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QUITOSANA: PRODUÇÃO E ESTUDO DE PARÂMETROS RELEVANTES ATRAVÉS

DE MÉTODOS VIAVEIS

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Letícia E. J. Ferreira, Josiana L. Fiorotti, Marcos Roberto Teixeira Halasz
1
Bolsista de iniciação Científica FAPES/FAACZ, discente do curso de Engenharia Química
2
Bióloga. Aluna do Mestrado Profissional de Tecnologia Ambiental FAACZ
3
Professor da Faculdade de Engenharia Química da FAACZ
1,2,3
Faculdade de Engenharia Química da Faculdade de Aracruz. Rua Professor Berilo Basílio dos Santos, 180, Bloco
C, Centro, Aracruz – ES, CEP:29194-910
e-mail: halasz@fsjb.edu.br

RESUMO - A quitosana é um biopolímero do tipo polissacarídeo derivado do processo de


desacetilação da quitina que apresenta extrema abundância na natureza por ser encontrado
principalmente em exoesqueletos de insetos e crustáceos, como por exemplo, carapaças de
caranguejo e cascas de camarão. A quitosana apresenta diversas aplicações, como por
exemplo, no processo de tratamento de água, na indústria alimentícia, na farmacêutica,
também tem aplicação na agricultura, biotecnologia entre outros. Neste trabalho estão sendo
estudadas algumas variáveis que influenciam na eficiência de conversão (grau de
desacetilação), como por exemplo, granulometria, purificação e efeito de aditivos. A quitosana
foi obtida através do processo de desacetilação da quitina presente em cascas de camarão, em
três etapas. A primeira consiste no tratamento da quitina, a segunda na desacetilação da
quitina e a terceira etapa de purificação do material. Ao final da primeira etapa foram
analisadas amostras com granulometrias 14#, #20, 28# e #48. Ao analisar a conversão das
diferentes amostras, através do método de análise condutimétrica, verificou-se que o maior
grau de desacetilação foi referente à amostra de #48 com 75,2%. Foram estudados o efeito de
aditivos na desacetilação, de granulometria, de secagem e os efeitos inerentes a etapa de
purificação.

Palavras-Chave: Crustáceos, Indústria Pesqueira, Quitosana, Processo de desacetilação, Grau


de desacetilação.

INTRODUÇÃO invertebrados (FURLAN, 1993 apud PINTO,


2006). Cascas de crustáceos possuem cerca de
A quitosana é um polímero atóxico, 13 a 42% de quitina onde 30 a 40% são proteínas
biodegradável, biocompatível, produzido por e 30 a 50% são sais de cálcio (SYNOWIECKI,
fontes naturais renováveis cujas propriedades 2003). Segundo ASSENHAIMER & RUBIO
industriais e tecnológicas vêm sendo exploradas (2003), durante o processamento do camarão,
há quase setenta anos (ROBERTS, 1992, apud através da etapa de descasque, são geradas
SIGNINI & CAMPANA FILHO, 2001). É obtida grandes quantidades de resíduo sólido, tendo em
através da reação de desacetilação da quitina vista que a cabeça e cascas do animal
(embora a quitosana possa ser encontrada correspondem a aproximadamente 40% de seu
naturalmente em algumas espécies de fungos), peso total, sendo tal resíduo composto por cerca
que também é um polissacarídeo e extremamente de 70 a 75% de água.
abundante na natureza sendo encontrada em Devido a constituição das cascas de
diversos organismos como no exoesqueleto de crustáceos tem havido grande interesse no seu
crustáceos e insetos. Tanto a quitina quanto a reaproveitamento, embora outros fatores como
quitosana são constituídas por unidades de 2- abundância de matéria-prima, utilização de
acetamido-2-deoxi-D-glicopiranose e 2-amino-2- rejeitos fartos oriundos da indústria pesqueira (as
deoxi-D-glicopiranose unidas por ligações carapaças de crustáceos são indevidamente
glicosídicas β(14). O que difere é a proporção rejeitados por este tipo de industria e em muitos
dessas unidades, quando há predominância de casos causam poluição local) e crescimento do
unidades acetamido a estrutura em questão é a número de pesquisas aumentando a
quitina, e quitosana quando há predominância de potencialidade de aplicação da quitosana,
unidades amino (MATHUR & NARANG, 1990, também expressam grande importância.
apud SIGNINI E CAMPANA FILHO, 2001). Quanto as propriedades físico-químicas, a
O termo quitina deriva da palavra grega quitina é insolúvel em água, solventes orgânicos,
chiton, significando um revestimento protetor para ácidos diluídos e álcalis, apresenta forma de
sólido cristalino ou amorfo. Suas três formas
VIII Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica
27 a 30 de julho de 2009
Uberlândia, Minas Gerais, Brasil
polimórficas são α-quitina, β-quitina e ү-quitina
dependendo de sua estrutura cristalina, da
disposição de suas cadeias e da presença de
moléculas de água (CRAVEIRO, 1999, apud
PINTO, 2006). Já a quitosana é insolúvel em
água, mas solúvel em soluções aquosas de
ácidos orgânicos e inorgânicos.
Segundo SANTOS et al (2003) a
solubilidade da quitosana está relacionada com
os grupos amino protonados na cadeia Figura 1 – Reação de Desacetilação
Heterogênea.
polimérica, onde a maior repulsão eletrostática
entre as cadeias é dada pela grande quantidade
desses grupos protonados e assim maior a A reação não é costumeiramente realizada
solvatação em água. Ela se mostra susceptível a em meio ácido devido à susceptibilidade das
mudanças estruturais, devido a grande ligações glicosídicas à hidrólise ácida. Entretanto,
quantidade de grupos reativos como as hidroxilas nem mesmo em meio alcalino ocorre uma total
e principalmente os grupos amino, especialmente desacetilação da quitina, a essa conversão existe
em reações de N-acetilação, N-alquilação, N- um parâmetro relacionado denominado grau de
carboxilação, N-sulfonação e formação de bases ( )
desacetilação médio GD , este é o parâmetro
de Schiff com aldeídos e cetonas. utilizado em referência a conversão de quitina em
Uma dentre suas propriedades mais quitosana. Outro termo menos difundido é o grau
importante é a de agir como quelante (LI,1992,
apud CAMPANA FILHO, 2004) pois esta de acetilação médio (GA), no qual a relação
característica promove uma seletividade à GA = GD − 100% é existente.
quitosana permitindo ligações com moléculas de Os principais fatores que afetam a
colesterol, gorduras, proteínas, células tumorais, desacetilação e as características da quitosana
e também a íons metálicos (MATHUR,1990, apud são temperatura e tempo de reação,
CAMPANA FILHO, 2004). Esta característica concentração da solução de álcali e adição
atribui a quitosana aplicações na formulação de diluente, razão quitina/álcali, tamanho das
emagrecedores e tratamento de efluentes, partículas, atmosfera da reação e presença de
embora sua área de atuação vá muito além. Na agentes que evitem a despolimerização
biomedicina a quitosana pode ser aplicada em (CAMPANA FILHO & SIGNINI, 2001).
membranas artificiais e suturas cirúrgicas, na
indústria farmacêutica como agente cicatrizante, O objetivo deste trabalho é obter quitosana
liberação controlada de drogas, controle de e estudar meios de aumentar o grau de
colesterol, na biotecnologia é empregada para desacetilação do produto através de métodos
imobilização de enzimas e células, separação de simplificados.
proteínas, em cromatografia entre outros. Na
agricultura é utilizada em fertilizantes, para
liberação controlada de agroquímicos e defensivo
METODOLOGIA
agrícola, na indústria de alimentos pode ser
empregado como aditivo alimentar, em nutrição A metodologia central executada é uma
animal e embalagem biodegradável para adaptação de SOARES (2006) e foi dividida em
alimentos (KUMAR, 2000; TENG et al, 2001, três etapas: a primeira consiste no tratamento da
apud CARVALHO, 2006). quitina, a segunda na desacetilação da quitina e a
A conversão de quitina em quitosana terceira etapa onde se obtém a quitosana
ocorre através da reação de desacetilação na purificada. O crustáceo utilizado neste trabalho foi
qual há hidrólise dos grupos acetamida na o camarão e a Figura 2 é uma ilustração do
estrutura da quitina, e são vários os métodos com resíduo utilizado.
que se pode obter: hidrólise enzimática, fusão
alcalina, explosão a vapor, ultra-som, tratamento
com microondas, desacetilação homogênea e
desacetilação heterogênea. Esta, a mais
difundida, as cascas são tratadas em solução
concentrada de hidróxido de sódio, sendo que a
concentração dessa solução, o excesso de álcali,
o tempo, e a temperatura da reação são
variáveis, conforme o procedimento adotado
(CAMPANA FILHO E SIGNINI, 2001). A Figura 1
representa a reação de desacetilação.
Figura 2 – Cascas de camarão
A etapa de tratamento da quitina foi 80oC cuja finalidade é não alterar a concentração
subdivida em separação manual do material da solução de alcalina da etapa posterior.
grosseiro, secagem, trituração do material, Na desacetilação da quitina cerca de 4,6g
separação por granulometria série Tyler #14, #20, da amostra é tratada em 220ml hidróxido de
#28 e #48 e pré-tratamento. sódio (40%) num reator de vidro encamisado com
Inicialmente foi realizada a separação do banho termostático de circulação por 6h a 115 ±
o
material grosseiro, necessária devido à presença 2 C como pode-se observar pela Figura 6.
de outros materiais presentes no resíduo
descartado. Em seguida o material foi seco na
estufa para ser triturado até atingir a
granulometria desejada. Para este fim, foi
utilizado um sistema de peneiramento para
segregar as amostras de acordo com o tamanho
do grânulo conforme a Figura 3.

Figura 3 – Separação das amostras por


granulometria
Figura 6 – Reator de Vidro Encamisado com
As Figuras 4 e 5 mostram respectivamente Banho Termostático de Circulação
o material triturado de peneirado em #20 e #48
respectivamente. Ao término da reação a suspensão é filtrada e o
produto é lavado com água destilada até pH
neutro, em seguida com metanol e finalmente
seco a temperatura ambiente. Assim tem-se a
quitosana conforme a Figura 7.

Figura 4 – Granulometria #20

Figura 7 - Quitosana
Figura 5 – Granulometria #48
A etapa de purificação da quitosana é
O pré-tratamento consiste em lavagem com utilizada a fim de remover sais remanescentes da
solução de ácido clorídrico (2,5%), a fim de etapa anterior. A purificação consiste na
reduzir o teor de sais de cálcio, seguido de dissolução de 200mg da amostra em 40ml de
lavagem com solução de hidróxido de sódio (5%), ácido acético (0,5M) agitado por 18 horas. Em
com objetivo de reduzir o teor de nitrogênio seguida a solução filtrada é adicionado hidróxido
protéico, e por fim, lavagem com solução de de amônio concentrado até a formação do
hipoclorito de sódio (0,36%), para retirada de precipitado, e então o produto é filtrado e lavado
odor e pigmentos. Após cada lavagem com as até pH neutro com água destilada e seco.
soluções lava-se a amostra com água destilada Desta metodologia surgiram adaptações a
até atingir pH neutro das águas de lavagem. Em fim de se estudar os efeitos da secagem, de
seguida é realizada secagem na estufa por 4h a aditivos e da purificação no grau de
desacetilação.
Para estudar o efeito da secagem inicial, Os resultados da espectroscopia de infravermelho
na etapa de tratamento da quitina, foram secas levaram a confirmação da presença das bandas
amostras de cascas de camarão a temperaturas e estiramento axial de OH (3429,55), deformação
tempos diferentes. Estas variáveis foram axial de C-N de grupo amino (1317,78),
analisadas de acordo com o sugerido por estiramento vibracional C-O de álcool primário
CASTRO E PAGANI (2004). (1060) e estiramento vibracional de amina
Para estudar o efeito de aditivos foi alifática (1072,39), características da substância
utilizado o tetraborohidreto de sódio (NaBH4), quitosana.
este foi adicionado na proporção 0,1g de
NaBH4/1g de quitina a etapa de desacetilação. O
tetraborohidreto de sódio é um agente redutor
que possui a função de minimizar a
despolimerização ocorrente.
Devido a metodologia central realizar a
etapa de purificação da quitosana, foram
realizados testes ignorando esta etapa a fim de
estudar o incremento dado por este procedimento
no GD .
Por fim, as amostras foram agitadas por
cerca de 18h em ácido clorídrico (0,05M) e
tituladas com solução aquosa de hidróxido de
sódio (0,17M) a fim de serem analisadas através Figura 9 - Análise de espectroscopia de
do método de titulação condutimétrica. A Figura 8 infravermelho
apresenta uma exemplificação dos gráficos
construídos para a obtenção do grau de Observou-se a otimização dada pelo
desacetilação das amostras calculado de acordo tratamento granulométrico, o qual oferece um
com a Equação 1. incremento significativo no grau de desacetilação
conforme a Tabela 1.

Tyler GDméd(%)
#14 41,05
#20 61,58
#28 68,75
#48 75,26
Tabela 1 – GD para diferentes mesh de peneira

O resultado deste incremento no grau de


desacetilação expressa sua importância no valor
numérico, pois já é sabido que a maior área de
Figura 8 – Gráfico Condutividade x Volume de contato proporcionado por vários grânulos
NaOH menores (#48) aumenta a interatividade de soluto
e solvente e assim a reação é consolidada com
um sucesso maior.
16,1 ⋅ [base] ⋅ (V2 − V1 ) Como mostra a Tabela 2, o tempo e a
%GD = (1) temperatura de secagem inicial do material são
m fatores significativos nos resultados obtidos.

Onde: V1 e V2 são volumes (ml) de Tempo(h) Temperatura(oC) GDméd(%)


neutralização do ácido e dos grupos amino 17 60 83
respectivamente, m é a massa da amostra de 6 95 73,5
quitosana e [base] é a concentração da base
Tabela 2 – GD obtidos de acordo com o tempo
utilizada.
e temperatura de secagem
RESULTADOS Das várias combinações entre tempo e
temperatura, a que melhor apresentou efeito no
Após a obtenção da quitosana foi realizada grau de desacetilação ocorreu à temperatura de
uma análise de espectroscopia de infravermelho 60oC por 17h.
para a detecção da presença de quitosana na Acerca dos efeitos de aditivos na etapa de
amostra como mostra a Figura 9. desacetilação, pode-se perceber através da
Tabela 3, que foi realizada em triplicata, que este
parâmetro também afetou significativamente os SANTOS, J. E. dos, 2003. Caracterização de
resultados. quitosanas comerciais de diferentes origens,
Polímeros: Ciência e Tecnologia, São Carlos
GDméd(%) – SP, 13, 242-249.
Com NaBH4 95,8
Sem NaBH4 85,1 AGRADECIMENTOS
Tabela 3 - Efeito do aditivo NaBH4 no GD
A Fundação de Apoio à Ciência e
Constatou-se ainda a inviabilidade da Tecnologia do Espírito Santo - Fapes, pelo apoio
etapa de purificação da quitosana no processo financeiro no desenvolvimento do projeto e pela
por apresentar certa dificuldade de execução, concessão da bolsa.
sabe-se também que esta etapa não é
imprescindível.

CONCLUSÃO

A granulometria se mostrou bastante


significativa para o estudo e é impactante efeito
no grau de desacetilação, assim como o tempo e
temperatura de secagem inicial, e aditivos.
É importante o controle do tempo e
temperatura na etapa inicial de tratamento da
quitina, tendo em vista que remove um percentual
de proteína e sais.
Além de não ser uma etapa indispensável,
a etapa de purificação apresenta certas
inviabilidades que ocasionam perdas ao
processo. Dessa forma, a sua execução se torna
optativa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMPANA FILHO, S., SIGNINI, R., 2001. Efeitos
de aditivos na etapa de desacetilação de
quitina, Polímeros: Ciência e Tecnologia,
São Carlos – SP, 11, 169-173.
CANELLA, K. M. N. C, GARCIA, R. B, 2001.
Caracterização de quitosana por
cromatografia de permeação em gel –
Influencia do método de preparação do
solvente, Química Nova, São Paulo – SP,
24, 13-17.
FIGUEIRA, C. E.; REIS, L. L. G. ; BARROZO, M.
A. S.; MURATA, V. V., 2007. Projeto ótimo
de um secador de leito deslizante modificado
de sementes de soja, Anais do VII
Congresso Brasileiro de Engenharia Química
em Iniciação Científica, São Carlos-SP
(publicado em CD-ROM).
GOY, R. C., 2004. Produção de esferas de
quitosana, Revista Biotecnologia Ciência &
Desenvolvimento,33, 30-34, Disponível em:
<http://www.biotecnologia.com.br/revista/bio3
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MOURA, C., et al., 2006. Quitina e quitosana
produzidas a partir de resíduos de camarão
e siri: Avaliação do processo em escala
piloto, Revista de ciências exatas e
engenharia – Vetor, Rio Grande – RS, 16,
37-45. IIA.

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