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Colegiado de Psicologia 1

UNIME – Itabuna/BA

RELAÇÕES ABUSIVAS:
UM OLHAR COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

Elaide dos Santos Nascimento1


Kellen Verena Silva Souza2

RESUMO

O artigo aborda a problemática das relações abusivas um problema de saúde


pública que vendo sendo amplamente discutido. Trata-se de um fenômeno de alta
prevalência que se expressa de inúmeras formas tais como violência física,
psicológica, sexual, moral e patrimonial. Deste modo, essa pesquisa visa identificar
quais são os fatores (esquemas) que levam a mulher a permanecer na relação
abusiva. Com métodos de natureza exploratória, buscou dados na literatura, cujos
resultados foram exibidos de forma qualitativa. Através dos dados coletados
constatou-se que há diversos motivos que levam a mulher a se manter nesses
relacionamentos, que estão associados a fatores como dependência financeira, as
estratégias de coping desenvolvidas por cada uma, influência religiosa, esquemas
iniciais desadaptativos, enfim aspectos referentes à sua vulnerabilidade social e
psíquica. Conclui-se, portanto, que embora as pesquisas acerca da violência
conjugal sejam volumosas, ainda existem muitos questionamentos que precisam ser
investigados com mais afinco, pois é notório o grande aumento da sua ocorrência,
logo é imprescindível ações de maior efeito no intuito de mobilizar a sociedade como
um todo para mitigar esse problema.

Palavras Chave: Relações abusivas. Violência conjugal. Terapia cognitivo-


comportamental

1 INTRODUÇÃO

As relações abusivas mais precisamente aquela que acontece entre casais, a


violência conjugal, se caracteriza pelo excesso de poder sobre o outro e a vontade
de controlar e dominar o cônjuge. Em contrapartida a vítima apropria-se da posição

1 Discente do 9º período do curso de Psicologia.


2 Psicóloga; Mestre em ciências e Técnicas Nucleares pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG.

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de objeto, assumindo a função de satisfação dos desejos do outro, em detrimento


dos seus. Geralmente se instala de forma tênue e vai formando uma dinâmica
relacional completamente destrutiva. No entanto ela não se restringe a idade, etnia,
classe social ou orientação sexual, podendo acontecer com qualquer pessoa.
Quando se fala de relacionamento abusivo muitas pessoas já o retratam
como violência física, mas ela pode assumir outras formas de abusos tais como
psicológico, sexual, moral e até mesmo patrimonial. Todas elas refletem diretamente
na saúde física e mental das mulheres, acarretando em diversas consequências que
variam de intensidade, por vezes são irreparáveis, visto que muitas permanecem
durante anos nessa condição de violência. Além disso, essa violência pode ser
exercida tanto pelo homem como pela mulher, contudo na maioria dos casos o autor
é o parceiro, a vista disso, essa pesquisa está direcionada para o que acontece com
maior frequência, ou seja, nas relações em que o parceiro agride a sua
companheira.
Mesmo diante de inúmeras medidas e leis que foram implementadas para
proteger a integridade da mulher, percebe-se através dos meios de comunicação,
principalmente, que as relações abusivas têm crescido a cada dia no mundo.
Pesquisa aponta que das mulheres que sofreram alguma forma de violência, 31%
ainda permanecem no relacionamento e 14% delas continuam sendo agredida pelo
companheiro (DATASENADO, 2013). Diante do exposto, considera-se relevante
investigar os fatores envolvidos na permanência da mulher em uma relação abusiva,
pois a compreensão destes oportunizaria uma redução nos estigmas, levando
assim, uma mudança nessa visão discriminatória para uma mais compreensiva.
Além disso, expor as razões e identificar a relação de certos fatores com o
relacionamento abusivo, e até mesmo aspectos que expliquem o aumento no
número de casos de violência psicológica, possibilitaria estimular reflexões,
conscientizações e intervenções mais efetivas que ajudassem as vítimas que se
encontram nessa situação.
Essa pesquisa tem o propósito de analisar quais os fatores (esquemas) que
levam a mulher a permanecer na relação abusiva. Para tanto, buscou-se realizar
uma revisão na literatura sobre a temática, cujos resultados foram expressos de
modo qualitativo. Logo, para simplificar o entendimento foi contextualizado acerca da
relação abusiva, apontado às consequências geradas por esse tipo de

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relacionamento e por fim, apresentados os fatores que levam a mulher a


permanecer nessa dinâmica abusiva.

2 VIOLÊNCIA CONJUGAL: CONCEITO, PREVALÊNCIA E PRINCIPAIS


CARACTERÍSTICAS

A violência está estabelecida na sociedade desde muito tempo, realizada


como forma de sobrevivência frente às dificuldades encontradas no ambiente. Esse
é um fenômeno que se faz presente na esfera pública e também dentro do espaço
privado. Sendo assim, essa prática levou ao desenvolvimento de suas várias faces,
gerando uma preocupação na atualidade, pois esta tem tomado proporções
alarmantes.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define violência como:

O uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si


próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que
resulte ou tenha grande possibilidade de resultar em lesão, morte, dano
psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação (KRUG et al., 2002,
p. 27).

Nesse contexto diante das inúmeras manifestações da violência encontra-se


aquela que se faz presente em um relacionamento abusivo, isto é, a violência
conjugal, aquela que acontece entre casais. De acordo com Teles & Melo (2002
apud Marques, 2005, p.19) “o drama da violência conjugal manifesta-se tanto nas
relações entre cônjuges, ex-cônjuges ou ex-parceiros, como também em outras
relações afetivas incluindo noivos ou namorados”.
Para Lamoglia & Minayo (2009) a violência conjugal é um fenômeno que
envolve uma ampla gama de significados e se apresenta de muitas maneiras, por
meio de abusos sexuais, psicológicos, maus tratos entre outros. Ela independe de
raça, etnia, classe social, idade e orientação sexual. Apesar das razões serem
inúmeras, sua base é poder patriarcal que propicia a desigualdade e o controle do
homem nas relações de gênero. Marques (2005, p.77) conceitua-a como um “ato
agressivo perpetrado pelo parceiro (a) íntimo (a), que determina dano físico, moral,
psicológico ou econômico, através da força ou da coação, que se produz de uma
forma contínua através do tempo”.

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Na visão de Hirigoyen (2006), o que diferencia a violência conjugal de uma


simples briga de casal, não são as pancadas ou o discurso que machuca, mas sim,
a discrepância na relação, ou seja, a ausência de simetria. Em uma discussão de
casal, as personalidades dos dois ficam protegidas, no qual ambos se respeitam, o
que não ocorre numa relação violenta quando a intenção é governar e subjugar o
parceiro (a).
Então a violência contra a mulher atualmente tornou-se um problema de
saúde pública, no entanto anteriormente não era assim, durante muito tempo a
mulher vivenciava situações de violência e não recebiam nenhuma ajuda ou socorro,
pois a violência conjugal era tratada como um assunto privado do casal, onde o
Estado não podia intervir. Foi somente após os anos 70, que conforme explicam
Oliveira & Gomes (2011) passou a ter visibilidade especialmente pela expansão dos
movimentos feministas, que delataram o poder patriarcal e os impactos do domínio
do homem contra a mulher. Suas iniciativas levaram a mobilizações na sociedade
para que os agressores fossem penalizados, houve criações de estruturas de apoio
às mulheres vítimas e grupos que gerassem conscientizações tanto para elas
quanto para os agressores. Conforme os autores citados as feministas conquistaram
também a “criação das delegacias especializadas em crimes contra a mulher” (p.2).
Além disso, uma das grandes conquistas alcançados no país foi à inserção da lei
Maria da penha na tentativa de proteger a mulher de qualquer agressão que venha a
sofrer. Essa Lei gerou meios para impedir e evitar esse tipo de violência.
Sendo assim a violência passou a ser abordada através de um novo olhar,
alterando a forma de tratar os crimes de violência contra a mulher, amparando-a
frente a esse cenário. Porém, mesmo diante de tanta visibilidade, com a ascensão
do feminismo, levaria a acreditar que a situação ia avançar que haveria mais
equidade entre homens e mulheres e direcionaria assim a diminuição da violência,
mas isso não é o que ocorre (HIRIGOYEN, 2006). A cada dia na sociedade cresce o
número de vítimas de relações abusivas.
Uma pesquisa realizada pelo DataSenado (2013) mostrou que mais de 13
milhões e 500 mil mulheres já vivenciaram algum tipo de agressão, 19% delas com
16 anos ou mais. E a idade que as mulheres estão mais propensas a passar por
uma violência doméstica pela primeira vez é entre 20 e 29 anos. Nesse período,
34% delas sofreram a primeira agressão.

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Segundo o DataSenado (2017) a violência contra as mulheres na maior parte


dos casos tem como principal agressor o próprio companheiro. Das mulheres
entrevistadas nessa pesquisa 41% alegaram ter sofrido agressão por aqueles que
elas escolherem conviver afetivamente, indicando o atual marido, parceiro ou
namorado. Já 33% delas apontaram o ex-parceiro, ex-marido ou ex-namorado como
os autores da violência. Já o DataSenado (2013) afirma que o Brasil é o país onde
mais matam mulheres, ocupando a 7ª posição no ranking mundial de assassinatos
femininos.
No que se refere aos tipos de violência, a apuração feita pelo DataSenado
(2017) indica que a violência física foi a mais referida entre as mulheres
entrevistadas: 67% delas responderam ter sofrido esse tipo de agressão, na
sequência com 47% foi mencionada a violência psicológica, ao passo que com 36%
ficou a violência moral e 15% a sexual. Conforme a mesma pesquisa mantém-se
alto o número de mulheres vítimas que não procuram ajuda nem denunciam, isto é,
27% delas disseram não ter feito nada diante da agressão. Apesar disso, de acordo
com o DataSenado (2013, p.6), “pelo menos 34% das vítimas procuraram
alternativas à denúncia formal, como a ajuda de parentes, de amigos e da Igreja”.
Entretanto “considerando a expressividade dos números, e por mais objetiva
que seja a pesquisa sobre a violência conjugal, esta não consegue abranger a
totalidade do fenômeno” (Marques, 2005, p.84), já que muitos episódios de violência
não são divulgados, descobertos ou denunciados.

2.1 OS DIFERENTES TIPOS DA VIOLÊNCIA

A violência na qual a mulher é submetida em um relacionamento abusivo


normalmente inicia-se sutilmente, passando por comentários e brincadeiras
inofensivas, ciúmes patológicos, chantagens, espancamentos e de fato até a morte.
Sendo assim, a violência conjugal pode se manifestar de diferentes formas, no
entanto de acordo com Hirigoyen (2006), as mulheres não passam necessariamente
por todas as formas da agressão, mas é fundamental que se saiba que todas elas
estão relacionadas e que os homens violentos passam de um tipo para outro,
explicando isso através da conduta “inconveniente” de sua parceira.
A violência psicológica é denominada “como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o

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pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,


comportamentos, crenças e decisões [...]” (BRASIL, 2006). De acordo com Hirigoyen
(2006) esse tipo de violência acontece em volta de várias ações que formam micro
violências, difíceis de perceber, podendo citar, por exemplo, o controle, no qual o
agressor quer fiscalizar tudo para forçar o modo como às coisas precisam ser
realizadas, vigiando de modo cruel para comandar e monitorar a parceira. No
isolamento, o homem pouco a pouco vai afastando a mulher de seus amigos, da
família, do trabalho, impedindo-a de ter uma vida social. Além disso, o agressor
pode mostrar-se indiferente as demandas afetivas, recusando-se a participar da vida
da companheira (o), não sair com ela (e), não ir a eventos familiares, permanecer
durantes dias de cara fechada sem que o outro saiba o motivo ou até mesmo não
levar em consideração a condição psicológica ou física, mandando-a fazer uma
limpeza na casa estando enferma ou ter relação sexual após uma discursão
violenta.
Logo, a violência física significa o uso da força física no intuito de machucar
deixando ou não marcas visíveis, incluindo uma série de maus tratos como puxar os
cabelos, dar beliscões, tapas, socos ou pontapés na barriga, nas zonas genitais,
provocar queimaduras entre outras ações que podem ir desde a um simples
empurrão ao homicídio (MANITA; RIBEIRO; PEIXOTO, 2009).
Em relação à violência sexual Manita; Ribeiro; Peixoto (2009) descreve como
qualquer conduta que obrigue a vítima a participar de atividades sexuais contra o
seu desejo, realizar atos sexuais com terceiros ou forçar a visualização de
pornografia, mediante uso da força física, coação ou ameaças. Então, uma relação
sexual imposta em muitos momentos ocorre em silêncio, pois faz parte do “dever
conjugal”, onde ainda nos dias atuais é tido como um direito para o homem e uma
obrigação que a mulher tem que fazer para seu parceiro (HIRIGOYEN, 2006).
Por sua vez a violência patrimonial é conceituada como qualquer ato que
caracterize “retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos
econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades” (BRASIL,
2006). O agressor para controlar a vítima não permite que esta tenha acesso a suas
economias ou bens, incluindo assim, recursos substanciais que são fundamentais
para suas necessidades básicas e também para a dos seus filhos. Mesmo que ela
tenha uma ocupação, o agressor tem a propensão a não deixá-la administrar o seu

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próprio dinheiro, que é pego e utilizado por ele (MANITA; RIBEIRO; PEIXOTO,
2009). Enquanto que a violência moral é “entendida como qualquer conduta que
configure calúnia, difamação ou injúria” (BRASIL, 2006).
Contudo a violência pode aumentar no que diz respeito a sua intensidade e
gravidade, chegando ao nível mais radical que é o assassinato do cônjuge.
Conforme Hirigoyen (2006), uma das principais razões de morte feminina refere-se
às violências no casal. Geralmente o homicídio acontece no período da separação,
podendo acontecer quando elas planejam partir ou mesmo depois de irem embora.

2.2 O CICLO DA VIOLÊNCIA

A dinâmica habitual que se faz presente dentro das relações abusivas é o


revezamento entre momentos marcados pela violência e atitudes gentis com
juramentos de mudanças. Conforme Walker (1979 apud Hirigoyen, 2006) a violência
conjugal normalmente funciona de forma cíclica e mesmo sendo a mais comum de
acontecer, não é a única, ou seja, nem todas as relações baseadas em violência
operam desta maneira.
O ciclo da violência evolui em quatro fases, de modo frequente e a cada fase
aumenta o risco para a vítima que o vivencia. A primeira fase, designada pelo
aumento da tensão, corresponde inicialmente por pequenos incidentes, no qual a
agressão não se mostra claramente, mas se revela por meio de agressões verbais,
tom da voz, silêncios hostis e olhares agressivos. Tudo que a parceira faz o
aborrece e assim, diante da tensão esta busca meios pra tranquilizar as coisas e
agradar o parceiro, sendo amorosa, atenciosa, abdicando suas próprias vontades
em favor do parceiro. Mesmo assim, o homem tende atribuir à mulher suas
insatisfações e problemas, que por sua vez esta se sente culpada pela situação
(WALKER, 1979 apud HIRIGOYEN, 2006).
A segunda fase é designada pela ocorrência da agressão, em que há um
descontrole total do homem, este grita, ofende, intimida ou ainda quebra coisas
antes mesmo de agredir a companheira. Essas agressões físicas principiam de
forma gradual com tapas, murros, empurrões, beliscões e podendo até fazer uso de
uma arma. Além disso, o parceiro pode querer manter relações sexuais cuja
finalidade é frisar o domínio que tem sobre ela. Nesse contexto a mulher não esboça
nenhuma reação para se defender, pois anteriormente já havia sido preparado o

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terreno através de sucintos ataques que a deixaram com medo (WALKER, 1979
apud HIRIGOYEN, 2006).
Logo, vem à fase de desculpas, no qual o agressor procura diminuir ou
extinguir suas atitudes. Depois das explosões sente-se arrependido, mas por ser um
sentimento desagradável, tenta se livrar dele buscando justificativas pra isso, a mais
simples delas, é culpabilizar a vítima por todo o acontecido ou ainda explicar seu
comportamento por conta de eventos externos, como a bebida, acúmulo de trabalho
ou raiva. Então pede perdão, promete que não voltará a ter tais condutas e buscará
ajuda de psicólogos ou que vai participar dos alcoólatras anônimos (WALKER, 1979
apud HIRIGOYEN, 2006).
Posteriormente vem a fase de reconciliação ou lua de mel, na qual o cônjuge
muda completamente seus comportamentos, assumindo uma postura amável,
tornando-se subitamente gentil, prestativo, apaixonado, ajudando nos afazeres
domésticos, presenteando-a e empenhando em acalmá-la. Nesta fase elas voltam a
ter esperanças e pensam que com seu amor, ele vai se transformar. No entanto ao
ser instalada a violência, os estágios recomeçam, acelerando com o tempo e
aumentando de intensidade (WALKER, 1979 apud HIRIGOYEN, 2006).

3 CONSEQUÊNCIAS GERADAS PELA VIOLÊNCIA

A violência conjugal tem consequências devastadoras na saúde física e


mental das mulheres e também dos próprios filhos. Mesmo que as sequelas das
agressões físicas sejam mais fáceis de serem vistas, acabam desaparecendo com o
tempo, à medida que os insultos, as humilhações deixam marcas permanentes
(HIRIGOYEN, 2006).
No que se refere à saúde física, a violência resulta em inúmeras lesões
físicas, corporais e cerebrais, sendo as mais frequentes os hematomas, fraturas nos
ossos, no maxilar, queimaduras, lesões dentárias, torácicas ou abdominais, perda
de cabelo por arranchamento entre muitas outras. Algumas mulheres apresentam
uma desordem igual à dos boxistas, algo semelhante aos efeitos da doença de
Parkinson, devido às lesões neurológicas ocasionadas pelas pancadas consecutivas
na região do crânio e rosto (MANITA; RIBEIRO; PEIXOTO, 2009).
Em nível de saúde sexual e reprodutiva os problemas podem ser inúmeros,
manifestando-se de diferentes maneiras. As mulheres que vivem com parceiros

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abusivos, são impedidas de se protegerem de uma gravidez indesejada ou doenças


sexualmente transmissíveis, podendo contrair o vírus do HIV, pelo sexo forçado ou
mesmo pela impossibilidade de fazer uso de preservativos. A agressão também
pode acontecer na gravidez, gerando consequências para o desenvolvimento do
embrião, podendo provocar aborto espontâneo, nascimento prematuro do bebê ou
baixo peso, cuidado pré-natal atrasado entre outros (KRUG, et al., 2002). Além
disso, Hirigoyen (2006) salienta que muitas mulheres ficam com alguma desordem
acerca do desejo, reagindo com repudio ou rejeição. Outras ainda negam qualquer
relação íntima por bastante tempo.
Por conta do cenário abusivo vivido, muitas mulheres são seriamente
afetadas psicologicamente, apresentando uma baixa autoestima, sentimento de
vergonha, culpa, desmerecimento, isolamento, mudanças na imagem que tem
acerca de si e do seu corpo, outras ainda revelam perturbação da ansiedade, medo,
transtorno do pânico bem como a depressão, tentativas de suicídio ou o suicídio
consumado e problemas de concentração (MANITA; RIBEIRO; PEIXOTO, 2009).
Além disso, uma das consequências psicológicas mais proeminentes da
violência conjugal é o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).

Este surge como uma resposta tardia e/ou protraída a um evento ou


situação estressante (de curta ou longa duração) de uma natureza
excepcionalmente ameaçadora ou catastrófica, a qual provavelmente causa
angústia invasiva em quase todas as pessoas [...]. Sintomas típicos incluem
episódios de repetidas revivescências do trauma sob a forma de memórias
intrusas (flashbacks) ou sonhos, ocorrendo contra o fundo persistente de
uma sensação de "entorpecimento" e embotamento emocional, afastamento
de outras pessoas, falta de responsividade ao ambiente, anedonia e
evitação de atividades e situações recordativas do trauma. (CID 10, 1993,
p.145).

Sendo assim, mesmo que a pessoa tenha conseguido sair do relacionamento


agressivo, as sequelas da violência se estendem por meio desse transtorno.
Passado certos anos, um episódio sem relevância pode fazer com que a vítima
retorne ao passado e reviva suas aflições. Ela continua vulnerável, mesmo estando
afastada do perpetrador. Depois de muito tempo da agressão, pode ainda ficar
fechada em si mesma convicta de que o mundo é ameaçador e conservar durante
muitos anos um sentimento de desmerecimento (HIRIGOYEN, 2006).
Portanto os inúmeros abusos tem a possibilidade de fragilizar a mulher nas
distintas áreas citadas e a depender da gravidade e tempo de violência sofrida
podem surgir danos permanentes.

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4 FATORES COGNITIVOS E COMPORTAMENTAIS DA MULHER VÍTIMA DE


VIOLÊNCIA

Diante de eventos que ponham a vida em perigo ou ameace a tranquilidade


das pessoas e até mesmo de um animal, na luta pela sobrevivência a tendência é de
enfrentar ou fugir. No entanto, mesmo que vivenciem frequentes agressões
perpetradas pelo seu parceiro, algumas mulheres permanecem visivelmente
paralisadas ao lado deles (SILVA E SANCHES, 2014). Por isso, de acordo com
Hirigoyen (2006), aparentemente, não se compreende como as mulheres
conseguem sujeitar-se por longos períodos de tempo a episódios de violência ou por
qual razão denunciam e após alguns dias retiram a queixa. Todavia, independente
de sua personalidade ou posição na sociedade, a mulher pode estar suscetível a
sofrer agressões do seu próprio companheiro, mas existem alguns fatores de
vulnerabilidade (social, relacionado à sua condição de mulher ou psicológica,
associada a sua personalidade ou seu histórico pessoal) que afetam as defesas da
mulher, mostrando maior dificuldade de se libertarem deste tipo de relação
(HIRIGOYEN, 2006).
A dificuldade que a mulher tem em abandonar um parceiro só pode ser
entendida levando-se em consideração as relações de submissão/dominação que
são impostas a mulher bem como sua situação perante a sociedade. “Na verdade,
se as mulheres podem deixar-se apanhar em uma relação abusiva, é porque, devido
a seu lugar na sociedade, já estão em posição de inferioridade” (HIRIGOYEN, 2006,
p.73). De acordo com a autora referida, ao longo do século, foi possível presenciar
mudanças significativas no que diz respeito às relações entre mulher e homem,
porém os estereótipos continuam. Embora a igualdade tenha sido inserida
gradativamente, ainda é visto as mulheres como passivas e subjugadas e homens
como ativos e dominadores. As mães, por exemplo, ajudaram que esse estereótipo
permanecesse, ao ensinar os filhos que não mostrem sua sensibilidade, não
chorem, sejam fortes e valentes, enquanto que educam as meninas a serem
atenciosas, compreensivas, meigas e orientadas para as necessidades do outro.
Logo, as mulheres desenvolvem um “eu ideal” em relação aos preceitos anunciados
pela sociedade e família. Por isso, algumas se inclinam para o padrão de mãe
aplicada e acessível, pensando que para segurar um homem é necessário
manifestar renúncia e subordinação.

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Nesse contexto a influência religiosa também exerce grande influência sobre


elas, sendo considerada uma das razões que fazem com que as mulheres
permaneçam nessa condição de violência.

A indissolubilidade do casamento e a submissão da esposa ao marido,


pregada pela maioria das Igrejas Cristãs, através de uma leitura
fundamentalista da Bíblia, faz com que muitas mulheres acreditem que
devem suportar com paciência o destino a elas reservado. Que ao pedirem
o divórcio estarão desobedecendo à lei de Deus e deixando de cumprir a
missão a que se dispuseram através do sacramento do matrimônio (SILVA
& SANCHES, 2014, p.124).

Além disso, muitas mulheres que vivenciam episódios de violência não tem
qualificação profissional para adentrar no mercado de trabalho, o que dificulta a
possibilidade de sair da relação violenta, outras ainda afastam-se do emprego e dos
estudos por conta da imposição do seu companheiro. E como afirma Tavares
(2011), em muitos casos, o parceiro dispõe de toda a renda do casal, o que torna a
mulher subordinada ao cônjuge e esta por sua vez não ver opções para ficar livre
dessa situação.
Já para Marques (2005), a mulher se mantém num relacionamento abusivo,
pois recebe algo que ela deseja (permuta) e mesmo que custe caro, a sua escolha é
feita de forma consciente, ponderando as vantagens e desvantagens. Umas das
permutas referem-se ao dinheiro. A mulher decide entre aproveitar os privilégios
materiais e ter que passar por insultos ou partir e se libertar dessas aflições. Outra
permuta é feita para preservar o conforto dos filhos, porém o que elas não
compreendem é que os maiores traumas na infância decorrem das brigam que
acontecem entre o casal. Desse modo, sentem medo pelas dificuldades que podem
aparecer para providenciar o seu mantimento e dos seus filhos depois da separação.
Outro fator envolvido no não rompimento da relação abusiva pode ser
compreendido por meio de uma perspectiva transgeracional isto é, a experiência da
mulher em um ambiente no qual o pai agredia a mãe na infância, sofria maus tratos
ou abusos, converte em sua própria agressão, quando esposa, se tornando em um
acontecimento completamente normal. Quanto mais forem empregados enquanto
crianças, corretivos físicos para discipliná-las, maior é a chance de a mulher
continuar num relacionamento violento, pois ela soube desde pequena que é natural
agredir a pessoa que se ama, quando esta comete algum erro (TAVARES, 2011).

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Durante a infância os indivíduos desenvolvem alguns esquemas provenientes


da sua interação com figuras importantes. A partir de então, elas expressam uma
forma particular de ver e enfrentar às circunstâncias ao seu redor. Young (1990 apud
Paim; Madalena; Falcke, 2012), sugere a presença de esquemas iniciais
desadaptativos (EIDs), conceituando-os como “estruturas responsáveis por
processos de funcionamento da personalidade que determinam a forma de interação
do indivíduo” (p.32). São estruturas profundas, fixas e resistentes que causam
sofrimento e ações disfuncionais em um nível significativo (CECERO E YOUNG,
2001 apud PAIM; MADALENA; FALCKE, 2012).
Os EIDs são despertados na presença de certos acontecimentos e também
aspectos do próprio relacionamento podem ser ativadores desses esquemas. No
momento em que um homem e uma mulher se juntam, cada um traz consigo uma
série de crenças criadas através das suas experiências com a família. E ainda, a
seleção do cônjuge e o tipo de vínculo que se constrói com este podem ser como
uma revivescência de um modelo já conhecido (Paim; Madalena; Falcke, 2012), ou
seja, busca-se por relacionamentos íntimos que preservem a referência relacional
aprendida no seu convívio de origem. Dessa maneira, isto explica que mulheres no
decorrer da infância que assistiram a episódios de violência têm maiores chances de
tolerar essa prática, graças a esses esquemas desenvolvidos.
Os esquemas iniciais desadaptativos são reunidos em cinco domínios
totalizando 18 EIDs distribuídos entre eles, que evidenciam características
particulares dos indivíduos. Conforme uma pesquisa realizada por Paim; Madalena;
Falcke (2012) foram identificados alguns desses EIDs que foram associados à
vitimização da violência conjugal: desconfiança/abuso, emaranhamento, auto
sacrifício e padrões inflexíveis. O primeiro domínio, desconexão e rejeição: está
associado à dificuldade que a pessoa tem de criar vínculos sólidos e adequados, no
qual acreditam que suas necessidades nunca serão supridas. Apresentando
experiências primárias negativas como desprezo, afastamento social, frieza ou
abuso. O esquema desadaptativo deste domínio é o de desconfiança/abuso, no qual
a pessoa espera ser ludibriada, traída ou envergonhada por alguém, vendo as
relações como perigosas. Sendo assim, pessoas com esse esquema tendem a
manter relacionamentos com companheiros que continuamente abusam delas,
confirmando repetidamente o seu esquema desadaptativo. O domínio autonomia e
desempenho prejudicados se referem às vivências de uma proteção excessiva e

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supressão de um espaço que incentive a independência. O esquema vinculado é o


emaranhamento/self que está associado a um envolvimento afetivo em demasia,
com dificuldades em operar de maneira autônoma e de se separar de pessoas
significativas (YOUNG; KLOSKO; WEISSHAAR, 2008).
As pessoas do domínio orientação para o outro, relaciona-se por meio de um
funcionamento exagerado em satisfazer os desejos dos demais, no lugar de suas
próprias necessidades. Nesse caso o esquema relacionado é o auto sacrifício.
Indivíduos com esse esquema procuram atender as necessidades de terceiros
mesmo custando a sua própria, no intuito de resguardar os outros de sofrimento ou
continuar num relacionamento com um indivíduo que julgue necessitado. Por fim, no
domínio designado de supervigilância e inibição, os sujeitos extinguem seus ímpetos
e sentimentos e se empenham em cumprir normas incorporadas no que diz respeito
a sua performance, expressão e relações afetivas. O esquema desadaptativo
vinculado refere-se aos padrões inflexíveis, onde o indivíduo tem a impressão quem
tem obrigação de gastar energia para alcançar elevados padrões internalizados e
assim, evitar constrangimento ou desaprovação. Desse modo a vitimização pode ser
como uma estratégia para manter esses esquemas (YOUNG; KLOSKO;
WEISSHAAR, 2008).
Por outro lado conforme Silva (2014) muitas pessoas perante as dificuldades
sofridas conseguem resgatar o trajeto de suas vidas normalmente. Uma das
justificativas para isso está ligada a como esses indivíduos encararam essas
dificuldades, isto é, que estratégias de enfrentamento ou coping utilizadas que
propiciou alcançar um resultado positivo. O coping é conceituado como “esforços
cognitivos e comportamentais em constante mudança para manejar demandas
específicas externas e/ou internas que surgem em situação de estresse e são
avaliadas como sobrecarregando ou excedendo os recursos da pessoa” (LAZARUS
E FOLKMAN, 1984 apud SILVA, 2014, p.17). Aprender essas estratégias resulta de
inúmeros fatores (individuais e ambientais) no decorrer da vida, como características
da personalidade, cenário em que residem, crenças, recursos disponíveis e
experiência de psicoterapia (SILVA, 2014).
Portanto muitas mulheres fazem uso dessas estratégias como forma de
adaptação e de sobrevivência perante a violência sofrida nas quais são submetidas
nos relacionamentos abusivos, na tentativa de minimizar ou eliminar as ameaças a
sua segurança física e seu bem estar emocional.

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4.1 AS POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO DA TERAPIA COGNITIVO-


COMPORTAMENTAL

Desenvolvida por Aaron Beck, a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)


trata-se de uma psicoterapia breve, estruturada, focada no presente, voltada para a
solução de problemas atuais e alteração de cognições e condutas disfuncionais
(BECK, 2013). Fundamenta-se no modelo cognitivo no qual [...] “parte da hipótese
de que as emoções, os comportamentos e a fisiologia de uma pessoa são
influenciados pelas percepções que ela tem dos eventos” (BECK, 2013, p.50).
Dessa forma a TCC apresenta-se como uma terapia importante, capaz de
atender as demandas de violência conjugal e como afirma Dattilio (2011), o
tratamento terapêutico é de fundamental relevância em assuntos como esse, visto
que, sem tratamento o ciclo da violência expande-se por mais tempo. Além disso,

A pessoa sob jugo não é mais senhora de seus pensamentos, está


literalmente invadida pelo psiquismo do parceiro e não tem mais um espaço
mental próprio. Fica como que paralisada, e mudança alguma pode
processar-se espontaneamente em seu interior. Ela precisa de uma ajuda
externa para pôr fim à sujeição, e é para isso que serve o trabalho
psicoterapêutico (HIRIGOYEN, 2006, p.182).

Logo, perante a infinidade de sintomas que a vítima de uma relação abusiva


manifesta, a terapia cognitivo-comportamental irá intervir naqueles que trazem maior
sofrimento para ela. Assim, diversas técnicas podem ser utilizadas, mas é diante da
demanda apresentada que avaliará a melhor para ser aplicada.
De uma maneira mais ampla é essencial que comece a terapia com uma
sessão para esclarecimento de informações que a paciente precise acerca do seu
tratamento, onde a função do psicólogo é ensinar e habituar a paciente no que se
referem as suas dificuldades, aclarando suas dúvidas e apoiando a vítima
(MOREIRA, 2014).
Para Hamberg e Holtzworth-Monroe (2007 apud Dattilio, 2011), as mulheres
que sofrem violência doméstica manifestam regras cognitivas provenientes de
diversos fatores. Assim, é essencial trabalhar com os pensamentos nos quais elas
se responsabilizam pela agressão e aqueles nos quais deduzem que o parceiro não
é capaz de viver fora da relação agressiva. Frequentemente, aspectos de
dependência e honestidade acompanhados de distorções cognitivas, também

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precisão de intervenção.
Além disso, a mulher pode ter crenças do tipo “não sou capaz de arrumar
alguém melhor” ou “não sou capaz de sair dessa situação”, nesse cenário é
fundamental trabalhar essas cognições por meio da restruturação cognitiva, pois
como afirma Moreira (2014, p.19) “a restruturação cognitiva muda à maneira de
interpretar o pensamento disfuncional”. Então se utiliza dessas estratégias de
reestruturação para ensinar o paciente a identificar e alterar as cognições
inadequadas, mediante técnicas como o questionamento socrático ou de evidências
e registro de pensamentos disfuncionais (BECK; TAYLOR; WOODY & KOCH, 1997
apud OLIVEIRA & ANDRETTA, 2011).
A TCC pode ainda empregar outros meios como a psicoeducação e a
descoberta guiada, para tornar claro algumas questões que se tornam difíceis se
serem compreendidas pela mulher nessa condição de violência. Nesse caso a
psicoeducação seria uma importante ferramenta cuja função, conforme Jesus &
Lima (2018, p.4), “é simplificar a queixa da paciente” por meio de exercícios de casa,
miniaulas, sugestões de leituras como a Lei Maria da Penha e outros textos
relacionados à violência contra as mulheres. Desse modo, a paciente que entende
adequadamente seu problema, os impactos acarretados e processo de tratamento,
tem maiores chances de tornar-se mais empoderada. Ao passo que a descoberta
guiada é a técnica mais utilizada na sessão, geralmente para identificar
pensamentos automáticos ocasionados a partir da agressão sofrida. “Por meio desta
técnica o psicoterapeuta atua com o objetivo de ajudar a paciente a identificar
conteúdos cognitivos severos e inflexíveis, colocando-os como suspeitas e não
verdades absolutas” (JESUS & LIMA, 2018, p.4).
Já nas circunstâncias em que a mulher desenvolve o transtorno do estresse
pós-traumático, por exemplo, além de utilizar a reestruturação cognitiva e a
psicoeducação, existem outras técnicas que são eficientes para atenuar os sintomas
desse transtorno. As técnicas de exposição cujo propósito é possibilitar o
desaparecimento da resposta do medo e da ansiedade especifica do TEPT e os
episódios de revivência e sinais de evitação (KEANE et al., 2006 apud OLIVEIRA E
ANDRETTA, 2011).
E como elucida Caballo (2002 apud Oliveira & Andretta, 2011) as técnicas de
relaxamento que ajudam os pacientes a regular os sintomas fisiológicos que lhes
invadem ao se esbarrarem com situações temidas. As mais utilizadas são as de

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relaxamento muscular progressivo e a de respiração diafragmática.


Também, o terapeuta pode trabalhar no fortalecimento do amor próprio, visto
que diante das distintas formas de violência sofrida, principalmente a psicológica, a
mulheres ficam com sua autoimagem totalmente comprometida. Como elucida
Hirigoyen (2006), é necessário intervir com elas na sua autoestima e no seu senso
se independência, para que consigam vencer seus bloqueios e recuperar seus
recursos pessoais. Junto com elas, elencar suas qualidades bem como suas vitórias,
pois “para sair de uma posição de vítima, é preciso, pelo trabalho psíquico,
reencontrar uma boa imagem de si mesmo” (p.187).

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente estudo com métodos de natureza exploratória foi produzido por


meio de uma revisão literária, sendo esta necessária para melhor entendimento do
tema, cujos resultados foram expostos de forma qualitativa. Conforme Gil (2008) a
pesquisa bibliográfica é produzida com base nos materiais já desenvolvidos,
composto essencialmente de artigos científicos e livros. O grande benefício desse
tipo de pesquisa consiste no fato de proporcionar ao pesquisador o alcance de uma
série de fenômenos muito mais extensa do que aquela que conseguiria investigar
diretamente.
Logo, diversos instrumentos foram usados para a realização desta pesquisa
tais como: dissertações, artigos, livros, cartilhas e leis. O levantamento de artigos foi
feito por meio dos bancos de dados online Scielo, Pepsic, Revista Psicologia,
Diversidade e Saúde, Repositório Comum, Cetcc, Pgpsi e Tede.

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO

É incontestável que a maior prevalência de agressão entre casais, é praticada


pelo o homem contra sua companheira. Esse fato pode ser facilmente percebido,
basta ligar os noticiários ou até mesmo por meio da vivência de uma vizinha, amiga
ou irmã. Contudo na literatura foi possível observar que ambos podem ser
perpetradores e por mais que existam poucos estudos sobre a temática, muitos
autores retrataram essa realidade, que por vezes é desconhecida e desacreditada
por muitos. O que fica evidente é que os homens podem ser agredidos pela

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parceira, porém com proporções muito menores do que acontece com elas. Como
destacado por Hirigoyen (2006), frequentemente a agressão física realizada pela
mulher é reativa. A maioria delas que assassinaram o parceiro foi em circunstâncias
para se protegerem ou como forma de se defenderem das agressões sofridas.
Pode-se mencionar também que diante das diversas formas de violência
sofrida pela mulher, a agressão física vem liderando com maior prevalência, mas em
contrapartida a psicológica é a que mais traz consequências graves, dado que não
possui materialidade e sua detecção torna-se complicada. À vista disso muitas
mulheres não reconhecem a situação de violência em que estão sendo expostas,
impedindo-as de tomar iniciativas para cessar o abuso e por vezes veem as ofensas,
o ciúme como algo natural, como uma demonstração de zelo e amor.
Logo, há um consenso na literatura quanto aos impactos desestruturantes das
relações abusivas, contudo esta também traz grande repercussão para a sociedade
e para os filhos. Como salienta Krug et al., (2002) a violência traz custos econômicos
para a comunidade no que diz respeito ao aumento da utilização dos serviços de
saúde e baixa produtividade. Considera ainda que os filhos que presenciam
violência conjugal têm maiores chances de apresentar dificuldades afetivas e
comportamentais, incluindo depressão, indisciplina, diminuição do desempenho
escolar e ansiedade.
Fica evidente por meio dos índices alarmantes apresentados nesse artigo que
a violência conjugal tem crescido consideravelmente. À vista disso, fica o
questionamento de qual lacuna está presente que em vez de mitigar esse problema
ele tem se elevado. Dessa forma, entende-se que acabar com a violência que
acontece na intimidade de um casal, parece uma realidade distante, porém constata-
se a necessidade em alterar a conduta dos protagonistas da violência, mas isso não
significa que eles têm que se livrar da pena que lhe foi atribuída, todavia percebe-se
através de um olhar mais humanizado que é essencial que estes tenham algum tipo
de acompanhamento ou tratamento psicológico, pois como diversos estudos
apontam muitos desses agressores na infância vivenciaram maus tratos, negligência
e abusos.
Assim, Epstein et al. (2005 apud Dattilio, 2011) indicaram um tratamento
denominado de Programa de Prevenção do Abuso de Casais, um modelo cognitivo-
comportamental que foca no risco de agressão por parte do companheiro. No qual o
foco é a psicoeducação acerca da conduta abusiva e seus efeitos prejudiciais, na

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administração da raiva no decorrer do conflito, no aperfeiçoamento das habilidades


de comunicação e auxiliando-o na recuperação de acontecimentos traumáticos
vividos.
Outro elemento importante verificado é que as primeiras agressões ocorrem
entre os jovens, sendo assim sob uma análise de prevenção, vê a juventude como
público importante para promover estratégias de intervenções, dado que a falta de
experiência em relacionamentos atrelada à imaturidade e ao desejo de
independência que surgem nessa etapa da vida, tornam-se mais propensos a não
reconhecer que estão numa situação de vitimização. E como as relações íntimas
têm acontecido de forma muito precoce, os jovens por serem facilmente
influenciados e acaba repetindo condutas violentas, apoiadas no preconceito,
desigualdade, ciúme, controle etc. Nesse caso ver as escolas como grande
colaboradora para prevenir e deixar claro os impactos sociais e legais de uma
relação abusiva bem como os efeitos de continuar nela, visto que, ela tem grande
poder na formação das opiniões desses jovens. Além do mais, as escolas poderiam
trabalhar sobre temáticas relacionais que tratem da igualdade entre homem e
mulher, do respeito mútuo entre ambos, pois se não modificar a mentalidade dos
jovens a tendência é propagar mais ainda a violência.
Além disto, apurou-se uma insuficiência no que concerne a materiais sobre os
fatores associados à permanência da mulher em relacionamentos abusivos. Mas
com base nos dados coletados, verificou-se que sair dessa dinâmica relacional é um
desafio e vai muito além de uma mera escolha que a mulher precisa fazer,
envolvendo recursos intrínsecos presentes em cada uma. Por vezes a mulher
carrega nesse cenário alguns estigmas do tipo “a mulher gosta de apanhar” ou
“aceita a violência porque quer”, então mais do que fazer uso desses estigmas vale
conhecer os motivos para que desse modo possíveis intervenções sejam
elaboradas, pois em diversas ocasiões à própria mulher ver a união como destrutiva,
outras ainda querem sair da relação, só que se sentem incapazes de tomar qualquer
decisão para se desvincular do parceiro.
Por todos esses aspectos, reconhece a necessidade da vítima receber apoio
externo por meio de um trabalho multiprofissional, para que haja uma ruptura desse
relacionamento bem como uma campanha de conscientização mais acentuada em
muitos ou senão em todos os setores da sociedade para que essas intervenções
gerem um encorajamento e empoderamento nessas mulheres.

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7 CONCLUSÃO

Diante do arcabouço teórico levantado verificou-se que a violência conjugal é


um fenômeno de natureza bastante complexa, visto que, está alicerçada no poder
patriarcal onde a mulher está na posição de submissa e o homem de dominador, no
entanto pouco a pouco essa ideia tem sido desmontada, pois a mulher hoje vem
ocupando um lugar mais privilegiado.
Assim, com o reconhecimento da violência conjugal como um problema de
saúde pública tornou-se alvo de investigação dos mais diversos âmbitos, bem como
foram implantados diversos mecanismos para resguardar a mulher diante desse
contexto. Contudo, perante o grande número de casos de violência conjugal contra
as mulheres, cabem aqui maior atenção e pesquisas sobre o tema para que se
investiguem as causas para tal ocorrência, pois estudos como esse contribuem para
o constante repensar dessas condutas violentas e a compreensão desta dinâmica
favorece uma abordagem adequada e possíveis formas para estimular
conscientizações, orientação e encaminhamento mais efetivo para as mulheres que
vivenciam essa situação.

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