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BRASIL: O PAÍS DOS MÚSICOS

Jaime Troiano

Este tem sido um grande bate-boca na última década: estamos mais


preocupados com os músicos do que com a orquestra. Estamos mais
fascinados pelos maravilhosos instrumentos de comunicação que estão à nossa
disposição do que pelo efeito integrado das partituras.

Fazer parte de uma orquestra deve ser um ato de humildade. Um ato inteligente e
de lúcida subserviência diante do interesse maior que é o monumental efeito do
conjunto. E que efeito é este? Nada mais, nada menos, do que o fortalecimento da
suprema arma de negócios de que as empresas dispõem: suas marcas.

Nestes últimos anos, temos visto todo tipo possível e imaginável de shows de
solistas. Nunca, jamais em tempo algum, tivemos à nossa disposição tantas
ferramentas ou instrumentos de comunicação. Televisão aberta, TV paga, rádio,
jornal, revista, inúmeras formas de mídia exterior, internet, marketing direto,
eventos, pdv...e a lista não acaba.

Isto sem falar em instrumentos com “sons” mais insólitos: guardanapos, tickets de
estacionamento, portas de elevador, balcões de padarias, portas de taxis, vagões
de metrô, roupas de equipes de esportes, chaveiros, bloquinhos de anotação de
recados, saquinhos de adoçante em restaurantes, tickets de pedágio...

Com todos esses instrumentos disponíveis, o que nós temos visto? Grandes e
pretenciosos espetáculos de virtuoses. O que temos visto é uma contínua tentativa
de provar a superioridade de cada instrumento sobre os demais, num ingênuo
esforço de simplificar a vida dos anunciantes. Como se as marcas que esse
cliente detém pudessem se alimentar apenas de um, ou de uns poucos,
timbres.

Nestes tempos de budgets apertados, a solução simplificada de usar apenas o


solista, que acha que resolve tudo, é ainda mais freqüente. A simplicação é um ato
de comodismo. A simplificação é apenas fruto de uma estratégia comercial para
impor a superioridade de um instrumento sobre os demais. Aliás, a vítima mais
recente neste palco de virtuoses é, acreditem se quiser, a propaganda. Ela nunca
foi tão injustamente satanizada como agora. Seu fantástico poder de criar valor
nunca foi tão insensatamente contestado. Por quê? Porque há “cellos” e “fagotes”
que acham possível viver sem ela na orquestra.

O Brasil é um país em que a comunicação tem “músicos” maravilhosos. Mas a


formação de “maestros” está em descompasso com os novos tempos. Os
grandes laureados da nossa comunicação de marketing são os grandes solistas.
Pensem bem e acho que vocês concordarão comigo: quantos “maestros”

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famosos, capazes de integrar partituras desses músicos tão hábeis e experientes,
nós conhecemos em nosso mercado?

Com o passar dos anos, nós fomos sendo, lenta e gradualmente, levados a
considerar o poder dos instrumentos individualmente. Mas não demos a mesma
atenção a como combinar a sinergia de seus efeitos. Seja por necessidades
comerciais de quem opera com cada um desses instrumentos; seja porque volta e
meia um deles assume um caráter modal; ou sejam mesmo porque seus
resultados são mais fáceis de serem medidos, fomos sendo levados a valorizar
solistas.

As feiras, o jornalismo de marketing e os eventos concentram-se no glamour do


instrumento, muito mais do que no seu papel dentro da sinfônica. Nas nossas
faculdades, não há nada que lembre a Northwestern University na formação de
“maestros” em comunicação integrada de marketing. Pior ainda, gente que passou
por lá sente uma dificuldade terrível de se ajustar ao nosso mercado, neste país
de músicos.

Os “maestros” assustam e ameaçam porque exigem obediência e respeito. E para


a personalidade brasileira e desta profissão, que têm um componente narcísico
muito forte, este ato de humildade que é apenas fazer parte de uma orquestra
incomoda demais. É lógico que temos um punhado de hábeis regentes. Mesmo
sabendo que estou cometendo injustiça com os não citados, não posso deixar de
citar pelo menos dois nomes: Júlio Ribeiro, Walter Longo. Ainda assim, são
poucos diante da necessidade emergencial de fortalecimento de nossas marcas e
de sua capacidade de gerar novos negócios para os respectivos clientes.

A OSESP, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, é hoje um grande


sucesso, com projeção internacional. Seu hábeis e experientes músicos não
teriam conseguido o que a OSESP conseguiu sem a disciplina inteligente e a
autoridade de seu principal regente, o Maestro John Neschling. Ainda que para
isso ele tenha sido obrigado a impor comportamentos de humildade e obediência
junto a seus virtuoses. Acho que tudo isto não é uma comparação tão distante de
nosso mercado!

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