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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

2ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Processo Nº. : 0000204-74.2017.8.05.0150


Classe : RECURSO INOMINADO
Recorrente(s) : CAZELI LUIZ LEMOS JUNG

Recorrido(s) : BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S A

Origem : 2ª VSJE DOS JUIZADOS LAURO DE FREITAS


Relatora Juíza : MARIA AUXILIADORA SOBRAL LEITE

G
DRA, NESSE CASO , NÃO PRECISA DE PERÍCIA, DADOS DO CONTRATO NO EV 01 .
A PARTE AUTORA PEDE A REVISÃO, E A RESTITUIÇÃO DOS VALORES A MAIOR.
FIZ O CÁLCULO , APUREI AS TAXAS, ESTÃO ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO,
CABE REVISÃO. VERIFICAR A QUESTÃO DA RESTITUIÇÃO, DEFINI QUE CABE
RESTITUIÇÃO SIMPLES DOS VALORES PAGOS A MAIOR, EM RELAÇÃO AO VALOR
DA PARCELA DE ACORDO COM TAXA BACEN, TODAVIA DEVE A PARTE AUTORA
PROVAR NOS AUTOS OS PAGAMENTOS A MAIOR, CORRETO?
VERIFICAR O DISPOSITIVO .

VOTO-E M E N T A
RECURSO INOMINADO. REVISIONAL DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO POR
ONEROSIDADE EXCESSIVA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. JUROS REMUNERATÓRIOS. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O
PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO DIANTE DA INCOMPETÊNCIA
ABSOLUTA DOS JUIZADOS PARA JULGAR A CAUSA. DESNECESSIDADE DE
PERÍCIA CONTÁBIL. TEORIA DA CAUSA MADURA. CAUSA PRONTA PARA
JULGAMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 1013 DO CPC. EXISTÊNCIA DE
DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL. TAXA DE JUROS ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO.
PRÁTICA ABUSIVA. INTERVENÇÃO JUDICIAL NO CONTRATO PARA ADEQUAÇÃO
DA TAXA DE JUROS PACTUADA EM CONSONÂNCIA À TAXA MÉDIA AFERIDA PELO
BACEN. RESTITUIÇÃO SIMPLES DOS VALORES PAGOS A MAIOR CONDICIONADA
À COMPROVAÇÃO NOS AUTOS DO PAGAMENTO DAS PARCELAS. SENTENÇA
PARCIALMENTE REFORMADA.

1. Trata-se de recurso inominado interposto contra sentença que extinguiu o processo


sem julgamento de mérito, reconhecendo de ofício preliminar de incompetência absoluta
dos juizados especiais, por entender o magistrado sentenciante que: “ Depreende-se dos
autos que a questão judicial posta para ser resolvida tem pertinência com fato que desafia sua
comprovação à perícia técnica. Como se sabe, no sistema dos juizados prova dessa natureza não é
permitida. Ressalte-se que tampouco se produziu outra prova que pudesse substituí-la. .”

A parte recorrente busca a reforma da sentença, argumentando não ser o caso de


incompetência absoluta dos juizados, e no mérito reitera a argumentação já exposta em
sede exordial, alegando que a taxa de juros cobrada na operação é exorbitante, e destoa
da média de mercado apurada pelo BACEN , pugnando pela procedência dos pedidos
com a consequente revisão do contrato para adequação da taxa fixada.

3. A sentença impugnada merece reforma, haja vista a presença nos autos de


elementos suficientes para o julgamento do mérito da questão, não se fazendo necessária
a realização de perícia contábil. Com efeito, para a análise da eventual abusividade da
cláusula que fixou a taxa de juros, basta que sejam fornecidos pela parte acionante dados
relativos ao valor financiado, número de parcelas, valor de cada parcela, modalidade de
empréstimo e data da contratação, após o quê poderá ser realizada a análise comparativa
entre a taxa de juros contratuais e aquela calculada pelo Banco Central, através de
acesso ao sítio eletrônico do BACEN. A parte acionante colaciona no evento 01 dados
resumidos do contrato, com a presença de todos os elementos, sendo plenamente
cabível a apreciação do mérito da causa.

1. 4.. Por primeiro, cumpre-me considerar que a utilização de princípios e cláusulas gerais
sempre foi vista com muita reserva pelos juristas, ante sua inevitável indeterminação de
conteúdo e, no que concerne ao hegemônico individualismo jurídico do Estado liberal, o
receio da intervenção do Estado nas relações privadas, por meio do juiz. Todavia, numa
sociedade em mudanças para a realização das finalidades da justiça social e para o trato
adequado do fenômeno avassalador da massificação contratual e da parte contratante
vulnerável, as cláusulas gerais constituem ferramentas hermenêuticas indispensáveis e
imprescindíveis; surge então norma expressa não só no novo Codex Civil com no Código
de Defesa do Consumidor, visando restaurar o equilíbrio contratual.
2. Assim é plenamente viável à intervenção estatal através do Estado Juiz, para que se
opere à revisão dos contratos, desde que se vislumbre a presença de prestações
desproporcionais ou em razão de fatos supervenientes que tornem excessivamente
oneroso o contrato, não sendo o processo em tela, uma dessas hipoteses.

3. Após consagrar o entendimento de que "a estipulação de juros remuneratórios


superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (Súmula 382), o STJ, por
intermédio do Recurso Especial Repetitivo nº 1.112.879 expressou que a alteração judicial
de taxa de juros remuneratórios pactuada em contratos tais depende da demonstração
cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado, apurada pelo Banco
Central para a operação, parâmetro que deve também ser usado quando não constar no
ajuste o percentual dos juros ou quando não comprovada a taxa firmada.
4. É dizer, a parte que alega a abusividade da cláusula de instituição da taxa de juros
tem o ônus probatório de demonstrá-la nos autos, sob pena de indeferimento de seu
pleito. Para tanto, a jurisprudência tem fixado que a taxa de juros cobrada será abusiva se
destoar de forma desproporcional da média de mercado apurada pelo Banco Central, por
ser critério objetivo e aquele que mais se coadune com o objetivo de verificar em cada
caso a ocorrência da dita abusividade.
5. Na hipótese dos autos, a parte autora logrou êxito na demonstração da
abusividade da taxa de juros fixada. Conforme consta dos elementos trazidos aos
autos, em especial o contrato colacionado no evento 01, a taxa de juros contratuais
fixada para a operação, de 2,76% a.m, e 38,64% a.a , consoante cálculo realizado
pelo aplicativo calculadora cidadã disponível no site do Bacen, é superior à média
de mercado estabelecida pelo Bacen à época da contratação, a saber, 08/04/2015,
para a modalidade de empréstimo contratada ( financiamento de veículo), que era
de 1,84% a.m, e 24,55 % a.a. conforme dados disponíveis no site do Banco Central.
6. Nesta senda, é imperioso constatar que, estando à taxa pactuada acima da
média de mercado fixada pelo BACEN, parâmetro objetivo que vem sendo adotado
pela jurisprudência do STJ para aferir a abusividade da cláusula que fixa a taxa de
juros, mister haja a intervenção judicial no âmbito do contrato para a restauração
do equilíbrio , de molde a restaurar o equilíbrio no bojo da relação jurídica travada.
7. No que tange ao pedido de restituição dos valores pagos a maior, este merece
deferimento, todavia o quantum apurado deve corresponder aos valores
efetivamente pagos nos autos, é dizer, cabe a restituição das parcelas cujo
comprovante de pagamento fora juntado aos autos. Para que faça jus à restituição,
deve a parte acionante colacionar os devidos comprovantes de pagamentos
individualizados, de molde a quantificar o montante a ser restituído. Ainda sobre a
restituição, esta deverá se dar na forma simples, ante a ausência de comprovação
de má fé por parte da instituição bancária, não sendo caso de aplicação do art. 42,
parág.único do CDC.

11. . ISTO POSTO, voto no sentido de CONHECER DO RECURSO E DOU-LHE


PARCIAL PROVIMENTO, reformando a sentença, para reconher a competência dos
juizados especiais para julgar a causa, e no mérito, julgo procedente o pedido, para
determinar a revisão do contrato, adequando-o à taxa média de juros apurada pelo
BACEN, para a modalidade e época contratados, que era de 1,84% a.m, e 24,55 %
a.a., determinando ainda a restituição dos valores pagos a maior tendo por base o
valor da parcela apurado de acordo com a taxa BACEN, na forma simples, em
correspondência com a comprovação dos pagamentos efetivamente juntados aos
autos, corrigidos pelo INPC a partir da data de cada pagamento. Sem custas
processuais e honorários advocatícios, pelo êxito da parte no recurso.

.
Salvador, Sala das Sessões, 13 de JULHO de 2017
BELA. MARIA AUXILIADORA SOBRAL LEITE
Juíza Relatora
BELA CÉLIA MARIA CARDOZO DOS REIS QUEIROZ
Juíza Presidente
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA
2ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Processo Nº. : 0000204-74.2017.8.05.0150


Classe : RECURSO INOMINADO
Recorrente(s) : CAZELI LUIZ LEMOS JUNG

Recorrido(s) : BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S A

Origem : 2ª VSJE DOS JUIZADOS LAURO DE FREITAS


Relatora Juíza : MARIA AUXILIADORA SOBRAL LEITE

ACÓRDÃO

Acordam as Senhoras Juízas da 2ª Turma Recursal dos Juizados


Especiais Cíveis e Criminais do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, CÉLIA
MARIA CARDOZO DOS REIS QUEIROZ –Presidente, MARIA AUXILIADORA SOBRAL
LEITE – Relatora e ALBÊNIO LIMA DA SILVA HONÓRIO, em proferir a seguinte
decisão: RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO . UNÂNIME, de acordo
com a ata do julgamento. Sem custas processuais e honorários advocatícios por ser
a parte beneficiária da justiça gratuita.

Salvador, Sala das Sessões, 13 de JULHO de 2017


BELA. MARIA AUXILIADORA SOBRAL LEITE
Juíza Relatora
BELA CÉLIA MARIA CARDOZO DOS REIS QUEIROZ
Juíza Presidente

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