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VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

"Pega no laço": por que essa expressão


ofende mulheres indígenas

Imagem: Arquivo pessoal

Luciana Ackermann
Colaboração para a Universa
19/04/2019 04h00

Curta e direta, a expressão "pegar no laço" retrata e marca profundamente a


história das mulheres indígenas. Seja na ficção ou na realidade, tamanha
violência ecoa de geração em geração entre os povos indígenas.

Renata Machado Aratykyra, da etnia Tupinambá, 29 anos, jornalista,


roteirista, produtora e poeta, lembra, por exemplo, de cenas de filmes de
faroeste, nas quais homens brancos destroem aldeias, violentam mulheres e

levam-nas em seus cavalos. Seguindo a máxima de que a vida imita a arte e TOPO
vice-versa, não são raros relatos de mulheres indígenas que foram "pegas
no laço" pelo homem branco.

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Daiara e Renata
Imagem: Arquivo pessoal

"Existe o fetiche sobre os corpos das mulheres indígenas enquanto objeto,


posse e propriedade. Como se estivessem à disposição de servi-los. O
desejo pelo domínio dos corpos das mulheres indígenas e também das
negras está e; presente no imaginário cultural e social. Nas narrativas, em
geral, somos chamadas pejorativamente de 'índia', não temos sequer um
nome", afirma Renata.

A jornalista destaca que o total desrespeito em relação às mulheres


indígenas é presente até mesmo em novelas "inocentes" e cita o folhetim
"Uga Uga", exibido na faixa das 19h, na Rede Globo, entre 2000 e 2001. "Na
composição do personagem, ridicularizavam uma indígena caracterizando-a
com dentes estragados, uma figura patética, submissa e com forte apelo
sexual. Foi difícil. Eu era bem nova e estava na escola, escutava muita coisa
calada, talvez por isso tenha me tornado jornalista".

Não é folclore 
TOPO
Renata expõe que não há o quê celebrar nesta sexta-feira (19). "O dia do
índio precisa ser desmistificado. Não queremos ser lembrados apenas no 19
de abril. Muito menos que crianças se vistam de índio como se fossemos
figuras folclóricas. Acaba sendo mais um período de resistência para a
gente, não de celebração. Queremos um dia real da consciência indígena, o
7 de fevereiro, por exemplo, foi instituído como data Nacional da Luta dos
Povos Indígenas".

A herança violenta dos colonizadores, que subjuga os povos originários,


forma o caldo cultural do estupro de mulheres, estendendo ao feminicídio,
segundo Renata, o que agrava ainda mais a situação é o "silenciamento"
dos crimes praticados contra a população indígena. Para tal critica, aponta
dados do relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado em
2010, mostrando que mais de uma em cada três mulheres indígenas são
estupradas ao longo da vida.

Para lidar com a dura realidade, Renata acredita que o melhor caminho é a
cultura. Não à toa, dedica-se a ocupar diferentes espaços e lugares:
"Conhecer, aprofundar e disseminar os saberes dos povos indígenas
fortalece a nossa própria identidade e nos empodera. Reconhecer nossa
essência é uma autocura. Acredito que ao amplificar nossas vozes,
conquistamos maior representatividade e direitos", diz.

Para reconhecer essa essência, Renata tem trabalhos variados: é


cofundadora da Rádio Yandê, a primeira radioweb indígena do Brasil,
criadora do podcast Originárias, presente no Spotify e em outras nove
plataformas, que integra a Central de Podcast Feminino PodSim, que
contará com entrevistas de artistas e músicos indígenas contemporâneos.

Também assina como co-roteirista da série documental "Sou moderno, Sou


Índio", que será exibida no CineBrasil TV. Renata também está na
organização do Festival Yby da Música Indígena, que será realizado em
novembro, em São Paulo, onde uma grande aldeia será erguida para
celebrar a cultura indígena tradicional e contemporânea. Faz ainda a
produção do centro de cultura indígena itinerante Casa Yandê.

Yuka era um Samurai


Em 2014, foi assistente de produção e de comunicação do músico Marcelo
Yuka no Observatório de Ecos. "Tá difícil, perdemos um guerreiro, um 
TOPO
samurai, que dizia: 'Era tudo a
carga mas o medo não media a
vida'. Da experiência de trabalhar
com Yuka fica a reflexão -- quando
temos sonhos temos que ser
persistentes e se preciso, sangrar
por eles", analisa a indígena, que
nasceu em Niterói e cresceu vendo
corpos carregados pelas favelas.
Imagem: Arquivo pessoal

Atualmente, divide-se entre o Rio


de Janeiro e a aldeia de origem de seu marido, no Mato Grosso do Sul. O
casal faz questão de passar os ensinamentos de seus povos ao pequeno
Kali Sini, de 3 anos. E quando chegar o tempo certo, Renata deverá passar
às novas gerações os ensinamentos de sua ancestralidade ligados às ervas,
plantas e outros saberes deixados pela avó materna.

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