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SISTEMA DE ENSINO PRESENCIAL CONECTADO

FORMAÇÃO PEDAGÓGICA EM SOCIOLOGIA

EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA: DESAFIOS À FORMAÇÃO DOCENTE

Campina Grande, Paraíba


2019
ÉC M A

EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA: DESAFIOS À FORMAÇÃO DOCENTE

Trabalho apresentado ao Curso (nome do


curso) da UNOPAR - Universidade Norte do
Paraná, para a Atividade Interdisciplinar.

Orientador: Profa. Cibelia Aparecida Pereira

Campina Grande, Paraíba


2019
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INTRODUÇÃO

Não se trata obviamente de impor à população espoliada e


sofrida que se rebele, que se mobilize, que se organize para
defender-se, vale dizer, para mudar o mundo. Trata-se na
verdade – não importa se trabalhamos com alfabetização, com
saúde, com evangelização ou com todas elas –, de,
simultaneamente com o trabalho específico de cada um desses
campos, desafiar os grupos populares para que percebam, em
termos críticos a violência e a profunda injustiça que
caracterizam a sua situação concreta. Mais ainda, que sua
situação concreta não é destino certo ou vontade de Deus, algo
que não pode ser mudado (FREIRE, 2005, p. 79).

A escola pública tem como compromisso garantir condições para seu corpo
discente, construir conhecimentos, atitudes e valores, contribuindo na formação de
cidadãos críticos, éticos e participativos nos contextos que os envolvem (BRASIL,
2004).
No entanto, para tanto é preciso uma superação de obstáculos, pois segundo
Atié (1999, p. 3), em sua análise sobre a escola pública: “Hoje, o desafio que se
coloca diante da escola é fornecer educação e informação para toda a vida... ela
precisa romper seus muros e estar plenamente inserida no seu tempo e na
comunidade a qual pertence.” Ações escolares devem ser consolidadas em um
contexto participativo, integrador de todos seus segmentos, sincronizadas com o
contexto atual, que requer uma política educacional capaz de contribuir na condução
do país ao pleno desenvolvimento, em conformidade com os princípios democráticos
em evolução.
Para concretizar esse escopo, é imprescindível que ocorra integração entre a
escola e a comunidade atendida, com reconhecimento e valoração dos saberes
extracurriculares e efetivação de companhias no trabalho educativo, atingindo o
maior contingente de pessoas em sua área de localização.
Diante disso, e partindo de uma reflexão sobre a situação-problema destacada
com a narrativa de um professor recém inserido (codinome de Antonio) numa escola
índigena. Muito distante da realidade que o docente já experienciou em sua carreira,
os alunos indígenas e a instituição educadora levantaram um leque de dúvidas e
questionamentos sobre sua posição naquele espaço. Conhecer a comunidade
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envolvente é importante para a resolução dos problemas que cada contexto escolar
encontra.
Devemos considerar que todos os participantes do processo educativo têm a
capacidade de elaboração propostas para a melhoria da educação. Esse processo
de interação deve ser pautado no diálogo e na confiança. Para isso a escola deve
oportunizar “situações de encontro” a fim de conhecer os recursos da comunidade e
os aspectos da sua realidade, visando à melhoria do ensino-aprendizagem.

DESENVOLVIMENTO

Vamos partir de alguns questionamentos levantados pela própria preposição da


situação-problema, tais como este profissional deveria trabalhar sua disciplina.
Como adequaria o currículo pensando em uma prática pedagógica que garanta a
aprendizagem e respeite as questões culturais da comunidade? De que maneira a
política da educação escolar indígena no Brasil pode fazer com que esses sujeitos
exerçam sua cidadania? E, finalmente, como a educação pode fortalecer a
valorização dessas culturas e permitir uma nova comunicação entre indígenas e não
indígenas?
Primeiro passo, é conhecer a comundiade envolvente, sua historicidade, seus
conhecimentos tradicionais, sua língua e seus costumes. Torna-se importante
ressaltar e reconhecer a funcionalidade dos conhecimentos não-formais, aqueles
não apresentados nos livros didáticos. Tais saberes, intitulados de populares e
tradicionais, são bases de muitas comunidades tradicionais, dentre elas as
indígenas.
Vamos supor que o professor Antonio ministre aulas de Ciências Biológicas.
Este pode utilizar o seu material didático sobre os estudos da flora em concordância,
ou mesmo num tipo de aliança, com os conhecimentos que a comunidade
envolvente possui sobre as ervas medicinais da região, assim como os saberes
sobre as árvores e plantas do ecossistema daquela localidade. A biologia também
pode conversar com os conhecimentos que alunos adquirem do seus núcleo familiar
sobre os peixes, mamíferos e reptéis da sua mata. Quais animais são caçados e
quais não são considerados adequados para o consumo de sua família.
De modo transversal a Educação Ambiental pode ser trabalhada numa escola
indígena de maneria bastante dinâmica. Posto que muitas dessas populações são
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atravessadas por conflitos de terras e desmatamento ilegal em seus domínios


territoriais. Quais animais estão em risco de extinção na floresta que cerca os
alunos? São questões bastante profundas e cotidianas para o corpo discente, que
podem ser adensadas pelo professor da escola.
Devo anotar que tais aberturas na sala de aula para a inserção do
conehcimento local é imperativo porque a Educação Escolar Indígena – é um direito
adquirido que assegura a afirmação das identidades étnicas. Seja pela recuperação
das memórias históricas, pela valorização das línguas e conhecimentos dos povos
indígenas e pela conformidade aos projetos societários construídos através da
autoniomia de cada povo uma escola voltada para Educação Indígena foi uma
conquista oriunda das lutas empreendidas por essas comunidades e seus aliados.
Trata-se, portanto, de um importante passo em direção da democratização das
relações sociais no país.
Como podemos de pronto anotar que a educação escolar indígena é recheada
de desafios, pois evoca complexas demandas no reconhecimento da diversidade de
mais de 225 povos e da sua busca por autodeterminação. Estes desafios foram
sendo enfrentados pela Secad/MEC com políticas de formação de professores
indígenas focadas nas licenciaturas e no magistério interculturais, de produção de
materiais didáticos e paradidáticos específicos, como também na ampliação da
oferta de educação básica nas escolas indígenas e de fortalecimento da interlocução
institucionalizada e informada de representantes indígenas com os gestores e
dirigentes do MEC (Ministério da Educação) e dos sistemas de ensino. Entretanto,
tais agendas encontram descotinuidades com as mudanças de governo e agentes
dentro do ministério. O processo de institucionalização da Educação Indígena ainda
é recente no nosso processo republicano, ressaltando que as diferenças étnicas
desses povos só fora realmente reconhecida no texto da Constituição Federal de
1988. Nesse sentido, estamos lidando com um direito em processo de construção.
Por estas razões é preciso salientar que na nossa própria historicidade como
nação, a educação como forma de letramento fora usada como instrumento
dominador nos primeiros séculos de colonização do nosso território. Anoto que no
processo de catequização, os missionários jesuítas procuraram antes se aproximar
dos indígenas, para conquistar sua confiança e aprender suas línguas. Esses
primeiros contatos entre jesuítas e índios ocorreram ora em clima de grande
hostilidade, ora de forma muito amistosa. Quando o índio se recusava a trabalhar ou
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se revoltava, opondo resistência ao processo de escravização (completa ou parcial),


ele era duramente perseguido e reprimido.
A princípio, para ensinar os índios a ler, escrever e contar, bem como lhes
inculcar a doutrina cristã, os missionários jesuítas percorriam as aldeias em busca,
principalmente, das crianças. Por não disporem de instalações fi xas e próprias para
o ensino, essas missões foram chamadas de volantes. Aos poucos foram se defi
nindo dois ambientes distintos onde os jesuítas ensinavam: as chamadas casas -
para a doutrina dos índios não batizados - e os colégios, que abrigavam meninos
portugueses, mestiços e índios batizados. Nos colégios a educação tinha um caráter
mais abrangente e estava voltada para a formação de pregadores que ajudariam os
jesuítas na conversão de outros índios.

Fotografia 1: Foto: Agência Brasil

Hoje, após a promulgação de nossa Carta Maior, a cultura e os saberes desses


povos devem ser respeitados. No entanto, como já apontei o processo de
institucionalização dessa Educação Indígena enfrenta variados desafios para sua
institucionalização.
Um desses desafios e é a falta de material didático adequado para abarcar
essas diferenças Podemos supor que o professor Antonio, pratagonista de nossa
situação-problema, como tantos outros professores que lecionam em escolas
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públicas, enfrente sérios problemas de falta de recursos didáticos gerando muito


desinteresse dos alunos em apreender as matérias apresentadas. Coloco em relevo
a disciplina de Sociologia, apontando que assim como Filosofia é uma disciplina
totalmente nova para os alunos do primeiro ano do ensino médio.
Para que as escolas indígenas sejam respeitadas de fato e possam oferecer
uma educação escolar verdadeiramente intercultural, que também sejam integradas
ao cotidiano das suas comunidades, torna-se necessária a criação da categoria
Escola Indígena nos sistemas de ensino do país. Por meio dessa categoria, será
possível assegurar às escolas indígenas autonomia, tanto no que se refere ao
projeto pedagógico quanto ao que se refere ao uso de recursos públicos para a
manutenção do cotidiano escolar, garantindo a plena participação de cada
comunidade indígena nas decisões relativas ao funcionamento da escola. Do ponto
de vista administrativo, identifificar como Escola Indígena o estabelecimento de
ensino localizado no interior das terras indígenas voltado para o atendimento das
necessidades escolares expressas pelas comunidades indígenas.
Tendo em vista o regime de colaboração da LDB, o art. 79 atribuiu à União: a
elaboração de normas relativas à Educação Escolar Indígena; a criação de
programas para fortalecer as práticas socioculturais e a língua materna de cada
comunidade indígena; a manutenção de programas para a formação de pessoal
especializado, destinado à educação escolar nas comunidades indígenas; o
estabelecimento de parâmetros curriculares adequados às comunidades indígenas;
e a elaboração e publicação de material didático específico e diferenciado.
Pela interpretação sistemática da LDB, verifi ca-se que o legislador inseriu essa
modalidade de ensino na Educação Básica, fazendo referência à especificidade e à
diferenciação nos arts. 26, § 4º, 32, § 3º; e no Título VIII – Das Disposições Gerais.
O art. 78 da LDB diz que o Sistema Federal de Ensino desenvolverá tão-somente
programas integrados de ensino e pesquisa para a oferta de educação escolar
bilíngüe e intercultural aos povos indígenas, e no art. 79 consta que a União apoiará
técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento da educação
intercultural às comunidades indígenas, desenvolvendo programas integrados de
ensino e pesquisa.
Outra questão de técnica de ensino de um professor não-indigena numa escola
indígena deve ser ressaltado como a noção de que nos processos educativos
tradicionais há muito pouca instrução. Não é próprio das sociedades indígenas o
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discurso pedagógico como o conhecemos: “Preste atenção: é assim que faz.


Primeiro, é preciso...”. Não. O modelo de aprendizagem indígena passa pela
demonstração, pela observação, pela imitação, pela tentativa e erro. Com essa
orientação, a política educacional para a modalidade de educação escolar indígena
tem se pautado pela necessidade de institucionalizar a escola indígena dentro dos
sistemas de ensino, garantindo aos estudantes indígenas os benefícios dos
programas de melhoria da qualidade da educação, ao mesmo tempo em que se
reforçam as ações específi cas de formação de professores indígenas e de produção
de materiais didáticos diferenciados

CONCLUSÃO

Apesar de o artigo 78 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996


estabelecer que “desenvolverá programas integrados de ensino e pesquisa, para
oferta de educação escolar bilíngüe e intercultural aos povos indígenas, com os
objetivos de: I. Proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação
de suas memórias históricas, a reafirmação de suas identidades étnicas; a
valorização de suas línguas e ciências; e II. Garantir aos índios, suas comunidades e
povos o acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade
nacional e demais sociedades indígenas e não indígenas”, o que acontece de fato
está longe do determinado há mais de 20 anos.
Pensar o currículo nas escolas indígenas é pensar a vida. Por exemplo, a
temática da terra e preservação da biodiversidade está profundamente relacionada à
vida, à saúde, à existência dos povos indígenas. Sem a terra, o ser “índio” é nada. A
discussão na escola sobre estes assuntos é importante para que cada aluno
indígena conheça os seus direitos assegurados em lei. Neste sentido, o contexto
fornece as temáticas a serem estudadas nas escolas, tornando-as espaços de rituais
de formação para a vida.
Não obstante o grande avanço que obtivemos em termos da educação escolar
indígena diferenciada, ainda existe um longo caminho a ser construído. Apesar da
luta constante e difícil, deparamo-nos constantemente com a ignorância, desrespeito
e total falta de informações e descaso de governantes e de membros das instituições
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de ensino público sobre as nossas reais necessidades e direito à educação


intercultural e de qualidade, que nos possibilite a participação plena de cidadão
brasileiro com nossas diferenças culturais asseguradas.

REFERÊNCIAS

ATIÉ, Lourdes. Editorial. Pátio-Revista Pedagógica, Porto Alegre, ano 3, n. 10, p. 3,


ago/out, 1999.

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Texto do Decreto-Lei n.º 5.452, de 1


de maio de 1943, atualizado até a Lei n.º 9.756, de 17 de dezembro de 1998. 25 ed.
atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 1999.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática


educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

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