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GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS.

TEORIA GERAL. ESPÉCIES.

Prof. Noemia Porto

A Importância das Garantias


As constituições contemporâneas trazem novo desafio ao constitucionalismo:
transpor-se a era da enunciação de princípios para a época da disciplina satisfatória de
direitos acionáveis (BONAVIDES, 2000, p. 207)
A preocupação centrada no exercício dos direitos constitucionais adquire especial
conotação quando se trata dos direitos fundamentais.

Elementos de Teoria Geral - Direitos Fundamentais


A) Conceito e Aspectos Gerais. Prevenção e Repressão. Titularidade
A Constituição brasileira classifica o gênero direitos e garantias fundamentais nas
espécies: direitos individuais, direitos coletivos, direitos sociais, direitos inerentes à
nacionalidade e direitos políticos. Especificamente quanto aos direitos e deveres
individuais e coletivos há manifestação do STF no sentido de que não se restringem ao
art. 5º (ADI 939-7/DF).
Substancialmente não há diferença entre direito e garantia. A garantia é um direito.
A garantia equivale a pouca preocupação com enunciação e a alto compromisso
enquanto meio destinado a fazer valer direitos.
Atuação preventiva das garantias = princípios de organização e fiscalização das
autoridades estatais - limitação do poder estatal e concretização do princípio da
Separação de Poderes.
Remédios constitucionais - garantias marcadamente repressivas, mesmo quando é
possível o manejo preventivo.
Titularidade no caso das garantais. Regra = quando o texto nada especifica no
particular, então o titular da garantia equivale ao titular do respectivo direito. A legislação
infraconstitucional pode ampliar a titularidade de garantia especificada, como, aliás, faz o
Código de Processo Penal (art. 654) em relação ao HC. A despeito da regra (titularidade
da garantia = titularidade do direito), em alguns casos a Constituição Federal estabelece
titularidade precisa. Exemplo disso é o mandado de segurança coletivo e a ação popular.

Mandado de Segurança
A) Origem
Em grande parte a origem se identifica no desdobramento do habeas corpus. Há
extensão da proteção às liberdades civis, para além do resguardo à liberdade física contra
o abuso de autoridade.
Presença do HC no Código de Processo Criminal do Império de 1832. Elevação ao
plano constitucional em 1891 (art. 72, parágrafo 22: dar-se-á o habeas corpus sempre
que um indivíduo sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação por
ilegalidade ou abuso de poder). Interpretação no sentido de que o mandado de segurança
já se encontrava implícito no art. 72. Essa previsão fez vigorar o que se chamava de
“teoria brasileira do habeas corpus”.
A revisão constitucional de 1926 reconduziu o HC ao seu uso tradicional (proteção
à liberdade de locomoção), com restrição, portanto, à referida teoria.
A Constituição de 1934 consagrou o mandado de segurança, inclusive com
contornos de controle de constitucionalidade.
A garantia não constou no Texto de 1937, mas sobreviveu no sistema jurídico
através de decreto-lei (nº 6 de 1937), embora com limitações à sua extensão e efeitos.
A Constituição de 1946 restaurou o instituto em âmbito constitucional.
A Constituição de 1988 consagrou inovação importante representada pelo
mandado de segurança coletivo.

B) Mandado de Segurança e Aspectos Pragmáticos


Campo de incidência delimitado pela exclusão (é cabível em não sendo o caso de
HC ou HD - proteções específicas para a liberdade de locomoção e o acesso a
informações ou dados).
Através do MS busca-se a invalidação de atos de autoridade ou a supressão dos
efeitos da omissão administrativa, que estejam gerando lesão a direito líquido e certo,
caracterizando-se a ilegalidade ou o abuso de poder.
O sujeito passivo é o Estado (concepção em sentido amplo - observar atividades
delegadas do Poder Público). No polo passivo há identificação da própria autoridade
coatora. O critério que se aconselha utilizar para identificar corretamente a autoridade
coatora é o de verificar se aquela que praticou o ato tem competência também para
desfazê-lo (MEIRELLES apud GUERRA, 2001, p. 92).
Em caso de órgão colegiado, a impetrada deve ser a autoridade que o representa
legalmente.
Atos complexos e duas possibilidades: órgão mais proeminente e os demais como
litisconsortes unitários ou a autoridade que com a sua vontade integrou o ato complexo,
consumando-o (GUERRA, 2001, p. 93).
Ato composto - notificação da autoridade inferior que assumiu a responsabilidade
pelo ato (GUERRA, 2001, p. 93).
Correção do ato administrativo = aspectos da competência, objeto lícito, forma
prescrita ou não defesa em lei, o motivo e a finalidade. Tanto os atos vinculados quanto os
atos discricionários são atacáveis por mandado de segurança. Ilegalidade - campo do ato
vinculado. Abuso de poder - ato discricionário. Controvérsia sobre o mérito administrativo,
no contexto da oportunidade e da conveniência.
Binômio: ato ilegal ou abusivo e direito líquido e certo (translúcido; não paira
dúvida; prova eminentemente documental; prova pré-constituída, sem necessidade,
portanto, de dilação probatória).
O procedimento deve carregar as marcas da rapidez e da simplificação.
Competência judiciária para julgamento observa a hierarquia da autoridade
coatora, além das demais regras cominadas de ratione personae e ratione materiae.
Importante observar, todavia, a competência dos próprios Tribunais para processarem e
julgarem os mandados de segurança impetrados contra seus atos e omissões.
Mandado de segurança e possibilidade de defesa de direito subjetivo próprio e
individual de quaisquer titulares. Controvérsias sobre pessoas físicas, entes
personalizados ou não, pessoa jurídica de direito privado e público.
Mandado de segurança preventivo - o justo receio, por parte do titular de direito
líquido e certo, de sofrer a violação a seu direito, que estaria, assim, ameaçado pela
autoridade. Essa ameaça não deverá fundar-se em mera suposição, mas sim em fatos e
atos já verificados e atuais (BARBI, apud GUERRA, 2001, p. 95).

C) Mandado de Segurança - Visão Perspectiva dos Requisitos


i) A natureza jurídica do mandado de segurança é de remédio constitucional com
natureza de ação civil.
ii) A finalidade do mandado de segurança é proteger direito subjetivo individual
líquido e certo, sendo assente a constatação de que a liquidez e a certeza se relacionam
à precisão ou certeza dos fatos que, articulados, conduzem à pretensão de direito
afirmada em juízo. Por isso mesmo o MS não se compatibiliza com ordem judicial
genérica.
iii) Nos termos da Lei nº 12.061/2009 (art. 7º, § 2º), observar que não poderá ser
concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a
entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação
de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou
pagamento de qualquer natureza.
iv) No mandado de segurança coletivo sobressai a defesa com a marca
característica da liberdade coletiva.
v) Apenas o próprio titular tem legitimidade para impetrar o mandado de segurança
individual (prevalência da regra em teoria geral, com ressalva para possibilidades futuras
de maior alcance definido em norma infraconstitucional). Conforme tem entendido o STF:
o mandado de segurança não admite a habilitação de herdeiros em razão do caráter
mandamental do writ e da natureza personalíssima do direito postulado (ex: STF, MS
25641/DF Distrito Federal, Relator Ministro Eros Roberto Grau, Pleno, julgado em
22.11.2007).
vi) No mandado de segurança coletivo a legitimidade é dos representantes da
coletividade - sindicato, associação em funcionamento há pelo menos um ano e partido
político com representação no Congresso Nacional. Possibilidade, ainda controversa, de
atuação supletiva do partido político na defesa de interesse coletivo abarcado pela
proteção de mandado de segurança coletivo.
vii) O objeto do MS coletivo é a defesa de interesses transindividuais (individuais
homogêneos ou coletivos).
viii) Para a impetração do MS coletivo não há necessidade de autorização dos
associados, mas é imprescindível que a previsão estatutária permita tal atuação da
entidade, e é viável que ela defenda os interesses de parte da categoria, e não da sua
totalidade (Súmulas 629 e 630 do STF e art. 21 da Lei nº 12.061/2009).
ix) No MS coletivo pode ser avaliada a chamada pertinência temática, ou seja, a
relação entre o objeto da ação e os objetivos institucionais do sindicato, da entidade de
classe ou associação, os quais atuam como substitutos processuais (legitimação
extraordinária).
x) O atual art. 5º, LXIX, amplia o espectro passivo do mandado de segurança,
compreendido que passa a estar em dois grupos: a) autoridades públicas; b) agentes de
pessoas jurídicas no exercício de atribuições do Poder Público.
xi) Feição recursal do MS - impetração contra ato judicial.
xii) Requisitos do MS e recurso extraordinário: a discussão em torno dos requisitos
de admissibilidade do mandado de segurança possui natureza meramente processual,
que envolve a apreciação de normas infraconstitucionais (ex: STF, AI-AgR 631320/RR-
Roraima, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, julgado em 13.03.2008).
xiii) O prazo decadencial em MS começa a fluir, em caso de ato complexo, a partir
da ciência da prática do último ato de vontade (ex: STF, MS 25552/DF - Distrito Federal,
Relatora Ministra Cármen Lúcia, Pleno, julgado em 07.04.2008).
xiv) Súmula 266 do STF - alcance interpretativo.
xv) MS e controle de constitucionalidade preventivo. Análise jurisprudencial:

(INFORMATIVO 479 – STF – 2007 – Constitucional) CORRETA FORMAÇÃO


DAS LEIS - DIREITO SUBJETIVO DO PARLAMENTAR - MANDADO DE SEGURANÇA
– POSSIBILIDADE (Transcrições) - MS 26712 ED-MC/DF. RELATOR: MIN. CELSO DE
MELLO.
EMENTA: MEDIDA PROVISÓRIA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE EM SEU
PROCESSO DE CONVERSÃO LEGISLATIVA. DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO DO
PARLAMENTAR À CORRETA ELABORAÇÃO, PELO PODER LEGISLATIVO, DAS LEIS
E DEMAIS ESPÉCIES NORMATIVAS. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE
ATIVA DO CONGRESSISTA. ULTERIOR CONVERSÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA EM
LEI. PERDA SUPERVENIENTE DE OBJETO DO MANDADO DE SEGURANÇA.
CESSAÇÃO, POR IGUAL, DA LEGITIMAÇÃO ATIVA “AD CAUSAM” DO PARLAMENTAR.
PREJUDICIALIDADE DO MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO EXTINTO.
- O parlamentar dispõe de legitimação ativa para suscitar o controle incidental de
constitucionalidade pertinente à observância, pelas Casas do Congresso Nacional, dos
requisitos – formais e/ou materiais – que condicionam a válida elaboração das
proposições normativas, enquanto estas se acharem em curso na Casa legislativa a que
pertence o congressista interessado.
- Com a aprovação da proposição legislativa ou, então, com a sua transformação
em lei, registra-se, não só a perda superveniente do objeto do mandado de segurança,
mas a cessação da própria legitimidade ativa do parlamentar, para nele prosseguir, eis
que a ação mandamental – além de incabível contra atos estatais em tese (Súmula
266/STF) - não pode ser utilizada como sucedâneo da ação direta de
inconstitucionalidade. Precedentes.
- Se se admitisse, em tal situação, a subsistência da legitimidade ativa do
parlamentar, estar-se-ia, na realidade, a permitir, anomalamente, que o membro do
Congresso Nacional – que não se acha incluído no rol taxativo consubstanciado no art.
103 da Carta Política – pudesse discutir, “in abstracto”, a validade constitucional de
determinada espécie normativa. Precedentes.
DECISÃO: O presente mandado de segurança está prejudicado, em face da
superveniente perda de seu objeto, eis que impetrado com o único propósito de
“determinar, à Mesa da Câmara dos Deputados, que somente vote a MP nº 366/2007,
após a elaboração do efetivo parecer por meio de Comissão Mista de Deputados e
Senadores” (fls. 11, item V, “d”).
As informações prestadas pelo Senhor Presidente da Câmara dos Deputados
evidenciam que a MP 366/2007 foi aprovada, pelo Plenário dessa Casa legislativa, “na
forma do Projeto de Lei de Conversão nº 19, de 2007” (fls. 103/109, 105).
A situação que se registrou na tramitação da referida medida provisória faz
instaurar, na espécie, hipótese caracterizadora de prejudicialidade, eis que já se concluiu,
na Câmara dos Deputados, o “iter” procedimental concernente à conversão legislativa da
MP 366/2007.
Sobreveio, ainda, no curso deste processo mandamental, um outro fato
impregnado de significativa relevância no plano processual.
Refiro-me à definitiva conversão, em lei (Lei nº 11.516/2007), da MP 366/2007,
após concluída a fase ritual perante o Senado da República.
Com o encerramento do itinerário bicameral do procedimento de conversão
legislativa da MP 366/2007 e com a resultante promulgação da Lei nº 11.516/2007,
exauriu-se, na instância do Congresso Nacional, o rito de formação dessa particular
espécie legislativa.
Os estritos limites temáticos delineados nesta impetração mandamental,
notadamente aqueles que conformam o pedido final (fls. 11, item V, “d”), obstam o
prosseguimento da presente ação de mandado de segurança, ante a evidente perda de
seu objeto.
Nem se diga, de outro lado, que a presente impetração poderia, agora, voltar-se
contra a própria Lei nº 11.516/2007 (DOU de 28/08/2007), resultante da conversão da MP
366/2007, eis que, como se sabe, não cabe mandado de segurança contra lei em tese.
É que os preceitos inscritos em tal diploma normativo consubstanciam ato em tese,
cujo coeficiente de normatividade e de generalidade abstrata impede, na linha de diretriz
jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula 266), a válida utilização
do remédio constitucional do mandado de segurança: “Não se revelam sindicáveis, pela
via jurídico-processual do mandado de segurança, os atos em tese, assim considerados
aqueles (...) que dispõem sobre situações gerais e impessoais, que têm alcance genérico
e que disciplinam hipóteses neles abstratamente previstas. Precedentes. Súmula
266/STF.”
(RTJ 180/942-943, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Não constitui demasia assinalar, neste ponto, que normas em tese – assim
entendidos os preceitos estatais qualificados em função do tríplice atributo da
generalidade, impessoalidade e abstração – não se expõem ao controle jurisdicional pela
via do mandado de segurança, cuja utilização deverá recair, unicamente, sobre os atos
destinados a dar aplicação concreta ao que se contiver nas leis, em seus equivalentes
constitucionais ou em regramentos administrativos de conteúdo normativo, consoante
adverte o magistério da doutrina (HELY LOPES MEIRELLES, “Mandado de Segurança”,
p. 40/41, 28ª ed., 2005, atualizada por Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes, Malheiros;
ALFREDO BUZAID, “Do Mandado de Segurança”, vol. I/126-129, itens ns. 5/6, 1989,
Saraiva; CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, “Manual do Mandado de Segurança”,
p. 41/43, 3ª ed., 1999, Renovar; FRANCISCO ANTONIO DE OLIVEIRA, “Mandado de
Segurança e Controle Jurisdicional”, p. 28/29, item n. 2.1.1, 2ª ed., 1996, RT).
Esse entendimento doutrinário, por sua vez, nada mais reflete senão a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que sempre tem enfatizado, a propósito da
matéria ora em exame, não serem impugnáveis, em sede mandamental, aqueles atos
estatais – como o de que ora se cuida – cujo conteúdo veicule prescrições disciplinadoras
de situações gerais e impessoais e regedoras de hipóteses que se achem abstratamente
previstas em tais atos ou resoluções (RTJ 132/189, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
Reconhecer-se, na espécie em exame, a possibilidade jurídico-processual de
impugnação, em sede mandamental, do ato normativo em questão equivaleria, em última
análise, a autorizar a indevida utilização do mandado de segurança como inadmissível
sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade, desconsiderando-se, desse modo, a
advertência deste Supremo Tribunal Federal, cujas decisões já acentuaram, por mais de
uma vez, a inviabilidade do emprego do “writ” mandamental como instrumento de controle
abstrato da validade constitucional das leis e dos atos normativos em geral (RTJ 110/77,
Rel. Min. FRANCISCO REZEK – RTJ 111/184, Rel. Min. DJACI FALCÃO - RTJ 132/1136,
Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):
“(...) O mandado de segurança não é sucedâneo da ação direta de
inconstitucionalidade nem pode substituí-la, sob pena de grave deformação do instituto e
inaceitável desvio de sua verdadeira função jurídico-processual.”
(RTJ 132/189, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Cumpre assinalar, ainda, presente o contexto que se registra na espécie em
exame, que também se verifica, no caso, outra situação evidenciadora da
inadmissibilidade do prosseguimento desta ação mandamental, consistente na perda
superveniente de legitimidade ativa “ad causam” do ora impetrante.
Não se desconhece, na linha do magistério jurisprudencial desta Suprema Corte
(MS23.334/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), que os membros do Congresso
Nacional dispõem de legitimidade ativa “ad causam” para provocar a instauração do
controle jurisdicional sobre o processo de formação das leis e das emendas à
Constituição, assistindo-lhes, sob tal perspectiva, irrecusável direito subjetivo de impedir
que a elaboração dos atos normativos, pelo Poder Legislativo, incida em desvios
inconstitucionais.
É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente proclamado,
em favor dos congressistas – e apenas destes –, o reconhecimento desse direito público
subjetivo à correta elaboração das leis e das emendas à Constituição:
“(...) O processo de formação das leis ou de elaboração de emendas à
Constituição revela-se suscetível de controle incidental ou difuso pelo Poder Judiciário,
sempre que, havendo possibilidade de lesão à ordem jurídico-constitucional, a
impugnação vier a ser suscitada por membro do próprio Congresso Nacional, pois, nesse
domínio, somente ao parlamentar - que dispõe do direito público subjetivo à correta
observância das cláusulas que compõem o devido processo legislativo - assiste
legitimidade ativa ad causam para provocar a fiscalização jurisdicional. (...).”
(MS 23.565/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Não se pode ignorar que a estrita observância das normas constitucionais
condiciona a própria validade dos atos normativos editados pelo Poder Legislativo (CARL
SCHMITT, “Teoria de La Constitución”, p. 166, 1934; PAOLO BISCARETTI DI RUFFIA,
“Diritto Costituzionale”, vol. I/433-434, 1949; JULIEN LAFERRIÈRE, “Manuel de Droit
Constitutionnel”, p. 330, 1947; A.ESMEIN, “Elements de Droit Constitutionnel Français et
Comparé”, vol. I/643, 1927; SERIO GALEOTTI, “Contributo alla Teoria del Procedimento
Legislativo”, p.241). Desse modo, torna-se possível, em princípio, a fiscalização
jurisdicional do processo de criação dos atos normativos, desde que, instaurada para
viabilizar, “incidenter tantum”, o exame da compatibilidade das proposições com o texto da
Constituição da República, venha a ser iniciada por provocação formal de qualquer dos
integrantes das Casas legislativas.
Bem por isso, o Supremo Tribunal Federal, na análise dessa específica questão,
consagrou orientação jurisprudencial que reconhece a possibilidade do controle incidental
de constitucionalidade das proposições legislativas, desde que instaurado por iniciativa de
membros do órgão parlamentar perante o qual se acham em curso os projetos de lei ou
as propostas de emenda à Constituição.
A possibilidade extraordinária dessa intervenção jurisdicional, ainda que no próprio
momento de produção das normas pelo Congresso Nacional, tem por finalidade
assegurar, ao parlamentar (e a este, apenas), o direito público subjetivo – que lhe é
inerente (RTJ 139/783) – de ver elaborados, pelo Legislativo, atos estatais compatíveis
com o texto constitucional, garantindo-se, desse modo, àqueles que participam do
processo legislativo (mas sempre no âmbito da Casa legislativa a que pertence o
congressista impetrante), a certeza de observância da efetiva supremacia da
Constituição, respeitados, necessariamente, no que se refere à extensão do controle
judicial, os aspectos discricionários concernentes às questões políticas e aos atos “interna
corporis” (RTJ 102/27 – RTJ 112/598 - RTJ 112/1023).
Titulares do poder de agir em sede jurisdicional, portanto, tratando-se de
controvérsia constitucional instaurada ainda no momento formativo do projeto de lei ou da
proposta de emenda à Constituição, hão de ser os próprios membros do Congresso
Nacional, a quem se reconhece, como líquido e certo, o direito público subjetivo à correta
observância da disciplina jurídica imposta pela Carta Política em sede de elaboração das
espécies normativas. O parlamentar, fundado na sua condição de co-partícipe do
procedimento de formação das normas estatais, dispõe, por tal razão, da prerrogativa
irrecusável de impugnar, em juízo, o eventual descumprimento, pela Casa legislativa, das
cláusulas constitucionais que lhe condicionam, no domínio material ou no plano formal, a
atividade de positivação dos atos normativos.
Ocorre, no entanto, tal como o Supremo Tribunal Federal tem advertido, que,
concluído o processo de elaboração legislativa, e dele derivando a formação de uma lei,
não mais subsiste a legitimação ativa do membro do Congresso Nacional, eis que,
promulgado e publicado determinado diploma legislativo (como a Lei nº 11.516/2007, p.
ex.), a única possibilidade de contestá-lo em tese reside na instauração – para a qual o
parlamentar não dispõe de legitimidade ativa “ad causam” (CF, art. 103) – do concernente
processo objetivo de fiscalização abstrata de constitucionalidade.
O Supremo Tribunal Federal, em situação virtualmente idêntica à registrada na
presente causa, já enfatizou que a transformação, em emenda à Constituição, de
proposta de reforma constitucional – ou, como no caso, a conversão, em lei, de medida
provisória – configura hipótese caracterizadora de perda superveniente da legitimidade
ativa do congressista, para impetrar o “writ” mandamental (ou para neste prosseguir),
notadamente quando deduzido com o objetivo de questionar suposta ilicitude revelada no
curso do “iter” formativo de determinada espécie normativa:
“PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO. IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE
SEGURANÇA POR PARLAMENTARES. POSSIBILIDADE. DIREITO PÚBLICO
SUBJETIVO À CORRETA FORMAÇÃO DAS ESPÉCIES NORMATIVAS. APROVAÇÃO
DA PROPOSTA DE EMENDA PELO CONGRESSO NACIONAL. HIPÓTESE
CARACTERIZADORA DE PERDA SUPERVENIENTE DA LEGITIMIDADE ATIVA PARA O
PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO MANDAMENTAL. PROCESSO EXTINTO, SEM
JULGAMENTO DE MÉRITO.
- A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – embora reconheça, ao membro do
Congresso Nacional, qualidade para fazer instaurar o controle jurisdicional pertinente ao
processo de elaboração normativa – nega-lhe, no entanto, legitimidade ativa para
prosseguir no processo mandamental, quando, em decorrência de fato superveniente, a
proposição normativa, em tramitação na esfera parlamentar, vem a transformar-se em lei
ou a converter-se em emenda à Constituição.
A superveniência da aprovação parlamentar do projeto de lei ou da proposta de emenda
à Constituição implica a perda da legitimidade ativa dos membros do Congresso Nacional
para o prosseguimento da ação mandamental, que não pode ser utilizada como
sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade. Precedentes.”
(MS 22.487/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 239/2001)
Cumpre registrar, por isso mesmo, que esta Corte – embora atribuindo, ao
parlamentar, legitimação ativa para requerer tutela jurisdicional concernente ao processo
de formação das espécies legislativas – recusa-lhe, contudo, qualidade para prosseguir
na ação de mandado de segurança, quando a proposição legislativa converter-se, como
na espécie, em lei (MS 22.442/DF, Rel. Min. SYDNEY SANCHES – MS 22.872/DF, Rel.
Min. MOREIRA ALVES – MS 24.150/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – MS 24.851/DF,
Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA):
“Perda de legitimidade do impetrante, por modificação da situação jurídica no curso do
processo, decorrente da superveniente aprovação do projeto, que já se acha em vigor.
Hipótese em que o mandado de segurança, que tinha caráter preventivo, não se pode
voltar contra a emenda já promulgada, o que equivaleria a emprestar-se-lhe efeito, de
todo descabido, de ação direta de inconstitucionalidade, para a qual, ademais, não está, o
impetrante, legitimado.”
(RTJ 165/540, Rel. p/ o acórdão Min. ILMAR GALVÃO - grifei)
Justifica-se, tal entendimento, pelo fato de que, se se admitisse, em tal situação, a
subsistência da legitimidade ativa do parlamentar, estar-se-ia, na realidade, a permitir que
o membro do Congresso Nacional – que não se acha incluído no rol taxativo
consubstanciado no art. 103 da Carta Política – pudesse discutir, “in abstracto”, a validade
constitucional de determinada espécie normativa, conferindo-se, à ação de mandado de
segurança, o caráter (indevido) de sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade,
como tem advertido a jurisprudência desta Suprema Corte:
“Mandado de segurança requerido por Deputados Federais, contra ato que
determinara a inclusão na ordem do dia, para discussão e votação, de proposta de
emenda constitucional.
A superveniente aprovação desta acarreta a perda de legitimidade ativa dos
impetrantes, tornando superado o pedido, que não pode ser tido como sucedâneo de
ação direta de inconstitucionalidade.”
(MS 22.986/DF, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI)
A inviabilidade da presente ação de mandado de segurança, em decorrência das
razões ora mencionadas, impõe, ainda, uma observação final: no desempenho dos
poderes processuais de que dispõe, assiste, ao Ministro-Relator, competência plena para
exercer, monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos dirigidos ao
Supremo Tribunal Federal, legitimando-se, em conseqüência, os atos decisórios que,
nessa condição, venha a praticar.
Cumpre acentuar, neste ponto, que o Pleno do Supremo Tribunal Federal
reconheceu a inteira validade constitucional da norma legal que inclui, na esfera de
atribuições do Relator, a competência para negar trânsito, em decisão monocrática, a
recursos, pedidos ou ações, quando incabíveis, estranhos à competência desta Corte,
intempestivos, sem objeto ou que veiculem pretensão incompatível com a jurisprudência
predominante do Tribunal (RTJ 139/53 - RTJ 168/174-175).
Nem se alegue que esse preceito legal implicaria transgressão ao princípio da
colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a
possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos
colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem
reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI
159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Sendo assim, pelas razões expostas, julgo extinto este processo de mandado de
segurança, restando prejudicado, em conseqüência, o exame dos embargos de
declaração opostos a fls. 85/91.
Arquivem-se os presentes autos. Publique-se. Brasília, 11 de setembro de 2007.
Ministro CELSO DE MELLO - Relator

xvi) caso de MS contra ato do CNJ (competência plenário ou turmas STF):


Mandado de Segurança (MS) 28375

Relatora: ministra Rosa Weber

Isabela Spínola Alves Corrêa e outros x Conselho Nacional de Justiça (CNJ)


Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, contra decisão do CNJ no
PCA nº 2009.10000019365 - que, ao determinar a cumulatividade na contagem de títulos
de mesma categoria na etapa classificatória do Concurso Unificado de Ingresso e
Remoção nos Serviços Notariais e de Registro do Estado de Goiás, teria alterado a
interpretação do artigo 7.1 do Edital de Abertura dada pela Comissão Organizadora do
referido concurso, produzindo nova norma, não prevista e diferente da regra editalícia.
Afirma a impetrante, em síntese, que a decisão impugnada lhe prejudicou na medida em
que, inicialmente classificada em 14º geral com a avaliação de títulos realizada pelo TJ-
GO, após a avaliação de títulos na forma da decisão do CNJ foi lançada na 79ª posição.
Sustenta, preliminarmente, a ausência de intimação do TJ-GO e dos eventuais atingidos
pela decisão, como determina o artigo 94 do Regimento Interno do CNJ.
Quanto ao mérito, alega que o CNJ invadiu a competência e discricionariedade dos
órgãos estaduais; a inconstitucionalidade da decisão impugnada e violação ao princípio
da proporcionalidade; e a inaplicabilidade da Resolução 81 do CNJ.
A liminar foi deferida para suspender os efeitos da decisão do CNJ e determinar a
notificação de todos os candidatos convocados à apresentação de títulos do Concurso
Unificado de Ingresso e Remoção nos Serviços Notariais e de Registro do Estado de
Goiás.
Em discussão: saber se o ato impugnado ofende direito líquido e certo do
impetrante.

O ato do CNJ foi mantido e o STF iniciou discussão para mudança do seu
regimento interno, de modo que não caberia mais para o plenário do STF MS de decisão
do CNJ. A competência seria das turmas, salvo quando o MS fosse impetrado em face de
ato do presidente do CNJ, que também é Presidente do STF. A mudança ainda não
ocorreu. STF considerou nesse MS demandas de caráter individual, sem transcendência.

Xvii) Mandado de segurança com repercussão geral no STF:


a) Recuso Extraordinário. Processo Civil e Constitucional. Concurso Público.
Mandado de Segurança. Sociedade de Economia Mista. Autoridade Federal.
Competência. Justiça Federal. Recurso Extraordinário Desprovido. Repercussão Geral
Reconhecida. Reafirmada a jurisprudência dominante sobre a matéria.

b) TRIBUNAL DE CONTAS – COMPOSIÇÃO – EGRESSO DO MINISTÉRIO


PÚBLICO – DISTRIBUIÇÃO DAS CADEIRAS – MANDADO DE SEGURANÇA – ORDEM
DEFERIDA NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – ALCANCE DO ARTIGO 73,
§ 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui
repercussão geral a controvérsia relativa à possibilidade, ou não, de cargo vago de
Conselheiro do Tribunal de Contas cujo ocupante anterior fora nomeado mediante
indicação da Assembleia Legislativa ser preenchido por membro do Ministério Público de
Contas, em observância à representatividade do órgão no aludido Tribunal.

c) Auto-aplicabilidade do art. 208, IV, da Constituição Federal. Dever do Estado de


assegurar o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de
idade.

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