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Abandono afetivo frente ao

ordenamento jurídico Brasileiro


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Publicado por Juliane Pedroso

há 4 anos

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Resumo
O presente artigo visa discutir aspectos a respeito do abandono
afetivo nas relações familiares. As relações familiares passaram
a ser identificadas pelo vínculo de afetividade entre seus
membros, mostrando que o princípio da afetividade vem se
destacando dentro da legislação brasileira, tornando-se
fundamental no âmbito do direito de família. Sendo assim,
dentro de tal legislação são impostos deveres aos pais em
relação aos seus filhos e, no momento que estes preceitos são
descumpridos, os pais devem ser responsabilizados por
abandono afetivo. Haja vista, os pais têm o dever de educar,
assistir, cuidar, participar do desenvolvimento e dispor de
condições necessárias para que seus filhos possam ser criados
em um ambiente saudável com amor e carinho. O abandono
afetivo é um assunto que vem ganhando grande repercussão,
tornando-se questão de grande relevância, pois pode acarretar
ao filho sérios prejuízos para sua vida, podendo até gerar
transtornos em um dos maiores bens do der humano, que é a
saúde psicológica ocasionada pelo abandono. Portanto,
evidencia-se que o objetivo central do presente trabalho é a
análise dos aspectos a respeito do abandono afetivo nas
relações familiares frente ao ordenamento jurídico brasileiro. A
compreensão dos argumentos levantados nas jurisprudências a
respeito do tema, assim como a efetivação de uma análise
crítica com base na legislação e na doutrina, com o intuito de
sempre observar o dano sofrido pelo filho abandonado
afetivamente por algum dos genitores. Como metodologia,
utilizou-se o estudo de bibliografias de alguns doutrinadores
brasileiros, contando, subsidiariamente, com sites e artigos
voltados ao tema em questão bem como a legislação oficial.

Palavras-Chave: Família. Abandono. Afetividade. Dano.


Responsabilidade.

Abstract
This paper discusses aspects concerning the emotional
distance in family relationships. Family relationships are now
identified by the bond of affection between members, showing
that the principle of affection has been highlighted within the
Brazilian legislation, it is crucial in the context of family law.
Thus, within such laws are imposed duties to parents regarding
their children and, at the time that these provisions are
breached, the parents should be held responsible for emotional
distance. Considering, parents have a duty to educate, assist,
care, participate in the development and have necessary
conditions for your children can be raised in a healthy
environment with love and affection. The emotional distance is
an issue that has gained great repercussion, making it a matter
of great importance, as it may cause the child serious harm to
your life and may even generate disorders in one of the greatest
assets of human der, which is the psychological health caused
abandonment. Therefore, it is clear that the main objective of
this work is the analysis of aspects about the emotional
distance in family relationships against the Brazilian legal
system. The understanding of the arguments raised in the case
law on the subject, as well as the execution of a critical analysis
based on the law and doctrine, in order to always observe the
damage suffered by the child emotionally abandoned by some
of the parents. The methodology used to study the
bibliographies of some Brazilian Scholars, counting,
alternatively, with websites and articles related to the subject
matter as well as official legislation.

Keywords: Family. Abandonment. Affectivity. Damage.


Responsibility.

Introdução
O Direito de família adapta-se às mudanças que ocorrem no
comportamento da sociedade, tornando as relações familiares
mais evidentes e respeitadas no ordenamento jurídico
brasileiro. Considera-se o afeto o fator de mais influência na
conformação das entidades familiares.

Assim, a finalidade do presente artigo visa analisar, em síntese,


a responsabilidade civil subjetiva dos pais que abandonam
afetivamente seus filhos, visto que esse abandono causa sérios
problemas aos filhos, tanto psicológica como moralmente.

Com a evolução do direito de família, o conceito de poder


familiar tornou-se sinônimo de proteção, pois, surgiram mais
obrigações e deveres a ambos os pais para com seus filhos
menores. E caso haja o descumprimento de tais deveres e
obrigações, ocorrerá a perda do poder familiar.

É no momento em que ocorre ausência de algum dos pais no


tocante ao afeto, que ocorre a discussão jurídica acerca do dano
moral afetivo e a responsabilidade civil em relação ao
abandono afetivo, sendo um assunto muito polêmico e
delicado, pois envolve relações entre pais e filhos.

Dessa forma, mostra-se que a evolução pela qual passou a


família acabou forçando diversas alterações na legislação, a
qual passou a adotar uma nova ordem de valores, deixando de
lado as questões meramente materiais e dando mais destaque
às relações sócio afetivas.
A pesquisa utilizada no desenvolvimento do presente artigo é o
estudo das bibliografias de alguns doutrinadores brasileiros,
contando, subsidiariamente, com a colaboração de sites e
artigos voltados ao tema, bem como a legislação vigente.

1 A família no ordenamento jurídico


Brasileiro
A definição de família é alvo de uma multiplicidade de
conceitos. Um deles é ser um elemento ativo, pois se encontra
sempre em mudança para melhor atender às necessidades de
uma sociedade em evolução. Dessa forma, torna-se a base da
sociedade para o ser humano, revelando-se como o ramo do
direito que está mais ligado à vida.

A evolução enfrentada pelo conceito de família acabou


forçando diversas alterações na legislação brasileira. Contudo,
a Constituição Federal de 1988 absorveu essa transformação,
adotando uma nova ordem de valores, igualando o homem à
mulher, dando mais ênfase ao afeto e priorizando a dignidade
da pessoa humana. Portanto, no Direito de Família houve
muitas mudanças, as quais se mostraram relevantes; logo, a
legislação e as jurisprudências tiveram de acompanhar tal
evolução com a finalidade de proteger a família e seus
membros.
A família recebe proteção do Estado, independentemente da
forma como é constituída, conforme o caput do
artigo 226 da Constituição Federal de 1988 (VADE MECUM,
2012. P. 72) que diz: “a família, base da sociedade, tem especial
proteção do Estado”. Assim, é de extrema importância que o
Estado cumpra o seu papel que é o de protegê-la.
Nesse passo, vê-se que, com as mudanças ocorridas, a
tendência atual da família é a de reconhecer o parentesco em
vínculo de afetividade como, por exemplo, o vínculo de afeto
que existe entre os pais e o filho adotivo, pois nesse caso não
existe vínculo consanguíneo, apenas de afetividade.
Acerca do tema, preleciona Maria Berenice Dias e Rodrigo da
Cunha Pereira (2004. P. 09) que

“o traço principal que identifica é o vínculo de afetividade.


Onde houver envolvimento de vidas com mútuo afeto é
imperioso reconhecer que aí se está no âmbito do Direito de
Família”.

A família passa a dar mais importância às relações parentais no


tocante ao afeto e ao desenvolvimento do ser humano.
Atualmente, os variados tipos de famílias não estão tão ligados
aos fatores biológicos, e sim ao afeto, de modo que não é
necessário ter o mesmo vínculo sanguíneo para que se construa
uma família com amor. Pode-se dizer que a família tornou-se o
meio funcional para que haja um bom desenvolvimento da
personalidade de seus membros, principalmente o da criança e
do adolescente, independentemente do vínculo sanguíneo que
os mesmos possuam.

Há de se ressaltar que a família contemporânea funda-se na


afetividade que surge em decorrência da convivência entre seus
membros, juntamente com a reciprocidade de sentimentos,
pois a sustentabilidade da família se dá diante da existência do
afeto.

1.1 A importância dos pais na formação dos filhos


A formação de qualquer criança tem início na família, e é na
família que os pais devem transmitir valores éticos e morais a
seus filhos, pois é no lar que a criança molda sua
personalidade.

Os pais são os responsáveis legais pela formação de seus filhos,


sendo necessário que ambos, tanto o pai quanto a mãe,
prestem as condições suficientes para garantir que a criança
tenha um desenvolvimento sadio e uma educação adequada.

Os deveres dos pais em relação aos filhos menores estão


dispostos no artigo 1634 do Código Civil de 2002, constando
dentre eles o dever de dirigir-lhes a criação e a educação, bem
como o direito de tê-los em sua companhia e guarda.
Segundo Maria Berenice Dias (2009. P. 388), nesse sentido:

Nesse extenso rol não consta o que talvez seja o mais


importante dever dos pais com relação aos filhos: o dever de
lhes dar amor, afeto e carinho. A missão constitucional dos
pais, pautada nos deveres de assistir, criar e educar os filhos
menores, não se limita a vertentes patrimoniais. A essência
existencial do poder parental é a mais importante, que coloca
em relevo a afetividade responsável que liga pais e filhos,
propiciada pelo encontro, pelo desvelo, enfim, pela
convivência familiar.

O afeto presente nas relações paterno-filiais não pode ser


imposto aos pais como um dever, tanto é que não consta
expressamente no artigo mencionado, pois ele só existirá com
o tempo, com a convivência.

Daí a importância que deve ser atribuída à convivência, pois é


com ela que nascem os verdadeiros sentimentos de amor e
carinho, devendo tratar-se com absoluta prioridade o direito à
convivência familiar entre pais e filhos, uma vez que é no
ambiente familiar e na presença dos pais que as crianças se
sentem acolhidas e protegidas.

A presença paterna e materna na formação dos filhos é


indispensável, destacando-se o cuidado, o amor, a proteção e o
afeto que estes devem prestar. Os pais têm o dever de estarem
presentes, convivendo com os filhos em cada etapa do seu
desenvolvimento, dando referência dos valores adequados a
serem seguidos pelos seus filhos.

O menor merece um lar e uma família estruturada para a


formação de sua personalidade, estando os pais sempre
presentes, mesmo que entre si estejam separados, pensando
sempre no melhor interesse e desenvolvimento da criança.
1.2 Poder familiar
Pátrio poder era a denominação utilizada no Código Civil de
1916, quando o assegurava exclusivamente ao marido. Mas
com o decorrer do tempo, restringiram-se os poderes, surgindo
o novo Código Civil de 2002 e alterou-se a expressão para
“poder familiar”, momento em que o poder-dever de conduzir
a família foi dado a exercício de forma conjunta pelos
genitores.
Para Pontes de Miranda (2012. P. 183) poder familiar

“é o conjunto de direitos que a lei concede ao pai, ou a mãe,


sobre a pessoa e bens do filho, até a maioridade, ou
emancipação deste, e de deveres em relação ao filho.”

Nesse sentido, pronunciou-se Barros Monteiro, citado pela


jurista Maria Helena Diniz (2011. P. 593), da seguinte forma:

Sujeitam-se, portanto, à proteção do poder familiar todos os


filhos menores advindos, ou não, de relações matrimoniais;
reconhecidos ou adotivos. Os não reconhecidos pelo pai, entre
o fato de ser a maternidade em regra sempre certa, submeter-
se-ão, enquanto menores, ao poder familiar da mãe.

No momento em que se descreve o poder familiar não se pode


falar somente no “poder”, e sim em um conjunto de direitos e
deveres que devem ser exercidos por ambos os pais em relação
aos seus filhos.

Os laços envolvidos no poder familiar não são apenas no


sentido moral e jurídico, mas de natureza afetiva e sentimental,
sendo moldado em razão das necessidades fundamentais dos
filhos menores.

Vê-se então que o poder familiar tornou-se mais que um poder,


pois passou a constituir-se de uma relação com o exercício de
várias atribuições exercidas pelos genitores, mas tendo como
propósito o melhor interesse dos filhos.
Os deveres dos pais tornam-se fundamentais para a criação, a
educação e a formação da criança, proporcionando-lhes
sobrevivência. Logo, o genitor que faltar com suas obrigações,
submete-se a reprimendas tanto de ordem civil, como de
ordem criminal. Cabe ressaltar, novamente, que o exercício do
poder familiar compete a ambos os genitores, com igualdade
de condições e direitos.

Mostra-se que tanto quanto é impossível uma criança ou


adolescente ter capacidade de administrar seus bens, assim
também, não tem condições de se desenvolver adequadamente
sozinha, sem auxílio de um responsável. Por tal razão é que
existem deveres a serem observados e respeitados pelos pais.

1.3 Extinção e suspensão do poder familiar


Ao se falar de extinção e suspensão do poder familiar, a
primeira se torna a menos complicada, pois ocorre por razões
decorrentes da própria natureza, independentemente da
vontade dos pais.

O artigo 1653 do Código Civil (VADE MECUM, 2012. P. 257)


atual dispõe que a extinção do poder familiar ocorre por: “I –
pela morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação, nos
termos do art. 5º, parágrafo único; III – pela maioridade; IV –
pela adoção; V – por decisão judicial, na forma do art. 1638.”
A respeito da suspensão do poder familiar, o qual está previsto
no artigo 1637, do Código Civil atual, se pronunciou Maria
Helena Diniz (2011, p. 593) da seguinte forma:
Na suspensão, o exercício do poder familiar é privado, por
tempo determinado, de todos os seus atributos ou somente de
parte deles, referindo-se a um dos filhos ou a alguns. Deveras,
desaparecendo a causa que deu origem à suspensão, o pai
poderá retornar ao exercício do poder familiar.

Significa, então, que ocorrerá a suspensão do poder familiar


quando o pai não agir corretamente em relação aos direitos dos
filhos, não cumprindo com seus deveres. Por exemplo, se o pai
estiver arruinando os bens dos filhos, será privado de
administrar tais bens, ocorrendo então a suspensão do poder
familiar. É como se fosse um castigo por tempo determinado
aos pais que agirem de má-fé, mas visando sempre preservar
os interesses dos filhos.

Silvio Rodrigues, mencionado na obra de Arnaldo Rizzardo


(2011. P. 545), ainda acrescentou hipóteses na suspensão,
afirmando: “Suspende-se o exercício do pátrio poder do
progenitor que, por maus-tratos ou privação de alimentos ou
de cuidados indispensáveis, puser em perigo a saúde do filho.
[...]”.

Mostra-se que as sanções previstas no Código Civil atual têm o


intuito de preservar o melhor interesse dos filhos, fazendo com
que os pais se conscientizem do dever que têm de cuidar,
educar e amar seus filhos.

2 Abandono afetivo
O abandono afetivo ganhou destaque em nosso ordenamento
jurídico, sendo caracterizado pelo não cumprimento do dever
dos pais de educar, cuidar e assistir o filho.

Porém, o tema em questão é muito complexo e delicado,


porque passa a questionar os valores e sentimentos das pessoas
junto a sua família. É um assunto que aparece com bastante
frequência no judiciário, e consequentemente discute-se nos
tribunais, inclusive com muitas opiniões divergentes.

Geralmente o abandono afetivo ocorre após a separação dos


genitores, quando a guarda do filho passa a ser concedida a
apenas um dos pais, sendo, na maioria das vezes, deferida à
mãe. O outro genitor passa então a ausentar-se, deixando de
cumprir com seus deveres e obrigações em relação ao filho,
sendo que tais deveres e obrigações encontram-se todos
regulamentados em nosso ordenamento jurídico.
Sabe-se que o dever do genitor que não ficou com a guarda não
é só aquele em relação aos alimentos, mas o de auxiliar na
construção da personalidade e desenvolvimento do filho, pois a
criança tem a figura paternal como referência e exemplo.

Ocorre que o genitor acaba constituindo uma nova família,


com novos filhos, e acaba abandonando o filho do
relacionamento anterior, negligenciando os deveres de
afetividade, assistência moral e psíquica, tornando isso um ato
ilícito, passível de indenização.

A psicologia explica que o afastamento do genitor, que a


carência do afeto nos laços familiares pode desenvolver nos
filhos sintomas de rejeição, baixa autoestima, chegando a
prejudicar o seu rendimento na escola, podendo resultar,
ainda, em outras inúmeras consequências.

Sobre a família e o afeto Aline Biasuz (2012. P. 126) dispõe


que:

A família e afeto são dois personagens desse novo cenário.


Contemporaneamente, o afeto é desenvolvido e fortalecido na
família, sendo este, ao mesmo tempo, a expressão de união
entre seus membros e a mola propulsora dos integrantes que
buscam a sua realização pessoal através da sua
exteriorização de forma autêntica.

Eduardo de Oliveira Leite (1991. P. 338), por sua vez,


menciona:

“Quanto maior a intensidade do sentimento familiar, maiores


os progressos da vida privada, da intensidade doméstica, da
identidade: os membros da família se unem pelo sentimento,
pelo costume e gênero da vida”.

Os laços de afetividade dentro da família são necessários para


que se tenha um bom relacionamento familiar. Neste ponto,
José Sebastião de Oliveira, citado por Aline Biasuz (2012. P.
126), comenta de forma interessante:

É dentro da família, que os laços de afetividade tornam-se


mais vigorosos e aptos a sustentar as vigas do
relacionamento familiar, contra males externos; é nela, que
seus membros recebem estímulos para pôr em prática suas
aptidões pessoais. Daí então ser a característica da
afetividade, aliada, por óbvio, à nuclearidade, a responsável
pela plena realização pessoal de cada membro familiar. A
afetividade faz com que a vida em família seja sentida da
maneira mais intensa e sincera possível, e isto, só será
possível caso seus integrantes não vivam apenas para si
mesmo: cada um é o “contribuinte” da felicidade de todos.

Cada membro da família tem o seu papel, principalmente os


pais. A ausência de um destes acarreta uma desestruturação
familiar, o que não colabora para um bom desenvolvimento da
criança, pois se o pai se torna ausente, a mãe acaba por
desempenhar o papel dos dois, podendo a criança desenvolver
um trauma emocional por muito tempo, em razão de não ter o
direito de conviver em um ambiente familiar tranquilo,
equilibrado, com amor e atenção necessários no momento do
seu desenvolvimento.

Nota-se, portanto, que o Código Civil apresenta novos valores


às famílias, valorizando os laços de afetividade, preocupando-
se com a dignidade e as pessoas, pois estas representam o
futuro da sociedade.
2.1 Princípio da Dignidade da pessoa humana
Este princípio encontra-se na Carta Magna, no título I, Dos
Princípios Fundamentais, a dignidade da pessoa, em seu
artigo 1º, inciso III, acompanhada de outros direitos e
garantias fundamentais.
Para a nobre jurista Maria Berenice Dias (2013. P. 139): “a sua
aplicação no plano afetivo é indiscutível, uma vez que pode ser
identificado como sendo o princípio de manifestação primeira
dos valores constitucionais, carregado de sentimentos e
emoções”.
Tal princípio é aplicado em todas as áreas do Direito,
principalmente no Direito de Família, pois este é o mais
humano de todos os princípios, tanto que chega a ser
considerado o valor supremo de nosso ordenamento jurídico,
sendo a base da comunidade familiar, e dedica-se a garantir a
afetividade e um melhor desenvolvimento a todos os membros
da entidade familiar.

O princípio em referência é um valor muito importante a ser


considerado dentro do ordenamento brasileiro, pois funciona
como ponto de contato para efetivação dos direitos e garantias
fundamentais elencados na Carta Maior(ALINE BIASUZ. 2012.
P. 103).
Logo, este princípio deve ser respeitado dentro das relações
jurídicas, pois visa à proteção dos direitos da pessoa humana,
assumindo valores entre a sociedade e o homem.

2.2 Princípio da afetividade


Este princípio é o grande norteador do Direito de Família, pois
se tornou um verdadeiro direito fundamental, sendo a base do
respeito à dignidade humana e da solidariedade familiar.

Tal princípio não tem disposição legal, mas está estampado


na Carta Magna, mais precisamente em seus artigos 226 §
4º, 227 caput, § 5º, § 6º e 229 § 6º (VADE MECUM. 2012. P.
72), onde está disposto que: “a entidade familiar formada por
qualquer dos pais e seus descendentes”, “o dever da família e
do Estado em proteger a criança e o adolescente [...]”, “os pais
têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores [...]”
Sobre a importância do princípio em questão, discorre Maria
Berenice Dias (2005, p. 66) que: “O Princípio jurídico da
afetividade faz despontar a igualdade entre os irmãos
biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais.
O sentimento de solidariedade recíproca não pode ser
perturbado pela preponderância de interesses patrimoniais.”

A mesma autora (2005. P. 66) ainda afirma “ser este princípio,


o norteador do direito das famílias”.
Não há outro meio que justifique a existência de uma família
senão a afetividade entre seus membros. São dos laços de afeto
e solidariedade que deriva a convivência familiar, não somente
dos laços de sangue, pois o afeto não é unicamente um laço que
envolve o seio familiar, e sim relações de sentimentos entre
seus membros.

O princípio da afetividade decorre do princípio da dignidade da


pessoa humana e do princípio da solidariedade familiar.
Todavia, tais princípios visam à efetivação dos direitos e
garantias fundamentais disposto na Carta Magna, não sendo
apenas um Direito, mas um princípio ético. Tanto é que o afeto
está presente em várias decisões dos tribunais brasileiros.
Este princípio merece destaque no processo judicial de
separação dos pais, no momento em que é deferida a guarda
dos filhos menores a um dos genitores. Nesse caso, a
dissolução dos vínculos afetivos não se resolve apenas entre os
genitores, quando da união resultou o nascimento de um filho,
pois é no momento da fixação da guarda que será sempre
levado em conta a relação de afetividade e afinidade dos pais
com seus filhos, preservando sempre a proteção à pessoa do
menor juntamente com seu bem-estar familiar.

2.3 Dano moral decorrente do abandono afetivo


Os juristas discutem muito a aplicação da reparação por danos
morais nas relações familiares, acreditando que os pais não
podem ser obrigados a pagar uma indenização ao seu filho por
não ter lhe dado o amor e atenção que deveriam. As críticas
existentes nas doutrinas afirmam que o afeto, amor e carinho
não são indenizáveis.

Mas ocorre que tais críticas não têm muito sentido, pois os atos
ilícitos praticados pelos genitores em relação ao abandono
afetivo de seus filhos menores, acabam causando grandes
abalos psicológicos e morais, passando a afetar seu
desenvolvimento e sua personalidade.

Os pais têm o dever de cuidar e dar afeto ao seu filho, questão


esta que se os genitores estivessem agindo corretamente, não
precisaria ser discutida em juízo. Mas, infelizmente, algumas
relações entre pais e filhos ocorrem de forma errada, visto que
os pais acabam preocupando-se mais com as relações de
trabalho, com os ganhos financeiros, e passam a deixar seus
filhos em abandono. Esses pais acreditam que se oferecerem
um brinquedo ou uma peça de roupa ao filho, ou seja, bens
materiais, o afeto pode ser deixado em “segundo plano”.

Para Bernardo Castelo Branco (2006. P. 116) a reparação por


dano moral atua como agente do princípio da dignidade da
pessoa humana:

Havendo violação dos direitos da personalidade, mesmo no


âmbito da família, não se poder negar ao ofendido a
possibilidade de reparação por dano moral, não atuando esta
como fator desagregador daquela instituição, mas de
proteção da dignidade dos seus membros. A reparação,
embora expressa em pecúnia, não busca, nesse caso, qualquer
vantagem patrimonial em benefício da vítima, revelando-se
na verdade como forma de compensação diante da ofensa
recebida, que em sua essência é de fato irreparável, atuando
ao mesmo tempo em seu sentido educativo, na medida em que
representa uma sanção aplicada ao ofensor, irradiando daí
seu efeito preventivo.

Vê-se que o dano moral no âmbito do direito de família merece


ser tratado com mais cuidado nas relações entre pais e filhos.
Aquele filho que procurou o judiciário para de alguma maneira
tentar suprir aquela falta de amor na fase de desenvolvimento,
não está procurando uma vantagem patrimonial, mas sim tenta
compensar o afeto não recebido, em alguns casos, até para
poder pagar um tratamento psicológico em razão do abalo
moral.

Debate-se o assunto em questão mais na doutrina, pois as


jurisprudências em torno desse tema não são ainda suficientes
por se tratar de um tema muito sensível.
É admissível a reparação por danos morais aos pais que
deixam seus filhos em abandono emocional e moral. Por outro
lado, vê-se que não se pode obrigar alguém a amar outra
pessoa, mesmo sendo relações entre pais e filhos, mas é
possível exigir que os pais sejam responsáveis em relação aos
seus filhos, prestando todo o auxílio moral e ético para um
bom desenvolvimento e sobrevivência.

Nesse sentido, Giselda Maria Fernandes Hironaka (SANTOS.


2008) esclarece de uma maneira interessante que:

O sistema jurídico não pode exigir de ninguém demonstrações


de amor e carinho, porquanto não seja disto que se trate, mas
sim, de uma situação em que o que se cobra dos pais é o
correto desempenho de suas funções para o pleno
desenvolvimento de seus filhos. Até porque, durante muito
tempo, muitos pais deixaram de demonstrar afeto, amor e
carinho para com seus filhos, mas cumpriram a função de
autoridade (com ou sem autoritarismo) que lhes cabia e que
permitiu que os filhos se adequassem socialmente.

Portanto, o que se protesta é que os pais ajam de maneira


responsável, criando seus filhos de maneira saudável, com
autoridade nas relações familiares.

O abandono afetivo acaba ocorrendo com mais frequência no


momento concreto em que ocorre a dissolução da sociedade
conjugal de seus genitores, pois é no momento da separação,
de fato, que os cônjuges devem acordar a quem incumbirá a
guarda, sempre visando à proteção da pessoa dos filhos.

Nesse sentido, a autora Maria Berenice Diaz (2005. 2008),


reforça que:

A cisão no relacionamento dos pais não podem levar à cisão


dos direitos parentais. O rompimento da relação de
conjugalidade não deve comprometer a continuidade da
convivência com ambos os genitores. O filho não pode sentir-
se objeto de vingança, em face dos ressentimentos dos pais.

No momento da dissolução dos vínculos conjugais, é que


ambos têm de compreender que deve haver um acordo em
relação à guarda e aos interesses dos filhos, pois o dever dos
pais com seus filhos não pode ser afetado pela separação.

Importante mencionar que nos casos em que a dissolução do


vínculo conjugal não se dá de forma harmônica, pode-se estar
diante da alienação parental. Hipótese esta que se refere à
utilização da criança como objeto de vingança para com o outro
genitor, acabando por prejudicar a convivência deste com o
menor. Nesse passo, aquele cônjuge que não ficou com a
guarda do filho, e que ora se denomina “cônjuge alienado”, se
utilize de tal situação para eximir-se da responsabilidade em
relação ao seu filho. Eis um dos momentos em que a alienação
parental e o abandono afetivo se encontram.

O genitor que não ficou com a guarda do filho deve ter


consciência da importância que deve ser atribuída à
convivência, pois é com ela que nascem verdadeiros
sentimentos de amor e carinho. Ademais, o direito a
convivência não está direcionado aos pais, aos adultos, e sim
aos filhos, ou seja, é destes o direito de viver, de conviver, de
estar, saudavelmente, na companhia de ambos os pais, na
medida do que é conveniente para um desenvolvimento
equilibrado. Os pais têm o dever de estarem presentes,
convivendo com os filhos em cada etapa do seu crescimento,
mesmo não estando com a guarda destes, pois a tendência é
que os filhos reproduzam aquilo que absorveram.

Essa é a importância de ambos os pais na formação de seus


filhos e da responsabilidade que estes devem ter. Portanto,
verifica-se a possibilidade de reparação por danos morais
decorrente do abandono afetivo, pois os pais que violarem o
direito de convivência familiar, paternidade responsável e o
princípio da dignidade da pessoa humana, motivarão prejuízos
na formação dos seus filhos menores, estando-se, então, diante
do dano moral.

2.4 Responsabilidade civil subjetiva pelo abandono


afetivo
Como é sabido no âmbito jurídico, é cabível de indenização
todo o ato ilícito praticado contra outrem.

A responsabilidade civil subjetiva está prevista em seu


artigo 186 do Código Civil (VADE MECUM. 2012. P. 163) que
descreve: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, compete ato ilícito”.
Por sua vez, dispõe o artigo 927 do Código Civil (VADE
MECUM. 2012. P. 202), caput, que: “Aquele que, por ato ilícito
causar dano a outrem, fica obrigado a reparar”.
Para que haja a responsabilidade civil subjetiva por abandono
afetivo, deverá ser comprovada a culpa dos pais, pois se houve
uma conduta sem culpa, não haverá o dever de indenizar.

O dever de indenização por abandono afetivo prescinde da


presença dos pressupostos da responsabilidade civil, que são
descritos pela jurista Maria Helena Diniz (2013. P. 45):

a) Existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada


juridicamente; isto é, que se apresenta como um ato ilícito ou
lícito, pois ao lado da culpa, como fundamento da
responsabilidade, temos o risco;

b) Ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à


vítima por ato comissivo ou omissivo do agente ou de terceiro
por quem o imputado responde; ou por um fato de animal ou
coisa a ele vinculada. Não pode haver responsabilidade civil
sem dano.

c) Nexo de causalidade entre o dano e ação (fato gerador da


responsabilidade), pois a responsabilidade civil não poderá
existir sem o vínculo entre a ação e o dano.
Para se estar frente à responsabilidade civil subjetiva, é
necessário que exista uma conduta, um dano, um nexo de
causalidade entre tal conduta e o dano, outrossim, que a culpa
seja comprovada.

É então que se passa a analisar a responsabilização por


abandono afetivo nas relações entre pais e filhos, pois havendo
o descumprimento dos deveres dos pais, e consequentemente
dano aos filhos, os pais devem ser penalizados, uma vez que se
encontram presentes os elementos caracterizadores da
responsabilidade. Esta não se refere somente à punição dos
pais, mas sim, à finalidade de educá-los, para evitar novas
condutas no futuro.

Aline Biasuz Suarez (2012. P. 164) descreve a responsabilidade


civil no direito de família como:

A responsabilidade civil no seio da família é o tipo de


responsabilidade mais “delicada” que pode ser estudada, pois
confrontam dois princípios muito próximos em si mesmos,
aquele que coloca a dignidade do membro familiar acima de
qualquer circunstâncias com aquele que dispõe sobre a função
social da família e a limitação da intervenção estatal.

Este é um tema muito polêmico de ser tratado, mas que surge


com certa frequência frente ao judiciário. Porém, o objetivo
todo desse tema é que as relações entre pais e filhos sejam mais
valorizadas e respeitadas.

Nessa linha de pensamento, refere Aline (2012. P. 240) que:

Na reparação civil por abandono afetivo, o bem jurídico


tutelado primeiramente é a integridade psíquica e emocional
do menor; num segundo plano é o desenvolvimento de sua
personalidade, livre de máculas, traumas, memórias
inefáveis, frustações negativas, cultivações da autoestima e,
por fim, libertação de patologias. Esta valoração tem como
ponto de partida a dignidade da pessoa, passando pelos
deveres inerentes ao poder familiar, a função da família,
tendo como limite a doutrina constitucional da proteção
integral, ou seja, melhor interesse da criança.

Quando um dos pais se omite em relação ao desenvolvimento


do seu filho, externa então há uma conduta ilícita, que viola os
direitos básicos do filho, além de descumprir o princípio da
dignidade da pessoa humana, logo, vê-se que é impossível não
ser reconhecida a responsabilidade civil em decorrência do
abandono afetivo.

Por outro lado, sabe-se que o valor a ser fixado para tal
indenização deve observar a razoabilidade, tendo vista a
análise das condições econômicas das partes e o tamanho do
dano causado ao filho.

Outro fator que vale ser diferenciado é a perda do poder


familiar e a responsabilidade civil. A perda do poder familiar é
mais grave, pois tem característica punitiva aos pais, já a
responsabilidade civil subjetiva por abandono afetivo, tem o
dever de punir o pai que negligenciou o cuidado ao filho,
cabendo-lhe indenização por tal atitude.

Nesse sentido, vale destacar um trecho do voto proferido pelo


Ministro Sidnei Beneti repelindo a possibilidade da perda do
poder familiar decorrente do abandono afetivo (CONRADO
PAULINO. 2012. P. 122):

Não podendo ser erigida como eximente indenizatória a


sanção construída pela perda do poder familiar (CC/2002,
art. 1638, II, c. C. Art. 1634, II), porque de uma sanção, de
natureza familiar, por ação ou omissão reprováveis do
genitor, a perda do poder familiar, não será congruente
extrair o despojamento de direito a outra sanção, de
consequências patrimoniais, consistente na indenização por
dano moral, até porque o contrário significaria impor ao
lesado a perda de direito (indenização por dano moral)
devido a haver sido vítima de ação ou omissão do mesmo
ofensor (abandono), ao mesmo tempo em que isso ensejaria
dupla vantagem ao ofensor, com o despojamento de
responsabilidades familiares e indenizabilidade de dano
moral (tornando-se verdadeiro incentivo ao abandono
familiar.

Assim, o judiciário deve analisar o abandono afetivo com muito


cuidado para identificar que tipo de dano sofreu o menor, se
este foi prejudicado em seu desenvolvimento. Por isso, torna-
se justo que o filho procure o poder judiciário para buscar a
reparação pelo sofrimento causado, mesmo que não seja
aliviada a dor causada pelo abandono, mas ao menos o
compensará de alguma maneira. Dessa forma, entenda-se que
não só o judiciário deve estar à frente do dilema da indenização
puramente dita, mas além da questão financeira, observar que
os prejuízos absorvidos pelo menor em sua psique merecem
atenção, tratamento, e, essencialmente, acompanhamento de
profissionais da área.

Há de se mencionar que o andar paralelo entre as ciências,


principalmente as humanas, é de extrema valia. No caso em
pauta, o acompanhamento de profissionais da Psicologia pode
se revelar como um fator preponderante. Os traumas e as
vivências degradantes podem esconder seus reflexos na
infância, mas se o objetivo é gerar uma sociedade em que se
tenha seres humanos saudáveis em todas as suas esferas, a
atenção deve se voltar às fases iniciais do desenvolvimento
infantil.

É no momento da infância que a criança absorve os ideais,


apreende o mundo, a moral. Na sua adolescência todos os
valores até então percebidos entrarão em choque, até o
momento em que aquela pessoa chegará à fase adulta, levando
consigo todas as suas vivências.

Dessa forma, não há como se falar em reparação em face do


abandono afetivo, sem prestigiar a importância da atuação da
Psicologia, por meio de seus profissionais, nos casos levados ao
judiciário.
2.5 O abandono afetivo diante dos tribunais
brasileiros
Os Tribunais de Justiça recebem vários pedidos de indenização
por abandono afetivo, mas ainda há divergências nas decisões,
acarretando a grande discussão entre os juristas. O principal
motivo de tais divergências é a seguinte questão: Como a
Justiça vai obrigar os pais a amarem seus filhos?

No ano de 2003, o Juiz Mario Romano Maggioni, titular da 2º


Vara da Comarca de Capão da Canoa no Rio Grande do Sul, na
ação Indenizatória nº 141/1030012032-0, condenou um pai ao
pagamento de uma indenização no valor equivalente a 200
salários mínimos. Sob o fundamento de que o pai, mesmo
estando em dia com a pensão alimentícia, não cumpria com o
dever de convivência familiar.

Na decisão, o magistrado consignou que (CONRADO


PAULINO. 2012. P. 108):

A educação abrange não somente a escolaridade, mas


também a convivência familiar, o afeto, amor, carinho, ir ao
parque, jogar futebol, brincar, passear, visitar, estabelecer
paradigmas, criar condições para que a criança se
autoafirme. Desnecessário discorrer acerca da presença do
pai no desenvolvimento da criança. A ausência, o descaso e a
rejeição do pai em relação ao filho recém-nascido ou em
desenvolvimento violam a sua honra e a sua imagem. Basta
atentar para os jovens drogados e ver-se-á que grande parte
deles deriva de pais que não lhe dedicaram amor e carinho;
assim também em relação aos criminosos.

[...]

Quando o legislador atribui aos pais a função de educar os


filhos, resta evidente que aos pais incumbe amar os filhos. Pai
que não ama filho está não apenas desrespeitando função de
ordem moral, mas, principalmente, de ordem legal, pois não
está bem educando seu filho.
Na decisão, o julgador destacou que a função paterna
compreende amar os filhos. Logo, não basta fazer o
pagamento da pensão alimentícia ou ser pai biológico, pois o
sustento é apenas um dos deveres dos pais para com os filhos.

Nesse sentido, o magistrado, ao proferir a sentença, destacou


em relação àquele que optou por ser pai: “deve desincumbir-
se de sua função, sob pena de reparar danos causados aos
filhos. Nunca é demais salientar os inúmeros recursos para
evitar a paternidade (vasectomia, preservativos etc.). Ou seja,
aquele que não quer ser pai deve precaver-se”(CONRADO
PAULINO. 2012. P. 113).

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, sob relatoria do


Desembargador Unias Silva, deu provimento no ano de 2004,
ao recurso interposto pelo filho (MINAS GERAIS. 2004):

INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS - RELAÇÃO PATERNO -


FILIAL - PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
- PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE. A dor sofrida pelo filho, em
virtude do abandono paterno, que o privou do direito à
convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico, deve ser
indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa
humana. Deram provimento. (TJMG, Apelação Civil
408.550.54, Rel. Des. Unias Silva).

No referido acórdão é mencionado o princípio da dignidade da


pessoa humana, em relação à convivência, amparo afetivo,
moral e psíquico.

Tal indenização por danos morais foi fixada no valor


equivalente a duzentos salários mínimos – que na época,
equivalia à quantia de R$44.000,00.

Todavia, houve Recurso Especial impetrado pelo pai no


Superior Tribunal de Justiça, o qual foi julgado no ano de
2006, oportunidade em que STJ não admitiu a
responsabilização pela falta de afeto. Mesmo assim, o ministro
Barros Monteiro não reconheceu o recurso, por compreender
que seria cabível, sim, a reparação por danos morais pelo
abandono afetivo (BRASIL. 2006).

RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL.


REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A
indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito,
não rendendo ensejo à aplicabilidade da norma do
art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz
de reparação pecuniária. 2. Recurso especial conhecido e
provido.

Situação esta modificada no ano de 2012, na relatoria da


Ministra Nancy Andrighi que reconheceu o cabimento do
Abandono Afetivo (BRASIL. 2012):

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO


AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL.
POSSIBILIDADE. 1. Inexistem restrições legais à aplicação
das regras concernentes à responsabilidade civil e o
consequente dever de indenizar/compensar no Direito de
Família. 2. O cuidado como valor jurídico objetivo está
incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa
expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas
diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88.
3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi
descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de
ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non
facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o
necessário dever de criação, educação e companhia - de
cuidado - importa em vulneração da imposição legal,
exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação
por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar das
inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno
cuidado de um dos genitores em relação à sua prole, existe um
núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero
cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à
afetividade, condições para uma adequada formação
psicológica e inserção social. 5. A caracterização do abandono
afetivo, a existência de excludentes ou, ainda, fatores
atenuantes - por demandarem revolvimento de matéria fática
- não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do
recurso especial. 6. A alteração do valor fixado a título de
compensação por danos morais é possível, em recurso
especial, nas hipóteses em que a quantia estipulada pelo
Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada. 7.
Recurso especial parcialmente provido.

Mostra-se com esta decisão que é sim cabível indenização


decorrente do abandono afetivo, destacando-se o dever dos
pais para com seus filhos. Todavia, se houver o
descumprimento de tais deveres, e estes causarem algum
prejuízo moral, psicológico e ético aos filhos, os filhos poderão,
sim, recorrer ao judiciário para reivindicar a indenização de
seus pais.

Conclusão
Em virtude do exposto, verifica-se que é possível os pais serem
responsabilizados civilmente pelos danos morais decorrentes
do abandono afetivo, pois com as evoluções na estrutura
familiar, foram aplicados aos pais mais deveres em relação aos
seus filhos, mostrando que os deveres não são apenas em
relação aos alimentos, ao auxílio material, mas sim ao amor, ao
afeto e carinho que são dados aos filhos. Atualmente o afeto
tornou-se a base da família, pois é na família que o filho menor
constrói a sua personalidade.

Logo, mostra-se ser de grande relevância o estudo do


abandono afetivo nas relações entre pais e filhos, pois é um
assunto muito delicado que acaba envolvendo questões tanto
na área jurídica como na área psicológica. Ocorre que os filhos
abandonados por seus genitores acabam procurando o
judiciário, a fim de que possam, de alguma maneira, suprir as
consequências que o abandono afetivo lhes conferiu, pois terão
seu desenvolvimento psicológico afetado.
Assim sendo, fica aos operadores do direito interpretar e punir
cada caso, de maneira justa, em conformidade com os
princípios expressos na Constituição Federal, tendo maior
destaque o princípio da afetividade e o princípio da dignidade
da pessoa humana.
Vê-se que as jurisprudências dos tribunais brasileiros aderem à
indenização decorrente do abandono afetivo, embora não seja
permitida a indenização por esse motivo, não apenas com a
intenção de punir aquele pai pela falta de amor, mas para lhe
mostrar que tem de cuidar e amar o filho e lhe dar atenção, até
porque não se pode obrigar alguém a amar, pois o amor tem de
nascer naturalmente na relação afetiva entre pais e filhos.

Referências Bibliográficas
BRANCO. Bernardo Castelo. Dano Moral no Direito de
Família. São Paulo. Ed. Método. 2006. P. 116
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso
Especial nº 1.159.242, da 3º Turma do Superior
Tribunal de Just.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso
Especial nº 757411, da 4ª Turma do Superior Tribunal
de Justiça. Brasília, DF, 15 de setembro de 2013.
DIAS, Maria Berenice. Direito das Famílias 2ª ed. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2005. P. 66
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5º
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha
(Coords.). Direito de Família e o novo Código Civil. Belo
Horizonte: Del Rey, 2004. P.9
DIAS. Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9ª
ed. Rev. Atual. E ampl. De acordo com: Lei 12.344/2010
(regime obrigatório de bens): Lei 12.398/2011 (direito dos
avós) – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. P. 139
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro.
Volume 5: direito de família. Ed. Saraiva, 26º Edição. São
Paulo. 2011
DINIZ. Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro.
28ª Ed. São Paulo: Saraiva, 5 direito de família ano 2013.
KAROW, Aline Biasuz Suarez. Abandono Afetivo. Ed. Juruá,
2012. P. 126

LEITE, Eduardo de Oliveira. Tratado de Direito de


Família: origem e evolução do casamento. Ed. Juruá,
1991. P. 338
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº
408.550.54. Rel. Des. Unias Silva da 7ª Câmara Cível do
Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, MG, 15 de
setembro de 2013.
MIRANDA, Pontes. Direito de Família: direito parental:
Direito Protectivo, Ed. Revista dos Tribunais, 2012, São
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RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8º edição. Ed.
Forense, 2011. P. 545
ROSA, CARVALHO, FREITAS. Conrado Paulino. Dimas
Messias. Douglas Phillips. Dano Moral e Direito das
Famílias. 2ª Ed. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. 2012
VADE MECUM. Obra coletiva, Editora Saraiva com a
colaboração de Luiz Roberto Curia, Livia Céspedes e Juliana
Nicolette – 13º ed. Atual e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012, p.
72
SANTOS. Margarete Martins. RESPONSABILIDADE CIVIL
POR ABANDONO AFETIVO. 2008. Disponível em:
<http://jradvogadosmg.adv.br/docs/RESPONSABILIDADE%
20CIVIL%20POR%20ABANDONO%20AFETIVO.pdf>. Acesso
em: 15 de agosto de 2

[1] Graduanda do Curso de direito da URCAMP - Campus


Santana do Livramento. E-mail: juuhpedroso@hotmail.com

Juliane Pedroso
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8 Comentários

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Vanessa Donófrio PRO


4 anos atrás

Realmente o abandono afetivo gera inúmeros reflexos emocionais e


psicológicos na vida do ente abandonado, seja ele menor ou idoso
muitas vezes este último colocado em asilos.
Estudo ótimo e o assunto bate de frente com o instituto da alienação
parental que tem o foco de destruir o vínculo afetivo e físico do pai
e/ou mãe com a criança, gerando deste fato falsas memórias no filho
que absorverá na construção da sua personalidade o "abandono
afetivo", ou seja, uma espada de 2 lados.

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