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12/01/2018 - 05:00

Da era do capitalismo à era do "talentismo"


Por Carlos Rydlewski

Klaus Schwab, criador e presidente do Fórum Econômico Mundial, que ocorre entre
os dias 23 e 26
O economista e engenheiro alemão Klaus Schwab é o criador e presidente do Fórum Econômico Mundial, o "think tank"
cujas reuniões anuais, sempre em janeiro, em Davos, na Suíça, atraem a elite do empresariado global. Schwab também é
autor de "A Quarta Revolução Industrial", que trata das promessas e dos perigos desencadeados pelas tecnologias que
fundem os mundos físico, digital e biológico.

A primeira Revolução Industrial (1820-1870), nesse contexto, usou o vapor para mecanizar a produção. Ela nos tirou da
roça e levou à indústria. A segunda (1870-1980) usou a energia elétrica, talvez a mais disruptiva das inovações, para criar a
produção em massa e reformular toda a vida em sociedade. Com a terceira (1980-2010), vieram os computadores e a
internet, mas suas alterações, em termos econômicos, foram parcimoniosas, embora no aspecto social tenham rompido
inúmeros paradigmas. Agora, com a Quarta Revolução Industrial, a coisa é para valer. Os bits e bytes vão mudar tudo a
nossa volta, inaugurando, quem sabe, uma nova Renascença. Nos novos tempos, o trabalho repetitivo estará em plena
extinção. Já o talento humano florescerá. O problema é que países como o Brasil estão despreparados para enfrentar esse
momento.

Leia, a seguir, entrevista com Schwab.

Valor: Existem cenários otimistas e pessimistas sobre os efeitos da próxima onda de automação no mundo do trabalho.
Por que devemos acreditar nos dados do Fórum Econômico Mundial, que prevê a perda de 7,1 milhões de empregos entre
2015 e 2020?

Klaus Schwab: Existem muitos métodos disponíveis para prepararmos previsões. Nosso estudo sobre o futuro do
trabalho fornece uma visão específica do impacto da tecnologia em diferentes setores, ocupações, tarefas e habilidades. O
mais importante, porém, é que essas análises e previsões não representam algo cabal, determinista. Ao contrário. É
importante ter em mente que podemos moldar o futuro e fazer com que ele seja melhor. As previsões são úteis para isso.
Funcionam como alertas. E essa mudança pode acontecer por meio de um esforço colaborativo, envolvendo todas as partes
que compõem a sociedade global. É justamente sobre isso que trata o Fórum Econômico Mundial.

"O Brasil precisa criar um ecossistema em que a tecnologia e a inovação possam prosperar e ter
impacto relevante na sociedade"

Valor: O senhor já disse que o aumento da desigualdade é uma das principais tendências para os próximos anos. A
tecnologia agrava esse cenário. Como superar esse impasse?
Schwab: Três áreas exigirão grandes transformações para garantir que as pessoas possam gerenciar com sucesso as
próximas mudanças no mundo do trabalho: os sistemas educacionais, as redes de segurança social e as políticas
trabalhistas. É imperativo que qualquer economia que deseje proporcionar alguma prosperidade e estabilidade para sua
população preste muita atenção nesses três pontos. Além disso, é fundamental reconhecer a importância nesse processo do
papel de organizações de alto desempenho, voltadas para o desenvolvimento do capital humano e de novos talentos. No
Brasil, isso está bem ilustrado no caso da Embraer. A empresa é um exemplo de liderança em inovação e de
desenvolvimento de uma força de trabalho mais qualificada. No futuro, a competitividade será impulsionada e conduzida
principalmente pela capacidade inovadora empresarial. A chave da questão, aqui, é o talento. Não estamos mais vivendo na
era do capitalismo, mas, sim, na era do "talentismo". Temos de ter isso em mente.

Valor: Nossas sociedades foram amplamente construídas, ética e economicamente, na perspectiva do trabalho como
fonte de ascensão social. Hoje, algumas pesquisas indicam que as pessoas não acreditam mais no "trabalho árduo" como
meio de crescimento pessoal. Quão preocupante é esse fato?

Schwab: As pessoas prosperam quando têm oportunidade. Se o trabalho não oferece oportunidade e dignidade, é possível
que esse significado mude. No entanto, isso também não está predeterminado. Também não cabe determinismo aqui.
Devemos nos desafiar a criar, pró-ativamente, um novo mundo de trabalho. E, nesse caso, ele deve melhorar nosso senso
de identidade e propósito. Acredito que, se gerimos bem esta fase de transformação, a humanidade pode entrar em um
novo Renascimento. Na primeira Revolução Industrial, as pessoas passaram da agricultura para a indústria. Na segunda e
terceira, elas se transferiram para o setor de serviços. Por que não imaginar que, no futuro, e com uma renda mínima
garantida, as pessoas encontrarão propósito no quarto setor, onde estarão envolvidas em atividades sociais, humanísticas e
culturais? Claro, isso ainda é um sonho, mas não é impossível e temos que construir narrativas positivas em tempos de
transição, ansiedade e turbulência.

Valor: Quais serão as consequências sociais e políticas da Quarta Revolução Industrial em países em desenvolvimento
como o Brasil?

Schwab: Sem agir, muitos países podem enfrentar problemas no crescimento, aumento da desigualdade e do
protecionismo, além de inquietação social. No entanto, este é um momento de grande oportunidade para os países que
abraçarem a tecnologia e suas novas possibilidades. Isso tanto nas empresas como no setor público. Em muitas economias
emergentes, os empresários criaram mercados completamente novos usando tecnologias digitais. Além disso, os países que
desenvolvem novos sistemas educacionais, redes de segurança social e políticas trabalhistas - e mantêm essas áreas ágeis
para enfrentar novas mudanças - acharão que a Quarta Revolução Industrial aumenta amplamente suas oportunidades de
crescimento e desenvolvimento. O Brasil é reconhecido como um centro de inovação na América Latina, mas precisa criar
um ecossistema em que a tecnologia e a inovação possam prosperar e ter um impacto relevante na sociedade. Para apoiar a
difusão do empreendedorismo, especialmente os jovens, o Fórum apresentará o UpLink, na sua reunião, em janeiro de
2018. UpLink é uma incubadora e aceleradora digital. Ela fornece para qualquer pessoa que tenha uma boa ideia acesso à
mentoria, capital de risco e a adesão a uma comunidade empresarial global. Nesse espaço, as startups podem interagir com
seus pares, com multinacionais, governos, universidades e investidores. Essa é a nossa contribuição nesse caso.

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