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A ECOLOGIA DOS SISTEMAS HUMANOS


NO NOVO PARADIGMA

Xavier Serrano Hortelano

"O ser humano desde o ponto de vista orgonômico é,


igual ao resto dos seres vivos, um fragmento de
energia cósmica especialmente organizada." (W. Reich)

ÍNDICE
 As "vacas
loucas" em um
sistema
enlouquecido
 A espécie
humana e "Gaia"
 Contato, couraça
e identidade
 Superando ao Dr.
Jekyll
 Cooperação e
apoio mútuo
 Orgonomia e
ecologia global

(Síntese das transcrições das conferências realizadas no "Club Social:


Diário Levante" em Valência, Maio de 2001 e em Novembro de 2001
em Rio de Janeiro no "Instituto de Medicina e Reabilitação")

Transcrições realizadas por Maria Clara Ruíz Martínez e Marina


Velela

Tradução por Juliana Vieira Martinez

*As "vacas loucas" em um sistema


enlouquecido
Há alguns meses o problema das "vacas loucas"
era atualidade na Europa. Se descrevia muito o
que acontecia, as doenças que contagiavam e
como medida preventiva, matavam milhões de
vacas. Mas, do que se falava, pouco era sobre as
orígens dessa doença. Esta espécie já sofreu os
estragos do animal humano, do suposto animal
superior e curiosamente nos afetou. O que criamos
está voltando-se a nós e além das razões
fisiológicas, é evidente que a busca da
produtividade e por tanto, a idéia capitalista
de ter – como se há dito em seu dia, - "carne para
todos" foi alcançado em condições realmente anti-
ecológicas, de aglomeração, de separação precoce
dos bezerros com as mães, ! de alterações
hormonais e, por tanto, de grave alteração dos
ritmos biológicos.

De fato, já faz alguns anos que fizeram


experimentos que já demonstravam esta tese. H.
Maturana descreve um deles em seu livro "A
árvore do conhecimento": "Durante alguns dias
separaram das mães cordeiros recém nascidos
para logo serem devolvidos. O cordeirinho cresce,
caminha, segue sua mãe e não revela nada
diferente até que comece a interar com outros
cordeiros pequenos. Estes animais gostam de
brincar correndo e bater com a cabeza. Os
cordeirinhos separados das mães, não fazem isso
durante horas. Não sabem e não aprendem
brincar; permanecem afastados e solitários". Este
biólogo se pergunta o que aconteceu, e sua
resposta é clara: "Não podemos dar uma respo!
sta detalhada do que aconteceu, mas o fato de que
este animal se comporte de maneira diferente
revela que seu sistema nervoso é diferente do
resto como resultado da privação materna
transitória que sofreu. Durante as primeiras horas
depois de nascer, a mãe lambe persistentemente
ao cordeirinho, passa-lhe a língua por todo o
corpo. Ao separá-los, impedimos esta interação e
tudo que existe de estimulação tátil, visual, e
provavelmente, contatos químicos de vários tipos.
Estas interações se revelam no experimento como
decisivas para uma transformação estrutural do
sistema nervoso que tem consequências
aparentemente bem remotas da simples lambida,
como é o brincar. Todo o ser vivo começa sua
existência com uma estrutura unicelular particular
que constitui seu ponto de partida. Por isso, a
ontogênese de todo ser vivo consiste em sua
contínua transformação estrutural, em um
processo que, por um lado, nele acontece sem
interrupção de sua identida! de nem do seu
acoplamento estrutural ao seu meio desde seu
início até sua desintegração final, e por outro lado,
segue um curso particular selecionado em sua
história de interações pela sequências de
mudanças estruturais em que gatilharam-se nele.
Por tanto, o dito para estes cordeirinhos não é
uma simples exceção."

Este exemplo que tanto nos fala da importância


que têm as variáveis dos ecossistemas no processo
de ontogênese (desenvolvimento maduro). E
também das consequências que levam estas novas
variáveis constritivas impostas (e que Maturana
chamaria "interações destrutivas") nos
ecossistemas circundantes. Por isso não faz
diferença falar das vacas e dos pastos, das galinhas
ou dos seres humanos, porque são alterações que
no fundo correspondem a dinâmicas que vão
contra a natureza de qualquer ser vivo. Ir em
contra ao ritmo biológico, ao evitar as dinâmicas
afetivo-amorosas dos primeiros momentos, supõe
uma agressão biológica externa, que condiciona o
processo de organização desta estrutura.

As vacas têm um período de amamentação - como


todo mamífero – que não foi respeitado, como não
se respeita o contato nem o fato de pastar em
liberdade, fatores que não têm a ver só com o que
comem ou com o que se produz desde o ponto de
vista biológico, senão com o ecossistema em que
vivem.

A análise que faço deste caso, poderia servir de


referência ao descrever muitos fenômenos atuais
não só desde a filosofia ou epstemologia, mas
também desde perspectivas científicas que ao
longo dos últimos decênios, pesquisadores de
distintas disciplinas foram refletindo, desde a
microbiologia até a geologia, passando também
pela psiquiatria. Estes científicos coincidem numa
série de aspectos que nos leva a definir a
alternativa paradigmática, a teoria científica atual
como paradigma holístico, ou seja, que leva em
consideração a globalidade das coisas e portanto,
aquilo que se analise será sempre em relação ao
meio. Cito uma frase de F. Capra, científico que
está divulgando estes conceitos: "O novo
paradigma tem uma visão holística do mundo já
que o vê como um todo integrado mais que como
uma descontínua coleção de partes. Também tem
uma visão ecológica usando o termo ecológico
num sentido mais amplo e profundo do habitual. A
ecologia profunda reconhece a interdependência
fundamental entre todos os fenômenos e o fato de
que como indivíduos e como sociedades estamos
todos imersos nos processos cíclicos da natureza."
O tema das vacas loucas está relacionado com o
ser humano desde vários pontos de vista.
Simplesmente o fato de separar aos recém
nascidos, aos bezerros, de suas mães e não deixá-
los viver o processo de amamentação com o
contato epidérmico e hormonal natural que isso
implica, já traz uma série de consequências, pois
afeta a este sistema completo. E este sistma tem
que se defender, tem que criar dinâmicas
alternativas, que não sabemos quais serão e que
podem ser posteriormente analisadas desde uma
ótica patogênica, ao desenvolver uns mecanismos
adaptativos, que o biólogo chileno H. Maturana
define como "autopoiéticos". Isso significa que
todo sistema desenvolve dinâmicas de autocriação
conforme relaciona-se com os ecossistemas
circundantes. E que, como já vimos, podem ser
interações compatíveis ou destrutivas, segundo
este autor e, que desde meu ponto de vista, -
mesmo que sempre vai existir processos
autopoiéticos-, serão de indole expansiva ou
constritiva. Sendo estes últimos semelhantes aos
que W. Reich descreve como consequência do
sistema defensivo que denomina "couraça
carácteromuscular", que provocam, por sua vez,
processos degenerativos e patologías funcionais.

Dependemos e nos relacionamos com o que nos


rodeia. Como nenhum ser vivo é uma entidade
isolada, o que fazemos, vai repercutir diretamente
no exterior. Isso é revolucionário científicamente
falando, porque significa, por exemplo, que em um
momento determinado uma podada de árvores
que poderia servir para acender uma lareira, com o
tempo possa estar prejudicando toda uma zona de
abelhas que estava aí com suas colméias,
perturbando esse sistema e esse tipo de espécie
em concreto. Esta é apenas uma das
consequências, porque com o tempo, na cidade,
pode ocorrer um ataque de abelhas e apartir daí
doenças que podem causar uma epidemia, pela
qual a humanidade vai desaparecendo a partir de
uma podada de árvores, porque há uma mutação.
Isso parece ficção científica, mas a ficção científica
tenta refletir situações de maneira avançada e
vanguardista.

Não sou um ecologista especializado em sistemas


físicos, geográficos nem geológicos, mas sim nos
sistemas humanos, por isso, tento passar o
conceito de autopoiése à nossa espécie, levando
em consideração a idéia filosófica de que não
existe nem o bom nem o mau senão as
consequências das ações.

Qualquer ação tem uma consequência. As vezes


não sabemos qual será, as vezes, podemos prevê-
la, e assim, prevení-la. Essa consequência seria
beneficiente para a manutenção, preservação,
confirmação, e portanto, para a evolução do que
existe e suas potencialidades, ou pode ser
contrativa, entrópica e assim, de desaceleração e
desestabilização do meio. Isso repercutiria a longo
prazo no processo do indivíduo que o provocou,
mesmo que a curto prazo não seja visível. Foi o
que se produziu no animal humano. Porque
contemplamos não só o que vemos, e temos
objetivos e interesses a curto prazo que nos
interessa corrigir e aos quais queremos tirar algum
benefício imediato. Entramos na base do
produtivismo, do economicismo e da mais-valia e,
portanto, da economia capitalista.
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*A espécie humana e "gaia"

Em menos de cem anos o desenfreio da "gaia", do


planeta Terra, nossa casa, há sido indescritível,
tendo em conta o tempo que é necessário para
cegar a um processo de estruturação, de evolução
e de desenvolvimento. Assim, os microssistemas e
as estruturas vivas foram gerando processos
autopoiéticos, adaptativos, de desenvolvimento,
de evolução, de manutenção do meio, que por sua
vez, foram criando processos produtivos,
adaptativos e de criação de novas espécies. Há
bilhões de anos apareceram as primeiras espécies
vivas conhecidas – as vegetais – e há pouco, há
apenas milhões de anos, começa a existir o mais
parecido à estrutura animal humana. Isso que se
gestou em 3.500 milhões de anos, em 80 ou 60
anos está transformando-se completamente, sem
nenhum tipo de ordem. A única lógica é a da
produtividade e a lógica neurótica de uma espécie,
que supõe formar parte dessa dinâmica global de
criação, que foi entrando na loucura como espécie,
desenvolvendo dinâmicas constritivas, destrutivas,
que foram gerando uma mutação concreta.
Evidentemente isso repercute no desenvolvimento
da própria espécie, que não se livra das doenças
inmunitárias e degenerativas, das enfermidades do
distrés (estrés patogênico) e do aumento de
enfermedades cardiovasculares, entre muitas
outras.

Poderíamos pensar que a margem de tudo isso há


mais comodidade e mais meios técnicos para
melhorar nossas vidas e ter mais possibilidades de
desenvolvimento. Mas a custa de muitos
desequilíbrios e sem ter presente o futuro. Não só
podemos avaliar a realidade pelo o que temos,
pelo o que há, desde uma perspectiva mecânica,
senão pelo o que somos e pelo o que existe, e o
que poderá existir. Não faço uma apología do
primitivismo nem da volta atrás, não se trata de
voltar às comunidades primitivas, mas sim de
tentar preservar aquilo que se desenvolveu
durante milhões de anos e, conviver com as leis do
vivo desta maneira. Desenvolvendo o presente
preservamos e potencializamos o futuro.

A ciência da ecologia estuda estas leis do vivo e a


comunicação dos distintos ecossistemas, o que
curiosamente um científico e profissional da
saúde, W. Reich, neuropsiquiatra, há meio século
já, investigou nesta direção e definiu esta corrente
com o termo "orgonomia". Se atreveu a colocar
um termo a uma disciplina nova, cuja a tentativa
era, precisamente, reunir científicos de diferentes
disciplinas para poder estudar de uma maneira
global as leis do vivo e tentar descubrir o que há
em comum entre uma bactéria e uma galáxia,
entre um animal humano e uma planta, e por quê
há vida e como co-existimos. Isso é o que
considera-se dentro do paradigma científico atual,
tentar explicar as coisas desde a polaridade e
desde o qualitativo. Isso supõe tentar entender
quais mecanismos levaram ao ser humano a
perder sua identidade como espécie. Porque o
animal humano é o único que não possui
identidade como espécie em relação ao resto dos
seres vivos com conhecimento de causa de que
para ter identidade não precisa ter consciência, já
que uma coisa é identidade biológica e outra,
identidade psíquica. E esta falta de identidade vai
vinculada ao que W. Reich definiu como "perda de
contato".

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*Contato, Couraça e Identidade

Em meu trabalho cotidiano como psicoterapeuta,


abordando diariamente o sofrimento emocional,
observo "in extremis" esta perda de contato. A
pessoa chega à consulta com uma sintomatología
sexual, psicopatológica ou psicossomática,
desconhecendo sua causa e a atribuindo a mil
possíveis e diferentes coisas, quando em realidade,
a maioría das ocasiões, deve-se a um disturbio
sistêmico produzido em sua estrutura humana
como consequência de um distrés ao não poder
adaptar-se por mais tempo às exigências dos
ecossistemas circundantes (família, sistema
educativo, laboral, social, cultural…).

Sendo a doença uma linguagem, a expressão de


um código somático, orgânico, que tem de ser
decifrado para poder compreender uma
mensagem implícita e desconhecida para a
consciência porque foi produzida uma perda de
contato com seus processos internos, com suas
necessidades, com seus conflitos, com seus
anseios, seus desejos, suas frustações…
E esta perda de contato vai produzindo-se
ordenadamente, como defesa ante as progressivas
exigências que cada recém nascido vai recebendo
ao longo da vida infantil, separadas, a maioría
delas, das necessidades reais que permitiríam o
amadurecimento e desenvolvimento, de forma
integrada e equilibrada, de todas as funções que
caracterizam a nossa espécie.

Isso vai ocasionando um embrutecimento


progressivo da nossa percepção mantido pela
"couraça caracteromuscular", denominada por W.
Reich, a qual, através de umas atitudes
comportamentais cronificadas e adaptativas
estereotipadas junto a tensões musculares
crônicas em determinadas partes do nosso corpo,
vão limitando a respiração e o processo vital em
geral para evitar perceber a angústia que
ocasionou a violência que foi exercida em nossos
corpos indefesos e fracos, negando nossas
necessidades afetivas, emocionais e sexuias,
estruturando esta percepção parcial e mecanicista
que nos caracteriza.

As consequências de este estado de coisas não só


se observam no espaço da clínica mas também nas
dinâmicas sociais e no comportamento humano
em geral. Perde-se a naturalidade, a percepção
cósmica, solidária, humana, sentindo a solidão, o
vazio existencial, introjetando ao "outro" e ao
mundo como inimigos e desenvolvendo atuações
egoístas, individualistas e destrutivas baseadas no
medo. Rompe-se o cordão que nos une à nave e
que nos faz flutuar no espaço, entrando no pânico
no desespero. Tudo isso mantido e restringido por
ecossistemas e estruturas sociais que facilitam a
compensação dessas carências através de
mecanismos evasivos (alguns meios de
comunicação, as máquinas), catárticos (algumas
festas e esporte de massas) e vorazes (o estímulo
ao consumo selvagem), e em ocasiões com
comportamentos repressivos e ideológicos.

Esta falta de identidade implica, desta maneira,


que o animal humano perdeu sua capacidade de
perceber e de autoperceber-se, perdendo assim,
sua essência humana como espécie, como
natureza, como parte do cosmos.

Como consequência, perdeu sua espiritualidade no


sentido leigo da palavra, ou seja, da sacralização
da natureza e daqueles atos que permitem um
desenvolvimento e contato com o vivo. Os
conceitos de espiritualidade e religião são
diferentes. As religiões são em geral uma
manifestação clara da dispersão da essêcia do
animal humano. É paradóxico, lamentável e
intolerável que hajam sido e sejam as religiões que
cometem em nome de Deus as maiores
atrocidades, e sejam as igrejas em nome das
religiões, que cometeram genocídios muito
maiores que os governos mais duros. Nem Hitler,
sequer com o nazismo, superou à igreja neste
sentido. Lembremo-nos o genocídio das culturas
latinoamericanas, por parte dos espanhóis, dos
portugueses, dos ingleses disparando em nome de
Deus, em nome de algo que se supõe sagrado e
espiritual e que dá vida.

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*Superando ao Dr. Jekyll

Nós criamos monstros e logo, nos assombramos e


nos assustamos com eles, tal como descreve Mary
Shelley em sua novela "Frankestein". O
personagem se assusta com o monstro de sua
criação, de sua própria atrocidade e nao só se
assombra, mas o despoja, o deixa, o abandona, o
nega. O monstro negado por seu criador, sem
nenhuma identidade, destrói. Em sua autopoiése,
apenas pode destruir, mesmo que não queira. Nos
assombramos, custa assumir nossa
responsabilidade e deveríamos começar tomando
consciência desta realidade. Isso significa que não
somente devemos dar importância a reciclar as
latas, a não jogar o lixo na natureza ou a não matar
pássaros pelas ruas. Isso reflete que possuimos
consciência ecológica, mas também temos que
assumir que seu aspecto fundamental, essencial e
ao qual nos resulta muito complexo, é o de poder
sentirmos parte do to! do, o que significa poder
sentir plenamente o que está acontecendo ao
nosso redor. Se sentíssemos realmente a
destruição não poderíamos destruir e aí onde está
o conceito de desidentificação como espécie. É
muito complexo, porque assumir uma plena
consciência ecológica significaria a possibilidade de
estar em contato com a nossa essência e de sentir
o que ocorre realmente ao nosso redor, o que nos
faria submergir em uma tristeza e um sofrimento
permanente e, para evitar isso, nosso biossistema
põe em ação mecanismos de defesa paliativos, -
que W. Reich descreveu como "processo de
encouraçamenteo" – limitando nosso contato e
embrutecendo nossa percepção, o nosso sentir e
assim, nossa "consciência ecológica global". Com
isso, falaremos de que a autopoiése que é
produzida no ser humano é diferente do resto das
espécies desde séculos atrás, caracterizando-se
por um claro processo de constrição por estar
esquecendo e perturbando as necessidades do
novo ser para desenvolver as potencialida! des que
tem como espécie e portanto, ocasionando um
processo de autorregulação, cada vez menor, mais
contraído, mais medroso. Recordemos a R. Spitz,
quando descreveu como crianças chegaram a
morrer por apatías, por depressões anaclíticas nos
orfanatos, não por fome, mas por falta de contato,
de afeto.

Se pode chegar a morrer por falta de amor, mas a


estrutura antes que isso aconteça, tentará sempre
criar novas formas para sobreviver. Inclusive pode
criar uma espécie de roupa de mergulhador em
volta, que impeça ver, olhar e sentir. Por isso,
neste discurso, a culpa não pode existir, mas sim a
responsabilidade. Não podemos pensar que somos
"maus" porque estamos educando crianças
neuróticas ou com estruturas autopoiéticamente
constritivas. Por que em pricipípio, atuamos como
sabemos e podemos estar condicionados por
nossos próprios limites caracteriais e pela laje da
nossa couraça. Mas sim que podemos e devemos
assumir nossa responsabilidade e buscar medidas
de mudanças, para que podamos desenvolver
sistemas familiares e educativos mais humanos
que facilitem mais a abertura da nossa percepção
e desenvolvimento da nossa capacidade de
contato,! ao permitir que os novos seres humanos
cresçam em condições e com um ritmo de acordo
com sua espécie, satisfazendo suas necessidades
biológicas e específicas. E este trabalho começa na
vida intra-uterina e no nascimento, continua
durante toda a infância e adolescência, até
alcançar a autonomia e o amadurecimento egóico.

Desta forma contemplamos nossas ações levando


em consideração não apenas as consequências
imediatas senão também as futuras. Precisamente
uma das características do novo paradigma é a
"sustentação" tal como descreve Lester Brown:
"uma sociedade sustentável é aquela capaz de
satisfazer suas necessidades sem diminuir as
oportunidades das gerações futuras".

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*Cooperação e apoio mútuo

Em poucas palavras, este é o grande desafio do


noso tempo. Criar oportunidades sustentáveis, ou
seja, entornos sociais e culturais aos quais
podamos satisfazer nossas necessidades e
aspirações sem comprometer o futuro das
gerações seguintes. Neste sentido Kropotkin, -
etnólogo e um dos principias ideologistas
libertários -, no início do século XX, já mencionava
este conceito, que o definia como "apoio mútuo".
Demonstrou como as espécies não se mantinham
por concorrência, mas que o princípio da vida as
regulava, ou seja, através da colaboração e da
cooperação das espécies. Isto está sendo
retomado no paradigma científico atual. Assim
lemos em uma obra do biólogo chileno H.
Maturana: "Na natureza não há concorrência, por
muito que seja afirmado por aqueles que mal
entenderam a Darwin. A concorrência não é um
fenômeno biológico primário. É um fenômeno
cultural". Nesta mesma linha encontra-se Reich,
pois uma das teses de seu "Funcionalismo
orgonômico" manifesta que: "É a mesma função
que dirige a cooperação".

Poderíamos trazer a idéia de colaboração e


cooperação ao terreno das sociedades humanas
para recuperar dinâmicas sociais que foram
perdidas e sufocadas pela competitividade e pela
ferocidade da violência vinculada aos interesses
econômicos que está nos levando à autodestruição
como espécie e, como consequência, ao do nosso
planeta.

Sempre houve movimentos que potenciaram este


princípio, e para o movimento libertário e o da
ecologia global é uma máxima fundamental. Mas
este princípio de cooperação há que fundamentar-
se em uma identidade de coletivo, há que apoiar-
se nos pilares da solidariedade emocional, não só
"ideológica" ou "moral", porque não sendo assim,
podemos fazer as coisas, mas em função de
modelos referenciais ou modas, e, por não estar
enraizado no sentimento pode haver um efeito
pouco duradouro ou incluso manipulável.

Por exemplo, agora está em moda o chamado


"Time Work", como técnica de aplicação nos
recursos humanos em empresas. Isto significa que
o foco de ação ao resolver os conflitos das
empresas, seja o de analisar a realidade de seus
membros e fomentar uma comunicação corrente
que permita desvelar aqueles conflitos que
possam estar condicionando a dinâmica de
trabalho. É um conceito interessante, mas pode
ser feito de forma mecânica e com fins produtivos,
com o qual perde seu objetivo humanizante e
coletivista. Em um outro aspecto, também parece
que atualmente toma-se outra vez a consciência
da importância da amamentação materna, sem
associar esta ação a uma visão retrógrada da
mulher. De fato houve a pouco tempo um
congresso de médicos sobre amamentação
natural, que houve um grande êxito, quando há
pouc! os anos, os pediátras se opunham àqueles
que falavam de dar ao peito aos filhos por "razões
médicas" -. Mas se esta ação realiza-se de forma
mecânica, seguindo uma moda e sem assumir ou
ter consciência emocional da função que cumpre
dentro do processo de equilíbrio e harmonia do
sistema familiar seus resultados serão parciais e
inclusive quantitativamente questionáveis. Porque
no fundo, não se trata de dar o peito, se trata de
como se dá, do tipo que se estabelece entre a
relação mãe-bebê, tendo em conta a
particularidade de cada sistema familiar
(condições econômicas, sociais, posição afetiva do
pai…). Porque, como tantos teóricos do novo
paradigma insistem, nós, somos animais
relacionais, com o qual a linguagem esá mediando
a situação. Uma linguagem que está vinculada a
uma dinâmica emocional, que por sua vez, constrói
uma forma de nos comunicar e nos dá um padrão
de relação.

Portanto, a dinâmica relacional, é a que vai marcar


a autopoiése da estrutura, ou melhor, o
fundamental será como nos relacionamos, não o
que fazemos. Isso, nos dará a chave do
desenvolvimento desta estrutura individual.

Tudo isso me faz lembrar a famosa frase "trepar,


que o mundo se acaba" que estava na moda faz
alguns anos em alguns ambientes culturais. Era
revolucionário "trepar", mas não por isso se
desenvolvia mais o afeto ou desapareciam as
dinfunções sexuais nem a neurose. Era uma
interpretação cultural parcial de algo que tinha sua
origem precisamente em um de nossos referentes
principias, W. Reich, que falava da importância da
vida sexual e afetiva das pessoas para melhorar a
qualidade de vida desde uma concepção global.
Porque a relação humana baseia-se na transmissão
de afetos, emoções e sentimentos, e por tanto, da
sexualidade.

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*Orgonomia e ecologia global

Conhecendo estes fatos, a posse da nossa


responsabilidade consistiria em tomar posições
frente a situações que reconhecemos como causas
destas constrições e desta perda de identidade
individual e coletiva.

Situações, por exemplo, como as que se produzem


pela influência da igreja católica ao manifestar que
é pecado o uso dos anticonceptivos,
introjentando-os como algo proibido, já
condicionando nefastamente a possibilidade de
escolher livremente o momento de ter um filho(a).
Isso é intolerável, como o fato de que em nome de
Maomé ou de quem seja, chega-se a castrar uma
mulher, privando-a de seu clítoris, ou a lapidem
por querer viver livremente sua sexualidade. Os
governos, as diplomacias, o aceitam e toleram
para evitar conflitos bélicos supostamente, mas
estes se produzem igualmente por fatores e
interesses econômico-políticos, como o atual
conflito com Iraque. Isso é muito mais despreciável
porque vai contra os aspectos básicos que
configuram a identidade do ser humano. E todos
temos algo a fazer, porque faz parte do cotidiano.
Coisas simila! res acontecem em nossas casas. Este
é o significado real que encontro ao conceito de
consciência ecológica.

Por isso, admiro a frase de Epicuro: "O


conhecimento não só nos deixa feliz, mas também
nos liberta."Porque no momento em que sou livre
já conheço algo e assim posso me responsabilizar.

Conhecemos coisas que permitiriam modificar os


sistemas humanos. Desde a concepção, a vida
intra-uterina, os partos, a amamentação, a
autorregulação. Desde a realidade de uns sistemas
aos quais se criam relação, comunicação, aos quais
se reconheça a validade do discurso da criança,
possibilita que conheçam o nosso. Estando
presentes e em constante interrelação e
comunicação emocional e verbal.

São estas mudanças cotidianas que podem facilitar


mudanças em nossos sistemas sociais. Porque a
partir do momento em que se generalizem e se
convertam em costumes também mudam-se as
leis e assim, a cultura. Isso sabemos por nossa
própria experiência. Na Espanha, só depois de
viver cotidianamente dinâmicas sexuais
transgressoras para o sistema, implantaram-se leis
que facilitam o uso dos anticonceptivos, o divórcio
ou o aborto, o que reflete uma dinâmica afetiva
mais livre. Ou seja, primeiro culturizamos uma
ação e depois, aparecem as leis, por isso a
responsabilidade seria nossa em grande medida.
Assumamos uma consciência ecológica e
desenvolvamos uma cultura ecológica.
Coloquemos meios para que possamos realmente
sentir as coisas que cometamos a conhecer e a
intuir que poderiam ajudar-nos a recuperar nosso
equilíbrio como espécie.

Já existe neste momento muitas pessoas e


coletivos em que estamos trabalhando para
conseguir estas mudanças culturais, este novo
desenvolvimento dos ecossistemas humanos.
Muitas vezes os meios de comunicação não
facilitam nada sua difusão, porque parecem banais
ou pouco significativos desde o ponto de vista do
marketing. Mas estamos ajudando a mudar este
estado de coisas. Constatamos que depois de vinte
ou trinta anos em reivindicar algo e desenvolver
certas condutas transgressoras cotidianamente,
nos damos conta de que há pessoas que começam
a viver assim, desta maneira, como algo normal e
habitual, como um costume.

Por exemplo, há coletivos educativos como a


escola "Els Donyets", que trabalha dentro de uma
prática escolar alternativa, em Valência, Coletivos
feministas, ecológicos, libertários, de homens e
mulheres que trabalham para mudar o cotidiano.
Todos podemos participar de forma madura,
solidária e ativa neste processo de mudança.

Criar em coletivo, trabalhar em equipe, com


formatos federativos, algo que os libertários já nos
ensinaram na Espanha.

Desenvolver redes de grupos que trabalhem pela


transformação dos sistemas humanos ao mesmo
tempo que realizamos em nossa vida cotidiana.
Desta forma iremos configurando o novo
paradigma apoiando-nos em suas sólidas bases
científicas que encontramos na teoria dos "campos
morfogenéticos" de R. Sheldrake, o conceito de
"Boopstrap" de G. Chef, "a tektologia" de A.
Bognadow precursora de "a teoria dos sistemas"
de L. Bertalanfy, "as estruturas dissipativas" de I.
Prigogine, "a autopoiése" de Maturana, o conceito
"Gaia" de J. Lovelock, o papel dos "neuropéptidos"
descoberto por C. Pert, "a homeopatia" de
Hanneman, a "teoria da libido" de Freud e a
"orgonomia" de W. Reich. A qual mostra a
evidência empírica da energia vital denominada
Orgônio, seguindo os passos do vitalista Bergson
desenvolvendo uma visão global e circular onde o
social, o individ! ual e o cósmico estão em
constante interrelação opondo-se em alguns
aspectos à teoria dos sistemas e a outros avanços
científicos já descritos de uma forma evidente,
mas ainda excesivamente intuitiva, porém
manifestavam um pleno contato com o Vivo.

Neste sentido, F. Capra escrevia em 1999: "Para


recuperar nossa plena humanidade devemos
reconquistar nossa experiência de conexão com a
inteira trama da vida. Esta conexão "religio" em
latim é a mesma essência da base espiritual da
ecologia humana".

W. Reich meio século atrás, já lembrava que: "O


desenvolvimento da sociedade deve e tem que ser
adaptado aos princípios da autorregulação do Vivo
e não como agora, em que o Vivo se ajusta às
demandas específicas de pequenas parcelas da
raça humana como são os grupos religiosos, as
culturas nacionalistas, os governos estatais, etc. O
princípio do Vivo inclui à toda humanidade. Um
credo religioso determinado, um estado nacional
ou uma cultura nacional específica tem muito
menos envergadura e importância que o Vivo.
Tudo o que em instituições está contra o Vivo não
sobrevivirá. Porque o Vivo é o princípio funcional
comum da humanidade. O estado, a religião, a
cultura em particular seria em certas condições o
que separa e cria o ódio, e, deste modo favorece o
sufocamento da vida. Não pode haver paz até que
o princípio do Vivo não tome as rédeas ! do
governo da espécie humana e seja valorizado além
das modas, das formas de existência limitadas que
nos divide. Sobre e somente esta base se pode
distinguir o indivíduo que trabalha
internacionalmente pelo Vivo, do político que
recolhe meramente votos para o partido
democrático de qualquer país; o partidário da
democracia social internacional do fascista; o
conservador daquele que tem interesse em
mobilizar dinâmicas sociais; o partidário
hipernacionalisata como Hitler com o trabalhador
internacionalista, e assim por diante… Desta
maneira, é inevitavel o esclarecimento de quem
está a favor e quem está contra ao princípio do
Vivo, da Autorregulação".
Na atualidade, os coletivos pós-reichianos, como
ao que dirijo na "Escuela Española de Terapia
Reichiana", procuramos seguir levando adiante
estas propostas, tanto no campo clínico – tentando
aliviar o sofrimento através da psicoterapia breve
caracteroanalítica (P.B.C.) ou recuperando nossas
potencialidades através da vegetoterapia
caracteroanalítica -, como no campo social e
preventivo mantendo este compromisso com a
Orgonomia tanto como cidadãos em nossa vida
privada como profissionais da saúde e agentes
sociais. Procurando que se faça realidade o
objetivo de W. Reich refletido nestas linhas "…o
foco da nossa atenção deve ser as cranças ao
nascerem, para poder guardar e salvar suas
potencialidades ainda inatas, e ajudando-lhes a
encontrar seu caminho, pois nada pode mudar
enquanto a humanidade s! iga desenvolvendo-se
encurvada e contraída".

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