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Capı́tulo 3

Módulo e Função Módular

A função modular é uma função que apresenta o módulo na sua lei de formação. No
entanto, antes de falarmos sobre funções modulares devemos definir o conceito de módulo,
também conhecido como valor absoluto.

3.1 Módulo de um número real


Definição 3.1: Seja x um número real. O módulo de x, denotado por |x|, é definido como:

x se x ≥ 0
|x| = (3.1)
−x se x < 0

Exemplo 3.1: Velamos alguns exemplos:


1. |5| = 5 4. | − 0, 2| = 0, 2
√ √
2. | − 5| = 5 5. | 8| = 8
3. |0| = 0 6. | − π| = π

Interpretamos geometricamente o módulo de um número real x, na reta, como sendo a


distância entre o ponto x e a origem. Em outras palavras, |x| corresponde à distância do
ponto x ao ponto 0.

1. Se x ≥ 0 então:

0 x

|x| = x

2. Se x < 0 então:

x 0

|x| = −x

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Como as distâncias são sempre positivas ou 0, então é fácil ver que

|x| ≥ 0.

Esta interpretação como distância será de grande ajuda para que possamos envergar
intuitivamente o significado de algumas propriedades envolvendo módulo, como por exemplo,
as seguintes

1. |x| = 0 ⇔ x = 0

2. |x| = |−x|

3. |x| ≥ x

as quais decorrem imediatamente da Definição 3.1, para qualquer x ∈ IR.

Exemplo 3.2: Resolva as seguintes equações:

1. |2x + 1| = 5

2. |9x + 2| = −3

Solução:

1. De |2x + 1| = 5 temos, pela Definição 3.1, que:

|2x + 1| = 2x + 1 ou |2x + 1| = −(2x + 1)

ou seja
2x + 1 = 5 ou − (2x + 1) = 5
Portanto,
x=2 ou x = −3
Logo o conjunto solução da equação é S = {−3, 2}.

2. Observe que não existe x ∈ IR tal que |9x + 2| = −3, pois, módulo é sempre positivo e
não podemos ter |9x + 2| < 0. Portanto, o conjunto solução da equação é S = ∅.

Proposição 3.1: Quaisquer que sejam os números reais a, b e x, tem-se:

1. |x|2 = |x2 | = x2 ;

2. |ab| = |a| |b|;

3. |a + b| ≤ |a| + |b|( Desigualdade Triangular );

4. Se a > 0, |x| ≤ a ⇔ −a ≤ x ≤ a;

5. |x| = x2 ;

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6. |a| − |b| ≤ ||a| − |b|| ≤ |a − b|;

7. |a − b| ≤ |a − x| + |x − b|.

Demonstração:

1. Sendo x2 ≥ 0, ∀x ∈ IR, temos que:


2
x = x2 ,

pela definição de módulo. Resta mostrar que

|x|2 = x2 .

Se x ≥ 0, temos
|x| = x
e, portanto,
|x|2 = x2 .

Se x < 0,
|x| = −x
e, portanto,
|x|2 = (−x)2 = x2 .

2. Do item 1 temos que:

|ab|2 = (ab)2 = a2 b2 = |a|2 |b|2 ,


ou seja,
|ab| = |a| |b| .

3. Provaremos, agora, a chamada desigualdade triangular e na sua prova faremos uso


do fato
|x| ≥ x, ∀x ∈ IR.

Temos

|a + b|2 = (a + b)2 = a2 + b2 + 2ab ≤ |a|2 + |b|2 + 2 |a| |b| = (|a| + |b|)2 .

Ou seja,
|a + b|2 ≤ (|a| + |b|)2 ,
donde obtemos

|a + b| ≤ |a| + |b| .

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4. Suponhamos que |x| ≤ a. Se x ≥ 0, temos

x = |x| ≤ a.

Sendo x ≥ 0, é claro que x ≥ −a, de modo que, neste caso,

−a ≤ x ≤ a.

Se x ≤ 0, então x ≤ a e
−x = |x| ≤ a.
Mas −x ≤ a é equivalente a x ≥ −a, de modo que

−a ≤ x ≤ a.

Portanto, provamos que

|x| ≤ a ⇒ −a ≤ x ≤ a.

Para provarmos a recı́proca, também distiguiremos os casos x ≥ 0 e x < 0. Suponhamos


que
−a ≤ x ≤ a.
Esta dupla desigualdade pode ser desdobrada em

x ≤ a e x ≥ −a.
Se x ≥ 0, |x| = x e a primeira desigualdade nos dá

|x| ≤ a.

Se x < 0, |x| = −x e, da segunda desigualdade, temos

|x| ≤ a.

Logo,

−a ≤ x ≤ a ⇒ |x| ≤ a.

Geometricamente,

−a 0 a
x

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5. Antes de provarmos esta parte, faremos uma
√ observação sobre o sı́bolo x, sendo x
um número real positivo. É comum usar x para indicar uma das raizes de x, sem
especificar qual dela, ou seja, colocar

x2 = x.

Tal notação pode conduzir


√ a uma contradição, vejamos:
Usando a fórmula x2 = x, temos
√ p
32 = 3 e (−3)2 = −3.
Mas √ p √
32 = (−3)2 = 9.
Logo,
3 = −3 (absurdo?!?!)

Para evitar este fato usaremos, sistematicamente, o sı́mbolo x para indicar √ a raiz
quadrada positiva de x. A raiz quadrada negativa de x será indicada por − x. Assim
especificado, temos que:

x2 é a raiz quadrada positiva de x2 , isto é, é o número positivo cujo quadrado
2
é x e o número |x| satisfaz tais condições, ou seja,

|x| ≥ 0 e |x|2 = x2 .
Logo, √
x2 = |x| .

6. Em virtude da desigualdade triangular, temos

|a| = |(a − b) + b| ≤ |a − b| + |b| ,


o que nós dá

|a| − |b| ≤ |a − b| . (I)


Pelo mesmo motivo, temos

|b| − |a| ≤ |b − a| .
Ora, é evidente que

|a − b| = |b − a| .
Consequentemente

|b| − |a| ≤ |a − b| ou |a − b| ≥ −(|a| − |b|). (II)

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De (I) e (II) e do item 4 concluı́mos que

||a| − |b|| ≤ |a − b| .

A outra desigualdade, é óbvia, e deixamos a cargo do leitor.

7. Esta última afirmação resulta, também da aplicção da desigualdade triangular à soma


a − b = (a − x) + (x − b), pois,

|a − b| = |(a − x) + (x − b)| ≤ |a − x| + |x − b| ,
ou melhor,

|a − b| ≤ |a − x| + |x − b| .
Como queriamos demonstrar.

Corolário 3.2: Dado um número real positivo a, qualquer que seja o número real x, temos:

|x| ≥ a ⇔ x≥a ou x ≤ −a.


Geometricamente,

−a 0 a
x x

Demonstração:
Seja |x| ≥ a. Suponhamos que exista um número real x que não satisfaz a condição

x≥a ou x ≤ −a.

Mas x não satisfaz esta última condição se, e somente se,

−a < x < a

o que, pelo item 4 da proposição 1.2, é equivalente a

|x| < a

contradizendo nossa hipótese.


Reciprocamente, se
x≥a ou x ≤ −a
então
|x| ≥ a.

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De fato, x não satisfaz a condição
|x| ≥ a
se, e somente se, x satisfaz a condição
|x| < a
novamente, pelo item 4 da proposição 1.2, |x| < a é equivalente a

−a < x < a,

o que nos a uma contradição da hipótese

x≥a ou x ≤ −a.

Portanto, esta demonstrado o corolário.

Corolário 3.3: Dados a, b, x ∈ IR, tem-se

|x − a| ≤ b

se, e somente se,


a − b ≤ x ≤ a + b.

Demonstração:
Com efeito, pelo item 4 da proposição 1.2, |x − a| ≤ b é equivalente a

−b ≤ x − a ≤ b.

Somando a a ambos os membros dessa desigualdade obtemos o resultado desejado, ou seja,

a − b ≤ x ≤ a + b.

Nota 3.1:
Todas as afirmações da proposição 1.2 e de seus corolários são ainda verdadeiras com <
em lugar de ≤ e > em lugar de ≥, como se verifica facilmente.

Exemplo 3.3: Resolva as seguintes inequações:


1. |x| < 3 3. |2x − 5| < 3
2. |x| > 4 4. |6 − 2x| ≥ 7

Solução:

1. Pela Proposição 3.1, item 4, temos que: |x| < 3 ⇔ −3 ≤ x ≤ 3.

2. Pelo Corolário 3.2 temos que: |x| > 4 ⇔ x < −4 ou x > 4.

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3. |2x − 5| < 3 ⇔ −3 < 2x − 5 < 3 ⇔ 2 < 2x < 8 ⇔ 1 < x < 4.
1 13
4. |6 − 2x| ≥ 7 ⇔ 6 − 2x ≥ 7 ou 6 − 2x ≥ −7 ⇔ x≤− ou x ≥ .
2 2
Exercı́cios 3.1: Resolva as seguintes equações e inequações:
1. |5x + 4| ≥ 4
2. |2x + 1| = 3
3. |x + 2| < 3
4. |x − 1| ≤ 1
5. |3x + 1| < 2
1 1
6. <
|x + 1| 2
7. |x2 + 1| < 3
8. |(x + 1)(x − 2)| ≥ 2
9. |x − 4| = |2x − 3|
10. |4 − 3x| > 0
11. |x2 − 3x| ≤ 1
12. 2 + |3x − 6| = 8
13. 3|x|2 − |x| − 2 = 0
14. |1 − x| = 1 − x

Exercı́cios 3.2: Sejam x, y ∈ IR, com y 6= 0.


1. Mostre que
1
= 1
y |y|

2. Usando o item anterior e a Proposição 3.1, mostre que



x |x|
=
y |y|

Exercı́cios 3.3: Resolva as seguintes inequações:


|x + 1|
1. ≤2
|2x − 1|
|x + 1| 1
2. <
|x − 1| 2

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3.2 Função modular
Dependendo dos valores de x uma função f (x) pode ser definida por duas ou mais sen-
tenças. Vejamos um exemplo:
Seja a função g : IR+ → IR dada por g(x) = x2 .
O domı́nio dessa função é formado pelos reais não-negativos. Ao desenhar seu gráfico,
tem-se apenas um pedaço da parábola.

Agora considere a função h : IR∗− → IR dada por h(x) = −x − 2.


O domı́nio dessa função é formado pelos reais negativos. Ao desenhar seu gráfico, tem-se
apenas um pedaço da reta.

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As duas funções g(x) e h(x) podem ser reunidas numa única função da seguinte forma:

x2 se x ≥ 0
f (x) =
x − 2 se x < 0

Definição 3.2: Seja g(x) uma função real. Definimos uma função modular como sendo a
função
f : IR → IR
x 7→ |g(x)|
Em outras palavras, chamamos de função modular uma função que é colocada dentro de um
módulo, ou seja, a função
f (x) = |g(x)|.

Observe que pela Definição 3.1 de módulo, tal função pode ser substituı́da por uma função
definida por duas sentenças, as quais são equivalentes à função anterior:

 g(x) se g(x) ≥ 0
f (x) =
−g(x) se g(x) < 0

Exemplo 3.4: Segue alguns exemplos de funções modulares.


1. f (x) = |x| 4. f (x) = |x + 3|
2. f (x) = |x2 − 3x| 5. f (x) = | − x|
1

x + 1
3. f (x) = 6. f (x) =
|y| x + 2

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Exemplo 3.5: As funções do Exemplo anterior podem ser escritas como uma função definida
por duas sentenças.

 x, se x ≥ 0
1. f (x) = 

−x, se x < 0  x + 3, se x + 3 ≥ 0
4. f (x) =
−(x + 3), se x + 3 < 0

 2 2
 x − 3x, se x − 3x ≥ 0
2. f (x) = 

−(x2 − 3x), se x2 − 3x < 0  −x, se x ≥ 0
5. f (x) =
x, se x < 0

 1
 , se y > 0
 |y|


3. f (x) =
 x+1 x+1

 , se ≥0

 1 
 x+2 x+2

 , se y < 0 6. f (x) =
|y|  
 x+1 x+1
 −

 , se <0
x+2 x+2

Exemplo 3.6: Fazendo o estudo de sinais podemos reescrever as funções apresentadas nos
itens 2, 4 e 6, do Exemplo 3.5, como:

 x2 − 3x, se x ≤ 0 ou x ≥ 3
1. f (x) =
−(x2 − 3x), se 0 < x < 3


 x + 3, se x ≥ −3
2. f (x) =
−(x + 3), se x < −3

 x+1

 , se x < −2 ou x ≥ −1

 x+2
3. f (x) =
 x + 1
 − , se −2 < x < −1


x+2

Exercı́cios 3.4: Escreva as seguintes funções modulares como uma função de duas sentenças,
tal como apresentado no Exemplo 3.6.
1. f (x) = |x2 − 4| 7. f (x) = |x − 1|
2. f (x) = |x| − 1 8. f (x) = |2x + 3|
3. f (x) = |x2 + 4x| 9. f (x) = |2x − 1| − 2
4. f (x) = |4 − x2 | 10. f (x) = |3x + 4| + 1
5. f (x) = |2x − 1| 11. f (x) = |x| − 3
2
6. |x + 4x + 3| − 1 12. ||2x − 2| − 4|

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3.2.1 Gráfico da função modular
Com o objetivo de esclarecer melhor, vamos construir o gráfico da função f (x) = | − x|.
Primeiramente, antes de construir o gráfico da função pedida, vamos analisar o gráfico
da função acima sem a utilização do módulo na sua lei de formação, ou seja, vamos fazer o
gráfico de g(x) = −x.

O módulo presente na lei da função faz com que a parte do gráfico que se localiza abaixo
do eixo x “reflita” no momento em que toca o eixo x. Mas por quê? Simples, a parte do
gráfico abaixo do eixo x representa os valores negativos de f (x) e, como o módulo de um
número é sempre um valor positivo, o gráfico de f (x) = | − x| fica:

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Exemplo 3.7: Construa o gráfico da função f (x) = |x2 − 4|.

Solução: Como no exemplo anterior, primeiro vamos construir o gráfico da função g(x) =
x2 − 4. Para construir o gráfico de uma função quadrática geral
f (x) = ax2 + bx + c
o qual é chamado de parábola, seguimos os seguintes passos:
1. Econtramos as raı́zes (zeros) da função, ou seja, resolvemos usando a fórmula de Báskara
a equação ax2 + bx + c = 0.
2. Determinamos o vértice da função, o qual é dado por
 
b ∆
− ,−
2a 4a
onde ∆ = b2 − 4ac.
3. Quando a > 0, a parábola tem concavidade voltada para cima, e quando a < 0 a
parábola tem concavidade voltada para baixo. Note que em qualquer um dos casos as
coordenadas de do vértice são sempre as mesmas.
Sendo assim temos que:
1. x2 − 4 = 0 ⇒ x2 = 4, ou seja, as raı́zes da equação são: x=2 ou x = −2
2. o vértice da parábola é: (0, −4)
3. como 1 > 0, temos que a parábola tem concavidade voltada para cima.
Portanto, o gráfico de g(x) = x2 − 4 é dado por:

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O módulo presente na lei da função faz com que a parte do gráfico que se localiza abaixo
do eixo x “reflita” no momento em que toca o eixo x. Sendo assim temos que o gráfico da
função f (x) = |x2 − 4| é dado por:

Exercı́cios 3.5: Faça o gráfico de todas as funções modulares apresentadas no Exercı́cio 3.4.

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