DO MILENIO
ANJOS, SONHOS
{
HAROLD BLOOM
PRESSAGIOS
| E IMORTALIDADE
Tradugao de
Marcos Santarrita
fyqae) 495?
ii
xdente ou alheio do gnosticismo, estando
€ mais uma forga efetiva; Deus existe, mas est
um conceito niilista, em
campos de morte ¢ esquizolrenia, mas esté tio separado ¢ exilado que
Z que o deus deste
m de nosso cosmo, n’io
4 tho oculto que se tornou
Ao € responsivel por nosso mundo de
fica impotente, Estamos sem patrono, uma ve:
mundo, adorado (como disse Blake) com os nomes de Jesus e Jeova,
é apenas um tapalhao, um arcanjo-artes4o que atamancou a Falsa
Criago que conhecemos como nossa Queda.
Como americanos, somos hoje pés-pragmatistas; s6 admitimos
as diferengas que fazem diferenga. Faz consideravel diferenca acreditar
que remontamos a antes da Criagao; que sempre estivemos 14, Parte
particula de Deus. A autodependéncia € uma doutrina solitaria;
discorda vigorosamente da afirmagao de Marx de que a menor unidade
humana sdo duas pessoas. O simples gnosticismo nio se presta ao
culto comunal, embora sem diivida se tenha tentado isso, num ou
noutro tempo ou lugar. Qual seria a prece de um gnéstico? Um apelo
ao eu, talvez, para despertar, a fim de ser libertado pela gnose.
Emerson, profeta americano, o diz para nés: “E sempre melhor aquilo
que me da a mim mesmo.”
Vivemos hoje, mais que nunca, num pais onde muitissima gente é
gndstica sem o saber, o que € uma singular ironia. Quando Newt
Gingrich nos diz que nosso futuro econémico depende inteiramente
da informagao, eu me lembro que os antigos gnésticos negavam a
matéria e a energia, e optavam em vez disso pela informacio acima
de tudo. A informacao gnéstica tem duas consciéncias basicas: primei-
fo, a separacao, e mesmo alienacao, de Deus, que abandonou este
cosmo, e segundo, a localizacao de um residuo de divindade no eu
mais interior do gnéstico. Esse eu mais profundo no faz parte da
natureza, nem da histéria: € destituido de matéria ou energia, €
Portanto nao faz parte da Criagho-Queda, que para o gnéstico
constituem um € mesmo fato. Se Gingrich € um gnéstico direitista
americano sem o saber, tumbém abundamos em gnésticos esquerdis-
tas que nao o sabem, € que, como Gingrich, buscam a salvacao por
meio de uma informagio meio diferente. Gingrich est4 muito influen-
Giado pelo experto em choque do futuro, Alvin Toffler, cuja visio de 29uma nova América nio é suficientemente coerente para que eu possa
apreendé-la, a nao ser que o caminho para a apoteose passa por uma
tecnologia de informagio cada vez mais avancada. Eu proprio, num
momento de ironia, certa vez caracterizei o gnosticismo antigo como
uma teoria de informagio, mas pouco percebia que toda Ppardédia
possivel, mesmo do gnosticismo, logo estaria a nosso alcance, neste
Pais gingrichiano. Os inimigos do gnosticismo o tém confundido com
todo tipo de ideologia moderna, mas supGe-se que os amigos sio os
que mais danos Ihe causam. Nosso atual culto aos anjos nos Estados
Unidos € outra parddia degenerada do gnosticismo, embora neste
ponto eu tenha de voltar mais ou menos longe, atras, para explicar
como é realmente curioso nosso furor angelical, e por que veio para
ficar, pelo menos até termos entrado no século 21.
HA anjos por toda a Biblia hebraica, mas raramente tém interesse
fundamental, e muitas vezes so reedigdes editoriais, delegados de
Javé sempre que os redatores sacerdotais achavam que o autor J
anterior estava ousando demais na descrigao de Deus. Os anjos sé se
tomaram figuras dominantes, substituindo um Deus cada vez mais
fremoto, Nos textos apocalipticos dos judeus dos séculos 2 e 3 antes
da Era Comum, numa Palestina sob o dominio dos ‘sucessores
helenistas de Alexandre o Grande. Na verdade, os anjos nao foram
uma invencao judaica, mas vieram do cativeiro babilénico com os
judeus. Sua origem ultima é a angelologia da Pérsia zoroastriana, que
pode remontar até 1500 A.E.C. Zoroastro (forma grega de seu verda-
deiro nome, Zarathustra, preferido por Nietzsche) € uma figura vaga
para a maioria de nés, mas parece ter inventado nosso senso religioso
de apocalipse e milénio, idéias que no existiam antes dele. As vezes
curiosamente refratadas, as idéias originais de Zoroasto reapareceram
no judaismo apocaliptico tardio, no gnosticismo_ € no ctistianismo
inicial, e tornaram a vir & tona no ramo xiita do Isla, que domina olra
até hoje. O estudioso Norman Cohn, nossa grande autoridade sobre
co milénio, afirmou recentemente que 0 que une apocalipses judaicos
2 7 os Livros de Enoque e alguns dos Manuscritos do
pés-biblicas como Novo Testamento, € a visio zoroastriana
Mar Morto, assim como i sta entre forcas sobrenaturais do bem e do
que postula uma luta dualisia Co fo do bem @ o Reino de Deus
mal, uma luta que termina a como a existéncia do Deménio e dos
estabelecido na terra: poesureigd0 dos mortos, além de todo o
outros anjos or “apoio, parecem ser importagdes judaicas, crisis
30 mundo de anjos