Você está na página 1de 4

Antígona

Nascido em 1876, Júlio Dantas foi uma notável figura literária da época.
Deixou vários livros de poesia, de contos, romances, crónicas, ensaios e peças
teatrais. Este último género foi o que lhe concedeu êxitos mais duradouros. Uma
das peças de teatro da sua autoria é Antígona, tragédia que tem como
heroína Antígona, filha de Édipo e Jocasta.

A intriga da história começa com uma alusão à guerra dos Sete contra Tebas,
na qual os dois irmãos de Antígona, Etéocles e Polinices, se confrontam em lados
opostos. Ambos morrem no campo de batalha mas, aos olhos de Creonte, tio
daqueles, Polinices é considerado traidor de Tebas e, por isso, não lhe são
concedidas honras fúnebres.

Júlio Dantas intentou, então, reescrever a tão célebre Antígona sofocliana.


Tanto a heroína de Dantas como a de Sófocles têm a função de estabelecer a
justiça dentro da polis e, para isso, têm de infringir as leis estabelecidas pelo rei.

Antígona recusa-se a cumprir a ordem de Creonte e, considerando tratar-se de


um dever sagrado dar sepultura aos mortos, infringe a ordem do soberano e realiza
os rituais fúnebres a que o irmão tem direito. Devido a este acto de piedade,
Antígona é condenada à morte pelo rei de Tebas e encarcerada viva no túmulo dos
Labdácidas, de quem descende. A acção impiedosa do rei será punida no final da
tragédia: ao tomar conhecimento da morte de Antígona, Hémon, filho de Creonte e
noivo de Antígona, suicida-se. Por consequência deste segundo suicídio, é a vez de
Eurídice, mãe de Hémon, decidir "morar eternamente no Hades".

A peça de Dantas está dividida em cinco actos que correspondem aos cinco
episódios intercalados por cinco estásimos em que se apresenta o texto original de
Sófocles. No que concerne ao desenvolvimento dramático, podemos constatar que
o Autor se aproxima muito perto do tragediógrafo grego, havendo, no entanto,
algumas diferenças.

Em Dantas, a principal dessas diferenças consiste na preferência pela prosa,


onde as falas das personagens se caracterizam por uma expressão linear e por uma
linguagem ligeira que permite uma diversificação de tensões humanas. Um outro
aspecto importante é que, além de haver uma carga reflexiva e filosófica muito
reduzida, Dantas faz uma inversão dos valores apresentados por Sófocles. Na
tragédia portuguesa, coloca-se em primeiro plano a questão política e em segundo
o relacionamento familiar.

O conflito central existente, quer em Sófocles, quer em Dantas, sai, neste


último, de um modo mais esbatido, uma vez que há outras tensões. Outra
característica a ser mencionada neste processo de distanciamento é que, pelo
momento ampliado de cada personagem, se descobrem novas facetas que as
modificam em relação ao texto original grego (a solidão face ao destino de Antígona
perde-se, criando-se sentimentos de solidariedade). Dantas, ao contrário de
Sófocles, prefere valorizar os sentimentos da heroína, principalmente quando esta
insiste em cumprir com os rituais fúnebres de Polinices.

Em relação à caracterização da heroína, não são feitas quaisquer referências


físicas. Sabe-se, apenas, que é uma rapariga jovem e que é noiva do filho de
Creonte, o seu maior inimigo. No entanto, a sua personalidade ganha novos
contornos à medida que a tragédia se desenrola. A sua caracterização é feita,
normalmente, por contraste com outras personagens e é nas suas atitudes que o
seu perfil é delineado.

Antígona é caracterizada, essencialmente, pelo seu acto de desobediência,


solitário e poderoso. É uma personagem que contém força e agressividade, sendo
capaz de arriscar tudo em defesa dos seus princípios. Enquanto aos olhos de
Creonte e de alguns conselheiros de Tebas, a filha de Édipo não passa de um ser
movido pelo ódio e pela ambição, para outros ela é apenas uma jovem inocente,
justa e acometida de piedade para com os mortos. Esta não é, pois, uma
caracterização unânime.

Do ponto de vista familiar, a heroína é uma personagem que representa o lado


frágil e sofredor da família contra aquele que detém o poder. Antígona é, assim,
detentora de um sentido político (facto mais evidente em Dantas), uma vez que é
colocada ao mesmo nível do seu adversário, Creonte.

Apesar da heroína ter poucas intervenções ao longo de toda a tragédia é esta


figura e os valores que defende que dominam a peça intitulada Antígona.

Concluindo, tanto a Antígona de Dantas como a de Sófocles, são duas peças


teatrais que abordam a questão da lei, contrapondo as leis justas às injustas e as
leis divinas às humanas. O que se verifica em Sófocles é que este autor esclarece a
problemática do que é justo e injusto a partir da prática do culto para a
religiosidade.

+++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++

Antígona
Mulher à frente do seu tempo que não tinha receio em infringir as normas ditadas
pelo rei em prol de saciar os seus deveres morais, neste caso, conceder ao seu
irmão Polinice suas honras fúnebres. Antígona tinha coragem e fibra e acabou
entregando, ao desobedecer a vontade do rei Creonte, a sua própria vida para
honrar a memória de sua família.

Ismena

Ao contrário de Antígona, Ismena era submissa e covarde (ao rei e aos homens),
não tendo a coragem de honrar sua família e ajudar a sua irmã. Se olharmos pelo
ângulo de fazer valer a lei e não a moral, Ismênia estaria certa, pois se cada um
utilizasse da própria moral, não haveria justiça.

Os velhos tebanos

O coro de anciãos tebanos declamava com sabedoria as histórias da cidade de


Tebas, dos deuses e principalmente da existência humana.

Creonte

O rei Creonte, tio de Édipo e de seus filhos, não estava ao lado do bem ou do mal.
Ele era um governante como os outros, porém bastante autoritário e inflexível em
suas decisões. Apesar de ser detentor de poder e riquezas, lastimava a corrupção
que o dinheiro trazia. Ele como rei, achava-se no direito e dever de construir leis
que garantissem a ordem em Tebas.
Corifeu

Um sábio que sempre aconselhava o rei Creonte, seu braço direito. Apesar de
tentar aconselhar da melhor forma possível, nunca discutia as decisões tomadas
pelo rei e concretizava suas ordens.

O guarda

Ao mesmo tempo em que o guarda aparenta ser fiel e obediente ao seu rei, ele não
apresenta uma conduta temerosa e sim irónica, pois quando é acusado pelo rei de
ter aderido à corrupção, ele retruca destemidamente, pois não havia sido ele o
culpado do acontecido.

Hémon

Jovem que a primeiro momento se demonstra sábio em aconselhar o pai, Creonte,


a não tomar decisões precipitadas com relação à Antígona, sua noiva. A partir do
momento que Creonte vê seu filho como um tolo pelo fato de tentar amenizar a
situação de Antígona, Hémon torna-se um desesperado e este desespero
transforma-se depois em ódio pelo seu próprio pai quando vê sua noiva enforcada.

Tirésias

Tirésias era o sábio adivinho que não podia ver as coisas físicas, porém, via muito
além do alcance dos humanos. Através da crença nas profecias de Tirésias, Creonte
pôde levantar Tebas, transformando-a numa grandiosa cidade. Tirésias é arrogante
com o rei a partir do momento em que Creonte julga suas profecias como mentiras
e resolve dizer o destino cruel que o aguarda.

Eurídice

Esposa de Creonte, mãe de Hémon, Eurídice cai em desespero oculto com a morte
de seu filho até o momento em que chega em casa e se mata. Eurídice sempre foi
companheira e submissa ao seu marido, mas com a notícia da morte de Hémon
depositou sobre Creonte todo o ódio que poderia surgir em uma mãe que acaba de
perder um filho.

Mensageiros

Os mensageiros aparecem como jornalistas, narrando dois fatos exatamente como


aconteceram: o primeiro narra a morte de Hémon à Eurídice e ao Corifeu e o
segundo, a morte de Eurídice a Creonte.

A tragédia de Sófocles, Antígona, que conta o desfecho da maldição de Édipo aborda, em


sumo, a discussão entre dois extremistas os protagonistas Antígona e Creonte. O primeiro
envolve a trama com questões do Direito Natural e, o segundo, com questões do Direito
Positivo. A peça, entretanto, conta com um personagem cujas falas rompem com esse
radicalismo Hemón. Percebe-se, assim, que a problemática da trama ultrapassa as diferenças
ideológicas dos protagonistas; sendo passível de inúmeras interpretações, críticas e relações
com temas que envolvam o Direito como a Moral, legitimidade, legalidade e titularidade do
poder.

O cenário inicial da Tragédia se dá com o diálogo entre as irmãs Ismênia e Antígona, que
lamentavam a morte de seus irmãos, Etéocles e Polinice (mortos um pelo outro) e
compartilhavam suas indignações com a imposição de Creonte (o rei de Tebas). Esse, havia
ordenado aos homens da pólis um sepultamento digno e conforme os ritos a Etéocles e, a
Polinice, ordenou que mantivessem o corpo insepulto (sem homenagens fúnebres, e preso em
meio às aves carniceiras). Não obstante, esse édito trazia a ameaça de apedrejamento àquele
que desobedecesse as ordens do Rei absolutista e tirânico.

Antígona, movida por crenças religiosas, decidiu agir em desacordo com a lei ditada por
Creonte, pois considera irrefutáveis as leis divinas, além de acreditar que essas estão acima
das leis humanas (fato característico do Direito Antigo, em que o Direito era confundido com as
leis da natureza e, também, com as leis divinas). O motivo da tamanha indignação por parte da
Antígona, deu-se pelo desrespeito à dignidade humana do seu semelhante (que é um dever
natural ou moral do homem). Infere-se, assim, que Sófocles fez uma relação direta da
personagem com o Direito Natural.

Creonte, em seu regime absolutista; considera-se competente para impor qualquer lei que o
convenha mesmo que essa entre em desacordo com uma parcela significativa da população e
com as crenças religiosas desta. O rei caracteriza-se, assim, como a personificação do Direito
Positivo. A ideia de que os indivíduos de uma sociedade só poderiam viver em paz através de
suas submissões a um poder absoluto e centralizado - presente na obra de Thomas Hobbes é
retomada nos diálogos de Creonte, que afirma, diversas vezes, dever ser obedecido em tudo;
quer seus atos pareçam justos, quer não.

Sabe-se que a legitimidade é o consenso que uma parcela significativa da população dá a uma
autoridade, e que esta é capaz de assegurar a obediência sem a necessidade de recorrer ao
uso da força. Através da assertiva, subentende-se que não há legitimidade no poder de
Creonte
- uma vez que o povo deve submeter-se, forçosamente, à seus mandos e desmandos. Quanto
à legalidade, é errôneo dizer que assim se caracteriza o poder do rei - pois, contrário a um
poder legal, este possuía poder arbitrário.

Sófocles, afim de concluir a tragédia, utilizou-se de um personagem Hemón, o príncipe - cujas


ideias pressupõem um ideal democrático e de acordo com as leis emanadas do Direito Natural.
Através dos seus diálogos (com base no que se fundamenta a legitimidade direito, razão e
justiça), Hemón mostra a Creonte a necessidade de ouvir o povo (que considera Antígona uma
heroína, e não criminosa). Dessa forma, o édito do rei, por ignorar os preceitos que provém dos
deuses, renega, segundo o príncipe, os \u201cditames da justiça\u201d.

No desenrolar da história, o foco nos ideais extremistas de Antígona e Creonte, faz com que
temas como o Direito e a Moral; relacionados aos personagens, sejam bem pontuados.
Utilizando-se disso, nota-se que o autor da peça, no decorrer da trama, fez jus às
considerações finais da obra. Também, os diversos assuntos - abordados acima - que trazem
as entrelinhas da tragédia, desencadeiam uma pluralidade de interpretações, críticas e
relações da peça (ou de partes desta) com temas que envolvam o Direito.

Você também pode gostar