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PEDOLOGIA DAS ÁREAS INTERTROPICAIS

1 - INTRODUÇÃO:

Segundo a Embrapa (apud SANTOS, 2005, p.1), solos são:

Corpos naturais independentes constituídos de materiais minerais e


orgânicos, organizados em camadas e, ou, horizontes resultantes da
ação de fatores de formação, com destaque para a ação biológica e
climática sobre um determinado material de origem (rocha, sedimentos
orgânicos etc) e numa determinada condição de relevo, através do
tempo.

A rocha é o substrato do qual os solos se originam, isto é, quando a rocha é exposta na


superfície, fica sujeita as características/fatores ambientais muito diferentes daquelas do
ambiente onde se formou/consolidou. Dentre estes elementos se encontram:

• A água em estado líquido (H2O(l)):

A água na natureza é geralmente ácida (possui excesso de H+)1. Cerca de 99% das
rochas são compostas por oito elementos: Si+4, Al+3, Fe+2/+3, Ca+2, Mg+2, Na+, K+ e O-2 (único
ânion2) que se ligam com forças variáveis, ou seja, possuem afinidade geoquímica ou
eletronegatividade3 diferentes. E o hidrogênio é o elemento que possui maior
eletronegatividade. Isso significa que quando a água em seu estado líquido e naturalmente
mais ácido passa a ter contato com um mineral, leva a um processo de Hidrólise, que é um
processo de quebra pela água.
Exemplo: quanto maior o tamanho do átomo de um elemento, maior é o número de
ligações que ele consegue estabelecer e o K+ é um átomo muito grande que consegue se ligar
com cerca de seis átomos de oxigênio, mas a chegada de um átomo de H + leva a substituição
de potássio pelo hidrogênio, uma vez que a eletronegatividade do hidrogênio é maior que a do
potássio. Entretanto, como o átomo de hidrogênio é muito pequeno, o máximo de ligações que
ele consegue estabelecer são duas. Portanto, a substituição do potássio pelo hidrogênio gera
um desequilíbrio do mineral, tanto em questão de tamanho (já que o átomo do hidrogênio é
bem menor), quanto de carga, pois alguns oxigênios passam a sobrar no mineral sem nenhuma
ligação, logo, passa a existir um excesso de carga negativa livre no mineral. E lembrando que
elementos com cargas iguais se repelem, estes elementos negativos sem ligação passam a se
repelir e levam a destruição do mineral.
Vale ressaltar ainda, que toda reação química tende/busca encontrar um equilíbrio em
um sistema fechado. Mas o solo, não é um sistema fechado e, portanto, está em constante
transformação na busca de encontrar este equilíbrio, como por exemplo, a perda constante de
certos elementos químicos através da água que penetra no solo – processo de lixiviação.

• Organismos vivos:

Todos os organismos vivos produzem ácidos (excesso de H+), logo, de maneira


semelhante à água, os seres vivos também contribuem para a destruição dos minerais que as
compõem. Ex.: os liquens são capazes de se formar aobre ambientes como rochas, trata-se de
1
pH ácido (0 a < 7): excesso de H+; pH neutro (7): H+ = OH- ; pH básico (>7 a 14): excesso de OH- .
2
Exatamente por ser o único com carga negative, o oxigênio é geralmente utilizado como ponte/elo de ligação entre
os outros elementos durante a formação dos mineirais.
3
Força que um elemento tem de atrair uma carga contrária.

1
uma associação simbiótica entre bactérias, que fazem a fotossíntese e fungos, que funcionam
como uma raiz, sendo capazes de absorver água e nutrientes, sendo estes nutrientes cargas
positivas que tenham utilidade para seus organismos, mas para absorver essas cargas, liberam
para o ambiente outra carga também positiva e que não tenha utilidade pra eles, que
geralmente é o H+, o que torna a água ainda mais ácida e, portanto, favorece o processo da
hidrólise. E ao desagregar as rochas, os liquens também abrem espaço para que outros
elementos vivos mais exigentes consigam se fixar naquele local. Logo, mais H+ é liberado no
ambiente, mais a rocha é desagregada, mais organismos se instalam e mais solos são
formados.

• Oxigênio na forma gasosa (O2):

O oxigênio na forma gasosa tem um efeito significativo sobre os minerais, pois ele tem
maior facilidade de absorver elétrons, de modo que é capaz de “roubar” elétrons de outros
elementos levando a oxidação destes – quando estes elementos perdem elétrons para o
oxigênio, passam a ter um aumento relativo da sua carga positiva. Ex.: o Fe+2 (ferro reduzido) é
a forma de ferro que geralmente aparece nas rochas ricas em Fe. A chegada de um átomo de
oxigênio que rouba um elétron do Fe+2 torna este Fe+3 (ferro oxidado). Mas o átomo de Fe +3 é
menor que o Fe+2, logo, a oxidação de uma quantidade significativa de Fe, leva a um
desequilíbrio interno dos minerais uma vez que há a diminuição do tamanho dos átomos que o
compõem.

ROCHA + H2O(l) + ORGANISMOS VIVOS + O2(g) =

Desequilíbrio da rocha =

Solo: resultado da busca por um novo equilíbrio

Observações:

• Em áreas temperadas, nem sempre há água líquida, de modo que o processo de


intemperismo fica paralisado durante esses períodos. Ex.: inverno = período de
dormência. Já em áreas intertropicais, como geralmente tem muita água, o processo de
intemperismo e formação dos solos é muito mais rápido, logo, não é por acaso que
nessas regiões se encontram os solos mais evoluídos (Latossolos).
• Apesar dos solos terem como base as rochas e, portanto, herdarem muitas
características a partir destas, os solos possuem características particulares, uma vez
que não sofrem influencia apenas da rocha base, mas também das particularidades do
ambiente em que estão expostos.

2 - FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO:

Os solos são constituídos por materiais não consolidados, de modo que o intemperismo
é essencial para sua formação, pois tem o poder de decompor e desintegrar as rochas, bem
como outros materiais expostos aos agentes externos.
Nos estágios iniciais da formação dos solos, as características da massa que se forma
submetida ao intemperismo são quase que inteiramente as mesmas existentes no material
originário (BUCKMAN & BRADY, 1968). Portanto, solos em estágios iniciais de formação são
rasos e têm muito das características litológicas herdadas da rocha matriz.

2
Quando os agentes externos, relativos ao meio ambiente, passam a atuar, o perfil do
solo vai se consolidando e adquirindo características determinantes de suas propriedades, o
que não significa que os processos de formação não continuam a atuar (BUCKMAN & BRADY,
1968). Cabe lembrar que ao mesmo tempo em que atuam os agentes formadores do solo,
agentes destrutivos, como os processos erosivos, também podem estar presentes, interferindo
no desenvolvimento do perfil do solo.
Relacionados às forças intempéricas, cinco fatores, descritos a seguir, influenciam
também na formação e no desenvolvimento dos solos, gerando diferentes combinações que
contribuem para a distinção dos solos, interferindo, portanto, na classificação dos mesmos.

1. Material de origem:

Funciona como um fator controlador, em que a composição química e a estrutura do


material originário, além de influenciar características como textura, cor e fertilidade,
determinam a maior ou menor resistência do solo ao intemperismo. Buckman & Brady (1968)
destacam que, muitas vezes, a composição química e mineralógica do solo não só determina a
eficácia das forças do intemperismo, mas também a vegetação natural.
Conforme já foi dito, a maior parte da litosfera é composta por: Si +4, Al+3, Fe+2/+3, Ca+2,
Mg+2, Na+, K+ e O-2, sendo o Si o elemento mais abundante e muito comum nas rochas
silicatadas4. E como todos estes elementos são cátions (possuem carga positiva), é o oxigênio
(único ânion) quem faz as ligações químicas entre eles. No caso do Si com o oxigênio, forma-se
uma ligação muito forte que exige muita energia para romper estas ligações, de modo que a
resistência das rochas formadas por estes dois elementos é muito elevada, como por exemplo,
o quartizito, cuja composição é de basicamente Si e O. Mas no caso de rochas compostas por
outros elementos, às ligações são mais fracas e menor é a resistência do material ao
intemperismo, logo, maior será a atuação do processo de pedogênese.
Rochas ígneas: quanto mais tempo a rocha tem para se formar, mais tempo dá para os
cristais minerais se cristalizarem, como é o caso do granito, que é uma rocha muito resistente.
Enquanto que em rochas cujo tempo de resfriamento é muito rápido, os minerais não têm
tempo suficiente para cristalizarem e tendem a ser mais fraturados5, logo, menos resistentes,
como é o caso do basalto.
Rochas sedimentares: formadas a partir de sedimentos de rochas e organismos vivos
sintetizantes. Como se trata de uma rocha que tem sua origem em um material que já foi
fragmentado anteriormente, são naturalmente menos resistentes que as rochas ígneas. Ma se o
material de origem da rocha sedimentar for rica em Si, a rocha que se forma pode ser
extremamente resistente, inclusive, até mais resistente que uma rocha ígnea que não for rica
em Si, por exemplo. Ex. de rocha sedimentar resistente: cimento.
Rochas metamórficas: surgem a partir de alterações tanto de rochas ígneas, quanto
sedimentares devido ao aumento da temperatura e/ou pressão, isto é, não se trata de uma
mudança na composição química, mas sim de uma reorganização dessa composição – é
basicamente uma reetruturação que leva a uma modificação também na resistência da rocha.
Por exemplo: a restruturação de um granito (ígnea) para um gnaisse (metamórfica) leva a uma
perda de resistência, já que no gnaisse há uma organização baseada na densidade (formando
camadas de material rico em Si e Al alternados com material rico em Fe e Mg) e que
desenvolve linhas de fraqueza que antes não existiam. Inclusive, dependendo da forma em que
o gnaisse aflora na superfície6. As rochas metamórficas são mais resistentes que as suas
4
Rochas com muito Si são consideradas ácidas e rochas com menos Si são consideradas básicas.
5
Lembrando que o processo de resfriamento é semelhante a um recipiente quente, se colocado sob uma superfície
fria, tende a fraturar devido a brusca mudança na temperatura.
6
As diferentes formas em que a orientação dessas camadas alternadas e com suas linhas de fraqueza afloram na
superfície podem variar da seguinte forma: vertical (água penetra entre as camadas que formam a rocha, mas percola

3
respectivas ígneas, porém são mais resistentes que as suas respectivas sedimentares, pois o
metamorfismo torna os elementos que compõem a rocha sedimentar mais consolidados. Ex. de
metamorfismo sedimentar: calcário transformado em mármore.
Apesar da maioria dos solos originarem a partir do intemperismo da rocha (elúvio ou
atóctones – formados in situ), os solos também podem se formar a partir de sedimentos, dos
quais há das formas: sedimentos aluviais ou fluviais (depositados por influência dos rios) e
sedimentos coluviais (normalmente são materiais arrastados de um local para outro com uma
distancia relativamente curta).
No caso de materiais aluviais, pode-se afirmar que quanto mais fino o material, é sinal
de que o rio não tinha muito poder de carreamento, enquanto que materiais mais grosseiros,
como seixos, sinaliza que o rio tinha muito poder de carreamento. A dificuldade de
caracterização de solos aluviais está ligada ao fato destes poderem variar muito de uma
margem para outra. Vale ressaltar ainda, que estes solos estão entre os mais utilizados para a
agricultura. No caso de solos formados em terraços7, o horizonte superficial é formado por um
material todo misturado por organismos vivos, bem como pelo próprio crescimento das raízes
da vegetação. Geralmente, estes solos formados a partir de sedimentos fluviais se enquadram
na classe dos Neossolos Flúvicos.
Os solos originados de colúvios envolvem uma certa dificuldade na sua identificação,
pois uma vez que os organismos vivos passam a adicionar matéria orgânica e homogeneizar o
material coluvionar, este passa a aparentar ter sua origem ali. Mas podem ser identificados a
partir da análise mais profunda do seu material, que podem indicar, por exemplo, que aquele
tipo de material dificilmente teria se formado ali sob aquelas condições climáticas ou a partir
daquele embasamento rochoso. Uma forma de identificar solos coluvionares, é a partir do
gráfico de teor de matéria orgânica (bem como outros elementos químicos): materiais de origem
in situ seguem uma tendência natural (padrão de uma linha oblíqua continua), enquanto que em
materiais coluvionares essa tendência é rompida8. Apesar dos materiais coluvionares serem
naturalmente menos coesos quando recentemente movimentados, não tendem a sofrer muitos
movimentos de massa, ua vez que já estao depositados nas áreas mais baixas e planas.

2. Clima:

Trata-se de um fator ativo bastante influente no desenvolvimento do solo, visto que a


temperatura e a umidade influenciam profundamente sobre a intensidade dos processos físicos
e químicos, portanto, determinando em grau extensivo a natureza do intemperismo.
Pode-se dizer que o clima adiciona energia (através do sol) ao ambiente. Lembrando
que a temperatura contribui para processos de expansão e retração das rochas; bem como
influencia diretamente na velocidade das reações químicas e biológicas9, de modo que quanto
mais elevada à temperatura, mais aceleradas são essas reações.
A adição de água ao ambiente gera processos de hidrólise e lixiviação, entre outros –
lembrando que cada elemento químico tem um tipo de comportamento em relação à água,
sendo alguns mais solúveis que outros10. Lembrando ainda que quanto mais evoluídos os solos,
mais foram lixiviados.

num período de tempo muito curto), oblíquo (mais facilmente intemperizada, pois a água além de penetrar entre as
camadas que formam a rocha tem mais tempo para percolar na mesma) ou horizontal (é a mais resistente, pois a água
não consegue penetrar entre as camadas).
7
Antigas planícies de inundação que atualmente não são mais cobertos por água.
8
Para fins da gênese dos solos, isso não tem importância significativa, mas para a geomorfologia este tipo de
informação é muito significativa.
9
Quanto mais baixa a temperatura, menor é o metabolismo dos organismos e menor é a sua atuação.
10
Al e Fe – baixa solubidade; Si – média solubidade; Ca, Mg, K e Na – alta solubidade e ao memso tempo são os
principais nutrientes dos solos.

4
Devido à influência climática, geralmente o horizonte A das áreas tropicais são
pequenos mesmo sob uma vegetação exuberante, tal fato ocorre em função da presença de
água e temperaturas elevadas que favorecem que o processo de decomposição seja tão rápido
quanto o processo de produção da matéria orgânica11. Já em áreas temperadas, encontramos
horizontes A muito espessos (até 1m), pois durante o período de temperaturas mais baixas, os
microorganismos decompositores ficam numa espécie de dormência e permite o acúmulo de
matéria orgânica. Em ambientes semi-áridos, geralmente o horizonte A é pouco espesso12
(cerca de 5cm), pois há pouca vegetação para virar matéria orgânica e essa é rapidamente
decomposta devido as elevadas temperaturas.

3. Organismos:

Os organismos vivos também funcionam como fatores ativos, pois adicionam matéria
(ex.: ácidos orgânicos e matéria orgânica) e energia ao solo. Além do processo de adição,
determinados animais (mesofauna13) são os responsáveis pela homogeneização do solo, bem
como decompõem materiais orgânicos14 auxiliando na formação do húmus. Quanto à cobertura
vegetal, a penetração do seu sistema radicular no solo, a pressão gerada pelo próprio
crescimento e as suas excreções orgânicas aceleram o intemperismo. Em contrapartida, age
como moderadora das influências climáticas e ameniza a atuação de processos erosivos.

4. Relevo:

A topografia funciona como fator controlador, podendo acelerar ou retardar o trabalho


das forças climáticas, em outras palavras, controla a taxa de pedogênese sobre a taxa de
erosão. De maneira que geralmente nas áreas mais planas a pedogênese tende a ser maior
que 1 em relacao a erosão e mais profundos são os solos, ex.: Latossolos do cerrado brasileiro.
Já em áreas de relevo mais movimentado, essa taxa tende a ser menor que 1 e os solos são
mais rasos e pouco evoluídos, dependendo da declividade, nem chegam a formar solos.
Mas há exceções devido a outros fatores que também influenciam: ex. 1: no Norte de
Minas há áreas cujos solos estão em áreas mais planas, mas que são bastante rasos e
praticamente sem utilidade agrícola, isso ocorre porque praticamente não há água na região,
logo, não há intemperismo suficiente para a evolução dos solos (apesar da rocha base ser o
calcário, cuja resistência é muito baixa); ex. 2: na região de mares de morro de Minas, apesar
do relevo ser movimentado, há muitos solos profundos (Latossolos) nos topos de morros, cuja a
explicação é que eram antigas áreas planas, mas que forma fortemente erodidos devido a
alteracoes climáticas e atuação de tectonismo.

11
No processo de decomposição, 70% do material é água e dos 30% restantes, 60% são carbono e que grande parte
volta para a atmosfera. O restante são nutrientes (constitui o que denominamos de húmus) devolvidos para o solo e
que podem ser novamente absorvidos pela vegetação (processo de ciclagem) ou serem lixiviados.
12
Muitas vezes constituem horizontes A fraco.
13
Insetos e anelídeos: formigas, cupins, minhocas, etc.
14
Cerca de 90% da matéria orgânica dos solos é de origem vegetal.

5
5. Tempo:

Trata-se de um fator passivo, visto que não adiciona e nem leva a perda de nada. Mas
é de fundamental importância, uma vez que se trata do período real em que os materiais de
origem tenham sido submetidos ao intemperismo e aos agentes externos.
Há dois tipos de idade, a idade absoluta – tempo de exposição da rocha origem – e a
idade relativa – relacionada à evolução/maturidade dos solos, é uma idade mais importante
para o processo da pedogênese, pois comanda as características do solo e, portanto, o seu
potencal agrícola.

3 – PROCESSOS DE FORMAÇÃO DO SOLO:

A superfície terrestre apresenta uma grande diversidade de solos em função das


diferentes combinações de seus fatores e processos de formação gerais e específicos.
O Brasil, país quase que inteiramente inserido no domínio tropical úmido, possui uma
variedade de solos com características próprias, mas que, em seu conjunto, também
apresentam atributos comuns, como, por exemplo, composição mineralógica simples, grande
espessura e horizontes predominantemente nas cores amarelas e vermelhas. Geralmente, são
solos empobrecidos quimicamente e menos férteis que os de regiões temperadas – reflexo das
características dos seus principais minerais componentes e dos processos de formação. Toledo
(2003) afirma ainda que o país está inserido em uma área de grande estabilidade estrutural,
sendo, portanto, o fator climático predominante na formação dos solos.
Adotamos a classificação estabelecida pela Embrapa (2006), que elege os fatores de
formação como os principais critérios para a delimitação de classes pedológicas.

6
3.1 – Processos gerais de formação dos solos:

A formação dos solos envolve quatro processos gerais dos quais todos os solos
passam, ainda que em diferentes intensidades:

1. Adição: de matéria (sedimentos, cinzas vulcânicas, água, etc) e/ou energia (sol como
uma das principais fontes de energia). O homem também pode adicionar elementos no
solo – como água, nutrientes/fertilizantes, resíduos industriais, calcário, etc – e
influenciar no comportamento dos solos, de modo a até mesmo construir um novo solo
ou alterá-lo drasticamente.
2. Remoção: ocorre principalmente via lixiviação e erosão, em ambos o principal agente é
a água, especialmente em áreas tropicais. Lembrando ainda que apesar das plantas
absorverem nutrientes dos solos, em ambientes naturais, estes elementos retornam
para os solos. Enquanto que em ambientes antropizados, estes nutrientes não retornam
para o solo já que o vegetal é totalmente retirado. Além disso, a retirada da vegetação
torna o solo mais suscetível aos processos erosivos e, portanto, a perda de massa. Vale
lembrar também, que a pastagem também leva o solo a perder nutrientes.
3. Transporte: ou realocação de material dentro do perfil do solo. Pode ser ascendente
(ex.: realizado pela água sob efeitos da capilaridade15) ou descendente (ex.: água sob
efeitos da gravidade). Os elementos que podem ser transportados são: água, matéria
orgânica, argila, materiais em solução e sais. O transporte implica na perda de um
horizonte para outro, mas não há a perda do solo em si.
4. Transformação: trata-se de reações químicas. Pode ocorrer com os minerais, como a
destruição dos minerais primários e posterior recombinação dos elementos que
sobraram formando um mineral secundário16. Bem como a quebra por decomposição
completa da matéria orgânica gerando húmus. Lembrando que a matéria orgânica é o
que dá a cor ao solo, especialmente no horizonte A, onde é mais presente.

3.2 – Processos específicos de formação dos solos:

Além destes processos gerais, influenciados pelos fatores de formação, bem como pela
ação diferenciada de um ou mais processos gerais, alguns solos passam por processos
específicos que são essenciais na determinação de suas características e, por conseguinte, em
sua classificação, dentre os quais, no Brasil, os mais freqüentes são:

• Hidromorfismo:

Os processos gerais mais atuantes são o de transformação17 e o de adição18


condicionados pelo excesso de água que predomina nos ambientes encharcados ou saturados
na maior parte do ano, ex.: veredas, várzeas e mangues (geralmente estão em áreas mais
baixas do relevo).
Os microorganismos aeróbicos que geralmente decompõem a matéria orgânica, porém,
neste caso os decompositores são os anaeróbicos, que ocorrem em menor quantidade que os

15
Fenômeno físico resultante das interações entre as forças de adesão e coesão da molécula de água. Graças à
capilaridade, a água desliza por entre poros dos materiais que compõem o solo.
16
Os minerais primários geralmente tem tamanho areia, enquanto que os minerais secundários geralmente tem
tamanho argila – devido a menor quantidade elementos que o compõem já que parte foi perdida.
17
Redução do ferro.
18
Água e matéria orgânica.

7
aeróbicos e que, além disso, possuem um metabolismo mais lento, logo, há um certo acúmulo
de matéria orgânica nestes solos, o que resulta em um horizonte A profundo e muito preto.
Morfologicamente, estes solos geralmente possuem: horizonte H (hístico19) ou A com
suas características bastante influenciadas pela forte presença de matéria orgânica;
normalmente, nestes solos não há formação de horizonte B, pois a elevada quantidade de água
impede a evolução do solo; e por fim, um horizonte C geralmente gleizado (Cg – de coloração
branca a cinza em função do Fe2+).
A maior parte das espécies vegetais destes ambientes são adaptadas e captam o ar
através das folhas e distribuem para o restante da planta (aerênquima).
A ausência de oxigênio em ambientes encharcados favorece a redução do ferro, pois os
organismos anaeróbicos presentes nestes locais doam elétrons para o Fe3+ o transformando em
Fe2+, fazendo com que o ferro passe de pouco solúvel para muito solúvel, o que altera a cor dos
solos e este acaba ficando com coloração cinza ou branca, já que é o Fe3+ que dá cor ao solo e
neste caso, serão transformados em Fe2+ que não dá cor ao solo20. Pode ocorrer nestes solos
nas regiões próximas as raízes das plantas ou em locais com maior presença de oxigênio, a
transformação do Fe2+ em Fe3+ em partes do solo gerando manchas amarelas, vermelhas ou
alaranjadas, denominadas mosqueados. Os mosqueados ocorrem sempre associados as
raízes, mas só são percebidos nos horizontes e camadas mais claras, pois a matéria orgânica
acumulada no horizonte A inibe a sua percepção.
A tendência é que estes mosqueados se desenvolvam cada vez mais, pois o ferro tende
mais a ser oxidado que reduzido. Quando a concentração do ferro alcança um nível muito
elevado, pode deixar de ser um mosqueado (mancha colorida) e passe a ser uma plintita, que
além da coloração, devido a maior concentração de ferro, é mais dura e densa que o solo.
Normalmente a plintita se forma em locais que há variação do nível freático, havendo um
período em que o solo fica seco. E se este processo de variação do nível freático tiver
continuidade, a plintita endurece de forma irreversível e passa a ser denominada de
petroplintita, canga ou laterita, que por sua vez, podem ficar espalhadas e pequenas, ou se
unirem formando concreções bem grandes. Observação: quando se chega no nível de
petroplintita, denominamos este processo de laterização, apesar de ter começado pelo
hidromorfismo em algum momento, pois neste caso se trata de uma concentração de ferro.
Estes solos são classificados em: Gleissolo (possuem horizonte A ou H com < 40cm) ou
Organossolo (com horizonte H com igual ou > 40cm) – muitas vezes estes solos ocorrem lado a
lado.

• Latolização ou Latossolização21:

Os processos gerais mais atuantes são o de perda (nutrientes e silício) e o de


transformação (de minerais primários em secundários). Ocorrem em locais com alta
precipitação e temperatura, drenagem livre e relevo aplainado (aspectos que permitem que
ocorra a infiltração da água no solo até alcançar o nível freático).
A lixiviação é responsável pela perda dos elementos químicos mais solúveis (Ca, MG,
K, Na), sendo que esses elementos são necessários para a nutrição vegetal, ou seja, há a
formação de um solo menos fértil, além de levar a uma concentração relativa22 de Fe e Al, pois
estes dois são muito pouco solúveis em água e por isso, não são perdidos por lixiviação.

19
Horizonte orgânico com teor de carbono orgânico maior que 80g/Kg.
20
O Fe3+ precipita sob duas formas minerais: hematita (vermelha) e goethita (amarela) – é o que dá coloração ao solo
(além da matéria orgânica). Já o Fe2+, além de solúvel, não dá cor ao solo.
21
É o processo mais comum no Brasil, com exceção do Nordeste Brasileiro.
22
Não há adição destes elementos, mas como há perda das bases, em termos de proporção, estes elementos ganham
em importância nestes solos.

8
A perda dessas bases pela lixiviação, levam a intensa transformação dos minerais
primários em secundários, de modo que o único mineral primário que resta nesses solos é o
quartzo, devido a sua elevadíssima resistência. Os minerais secundários gerados são
geralmente arredondados o que implica numa maior estabilidade.
Os solos resultantes deste processo tendem a serem ricos em argila (pois os minerais
secundários são menores, formando mais essa fração textural), pobres (devido a elevada
lixiviação), profundos (com horizonte B muito espesso – maior ou igual a 50 cm – denominados
de Bw), bastante homogêneos, resistentes a erosão devido a sua alta capacidade de infiltração
e retenção de água (elevada concentração de microporos23 e macroporos24) e pela própria
tendência de localização em áreas mais aplainadas.
Portanto, apesar de pobres, possuem alta aptidão agrícola, pois, excetuando-se a falta
de nutrientes (que pode ser solucionada a partir da adição de fertilizantes), atendem a outras
exigências para uso. Denominados de Latossolos.

• Podzolização:

Envolve o transporte descendente de material (argila ou húmus) do horizonte A para o


horizonte B.

1. Transporte descendente de argila:

Para que a argila seja transportada, precisa estar dispersa, uma vez que agregados
geralmente não são passíveis de serem transportados. Ciclos de umedecimento e secagem
favorecem a dispersão da argila, principalmente no horizonte A que é o mais superficial, logo, o
mais exposto aos agentes externos. Após a desagregação, por ser muito pequena/leve25, acaba
sendo é transportada pela água do horizonte A em direção a B, entretanto, em B, encontra uma
série de agregados e acaba que a água perde energia e a argila passa a se depositar sobre os
agregados26, o que reduz a porosidade de B, uma vez que seus poros passam a ser
preenchidos pela argila. Como conseqüência, a água infiltra com uma boa velocidade em A,
mas tem dificuldade de infiltrar em B (há uma quebra da velocidade), logo, A fica rapidamente
saturado e passa a haver um aumento do escoamento superficial e, portanto, o que torna este
tipo de solo bastante susceptível a erosão, principalmente, em sulcos, o que é agravado pela
ocorrência deste solo em locais de relevo movimentado27.
Além disso, no contato entre A e B, também há um escoamento da água e a água
diminui o atrito, passando a haver escorregamentos e rastejamentos entre estes dois
horizontes.
Quando este processo de podzolização da argila é muito intenso, A fica praticamente
sem argila e B passa a acumular tanto a argila que já possuía, quanto a argila transportada de
A, havendo uma diferença textural muito grande entre estes dois horizontes (argila em B é
muito maior que em A).

23
Responsáveis pela retenção de água – normalmente ficam dentro dos torrões/agregados do solo.
24
Responsáveis pela infiltração da água – normalmente entre os agregados do solo.
25
Tamanho coloidal (< 0,002), transportada principalmente em suspensão.
26
Ao cobrir os agregados, a argila deixa a superfície destes agregados mais brilhantes, é o que denominamos de
cerosidade.
27
Tal processo favorece o desenvolvimento da erosão tanto laminar (levando a perda do horizonte A), quanto em
sulco, mas não chega a causar voçorocamos, uma vez que o horizonte B é muito coeso e não permite um grande
aprofundamento destes sulcos.

9
Em alguns casos, a perda da argila em A é tão intensa que se forma um horizonte E
entre estes dois horizontes, trata-se de um horizonte marcado pela perda (eluviação) de argila28,
sendo praticamente constituído só por areia, o qual normalmente tem cor mais clara que o
horizonte B, em função da presença de maior quantidade de areia, que é pouco eficiente na
pigmentação do solo e quando completamente branco, chamado de E álbico.
Este processo de formação é o segundo mais comum no Brasil e pode formar quatro
tipos de solos: Argissolos, Luvissolos, Nitossolos e Planossolos – que na antiga classificação
eram chamados de Podzólicos.
Estes solos tendem a ser mais férteis que os Latossolos, pois uma vez que a argila
diminui a taxa de infiltração a partir de B, menor é também a lixiviação. São solos com potencial
agrícola e bastante utilizados, entretanto, demandam o uso de técnicas complexas de uso e
conservação (terraceamento, curvas de nível, não deixar sem cobertura vegetal, etc), pois do
contrário são facilmente erodidos.
Um dos fatores que auxiliam na percepção de argissolos é que os agregados do
horizonte B são tão firmes que só saem inteiros, por isso é difícil limpar o perfil que fica com a
superfície bastante irregular.

2. Transporte descendente de húmus:

Na maior parte dos solos, o húmus29 (matéria orgânica decomposta) se concentra no


horizonte A, principalmente em função da forte atração/união entre este húmus e a argila. No
entanto, em solos arenosos30 a formação destes complexos é dificultada pelo teor muito baixo
de argila, o que faz com que o húmus fique mobilizável e seja transportado pela água do

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Pois ao contrário da parte mais superficial do solo (como em A), não há um mínimo de matéria orgânica para
prender a argila (já que possuem cargas opostas e isso as atrairiam, caso estivessem em contato).
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Tão leve quanto a argila.
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O transporte de húmus só ocorre em solos arenosos (constituição textural com mais de 70% de areia), muito
associados a arenitos e quartizitos (materiais que intemperizados geram textura areia).

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horizonte A em direção as camadas mais profundas do solo e também para os níveis
freáticos31.
Parte do húmus transportado passa a se acumular no horizonte B, formado o chamado
B espódico (Bh), que é um tipo de horizonte muito rico húmus e devido a isso possui uma
coloração bastante escura, chegando a lembrar um A enterrado, geralmente, o A destes solos
chegam a ser at’;e mais claros que o Bh.
Além disso, a percolação da água com alta concentração de húmus (que contém muitos
ácidos orgânicos) causa a formação de um horizonte entre o A e o B, o horizonte E, que nesse
caso recebe a adjetivação de E álbico em função da “lavagem” dos grãos de quartzo da areia
com a água acidificada, o que o torna bastante branco.
Os solos formados por este processo são denominados de Espodossolos, antigamente
chamados de Podzol. São solos de pouca significância geográfica no Brasil e que não
possuíem aptidão agrícola, pois são praticamente constituídos por areia (que não armazena
água), de pH muito baixo e que não tem capacidade de troca catiônica (CTC). A vegetação
destes solos é a capinarama (arbórea raquítica).

• Halomorfismo:

É um processo natural que envolve a forte atuação do transporte ascendente de sais, o


que só é possível em locais onde a evapotranspiração é bem maior que a precipitação e os
solos são geralmente rasos, potencializando os efeitos da temperatura. O relevo mais aplainado
também favorece, uma vez que evita a migração da água pela declividade.
Neste processo ocorre o acúmulo de água no contato solo rocha, intemperizando a
mesma, e com isso, os sais desprendidos da rocha solubilizam-se em água, sem serem
lixiviados, pois não há presença suficiente de água para que isso ocorra. Assim, com a elevada
evapotranspiração, esses elementos ascendem conjuntamente com a água (efeito de
capilaridade), precipitando-se em superfície, formando manchas brancas salinas.

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A água que recebe parte deste húmus ganha uma coloração também escurecida e possui pH baixo (devido a maior
acidez), mas nunca possui aspecto barrento, pois tende a flocular e precipitar todas as impurezas, ou seja, todas as
sujeiras ficam depositadas no fundo ou separadas da água.

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Os solos formados por esse processo são bastante pontuais e com baixíssima utilidade,
pois apesar de extremamente férteis, apresentam uma série de problemas quanto ao uso, pois
o teor de sal fica tão elevado que as plantas têm dificuldade de absorver água, algumas até
tendem a perder água para o solo, logo, apenas espécies adaptadas conseguem se
desenvolver sobre estes solos, como por exemplo, os coqueiros.
Além disso, quanto mais salinos os solos, mais a argila fica dispersa, não formando
agregados e dificultando a infiltração, pois os poros ficam “entupidos” com a argila. Também
torna os solos mais endurecidos. Além disso, parte dos sais pode alcançar o nível freático e
prejudicar a qualidade da água.
É comum originar uma estrutura colunar nestes solos, que na realidade são os caminhos
preferenciais da água.
Não fazem parte de uma classe específica, por isso ganham apenas o adjetivo de
salinos.
Um dos fatores que podem tornar estes solos utilizáveis é a adição de água através da
irrigação, entretanto, se situam exatamente em regiões de muita seca (agreste e no sertão
nordestino).
Uma observação importante diz respeito à salinização, que é gerada por irrigação mal
planejada, onde a falta de drenagem (retirada do excesso de água do solo) gera o mesmo
processo e as mesmas conseqüências do processo natural em alguns solos, mas que, na
verdade trata-se de um processo de degradação ambiental. Quando isso ocorre, uma solução
seria a acidificação da água para que tenha maior poder de solubilizar/dissolver os sais e
posteriomente, adicionar água normal no solo para que lixivie todos os sais que foram
solubilizados, mas também é necessário que seja associado a um processo de drenagem, para
que evite a continuidade deste processo. Mas na prática, ninguém utiliza desta técnica, pois
tem um custo muito elevado. Pode ser que abandonado este solo se recupere naturalmente,
mas demandaria um médio a longo prazo.

• Calcificação:

O processo geral mais atuante é o transporte ascendente de material. Bastante


semelhante ao halomorfismo, ocorre em solos jovens, localizados em áreas de pouca
precipitação e de elevada temperatura (mais presente na região do semi-árido), isto é, onde a
evapotranspiração também é muito maior que a precipitação. A grande diferença para o
halomorfismo, é que neste caso se trata de solos cujo material de origem é o calcário ou com
alto teor de carbonatos de cálcio (CaCO3) e magnésio (MgCO3),
No processo a água penetra no solo raso, intemperiza a rocha, gerando solubilização
basicamente do Ca, CO3 e MG, mas parte deste material dissolvido ascende com a água e se
recristaliza ao longo do perfil do solo, especialmente no horizonte A.
Mas o cálcio (Ca2+) tem uma grande afinidade com a matéria orgânica (carga negativa)
devido a sua diferença de cargas e acaba por funcionar como uma ponte de ligação entre as
moléculas de matéria orgânica se tornando maiores, o que por sua vez, dificulta a sua
decomposição. Logo, forma-se um horizonte A: mais espesso (pelo menos 25cm), muito escuro
(devido o acúmulo de matéria orgânica) e de alta fertilidade (devido o acumulo de sais, porém,
sem exagero a ponto de ser tóxico) – chamado de horizonte A chernozêmico.
São solos com uma produtividade muito elevada no período chuvoso ou quando a
irrigação é realizada.

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No Brasil, estes solos ocorrem muito na Chapada do Apodi (RN). A vegetação natural
destes solos é a caatinga verde, que não é muito constituída por cactáceas, trata-se de uma
vegetação mais verde e desenvolvida.
São chamados de Chernossolos, antigamente denominados de Rendzina. É a única
classe de solos determinada por características do horizonte A e que independe da presença
ou não de outros horizontes.
Mas vale destacar que nem todo Chernossolo é resultado do processo de calcificação,
na realidade, podem resultar apenas de uma altíssima presença de matéria orgânica no
horizonte A devido o material de origem, por exemplo, quando este material é o basalto.

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