e neste se


a c h a p r o v i d o o bispo a t u a l do M a r a n h ã o , d e q u e j á t e m suas *bulas e h á d e ir
erigir o dito b i s p a d o e a S a n t a Igreja c a t e d r a l n a m e s m a c i d a d e , e e s p e r o q u e ,
pelas suas virtudes e mais circunstâncias q u e m e m o v e r a m a n o m e á - l o , o fará c o m
acerto, zelo, a m o r d e D e u s e d e suas ovelhas, m e p a r e c e u m a n d a r - v o s r e c o m e n -
d a r a sua pessoa p a r a q u e lhe deis a ajuda e favor d e q u e necessitar p a r a a n o v a
ereção e concorrais c o m ele p a r a t u d o q u e for a b e m de exercitar o seu pastoral
oficio, d e q u e receberei g r a n d e p r a z e r e pelo contrário m e haverei p o r m a l servi-
d o d e vós e pelo q u e p e r t e n c e às h o n r a s militares e políticas... 1

• 92 «
Cópia da carta do Ilustríssimo e Reverendíssimo bispo destas [ fl. 358 ]
Minas ao Senado da Câmara da Cidade Mariana,
recebida em 25 de agosto de 1747 anos

Carta episcopal que transmite recomendações pessoais para


a própria instalação n a sede do bispado, descreve dificuldades
enfrentadas nos caminhos entre M a r a n h ã o e Minas e solicita
boas condições de moradia.
Mesmo referindo-se a período anterior à posse do bispo de
Mariana, integra o grupo de documentos com informações sobre
d o m frei Manuel da Cruz, com o qual Caetano da Costa Matoso
viveria grandes desentendimentos.
A u t o r i a , l o c a l , d a t a : D o m frei M a n u e l d a C r u z ;
M a r a n h ã o ; 11.4.1747.
D e s t i n a t á r i o : Senado da C â m a r a da Cidade Mariana.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : A afetação de humildade ou de
autodesqualificação é artificio retórico que objetiva obter a con-
descendência do leitor. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, caligrafada
do século XVIII, na qual se destacam as amplas hastes superio-
res e inferiores, em forma de cajado ou semicírculos. Presença
do "s" caudado seguido de " s " simples, redondo; "d" uncial, ter-

Cópia interrompida no original.


662

minando em voluta; das Iigaturas "co"(em forma de " w " redon-


do) e "te" nas abreviaturas, com laçada (assemelhando-se ao "La"
redondo). Uso do duplo " f e do "y" em ditongos com sinal
diacrítico. (YDL)
Cópia manuscrita:
A H M I , C S P O P , D o m frei Manuel da Cruz, Copiador de cartas
particulares, fl. 87.
Cópia impressa:
T R I N D A D E , R a i m u n d o . Arquidiocese de Mariana: subsídios p a r a
sua história. São Paulo; Escolas Profissionais do Liceu Cora-
ção de Jesus, 1928. V. 1, p. 99-100.

J
á t e n h o notícias de. Vossas M e r c ê s e s t a r e m certos q u e S u a M a j e s t a d e , q u e
D e u s g u a r d e , a t e n d e n d o à sua real b e n e v o l ê n c i a , e n ã o a o m e u p o u c o ou
n e n h u m m e r e c i m e n t o , foi servido n o m e a r - m e *bispo desse n o v o b i s p a d o d e
M a r i a n a , m a n d a n d o - m e j u n t a m e n t e insinuar, n a *frota presente, q u e fizesse
a m i n h a j o r n a d a c o m a b r e v i d a d e possível, o q u e n ã o fiz o a n o p a s s a d o p o r
urgentíssimas razões d e q u e dei conta, fazendo tenção principiá-la neste m ê s por-
q u e cuidei j á teria c h e g a d o a frota. M a s c o m o agora, p o r u m a e m b a r c a ç ã o , che-
g a m notícias de q u e ela n ã o c h e g a r á senão nos princípios d e j u l h o , a i n d a q u e Faço
t e n ç ã o partir logo, c o m o infalivelmente hei de passar o inverno no sertão do Piauí,
só n o m a i o futuro p o d e r e i c o n t i n u a r a m i n h a j o r n a d a a essa c a p i t a n i a , a o n d e
chegarei e m s e t e m b r o , segundo as notícias q u e m e d ã o . B e m sei q u e a d e m o r a é
g r a n d e , m a s precisa, p o r q u e no inverno são invadeáveis os sertões, p r i n c i p a l m e n -
te os d o rio d e São Francisco. N e s t a d e m o r a , p o r é m , t e m Vossas M e r c ê s t e m p o de
dispor a s u a catedral e m termos q u e q u a n d o e u c h e g a r se possa n e l a dar princípio
aos ofícios divinos e louvores a D e u s , p o r q u e deste santo exercício resultam todas
[ fl. 358v. ] a s felicidades espirituais e corporais d e u m bispado. N ã o sei / / e m q u e p a r t e d a
c i d a d e está a catedral, n e m q u e casas m e d a r ã o p a r a a m i n h a residência; se forem
alugadas, c o m o aqui r e c o m e n d o a Vossas Mercês, m a s a l u g u e m p e r t o d a catedral
q u a n t o possível, e t e n d o q u i n t a l p a r a h o r t a l i ç a o e s t i m a r e i m u i t o , p o r q u e m e
d i z e m é deste gênero fertilíssimo esse *país. N ã o t e n h o notícias d e q u e m g o v e r n a
o eclesiástico dessa cidade, e p o r isso lhe n ã o escrevo, p o r é m Vossas M e r c ê s lhe
segurem, de m i n h a p a r t e , o g r a n d e gosto q u e terei de q u e assim a catedral c o m o
as casas d a m i n h a residência estejam n a m i n h a c h e g a d a n a f o r m a q u e r e c o m e n d o
a Vossas M e r c ê s , e s t a n d o todos c e r t o s q u e p a r a t u d o o q u e for d e seu gosto e
a g r a d o m e a c h a r ã o s e m p r e c o m a v o n t a d e m u i t o p r o n t a . D e u s g u a r d e a Vossas
M e r c ê s , c o m o m u i t o desejo e lhe rogo. M a r a n h ã o , 11 d e abril d e 1747.

D e Vossas Mercês,
mais afetuoso v e n e r a d o r .
Bispo
663

• 93 «
[Descrição das festividades da entrada do bispo de Mariana]

Descrição da entrada triunfal de d o m frei Manuel da Cruz


n a cidade de Mariana, das manifestações de júbilo e da instala-
ção do bispado.
Integra o grupo de documentos com informações sobre dom
frei M a n u e l d a Cruz, c o m o qual C a e t a n o d a Costa M a t o s o
viveria grandes desentendimentos.
Autoria, l o c a l , data: anônimo; Mariana, 1748.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato com características do gê-
nero encomiástico. A leitura de sinais da presença da divina pro-
vidência evidencia a vontade de Deus escolastícamente inscrita
n a ordem das coisas e profeticamente figurada nos fatos e na
natureza. Aplicação da tópica do "decoro", termo relativo ao
que então se considerava como características discursivas apro-
priadas a u m assunto, personagem ou cenário. {JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, caligrafada
do século XVIII, utilizando o "d" uncial com ou sem voluta; o
"s" duplo em dois traços curtos, paralelos e oblíquos; o " o " do
sufixo " ã o " rodado; vírgulas retas e oblíquas; uso do "y" como
semivogal. No verso do fólio 359, cálculos de soma e subtração
com letra de Caetano da Costa Matoso. (YDL)
Critérios: e d i t o r i a i s : Foram suprimidos cálculos de soma
e subtração no fólio 359v.
Cópias impressas:
K A N T O R , íris. Pacto festivo em Minas colonial: a entrada triun-
fal dó primeiro bispo n a sé de Mariana. São Paulo: Universi-
dade de São Paulo, F F L C H , 1996. p. 165.

C
h e g o u o s e n h o r "bispo das M i n a s ao seu palácio n a C i d a d e M a r i a n a e m [ fl. 359 ]
15 do m ê s de o u t u b r o d e 1748 pelas dez h o r a s da m a n h ã , é neste dia n ã o
fez a s u a " e n t r a d a c o m a solenidade que se c o s t u m a receber os senhores
bispos, p o r vir b a s t a n t e m e n t e molesto d a p r o l o n g a d a v i a g e m e dilatados sertões
q u e e x p e r i m e n t o u , pois c o n t a m d a q u i até. o M a r a n h ã o seiscentas e tantas "léguas,
e o Espírito S a n t o o a c o m p a n h o u , pois e m t o d a ela n ã o e x p e r i m e n t o u m a i s do
q u e u m a leve moléstia q u e teve, d a qual esteve s a n g r a d o , p o r cautela, três vezes.
C o m o necessitava de t o m a r a l g u m a c u r a p a r a o q u e pudesse suceder, gastou
esta a l g u m t e m p o , d o n d e veio a d a r sua e n t r a d a e m 28 de n o v e m b r o d o dito a n o ,
664

e se fez esta função c o m g r a n d e solenidade e assistência de t o d o o principal destas


M i n a s , fazendo-se-lhe u m a a p a r a t o s a procissão triunfal, q u e se c o m p u n h a d e dois
famosos *carros triunfantes, cheios de m ú s i c a , c a n t a n d o várias letras, r e p e t i n d o
m u i t o s vivas, q u e p a r e c i a m os p r ó p r i o s anjos. L e v a v a m o n z e figuras de c a v a l o ,
c o m várias insígnias n a m ã o , t u d o d e d i c a d o a o "prelado, três d a n ç a s g r a v e m e n t e
o r n a d a s a o p r ó p r i o do seu sentido. N a noite a n t e c e d e n t e se lhe deitou u m grave
"fogo, a l é m d a s m u i t a s línguas dele q u e t i n h a m a p a r e c i d o de noite pelas j a n e l a s
três dias sucessivos, depois d a q u e l e q u e , e m seu palácio, p o r t o u a p r i m e i r a vez, o
q u e se repetiu três dias mais n o dia q u e t o m o u posse d a sua catedral, h a v e n d o d e
noite e m seu palácio vários divertimentos q u e lhes d a v a m os m o r a d o r e s d a q u e l a
c i d a d e , q u e c o n s t a r a m d e bailes, óperas, " a c a d e m i a s , " p a r n a s o s , c o m é d i a , sona-
tas e vários saraus, t u d o m o d e s t o e c o m gravidade e asseio feito, e d u r a r a m estes
gratuitos divertimentos oito dias sucessivos, q u e se findou esta solenidade c o m a
n o v a eleição e posse do ilustre "cabido, q u e e m obséquio fizeram trino, p r e g a n d o
neles os m e l h o r e s o r a d o r e s q u e se p u d e r a m excogitar, sendo o p e n ú l t i m o o d o u -
t o r J o s é de A n d r a d e , "arcipreste e " p r o v i s o r d a m e s m a Sé, e ú l t i m o o d o u t o r
G e r a l d o J o s é , *arcediago e "vigário-geral d a m e s m a diocese, q u e p o r último co-
r o o u a o b r a , m a s c o m o o princípio, n o p r i m e i r o dia, e m q u e o r o u o r e v e r e n d o
p a d r e d o u t o r J o s é , n ã o foi m e n o s , n ã o p o d i a deixar d e ter b o m fim.

• 94 «

[ fl. 360 ] Cópia de um edital de Sua Excelência Reverendíssima

Cópia sem valor documental d e decisão episcopal dirigida


aos p á r o c o s c o m u n i c a n d o a s u s p e n s ã o d o r e g i m e n t o dos
emolumentos do bispado, publicado pelo bispo de Mariana a 3
de abril de 1751.
Integra o grupo de documentos com informações sobre d o m
frei M a n u e l da C r u z , com o qual C a e t a n o d a Costa Matoso
viveria grandes desentendimentos.
Autoria, l o c a l , data: dom Frei Manuel da Cruz, Mariana,
24.5.1751.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, cursiva do
século XVIII- Apresenta haste simples destrógira no 'l" minús- e

culo; haste inferior do " s " pendente, como cajado; "d" uncial e
haste ascendente no " a " final de palavra. Abreviaturas especiais
665

de palavras que começam com a letra " c " , com letras sobrepos-
tas inclusas. Nas quatro últimas linhas do fólio 360 e duas linhas
360v., letra com traçado evoluído e bastante personalizado, da
mão Caetano d a Costa Matoso. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Colação feita a partir da cópia do
AEAM, arquivo 1, gaveta 1, pasta 9, fl. 6EE-6EEv.
Cópias manuscritas:
AEAM, arquivo 1, gaveta 1, pasta 9, fl. 6EE-6EEv.

D o m frei M a n u e l da C r u z , da o r d e m do "melífluo d o u t o r São B e r n a r d o ,


p o r m e r c ê de D e u s e d a S a n t a Sé Apostólica, p r i m e i r o "bispo deste novo
b i s p a d o d e M a r i a n a , do C o n s e l h o d e S u a M a j e s t a d e Fidelíssima, q u e
D e u s g u a r d e . F a z e m o s saber q u e f a n d a n d o l nós e m "visita diocesana e fora dela
nos fizeram os nossos diocesanos repetidos r e q u e r i m e n t o s p a r a [que] m o d e r á s s e -
m o s os f e m o l u m e n t o s l p a r o q u i a i s e dos sacerdotes nas festividades, e ofícios, e
e n t e r r o s , e e n c o m e n d a ç õ e s e t c , e x p o n d o - n o s q u e p e l a e x o r b i t â n c i a d o s tais
e m o l u m e n t o s se d e i x a v a m d e fazer m u i t a s festas e ofícios n ã o só das " i r m a n d a d e s
c o m o t a m b é m pelos defuntos q u e faleciam, ao q u e , a t e n d e n d o n ó s c o m p a t e r n a l
p i e d a d e e desejando se fizessem sufrágios pelas almas n a f o r m a das "constituições
Te costumesl d e outros bispados, que este foi o principal motivo q u e nos í m o v e u l
a a t e n d e r as suas súplicas, lhes fizemos n o v o "regimento q u e se t e m p u b l i c a d o e m
m u i t a s freguesias. E p o r q u e nos consta c o m v e r d a d e q u e os p a r o q u i a n o s só obser-
v a m as cláusulas d o r e g i m e n t o q u e r e s p e i t a m aos e m o l u m e n t o s dos p á r o c o s e
sacerdotes e n ã o à satisfação dos ofícios e mais cláusulas do dito r e g i m e n t o , sus-
p e n d e m o s e fhavemosl p o r suspenso o tal r e g i m e n t o até o r d e m d e S u a M a j e s t a d e
Fidelíssima, a q u e m d e m o s conta, e, no e n t a n t o , c o b r e m os reverendos p á r o c o s os
seus e m o l u m e n t o s p e l o costume a n t i g o da p u b l i c a ç ã o deste e m diante. E p a r a q u e
fcheguel à n o t í c i a de t o d o s , m a n d a m o s a o r e v e r e n d o " p á r o c o a q u e m este for
e n t r e g u e , depois d e p u b l i c a d o e registrado n o livro dos capítulos d a visita e assi-
n a n d o - s e nas costas deste, o r e m e t e r á a o p á r o c o vizinho d a freguesia e m q u e o tal
r e g i m e n t o foi p u b l i c a d o e observado, p a r a q u e faça o m e s m o , e depois d e c o r r e r
t o d a a c o m a r c a desta C i d a d e o / / ú l t i m o r e v e r e n d o p á r o c o nô-Io e n v i a r á e m [fl. 360v. ]
c a r t a fechada. D a d o e passado etc. aos 24 d e m a i o . . . 1

Cópia interrompida no original.


• 95 <

[Ordem régia para que se publicasse o decreto de 19 de fevereiro


de 1752 proibindo a execução e penhora de escravos e fábrica de
minerar dos mineiros proprietários de mais de 30 escravos]

Cópia sem valor documental de decisão régia de proibir a


execução e a penhora de escravos e de equipamentos de minera-
ção dos proprietários que possuíssem mais de trinta escravos,
em decorrência de solicitação de privilégios aos mineiros seme-
lhantes aos concedidos aos proprietários de engenhos e com o obje-
tivo de arrefecer os ânimos contra a lei de 3 de dezembro de 1750.
Diploma legal fundamental para despachos, pareceres e sen-
tenças de u m magistrado em Minas Gerais, publicado e cumpri-
do em data posterior ao afastamento do compilador de seu posto
e m Vila Rica, demonstrando que permanecia atento ao que ali
se passava.
A u t o r i a , l o c a l , d a t a : C o n s e l h o U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
29.2.1752.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
U s o n a h i s t o r i o g r a f i a : Charles R. Boxer discute a im-
portância dos escravos nos trabalhos de mineração e, embora,
reconheça que a posse média de escravos em Minas Gerais não
era alta, ilustra a tensão promovida por comerciantes contra pro-
prietários, que com a nova lei ficavam isentos d e pagar seus
débitos n u m quadro de grande endividamento em Minas (A ida-
de de ouro do Brasil: dores de crescimento de u m a sociedade colo-
nial. 2. ed, São Paulo: Nacional, 1969. p . 203-204).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , cursiva e
caligrafada do século X V I I I . .Bastante inclinada à direita, mes-
m o nas letras redondas dotadas dejambage, como o " m " e V ;
"d" uncíal terminando em movimento circular; " s " pendente, com
larga cauda e do caudado seguido do " s " simples, em forma de
vírgula; Ugatura no grupo "Ih", c o m apex e fusão d a haste sim-
ples do "I" com a do "h".
Cópia manuscrita:
APM, SC 93, fl. 155-155v.
667

Cópia [fl. 3 6 4 ]

D o m J o s é , p o r g r a ç a d e D e u s , rei de Portugal e do Algarve, d ' a q u é m e d ' a l é m


m a r , e m Africa s e n h o r d e G u i n é etc. F a ç o saber a vós, G o m e s Freire d e A n d r a d e ,
" g o v e r n a d o r e capitão-general d a capitania d o R i o d e J a n e i r o c o m o g o v e r n o das
M i n a s G e r a i s , q u e p o r ser d a m i n h a real i n t e n ç ã o q u e r e r s e m p r e favorecer os
m e u s vassalos q u e t r a b a l h a m nas minas e q u e neste e m p r e g o se fazem t ã o dignos
dela, fui servido, p o r "decreto d e 19 de fevereiro do p r e s e n t e a n o , fazer-lhes m e r -
cê e g r a ç a d e q u e todo o m i n e i r o q u e tiver trinta escravos próprios e daí p a r a c i m a
se n ã o faça execução e p e n h o r a nos m e s m o s escravos n e m n a "fábrica d e m i n e r a r ,
c o r r e n d o só a d i t a e x e c u ç ã o e m os m a i s bens e n a t e r ç a p a r t e dos lucros q u e
t i r a r e m das m i n a s , d e q u e vos aviso p a r a q u e tenhais e n t e n d i d o a "resolução q u e
h o u v e p o r b e m t o m a r nesta m a t é r i a , o r d e n a n d o - v o s q u e a façais p u b l i c a r p a r a
q u e c h e g u e à n o t í c i a de t o d o s e p a r a este fim m a n d a r e i s t a m b é m registrar esta
o r d e m n a Secretaria desse g o v e r n o e e m todas as "ouvidorias e " c â m a r a s dele. El-
rei, nosso s e n h o r , m a n d o u pelos conselheiros do seu C o n s e l h o U l t r a m a r i n o a b a i -
xo-assinados é se p a s s o u p o r duas vias. T e o d o r o d e A b r e u B e r n a r d e s a fez e m
Lisboa a 29 de fevereiro de 1752. O secretário J o a q u i m Miguel Lopes d e Lavre a fez
escrever. F e r n a n d o J o s é M a r q u e s Bacalhau. Diogo Rangel de Almeida Castelo Branco.

• 96 <
Regimento de 10 de outubro de 1754 sobre os emolumentos dos [fl. 365 ]
ouvidores e mais Justiças das comarcas de Minas Gerais 1

Diploma legal fixando as propinas de ouvidores, juízes,


oficiais de Justiça, advogados, requerentes e carcereiros, válido
para Minas Gerais e para todas as comarcas em que houvesse
extração aurífera. Atendia a solicitações freqüentes das câmaras
de Minas Gerais de redução dos gastos com a Justiça n a região.
E comentado pelo documento 97.
As anotações de Caetano da Costa Matoso concentram-se
na comparação dos valores fixados pelo antigo regimento de 17
de setembro de 1721 e pela legislação complementar com os novos
emolumentos e nas críticas aos parcos rendimentos a partir da
nova regulamentação, consideradas as grandes despesas e a cares-
tia local.

Título e escólios da lavra de Caetano da Costa Matoso.


668

Este documento, fundamental p a r a a atuação de u m m a -


gistrado êm Minas Gerais, com data posterior ao afastamento
girncnto, cjt de C a e t a n o da Costa Matoso de seu posto em Vila Rica, de-
neceííarias, c monstra
passava.
que seu compilador permanecia atento ao que ali se

fefaramença Autoria, l o c a l e data: Rei; Belém; 10.10.1754.


dfignaturasj A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O p r e s e n t e r e g i m e n t o , cujo
narrador fala na primeira voz, é precedido por breve exórdio e é
composto por seções onde se detalham as instruções, prevalecen-
*A *****do*a forma imperativa na linguagem e a construção de períodos
pela combinação de hipotaxe e parataxe, típica dos discursos
ri
/ « A . *******
jurídicos
i m

' * w*
ou legislativos da época. Nos comentários, aplicação
da tópica do empenho dos mineiros e da decadência das Minas.

_ * C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna. Texto im-


presso, com capitular iluminada. Letra típica d a imprensa do
século X V I I I , em que sobressaem o " s " simples ou duplo em
forma de cajado invertido; uso do "y" como semivogal nos diton-
gos; uso moderno do "v" e do "u". Para acentuação, o agudo
m a r c a t o n i c i d a d e ou a b e r t u r a de vogal, c o m o e m " f a r á " ,
"somente"; o til da nasalização deslocado, como em "mençaõ".
O texto impresso apresenta numeração própria em números ará-
picos de 1 a 20, na margem superior, ao centro, entre parênte-
ses; os fólios 365 a 369 apresentam u m a segunda numeração, ao
centro da margem inferior, mista, pela utilização de letra e alga-
rismos romanos, de "A" a "AV"; uso de reclamo em sílabas (re-
petição da primeira sílaba da palavra que inicia o fólio seguin-
te). Título explicativo e notas marginais, abaixo e à direita do
texto, autografas, em letra cursiva, com traçado evoluído e per-
sonalizado de Costa Matoso: abreviatura do "que " e " a " final
com ponto de fuga ascendente, " p " minúsculo em dupla haste de
linhas paralelas, til em arco, "d" uncial com haste quase paralela
à escrita, extremamente veloz, como t a m b é m são as caudas do
"s" final pendente, em voluta. (YDL)
Critérios editoriais: Foram suprimidos grifos indicativos
dos pontos comentados nos escólios.
Cópia manuscrita:
APM, C M M 04, fl. 76-84v.
Cópia impressa:
APM, SC 14, fl. 84-87v.
E u, el-rei, faço saber aos q u e este m e u *alvará e m forma de lei v i r e m q u e ,
t e n d o p a r t i c u l a r c u i d a d o n a c o n s e r v a ç ã o e a u m e n t o dos m e u s d o m í n i o s
da América, o qual depende muito da b o a administração da justiça, e
h a v e n d o j á d a d o as p r o v i d ê n c i a s q u e p a r e c e r a m necessárias p a r a a subsistência
dos "ministros e "oficiais d e s t i n a d o s p a r a ela, e s p e c i a l m e n t e p a r a o distrito das
Minas, m a n d a n d o fazer "regimento dos salários, assinaturas e mais "próis e
" p e r c a l ç o s q u e h a v i a m d e levar c o m p e t e n t e s , n o a n o d e m i l s e t e c e n t o s e v i n t e
e um, a
pelo governador das Minas Gerais d o m L o u r e n ç o de Almeida, com
outros ministros adjuntos,' 3
conforme o tempo e estado dela, o qual m a n d e i
o b s e r v a r , n ã o o b s t a n t e a q u e l a d e t e r m i n a ç ã o , sou i n f o r m a d o q u e o dito r e g i -
m e n t o se n ã o c u m p r e 0
i n t e i r a m e n t e e m as c o m a r c a s das m e s m a s M i n a s e e m
o u t r a s q u e p o s t e r i o r m e n t e se d e s c o b r i r a m e p o v o a r a m , o u p e l a m a i o r d i s t â n -
cia d e l a s o u p e l a d i v e r s i d a d e d o s g o v e r n o s , i n t r o d u z i n d o - s e s a l á r i o s excessi-
vos q u e se p r e t e n d e m c o n t i n u a r p o r estilo e c o m p r e t e x t o s m e n o s j u s t i f i c a d o s ,
e m p r e j u í z o dos p o v o s ; e q u e r e n d o d e s t e r r a r os a b u s o s e excessos n e s t a m a t é -
r i a , p a r a q u e e m t o d a s as c o m a r c a s e distrito das M i n a s se o b s e r v e , i n d i f e r e n -
t e m e n t e , u m só r e g i m e n t o , e este seja e m f o r m a tal q u e os m i n i s t r o s q u e a elas
v ã o servir t e n h a m c o m q u e d e c e n t e m e n t e ^ se p o s s a m s u s t e n t a r i n d e p e n d e n -
1

tes n o s l u g a r e s q u e a d m i n i s t r a m , e a q u e l e s e m o l u m e n t o s q u e se d e v e m p e r -
m i t i r p a r a c o m p e n s a r as d e s p e s a s q u e f a z e m n a s v i a g e n s e j o r n a d a s ^ e t a m -
b é m os. oficiais q u e v ã o p r o v i d o s p a r a as m e s m a s p a r t e s n o s "ofícios c r i a d o s
p a r a aquela a d m i n i s t r a ç ã o , sem v e x a ç ã o dos povos e excessos q u e l e v a m e
t ê m i n t r o d u z i d o , sou s e r v i d o o r d e n a r q u e e m t o d a s as c o m a r c a s d a s m i n a s ,
assim p e r t e n c e n t e s ao g o v e r n o das M i n a s Gerais, c o m o do C u i a b á e M a t o
Grosso, São Paulo e Goiás, e nas que ficam no continente do governo da
Bahia, c o m o são J a c o b i n a , Rio de Contas e Minas Novas do Araçuaí, e e m
t o d a s as m a i s q u e se d e s c o b r i r e m nos m e s m o s ou diversos g o v e r n o s se o b s e r -
v e o p r e s e n t e r e g i m e n t o q u e m a n d e i o r d e n a r , p o n d e r a d a s t o d a s as c i r c u n s -
t â n c i a s n e c e s s á r i a s e c o n t i n g e n t e s , c o m a d e c l a r a ç ã o s o m e n t e d e q u e nele se

A 26 de março.
Que foram o doutor Bernardo de Gusmão, 'ouvidor do Sabará, e o doutor Manuel Luís Cordeiro,
juiz de "fora que tinha acabado do Rio de Janeiro, e foi feito e assinado em Vila Rica aos 17 de
setembro de 1721.
"Se não cumpre": inteiramente se cumpria sem alteração alguma nem aumento de salários.
"Decentemente": é erro, porque com o que vai taxado não pode ser nem compensar as grandes
despesas que trazem consigo aqueles lugares, pelas grandes distâncias em que se acham e carestia do
país.
670

f a r á m e n ç ã o . E l e v a r ã o os " o u v i d o r e s , "juízes e seus "oficiais as a s s i n a t u r a s e


emolumentos seguintes. e

[ íí. 365v. ] Ouvidores das comarcas


r 5

T e r ã o * estes d e alçada nos bens d e raiz até a q u a n t i a d e vinte e c i n c o mil


1

"réis e nos bens móveis até trinta mil e nas p e n a s pecuniárias até dez mil réis.
D a s sentenças definitivas, sendo a causa até a q u a n t i a de trinta mil réis, leva-
1

r ã o d e assinatura q u a t r o c e n t o s réis; de trinta até c e m mil réis, seiscentos réis; d e


c e m até q u i n h e n t o s mil réis, oitocentos réis; e de q u i n h e n t o s mil réis p a r a cima,
mil e duzentos réis. Embargando-seJ as ditas sentenças, levarão m e t a d e d a assina-
t u r a d a sentença, q u e r esta seja e m b a r g a d a p o r u m a só p a r t e ou p o r a m b a s , das
quais n ã o levarão mais q u e a dita m e i a assinatura. Esta m e s m a ^ o r d e m e diferença
se p r a t i c a r á nas assinaturas das sentenças sobre exceções p e r e m p t ó r i a s e d e espó-
lio, artigos d e a t e n t a d o , d e falsidade e oposição, q u a n d o t i v e r e m c o n h e c i m e n t o
o r d i n á r i o e se j u l g a r e m a final, p o n d o - s e c o m a sentença fim à causa, e se p a g a r á
a assinatura dela, regulando-se pelo peditório d a a ç ã o ; p o r é m , q u a n d o esta se n ã o
t e r m i n a r pela dita sentença, n ã o levarão dela coisa a l g u m a . D a s exceções
declinatorias levarão trezentos réis.

e -
Por "provisão de 13 de novembro de 1732.se ordenou que os juízes ordinários não levassem salários
e que os que estavam taxados aos ouvidores e juízes de fora se'não cobrassem 'quintados, mas sim
á razão de 1.320 réis cada * oitava, que era o valor que tinha cada uma no ano de 1721, em que se
tinha feito o 'regimento, nascendo esta ordem da dúvida que naquele tempo havia se sê haviam
cobrar os emolumentos das Justiças sem quinto, que vinha a valer 1.500 réis cada oitava, ou tirado
o quinto dela, queficavaentão em 1.200 réis; epor ela seficõu cobrando à razão de 1.320 por oitava
até o ano de 1735, em que principiou a cobrar-se o quinto por 'capitação, e não por* fundição, e
como se não tirava do ouro o quinto, ficou correndo pelo seu intrínseco valor, que é o de 1.500 réis
cada oitava. E nesta forma, desde esse ano em diante, se cobraram os emolumentos até agosto de
1750, em qüe de novo se tornou a mandar cobrar o quinto por *casas de fundição, e desde esse tempo
até a publicação deste regimento se tornou a praticar a dita ordem de 17 32, sendo o valor da oitava
para as Justiças 1.320 réis..
Têm os ouvidores das Minas 500 mil réis de ordenado, por provisão do ano de 1718, tendo até este
tempo o ordenado de 600 mü réis desde a criação das primeiras 'ouvidorias de Minas, que se fez no
ano de 1709. Por 'provedores de defuntos e ausentes têm, na forma do regimento deles, de toda a
arrecadação que fizerem, dois por cem.
S* Tudo o que vai apontado à margem é ó que se levava pelo regimento velho. Oitava, / ; meia oitava,
1
B
l
/, ~, um quarto de oitava, V^.
¿

Tinham alçada de cem mil réis pelo parágrafo quarto do regimento dos ouvidores, tanto em bens de
raiz como móveis, que foi feito em Lisboa a 11 de março de. 1669.
Levava-se uma oitava por qualquer quantia que fosse, que se pagava na conclusão, e ao assinar da
sentença se pagava só V do *selo.
+

J -
Nada se levava dos embargos.
k- Em todas estas qualidades de sentenças, se se extraíam se levava e nada de embargos, de tal
forma que se havia diversas sentenças nos mesmos autos se não levava conclusão ou *espórtula mais
4

que de uma.
671

N a s a ç õ e s ' d e alma, n ã o c a b e n d o a causa n a alçada, levarão trezentos *réís e


c a b e n d o nela, cento e c i n q ü e n t a réis, e esta m e s m a q u a n t i a d e u m a a b s o l v i ç ã o " 1

d a i n s t â n c i a ; dos m a n d a d o s 1 1
d e p r e c e i t o , t r e z e n t o s réis; e d e o u t r o s q u a i s q u e r
m a n d a d o s , c e n t o e c i n q ü e n t a réis; das c a r t a s p r e c a t ó r i a s , citatorias, executórias,
0

d e inquirição, de. posse e p a r a outras quaisquer diligências, trezentos réis; o m e s -


m o das cartas ou alvará de editos; das *cartasP de seguro, nos casos e m q u e as
p o d e m passar, d e c a d a u m dos culpados q u e se p r e t e n d e r e m segurar, sendo pes-
soas livres, seiscentos réis; p o r é m , sendo p a i e filho, m a r i d o e m u l h e r ou s e n h o r é
seus escravos, levarão s o m e n t e a dita quantia, c o m o se fosse u m a pessoa só; n ã o
p a s s a r ã o , p o r é m , as cartas d e seguro nos delitos excetuados n a lei e q u e , privativa-
m e n t e , p e r t e n c e m ao c o r r e g e d o r do crime d a * "relação do distrito; n e m nos casos
q u e lhes são permitidos p o d e r ã o passar as ditas cartas mais q u e p o r u m a n o ; e se
d e n t r o dele for a c a r t a q u e b r a d a , p o d e r ã o p a s s a r s e g u n d a pelo t e m p o q u e lhe
restar, p a r a se concluir o a n o , da qual levarão a m e s m a assinatura. D a s justificações ! 1

p a r a e m b a r g o o u s e g u r a n ç a , e d e q u e se m a n d a r p a s s a r i n s t r u m e n t o , trezentos
réis; de * s e l p d a s e n t e n ç a ou c a r t a , d u z e n t o s réis; d e * j u r a m e n t p supletorio e
r s

t a m b é m d a d o aos "louvados p a r a se avaliar a causa / / de c a d a u m , c e n t o e cin- [ fl. 3 6 6 ]


q ü e n t a réis; p o r é m , louvando-se a m b a s as p a r t e s do m e s m o l o u v a d o , l e v a r ã o só
1

a dita q u a n t i a ; d e i n q u i r i r " c a d a t e s t e m u n h a , c e n t o e c i n q ü e n t a réis, t a n t o e m


causas crimes c o m o eiveis, n a q u e l a s e m q u e o p o d e fazer; de e x a m e feito d e n t r o v

e m casa e sua p r e s e n ç a sobre vício de autos, papéis ou livros, seiscentos réis; d e


a r t i g o s d e habilitação, c e n t o e c i n q ü e n t a réis; d e e m b a r g o s r e m e t i d o s , trezentos
w x

Se a parte não pagava logo e se extraía sentença, pagava da assinatura dela W^, fosse mais ou menos
a quantia.
m
- Nada de absolvição da instância.
Levava-se V tios mandados de preceito e de outros quaisquer que fossem.
+

°- De todas as cartas passadas em forma e que levavam *selo, fosse a matéria qual fosse, se levava ' / 8

é do selo V . +

P' De cada carta de seguro '/ , fosse um ou muitos os culpados que a pediam, que podiam passar ainda
8

nos casos excetuados na forma do seu regimento, assim como alvarás defiança,até quarto alvará à
mesma pessoa.
Levava-se 1

- Levava-se '/^,
r

Sl
Levava-se ' / d e todo e qualquer juramento que se tomasse.
+

*' Também se não levavam dois juramentos, mas só um.


11
• Levava-se V de cada uma. 4

v
' Levava-se /,,, 1

w
- Nada se levava.
X-
Nada também.
réis, e v i n d o - s e c o m eles n a e x e c u ç ã o , sendo d e n u l i d a d e , p a g a m e n t o , c o m p e n -
v

s a ç ã o , r e t e n ç ã o d e benfeitorias, artigos d e l i q u i d a ç ã o e justificativos, l e v a r ã o a


m e t a d e d a assinatura d a sentença definitiva, p o r é m sendo de terceiro s e n h o r ou 2

p o s s u i d o r l e v a r ã o a final a m e s m a assinatura q u e d e sentença definitiva.


D a s a r r e m a t a ç õ e s e m leilão, sendo de bens móveis de valor até cinqüenta mil
33

"réis, levarão de c a d a u m a cento e cinqüenta réis; de cinqüenta mil réis até cem, terão
trezentos réis, e passando de cem mil réis ou sendo bens de raiz, seiscentos réis; p o -
r é m , r e q u e r e n d o o arrematante carta p a r a seu título n ã o levará dela assinatura. D e
c a d a v i s t o r i a da cidade ou vila, dois mil e quatrocentos réis; e sendo no * t e r m o ou
aD a c

comarca, levarão o caminho, a seis "léguas por dia, quatro mil e oitocentos réis; e o
m e s m o vencerão p o r dia nas diligências, indo fora da terra, a requerimento de parte.
D o s i n s t r u m e n t o s ^ de agravo, seiscentos réis; das a p e l a ç õ e s q u e vierem a o dito
3 ae

juízo e sentenças delas, mil e duzentos réis, e vindo-se com embargos à sentença, a
m e t a d e da assinatura d a primeira, quer esta seja e m b a r g a d a p o r u m a só p a r t e ou por
ambas, n a forma q u e fica dito; dos " d i a s ^ d e aparecer, seiscentos réis; das *devassas S a

particulares que tirarem a requerimento de p a r t e ou h a v e n d o culpados, levarão do


auto e j u r a m e n t o ao queixoso trezentos réis; de cada testemunha, * cento e cinqüenta 3 1

réis; e d a p r o n ú n c i a feita, seja u m ou muitos culpados pronunciados, j u n t a m e n t e ou


e m diverso t e m p o , seiscentos réis; nas q u e r e l a s , levarão do a u t o , t e s t e m u n h a s e
31

pronúncia, o m e s m o q u e nas devassas.

Sendo julgados afinal,se levava '/„.


Levava-se também / , e finalmente de qualquer papel que se julgava por sentença se levava sempre
l
8

V8.
aa. Levava-se /. , fosse o valor qual fosse, ou de bens móveis ou de raiz, e requerendo o arrematante
1
¿

carta pagava / da assinatura dela. l


H

^ Levavam-se V - 8

Levavam-se V por dia, fazendo-se a conta a quatro léguas por dia. No 'regimento velho (como
a C i
a

neste) se não faz expressão do que se devia levar de cada vistoria feita no termo ou comarca, e por isso
cada 'ministro que servia levava pelo arbítrio que lhe parecia, e alguns excessivamente, de que
nasceu determinar-se, nesta matéria, a forma da cobrança por 'provisão de 2 7 de junho de 1733 em
que se ordenou que os 'ouvidores, como 'superintendentes das terras minerais, que levavam de cada
vistoria nelas ^ / ¡ ¡ e ' / , , de caminho, levassem / de vistoria e 4 de caminho; e o 'escrivão, que tinha
1 l(,
n

/ de vistoria e de caminho V ,ficasseem V de caminho e V de vistoria; aos 'guardas-mores, que


!,
a s 8 B

tinham / de vistoria e de caminho V , ficassem em '/ de vistoria e de caminho V ; os seus


, 2
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(
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escrivães, que tinham '/ de vistoria e de caminho V , ficassem em V de vistoria e de caminho as


(
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mesmas V , e que a 'câmara, nas vistorias que faz dentro da vila, de que levava / , ficasse em
8
3 2
s

"'/ , e que em tudo o mais se observasse o 'regimento.


8

Levava-se V . 4

' Levava-se / e nada de embargos.


a e i
i

Levava-se ' / . 4

Levava-se / de se assinar o auto.


1
+

^ Levava-se / e da pronúncia nada.


1
4

- Levava-se somente V de assinar o auto.


al
2
673

D e " a p o s e n t a d o r ia, J q u a n d o forem e m "correição às vilas d a sua c o m a r c a ,


a

n ã o l e v a r ã o coisa a l g u m a dos b e n s d o "concelho, e m dinheiro o u e m espécie, e só


se lhes d a r ã o c a m a s , casas, l e n h a p a r a os primeiros dias e louça p a r a a c o z i n h a e
m e s a , e o mais q u e lhes for necessário o c o m p r a r ã o c o m o seu d i n h e i r o pelo p r e ç o
e estado d a terra; e o m e s m o observarão q u a n d o forem às ditas vilas p o r m a n d a d o
m e u , a diligências do m e u real serviço. D a a u d i ê n c i a ^ geral n a / / " c â m a r a , capí- [ fl. 366v. ]
tulos d e " c o r r e i ç ã o e p r o v i m e n t o s q u e fizerem n o s livros dela, l e v a r ã o v i n t e e
q u a t r o mil "réis; d a e l e i ç ã o al
das Justiças e "pelouros, q u e os "ouvidores p o d e m
fazer p a r a três anos e m q u a l q u e r t e m p o do terceiro a n o d a eleição p a s s a d a , doze
m i l réis; d a * d e v a s s a a m
d e s u b o r n o , n ã o h a v e n d o c u l p a d o s , n ã o l e v a r ã o coisa
a l g u m a dos bens d o concelho; d a a s s i n a t u r a a n
das "cartas d e u s a n ç a aos oficiais
eleitos, d e c a d a u m a levará mil e duzentos réis; das r u b r i c a s a o
dos livros das c â m a -
ras, o n d e n ã o h o u v e r "juízes de fora, de c a d a u m a folha oitenta réis.

N a s revistas P das aferições das balanças, pesos e m e d i d a s n ã o levarão coisa


a

a l g u m a das pessoas q u e t i v e r e m aferido e a p r e s e n t a r e m e m c o r r e i ç ã o escrito de


aferição feita n a forma da lei. E p o r q u e nesta m a t é r i a deve h a v e r g r a n d e c u i d a d o ,
p r i n c i p a l m e n t e nas balanças e pesos m i ú d o s d e p e s a r ouro e m p ó , p o r ser m o e d a
q u e corre n a q u e l e distrito das minas, pelo g r a n d e prejuízo q u e se segue à "repú-
blica, n ã o h a v e n d o igualdade nos ditos pesos e b a l a n ç a s p o r falta d e aferição, os
o u v i d o r e s , assim q u e a b r i r e m correição e m c a d a u m a das vilas d a sua c o m a r c a ,
m a n d a r ã o lançar "pregões nela e pelos lugares e arraiais do " t e r m o e p ô r "editais
nos lugares públicos e c o s t u m a d o s , q u e todos os q u e t ê m obrigação de aferir v ã o
apresentar as suas aferições, havendo-se p o r citados c o m os ditos pregões e editais;
e os q u e t i v e r e m aferido, m o s t r a n d o escrito de aferição, se lhes r u b r i c a r á este,
pondo-se-lhe i;;
Visto e m c o r r e i ç ã o " c o m a r u b r i c a d o ouvidor, sem p o r isso lhe
levar estipêndio a l g u m ; p o r é m , os q u e n ã o tiverem aferido ou n ã o forem a p r e s e n -
tar a s u a aferição o u tiverem aferido fora de t e m p o d e t e r m i n a d o p e l a lei p a g a r ã o

J-
a
O mesmo se observava.
^
a Cl
Nada estava nesta parte provido pelo 'regimento velho e havia em cada comarca e em cada câmara
diverso salário nesta parte, introduzido por costume e muito maior do que agora se lhe arbitra,
[incompleto].
fim. ]sj j levava.
at a s e

an
" Levava-se ainda que não estava provido no regimento.
1

-
a o
Levava-se ' / de cada rubrica.
4

a
P- Por costume que o regimento não tinha revogado se levava nas revistas das licenças dos "oficiais
:

mecânicos e *tendeiros e escritos de aferição, estivessem ou não correntes, / ; e não estando corren- 1
a

tes ou não aparecendo, além da dita / eram condenados em outra para o 'meirinho e /.^ de custas
1
H
1

no distrito de Vila Rica; e em outras comarcas era maior ã condenação. E se proibiu que nesta parte
se levasse emolumento algum estando correntes os papéis, por 'provisão de 28 de,outubro de 1750 e
que sobre isto se perguntasse na 'residência.
674

a c o n d e n a ç ã o q u e aos "ouvidores p a r e c e r justa, havendo-se n e l a c o m m o d e r a ç ã o ,


n ã o p o d e n d o exceder a q u a n t i a de três mil e seiscentos "réis, e t e r ã o os ouvidores,
d e c a d a u m a , a terça p a r t e , e o "escrivão d u z e n t o s e q u a r e n t a réis, e o resto o
" m e i r i n h o d a ouvidoria, pelo t r a b a l h o d a c o b r a n ç a , sem custasj e isto e n q u a n t o
n ã o h o u v e r "rendeiro d a "chancelaria, ao q u a l c o m p e t e , p e l a lei, de m a n d a r as
p e n a s n e s t a m a t é r i a ; e, além disto, inquirirão s e m p r e os ouvidores, n a "devassa da
"correição, dos q u e u s a m d e pesos e balanças falsas, e c o n t r a os q u e a c h a r c o m -
p r e e n d i d o s p r o c e d e r á n a f o r m a d a lei.
E p o r q u e os ditos ouvidores são t a m b é m "provedores n a s suas c o m a r c a s e
t ê m o b r i g a ç ã o d e e x a m i n a r as c o n t a s dos "concelhos, i n d o e m c o r r e i ç ã o , e d e
[ fl. 3 6 7 ] p r o v e r os inventários dos órfãos, e d e t o m a r / / contas dos r e n d i m e n t o s das "legí-
timas deles, e d e as rever, sendo t o m a d a s pelo "juiz dos órfãos, e d e t o m a r contas
aos testamenteiros e do mais q u e lhes c o m p e t e c o n h e c e r pelo seu " r e g i m e n t o .
N a s contas dos testamentos n ã o levarão resíduo do q u e a c h a r e m c u m p r i d o , e
isto a i n d a q u e as despesas fossem feitas depois d o a n o e mês, ou depois d o t e m p o
q u e o testador lhes c o n c e d e u ; p o r é m , se forem feitas depois de. serem citados p a r a
d a r conta, t e n d o sido citados j á passado o t e m p o , levarão resíduo d o que, depois
d e citados, for c u m p r i d o , e será do p r ê m i o o u l e g a d o q u e o t e s t a d o r deixou a o
t e s t a m e n t e i r o ; e n ã o lhe s e n d o d e i x a d o coisa a l g u m a , o h a v e r ã o dos b e n s d o
t e s t a m e n t e i r o , q u e o deve satisfazer pela sua negligência c o m tal d e c l a r a ç ã o , q u e
sendo a dúvida do c u m p r i m e n t o só p o r falta de formalidade, sendo certa a despe-
sa e c o n f o r m e a disposição, se n ã o levarão resíduo; e a c h a n d o q u e c u m p r i u b e m ,
c o m o devia, e d e n t r o do t e m p o , ou antes d e ser citado, levarão d e j u l g a r o testa-
m e n t o p o r c u m p r i d o mil e duzentos réis^ e d a quitação, q u e r e n d o - a o testamenteiro,
n ã o levarão assinatura. D a s contas q u e t o m a r e m nos concelhos até duzentos mil
réis levarão seiscentos réis; sendo o r e n d i m e n t o d e d u z e n t o s mil réis até q u a t r o -
centos, levarão mil e duzentos réis; d e quatrocentos mil réis até u m conto de réis,
dois mil e q u a t r o c e n t o s réis; d e u m c o n t o até dois contos d e réis, q u a t r o mil e
oitocentos réis, e n a d a m a i s , a i n d a q u e o r e n d i m e n t o seja m a i o r ; e n ã o levarão
resíduo, e só das adições q u e glosarem, t e n d o sido m a l despendidas, e o p a g a r ã o
aos "oficiais q u e fizerem essa despesa, fazendo r e p o r a i m p o r t â n c i a dela. O m e s -
m o observarão nas "confrarias, hospitais e albergarias, c o n f o r m e a i m p o r t â n c i a d o
r e n d i m e n t o , s e m resíduo; e só o p o d e r ã o levar d o q u e a c h a r e m m a l d e s p e n d i d o ,
e fizerem r e p o r à custa dos q u e m a l o d e s p e n d e r e m . D a s contas q u e t o m a r e m aos
tutores dos bens dos órfãos q u e a d m i n i s t r a m ou das q u e r e v e r e m , sendo j á t o m a -
das pelos juízes deles, levarão o m e s m o concedido a estes. D a s ^coimas apeladas,
h a v e n d o - a s ou sejam confirmadas ou revogadas, d e c a d a u m a levarão, d a p a r t e
?

v e n c i d a , c e n t o e c i n q ü e n t a réis. D a s r u b r i c a s l dos livros q u e lhes p e r t e n c e r e m


ac

at
l' Levava-se 1 .1
A
675

c o m o " p r o v e d o r l e v a r ã o o m e s m o q u e p o r elas lhes é c o n c e d i d o como


"ouvidor. D o s inventários e partilhas, levarão o m e s m o que vai d a d o aos
"juízes dos ó r f ã o s . a r

J u í z e s de fora e órfãos [ fí. 367v, ]

T e r ã o de a l ç a d a nos bens d e raiz dezesseis mil "réis e vinte n o s bens móveis


e nas p e n a s pecuniárias até seis mil réis.
D a s sentenças definitivas, ou sejam as causas o r d i n á r i a s ou s u m á r i a s , s e n d o
d e valor até trinta mil réis, levarão trezentos réis; de trinta até c e m mil réis, levarão
q u a t r o c e n t o s réis; d e c e m até quinhentos mil réis, seiscentos réis; de q u i n h e n t o s mil
réis p a r a cima, oitocentos réis; e m b a r g a n d o - s e as sentenças, o u seja p o r u m a das
partes o u p o r a m b a s , levarão s o m e n t e a m e t a d e d a assinatura da sentença, p a g a n -
do c a d a u m a a p a r t e c o m p e t e n t e , q u a n d o a m b a s e m b a r g a r e m . A m e s m a assinatu-
r a l e v a r ã o das exceções p e r e m p t ó r i a s e de espólio, artigos de a t e n t a d o , de falsida-
d e e o p o s i ç ã o , q u a n d o tiverem c o n h e c i m e n t o o r d i n á r i o e se d e t e r m i n a r e m a fi-
nal, p o n d o - s e c o m a sentença fim à causa, observada a diferença d o valor dela,
q u e se r e g u l a r á pelo p e d i d o n a a ç ã o , e n ã o p o n d o a s e n t e n ç a fim à c a u s a , n ã o
levarão coisa a l g u m a ; das exceções declinatorias levarão c e n t o e c i n q ü e n t a réis.
N a s ações de a l m a , n ã o c a b e n d o n a alçada levarão duzentos réis e c a b e n d o
nela, c e m réis; dos " m a n d a d o s d e preceito, d u z e n t o s réis, e d e o u t r o s q u a i s q u e r
m a n d a d o s p a r a citações, prisões, p e n h o r a s e alvarás d e folha e soltura, o i t e n t a
réis; das cartas p r e c a t ó r i a s , citatorias e executórias, d e inquirição de posse e p a r a
o u t r a s q u a i s q u e r diligências, cento e c i n q ü e n t a réis, e o m e s m o das cartas o u alvarás
d e editos; das justificações p a r a e m b a r g o ou segurança e d e q u e se m a n d a r p a s s a r
i n s t r u m e n t o , c e n t o e c i n q ü e n t a réis; do selo d a s e n t e n ç a ou c a r t a , c e m réis; d o
j u r a m e n t o supletorio, e t a m b é m d a d o aos "louvados p a r a a v a l i a r e m a c a u s a d e
c a d a u m , c e m réis; e louvando-se a m b a s as p a r t e s e m u m só louvado levarão c e m
réis s o m e n t e ; d e inquirir c a d a t e s t e m u n h a e m causa-crime ou cível, c e m réis; dos
e x a m e s q u e se fazem e m s u a p r e s e n ç a sobre falsidade ou vício d e alguns autos,
livro ou d o c u m e n t o , q u a t r o c e n t o s réis; d e artigos d e h a b i l i t a ç ã o , c e m réis, e o
m e s m o das sentenças de absolvição d a instância; d e e m b a r g o s r e m e t i d o s , cento e
c i n q ü e n t a réis, e vindo-se c o m eles n a execução, sendo de n u l i d a d e , p a g a m e n t o ,
c o m p e n s a ç ã o , de r e t e n ç ã o d e benfeitorias, artigos d e l i q u i d a ç ã o e justificativos,
levarão m e i a assinatura d a sentença definitiva, c o m o nos mais e m b a r g o s , e acima
fica d e c l a r a d o ; sendo, p o r é m , os e m b a r g o s de terceiro, levarão / / deles a m e s m a [ fl. 368 ]
assinatura q u e d a sentença definitiva.

Levavam também os ouvidores, como juizes das justificações, ' / „ de cada papel que se justificava, e
o 'escrivão / , o que neste não vai provido.
1
y
676

D a s a r r e m a t a ç õ e s n a p r a ç a e m leilão, sendo d e b e n s m ó v e i s de v a l o r até


c i n q ü e n t a mil *réis levarão de c a d a u m a oitenta réis; d e c i n q ü e n t a até c e m mil
réis, c e n t o e c i n q ü e n t a réis; e p a s s a n d o de c e m mil réis ou s e n d o bens d e raiz,
trezentos réis; p o r é m , r e q u e r e n d o o a r r e m a t a n t e c a r t a p a r a seu título n ã o levarão
assinatura; d e c a d a vistoria n a cidade o u vila, dois mil réis, e sendo fora, n o "ter-
m o , levarão p o r dia, à r a z ã o de seis "léguas, três mil e seiscentos réis; e o m e s m o
v e n c e r ã o c a d a d i a i i a s diligências, indo fora d a terra, a r e q u e r i m e n t o de p a r t e ; das
"devassas particulares q u e tirarem a r e q u e r i m e n t o d e p a r t e ou h a v e n d o culpados
levarão do a u t o e j u r a m e n t o a o queixoso cento e c i n q ü e n t a réis; de c a d a testemu-
n h a , c e m réis; e d a p r o n ú n c i a , seja u m ou muitos culpados, p r o n u n c i a d o s j u n t a -
m e n t e ou e m diverso t e m p o , q u a t r o c e n t o s réis; nas q u e r e l a s l e v a r ã o d o a u t o ,
t e s t e m u n h a s e p r o n ú n c i a , ü m e s m o q u e nas devassas; das rubricas dos livros das
" c â m a r a s , p o r c a d a folha, sessenta réis, e o m e s m o dos m a i s livros q u e p o d e m
rubricar.
O s "juízes dos órfãos, d o auto do inventário, j u r a m e n t o a o i n v e n t a r i a n t e e
avaliadores, n ã o os h a v e n d o j u r a m e n t a d o s levarão seiscentos réis e n a d a m a i s ,
sendo n a c i d a d e ou vila e sendo fora dela, e m distância, v e n c e r ã o do c a m i n h o o
salário n a f o r m a q u e abaixo se declara. P o r é m , n ã o irão fora fazer inventários,
s e n ã o q u a n d o for m a i s utilidade dos órfãos, e n ã o levarão avaliadores consigo à
custa deles, p o r d e v e r e m ser vizinhos do lugar ou sítio o n d e estão os bens, os quais
t ê m r a z ã o p a r a saber m e l h o r o valor e estimação deles. E h a v e n d o avaliadores do
"concelho j u r a m e n t a d o s , q u e r e n d o ir s e m v e n c e r e m salário d e c a m i n h o , os d e -
v e m levar.
D a s p a r t i l h a s e d e t e r m i n a ç ã o delas l e v a r ã o n a f o r m a d o " r e g i m e n t o feito
p a r a os juízes dos órfãos do Brasil e m dois de m a i o d e m i l setecentos trinta e u m ,
n o q u a l se lhes c o n c e d e u u m p o r c e n t o até a q u a n t i a d e c e m mil réis, q u e im-
p o r t a o salário mil réis, e n a d a mais até u m "conto, de q u e l e v a r ã o dois mil réis;
e c h e g a n d o a dois contos de réis, três mil réis; e x c e d e n d o , p o r é m , esta q u a n t i a ,
levarão q u a t r o mil e oitocentos réis e n a d a mais, posto q u e o i n v e n t á r i o e p a r t i -
lhas sejam d e m a i o r i m p o r t â n c i a . E n ã o irão fazer as p a r t i l h a s fora c o m p r e t e x t o
a l g u m , e se o f o r e m n ã o v e n c e r ã o c a m i n h o , D a s a r r e m a t a ç õ e s dos b e n s e m
[ fl. 368v. ] leilão l e v a r ã o o / . / m e s m o q u e os juízes d e fora, à custa dos a r r e m a t a n t e s , s e m
d e f r a u d a r e m os b e n s dos órfãos; de c a d a a u t o d e c o n t a s q u e t o m a r e m aos t u t o -
res e c u r a d o r e s , e estes forem o b r i g a d o s a dá-las, q u e é d e dois e m dois a n o s ,
s e n d o dativos, d e q u a t r o e m q u a t r o , s e n d o legítimos ou t e s t a m e n t á r i o s , n a for-
m a d a lei, l e v a r ã o o salário q u ê lhes d e t e r m i n a q dito r e g i m e n t o , h a v e n d o só
r e s p e i t o a o r e n d i m e n t o de q u e t o m a m c o n t a , e n a d a m a i s l e v a r ã o , a i n d a q u e
aquele seja m a i o r e muitos os órfãos, p o r ser u m o i n v e n t á r i o e t u t o r e u m a só
a d m i n i s t r a ç ã o d e q u e d á c o n t a ; p o r é m , s e n d o m u i t o s os órfãos e. diferentes os
r e n d i m e n t o s dos bens se r a t e a r á a despesa d a c o n t a c o n f o r m e o q u e tocar a c a d a
u m . N e m t a m b é m irão os juízes t o m a r fora as contas p á r a v e n c e r e m c a m i n h o s ,
p o r t e r e m os t u t o r e s o b r i g a ç ã o d e as i r e m d a r p e r a n t e eles, s e n d o notificados
677

p o r seu m a n d a d o depois de passado o t e m p o ou h a v e n d o justa causa p a r a


r e m o v ê - l o s d a tutela; e q u a n d o haja neles c o n t u m á c i a , p o d e r ã o o b r i g á - l o s p e -
los m e i o s q u e l h e s s ã o p e r m i t i d o s p o r d i r e i t o , d a m e s m a s o r t e q u e aos
t e s t a m e n t e i r o s e outros q u e t ê m o b r i g a ç ã o d e d a r e m c o n t a s d a s u a a d m i n i s t r a -
ção p e r a n t e juízes certos e c o m p e t e n t e s .
O s *juízes d e fora [e os] dos órfãos, n o m a i s q u e a q u i n ã o v a i e x p r e s s o ,
l e v a r ã o as m e s m a s assinaturas e salários d e c a m i n h o q u e ficam p e r m i t i d o s n o s
juízes d e fora d o geral. E os juízes eleitos pelas " c â m a r a s n ã o levarão assinaturas,
d a m e s m a sorte q u e as n ã o levam os juízes ordinários, e só levarão o *selo das senten-
ças e cartas, inquiridorias, rematações e caminhos, dos quais se lhes contarão somente
dois mil e quatrocentos "réis p o r dia, à razão de seis "léguas; e sendo m e n o r a distân-
cia, a q u a t r o c e n t o s réis p o r l é g u a e os e m o l u m e n t o s das p a r t i l h a s e c o n t a s q u e
d e t e r m i n a o dito r e g i m e n t o d e dois de m a i o de mil setecentos e trinta e u m .

*Escrivães e *tabeliães d o judicial

De cada citação as
ou notificação d e q u e p a s s a r e m certidão, s e n d o n a c i d a d e
ou vila levarão q u a t r o c e n t o s réis e sendo n o " t e r m o , p o r m a n d a d o , levarão mais
o q u e l h e s t o c a r d e c a m i n h o , c o n f o r m e a d i s t â n c i a ; p o r é m , s e n d o feita e m
audiência a t
ou e m sua casa l e v a r ã o setenta e c i n c o réis, e o m e s m o l e v a r ã o d e
cada a u t u a ç ã o , a u
de u m a p r o c u r a ç ã o a v
*apud actaj a i n d a q u e sejam muitos os / / [ fl. 369 J
p r o c u r a d o r e s , c e n t o e c i n q ü e n t a réis. .E se d u a s a w
ou três pessoas constituírem u m
procurador, levarão o mesmo de cada uma, s a l v o a x
sendo marido e mulher ou
i r m ã o s e m u m a h e r a n ç a , o u "cabido, "universidade ou "concelho, q u e n ã o p a g a -
r ã o s e n ã o c o m o u m a só p e s s o a . D o s m a n d a d o s ) q u e p a s s a r e m p a r a citações,
3 7

segurança, prisão^ avocatórios e outras diligências, c e n t o e vinte réis; o m e s m o a z

dos alvarás d a folha de soltura o u v é n i a e o u t r o s s e m e l h a n t e s ; e t a m b é m ^ 3


dos
" m a n d a d o s d e preceito p o r confissão d a p a r t e , q u a n d o for c o n d e n a d a e m a u d i ê n -
cia; s e n d o , D D
p o r é m , feita nos autos p o r t e r m o e d a d a neles sentença, a i n d a q u e

as
- Citação, V . 2

a L
Em audiência, [4?] 'vinténs de ouro.
a u
- De cada autuação, [2?] vinténs.
a V l
Procuração, 4 vinténs.
-
a w
E se duas, 4 vinténs de cada uma.
-
ax
Salvo, 4 vinténs somente.
y-
a
Dos mandados, 4 vinténs.
"
az
O mesmo, 4 vinténs.
k- a
E também, 4 vinténs.
DD
- Sendo, 4 vinténs.
678

seja de preceito, levarão o m e s m o q u e lhes tocar pelas definitivas. D a s revelias^ c

e m a n d a d o s d e q u e se fizer m e n ç ã o nos termos do processo, n ã o obstante a O r d e -


n a ç ã o , livro 1, título 8 3 , p a r á g r a f o s 6 è 9, p e r m i t i r d e c a d a t e r m o sete *réis e
q u a t r o réis p o r c a d a m a n d a d o , n ã o se lhes c o n t a r á coisa a l g u m a , p a r a evitar a
confusão d a c o n t a e m a i o r d e s e m b a r a ç o dela, havendo-se respeito a esta diminvii-
çao n o q u e h ã o d e levar pela escrita a *rasa q u e abaixo se lhes a r b i t r a p a r a c o m -
p e n s a r esse prejuízo; d e u m ^ t e r m o d e confissão ou t r a n s a ç ã o e n t r e p a r t e s ou
desistência, c e n t o e c i n q ü e n t a réis; das inquirições, a l é m d o q u e m o n t a r a rasa d e
sua escrita, levarão d e c a d a a s s e n t a d a oe
setenta e cinco réis, t i r a n d o três testemu-
n h a s debaixo d e c a d a u m a ; e n ã o p o d e r ã o levar mais q u e duas assentadas p o r dia,
u m a d e m a n h ã , o u t r a d e t a r d e , é t e n d o u m a menos, e o u t r a mais t e s t e m u n h a s se
suprirá u m a p o r outra, e m forma q u e t o q u e à assentada três testemunhas; e n ã o
c h e g a n d o a esse n ú m e r o se lhes c o n t a r á vinte réis p o r c a d a u m a ; s e n d o ^ tiradas
e m casas particulares n a cidade o u vila ou seus a r r a b a l d e s , e m u m a só casa levarão
setenta e cinco réis, e se forem e m diversas casas levarão o m e s m o de c a d a u m a ; e
indqkg fora d a cidade ou vila levarão o q u e lhes tocar d e seu c a m i n h o c o n f o r m e a
distância e d e m o r a j u s t a q u e tiverem. D e c a m i n h o , D n
nas inquirições e mais dili-
gências a q u e forem a r e q u e r i m e n t o de p a r t e levarão p o r dia dois mil e q u a t r o c e n -
tos, c o n t a n d o a seis *léguas p o r d i a , e p o r l é g u a a q u a t r o c e n t o s réis; e, s e n d o
m e n o s a distância se lhes c o n t a r á p o r légua.

D a s c o n c l u s õ e s ' das sentenças interlocutórias levarão trinta réis, e c i n q ü e n t a


0

réis das definitivas;*^ d a c o n c l u s ã o a n t e o j u i z d a a p e l a ç ã o , o ! í


s e n d o definitiva,
t r e z e n t o s réis; d a p u b l i c a ç ã o das s e n t e n ç a s interlocutórias,°1 sessenta réis e das
[ fl. 369v. ] d e f i n i t i v a s , " c e n t o e vinte / / réis; e s e m p r e nela d e v e m d a r fé se f o r a m as p a r t e s
0 1

presentes ou n ã o . A r a s a D n
se h á d e c o n t a r p o r *regras a trinta réis p o r c a d a vinte
e cinco regras, t e n d o estas trinta letras c a d a u m a ; e assim* 30
se c o n t a r á nas inquiri-

bc. De cada revelia, 2 'vinténs.


bd. De um termo, V - 4

be. De cada assentada, 2 vinténs, e se levava uma assentada de três em três testemunhas, fossem ou não
fossem muitas.
bf. Sendo tiradas em casas, levava-se mais 4 vinténs de caminho, além da escrita.
Leva-se V por dia, em quatro léguas cada um.
g

bh. De caminho, / por dia, à razão de quatro léguas em cada dia.


2
R

bi. Das conclusões, 2 vinténs..


bj. Das definitivas, 4 vinténs.
bk. Da apelação,
bl. Interlocutórias, 2 vinténs.
bm. Definitivas, 4 vinténs.
bn. Levava-se ' / por 180 regras, de 30 letras cada uma, vindo agora a ficar em 210 cada 180 regras.
a

bo. Contavam-se da mesma forma e se cobravam de cada termo 2 vinténs, de cada mandado em
audiência 1 vintém, de cada revelia 2 vinténs e de cada autuação de feitos 4 vinténs.
ções, apelações, traslados e termos d o processo, atendendo-se a terem-se tirado os
e m o l u m e n t o s dos t e r m o s , revelias e m a n d a d o s q u e serão obrigados a fazer c o m o
dantes, contados s o m e n t e a "rasa. E das sentenças' ! e das q u e t i r a r e m d e instru-
3 3

m e n t o s de agravos e cartas de a r r e m a t a ç ã o se lhes c o n t a r á c a d a m e i a folha escrita


d ê a m b a s as p a r t e s a quatrocentos réis, t e n d o c a d a l a u d a vinte e cinco "regras e
c a d a r e g r a trinta letras, u m a s p o r outras. Das* *! cartas testemunháveis, citatorias,
3

d e inquirição, d e seguro ou o u t r a q u a l q u e r q u e leva "selo e i n s t r u m e n t o s d e agra-


vo levarão de c a d a m e i a folha das primeiras três, escrita d e a m b a s as p a r t e s c o m as
m e s m a s regras e letras, trezentos e c i n q ü e n t a réis, e o mais a rasa n a f o r m a q u e fica
dito.
D a s buscas " dos processos, ou sejam findos o u r e t a r d a d o s , t e n d o p a s s a d o
131

seis meses s e m se falar neles, n ã o estando conclusos ou estando u m a n o n a m ã o


do "escrivão levarão, depois dos primeiros seis meses passados daí e m diante, p o r
c a d a mês, q u a r e n t a e oito "réis, n ã o levando mais q u e a respeito dos meses q u e
houver e m q u e o feito for findo ou r e t a r d a d o depois de passados os primeiros seis
meses, e c h e g a n d o ã a n o levarão q u i n h e n t o s e setenta e seis réis, e s e n d o m a i s
t e m p o q u e passe de ano levarão no segundo mais duzentos e oitenta e oito réis, q u e
é m e t a d e d o q u e lhes p e r t e n c e pelo p r i m e i r o ; e se p a s s a r d e dois a n o s l e v a r ã o
noventa e seis réis do terceiro, q u e é a terça p a r t e do que devem levar a respeito do
segundo, e p o r todos três levarão novecentos e sessenta réis, e n a d a mais, a i n d a q u e
a busca seja de mais anos. O q u e se entenderá até trinta anos, p o r q u e passados estes,
p o d e r ã o levar o que ajustarem c o m as partes, p o r n ã o terem obrigação de d a r conta
dos processos. E a b u s c a levarão d è todos os autos, inquirições e escrituras q u e
tiverem e m seu p o d e r e guarda; p o r é m , b s
sendo as buscas e m livros, c o m o são d e
querelas o u d e n ú n c i a s , levarão d a busca somente a m e t a d e do q u e l e v a r i a m dos
processos e escrituras, h a v e n d o respeito no q u e dito fica.
De cada' 31
p e n h o r a , e m b a r g o ou seqüestro q u e fizerem n a cidade ou vila e m
b e n s d e q u a l q u e r espécie l e v a r ã o q u a t r o c e n t o s e o i t e n t a réis pelo a u t o e ida; e

kP" Contavam-se 12 'vinténs, tendo cada página 25 regras e cada uma de 30 letras.
k l Cartas citatórias, testemunháveis, de inquirição e instrumentos de agravo se contavam, por cada
meia folha das primeiras três a 12 vinténs e as mais a rasa, e das "cartas de seguro e de editos a V 2

cada uma, e das certidões se contava, de cada meia folha 12 vinténs.


k - Dos feitos que estavam retardados, passados seis meses, a 2 vinténs por mês em o primeiro ano e,
f

depois, no segundo ano, mais V^, e deste por diante até ao terceiro ano mais / e passados três anos
1
p

V„ e nada mais.
Ds
- De busca em quaisquer livros se levava metade do que fica dito.
k Levava-se /
L l
r
680

s e n d o n o * t e r m o l e v a r ã o mais o q u e lhes t o c a r d e c a m i n h o ; dos "pregões* 311


de
[ fl. 370 ] bens penhorados que / / o "porteiro der n a p r a ç a e lugares públicos n ã o levarão
coisa a l g u m a , e s o m e n t e a escrita deles a "rasa, os quais d e v e m l a n ç a r p e l a certi-
d ã o do p o r t e i r o e fé q u e este t e m nas coisas q u e p e r t e n c e m a o seu "ofício; das
a r r e m a t a ç õ e s ^ dos bens p e n h o r a d o s ou e m leilão, sendo de móveis d e valor até
c i n q ü e n t a mil "réis levarão setenta e cinco réis; de c i n q ü e n t a mil réis p a r a c i m a até
c e m m i l réis, c e n t o e c i n q ü e n t a réis; e passando d e c e m mil réis ou sendo d e b e n s
d e raiz, trezentos réis; p o r é m , q u e r e n d o o a r r e m a t a n t e carta d e a r r e m a t a ç ã o p a r a
seu título levarão dela a escrita c o m o d e sentença, n a f o r m a atrás declarada. E do
termo* * d a entrega, q u a n d o os bens se n ã o a r r e m a t a r e m , levarão o m e s m o q u e
31

de qualquer m a n d a d o .
D a s vistorias* 371
n a c i d a d e o u vila, a l é m d o q u e lhes i m p o r t a r a e s c r i t a a
r a s a l e v a r ã o t r e z e n t o s réis, e s e n d o fora l e v a r ã o o s e u c a m i n h o ; dos exames* )' 3

q u e f i z e r e m e m a l g u n s a u t o s , livro e e s c r i t u r a ou o u t r o q u a l q u e r d o c u m e n t o
s o b r e vício ou falsidade l e v a r ã o c a d a u m seiscentos réis; e o q u e frzer o a u t o
levará d e mais a escrita; e nos que* 32
se fizerem s o b r e l e s ã o , aleijão o u defor-
m i d a d e p e l o s "cirurgiões l e v a r ã o s o m e n t e a e s c r i t a , e s e n d o feitos e m p r e s e n -
ça d o " o u v i d o r o u "juiz l e v a r ã o d a i d a , s e t e n t a e c i n c o réis. D a s c a r t a s c a
de
e d i t o s , q u i n h e n t o s réis; das posses * q u e f o r e m d a r n a c i d a d e o u vila, a l é m d a
0 3

e s c r i t a , t r e z e n t o s réis; e s e n d o fora l e v a r ã o o seu c a m i n h o c o n f o r m e a d i s t â n -


cia e d e m o r a q u e t i v e r e m ; d e q u a l q u e r c c
certidão que passarem do que cons-
tar d o s a u t o s r e f e r i n d o - s e a eles l e v a r ã o d e c a d a m e i a folha escrita d e a m b a s
as p a r t e s d u z e n t o s e c i n q ü e n t a réis, s e n d o c a d a l a u d a d e v i n t e e c i n c o "regras
e c a d a r e g r a d e t r i n t a l e t r a s , c o m o fica d i t o , e s e n d o d e m e n o s n ã o p a s s a n d o
d e u m a l a u d a , c e n t o e c i n q ü e n t a réis.

üU
- Levavam-se 4 "vinténs de cada termo de pregão.
b - Levava-se / , por virtude de uma sentença da Bahia, ainda que o "regimento só mandava levar 2
v l
2

vinténs do auto, e a rasa, e os mandados que houverem, tanto em bens móveis como de raiz, e de toda
a quantia.
- Levava-se V .
b w
+

k* Levava-se V^, além da rasa, suposto que o regimento só dava 2 vinténs do auto, fora a rasa e
1

mandados ç revelias, o que se reduziu a dita ' / . 2

bY- Levava-se ' / , além da escrita.


2

b • Levava-se a mesma rasa, ainda sendo em presença do juiz, além de 4 vinténs de caminho, que sempre
z

tinham dentro da vila.


' Levava-se / .
c a 1
2
c
b- Levava-se ' / , além da escrita.
2

' Levavam-se 6 vinténs de cada página.


c c
681

Nas quereÍas d e *devassas c ce


levarão d o a u t o , a l é m d a sua escrita, setenta e
cinco "réis; e dg sumário, *" a escrita a rasa; assentada e conclusão, c o m o d a "defi-
c

nitiva, e n a d a mais, sendo n a c i d a d e ou vila e sendo fora levarão o seu c a m i n h o ;


d e c a d a £ libelo q u e o f e r e c e r e m p o r p a r t e d a J u s t i ç a , c o m o p r o m o t o r dela n o s
c

casos q u e lhes p e r t e n c e a a c u s a ç ã o , sendo o caso de querela l e v a r ã o trezentos réis


e sendo de devassa, q u e deve ser b e m vista p a r a se c o n f o r m a r c o m ela e ser m a i o r
o t r a b a l h o , seiscentos réis; dos t e r m o s c n
de seguro e d e viver e d e p r o c e d e r b e m e
o u t r o s , sendo feitos e m sua casa, d e c a d a u m q u e os assinar, c e n t o e c i n q ü e n t a
réis; e i n d o c l
tomá-los à cadeia ou à casa d o juiz, trezentos / / réis; e o m e s m o J c
[ fl. 370v. ]
levarão d e q u a l q u e r t e r m o d e h o m e n a g e m .
N a s devassas ^ tiradas a r e q u e r i m e n t o de p a r t e , deve esta satisfazer as custas
0

dela; e sendo * tirada *ex-qfficio nos casos particulares q u e a lei d e t e r m i n a , as p a g a -


0

r ã o os culpados q u e f o r e m obrigados à p r i s ã o , posto q u e se n ã o v e n h a m livrar; e


não c m
h a v e n d o culpados, pagar-se-á a m e t a d e s o m e n t e d o q u e nela se m o n t a r , à
c u s t a d o " c o n c e l h o o n d e se c o m e t e u o malefício. D e r e g i s t r a r 011
a sentença na
c u l p a levarão setenta e cinco réis; nas r e v i s t a s c0
das "aferições e m c o r r e i ç ã o n ã o
levarão os escrivães dela coisa a l g u m a das pessoas q u e forem absolvidas, p o r é m
das q u e n ã o tiverem c u m p r i d o t e r ã o d u z e n t o s e q u a r e n t a réis d a m u l t a e m q u e
c a d a u m for c o n d e n a d o , c o m o fica dito no título dos ouvidores.
E n ã o p o d e r ã o os "escrivães e "tabeliães d o j u d i c i a l c o n t a r as c u s t a s p o r
si n e m p e d i - l a s às p a r t e s a n t e s d e v e n c i d a s e c o n t a d a s p e l o c o n t a d o r , a i n d a
c o m o p r e t e x t o d e lhas d e s c o n t a r e m a seu t e m p o p e n a d e s u s p e n s ã o e p r i v a -
ç ã o d e seus "ofícios.

ct
*' Levava-se por estilo / pelo auto e sumário e nada de rasa.
2
g

c e i
Levava-se a *rasa, fora os termos.
c
^ Levava-se a rasa, fora os termos.
c
£ ' Levava-se a rasa.
c n _
Levava-se ' / . 4

C1
* Levavã-se / e 4 "vinténs de caminho.
1
4

C
J' Levava-se V , +

c
k- O mesmo.
c,
l" O mesmo.
c m
- O mesmo.
ç n _
Levava-se / . l
2

c o
' Nada se levava absolutamente.
682

"Tabeliães das Notas

D e c a d a P escritura q u e fizerem n o livro das n o t a s levarão dois mil e q u a t r o -


c

centos réis e s e r ã o o b r i g a d o s a d a r e m o traslado dela à p a r t e , s e m p o r isso l h e


l e v a r e m o u t r a p a g a . D e c a d a 1 p r o c u r a ç ã o b a s t a n t e c o m a m e s m a obrigação, mil
c

e oitocentos "réis; d e c a d a p a p e l c r
q u e l a n ç a r e m nas n o t a s e t i r a r e m delas levarão
a s u a escrita a *rasa, n a forma q u e os "escrivães e tabeliães do judicial. D a i d a c s

fora d e casa a fazer a l g u m a escritura, a l é m d o estipêndio q u e p o r ela lhes c o m p e -


te, setenta e cinco réis, e sendo fora d a c i d a d e ou vila levarão o m e s m o c a m i n h o
q u e v e n c e m os e s c r i v ã e s d o j u d i c i a l . D e c a d a c t
a p r o v a ç ã o de t e s t a m e n t o ou
"codicilo, mil e duzentos réis; de c a d a 0 1 1
r e c o n h e c i m e n t o e subestabelecimento,*^
cento e cinqüenta; de b u s c a c w
d e escritura n o livro das notas levará a m e t a d e d o
q u e l e v a m os escrivães e tabeliães do judicial; dos processos, e escrituras, e mais
d o c u m e n t o s , q u e é, p o r c a d a m ê s , vinte e q u a t r o réis n o p r i m e i r o a n o , q u e sendo
c o m p l e t o i m p o r t a d u z e n t o s e oitenta e oito réis, e p a s s a n d o d e a n o l e v a r ã o n o
s e g u n d o cento e q u a r e n t a e q u a t r o réis, e se p a s s a r d e dois anos levarão mais do
terceiro q u a r e n t a e oito réis, e p o r todos, quatrocentos e oitenta réis, e n a d a mais,
a i n d a q u e t e n h a m passado mais anos; e o u t r o tanto levarão p o r b u s c a r q u a l q u e r
[ fl. 371 ] i n s t r u m e n t o q u e j á tiverem tirado da nota, n ã o lhes tendo / / sido requerido p e l a
p a r t e a q u e p e r t e n c i a a e n t r e g a dele q u a n d o esta se n ã o d e m o r o u p o r culpa sua.

Escrivães dos órfãos

Nos processos c x
q u e o r d e n a r e m l e v a r ã o o m e s m o q u e os m a i s escrivães e
t a b e l i ã e s d o j u d i c i a l ; do a u t o d e i n v e n t á r i o , s e n d o n a c i d a d e ou vila, a l é m d a
escrita a rasa, d a ida setenta e cinco réis, e a rasa se c o n t a r á d a m e s m a sorte q u e n o
judicial; e indo fora fazê-lo levarão o c a m i n h o , c o m o os mais escrivães e tabeliães;
nas partilhas levarão do auto o m e s m o q u e do inventário, e m a i s a escrita a rasa;

C
P• Levava-se / e davam o traslado.
2
a

ct
l- Levava-se / e V .
l
8 a

cr
- Levava-se a rasa.
cs
- Levavam-se 4 'vinténs.
ct
- Levava-se V . 8

c u
- Levavam-se 4vinténs.
c v _
Levava-se ' / . +

C W -
O mesmo, como fica dito no titulo dos tabeliães do judicial.
c x
' O mesmo se levava.
683

das conclusões, assim p a r a a d e t e r m i n a ç ã o d a p a r t i l h a c o m o p a r a se j u l g a r p o r


sentença, o m e s m o q u e delas levam os do judicial; e n ã o extrairão cartas de parti-
lhas senão r e q u e r e n d o - a s os órfãos depois de m a i o r e s ou h a v e n d o alguns m a i o r e s
co-herdeiros q u e as p e ç a m . D e c a d a t e r m o y d e tutela escrito n o livro, setenta e
c

cinco *réis ê de o c o p i a r e m no inventário somente o q u e i m p o r t a r a escrita; dos


termos 0 2
de e n t r e g a dos órfãos, q u a n d o se d e r e m a "soldada, e d e fiança, m a n d a -
dos e a l v a r á s , setenta e c i n c o réis; o m e s m o l e v a r ã o dos t e r m o s d e e n t r a d a n o
cofre, n o livro q u e nele deve estar, e t a m b é m do q u e fizer d a saída; esta, p o r é m , se
n ã o fará s e m p r i m e i r o ser ouvido o tutor dos m e n o r e s a q u e p e r t e n c e r . D o s t e r m o s
q u e fizerem d e a r r e n d a m e n t o dos bens dos órfãos nos casos q u e lhes são permití-
dos levarão a escrita e da ida à p r a ç a setenta, e cinco réis; e das a r r e m a t a ç õ e s dos
bens, o m e s m o q u e fica dito nos escrivães e tabeliães do judicial.

D a s c o n t a s ^ q u e o "juiz t o m a r aos tutores dos r e n d i m e n t o s das "legítimas


3

dos órfãos l e v a r ã o do auto setenta e cinco réis, e o m a i s d e sua escrita, c o n t a d a à


"rasa; d e b u s c a ^ dos i n v e n t á r i o s r e q u e r i d a p o r p a r t e dos órfãos ou seu t u t o r
levarão pelo p r i m e i r o a n o , n o fim dele, cento e c i n q ü e n t a réis, e o u t r a t a n t a q u a n -
tia pelo segundo e t a m b é m pelo terceiro, e m q u e se m o n t a m pelos ditos três anos
q u a t r o c e n t o s e c i n q ü e n t a réis, e n a d a mais dali e m diante; p o r é m , * q u a n d o lhes
1 0

forem r e q u e r i d o s p o r a l g u m a p a r t e q u e n ã o seja p o r p a r t e dos órfãos ou d e seus


tutores p o d e r ã o levar busca deles d a m e s m a sorte q u e a p o d e m levar os escrivães
e tabeliães do judicial d e feitos findos o u r e t a r d a d o s .

^Distribuidores [ fl. 37 l v . ]

D e c a d a d i s t r i b u i ç ã o ^ levarão cento e c i n q ü e n t a réis; d e b u s c a , ^ p o r ser e m


e

livro, o m e s m o q u e o "tabelião de notas, p o r é m n ã o a p o d e r ã o levar s e n ã o passa-


dos cinco anos q u e o feito, a u t o ou escritura forem distribuídos. D e c a d a ° ^ certi-
d ã o q u e p a s s a r e m , cento e c i n q ü e n t a réis.

C
Y- Levavam-se 2 "vinténs.
c z
' 2 vinténs.
Levavam de escrever as contas que se tomavam duas assentadas em cada dia, a dois vinténs cada
uma, além da escrita.
Levava-se V sendo de autos findos do primeiro ano em diante, e nada mais.
2
d c
- Levavam como os mais escrivães.
d d
- Levavam "A.
, 4

' Levavam o mesmo que os tabeliães e pela mesma forma de tempo.


e

Af -
\Íncompletõ\
684

*Inquiridores

D e i n q u i r i r a c a d a t e s t e m u n h a l e v a r ã o c e n t o e c i n q ü e n t a *réis e d e
a s s e n t a d a , " q u e terá d e c a d a três t e s t e m u n h a s , setenta e cinco réis; d e inquirir **
1 1 1

e m casa particular n a cidade ou vila, sendo e m u m a só casa, setenta e cinco réis e


se for e m diversas casas levarão o m e s m o d e c a d a u m a ; e i n d o fora d a c i d a d e ou
vila l e v a r ã o o q u e lhes t o c a r de seu c a m i n h o , como v e n c e m os "escrivães e "tabeliães.

* Contadores

D e contaWJ o salário q u e v e n c e o escrivão ou t a b e l i ã o , t a n t o d a p a r t e d o


a u t o r c o m o do réu, levarão d e c a d a u m a c e n t o e c i n q ü e n t a réis; de c o n t a r as custas
d a p a r t e , trezentos réis; e q u a n d o ^ as h o u v e r d e dividir, p o r ser a c o n d e n a ç ã o das
custas p o r p a r t e s , levarão d e a m b a s q u a t r o c e n t o s e c i n q ü e n t a réis, h a v e n d o d e
c a d a u m a conforme a p a r t e q u e lhes tocar; p o r é m , de c o n t a r as pessoais q u a n d o as
p a r t e s as v e n c e m n ã o levarão coisa a l g u m a . H a v e n d o d e c o n t a r j u r o s ou impor-
tância líquida d e frutos ou r e n d i m e n t o s anuais levarão p o r c a d a u m a n o c e n t o e
c i n q ü e n t a réis; e d e o u t r a s contas q u e os j u l g a d o r e s lhes m a n d a r e m fazer e n t r e
partes, sendo e m causa d e m a i o r valor q u e exceda a a l ç a d a l e v a r ã o o q u e lhes for
t a x a d o pelo j u i z q u e as m a n d a r fazer, o qual a r b i t r a r á o salário c o n f o r m e a quali-
d a d e delas; e n ã o levarão coisa a l g u m a sem lhes ser t a x a d o , n e m m a i o r estipêndio
q u e o a r b i t r a d o ; p o r é m , a c h a n d o - s e as p a r t e s gravadas n o arbítrio p o d e r ã o recor-
rer a m a i o r a l ç a d a p o r m e i o d e agravo ou q u a n d o se c o n h e c e r d a a p e l a ç ã o .

[ fl. 372 ] *Meirinhos e "alcaides

D e c a d a ^ prisão levarão seiscentos réis e o m e s m o ^ m


de cada penhora, em-
b a r g o ou seqüestro; de c a d a c i t a ç ã o c m
q u e p o r estilo fazem t e r ã o o m e s m o q u e os
escrivães e tabeliães d o judicial, p a s s a n d o c e r t i d ã o c o m fé dela; d e c a m i n h o , * 1 0

d£- Levava-se / . 1
t

Levavam de três testemunhas, por assentada, 2 'vinténs de ouro.


Levava V dentro da vila ou cidade, e saindo fora o mesmo caminho que o escrivão.
+

^J- De contar um feito, '/ ; de feito-crime em que não havia parte, '/ ; e havendo parte, '/ -
2 4 2

^ Levava ' / de cada uma, e das apelações com apensos ou sem eles, '/,, e fora daqui nada mais
+

levavam, excetuando em alguma conta intrincada em que pediam arbítrio ao juiz.


^ Levavam / ]
r
d m
- Levavam 7 . 2

- Levavam '/,.
d n

Levavam ' / por dia, contando a quatro 'léguas.


a
685

assim no j u í z o da ouvidoria c o m o [no] ordinário, levarão p o r dia m i l e duzentos


"réis; e i n d o fora a mais diligências do q u e u m a r a t e a r ã o ? p o r todas a i m p o r t â n -
0

cia do q u e v e n c e r e m d e c a m i n h o .

"Escrivães d a v a r a

D e c a d a a u t o ^ q q u e f i z e r e m d e p r i s ã o d a s p e s s o a s q u e os " m e i r i n h o s e
"alcaides p r e n d e r e m , i n d o e m s u a c o m p a n h i a l e v a r ã o t r e z e n t o s "réis; e d a ida
c o m o m e i r i n h o ou alcaide, outros trezentos réis; e o m e s m o levarão d e c a d a a u t o
q u e fizerem das c o n d e n a ç õ e s verbais q u e escreverem e m livro; dos autos d e p e -
n h o r a , e m b a r g o ou seqüestro e outros q u e p o r r a z ã o d e seu "oficio p o d e m fazer,
trezentos réis; de c a m i n h o e diligências fora d a c i d a d e ou vila l e v a r ã o o m e s m o
q u e levam os m e i r i n h o s e alcaides.

"Porteiros

D e c a d a c i t a ç ã o q u e f i z e r e m e p a s s a r e m fé l e v a r ã o c e n t o e c i n q ü e n t a réis,
e s e n d o n a a u d i ê n c i a , t r i n t a e sete réis e m e i o ; p o r é m , se for e m d i s t â n c i a fora
d o l u g a r o u vila l e v a r ã o o seu c a m i n h o a c e m réis p o r " l é g u a , q u e é p o r d i a ,
à r a z ã o d e seis l é g u a s , seiscentos réis; d e c a d a * p r e g ã o ^ e m audiência, trinta e
r

sete réis e m e i o ; d e a p r e g o a r n a p r a ç a e m a i s l u g a r e s p ú b l i c o s os b e n s p e n h o -
r a d o s os dias d a lei l e v a r ã o , d e c a d a u m , sessenta réis, q u e , n o s oito dias q u e
d e v e m a n d a r os b e n s m ó v e i s , i m p o r t a r ã o q u a t r o c e n t o s e o i t e n t a r é i s , e n o s
v i n t e dias q u e d e v e m a n d a r os d e raiz, mu e d u z e n t o s réis, os q u a i s só v e n c e -
r ã o d e p o i s d e p a s s a r e m c e r t i d ã o c o m fé d e q u e os c o r r e u , c o m o é estilo, p a r a
se j u n t a r aos a u t o s ; e satisfazendo o d e v e d o r à d í v i d a a n t e s q u e se a c a b e m os
d i a s d a p r a ç a p a g a r - s e - á os p r e g õ e s q u e t i v e r c o r r i d o e n a d a m a i s . D e
a r r e m a t a ç ã o ^ d e b e n s m ó v e i s até c i n q ü e n t a m i l réis l e v a r ã o t r i n t a e sete réis
e m e i o ; d e c i n q ü e n t a mil réis p a r a c i m a até c e m , s e t e n t a e c i n c o réis; e p a s s a n -
d o de c e m mil réis, c e n t o e c i n q ü e n t a réis. / / De apregoar u m a carta de [ fl. 372v. ]
editos e f e c h a d a e p a s s a r c e r t i d ã o d e p o i s d e findo o t e m p o , t r e z e n t o s réis.

P- Também se rateava; também tinham de cada levada na vila ' / .


d
z

dq.
Levavam / de tudo o que trata este capítulo; e de caminho, o mesmo que levavam os meirinhos,
1
+

' Levavam 2 "vinténs de ouro sendo pregão em audiência e 4 vinténs sendo fora dela.
d r

' Levavam / de qualquer quantia que fosse e se a parte pagava antes da arrematação, ' / .
d s l
2 4
686

"Partidores dos órfãos

O s a v a l i a d o r e s dos b e n s nas c i d a d e s o u vilas s e r ã o os m e s m o s p a r t i d o r e s


j u r a m e n t a d o s / * h a v e n d o - o s , e l e v a r ã o d e avaliar os b e n s q u e se i n v e n t a r i a r e m ,
1

c a d a u m , seiscentos *réis; se, p o r é m , se gastar u m dia inteiro n o inventário levará


c a d a u m mil e d u z e n t o s réis, e assim os mais dias q u e g a s t a r e m a esse respeito;
p o r é m , sendo o inventário distante da cidade ou vila serão os avaliadores vizinhos
do lugar o n d e estiverem os bens, p o r t e r e m mais r a z ã o de saber o valor deles. N ã o
h a v e n d o v i z i n h a n ç a p e r t o se c o n t a r á a c a d a u m a m i l e d u z e n t o s réis p o r dia,
d e s d e q u e s a í r e m d e sua casa até se r e c o l h e r e m , c o n t a d o s os dias a seis "léguas
c a d a u m . E q u e r e n d o ir os avaliadores d o "concelho s e m q u e se lhes conte c a m i -
n h o e só o t e m p o q u e d u r a r a feitura do inventário, os "juízes os a d m i t i r ã o m a n -
d a n d o - l h e s p a g a r os dias q u e d u r a r o inventário e avaliações. O s p a r t i d o r e s leva-
r ã o a m b o s j u n t o s o u t r o t a n t o salário, c o m o é p e r m i t i d o a o j u i z d a facção das
partilhas, c o m o fica dito, e n ã o levarão c a m i n h o , a i n d a q u e estas se façam fora d a
c i d a d e ou vila, assim c o m o o n ã o d e v e m levar o j u i z e "escrivão.

*Escrivães d a c â m a r a

D e c a d a alvará * q u e for assinado pelos "oficiais d a " c â m a r a levarão cento e


1 11

c i n q ü e n t a réis; d e todos°- os assentos e t e r m o s q u e fizerem nos livros d e l a p o r


v

m a n d a d o dos "vereadores a r e q u e r i m e n t o d e partes, assim c o m o obrigações, fian-


ças e outras semelhantes, d e c a d a u m , cento e c i n q ü e n t a réis; d e c a d a licença°- w

q u e p a s s a r e m aos vendeiros e "oficiais mecânicos e aos mais q u e t ê m p o r t a a b e r t a


p a r a v e n d e r , q u a t r o c e n t o s réis; das "cartas*** p a t e n t e s e "provisões q u e se registra-
r e m nos livros d a C â m a r a , mil e d u z e n t o s réis; das c a r t a s t e s t e m u n h á v e i s q u e
p a s s a r e m d e quaisquer r e q u e r i m e n t o s q u e se fizerem, aos vereadores e oficiais d a
c â m a r a levarão o m e s m o q u e os mais escrivães, à custa d e q u e m as r e q u e r e r ; d a
p u b l i c a ç ã o ^ y d a s e n t e n ç a q u e a c â m a r a proferir n o s feitos d e injúrias v e r b a i s ,
c e n t o e vinte réis; e escrevendo a l g u m a coisa neles depois d e conclusos p o r m a n -
d a d o dos "juízes e vereadores levarão o q u e m o n t a r essa escrita a rasa^ c o n t a d a n a
[ fl. 373 ] f o r m a que, / / o s m a i s escrivães e "tabeliães do j u d i c i a l . D o s " c o n t r a t o s q u e se

d*' De cada partilha levava cada um partidor / chegando o inventário até / $ e passando das /
1
a
w>) m
i

para cima, levavam a V e de caminho nada se levava.


g

- Levam-se 4 vinténs.
d u

dv
- Levavam-se 4 "vinténs de ouro.
- Levava-se V .
d w
a

d - Levava-se o mesmo que os tabeliães a *rasa, e assim também nas cartas testemunháveis.
51

ày- Levava-se V e tirava a sentença, e tudo o mais que escrevia se contava pela rasa.
4
r e m a t a r e m p e l a c â m a r a n ã o levarão p r o p i n a a l g u m a e somente de c a d a a r r e m a t a ç ã o ,
o u seja d e aferições ou currais ou talhos ou outras semelhantes r e n d a s , levarão d e
c a d a u m a dois mil e q u a t r o c e n t o s *réis; p o r é m , d a a r r e m a t a ç ã o d e q u a l q u e r o b r a
q u e a * c â m a r a m a n d a r fazer levarão só mil e duzentos réis* d e c a d a "regimento d e
"ofício ou t a x a q u e se passar p a r a s e m p r e , mil e duzentos réis; d e c a d a "provisão
d e "juiz d e c a d a u m dos ofícios m e c â n i c o s e "cartas d e e x a m e , mil e duzentos réis;
d e c a d a t e r m o d e j u r a m e n t o e posse q u e se d e r n a " c â m a r a aos " c a p i t ã e s d a
" o r d e n a n ç a e o u t r o s , seiscentos réis; d e e s c r e v e r e m as eleições das J u s t i ç a s q u e
fizerem os "ouvidores ou "oficiais d a c â m a r a , d e três e m três a n o s , q u a t r o mil e
oitocentos réis. Pela escrita das contas do "concelho, n ã o t e n d o o r d e n a d o , levarão
sete mil e duzentos réis.

"Escrivães d a a l m o t a ç a r i a

De uma a ç ã o d z
levarão setenta e cinco réis; de u m a a b s o l v i ç ã o ea
d a instância
do j u í z o assentada e m c a d e r n o , o m e s m o ; de: u m a a p e l a ç ã o ' e n t r e p a r t e s p a r a o
6 3

juiz ou c â m a r a , cento e c i n q ü e n t a réis; d e c a d a t e s t e m u n h a , ec


cento e cinqüenta
réis; d e u m a s e n t e n ç a , " duzentos réis; d e u m a p e n a
ea e e
posta entre partes, cento e
c i n q ü e n t a r é i s . N o p r o v i m e n t o p e l a c i d a d e , o u v i l a , q u a n d o f o r e m c o m os
*almotacés levarão dos q u e a c h a r e m e m culpa e forem c o n d e n a d o s , de c a d a u m ,
trinta e sete réis e m e i o ; e h a v e n d o causas e m q u e se h o u v e r d e o r d e n a r processo
e g u a r d a r a o r d e m do j u í z o , levarão d o q u e p r o c e s s a r e m o m e s m o q u e os mais
escrivães e "tabeliães d o judicial.

Advogados

De cada requerimento e f
n a a u d i ê n c i a , c e n t o e c i n q ü e n t a réis; de p ô r
u m a a ç ã o , S o m e s m o ; de u m a p e t i ç ã o ^ de agravo, mil e d u z e n t o s réis;
e e

d z
- Levavam-se dois 'vinténs.
ea
- Dois vinténs.
Quatro vinténs.
e C i
Quatro vinténs.
e a
' Cincovinténs.
ee
" Quatro vinténs.
Levava-sç '/ . 4

e
§' Levava-se '/ . 4

Levava-se /o. 1
688

d e u m a e x c e ç ã o o m e s m o ; d e razão J oferecida p o r e m b a r g o s , trezentos "réis;


}
ei e

d e " c a u s a ^ o r d i n á r i a c o m réplica e tréplica, nove mil e seiscentos réis; d e causas * 6

sumárias, q u a t r o mil e oitocentos réis, o q u e será p a s s a n d o a causa d e c e m mil réis


e n ã o c h e g a n d o levarão a m e t a d e . e m

[ fl. 373v, ] "Requerentes

D e p o r e m u m a a ç ã o e m a u d i ê n c i a , cento e c i n q ü e n t a réis; d e c a d a r e q u e -
en

r i m e n t o , o m e s m o ; e ajustando-se c o m as p a r t e s a t r a t a r das causas, p o d e r ã o


6 0

levar, p o r mês, mil e duzentos réis e n ã o mais, ou seja u m a ou m u i t a s causas.

*Carcereiros q >

D e c a r c e r a g e m l d e c a d a u m dos presos, q u a n d o se m a n d a r soltar, levarão


ec

mil e oitocentos réis, e o m e s m o levarão dos q u e forem presos de noite c o m a r m a s


defesas; p o r é m , dos q u e forem presos p o r serem a c h a d o s fora d e horas, depois do
sino, s e m a r m a s , levarão só m e i a c a r c e r a g e m . E sendo a l g u m p r e s o p o r erro ou
sem m a n d a d o do *juiz e sem culpa, e p o r isso for m a n d a d o soltar p o r d e s p a c h o
ou a l v a r á , n ã o l e v a r á dele " c a r c e r a g e m . D o p r e s o q u e for m u d a d o p a r a o u t r a
p r i s ã o levará s o m e n t e a m e t a d e d a c a r c e r a g e m q u e ele havia d e p a g a r q u a n d o
fosse solto; e o carcereiro d a prisão p a r a o n d e for m u d a d o levará, q u a n d o o solta-
r e m , a c a r c e r a g e m inteira. D o s escravos presos, ou seja p o r culpas ou p o r serem
p e n h o r a d o s a seus senhores, e n ã o haver depositário a eles, ou p o r fugidos o u p o r
o r d e m d e seus senhores, sendo soltos levarão mil e duzentos réis s o m e n t e . E n ã o
lhes q u e r e n d o seu s e n h o r d a r d e c o m e r , o carcereiro lhes assistirá c o m o sustento
necessário, e levará dele, p o r c a d a escravo, p o r dia, c e n t o e vinte réis.
E p o r q u e este "regimento é só geral p a r a o distrito das M i n a s , e m q u e h á d e
ter sua observância, e diverso d o q u e é c o n c e d i d o p a r a as c o m a r c a s de b e i r a - m a r
e sertão, e h á algumas destas q u e c o m p r e e n d e m t a m b é m vilas e terras d e m i n a s

-
ei
Levava-se '/¡j.
J-
e
Levava-se V «
+

k-
e
Levavam-se / -
8
8

'-
e
Levavam-se */ , fossem maiores ou menores as quantias das causas, e por isso não tinham mais coisa
s

alguma, ainda que neles sobreviessem alguns incidentes que retardassem o ponto principal delas.
e m
- De cada petição ordinária se levava f e aqui se não provê nesta parte.
1
v
en
- Levava-se V . +

C O i
Levava-se V , e cada um se ajustava com a sua parte como lhe parecia, porque esta matéria não
4

estava provida no "regimento.


e
P' Não estava provido no regimento o salário dos carcereiros, e por *portaria dos "governadores é que
p levavam.
cc
l- Levava W^, sem diferença de presos ou tempo.
689

e m q u e se p a g a m "quintos,, levarão os "ouvidores e seus "oficiais d e n t r o d o distri-


to delas q u a n d o nele assistirem os m e s m o s salários q u e neste se lhes p e r m i t e m ;
p o r é m , n a s mais vilas e lugares e m q u e n ã o houver minas atuais e m q u e se p a g u e m
quintos observarão, sem alteração, o "regimento feito p a r a os "ouvidores, "juízes e
oficiais de Justiça das ditas comarcas de beira-mar e sertão, e sempre os emolumentos
e assinaturas se r e g u l a r ã o conforme o distrito e m q u e f o r a m ajuizadas as p a r t e s
a o n d e p e r t e n c e m as causas, ainda q u e p o r ausência dos ouvidores se c o n t i n u e m e
t e r m i n e m e m outro diverso.
H a v e n d o n o v o s d e s c o b r i m e n t o s distantes d e p o v o a d o , p o r q u e neles, p e l o [ fl. 374 ]
g r a n d e c o n c u r s o e, m u l t i d ã o de p o v o , é necessária p r o n t a administração d a justiça
e se c o s t u m a m v e n d e r os m a n t i m e n t o s p o r excessivos preços, levará o o u v i d o r d a
c o m a r c a o n d e as novas m i n a s se d e s c o b r i r e m e t a m b é m seus oficiais d e n t r o d o
distrito delas mais a t e r ç a p a r t e do c o n t e ú d o neste r e g i m e n t o ; p o r é m , p a s s a n d o
três a n o s , n ã o p o d e r ã o l e v a r o dito excesso e s o m e n t e os salários d e t e r m i n a d o s
nele.
Este "alvará e m f o r m a de lei se c u m p r a e g u a r d e i n t e i r a m e n t e c o m o nele se
c o n t é m , n ã o obstante quaisquer outras leis, regimentos ou "resoluções e m c o n t r á -
rio q ü e hei p o r d e r r o g a d o s p a r a esse efeito c o m o se deles fizesse expressa e indivi-
dual m e n ç ã o . Pelo q u e m a n d o a o m e u C o n s e l h o U l t r a m a r i n o , "vice-rei, "gover-
n a d o r e s e c a p i t ã e s - g e n e r a i s d o E s t a d o do Brasil, "ministros e m a i s pessoas dos
m e u s reinos e domínios q u e o c u m p r a m e g u a r d e m e façam i n t e i r a m e n t e c u m p r i r
e g u a r d a r c o m o nele se c o n t é m ; e a o " d e s e m b a r g a d o r Francisco Luís d a C u n h a e
Ataíde, d o m e u C o n s e l h o e c h a n c e l e r - m o r do R e i n o , m a n d o q u e o faça p u b l i c a r
n a C h a n c e l a r i a e o faça i m p r i m i r e registrar nos lugares o n d e se c o s t u m a m fazer
semelhantes registros, e este p r ó p r i o se l a n ç a r á n a T o r r e do T o m b o . Escrito e m
B e l é m a dez d e o u t u b r o de mil setecentos c i n q ü e n t a e q u a t r o . e r

Rei.

Também estava provido no regimento velho que os "guarda-mores levassem de cada dia de caminho
para repartições de terras ou vistorias V e de assinatura de cada carta /,,; e que os seus 'escrivães
s
1

levassem de cada dia de caminho / fora da escrita, que seria contada pela "rasa; de feitio de cada
i
í í

carta, V^eo mesmo de cada auto de posse; que ao depois foi declarado, em parte pela 'provisão de
27 de junho de 1733, de que já acima, no título dos ouvidores, se fez menção. Não se proveu sobre os
emolumentos dos guarda-mores e seus escrivães, ao mesmo tempo que se lhes deu providência no
regimento velho e pela ordem de 27 de junho de 1733. Não se proveu sobre os ordenados que os
ouvidores e seus escrivães devem levar como 'superintendentes das terras minerais, nem o que devem
levar de cada auto de vistoria nas ditas terras, nem ao menos se ordenou que nesta parte se observasse
o costume ou a resolução de 27 de junho de 1733 ou que especialmente se revogasse. Não se proveu
spbre as petições ordinárias dos advogados. Não se proveu se deviam levar os ouvidores salário de
rever as licenças dos 'ofícios mecânicos e 'tendeiros, de que se levava '/ , ao mesmo tempo que só se
H

proibiu levá-lo de se reverem os escritos de aferição. Não se proveu sobre os emolumentos que os
ouvidores devem levar e mais seus escrivães sobre papéis que se justificam, por serem todos, nas suas
comarcas, juízes das justificações, e levavam '/¡¡de qualquer papel justificado e A o escrivão. Não
l
2

se proveu sobre escrivães da ouvidoria nem o que devem levar de 'novos direitos das 'cartas de
seguro.
690

Diogo de M e n d o n ç a Corte-Real

*Alvará e m f o r m a d e lei p e l o q u a l V o s s a M a j e s t a d e é servido d e c l a r a r as


assinaturas e e m o l u m e n t o s q u e d e v e m h a v e r os "ouvidores, "juízes e. seus "ofici-
ais das c o m a r c a s das M i n a s G e r a i s , C u i a b á , M a t o G r o s s o , S ã o P a u l o e G o i á s , e
nas q u e ficam no continente do g o v e r n o da Bahia, e todas as m a i s q u e se descobri-
r e m nos m e s m o s ou diversos governos, e t u d o n a forma q u e a c i m a se declara.
P a r a Vossa Majestade ver.
[ fl. 374v. ] Francisco Luís d a C u n h a e Ataíde.
Foi p u b l i c a d o este alvará e m f o r m a d e lei n a C h a n c e l a r i a - m o r d a C o r t e e
R e i n o . Lisboa, 15 d e o u t u b r o d e 1754.
D o m Sebastião M a l d o n a d o .
R e g i s t r a d o n a C h a n c e l a r i a - m o r d a C o r t e e R e i n o n o livro das leis, à folha
5 1 . Lisboa, 18 d e o u t u b r o d e 1754.
R o d r i g o X a v i e r Álvares d e M o u r a .
T o m á s Pinto d e V i l h a n a o fez.
Foi impresso n a C h a n c e l a r i a - m o r d a C o r t e e R e i n o .

• 97 «

[ fl. 375 ] Papel sobre o novo regimento retro 1

Comentários ao regimento de 10 de outubro de 1754, que


regulamentou nova remuneração aos ouvidores, juízes, oficiais de
Justiça, advogados, requerentes e carcereiros, válido para Minas
Gerais e para todas as comarcas em que houvesse extração aurífera.
As considerações giram em torno da comparação dos valores fixa-
dos pelo antigo regimento de 17 de setembro de 1721 e pela legisla-
ção complementar com os novos emolumentos, das críticas aos par-
cos rendimentos a partir da nova regulamentação, consideradas
as grandes despesas e a carestia local, e das críticas à discrepância
entre as responsabilidades de alguns cargos ou a complexidade de
serviços executados e sua respectiva gratificação. Vincula-se ao
documento 96.

Título atribuído por Caetano da Costa Matoso.


691

Este documento, com data posterior ao afastamento de Cae-


tano da Costa Matoso de seu posto em Vila Rica, demonstra
que ele permanecia atento ao que ali se passava.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Francisco Ângelo Leitão; Minas
Gerais; ça. 1754.
D e s t i n a t á r i o ; Caetano da Costa Matoso.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento constitui argumen-
tação contrária ao regimento contido no documento anterior,
erigindo em tópica a injustiça, a ilegalidade, a irracionalidade e
o prejuízo inerentes a e l e c o empenho dos mineiros. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, caligrafada
e regularizada do século XVIII. Apresenta maiúsculas trabalha-
das por volutas em semicírculo e " e " quando conectivo em módulo
maior, redondo com ampla aspirai; "t" de dupla haste com perfil
na haste inferior; " p " de haste inferior simples e perfil; grupo
"lh" com definição das duas letras, sendo o " h " de duas feituras:
semelhante ao " E " redondo ou de haste simples com orelha pro-
nunciada; "f' com o traço horizontal em laçada dupla; vogais de
final de linha com ponto de fuga e m traço ascendente. Título
com a letra d e Caetano da Costa Matoso. (YDL)

O " r e g i m e n t o n o v o p a r e c e q u e se n ã o c o n f o r m a c o m a r a z ã o n o q u e res-
peita aos salários d a conclusão o u assinaturas dos ^ouvidores, p o r q u e se
n ã o deve r e g u l a r o t r a b a l h o dos j u l g a d o r e s a t e n d e n d o a o p e d i d o n a s
ações m a s , sim, à n a t u r e z a das causas, pois é certo ser diferente o t r a b a l h o das
ordinárias p a r a as sumárias. Nestas p o d i a haver d i m i n u i ç ã o do q u e se lhes taxava
n o r e g i m e n t o velho e das outras n a d a se lhes p o d i a diminuir.
O m e s m o p a r e c e se devia e n t e n d e r ou observar a respeito d o e m o l u m e n t o
das ações d e alma, sendo igual os das q u e c a b e m n a a l ç a d a às q u e n ã o c a b e m . E
nesta p a r t e p a r e c e estar o r e g i m e n t o novo p o u c o claro, p o r q u e fala nas ações d e
a l m a e t a x a o salário d e trezentos "réis às q u e n ã o c a b e m n a a l ç a d a e de c e n t o e
c i n q ü e n t a às q u e c a b e m , e n ã o declara se o e m o l u m e n t o é d o j u r a m e n t o , se d a
assinatura d a sentença. Se se extrair o q u e o r e g i m e n t o velho d i s t i n t a m e n t e decla-
ra u m a e o u t r a coisa, e se n o r e g i m e n t o n o v o se t a x a nos m a n d a d o s d e p r e c e i t o
300 réis de assinatura, sem declaração de caber ou n ã o c a b e r a q u a n t i a n a alçada,
é certo p o r esta forma ficar p a g a n d o mais d e assinatura o q u e confessa do q u e o
rebelde, o q u e p a r e c e carecia d e m a i o r p r o v i d ê n c i a p a r a mais clareza; aliás, fica o
c a m i n h o a b e r t o p a r a novos estilos nascidos de inteligências q u e se lhe p o d e m dar,
a t e n d e n d o as definitivas ou assinaturas do p r i m e i r o / / p a r á g r a f o . [ fl. 375v. ]
T a m b é m n ã o sei q u a l seja a r a z ã o d e q u e n o r e g i m e n t o n o v o , p a r á g r a f o
q u a r t o , o n d e diz "e p a s s a n d o d e c e m mil réis ou sendo d e bens d e raiz" t a x a r 600
réis, s e m declarar exceder os ditos bens de raiz a q u a n t i a d e c e m mil réis ou n ã o ,
692

e d e s t a sorte se p o d e r á vir a e n t e n d e r q u e s e n d o a r e m a t a ç ã o d e b e n s d e raiz


s e m p r e o salário deve ser d e 600 "réis.
E n o q u e respeita a o salário d o s c a m i n h o s , a t e n d e n d o às despesas q u e neles
se fazem, n a d a se p o d i a d i m i n u i r do "regimento velho, q u e é d e u m a "oitava de
mil e duzentos p o r "légua, e aos "juízes d e fora se lhe p o d i a t a x a r a 1.000 réis.
N a s apelações e agravos d e i n s t r u m e n t o q u e s o b e m à "ouvidoria n a d a se lhes
t a x a d e a p r e s e n t a ç ã o , tendo pelo r e g i m e n t o velho "meia p a t a c a d e o u r o ; p o r é m ,
a u m e n t a - s e - l h e o salário n o n o v o r e g i m e n t o d e m e i a a s s i n a t u r a , v i n d o - s e c o m
e m b a r g o s , o q u e se n ã o praticava e m Vila R i c a e p a r e c e o p r a t i c a r i a n o seu lugar
q u e m fez o r e g i m e n t o , pois j á vi levar e m uns autos m a i s d o q u e u m a conclusão,
o que irá estranhado.
N o sexto p a r á g r a f o se d i z q u e os q u e n ã o t i v e r e m "aferido ou n ã o f o r e m
[fl. 376 ] a p r e s e n t a r a sua aferição ou tiverem aferido fora / / do t e m p o d e t e r m i n a d o
p e l a lei p a g a r ã o a c o n d e n a ç ã o q u e aos " o u v i d o r e s p a r e c e r j u s t a , c o n c l u i n d o
q u e n ã o e x c e d e r á d e 3 . 6 0 0 réis, a o q u e p a r e c e q u e os q u e tivessem a f e r i d o ,
a i n d a q u e f o r a d e t e m p o , a p r e s e n t a n d o seu " b i l h e t e n a " c o r r e i ç ã o , d e v i a m
ser só c o n d e n a d o s p e l o seu d e s c u i d o , c o m m o d e r a ç ã o , e n ã o c o m i g u a l d a d e
a o r e b e l d e q u e n ã o c o m p a r e c e s s e o u n ã o tivesse a f e r i d o , e b a s t a v a s e r só a
c o n d e n a ç ã o d e 6 0 0 réis; e t a m b é m se d e v i a a d v e r t i r e d e c l a r a r a m e s m a c o n -
d e n a ç ã o d e v e ter o q u e n ã o t i r a r l i c e n ç a e " a l m o t a ç a r n o t e m p o q u e se lhe
c o n s i g n a , p o r q u e pelas " a l m o t a ç a r i a s se lhe a u m e n t a e d i m i n u i os p r e ç o s dos
g ê n e r o s e p o d e m fazer p r e j u í z o às p a r t e s o n ã o as t i r a r e m a t e m p o ; e n e s t a
p a r t e e d i t a c o n d e n a ç ã o dos q u e a p a r e c e r e m e m c o r r e i ç ã o d e v e ser d i s t i n t a a
c o n d e n a ç ã o e h a v e r d e c l a r a ç ã o , p o r q u e é c e r t o q u e estas se c h a m a m c o n d e -
n a ç õ e s d a sala, q u e só p e r t e n c e a o " m e i r i n h o o p e r c e b e r o e m o l u m e n t o d e -
las, q u e d e v i d o l h e p a r e c e ser p e l a assistência e p r i v a ç ã o do u s o d o seu "ofício
p o r c a u s a d a d i t a o c u p a ç ã o , e d e s t a s c o n d e n a ç õ e s n a d a t i n h a m os s e n h o r e s
j u l g a d o r e s , e só sim a " o i t a v a q u e d e t u d o l e v a v a m p e l o c o s t u m e , e c o m estas
c o n d e n a ç õ e s d a sala é c e r t o , n a c o b r a n ç a delas, n ã o t e r e m os ditos m e i r i n h o s
t r a b a l h o , e p o r isso d e v e ser distinta esta c o n d e n a ç ã o d a dos r e b e l d e s .
[ ff 376v. ] E n o q u e r e s p e i t a a o "escrivão, / / p e l o r e g i m e n t o velho se lhe t a x a v a d e

c a d a c o n d e n a d o e m audiência d e correição d o assento q u e fazia 4 0 réis d e o u r o ,


q u e são 75 réis; c o m o agora se lhe permite no novo 240 réis e h a v e n d o nesta parte
tanto excesso e e m outras tanta diminuição, o que nasce d a falta d a observância q u e
havia do r e g i m e n t o velho e m algumas c o m a r c a s , c o m o vi, q u e l e v a v a m u m q u a r -
to d e o u r o de c a d a c o n d e n a d o , e talvez p o r este respeito se l h e p e r m i t e n o n o v o
o q u e se lhe taxa p o r se n ã o ter advertido n o velho n o q u e se lhe taxava.
N o fim do oitavo parágrafo sei só ser estilo p a g a r o "rendeiro d a audiência d a
r e v i s t a a o " m i n i s t r o p o r l h e j u l g a r as a p e l a ç õ e s das " c o i m a s 8 " o i t a v a s , q u e
c o r r e s p o n d i a m a l g u m t e m p o a 12.000 réis e depois d a "casa d e fundição a 10.560
e a g o r a , q u a n d o m u i t o , pelo salário t a x a d o , p o d e r á c h e g a r a 2.400 réis, sendo 16
693

apelações, q u e raras vezes sucederá; e t i n h a o escrivão a m e t a d e do q u e t i n h a o


"ministro e o " m e i r i n h o d a correição a m e t a d e d o q u e tinha o escrivão.

*Juiz d e f o r a

N o " r e g i m e n t o velho se n ã o d e u p r o v i d ê n c i a a respeito dos e m o l u m e n t o s


deste ministro p o r o n ã o ter havido até esse t e m p o n a s M i n a s , e só o dito regimen-
to, / / n o fim d o capítulo dos e m o l u m e n t o s dos ministros, diz: "cujas assinaturas [ fl. 3 7 7 ]
n ã o levarão os ministros q u e n ã o forem "letrados p r o v i d o s p o r S u a M a j e s t a d e , n a
f o r m a d a O r d e n a ç ã o , livro 3 , título 9 6 " . E assim, q u a n d o se c r i o u o l u g a r d e
n o v o , e n t e n d o iria o r d e m especial a respeito dos e m o l u m e n t o s , p o r q u e a n ã o ir os
p o d e r i a m levar c o m o os "ouvidores, a t e n t o serem letrados p r o v i d o s p o r S u a M a -
j e s t a d e , P o r é m , sei q u e os ditos juízes, das conclusões, l e v a v a m três q u a r t o s , e o
m e s m o , e n t e n d o , era d e assinaturas de cartas precatórias e p a r a inquirição e o u -
tros papéis semelhantes, e d e c a m i n h o e inquiridorias, o m e s m o q u e os ouvidores;
e a g o r a é g r a n d e a d i m i n u i ç ã o e p a r e c e ser mais lapso d a p e n a o u e r r o d a i m p r e s -
são o taxar-se-lhe 100 "réis d e inquirir c a d a t e s t e m u n h a nas causas s u m á r i a s e
o r d i n á r i a s d ò q u e d e p r o p ó s i t o feito, pois desta sorte fica d e m e n o r c o n d i ç ã o o
m i n i s t r o d o q u e o " i n q u i r i d o r , o q u e n ã o se c o n f o r m a c o m a r a z ã o . E só n a s
devassas p o d e r i a ser t o l e r a d o o dito e m o l u m e n t o , a t e n t o a o m e n o s t r a b a l h o q u e
nisso h á e da m e s m a f o r m a n a s justificações, s e n d o pelos ditos j u í z e s ou o u t r o s
quaisquer ministros p e r g u n t a d a s , e não pelos "escrivães, c o m o é costume
c o m u m e n t e fazer, pelo q u e p o d e resultar prejuízo às partes, p o r p o d e r h a v e r dolo,
e m e parece ser / / contra o q u e determina a lei; e nesta p a r t e se devia prover n o [ fl. 377v. ]
regimento contra este costume, de sorte que nas "residências se perguntasse pela falta d a
observância. D a m e s m a forma se devia prover com penas graves a respeito dos juízes
orómáños p a r a q u e n ã o levem "espórtulas algumas dos juramentos d e alma, supletorios
e justificações verbais, c o m o sempre se observou a n ã o se levarem e só no t e m p o de
Vossa Mercê o introduziram os dois juízes M a d e i r a e M a n s o , c o m o pretexto d e q u e
e r a m letrados, sem a t e n d e r e m a q u e n ã o e r a m ministros de "vara b r a n c a , c o m o o
r e g i m e n t o velho o d e t e r m i n a , e esta introdução, e n t e n d o , ignorava Vossa M e r c ê ,
p o r q u e , q u e r e n d o d o último juiz agravar u m "solicitador p a r a Vossa M e r c ê , o p e r -
suadiu a q u e o n ã o fizesse, e c o m o ficasse introduzido este costume, c o n t r a o q u e
determinava o regimento velho, é preciso prover, de sorte q u e se evite esta m a l d a d e
a p r e t e n d e n t e s desta o c u p a ç ã o ansiosos e, depois d e conseguida, ambiciosos.

N o j u í z o d a "provedoria dos ausentes se devia p r a t i c a r o m e s m o q u e nos mais


j u í z o s , i n q u i r i n d o e c o n t a n d o o " c o n t a d o r do geral, e n ã o c o n t a n d o o escrivão,
c o m o se faz e m Vila R i c a e M a r i a n a , p o r "provisão q u e d i z e m t e m , q u e se devia
/ / m a n d a r d e r r o g a d a , e nas outras c o m a r c a s fazem t a m b é m o m e s m o os escrivães [ fl. 378v. ]
e assinam os p r o v e d o r e s , q u e t a m b é m se deve proibir, c o m o e n t e n d o o o r d e n a a
lei, c o m p e n a de erro d e ofício n o q u e respeita a c o n t a r os escrivães, O r d e n a ç ã o ,
694

Livro 10, título 7 9 , p a r á g r a f o l 6 , a l é m d o q u e m e c o n s t a q u e a dita "provisão n ã o


foi p a r t i c u l a r p a r a Vila R i c a e M a r i a n a m a s , sim, geral p a r a o Brasil, e, m e dizem,
n ã o d á faculdade aos "escrivães p a r a c o n t a r e m e a s s i n a r e m m a s , sim, os "prove-
dores, p o r q u e assim p a r e c e p o r nas outras c o m a r c a s assinarem os ditos p r o v e d o -
res, e q u a n d o a c o n t a g e m e inquiridoría deste juízo, p r i n c i p a l m e n t e e m Vila R i c a ,
p a r a o do geral n ã o passasse, p a r e c e - m e q u e se p o d i a criar, d e n o v o , "oficio d e
" d i s t r i b u i d o r , " i n q u i r i d o r e " c o n t a d o r p a r a as d u a s " p r o v e d o r i a s d e ausentes e
F a z e n d a R e a l , e t a m b é m "superintendências, fazendo c a r g a e m todos eles d e to-
das as ações, n ã o obstante serem certos os escrivães, pois assirmme p a r e c e o deter-
m i n a m duas leis q u e traz a Prática criminal, de Ferreira, a l c a n ç a d a u m a a requeri-
m e n t o de J o ã o d e Araújo, distribuidor d a C o r t e , e desta sorte ficará este oficio,
2

nestes j u í z o s , c o m e m o l u m e n t o s m u i t o suficientes, e neles t a m b é m m u i t o conve-


n i e n t e s e precisos.

[ fl. 378v. ] T a m b é m n o s juízos das ditas p r o v e d o r i a s se p r i n c i p i a m m u i t a s / / causas p o r


p e n h o r a feitas p o r executiva, citando-se às p a r t e s logo, p a r a a l e g a r e m os e m b a r -
gos e m seis dias, e depois se j u l g a m p o r sentença. Nisto se devia p r o v e r q u e t o d a
a c a u s a q u e e m q u a l q u e r j u í z o assim principiasse dela se n ã o extraísse s e n t e n ç a
e m prejuízo das p a r t e s m a s , antes, nos m e s m o s autos corresse a e x e c u ç ã o até se
finalizar e depois tirar carta d e a r r e m a t a ç ã o , se as p a r t e s a p e d i r e m .
A l é m d o q u e , l e v a m os escrivães d a F a z e n d a R e a l salários exorbitantes p o r
estilo, pois o "regimento velho n ã o dava providência^, e o m e s m o se e n c o n t r a n o
m e s m o , *inquam, se e n c o n t r a n o n o v o , e p o r evitar a e x o r b i t â n c i a q u e l e v a m se
d e c l a r a o q u e p o d e r ã o levar r a c i o n a v e l m e n t e :

d e c a d a c o n h e c i m e n t o q u e p a s s a r e m d a receita.. 600
do "bilhete d e c a r r e g a r "novos direitos p a r a "carta de seguro,
"oficio ou coisa s e m e l h a n t e . . . . , 150
d e c o n h e c i m e n t o d e recibo q u a n d o se. faz p a g a m e n t o 300
d e r e m a t a ç ã o de o b r a s q u e m a n d a fazer a F a z e n d a R e a l 2.000
d e u m a fé d e ofícios aos soldados 1.200
d e u m a quitação geral a o caixa dos "contratos reais p o r e x a m i n a r todas
as receitas feitas e m u m triénio, e no mais t e m p o a este respeito 7.200
[ fl. 379 J d e u m a livrança d e m a n t i m e n t o s 600
d e registro d e u m a "provisão ........................900
de u m a "carta p a t e n t e , 1.500
d e u m t e r m o d e fiança 300

FERREIRA, Manoel Lopes. Prática criminal. Expendida na forma da praxe observada neste nossa
Reino de Portugal; e novamente acrescentada e ilustrada de muitas Ordenações, íeis extravagantes,
regimentos, e doutores.Tomo II. Dividido em três tratados. Lisboa: Carlos Esteves Mariz,
M.DCC.XLII [1742]. p. 113-116. O nome correto do distribuidor da Corte era José Nostórío.
695

E isto se e n t e n d e r á de t e r m o d é fiança feito e m livros, e n ã o d e autos, q u e


esses serão o q u e i m p o r t a r e m a "rasa, q u e esta t o d a será c o n t a d a c o m o vai t a x a d o
aos mais "escrivães.
Se nos * r e g i m e n t o s se p o d e falar e m ' " s e c r e t á r i o s ' , e m tais t e r m o s se lhes
d e v e m t a x a r os seus e m o l u m e n t o s e p o d e r ã o levar:

de c a d a "provisão q u e p a s s a r e m 1.200
de a registrarem 900
de cada "patente •. 4.800
d e a registrar „ 1.800
d é c a d a "sesmaria 10,000

C o m o as " c â m a r a s se t ê m m o s t r a d o t ã o zelosas do b e m c o m u m e m p e d i -
r e m n o v o r e g i m e n t o , q u e j u s t o e r a este fosse, e t a m b é m e m p e d i r e m a lei dos
m i n e i r o s , c o m e n g a n o , p o i s d e l a se n ã o segue p r o v e i t o a S u a M a j e s t a d e n e m
a o b e m c o m u m m a s , só s i m , a o s p a r t i c u l a r e s m i n e i r o s e m p e n h a d o s , q u e
p u d e r a ser se se a v e r i g u a s s e q u e m f o r a m os d a c o n t a , se a c h a r i a s e r e m m i n e i -
ros e m p e n h a d í s s i m o s , e a s s i m se d e v i a o r d e n a r às m e s m a s c â m a r a s q u e , e m
termo breve, fizessem r e g i m e n t o n o v o p a r a os " a f e r i d o r e s , t a x a n d o - l h e s m e -
nos estipêndio, de sorte q u e o que t a x a r e m / / n ã o exceda à m e t a d e d o que [ fl. 379v. ]
c o s t u m a m l e v a r p e l o r e g i m e n t o v e l h o , e m e n o s h a v i a d e s e r se se n ã o a t e n -
d e s s e h a v e r a l g u m a s vilas q u e t ê m p o u c o r e n d i m e n t o p a r a r e e d i f i c a ç ã o d o
q u e são o b r i g a d o s reedificar e fazer, p o i s é e x o r b i t â n c i a p a g a r u m a " v e n d a d e
a f e r i ç ã o e r e c e i t a a o aferidor e m j a n e i r o e j u n h o m a i s de o n z e ou d o z e m i l , e
a isto n ã o d ã o p r o v i d ê n c i a as zelosas c â m a r a s p a r a t e r e m m a i s r é d i t o s p a r a os
d i s t r i b u í r e m , c o m o m u i t a s vezes lhes p a r e c e m s e m u t i l i d a d e d o b e m comum
n e m necessidade.

O s *juízes d o s ó r f ã o s feitos p o r e l e i ç ã o

N ã o estou certo se dos autos de inventário levavam "espórtulas; do d e partilhas


levavam, pelo q u e m e parece, quatro "oitavas das rematações; t a m b é m n ã o levavam
n a d a , segundo m i n h a l e m b r a n ç a , assim c o m o as n ã o levam os juízes ordinários, e
só levavam os "selos das sentenças e m a i s papéis, q u e o levavam c o m i g u a l d a d e
aos mais "ministros, e d a m e s m a forma as inquiridorias nas justificações.
Se n o r e g i m e n t o tiver lugar, se deve p r o v e r q u e os ditos juízes de órfãos n ã o
p o d e r ã o r e m o v e r os tutores q u a n d o estes i m p u g n e m o dar-se d i n h e i r o a j u r o dos
órfãos d e q u e são / / tutores, p o r considerarem p o u c a segurança e m q u e m o t o m a [ fl. 380 ]
e fiadores q u e d á p o r q u e se t e m visto e m alguns juízes q u a n d o os t u t o r e s r e p u g -
n a m n o m e a r e m outros p a r a r e s p o n d e r e m e m lugar d o legítimo q u e i m p u g n a , e
desta sorte se d á c o m g r a n d e prejuízo dos órfãos.
696

*Escrivães

N e s t a p a r t e está o "regimento n o v o c o m d i m i n u i ç ã o do velho, n o q u e respei-


t a aos c a m i n h o s , e m c a d a " l é g u a 35Q "réis, p o r q u e n a f o r m a d o v e l h o , a t é o
t e m p o q u e se p u s e r a m as "casas de fundição, se c o n t a v a m p o r l é g u a 750 réis e
a g o r a se t a x a só 4 0 0 réis. Este salário é m u i t o d i m i n u t o , a t e n d e n d o às despesas
q u e é preciso fazer q u a l q u e r escrivão c o m a sua pessoa, p a j e m e cavalo, e assim se
devia a u m e n t a r a o m e n o s a 6 0 0 réis p o r légua.
N o q u e respeita à escrita dos autos h á tão g r a n d e d i m i n u i ç ã o q u e n ã o sei
c o m o se desse tal corte, p o r q u e contando-se n a forma do "regimento velho 1.500
réis p o r cento e oitenta "regras a g o r a se v e m a c o n t a r duzentos e vinte e seis réis,
e desta f o r m a se d i m i n u i n o regimento novo do velho cinco p a r t e s e três terços,
[ fl. 380v. ] cuja d i m i n u i ç ã o / / é m u i t o g r a n d e e n ã o se c o n f o r m a c o m a r a z ã o ; e m u i t o
m e n o s conforme o faz ser o tirar o e m o l u m e n t o dos termos, m a n d a d o s e revelias,
de sorte q u e se as causas ordinárias e a i n d a sumárias i m p o r t a v a m , a *rasa delas,
dez "oitavas, i m p o r t a v a m o m e n o s os t e r m o s , m a n d a d o s , revelias, interlocutórias
e definitivas seis ou sete oitavas. E a i n d a q u e n o n o v o r e g i m e n t o se p e r m i t e o
c o n t a r a conclusão interlocutória e definitiva s e m p r e os escrivães nesta p a r t e ficam
p r e j u d i c a d o s , o m e n o s n o q u e i m p o r t a v a sete oitavas, e r e c e b e m o prejuízo d e
cinco, e sendo e m autos de execução é m a i o r o prejuízo, pela r a z ã o d e ter mais
termos q u e se fazem precisos. E assim, a t e n t a esta diminuição t ã o g r a n d e c o m a
q u e se lhe faz de a b a t i m e n t o n a rasa, n ã o sei p o r q u e f o r m a nesta lhe vai ressarci-
d o o prejuízo dos ditos t e r m o s , m a n d a d o s e revelias, os quais n e n h u m e m b a r a ç o
n e m confusão faziam aos "contadores p a r a efeito d e fazerem a c o n t a dos autos, e
se a l g u m a confusão se fazia, *ínquam, confusão se oferecia aos c o n t a d o r e s , esta n ã o
p r o c e d i a d e c o n t a r ou n ã o c o n t a r os ditos termos, m a n d a d o s e revelias, m a s só a
h a v i a e m alguns autos de preferências, oposições e o u t r o s s e m e l h a n t e s , a q u e os

[ fl. 381 ] senhores julgadores n ã o / / deferiam c o m a clareza necessária e precisa, pois assim
c o m o o leme é o governo da e m b a r c a ç ã o assim são os despachos p a r a os c o n t a d o -
res, e faltando nestes a clareza a respeito das c o n d e n a ç õ e s j á p õ e m aos c o n t a d o r e s
a d i v i n h a r , e disto n a s c e m dúvidas causadas das interpretações q u e c a d a u m d á aos
despachos, c o n f o r m e lhe faz mais c o n t a p a r a se lhe diminuir o q u e se t e m c o n t a d o
ou a o m e n o s dilatar a causa, c o m o pretexto d e e m b a r g o s de erros de contas.
E, assim, o r e g i m e n t o velho, a respeito das conclusões, faz u m a s declarações
d o q u e se h á de c o n t a r aos escrivães. S e n d o conclusos à revelia d e q u a l q u e r das
partes^ lhes m a n d a c o n t a r m e i a c o n c l u s ã o e à revelia assim e m t o d a s as causas
c o m o n a s a p e l a ç õ e s , e nestas lhes t a x a m a i o r e m o l u m e n t o . P o r é m , n e s t a p a r t e
n u n c a se. observou o dito regimento p o r m a l e n t e n d i d o , e era a p a r t e e m q u e se
considerava c o m confusão, e só n o R i o d a M o r t e s se c o n t o u do " " c o n c l u s o " q u e
p u n h a o escrivão dois "vinténs d e o u r o , q u e depois se tirou, observando o costume
das mais partes, q u e era só contar os dois vinténs do termo d e conclusão e a rasa dele.
697

E n o q u e respeita aos d e s p a c h o s , se e r a m / / interlocutórios se c o n t a v a d e c a d a [ fl. 38 l v . ]


u m dois "vinténs e se definitivos q u a t r o vinténs; e do t e r m o d a p u b l i c a ç ã o , dois
vinténs e a "rasa e m a n d a d o s , e a esta forma d e c o n t a n u n c a os escrivães c o n t r a ela
o p u s e r a m dúvida p o r n ã o a c h a r e m m o d o de declaração ao "regimento q u e fizes-
se a seu favor q u e n ã o tivesse c o n t r a d i ç ã o dos c o n t a d o r e s e letrados a q u e se falou
de p a r t e a p a r t e b a s t a n t e m e n t e , assentando-se q u e p a r a l e v a r e m os dois vinténs
do " " c o n c l u s o " n ã o h a v i a m d e l a v r a r termos d e conclusão s e n ã o p o r "cota, e q u e
a lavrá-los ou se lhes havia de c o n t a r u m a coisa ou outra, e p o r esta r a z ã o ficou o
r e g i m e n t o nesta p a r t e , p o r m a l e n t e n d i d o , sem observância.
N ã o deve ter o "escrivão das execuções d e ida à p r a ç a mais salário d o q u e o
d a escrita do a u t o d e a r r e m a t a ç ã o , e fora deste o m u i t o setenta e cinco "réis, c o m o
se lhe taxa n o r e g i m e n t o velho d e c a d a ida à p r a ç a p o r v e n d a d e p e n h o r e s , e n ã o
o q u e lhe t a x a o r e g i m e n t o n o v o , p o r talvez t e r e m i n t r o d u z i d o os escrivães n a
c o m a r c a o n d e serviu o "ministro q u e fez o regimento o l e v a r e m m a i o r e m o l u m e n t o ,
c o m o o vi levar de m e i a "oitava d e o u r o , o q u e era c o n t r a o r e g i m e n t o .
N ã o / / s e t a x a n o r e g i m e n t o n o v o salário a o escrivão d a " o u v i d o r i a dos [ fl. 382 ]
autos q u e subir c o m p o r a p e l a ç ã o e a g r a v o d e i n s t r u m e n t o das vistas, e assim
destas se lhes devia taxar q u a t r o réis d e c a d a m e i a folha, atento a neste R e i n o ter
dois réis; e d a n d o - s e e m p r o v a p o r a p e n s o a l g u m feito findo, p e d i n d o - s e a respei-
to dele vista, se lhes devia taxar, de c a d a m e i a folha, dois réis.
N o m e s m o r e g i m e n t o novo se t a x a aos escrivães de i r e m tirar t e s t e m u n h a s n a
vila ou c i d a d e a casa particular d e c a m i n h o setenta e cinco réis, s e m se considerar
o prejuízo q u e r e c e b e m e m sair fora d o seu cartório e t e m p o q u e se gasta e m vestir
e despir, q u e , a t e n d e n d o - s e a t u d o isto, n ã o só se lhe d e v i a m t a x a r os c e n t o e
o i t e n t a e sete réis q u e t i n h a m p e l o r e g i m e n t o velho m a s a i n d a se lhe devia a u -
m e n t a r , pondo-se-lhe e m 300 réis. E o m e s m o d e v i a m ter os "tabeliães saindo a
fazer escritura ou a p r o v a r testamento, atendendo-se t a m b é m às d e m o r a s q u e t ê m
n a s casas a q u e a vão fazer semelhantes atos.
O escrivão d a ouvidoria pela ida c o m o "corregedor à vila e " c â m a r a d e sua
c o m a r c a tirar "devassa do s u b o r n o e t o m a r contas deve t a m b é m ter s u a " p r o p i n a
a m e t a d e d o q u e leva o c o r r e g e d o r / / e d a m e s m a forma q u a n d o se for a fazer [ fl, 382v. ]
"pelouros. E d e p a s s a r as "cartas d e u s a n ç a aos v e r e a d o r e s d e c a d a u m a se lhe
deve t a x a r seiscentos réis e das cartas d e seguro 500 réis, que. é o m e s m o q u e n o
r e g i m e n t o n o v o se lhe t a x a das dos editos.

*Distribuidor

D e q u a l q u e r distribuição é bastante o salário d e 80, e n ã o o d e 150 réis q u e o


regimento n o v o lhe taxa.
D e busca, por ser e m livro, levará o m e s m o q u e o tabelião de notas, p o r é m nesta
parte se n ã o deve observar a lei mas, antes, se deve declarar q u e leve a busca confor-
698

m e o m e s m o "tabelião n o q u e respeita ao t e m p o , e n ã o depois d e cinco anos passa-


dos, p o r q u e mais facilmente se p r o c u r a e a c h a nos livros das notas u m a escritura,
p r o c u r a ç ã o ou papel q u e se lança p r o c u r a n d o pelas assinaturas ou *abecedário q u e
os tabeliães t ê m do que [registram] nos livros d a distribuições, e m as quais buscas se
gasta c o m u m e n t e mais t e m p o . E se devia nesta p a r t e seguir o m e s m o q u e n o "regi-
m e n t o velho, n ã o levando, p o r é m , os primeiros seis meses n a d a , e b e m advertido
foi o arbitrar-se-lhe salário das certidões q u e passasse, p o r q u ê n o regimento velho o
n ã o tinha taxado.

inquiridores

[ fl. 383 ] Deve-se-lhes a u m e n t a r / / o c a m i n h o , d e sorte q u e l e v e m o m e s m o q u e fica


dito aos "escrivães, assim i n d o fora c o m o n a vila ou cidade a tirar t e s t e m u n h a s a
casas particulares. E t a m b é m d a inquirição destas se lhes a r b i t r a r á o m e s m o q u e
fica dito a este respeito no capítulo dos "ouvidores.

"Contadores

N o q u e r e s p e i t a a este " o f í c i o , e s t á c o n f o r m e o r e g i m e n t o n o v o n o s
e m o l u m e n t o s , exceto n a c o n t a dos j u r o s , p o r q u e nesta p a r t e se deve observar o
q u e neste R e i n o . s e pratica, q u e é de c a d a c o n t a de recibo a recibo u m t a n t o , e n ã o
d e a n o a a n o , p o r q u e no decurso d e u m a n o p o d e o d e v e d o r fazer cinco ou seis
p a g a m e n t o S j e p o r esta r a z ã o é a c o n t a m a i s r u i m de fazer, pois è prejuízo fazer
c o n t a d e recibo a recibo e d e meses e dias, q u e é necessário, p r i m e i r o , p a r a saber
o q u e estes i m p o r t a m ; fazer a c o n t a a o a n o , r e p a r t i r pelos meses e depois pelos
dias. E assim deve ser distinta a declaração desta q u a l i d a d e d e c o n t a à d e frutos ou
r e n d i m e n t o s anuais, p o r esta seguir a r e g r a dos anos, o q u e n ã o segue c o m u m e n t e
a dos j u r o s , pela r a z ã o dita.
T a m b é m se deve taxar salário aos contadores das certidões q u e passarem, q u e
algumas vezes sucede, e o m e l h o r p a r e c e q u e se dissesse q u e de q u a l q u e r certidão
[ fl. 383v. ] q u e passassem levassem o m e s m o q u e os escrivães. Ao m e s m o / / c o n t a d o r se deve
t a x a r o q u e deve levar da conta que faz nos livros da " c â m a r a d a escrita do escrivão
dela, d e u m ano, que, p o r d a r trabalho e m Vila Rica, C i d a d e M a r i a n a e S a b a r á , se
lhe devia taxar 8.400 "réis, e nas mais vilas a 1.200 réis, p o r haver nos ditos livros
m e n o s q u e c o n t a r peias, *inquam, contar cujas contas serão feitas pelo c o n t a d o r do
geral.

" M e i r i n h o s e "alcaides e seus "escrivães

Aos ditos m e i r i n h o s se lhes taxa n o r e g i m e n t o n o v o p o r dia a 1.200 réis, s e m


mais d e c l a r a ç ã o d e "léguas. P o r é m , se deve e n t e n d e r a n d a n d o seis léguas, c o m o
699

fica dito n o s "ministros e "escrivães, o q u e p a r e c e se devia d e c l a r a r , p o r evitar


dúvidas e a u m e n t a r - s e - l h e s o salário, o m e n o s , a 300 "réis p o r "légua, a t e n t o as
despesas q u e lhes são preciso fazer. E a respeito das r a t e a ç õ e s se lhe devia p ô r
p e n a s tão g r a v e s n o m e s m o " r e g i m e n t o , de sorte, q u e , a l c a n ç a d o s e m falsidade
fossem logo suspensos d e seus "ofícios, presos seis meses e p a g a r e m as p a r t e s e m
d o b r o o q u e lhes tivessem levado d e mais e inabilitados p a r a n u n c a m a i s p o d e r e m
servir, sendo os "contadores obrigados, p e n a d e erro de oficio, / / a d e c l a r a r p o r [ fl. 384 ]
escrito nos a u t o s os excessos e m q u e os a c h a r c o m p r e e n d i d o s , e à vista deles os
j u l g a d o r e s e x e c u t a r e m o d e t e r m i n a d o n o r e g i m e n t o , p e n a de se lhes d a r e m c u l p a
e m "residência e d e se p e r g u n t a r nela p e l a falta d a observância deste capítulo. E
só assim se p o d e r ã o evitar m u i t a s m a l d a d e s e l a d r o e i r a s q u e se f a z e m , e c o m
m u i t o g r a n d e excesso os "oficiais dos "contratos e F a z e n d a R e a l , q u e aqueles p a r a
b e m n ã o h a v i a m d e p a g a r as partes, p o r q u e os " c o n t r a t a d o r e s o d e v i a m fazer à
sua custa, assim c o m o p a g a m a c o b r a d o r e s q u e t ê m assalariados, e estes m e s m o s
p o d i a m ter provisões p a r a fazerem todas as diligências precisas só dos seus c o n t r a -
tos, e desta sorte se evitariam tantos r o u b o s e tantos negócios ilícitos q u e fazem
alguns c o n t r a t a d o r e s c o m os oficiais à custa das p o b r e s partes, E o m e s m o a respei-
to d o salário d e c a m i n h o levarão os escrivães d a v a r a , e da m e s m a f o r m a levarão
o m e s m o q u e os m e i r i n h o s i n d o a fazer p e n h o r a , e m b a r g o s ou seqüestro.

N o r e g i m e n t o novo se t a x a aos escrivães da v a r a 300 réis d e c a d a assento o u


auto d e c o n d e n a ç ã o verbal q u e fizerem e m livro. N u n c a vi e m c o m a r c a das q u e
assisti q u e os escrivães d a v a r a fizessem assento ou a u t o / / das ditas c o n d e n a ç õ e s [ fl. 384v. ]
e m livro, p o r q u e estes assentos e m livros só p e r t e n c e m a o escrivão d a " c â m a r a e o
d a "almotaçaria, e n ã o sei c o m o a escrivão do m e i r i n h o do tal assento se lhe taxe
n o r e g i m e n t o n o v o trezentos réis e a o escrivão d a a l m o t a ç a r i a trinta e sete réis e
m e i o sendo o assento da m e s m a qualidade e p e r t e n c e n t e a o seu oficio.

*Porteiro

N ã o e r a c o s t u m e fazerem estes citações nas vilas e m e n o s irem-nas fazer fora,


e se a l g u m a n a vila fizeram, q u e só m e l e m b r a q u e foi no t e m p o q u e Vossa M e r c ê
serviu, foi c o m d e s p a c h o q u e assim o o r d e n a v a e p o r ser p e s s o a vil o c i t a d o e
ocultar-se aos "oficiais, d e mais q u e n a A m é r i c a só m e r a m e n t e são "pregoeiros.
N o m e s m o regimento novo se taxa a o "porteiro ou p r e g o e i r o d e c a d a "pregão
d a p r a ç a setenta réis, c o m o nos das cartas d e editos se lhes diminui, sendo t a m b é m
d a p r a ç a , taxando-se-lhes 300 réis d e c a d a carta d e editos, sem se advertir q u e h á
editos d e 9, 18, 2 7 , 30 e 6 0 dias, e assim t a n t o h á de p a g a r o q u e tira os "editos d e
p o u c o s dias c o m o o d e muitos. Parece n ã o p o d e ser n e m se conforma c o m a razão;
t a m b é m / / o n ã o é o admitir-se pregoeiros q u e n ã o sabem ler n e m escrever. [ fl. 385 ]
Á o m e s m o p r e g o e i r o se deve t a x a r o e m o l u m e n t o q u e deve l e v a r dos p r e -
gões das " r e n d a s d a c â m a r a e o b r a s ou consertos q u e r e m a t a r e m , p a r e c e n d o o
700

mais a c e r t a d o , p o r serem "pregões d e noite, c o m b a s t a n t e t e m p o d e d e m o r a , se


lhes devia t a x a r de c a d a p r e g ã o 150 "réis è d a a r r e m a t a ç ã o 300 réis, cujos pregões
e a r r e m a t a ç õ e s serão obrigados a p a g a r os r e m a t a n t e s , assim c o m o até a g o r a p a -
g a v a m o d a "aferição 2 4 , 0 0 0 réis e o das "meias p a t a c a s das c a b e ç a s d o g a d o
12.000 réis, e d e s t a sorte se e v i t a m d ú v i d a s q u e se p o d e m o f e r e c e r à falta d a
providência q u e n ã o d á o "regimento n o v o nesta p a r t e . T a m b é m se devia p r o v e r
q u e as " c â m a r a s , pelos b e n s do "concelho, sejam o b r i g a d a s a p a g a r a o dito "pre-
goeiro d e c a d a p r e g ã o pelas ruas dos "editais e coisas semelhantes q u e e x p e d e m e
m a n d a m fixar pelas p a r t e s públicas d a vila 100 réis de c a d a p r e g ã o , e o m e s m o se
e n t e n d e r á d e o u t r o q u a l q u e r j u í z o ou tribunal, sendo o b r i g a d o a p a g a r - l h e q u e m
o m a n d a r t r a b a l h a r , pois n ã o está o b r i g a d o oficial a l g u m a fazê-lo s e m q u e lhe,
[ íl. 385v. ] p a g u e , d e sorte q u e c o n t r a q u e m q u e r q u e o m a n d a r / / a p r e g o a r p o d e r á r e q u e r e r
m a n d a d o p a r a c o b r a r pelos seus bens, e os j u l g a d o r e s lhos m a n d a r ã o passar, exceto
n a s r e m a t a ç õ e s ditas das r e n d a s e o b r a s . C o n t r a o r e m a t a n t e se p r o c e d e r á , e n o
q u e c o b r a r d o " p r o c u r a d o r d a c â m a r a a este passará recibo, q u e o dito p r o c u r a d o r ,
c o m petição, o apresentará à c â m a r a p a r a q u e m a n d e a o "tesoureiro lhe satisfaça,
sem ser preciso m a n d a d o ou quitação p a r a à sua conta senão o recibo do p r o c u r a -
dor, p o r serem quantias módicas q u e n ã o a d m i t e m despesas.

"Escrivães d a c â m a r a

Está o r e g i m e n t o novo muito d i m i n u t o n o q u e respeita a o e m o l u m e n t o q u e


se lhes t a x a d a a r r e m a t a ç ã o d a aferição, p o r q u e d e s t a lhes d a v a d e " p r o p i n a o
r e m a t a n t e o m e n o s 36.000 réis e c o m u m e n t e , *inquam réis e c o m u m e n t e
y
3
45.000
réis e d a r e m a t a ç ã o das meias p a t a c a s das cabeças do g a d o 2 4 . 0 0 0 réis. E assim
destas r e m a t a ç õ e s , c o m o j á disse n o c a p í t u l o d o p r e g o e i r o , p o r ser d e n o i t e e
m u i t a s vezes a n d a r e m as r e n d a s a p r e g ã o m u i t o t e m p o sem se r e m a t a r e m , b e m se
[ íl. 3 8 6 ] lhes p o d i a t a x a r a 8.000 réis d e c a d a r e m a t a ç ã o , p a g a s pelos / / r e m a t a n t e s . E d e
talhos n ã o t e n h o notícia d e tais r e m a t a ç õ e s , p o r é m nas d e obras e consertos se lhes
d e v i a t a x a r 2.000 réis d e c a d a r e m a t a ç ã o , p a g o s p e l o m e s m o r e m a t a n t e , e das
"provisões dos "juízes dos ofícios e do "regimento, inquam, dos ofícios 1.800 réis,
e d o r e g i m e n t o d e q u a l q u e r oficio 6 0 0 réis, q u e neste é b a s t a n t e e m o l u m e n t o e n a
provisão p o u c o , e desta sorte se tira d o e m o l u m e n t o d o regimento o q u e acresce
n o d a p r o v i s ã o , e fica m a i s útil às p a r t e s , p o r s e r e m mais os r e g i m e n t o s q u e se
p a s s a m d o q u e as provisões. E s e m p r e , desta sorte, fica o escrivão q u a s e c o m o
e m o l u m e n t o q u e t i n h a a n t i g a m e n t e d o r e g i m e n t o . T a m b é m se lhes deve t a x a r
1.200 réis d e c a d a provisão q u e p a s s a r e m a c a d a "fiscal das "casas d e fundição, e

3. No origina!, comumente, inguam, réis e commumente.


701

o m e s m o emolumento levarão das mais "provisões q u e passarem aos "juízes vintenários


e seus "escrivães, e outras semelhantes de "ofícios q u e possa prover a *câmara.
T a m b é m se deve p r o v e r c o m o se h á d e c o n t a r a o dito escrivão d a c â m a r a a
escrita q u e fazem nos livros dela, assim de registros de "editais c o m o d e p r o v i m e n -
tos, "decretos, "regimentos, leis, o r d e n s d e g o v e r n a d o r e s , cartas / / q u e se escre- [ fl. 386v. ]
v e m às c â m a r a s , e elas t a m b é m escrevem, q u e t u d o se registra, e nisto se deve d a r
p r o v i d ê n c i a se h á d e ser c o n t a d o c o m o aos "tabeliães d e notas, p o r ser escrita d e
livros, se de o u t r a sorte, p o r q u e esta escrita se lhes p a g a pelos b e n s d o "concelho,
pois dele n ã o t ê m o r d e n a d o mais do q u e p a r a p a p e l , tinta e p e n a s , e é preciso q u e
lhes p a g u e esta escrita, da qual n ã o era c o n v e n i e n t e t e r e m eles o r d e n a d o sabido
c o m obrigação de o fazerem, p o r q u e a t e r e m o dito o r d e n a d o m u i t a s coisas se n ã o
h a v i a m d e registrar, d e sorte q u e n ã o o t e n d o e sendo-lhes preciso t r a b a l h a r p a r a
g a n h a r , alguns, p o r omissos e preguiçosos, o n ã o fazem. É t a m b é m preciso desta
c o n t a q u e deve ser feita pelo "contador d o o r d i n á r i o taxar-se-lhe o e m o l u m e n t o
q u e fica dito n o capítulo dos c o n t a d o r e s , atento a o t e m p o q u e lhe levará a fazer,
p e l a r a z ã o de? q u e nos livros se escreve o teor de u m "edital, c a r t a ou coisas s e m e -
l h a n t e s e à m a r g e m se declara, p o r "cota, q u a n t o s editais ou cartas e o u t r a s coisas
se e s c r e v e r a m d a q u e l e teor, d e q u e é preciso fazer contas e m p a p e l à p a r t e p a r a se
p ô r e m limpo e l a n ç a r / / n o livro, de cujas contas e escrita de m e n o s d e a n o se lhe [ fl. 387 ]
p a g a v a m 6.000 "réis, e n u n c a os c o n t a d o r e s g o s t a v a m delas, e esta c o n t a d e v e
c o b r a r o "escrivão d a c â m a r a c o m o q u e lhe for c o n t a d o pelos bens d o c o n c e l h o .

Escrivães d a "almotaçaria

E este oficio de m u i t a s p o u c a s conveniências, e nele t ê m os escrivães p o u c a escri-


ta, p o r lhes estar p r o i b i d o o fazer e o r d e n a r processos ordinários, e p o r esta r a z ã o
os sumários são t ã o poucos e d e tão p o u c a utilidade q u e p o u c o o u n a d a g a n h a m ,
e só n a s c a u s a s das p r o p r i e d a d e s , e m q u e p o d i a m fazer a l g u m a c o n v e n i ê n c i a ,
c o m o os j u l g a d o r e s superiores as p u x a m a si, n a d a lhes fica d e r e n d i m e n t o q u e
seja d e a l g u m a utilidade m a i s d o q u e os "bilhetes das a l m o t a ç a r í a s , d e dois e m
dois meses. E n o q u e se havia d e levar dele se n ã o taxou e m o l u m e n t o no regi-
m e n t o v e l h o , e m e n o s n o n o v o , e assim, p o r estilo ou o r d e m p a r t i c u l a r q u e se
dizia havia, se levava d e c a d a "almotaçaria 375 "réis, e se lhes p o d e agora t a x a r
262 /a, e n o regimento n o v o se lhes taxa de u m a a ç ã o 75 réis. N ã o sei c o m o / / s e
l
[ fl. 387v. ]
possa lavrar u m r e q u e r i m e n t o d e u m a ação c o m as m e s m a s circunstâncias q u e as
l a v r a m os mais "escrivães, pois dela consta t o d o o fato do q u e se r e q u e r e u p a r a se
lhes t a x a r tão limitado e m o l u m e n t o e q u e r a z ã o haja p a r a n ã o ser igual aos mais
escrivães, c o m o deve ser.
N o p r o v i m e n t o p e l a c i d a d e ou vila, diz o r e g i m e n t o n o v o , dos q u e f o r e m
c o n d e n a d o s , isto se e n t e n d e nas "correições, terá o escrivão d e c a d a assento 37
réis Vá, e é p o u c o , q u e deve ter 75 réis. T a m b é m se deve p r o v e r o q u e deve p a g a r
702

o "aferidor e "rendeiro d o *ver a o dito "escrivão p o r dia, assim nas "correições d a


vila e c i d a d e c o m o das q u e se fizerem pelo " t e r m o , p o r q u e a n t i g a m e n t e e r a costu-
m e r e p a r t i r as custas dos c o n d e n a d o s pelo dito escrivão e "oficiais d a dita correição,
e d a r e m - l h e os rendeiros d e c o m e r . Depois, estes, p o r a c h a r e m ser-lhes mais útil
as custas, se ajustaram h á m u i t o s anos c o m o dito escrivão e oficiais a lhes d a r e m
d e c o m e r e a o seu p a j e m e cavalo e 3.000 "réis a c a d a u m p o r dia, e esta m e s m a
o r d e m se devia g u a r d a r , p o n d o - s e , p o r é m , o e m o l u m e n t o e m 2.400 réis p o r dia,
q u e deles só fica a o escrivão 1.500 réis, p o r gastar d e aluguel do cavalo 9 0 0 réis
[ fl. 388 ] c a d a / / dia, e a l u g a n d o escravo só lhe ficam 1.200 réis. Deve-se p r o v e r mais, p o r
evitar algumas dúvidas, q u e a o dito escrivão das almotaçarias nos atos das correições
a ele p r i v a t i v a m e n t e p e r t e n ç a m as notificações, q u e r e n d o - a s fazer, e a o m e i r i n h o
e seu escrivão as p e n h o r a s e prisões, se as h o u v e r , e q u e s e m p r e os r e n d e i r o s
sejam obrigados a levar os do juízo, e só e m sua falta outros q u a i s q u e r , p e n a d e
l h e p a g a r e m p e l a sua fazenda, estando p r o n t o s p a r a irem.
N o m e s m o " r e g i m e n t o se deve o r d e n a r q u e o dito escrivão d a a l m o t a ç a r i a
n ã o r e c e b a das p a r t e s e m o l u m e n t o a l g u m de q u a l q u e r a ç ã o antes de c o n t a d a pelo
" c o n t a d o r d o geral, e d a m e s m a f o r m a será c o n t a d a pelo m e s m o c o n t a d o r a escri-
ta do registro dos "editais dos "almotacés q u e p a g a m os rendeiros d a "aferição e
d o ver, m a n d a n d o - s e c o n t a r c o m o se d e t e r m i n a r a o escrivão d a " c â m a r a e t a x a n -
do-se a o c o n t a d o r d a c o n t a d e u m a n o 450 réis, p o r ser limitada.
T e n d o l u g a r n o m e s m o r e g i m e n t o pôr-se p e n a aos a l m o t a c é s q u e n ã o fize-
[ fl. 388v. ] r e m as correições d o t e r m o três vezes n o a n o , a saber, / / e m m a r ç o o u abril, j u l h o
o u agosto, n o v e m b r o ou d e z e m b r o , e nas vilas o u cidades d e dois e m dois meses,
e se o n ã o fizerem ficarem inabilitados p a r a m a i s n ã o p o d e r e m servir n a "repúbli-
ca, e q u e p a r a isso será obrigado o escrivão, assim c o m o e n t r a r e m os almotacés,
i n t i m a r - l h e s o capítulo d o r e g i m e n t o e p a s s a r c e r t i d ã o n o livro d o assento das
c o n d e n a ç õ e s das " c o i m a s , e q u a n d o a c a b a r e m d e servir a p a s s a r á t a m b é m n o
m e s m o livro se fizeram as ditas correições p e l a c i d a d e o u vila e t e r m o ou n ã o ,
p e n a d e suspensão d o seu "oficio e d e p a g a r d a s u a fazenda a terça dos bens do
" c o n c e l h o e a o escrivão d a c â m a r a o q u e lhe t o c a r das c o n d e n a ç õ e s feitas aos
c o n d e n a d o s p o r falta d e licenças e r e g i m e n t o s , cuja c o n t a se h a v e r á p o r l i q u i d a d a
pelo i m p o r t e d a correição a n t e c e d e n t e q u e constar do assento do livro das coimas.
E c u m p r i n d o esta m e s m a p e n a , terão os almotacés q u e a n ã o c u m p r i r e m e, a l é m
d e a sobredita, p a g a r e m mais a o escrivão e oficiais os seus e m o l u m e n t o s regulados
pelos da correição antecedente. Esta m e s m a p e n a terão os rendeiros da aferição e do
[ fl. 389 ] ver e trinta dias d e cadeia, q u a n d o se n ã o p o n h a m p r o n t o s / / p a r a a c o m p a n h a r o
a l m o t a c é e p a r a r e q u e r e r e m as c o n d e n a ç õ e s , as quais, logo q u e se fizerem, serão
l a n ç a d a s n o livro, e n ã o e m c a d e r n o . E q u a n d o suceda estar ô r e n d e i r o d o v e r ou
aferidor d o e n t e , ou se faça, deve ir q u a l q u e r deles, fazendo as vezes u m do o u t r o ,
ou eleger, q u a l q u e r q u e esteja i m p e d i d o , pessoa q u e o faça, e este capítulo será
o b r i g a d o o escrivão d a c â m a r a d e m o s t r a r e ter aos q u e l a n ç a r e m nas ditas r e n d a s
703

e p o r t a r p o r fé n o ato d a r e m a t a ç ã o q u e lho intimou e fez ciente. E t o d o o sobredito


farão os "corregedores observar inviolavelmente, e d a m e s m a sorte as *posturas
das "coimas d o " s e n a d o , de q u e os "almotacés só são m e r o s executores, e c o m o
tais n ã o p o d e m diminuir o q u e pelo s e n a d o e b e n s do "concelho está d e t e r m i n a -
d o . E t a m b é m n ã o p o d e r ã o os do concelho e s e n a d o fazer ou r e f o r m a r p o s t u r a s
*per se s e m assistência d o s " c o r r e g e d o r e s , p o r q u e estes, c o m o i n d e p e n d e n t e s e
isentos dos interesses q u e c o m p r e e n d e m aos mais dos do s e n a d o , q u e c o m u m e n t e
só fazem as coisas atento as suas conveniências e n ã o do b e m c o m u m , c o m a c e r t o
d e t e r m i n a r á as p e n a s p e c u n i á r i a s / / c o m o as mais q u e j u s t a s lhes p a r e c e r , c o m [ fl. 389v. ]
igualdade à culpa, d e sorte q u e n ã o p o d e h a v e r e m e n d a o n d e n ã o h o u v e r castigo,
e q u a n d o a l g u m t e n h a d e l i n q u i d o terceira vez n a m e s m a c u l p a ou s e m e l h a n t e ,
sendo grave ou d a n o grave d o povo, será p r e s o trinta dias d e cadeia, e d e lá n ã o
será solto s e m p a g a r a c o n d e n a ç ã o e m d o b r o , e fará t e r m o p a r a n ã o u s a r mais d o
"trato se for vendeiro, e p a r a isso será obrigado o "escrivão d a a l m o t a ç a r i a a tirar
rol dos livros dos assentos das c o n d e n a ç õ e s o m e n o s de três anos atrasados p a r a
p o d e r informar a o "almotacê c o m individuação, e n ã o o fazendo assim se lhe d a r á
e m culpa, e i n f o r m a n d o e n ã o p r o c e d e n d o o a l m o t a c ê o escrivão o d e c l a r e n o
t e r m o e à margem lhe p o n h a " P a r a ver o d o u t o r corregedor", o qual p r o c e d e r á
c o n t r a o a l m o t a c ê a p r i s ã o d e três dias d e c a d e i a p o r c a d a c u l p a . E o m e s m o
c o r r e g e d o r se i n f o r m a r á se os ditos almotacés d e i x a m d e deferir aos "rendeiros e
os a m e a ç a m c o m prisões, p o r lhe r e q u e r e r e m lhe m a n d e t o m a r as suas apelações
p o r falta de observância do c o n t e ú d o nas posturas, / / "editais e " b a n d o s , e a c h a n - [ fl. 390 ]
do-os c o m p r e e n d i d o s c o n t r a eles p r o c e d a a p r i s ã o e os d e p o n h a d a o c u p a ç ã o .
N e s t e j u í z o p a r e c e j u s t o , pelo q u e a e x p e r i ê n c i a m e m o s t r o u , se devia p e r m i t i r
tirar-se s u m á r i o s , p e r g u n t a das t e s t e m u n h a s aos itens, *inquom t e s t e m u n h a s a u n s
i

itens q u e o S e n a d o d e Vila R i c a o r d e n o u , p o r q u e as v e n d a s ocultas são m u i t a s , e


t a m b é m alguns cortes de gado, e estes c a u s a m prejuízo grave aos outros q u e p a -
g a m o q u e são obrigados, e c o m r a z ã o estes sé q u e i x a m g r a v e m e n t e , e m u i t o m a i s
n a falta do m e i o d o castigo p a r a a e m e n d a . E p o r esta r a z ã o se carece d e escrita
s u m á r i a p a r a , depois d e tiradas as t e s t e m u n h a s , se averiguar p o r elas a culpa, d e
sorte q u e alguns sumários q u e tirei, p o r assim o a c h a r o b s e r v a d o , s e m p r e o, inquam,
o b s e r v a d o (que depois p o r Vossa M e r c ê m e foi d a d o a e n t e n d e r q u e o proibia)
s e m p r e os culpados confessaram a culpa, e só se q u e i x a v a m d e q u e m c o n t r a eles
j u r a r a , e p e d i a m m o d e r a ç ã o . D e t e r m i n a n d o - s e assim se deve o r d e n a r q u e , a res-
peito das "vendas ocultas, "cortes e "tabuleiros pelas p a r t e s proibidas, / / se n ã o [ fl. 390v. ]
observe 0 " b a n d o d o "general, m a s sim a reforma q u e fez o S e n a d o d e Vila R i c a
p o r edital a respeito d o dito b a n d o , s e m reserva do direito deste, q u e se deixou n o
dito edital d a dita r e f o r m a , e os c o m p r e e n d i d o s mais vezes q u e a p r i m e i r a serão
presos e p a g a r ã o o d o b r o , c o n f o r m e as vezes e m q u e t i v e r e m sido c o m p r e e n d i -
dos. E se assim se n ã o o r d e n a r n e n h u m a e m e n d a p o d e h a v e r , m a s antes se deixa
c a m i n h o a b e r t o p a r a c o n t í n u o s r o u b o s d e n e g r o s fugidos, "casas d e a l c o u c e e
704

coisas semelhantes, q u e só p o r este m e i o se p o d e r i a m evitar, p o r s e r e m estes sós os


"ministros q u e c o r r e m o t e r m o a semelhantes diligências, e n ã o outros.
D e v e m mais os " a l m o t a c é s n ã o i m p e d i r aos " r e n d e i r o s p e r g u n t a r e m pelas
"almotaçarias aos vendeiros os preços p o r q u e v e n d e m os gêneros delas n a presença
dos "oficiais e "escrivão, se preciso for, e r e s p o n d e n d o q u ê v e n d e p o r t a n t o preço
maior do q u e da aímotaçaria, pela sua confissão será c o n d e n a d o pela informação dos
[ fl. 391 ] oficiais ou escrivão, sem se lhe fazer mais perguntas, n e m o almotacé / / s e fazer e m
lugar d e "juiz seu p r o c u r a d o r . O s ditos almotacés d e v e m fazer as ditas "correições
n ã o d e c o r r i d a , c o m o fazem, m a s , sim, c o m toda averiguação e e x a m e d e todos os
víveres, vendo-os u m p o r u m , a q u e assistirá, e se quiser m a n d a r d a r busca n a casa
o u l h a r e q u e r e r lha m a n d a r á dar, e a c h a n d o coisas corruptas q u e c a u s e m d a n o a o
p o v o p r o c e d e r á n a f o r m a das "posturas, d e sorte q u e se n ã o t o r n e aproveitar d o
q u e m a n d a r l a n ç a r fora o u e n t e r r a r . A c h a n d o , p o r é m , a l g u m a p e s s o a b r a n c a ,
m u l a t o ou mulata, preto ou p r e t a forra, ou "coartado muito p o b r e , se lhe faculta o
poder-lhe moderar a condenação, atendendo a muita pobreza, perguntando pri-
m e i r o d u a s ou três t e s t e m u n h a s v e r b a l m e n t e , n a p r e s e n ç a d o escrivão, p a r a este
fazer assento dos seus ditos. N o caso q u e os rendeiros o q u e i r a m i m p u g n a r e m o s t r a r
o contrário, é n ã o q u e r e n d o , n ã o será preciso escrita, e p o r isso n a d a terá o escrivão
de e m o l u m e n t o ; e n o caso q u e a faça e q u e os rendeiros q u e i r a m i m p u g n a r , e m tais

[ fl. 391v. ] termos levará d e c a d a / / t e s t e m u n h a o que se lhe t a x a n o "regimento novo, q u e


h a v e r á d o v e n c e d o r p a r a este o haver d o vencido, e esta m o d e r a ç ã o se e n t e n d e r á
n ã o sendo a culpa gravíssima e das compreendidas nas vendas ocultas e coisas seme-
lhantes.

Advogados

N o "regimento novo se lhes n ã o t a x a o q u e h ã o d e levar d e c a d a petição, e


assim dissera q u e se lhes devia taxar de c a d a u m a 200 "réis, exceto as p a r a "carta
de seguro, q u e essas serão 600 réis, e as de a ç ã o de força ou espólio e justificativas
d e itens e e m b a r g o s d e terras minerais, 375 réis p o r c a d a u m a .
N o m e s m o regimento novo se oferece a m e s m a dúvida a q u e se r e s p o n d e a
respeito dos j u l g a d o r e s , p o r q u e é certo q u e o m u i t o ou p o u c o p e d i d o n a causa
n ã o a u m e n t a n e m d i m i n u i o t r a b a l h o a o a d v o g a d o m a s , sim, a c o n t u m á c i a e
rebeldia das partes. E c o m o assim seja e b e m constante é q u e os a d v o g a d o s p a r a
c o m eles o r e g i m e n t o se n ã o observa, p o r q u e levam o q u e q u e r e m e dizem q u e a
[ fl. 392 ] eles se lhes n ã o p o d e m t a x a r / / e m o l u m e n t o s , p o r q u e as p a r t e s p o d e m ir a o n d e
q u i s e r e m e q u e só se taxa p a r a efeito d a conta, c o m o e n t ã o se h á de prejudicar tão
g r a v e m e n t e a u m a u t o r ou r é u q u e t e m j u s t i ç a p a r a a o depois p ô r a defender,
a i n d a q u e a q u a n t i a p o u c a seja se lhe c o n t a r a o depois d o v e n c i m e n t o só a m e t a d e
d o salário, t e n d o sido m u i t a s vezes a causa tão trabalhosa, e mais do q u e se fosse
d e tão g r a n d e q u a n t i a , *inguam, se fosse d e g r a n d e q u a n t i a .
705

E assim, desta sorte, p a r e c e q u e se deve e n t e n d e r q u e o "regimento determi-


n a q u e se as dívidas forem p e q u e n a s q u e os autores a p e r c a m , q u e r e n d o os réus
d e m a n d a n ã o t e n d o justiça, e t a m b é m q u e os réus antes p a g u e m o q u e se lhes
p e d i r , a i n d a q u e n ã o d e v a m , p o r q u e p e r d e n d o uns o q u e se lhes deve e p a g a n d o
o u t r o s o q u e n ã o d e v e m , n o fim d a c a u s a tais s e r ã o as q u a n t i a s q u e , o b r a n d o
assim, ficarão m e l h o r , e e m tal caso, dissera eu, q u e mais a c e r t a d o seria q u e os
v e n c e d o r e s n ã o só cobrassem o q u e se lhes t a x a m a s a i n d a t o d a s as mais despesas
e prejuízos a q u e o vencido d a causa, sem q u e b r a n e m diminuição, q u e isto e r a o
v e r d a d e i r o p a r a e m e n d a d e velhacos, e p o r esta forma / / mais depressa se evita- [ fl. 392v. ]
r i a m trapaças q u e cá, e m partes, se evitam, c o m o t o m a r d a "dízima, e o m a i s q u e
m e l h o r V o s s a M e r c ê sabe.

"Requerentes

Q u e se lhes t a x e p o r m ê s e m o l u m e n t o n o q u e respeita aos m e s e s e m q u e


c o r r e r a causa j u s t o é, e n ã o estando p a r a d a , e deve-se advertir q u e deve ser d e
cada causa, p o r q u e u m a p a r t e p o d e trazer muitas e e m diferentes juízos e cartórios
e m q u e h á t r a b a l h o , e n ã o é j u s t o pagar-se tanto a o q u e t e m m u i t o t r a b a l h o c o m o
a o q u e t e m p o u c o ; t a m b é m se devia d e c l a r a r q u e o " c o n t a d o r c a r r e g a s s e n a s
custas sobre o vencido o q u e se tivesse p a g o ao dito r e q u e r e n t e , q u e só basta q u e
seja a 600 "réis p o r mês.

Carcereiros

L e v a v a m estes d e "carceragem d e c a d a preso n a m a i o r p a r t e das c o m a r c a s


das Gerais u m a "oitava, q u e no t e m p o presente c o r r e s p o n d e a 1.200 réis. P a r e c e
q u e e m se lhes t a x a r 900 réis, q u e é m u i t o bastante, e n ã o 1.800 réis, c o m o se lhes
taxa, e a dita c a r c e r a g e m d e 900 réis p a g a r á toda a qualidade / / d e p r e s o , exceto [ fl. 393 ]
o q u e for p r e s o p o r erro ou s e m m a n d a d o d o juiz e sem culpa, p o r q u e este sendo
m a n d a d o soltar p o r o r d e m n ã o p a g a r á n a d a . E d a m e s m a f o r m a n ã o p a g a r á n a d a
d e c a r c e r a g e m todo o preso q u e se m u d a r d e u m a cadeia p a r a o u t r a , e só p a g a r á
ao carcereiro a c a r c e r a g e m p o r "encheio d a cadeia d o n d e for solto, p o r q u e q u a n -
do os presos se r e m o v e m d e u m a cadeia p a r a o u t r a — c o m u m e n t e n o Brasil são os
criminosos — , e estes são removidos c o n t r a a sua v o n t a d e , e é c e r t o se r e m o v e m
sem p a g a , e q u a n d o são soltos se p a g a r e m a m e i a c a r c e r a g e m q u e n o r e g i m e n t o
novo se p e r m i t e a o carcereiro d o n d e saiu p a r a aquela d o n d e é solto, c o m t o d a a
c a r c e r a g e m fica o d a cadeia d a soltura, e n u n c a vai n a d a à m ã o d o o u t r o . E escu-
sado p a r e c e fazer o preso despesa q u e dela se fica utilizando o carcereiro a q u e m
n ã o p e r t e n c e , d e m a i s q u e semelhantes presos todos os carcereiros os desejam fora
d a s u a cadeia, e d e b o a v o n t a d e n ã o só os deixariam ir sem lhes p a g a r m a s a i n d a
lhes d a r i a m algumas coisas p o r os ver fora dela. E d e presos removidos p o r causas
706

[ fl. 393v. ] cíveis, / / será u m acaso havê-los. R a z ã o p o r q u e , t e n h o p o r mais a c e r t a d o n ã o


p a g a r e m os presos removidos d o n d e s a e m d o q u e v i r e m a p a g a r d u a s *carceragens
a o d a cadeia d o n d e são soltos, c o m o dito fica.
D e t o d a a q u a l i d a d e d e escravo q u e for solto d a prisão e m q u e estiver, n ã o
lhe d a n d o seu s e n h o r d e c o m e r , será o *carcereÍro o b r i g a d o a dar-lhe o necessário,
d e q u e levará p o r dia 110; e se a l g u m dos ditos escravos, s e n d o criminosos, d e
q u a l q u e r c a d e i a q u e sair e dela c o m as culpas for r e m e t i d o à d o j u í z o superior e
nele tiver livramento, d e sorte q u e dele se t o r n e a utilizar seu s e n h o r , será obriga-
d o a p a g a r todos os e m o l u m e n t o s q u e se t a x a m aos carcereiros das cadeias o n d e o
tal escravo tiver estado preso.

98

[Rol das pessoas de confissão e comunhão


em diversas vilas de Minas Gerais]

Lista discriminando para algumas freguesias da comarca


eclesiástica de M a r i a n a e p a r a o recolhimento de Macaúbas o
número de comungantes e confessados e diversos outros indicativos
numéricos de natureza religiosa.
Estas informações teriam sido recolhidas ao longo do pro-
cesso inicial d e investigação por parte do ouvidor sobre o estado
d a religião e dos religiosos na capitania, relacionado à discussão
sobre a administração desempenhada pelo bispado de Mariana
e seus rendimentos.
Autoria, l o c a l , data: anônimo; Vila Rica; 1749.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva do
século XVLTL Apresenta maiúsculas destrógiras, alongadas e com
laçadas pequenas e redondas no ápice das hastes, que são inici-
adas com perfil; "t" de haste dupla como forquilha invertida e
corte transversal pronunciado; "f' de dupla haste, com corte ho-
rizontal em volutas. Números arábicos arredondados, com per-
fil. D a t a com letra de Caetano da Costa Matoso, à direita do
fólio 394v. (YDL)
707

Macaúbas [ 394 ]
T e m 70 *recolhidas e 14 escravas, todas d e c o m u n h ã o .

Furquim
T e m pessoas d e confissão 1.219, de c o m u n h ã o 1.222, t e m cinco sacerdotes e 6
" c a p e l a s etc.

G a t a s Altas

T e m 3.783 de confissão e c o m u n h ã o .

C amargos

T e m J .412, das quais são m e n o r e s 297, crismados 1.500.

Antônio Pereira

T e m d e c o m u n h ã o 1.163, de confissão 2 3 2 , q u e fazem a s o m a d e 1.395.

• São José da Barra


T e m 2 . 6 1 2 , "fogos 2 0 0 , s a c e r d o t e s 3 , casais d e g e n t e livre 6 5 , pessoas d e
c o m u n h ã o 1.003, de confissão 1.612.
Inficionado
T e m 2.880, d e comunhão 1.938, d e confissão 940, crismados 1.642, casais 65.
Piranga
T e m 5.536.

Cidade [Mariana]
T e m 7.329.

São Sebastião
T e m 1.500.

São Caetano
T e m 2.604.

Sumidouro
T e m 4.610.
E m 1749.1

Acréscimo com letra de Caetano da Costa Matoso.


708

• 99 <

[ íl, 395 ] Rendimentos do bispado de Mariana, das chancelarias que se


pagam na Câmara e nas comarcas de Vila Rica, Sabará, Rio das
Mortes, Rio Verde, Pitangui e Serro do Frio

Estimativa detalhada das fontes de receita do bispado de


Mariana, Aparecem relacionados o valor dos emolumentos co-
brados conforme serviço religioso e o n ú m e r o de ocorrências,
totalizando-se os rendimentos parciais obtidos. Discrimina os
valores arrecadados pelas chancelarias, as pensões que o bispo
recebe, os rendimentos das visitas episcopais e diversas outras
atividades geradoras de receita. Este recurso evidencia o esforço
de apresentação de estimativas contábeis. Semelhante aos docu-
mentos 102 e 108, diverge quanto áo número de eclesiásticos, de
capelas e de igrejas e ao valor dos emolumentos; apresenta as
maiores cifras dentre os três.
O documento parece ser u m a tentativa de consolidação de
dados a ser enviada à C o r o a pelo ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso. Visava, e m decorrência de suas atribuições, fornecer
subsídios p a r a responder a determinação régia de. remessa de
informações sobre o rendimento do bispado. O c u p a posição chave
n a disputa entre a jurisdição real e a episcopal, traduzindo o
esforço de controle e vigilância sobre os recursos financeiros da
Igreja.
Autoria, local, data: Caetano da Costa Matoso; Lisboa;
ca. 1753.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Mar-
cos Magalhães de Aguiar e m estudo sobre as irmandades em
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em torno do controle das confrarias e para
obter dados estatísticos sobre o clero m i n e i r o [Vila Rica dos
coitfrades: sociabilidade contrariai entre negros e mulatos no sé-
culo X V I I I . São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H ,
1993. p. 100-102).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , híbrida,
com letras d a bastarda italiana, como o "d" minúsculo; j á o " D "
capital, com laçada n a parte inferior, arrematado por traço em
aspirai ou com alongamento como ponto de fuga; vários tipos de
"r", em forma de martelo, ou redondo; utiliza abreviaturas cor-
rentes, por contração e letras sobrepostas, antecedidas por pon-
to; números arábicos arredondados e destrógiros; presença do
caldeirão. (YDL)
709

D e "provisões p a r a u s a r d e ordens, e m c a d a a n o , a dois


mil "clérigos (ainda que, mais h á , pois t o m a n d o posse do
b i s p a d o , c o m p r o c u r a ç ã o d o "bispo, L o u r e n ç o J o s é d e
Q u e i r ó s , se c o n t a r a m n a sua " e n t r a d a e m M a r i a n a mais
d e 2.500, e suposto depois disto saíram alguns, s e m p r e o
n ú m e r o destes se s u p r e p e l o g r a n d e n ú m e r o q u e t e m
o r d e n a d o o bispo) c a d a "chancelaria 2-200 "réis e "selo
1 9 5 , q u e t a m b é m é do bispo, v e m a i m p o r t a r - l h e c a d a
provisão 1.395, q u e p o r todas fazem a s o m a de 2:790U000

D è provisões p a r a "capelães das "capelas filiais, q u e p o r


serem ao m e n o s 4 0 0 , c a d a chancelaria a 1.600, c a d a selo
3 7 5 , i m p o r t a c a d a provisão a n u a l m e n t e a o bispo 1.975,
fazem a s o m a d e 790Ü000

D e provisões p a r a "coadjutores de "igrejas p a r o q u i a i s ,


q u e e x c e t u a n d o p o u c a s q u e os n ã o t ê m , serão 3 8 , c a d a
c h a n c e l a r i a 5 o i t a v a s d e o u r o , c a d a selo 3 7 5 , v e m a
importar cada u m a 7.875, que por junto fazem a
sorna d e , 299U250

D e p r o v i s õ e s p a r a c a p e l ã e s d a s " i r m a n d a d e s sitas e m
igrejas p a r o q u i a i s e capelas, q u e h a v e r á a o m e n o s 6 0 0 ,
c a d a c h a n c e l a r i a 1.600, c a d a selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a
provisão 1.975, q u e p o r todas v ê m a fazer a s o m a d e . . . . I:185ü000

D e provisões p a r a "sacristãos d e igrejas paroquiais e muitas


capelas, q u e farão o n ú m e r o de 200, c a d a chancelaria a
1.600, c a d a selo 3 7 5 , v e m a i m p o r t a r c a d a p r o v i s ã o
1.975, s o m a m .197Ü500

D e provisões p a r a "fabriqueiros das igrejas p a r o q u i a i s ,


q u e são 4 8 , c a d a chancelaria 1.600, c a d a selo 3 7 5 , q u e
i m p o r t a c a d a provisão 1.975, fazem a s o m a de 94Ü800

D e p r o v i s õ e s p a r a "vigários d a v a r a , q u e são 6, c a d a
c h a n c e l a r i a 1.600, c a d a selo 3 7 5 , q u e i m p o r t a c a d a
provisão 1.975, fazem a s o m a d e . . . 11Ü850

5:368Ü400
710

[ fl. 395v. ] D e "provisões p a r a "escrivães d o eclesiástico, q u e são


7, corri o d a "vigararia geral, c a d a "chancelaria 1.600,
c a d a selo 3 7 5 , q u e i m p o r t a c a d a provisão 1.975, q u e
por junto somam 13U825

D e provisões p a r a " m e i r i n h o s d o m e s m o , q u e t a m b é m
são 7, e a i m p o r t â n c i a d a c h a n c e l a r i a e selo a m e s m a ,
somam , 13Ü825

De. p r o v i s õ e s p a r a m e i r i n h o d o c a m p o e e s c r i v ã o d o
mesmo, que há somente e m Mariana, cada chancelaria
1 . 6 0 0 , c a d a selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a p r o v i s ã o 1 . 9 7 5 ,
somam , , 3Ü950

D e provisões p a r a "inquiridores, "contadores, "distribui-


dores e escrivães d o registro, q u e são 7, c a d a chancelaria
1.600, c a d a selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a provisão 1.975, q u e
por junto somam , 13U825

D e provisões p a r a "ermitães das "capelas, a i n d a q u e e m


a l g u m a s h á 3 , e m outras 2, r e g u l a d o o n ú m e r o deles pelo
das c a p e l a s , f a r ã o o n ú m e r o d e 4 0 0 , c a d a c h a n c e l a r i a
1.600, c a d a selo 375, i m p o r t a c a d a provisão 1.975, q u e
p o r j u n t o fazem a s o m a de 790U000

D e provisões p a r a se e x p o r o S e n h o r nas festas, q u e p o r


se fazerem e m c a d a "igreja p a r o q u i a l a o m e n o s três e m
c a d a a n o e e m c a d a capela a o m e n o s u m a , serão 5 4 4 , a
c h a n c e l a r i a 1.600, o selo 3 7 5 , v e m a i m p o r t a r c a d a
p r o v i s ã o 1.975, q u e multiplicadas p o r 544 f a z e m a
soma de 1:064U400

D e provisões p a r a c a s a m e n t o s , q u e a o m e n o s se farão
mil e m c a d a a n o e m todo o b i s p a d o , e x c e t u a n d o os dos
escravos, q u e n a d a p a g a m : a saber, 600 q u e se celebrarão
nas m a t r i z e s , cuja c h a n c e l a r i a é d e 1.200 e o selo 3 7 5 ,
que vem a somar cada um 1.575, i m p o r t a m por
t o d o s os 600 945Ü000

Q u a t r o c e n t o s , q u e se c e l e b r a r ã o n a s c a p e l a s , c u j a
c h a n c e l a r i a é 2 . 4 0 0 , selo 3 7 5 , v e m a i m p o r t a r c a d a
provisão 2.775, somam 1:110U0Ô0
711

D e m a n d a d o s d e comissão p a r a se t i r a r e m d e p o i m e n t o s
nos casamentos, q u e q u a n d o nada em todo o bispado,
c a d a a n o , serão 100, c a d a "chancelaria 1.200, c a d a *selo
3 7 5 , i m p o r t a c a d a m a n d a d o 1.575, fazem p o r j u n t o a
soma de , 157Ü500

D e cartas d e e x c o m u n h ã o , q u e e m todo o bispado q u a n d o


n a d a s e r ã o 100 e m c a d a a n o , c a d a c h a n c e l a r i a 2 . 4 0 0 ,
c a d a selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a carta d e e x c o m u n h ã o 2.775,
somam : 277Ü500

D e m a n d a d o s d e absolvição, q u e t a m b é m serão 100, c a d a


c h a n c e l a r i a 1.200, selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a m a n d a d o
1.575, s o m a m 157Ü500

4:547Ü325 [fl. 3 9 6 ]

D e m a n d a d o s d e absolvição aos declarados p o r faltarem


a o preceito d a Q u a r e s m a , q u e e m t o d o o b i s p a d o serão
ao m e n o s 2 0 0 , c a d a c h a n c e l a r i a 1.200, c a d a selo
3 7 5 , i m p o r t a c a d a m a n d a d o 1.575, s o m a m . ..31515000

D e provisões de "mestres d e capela, q u e são 6, u m ê m


c a d a c o m a r c a , c a d a chancelaria 1.600, selo 375, i m p o r t a
c a d a p r o v i s ã o 1.975 11Ü850

N e s t e s m e s t r e s d e c a p e l a se r e p a r a q u e d ã o l i c e n ç a a
outros músicos p a r a c a n t a r , levando duas "oitavas de o u r o
p o r c a d a licença, tendo Sua Majestade declarado, p o r
u m "alvará à B a h i a , ser abuso d a jurisdição episcopal o
p r o v i m e n t o deles pelos "bispos c o m a a m p l i a ç ã o d e n ã o
c a n t a r a l g u é m s e m licença deles, e q u e aos bispos s o m e n t e
t o c a p r o i b i r c a n t o s p r o f a n o s n a s igrejas, e n ã o m a i s a
respeito d e músicos.

T a m b é m se r e p a r a e m ter c r i a d o o bispo " m e i r i n h o e


"escrivão do c a m p o e m M a r i a n a , c o m o t a m b é m escrivães
d o r e g i s t r o e m c a d a c o m a r c a , q u e nelas r e g i s t r a m as
"provisões do bispado registradas j á n a sua C â m a r a .
712

T o d a s as "provisões referidas se p a s s a m e m c a d a a n o e
a l é m delas outras m u i t a s , c o m o são a "clérigos e frades
p a r a confessar e p r e g a r , c a d a u m a d e *per se, das quais
d i z e m uns q u e se p a g a m "chancelarias, outros q u e n ã o ;
p o r é m s e m p r e é n o t á v e l g r a v a m e aos p o b r e s clérigos
p a g a r e m feitios, registros e "selos, os selos s e m p r e p a r a o
"bispo, q u e p o r ser c a d a u m nestas provisões 9 3 "réis e
m e i o , e m d u a s m i l p r o v i s õ e s p a r a c o n f e s s a r q u e se
p a s s a m a c l é r i g o s , q u e t o d a s se a p r o v a m , se faz a
q u a n t i a de I87Ü000

E e m d u z e n t a s provisões p a r a p r e g a r , q u e é o m e n o s q u e
p o d e h a v e r e m u m b i s p a d o o n d e todos t ê m a t e n t a ç ã o
d e p r e g a r , s o m a a conta dos selos 18U700

[ fl. 396v. ] S o m a m todas as chancelarias, salvo o e r r o 10:448U275

N ã o se fala nas chancelarias dos papéis dos " o r d i n a n d o s ,


q u e t ê m sido m u i t o s , n a v e r d a d e , e s e n d o q u a s e todos
naturais deste R e i n o , n o m e s m o bispado d e M a r i a n a se
lhes fizeram todas as diligências. N e m t a m b é m se fala nas
chancelarias das provisões d e "mestres d e latim, p o r n ã o
haver certeza da quantidade de umas e outras, m a s é certo
que o bispo n ã o consente que n e m ainda e m casas
particulares haja mestres de latim q u e ensinem aos filhos
dos donos delas sem q u e seja c o m provisão sua, o que se
viu n a freguesia da Conceição dos Carijós, o n d e tendo u m
h o m e m u m mestre de latim p a r a seus filhos e m casa l h o
tirou, por n ã o ter provisão sua, e lhe meteu outro c o m ela.

" P e n s õ e s q u e e m c a d a a n o l e v a o b i s p o p e l o s "ofícios

D e p e n s ã o p e l o oficio d e ' ' e s c r i v ã o d a "vigararia

g e r a l , 2 0 0 "oitavas d e o u r o , q u e são ,.„ 300Ü000

D o escrivão d a "vigararia d a v a r a de Vila Rica, o m e s m o 300U000

D e escrivão d a vigararia d a v a r a do S a b a r á , o m e s m o 300U000


D o escrivão d a v i g a r a r i a d a v a r a d o R i o d a s M o r t e s ,
100 oitavas d e o u r o , q u e v ê m a ser 150U000
713

D o escrivão d a "vigararia d a v a r a do S e r r o do Frio, 100


"oitavas d e o u r o „ , 25OUO0O

D o escrivão de Pitangui, 50 oitavas de o u r o , q u e são 75U000

D o escrivão d a do R i o V e r d e , 50 oitavas d e o u r o 75U000

D e c a d a u m dos 6 "mestrados d e capela, u m p o r o u t r o , à


q u a r t a d e o u r o , q u e fazem a s o m a de "libra e m e i a 288U00Õ

S o m a m as "pensões referidas, s e g u n d o o q u e p a r e c e l:638U0OO

D o "ofício d e " m e i r i n h o - g e r a l n ã o leva, p o r o r a , p e n -


são, p o r q u e v e n d e n d o - o p o r u m triénio a u m "cirurgião
c o m a f a c u l d a d e d e este o p o d e r v e n d e r , o v e n d e u ele
p o r q u a t r o mil c r u z a d o s , e a i n d a d u r a o triénio.

R e n d i m e n t o s d a *visita

L e v a o "bispo d e p r o c u r a ç õ e s p e l a visita d e c a d a "igreja


/ / paroquial, assistindo-lhe os "párocos c o m as ^vitualhas [ A. 397 ]
a ele e a sua comitiva, 9 "oitavas d e o u r o , q u e , p o r s e r e m
as igrejas 4 8 , i m p o r t a m , , , 648U000

L e v a de p r o c u r a ç ã o p e l a visita d e c a d a "capela 6 oitavas


d e o u r o , q u e p o r s e r e m as capelas ao m e n o s 4 0 0 , i m p o r t a m 3:600Ü000

Leva de p r o c u r a ç ã o p e l a visita de c a d a oratório p r i v a d o


6 oitavas d e o u r o , n ã o s e m escândalo dos q u e s a b e m d a
p r o i b i ç ã o do cap.fin. de Censib., e n ã o se lhe p õ e o n ú m e r o
p o r n ã o h a v e r certeza dele

Leva de t o m a r contas às "irmandades, ou sejam eclesiásticas


o u s e c u l a r e s ( s o b r e o q u e c o m ele t e m b u l h a d o o
"corregedor), 3 oitavas de ouro a c a d a i r m a n d a d e , levando
o corregedor só u m a ; e p o r haver e m todas as 48 freguesias,
e ainda e m capelas, irmandades que c h e g a m ao n ú m e r o de
400 ao menos, importam as contas de todas 1.200 oitavas,
q u e são 2:800U000
P a r a e v i t a r c o n t e n d a s c o m o " c o r r e g e d o r s o b r e as
" i r m a n d a d e s , o r d e n o u e m "visita a o s " p á r o c o s n ã o
a d m i t i s s e m e m suas igrejas i r m a n d a d e s s e m "provisão
de ereção sua.

Pela a d m i n i s t r a ç ã o do s a c r a m e n t o d a crisma, e m q u e p õ e
o bispo u m c r i a d o c o m u m a salva a r e c e b e r o u r o , o u t r o a
receber "cera, e ou em u m a ou e m outra espécie
n e c e s s a r i a m e n t e são as ofertas dos c r i s m a d o s , q u e sem
elas se n ã o a d m i t e m , se n ã o p o d e s a b e r a o certo o q u e
importa o r e n d i m e n t o , mas, seguramente, de cada
freguesia q u e visitou tirou mais d e duzentos mil "réis e m
o u r o e cera, que, recebida, fazia logo v e n d e r e p o r b o m
p r e ç o , e c o m p u t a d a s as freguesias q u e v i s i t o u o a n o
p a s s a d o , q u e f o r a m 13 (fazendo visitar as o u t r a s p o r
visitador), lhe veio a r e n d e r a crisma 2:6O0UOO0

S o m a m os r e n d i m e n t o s d a visita, tiradas as p r o c u r a ç õ e s
dos oratórios privados, a q u e se, n ã o fez a conta, salvo o
erro 8:648ÜOO0

Têm, finalmente, o bispo de " c ô n g r u a d e el-rei 1:000Ü000

Q u e j u n t o c o m as somas a c i m a , das "chancelarias 10:448X5275

D a s "pensões dos "ofícios e "mestrados de capela J:638Ü000

D e p r o c u r a ç õ e s pelas visitas das igrejas e "capelas 8:648tJ000

S o m a t u d o , salvo o erro 21:734Ü275


715

• 100 «

[Informação sobre rendimentos do bispado de Mariana]

Estimativa detalhada das fontes de receita do bispado de


Mariana. Aparecem relacionados o tipo de serviço prestado pela
câmara eclesiástica, o número de ocorrências e o custo.
O documento foi produzido por alguma "pessoa inteligente"
a quem o ouvidor Caetano da Costa Matoso encaminhou inquéri-
to escrito- Visava, em decorrência de suas atribuições, fornecer
subsídios para responder a solicitação régia de informações sobre o
rendimento do bispado. O c u p a posição chave n a disputa entre a
jurisdição real e a episcopal, traduzindo o esforço de controle e
vigilância sobre os recursos financeiros da Igreja.
Autoria, l o c a l , data: anônimo; Mariana; ca. 1752.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Marcos
Magalhães de Aguiar em estudo sobre as irmandades e m Minas,
especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição entre Estado
e Igreja em torno do controle das confrarias e para obter dados
estatísticos sobre o clero mineiro (Vila Rica dos confrades: sociabili-
dade confrarial entre negros e mulatos n o século X V I I I . São
Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p . 100-102).
9 S - /O • A C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, híbrida de
encadeamento, menos caligrafada; tem o " d " uncial, o til como
pequeno ponto de interrogação sobreposto; usa o agudo nas síla-
bas tônicas; hastes alongadas como p o n t o de fuga e m vogais
finais. (YDL)
C r i t é r i o s editoriais: A fim de manter a uniformidade, foi
acrescido o caldeirão em algumas cifras da coluna de valores m o -
netários.

H
averá neste b i s p a d o de M a r i a n a até 900 "clérigos, q u e todos t i r a m *pro- [ fl. 399 ]
visões a n u a l m e n t e p a r a u s a r e m d e suas o r d e n s , a i n d a os filhos deste
b i s p a d o e nele o r d e n a d o s , c o n t r a o estilo p r a t i c a d o n o a r c e b i s p a d o d a
Bahia, mais b i s p a d o s e neste, n o t e m p o dos prelados [antecessores?] deste.
S e m p r e foi c o s t u m e p a g a r , c a d a clérigo, d e " c h a n c e l a r i a p a r a o b i s p o 320
"réis d e c a d a provisão de usar d e ordens, e n a posse deste "prelado, t o m a d a p e l o
r e v e r e n d o d o u t o r L o u r e n ç o J o s é de Q u e i r ó s C o i m b r a , se a u m e n t o u a dita c h a n -
celaria, p o n d o - s e e m 1.200 c a d a u m a , de feitio 466 e d e "selo 9 3 e m e i o , q u e este
t a m b é m é p a r a o dito bispo. E q u a n d o q u a l q u e r clérigo vai reformar a sua p r o v i -
716

são ou m a n d a , se lhe n ã o entrega s e m q u e p r i m e i r o p a g u e p a r a u m a " i r m a n d a d e


d e São P e d r o , q u e o dito "bispo inventou, duas "oitavas e m e i a d e e n t r a d a e u m a
d e a n u a l , e m c a d a u m a n o , e o q u e recusar a d a r isto e " q u i n t a d o a 1.500 [*réis a
oitava] n ã o leva "provisão n e m se lhe deixa dizer missa.
T a m b é m m a n d a passar provisões s e p a r a d a m e n t e p a r a q u a l q u e r clérigo exercer
a o c u p a ç ã o d e "capelão d e q u a l q u e r "capela (como q u e se n ã o fosse b a s t a n t e a
q u e t e m j á d e u s a r de ordens), levando d e "chancelaria 1.600, d e feitio 640 e d e
"selo 9 3 e m e i o , e s e m p r e as capelas q u e h á e m t o d o o b i s p a d o h ã o de exceder o
n ú m e r o de 400.
E m m u i t a s freguesias h á capelães d e i r m a n d a d e s e m as matrizes, q u e t a m b é m a
estes faz tirar provisões, q u e todas farão o n ú m e r o d e 100, l e v a n d o o m e s m o q u e
a c i m a fica dito.
E m 32 freguesias é q u e p o d e r á h a v e r "coadjutores, p a g a c a d a u m pela sua
provisão d e c h a n c e l a r i a 4¡500, feitio 750 e selo 9 3 e m e i o .
E m 3 0 freguesias, p o u c o mais ou m e n o s , h a v e r á sacristãos, q u e todos t a m -
b é m t i r a m a n u a l m e n t e p r o v i s ã o , d e q u e p a g a m d e c h a n c e l a r i a 1.600, e s e n d o
c o m o c u p a ç ã o d e "fabriqueiro 4.500, d e feitio 6 4 0 e selo 9 3 e m e i o .
[ fí. 399v. ] O s seis "vigários d a v a r a n ã o tiram provisões anuais, p o r q u e se lhes passa até
se n ã o m a n d a r o c o n t r á r i o , m a s n u n c a existem m u i t o t e m p o n a dita o c u p a ç ã o ; p a -
g a m d e chancelaria 4.500, feitio 640 e selo 9 3 e m e i o .
O s seis " p r o m o t o r e s t i r a m p r o v i s ã o a n u a l , d e q u e p a g a m o m e s m o q u e os
vigários d a vara.
O s "escrivães d o j u í z o eclesiástico são sete; c a d a u m tira provisão anual, p a -
gam o mesmo.
O s sete "meirinhos e sete escrivães d a v a r a t a m b é m t i r a m provisões anuais,
de que p a g a m o mesmo.
O m e i r i n h o d o c a m p o e seu escrivão, de n o v o c r i a d o e m M a r i a n a , p a g a m o
mesmo.
E m c a d a " c o m a r c a h á u m "inquiridor, "contador, "distribuidor e "escrivão
do registro, q u e t u d o a n d a anexo; de c a d a provisão a n u a l destes, o m e s m o .
E s t e efeito d o r e g i s t r o teve p r i n c í p i o n a c h e g a d a a o R i o d e J a n e i r o d o
Excelentíssimo Reverendíssimo d o m frei J o ã o d a C r u z , q u e p o r causa das distâncias
se p e r d i a m muitos p a p é i s d e clérigos. Q u a n d o r e c o r r i a m a ele p a r a reforma das suas
licenças, o p o d e r i a m estes fazer s o m e n t e c o m as certidões dos registros. H o j e n ã o se
carece d e recorrer senão c o m os p r ó p r i o s papéis, s e m q u e seja necessário d a r c a d a
"clérigo 187 e m e i o n a C i d a d e [ M a r i a n a ] e, v i n d o p a r a V i l a R i c a , o n d e t e m
domicílio e m distância d e d u a s "léguas, d a r o u t r o t a n t o . E q u a n d o o n ã o faça
assim, logo é suspenso, c o m o t e m acontecido a m u i t o s , t e n d o d e c l a r a d o p o r suas
"pastorais q u e q u e m n ã o registrar os papéis nas c o m a r c a s o n d e reside ficará suspenso
se disser missa, confessar ou p r e g a r antes d e d a r 187 e m e i o d e c a d a u m a provi-
são, q u e é o único fim a q u e se e n c a m i n h a tão g r a n d e zelo.
717

N a s provisões p a r a e x p o r o S e n h o r n ã o h á excesso.
N a s de casamentos, o mesmo. [fl- 4 0 0 ]
M a n d a d o s de comissão, s e m p r e e m c a d a u m a n o , se m a n d a r ã o p a s s a r m a i s d e
4 0 0 , p o r q u e até m u l a t o s e negros se c o n c e d e m , e m o r d e m a o a u m e n t o das " c h a n -
celarias.
N a s cartas d e e x c o m u n h ã o t a m b é m n ã o h á excesso.
N o s m a n d a d o s de absolvição, o m e s m o .
O m e s m o nos m a n d a d o s do t e m p o d a Q u a r e s m a .
O s seis "mestres de capela p a g a m d e c h a n c e l a r i a 4.500, feitio 6 4 0 , "selo 9 3
e meio.
O s ditos mestres l e v a m de c a d a licença q u e d ã o aos músicos p a r a q u a l q u e r
festividade 2 oitavas d a missa c a n t a d a , d e " V é s p e r a s u m a o i t a v a , e m S e m a n a
S a n t a 8 oitavas.
O s "ofícios das "bancas sempre a n d a r a m p e n s i o n a d o s e m 96 mil. N a chega-
d a d o Excelentíssimo bispo do R i o d e J a n e i r o , d o m frei A n t ô n i o d o D e s t e r r o no
t e m p o q u e g o v e r n o u as M i n a s deste " p r e l a d o , os p e n s i o n o u e m 2 0 0 mil. Assim
ficaram até este presente a n o q u e o dito p r e l a d o os v e n d e u .
A saber:
o ofício de "escrivão de vigário-geral, e m c a d a u m a n o , d e p e n s ã o . . . 1:800UOOO
o d a c o m a r c a d e Vila R i c a 700X5000
o d a de S a b a r á 700X5000
o d a d o R i o das M o r t e s s 700X5000
o d a do S e r r o d o F r i o . , . . , 400U000
o d a d e P i t a n g u i e R i o V e r d e , n ã o se sabe c o m certeza
os mestres d a capela, e m c a d a u m a n o 48X5000
o ofício d e "meirinho-geral se v e n d e u p o r 1:600X5000
O s m e i r i n h o s das c o m a r c a s e seus escrivães d a v a r a os v e n d e u , uns e outros a [ íl. 400v. ]
500X5000, p o r t e m p o d e três anos.

Leva-se de vista dos livros d a "fábrica de c a d a igreja, d e t o m a r a c o n t a . . . 5X5250


D e "visita de c a d a "capela 9X5000
Q u e p o r todas serão mais d e 500.
T a m b é m leva o m e s m o pelos oratórios particulares, o q u e n u n c a se c o s t u m o u .
Leva p o r t o m a r contas a c a d a u m a " i r m a n d a d e 4X5500
Q u e s e m p r e h á mais d e 4 0 0 , etc.
- 101 -

[Papel acerca dos rendimentos do bispado de Mariana]

Estimativa detalhada das fontes de receita do bispado dé


Mariana. Aparecem relacionados o valor dos emolumentos cobra-
dos conforme o serviço religioso e o número de ocorrências, sem a
totalização dos rendimentos obtidos. Discrimina os valores arreca-
dados pelas chancelarias, as pensões que o bispo recebe, os rendi-
mentos das visitas episcopais e diversas outras atividades geradoras
de receita. Este recurso evidencia o esforço de apresentação de es-
timativas contábeis. O texto é pontuado por intervenções irônicas
e mordazes, em que o autor ilustra os excessos praticados pela ad-
ministração eclesiástica na capitania.
O documento foi produzido por alguma "pessoa inteligente"
a quem o ouvidor Caetano d a Costa Matoso encaminhou inquéri-
to escrito. Visava, em decorrência de suas atribuições, fornecer
subsídios para responder a solicitação régia de informações sobre o
rendimento do bispado. O c u p a posição chave n a disputa entre a
jurisdição real e a episcopal, traduzindo o esforço de controle e
vigilância sobre os recursos financeiros da Igreja.
Autoria, l o c a l , data: anônimo; Mariana; ca. 1752.
U s o n a historiografía: Este texto foi analisado por Marcos
Magalhães de Aguiar em estudo sobre as irmandades em Minas,
especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição entre Estado
e Igreja em torno do controle das confrarias e para obter dados
estatísticos sobre o clero mineiro {Vila Rica dos confrades: sociabili-
dade confrarial entre negros e mulatos no século XVffl. São
Paulo; Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p . 100-102).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : A relação contém comentários que
aplicam recursos retóricos típicos do género satírico, sobretudo
a ironia. J P F )
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , bastante
caligrafada, alongada e destrógrada, semelhante à monumental in-
glesa moderna, com o "que" abreviado em laçadas inicial e final
da haste ascendente; haste do " p " com perfil e dupla. (YDL)
Critérios editoriais: A fim de manter a uniformidade, foi
suprimido o caldeirão, apresentado no original de forma irregular
na coluna de discriminação dos serviços religiosos.
719

"Provisões p a r a usar d e o r d e n s p o d e r ã o ser - 1.000 [fl. 401 ]

Provisões d e "capelães, p o r h a v e r e m m u i t a s q u e o n ã o t ê m : 350

D e "coadjutores , 30

Capelães de "irmandades c o m provisão.. 200

D e "sacristãos 50

D e "fabríqueiros, a n d a m anexos a sacristãos e t u d o e m u m a p r o -


visão o r d i n a r i a m e n t e - [incompleto]

D e "vigários d a v a r a se c o s t u m a v a passar provisão , u m a p a r a en-


q u a n t o se n ã o m a n d a s s e o contrário. S e agora são anuais, n ã o sei,
p o r é m a "chancelaria destas provisões são 4.500, "selo 9 3 e m e i o ,
são , i 6

"Escrivães d a " b a n c a são 8, q u e o d o S a b a r á se dividiu e m dois.


S u a c h a n c e l a r i a são 4.500 [réis], e n ã o 1.600.

" M e i r i n h o s , c h a n c e l a r i a s e selo 3.843 e m e i o 7

Seus escrivães, o m e s m o 7

Meirinho do campo, o mesmo [incompleto]

Seu escrivão, o m e s m o [incompleto]

" I n q u i r i d o r e s , c h a n c e l a r i a 3.000, são 7

Escrivães d o registro, p a r e c e q u e se lhes passa provisão à p a r t e .

Provisões d e "ermitães s e r ã o . 200

Provisões d e expor o Santíssimo S a c r a m e n t o serão 544

Porém, a chancelaria 1.200 e s e l o n a c o m a r c a d a Cidade


[ M a r i a n a ] e n t e n d o ser 9 3 e m e i o , e se são 3 7 5 é p a r a o *vigá-
rio-geral.
720

"Provisões p a r a c a s a m e n t o s p o d e r ã o ser 500: nas matrizes 200 e


nas "capelas 300, p o r q u e mais são os q u e se "recebem e m capelas
q u e nas matrizes; c o m advertência, p o r é m , q u e o r d i n a r i a m e n t e a
todos se passa provisão, p r i m e i r o p a r a a matriz, c o m "chancelaria
d e 1.200, e d e p o i s p o r n o v o r e g i s t r o se l h e p a s s a o u t r a p a r a a
c a p e l a , c o m c h a n c e l a r i a de 2.400. O "selo se é p a r a o " p r e l a d o
são 9 3 e m e i o e se são 375 é p a r a os "ministros.

M a n d a d o s d e comissão serão 6 0 0 , p o r q u e se p a s s a m p a r a mais coi-


sas q u e casamentos. Só a " o r d i n a n d o s h á tal q u ê se lhes p a s s a m 5
ou 6 e mais requisitorios p a r a fora etc.

C a r t a s d e e x c o m u n h ã o serão 100, p o r é m o selo c o m a


declaração acima.

M a n d a d o s d e absolvição serão 2 0 0 , c o m d e c l a r a ç ã o n o selo.

[ fl. 401v. ] " M o n i t o r i o s serão 100, c o m d e c l a r a ç ã o n ó selo.

"Mestres d e capela 6, c h a n c e l a r i a 4.500, e n ã o 1.600.

Provisões d e confessar n ã o t ê m chancelaria m a s t ê m selo serão 1,000

Provisões de p r e g a r n ã o t ê m chancelaria m a s t ê m selo serão 200

M e s t r e s d e latim, p a r e c e q u e j á se n ã o passam, e só de escola pública.

D e o r d i n a n d o s , j á a c i m a v ã o incluídos nos m a n d a d o s d e c o m i s s ã o , p o r é m
h o u v e curioso q u e o b s e r v o u nestas " T ê m p o r a s q u e 25 o r d i n a n d o s l a r g a r a m n a
C â m a r a Eclesiástica m e l h o r d e d e z mil "cruzados. V e r d a d e é q u e , repartidos e m
chancelarias, selos, "provisor, "escrivão d a C â m a r a , escrevente, p o r t e i r o , m e s t r e
d e c e r i m ô n i a s , m e s t r e d e c a n t o c h ã o , diabos e suas m ã e s , e até se m a n d o u q u e
n e n h u m saísse d e palácio sem fazer a "coroa c o m o b a r b e i r o d a casa, e este n ã o só
lhes fez a c o r o a m a s t a m b é m a b a r b a e mais o cabelo; finalmente c o r o o u a o b r a e
acabou de rapar tudo.
Ali se observou q u e se c o n t a v a m os autos q u e se fizeram p o r comissários fora
c o m o se fossem feitos e trabalhados p o r eles, e se c o n t a v a m os dias e c a m i n h o s q u e
g a s t a r a m e a n d a r a m os comissários t a m b é m p a r a eles, e sendo estes autos u m a só
vez feitos v ê m a ficar refeitos p o r q u e pagos duas vezes, u m a a q u e m os t r a b a l h o u
e o u t r a a q u e m os m a n d o u . P o r é m , o "vigário-geral n ã o leva q u a n t o aos c a m i -
721

n h o s . J á e u ouvi dizer q u e h o u v e u m s e n h o r q u e c o n v i d a n d o operários p a r a s u a


v i n h a , f o r a m uns pela m a n h ã p a r a o t r a b a l h o , outros a o j a n t a r e outros de t a r d e ,
e q u a n d o foi a pagar-lhes, t a n t o d e u a u n s c o m o a outros, e q u e m u r m u r a n d o os
t r a b a l h a d o r e s desta desigualdade, lhes r e s p o n d e r a o s e n h o r d a v i n h a q u e d a v a d o
seu e n ã o fazia injúria a n e n h u m . Se isto foi assim, e u n ã o o vi, m a s assim o c o n t a
a gente d a q u e l e t e m p o , q u e n ã o m e n t e . L á , era d a r do seu e d e sua livre v o n t a d e
q u e a q u e l e senhor, p a r e c e , q u e n ã o t i n h a a q u e m d a r contas, m a s cá, dizem, q u e
é d o alheio e c o n t r a v o n t a d e de seu d o n o e d e q u e m se n ã o e n t e n d e c o m estas
c o n t a s , e se isto é b o m o u m a u e u n ã o e n t e n d o , e digníssimos d o u t o r e s t e m a
S a n t a M a d r e Igreja, p o r q u e o u ç o dizer q u e os h á p a r a t u d o , e até p a r a se fazerem
"benefícios c o n t r a v o n t a d e , c o m o é à força fazer os "clérigos i r m ã o s d a " i r m a n d a -
d e d e S ã o P e d r o . E sem l a r g a r e m duas "oitavas d e e n t r a d a e m e i a d e u m a vela
q u e n ã o vale dar-se esta, a i n d a q u e a haja, m a s p r e c i s a m e n t e a m e i a p o r ela e d e
a n u a l u m a oitava, sem cuja satisfação (e c o m o u r o "quintado) se lhe n ã o d ã o os
seus p a p é i s , n ã o se viu m e l h o r m o d o d e garfear. V a l h a - m e D e u s , / / q u e m e ia [ fl. 402 ]
divertindo c o m o q u e m sonha, e se n ã o acordo a i n d a o sonho c o n t i n u a r a . 1

O nosso caso é outro.

As sentenças d e foro contencioso e quitações d e t e s t a m e n t o s serão ...200

N ã o h á dúvida q u e h á registros d e 187 e m e i o , 375 e 750; t a n t o h á q u e a m e t a d e


bastava, pois se registram os papéis n a C â m a r a e depois t o r n a m a registrar-se nas
c o m a r c a s . *Ad guia? Se muitos papéis n e m d e u m c a r e c i a m , q u a n t o mais de dois.
Se isto n ã o é p a r a levar dois salários, e n t ã o n ã o sei o p a r a q u e é. E p a r a q u e será
registrarem-se as "provisões d e expor o Santíssimo se se tiram n a véspera d a festa,
e feita esta n ã o serve p a r a mais n a d a ? [E] as cartas d e inquirições, precatórios e
papéis semelhantes q u e v ê m d e fora t a n t o q u e c h e g a m , se os próprios h ã o d e ficar
nos cartórios, e deles se, p a s s a m instrumentos? P a r e c e q u e t o r n a v a a sonhar.
M a s n ã o é sonho p a g a r o "escrivão d a C â m a r a 3 ou 4 mil "cruzados d e "pensão.
Escrivão do "auditório d a C i d a d e [ M a r i a n a ] , outros 3 ou 4 mil cruzados.
M a s dizer: " E ao m e u "padre c u r a , q u e é u m p o b r e pelas muitas esmolas q u e
faz." Pois d i z e m q u e n ã o t e m n a d a d e seu p a r a o gastar.
O s mais "ofícios n ã o sei se são 200 oitavas, se 200 mil "réis e os m a i s [respec-
tivamente?].
"Mestres d e capela, era antes u m a " q u a r t a de o u r o , as q u a t r o c o m a r c a s , C i -
d a d e , Vila R i c a , S a b a r á e R i o das M o r t e s ; as o u t r a s e r a m m e n o s . Q u a n t o aos
compassos, n a C o r t e se t e m ventilado e aí se saberá; p o r é m os salários n ã o são

O narrador introduz crítica à cobrança irregular de taxas da Igreja, usando ironicamente referência à
parábola dos trabalhadores da vinha segundo o Evangelho de São Mateus, capítulo 20, versículos 1 a 16.
722

s o m e n t e duas "oitavas, m a s 2, 4, 6 e 8, conforme as funções.


A p r i m e i r a v e n d a do "oficio j á a c a b o u , e a q u e m o serve n ã o se lhe d e u pelo
custo d a provisão s o m e n t e .
N a s "visitas d e antes n ã o p a g a v a m n a d a das matrizes.
O s " p á r o c o s b e m p a g a m , p o r q u e assistem c o m o necessário ou c o m m u i t o
supérfluo aos "prelados e sua g r a n d e "família.
Por visita das "capelas p a r a o "prelado são 5 oitavas e 1 p a r a o "secretário.
P o d e r ã o ser 380, das quais terão "capelães 350, m a s todas p a g a m .
D o s "oratórios se p a g a o m e s m o , e p o d e r ã o ser até 20.
[ fl. 402v. ] D a s " i r m a n d a d e s são 3 oitavas e m e i a hoje, 2 p a r a o p r e l a d o , 1 p a r a o secre-
tário e m e i a p a r a o " m e i r i n h o , h á p o u c o t e m p o i n t r o d u z i d a d e n o v o . P o d e r ã o
n ã o c h e g a r a 200 as i r m a n d a d e s a q u e t o m a contas.
D e crismas n a d a posso dizer.
A "côngrua p a r e c e será m a i o r , p o r se m a n d a r aos "cónegos d a r mais 50 p o r
100, e n t e n d o assim seria o p r e l a d o . A t é a g o r a e r a u m "conto, a saber: 120 mil
p a r a os "ministros, 80 mil "réis p a r a esmolas e p a r a os p r e l a d o s 8 0 0 mil réis.
F a l t a m provisões de e r e ç ã o d e capelas, que p a g a m 12 mil réis de "chancela-
ria, fora "selo.
D e . ereções d e i r m a n d a d e s , 1.800, fora selo.
"Colações d e "benefícios, q u e p a g a m 10, 12, 18 e 20 mil réis.

Omnia sub censura?-

• 102 <

[ fl. 403 ] Rendimento do bispado de Mariana, das chancelarias que se


pagam na Câmara e nas comarcas de Vila Rica, Sabará, Rio das
Mortes, Rio Verde, Pitangui e Serro do Frio

Estimativa detalhada das fontes de receita do bispado de


Mariana. Aparecem relacionados o valor dos emolumentos co-
brados conforme o serviço religioso e o número de ocorrências,
totaliz ando-se os rendimentos parciais obtidos. Discrimina os

T u d o sob censura.
valores arrecadados pelas chancelarias, as pensões que o bispo
recebe, os rendimentos das visitas episcopais e diversas outras
atividades geradoras de receita. Este recurso evidencia o esforço
de apresentação de estimativas contábeis. Semelhante aos docu-
mentos 99 e 108, diverge quanto ao número d e eclesiásticos, de
capelas e d e igrejas e ao valor dos emolumentos; apresenta as
menores cifras dentre os três.
O documento parece ser u m a tentativa de consolidação de
dados a ser enviada à C o r o a pelo ouvidor C a e t a n o d a Costa
Matoso. Visava, em decorrência de suas atribuições, fornecer
subsídios para responder a solicitação régia de informações so-
bre o rendimento do bispado. O c u p a posição chave n a disputa
entre a jurisdição real e a episcopal, traduzindo o esforço d e
controle e vigilância sobre os recursos financeiros da Igreja.
Autoria, l o c a l , data: Caetano d a Costa Matoso; Lisboa;
ca. 1753.
U s o n a historiografía: Este texto foi analisado por M a r -
cos Magalhães de Aguiar, em estudo sobre as irmandades em
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em torno do controle das confrarias e para
obter dados estatísticos sobre o clero mineiro (Vila Rica dos confrades:
sociabilidade contrariai entre negros e mulatos no século XVTIL
São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p. 100-
102).
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, caligrafada e
regularizada do período barroco, evidenciando traços bem marca-
dos: hastes inferiores distintas do " q " simples, levemente inclinada,
com apóstrofe arqueado sinalizando a abreviatura," do " p " em pro-
longamento sinistrógiro, marcado e paralelo à escrita; do "s" caudado,
arqueado e também sirústrógiro; do duplo 'T*, o primeiro retilíneo,
com perfil, o segundo com orelha destrógira. Números arábicos ar-
redondados e destrógiros, com uso do caldeirão. N o folio 405, a
caligrafia, do mesmo tipo, se toma mais tipificada. (YDL)
724

D e "provisões p a r a u s a r d e o r d e n s , diz o original, dois


m i l "clérigos, p o r é m a v e r d a d e é q u e s e r ã o 7 0 0 , c o m
p o u c a diferença, c a d a "chancelaria a 1.200, s o m a m . 840U000

D e "selos, suposto diga o origina! c a d a u m a 195 "réis, a


v e r d a d e é q u e é c a d a "selo a 9 3 e m e i o , q u e s o m a m ± 65Ü450

D e provisões p a r a "capelães das "capelas filiais, que serão


400, q u e não tenho dúvida, a 1.600 de chancelaria, s o m a m 640U000

D e selos d e 400 provisões, a 9 3 e meio c a d a u m a , s o m a m 37U400

D e provisões p a r a " c o a d j u t o r e s d e "igrejas p a r o q u i a i s ,


e x c e t u a n d o p o u c a s q u e os n ã o t ê m , serão 38 até o a n o
d e 1751. G a d a provisão tinha de chancelaria 7.500. D e s d e
1751 p a r a cá, n ã o se sabe o motivo p o r q u e t ê m só d e
c h a n c e l a r i a c a d a provisão d e coadjutor a 5.700 «. 2 1 6 U 6 0 0

D e selos p a r a as ditas 3 8 , a 9 3 e meio c a d a u m , s o m a m 3U393

D e p r o v i s õ e s p a r a c a p e l ã e s e m " i r m a n d a d e s sitas e m
"igrejas p a r o q u i a s e capelas, q u e serão a o m e n o s 6 0 0 ,
c a d a c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m 960U000

D e selos p a r a as ditas 600, a 9 3 e meio c a d a u m , s o m a m 56U100

D e provisões p a r a sacristãos d e igrejas p a r o q u i a s e c a p e -


las, q u e serão a o m e n o s 6 0 (suposto diz o original 100),
c a d a c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m , : 96Í5000

D e selos p a r a as ditas 60, a 9 3 e meio, s o m a m 5U610

D e p r o v i s õ e s p a r a "fabriqueiros das igrejas p a r o q u i a i s ,


q u e suposto diz o original serão 4 8 , a v e r d a d e é q u e n ã o
serão 30, c a d a c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m 48U000

D e selos p a r a as ditas 30, a 9 3 e m e i o , s o m a m

D e provisões p a r a "vigários da vara, q u e são 6, suposto


n ã o são anuais, salvo se lança fora o dito vigário d a v a r a ,
c a d a c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m 915600
725

D e "selos p a r a as ditas 6, a 9 3 e m e i o , s o m a m Ü561

D e "provisões p a r a "escrivães, digo, "meirinhos do ecle-


siástico, q u e s u p o s t o diz o original são 7, c o n t u d o n ã o
são s e n ã o 6, a 1.600 c a d a chancelaria, s o m a m 9U600

D e selos p a r a as mesmas 6, a 9 3 e m e i o , s o m a m U561

D e provisões p a r a escrivães do eclesiástico, suposto diz o


original são 7, a v e r d a d e é q u e são 6, c o m o d a "vigararia
geral, c a d a c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m 9U600

D e selos p a r a as m e s m a s 6, a 9 3 e m e i o , s o m a m U561

D e provisões p a r a m e i r i n h o do c a m p o e escrivão do m e s -
m o , que há somente em Mariana, cada chancelaria a
1.600, s o m a m 3U200

D e selos p a r a os ditos 2, a 9 3 e m e i o , somam........ U187

Soma a lauda 2:105ü228

V e m da lauda antecedente 2:105ü228 [ fl. 403v. ]

D e provisões p a r a "inquiridores, "contadores, "distribui-


dores e escrivães d o registro, q u e são 7, c a d a c h a n c e l a r i a
a 1.600, s o m a m 1IU200

D e selos p a r a as ditas 7, a 93 e meio, s o m a m U654 A l

D e provisões p a r a "ermitães das "capelas, suposto diz o


original q u e são 4 0 0 , a l é m de ter d i m i n u i ç ã o nas c o m a r c a s
de M a r i a n a e O u r o P r e t o , c o n t u d o a v e r d a d e é q u e n ã o
serão senão 300, e c a d a c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m , 480Ü000

D e selos p a r a as ditas 3 0 0 , a 9 3 e m e i o , s o m a m 28U050

D e provisões p a r a se e x p o r o S e n h o r nas festas, q u e n o


original t e m 5 4 4 , e n a v e r d a d e p a s s a r ã o d e 6 0 0 , c a d a
c h a n c e l a r i a a 1.600, s o m a m ...960UOOO
726

D e "selos p a r a as ditas 6 0 0 , a 93 e m e i o , s o m a m
: 56Ü100

D e "provisões p a r a casamentos, diz o original que se fa-


r ã o 1.000 e m c a d a a n o , e x c e t u a n d o escravos q u e n a d a
p a g a m , e e n t e n d o se fazem mais e q u e c h e g a r ã o a 1.500
u m a n o p o r o u t r o , p o r q u e os filhos do R e i n o , p o r falta
d e interesses p a r a se r e t i r a r e m p a r a as suas pátrias, se v ã o
casando e estabelecendo, por terem perdido a esperan-
ça, e os filhos do "pais c a s a m de p o u c a idade, e os que
têm V a s t a da t e r r a e de neófitos c a s a m todos, c a d a
c h a n c e l a r i a p a r a se r e c e b e r e m n a m a t r i z a 1.200, s o m a m 1-.800Ü000

D e selos p a r a as ditas 1.500, a 93 e m e i o , s o m a m 140Ü250

D e p r o v i s õ e s p a r a se " r e c e b e r e m nas "capelas, q u e se


n ã o p a s s a m s e n ã o depois de se t i r a r e m p a r a a matriz, e
vimos que se r e c e b e m nas capelas a tirar duas provisões,
e a m a i o r p a r t e dos que c a s a m se r e c e b e m nas capelas
p o r evitarem despesas, viagens e publicidades, d e q u e se
g u a r d a m uns p o r p o b r e z a , estes p o r c a s a r e m c o m pesso-
as desiguais, a q u e l e s c o m p r e t o s e o u t r o s c o m g r a n d e
v e l h i c e , e p o d e r ã o ser os q u e t i r a m p r o v i s õ e s p a r a as
capelas 8 0 0 , a 1.600 d e chancelaria, s o m a m 1:280Ü000

D e selos p a r a as ditas 8 0 0 , a 93 e meio, s o m a m , 74U800

D e m a n d a d o s d e comissão p a r a se t i r a r e m os d e p o i m e n -
tos, q u e q u a s e todos os t i r a m p o r n ã o v i r e m à p r e s e n ç a
dos *ministros e fazerem despesas, e a i n d a os m u i t o p o -
bres, n ã o sendo d o m e s m o lugar e m q u e se a c h a o "bis-
p o ou ministro d a c o m a r c a ; e alguns tiram dois m a n d a -
dos q u a n d o lhes falta a certidão do batismo p a r a a justi-
ficação, p e l a m e s m a razão lhes custa m e n o s o m a n d a d o
do q u e a despesa d e c o n d u z i r [testemunhas?], e p a g a m
destes d e p o i m e n t o s e justificações duas vezes custas, u m a
a q u e m vai à comissão e o u t r a a o "escrivão do j u í z o , e
por esta razão serão 1.500 mandados, a 1.200
de chancelaria cada um, somam ................„. 1:800U000

Soma a lauda 8:736ü282 /a


1

[ fl. 4 0 4 ] V e m d a l a u d a e m fronte 8:736U282V2


D e "selos p a r a os ditos 1.500, a 9 3 e m e i o , s o m a m

D e m a n d a d o s , m a i s d e c o m i s s ã o , q u e se p a s s a m n e s t e
b i s p a d o p a r a o u t r a s justificações, p a r a defesa das teste-
m u n h a s q u e p r o d u z e m os culpados, p a r a desvanecer im-
p e d i m e n t o s d o m a t r i m ô n i o , p a r a justificar premissas, p a r a
dispensas, p a r a a d v o g a r causas, p a r a o *vigário-geral d o
bispado, e m t o d o ele p o d e m ser mais d e 400 m a n d a d o s ,
a 1.200 d e "chancelaria c a d a u m , s o m a m . . . ,

D e selos p a r a os ditos 4 0 0 , a 9 3 e meio, s o m a m

D e t o d o s estes c a s a m e n t o s , p o d e m ser p o r a n o 6 0 0 h o -
m e n s dos q u e c a s a m n a t u r a i s d e P o r t u g a l o u d e o u t r a
p a r t e , e p a r a lhes d i s p e n s a r e m os " b a n h o s das suas pátri-
as, a l é m da justificação d e solteiros e m q u e t a m b é m p a r a
muitos se passa m a n d a d o d e comissão, e m q u e a q u i n ã o
falo, d e p o s i t a m d e c a u ç ã o , c a d a u m , 3 0 . 0 0 0 , e se lhes
não v e m a certidão de b a n h o s corrente n o tempo q u e
lhe d e s t i n a m p e r d e m a c a u ç ã o p a r a a ' M i t r a e lhe tor-
n a m a reformar o t e m p o fazendo d o b r a d a c a u ç ã o , e al-
guns p e r d e m duas e três; e p o d e haver e m todo o b i s p a d o
cauções p e r d i d a s c a d a a n o 40, a 30.000 c a d a u m a , s o m a m

D e cartas d e e x c o m u n h ã o , q u e diz o original serão 100


e m t o d o o b i s p a d o , p a r e c e - m e serão 50, p o r q u e n ã o cos-
t u m a m a p a r e c e r as coisas p o r e x c o m u n h ã o , p o r q u e a gen-
te deste "país q u e faz o d a n o a m a i o r p a r t e são escravos,
a q u e m o direito n ã o sujeitou a esta p e n a , e os q u e são
livres d e q u a l q u e r comissão, a i n d a q u e façam d a n o s ou
r o u b o , uns n ã o fazem caso d a e x c o m u n h ã o e outros n ã o
lhes c h e g a à notícia pelas distâncias d o país, e p o r esta
r a z ã o se t i r a m p o u c a s , q u e s e n d o 5 0 , a 2.400 de
chancelaria c a d a u m a , s o m a m ,

D e selos p a r a as m e s m a s 50, a 9 3 e m e i o , s o m a m ,

D e m a n d a d o s d e absolvição q u e diz o original serão 100,


j u l g o q u e s e r ã o só 5 0 , p o r q u e os q u e se d e i x a m exco-
m u n g a r fogem e m u d a m d e t e r r a sem buscar absolvição,
a 1.200 d e chancelaria, s o m a m
728

D e *selos p a r a as m e s m a s 50, a 93 e m e i o , s o m a m 4X5675

D e m a n d a d o s d e absolvição p a r a os declarados q u e fal-


t a m a o preceito d a Q u a r e s m a , diz o original que são 200,
e a v e r d a d e é q u e p o d e r ã o c h e g a r a 100, e a r a z ã o é
p o r q u e , a i n d a q u e sejam mais os d e c l a r a d o s , c o m o fo-
g e m p a r a outros "países n ã o p e d e m m a n d a d o de
absolvição, a 1.200 d e "chancelaria, s o m a m 120U000

D e selos p a r a os m e s m o s 100, a 9 3 e meio, s o m a m 9X5350

Soma a lauda 1 0 : 9 1 2 Ü 6 3 2 Va

[ fi. 404v. ] V e m da lauda antecedente ,. 1 0 : 9 1 2 Ü 6 3 2 A


l

D e provisões p a r a "mestres d e capela, q u e são 6, a 1.200


de chancelaria cada uma, s o m a m . . 7X5200

D e selos p a r a as m e s m a s 6, a 9 3 e meio, s o m a m . X5552

D e provisões p a r a confessar e p r e g a r n ã o se p a g a c h a n -
celaria, só p a g a m o selo, q u e p e r t e n c e ao "bispo, e serão
os m e s m o s 700 "clérigos q u e tiram provisões p a r a con-
fessar; t i r a n d o alguns p o r velhos e de n e n h u m préstimo,
virão a ficar e m 6 0 0 , e dizer o original q u e serão mais
p r e g a d o r e s , c o n t u d o serão 50 os q u e p r e g a m , e v ê m a
ser 6 5 0 selos, a 9 3 e m e i o , s o m a m , 60X5775

N ã o se fala n o original e m c h a n c e l a r i a d e " o r d i n a n d o s ,


q u e p o r se a d m i t i r e m todos sem escolha n e m eleição, e
alguns c o m escândalo d o b i s p a d o , p o r ser público e sabi-
d o t e r e m i m p e d i m e n t o s *animas et corporis e só se n ã o ad-
mitem mulatos, contudo, sempre cada ano, por terem
todos alguns troncos fora d o b i s p a d o , que t i r a m c a d a u m
dois requisitórios c a d a a n o , e m u i t o s três e q u a t r o , p o -
r é m pelo m e n o s são 40 requisitórios e m c a d a a n o , a 1.200
de c h a n c e l a r i a , s o m a m 48U000

D e selos p a r a as m e s m a s 40, a 9 3 e m e i o , s o m a m 3X5740

D e m a n d a d o s d e *publicandis c a d a o r d i n a n d o , ao m e n o s
)

dois e m 40 m a n d a d o s , a 1.200 d e chancelaria, s o m a m . , ,.. 48X5000


729

D e "selos p a r a os m e s m o s 40, a 9 3 e m e i o , s o m a m . . . . . . 3Ü740

D e m a n d a d o s para "patrimônios 20, a 1.200 de chancelaria


cada um, somam 24U000

D e selos p a r a os m e s m o s 20, a 9 3 e m e i o , s o m a m 1U870

D e "pensões dos "ofícios d e "escrivães p a r a a "Mitra, diz


o original q u e são 3 0 0 . 0 0 0 c a d a u m , e n a v e r d a d e são
200.000 c a d a u m , q u e e m 5 s o m a m , „ 1:00015000

D o ofício d a c o m a r c a do S e r r o , p a g a s o m e n t e 6OU0O0

D o ofício d e Pitangui e R i o V e r d e , n a d a .

Falta no original o ofício d a " C â m a r a episcopal q u e d á a o


"bispo a "terça parte, que está justo e m 2.000 cruzados, e são 800U000

Falta t a m b é m o meirinho-geral, q u e d á as terças p a r t e s ,


que, u m a n o p o r o u t r o , são 100.000, e q u a n d o h á visita
é d o b r a d o , p o r q u e s u p o s t o foi v e n d i d o s e m p r e leva o
bispo a terça p a r t e 100U000

Soma a lauda 13:070U509'/ 2

V e m d a l a u d a e m fronte 13:070ü509'/ a [ fl. 4 0 5 ]

D o s vigários q u e falecem leva d e "lutuosa a m e l h o r p e ç a


q u e fica d o d e f u n t o e t a m b é m até dos "clérigos. M a s
p o u c o s h e r d e i r o s o u testamenteiros lha d ã o . T e v e duas
lutuosas depois q u e c h e g o u a este b i s p a d o , de 100.000
c a d a u m a , q u e e m a m b a s são .. 2 0 0 U 0 0 0

D e p r o c u r a ç õ e s d e c a d a "igreja p a r o q u i a l q u a n d o faz vi-


sita, leva 13.500, visita u m a c o m a r c a e m c a d a a n o , q u e
são 15 igrejas, e s o m a m 202Ü500

De. visita das "capelas d e c a d a c o m a r c a , q u e são 100, a


7.500 d e c a d a u m a , s o m a m 750ÜOOO

D e procurações de oratórios, u m em cada comarca, a


7.500 d e c a d a u m , s o m a m 45ÜO00
D e t o m a r c o n t a às " i r m a n d a d e s , que. serão 100 e m c a d a
"visita, a 4.500 c a d a u m a , s o m a m .450X5000

P o r é m , a g o r a só lhe ficam d u a s c o m a r c a s c o m p o u c a s
i r m a n d a d e s , q u e são M a r i a n a e Vila R i c a , p o r q u e nestas
t o m a o "corregedor contas por u m a "oitava a cada
irmandade.

P e l a a d m i n i s t r a ç ã o do s a c r a m e n t o d a c o n f i r m a ç ã o , e m
q u e todos os fiéis qUe se c r i s m a m d ã o oferta d e "cera, o u
o u r o , de sorte q u e os mais p o b r e s , q u e são os escravos,
d ã o u m a " q u a r t a d e cera, e os mais g e r a l m e n t e m e i a "li-
b r a e muitos u m a libra e bastantes ofertas d e o u r o m u i t o
distinta, e p o r esta r a z ã o e p o r q u e o "bispo t e m especial
c u i d a d o q u e n ã o passe a l g u m c r i s m a d o sem d a r a oferta,
e n c a r r e g a n d o esta obrigação a sua "família e p e l e j a n d o
logo c o m eles n a q u e l e ato se acaso vê q u e passa a l g u m
escravo ou criança sem d a r oferta, e p o r isso e m 15 fre-
guesias q u e visita e m c a d a a n o lhe r e n d e , c a d a u m a ,
200.000, que somam 3:000X5000

Q u a n d o n ã o faz visita, c r i s m a n o seu palácio três vezes


n o a n o , q u e lhe p o d e r e n d e r 300X5000

S o m a t o d a a c o n t a deste rol, salvo erro, o seguinte 18:018X50091/2

N ã o se fala e m estar a r r e n d a d o o "ofício desta C i d a d e


[ M a r i a n a ] p o r q u a t r o mil e q u i n h e n t o s c r u z a d o s , c o m
u m "conto d e réis à vista, o d e V i l a R i c a p o r setecentos e
c i n q ü e n t a , e o u t r o s assím c o m o estes e alguns inferiores,
c o m o p r e t e x t o do s e m i n á r i o , cuja c e r t e z a n ã o t e m
f u n d a m e n t o n e m p o r h o r a se p o d e afirmar.
• 103 <

[Borrão de mapa do rendimento do bispado de Mariana, das


chancelarias que se pagam na câmara e nas comarcas de Vila Rica,
Sabará, Rio das Mortes, Rio Verde, Pitangui e Serro do Frio]

Rascunho incompleto de avaliação detalhada das fontes de


receita do bispado de Mariana. Aparecem relacionados o valor dos
emolumentos cobrados conforme o serviço religioso e o número de
ocorrências, totalizando-se os rendimentos parciais obtidos. Dis-
crimina os valores arrecadados pelas chancelarias, as pensões que
o bispo recebe, os rendimentos das visitas episcopais e diversas
outras atividades geradoras de receita. Este recurso evidencia o
esforço de apresentação de estimativas contábeis. Serviria de base
para a elaboração dos documentos 99, 102 e 108.
O documento parece ser u m a tentativa de consolidação de
dados a ser enviada à C o r o a pelo ouvidor C a e t a n o da Costa
Matoso. Visava, em decorrência de suas atribuições, fornecer
subsídios para responder a solicitação régia de informações so-
bre o rendimento do bispado. O c u p a posição chave n a disputa
entre a jurisdição real e a episcopal, traduzindo o esforço de
controle e vigilância sobre os recursos financeiros da Igreja.
Autoria, l o c a l , data: Caetano da Costa Matoso; Lisboa;
ca,. 1753.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Mar-
cos Magalhães de Aguiar, em estudo sobre as irmandades em
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em torno do controle das confrarias e para
obter dados estatísticos sobre o clero mineiro (Vila Rica dos confrades:
sociabilidade confraria! entre negros e mulatos no século X V I I I .
São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p. 100-
102).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, cursiva, n ã o
regularizada do século X V I I I . Destrógrada, muito imperfeita,
mas evidenciando escrita muito veloz, de traçado evoluído. Des-
tacam-se uso de traço ascendente como ponto de fuga no final de
palavras; " p " em haste dupla, retilíneo, em forquilha, com o mesmo
traçado do "que" em abreviatura. Letra pouco caligrafada, por
se tratar de texto rascunho, mas mantendo os traços que a dife-
r e n c i a m n o Códice, identificada c o m o d e C a e t a n o d a Costa
Matoso. De difícil leitura pela porosidade e fragilidade da base,
permitindo a penetração da tinta n o papel e interferência do
escrito no recto para o verso, e vice-versa. (YDL)
732

[ fl. 406 ] . . . ' p o r se m e o r d e n a r pelo C o n s e l h o do U l t r a m a r n a "frota


p a s s a d a n ã o consentir-se estes "ermitães c o m "provisões
d o "bispo, o q u e t e n h o feito observar, apesar d a g r a n d e
oposição q u e p o r isso m e t ê m feito, q u e m a i s cresce p o r
n ã o s e r e m i m p e d i d o s nas mais c o m a r c a s , o q u e virá b r e -
v e m e n t e t a m b é m a suceder nesta n a falta de q u e m a d e -
f e n d a , e nesse c a s o p a s s a m d e 3 0 0 as ditas p r o v i s õ e s ,
c o m o a c h o agora.

D e provisões p a r a se expor o S e n h o r passam de 600, q u e


neste n ú m e r o , a 1.600 c a d a "chancelaria, i m p o r t a m 960U000

D e "selo, a 9 3 e m e i o , ., ..55U100

D e provisões p a r a c a s a m e n t o s achei serem muitas, p o r -


q u e os filhos d o R e i n o , p o r falta d e interesses p a r a se
r e t i r a r e m p a r a as suas terras, e outros p e l a a b u n d â n c i a
deles e n ã o p r e t e n d e r e m sair destas, se v ã o Casando e
e s t a b e l e c e n d o ; e i g u a l m e n t e os filhos do "país c u i d a m
e m casar d e m u i t o p o u c a i d a d e , e c a s a m t o d o s os q u e
t ê m "casta d a terra é de neófitos, e p o r estas razões achei
informações d e s e r e m m u i t o mais d e 1.000, e até 1.500,
p o r é m r e g u l a n d o , pelo m e n o s é sem dúvida, p a s s a m d e
8 0 0 p o r a n o , q u e neste n u m e r o i m p o r t a m a 1.600 1:280U000

D e selo, a 9 3 ç m e i o 72U800

A c h e i q u e estas provisões , c o m esta c h a n c e l a r i a d e 1.600,


é só p a r a os c a s a m e n t o s q u e são feitos nas matrizes, m a s
n ã o é assim nos q u e são feitos nas "capelas filiais delas,
p o r q u e estas p a g a m d e c h a n c e l a r i a a 2 . 4 0 0 , e das 800
virão a ser estas 5 0 0 , e daí p a r a cima, q u e a u m e n t á n d o -
se nas 500, e m c a d a u m a 8 0 0 , v e m a i m p o r t a r mais 400U000

D e m a n d a d o s d e comissão p a r a se t i r a r e m d e p o i m e n t o s
n o s c a s a m e n t o s , a c h e i excesso g r a n d e , p o r q u e a i n d a a
negros e m u l a t o s forros se passam, p r o c u r a n d o todos, c o m

A cópia inicia-se neste ponto no original, faltando-lhe o trecho inicial.


733

isto, nern ir à p r e s e n ç a dos "ministros eclesiásticos, n e m


fazer m a i o r e s despesas nas g r a n d e s j o r n a d a s , ajustándo-
se a p a g a r duas vezes custas destas justificações, u m a s a
q u e m vai a comissão e outras ao "escrivão do juízo de que
se p a s s a m os m a n d a d o s , e suposto achei b o a informação
q u e p a s s a r i a m d e mil, pela sua multiplicidade; c o n t u d o ,
fazendo rigoroso exame, m e persuadi serem de 600 até700,
q u e a 1.200 nos 6 0 0 i m p o r t a m 720UOOO

D e *selo, a 9 3 e m e i o 55Ü100

Soma 6:430Ü778

6:43015778 [ fl. 406v. ]

A c h e i t a m b é m q u e u m a b o a p a r t e d e todos estes casa-


m e n t o s é feita p o r pessoas do R e i n o e ilhas adjacentes, e
t a m b é m p o r pessoas de o u t r o s bispados deste continen-
te, e a i n d a d a Africa e ilhas a n e x a s . E p a r a estes todos
serem dispensados nos " b a n h o s das suas pátrias, a l é m d a
justificação de solteiros, p a r a q u e t a m b é m se passa m a n -
d a d o s d e c o m i s s ã o , d e p o s i t a m d e c a u ç ã o 3 0 . 0 0 0 "réis
c a d a u m até duas "frotas sendo n o R e i n o e m e n o s t e m p o
à p r o p o r ç ã o das distâncias, e se lhes n ã o chega n o t e m p o
q u e se lhes c o n t i n h a corrente a certidão d e b a n h o s , p e r -
d e m a c a u ç ã o p a r a a "Mitra, e se lhes t o r n a a reformar o
t e m p o fazendo d o b r a d a c a u ç ã o , p e r d e n d o alguns duas e
três, e h a v e r á 20 e mais cauções perdidas e m c a d a a n o ,
c o m p u t a n d o as d o b r a d a s , q u e a 30.000 réis i m p o r t a m 60015000

T a m b é m a c h e i q u e a l é m destes m a n d a d o s d e comissão
p a r a c a s a m e n t o s se p a s s a m outros muitos p a r a justifica-
ções, t a n t o n a falta de certidões d e b a t i s m o c o m o p a r a
defesa d e culpas, i m p e d i m e n t o s d e m a t r i m ô n i o , e m q u e
h á bastantes, p a r a justificar premissas, p a r a dispensas, p a r a
a d v o g a r causas, p a r a o vigário-geral, p a r a justificações e
requisitórios d e " o r d i n a n d o s , q u e h á tal q u e se lhes p a s -
s a m 5 e 6 p a r a diversas partes, e todas pelo m e n o s farão
o n ú m e r o seguro de 4 0 0 , q u e a 1.200 i m p o r t a m 48OU0O0
734

D e cartas d e e x c o m u n h ã o ^ q u e serão a o m e n o s 60, a c h a n -


do b o a i n f o r m a ç ã o d e s e r e m até 100, q u e a 2 . 4 0 0 d e
"chancelaria importam 144U000

D e "selo, a 9 3 e m e i o , , 5Ü510

D e m a n d a d o s d e absolvição, q u e serão 60, a 1.200 72UOOO

D e selo, a 9 3 e m e i o 5U610

D e m a n d a d o s d e absolvição p a r a os declarados q u e faltam


a o p r e c e i t o d a Q u a r e s m a serão 100, p o r q u e a i n d a q u e se-
j a m mais os declarados, c o m o fogem e se r e t i r a m p a r a ou-
tros "países e n ã o t ê m domicílio certo, n ã o c u i d a m e m
absolver-se n e m tirar m a n d a d o s p a r a isso, q u e nos 100 a
1.200 i m p o r t a m 120U000

D e selo, a 9 3 e m e i o 9U350

D e "provisões p a r a "mestres d e capela, q u e são 6, a 4.500 27UOOO

D e selo, a 9 3 e m e i o * U551

A c h e i q u e estes mestres de capela levam d e c a d a licença


que d ã o aos músicos p a r a qualquer festividade duas oitavas
de missa cantada, de "Vésperas u m a oitava e de S e m a n a
Santa oito oitavas, sem e m b a r g o d e se ter proibido este ex-
cesso p o r ordens antigas e se ter p o r vezes julgado no juízo

Soma 7:894Ü799

[fl. 407 ] 7:89413799

d a C o r o a d a R e l a ç ã o d a B a h i a , e n ã o ser esta a f o r m a
p o r q u e o C o n c í l i o T r í d e n t i n o m a n d a q u e os "bispos
e v i t e m se c a n t e m n a s igrejas p a p é i s p r o f a n o s p o r q u e
a q u i , e m se p a g a n d o a " e s p ó r t u l a , n a d a m a i s se e x a -
m i n a e p o d e m os m ú s i c o s c a n t a r os p a p é i s e solfa q u e
lhes p a r e c e r .
735

D e "provisões p a r a confessar e p r e g a r se n ã o p a g a " c h a n -


celaria, m a s s o m e n t e "selo e feitio, e sendo os de confes-
sar p e l o m e n o s 6 0 0 , são as d e p r e g a r t a m b é m ao m e n o s
60, que a 93 e meio cada u m a 61U710

As c h a n c e l a r i a s dos papéis dos " o r d i n a n d o s v ã o incluí-


das nos m a n d a d o s d e comissão, m a s é tal o excesso q u e
p a d e c e m os o r d i n a n d o s q u e houve pessoa curiosa e p r u -
dente que observou nas " T ê m p o r a s passadas que 25
o r d i n a n d o s l a r g a r a m n a C â m a r a Eclesiástica o m e l h o r
d e dez mil "cruzados, repartidos e m chancelarias e selos,
"provisor e "escrivão d a C â m a r a , "porteiro, " m e s t r e de
cerimônias e m e s t r e de c a n t o c h ã o , p a s s a n d o a t a n t o q u e
até se m a n d o u q u e todos fizessem a " c o r o a c o m b a r b e i r o
d o "bispo p a r a ficarem mais b e m b a r b e a d o s , p r a t i c a n -
do-se nesta ocasião c o n t a r e m - s e os autos q u e se fizeram
p o r comissários c o m o se fossem feitos pelos oficiais q u e
e x p e d i r a m as o r d e n s , e d a m e s m a f o r m a c o n t a n d o p a r a
si os m e s m o s dias e c a m i n h o s q u e nas diligências gasta-
r a m os ditos comissários, v i n d o assim a serem c o m p l e -
t a m e n t e pagos d u a s vezes 7:956U509

* P e n s õ e s q u e se p e r c e b e m d o s * ofícios e m c a d a u m a n o

Ofício d e "escrivão d a C â m a r a eclesiástica , ...... ...800Ü000


[Oficio de] escrivão d o ^auditório d a C i d a d e M a r i a n a 1 -.800Ü000
[Ofício de] escrivão do auditório d e Vila R i c a 750ÜOOO
[Oficio de] escrivão do auditório d e S a b a r á 750Ü000
[Ofício de] escrivão d o auditório d o R i o das M o r t e s ... 400Ü000
[Oficio de] escrivão do auditório do S e r r o d o Frio 400ÜOOO
[Oficio de] escrivão do auditório de Pitangui 80Ü000
[Ofício de] escrivão do auditório d e R i o V e r d e ..50Ü000
[Ofício] d e " m e i r i n h o - g e r a l 200ÜOOO
[Ofício] d e escrivão d o meirinho-geral 100Ü000
[Oficio] de m e i r i n h o de Vila R i c a 250UOOO
100U000
[Ofício] de m e i r i n h o do S a b a r á *
100ÜOOO
[Ofício] d e m e i r i n h o d o R i o das M o r t e s
..50ÜOO0
[Oficio] de m e i r i n h o do S e r r o Frio

Soma 13:806Ü509

13:806Ü509 [ fl. 407v. ]


" M e i r i n h o de Pitangui, m e i r i n h o de R i o V e r d e e escrivães
çle todos estes meirinhos, c o m o são "ofícios mais t ê n u e s ,
n ã o p u d e descobrir q u e "pensões p a g a v a m , suposto n ã o
h a v e r a l g u m q u e deixe d e p a g a r p o u c o o u m u i t o e d e
todos eles se tira "provisão a n u a l , q u e , a 4.500 réis c a d a
u m a , e m 8 escrivães d a " b a n c a , 7 m e i r i n h o s e 7 escrivães 11

deles faz a s o m a d e 99X5000


D e "selo, a 9 3 e m e i o 2X5057
D e m e i r i n h o d o c a m p o e seu escrivão, ' "corretor d e fo-
1

lhas e "fiel d a C â m a r a , ofícios criados d e n o v o p e l o bis-


p o a t u a l , n ã o p u d e p e r c e b e r c o m v e r d a d e se p a g a v a m
p e n s õ e s , asseverando uns q u e sim e outros que n ã o , p o r é m
é certo que tiram provisões anuais, q u e , a 4.500 c a d a u m a
d e "chancelaria, i m p o r t a m 18X5000
D e selo, a 9 3 e m e i o X5374
D e "monitorios p a r a c o b r a n ç a s de "párocos e "capelães,
q u e serão pelo m e n o s 30 p o r ano, a 1.200 de chancelaria
cada um, importam 36X5000
D e selo, a 9 3 e m e i o .. 2X5805
D e sentenças d e foro contencioso, que ao m e n o s serão 100
e m c a d a a n o , a 1.200 120X5000
D e selo, a 9 3 e m e i o ...9X5350
D e " m e s t r e s d e c a p e l a e m 6, a 4 8 . 0 0 0 réis d e p e n s ã o
cada um 288X5000
Estes são os r e n d i m e n t o s certos, e m c a d a a n o , q u e se
t i r a m neste b i s p a d o , q u e i m p o r t a m pelo m e n o s era 14:382X5095
D e p e n s ã o d o ofício de " c o n t a d o r d a C i d a d e 160X5000
E d e provisão e selo 4Ü593H
Soma „ ...„.,..„.„ ................. 14:546ü688 /2
1

R e n d i m e n t o s incertos p a r a a c o m p u t a ç ã o anual.

D e p r o v i s ã o d e "vigário-geral 12X5000
D e "provisor , 12X5000
D e "arcediago 19X5000

a. Já ficam supra contadas as provisões de 7 escrivães e 7 meirinhos.


b. Já ficam supra contadas as suas provisões.
D a s três "dignidades d a sé, a 12.000 réis 36Ü000
D e cada "cónego 7U200
D e c a d a *capelão ~ 4U500
D e sacristão-mor 4Ü500
D a s instituições de c a d a vigário 24U000
D e " m o ç o s do coro ........... 1U600
De cada "promotor 4U500
D e "cartas d e participantes 2U400
D e e r e ç ã o d e c a d a capela 1 2U000

R e n d i m e n t o d a *visita q u e se faz t o d o s os a n o s
e m m a i s o u m e n o s igrejas d o b i s p a d o

D e visita d e c a d a "igreja paroquial, assistindo os p a . . . 2

• 104 <

[Minuta de parecer do ouvidor da comarca de Vila Rica Caetano


da Costa Matoso sobre rendimentos do bispado de Mariana]

Resposta de Caetano da Costa Matoso a solicitação régia de


informações sobre rendimentos do bispado de Mariana. O c u p a
posição c h á v e n a disputa entre a jurisdição real e a episcopal, tra-
duzindo o esforço de controle e vigilância sobre os recursos finan-
ceiros da Igreja.
Discorre sobre as práticas adotadas pela administração do
bispado e combina avaliação dos rendimentos com narrativa
confessional a respeito dos conflitos com o bispo e dos problemas
que passou no exercício do lugar de ouvidor em Vila Rica. Assu-
me caráter de grave denúncia dos excessos praticados pela ad-
ministração eclesiástica n a capitania. Foi elaborado e m Portu-
gal, após o afastamento de C a e t a n o da Costa Matoso de seu

Cópia interrompida no original.


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posto em Vila Rica, p r o v a v e l m e n t e c o m o peça e m sua


defesa.
Autoria, l o c a l , data: Caetano da Costa Matoso;
Lisboa; ca. 1753.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Mar-
cos Magalhães de Aguiar, em estudo sobre as irmandades e m
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em t o m o do controle das confrarias. O teste-
m u n h o direto do ouvidor denunciando excessos praticados pelo
bispo colabora para ilustrar aspectos críticos da conduta do bis-
po em defesa da jurisdição eclesiástica {Vila Rica dos confrades: so-
ciabilidade confrarial entre negros e mulatos n o século XVIII.
São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p . 1 5 8 -
159). N o mesmo sentido segue íris K a n t o r e m análise sobre as
instâncias realizadoras das festas em Minas ao dedicar-se à pres-
são por que passa a Igreja e o bispado e a valorizar algumas das
denúncias contidas neste documento contra as práticas adotadas
pelo bispo n a tentativa de defender a jurisdição episcopal das
irmandades [Pacto Festivo;em Minas Colonial: a entrada triunfal do
primeiro bispo na Sé de Mariana. São Paulo: Universidade de
São Paulo, F F L C H , 1996. p. 126-127).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento, n a primeira pes-
soa do singular, constitui u m a espécie d e histórico sobre o
bispo, através de tópicas de vituperação q u e o caracterizam
c o m o t i r a n o ( p o r t a n t o , g a n a n c i o s o , d e s o n e s t o , desordeiro).
E m c o n t r a p o s i ç ã o , o n a r r a d o r se c a r a c t e r i z a c o m o p r o b o ,
isento e independente, elogiando suas próprias virtudes. E m
algumas passagens ocorre a aplicação d a tópica dos "exces-
sos", d a desonestidade, d a violência e d a ganância c o m o re-
curso de vituperação da p e r s o n a g e m tirânica do bispo. (JPF).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , cursiva,
n ã o r e g u l a r i z a d a do século X V I I I . D e s t r ó g r a d a , m u i t o im-
perfeita, m a s e v i d e n c i a n d o escrita m u i t o veloz, de t r a ç a d o
evoluído. Destacam-se: uso de traço ascendente como p o n t o
de fuga n o final de palavras; " p " em haste dupla, retilíneo,
em forquilha, c o m o m e s m o t r a ç a d o do " q u e " e m abreviatu-
ra. Letra p o u c o caligrafada, p o r se tratar d e texto r a s c u n h o ,
m a s m a n t e n d o os t r a ç o s q u e a d i f e r e n c i a m n o Códice,
identificada c o m o de C a e t a n o d a C o s t a M a t o s o . D e difícil
leitura pela porosidade e fragilidade d a base, p e r m i t i n d o a
p e n e t r a ç ã o da tinta no papel e interferência do escrito no recto
p a r a o verso, e vice-versa. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Considerando-se. o caráter de ras-
cunho deste texto, as rasuras foram recuperadas e apresenta-
das tachadas; foram mantidas ás indicações de colações e deslo-
camentos.
739

F oi Vossa Majestade servido o r d e n a r - m e , p e l a "provisão j u n t a , q u e fazendo


a melhor averiguação que pudesse sobre o rendimento do bispado de
M a r i a n a , à vista d o m a p a t a m b é m j u n t o dos r e n d i m e n t o s , informasse se
c o m o dito r e n d i m e n t o se p o d i a o m e s m o "bispo sustentar d e c e n t e m e n t e , e t a m -
[ fl. 4 0 8 ]

b é m averiguasse se nele se t i n h a m c r i a d o os "oficios d e " m e i r i n h o e "escrivão.do


c a m p o e escrivães d o registro nas comarcas, e se é certo proibir o b i s p o se eríjam
"confrarias sem a u t o r i d a d e sua, e m a n d a se n ã o a d m i t a m as seculares.
L o g o q u e m e foi e n t r e g u e esta o r d e m cuidei n a execução dela c o m t o d a a q u e l a
averiguação q u e se m e r e c o m e n d a v a e p e d i a a m a t é r i a , e m q u e t a m b é m ia interessa-
do a q u e l e zelo c o m q u e p r o c u r o satisfazer as diligências q u e m e são cometidas, e
suposto e u tinha u m b o m c o n h e c i m e n t o d o g r a n d e r e n d i m e n t o d a q u e l e b i s p a d o n ã o
fiado nele p r o c u r e i e x a m i n a r p o r diversas partes e pessoas q u e t i n h a m b o a inteligên-
cia d a m a t é r i a e lhes passava pelas m ã o s , a p u r a n d o c a d a u m a das parcelas do m a p a
q u e se m e remetia, e p o r ele fiz o q u e d e n t r o r e m e t o c o m esta, a u m e n t a n d o e d i m i n u -
i n d o à p r o p o r ç ã o do q u e achei e ia e r r a d o n o dito m a p a .
E s t a n d o feito este e x a m e e r e s e r v a n d o o d a r c o m ele c o n t a n a "frota p r ó x i -
m a , sucedeu ser c h a m a d o injustamente d a R e l a ç ã o d a B a h i a sobre a d ú v i d a d e ter
o u n ã o c u m p r i d o u m a s e n t e n ç a d a q u e l a M e s a , e d e p o i s disso se m e s e g u i r e m
alguns mais t r a b a l h o s p r o v i d o s pelos inimigos q u e n a q u e l a s terras e a i n d a n e s t a
g r ã g o z a só a m i n h a m u i t a isenção e i n d e p e n d ê n c i a , virtudes d e s c o n h e c i d a s n a -
quele "país. E c o m o até a g o r a foi este o m o t i v o d e n ã o ter i n f o r m a d o , a g o r a ,
a i n d a q u e n ã o livre de oposições, p o n h o n a p r e s e n ç a d e V o s s a M a j e s t a d e t o d a a
diligência q u e nesta p a r t e fiz a i n d a e m t e m p o q u e exercia o m e u lugar p a r a m a n -
d a r usar dela c o m o for servido.
O dito m a p a q u e d e n t r o vai j u n t o é feito c o m toda a p r o p o r ç ã o n o s r e n d i -
m e n t o s das parcelas e e m todas elas s e m p r e e m dúvida o pus n a m e n o r p a r t e , d e
tal sorte q u e , n o m e u j u í z o , ficaram sendo indefectíveis todas aquelas p a r c e l a s , e
s e m e m b a r g o de q u e de m u i t a s eu n ã o p o d e r i a d a r provas; c o n t u d o , d o s u m á r i o
q u e t a m b é m vai j u n t o , q u e fiz estando e m "correição n a q u e l a C i d a d e , se p r o v a
u m a b o a p a r t e d o r e n d i m e n t o d a q u e l e b i s p a d o e os excessos q u e nele h á , e m
t u d o f a z e n d o o b i s p o n ã o só o q u e lhe p a r e c e m a s m a n d a n d o e p e r m i t i n d o aos
seus "oficiais inferiores f a ç a m t a n t a d e s o r d e m , sobre q u e grita s e m r e m é d i o u m
p o v o aflito, c o m o t u d o consta do m e s m o sumário.
N ã o se cuidava, n a v e r d a d e , e m o u t r a coisa mais q u e n a f o r m a p o r q u e se h á
de fazer r e n d o s o a q u e l e b i s p a d o , seja q u a l for [o] m e i o , t e n d o p a r a isso "ministros
q u e c o n c o r r a m e c o n d e s c e n d a m nesta p a r t e c o m a v o n t a d e d o bispo, e p o r q u e o
" a r c i p r e s t e "F*,* q u e servia d e e n t ã o d e "vigário-geral e " p r o v i s o r , l h e a r g ü í a
muitos destes excessos e n ã o consentia se praticassem n a p a r t e q u e lhe tocava.

Geraldojosé de Abranches.
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N ã o se cuidava, n a verdade, e m outra coisa mais que n a forma por que se havia
fazer rendoso aquele bispado, ainda q u e fosse Üegítimo o meio, e p a r a isto concorri-
a m todos os que pretendiam viver no agrado do *bispo, sendo esta ;a razão p o r que
desgostava do seu "arcediago *F., q u e servia de "vigário-geral e "provisor, o n ã o
concorrer este, p o r n i m i a m e n t e escrupuloso, p a r a a q u e l e s excessos. E t a n t o q u e
a c h e i q u e n ã o só o n ã o p r a t i c a v a de *per se os m e s m o s excessos, restituindo muitas
p a r c e l a s q u e i n d e v i d a m e n t e lhe foram contadas, c o m o e m parte consta d o m e s m o
s u m á r i o , e u s a n d o e m papéis daquelas caridades c o m os p o b r e s que n ã o usava o
b i s p o , m a s i m p e d i a q u e os seus "oficiais c o m e t e s s e m os m e s m o s excessos q u e
p r a t i c a v a m os outros, e m e n d a n d o t a m b é m e m si n ã o só o q u e levava nas conclu-
sões dos autos c o n t r a o "regimento secular depois q u e veio n o c o n h e c i m e n t o d a
p r á t i c a dele m a s a i n d a o r e c e b e r os salários e m o u r o " q u i n t a d o depois q u e foi
[fl. 408v. ] a d v e r t i d o / / e c o n h e c e u este excesso. E p o r estas e o u t r a s a ç õ e s , o u ç o q u e o
bispo s u s p e n d e r a - o do dito c a r g o , o q u e s e m p r e profetizei, vivendo c o n t r a a for-
m a e m q u e viviam os q u e mais q u e r i a m lisonjear o bispo q u e o o l h a r p a r a as suas
consciências.

Este r e n d i m e n t o - d e s t e bispad o e exeessivu e u, í. iiau e m e n u i o cxi^ca-

so de *pensõcs em *üficius c o m que certamentc-irão p o d e m , o q u e cede em nota»


vel d e t r i m e n t o d a j u s t i ç a c a o u t i a s muitas mais diversidade c o m q u e s e - p r o e u r a m
d i n h e i r o s p r e t e x t a d o s s e m a p a r e c e r o fim p a r a cessar- o e s c â n d a l o , necessitando
t u d o de u m a r e f o r m a geral t proporçionaiido-se o rendimenLo dos p a p é i s p e l o
q u e for j u s t o e extinguindo-se a r e p e t i ç ã o d e ^provisões e t u d o o q u e p a r e c e r
escusado p a r a evitar desordens c d e t i i i i i c n t o [às] partes.
T o d o este i c n d i m e n t o é mais que excessivo p a r a q u a l q u e r bispo q u e se ti"ata
c o m a d e c ê n c i a devida a seu caráter c m u i t o mais p a r a u bispo atual, pois indecen-
t e m e n t e vive i TaO 50 lio t r a t o d e m a s i a d a m e n t e ecuiiuiiiinj dt* sua pessoa e" da sua
*fauiiha m a s a i n d a n o trato extcriui, p a r a c o m e i v a ç ã o do r c s p e k u du seu lugar,;
q u e d e n e n h u m a forma concilia.
Este r e n d i m e n t o t o m a d o pelo t o d o é n o t a v e l m e n t e excessivo e t o m a d o p o r
c a d a u m a das parcelas n ã o só é excessivo m a s violento e carece d e u m a p r o n t a
r e f o r m a p a r a evitar tantas c o n s e q ü ê n c i a s perniciosas a o p ú b l i c o e a d m i n i s t r a ç ã o
d a J u s t i ç a , e p r o p o r c i o n a n d o - s e naquelas partes e m q u e deve existir e extinguin-
do-se i n t e i r a m e n t e a repetição de provisões e t u d o o q u e p a r e c e r escusado, pelo
q u e s e m u m a especial providência n ã o só c o n t i n u a r ã o os excessos que c l a r a m e n t e
c o n s t a m d o s u m á r i o m a s se p r a t i c a r ã o o u t r o s n o v o s , p o r q u e n a q u e l a C i d a d e
[ M a r i a n a ] e b i s p a d o se n ã o cuida e m outra coisa mais q u e extorsões semelhantes
e n a d a n o b e m espiritual dos súditos, p a s s a n d o a t a n t o o seu excesso q u e até faz
c o b r a r q u i n t a d o e do sumário etc.
O p r o v i m e n t o dos ofícios, parece, -devia Vossa Majestade, eoniu g i ã u - m c s t r c
d a O r d e m de Cristo, luinar a si o p r o v i m e n t o ou a o m e n o s fazei-llie tiiai as *pctv
sõcs;-por evitar os-gi andes í o u b o s q u e nele se fazem, p a r a se p o d e r e m - a l i v i a r ' o s
741

q u e os servem, a l é m tio p a g a m e n t o das—pensões, p o i q u e &ãu Lao excessivas q u e


só f u r t a n d o c a d a u m d d e s deixará d e t r a b a l h a r p a r a u *bispo. 2 S o b r e a g r a n d e
c o b r a n ç a q u e u bispo tem-feito c o m u ululo d e ' s m i i n á r i o ^ - n a u só *per se m a s p o r
c a r t a s , c o m o s e v ê d a q u e vai j u n t a , e outros mais m o d o s violentos, deve t a m b é m
dar-se p r o v i d ê n c i a , p o r q u e estes- dinheiros os m e t e e m si e se faz e s c a n d a l o s o - n ã o
t e r d a d o p r i n c í p i o à q u e l a - o b r a p a i a iirustrar-os-apiicou, c m u i t o m a i s d a n d o - a
j u r o s os ditos d i n h c i i o i e, p e l a fornia q u e consta, d o s u m á r i u , fazenda t a m b é m q u e
se a b s t e n h a d a pensão p a r a a " i r m a n d a d e de São Pedro q u e faz p a g a r aus M é r i g o s ,
d e i x a n d o que-cada u n i delcj. seja devoto de São P e d r o , se lhe p a r e c e r .
1 E p r i n c i p a l m e n t e q u a n d o este r e n d i m e n t o n ã o só s u p e r a b u n d a p a r a sus-
t e n t a ç ã o d e o u t r o q u a l q u e r bispo q u e se tratasse c o m aquela d e c ê n c i a d e v i d a a o
s a g r a d o d a sua pessoa e repartisse caritativamente c o m os p o b r e s d o seu "bispado
o m e s m o r e n d i m e n t o m a s m u i t o mais para, u m bispo q u e i n t e i r a m e n t e recolhe e m
si t o d o o dito r e n d i m e n t o , faltando ao seu estado e d a sua "família, c o m q u e m
p r a t i c a u m a e c o n o m i a n ã o vulgar e estranhável, d e i x a n d o d e se c o m p a d e c e r dos
p o b r e s , dizendo n ã o ter obrigação d e lhes d a r esmola p o r ser bispo d e " c ô n g r u a ,
e o q u e m a i s é q u e , p o r n ã o p e r d o a r a n e n h u m deles as " e s p ó r t u l a s q u e l h e
t o c a m , d e i x a m muitos q u e vivem c o m vida escandalosa de se "receber e tirar-se
d e l a p o r n ã o t e r e m c o m q u e o fazer, c o m o m e confessaram alguns vigários, além
d e outras faltas de c a r i d a d e q u e h o r r o r i z a m e n ã o e x p o n h o p o r n ã o ser difuso.
1 P a s s a n d o a t a n t o o s e u excesso q u e n ã o só c o b r a c o m " q u i n t o s t o d o o
r e n d i m e n t o d o seu b i s p a d o , c o n t r a o q u e se p r a t i c a n o secular, f a z e n d o q u e os
m a i s "oficiais e súditos assim o c o b r e m , o q u e até se p r a t i c a n a s " c o n h e c e n ç a s ,
c o m o consta do o u t r o s u m á r i o , m a s t a m b é m o r d e n a n d o pelo ...2
E achei q u e n ã o só criou os "ofícios d e " m e i r i n h o e "escrivão do c a m p o m a s [ fl. 4 0 9 ]
t a m b é m os ofícios d e " c o r r e t o r e "fiel d a C â m a r a , e n o m e u t e m p o quis c r i a r
" p o r t e i r o s nos seus " a u d i t ó r i o s , o q u e l h e i m p e d i n a m i n h a c o m a r c a , e n ã o só
estes se d e v e m extinguir m a s a i n d a os dos registros, permitindo-se-lhe só o regis-
tro d a C i d a d e p a r a os papéis precisos, e n ã o todos, d e q u e se p a g a r ã o pela "rasa,
e assim t o d o s os m a i s q u e n ã o só ele m a s seus antecessores f o r a m c r i a n d o s e m
licença e a u t o r i d a d e d e Vossa Majestade, sem o qual o n ã o p o d i a m fazer e m e n o s
este q u a n d o criava a q u e l e b i s p a d o .
A l é m disso, eu m e p e r s u a d o ser t a m b é m d a r e g a l i a d e V o s s a M a j e s t a d e ,
c o m o "grão-mestre, o p r o v i m e n t o deles, e neste caso seria m e l h o r o m a n d a r fazê-
lo, p o r evitar t a n t a d e s o r d e m , ou a o m è n p s fazer extinguir-lhe as p e n s õ e s c o m q u e
n ã o p o d e m , e só furtando c a d a u m deles deixará d e t r a b a l h a r p a r a o bispo, e t u d o
isto c e d e e m grave d e t r i m e n t o d a "república e d a J u s t i ç a . S o b r e 2.
Pelo q u e respeita à ereção de i r m a n d a d e s , cuidei e m tirar d e u m livro dos seus
p r o v i m e n t o s e m u m a freguesia [incompleto]
2 ...pelo edital j u n t o se observasse o r e g i m e n t o secular, d e n e n h u m a f o r m a o fez
p r a t i c a r n a s u a C â m a r a eclesiástica, d o n d e s a e m todos os excessos expostos, de-
742

v e n d o reformar-se p r i m e i r o a si, p a r a os mais o f a z e r e m à s u a i m i t a ç ã o , e n ã o


desta forma, c o m o t a m b é m o p r a t i c o u c o m todos os vigários d o seu b i s p a d o , a
q u e m , i n d e v i d a m e n t e e sem j u s t a causa e m m u i t a p a r t e , d i m i n u i u p o r u m "regi-
m e n t o os seus e m o l u m e n t o s , n ã o d i m i n u i n d o n e n h u m dos seus, q u e e r a o q u e
devia fazer p o r s e r e m os m a i s excessivos, e sendo esta a m a i o r causa p o r q u ê todos
eles c l a m a v a m , e c o m justiça.
Pelo q u e respeita à ereção d e " i r m a n d a d e s e t o m a r delas contas, é excesso o
q u e pratica, p o r q u e e m todas as c o m a r c a s d e q u e m e informei é raríssima a d e q u e
se t o m a m p e l o j u í z o secular., q u a n d o pelas d a c o m a r c a e m q u e servi a c h e i q u e
t o d a s são s e c u l a r e s e q u e as q u e t ê m " p r o v i s ã o eclesiástica lhes a d v e i o m u i t o
posteriormente ao ato da ereção e a tempo que j á conservavam a natureza de
seculares, q u e se lhes n ã o p o d i a m u d a r , b a s t a n d o serem vistas c o m provisão p a r a
s e r e m j u l g a d a s eclesiásticas. E c o m o m e u p r e d e c e s s o r , C a e t a n o F u r t a d o , foi o
p r i m e i r o q u e t o m o u contas de algumas destas, eu, e x a m i n a n d o - a s todas, foi raríssima
a q u e achei e m q u e interviesse a a u t o r i d a d e eclesiástica antes d a s u a ereção ou no
ato d e l a p a r a ficarem n a f o r m a de direito desta n a t u r e z a . E p o r isso p r a t i c a n d o
c o m o bispo o c e d e r delas, c o m o n ã o esteve p o r isso¿ obriguei aos "irmãos a q u e
dessem contas p e r a n t e m i m , e p r i n c i p a l m e n t e e m t o d o o " t e r m o d a C i d a d e M a r i a n a ,
e m q u e n ã o h a v i a só q u e se n ã o tomasse c o n t a s p e l o eclesiástico, s e n d o q u a s e
todas seculares, p o r q u e depois q u e as erigiam é q u e m a n d a v a m b u s c a r provisões
d e e r e ç ã o a o R i o d e J a n e i r o , o n d e residia o "bispo, e lhes c h e g a v a m t a r d e , e n ã o
havia t e m p o d e prescrição.

O privar o bispo desta e outras jurisdições e regalias c o m q u e p r e t e n d i a esta-


b e l e c e r o seu n o v o b i s p a d o sobre a j u r i s d i ç ã o secular d e u c a u s a a c o n ñ r m a r o
capítulo de "visita de seu antecessor e o r d e n a r o q u e se vê. das cópias, q u e v ã o n o
fim d o novo m a p a . E t a m b é m deu a p r i m e i r a causa a m e n o s afeição c o m q u e era
visto e c o m q u e se estimou a m i n h a retirada.
F i n a l m e n t e , c o m aquela ingenuidade c o m q u e p r o c u r o c h e g a r e se deve ir à
p r e s e n ç a de Vossa Majestade, sou o b r i g a d o a dizer q u e aquele b i s p a d o necessita
[ fl. 409 v. ] / / d e u m a cuidadosa e p r o n t a reforma, acudindo-se a tanta d e s o r d e m q u a n t o p a -
d e c e m os m o r a d o r e s d a q u e l a c a p i t a n i a , evitando-se assim os e s c â n d a l o s q u e se
o r i g i n a m d e matérias temporais e os maiores nas espirituais, pois n a v e r d a d e t u d o
passou a pior estado do q u e estava antes d e h a v e r bispo e governava o çlo R i o de
J a n e i r o , fazendo hoje c a d a u m o que lhe p a r e c e , a troco d e p o d e r cobrir c o m inte-
resses os seus delitos, servindo as visitas d e interessar à "família do bispo e n a d a
m a i s , p o r q u e c o m o é d e fácil p e r s u a s ã o t u d o se a c a b a e m " " c o n s i g n e " e m u i t a s
vezes c o m a c a p a d a virtude, à vista do q u e Vossa Majestade m a n d a r á o que for
servido.,.2

Cópia interrompida no original.


• 105 -

[Borrão de mapa do rendimento do bispado de Mariana,


das chancelarias que se pagam na Câmara e nas comarcas
de Vila Rica, Sabará, Rio das Mortes, Rio Verde,
Pitangui e Serro do Frio]

Rascunho de avaliação detalhada das fontes de receita do


b i s p a d o d e M a r i a n a , A p a r e c e m r e l a c i o n a d o s o v a l o r dos
emolumentos cobrados conforme o serviço religioso e o número
de ocorrências, totalizando-se os rendimentos parciais obtidos.
Discrimina os valores arrecadados pelas chancelarias, as pensões
que o bispo recebe, os rendimentos das visitas episcopais e diversas
outras atividades geradoras de receita. Este recurso evidencia o
esforço de apresentação de estimativas contábeis. Serviria de base
para a elaboração dos documentos 99, 102 e 108.
O documento parece ser u m a tentativa de consolidação de
dados a ser enviada à Coroa pelo ouvidor Caetano da Costa Matoso.
Visava, em decorrência de suas atribuições, fornecer subsídios para
responder a solicitação régia de informações sobre o rendimento
do bispado. O c u p a posição chave na disputa entre a jurisdição
real e a episcopal, traduzindo o esforço de controle e vigilância
sobre os recursos financeiros da Igreja.
Autoria, l o c a l , data: Caetano da Costa Matoso; Mariana;
ca. 1752.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Mar-
cos Magalhães de Aguiar, em estudo sobre as irmandades em
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em torno do controle das confrarias e para
obter dados estatísticos sobre o clero mineiro {Vila Rica dos confrades:
sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século X V I I I .
São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p. 100-
102).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva, não
regularizada do século XVIII. Destrógrada, muito imperfeita, mas
evidenciando escrita muito veloz, de traçado evoluído. Destacam-
se: uso de traço ascendente como ponto de fuga n o final de pala-
vras; " p " em haste dupla, retilíneo, e m forquilha, com o mesmo
traçado do "que" em abreviatura. Letra pouco caligrafada, por se
tratar de texto rascunho, mas m a n t e n d o os traços que a diferenci-
am no Códice, identificada como de Caetano da Costa Matoso.
D e difícil leitura pela porosidade e fragilidade da base, permirin-
744

do a penetração da tinta no papel e interferência do escrito no


recto para o verso, e vice-versa. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Considerando-se o caráter de rascu-
nho deste texto, foi m a n t i d a a indicação de deslocamento de
texto. As rasuras foram suprimidas, exceto trecho sem retifica-
ções posteriores, apresentado tachado. A fim de manter a unifor-
midade, foi acrescido o caldeirão em algumas cifras d a coluna
de valores monetários.

[ fl. 4 1 0 ] D e "provisões p a r a u s a r d e o r d e n s , m a i s d e setecentos


"clérigos, c o m b e m p o u c a diferença, a 1.200 "réis c a d a
uma........ 960U000

A c h e i q u e t o d o s t i r a m provisões a n u a l m e n t e p a r a u s a -
r e m d e suas o r d e n s , a i n d a s e n d o filhos deste b i s p a d o e
nele o r d e n a d o s , c o n t r a o q u e se p r a t i c a n o a r c e b i s p a d o
d a B a h i a e mais bispados "sufragâneos, c o m o t a m b é m se
p r a t i c a v a neste antes de dividido do do R i o d e J a n e i r o .

Achei t a m b é m q u e sempre foi costume neste bispado antes


da dita divisão pagar-se de cada provisão de usar de ordens
p a r a o b i s p o 3 2 0 , a u m e n t a n d o - s e neste n o v o b i s p a d o a
"chancelaria a 1.200, feitio 466 e "selo (que t a m b é m é para
o "bispo) 93 e meio, q u e , e m 800 provisões, im-
portam , 74Ü800

Praticando-se t a m b é m u m a lamentável d e s o r d e m d e obri-


gar, p o r o r d e m d o bispo, a c a d a u m destes clérigos, q u a n -
d o t i r a m e r e f o r m a m estas provisões, a q u e p a g u e p a r a
u m a " i r m a n d a d e de S ã o P e d r o duas "oitavas e m e i a d e
entrada e u m a de anual, n ã o se lhe entregando as suas provi-
sões n e m d e i x a n d o - s e u s a r das suas o r d e n s sem satisfa-
z e r e m esta "espórtula violenta a todos, e se a l g u m diz
missa fora do t e m p o d a provisão é d e n u n c i a d o e suspenso.

D e provisões escusadas d e "capelães d e "capelas filiais,


a c h e i serem mais de q u a t r o c e n t a s e m t o d o o b i s p a d o , e
delas se leva chancelaria 1.600, feitio 640, selo 9 3 e m e i o ,
e, feita a conta, as c h a n c e l a r i a s d e q u a t r o c e n t a s i m p o r -
tam , , 640U000

E os selos delas .. 37Ü400


745

D e "provisões p a r a "coadjutores d e " p a r ó q u i a s d o t e m -


p o do "bispo p a s s a d o , 3.750, q u e são 38 até a o presen-
te, d e q u e até a o a n o passado se levava as cinco "oitavas
d e q u e se faz m e n ç ã o , q u e são 7.500. A g o r a n ã o sei c o m
q u e p r e t e x t o se leva só 5.700 de "chancelaria, q u e v e m a
importar todas 216U600

E d o "selo delas, a 9 3 e m e i o 36Ü393

D e provisões d e "capelães de "irmandades sitas e m p a r ó -


quias e "capelas, q u e achei serem d e duzentas p a r a cima, a
1.600 d e c h a n c e l a r i a , 90QÜT0O0

E do selo delas, a 93 e meio 3GU100

D e provisões p a r a sacristãos das "igrejas paroquiais e ca-


p e l a s , q u e são p o u c o m a i s d e sessenta (e n ã o c e m ) , a
1.600 d e c h a n c e l a r i a , 96Ü000

E do selo delas, a 9 3 e meio 5CJ610

D e provisões p a r a "fabriqueiros, trinta {e n ã o 48), a 1.600 48UOO0

E do selo delas, a 9 3 e m e i o 2U805

E nesta p a r t e t a m b é m achei q u e m u i t a s vezes n a m e s m a


provisão de n o m e a ç ã o de sacristão vai incluída a de
fabriqueiro, e neste caso p a g a d e chancelaria 4.500.

D e provisões p a r a vigários d a v a r a seis, a 4 . 5 0 0 (e n ã o


1.600} 27Ü000

E do selo, a 9 3 e m e i o U561

A c h e i q u e estas provisões n ã o são a n u a i s m a s , sim, di-


zem q u e e q u a n t o se n ã o m a n d a o contrário, e p o r via d e
r e g r a n ã o d u r a m u i t o t e m p o q u e se n ã o m a n d e .

D e provisões p a r a p i u m o t o r e s ~ ( p o s t u q u e n ã o v e n h a m
t

n o extrato j u n t u ) , seis, q u e a 4.500, são-antrais v 27U000

E d o selo, a 9 3 e m e i o mm
746

[ fl. 410v. ] D e . "provisões p a r a "escrivães do eclesiástico, q u e s e n d o


seis, se dividiu e m d u a s a "escrivaninha do S a b a r á , e são
sete, a 4.500 (e n ã o 1.600) 36Ü000

E do "selo, a 9 3 e m e i o . „ , t U748

D e provisões d e m e i r i n h o , sete, a 4.500 (e n ã o 1.600) , -,


r .....31U500

E d o selo, a 9 3 e m e i o Ü 5 8 4 Vi

D e provisões p a r a m e i r i n h o e escrivão do c a m p o , q u e h á
só n a C i d a d e [ M a r i a n a ] , e são gerais p a r a t o d o o bispa-
do, a 4.500 c a d a u m a (e n ã o 1.600) : 9Ü000

E do selo, a 9 3 e m e i o U187

D e provisões p a r a "inquiridores, "contadores, "distribui-


dores e "escrivães d o registro, q u e t u d o a n d a a n e x o , são
sete, a 4 . 5 0 0 {e n ã o 1.600) 31Ü500

E do selo, a 9 3 e m e i o U 5 8 4 Ya

A c h e i q u e este "oficio d e escrivão do registro teve princí-


p i o logo q u e t o m o u posse d o bispado do R i o de J a n e i r o
o "bispo q u e é hoje d e M i r a n d a e foi antecessor d o p r e -
sente antes d a divisão destes bispados, t o m a n d o p o r p r e -
texto a p e r d a q u e h a v i a de p a p é i s de clérigos e outros
m a i s , p o r causa das m u i t a s distâncias; e suposto q u e hoje,
p e l a referida divisão, n ã o h a j a estas distâncias, se con-
serva, c o n t u d o , o dito registro,, e. d e tal f o r m a q u e , fican-
d o as provisões registradas n a " C â m a r a Eclesiástica, p a -
g a n d o - s e d e registro d e c a d a u m a 187 réis e m e i o , h á
rigorosa o b r i g a ç ã o de se registrarem t a m b é m n o registro
d a c o m a r c a e m q u e reside a pessoa, a i n d a sendo nesta
vila, s e m e m b a r g o d e distar d a C i d a d e m u i t o m e n o s de
d u a s *léguas, e aí p a g a d e n o v o outros 187 "reis e m e i o ,
t e n d o a c o n t e c i d o p o r vezes s e r e m suspensos do exercí-
cio d e suas o r d e n s aqueles q u e t ê m sido omissos e m fa-
zer o dito registro n a forma q u e p o r "editais seus o t e m
declarado.
747

D e "provisões p a r a "ermitães serão, c o m p o u c a diferença,


d u z e n t a s , q u e , a 1.600 c a d a "chancelaria, i m p o r t a m [incompleto]

E do "selo, a 9 3 e meio \incompleto]

Esta c o m p u t a ç ã o d e d u z e n t a s provisões é a t e n d e n d o a
q u e p r e s e n t e m e n t e se n ã o p a s s a m p a r a esta c o m a r c a , p o r
se m e o r d e n a r pelo C o n s e l h o do U l t r a m a r , n a "frota p a s -
s a d a , n ã o consentisse estes e r m i t ã e s c o m provisões d o
" b i s p o , o q u e t e n h o feito o b s e r v a r , suposto n ã o s e r e m
impedidos nas mais c o m a r c a s e o n ã o serão t a m b é m b r e -
v e m e n t e nesta, e s e n d o assim v i r á a ser o n ú m e r o das
ditas provisões n ã o m e n o s d e 3 0 0 , c o m o e r a até a g o r a .

D e provisões p a r a expor-se o Santíssimo S a c r a m e n t o


p a s s a m d e s e i s c e n t a s , q u e p o r este n ú m e r o , a 1.600,
importam.......... , 960Ü0O0

D e selos, a 9 3 e meio 156X5000

D e provisões p a r a c a s a m e n t o s achei serem m u i t a s , p o r -


q u e os filhos d o R e i n o , p o r falta d e interesses p a r a se
r e t i r a r e m p a r a as suas p á t r i a s , e o u t r o s , pelos t e r e m g r a n -
des e n ã o q u e r e r e m sair d a q u i , se v ã o c a s a n d o e estabe-
l e c e n d o , e i g u a l m e n t e os filhos d o "país c u i d a m e m ca-
sar d e muito p o u c a idade, e c a s a m todos os q u e t ê m "cas-
ta d a terra e de neófitos. E nesta certeza achei serem, c o m
p o u c a diferença, 1.000, e achei de 1.000 até 1.500, e fazen-
d o u m j u í z o p r u d e n t e , s e m excesso, m e p e r s u a d i q u e
s e r i a m até o i t o c e n t a s , / / q u e s e n d o p a s s a d a s p a r a se [ f l . 411 ]
f a z e r e m nas m a t r i z e s p o r q u e t ê m c h a n c e l a r i a , a 1.200
importam [incompleto]

D o "selo, a 9 3 e m e i o [incompleto]

A c h e i t a m b é m q u e estas provisões p a r a c a s a m e n t o nas


matrizes se n ã o verificam p o r via d e regra, e só se v e m a
fazer os c a s a m e n t o s nas "capelas filiais delas p o r q u e a l é m
d e e v i t a r e m c o m isso m a i o r e s despesas e viagens c u i d a m
t a m b é m e m evitar a publicidade, p o r p o b r e z a uns e ou-
tros (e são os mais) p o r c a s a r e m c o m pessoas desiguais n a
748

cor. E até agora, depois d e se passar a p r i m e i r a "provisão


p a r a se fazer n a m a t r i z o c a s a m e n t o , q u e era indefectível,
se fazia preciso requerer c o m ela nova provisão p a r a O p o -
der ser e m "capela, q u e c o m facilidade se lhe concedia,
v i n d o assim a precisar-se d e d u a s provisÕes, a p r i m e i r a
a

d e 1.200 de c h a n c e l a r i a e a s e g u n d a d e 2.400, a l é m dos


9 3 e m e i o e m c a d a u m a . E desta f o r m a se faz a m a i o r
p a r t e dos c a s a m e n t o s , que, serão m a i s d e 5 0 0 , suposta a
q u a n t i d a d e d e capelas, q u e , a 2.400 réis, i m p o r t a m {incompleto]

E m m a n d a d o s de c o m i s s ã o , a c h e i excesso g r a n d e , p o r -
q u e a i n d a a n e g r o s e m u l a t o s forros se p a s s a m , p r o c u -
r a n d o todos c o m isto n e m v i r e m à p r e s e n ç a dos "minis-
tros eclesiásticos n e m fazerem m a i o r e s despesas nas gran-
des j o r n a d a s , p a g a n d o duas vezes custas destas justifica-
ções, u m a a q u e m vai à comissão e o u t r a a o escrivão do
j u í z o q u e passa, e suposto achei b o a informação q u e p a s -
s a r i a m de mil pela sua multiplicidade c o n t u d o m e persu-
adi seriam de seiscentos até setecentos, q u e , a 1200, Os
seiscentos i m p o r t a m -. [incompleto]

E d e selo, a 9 3 e m e i o , , [incompleto]

A c h e i t a m b é m q u e a l é m destes m a n d a d o s d e comissão
p a r a casamentos se passam outros muitos p a r a justificações,
tanto n a falta de certidões de batismo c o m o p a r a defesa de
culpas e i m p e d i m e n t o s d o m a t r i m ô n i o , e m q u e h á m u i -
tas p a r a justificar premissas, p a r a dispensas, p a r a a d v o -
g a r causas, p a r a o vigário-geral, p a r a justificações e re-
quisitórios d e o r d i n a n d o s , q u e há tal q u e se lhe p a s s a m
cinco e seis p a r a diversas partes, e todos farão o n ú m e r o d e
q u a t r o c e n t o s seguros, que^ a 1.200, i m p o r t a m [incompleto]

E d e selo, a 9 3 e m e i o [incompleto]

U m a b o a p a r t e d e todos estes c a s a m e n t o s é feita p o r pes-


soas do R e i n o e ilhas adjacentes, e t a m b é m p o r pessoas
[ fl. 41 lv. ] d e outros / / bispados deste continente e a i n d a da África

Agora se pratica uma só provisão, que custa 2.400.


e ilhas adjacentes, e p a r a estes todos serem dispensados
nos " b a n h o s das suas pátrias, além d a justificação d e sol-
teiros, p a r a q u e t a m b é m se passa m a n d a d o d e comissão,
d e p o s i t a m d e c a u ç ã o , a 30.000 c a d a u m , até duas "fro-
tas, ou t e m p o p r o p o r c i o n a d o d a terra de q u e é, e se lhes
n ã o c h e g a a certidão de b a n h o s corrente d e n t r o d a q u e l e
t e m p o p e r d e r a a c a u ç ã o p a r a a " M i t r a , sendo citados, e
lhe t o r n a m a reformar o t e m p o fazendo d o b r a d a c a u ç ã o ,
p e r d e n d o alguns duas e três, e h a v e r á vinte ou mais cau-
ções p e r d i d a s e m c a d a a n o , c o m p u t a n d o as d o b r a d a s ,
q u e , a 30, i m p o r t a m .-. 6 0 0 Ü 0 0 0

D e cartas d e e x c o m u n h ã o serão sessenta, p o r arbítrio p r u -


d e n t e q u e fiz, a c h a n d o b o a informação de serem até c e m ,
que, a 2.400 d e " c h a n c e l a r i a , i m p o r t a m [incompleto]

E d o "selo, a 9 3 e meio [incompleto]

D e m a n d a d o s d e absolvição serão c i n q ü e n t a , pela r a z ã o


d e se r e t i r a r e m e c u i d a r e m p o u c o n a absolvição os q u e se
d e i x a m e x c o m u n g a r , q u e , a 1.200, i m p o r t a m [incompleto]

E d e selo, a 9 3 e meio [incompleto]

D e m a n d a d o s de absolvição p a r a os declarados q u e faltam


n o preceito d a Q u a r e s m a serão cem, p o r q u e ainda q u e se-
j a m mais os declarados, c o m o fogem e se retiram p a r a ou-
tros "países e n ã o t ê m domicílio certo, n ã o cuidam e m ab-
solver-se n e m m a n d a d o s p a r a isso, e, a 1.200, i m p o r t a m
os cem [incompleto]

E do selo, a 9 3 e m e i o [incompleto]

D e provisões de "mestres d e capela, q u e são seis, a 4.500


c a d a u m a (e n ã o 1.600) [incompleto]

E d o selo, a 9 3 e m e i o [incompleto]

A c h e i q u e estes mestres l e v a m d e c a d a licença q u e d ã o


aos músicos p a r a q u a l q u e r festividade d u a s "oitavas d a
missa c a n t a d a , d e " V é s p e r a s u m a o i t a v a e d e S e m a n a
750

S a n t a oito "oitavas, sem e m b a r g o de se ter proibido este


excesso p o r o r d e n s antigas e se ter j u l g a d o p o r vezes no
j u í z o d a C o r o a desta R e l a ç ã o e n ã o ser esta a forma p o r
q u e o Concílio T r i d e n t i n o m a n d a q u e os "bispos evitem
c a n t a r e m - s e nas igrejas papéis profanos, p o r q u e aqui e m
se p a g a n d o a " e s p ó r t u l a e m n a d a m a i s se r e p a r a n e m
e x a m i n a a q u a l i d a d e dos p a p é i s e "solfas, e p a g a c a d a
u m de "pensão , ,4815000

D e "provisões p a r a confessar e pregar se n ã o paga "chance-


laria, m a s só sim selo e feitio, e sendo as de confessar seis-
centas, serão 60 ao menos as de pregar, que, a 93 e meio
cada uma, importam [incompleto]

I m p o r t a m as chancelarias e "selos , [incompleto]

"Monitórios e p e n s õ e s d e "mestres d e capela [incompleto]

[ fl. 4 1 2 ] A n t i g a m e n t e e r a m separados os "sacristães dos "fabriqueiros, sendo pela m a i o r


p a r t e [—] "párocos os q u e [se associaram?] c o m a fábrica, e depois se p a s s a r a m
a l g u m a s provisões de fabriqueiros s e p a r a d a m e n t e , e n a "visita p a s s a d a d e 1751
p r o v e u q u e t o d o s os sacristãos fossem i g u a l m e n t e fabriqueiros e m 4 8 ou 4 9 fre-
guesias.
C a s a m e n t o p a r a as m a t r i z e s s e r ã o t r e z e n t o s e n a s " c a p e l a s q u i n h e n t o s .
P a s s a - s e p r o v i s ã o c o n f o r m e , se p e d e : se é p a r a a m a t r i z 1.200, se é p a r a a
capela 2-400.
C a r t a s d e e x c o m u n h ã o c i n q ü e n t a e m a n d a d o s d e absolvição até vinte.
M a n d a d o s d e absolvição d a Q u a r e s m a até 150.
Leva "lutuosa n ã o só dos p á r o c o s q u e falecem m a s a i n d a dos q u e f o r a m e j á
o n ã o s ã o , e n e s t a c o m a r c a e m a freguesia d e S a n t o A n t ô n i o d a C a s a B r a n c a
faleceu, h á dois anos, u m q u e foi p á r o c o dos primeiros destas M i n a s e m tal p o b r e -
za q u e n a d a mais se lhe a c h o u d e valor q u e o seu "breviário, q u e foi m a n d a d o ver
p o r o r d e m sua e recebido a p r o d u t o p o r lutuosa...*
N a "cera das crismas, q u a n d o a l g u m a " i r m a n d a d e l h e p e d e p o r [petição?]
a l g u m a p o r esmola a n ã o d á a b s o l u t a m e n t e , e visitando a freguesia do C u r r a l del-
R e i n o a n o d e 1750 lhe fez a i r m a n d a d e d o Rosário s e m e l h a n t e r e q u e r i m e n t o , a
q u e , p o r p ô r d e s p a c h o q u e declarassem o q u a n t o d a v a m ao escrivão d a dita ir-
m a n d a d e e d e c l a r a n d o q u e d a v a m 150.000, p u s e r a o d e s p a c h o d e q u e l h e des-
s e m m e n o s p a r a p o d e r e m c o m p r a r cera, e deixa a cera aos p á r o c o s p a r a q u e l h a
v e n d a m , fazendo passar recibo d e toda ela, e a c e m mil "réis l a r g a m e n t e [em] c e r a
e o u r o , u m a [espécie] p o r o u t r a .
751

T r i n t a "monitórios p a r a c o b r a n ç a s d e "párocos e "capelães.


*...e n a freguesia d a I t a b i r a h á u m clérigo q u e n u n c a foi p á r o c o , falecendo
sem b e n s mais q u e u m p r e t o , este se lhe t o m o u p o r o r d e m do "bispo p o r "lutuosa,
q u e r e n d o levá-la d e todos os clérigos.

"Pensões para a * Mitra [ fl. 413 ]

S u p o s t o q u e diz o extrato q u e os "ofícios d a " b a n c a a n d a v a m p e n s i o n a d o s


e m 3 0 0 . 0 0 0 , a c h e i q u e estes ofícios, j á d o t e m p o d o b i s p o frei A n t ô n i o d e
G u a d a l u p e , a n d a v a m p e n s i o n a d o s e m 96 mil c a d a u m , e assim se c o n s e r v a r a m
até q u e t o m o u posse d o "bispado d o R i o d e J a n e i r o o bispo atual, frei A n t ô n i o d o
D e s t e r r o , o q u a l , c o m o era a i n d a antes d a divisão, os p e n s i o n o u a 2 0 0 m i l réis
c a d a u m , e assim ficaram até este presente a n o e m q u e o bispo deste b i s p a d o os
v e n d e u , ou p ô s p e n s ã o , p e l a f o r m a seguinte:

Ofício d e "escrivão d a C â m a r a , q u e d a n d o ao bispo a "terça p a r t e n o p r i m e i r o


a n o , se ajustou n o s e g u n d o e m 2.000 " c r u z a d o s , q u e s e m p r e t e m p a g o até a o
p r e s e n t e e neste n ã o h á mais alteração 800UOOO
Escrivão do "auditório d a C i d a d e , a r r e n d a d o ou p e n s i o n a d o e m 1:800U000
[Escrivão do auditório] d e Vila R i c a 700Ü000
[Escrivão do auditório] do S a b a r á 700UOOO
[Escrivão do auditório] do R i o das M o r t e s 700U000
[Escrivão do auditório] do S e r r o do F r i o . . . . 400U000
[Escrivão d o auditório] Pitangui ,150X3000
[Escrivão d o auditório] R i o V e r d e ...„..„...„ 200U000

• 106 «

R e g i m e n t o d o eclesiástico [ fl. 414 ]

R e g i m e n t o d a C â m a r a eclesiástica c o m os valores dos


emolumentos, divididos entre as chancelarias, as assinaturas do vi-
gário da vara, do promotor do juízo e dos diferentes serviços
cumpridos pelos escrivães da banca, pelo meirinho e pelo escri-
vão. E complementado pelo documento 107.
Esta relação dos emolumentos definidos p a r a a adminis-
tração eclesiástica subsidiaria resposta de C a e t a n o d a Costa
Matoso a solicitação régia de informações sobre os rendimentos
do bispado de Mariana.
A u t o r i a , l o c a l , data: não identificados.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Mar-
cos Magalhães de Aguiar, e m estudo sobre as irmandades e m
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em torno do controle das confrarias e p a r a
obter dados estatísticos sobre o clero mineiro f Vila Rica dos confrades:
sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XViLL.
São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p. 100-
102).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva do
século X V I I I . O " p " minúsculo é m a r c a d o por hastes duplas,
sendo a segunda arqueada, com movimento p a r a a esquerda;
" d " uncial, com haste terminando em movimento descendente
moderado; " h " semelhante ao " E " redondo; "g" em ampla laça-
da; "r" redondo em grande modulo; f * de dupla haste, com
<(

traço horizontal em volteio; ponto abreviativo usado antes de


letras sobrepostas; o grupo " t o " e m ligatura n a s abreviações.
Uso de numerais arábicos redondos, com perfil. (YDL)

"Chancelarias

D e "provisão de "pároco encomendado pelo nosso "vigário


d a v a r a , p o r t e m p o d e q u a t r o meses 1.800
D e provisão p a r a d i z e r e m missa os sacerdotes q u e d e outro
b i s p a d o v i e r e m p a r a esse 1.200
D e provisão p a r a p e d i r esmola p o r t e m p o limitado e for j u s t o . . . , 1.200
D e provisão d e diligência p a r a n o v a "capela o u " e r m i d a 12.800
D e provisão p a r a erigir "confraria 1.800
D e provisão p a r a se expor o S a c r a m e n t o , .........,.„.„., , 1.200
D e c a r t a d e e x c o m u n h ã o e "participantes o u o u t r a censu-
r a a respeito d a p a r t e ; 2.400
D e m a n d a d o d e absolvição de q u a l q u e r c e n s u r a 1.200
D e provisão p a r a absolver defunto e x c o m u n g a d o 1.200
Diligências p a r a trasladar ossos., ....,..,...„„* 2.400
D e provisão p a r a "reconciliar igreja o u a d r o
a requerimento da parte 1 -200
D e m a n d a d o d e comissão p a r a se p e r g u n t a r t e s t e m u n h a s a
r e q u e r i m e n t o da p a r t e o u q u a l q u e r 1.200
D e provisão p a r a se " r e c e b e r e m o u b a t i z a r e m fora d a
" p a r ó q u i a t a n t o os n a t u r a i s do b i s p a d o c o m o os forasteiros 2.400
753

D e "provisão p a r a os mesmos se "receberem ou batizarem


p o r o u t r o sacerdote q u e n ã o seja o p r ó p r i o " p á r o c o 1.200
D e quaisquer sentenças extraídas, precatórias, cartas d e
inquirição e outras certidões de " b a n h o s e m f o r m a 1.200
D e provisão p a r a confessar nada

Assinaturas d o "vigário d a v a r a

D e q u a i s q u e r sentenças cíveis ou crimes d a d a a final e m


q u a l q u e r q u a n t i a q u e seja 1.500
D a s interlocutórias 479
D a s "cartas de seguro, [alvarás?] d e fiança, cartas d e in- [ fl. 414v. ]
quirições, p r e c a t ó r i a s e justificações q u e se j u l g u e m p o r
sentença 1.500
D a s justificações c o m o juiz delas • 1.500
D e "selo d e q u a l q u e r p a p e l q u e haja d e levá-lo 375
P a r a q u e m p õ e o selo 93 e A
l

P o r m a n d a d o p a r a se fazer q u a l q u e r citação 375


P o r m a n d a d o dissolvendo d e preceito 375
P o r " j u r a m e n t o s supletorios ou dados p a r a se avaliar a
causa, e das d e calúnia , 375
D o s " j u r a m e n t o s decisorios dados a r e q u e r i m e n t o d e p a r t e 600
D o s hábitos, o m e s m o 600
D e q u a l q u e r a u t o de a r r e m a t a ç ã o de q u a l q u e r q u a n t i a 1.200
D o s j u r a m e n t o s d a d o s a "louvados p a r a avaliarem as
causas q u e o d e v e m ser antes d a a r r e m a t a ç ã o 600
D e c a d a t e s t e m u n h a q u e p e r g u n t a r e m q u a l q u e r causa
até oito artigos 479
E a este respeito, h a v e n d o mais artigos .... , 479
D e c a d a vistoria d e n t r o , n a vila 3.000
D e c a m i n h o i n d o fora, c a d a dia ••- 7.200
D e e x a m e ou vistoria e m casa sobre vício d e papéis ou
o u t r a q u a l q u e r coisa e m q u e se faça vistoria 750
D e "visita d e q u a l q u e r capela sobre a decência e
p r e p a r a ç ã o q u e nela se c e l e b r a r o S a n t o Sacrifício 7.200
D e r u b r i c a r os livros das igrejas, dos batizados,
c a s a m e n t o s , m o r t o s e "confrarias • 2.400
D e assinaturas d e q u a i s q u e r provisões, cartas, "monitorios
ou d e q u a i s q u e r censuras e m a n d a d o s p a r a absolvê-los, e
mais papéis e m q u e haja c h a n c e l a r i a e selo 1.500
D o a u t o de p e r g u n t a s d e esponsais ¿ 3.600
754

D a dispensa d e *banhos p a r a se c a s a r e m . 2.400


D e m a n d a d o d e "desobriga d a fiança ou entrega d e de-
pósito, q u a n d o se a p r e s e n t a m os b a n h o s e m forma, s e m
impedimento 750
D e t o m a r d e p o i m e n t o aos q u e q u e r e m casar 1.200
[ fl. 4 1 5 ] D o r e c e b i m e n t o do libelo e m a u d i ê n c i a 375
D e e x a m i n a r o "rol dos confessados, e fazê-lo registrar
n a C â m a r a , e fazer o mais neste particular, que por Direito e
"constituições está o b r i g a d o nada
D e assinar c a d a l a n ç o q u e h o u v e r nos b e n s q u e se
r e m a t a r e m e m p r a ç a pública ... 375
D e a s s i n a r os a u t o s das q u e r e l a s o u d e n ú n c i a s q u e se
d e r e m n o juízo e d e j u r a m e n t o d a d o a o q u e r e l a n t e ou
d e n u n c i a n t e , n a forma d a lei 1.200
D e t o m a r e m contas dos testamentos pelo q u e respeita ao
resíduo, se h a v e r ã o e m t u d o c o n f o r m e o j u í z o secular.
D e licença p a r a confessar nada
D e c a d a conclusão - ...375

*P r o m o t o r do juízo

Por c a d a resposta q u e derem, papéis q u e íhe devem ir c o m


vista ou i m p e d i m e n t o c o m q u e neles vier 1.800

E n o mais o b s e r v a r á o disposto n o "regimento dos advogados dos "auditórios,


q u e vai a d i a n t e ,

"Escrivães d a b a n c a

D e u m a u t o , q u a l q u e r q u e seja 187

E levarão mais a escrita c o n t a d a a "rasa e m a n d a d o s e revelias q u e h o u v e r .

A rasa será a 180 "regras p o r 1.500, c o m d e c l a r a ç ã o q u e t e r á c a d a r e g r a


trinta letras, e n ã o as t e n d o n ã o v e n c e r ã o n a d a , e n ã o c h e g a n d o a escrita a 180
regras levarão o q u e m o n t a r , a 45 "réis p o r cinco regras.

P o r u m a a u t u a ç ã o , além dos m a n d a d o s e revelias 135


Por c a d a p r o c u r a ç ã o *apud acta... 187 e V%
755

O q u e levarão a c a d a pessoa o u constituinte n ã o s e n d o


/ / m a r i d o o u m u l h e r ou i r m ã o s e m h e r a n ç a , *cabido, [ fl. 415v. ]
"irmandade ou "universidade, de qualquer m o d o q u e seja 187 e V2
D e conclusão de c a d a p a p e l 135
D e conclusão e revelia , ... — 135
D e revelia, q u a n d o u m a p a r t e se a p r e g o a 135
D e citação e m audiência 135
D o m a n d a d o do julgador, feito dele e m e n ç ã o no termo ^ 135
S e n t e n ç a d e confissão, d e q u a l q u e r q u a n t i a q u e for, n ã o
se tirará d o processo e só se passará m a n d a d o dissolven-
do, d o qual levará 375
D a p u b l i c a ç ã o das sentenças interlocutórias 135
D a s definitivas 270
De qualquer reconhecimento 187 e V2
D e c a d a t e s t e m u n h o q u e escrever n a d a mais q u e a escri-
ta, c o r r e n d o a c a u s a e m j u í z o ou e m *devassa, e nas justi-
ficações, p o r c a d a t e s t e m u n h a 375
D e c a d a assentada, de três e m três t e s t e m u n h a s 9 3 e V2
E se n ã o c h e g a r a três t e s t e m u n h a s a inquirição, levará a
escrita, e disto 4 6 e Vi
D e escrever t e s t e m u n h o s e m casa p a r t i c u l a r levará, além
da escrita, de caminho, sendo dentro da vila ou povoação 187 e Vi

E de c a m i n h o , indo fora dela, l e v a r á três mil "réis p o r dia, q u e se e n t e n d e r á


a n d a n d o nele q u a t r o "léguas, e a este respeito a n d a n d o mais o u m e n o s .

D e q u a l q u e r certidão levará, d e c a d a l a u d a , 27Q réis, c o m d e c l a r a ç ã o d a dita


"rasa a respeito das "regras e letras e m c a d a l a u d a .

D e c a d a ida à p r a ç a p a r a v e n d a de p e n h o r e s 135
Se for c o m "oficial fazer p e n h o r a , levará a escrita a rasa
e da i d a 187 e Vá
Se antes d a a r r e m a t a ç ã o a p a r t e p a g a r e se lhe entregare-
m o s p e n h o r e s , levará d a escrita a rasa e d a entrega deles 13 5

D e a u t o d e a r r e m a t a ç ã o dos [bens] móveis o u d e raiz [ A- 4 1 6 ]


levará só a escrita a rasa e do auto ,. 135

E os m a n d a d o s q u e h o u v e r , e n ã o farão t e r m o de "pregões nos autos, e só


a j u n t a r ã o a eles certidão d o "porteiro e m c o m o os c o r r e u os dias d a lei, e fazendo
o c o n t r á r i o se lhe n ã o p a g a r á n a d a pelos ditos termos.
756

P o r t r a s l a d a r a aplicação, levará o q u e m o n t a r a "rasa,


t e n d o as "regras as ditas trinta letras e 180 regras , 1.500

D a s sentenças tiradas do processo ou tiradas d o instrumento


d e a g r a v o , p o r c a d a m e i a folha 450 *réis, c o m declara-
ç ã o q u e h á d e ter c a d a l a u d a 25 regras e c a d a regra 30
letras, e n ã o tendo as ditas regras e letras não levarão n a d a .

D e c a d a carta testemunhável e m q u e n ã o for testada, ou


o u t r a q u a l q u e r feita p o r petição 450

D o i n s t r u m e n t o de a g r a v o , *dia d e a p a r e c e r , cartas d e
i n q u i r i ç ã o t e s t e m u n h á v e i s , c o m o traslados dos a u t o s , e
as mais q u e as levarem e h o u v e r e m de ser seladas, leva-
r ã o as p r i m e i r a s seis páginas a 225 réis p o r c a d a l a u d a e
as mais a rasa, e t e n d o o p a p e l mais q u e as seis, coisa d e
consideração, irá ao "contador.

D o e x a m e feito e m letras ou vício d e papéis 750

D e u m a comissão nos autos , 187 e k x

D e c a d a carta p r e c a t ó r i a o q u e m o n t a r a rasa, c o m a d e c l a r a ç ã o a c i m a das


regras e letras.

D e u m t e r m o de c o n d e n a ç ã o de m a n d a d o d e preceito 233
D a n d o - s e e m p r o v a a l g u m feito findo p o r apenso, se a
respeito dele se p e d i r vista levará o escrivão dele a o t o d o , 466
D e b u s c a d e feitos depois d e deferidos ou r e t a r d a d o s ,
levará e m q u a l q u e r t e m p o 750
D e feitio d e c a r t a d e editos, de c a d a u m a 750
De. feitio de carta de e x c o m u n h ã o ou "participantes ,750
D e feitio d e q u a l q u e r p r o v i s ã o , m a n d a d o d e comissão,
[ fl. 416v. ] / / d e absolvição, d e censuras ou "monitório e certidão
de "banhos e m forma •. 750

E n ã o p o d e r ã o os "escrivães pedir às partes custas o u salários c o n t a d o s * per se


antes d e c o n t a d o s p e l o c o n t a d o r , p e n a d e e r r o d o oficio, exceto dos p a p é i s q u e
t ê m salários taxados neste " r e g i m e n t o .

D e a u t o de p e r g u n t a s d e esponsais, sem rasa, levará d e c a d a p a r t e 750


757

D e u m t e r m o de depósito ou fiança d e " b a n h o s 600


D o s m a n d a d o s d e entrega d o depósito ou desobriga d a fiança .„....,. ...375

"Meirinho

D e u m a prisão i ....900
De cada penhora 900
D e u m seqüestro ; 900
D e c a m i n h o , p o r dia ... , 3.000
D e c a d a citação , ....750
D e c a d a l e v a d a n a vila 750

Se for fora d a vila, os dias q u e gastar d e ida e vinda.

"Escrivão

D e c a m i n h o , p o r dia 3.000
D e a u t o d e seqüestro, d e prisão, e m b a r g o ou outras quais-
quer que lhe tocarem 466

• 107 <

Acrescentamento que se acha no *regimento do "auditório [fí.417 ]


eclesiástico que pertence ao escrivão da "banca

Suplemento ao regimento do eclesiástico com valores e servi-


ços cobrados pelo escrivão da banca da câmara eclesiástica, com-
pleta dados do documento 106.
Esta tabela de preços definidos para a administração eclesi-
ástica subsidiaria resposta de Caetano da Costa Matoso a solicita-
ção régia de informações sobre os rendimentos do bispado de
Mariana.
Autoria, l o c a l e data: não identificados.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por Marcos
Magalhães de Aguiar, em estudo sobre as irmandades em Minas,
especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição entre Estado
e Igreja em torno do controle das confrarias e para obter dados
758

estatísticos sobre o clero mineiro (Vila Rica dos confrades: sociabili-


dade confraria! entre negros e mulatos no século X V I I I . São
Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p. 100-102).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, híbrida de
encadeamento, com amplos movimentos circulares. Apresenta mai-
úsculas em módulo grande, com traços destrógiros e volutas; pon-
to de fuga pronunciado e ascendente nas vogais finais de palavras.
Presença de sinal de guarda antecedendo os valores numéricos.
(YDL)
C r i t é r i o s editoriais: Foram suprimidas as guardas.

D e c a d a alvará d e folha, do m a n d a d o e certidão n o fim 600


D e q u a l q u e r m a n d a d o p a r a citação 200
D e q u a l q u e r t e r m o d a "vara , , ,....„„ , 375
D e u m termo de juramento ., 375
D e fazer termos d e a m a n c e b a d o s q u e resulta a culpa da d e n ú n c i a , 375
D e registrar c a d a *rol dos confessados , 375

D e [qualquer?] certidão q u e n ã o for a *rasa levará o "escrivão o m e s m o q u e


se leva n o j u í z o secular.

P o r o r d e m d e S u a Excelência R e v e r e n d í s s i m a d e trinta d e j u n h o d e 1736,


q u e se a c h a a c o s t a d a ao " r e g i m e n t o d o " c o n t a d o r , m a n d a q u e se observe neste
j u í z o o m e s m o q u e se observa no j u í z o secular n o estender os "pregões ao "porteiro.

• 108 <

Rendimento da Mitra do bispado de Mariana

Estimativa detalhada das fontes de receita do bispado de


Mariana. Aparecem relacionados o valor dos emolumentos cobra-
dos conforme o serviço religioso e o n ú m e r o de ocorrências,
totalizando-se os rendimentos parciais obtidos. Discrimina os valo-
res arrecadados pelas chancelarias, as pensões que o bispo recebe,
os rendimentos das visitas episcopais e diversas outras atividades
geradoras de receita. Este recurso evidencia o esforço de apre-
sentação de estimativas contábeis. Semelhante aos documentos
99 e 102, diverge quanto ao número de eclesiásticos, de capelas
e de igrejas e ao valor dos emolumentos; apresenta as cifras
medianas dentre os três.
O documento parece ser u m a tentativa, de consolidação de
dados a ser enviada à C o r o a pelo ouvidor Gaetano d a Costa
Matoso. Visava, e m decorrência de suas atribuições, fornecer
subsídios para responder a solicitação régia de informações so-
bre o rendimento do bispado. O c u p a posição chave n a disputa
entre a jurisdição real e a episcopal, traduzindo o esforço de
controle e vigilância sobre os recursos financeiros da Igreja.
A u t o r i a , l o c a l , data: Gaetano da Gosta Matoso; Lisboa;
ca. 1753.
U s o n a historiografia: Este texto foi analisado por M a r -
cos Magalhães de Aguiar, e m estudo sobre as irmandades em
Minas, especialmente para enfocar os conflitos de jurisdição en-
tre Estado e Igreja em torno do controle das confrarias e para
obter dados estatísticos sobre o clero rnineiro (Vila Rica dos confrades:
sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século X V I I I .
São Paulo: Universidade de São Paulo, F F L C H , 1993. p . 100-
102).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva, bas-
tante caligrafada, extremamente regularizada, e m m ó d u l o pe-
queno, arredondado, mantendo porém traços da bastarda barro-
ca: hastes do " p " em movimento arqueado, "f' de traço horizon-
tal e m volteios, " D " dp tipo capital, com laçada n a base, termi-
n a n d o em aspirai; n u m e r a ç ã o arábica de forma a r r e d o n d a d a
com perfil e uso do caldeirão.

A s " c h a n c e l a r i a s e "selos d e t o d a s as " p r o v i s õ e s e m a n d a d o s p a s s a d o s


n a C â m a r a d o " b i s p o e n a s seis " v i g a r a r i a s d a v a r a d a s seis c o m a r c a s ,
além da de Mariana.

D e provisões p a r a usar d e o r d e n s e m c a d a a n o a mais de


dois mil "clérigos (que muitos mais h á , p o r q u e m a i s de
2.500 se c o n t a r a m q u a n d o , c o m p r o c u r a ç ã o d o b i s p o ,
t o m o u posse do b i s p a d o L o u r e n ç o J o s é de Q u e i r ó s , e se
alguns s a í r a m o n ú m e r o destes se supre pelos muitos q u e
t e m o b i s p o o r d e n a d o ) , f a z e n d o a c o n t a só a dois mil;
c a d a "chancelaria 1.200, c a d a "selo 93 Vá, i m p o r t a c a d a
provisão 1.293 h l

soma , 2:587Ü000
760

D e "provisões d e "capelães d e "capelas filiais, q u e , p o r


serem a o m e n o s 400, são outros tantos os capelães; c a d a
"chancelaria 1.600, c a d a "selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a p r o -
visão 1.693 /a l

soma = 677U400
D e provisões p a r a "coadjutores das "igrejas p a r o q u i a i s ,
q u e , e x c e t u a n d o p o u c a s q u e os n ã o têm, serão 38; c a d a
c h a n c e l a r i a 7.500, c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a provi-
são 7.593 Vá
soma 288Ü550
D e provisões p a r a capelães das " i r m a n d a d e s sitas e m igre-
jas paroquiais e capelas, que farão o n ú m e r o de 400;
c a d a c h a n c e l a r i a 1.600, c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a
p r o v i s ã o 1.693 Vá
soma 677Ü400
D e provisões p a r a "sacristães de igrejas p a r o q u i a i s e m u i -
tas capelas, q u e farão o n ú m e r o de 100; c a d a chancela-
ria 1.600, c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a provisão 1.693

soma 169Ü350
D e p r o v i s õ e s p a r a "fabriqueiros das igrejas p a r o q u i a i s ,
q u e são 4 8 ; c a d a chancelaria 1.600, c a d a selo 9 3 Vá, im-
p o r t a c a d a provisão 1.693 Vá
soma 81U288
D e provisões p a r a "vigários d a v a r a , q u e são 6; c a d a c h a n -
c e l a r i a 1.600, c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a p r o v i s ã o
1.693 Vá
soma , 10Ü161
4:491Ü149
[ fl. 418v. ] D e provisões p a r a "escrivães dos juízos eclesiásticos, q u e
são 7 e c o m o d a "vigararia geral; c a d a chancelaria 1.600,
c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a provisão 1.693 Vá
soma „ 11Ü854
D e provisões p a r a "meirinho dos mesmos juízos, q u e
t a m b é m são sete; c a d a c h a n c e l a r i a 1.600, c a d a selo 9 3
Vá, i m p o r t a c a d a provisão 1.693 Vá
soma . : 1.1Ü854
D e provisões p a r a escrivães das varas de m e i r i n h o q u e
são 7; c a d a chancelaria 1.600, c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a
c a d a p r o v i s ã o 1.693 Vá
soma 11Ü854
761

D e "provisões p a r a " m e i r i n h o do c a m p o e "escrivão d o


m e s m o , q u e h á s o m e n t e e m M a r i a n a ; c a d a "chancelaria
1.600, c a d a "selo 9 3 '/a, i m p o r t a c a d a provisão 1.693 Vá
soma 3Ü387
D e provisões p a r a "inquiridores, " c o n t a d o r e s , "distribui-
dores e escrivães do registro, q u e são 7; c a d a chancelaria
1.600, c a d a selo 9 3 Vá, i m p o r t a c a d a provisão 1.693 Vá
soma , „. 1 1 U 8 5 4
D e p r o v i s õ e s p a r a " e r m i t ã e s das " c a p e l a s , a i n d a q u e
e m a l g u m a s h á três, e m o u t r a s dois, r e g u l a d o o n ú m e -
ro deles p e l o das capelas, farão o n ú m e r o de 4 0 0 ; c a d a
c h a n c e l a r i a 1.600, c a d a selo 9 3 Á, i m p o r t a c a d a p r o -
l

v i s ã o 1.693 Vá.
soma 677Ü400
D e provisões p a r a se expor o S e n h o r n a s festas, q u e p o r
se fazerem e m c a d a igreja p a r o q u i a l ao m e n o s três e m c a d a
a n o e e m c a d a c a p e l a a o m e n o s u m a , serão 5 4 4 ; c a d a
chancelaria 2.400, c a d a selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a provisão
2.775
soma , 1:509Ü600
D e provisões p a r a c a s a m e n t o s , q u e ao m e n o s h a v e r á mil
c a d a a n o e m t o d o o b i s p a d o , e x c e t u a n d o os dos escra-
vos, q u e n a d a p a g a m ; a s a b e r 6 0 0 , q u e se c e l e b r a r a m
nas matrizes cuja chancelaria é 1.200, selo 3 7 5 , i m p o r t a
cada provisão 1.575
soma 945Ü0O0
D e c a s a m e n t o s q u e se c e l e b r a r a m n a s capelas, e serão
4 0 0 ; c a d a c h a n c e l a r i a 2.400, c a d a selo 375, i m p o r t a c a d a
provisão 2.775
soma 1:110Ü000
D e m a n d a d o s de comissão p a r a se t i r a r e m d e p o i m e n t o s
nos c a s a m e n t o s , q u e q u a n d o n a d a e m todo o bispado se-
r ã o c e m ; c a d a chancelaria 1.200, c a d a selo 375, i m p o r t a
c a d a m a n d a d o 1.575
soma 157Ü500
D e cartas d e e x c o m u n h ã o , q u e e m t o d o o b i s p a d o serão
c e m e m c a d a a n o ; c a d a chancelaria 2.400, c a d a selo 375,
i m p o r t a c a d a c a r t a 2.775
soma 277Ü500
• 4:727Ü803
762

[ fl. 4 1 9 ] D e m a n d a d o s de absolvição p a r a declarados n a falta da


"desobriga d a Q u a r e s m a , que serão a o m e n o s 200; c a d a
"chancelaria 1.200, c a d a "selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a m a n -
d a d o 1.575
soma , 315U000
D e "monitorios q u e cada a n o se p a s s a r a m n a "vigararia
geral e nas seis d a vara, q u a n d o m u i t o m e n o s 200; c a d a
chancelaria 1.200, c a d a selo 3 7 5 , i m p o r t a c a d a m o n i t o r i o
1.575
soma , 315Ü000
D e "provisões de "mestres de capela, q u e são 6, c a d a u m
e m c a d a c o m a r c a , c a d a chancelaria 1.600, c a d a selo 93
Vá, i m p o r t a c a d a provisão 1.693 Vá
soma r 10ÜI61
D e provisões q u e se p a s s a m t a m b é m e m c a d a ano a "clé-
rigos e frades p a r a confessar e p r e g a r , pelas quais dizem
u n s se l e v a m chancelarias, outros que n ã o , p o r é m é certo
q u e s e m p r e se l e v a m selos pelas de confessar, q u e serão
a o m e n o s p a r a dois mil; c a d a selo 93 Vá
soma 187Ü000
Pelas de pregar, q u e serão ao m e n o s duzentas, p o r h a v e r
n a q u e l e b i s p a d o notável t e n t a ç ã o de p r e g a r e c o p i o s o
n ú m e r o de tentados; c a d a selo 93 Vá
soma 18Ü700
845Ü861
H á t a m b é m muitas chancelarias e selos dos papéis dos "ordinandos, que todos
se p r e p a r a m n o bispado, ainda que os ordinandos sejam de bispados deste R e i n o .

S o m a m todas as chancelarias referidas, salvo e r r o . . . . 10:064U813

A l é m destas chancelarias, h á outras muitas, c o m o são as das sentenças extra-


ídas do processo e as das quitações gerais dos testamentos, u m a s e o u t r a s n a vigararia
geral e nas seis d a v a r a , p o r é m n ã o se p o d e averiguar o n ú m e r o delas n e m o das
provisões p a r a mestres de latim, sem as quais não consente o "bispo q u e os haja,
a i n d a e m casas particulares, c o m o aconteceu n a freguesia d a C o n c e i ç ã o dos Carijós,
o n d e t e n d o certo h o m e m e m sua casa u m "mestre de latim q u e lhe ensinava os
filhos, p o r n ã o ter provisão p a r a isso lhe tirou o bispo, c o n t r a sua v o n t a d e , e lhe
m e t e u o u t r o p o r provisão sua.
Estas provisões de mestres de latim e todas as mais que a c i m a se referem se
p a s s a m e m c a d a a n o , p a g a n d o os providos, a l é m das chancelarias e selos p a r a o
[ fl. 419v. ] bispo, os feitios e registros p a r a os "escrivães, / / h a v e n d o feitio q u e chega a 2-250
e registro que chega a 750.
763

" P e n s õ e s p e l o s "ofícios e m c a d a a n o

P a g a o "escrivão d a "vigararia geral 200 "oitavas d e o u r o , q u e são .... 3 0 0 U 0 0 0


[Paga] o escrivão d a vigararia d a v a r a d e Vila R i c a 200 oitavas 300U000
[Paga] o escrivão d a vigararia d a vara do S a b a r á 200 oitavas 30015000
[Paga] o escrivão d a vigararia d a v a r a do R i o das M o r t e s 100 oitavas 150U000
[Paga] o escrivão d a vigararia d a v a r a d o S e r r o do Frio 100 oitavas.... 15OUO00
[Paga] o escrivão d a vigararia d a v a r a d o P i t a n g u i 50 oitavas 7515000
[Paga] o escrivão d a vigararia d a v a r a d o R i o V e r d e 50 oitavas ............ 75T5000
C a d a u m dos seis "mestres d e capela, u m p o r o u t r o , a q u a r t a d e o u r o
soma 288T5000
S o m a m as pensões a c i m a , c o m o p a r e c e 1:63815000

N o s p r o v i m e n t o s dos mestres de capela se diz q u e n i n g u é m p o d e r á l e v a n t a r


c o m p a s s o s e m l i c e n ç a sua, o q u e se o b s e r v a i n v i o l a v e l m e n t e , l e v a n d o eles p o r
c a d a l i c e n ç a d u a s oitavas d e o u r o , ou n ã o c o n s e n t i n d o q u e o u t r o s c a n t e m o u
a r r o g a n d o a si esse exercício e m todas as festas, n o q u e muito se r e p a r a , p o r ter
d e c l a r a d o S u a M a j e s t a d e à Bahia, p o r u m "alvará, q u e tais p r o v i m e n t o s são a b u -
so d a j u r i s d i ç ã o episcopal, p o r n ã o p e r t e n c e r aos "bispos, a respeito d a m ú s i c a ,
mais d o q u e proibir cantos profanos n a s igrejas.
D o ofício d e "meirinho-geral n ã o leva p o r h o r a p e n s ã o o bispo p o r q u e , ven-
d e n d o - o p o r u m triénio a u m " c i r u r g i ã o , d a n d o - l h e a f a c u l d a d e d e t a m b é m o
v e n d e r , o v e n d e u ele p o r q u a t r o mil "cruzados, e a i n d a d u r a o triénio.
T a m b é m se r e p a r a t e r o bispo c r i a d o os ofícios d e m e i r i n h o e escrivão d o
c a m p o , c o m o t a m b é m escrivães d o registro e m c a d a c o m a r c a , q u a n d o p a r e c e q u e
sem licença d e S u a Majestade n ã o p o d e criar novos ofícios.

R e n d i m e n t o s d e c a d a "visita

D e p r o c u r a ç õ e s p e l a visita de cada "igreja paroquial, p o r


mais q u e assistem os "párocos c o m a s "vitualhas ao bispo e
s u a c o m i t i v a , / / 9 oitavas d e o u r o , q u e p o r s e r e m as [ fl. 4 2 0 ]
igrejas 4 8 s o m a m , 64815000

D e p r o c u r a ç õ e s pela visita d e c a d a "capela 6 oitavas d e


o u r o , q u e p o r serem as capelas a o m e n o s q u a t r o c e n t a s
importam 3:60015000
D e p r o c u r a ç õ e s pela "visita de c a d a oratório particular 6
o i t a v a s de o u r o , n ã o s e m e s c â n d a l o dos q u e s a b e m a
p r o i b i ç ã o d o cap.jin. de Censib., e p o r se n ã o saber o n ú -
m e r o c e r t o dos oratórios se n ã o a b o n a p o r j u n t o a im-
p o r t â n c i a das visitas deles.

D e t o m a r contas n a visita a q u a t r o c e n t a s " i r m a n d a d e s ,


q u e é o m e n o s q u e p o d e haver, ou sejam estas eclesiásti-
cas o u s e c u l a r e s (sobre o q u e c o m ele t e m b u l h a d o o
"corregedor), 3 oitavas d e o u r o , levando o c o r r e g e d o r 1
e s o m a m e m q u a t r o c e n t a s i r m a n d a d e s o n ú m e r o d e 1.200
"oitavas, q u e i m p o r t a m , 1:800UOOO

Pela a d m i n i s t r a ç ã o do s a c r a m e n t o d a crisma, e m q u e está


u m criado c o m u m a salva a receber o u r o , o u t r o a rece-
b e r "cera, e o u e m u m a ou e m o u t r a espécie necessaria-
m e n t e são as ofertas dos crismandos, q u e sem elas se n ã o
a d m i t e m , se n ã o p o d e saber a o c e r t o o q u e i m p o r t a o
r e n d i m e n t o , m a s s e g u r a m e n t e d e c a d a freguesia q u e vi-
sitou o " b i s p o t i r o u m a i s d e 2 0 0 m i l "réis e m o u r o e
cera, q u e , recebida, a fazia logo v e n d e r e p o r b o m p r e ç o .
E c o m p u t a d a s as freguesias q u e p o r si visitou o a n o pas-
sado, que foram 13 ( p o r q u e às d e m a i s mandou
"visitador), veio a r e n d e r a crisma , 2:600U000

S o m a m os r e n d i m e n t o s d a visita, exceto as p r o c u r a ç õ e s
pelos oratórios p r i v a d o s , a q u e se n ã o fez c o n t a 8:64815000

T e m finalmente o bispo d a " c ô n g r u a del-rei l:0O0UOOO


q u e j u n t o c o m a s o m a a c i m a das "chancelarias 10:064U813
D a s "pensões dos "ofícios e "mestrados d a capela 1:638U000
D o r e n d i m e n t o d a visita, 8:648Ü000
S o m a t u d o , salvo e r r o 21:350Ü813
765

> 109 <

[Modo e estilo de minerar nos morros


de Vila Rica e de Mariana]

Descrição de pessoa prática n a mineração das diversas for-


mas de posse e acesso aos veios auríferos e de água. Descortina-se
a partir deste documento u m a situação de complexidade no to-
cante à exploração aurífera e a sua tecnologia, deterrriinadas pela
tipologia das datas. Além disso, denota formas de extração não
previstas no regimento de 19 de abril de 1702, momento em que
apenas as lavras de aluvião eram exploradas, e o estabelecimento
de parâmetros para a distribuição e a solução d e contendas pela
posse de água e de lavras baseados no direito consuetudinário e n a
jurisprudência. Complementa o documento 1 8 .
Este documento constituía subisídio p a r a despachos e sen-
tenças do ouvidor Caetano da Costa Matoso e p a r a a elaboração
de parecer sobre a reforma do regimento, solicitada pelas câmaras
de Minas Gerais e objeto de consulta do Conselho Ultramarino
em 175L
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Vila Rica; ca. 1750.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de u m a descrição. Segundo
Rafael Bluteau, "descrição" é "Definição imperfeita. Representa-
ção, ou pintura de alguma cousa com palavras" [Vocabulário portu-
guês e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes d a C o m p a n h i a de
Jesus, 1713. V. 3, p . 115). Observe-se a atenção especial que o
narrador confere ao "prejuízo" . (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , cursiva e
caligrafada do século X V I I I . Apresenta especificidades: " s " final
redondo, que se prolonga abaixo da linha da escrita; " s " duplo em
forma de paralelas oblíquas que se prolongam acima da escrita;
"d" uncial que forma ligatura com o " e " ; "f' que traz o traço oblí-
quo pronunciado, assemelhando-o a u m " X " ; " c " sempre em
módulo maior que o restante das minúsculas. (YDL)
Cópia impressa:
LANARI, Cássio; O L I V E I R A , Tarquinio J. B. de. Ouro nas Mi-
nas Gerais. O u r o Preto; ESAF, Casa dos Contos, 1976. p. 4 3 - 4 8 .
766

[ fl. 422 ] M o d o e estilo q u e se t e m o b s e r v a d o e p a r e c e se d e v e o b s e r v a r


n o uso d e m i n e r a r nos m o r r o s e distrito de Vila R i c a d o O u r o P r e t o

S e g u n d o os ditames d a r a z ã o q u e alcanço são os seguintes:

N o s serviços d e *catas d e talho a b e r t o e m terras *realengas e c o m u n s a todos,


se a d q u i r e posse c o m os serviços q u e nelas se faz, c o m o é q u e b r a r a * t a p a n h o a c a n g a
e d e s b a r r a n c a r as t e r r a s c o m á g u a s o u serviços b r a ç a i s , c o m o t a m b é m t e r r a s
escorregadas p o r causa dos m e s m o s serviços, p a r a que. d e n t r o destas se n ã o pos-
s a m outros m e t e r a fazer serviço a l g u m c o n t r a v o n t a d e de seus donos. E nas terras
q u e estão e m ser p o r c i m a das ditas catas p o d e m t r a b a l h a r livremente outros quais-
q u e r , sem q u e os das catas lhos p o s s a m impedir, e m "serviços d e b u r a c o s , e m os
quais, e n q u a n t o t i r a r e m o u r o , n ã o os d e v e m as catas a r r u i n a r n e m l a n ç a r fora,
a i n d a q u e lhes i m p e ç a a c o n t i n u a ç ã o d a c a t a , o q u e a c a b a n d o d e lavrar o dito
b u r a c o fica livre o i m p e d i m e n t o p a r a a c o n t i n u a ç ã o d a cata. E fazendo-se o u t r o
serviço d e m a i s d u r a ç ã o , c o m o é de m i n a s o u casas p o r c i m a d a cabeceira p a r a
o n d e c o n t i n u a m a t r a b a l h a r a dita cata, d e v e m protestar-lhes n ã o lhes servir d e
i m p e d i m e n t o à l a b o r a ç ã o d a c a t a , p a r a lhes n ã o p e d i r e m coisa a l g u m a d o seu
i m p o r t e . E n ã o lhes fazendo o dito p r o t e s t o , p a r e c e , ficam c o m a o b r i g a ç ã o d e
lhes p a g a r p o r s e r e m t e r r a s c o m u n s e ' r e a l e n g a s . E h a v e n d o n a s tais p a r a g e n s
o u t r a s catas místicas d e outros d o n o s q u e a divisam, q u e deve h a v e r é o serviço
q u e c a d a u m fizer e adquirir pelo seu trabalho e escorregados das terras p o r causa
dos [serviços] de c a d a u m , q u e parece q u e só assim a d q u i r e m posse das terras realengas.
N o s "serviços d e m i n a s o q u e se deve observar é q u e , c h e g a d a s estas à forma-
ç ã o e m q u e se extrai o o u r o , f o r m a m b r a ç o s c a d a u m a p a r a o n d e m e l h o r c o n t a
lhes faz. Nestes b r a ç o s , ou " c o n t r a m i n a s , m u i t a s vezes se e n c o n t r a m u m a s c o m
outras, d e q u e p r o c e d e m muitas c o n t e n d a s e vistorias, e m cujos encontros o q u e
se observa é q u e o q u e está a d i a n t a d o seguir o seu r u m o e m q u e vai ou p a r a o n d e
lhe p a r e c e r ter m e l h o r conta, e o q u e está a t r a s a d o se m a n d a desviar p a r a o u t r a
p a r t e q u e n ã o faça prejuízo a o q u e está a d i a n t a d o . E n o caso e m q u e este q u e i r a
passar p o r b a i x o ou p o r c i m a d o q u e está, se lhe c o n c e d e a tal p a s s a g e m , sendo
e m c r u z , p o r d o n d e m e l h o r [depressão?] t e m e a fortaleza das terras o p e r m i t e m ,
ficando p o r é m o q u e q u e r p a s s a r o b r i g a d o a toda a s e g u r a n ç a d o q u e está e ressar-
cir-lhe t o d o o prejuízo q u e lhe causar. Q u e sendo a dita p a s s a g e m p o r baixo do
q u e está a d i a n t a d o , se m a n d a a o q u e p a s s a s e g u r a r c o m d o b r a d a fortaleza d e
m a d e i r a a tal p a s s a g e m , c o m o t a m b é m tantos ou q u a n t o s "palmos p a r a trás e p a r a
d i a n t e , c o n f o r m e a s e g u r a n ç a das terras, e j u n t a m e n t e se lhe o p õ e preceito, c o m
d i s t â n c i a c e r t a , a o q u e p a s s a n a dita p a s s a g e m n ã o t r a b a l h a r p o r si n e m p e l o s
p r e t o s "falseadores, a i n d a q u e c o n t a lhe t e n h a p a r a a conservação dos ditos servi-
ços, m o r m e n t e d o q u e está. E s e n d o q u e este p a s s e , e n ã o l h e f a z e n d o c o n t a
t r a b a l h a r mais n o tal serviço, d e v e entupir c o m terras a tal p a s s a g e m e d a r p a r t e a o
d e c i m a p a r a este melhor entulhar, e desta forma fica cessando a dita obrigação. E
767

sendo a dita passagem p o r cima do que está, n ã o t e m este obrigação d e fazer mais
segurança do q u e a q u e lhe é preciso p a r a si, E sendo preciso a a l g u m destes furo
p a r a a respiração d e trabalhar, se lhes permite. A i n d a q u e o outro n ã o consinta, lho
deve conservar p o r força, p o r ser preciso e de necessidade p a r a a luz d a c a n d e i a e
respiração d a gente, q u e p o r falta desta t e m m o r r i d o alguns abafados.
G o m o t a m b é m n a c o n t i n u a ç ã o destas m i n a s sucede i r e m t r a b a l h a n d o à p o r -
fia u m a e o u t r a a o p a r e suceder ajuntarem-se u m a e o u t r a c a b e c e i r a , s e m adian-
t a m e n t o a l g u m de u m a e o u t r a p a r t e . Nestes t e r m o s , se lhes m a n d a a u m a e o u t r a
dividir p a r a o lado c o n t r á r i o , d e i x a n d o u m e o u t r o terra e n t r e m e i o q u e b e m baste
p a r a a c o n s e r v a ç ã o d e u m e o u t r o serviço, c o m p r e t e x t o d e n ã o c o n s e n t i r e m
*faiscadores n e m serviço a l g u m p a r a a p a r t e de e n t r e a m b o s , a i n d a q u e t e n h a
f o r m a ç ã o c o m o u r o . Q u e nos tais t e r m o s se lhes m a n d a q u e , a c a b a n d o u m e o u t r o
a c o n t i n u a ç ã o dos tais serviços, e x t r a i a m o o u r o q u e n a dita divisão lhes ficou
i g u a l m e n t e , p o r se a c h a r ter neste d o m í n i o igual.
T a m b é m sucede i r e m estes "serviços d e m i n a s o u " c o n t r a m i n a s p o r b a i x o d a
t e r r a l a v r a r p o r b a i x o dos d e s b a r r a n c o s e t e r r a s c o r r i d a s p e r t e n c e n t e s às "catas
/ / ditas de t a l h o a b e r t o . Nestes t e r m o s , n ã o p o d e m os das catas i m p e d i r o "servi- [ fl. 422v. ]
ço d a s m i n a s n e m t a m b é m as minas i m p e d i r a c o n t i n u a ç ã o das catas: q u e c h e g a n -
do o " d e s m o n t a r das catas às m i n a s fiquem as m i n a s n a tal p a r t e s e m vigor e as
catas c o n t i n u a n d o o seu r u m o .
T a m b é m nestes serviços d e minas sucede d a r e m c o m á g u a nas veias d a terra
e alguns e m fundões q u e lhes i m p e d e m o t r a b a l h a r , d e q u e se v a l e m p r o c u r a r
c a m i n h o pelo t o m de outras alavancas de outras m i n a s inferiores p a r a a l a n ç a r , d e
q u e t e m havido várias c o n t e n d a s , e m cujos t e r m o s se lhes m a n d a q u e s e n d o e m
p a r t e q u e n ã o faça prejuízo a r e c e b a m , e m f o r m a q u e c o r r a s e m p r e p o r u m teor,
n ã o t r a z e n d o areias n e m o u t r a q u a l i d a d e d e terras q u e cause prejuízo, p a r a o q u e
se lhes m a n d a q u e p o n h a m u m a t á b u a ç õ m u m furo, p a r a esta vir p o r este regis-
tro, p a r a evitar o d a n o q u e causa d e o u t r a sorte, q u e c o m u m e n t e se lança esta p a r a
o esgoto c o m "bateias. E sendo esta e m p a r t e q u e cause g r a n d e d a n o , n ã o a deve
lançar, a i n d a q u e n ã o t e n h a o u t r o recurso, q u e p a r e c e n ã o p o d e h a v e r conveniên-
cia p r ó p r i a c o m prejuízo alheio, o q u e é pelo c o n t r á r i o , q u e i n d o o d o serviço
inferior c o m a l g u m serviço furar nos tais fundões do serviço superior e m p a r t e q u e
[a] á g u a c o r r a n a t u r a l m e n t e p a r a este a d e v e receber, a i n d a q u e l h e cause a l g u m
d a n o p o r esta o ir p r o c u r a r .
T a m b é m t e m havido c o n t e n d a s a respeito d e algumas m i n a s q u e t ê m a c h a d o
á g u a nativa e m a l g u m a c o n t r a m i n a . E c o m o n ã o a c h a m o u r o , e n c a n a m a á g u a
c o m p e d r a s , p a r a q u e esta, a i n d a q u e se a b a t a a dita m i n a , lhes n ã o i m p e ç a o sair a
á g u a p a r a fora. E indo o u t r a m i n a atravessar o dito canal, lhe e n c a m i n h a m p e l a
sua m i n a a dita água, e faltando esta n a p r i m e i r a e a p a r e c e n d o e m a o u t r a m i n a d e
novo se c o n t e n d e p a r a a t o r n a r ao seu antigo curso. E, fazendo-se e x a m e n a dita
m i n a , a c h a n d o - s e q u e atravessou o canal q u e o o u t r o tinha feito, a i n d a q u e a m i n a
esteja a b a t i d a - q u e pela m e s m a r a z ã o t i n h a fabricado o c a n a l —, se l h e m a n d a
e n c a m i n h a r p a r a o primeiro possuidor. E q u a n d o este a t e n h a tirado e m terra e m
768

ser o n d e o o u t r o n ã o tinha c h e g a d o , a i n d a q u e se c o n h e ç a ser a p r ó p r i a , se m a n d a


ficar c o m ela, p o r n ã o ter e n t r a d o e m serviço a l g u m fabricado p o r o u t r e m .
T a m b é m estes "serviços d e minas sucede, c o m a m u i t a c o n t i n u a ç ã o de terras
q u e t i r a m n o centro, fazerem grandes desbarrancos, a b a t e n d o - s e a terra até [em]
cima, q u e e m algumas p a r t e s fazem g r a n d e prejuízo, c o m o são casas d e vivenda,
" t a n q u e s d e á g u a e c a m i n h o s públicos, q u e t u d o a m e a ç a m riscos d e vida. Suposto
q u e o extrair o o u r o se n ã o p o d e impedir, é ficando c o m o e n c a r g o de p a g a r e
ressarcir t o d o o d a n o q u e c a u s a r e m , c o n h e c i d o este p o r sem dúvida q u e o causa.
N a s v e r t e n t e s d e águas d a c h u v a , a posse q u e nestas se a d q u i r e é fazendo
regos e t a n q u e s nas terras desimpedidas q u e ficam destes p a r a cima. E nesta dis-
tância q u e verte p a r a estes regos e t a n q u e s fabricados se n ã o p o d e m outros intro-
d u z i r a fazer o u t r o s q u e lhes d i m i n u a m a tal v e r t e n t e , a i n d a q u e d e n t r o d e s t a
v e r t e n t e f a ç a m a l g u m serviço de m i n a ou b u r a c o , q u e a estes t ã o - s o m e n t e se lhes
p e r m i t e fazer a l g u m a s "lavagens p a r a l a v a r as terras c o m "bateias e lançar-lhes
á g u a c o m b a r r i s . C o m o t a m b é m , a i n d a q u e outros t e n h a m á g u a p a r a passar p o r
d e n t r o das tais vertentes, o n ã o p o d e m fazer c o n t r a v o n t a d e de seu d o n o ; só sendo
p o r c i m a d a terra, e m bicas'levantadas do c h ã o e estas cobertas c o m t á b u a s , p a r a
q u e n e m a q u e c h o v e r e m c i m a das bicas se d e s e n c a m i n h e aos d o n o s das tais
vertentes, q u e assim se observou e m u m a vistoria q u e se fez n o m o r r o de S a n t a n a ,
do Ribeirão, n o tempo do doutor Caetano Furtado de M e n d o n ç a .
[ fl. 4 2 3 ] N a s posses d e " c a n o a s e t a n q u e s q u e se a c h a m p e l o s c ó r r e g o s p a r a o n d e
n a t u r a l m e n t e p e n d e m estas águas e areias q u e c o r r e m de cima dos serviços supe-
riores, esta se a d q u i r i u d e a n t i g a m e n t e se a r r i m a r e m a "faiscar alguns p r e t o s , e
pela c o n t a q u e lhe a c h a v a m os senhores destes e n t r a r a m a fazer t a n q u e s , uns mais
p e q u e n o s e outros maiores, a q u e c h a m a m " m u n d é u s , e nesta posse t e m passado,
p o r v e n d a , de uns a outros possuidores.

M o d o e estilo d e m i n e r a r q u e se t e m observado nos m o r r o s d a Passagem e


de Santana, da Cidade [Mariana]

N e s t e se o b s e r v o u n o princípio q u e se descobriu o da P a s s a g e m , c o m o era


u m a só f o r m a ç ã o , e esta geral, darem-se os b u r a c o s d e q u a r e n t a "palmos d e dis-
tância u n s dos outros, ficando c a d a u m c o m vinte p a l m o s e m r o d a p a r a t o d o s os
lados, c o m o d o m í n i o nesta distância, t a n t o e m c i m a c o m o debaixo d a terra, n a
f o r m a ç ã o , q u e e m t e n d o c a d a u m l a v r a d o os ditos vinte p a l m o s n ã o p o d e r e n t r a r
a o q u e p e r t e n c e r aos outros dos lados, a i n d a q u e veja o o u r o c o m g r a n d e c o n t a . E
sobre estas divisões h a v i a m u i t a s c o n t e n d a s , p e d i n d o desbulhos uns aos outros.
As "minas d e escadas d e r a m a m e s m a distância p a r a os lados, e n o c o m p r i -
m e n t o p a r a d i a n t e c e m p a l m o s . N a s m i n a s d e olivel se d e r a m vinte e cinco p a l m o s
p a r a os l a d o s e q u a t r o c e n t o s p a r a d i a n t e , ficando c o m d o m í n i o e p o s s e n e s t a
distância, d e c i m a até o c e n t r o d a terra, o q u e p a r a a d q u i r i r a dita posse bastava
fazer serviço d a p o r t a p a r a d e n t r o quinze p a l m o s , t a n t o e m m i n a s c o m o e m b u r a -
769

cos, a i n d a q u e as n ã o c o n t i n u a s s e m a n o s . E nesta f o r m a se o b s e r v o u n o m o r r o
dito de S a n t a n a , nos quais até agora se observa. N o q u e toca aos " t a n q u e s , regos
e vertentes, é o m e s m o q u e se observa neste m o r r o d e Vila R i c a .
N o q u e respeita aos "serviços de r o d a s nos veios d e á g u a , são terras tiradas
p o r títulos d e " d a t a s , t a n t o e m rios c o m o e m c ó r r e g o s e "tabuleiros, n o s l a d o s
destes. Q u e s o m e n t e desta forma se a d q u i r e d o m í n i o e posse destas, o q u e m e l h o r
consta do "regimento.
A g u a s nativas: p a r a se a d q u i r i r d o m í n i o nelas e tirá-las d o seu n a s c i m e n t o
p a r a o u t r a p a r t e , h á d e h a v e r "provisão d e q u e m t e m o dito p o d e r e fazer serviços
p a r a as tirar e levá-las p a r a o n d e trabalhe c o m elas. Aliás, passando-se t e m p o s q u e
o n ã o façam, as p o d e r á o u t r o tirar c o m títulos mais m o d e r n o s , q u e se lhes d á mais
vigor pelos serviços q u e nelas faz — q u e p a r e c e n ã o é r a z ã o q u e esteja á g u a i m p e -
dida s e m utilidade, h a v e n d o q u e m dela c a r e ç a . E se c o m a c o n t i n u a ç ã o destes
r e g o s lhes for preciso p a s s a r p o r sítios e r o ç a s de o u t r o s d o n o s , os n ã o p o d e r ã o
i m p e d i r a d i t a c o n t i n u a ç ã o d o rego, p a g a n d o - l h e s , p o r é m , os prejuízos e danos
q u e lhes fizer. E i n d o este= rego p o r c i m a d e o u t r o q u e esteja m a i s antigo, será
o b r i g a d o a t o d o o d a n o q u e c o m este lhe fizer p o r causa d e a l g u m a r r o m b a m e n t o
ou s a n g r a d o u r o s de á g u a , ressalvando-lhe t o d o o d a n o e conservá-lo n a sua anti-
ga posse. E c a r e c e n d o o rego q u e se a c h a p o r baixo das vertentes d a c h u v a s , lhas
deve ressalvar c o m contrarregos p o r c i m a e passar as águas e m bicas p o r c i m a d o
r e g o n a s p a r t e s m a i s c o n v e n i e n t e s q u e h o u v e r . E se este rego " a n o v a d o lhe for
preciso b o t a r á g u a pela p a r t e debaixo do rego antigo p a r a l a v r a r a l g u m a s terras
q u e t e n h a , a passará a s u a custa, sem prejudicar a o q u e está. E n o caso q u e este
r e g o a n o v a d o v e n h a mais baixo do q u e o o u t r o q u e esteja n a tal p a r a g e m , p a s s a r á
c o m a o b r i g a ç ã o d e t o d a a servidão precisa a o d e c i m a , ressarcindo-lhe t o d o o
prejuízo q u e lhe c a u s a r , q u e p a r e c e n ã o p o d e h a v e r utilidade p r ó p r i a c o m p r e -
j u í z o alheio.

• 110 •«
Cana-de-açúcar [fl.424 ]

Narrativa d e imigrante português vivendo em Minas Ge-


rais que descreve as características da cana-de-açúcar plantada
na região, seu cultivo, processo produtivo do açúcar branco e
mascavo e da cachaça e seu emprego, tratando ainda das carac-
terísticas dos engenhos de Minas Gerais n u m a perspectiva com-
parativa com os de outras regiões da América portuguesa.
A descrição atende provavelmente a inquérito solicitado pelo
ouvidor da comarca de Vila Rica em virtude de interesse em
ilustrar as características naturais do Novo M u n d o . Este docu-
mento integra o núcleo deste Códice formado por narrativas sobre
natureza vegetal e m Minas, procedimento recorrente n a época
q u e revela, sob u m a perspectiva p r a g m á t i c a , a intenção de
descortinar as potencialidades econômicas da colônia. Denotador,
por u m lado, do apreço do compilador pelos aspectos técnicos n a
região, esta modalidade de relato parece atender ao registro eru-
dito presente n a época entre os historiadores e, ainda, traduzir
u m a perspectiva pragmática-utilitarista a respeito da natureza
colonial. Destaque-se que os engenhos de cana eram proibidos
na capitania, fato conhecido pelo compilador do Códice, que o
menciona no documento 31.
Autoria, l o c a l e data: Anônimo; Minas Gerais; ca. 1750.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de u m a descrição. Se-
gundo Rafael Bluteau, "descrição" é "Definição imperfeita. R e -
presentação, ou pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabu-
lário portugués e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da C o m -
panhia de Jesus, 1713. V. 3, p. 115). Observe-se a atenção espe-
cial que o narrador confere ao "prejuízo". (JPE)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, cursiva hí-
brida e destrógrada. Alternam-se o "d" uncial com o bastardo
italiano; vários tipos de "s", desde o caudado, de haste simples,
ao redondo; "1" com perfil e u m só traço ou n a forma do bastar-
do italiano. (YDL)

Q
u a n t o [ao] açúcar, h á o u t e m havido três d a A m é r i c a , c o m o é: do R i o de
J a n e i r o ; Bahia; P e r n a m b u c o e P a r a í b a d o N o r t e . E d a q u i são os m e l h o r e s
os [de] P e r n a m b u c o , p o r mais claros e secos. O a ç ú c a r p r o c e d e de u m a s
^ c a n a s q u e v u l g a r m e n t e lhes c h a m a m d e a ç ú c a r . Estas c a n a s são b e m
própriadas ás nossas canas de Portugal, c o m q u e se c o m p õ e m as parreiras e "latadas,
n a cor e no feitio, q u e é o mesmo; a folha é muito mais áspera — e tão áspera q u e corta
- , é mais estreita, não cresce tanto c o m o as nossas, mas no geral é de seis, sete "pal-
mos, m a s j á se tem visto d e doze, que se a p a n h a m tivesse a sua satisfação. Crescem
b e m , q u e a melhor terra h á de ser "varga e alguma coisa úmida. T ê m estas canas os
seus gomos muito mais perto ou juntos uns dos outros, q u e a maior distância q u e t ê m
algumas é meio p a l m o , q u e o c o m u m é muito menos. São as nossas canas vãs ou ocas
p o r dentro; estas são maciças e cheias de u m â m a g o claro e muito sumarento, e desta
u m i d a d e , que n ã o é pouca, se faz todo o fruto que se tira desta planta d a cana.
P l a n t a - s e a c a n a e m t o d o o t e m p o , e e m t o d o o t e m p o se c o s t u m a nestas
M i n a s fabricá-la. E o m a i o r fruto q u e nestas M i n a s se tira da c a n a é t o d o o a n o p o r
771

r e d o n d o fazer-se " a g u a r d e n t e dela, a q u e v u l g a r m e n t e c h a m a m " c a c h a ç a , m a s o


seu n o m e verdadeiro é aguardente de cana. Esta aguardente t e m muito gasto,
p o r q u e n ã o é só a q u e se gasta e m várias e n f e r m i d a d e s — c o m o dores, inflama-
ções, feridas e p a r a os olhos e a surdez e, e m conclusão, é m u i t o m e d i c i n a l —, m a s
a q u e mais se gasta é pelas " t a b e r n a s a q u e b e b e m os pretos e a i n d a muitos b r a n -
cos a g a s t a m . E g r a n d e é o c a b e d a l q u e se faz nesta b e b i d a , cuja c o n s e r v a u m
cheiro ascoroso q u e só pelo cheiro se faz [repugnante?].
P a r a se fazer esta b e b i d a , se c o r t a a c a n a n a roça, e se desfolha, e se c o r t a o
"olho c o m u m "palmo de c a n a , p o u c o mais ou m e n o s , e ali fica; e a c a n a se faz e m
"feixes, a m a r r a n d o - s e com a sua m e s m a p a l h a , e se c a r r e g a e m " c a r r o p a r a o
e n g e n h o , e ali se m ó i , d e sorte q u e fica aquele b a g a ç o n u m a p a l h a tão seca sem
n e n h u m a u m i d a d e , e d e d o n d e se m ó i v a i a q u e l e c a l d o , q u e c á l h e c h a m a m
g a r a p a , p o r u m a bica d e p a u a cair d e n t r o d e u n s cochos d e p a u , q u e são ou d e
tábuas ou d e p a u inteiriço do [tamanho?] d e u m a "caixa d e a ç ú c a r e m t u d o , n o
c o m p r i m e n t o , l a r g u r a e a l t u r a ; e c o m o estas vasilhas j á a n d a m [ a v o l u m a d a s ? ] ,
cheios u m o u m a i s , c o n f o r m e é a posse d o l a v r a d o r , ferve a q u e l a g a r a p a , o u
caldo, q u e ajunta a escuma a u m a b a n d a , o u se está m u i t o cheio b o t a p o r fora o u
lha t i r a m , e depois de p a r a r esta fervura se b o t a aquele caldo, ou g a r a p a , e m u m
a l a m b i q u e o u m a i s a estilar, e dali sai a d i t a a g u a r d e n t e q u e dali vai p a r a as
" p i p a s . E a o " e n g e n h o a v ã o c o m p r a r h o m e n s q u e a c a r r e g a m e m "barris nos
cavalos, e os barris são b e m c o m o os q u e os "moços ou escravos c a r r e g a m á g u a .
P a r a v e r d a d e i r a m e n t e esta c a n a estar c a p a z d e se cortar, plante-se ern q u e t e m -
p o for, h á de passar dois j a n e i r o s p o r ela, só se a t e r r a é tão b o a q u e p u x a m u i t o . O
q u e se p l a n t a d e s t a c a n a são os olhos; t a m b é m se p l a n t a a m e s m a c a n a assim
m e s m o inteira. O m o d o de a p l a n t a r é depois d a t e r r a l i m p a e q u e i m a d a , e se é
"assente "varga q u e se lhe p o d e m e t e r / / a r a d o , assim q u e este a vai a b r i n d o o [ íl. 424v. ]
rego n a terra assim se v a i b o t a n d o à t e r r a os olhos, pelo c o m p r i m e n t o do rego, a
c a n a deitada, ou se a b r e m a t e r r a c o m as e n x a d a s , e daí a dois meses ou m a i s se
l i m p a e depois se l h e tira a folha velha.
Nestas M i n a s , t o d o o a n o ou todos os anos, é preciso p l a n t a r assim a c a n a , senão
p e r d e - s e , p o r q u e n ã o são as terras tão b o a s q u e a p o s s a m sustentar q u e d a raiz q u e
fica n a t e r r a torne a r e b e n t a r , d e sorte q u e fique basta c o m o j á t i n h a estado. S ó sim se
a p a n h a a l g u m a v a r g a q u e , c o m o é terra assente, a i n d a a conserva alguns anos sem se
plantar.
N ã o é assim nos p o v o a d o s — p o v o a d o s c h a m a m o s nós cá, os das M i n a s , o do R i o
de J a n e i r o , o d a B a h i a etc. Nestas terras, h á muitos anos q u e h á e n g e n h o s , e c a d a
e n g e n h o t e m "partidos de c a n a , e t u d o são vargas. E h á p a r t i d o q u e só u m a v e z se
p l a n t o u , e a terra s e m p r e o sustenta b o a , p o r q u e corta-se q u a n d o é t e m p o , q u e n ã o é
s e m p r e . E d e s b a s t a d a a c a n a , fica aquela terra l i m p a d a c a n a , só c o b e r t a de p a l h a
" e m p e ç a n d o ; bota-se-lhe o fogo, e t o r n a a b r o t a r c o m o d e n o v o . É p o r acaso se se
p l a n t a a l g u m a falta q u e t e m . O s s e n h o r e s d e e n g e n h o são os q u e m e n o s c a n a
772

conservam: h á "partidos de c a n a q u e "fabricam lavradores de fora e m o e m a c a n a


nos " e n g e n h o s , c o m o negócio q u e fazem, q u e a m b o s ficam b e m ; e n g e n h o s h á
q u e d ã o as terras aos lavradores p a r a estes as fabricarem; e o u t r o s lavradores h á
q u e são as terras suas. E n ã o p o d e m os e n g e n h o s viver s e m l a v r a d o r e s , p o r q u e os
e n g e n h o s t ê m m u i t a s ocupações q u e fazer c o m os escravos e n ã o lhes sobra t e m p o
p a r a fabricarem c a n a q u e lhes baste p a r a suas fábricas p o r muitos escravos q u e
tenham.
N e s t a s M i n a s , j á hoje se faz m u i t o açúcar, e t a n t o e m p o v o a d o c o m o cá n ã o se
c o r t a c a n a p a r a a ç ú c a r senão n o t e m p o seco, e h á d e ser a c a n a b o a [e] limpa. Primei-
ro q u e o s e n h o r de e n g e n h o e n t r e a fazer a sua safra d o açúcar, p r e p a r a o seu enge-
n h o , q u e s e m p r e h á q u e consertar, p o r q u e são fábricas m u i t o g r a n d e s . H á enge-
n h o s q u e os faz m o e r a á g u a e outros, bestas, e estes são p o b r e s ; aqueles a n d a m
c o m t a n t a violência q u e j á t e m havido " m o e n d a s q u e l e v a r a m corpos d e pessoas
inteiras, m a s q u a n d o c h e g a m a p a s s a r s a e m moídos. O e n g e n h o e m q u e se m ó i a
c a n a essencial são as m o e n d a s . São estas três p a u s q u e terão d e grosso oito até dez
" p a l m o s e d e a l t u r a cinco o u seis, e t o d o s três estão e m p é , t ã o b e m u n i d o s e
direitos q u e lhes m a l c a b e u m a faca flamenga. C a d a u m destes p a u s t e m u m a
d e n t a d u r a à r o d a n o m e i o d e c a d a p a u , de sorte q u e t o d o s t ê m estes d e n t e s e
todos t ê m , e n t r e dente e d e n t e , vão, ou b u r a c o , p o r o n d e se m e t e m e n t r e uns e
outros. E estão estes dentes tão fixos e seguros q u e sendo as três m o e n d a s c o m o
três dedos e m p é direitos e q u a n d o o e n g e n h o q u e r m o e r , a n d a a " r o d a à m o e n d a
do m e i o , e c o m aqueles dentes a n d a n d o a d o m e i o faz a n d a r às duas d e fora; e
assim q u e v ã o m o e n d o se lhe m e t e a c a n a , e c o m o estão tão j u n t a s assim se vai
e s p r e m e n d o a c a n a , q u e , p a s s a n d o - a três ou q u a t r o vezes, fica a q u e l e b a g a ç o sem
substância d e u m i d a d e , q u e t o d a t e m escorrido p a r a baixo e daí vai pela bica a
cair n a s " c a l d e i r a s , q u e j á estão c o m fogo. E m u i t o cheias as c a l d e i r a s , p á r a o
e n g e n h o , p o r q u e este caldo n ã o h á d e ser azedo c o m o é o d a "cachaça.
[ fl. 425 ] M a s os e n g e n h o s q u e fazem / / a ç ú c a r d e sorte são p r e v e n i d o s d e m u i t a s

caldeiras q u e n u n c a a q u e l e p á r a , p o r q u e vai p a s s a n d o de cheias p a r a as o u t r a s ,


n ã o p a r a as desocupar, m a s q u e se faz p o r q u e , se " e s c u m a m e m u m a s e e m outras
ainda, até vai p a s s a n d o d e caldeira a caldeira a "purificar, p o r q u e o q u e se faz e m
u m a s n ã o se faz n o u t r a s , e c a d a u m a t e m o seu mister, E depois d e p u r i f i c a d a
a q u e l a calda e j á e m " p o n t o , se b o t a e m u m a s "fôrmas d e p a u (e t a m b é m se fazem
d e barro) do feitio d e u m barril, d e sorte q u e t e n d o três, ou p o u c o m a i s o u m e n o s ,
p a l m o s d e boca, vai a c a b a r e m m o d o de funil p a r a b a i x o , e neste fundo é t a p a d a
c o m t á b u a , e esta t á b u a é furada c o m cinco ou seis furos d e v e r r u m a força. Estão
estas formas, q u e t ê m de altura três, q u a t r o , p a l m o s , c o m o n ã o t ê m assento q u e as
segure p o r ser q u a s e a g u d o , estão metidas e m uns b u r a c o s , cujos estão feitos e m
u m a s t á b u a s grossas q u e [estão?] altas do c h ã o p a l m o e m e i o p o r n ã o c h e g a r o
fundo d a fôrma a o c h ã o , e ali se b o t a a q u e l a calda, q u e q u a n d o vai j á vai m e i o
fria, q u e logo coalha e n ã o t e m lugar d e sair p o r aqueles b u r a c o s .
Enche-se esta "fôrma, m a s sempre dois, três, dedos de p a u , e depois q u e está
b e m c o a l h a d o , cobre-se este açúcar de b a r r o a m a s s a d o , q u e n ã o seja m u i t o mole
n e m m u i t o d u r o , e este b a r r o é o q u e faz este açúcar ficar b r a n c o , e s e m b a r r o n ã o
fica b r a n c o . T e m e n t ã o certo limite d e dias p a r a estar este b a r r o , q u e tirado o b a r r o
j á o a ç ú c a r está capaz d e se tirar d a fôrma. Servem aqueles buracos d o fundo de
ralo p a r a a q u e l e a ç ú c a r destilar u m "melado ou "melaço - c o m o lhe c h a m a m o s
e m Portugal - e deste q u e d a q u i se estila das fôrmas é d o q u e lá vai. T o d a s estas
fôrmas estão e m o r d e m p o r aqueles buracos das tábuas, e p o r baixo dos fundos das
fôrmas estão várias bicas, que c o m o são as fôrmas muitas n ã o p o d e ser u m a a bica
só, m a s estas q u e estão a p a r a n d o o m e l a ç o v ã o todas cair e m u m a q u e está posta,
de sorte q u e vai o m e l a ç o cair e m u m a "pipa, e cheia aquela se p õ e m outras.
D e s t e m e l a ç o se faz t a m b é m " c a c h a ç a , ou " a g u a r d e n t e , q u e esta é a q u e
v e r d a d e i r a m e n t e é c a c h a ç a . Deste m e l a ç o — q u e cá o seu n o m e é "mel d e t a n q u e
— se c u r a m os [tersóis?] c o m outras misturas, m a s o mel d e t a n q u e é o principal, e
m u i t a gente t e m s a r a d o . D a q u e l a s fôrmas, depois q u e o "mestre v ê q u e o b a r r o
t e m o t e m p o necessário e q u e está capaz d e se tirar, se tira, e h á f ô r m a q u e d á duas
" a r r o b a s e m a i s , m a s o c o m u m são fôrmas q u e d ã o q u a r e n t a até c i n q ü e n t a "libras
de "açúcar b r a n c o , q u e de certa altura d a fôrma p a r a o fundo é m a s c a v a d o , q u e é
o mais p e s a d o , p o r isso vai p a r a o fundo, e p o r esta r a z ã o escorre a q u e l e m e l a ç o ,
e t i r a d o d a q u i o a ç ú c a r a n d a alguns dias a secar a o sol. M a s isto dito a q u i n ã o é
n a d a , q u e p r i m e i r o q u e chegue a isto leva muitas e m u i t a s voltas.

• 111 <

[Engenho de açúcar e aguardente, azeite de mamona e


farinhas de mandioca e de milho]

Descrição objetiva, tomada por observação direta e dados


dos documentos 110 e 112, dos processos de beneficiamento e
equipamentos agrícolas, dos engenhos de açúcar e cachaça, dos
engenhos de pilões de milho, passando pelo azeite extraído da
m a m o n a e pela confecção da farinha de mandioca. Prevalecem
os aspectos técnicos e os resultados alcançados.
Este documento integra o núcleo deste Códice formado por
narrativas sobre natureza vegetal e m Minas, procedimento re-
corrente n a época que revela, sob u m a perspectiva pragmática,
a intenção de descortinar as potencialidades econômicas da co-
774

lônia. Denotador, por u m lado, do apreço do compilador pelos


aspectos técnicos na região, esta modalidade de relato parece
atender ao registro erudito presente na época entre os historia-
dores e, ainda, traduzir u m a perspectiva pragmática-utilitarista
a respeito da natureza colonial. Destaque-se que os engenhos de
cana eram proibidos na capitania, fato conhecido pelo compila-
dor do Códice, que o menciona no documento 31.
Autoría, l o c a l e data: Caetano da Costa Matoso; Vila
Rica; ca. 1750.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se d e u m a descrição. Se-
gundo Rafael Bluteau, "descriçâo e "Definição imperfeita. R e -
,,

presentação^ ou pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabu-


lario português e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da Compa-
nhia de Jesus, 1713. V . 3, p. 115). Observe-se a atenção especial
que o narrador confere ao "prejuízo". QPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva pou-
co caligrafada, com traçado evoluído e personalizado. Raros " s "
caudados de traço simples, e m forma de cajado aberto; predo-
minam os de haste dupla, paralela e destrógira e o sigmático. O
"d" é uncial isolado, ou em ligatura com as vogais que se se-
guem. Finais de palavras com ponto de fuga em linha curva
ascendente. Letra de Costa Matoso. (YDL)

[ fl. 426 ] *Engenho de açúcar e *aguardente c h a m a d a de cana,


e. a q u e c h a m a m * c a c h a ç a

C o m p õ e - s e de u m a g r a n d e [*roda] q u e faz voltar a á g u a e d e u m p a u a n e x o


q u e sai d o c e n t r o dela, n a p o n t a d o q u a l h á u m *rodete c o m seus d e n t e s , nos
quais p e g a m pela p a r t e de c i m a os dentes de o u t r a r o d a g r a n d e , a q u e c h a m a m
* b o l a n d e i r a , n o m e i o d a q u a l e n t r a o "pescoço d e u m a " m o e n d a q u e t e m d e
c o m p r i d o q u a t r o ou cinco "palmos e d e largo o m e s m o , ou m e n o s , s e n d o o feitio
dela r e d o n d o e c h a p e a d a e m r o d a c o m c h a p a s d e ferro p r e g a d a s n o a l t o , p o r
c i m a das quais, e m r o d a , ficam uns dentes q u e saem d o m e s m o p a u , nos quais se
m e t e m outros dentes, do m e s m o feitio, d e d u a s m o e n d a s mais, da, m e s m a forma,
q u e lhe ficam a õ l a d o , as quais a n d a m p o r i m p u l s o dos d e n t e s d a m o e n d a do
m e i o , segurando-se as duas dos lados, pela p a r t e d e cima, c m duas *travessas, 'e
p e l a p a r t e d e b a i x o t e m seus "aguilhões d e ferro, d e peso d e três e m a i s " a r r o b a s ,
c o m "espigões q u e e n t r a m nas ditas m o e n d a s e sobre q u e a n d a m , ficando fora
delas u m " p a l m o d o dito ferro, q u e assenta e m o u t r o ferro p o r b a i x o , t e n d o das
b a n d a s c a d a u m a seu b r o n z e , c o m o q u a l ficam seguras p a r a a n d a r , s e n t a d a s
todas três sobre u m p a u de g r a n d e grossura, a q u e c h a m a m "mesa.
P o r e n t r e as ditas m o e n d a s , ou p o r d a do m e i o , se m e t e m p o r u m deles a
c a n a , q u e c o m a violência e u n i ã o de u m a e o u t r a m o e n d a se vai logo r a l a n d o e
775

c o n t i n u a n d o a passar-se p e l o o u t r o l a d o até q u e , c o m efeito, estile dela t o d o o


s u m o q u e t e m e o b a g a ç o q u e fica se deita fora. C a i n d o o tal s u m o n a dita "mesa,
se e n c a m i n h a p o r u m lado dela a u m p e q u e n o a q u e d u t o q u e guia a u m a s [pias?]
de p a u a q u e c h a m a m cochos, o n d e estando o dito s u m o 24 h o r a s , mais ou m e -
nos, ferve a dita c a l d a e se azeda, e daí se lança e m u m a l a m b i q u e de m a i o r ou
m e n o r g r a n d e z a , o n d e c o m o fogo p o r baixo ferve, até q u e destila a a g u a r d e n t e , e
d a q u i vai p a r a as "pipas, e se p o d e b e b e r logo.
E q u a n d o se q u e r fazer açúcar, e m lugar d e ir a calda p a r a o cocho, se enca-
m i n h a p a r a u m a "caldeira d e c o b r e , / / o n d e fervendo c o m fogo ativo p o r baixo [ fl. 426v. ]
vai j u n t a n d o p o r c i m a u m a escuma, q u e se lhe vai t i r a n d o c o m u m a e s c u m a d e i r a
g r a n d e e se l a n ç a fora. E c o m o m u i t o ferver se v a i purificando de sorte esta calda
q u e fica e m " p o n t o de m e l a d o ou p o n t o fino; e s t a n d o nele se vai p a s s a n d o p o r
u m p a n o , d e sorte q u e fica c o a d o de a l g u m a g r a ç o q u e possa ter, e assim se vai
logo d e i t a n d o e m o u t r a caldeira mais p e q u e n a , a q u e c h a m a m "tacha, e ali s e m
fogo ^se vai a p u r a n d o , d e s o r t e q u e fica e m p o n t o m u i t o m a i s grosso q u e o d e
"melaço, e d a q u i se tira c o m u m a colher g r a n d e a q u e c h a m a m " r e m i n h o l , e o
v ã o l a n ç a n d o e m u m a s "fôrmas de b a r r o ou p a u c o m u m p e q u e n o furo n o fundo,
p o r o n d e sai a u m i d a d e d a q u e l a c a l d a , q u e é o c h a m a d o m e l a ç o . E c o m esta
estilação vai e n g r o s s a n d o n a f ô r m a a d i t a calda c o b r i n d o - a p o r c i m a , e n q u a n t o
está b r a n d a , c o m b a r r o e m cima, q u e "purifica mais o açúcar e o faz mais b r a n c o ,
e está nesta f ô r m a 15 ou 20 dias, passados os quais se lhe tira o b a r r o , e assim nas
fôrmas se p õ e a secar a o sol p o r alguns dias, no fim dos quais o tiram das fôrmas
e m q u e se a c h a u n i d o e d u r o e depois o fazem e m "caras, o q u e t e m n a f ô r m a
largueza p a r a elas, e o mais q u e b r a m e fazem e m p ó , c o m o dele se usa.
A c a n a d e q u e se faz u m a e o u t r a coisa é p e l o m o d o e feitio d e caniço d o
R e i n o , crescendo à p r o p o r ç ã o d a q u a l i d a d e d a terra e m altura d e 5 até 12 e 15
"palmos. Esta se c o r t a e l i m p a d e a l g u m a folha seca q u e tem, e cortando-se-lhe a
p o n t a o u "olho v ã o neste dois c a n o s a q u e c h a m a m elos, e m e t e n d o - s e deitados
d e b a i x o da t e r r a dali n a s c e m q u a t r o e cinco c a n a s . D e p o i s d e crescidas, o q u e
fazem e m dois anos, se t o r n a m ã c o r t a r e p l a n t a r os olhos d a m e s m a f o r m a . E
beneficiada c o m o o milho, sachando-se ou c a p i n a n d o - s e , sem q u e p a r a isso seja
r e g a d a ou se lhe faça o u t r o beneficio. E logo que esta c a n a t e m dois o u três pal-
m o s , é doce o suco, e se p l a n t a ou n a m e s m a p a r t e o n d e se corta, se é terra b o a , ou
e m diversa. T e m folhas pelo feitio das canas do R e i n o , a i n d a q u e mais p e q u e n a s ;
t e m grossura p o u c o mais q u e a d e m i l h o , tendo a casca c o m o a d o m i l h o .

Azeite de m a m o n a [ fl. 4 2 7 ]

A s e m e n t e d e q u e se faz este azeite é daqueles "carrapatos d e q u e n o R e i n o


h á e m p a r t e s , a cujas árvores c h a m a m lá, alguns, figueiras-do-inferno. Esta se-
m e n t e se soca ou pisa, ou e m "pilões, p o r " e n g e n h o , ou à m ã o , e m gamelas, feitio
776

dos m e s m o s *pilões; e depois de p i s a d a se-deita e m u m t a c h o c o m u m p o u c o d e


á g u a c o m q u e vai fervendo a o fogo, e o azeite q u e sai d o dito p o l m e v e m a de
c i m a d a á g u a e m q u e se coze; e assim se vai tirando c o m u m a colher p a r a fora, e
é este o azeite q u e serve p a r a alumiar, ficando s o m e n t e a á g u a n o fundo do t a c h o .
E s t a s á r v o r e s se s e m e i a m dos m e s m o s " c a r r a p a t o s e b e n e f i c i a m c o m o a o u t r a
q u a l q u e r p l a n t a , e é á r v o r e q u e d u r a anos c o r t a n d o - s e - l h e c o n t i n u a d a m e n t e os
cachos, e m cujos r a m o s r e b e n t a m outros.
T a m b é m se faz azeite d e a m e n d o i m , q u e [é] u m a p l a n t a c o m o a de "tremoços,
q u e se semeia e d á u m a s e m e n t e q u e se c o m e , d e cujo azeite se serve m u i t a gente p a r a
o p r a t o e mais guisados, e m lugar d o azeite doce do R e i n o .

. F a r i n h a d e m a n d i o c a a q u e se c h a m a d e p a u

M a n d i o c a é u m a árvore n ã o grossa m a s levantada c o m bastantes r a m o s sem


forma, saindo c a d a u m p a r a sua parte, a qual lança u m a raiz de dois até quatro e
cinco "palmos, b a s t a n t e m e n t e grossa; e p a r a se tirar se a r r a n c a c o m facilidade a
árvore, descobrindo-lhe a terra, q u e n ã o é muita, p o r estar à superfície. A esta raiz se
tira u m a delgada c a p a r a s p a d a Com u m a faca, e muito b e m lavada se vai desfazer e m
u m a "roda c h a p e a d a de cobre picado e m pequenos buracos p a r a ralar, pondo-se d e
u m a p a r t e da roda, a o n d e estando firme a vai desfazendo e r a l a n d o a r o d a , ou os
ditos b u r a c o s , ou cobre levantado, p o r força deles. E c a i n d o e m u m a tina d e p a u ,
dela se vai passando a uns cestinhos feitos de taquara ou cana, a q u e c h a m a m "tipitis;
e c h e i o s estes d a d i t a m a n d i o c a r a l a d a se m e t e m e m u m a " p r e n s a a o n d e ,
"esborrachando-se os ditos cestos, se estila toda a u m i d a d e , d e parte d a qual se fazem
os polvilhos, q u e ficam s u m a m e n t e brancos. E extinta toda a u m i d a d e d a dita m a n -
dioca se tira dos cestos e deita a torrar e m "fornos de cobre, e feita assim serve de
alimento c o m o p ã o ao c o m u m das gentes, especialmente l a n ç a d a e m caldo gordo.

[ fl. 42 7v. ] F a r i n h a d e m i l h o feita e m p i l õ e s

L a n ç a - s e o m i l h o nos "pilões a q u e b r a r , e q u e b r a d o , q u e é o m e s m o q u e
tirar-lhe o cascabulho d e fora, limpo dele, se deita de m o l h o p o r cinco ou seis dias
e m á g u a fria, a o n d e a z e d a a l g u m a coisa. Passados estes dias, se tira e deita nos
pilões s e g u n d a vez, o n d e se soca, m ó i e desfaz, e dali se tira e l a n ç a e m uns fornos
d e c o b r e o u tachos, o n d e se torra e fica servindo d e a l i m e n t o c o m o d e p ã o e d e
mais uso nestas M i n a s q u e d a m a n d i o c a .
T a m b é m h á " m o i n h o s q u e m o e m m i l h o c o m o os d e P o r t u g a l , cuja farinha
serve p a r a m a n t i m e n t o dos escravos, deitando-a estes e m p a n e l a s ou tachos, o n d e
ferve a l g u m a coisa c o m água, e ficando c o m o massa dura, a q u e c h a m a m angu,
c o m e m este assim q u e n t e e frio, e m i s t u r a d o t a m b é m c o m algumas ervas ou feijão
aos "almoços e "ceias. E aos "jantares, c o m u m e n t e , é o milho l i m p o d a casca e
777

cozido assim inteiro sem sal n e m t e m p e r o a l g u m , a q u e c h a m a m canjica. E d e


q u a l q u e r destas "farinhas de m o i n h o ou pilões se faz b r o a c o m o n o R e i n o , e é
m u i t o mais clara p o r o m i l h o ser b r a n c o , e j á e m a l g u m a s p a r t e s destas M i n a s ,
pela B o r d a do C a m p o , h á trigo, centeio, milho m i ú d o e p a i n ç o .

• 112 «
Farinha de mandioca ou de pau 1
[fl.428 ]

Narrativa de imigrante português vivendo em Minas Gerais


sobre métodos de plantio e benefieiamento da mandioca. C o m apre-
ço pelos detalhes, expõe as formas de processar os grãos de milho
em pilões ou moinhos, as variedades de mandioca existentes nas
Minas, a utilidade medicinal de seus derivados, oferecendo com
minudência as práticas de plantio e transformação até alcançar a
farinha.
A descrição atende provavelmente a inquérito solicitado pelo
ouvidor da comarca de Vila Rica em virtude de interesse e m ilus-
trar as características naturais do Novo M u n d o . Este documento
integra o núcleo deste Códice formado por narrativas sobre natu-
reza vegetal em Minas, procedimento recorrente n a época que
revela, sob u m a perspectiva pragmática, a intenção de descortinar
as potencialidades econômicas da colônia e de Minas Gerais, es-
pecificamente. Denotador, por u m lado, do apreço do compila-
dor pelos aspectos técnicos n a região, esta modalidade de relato
parece atender ao registro erudito presente n a época entre os his-
toriadores e, ainda, traduzir uma perspectiva pragmática-utilitarista
a respeito da natureza colonial.
Autoria, l o c a l e d a t a : Anônimo; Minas Gerais; ca. 1750.
U s o n a historiografia: Ao dedicar parte considerável de
seu estudo à cultura da mandioca em Minas, Waldemar de Almeida
Barbosa tomaria deste testemunho a comprovação da generaliza-
ção do consumo da mandioca e a descrição da forma como era
consumida na região (A decadência das Minas e ajuga da mineração.
Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 1971.
P. 214).

Título atribuído por Caetano da Costa Matoso.


A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de u m a descrição. Se-
gundo Rafael Bluteau, "descrição" é "Definição imperfeita. R e -
presentação, ou pintura de alguma cousa com palavras" [Vocabu-
lário português e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da C o m -
panhia dejesus, 1713. V. 3, p. 115). Observe-se a atenção espe-
cial que o narrador confere ao "prejuízo". (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva hí-
brida e destrógrada. Alternam-se o "d" uncial com o bastardo ita-
liano; vários tipos de "s", desde o caudado, de haste simples, ao
redondo; "1" com perfil e u m só traço ou na forma do bastardo
italiano; "f' de duplas hastes, com traço horizontal em laçada; " q "
em abreviatura, com laçada seguida de traço ascendente, em am-
plo movimento; o "d" uncial tem o traço de prolongamento para-
lelo à linha da escrita. Capitulares ornadas de apex, com hastes
em aspirai. Letra idêntica à do documento 110. (YDL)

E
n e s t a A m é r i c a , ou Brasil, o p ã o c o m u m e u s u a l s u s t e n t o a f a r i n h a d e
m a n d i o c a , q u e v u l g a r m e n t e n o nosso Portugal lhe c h a m a m o s à dita fari-
n h a q u e vai de cá farinha de p á u .
T a m b é m se usa d e "farinha d e m i l h o , m a s este uso é só nas M i n a s e e m São
P a u l o , e n ã o e m t o d a a p a r t e (como é geral a de m a n d i o c a ) . P a r a se fazer a farinha
de m i l h o se t o m a ao milho e m grão o u se b o t a e m u m "pilão, q u e é u m b u r a c o
q u e se faz e m u m p a u q u e leva u m a " q u a r t a do dito m i l h o ou mais, e ali se pisa ou
soca, c o m o cá se c h a m a c o m u m a tranca, q u e t e m seis ou sete p a l m o s d e c o m p r i -
?

d o , a q u e c h a m a m mão-de-pilão. E depois de estar q u e b r a d o ou a q u e l a c a s q u i n h a


q u e o g r ã o t e m b e m fora, se s a c o d e o tal m i l h o e se b o t a [em] u n s c o c h o s o u
gamelas de p a u , e ali está d e m o l h o e m á g u a q u e o c o b r e , e d e dois e m dois dias
se lhe m u d a a á g u a , e no fim de, oito dias, q u e j á e n t ã o está m o l e , se lava m u i t o
b e m e se b o t a ao dito pilão a pisar c o m a dita m ã o . E assim se vai fazendo e m
farinha, a q u e c h a m a m "fubá, e se vai p e n e i r a n d o e m u m a s p e n e i r a s d e t a q u a r a
finas, e c o m o n ã o basta u m a só vez p a r a ficar b e m p i s a d o , se pisa três ou q u a t r o e
se vai p e n e i r a n d o até ficar d e todo e m fubá. T a m b é m h á uns " e n g e n h o s d e r o d a
q u e a á g u a faz a n d a r q u e t ê m uns pilões q u e pisam o m i l h o . E feito assim e m fubá,
se b o t a e m u m t a c h o ou "forno d e cobre, q u e é o m e s m o é ter as b o r d a s p e q u e n a s
e este está assentado e m u m a fornalha, e c o m bastante fogo se vai t o r r a n d o , m a s
c o m u m a p á c u r t a se m e x e m u i t o b e m p a r a q u e se n ã o q u e i m e . E t o r r a d a ela se
g u a r d a p a r a se c o m e r e d u r a oito dias e mais c o m b o m gosto.
O p ã o c o m u m p o r t o d o o Brasil, ou América, é a farinha de m a n d i o c a . É esta
u m a p l a n t a q u e n u n c a se lhe estraga ou p e r d e a s e m e n t e , a i n d a q u e p o u c o cuida-
do haja. E a s e m e n t e desta p l a n t a m u i t o distinta do fruto q u e dá, p o r o fruto só
serve p a r a se c o m e r , n ã o p l a n t a r , e a s e m e n t e só serve p a r a se p l a n t a r , e n ã o se
c o m e r . T r ê s castas h á de m a n d i o c a . H á u m a de q u e mais se usa nestas M i n a s , é
779

u m a c h a m a d a m a n d i o c a b r a v a ; esta m a n d i o c a m a t a a q u a l q u e r p e s s o a q u e a co-
m e r d a sorte q u e se cria e sai d a terra, e pelo contrário aos animais q u e a c o m e m
da m e s m a sorte lhes n ã o faz m a l , c o m o cavalos e p o r c o s , e a estes m e s m o s animais
m a t a p a r a logo se acaso b e b e m u m a á g u a q u e d a dita m a n d i o c a sai q u a n d o se
e s p r e m e , c o m o eu vi j á m o r r e r e m . As outras duas castas de m a n d i o c a lhes cha-
m a m a i p i m , u m v e r m e l h o , o u t r o b r a n c o . O v e r m e l h o , a i n d a se se c o m e r c o m o
fica dito d a b r a v a a i n d a faz m a l . A b r a n c a é m u i t o doce, n ã o faz m a l . Estas d u a s
c h a m a d a s aipim se lhes c h a m a m m a n d i o c a s m a n s a s . Q u a l q u e r destas m a n d i o c a s
se usa d e c o m e r assadas ou t a m b é m c o z i d a s n a p a n e l a d a v a c a , como muitos
u s a m , e n ã o t ê m m a u gosto, e sem receio se p o d e c o m e r desta sorte a q u a n t i d a d e
q u e q u i s e r e m . T o d a s estas três m a n d i o c a s , a r r a n c a d a s e b o t a n d o e m * tijuco q u e
as c u b r a , d e n t r o e m oito dias estão m o l e s , e depois / / d e assim estarem se c o m e m [ fl. 428v. ]
sem escrúpulo n e n h u m d e fazerem mal. E desta m a n d i o c a , assim depois d e lava-
d a e l i m p a d a c a s c a e seca ao sol, -se p i s a e p e n e i r a , se fazem u n s m i n g a u s o u
caldos b e m t e m p e r a d o s ; são muito frescos e peitorais e dão-se a gentes doentes e
d e p o u c a sustância. D a q u i é q u e t r a z e m aqueles n o m e s m i n g a u s d e "carimã.

E a m a n d i o c a u m a tal p l a n t a q u e c o m t o d o o t e m p o se dá; a i n d a n a m a i o r
seca^ m e l h o r fruto. N a s terras altas se d á b e m , e q u a n t o m e l h o r t e r r a m e l h o r fruto.
N a s *vargas se d á m u i t o b e m se ela é seca, q u e se são ú m i d a s a p o d r e c e . E preciso
a esta p l a n t a estar s e m p r e d e u m ã n o m u i t o p a r a c i m a n a terra p a r a d a r b o m fruto.
N ã o h á d ú v i d a q u e q u a n d o as terras são novas e areentas q u e mais depressa se
cria, m a s n u n c a m e n o s do a n o . E a m a n d i o c a u m p a u m u i t o t e n r o e c o m g r a n d e
â m a g o p o r d e n t r o , c o m u m a casca tênue d a cor de u m p a r d o escuro (não o a i p i m
b r a n c o , q u e esse c o m efeito o é), d a grossura de q u a l q u e r " b o r d ã o o u p o u c o mais.
E b e m v e r d a d e q u e a b r a v a a c h a n d o t e r r a a sua satisfação engrossa, n ã o t o d a ,
mais do q u e q u a l q u e r pulso d e h o m e m t r a b a l h a d o r , o q u e n ã o sucede n o a i p i m ,
q u e s e m p r e é mais fino, p o r b o a q u e a terra seja. T e m estes p a u s os seus "olhos
p p r o n d e b r o t a m o u a r r e b e n t a m j u n t o s e m u i t o à m o s t r a , p o r s e n d o o p a u liso, e
só q u a n d o cresce m u i t o n a g r o s s u r a se l h e v ê e m u m a s veias; se v ê e m os olhos
m u i t o b e m , e p o u c o mais ou m e n o s t ê m d e distância u m ao o u t r o d e dois d e d o s .
N u n c a se faz árvore g r a n d e , se b e m q u e h á p a u d e dez "palmos, q u e o c o m u m são
d e cinco até oito, m a s n u n c a é direito p a r a cima, sim p a r a as b a n d a s e descompos-
tos, e n a t u r a l m e n t e nasce d a t e r r a até altura de três ou q u a t r o p a l m o s , e nesta faz
três galhos, e assim v ã o crescendo até certa altura, a t é q u e c a d a galho forma outros
três, e assim vai a n d a n d o , e se a d e i x a m estar n a terra m u i t o mais t e m p o , p o r q u e
n u n c a se p e r d e sendo a terra seca e livre de p o r c o s do m a t o e a i n d a dos d e casa,
q u e c o m e m m u i t o nela, v ã o crescendo os ditos galhos p a r a as b a n d a s , n u n c a p a r a
cima, sim m u i t o descompostos. Planta-se esta s e m e n t e ou p l a n t a , o p a u p a r a m e -
lhor dizer, d e j u n h o até agosto, e c o m u m e n t e h á d e ser t e m p o seco, e o m e l h o r
p l a n t a r h á d e ser antes d e este p a u a r r e b e n t a r , q u e p a r a ele r e b e n t a r ou b r o t a r n ã o
carece d e estar m e t i d o n a terra, q u e sendo v e r d e , e m c h e g a n d o t e m p o , a r r e b e n t a .
H á de ser esta p l a n t a d a e m dias de sol, p o r q u e h á u m dizer n o Brasil d a m a n d i o c a
780

q u e se diz: " P l a n t a - m e n o p ó e n ã o t e n h a s d e m i m d ó . " C o s t u m a - s e a esta p l a n t a


n u n c a recolher-se, se b e m q u e nos C a m p o s Gerais — o n d e a p e r t a m m a i s as gea-
das, assam os ditos p a u s , e m u r c h o s eles assim n ã o r e b e n t a m e p e r d i d a está e n t ã o
— alguns lavradores q u e u s a m desta lavoura a a j u n t a m e m "feixes e a c o b r e m c o m
q u a l q u e r c o b e r t u r a de c a p i m , q u e no m e s m o c a m p o lhe fazem, q u e a i n d a q u e lhe
d ê o sol n ã o lhe faz t a n t o m a l c o m o a g e a d a . P r e p a r a d a a terra, q u e é r o ç a d a [e]
q u e i m a d a , se v ã o a b r i n d o as covas c o m a e n x a d a , longe u m a d a o u t r a cinco até
seis p a l m o s , e n ã o h á d e ser cova r e d o n d a , sim d e u m a face só, q u e é m e t e r a
e n x a d a toda e tirar a terra, e torna-se a m e t e r n ã o no m e s m o b u r a c o m a s sim a
u m a b a n d a , d e sorte q u e fique a cova t o d a u m a e de f u n d o h á de ter a altura d a
m e s m a e n x a d a . E feita assim a terra, ou toda ou p a r t e dela, se vai b u s c a r a m a n d i -
oca ou " r a m a , q u e c o m u m e n t e lhe c h a m a m , e se vai p o n d o e m feixe p e l a roça,
p o r q u e n ã o se p õ e t o d a j u n t a . E c h e g a d o o dia d e plantar,, se vai c o r t a n d o c a d a
[ fl. 4 2 9 ] p a u daqueles e m p e d a c i n h o s d e u m / / "palmo, e h á de ser este p a u c o r t a d o no
ar, e n ã o no c h ã o n e m e m c i m a d e outro p a u ; p o r se n ã o e s m a g a r ou esfolhar a
casca, h á d e ser n o ar, e de dois ou três golpes, d e sorte q u e caia o p e q u e n o no
c h ã o . C o n s e r v a este p a u e n q u a n t o está v e r d e u m a tal u m i d a d e n a sua casca q u e
q u a n d o se corta b o t a u m leite m u i t o claro e grosso, q u e é de o n d e se lhe gera a
raiz, e p o r esta r a z ã o é q u e se h á d e cortar n o ar; esta p l a n t a r e b e n t a mais depressa
d o q u e b o t e raiz. Feitos assim os p a u z i n h o s , vai u m a ou mais pessoas a p a n h á - l o s ,
e b o t a n d o - o s u m ou dois p a u s e m c a d a cova, e v ã o outros atrás e n d i r e i t a n d o os
p a u s , p o r q u e h ã o d e ficar e m p é encostados e c o m os olhos p a r a [cirna?], e nisto
d e v e h a v e r cautela, p o r q u e se n ã o ficam os olhos p a r a cima m o r r e m , q u e é seca-
r e m . E n e s t a p l a n t a se g a s t a m às vezes s e m a n a s , c o n f o r m e é a q u a n t i d a d e d a
p l a n t a , e q u a n d o o l a v r a d o r p l a n t a m u i t a m a n d i o c a n ã o se diz plantou tantos * alqueires,
m a s diz-se plantou tantos mil *feixes. N ã o se p l a n t a e m dia d e c h u v a , p o r r a z ã o de lhe
lavar o leite, e t a m b é m assim q u e se vai p i c a n d o se vai p l a n t a n d o , e assim q u e se
b o t a nas covas se cobre d e terra, p o r q u e o sol t a m b é m lhe seca o leite. Feita a dita
p l a n t a , se traz a terra limpa, e m e n o s duas vezes n o a n o , e p a s s a d o o dito t e m p o ,
c o m o j á se disse, p a r a c i m a de a n o ou dezoito meses, o m e l h o r t e m p o d e "desfa-
zer esta p l a n t a ou de fazer a farinha é q u a n d o o p a u j á n ã o t e m folhas, p o r q u e
e n t ã o r e n d e m e l h o r , se b e m q u e e m t o d o o t e m p o se faz f a r i n h a ( t a m b é m dos
olhos das folhas q u a n d o são t e n r o s os grelos, digo, d a m a n d i o c a m a n s a se faz u m
guisado d e q u e u s a m os filhos d a terra, q u e c o m e m e cujo o comi, a q u e c h a m a m
m a n i ç o b a ) . A m a n d i o c a b r a v a r e n d e m u i t o mais do q u e a m a n s a , e p r i n c i p a l m e n -
te e m raízes j á teve p a u de m a n d i o c a q u e d e u tanta raiz q u e se fez m e i o alqueire
d e farinha. E b e m v e r d a d e q u e n ã o é r e g r a c o m u m . As raízes d a m a n d i o c a b r a v a
são m u i t o m a i s grossas e c o m p r i d a s , o q u e n ã o t e m a m a n s a , q u e são m e n o s e
curtas, m a s n o seu t a n t o desfazem-se mais e m farinha do q u e a b r a v a , p o r q u e esta,
c o m o é mais grosseira, faz m u i t o mais "cureras» ou farelos. P a r a m e l h o r explicar:
é o suco desta raiz c o m o u m n a b o , tem a casca m u i t o m a i s grossa e a raiz e m si é
781

m u i t o alva e m u i t o mais d u r a q u e o n a b o ; c o r t a d a u m a raiz d e m a n d i o c a c o m


u m a faca e c o r t a d o o n a b o , olha-se p a r a u m e o u t r o , o suco é o m e s m o . H á raiz d e
m a n d i o c a b r a v a q u e t e m oito "palmos ou mais e h á p a u q u e d á seis, sete, raízes,
m a s n ã o são todas iguais e h á p a u q u e d á mais, m a s n ã o é geral, e se são terras
boas e novas p o u c a terra d á m u i t a farinha. A r r a n c a m - s e estas raízes, ou m a n d i o c a ,
p a r a se fazer e m c a d a dia e se m a n d a m a riscar tantos "jacas, p o r q u e j á o l a v r a d o r
sabe os q u a n t o s "alqueires lhe d ã o aqueles tantos j a c a s . O s j a c a s são uns cestos
fundos d e altura d e cinco p a l m o s de b o c a e Vai estreitando p a r a o fundo, d e sorte
q u e fica de u m . V e m esta m a n d i o c a p a r a casa e e n t r a m a raspá-la, d e sorte [que]
lhe n ã o fica sinal de casca, e se lava m u i t o b e m fica m u i t o clara, do q u e vai a ralar
e m u m a " r o d a , q u e a faz a n d a r c o m a m ã o e t a m b é m c o m á g u a . Esta r o d a é
" c h a p e a d a c o m u m a s c h a p a s d e c o b r e o u d e a r a m e , e estão p i c a d a s p o r u m a
b a n d a m u i t o b a s t a n t e m e n t e , d e sorte q u e p a r a a o u t r a b a n d a s a e m todos aqueles
piques e fica t u d o e m p o n t a s vivas e estas c h a p a s n a face q u e faz a r o d a direita. E
c o m o a dita r o d a a n d a c o m violência, ou c o m a m ã o ou c o m á g u a , se vai c h e g a n -
do à q u e l a raiz d a m a n d i o c a e aquelas p o n t a s a v ã o ["desfazendo?] e r a l a n d o , d e
sorte q u e fica aquela massa p o r baixo d a r o d a , q u e s e m p r e está alta do c h ã o cinco
o u seis p a l m o s e m u m a caixa, ou g a m e l a , ou c o c h o , q u e c o m u m e n t e a s s i m se
c h a m a , e dali se tira p a r a uns cestos q u e são feitos e b e m tecidos d e t a q u a r a ou
casca do p a u d e p a l m i t o v e r d e . Parecem-se estes cestos — q u e se lhes [ c h a m a m ? ]
"tipkis, q u e assim é o seu n o m e —, / / c o m o é o seu n o m e , [com?] "masseiras q u e [ íl. 429v. ]
v ê m d o Algarve n o tecido, m a s são muito maiores, d e sorte q u e se e n c h e três ou
q u a t r o — o c o m u m são dois — e se m e t e m d e n t r o ou debaixo d e u m a "prensa c o m
u m "fuso q u e , a n d a n d o - s e a r o d a c o m ele, a p e r t a aqueles tipitis, d e s o r t e q u e
escorre a q u e l a á g u a e esta é a q u e m a t a se a b e b e m , e fica a q u e l a m a s s a seca.
(Nesta á g u a sai u m p o l m e tão sutil c o m o alvo q u e assenta no fundo [da vasilha?]
e m [que] cai, d e s o r t e q u e ele assentado se b o t a a á g u a fora e fica o dito p o l m e ,
q u e seco b e m a o sol é o q u e serve d e polvilhos de q u e se u s a m n a s cabeleiras.
T a m b é m se faz m i n g a u s dele, q u e é c o m o caldos d e g o m a e b e m se p o d e c o m e r
s e m escrúpulo q u e n ã o fazem m a l , antes m u i t o b e m , m a s m u i t o e m u i t o m e l h o r e s
são os q u e ficam ditos p a r a confortar e refrescar.) E se tira daqueles tipitis e daí se
vai p e n e i r a n d o e m u m a s p e n e i r a s d e t a q u a r a ralas e fica aquela massa o u farinha
m u i t o clara, e n a p e n e i r a ficam uns farelos a q u e se c h a m a m "cureras. D e p o i s d e
a q u e l a farinha p e n e i r a d a vai a o "forno de cobre a t o r r a r , e é preciso ter o forno
3

fogo g r a n d e , e q u e m faz a farinha h á de ser ligeiro e m a m e x e r , senão perde-se,


q u e é mais fácil e m se p e r d e r q u e a de m i l h o . E t o r r a d a b e m e b e m , se g u a r d a
p a r a se ir c o m e n d o , m a s n u n c a d u r a tanto c o m o a de milho, p o r q u e m a i s depressa
amolece e p e r d e aquele gosto q u e t e m q u a n d o está t o r r a d a .
O b e m d a m a n d i o c a é o ser t ã o geral p ã o c o m u m a q u e a b u n d a n t e m e n t e é
mais sadia n o c o m u m e necessário do q u e a farinha d e milho, m a s c o m i d a d e m a -
siada e, c o m o os filhos d a t e r r a fazem [os terséis?], o q u e n ã o faz a de m i l h o , q u e
esta [os quieta?].
O m e l h o r d a m a n d i o c a é a m a n d i o c a "puba. A m a n d i o c a p u b a é aquela q u e
eu digo q u e b o t a d a n o "tijuco amolece ou a p o d r e c e , q u e q u a n d o está m o l e t e m
u m c h e i r o q u e p a r e c e está p o d r e , e p o r isso lhe c h a m a m p e l a "língua d a t e r r a
m a n d i o c a p u b a ; é b o a . A i n d a q u e no gosto o n ã o seja m u i t o , n o mais o é, q u e
seca e b e m p e n e i r a d a se faz aqueles caldos c h a m a d o s de "carirnã, q u e são b o n s ,
q u e se d ã o t a m b é m aos [tísicos?], p o r q u e n u t r e m e refrescam. Até assada se c o m e
q u a n d o saí do tijuco, e n ã o é m a u sustento, pois até farinha se faz desta m a n d i o c a ,
a q u e é q u e n ã o t e m b o m gosto etc.

• 113 <
[Notícias das taquaras, dos cipós e das muitas comidas
que se fazem de milho nas Minas]

Relação objetiva sobre as taquaras, os cipós e as variações


culinárias do milho em Minas Gerais. A preocupação central é
demonstrar as diversas utilidades desses produtos, incluindo-se
valor medicinal e posologia.
A descrição atende provavelmente a inquérito solicitado pelo
ouvidor da comarca de Vila Rica em virtude de pretensão de ilus-
trar as características naturais do Novo Mundo. Patenteador, por
u m lado, do apreço do compilador pelos aspectos naturais e técni-
cos n a região, cumpria também u m a exigência dos padrões dos
textos eruditos da época. Este documento integra o núcleo deste
Códice formado por narrativas sobre natureza vegetal em Minas,
denunciando aparentemente interesse em revelar as potencialidades
econômicas da natureza colonial, podendo estar referido também
a suas obrigações de ouvidor e corregedor de fiscalizar os ofícios
médicos.
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Minas Gerais; ca. 1750.
U s o n a historiografia: Sérgio Buarque de H o l a n d a cita
este "escrito anônimo de 1747 [sic]" para ilustrar a diversifica-
ção e a expansão das lavouras que ocorreram em Minas após a
carestia dos primeiros tempos e reproduz desta fonte a descrição
das variadas receitas em que se emprega o milho, enfatizando a
preponderância do milho sobre a mandioca na dieta do mineiro.
(Metais e pedras preciosas. In: História geral da civilização brasi-
leira. São Paulo: Difel, 1976. T . 1, v. 2, p. 289-290). O mesmo
783

autor, em estudo anterior, utiliza o documento p a r a discutir a


contribuição do milho n a dieta dos paulistas e nas áreas de sua
expansão e hierarquias culinárias ao produto associadas (Cami-
nhos e fronteiras, 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
p. 182-185).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de uma descrição. Segun-
do Rafael Bluteau, "descrição" é "Definição imperfeita. Repre-
sentação, ou pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabulário
português e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes d a C o m p a -
nhia de Jesus, 1713. V. 3, p. 115). Observe-se a atenção especial
que o narrador confere ao "prejuízo". (JPF)
C o m e n t á r i o paleografíco: Escrita moderna, caligrafada
e regularizada, típica do período barroco. Destrógrada, em que se
acentuam as aberturas das vogais, como "a" e " o" (semelhantes
às unciais); "f' de dois olhos, com traço horizontal arqueado (apa-
rentando u m terceiro olho); hastes inferiores do " s " caudado, do
" g " , do "y" e do " p " , como semicírculos, proporcionais e equili-
brados. Uso do circunflexo para marcar tonicidade de vogais ou
semivogais. T r a z capitulares importantes, com volutas e laçadas.
(YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Sempre que identificadas, foram
corrigidos os erros de grafia na nomenclatura popular das espé-
cies vegetais citadas. N o s casos em que isso n ã o foi possível,
restringiu-se apenas à atualização ortográfica dos nomes cons-
tantes no original.

N o t í c i a s d a s t a q u a r a s o u c a n a s m o n t a n h e s a s q u e se a c h a m p e l o s s e r t õ e s [ fl. 4 3 0 ]
d e s t a s M i n a s e d e a l g u n s c i p ó s e seus p r é s t i m o s

H á o t a q u a r a ç u , assim c h a m a d o n o v o c á b u l o d o *gentio d o m é s t i c o , q u e
q u e r dizer cana grossa. O seu préstimo p a r a o gentio e cursadores do sertão é servir-
lhes m u i t a s vezes de p a n e l a p a r a cozinhar carne ou quaisquer legumes c o m m u i t a
b r e v i d a d e e c o m particular gosto, p o r ser g r a n d e o seu vão: c o r t a n d o c a n u d o p o r
c a n u d o e cheio d e q u a l q u e r *vianda, t a p a d o , o l a n ç a m e m u m a fogueira, v i r a n d o
d e u m a p a r t e p a r a o u t r a , e o q u e nele se m e t e se coze c o m m u i t a brevidade; t e m
mais p r é s t i m o de se fazer dela os "tipitis, q u e são c o m o cestinhos e m q u e se m e t e
a m a s s a p a r a ir à "prensa; t a m b é m dela se fazem as peneiras p o r q u e se c o a m as
m e s m a s farinhas depois d e espremidas n a p r e n s a e passadas a o "pilão; t a m b é m
t ê m p r é s t i m o de servirem p a r a canas de rede, c o m o as da í n d i a p a r a os "palanquins;
t a m b é m servem p a r a escadas pelo seu g r a n d e c o m p r i m e n t o e leveza.
H á outras castas de t a q u a r a s , c o m o é o t a q u a r a t ã , e estas são mais delgadas;
servem mais p a r a esteiras e balaios e vasos p a r a muitas serventias.
784

H á o u t r a c h a m a d a t a q u a r a p o c a , t a m b é m grossa e c o m p r i d a m a s d e p o u c a
sustância, q u e só serve p a r a esteiras e "jacas, q u e servem d e c a r r e g a r m a t é r i a s
grossas c o m o cestos.
H á t a m b é m o t a q u a q u i c é , q u e q u e r dizer taquara de faca, p o r q u e , r a c h a d a s ,
Ficam c o m g u m e c o m o faca, d e sorte q u e d ã o golpes p e n e t r a n t e s , e p o r esse res-
p e i t o o g e n t i o delas u s a m , e a p a r a d a s c o m faca e l e v e m e n t e t o s t a d a s a o fogo
fazem as p o n t a s das suas flechas c o m q u e v i o l e n t a m e n t e trespassam, sendo seus
arcos de p a u s fortíssimos, q u e desse i n s t r u m e n t o se v a l e m p a r a m a t a r e m os mais
ferozes animais. P a r a hastes destas p o n t a s , serve o t a q u a r a t ã , p o r serem mais del-
g a d a s , ou o u t r a s c a n a s a q u e c h a m a m cabajuvas; e n g a s t a d a s nas tais p o n t a s e
e m p e n a d a s c o m p e n a s d e ave grandes, c o m o jacus e araras, ficam p r e p a r a d a s , q u e
n o i d i o m a gentílico q u e r dizer uibá, e q u a n d o q u e r e m dizer a m u i t a flecha d i z e m
quirauibá.
H á mais a t a q u a r a c h a m a d a p i n i m a , q u e q u e r dizer taquara pintada; e tive-
r a m a rica serventia p a r a " b o r r a c h a s d e g u a r d a r o u r o , a q u e c h a m a m "picuá, e
m u i t o s as o r n a v a m c o m bocais de p r a t a e delas u s a v a m c o m o bolsas.
H á mais a t a q u a r a q u e c h a m a m d e laçada, q u e é d e q u a l i d a d e m i ú d a e dela
se fazem os laços p a r a colher os papagaios, maitacas, m a r a c a n ã s , aruaís, p e r i q u i -
tos, j a n d a i a s , q u e n o t e m p o dos milhos descem às roças, e os caçadores, ocultos,
pelos pescoços os v ã o l a ç a n d o sobre o m e s m o milho ou árvore.

Notícias dos cipós

[ fl. 430v. ] H á o cipó c h a m a d o b u t u a , q u e só a raiz t e m singulares préstimos b e m sabi-


dos n a m e d i c i n a .
H á o cipó c h a m a d o rapacari; serve a sua raiz d e s a b ã o p a r a lavar o c o r p o e
t o d a a q u a l i d a d e d e r o u p a s , e d e si l a n ç a m u i t a s e s c u m a s ; a d m i r á v e l p a r a
" a l m o r r e i m a s e m "ajudas.
H á p cipó c h a m a d o í m b é e, outros, prego das M i n a s , p o r ter a serventia p a r a
a m a r r a r ; e d a sua casca exterior se fazem as a m a r r a s p a r a âncoras e "fateixas das
e m b a r c a ç õ e s e c o r d o a r i a s p a r a os v e l a m e s , s u p r i n d o a falta das d e linhos; p e l a
m a i o r p a r t e n a s c e m nos troncos dos p a u s grossos, e n o p é l a n ç a m u m a s folhas, e
n o m e i o u m a p i n h a m u i fechada, m u i s u m e n t a e doce; este se conserva n a á g u a e
suas folhas [são] medicinais p a r a b a n h o s , chagas e c u r a r "fontes.
H á o u t r o cipó c h a m a d o t i m b ó , q u e supre a falta dos pregos; t e m m u i t a d u r a -
ção a o t e m p o , e m u i t o mais n ã o lhe c h e g a n d o água ou t o d o debaixo dela.
H á o u t r o do m e s m o c h a m a d o t a m b é m t i m b ó , q u e é grosso e d e c o m p r i d a
c o r d a , q u e p i s a d o nas lagoas e s c u m a c o m o s a b ã o ; este é v e n e n o r e f i n a d o q u e
a p e n a s o peixe dele gusta fica m o r t o , r a z ã o p o r q u e é p r o i b i d o pelas " c â m a r a s dos
lugares c o m graves p e n a s , p o r q u e b e b e n d o os animais d a q u e l a á g u a ou c o m e n d o
a folha, s e m r e m é d i o m o r r e m , e o m e s m o sucederia à gente se a comesse.
785

H á " t a m b é m o c h a m a d o guaiviticambira, q u e q u e r dizer canelas de velha farelenta;


é v e r m e l h o , este é m u i t o forte p a r a a m a r r a r e se conserva m u i t o m e t i d o nas p a r e -
des.
H á o u t r o c h a m a d o alho, q u e pelo cheiro se c o n h e c e .
T o d o s servem d e a m a r r a r , p o r serem b r a n d o s e m u i c o m p r i d o s .
H á outros muitos mais, sem ministério d e q u e se faça m e m ó r i a .

N o t í c i a d e m u i t a s c o m i d a s q u e se f a z e m d e m i l h o

P r i m e i r a m e n t e , serve e m g r ã o p a r a sustento dos animais domésticos e silves-


tres. D e l e se faz o "fubá, assim c h a m a d o nas M i n a s e, e m Portugal, farinha; deste,
ó a n g u p a r a os negros, cozido e m u m t a c h o de água até secar; só se diferencia d a
b r o a e m ser esta cozida n o forno e levar sal.
E n q u a n t o v e r d e , m u i t o se c o m e assado e d a sua espiga, a i n d a e m leite, se tira
o g r ã o ; e s o c a d o e m pilão, do caldo cozido e m u m t a c h o , se fazem u m a s p a p a s
q u e i m i t a m o m a n j a r b r a n c o ; é m u i t o substancial.
D o b a g a ç o q u e fica se fazem uns bolos, q u e metidos e m folhas debaixo das [ fl. 431 ]
brasas do fogão e assados são gostosos, e se c h a m a m p a m o n h a s .
D o milho seco se faz a farinha p a r a a mesa: b o t a d o este de m o l h o e depois
p i s a d o e p e n e i r a d o d o farelo, se p õ e a t o r r a r e m u m a g r a n d e b a c i a d e c o b r e ;
t i r a d o , é usual p ã o d a terra.
D o m i l h o seco q u e b r a d o e m p i l ã o , e s c o l h e n d o - o d a casca c o m p e n e i r a , a
q u e nas M i n a s c h a m a m g u r u p e m a , se faz a canjica grossa, q u e os ricos c o m e m p o r
gosto e os p o b r e s p o r necessidade, p o r n ã o ter mais t e m p e r o q u e o ser b e m cozi-
da. Desta canjica se faz o célebre m a n j a r a que c h a m a m c a t i m p u e r a , q u e m a s c a d a
n a b o c a é l a n ç a d a n o caldo d a m e s m a canjica, e n o dia seguinte j á t e m seu a z e d o
e está perfeita, e p a r a ser mais saborosa h á de ser m a s c a d a p o r a l g u m a velha, e
q u a n t o mais velha melhor^ isto p o r lhe aproveitar a b a b a ; e assim dela g u s t a m os
de b o m e s t ô m a g o , q u e os nojentos a l e v a m e s o c a m a o p i l ã o e a c r e s c e n t a m - n a
c o m água; esta é medicinal p a r a as febres, p o r fresca, p a r a o q u e s e m p r e se escolhe
o milho q u e seja b r a n c o , m a s n u n c a é tão saborosa n e m medicinal c o m o m a s c a d a
aos d e n t e s .
D o m e s m o milho b e m socado se faz a canjica fina, q u e t e m p e r a d a c o m "adu-
b o s supre a falta d e a r r o z , e n a opinião d e muitos é melhor.
D a m e s m a f a r i n h a , e n q u a n t o n ã o é t o r r a d a , se faz cuscuz, q u e nas M i n a s
supre a falta do p ã o d o trigo, q u e desfabricados e levados a o forno a t o r r a r fica
biscoito gostoso e serve p a r a j o r n a d a s , pela sua d u r a ç ã o .
D a m e s m a farinha d o milho m i s t u r a d a c o m " m e l a d o e a m e n d o i m (que se
c r i a m n a terra, a casca c o m o pinhões grandes e a "vianda c o m o m i l h o grosso e o
gosto c o m o nozes) se fazem uns bolos, alcamonia, digo, a q u e c h a m a m a l c a m o n i a
ou p é s - d e - m o l e q u e .
786

D o m e s m o m i l h o se fazem as "viandas c h a m a d a s p i p o c a s , q u e é p o n d o - s e
[ fl. 43 lv. ] a l g u m a s espigas a o fumo e m e t i d o s os g r ã o s e m u m c e s t i n h o / / c o m a l g u m a s
b r a s a s e a b a n a n d o - s e c o m o "turíbulo r e b e n t a o m i l h o , e assim ficam as pipocas
c h a m a d a s escolhido-das-brasas, d e q u e u s a v a m m u i t o os paulistas.
M a i s do milho se fazem, ou de sua farinha, uns bolos a q u e c h a m a m [beijus?],
q u e é a m a s s a n d o - s e c o m " m e l a d o e m p o r ç ã o de farinha q u a n d o i n c o r p o r e nas
m ã o s se fazem r e d o n d o s e e m b r u l h a d o s e m folhas, e cozidos e m tachos até e n d u -
recer ficam os [beijus?] c h a m a d o s .
D o m e s m o milho se faz a b e b i d a m e l h o r p a r a os pretos d a Gosta d a M i n a , q u e
é o m i l h o m o l h a d o [e botado?] e m u m a s folhas d e b a n a n e i r a s ; depois que tiver nasci-
do o grelho seca-se ao sol, e depois de seco vai a o "pilão e peneira-se, e o "fubá
q u e sai bota-se e m u m t a c h o c o m água a ferver, e depois d e cozido coa-se e b o t a m
e m u m "barril até t o m a r seu a z e d u m e p a r a m e l h o r g u s t a r e m ; este v i n h o n a sua
l í n g u a se c h a m a aluá.
O u t r o cipó, c h a m a d o j a c a t u p é , q u e n a raiz cria u m g r a n d e n a b o e p a r a se
c o m e r n ã o necessita de fogo; p o r é m , d á u m a s e m e n t e de, três grãos e m u m a casca
c o m o d e fava p e q u e n a e tão venenosa c o m o o n a b o d o m e s m o cipó; é saudoso, d e tal
sorte q u e a p e n a s se c o m e de r e p e n t e se m o r r e ; é semente p r e t a do t a m a n h o d e u m
"tremoço.

• 114 <

[Lembranças das ervas medicinais, dos cipós e das árvores


e paus mais usuais no país das Minas]

Apontamentos sobre espécies vegetais existentes em Minas


feitos por observação direta. N a seqüência inicial, compreende
uma lista com a designação de inúmeras ervas, terrenos em que
ocorrem e seu emprego curativo, seguida de u m a relação sumária
de alguns cipós e suas designações. A terceira e última parte relaci-
ona grande variedade de madeiras através de seus nomes popula-
res e indígenas^ algumas delas associadas a fins curativos ou eco-
nômicos. Certo utilitarismo em torno d a natureza da região per-
corre todo o documento, que combina o reconhecimento das es-
pécies vegetais existentes na região e sua finalidade econômica e
as preocupações inerentes ao colecionador.
A descrição atende provavelmente a inquérito solicitado pelo
ouvidor da comarca de Vila Rica em virtude de pretensão de ilus-
787

trar as características naturais do Novo M u n d o . Patenteador,


por u m lado, do apreço do compilador pelos aspectos naturais e
técnicos na região, cumpria também u m a exigência dos padrões
dos textos eruditos da época. Este documento integra o núcleo
deste Códice formado por narrativas sobre natureza vegetal em
M i n a s , d e n u n c i a n d o a p a r e n t e m e n t e interesse em revelar as
potencialidades econômicas da natureza colonial, podendo estar
referido também a suas obrigações de ouvidor e corregedor de
fiscalizar os ofícios médicos.
Autoria, l o c a l e d a t a : anónimo; Minas Gerais; ca. 1750.
U s o n a historiografia: Beatriz Ricardina de Magalhães
apóia-se no documento ao associar a parcimônia do mobiliário
nas residências da comarca de O u r o Preto a aspectos culturais,
descartada a carência de elementos materiais {A d e m a n d a do
trivial; vestuário, alimentação e habitação. Revista Brasileira de
Estudos Políticos, Belo Horizonte, n. 65, p. 191, 1987).
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna, cursiva, hí-
brida do século X V I I I e detrógrada, com hastes superiores do
tipo da bastarda italiana, em que t a m b é m se destaca o " p " de
dupla haste, munido de apex e olho em laçada; abreviatura do
" q u e " com ponto abreviativo e laçada ascendente, que se trans-
forma em meia voluta acima da letra. Apresenta capitulares com
apex em forma de amplas laçadas. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Sempre q u e identificadas, foram
corrigidos os erros de grafia n a nomenclatura popular das espé-
cies vegetais citadas. Nos casos em que isso n ã o foi possível,
restringiu-se apenas à atualização ortográfica dos nomes cons-
tantes no original.

L e m b r a n ç a d e e r v a s m a i s m e d i c i n a i s q u e h á n e s t e *país d a s M i n a s [ fl. 432 ]

E r v a c h a m a d a d e s a n t a - m a r i a , q u e se d á p o r terras estercadas; t e m esta erva


virtude p a r a m a t a r lombrigas, p a r a *panariz e "carbúnculos.

E r v a c h a m a d a suçuaia, q u e c o s t u m a haver p o r "capoeiras e terras estercadas;


é perfeito r e m é d i o p a r a defluxões e p a r a c o r t a r o sangue e m febres malignas.

Erva c h a m a d a do b i c h o ; p a r a "corruções é r e m é d i o a p r o v a d o .

E r v a c h a m a d a crista-de-galo, t e m as folhas p e l a p a r t e d e c i m a verdes, p o r


baixo e n c a r n a d a s ; c o s t u m a esta erva dar-se e m terras frescas; é b o a p a r a "esquinên-
cias e feridas de garganta.
738

E p a r a o m e s m o efeito t e m a m e s m a virtude o grelo de j u q u e r i , cuja folha se


come.

Erva c h a m a d a d e j a c u c a n g a , nasce pelas "capoeiras; esta t e m a f o l h a larga e


espinhos nos r a m o s e p a r a quaisquer feridas é r e m é d i o b p m .

E r v a c h a m a d a língua-de-vaca, c o s t u m a a dar-se p o r terras boas; a folha, p o r


c i m a v e r d e e p o r baixo b r a n c a , t a m b é m é b o a p a r a feridas.

Erva c h a m a d a de p a s s a r i n h o , q u e c o s t u m a dar-se p o r cima das laranjeiras, e


as m a t a ; esta, socada, b e b i d o o s u m o , é b o a p a r a q u e d a s .

E r v a c h a m a d a p a r i p a r o b a , t e m a folha g r a n d e e c o s t u m a dar-se p o r t e r r a
fresca; é b o a p a r a desfazer o s a n g u e pisado.

E r v a c h a m a d a mata-pastos, q u e se cria pelos pastos; esta é b o a p a r a "ajudas,


frescas.

[ íl. 432v ]
; E r v a c h a m a d a fedegoso, quase t e m a m e s m a p a r e c e n ç a e a m e s m a virtude.

E r v a c h a m a d a fumo-bravo, dá-se p o r terras boas; é b o a p a r a ajudas.

E r v a c h a m a d a m a s t r u ç o , c o s t u m a a dar-se p o r terras b o a s .

E r v a c h a m a d a m e n t r a s t o , t a m b é m c o s t u m a dar-se p o r terras b o a s e t e m sua


p a r e c e n ç a e cheiro c o m u m a q u e h á e m Portugal c h a m a d a t r e v o .

E r v a c h a m a d a vassoura, q u e p o r outro n o m e se c h a m a o a i r u m e .

E r v a c h a m a d a vassourinha, c o s t u m a a dar-se p o r terras b o a s .

E r v a c h a m a d a aninga, é b o a p a r a " a l m o r r e i m a s .

E r v a c h a m a d a purica.

E r v a c h a m a d a betônica brava.

Erva c h a m a d a caputera.

E r v a - m o u r a , q u e c o s t u m a dar-se p o r t e r r a boa.
789

Erva c h a m a d a serralha.

E r v a c h a m a d a p i n o , t a m b é m se d á e m t e r r a fresca.

E r v a c h a m a d a guibá.

Erva c h a m a d a maría-conga.

E r v a c h a m a d a ovário-de -peixe.

Erva c h a m a d a barbasco.

Erva c h a m a d a papua. [ - 4-^3 ]


n

Erva c h a m a d a catião.

L e m b r a n ç a d o s c i p ó s m a i s u s u a i s d e q u e se l h e s s a b e o n o m e e d e l e s se u s a ,
h a v e n d o o u t r o s m u i t o s d e q u e se n ã o s a b e o n o m e

C i p ó c h a m a d o t i m b o p e b a , é o m e l h o r q u e há.

Cipó chamado venhé.

C i p ó c h a m a d o ovaimi.

Cipó c h a m a d o camira.

Cipó c h a m a d o guario.

Cipó c h a m a d o manteiga.

Cipó c h a m a d o mecuna.

C i p o c h a m a d o são-joão.

C i p ó c h a m a d o de b u t u a .

Cipó c h a m a d o de espinhos.

C i p ó c h a m a d o i m b é . Este e o p r i m e i r o acima são os m e l h o r e s q u e h á .


790

[ fl, 433v. ] A r v o r e s m a i s u s u a i s e p a u s d e q u e m a i s se u s a d e l e s

P a u c h a m a d o c e d r o , é o m e l h o r que h á p a r a *batéis, " c a r u m b é s e p a r a t a b u -


a d o ; c o s t u m a a dar-se e m terras boas.

P a u c h a m a d o jequitibá, é árvore m u i t o c o m p r i d a e só c o p a d a e m cima; serve


esta p a r a "caixões d e "rodas d e m i n e r a r .

P a u c h a m a d o guarita, é p a u d e lei e b o m p a r a "eixos d e r o d a s .

P a u c h a m a d o oacá.

P a u c h a m a d o c a n j a r a n a , t a m b é m b o m p a u d e lei.

Pau chamado urucurana.

P a u c h a m a d o a l m e c e g a , e s t a d á [incompleto].

P a u c h a m a d o g r a ú n a , q u e é o m e l h o r q u e h á , p o r ser durável t a n t o p a r a a
terra c o m o p a r a o ar.

Pau c h a m a d o jacarandá, que é o pau melhor que há para obra de torno.

P a u c h a m a d o angelim, é p a u m u i t o grosso; serve p a r a "mesas d e " e n g e n h o e


p o r t a s , e se usaria mais dele se n ã o fosse o seu a m a r g o r .

P a u c h a m a d o catinga.

P a u c h a m a d o p e r o b a , t a m b é m dos principais p a u s do m a t o .

P a u c h a m a d o cabeçu, e p o r o u t r o n o m e pau-de-colher.

P a u chamado sapopema.

Pau chamado valemba.

P a u c h a m a d o o ingazeiro, este d á fruta q u e se c o m e .

P a u c h a m a d o i n v a v o b a , q u e n e m é v e r d a d e i r a m e n t e p a u p o r ser oco p o r
d e n t r o e d e p e q u e n a grossura.
791

P a u c h a m a d o g u o r e n d e ú b a , este, estilada a casca, é b o m p a r a os olhos.

P a u c h a m a d o angico.

P a u c h a m a d o sucupira. [ fl. 4 3 4 ]

P a u c h a m a d o canafistula, serve p a r a curtir couros.

Pau c h a m a d o tupixava.

Pau c h a m a d o b r e j a ú b a , é b o m p a r a arcos de b o d o q u e s .

P a u c h a m a d o tapetingui.

Pau chamado jaquerê.

P a u c h a m a d o g o i a b e i r a , q u e d á f r u t o q u e se c o m e ; é d o t a m a n h o d e
maçãs.

P a u c h a m a d o coirana.

P a u c h a m a d o cabetinga.

P a u c h a m a d o c a b i ú n a , este é q u e vai p a r a Portugal.

Pau chamado votambu.

Pau chamado mulato.

P a u c h a m a d o três-folhas, q u e por o u t r o n o m e se c h a m a a c u c h i p u t a g i a r á .

Pau c h a m a d o embiruçu.

P a u c h a m a d o aterituba, q u e d á tinta p a r a tingir d e v e r m e l h o .

P a u c h a m a d o vinhático, t a m b é m b o m p a u d e lei.

P a u c h a m a d o j a r a g u e t i á , é m u i m o l e e depois de seco fica oco.

P a u c h a m a d o p a l m i t o , q u e é m u i c o m p r i d o e quase t o d o igual, e só e m c i m a
t e m n a t r a m a c o m o de p a l m a e d e n t r o dela o p a l m i t o , q u e se c o m e .
792

Pau chamado jeribá.

Pau chamado pindaúva.

P a u c h a m a d o m a r i a - p r e t a , t a m b é m b o m p a u d e lei.

P a u c h a m a d o canela, q u e q u a n d o se corta cheira m e s m o canela.

Pau chamado pequiá.

Pau chamado tambatarabá.

[ fl. 434-v. ] Pau chamado timbouva.

Pau c h a m a d o oacá.

P a u c h a m a d o j a b u t i c a b a , que d á u m a s frutas pelo m e s m o c o r p o do p a u cha-


m a d a s j a b u t i c a b a s , m u i t o frescas e boas.

Pau chamado jatu.

P a u c h a m a d o de breu.

P a u c h a m a d o bicuíba, q u e d á u m a s frutas c h a m a d a s bicuíba, g r a n d e r e m é -


dio p a r a t u d o .

P a u c h a m a d o p a u - s a n t o , q u e a casca serve p a r a dores de b a r r i g a , p o r outro


nome para-tudo.

P a u c h a m a d o gameleira, q u e t a m b é m p o r o u t r o n o m e se c h a m a airova.

P a u c h a m a d o d e m o e n d a s , e disso serve p o r seu p a u m u i t o grosso.

P a u c h a m a d o ribeirão.

P a u c h a m a d o capeba, q u e t a m b é m se c h a m a p a r i p a r o b ã .

Pau chamado javandi.

Pau chamado barbatimão.

Pau c h a m a d o suçuacanga.
P a u c h a m a d o guarova.

Pau c h a m a d o buripinheiro.

P a u c h a m a d o sassafras.

Pau chamado não-me-chama.

P a u c h a m a d o pitingueira.

P a u c h a m a d o upiúva.

P a u c h a m a d o seguraja.

P a u c h a m a d o ubatiga.

Pau c h a m a d o pau-guiné.

P a u c h a m a d o cipotão.

Pau chamado ubopeba.

Pau chamado ubacambuci.

P a u c h a m a d o de vinagra.

Pau chamado vacurupario.

Pau chamado vacrumichava.

Pau chamado carandá.

P a u c h a m a d o creúva.

Pau chamado cabreúva.

P a u c h a m a d o p a u - d e - ó l e o , q u e é de c o p a i b a .

P a u chamado cambará.

Pau chamado pau-monjolo.


794

P a u c h a m a d o jutaigurabixira,

Pau chamado pau-da-quaresma

P a u c h a m a d o araübir.

Pau chamado pau-de-congonha.

P a u c h a m a d o d e casca-de-cobra, este se dá mais p o r "capoeiras; a raiz deste


p a u é r e m é d i o a p r o v a d o , e o t e n h o visto e x p e r i m e n t a r e m a l g u m a s pessoas d e
m o r d i d e l a s de c o b r a ; m a s c a n d o a raiz e levando o salivre p a r a baixo e o b a g a ç o
p o s t o n a m o r d e d u r a n ã o h á r e m é d i o q u e lhe c h e g u e . Esta á r v o r e t e m o p é d a
folha c o m p r i d o e a folha se r e p a r t e e m cinco partes.

• 115 <

[ fl. 436 ] Mapa do soldo que vence a guarnição de *dragões


da capitania das Minas Gerais, desde o posto de *tenente
de mestre-de-campo general até o de soldado

Relação de postos militares que compunham a companhia


de dragões em Minas e seus respectivos soldos.
Envolve preocupação programática do compilador em reu-
nir informações que compreendessem o estado político e militar
da América portuguesa, sendo marcante o esforço de se fazer
registrar a memória dessas ocorrências.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Provedoria d a Real Fazenda de
Minas Gerais; Vila Rica; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita m o d e r n a , extrema-
mente caligrafada e regularizada, do tipo redondo. Presença do
cifrão cortado transversalmente, com traço q u e termina em ân-
gulo, igual a u m circunflexo. Abreviatura usual de "réis". (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Foi mantido o cifrão cortado e fo-
ram desdobradas as abreviaturas.
80$000
60$000
80$000
60^000
48à5000
40^000
32^000
24^000
7 5 1 *réis '/a
375 réis h
x

335 réis

• 116 <
[Excerto do termo de uma visita pastoral à freguesia
de Nossa Senhora do Pilar do Pitangui]

Narrativa produzida durante visitação episcopal descreven-


do as características de uma criança encontrada pelo visitador pos-
suidora de estatura e medidas acima do comum. O texto apresen-
ta as características físicas do menino e suas habilidades, seguidas
da indicação de suas medidas através de traços.
Relato de cunho teratológico e inscrito em padrões eruditos
adotados na época, esse registro contribui para ilustrar a variedade
de fontes a que recorre o colecionador para formar seu compêndio.
Embora tais registros teratológicos compusessem parte da trama das
narrativas religiosas, não deve ser descartado que talvez represente
influência dos debates científicos sobre os efeitos do clima america-
no sobre a constituição física e mental de seus habitantes.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Francisco Pinheiro da Fonseca;
Pitangui; 10.5.1738,
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de u m a descrição. Se-
gundo Rafael Bluteau. "descrição" é "definição imperfeita. R e -
presentação, ou pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabu-
lário português e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da C o m p a -
nhia de Jesus, 1713. V. 3, p . 115). O documento constituiria,
provavelmente, subsídio para a "história" tal como ê entendida
n a época: "narrração de cousas memoráveis que têm acontecido
796

em algum lugar, em certo tempo, e com certas pessoas ou na-


ções", segundo o mesmo autor (v.4, p. 39).
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, caligrafada
e regularizada do século XVIII, de traçado evoluído e personali-
zado. Apresenta algumas especificidades: "d" uncial, cujo traço
termina em semicírculo fechado; " s " caudado com único traço
oblíquo retilíneo; " f de u m só traço vertical, sinuoso e cortado
por traço reto horizontal, alterna com o de laçadas e traço ascen-
dente em volutas; "g" de duplo olho, sendo que o inferior termina
em semicírculo sinistrógiro. Letra de Caetano da Costa Matoso.
Texto contido em moldura. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Foí suprimida moldura existente no
original. As medidas dos traços no original foram índicadoas em
nota de rodapé.

E
[ fl. 4 3 7 ] ~J ^ m 10 d e m a i o d e 1 7 3 8 , e s t a n d o e u e m "visita n a "freguesia d e N o s s a
S e n h o r a d o Pilar d a vila d e P i t a n g u i , nesse t e m p o " b i s p a d o d o R i o d e
l J a n e i r o e h o j e d e M a r i a n a , achei u m m e n i n o , filho legítimo d e M i g u e l d e
F a r i a S o d r é e d e sua m u l h e r V e r ô n i c a Dias Leite, o q u a l t i n h a de idade seis anos
e 11 meses, tão c o r p u l e n t o q u e p a r e c i a ter casta de gigante, t ã o b e m disposto e d e
tal f o r m o s u r a q u e t e n d o l o u r o o cabelo, b a s t a n t e m e n t e o n d e a d o , t i n h a o c a r ã o
tão fino, alvo e r o s a d o q u e p o d i a competir c o m as d a m a s m a i s formosas d a C o r t e .
T o m e i - l h e as m e d i d a s e m várias partes do c o r p o , e são as seguintes: as forças e r a m
d e r a p a z de 12 a n o s , o e n t e n d i m e n t o n ã o excedia aos da sua v e r d a d e i r a i d a d e ,
p o r é m m o n t a v a só e m u m cavalo e g o v e r n a v a direto p a r a o n d e queria.
D u a s m e d i d a s deste risco era a grossura da c a r a t o m a d a pela b o c a p a r a o pescoço.

Q u a t r o , debaixo d a b a r b a ao alto da cabeça.

Duas, o pescoço. ^

U m a , o pulso.

No original, risco de 2G,3cm.


No original, risco de 16,8cm.
No original, risco d e 19,6cm.
No original, risco de 20,5cm.
797

Q u a t r o , a grossura pelo peito.

Q u a t r o , d a b a r r i g a sobre o u m b i g o .

Q u a t r o , o cós d o calção.

D u a s , a grossura d a coxa logo sobre o j o e l h o .

Duas, a barriga da perna.

O i t o , a altura.

E sendo estas m e d i d a s todas fora da regra da v e r d a d e i r a simetria, olhando-se


p a r a o dito m e n i n o e m coisa a l g u m a se lhe divisava i m p r o p o r ç ã o notável.

> 117 <


[Excerto do termo de uma visita pastoral à freguesia
de São Miguel do Piracicaba]

Narrativa produzida durante visitação episcopal descreven-


do ocorrência de gravidez precoce de menina de 13 anos. Infor-
m a a respeito da ocorrência de partos anteriores e da conduta do
casal em relação ao matrimónio e batismo.
Relato de cunho teratológico inscrito e m padrões eruditos
adotados na época, este registro contribui para ilustrar a varie-
dade de fontes a que recorre o colecionador p a r a formar seu

No original, risco de 25,6cm.


'" No original, risco de 28cm,
No original, risco de 22,6cm.
'*- No original, risco de 24,4cm.
'• No original, risco de lS,3cm.
^" No original, risco de 16,5cm.
798

compêndio. E m b o r a tais registros teratológicos compusessem


parte da trama das narrativas religiosas, não deve ser descarta-
do que talvez represente influência dos debates científicos sobre
os efeitos do clima americano sobre a constituição física e men-
tal de seus habitantes.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Francisco Pinheiro d a Fonseca;
São Miguel do Piracicaba; ?.1.1738.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de u m a descrição. Se-
gundo Rafael Bluteau, "descrição" é "definição imperfeita. R e -
presentação, ou pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabu-
lário português e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes d a C o m -
panhia de Jesus, 1713. V. 3, p. 115). Este documento constitui-
ria, provavelmente, subsídio para a "história", tal como é enten-
dida na época: "narração de cousas memoráveis que têm acon-
tecido em algum lugar, em certo tempo e com certas pessoas ou
nações", segundo o mesmo autor (v.4, p. 39). (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , caligra-
fada e regularizada do século X V I I I , de t r a ç a d o evoluído e
personalizado. Apresenta algumas especificidades: "d uncial, 5>

cujo traço termina e m semicírculo fechado; " s " ç a u d a d o com


único traço oblíquo retilíneo; "f' de u m só traço vertical, si-
nuoso e cortado p o r traço reto horizontal, a l t e r n a com o de
laçadas e traço ascendente em volutas. L e t r a de C a e t a n o d a
Costa M a t o s o . (YDL)

[ fl. 437v. ] • ^ m j a n e i r o d e 1 7 3 8 , e s t a n d o e m *visita n a freguesia d e S ã o M i g u e l d e


•""1 Piracicaba, c o m a r c a d o S a b a r á , bispado d o R i o de J a n e i r o nesse t e m p o e
* ^ hoje d e M a r i a n a , n e l a ficou c o m p r e e n d i d o F r a n c i s c o d e G o d ó i , n a t u r a l
de São P a u l o , c o m L e o c á d i a de Siqueira, filha d e M a n u e l P e r e i r a d e Siqueira, a
q u a l t i n h a nesse t e m p o 13 anos d e idade, a n d a v a p r e n h e e j á havia p a r i d o d u a s
vezes. T i n h a oito anos q u a n d o se a m a n c e b o u c o m o dito G o d ó i e p a r i u a primei-
r a v e z d e dez a n o s , o n z e meses e oito dias. T u d o se p r o v o u e averiguou pelos ditos
das t e s t e m u n h a s d a "devassa, o n d e se a c h a r á n o livro delas n a C â m a r a d a C i d a d e
M a r i a n a , e pelas t e s t e m u n h a s q u e p r o d u z i r a m p a r a justificar ser solteiros, e d e p o -
i m e n t o s q u e d e r a m p a r a se c a s a r e m u m c o m o u t r o , c o m o c o m efeito f i c a r a m
c a s a d o s , e a l é m disto pelo livro dos b a t i z a d o s d a m e s m a freguesia, o n d e ela foi
b a t i z a d a e t e m o seu assento à folha sete e n o m e s m o livro está o d o p r i m e i r o
filho. E ela tinha "casta d a terra.
799

" 118 <

Memória dos governadores que têm havido nesta capitania [fl.438 ]


do Rio de Janeiro desde o princípio de seu estabelecimento

Lista contendo os nomes dos governadores da capitania do


R i o de J a n e i r o de 1532 até o governo de G o m e s Freire de
Andrade, com acréscimos da lavra de Gaetano da Gosta Matoso
p a r a os governadores subseqüentes até o m a n d a t o d e Luís de
Vasconcelos e Sousa, iniciado em 1773. Sua fórmula enquadra-
se nos padrões impostos p a r a a escrita da história militar, eclesi-
ástica e política do reino de Portugal pela Academia Real de
História Portuguesa, a partir de 1721, com recolhimento de da-
dos de fontes autênticas e marcados pela objetividade em secre-
t a r i a s , c a r t ó r i o s , depoimentos, testemunhos e notícias. O
paradigma foi aplicado às colônias, com adaptações concernentes
à história natural, à conquista, ao povoamento, à evangelização
e às potencialidades econômicas.
Este documento, provavelmente derivado da ação da Aca-
d e m i a dos Felizes, n o R i o d e J a n e i r o e n t r e 1747 e 1 7 5 0 ,
exemplifica o interesse e a afinidade do ouvidor Caetano da Costa
Matoso pelos temas exercitados em círculos de letrados.
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Rio de Janeiro; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, híbrida do
século XVIII, com ampla inclinação à direita. As linhas são li-
mitadas por traços horizontais cheios. Variedade de maiúsculas
capitulares, enfeitadas por volutas em forma de semicírculos chei-
os. Uso do " s " caudado, de u m só traço e cheio. As três últimas
linhas do texto apresentam outra caligrafia, mais cursiva e im-
perfeita, de Caetano da Costa Matoso. (YDL)

M a r t i m de Sá
R o d r i g o de M i r a n d a H e n r i q u e s
Duarte Correia Vasqueanes
Salvador C o r r e i a d e S á e Benevides
Salvador d e Brito Pereira
D o m Luís d e A l m e i d a
T o m é Correia de Alvarenga
Pedro de Melo
D o m Pedro Mascarenhas
800

J o ã o d a Silva e Sousa
Matias d a C u n h a
Duarte Teixeira Chaves
D o m M a n u e l Lobo
J o ã o Furtado de Mendonça
D o m Francisco N a p i e r d e Lencastre
Luís C é s a r d e Meneses
Sebastião de C a s t r o e C a l d a s
A n t ô n i o Pais d e S a n d e
A r t u r d e Sá e M e n e s e s
D o m Á l v a r o da Silveira e A l b u q u e r q u e
D o m F e r n a n d o M a r t i n s M a s c a r e n h a s de Lencastre
Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho
Francisco de C a s t r o de M o r a i s
Francisco d a T á v o r a
A n t ô n i o d e Brito e M e n e s e s
Aires d e S a l d a n h a d e A l b u q u e r q u e
Luís V a i a M o n t e i r o
G o m e s Freire de A n d r a d e
O conde da C u n h a 1

O m a r q u ê s do L a v r a d i o , Luís de Vasconcelos e Sousa, filho d o m a r q u ê s d e


Castelo M e l h o r . 2

• 119 <

[ fl. 439 ] Relação dos ouvidores-gerais do Rio de Janeiro, tirada a lista dos
livros das comarcas que há no Senado da Câmara, no ano de 1752

Relação dos ouvidores da comarca do Rio de J a n e i r o e


data da respectiva posse, tendo como datas-limite os anos de
1624 e 1751. Sua fórmula enquadra-se nos padrões impostos
para a escrita da história militar, eclesiástica e política do reino

A partir deste vice-rei, letra de Caetano da Costa Matoso.


Luís de Vasconcelos e Sousa era filho de dom Antônio de Almeida Soares e Portugal, l marquês do
s

Lavradio
801

de Portugal pela Academia Real de Historia Portuguesa, a par-


tir de 1721, com recolhimento de dados de fontes auténticas e
marcados pela objetividade em secretarias, cartórios, depoimen-
tos, testemunhos e notícias. O paradigma foi aplicado ás colô-
nias, com adaptações concernentes à história natural, â conquis-
ta, ao povoamento, à evangelização e às potencialidades econô-
micas.
Este documento, provavelmente derivado d a ação d a Aca-
d e m i a d o s Felizes n o R i o d e J a n e i r o e n t r e 174-7 e 1 7 5 0 ,
exemplifica o interesse e a afinidade do ouvidor Gaetano da Costa
Matoso pelos temas exercitados em círculos de letrados.
A u t o r i a , l o c a l e data: anônimo; Rio de Janeiro; ca. 1752.
C o m e n t á r i o paleográfíco: Escrita moderna, caíigrafada
e imitativa da inglesa monumental. C h a m a m a atenção as mai-
úsculas enfeitadas por volutas, e m forma de semicírculos cheios,
além do " G " em formato uncial; " e " copulativo em aspirai de
módulo grande; " p " de haste simples, com perfil; ponto de fuga
em traço descendente. (YDL)

J o ã o de Sousa C a r d e n a s , " d e s e m b a r g a d o r dos agravos d a R e l a ç ã o deste Es-


t a d o , e veio e m "correição, e a principiou e m 16 d e abril de 1624.
Luís N o g u e i r a d e Brito, "ouvidor-geral desta r e p a r t i ç ã o [do Sul], principiou
a sua p r i m e i r a correição e m 24 d e o u t u b r o de 1626.
P a u l o P e r e i r a , ouvidor-geral, principiou e m 6 d e agosto de 1631.
Francisco T a v e i r a d e Neiva, ouvidor-geral, fez correição e m o a n o d e 1636.
D i o g o d e Sá d a R o c h a , ouvidor-geral, principiou a sua c o r r e i ç ã o p r i m e i r a
aos 3 d e m a r ç o de 1638.
M a r c o s C o r r e i a de M e s q u i t a , ouvidor-geral, principiou a sua [correição] e m
9 de. d e z e m b r o d e 1641.
D a m i ã o de Aguiar, ouvidor-geral, principiou e m 17 de agosto de 1646.
J o ã o V e l h o de Azevedo, ouvidor-geral, principiou em 6 de d e z e m b r o de
1653.
P e d r o d e M u s t r e Portugal, ouvidor-geral, principiou e m 2 2 d e d e z e m b r o d e
1660.
Sebastião C a r d o s o S a m p a i o , ouvidor-geral, p r i n c i p i o u e m 16 d e agosto d e
1662.
M a n u e l D i a s R a p o s o , ouvidor-geral, principiou e m 22 d e j u n h o d e 1667.
J o ã o d e A b r e u e Silva, ouvidor-geral, principiou e m 3 d e o u t u b r o d e 1669. [ íl. 439v. ]
A n d r é d a C o s t a M o r e i r a , ouvidor-geral, principiou e m 3 de agosto d e 1672.
P e d r o d e U n h ã o C a s t e l o B r a n c o , ouvidor-geral, principiou e m 3 d e m a r ç o
de 1676.
802

Francisco B a r r e t o de Faria, "ouvidor-geral, principiou e m 3 d e abril d e 1677.


O " d e s e m b a r g a d o r J o ã o d a R o c h a Pita, ouvidor-geral, n o a n o de 1679.
A n d r é d a C o s t a M o r e i r a , ouvidor-geral, p r i n c i p i o u e m o a n o d e 1685.
O d e s e m b a r g a d o r sindicante Belchior d a C u n h a B r o c h a d o fez correição n o
S e n a d o e m o a n o de 1689.
D e s e m b a r g a d o r Francisco d a Silva S o u t o M a i o r , o u v i d o r - g e r a l , p r i n c i p i o u
e m o a n o de 1690.
M i g u e l d e Siqueira Castelo B r a n c o , ouvidor-geral, e m o a n o d e 169[1?].
M a n u e l d e C a r v a l h o M o u t i n h o , ouvidor-geral, e m o a n o d c 1694.
Sebastião F e r n a n d e s C o r r e i a , ouvidor-geral, e m o a n o d e 1695.
M a n u e l d e Sousa L o b o , ouvidor-geral, e p r i n c i p i o u e m o a n o d e 1696.
J o s é V a z P i n t o , o u v i d o r - g e r a l do R i o d e J a n e i r o , p r i n c i p i o u e m o a n o d e
1699.
[ fl. 4 4 0 ] O d e s e m b a r g a d o r J o s é d e Siqueira, ouvidor-geral, p r i n c i p i o u e m o a n o d e
1703.
J o ã o d a C o s t a d a Fonseca, ouvidor-geral, principiou e m o a n o d e 1706.
R o b e r t o C a r R i b e i r o , ouvidor-geral, principiou e m o a n o d e 1710.
Vital C a s a d o R u s t e r , sendo *juiz de fora, serviu de ouvidor-geral e m o a n o
de 1713.
F e r n a n d o P e r e i r a d e Vasconcelos, serviu de ouvidor-geral e m o a n o d e 1715.
P a u l o d e T o r r e s R i o Vieira, serviu d e ouvidor-geral e m o a n o de 1719.
M a t i a s P e r e i r a de Sousa, sendo j u i z de fora, serviu d e o u v i d o r - g e r a l e m o
ano de 1721.
O d e s e m b a r g a d o r M a n u e l d a C o s t a M i m o s o , serviu de ouvidor-geral e m o
a n o d e 1729.
F e r n a n d o Leite L o b o , serviu d e ouvidor-geral e m o a n o d e 1 7 3 1 .
A n t ô n i o de Sousa d e A b r e u G r a d e , foi ouvidor-geral e m o a n o de 1725.
Agostinho P a c h e c o Teles, serviu de ouvidor-geral e m o a n o d e 1734.
O d e s e m b a r g a d o r I n á c i o Dias e M a d u r e i r a , serviu d e o u v i d o r - g e r a l e m o
a n o d e 1736.
J o ã o Soares Tavares^ serviu de ouvidor-geral e m o a n o de 1737.
[ íl. 440v. ] J o ã o Alvares Simões, serviu de ouvidor-geral e m o a n o d e 1740.
M a n u e l A m a r o P e n a d e M e s q u i t a P i n t o , serviu d e ouvidor-geral e m o a n o
de 1745.
Francisco A n t ô n i o B e r q u ó d a Silveira Pereira, serviu d e ouvidor-geral e m o
a n o d e 1748.
M a n u e l M o n t e i r o de Vasconcelos, serviu de ouvidor-geral e m o m e s m o a n o
d e 1751 e é o q u e p r e s e n t e m e n t e está o c u p a n d o o cargo d e ouvidor e "corregedor
da comarca.
803

• 120 <

Bispos que têm havido no Rio de Janeiro [fl.441 ]

Relação dos bispos do Rio de Janeiro, que obedece a o se-


guinte modelo: titular, cargos anteriores ou o r d e m de origem,
forma de nomeação, posse e fim do mandato. T e m como datas-
limíte os anos de 1631 e 1746. Sua fórmula enquadra-se nos
padrões impostos para a escrita da história militar, eclesiástica e
política do reino de Portugal pela Academia Real de História
Portuguesa, a partir de 1721, com recolhimento de dados de
fontes autênticas e marcados pela objetividade e m secretarias,
cartórios, depoimentos, testemunhos e notícias. O p a r a d i g m a
foi aplicado às colônias, com adaptações concernentes à história
n a t u r a l , à conquista, a o p o v o a m e n t o , à evangelização e às
potencialidades econômicas.
Este documento, provavelmente derivado da ação da Aca-
d e m i a dos Felizes n o R i o d e J a n e i r o e n t r e 1747 e 1750,
exemplifica o interesse e a afinidade do ouvidor Caetano da Costa
Matoso pelos temas exercitados em círculos de letrados.
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Rio de Janeiro; ca. 1750.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , do século
XVIII, bastante cursiva e. pouco regularizada, mas com traçado
evoluído e personalizado. M a r c a m - n a o "d" uncial de haste sim-
ples, veloz; o " p " de dupla haste, em forquilha; o "t" minúsculo,
em módulo maior do que o das outras letras, de haste também
dupla; ponto de fuga no final de palavras, arqueado e ascenden-
te. Letra de Gaetano da Costa Matoso. (YDL)

D o m L o u r e n ç o d e M e n d o n ç a , n o m e a d o n o t e m p o dos Filipes, q u e n ã o c h e g o u
a t o m a r posse p o r q u e seguiu o p a r t i d o d e Castela n a feliz a c l a m a ç ã o do s e n h o r rei
dom João, o quarto.
D o m frei M a n u e l Pereira, religioso d e São D o m i n g o s , n o m e a d o *bispo p o r
el-rei d o m P e d r o II, e s t a n d o e m R o m a , o n d e se sagrou, e c h e g a n d o a P o r t u g a l
r e n u n c i o u o bispado e ficou c o m o c a r á t e r de secretário de Estado.
D o m frei J o s é de Barros e A l a r c ã o , q u e era " p r o m o t o r d o S a n t o Oficio, to-
m o u posse e m o a n o d e 1682 e faleceu e m o d e 1696, v i n d o a ser o p r i m e i r o
bispo d o R i o d e J a n e i r o e terceiro n a o r d e m das n o m e a ç õ e s .
D o m Francisco d e São J e r ô n i m o , d a c o n g r e g a ç ã o d e S ã o J o ã o Evangelista,
t o m o u posse n o a n o d e 1702; faleceu a 7 d e m a r ç o de 1 7 2 L
804

D o m frei A n t ô n i o d e G u a d a l u p e , religioso " o b s e r v a n t e d e S ã o F r a n c i s c o ,


t o m o u p o s s e a 2 4 d e a g o s t o d e 1 7 2 5 , foi p r o m o v i d o p a r a *bispo d e V i s e u e
e m b a r c o u p a r a Lisboa a 25 d e m a i o d e 1740; faleceu e m o m e s m o a n o e m São
Francisco d a C i d a d e d e Lisboa.
D o m frei J o ã o d a C r u z , religioso d o C a r m o descalço, t o m o u posse a 9 d e
m a i o d e 1741 e r e n u n c i o u e m 1744, e m b a r c a n d o - s e p a r a Lisboa e m 1745.
D o m frei A n t ô n i o do Desterro, m o n g e d e São Bento, t o m o u posse e m 11 d e
d e z e m b r o d e 1746, v i n d o d e Angola, o n d e era bispo.

• 121 <

[Testamento de dom frei Antônio de Guadalupe]

D i s p o s i ç õ e s t e s t a m e n t á r i a s d e d o m frei A n t ô n i o d e
Guadalupe, feito e m 1740, ano de sua partida do Rio de Janeiro
para Lisboa, com protestação de sua religiosidade e fé n a salva-
ção, solicitação de, interferência aos santos de devoção, u m a pe-
quena biografia, forma de sepultamento, missas por intenção de
sua alma, instituição d e sua alma por herdeira, nomeação de
testamenteiros e distribuição de bens entre seus familiares e obras
pias, seguido de extrato de codicilo retificando as condições de
libertação de um escravo.
O interesse do ouvidor Caetano da Costa Matoso neste do-
cumento p o d e vincular-se a o processo contra d o m frei J o ã o da
Cruz, seu sucessor, por ter despendido 30.000 cruzados do espólio
de d o m frei Antônio de Guadalupe, falecido pouco depois de che-
gar a Lisboa, em discussão no Conselho Ultramarino no início da
década de 1750, que solicitou pareceres de autoridades e burocra-
tas na colônia.
Autoria, l o c a l e data: d o m frei Antônio de Guadalupe;
Rio de Janeiro; 9.4.1740.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O testamento, obedecendo à for-
m a usual da época, compreende invocação d a Santíssima Trin-
dade e u m a espécie de exórdio penitencial. Note-se a aplicação
de tópicas de autodesqualificação. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , bastarda
do tipo italiano do século X V I I I , com pequenas laçadas cheias
nas hastes superiores. " D " de traço muito especial, tipo capital,
com voluta cheia de arremate; as outras maiúsculas trazem apex,
805

em forma de semicírculo lateral. Abreviatura do "que' sinalizada


pelo uso d o circunflexo sobreposto à letra " q " ; " d " uncial;
alternância do " o " aberto (uncial) com o redondo, fechado; " f
com dois olhos e movimento de laçada ascendente como traço de
corte. (YDL)

E m n o m e d a Santíssima T r i n d a d e , Pai, Filho e Espírito Santo, a m é m . [ fl. 4 4 3 ]

E u , frei A n t ô n i o de G u a d a l u p e , estando e m m e u perfeito j u í z o , e m vésperas


d e e m b a r c a r d o R i o de J a n e i r o p a r a Lisboa, c o n h e c e n d o a i n c e r t e z a d a vida e
certeza d a m o r t e , e t e n d o a faculdade p a r a fazer testamento, c o m o a b a i x o declara-
r e i o faço n a m a n e i r a seguinte:
P r i m e i r a m e n t e declaro e protesto q u e sou cristão p o r graça e m e r c ê d e D e u s
Nosso S e n h o r e fiel católico r o m a n o , e q u e c o m o tal creio e confesso t u d o o q u e crê e
ensina a S a n t a M a d r e Igreja Católica R o m a n a , estando p r o n t o c o m a g r a ç a divina a
d a r a vida e d e r r a m a r o s a n g u e p o r esta fé e, se necessário for e o m e s m o D e u s se
dignar fazer-me a m e r c ê , d e d a r a vida p o r ela.
* T e n h o firme esperança n a misericórdia infinita de D e u s , d e q u e , sem e m b a r g o
dos m e u s inumeráveis e g r a n d e s p e c a d o s , m e h á d e p e r d o a r pelos infinitos mereci-
m e n t o s d e N o s s o S e n h o r J e s u s Cristo, f a z e n d o eu da m i n h a p a r t e a j u d a d o d e sua
graça, e pela p a i x ã o e m o r t e deste salvador m e h á de d a r a b e m - a v e n t u r a n ç a eterna,
i n t e r c e d e n d o a s e m p r e V i r g e m M a r i a , sua m ã e , refúgio dos p e c a d o r e s , suposto q u e
c o n h e ç o q u e sou o m a i o r deles, o mais ingrato e o q u e m e r e ç o q u e ela n ã o converta
p a r a m i m os seus olhos misericordiosos.
T a m b é m espero q u e i n t e r c e d a m p o r m i m os santos anjos, e m especial o d e
m i n h a g u a r d a , s e m se l e m b r a r das m u i t a s desatenções q u e c o m ele t e n h o tido e m
t o d a a m i n h a vida, e os arcanjos são Miguel, são Gabriel, são Rafael, dos quais sou
devoto, a i n d a q u e n ã o q u a n t o devia ser, e o m e s m o espero d e todos os santos d a corte
celestial e m u i t o especialmente d o p a t r i a r c a são J o s é , esposo de M a r i a Santíssima, são
J o ã o Batista, são J o ã o Evangelista, d e todos os santos apóstolos, e m p a r t i c u l a r d e são
P e d r o e são P a u l o e do m e u p a d r e são Francisco, a q u e m p e ç o se l e m b r e de q u e sou
seu filho, posto q u e indigníssimo, d o m e u santo A n t ô n i o de Lisboa e de todos os
santos d a m i n h a o r d e m , e m especial d e são B o a v e n t u r a e são P e d r o d e A l c â n t a r a , e
além destes, d e s a n t a T e r e s a d e J e s u s , são G o n ç a l o , são G a e t a n o , são Francisco
Xavier, santa B á r b a r a e finalmente de todos aqueles a q u e m tenho particular
d e v o ç ã o , e a são S e b a s t i ã o , p a d r o e i r o d a sé do R i o d e J a n e i r o , aos quais t o d o s
r o g o h u m i l d e m e n t e q u e , p o r a m o r d a q u e l e D e u s a q u e m estão v e n d o , i n t e r c e -
d a m p o r m i m p a r a q u e m e d ê o q u e desejo, q u e é u m a b o a m o r t e . C o n h e ç o a
o b r i g a ç ã o q u e t e n h o d e a m a r a m e u D e u s d e t o d o o c o r a ç ã o e s o b r e t o d a s as
:

coisas, e suposto q u e t e n h o tão i n g r a t a m e n t e faltado a ela, agora protesto c o m sua


806

g r a ç a d e o a m a r c o m o devo e assim declaro q u e o a m o de todo o m e u c o r a ç ã o e


ofereço t o d o o a m o r q u e lhe t e m a V i r g e m M a r i a , sua m ã e , e t o d o s os b e m -
a v e n t u r a d o s e m s u p r i m e n t o d o a m o r q u e m e falta; r e s i g n o - m e t o t a l m e n t e n a s
m ã o s de D e u s e m e conformo com a sua santa vontade, aceitando c o m a sua
divina g r a ç a a m o r t e e todas as adversidades q u e ele for servido d a r - m e p o r qual-
q u e r via q u e for, o f e r e c e n d o - a j u n t a m e n t e c o m os m e r e c i m e n t o s d e N o s s o S e -
n h o r J e s u s Cristo e m satisfação dos m e u s p e c a d o s ; p e r d ô o q u a n t a s ofensas e agra-
vos m e h a j a m feito p u r a m e n t e p o r a m o r d e D e u s e p e ç o p e r d ã o a q u a l q u e r pes-
[ fl. 443v. ] soa q u e d e m i m estiver ofendida / / e a g r a v a d a .
D e c l a r o q u e sou n a t u r a l d a vila d e A m a r a n t e , filho d e J e r ó n i m o d e Sá e
C u n h a e d e d o n a M a r i a d e C e r q u e i r a , q u e nasci e m 27 d e setembro d e 1672, sou
professo n a "religião de são Francisco, n a "província d e Portugal, d a " o b s e r v â n -
cia, e p e ç o aos religiosos dela que, s e m e m b a r g o do m a u e x e m p l o c o m q u e e n t r e
eles vivi 22 anos, m e p e r d o e m e m e n ã o faltem c o m os sufrágios c o m o i r m ã o seu,
o q u e fiz p o r m e r e c e r c o m n ã o faltar c o m eles aos religiosos q u e até o p r e s e n t e
t ê m falecido. F u i n o m e a d o "bíspo d o R i o d e J a n e i r o e m 25 d e n o v e m b r o d e
1722, sagrado e m 13 d e m a i o de 1725, e a 2 de agosto seguinte cheguei a o dito
R i o de Janeiro.
A l c a n c e i o i n d u l t o j u n t o a este t e s t a m e n t o do s e n h o r p a p a C l e m e n t e X I I
p a r a testar dos b e n s q u e a d q u i r i *intuitu ecclesios, n e m e u t e n h o o u t r o s q u e m e
viessem p o r o u t r a via, à q u a n t i a d e vinte mil c r u z a d o s , a saber: seis a favor d e
m e u s "familiares q u e a t e m p o de m i n h a m o r t e m e assistirem e catorze p a r a testar
e m o b r a s pias. E suposto n o dito indulto esteja e r r a d o o m e u n o m e , este e r r o n ã o
obsta sua validade, *iía varias opiniões citadas.
C o m o n ã o posso saber o n d e será o m e u falecimento, m a n d o q u e s e n d o n o
R i o d e J a n e i r o m e d ê e m sepultura n o cemitério o n d e se e n t e r r a m os religiosos d e
S a n t o A n t ô n i o desta cidade, sem especialidade a l g u m a n a sepultura, e falecendo
n o m a r levarão o m e u c o r p o , p o d e n d o ser, a ser sepultado n o cemitério d e São
Francisco d a C i d a d e , e m Lisboa, o n d e t o m e i o hábito; e o m e s m o será falecendo
e m Lisboa; e falecendo e m o u t r a terra o n d e haja convento d e m i n h a religião m e
s e p u l t a r ã o e m s e m e l h a n t e lugar.
E n o lugar e m q u e falecer logo se começarão a dizer mil missas pela m i n h a alma,
sendo n o R i o d e J a n e i r o de esmola de 400 "réis e sendo e m Portugal d e esmola de
200 réis, e estas missas se farão dizer logo por todos os sacerdotes que houver e n ã o se
e n c o m e n d a r ã o por j u n t o de alguns, por evitar as dilações què costuma haver e por-
que quero sejam ditas logo c o m a maior brevidade p a r a alívio d a m i n h a alma, se a
misericórdia de Nosso Senhor se dignar d e que m e aproveitem.
Instituo a m i n h a a l m a p o r herdeira e p o r m e u s testamenteiros n o m e i o aos
p a d r e s J o ã o d e Araújo M a c e d o e J o ã o J á c o m e Pereira, meus "capelães, e n ã o m e
a c o m p a n h a n d o p a r a o R e i n o este segundo e m seu lugar n o m e i o a o p a d r e M a n u -
el d a C o s t a Pereira, capelão, digo, m e u capelão, aos quais p e ç o q u e i r a m aceitar
este t r a b a l h o e d a r c u m p r i m e n t o a estas m i n h a s disposições.
O s seis mil c r u z a d o s s e r ã o r e p a r t i d o s pelos m e u s "familiares existentes n a
m i n h a c o m p a n h i a a o t e m p o d o m e u f a l e c i m e n t o , e s e n d o este n o m a r o u e m
Lisboa ou e m o u t r a terra antes d e ir p a r a Viseu, p a r a cujo bispado estou n o m e a -
d o , / / s e r e p a r t i r ã o n a f o r m a d o papel q u e vai j u n t o a este t e s t a m e n t o p o r m i m [ fl, 4 4 4 ]
assinado, n o q u a l se declara a o seguinte:
D e i x o aos pais do p a d r e r e v e r e n d o Luís de S a n t a Q u i t é r i a 6 0 0 m ü "réis, q u e
se e n t r e g a r ã o à pessoa q u e ele disser.
D e i x o a o p a d r e J o ã o de Araújo M a c e d o 600 mil réis.
D e i x o a o p a d r e M a n u e l d a C o s t a Pereira 600 mil réis.
D e i x o a o p a d r e J o ã o J á c o m e Pereira 100 mil réis.
D e i x o a J o a q u i m d e Araújo 4 0 0 mil réis.
D e i x o a J o s é C a r d o s o d e A g u i a r 100 mil réis. [E] q u e t u d o faz a dita q u a n t i a
d e seis mil "cruzados, a d v e r t i n d o q u e dos mais b e n s q u e se m e a c h a r e m a l é m dos
vinte mil cruzados do indulto se deve p a g a r a c a d a u m dos sacerdotes e criados os
o r d e n a d o s q u e c o n s t a r se lhes estão d e v e n d o , p o r é m n ã o aos p a j e n s , p o r q u e a
estes se n ã o c o s t u m a p a g a r o r d e n a d o , m a s a c a d a u m dos familiares se lhes d a r á
u m "vestido d e luto de "baeta, p a g o d a c o n t a dos vinte mil c r u z a d o s .
Aos seis escravos q u e m e a c o m p a n h a m p a r a o R e i n o , a saber, Luís M i n a ,
J o ã o C o n g o , J o s é R e i n o l e J o ã o B e n g u e l a ou P e q u e n o , M a r t i n h o e R a i m u n d o ,
m u l a t o s , deixo forros, e a c a d a u m se d a r ã o c i n q ü e n t a mil réis d e esmola p a r a
a p r e n d e r e m "ofícios, p o r é m m e u s testamenteiros lhos n ã o e n t r e g a r ã o e m sua m ã o
logo, m a s disporão de sorte q u e os n ã o gastem d e m o d o q u e mais lhes sirvam d e
d a n o q u e d e utilidade, e esta liberdade q u e lhe d o u é declaração dela, p o r q u e n o
propósito e i n t e n ç ã o h á m u i t o t e m p o q u e lha t e n h o d a d o .
A " i r m a n d a d e d e S ã o Pedro d a vila d e A m a r a n t e se d a r ã o 250 mil réis, p a r a
efeito d e i n t e i r a r e m aos dois " c a p e l ã e s d o l e g a d o q u e t e n h o instituído n a dita
i r m a n d a d e os 4 0 0 réis a c a d a u m e m c a d a u m a n o , os quais d e f r a u d a r a m depois
d o ajuste q u e fizeram os irmãos c o m o m e u p r o c u r a d o r p o r capítulo d e "visita d e
u m "visitador q u e o e n t e n d e u assim, s e m e m b a r g o d a escritura q u e se t i n h a feito
e d a d o a execução a ela, e esta deixa se satisfaça p o r via do r e v e r e n d o p a d r e J o ã o
R o d r i g u e s R a t o , "reitor d a igreja d e U n h ã o , q u e foi neste negócio o m e u p r o c u -
rador.
A o c o n v e n t o o n d e m e u corpo for sepultado se d a r ã o 200 mil réis d e esmola
e o u t r o s 2 0 0 mil réis se g a s t a r ã o nas m i n h a s e x é q u i a s , n a s q u a i s n ã o é m i n h a
v o n t a d e q u e haja s e r m ã o , p o r q u e os p r e g a d o r e s nesta ocasião l o u v a m o defunto,
e d e m i m n ã o h á b e m q u e dizer c o m v e r d a d e e p a r a dizer o m a l q u e só e m rriim
h á c a u s a r á escândalo.
D e i x o a c a d a u m d e m e u s testamenteiros 200 mil réis.
D e i x o ao mosteiro d a M a d r e de D e u s de G u i m a r ã e s 800 mil réis, e s p e r a n d o
das suas religiosas q u e c o m esta e s m o l a c o m e s p e c i a l i d a d e m e e n c o m e n d e m a
D e u s , o q u e p o r outros princípios lhe t e n h o m e r e c i d o .
808

[ fl. 444v. ] D e i x o a E g a s / / M u n i z C o e l h o , d a q u i n t a d e L a b o r i s , j u n t o à vila d e


A m a r a n t e , 4 0 0 mil *réis p o r esmola.
D e i x o a o d o u t o r V i t o r i a n o d e Sousa, do lugar d e M a c i e i r a , j u n t o à vila d a
Feira,. 4 0 0 mil réis p o r esmola p a r a ajuda do dote p a r a . s e r freira u m a filha sua.
A l é m das mil missas q u e digo acima, se m a n d a r ã o dizer outras mil d e esmola d e
2 0 0 mil réis, 500 pela m i n h a a l m a e 500 pelas almas d e meus pais, d e m e u i r m ã o
e de u m a i r m ã n a t u r a l q u e tive; e d e esmola d e 120 mil réis se m a n d a r ã o dizer
500 p o r *Jideiibus defundis.
D e i x o a o p a d r e J o ã o d e Meireles d a Silva, d e A m a r a n t e , . 100 mil réis p o r
esmola.
O p a d r e r e v e r e n d o J o ã o Batista d e S a n t o A n t ô n i o , "comissário das capelas
d o c o n v e n t o d e São Francisco da C i d a d e d e Lisboa, t e m sido o m e u p r o c u r a d o r e
p o d e r á ter a l g u m dinheiro m e u n a sua m ã o ; deste, falecendo e u n o m a r , lhe sou
d e v e d o r ou a q u e m ele t e m aplicado o salário q u e lhe c o s t u m o d a r d e 120 mil
réis, os quais se lhe d e s c o n t a r ã o do dinheiro q u e tiver m e u e m seu p o d e r , se é q u e
o t e m , e d e m a i s se d a r ã o a q u e m ele aplicar 200 mil réis, e n ã o t e n d o o dinheiro
m e u d e outros b e n s q u e se m e a c h a r e m h a v e r á os 120 mil réis c o m o dívida e os
.200 mil réis d o dinheiro de q u e t e n h o faculdade p a r a testar.
D e i x o p a r a a enfermaria d o convento d e São Francisco d a C i d a d e 4 0 0 mil réis;
e se c u m p r i d a s estas "deixas restar a l g u m a coisa dos 14 mil "cruzados, se r e p a r t i r á
pelos p o b r e s .
T u d o o mais q u e se m e a c h a r além dos vinte mil cruzados se g u a r d a r á p a r a
q u e m pertencer; e se for antes d e ir p a r a Viseu, p e r t e n c e t u d o à igreja do R i o d e
J a n e i r o . E declaro q u e se m o r r e r no m a r , se p r o c u r a r ã o vinte mil cruzados, exceto o
q u e se p a g a n o cofre n a m ã o do p a d r e M a r t i n h o Borges, p r o c u r a d o r da "provín-
cia do Brasil n o colégio de S a n t o A n t ã o d e Lisboa. E p o r este m o d o t e n h o feito o
m e u t e s t a m e n t o e última v o n t a d e , q u e valerá n a m e l h o r forma d e direito. R i o d e
J a n e i r o , 9 d e abril de 1740.

T a m b é m fez u m "codicilo n o m a r p o u c o s dias antes de c h e g a r a Lisboa, no


qual declarou q u e se pagasse a Sua Majestade os "novos direitos d a fundação do
seminário q u e instituiu n o R i o d e J a n e i r o , aos quais tinha d a d o fiança até se saber
e averiguar a q u a n t i a q u e se havia de p a g a r ; mais, q u e u m m u l a t i n h o p o r n o m e
R a i m u n d o , q u e foi c o m ele, o deixava forro, ficasse servindo a o p a d r e J o ã o d e
Araújo até a idade de 25 anos, ficando e n t ã o livre, e se lhe d a r i a m os c i n q ü e n t a
mil réis q u e n o seu t e s t a m e n t o lhe deixou.
809

• 122 <
Catálogo das "igrejas paroquiais do bispado [fl. 445 ]
do Rio de Janeiro

Relação de igrejas das diversas comarcas eclesiásticas do bis-


pado do Rio de Janeiro, com dados sobre seu estatuto e vigário que
ali professava, e titulares do cargo de vigário da vara de cada comarca,
com comentários com letra de Caetano da Costa Matoso sobre qua-
lidades e imperfeições morais e profissionais de diversos religiosos.
Sua fórmula, enquadra-se nos padrões impostos para a escrita da
história militar, eclesiástica e política do reino de Portugal pela Aca-
demia Real de História Portuguesa, a partir de 1721, com recolhi-
mento de dados de fontes autênticas e marcados pela objetividade
em secretarias, cartórios, depoimentos, testemunhos e notícias.
Este, documento, provavelmente derivado da ação da Aca-
d e m i a dos Felizes n o R i o de J a n e i r o e n t r e 1747 e 1750,
exemplifica o interesse e a afinidade do ouvidor Caetano da Costa
Matoso pelos temas exercitados em círculos de letrados.
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Rio de Janeiro; ca. 1744.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, regularizada
e caligrafada do século XVIII, com simplificação dos traços bar-
rocos. Porém, m a n t é m o "d" uncíal, em ligatura com vogais; o
" C " em módulo grande, de voluta que alcança a linha inferior,
alternando com outro e m proporções normais; o " s " pendente,
de u m só traço, e o " g " de haste em olho ou simples. Uso de
abreviaturas, assinaladas pelo p o n t o . O circunflexo a p a r e c e
m a r c a n d o tonicidade de vogais. C o m correções marginais e
interlineares do punho de Caetano da Costa Matoso. (YDL)

Capitania de Porto Seguro

1. A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a P e n h a d e P o r t o Seguro, " e n c o m e n d a d o o p a d r e


Sebastião d e Araújo Baion, d a vila de S a n t a C r u z . a

2- A igreja de S a n t a C r u z d a vila deste n o m e , vigário o p a d r e Silvestre d e Brito d e


Figueiredo. 0

a. Velho e doente e sem letras.


b. Para 'examinador.
3 . A igreja de S a n t o A n t ô n i o da vila do R i o das C a r a v e l a s , vigário o p a d r e Diogo
L o u r e n ç o N a b a e s , a o q u a l vai s u c e d e r a g o r a o p a d r e M a n u e l F r a n c i s c o d e
Carvalho, formado. 0

É "vigário d a vara deste distrito o p a d r e J o s é de Brito Figueiredo.

C a p i t a n i a d o Espírito Santo

4. A igreja d e Nossa S e n h o r a d a Vitória d a m e s m a vila, "colada, é vigário o p a d r e


J o ã o T r a n c o s o d e Lira.
5 . A igreja d o E s p í r i t o S a n t o d a V i l a V e l h a , c o l a d a , v i g á r i o o p a d r e M a n u e l
Lopes d e A b r e u .
6. A igreja de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o da vila de G u a r a p a r i , a n u a l , "pároco
o padre M a n u e l de Matos.^
7 . A capela d a p o v o a ç ã o de S ã o M a t e u s , p á r o c o o p a d r e V i c e n t e Ferreira.

E vigário d a v a r a o p a d r e M a n u e l T a v a r e s d e A l b u q u e r q u e .

C a p i t a n i a dos C a m p o s dos Goitacases

8. A igreja d e S ã o S a l v a d o r dos C a m p o s , c o l a d a , v i g á r i o o p a d r e j o ã o Clemente.


9. A igreja d e São J o ã o d a Praia, colada, vigário o p a d r e P e d r o M a r q u e s
Durão.
1 0 . A capela c u r a d a d a fazenda de C a e t a n o d e Barcelos, "capelão o p a d r e A n t ô -
nio Martins Monteiro.

E vigário d a v a r a deste distrito o p a d r e J o ã o C l e m e n t e . 6

Capitania de C a b o Frio

1 1 . A igreja d e Nossa S e n h o r a da Assunção de C a b o Frio, c o l a d a , " e n c o m e n d a -


do o p a d r e A n t ô n i o R i b e i r o d e A m a r a l .
12. A igreja d e N o s s a S e n h o r a de S a q u a r e m a , " a n u a l , vigário o p a d r e J o s é do
Couto, de Tapacorá.
1 3 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d o A m p a r o de M a r i c á , a n u a l , vigário o p a d r e
G a s p a r A n t u n e s de Sousa.

O 'superior da Companhia [de Jesus].


* Revisor da Companhia.
Vigário da vara.
811

R i o d e J a n e i r o e seu r e c ô n c a v o [ fl. 445v. ]

1 4 . A i g r e j a d a Sé, é *pároco o "cabido e "cura a n u a l o p a d r e M a n u e l R o d r i g u e s


Cruz.
1 5 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a C a n d e l á r i a , "colada, vigário o p a d r e I n á c i o
M a n u e l da Costa Mascarenhas.

Recôncavo

1 6 . A igreja d e S ã o Sebastião d e Itaipu, "anual, vigário o p a d r e M a n u e l R i b e i r o


de Cobelos.
1 7 . A igreja d e S ã o J o ã o de Icaraí, colada, " e n c o m e n d a d o o p a d r e Salvador V i e i r a
Mendes.
1 8 . A igreja d e S ã o G o n ç a l o , colada, vigário o p a d r e Francisco C o r r e i a Vidigal.
1 9 . A " c a p e l a c u r a d a , m a s c o m s u b o r d i n a ç ã o aO vigário d e S ã o G o n ç a l o , d e
Nossa S e n h o r a d o D e s t e r r o de Itaitindiba, do "juiz d o fisco, capelão o p a d r e
Simão Fernandes.
2 0 . A igreja de São J o ã o de Itaboraí, colada, e n c o m e n d a d o o p a d r e J o ã o R e b e l o
d e Barros.
2 1 . A igreja d e Nossa S e n h o r a do Desterro d e I t a m b i , anual, o p a d r e Zeferino d e
A n d r a d e é vigário.
2 2 . A igreja d e S a n t o A n t ô n i o de Sá, colada, e n c o m e n d a d o o p a d r e J o s é P e r e i r a
Barbosa.
2 3 . A igreja d a Santíssima T r i n d a d e , a n u a l , vigário o p a d r e J o s é R o d r i g u e s Pai-
xão.
2 4 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a Ajuda d e G u a p i m i r i m , a n u a l , vigário o p a d r e
A n t ô n i o J o s é Pereira.
2 5 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a P i e d a d e d e M a g é , c o l a d a , v i g á r i o o p a d r e
Baltasar d e Oliveira.
2 6 . A igreja d e São N i c o l a u do Suruí, a n u a l , vigário o p a d r e C u s t ó d i o Leite.
2 7 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a G u i a d e P a c o b a í b a , a n u a l , v i g á r i o o p a d r e
G e o r g e d a Fonseca.
2 7 . A igreja d é Nossa S e n h o r a d a Piedade d e I n h o m i r i m , c o l a d a , e n c o m e n d a d o
o p a d r e Veríssimo d e Sá.
2 9 . A igreja de N o s s a S e n h o r a do Pilar do Iguaçu, colada, vigário o p a d r e A n t ô -
nio de Brito C o e l h o .
3 0 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a P i e d a d e do I g u a ç u A c i m a , a n u a l , vigário o
p a d r e I n á c i o R o d r i g u e s de Figueiredo.
3 1 . A c a p e l a c u r a d a d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , n a f a z e n d a do Alferes,
a n u a l , "capelão o p a d r e B a r t o l o m e u d a C o s t a .
812

3 2 . A igreja d e S ã o P e d r o e São P a u l o d a P a r a í b a , fazenda d e P e d r o Dias Pais,


*pároco o p a d r e M a n u e l da Costa, formado; vai p a r a o R e i n o e Pedro Dias n ã o
q u e r pároco, e. se deve sujeitar ao pároco d a capela acima, Bartolomeu d a Costa.
3 3 . A igreja de S a n t o A n t ô n i o d e J a c u t i n g a , *anual, vigário o p a d r e F e r n a n d o
Soares d e P i n h o ; está u n i d a a esta a *capela c u r a d a d e S e r a p u í p o r sentença,
e n ã o se deve t o r n a r a dividir.
3 4 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o de M a r e p i c u , a n u a l , vigário o p a d r e
Francisco P e r e i r a d e L e m o s .
3 5 . A igreja do Salvador d o M u n d o d e G u a r a t i b a , a n u a l , vigário o p a d r e P e d r o
de Sousa H o m e m .
3 6 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d o Desterro do C a m p o G r a n d e , a n u a l , vigário o
p a d r e M a n u e l Pereira.
3 7 . A igreja d e Nossa S e n h o r a do L o r e t o de J a c a r e p a g u á , "colada, vigário o p a -
dre A n t ô n i o de Sousa M o r e i r a .
3 8 . A igreja d e S ã o J o ã o d e M e r i t i , c o l a d a , " e n c o m e n d a d o o p a d r e T e o d ó s i o
Fernandes.
3 9 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a A p r e s e n t a ç ã o d e Irajá, c o l a d a , vigário o p a d r e
Francisco d e Araújo M a c e d o .
[ fl. 446 ] 4 0 . A igreja d e S ã o T i a g o d e I n h a ú m a , a n u a l , vigário o p a d r e Francisco C a e t a n o
Galvão Taborda.
4 1 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a A j u d a d a ilha do G o v e r n a d o r , a n u a l , vigário o
p a d r e M i g u e l C a r d o s o de Barros.
4 2 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d e A n g r a dos Reis, colada, vigário o
p a d r e Luís N o g u e i r a Travassos; o m e s m o serve d e "vigário d a v a r a .

N o distrito desta freguesia está a aldeia d e índios d o visconde d e Asseca, n a


q u a l , a l g u m dia, teve p o r s u p e r i o r u m "clérigo a q u e está o b r i g a d o , h o j e
corre p o r c o n t a do vigário.

Parati

4 3 . A igreja de N o s s a S e n h o r a dos R e m é d i o s d e P a r a t i , colada, vigário o p a d r e


Manuel Rodrigues de Carvalho.
4 4 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d e T a l d e U b a t u b a , a n u a l , p á r o c o o p a d r e M a -
n u e l d a Fonseca d e A r a ú j o /

Serve d e "vigário d a v a r a destas duas freguesias o s o b r e d i t o p a d r e M a n u e l


Rodrigues de Carvalho.

Não há que examinar.


813

C o m a r c a de Santos, pertencente à capitania d e S ã o Paulo

4 5 . A igreja de S ã o Sebastião, "colada, " e n c o m e n d a d o o p a d r e M a n u e l de Vilela


Bueno. S
4 6 . A igreja d e Santos da vila d o m e s m o n o m e , colada, vigário o p a d r e Francisco
Barbosa.* 1

4 7 . A igreja d e S ã o V i c e n t e d a vila do m e s m o n o m e , c o l a d a , e n c o m e n d a d o o
p a d r e Francisco Alvares de Barros. 1

4 8 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a da C o n c e i ç ã o d a vila d o m e s m o n o m e , c o l a d a ,
e n c o m e n d a d o o p a d r e D i o g o R o d r i g u e s de S ã o J o s é j

E "vigário d a v a r a deste distrito o referido Francisco Alvares d e Barros.

C o m a r c a de Paranaguá, d a m e s m a capitania

4 9 . A igreja de Nossa S e n h o r a do R o s á r i o d a vila de P a r a n a g u á , c o l a d a , e n c o -


m e n d a d o o p a d r e Estêvão d e Oliveira e Rosa.
5 0 . A igreja de São J o ã o Batista da Cananéia, colada, vigário o p a d r e J o ã o de Heiró.k
5 1 . A igreja d e B o m J e s u s d e I g u a p é , colada, vigário o p a d r e A n t ô n i o R i b e i r o .
5 2 . A c a p e l a d e N o s s a S e n h o r a do Pilar, j u n t o a P a r a n a g u á , " a n u a l , p á r o c o o
padre Manuel Moreira.
5 3 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a L u z d e Curitiba, colada, vigário o p a d r e M a n u -
el D o m i n g u e s Leitão.
5 4 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a G r a ç a d o R i o São F r a n c i s c o X a v i e r , a n u a l ,
vigário o p a d r e M a n u e l M a r t i n s .

E vigário d a v a r a deste distrito o p a d r e Cristóvão d a C o s t a d e Oliveira, de


Paranaguá.
Francisco d e B ó r g e a , "clérigo c a p a z , q u e l h e d e i x o u " r e v e r e n d a s o s e n h o r
G u a d a l u p e e sabe.

C o m a r c a d a L a g u n a , a o sul, p e r t o d a i l h a d e S a n t a C a t a r i n a [ fl. 446v. ]

5 5 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a do D e s t e r r o da ilha d e S a n t a C a t a r i n a , c o l a d a ,
vigário o p a d r e Francisco Pereira Pimentel.

8' Bom.
k- Incapaz por falta de moral.
L
Bom, excessivo e examinava também.
J- O "revisor da Companhia.
k- Tem um 'hospício da Companhia com seu 'superior.
5 6 . A igreja d e S a n t o A n t ô n i o da vila de Nossa S e n h o r a dos Anjos d a L a g u n a ,
a n u a l , vigário o p a d r e Francisco Vilela; está s e m "provisão, m a s c o m c a r t a
m i n h a p a r a c o n t i n u a r , e se lhe deve p a s s a r provisão.
5 7 . A igreja d a n o v a p o v o a ç ã o do R i o G r a n d e d e São P e d r o , "anual, vigário o
p a d r e J o s é Carlos d a Silva.

É *vigário da v a r a d e s t e distrito o dito p a d r e Francisco Vilela.


A igreja da N o v a C o l ô n i a do S a c r a m e n t o , "colada e vigário d a v a r a d a mes-
m a o padre M a n u e l Pimentel Rodovalho.
Esta p o v o a ç ã o p e r t e n c e a o governo d o R i o G r a n d e . 1

C o m a r c a d e ItUj d a c a p i t a n i a d e S ã o P a u l o

5 8 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a C a n d e l á r i a d e Itu, c o l a d a , " e n c o m e n d a d o o


p a d r e J o s é Pires M o n t e i r o .
5 9 . A igreja de Nossa S e n h o r a da P e n h a de A r a r i t a g u a b a , a n u a l , vigário o p a d r e
Filipe de C a m p o s .
6 0 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a P o n t e d e S o r o c a b a , a n u a l , vigário o p a d r e P e d r o
D o m i n g u e s Pais.
6 1 . A igreja de N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d e P a r a n a p a n e m a , a n u a l , "pároco o
padre Domingos Machado.
62. A igreja, q u e ainda n ã o é, do descobrimento d e Apiaí, c o m p o u c a d u r a ç ã o , a n u -
al, p á r o c o o p a d r e J o s é Pinto de Paiva.

E vigário d a v a r a deste distrito o p a d r e Miguel D i a s Ferreira, d a vila de I t u . m

Minas do Cuiabá, pertencentes à capitania de São Paulo

6 3 . A igreja do S e n h o r B o m J e s u s do C u i a b á , a n u a l , vigário d a igreja e d a vara o


p a d r e J o ã o C a e t a n o C é s a r d e Azevedo.

H á nestas m i n a s u m novo descobrimento, c h a m a d o o M a t o Grosso, n o qual,


se c o n t i n u a r , se deve fazer o u t r a freguesia. 11

Minas de Goiás, pertencentes à m e s m a capitania

64 r A igreja de S a n t a n a , anual, vigário o p a d r e M a t e u s M a c h a d o H o m e m . 0

6 5 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d a M e i a P o n t e , a n u a l , vigário o
p a d r e P e d r o M o n t e i r o de Araújo.

Não há senão Os "párocos.


Foí pároco encomendado, 'é bom em tudo e capaz para 'examinador.
O vigário que vai é bom para tudo.
Bom para tudo.
815

6 6 . A igreja d e Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o dos Crixás, * a n u a l , vigário o p a d r e


M a n u e l L o p e s d a Silva.

E "vigário d a vara deste distrito o sobredito p a d r e M a t e u s M a c h a d o H o m e m .

M i n a s dos T o c a n t i n s , d a m e s m a capitania [ fl. 4 4 7 ]

6 7 . A igreja d e Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o das T r a í r a s , a n u a l , vigário o p a d r e


V i c e n t e Pereira d a Silva.
6 8 . A igreja de São J o s é dos T o c a n t i n s , anual, vigário o d o u t o r A n t ô n i o Pereira
Correia.

O m e s m o é vigário d a vara.P

C o m a r c a de São Paulo

6 9 . A igreja de S ã o P a u l o , d a c i d a d e d o m e s m o n o m e , "colada, vigário o p a d r e


Mateus Lourenço de Carvalho.
7 0 . A igreja d e S a n t a n a das C r u z e s d a vila d e M o g i , " e n c o m e n d a d o o p a d r e
Francisco M e n d e s do C o u t o .
7 1 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o dos G u a r u l h o s , a n u a l , vigário o p a d r e
Faustino do P r a d o X a v i e r .
72. A igreja d e S a n t o A m a r o , a n u a l , vigário o p a d r e A n t ô n i o M u n i z M a r i a n o .
73. A igreja d e Nossa S e n h o r a d a P e n h a , anual, vigário o p a d r e I n á c i o d e A l m e i d a
Lara.
7 4 . A igreja d e S ã o R o q u e , a n u a l , vigário [incompleto].
75. A igreja d e São J o ã o de Atibaia, anual, vigário o p a d r e Salvador C a r d o s o d e
Oliveira.
76. A igreja d e Nossa S e n h o r a d e M o n s e r r a t e d a Cotia, a n u a l , vigário o p a d r e Sal-
v a d o r G a r c i a Pontes.
77. A igreja d e Nossa S e n h o r a de N a z a r é do G u a t u b a i a , a n u a l , vigário o p a d r e
A n t ô n i o da Silveira C a r d o s o .
7 8 . A igreja de S a n t a n a d e P a r n a í b a , c o l a d a , vigário o p a d r e M a n u e l M e n d e s ,
formado.
79. A igreja d e Nossa S e n h o r a do D e s t e r r o d e j u n d i a í , anual, vigário o p a d r e J a c i n t o
de A l b u q u e r q u e S a r a i v a .
8 0 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a do D e s t e r r o d e J u q u e r i , a n u a l , vigário o p a d r e
T o m é Pinto Guedes.
8 1 A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o de M o g i do C a m p o , a n u a l , vigário
o p a d r e J o ã o Gonçalves C h a v e s .

Bom para tudo.


816

É "vigário d a v a r a deste distrito o vigário de São P a u l o , M a t e u s L o u r e n ç o d e


Carvalho. 9

C o m a r c a de Taubaté, da m e s m a capitania

8 2 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o de J a c a r e í , " a n u a l , vigário p a d r e


J o ã o M a r t i n s Bonilha.
8 3 . A igreja d e S ã o Francisco das C h a g a s d e T a u b a t é , "colada^ " e n c o m e n d a d o o
p a d r e Filipe d a Silva.
8 4 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d o B o m Sucesso d e P i n d a m o n h a n g a b a , a n u a l ,
vigário o p a d r e Luís Francisco N u n e s .
85. A capela d e Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , do distrito d a freguesia a c i m a e fazenda
d e J o s é C o r r e i a Leite, "capelão o p a d r e C a e t a n o Gonçalves.
86. A igreja d e S a n t o A n t ô n i o d e G u a r a t i n g u e t á , anual, vigário o p a d r e J o s é Alvares
Vilela.
[ fl. 447v. ] 87. A igreja d e Nossa S e n h o r a d a P i e d a d e d e I g u a p a c a r é , a n u a l , vigário o p a d r e
A n t ô n i o Esteves d a R i b e i r a .

E vigário da vara deste distrito o p a d r e J o s é Alvares Vilela, vigário de


Guaratinguetá. " 1

Capitania das Minas

C o m a r c a do R i o das M o r t e s

C o m p r e e n d e esta c o m a r c a as igrejas dos dois c a m i n h o s , V e l h o e N o v o , q u e são


r e p u t a d a s p o r de M i n a s , e assim e m primeiro lugar se falará delas.

C a m i n h o Velho q u e vai de S ã o Paulo

8 8 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o ou d a P e n h a d o P o u s o Alto, a n u a l ,


vigário o p a d r e M a n u e l A n t ô n i o T e i x e i r a de M i r a n d a V a i a .
89. A igreja d e Nossa S e n h o r a d e M o n s e r r a t e de B a e p e n d i , a n u a l , vigário o p a d r e
Antônio Ribeiro da Cruz.
9 0 . A igreja ou c a p e l a d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o das C a r r a n c a s , a n u a l ,
"pároco o padre Manuel Rodrigues Ramos.
9 1 . A igreja, q u e a i n d a n ã o ê, d o descobrimento do R i o V e r d e ; está p o r capelão
p a r a a d m i n i s t r a r os s a c r a m e n t o s aos mineiros o p a d r e A n t ô n i o M e n d e s .

I 1
*Examinador e também na Companhia.
-
r
Bom e conveniente para tudo.
817

C a m i n h o N o v o que vai do R i o de J a n e i r o

9 2 . A capela de Nossa S e n h o r a d a Glória, n a roça de S i m ã o P e r e i r a , "capelão o


padre. A n t ô n i o G a r c i a d a Rosa.
9 3 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a Assunção d o E n g e n h o , "anual, "pároco o p a -
d r e G a e t a n o Lopes d e L i m a .
9 4 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a P i e d a d e , anual, vigário o p a d r e J o s é de Freitas.

Estas são as igrejas dos dois c a m i n h o s , q u e n ã o são r e p u t a d a s p o r d e M i n a s .


Seguem-se as q u e o são da dita c o m a r c a do R i o das M o r t e s .

9 5 . A igreja d e Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o d a A i u r u o c a , a n u a l , vigário o p a d r e


José Matol.
9 6 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d o Pilar d a vila d e S ã o J o ã o d e l - R e i , " c o l a d a ,
"encomendado o doutor Manuel da Rosa Coutinho.
9 7 . A igreja d e S a n t o A n t ô n i o d a vila de São J o s é , colada, vigário o p a d r e j o s é
Nogueira Ferraz.
9 8 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o dos P r a d o s , a n u a l , vigário o p a d r e
Manuel da Encarnação Justiniano.
9 9 . A igreja d e S a n t o A n t ô n i o d e Itaverava, anual* vigário o p a d r e J o ã o F e r r e i r a
Ribeiro.

E "vigário d a v a r a deste distrito o sobredito d o u t o r M a n u e l d a R o s a C o u t i n h o . 3

C o m a r c a de Vila Rica , [ A- 4 4 8 ]

1 0 0 . A igreja d e Nossa S e n h o r a das C o n g o n h a s do C a m p o , a n u a l , vigário o p a -


dre Manuel Pereira Correia, formado.
1 0 1 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o dos Carijós, anual, vigário o p a d r e
M a n u e l R i b e i r o d a Silva.
1 0 2 . A igreja dé S a n t o A n t ô n i o d o O u r o B r a n c o , colada, " e n c o m e n d a d o o p a d r e
M a n u e l Alvares d e C a r v a l h o .
1 0 3 . A igreja d e S a n t o A n t ô n i o d a Itatiaia, a n u a l , vigário o p a d r e G o n ç a l o d e
Moura Marinho.
1 0 4 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d e V i l a R i c a , c o l a d a , vigário o
d o u t o r Félix Simões de P a i v a . 1

1 0 5 . A igreja d e Nossa S e n h o r a do Pilar do O u r o P r e t o , c o l a d a , vigário o p a d r e


P e d r o L e ã o d e Sá.

s
- Bom, 'letrado, muito prudente, bom moralista. 'Examinador ruim, despachador idem, omisso.
x
- Vigário da vara, pri une.
1 0 6 . A igreja d e S ã o B a r t o l o m e u , "colada, vigário, digo, " e n c o m e n d a d o o dou-
t o r P a u l o de M a s c a r e n h a s C o u t i n h o .
1 0 7 . A igreja de S a n t o A n t ô n i o do C a m p o , ou d a C a s a B r a n c a , " a n u a l , vigário o
p a d r e J o ã o B a r b o s a Maciel.
1 0 8 . A igreja d e Nossa S e n h o r a de N a z a r é d a C a c h o e i r a , colada, e n c o m e n d a d o
o p a d r e M a n u e l C a e t a n o Xavier.
1 0 9 . A igreja dê Nossa S e n h o r a d a B o a Viagem d a Itabira, a n u a l , vigário o padre
J o ã o de Sousa L o b a t o .

E "vigário d a vara deste distrito o d o u t o r M i g u e l d e C a r v a l h o d e Almeida.

C o m a r c a d o R i b e i r ã o [do C a r m o ]

1 1 0 . A igreja de Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o d a vila do C a r m o , colada, vigário


o padre José Simões. u

111. A igreja d e São Sebastião e Almas, colada, e n c o m e n d a d o o p a d r e C a e t a n o d a


Mata Gião.
112. A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o da G u a r a p i r a n g a , colada, e n c o m e n -
d a d o o p a d r e M a n u e l R i b e i r o Guimarães..
113. A igreja de Nossa S e n h o r a d o R o s á r i o do S u m i d o u r o , a n u a l , vigário o d o u t o r
Manuel de Amorim Coelho.
1 14. A igreja d e Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o d o arraial d e A n t ô n i o Pereira, ou
n o v a m e n t e do S e n h o r do Bonfim, anual, vigário o p a d r e J u l i ã o N u n e s dos Reis.
115. A igreja d o B o m J e s u s do F u r q u i m , colada, e n c o m e n d a d o o p a d r e Francisco
Pereira d a T e r r a da Feira.
1 16. A igreja d e São C a e t a n o , a n u a l , "pároco o p a d r e A n d r é G o m e s Ribeiro.
117. A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o dos C a m a r g o s , a n u a l , vigário o p a d r e
Luís A n t ô n i o Castelo B r a n c o .
118. A igreja d e Nossa S e n h o r a d e N a z a r é d o Inficionado, a n u a l , vigário o p a d r e
A n t ô n i o S a r m e n t o de Vasconcelos.
1 19. A igreja de Nossa S e n h o r a da C o n c e i ç ã o das C a t a s Altas, colada, e n c o m e n -
d a d o [incompleto],

E vigário d a v a r a deste distrito o d o u t o r M a n u e l Freire, B a t a l h a . v

Comarca do Sabará

1 2 0 . A igreja de S a n t o A n t ô n i o do M a t o D e n t r o ou d o R i b e i r ã o d e S a n t a B á r b a -
r a , colada, vigário o p a d r e M a n u e l d e Sousa T a v a r e s .

Bom em tudo, 'examinador.


Também às vezes examinava.
819

1 2 1 . A igreja d e São J o ã o d o M o r r o G r a n d e , *anual, vigário o p a d r e M a r c o s


Freire d e C a r v a l h o .
1 2 2 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a do B o m Sucesso d a vila do C a e t é , ' c o l a d a , vigá-
rio o d o u t o r H e n r i q u e Pereira.
1 2 3 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d e Vila R e a l d o S a b a r a , c o l a d a ,
vigário o d o u t o r L o u r e n ç o J o s é d e Q u e i r ó s C o i m b r a .
12.4. A igreja d e S a n t o A n t ô n i o d a R o ç a G r a n d e , colada, " e n c o m e n d a d o o p a d r e
J o ã o d e Amaral de Abreu.
1 2 5 . A igreja d e Nossa S e n h o r a da Conceição dos Raposos, c o m u n i ã o d a d o Ar- [ fl. 448v. ]
raiai V e l h o , c o l a d a , vigário o p a d r e J o s é M a t i a s de Gouveia.
1 2 6 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o do R i o das Pedras, colada, vigário
o p a d r e J o ã o Soares B r a n d ã o .
1 2 7 . A igreja de Nossa S e n h o r a do Pilar das C o n g o n h a s do S a b a r á , a n u a l , vigá-
rio o p a d r e M a n u e l Pinheiro, f o r m a d o .
1 2 8 . A igreja de S a n t o A n t ô n i o do R i o das V e l h a s , a n u a l , vigário o p a d r e J o ã o d e
Almeida de A b r e u . w

1 2 9 . A igreja de S ã o M i g u e l d e M a t o D e n t r o , a n u a l , v i g á r i o o p a d r e A m a r o
Rodrigues Costa.
1 3 0 . A igreja de Nossa S e n h o r a d a B o a V i a g e m do C u r r a l del-Rei, a n u a l , vigário
o padre Alexandre Nunes Cardoso. x

1 3 1 . A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a P i e d a d e da Vila d o Pitangui, c o l a d a , e n c o -


m e n d a d o o p a d r e Inácio Gonçalves L o u r e i r o .

E "vigário da v a r a deste distrito o sobredito d o u t o r L o u r e n ç o J o s é d e Q u e i r ó s


Coimbra.Y

C o m a r c a do Serro do Frio

1 3 2 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d a Vila d o Príncipe, colada, vigá-


rio o p a d r e S i m ã o P a c h e c o .
1 3 3 . A igreja d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d o M a t o D e n t r o , a n u a l , vigário o
p a d r e A n d r é M o r e i r a de Faria, f o r m a d o .

E vigário d a v a r a o m e s m o p a d r e A n d r é M o r e i r a d e F a r i a . 2

Antônio Teixeira Álvares.


Formado.
"Examinador, bom em tudo.
Examinador
820

* 123 <

[Inscrição comemorativa da primeira pedra lançada


no alicerce do convento da Ajuda]

Cópia de provável inscrição em pergaminho comemorati-


va do lançamento da pedra fundamental do convento d a Ajuda,
no Rio de Janeiro, inaugurado em 1750.
Este tipo de documento era elemento corporificador do fes-
tejo público comemorativo, mescla de ato público e acadêmico.
Compulsado, talvez, por membro da Academia dos Felizes, que
atuou no Rio de Janeiro entre 1747 e 1750, exemplifica o inte-
resse e a afinidade do ouvidor Caetano da Costa Matoso pelos
temas exercitados em círculos de letrados. Deve-se destacar a
sua participação no ato acadêmico em h o m e n a g e m a quatro
freiras que chegaram da Bahia para a instituição, que incluiu a
apresentação de dois sonetos do padre Mateus Saraiva intitulados
A primeira pedra lançada no alicerce do convento e Fundação do
convento, nos dias 10 a 12 de dezembro de 1749, m o m e n t o em
que se encontrava n o Rio de J a n e i r o p r e p a r a n d o sua viagem
para Vila Rica.
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Rio dejaneiro; 14.5.1745.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O texto contém tópicas caracterís-
ticas do gênero encomiástico. fJPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, do período
barroco, imitativa da monumental inglesa moderna. As maiúscu-
las e m capitais ornadas d e amplas volutas e laçadas duplas e
simples; traços ascendentes no final das palavras; "d" uncial com
diversas variações: de haste simples, em laçadas que se acoplam
às vogais seguintes; " s " de diversas feituras: redondos, semelhan-
tes ao " z " , com ou sem cauda. Módulos múltiplos em função dos
enunciados. Numerais romanos n a indicação do ano (1742). (YDL)

[ fl. 4 4 9 ] Sagrado Templo


p a r a a católica posteridade
monumento memorável
nesta A m é r i c a p o r t u g u e s a
erigido
n o subúrbio d a cidade de São Sebastião d o R i o d e J a n e i r o
p o r real o r d e m d o magnífico m o n a r c a
d o m J o ã o V , rei de Portugal,
p a r a clausura
de virgens professas n a "religião d o "patriarca são Francisco,
g o v e r n a n d o a igreja de D e u s
o p a p a Benedito X I V , d e gloriosa m e m ó r i a ,
s e n d o "bispo
desta c i d a d e e seus domínios diocesanos e d a " p r o -
víncia das M i n a s Gerais, d a d e Goiás, C u i a b á ,
capitania d e São Paulo e d e todos os desta
A m é r i c a portuguesa, calculados p a r a a região
d o sul,
o Excelentíssimo e R e v e r e n d í s s i m o d o m J o ã o d a C r u z ,
d a religião dos carmelitas descalços,
q u e lançou a p e d r a primeira, q u e b e n z e r a c o m sole-
nes cerimônias p a r a esta s a g r a d a clausura,
c o m g r a n d e auxílio da sua liberalidade
e m u i t a p a r t e dos referidos povos, e m 14 de m a i o d o
a n o d e Cristo de M D C C X L I I , 1

governando
o t e m p o r a l e as a r m a s desta capitania
d o R i o d e J a n e i r o e contígua província das M i n a s G e -
rais o Excelentíssimo e Ilustríssimo "capitão-general G o m e s Freire d e A n d r a d e .

• 124 <

[Inscrição comemorativa da primeira pedra lançada


no alicerce do templo de São Sebastião]

Cópia em latim e tradução de provável inscrição em perga-


minho comemorativa do lançamento da pedra fundamental d a
nova catedral do Rio de Janeiro. As obras foram interrompidas

A data correta é 14 de maio de 1745.


822

em 1752 e n ã o foram mais r e t o m a d a s . N o m e s m o local foi


construída a Escola Politécnica do Rio de Janeiro.
Este tipo de documento era elemento corporificador do fes-
tejo público comemorativo, mescla de ato público e acadêmico.
Compulsado, talvez, por m e m b r o da Academia dos Felizes, que
atuou no Rio de Janeiro entre 1747 e 1750, traduz o interesse e
a afinidade do ouvidor Caetano d a Costa Matoso pelos temas
exercitados em círculos de letrados. Deve-se destacar a sua par-
ticipação n a festa, que coincide com a sua permanência n o Rio
de Janeiro para preparação de sua viagem para Vila Rica.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : a n ô n i m o ; R i o de J a n e i r o ;
20.1.1749.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O texto contém tópicas caracte-
rísticas do gênero encomiástico. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, de letra re-
donda, com vestígios da bastarda italiana. T r a z capitulares or-
nadas de pequenas laçadas terminais. Reprodução de lápide co-
memorativa, escrita em latim (fólio 450) e sua tradução (fólios
451-451v.). (YDL)

[fl. 450 ] D. O. M.
Benedicto X I V Pontífice M á x i m o S e d e n t e
D. D.Joannes V
Augustísimo Potentíssimo, ac Magnificentíssimo Portugaliae et
[Algarbirium R e x , et Brasiliae D o m
P r o effusissima, q u a R e g e s o m n e s antecellit, in Superos munificientia, et pietate
T u t e l a r e m h o c p r i m u m Divi Sebastiani T e m p l u m
I n edito a n t i q u a e Civitatis colle olim c o n s t r u c t u m
a Sereníssimo Portugaliae, Algarbirium, et Brasiliae R e g e Sebastiano
ob r e p o r t a t a m a b expulsis T a m m u y i s , et Francis victoriam
a n n o a r e p o r t a t a Salute M D L X V I I I ,
Et
in C a t h e d r a l i s Ecclesiae h o n o r e m , a u t h o r i t a t e I n n o c e n t i i X I
anno M D C L X X V postea evectum
a Magnifico Portugaliae R e g e , et Brasiliae Principe Petro II,
nunc
ob m a i o r e m Civitatis a m p l i t u d i n e m , et c o m m o d i o r e m p o p u l i utilitatem
C a p a c i o r i h a c a r e a magnificentius d e n u o condere.
Sumptuosius instaurare jussit ex voto,
A e t e r n u m u t i q u e eximiae suae in D e u m , D i v u m q u e S e b a s t i a n u m pietatis, et
Regalis
823

Magnifícentiae M o n u m e n t u m :
Primo
T a n t i operis Lapidi j a c i e n d o ,
X X die J a n u a r i i T u t e l a r í N o m i n i Sacra
anni M D C C X L L X ;
Praesentibus
Excelentissimo et Reverendissimo D . D . Frater A n t o n i o a b Exílio
[Fluminensis hujus Diocesis Episcopus,
et
Excellentissimo et Ilustríssimo D . Gomesio Freyre d e A n d r a d e
T o t i u s AustraJis O r a e Generali D u c e , ac S u p r e m o G u b e r n a t o r e ,
Illustrissimo D . D o c t o r e Francisco Cordovil de Siqueira e Melo
Ararii Regii Praefecto.

A Deus Óptimo Máximo [ íl. 451 ]


S e n d o S u m o Pontífice o Santíssimo S e n h o r Benedito XTV,
o Augustíssimo, Potentíssimo e Magnificentíssimo S e n h o r D o m J o ã o , o q u i n t o ,
rei d e Portugal e do Algarve e d o Brasil etc.
Pela sua liberalíssima munificência e p i e d a d e p a r a com os santos t

n a qual excedeu a todos os mais reis,


neste presente a n o de 1749.
A t e n d e n d o a o g r a n d e a u m e n t o e extensão desta cidade e a m a i o r c ô m o d o
e utilidade do povo p a r a a assistência do culto divino,
m a n d o u de novo edificar, mais magnífica e suntuosamente,
este p r i m e i r o templo tutelar de são Sebastião,
neste lugar mais a m p l o e á r e a mais capaz;
o qual p r i m e i r a m e n t e foi fundado n a eminência d o m o n t e e m q u e esteve
[situada p r i m e i r a
vez esta cidade,
pelo Sereníssimo rei de Portugal, Algarve e Brasil, o senhor d o m Sebastião,
e m ação d e graças p e l a vitória a l c a n ç a d a
n a expulsão e destruição dos tamoios e franceses
n o a n o d e mil quinhentos e sessenta e oito;
e sublimado depois à h o n r a d e sé episcopal
pelo magnífico príncipe do Brasil e rei d e Portugal, o s e n h o r d o m P e d r o I I ,
c o m a u t o r i d a d e do S u m o Pontífice Inocêncio X I
n o a n o de mil seiscentos e setenta e cinco.
Eterno padrão
e p e r p é t u o m o n u m e n t o d a sua exímia p i e d a d e e real magnificência p a r a
c o m D e u s e são Sebastião. 1
824

A o lançar-se a p r i m e i r a p e d r a
d e t ã o magnífica o b r a e n o v a sé aos 20 de j a n e i r o ,
dia c o n s a g r a d o ao ínclito m á r t i r são Sebastião, seu tutelar.
Assistiram
o Excelentíssimo e R e v e r e n d í s s i m o S e n h o r Digníssimo d o m frei A n t ô n i o
[do D e s t e r r o , "bispo desta
diocese do R i o de J a n e i r o ,
[ fl. 45 lv. ] o Excelentíssimo e Ilustríssimo S e n h o r G o m e s Freire de A n d r a d e , "capitão-
g e n e r a l e s u p r e m o " g o v e r n a d o r do R i o d e J a n e i r o ,
capitania d e São Paulo e M i n a s Gerais
e
o Ilustríssimo s e n h o r d o u t o r Francisco Cordovil d e Siqueira e M e l o ,
"provedor da Fazenda Real da capitania
do R i o d e J a n e i r o , a n o d e 1749.

• 125 «

[ fl. 452 ] Regimento do ouvidor-geral da cidade do Rio de Janeiro


e repartição do Sul, passado por Sua Majestade ao
doutor João de Abreu e Silva

Diploma, destinado a instruir a atuação de u m ouvidor es-


pecífico, traçando detalhadamente suas atribuições, competên-
cia e alçada. Esse procedimento era característico da Coroa por-
tuguesa, que adaptava os padrões administrativos metropolita-
nos à realidade colonial e criava mecanismos de controle da bu-
rocracia baseados n a lealdade, n a confiança e n a vigilância recí-
proca entre seus membros.
Esta segunda cópia deste mesmo regimento neste Códice (ver
d o c u m e n t o 23), acrescida de a n o t a ç õ e s sobre m u d a n ç a s ou
derrogação de algum capítulo por legislação complementar, foi
feita pelo ouvidor Caetano da Costa Matoso no Rio de Janeiro,
provavelmente para a preparação de sua defesa na Corte, quan-
do j á se encontrava afastado do seu cargo.
A u t o r i a , l o c a l e data: Conselho U l t r a m a r i n o ; Lisboa;
1669.
D e s t i n a t á r i o : J o ã o de Abreu e Silva.
U s o n a historiografia: Donald Ramos discute a posição
ambígua do ouvidor dentro da burocracia colonial como decor-
rente, em parte, d a utilização de u m regimento de 1669, anacrô-
nico se confrontado com a realidade das Minas Gerais (A social
history of Ouro Preto; stresses of dynamic urbanization in colonial
Brazil, 1695-1726. Gainesville: University of R ó r i d a , 1972. p .
377-378).
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "regi-
m e n t o " é "Governo. Direção" [Vocabulário português e latino [...]
Lisboa: Oficina de Pascoal d a Silva, 1720. V. 7, p . 199) . O
presente regimento, cujo narrador fala na primeira voz, é prece-
dido por breve exórdio, onde t a m b é m consta o destinatário, tra-
tado na segunda pessoa do plural, e é composto por "capítulos",
rtâattío ?f£ onde se detalham as instruções, prevalecendo a forma imperati-
va n a linguagem e a construção de períodos pela combinação de
hipotaxe e paralaxe, típica dos discursos jurídicos ou legislativos.
ÍJPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, redonda do
século XVIII, extremamente regularizada e caligrafada. Capi-
tulares ornadas de discretos apex, maiúsculas b e m delineadas.
O "que" abreviado traz movimento ascendente em linha de meia
voluta, bem caracterizado e semelhante ao movimento de execu-
ção do " f com dois olhos; grupo "lh" com perfil n a primeira
letra. Marginália como variação de letra do texto, mais cursiva
e personalizada, típica de Caetano da Costa Matoso. (YDL)
Cópias manuscritas:
A P M , SC 0 1 , fl. 70v.-74.
A P M , SC 02, fl.l00-102v.

E u , o príncipe, c o m o regente e g o v e r n a d o r dos reinos d e P o r t u g a l e Algarve,


faço s a b e r a vós, "licenciado J o ã o d e A b r e u e Silva, q u e ora m a n d o p o r "ouvidor-
geral do R i o d e J a n e i r o e sua repartição d o Sul n o Estado d o Brasil, q u e e m servir
o dito c a r g o e a d m i n i s t r a r justiça tenhais a forma seguinte:

Residireis d e o r d i n á r i o n a c i d a d e de São Sebastião do R i o de J a n e i r o , p o r


ser p o v o mais f r e q ü e n t a d o e a principal cidade d a q u e l a r e p a r t i ç ã o , e n o m e i o dela
q u e fica mais a c o m o d a d o p a r a as p a r t e s i r e m r e q u e r e r sua justiça, d o n d e ireis u m a
vez e m vosso triénio visitar as capitanias de vossa r e p a r t i ç ã o e fareis n e l a "correição,
u s a n d o e m todas o q u e p o r seu "regimento u s a r a m os "corregedores das c o m a r c a s ,
tirado n o e m q u e p o r este r e g i m e n t o se vos o r d e n a r o u t r a coisa.
826

N a s "visitas e "correições q u e fizerdes, procurareis o q u e , c o n f o r m e o Direi-


to, vos p a r e c e r é necessário e fazem os "corregedores das c o m a r c a s , e vos informareis
se os "donatários u s a m d e mais p o d e r e s e jurisdição d o q u e lhes são concedidos
p o r suas doações, "provisões m i n h a s e f o r m a d a O r d e n a ç ã o , e n ã o lhes consentireis
o c o n t r á r i o , e m e dareis c o n t a do q u e m e u a c h a r d e s c o m o mais q u e vos p a r e c e r
necessário prover-se, d a n d o as razões q u e p a r a isso há, q u e remetereis a o C o n s e -
lho U l t r a m a r i n o , a o secretário dele.

Visitareis as m i n a s d o o u r o d e São P a u l o , o r d e n a n d o q u e delas se tire o u r o e se


freqüentem e p o n h a m e m b o a arrecadação os direitos de m i n h a F a z e n d a , e m e avisareis
d o estado e m q u e estão e d o q u e é necessário prover-se.

N a s terras o n d e estiverdes [e] quinze "léguas a o redor, conhecereis d e a ç ã o


n o v a n o cível e c r i m e , e tereis n o cível de alçada até c e m mil "réis sem a p e l a ç ã o e
a g r a v o , digo, n e m agravo, e sendo mais q u a n t i a dareis a p e l a ç ã o e agravo p a r a a
R e l a ç ã o d o Brasü, r e q u e r e n d o - o as p a r t e s .

E p o r q u e aos "ouvidores das capitanias t e n h o concedido até vinte mil réis d e


a l ç a d a , a p e l a n d o as p a r t e s dele o u a g r a v a n d o n a vossa r e p a r t i ç ã o , t o m a r e i s co-
n h e c i m e n t o e despachareis c o m o for justiça, d a n d o apelação e a g r a v o p a r a a R e -
lação do Brasil n o q u e n ã o c o u b e r e m vossa alçada.

N o s casos-crimes dos escravos e índios, tereis a l ç a d a e m t o d a s as p e n a s , de-


g r e d o s e açoites q u e aos malfeitores p e l a O r d e n a ç ã o são postas; e nos casos d e
m o r t e , julgareis c o m o " g o v e r n a d o r e " p r o v e d o r d a F a z e n d a , até m o r t e inclusive,
[ fl. 452v. ] e n o q u e dois / / c o n f o r m a r e m poreis a sentença e a dareis a e x e c u ç ã o s e m apela-
ção n e m agravo. a

O "juiz de fora é o adjunto hoje, em lugar do provedor, por provisão.


7

N o s casos d e peões b r a n c o s livres e m q u e pelas O r d e n a ç õ e s é p o s t a p e n a até


cinco anos de d e g r e d o , despachareis p o r vós só, e h a v e n d o d e ser c o n d e n a d o s e m
' p e n a vil, c o m o açoites ou *baraço, ou *pregão, ou e m caso q u e , p r o v a d o , m e r e -
ça p e l a lei *morte n a t u r a l ou cível ou c o r t a m e n t o d e m e m b r o , despachareis c o m o
" g o v e r n a d o r e " p r o v e d o r d a F a z e n d a , e sendo todos conformes poreis a sentença
e se d a r á a execução sem apelação n e m a g r a v o , e n ã o sendo conformes as partes
p o d e r ã o apelar, e n ã o t e n d o p a r t e apelareis p e l a j u s t i ç a . b

N o s c r i m e s d e pessoas n o b r e s , " m o ç o s d a c â m a r a do m e u serviço, cavalei-


ros fidalgos e d a í p a r a c i m a , d e s p a c h a r e i s d a m e s m a m a n e i r a c o m os dois a d -
j u n t o s nos casos e m q u e a O r d e n a ç ã o p õ e p e n a a t é seis a n o s d e d e g r e d o , e n ã o
s e n d o t o d o s c o n f o r m e s dareis a p e l a ç ã o e a g r a v o p a r a a R e l a ç ã o d o Brasil, e os
c r i m e s m a i o r e s e m q u e a lei d á m a i o r p e n a , d e s p a c h a r e i s p o r vós c o m a p e l a ç ã o
para a mesma Relação.

E s u c e d e n d o q u e aí esteja o p r o v e d o r - m o r dos defuntos, será adjunto nos ditos


feitos c o m o g o v e r n a d o r , e n ã o estando será o p r o v e d o r - m o r d a F a z e n d a , e faltando
a m b o s será adjunto o p r o v e d o r da F a z e n d a d a dita capitania, e p a r a assim j u l g a r d e s
vos ajuntareis n a c a s a d a c â m a r a .

10

C o n h e c e r e i s das apelações e agravos q u e se t i r a r e m dos j u í z o s ordinários d e


vossa R e p a r t i ç ã o e os despachareis sem apelação n e m agravo n o q u e c o u b e r e m
vossa alçada.

11

E assim t a m b é m conhecereis dos q u e se t i r a r e m dos juízes dos órfãos, n ã o estan-


d o nessa r e p a r t i ç ã o o p r o v e d o r d a c â m a r a , digo, d a c o m a r c a , p o r q u e a ele, e n ã o
a o p r o v e d o r n o m e a d o p e l a M e s a d a Consciência, p e r t e n c e o c o n h e c i m e n t o dos
ditos agravos.

Nas *juntas deve preceder o 'ouvidor ao provedor, por 'provisão.


828

12

Sereis "auditor dos soldados dos "presídios q u e a t u a l m e n t e servirem nos p r e -


sídios, digo, n a milícia pagos e o c u p a d o s nela, e nos crimes os despachareis c o m o
" g o v e r n a d o r , e n ã o c o n c o r d a n d o c h a m a r e i s o "provedor d a F a z e n d a , n ã o estan-
d o n o distrito o p r o v e d o r d a c o m a r c a ou d a F a z e n d a n a f o r m a referida, e se des-
p a c h a r ã o c o m o a c i m a se vos o r d e n a ,

13

E p o r q u e m u i t a s vezes h á d ú v i d a s e n t r e o o u v i d o r - g e r a l e, o p r o v e d o r d a
F a z e n d a , q u e r e n d o c a d a q u a l a m p l i a r s u a j u r i s d i ç ã o , j u l g a r e i s t o d a s as coisas,
[ fl. 4 5 3 ] assim de h o m e n s d o m a r c o m o dos mais q u e n ã o t o c a r e m à m i n h a / / F a z e n d a ,
p o r q u e dessas é juiz o m e s m o p r o v e d o r . 0

14

D a r e i s c a r t a p a r a as justiças d e vossa repartição g u a r d a r e m as "cartas de segu-


r o dos "clérigos de o r d e n s sacras ou "beneficiados e p a r a se lhes g u a r d a r e m as
sentenças p o r q u e forem livres diante do s e u juiz, e isto sendo-vos p o r eles r e q u e -
r i d o n a forma d a O r d e n a ç ã o , livro l , título 7, p a r á g r a f o 3 2 .
e

15

A l é m das cartas de seguro q u e c o m o "corregedor da c o m a r c a podeis passar e


alvarás de fiança, as passareis n a vossa repartição sobre as resistências e mortes, n a
forma da O r d e n a ç ã o , no dito título 7 , parágrafo 11, quer sejam negativas ou con-
9

fessativas, até quatro cartas somente, e levareis as assinaturas q u e levam os corregedo-


res das comarcas, salvo aquelas e m q u e eles t ê m quatro "réis, p o r q u e c o m o naquele
Estado é a m e n o r m o e d a u m "vintém hei p o r b e m q u e o leveis d e assinatura.

16

E q u e o g o v e r n a d o r ou "capitão-mor não possa m a n d a r soltar presos


alguns que o forem por m a n d a d o da justiça n e m libertar homiziados alguns, e
s e n d o p o r c a u s a das g u e r r a s n e c e s s á r i o l a n ç a r - s e " b a n d o p a r a os h o m i z i a d o s
criminosos a c u d i r e m a "defensão e reparo da terra p o r causa de inimigos, hei
p o r b e m q u e os d i t o s b a n d o s se n ã o l a n c e m s e n ã o c o n s u l t a d o s c o n v o s c o o
g o v e r n a d o r , e e n t ã o se l a n c e m e m n o m e d e a m b o s , e d i s c o r d a n d o s e r á t e r c e i -

E no empate do provedor, hoje o *juiz de fora.


829

r o o a d m i n i s t r a d o r ou q u e m seu c a r g o servir, e o q u e dois a c o r d a r e m se g u a r -


d a r á , n o s q u a i s " b a n d o s se e x c e t u a r ã o os c r i m e s d e l e s a - m a j e s t a d e , moeda
falsa, s o d o m i a , resistência e a l g u n s c u l p a d o s [em] c r i m e s q u e p a r e ç a e s c a n d a -
l o s o a n d a r e m livres, e d e l i n q ü i n d o a l g u n s d e b a i x o d o b a n d o sejam l o g o p r e -
sos e c a s t i g a d o s , e h a v e n d o d ú v i d a s s o b r e a v a l i d a d e dos b a n d o s c o n h e c e r e i s
d a v a l i d a d e deles, n a f o r m a d e vosso " r e g i m e n t o , p a r a se d e t e r m i n a r e m c o m
os a d j u n t o s , n a f o r m a a t r á s d e c l a r a d a .

17

N ã o p o d e r á o "governador-geral, "capitão-mor, n e m c â m a r a o u o u t r a pessoa,


tirar-vos do dito cargo, p r e n d e r - v o s ou suspender-vos, e fazendo-o vos n ã o dareis
p o r suspenso e os prendereis, e a o g o v e r n a d o r ou c a p i t ã o - m o r "emprazareis p a r a
diante dos corregedores do crime d a C o r t e , fazendo autos dos excessos que convosco
tiverem, e m a n d o aos oficiais de Justiça e G u e r r a vos o b e d e ç a m nisso, sob p e n a de
suspensão d e seus ofícios e das mais p e n a s q u e h o u v e r p o r m e u serviço; e s e n d o
caso, o quê n ã o espero, q u e cometais a l g u m crime ou excesso q u e p a r e ç a deverdes
ser deposto antes da "residência, farão disso autos, q u e vós n ã o impedireis e m o s
r e m e t e r ã o a o Conselho U l t r a m a r i n o , c o m clareza do delito, p a r a eu m a n d a r o q u e
h o u v e r p o r m e u serviço, e nas residências dos g o v e r n a d o r e s e c a p i t ã e s - m o r e s se
p e r g u n t a r á p o r isto.

18 [ f l . 453v. ]

E sendo caso q u e cometais a l g u m excesso (o q u e n ã o será) tão grave q u e p o r


ele e p e l a s leis m e r e ç a i s p e n a d e m o r t e , e n t ã o s o m e n t e p o d e r e i s ser p r e s o n o
flagrante, e d e o u t r a m a n e i r a n ã o .

19

N a s p e n a s q u e puserdes tereis alçadas até, digo, alçada até vinte mil "réis e
livro e m q u e se c a r r e g u e m , e "tesoureiro destas despesas. E s t e d i n h e i r o se n ã o
g a s t a r á senão p o r m a n d a d o s vossos, e q u a n d o o " p r o v e d o r - m o r d a F a z e n d a for
t o m a r contas lhas d a r á o m e s m o tesoureiro p e l o livro e m a n d a d o s , e o q u e sobejar
se e n t r e g a r á a o "almoxarife, l a n ç a n d o - l h e e m receita.

20

E sendo-vos p o s t a suspeição, e n ã o vos d a n d o p o r suspeito, a p a r t e q u e a


p u s e r d e p o s i t a r á q u a t r o mil réis de c a u ç ã o , e j u l g a n d o - s e q u e n ã o p r o c e d e p e r d e -
r á a m e t a d e dela p a r a os presos p o b r e s , e julgando-vos p o r n ã o suspeito p e r d e r á a
c a u ç ã o toda p a r a os presos.
830

21

R e m e t e r e i s a suspeição, p a r a a j u l g a r , a o * p r o v e d o r - m o r d o s defuntos d a
c o m a r c a , e s t a n d o no distrito, e n ã o estando ao dos defuntos e ausentes ou o u t r o
j u l g a d o r " l e t r a d o , e s t a n d o n e l e , e n ã o o h a v e n d o a o "juiz m a i s v e l h o d o a n o
atrás, e n ã o o h a v e n d o ou sendo suspeito seja o s e g u n d o , e assim p o r diante até o
"vereador mais m o ç o , a o q u a l se n ã o p o d e r á p ô r suspeição, e o tal j u i z ou verea-
d o r d e s p a c h a r á as suspeições t o m a n d o p o r a d j u n t o o " l e t r a d o m a i s a n t i g o d o
" a u d i t ó r i o , g u a r d a n d o e m t u d o a f o r m a d a O r d e n a ç ã o , livro 3 , título 21 das
9

suspeições p o s t a s .

22

E sendo a dita suspeição posta fora d o R i o d e J a n e i r o , o n d e seja vosso d o m i -


cílio, n ã o e s t a n d o n e n h u m dos sobreditos n o distrito ireis p r o c e d e n d o n a c a u s a
e n q u a n t o durar a suspeição, t o m a n d o por adjunto o juiz mais velho, e sendo
suspeito t o m a r e i s o s e g u n d o , e s e n d o suspeito t a m b é m ou n ã o o h a v e n d o ireis
t o m a n d o até o v e r e a d o r mais m o ç o , a o qual se n ã o p o d e r á p ô r suspeição, e t u d o
o p o r vós c o m o dito adjunto, e estando p r e p a r a d o o remetereis n a forma referida
a q u e m c o m p e t e o havê-la d e julgar, e sendo j u l g a d o p o r n ã o suspeito o u sendo
[ fl. 454 ] / / passado o t e m p o das suspeições ireis só c o m a causa p o r d i a n t e , c o m o se vos
n ã o fosse p o s t a a suspeição, f a z e n d o disso d e c l a r a ç ã o n o feito, e s e n d o j u l g a d o
p o r suspeito se t o m a r á a c a u ç ã o à p a r t e e se elegerá juiz n a f o r m a d a O r d e n a ç ã o .

23

S e n d o d o e n t e [o] o u v i d o r l e t r a d o p o s t o p o r m i m ou i m p e d i d o d e m a n e i -
r a q u e n ã o p o s s a servir, s e r v i r á o j u i z m a i s v e l h o d e o u v i d o r , o q u a l s e r v i r á
d u r a n t e seu i m p e d i m e n t o , e f a l e c e n d o o u s e n d o i m p e d i d o , d e s o r t e q u e h a j a
d e d u r a r m a i s d e seis m e s e s , p r o v e r á o " g o v e r n a d o r - g e r a l d o E s t a d o a p e s s o a
q u e suficiente p a r e c e r p a r a o dito c a r g o p e l o t e m p o q u e l h e p a r e c e r , e d u r a r á
seu p r o c e d i m e n t o e n q u a n t o d u r a r o dito i m p e d i m e n t o , e o g o v e r n a d o r ou
"capitão-mor d a r á logo ao governador-geral conta, p a r a que parecendo-lhe
m a n d a r p r o v e r o faça, e t a m b é m m e d a r á c o n t a p e l o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o ,
p a r a eu m a n d a r o q u e h o u v e r p o r m e u serviço, e o ouvidor q u e servir de
"serventia u s a r á d a m e s m a j u r i s d i ç ã o e alçada,, e s e n d o o i m p e d i m e n t o do
p r o p r i e t á r i o j u s t o l e v a r á ele o o r d e n a d o p o r i n t e i r o , e n ã o o s e n d o ou faltan-
d o e m t o d o l e v a r á s o m e n t e o " s e r v e n t u á r i o a m e t a d e d o o r d e n a d o , c o m o se
faz e m A n g o l a ,
831

24

E m a n d o a t o d o s os m e u s " d e s e m b a r g a d o r e s , " c o r r e g e d o r e s , " o u v i d o r e s ,


"juízes, justiças e "oficiais e pessoas a q u e m este "regimento ou traslado dele e m
pública f o r m a for m o s t r a d o e o c o n h e c i m e n t o dele p e r t e n c e r o c u m p r a m e guar-
d e m e f a ç a m i n t e i r a m e n t e c u m p r i r e g u a r d a r sem dúvida n e m e m b a r g o a l g u m , e
se registrará n o livro do C o n s e l h o U l t r a m a r i n o e C a s a da Suplicação e C â m a r a d a
c i d a d e do Salvador, B a h i a d e T o d o s os Santos, e o p r ó p r i o se p o r á n o cartório d a
C â m a r a d o R i o d e J a n e i r o p a r a a todo o t e m p o constar dele. Francisco d a Silva o
fez e m Lisboa a 11 d e m a r ç o d e 1669. O secretário M a n u e l B a r r e t o de S a m p a i o
o fez escrever. Príncipe.

" R e g i m e n t o d e q u e h á d e u s a r o " l i c e n c i a d o J o ã o d e A b r e u e Silva n o


cargo de "ouvidor-geral da capitania do R i o de J a n e i r o d e q u e Vossa Alteza
l h e t e m feito m e r c ê , c o m o nele se d e c l a r a . P a r a V o s s a A l t e z a v e r . P o r d e s p a -
c h o d o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o d e d e z o i t o d e m a r ç o d e [mil] seiscentos e ses-
senta e nove.
Francisco M a l h e i r o s . Francisco Ferreira R e b e l o .
R e g i s t r a d a / / nos livros d a S e c r e t a r i a d o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o . M a n u e l [ fl. 454v. ]
B a r r e t o de S a m p a i o .
O q u a l traslado de r e g i m e n t o e registros dele, eu, F r a n c i s c o de S o u s a
C o u t i n h o , "escrivão d a C â m a r a d e s t a c i d a d e d o R i o d e J a n e i r o e seu " t e r m o ,
t r a s l a d e i d o p r ó p r i o q u e t o m e i à p a r t e , o d o u t o r J o ã o d e A b r e u e Silva, q u e
aqui assinou de c o m o recebeu b e m e fielmente, e ao dito r e g i m e n t o m e re-
p o r t o e m t o d o e p o r t o d o , e o c o r r i , " c o n c e r t e i , s u b s c r e v i e assinei c o m "oficial
c o m i g o a q u i , a s s i n a d o h o j e , d e z e s s e t e d e j u n h o d e mil seiscentos e sessenta e
nove anos.
Francisco de Sousa C o u t i n h o .
C o n c e r t a d o p o r m i m , escrivão, Francisco d e Sousa C o u t i n h o .
J o ã o d e A b r e u e Silva.
O q u a l t r a s l a d o d o r e g i m e n t o , eu, P e d r o de M o r a c i n , p o r o r d e m d o
" d e s e m b a r g a d o r , o d o u t o r ouvidor-geral F e r n a n d o Pereira d e V a s c o n c e l o s , a q u i
fez trasladar do livro sétimo d e registros d o S e n a d o d a C â m a r a desta cidade, e m
q u e se a c h a l a n ç a d o à folha trinta e u m , a q u e m e r e p o r t o q u e o corri, concertei,
subscrevi e assinei.
R i o [de J a n e i r o ] e m dezoito de abril de mil setecentos e quinze anos. P e d r o
de Moracin.
C o n c e r t a d o p o r m i m , escrivão d a C â m a r a , P e d r o d e M o r a c i n .
832

• 126 «

[ fl. 455 ] Catálogo dos bispos do Brasil até o ano de 1676,


em que o da Bahia foi elevado a arcebispado

Resumo feito por Gaetano da Gosta Matoso do "Catálogo


dos bispos que teve o Brasil até o ano de 1676, em que, a capital
da cidade da Bahia foi elevada a metropolitana, e dos arcebis-
pos que nele tem havido, com as notícias que de uns e outros
pôde descobrir o ilustríssimo e reverendíssimo senhor d o m Se-
bastião Monteiro da Vide, quinto arcebispo da Bahia" [CONS-
TITUIÇÕES primeiras do arcebispado da Bahia [...]. C o i m b r a :
Real Colégio das Artes da Companhia dejesus, 1720. Anexo 1).
A elaboração de catálogos compunha u m gênero dentre as diver-
sas possibilidades de escrita da história até o século X I X .
Este d o c u m e n t o revela a objetividade, a racionalidade e
ò tipo de leitor q u e era o c o m p i l a d o r do Códice nos limites
estabelecidos p a r a a seleção de informações: titulares, cargos
anteriores ou o r d e m de origem, forma de n o m e a ç ã o , posse,
principais ações, fim d e m a n d a t o e falecimento, com a exclu-
são de digressões ou detalhes. Sua fórmula e n q u a d r a - s e nos
padrões impostos p a r a a escrita d a história militar, eclesiás-
tica e política do reino de Portugal pela A c a d e m i a R e a l d e
História Portuguesa, a partir d e 1721, c o m recolhimento de
dados de fontes autênticas e m a r c a d o s pela objetividade e m
secretarias, cartórios, d e p o i m e n t o s , t e s t e m u n h o s e notícias.
T r a d u z , ainda, o interesse e a afinidade do ouvidor C a e t a n o
d a Costa Matoso pelos temas exercitados e m círculos d e le-
trados e seu objetivo de formar u m a 'coleção', ou seja, "ajun-
tamento; coleção de várias coisas q u e se tem lido e a n o t a d o " .
A u t o r i a , l o c a l e data: Sebastião M o n t e i r o da Vide
[Prudêncio do Amaral]; Salvador; 1712.
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , do século
XVIII, cursiva, individualizada, sem regularidade. De traçado
evoluído, com muitas rasuras, que evidenciam o caráter provisó-
rio ou, mesmo, de rascunho. Alguns traços lembram escritas mais
perfeitas de outros documentos do Códice: "t" em módulo maior,
com laçada inferior; " s " pendente, terminando em voluta angu-
lar; "r" redondo, rodado, grupo "lh", formando ligatura. Letra
de Caetano da Costa Matoso. (YDL)
833

\ - "bispo do Brasil
D o m Pedro Fernandes Sardinha, "clérigo do hábito de São Pedro, eleito p o r el-
rei d o m J o ã o , o terceiro, e chegou à B a h i a n o p r i m e i r o do a n o d e 1552, e sendo
c h a m a d o a Lisboa pelo m e s m o rei no a n o de 1556, aos 14 dias de viagem, e m 16 d e
j u n h o , d e u à costa n a enseada dos Franceses, o n d e todos foram m o r t o s e comidos
pelos "gentios caetés, que é entre P e r n a m b u c o e o rio de São Francisco. Erigiu três
"paróquias, q u e foram a sé, que criou e p a r a q u e trouxe "cónegos, Nossa S e n h o r a da
Vitória d e Vila Velha, extramuros, e a d e São J o r g e d a vila dos Ilhéus.

2° D o m P e d r o Leitão, t a m b é m clérigo, q u e c h e g o u à B a h i a e m 4 d e d e z e m b r o
d e 15 59, e foi o q u e o r d e n o u a o venerável p a d r e j o s é de Anchieta. M o r r e u n a m e s m a
c i d a d e , e foi sepultado n a capela da S e n h o r a do A m p a r o , n a sé, e n ã o c o n s t a d o
dia e a n o , e ao depois se t r a s l a d a r a m os seus ossos p a r a Portugal.

3Q
D o m A n t ô n i o Barreiros, t a m b é m clérigo, q u e chegou à B a h i a e m dia d e
A s c e n s ã o d o a n o d e 1576, e foi e n t e r r a d o n a * c a p e l a - m o r d a igreja v e l h a d o
colégio d a C o m p a n h i a [de J e s u s ] , sem certeza d o dia e a n o . F u n d o u - s e e m seu
t e m p o o c o n v e n t o d e São Francisco, q u e foi o segundo fundado n o Brasil, s e n d o
o p r i m e i r o o d e N o s s a S e n h o r a das Neves, e m O l i n d a .

Ar D o m C o n s t a n t i n o B a r r a d a s veio n o a n o d e 1559,* e g o v e r n a n d o dezoito


anos m o r r e u n o p r i m e i r o d e n o v e m b r o d e 1 6 1 8 , e foi s e p u l t a d o n a c a p e l a - m o r
do, c o n v e n t o de S ã o Francisco^

5 - D o m M a r c o s T e i x e i r a , clérigo t a m b é m ; n ã o consta de q u a n d o t o m o u posse,


só sim q u e falecera e m 8 d e o u t u b r o d e 1624, n a c a m p a n h a , o n d e foi e n t e r r a d o
n a capela de Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o de Itapagipe. N o seu t e m p o t o m a r a m
os h o l a n d e s e s a B a h i a , q u e a l g u n s i m p u t a r a m à r e t i r a d a q u e fez p a r a fora d a
cidade. E foi p r e s o e enviado à H o l a n d a o "governador, q u e e n t ã o era D i o g o d e
M e n d o n ç a Furtado, a q u e m sucedeu Matias de Albuquerque, governador que
e n t ã o era d e P e r n a m b u c o .

6- D o m M i g u e l Pereira, clérigo e "prelado q u e tinha sido d e T o m a r ; t o m o u


p o r p r o c u r a ç ã o posse do b i s p a d o e m 19 d e j u n h o de 1628 e m o r r e u e m Lisboa
antes d e vir p a r a ele, e m 16 d e agosto de 1630, q u a n d o estava p a r a partir.

7 D o m P e d r o d a Silva e S a m p a i o , t a m b é m clérigo, " d e ã o d e Leiria e d o


e

C o n s e l h o G e r a l do S a n t o Oficio, chegou a o b i s p a d o e m 19 de m a i o d e 1634, e


faleceu e m 15 de abril d e 1649, e j a z n a c a p e l a - m o r d a Sé, sendo depois levados

O correto é 1599.
834

seus ossos p a r a o R e i n o , cuja e m b a r c a ç ã o se p e r d e u n a a l t u r a das ilhas s e m se


salvar pessoa a l g u m a .

8 e
D o m Á l v a r o Soares d e C a s t r o , t a m b é m "clérigo e d o C o n s e l h o G e r a l d o
[ fl. 455v. ] S a n t o Oficio, / / faleceu e m Lisboa, n o m e a d o s o m e n t e , p o r q u e nesse t e m p o , q u e
era logo posterior à feliz a c l a m a ç ã o de el-rei d o m J o ã o , o q u a r t o , se n ã o confirma-
v a m e m R o m a os bispos n o m e a d o s p o r causa das guerras c o m Castela.

9° D o m Estêvão dos Santos, "cónego r e g r a n t e de S a n t o Agostinho e m São


V i c e n t e d e F o r a e juiz dos cavaleiros, p r i m e i r o "bispo q u e depois das guerras se
c o n f i r m o u p o r C l e m e n t e X . C h e g o u à B a h i a e m 15 d e abril e faleceu e m 6 d e
j u l h o d o m e s m o a n o de 1672 e está sepultado n a c a p e l a - m o r da sé.

1 0 D o m Frei C o n s t a n t i n o d e S a m p a i o , religioso d e São B e r n a r d o , q u e fale-


e

c e u e m Lisboa antes d e lhe c h e g a r e m as "bulas. E este foi o último bispo n o m e a -


d o d a Bahia, a q u e se seguiu a criação do arcebispo.

I 9
"arcebispo D o m G a s p a r B a r a t a de M e n d o n ç a , clérigo, q u e antes de o ser
foi "juiz d e fora d e T o m a r e o r d e n a d o foi " d e s e m b a r g a d o r d a "Relação eclesiás-
tica d e Lisboa. S e n d o juiz dos c a s a m e n t o s , v o t o u n a causa d e n u l i d a d e d e m a t r i -
m ô n i o d o s e n h o r rei d o m Afonso V I e a r a i n h a d o n a M a r i a Francisca Isabel de
Sabóia. Foi p r i o r de S a n t a Engrácia e depois g o v e r n a d o r do b i s p a d o d e M i r a n d a ,
e u l t i m a m e n t e " a b a d e de G e s t a ç ô , n o bispado do P o r t o , d o n d e foi n o m e a d o p a r a
arcebispo pelo senhor rei d o m Pedro, que suplicando áo p a p a Inocêncio X I
d e s m e m b r a s s e d e s t a diocese três b i s p a d o s , erigindo-os d e n o v o , c o m efeito lhe
erigiu o b i s p a d o d o M a r a n h ã o , P e r n a m b u c o e R i o d e J a n e i r o , ficando p a r a eles
m e t r ó p o l e a B a h i a (exceto o M a r a n h ã o , q u e ficou sujeito a Lisboa pela dificulda-
de d a n a v e g a ç ã o p a r a a Bahia, sendo mais fácil p a r a Lisboa) e p a r a o de Angola e
S ã o T o m é . T o m o u posse p o r p r o c u r a d o r deste a r c e b i s p a d o e m 3 d e j u n h o d e
1 6 7 7 , e p o r q u e os a c h a q u e s l h e i m p e d i r a m a j o r n a d a n o m e o u g o v e r n a d o r e s ,
p o r é m v e n d o - s e i m p o s s i b i l i t a d o r e n u n c i o u o a r c e b i s p a d o . F a l e c e u n a vila d o
S a r d o a l e m 11 d e d e z e m b r o d e 1686.

2 D o m frei J o ã o da M a d r e d e D e u s , religioso d e S ã o Francisco e "provincial


a

da "província d e P o r t u g a l , eleito pela r e n ú n c i a d e d o m G a s p a r B a r a t a , c h e g o u à


B a h i a e m 20 d e m a i o de 1683 e faleceu aos 13 de j u n h o d e 1686 e está sepultado
n a "capela-mor d a sé.

3 - D o m frei M a n u e l d a R e s s u r r e i ç ã o , religioso *recoleto d e V a r a t o j o ; e r a


" o p o s i t o r e m leis, colegial d e S ã o P e d r o e " d o u t o r a l d e L a m e g o , q u e o u v i n d o
p r e g a r a o venerável frei A n t ô n i o das C h a g a s , r e n u n c i o u o m u n d o e se recolheu a
835

este seminário. C h e g o u à B a h i a e m 13 d e m a i o d e 1688 e g o v e r n a n d o t a m b é m


dois anos o t e m p o r a l p o r m o r t e do g o v e r n a d o r M a t i a s d a C u n h a , faleceu a n d a n -
do e m *visita n a s vilas d o Sul aos 16 d e j a n e i r o d e 1691 e está sepultado / / n o [ fl. 4 5 6 ]
seminário de Belém, q u e a d m i n i s t r a m os p a d r e s d a C o m p a n h i a .

4 D o m J o ã o F r a n c o de Oliveira, bispo antes d e A n g o l a e m q u e esteve q u a -


9

t r o a n o s ; "clérigo t a m b é m , e c h e g o u à B a h i a e m 5 d e d e z e m b r o d e 1692 e aí
esteve até 28 d e agosto d e 1700, e m q u e se e m b a r c o u p a r a o R e i n o a ser "bispo
d e M i r a n d a , e m q u e tinha sido n o m e a d o .

5 e
D o m Sebastião M o n t e i r o d a V i d e , clérigo, chegou à B a h i a e m 29 d e m a i o
d e 1702, sendo "vigário-geral e m Lisboa foi eleito "arcebispo e faleceu n o a n o d e
1722.

6 D o m Luís Alvares d e Figueiredo, clérigo, "provisor e vigário-geral d e Braga,


9

o n d e tinha sido "bispo coadjutor d o arcebispo d o m R o d r i g o d e M o u r a Teles; foi


eleito e m 1725 e c h e g o u à Bahia no m e s m o a n o .

• 127 «
[Catálogos de capitanias e donatários e de governadores e vice-reis
do Estado do Brasil e outros apontamentos de leitura]

Apontamentos de leituras diversas do ouvidor Caetano da


Costa Matoso, com dados sobre: expansão portuguesa n a Áfri-
ca; capitanias d a América portuguesa e respectivos donatários,
governadores e vice-reis do Estado do Brasil, nomeação e fim do
mandato, de 1549 a 1750; histórico da criação das capitanias de
Goiás e: Cuiabá; contrato das entradas no triénio 1748-1751,
registros que englobava e alíquotas sobre os diversos gêneros;
breve história e descrição de Vila Boa.
Este documento revela a objetividade, a racionalidade e o
tipo de leitor que era o compilador do Códice. Sua fórmula enqua-
dra-se nos padrões impostos para a escrita da história militar,
eclesiástica e política do reino de Portugal pela Academia Real
de História Portuguesa, a partir de 1721, com recolhimento de
dados de fontes autênticas e marcados pela objetividade e m se-
836

cretárias, cartórios, depoimentos, testemunhos e notícias. T r a -


duz, ainda, o interesse e a afinidade d o ouvidor Gaetano d a
Gosta Matoso pelos temas exercitados em círculos de letrados e
seu objetivo de formar u m a 'coleção', ou seja, "ajuntamento;
coleção de várias coisas que se tem lido e anotado".
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : a n ô n i m o ; n ã o identificado; ca.
1752.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O documento constituiria, p r o -
vavelmente, subsídio para a "história" tal como entendida n a
época: "narração de cousas memoráveis que têm acontecido em
algum lugar, em certo tempo, e com certas pessoas ou nações",
s e g u n d o R a f a e l B l u t e a u [Vocabulário português e latino [...]
Coimbra: Colégio das Artes da C o m p a n h i a de Jesus, 1713. V.
4, p . 39). {JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva, não
regularizada do século X V I I I . Destrógrada, muito imperfeita,
mas evidenciando escrita muito veloz, de traçado evoluído. Des-
tacam-se o uso de traço ascendente como ponto de fuga n o final
de palavras; " p " em haste dupla, retilíneo, em forquilha, com o
mesmo traçado do " q u e " em abreviatura. Letra de Caetano da
Costa Matoso. (YDL)
Critérios editoriais: Procedeu-se a deslocamento de tex-
to, conforme indicação do original.

[ fl. 4 5 7 ] • lha de São T o m é , descoberta p o r Fernão Gomes e m 1471, reinando d o m


I Afonso Vi E d o m J o ã o , o segundo, a m a n d o u p o v o a r , p o r "alvará d e c o m e n d a ,
-A-cavaleiro d e s u a C a s a , n o a n o d e 1494, e p a r a este efeito e n v i o u os filhos
m e n o r e s tirados a o s j u d e u s q u e se n ã o quiseram batizar.
0 reino d e Angola foi descoberto n o a n o de 1485, r e i n a n d o el-rei d o m J o ã o , o
s e g u n d o , p o r D i o g o C ã o , fidalgo p o r "provisão sua, e lhe d e u o b r a s ã o d e a r m a s
e m m e m ó r i a dos dois p a d r õ e s q u e l e v a n t o u n a b o c a d o r i o Z a i r e , n o C o n g o ,
q u a n d o descobriu Angola, e p a r a segurança e conservação deste reino se edificaram
as fortalezas d e L u a n g o s , Benguela, C a b i n d a , B o n g o e o u t r a s .

Foi dividido o Brasil e m 14 "províncias, o u capitanias, a saber:

1 O G r ã o - P a r á , q u e conquistou e p o v o o u Francisco C a l d e i r a de Castelo B r a n c o


n o a n o de 1516, depois passou à C o r o a , o n d e se conserva.
2 M a r a n h ã o , foi descoberto p o r Luís de M e l o d a Silva e depois p o v o a d o p o r
J e r ô n i m o d e A l b u q u e r q u e , q u e o restaurou dos franceses c o m A l e x a n d r e d e M o u r a ,
m a n d a d o s p e l o "governador-geral d o Brasil, G a s p a r d e Sousa; está hoje n a C o -
r o a e é a sua capital S ã o Luís.
837

3 C e a r á , q u e n u n c a teve " d o n a t á r i o .
4 R i o G r a n d e , foi descoberto p o r Nicolau R e s e n d e , n ã o teve d o n a t á r i o .
5 P a r a í b a , foi d a d a a J o ã o d e Barros, o Historiador, p o r d o m J o ã o , o terceiro,
q u e a m a n d o u p o v o a r p o r seus filhos, e n ã o t e n d o efeito esta m e r c ê pelos g r a n d e s
c o n t r a t e m p o s q u e e x p e r i m e n t a r a m n o m a r , a m a n d o u p o v o a r o cardeal H e n r i q u e ,
à custa d a C o r o a , passados muitos anos, p o r F r u t u o s o Barbosa, s e m a m e r c ê d e
doação.
6 I t a m a r a c á , fez el-rei d o m J o ã o , o terceiro, m e r c ê dela a P e d r o L o p e s d e
S o u s a p a r a a c o n q u i s t a r e depois foi d a d a a d o m A n t ô n i o d e A t a í d e , p r i m e i r o
c o n d e d a C a s t a n h e i r a , d o n d e passou p o r sucessão à C a s a de Cascais.
7 P e r n a m b u c o , fez el-rei d o m J o ã o , o terceiro, m e r c ê dela a D u a r t e C o e l h o
Pereira e m o a n o d e 1 5 5 1 , q u e a p o v o o u e e n g r a n d e c e u . C o n t i n u o u - s e e m seus
descendentes até D u a r t e d e A l b u q u e r q u e C o e l h o , q u e p o r m e r c ê d e Felipe I I I foi
c o n d e de P e r n a m b u c o e marquês d e Basto, pai de d o n a M a r i a M a r g a r i d a de
Castro A l b u q u e r q u e , m u l h e r do conde de Vimieiro d o m Miguel de Portugal;
hoje está n a C o r o a .
8 Sergipe, n ã o t e m d o n a t á r i o n e m é o p u l e n t a , p o r q u e , c o m o n ã o t e m p o r t o
c a p a z , d á c o n s u m o pela B a h i a aos seus "efeitos.
9 B a h i a , foi d e s c o b e r t a p o r C r i s t ó v ã o J a q u e s e m o a n o d e 1549 e d a d a a
Francisco P e r e i r a C o u t i n h o , c h a m a d o o P a s t u â o , filho d e Afonso Pereira, alcaide-
m o r d e S a n t a r é m , p o r m e r c ê d e el-rei d o m J o ã o , o t e r c e i r o , e m satisfação dos
g r a n d e s serviços q u e fizera n a í n d i a ; d e p o i s d e c o n q u i s t á - l a d o "gentio e estar
alguns anos s e m p r e e m g u e r r a , p o r falta d e gente se retirou aos Ilhéus, e v o l t a n d o
o u t r a vez a conquistá-la m o r r e u / / d a n d o à costa, e c o m sua m o r t e t o m o u el-rei [ fí. 457v. ]
o u t r a vez esta capitania.
10 O s Ilhéus, foi d a d a p o r d o m j o ã o , o terceiro, e m o a n o d e 1564 a j o r g e d e
Figueiredo C o r r e i a , c o m e n d a d o r d a O r d e m de Cristo, filho d e R u i d e Figueiredo;
está hoje n a C a s a d o A l m i r a n t e do R e i n o .
11 P o r t o S e g u r o , foi seu p r i m e i r o p o v o a d o r e d o n a t á r i o P e d r o d e C a m p o s
T o u r i n h o e m o a n o de. 1 5 5 3 , cuja filha, L e o n o r de C a m p o s , a v e n d e u p o r c e m
mil réis d e j u r o s a d o m j o ã o d e L e n c a s t r e , d u q u e d e Aveiro, e hoje se a c h a n a
Coroa.
12 Espírito S a n t o , foi d a d a a V a s c o F e r n a n d e s C o u t i n h o e m o a n o d e 1525,
e m cujos descendentes se c o n t i n u o u até A n t ô n i o Luís Gonçalves d a C â m a r a , que.
a v e n d e u a Francisco Gil d e A r a ú j o , e el-rei d o m j o ã o , o q u i n t o , a c o m p r o u p a r a
a Coroa.
13 R i o d e J a n e i r o , M e m d e Sá a conquistou dos franceses e m o a n o d e 1566,
e v o l t a n d o p a r a a Bahia, o n d e era g o v e r n a d o r , deixou n o g o v e r n o seu s o b r i n h o
Estácio de Sá, q u e c o n t i n u o u aquela conquista; está hoje n a C o r o a .
14 São V i c e n t e , foi seu p r i m e i r o d o n a t á r i o , p o r m e r c ê d e el-rei d o m j o ã o , o
terceiro, M a r t i m Afonso d e Sousa, g o v e r n a d o r d a í n d i a , e hoje está n a C o r o a .
838

Catálogo dos "governadores

1 T o m é de Sousa, filho b a s t a r d o de J o ã o d e Sousa, "prior d e R a t e s , n o m e a -


d o e m 1549 p o r d o m J o ã o III.
2 D o m D u a r t e d a Costa, a r m a d o r - m o r , o foi r e n d e r no a n o d e 1553.
3 M e m d e Sá (irmão d o S é n e c a p o r t u g u ê s Francisco d e Sá d e M i r a n d a ) , lhe
foi suceder e m o a n o d e 1558.
4 Luís d e Brito e Almeida, lhe sucedeu e m o a n o d e 1572.
5 L o u r e n ç o da Veiga, o veio r e n d e r e m 1578 e faleceu n o g o v e r n o e m 1583,
e p o r m o r t e dele e n t r a r a m a governar o S e n a d o d a C â m a r a e "ouvidor-geral C o s m e
R a n g e l , p o r n o m e a ç ã o q u e deles fez o g o v e r n a d o r nos últimos dias d a vida.
6 M a n u e l Teles B a r r e t o , veio t o m a r posse e m o a n o de 1584, faleceu t e n d o
g o v e r n a d o q u a t r o anos, e t r o u x e d o R e i n o "vias d e sucessão e nelas se a c h a r a m
n o m e a d o s o "bispo d o m A n t ô n i o Barreiros e o " p r o v e d o r d a F a z e n d a Cristóvão
d e B a r r o s , q u e g o v e r n a r a m mais de três anos.
7 D o m Francisco d e Sousa, d a C a s a dos C o n d e s do P r a d o , passou a g o v e r n a r
e m 1 5 9 1 , c o m a p r o m e s s a de título d e m a r q u ê s se descobrisse m i n a s , q u e u m
m o r a d o r d a B a h i a fora p r o m e t e r à Castela, o q u e n ã o teve efeito pelos e n g a n o s
do descobridor.
[ fl. 4 5 8 ] 8 D i o g o Botelho, filho d e Francisco Botelho, estribeiro-mor d o infante d o m
F e r n a n d o , lhe veio suceder e m o a n o 1602.
9 D o m D i o g o d e Meneses, filho de d o m J o ã o d e M e n e s e s , capitão d e T â n g e r ,
o veio r e n d e r e m o a n o 1608.
10 G a s p a r d e Sousa, i r m ã o de Álvaro d e Sousa, do C o n s e l h o de Estado dos reis
Felipe II e III, lhe sucedeu e m o a n o de 1613;
11 D o m Luís de Sousa, lhe veio suceder e m o a n o d e 1617.
12 D i o g o d e M e n d o n ç a F u r t a d o , o veio r e n d e r e m 1621, e sendo prisioneiro
pelos holandeses q u a n d o t o m a r a m a B a h i a foi r e m e t i d o p a r a H o l a n d a e s u c e d e r a m
n o g o v e r n o do " c a m p o o "auditor-geral e o bispo d o m M a r c o s Teixeira, e restau-
r a d a a B a h i a e m 1625 ficou c o m o governo geral.
13 D o m Francisco R o l i m d e M o u r a , g o v e r n a d o r de C a b o V e r d e , do C o n s e l h o
d e E s t a d o d e Felipe TV, s e n h o r d a ilha G r a c i o s a p o r m e r c ê do m e s m o rei.
?

14 D i o g o Luís d e Oliveira, filho d e J o a n e M e n d e s d e Oliveira, m o r g a d o d e


Oliveira, lhe veio suceder e m 1626.
15 P e d r o d a Silva, l h e veio suceder e m 1 6 3 5 , e pelos serviços q u e fez neste
governo o n o m e o u el-rei conde de São Lourenço e defendeu a Bahia dos holandeses.
16 O c o n d e d a T o r r e , d o m F e r n a n d o M a s c a r e n h a s , l h e s u c e d e u e m 1639,
t r a z e n d o p a t e n t e d e " g o v e r n a d o r e capitão-general d e t o d o o Brasil, e sendo no
m e s m o a n o n o m e a d o p a r a ir restaurar P e r n a m b u c o , lhe sucedeu.
17 D o m V a s c o M a s c a r e n h a s , c o n d e d e Ó b i d o s , q u e depois foi vice-rei d a í n d i a
e tomou o governo quando o conde da T o r r e partiu p a r a Pernambuco.
839

18 D o m J o r g e M a s c a r e n h a s , m a r q u ê s d e M o n t a l v ã o , lhe s u c e d e u logo e m
1640, c o m a p a t e n t e d e p r i m e i r o *vice-rei d o E s t a d o , e sendo m a n d a d o p r e n d e r
p e l a falsa suspeita q u e se teve d a sua fidelidade, d e q u e se justificou l o g o q u e
c h e g o u a Lisboa, foi restituído a todas as suas h o n r a s .
19 A n t ô n i o Teles d a Silva, lhe sucedeu e m 1642, c o n t i n u o u a g u e r r a c o m os
holandeses e m o r r e u afogado v i n d o p a r a o R e i n o .
20 A n t ô n i o T e l e s d e M e n e s e s , c o n d e d e V i l a - P o u c a , lhe s u c e d e u e m 1647,
p a s s a n d o a o Brasil p o r general d a a r m a d a c o n t r a os holandeses.
21 O c o n d e d e Castelo M e l h o r , J o ã o R o d r i g u e s d e V a s c o n c e l o s , q u e t i n h a
sido g o v e r n a d o r das a r m a s das províncias d o M i n h o e Alentejo, l h e sucedeu e m
1652.'
22 D o m J e r ô n i m o d e A t a í d e , c o n d e d e A t o u g u i a , l h e s u c e d e u e m 1 6 5 4 ,
sendo general d a a r m a d a e d o C o n s e l h o d e Estado.
2 3 Francisco B a r r e t o d e M e n e s e s , lhe sucedeu e m 1657; t i n h a feito g r a n d e s
serviços nas restaurações d e A n g o l a e P e r n a m b u c o , e m q u e / / m e r e c e u o título £ f| 458v. ]
d e c o n d e d o R i o G r a n d e p a r a sua filha d o n a A n t ô n i a Josefa d e Sá, q u e casou c o m
L o p o F u r t a d o d e M e n d o n ç a , q u e m o r r e u presidente d a J u n t a d o C o m é r c i o .
2 4 O c o n d e de Ó b i d o s , d o m V a s c o M a s c a r e n h a s , q u e t e n d o j á sido governa-
dor deste Estado e p a s s a n d o a vice-rei d a í n d i a , s e g u n d a vez foi n o m e a d o vice-rei
e capitão-general d o Brasil, e s u c e d e u e m 1663.
25 A l e x a n d r e d e S o u s a F r e i r e , l h e s u c e d e u e m 1 6 6 8 , t e n d o sido c a p i t ã o -
general de M a z a g ã o .
26. Afonso F u r t a d o d e M e n d o n ç a , primeiro visconde d e B a r b a c e n a , lhe su-
c e d e u e m 1 6 7 1 ; m o r r e u n o governo, e p o r falta de "vias p a r a a sucessão n o m e o u ,
à h o r a d a m o r t e , p o r conselho d a C â m a r a e n o b r e z a , a o "chanceler, o "mestre-
d e - c a m p o e o " v e r e a d o r m a i s velho.
27 R o q u e d a C o s t a B a r r e t o , q u e governava a província d a E s t r e m a d u r a c o m
p a t e n t e d e s a r g e n t o - m o r d e b a t a l h a , sucedeu n o g o v e r n o e m 1678 c o m p a t e n t e
de mestre-de-campo general.
28 A n t ô n i o d e Sousa de M e n e s e s , c h a m a d o o B r a ç o d e P r a t a , p o r o trazer
assim e m lugar d e u m q u e p e r d e r a n a g u e r r a d e P e r n a m b u c o , lhe s u c e d e u e m
1682.
29 D o m A n t ô n i o Luís d e Sousa, s e g u n d o m a r q u ê s das M i n a s , lhe s u c e d e u
e m 1684, e recolhido ao R e i n o m a n d o u às a r m a s e entrou p o r Castela, p o n d o n a
o b e d i ê n c i a d e C a r l o s I I I as terras p o r q u e passava e o fez a c l a m a r n a c o r t e d e
M a d r i , atravessando c o m as suas tropas t o d a a E s p a n h a até se j u n t a r c o m ele n o
reino d e V a l e n ç a .
30 M a t i a s da C u n h a , l h e sucedeu e m 1687, q u e tinha g o v e r n a d o o M i n h o e
o R i o d e J a n e i r o ; m o r r e u neste g o v e r n o e n o m e o u , n a sua falta, o "arcebispo d o m
frei M a n u e l d a Ressurreição e o chanceler M a n u e l C a r n e i r o d e Sá.
31 A n t ô n i o Luís G o n ç a l v e s d a C â m a r a C o u t i n h o , "almotacé-mor. q u e g o -
v e r n o u P e r n a m b u c o , lhe sucedeu e m 1690; foi depois vice-rei d a í n d i a .
840

32 D o m J o ã o de L e n c a s t r e , lhe s u c e d e u e m 1694; n o t e m p o deste g o v e r n o


se d e s c o b r i r a m as m i n a s do salitre e e n t r a r a m a a p a r e c e r as d o o u r o ,
3 3 D o m R i b e i r o d a C o s t a , q u e t i n h a sido g o v e r n a d o r d a ilha d a M a d e i r a ,
lhe s u c e d e u e m 1702, e depois foi vice-rei d a í n d i a .
34 Luís C é s a r de M e n e s e s , t e n d o g o v e r n a d o o R i o d e J a n e i r o e A n g o l a c o m
a p a t e n t e d e "capitão-general, lhe sucedeu e m 1705.
35 D o m L o u r e n ç o de A l m e i d a , q u e se a c h a v a n a B a h i a t e n d o a c a b a d o o
g o v e r n o d e Angola, recebeu c a r t a p a r a governar debaixo d a m e s m a h o m e n a g e m ,
e t o m o u o g o v e r n o e m 1710.
36 P e d r o d e Vasconcelos e Sousa, lhe sucedeu e m 1711.
[ fl. 459 ] 37 D o m P e d r o A n t ô n i o d e N o r o n h a , c o n d e d e V i l a V e r d e e n o m e a d o , //
nesta ocasião o m a r q u ê s de Angeja, lhe sucedeu e m 1714 c o m a p a t e n t e de "vice-
rei c o m q u e t i n h a g o v e r n a d o a í n d i a .
38 D o m S a n c h o de F a r o e Sousa, c o n d e de V i m i e i r o , q u e t e n d o g o v e r n a d o
as a r m a s das províncias d a Beira e M i n h o e a p r a ç a d e M a z a g ã o c o m p a t e n t e de
" c a p i t ã o - g e n e r a l , c o m a m e s m a t o m o u p o s s e d o g o v e r n o d a B a h i a e m 1718, e
m o r r e u n o g o v e r n o ; e abrindo-se p o r s u a m o r t e as "vias [de sucessão], se a c h o u
n o m e a d o o "arcebispo d o m Sebastião Monteiro da Vide, o *mestre-de-campo
mais antigo, que era J o ã o de Araújo de Azevedo, e o "chanceler, que era o
" d e s e m b a r g a d o r C a e t a n o d e Brito d e Figueiredo.
39 V a s c o F e r n a n d e s C é s a r , q u e t o m o u posse c o m p a t e n t e d e vice-rei e m
1720, tinha sido vice-rei d a í n d i a , e neste g o v e r n o lhe fez el-rei m e r c ê d o título d e
c o n d e de S a b u g o s a .
4 0 A n d r é d e M e l o e C a s t r o , s e g u n d o c o n d e das Galveias, q u e t e n d o sido
e m b a i x a d o r e m R o m a e g o v e r n a n d o três anos as M i n a s lhe s u c e d e u n o a n o de
1735 c o m p a t e n t e de vice-rei.
41 C o n d e de A t o u g u i a , q u e t e n d o g o v e r n a d o o reino do Algarve lhe suce-
d e u e m 1750, e existe c o m a p a t e n t e d e vice-rei.

P e r n a m b u c o foi erigido e m b i s p a d o p o r I n o c ê n c i o X I , a instância d e d o m


P e d r o , o s e g u n d o , e m o a n o d e 1676, e foi seu p r i m e i r o " b i s p o d o m E s t ê v ã o
Brioso d e Figueiredo, q u e t i n h a sido "vigário-geral d o a r c e b i s p a d o d e Lisboa.
R i o d e J a n e i r o , c r i a d o n o m e s m o a n o , e foi o p r i m e i r o b i s p o d o m frei
M a n u e l P e r e i r a , d a o r d e m dos P r e g a d o r e s , q u e r e n u n c i o u o b i s p a d o e foi secre-
tário de E s t a d o .
A catedral de S a n t a C r u z n a cidade de L u a n d a , capital d o reino d e Angola,
foi erigida p o r C l e m e n t e V I I I , a instância d e Felipe II e m o a n o d e 1596, e foi
p r i m e i r o bispo d o m Miguel R a n g e l , religioso da "província de S a n t o Antônio, e
tinha sido esta igreja, antes d a sua ereção, d a jurisdição dos bispos d e São T o m é .
A catedral d a ilha d e São T o m é foi ereta. e m 1534 p o r P a u l o III, a instância
d e el-rei d o m J o ã o , o terceiro, e foi primeiro bispo d o m D i o g o O r t i z d e Vilhegas,
e t e m até hoje p e r t o d e trinta bispos.
841

O b i s p a d o d e São T i a g o , das ilhas d e C a b o V e r d e , foi ereto pelo p a p a Cíe- [ fl. 459v. ]


m e n t e V I I , a instância d e d o m J o ã o , o terceiro, e m o a n o d e 1532, e foi p r i m e i r o
"bispo Brás N e t o , e se t e m c o n t i n u a d o e m p e r t o de vinte bispos.
E m 1748, o r d e n o u el-rei se recolhesse d o m Luís M a s c a r e n h a s " g o v e r n a d o r
de São P a u l o e o r d e n o u a G o m e s Freire de A n d r a d e , g o v e r n a d o r d o R i o de
J a n e i r o , dividisse o g o v e r n o de S ã o P a u l o e m d u a s c a p i t a n i a s , u m a d e G o i á s e
o u t r a d e C u i a b á , e o antigo governo d e S ã o P a u l o ficasse u n i d o a o g o v e r n o do
R i o d e J a n e i r o e q u e g o v e r n a s s e t o d o s até n o m e a ç ã o d e n o v o s " g e n e r a i s , q u e
f o r a m n o m e a d o s e m 27 d e j u l h o d e 1748: p a r a Goiás, d o m M a r c o s d e N o r o n h a ,
filho d o c o n d e dos Arcos, d o m T o m á s d e N o r o n h a , q u e se a c h a v a g o v e r n a n d o
P e r n a m b u c o , e daí saiu p a r a o R i o d e J a n e i r o , d o n d e fez j o r n a d a p a r a o dito
g o v e r n o — e n o c a m i n h o , p o u c o dias antes do P a r a c a t u , lhe fez G o m e s Freire
e n t r e g a do g o v e r n o , v i n d o d e Goiás a abrir e m Pilões e R i o C l a r o as m i n a s dos
d i a m a n t e s a q u e t i n h a sido m a n d a d o — , a q u e c h e g o u e m fins d e o u t u b r o d e
1749, e p a r a C u i a b á , d o m A n t ô n i o R o l i m de M o u r a , i r m ã o d o c o n d e d e V a l - d e -
R e i s , q u e s a i n d o d e L i s b o a e m fevereiro d e 1749 e s p e r o u n o R i o d e J a n e i r o
" m o n ç ã o d e fazer j o r n a d a , a q u e d e u princípio e m [incompleto].
A q u i h á o " c o n t r a t o a q u e c h a m a m das " e n t r a d a s , q u e neste triénio, q u e
principiou e m o u t u b r o d e 1748, foi a r r e m a t a d o livre p a r a el-rei [por] 113 " a r r o b a s
e u m a "libra d e o u r o . C o m o j á se disse, compõe-se de vários "registros, q u e todos
se e n c a m i n h a m a esta capitania, sendo o d e m a i o r c o n c u r s o e m a i o r r e n d i m e n t o o
d e M a t i a s Barbosa, p o r o n d e passa t u d o o q u e v e m d o R i o d e J a n e i r o — e n o a n o
se. tiram nele p e r t o d e 3 0 0 mil "cruzados —; o o u t r o registro é d e t u d o o q u e e n t r a
d a p a r t e de S ã o P a u l o , a q u e c h a m a m o C a m i n h o V e l h o , e foi o p r i m e i r o c a m i -
n h o p a r a estas M i n a s ; o registro d a C o n t a g e m é de t u d o o q u e e n t r a do sertão d a
B a h i a e P e r n a m b u c o ; o das e n t r a d a s d e Goiás e suas anexas; o das e n t r a d a s d e
C u i a b á e suas a n e x a s ; e o das e n t r a d a s de P a r a n a g u á e P a r a n a p a n e m a . T o d o s
estes registros se r e m a t a v a m separados, e d e c a d a u m havia u m c o n t r a t o , e h á anos
se r e m a t a m todos j u n t o s , debaixo d e u m só c o n t r a t o , a i n d a q u e nas a r r e m a t a ç õ e s
lhe p õ e m o t a n t o e m c a d a u m , suposto se lance n o t o d o , sendo só o d a e n t r a d a d o
R i o d e J a n e i r o o q u e supre p a r a os mais q u e n ã o r e n d e m o p o r q u e os avaliam,
r a t e a n d o d o capital a c a d a u m deles pelo q u e r e n d e r a m j á e hoje n ã o r e n d e m . E
consiste a c o b r a n ç a deste c o n t r a t o , e m c a d a registro, e m receber-se d e / / c a d a [ fl. 4 6 0 ]
escravo ou escrava q u e passar p a r a d e n t r o duas "oitavas; p o r c a d a c a b e ç a d e g a d o
u m a oitava; p o r c a d a cavalo ou o u t r a b e s t a m u a r q u e e n t r a r , s e m c a r g a o u e m
p ê l o , s e m sela, d u a s oitavas; p o r c a d a c a r g a d e " f a z e n d a seca d e p e s o d e d u a s
a r r o b a s u m a oitava e m e i a e as q u e t ê m mais ou m e n o s p a g a m à p r o p o r ç ã o das
d u a s a r r o b a s ; p o r c a d a c a r g a d e " m o l h a d o s se p a g a m e i a oitava, e se r e p u t a m
carga d e m o l h a d o os gêneros comestíveis e fazenda seca os q u e o n ã o são.
A R e l a ç ã o d a B a h i a foi instituída p o r Felipe I I I e m o a n o d e 1609; seu filho
Felipe I V a suprimiu e el-rei d o m J o ã o , o q u a r t o , a restabeleceu e m 1652.
842

A cidade de S ã o Paulo está e m 24 graus de latitude austral e dela p a r a Vila


B o a , capital d a capitania de Goiás, corre a linha reta d e noroeste sueste e m distân-
cia d e 150 *léguas, c o m p o u c a diferença, a i n d a q u e a "derrota d a dita c i d a d e p a r a
ela, pelas voltas d o c a m i n h o , d á e m 2 3 3 léguas. A dita Vila B o a está e m 16 graus
d e latitude austral, assentada e n t r e m o r r o s q u e a fazem cálida e d e ares grossos,
s e m e m b a r g o d e q u e n ã o é m u i t o doentia; o terreno é p o u c o fértil e t e r á q u i n h e n -
tas, a t é seiscentas, famílias, das quais.assiste a m a i o r p a r t e nas suas lavras; t e m u m a
igreja m a t r i z e duas "capelas. T e v e princípio e m 1732, t e m dilatadíssima c o m a r c a
c o m longes d e m a i s de duzentas léguas e a b u n d a n t e d e minas,

• 128 <

[fl. 4 6 1 ] Simão de Vasconcelos, na Vida do padre Almeida 1

Resumo de diversos livros e capítulos da obra Vida do padre


Almada, de Simão de Vasconcelos, que apresenta dados sobre
nações, elementos rituais, alimentação e aspecto físico dos índios,
descrição de Pernambuco e Campos dos Goitacases e ocupação
holandesa de Angola, e m 1641.
Este documento revela a objetividade, a racionalidade e o
tipo de leitor que era o compilador do Códice nos limites das infor-
mações selecionadas, que excluíram as narrativas e os fatos de
cunho mítico, os detalhes e as digressões. Sua fórmula enqua-
dra-se nos padrões impostos p a r a a escrita da história militar,
eclesiástica e política d o reino de Portugal pela Academia Real
de História Portuguesa, a partir de 1721, com recolhimento de
dados d e fontes autênticas e marcados pela objetividade em se-
cretarias, cartórios, depoimentos, t e s t e m u n h o s e notícias. O
paradigma foi aplicado às colônias, com adaptações concernentes
à história natural, à conquista, ao povoamento, à evangelização
e às potencialidades econômicas. Traduz, ainda, o interesse e a
afinidade do ouvidor Caetano d a Costa Matoso pelos temas exer-
citados e m círculos de letrados e seu objetivo de formar u m a

V A S C O N C E L O S , Simão de. Vida do padre João de Almada da Companhia de Jesus na Província do Brasil
[...]. Lisboa: Oficina Craesbeeckíana, 1658, passim.
843

'coleção', ou seja, "ajuntamento; coleção de várias coisas que se


tem lido e anotado".
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Simão de Vasconcelos; Lisboa;
1658.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Aplicação de tópicas que tipificam
os aborígenes como "bárbaros"; da tópica poética do locus amenus
("lugar a m e n o " ) e descrições c o m características d o gênero
encomiástico. fJPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva, n ã o
regularizada do século X V I I I . Destrógrada, muito imperfeita,
mas evidenciando escrita muito veloz, de traçado evoluído. Des-
tacam-se o uso de traço ascendente como ponto de fuga n o final
de palavras; " p " e m haste dupla, retilíneo, em forquilha, com o
mesmo traçado do "que" em abreviatura. Letra de Caetano da
Costa Matoso. (YDL)
C r i t é r i o s editoriais: Este documento e o 129 encontram-
se em seqüência no original, em u m mesmo caderno, com as
mesmas caligrafia e tinta, optando-se aqui pelo seu desmem-
bramento, por tratarem de temas muito diversos.

í n d i o s , l i v r o 1, c a p í t u l o 5

E r a t a m b é m h a b i t a d a esta região de várias espécies d e índios, q u e c o s t u m a v a m


dizer os p r i m e i r o s p o r t u g u e s e s p o v o a d o r e s dela q u e e r a m tantos c o m o as folhas
das árvores, e a i n d a hoje são infinitos.
T o d a s estas n a ç õ e s se r e d u z e m a q u a t r o , a s a b e r : t u p i n a m b á s , t a b a j a r a s ,
potiguaras e tapuias, dividindo-se esta última e m nações inumeráveis, c o m línguas
diversíssimas, falando as três primeiras a m e s m a língua, c o m p o u c a diferença.
S ã o g e r a l m e n t e d e n a t u r e z a fera e t r a g a d o r a d e c a r n e h u m a n a ; a n d a m todos
n u s , assim v a r õ e s c o m o fêmeas, s e m p e j o a l g u m e n t r e si; n o e n t e n d i m e n t o são
rudes e mais q u a n t o mais v ã o crescendo; n ã o t ê m a r t e n e m polícia a l g u m a , n e m
s a b e m c o n t a r mais q u e até q u a t r o , c o n t a n d o os mais n ú m e r o s pelos dedos dos pés
e m ã o s , e os anos pelos frutos das árvores; t r a z e m p e l a m a i o r p a r t e as orelhas e
beiços furados, e alguns até as duas faces p o r j u n t o à b o c a , e nestes b u r a c o s engas-
t a m p e d r a s e p e d a ç o s d e o u r o ; são d e ordinário corpulentos, robustos e forçosos,
e p o r q u e m a i s o sejam os a t a m pelas p e r n a s q u a n d o n a s c e m c o m certas faixas
m u i t o a p e r t a d a m e n t e , c o m q u e depois de grandes ficam m a i s vigorosos.
E gente pobríssima, cuja m e s a é a terra, e as iguarias d e p e n d e m d o seu a r c o ,
e m q u e são destríssimos, c a ç a n d o c o m suas flechas os ares d a t e r r a e os peixes d a
á g u a ; o seu e n x o v a l é u m a r e d e , u m *patiguá o u cesto d e p a l h a , u m p o t e , u m
c a b a ç o , u m a cuia e u m c ã o , servindo-lhe a r e d e a t a d a de u m t r o n c o a o u t r o p a r a
844

d o r m i r , o "patiguá p a r a g u a r d a r a r e d e , c a b a ç o e cuia, o p o t e p a r a seus vinhos,


q u e fazem das frutas das árvores, o c a b a ç o p a r a suas farinhas, seu m a n t i m e n t o
o r d i n á r i o , e a cuia p a r a b e b e r e m p o r ela e. o cão p a r a descobridor das feras q u a n -
d o v ã o caçar. Estes são todos os seus móveis q u e l e v a m consigo, e todos levam a
m u l h e r às costas e t a m b é m os filhos p e q u e n o s , atados de u m e o u t r o l a d o , q u e o
m a r i d o só leva o arco.
E m religião, são e m e x t r e m o b á r b a r o s , n ã o c o n h e c e n d o fé, n e m lei, n e m rei,
p o r q u e se diz lhes faltam n a s u a língua as três: "f", " l " , " r " . D a n a d a t ê m conheci-
m e n t o , n e m dos seus princípios mais q u e u m a s tradições d e u m dilúvio universal
de águas; n ã o c o n h e c e m a deus algum, n e m a d o r a m coisa a l g u m a ; t ê m somente
u n s escuros vestígios d e q u e h á u m a excelência s u p e r i o r , a q u e c h a m a m T u p ã ,
q u e q u e r d i z e r estrondo espantoso.
T ê m e n t r e si muitos feiticeiros, q u e os e n g a n a m e e m b r u x a m a c a d a passo,
sendo destes piores os "tapuias, que c o m u m e n t e a d o r a m visivelmente o diabo e m
[fl, 46 lv. ] formas ridículas / / d e moscas, ratos, sapos e outros a n i m a i s desprezíveis, e são
estes de todos os q u e mais vivem, p a s s a n d o pela m a i o r p a r t e d e c e m anos; são os
m a i s a t r a i ç o a d o s e v a g a b u n d o s d e todos.
E m costumes, são quase feras e p a r e c e m sem ação a l g u m a de h u m a n i d a d e , e
mais p a r e c e m b r u t o s e m p é q u e h o m e n s racionais; aos hóspedes r e c e b e m c h o r a n -
do e aos m o r t o s fazem exéquias b á r b a r a s , e n t e r r a n d o a u n s e m u m vaso, a m o d o
d e " t a l h a , c o m s u a foice, e n x a d a o u o u t r o i n s t r u m e n t o d e t r a b a l h o a o p e s c o ç o
p a r a q u e p o s s a m n a o u t r a vida t r a b a l h a r e t e n h a m q u e comer; outros os m e l h o -
r a m d e sepultura m e t e n d o - o s e m suas e n t r a n h a s , p a r a o q u e l e v a m o c o r p o m o r t o
a c a m p o , a c o m p a n h a d o dos p a r e n t e s , e aí o vão r e p a r t i n d o e n t r e si à p r o p o r ç ã o
d o m a i o r ou m e n o r p a r e n t e s c o q u e t ê m c o m ele; c a d a u m a destas p a r t e s t o r r a m
u m a s v e l h a s q u e p a r a isto h á d e s t i n a d a s , e t o r r a d a s c o m e c a d a u m o q u e l h e
tocou, e t ê m p a r a si ser este o sinal d e m a i o r a m o r q u e p o d e m m o s t r a r aos q u e
m o r r e m , dár-lhes sepultura e m seus ventres, m a s c o m esta diferença q u e os corpos
dos principais q u e m o r r e m só os c o m e m os outros principais e r e p a r t e m os ossos
pelos p a r e n t e s , q u e os g u a r d a m p a r a o t e m p o d e suas festas, o n d e p a r t i d o s p o r
m i ú d o os v ã o c o m e n d o p o u c o a p o u c o , e e n q u a n t o assim n ã o são c o m i d o s a n -
d a m d e luto, q u e é c o r t a r e m os cabelos; d a m e s m a f o r m a c o m e m os t a p u i a s os
filhos q u e lhes m o r r e m depois d e nascidos dizendo p e d i r a b o a r a z ã o t e n h a m p o r
t u m b a o m e s m o b e r ç o d o seu nascimento.

P e r n a m b u c o , capítulo 6

T e m ares b e n i g n o s ; é o t e r r e n o e s t e n d i d o e m "várgeas e c a m p o s , vestido


t o d o d e verdes e amarelos canaviais de açúcar; t e m grandes "oficinas, a q u e cha-
m a m " e n g e n h o s reais, q u e t r a b a l h a m t o d o o a n o c o m g r a n d e c ó p i a d e g e n t e , e
h o u v e anos e m q u e s a í a m c i n q ü e n t a e sessenta navios c a r r e g a d o s d e a ç ú c a r ; o
pau-brasil é ali o m a i s precioso, d e q u e se t i r a m até sete formosíssimas tintas; t e m
845

b o m c o m é r c i o , b o n s edifícios e riquezas, e foi t o m a d o pelos holandeses, e s t a n d o


e m seu p o d e r 24 anos, até ao d e 1654, e m q u e foi r e s t a u r a d o ,

Goitacases, capítulo 11, livro 4

S ã o c a m p i n a s formosíssimas e direitas de vinte e mais "léguas, todas verdes e


enfeitadas q u e p a r e c e m o u t r o s c a m p o s elísios, h a v e n d o neles f a m o s a s lagoas, e
u m a d e tal g r a n d e z a q u e do meio dela m a l se vê terra, sendo de á g u a s / / doces e [ fl. 462 ]
h a b i t a d o s de infinidade d e p a t o s e outras m u i t a s aves. São c h a m a d o s goitacases,
do "gentio goitacá, h a b i t a d o r daquelas p a r t e s e d a q u e havia três castas d e nações,
t u d o gente b á r b a r a e t r a g a d o r a de c a r n e h u m a n a , sendo inimigos capitais u n s dos
outros, e m tal f o r m a q u e o n d e q u e r q u e se e n c o n t r a v a m infalivelmente se m a t a -
v a m e c o m i a m uns aos outros.

A n g o l a , c a p í t u l o 1, l i v r o 6

T o m a r a m os holandeses, e m o a n o d e 1 6 4 1 , a cidade d e L u a n d a , capital d o


reino d e A n g o l a , d e q u e estiveram senhores até 15 de agosto d e 1638,^ e m q u e
foi r e n d i d a p e l o g e n e r a l S a l v a d o r C o r r e i a de Sá, q u e a isso foi m a n d a d o c o m
o n z e navios e q u a t r o " p a t a c h o s , q u e l e v a v a m setecentos p a r a oitocentos h o m e n s
d e infantaria, além d a gente do m a r , q u e s e r i a m q u a t r o c e n t o s .

• 129 <

[História da Vila do Príncipe e do modo de lavar os


diamantes e de extrair o cascalho]

Histórico da Vila do Príncipe, que oferece dados sobre:


criação da vila, autoridades e órgãos da administração ali exis-
tentes, descoberta de diamantes e sua tributação, contratos dos
diamantes, freguesias, igrejas e capelas, tropas militares, arrai-
ais do seu termo, áreas povoadas e atividades econômicas. U m a
segunda parte trata das diversas técnicas utilizadas na extração
é lavagem dos diamantes.

D e acordo com a obra de Simão de Vasconcelos, a data correta é 24 de agosto de 1648.


Sua fórmula enquadra-se nos padrões impostos para a es-
crita da história militar, eclesiástica e politica do reino de Portu-
gal pela Academia Real de História Portuguesa, a partir de 1721,
com recolhimento de dados de fontes autênticas e marcados pela
objetividade ém secretárias, cartórios, depoimentos, testemunhos
e notícias. O paradigma foi aplicado às colônias, com adapta-
ções concernentes à história natural, à conquista, ao povoamen-
to, à evangelização e às potencialidades econômicas.
O relato parece ter sido encomendado pelo ouvidor Cae-
tano da Costa Matoso, nos primeiros anos de sua atuação como
ouvidor de Vila R i c a (1749-52), a antigo m o r a d o r capaz de
testemunhar sobre a ocupação do território das Minas Gerais.
O interesse do ouvidor em reunir relatos sobre o povoamento
de Minas Gerais, seja por exigências do cargo ou por seu perfil
intelectual, coincide com ó falecimento dos remanescentes dos
primeiros povoadores de Minas e com a fixação de suas remi-
niscências sob a forma escrita, colecionadas por particulares.
É t a m b é m revelador, por outro lado, do apreço do compilador
pelos aspectos técnicos n a região.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : anônimo; Vila do Príncipe; ca.
1750.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Por acumulação e detalhamento
de itens, o texto se constitui como descrição elogiosa da Vila do
Príncipe e das técnicas de extração dos diamantes. Segundo Rafael
Bluteau, "descrição" é "Definição imperfeita. Representação ou
pintura de alguma cousa c o m palavras" (Vocabulário português e
latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da C o m p a n h i a de Jesus,
1713. V. 3, p. 115). (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, cursiva, n ã o
regularizada do século X V I I I . Destrógrada, muito imperfeita,
m a s evidenciando escrita muito veloz, de traçado evoluído. Des-
tacam-se o uso de traço ascendente como ponto de fuga n o final
de palavras; " p " em haste dupla, retilíneo, em forquilha, com o
mesmo traçado do " q u e " e m abreviatura. Letra de Caetano da
Costa Matoso. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : Este documento e o 128 encontram-
se e m seqüência n o original, em u m mesmo caderno, com as
mesmas caligrafia e tinta, optando-se aqui pelo seu desmem-
bramento por tratarem de temas muito diversos. Procedeu-se a
deslocamento de texto, conforme indicação do original.
847

Vila do Príncipe

F u n d o u - s e e levantou-se "pelourinho n o m o r r o d e S a n t o A n t ô n i o , d u a s "lé-


guas d i s t a n t e do T i j u c o , o q u a l foi m a n d a d o l e v a n t a r p e l o " o u v i d o r d o S a b a r á
Luís Botelho d e Q u e i r ó s , e passados p o u c o s anos se m u d o u esta vila p a r a o sítio
e m q u e hoje existe, distante d o p r i m e i r o onze léguas e d o T i j u c o nove, pelo "juiz
o r d i n á r i o A n t ô n i o Q u a r e s m a , a instâncias d e u m a sua a m i g a n e g r a , p o r n o m e
J a c i n t a , existente a i n d a hoje, q u e vivia n a q u e l e sítio c o m lavras suas. E p a r a ali fez
m u d a r o " p e l o u r i n h o e t u d o o mais q u e p ô d e , e se foi a u m e n t a n d o , e t e m hoje
bastantes m o r a d o r e s c o m Casas d e C â m a r a e C a d e i a e residência dos "ouvidores,
q u e h o j e n a q u e l a c o m a r c a h á , e m q u e foi o p r i m e i r o A n t ô n i o R o d r i g u e s B a n h a
pelos a n o s d e 1725, e este se retirou p e l a B a h i a , o n d e faleceu, s e n d o o p r i m e i r o
q u e levou d i a m a n t e s , de q u e e n t ã o se fazia p o u c o caso p o r falta d e c o n h e c i m e n t o .
N o fim do seu lugar, se lhe entrou a d a r estimação aos d i a m a n t e s , p o r avisos
d o " g o v e r n a d o r d o m L o u r e n ç o de A l m e i d a , e l h e s u c e d e u A n t ô n i o F e r r e i r a d o
V a l e e M e l o , e n o t e m p o deste, pelos anos d e 1728 e 1729, se c o m e ç a r a m a tirar
d i a m a n t e s p o r o r d e m d o g o v e r n a d o r , *matricuiando-se os n e g r o s e p a g a n d o os
donos / / a s "capitações n a f o r m a q u e os m a n d o u m u l t a r uns a cinco mil "réis p o r [ fl. 462v. ]
seis meses, outros a dez, e outros mais, até c h e g a r e m as ordens d e el-rei, a q u e m
tinha dado parte.
A esse ouvidor se seguiuJ o s é de C a r v a l h o M a t e u s , o qual, j á e m observância das
o r d e n s d e el-rei e feito " i n t e n d e n t e dos d i a m a n t e s , c a p i t o u os n e g r o s à " d o b r a
c a d a u m , p o r seis meses, d a n d o "bilhetes p a r a os escravos q u e se m a t r i c u l a v a m e
m e t i a q u e m q u e r i a pelo dito p r e ç o . E n o t e m p o deste foi o m a i o r c o n c u r s o d e
mineiros a tirar diamantes, pondo-se tudo regulado e m b o a arrecadação p a r a a
F a z e n d a R e a l e c o m t r o p a d e sessenta soldados, q u e c o m a n d a v a o "capitão J o s é
d e M o r a i s C a b r a l fazendo p a t r u l h a s e e x a m e s pelos córregos e rios e m q u e h a v i a
os d i a m a n t e s , c o m l i b e r d a d e d e se t r a b a l h a r e m t o d a a p a r t e assim " g r u p i a r a s
c o m o "corgos e rios e m q u e a p a r e c i a m , e x a m i n a n d o - s e os n e g r o s q u e t i n h a m
escritos, e aqueles a q u e m se lhes n ã o a c h a v a m se confiscavam.
A este o u v i d o r se s e g u i u , n o m e a d o i n t e n d e n t e c o m d i r e i t o d e o u v i d o r , o
" d e s e m b a r g a d o r Rafael Pires P a r d i n h o , n o a n o d e 1732, m a n d a d o d e P o r t u g a l
c o m "oficiais d e "escrivão, "fiscal e "meirinho d a m e s m a I n t e n d ê n c i a , c o m o r d e -
n a d o d e 8 mil "cruzados, e o escrivão, q u e fora logo depois servindo d e "fiscal,
t a m b é m p o r l a n ç a r e m fora o dito fiscal, c o m o r d e n a d o d e 600 mil réis q u e lhe
taxou o g o v e r n a d o r , sem e m b a r g o d e trazer c a d a u m 3 mil cruzados d e o r d e n a d o ,
e o tesoureiro q u e cá se criou se lhe m a n d o u p a g a r pelo C o n s e l h o [ U l t r a m a r i n o ]
400 m i l réis p o r a n o . E este ministro capitou a i n d a u m a n o n a f o r m a q u e o seu
antecessor, e depois deste a n o , q u e foi o d e 1734, se proibiu a e x t r a ç ã o dos dia-
m a n t e s , p o r o r d e m de el-rei e d o "general c o n d e das Galveias, e se d e m a r c a r a m as
terras p a r a a proibição, p o r M a r t i n h o d e M e n d o n ç a , q u e t i n h a sido m a n d a d o p o r
848

el-rei a c u i d a r n a c o b r a n ç a de "quintos e mais direitos e d i a m a n t e s , ficando assim


[ íl. 4 6 3 ] existindo o m e s m o "ministro e / / oficiais d a q u e l a I n t e n d ê n c i a f a z e n d o v e d a r e
t i r a n d o devassas c o n t r a as pessoas q u e a furto t i r a v a m d i a m a n t e s depois desta p r o i -
b i ç ã o , fazendo executar as o r d e n s de el-rei e " b a n d o s dos "generais nesta m a t é r i a ,
e m q u e h o u v e r a m muito e b a s t â n t e m e n t e rigorosos; até q u e , p o r o r d e m d e el-rei,
q u e veio n o a n o d e 1739, e m q u e estiveram fechadas e p r o i b i d a s estas extrações,
p a s s o u à q u e l e distrito o g e n e r a l G o m e s F r e i r e a fazer a b r i r a q u e l a s m i n a s p o r
" c o n t r a t o , q u e c o m efeito r e m a t o u p a r a p r i n c i p i a r e m o p r i m e i r o d e j a n e i r o d e
1740 a J o ã o F e r n a n d e s d e Oliveira c o m Francisco Ferreira da Silva, p o r t e m p o d e
q u a t r o a n o s , a 230 mil "réis c a d a escravo p o r a n o , q u e veio a i m p o r t a r e m 1
m i l h ã o e 380 mil "cruzados nos q u a t r o a n o s , m e t e n d o só seiscentos escravos, com
proibição n a forma das condições e c o m terras demarcadas p a r a p o d e r trabalhar só o
contrato n o dito t e m p o , c o m o se v ê das condições, fazendo o dito general alargar
m u i t o mais a d e m a r c a ç ã o das terras proibidas da q u e estava feita pelo dito M a r t i n h o
d e M e n d o n ç a . Findos os q u a t r o anos, t o r n o u a r e m a t a r o dito c o n t r a t o , c o m as
m e s m a s condições, o dito J o ã o Fernandes, só sem c o m p a n h e i r o , a 270.000 réis c a d a
escravo p o r a n o , sendo t a m b é m seiscentos os " c a p i t a d o s , d a n d o - s e mais a l g u m a
terra p a r a p o d e r extrair os diamantes e 600.000 cruzados de e m p r é s t i m o pela F a -
z e n d a R e a l para custeamento do dito Contrato e ouro, e o mais se verá das condições.
O terceiro contrato, q u e existe hoje, a r r e m a t o u p o r outros q u a t r o anos o capi-
t ã o F e l i s b e r t o C a l d e i r a , c o m as m e s m a s c o n d i ç õ e s d o s e g u n d o e os m e s m o s
seiscentos negros de "matrícula, c o m a obrigação d e m e t e r quatrocentos nas minas
do S e r r o do Frio e duzentos nas minas dos Pilões, e m Goiás, q u e foram descobertas
e m 1742 e estavam proibidas até a o p r e s e n t e , sendo o p r e ç o d e c a d a n e g r o , p o r
a n o , 230.000 réis.
[ fl. 463v. ] A Vila d o P r í n c i p e é m a l f u n d a d a p o r uns d e s p e n h a d e i r o s , m e t i d a e n t r e
m a t o s , p o r p a r t e d o q u a l p a s s a u m p e q u e n o c ó r r e g o ou r i b e i r ã o ; t e m b a s t a n t e
gente e casas d e m a d e i r a s ordinárias; t e m sua igreja m a t r i z o r d i n á r i a e u m a "cape-
la d e S a n t a R i t a . E a esta freguesia p e r t e n c e o arraial do Tijuco, q u e foi f u n d a d o
p r i m e i r o q u e a vila, n o sítio e m q u e hoje existe j u n t o às m e l h o r e s lavras q u e havia
n a q u e l a c o m a r c a , q u e h o j e se a c h a m todas d e n t r o d a d e m a r c a ç ã o p r o i b i d a e é
arraial g r a n d e e m sítio alegre, c o m b o a igreja de S a n t o A n t ô n i o e u m a capela d a
S e n h o r a d o R o s á r i o e m q u e está o S a c r a m e n t o e u m "capelão p o s t o pelo *pároco
p o r concessão pontifícia vinda n o a n o d e 1740.
N e s t e arraial existe a I n t e n d ê n c i a dos Q u i n t o s de E l - R e i e dos D i a m a n t e s ,
q u e se c o m p õ e de u m "intendente de u m a e outra coisa, "ministro n o m e a d o p o r el-
rei c o m r e n d i m e n t o dos mais i n t e n d e n t e s , q u e é [incompleto] e mais 4 0 0 . 0 0 0 réis
c o m o i n t e n d e n t e dos diamantes; t e m u m "fiscal do o u r o , q u e é t a m b é m dos dia-
m a n t e s , e o r d e n a d o dos fiscais, sem mais n a d a ; tem dois "escrivães, u m do ouro e
outro dos diamantes, c o m o r d e n a d o d e 600.000 réis, pagos pela F a z e n d a R e a l , e é
n o m e a ç ã o do general, assim c o m o todos os mais; t e m u m "tesoureiro p a r a a m b a s as
849

"intendências e vence o r d e n a d o de vinte "moedas; além d o q u e t ê m os tesoureiros


das intendências e úrn "meirinho, que t e m o m e s m o q u e os mais. E n a a r r e m a t a ç ã o
dos contratos t e m o intendente de "propina 800.000 réis, o escrivão 150.000 réis e
o fiscal o m e s m o .
E este m e s m o arraial situado a o p é das terras e m q u e se e x t r a e m os d i a m a n -
tes, e h á nele u m a t r o p a de oitenta soldados, c o m u m "capitão, dois "alferes, u m
" t e n e n t e e tantos "cabos d e e s q u a d r a q u a n t o s se p r e c i s a m p a r a a divisão das p a -
trulhas, e a n d a m s e m p r e d e dia e d e noite pelos ribeiros e corgos d e m a r c a d o s e
p o r o n d e l a b o r a m os "contratos, e x a m i n a n d o se a n d a m neles negros de mais dos
concedidos, e sendo obrigados a d a r e m a o "contrato as g u a r d a s necessárias.
T e m este arraial b a s t a n t e gente q u e vive das suas v e n d a s e "ofícios e alguns [ fl. 4 6 4 ]
m i n e i r o s q u e t ê m suas lavras d e n t r o d a d e m a r c a ç ã o , c o n c e d i d a a l i b e r d a d e d e
t r a b a l h a r nelas p o r el-rei, visto q u e j á antes e r a m suas e se e x a m i n a r e m n ã o h a v e r
nelas d i a m a n t e s . E e m t o d a a c o m a r c a , q u e é m u i t a p a r t e g r a n d e e d e s p o v o a d a ,
t ê m algumas lavras, e m q u e se a c h a m alguns arraiais, p r i n c i p a l m e n t e n a freguesia
d e N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o do M a t o D e n t r o , e m distância d e três dias d e
v i a g e m antes d e c h e g a r à vila, m a s p o r diverso c a m i n h o p a r a a p a r t e de leste d o
c a m i n h o q u e vai direto à vila. T e m m a i s o arraial d a S e n h o r a d o Pilar, d e p o u c a
g e n t e , o a r r a i a l dos C ó r r e g o s , t a m b é m p e q u e n o , a T a p e r a e I t a p a n h o a c a n g a ,
t a m b é m p e q u e n o s , e todos d a dita freguesia d a C o n c e i ç ã o . T e m m a i s , i n d o d o
S a b a r á p a r a o Tijuco, e daí p a r a a vila, o arraial d a P a r a ú n a , o d a G o u v e i a , o do
M i l h o V e r d e , o d e São G o n ç a l o , todos p e q u e n o s e c o m suas "capelas, e m q u e se
a d m i n i s t r a m os s a c r a m e n t o s , s e n d o o p r i m e i r o p e r t e n c e n t e à dita freguesia d e
M a t o [Dentro] e os outros à freguesia d a Vila [do Príncipe].
T a m b é m h á nesta c o m a r c a , n a b a r r a q u e faz o rio das Velhas n o rio d e S ã o
F r a n c i s c o , u m arraial c h a m a d o B a r r a d o R i o das V e l h a s , c o m sua freguesia d e
S a n t o A n t ô n i o , q u e apresenta o arcebispado da Bahia, e t e m extensão d e d u z e n -
tas "léguas, t e n d o freguesia n a c o m a r c a d o S e r r o e S a b a r á , e é o arraial p e q u e n o
e d e refúgio aos malfeitores, p o r ser m e t i d o n o sertão e se p a s s a r e m dali p a r a o n d e
querem.

Diamantes

O p r i m e i r o m o d o de, * l a v a r d i a m a n t e s foi p o r " b a t e i a s , e s t a n d o n e l a s


" b a n d e j a n d o os n e g r o s e os l i m p a n d o d a t e r r a até f i c a r e m n o f u n d o c o m os
" e s m e r i s ; o s e g u n d o m o d o foi e m " t a b u l e i r o s , o n d e se e s c o l h i a m e a p a r t a v a m
d o " c a s c a l h o q u e se t i r a v a n o s "corgos; o t e r c e i r o , q u e h o j e se p r a t i c a , é p a s -
s a n d o t o d o s os / / c a s c a l h o s p o r u m a g r a d e d e f e r r o n ã o l a r g a q u e , b o t a n d o - [ fl. 464v. ]
se-lhe á g u a p o r c i m a , faz c o m q u e os c a s c a l h o s m i ú d o s p a s s e m p a r a b a i x o d e
u m a b i c a d e t a b u a d o , q u e os r e c e b e , e d a l i c o r r e p a r a u m " t a n q u e , d o n d e
d e p o i s se t i r a m e se p a s s a m a u m a s p e q u e n a s " c a n o a s , o n d e se l h e b o t a á g u a
850

q u e b a s t e p a r a t r a b a l h a r u m n e g r o , q u e nelas os a p a r t a e e s c o l h e , q u e c o m a
água se lhes conhece a diferença q u e tem das mais p e d r a s do "cascalho e
e s m e r i s , e assim, m e l h o r q u e d e o u t r o m o d o , se a p r o v e i t a t u d o .

M o d o de extração dos cascalhos

N o s rios g r a n d e s , é necessário tirá-los d a sua n a t u r a l c o r r e n t e , passando-os,


o u p o r bicas o u p o r terra, r o m p e n d o - s e e m a l g u m a p a r t e , c o n f o r m e se precisa e é
m a i s c o n v e n i e n t e . E m u d a d o assim o rio, se lhe a s s e n t a u m a *roda d e esgotar
á g u a p o r rosário, e esgotada se vai tirando o "desmonte o u e n t u l h o d a t e r r a , p o r
b a i x o d o q u a l está o cascalho q u e se tira à " b a t e i a p a r a ser " l a v a d o n a f o r m a
a c i m a . E e m p a r t e s do rio J e q u i t i n h o n h a se lhe a c h a m p o ç o s , a q u e c h a m a m
"caldeirões, d e 120 e 140 p a l m o s d e f u n d o , t e n d o d e n t r o e m si v á r i a s l a p a s e
concavidades q u e m e t e m p a r a as serras q u e estão nos l a d o s d o rio imediatas a ele,
o n d e se a c h a c a s c a l h o c o m d i a m a n t e s , e às vezes e m a b u n d â n c i a , e e m o u t r a s
p a r t e s se a c h a m caldeirões c o b e r t o s d e lajes e p e d r a s g r a n d e s q u e , q u e b r a d a s
e s t a s , se a c h a m p o r b a i x o c a s c a l h o s . E n o r i o d a s P e d r a s , q u e se m e t e n o
J e q u i t i n h o n h a , t e m as m e s m a s f o r m a t u r a s e nele se d e s c o b r i r a m u m a s p e d r a s for-
m a d a s e m lajes, q u e ao b r o q u e a r e m - s e q u e b r a m m u i t o , m a s nos seus p e d a ç o s se
[ fl. 465 ] a c h a m / / r a m o s , árvores e outras raridades d a n a t u r e z a , coisa admirável, sendo a
p e d r a m e i o b r a n c a e os r a m o s e perspectivas q u e m o s t r a f o r m a d o s d e "esmeril
p r e t o o u areia.

N o s " c o r g o s ou ribeiros p e q u e n o s , se t i r a m p a r a u m l a d o d a s u a n a t u r a l
c o r r e n t e p a r a se lhe, t i r a r e m os cascalhos n o veio d a á g u a , c o m o fica dito, e às
vezes r e m e t e à m e s m a f o r m a t u r a d e cascalhos p e l a t e r r a d e n t r o , cuja t e r r a se cha-
m a "tabuleiros o u "grupíaras, e extraindo-se o cascalho e n q u a n t o se a c h a . E n o
dito rio das P e d r a s , e m u m c a l d e i r ã o , se a c h a r a m d i a m a n t e s c r a v a d o s e c o m o
nascidos e m p e d r a s p a r d a s , a q u e c h a m a m " t a p a n h o a c a n g a , e no rio J e q u i t i n h o n h a ,
ribeiro do Inferno e rio das P e d r a s se a c h a m vários s u m i d o u r o s m u i t o profundos
q u e n ã o p o d e r ã o os m i n e i r o s n u n c a c h e g a r a o fundo deles, e a i n d a nos corgos
q u e se m e t e m neles se a c h a m os mesmos s u m i d o u r o s . E no d o Bonsucesso se a c h a
u m a l a p a , d o n d e se p o d e m a c o m o d a r mais de duzentas pessoas, e, n o m o r r o cha-
m a d o d o M a r a v i l h a , q u e deságua p a r a o rio das P e d r a s e ribeiro d o Inferno, se
a c h a u m s u m i d o u r o c o m vários abertos debaixo d o m e s m o m o r r o , q u e atravessa
de u m a parte a outra.

P a r a custear o "contrato, se gasta de 400 mil "cruzados p a r a c i m a todos os


anos, e q u a n t o mais despesa se faz mais utilidade t e m o contrato n a m e l h o r extração
que há.
851

> 130 «

Notícia dos marcos de Portugal em os domínios austrais, [fl.466 ]


dada por Estêvão Pereira, natural do Rio de Janeiro,
viajando por eles por um voluntário extermínio
e dando depois uma fiel conta do que viu enquanto por lá andou.
A nau que fala neste papel se perdeu
foi a primeira que levou casais à Colônia [do Sacramento]

Extrato com dados de seis notícias dentre doze escritas por


Estêvão Pereira d a Silva e entregues a d o m J o ã o V n a audiência
de 6 de abril de 1728 por Alvaro José de Serpa Souto Maior.
T r a t a dos padrões com armas de Portugal na América espanho-
la, da instância com que os castelhanos tentavam ocultar u m
padrão na catedral de Assunção, do motim contra a retirada dos
padrões portugueses no Paraguai, dos aliados portugueses n a
região, das minas que possuíam os padres da C o m p a n h i a de
Jesus nas terras de Portugal e dos descobridores da serra da Estrela.
A natureza das informações apresentadas sugerem que a
preparação desse documento atendia demanda do secretário real
Alexandre de Gusmão que, através do levantamento de. docu-
mentos e de inquéritos solicitados a funcionários e colonos das
regiões em litígio c o m a E s p a n h a sobre aspectos geográficos,
históricos, etnográficos e econômicos, reunia, n a fase preparató-
ria do T r a t a d o de M a d r i , elementos a favor de Portugal nas
negociações.
Espectador da preparação e movimentação da missão de
negociação do tratado nos primeiros anos da década de 1750, o
ouvidor Caetano da Costa Matoso teve acesso ao documento pro-
vavelmente naquele momento. Integrando u m grupo de documen-
tos distante do universo de temas relacionados a sua atividade de
magistrado em Minas Gerais, o documento ilustra o interesse do
súdito letrado, que se aproveita da experiência no ultramar para
reunir informações sobre os sucessos da presença portuguesa na
América.
Autoria, l o c a l e data: Estêvão Pereira da Silva; Rio d e
Janeiro; ca. 1728.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : A "notícia" constitui, provavel-
mente, relato de algo "memorável" conforme o conceito de histó-
ria da época. Segundo Rafael Bluteau, "história" é, "Mais parti-
cularmente", "narração de cousas memoráveis, que têm aconte-
cido em algum lugar, em certo tempo e com certas pessoas, ou
852

nações" (Vocabulário português e latino [...] Coimbra: Colégio das


Artes da Companhia de Jesus, 1713. V. 4, p. 39). (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, caligrafada
e regularizada, do século X V I I I . T r a ç a d o r e d o n d o das letras,
com hastes alongadas em traços perpendiculares oblíquos ou ter-
minando e m forma de cajado; o "d" uncial t a m b é m t e n n i n a e m
cajado invertido; uso do " h " em forma do " E " redondo; o "y"
aparece com valor de semivogal. Uso m o d e r n o de pontuação:
vírgula, ponto-e-vírgula, ponto final. (YDL)

E m o d e c u r s o d e oito anos q u e a n d e i pelas í n d i a s d e E s p a n h a e r e i n o d o


P e r u e m u i t o s sertões d a q u e l e s d o m í n i o s d e s c e n d o p a r a B u e n o s A i r e s , vi q u e
j u n t o d e u m a torre estava u m m a r c o c o m as a r m a s d e Portugal, a o qual t i r a r a m os
castelhanos e o m e t e r a m debaixo do a l t a r - m o r d a m a t r i z p o r o t i r a r e m d a vista dos
portugueses que passavam p o r aquela cidade vindos da Colónia, ao qual tinha
visto n o m e s m o lugar antes q u e o tirassem. V i t a m b é m n a p r a ç a d a c i d a d e d e
Q u i t o o u t r o m a r c o c o m as m e s m a s a r m a s portuguesas, e o m e s m o vi n o Potosí,
a r r u m a d o s d e leste a oeste.
P a s s a n d o à c i d a d e d e S a n t a F é e à d e L a s C o r r i e n t e s e m i s s õ e s dos p a d r e s
d a C o m p a n h i a [ d e J e s u s ] , vi m u i t a s p o v o a ç õ e s de índios c o m i n u m e r á v e l
g e n t e , o n d e m e c e r t i f i c a r a m q u e p u n h a m os p a d r e s d a C o m p a n h i a u m n o t á -
vel n ú m e r o d e a r c o s , l a n ç a s e "fundas e m c a m p o dos í n d i o s q u e t i n h a m su-
b o r d i n a d o s ; vi q u e os p a d r e s d a C o m p a n h i a , e m c e r t a s missões, t i n h a m o u r o ,
e dentro de particulares redutos o "bateavam. Passando à cidade d a Assunção
d e P a r a g u a i , vi n a sé d e s t a c i d a d e o u t r o m a r c o c o m as a r m a s d e e l - r e i d e
P o r t u g a l , c o m u m a s letras q u e d i z i a m " E s t a d o s d e el-rei d e P o r t u g a l " , o q u a l
m a r c o e s t á p o r d e t r á s d a p o r t a d a dita sé, e n c a i x a d o n a p a r e d e . D e p o i s d e v e r
o q u e a c i m a d i g o , passei à V i l a R i c a d o E s p í r i t o S a n t o e d a í à vila d e S a g u a t i ,
q u e fica f r o n t e i r a aos c a m p o s d e X e r e s , e d a í t o r n e i p a r a a c i d a d e d e A s s u n -
ç ã o d e P a r a g u a i , o n d e a c h e i a n o v i d a d e q u e o g o v e r n a d o r q u e ali se a c h a v a ,
d o m D i o g o R e i s , q u e r e n d o a r r a n c a r o m a r c o q u e ali e s t a v a , se " a m o t i n a r a m
os d o P a r a g u a i e l h o i m p e d i r a m , e v e n d o - s e e m risco o g o v e r n a d o r r e t i r o u - s e
p a r a as m i s s õ e s dos p a d r e s d a C o m p a n h i a a fim d e vir c o m í n d i o s e a r r a n c a r
o dito m a r c o , m a s s e m efeito p o r q u e se o p u s e r a m os d e P a r a g u a i .
[ fl. 466v. ]
C o m este m o t i m , m a n d o u aviso a Buenos Aires, o n d e / / estava o tenente-rei
d o m B a l t a s a r G a r c i a e o "bispo, q u e t i n h a v i n d o d a c i d a d e d e C u z c o , q u e se
a b a l a r a m e p u s e r a m e m m a r c h a pelo rio Iruruaia, q u e vai d e s a g u a r a o r u m o do
sul, e d a í e n t r a r a m pelas missões d o rio C a p i g u , e dele p a r a o p o v o d e S a n t a
M a r i a , c h a m a d o Policarpo, d o n d e se p u s e r a m e m m a r c h a p a r a o rio d e T e b i q u a r i ,
o n d e a r m a r a m o seu " c a m p o .
853

S a í r a m os de P a r a g u a i c o m o seu g o v e r n a d o r q u e d e n o v o elegeram, c h a m a -
d o d o m J o s é d e A n t i q u e r a e C a s t r o , e [o] o u v i d o r d a R e a l A u d i ê n c i a d e
C h u q u i s a c a , e d a n d o b a t a l h a a h o r a s d o m e i o - d i a fizeram os p a r a g u a i a n o s d e n t r o
d e d u a s h o r a s g r a n d e estrago, pondo-se os *cabos e m fugida p a r a o p o v o d e S a n t o
I n á c i o , a o n d e e s c a p a r a m , e dali d e r a m os ditos cabos aviso d o sucesso à c i d a d e d e
B u e n o s Aires e a o vice-rei d e L i m a , q u e m a n d o u logo o r d e m a d o m B r u n o M a u -
rício d e Z a b a l a q u e m a r c h a s s e logo c o m g e n t e d e Buenos Aires, d e S a n t a F é ,
C ó r d o b a e d e Las Siete Corrientes a destruir os d e P a r a g u a i .
C h e g a n d o esta " m á q u i n a d e g e n t e ao rio T e b i q u a r i , t o r n a r a m a sair os d e
P a r a g u a i , e n ã o c o n s e g u i r a m n a d a os c a b o s castelhanos, p o r ser m a i o r o p o d e r
daqueles, c a p i t u l a n d o os d e P a r a g u a i q u e e s t a v a m e m terras d e el-rei d e P o r t u g a l
e q u e n ã o h a v i a m consentir se tirassem seus m a r c o s , q u e havia tantos anos q u e ali
estava m e t i d o aquele m a r c o , p o r cuja causa n ã o o b e d e c i a m às o r d e n s dos gover-
n a d o r e s , e assim ficaram.
D e p o i s d e observar o referido, fui c o m a m i n h a "derrota e p a r t i p a r a a vila d e
C u r a g u a t i , e c o m o achasse grandes notícias de q u e nas cabeceiras d o rio G r a n d e
e d e s p e n h a d e i r o do rio P a r a n á e serra d a Estrela t i n h a m os p a d r e s d a C o m p a n h i a
das missões descoberto g r a n d e s tesouros fui aos tais descobrimentos e gastei vinte
dias d e v i a g e m p o r a q u e l a s d i l a t a d a s c a m p a n h a s , o n d e c h e g u e i a o m e i o - d i a e
avistei, n o alto d a serra d a Estrela, a o r u m o do sueste, u m sítio f o r m a d o e m três
g r a n d e s serras, c h a m a d a u m a Santa C a t a r i n a o u t r a C a í e o u t r a O g n i , e vi aqueles
distritos m u i t o férteis de g a d o v a c u m , q u e é inumerável. E i n d o c h e g a n d o à serra
d e S a n t a C a t a r i n a , m e s a í r a m ao e n c o n t r o q u a t r o índios e p e r g u n t a r a m - m e q u e
fazia p o r aqueles sertões. R e s p o n d i - l h e s q u e a n d a v a p e r d i d o h a v i a três meses e
q u e n ã o atinava c o m c a m i n h o p a r a p o v o a d o .
O u v i n d o - m e , m e levaram o n d e estavam os p a d r e s a r r a n c h a d o s e o n d e a c h e i
a Faustino C o r r e i a , q u e tinha ido p o r piloto no navio S a n t o T o m á s q u a n d o foi
c o m os casais p a r a a C o l ô n i a . Passou-se à g u a r d a dos castelhanos, q u e está n o
l u g a r / / q u e c h a m a m S ã o J o ã o , cinCo léguas d a nossa p o v o a ç ã o d a C o l ô n i a , [ fl. 4 6 7 ]
d o n d e se p a s s a v a p a r a as missões dos p a d r e s d a C o m p a n h i a , e c o m o e r a piloto
d e i t a r a m - l h e a " r o u p e t a , e c o m ela a n d a v a e m descobrimentos d e g r a n d e s have-
res p a r a os p a d r e s .
V i t a m b é m n o m e s m o sítio a o paulista Francisco B u e n o Feio e m e s t r e d a -
quelas m i n a s ; e vi t a m b é m n o serro do C a í t i r a v a m m u i t o o u r o , n ã o q u e r e n d o o
d e " l a v a g e m m a s sim o d e "beta, e n o serro d e S a n t a C a t a r i n a t i r a v a m m u i t a
p r a t a , o n d e t ê m oito fundições e m q u e estão a t u a l m e n t e fundindo, fazendo p i n h a s
e b a r r a s q u e p a s s a m e m mulas p a r a as missões, e t i r a v a m m u i t a s p e d r a s preciosas.
Isto foi o q u e vi n o t e m p o e m q u e a n d e i p o r a q u e l a s p a r t e s , q u e t u d o é
certíssimo, c o m o q u e m o presenciou etc.
854

• 131 «

[ fl. 468 ] Cópia da carta que da cidade de Buenos Aires escreveu


o padre da Companhia de Jesus Pedro Lago ao reverendo padre
Antônio Galvão, do colégio da Colônia [do Sacramento]

Correspondência enviada por u m jesuíta espanhol a u m jesu-


íta português comentando as negociações do Tratado de Madri e a
possibilidade de ocupação de missões jesuíticas espanholas por
portugueses como decorrência d a troca d a Colônia do Sacramento
por Sete Povos, ponto central nas negociações. Seu autor enfatiza o
esforço dos missionários na o b r a de cristianização e os riscos de
destruição de trabalho religioso e sugere rebeliões indígenas contra
o dcmínio português. Vincula-se ao documento 132.
Espectador d a preparação e movimentação da missão de
negociação do tratado nós primeiros anos da década de 1750, o
ouvidor C a e t a n o d a Costa Matoso teve acesso ao documento
provavelmente naquele momento. Integrando u m grupo de docu-
mentos distante do universo de temas relacionados a sua ativida-
d e de magistrado e m Minas Gerais, este documento ilustra o
interesse do súdito letrado, q u e se aproveita d a experiência no
ultramar para reunir informações sobre os sucessos da presença
portuguesa n a América.
Autoria, l o c a l e data: Pedro Lago; Buenos Aires; ca. 1752.

'fff . D e s t i n a t á r i o : Antônio Galvão.


A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Esta carta mobiliza argumenta-
ção contra a ingerência das coroas espanhola e portuguesa nas
missões jesuíticas do Sul. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita m o d e r n a , bastarda
do tipo italiana, bmtardilla castelhana m o d e r n a , com pronunci-
ados perfis nas hastes superiores. Regularizada e caligrafada do
século XVIII. (YDL)

N o d u d a m o s q u e en tiempos en q u e tan propicia se calla n u e s t r a C o r t e a


los entereses d e la de Lisboa, p o d r a esta a d e l a n t a r sus p r o y e c t o s h a s t a
d o n d e n u n c a j a m á s p u d o esperar en otras circunstancias. P e r o n o p o d e -
m o s creer (si n o es subrepticiamente) si n o p u d o h a b e r o b t e n i d o d e la p i e d a d d e
n u e s t r o rey católico la ruina en el todo o en gran p a r t e de nuestras misiones, q u e
tantos vasallos h a n añadido a su corona, y tantos créditos h a n d a d o al celo cristiano de
sus piadosos progenitores, y a toda nuestra C o m p a ñ í a q u e con sudor y sangre de sus
hijos las ha p l a n t a d o y conservado contra tantos enemigos q u e h a n p r o c u r a d o destruirlas
— entre los cuáles tienen el p r i m e r lugar los que ahora proyectan hacerse dueños de
ellas —, pero se h a llegado el tiempo e n q u e hayan d e acabarse tan floridas misiones,
y Dios asi lo hubiere dispuesto p a r a nuestros pecados, llevaremos este azote de Dios
con aquella paciencia y conformidad q u e Su Majestad se sirviere d a m o s , en u n golpe
el m á s sensible q u e en nuestra América p u e d e padecer yo y la C o m p a ñ í a .
U n a cosa p u e d o asegurar a V u e s t r a R e v e r e n d i s i m a , q u e S u M a j e s t a d católi-
ca p o d r a traspasar al d o m i n i o portugués aquella p a r t e d e tierras q u e quisiere, d e
las q u e o c u p a n los indios d e n u e s t r a s misiones; p e r o sus á n i m o s e n c u a n t o son
libres, n o p o d r a conseguir transferirlos a otro d o m i n i o etc.

• 132 «

Resposta à dita carta que no Rio de Janeiro


se mandou ao dito padre

Correspondência enviada por u m jesuíta português em repos-


ta a missiva de um jesuíta espanhol comentando as negociações do
T r a t a d o de M a d r i e a possibilidade de o c u p a ç ã o de missões
jesuíticas espanholas por portugueses como decorrência da troca
da Colônia do Sacramento por Sete Povos, ponto central nas nego-
. ciações. A carta do espanhol enfatizava o esforço dos missionários
n a obra de cristianização e os riscos de destruição de trabalho reli-
gioso e sugeria rebeliões indígenas contra o domínio português. O
português, por seu turno, historiava os tratados anteriores, arrola-
va argumentos demonstradores do prejuízo português delineados
nas negociações do tratado, defendia solução violenta para o pro-
blema, contestava argumentação de zelo ao desnudar interesses
econômicos dos missionários e censurava a ameça de mobilização
indígena. Vincula-se ao documento 131.
Espectador da preparação e movimentação da missão de
negociação do tratado nos primeiros anos da década de 1750, o
ouvidor Caetano da Costa Matoso teve acesso ao documento pro-
vavelmente naquele momento. Integrando u m grupo de documen-
tos distante do universo de temas relacionados a sua atividade de
magistrado em Minas Gerais, o documento ilustra o interesse do
súdito letrado, que se aproveita da experiência no ultramar para
reunir informações sobre os sucessos da presença portuguesa na
América.
856

Autoria, l o c a l e data: Antonio Galvão; Rio de Janeiro;


ca. 1752.
D e s t i n a t a r i o : Pedro Lago.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Esta carta mobiliza argumentação
em favor do acordo a que chegaram as coroas espanhola e portu-
guesa sobre a região das missões jesuíticas, no Sul, censurando a
posição assumida pelo clérigo d a missiva anterior. Verifica-se a
aplicação das seguintes tópicas: d a prudencia, topo da tradição
/ / / clássica reapropriada nos séculos XVII e X V I I I como correlato
político d a mediocridade (aristotélicamente entendida como a
/ t/â. moderação que, enquanto virtude intelectual, deve orientar as
ações); da legalidade como recurso de argumentação a favor d a
c/ /«/ • tese que o missivista defende; do justo premio pelo esforço guer-
reiro. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita m o d e r n a , bastarda
do tipo italiana, bastardilla castelhana moderna, com pronunci-
ados perfis nas hastes superiores. Regularizada e caligrafada do
século XVIII. (YDL)

M u i t o r e v e r e n d o p a d r e mestre:

[ fl. 468v. ] D o u a Vosso Padre o p a r a b é m pela notícia que temos j á confirmado d e


h a v e r desvanecido a negociação q u e se travava entre as C o r o a s d e Lisboa e M a d r i
a respeito d a d e m a r c a ç ã o dos domínios q u e u m a e o u t r a c o r o a p o s s u e m nos seus
descobertos e conquistas, p o r q u e esta n o v a terá livrado a Vosso P a d r e e aos p a -
dres missionários d a sua "província do g r a n d e c u i d a d o q u e lhes d a v a a alienação
q u e e m virtude do q u e estava t r a t a d o fazia a C o r o a d e E s p a n h a à, d e P o r t u g a l d e
a l g u m a s das missões q u e vossos p a d r e s a d m i n i s t r a m . P o r é m , p o d e V o s s o P a d r e
estar certo q u e o n o v o a c o r d o q u e t o m o u o nosso s o b e r a n o nesta m a t é r i a n ã o foi
d e m e n o s gosto p a r a a n a ç ã o p o r t u g u e s a , especialmente p a r a aqueles q u e costu-
m a m ver as coisas p o r todos os lados, p o r q u e p e s a n d o estes as conveniências q u e
r e c i p r o c a m e n t e resultavam desta negociação a u m a e o u t r a m o n a r q u i a a c h a r a m
q u e n a b a l a n ç a d a r a z ã o e d a política n ã o so n ã o g u a r d a v a m u m perfeito equilí-
brio m a s ficava a nossa g r a v e m e n t e lesa n o t o d o dos seus domínios, pois c e d e n d o
esta à d e E s p a n h a terras, m a r e s , p o r t o s e ilhas q u e ou c o m b o a fé e j u s t o título
possui o u p o r direito lhe p e r t e n c e a ela n ã o cedia a de E s p a n h a mais q u e algumas
t e r r a s e costas e m q u e esta conserva a posse sem direito e a q u e l a o direito c o m
justiça.
P r i m e i r a m e n t e , cedia Portugal a E s p a n h a a C o l ô n i a do S a c r a m e n t o c o m t u d o
o q u e lhe p e r t e n c e , e p o d e p o r q u a l q u e r título p e r t e n c e r d e n t r o d o rio d a Prata,
domínios uns d e q u e atualmente está de posse e outros a q u e conserva o direito pela
857

posse q u e deles t o m o u e m n o m e deste R e i n o A m é r i c o V e s p ú c i o , seu p r i m e i r o


a

descobridor, cuja posse n ã o só foi legítima p o r direito das gentes, conforme o qual
t u d o o q u e está devoluto é de seu p r i m e i r o d e s c o b r i d o r m a s t a m b é m j u s t a , p o r
indulto d a Sé Apostólica, q u e concedeu a esta C o r o a todas as terras, portos, m a r e s e
ilhas q u e os seus vassalos descobrissem,* c o m o consta das * b u l a s d e N i c o l a u V ,
5 c

Calisto III, Xisto IV, amplissimamente confirrnadas p o r Leão X n a b u l a q u e princi-


p i a : "Praexcelsae devotionis..."
D e m a i s d i s t o , n a d e m a r c a ç ã o d e t e r m i n a d a p e l a Sé A p o s t ó l i c a , p a r a evi-
t a r as c o n t e n d a s q u e h a v i a e n t r e e s t a C o r o a e a d e E s p a n h a s o b r e os seus
d e s c o b r i m e n t o s , p e r t e n c e m a P o r t u g a l n ã o só t o d a s as c o r r e n t e s d o r i o d a
P r a t a c o m o c o n t i n e n t e e ilhas d a p a r t e o r i e n t a l deste rio m a s t a m b é m m u i t a s
t e r r a s q u e ficam a o p o e n t e d a s suas m a r g e n s , p o r q u e í a n ç a n d o - s e o m e r i d i a n o
3 7 0 *léguas a leste d a s ilhas d o s A ç o r e s , e n ã o d a s d e C a b o V e r d e (o q u e está
n a n o s s a e l e i ç ã o , p o r q u e s e n d o n ó s os q u e i x o s o s fica a n o s s o a r b í t r i o e l e g e r
q u a l q u e r d o s p o n t o s q u e a b u l a d e A l e x a n d r e V I p r o p õ e ) , ficam a o o r i e n t e d a
linha sobredita: na América setentrional, Porto Rico, grande p a r t e da T e r r a
F i r m e c o m a N o v a / / A n d a l u z i a ; e n a A m é r i c a m e r i d i o n a l , S a n t a C r u z d e la [ fl. 469 ]
S i e r r a , c o m m u i t a p a r t e d o P a r a g u a i , e t u d o m a i s a este r e s p e i t o a t é q u a s e
c i n q ü e n t a graus d e latitude austral, c o m o o p o d e ver qualquer geógrafo que
c o m fiel c o m p a s s o e x a m i n a r e s t a d e m a r c a ç ã o .
A l é m disto, cedia mais n o dito t r a t a d o esta C o r o a à d e E s p a n h a as M o l u c a s
ou Filipinas, c o m t o d o o direito q u e a ela t e m e p o r q u a l q u e r título p u d e r ter, as
quais p e r t e n c e m a o d o m í n i o d e Portugal p o r três títulos os mais justos: p r i m e i r o ,
p o r título d e d e s c o b r i d o r e s , p o r q u e os p o r t u g u e s e s f o r a m os p r i m e i r o s q u e as
d e s c o b r i r a m e nelas p r o p a g a r a m a lei evangélica; s e g u n d o , p o r título d e h e r a n ç a ,
p o r q u e o seu legítimo rei d o m M a n u e l , ^ q u e e m G o a r e c e b e u o b a t i s m o , voltan-
do a g o v e r n a r e d o u t r i n a r os. seus povos, faleceu e m M a l a c a sem descendência, e

Hunc Argenteum Fluvium primus Americus Vespucius intravit an. 1501, invenitque in eo insulas
gemmiferas, et innumerabiles. argenti fodinas. 1

Orbis Maritimus loco competent!, 2

In bullata collections quibusdam Sacemmis Lusitanis Regibus jus patronatus conceditur, pg, 8.
Jacinto Freire^ na Vida de dom João de Castro, página 76. 3

Américo Vespúcio entrou, por primeiro, neste rio da Prata, no ano de 1501, e nele encontrou ilhas
abundantes em pedras preciosas assim como incontáveis minas de prata.
Orla marítima em lugar apropriado.
ANDRADE.Jacinto Freire de. Vida de dom João de Castro, quarto vice-rei da índia, escrita por Jacinto
Freire de Andrade, impressa por ordem de seu neto, o bispo dom Francisco de Castro. Lisboa:
Oficina Craesbeeckiana, 1681.
858

grato aos benefícios q u e desta C o r o a tinha recebido as deixou a el-rei d o m J o ã o


III e
e m t e s t a m e n t o solene, o u t o r g a d o c o m todas as legalidades civis; e, u l t i m a -
m e n t e , p o r título de c o m p r a , p o r q u e o m e s m o rei d o m J o ã o I I I , p o r n ã o descon-
certar a boa h a r m o n i a q u e conservava c o m o i m p e r a d o r Carlos V , q u e t a m b é m
queria ter nelas d o m í n i o , l h e c o m p r o u por trezentos e c i n q ü e n t a m i l "ducados d e
o u r o , pagos e m m o e d a corrente, p o r escritura celebrada e m S a r a g o ç a , n o a n o d e
1529, t o d a a a ç ã o d e d o m í n i o , posse e q u a s e possessão, e todo o direito d e n a v e -
g a r e c o m e r c i a r q u e p o r q u a l q u e r título t i n h a o u p o d i a ter as ditas ilhas, o q u e n ã o
louvarei e m n e n h u m p r í n c i p e , p o r q u e n ã o é j u s t o c o m p r a r c o m o u r o o q u e se
p o d e resgatar c o m o ferro.
O r a , *ex aequo, t e m Vosso P a d r e as grandes utilidades q u e esta C o r o a interes-
sava n a p r e s e n t e negociação, e n e m p o d i a deixar d e ser assim p o r q u e n u n c a P o r -
tugal alcançou vantagens d e E s p a n h a s e n ã o c o m a espada n a m ã o , sendo s e m p r e
necessário q u e p r i m e i r o escrevêssemos n a s feridas dos espanhóis as m e m ó r i a s d a
nossa justiça e q u e rubricássemos c o m seu sangue as razões d o nosso direito, c o m
o q u e , se Vosso P a d r e ponderasse b e m a m a t é r i a e olhasse p a r a as histórias d a s u a
m o n a r q u i a n ã o havia de se p e r s u a d i r q u e a b o a a m i z a d e e d u p l i c a d a aliança q u e
c o n s e r v a m as Majestades d e u m a e o u t r a C o r o a seriam causa de se a d i a n t a r e m n a
Corte d c M a d r i , n a p r e s e n t e c o n j u n t u r a , os nossos projetos, p o r q u e s e m p r e os
m a l o g r a m o s c o m E s p a n h a todas as vezes q u e n ã o b u s c a m o s o c a m i n h o d a s a r m a s .
P o r é m , sc v a m o s a falar v e r d a d e , Vosso P a d r e n ã o o l h a v a p a r a a utilidade
c o m u m d a C o r o a d e E s p a n h a m a s p a r a as conveniências particulares d a C o m p a -
n h i a ; olhava Vosso P a d r e p a r a o que esta perdia, e n ã o p a r a o q u e aquela g a n h a -
va; olhava, f i n a l m e n t e ^ n ã o p a r a o q u e se a u m e n t a v a à m o n a r q u i a d e E s p a n h a
m a s p a r a o q u e se diminuía à "república s o b e r a n a q u e a C o m p a n h i a , c o m título
f fl. 469v. ] de 'missões', conserva n o P a r a g u a i , c o m dez milhões / / dc r e n d i m e n t o , sessenta
mil h o m e n s e m c a m p o , disciplinados p o r "oficiais peritos q u e vossos p a d r e s tra-
z e m d a E u r o p a c o b e r t o s c o m a " r o u p e t a d c s a n t o I n á c i o , m a i s desvelados n a
disciplina m i l i t a r q u e n a cristã d o s índios, aos q u a i s vossos p a d r e s , e m vez d e
inflamar n a c a r i d a d e dos p r ó x i m o s , c r i a m n o ódio dos vizinhos, fazendo-os m o -
lestar c o m contínuas correrias, p a r a o q u e trazem s e m p r e n o c a m p o vários corpos
volantes d e cinco p a r a seis mil c o m b a t e n t e s , d o q u e t e m resultado fazerem os seus

Provas da história genealógica da Casa Real, tomo 2, página 128. 4

Monsieur Frézier, dans la relation de son voyage de la nier du Sud, tomo 2, pagina 469.-''

SOUSA, Antônio Caetano de. Provas de história genealógica da Cma Real portuguesa [...]. Lisboa Ociden-
tal: Oficina Silviana da Academia Real, 1739-1748.
FRÉZIER, Amédée François. Relation da voyage de la mer du Sad aux côtes du CMy e du Pérou. Fait
pendant les années 1712, 1713 e 1714 [...] Paris: Cbez Jean-Geoffroy Nyon, MDCCXVI [17.16].
vizinhos algumas e n t r a d a s nas suas missões n ã o p a r a p e r t u r b a r a s u a c r i s t a n d a d e
m a s p a r a castigar a sua insolência.
C o m q u e , p a d r e m e s t r e , n ã o nos q u e i r a v e n d e r "bulas, p o r q u e t o d o s s a b e -
m o s q u e aflição q u e a Vosso P a d r e e aos seus religiosos causa a alienação dessa
p a r t e das suas missões: n ã o era zelo d o espiritual, m a s a a m b i ç ã o d o t e m p o r a l dos
índios. Se n ã o , diga p a d r e m e s t r e , q u e d e t r i m e n t o p o d i a p a d e c e r a c r i s t a n d a d e
dos índios n e s t a t r a n s i ç ã o d o d o m í n i o ? P o d i a V o s s o P a d r e p r e s u m i r q u e u m a
n a ç ã o tão religiosa e p r o p a g a d o r a d a fé Como a p o r t u g u e s a , q u e n a s terras mais
incultas d a Ásia, Africa e A m é r i c a t e m feito p r o d u z i r a s e m e n t e evangélica tão
copiosas s e a r a s , n ã o c o n s e r v a r i a e a u m e n t a r i a as q u e os jesuítas e s p a n h ó i s t ê m
cultivado nas terras das suas missões? F a l t a r i a m , p o r v e n t u r a , religiosos p o r t u g u e -
ses d o m e s m o estatuto d e Vosso P a d r e q u e dirigissem essas missões s e m q u e os
índios e x p e r i m e n t a s s e m , n e m ainda alteração n o h á b i t o , e c o n o m i a dos seus mis-
sionários? N ã o faltariam, p o r c e r t o , m a i o r m e n t e n ã o sendo estas missões e n t r a -
n h a d a s nos sertões de A n g o l a ou n o pernicioso clima d e São T o m é , e a i n d a q u e
p o r a l g u m a s razões p a r t i c u l a r e s q u e j u l g o n ã o h a v e r i a se n ã o c o m e t e s s e a estes
religiosos a a d m i n i s t r a ç ã o destas missões, n ã o faltariam nas outras religiões v a r õ e s
d e espírito apostólico, d e b a i x o d e cuja a d m i n i s t r a ç ã o se c o n s e r v a r i a m os índios,
a i n d a que m a u s soldados, bons cristãos.
D i g a - m e a g o r a , Vosso P a d r e , c o m q u e r a z ã o ou justiça t i n h a m os seus p a d r e s
d e l i b e r a d o {se é c e r t o o q u e insinua n a sua carta) c o m o v e r os â n i m o s dos índios
p a r a q u e , sediciosos, conspirassem c o n t r a os reais "decretos, d e v e n d o vossos p a -
dres, c o m o imitadores d a perfeição cristã, serem os p r i m e i r o s q u e os persuadissem
a se sujeitar às o r d e n s do seu s o b e r a n o , ? p r o p o n d o - l h e s aquela a d m i r á v e l d o u t r i -
n a q u e o a p ó s t o l o são P a u l o d a v a aos romanos p a r a os conter na obediência e
sujeição d e seus príncipes, a i n d a q u a n d o tiranos, a qual santo Agostinho profun-
d a m e n t e explica e s a b i a m e n t e ilustra? M a s vossos p a d r e s m o s t r a m q u e t ê m d e
apóstolos o n o m e , m a s n ã o o espírito.
L a r g a m a t é r i a m e oferecia, Vosso P a d r e , neste lugar, p a r a e s t e n d e r a m i n h a
p e n a se o permitisse a b r e v i d a d e de u m a carta. C o n c l u o , pois,, esta c o m dizer a
V o s s o P a d r e q u e p o d e t o r n a r p a r a d o n d e veio, p o r q u e j á n ã o são necessárias as

Omnis anima potestatibus sublimioríbus súbdita sit. Non est eram potestas nisi a Deo; quae autem sunt, a
Deo ordinata sunt. Itaque qui resistit potestati, Dei ordinationi resistit; qui autem rcsistunt, ipsi
damnationem acquirunt Paulus, ad Rom., cap. 13, vide Divum Aug., can. 97, qui resistit, caus. 11, q. 3. fi

Que toda alma seja submissa às autoridades constituídas. Com efeito, não há autoridade que não
provenha de Deus, e as autoridades existentes foram estabelecidas por Deus. Assim, quem resiste à
autoridade resiste à ordenação estabelecida por Deus e os que a ela resistem atraem para si a
condenação. S. Paulo, Rom., cap. 13; vide Santo Agostinho, can. 97, "qui resistit", caus. 11, q. 3.
860

suas representações n a corte de M a d r i p a r a se desvanecer esta negociação, p o r q u e


[ íl. 470 ] a de Lisboa, p o n d e r a n d o m e l h o r as coisas, alcançou / / o q u a n t o a prejudicava o
p r e s e n t e t r a t a d o ; n e m a i n d a q u e se n ã o tivesse m u d a d o os projetos, c r e m o s n ã o
seriam a t e n d i d a s as suas razões, salvo se Vosso P a d r e , p a r a as fazer de peso, puses-
se d a sua p a r t e os motivos q u e , dizem, p a r a este efeito traz. D e u s g u a r d e a Vosso
P a d r e p o r m u i t o s anos etc.

• 133 «

[ fl. 471 ] Cópia de um papel feito por Antônio Pedro,


governador que foi da praça da Colônia [do Sacramento]

Invectiva contra a cessão da Colônia do Sacramento pelos


portugueses e, conseqüentemente, a perda do controle do estuá-
rio do rio da Prata e de sua navegação em troca de Sete Povos,
sob domínio espanhol, ponto central das negociações do Trata-
do de Madri entre as duas Coroas. C o m base n a sua experiência
corno governador da Colônia do Sacramento, deduz os prejuí-
zos comerciais advindos do contrabando espanhol via rio da Prata,
o acesso facilitado às regiões mineradoras, os riscos de u m a in-
vasão inglesa para controle da rota do Pacífico pelo cabo H o r n ,
nação até então aliada de Portugal e que teria interesses comer-
ciais prejudicados com o domínio espanhol. As críticas tinham
como alvo Alexandre d e Gusmão e a forma como vinha condu-
zindo as negociações.
Espectador da preparação e movimentação da missão de
negociação do tratado nos primeiros anos da década de 1750, o
ouvidor C a e t a n o d a Costa Matoso teve acesso ao documento
provavelmente naquele momento. Integrando u m grupo de docu-
mentos distantes do universo de temas relacionados a sua ativi-
dade de magistrado e m Minas Gerais, o documento ilustra o
interesse do súdito letrado, que se aproveita d a experiência no
ultramar para reunir informações sobre os sucessos da presença
portuguesa n a América.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Antônio P e d r o de Vasconcelos;
Lisboa; ca. 1750.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : O narrador constitui argumenta-
ção contra a entrega da Colônia do Sacramento à Goroa espa-
nhola, erigindo em tópica os prejuízos e as ameaças que resulta-
riam tal cessão. {JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á í í c o : Escrita m o d e r n a , cursiva do
século XVIII, regularizada e destrógrada. Apresenta maiúsculas
com volutas amplas e cheias; "f' de traço horizontal ascendente,
em voluta; o " t " e m dupla haste, com laçada n a base; uso de
cedilha e til. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir da
cópia impressa do documento e restringiram-se aos termos que
comprometiam o significado e o entendimento do texto, mantidas
as pequenas variantes e as supressões introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
BA, 54 - XIII - 16, fl. 152. Carta de Antônio Pedro de Vasconcelos
em que censura o tratado de limites de 1750.

BPE, cód. C V a fl.193.


1-5
Cópia impressa:
GUSMÃO, Alexandre de. Obras. 2. ed. São Paulo: Cultura, 1945.
p . 121-165. C o m comentários de Alexandre de Gusmão.

Q
u a n d o o nosso m u i t o a u g u s t o m o n a r c a , q u e S a n t a G l ó r i a haja, fez a
g r a n d e h o n r a d e m e e n t r e g a r e s p o n t a n e a m e n t e a m i n h a d i r e ç ã o o go-
v e r n o da N o v a C o l ô n i a do S a c r a m e n t o d o R i o d a P r a t a n o a n o d e 1 7 2 1 ,
^ e n t r e as mais expressões c o m q u e v o c a l m e n t e m e instruiu d o m o d o
c o m q u e era servido q u e eu procedesse nele, m e disse ser a q u e l a p r a ç a d e t a n t a
i m p o r t â n c i a aos interesses da sua C o r o a q u e pelo mais vantajoso equivalente n ã o
a largaria n u n c a a Castela.
A j u s t a n d o - m e eu c o m esta real m á x i m a , dispus s e m p r e n o t e m p o d a p a z a
sua c o n s e r v a ç ã o e a u m e n t o do t e r r e n o e d a g u e r r a a "defensa, d e m a n e i r a q u e
n u n c a p u d e s s e d a r aos castelhanos o gosto d e se a p o d e r a r e m dela, o q u e , m e d i a n -
te o auxílio d o c é u , consegui. M a s h a v e n d o - a d e i x a d o e m fevereiro d e 1749 a
m e u sucessor p e l a c a r t a credencial q u e a p r e s e n t o u , ouvi depois d e c h e g a r a Lis-
b o a q u e esta p r a ç a t ã o i m p o r t a n t e se a c h a p e l a oferta d e ( c e r t o s ! e q u i v a l e n t e
cedida p o r u m t r a t o à corte d e E s p a n h a .
P e r m i t a - m e , p o r a t e n ç ã o a o b e m c o m u m e d e b o m vassalo, a o u s a d i a d e
dizer. A d m i r o q u e u n s talentos d e t a n t a c a p a c i d a d e e perspicácia, c o m o os q u e
m a n e j a m esta negociação, deixassem de r e p a r a r q u e ao m e s m o t e m p o q u e Castela
p r e t e n d e fechar-nos u m a p o r t a p o r o n d e nos e n t r a a sua p r a t a lha deixemos aber-
ta p a r a e n t r e g a r o nosso o u r o e q u e e n t r e g u e m o s a chave m e s t r a dos nossos tesou-
ros a m e r i c a n o s n ã o só à E s p a n h a m a s às nações mais p o d e r o s a s n a m a r i n h a , c o m o
l ú g o direi.
862

Se h a v e m o s p r e v e n i d o Tdanol r e m o t o q u e p o d i a causar n o Brasil o estabele-


c i m e n t o dos franceses n a ilha d e F e r n a n d o d e N o r o n h a , ficando esta e m t a n t a s
[fl. 47 Iv. ] / / distâncias d a s u a costa, e expulsando-os constituímos nela u m "presídio p a r a
sua segurança, c o m o n ã o conservarmos c e r r a d a a p o r t a d a q u e até a g o r a foi chave
a N o v a Colônia, deixando c o m a sua e n t r e g a a b e r t o a o castelhano o c a m i n h o q u e
discorre direito a o c e n t r o d a q u e l e oculto *país d a N o v a C o l ô n i a , a e s t r a d a q u e
nele a b r i r a m pelo C u r i t i b a os condutores das cavalhadas do R i o G r a n d e d e São
P e d r o , precisas a o tráfico das M i n a s Gerais?
O u ç o aos q u e favorecem o p a r t i d o d a cessão q u e fazendo-a evitamos a guer-
r a q u e nos p o d e fazer u m vizinho p o d e r o s o , q u e n ã o se deve fazer despesa c o m
u m a p r a ç a q u e só serve de c a p a , q u e só serve p a r a r e b u ç a r o c o m é r c i o clandestino
e d e c o n t r a b a n d o , t ã o c o n t r á r i o aos t r a t a d o s antigos, e q u e e m equivalente d e u m
p a í s t ã o inútil n o s d ê e m o u t r o m a i s d i l a t a d o d e q u e p o d e r e m o s t i r a r m a i o r e s
conveniências.
A estas razões, c o n t r a as quais ocorre u m g r a n d e n ú m e r o d e respostas m u i t o
convincentes, r e s p o n d e só o m e u zelo q u e o equivalente q u e E s p a n h a nos p r o m e -
te n ã o c h e g a a ser m e t a d e d o t e r r e n o q u e nos t e m u s u r p a d o c o n t r a a "bula d o
p a p a A l e x a n d r e V I d o a n o d e 1694, Tcontra o T r a t a d o de S a r a g o ç a e c o n t r a o d e
Lisboal d e m a i o d e 1 6 8 1 , e m que, n ã o obstante a p o u c a v a n t a g e m q u ê os pleni-
potenciários dos portugueses s o u b e r a m tirar fde situaçãol tão propícia, só assenta-
r a m q u e u m a e o u t r a ficassem conservadas nos legítimos direitos q u e lhes p e r t e n -
cessem pelos justos títulos d a sua p r ó p r i a d e m a r c a ç ã o ; e q u e o negócio de c o n t r a -
b a n d o , c o m o nós n ã o somos o q u e o v a m o s fazer aos seus domínios, antes são eles
e s p a n h ó i s os m e s m o s os q u e v ê m c o m p r a r as m e r c a d o r i a s q u e t e m o s n a q u e l a
p r a ç a , e m q u a l q u e r o u t r a q u e formos estabelecer as irão buscar. E c o m o E s p a n h a ,
e m vez d e r e p r i m i r o c o n t r a b a n d o dos seus vassalos, nos q u e r " c o a r t a r a l i b e r d a d e
[ fl. 472 ] q u e / / v e n d a c a d a u m e m sua casa o q u e lhe sobra do seu p r o v i m e n t o , s e m p r e
descobrirá motivos q u e nos argüir d a m á observância do estipulado e m q u a l q u e r
lugar a q u e nos retiremos. Assim, fica sendo inútil l a r g a r m o s o q u e tão legitima-
m e n t e possuímos se depois n ã o evitarmos a g u e r r a deste vizinho p o d e r o s o , Tquel
e n t ã o o será m a i s , a l a r g a n d o o seu d o m í n i o e estreitando o d e Portugal.
O r a , l a r g a d a a C o l ô n i a e p o s t a esta fortaleza n a m ã o dos castelhanos n ã o só
a p e r d e m o s c o m o seu território m a s t a m b é m a nossa liberdade de n a v e g a r o rio
d a P r a t a , q u e até a g o r a , c o m o das A m a z o n a s , serviu d e m e t a d o d o m í n i o d e
P o r t u g a l n a A m é r i c a . A c e i t a n d o o m e s m o equivalente q u e nos p e r t e n c e pela de-
m a r c a ç ã o nossa, ficamos p e r d e n d o o direito q u e ela n o s d e u , e c o m este tácito
c o n s e n t i m e n t o s o m o s os m e s m o s q u e c o n v i m o s e m a b o l i r os a n t i g o s t r a t a d o s .
Estas são, logo, u m a s p e r d a s absolutas e certas. M a s segue-se-lhe o u t r a evidente, e
a m a i o r , e a m e u p a r e c e r infalível, a b s t r a i n d o - n o s de p o n d e r a r se são frijasl o u
maliciosas as intenções d e E s p a n h a : q u e s e g u r a n ç a nos fica d e q u e os novos h a b i -
tantes desta p r a ç a e território q u e deixamos, assim c o m o a sua cobiça os guiava até
863

a g o r a a vir b u s c a r nas m ã o s dos portugueses os gêneros q u e l e v a v a m a o dilatado


reino d o P e r u e Chile e província d o P a r a g u a i p a r a a d i a n t a r e m os seus interesses,
n ã o m e t e r ã o outros gêneros recebidos d e E s p a n h a p a r a os l e v a r e m p e l o c a m i n h o
q u e lhes deixamos a b e r t o e os c o m u t a r e m c o m o o u r o das nossas m i n a s , fazendo
d a q u e l a e s t r a d a u m c a n o p o r o n d e se extravagasse t o d a a s u a r i q u e z a , q u e n ã o
passa a Portugal senão p o r meio das m e r c a d o r i a s Tquel deste R e i n o se lhes m a n -
d a m ? E se os mineiros a c h a r e m / / conveniência nesta, q u e r e m é d i o se lhes p o d e [ fl. 47 2v. ]
d a r e m sertões tão dilatados? Q u a n t a s tropas serão precisas p a r a os impedir? S e m -
p r e i m p o r t a r á m a i s isto q u e o d i s p ê n d i o q u e se faz c o m a g u a r n i ç ã o d a N o v a
C o l ô n i a , que afirmo n ã o excede m u i t o de c e m mil "cruzados, entre a m a n u t e n ç ã o
e os soldos, pois os p a i s a n o s í h á m u i t o t e m p o l q u e se lhes n ã o assiste c o m To
misterl q u e só t i v e r a m d u r a n t e o sítio; e esta s o m a quase fica ressarcida c o m os
direitos q u e p a g a m nesta c i d a d e as suas alfandegas, e d o Brasil os g ê n e r o s q u e n a
m e s m a C o l ô n i a se i n t r o d u z e m , e nas vizinhanças d e B u e n o s Aires, o q u e certa-
m e n t e fica cessando; a l é m d e q u e s e m p r e se deve c o n s i d e r a r a m e s m a despesa,
e m fqualquerl p a r t e p a r a o n d e se m u d e a q u e l e presídio.

C o m o p a r a a segurança se deve considerar tudo, t a m b é m é digno de p o n d e r a r


que se alguma das nações mais poderosas na m a r i n h a , que sem escala no princípio
das r*monçõesl vão embocar ao cabo de H o r n p a r a entrarem n o m a r do Sul, intenta
estabelecer-se n o vantajoso sítio d a C o l ô n i a q u e largamos p a r a nela fazerem u m a
benfeitoria q u e lhes é tão precisa p a r a aquela navegação q u e facilmente se p o d e r á
conseguir e m qualquer r o m p i m e n t o que haja n a E u r o p a c o m Espanha. Q u e irreparável
d a n o nos fará aquela vizinhança, m a i o r m e n t e a inglesa, que sei eu n ã o a p e r d e de
vista! D e cujo estabelecimento se segue, p o r conseqüência, se h á de originar a descon-
fiança c o m u m aliado que p r o c u r a m o s e nos socorre e m toda a ocasião que E s p a n h a
p r e t e n d e oprimir-nos, v i n d o p o r este m o d o a perdê-lo e a p r o c u r a r p a r a suportar
nova guerra, a mais sensível q u e se h á d e atear n o Brasil, s e m termos, j á então, a
q u e m se recorra, por Tserl o inimigo o que até ali era defensor. E crível se figure que
h a v e n d o Ta n a ç ã o inglesai p e r d i d o aquele r a m o d e c o m é r c i o q u e e n t r e t i n h a p o r
nossa via o quererá / / restaurar no costumado contrabando, c o m o fazem por todas as [ fl. 4 7 3 ]
costas d a A m é r i c a espanhola, e c o m p r e e n d e n d o o u t r o pelo sertão c o m os nossos
mineiros, p o d e r á introduzir e m todo o Brasil os seus gêneros, que p o d e m largar p o r
preços a c o m o d a d o s que n e n h u m a conta façam nos seus habitantes as fazendas que
levam as "frotas do nosso R e i n o , de que a falta das fábricas que h á nele obriga a que
se c o m p r e m aos mesmos estrangeiros e c h e g a m carregadas dos direitos que p a g a m
Sua Majestade aqui e na América.

P o d e r - s e - m e - á n o t a r a confiança d e falar e m s e m e l h a n t e negociação s e m ser


p e r g u n t a d o , m a s eu e n t e n d o que j u s t a m e n t e p o d i a f o r m a r escrúpulo d e n ã o dis-
correr e m m a t é r i a de t a n t a i m p o r t â n c i a q u a n d o p o d e m valer estas razões às utili-
d a d e s d a m i n h a p á t r i a e aos interesses d a C o r o a do m e u s o b e r a n o e a c ô m o d o dos
seus vassalos.
• 134 <

[Carta de Marco Antônio de Azevedo Coutinho a


Gomes Treire de Andrade sobre navegação do rio Madeira]

Cópia sem valor documental de missiva em que o secretário


de Estado solícita a Gomes Freire de Andrade u m parecer a res-
peito da conveniência d a navegação ao longo do rio M a d e i r a ,
até ali proibida. Resgata os debates sobre o assunto que vinham
ocorrendo no Conselho Ultramarino, nos quais apareciam refle-
tidos o temor de que o Maranhão se despovoasse com o estabe-
lecimento das ligações fluviais com a região das minas e, p o r
outro lado, a necessidade de deter o avanço espanhol. Envia, e m
anexo, cópia da instrução remetida ao governador do M a r a n h ã o ,
J o ã o de Abreu Castelo Branco. F o r m a processo com os docu-
4 mentos 135, 136, 137.
j Integrando u m grupo de documentos distantes do universo
de temas relacionados à sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, este documento ilustra o interesse do súdito letrado, que
se aproveita da experiência no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa n a América.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : M a r c o Antônio de Azevedo
Coutinho; Lisboa; 15.9.1748.
D e s t i n a t á r i o : Gomes Freire de Andrade.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : D o c u m e n t o e m forma epistolar
contendo instruções administrativas (JPF).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, regulariza-
da e caligrafada, do tipo usual no período barroco. Utiliza o " C "
e o " e " copulativo em módulo maior que as demais letras; "f"
com dois olhos e traço horizontal ascendente, e m voluta. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir da
cópia impressa do documento e restringiram-se aos termos que
comprometiam o significado e o entendimento do texto, mantidas
as pequenas variantes e as supressões introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
USP/IEB, Coleção Lamego, 4 / a / 39. Noticias pertencentes à comuni-
cação do Mato Grosso com o Estado do Maranhão, 1748. Carta do secretá-
rio de Estado Marco Antonio de Azevedo Coutmho, datada de Lisboa a 15 de
setembro de 1748 dirigida a Gomes Freire de Andrade.
U S P / I E B , Coleção J . F. de Almeida Prado, 1,4,40.
BMMA, m s s / a / 4 1 . Notícias sobre a comunicação do Mato Grosso com o
Estado do Maranhão.
BNRJ, DiMss, 21,4,1.
865

Cópia impressa:
EXCERTOS do arquivo do Morgado de Mateus. Notícias per-
tencentes à comunicação do M a t o Grosso com o Estado dp
M a r a n h ã o . Anais da Biblioteca Nacional, R i o de J a n e i r o , v.
107, p. 43-44, 1987.

P ela c ó p i a inclusa d e u m a instrução q u e r e m e t o ao g o v e r n a d o r do E s t a d o d o


M a r a n h ã o e pelas relações e m a p a q u e a a c o m p a n h a m , v e r á Vossa S e n h o -
ria o q u e Sua Majestade e n c a r r e g a àquele " g o v e r n a d o r a respeito d a Tex-
p l o r a ç ã o l d o rio da M a d e i r a e os motivos q u e p e r s u a d i r a m a m a n d a r - s e fazer esta
[ fl. 4 7 4 ]

diligência. O o b j e t o tal q u e ela se e n c a m i n h a é d e tais c o n s e q ü ê n c i a s q u e faz


preciso t o d o o c u i d a d o e p r e v e n ç ã o , p o r é m deve atender-se a q u e o benefício q u e
p o r u m a p a r t e se p r o c u r a n ã o se julga c o n t r a p e s a d o c o m d e t r i m e n t o s graves p o r
outra parte.
N o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o se t e m h á m u i t o t e m p o p o r m á x i m a utilíssima
impedir a comunicação de quaisquer minas c o m o Estado do M a r a n h ã o p a r a
evitar q u e os m o r a d o r e s dele, atraídos pela a m b i ç ã o do o u r o , d e s a m p a r e m , c o m o
s u c e d e u e m S ã o P a u l o , a c u l t u r a dos frutos d a t e r r a , q u e n ã o é m e n o s sólida
riqueza p a r a u m estado e n a q u e l e deve ser mais a t e n d i d a , vista a preciosidade dos
seus g ê n e r o s .
C o n t u d o , p r e s e n t e m e n t e h á pareceres d e q u e deve p r e p o n d e r a r a esta consi-
d e r a ç ã o a circunstância, digo, a i m p o r t â n c i a de segurarmos a n a v e g a ç ã o do dito
r i o , q u e os espanhóis nos i n t e n t a m u s u r p a r , e p o r meio dela e d a c o m u n i c a ç ã o d o
P a r á a c r e s c e n t a r m o s às nossas forças n o sertão do M a t o Grosso, d e m a n e i r a q u e ,
e m lugar d e r e c e a r m o s a s u p e r i o r i d a d e d e q u e agora g o z a m os castelhanos pelo
n ú m e r o de "gentio q u e t ê m nas aldeias dos M o x o s e Chíquítos, sejam eles os q u e
t e n h a m q u e t e m e r d a nossa, p e l a diferença das e m b a r c a ç õ e s c o m q u e p o d e m o s
n a v e g a r e pelo concurso d a gente p o r t u g u e s a p a r a aqueles sertões e fácil t r a n s p o r -
te, d e a r m a s e m u n i ç õ e s d e t o d a a sorte.
N ã o h á d ú v i d a que p a r a este fim n o s d e u a Providência notável c o m o d i d a d e
p o r m e i o d a q u e l a n a v e g a ç ã o , pois / / c o m o uso dela as terras d e M a t o Grosso e [ fl. 474v. ]
C u i a b á , q u e hoje c o n s i d e r a m o s c o m o p o s t a s p a r a nós n o fim d o m u n d o pelas
dificuldades do seu acesso, ficariam sendo m u i t o mais c ô m o d a s p a r a as " c o n d u -
ções do q u e Goiás e a i n d a as m e s m a s M i n a s Gerais. E p o r este princípio p o d e m o s
lograr n a q u e l e s sertões g r a n d e s v a n t a g e n s sobre os e s p a n h ó i s , visto q u e as suas
m i s s õ e s s o b r e d i t a s , q u e c o n o s c o c o n f i n a m e d i s t a m a m a i s d e c e m "léguas d e
C h u q u i s a c a e do Potosí, t ê m a c o m u n i c a ç ã o c o m aquelas cidades, e m u i t o mais
c o m outras do Peru, tão i n t e r r o m p i d a c o m a invencível aspereza das serranias dos
A n d e s q u e n u n c a será possível aos m o r a d o r e s d a q u e l a s missões e d e S a n t a C r u z
866

de la Sierra fazerem paralelo c o m as forças q u e a n a v e g a ç ã o das A m a z o n a s e da


M a d e i r a nos p o d e m facilitar n o M a t o Grosso,
È S u a M a j e s t a d e servido q u e , p o n d e r a n d o Vossa S e n h o r i a c o m a m a i o r re-
flexão este i m p o r t a n t e negócio, e n t r e p o n h a sobre ele o seu p a r e c e r , e q u a n d o este
seja d e q u e a d i t a c o m u n i c a ç ã o se i n t r o d u z a e q u e p o d e r á h a v e r p r e j u í z o e m
d e m o r á - l a , V o s s a S e n h o r i a a n i m e a ela os m o r a d o r e s d e M a t o G r o s s o , p r e s c r e -
vendo-lhes, p o r é m , as m e s m a s cautelas a p o n t a d a s n a instrução d a d a a o governa-
d o r do M a r a n h ã o e as m a i s q u e a V o s s a S e n h o r i a p a r e c e r e m convenientes, até
q u e o m e s m o s e n h o r d e t e r m i n e nesta m a t é r i a o q u e p a r e c e r mais útil a o seu real
serviço. D e u s g u a r d e a Vossa Senhoria. Lisboa, 15 d e s e t e m b r o d e 1748.

S e n h o r G o m e s Freire d e A n d r a d e M a r c o Antônio de Azevedo Coutinho

• 135 <

[Carta de Marco Antônio de Azevedo Coutinho a João de Abreu


Castelo Branco sobre navegação do rio Madeira]

Cópia sem valor documental de resposta à carta de J o ã o de


Abreu Castelo Branco sobre o acesso de sertanistas às minas dos
Arinos, estimulando que seja feito pelo rio Madeira. Manifesta-se
aqui o interesse metropolitano no controle d a navegação deste
rio. Após breve apresentação, o texto procura instruir o governa-
dor do M a r a n h ã o a respeito da importância daquela via d e na-
vegação, divulgando os relatos das expedições aí ocorridas que
t r a t a m de minas de ouro recém-descobertas, da expansão de
missões religiosas espanholas e da possibilidade de ocorrência
de disputas entre portugueses e espanhóis.
Centrando-se nas apreensões em torno do avanço espanhol
através das missões religiosas ao longo dos rios d a região, em
u m segundo m o m e n t o o texto é a c o m p a n h a d o de recomenda-
ções a respeito das ações que deveria tomar o governador, den-
tre elas o controle da navegação do rio M a d e i r a até M a t o Gros-
so e o isolamento das missões espanholas. Deveria, finalmente,
proceder secretamente ao envio de expedição através do rio
Madeira até Mato Grosso em que fosse preparada u m a relação
d a viagem com maiores detalhes sobre a situação ao longo do
rio. E m anexo, duas notícias de comunicação do M a t o Grosso
com o M a r a n h ã o pelo rio Madeira. Forma processo cpm os do-
cumentos 134, 136, 137.
867

Integrando u m grupo de documentos distantes do universo


de temas relacionados à sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, o documento (que pode ter sido recolhido pelo compila-
dor do Códice logo após sua passagem pelo R i o de J a n e i r o em
janeiro de 1749) ilustra o interesse do súdito letrado, que se apro-
veita da experiência no ultramar para reunir informações sobre
os sucessos d a presença portuguesa n a América.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : M a r c o Antônio de Azevedo
Coutinho; Lisboa; 15.9.1748.
D e s t i n a t á r i o : J o ã o de Abreu Castelo Branco.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : D o c u m e n t o e m forma epistolar
contendo instruções administrativas (JPF).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna, regulariza-
da e caligrafada, do tipo usual no período barroco. Utiliza o " C "
e o " e " copulativo em módulo maior que as demais letras; "f"
com dois olhos e traço horizontal ascendente, e m voluta. (YDL)
Critérios e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir d a
cópia impressa do documento e restringiram-se aos termos que
comprometiam o significado e o entendimento do texto, mantidas
as pequenas variantes e as supressões introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
U S P / I E B , Coleção L a m e g o , 4 / a / 3 9 . Notícias pertencentes à co-
municação do Mato Grosso com o Estado do Maranhão, 1748. Carta
do secretário de Estado Marco Antonio de Azevedo Coutinho, datada
de Lisboa a 15 de setembro de 1748, dirigida a Gomes Freire de
Andrade.
U S P / I E B , Coleção J. F. de Almeida Prado, 1,4,40.
B M M A , m s s / a / 4 1 . Notícias sobre a comunicação do Mato Grosso
com o Estado do Maranhão.
BNRJ, DiMss, 21,4,1.
Cópia impressa:
E X C E R T O S do arquivo do Morgado de Mateus. Notícias per-
tencentes à comunicação do Mato Grosso com o Estado do
M a r a n h ã o . Anais da Biblioteca Nacional, R i o de J a n e i r o , v.
107, p. 45-48, 1987.

C ó p i a p a r a o "governador e capitão-general do Estado do M a r a n h ã o [ A. 4 7 5 ]

E m c a r t a d e 26 d e s e t e m b r o do a n o p a s s a d o , d e u Vossa S e n h o r i a c o n t a q u e
b a i x o u a esta c i d a d e do P a r á J o ã o d e Sousa, depois d e a n d a r dois a n o s c o m os
outros sertanejos n o d e s c o b r i m e n t o das m i n a s dos Arinos, o n d e a c h a r a m o u r o e m
várias p a r t e s , m o s t r a n d o - s e pelas informações q u e estas m i n a s p o d e m distar do
a r r a i a l d o M a t o G r o s s o d e z dias p o r c a m i n h o d i r e i t o . E c o m o o dito J o ã o d e
868

S o u s a e seus c o m p a n h e i r o s p r e t e n d i a m voltar p a r a a q u e l a s m i n a s p e l o rio dos


T a p a j ó s , p o r o n d e t i n h a m descido, desejava Vossa S e n h o r i a saber se S u a Majes-
t a d e levava a b e m q u e p o r aquele rio se desse c o m u n i c a ç ã o àquelas m i n a s .
N ã o t e m Sua Majestade p o r conveniente q u e pelo dito rio dos Tapajós, n e m
p o r algum outro dos q u e descem dos distritos de C u i a b á e Goiás, se a b r a comunica-
ção p a r a a capitania do P a r á , P o r é m , a t e n d e n d o a alguns fins q u e se c o n s i d e r a m
m u i t o i m p o r t a n t e s a o real serviço n a exploração do rio d a M a d e i r a , h á p o r b e m
o r d e n a r q u e os sobreditos se recolham p a r a as minas dos Arinos, subindo pelo dito
rio d a M a d e i r a até o arraial d o M a t o Grosso, d o n d e p o d e r ã o facilmente transpor-
tar-se àquelas m i n a s c o m m e n o s i n c ô m o d o , p o r ser o dito rio dos Tapajós e m b a r a -
ç a d o c o m muitas cachoeiras, o q u e p a r e c e n ã o encontra n o d a M a d e i r a , p o r correr
quase sempre p o r terras chãs. P o r é m , este transporte n ã o p e r m i t e Sua Majestade se
faça à discrição dos ditos mineiros, senão c o m todas as cautelas q u e abaixo explica-
rei a Vossa Senhoria.
P a r a q u e Vossa Senhoria e n t e n d a m e l h o r o motivo delas, é preciso q u e eu lhe
[ fl. 475v. ] p a r t i c i p e algumas notícias q u e se t ê m a l c a n ç a d o pela / / p a r t e d o M a t o Grosso e
p r o v a v e l m e n t e se i g n o r a m o n d e Vossa S e n h o r i a reside.
Por várias confrontações está averiguado q u e o rio q u e d e s e m b o c a nas A m a -
zonas c o m o n o m e d a M a d e i r a é o m e s m o q u e passa p e l a e x t r e m i d a d e das mis-
sões d e jesuítas espanhóis, q u e c h a m a m dos M o x o s , o n d e lhe d ã o o n o m e d e rio
d e S ã o M i g u e l , e ali r e c e b e o u t r o rio g r a n d e , c h a m a d o M a m o r é , q u e v e m d a
cordilheira dos A n d e s e passa p o r S a n t a C r u z de la Sierra. C o n t i n u a n d o o m e s m o
rio d a M a d e i r a a c i m a , digo, m a i s a c i m a , lhe d ã o os nossos sertanejos d e M a t o
Grosso o n o m e d e G u a p o r é , e r o d e a n d o o arraial d e M a t o Grosso d á volta p a r a
os m o n t e s dos Parecis, o n d e nasce entre o C u i a b á e o M a t o Grosso.
Este rio d a M a d e i r a é p a r a nós, hoje, mais c o n h e c i d o d a p a r t e d e c i m a até as
missões dos M o x o s d o q u e d a p a r t e d e b a i x o , s e m e m b a r g o d e ser n e s t a p a r t e
o c u p a d o c o m missões dos nossos jesuítas do P a r á . P o r é m , até a g o r a n ã o houve a
c u r i o s i d a d e de se r e m e t e r e m n e m m a p a , n e m r e l a ç ã o disso m e s m o q u e o c u p a -
m o s , e m u i t o m e n o s d o q u e fica p a r a c i m a . S a b e - s e , c o n t u d o , q u e j á a l g u m a s
vezes f o r a m portugueses do rio das A m a z o n a s c o m "canoas d e voga e saveiros até
as missões dos M o x o s , q u e é o q u e basta p a r a constar q u e até o M a t o Grosso se
p o d e n a v e g a r c o m a m e s m a c o m o d i d a d e , pois dos m o u x o s p a r a c i m a n ã o t e m
embaraço algum.
Isto p e r c e b a V o s s a S e n h o r i a m e l h o r p e l a r e l a ç ã o q u e lhe r e m e t o d e d u a s
n a v e g a ç õ e s q u e fizeram alguns sertanejos de M a t o Grosso e m 1742 e e m 1 7 4 3 ,
d e s d e a q u e l e a r r a i a l até a foz do M a m o r é , d a q u a l se c o n j e c t u r a q u e p o d e r ã o
distar até as primeiras aldeias dos nossos jesuítas c i n q ü e n t a o u sessenta "léguas.
[ fl. 4 7 6 ] A vista da dita relação e d e u m m a p a m u i t o imperfeito / / q u e veio c o m ela,
se f o r m o u este q u e r e m e t o a Vossa S e n h o r i a p a r a m e l h o r inteligência do q u e lhe
digo nesta carta.
869

As aldeias dos M o x o s , consta q u e são n u m e r o s a s d e "gentio, p o r é m t ã o re-


m o t a s d o P e r u e a i n d a d e C h u q u i s a c a e d o Potosí e c o m a m e d i a ç ã o d e tais
s e r r a n i a s q u e p o u c a assistência p o d e m r e c e b e r dos e s p a n h ó i s . E s t ã o e m t e r r a s
baixas e alagadiças, e c o m o n a q u e l a s v i z i n h a n ç a s se n ã o d e s c o b r i r a m a t é a g o r a
metais n ã o t ê m coisa q u e convide os m e s m o s espanhóis a c o n c o r r e r e m p a r a a q u e -
la p a r t e .
N a relação q u e r e m e t o , v e r á Vossa S e n h o r i a q u e os jesuítas castelhanos d a mis-
são d e São M i g u e l t a n t o q u e v i r a m os nossos sertanejos de M a t o Grosso n a v e g a r e m
p o r a q u e l e rio abaixo v i e r a m p l a n t a r o u t r a missão defronte, c h a m a d a d e S a n t a R o s a ,
e c o m isto p r e t e n d e r a m apossar-se do m e s m o rio, d e c l a r a n d o aos nossos q u e tor-
n a r a m n o a n o seguinte q u e Jhes n ã o era lícita a q u e l a n a v e g a ç ã o . E c o n s t a p o r
c a r t a s d o C u i a b á q u e i n d o depois alguns dos nossos às m e s m a s aldeias nelas os
a ç o i t a r a m e m a l t r a t a r a m m u i t o p a r a q u e n ã o t o r n a s s e m , d i z e n d o ter p a r a isso
o r d e m d o g o v e r n a d o r ou c o r r e g e d o r de S a n t a C r u z de la Sierra.
A este intento d e n o s p r i v a r e m d a n a v e g a ç ã o livre do rio d a M a d e i r a , n a s -
c e n d o ele e a c a b a n d o e m terras nossas, acresce a consideração do perigo q u e h á :
q u e os m o r a d o r e s d a n o v a missão d e S a n t a R o s a d e s c o b r i r a m n a q u e l a v i z i n h a n ç a
m i n a s d e o u r o q u e a t r a í r a m c o n c u r s o d e gente e s p a n h o l a d e C h u q u i s a c a e d o
Potosí, e isto n ã o só lhes d a r i a maiores forças p a r a sustentarem a sobredita p r e t e n -
são m a s o c a s i o n a r i a , e m b r e v e s t e m p o s , e n c o n t r o s dos nossos m i n e i r o s c o m os
castelhanos e disputas / / p e s a d a s sobre o domínio das terras adjacentes. Fortifica- [ fL 476v. ]
se este receio observando-se q u e e m u m ribeiro a dez dias a c i m a d a missão d e
S a n t a R o s a e d a m e s m a p a r t e descobriram, j á os nossos, ouro; e as m e s m a s m i n a s
dos Arinos, e das T r ê s Barras se conjectura q u e ficam p o r detrás d a q u e l a missão, a
n ã o m u i t a distância.
S u p o s t o o q u e deixo explicado, tem-se p o r necessário e c o n v e n i e n t e n ã o só
a p o s s a r m o - n o s d a n a v e g a ç ã o do rio d a M a d e i r a até o M a t o Grosso m a s t o m a r -
m o s a t e m p o as m e d i d a s p a r a q u e a dita n o v a missão e s p a n h o l a nos n ã o cause os
prejuízos q u e p o d e m o s recear, o u p r o c u r a n d o os meios p a r a a tirar dali s e m es-
c â n d a l o ou r o d e a n d o - a e m a l g u m a d i s t â n c i a c o m h a b i t a ç õ e s e " s e s m a r i a s dos
nossos, de sorte q u e se n ã o possam os castelhanos alargar n e m t e n t a r outros esta-
belecimentos da p a r t e oriental d o rio d a M a d e i r a . E talvez virá a ser conveniente,
p a r a este efeito, permitir-se e freqüentar-se a c o m u n i c a ç ã o do P a r á c o m o M a t o
Grosso p o r a q u e l e rio.
P o r é m , c o m o p a r a se t o m a r u m a ajustada resolução nesta m a t é r i a é preciso
p r e c e d e r e m m a d u r o s e x a m e s e explorações, é Sua M a j e s t a d e servido q u e V o s s a
S e n h o r i a escolha a pessoa m a i s p r u d e n t e e c a p a z q u e aí a c h a r , e c o m u n i c a n d o -
lhe debaixo d e segredo t u d o o q u e lhe deixo referido, lhe e n c a r r e g u e o m a n d o e
i n c u m b ê n c i a desta e x p l o r a ç ã o , que fará e m u m a ou d u a s "canoas d e voga, a r m a -
das d e sorte q u e n ã o possam recear insulto n e m das canoas das aldeias e s p a n h o -
las, n e m das d e alguns índios bravos q u e se e n c o n t r a m pelo m e s m o rio.
870

D e v e V o s s a S e n h o r i a o r d e n a r a este *cabo q u e nas últimas aldeias dos nos-


sos j e s u í t a s d o M a d e i r a t o m e m a n t i m e n t o s p a r a m ê s e m e i o , q u e o m a i s q u e
[ fl. 4 7 7 ] p o d e r á d u r a r a v i a g e m dali / / até as nossas p o v o a ç õ e s do M a t o G r o s s o , e q u e
e n q u a n t o p a s s a r e m pelo distrito das aldeias e s p a n h o l a s d o s M o x o s n ã o t o m e m
terra e m p a r t e a l g u m a , e n e m depois de saírem Tdasl dos nossos jesuítas a d m i t a m
p r á t i c a d e c a n o a a l g u m a dos p a d r e s d a C o m p a n h i a c a s t e l h a n o s o u d e índios,
sejam m a n s o s ou bravos, n e m consintam q u e c h e g u e m a seu b o r d o , p a r a assim se
evitar q u e d e a l g u m m o d o p e n e t r e m os jesuítas e s p a n h ó i s o fim d a e x p e d i ç ã o ,
n e m s a i b a m d o n d e p a r t i u ou p a r a q u e p a r t e foi m a n d a d a , è isto m e s m o se deverá
observar no retorno.
A o m e s m o c a b o e n c a r r e g a r á V o s s a S e n h o r i a q u e faça u m a m u i t o individual
relação d a sua viagem, o b s e r v a n d o e a p o n t a n d o c o m t o d a a m i u d e z a os rios, m o n t e s
e planícies de u m a e o u t r a p a r t e do rio da M a d e i r a , os r u m o s a q u e ele correr, as
situações das aldeias, t a n t o nossas c o m o espanholas, e o q u e se p u d e r conjecturar
d a sua força e n ú m e r o d e gente. E será conveniente q u e n a comitiva haja a l g u m a
pessoa q u e saiba todos os dias t o m a r a altura, e n a m e s m a c o m p a n h i a p o d e r ã o ir
os ditos m i n e i r o s dos Arinos p a r a ficarem no M a t o Grosso, e dali p a s s a r e m ao seu
descobrimento.
C h e g a d a a expedição ao M a t o Grosso, recolherá o c a b o as notícias q u e a c h a r
d o e s t a d o d a q u e l a s m i n a s e d a s d e C u i a b á , e t o d a s as q u e p u d e r ajuntar
c o n c e r n e n t e s às missões e s p a n h o l a s e aos novos d e s c o b r i m e n t o s dos nossos m i -
n e i r o s . E c o m p o u c o s dias d e d e m o r a n a q u e l e a r r a i a l , refazendo-se dos m a n t i -
m e n t o s necessários até as nossas aldeias, t o r n a r á a descer e se recolher a o P a r á
c o m a m a i o r b r e v i d a d e possível.
As notícias q u e t r o u x e r e m c o m u n i c a r á V o s s a S e n h o r i a c o m o *bispo q u e
a g o r a vai p a r a o P a r á , e a m b o s e x p o r ã o a S u a Majestade o seu j u í z o a respeito d e
t u d o o q u e a c i m a fica explicado, e Vossa Senhoria o r e m e t e r á a esta C o r t e c o m as
m e s m a s notícias e relações p e l a ocasião m a i s p r o n t a q u e p u d e r , p a r a q u e S u a
[ fl. 4 7 7 v . ] M a j e s t a d e resolva o q u e tiver / / p o r mais c o n v e n i e n t e a o seu real serviço. M a s
e m t o d o este negócio deverá V o s s a S e n h o r i a observar, c o m todas as m a i s pessoas,
exato segredo, p r e t e x t a n d o a ocasião, digo, a expedição c o m o fim d e restituir aos
m i n e i r o s a o seu distrito e r e c o m e n d a n d o a o c a b o q u e a n i n g u é m c o m u n i q u e o
v e r d a d e i r o objeto d a sua v i a g e m . D e u s g u a r d e a V o s s a S e n h o r i a . Lisboa, 15 de
s e t e m b r o d e 1748.

M a r c o Antônio de Azevedo Coutinho


• 136 <

Verdadeira notícia que deu Francisco Leme do Prado do que


passou, viu e experimentou na viagem que fez destas minas do
Mato Grosso pelo rio abaixo às missões dos padres da Companhia
[de Jesus] do reino de. Castela, a que chamam Moxos, cujas
pertencem à província da cidade de Lima, indo por companheiros
Manuel Félix de Lima, Joaquim Ferreira Chaves, Vicente Pereira
de Assunção, Manuel de Freitas Machado, Mateus Correia Leme e
João dos Santos Werneck, paragens por onde não consta andasse
pessoa portuguesa

Relação das duas expedições realizadas a partir de j u n h o


de 1742 pelo paulista Francisco Leme do Prado, acompanhado
n a primeira delas pelo português Manoel Félix de Lima, que
partem de Mato Grosso em busca da riqueza das minas do rio
Madeira e do estabelecimento de relações comerciais com a mis-
são dos Moxos. Buscavam oportunidades econômicas, mas, so-
bretudo, reconhecer a exata posição dos estabelecimentos missi-
onários espanhóis e as possibilidades de interligações através da
rede hidrográfica existente no interior da América portuguesa.
Este d o c u m e n t o a c o m p a n h a i n s t r u ç ã o a o g o v e r n a d o r do
M a r a n h ã o , servindo p a r a subsidiar seu conhecimento sobre as
condições e importância do rio Madeira. F o r m a processo com
os documentos 134, 135 e 137
A "Primeira viagem" transcorre entre j u n h o de 1742 e janei-
ro de 1743. O relato descreve seus afluentes, arraiais e evidências
de ocorrência de ouro. Preocupa-se primordialmente em apontar
o estado das diversas missões espanholas ali existentes com descri-
ção de sua infra-estrutura (economia, religião, militar, padres res-
ponsáveis, n ú m e r o de índios e suas características). Registra a
separação de parte da expedição: Francisco Leme do Prado retorna
a Mato Grosso em janeiro de 1743 e Manoel Félix de Lima e
acompanhantes seguem através do rio Madeira até alcançar Belém
em ca. de fevereiro do mesmo ano, sendo este o primeiro portu-
guês a completar integralmente o roteiro através de rios entre Mato
Grosso e Pará.
A "Segunda viagem", realizada entre de março e maio de
1743, seguindo a mesma rota da viagem anterior, parece buscar
atualizar e complementar as primeiras informações conseguidas.
Vive alguma hostilidade no encontro com os padres da rrússâo de
Santa Rosa, instalada h á poucos meses n a margem oeste do rio
Madeira, que os proíbe de seguir adiante. Descreve aspectos em
torno da economia e condições de defesa da missão de Exaltação
de Santa Cruz.
Estas peças documentais integrariam o acervo de informa-
ções sobre regiões da América em disputa com a Espanha, que,
mais tarde, a partir de 1746, subsidiaria a preparação do Trata-
do de Madri. O modo de apresentação e a natureza das infor-
mações apresentadas sugerem que a preparação deste documen-
to viesse a t e n d e r d e m a n d a do secretário real, Alexandre de
G u s m ã o , que, através de levantamento de d o c u m e n t o s e de
inquéritos solicitados a funcionários e colonos sobre aspectos
geográficos, históricos, etnográficos e econômicos das regiões
em litígio com a Espanha, reunia elementos para as negociações
a favor de Portugal.
Integrando u m grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados a sua atividade de magistrado e m Minas
Gerais, este documento ilustra o interesse do súdito letrado, que
se aproveita da experiência no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa n a América.
Autoria, l o c a l e data: J o ã o Gonçalves Pereira; Cuiabá,
?.9.1743.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato de viagem em que preva-
lecem detalhes geográficos e demográficos, repetindo-se a se-
qüência descritiva do percurso de u m a localidade a outra, carac-
terísticas da missão jesuítica visitada e considerações sobre seus
p a d r e s . R e t o r i c a m e n t e , suas descrições constituem-se c o m o
ecfrase. Segundo Rafael Bluteau, "descrição" é "definição im-
perfeita. Representação ou pintura de alguma cousa com pala-
vras" {Vocabulário português e latino [....] Coimbra: Colégio das Artes
da Companhia de Jesus, 1713. V . 3, p. 115). (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, regulariza-
da e caligrafâda, do tipo usual no período barroco. Utiliza o " C "
e o " e " copulativo e m módulo maior que as demais letras; "f"
com dois olhos e traço horizontal ascendente, em voluta. (YDL)
C r i t é r i o s e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir da
cópia impressa do documento e restringiram-se aos termos que
comprometiam o significado e o entendimento do texto, mantidas
as pequenas variantes e as supressões introduzidas pelo copista.
Cópias manuscritas:
U S P / I E B , Coleção Lamego, 4 / a / 3 9 . Notícias pertencentes à co-
municação do Mato Grosso com o Estado do Maranhão, 1748. Carta
do secretário de Estado Marco Antonio de Azevedo. Coutinho, datada de Lis-
boa a 15 de setembro de 1748, dirigida a Gomes Freire de Andrade.
U S P / I E B , Coleção J . F. de Almeida Prado, 1,4,40.
873

BMMA, m s s / a / 4 1 . Notícias sobre a comunicação do Mato Grosso com o


Estado do Maranhão.
BNRJ, DiMss, 21,4,1.
Cópias impressas:
E X C E R T O S do arquivo do Morgado de Mateus. Noticias per-
tencentes à comunicação do Mato Grosso com o Estado do
M a r a n h ã o . Anais da Biblioteca Nacional, R i o de J a n e i r o , v.
107, p. 49-55, 1987.
C O R T E S Ã O , J a i m e . Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madri
(1695/1735). Rio de Janeiro: Ministério das Relações Exteri-
ores, 1950. V. 1, p. 52-80.

Primeira viagem

[ I j Saiu o dito Francisco L e m e do P r a d o e c o m p a n h e i r o s a c i m a n o m e a d o s


destas m i n a s sem mais notícia q u e a d e supor-se n ã o ficariam m u i t o distantes as
missões dos M o x o s , e m r a z ã o d e estarem tão p e r t o as dos C h i q u i t o s . E assim, às
cegas, foi s e g u i n d o sua " d e r r o t a pelo rio c h a m a d o S a r a r é ; e p a s s a d o s dois dias
saiu a o de G u a p o r é , o n d e fica o p o r t o d a Pescaria; e i n d o p o r ele abaixo viu, à
m ã o direita, u m ribeirão, c h a m a d o Galera, cujo n o m e lhe p u s e r a m os sertarústas
q u e / / por terra andaram; mais abaixo, outro chamado Capivari; e da parte es- [ft. 4 7 8 ]
q u e r d a , p a s s a d o esse, u m a ilha encostada à p a r t e direita, defronte d a q u a l , p a r a a
p a r t e e s q u e r d a , fica o rio V e r d e , do q u e se n ã o vê a b a r r a senão c o s t e a n d o pelo
b a r r a n c o d a m e s m a p a r t e , p o r q u e c o s t e a n d o pela p a r t e direita n ã o se p o d e ver,
p o r q u e a e n c o b r e a dita ilha.
2 R o d a n d o mais a b a i x o fica u m s a n g r a d o u r o à m ã o direita e, m a i s a b a i x o ,
o u t r o d a m e s m a p a r t e , p o r cuja b a r r a se e n t r a e vai o rio a c i m a p a r a a c o n q u i s t a
que descobriram Antônio de Almeida e Morais é Tristão da C u n h a Gago, don-
d e t r o u x e r a m m o s t r a s d e o u r o , e d o nosso p o r t o d a Pescaria a esta b a r r a são sete
"léguas, digo, dias d e v i a g e m ; m a i s a b a i x o se costeia a p o n t a d a serra q u e fica d a
p a r t e e s q u e r d a defronte d a c h a p a d a de S ã o Francisco X a v i e r , nosso arraial; m a i s
a b a i x o , c i n c o dias d e v i a g e m , se d á n o distrito d o " g e n t i o b á r b a r o d e n a ç õ e s
g u a r a i u s e c o r u m u s ; i n d o m a i s dois dias a b a i x o está u m a ilha q u e e m passá-la se
g a s t a m dois dias, e t o d o este distrito dos q u a t r o dias é d o dito g e n t i o , e n t r e o
q u a l t i v e r a m sustos p e l a s a b a l r o a d a s q u e lhes d e u o dito gentio, nas q u a i s n ã o
p e r i g o u p e s s o a a l g u m a , e d a n d o - l h e o dito L e m e a l g u m a s dádivas p a s s a r a m s e m
moléstia.
3 P a s s a d o o dito distrito, a o c a b o d e seis dias, a h o r a s d e p o u s o , v i r a m d a
p a r t e direita u m a cruz d e seis "palmos de altura c o m t e r r e n o l i m p o , e fazendo nele
pouso se alegrou p o r supor estar p e r t o das missões, e i n d o n o dia seguinte c o m a
874

m e s m a "derrota, pelas o n z e h o r a s do dia, avistou seis canoas de índios, c o m cinco


o u seis e m c a d a c a n o a , e logo d e longe a c e n o u c o m u m lenço b r a n c o , p o r estar
[ fl. 478v. J a i n d a distante deles, os quais a t o d o o r e m a r / / i a m fugindo, à vista do q u e fez a
diligência p a r a os alcançar, e c o m efeito o conseguiu a o e n t r a r p o r u m riacho, e
falando-lhes h ã o se e n t e n d i a m , p o r n ã o e n t e n d e r e m o nosso i d i o m a n e m o dito
L e m e 0 deles; só o u v i u d i z e r a u m " S ã o M i g u e l " , d a n d o c o m a m ã o p a r a rio
a b a i x o , o n d e e n t e n d e u serem aqueles índios da m i s s ã o d e S ã o M i g u e l , e e n t r a -
r a m p o r u m riacho, e o dito L e m e seguindo p a r a baixo, digo, seguiu p a r a baixo
c o m b o a s e s p e r a n ç a s ; e a n d a n d o mais d u a s h o r a s avistou o u t r a c a n o a , e m q u e
v i n h a m cinco índios, e f a z e n d o - a p a r a r conversou c o m eles p o r acenos, p o r lhe
n ã o e n t e n d e r e m a língua, p e r g u n t a n d o - l h e s se ficava longe ou p e r t o a missão d e
São Miguel, a o q u e r e s p o n d e u u m , p o r m o d o "gentílico, q u e era dia e m e i o de
v i a g e m , e d a n d o - l h e o dito L e m e u m a "vara d e fita e M a n u e l Félix u m a faca
flamenga os ditos índios lhe foram servir de guia. E, c o m efeito, e n t r o u essa t a r d e
pela b a r r a q u e fica à m ã o e s q u e r d a e c h e g a r a m à missão d e S ã o M i g u e l no dia
seguinte, pelas q u a t r o h o r a s d a t a r d e ; e c h e g a n d o a o p o r t o escreveu aos p a d r e s
pedindo-lhes licença p a r a lhes falar. E s e m r e p u g n â n c i a o m a n d a r a m e n t r a r e a
seus c o m p a n h e i r o s , e veio u m p a d r e d a C o m p a n h i a [de Jesus] p o r n o m e G a s p a r
do P r a d o , n a t u r a l d e A l e m a n h a , j á v e l h o , m i s s i o n á r i o d e s t a m i s s ã o , e a t o d o s
l e v o u p a r a d e n t r o dos "claustros d e l a m a n d a n d o r e p i c a r os sinos c o m n o t á v e l
alegria, e n o dia seguinte c a n t o u missa a N o s s a S e n h o r a d i z e n d o e r a pelo b o m
sucesso d e sua viagem; e esteve nesta missão q u a t r o dias p o r rogos d o dito p a d r e ,
nos quais h o s p e d o u a todos c o m m u i t a alegria e g r a n d e z a d e comestíveis.

4 E s t a missão t e m q u a t r o mil índios, u s a m de arco e flecha s e m mais outras


[ fl. 4 7 9 ] a r m a s , e n e l a n ã o / / havia m a i s q u e o dito p a d r e . A igreja é c o b e r t a d e p a l h a e
era h á p o u c o s anos ereta; n ã o estavam as casas a r r u a d a s . O s "efeitos q u e t e m é
açúcar, e o p a n o do algodão era só p a r a o vestuário, p o u c o g a d o v a c u m e cavalar.
T e m esta missão d u a s "serventias p a r a o nosso rio: a p r i m e i r a é estreita e e m
t e m p o seco é inavegável p o r q u e seca; a s e g u n d a é m a i s larga, e e n t r e u m a e o u t r a
b a r r a faz ilha, q u e p a r t e d e l a é a l a g a d i ç a , e d e u m a a o u t r a b a r r a , i n d o p e l a
( m a d r e ! d o rio são dois dias d e v i a g e m e indo-se p o r detrás são três..
5 D e s t a missão saiu n o fim dos q u a t r o dias, e n a v e g a n d o rio abaixo passou
p e l a b a r r a d o rio B a u r e s , e m q u e e s t ã o , p o r ele a c i m a , q u a t r o missões: N o s s a
S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , São M a r t i n h o , a T r i n d a d e e São Gabriel. A estas missões
n ã o foi, e sabe delas pelos p a d r e s assim lho certificarem; e p a s s a d a a q u e fica à
m ã o e s q u e r d a foi e n t r a r pelo rio I t o n a m á s , q u e fica d a m e s m a p a r t e e faz b a r r a n o
nosso, e subindo p o r ele a c i m a a c h o u dois ribeirões da p a r t e direita, e subindo-se
pelo s e g u n d o e m t e m p o d e cheia se vai à missão d e S ã o P e d r o , m a s o dito L e m e
foi s e m p r e p e l a m a d r e ; e c o m p l e t o s oito dias c h e g o u à m i s s ã o d e S a n t a M a r i a
M a d a l e n a , q u e fica à m ã o direita, o n d e assistem dois p a d r e s d a C o m p a n h i a , u m
p o r n o m e J o s é R e i t e r , a l e m ã o , e Atanásio D e o d o r o , italiano. Estes p a d r e s recebe-
875

r a m a o dito L e m e e seus c o m p a n h e i r o s c o m m u i t a alegria e os fizeram m o r a r


d e n t r o dos "claustros d e s u a missão, e foi m u i t o g r a n d e o a g a s a l h o nesta, d i g o ,
q u e lhe fizeram. N e s t a (segundo disseram os padres) h á mais d e três mil índios. A
igreja é m u i t o g r a n d e e n o v a , feita d e n a v e s , e m r a z ã o d a m u i t a l a r g u r a , e p o r
d e n t r o feita d e a b ó b a d a , p i n t a d a c o m b o n s " r e t á b u l o s d e " t a l h a e c o b e r t a d e
telha, e t a m b é m os dormitórios, e está feita à imitação de u m grandioso c o n v e n t o ,
t e m ó r g ã o , h a r p a ; e as casas dos / / índios são a r r u a d a s . U s a m das m e s m a s a r m a s [ fl. 479v. ]
de q u e u s a m os d a p r i m e i r a m i s s ã o . O s "efeitos q u e t e m são a ç ú c a r , p a n o d e
algodão, " a g u a r d e n t e feita d e "mel, c o m o a d a Bahia, a q u e c h a m a m "cachaça.
6 D a missão d e São M i g u e l a esta se g a s t a m pelo rio o n z e dias e p o r t e r r a
três; nesta missão ficaram M a n u e l Félix de L i m a , J o a q u i m Ferreira C h a v e s , V i c e n t e
P e r e i r a d e Assunção e M a n u e l d e Freitas M a c h a d o , c o m q u a t r o escravos; e q u e -
r e n d o o dito L e m e , M a t e u s C o r r e i a e J o ã o dos Santos W e r n e c k , c o m oito escra-
vos, irem desta missão p a r a a d a Exaltação d e S a n t a C r u z , lhes d e r a m os p a d r e s
d e z índios p a r a os a c o m p a n h a r e m , e seguindo viagem r o d a r a m pelo rio I t o n a m á s
a b a i x o , s a í r a m ao nosso, e seguindo p o r ele foram e n t r a r pelo rio M a m o r é , q u e é
o q u e passa p e l a c i d a d e d e S a n t a C r u z , e g a s t a r a m d a dita missão d e S a n t a M a r i a
M a d a l e n a à d a Exaltação d e S a n t a C r u z vinte e dois dias d e viagem, sendo q u e
d a q u e l a a esta são q u a t r o dias p o r terra.
7 N e s t a missão foram recebidos p o r dois p a d r e s d a C o m p a n h i a q u e assistem
nela, L e o n a r d o d e Valdivia, n a t u r a l d a cidade de Valdivia, j á velho, e Sebastião
G a r c i a , a i n d a m o ç o , n a t u r a l d e C a l h a u d e L i m a . Nesta missão estiveram dezessete
dias m o r a n d o d e n t r o dos m e s m o s dormitórios dos p a d r e s , estes e m aposentos d e
s o b r a d o e aqueles nos baixos, c o m b o m e afável agasalho, alegria e m u i t a h o s p e -
d a g e m . E foi tal a afabilidade e afeto c o m q u e os t r a t a r a m q u e a t u a l m e n t e esta-
v a m c o m eles e às h o r a s d e silêncio é q u e se recolhiam, e várias vezes i a m os ditos
p a d r e s c o m eles ver as ruas d e sua missão e s o b r e t u d o se a d m i r a v a m m u i t o d e q u e
os m e s m o s p a d r e s , e m t o d o o t e m p o q u e estiveram, / / n ã o contentes das m u i t a s [ fl. 4 8 0 ]
"viandas q u e todos os dias lhes p u n h a m à m e s a , os serviam eles a o p é dela. T e m
u m a igreja feita d e a b ó b a d a p o r d e n t r o , coberta de " c a r a n d á s , à imitação d e telha,
é m u i t o g r a n d e e t o d a p i n t a d a , t r i b u n a d o u r a d a , c o m painéis e m o l d u r a s d e "ta-
lha p o r t o d a ela, t e m ó r g ã o , h a r p a , b a i x ã o , r a b e c ã o e " c h a r a m e l a s . T o d o s os dias
h á m ú s i c a n a igreja c o m esses instrumentos tocados pelos m e s m o s índios. N o s dias
d e s e m a n a , a o t e m p o d a missa, a i n d a q u e esta seja r e z a d a , se c a n t a o h i n o d o
santo d a q u e l e dia, e a o l e v a n t a r o S a c r a m e n t o se c a n t a n o c o r o o *Tantum Ergo. D e
m a n h ã , à dita missa se j u n t a m todos os q u e se a c h a m presentes à rezar; pelas três
h o r a s d a t a r d e se toca o sino, e v ê m todos os d e m e n o r i d a d e à d o u t r i n a ; pelas
c i n c o v ê m t o d o s ã r e z a r o t e r ç o , d e j o e l h o s , n o p á t i o . Isto é t o d o s os dias. O s
efeitos q u e h á nesta missão são cacau, a ç ú c a r , p a n o de a l g o d ã o , "cera e m velas
b r a n c a s e a g u a r d e n t e s , n a forma q u e fica dito acima, s a b ã o , m u i t o g a d o v a c u m e
cavalar. O s "vestidos q u e v i r a m nestas missões foram d e algodão e alguns "calções
876

e "vestias d e "baeta grossa e rala, q u e n e n h u m a p a r e c e n ç a t e m c ú m a nossa, os


c h a p é u s de p a l h a e m todos os índios e os m e s m o s p a d r e s vestem d e algodão tinto.
O s ditos "efeitos são os q u e c o s t u m a m m a n d a r p a r a S a n t a C r u z d e L a Sierra, p a r a
d e lá lhes vir o v i n h o , trigo, sal e a l g u m vestuário d e p a n o d e linho e o u t r a s coisas
necessárias p a r a a q u e l a s missões, e o p a n o de l i n h o é s e m e l h a n t e a o q u e c á se
c h a m a "cré.
8 T e m esta missão três mil índios e u s a m das a r m a s q u e a c i m a ficam ditas.
N ã o viu n e s t a p r i m e i r a v i a g e m a r m a s p r e p a r a d a s m a i s q u e u m a o u d u a s d e
" p a s s a r i n h a r , e falando-lhe~ o dito L e m e e m negócio d e g a d o r e s p o n d e r a m - l h e
[ fl. 480v, ] q u e o g o v e r n a d o r n ã o havia levar isso a b e m s a b e n d o - o , q u e a s a b e r e m q u e ele / /
o h a v i a de dissimular n ã o só v e n d e r i a m m a s d a r i a m d e g r a ç a até setecentas c a b e -
ças, e se n ã o falou e m mais negócio n e m eles o q u i s e r a m consentir. E m todo este
t e m p o q u e e s t i v e r a m n e s t a missão e nas m a i s n ã o se falou e m i n v a s ã o q u e os
espanhóis nos houvessem d e fazer, n e m se t e m i a m d e q u e lha fizéssemos, só sim se
q u e i x a v a m dos ingleses d e lhes h a v e r e m t o m a d o os seus p o r t o s , p o i s lhes causa-
v a m muitas faltas e m seus necessários, t a n t o assim q u e m a n d a n d o eles b u s c a r oi-
t e n t a "varas d e p a n o d e linho lhes t i n h a m v i n d o s o m e n t e : d e z , e v e n d o o dito
L e m e a sua necessidade lhes dera quinze varas dele, de q u e se m o s t r a r a m g r a n d i o -
s a m e n t e a g r a d e c i d o s d a n d o - l h e algumas galantarias e m r e c o m p e n s a ; e e m várias
práticas disseram q u e àquela missão t i n h a m vindo d e rio abaixo trinta h o m e n s e m
u m saveiro e u m a " c a n o a de voga dizendo q u e q u e r i a m ir à c i d a d e de S a n t a C r u z ,
e q u e v i n h a m d a Bahia, m a s os p a d r e s os fizeram a r r i b a r e só ficara u m , p o r n o m e
M a n u e l H o m e m , fazendo u m a s obras d e carpintaria, e a o cabo d e seis meses lhes
d e r a m os p a d r e s u m r a p a z e u m a c a n o a p e q u e n a e q u e r o d a r a p a r a a m e s m a p a r t e
d o n d e t i n h a vindo; e q u e os tais h o m e n s disseram h a v i a m gastado seis semanas e m
c h e g a r e m àquela missão e q u e lhes h a v i a m d a d o u m p a r d e pistolas portuguesas,
as quais os ditos p a d r e s d e r a m a o dito L e m e ; e q u e t a m b é m t i n h a v i n d o d e rio
a b a i x o à m e s m a missão d a E x a l t a ç ã o u m clérigo p o r t u g u ê s p o r n o m e J o ã o d e
S a m p a i o e trouxera seus m i m o s aos p a d r e s e q u e t o r n a r a p a r a a p a r t e d o n d e tinha
v i n d o ; e [que] depois viera u m p a d r e c a r m e l i t a n o d i z e n d o q u e r i a ir p a r a S a n t a
C r u z e pelos p a d r e s o n ã o c o n s e n t i r e m lhes disse ia subir pelo rio do M a r a n h ã o
até as cabeceiras a d a r nas m i n a s c h a m a d a s Goiás; disseram mais os ditos p a d r e s

[ fl 481 ] c
l u e n a v
i a
três "províncias, C ó r d o b a , / / Chile e L i m a . e q u e esta era a sua, e m a
q u a l h a v i a v i n t e e q u a t r o missões, e d e c l a r a r a m os n o m e s delas, das q u a i s v ã o
n o m e a d a s algumas e todas m u i t o a b u n d a n t e s dos efeitos j á ditos; e q u e a cidade
de S a n t a C r u z de la Sierra ficava à m ã o direita do m e s m o rio e q u e era p e q u e n a e
p o b r e ; e q u e o p a d r e Sebastião G a r c i a dissera que n e m vila p o d i a ser e se c h a m a -
va cidade p o r ter g o v e r n a d o r e q u e as casas e r a m cobertas de palmeiras e d e esta-
va, digo, e distava d a dita missão u m m ê s d e v i a g e m rio acima, pelo qual estão as
mais missões: S ã o P e d r o , S a n t o Inácio, L o r e t o , S ã o Francisco X a v i e r , e só a d e
S a n t a n a está e m u m braço q u e faz b a r r a no dito rio, e p o r ele estão as mais d e u m a
e outra parte.
877

9 É este rio m u i t o fundo e se n ã o p o d e n a v e g a r p a r a c i m a s e n ã o a r e m o s ,


corre c o m violência, é turvo a m o d o de á g u a s d e "faisqueira, a ele deságua u m rio
q u e vai das missões chiquitas d e São Rafael e São R o m ã o . T a m b é m disse o p a d r e
Isidoro de tal, q u e assiste n a missão d e S a n t a n a , v i n d o à d a E x a l t a ç ã o , a o dito
L e m e q u e òs portugueses t i n h a m m a n d a d o u n s "regalitos à missão d e São Rafael.
E desta missão chiquita n ã o d e r a m mais notícia n e m nela falaram mais.
10 E s t a n d o j á o dito L e m e e os m a i s c o m p a n h e i r o s p a r a v o l t a r e m , teve a
notícia d e q u e M a n u e l Félix d e L i m a , J o a q u i m Ferreira C h a v e s , M a n u e l d e Freitas
M a c h a d o e V i c e n t e Pereira d e Assunção t i n h a m r o d a d o d a missão d e S a n t a M a -
ria M a d a l e n a p a r a o rio abaixo p e l a notícia q u e lhes t i n h a m d a d o os ditos p a d r e s
q u e d a q u e l a missão se gastava onze dias a c h e g a r à dos frades do C a r m o p o r t u -
gueses. E c o m o o dito L e m e viu o p e r i g o do " g e n t i o , v e n d o - s e impossibilitado
p a r a t o r n a r c o m tão poucos c o m p a n h e i r o s p o r a q u e l a p a r t e , c o m u n i c o u a o p a d r e
L e o n a r d o q u e lhe e r a / / preciso t o r n a r p a r a este "país, p o r ser c a s a d o e ter filhos [ fl. 4 8 lv. ]
e lhe n ã o estava b e m passar adiante. V e n d o o dito p a d r e esta resolução, lhe disse
q u e d e sua p a r t e lhe d a r i a c i n q ü e n t a índios, e d a n d o p a r t e a o superior q u e estava
e m São P e d r o este m a n d o u mais vinte e cinco, a l é m de m u i t a " m a t a l o t a g e m q u e
lhe d e r a m p a r a a viagem, o r d e n a n d o viesse e m c o m p a n h i a dele o p a d r e A t a n á s i o
até passar os b á r b a r o s , o q u e o dito L e m e n ã o quis consentir p e l a moléstia q u e o
dito p a d r e p o d e r i a ter n a viagem.
11 C o m p l e t o s os dezessete dias, saiu d a dita missão, e chegou à d e S ã o Miguel,
o n d e lhe fugiram dois escravos, e m p r o c u r a dos quais m a n d o u o. p a d r e G a s p a r do
P r a d o m u i t o s índios, e v e n d o o dito L e m e t e r e m se passado muitos dias m a n d o u
os índios q u e tinha trazido p a r a as suas missões, d a n d o p a r t e a o superior d o q u e
l h e t i n h a s u c e d i d o ; e p a s s a d o s q u i n z e dias a p a r e c e r a m os n e g r o s e, a o m e s m o
t e m p o , o r d e m d o superior p a r a q u e o dito p a d r e G a s p a r desse d a q u e l a missão
q u a r e n t a índios ou os q u e fossem necessários, e sendo necessário a c o m p a n h a s s e o
m e s m o p a d r e a o dito L e m e . E q u e r e n d o aquele fazê-lo, este c o m m u i t a instância
o n ã o consentiu a q u e saísse fora d a sua missão p o r sua causa e q u e só sim aceitava
os índios, os quais trouxe e m sua c o m p a n h i a sete dias d e viagem, e completos estes
os m a n d o u p a r a a sua missão e veio c o m b o m sucesso até c h e g a r a estas m i n a s .

Segunda viagem [ fl. 482 ]

Partiu do p o r t o d a Pescaria e m 2 3 d e m a r ç o d e 1743, e r o d a n d o o rio abaixo


c o m seu i r m ã o P a u l o de A n h a i a e P e d r o F e r n a n d e s , c o m seis r e m e i r o s e m u m a
c a n o a , c h e g o u a o c a b o d e dezessete dias a avistar u m a m i s s ã o n o v a , i n d o r i o
a b a i x o , à m ã o direita d a nossa p a r t e , q u a s e defronte d e S ã o M i g u e l , a q u a l se
tinha fabricado h a v i a três meses, p o u c o mais distante d o b a r r a n c o d o rio, e t e m
p o r i n v o c a ç ã o S a n t a R o s a . N e l a assistem dois p a d r e s d a C o m p a n h i a , u m p o r
n o m e Atanásio D e o d o r o , acima declarado, e o u t r o J o ã o d e tal, n a ç ã o irlandesa.
878

A esta m i s s ã o f o r a m J o ã o dos S a n t o s W e r n e c k e J o s é B a r b o s a d e S á , aos


q u a i s i m p e d i r a m estes p a d r e s o p a s s a r e m d a q u e l e l u g a r p a r a b a i x o e d e t e v e -
os u m dia, p o r m a n d a r p o r t e r r a avisar a o s u p e r i o r q u e se a c h a v a n a m i s s ã o
d e S a n t a M a r i a M a d a l e n a , e c o m b a s t a n t e i n s t â n c i a ( s e g u n d o disse o W e r n e c k )
lhes disse q u e dali t o r n a s s e m p a r a c i m a , p o i s n ã o h a v i a o r d e m p a r a dali d e i -
x a r p a s s a r a n i n g u é m p a r a rio a b a i x o , e c o n t u d o f o r a m p a r a a m i s s ã o d e S a n t a
M a r i a M a d a l e n a , o n d e os n ã o a c e i t a r a m , e e n q u a n t o eles f o r a m p a r a a d i t a
missão passou o dito L e m e e m direitura p a r a a missão da E x a l t a ç ã o de Santa
C r u z , q u e d a q u e l a a e s t a g a s t o u q u i n z e dias, o n d e foi a c e i t o c o m m u i t o m a i s
alegria q u e da p r i m e i r a e h o s p e d a d o d a m e s m a forma a c i m a dita, e esteve
nesta missão nove dias.
N o decurso deste t e m p o n ã o viu coisa n o v a q u e da p r i m e i r a n ã o tivesse visto, só
[ fl. 482v. ] sim falando-se e m a r m a s d e fogo, o levou o dito p a d r e L e o n a r d o a u m / / a r m a -
zém, o n d e viu dezesseis ou dezessete a r m a s de fogo m u i t o antigas e d e s a p a r e l h a d a s
e os c a n o s c o m i d o s d a ferrugem, e p e r g u n t a n d o o dito L e m e p a r a q u e q u e r i a m
aquilo r e s p o n d e u o dito p a d r e q u e o seu antecessor, v i n d o a fundar a q u e l a mis-
são, tivera desconfiança dos índios se q u e r e r e m levantar e q u e p o r isso as m a n d a -
r a vir, m a s c o m o n ã o resultou coisa alguma as m a n d o u b o t a r n a q u e l e sótão, o n d e
se p e r d e r a m , m a s q u e visse se a l g u m a estava c a p a z de servir, p o r q u e lha q u e r i a
d a r ; e, c o m efeito, l h e d e u u m c a n o , a P a u l o d e A n h a i a u m a a r m a e a P e d r o
F e r n a n d e s o u t r a , m o s t r a n d o nisto o p o u c o caso q u e ele, dito p a d r e , fazia das tais
a r m a s , e c o m rogos p e d i u a o dito L e m e n ã o tornasse àquelas missões e advertisse
aos seus n ã o intentassem a q u e l a viagem, p o r q u e n ã o h a v i a m d e ser aceitos e p e l a
moléstia q u e lhes p o d i a causar, e m r a z ã o de ser j á o u t r o o "superior e n ã o levava
a bem como o primeiro.

Estão estas missões e m terras rasas d e c a m p o e m a t o s , e m q u e t ê m suas la-


v o u r a s e m m u i t a p a r t e alagadiços; d a p a r t e direita t a m b é m são c a m p o s c o m al-
guns m o n t e s e m a t o s , e as serranias, s e g u n d o dizem, estão m u i t o d e n t r o . Passados
os n o v e dias se despediu d a dita missão, e sem p o r t a r e m o u t r a s c h e g o u a este
p o r t o e m 2 3 d e m a i o . Q u a n d o saiu d a dita missão m a n d o u o dito p a d r e d o z e
índios p a r a o a c o m p a n h a r , os quais trouxe e m sua c o m p a n h i a até o n z e dias d e
viagem, e findo o dito t e m p o os despediu p a r a a dita missão. T a m b é m disse o dito
[ fl. 483 ] L e m e aos p a d r e s o n d e ficava o P e r u e r e s p o n d e u u m d i z e n d o / / o n d e e r a o
Brasil; r e s p o n d e u q u e era a A m é r i c a toda. A esta resposta disse o p a d r e q u e t o d a
a q u e l a p a r t e p o r o n d e eles e s t a v a m era o Peru.
879

• 137 <

Resposta [de Gomes Freire de Andrade ao secretário de


Estado Marco Antonio de Azevedo Coutinho
sobre navegação do rio Madeira]

Parecer, atendendo a consulta real, em defesa da urgência


de se promover a navegação pelo rio Madeira, em vista da possi-
bilidade de comunicação entre as minas da região do Mato Grosso
e o Estado do M a r a n h ã o . O impedimento do avanço das mis-
sões espanholas e a consolidação do controle português sobre o rio
Madeira assumem aqui peso estratégico no controle sobre Minas
Gerais e Goiás. Forma processo com os documentos 134 a 136.
Integrando u m grupo de documentos distantes do universo
de temas relacionados à sua atividade de magistrado e m Minas
Gerais, o documento ilustra o interesse do súdito letrado, que se
aproveita da experiência no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa na América.
A u t o r i a , l o c a l e data: Gomes Freire de Andrade; Rio de
Janeiro; 20.3.1749.
D e s t i n a t á r i o : Marco Antônio de Azevedo Coutinho.
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, regulariza-
d a e caligrafada, do tipo usual no período barroco. Utiliza o " C "
e o " e " copulativo em módulo maior que as demais letras; "f'
com dois olhos e traço horizontal ascendente, em voluta. (YDL)
Cópias manuscritas:
U S P / I E B , Coleção Lamego, 4 / a / 39. Noticias pertencentes à comu-
nicação do Mato Grosso com o Estado do Maranhão, 1748. Carta do secre-
tario de Estado Marco Antonio de Azevedo Coutinho, datada de Lisboa a 15
de setembro de 1748, dirigida a Gomes Freire de Andrade.
U S P / I E B , Coleção J. F. de Almeida Prado, 1,4,40.
B M M A , m s s / a / 4 1 . Notícias sobre a comunicação do Mato Grosso
com o Estado do Maranhão.
BNRJ, DiMss, 21,4,1.
Cópia impressa:
E X C E R T O S do arquivo do Morgado de Mateus. Notícias per-
tencentes à comunicação do Mato Grosso com p Estado do
M a r a n h ã o . Anais da Biblioteca Nacional, R i o de J a n e i r o , v.
107, p. 56-57, 1987.
880

E m c a r t a d e 17 d e s e t e m b r o , m e r e m e t e V o s s a E x c e l ê n c i a c ó p i a s d a s
r e l a ç õ e s , i n s t r u ç ã o e m a p a q u e S u a M a j e s t a d e foi s e r v i d o m a n d a r a o "gover-
n a d o r d o E s t a d o d o M a r a n h ã o , e n c a r r e g a n d o - l h e faça e x p l o r a r e n a v e g a r o
rio da M a d e i r a pela g r a n d e necessidade que h á de segurar a posse e navega-
ção daquele rio.
O impedir-se a c o m u n i c a ç ã o de minas c o m o Estado do M a r a n h ã o p a r a
e m b a r a ç a r o largo c o n t r a b a n d o e r o u b o da Real Fazenda, que era certo por
a q u e l a p a r t e e s t a n d o f r a n c a a n a v e g a ç ã o , e m a i s a ser a c o b r a n ç a do " q u i n t o
n a s "casas d a m o e d a ou f u n d i ç ã o e t a m b é m evitar q u e os m o r a d o r e s d a q u e l e
e s t a d o , l e v a d o s d a a m b i ç ã o , d e s a m p a r a s s e m seus e s t a b e l e c i m e n t o s , n a f o r m a
s u c e d i d a n a c a p i t a n i a d e S ã o P a u l o , q u a n d o os h a b i t a n t e s d e l a se m e t e r a m a
d e s c o b r i r m i n a s , d e i x a n d o a c u l t u r a d e suas r o ç a s e " s e s m a r i a s , o q u e e r a m a i s
c o n s i d e r á v e l , e p a r a t e m e r n o E s t a d o d o M a r a n h ã o , n o q u a l são m a i s p r e c i s o s
os g ê n e r o s q u e se t i r a m d a c u l t u r a e t r a b a l h o , foi a c a u s a a t é o p r e s e n t e e m
q u e j u s t a m e n t e se f u n d o u o C o n s e l h o U l t r a m a r i n o . E são t ã o fortes os seus
f u n d a m e n t o s q u e só os p o d e r e v o g a r a n e c e s s i d a d e e m q u e e s t a m o s d e n o s
fazer p o d e r o s o s e r e s p e i t a d o s n ã o só n a n a v e g a ç ã o d o r i o d a M a d e i r a m a s n à

[ fl. 483v. ] c o n g r e g a ç ã o / / d e gentes n a vila e distrito d e C u i a b á , p r e v e n i n d o - n o s a t e m -


p o ao d a n o q u e nos a m e a ç a q u a n d o c h e g o u a m o n t a r n o trono de Castela o
presuntivo herdeiro daquela Coroa.
Incontestável é q u e a d e t e r m i n a ç ã o c o m q u e os p a d r e s d a C o m p a n h i a [de
Jesus] das missões, estabelecendo desta p a r t e do rio d a M a d e i r a a de S a n t a Rita,*
e á c o m q u e i m p e d e m a nossa p a s s a g e m a o M a r a n h ã o , c h e g a n d o ao excesso de
m a l t r a t a r aos p o r t u g u e s e s q u e n o rio e n c o n t r a m , o fazem p a r a q u e , temerosos,
nos a b s t e n h a m o s e a p a r t e m o s d e n a v e g a r pelo rio à q u e l e E s t a d o , q u e r e n d o só
p a r a si a liberdade d e n a v e g a r a t é e n c o n t r a r e m ricos estabelecimentos ou, t o m a -
das as suas m e d i d a s , resolverem-se a a t a c a r os nossos, q u e postos e m descuido
serão fáceis d e v e n c e r .
P a r e c e - m e indispensável adiantar-nos à n a v e g a ç ã o p a r a r e p a r a r m o s o p e n e -
t r a n t e golpe q u e , a n d a n d o a o t e m p o , se h á d e intentar d a r - n o s e m p a r t e q u e t e m
tão precioso g ê n e r o , c o m o as M i n a s Gerais e G o i á s . S e g u r a n d o - s e a n a v e g a ç ã o
do rio d a M a d e i r a firmamos b a r r e i r a p o r a q u e l a p a r t e e p r e v e n i m o s os males q u e
Vossa Excelência c o m tantas luzes d á a ver n a instrução e c a r t a a o g o v e r n a d o r do
M a r a n h ã o . Se n o C u i a b á o houvesse a o t e m p o q u e se estabeleceu a missão S a n t a
R o s a , é provável teria i n q u i e t a d o t a n t o aquele estabelecimento ríingindol serem
b a n d i d o s os q u e faziam os r o u b o s e as desordens q u e , capacitados os p a d r e s q u e
o g o v e r n a d o r n ã o p o d i a d a r remédio aos danos q u e lha c a u s a v a m os malfeitores,
[ fl. 4 8 4 ] r e p a s s a r i a m o r i o . / / H o j e , se n e c e s s i t a d e m u i t a s i m u l a ç ã o , d e d e s p e s a e

• Gomes Freire de Andrade referiu-se, equivocadamente, à missão Santa Rosa como Santa Rita.
881

r d e s c ô m o d o l , e c o m o d a fazenda dos Fparticulares 1 se n ã o possa fazer t a n t a c o m o


é preciso e n o C u i a b á n ã o haja o r e n d i m e n t o necessário p a r a a referida, deve-se
tirar d o Goiás c o m q u e a s u p r a d o m A n t ô n i o R o l i m , pois é certo, a c o n t i n u a r o
nosso descuido e a n ã o p o d e r m o s ajustar n o ministério d e Castela ser a divisão
pelo rio d a M a d e i r a , adiante nos custará a conservação d e C u i a b á m a i s do q u e h á
c o n s u m i d o a d a p r a ç a da C o l ô n i a [do S a c r a m e n t o ] .
D i s c o r r e n d o n ã o h á m u i t o t e m p o c o m alguns c a s t e l h a n o s d e L i m a s o b r e
n o v i d a d e s , m e referiu u m ser a m a i o r q u e h a v i a n a q u e J a c i d a d e a c e r t e z a d o
q u a n t o os p o r t u g u e s e s e n t r a r a m e i a m e n t r a n d o pelo r e i n o d o P e r u , d e q u e o
g o v e r n a d o r de S a n t a C r u z d e la Sierra repetia avisos q u e d a v a m motivos a g r a n -
des discursos. R e s p o n d i q u e o avanço q u e a furto fizeram os p a d r e s d a C o m p a -
nhia das missões, estabelecendo a de S a n t a R o s a desta p a r t e d o rio d a M a d e i r a ,
raia d e u m a e o u t r a C o r o a , nos d a v a m mais causa a discorremos e sermos q u e i x o -
sos, v e n d o inobservado o T r a t a d o de Paris, q u e a o suspender das a r m a s m a n d o u
c o n s e r v a r t u d o n o estado e m q u e estava à q u e l e t e m p o . R e s p o n d e u - m e q u e os
portugueses h a v i a m infringido o m e s m o t r a t a d o , pois se m e t e r a m n a s missões h á
t a n t o estabelecidas, s e m q u e d e u m a o u o u t r a p a r t e d o rio se houvesse e n c o n t r a d o
o u t r a n a ç ã o q u e os p a d r e s o u índios das missões, e q u e era certo q u e a l i n h a q u e
as c o b r e inclui e m si q u a n t o temos n o C u i a b á ; c o m a m e s m a linha e c o m / / o q u e [ fl. 484v. ]
n o s u s u r p a r a m n a Ásia, findei o discurso, ficando p e r s u a d i d o q u e a o vice-rei d o
P e r u d á b a s t a n t e c u i d a d o àquela n a v e g a ç ã o .
Passo a G o i á s , d o n d e a n i m a r e i q u a n t o m e seja possível n o C u i a b á a navega-
ção do rio d a M a d e i r a , e c o m d o m A n t ô n i o R o l i m , q u a n d o m e aviste c o m ele,
conferirei q u a n t o m e o c o r r e r nesta i m p o r t a n t e relo, digo, resolução d e S u a M a -
j e s t a d e . N a e x e c u ç ã o d e l a se o b r a r á c o m g r a n d e r e c o m e n d a ç ã o n a o b s e r v â n c i a
das advertências e r e g u l a m e n t o s q u e f o r a m a o " g o v e r n a d o r d o M a r a n h ã o e Vossa
E x c e l ê n c i a m e r e m e t e . O referido p o r á V o s s a E x c e l ê n c i a n a p r e s e n ç a d e S u a
M a j e s t a d e . D e u s g u a r d e a Vossa E x c e l ê n c i a muitos a n o s . R i o d e J a n e i r o , 20 d e
m a r ç o d e 1749.

Ilustríssimo Excelentíssimo s e n h o r M a r c o A n t ô n i o de A z e v e d o C o u t i n h o .
G o m e s Freire de A n d r a d e
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• 138 -

[Diário da jornada que fez o ouvidor Caetano da Costa Matoso


para as Minas Gerais]

Anotações diárias das ocorrências e observações feitas por


Gaetano da Gosta Matoso entre 27 de janeiro e 7 de fevereiro de
1749 enquanto seguia viagem entre o Rio de Janeiro e Vila Rica,
onde assumiria o posto de ouvidor da comarca.
Pelos caminhos que o levavam a Minas Gerais, desde a
partida na cidade do Rio de Janeiro, o ouvidor registra aspectos
d a flora, o estado das estradas, as povoações e arraiais encontra-
dos, os rios que cruza, a visão das serras e. os fenômenos natu-
rais, relatando as condições de viagem, o trabalho com as tro-
pas, a hospedagem e a sociabilidade nos pousos do caminho.
Informa com bastante minudência a respeito das atividades eco-
nômicas estabelecidas ao longo do Caminho Novo, suas roças e
rocinhas, o funcionamento e rendimentos dos postos de controle
e arrecadação e trata de seus habitantes e proprietários de ter-
ras, buscando quase sempre reunir subsídios sobre o estabeleci-
mento destes n a região.
Seu teor revela-se u m a verdadeira síntese das preocupa-
ções e temas que perseguem Caetano da Costa Matoso d u r a n t e
sua experiência colonial: a recolha de informações econômicas;
a descrição d a natureza sob u m olhar científico (medindo deslo-
camentos e distâncias entre pontos); a preparação de aponta-
mentos de historiador narrando as conquistas dos povoadores
originais e o olhar atento de funcionário vigilante registrando o
estado da administração real.
Por constituir u m a narrativa direta e autoral do próprio
compilador, o documento oqupa lugar único no conjunto do Códice,
muito embora integrando grupo de registros de viagens na Amé-
rica portuguesa.
A brusca interrupção do texto exatamente n a passagem de
u m fólio para outro induz à idéia de perda do restante do diário.
Autoria, l o c a l e data: Caetano da Costa Matoso; Cami-
nho Novo; 27.1.1749 a 7.2.1749.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Relato de viagem, obedecendo a
forma de diário, em que prevalece a descrição da paisagem geo-
gráfica, do povoamento e dos rendimentos fiscais dos lugares
percorridos. O n a r r a d o r observa e organiza as descrições n a
seguinte seqüência: dia da viagem, detalhes d a partida e da ca-
m i n h a d a , aspectos d a paisagem, chegada a o lugar do pouso,
883

características do lugar e da hospedagem, outros comentários.


R e t o r i c a m e n t e , constitui-se c o m o ecfrase. S e g u n d o Rafael
Bluteau, "descrição" é "definição imperfeita. Representação, ou
pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabulário português ê
latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da Companhia de Jesus,
1713. V. 3, p. 115). Observa-se a aplicação da tópica poética do
locus amenus ("lugar ameno"); da tópica da n a t u r e z a rude dos
trópicos; das tópicas poéticas de animização de seres inanima-
dos e da tópica da arrogância dos paulistas. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, cursiva do
século XVIII, com traçado evoluído e personalizado. Letra e m
módulo pequeno, veloz; hastes pendentes, em forma de meio cír-
culo; pontos de fuga em linha curva ascendente; abreviaturas
usuais. Rasuras acentuam o caráter de texto provisório. Letra de
Costa Matoso. (YDL)

S e g u i n d o p r i m e i r o t o d o o p r i m e i r o dia, saí n o dia segunda-feira, 2 7 d e j a -


neiro d e 1749, pelas q u a t r o d a m a n h ã . Saí a o noroeste e vim i n c l i n a n d o à
q u a r t a n o r t e n o dia seguinte à m i n h a p a r t i d a d o noroeste, e m b a r c a d o e m
u m "escaler de seis r e m o s , e m e e m b a r q u e i a o C a r m o . E n a m i n h a c o m p a n h i a
[íl. 485 ]

u m p a d r e d a C o m p a n h i a [de Jesus] c h a m a d o J o s é N o g u e i r a , s o b r i n h o d o "bispo


de M a r i a n a , q u e ia p a r a a sua c o m p a n h i a a rogos d o m e s m o bispo. E era a tercei-
r a vez q u e às M i n a s t i n h a m v i n d o p a d r e s d a C o m p a n h i a , p o r q u e a p r i m e i r a foi
q u a n d o se d e s c o b r i r a m estas M i n a s Gerais, n o a n o d e 1695, e m q u e A r t u r d e Sá
e M e n e s e s , g o v e r n a d o r d o R i o [de J a n e i r o ] , veio t o m a r posse delas e t r o u x e n a
sua c o m p a n h i a u m destes p a d r e s , q u e era seu confessor. Saímos c o m m a r é sosse-
g a d a , e p o r q u e logo foi a m a n h e c e n d o fui v e n d o c o m gosto o delicioso d a q u e l a
b a í a t o d a m a t i z a d a d e ilhas, u m a s cultivadas, o u t r a s c o b e r t a s d e m a t o s , alguns
a i n d a virgens. E ali reparei m e l h o r n a ilha do G o v e r n a d o r ou dos Sete E n g e n h o s ,
q u e é b a s t a n t e m e n t e g r a n d e e c e r c a d a e m r o d a d e várias casas e " e n g e n h o s d e
açúcar, c o m altos m a t o s e alguns t a m b é m n u n c a cortados. J u n t o a ela, d a p a r t e d e
leste e p o u c o m a i s distância de dois tiros d e m o s q u e t e , está u m a ilha c h a m a d a
D ' á g u a , a q u a l , p o r ser m u i t o celebrada p e l a curiosidade c o m q u e d e p r e s e n t e era
t r a t a d a , fiz a p o r t a r a ela. E, n a v e r d a d e , é deleitosa, p o r q u e s e n d o c e r c a d a e m
r o d a n a distância de p e r t o de m e i a "légua c o m u m a rua, é t o d a ela pelos lados
posta d e b e l a s "árvores de espinho q u e c r e s c e r a m mais ao ar e n ã o e s p a l h a m t a n t o
c o m o as nossas, e "entressachadas d e m u i t a s flores e alecrins, e p r i n c i p a l m e n t e d e
u m a s flores b r a n c a s c o m o rosetas p e q u e n a s , q u e a q u i c h a m a m bogaris, q u e são as
mais galantes e d e mais especioso cheiro q u e t e n h o e n c o n t r a d o nestas p a r t e s ; é
m u i t o cheio d e jasmins-de-itália, os m a i o r e s q u e t e n h o visto, e d e m a t o esta flor.
T e m o u t r a r u a , q u e a c o r t a p e l o alto, u m a fonte, vários recreios, m u i t a s m a i s
"árvores d e e s p i n h o e d e t o d a a m a i s fruta destas p a r t e s , e enfim é a g r a d á v e l ,
a i n d a q u e d e casas m u i t o inferior. A c a b a d a assim d e ver, c o n t i n u a m o s a nossa
viagem. C h e g a m o s à b o c a do rio d e I n h o m i r i m pelas nove e m e i a . T e m este rio
dois tiros d e m o s q u e t e d e l a r g u r a , c o m b a s t a n t e p r o f u n d i d a d e , e n t r a n d o p o r ele
e m b a r c a ç õ e s d o alto; t e m duas " b o d e g a s , à e n t r a d a d e u m a e o u t r a p a r t e , e d a
p a r t e e s q u e r d a p o u c o adiante o u t r a , e mais adiante d a direita o u t r a ; v e m v o l t a n d o
este rio c o m várias voltas, e m n ú m e r o d e treze, s e m p r e n a m e s m a altura e l a r g u r a ,
t o d o s o m b r i o e cheio de arvoredos d e u m a e o u t r a p a r t e , quase todos virgens pelo
m a t o d e n t r o , e n a b o r d a d e u m a s árvores a q u e c h a m a m m a n g u e s , q u e t ê m a
singularidade de irem m e t e n d o os r a m o s p a r a á g u a e p o r ela d e n t r o c h e g a r e m à
t e r r a e fincarem raízes, e depois d e t e r e m l a n ç a d o q u a n t i d a d e e n t r a m a crescer
p a r a cima, e é coisa vistosa estar u m a árvore c o m p r i d a sustentada sobre q u a n t i d a -
d e de p e q u e n a s raízes, todas p o r c i m a d a água, e destas árvores são as varas q u e
d a q u i v ã o p a r a as parreiras daí, pela m u i t a d u r a ç ã o q u e têm. Fica e m distância d a
b o c a do rio até o p o r t o u m a "légua, e nas voltas mais d e duas. C h e g u e i a I n h o m i r i m
pelas onze e meia; é u m p o r t o c o m casas térreas q u e servem d e a c o m o d a r a gente
q u e v a i e v e m das M i n a s e e m b a r c a e d e s e m b a r c a neste lugar, a i n d a q u e o rio
c o n t i n u e mais p a r a diante; é p e q u e n a aldeia e n o alto t e m u m a " e r m i d a d a S e -
n h o r a d a Estrela, d e p o u c a consideração. Aí estivemos a t é q u a t r o h o r a s d a t a r d e ,
e m que saímos, e p o r entre arvoredos e caminho apertado, q u e e m partes n ã o
c a b e mais q u e u m a besta c a r r e g a d a , vim, e s e m p r e p o r e n t r e m o r r o s , a d m i r a n d o
o d e n s o dos m a t o s e o e l e v a d o e grosso d e m u i t a s á r v o r e s , q u e b e m s e r i a só
p o d e r i a m ter c o m a criação d o m u n d o a s u a o r i g e m . E r a o c a m i n h o , p o r este
respeito, s o m b r i o , e pelas m u i t a s chuvas de trovoadas, q u e neste t e m p o d o verão
h á certas q u a s e todos os dias,, e s t a v a m impraticáveis os c a m i n h o s . N o c a m i n h o
e n c o n t r a m o s várias roças, e e m u m a a igreja d a P i e d a d e , q u e é u m a casa a r m a d a
d e m a d e i r a c o m b a r r o , o n d e c o m u m e n t e havia pretos, e j u n t o a elas a l g u m p o u c o
cultivo a m e i a l é g u a d e distância. V i e m o s pela b o r d a do rio C u i a r a , q u e se vai
m e t e r n o rio I n h o m i r i m ; é c a u d a l o s o e s o m b r i o , t o d o m e t i d o e n t r e r a m o s ; e m
u m a s p a r t e s se escondia, e m outras nos aparecia, e p o r duas o p a s s a m o s p o r c i m a
d e p o n t e . E t e n d o p a s s a d o duas léguas e m e i a , cheguei, pelas seis e m e i a , a u m
sítio q u e c h a m a m o Fragoso, de u m J o ã o Fragoso, q u e h a v e r á 26 a n o s fez nele sua
roça j u n t o à m a r g e m do m e s m o r i o , e m q u e fiquei nesta p r i m e i r a noite, j u n t o e
nas faldas d a serra dos Ó r g ã o s , serra altíssima q u e se assegura p r i n c i p i a r n a capita-
nia dos Ilhéus e c o r r e r p o r aqui e ir a São P a u l o , e daí pela L a g u n a , R i o G r a n d e
e M a l d o n a d o , M o n t e v i d é u , e passado o rio d a P r a t a , c o r r e r p o r B u e n o s Aires, ir
c o r r e n d o à costa dos domínios d e Castela e ir p r e n d e r n a célebre cordilheira d o
reino d o Chile. Este sítio e m q u e fiquei é u m t e r r e n o mais largo do q u e n e n h u m
o u t r o q u e até a q u i t i n h a visto; t e m s e u cultivo, a i n d a q u e n ã o d e m a s i a d o . O s
m o n t e s p o r a q u i e serra dos ó r g ã o s são cobertos d e a r v o r e d o , a l g u m e m g r a n d e
altura, t o d o virgem, p o r inacessível. Este c a m i n h o d e I n h o m i r i m , e p o r este sítio,
885

se descobriu n o a n o d e 1718 ou 1719, n o t e m p o d o governo d e Aires d e S a l d a n h a


n o R i o , e é o terceiro p o r q u e se foi às M i n a s Gerais, sendo o p r i m e i r o o d e P a r a t i
pela b a r r a fora e o s e g u n d o o do C o u t o , q u e é t a m b é m p o r c i m a desta serra, e m
p o u c a distância deste sítio e p o r p a r t e mais áspera, e hoje p o u c o se freqüenta. Este
dia t i n h a a m a n h e c i d o n u b l a d o m a s n ã o c h e g o u a chover e ficou fresco, a i n d a q u e
c o b e r t o e m t o d o ele. O s três dias antecedentes t i n h a chovido t a n t o q u e m e e m b a -
r a ç a r a m a saída do R i o , e p o r a q u i a c h a v a m cheios os ribeiros e os c a m i n h o s , d e
lama.
A m a n h e c e u o dia d a terça-feira, segundo d a m i n h a j o r n a d a , t a m b é m cober-
to. D i s p o s t o t u d o p a r a a p a r t i d a , saí pelas seis e três quartos do sítio e m q u e tinha
d o r m i d o . L o g o a o sair t o m e i a repassar o dito rio [ I n h o m i r i m ] , n ã o v a d e a n d o - o ,
p o r n ã o ter p o n t e , e pela b o r d a dele e d a serra, j á p o r e n t r e m a t o s s u m a m e n t e
espessos, vim e m distância d e u m b o m q u a r t o d e *légua, e daí entrei a subir a
serra j u n t o a u m m o r r o q u e n o alto finge, c o m u m a g r a n d e p e d r a , a figura d e u m
frade, e p o r isso l h e c h a m a m deste n o m e . N e s t a s u b i d a , e m q u e h a v e r á u m a
légua, gastei p e r t o d e duas horas, p o r ser o c a m i n h o mais escabroso / / q u e t e n h o [ fl. 485v. ]
até a q u i visto, pelo solto e g r a n d e das p e d r a s , e tão elevado q u e b a s t a n d o subir a
u m cavalo c o m sela m e a d m i r e i s u m a m e n t e de q u e o pudesse subir a l g u m c a r r e -
g a d o , m a s p o r isso g a s t a m m u i t o t e m p o e c a e m , e ficam m u i t a s vezes debaixo das
c a r g a s . P o r t o d a esta s e r r a a c i m a é o c a m i n h o q u a s e t o d o c o p a d o e d e n s o d e
infinidade e diversidade d e árvores, e m q u e m e a d m i r a v a o r a r o , elevado e direito
delas, e notei e m m u i t a s o c o m o se lhes u n i a m alguns filhos seus q u e lhes n a s c i a m
a o p é , os quais as a b r a ç a v a m tão estreitamente q u e a l a r g a v a m o c o r p o , ficando
m u i t a s vezes a grossura, d e u m a t á b u a , e c o m ele o c o b r i a m e m m u i t a s p a r t e s
inteiramente, tudo e m agradecimento daquele natural a m o r c o m que, como m ã e ,
a á r v o r e lhes a b r i a os b r a ç o s e [os acolhia?] neles. E r a e m t o d o este c a m i n h o
c o n t i n u a d o o m u r m ú r i o e m o t i m das águas q u e faziam o c o r p o d a q u e l e rio, p r e -
cipitando-se d e t a n t a elevação q u e , fazendo-se duvidosa qual era a causa de t a n t a
elevação d a á g u a , a d m i r a v a o precipício c o m q u e se l a n ç a v a m d e tão alto, q u e -
b r a n d o p o r aqueles p e n e d o s e m puríssimos cristais as m e s m a s á g u a s , tão claras
c o m o excelentes n o s a b o r a todas as q u e t i n h a e n c o n t r a d o nestas p a r t e s . A estes
precipícios c h a m a m aqui cachoeiras, u m a s m a i o r e s , outras m e n o r e s , é n a v e r d a d e
c o m p e n s a v a m n a vista o i m p o r t u n o d a subida e faziam [com a serra?] h a r m o n i a
n a o r d e m c o m q u e se p r e c i p i t a v a m . Enfim, seria n o c o p a d o e a m e n o a m a i s exce-
lente [estrada?], a n ã o ser e m u m sítio t ã o escabroso. C h e g u e i a o alto d a subida, e
a q u i nele c h a m a m serra do M a r e a q u i fica o m o n t e d a B o a V i s t a , p o r d e l a se
avistar t o d a a b a í a e a c i d a d e d o R i o e todos os seus arrabaldes; p o r é m , e u n a d a
disto p u d e ver, p o r q u e a i n d a q u e nesta altura estavam descobertos os ares, contu-
d o daí p a r a baixo estavam densados, e m f o r m a q u e n a d a se via. D e s t e sítio corria
a i n d a p a r a c i m a os m o n t e s e m o u t r a tanta elevação, p o r é m o c a m i n h o segue p o r
e n t r e estas alturas s u b i n d o e descendo, u m a s vezes mais e o u t r a s m e n o s , e q u a s e
s e m p r e f e c h a d o e d e tão p o u c a l a r g u r a q u e n ã o p o d e m dois cavaleiros e m p a r e -
lhar, m a s h ã o d e vir uns detrás dos outros. E assim p o r ele e j á s e m p e d r a s viemos
ao sítio c h a m a d o I t a m a r a t i , q u e q u e r dizer pedra pequena, q u e fica i m e d i a t o a u m
p e q u e n o rio c h a m a d o d o m e s m o n o m e , q u e atravessei, e aí, e m u m l a r g o c o m
a l g u m desafogo, está u m a roça n a qual estão duas c h o u p a n a s mais largas e cober-
tas d e p a l h a q u e servem d e estalagem aos passageiros, e é r o ç a do a n o d e 1730.
Estes roceiros t ê m c o m u m e n t e u m a "légua de " s e s m a r i a d a d a p e l o g o v e r n a d o r ,
cuja c a r t a c o n f i r m a m n o R e i n o d e n t r o d e dois anos, e u s a m d a tal roça n o sítio
q u e nela os t ê m mais a c o m o d a d o . Aqui cheguei pelos três quartos p a r a as o n z e d a
m a n h ã t e n d o a n d a d o só d u a s léguas, q u e é a distância d o sitio e m q u e saí a t é este
e m q u e fiquei, e d o r m i neste d i a , e n ã o p a s s e i d e l e , p o r q u e v i n d o l i g a d o aos
v a g a r e s d e a l g u m a s bestas q u e traziam o sustento p a r a m i m e m i n h a comitiva, q u e
p a s s a v a d e d o z e pessoas, n ã o p o d i a passar a d i a n t e , p o r q u e n ã o ficava sítio a c o -
m o d a d o a o n d e estas bestas p u d e s s e m c h e g a r e j u n t a m e n t e houvesse c ô m o d o p a r a
as pessoas. P o r ser tal este c a m i n h o , p a r a fazer esta viagem m e n o s d e s a c o m o d a d a ,
m e sujeitei a este i n c ô m o d o de vir de c o m e r e bestas c a r r e g a d a s c o m ele e p a r a ter
c a m a p a r a m i m e o p a d r e q u e comigo vinha foi preciso m a n d a r a d i a n t e u m escra-
vo aos sítios convenientes e m e n o s m a u s d a n d o aviso d o dia e m q u e aí c h e g a v a e
"família q u e trazia e p a r a q u e , j u n t a m e n t e , se tivesse c a p i m (ou erva) a p a n h a d a
p a r a as bestas, p o r q u e de o u t r a sorte se l a n ç a m estas pelos m a t o s a b u s c a r sua vida
e a o depois h á o t r a b a l h o e d e m o r a de se j u n t a r e m e p o r e m p r o n t a s . E, n a v e r d a -
d e , é n o t a v e l m e n t e i n c o m o d a d o p a r a t o d o s este c a m i n h o , p o r n ã o p o d e r e m ter
esta p r o v i d ê n c i a q u e só facilitava o respeito d o lugar p a r a q u e v i n h a , a q u e p o r
todos estes sítios a c e d e m especial v e n e r a ç ã o . P o r q u e observei a a g u l h a , e vi q u e
v i n h a direto a n o r t e q u a r t a d e noroeste. A q u i estive toda a tarde, e m q u e fiquei
não mal acomodado.

A m a n h e c e u ó dia d a quarta-feira, 29, e terceiro d a j o r n a d a , a í n d a n u b l a d o e


fresco. E disposto t u d o a fazer viagem, saí pelas seis h o r a s d a m a n h ã , e p o r entre as
m e s m a s serras e m a t o s vim a n d a n d o e m p o u c a distância d a m a r g e m d o rio d e
I t a m a r a t i ; e a n d a d o u m q u a r t o d e l é g u a c h e g u e i a o u t r o , q u e v a d e e i e levava
b a s t a n t e água, p o r q u e p o u c o acima se lhe u n i u o u t r o rio, q u e nesta u n i ã o lhe d ã o
o n o m e de P i a b a n h a ; passado ele, v i m costeando u m m o r r o e s u b i n d o p o r ele e m
voltas e depois saí a u m largo e m q u e estão u m a s p o u c a s [choupanas] d e p a l h o ç a s
e c h a m a m Preguiças, e a q u i faz m e i a légua d e I t a m a r a t i . V i m o u t r a vez subindo
o u t r o m o r r o c o m p o u c a subida, sendo dele a descida d e mais d e q u a r t o de légua;
assim c o n t i n u a v a s e m p r e o c a m i n h o todo fechado de u m e o u t r o l a d o , e q u a n d o
n ã o e r a c o p a d o a o m e n o s era q u a s e inacessível a o sol, e p a r a se v e r o c é u se
precisa de. se l e v a n t a r a cabeça n a m u i t a altura das árvores. N e s t e c a m i n h o che-
guei a o u t r a aldeia, a q u e c h a m a m o R i o d a C i d a d e , distante u m a légua d a P r e -
guiças; t e m três ou q u a t r o c h o u p a n a s , c o m sua casa d e s o b r a d o , q u e foi a p r i m e i r a
q u e vi, m a s d e p a l h a , e só m e t a d e d o t e t o era c o b e r t o d e telha. L o g o i m e d i a t o está
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u m rio d o m e s m o n o m e , p o r n a q u e l e sítio ter h a v i d o u m p o v o a d o m a i o r d o


"gentio, o qual p a s s a m o s p o r ponte; depois continua o c a m i n h o s u b i n d o e coste-
a n d o p o r altíssimos m o r r o s , e m q u e p a r a u m lado se p e r c e b i a e m alguns claros d o
c a m i n h o u m a e m i n ê n c i a d e s p r o p o r c i o n a d a e p a r a o u t r o u m precipício igual. E n -
c o n t r a v a p o r estes c a m i n h o s todos vários riachos e ribeiros p e q u e n o s c o m águas
cristalinas e de s u m o gosto, e a o m e s m o t e m p o vi e m alguns descer p o r alguns
m o r r o s altíssimos várias c a c h o e i r a s e fontes p r e c i p i t a n d o as á g u a s d a q u e l a emi-
n ê n c i a , e e r a a d m i r a ç ã o o ver o n d e n a s c i a m . N o c a m i n h o e n c o n t r e i , e m u m a
baixa, outras p o u c a s c h o u p a n a s j u n t a s a u m p e q u e n o rio, q u e e m p o u c a distância
misturava as suas á g u a s nas do rio da C i d a d e , e a esta aldeia, ou r a n c h o (como p o r
a q u i lhe c h a m a m ) , c h a m a das Araras, p o r ser sítio o n d e se m a t a v a m muitos desses
pássaros, e aqui é "légua e m e i a distância do rio d a C i d a d e . C o n t i n u e i p o r igual
c a m i n h o e n t r e j á s u b i n d o e j á descendo, c o m mais e m e n o s voltas, e passado u m
b o m q u a r t o d e légua entrei a subir u m m o r r o c h a m a d o d a M a n g a l a r g a , cuja subi-
d a é d e mais d e q u a r t o d e légua, c a m i n h o d e p e d r a s e escabrosíssimo, c o m infini-
tos d e u m a p a r a o u t r a p a r t e . C h e g u e i a u m alto e m q u e c o m o u t r o m o r r o faz u m a
q u e b r a d a , e ele c o n t i n u a a i n d a e m m u i t a distância d e elevação, e o d a tal q u e b r a -
d a entrei logo a descer, a i n d a q u e p o r c a m i n h o sem calçada, c o n t u d o fortemente
p r e c i p i t a d o , e e m distância de. p e r t o d e u m a l é g u a d e descida, h o fim d a q u a l
achei vários regatos q u e se u n i a m m a i s a d i a n t e e m u m r i a c h o c h a m a d o das P e -
dras, q u e v a d e e i , j u n t o a o q u a l estavam duas c h o u p a n a s , a cujo sítio c h a m a m a
r o c i n h a d o Secretário. C o n t i n u e i p o r d i a n t e p o r c a m i n h o s c o m p o u c a diferença
u n s dos outros, e passada / / m e i a légua cheguei a u m sítio mais largo e p e r t o d o [ fl. 486 ]
m e s m o rio das P e d r a s o n d e estavam algumas c h o u p a n a s , e se c h a m a v a a roça d o
Secretário. N e s t e sítio descansei e jantei, p o r ter aviso d e q u e eu v i n h a e s e n d o a
casa e m q u e o fiz a m e s m a d o d o n o dele, q u e e r a u m m o ç o d e b o a p r e s e n ç a ,
n a t u r a l dessa C o r t e e filho de u m "secretário q u e foi muitos a n o s d o R i o d e J a n e i -
ro q u e a q u i se e s t a b e l e c e u e p r i n c i p i o u a r o ç a r este sítio h á v i n t e a n o s e dele
a d q u i r i u o n o m e . D e s c a n s e i aí até. p e r t o d e cinco h o r a s , t a m b é m p o r c a u s a d o
calor, q u e cresceu a l g u m a coisa e. a esta h o r a , e saí p o r e n t r e a r v o r e d o s e b o m
c a m i n h o , e p o r isso gostoso, c o m claros d e a r v o r e d o b e m m a t i z a d o . D e p o i s d e
m e i a légua cheguei a u m rio n ã o p e q u e n o , e m q u e estava u m a p o n t e d e p a u p o r
q u e passei, e logo a o passá-lo está u m a aldeia c h a m a d a d o F a g u n d e s , p o r ser u m
Francisco F a g u n d e s , p a i d o d o n o , o q u e a fez, c o m sua casa d e p a l h a de s o b r a d o
e n ã o m á a c o m o d a ç ã o e n t r e as mais, e a q u i fiquei esta noite. E o rio t e m o m e s m o
n o m e , é vai c o m todos os p o r q u e t i n h a passado j u n t o s desaguar h o rio P a r a í b a ,
d e q u e a d i a n t e se dirá.

Seguiu-se o dia de quinta-feira, q u a t r o d a j o r n a d a , q u e a m a n h e c e u c o b e r t o .


E disposto t u d o a j o r n a d a , saí pelas cinco e meia, e logo entrei a subir p o r e n t r e
dois m o r r o s direito a o n o r t e , e depois entrei a descê-los e m m a i o r descida, n o fim
d o qual, e m sítio mais espaçoso, estava o u t r o r a n c h o , a q u e c h a m a m o Paiol; e d a í
tornei a subir logo p a r a o u t r o m o r r o e m m a i o r altura, o n d e estava a o u t r a aldeia,
d e três ou q u a t r o c h o u p a n a s , a q u e se c h a m a B o a Vista; e daí v i m descendo e m
m a i o r declive, n o fim do qual estava o u t r o r a n c h o , ou aldeia, c h a m a d o a r o c i n h a
d o F a g u n d e s ; e daí costeando, subindo e descendo, v i m a o u t r a , c h a m a d a a C e -
b o l a , j u n t o a u m ribeiro e m q u e e s t a v a m u m a s casas d e p a l h a s , m a s m a i o r e s e
c o m sua "ermida; e daí c o n t i n u a n d o , s e m p r e c o m subidas e a i n d a m a i o r e s desci-
das, m a s p o r c a m i n h o s m e n o s m a u s , passei o r a n c h o e r o ç a d e P e d r o M o r e i r a , e
p o u c o a d i a n t e a r o c i n h a desta roça; e depois, c o n t i n u a n d o s e m p r e p o r e n t r e os
m e s m o s m a t o s , e m q u e havia r a r i d a d e d e arvoredo e p a u s excelentes e q u a s e t u d o
c o p a d o , e q u a s e s e m p r e descendo, cheguei à b o r d a d o rio P a r a í b a pelas três q u a r -
tos p a r a o n z e , a cujo sítio fazem do F a g u n d e s cinco "léguas, q u e m e p a r e c e r a m
b a s t a n t e m e n t e c o m p r i d a s . E este r i o c a u d a l o s o , q u e t e n d o o seu p r i n c í p i o nas
serras d a vila d e P a r a t i , q u e é p o u c a s léguas p a r a o sul do R i o d e J a n e i r o p e l a
b o r d a do m a r , e daí c o r r e n d o p a r a as partes d a c i d a d e de São P a u l o , v e m fazendo
i m e n s o s giros, e tantos q u e v a d e a n d o - s e p o r m u i t a s p a r t e s h á sítios e m q u e se
passa dez, vinte e trinta vezes, e r e c e b e n d o todas [as] águas desta i m e n s i d a d e d e
serras e vales c o r r e p o r este sítio, e d a m e s m a f o r m a m e t e n d o e m si outros m u i t o s
rios vai aos célebres C a m p o s dos G o i t a c a s e s p e l a s u a a b u n d â n c i a , e daí se vai
e m b o c a r n o m a r n a capitania d a Paraíba, é o m e s m o q u e rio mau, d e q u e t o m a o
n o m e , e dista oitenta léguas do R i o [de J a n e i r o ? ] , precipitando-se p o r cachoeiras
infinitas e a l g u m a s d e e x t r a o r d i n á r i a a l t u r a , e p o r isso n ã o é n a v e g á v e l , s e n d o
profundíssimo e b a s t a n t e m e n t e largo, e sendo aqui a p e r t a d o t e m a l a r g u r a de dois
tiros d e m o s q u e t e . Passa-se e m e m b a r c a ç ã o , cujo r e n d i m e n t o é d e el-rei, e presente-
m e n t e t r a z a r r e n d a d o p o r q u a r e n t a e c i n c o mil c r u z a d o s c o m a " p a s s a g e m d o
P a r a i b u n a , e m q u e se p a g a u m a e outra, c o m o adiante se dirá. A o p a s s a r este rio
está u m l u g a r d e várias c h o u p a n a s , t a m b é m do m e s m o n o m e , c o m o u t r a s mais
p a l h o ç a s e e r m i d a , e entre elas u m a s casas d e m a d e i r a e s o b r a d o e telha, c o m d e z
j a n e l a s de sacada, e nos lados duas grandes v a r a n d a s c o m b o a s a c o m o d a ç õ e s p o r
d e n t r o , e m q u e hoje reside u m d o u t o r P e d r o Dias, " g u a r d a - m o r d e todas as M i -
nas e s e n h o r de d u a s léguas d e t e r r e n o pelo c a m i n h o q u e vim até a b o r d a deste
rio, d e cinco até P a r a i b u n a , d e m a i s d u a s até T r ê s I r m ã o s , e s e m m e d i d a p e l a
largura, p o r ser t u d o sertão, de q u e usa c o m o lhe p a r e c e . Seu avô era n a t u r a l de
S ã o P a u l o , c h a m a d o F e r n ã o D i a s , q u e foi o q u e teve a resolução d e e n t r a r p o r
estes sertões, descobrir as m i n a s , e neste d e s c o b r i m e n t o m o r r e u . E seu filho, G a r c i a
R o d r i g u e s , p a i deste P e d r o Dias, t a m b é m n a t u r a l d e São P a u l o , t e n d o a c o m p a -
n h a d o seu p a i nos descobrimentos, e pelas notícias d a situação e m q u e se a c h a -
v a m , e n t r o u a abrir este c a m i n h o do R i o d e J a n e i r o peio C o u t o até as M i n a s , e
p o r este e outros mais serviços e os d e seu p a i lhe fez el-rei d o m P e d r o II a m e r c ê
d e três léguas de terra p a r a c a d a filho q u e tivesse n a p a r t e do c a m i n h o q u e desco-
bria, q u e depois t e n d o vários filhos largou m u i t a p a r t e e ficou só c o m esta, q u e é
coisa i m e n s a . T a m b é m lhe fez m e r c ê do "ofício de g u a r d a - m o r das M i n a s , q u e
889

ele n ã o queria a c e i t a r dizendo a r r o g a n t e m e n t e q u e ele n ã o q u e r i a q u e el-rei lhe


fizesse m e r c ê p o r q u e ele é q u e as q u e r i a fazer a el-rei, e l e v a d o d e s t a m e s m a
e l e v a ç ã o d e paulista d e u a el-rei a " p a s s a g e m destes dois rios q u e n o p r i n c í p i o
m a n d a v a fazer pelos seus escravos, sem e m o l u m e n t o , e ofereceu a el-rei dizendo
p o d i a fazer nela u m b o m r e n d i m e n t o . Nesta casa m e hospedei e n e l a n ã o estava o
dito P e d r o D i a s , q u e ficava n o R i o d e J a n e i r o , m a s m e t i n h a feito a lisonja d e
m a n d a r a n t e c i p a d a m e n t e h o s p e d a r - m e , o q u e se m e fez c o m toda a b o a c o m o d i -
d a d e a m i m e m a i s "família q u e comigo vinha. A q u i fiquei n ã o só p o r q u e este e r a
o sítio destinado a ficar e d o r m i r e p o r q u e as cargas n ã o c h e g a r a m senão à noite,
e j u s t a m e n t e p o r q u e neste t e m p o se n ã o faz j o r n a d a d e t a r d e , p o r q u e o m u i t o
c a l o r dos dias a r m a s e m p r e d e t a r d e grandes trovoadas c o m e s t a m p i d o e clareios
g r a n d e s , a i n d a q u e eu até este sítio t i n h a tido a felicidade d e e s c a p a r , p o r q u e
a i n d a q u e s e m p r e se a r m a r a m n u n c a c h e g a r a m a ter efeito, p o r se desfazerem.
Este P e d r o Dias a n d o u e m C o i m b r a e se f o r m o u , e nesse t e m p o casou c o m u m a
s e n h o r a daí do c a m p o , do lugar de V e r r i d e , e nasceu n o R i o d e J a n e i r o . H á 42
anos q u e seu p a i f u n d o u esta casa, t e m p o e m q u e a c a b o u d e se abrir o c a m i n h o ,
e o n d e j á n a s c e r a m os irmãos q u e se lhe seguiram.

A m a n h e c e u / / o dia de sexta-feira, 31 d e j a n e i r o , e cinco d a m i n h a j o r n a d a , [ fl. 486v. ]


t o d o u n i f o r m e m e n t e coberto, e assim d e m o s toda a m a n h ã sem q u e o SoLnos fizesse
m í n i m o d a n o . Disposto t u d o a partir, saí pelas cinco e três quartos, e c o n t i n u a n d o p o r
e n t r e m o r r o s e m a t o s , igualmente j á subindo e j á descendo, mais e m e n o s , cheguei a
u m largo em distância d e duas "léguas, e m q u e está u m r a n c h o ou aldeia de p a l h o ç a s ,
q u e é do dito P e d r o Dias, c o m q u e faz b o m r e n d i m e n t o , p o r n ã o haver o u t r a nesta
vizinhança. C h a m a - s e F a r i n h a , d e u m *F. F a r i n h a q u e nela residiu m u i t o t e m p o , e é
p o v o a ç ã o d o p r i n c í p i o deste c a m i n h o , q u e foi a b e r t o nos p r i m e i r o s a n o s deste
século. Passada esta aldeia, vim c o n t i n u a n d o igualmente p o r e n t r e m a t o s n a m e s m a
forma, ainda por caminhos menos m a u s , subindo não muito, p o r é m descendo
e x t r a o r d i n a r i a m e n t e até o rio a q u e c h a m a m o P a r a i b u n a , q u e q u e r dizer rh fero,
o b s e r v a n d o assim a m u i t a altura e m q u e ficavam as terras e rio P a r a í b a , p o r q u e tinha
passado, e p o r isso t e m as cachoeiras e precipícios j á ditos. C h e g u e i a o dito rio pelas
dez h o r a s e u m q u a r t o , e m q u e faz cinco léguas, e aí d a p a r t e de q u e m m e h o s p e d o u
o m e s m o feitor d a P a r a í b a q u e tinha comigo vindo a h o s p e d a r - m e e m casas e m q u e
reside j u n t o a este rio e são do m e s m o P e d r o D i a s , e m q u e t a m b é m t e m várias
c a b a n a s e casas d e a c o m o d a ç ã o o r d i n á r i a p a r a os passageiros. A q u i fui t r a t a d o
igualmente e fiquei pela m e s m a r a z ã o das trovoadas, q u e neste dia e t a r d e h o u v e
u m a g r a n d e q u e aqui fez m e n o s impressão e chuva, e pelo c a m i n h o caiu c o m m a i s
a p e r t o e m u i t a á g u a q u e d e s a c o m o d o u aos "arrieiros q u e m e t r a z i a m as cargas e aos
mais q u e t a m b é m v i n h a m . Este rio [Paraibuna] é caudaloso e v e m d e várias p a r t e s
incluindo e m si muitos outros rios, e v e m a ser u m b r a ç o do rio Paraíba, e m q u e se vai
m e t e r e m b o a distância; t e m a m e s m a l a r g u r a que o Paraíba n a p a r t e e m q u e o passei
e h á nele e m b a r c a ç ã o p o r q u e se passa. D a o u t r a p a r t e dele está u m a casa e m q u e h á
u m "provedor, "oficio q u e el-rei v e n d e p o r 9, 10, mil "cruzados c a d a três anos, u m
"escrivão, q u e t a m b é m v e n d e p o r p o u c o mais, e u m "alferes c o m quinze soldados da
g u a r n i ç ã o do R i o de J a n e i r o . N i n g u é m p o d e passar p a r a as M i n a s sem licença do
g o v e r n a d o r do R i o , q u e se lhe passa e de q u e p a g a certo e m o l u m e n t o ao p r o v e d o r d a
F a z e n d a d a q u e l a cidade. Esta licença se apresenta a o passar deste rio àquele p r o v e -
dor, o qual a faz registrar e m livro de registro q u e assina o q u e a traz, de cujo registro
p a g a u m a "pataca, q u e são 320 ["réis], a o p r o v e d o r p o r assinar este registro e o u t r a
a o escrivão d e o fazer, e d a sua pessoa "meia p a t a c a p a r a o "contador e dois "vinténs,
q u e se r e p a r t e m pelos soldados e alferes, que percebe à p r o p o r ç ã o do seu o r d e n a d o ,
q u e s e m p r e lhe fica a salvo, assim c o m o o dos soldados; e d e c a d a cavalo 320 p a r a o
c o n t a d o r e dois vinténs p a r a os soldados, havendo-se nisto p o r p a g a a "passagem do
P a r a í b a , advertindo q u e pelos róis a n d a nesta "carreira p a r a c i m a d e q u i n h e n t o s
cavalos, os quais p a s s a m este rio oito e. dez vezes no a n o , e neles se "avança mais q u e
tudo. E o dinheiro dos soldados é tributo q u e a q u i i n t r o d u z i r a m os "governadores do
R i o c o m b o a consciência. E aqui n a d a escapa, p o r q u e h á rigoroso e x a m e a p u r á n d o -
se as licenças, q u e tendo alguma dúvida ou vindo alguém sem ela n ã o passa e t o r n a a
voltar, p o r q u e n ã o p o d e passar p o r o u t r a p a r t e p o r se n ã o v a d e a r este rip. E t u d o isto
q u e se p a g a é v i n d o p a r a cima ou p a r a baixo, e só t e m a, diferença de q u e p a r a baixo
se n ã o precisa licença e só se p a g a os 200 réis p o r c a d a pessoa e 360 p o r c a d a cavalo.
E t a m b é m o q u e t e m tenção de voltar às M i n a s é preciso leve certidão d e q u e passou,
p a r a no R i o se lhes passar segunda licença; e desta certidão p a g a m u m a p a t a c a , m e i a
p a r a o escrivão e m e i a p a r a o p r o v e d o r de a assinar. Este "registro está neste sítio h á
p o u c o mais d e trinta anos, e depois d e aberto o c a m i n h o e q u e se introduziu se pôs n a
serra da M a n g a l a r g a , p o r q u e passei, o n d e esteve p o u c o s anos e veio p a r a este sítio
depois q u e G a r c i a Rodrigues ofereceu a el-rei as passagens destes rios. Esta casa e m
q u e fiquei é feita p o u c o depois q u e se abriu o c a m i n h o e G a r c i a R o d r i g u e s fez a d o
P a r a í b a , e a q u i t e m "ermida sua e várias a c o m o d a ç õ e s , sendo suas t a m b é m as casas
e m q u e está o registro q u e d á g r a t u i t a m e n t e a el-rei. A q u i p a s s e i a n o i t e b e m
acomodado.

Seguiu-se o dia d e s á b a d o , seis d a j o r n a d a e p r i m e i r o de fevereiro, q u e a m a -


n h e c e u t o d o e n e v o a d o . E disposto t u d o a sair, passei o rio logo d e p o i s d e três
h o r a s , e e n q u a n t o se passavam as bestas e mais gente estive n o dito registro fazen-
d o registrar a m i n h a licença e d a "família e satisfazer os e m o l u m e n t o s , e j u n t a -
:

m e n t e r i n f o r m a n d o - m e d o q u e t e n h o dito, até q u e , p r o n t o t u d o , saí peías seis e u m


q u a r t o . E e n t r e i logo a t r e p a r p o r u m m o r r o a c i m a de n ã o p e q u e n a a l t u r a , e
depois dele se seguiram três i g u a l m e n t e grandes, a q u e c h a m a m os T r ê s I r m ã o s , e
neles n ã o h á mais q u e subir e descer sem d e m o r a , n e m e m b a i x o n e m e m cima, e
m e f o r a m p e n o s o s p o r q u e c o m o a t r o v o a d a t a m b é m p a r a este sítio n a t a r d e a n t e -
c e d e n t e c a r r e g o u c o m c h u v a p ô s p c a m i n h o i n c a p a z e o mais i n d i g n o q u e t i n h a
e n c o n t r a d o . A c a b a d o s os T r ê s I r m ã o s está u m a p e q u e n a aldeia ou r a n c h o d e duas
891

ou três casas, a q u e c h a m a m os T r ê s I r m ã o s , e m quase duas "léguas d e c a m i n h o ,


e daí a m e i a "légua, e m u m a b a i x a larga, estava outra, e m q u e d e n o v o se faziam
u m a s casas d e m a d e i r a e s o b r a d o e estavam j á duas ou três palhoças, c h a m a d a a
V á r z e a dos T r ê s I r m ã o s . V i m c o n t i n u a n d o todo este c a m i n h o s e m p r e e n t r e m a -
tos, como até a q u i , e s e m p r e s u b i n d o e descendo m a i s e m e n o s , c o m p o u c a ou
n e n h u m a diferença, e s e m p r e c o m c a d a vez piores c a m i n h o s ; passei, / / e s e m p r e [ fl. 4-87 ]
seguindo a o n o r t e , o sítio d e S i m ã o Pereira, q u e está e m u m b a i x o c o m seu r a n -
c h o , suas casas d e m a d e i r a e s o b r a d o e s u a " e r m i d a , f u n d a ç ã o do princípio deste
c a m i n h o ; e daí vim seguindo e m perto d e u m a légua a o n d e estava a r o c i n h a desta
roça, e depois veio o c a m i n h o , c o r r e n d o j u n t o , e à vista s e m p r e d o rio P a r a i b u n a
q u e a q u i corria; e aí passei a r o c i n h a d e M a t i a s B a r b o s a , e s e m p r e s e g u i n d o o
m e s m o rio e m m a i s de u m a légua, j á p r e c i p i t a d o , m a i s e m e n o s , c h e g u e i pelas
onze e meia, j u n t o a ele, a u m sítio a q u e c h a m a m Matias B a r b o s a , o n d e estava
disposta a m i n h a a c o m o d a ç ã o , q u e foi c o m descanso m e u até a m a n h ã seguinte.
Este sitio é f u n d a ç ã o t a m b é m do princípio do c a m i n h o , feita p o r u m M a t i a s Bar-
bosa, q u e o d e u e m d o t e a u m a filha q u e casou c o m u m * m e s t r e - d e - c a m p o do
R i o de J a n e i r o , e hoje brigadeiro e g o v e r n a d o r e m B r a g a n ç a ; é sitio c o m bastantes
a c o m o d a ç õ e s p a r a bestas d e carga, a i n d a p a r a g e n t e m u i t o p o u c a ; nele está u m
clérigo q u e administra, e m e s e g u r a r a m r e n d e r a o d o n o e m milhões e o m a i s q u e
se lhe gasta, três p a r a q u a t r o mil "cruzados. N e s t a s casas deste sítio, ou aldeia, q u e
t ê m a diferença de serem cobertas de telha, está p o s t o o "registro d o "contrato das
e n t r a d a s das fazendas q u e p o r este c a m i n h o v ã o p a r a as M i n a s , cujo c o n t r a t o , ao
todo, r e n d e p r e s e n t e m e n t e n o triénio a el-rei 113 "arrobas e u m a "libra o u libra
e m e i a de o u r o , q u e fazem a i m p o r t â n c i a d e u m m i l h ã o e seiscentos e tantos mil
c r u z a d o s , s e n d o este o m e l h o r registro d e t o d o s os q u e n o distrito d e t o d a s as
M i n a s t ê m este c o n t r a t o , p o r q u e nele se tira n o a n o p e r t o d e trezentos mil cruza-
dos. A q u i se p e s a m todas as cargas de fazenda {entende-se d e t o d a a q u e l a q u e vai
p a r a se v e n d e r , e n ã o do q u e c o n s t a q u e c a d a u m leva p a r a seu uso o u r o u p a d a
sua casa ou família) e p a g a c a d a duas arrobas de "fazenda seca, c o m o "fardos e t c ,
oitava e meia de ouro, que valem 2.250, e duas arrobas de "molhado, como
v i n h o , azeite e t c , m e i a oitava de o u r o , q u e são 750, e p o r c a d a escravo q u e p a s s a
a p r i m e i r a vez três mil réis, e p a r a p a s s a r a s e g u n d a é preciso m o s t r a r q u e j á esteve
nas M i n a s . Este registro está neste sítio h á doze anos, t e n d o estado antes n o sítio
[adiante, avizinhante?] d a B o r d a do C a m p o . O d o n o d á d e g r a ç a as casas desta
fazenda p a r a ele estar, p e l a g r a n d e conveniência q u e lhe faz o estar a q u i , p o r q u e
n ã o p a s s a m cargas q u e a q u i n ã o p a r e m e d e s c a r r e g u e m , e p o r isso d e s t i n a m a
j o r n a d a a ficar neste sítio, e assim é c e r t a a despesa e o lucro p a r a o d o n o d a
fazenda. H á neste registro u m " p r o v e d o r n o m e a d o pelos c o n t r a t a d o r e s , a q u e m
d ã o 2 p o r 100 e t e m a obrigação de correr o risco sobre ele todo o d i n h e i r o q u e se
deixa d e satisfazer n o registro, p o r q u e m u i t a s vezes o n ã o t r a z e m os "arrieiros e
custa espera; t e m m a i s u m "escrivão, a q u e m d ã o os m e s m o s c o n t r a t a d o r e s 2.000
892

o u 3 . 0 0 0 *réis e n o m e i a m ; h á t a m b é m n e s t e r e g i s t r o u m s o l d a d o d o s d a s
tropas das Minas, h a v e n d o antes dois, o qual está p a r a executar qualquer
o r d e m d o " c o n t r a t o ; e n e n h u m e s t i p ê n d i o t e m m a i s q u e os soldos d e el-rei. O
" g e n e r a l p r e s e n t e , h a v e r á d i a s , fez fixar n e s t e sítio u m " e d i t a l p a r a q u e n e -
n h u m e s c r a v o p a s s a s s e p a r a as M i n a s s e m q u e d e s t a p a s s a g e m se fizesse as-
s e n t o c o m o n o m e do e s c r a v o , d e q u e n a ç ã o e i d a d e t i n h a , e q u e m o p a s s a v a ,
e q u e [o] a s s e n t o assinasse este p a s s a d o r , e q u e d e n t r o d e dois m e s e s p o d e r i a
d i s p o r d e l e e, p a s s a d o s eles, " c a p i t á - l o , e a e s t e s o l d a d o d e u o g e n e r a l e s t a
i n c u m b ê n c i a , q u e assim se o b s e r v a , d e q u e se lhe n ã o p a g a c o i s a a l g u m a . E a
este sítio faz b o a s c i n c o "léguas do P a r a i b u n a .
Seguiu-se o dia d e d o m i n g o , q u e o foi neste a n o d a "Septuagésima e dia d a
Purificação d a S e n h o r a , o sétimo d a m i n h a j o r n a d a , q u e a p a r e c e u c o b e r t o e a o
depois e n t r o u a c h o v e r p o r a l g u m a s p a r t e s , a i n d a q u e s e m i n c ô m o d o m e u . Saí
deste sítio pelas seis e três q u a r t o s , depois d e ouvir missa, e c o n t i n u a n d o a v i a g e m
d a m e s m a sorte p o r e n t r e m a t o s e m o r r o s , e m p o u c o m a i s d e m e i a légua, n a
descida d e u m estava u m p e q u e n o r a n c h o j u n t o a u m ribeiro a q u e c h a m a m a
r o c i n h a do M a t i a s Barbosa; e depois c o n t i n u a n d o s e m p r e a subir e descer, s e m
fazer o u t r a coisa, a i n d a q u e p o r m e n o s m a u s c a m i n h o s q u e os d o dia a n t e c e d e n t e ,
e t u d o p o r e n t r e altos m a t o s e n a m e s m a forma q u e até a q u i , e assim passei p o r
o u t r o sítio a q u e c h a m a m a r o c i n h a do Medeiros; e c o n t i n u a n d o e m p o u c o mais
d e m e i a légua estava a roça d o M e d e i r o s , e m sítio mais l a r g o , j u n t o a u m ribeiro
e m q u e h a v i a casa d e t e l h a , a i n d a q u e d e m a d e i r a , e a l g u m a s c h o u p a n a s p a r a
a c o m o d a ç õ e s d o s p a s s a g e i r o s , e t o m o u o n o m e d e u m *F. M e d e i r o s , q u e n o
princípio do c a m i n h o fez esta roça; e dali c o n t i n u a n d o e m b a s t a n t e distância abai-
xo continuei d e s c e n d o de u m m o r r o , n o fim do q u a l t o r n o u n o v a m e n t e a a p a r e -
cer o rio P a r a i b u n a ; e v o l t a n d o u m giro q u e a q u i faz e m u m a b a i x a , aí e m u m
largo, j u n t o a ele está o u t r a p o v o a ç ã o ou r a n c h o de c h o u p a n a s e u m a casa t a m -
b é m d e s o b r a d o e telha, e m q u e ficam algumas pessoas presentes, e a q u i c h a m a m
o M a r m e l o , e faz a este sítio d o q u e saí mais d e q u a t r o léguas. L o g o p o u c o adiante
deste sítio se v ê vir precipitado o m e s m o rio p o r u n s m o r r o s e p e n e d o s a b a i x o , a
q u e c h a m a m a cachoeira do M a r m e l o , e faz célebre perspectiva. E daí v i m , sem-
[ íl. 487v. ] p r e à vista deste r i o , p o r iguais c a m i n h o s , e m distância de mais / / d e u m a légua,
e j u n t o a ele cheguei a u m sítio a q u e c h a m a m o J u i z d e Fora, p e l o meio-dia, a
q u e faz cinco léguas. E este sítio c o m o os mais; t e m u m a casa d e s o b r a d o e suas
a c o m o d a ç õ e s p a r a os m a i s passageiros, e é c h a m a d o do J u i z d e F o r a p o r q u e foi
e r i g i d o p o r u m Luís F o r t e s , "juiz d e fora q u e t i n h a sido n o R i o d e J a n e i r o , a
q u e m , p a r e c e , c r i m i n a r a m p o r a m i z a d e c o m os franceses n a ocasião e m q u e ulti-
m a m e n t e se a p o d e r a r a m d a q u e l a c i d a d e , e depois veio p a r a este sítio, e m q u e
viveu. E m p o u c a distância p a r a trás deste sítio se considera pelos experientes ser o
m e i o do c a m i n h o , c o m p u t a d a s as descidas e subidas d e todo ele. L o g o depois q u e
a q u i cheguei, q u e foi c o m b a s t a n t e c a l m a , se a r m o u u m a t r o v o a d a e e n t r o u a
c h o v e r raio, e pelo decurso d a t a r d e foi a p e r t a n d o a i n d a mais, c o m b a s t a n t e c h u v a
e excessivos t r o v õ e s , de q u e felizmente t í n h a m o s e s c a p a d o a t é a q u i e p o r isso
a c h a m o s os c a m i n h o s m e n o s m a u s , q u e c o m c h u v a s são os m a i s i m p r a t i c á v e i s ,
p o r t e r e m terras d e b a r r o q u e escorregam q u a n t o p o d e ser.
Seguiu o dia d e segunda-feira, oito d a m i n h a j o r n a d a , e p o s t o q u e a c h u v a
n ã o passou d a t a r d e a n t e c e d e n t e e s t a v a m os ares a i n d a grossos e o dia fresco e
excelente. Saí pelas seis h o r a s . E c o m o t i n h a chovido a c h e i o c a m i n h o i m p e r t i -
n e n t e , p o r e s b a r r a r s u m a m e n t e , d e f o r m a q u e era dificultosa a s u b i d a e a i n d a
mais a descida dos m o r r o s . O c a m i n h o era o m e s m o , entre arvoredos e s u b i n d o e
d e s c e n d o m o r r o s , a i n d a q u e sem atoleiros m a i o r e s . Passei o sítio d a r o c i n h a d o
Alcaide-mor c o m d u a s ou três c h o u p a n a s , e e m mais d e m e i a "légua e e m m e n o s ,
cheguei à roça do Alcaide-mor, que tinha u m a dúzia de choupanas, todas do
serviço d o m e s m o d o n o , e m u m b a i x o , j u n t o a u m p e q u e n o r e g a t o , e o d o n o
p r i m e i r o e r a *alcaide-mor do R i o de J a n e i r o , sogro de G a r c i a R o d r i g u e s ; p o u c o
mais a d i a n t e estava o u t r a r o c i n h a d o m e s m o alcaide-mor; e c o n t i n u a n d o p o r di-
a n t e , j u n t o a u m r i b e i r o e n o fim d e u m a m a i o r descida, estava a r o c i n h a d e
A n t ô n i o M o r e i r a , c o m m e i a dúzia de p a l h o ç a s e r a n c h o das cargas; e c o n t i n u a n d o
a d i a n t e , e m p e r t o légua, estava a roça do dito A n t ô n i o M o r e i r a , n a descida d e u m
m o r r o , e m u m sítio m a i s largo, c o m v i n t e e t a n t a s c h o u p a n a s e d u a s d e telha,
a i n d a q u e térreas d e m e n o s m á acomodação, serviço de u m d o n o . V i m c o n t i n u a n -
do s e m p r e a n o r t e , só c o m as diferenças das voltas dos c a m i n h o s , e p a s s a n d o u m
p e q u e n o rio, p o r j u n t o a u m a c a c h o e i r a c h a m a d a d e A n t ô n i o M o r e i r a , e m q u e
a l t a m e n t e se precipita a h a á g u a c o m u m notável e s t r o n d o , v i m , pelas d e z h o r a s ,
p a r a r n o v a m e n t e j u n t o à m a r g e m d o dito rio P a r a i b u n a , q u e n ã o t o r n e i a v e r
desde q u e saí até este sítio. E aí j u n t o a ele estava u m sítio c h a m a d o o Q u e i r ó s , o
qual t e m este n o m e do seu edificador. Assim c o m o todos os mais sítios, t e m m e i a
dúzia d e c h o u p a n a s , todas do d o n o , e u m r a n c h o , u m a d e telha m e n o s m á , e m
q u e m e a c o m o d e i e m i n h a "família, c o m sua "capelinha, a mais asseada das q u e
vi, e a q u i fazem cinco léguas p e q u e n a s ou q u a t r o maiores. A q u i fiquei e descansei
n ã o só p o r ser o destinado sítio p a r a o m e u c ô m o d o m a s p o r m e livrar do Sol, q u e
t e n d o d e s c o b e r t o m e principiava a a p e r t a r fortemente. E esta é a r a z ã o p o r q u e
q u e m faz p o r este c a m i n h o j o r n a d a c o m m a i s c ô m o d o neste t e m p o se a r r a n c h a d e
m a n h ã , p o r q u e ou e n t r a o Sol a fazer impressão c o m excesso, p o r a n d a r p o r c i m a
d a c a b e ç a dos q u e h a b i t a m estas alturas, ou se e n t r a a n u b l a r (que é o mais ordi-
nário) é a r m a r e m - s e trovoadas insofríveis, pelo h o r r o r q u e m e t e m p o r e n t r e estes
m a t o s e m q u e fazem m a i o r eco e p e l a q u a n t i d a d e d e c h u v a q u e l a n ç a m , c o m o
sucedeu nesta tarde, que se a r m o u o u t r a n ã o p e q u e n a . E c o n t a m os experientes q u e
neste t e m p o e r a m todos os dias indefectivelmente certas estas trovoadas logo depois
do "jantar^ e q u e até a q u i se n ã o t i n h a visto verão mais seco do q u e este, e p o r isso
a este t e m p o lhe c h a m a m o das águas, e m q u e mais chove do q u e n o t e m p o q u e p o r
aqui t ê m p o r inverno.
894

E m terça-feira, dia n o n o d a m i n h a j o r n a d a , a m a n h e c e u c o m u m a n o t á v e l
c e r r a ç ã o . E disposto t u d o a sair, p a r t i pelas cinco h o r a s e m e i a , e v i n d o j á p o r
c a m i n h o s a l g u m t a n t o desafogados, a i n d a q u e s e m p r e entre m a t o s , e m distância
d e m e i a "légua, passei a r o c i n h a do Q u e i r ó s , d e duas ou três c h o u p a n a s , d e o n d e
tinha saído; e daí a o u t r a meia, e m u m a baixa, passei o sítio d o A z e v e d o , e m q u e
havia casas de telhado, a i n d a q u e térreas, e m q u e h a v i a mais a l g u m a s c h o u p a n a s
p e r t e n c e n t e s t o d a s ao m e s m o d o n o ; e c o n t i n u a n d o p o r diante, s e m p r e s u b i n d o e
d e s c e n d o , o b s e r v a v a d e a l g u n s altos m a i s desafogados o e s p a ç o s o e m o n t u o s o
destas serras, e m q u e se n ã o vê o u t r a coisa mais q u e uns m o n t e s p e g a d o s a outros,
s e m m a i s interposição e n t r e eles q u e a d e alguns rios ou ribeiros. P o u c o adiante,
e m m e n o s d e légua, passei a r o c i n h a d o A z e v e d o , q u e são d u a s ou três c h o ç a s ,
c o m u m r a n c h o p a r a a c o m o d a ç ã o dos "arrieiros; e daí e m m a i s d e légua cheguei
a u m a baixa, j u n t o de u m ribeiro a o n d e c h a m a m o E n g e n h o , e m cujo lugar achei
bastantes casas d e p a l h a e algumas a c o m o d a ç õ e s , e u m a d e telha m e n o s m á , ain-
d a q u e n ã o b o a , e c o m sua *ermida, q u e serve d e freguesia, e é c h a m a d o E n g e -
n h o p o r h a v e r neste sítio u m de a g u a r d e n t e s , q u e n o princípio fundou o seu pri-
m e i r o f u n d a d o r , q u e era n a t u r a l do R i o d e J a n e i r o , e é p o v o a ç ã o d o princípio do
c a m i n h o ; d a í v i m c o n t i n u a n d o p e l o m e s m o c i m o e passei u m p e q u e n o sítio, a
q u e c h a m a m Luís Ferreira, do seu fundador, e hoje vive nele u m seu filho, forma-
d o , c h a m a d o Cristóvão Ferreira; t e m u m a s p e q u e n a s casas d a s u a residência c o m
sua e r m i d a ao p é e algumas p o u c a s a c o m o d a ç õ e s p a r a passageiros e c h o u p a n a s
[ íl. 4 8 8 ] p a r a o t r a t o d a casa. / / D a í vim s e g u i n d o q u a s e a n o r o e s t e e passei p o r o u t r a
b a i x a , c h a m a d a P e d r o Alvares, e m q u e [há] u m a s m e l h o r e s casas, a i n d a q u e tér-
reas, c o m sua e r m i d a e outras mais c h o u p a n a s e a c o m o d a ç õ e s , e j u n t o a o cami-
n h o u m " m o i n h o d e m i l h o e o u t r o de m a n d i o c a c o m " e n g e n h o d e água; d a q u i
e m p o u c a distância passei a sua r o c i n h a c o m três c h o u p a n a s ; e p o u c o a d i a n t e a
r o c i n h a de J o ã o G o m e s , só c o m u m a casinha e r a n c h o ; e daí a m e i a légua che-
guei, pelo m e i o - d i a , a u m a r o ç a c h a m a d a d e J o ã o G o m e s , p o s t a e m u m alto, e
t o m o u o n o m e d o p a i d o p o s s u i d o r , q u e a c o m p r o u j á p r i n c i p i a d a pelo j á dito
P e d r o Alvares, q u e d a q u i foi p a r a a que hoje t e m o seu n o m e , e m q u e a i n d a existe
e é p o v o a ç ã o d e p o u c o depois d e descoberto este c a m i n h o . N e s t e sítio fiquei n ã o
mal a c o m o d a d o ; tinha suas casas sofríveis, ainda q u e térreas, e outras mais c h o u p a -
nas do serviço, dois ranchos e sua ermida. Neste dia se m e mostrou p a r a a p a r t e d e
oeste u m a altíssima serra c h a m a d a da Ibitipoca, d e q u e nasce o rio P a r a i b u n a , o rio
G r a n d e d e São P a u l o , que vai desembocar e m [incompleto] graus de latitude a o sul, e
outro rio que se vai m e t e r n o d a Prata.

E m quarta-feira, décimo d a m i n h a j o r n a d a e 5 d e fevereiro, a m a n h e c e u n u -


b l a d o e d e n s o . E p r e p a r a d o e disposto t u d o , saí pelas seis h o r a s , e c a r r e g a n d o mais
p a r a oeste vim c o n t i n u a n d o a subir e descer m o r r o s p o r entre m a t o s , a i n d a q u e j á
cortados, ficando mais espaçosos. E passado p e r t o d e u m a légua c h e g a m o s a u m a
p e q u e n a aldeia c h a m a d a o P i n h o V e l h o , c o m p o u c a s c h o u p a n a s e s i t u a d a e m
u m a baixa; e daí c o n t i n u a n d o e m mais d e "légua, cheguei a o u t r a e m q u e se fazia
duas léguas d o n d e Unha saído, c h a m a d o o P i n h o N o v o , t a m b é m p e q u e n a aldeia
d e p o u c a a c o m o d a ç ã o p a r a passageiros; p o u c o a d i a n t e , e m p e r t o d e m e i a légua,
está j u n t o a u m rio o u t r a aldeia, c h a m a d a a M a n t i q u e i r a , c o m suas novas casas e
q u a d r a d a s q u e se a n d a v a m fazendo, c o m cinco janelas p o r b a n d a e d e p e d r a , q u e
foram as primeiras q u e neste c a m i n h o vi desta forma; daí entrei a subir e vim até
u m ribeiro e m p o u c a distância e. dele entrei a subir p o r u m a serra a c i m a , c h a m a d a
d a M a n t i q u e i r a , e m distância d e m e i a légua b o a , d e subida, a l é m d o m a i s q u e
p a r a ela se v e m subindo ao longe — é d e b a r r o , ou "tijuco, q u e assim se c h a m a p o r
cá, é de n ã o dificultosa subida. D o alto dela, o l h a n d o p a r a trás, vi a distância d o
q u e t i n h a a n d a d o até a serra do M a r e a infinidade d e m o n t e s d e q u e sê c o m p õ e m
estas serras, n a v e r d a d e , d e m a s i a d a m e n t e fragosas. D a í vim c o n t i n u a n d o p o r c i m a
d a serra e m distância d e u m q u a r t o d e légua, e d a í p r i n c i p i o u o u t r a s u b i d a d e
o u t r o q u a r t o de légua, e t u d o ainda p o r e n t r e m a t o s , a i n d a q u e j á n ã o t ã o densos
n e m . t ã o altos; e c o n t i n u a n d o s e m descer t a n t o q u a n t o s u b i r a passei p o r o u t r a
aldeia, c h a m a d a [Palheiros?], d e p o u c a a c o m o d a ç ã o . E daí v i m j á d e s c o b r i n d o
alguns m o r r o s descobertos sem matos, e só as baixas é q u e t i n h a m algum, até q u e
cheguei mais m e foram a p a r e c e n d o descobertos os m o r r o s , e a i n d a q u e o calor a
esta h o r a m e a p e r t a v a b a s t a n t e , c o n t u d o vinha j á c o m algum desafogo, v e n d o q u e
respirava e se e s t e n d i a m mais a o longe os objetos d a vista, d e i x a n d o aquele afoga-
do e melancólico c a m i n h o e m q u e e m dez dias n ã o via o u t r a coisa s e n ã o o m a t o e
árvores i m e d i a t a s a m i m . Assim, neste m a i o r desafogo, c h e g u e i pelo m e i o - d i a a
u m a b a i x a e m q u e h á u m sítio c h a m a d o a B o r d a do C a m p o , p o r nele se a c a b a r o
c a m i n h o do m a t o , e aqui faz seis léguas d o n d e saí. E sitio d e b a s t a n t e s c h o u p a n a s
e d e casas, a i n d a q u e t é r r e a s , suficientes e d a m e l h o r a c o m o d a ç ã o e t r a t o q u e
achei; t e m s u a " e r m i d a e seu " m o i n h o de m i l h o o r d i n á r i o c o m o os do R e i n o e
o u t r o m a i o r , q u a s e pelo feitio dos d e " e n g e n h o d e p a p e l e m q u e se faz "farinha d e
m i l h o , q u e só serve p a r a se c o m e r c o m o p ã o , assim c o m o a de m a n d i o c a , a q u e aí
c h a m a m o s d e p a u : deita-se o milho seco e m u n s vasos d e p a u q u e estão m e t i d o s
à superfície d a t e r r a , sobre o q u a l c a e m uns p e s a d o s p a u s c o m d u a s c h a p a s d e
ferro nas p o n t a s m o v i d o s pelo e n g e n h o ; a q u i se q u e b r a e m p e d a ç o s o m i l h o e lhe
fica t i r a d o a q u e l e c a s c a b u l h o d e fora; d a q u i se tira, e p e n e i r a p a r a se s e p a r a r o
m e s m o c a s c a b u l h o , e depois de t i r a d o se l a n ç a assim q u e b r a d o e m tinas, d e á g u a ,
n a s quais está d e m o l h o oito e n o v e dias; e depois disso o t o r n a m a d e i t a r nos
m e s m o s vasos,, e m q u e se m ó i mais, m a i s ficando e m [pastame?] mais grosso; e
aqui se tira p a r a u m a grande caldeira de cobre que está e m u m a fornalha, o n d e se seca
esta farinha e depois de seca fica servindo p a r a se comer, e n ã o serve p a r a outra coisa.
A q u i fiquei todo este dia, e m que fui tratado como e m parte n e n h u m a .

Seguiu-se o dia de quinta-feira, 11 dias d a m i n h a j o r n a d a , n u b l a d o . E dis-


posto t u d o a sair, saí pelas cinco e meia, e n a c o m p a n h i a deste roceiro t o m a m o s o
c a m i n h o seguindo a m e i a p a r t i d a e n t r e n o r t e noroeste p o r ela, e d e s c a i n d o p e l a
896

q u a r t a endireitei a o n o r t e . Logo a o sair deste sítio vi d a p a r t e e s q u e r d a a estrada


q u e vai p a r a a vila d e S ã o J o ã o d o R i o das M o r t e s , e foi a p r i m e i r a estrada diversa
q u e e n c o n t r e i até aqui, sendo a p o r q u e t i n h a vindo única, e m forma q u e a i n d a os
[ fl. 4 8 8 v . ] ignorantes dela a h ã o de acertar. V i m entrando pelo que c h a m a m C a m p o , / /
d e i x a n d o j á o c a m i n h o a q u e c h a m a m do M a t o . É c h a m a d o c a m p o p o r descober-
to, a respeito do m a t o , e, n a v e r d a d e , é c a m i n h o excelente e desafogado; é igual-
m e n t e subindo e descendo m o r r o s , a i n d a q u e mais p e q u e n o s ; são todos faltos d e
m a t o s e c o b e r t o s i g u a l m e n t e d e u m feno d e u n s dois p a l m o s , e s o m e n t e pelas
b a i x a s e q u e b r a d a s deles h á v á r i a s n ó d o a s de m a t o , a q u e c h a m a m c a p õ e s e
capoeiras — capões são aquelas n ó d o a s q u e a i n d a estão d e m a t o v i r g e m e capoei-
r a s a q u e l a s q u e a i n d a são m a t o , m a s é m a i s p e q u e n o p o r c o r t a d o e t o r n a d o a
crescer h á p o u c o t e m p o . E assim d a v a este c a m i n h o lugar a a l g u m a extensão d e
"léguas n a vista p a r a a p a r t e d e peste, q u e p a r a a de leste ia s e m p r e a vista e m
p o u c a distância dos m e s m o s m a t o s a q u e aqui c h a m a m os Gerais, p o r q u e conti-
n u a m i g u a l m e n t e até à c a p i t a n i a do Espírito S a n t o e C a m p o s dos Goitacases. E
p o r se sair deste m a t o se c o r t o u o c a m i n h o n a q u e l a volta, p o r se sair ao c a m p o , e
p o r isso fica mais distância p o r causa desta volta. T e n d o a n d a d o p e r t o d e u m a
légua, c h e g u e i p e l a b o r d a d e u m rio, q u e reparei e m ir b a r r e n t o , e se m e disse ser
p o r causa d e se m i n e r a r c o m a água dele e m distância d e u m a légua dali. E a este
rio o c h a m a m o d o Registro V e l h o , e é o q u e , j u n t a n d o m a i s á g u a s , v a i p a s s a r
p e l a vila de S ã o J o ã o , a q u e aí c h a m a m das M o r t e s , e é u m a das cabeceiras do rio
d a P r a t a . V i m c o n t i n u a n d o p o r j u n t o a ele e m distância d e u m q u a r t o d e légua,
até q u e o p a s s e i p o r u m a p o n t e d e p a u , a o sair d a q u a l e s t a v a u m l u g a r n ã o
p e q u e n o c h a m a d o R e g i s t r o V e l h o , p o r n e l e ter tido o seu p r i m e i r o a s s e n t o o
"registro das e n t r a d a s , de q u e j á falei, e esteve alguns vinte a n o s . E aldeia m a i o r
d o q u e as p o r q u e t i n h a p a s s a d o , a i n d a q u e as casas são c o m o as p a s s a d a s . O
p r i m e i r o q u e j u n t o a ele fez roça foi G a r c i a R o d r i g u e s , o q u e descobriu o c a m i -
n h o , c o m u m a i r m ã do qual casou u m M a n u e l d e Sá, filho de O u r é m e i r m ã o do
"juiz de fora do R i o Luís Fortes, d e q u e j á falei, q u e c o m ele veio e p a r a este sítio
veio residir e fez as casas q u e nele h á hoje, c o m s u a " e r m i d a e e m q u e a i n d a
reside, e t a m b é m e m outras casas u m seu p a r e n t e , p e r t e n c e n d o a a m b o s o q u e h á
no dito lugar. Dois filhos deste sujeito t i n h a m sido do m e u t e m p o d e C o i m b r a , e
assim q u e s o u b e r a m e u t i n h a ficado no dia a n t e c e d e n t e n a o u t r a r o ç a m e f o r a m a
ela logo a visitar e lhes devi irem nesta m a n h ã c o m o dito *F., seu pai, a esperar-
m e a o c a m i n h o , e t r a z e n d o - m e à sua casa m e t r a t a r a m nela c o m bizarria, sentindo
q u e eu n ã o houvesse d e ficar ali. Saí d a q u i pelas oito h o r a s , a c o m p a n h a n d o - m e
todos i g u a l m e n t e e o m e s m o roceiro e m q u e tinha ficado, até u m alto distante, e m
q u e j á n ã o consenti eles passassem. C o n t i n u e i p o r igual c a m i n h o , e p a s s a n d o u m
p e q u e n o sítio c h a m a d o de J o s é R i b e i r o cheguei a o u t r o c h a m a d o d a Caveira, e m
q u e faz u m a légua do Registro e é aldeia p o u c o m a i o r ; e daí a o u t r a légua passei
o u t r a p e q u e n a aldeia c h a m a d a o C a n g a l h e i r o ; e daí a outra, p o r igual c a m i n h o ,
cheguei pelas o n z e h o r a s a u m sítio c h a m a d o o R i b e i r ã o d e Alberto Dias — t e m
j u n t o a si u m riacho q u e t a m b é m é cabeceira do rio d a P r a t a e se vai m e t e r daí a
três *léguas no d o Registro —, no qual m e a g u a r d e i e fui t r a t a d o c o m g r a n d e z a e
limpeza, p o r ter o roceiro j á aviso d e q u e v i n h a . Foi fundação d e u m paulista j á n a
a b e r t u r a d o c a m i n h o , a q u e m o c o m p r o u o roceiro atual, õ q u a l o t e m h á anos
m e l h o r a d o b a s t a n t e m e n t e c o m casas, algumas d e p e d r a , e sua *ermida, e t u d o d e
u m só d o n o . D a q u i saí d e p o i s das q u a t r o h o r a s , p o r a d i a n t a r m a i s a j o r n a d a ,
v e n d o t a m b é m q u e j á as b e s t a s d e c a r g a d a m i n h a c o m i t i v a m e n ã o p o d i a m
a c o m p a n h a r e t i n h a m ficado a t r á s n o dia a n t e c e d e n t e p e r n o i t a n d o a n t e s d a
serra da Mantiqueira, e precisava por alguma razão chegar em mais breve
t e m p o , a p e s a r d e m a i o r e s m a n h a s das b e s t a s , a q u e n ã o e s t a v a m c o s t u m a d a s .
E m d i s t â n c i a d e m e i a l é g u a p a s s e i p o r u m sítio d e p o u c a s c h o u p a n a s a q u e
c h a m a m S a m a m b a i a ; daí c o n t i n u a n d o p o r c a m i n h o s iguais e c o m bastante
c a l o r c h e g u e i à R e s s a q u i n h a , q u e fica e m d i s t â n c i a d e u m a l é g u a d a S a m a m -
b a i a . E a l d e i a p e q u e n a c o m suficiente a c o m o d a ç ã o , e r m i d a e fica j u n t o a u m
riacho, e é do princípio do c a m i n h o . D a í vim c o n t i n u a n d o e passei p o r u m a
p e q u e n a aldeia c h a m a d a C a p o e i r a , de p o u c a a c o m o d a ç ã o , e daí c o n t i n u a n -
do passei p o r o u t r a aldeia, c h a m a d a a Ressaca, de mais a c o m o d a ç õ e s p a r a
p a s s a g e i r o s o r d i n á r i a s , c o m s u a e r m i d a d e p e d r a e cal, q u e foi a p r i m e i r a q u e
n e s t a f o r m a e n c o n t r e i ; e j á d e n o i t e , p e l a s sete h o r a s , c h e g u e i a u m sítio c h a -
m a d o o G a m a , e m q u e faz l é g u a e m e i a d a R e s s a q u i n h a e t r ê s l é g u a s d o
R i b e i r ã o ; é sítio p e q u e n o e d e a c o m o d a ç ã o o r d i n á r i a e t e m o n o m e do c o g n o -
m e d o seu p r i m e i r o f u n d a d o r . A q u i p e r n o i t e i .

Seguiu-se o dia de sexta-feira, 12 d a m i n h a j o r n a d a , q u e a m a n h e c e u claro e


t o d o d e s c o b e r t o . P r o n t o t u d o a p a r t i r , saí pelas c i n c o h o r a s , e c o n t i n u a n d o a o
n o r t e , a i n d a q u e inclinando algumas vezes p a r a a q u a r t a do noroeste, v i m conti-
n u a n d o p o r iguais c a m i n h o s d e s u b i d a e descida, a i n d a q u e p o u c o í n g r e m e , e
b o m c a m i n h o e d e m e l h o r c o m o d i d a d e p a r a a n d a r . Passei o sítio d o C a r a n d a í ,
e m u m a b a i x a j u n t o a u m p e q u e n o rio deste n o m e , e é sítio de. p o u c a considera-
ção e a c o m o d a ç õ e s ordinárias, e u m a légua d a q u e saí; daí passei, e m p e r t o d e
m e i a légua, a r o c i n h a d a T a i p a , p o v o a ç ã o d e duas o u três c h o u p a n a s , e daí a m e i a
légua estava a r o ç a c h a m a d a . . . 1

Cópia interrompida no original.


898

• 139 <

[ il. 489 ] Itinerário geográfico com a verdadeira descrição dos caminhos,


estradas, roças, sítios, povoações, lugares, vilas, rios, montes e
serras que há da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro até as
Minas do Ouro. Composto por Francisco Tavares de Brito.
Sevilha. Na oficina de Antônio da Suva. MDCCXXXII [1732].
Com todas as licenças necessárias

Nota explicativa de um mapa elaborado provavelmente em


1717, que, com o acréscimo de u m a p e q u e n a introdução e a
atualização de alguns dados, foi transformada em roteiro p a r a
as Minas Gerais, partindo de Santos ou do Rio de Janeiro. Arro-
la as propriedades, pousos, serras, rios, principais lavras. Des-
creve os rios de maior porte, as comarcas e seus limites e historia
a evolução das vilas. Note-se que a redação de. u m a introdução e
a menção ao período em que Minas Gerais e São Paulo forma-
vam u m único governo e à descoberta dos diamantes, j á em
1729, sugerem intervenções na versão original e m pelo menos
dois momentos diferenciados. A transformação de u m a legenda
em texto apenas com a exclusão das convenções utilizadas n a
indicação de fazendas, engenhos, roças, lavras, serras, arraiais e
povoações explica o aspecto fragmentário e desordenado de al-
guns trechos.
A introdução ao documento e a natureza das informações
apresentadas sugerem que sua preparação viesse atender d e m a n d a
do secretário real Alexandre de Gusmão, que, através do levan-
tamento de documentos e de inquéritos solicitados a funcionários
e colonos sobre aspectos geográficos, históricos, etnográficos e
econômicos das regiões em litígio com a E s p a n h a , reunia ele-
mentos p a r a as negociações a favor de Portugal, antes mesmo
da fase preparatória do T r a t a d o de Madri.
Integrando u m grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados a sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, o documento ilustra o interesse do súdito letrado, que se
aproveita da experiência no ultramar p a r a reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa n a América.
Autoria, l o c a l e data: Francisco Tavares de Brito [Félix
de Azevedo Carneiro e Cunha]; Lisboa; 1732.
U s o n a h i s t o r i o g r a f í a : Waldemar de Almeida Barbosa
busca neste documento subsídios para a reconstituição dos ca-
minhos para Minas. [História de Minas. Belo Horizonte: Comuni-
cação, 1979.V. l , p . 470-474). Carlos Magno Guimarães e Liana
Maria Reis contestam a exclusividade da mineração e demons-
tram a diversificação de atividades na região, o movimento de
expansão agrícola e de ocupação da terra utilizando dados deste
impresso {Agricultura e caminhos de Minas 1700-1750. Revista do
Departamento de História, Belo Horizonte, v, 4, p. 85-93, 1987).
Marcos Magalhães de Aguiar destaca deste documento a descri-
ção de Vila R i c a (Vila R i c a dos c o n f r a d e s : s o c i a b i l i d a d e

E
confraria! entre negros e mulatos no século XVIII. São Paulo:
Uctnprchm Universidade de São Paulo, F P L C H , 1993. p . 21-22).
Itinerario Gei
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Trata-se de uma descrição prece-
an o s Icmttcs <
dida de exórdio objetivando despertar a simpatia do leitor. Se-
: M í i u s ) roô l o
gundo Rafael Bluteau, "descrição" é "Definição imperfeita. Re-
xíTou curioüs , presentação, ou pintura de alguma cousa com palavras" (Vocabu-
:cs n o t i c b í ; m u lário português e latino [...] Coimbra: Colégio das Artes da Com-
:ogmtos cfpjços panhia de Jesus, 1713. V. 3, p. 115). Verifica-se a aplicação d a
cs i n c e r t o s c e n a tópica poética do locus amenus ("lugar ameno") e de tópicas ca-
tem Tcrüdo i c racterísticas do gênero encomiástico. Conjugando o verbo n a
dadetns noticüs primeira pessoa do singular, o narrador utiliza artificio retórico
inteiro c r e d i t o a que visa envolver o leitor na narrativa. (JPF)
' c f o . D o w h e filhe C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna. Texto im-
presso, com iluminura na página de rosto e escatocolo e vinhetas
nas páginas A2 e A4. Letra típica cia imprensa do século XVIII,
em que sobressaem o " s " simples ou duplo em forma da cajado
invertido; uso do "y" como semivogal nos ditongos; uso moderno
do "v" e do "u". Para acentuação, o agudo marca tonicidade ou
abertura de vogal, como em "só", que alterna com o grave, como
em "será"; o til da nasalização deslocado, como em "naõ". (YDL)
Critérios e d i t o r i a i s : As colações foram feitas a partir das
duas versões manuscritas do documento e restringiram-se aos
termos que comprometiam o significado e o entendimento do
texto, mantidas as pequenas variantes e as supressões introduzidas
pelo impressor.
Cópias manuscritas:

BPE, ^ • descrição do mapa geográfico que compreende os limites do


governo de São Paulo e Minas e também do Rio de Janeiro.
BA, 54 ~ X I I I - 4. Descrição do mapa geográfico que compreende os ümües
do governo de São Paulo e Minas e também do Rio de Janeiro.
Cópias impressas:
B R I T O , Francisco Tavares de. Itinerário Geográfico com a ver-
dadeira descrição dos caminhos, estradas, roças, sítios, povo-
ações, lugares, vilas, rios, montes e serras que há da cidade de
São Sebastião do Rio de Janeiro até as Minas do Ouro. Revis-
ta do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 20,
p. 430-441, 1956.
900

B R I T O , Francisco Tavares de. Itinerário Geográfico com a ver-


dadeira descrição dos caminhos, estradas, roças, sítios, povo-
ações, lugares, vilas, rios, montes e serras que h á d a cidade de
São Sebastião do Rio de Janeiro até as Minas do O u r o . Bar-
roco, Belo Horizonte, v. 4, p. 91-118, 1972. Edição fac-simi-
lar.
DERBY, Orville A. U m m a p a antigo de partes das capitanias
de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Revista do Ins-
tituto Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v, 2, p .
197-219, 1898.

[ fl. 4 9 0 ] Introdução

E u e m p r e e n d i o r d e n a r e descrever u m itinerário geográfico e m q u e se incluís-


sem os limites do g o v e r n o d e São P a u l o e M i n a s n ã o só p o r p e r s u a s ã o de algumas
pessoas curiosas q u e desejavam semelhantes notícias m a s p a r a q u e se s a i b a m os
incógnitos espaços d a q u e l e *país e desterrar os incertos conceitos d e todos os q u e
o n ã o t ê m versado. E p o r q u e colhi de t u d o verdadeiras notícias, r a z ã o será q u e se
m e d ê inteiro crédito a t u d o neste itinerário referido, pois é filho d e u m a notícia
m u i t o individual.
B e m sei q u e a p r e s e n t e m a t é r i a é prolixa e e m b a r a ç a d a , e p o r isso p o u c o
agradável aos q u e n ã o t ê m uso d a geografia, m a s c o n t u d o tão útil e proveitosa às
[fl. 490v. ] coisas civis dos negócios dos príncipes, às facções / / militares, a o c o n h e c i m e n t o
do q u e h á n a t e r r a e n o m a r q u e se n ã o p o d e crer q u e haja a l g u é m q u e possa
t r a t a r estas d e p e n d ê n c i a s c o m p r o p r i e d a d e sem c o n h e c i m e n t o desta ciência, c o m o
escreveu o doutíssimo E s t r a b ã o n o livro I d e sua Geografia^ o n d e diz q u e todos os
q u e t ê m negócios nas cidades necessitam de c o n h e c i m e n t o desta ciência, p o r ser a
q u e m a i s lhes c o n v é m e oferece a c a d a passo.
Confesso i n g e n u a m e n t e q u e m e não a n i m a v a a t o m a r semelhante e m -
p r e s a , p o r q u e a i n d a q u a n d o h á o b s e r v a ç õ e s m a i s e x a t a s s e m p r e os p e r i t o s n a
a r t e e n c o n t r a m q u e e x a m i n a r e e m e n d a r , p o r a u m e n t o o u p o r defeito, p o r -
q u e assim c o m o n a p r á t i c a se n ã o p o d e r á f a c i l m e n t e d a r u m a l i n h a r e t a , assim
t a m b é m se n ã o p o d e r á n e s t a ciência c o n c e d e r u m a c e r t a e infalível m e d i d a , e
só sim u m a tal q u e seja s e m falência. Assim m e resolvi, p e r s u a d i n d o - m e q u e
p o d i a m p a s s a r s e m e s t a e s p e c u l a ç ã o os q u e fiam t ã o d e l g a d o , e n t e n d e n d o
q u e g u i a n d o - s e p e l o r o t e i r o deste i t i n e r á r i o n ã o t r o p e ç a r ã o n o s o b s t á c u l o s d a

Geógrafo grego, nasceu em Amasea, aproximadamente em 58 a.C. e morreu entre 21 e 25 d.G. Na


sua obra intitulada Geografia; oferece dados de caráter histórico de inúmeros povos e impérios.
901

i n c e r t e z a p e l a falta d e c o n h e c i m e n t o d a s / / d i s t â n c i a s dos l u g a r e s q u e c o m - [fl- 491 ]


preende e ensina.
P o d e r á b e m s u c e d e r q u e se v e n h a a c o n t i n u a r esta tarefa a u m e n t a n d o - s e
c o m largas e úteis notícias assim das q u e se d e i x a m d e dizer, p o r n ã o p a r e c e r
prolixo neste itinerário, c o m o das mais q u e se p o d e m a d q u i r i r n o vasto â m b i t o
d a q u e l a *província. E n q u a n t o se n ã o segue esta fortuna, viva o leitor nesta espe-
rança.

*Vak

Itinerário [ fl. 492 ]

Gosta marítima

B a r r a g r a n d e d e Santos; Bertioga, b a r r a p e q u e n a ; rio d e U n á , c a p a z d e lan-


chas; b a r r a de T o q u e - T o q u e , d a ilha d e S ã o Sebastião; b a r r a das Canavieiras, d a
m e s m a ilha; rio U b a t u b a ; b a r r a d e C a i r o ç u ; b a r r a d e M a r a m b a i a ; rio G u a r a t i b a ,
d e lanchas; rio Tijuca, d e lanchas; b a r r a do R i o d e J a n e i r o .

Ilhas

I l h a d a M o e l a ; ilha dos Alcatrazes; Uha d e S ã o Sebastião; ilha dos P o r c o s ;


ilha das C o u v e s ; ilha G r a n d e ; ilha d e J o r g e Galego; ilhas do Pai.

Povoações marítimas [ fl. 492v. ]

S ã o V i c e n t e ; Santos; vila d e U n á ; vila d e S ã o Sebastião; vila d e U b a t u b a ;


vila d e Parati; vila d e A n g r a dos Reis; c i d a d e do R i o d e J a n e i r o ; vila de M a c a c u ;
cidade d e C a b o Frio.

C a m i n h o p a r a as M i n a s , p a r t i n d o d e S a n t o s

A q u i se e m b a r c a e m c a n o a e se vai p o u s a r a o p é d a serra d e C u b a t ã o . Pela


m a n h ã se sobe a serra, a q u a l j á hoje está c o m c a p a c i d a d e p a r a se c h e g a r à sua
altura, exceto e m dois ou três *passos, o n d e é preciso a p e a r e m - s e os c a m i n h a n t e s
se se n ã o q u e r e m ver e m p e r i g o , p o r q u e p a r a q u a l q u e r p a r t e q u e c a í r e m a c h a r ã o
precipício inevitável. E m p o u c o mais d e três h o r a s se vence a e m i n ê n c i a d a q u e l a
serra, d a qual se vê o m a r e a planície d a terra c o m u n i c a d a das t r a n s p a r e n t e s e
cristalinas águas d e infinitos rios, q u e servem p a r a a vista de agradáveis e lisonjei-
ros objetos. / / A esta serra e sua cordilheira d e r a m os p r i m e i r o s h a b i t a d o r e s o [ fl. 4 9 3 ]
902

n o m e de P a r a n a p i a c a b a , q u e significa, n a *língua geral do Brasil, lugar donde se vê o


mar.
E p r o s s e g u i n d o a j o r n a d a se vai p e r n o i t a r n o rio dos C o u r o s , e n o o u t r o dia
se e n t r a n a cidade Tde São P a u l o ! até o meio-dia o u u m a h o r a , e m j o r n a d a ordi-
n á r i a . D e s t a c i d a d e se p a r t e p a r a as M i n a s e se passa pelas passagens seguintes:
Nossa S e n h o r a d a P e n h a (fazenda dos p a d r e s d a C o m p a n h i a [de J e s u s ] , e se
p a s s a n u m rio a o sair dela); vila d e M o g i (passa-se u m rio a o e n t r a r ) ; vila d e
J a c a r e í (passa-se, antes de e n t r a r n a vila, o rio P a r a í b a , e m canoa); princípio d o
C a p ã o G r a n d e ; C a p e l a ; vila d e T a u b a t è ; vila d e P i n d a m o n h a n g a b a ; G u a r a t i n g u e t á .
A esta vila t a m b é m v e m d a r o c a m i n h o d e P a r a t i , q u e c h a m a m o C a m i n h o
V e l h o , e q u e m sai de P a r a t i , v e m ao B a n a n a l , sobe a inacessível serra e descansa
n a A p a r i ç ã o ; passa-se o rio P a r a i t i n g a (que t o m a a q u i o n o m e das serranias p o r
o n d e p a s s a e l o g o depois se c h a m a P a r a í b a d o Sul); e se p e r n o i t a n o sítio q u e
t a m b é m t o m a o n o m e do rio; Afonso M a r t i n s ; passa-se a q u i o F a c ã o , q u e é u m
[ fl. 493v. ] *carreirínho / / q u e vai pelo alto de u m c u m e , no qual a p e n a s passa u m cavalo ou
passa u m h o m e m a p é , e se acaso declina para. a l g u m a das p a r t e s se precipita.
Vai-se à E n c r u z i l h a d a e se e n t r a depois n a vila d e G u a r a t i n g u e t á , j á dita, e
dela se p a r t e p a r a as M i n a s , passando-se e m c a n o a , e daí a b r e v e distância o rio
P a r a í b a , n o sítio d e Aipacaré; e se prossegue a c a m i n h o das M i n a s .

Sítios o u r o ç a s d e s t e c a m i n h o

E m b a ú ; passa-se u m rio vinte vezes, e p o r isso se c h a m a o Passa V i n t e ; sobe-


se a notável cordilheira ou serra d a M a n t i q u e i r a ; passa-se o u t r o rio trinta vezes e
lhe c h a m a m o Passa T r i n t a ; e se vai a o Pinheirinho; daí a R i o V e r d e ; Pouso Alto;
B o a Vista.
Sobe-se u m m o n t e e m cujo c u m e se dilata a vista c i r c u l a r m e n t e pelos hori-
zontes, c o m igualdade e sem obstáculo a l g u m o u estorvo d e o u t r o m o n t e q u e se
o p o n h a , e m q u e d á mostras d a sua g r a n d e eminência; e se vai a G a x a m b u , o n d e
[ fl. 494 ] h á u m m o n t e cuja falda é / / l a m b i d a d e t o d o o g ê n e r o d e caça q u e ali v e m gustar
d a q u e l a terra, p o r ser aprazível, se b e m q u e m u i t o salitrada.
B a e p e n d i ; P e d r o Paulo; Ingaí; T r a i u t u b a ; C a r r a n c a s ; rio G r a n d e ; Tijuco; rio
das M o r t e s P e q u e n o .
E n t r a - s e n a vila de S ã o J o ã o del-Rei, n o R i o das M o r t e s . D e s t a v ü a se vai
p a r a as M i n a s Gerais e m cinco ou seis dias p o r u m a de duas estradas, a m b a s q u a s e
iguais assim n a e x t e n s ã o c o m o n a s c o m o d i d a d e s e c a m i n h o s . U m a se intitula o
C a m i n h o V e l h o ; outra, o C a m i n h o N o v o . A estrada velha se t o m a ã m ã o direita
e a estrada n o v a fica à m ã o esquerda, cujos sítios ou roças de u m a e o u t r a são as
seguintes:
903

Caminho Velho

Logo q u e se sai d a vila d e São J o ã o se passa e m c a n o a o rio das M o r t e s (se se


n ã o q u e r p a s s a r n a p o n t e , d e q u e se p a g a q u a r e n t a *réis) e se vai a o C a r a n d a í ;
C a t a g u a s e s ; C a m a p u ã ; Carijós; M a c a b e l o .

Caminho Novo [ fl. 494v. ]

C a r a n d a í ; L a g o a D o u r a d a (toma este n o m e t o d o aquele t e r r e n o , u s u r p a n d o - o


d a l a g o a vizinha); C a m a p u ã ; R e d o n d o ; C o n g o n h a s ; M a c a b e l o .

P a r e m o s n e s t e sítio e f a ç a m o s p a r a ele a j o r n a d a p e l o R i o d e J a n e i r o

Parte-se d a cidade do R i o d e J a n e i r o e m l a n c h a e se e n t r a pelo rio d e I g u a ç u ,


e e m u m a m a r é se chega ao sítio d o Pilar; e d a q u i e m c a n o a pelo rio a c i m a se vai
a o C o u t o ; a q u i se m o n t a a cavalo e se segue j o r n a d a a T a q u a r a ç u , a o p é d a B o a
Vista; sobe-se a serra c o m bastante t r a b a l h o . D o mais e m i n e n t e d a estrada se vê o
m a r , os rios e a planície da terra e m recíproco comércio; g o z a a q u i a vista d e u m
f a m o s o e s p e t á c u l o . E p r o s s e g u i n d o a j o r n a d a , fica à m ã o e s q u e r d a u m m o n t e
inacessível, tão r e d o n d o e igual q u e p a r e c e ser feito a o t o r n o ; é t o d o de p e d r a , e
p o r u m a b a n d a d a sua falda / / vai a estrada deixando a sua a g i g a n t a d a e m i n ê n c i a [ fl. 4 9 5 ]
m u i t o a t r á s os A d a n t e s e O l i m p o s . ^ A o p é desta serra, d a p a r t e do n o r t e , estão
situadas as roças do Silvestre; Bispo; G o v e r n a d o r ; Alferes; R o c i n h a ; P a u G r a n d e ;
rCavaru-Miriml; Cavaruaçu; dona Maria; dona Maria; dona Maria; dona Maria
T a q u a r a ç u ; d o n a M a r i a P a r a i b u n a — passa-se a q u i o rio deste n o m e , e a q u i está o
*registro —; r o c i n h a do A r a ú j o ; C o n t r a s t e ; Cativo; M e d e i r o s ; J o s é d e Sousa; J u i z
d e F o r a ; Aicaide-mor; Alcaide-mor; A n t ô n i o M o r e i r a ; M a n u e l C o r r e i a ; Azevedo;
Araújo; Gonçalves; Gonçalves; P i n h o ; Bispo — a q u i se sobe a g r a n d e cordilheira
d a M a n t i q u e i r a - ; R o c i n h a ; C o r o n e l - B o r d a do C a m p o ; Registro - a q u i se p a g a
d e c a d a c a r g a d e *seco u m a *oitava e d e * m o l h a d o m e i a oitava.
E q u e m q u e r ir p a r a a vila d e S ã o J o ã o d e l - R e i t o m a u m a e s t r a d a à m ã o
e s q u e r d a e vai a o sítio do Barroso. E e m o u t r a j o r n a d a p o d e c h e g a r à dita vila.
E v a m o s prosseguindo o nosso c a m i n h o das M i n a s Gerais: / / J o s é R o d r i g u e s ; [ fl. 495v. ]
J o ã o R o d r i g u e s ; A l b e r t o D i a s ; P a s s a g e m ; R e s s a c a ; C a r a n d a í ; O u t e i r o ; os D o i s
I r m ã o s ; G a l o C a n t a n t e ; R o c i n h a ; A m a r o R i b e i r o ; Carijós; M a c a b e l o — a q u i se
passa o R o d e i o , isto é, q u e se rodeia u m a serra a q u e c h a m a m Itatiaia —; Dhéus;
Lana.

Atlantes — propriamente Atlante ou Atlântida - 'ilha de Atlas', que se situaria fora do estreito de
f

Gibraltar. O monte Olimpo situa-se entre a Macedónia e a Tessália; os gregos acreditavam que ali
habitavam os deuses.
904

D a q u i t o m a à m ã o e s q u e r d a q u e m q u e r ir c a m i n h o direito p a r a Vila R e a l , e
se vai p e l a C a c h o e i r a , à vista d a C a s a B r a n c a , b u s c a r a p a s s a g e m d o G a r a v a t o .
E prosseguindo o c a m i n h o das M i n a s G e r a i s , d o L a n a se vai às T r ê s C r u z e s ,
e daí a T r i p u í , q u e fica u m a *légua d e Vila Rica, e logo se e n t r a nela.
P a r a se p a s s a r d a q u i a Vila R e a l se t o r n a pelo T r i p u í às T r ê s C r u z e s e p e l a
B o c a i n a fbu outras duas o u l três estradas se vai à vista d a C a s a B r a n c a b u s c a r a
p a s s a g e m do G a r a v a t o ; e daí se t o m a à m ã o esquerda, pelo C u r r a l i n h o e R a p o -
sos, e se e n t r a e m Vila R e a l , e desta se passa a todas as mais vilas de sua c o m a r c a .
E j á q u e d a m o s notícia dos c a m i n h o s e estradas terrestres, diremos a g o r a das
[ fl. 4 9 6 ] e s t r a d a s a q u á t i c a s , q u e são os / / rios, e p r i n c i p i a r e m o s pelos m a i o r e s , p o r q u e
s e m p r e aos grandes se d e v e m os primeiros lugares.

Série dos rios

R i o d a P r a t a ; rio G r a n d e ; rio das M o r t e s ; rio T i e t ê ; rio São Francisco; rio das


Velhas; rio das C o n g o n h a s ; rio d e São Bartolomeu; rio d e P e d r a s ; rio da P r a t a ; rio
S a b a r á ; rio d o G a i a ; rio do Inferno; rio P a r á ; rio P a r a o p e b a ; rio de= São J o ã o ; rio
P a r a í b a do Sul — três olhos d'água, Tde seu n a s c i m e n t o l ; P a r a i b u n a ; rio do Espíri-
to S a n t o ; ribeirão do C a r m o ; rio S u m i d o u r o ; rio G u a l a x o ; rio G u a r a p i r a n g a ; rio
D o c e ; rio S a n t a B á r b a r a ; rio São M a t e u s ; rio C a t a s Altas; rio C a m a r g o s .

D e s c r i ç ã o dos rios

Rio da Prata

P r o c e d e este s e g u n d o Briareu^ dos r i o s de p r i n c í p i o s limitados e d e fontes


[ fl. 496y. ] / / m u i t o p o b r e s , m a s c o m a v i z i n h a n ç a do rei dos metais enobrecidos. T e m d a
p a r t e d o leste o n a s c i m e n t o p o r q u e até nesta circunstância t e n h a a r r e m e d o s do
Sol. O rio G r a n d e lhe oferece os primeiros cabedais p a r a q u e seja t a m b é m g r a n d e
a s u a o p u l ê n c i a . N a s c e este d e duas fontes p e q u e n a s : u m a j u n t o das m i n a s d e
I b i t i p o c a , o u t r a das d e A i u r u o c a ; e logo a p o u c a d i s t â n c i a se m o s t r a r á p i d o e
caudaloso. Depois e n t r a nele o rio das M o r t e s , q u e nasce d a B o r d a do C a m p o do
C a m i n h o N o v o , i n c o r p o r a d o c o m o das M o r t e s P e q u e n o , e t o d o s identificados
p a s s a n d o pelo m e r i d i a n o d e São P a u l o , r e c e b e m a visita do c e l e b r a d o T i e t ê , e de
r o m a r i a v ã o p a r a r a Buenos Aires ou à N o v a Colônia, e sai a o m a r e m altura de
trinta e cinco g r a u s e u m m i n u t o .

-3. Gigante da mitologia grega, chamado Briareu pelos deuses e Egeon pelos homens. Participou como
aliado das divindades olímpicas da luta que derrotou os Titãs, e por isso merecia alta consideração e
recebeu recompensas, além de ficar encarregado da guarda dos Titãs em sua prisão subterrânea.
905

Rio de São Francisco

E este o terceiro rio n a o r d e m d a sua g r a n d e z a dos q u e p r a t i c a m c o m curso


m a i s extenso as terras d o Brasil. Constrói-lhe a m a i o r p a r t e das suas riquezas o
c e l e b r a d o rio das V e l h a s , c o m tantas ^alfaias d e o u r o q u a n t a s / / são as suas cor- [ íl. 4 9 7 ]
rentes d e p r a t a ; c o m este se faz n ã o só c a u d a l o s o m a s logo s o b e r b o . C o m p õ e - s e o
rio das V e l h a s d o das C o n g o n h a s , q u e passa p e l a falda de I t a b i r a , e d o rio S ã o
B a r t o l o m e u , q u e lhe c a r e i a m o c a b e d a l E n t r a m nele vários riachos; os m a i s n o t á -
veis são o das P e d r a s e o rio S a b a r á , q u e t r a z e m suas águas dos riachos G a i a e d o
Inferno, c h a m a d o assim p o r q u e se passa p o r ele p o r u m a p o n t e d e m e n o s d e vinte
*pés d e c o m p r i d o , c o r r e n d o o rio p o r baixo p o r mais d e duzentos d e p r o f u n d i d a -
de; são suas p a r e d e s [tão?] talhadas a p i q u e c o m alguns r a m o s e estes e m p e d r a s
saídas p a r a fora q u e estão c o n v i d a n d o a q u e m olha d a p o n t e o h o r r o r o s o precipí-
cio. M u i t o s d e s a g u a m n o r i o d e S ã o F r a n c i s c o , o q u a l j u n t a m e n t e c o m o das
V e l h a s e rio P a r a , u n i d o c o m o rio P a r a o p e b a e S ã o J o ã o , v ã o todos d a r a o m a r .

R i o P a r a í b a d o Sul

N a s c e este rio d e três olhos d ' á g u a e p a r t e d a vila d e A n g r a dos R e i s / / [ fl. 497v. ]


d i s c o r r e n d o p o r e n t r e as serranias e m o n t a n h a s d e Paraitinga, das quais t o m a a q u i
o n o m e ; p o r é m , d i l a t a n d o - s e p a r a oeste, o p e r d e e t o m a o n o m e d e P a r a í b a ;
d a n d o volta p e l a vila d e J a c a r e í faz c a m i n h o p a r a leste, p a s s a n d o p e l o sítio d e
A i p a c a r é pelo C a m i n h o V e l h o das M i n a s e n o C a m i n h o N o v o pelo sítio d e G a r c i a
R o d r i g u e s , q u e t o m o u o n o m e do m e s m o rio p a r a o d a r à q u e l e sítio; e d e p o i s ,
fazendo c a m i n h o p a r a os C a m p o s dos Goitacases, fertilizando-os, sai a o m a r p e l a
b a n d a d o leste e m altura de vinte e u m graus e trinta minutos.

R i o d o Espírito Santo

D a serra d e Itatiaia e da d e I t a p a n h o a c a n g a n o O u r o Preto, d a b a n d a d o leste,


nascem duas fontes, que depois de unidas p r o d u z e m o ribeirão do C a r m o ,
enriquecidas d e o u r o p o r todas as suas m a r g e n s , fundo e c o n t o r n o s . Este r e c e b e
e m si. os rios d o S u m i d o u r o , q u e c o r r e p o r b a i x o d a t e r r a l a r g o e s p a ç o , e d o
B r u m a d o , a m b o s i n c o r p o r a d o s a dois dias d e j o r n a d a d a vila / / d o C a r m o ; e [ fl. 4 9 8 ]
e n t r a n d o nele mais abaixo o d e F u r q u i m , p e r d e m a m b o s os n o m e s e t o m a m o d e
Espírito S a n t o , e vai d e s e m b o c a r ao leste d a vila q u e t a m b é m do rio se a d o r n o u
c o m o n o m e , e m altura de vinte graus e quinze m i n u t o s .

Rio Doce

Este rio se c o m p õ e dos rios S a n t a B á r b a r a , São M a t e u s , C a t a s Altas, C a m a r g o s


e outros quase s e m n o m e , e outros q u e c o r r e m pelos distritos do M a t o D e n t r o nas
906

M i n a s Gerais e cordilheiras d a g r a n d e serra d e I t a p a n h o a c a n g a , q u e se estende d o


O u r o P r e t o ou Vila R i c a p a r a o noroeste. Este rio e n t r a n o m a r d a b a n d a do leste
e m altura d e d o z e graus e trinta e q u a t r o minutos.

Serras

P a r a n a p i a c a b a é u m a g r a n d e cordilheira q u e corre a ícostal; C u b a t ã o à subi-


d a d e S a n t o s p a r a São Paulo; subida d e Parati ou d e Paraitinga p a r a c i m a da dita
[ fl. 498v. ] serra ou / / cordilheira no C a m i n h o V e l h o ; Boa Vista, trânsito ou subida d a serra
d o C a m i n h o N o v o do R i o d e J a n e i r o p a r a as M i n a s ; cordilheira d a M a n t i q u e i r a ,
m o r r o d o R i o das M o r t e s c o m *beta d e o u r o ; P o n t a d o M o r r o , n o A r r a i a l V e l h o ;
C a m a p u ã ; Itabira; I t a p a n h o a c a n g a ; Itacolomi; S e r r o do Frio; m o r r o d a C o n c e i -
ção.

F a z e n d a s de *engenhos; roças; arraiais; povoações e lugares; termos das vilas


e o n d e se d ã o *catas p a r a tirar o u r o ; p a r a g e m d e I t a m a r a n d i b a , o n d e se t o m a o
c a m i n h o p a r a o d e s c o b r i m e n t o das esmeraldas e p a r a a lagoa D o u r a d a .

Lavras várias

A i u r u o c a ; Ibitipoca; Arraial V e l h o ; C o n g o n h a s ; I t a v e r a v a ; I t a b i r a ; C a r a ç a ;
G u a r a p i r a n g a ; C a m a r g o s ; C a t a s Altas; São Mateus; Santa Bárbara; I t a m b é ;
Itacambira; Conceição.
D e i x o outras infinitas, p o r n ã o fazer m a i o r *prolação. F a ç o somente m e n ç ã o
das referidas, p o r q u e delas se trata e m outros lugares deste itinerário, p a r a se saber
o n d e estejam situadas.

[ fl. 499 ] Comarcas

As c o m a r c a s deste itinerário são cinco. A capitania d o R i o d e J a n e i r o t e m so-


m e n t e u m a , a qual expira p e l a p a r t e d o n o r t e d a m e s m a c i d a d e n o p é d a serra d a B o a
V i s t a , n o C a m i n h o N o v o das M i n a s , antes d e Tal subir, e c o m a c a p i t a n i a d o
Espírito S a n t o ; p e l a p a r t e do sul fenece n o m a r O c e a n o ; p e l a p a r t e do leste n o
m e s m o ; pela d e oeste n a vila de U n a , inclusive, e c o m a c o m a r c a de São P a u l o .
O g o v e r n o de São Paulo e M i n a s t e m q u a t r o c o m a r c a s : a p r i m e i r a é a c i d a d e
d e São Paulo; a s e g u n d a é a d o O u r o Preto; a terceira, a d o R i o das V e l h a s ; a
q u a r t a , a do R i o das M o r t e s .
A c o m a r c a d e São P a u l o p a r t e do norte c o m a do R i o das Velhas; d o sul c o m
a do R i o d e j a n e i r o e c o m o m a r O c e a n o ; de leste c o m a do R i o de J a n e i r o e c o m
a d o R i o das M o r t e s , pela cordilheira d a M a n t i q u e i r a ; e de oeste se p o d e estender
até N o v a C o l ô n i a .
907

A c o m a r c a do O u r o Preto p a r t e d o n o r t e / / c o m os m a t o s dos Ilhéus fel d a [ fl. 499v. ]


B a h i a ; do sul c o m a do R i o das M o r t e s pelo limite d o rio das C o n g o n h a s ; d o leste
c o m a do Espírito S a n t o ; e d o oeste c o m a do R i o das V e l h a s , pelos limites d a
p a s s a g e m do G a r a v a t o e C a t a s Altas.
A d o R i o das Velhas p a r t e do n o r t e c o m os C u r r a i s e sertões d a Bahia; do sul
e m p a r t e c o m a do R i o das M o r t e s , pelas m o n t a n h a s de Itabira, inclusive, e c o m
a de S ã o P a u l o ; p e l a do leste c o m a d o O u r o P r e t o , pelos limites d a p a s s a g e m d o
G a r a v a t o e das C a t a s Altas; e do oeste pelos sertões s e m c o n h e c i d o limite.
A d o R i o das M o r t e s p a r t e do norte e m p a r t e c o m a do O u r o P r e t o , pelo rio das
C o n g o n h a s , e e m p a r t e c o m a d o R i o das Velhas; do sul e m p a r t e c o m a d o R i o d e
J a n e i r o , p e í a serra d a Boa Vista no C a m i n h o N o v o , e e m p a r t e c o m a d a c i d a d e d e
São Paulo; de leste c o m a d o R i o de J a n e i r o ; de oeste c o m a d e S ã o P a u l o , pelo
limite d a M a n t i q u e i r a , n o C a m i n h o V e l h o .

Vilas das M i n a s , segundo as antiguidades e m q u e f o r a m criadas [ fl. 500 ]

O " g o v e r n a d o r e capitão-general A n t o n i o d e A l b u q u e r q u e C o e l h o d e C a r -
valho erigiu as seguintes: vila de Nossa S e n h o r a do C a r m o , q u e t o m o u p n o m e d o
ribeirão q u e c o r r e j u n t o a ela; Vila Rica, n o O u r o Preto; Vila R e a l , n o R i o das
Velhas.
O g o v e r n a d o r capitão-general d o m Brás Baltasar d a Silveira levantou as q u e
se seguem: vila de São J o ã o del-Rei, no R i o das M o r t e s ; Vila N o v a d a R a i n h a , n o
C a e t é ; Vila N o v a do Príncipe, n o S e r r o d o Frio; vila d a P i e d a d e , e m Pitangui.

Vila do C a r m o

Está situada e m altura de vinte graus e q u i n z e minutos. E d e clima favorável


p a r a t o d o o g é n e r o d e p l a n t a s , Imas n ã o l t e m e m si o m i l h o e feijão q u e l h e
bastein, e g r a n d e p a r t e deste m a n t i m e n t o j á lhe v e m dos C a m p o s d a C a c h o e i r a ,
C a s a B r a n c a e C u r r a l i n h o , c o n d u z i d o / / e m cavalos d i s t â n c i a d e seis ou sete [ fl. 500v. ]
"léguas. Está f u n d a d a e m sítio alegre, e assim d o m e s m o ribeirão c o m o da t e r r a se
t ê m tirado muitos tesouros, e a t u a l m e n t e se tira e m t o d o o seu ' t e r m o b a s t a n t e
o u r o , m a s e m f o r m a q u e t e n h a c o n t a só a q u e m o p e r m i t e a D i v i n a Providência,
e e m todas as mais M i n a s é o m e s m o .

Vila Rica

E n t r e m o n t a n h a s de imensa altura e delas r o d e a d a , e m f o r m a q u e a vista se


n ã o p o d e estender, se l e v a n t o u esta vila, e suposto q u e a b a t i d a pela p r o f u n d i d a d e
e m q u e está a m a i o r p a r t e dela situada; mais soberba e o p u l e n t a q u e todas, assim
p e l a freqüência d e comerciantes c o m o p e l a a b u n d â n c i a d e suas m i n a s , m o r m e n t e
.908

d a inacessível m o n t a n h a d e I t a p a n h o a c a n g a , e m cujas faldas se encosta e descan-


sa. Esta serra é u m Potosí^ d e o u r o , m a s p o r falta d e á g u a n o verão n ã o enriquece
a todos q u e nela m i n e r a m , suposto q u e os r e m e d e i a .
[ fl. 501 ] N e s t a vila falta d e t u d o o q u e d e p e n d e d e agricultura, / / assim q u e t o d o o
m a n t i m e n t o lhe v e m dos referidos C a m p o s p o r distância d e três, q u a t r o e cinco
*Jéguas. Está e m altura d e vinte graus e vinte m i n u t o s .

Vila R e a l

N o princípio desta vila, pela p a r t e q u e olha p a r a o sul, corre o rio das Velhas
a l a v a r - l h e as m a r g e n s . A este r e n d e vassalagem o rio S a b a r á , q u e saindo-lhe a
saqueá-lo se despoja do n o m e c o m o tributo das águas, r o d e a n d o esta vila pelas
lavras d o leste e do norte. A m b o s c o r r e m turvos, p o r q u e a t u a l m e n t e e m a m b o s se
m i n e r a , m a s r a r a s vezes s a e m os m i n e i r o s l u c r a d o s nestes distritos p o r q u e n ã o
c o r r e s p o n d e m os haveres a o ordinário dispêndio, m a s a g o r a c o m as *rodas se tira
muito ouro.
São abundantíssimas de todos os frutos as terras desta c o m a r c a , os quais t o -
dos n e l a se c o m p r a m p o r m e n o s d a m e t a d e q u e nas M i n a s G e r a i s . A vila está
situada e m território aprazível, e os m o r a d o r e s se t r a t a m a q u i c o m m u i t o Iuzimento,
[ fl. 501v. ] p o r q u e nas suas fazendas a m a i o r p a r t e c o n s e r v a / / c o m p o u c a despesa m u i t a
cavalaria,
A esta vila v ê m p a r a r todas as carregações, q u e s a e m d a B a h i a e P e r n a m b u c o
pelas estradas dos Currais e rio d e São Francisco, e nela, antes q u e e m o u t r a p a r t e ,
e n t r a m os g a d o s , c o m u m sustento das M i n a s e q u a s e r e p u t a d o c o m o o m e s m o
p ã o . Está esta vila e m altura d e dezenove graus e c i n q ü e n t a e dois m i n u t o s .

Vila de São J o ã o del-Rei

A o sul d e todas as vilas, v i n t e e u m graus e seis m i n u t o s , se erigiu esta vila e m


u m a s p l a n í c i e s q u e c o n v i d a m c o m s u a a m e n i d a d e , frescura Tal i n t e r i o r alegria
Taosl q u e d e l a g o z a m , o r n a d a d e verdes c a m p o s q u e lhe s e r v e m d e proveitosos
pastos, e n ã o m e n o s é enriquecida de lucrosas m i n a s , m a s d e s u m a dificuldade e
Tnãol p a r a todos senão n o inverno, de cujas afluências e e n x u r r a d a s se a p r o v e i t a m
i n d o os negros à *gandaía a q u e se c h a m a *faisqueira, p e l a falda de u m m o n t e de
[ fl. 502 ] m a i s q u e m e d i a n a g r a n d e z a , t o d o c o m p o s t o de p e d r a d e f*betal / / d e o u r o , a
qual m o í d a c o m p e d a ç o de ferro, n o q u e mais se desperdiça d o q u e se aproveita
p o r m e r a i n c ú r i a Fe evidente i m p e r í c i a l ; e n o t e m p o seco p a d e c e o c o m u m , e

• Cidade da Bolívia de cuja região (sobretudo das minas de Cerro Rico) se exportaram milhares de
toneladas de prata entre meados do século XVI e o século XVIII, quando, cessou a produção.
909

s o m e n t e l a v r a m alguns particulares c o m força d e escravos, d a n d o *catas nas faldas


d o dito m o n t e , q u e são d e g r a n d e utilidade, e c o m m e n o s c o n v e n i ê n c i a se d ã o
t a m b é m p o r aquela dilatada [ v a r g e m ! U m a s e outras fmuitasl vezes se. n ã o a p r o -
veitam p o r Tsel n ã o fpoderl v e n c e r a m u i t a á g u a q u e v e r t e m .
A p o u c a distância desta vila corre o rio das Mortes, cujo fundo se sabe Fque él
e m p e d r a d o de ouro, e dele se tirava antigamente o que podia trazer u m negro indo
d e *mergulho a r r a n c a r c o m u m 'almocafre e n q u a n t o íhe d u r a v a o fôíego. Agora,
com novo artificio, se tira e m canoas c o m grandes colheres de ferro enxeridas e m u m a
comprida haste de p a u , as quais artificiosamente v a z a m e m uns fsacosl de couro cru
que estão pendentes pela parte convexa e c o m u m a s argolas, pelas quais se p u x a d a
terra c o m uns sarilhos quanto p o d e sofrer o fornimento dos cabos, e cheias as colheres
se cravam c o m a haste n o fundo e trazem os Psacosl cheio de lodo, areia e / / pedras, [ fl. 502v. ]
o q u e tudo depois se *bateia e fica o mais precioso, por se. não p o d e r e m mover, n e m
ainda arrancar as pedras de estranha grandeza que estão no fundo p a r a se raspar a
*piçarra dele, o n d e o ouro faz seu mais natural assento.

Vila Nova d a R a i n h a

Esta vila é a terceira n a o r d e m d a sua antiguidade. Dista d a Vila R e a l p e r t o


d e q u a t r o *léguas; está f u n d a d a e m sítio alegre e desafogada d e montes; é a b u n -
d a n t e de m a n t i m e n t o s , t e m bastante lavras. Se p o u c o l u c r a m , m e n o s gastam; p o r
esta c a u s a h á n o *termo dela m u i t o s h o m e n s opulentos e t e m b o n s pastos p a r a
c o n s e r v a r e m seus cavalos c o m c o m o d i d a d e . Está esta vila a o n o r t e d e t o d a s as
vilas d e M i n a s e m altura d e dezenove graus e trinta e oito m i n u t o s .

Vila N o v a do Príncipe

Esta vila aprazível está f u n d a d a n a p o v o a ç ã o q u e antes se intitulava S e r r o / / [ fl. 5 0 3 ]


d o Frio e a g o r a se t o m a g e n e r i c a m e n t e p o r todo seu t e r m o . N e l e se a c h a m infini-
tas m i n a s e p a r t i c u l a r m e n t e n a C o n c e i ç ã o , o n d e h á u m m o n t e d e d e s m e d i d a g r a n -
deza no qual se a c h a o u r o c o m o o q u e dissemos de I t a p a n h o a c a n g a e m Vila R i c a .
N e s t a s m i n a s do S e r r o d o F r i o , c o m a r c a d e s t a V i l a d o P r í n c i p e , j u n t o às
lavras d e B e r n a r d o d a F o n s e c a L o b o , sítio e p a r a g e m o n d e c h a m a m o C a e t é -
M i r i m , s a e m a l t e r n a t i v a m e n t e c o m o o u r o m u i t o s b o n s d i a m a n t e s . F i c a m estas
lavras d e C a e t é - M i r i m e m u m b a i x o , e d a p a r t e d e c i m a ( c o m o d o C a s t e l o d e
L i s b o a p a r a o Rossio) está u m m o r r o d e p e d r a s b r a n c a s d e t a m a n h o d e u m a
*libra, e a q u i se a c h a m t a m b é m d i a m a n t e s .
T e m esta vila t e r m o s m u i t o dilatados e p a r a a p a r t e do oeste a i n d a se n ã o
t e m a v e r i g u a d o o seu limite. D e l a se vai a I t a c a m b i r a , o n d e t a m b é m se m i n e r a .
A n t e s d e c h e g a r a estas m i n a s , n o sítio d e I t a m a r a n d i b a , se t o m a o c a m i n h o p a r a
o d e s c o b r i m e n t o das e s m e r a l d a s , f a z e n d o c a m i n h o q u i n z e o u dezesseis dias d e
j o r n a d a e d o z e ou treze p a r a o m o r d e s t e !
910

[ fl. 503v. ] O s q u e até o Tpresentel o b u s c a r a m i n d o / / s o m e n t e pelo tino, sem notícia


a l g u m a das lições geográficas, a n d a r a m c o m muito t r a b a l h o m u i t o mais d o c a m i -
n h o q u e lhes era necessário, p o r q u e se partissem de Vila N o v a d a R a i n h a p a r a o
norte a t a l h a v a m mais de meio c a m i n h o e depois de p o u c o s dias a n d a d o s p o d e r i -
a m I t o m a r l o seu r u m o Toul seguir seu tino e c o m m u i t a b r e v i d a d e c h e g a r i a m a o
lugar destinado. Pela B a h i a se intentou este descobrimento h á muitos, anos, s e n d o
*governador Luís d e Brito e A l m e i d a e p r i m e i r o descobridor o ousado Sebastião
F e r n a n d e s J T o u r i n h o ] , fazendo sua e n t r a d a c o m m a i s u n s poucos c o m p a n h e i r o s
pelo rio D o c e , fazendo c a m i n h o a oeste, a n d a n d o p a r a cima p e r t o d e c i n q ü e n t a
' l é g u a s ao longo dele, a c h a r a m muitas p e d r a s verdes. C i n c o ou seis léguas p a r a a
p a r t e d o n o r t e , descobriram u m a g r a n d e e formosa p e d r a r i a d e esmeraldas e o u t r a
de safiras, q u e estão j u n t a s a u m a lagoa, e mais a b a i x o , distante de sessenta ou
setenta léguas da b a r r a do rio D o c e , vieram a c h a r das m e s m a s p e d r a s . E q u a t r o ou

[ fl. 504- ] cinco léguas p a r a a p a r t e do sul descobriram / / o u t r a serra, e m q u e lhe afirmou a


g e n t e q u e h a v i a p e d r a s v e r d e s e v e r m e l h a s do t a m a n h o de u m d e d o e o u t r a s
azuis, todas resplandecentes. E desta serra, a n d a n d o p a r a leste u m a légua ou p o u -
co mais se e n c o n t r a r a m c o m o u t r a d e fino cristal q u e cria e m si e s m e r a l d a s e
j u n t a m e n t e p e d r a s azuis.
A n t ô n i o D i a s A d o r n o foi o s e g u n d o d e s c o b r i d o r . C h e g o u à dita s e r r a d o
leste, a c h o u esmeraldas, e da b a n d a do oeste safiras; u m a s e o u t r a s se c r i a m e m
cristal. T r o u x e o dito g o v e r n a d o r g r a n d e q u a n t i d a d e , e algumas m u i t o g r a n d e s , as
quais t a m b é m associava outras p e q u e n a s , p o r é m se p r e s u m e q u e debaixo d a t e r r a
h a v e r á m u i t a s mais finas. E sem d ú v i d a q u e pelos c a m i n h o s q u e estes h o m e n s
fizeram, a distância da terra q u e p e n e t r a r a m , muito mais fácil será este descobri-
m e n t o i n t e n t a d o pelas M i n a s . Alguns paulistas e m p r e e n d e r a m , m a s s e m p r e tive-
r a m casos de desunião q u e os p e r t u r b a r a m , e disto *sufficit.

[ fl. 504v. ] Vila da Piedade

A ú l t i m a e sétima vila é a d a P i e d a d e , sítio antes n o m e a d o P i t a n g u i , p a r a


o n d e r c o n c o r r e r a m l m u i t o n ú m e r o d e paulistas. T e m u m serro, o n d e a t u a l m e n t e
se m i n e r a , e e m u m a [paragem 1 dele, a q u e c h a m a m o Batatal, se tiram m u i t o s
q u i n t a i s d e o u r o e m p e d a ç o s d e g r a n d e p e s o , e n e s t e s í t i o se trabalha
freqüentemente.

FINIS LAUS DEO.^

O fim é louvor a Deus.


911

* 140 <
Relação dos *efeitos e cabedal de que consta a carga dos vinte [fl.505 ]
navios e duas naus de guerra de que se compõe a *frota do
Rio de Janeiro, que de lá saiu em 26 de março e entrou no porto
dessa cidade em 23 de junho de 1749, comandada por dom
Manuel Henriques de Noronha na nau Nossa Senhora das
Necessidades, *capitânia da frota

Lista de valores pertencentes à Coroa e a terceiros (em di-


versas unidades monetárias) e dos produtos d a América portu-
guesa transportados n a frota do R i o de J a n e i r o de m a r ç o de
1749. A carga, com remessas institucionais e particulares, é com-
posta de dinheiro, ouro em pó, ouro em barra, distribuídos em
volumes equilibrados entre os principais navios da frota, e diver-
sos gêneros, como açúcar, pau-brasil e outras madeiras, couro e
sola, escravos, além de derivados da pesca e extrativismo.
Este documento, que integra núcleo de documentos deste
Códice formado por relações de produtos exportados nas frotas de
1749, parece servir de demonstração das potencialidades econô-
micas e das alternativas das regiões coloniais através da varieda-
de de produtos presentes no Brasil.
Integrando u m grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados à sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, este impresso ilustra o interesse do súdito letrado, que se
aproveita d a experiência no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos d a presença portuguesa na América. Forma,
ao lado de outros, u m grupo de documentos com a perspectiva
DutfKrii; tuba d e rendimentos p a r a a Fazenda do rei.
i a . 4 M*7* • ' A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Alfandega de Lisboa; Lisboa;
23.6.1749.
U s o n a historiografia: Roberto Simonsen, tomando es-
tas relações de produtos exportados d a América portuguesa nas
frotas do primeiro semestre de 1749, demonstra,, de u m lado, a
t io6U$67:a importância dos valores representados pelo ouro e diamantes e,
de outro, a diversificação dos produtos agrícolas que seria capaz
. m *
de compensar as perdas advindas da queda das exportações dos
metais preciosos (História econômica do Brasil (1500/1820). 8.
ed. São Paulo: Nacional, 1978. p . 362-363).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna. Texto im-
presso. Letra típica da imprensa do século X V I I I , e m que so-
bressaem o " s " simples ou duplo em forma da cajado invertido;
912

uso moderno do "v" e do "u". Para a acentuação, o agudo mar-


ca tonicidade ou abertura de vogal, como em "pó"; o til d a nasa-
lização deslocado, como em "graõs". Uso do caldeirão em for-
m a de "U". Título em itálico. (YDL)
Cópias impressas:
B O X E R , Charles R.. A idade de ouro do Brasil: dores de cresci-
mento de urna sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacio-
nal, 1969. p. 360-361.
LANARI, Cássio; OLIVEIRA, Tarquinio J . B. de. Ouro nas Mi-
nas Gerais. O u r o Preto: ESAF, Casa dos Contos, 1976. p . 40.
S I M O N S E N , R o b e r t o C. História econômica do Brasil (1500/
1820). 8. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1978.
p. 383.

137U585 "cruzados em 55.0340U000 em dinheiro, na 'capitânia.


1 0 6 U 5 6 7 c r u z a d o s e m e i o e m 4 2 . 6 2 7 U 0 0 0 e m d i n h e i r o , n a *almirante.
1.432U931 cruzados e três quartos em 5 7 3 U 1 7 2 "oitavas de ouro e m p ó , n a capitânia.
1.428U300 c r u z a d o s e m 5 7 1 U 2 9 0 oitavas d e o u r o e m p ó , n a a l m i r a n t e .
1 7 3 U 4 0 3 c r u z a d o s e m 4 6 U 2 4 1 oitavas d e o u r o e m b a r r a , n a capitânia.
1 7 9 U 0 6 2 cruzados ê m 4 7 U 7 5 0 oitavas de ouro e m b a r r a , n a a l m i r a n t e .

C a b e d a l p a r a as p a r t e s , e m a m b a s a s n a u s .

9.971U886 cruzados em 3.998.754U411, em dinheiro.


1 . 1 9 0 U 0 1 8 c r u z a d o s e m 3 1 7 U 4 4 5 oitavas d e o u r o e m p ó .
4 7 9 U 8 6 5 cruzados e m 1 2 7 U 9 6 4 oitavas de o u r o e m b a r r a .
N e s t e c a b e d a l , 13 milhões e 7 8 4 U 6 5 5 c r u z a d o s e 2 9 4 *réis.

Diamantes

2 U 1 8 5 oitavasj 6 *grãos e 6 avos, n a capitânia.


2 U 1 8 6 oitavas e 3 quartos, n a almirante.

*Efeitos

3 U 0 5 7 *caixas d e a ç ú c a r .
U 6 4 0 *fechos d e açúcar.
U 2 4 7 *caras d e açúcar.
4 1 U 3 0 5 c o u r o s e m cabelo.
4 U 7 4 6 *meios d e sola.
1U043 *couçoeiras.
913

U 6 9 2 dúzias d e t a b u a d o de *tapinhoã.
1 U 5 1 6 *barris d e *mel e farinha.
U 8 7 3 curvas e vários p a u s .
U 1 5 0 *pipas d e azeite d e p e i x e .
1U870 pontas de marfim.
1 U 7 5 3 toros d e p a u s d e j a c a r a n d á .
U 6 6 1 *fardos d e b a r b a s d e baleia.
U 3 1 1 "surrões d e lã.
2 U 8 5 1 toros d e pau-brasil.
1 U 1 9 1 v a r a s d e m a n g u e p a r a parreiras,
U 8 5 0 *varais p a r a *seges.
Ü 2 3 0 escravos.

• 141 <

Relação dos *efeitos de que se compõe a carga dos cinco navios [fl.506 ]
que saíram do Maranhão e Grão-Pará em 28 de junho de 1749,
que principiaram a entrar no porto desta cidade de Lisboa
desde 15 até 20 de agosto de 1749

Lista de valores totais e m arrobas e arráteis e respectivos


produtos do M a r a n h ã o e Grão-Pará transportados n a frota de
j u n h o de 1749. A carga é composta por cacau, cravo, café, algo-
d ã o cascos de tartarugas e diversos outros gêneros d e origem
agrícola, extrativa ou criatória.
Este documento, que integra o núcleo de documentos deste
Códice formado por relações de produtos exportados nas frotas de
1749, parece servir de demonstração das potencialidades econô-
micas e das alternativas das regiões coloniais através d a varieda-
de de produtos presentes no Brasil.
Integrando u m grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados à sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, este impresso ilustra o interesse do súdito letrado, que se
aproveita da experiência n o ultramar p a r a reunir informações
sobre os sucessos d a presença portuguesa n a América. Forma,
ao lado de outros, um grupo de documentos com a perspectiva
de rendimentos para a Fazenda do rei.
Autoria, l o c a l e data: Alfândega de Lisboa; Lisboa; 20.

REI 8.1749.
U s o n a historiografia: Roberto Simonsen, tomando es-
tas relações de produtos exportados da América portuguesa nas
Dos effíttot* d frotas do primeiro semestre de 1749, demonstra, de u m lado, a
dot finco ÁV' importância dos valores representados pelo ouro e diamantes e,
ran&aâ' e C 9 de outro, a diversificação dos produtos agrícolas, que seria ca-
nòv de 1749 paz de compensar as perdas advindas da queda das exportações
irar na Pari dos metais preciosos [História econômica do Brasil (1500/1820). 8. ed.
dtfJe ati São Paulo: Nacional, 1978. p . 362-363).
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna. Texto im-
A presso. Letra típica da imprensa do século X V I I I , em que so-
bressaem o " s " simples ou duplo em forma da cajado invertido;
uso moderno do "v" e do "u", P a r a a acentuação, o agudo mar-
ca tonicidade ou abertura de vogal, como em "café"; o til d a
nasalização deslocado, como em "algodão". Uso do caldeirão
em forma de " U " , Título em itálico. (YDL)
Cópias impressas:
B O X E R , Charles R . A idade de ouro do Brasil: dores de crescimen-
to de u m a sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacional,
1969. p . 361-362.
S I M O N S E N , Roberto C. História econômica do Brasil (1500/1820).
8. ed. São Paulo: Nacional, 1978. p . 384.

A saber:

4 8 U 1 4 8 *arrobas e 19 "arráteis d e cacau.


1 U 0 2 2 a r r o b a s e 19 arráteis d e cravo grosso.
U 2 3 4 a r r o b a s e 16 arráteis de cravo fino.
2 U 3 5 5 a r r o b a s e 9 arráteis de "salsa.
2 U 3 0 7 a r r o b a s e 27 arráteis de café.
8 U 0 4 7 a r r o b a s e 4 arráteis d e açúcar.
U 2 4 5 a r r o b a s e 12 arráteis d e algodão.
U 1 7 0 a r r o b a s e 4 arráteis d e algodão e m fio.
U 0 2 0 a r r o b a s e 20 arráteis d e u r u c u p a r a tinta.
U 0 0 2 a r r o b a s d e chocolate.
U 0 0 5 a r r o b a s d e "casca-preciosa.
U 0 2 4 cascos d e tartarugas.
U 0 1 5 arrobas de "quina-quina.
8 U 0 0 0 c o u r o s e m cabelo.
915

• 142 «
Relação do cabedal e *efeitos de que consta a carga dos 39 navios [fl.507 j
mercantes de que se compõe a *frota de Pernambuco,
comboiados pela nau de guerra Nossa Senhora da Lampadosa,
comandada pelo capitão de mar e guerra José Gonçalves Lage, que
saiu daquela praça no primeiro de maio de 1749 e entrou no porto
desta cidade de Lisboa a 20 de julho do mesmo ano.
Lisboa, na oficina de Pedro Ferreira, impressor da rainha
Nossa Senhora. Ano de 1749. Com todas as licenças necessárias

Lista de valores pertencentes à Coroa e a terceiros (em di-


versas unidades monetárias) e dos produtos da América portugue-
sa transportados na frota de Pernambuco de maio de 1749. A
carga, com remessas institucionais e particulares, é composta de
dinheiro, ouro em pó, ouro em barra, distribuidos em volumes
equilibrados entre os principais navios da frota, e diversos gêne-
ros como açúcar, pau-brasil e outras madeiras, couro e sola, es-
cravos, além de derivados do extrativismo e atividades criatórias.
Este documento, que integra o núcleo de documentos deste
Códice formado por relações de produtos exportados nas frotas de
1749, parece servir de demonstração das potencialidades econô-
micas e das alternativas das regiões coloniais através da variedade
de produtos presentes no Brasil.
Integrando u m grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados à sua atividade de magistrado e m Minas
Gerais, este impresso ilustra o interesse do súdito letrado que se
aproveita da experiência no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa na América. Forma,
ao lado de outros, u m grupo de documentos com a perspectiva
de rendimentos para a Fazenda do rei.
A u t o r i a , l o c a l e d a t a : Alfandega de Lisboa; Lisboa;
20.7.1749.
U s o n a historiografia: Roberto Simonsen, t o m a n d o es-
tas relações de produtos exportados da América portuguesa nas
frotas do primeiro semestre de 1749, demonstra, de u m lado, a
importância dos valores representados pelo ouro e diamantes e,
de outro, a diversificação dos produtos agrícolas que seria capaz
de compensar as perdas advindas da queda das exportações dos
metais preciosos {História econômica do Brasil (1500/1820). 8. ed.
São Paulo: Nacional, 1978. p. 362-363).
RI
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f i c o : Escrita moderna. Texto im-
presso. Letra típica da imprensa do século X V I I I e m que sobres-
saem o " s " simples ou duplo em forma da cajado invertido; uso
moderno do "v" e do "u". Para acentuação, o agudo ou o grave
Do cabedal\ m a r c a m tonicidade ou abertura de vogal, como em " p ó " , ' Jozè";
vfoitnercontt o til da nasalização deslocado, como em "graõs". Uso do caldei-
lttco ccmloy
% rão em forma de " U " . Título em itálico.(YDL)
Cópias impressas:
Guerra JOZÀ B O X E R , Charles R.. A idade de ouro do Brasil: dores de cresci-
.Prafa em oi mento de u m a sociedade colonial. 2. ed. São Paulo: Nacio-
PertothJlaL nal, 1969. p . 362.
mo amo. - - LANARI, Cássio; O L I V E I R A , Tarquinio J . B. de. Ouro nas Mi-
nas Gerais. O u r o Preto: ESAF, Casa dos Contos, 1976. p . 39.
S I M O N S E N , R o b e r t o C . História económica do Brasil ( 1 5 0 0 /
1820). 8. ed. São Paulo: Nacional, 1978. p . 382.

1 5 U 0 5 6 *cruzados e m 6 . 0 2 2 U 4 0 0 e m d i n h e i r o d o * d o n a t i v o .
3 0 U 4 6 0 cruzados e 320 *réis e m 8.122 *oitavas e 6 4 *grãos d e o u r o e m p ó .
2 U 1 4 0 cruzados e 220 réis e m 570 oitavas e 60 grãos de o u r o e m b a r r a .
8 U 5 1 2 c r u z a d o s e 3 . 4 0 4 U 8 0 0 réis e m d i n h e i r o p a r a a *bula.
U 7 5 I c r u z a d o s e m 200 oitavas e 24 grãos d e o u r o e m p ó p a r a a dita.

Para partes

7 8 7 U 4 8 7 c r u z a d o s e m d i n h e i r o p a r a particulares.
8 7 U 9 0 0 c r u z a d o s e m 2 3 U 4 4 0 oitavas d e o u r o e m p ó .
U 6 9 6 cruzados em 199 oitavas de o u r o e m p e ç a s .

5 0 U 8 3 0 c r u z a d o s e 300 réis e m 2 0 . 3 3 2 U 3 0 0 réis e m d i n h e i r o do manifesto.

I m p o r t a t u d o l m i l h ã o e I 3 U 7 3 5 cruzados.

E m * efeitos

1 3 U 2 9 0 *caixas de a ç ú c a r .
1 U 2 2 1 *fechos d e a ç ú c a r .
1 U 0 2 2 *caras d e açúcar.
9 8 U 2 6 6 *meios d e sola.
3 7 U 3 6 0 couros de atanado.
16U251 couros e m cabelo.
917

U 5 2 8 couros de veado.
U 5 5 3 *couçoeiras.
U 7 5 3 "barris d e doce.
U 3 9 9 barris de "melaço.
U 3 5 9 barris d e farinha.
U 0 0 4 barris de " i p e c a c u a n h a .
7 U 0 9 0 "quintais d e p a u - b r a s i l .
U 0 4 5 quintais d e pau-violeta.
U 0 6 0 quintais d e "tatajuba.
1TJ128 varas d e p a r r e i r a .
U 0 2 3 "varais d e "sege.
U 0 2 5 vigas.
U 1 4 0 escravos.

• 143 «
Descrição do bispado do Maranhão [fl.508 ]

Exposição detalhada sobre a situação religiosa, econômi-


ca e geográfica do território compreendido pelo bispado d o
Maranhão. A estrutura e a ordenação de parte deste texto guar-
d a m semelhanças com o conteúdo de u m a visita pastoral, pois
apresenta extenso levantamento do clero, das instituições e enti-
dades católicas, tratando dos lugares sagrados, do estado dos
templos e vasto repertório de dados de natureza material e espi-
ritual. Diante da preocupação com as condições materiais p a r a
o culto, expõe, ainda, os rendimentos das igrejas, a conduta dos
padres, o número de fiéis e as missões ocupadas da evangelização
indígena. Tais notícias parecem ter sido obtidas através de via-
gem em que o autor percorreu a região.
Estas informações de caráter religioso são complementadas
p o r descrições de n a t u r e z a diferenciada. S o b outro p a d r ã o
discursivo, são descritos os elementos da rida material, econômi-
ca e natural dos moradores (tipos de peixes, baías e redes hidro-
gráficas, produtos extrativos, agricultura, contatos entre colonos e
índios), baseados geralmente em narrativas de diferentes sertanistas
que percorreram a região. Traía, dentro do mesmo padrão e com
base n a observação direta, da descrição das freguesias, dos arraiais
e das vilas e sua administração politica, das dimensões da exten-
são do bispado, das nações indígenas e seus costumes, e das forta-
lezas existentes.
Esse modo de apresentação e a natureza das informações su-
gerem que a preparação deste documento viesse atender demanda
do secretário real Alexandre de Gusmão, que através de inquéritos
sobre aspectos geográficos, históricos, etnográficos e econômicos da
América portuguesa solicitados a funcionários e colonos das regiões
em litígio com a Espanha reunia elementos para as negociações a
favor de Portugal na fase preparatória do Tratado de Madri. Obser-
var que os escólios de Caetano da Costa Matoso revelam seu interes-
se em conhecer distâncias das localidades e acidentes apontados,
refletindo o esforço demarcatório que toma conta dos portugueses
nessa fase, o que pode. vir a aproximar seu interesse aos debates em
torno do Tratado de Madri que envolviam a região.
Pode-se suspeitar que este documento e o de n ú m e r o 145
tenham sido reunidos por pedido especial do ouvidor a padres
que acompanharam o mesmo bispo n a sua j o r n a d a do M a r a n h ã o
a M a r i a n a . N ã o p o d e ser descartada a possibilidade de estas
informações sobre o bispado do M a r a n h ã o servirem de contras-
te para a apreciação que Caetano da Costa Matoso fazia a res-
peito do bispado de Mariana, podendo estar relacionadas com
alguma perspectiva de avaliação d a atuação pregressa do bispo
dom frei Manuel da Cruz.
Integrando um grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados à sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, este documento ilustra o interesse do súdito letrado que
se aproveita d a experiência n o ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa n a América.
Autoria, l o c a l e data: Manoel Ribeiro Soares ou Vicente
Gonçalves George de Almeida; M a r a n h ã o ; ca. 1747.
A s p e c t o s discursivos: Segundo Rafael Bluteau, "descrição"
é "definição imperfeita. Representação ou pintura de alguma cousa
com palavras" [Vocabulário português e latino [.,.] Coimbra: Colégio das
Artes da Companhia d e j e s u s , 1713. V. 3, p . 115). N a presente
descrição, freqüentemente o narrador emprega o elogio encomiástico
do lugar. Retoricamente, trata-se de ecfrase. Observar em diversas
passagens do documento a aplicação da tópica do locus amerms ("lu-
gar ameno") e da tópica da barbárie do aborígene. (JPF).
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva pou-
co regularizada e caligrafada do século X V I I I . Apresenta mai-
úsculas com volutas e laçadas providas de apex em forma de
meio círculo; destaca-se o " C " e m ampla curvatura, atingindo
linha inferior da escrita. Sinal de nasalização especial e muito
veloz, e m voluta, que lhe dá o aspecto de "n" ou "u". Márginália,
acréscimos e anotação final (fólio 524) com letra de terceiro, isto
é, de Caetano da Costa Matoso. (YDL)
919

T e m a c i d a d e de S ã o Luís d o M a r a n h ã o q u a t r o conventos, a saber: u m de


Nossa S e n h o r a do M o n t e , d o C a r m o ; colégio de N o s s a S e n h o r a d a L u z ,
d a C o m p a n h i a d e J e s u s ; S a n t o A n t ô n i o , d e religiosos c a p u c h o s ; N o s s a
S e n h o r a das M e r c ê s , d e religiosos m e r c e d á r i o s .
T e m m a i s dois conventos, a saber: u m d a C o m p a n h i a , d a M a d r e d e D e u s ,
q u e fica distante da cidade duas carreiras d e cavalo, e o u t r o de religiosos carmelitas
calçados, d e N o s s o S e n h o r d o Bonfim, q u e fica distante d a c i d a d e p e r t o d e u m
q u a r t o d e "légua p o r m a r .
T e m c a d a c o n v e n t o sua igreja, a saber:
O colégio d a C o m p a n h i a , a d e N o s s a S e n h o r a d a L u z , q u e é a p a d r o e i r a
d a q u e l e colégio, [com] dois "altares colaterais e egregiamente p a r a m e n t a d o s , u m
d e são Francisco X a v i e r , o u t r o d e santo Inácio; está esta igreja a d m i r á v e l t a n t o e m
p i n t u r a s como em arquitetura e g r a n d e z a .
A igreja d o c o n v e n t o d e N o s s a S e n h o r a do M o n t e do C a r m o t e m q u a t r o
altares colaterais; t e m m a i s u m a "capela n o "claustro de Nosso S e n h o r d o Bonfim.
A igreja d o c o n v e n t o d e S a n t o A n t ô n i o t e m dois altares colaterais, a saber:
u m de são Francisco e o u t r o d e santo A n t ô n i o , e t e m mais a capela dos T e r c e i r o s ,
p a r a o n d e se e n t r a pela m e s m a igreja dos religiosos; é esta capela d e N o s s a S e -
n h o r a das D o r e s ; t e m sacristia e *consistórío sobre si e t e m mais, à p o r t a d a igreja
dos religiosos, u m a capela admirável do S e n h o r c o m a c r u z às costas.
A igreja d e Nossa S e n h o r a das M e r c ê s tem q u a t r o altares colaterais; u m d o
B o m J e s u s d a P i e d a d e , o n d e está m e t i d a e m u m "caixão u m a admirável i m a g e m
do B o m J e s u s feita de p a p e l ã o , é prodigiosa e m o b r a r milagres; o s e g u n d o é d e
C r i s t o crucificado c o m N o s s a S e n h o r a , são J o ã o e M a d a l e n a a o p é d a c r u z ; o
terceiro, d e são R a i m u n d o de Penhafor; o q u a r t o , das A l m a s . Está esta igreja d e
Nossa S e n h o r a das M e r c ê s m u i t o b e m p a r a m e n t a d a , t e m duas torres, três sinos;
A igreja d e Nossa S e n h o r a M a d r e de D e u s , d a C o m p a n h i a , t e m dois altares
colaterais, e a d e N o s s a S e n h o r a d a L u z , do colégio a c i m a dito, t e m duas torres,
posto q u e u m a a i n d a n ã o esteja a c a b a d a , três sinos m u i t o b o n s e t e m u m a capela
no noviciado admirável;
A igreja do c o n v e n t o do Bonfim t e m dois altares colaterais e u m só sino, s e m
torre, m a s t e m c a m p a n á r i o .
T e m o colégio d a C o m p a n h i a sessenta religiosos, p o u c o m a i s o u m e n o s , / / [ fl. 508v. ]
é casa de noviciado, nela h á estudos de G r a m á t i c a p a r a os h a b i t a d o r e s d a q u e l a
c i d a d e , R e t ó r i c a , Filosofia e Teologia. N o c o n v e n t o de S a n t o A n t ô n i o , dos religi-
osos c a p u c h o s , t a m b é m h á a t u a l m e n t e Filosofia e T e o l o g i a , p o r q u e assim q u e
a c a b a m u m triénio d e Filosofia logo e n t r a outro; t e m este c o n v e n t o até trinta ou
q u a r e n t a religiosos, e a m a i o r p a r t e destes são estudantes e todos filhos de Portugal,
p o r q u e n a q u e l e convento, p o r o r d e m especial que há, n ã o aceitam filhos d a terra.
O c o n v e n t o de N o s s a S e n h o r a d o M o n t e do C a r m o t a m b é m terá p e r t o d e
q u a r e n t a religiosos, p o u c o m a i s o u m e n o s ; nele se e n s i n a t a m b é m Filosofia e
Teologia, mas não é sempre.
920

O c o n v e n t o de Nossa S e n h o r a das M e r c ê s t a m b é m terá trinta p a r a q u a r e n t a


religiosos, p o u c o mais o u m e n o s .
O c o n v e n t o d o Bonfim t e r á sete ou oito, p o u c o mais ou m e n o s , e o d a M a d r e
3

d e D e u s , d a C o m p a n h i a de J e s u s , t e m superior e alguns religiosos mais.


Estes são os conventos d a c i d a d e d e São Luís do M a r a n h ã o .
T e m mais o b i s p a d o q u a t r o [conventos], a saber: dois d e Nossa S e n h o r a das
M e r c ê s , u m n o rio M e a r i m , q u e t e r á sete p a r a oito religiosos, p o u c o m a i s ou
m e n o s , a igreja d o qual t e m três altares; está este convento e m sítio m u i t o aprazível
e a b u n d a n t e d e p e i x e s , c a r n e s , laticínios e t o d o o g ê n e r o d e m a n t i m e n t o s q u e
c o s t u m a p r o d u z i r a q u e l a t e r r a ; o o u t r o c o n v e n t o dos m e r c e d á r i o s é n a vila d e
T a p u i t a p e r a , q u e terá 15 religiosos, p o u c o m a i s o u m e n o s , cuja igreja t e m três
altares. E nesta vila está outro convento, de Nossa S e n h o r a do M o n t e do C a r m o , e
a igreja deste é admirável, tanto n a grandeza [como?] arquitetura e torres, q u e t e m
duas. T e m mais esta vila T a p u i t a p e r a u m colégio d a Companhia,* o n d e se ensina 1

G r a m á t i c a aos daquele distrito; t a m b é m a igreja deste t e m três altares e n ã o t e m


torre alguma, n e m a igreja das Mercês, c o m o t a m b é m a de M e a r i m . H á mais n a dita
vila u m *recolhimento, q u e fundou o p a d r e missionário Gabriel M a l a g r i d a , religioso
c

d a C o m p a n h i a d e Jesus.

Estes são os conventos q u e t e m o b i s p a d o do M a r a n h ã o , e x c e t u a n d o a dois


r e c o l h i m e n t o s q u e se ficavam p r i n c i p i a n d o , a saber; u m n a c i d a d e e o u t r o j u n t o
[ fl. ,509 ] a o rio / / P a r n a í b a , q u e c h a m a m o Buriti dos L o p e s . A t u d o d e u p r i n c í p i o o
m e s m o p a d r e missionário, e dista d a cidade 130 *léguas p a r a o n o r t e .

Igrejas p e r t e n c e n t e s a o *ordinário

A sé e catedral d a q u e l a cidade, a qual t e m 16 *cônegos, 8 *meio-cônegos, 18


"capelães, 6 *moços do c o r o , [sineiro?], dois sacristãos e m estações, "porteiro d a
massa, v a r r e d o r . T e m a m e s m a sé cinco altares, a saber: o de Nossa S e n h o r a d a
Vitória, q u e é p a d r o e i r a dela, S a c r a m e n t o , Almas, santo A n t ô n i o e o d o Rosário.
É a *capela-mor d a dita sé admirável, tanto n a g r a n d e z a c o m o nos p a r a m e n t o s ; o
coro dela é à imitação d a Patriarcal d e Lisboa, p o r q u e os assentos dos reverendos
"capitulares são todos c o b e r t o s d e p a n o s verdes. E m os ditos * p r e b e n d a d o s , an-
d a m vestidos d e "capas m a g n a s e *murças e n c a r n a d a s , i m i t a n d o a dita Patriarcal,
d e o n d e são 'sufragáneos, e os "meio-cônegos a n d a m vestidos d e r o x o . Estes são

Foieretoem 1721 por um frei Antônio de Sá, carmelita, 1

Fundado em 1734.
Fundado em 1746.

Em todos os escolios deste documento, letra de Caetano da Costa Matoso.


921

os h á b i t o s corais d a q u e l a c a t e d r a l , q u e t a m b é m serve d e m a t r i z . E t e m a q u e l a
cidade d e confissão e c o m u n h ã o 9 9 8 pessoas, p o u c o m a i s ou m e n o s , o q u e consta-
va d o *rol d a "desobriga q u e eu m e s m o fiz vários anos.
H á m a i s n a cidade sete igrejas pertencentes ao "ordinário; Misericórdia, q u e
t e m só u m altar; R o s á r i o dos Pretos, t e m três; São João., q u e é a igreja dos solda-
dos, t e m três altares; Nossa S e n h o r a dos R e m é d i o s , t e m três altares; N o s s a S e n h o -
r a da C o n c e i ç ã o dos M u l a t o s , q u e t e m u m ; Nossa S e n h o r a d o D e s t e r r o , q u e t e m
outro altar, foi esta igreja de Nossa S e n h o r a d o D e s t e r r o a p r i m e i r a m a t r i z d a q u e -
la cidade, o n d e estiveram os primeiros palácios dos "governadores; igreja d e N o s -
sa S e n h o r a d a B o a H o r a , q u e está logo fora da cidade, d a m e s m a sorte está t a m -
b é m a dos R e m é d i o s .
A igreja m a t r i z da vilã d e T a p u i t a p e r a ^ tem q u a t r o "altares colaterais, além
d a *capela-mor. T e m esta m a t r i z p e r t o d e sete mil a l m a s d e confissão e c o m u -
n h ã o , segundo m e disse o vigário dela R o b e r t o R o d r i g u e s , e r e n d e 6 0 0 mil "réis.
A igreja m a t r i z do R i o M e a r i m , q u e t e m pessoas d e confissão e c o m u n h ã o
e

p e r t o d e mil pessoas, c o n f o r m e m e afirmou o vigário d a q u e l a freguesia J o s é Pi-


m e n t a , q u a n d o o Excelentíssimo S e n h o r "bispo a foi "visitar, e e u e m sua c o m p a -
nhia; r e n d e 150 mil réis.
A igreja m a t r i z do I t a p e c u r u t e m só u m altar, p o r n ã o estar a i n d a a c a b a d a . S
f
[ A. 509v. ]
T e m a freguesia dela p e r t o d e duas mil almas d e confissão e c o m u n h ã o , s e g u n d o
m e disse o vigário dela, J o ã o d a C o s t a C o u t i n h o , e m t e m p o q u e S u a Excelência
R e v e r e n d í s s i m a a visitou."
A igreja m a t r i z de N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o d a vila d o I c a t u t e m três
1

altares, cuja freguesia t e m d e confissão e c o m u n h ã o p e r t o d e 1.500 a l m a s J


A freguesia d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o ^ das Aldeias Altas, digo, a igreja
t e m três altares e a freguesia t e m d e confissão e c o m u n h ã o p e r t o d e 1.500 almas,
p o u c o mais o u m e n o s , s e g u n d o m e [disse?] o p a d r e T o m á s Aires, e m o t e m p o
q u e S u a Excelência a visitou. 1

d
- Distância?
e
- Distância?
Quer dizer pedra jurada.
Distância?
^- Rende 150 mil réis.
1-
Distância?
j- Rende 200 mil réis.
k* Distância?
L
Rende 300 mil réis.
922

A igreja d e S ã o B e r n a r d o 111
do R i o P a r n a í b a t e m só u m altar, cuja freguesia
t e r á de confissão e c o m u n h ã o d u a s m i l pessoas, p o u c o mais o u m e n o s , e assim
esta igreja c o m o a d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o das Aldeias Altas e as mais q u e
a d i a n t e n o m e a r são dos sertões. 111

A igreja d e Nossa S e n h o r a d o M o n t e d o C a r m o d e P i r a c u r u c a 11
é feita d e
p e d r a de cantaria, templo admirável tanto na sua grandeza como n o mais e o
oficio e digo q u e foi o m e l h o r q u e vi cá n o Brasil a respeito d a p e d r a r i a , t a n t o
assim q u e nestas M i n a s n ã o vi t e m p l o s e m e l h a n t e ; t e m d u a s torres magníficas e
"frontispício m u i t o b o m . T e r á esta freguesia três p a r a q u a t r o mil almas de confis-
são e c o m u n h ã o , p o u c o m a i s o u m e n o s , s e g u n d o m e disse o v i g á r i o dela J o s é
Lopes, e m t e m p o q u e Sua Excelência a *visitou.°
A igreja de S a n t o A n t ô n i o d o SurubiP t e m três altares, e a d e c i m a t a m b é m
t e m três, a d e Piracuruca. T e m esta igreja d ê S a n t o A n t ô n i o 3.50Q almas d e con-
fissão e c o m u n h ã o , está situada e m u m aprazível, vistoso e alegre c a m p o 9 e j u n t o
d a q u a l está u m a lagoa d e água tão admirável q u e os h a b i t a d o r e s d a q u e l e *país,
b e b e n d o - a , e x p e r i m e n t a m s e m p r e b o a s a ú d e e n ã o a d o e c e m d e sezões, p o s t o q u e
a á g u a d e l a esteja s e m p r e t o l d a d a p e l o g r a n d e c o n c u r s o d e g a d o s q u e ali v ã o
saciar a sede.
[ fl. 510 ] A igreja d e Nossa S e n h o r a do Desterro dos Crateús " t e m só u m altar p o r n ã o
1

estar a i n d a a c a b a d a , e pessoas d e confissão e c o m u n h ã o t e m setecentas, p o u c o


mais o u m e n o s , segundo m e disse o vigário dela J o ã o L o p e s . s

A igreja de N o s s a S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o do Brejo dos Aroases - t e m três altares,


1

e pessoas d e confissão e c o m u n h ã o mil, p o u c o mais o u m e n o s , segundo m e disse


o vigário dela, p a d r e J o s é das Neves; está esta igreja situada j u n t o a u m a serra á o
p é d e u m córrego admirável e delicioso q u e d e r r a m a d a m e s m a serra."
A igreja d e N o s s a S e n h o r a d a Vitória d a vila d a M o c h a t e m t r ê s altares: u m
v

da padroeira, segundo da S e n h o r a Santana, onde o doutor ouvidor Custódio


C o r r e i a d e M a t o s instituiu u m a " i r m a n d a d e d a m e s m a S e n h o r a S a n t a n a , e m q u e
t e m realçado t a n t o o zelo dos devotos que, s u p o n h o , até o fim do m u n d o estará

III.
Distância?
n. Rende 400 mil *réis.
o. Rende perto de quatro mü *cmzados.
P Rende três para quatro mil cruzados.
Distância?
r.. Distância?
s. Rende 300 mil réis.
t.
Distância?
u. Rende 600 mil réis.
V.
Distância?
923

s e m p r e rio m a i o r a u g e d e relevantes venerações e cultos q u e l h e t r i b u t a m , w


e o
terceiro altar é d e são Francisco. T e r á esta igreja ou freguesia d e confissão e c o m u -
n h ã o q u a t r o mil almas, p o u c o mais ou m e n o s . E esta igreja a p r i m e i r a q u e tive-
r a m os sertões do b i s p a d o do M a r a n h ã o , está r i c a m e n t e p a r a m e n t a d a , n o q u e se
e s m e r a m u i t o a " i r m a n d a d e do Santíssimo S a c r a m e n t o , e t e m duas torres, e foi o
p r i m e i r o vigário dela T o m é d e C a r v a l h o . H á mais nesta vila u m a igreja dos p r e -
tos, d e N o s s a S e n h o r a do R o s á r i o , q u e t e m só u m altar.
A igreja d e S a n t o A n t ô n i o d a G u r g é i a , x
q u e n o v a m e n t e foi e r i g i d a p e l o
Excelentíssimo S e n h o r "bispo d o m Frei M a n u e l d a C r u z , t e m três altares e c a m -
p a n á r i o , e a igreja, d e p e d r a e cal, está situada e n t r e dois aprazíveis córregos q u e
fazem b a r r a no rio G u r g é i a , distante d a m e s m a igreja d u a s "carreiras d e cavalo,
p o u c o mais o u m e n o s ; terá de confissão e c o m u n h ã o duas mil almas, p o u c o m a i s
ou m e n o s ; r e n d e dois mil "cruzados.
A igreja d e Nossa S e n h o r a do L i v r a m e n t o do P a r n a g u á y t e m três altares, a
saber: o do Livramento, Senhora S a n t a n a e Almas. T e m esta igreja u m a torre e está
situada j u n t o a u m a lagoa q u e t e m três "léguas de comprido e u m a d e largo. Esta
terá d e confissão e c o m u n h ã o 2.500 almas, p o u c o mais ou m e n o s . 2

A igreja d e S ã o Bento das Balsas está situada e n t r e sete fontes e j u s t a m e n t e a o


p é d e u m a s g r a n d e s serras; foi esta freguesia e r e t a a a
pelo Excelentíssimo S e n h o r
bispo; t e m s o m e n t e u m altar, p o r n ã o e s t a r e m finalizadas as o b r a s d a igreja.
Estas são as igrejas / / matrizes pertencentes a o bispado d o M a r a n h ã o . Veja- [ fl. 510v. ]
m o s a g o r a q u a n t a s são as "capelas p e r t e n c e n t e s a o "ordinário.
N a cidade do M a r a n h ã o h á cinco capelas, a s a b e r : ^ u m a do p a d r e J o s é
R o d r i g u e s d e T á v o r a , a s e g u n d a d o p a d r e A n d r é C o r d e i r o , d o rio Anil, a terceira
do p a d r e M a n u e l F e r n a n d e s , e m M u c a j u t u b a ; a q u a r t a d o p a d r e Inácio d a Costa,
a q u i n t a do p a d r e Francisco d a Costa; acresce mais u m a igreja, a d e N o s s a S e n h o -
ra da C o n c e i ç ã o , n o rio M u n i m , q u e t e m três altares; é esta igreja d e u m a aldeia
d e índios q u e p e r t e n c e à m e s m a freguesia d a sé.
T e m a m a t r i z d a vila d e T a p u i t a p e r a três capelas, a saber: N o s s a S e n h o r a d o
L i v r a m e n t o , q u e está e m u m a ilha defronte d a vila; a s e g u n d a capela é nos C a m p o s
dos Perises, q u e é de S a n t o A n t ô n i o ; e a terceira, j u n t o à b a í a d o C u m ã , q u e é d e
Nossa Senhora da Conceição.

w
- Rende quatro mil cruzados.
*~ Sitio e distância?
Y- Distância?
z
" Rende 3 mil cruzados.
^ Rende 300.000 réis.
a
k- Que casta de capelas?
924

A freguesia d o I t a p e c u r u t e m duas "capelas: a p r i m e i r a d e N o s s a S e n h o r a d e


N a z a r é , a s e g u n d a é n a fortaleza d o m e s m o R i o I t a p e c u r u , q u e m e n ã o h á a
i n v o c a ç ã o dela.
A freguesia de. S ã o B e r n a r d o t e m d u a s capelas: a p r i m e i r a é a d a missão dos
índios a r a i p ã s , cuja invocação m e n ã o l e m b r o , a s e g u n d a de N o s s a S e n h o r a d a
C o n c e i ç ã o , d a missão dos índios a n a p u r u s .
A freguesia d e Nossa S e n h o r a do M o n t e do C a r m o d e P i r a c u r u c a t e m u m a
capela n o Buriti dos Lopes, o n d e se ficava f u n d a n d o u m seminário.
A freguesia d e S a n t o A n t ô n i o d e S u r u b i t e m d u a s c a p e l a s : a p r i m e i r a d e
N o s s a S e n h o r a dos H u m i l d e s , c o m três altares; é esta i m a g e m m u i t o milagrosa
pelos admiráveis prodígios q u e c o n t i n u a m e n t e o b r a ; e a s e g u n d a , d e M a n u e l d e
Almeida de Carvalho, é de Santo Antônio.
A freguesia d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o dos Aroases t e m u m a só capela,
de Nossa Senhora do O , onde c h a m a m o Catinguinhá.
A freguesia d e Nossa S e n h o r a d a Vitória d a vila d a M o c h a t e m duas capelas
p e r t e n c e n t e s ao colégio d a c i d a d e d a Bahia: a p r i m e i r a , j u n t o a o rio C a n i n d é , no
Brejo d o S a n t o Inácio, o n d e a m e s m a C o m p a n h i a d e J e s u s t e m o "hospício, é esta
capela d e S a n t o Inácio; a s e g u n d a é de S ã o J o ã o , n o rio Piauí, o n d e t a m b é m h á
hospício d a C o m p a n h i a ,
A freguesia d e S a n t o A n t ô n i o d a G u r g é i a t e m só u m a capela, de Nossa S e -
n h o r a d a C o n c e i ç ã o , q u e é do " c a p i t ã o - m o r G o n ç a l o d e Bairros.
A freguesia d e Nossa S e n h o r a do L i v r a m e n t o do P a r n a g u á t e m três capelas:
u m a d e Nossa S e n h o r a d a C o n c e i ç ã o , n a fazenda do J a c a r é , o u t r a d e Nossa S e n h o r a
do L i v r a m e n t o , n o C u r i m a t á , e a terceira nos C a m p o s das P a l m e i r a s ; t e m mais
u m a n o s C a m p o s d e [GÜbués?].
Estas são as capelas p e r t e n c e n t e s a o "ordinário.

Igrejas e capelas pertencentes ao colégio d o dito b i s p a d o d a B a h i a


[fl. 511 ]
A igreja d e São J o s é , q u e é n a ilha d a m e s m a c i d a d e , o n d e t e m u m a missão
d e índios c h a m a d o s t u p i n a m b á s .
A igreja d a missão d a n a ç ã o caí-caí, n o rio I t a p e c u r u . a c

A igreja d a aldeia p e q u e n a , d a n a ç ã o dos índios b a r b a d o s . T e m mais o u t r a


igreja e m a aldeia g r a n d e dos índios d a m e s m a n a ç ã o .
A igreja d a missão dos índios g u a n a r é s , sita nas Aldeias Altas, j u n t o às m a r -
gens do rio I t a p e c u r u , o n d e t a m b é m estão as duas acima, T e m nesta missão d a d o
princípio a u m colégio p e q u e n o . T e m mais duas igrejas n o rio P i n d a r é , e v e m a

Esta diferença?
925

ser u m a d a a l d e i a p e q u e n a dos guajajaras e o u t r a d a a l d e i a g r a n d e d a m e s m a


n a ç ã o . T e m m a i s o u t r a igreja d a aldeia, sita nos aprazíveis c a m p o s d o M a r a c u ,
o n d e o colégio t e m fazendas d e g a d o q u e r e p r o d u z e m todos os anos m a i s d e cinco
mil b e z e r r o s .
A igreja d a missão dos T r e m e m b é s sita nas p r a i a s do m a r j u n t o aos Lençóis,
são os índios desta aldeia c h a m a d o s , p o r a n t o n o m á s i a , os p e i x e s - d e - á g u a , t a n t o
assim q u e q u e m vai e m c a n o a q u e eles g o v e r n a m n ã o se afoga a i n d a q u e os m a r e s
estejam n i m i a m e n t e e m p o l a d o s , c o m o s u c e d e u a o p a d r e M a n u e l T a b o r d a , d a
m e s m a C o m p a n h i a , q u e q u e r e n d o se t r a n s p o r t a r p a r a a cidade d o M a r a n h ã o e m
u m a p e q u e n a c a n o a se e m b r a v e c e r a m os m a r e s d e tal sorte, i n d o e m m e i o d e
u m a baía, q u e se e n c h e u a c a n o a de á g u a , e v e n d o os índios perigo t ã o evidente
que. a c a n o a se ia a o f u n d o , p e g a m n o p a d r e as costas u n s , e o u t r o s v i r a r a m a
c a n o a p a r a efeito d e s e g u i r e m sua v i a g e m . S ã o tais estes í n d i o s q u e assim q u e
v ê e m n o m a r vir os t u b a r õ e s p o r os c o m e r e m , lhes m e t e m n a b o c a u m p a u d e
a m b a s as b a n d a s a g u d o de q u e s e m p r e v ã o p r e v e n i d o s p a r a a q u e l e m i n i s t é r i o .
Estas as igrejas das missões p e r t e n c e n t e s a o colégio.

T e m m a i s a igreja d a fazenda d e A n i n d i b a , o n d e t e m 1.200 escravos, p o u c o


mais o u m e n o s ; t e m mais a igreja da fazenda d e S ã o Brás, o n d e t e m 150 escravos,
p o u c o m a i s o u m e n o s ; t e m mais a capela d e S ã o M a r c o s , j u n t o à P o n t a d a Areia.
Estas duas igrejas p r ó x i m a s e as duas capelas estão sitas n a ilha d a m e s m a cidade.
O colégio d a vila d e T a p u i t a p e r a t e m só a igreja d a missão d e São J o s é , a l é m
d a do m e s m o colégio.

Igrejas e capelas p e r t e n c e n t e s ao c o n v e n t o d e [ fl. 51 l v . ]


Nossa Senhora do M o n t e do C a r m o

A igreja d e Nosso S e n h o r do Bonfim d o E n g e n h o , n o R i o I t a p e c u r u , o n d e


terá d e e s c r a v a t u r a q u i n h e n t a s almas, p o u c o mais ou m e n o s . * ac

A igreja d a f a z e n d a do Q u e b r a p o t e s , d a ilha d o M a r a n h ã o , o n d e t e r á d e
g e n t e , entre escravos e índios, trezentos, p o u c o mais o u m e n o s .
A *capela d e Nossa S e n h o r a d a G u i a , n a dita ilha.
A capela d a S e n h o r a S a n t a n a , nas fazendas q u e t e m o c o n v e n t o nas Aldeias
Altas, nas m a r g e n s do rio I t a p e c u r u .
O c o n v e n t o d a vila d a T a p u i t a p e r a t e m u m a c a p e l a n a a l d e i a d e í n d i o s ,
j u n t o à b a í a do C u m ã .

Esta diferença?
926

Igrejas e capelas pertencentes a o convento de Nossa S e n h o r a das M e r c ê s

A igreja d e A n d i r o v a , o n d e t e m obrigação d e estar u m religioso p a r a efeito


de dizer missa aos h a b i t a d o r e s daquele distrito.
A *capela d a ilha P e q u e n a . Assim a igreja c o m o a capela estão a m b a s n a ilha
d a m e s m a cidade.
T e m m a i s u m a igreja, do " e n g e n h o d a I t a o c a , o n d e t e m a q u e l e c o n v e n t o
p a r a c i m a de seiscentos escravos.

Igrejas p e r t e n c e n t e s ao c o n v e n t o d e S a n t o A n t ô n i o

A igreja d e u m a g r a n d e aldeia q u e t e m o c o n v e n t o j u n t o a o rio C o t i m , n a


ilha d a m e s m a c i d a d e d e q u e se serve a q u e l e c o n v e n t o , o n d e terá, d e g e n t e d e
confissão e c o m u n h ã o , de seiscentas almas p a r a cima.
Estas são as igrejas e capelas pertencentes aos conventos do dito b i s p a d o .

R u a s q u e t e m a cidade de São Luís do M a r a n h ã o

P r a ç a , r u a do M o n t e A l e g r e , r u a d a P r a i a G r a n d e , r u a d e N o s s a S e n h o r a
das M e r c ê s , r u a Nossa S e n h o r a do C a r m o , r u a N o v a , r u a d e J e r ô n i m o G o n ç a l -
ves, r u a de Isabel G o m e s , r u a de M a n u e l G a s p a r , r u a de Nossa S e n h o r a d a
C o n c e i ç ã o , r u a das Barreiras, r u a d a M a d r e de D e u s , r u a d a P a z , r u a das Flores,
[ fl. 5 1 2 ] r u a G r a n d e , r u a d o U r u c u , r u a d e S ã o J o ã o , r u a de / / N o s s a S e n h o r a dos R e m é d i o s ,
r u a de Santo Antônio, rua do Cruzeiro, rua do Saavedra, rua da Ponta da Cuia,
r u a d a F o n t e d a T e l h a , r u a dos V i e g a s , r u a d o Egito, b e c o d a s A r r a i a s .
Estas são as ruas q u e t e m a cidade de São Luís do M a r a n h ã o .
E s t á esta c i d a d e s i t u a d a a o p o e n t e a m a i o r p a r t e , e a o u t r a a o sul. N ã o h á
n e l a , a i n d a n o t e m p o de i n v e r n o , l a m a s pelas r u a s , p o r s e r e m de areias e
outras calçadas de p e d r a , e m p a r t e . T e m q u a t r o fortalezas, a saber: duas no
Baluarte, a e
u m a e m São Francisco e outra na P o n t a da Areia, p o r onde en-
t r a m os n a v i o s , a i n d a q u e c o m g r a n d e d i f i c u l d a d e , p o r h a v e r d e f r o n t e d e s t a
fortaleza u m canal que n ã o tem mais que q u a t r o "braças de fundo, e naquele
l u g a r se t e m p e r d i d o v á r i o s navios. E é t ã o a n g u s t o o dito c a n a l q u e a r r e d a n -
d o - s e p a r a q u a l q u e r d a s p a r t e s i n f a l i v e l m e n t e se p e r d e m , p e l a " m á q u i n a d e
c o r o a s d e a r e i a q u e h á n a q u e l e s m a r e s e j u n t a m e n t e p e d r a r i a ; e assim q u e os
n a v i o s p a s s a m este e s t r e i t o , logo t e m p o r t o a d m i r á v e l , o n d e a n c o r a m e ficam
livres d a s t e m p e s t a d e s d o m a r , p o r ser a q u e l e rio u m a f a m o s a e n s e a d a o n d e
os v e n t o s n ã o s ã o n o c i v o s às e m b a r c a ç õ e s d a q u e l a g r a n d e z a . F i c a m , p o i s ,
estes a n c o r a d o s n a d i t a e n s e a d a p a r a a p a r t e d o p o e n t e d e f r o n t e d a c i d a d e ,

ae
- A grandeza delas?
927

j u n t o à p r a i a G r a n d e . E n t r a este rio ou b r a ç o de m a r pela ilha d e n t r o três "léguas,


p o u c o mais ou m e n o s , até os sítios d e A r a c a n g a , e se divide e m vários b r a ç o s , a
saber; J a p a r a , o rio das Bicas, o rio I t ã e o rio q u e e n t r a p a r a as f a z e n d a s d o
Bonfim. A estes b r a ç o s d e m a r c h a m a m os n a t u r a i s d a q u e l a t e r r a i g a r a p é s , q u e
q u e r dizer por onde andam canoas ou coisas de navegações. São m u i t o a b u n d a n t e s d e p e i x e
e marisco estes rios, cujas p r a i a s estão vestidas de u m a s infrutíferas árvores c h a m a -
das m a n g u e s , q u e c o m as folhas e canas dela se c u r t e m sola. S o b r e estas árvores
d o r m e m s e m p r e u m a s aves c h a m a d a s g u a r á s , q u e / / pelo e n c a r n a d o e a d m i r a - [ fl. 512v. ]
veis p l u m a s d e q u e se a d o r n a m c o n v i d a m aos h a b i t a d o r e s d a q u e l a t e r r a a tira-
r e m - l h e a vida p a r a das p e n a s fazerem vários r a m a l h e t e s primorosos. H á m a i s p o r
aqueles m a n g u e s e praias m u i t a a b u n d â n c i a d e aves d e várias cores. T e m mais a
dita e n s e a d a o u t r o b r a ç o d e m a r , q u e principia d a fortaleza d o B a l u a r t e até o rio
Anil, q u e são d u a s "léguas. São os h a b i t a d o r e s d o M a r a n h ã o d e índole a d m i r á -
vel, m u i t o caritativos p a r a os filhos de. P o r t u g a l . N ã o h á n a q u e l a t e r r a p o b r e s
m e n d i g o s , s e n d o a m e s m a t e r r a p o b r e p o r falta d e c o m é r c i o . d e q u e hoje
e s t á , a i n d a q u e h o j e j á lá v ã o t o d o s os a n o s 12 n a v i o s , p o u c o m a i s o u m e -
n o s , n a "frota. T e m a i l h a e m q u e e s t á s i t u a d a a c i d a d e sete l é g u a s e m q u a -
dro.

T e m q u a t r o rios q u e a fazem a d m i r a v e l m e n t e aprazível. Deles se p o d e veri-


ficar o tinto q u e fala dos q u a t r o rios do p a r a í s o terreal. São os rios: o Anil, q u e
t e n d o o seu n a s c i m e n t o n o m e i o d a ilha, debaixo de u m r o c h e d o d e p e d r a s , vai
p o r e n t r e frondosas e copadas árvores, c o m o são coqueiros, fazer b a r r a , d a p a r t e
do n o r t e , e m u m b r a ç o do m a r q u e sai d a e n s e a d a a c i m a dita — são admiráveis as
águas deste rio, t a n t o p o r serem frigidíssimas c o m o salutíferas p a r a os indivíduos
racionais o rio M o c a i t i b a , q u e t a m b é m , digo, q u e faz b a r r a e m u m b r a ç o d e
m a r a o nascente - é t a m b é m admirável este rio, pelas cristalinas águas d e q u e se
c o m p õ e e desde seu n a s c i m e n t o até perto do m a r está de u m a e o u t r a p a r t e p o v o -
a d o —; o rio Cotim,. q u e faz b a r r a p a r a a p a r t e d o n o r t e , o n d e a faz t a m b é m o rio
Anil — t e m este rio suas cabeceiras e m buritizal o p a c o e triste, c o n t u d o são as suas
águas admiráveis o rio A h d i r o v a faz b a r r a n o m a r d a p a r t e sul, t a m b é m é a d m i -
rável p e i a b o n d a d e , d e suas águas.
A l é m destes, t e m n a ilha d o M a r a n h ã o vários / / rios m a i s p e q u e n o s , q u e [ fl. 5 1 3 ]
n ã o declaro p o r n ã o ser extenso.
T e m a c i d a d e do M a r a n h ã o duas fontes g r a n d e s , a saber: a fonte das P e d r a s ,
c o m duas bicas d e á g u a admirável - esta fonte é a m o d o d e chafariz e lhe fizeram
os holandeses no t e m p o q u e foram senhores do M a r a n h ã o , e h á anos e m q u e a
seca é rigorosa, q u e seca m a s n ã o d e t o d o —; a fonte dos A r m a z é n s , q u e d e i t a
s e m p r e , assim d e v e r ã o c o m o de inverno, á g u a c o m m u i t a a b u n d â n c i a — p e l a falta
da outra, serve d e r e m é d i o aos h a b i t a d o r e s d a q u e l a terra —, fica esta fonte fora d a
c i d a d e q u a s e u m a "carreira d e cavalo. T e m mais várias fontes p e q u e n a s , c o m o a
fonte d e S a n t o A n t ô n i o , a fonte d a T e l h a e a fonte d o Bispo, q u e é a q u e l a a o n d e
928

ia b u s c a r o m e s m o "bispo, * p o r suas m ã o s , á g u a p a r a b e b e r , pelo t e r e m p o s t o e m


3

cerco p o r n ã o só u m " g o v e r n a d o r m a s t a m b é m muitos dos h a b i t a d o r e s d a q u e l a


t e r r a , d e q u e resultou enforcarem-se muitos e ficarem p e r d i d a s as m e l h o r e s casas
d a q u e l a cidade. O m e s m o sucedeu q u a n d o l a n ç a r a m dela fora a o p a d r e A n t ô n i o
Vieira. S a

T e m p e r t o d e q u a t r o c e n t o s poços, p o r q u e q u e r e m ter nos seus quintais á g u a


p a r a o serviço das suas casas. E a terra muito a b u n d a n t e d e c a r n e e peixe, frutas,
f a r i n h a s , a r r o z , m i l h o e feijão e todos os mais l e g u m e s q u e c o s t u m a m p r o d u z i r
n o s brasis. São os h a b i t a d o r e s n i m i a m e n t e preguiçosos e inclinados a b e b e r , fumo
e " l a t r a ç ã o d e vidas alheias e o u t r o s vícios q u e , p o r m o d e s t o , os n ã o explico.
T u d o nasce d e t e r e m p o u c o s negócios e m q u e se o c u p e m , e p e l o contrário sucede
nas m u l h e r e s , q u e a l é m de serem admiráveis n o seu p r o c e d i m e n t o e f o r m o s u r a
t r a b a l h a m d e dia e de noite p a r a sustentarem as obrigações d e suas casas, t a n t o e m
b a t e r e fiar algodão c o m o e m coser e fazer r e n d a s .
H á n o s m a r e s circunvizinhos d a q u e l a c i d a d e u n s peixes c h a m a d o s q u a t r o -
olhos, q u e n a realidade os t ê m ; dois lhes servem p a r a se vigiarem das aves q u e os
c o m e m e dois dos peixes q u e os d e v o r a m ; o t a m a n h o destes peixes é c o m o u m a
s a r d i n h a , p o u c o m a i s ou m e n o s , e q u a s e s e m p r e a n d a m n a superfície d a á g u a
[ fl. 513v, ] c o m a / / c a b e ç a d e fora.
H á o u t r a espécie d e peixe c h a m a d o b a i a c u , q u e q u e m c o m e cozido infalivel-
m e n t e m o r r e se lhe n ã o tiram o fel; h á o u t r o peixe c h a m a d o p o r a q u ê , p o r o u t r o
n o m e tremelga, e q u a n d o p e g a no anzol faz a d o r m e c e r o b r a ç o , e o m e s m o suce-
d e àqueles q u e lhe d ã o c o m a l g u m i n s t r u m e n t o e a i n d a estando fora d a á g u a .
T e m os m a r e s j u n t o d a q u e l a c i d a d e as b a í a s s e g u i n t e s , a s a b e r . A d e
T a p u i t a p e r a , q u e t e m três p a r a q u a t r o "léguas d e c o m p r i d o , p o r o n d e e n t r a m os
navios p a r a o p o r t o d a q u e l a c i d a d e . T e m esta b a í a , p a r a u m a das p a r t e s , d u a s
ilhas, a saber: a ilha das Poias, o n d e h á m u i t a a b u n d â n c i a de cobras venenosíssimas,
p o r o u t r o n o m e a ilha do M e d o ; t e m o u t r a ilha j u n t o desta, q u e c h a m a m a ilha do
L i v r a m e n t o , p o r nela estar u m a igreja d e Nossa S e n h o r a d o L i v r a m e n t o . T e m a
p a r t e d o sul, j u n t o d a m e s m a ilha, o u t r a b a í a c h a m a d a do I t a q u i , e t e m este n o m e
[devido?] a u m a ilha p e q u e n a de p e d r a s deste m e s m o n o m e , a qual b a í a faz u m
b r a ç o pela ilha d e n t r o , q u e vai sair a o estreito q u e faz o m a r , d a b a n d a d a terra
firme d a p a r t e do sul, q u e c h a m a m a o dito estreito rio dos M o s q u i t o s , e n o prin-
cípio deste, ao p o e n t e , está u m a ilha p e q u e n a e r e d o n d a c h a m a d a T a u á , o n d e d á
princípio o u t r a b a í a de seis ou mais léguas q u e vai d a r à b o c a d o rio M e a r i m e

at
- Que bispo?*
a
£- Como foi isto?

Dom frei Timóteo do Sacramento.


929

P i n d a r é ; à p a r t e d o sul, p a r a a p a r t e do nascente d o estreito^ está u m a b a í a c h a m a -


d a P i n d o ç u j u r u , e nela se t ê m p e r d i d o várias c a n o a s d e fazenda q u e se t r a n s p o r t a -
v a m p a r a os sertões, p o r n a q u e l a b a í a se a l t e r a r e m d e m a s i a d a m e n t e os m a r e s ,
c o m o t a m b é m n o B o q u e i r ã o , princípio d a ilha do Itaqui, se p e r d e m m u i t a s c a n o -
as t o d o s os a n o s , t a n t o pelos g r a n d e s r o c h e d o s d e p e d r a s q u e h á n a q u e l e l u g a r
c o m o p o r c o r r e r e m as águas do sul p a r a o n o r t e c o m m u i t a violência n a v a z a n t e
da m a r é e n a e n c h e n t e do norte p a r a o sul, c o m que, e m t o d o o t e m p o , é perigoso
o dito B o q u e i r ã o , q u e está e n t r e a ilha do M e d o e a d a c i d a d e , sendo necessário
q u e esteja a m a r é vazia p a r a efeito de p a s s a r e m o dito / / B o q u e i r ã o as e m b a r c a - [ fl. 5 1 4 ]
çoes q u e l e v a m m a n t i m e n t o s àquela cidade, H á mais o u t r a b a í a c h a m a d a M e i o ,
e m q u e faz b a r r a o rio I t a p e c u r u . H á o u t r a b a í a j u n t o à vila d o Icatu, e m q u e faz
b a r r a o rio M u n í m , e esta b a í a se estende até J a c a r e í , e aí e n t r a u m b r a ç o d e m a r
p e l a t e r r a d e n t r o d a p a r t e do p o e n t e p a r a o n a s c e n t e , q u e t e m m a i s d e q u i n z e
léguas, a qual finaliza n a costa do m a r a o nascente, e dessa costa e n t r a o u t r o b r a ç o
até. à baía d o M u c u n a m b i b a , q u e terá seis p a r a sete *léguas d e largo, j u n t o à qual
p r i n c i p i a a b a í a d o A l e g r e , e n o fim d e s t a p r i n c i p i a a o A p e r c h a , o n d e o
Excelentíssimo b i s p o d o m frei M a n u e l d a C r u z , j u n t o c o m sua comitiva, esteve
q u a s e s u b m e r g i d o — eu vi — d e u n s m a r e s n a q u e l a b a í a s e r e m c o m u m e n t e
bravíssimos p e l a s e v e r i d a d e de suas e m p o l a d a s o n d a s . Está j u n t o a esta b a í a a
p r i m e i r a fortaleza q u e h o u v e n o b i s p a d o do M a r a n h ã o e nela sortiam os navios
ou, p a r a m e l h o r dizer, t o m a v a m p o r t o . D a q u i e n t r a m os Lençóis, q u e são m o n t e s
d e areias e m i n e n t e s q u e os navegantes, fazendo v i a g e m p a r a aqueles estados, os
avistam de m u i t o longe, c o m o sucedeu a m i m n o t e m p o q u e m e transportei p a r a
aqueles estados. T e m d e c o m p r i d o os ditos Lençóis o u m o n t e s d e a r e i a mais d e
c e m léguas pela costa do m a r até a b a r r a do rio P a r n a í b a e daí até o rio C a m b u c i .

D a sobredita b a í a d o A p e r c h a se vai c o s t e a n d o o m a r ao n a s c e n t e até q u e


este m e t e u m b r a ç o pela terra d e n t r o mais de dez léguas, e este b r a ç o se divide e m
o u t r o q u e vai [finalizar?] e m o p o r t o c h a m a d o M e a r i m . D i s t a n t e deste p o r t o seis
léguas fica o rio N e g r o , q u e n o t e m p o d e v e r ã o d á vau, e daí a dois dias de v i a g e m
o rio das Preguiças, faz b a r r a no m a r da p a r t e d o sul. T e m este rio d e l a r g u r a n a
sua b a r r a quase u m q u a r t o de légua, p o u c o mais ou m e n o s , p o r se m i s t u r a r a á g u a
doce c o m a salgada, e é navegável. T e r á este rio das Preguiças até as cabeceiras d e
o n d e nasce p e r t o / / d e duzentas léguas, e desde o p o r t o acima dito até o rio das [ fl. 514v. ]
Preguiças está t u d o p o v o a d o d e fazendas de cavalgaduras dos p a d r e s d a C o m p a -
n h i a d o colégio do M a r a n h ã o . D o m e s m o rio d a s P r e g u i ç a s a t é a m i s s ã o dos
T r e m e m b é s estão várias fazendas, assim d e g a d o v a c u m c o m o cavalares, e destas
a m e l h o r é o d a fazenda c h a m a d a a do L a g o , p o r ter m u i t a s mil éguas d e entrega.
D a dita missão até o rio P a r n a í b a t e m fazendas n a f o r m a acima.
E o rio P a r n a í b a u m dos m a i o r e s q u e t e m o b i s p a d o do M a r a n h ã o , e eu, m e
p a r e c e q u e só o d e São Francisco o excede n a m a i o r i a . É rio o dito P a r n a í b a q u e
t e m trezentas léguas, p o u c o m a i s ou m e n o s , desde o m a r e m q u e faz b a r r a até a
930

serra dos Gilbués, o n d e t e m sua o r i g e m . É rio este tão largo, p r i n c i p a l m e n t e q u a n d o


se v a i a v i z i n h a n d o ao m a r v i n t e "léguas, q u e m a l se divisa u m a pessoa d e u m a
b a n d a a o u t r a e m todo o espaço das vinte léguas mais vizinhas a o m a r . A l é m d e
várias ilhas q u e t e m este rio, t e m u m a d e sete léguas, antes d e fazer b a r r a n o m a r
d u a s a t é três l é g u a s , p o u c o m a i s ou m e n o s . Está a d i t a i l h a p o v o a d a d e g a d o
cavalar, e m e disse o d o n o dela, J o s é d e A b r e u Bacelar, q u e tinha dez mil éguas d e
entrega.
T e m mais o u t r a ilha, q u e h á d e ter seis léguas e m q u a d r a , q u e t a m b é m está
p o v o a d a d e g a d o v a c u m e c a v a l a r . A este r i o v ã o v á r i a s e m b a r c a ç õ e s d e
P e r n a m b u c o e d a B a h i a a c o m p r a r gados e fazer carnes p a r a negócio. E p o v o a d o
de u m a e o u t r a p a r t e d e fazendas duzentas léguas, e são tão admiráveis os gados
dela q u e são os m e l h o r e s q u e t e m todo o sertão.
D e s d e a c i d a d e do M a r a n h ã o ãté, a b a r r a deste rio [ P a r n a í b a ] são c e n t o e
q u a r e n t a léguas pelas praias do m a r . Neste rio fazem b a r r a o rio P i r a c u r u c a , o rio
A r u n g a , o rio S a m b i t o , o rio I t a u e i r a , o rio C a n i n d é , o rio G u r g é i a . Estes dois
[ fl. 5 1 5 ] últimos são rios navegáveis / / q u e têm as suas cabeceiras, o G u r g é i a nas serras do
Gilbués e o C a n i n d é t e m as suas cabeceiras j u n t o à travessia d a B a h i a . Faz b a r r a
mais n o rio P a r n a í b a , o rio das Alpercatas, o rio de São B e n t o das Balsas, o rio d a
C a n a v i e i r a , o rio do P a r a i m , o rio das P o m b a s , o R i a c h ã o e outros muitos, d e q u e
n ã o sou sabedor. O rio das Alpercatas e o das Balsas são navegáveis, q u e fazem
b a r r a d a p a r t e d o norte n o m e s m o rio. Estes dois rios e os q u a t r o últimos fazem
b a r r a , c o m o j á disse, n a p a r t e do norte d o dito rio e os outros d a p a r t e d o sul.
Estão m u i t a s terras entre estes rios e nas m a r g e n s do m e s m o P a r n a í b a p o v o -
adas d e "gentilismo a i n d a i n d ó m i t o , c o m o são a n a ç ã o timbiras, c u p i n h a r ó s , p e -
d r a s - n a - b o c a , gueguês e a l g u m resto dos corocatis. A l é m destas nações, h á m u i t a s
d e q u e se lhes n ã o sabe. o n o m e , das q u a i s v i v e m p e r t o d e t r i n t a e m o C o c a i
G r a n d e , e é tão g r a n d e o tal cocai q u e t e m sessenta léguas d e c o m p r i d o . A l a r g u r a
n ã o a sei, p o r q u e o "capitão J o ã o do R e g o e outros muitos "cabos q u e f o r a m d a r
g u e r r a a o "gentio só fazem m e n ç ã o do c o m p r i m e n t o e j u n t a m e n t e dos deliciosos,
aprazíveis, a m e n o s e dilatados c a m p o s q u e h á p o r a q u e l a s p a r t e s , cujo fim n ã o
s a b e r ã o c o m facilidade os nossos v i n d o u r o s , e j u n t a m e n t e a n o t í c i a d e reinos e
impérios d e gentilismo q u e h á p a r a aquelas partes, t u d o a o sul, e ao n o r t e m e n o s ,
H á n a q u e l e vastíssimo m a p a a n a ç ã o acoroá-guaçu, q u e é tão g r a n d e e dila-
t a d a q u e se estende desde o rio M e a r i m até Goiás. H á t a m b é m a n a ç ã o acoroá-
m i r i m , q u e é g r a n d e , m a s n ã o c o m o a q u e dito fica. H á t a m b é m a n a ç ã o gueguê,
c o m o já disse, e h á tantas mais que, segundo m e disse u m c a b o d a t r o p a d e J a c i n t o
d e S a m p a i o , e o m e s m o J a c i n t o o escreveu a o "general do M a r a n h ã o , q u e e r a m
[ fl. 5 1 5 v ]
r tantas as nações q u e cinco anos a n d a r a m pelas suas terras e m busca d e o u r o , / /
p r i n c i p a l m e n t e às m i n a s d o P i n d a r é , e q u e n u n c a p u d e r a m alcançar n o decurso d e
tantos anos a certeza das nações que havia. E e r a m tão b á r b a r o s os tais gentios p o r
o n d e p a s s o u a dita t r o p a [que] q u a n d o lhes atiravam c o m c h u m b o esfregavam as
931

feridas c o m areia até q u e a m o r t e de u n s d e s e n g a n a v a e abria os olhos a segredo


de outros. O *sargento-mor J o ã o N o g u e i r a d e Sousa m e disse, n a c i d a d e de São
Luís do M a r a n h ã o , q u e , a n d a n d o c o m descobrimento das m i n a s d o P í n d a r é , vira
muitas aldeias c o m o cidades, c o m ruas admiráveis, a i n d a q u e c o m casas cobertas
d e *pindoba. Esta é a notícia q u e t e n h o do "gentio q u e h a b i t a n a q u e l a s p a r t e s ,
n e m p o d e h a v e r o u t r a mais certa do q u e esta, e é a q u e m e d e u o " c a p i t ã o - m o r das
conquistas A n t ô n i o G o m e s Leite, q u e é t a n t o o "gentilismo q u e até o fim d o m u n -
do se n ã o h á de m e t e r [deposto?], e este t i n h a f u n d a m e n t o p a r a m o certificar, p o r
a n d a r m u i t o s a n o s m e t i d o c o m várias n a ç õ e s d e gentio lá p o r essas vastíssimas
regiões.
O rio M e a r i m t e m d a sua b a r r a até as cabeceiras q u a t r o c e n t a s "léguas, p o u c o
mais ou m e n o s . P o r ele se n a v e g a m três meses de viagem, que foi o q u e n a v e g o u o
c a p i t ã o - m o r d a p r a ç a d o M a r a n h ã o D u a r t e S a r d i n h a . E rio admirável t a n t o p e l a
fertilidade dos c a m p o s circunvizinhos c o m o p e l a a b u n d â n c i a d e p e s c a d o e varie-
d a d e de aves q u e e m suas m a r g e n s se criam. Estão estes c a m p o s p o v o a d o s s o m e n -
te seis dias de v i a g e m d a b a r r a do rio p a r a cima de g a d o v a c u m e cavalares, e o
mais a i n d a t u d o está infestado d o gentilismo, e d i z e m m u i t o s q u e nas m a r g e n s
deste rio h á m u i t o cravo e cacau, e c o m o d e fato eu vi b a s t a n t e deles n a c i d a d e do
Maranhão.

R i o s q u e fazem b a r r a n o rio M e a r i m d a p a r t e d o p o e n t e

O rio G r a j a ú , navegável d e c a n o a s dois meses, e o u t r o s m u i t o s d e q u e n ã o


sei o n o m e ; d a p a r t e do nascente, o rio C o r d a , t a m b é m navegável, e outros m u i -
tos rios.
O rio Pindaré t e m desde a sua b a r r a até as cabeceiras p e r t o de duzentas léguas. [ fl. 5 1 6 ]
T a m b é m é navegável até as aldeias dos índios guajajaras, e daí p a r a cima, oito dias,
tem as suas cabeceiras, n a serra P o m b a . É esta serra cândida, e m e disse u m paulista
q u e a n d o u q u a t r o anos c o m o gentilismo q u e h a b i t a n a q u e l a s terras q u e n a dita
serra h á muito o u r o , e o m e s m o disseram alguns índios q u e várias nações q u e c o n -
finam c o m os brancos a p a n h a r a m q u e n a q u e l a serra havia muito itaiúba - que q u e r
dizer ouro —, q u e os seus p a r e n t e s do beiço furado faziam dele "botoques p a r a os
m e s m o s beiços e orelhas. H á n a dita serra P o m b a várias castas de pedrarias precio-
sas, tão resplandecentes q u e n a noite mais tenebrosa d ã o claridade. H á nesta serra,
c o n t i n u a m e n t e , estrondo, segundo m o contou o p a d r e M a n u e l , missionário M a n u e l
da Silva d a C o m p a n h i a d e J e s u s , missionário q u e foi das aldeias circunvizinhas
à q u e l e gentilismo, pelo gentio m a n s o ter a p a n h a d o alguns dos b r a v o s que h a b i t a m
n a q u e l e distrito e este lho certificar o m e s m o q u e certificou o paulista q u e lá a n d o u
os anos q u e j á disse.

E esta serra n i m i a m e n t e elevada e tão c o m p r i d a e dilatada q u e d i z e m m u i t o s


q u e a avistaram (como f o r a m os d a t r o p a d e J a c i n t o d e S a m p a i o , q u e a i n d a a n d a
932

e m d e s c o b r i m e n t o das ditas minas do Pindaré e, segundo a notícia q u e t e n h o , se


é certo, j á t e m descoberto n a dita serra ouro com m u i t a a b u n d â n c i a ) q u e t e m mais
d e q u a t r o c e n t a s "léguas, p o r ter seu princípio e m Goiás p e l a p a r t e do sul até o
p o e n t e , N e s t a serra se dividem os bispados do P a r á e M a r a n h ã o pelas v e r t e n t e s
das águas; m e disseram mais dois h o m e n s d a dita t r o p a q u e s e m p r e aquela serra
está c o b e r t a d e n é v o a ou neblina, e p a r a se chegar a ela daquela p a r t e é dificultoso,
e n v i d a os g r a n d e s m a t o s e imensidade d e "gentio q u e h á .
[ fl. 516v. ] O rio Itapecuru t e m a sua etimologia d e / / u m a p e d r a toda furada p o r várias
partes. T e m de o n d e faz b a r r a às suas cabeceiras duzentas léguas. É rio este q u e está
p o v o a d o até a aldeia dos caí-caís de "engenhos de açúcar e roçarias, q u e são cinco
dias d e v i a g e m p o r ele a c i m a , e o d o I t a p e c u r u - M i r i m faz nele b a r r a . A t é suas
cabeceiras (onde eu j á estive) está p o v o a d o , de u m a e outra p a r t e , de fazendas d e
gados vacuns e cavalares, a i n d a q u e muitas léguas o n ã o está, p r i n c i p a l m e n t e d a
p a r t e do p o e n t e , pela g r a n d e mataria e risco de gentio q u e t e m entre o dito rio e o
d e M e a r i m . T e m o dito rio Itapecuru n a sua barra, que a faz do sul p a r a o norte
(como t a m b é m os mais rios d e q u e temos falado), u m a fortaleza de treze peças de
artilharia q u e fizeram os holandeses e m t e m p o q u e t o m a r a m o M a r a n h ã o , e p o u c o
distante da p o r t a desta fortaleza está u m a grande p e d r a , detrás d a qual se esconde-
r a m os moços valorosos portugueses q u a n d o t o r n a r a m a restaurar a dita fortaleza e
a r e s t a u r a r a m deste m o d o : assim que a a u r o r a veío destruindo as caliginosas som-
bras d a noite, logo os holandeses abriram a porta d a dita fortaleza c o m toda a cau-
tela, p o r é m os portugueses, c o m o estavam b a s t a n t e m e n t e prevenidos, n ã o b a s t o u
toda a cautela dos holandeses p a r a q u e eles n ã o entrassem n a q u e l a h o r a pela p o r t a
d a dita fortaleza, e passaram a todos os inimigos a ferro.

O rio M u n i m terá d a sua b a r r a às cabeceiras, q u e são nos c a m p o s d o rio


I g u a r á , cento e c i n q ü e n t a léguas, q u e t a m b é m faz b a r r a a este rio d a p a r t e d o sul
p a r a o n o r t e , n o m a r . Está p o v o a d o d e e n g e n h o s d e a ç ú c a r e r o ç a r i a s t o d o o
espaço q u e m e d e i a e n t r e o I t a p e c u r u e o m e s m o rio, c o m o t a m b é m o M u n i m -
M i r i m , o n d e o gentio g u a n a r é destruiu vários engenhos de açúcar, e ficaram d e tal
sorte q u e até hoje se n ã o [reedificaram?] a m a i o r p a r t e deles. P a r e c e m os sítios
deste rio o paraíso terreal, p o r serem férteis, aprazíveis, admiráveis e a b u n d a n t e s
[ fl. 517 ] d e / / t o d o o necessário p a r a o indivíduo h u m a n o . Faz b a r r a o M u n i m - M i r i m n o
rio M u n i n g u a ç u e p o u c o distante abaixo desta está u m a fábrica d e m a d e i r a m e -
lhor d o q u e a do C o m a r c ã o , e m Portugal, à qual fizeram D i o g o M o n a [e] J o ã o
J a u r e s , e m e disse o dito M o n a q u e lhe tinha custado 260.000 "cruzados.
H á t a n t o pelos m a t o s do rio M u n i n g u a ç u c o m o p e l o M i r i m m u i t a s b a u n i -
lhas, e n a q u e l a s p a r a g e n s é q u e as vão buscar p a r a efeito de c o m elas negociar. H á
mais vários óleos preciosíssimos, c o m o o bálsamo d e u m a árvore c h a m a d a m i r i m
e u m a fruta c h a m a d a c u m a r u , q u e sendo p e q u e n i n a , r e d o n d a e p r e t a é tão a r o -
m á t i c a q u e se lhe n ã o p o d e aturar suas odoríferas exalações; é admirável p a r a d o r e s
de cabeça e de ouvidos. E j á que falamos e m óleos, t o m e m o s as vastíssimas m a t a s
933

d o P i n d a r é , G r a j a ú e M e a r i m , o n d e n ã o só h á o óleo dito e as m e s m a s frutas m a s


i m e n s i d a d e d e óleo d a c o p a í b a , e se tira u m e o u t r o d e á r v o r e s c o p a d í s s i m a s
fazendo a r o d a das árvores u m a fenda q u e e n c h e m d e algodão, p a r a o q u a l desti-
l a m a q u e l a s árvores este licor q u e o *gentilismo d o m a d o a p r o v e i t a e s p r e m e n d o
aquele algodão e m "tabocas grossas e ocas. H á t a m b é m j u n t o à b a r r a d o rio P i n d a r é
vários " e n g e n h o s de a ç ú c a r e n o rio M e a r i m da m e s m a sorte, o n d e são tão a d m i -
ráveis os canaviais q u e d u r a m vinte anos s e m se p l a n t a r e m . P o r este rio M e a r i m
e n c h e a m a r é c o m t a n t a violência q u e gasta três horas; nele faz p o r o r o c a o m a r
c o m t a n t a violência q u e se q u a n d o e n c h e a m a r é , a c h a a l g u m a c a n o a j u n t o d e
b a i x i o , a faz infalivelmente e m p e d a ç o s , o q u e faz m u i t a s "léguas p e l o dito rio
a c i m a , e p o r m a i s q u e se t e n h a i n d a g a d o a r a z ã o daqueles m a r e s fazerem n a q u e l e
rio t a n t a força e violência até agora n e n h u m d o u t o a deu. D a b a r r a do rio M e a r i m
até a ilha d o M a r a n h ã o t u d o são c a m p o s deliciosos e p o v o a d o s d e g a d o v a c u m e
cavalares.

O r i o I g u a r á faz b a r r a n o rio M u n i m e é t ã o terrível a á g u a d e s t e rio q u e [ fl. 517v. ]


q u e m a b e b e infalivelmente adoece. E m certos tempos, c o m o é desde m a r ç o
até o fim d e a g o s t o , são suas á g u a s v e r m e l h a s d e c o r . T a m b é m está p o v o a d o
d e f a z e n d a s d e g a d o , p o r é m Os d o n o s delas n ã o assistem j u n t o d e l e m a s , a n -
tes, d i s t a n t e u m a l é g u a o u o q u e n a v e r d a d e for, p o r n ã o b e b e r e m s e m e l h a n -
tes águas.
O rio Poti faz b a r r a n o rio P a r n a í b a e t e m as suas cabeceiras, nas serras d e
I b i a p a b a , águas vertentes p a r a o bispado do M a r a n h ã o . Esta serra d a I b i a p a b a divi-
d e o b i s p a d o de P e r n a m b u c o do do M a r a n h ã o pelas vertentes dos rios. N e l a h á
m i n a s de o u r o e p r a t a , e m e disse o "sargento-mor A n t ô n i o da Costa q u e a palpitara
quase toda, e que e m todas as partes mostrava ter ouro, e lá a n d a m descobridores d e
m i n a s de p r a t a , a qual p r a t a está e m pedras; e eu tive u m a q u a n d o fui vigário d a
cidade do M a r a n h ã o , q u e m a deu u m h o m e m que a n d a v a nas diligências das ditas
m i n a s . T a m b é m nela h á m i n a s de c o b r e , estanho e c h u m b o , segundo m e disse o
" c a p i t ã o - m o r dos C r a t e ú s A n t ô n i o F e r n a n d e s , e m e m o s t r o u t o d a essa casta d e
metais extraídos n a dita serra. E o rio Poti p o v o a d o d e u m a e o u t r a p a r t e de fazendas
d e g a d o v a c u m e cavalar.
O rio Piauí faz b a r r a n o rio C a n i n d é , T e m suas cabeceiras j u n t o a o Brejo d e
S ã o J o ã o , dos p a d r e s d a C o m p a n h i a , do colégio d a Bahia. E p o v o a d o de fazendas
de gado.
O rio P a r a i m faz b a r r a n o rio G u r g é i a . T e m suas cabeceiras nas serras d a B o a
Vista, q u e dividem o b i s p a d o do M a r a n h ã o do [de] P e r n a m b u c o . T e m este r i o ,
d a sua b a r r a às cabeceiras, p e r t o d e c e m léguas, e t e m u m a lagoa n o m e i o , q u e
t e m três léguas de c o m p r i m e n t o e u m a de largo.
O rio Suçuí t a m b é m faz b a r r a n o rio Gurgéia. Está t o d o nas suas m a r g e n s
infestado do "gentilismo, a saber: da n a ç ã o a c o r o á g r a n d e , d a n a ç ã o a c o r o á - m i r i m
e os gueguês. P o r isso n ã o sei a distância q u e v a i da sua b a r r a às cabeceiras.
934

[ fl. 518 ] O rio das Cajazeiras faz b a r r a no m e s m o rio / / G u r g é i a e n ã o sei t a m b é m a


longitude às cabeceiras p o r estar infestado de *gentio u m a e o u t r a p a r t e . N e s t e rio
m e certificou o * g u a r d a - m o r das m i n a s das Arraias q u e nele havia o u r o e m m u i t a
a b u n d â n c i a e g r a n d e z a , p o r ter visto u m roteiro q u e o " g o v e r n a d o r do E s t a d o d o
M a r a n h ã o , J o ã o d e A b r e u C a s t e l o B r a n c o , lhe m o s t r o u , o q u a l r o t e i r o fez u m
p a u l i s t a q u e p o r n o m e n ã o p e r c a , ^ e os m e s m o s sinais q u e o d i t o g u a r d a - m o r
a c h o u n o roteiro m e certificou e ao m e s m o g u a r d a - m o r J o ã o Francisco, m o r a d o r
nas m a r g e n s d o rio G u r g é i a , q u e a n d a n d o e m g u e r r a c o m o gentio vira os m e s -
m o s sinais q u e e s t a v a m n o roteiro^ e ele incitou a o g u a r d a - m o r (que v i n h a e m
m i n h a c o m p a n h i a , q u e v i n h a da cidade d e São Luís do M a r a n h ã o p a r a as T e r r a s
Novas) a q u e fosse à q u e l e d e s c o b r i m e n t o , m a s c o m o v i n h a c o m n e g ó c i o grosso
ficaram ajustados p a r a o u t r a ocasião, a i n d a q u e n ã o trouxe o dito roteiro n e m sua
cópia, p o r lhe n ã o q u e r e r d a r o g o v e r n a d o r , q u e s o m e n t e p e r m i t i u lesse. Estes são
os rios d e n o m e q u e t e m o bispado de São Luís do M a r a n h ã o , a l é m de outros d e
q u e n ã o sou sabedor, p o r estar e m t e r r a do "gentilismo, m a s sim sei h á m u i t o s d e
d e s m a r c a d a g r a n d e z a nessas dilatadas regiões, pelo dizer o m e s m o gentio q u e os
b r a n c o s a p a n h a m e m "guerras justas.

T o d o s estes rios são d e á g u a s a d m i r á v e i s (exceto o I g u a r á ) e fertilíssimos e


a b u n d a n t e s d e peixes, assim p e q u e n o s c o m o grandes. T ê m peixes d e d e s m a r c a d a
g r a n d e z a , c o m o são uns c h a m a d o s piratingas, q u e c o m alguns deles n ã o p o d e m
dois h o m e n s , surubi, m a n d u b a , peixe-fidalgo, corvina, ç u r i m a t ã , b a g r e s , arraias.
Estes são os peixes g r a n d e s d e todos os rios ditos. D o s p e q u e n o s h á m u i t a a b u n -
d â n c i a , c o m o p i r a n h a s , m a n d i s , traíra etc. H á t a m b é m nestes rios m o n s t r o s h o r r o -
rosos, c o m o são j a c a r é s e a c o b r a sucuriú, q u e é tão d e s m a r c a d a a sua g r a n d e z a e
grossura q u e c o m e a u m boi inteiro, e eu o n ã o c r e r a se o n ã o v i r a nas fazendas
das Cajazeiras, nas m a r g e n s do rio G u r g é i a , e m u m a g r a n d e l a g o a , a o n d e fui p o r
ver e a d m i r a r aquele m o n s t r o incitado dos vaqueiros e h o m e n s d a q u e l a fazenda,
q u e c o m os n e g r o s dela, q u e e r a m mais d e v i n t e , a f o r a m l a ç a r c o m c o r d a s d e
l a ç a r bois, a q u a l c o b r a estava s o b r e a á g u a s e m se p o d e r m o v e r p e l o g r a n d e
[ fl. 518v. ] d e t r i m e n t o q u e lhe d a v a n a b a r r i g a o boi, q u e / / s o m e n t e t i n h a os chifres d e fora
d a b o c a ; e a o m e s m o t e m p o q u e a l a ç a r a m e f o r a m p u x a n d o pelas c o r d a s q u e
t i n h a m enleadas e m u m grosso p a u deu a dita c o b r a u m e m p u r r ã o q u e fez t u d o
e m p e d a ç o s , e foi necessário p a r a efeito d e se m a t a r a t i r a r e m - l h e aos olhos c o m
balas vários tiros, e saindo p a r a fora, digo, e tirando-o p a r a fora era t ã o h o r r o r o s o
aquele a n i m a l que só c o m o aspecto faria fugir a q u e m n u n c a visse s e m e l h a n t e monstro.
T i n h a de c o m p r i m e n t o mais d e sessenta "palmos e de grossura n ã o sei explicar.
H á mais n a q u e l e s rios, p r i n c i p a l m e n t e q u a n t o estes t ê m as suas cabeceiras
e m buritizais, u n s monstros c h a m a d o s m ã e s - d ' á g u a , q u e t ê m cara, m ã o e pés c o m o

Provavelmente, João de Sousa Azevedo.


935

gente. E u n u n c a os vi, p o r é m m e certificaram h o m e n s fidedignos, e u m deles d e


g r a n d e a u t o r i d a d e q u e foi o p a d r e mestre J o ã o T a v a r e s (talento insigne d a C o m -
p a n h i a de Jesus), q u e a v i r a nas cabeceiras do rio das Preguiças q u a n d o foi missi-
onário dos índios t r e m e m b é s . O m e s m o m e disseram o capitão B e r n a r d o Pereira,
J o s é d e A n d r a d e L o p e s , q u e os v i r a m fora da á g u a nas cabeceiras d o rio P a r a i m
q u a n d o a n d a v a m v a q u e j a n d o os seus gados.
E n o rio P a r n a í b a m e certificou o *capitão-mor Antônio Gonçalves J o r g e vira
cavalos-marinhos no dito rio e as mesmas mães-d'água n a sua fazenda d a Cachoeira
e n a d e Santo Antônio. D e q u e neste rio h á monstros grandes n ã o h á dúvida, p o r
terem comido e engolido a muitos homens q u e neles se têm ido lavar e se t ê m lança-
do a n a d a r nos mesmos rios, c o m o sucedeu a u m mulato do capitão J o s é Soares, q u e
sendo g r a n d e n a d a d o r , q u e r e n d o passar e m certa ocasião u m a boiada, se l a n ç o u a
n a d a r n o dito rio e lhe p e g a r a m pelos pés, sem ter mais lugar d o q u e dizer estas
palavras; " Q u e m m e acode, q u e m e levam?" O mesmo sucedeu a u m negro de J o s é
G o m e s , e assim u m c o m o outro m e constaram estes lamentáveis sucessos.
H á p o r aqueles c a m p o s cobras venenosíssimas, c o m o a cascavel, q u e apenas
m o r d e principia a criatura vivente a b o t a r sangue p o r todas as j u n t a s do corpo, / / a [fl. 5 1 9 ]
j a r a r a c a , c a n i n a n a , coral, q u e t a m b é m p i c a c o m o r a b o , c o b r a d e d u a s cabeças,
jibóia. E esta c o b r a m u i t o feroz e ligeira, e d o r m e m u i t o , ressona c o m o se fosse
criatura h u m a n a , e apenas vê fogo se vai a ele e d á tanta r a b a n a d a q u e ou a p a g a o
fogo ou m o r r e consumida entre os ^ c ê n d i o s d e suas chamas. Além destas h á outras
m u i t a s venenosas.
E todo o b i s p a d o do M a r a n h ã o muito a b u n d a n t e assim d e pescados c o m o d e
carnes, caças do m a t o , a saber: veados, pacas, quatis, coelhos, perdiz, codorniz, p o m -
b a s , m u t u m , q u e é u m a ave do t a m a n h o d e u m p e r u , j a c u s , p a t o s , [marrecos?],
tuiuiús^ curicacas, p a p a g a i o s , canindés, curicas, e m a s , seriemas, p o r c o s - d o - m a t o ,
antas, tatu-bola e tatupeba. Este último se sustenta muitas vezes e m cadáveres h u -
m a n o s , p o r q u e apenas m o r r e u m h o m e m e o sepultam no c a m p o logo estes, a i n d a
q u e l o n g e estejam, v ê m a o cheiro d o c o r p o m o r t o e fazem b u r a c o n a t e r r a até
chegar a o corpo, de que se sustentam. H á tigres, onças e outras mais variedades de
caças imensas, q u e n ã o explico.

Vilas pertencentes ao bispado do M a r a n h ã o

A vila d e T a p u i t a p e r a , a n
d e q u e é s e n h o r u m fidalgo e nela a p r e s e n t a "ouvidor
e "pároco. D e s t a vila se sustenta a cidade do M a r a n h ã o d e farinhas, a r r o z , feijão,
m i l h o , algodão, azeites d e m a m o n a , de gergelim e d e frutas e a l g u m peixe. E t e m
c a p i t ã o - m o r e "juízes.

'• Distância?
936

A vila do I c a t u a i
é da s e n h o r a r a i n h a . T e m S e n a d o e " c a p i t ã o - m o r . D e s t a
vila vão m u i t a s b a u n i l h a s p a r a a cidade do M a r a n h ã o , sabões e azeites de a n d i r o b a .
S ã o estas u m a s frutas r e d o n d a s d o t a m a n h o d e u m a g r a n d e m a ç ã e p o r d e n t r o t ê m
u m a certa m a s s a d e q u e se faz o azeite. D e s t e h á imensidade pelas m a t a s d o rio
Munim.
A vila d a M o c h a J t e m *ouvidor, ^ c o m jurisdição mais d e d u z e n t a s "léguas,
a a

[ fl. 519v, ] p o r ter d o m í n i o e m todos os / / sertões do M a r a n h ã o até o rio P a r n a í b a . T a m b é m


t e m S e n a d o esta vila, e faz "juízes ordinários p a r a os arraiais seguintes: o p r i m e i r o
p a r a S a n t o A n t ô n i o do Surubi, segundo p a r a P i r a c u r u c a , terceiro p a r a S a n t o A n -
tônio d a Gurgéia, q u a r t o p a r a o P a r n a g u á . T a m b é m t e m c a p i t ã o - m o r . E é a d m i -
rável a dita vila t a n t o p e l o b o m sítio e m q u e está f u n d a d a c o m o p e l o g r a n d e
comércio que nela há de homens de negócio, assim do M a r a n h ã o c o m o de
P e r n a m b u c o e B a h i a . D e s t a vila v ã o as causas p o r a p e l a ç ã o p a r a a R e l a ç ã o d a
Bahia, e do M a r a n h ã o e P a r á p a r a Lisboa.
Estas são as vilas q u e t e m o b i s p a d o do M a r a n h ã o , q u e sendo t ã o g r a n d e n a
extensão, p e l a i m e n s i d a d e d e fazendas c o m q u e t o d o está p o v o a d o , n a i n t e n ç ã o
parece diminuto.
A C â m a r a d o M a r a n h ã o j u n t o c o m o ouvidor dela fazem os juízes seguintes:
p r i m e i r o p a r a as Aldeias Altas, segundo p a r a a P a r n a í b a , terceiro p a r a S ã o B e n t o
das Balsas, q u a r t o p a r a o R i o I t a p e c u r u .
T e m a cidade do M a r a n h ã o capitão-mor pago, com p r a ç a de armas e
s o l d a d e s c a . ' T e m o bispado dito de c o m p r i m e n t o , desde a cidade até o P a r n a g u á ,
3

q u e é a ultima freguesia dele, 300 léguas, a saber: 80 até as Aldeias Altas e 220 até
a freguesia dita. T e m d e largo, desde a travessia d a B a h i a até a fazenda d a Bata-
lha, d a freguesia d e São B e n t o das Balsas, cento e tantas léguas.
Isto é o q u e está p o v o a d o d e fazendas, p o r q u e a m a i o r p a r t e daquelas terras
estão todas p o v o a d a s (como j á dissemos) de "gentilismo, p r i n c i p a l m e n t e o distrito
das Balsas, q u e é tão dilatado que m e disse o capitão-mor das conquistas A n t ô n i o
G o m e s Leite q u e a n d a r a muitos meses p o r ele sem saber o n d e finalizava, e que
e r a m terras fertilíssimas e a b u n d a n t e s d e caças e pescados, q u e nelas h á c a m p o s
admiráveis e dilatados de tal m a n e i r a que se n ã o a c a b a r ã o d e p o v o a r até o fim do
m u n d o . Neles h á várias nações de "gentilismo q u e c o m e m uns aos outros q u a n d o
m o r r e m , e ele, dito capitão-mor, t a m b é m m e disse c o m e r a u m p e d a ç o d e u m a m ã o
d e u m m e n i n o q u e elés t i n h a m assado debaixo do c h ã o , isto é, q u a n d o o "gentio

a1.
Distância?
a
J'
Distância?
É a Ouvidoria do Piauí
'" Que soldados?
a
937

q u e r assar c a r n e de *biaribi fazem u m a cova r e d o n d a , e e n c h e m d e folhas de árvore


debaixo e e m r o d a , e depois a e n c h e m d e postas de carne, e c o b e r t a d e terra lhe
p õ e m / / fogo e m cima até se cozer. E m e disse o m e s m o *capitão-mor q u e t e m e n - [ fl. 520 ]
do a m o r t e p o r isso c o m e r a d o tal guisado, p o r q u e o *genúo assim c o m o o despojou
de todos os seus Vestidos, assim t a m b é m o h a v i a m de despojar d a p r ó p r i a vida se
n ã o comesse, e m e a n d o u muito t e m p o pelas terras do dito gentio a c o m p a n h a n d o
c o m ele e c o m e n d o sapos, cobras, macacos, guaribas e toda a mais *sevandija q u e
c o m i a o gentio, o qual t e m p o r D e u s só a sua barriga, a i n d a q u e algumas nações
a d o r a m o Sol e a L u a , e outras a o diabo.
E algumas destas t ê m *coroa, c o m o se fossem frades, c o m o é a n a ç ã o a c o r o á -
g r a n d e e m i r i m e a n a ç ã o gueguê; e é tão cruel a dita n a ç ã o do g u e g u ê q u e t e n d o o
capitão-rnor A n t ô n i o G o m e s Leite aldeado a mil e oitocentos lhe p ô s u m missionário
religioso de S a n t o A n t ô n i o d o c o n v e n t o d o M a r a n h ã o , e poucos m e s e s depois d e
sua assistência n a aldeia lhe q u e b r a r a m a c a b e ç a , t i r a n d o - l h e a v i d a , e f u g i r a m
todos, levando 150 a r m a s de fogo e t o d a a pólvora, c h u m b o e b a l a q u e havia n a
aldeia, e c o m ela fizeram grande, estrago nos b r a n c o s , p o r q u e assolaram mais d e
setenta fazendas p e l a ribeira do rio G u r g é i a , e c o m t a n t a tirania q u e até das m e s -
m a s casas n ã o d e i x a v a m u m só p a u a q u e n ã o p u s e s s e m fogo, t a n t o assim q u e
n e m os m e s m o s sacerdotes e s c a p a v a m , p o r q u e a o *coadjutor d a freguesia d e S a n -
to A n t ô n i o d a G u r g é i a m a t a r a m n a fazenda d a T a p e r a , indo ele e m c i m a d e u m
cavalo. N ã o c o n t e n t e s d e o p a s s a r e m d e u m a bala, a t e m p o q u e ele se a p e o u e
p e d i u a u m n e g r o seu escravo q u e o ajudasse a b e m m o r r e r , v i e r a m os ditos
b á r b a r o s (caso lastimoso) e o v a r a r a m c o m lanças d e p a r t e a p a r t e . G r a n d e s são os
estragos q u e t e m feito esta n a ç ã o , e s o b r e t u d o a tirania q u e fizeram a u m a casa
c o b e r t a d e p a l h a , q u e dentro e m si t i n h a n o v e pessoas, p o r q u e a c e r c a r a m e lhe
p u s e r a m o fogo p o r t o d a s as p a r t e s , m o r r e n d o q u e i m a d o s vivos t o d o s qs q u e
estavam dentro.

A n d a m s e m p r e nus, assim m a c h o s c o m o fêmeas; são a m a i o r p a r t e d e g r a n d e


estatura; a n d a m s e m p r e pintados de u m a s tintas v e r m e l h a s c h a m a d a s u r u c u / / e [ fl. 520v. ]
outras p r e t a s , d e u m a s frutas q u e c h a m a m j e n i p a p o s , e são tão fétidas q u e só o
cheiro b a s t a p a r a c a u s a r o m a i o r temor; a n d a m muitos c o m *trunfas d e p e n a s , a
m o d o d e *mitras, n a c a b e ç a e à r o d a d a cintura t r a z e m o m e s m o . M u i t a s nações
t ê m o beiço furado e outras as orelhas. Suas a r m a s são lanças d e p a u p r e t o , m u i t o
a g u d a s , ou d e pau-ferro, q u e é duríssimo, as quais lanças fazem c o m m a c h a d o s d e
p e d r a e o aperfeiçoam c o m dentes d e quati; u s a m t a m b é m do a r c o e flecha, a qual
fazem d e u m a s certas árvores c h a m a d a s t a q u a r a s q u e a n a t u r e z a cria, t ã o leves e
a g u d a s q u e c o m elas v a r a m o m a i o r b o i ; u s a m t a m b é m d e u m a s * c a c h a p o r r a s
curtas e de *pau d e j u c á , q u e ê q u a d r a d a . P o r é m , c o m todas estas a r m a s n u n c a
saem a pelejar a peito descoberto, p o r q u e só c o m ciladas e traições fazem n a lua.
E q u a n d o e m p r e e n d e m m a t a r a l g u m b r a n c o ou n e g r o , b u s c a m h o r a e m q u e este-
j a m descuidados, p o r q u e m a n d a m espia, e esta v e n d o ocasião o p o r t u n a c o m e ç a a
938

c a n t a r c o m o pássaro, q u e é o sinal q u e d á , ao qual os outros r e s p o n d e m d a m e s -


m a sorte, até q u e se a j u n t a m todos e v ã o tirar à vida aos q u e mais esquecidos estão
d a m o r t e . E assim q u e c o n s e g u e m os fins q u e i n t e n t a m , aí m e s m o l a r g a m arcos e
flechas, l a n ç a s , " p a u s d e j u c á e * c a c h a p o r r a s p a r a , d e s e m b a r a ç a d a m e n t e , fugi-
r e m , e m r a z ã o d e s e r e m de â n i m o r u i m , pusilânime, e tímidos, p o r q u e c u i d a m v ã o
logo sobre eles os b r a n c o s . Isto v i e u n a fazenda d a G a m e l e i r a , sita n a s m a r g e n s
do rio G u r g é i a , q u e a n d a n d o e m c o m p a n h i a do Excelentíssimo b i s p o d o m Frei
M a n u e l d a C r u z , e m *visita, e n t r a r a m n a m e s m a fazenda, o n d e t i r a r a m a vida a
u m n e g r o e aí d e i x a r a m os instrumentos a c i m a . T a m b é m u s a m u m a s b u z i n a s d e
u m som tão h o r r o r o s o q u e q u e m o ouve fica logo despavorido, as quais fazem d e
cabaços, e eu as ouvi m u i t a s vezes.
E muitos dias d e viagem pelo m e s m o rio G u r g é i a acima, o n d e estes b á r b a r o s
t ê m a sua h a b i t a ç ã o , p o r serem todas as terras circunvizinhas d a q u e l e rio as m e -
lhores daqueles sertões, t a n t o pelas m u i t a s frutas e caças c o m o pelo b o m p e s c a d o
e méis d e abelhas, q u e sendo deste todo o sertão a b u n d a n t e , n a s p a r a g e n s deste
[ fl. 521 ] rio h á t a n t o q u e se l h e n ã o / / p o d e d a r v e n c i m e n t o . E s t a n d o e u a r r a n c h a d o n a
fazenda das V a r g e n s , nas m a r g e n s do rio P a r a i m , fui logo c o m os negros ver q u e
casta d e m e l h a v i a n a q u e l a p a r a g e m , e logo achei u m a árvore c h a m a d a p e q u i z e i r o ,
q u e t i n h a n o v e abelheiras, três d e u m a a b e l h a q u e c h a m a m tubi, duas d e o u t r a
q u e c h a m a m tataíra, q u e é bravíssima, u m a d e u r u ç u , q u e é o m e l h o r m e l q u e
t e m o sertão, d u a s d e m a n d a ç a i a e u m a d e tujuva. E, finalmente, t i r a r a m os n e -
gros t a n t o m e l q u e n ã o h o u v e q u e m lhe desse v e n c i m e n t o . H á o u t r a c a s t a de
a b e l h a s c h a m a d a s i r a p u ã , q u e c o r t a m o cabelo e m o r d e m , e finalmente, h á tantas
castas d e abelhas e de méis admiráveis q u e v e r d a d e i r a m e n t e as n ã o sei exprimir
p o r seus n o m e s .

T o r n e m o s a o "gentilismo, q u e destes méis se sustentam e do mais q u e a c i m a


dissemos. T i r a m fogo dos p a u s desta sorte: esfregam t a n t o o p a u u m n o o u t r o c o m
as m ã o s até q u e se a c e n d e o fogo, verificando-se aqui o p r o l o q u i o de Aristóteles'*
a respeito d e u m m o v i m e n t o ser a causa do calor. S ã o estes p a u s m o l e s e lhes
chamam taquaraguatã.
C o m e m m u i t o esta casta d e gente, t a n t o assim q u e nove c o m e r a m u m b o i n o
dia, c o m o e u vi n a freguesia do P a r n a g u á , q u a n d o o " c a p i t ã o - m o r Paulo C a r v a -
lho cativou 150, e t a m b é m estão muitas vezes sem c o m e r dois dias e mais. F a z e m
seus j o g o s , d a n ç a s e *poracés, e q u a n d o m o r r e m alguns seus p a r e n t e s se a j u n t a m
todos e m r o d a , estando o defunto no meio, ali c h o r a m e l a m e n t a m a falta d o com-
p a n h e i r o e lhe n a r r a m as façanhas e proezas que t ê m feito, as quais se c o n h e c e m p o r
u n s riscos q u e fazem nos braços, isto é, c a d a h o m e m q u e m a t a m fazem u m risco, e

O autor refere-se a argumentos de Aristóteles contidos na Física, passim, mas provavelmente sobre-
tudo no livro VIII, 1, 4, 5.
939

aquele q u e mais t e m é o mais abalizado, e ali r e c o m e n d a m uns aos outros à vigilân-


cia q u e d e v e m ter dos brancos (porém esta r e c o m e n d a ç ã o o fazem todas as noites).
E depois de terem c h o r a d o pelo parente, c u i d a m logo e m lhe d a r sepultura e m seus
próprios ventres, na forma q u e acima dissemos. Q u a n d o q u e r e m d a r e m os brancos
ou m a t a r , dão primeiro u m u r r o m e d o n h o c o m o sovaco dos braços, e depois v ã o
logo a ferir ou m a t a r .
E n t r e estes h á várias nações q u e t ê m p o r costume e lei e n t r e si (não é m e u
â n i m o transgredir o limite / / d a modéstia, m a s só sim n a r r a r a r e a l i d a d e destes [ fl. 52 lv. ]
b á r b a r o s ) t o d a s as noites, depois d a m e i a - n o i t e , a n d a r e m a q u e l e s q u e d e t e r m i -
n a m a p r e g o a n d o pelas aldeias é a d m o e s t a n d o a todos a q u e a c o r d e m e multipli-
q u e m , p a r a efeito d e t e r e m m u i t a gente q u e p u g n e c o n t r a os b r a n c o s , e são tão
d e p r a v a d o s n o s c o s t u m e s ( p r i n c i p a l m e n t e as n a ç õ e s guajajaras) q u e a p e n a s as
c u n h a s são d e sete anos logo c u i d a m e m as deflorar, seja c o m o i n s t r u m e n t o q u e
for, p a r a se p o r e m netas p a r a a geração.
As c u n h a s o u , p a r a m e l h o r dizer, m u l h e r e s , assim q u e p a r e m , a p r i m e i r a coisa
q u e fazem é i r e m lavar a o rio, e j u n t a m e n t e o seu filhinho r e c é m - n a s c i d o .
H á entre estas nações muitos feiticeiros, q u e t ê m p a c t o c o m o d e m ô n i o . E u ,
q u e c o n h e c i u m a índia p e r t e n c e n t e às missões d o colégio d a C o m p a n h i a , q u e ia
e x t i n g u i n d o u m a aldeia c o m c o m i d a s q u e d a v a aos índios, a q u a l esteve p r e s a
m u i t o s anos e m u m tronco. O rito q u e a c i m a digo n ã o é só dito m e u , m a s sim dos
missionários d a C o m p a n h i a de J e s u s q u e estão pelas aldeias, e m e certificou o
p a d r e Inácio d a Veiga, missionário dos guajajaras, q u e q u e r e n d o p r o i b i r a tal lei
ou costume eles o q u i s e r a m m a t a r .
S ã o m u i t o p r ó d i g o s e liberais, d e sorte q u e d ã o t u d o , p r o p r i e d a d e certa d e
q u e m tem pouco que dar.

Arraiais que tem o bispado do M a r a n h ã o ou povoações

Aldeias Altas, S ã o B e r n a r d o d a P a r n a í b a , Buriti dos Lopes, d a P i r a c u r u c a ,


arraial d e S a n t o A n t ô n i o do S u r u b i , o arraial d e N o s s a S e n h o r a dos H u m i l d e s , o
arraial dos C r a t e ú s , o arraial do Brejo dos Aroases, o arraial d a C a t i n g u i n h a , o
arraial d e S ã o Bento das Balsas, o arraial de S a n t o A n t ô n i o d a G u r g é i a , o arraial
d o Poti, o arraial d o P a r n a g u á , o arraial d o J a c a r é e o arraial dos Poções, q u e é o
último do dito b i s p a d o c a m i n h a n d o p a r a o rio d e São Francisco, p a r a a o n d e nós
agora vamos v e l o z m e n t e . a m

D o alto d a s e r r a d a B o a Vista (onde n ã o falta o u r o e c o m g r a n d e c o n t a , [fl. 522 ]


s e g u n d o m e disse M a n u e l d e Oliveira, m i n e i r o insigne q u e a t i n h a socavado e m

• Distância?
940

v á r i a s p a r t e s e q u e e m todas m o s t r a v a ser riquíssima a q u e l a serra, m a s c o m o é


m u i t o de falto d e á g u a q u e havia de ser dificultosa a dita extração), águas vertentes
p a r a o nascente, principia daquela p a r t e o vastíssimo m a p a do bispado de
P e r n a m b u c o , q u e se m e n ã o e n g a n a a idéia é o m a i o r q u e t e m o E s t a d o do Brasil,
e dele s o m e n t e direi s u c i n t a m e n t e o q u e souber.
P r i m e i r a m e n t e , é t o d o p o v o a d o p o r aquelas p a r t e s p o r o n d e passei d e gados
v a c u m e algum cavalar, a i n d a q u e p o u c o ; é fertilíssimo e tão a b u n d a n t e dé t o d o o
comestível q u e c o s t u m a m p r o d u z i r aqueles "países, vistoso pelas admiráveis pla-
nícies dos seus aprazíveis c a m p o s .
E i n u n d a d o dos rios m a i o r e s q u e p o s s u i pelo s e r t ã o (exceto o rio d e S ã o
Francisco e P a r n a í b a , acima ditos), c o m o é o rio P r e t o , q u e corre do sul p a r a o
n o r t e , e é tão a r r e b a t a d o n a velocidade de suas correntes q u e c o m dificuldade se
n a v e g a p o r ele acima; faz b a r r a no rio G r a n d e , distante do rio de S ã o Francisco
vinte "léguas; é admirável pelas cristalinas águas e d e r r e t i d a p r a t a , q u e p o r e n t r e
frondosos a r v o r e d o s faz sua carreira, e tão cristalina q u e a i n d a nos mais fundos e
p r o f u n d o s poços se está v e n d o a areia e o fundo, c o m o m e sucedeu q u a n d o p o r
ali passei, p o r q u e vindo m e buscar e m u m a c a n o a p a r a celebrar missa e m u m dia
santo e m u m a s casas q u e nas m a r g e n s do rio estão fui v e n d o da c a n o a o q u e n ã o
p o d i a c r e r , p o r q u e t e n d o o rio n a q u e l a p a r a g e m mais d e dez *côvados d e alto
estava v e n d o a areia c o m o q u e se n ã o tivesse mais q u e u m ; é navegável muitos
dias d e viagem, e d e u m a p a r t e e o u t r a p o v o a d o nas m a r g e n s d e p o b r e z a e p a r a os
centros d e fazendas.
O rio G r a n d e , e m q u e o rio Preto faz b a r r a , é rio d e tal g r a n d e z a q u e b e m
a d e q u a d o lhe é o n o m e p o r p a r e c e r u m m a r p e q u e n o , sendo a b a i x o do rio de São
Francisco o s e g u n d o n a m a i o r i a ; faz b a r r a n o dito rio de S ã o F r a n c i s c o , d o sul
p a r a o norte, e se c o n h e c e m u i t a s léguas a divisa do rio e m q u e fez b a r r a ; t e m as
suas cabeceiras lá nesse centro, o n d e t u d o está p o v o a d o de "gentilismo, a i n d a q u e
m u i t o s dias d e v i a g e m d a sua b a r r a ; é p o v o a d o c o m o o rio P r e t o .
[ fl. 522v. ] O rio C o r r e n t e t a m b é m c o r r e do sul p a r a o norte, fazendo / / b a r r a n o rio d e
S ã o Francisco; está este rio p o v o a d o p o u c o s dias d e viagem; p o r e s t a r e m a i n d a
aqueles sertões p o r descobrir, n ã o se sabe o n d e t e m as suas cabeceiras, m a s o que.
sei é q u e , a n d a n d o u m m i n e i r o m u i t o s meses d e n t r o n a q u e l e sertão, p a r a efeito
d e d e s c o b r i r as m i n a s das serras das A r a r a s , saiu pelo rio e m u m a c a n o a a vir
b u s c a r m a n t i m e n t o s j u n t o a S a n t o A n t ô n i o do U r u b u e t a m b é m disse t i n h a a c h a -
do e m várias p a r t e s o u r o c o m conta, p o r é m q u e o roteiro lhe d e r a u m seu tio n a
h o r a d a m o r t e dizia q u e a i n d a mais adiante tantos dias d e viagem estavam haveres
m u i t o g r a n d e s j u n t o a u m córrego o n d e ele d e i x a r a u m a a l a v a n c a fincada com
u m a caveira d e u m negro q u e lhe m o r r e r a n a p o n t a , q u e este era o sinal.
O rio C a r i n h a n h a t a m b é m faz b a r r a n o rio S ã o F r a n c i s c o , d o sul p a r a o
n o r t e ; é rio navegável e g r a n d e .
O rio Pacuí t a m b é m faz o m e s m o curso, fazendo b a r r a n o rio d e São Francis-
co, d a m e s m a sorte q u e os acima.
941

O rio P a r a c a t u , g r a n d e rio n a [realidade?], p o r q u e dele t o m a r a m o n o m e


aquelas famosíssimas m i n a s q u e e n r i q u e c e r a m a tantos h o m e n s . A o d e s c o b r i d o r
d e u o r o t e i r o a q u e l e m e s m o q u e o d e u a o q u e a n d a d e s c o b r i n d o as m i n a s das
serras das A r a r a s .
P e l a g r a n d e z a destes rios se p o d e v i r n o c o n h e c i m e n t o d a q u e l e m a p a d o
bispado de P e r n a m b u c o .
A s freguesias dele p o r o n d e passei foi a d a B a r r a do R i o G r a n d e , q u e c h e g a
até o rio C a r i n h a n h a , o n d e t e m u m a capela e o u t r a n a M a n g a d o R i o G r a n d e ,
q u e fez o p a d r e M a l a g r i d a , religioso d a C o m p a n h i a d e J e s u s n o s E s t a d o s d o
M a r a n h ã o , a n d a n d o m i s s i o n a n d o p o r aqueles desertos; a o u t r a freguesia é a d e
São R o m ã o . Q u a l q u e r delas é m a i o r do q u e o reino d e Portugal, e t e m "vigário-
geral.
As m i n a s do P a r a c a t u , posto q u e t e n h a m igreja, c o n t u d o , p e r t e n c e m à fre-
guesia d e S ã o R o m ã o .
O rio das V e l h a s , q u e t e m as suas cabeceiras nas serras d e S ã o B a r t o l o m e u
destas M i n a s Gerais.

R i o s / / d o a r c e b i s p a d o d a B a h i a q u e f a z e m b a r r a d o n o r t e p a r a o sul [ fl. 5 2 3 ]

O rio das R ã s , o rio V e r d e , o rio Pacuí, o rio C u r i m a t a í e o rio J e q u i t a í .


T o d o s estes rios sao navegáveis, n ã o e m todas as p a r t e s , p o r q u e e m m u i t a s d ã o
v a u . Estes são os rios q u e passei pelos sertões.

Freguesias q u e passei d o dito arcebispado

S a n t o A n t ô n i o d o U r u b u , cuja m a t r i z t e m três altares e está situada j u n t o às


m a r g e n s do rio S ã o Francisco.
A igreja d e S a n t a n a d e Paratinga, filial d a m a t r i z acima. T e m a dita igreja três
altares e é toda feita à *romana.
A igreja d o B o m J e s u s d a L a p a , admirável p o r ser o b r a f u n d a d a pela n a t u r e -
za. Está esta igreja debaixo de u m m o n t e d e p e d r a s o u r o c h e d o n i m i a m e n t e ele-
v a d o ; é d e g r a n d e z a p r o p o r c i o n a d a , c o m o a do O u r o P r e t o destas M i n a s , p o u c o
mais o u m e n o s ; t e m "cruzeiro, c o m o q u e se fosse artificialmente i d e a d o , o q u a l ,
d a p a r t e d o sul, t e m u m v ã o a d m i r á v e l q u e c o m as luzes q u e p o r ele e n t r a m
t o r n a m o t e m p l o resplandecente, e é única p a r t e p o r o n d e t e m luz o dito t e m p l o ,
o qual v ã o cai sobre o rio d e São Francisco, o n d e está u m a v a r a n d a t a m b é m feita
d a n a t u r e z a , e m q u e estão várias flores q u e se r e g a m c o m a á g u a q u e l e v a m d o rio
p o r cordas. T e m esta igreja três altares, a saber, o d e B o m J e s u s , N o s s a S e n h o r a d a
Soledade e santo A n t ô n i o ; t e m coro feito p e l a n a t u r e z a , cinco celas, p o u c o m a i s
ou m e n o s , todas feitas pelo m e s m o artífice; t e m u m a g r a n d i o s a l â m p a d a d e p r a t a
q u e está n o m e i o do c r u z e i r o d a igreja, n o teto d a q u a l se a c h o u t a m b é m u m
b u r a c o feito pela n a t u r e z a e m a p e n h a , a cuja está p r e s a a m e s m a l â m p a d a ; t e m
942

g r a d e s d e p a u p r e t o , e é d e a d m i r a r q u e e s t a n d o a dita igreja e m m e i o , d i g o ,
debaixo d e u m a r o c h a nela h á terra q u a n t o baste p a r a a sepultura d o c o r p o h u m a -
n o e m toda a p a r t e d a igreja, p a r a a qual se sobe p o r u m a s escadas d e p e d r a p e l a
p o r t a q u e está e n t r e o sul e o p o e n t e .
[ fl. 523v. ] A igreja dos M o r r i n h o s t e m cinco altares; é t e m p l o / / d e e s t u p e n d a arquite-
t u r a e está r i c a m e n t e p a r a m e n t a d a d e p r a t a e o u r o e o r n a m e n t o s , assim c o m o o
está a d o B o m J e s u s , acima dita. E esta igreja dos M o r r i n h o s filial d a m a t r i z das
A l m a s , d a B a r r a d o R i o das Velhas.
M u i t a s m a i s igrejas e "capelas h á , p o r é m só faço m e n ç ã o destas, p o r m a i s
especiais.
S ã o d o M a r a n h ã o a estas M i n a s G e r a i s setecentas "léguas, p o u c o m a i s ou
m e n o s , a saber: trezentas à s e r r a d a B o a Vista, p o r o n d e confina o b i s p a d o do
M a r a n h ã o c o m o d e P e r n a m b u c o , e quatrocentas a esta C i d a d e M a r i a n a . Estas são
as notícias q u e sucintamente posso dar do dito bispado do M a r a n h ã o e dos sertões
p o r o n d e vaguei.
Advirto q u e e m São M a r c o s , j u n t o à cidade do M a r a n h ã o , está u m a p e ç a de
artilharia q u e faz sinal à cidade assim q u e os navios avistam a capela d o dito santo
ou, p a r a m e l h o r dizer, assim q u e o artilheiro os avista etc.
T e m tido o bispado d o M a r a n h ã o os bispos: o p r i m e i r o foi d o m frei Francis-
co d e S ã o J e r ô n i m o , q u e g o v e r n o u cinco anos e foi m o r r e r e m Lisboa; o s e g u n d o
d o m frei J o s é D e l g a r t e , q u e g o v e r n o u sete anos; d o m frei M a n u e l d a C r u z , q u e
g o v e r n o u sete; d o m frei Francisco d e Santiago, q u e a t u a l m e n t e g o v e r n a . 5

O p r i m e i r o foi "loio, o segundo religioso trino, o terceiro b e r n a r d i n o , o q u a -


tro franciscano.

[ fl. 5 2 4 ] Cidade de Belém do Grão-Pará


O p r i m e i r o bispo d o m frei B a r t o l o m e u do Pilar.
D o m frei G u i l h e r m e d e S ã o J o s é .
D o m frei M i g u e l d e Bulhões chegou ao P a r á e m 3 de fevereiro d e 1749.
D u a s freguesias, u m a da sé e o u t r a do R o s á r i o da C a m p i n a .
O colégio d e S a n t o A l e x a n d r e , da C o m p a n h i a . ^

Até o período referido, o Maranhão tivera os seguintes bispos: dom frei Antônio de Santa Maria,
dom frei Gregório dos Anjos, dom frei Francisco de Lima, domfreiTimóteo do Sacramento, dom
frei José Delgarte, dom Frei Manuel da Cruz e dom frei José de Santiago.
Dados sobre o Pará com letra de Caetano da Costa Matoso.
943

• 144 «
[1] Descrição cosmográfica por espaços geométricos do [fl.525 ]
continente mediterrâneo das Terras Novas do bispado do
Grao-Para^ confinantes pela parte austral com o do Maranhão,
pela meridional com o de Pernambuco e pela setentrional
com o Rio de Janeiro, repartidas em seis paróquias,
a beneplácito de seu Excelentíssimo e
Reverendíssimo senhor bispo dom frei Guilherme de São José,
do Conselho de Sua Majestade

M a p a que provavelmente acompanhava relatório do bispo


do Grão-Pará, d o m frei Guilherme de São José, sobre conflitos
de jurisdição nas Terras Novas entre o bispado sob sua adminis-
tração e os bispados de Pernambuco e do Rio de J a n e i r o . N a
primeira parte historia o descobrimento aurífero e situa geogra-
ficamente a zona em litígio, comprovando sua localização nas
vertentes do Tocantins, portanto pertencentes ao bispado do Grão-
Pará. Descreve quatro paróquias j á estabelecidas e dois arraiais
que pleiteavam a elevação, suas igrejas e capelas, paramentos,
situação econômica e administrativa. Menciona a expulsão de
clérigos enviados dos dois bispados envolvidos n a disputa e o
l a n ç a m e n t o de finta i n d e v i d a p e l o g o v e r n a d o r d o m Luís
Mascarenhas.
Este documento provavelmente serviu de subsídio à expedi-
ção chefiada pelo governador Gomes Freire de Andrade de de-
marcação dos limites d a capitania de Goiás, criada e m 1748.
Integrando u m grupo de documentos distante do universo
de temas relacionados a sua atividade de magistrado e m Minas
Gerais, o documento ilustra o interesse do súdito letrado, que se
aproveita da experiência no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa na América.
Autoria, l o c a l e data: anônimo; Belém do Pará; ca. 1744.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "descri-
ção" é "Definição imperfeita. Representação, ou pintura de al-
g u m a cousa c o m p a l a v r a s " (Vocabulário português e latino [...]
Coimbra: Colégio das Artes d a C o m p a n h i a de Jesus, 1713. V.
3, p . 115). Retoricamente, trata-se de ecfrase. Observam-se a
aplicação da tópica da decadência e da tópica da ferocidade dos
aborígenes. (JPF)
C o m e n t á r i o paleográfico: Escrita moderna, cursiva, re-
gularizada e caligrafada, libraria do período barroco, de excelen-
te feitura. Exibe todas as características mais significativas d a
época: " s " pendente, em traço paralelo à escrita, semelhante ao
"s" caudado seguido do simples, e m forma de vírgula; "d" uncial
rodado, com orelha ou simples; laçadas nas maiúsculas, que apre-
sentam apex em forma de semicírculo; "que" abreviado com la-
çada na base e prolongamento vertical terminando em forma
curva; " h " em forma de " E " redondo. (YDL)
C r i t é r i o s editoriais: A reprodução em cores do desenho
original encontra-se no encarte do presente volume. A relação de
topónimos não inclui alguns registros ilegíveis no original. Para
facilitar a localização dos topónimos, o n ú m e r o atribuído a cada
localidade encontra-se assinalado em reprodução em preto e bran-
co encartada no presente volume.
Cópia impressa:
DESCRIÇÃO de u m m a p a de paróquias n o Tocantins, século
X V I I I . Anais do Congresso Comemorativo do Bicentenário da
Transferência da sede do governo do Brasil. R i o de J a n e i r o :
Imprensa Nacional, 1963. p. 98-100. Transcrição da legen-
da.

[2] Rio Paranatinga de C i m a


[3] Rjo P a r a n a t i n g a d e Baixo
[4] R i o dos T o c a n t i n s
[5] T e r r a s N o v a s do bispado do G r ã o - P a r á
[6] Bispado do R i o d e J a n e i r o ; a q u i se t e r m i n a .
[7] D e s t a R i b e i r a do P a r a n ã afugentou o *cônego Francisco d a R o c h a L i m a ,
s e n d o *visitador e *vigário-geral, c o m t e r r o r d e p r i s ã o e e x c o m u n h ã o , a o
vigário-geral d e S ã o R o m ã o , d o b i s p a d o d e P e r n a m b u c o , q u e se r e t i r o u
deixando-lhe o partido e o deve o bispado do P a r á ao zelo de tão exato *rmnistro.
[8] Paranã
[9] M a t r i z de N o s s a S e n h o r a d o R o s á r i o d o P a r a n ã
[10] Cavalcante
[11] Corriola, b r u m a d o q u e disputou o cónego Francisco d a R o c h a L i m a , sen-
do visitador e vigário d a vara de S ã o J o s é , do b i s p a d o do R i o d e J a n e i r o , e
se apossou e defendeu e ficou p a r a o P a r á .
[12] R i o de S ã o Félix
[13] Rio da Palma
[14] Chapada
[15] Arraial d e S ã o Félix das M i n a s
[16] Lavras d e o u r o
945

[17] Canabrava
[18] Ad perpetuam rei memoriam.^ *Polé q u e m a n d o u l e v a n t a r d o m Luís de
M a s c a r e n h a s p a r a q u e m n ã o lhe desse ouro n a "finta q u e b o t o u p a r a si.
[19] Palma
[20] E s t r a d a p a r a Goiás e m i n a s dos Crixás.
[21] Arraias
[22] Boquira
[23] Arraial das Arraias
[24] Ribeirão do Custódio
[25] Carmo
[26] Santo Antônio
[27] Estrada p a r a Goiás
[28] Carmo
[29] Santo Antônio
[30] São Gonçalo
[31] São J o ã o
[32] Manuel Dias
[33] São Cosme
[34] Carmo
[35] Barra
[36] Estrada p a r a a Barra da Palma
[37] São Luís
[38] Conceição
[39] T r a v e s s i a deserta
[40] Coelho
[41] São J o s é
[42] São Tiago
[43] Pestana
[44] Madureira
[45] Bernardino
[46] Barra da Palma
[47] Estrada q u e v e m d o rio G r a n d e p a r a as T e r r a s N o v a s
[48] Igreja de S ã o Félix d a B a r r a d a P a l m a , m a t r i z
[49] Coelho
[50] Santana
[51] Pilar, fazenda
[52] Lages

Para perpétua memória do fato.


946

[53] R i o d e M a n u e l Alves
[54] Santana
[55] Almas
[56] Dionísio
[57] Vieira P i z a r r o
[58] Brejo
[59] Morrinhos
[60] Correia
[61] Natividade
[62] Baixo Arraial da Natividade
[63] Bezerra
[64] D e C i m a [Arraial de C i m a da Natividade]
[65] São Miguel
[66] Raposo
[67] Espírito S a n t o
[68] M a d r e de D e u s
[69] Estrada p a r a o Pontal
[70] São J o s é
[71] S a n t a Isabel
[72] Fernandes
[73] Canobre
[74] Braba
[75] R i o de S a n t a T e r e s a
[76] N o v o d e s c o b e r t o do P o n t a l , distante 12 *léguas
[77] Pizarro
[78] Serranias
[79] Rio Araguaia
[80] Equinocial

E m janeiro do a n o d e 1730, e m q u e se descobriram os diamantes n a c o m a r c a


d o Serro Frio, se p o v o a r a m as T e r r a s Novas, nos sertões, e m nove graus até dezesseis
d a linha equinocial p a r a o sul, e nelas depois t a m b é m se a c h a r a m m i n a s d e ouro
q u e c o n t i n u a m , e reconhecendo os habitadores a o bispado do G r ã o - P a r á , o n d e vai
desaguar o rio dos T o c a n t i n s , e m cujas margens e vertentes se situaram, t e m cresci-
do tanto a p o v o a ç ã o que se a c h a m seis "paróquias, q u a t r o j á estabelecidas e duas
q u e o i m p l o r a m , p o r serem suficientes p a r a m a n t e r e m seu p r ó p r i o " p á r o c o , p o i s
elas todas, e c a d a u m a s e p a r a d a m e n t e , t ê m seus "juízes ordinários, " p r o v e d o r de
ausentes e " i n t e n d e n t e d a F a z e n d a R e a l e m os seis distritos q u e se a c h a m neste
planisferio, c o m a longitude, latitude e circunferência q u e dos n ú m e r o s aritméticos
marginais dos graus se p o d e conhecer, e são as seguintes: São Félix d a P a l m a , Nati-
v i d a d e . Arraias, P a r a n ã , M i n a s de São Félix e Pontal, e estas duas últimas, a m b a s ,
suplicam e suspiram pela sua criação.
A p r i m e i r a ' p a r ó q u i a , d e S ã o Félix d a P a l m a , situada n a s u a b a r r a o n d e se
ajunta c o m o rio P a r a n a t i n g a , a i n d a n ã o t e m igreja, p o r se a r r u i n a r a p r i m e i r a
antes de a c a b a d a e a s e g u n d a D e u s sabe q u a n d o se fará; n ã o t e m p a r a m e n t o s .
G o z a seu m a l repartido distrito t u d o o q u e c o n t é m o rio d a P a l m a , d e u m a e o u t r a
p a r t e até seus princípios, ficando m u i t o mais vizinhos a Arraias p a r a o recurso dos
s a c r a m e n t o s . G o z a d a m e s m a sorte d o P a r a n a t i n g a até as serras, e descendo até a
b a r r a dos T o c a n t i n s sobe p o r eles e a g r e g a o arraial de S ã o Félix c o m seus a n e x o s ,
q u e se lhe deve d e s m e m b r a r , e t o r n a n d o pelos T o c a n t i n s a b a i x o , p e l a p a r t e d o
n o r t e , desce p a r a a ribeira d a C a n a b r a v a , [e] de u m a e o u t r a b a n d a v a i c o n t i n u a n -
do até o Pontal d ' a q u é m e d ' a l é m . N e s t a m a t r i z n ã o h á S e m a n a S a n t a , p o r omis-
são do " p á r o c o ; t e m "juízes ordinários, "provedor d e ausentes e r e g e n t e das T e r -
ras N o v a s ; t e m oitenta fazendas d e g a d o , várias "engenhocas; é p o r todas p a r t e s
assaltada dos "gentios e n ã o h á nela u m a só "capela; é asilo d e frades apóstatas.
A s e g u n d a p a r ó q u i a é d e N o s s a S e n h o r a d o R o s á r i o d o P a r a n ã . Está b e m
r e p a r t i d a , a p e s a r do p á r o c o d a P a l m a . T e m 76 fazendas d e g a d o , seus "engenhos
d e canas; t e m três capelas, fazem s e m a n a s santas, b o n s o r n a m e n t o s , h á freqüência
d e s a c r a m e n t o s ; t e m seus juízes ordinários, p r o v e d o r d e ausentes e i n t e n d e n t e d a
F a z e n d a R e a l . C o m b a t e m esta ribeira os "tapuias b á r b a r o s e n ã o h á nela frades
fugitivos, p o r q u e os m o r a d o r e s os n ã o c o n s e n t e m e t e r e m sido causa d e p a g a r e m
"quintos, c o m o os m i n e i r o s dos escravos. Destas cabeceiras d o P a r a n ã d e C i m a
afugentou p e s s o a l m e n t e , c o m dois "clérigos q u e o a c o m p a n h a r a m e 0 seu "secre-
tário e " m e i r i n h o , o clérigo Francisco d a R o c h a L i m a a o "vigário-geral d e S ã o
R o m ã o , d o b i s p a d o de P e r n a m b u c o , q u e se q u e r i a apossar e i n t r o d u z i r , e feito
ato de desistência, ficaram muito amigos c o m c u m p r i m e n t o s d e jurisdições, e h o s -
p e d a n d o o p e r n a m b u c a n o a o p a r a e n s e se b r i n d a r a m e d e s p e d i r a m , este r i s o n h o e
aquele focinhudo.
A terceira p a r ó q u i a é a N a t i v i d a d e , e n ã o se diz o q u e foi m a s só o q u e é
a t u a l m e n t e ; u m epitáfio d e sua g r a n d e z a , e nas "rodas q u e t e m m o s t r a o volúvel
d a F o r t u n a , q u e sendo e m seu descobrimento p r ó d i g a hoje a v a r a nas relíquias d e
2

o u r o , resto d o q u e d e u e m seu p r i n c í p i o . A q u i foi T r ó i a , ^ e m cujo m o n t e está


u m a p e q u e n a m a s m u i t o asseada igreja d e taipa c o m b o n s o r n a m e n t o s ; suas "ir-
m a n d a d e s fazem suas festas, s e m a n a s santas, aos d o m i n g o s terços pela r u a canta-
d o , freqüência de s a c r a m e n t o s a zelo d o p a d r e Francisco J o s é B r a n d ã o , zeloso do
culto divino. H á muito comércio nas lojas. Está o arraial dividido, p a r t e e m c i m a d o
m o n t e , o n d e h á lavras q u a n d o h á chuvas, e p a r t e e m b a i x o , n o vale, p a r a t o d o o

2. Divindade alegórica dos gregos e dos romanos, personificação do acaso e do capricho da sorte.
3. Cidade da Asia Menor que resistiu ao cerco grego durante dez anos. Os episódios concernentes a essa
guerra acham-se narrados na Ilíada, de Homero.
.948

t e m p o . A q u i t e m u m a p e q u e n a e m u i p o b r e capela p a r a se dizer e ouvir missa; t e m


seus *juízes ordinários, "provedor de ausentes e ' i n t e n d e n t e d a F a z e n d a Real. São
os m o r a d o r e s oprimidos dos "gentios a c a d a instante. T e m alfândega, ou " c o n t a -
gem, p e q u e n o distrito, m a s m u i t a gente.
A q u a r t a "paróquia é das Arraias. E arraial e lavras d e o u r o . T e m u m a c h a p a d a ,
q u e p o r rica é fiadora dos m i n e i r o s e c o m e r c i a n t e s ; t e m u m a igreja m u i t o b e m
a d e r e ç a d a — c e l e b r a m nela suas festas c o m g r a n d e z a e s e m a n a s santas c o m m u i t a
devoção e concurso de toda a Ribeira d a Palma, q u e lhe fica vizinha —, e v ê m os
m o n t a n h e s e s aos oficios divinos, à frequência d e sacramentos; t e m seus juízes ordi-
nários, p r o v e d o r d e ausentes, intendente d a F a z e n d a R e a l , "registro de contagem.
Nesta p a r a g e m m a n d o u d o m Luís M a s c a r e n h a s levantar u m a "polé p o r non plus ultra
d a sua a m b i ç ã o , c o m o Hércules^" as colunas do seu valor, e lançou u m a finta geral
dizendo q u e e r a p a r a as despesas da g u e r r a que queria fazer ao gentio, e a fez d e fato
às "borrachas d e todos, e ficou vitorioso ê rico c o m este saque, q u e i m p o r t o u e m 17
mil "oitavas. C o n t i n u a m e n t e p a d e c e danos dos gentios e m suas roças e arrabaldes.
A q u i n t a p a r ó q u i a espera ser o arraial d e São Félix das M i n a s . P r i m e i r o q u e
todos os mais das T e r r a s N o v a s , m o s t r o u sua opulência e p ô d e sustentar c o m o d a -
m e n t e a seu " p á r o c o c o m o m e s m o distrito, q u e t e m os seus j u í z e s o r d i n á r i o s ,
p r o v e d o r dos ausentes, i n t e n d e n t e d a F a z e n d a R e a l . T e m registro d e c o n t a g e m ,
p o r suas lavras limitadas d e o u r o ; a sua igreja é a i n d a d e p a l h a , d e s u a p r i m e i r a e
infeliz p o v o a ç ã o , e m q u e e n t r a n d o o c o n d e d e A s s u m a r c o m militares t r o p a s in-
t r o d u z i u a o "ouvidor d e G o i á s e justiças p a r a sua d e s t r u i ç ã o , e x c l u i n d o t o d a a
jurisdição e regência q u e se a c h a v a p o s t a pelo " g o v e r n a d o r do Estado do M a r a n h ã o .
E assim se conserva anexo à p a r ó q u i a d a B a r r a d a P a l m a , apesar de seus h a b i t a n -
tes q u e de m á v o n t a d e r e c o n h e c e m tal p á r o c o q u e lhes n ã o assiste e s u s t e n t a m
"capelão q u e lhes a d m i n i s t r a os s a c r a m e n t o s .
A sexta p a r ó q u i a suspira ser o Pontal, o n d e de p r e s e n t e e m as serras d a p a r t e
do noroeste se descobriu ouro e f o r a m os descobridores a G o i á s c o m as amostras
a o " s u p e r i n t e n d e n t e das t e r r a s m i n e r a i s , q u e é o o u v i d o r - g e r a l , p a r a se d a r a o
"manifesto. D e u s p e r m i t a q u e sejam boas m i n a s , p o r q u e as demais se a c h a m m u i
d e c a d e n t e s e exauridas; t e m u m i n t e n d e n t e q u e lhe a d m i n i s t r a justiça.

Nome romano de Héracles grego, semideus filho de Zeus e Alcmena, que como expiação pelo
assassínio de sua esposa foi obrigado por Eristeu, rei de Micenas e Tirinto, a executar 12 tarefas
consideradas impossíveis. Além dessas realizou outras façanhas, entre as quais a que se faz referência
aqui, a separação das montanhas Calpe {na Europa) e Ábila (na África), que formam o estreito de
Gibraltar, local tido como o fim do mundo. Ao separar as montanhas, permitindo a comunicação
entre o Atlântico e o Mediterrâneo, Hércules plantou em cada uma delas uma coluna com a legenda
'Não além'. Em sentido figurado, a expressão colunas de Hércules significa o limite extremo que é
possível alcançar numa arte ou ciência.
949

• 145 <

Descrição do bispado do Grão-Pará [fl.526 ]

Relato sobre a cidade de Santa Maria de Belém do G r ã o -


Pará e seus arredores e áreas povoadas sob a jurisdição do bis-
p a d o do Grão-Pará. Dividida entre "caderno primeiro" e "ca-
derno segundo", a narrativa elabora minuncioso repertório so-
bre os empreendimentos religiosos e econômicos da Igreja cató-
lica na região, informações geográficas quanto às condições de
navegação costeira e fluvial, notícias d e conflitos entre índios e
portugueses e atividades econômicas de todo o tipo. Percorre
cada u m a das aldeias e missões do bispado descrevendo p a r a
cada u m a delas a arquiteura religiosa, as atividades econômicas e
as ocupações profissionais, a pesca e a caça, os armamentos indí-
genas, a defesa, dados demográficos, contatos entre sertanejos e
índios, cultura indígena.
A estrutura e a ordenação de parte deste texto g u a r d a m
semelhanças com o conteúdo de u m a visita pastoral, pois apre-
senta extenso levantamento do clero, das instituições e entidades
católicas, tratando dos lugares sagrados, do estado dos templos e
vasto repertório de dados de natureza material e espiritual. Ain-
da diante da preocupação com as condições materiais para o cul-
to, expõe os rendimentos das igrejas, a conduta dos padres, o
número de fiéis e as missões ocupadas da evangelização indígena.
Tais noticias parecem ter sido obtidas através de viagem em que
o autor percorreu a região, possuindo a estrutura de relato de
viagem.
Esse modo de apresentação e a natureza das informações
sugerem que a preparação deste documento viesse atender de-
m a n d a do secretário real, Alexandre de Gusmão, que, através de
inquéritos solicitados a, funcionários e colonos sobre aspectos ge-
ográficos, históricos, etnográficos e econômicos das regiões em
litígio com a Espanha, reunia elementos para as negociações a
favor de Portugal, antes mesmo da fase preparatória do T r a t a d o
de Madri.
Não pode ser descartada a possibilidade de estas informa-
ções sobre o bispado do Grão-Pará servirem d e contraste p a r a a
apreciação que Caetano d a Costa Matoso fazia a respeito do
bispado de Mariana. Pode-se suspeitar que este documento as-
sim como aqueles imediatamente anteriores tenham sido reuni-
dos por pedido especial do ouvidor a padres q u e a c o m p a n h a r a m
dom frei Manuel da Cruz desde o M a r a n h ã o até Mariana.
950

Integrando u m grupo de documentos distante do universo


de temas relacionados à. sua atividade de magistrado em Minas
Gerais, este documento ilustra o interesse do súdito letrado, que
se aproveita da experiencia no ultramar para reunir informações
sobre os sucessos da presença portuguesa n a América.
A u t o r í a , l o c a l e d a t a : G e r a l d o J o s é de A b r a n c h e s ;
Mariana; ca. 1750.
A s p e c t o s d i s c u r s i v o s : Segundo Rafael Bluteau, "descri-
ção" é "definição imperfeita. Representação ou pintura de algu-
* * ' • m a c o u s a c o m p a l a v r a s " (Vocabulário português e, latino [...]
SlMT.f 4 •
Coimbra: Colégio das Artes da C o m p a n h i a de Jesus, 1713. V .
3 , p. 115). N a presente descrição, freqüentemente o n a r r a d o r
emprega o elogio encomiástico do lugar. Retoricamente, trata-
se de ecfrase, atentando para detalhes da administração civil e
religiosa (incluindo descrição de templos e outras instalações da
Igreja), atividades econômicas das missões, relações com o gen-
tio, povoamento e estado das habitações coloniais. Observar em
diversas passagens do documento a aplicação da tópica do locus
amenus ("lugar ameno") e das tópicas da barbárie e ferocidade,
dos aborígenes. (JPF)
C o m e n t á r i o p a l e o g r á f í c o : Escrita moderna, caligrafada
e regularizada do período barroco, discretamente inclinada à
direita. Apresenta o "d" uncial de haste simples ou com giro; " s "
caudado de u m só traço ou redondo; o "y" (como semivogal) e o
" j " com haste em forma de cajado. Algumas abreviaturas usu-
ais, com ponto de abreviação e letras sobrepostas^ Til em forma
de " u " indica tonicidade de vogal, como em "caetê". O texto
está dividido em dois cadernos, o primeiro de fólios 526-535v.,
com tinta de coloração acinzentada, escrito com pena grossa; o
segundo de 536-553, com tinta ferro-gálica, d a maior parte do
Códice. Ambos os cadernos estão numerados n a margem superior
direita, com numeração contínua em letra distinta do texto, a
m e s m a do título e rasuras, de terceiro, isto é, de Caetano da
Costa Matoso. Anotação de outra m ã o no fólio 537v., m a r g e m
superior. (YDL)

Caderno primeiro

C o m e ç a a p o v o a ç ã o da cidade de S a n t a M a r i a d e Belém d o G r ã o - P a r á e m a
p o n t a c h a m a d a a da Salinas, e m r a z ã o d e ter, c o m efeito, u m a s salinas, as quais
são d e Sua M a j e s t a d e , e t e m aí u m "capitão q u e se faz todos os três anos; é d e
r e n d i m e n t o bastante. Estão t a m b é m j u n t o c o m ele três, até seis soldados. T e m aí
u m a g r a n d e p e ç a d e artilharia, q u e tem sua serventia q u a n d o v e m a *frota p a r a
avisar os navios p a r a se f a z e r e m n a volta do m a r e m r a z ã o d e se l i v r a r e m dos
951

g r a n d e s "baixios q u e a tal p o n t a b o t a a o m a r , e j á hoje c o s t u m a m l a r g a r fogo d e


noite às muitas lenhas q u e o m a r c o s t u m a ajuntar n a q u e l a enseada, t u d o a fim d e
l i v r a r e m do perigo os navios, os quais gastam, até d a r e m fundo defronte d a cida-
de, três dias, às vezes m e n o s , e outras, e m r a z ã o d e a n d a r e m só dia — q u e d e noite
d ã o fundo —, mais.
C o m e ç a a tal p o v o a ç ã o d a dita p o n t a e m aprazíveis fazendas q u e h á p e l a
b e i r a - m a r o r n a d a s d e b o a s casas (pois se e s m e r a m m u i t o nisso os m o r a d o r e s d a
dita cidade), c o m o t a m b é m d e deliciosas frutas, boas águas, m u i t a s variedades d e
criações, q u e a l g u m dia foram agrestes, c o m o são pacas e cutias, q u e é c a ç a q u e
m u l t i p l i c a e m casa, e t a m b é m os p o r c o s - d o - m á t o , m u i t a s aves c é l e b r e s , c o m o
j a c u , m u t u r n , cujubi, aves grandes e m u i t o saborosas, as do m a r , g u a r á s , q u e são
todos v e r m e l h o s , e os colhereiros cor-de-rosa, e finalmente m u i t a casta d e aves
m u i t o lindas, q u e são a b u n d a n t e s aquelas fazendas q u e ficam a i n d a n o Salgado, o
q u e as faz m u i t o aprazíveis aos olhos. S ã o m u i t o a b u n d a n t e s d e p e i x e , t a n t o d a
á g u a s a l g a d a c o m o d a d o c e , e m r a z ã o dos m u i t o s e c a u d a l o s o s rios d e q u e é
c o r t a d a a t e r r a , c o m o a d i a n t e se dirá. O s h a b i t a d o r e s destas fazendas f a b r i c a m
f a r i n h a s , feijão, a l g o d ã o , s e r r a m m a d e i r a s e f a z e m salgas d e p e i x e p a r a v i r e m
v e n d e r h a cidade.
Passados alguns dias de v i a g e m está u m célebre rio, q u e t e r á m e i a "légua d e
b o c a , c h a m a d o o C a e t é , o n d e está u m a vila c h a m a d a m e s m o o C a e t é . C o n s t a
esta vila, n o t e m p o de hoje, d e q u a t r o até c i n c o casas. O s m o r a d o r e s q u e n e l a
h a v i a e m o t e m p o q u e p o r lá p a s s e i e r a m o vigário e u m a viúva. As casas e a
igreja são d e p a l h a . T i n h a u m santo A n t ô n i o a m a r r a d o , u m esteio e n a d a m a i s d e
santos. E s e m d ú v i d a q u e t e m m u i t o s m o r a d o r e s o rio a b a i x o e a c i m a , e q u a s e
t u d o gente criminosa q u e m o r a p o r ali, e m r a z ã o q u e a dita vila / / e todas a q u e - [ fl. 526v. ]
las terras até d u z e n t a s "léguas, são d o "porteiro-mor, e t ê m lá seu " c a p i t ã o - m o r ,
r a z ã o q u e , p o r s e u privilégio, n ã o v a i lá o " o u v i d o r , e os c r i m i n o s o s c o m essa
certeza v i v e m descansados. A mais gente se retirou p a r a o u t r a n o v a vila q u e a b a i -
xo se dirá.
B e m a o p é d e s t a c h a m a d a vila [do C a e t é ] está u m a g r a n d e aldeia d o s p a -
d r e s d a C o m p a n h i a [de J e s u s ] m u i t o b e m a r r u a d a e [com?] b o a igreja; as casas
de s u a assistência b e m asseadas, c o m seis cubículos m u i t o e s t u p e n d o s , c o m b o a
v a r a n d a sobre o rio. A á g u a é superlativa. Aí vi u m a d i s p a r i d a d e m u i t o g r a n d e e
incrível a q u e m o n ã o vê: e é as m u l h e r e s c o m vozes grossas e os h o m e n s c o m
elas finas, e isto é só e n t r e os " t a p u i o s , p r i n c i p a l m e n t e q u a n d o c a n t a m . A n d a m
vestidas q u a n d o s a e m p a r a [a] igreja c o m sua saia de a l g o d ã o tinto d e p r e t o , s u a
"camisa e u m a t o a l h a b r a n c a n a c a b e ç a até a c i n t u r a ; os h o m e n s , u m c a l ç ã o o u
a p i c a a m a r r a d a , q u e e n t r e eles é c o m p o s t u r a , e x c e t o o " p r i n c i p a l e c a p i t ã o -
m o r , s a r g e n t o - m o r e os seus m a i s m i n i s t r o s , q u e s e m p r e a n d a m c o m p o s t o s , o
q u e m a i s a b a i x o d i r e m o s . E s t a aldeia é das p o b r e s q u e p o s s u e m os p a d r e s d a
C o m p a n h i a ; assistem n e l a c o n t i n u a m e n t e dois p a d r e s . O c u p a m os í n d i o s e m
952

p e s c a r i a s , q u e t r a z e m vários galeões d e q u i n z e r e m e i r o s p o r b a n d a e os dois


pilotos e m a i s alguns "colomins. C a d a u m destes t r a z u m " c a b o , h o m e m b r a n -
c o , e o lucro q u e t ê m é d e c a d a cinco " a r r o b a s d e peixe q u e faz é u m a p a r a ele,
a q u e c h a m a m g a n h a r quintos; e assim a n d a m p o r a q u e l a costa a t é e n c h e r e m os
tais galeões, q u e l e v a m mil e tantas a r r o b a s , setecentas, n o v e c e n t a s , c o n f o r m e o
t a m a n h o , e l o g o as l e v a m p a r a a c i d a d e , e estas se v e n d e m n o colégio a d e z
"tostões [a] a r r o b a do seco e de s a l m o u r a a dois m i l "réis o " p o t e , e n ã o cause
a d m i r a ç ã o os p a d r e s v e n d e r e m , p o r q u e n a tal c i d a d e t o d a s as religiões t ê m b a l a n ç a
g r a n d e na portaria, c o m o diremos q u a n d o lá chegarmos, e nisto é q u e os o c u p a m .
D e s t e célebre rio c h a m a d o C a e t é t e m outros muitos de s u a g r a n d e z a e m a i -
ores q u e d e s a g u a m e m g r a n d i o s a s baías q u a n d o d e s e m b o c a m e m o o c e a n o à
costa e e m outras p a r a g e n s tão estreitas q u e m a l c a b e m as ditas c a n o a s , c h a m a d a s
[ fl. 527 ] galeões, e é necessário os índios / / saltarem n a á g u a e p u x a r e m as tais canoas à
c o r d a , e é tal a p r a g a d a v a r i e d a d e d e m o s q u i t o s q u e n ã o s a b e u m a p e s s o a d e
quais se h á d e queixar.
D e p o i s d e se p a s s a r t u d o , chega-se à célebre a l d e i a d o M a r a c a n ã . É esta
t a m b é m dos p a d r e s da C o m p a n h i a . T e m a t u a l m e n t e dois, até três p a d r e s . T e m
esta aldeia e m si três nações d e índios e três "principais. Estes s a b e m ler e escrever
e b a s t a n t e de política, p r i n c i p a l m e n t e o d e m a i o r a u t o r i d a d e e s e n h o r das terras
d a situação d a aldeia. T e m este o hábito d e Cristo é u m "bastão, coisa e s t u p e n d a
q u e l h e d e u el-rei d o m P e d r o , d e gloriosa m e m ó r i a ; d e u a s e u a v ô ou b i s a v ô ,
p o r q u e foi a o R e i n o depois q u e v e n c e u ou foi a principal causa d e se r e s t a u r a r o
M a r a n h ã o , q u e estava d e posse dos franceses, e este tal foi e m socorro c o m a sua
gente s e m ser o b r i g a d o , mais q u e só levado d e fiel vassalo, r a z ã o p o r q u e a sobredita
M a j e s t a d e o m a n d o u b u s c a r e lhe fez todas as honras, O h á b i t o é p a r a e n q u a n t o
a a l d e i a p e r m a n e c e r e h o u v e r n e l a p r i n c i p a l . S u a m u l h e r t e m d o m e t o d a s as
filhas. T r a t a - s e c o m t o d o o respeito; baste q u e os p a d r e s n ã o lhes g o v e r n e m mais
q u e t ã o - s o m e n t e o espiritual, o q u e n a s m a i s t u d o g o v e r n a m , p o r é m nesta o n ã o
fazem. G a l e i a b e m , c o m b o n s "vestidos; t e m a l g u n s d e z escravos m a c h o s , t e m
m u i t a s mais fêmeas, q u e assistem a m u l h e r e filhas; t e m capitães-mores, sargentos-
m o r e s e t o d o s os m a i s oficiais e m e i r i n h o s ; t e m b o a s casas o n d e m o r a , c o m o
t a m b é m os outros dois principais, q u e n o t r a t a m e n t o são iguais, p o r é m s e m p r e o
t r a t a m c o m m u i t a v e n e r a ç ã o . A igreja é coisa estupenda: t e m t u d o o necessário de
p r a t a , t e m " i r m a n d a d e do Santíssimo, q u e q u a n d o sai fora v ã o a c o m p a n h a r c o m
suas "opas, c o m t o d o o asseio, t e m i r m a n d a d e das Almas, b o a t u m b a , i r m a n d a d e
d e Nosso S e n h o r , t e m belos "frontais d e todos as cores, m u i t a cortina, três altares;
fazem todas as festas d o a n o , até " E n d o e n ç a s ,

C o s t u m a m a estarem p r o n t o s estes índios, pois são os pilotos do c a m i n h o do


P a r á p a r a o M a r a n h ã o e do M a r a n h ã o p a r a o P a r á , t a n t o p o r fora d a costa, cami-
[ fl. 527v. ] n h o dos navios, pois são os "capitães / / destes obrigados a t r a z e r e m u m o u dois
d a q u e l e s índios a q u e c h a m a m p r á t i c o s , e pelo c a m i n h o d e d e n t r o , p o r [onde]
953

a n d a m as c a n o a s p a r a o M a r a n h ã o , v ã o eles p o r pilotos e proeiros. E é d e a d m i r a r


uns h o m e n s s e m p r á t i c a a c e r t a r e m t a n t o c o m a experiência, pois todos os anos se
m u d a m as areias n a q u e l a s baías, e m r a z ã o dos g r a n d e s m a r e s q u e nelas fazem, e
são t ã o largas q u e depois de estar a e m b a r c a ç ã o n o m e i o é q u e m a l se avistam as
árvores da o u t r a p a r t e . Passam-se estas n a p r e a m a r e r e z a m , q u e assim como co-
m e ç a a v a z a r a m a r é e m u m instante ficam e m seco, e só ficam esgotando a sua
c o s t u m a d a c o r r e n t e os a r r e b a t a d o s rios q u e nelas v ê m fazer b a r r a ; e e n t ã o se v ê e m .
as g r a n d e s s e r r a s d e a r e i a q u e p e l o m e i o delas e s t ã o , q u e a i n d a m u i t a s vezes
passando-se e m a dita p r e a m a r t o p a m as canoas, c o m o eu o experimentei, p o r é m
s e m e m b a r g o q u e terras e s t r a n h a s è m a r e s p o u c o conhecidos, m u i t o a b u n d a n t e s
d e peixes e as terras d e c a ç a e a i n d a a b e i r a - m a r de caças m a r í t i m a s . M o r r e t a m -
b é m b a s t a n t e g e n t e pela m e s m a v e l o c i d a d e c o m q u e v a z a m estas b a í a s c o m a
m e s m a origem, e c o m o t u d o fica espraiado se faz aprazível e desejoso a o passear-
se p o r aquelas areias, p o r é m q u e m é experiente ou se d á pelo aviso dos tais índios,
assim c o m o d á o p r i m e i r o r o n c o d e vento n a costa, b o c a das tais baías, logo se h á
de recolher a e m b a r c a ç ã o , a qual é preciso esteja ou à beira de terra o u e m a l g u m a
b a r r a de rio, d e sorte q u e esteja sobre a a m a r r a e *fateixas q u e c o s t u m a m levar, q u e
se p o r a c i d e n t e s ficam as tais embarcações e m seco n o meio das sobreditas baías,
c o m o v ê m m u i t o velozes os m a r e s , e m breve t e m p o as m e t e m a p i q u e . P o r é m , é
g r a n d e b r i o e p r e s u m e m d e sabedoria os tais índios q u e p o r sucesso lhes s u c e d e
ficar a c a n o a e m tais paragens, p o r q u e nisso m u i t o c u i d a m e m r a z ã o d e seu ofi-
cio.

E este c a m i n h o m u i t o a b u n d a n t e d e t o d a a casta de mariscos e frutas, a i n d a


que agrestes saborosas, praias dilatadas c o m divertimento natural, a i n d a q u e
c a u s e m s a u d a d e s p o r seu deserto. C o n t u d o , servem de lenitivo a q u e m as p a s s a r
/ / s a u d o s o (como sucede a muitos). C o s t u m a m estas a criar u m a s q u a s e p e d r a s [ fl. 5 2 8 ]
q u e se g e r a m das escumas das o n d a s do m a r , chatas p o r u m a p a r t e e q u a s e b o l e a d a s
p e l a outra, e m cuja p a r t e está c o m o aberta a buril u m a estrela c o m a m a i o r perfei-
ção q u e se p o d i a d a r e m m ã o s de artífice criada, p o r é m c o m o é o d a n a t u r e z a n ã o
h á q u e a d m i r a r s e n ã o nas pessoas q u e tal vêem. Isto suposto, os mais índios q u e
ficam, uns v ã o pescar e outros vão p a r a as suas roças c o m suas famílias fabricarem
mantimentos.
D e p o i s desta aldeia, segue-se a dos Sacacos, q u e é dos p a d r e s d e S a n t o A n t ô -
nio. Fica e m a b a í a dos J o a n e s . S ã o estes índios d e g r a n d e estatura e forças, t o d o s
ou a m a i o r p a r t e deles s a b e m ler e escrever, p o r curiosidade q u e t ê m os p a d r e s e m
os e n s i n a r e m e n q u a n t o rapazes; t ê m u m a bela aldeia, b e m a r r u a d a , e boas casas
p a r a o seu tanto; a igreja t e m b o n s o r n a m e n t o s e p r a t a s , fazem t a m b é m todas as
festas g r a n d e s d o a n o ; t ê m u m *pálio, coisa rica c o m oito *varas d e p r a t a p a r a
q u a n d o sai o S e n h o r fora. O c u p a m - s e estes t o d o o a n o e m p e s c a r e m tainhas, q u e
é o q u e t e m a q u e l a b a í a e costa, e p o r sucesso a p a r e c e m o u t r a s castas d e peixe, e
é tal a b u n d â n c i a das tainhas, q u e a n d a m s e m p r e e m c a r d u m e s , q u e e n c h e m t o d a
954

a q u e l a baía; e u n s a n d a m e m várias canoas, outros estão n a p r a i a a "escalar e a


salgar, e depois as p õ e m a secar. A r a z ã o q u e t ê m p a r a a n d a r e m t o d o o a n o nesta
lida é p o r q u e são obrigados p o r Sua Majestade (segundo o seu p a g a m e n t o q u e se
lhe dá), e m r a z ã o d e o tal "contrato das tainhas se a n e x o u a o dos "dízimos, e é
c o n t r a t o q u e r e n d e m u i t o , p o r q u e a l é m d e se v e n d e r e m b e m n a c i d a d e , roças e
"engenhos c o m elas fazem p a g a m e n t o aos soldados, e m lugar d o " p ã o de m u n i -
ç ã o q u e se lhes d a v a e c o s t u m a m dar-lhes os "dizimeiros, duas c a d a dia, e isto foi
a r e q u e r i m e n t o dos m e s m o s soldados, dizendo q u e antes q u e r i a m o peixe d o q u e
a farinha, e m r a z ã o d a t e r r a ser m u i t o a b u n d a n t e dela, b a r a t a , e q u e q u a l q u e r
pessoa a n ã o n e g a v a . V ê m estes índios todos os meses e m u m galeão d e dezessete
r e m e i r o s p o r b a n d a e dois pilotos, e v ê m c a r r e g a d o s d e cestos até a c i m a cheios
delas. V ê m u m ou dois índios n a p r o a c o m duas buzinas feitas d e p a u , u m z u r r a n -
do c o m o b u r r o p r o p r i a m e n t e e o u t r o s p a r e c e m l e g i t i m a m e n t e c o m [o som] d a
t r o m b e t a dos Passos, e são seus instrumentos d e q u e u s a m , os quais alegram b e m
[ fl. 528v. ] os soldados q u a n d o os o u v e m , e m / / r a z ã o d e lhes vir a r e d e n ç ã o . N a tal aldeia
n ã o se p o d e c o m e r galinhas, n e m ovos, n e m p o r c o e, finalmente, n a d a , p o r q u e
t u d o é c o m e r tainha, p o r q u e os tais animais a n d a m p e l a p r a i a a c o m e r as tripas e
cabeças das tais tainhas. As a r m a s destes tais índios são uns p a u s m u i t o g r a n d e s ,
q u e i m a d o s d e u m a e o u t r a p a r t e , q u e pela g r a n d e z a b e m p o d i a m servir de t r a n c a
de u m a p o r t a d e loja. S ã o m u i t o destros e m os j o g a r , c o m o t a m b é m n o atirar d e
flecha, d e q u e são destros b a s t a n t e m e n t e .

P a s s a d a esta situação, p a s s a m - s e vários rios e baías até chegar-se à célebre


vila d a Vigia, cujo n o m e teve sua origem q u a n d o os franceses estiveram de posse
d o M a r a n h ã o e e m a dita p a r a g e m , e m a q u a l hoje é a vila, estavam vigias c o m
e m b a r c a ç õ e s p r o n t a s , n o caso q u e os tais franceses p r e t e n d e s s e m t o m a r t a m b é m a
cidade. C o m esta h a b i t a ç ã o v i r a m ser b o a a p a r a g e m p a r a a tal f u n d a ç ã o , se foram
a g r e g a n d o várias pessoas q u e p o r p e r t o t i n h a m suas fazendas, fizeram igreja, coisa
m u i t o b o a , o n d e c o l o c a r a m u m a bela i m a g e m de N o s s a S e n h o r a do N a z a r é , cuja
S e n h o r a é d e tantos milagres q u e mais é p a r a adrnirá-los q u e p a r a dizê-los, pois
h a v e n d o u m c o n t á g i o n a q u e l a vila se a c h a v a a S e n h o r a s u a n d o , e c h e g a n d o o
r e p a r o dos h o m e n s a m a i s v i r a m q u e os vestidos d a S e n h o r a se a c h a v a m p o r
b a i x o todos cheios d e l a m a , pois esta a n d a v a t o d a a noite visitando os enfermos. E
isto se verificou p o r sacerdotes d e b o a vida, p o r q u e a tal vila t e m três conventos,
u m dos p a d r e s d a C o m p a n h i a , q u e t ê m estes u m belo t e m p l o , d e g r a n d e e majes-
toso, c o m b o n s d o r m i t ó r i o s e classes, pois d ã o estudos, c o m o e m t o d a a p a r t e
c o s t u m a m ; t ê m mais os religiosos d e Nossa S e n h o r a do M o n t e d o C a r m o t a m b é m
b o m c o n v e n t o , p o r é m mais p e q u e n o ; e Os religiosos de N o s s a S e n h o r a das M e r -
cês, c o m b o n i t a igreja p o r é m convento b a s t a n t e m e n t e p e q u e n o . T ê m vários "clé-
rigos, todos estes t e s t e m u n h a s de v e r d a d e do q u e o b s e r v a r a m n a S e n h o r a . Final-
m e n t e , a m a i o r v e r d a d e q u e p a r a isto h á são as p a r e d e s d a igreja e s t a r e m cheias e
cobertas de t o d o o g ê n e r o d e milagres, c o m o t a m b é m a sacristia e casa de " i r m a n -
955

d a d e , e todos os anos vão / / vários "círios, tanto d a cidade c o m o de outras p a r t e s , [ fl. 529. ]
e se fazem grandiosas festas, a q u e c o m u m e n t e v ã o assistir os senhores "bispos e
"generais.
E esta vila m u i t o p o v o a d a , b e m a s s e n t a d a e b e m a r r u a d a . Fica sobre u m
g r a n d i o s o rio, m u i t o a b u n d a n t e de p e i x e , t a n t o d e á g u a d o c e c o m o d a salgada.
V i v e m os m o r a d o r e s dela d e p l a n t a r e m algodões, m a n t i m e n t o s de toda a casta (e
j á hoje p l a n t a m seus "caçoais), de salgas de peixe e m u i t o marisco, q u e levam p a r a
a cidade, p r i n c i p a l m e n t e n o t e m p o d a Q u a r e s m a . Fez-se esta vila muito populosa
d e m o r a d o r e s , e m r a z ã o dos muitos q u e se m u d a r a m d a célebre vila q u e a t r á s
referimos, c h a m a d a o C a e t é . T ê m todos estes conventos m u i t a s fazendas p o r aqueles
rios, m u i t o galantes pelo belo passadio c o m o pelo r e n d i m e n t o e m u i t o aprazíveis,
p r i n c i p a l m e n t e a dos p a d r e s d a C o m p a n h i a , q u e nisso são muitos "pichosos.
S e g u e m - s e destas e m d i a n t e e d e p e r m e i o muitas dos m o r a d o r e s d a dita vila,
c o m o t a m b é m d e certa p a r t e e m diante dos d a c i d a d e , quase todas à beira destes
grandiosos rios, q u e uns t ê m de largo u m q u a r t o d e "légua, outros a m e t a d e , aos
quais v ê m d e s e m b o c a r muitos e muitíssimos t a m b é m b a s t a n t e m e n t e largos, e c o m o
t a m b é m vários riachos, pelos quais a c i m a t a m b é m estão várias fazendas, até c h e -
gar à b a í a d o Sol, a o n d e c o m u m e n t e d ã o fundo os navios, p o r ser m u i t o cheia d e
secos e b a n c o s d e areia. Nesta h á m u i t a s fazendas e belas, p o r ser m u i t o aprazível;
dela saem m u i t o s rios, até p e r t o da cidade. Depois dela segue-se a b a í a d e S a n t o
A n t ô n i o , p e q u e n a m a s muito brava. Depois desta seguem-se dois rios, u m c h a m a -
do M a g u a r i a ç u e o o u t r o M a g u a r i - M i r i m , e o u t r o q u e v e m d a costa. T o d o s três
d e s e m b o c a m ou a eles v e m desembocar o d a cidade. P o r é m depois destes passados
chega-se à p o n t a do Mel, muito brava e m razão de d e s e m b o c a r e m tantos rios. Desta
se avista a cidade. Nesta m e s m a p o n t a têm os religiosos do C a r m o u m a gravíssima
fazenda c o m grandes casas, igreja e "fábrica. Nela é muito aprazível, p o r descobrir
tantos e tão grandes / / rios. [ fl. 529v. ]
D e p o i s desta, passando-se três m o r a d o r e s , segue-se a dos religiosos de N o s s a
S e n h o r a das M e r c ê s , c h a m a d a a fazenda d e Val-de-Cães. Esta fazenda, g r a n d i o s a d e
tal sorte q u e fica s o b r e o rio c o m u m g r a n d e cais, t e m u m a b e l a c a s a r i a c o m
grandissíssima v a r a n d a p a r a o m a r , t e m muitas celas e salas (pois c o s t u m a m ir à tal
fazenda os senhores bispos e generais a divertirem). C o n s t a esta fazenda, além das
grandiosas casas q u e t e m , ter u m a bela igreja c o m b o n s p a r a m e n t o s e c o n t i n u a -
m e n t e u m " a b a d e , q u e é m e s m o religioso, e d e c o m p a n h e i r o u m leigo; t e m d e
"fábrica u m " e n g e n h o real, coisa e s t u p e n d a e m q u e fazem m u i t o a ç ú c a r e "aguar-
d e n t e d e c a n a . P a r e c e a tal fazenda u m a vila, e m r a z ã o d e t e r e m os tais religiosos
a r r u a d o t o d a á fazenda — u m a r u a consta d e carpinteiros, a o u t r a d e torneiros, a
o u t r a d e m a r c e n e i r o s , a o u t r a de ferreiros, a o u t r a d e serralheiros - duas olarias,
t a n t o d e telha c o m o d e tijolo, potes e m a i s louças. O s "oficiais destas fábricas são
mestiços, m a m e l u c o s , m u l a t o s e "tapuios crioulos, cuja f a z e n d a d á m u i t o l u c r o
aos tais religiosos, p o r q u e q u a n d o h á a l g u m a o b r a d e e m p e n h o n a c i d a d e , t a n t o
956

p a r a casas c o m o p a r a o mais, se p r o c u r a m os ditos "mestres e seus "oficiais, e isto


nasce d a m u i t a habilidade q u e t ê m os tais artífices p o r sua p r o g e n i e .
Fica esta tal fazenda fronteira à grandiosa torre d a B a r r a , q u e fica n o m e i o do
m a r (magnífica o b r a d e Sua Majestade el-rei d o m J o ã o , o quinto). T e m esta forta-
leza duas baterias, u m a ao l u m e do m a r , o u t r a mais a c i m a , t e m d e n t r o e m si várias
"casas d e prisão, muitos quartéis, t e m mais e m c i m a u m a igreja d e N o s s a S e n h o r a
das M e r c ê s , c o m u m b o m sino, t e m ao p é d a dita igreja u m b o m p o m a r c o m várias
laranjeiras e horta, t e m u m belo p o r t ã o p a r a o m a r c o m b o a segurança, t e m a o p é
[fl. 530 ] m u i t a p e d r a r i a q u e c o s t u m a m a deitar os / / h o m e n s q u e v ê m d o s e r t ã o , cuja
obrigação consiste, a c a d a u m e m u m a c a n o a , até duas, d e p e d r a , a o p é d a dita
fortaleza, p a r a q u e o m a r desfaça a fúria das suas o n d a s e m a q u e l a m u i t a p e d r a ,
q u e se a c h a e m circuito dela. É esta fortaleza o b r a singular; b a s t a q u e S u a Majes-
tade m a n d a s s e oficiais d o seu R e i n o experientes a tal fazer. Q u a s e ao fronte desta
se a c h a [um] forte fundado e m a p o n t a d e u m a ilha q u e t e m dez peças de artilha-
ria, cujo forte avista p r i m e i r o a "frota q u e a m e s m a sobredita fortaleza, e a r a z ã o é
q u e sendo c o s t u m a d a a fortaleza a p r i m e i r o avistar a frota sucedeu q u e u m a ilha
q u e defronte lhe ficava e m u m a noite d e g r a n d e t o r m e n t a d e s a p a r e c e u e d a í a
p o u c o s t e m p o s a p a r e c e u a d i a n t e d a m e s m a fortaleza d a B a r r a , a q u a l hoje t e m
mais d e m e i a "légua d e c o m p r i d o e bastante de largo, t o d a j á cheia de m a t o e j á
b e m alto. C o s t u m a este forte q u a n d o avista a frota b o t a r b a n d e i r a p a r a avisar a
fortaleza, a qual c o s t u m a estar c o m m u i t a vigilância, p r i n c i p a l m e n t e n o t e m p o e m
q u e c o s t u m a c h e g a r a frota, pois t e m p o r estatuto a c a d a navio q u e chega o u avista
d a r u m a "peça a avisar os fortes e castelo da cidade p a r a q u e estejam p r o n t o s .

D e p o i s de p a s s a d a a tal fortaleza e fazenda dos religiosos d e N o s s a S e n h o r a


das M e r c ê s , seguem-se duas fazendas a l g u m t a n t o p e q u e n a s , p o r seus d o n o s se-
r e m tais e quais e n ã o as a u m e n t a r e m . D e p o i s destas fica u m a aldeia c h a m a d a
U n a , á qual é dos p a d r e s de S a n t o A n t ô n i o . Acha-se hoje d i m i n u t a p o r os índios
se t e r e m espalhado. S e m e m b a r g o o ter sido g r a n d e aldeia e c o m g r a n d e s privilé-
gios, p o r ter ido o "principal a o R e i n o , p o r é m hoje está r e d u z i d a a g r a n d e misé-
ria. V i v e m estes índios d o q u e t r a b a l h a m e a d q u i r e m p a r a c o m e r .
S e g u e m - s e l o g o a b a i x o d e s t a a l d e i a três f a z e n d a s . U m a d e l a s , q u e é d e
u m "clérigo, e coisa e s t u p e n d a , p o r ser b e m a r r u a d a , c o m v á r i a s á r v o r e s , "jo-
gos d e b o l a e " l a r a n j i n h a ; t e m b o a s c a s a s e b o a c a p e l a d e N o s s o S e n h o r d a
[ fl. 530v. ] O l i v e i r a , a q u e m se f a z e m b o a s festas t o d o s os / / a n o s . V a i m u i t a g e n t e d a
c i d a d e assistir às ditas festas.
C h e g a - s e , c o m efeito, à cidade. N o princípio dela t e m u m forte a q u e c h a -
m a m o forte d e S a n t o A n t ô n i o , e m e p a r e c e p o r estar a o p é d o m u r o d e S a n t o
A n t ô n i o , cujo c o n v e n t o fica logo no princípio d a cidade. E este convento m a g n í -
fico, p o r ser t o d o de a b ó b a d a s . A igreja é m u i t o g r a n d e ; t e m só cinco altares, é
t o d a d e p e d r a r i a q u e veio do R e i n o , isto é, as "ombreiras das j a n e l a s e "cunhais
das p o r t a s . T e m três d o r m i t ó r i o s , c o m seu n o v i c i a d o p a r a os n o v i ç o s , os quais
957

v ê m d o R e i n o n a *frota q u a n d o deles c a r e c e m , c o m o t a m b é m vários religiosos,


sacerdotes e leigos, e a r a z ã o disto é p o r q u e n ã o q u e r e m t o m a r noviços d a t e r r a ,
digo, filhos dela; é p o r n ã o p a d e c e r e m o q u e as mais religiões p a d e c e m , c o m as
p a r c i a l i d a d e s e m s e r e m os filhos d a terra c o m os filhos d o R e i n o . E é tal o seu
r e g i m e q u e a i n d a estes m e s m o s e n t r e si, sendo todos dela, q u a n d o u m triénio o
"comissário provincial é filho d e Lisboa, o "guardião é filho d e fora, e q u a n d o o
dito comissário provincial é filho d e fora, o g u a r d i ã o é d e Lisboa. Estes tais " p r e -
lados v ê m feitos d o R e i n o . T e m mais este c o n v e n t o u m a g r a n d i o s a "livraria c o m
seis estantes b a s t a n t e m e n t e grandes p o r c a d a p a r t e , e e n t r e c a d a u m a , u m a p o r t a
ou j a n e l a r a s g a d a até a b a i x o , p o r [que] se sai p a r a u m a formosa v a r a n d a c o m
belos assentos e b o a vista, t a n t o p a r a o c a m p o c o m o p a r a o m a r . P o r baixo desta
está a enfermaria, e m u i t o b e m p r e p a r a d a de t u d o , t e m u m g r a n d e o r a t ó r i o o n d e
se diz missa todos os dias aos religiosos enfermos, t e m t a m b é m u m a g r a n d e v a r a n -
da, e esta cheia t o d a d e "alegretes, c o m muitas variedades d e p l a n t a s p a r a diverti-
m e n t o dos enfermos. A cerca é infinitamente g r a n d e . N e l a t e m u m b o m j a r d i m ,
t e m u m g r a n d e t a n q u e c o m peixe e tartarugas. T e m u m a b o a olaria, forno d e cal.
F i n a l m e n t e , t e m m u i t a s e m u i t a s coisas p a r a se a d m i r a r : t e m u m g r a n d e p á t i o
antes d a igreja e p o r t a r i a , t e m dois arcos m u i t o g r a n d e s p o r o n d e se e n t r a p a r a ele,
e m o m e i o dos quais, d a p a r t e d e fora, está u m formoso oratório, q u e é o s e g u n d o
passo d a procissão dos Passos.

S e g u e m - s e d u a s ruas, u m a c h a m a d a a d a P r a i a e a o u t r a a r u a D i r e i t a d e
S a n t o A n t ô n i o , e m cuja esquina está o palácio e m q u e m o r a o " c h a n t r e e "provisor
do b i s p a d o c o m s e u i r m ã o , " c ó n e g o p r e s b í t e r o d a sé. T e m este p a l á c i o q u i n z e
j a n e l a s p a r a a p a r t e d a r u a Direita, rasgadas c o m [grandes?] sacadas: f o r a m p i n t a -
das de v e r d e e frisadas d e o u r o , c o m o t a m b é m as bolas todas d o u r a s ; u m a g r a n d e
p o r t a n o m e i o , toda de p e d r a r i a ; as "casas p o r baixo c o m as j a n e l a s d o m e s m o
feitio q u e as d e c i m a . / / E p a r a a o u t r a p a r t e , q u e é u m a l a r g a travessa q u e [fl. 531 ]
a c o m p a n h a o m u r o d a cerca dos p a d r e s , t e m o tal palácio treze j a n e l a s d o m e s m o
feitio e t a m b é m u m a p o r t a . As salas de c i m a são b e l a m e n t e p i n t a d a s e d o u r a d a s ,
t ê m todas as portas e j a n e l a s cortinas d e d a m a s c o , boas cadeiras d o m e s m o . T e m
o dito p r o v i s o r , e m u m a das m a i o r e s salas e n a c a b e c e i r a d e l a , u m m a j e s t o s o
o r a t ó r i o c o m belas i m a g e n s e o r n a m e n t o s e m u i t a s p e ç a s d e p r a t a e o u r o , e as
mais p a r e d e s até o teto estão cheias de livros, postos e m suas b e m d o u r a d a s estan-
tes. E p o d e - s e e n t r a r n a tal sala, p o r t u d o ser p r e c i o s o , e a r a z ã o é p o r q u e o
sobredito provisor é n o q u e cuida e c o m mais n a d a se m e t e . N ã o falta à sé, só se
está d o e n t e . A n d a e m u m a b e m d o u r a d a "cadeira d e dois "varais, q u e a c a r r e g a m
dois esforçados n e g r o s e u m m u l a t o , c o m u m c h a p é u d e sol d e d a m a s c o v e r d e
forrado d e seda b r a n c a e c o m g r a n d e s franjões de o u r o e m r o d a . O i r m ã o "cóne-
go t a m b é m se trata c o m o m e s m o estado. T e m mais o palácio g r a n d e s v a r a n d a s e
b o m j a r d i m . Defronte m o r a o i r m ã o , pois são estes três, q u e é o "vigário-geral. As
suas "casas t a m b é m são m u i t o g r a n d e s , p o r é m as p r i n c i p a i s ficam c o m a frente
958

p a r a a r u a c h a m a d a a d a Praia. T ê m d e z janelas t a m b é m n a m e s m a forma, b o a


p o r t a e b o a s salas, b o a vista p a r a o m a r q u a n t o os olhos p o s s a m a l c a n ç a r . Este
t a m b é m se trata c o m o m e s m o estado. E síndico h á muitos anos dos religiosos d e
S a n t o A n t ô n i o . N u n c a quis ser d a sé, só p o r n ã o c a n t a r . S ã o "casas estas m u i t o
ricas. A r a z ã o é q u e são três irmãos, c o m o dito fica, q u a t r o irmãs q u e n u n c a casa-
r a m , dois tios q u e t a m b é m o n ã o foram e u m a tia d a m e s m a sorte, e todos estes
t r a b a l h a m p a r a u m m o n t e , q u e n e m os p a d r e s d a C o m p a n h i a lhes g a n h a m . T e m
três "engenhos reais d e fazer açúcar, muitas e m u i t a s fazendas d e t o d o o g ê n e r o d e
"efeitos d a terra; escravos são tantos q u e os n ã o c o n h e c e m (declaro q u e se fiz esta
explicação acima é p o r q u e n ã o parecesse m u i t o o fausto c o m q u e estes se tratam).
V a i c o n t i n u a n d o esta r u a d a Praia, pois é a p r i m e i r a p o r estar a o p é do m a r , c o m
b e l a s casas d e u m s o b r a d o c o m b o a s j a n e l a s e salas e a l g u m a s t é r r e a s , p o r é m
assim m e s m o c o m o m e s m o feitio q u e as d e [sobrado?].

A r u a D i r e i t a d e S a n t o A n t ô n i o , d a m e s m a sorte, c o n t i n u a c o m a m e s m a
b e l e z a d e casas, p o r é m p a s s a d a s c i n c o até seis m o r a d a s a d i a n t e do p a l á c i o do
c h a n t r e está a igreja d a Misericórdia. T e m esta igreja u m g r a n d e a d r o e m r o d a
[ fl. 531v. ] com quase meia parede, que o cerca e coberto por cima; tem duas / / portas,
principal e "travessa; está e m b o m t a m a n h o . T e m três altares — são todos douros e
o c h ã o azul —, t e m m u i t o b o a sacristia, bons o r n a m e n t o s , p o r q u e a " i r m a n d a d e é
m u i t o rica. T e m u m grandioso hospital, e é b e m servido, p o r ter m u i t o s escravos
dele e c o m boas r e n d a s , p o r ter várias fazendas suas p o r ter tido m u i t a s "deixas.
T e m u m a b o a fazenda de g a d o p a r a d a r leite e vitelos p a r a os enfermos.
Seguindo a r u a c h a m a d a a d a Praia, p o u c a distância adiante, o n d e fica a dita
Misericórdia (entendendo, p o r é m , q u e esta rua é q u a s e toda d e casas de sobrado)
fica a igreja e c o n v e n t o d e Nossa S e n h o r a das M e r c ê s , e m u m g r a n d e largo ou
p r a ç a , d o n d e saem cinco ruas, q u e u m a delas é a d a Misericórdia. T e m este con-
vento u m a g r a n d e igreja, sem e m b a r g o q u e j á está a l g u m t a n t o velha. C o n t u d o ,
t e m cinco altares, e o m o r é de b o a "talha, n o v a e d e n o v o d o u r a d o , os o r n a m e n t o s
são preciosos e tão belos q u e sendo a igreja antiga (porém m u i t o alegre) fica muito
mais c o m os tais seus o r n a m e n t o s e boas peças d e prata; a sacristia é coisa estupen-
d a pelos b o n s q u a d r o s q u e t e m e bons o r n a m e n t o s q u e nela se v ê e m , c o m o tam-
b é m u m b o m altar, q u e t e m b e l a m e n t e o r n a d o , e teto m a r a v i l h o s a m e n t e p i n t a d o ;
t e m m a i s b o n s "claustros, t o d o s d e arcos, q u e c a e m p a r a u m j a r d i m , e n o s tais
claustros ou c o r r e d o r e s dele estão as celas dos religiosos leigos; t e m t a m b é m nos
tais [claustros] u m a "capela muito devota e b e m o r n a d a o n d e se v e n e r a a i m a g e m
d o S e n h o r dos Passos, e é d e u m religioso leigo. E n q u a n t o aos d o r m i t ó r i o s d e
c i m a , são q u a t r o e m q u a d r o e só d e u m a p a r t e t e m celas e d a o u t r a t u d o são
v a r a n d a s , t a m b é m e m q u a d r o p a r a o tal j a r d i m . F o r a destes t e m u m d e g r a n d e
altura e largueza e c o m grandes e espaçosas v a r a n d a s q u e c a e m p a r a a cerca. Este tal
dormitório sendo b a s t a n t e m e n t e c o m p r i d o consta só d e três celas ou salas — a pri-
m e i r a é do "comissário-geral, a segunda do " c o m e n d a d o r , a terceira do "secretário
959

d o *comissário-geral — e u m a g r a n d e casa do "capítulo, a qual é e m seu t a m a n h o


g r a n d e , toda p o r cima p i n t a d a e d o u r a d a , t e m seis janelas rasgadas, bons t a m b o r e -
tes a o r e d o r das paredes e u m g r a n d e "bofete n o meio, bons q u a d r o s nas p a r e d e s e
u m arquivo de belas madeiras o n d e estão os papéis de importância d a c o m u n i d a -
de, e logo / / s e segue a magnífica cela do "comissário-geral, o qual é o "prelado [ fl. 532 ]
m a i o r daquela "religião, o qual v e m feito ou n o m e a d o todos os três anos de Castela,
p o r lá terem o seu "geral e n ã o terem conventos e m Lisboa, n e m e m p a r t e mais d o
R e i n o mais q u e n o P a r á e M a r a n h ã o . O s mais p r e l a d o s conventuais fazem-nos
eles, d e cujo ["capítulo?] é presidente o tal comissário-geral. T e m este u m a g r a n d e
cela c o m b o a sala, p o r estar j u n t a m e n t e b e m o r n a d a , t e m duas alcovas c o m b o a s
cortinas nas grandes portas, q u e têm boas despensas e c o m bons sótãos p o r cima,
p o r r a z ã o de todas as "casas serem pintadas e b e m forradas por cima. Segue-se a d o
" c o m e n d a d o r , q u e é o p r e l a d o d a casa, e é esta d a m e s m a sorte. E depois a d o
"secretário, q u e é p o u c o somenos. Desce u m a g r a n d e escada deste tal dormitório
p a r a os outros, e m razão d e ser muito alto.

D i z e m ao q u e q u e r e m os tais religiosos fazer convento novo e q u e todo h á d e


ficar n a q u e l a altura, p o r é m t a r d e ou n u n c a será e m r a z ã o do seu m a u g o v e r n o , e
t o d o s os p r e l a d o s s a e m ricos e n ã o sei isto o q u e é, p o i s eles p o s s u e m a q u e l a
grandiosa fazenda q u e atrás fica dito, c h a m a d a Val-de-Cães, q u e r e n d e q u a n t i d a -
des de dinheiro, p o r é m t a m b é m " a b a d e q u e vai p a r a ela t a m b é m n ã o sai p o b r e .
T e m mais o u t r a a r r e d a d a da c i d a d e , coisa de u m a "légua, a q u e c h a m a m
T u c u n d u b a ; é " e n g e n h o real d e fazer a ç ú c a r e "aguardente de c a n a , coisa super-
lativa, p o r q u e a restilam b e m , e t a m b é m d á m u i t a farinha e legumes. T e m p a r a
c i m a de cem escravos e é b a s t a n t e m e n t e r e n d o s a , p o r estar a o p é d a cidade e ir-se
lá p o r t e r r a . T e m m a i s o u t r a n o rio d a G u a m á , d e q u e a seu t e m p o f a r e m o s
m e n ç ã o . E esta tal d e "caçoais e muitas farinhas e boas q u e q u a s e delas se sustenta
a c o m u n i d a d e t o d o o a n o . T e m mais [outra] n a célebre ilha d o M a r a j ó , d e q u e
t a m b é m falaremos l a r g a m e n t e q u a n d o nela falarmos. P o r é m , t ê m os tais religio-
sos nesta ilha m a i s d e sete fazendas de g a d o , e é c o m t a n t a a b u n d â n c i a c o m q u e
esta ilha cria o g a d o q u e c a d a fazenda t e m três vaqueiros b r a n c o s e quinze e vinte
negros, que todos estes c o n t i n u a m e n t e / / a n d a m n o c a m p o a v a q u e j a r p a r a d a r [ fl. 532v. ]
v e n c i m e n t o à m u i t a criação, q u e p o r causa dos pastos serem m u i t o viçosos e b o n s
m u l t i p l i c a m as tais fazendas e m tal m a n e i r a q u e s e m p r e estão cheias d e gados
bravos, e a n d a m p o r esta r a z ã o muitos h o m e n s vivendo d e os m a t a r e m e tirarem-
lhes os c o u r o s p a r a v e n d e r e m , e os d o n o s das fazendas os n ã o i m p e d e m , pois é
beneficio g r a n d e p a r a q u a l q u e r fazenda de g a d o o matar-se-lhe o g a d o b r a v o .

Isto suposto, t ê m os religiosos as sobreditas fazendas d e q u e lhes resulta o u


eles r e m a t a r e m s e m p r e os açougues, p o r mais b a r a t o q u e seja, ou lhes p o n h a m a
c a r n e , q u e c o s t u m a d a m e n t e é a cinco "réis a "libra. V ã o três c a n o a s o u a n d a m
c o n t i n u a m e n t e a i r e m e a v i r e m d a tal ilha e dela p a r a a c i d a d e a c a r r e g a r e m
gados p a r a efeito d e p r o v e r e m os açougues. São estas canoas m u i t o g r a n d e s , c o m
960

d u a s velas r e d o n d a s , e u m a delas é u m formoso iate q u e a r m o u u m religioso, p o r


ser m u i t o curioso e nele a n d a v a , p o r ser u m dos administradores das tais fazendas.
T r a z c a d a c a n o a destas oitenta bois e suas vitelas, q u a n d o p o u c o vinte, digo, trinta
e dois "tapuias, quinze destes d e c a d a b a n d a , p a r a r e m a r e m q u a n d o n ã o h á ven-
to, e os dois são os pilotos q u e g o v e r n a m . O p a d r e ou o h o m e m b r a n c o q u e a n d a
n e l a s e m p r e t r a z seu " c o l o m i m , p a r a lhe d a r fogo a o c a c h i m b o . E a q u e a n d a
a r m a d a a iate carrega até cento e tantos. G a s t a m estas q u a n d o b o a v i a g e m fazem
vinte e q u a t r o h o r a s até q u a r e n t a e oito, p o r q u e p a s s a m u m a b a í a a q u e c h a m a m
do M a r a j ó , m u i t o g r a n d e , q u e t e m sete c o r r e n t e z a s , e só depois q u e se está n o
meio é q u e a p e n a s se avista a terra d a o u t r a p a r t e , c o m o q u e m [avista] uns m a n -
jericões. E a carne m u i t o gostosa e sempre g o r d a , e m r a z ã o d e vir o g a d o do seu
[ fl. 533 ] p a s t o s e m m a l e s a l g u n s , p o i s n ã o v ã o p e l o seu p é e vir / / a q u e l e q u a s e n e c e s -
sário.

E, finalmente, têm outras várias d e m e n o s n o m e , p o r é m s e m p r e d ã o m a n t i -


;

m e n t o s p a r a gasto d a c o m u n i d a d e . M a s q u e h á d e ser se todos os "prelados m a i -


ores, antes d e a c a b a r e m os três anos, v ã o p a r a o R e i n o dizendo q u e v ã o a d e p e n -
dências d a c o m u n i d a d e e mais conventos e q u a n d o q u e lá c h e g a m c o m p r a m quintas
e a n d a m e m "seges? P o r é m , o q u e serviu até 1746 ficou sem n a d a , p o r q u e até o
q u e l h e tocava d a v a aos conventos mais p o b r e s q u a n d o a n d a v a e m "visita, o q u e
b e m e x p e r i m e n t o u o c o n v e n t o d o M a r a n h ã o e m os c o r t i n a d o s d e d a m a s c o q u e
lhe d e u p a r a a igreja (este é o p a d r e mestre frei M a n u e l Alves, mestre "jubilado e
" a p r e s e n t a d o e " e x a m i n a d o r sinodal e m t o d o o b i s p a d o d o M a r a n h ã o e do P a r á ) .
Fica o tal c o n v e n t o ao p é do m a r , pois lhe está b a t e n d o n o m u r o d a cerca. T e m
u m a g r a n d e p o r t a p a r a a p r a i a a q u e c h a m a m do " c a r r o , p o r é m e u s e m p r e lhe
c h a m e i p o r t a de c a n o a s p o r duas razões: u m a p o r q u e n a terra n ã o h á carros e a
o u t r a , a i n d a q u e os houvesse e r a impossível subir as g r a n d e s escadas q u e t e m
sobre ou p a r a o m a r . V ê m a ela d e s e m b a r c a r os p e s c a d o r e s c a n o a s q u e t r a z e m
lenhas e os m a n t i m e n t o s e, finalmente, t u d o , pois são os cavalos e carros d a terra,
pois t o d o o seu m a n e i o é p o r m a r , p o r ser toda c o r t a d a d e rios.

N o fim d o c o n v e n t o , saído sobre o m a r ou a r r e d a d o d a t e r r a , t e m u m forte


b e m fortalecido pelas boas m u r a l h a s q u e t e m e c o m o t a m b é m pelas boas e g r a n -
des p e ç a s de artilharia. T e m s e m p r e soldados d e sentinela, t e m "capitão, "sargen-
to e "cabo d e e s q u a d r a , t e m b o n s quartéis d e n t r o e p r a ç a d e a r m a s , t e m "casas
p a r a prisões, t e m p o n t e levadiça p a r a a terra, feita d e m a d e i r a c o m suas cadeias de
ferro p a r a se l e v a n t a r , se for p r e c i s o . C h a m a - s e o forte d e N o s s a S e n h o r a das
M e r c ê s , q u e é a sua defensora e orago. Serve este d e m u i t o prejuízo a o convento
q u a n d o atira, pelo fazer t r e m e r e ter j á alguns alicerces j á a r r u i n a d o s , p o r r a z ã o de
[ fl. 533v. ] lhos terem / / m i n a d o os ratos, d e q u e é m u i t o a b u n d a n t e o tal c o n v e n t o , c o m o
t a m b é m as mais casas e conventos, p o r ser, s u p o n h o eu, o [clima?] "treito a isso. E
p a r a q u e n ã o m e esqueça t a m b é m , é a t e r r a do P a r á m u i t o a b u n d a n t e de b a r a t a s ,
e m b a s t a n t e q u a n t i d a d e . A igreja deste convento t e m u m a só torre, p o r n ã o t e r e m
961

a c a b a d o a outra, pois chegou só até m e i o , p o r é m a a c a b a d a t e m grandiosos sinos.


T e m mais este c o n v e n t o u m religioso leigo a q u e m c h a m a m o R a n h e t a , o C a b e ç a
d e C a c h i m b o , o C o c o , o B a b a e, finalmente, u m calendário de alcunhas. Só olhar
p a r a ele m e t e fastio..
Isto suposto, vai c o n t i n u a n d o a r u a d a Praia, q u e d a q u i e m d i a n t e t ê m todas
as casas a fronteira p a r a a praia, sem casas defronte mais q u e s o m e n t e u m m u r o
b a i x o , b e m fortalecido, e m q u e bate o m a r q u a n d o está a m a r é cheia, c o m seus
assentos p a r a q u e m se quiser assentar a t o m a r o fresco, e é esta r u a c o m p o s t a d e
belas m o r a d a s d e casas p o r serem seus donos h o m e n s de muitos [cabedais], c o m o
Agostinho d e tal, q u e t e m algumas sete fazendas e mais d e trezentos escravos d e
t o d a a casta, q u e até três m o u r a s m a n d o u vir d o R e i n o p a r a a c o m p a n h a r e m a
m u l h e r , e a n d a m estas tais vestidas e m c o r p o , p o r n ã o u s a r e m d e m a n t o , e s e m p r e
todas três de u m a cor, pois q u a n d o u m a m u d a todas mais m u d a m . ( C h a m a v a m -
lhes os T r ê s Inimigos d a Alma.) E p a s s a n d o outras casas t a m b é m ricas, ficam as d o
c a p i t ã o M a n u e l d e G ó i s , coisa e s t u p e n d a ; são m u i t o g r a n d e s , b e m p i n t a d a s e
d o u r a d a s , b o a s j a n e l a s , as salas s e m p r e c o m c o r t i n a d o s d e d a m a s c o c a r m e s i m ,
sanefas de v e l u d o c o m franjões d e o u r o , todas r o d e a d a s d e c a d e i r a s d o m e s m o
v e l u d o e franjas, b o a s p a p e l e i r a s m a r c h e t a d a s e c o m f e c h a d u r a s d e p r a t a ; t e m
mais u m g r a n d e oratório o n d e t e m missa todos os dias, p o r ele estar j á trôpego das
p e r n a s e quase tísico. T e m seus escravos e d u a s fazendas d e n ã o m u i t o r e n d i m e n -
to. A r a z ã o foi p o r se tratar c o m os "generais e "ouvidores, q u e são sanguessugas
q u e s e m p r e / / c h u p a m . P o r é m , s o b r e t u d o teve este h o m e m u m filho e s t u d a n t e [fl. 5 3 4 ]
q u e foi a C o i m b r a a formar-se, e tão b e m - s u c e d i d o q u e d e n t r o e m três anos o fez,
coisa q u e a d m i r o u a toda a terra. Foi m u i t o m a l - a f o r t u n a d o c o m os filhos.

F i c a m outras várias e boas casas até c h e g a r o palácio do s e n h o r "bispo. C h a -


m a - s é p a l á c i o e m r a z ã o à p e s s o a q u e e m si t e m , p o r q u e o v e r d a d e i r o p a l á c i o
a i n d a n ã o está a c a b a d o e é. a o p é d a sé, e este e m q u e assiste a m e t a d e é dos
p a d r e s d a C o m p a n h i a e a o u t r a é de u m velho m u i t o rico, q u e p o r sua m o r t e lhos
h á de deixar e t u d o mais, pois a m u l h e r t a m b é m assim o fez. P a g a a F a z e n d a R e a l
todos os anos d u z e n t o s mil "réis d e aluguel. T e m este seis janelas n a frente, q u e
c a e m p r o m a r , rasgadas e c o m b e m t o r n e a d a s grades, u m a g r a n d e p o r t a e m b a i x o
c o m suas j a n e l a s a o p é , duas de c a d a b a n d a , q u e servem de d a r luz aos escritórios
d a C â m a r a e " b a n c a p a r a a p a r t e d a "travessa, pois é d e c a n t o virado; t e m outras
seis janelas d a m e s m a sorte e o u t r a p o r t a . T e m e m cima sala vaga. P a r a u m a p a r t e
fica o o r a t ó r i o , c o m q u a t r o j a n e l a s p a r a a r u a , p o r ficar n o c a n t o ; t e m este u m
o r n a d o o r a t ó r i o , digo, altar, c o m b o n s castiçais de p r a t a à * r o m a n a , q u a t r o relicá-
rios e belas "talhas c o m b o n s vidros, cruz d e p r a t a . N ã o t e m i m a g e n s d e vulto, p o r
à r o m a n a ; tem, sim, u m majestoso painel c o m b o a s cortinas, t a n t o nele c o m o nas
p o r t a s e j a n e l a s , c o m o t a m b é m u m g r a n d e "dossel p a r a o s e n h o r b i s p o , b o n s
"bofetes e o r n a m e n t o s d e t o d a a v a r i e d a d e e c o m distinção. N e n h u m p a s s a d e
"melânia a b a i x o ; t e m t u d o c o m m u i t a g r a n d e z a , e t u d o m a n d o u S u a M a j e s t a d e
962

s e p a r a d o p a r a o "prelado, fora os seus "pontificais q u e t e m n a sé, q u e isto é p a r a


o seu c o m u m . T e m mais a sala das visitas; esta o c u p a três janelas q u e c a e m p a r a o
m a r , está t o d a c e r c a d a d e cadeiras d e d a m a s c o , as portas e j a n e l a s c o m cortinas,
dois espelhos g r a n d e s e n t r e as janelas, defronte dos tais, [na] p a r e d e d e trás, está
[ fl. 534v. ] u m magnífico "dossel de d a m a s c o c a r m e s i m , debaixo / / do q u a l está u m painel
c o m o retrato d e nosso m o n a r c a , c o m o t a m b é m u m "bofete c o b e r t o c o m u m p a n o
d e d a m a s c o , e e m c i m a dele u m cofre q u a d r a d o , forrado de v e l u d o c a r m e s i m e
m a r c h e t a d o de p r a t a c o m sua cruz e m c i m a do m e s m o , e d e n t r o está cheio d e
preciosas relíquias q u e S u a Majestade m a n d o u a o s e n h o r "bispo e t e m repartido
m u i t a s pelos conventos e mais igrejas; t e m mais u m b o m relógio d e p a r e d e , e é
b e m p i n t a d a p o r c i m a a dita sala. Segue-se outra, p o r é m mais p e q u e n a ; t e m duas
j a n e l a s c o m cortinas, t a n t o nelas c o m o nas p o r t a s . N e s t a está a "livraria d e S u a
Excelência; t e m seu bofete c o m seu "coxim de d a m a s c o — e m c i m a o s e n h o r se
encosta q u a n d o lê —, a o p é do q u a l está u m a estante e m q u e d e s c a n s a m os livros;
as cadeiras desta são de p a l h i n h a e as guarnições " a c h a r o a d a s . E n t r a n d o p a r a o
interior desta está u m a do m e s m o t a m a n h o , o n d e está u m g r a n d e leito c o m a r m a -
ção d e d a m a s c o , b o a colcha; serve este p a r a o t e m p o frio. E m o interior d a sala
das visitas são duas, u m a é o n d e estão os "vestidos, caixões e b a ú s d e r o u p a d e
S u a Excelência e o u t r a é a m e l h o r "casa q u e t e m o tal palácio, p o r ser a despensa
do precioso. P o r trás do oratório fica u m a g r a n d e sala o n d e estão os "pontificais
d a sé e n a o u t r a está o u t r o leito c o m a r m a ç ã o d o q u e c h a m a m "mosqueiro, q u e
[é] p a r a o t e m p o d o calor, e deste usava m a i s p e l a terra ser c o n t i n u a m e n t e cálida.
T e m vários e bastantes quartos p a r a a "família; a sala vaga t e m bons "reposteiros
e t e m u m dossel d e p a n o v e r d e c o m franjas amarelas, e nele m e s m o n o m e i o t e m
as a r m a s do s e n h o r bispo. As c a r r u a g e n s são: u m a "cadeira t o d a d o u r a d a e forra-
d a p o r d e n t r o d e a z u l , e c a r r e g a m - n a dois n e g r o s e u m m a i s leva u m g r a n d e
c h a p é u d e sol de d a m a s c o azul, p a r a q u e o sol n ã o dê nas vidraças; a o u t r a é u m a

[ fl. 535 ] "serpentina. D á Sua / / Majestade trinta índios forros todos os m e s e s p a r a serviço
do s e n h o r bispo, c o m obrigação d e lhe d a r duas "varas d e p a n o todos os meses,
q u e é b e m servido e livra-se. d e c o r r e r risco a escravo.
T e m ò s e n h o r bispo de " c ô n g r u a n a terra três mil "cruzados e n o R e i n o , q u e
vai d a B a h i a , q u i n h e n t o s mil "réis; t e m mais setecentas tainhas secas, q u e é o "pão
d e m u n i ç ã o , e as mais benesses q u e lhe t o c a m , p r i n c i p a l m e n t e o q u e lhe vai das
m i n a s d a N a t i v i d a d e , Carlos M a r i n h o , São Félix e M a t o Grosso, q u e t u d o p e r t e n -
ce a o P a r á .
E m esta travessa a c a b a a r u a d a Praia, p o r q u e o q u e se segue p a r a d i a n t e são
as casas das c a n o a s d e S u a M a j e s t a d e , s o m e n t e cobertas p o r cima, e debaixo estão
as ditas canoas, q u a n d o n ã o a n d a m e m viagem, e é e m r a z ã o d e lhe n ã o c h o v e r
n e m lhe d a r o sol e n e m o m a r as "estruir q u a n d o n ã o é necessário. T e m s e m p r e
dois soldados de g u a r d a . A r u a o n d e sai a sobredita travessa d o palácio é a r u a e m
q u e a t r á s falamos. Passa p e l o a d r o d a M i s e r i c ó r d i a , é esta m u i t o l a r g a e b e m
963

assente, e t o d a s m a i s o são; está b e m c h e i a d e casas, t e m fora disto u m a b o a


"capela, q u e é o terceiro passo d a procissão dos Passos, e é coisa b o a p e l a m a n d a -
r e m fazer os religiosos do C a r m o e m "despique q u e tiveram c o m os das M e r c ê s ,
pois estes o a r m a v a m à p o r t a da sua igreja.
Vai continuando esta rua até defronte d a casa das canoas, e aí t e m u m a p o n t e
muito boa, e m razão de u m riacho que atravessa a cidade. A p o n t e é de p e d r a e até
aqui chega o bairro d a C a m p i n h a e freguesia d e Nossa S e n h o r a do Rosário, a q u e
agora iremos. T e m esta r u a , a q u e c h a m a m a Direita, várias travessas; desde esta
p o n t e até defronte do convento de religiosos das Mercês, quatro travessas, q u e v ã o
sair e m u m a rua muito direita, e lha c h a m a m a rua Direita do Palácio. T e m boas casas
e quase todas d e u m feitio. Esta sai c o m outras tantas travessas p a r a outra r u a q u e lhe
c h a m a m a do C a g ã o , o n o m e derivado d a a l c u n h a d e u m h o m e m q u e ali m o r o u
muitos anos. Desta, / / p a s s a m várias travessas p a r a outra que j á p o r ali c h a m a m o [ fl. 535v. ]
Rosário; as casas são mais limitadas, p o r é m m o r a p o r aí b o a gente. Defronte dos
religiosos das Mercês saem três ruas muito compridas que vão ter à igreja d e Nossa
Senhora do Rosário, e outras várias q u e v ã o d a Misericórdia. Até t e m muitas ruas este
bairro, ê muito alegre e m o r a muita gente b o a nele, c o m o t a m b é m quase toda a gente
d a sé, e a i n d a q u e lhe fica alguma coisa distante lhe n ã o causa detrimento, ainda e m
tempo de chuva, e mais é a cidade toda, sem ser calçada, p o r é m são as ruas de areia
grossa, q u e assim c o m o acaba de chover escorre a água e fica c o m o dantes e n e m fica
l a m a q u e se apegue aos sapatos. C r i a m estas seu capim rasteiro, p o r é m é naquelas
partes p o r o n d e n ã o a n d a gente.
A freguesia deste b a i r r o , c o m o j á disse, é Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , igreja
q u e é dos pretos. D e r a m estes u m altar aos b r a n c o s p a r a as suas funções e t e r e m o
s a c r a m e n t o e n q u a n t o n ã o faziam igreja n o v a . E esta tal m u i t o b o n i t a e m u i t o
alegre, está e m b o m sítio e c o m m u i t a largueza d e a d r o e m r o d a e b a s t a n t e g r a n -
de, t e m três altares muito b e m ornados, b o a sacristia e "casas de " i r m a n d a d e . Fa-
zem os irmãos do Santíssimo todas as solenidades do a n o c o m m u i t a perfeição; até
fazem domingas segundas d o mês, p o r se n ã o e n c o n t r a r e m c o m as terceiras d a sé;
fazem todas as domingas da Q u a r e s m a c o m missa c a n t a d a e sermão e t o d a a S e m a -
n a Santa. T o d a s funções lhes fazem os "cónegos e "capelães d a sé, n ã o todos, m a s
sim os precisos, de q u e lhes resultam os b o n s p a g a m e n t o s q u e lhes fazem os irmãos,
p o r ser logo à vista. T e m muito b o n s sinos e tudo o mais necessário c o m a b u n d â n c i a
p a r a o culto divino. Desta igreja p a r a adiante, ou correndo p a r a a p a r t e d o centro o u
m a t o , fica mais u m a rua.

Caderno segundo [ fl. 536 ]

Segue-se o u t r a r u a até o convento dos p a d r e s d e S ã o J o s é , a q u e v u l g a r m e n t e


c h a m a m Piedosos, q u e é "província q u e n o R e i n o h á n o Alentejo. O n d e está o
seu c o n v e n t o é lugar m u i t o aprazível, m u i t o galante, p o r ter u m a b o a c a m p i n a ,
964

o n d e v ã o espairecer os senhores "bispos e "governadores d a q u e l a terra; t e m b o a


cerca c o m as variedades d e fruta q u e no *país há.
E seguindo a mais c i d a d e , p a s s a d a a limitada p o n t e q u e n o m e i o t e m , fica o
colégio dos p a d r e s d a C o m p a n h i a e a sé defronte. C o m o j á se disse, saem desta
p r a ç a várias ruas. A principal é u m a larga r u a a q u e c h a m a m a r u a do N o r t e . E m
o m e i o dela fica u m a g r a n d e "capela, feita a o m o d e r n o c o m três altares m u i t o
b e m o r n a d o s e t o d a a " t a l h a d o u r a d a , e t e m b o a s a r m a ç õ e s , e a esta c h a m a m
N o s s a S e n h o r a d a S a ú d e , p o r ter u m a i m a g e m m u i t o formosa n o a l t a r - m o r e é
m u i t o milagrosa.
Esta capela fica c o m o "frontispício p a r a o c o n v e n t o do C a r m o , q u e é igreja
maravilhosa, pois a fizeram d e novo. T e m cinco altares das grades p a r a d e n t r o ; o
coro dos religiosos é no *altar-mor c o m cadeiras b e m instaladas e todos os altares
d o u r a d o s ; a igreja toda de "cimalhas o n d e se p õ e m grandes sanefas e cortinas d e
veludo pelas festas; t e m p o r toda a igreja muitas *placas d e três l u m e s , feitas c o m
t o d a a h a b i l i d a d e ; a sacristia é b a s t a n t e m e n t e g r a n d e , c o m "caixões d e u m a e
o u t r a p a r t e de p a u a m a r e l o , e m o l d u r a d o d e p a u p r e t o , c o m u m g r a n d e altar o n d e
está u m a g r a n d e e milagrosa i m a g e m d e Nosso S e n h o r a m a r r a d o à c o l u n a , e d e
c a d a b a n d a d o d i t o a l t a r estão p o r m o d o d e dois a r m á r i o s , q u e c o n s t a m das
gavetinhas dos "amitos dos religiosos, pois e m c a d a gaveta está o n o m e d e c a d a
u m ; n a p o r t a r i a , q u e está feita c o m perfeição, t e m u m altar majestoso c o m u m a
d e v o t a i m a g e m d e N o s s a S e n h o r a das Sete D o r e s . O s d o r m i t ó r i o s , q u e n o v o s
[ fl. 536v. ] estão a c a b a n d o , estão c o m singular perfeição, largos corredores, espaçosas celas / /
b e m " a c i m a l h a d a s e c o m b o a extensão, a c e r c a m u i t o g r a n d e , b o a s aulas, t e m
g r a n d e o r d e m terceira, e m u i t o rica, e t e m seu altar, q u e fica n o m e i o d a igreja,
fundo p a r a d e n t r o , a o m o d o d e capela, e t e m ricos o r n a m e n t o s , e a sua procissão
f a z e m - n a no D o m i n g o d e R a m o s .

Depois d e passado este convento vai c o n t i n u a n d o a rua, a i n d a q u e n ã o m u i -


to p o v o a d a , e m r a z ã o d e ter seus alagadiços. Fica n o fim dela o c o n v e n t o dos
religiosos da C o n c e i ç ã o , q u e t a m b é m são c a p u c h o s , p o r é m é "província à p a r t e .
É c o n v e n t o limitado, p o r t e r e m o "principal no M a r a n h ã o . Assistem nele q u a t r o
ou c i n c o religiosos, e os m a i s estão p o r as aldeias a d m i n i s t r a n d o a d o u t r i n a e
s a c r a m e n t o s aos índios d e q u e estão entregues,
O colégio desta c i d a d e é g r a n d i o s o , t e m três classes — u m a d e G r a m á t i c a ,
o u t r a de M o r a l e o u t r a d e Filosofia. A igreja é g r a n d i o s a : t e m c i n c o altares n o
"cruzeiro e cinco d e c a d a b a n d a pelo c o r p o d a m e s m a , a b a i x o ; a sacristía, toda
e m o l d u r a d a de tartaruga, as p i n t u r a s e d o u r a d o e a r m a ç õ e s d a dita; é coisa gran-
de. O s dormitórios estavam a c a b a n d o , q u e são d e dois a n d a r e s , a l é m dos baixos
c o m g r a n d e s j a n e l a s , e é m u i t o rico este c o n v e n t o , e é o n d e estão os religiosos
velhos e " a p r e s e n t a d o s .
Defronte a sé lhe fica, a este convento, q u e é igreja magnífica: t e m duas torres
c o m g r a n d e s sinos, q u e são seis, u m deles e o m a i o r é o d o relógio; t e m c i n c o
965

altares p o r c a d a b a n d a , os oito p e r t e n c e m à sé, os dois são f u n d o s , e u m é d o


S a c r a m e n t o e outro é d e Nossa S e n h o r a d e Belém, cuja invocação é d a cidade e
sua p a d r o e i r a . O s altares, c a d a u m t e m suas grades q u e se fecham; estes n ã o t ê m
imagens d e vulto, c o n s t a m só d e painéis c o m seu *dosseí, u m a l â m p a d a dos casti-
çais e u m a c r u z à " r o m a n a e dois "tocheiros g r a n d e s e m c a d a c a n t o das g r a d e s ,
c a d a u m c o m seu ' b r a n d ã o , o que t u d o se acende a c a b a d o o p r i m e i r o coro, e está
aceso tudo até principiar o segundo coro. O coro o n d e se c a n t a é d o t a m a n h o o u
m a i o r / / q u e a m e s m a igreja; t e m uns "cancelos muito altos q u e se fecham q u a n d o [ fl. 537 ]
é necessário; e m cima d a "cimalha deles t e m u m a cruz c o m seu Cristo e seis casti-
çais grandes, q u e as velas q u e se lhes p õ e m são d e duas "libras, e estas se a c e n d e m
q u a n d o o s e n h o r "bispo vai à sé. D o s *cancelos p a r a d e n t r o segue-se a b a n c a d a
dos " m e i o - c ô n e g o s , a q u e c h a m a m "beneficiados; estão estas c o b e r t a s d e p a n o s
verdes e nos assentos sua "moscovia, e m r a z ã o do calor. O s "capelães ficam a o p é
d a estante d a n d o as costas aos tais, e m seus b a n c o s c o m l i m i t a d o encosto e s e m
degrau algum, somente u m a t á b u a o n d e p õ e m os pés, e m r a z ã o d e o coro ser de
ladrilho, e os b a n c o s t a m b é m são forrados d e p a n o s verdes. A estante fica p r ó x i m a
a eles, e os reverendos "cónegos s o b e m dois degraus p a r a a sua b a n c a d a . O t r o n o
do senhor bispo t e m q u a t r o degraus além dos dois p e q u e n o s , e todos forrados d e
" b a e t a v e r m e l h a . O " a l t a r - m o r t a m b é m é à r o m a n a , de. painel, e m o q u a l está
p i n t a d a Nossa S e n h o r a d a G r a ç a , e este t e m seu majestoso dossel 6 três l â m p a d a s à
r o m a n a , cruz e seis castiçais de p r a t a , e n a m e s m a b a n q u e t a duas imagens, d e são
P e d r o e são P a u l o , t a m b é m d e p r a t a . [A] "casa de "cabido, coisa estupenda, toda
d o u r a d a pelo teto, c o m as a r m a s reais no m e s m o , c o m dois painéis h a cabeceira,
q u e u m consta d o senhor bispo fundador e o u t r a do s u m o pontífice q u e lhe m a n -
d o u as " b u l a s ; é t o d o f o r r a d o pelas p a r e d e s d e p a n o d e " a r r a s e n o m e i o u m
c o m p r i d o "bofete c o b e r t o de damasco c o m franjas d e o u r o , e m c i m a do qual está
u m a g r a n d e escrivaninha de p r a t a , e o livro dos estatutos, e o arquivo o n d e se vota,
e o livro dos assentos d o m u i t o dinheiro q u e se d á a j u r o . T e m casa o n d e estão
muitos "tocheiros, a "essa, q u e é coisa g r a n d e , m u i t a estante e variedades d e coisas.
T e m o u t r a casa o n d e se g u a r d a a "cera, v i n h o e "alcatifas. T e m duas sacristias: a
mais p e q u e n a é só p a r a os cónegos d a "missa do dia o u / / conventual, e esta t e m [ fl. 537v. ]
p o r t a p a r a o "supedáneo do altar-mor; a o u t r a é m u i t o g r a n d e , t e m seu altar m u i t o
b o m o n d e se diz missa, "caixões e s t u p e n d o s , b o n s espelhos e b o a s gavetas p a r a
"amitos. Abaixo d a sacristia está outra casa o n d e está a q u e l a g r a n d e q u a n t i d a d e de
"frontais, e aí t a m b é m os a r m á r i o s dos reverendos cónegos, q u e é coisa e s t u p e n d a
d e ver. O s "pontificais, o r n a m e n t o s e p r a t a q u e esta catedral t e m só vendo-se é q u e
satisfará a q u e m dizendo-se-lhe o n ã o acredita. C o n s t a esta sé d e q u a t r o "dignida-
des — "arcediago, "arcipreste, "chantre, "mestre-esçola —, dez cónegos presbíteros,
seis "diáconos e q u a t r o "subdiáconos, dezesseis "beneficiados, vinte "capelães, dois
"mestres de cerimônias, u m mestre d e c a n t o c h ã o , outro d e latim, dois organistas,
dois "sacristães, u m ^tesoureiro dos pontificais c o m seu "ajudante, u m "porteiro d a
966

massa,, três " g u a r d a s ou "enxota-cães, u m sineiro, u m " a r m a d o r , a


e t o d o s estes
c o m e m "côngrua d e Sua Majestade.
T e m m a i s esta cidade u m a igreja, a q u e c h a m a m do S a n t o Cristo, pela devo-
ta i m a g e m q u e nela está; é dos soldados e fica a o p é do Castelo.
T e m outra d e São J o ã o , q u e fica e m bairro muito alegre e faz sua p r a ç a muito
b o a . E m u m a das partes dela fica o magnífico "aljube q u e m a n d o u fazer o senhor
d o m frei G u i l h e r m e de São J o s é , c o m p a d e c e n d o - s e de os seus "clérigos andassem
p o r mãos de seculares e debaixo de suas chaves, sendo estes seus inimigos atuais.
Esta dita cidade terá n a freguesia d e Nossa S e n h o r a do R o s á r i o , p o u c o mais
ou m e n o s , mil e t a n t a s pessoas, e m r a z ã o d e q u e a l é m d a gente d a c i d a d e t e m
mais pelo rio abaixo coisa d e duas m a r é s os m o r a d o r e s q u e p o r ele m o r a m e suas
famílias e escravos. E a d a sé c h e g a r á a m u i t o p e r t o d e duas m i l , p o r ser mais
antiga e g r a n d e e ter m u i t a gente t a m b é m , a l é m d a cidade, pelo rio a c i m a , mora^
[ íl. 5 3 8 ] dores m u i t o ricos p o r serem senhores / / d e muitos "caçoais e " e n g e n h o s d e açú-
car e aguardentes de cana.
C o n t i n u a o rio p a r a cima d a cidade u m b o m espaço d e n t r o , n o q u a l t e m dois
"caldeirões m u i t o grandes q u e t ê m sorvertido m u i t a s e m b a r c a ç õ e s , e c o m elas a
gente, e ê necessário m u i t o sentido, pois o r e d e m o i n h o p u x a á g u a d e m u i t o l o n -
ge, e j u n t o c o m ela t u d o o q u e a p a n h a .
Fica logo adiante a b a í a d o M o r t i c u r a , q u e é m u i t o b r a v a . A l é m das m u i t a s
fazendas q u e e m r o d a t e m , está u m a q u e consta de. várias "fábricas, p o r ter m u i t o
ferreiro, carpinteiros, q u e estes além de fabricarem m a d e i r a s p a r a casas t a m b é m fa-
z e m g r a n d e s bofetes e papeleiras, finalmente t u d o q u e se lhes oferece, e p a n o s d e
a l g o d ã o finos p o r ter t a m b é m tecelões. T e m u m g r a n d e e n g e n h o d e a ç ú c a r e
"fábrica d e a l g o d ã o , digOj d e " a g u a r d e n t e s , t a n t o d e c a n a c o m o d e beiju e d e
laranja, e nisto se faz g r a n d e negócio pelas v e n d e r e m p a r a o sertão. T o d o s estes
"oficiais são uns mulatos, outros mestiços e outros m a m e l u c o s , e t a m b é m alguns
"tapuios j á crioulos, e estes todos escravos d o "vigário-geral. C o n s t a esta fazenda
de q u a t r o c e n t o s escravos. G o n t a q u e s e m p r e a n d a certa, p o r ser célebre, o sobredito
d o n o e m t o d a s as suas coisas. F i c a m as casas situadas e m u m alto c o m g r a n d e
v a r a n d a sobre o m a r ; é u m a g r a n d e [galeria?]: n a frontaria t e m dez j a n e l a s rasga-
das e sacadas, e p o r b a n d a seis; t e m seu [pomar] p o r m o d o de forte, saído a o m a r
c o m g r a n d e s "alegretes e neles t o d a a v a r i e d a d e d e flores e suas frutas do R e i n o ;
t e m u m a g r a n d e "capela b e m o r n a d a e, finalmente, é a o n d e os senhores "bispos
v ã o espairecer. D a cidade lá é a distância de m a r é e meia.
[ fl. 538v. ] D e s t a b a í a s a e m vários rios. U m deles é / / o c h a m a d o M o j u , largo b a s t a n t e .

N a s terras deste, p r i n c i p a l m e n t e nas m a r g e n s q u e t u d o são v a r g e n s , fabricam-se


c a n a v i a i s p a r a a ç ú c a r , e a s s i m q u a s e t o d a s as f a z e n d a s s ã o " e n g e n h o s . E

Também tem *mestre de capela.


967

b a s t a n t e m e n t e c o m p r i d o o tal rio e mais p o d i a estar p o v o a d o se n ã o fosse o m u i t o


"gentio q u e t e m p a r a as cabeceiras. T e m m u i t a s "capelas, e u m a delas serve d e
freguesia, e t e r á seis mil almas e n t r e b r a n c o s e escravos.
Sai o u t r o rio, a q u e c h a m a m o A c a r á , mais estreito, p o r é m m u i t o aprazível e
alegre, águas b o a s t a m b é m . A sua "fábrica t a m b é m são canaviais e "engenhos e as
terras m u i t o a b u n d a n t e s de m a n t i m e n t o s . T a m b é m é freguesia m u i t o b o a .
Sai o u t r o rio, a q u e c h a m a m I t a p e c u r u . Este é m u i t o estreito e t o d o cheio de
u m a s ervas q u e se tecem u m a s c o m as outras, e é necessário as c a n o a s t r a z e r e m
u m a s varas e n a p o n t a delas u n s ganchos, p o r m o d o de foice, p a r a i r e m c o r t a n d o
as tais ervas. As terras deste rio n ã o d ã o senão m a n t i m e n t o s , e esses poucos m u i t o
famintos, e m r a z ã o d e n ã o ter peixe.
Sai u m b r a ç o d o m a r m u i t o largo e alegre, t e m boas fazendas e "engenhos,
p r i n c i p a l m e n t e Os dos religiosos do C a r m o . D e s t e tal b r a ç o se a p a r t a m dois rios.
U m deles c h a m a - s e o G u a m á : n ã o é m u i t o largo, é tristonho; as fazendas deste
são "caçoais pelas terras serem boas e [os] h o m e n s m u i t o ricos; t a m b é m d ã o m u i -
tos m a n t i m e n t o s . A q u e l a s fazendas, t ê m m u i t a s capelas e b o a s , e u m a delas é a
freguesia, q u e é d e m u i t o r e n d i m e n t o . O tal rio t e m p o u c o peixe, e n o m e i o dele
u m a g r a n d e c a c h o e i r a q u e n a m a r é vazia n ã o p o d e passar c a n o a g r a n d e . O o u t r o
c h a m a - s e o C a p i m . Este é largo e alegre; t a m b é m nele se fabricam caçoais e m u i t o
café e t e m g r a n d e s olarias e d ã o muitos m a n t i m e n t o s e t a m b é m b a s t a n t e p e i x e .
/ / T a m b é m é freguesia d e muito r e n d i m e n t o . A igreja fica situada e m u m a f a m o - [ fl. 539 ]
sa fazenda d e u m h o m e m m u i t o rico, e a fez a s u a custa p r o c u r a n d o p a r a isso os
m e l h o r e s "oficiais e a o r n o u d e g r a n d e s e preciosas p e ç a s de p r a t a e ricos o r n a -
m e n t o s , muitos b o n s sinos e m as duas torres q u e t e m n a frontaria. N o s seus p a l á -
cios, n ã o falemos, q u e t e m obras neles q u e c a u s a m a d m i r a ç ã o . E solteiro, s e n h o r
d e oito fazendas m u i t o g r a n d e s , t e m mais d e setecentos escravos.
E m o rio c h a m a d o M o j u , de q u e j á falamos, depois d e três dias d e v i a g e m
p o r ele a c i m a fica, à p a r t e direita, u m b r a ç o m u i t o estreito, a q u e c h a m a m o
I g a r a p é - M i r i m , e deste se sai a o u t r o rio, mais largo, e dele se sai a u m a g r a n d e
b a í a , q u e se c h a m a o M a r a p a t á , m u i t o a b u n d a n t e d e peixe, e v ã o a ela m u i t o s
p e s c a d o r e s fazerem salgas. N e s t a fica u m a g r a n d e vila, a q u e c h a m a m o C a m e t á .
T e m u m c o n v e n t o dos religiosos de Nossa S e n h o r a das Mercês e a m a t r i z m u i t o
b o a , igreja b e m o r n a d a , t e m m a i s duas capelas, u m a d e S ã o G o n ç a l o , o u t r a d e
Nossa S e n h o r a d a P e n h a d e França, muito milagrosa, e todos os anos v ã o d a cidade
fazer-lhe grandes festas. T a m b é m tem mais outra, mais retirada d a vila d o Espírito
Santo, c o m g r a n d e " i r m a n d a d e , e todos os anos fazem i m p e r a d o r c o m muitas festas
no dia e nas "oitavas. A vila está b e m situada e [tem] boas casas. Esta igreja apresen-
ta-a o fidalgo A n t ô n i o d e A l b u q u e r q u e , e este é senhor d a tal vila e t a m b é m lhe p õ e
" c a p i t ã o - m o r e mais "oficiais.

D e p o i s , fica n o m e i o da tal b a í a u m a ilha q u e a faz dividir d e o u t r a , a q u e


c h a m a m a b a í a do Limoeiro. Esta é muito b r a v a , e m r a z ã o dos m u i t o s secos e ficar
968

m u i t o d e s a m p a r a d a . Â costa dela sai u m rio, n a b o c a d o qual está u m a famosa


[ fl. 539v, ] fazenda, e t e m u m a g r a n d e *capela feita / / c o m toda a perfeição e m u i t o m o d e r -
n a : t e m cinco altares o r n a d o s d e vários o r n a m e n t o s distribuídos pelas festas d o
a n o . Esta f a z e n d a consta d e "fábrica d e c a n a p a r a estilar a g u a r d e n t e , cuja saída
dela é o sertão, e t a m b é m , além dos muitos m a n t i m e n t o s q u e d á e de q u e é fértil,
t e m u m a g r a n d e m i n a de cal de n a t u r e z a q u e lhe dá m u i t o lucro.
Desta dita p a r a c i m a se segue o rio c h a m a d o das C a r r a n c a s , aprazível e delei-
toso, p o v o a d o de várias fazendas, e mais delas fabricam cacau, e é freguesia q u e
terá cinco mil almas d e c o m u n h ã o e três mil a i n d a s e m o serem. N o fim deste tal
rio t e m u m a fazenda do "capitão A n t ô n i o F u r t a d o , m u i t o g r a n d i o s a p o r este ser
s e n h o r d e m u i t o s escravos e ter nela " e n g e n h o de a ç ú c a r e d e a g u a r d e n t e — h o -
m e m m u i t o caritativo, p r i n c i p a l m e n t e c o m os h o m e n s q u e v ê m do sertão c o m as
várias doenças q u e este lhes p r o m e t e , tendo s e m p r e e m sua casa b o t i c a a d e q u a d a
a s e m e l h a n t e s queixas.
Vai-se seguindo outro rio, q u e p o u c a s m a r é s fica p r ó x i m o , e e m certa p a r t e
deste, e e m a mais estreita, s e m e m b a r g o o rio ser largo, a c o r r e n t e z a traz as c a n o a s
c o m sua violência a o p é d a m u r a l h a d a fortaleza. A esta tal se c h a m a a fortaleza do
G u r u p a . E esta u m a g r a n d e fortaleza, t e m c i n q ü e n t a e três p e ç a s d e artilharia,
q u a t r o guaritas, c e n t o e v i n t e soldados d e g u a r d a e mais "oficiais, * c a p i t ã o - m o r
p o s t o p o r S u a Majestade d e três e m três anos e pessoa d e distinção, q u e é segundo
lugar depois d e " g o v e r n a d o r .
T e m u m a vila p r ó x i m a à fortaleza, c o m sua igreja m a t r i z g r a n d i o s a pelo m a g n í -
fico d o t e m p l o e o r n a m e n t o s . T e r á m i l e q u i n h e n t a s almas, t i r a n d o os q u e n ã o são
d e c o m u n h ã o , p o r haver m u i t a "gentilidade e s e r e m rudes d e e n t e n d i m e n t o p a r a
a p r e e n d e r e m a d o u t r i n a cristã. N a dita vila t e m o c o n v e n t o dos religiosos p i e d o -
sos, d e q u e j á falamos e n q u a n t o n a c i d a d e , e nesta vila é o seu c o n v e n t o principal.
Assistem nele a c i m a de sessenta religiosos. Nesta fortaleza se p a g a m os "quintos a
[ fl. 540 ] Sua M a j e s t a d e , pois todas as canoas q u e p o r ali p a s s a m / / p a g a m : as q u e t r a z e m
cacau, cravo e salsaparrilha p a g a m de c a d a cinco "arrobas u m a e as q u e vão a o
negócio dos índios d e c a d a u m p a g a m seis mil "réis, p o r é m n o efeito d o cacau,
pois está posta a taxa de c a d a a r r o b a d e cacau valer n a terra três mil e seiscentos e
a r r o b a de cravo cinco mil e duzentos e a d e salsa seis mil e q u a t r o c e n t o s .
Neste rio q u e se segue c h a m a m o das T r o m b e t a s , largo b a s t a n t e m e n t e , m u i -
to a b u n d a n t e d e c a ç a e p e i x e . N e l e ficam as aldeias d o s religiosos piedosos d a
"província do Alentejo, e t e m d e z aldeias de "gentio doméstico, a m a i s principal
q u e e n t r e elas t e m é u m a c h a m a d a G u r u p a t u b a . E aldeia m u i t o p o p u l o s a , p o r ter
mil e seiscentas almas; o "principal é m u i t o p o d e r o s o , p o r sua gente ou vassalos
s e r e m m u i t o valentes. T e m nela o u t r o principal, seu súdito, q u e dele se valeu p o r
ser perseguido dos outros, e este ter p e q u e n o p o d e r b u s c o u o g r ê m i o d a Igreja é o
a m p a r o d o o u t r o . E m esta aldeia estão dois até q u a t r o p a d r e s e t e m nela b o m
"hospício e igreja. O feminino é m u i t o galante, p o r serem m u i t o alvas e rosadas;
969

fabricam boas redes, cuias e muitos m a n t i m e n t o s p a r a fazerem m i m o s aos sertane-


j o s , q u e , n a m o r a d o s disto e suas formosuras, p e r d e m suas carregações, e n t r e g a n -
do-as fielmente; p o r é m estas ao m e n o s n u n c a faltam a o sustento, pois c a r r e g a m as
c a n o a s a estes miseráveis do q u e d á a terra.
Segue-se o u t r a do J e q u i t a í , t a m b é m m u i t o p o p u l o s a ê de m u i t a gente. N e s t a
se fabrica m u i t o azeite de " a n d i r o b a , q u e serve só p a r a a l u m i a r , e m u i t a t a r t a r u g a
de v i r a ç ã o , p o r ter g r a n d e s p r a i a s , pois as tais t a r t a r u g a s , q u a n d o é o t e m p o d e
desovar, e m as noites d e l u a r s a e m àquelas praias e fazem u m a cova e ali l a r g a m
os ovos e a o d e p o i s a t a p a m e lhe p a s s a m o p e i t o p o r c i m a , e n u n c a m a i s os
p r o c u r a m . M a s c o m a q u e n t u r a d a areia se g e r a m as t a r t a r u g u i n h a s , e assim c o m o
s a e m dos ovos c o m e ç a m a l e v a n t a r a areia e a sair, p o r é m t ê m muitos inimigos
q u e à e s p e r a delas estão: e m terra, os u r u b u s , q u e é o m e s m o q u e corvos; n o m a r ,
à beira / / das praias, os j a c a r é s e peixes-bois, monstros q u e n a q u e l e s m a r e s h á . A [ fl. 540v. ]
estas t a r t a r u g a s v e m m u i t a gente e m c a n o a s m u i t o g r a n d e s a carregá-las delas e
levando-as à c i d a d e e mais vilas fazem g r a n d e negócio, pois elas d e si são g r a n d e
comestível, t a n t o n o s a b o r c o m o e m d u r a ç ã o , pois m u i t o t e m p o e m casa, a i n d a
q u e lhe n ã o dessem de c o m e r , n ã o bastaria isso p a r a m o r r e r , pois estas se susten-
t a m n a sua g o r d u r a , q u e é m u i t o g r a n d e . Basta q u e muitos negociantes delas e m
sua fatura m a t a m m u i t a s só a efeito de fazerem *potes d e m a n t e i g a d a g o r d u r a e
b a n h a s , e as m a i s carnes a *moqueiam. S ã o estas m u i t o gostosas e se fazem delas
todos os guisados q u e se p o d e m fazer d a c a r n e d e carneiro. Estas tais t a r t a r u g a s
n ã o são das q u e se tiram aqueles célebres cascos de q u e se fazem os p e n t e s e mais
obras, e m r a z ã o d e serem criadas e nascidas e m á g u a d o c e , e as outras são d e á g u a
salgada, e essas são as q u e t ê m os cascos finos, q u e destas t a m b é m h á n a tal cida-
de.

T e m o u t r a a l d e i a estes religiosos, a q u e c h a m a m o P a c u í . T e r á setecentas


almas, é m u i t o rica, p o r estar e m u m a lagoa ou lago o n d e t e m m u i t a "salsaparrilha,
e esta se tira sem g r a n d e t r a b a l h o , e ter m u i t o c a c a u e as terras m u i t o férteis e m
d a r e m m u i t o s m a n t i m e n t o s , e o m a i s é e s t a r e m livres d e invasões dos *gentios
b r a v o s , e m r a z ã o [de] d a q u e l e s m a t o s p r ó x i m o s se t e r e m a f u g e n t a d o e m u i t o s
t e r e m v i n d o a rogos dos religiosos e p o r suas p r e g a ç õ e s e dádivas a o g r ê m i o d a
Igreja. P o r é m , c o m efeito, é "tapuia este m u i t o pacífico e a m i g o dos b r a n c o s , d e
sorte q u e q u a n d o p a s s a a l g u m a ou q u a l q u e r c a n o a d o s n e g o c i a n t e s d o s e r t ã o
todos desejam ir c o m ele. Estes, a i n d a sendo bravos, conta-se, n u n c a fizeram m a l
a n i n g u é m . Nesta c o s t u m a m a estarem [dois?] religiosos a t u a l m e n t e . T ê m b o a / / [ fl. 541 ]
assistência, p e l a m o r a d i a ser b o a , t a n t o e m boas casas c o m o e m ser saudável, e m
r a z ã o dos ares e o m i m o s o das frutas e a a b u n d â n c i a d e p e i x e . A igreja é
perfeitíssima, t e m b o n s o r n a m e n t o s , p o r devoção g r a n d e q u e t ê m os índios c o m
N o s s a S e n h o r a d o Pilar, p a d r o e i r a d a q u e l a c a p e l a e m i s s ã o . T ê m estes í n d i o s
" i r m a n d a d e d a S e n h o r a e t a m b é m d o Santíssimo S a c r a m e n t o , q u e q u a n d o sai
fora vai c o m o m e s m o culto q u e c o s t u m a m os b r a n c o s , "pálio d e d a m a s c o c o m
970

franjas d e o u r o , as "varas d e p r a t a , as lanternas do m e s m o e cruz, os índios c o m


suas "opas d e p a n o "berne e t u d o o mais necessário. São estes m u i t o destros e m
e x p o r a d o u t r i n a cristã, e b e m inclinados e devotos. O feminino, n o seu t a n t o b e m
p a r e c i d a s e b e m feitas de corpo, t ê m boas vozes, q u e se supõe ser p o r r a z ã o das
b o a s águas d e q u e é a b u n d a n t e a dita aldeia.
T e m o u t r a , a q u e c h a m a m o I t a m b é . C o n s t a esta d e mil e d u z e n t a s almas,
e n t r e g r a n d e s e p e q u e n o s . T e m este "principal, p o r s e u estatuto a n t i g o , q u e toda
a sua gente d e g u e r r a h á d e ser solteira, e, estes todos m o r a m e m bairro à p a r t e , e
os casados e velhos estão e m outro. Este tal principal trata-se c o m m u i t o respeito,
a n d a q u a s e s e m p r e vestido de e n c a r n a d o , sabe ler, escrever e c o n t a r — e os religi-
osos o v e n e r a m m u i t o —; traz a sua gente b e m disciplinada; é c a p i t ã o - m o r regente
d a q u e l e rio d e t o d o s os í n d i o s q u e nele h a b i t a m . F o i g r a n d e p e r s e g u i d o r dos
b r a n c o s q u e à q u e l a s p a r t e s i a m fazer n e g ó c i o , m a t o u m u i t o s , e c o m eles dois
p a d r e s . M a s p o r D e u s assim o permitir, q u e é o q u e se deve s u p o r , v i e r a m sem
diligência a l g u m a d e os missionários buscá-los, d e q u e m f o r a m r e c e b i d o s c o m
alegria e m e d o , pois e r a m tão ferozes e seu n o m e tão n o m e a d o , p o r é m f o r m a r a m
logo a sua famosa aldeia, o n d e estão vivendo e m m u i t a p a z e t ê m sido m u i t o fiéis,
[ fl. 541v. ] / / c o m o t a m b é m t ê m afugentado daquelas p a r t e s m u i t o gentio b r a v o q u e vexava
aos sertanejos negociantes estes tais índios. Suas a r m a s , é p o r m o d o d e u m a l a n ç a
feita d e u m p a u m u i t o forte e ao p é d o bico, pois as tais n ã o t ê m " c h o p a ; t ê m a o
m o d o é u m ã c a b a c i n h a c o m p r i d a , coisa d e u m " p a l m o , a q u a l a f a z e m oca p o r
d e n t r o , deixando-lhe só d u a s limitadas fendas p o r o n d e lhe m e t e m suas p e d r i n h a s
c o m p r i d a s , p a r a q u e depois q u e estiverem d e n t r o n ã o possam p a r a fora sair, e isto
é p a r a q u e q u a n d o b r i g a m b a t e m a tal lança, a q u e eles c h a m a m m u r u c u , e c o m o
b a t e r fazem b u l h a g r a n d e as p e d r a s n o tal c ô n c a v o ; os bicos destes p a u s a n d a m
e r v a d o s e n a pessoa q u e d ã o e fazem s a n g u e p a r a logo m o r r e . S ã o estes m u i t o
destros e m m a n e j a r a t a i a r m a e m u i t o valentes e d e g r a n d e e s t a t u r a d e c o r p o ;
são m u i t o o b e d i e n t e s aos seus m i s s i o n á r i o s e t ê m b o a igreja. E é b e m r e g i d a
aquela aldeia pela capacidade do principal, e o que era antigamente inimigo
d o s b r a n c o s a g o r a era o seu m a i s a m i g o e a m i g o d e os servir, e os índios q u e
este p r i n c i p a l a l u g a v a aos sertanejos l o g o lhes e n c o m e n d a v a q u e se a l g u m fu-
gisse à v i n d a p a r a b a i x o l h o dissesse q u e lhe dessem, sim, b o a p a s s a g e m e q u a n d o
t o r n a s s e m lho entregasse, q u e s e m p r e o a c h a r i a m p r o n t o p a r a servir a t o d o s os
senhores brancos.

M a i s a c i m a fica outra, q u e lhe c h a m a m o T â m a r a . T e r á seiscentas almas. As


a r m a s destes são a o m o d o de u m m a c h a d o , o c a b o é p a u e o q u e h a v i a ser ferro é
d e p e d r a ; n o b r a ç o e s q u e r d o t r a z e m u m a rodela p a r a se l i v r a r e m das flechas. T ê m
estes n a c a r a d u a s riscas p r e t a s q u e lhes s a e m e m dois cantos da b o c a até as ore-
lhas, as caras m u i t o chatas e os olhos r a s g a d o s e a o m o d o a e s p a n t a d o s q u e os
[ fl. 542 ] fazem / / horrorosos e m e d o n h o s . Estes se t ê m r e b e l a d o p o r duas vezes e m o r t o os
p a d r e s e os b r a n c o s q u e c o m eles se a c h a v a m e n e m c u i d a v a m e m igreja, o q u e n o
971

t e m p o d e hoje c u i d a m m u i t o , e presume-se q u e j a m a i s se. rebelarão, e m r a z ã o d e


sua obediência e t a m b é m t e r e m j á muitos nascidos e crioulos da aldeia, e criados
c o m os p a d r e s , a q u e m c r i a m a m o r , e m r a z ã o d a c r i a ç ã o . O " p r i n c i p a l destes
s e m p r e t e m g u a r d a s à p o r t a , vivendo c o m o desconfiado, m a s c o m o a sua vida era
a n d a r furtando e o q u e mais queria e r a m outros índios p a r a v e n d e r aos b r a n c o s e
n ã o t i n h a lei c o m n i n g u é m todos e r a m c o n t r a ele, causa m a i o r p o r o n d e se veio
a o g r ê m i o d a Igreja. E " t a p u i a m u i t o alentado e d e s t e m i d o . S u a p r e s e n ç a m e t e
h o r r o r , p o r ser m u i t o feio. N u n c a j a m a i s quis usar d e "vestidos; a n d a s e m p r e n u e
a r m a d o d e g u e r r a : a s u a v e s t i m e n t a é u m saiote d e p e n a s d e v á r i a s cores, nos
joelhos outros, a o descer d o o m b r o p a r a o b r a ç o outros, nos cotovelos outros, n a
c a b e ç a e m r o d a o u t r o , u m a "aljava a tiracolo c h e i a d e flechas, u m a r c o m u i t o
g r a n d e e grosso e d e p a u m u i t o d u r o — p o r é m q u a n d o este a n i m a l lhe m e t e a
flecha a faz d o b r a r c o m o se fosse de c e r a - , u m a rodela d e g r a n d e t a m a n h o n o
b r a ç o e s q u e r d o e n a m ã o direita o seu m a c h a d o d e p e d r a c o m u m d i l a t a d o c a b o .
Este tal s e m p r e é c h a m a d o dos b r a n c o s q u a n d o q u e r e m d a r a l g u m a g u e r r a a o
"gentio b r a v o , e assim c o m o o a v i s a m logo m a n d a c h a m a r o seu c a p i t ã o - m o r ,
s a r g e n t o - m o r e mais oficiais e lhes d á as ordens p a r a q u e t o d a a gente d e g u e r r a
v e n h a d e t a r d e à sua casa e m a n d a logo ao m e i r i n h o d a aldeia v á p o r casa das
m u l h e r e s — c a s a d a s , velhas e solteiras — q u e t r a g a m à sua casa t o d a a casta d e
v i n h o q u e tiverem, / / e estas se o n ã o d ã o e se se lhes a c h a m a n d a as açoitar n o [ fl. 542v. ]
pelprrrinho. D e p o i s d e j u n t a a soldadesca e os vinhos p r o n t o s , e n t r a m c o m os seus
ritos, c o m m u i t a s gritarias e u r r o s q u e m e t e r ã o m e d o a o d e m ô n i o e b e b e m até
ficarem p o r ali t o d o s c a í d o s . Pela m a n h ã levanta-se o p r i n c i p a l , t o d o a r m a d o ,
c o m os olhos v e r m e l h o s , e s c u m a n d o pela boca, aos saltos e às voltas p o r e n t r e a
sua gente, b r a n d i n d o o arco, l a n ç a n d o flechas aos ares, e depois d e b e b e r e m v ã o
se despedir d o p a d r e e vão se e m b a r c a r , e é a m a i o r alegria q u e t e m este índio
a n d a r s e m p r e e m g u e r r a . E, c o m efeito, g r a n d e soldado e m u i t o destro e m todas
as a r m a s d e q u e os mais índios u s a m . E m u i t o a m a d o dos b r a n c o s e p r i n c i p a l m e n -
te dos "cabos d a t r o p a d e g u e r r a , q u e s e m p r e está naqueles sertões p a r a r e b a t e r as
fúrias d a q u e l e gentilismo, e destas faremos m e n ç ã o q u a n d o for t e m p o .

E as m a i s aldeias destes religiosos são m a i s t é n u e s , e m r a z ã o d o s p o u c o s


í n d i o s d e q u e e s t ã o p o v o a d a s . S e m p r e estas p e q u e n a s p o v o a ç õ e s c o n s t a m d e
t r e z e n t o s í n d i o s p a r a c i m a . Estes são m u i t o o b e d i e n t e s aos seus m i s s i o n á r i o s e
v i v e m e m m u i t a p a z . O s e u "trato é f a z e r e m m a n t e i g a s d e t a r t a r u g a e a l g u m
cacau.
F i c a n o fim destas aldeias d e q u e t e m o s feito m e n ç ã o , e q u a s e a o p é d a
última, a fortaleza do M a c a p á . T e m esta "capitão, "ajudante e "alferes, "sargen-
tos, "cabos d e e s q u a d r a e oitenta soldados d e g u a r n i ç ã o , t e m u m a aldeia p e q u e n a
q u e terá duzentos índios, q u e são p a r a serviço d a m e s m a fortaleza. Q u e m a r e g e é
o m e s m o "capelão d a "capela d a fortaleza. T e m esta d e n t r o dos m u r o s "casas e
quartéis p a r a os oficiais e soldados. A capela está o r n a d a c o m t o d a a decência, t e m
972

três altares e o seu t a m a n h o é bastante, Esta fortaleza t e m trinta e duas peças d e


[ fl. 543 ] artilharia, / / fica e m o rio das A m a z o n a s , alterosa a o m a r , b e m fornida d e m u r a -
lhas e "bastimentos.
L o g o depois de dois dias de. viagem ficam [as] aldeias dos p a d r e s c a p u c h o s
d e S ã o B o a v e n t u r a . A p r i m e i r a é dos j u r u n a s . Este "gentio é m u i t o feio, p o r t e r e m
a b o c a n e g r a , q u e lhes fazem logo q u a n d o n a s c e m , p i c a n d o até fazer s a n g u e e a o
depois lhes d ã o c o m tinta p r e t a d e certos p a u s q u e eles a fazem; e a l é m d e lhes
p i n t a r e m beiços e b a r b a , até o nariz e nas ilhargas da boca, dois dedos de espaço
dela a r r e d a d a , t ê m outras riscas, c o m o são u m a d e e n t r e os olhos até o cabelo e
d u a s , u m a d e c a d a parte, dos cantos dos olhos até as orelhas. E este gentio p o r sua
n a t u r e z a fraco e tímido aos mais, r a z ã o p o r que custou p o u c o a vir ao grêmio d a
igreja. C o n s t a esta aldeia d e quinhentas e tantas pessoas; estão nela de contínuo dois
religiosos. T e m sua igreja muito b o a e grande, com bons o r n a m e n t o s e boas peças
de p r a t a e m u i t o asseada, e m razão de estes "tapuias serem m u i t o devotos, a i n d a
q u e feios. T u d o q u a n t o g a n h a m e a d q u i r e m logo l e v a m aos p a d r e s dizendo pelo
nosso português: "Aqui está a esmola de Deus.' E assim gostam de ver muitas luzes
?

n a sua igreja. V ã o todos os dias duas vezes à igreja a rezar e a dizer a doutrina de
q u e são todos muito peritos, pelo exercício q u e têm, e os p a d r e s n o fim lhes fazem
sua prática. Estes se o c u p a m e m fabricar algodões, p a r a fazer redes e t a m b é m fazem
muitas cuias c o m boas pinturas, e tudo isto v e n d e m aos sertanejos q u e p o r aqueles
sertões a n d a m a negociar. O s h o m e n s ocupam-se e m fazer cacau, manteigas [de]
tartarugas p a r a os missionários m a n d a r e m aos religiosos do convento e outros alu-
[ fl. 543v. ] gam-se aos sertanejos p a r a / / r e m a r e m as canoas.

T e m o u t r a m a i s acima, a q u e c h a m a m a Ipitipoca. Esta é aldeia p o p u l o s a , terá


mil e tantas almas; tem s e m p r e q u a t r o p a d r e s e mais alguns b r a n c o s q u e a g r e g a m
os p a d r e s . Estes são daqueles sertanejos c o b r a d o s q u e n ã o p o d e m ir a o p o v o a d o ,
e a r a z ã o é p o r q u e este gentio é m u i t o feroz e p o u c o fiel. E necessário a n d a r m u i t o
a t e n t o c o m ele, p o r ser m u i t o desconfiado. A igreja está c o m asseio, m a s m e l h o r
p o d i a estar, p o r é m os tais são p o u c o devotos, mais c u i d a m n o s seus ritos do q u e
n a igreja e doutrina. T o d a s as noites d e contínuo v ã o fazer as suas d a n ç a s à casa
dos "principais, q u e são dois tapuias d e terrível aspecto. T ê m seus "vestidos m u i t o
b o n s , m a s n a s noites ou e m certas n ã o u s a m deles, a n t e s p õ e m - s e a r m a d o s d e
g u e r r a , e os m a i s índios v ê m t a m b é m n u s , c o m saiotes de p e n a s , arcos e flechas e
p i n t a d o s todos d e u r u c u , q u e é u m a tinta v e r m e l h a q u e t e m b e m m a u cheiro. E
assim se p õ e m e m fileiras pela p r a ç a d a aldeia, e t ê m n o princípio dela u n s toros
d e p a l m e i r a , e a dois e dois se desafiam, e c a d a u m p e g a n o seu e e n t r a m a d a r
carreiras, e n o fim e n t r a m a lutar. Isto é p a r a efeito d e estarem c o s t u m a d o s a serem
c o r r e d o r e s e e s t a r e m s e m p r e p r o n t o s p a r a p e l e j a r e m . E assim s ã o estes í n d i o s
desta aldeia m u i t o d u r o s p a r a o t r a b a l h o e destros p a r a a g u e r r a . T ê m estes o
beiço d e baixo furado, o n d e m e t e m u m p e n a c h i n h o de três penas,, q u e lhe faz a
m o d o d e b a r b a s , q u e a i n d a os faz mais hórridos. São estes m u i t o amigos de c o m e r
973

os outros índios e m u i t o m e l h o r b r a n c o s se os p u d e s s e m a p a n h a r , coisa q u e t e m


custado m u i t o aos p a d r e s e m os tirar d e tal costume. E se n ã o fosse o a m e a ç o dos
"cabos d a t r o p a , q u e os a m e a ç a r a m q u e se t o r n a s s e m os havia fazer / / e s c r a v o s , e [ fl. 5 4 4 ]
d e "caçoais, digo, os tais, tímidos c o m o a m e a ç o , se e m e n d a r a m e a b s t i v e r a m d e
t ã o r u i m costume.
T ê m estes p a d r e s o u t r a mais a c i m a , coisa d e três dias d e viagem, a q u e cha-
m a m a aldeia d o Sapé. P a r a se ir a esta se e n t r a p o r u m b r a ç o d e rio, cujo s e m p r e
está c o m a á g u a t u r v a d a , p o r r a z ã o de q u e n o fim dele está u m l a g o disforme
m u i t o g r a n d e , pois q u a n d o se sai a ele. n ã o se avista terra d a o u t r a p a r t e e só se
avista depois de se estar n o m e i o dele, e a causa d e estarem as águas t u r v a d a s é p o r
r a z ã o d e h a v e r n o tal lago muitos jacarés d e g r a n d e t a m a n h o q u e a n d a m s e m p r e
a t r á s dos m a i s p e i x e s , e assim são t a n t o s q u e f a z e m r e v o l v e r os l o d o s , e estes
t u r v a m as águas. E c o m o estes lagos são águas m o r t a s e turvadas c a u s a m m u i t a s
d o e n ç a s n a tal aldeia, q u e fica esta situada sobre u m a ribanceira m u i t o alta, q u e se
assim n ã o fora e r a inabitável, p o r q u e ao m e n o s é m a i s l a v a d a dos ventos. T e r á
esta aldeia oitocentas a l m a s . S ã o índios pacíficos e m u i t o amigos dos b r a n c o s e
servem aos sertanejos c o m lealdade. O "principal s a b e ler, escrever e c o n t a r , a n d a
c o n t i n u a m e n t e vestido d e e n c a r n a d o , m u i t o valente, m a s m u i t o p r u d e n t e . [Lou-
va-se?] muito q u e os passageiros t o m e m p o r t o n a sua aldeia e muito mais quando
lhe m a n d a m a l g u m "frasco d e " a g u a r d e n t e o u " m e l a d o , t u d o q u a n t o a d q u i r e ,
pois faz m u i t o dinheiro e m a "salsaparrilha e e m as b a u n i l h a s , p r i n c i p a l m e n t e , e o
d i n h e i r o q u e destas "drogas se faz n a c i d a d e e n c o m e n d a ele aos p a d r e s lhe t r a g a m
o necessário p a r a sua casa, isto é, d e vestir, e o mais m a n d a q u e e m p r e g u e m e m
"cera e o r n a m e n t o s p a r a a igreja. E assim está esta b e l a m e n t e o r n a d a ; t e m só u m
altar, m a s este m u i t o majestoso e t o d o d o u r a d o , e o teto de t o d a / / a igreja b e m [ fl. 544v. ]
p i n t a d o , t e m u m rico p á l i o p a r a q u a n d o o S e n h o r sai fora. O " h o s p í c i o dos
p a d r e s , q u e c o n t i n u a m e n t e são dois, é m u i t o g a l a n t e , e o " p r i n c i p a l s e m p r e
está c o m eles, c o i s a q u e os o u t r o s n ã o f a z e m p o r q u e n u n c a t o m a r a m v e r os
missionários. E b o m cristão, confessa-se a m i ú d o e traz a sua gente b e m
regida.

Fica [ o u t r a aldeia] mais a c i m a e m u m rio, a q u e c h a m a m Tefé. Este t e m á g u a


m u i t o cristalina e m u i t o saudável, p o r ter as m a r g e n s a b u n d a n t e s d e m u i t a "salsa
e j u n t a m e n t e v i r e m as á g u a s m u i t o b a t i d a s p o r p e d r a s . E m r a z ã o d e o rio ter
m u i t a s cachoeiras e de grandes alturas, n e m se p o d e n a v e g a r pelo rio a c i m a m a i s
q u e q u a t r o ou cinco dias de v i a g e m , e c o m t r a b a l h o . Fica esta aldeia q u a s e n a
b o c a deste r i o ; t e m n e l a l a r g u r a b a s t a n t e e m u i t o a b u n d a n t e d e b o n s peixes e
caças. A aldeia t e m o m e s m o n o m e d o rio, terá até q u i n h e n t a s e tantas almas; os
índios são d e b o a p r e s e n ç a , p o r serem b e m p a r e c i d o s , p r i n c i p a l m e n t e as m u l h e -
res; t ê m b o a s v o z e s , s u p o n h o p r o c e d e m d a b o a á g u a . O p r i n c i p a l é u m í n d i o
m u i t o a g i g a n t a d o , de b o m s e m b l a n t e , m u i t o guerreiro, muito destro n o atirar do
arco e flecha e p r i n c i p a l m e n t e no atirar p o r elevação. E m u i t o rigoroso c o m sua
974

gente, m a s t o d o o seu vassalo, q u e é b o m soldado e valente, a estes q u e r m u i t o e


são d a sua g u a r d a . E assim diz o m e s m o "principal q u e antes q u e r p o u c o s b o n s
q u e muitos e ruins.
S e m p r e a n d a este descortinando e r o n d a n d o os m a t o s vizinhos à s u a aldeia,
c o m receios de irm "gentio q u e sempre a n d a v a g a b u n d o , a q u e c h a m a m o m u r a :
n ã o t e m o u t r o ofício senão a n d a r r o u b a n d o e b r i g a n d o , o n d e d o r m e m n ã o a m a -
n h e c e m , s a b e m a r r e m e d a r toda a casta de animal e pássaros, é gentio muito valente,
[ fl. 5 4 5 ] e o mais é q u e / / a correr n i n g u é m o a p a n h a , é muito atraiçoado. Finalmente, são
c o m o animais, p o r q u e os mais "tapuias, aínda gentíos e bravos, t ê m suas aldeias e m
o centro dos m a t o s ou e m cabeceiras d e rios e suas roças e criações, m a s os tais m u r a s
q u a n d o n ã o a c h a m q u e furtar c o m e m raízes d e p a u , formigões e outros bichos e
"sevandijas. Isto é q u a n d o a n d a m tímidos p o r q u e se m e t e m a o centro, m a s q u a n d o
a n d a m e m as b e i r a d a s dos rios p a s s a m b e m . . N u n c a a n d a m m u i t o s ; a n d a m às
"malocas, q u e se se ajuntassem creio q u e n e m os mais gentios n e m brancos poderi-
a m freqüentar semelhantes terras. A i n d a n e n h u m foi escravo n e m se viu n a cidade,
a i n d a q u e alguns se t ê m a p a n h a d o , m a s estes q u a n d o q u e v ê e m q u e n ã o p o d e m
fugir n e m escapar ferram os dentes e m e t e m a c a b e ç a e n t r e os joelhos, e assim e m
breve t e m p o m o r r e m . (Um certo sertanejo, h o m e m b r a n c o , indo pelo rio d e Pacuí,
q u e é muito largo e aprazível e muito a b u n d a n t e de peixe e caça, este tal sertanejo
a n d a v a e x a s p e r a d o , pois t i n h a d a d o toda sua fazenda a u m principal gentio q u e
a n d a v a d a n d o guerra aos outros e os v i n h a v e n d e r aos b r a n c o s , c o m o é costume.
M a s c o m o foi mal-afortunado, esta vez p e r d e u t u d o e o mais da sua gente. E v e n d o -
se assim fugiu m e t e n d o - s e a o centro dos m a t o s . Este sobredito sertanejo botou-se
p o r aquele rio a ver se topava a l g u m a m a l o c a d e tapuias p a r a os cativar, a i n d a q u e
c o n t r a o direito e consciência. O u v i u a n d a r latindo cachorros e m terra; disse aos
pilotos e r e m a d o r e s seguissem p a r a a terra c o m b r a n d u r a , dizendo q u e preparassem
as a r m a s e outros arcos e flechas q u e aquilo era gentio q u e a n d a v a c a ç a n d o . E

[ fl. 545v. ] c h e g a n d o à terra n ã o ouviram n e m v i r a m mais / / n a d a . O tal gentio m u r a , que é o


q u e a n d a v a latindo c o m o cachorro, estava escondido detrás dos paus e do m a t o , de
sorte q u e os três primeiros da c a n o a q u e saltaram e m terra foram flechados e escapa-
r a m d a m o r t e c o m muito trabalho. M a s depois d e b r i g a r e m a l g u m t e m p o , o b r a n c o ,
c o m o exasperado, atirou u m tiro a u m e lhe d e u pelas pernas. E c o r r e n d o sobre ele,
o tapuia se e m b a r a ç o u e m uns cipós e, caindo, o b r a n c o o pegou. E ajudado d a sua
gente õ a m a r r a r a m , e os outros fugiram, ficando três m o r t o s . O c h u m b o do vivo
e r a m só três granos. T r o u x e r a m - n o p a r a a canoa, e esteve sossegado alguns dias, e o
b r a n c o muito contente cuidando o levaria à cidade. M a s o tapuia, c o m o via q u e n ã o
p o d i a fugir, p o r ir b e m algemado, esperou que o b r a n c o se chegasse p o r ele, e tanto
q u e se chegou lhe p e g o u c o m os dentes n o d e d o m í n i m o , q u e lho cortou fora, e o
b r a n c o v e n d o semelhante coisa ficou suspenso, m a s t o r n a n d o a si o d e s a m a r r o u do
toldo d a c a n o a e assim m e s m o algemado d e pés e mãos o lançou a o m a r , e o q u a l
morreu.) E assim são desta sorte estes diabólicos "gentios, razão p o r q u e o "principal
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d e q u e falamos a n d a s e m p r e vigiando a sua aldeia, pois o tiveram q u a s e expulso


fora dela e lhe m a t a r a m m u i t a gente, e se n ã o fosse o ser tão valente e e s t a r e m
nessa ocasião c i n c o b r a n c o s n a aldeia, todos m o r r e r i a m , pois o tal g e n t i o m u r a
t u d o passa a facão, p o r q u e n e m q u e r e m escravos n e m fazem negócio c o m
ninguém.
A aldeia deste principal está b e m situada e a r r u a d a , t e m igreja m u i t o b o a e
d e assistência dos religiosos / / e as mais q u e t ê m são mais d i m i n u t a s d e g e n t e m a s [ íl. 5 4 6 ]
obedientes e b o m cristãos.
T e r ã o estes p a d r e s quinze aldeias q u e a d m i n i s t r a m t a n t o n o espiritual c o m o n o
temporal.
O s p a d r e s d a C o m p a n h i a t e r ã o dezenove aldeias.
A p r i m e i r a fica n o rio d a M a d e i r a . Este é m u i t o largo n a b o c a o u b a r r a , t e m
de l a r g u r a u m q u a r t o d e [*Iégua?]; a á g u a é "boa, t e m m u i t a cachoeira e d i z e m ser
m u i t o d i l a t a d o , pois passa p o r terras d e Castela e j á v e m c a u d a l o s o à sobredita
a l d e i a . C h a m a - s e a a l d e i a dos A b a c a x i s , t e r á d u a s m i l e t a n t a s a l m a s . É u m a
cidade n a g r a n d e z a . E s t á a r r u a d a c o m toda a perfeição, t e m três castas d e n a ç õ e s ,
d e sorte q u e a p r i m e i r a , q u e fica ao p é d a igreja, é a m a i s p o p u l o s a e s e n h o r a d a
t e r r a . As o u t r a s são a g r e g a d a s . N o fim desta p r i m e i r a faz u m g r a n d e m u r o d e
estacas m u i t o grossas e fortes, e n o m e i o u m a r c o d e m a d e i r a b e m feito. E n a
s e g u n d a n a ç ã o , o m e s m o e m divisa p a r a a terceira; t e m b o a s casas, p r i n c i p a l m e n -
te as d o p r i m e i r o principal, e as dos outros t a m b é m são m u i t o b o a s . Estes a n d a m
b e m vestidos e c o m seus pajens, d e sorte q u e q u a n d o v ã o à missa o u a falar c o m
os p a d r e s , v e m p r i m e i r o o principal d a p r i m e i r a n a ç ã o , vestido e p r e p a r a d o c o m
t o d o o seu a c o m p a n h a m e n t o d e c a p i t ã o - m o r , s a r g e n t o - m o r e mais soldados, t o -
dos a r m a d o s , e m e i r i n h o , v e m à casa do segundo, o qual leva o m e s m o a c o m p a -
n h a m e n t o , e d e p o i s a m b o s v ã o b u s c a r o m a i s p r i n c i p a l . E assim, c o m g r a n d e
fausto, v ã o p a r a a missa ou visitar os p a d r e s , e t a m b é m q u a n d o sai o S e n h o r fora.
Este q u e é d o n o d a aldeia é índio d e g r a n d e estatura, e a i n d a q u e esta n a ç ã o t e m
suas riscas p r e t a s pelo [rosto], os p r i n c i p a i s n ã o as t ê m , p o r q u e os p a d r e s n ã o
c o n s e n t e m q u e se lhes façam, p o r os n ã o fazerem disformes. T e m este b o m trata-
m e n t o d e casa, b e m p r e p a r a d a ; traz d u a s c a n o a s n o m a r a t u a l m e n t e a p e s c a r ,
índios e m t e r r a a caçar, e fora isto a criação doméstica. T o d o s os passageiros b r a n -
cos, os vai visitar / / logo a o p o r t o s e m g r a n d e moléstia, p o r suas casas ficarem a o [ fl. 546v. ]
p é dele, e logo presenteia os passageiros e os levam p a r a casa c o m g r a n d e afago e
c a r i n h o , a o q u e eles c o r r e s p o n d e m p o r i r e m j á p r e p a r a d o s p a r a isso. E m u i t o
r e s p e i t a d o d e t o d o s , p o r ser a p o t e n t a d o e b e n i g n o ; e os o u t r o s , t o m a n d o o seu
e x e m p l o , fazem o m e s m o . T ê m c o n t i n u a m e n t e q u a t r o p a d r e s , e a i n d a estes n ã o
p o d e m b e m v e n c e r o t r a b a l h o d a d o u t r i n a , confissões e mais s a c r a m e n t o s . A igre-
j a é coisa b o a : t e m três altares, todos d o u r a d o s e p i n t a d o s , e a m a i s igreja, e é
m u i t o g r a n d e . O "hospício dos p a d r e s é m u i t o alegre, p o r estar a o p é d a ribancei-
r a e m u i t o alto a o rio.
976

A o u t r a q u e se segue, a I n a m b i , n o m e derivado desta m e s m a p a l a v r a , q u e n o


n o s s o p o r t u g u ê s q u e r d i z e r orelhas, e c o m o estes índios logo d e p e q u e n o s lhes
furam as orelhas c o m u m rasgão e lhes m e t e m u m p a u r e d o n d o q u a n t o caiba pelo
r a s g ã o , e j u n t a m e n t e u m peso p e n d e n t e p a r a efeito de ele ir p u x a n d o as orelhas
p a r a baixo, e depois de sã a ferida q u a n t o mais cresce o índio t a n t o m a i o r p a u lhe
v ã o m e t e n d o e o peso a c r e s c e n t a n d o , d e sorte q u e q u a n d o c h e g a m a ser h o m e n s
ficam-lhe as orelhas q u a s e c h e g a n d o aos o m b r o s e c o m u m g r a n d e b u r a c o , e este
lhe serve p a r a q u a n d o fazem as suas danças ou vão p a r a a g u e r r a : a r m a m - s e d e
saiotes d e p e n a s , c o m o j á se t e m dito, e n a s orelhas m e t e m u m p a u , q u e fica b e m
a t o c h a d o e u m de c a d a p a r t e , e destes s a e m dois p e n a c h o s , q u e c o m o t u r b a n t e d e
p e n a s n a c a b e ç a p a r e c e m a figura do d e m ô n i o ; e o m a i s é estarem tintos de u r u c u ,
[fl. 5 4 7 ] p a r e c e n d o q u e estão a r d e n d o e m fogo, e j u n t a m e n t e / / o s urros q u e d ã o q u a n d o
estão n a s suas d a n ç a s ou são c h a m a d o s d a t r o p a p a r a a j u d a r e m a l g u m a g u e r r a
que. d ã o . São m u i t o valentes. O "principal, p o r mais q u e os p a d r e s t r a b a l h e m c o m
ele a q u e a n d e v e s t i d o , n ã o é possível. A l g u m a v e z se veste, p o r é m n ã o d u r a
m u i t o q u e se n ã o dispa. E p o n d o - s e e m t e r m o s d e g u e r r a vai c o m p a r t e d e sua
gente fazer caçadas aos porcos e onças e tigres, p a r a efeito d e n ã o p e r d e r a destre-
za d e atirar e a u m e n t a r as forças ou conservar as q u e t e m . T ê m - s e estes "tapuias
r e b e l a d o p o r d u a s vezes, m a t a n d o os p a d r e s e m a i s alguns b r a n c o s q u e c o m eles
se a c h a v a m , e n u n c a são m u i t o fiéis. S e m p r e a n d a m desconfiados e se os p a d r e s
lhes q u e r e m p r o i b i r os ritos, c o m o é i r e m c h o r a r n a cova a o n d e se e n t e r r a m al-
g u n s dos seus p a r e n t e s q u a s e oito dias, e lá e m certos t e m p o s e depois q u e lhe
p a r e c e t i r a m os ossos e os m e t e m e m u m a r e d e p e q u e n a e m u m c a n t o d a casa, e
l e v a n t a d a a tal r e d e . Q u a n d o v ê m d a guerra, t r a z e m as caveiras d e alguns princi-
pais ou abalizados q u e m a t a m e as p õ e m nas fronteiras d e suas casas, q u e são os
seus m a i o r e s brasões* E n o mais n ã o c u i d a m . P a r a irem p a r a a d o u t r i n a , é neces-
sário m u i t a cerimônia, e muitas vezes só se a c h a m os rapazes e m u l h e r e s . A igreja
está d e c e n t e pelo c u i d a d o dos p a d r e s .

T e m o u t r a q u e está e m u m rio m u i t o f ú n e b r e , e h á n e l e m u i t a s d o e n ç a s
n a s v a z a n t e s , d i z e m ser p r o c e d i d o d a s raízes d e c e r t a s á r v o r e s q u e n a s m a r -
gens d o tal rio h á , pois a t é os m e s m o s peixes m o r r e m e v ê m b o i a n d o s o b r e a
água, inchados. N a aldeia [não prossegue?] tanto, p o r ter u m limitado riacho
d o n d e [ b e b e m ? ] e ser l e v a n t a d o a o r i o , pois este cai d e s p e n h a d o p o r p e d r a s
n o r i o g r a n d e , e c o m o nele n ã o e n t r a m suas á g u a s é b e m l i v r a d o , o q u e n ã o
t ê m os o u t r o s . A esta a l d e i a c h a m a m o C a r a c u . T e r á o i t o c e n t a s a l m a s , p o u c o
[ fl. 547v. ] m a i s o u m e n o s , e n t r e p e q u e n o s / / e g r a n d e s , É g e n t i o disforme n a g r a n d e z a
e a i n d a n o s m e m b r o s , c o m o t e r e m u m a s m ã o s g r a n d e s e os b r a ç o s finos, as
e s p á d u a s l a r g a s , e b a r r i g u d o s , e as p e r n a s finas, e o u t r o s c a b e ç u d o s . S ã o í n d i o s
m u i t o r ú s t i c o s e r u d e s p a r a a p r e n d e r e m e c o m p r e e n d e r e m a d o u t r i n a cristã,
n ã o s ã o a m i g o s d e g u e r r a s n e m n u n c a os b r a n c o s p a r a isso os c o n v i d a r a m ,
p o r é m são m u i t o t r a b a l h a d o r e s d e m a n t i m e n t o s , f a z e m m u i t a s r o ç a s d e fari-
977

n h a , feijão, a r r o z , a l g o d õ e s , c a r á s e b a t a t a s , e só nisto c u i d a m , s u p o n h o p o r
serem muito comilões. A p a n h a m no tempo muito cacau, cravo e "salsaparrilha,
q u e t u d o d ã o aos p a d r e s , d e q u e lhes r e s u l t a g r a n d e p r o v e i t o . S ã o o b e d i e n t e s
aos m i s s i o n á r i o s e g o s t a m d e v e r festas n a igreja c o m m u i t a s l u z e s . A d i t a é
g r a n d e , t e m só u m a l t a r , p o r é m b e m p r e p a r a d o . O "hospício está b e m situa-
d o e p e g a d o à m e s m a igreja; t e m s e m p r e dois religiosos c o n t i n u a m e n t e .
O "principal era índio fúnebre e melancólico, e diziam os p a d r e s p a r e c i a lhe
v i n h a p o r g e r a ç ã o . Este tal estava s e m p r e m e t i d o e m casa, algumas t a r d e s saía a o
passeio p o r t o d a a aldeia e logo saía à ribanceira sobre o rio, e o seu divertimento
e r a m a n d a r p e s c a r aos j a c a r é s , q u e os há m e d o n h o s e disformes p o r s u a g r a n d e z a .
P o r é m foi m a l sucedido neste divertimento, p o r q u e u m a t a r d e (é d e se saber q u e
o m o d o c o m q u e p e s c a m estes animais é c o m u m a c o r d a grossa feita d e "pita, q u e
é coisa m u i t o forte, e n o fim u m a cruz d e p a u rijo, e c a d a braço é d e dois paus e u m a
cruz p o r baixo e o u t r a p o r cima, e no meio a [isca?], e depois d e b e m a m a r r a d a
b o t a m a o m a r , o j a c a r é logo v e m , p o r ser m u i t o veloz n o engolir, e m r a z ã o d e
q u a n d o pega c o m a boca dá u m a rabanada c o m o rabo para ajudar o bocado,
p o r q u e t e m a b o c a muito rasgada e as goelas largas, e engole a tal isca até o b u c h o ,
e depois d e o cansarem o p u x a m p a r a / / a terra e lhe d ã o muitos tiros até o m a t a - [ fl. 5 4 8 ]
r e m , m a s se estes lhe n ã o a c e r t a m nas fontes são debalde, p o r q u e o mais c o r p o é
cascudo e n ã o lhe entra bala) e estando neste tal divertimento, a p a n h a r a m u m destes
m u i t o grandes, acudindo toda a aldeia e os padres a v e r e m tal m o n s t r o , e vendo-se
este exasperado correu m e s m o p a r a a terra, e correndo velozmente pela p r a i a p a r e -
cia q u e r e r c o m e t e r a ribanceira, q u e c o m tal investida fugiu m u i t a g e n t e , m a s o
m a l i g n o do m o n s t r o a b a i x o u a cabeça e q u e b r o u os m e m b r o s e se fez p o r q u a s e
m o r t o . Atiraram-lhe muitos tiros e assentaram estava m o r t o , p o r é m n e n h u m o q u e -
ria ir certificar, n e m p o r m a n d a d o do principal n e m dos padres, e os ameaços n ã o
valiam ao temor. Achava-se entre estes o filho mais velho do principal e q u e o havia
suceder. Queria-lhe m u i t o . Ele o merecia, p o r ser d e b o a presença e n t r e tantos feios,
tinha b o m gênio, amigo dos brancos e principalmente dos seus p a d r e s , c o m q u e m
sempre estava. V e n d o este q u e n e n h u m se resolvia ir a o tal e x a m e , d e u o "bastão a
u m seu pajem, e p ô s o c h a p é u n a cabeça, e pegou d e u m m a c h a d o , e d e todos foi
requerido a q u e n ã o fosse, m a s ele, c o n t u m a z , d e sorte q u e os q u e estavam p e g a n d o
n a corda n ã o t i n h a m sentido mais q u e tão-somente no m o ç o , e o j a c a r é assim c o m o
se chegou a o p é dele e foi levantando o m a c h a d o p a r a lhe d a r o golpe n a cabeça
este d e u u m a r a b a n a d a c o m o r a b o tão ligeira q u e m e t e u a o miserável atravessado
n a boca, e c o r r e n d o pela p r a i a se m e t e u c o m ele ao m a r . O s q u e estavam c o m a
corda, uns l a r g a r a m de ver tal coisa e outros foram d a ribanceira abaixo, de q u e
ficaram b e m maltratados. O j a c a r é a i n d a surgiu duas vezes c o m ele acima d a água.
L a n ç a r a m logo canoas atrás, fizeram as diligências possíveis, p o r é m t u d o b a l d a d o .
H o u v e muito p r a n t o n a aldeia, m u i t a tristeza nos padres. O p a i , se eles n ã o fossem
que o consolavam c o m os mais filhos q u e tinha c e r t a m e n t e m o r r e r i a . M a i s d e a n o
978

n ã o passeou mais do q u e da casa p a r a a igreja e d a igreja p a r a casa. Fizeram-lhe


[ fl. 548v. ] grandes / / funerais, os padres m a n d a n d o buscar outros às aldeias vizinhas.
A q u e se segue é a aldeia dos A c a n g a s . Fica situada e m u m largo rio e q u e é
o rio do Arasi, e q u e m olha p a r a sua á g u a p a r e c e [verde?] p o r é m tirando-se fora
ç m u i t o clara. A aldeia destes fica pelo rio acima, coisa de u m dia d e viagem. Está
p l a n t a d a e m u m l u g a r muito assente e alegre, a aldeia b e m a r r u a d a — q u e s e m p r e
são missões de p a d r e s d a C o m p a n h i a —, m a s as casas são m u i t o ruins, p e l a p o u c a
curiosidade dos índios, e se t ê m igreja d e v e m - n a ào cuidado dos p a d r e s e a o seu
asseio. O "hospício dos ditos é m u i t o bonito; fica e m u m alto c o m à vista sobre o
rio e a terra. Este "gentio n ã o cuida mais q u e no descanso e c o m e r ; fazem p o u c a s
roças, e algumas q u e fazem é p a r a fazerem "vinhos d e beiju p a r a as suas d a n ç a s
q u e t o d a s as noites fazem. Sustentam-se e m frutas do m a t o e m a n s a s e e m peixe,
q u e é m u i t o e m a b u n d â n c i a , e e m caças do m a t o , m a s estas lhes c u s t a m às vezes a
vida ou v i r e m m a l t r a t a d o s , p o r isso vão s e m p r e e m malocas, e a r a z ã o é p o r q u e
t ê m u m r u i m vizinho, mais a o c e n t r o d o m a t o , q u e s e m p r e a n d a à c a ç a deles,
p o r q u e os a b o r r e c e m , e estes tais a c a n g a s v i e r a m se fazer cristãos, c o m m e d o q u e
os caí-caís os n ã o acabassem. T ê m alguns missionários falado c o m os caí-caís q u e
se façam cristãos, pregando-lhes e a n i m a n d o - o s c o m dádivas e p r o m e s s a s , a o q u e
r e s p o n d e m q u e n ã o t e m dúvida serem cristãos e serem leais, o q u e b e m m o s t r a v a
o eles n e m t e r e m m o r t o b r a n c o s n e m p a d r e s , m a s q u e os deixassem brigar c o m os
a c a n g a s , q u è os q u e r i a m m a t a r a todos e depois "desceriam todos c o m suas m u -
lheres p a r a a aldeia. M a s c o m o isto n ã o p o d e ser, estão u n s v i v e n d o n o ódio e
o u t r o s c o m o m e d o . Estes a c a n g a s s e m p r e a n d a m c o m as a r m a s n a m ã o , p o r
a n d a r e m s e m p r e c o m o sobressalto dos o u t r o s . B r i g a m estes de a r c o e flecha e
b u s c a m certas resinas d e várias árvores c o m q u e u n t a m a c a b e ç a e a o depois b o -
t a m - l h e areia, e t o r n a m a d a r o u t r a u n t u r a e a p ô r o u t r a areia, finalmente p õ e m as
[ fl. 549 ] vezes q u e lhes / / p a r e c e m até lhes ficar u m tal cascão q u e n e m a m e l h o r " c a t a n a
l h e e n t r a . E fazem isto p o r se livrarem de u m a s a r m a s q u e t ê m d e uso seus inimi-
gos, q u e é u m p a u muito forte, d o c o m p r i m e n t o d e cinco "palmos — d e u m a p a r t e
t e m u m bico oitavado e d a outra, coisa de p a l m o e m e i o c h a t o , de l a r g u r a d e u m a
m ã o "travessa, e n o m e i o l o m b u d o , e d e u m a p a r t e e o u t r a u m g u m e q u e corta
m e l h o r q u e q u a l q u e r ferro, p o r é m n ã o e n t r a n a c a b e ç a dos a c a n g a s - , e assim
v i v e m nestes ódios h á muitos anos e viverão. O "principal destes é valente e exas-
p e r a d o n a guerra, e s e m p r e vai c o m os mais, e estaria s e m p r e a ir se n ã o fossem os
p a d r e s , q u e lho p r o í b e m , e d e tal sorte q ú e q u a n d o v ã o saem d e noite e q u a n d o
v ê m os missionários, enfadam-se c o m eles, a m e a ç a n d o - o s c o m as tropas, m a s eles
q u e i x a n d o - s e q u e os outros lhe m a t a r a m tantos q u e a n d a v a m à caça, "e nós p o r
v i n g a r m o s suas m o r t e s í a m o s ver se e n c o n t r á v a m o s a l g u m a " m a l o c a [desgarra-
da?] p a r a o m e s m o lhes fazermos", q u e só assim é q u e se v i n g a m , e se os caí-caís
n ã o fossem gentios, a i n d a q u e bravos e brutos, o ter t a n t o respeito aos b r a n c o s e
aos p a d r e s , j á os t i n h a m a c a b a d o .
979

Fica outra e m u m rio [chamado?] T a q u a r i r i ; é a aldeia T i m o a ç u . O rio é muito


alegre, a b u n d a n t e de belos peixes, a á g u a excelente, m u i t a caça, tanto d e terra c o m o
das m a r g e n s , c o m o patos, marrecos, maçaricos, garças, colhereiros, gansos e outras
mais variedades. A aldeia está situada e m u m alto m o r r o e inconquistável, p o r estar
todo cercado, além de ser a pique de tabocas grandes e tão densas e estas cheias de
espinhos q u e é impossível n e m à c a ç a r o m p e r s e m e l h a n t e aspereza q u a n t o mais
c r i a t u r a h u m a n a . Só p o r u m a p a r t e se "servem, e é c a m i n h o d e l a d e i r a a b a i x o ,
b a s t a n t e e m p i n a d a , e o c a m i n h o p o u c o largo e b a s t a n t e c o m p r i d o . Antes q u e se
chegue abaixo, n a entrada do m o r r o , e m cima, t e m u m p o r t ã o muito forte, e desse
p o r t ã o até c h e g a r às casas d a aldeia vai u m caminho, q u e apenas c o m m u i t o traba-
lho caberão três homens e m carreira e d e c a d a p a r t e u m a altíssima estacada d e paus
m u i t o fortes e grossos, / / e nas pontas bicos muito agudos. A aldeia está b e m situa- [ íl. 549v. ]
da, tem boas casas e b e m a r r u m a d a s por sua o r d e m , está e m u m p l a n o fundada. As
casas d o "principal são m u i t o grandes e d e sobrado. A igreja é coisa estupenda: t e m
u m altar todo d o u r a d o e a mais igreja, pintada, fica levantada do c h ã o , sobe seu p a r
d e degraus p a r a o a d r o , q u e é g r a n d e , t e m duas torres n o "frontispício c o m seus
sinos. Fica o "hospício dos p a d r e s p e g a d o à igreja, muito b e m feito, t o d o r o d e a d o
de varandas, pois esta é aldeia de tantas q u e h á naqueles sertões, pois avista vários e
muitos rios e lagos, m a t o s , e m conclusão q u a n t o a vista p o d e alcançar. É m u i t o
saudável; t e m três fontes muito grandes e de boas águas. T e m s e m p r e dois p a d r e s , e
todos desejam ir p a r a ali, pela b o n d a d e da aldeia e dos índios. T e r á , p o u c o mais ou
m e n o s , oitocentas e tantas almas; o principal é h o m e m m u i t o p r u d e n t e , sabe ler,
escrever e contar, e todos os seus filhos que são os primeiros q u e v ã o p a r a a doutri-
n a , e d é t a r d e ele é o primeiro que vai p a r a a reza n a igreja, e m q u e d á exemplo; ê
se falta algum ele conhece a falta logo sabe a r a z ã o e o vai visitar se está doente e se
n ã o o visita c o m açoites. S e m p r e este está c o m os padres, e se aparece algum b r a n c o
p o b r e , ou p o r n ã o ter fortuna ou p o r se perder, o t e m consigo d a n d o - l h e o necessá-
rio, e lhe d á c a n o a e índios p a r a fazerem cacau, e assim o p õ e c o m princípio d e
tornar a ser gente, coisa q u e t e m a d m i r a d o naquelas partes a todos q u e u m índio
seja tão a m a n t e d a pobreza. P a r a acudir a isto, m a n d a a p a n h a r muito cacau e r e m e -
te-o à cidade a o p a d r e p r o c u r a d o r das missões, o que lho v e n d e e lhe c o m p r a t u d o
q u e v e m nas receitas. As mulheres, as faz fiar e fazer redes e p i n t a r cuias p a r a as
v e n d e r e m e vestirem-se; aos velhos, fazer balaios, "pacarás e outras coisas p a r a o
m e s m o efeito. T r a z três canoas n o m a r p a r a sua família e mais b r a n c o s q u e ali se
a c h a m . Estes índios são b e m feitos do c o r p o e b e m parecidos n o rosto, principal-
m e n t e as fêmeas; a n d a m s e m p r e c o m p o s t a s , a o m e n o s c o m sua saia. S ã o m u i t o
valentes e respeitados, o qual respeito lhes custou muito sangue, m a s / / agora vi- [ fl. 550 ]
v e m sossegados sem ter inimigos.

Fica o u t r a mais acima no m e s m o rio Arasioaras. T e r á esta aldeia até quatrocen-


tas almas, é ["gentio?] rústico e feroz, a estatura m e d i a n a , a cara m u i t o chata e as
faces são todas riscadas d e riscas pretas, as ventas muito abertas e o nariz furado n o
980

meio, o n d e m e t e m as suas penas de guará, que são v e r m e l h a s s e outras de garça, q u e


são brancas; e parecem-se, q u a n d o as trazem, galinhas q u e a n d a m c o m "gogo. Ami-
gos d e brigar e grandes negociantes, grandes atiradores de espingarda, m a s d u r a m -
lhe p o u c o t e m p o , p o r n ã o saberem tratar delas. O s "vestidos q u e c o m p r a m , q u e são
"vestias, "camisas, "calções, chapéus, cintas, t u d o isto n ã o chega a d u r a r três dias,
p o r q u e v ã o c o m eles p a r a as suas d a n ç a s , e c o m o b e b e m m u i t o d a q u e l a s suas
vinhaças, l a n ç a n d o u m fora e m e t e n d o outro, todos se sujam, deitando-se pelo chão,
e n o outro dia logo desgostam e vão c o m p r a r mais, e p a r a isto estão prevenidos d e
c a c a u e b a u n i l h a , d e q u e são m u i t o a b u n d a n t e s os seus m a t o s , e os h o m e n s d e
negócio v ã o atrás d a baunilha por ser coisa d e muito valor. O rio, c o m o j á dissemos,
é muito a b u n d a n t e . Estes p l a n t a m m u i t a roça e fazem muito "pote de manteiga d e
peixe-boi, de q u e h á m u i t a abundância e m u m grande lago q u e fica p o u c o acima d a
aldeia. É este peixe muito grande e só a semelhança q u e t e m c o m o boi é n a cabeça,
q u e é semelhante à do boí, e os chifres são curtos e n ã o são duros. Este dito peixe é
d e s u m a grandeza: n ã o comete gente h u m a n a ; a p a n h a d o , tirando as "ventrechas —
q u e é coisa estupenda, pois, passadas tão-somente pelo fogo e m u m espeto e meti-
das n a m a n t e i g a do m e s m o peixe c o m alhos e vinagre, q u a l q u e r coisa, é o m e l h o r
l o m b o de p o r c o — e o mais corpo do peixe ê t u d o c o m o toucinho, q u e n ã o q u e r e n d o
fazer e m m a n t e i g a o fazem e m "traçalhos e serve t a m b é m p a r a t e m p e r a r , e nisto
fazem g r a n d e negócio os tais índios. O "principal deles é t a m b é m g r a n d e negocian-
te; t e m sua casa c o m muito traste, ainda que mal a r r u m a d o s , c o n t u d o é levado do
interesse, ainda q u e tudo c o m ele acaba [em] u m "frasco de aguardente; sempre é
[ fl. 550v. ] b o m "tapuia, pacífico, a c a b a muita coisa com os outros, pois entre eles / / é tido e
havido p o r muito valente, c o m o t a m b é m toda a sua gente. A igreja, a i n d a q u e p e -
q u e n a , está c o m perfeição o r n a d a e t e m u m grande alpendre e m r o d a q u e a c o m o d a
t a m b é m muita gente. O "hospício é muito galante e t e m nele sempre dois padres.

A q u e se segue é dos C a n c a í b a s , tapuias muito feios, s e m p r e m a g r o s e estíticos,


n ã o p o r fome, pois estão e m u m rio m u i t o a m e n o e m u i t o a b u n d a n t e d e peixe,
caça e m a n t i m e n t o s , m a s p a r e c e p o r serem frenéticos t a n t o n a l u x ú r i a c o m o n a
g u e r r a , p o i s até q u a n d o v ã o p a r a ela l e v a m as m u l h e r e s consigo. D i z e m , e c o m
v e r d a d e , q u a n d o os p a d r e s lhes q u e r e m proibir as levem, q u e levando-as consigo
p e l e j a m c o m mais esforço à vista delas, e finalmente n ã o d ã o volta a l g u m a sem
q u e as levem consigo. Esta casta d e índios são muito obedientes aos missionários
e são t r a b a l h a d o r e s e amigos de servir aos b r a n c o s , p a g a n d o - l h e . T e r ã o d e almas
seiscentas e tantas; as fêmeas são formosas, fazem b o a s redes e cuias. A igreja é
b o a , os p a d r e s d e c o n t í n u o são dois, assistentes e m u m divertido "hospício e b e m
t r a t a d o s pelos índios, q u e os v e n e r a m m u i t o .
E as m a i s aldeias destes p a d r e s são correspondentes a esta, sem t e r e m coisa
a l g u m a de m a i o r n o v i d a d e de q u e se faça m e n ç ã o .
L o g o p o u c o s dias de viagem fica a fortaleza dos Pauxis; é fortaleza g r a n d e e b e m
p r e p a r a d a d e "bastimentos; terá trinta peças e nestas muitos de 48. T e m "capitão e
981

m a i s *cabos, g u a r n e c i d a d e trezentos soldados. É p r a ç a fechada c o m u m a g r a n d e


cisterna n o m e i o , casas ou quartéis p a r a todos, u m a capela d o s e n h o r do Bonfim
d e n t r o n a m e s m a fortaleza; t e m boas m u r a l h a s , seis guaritas, e m q u e estão g u a r -
das, p r i n c i p a l m e n t e d e noite. T e m u m a p o v o a ç ã o a o p é q u e terá d u z e n t o s casais,
e n t r e b r a n c o s , m u l a t o s e m a m e l u c o s , e t a m b é m t e m u m a a l d e i a d e índios q u e
a d m i n i s t r a m o "capitão e o "pároco. Estes servem p a r a o serviço d a fortaleza e d a
p o v o a ç ã o p a r a efeito d e se c o n s e r v a r p a r a a j u d a d e ser t e m i d a e d e f e n d i d a a
fortaleza, e n a tal / / t e m t a m b é m seus m u r o s e m g u a r n i ç ã o e algumas peças neles. [ fl. 551 ]
E p o v o a ç ã o aprazível pelo rio ser alegre e m u i t o largo; t e m boas águas e m u i t o
a b u n d a n t e d e peixes ê caças d o m a t o . F a z e m g r a n d e negócio p o r estarem e n t r e o
c a c a u e a *salsa.
D e s t a fortaleza p a r a c i m a , a l g u n s dias d e v i a g e m , fica o r i o c h a m a d o d o
J a p u r á , a o n d e c o m e ç a m as aldeias dos p a d r e s do C a r m o . P o r vários rios e lagos
situados n a b a r r a deste sobredito rio fica a aldeia dos T u p i n a b a r a n a s , e é m u i t o
g r a n d e . Só d e gente d e g u e r r a t e m oitocentas e terá [outros?] tantos e n t r e velhos,
m u l h e r e s e crianças. Está e m u m b o m sítio, c o m b o a vista, p o r ficar alta a o rio, o
qual é insuportável, e m r a z ã o das doenças. A á g u a é s e m p r e t u r v a d a e m u i t o r u i m
gosto e q u a s e t o d a s as mais q u e d e alguns rios nele fazem b a r r a são d a m e s m a
sorte doentias. As terras c u s t a m a reter as plantas, e m r a z ã o da m u i t a formiga, m a s
os índios desta se aproveitam, e é t a n t a q u a n t i d a d e nele, rio, e m as suas terras q u e
os "tapuias d o sertão dentro é quase o seu sustento, j u n t o c o m a l g u m a s raízes d e
certo p a u , q u e são a m o d o d e b a t a t a s grandes, e [estes?] as r a l a m e m u m a casca d e
p a u q u e t e m uns bicos curtinhos e grossos e m u i t o densos, e t e n d o isto e outras
"sevandijas d a terra p o u c o caso fazem do peixe ou caça. T o r n a n d o à aldeia, está
esta m u i t o b e m a r r u a d a n o seu tanto: as casas s e m p r e são d e tapuias, as p a r e d e s d e
b a r r o s e m m a i s a l i s a m e n t o , c o b e r t a s d e p a l h a e essa b e m d e f u m a d a , e m a i s as
p a r e d e s , p o r q u e e m tais casas n ã o se a p a g a o fogo p o r q u e além d e e s t a r e m a o p é
dele s e m p r e t ê m a l g u m a b í b u l a e suas b a t a t a s , seus peixes " m o q u e a d o s e caças,
pois esta c a s t a d e gente s e m p r e q u e r estar c o m a m ã o n a b o c a , a o m o d o d e crian-
ças, a i n d a q u e t a m b é m s a b e m ser duros à fome. M a s c o m o n ã o / / h á de isto ser [ fl. 5 5 lv. ]
assim se s e m p r e t r a z e m o ["almoceiro?] cheio? As "casas do "principal são b o a s ,
d e m e i o s o b r a d o , cobertas d e telhas e caiadas d e tabatinga, q u e é u m b a r r o m u i t o
b r a n c o q u e h á e m certas p a r t e s nas beiradas destes rios e c o m efeito p o u c o d e s m e -
rece a alvura d a cal; só o q u e t e m é tirar-se mais do q u e à m e s m a cal. E índio d e
m e d i a n a estatura, m u i t o tímido d e todas aquelas nações vizinhas a i n d a b á r b a r a s ,
t a n t o p o r seu valor c o m o p o r ter m u i t a gente e b o n s soldados; s e m p r e t e m g u a r d a s
a sua p o r t a d e índios a r m a d o s . Ele a n d a vestido c o m o b r a n c o , t e m b o m r e g i m e n a
sua gente, n ã o consente q u e lhe v ã o à sua p o r t a c o m gritarias ou d a n ç a s , só sim
lhas n ã o p r o í b e e m suas casas, mais a i n d a os instrumentos destes são toleráveis,
p o r q u e são q u a t r o gaitas g r a n d e s e c a d a u m a c o m sua voz, de m a n e i r a q u e t o c a d a s
p a r e c e u m realejo; é coisa q u e n ã o a g o n i a os ouvidos, m a s n e m assim os q u e r
ouvir o principal. Q u a n d o n ã o t e m b r a n c o s c o m q u e m estar, vai ter c o m os p a -
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d r e s , m a s p o u c a s vezes os n ã o t e m , p o r q u e o rio é d e m u i t o n e g ó c i o , e se os
b r a n c o s são d o R e i n o faz-lhe m u i t o a g a s a l h o e p r e s e n t e s e m i m o s , e e n t ã o lhes
c o m e ç a a p e r g u n t a r m u i t a coisa d e lá e os ouve c o m m u i t a a t e n ç ã o , pois o intento
e s u a v o n t a d e é ir p a r a o R e i n o a ver, e t e m a j u n t a d o seus d i n h e i r o s dos seus
negócios. O s p a d r e s l e v a r a m - n o à c i d a d e , q u e ficou a d m i r a d o , dizendo " Q u e será
o R e i n o à vista disso?", e se queria ficar n a cidade se os p a d r e s n ã o o i m p o r t u n a s -
s e m m u i t o d i z e n d o - í h e q u e os seus vassalos e filhos h a v i a m desconfiar d i z e n d o
q u e os p a d r e s ou b r a n c o s o t i n h a m m o r t o e se m e t e r i a m ao m a t o e se t o r n a r i a m
o u t r a vez a o seu *gentilismo. O índio ouviu estas razões c o m a t e n ç ã o e as aceitou.
O s "prelados e religiosos graves lhe fizeram m u i t o s m i m o s d e vários trastes, d e
[ fl. 552 ] q u e ficou m u i t o / / alegre e s e m p r e p r o m e t e n d o - l h e havia ir ver o R e i n o p a r a o
c o n t e n t a r , T e m esta aldeia b o a igreja c o m bons p r e p a r o s e o "hospício dos p a d r e s
t a m b é m está feito; c o m direção t e m c o n t i n u a m e n t e dois religiosos e u m " d o n a t o .
E m u i t o útil esta aldeia aos p a d r e s , e m r a z ã o de fazerem m u i t o c a c a u e "salsa, pois
este r i o , a i n d a q u e os outros falhem, c o m o às vezes s u c e d e , e ficam m u i t o s h o -
m e n s p e r d i d o s , e m r a z ã o dos gastos feitos e n ã o c o l h e r e m fruto, m a s este d e q u e
falamos s e m p r e d á o mais ou m e n o s , e n ã o é tão trabalhoso d e a p a n h a r c o m o nos
o u t r o s o é, p o r t e r e m m u i t o s a l a g a d i ç o s e a n d a r e m os " t a p u i a s q u a s e s e m p r e
metidos n a á g u a c o m m u i t o risco, e este é quase todas as suas b e i r a d a s d e t e r r a de
m a s s a p é , e assim m a n d a m os missionários muitos galeões c a r r e g a d o s de c a c a u e
salsa, e d e q u a n d o e m q u a n d o seu "colomím p a r a o c a c h i m b o do reverendíssimo
"provincial e o u t r o a o "prior e o u t r o ao "secretário, e m o r d e m a os conservar nas
missões, pois l e v a m b o a vida e fazem negócio g r a n d e .

L o g o [depois] desta, segue-se a dos C a m b e b a s . Está p o r u m b r a ç o d e rio e


n o fim está u m g r a n d e lago q u e e m terras dele está f u n d a d a . A aldeia n ã o t e m
o u t r o n o m e m a i s q u e a dos seus h a b i t a d o r e s ; é esta casta d e índios m u i t o feia,
p o r q u e assim c o m o n a s c e m logo lhes p õ e m duas t á b u a s , e a g r o s s u r a destas e
t a m a n h o se vai a c r e s c e n t a n d o c o m a i d a d e , e lhes p õ e m u m a d a testa até o meio
d a c a b e ç a e a o u t r a é detrás a u n i r a p o n t a c o m a o u t r a , e assim as a p e r t a m m u i t o
b e m , e a c a b e ç a t e n r a logo vai o b e d e c e n d o , de sorte q u e depois d e grandes ficam
c o m a c a b e ç a a g u d a c o m u m g u m e no m e i o , b e m delgado, as orelhas furadas è
p e n d u r a d a s , a b o c a p r e t a , a testa c h a t a e d i l a t a d a , os olhos ficam-lhe esporados
p a r a f o r a e "esgazeados; p a r e c e m o d e m ô n i o . E o p i o r é f a z e r e m o m e s m o às
[ fl. 552v. ] m u l h e r e s , q u e se lho n ã o fizessem n ã o h a v i a m s e r tão desastradas, m a s assim / /
só eles as logrem. E d o e n t i a a p a r a g e m , as águas m u i t o ruins, e é t a n t o o j a c a r é
q u e t a n t o q u e a b r e o u a q u e c e o sol n ã o se vê mais q u e j a c a r é s a b o i a r pelo lago,
q u e p a r e c e m m a d e i r o s . [Estes?] índios [usam] d e u m a s canoas m u i t o rasas e com-
pridas, a q u e c h a m a m ubás, até nesta casta d e e m b a r c a ç õ e s m o s t r a m sua mofineza,
pois a i n d a se n ã o viu gente mais bisonha. E assim está a aldeia cheia de aleijados,
p o r q u e os j a c a r é s , j á sem m e d o , lhes seguem as c a n o a s , e c o m o são rasas, q u a n d o
q u e se d e s c u i d a m e m m e t e r m a i s o r e m o n a á g u a certo está ir a m ã o j u n t o c o m o
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b r a ç o , e se acode c o m o o u t r o t a m b é m lho levam. F i n a l m e n t e , q u a n d o a n d a m e m


pescarias, m e t i d o s n a água e a o cacau, lhes fazem g r a n d e estrago. E, finalmente, é
u m a dor d e c o r a ç ã o o v e r uns sem p e r n a s ou só c o m u m a , outros s e m b r a ç o s e
o u t r o s e m n á d e g a s e outras p a r t e s mais, e outros todos cheios d e cicatrizes, "sestros,
ou fora os q u e v ã o p o r u m a vez. H á m u i t o cuidado no p o r t o c o m as crianças, n ã o
as d e i x a n d o lavar senão e m cima, n a p r a i a , e m cacimbas, e a i n d a assim é necessá-
rio vigias e c o r r e r c o m vigilância à p r a i a , a o n d e v ã o b a s t a n t e s í n d i o s c o m u n s
c h u ç o s , pois os j a c a r é s , m a n h o s o s , s o b e m à p r a i a a esperar "colomins q u e v ê m ou
b r i n c a r ou lavar-se, e q u a n t o q u e os a p a n h a m descuidados l e v a m a carreira direi-
ta a o m a r e n a b o c a a presa, pois cães são b e m p o u c o s nesta aldeia, p o r q u e tiran-
do à [gente?] o m e l h o r b o c a d o p a r a o j a c a r é é u m c ã o e e n q u a n t o o tiver n ã o
c o m e gente, e estão [estes?] monstros tão c o s t u m a d o s a gente q u e os peixes vivem
e m p a z sólida. A estes índios c h a m a m os outros c o m ida-d e-j a c a r e , e os p a d r e s
q u a n d o vão à c i d a d e ou m a n d a m alguns "efeitos é-lhes necessário p e d i r às outras
aldeias índios p a r a lhes r e m a r e m as c a n o a s , p o r q u e se a l g u m c a m b e b a a p a r e c e n a
c i d a d e / / se o n ã o m a t a m fica b e m m o í d o . É esta casta de índios m u i t o fraca, vil [ fl. 553 ]
e negligente, s e m h a b i l i d a d e n e m serventia; são desprezados dos m a i s . T o d o s os
mais índios se servem deles q u a n d o os a p a n h a m , e m r a z ã o do q u e os p a d r e s os
n ã o d e i x a m sair. S ã o fracos roceiros. A h a b i l i d a d e q u e t ê m [é] p l a n t a r e m m u i t o
a l g o d ã o e fazerem u n s p a n o s , de q u e hoje estão m u i t o a p u r a d a s a q u e l a s índias,
pois os fazem c o m muitos lavores e suas franjas a o redor. D a tinta q u e m a i s u s a m
nestes lavores são azul claro, tinta m u i t o fixa, q u a n t o m a i s se lava m a i s b o n i t a fica,
e a o u t r a é v e r m e l h o , u m t a n t o e s c u r a . Estes servem d e colchas p a r a c a m a s e
t a m b é m f a z e m suas r e d e s c o m o [ m e s m o ? ] " t e ç u m e , m a s m a i s fino e d u r a m
muito... *

Cópia interrompida no original.


o t i c f u n a i ó u ) J o s m n a m s s m m ^ a m a n

rio ouStfoz mat: notoria wte'armo de3>S cmhuirui. cnqiz


...üa^i/te heXedra lá&fyM, ou¿tAcada impejicao ani^iajjtma a tudindo ájUííuj, cfiqiMt Mn&oücax- dt Junada i) a qualjürra Segue úCafJO doji. ortLjjan to
t

"iíoéuijxla Commarcado Jlio daidlíorki cito dial delVaqan ouwnr daCffliia¡ ¿(M^IfcnüóJjcrayj, váta2iccL caitaladacm2o^iaoó^C(^oiuamií^orLi)¿íoóuÍdaóyutnociaif
f t t m t ¿ ^ó'J^tntcJpraxitno, aiaim
Wmtntía.djar^ñda.Strwi ai2¡ttiffa¿
} doJliooerd^Tcídiio deudoMioSna^iy;aueccrcao imferidaJérní. tm$}yede¿xou d$¿¿c ripeadjaiw qucemhiá JtoxaJtcUsst%/líomtmenlo memanujelaiauolical£^teridaaej.
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Com otmiprí/tGm!/cnirco&etm yuehútoria^ detonÁcczfje avromulaacaodaléi ^a^v.iaturaS^/ÍMi clieqacv ol0idador^ú ino)peMJ^menai Z$?mtfiaa,/jovótáaporJjjraditaj,eSinaáj^m^um do^/yojfolos der
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