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Crianças em Risco

Universidade Portucalense
Porto, Portugal
Disciplina: Intervenção Precoce - Prof. Dr.ª Olívia Carvalho
14 de Abril de 2008

Trabalho realizado por:

Isabel Saraiva Barbosa

N.º21666
"Os nossos pais amam-nos porque somos seus filhos, é um facto

inalterável. Nos momentos de sucesso, isso pode parecer irrelevante,

mas nas ocasiões de fracasso, oferecem um consolo e uma segurança

que não se encontram em qualquer outro lugar."

[ Bertrand Russell]

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Sumário

1 - Introdução .......................................................................................................... 3

2 - O que é Intervenção Precoce............................................................................. 4

3 - Abordagem dos factores de risco ....................................................................... 6

3.1 - Definição dos factores de risco ............................................................................. 6

3.2 - Principais factores de risco ................................................................................... 7

3.3 - Tipologia das situações de perigo para a criança/jovem ......................................... 7

4. Abordagem dos factores de protecção ................................................................ 9

4.1 - Definição dos factores de protecção ...................................................................... 9

4.2 - Os três pólos da protecção .................................................................................. 10

5 - A perspectiva sistémica e ecológica................................................................. 11

5.1 - Níveis do sistema ecológico................................................................................ 12

6 - O sistema de serviços de Intervenção Precoce numa Perspectiva Ecológica .. 14

6.1 - Factores ligados ao microssistema ...................................................................... 14

6.2 - Factores ligados ao mesossistema ....................................................................... 14

6.3 - Factores ligados ao exossistema .......................................................................... 15

6.4 - Factores ligados ao macrossistema ...................................................................... 15

7 – Apresentação do Caso .................................................................................... 16

Conclusão ............................................................................................................. 24

Referências Bibliográficas ..................................................................................... 25

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1 - Introdução

Este trabalho foi elaborado no âmbito da disciplina de Intervenção Precoce de


modo a abordar os aspectos relacionados com a Intervenção Precoce em crianças de
risco, aprofundando os nossos conhecimentos relativamente a este assunto.
Desta forma, no presente trabalho, é definido e explorado o conceito de
Intervenção Precoce apoiando-nos, para isso, no Despacho n.º891/99, numa definição
de Joaquim Côloa e em Joaquim Bairrão.
Seguidamente, é feita uma breve abordagem sobre os factores de risco baseando-
nos nos autores Joaquim Côloa e Ana Melo. Deste modo, podemos considerar como
factores de risco qualquer evento, condição ou caracterização que aumenta a
probabilidade de ocorrer um efeito alvo identificado.
De seguida, abordamos também os factores de protecção, que como nos refere
Rutter (1990, cit. por Anaut, 2005, p.51) os factores de protecção modificam a reacção à
situação que apresenta o risco, ao reduzir o efeito do risco e as reacções negativas em
cadeia. Como no caso do estudo dos factores de risco, as investigações sobre os factores
de protecção mostram que a protecção resulta por um lado de variáveis genéticas e
constitucionais, das disposições e das características da personalidade, dos suportes do
meio (familiar e extrafamiliar) mas também da disponibilidade, da acessibilidade e da
qualidade dos suportes sociais.
É feita também uma breve abordagem acerca da Perspectiva Sistémica e
Ecológica segundo o modelo de Bronfenbrenner, que caracteriza uma série de
interrelacções com influência no desenvolvimento da criança sendo eles o micro, meso,
exo e macrossistema. Do mesmo modo, é referido ainda o sistema de serviços de
Intervenção Precoce numa Perspectiva Ecológica.
Neste trabalho é feita a apresentação de um caso, de uma família com quatro
menores que está a ser acompanhada por uma equipa do CAFAP, de modo a evidenciar
o papel dos intervenientes do processo de mudança nas famílias de risco.

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2 - O que é Intervenção Precoce

A Intervenção Precoce consiste numa perspectiva ecológico sistémica e


pluridisciplinar que tem como intuito facilitar o desenvolvimento da criança e
proporcionar o bem-estar da família. Nesta perspectiva, a Intervenção Precoce tem
como principal objectivo apoiar a família, de modo a proporcionar-lhes um tipo de
relacionamento e uma forma de lidar melhor com o seu filho, privilegiando os contextos
de vida da criança e promovendo ambientes mais adequados ao seu desenvolvimento.
Para que esta Intervenção resulte na sua plenitude, é necessário que haja da parte
dos profissionais e da família em questão uma relação de confiança e parceria para que
se possam avaliar os pontos fortes da criança, realizar o levantamento de recursos e as
capacidades da família e fazer a adequação de contextos em que ela se insere. Tudo isto
para que possa existir um bom relacionamento entre ambas as partes e se proporcionem
momentos de prazer e satisfação nestas novas mudanças que irão surgir na família.
Segundo Breia, Almeida e Côloa (2004, pág. 21) ainda hoje não existe um
consenso para definir verdadeiramente Intervenção Precoce, uma vez que tem sido
utilizada em diferentes práticas, umas com carácter de prevenção e outras com carácter
de remediação. “As de carácter de prevenção procuram actuar antes que surjam
situações problemáticas, essencialmente em condições de risco. Ocorrendo com o
intuito de reduzir a incidência de situações problemáticas. As de carácter de remediação
são as que surgem numa situação problemática mas no sentido de evitar o seu
agravamento. Através da aquisição de competências ou comportamentos
compensatórios, de modo a diminuir o número de casos e também reduzir a prevalência
de problemas ou condições manifestados na população; ou então através da redução da
expressão de sequelas existentes em situações já diagnosticadas ou identificadas”.
Contudo, segundo o despacho n.º891/99, podemos ver a “Intervenção Precoce
como uma medida de apoio integrado, centrado na criança e na família, mediante acções
de natureza preventiva e habilitativa, designadamente do âmbito da educação, da saúde
e da acção social, com vista a:
a) Assegurar condições facilitadoras do desenvolvimento da criança com
deficiência ou em risco de atraso grave de desenvolvimento;
b) Potenciar a melhoria das interacções familiares;
c) Reforçar as competências familiares como suporte da sua progressiva
capacitação e autonomia face à problemática da deficiência”;

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Tendo como os seus principais destinatários crianças até aos 6 anos de idade,
especialmente dos 0 aos 3 anos, que apresentem deficiência ou risco de atraso grave do
desenvolvimento.
As características que podemos encontrar na Intervenção Precoce são a
necessidade das crianças serem avaliadas e interpretadas no seu contexto familiar e
social; que exista uma proximidade com a população de modo a se poder conhecer
previamente as necessidades, os problemas e os recursos comunitários, permitindo
fomentar compromissos e parcerias mais facilmente; esta actuação deve ser estruturada
e assente em programas individualizados, desenvolvidos no domicílio e ambientes em
que normalmente a criança se encontra.
Sendo os objectivos da Intervenção Precoce a criação de condições facilitadoras
do desenvolvimento global da criança, importa optimizar as condições da interacção
criança/família e, envolver a comunidade no processo de intervenção, de forma contínua
e articulada”.
Segundo Bairrão e Almeida (2003, p.15), do ponto de vista de Bailey e Wolery
(2002) “a Intervenção Precoce, abrange serviços de Educação Especial e afins
destinados às crianças de idades precoces e de idade pré-escolar com Necessidades
Educativas Especiais e às suas famílias”.
Contudo, os mesmos autores (Ibidem) referem-nos que na perspectiva de Dunst
e Bruder (2002) consideram que a “Intervenção Precoce diz respeito:
a) Aos serviços, apoios e recursos necessários para responder às
necessidades de todas as crianças que ocorrem aos programas de
Intervenção Precoce. Com este objectivo inclui actividades e
oportunidades que viam incentivar a aprendizagem e o desenvolvimento
da criança;
b) Aos serviços, apoios e recursos necessários para que as famílias possam
promover o desenvolvimento dos seus filhos, criando oportunidades para
que tenham um papel activo neste processo”.

Na perspectiva de Bairrão, dada no seu artigo “Mayday Mayday” a “Intervenção


Precoce é uma abordagem multidisciplinar em educação especial, geralmente um
conjunto de recursos para crianças em risco ou “risco já adquirido” (biológico, social,
ou compósito), que abarca a população entre os 0 e os 5/6 anos. Tal modalidade
preventiva em EE, pode revestir várias modalidades de intervenção nomeadamente, nos
contextos familiares, pré-escolares (creche e jardim de infância) ou noutros locais de
guarda ou cuidados onde tais crianças se encontram”.
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3 - Abordagem dos factores de risco

3.1 - Definição dos factores de risco

Nestes factores de risco podemos considerar os factores de risco familiares, os


factores de risco individuais e no grupo de pares e, os factores de risco
comunitários/sociais.
A estes factores de risco, alguns autores dividem-se em específicos ao uso de
drogas e não específicos, ou gerais a uma maior variedade de patologias. Estes últimos
encontram-se relacionados com questões do funcionamento familiar; no que respeita aos
específicos podemos encontrar os que estão relacionados com a exposição às drogas, ao
uso de álcool. São também considerados como factores de risco familiar: os conflitos
familiares, assim como o divórcio ou a separação dos pais, os problemas na gestão da
família, as práticas educativas desajustadas, problemas de disciplina e o abuso físico.
No que diz respeito aos factores de risco individuais e de pares temos de
salientar os problemas de saúde mental e psicopatologia ou outros problemas de
comportamento (perturbações de conduta, hiperactividade e défice de atenção,
dificuldades de autocontrolo, agressividade). A procura de sensações ou o apresentar de
atitudes favoráveis face ao uso de drogas são igualmente apontados por vários autores,
juntamente com a alienação e rebeldia, ser vítima de abuso físico, sexual ou emocional.
Alguns dos principais factores de risco relacionados com as comunidades
incluem a carência económica e a disponibilidade e acessibilidade das drogas, um baixo
envolvimento na comunidade, a desorganização comunitária e a mobilidade da
população. Estes factores acabam por interferir com o funcionamento familiar, uma vez
que os pais estão numa situação económica e social desfavorável, aumentando assim o
número de elementos stressadores a que estão expostos. O que significa que os pais se
mostrem menos disponíveis para prestar a necessária atenção aos filhos; que os
problemas conjugais possam também vir a surgir; e as condições habitacionais poderão
também não garantir as condições mínimas para que o estabelecimento de fronteiras
entre os diferentes sub-sistemas familiares seja adequado, encontrando-se toda a família
a partilhar o mesmo espaço. Assim as dificuldades financeiras, a exclusão social e o
isolamento podem ser considerados como os factores de risco. (Melo, 2004, pp. 22-24)
Podemos ter em atenção que nos poderão surgir factores de risco múltiplos uma
vez que a probabilidade de resultados negativos aumenta grandemente quando múltiplos
factores de risco estão presentes.

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Segundo Marcelli (1996, cit. por Anaut (2005, p.32), “considera como factores
de risco: todas as condições existenciais na criança ou no seu meio ambiente que
envolvem um risco de morbilidade superior à que se observa na população em geral
através dos inquéritos epidemiológicos”.
Do ponto de vista de Garmezy (1996, cit. por Anaut, 2005, p.32), “um factor de
risco poderá ser um acontecimento ou uma condição orgânica ou ambiental que
aumente a probabilidade da criança de desenvolver problemas emotivos ou de
comportamento”.
Deste modo, podemos considerar “crianças em risco as crianças que, por um
lado, apresentam disposições genéticas e de personalidades específicas e, por outro,
vivem num contexto ambiental marcado pela pobreza, pela violência, pela inadequação
das relações parentais, pela monoparentalidade”. (Anaut, 2005, p.39)

3.2 - Principais factores de risco

1. Risco estabelecido: este risco refere-se às crianças que apresentam


problemas físicos ou mentais graves de etiologia conhecida, passíveis de originarem
atrasos de desenvolvimento (e.g. síndrome de Down, anomalias cromossómicas,
alterações sensoriais, microcefalias, paralisias cerebrais, etc.)
2. Risco biológico: neste risco poderemos assistir a crianças que apresentam
antecedentes pessoais e familiares, nomeadamente, no que se prende com os períodos
pré, péri e pós natais que podem resultar em problemas de desenvolvimento (e.g. baixo
peso à nascença, anóxia, nascimento prematuro, doença metabólica, etc.)
3. Risco ambiental: aqui podemos verificar crianças cujas experiências
precoces, nomeadamente, cuidados maternos e familiares, cuidados de saúde, nutrição,
oportunidades de estimulação física, social e de adaptação, são de tal modo limitadas
que implicam uma alta possibilidade de atraso no desenvolvimento.
(Breia, Almeida & Côloa, 2004, pág. 103)

3.3 - Tipologia das situações de perigo para a criança/jovem

1. Abandono: quando a criança se encontra entregue a si própria, não tendo


quem lhe assegure as suas necessidades básicas físicas e de segurança;
2. Negligência: são as necessidades físicas básicas e de segurança que não
são atendidas por quem cuida dela, não tendo a intenção de lhe causar danos;

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3. Abandono escolar: abandono do ensino básico obrigatório por crianças
e/ou jovens em idade escolar;
4. Maus tratos físicos: acção que não foi intencional do adulto mas que veio
a provocar danos físicos ou doenças na criança, ou que a poderá vir a colocar em grave
risco como consequência de alguma negligência;
5. Maus tratos psicológicos/abuso emocional: não se tem em consideração
as necessidades psicológicas da criança, principalmente as que têm a ver com as
relações interpessoais e com a auto-estima;
6. Abuso sexual: utilização de um menor para satisfazer os desejos sexuais
de um adulto;
7. Prostituição infantil;
8. Pornografia infantil: é designada por qualquer representação de uma
criança no desempenho de actividades sexuais explícitas reais ou simuladas ou qualquer
representação dos órgãos sexuais de uma criança para fins predominantemente sexuais;
9. Exploração do trabalho infantil: de forma a obter benefícios económicos,
a criança/jovem é obrigada à realização de trabalhos que excedem os limites do habitual
que deveriam ser realizados por adultos e que interferem na sua vida escolar;
10. Exercício abusivo de autoridade: uso abusivo do poder paternal em
detrimento dos direitos e protecção da criança/jovem;
11. Mendicidade: por vezes é utilizada para mendigar, ou é a criança que
exerce a mendicidade por sua própria iniciativa;
12. Exposição a modelos de comportamento desviante: por vezes as condutas
do adulto, mesmo não sendo intencionais, provocam nas crianças padrões de conduta
anti-sociais ou desviantes bem como perturbações do desenvolvimento;
13. Corrupção de menores: as condutas no adulto que promovem na
criança/jovem condutas anti-sociais e desviantes como a agressividade, apropriação
indevida, sexualidade e tráfico ou consumo de drogas;
14. Prática de facto qualificado como crime por criança/jovem com idade
igual ou inferior a 12 anos;
15. Uso de estupefacientes;
16. Ingestão de bebidas alcoólicas;
17. Problemas de saúde;
18. Outras situações de perigo.

(Tipologia das situações de perigo para a criança/jovem – material cedido pela Docente da Disciplina)

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4. Abordagem dos factores de protecção

4.1 - Definição dos factores de protecção

Assim como os factores de risco, também os factores de protecção podem ser


considerados em contexto familiar, individualmente e no grupo de pares e em contexto
social.
Como factores de protecção familiares podemos verificar a coesão familiar, a
criação de oportunidades para o envolvimento da família, a supervisão parental, o clima
afectivo da família e a cordialidade nas relações parentais. Existem também autores que
apontam cinco grandes categorias de factores de protecção familiares como: as relações
pais-filhos apoiantes, próximas e mutuamente reforçadoras; métodos de disciplina
positivos; monitorização e supervisão das actividades da criança fora de casa;
envolvimento da família e fomento do envolvimento da criança fora de casa e procura
de informação e suporte para benefício das crianças.
No que concerne aos factores de protecção individual ou de pares temos as
competências sociais ajustadas, as competências sociais de coping, um temperamento
ou orientação social positiva e apresentar um sentido bem construído de auto-eficácia e
a capacidade de adaptação às mudanças.
Quanto aos factores de protecção na sociedade podemos considerar a existência
de oportunidades e o reforço para o envolvimento na comunidade de um sistema de
apoio externo positivo, com recursos formais e informais de que a família se possa
socorrer, e a criação de normas e padrões anti-drogas. (Melo, 2004, pp. 22-24)
Segundo Rutter (1990, cit. por Anaut, 2005, p.51) “os factores de protecção
modificam a reacção à situação que apresenta o risco, ao reduzir o efeito do risco e as
reacções negativas em cadeia. Assim, as investigações sobre os factores de protecção
mostram que a protecção resulta por um lado de variáveis genéticas e constitucionais,
das disposições e características da personalidade, dos suportes do meio (familiar e
extrafamiliar) mas também da disponibilidade, da acessibilidade e da qualidade dos
suportes sociais”.
Desta forma, podemos considerar os factores de protecção como as
características individuais e ambientais que melhoram ou potenciam a resposta positiva
do indivíduo a factores de risco ou situações de vida stressantes.

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4.2 - Os três pólos da protecção

Segundo a European Agency for Development in Special Needs Education


(2005, p.18), considera que Simeonsson (1994) “prevê três pólos de protecção, sendo
eles:
1. A prevenção primária: que tem por objectivo reduzir o número de novos
casos identificados de uma determinada condição ou problema na população
(incidência). A prevenção primária inclui medidas de prevenção das alterações ou
circunstâncias que podem conduzir a incapacidades (WHO, 1980). De acordo com
outros autores a prevenção primária refere-se a “intervenções que ocorrem antes do
começo de uma alteração”. Sendo que estas acções podem ser: a) universais, como as
medidas de saúde dirigidas a todas as crianças e famílias, por exemplo, programas de
imunização para toda a população; b) selectivas, dirigidas a uma determinada
população, por exemplo, grupos de risco; c) indicadas para uma população, por
exemplo, indivíduos com um risco identificado;
2. A prevenção secundária tem por objectivo reduzir o número de casos
existentes, identificados com um determinado problema, actuando após o seu
aparecimento, mas antes de estar totalmente desenvolvido (prevalência).
3. A prevenção terciária: tem por objectivo reduzir as complicações
associadas a problemas ou a condições identificadas, limitar ou reduzir os efeitos de
uma alteração ou incapacidade, actuando quando estes já estão instalados”.

Podemos encontrar três níveis, nas principais variáveis que favorecem a


protecção dos sujeitos resilientes: o individual; o familiar e o extrafamiliar.
Considerando como factores de protecção individuais: o “Temperamento activo,
afável, bom carácter (amabilidade); Género: ser rapariga, antes da adolescência, ou
rapaz, durante a adolescência; Idade (juventude); QI elevado, ou bom nível de
capacidades cognitivas; Sentimento de auto-eficácia e de auto-estima; Competências
sociais; Consciência das relações interpessoais (próximo da inteligência social);
Sentimentos de empatia; Locus de controlo interno; Humor; Atraente para os outros
(charme, carisma) ”
Como factores de protecção familiares são considerados: “Pais calorosos e apoio
paterno; Boas relações pais/filhos; Harmonia parental (compreensão) ”.
E como factores extrafamiliares temos “rede de apoio social (avós, pares) e as
experiências de êxito escolar. ” (Garmezy e Masten,1991, cit. por Anaut, 2005, p. 52)

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5 - A perspectiva sistémica e ecológica

A abordagem da Intervenção Precoce, no âmbito de uma perspectiva sistémica e


ecológica, surge a partir do trabalho de Bronfenbrenner (1979). O modelo sistémico é
visto como um processo dinâmico no qual os indivíduos interagem directa ou
indirectamente com todos os contextos, (re) estruturando-os e criando-se deste modo,
reacções contínuas em todos os sistemas. Segundo Breia, Almeida e Côloa (2004, p.33),
“a Intervenção Precoce é, nesta perspectiva vista como o resultado de relações que se
estabelecem entre indivíduos e destes com os seus contextos. Uma perspectiva que
assume que a situação da criança e da respectiva família estão dependentes dos
contextos em que interagem e decorrem das trocas que se estabelecem no “ambiente
ecológico””. Sendo este “ambiente ecológico” entendido como um conjunto de
sistemas, mais ou menos próximos da criança, que estabelecem interacções entre si.
Em 1998, Bronfenbrenner actualiza o seu conceito de ecologia do
desenvolvimento humano, ao qual acrescenta “ao longo do curso da vida”, ou seja, este
autor defende que as mudanças nas características humanas se realizam ao longo de
todo o percurso da vida, uma vez que se encontra em constante desenvolvimento através
das propriedades da pessoa e do ambiente que interagem com o intuito de produzir a
estabilidade e mudança, visto que no Desenvolvimento Humano tudo é dinâmico e
capaz de ser mudado por parte do indivíduo em todos os aspectos, alterando ou
reforçando a sua maneira de ser. Mesmo na fase adulta, isso é possível acontecer de
igual modo, uma vez que está em condições de se alterar profundamente, por isso ele
defende que essa mudança pode ser realizada ao longo da vida. Desta forma, segundo
Breia, Almeida e Côloa (2004, p.34), o autor defende que o desenvolvimento vai
depender de quatros componentes e das suas interrelacções:
a) Processo – interacções que a criança estabelece com os elementos dos
contextos;
b) Pessoa – características da criança que facilitam as interacções;
c) Contexto – características dos contextos que influenciam a criança em
desenvolvimento;
d) Tempo – a sequência temporal em que as interacções se processam.

Nesta perspectiva é necessário ter em atenção a variedade de contextos em que a


criança e a família se encontram inseridos e desenvolvem as suas rotinas diárias, uma

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vez que estas diferem de criança para criança, de família para família e, por vezes, numa
mesma família de momento para momento.

5.1 - Níveis do sistema ecológico

Os níveis do sistema ecológico que Bronfenbrenner considerou dividem-se num


conjunto de quatro complexos meios ecológicos: o micro; o meso; o exo e o
macrossistema.
Assim podemos entender como microssistema os “contextos que estão mais
próximos da criança, incluindo as interacções que a mesma aí estabelece (família,
escola, casa dos avós, etc.)” (Colôa, 2004, p.34). Sendo neste ecossistema onde as
crianças passam mais tempo. Contudo, há algumas crianças que passam também tempo
noutros espaços como amas, jardins-de-infância, hospitais e clínicas que são aquelas
crianças que se encontram mais fragilizadas ou com incapacidades. Outros espaços que
podemos considerar como menos envolventes, mas que influenciam e são importantes
na vida da criança e da família, são a igreja, locais de vizinhança.
Segundo Carvalho (2002, p..5), sabendo que as crianças passam o seu tempo
numa vasta gama de microssistemas, isso exige diversas competências aos profissionais
de I.P., tais como:
a) Compreender a influência do ambiente no comportamento;
b) Estar familiarizado com a ordem dos ambientes típicos e suas
características;
c) Trabalhar com adultos em múltiplos ambientes para avaliar as suas
necessidades e, quando necessário, fazer modificações nesses ambientes;
d) Ajudar as crianças a adaptarem-se às exigências dos ambientes.

Relativamente ao mesossistema, considera-se a interacção ente os elementos do


microssistema que a criança faz parte num determinado momento da sua vida. Este
ecossistema é representado pelas interacções entre dois ou mais contextos, onde o
indivíduo participa activamente. Nestas interacções podemos “considerar a relação entre
o domicílio e serviços comunitários, relações entre os pais e o professor ou interacções
de profissionais com outros profissionais”, sendo que estas interacções nos subsistemas
exercem influências imediatas no desenvolvimento da criança. Estas influências
verificam-se à medida que vão negociando as suas trocas, quer nas rotinas diárias, quer
nos seus ambientes ou na comunidade. (Carvalho, 2002, pp.5-6)

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O exossistema diz respeito a estruturas sociais cujos componentes, embora sejam
mais distantes da criança, têm impacto directo no meso e microssistemas. Exemplos
disso são os locais de trabalho dos pais, a rede de amigos dos pais, organizações
comunitárias ou religiosas, etc. E é neste nível que podemos enquadrar os serviços de
I.P..
Assim, segundo Carvalho (2002, p.6), do ponto de vista de Bailey & Wolery
(1992) existem quatro competências relacionadas com o trabalho neste nível, por parte
dos profissionais de I.P.:
a) Ter em conta as características e variedade dos diferentes programas e
serviços;
b) Prestar serviços adequados aos casos;
c) Reconhecer e usar sistemas de suporte informais;
d) Envolver as famílias nas decisões sobre as práticas do programa.

Relativamente ao macrossistema este enquadra todos os outros ecossistemas e


pode ser definido como o conjunto das crenças, atitudes, valores, ideologias e aspectos
normativos de determinada cultura ou subcultura específica.
Segundo Carvalho (2004, p.7) para que se possa tratar um problema será
necessário uma compreensão alargada de:
- factores dos sistemas que para ele contribuíram;
- probabilidades do sistema para dar suporte às alterações desejadas;
- potenciais “efeitos paralelos” de uma intervenção em outros aspectos do
sistema.

Assim, por perspectiva ecológica, verifica-se uma dialéctica constante entre


sistemas, num desenvolvimento renovador constante, visto que existe uma
interdependência dinâmica, e que qualquer mudança em qualquer dos sistemas se pode
repercutir, directa ou indirectamente, noutros sistemas. Deste modo, as mudanças que
ocorrem em qualquer sistema são o resultado de mudanças das condições de
determinado ambiente, das condições dos indivíduos, por referência a esse ambiente ou
da interacção entre ambos. Deste modo, interessa, sobretudo, reconhecer e analisar as
causas dessas mudanças. (Colôa, 2003)

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6 - O sistema de serviços de Intervenção Precoce numa

Perspectiva Ecológica

Ao longo do tempo a intervenção optou por se centrar nos espaços que são mais
próximos da criança, não dando tanta importância ao impacto dos sistemas mais formais
e organizados. Porém, com o passar do tempo tem-se verificado que por vezes o
problema não se encontra tanto centrado na família, mas sim na forma como ele foi
construído e percepcionado socialmente. Desta forma, cabe aos prestadores de serviços
diminuir esta dificuldade da pressão criada por parte dos sistemas e maximizar o apoio.
Assim, podemos verificar que o ambiente envolvente tem grande influência nos
comportamentos, pensamentos, e sentimentos, acabando por influenciar o tipo de
comportamentos e tornando-os mais ou menos adequados. Para uma intervenção eficaz
é necessário compreender a relação e reconhecer em que medida pode ser alterada de
forma a se estabelecerem expectativas realísticas para a mudança.

6.1 - Factores ligados ao microssistema

Neste nível é necessário avaliarem-se os aspectos críticos do microssistema, de


modo a se poder facilitar a mudança necessária ou desejada. Para isso o profissional
necessita de avaliar o próprio ambiente, ou documentar as necessidades no seio do
ambiente. Esta avaliação tem como primordial objectivo a recolha de informação para a
realização da modificação desse ambiente, de forma a poder responder às necessidades
e prioridades da família.

6.2 - Factores ligados ao mesossistema

Neste ecossistema podemos referir as relações entre os membros da família e os


vários elementos/profissionais dos sistemas formais de apoio. Nesta situação os técnicos
de apoio têm de ter em atenção a forma como transmitem as informações à família em
que estão a intervir, uma vez que não devem adoptar uma postura com mensagens
negativas. Por vezes, encontram-se as famílias descontentes com estes profissionais
uma vez que não são tratadas da melhor forma e por discordarem das suas
recomendações.
Neste nível do mesossistema, segundo Baylei e Wolery (1992) cit. por Carvalho
(2004, p.11), os técnicos deverão ser capazes de:
a) Reconhecer potenciais problemas na comunicação com os pais ou outros
profissionais;
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b) Estabelecer ligações dentro e através dos sistemas;
c) Servir, efectivamente, como um membro da equipa;
d) Facilitar a participação das famílias nas equipas, e na tomada de
decisões;
e) Assegurar que as transições ecológicas sejam efectivas.

6.3 - Factores ligados ao exossistema

Como factores deste ecossistema podemos ver os contextos culturais, políticos e


legais que influenciam os suportes formais que funcionam dentro de um dado sistema.

6.4 - Factores ligados ao macrossistema

Os factores culturais, sociais e económicos exercem influência na vida familiar,


podendo apresentar um profundo impacto na vida das famílias. Uma outra dificuldade
com que nos podemos deparar é o preconceito cultural, uma vez que a maior parte dos
programas é baseada num conjunto de valores que por vezes não correspondem aos da
família na qual se está a intervir. Deste modo, é muito arriscado se os prestadores de
cuidados não tiverem a capacidade de reconhecer essas diferenças e, continuarem a
obrigar as famílias a adoptá-los, o que poderá conduzir a intervenção ao fracasso.
Bailey e Wolery (1992) cit. por Carvalho (2004) descrevem as competências
relacionadas com o trabalho ao nível do macrossistema:
a) Conhecer a legislação em vigor e a sua lógica;
b) Reconhecer a filosofia da I.P.;
c) Resolver dilemas éticos;
d) Servir como um “defensor” de serviços adequados e de grande qualidade
para as crianças e as famílias.

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7 – Apresentação do Caso

O caso que vamos apresentar de seguida diz respeito a uma família que tem à
sua responsabilidade quatro filhos menores. Primeiramente, iremos abordar um pouco
da história da família para que se possam compreender as problemáticas que a ela se
encontram associadas. Durante a apresentação do caso, mudaremos o nome das crianças
e respectivos familiares, e outros dados passíveis de identificar a família, tal como nos
foi solicitado.

Caracterização das crianças


Nome: “Afonso”
Data de Nascimento: 22/04/1998
Idade: 10
Nacionalidade: Portuguesa
Profissão / Ocupação: estudante

Nome: “Ricardo”
Data de Nascimento: 15/06/1999
Idade: 8
Nacionalidade: Portuguesa
Profissão / Ocupação: estudante

Nome: “Sara”
Data de Nascimento: 06/06/2005
Idade: 2
Nacionalidade: Portuguesa

Nome: “Rita”
Data de Nascimento: 06/06/2005
Idade: 2
Nacionalidade: Portuguesa

Composição do Agregado Familiar

Parentesco Idade Estado Civil Profissão


Avô Materno ----- Casado
Avó Materna ----- Casada Reformada
“João” (pai) 38 Casado Construção Civil
“Rute” (mãe) 31 Casada Doméstica
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Caracterização das condições de vida da família

Indicadores relevantes

Situação económica e profissional do agregado familiar:


O pai inicialmente trabalhava na construção civil, mas entretanto ficou
desempregado. A mãe realiza alguns trabalhos de campo como jornaleira.
A Avó encontra-se reformada. Família viveu sempre em situação de pobreza.

Problemáticas que mais se evidenciam no agregado familiar:


Os avôs maternos viveram sempre em situação de pobreza, crescendo numa
pequena localidade rural do litoral/interior. (microssistema / factor de risco – situação
económica)
A Rute, filha mais nova do casal, resolve abandonar a escola precocemente de
modo a poder ajudar os pais nos trabalhos. Mais tarde, conhece o Sr. João e, pouco
tempo depois resolvem morar juntos, optando por ir para outra localidade com o intuito
de trabalhar. Algum tempo depois resolvem regressar e, são pressionados pela família,
para oficializar a sua relação através do casamento. (mesossistema / factor de risco –
pressionados a casar devido ao pensamento dos vizinhos) Este tinha um emprego na
área da construção civil, apresentando alguma instabilidade. (mesossistema / factor de
risco – instabilidade no emprego) O casal resolve ir morar com os pais da D. Rute,
começando a surgir aqui algumas dificuldades no casal. Passa a haver dificuldades na
sua relação, momentos de violência verbal e física associada, agravados pelo consumo
de álcool. (microssistema / factor de risco – relação conjugal conflituosa) Esta situação
de violência era apenas do conhecimento da avó, contudo por questões culturais foi-se
mantendo esta relação conjugal, devido ao receio do impacto social do divórcio.
(mesossistema / factor de risco – não optam pelo divórcio mesmo a situação não sendo
boa, devido ao impacto social) Este insucesso causado pelo Sr. João contribui para que
a família crie uma imagem negativa a seu respeito, por não se autonomizar e garantir a
estabilidade para a família. (microssistema / factor de risco - perca de trabalho ou
emprego esporádico por parte do pai) Depois surgiu o nascimento do primeiro filho por
vontade do Sr. João, contudo apesar do desejo da esposa em ser mãe, não se sentia
completamente segura do facto de desejar um filho do marido dada a sua instabilidade
financeira. (microssistema / factor de risco – situação financeira instável) Também, a
segunda e a terceira gravidez surgiram devido à vontade expressa do Sr. João. Apesar da
terceira gravidez ter sido considerada de risco e ter sido mesmo aconselhada a abortar,
ela recusou esse pedido.

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Antes de se iniciar o encaminhamento pelo CAFAP, os dois rapazes foram
retirados à família e foram acolhidos num lar, sendo-lhes permitido que fossem a casa
durante o fim-de-semana, por um período de tempo. (exossistema / factor de protecção
– retirada dos menores para um Lar). Nesse intervalo de tempo, registaram-se
indicadores de abuso sexual do menor mais velho e uma lesão na cara do outro, por
mordidela de um cão. (microssistema / factor de risco – abuso sexual do menor) Os
técnicos suspeitavam que fosse o pai o responsável pelo sucedido, e a família acusava a
instituição de acolhimento. Após o episódio ocorrido com o menor também as duas
meninas foram retiradas. (exossistema / factor de protecção – retirar as meninas
menores de casa para uma instituição de Acolhimento)
A família contratou um advogado para solicitar o regresso dos menores.
Contudo, os técnicos alegavam que ainda não estavam reunidas as condições, apesar de
terem ocorrido algumas melhorias no ambiente doméstico. (microssistema / factor de
protecção – mudanças no lar para o regresso dos menores)
Relacionamento interpessoal com adultos e pares:
Todos os adultos (mãe e avós) verbalizam e expressam bastante afecto positivo
pelas crianças, podendo-se confirmar a existência de laços afectivos muito fortes na
família, e uma grande cumplicidade, principalmente, entre os menores e a mãe.
(microssistema / factor de protecção – relação afectiva dos menores com a mãe que era
bastante positiva, e relação afectuosa por parte dos avós) A relação estabelecida entre os
menores e a mãe era claramente diferenciada dos restantes adultos, revelando indícios
de uma vinculação segura. (microssistema / factor de protecção – boa vinculação
estabelecida com a mãe)
Motivos de intervenção:
No período da última gravidez da mãe, tiveram bastantes dificuldades
financeiras, que foram apenas suportáveis com o apoio dos avós, e sendo também
beneficiários de Rendimento Social de Inserção até à obtenção de emprego por parte do
pai. (macrossistema / factor de protecção – obtenção do rendimento mínimo) Foi através
deste apoio que a família teve contacto com os serviços sociais que deram à abertura de
processo de promoção e prevenção. Estando envolvidas neste caso, uma Técnica da
Segurança Social, da equipa Multidisciplinar de Apoio aos Tribunais e por uma técnica
de serviço social de um núcleo local da segurança social. (macrossistema / factor de
protecção – colaboração entre os vários serviços de modo a melhorar as necessidades
sentidas pela família) Sendo depois a família encaminhada por estas duas responsáveis
para o CAFAP (Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental), de modo a que
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este interviesse para realizar o processo de mudança caso se verificassem condições
para tal. (exossistema/ factor de protecção – parceria para melhorar as condições) Uma
vez que duvidam das capacidades dos adultos para assegurarem as condições
necessárias dos menores, visto que tinham identificado perigos no espaço doméstico
físico e apresentavam diversos sinais de negligência e desorganização familiar, como: a)
habitações com condições de higiene e limpeza deficitárias (os mesmos espaços eram
usados para dormir, cozinhar e comer, encontrando-se sobrelotados), b) objectos
perigosos ao alcance fácil das crianças (alfaias e produtos agrícolas) e zonas perigosas
(como ribanceiras desprotegidas), c) alimentação inadequada e/ou inconsciente
(ausência de produtos básicos em casa como leite para as crianças; antes do ano de
idade das gémeas a mãe fornecia leite inteiro pasteurizado ao invés de requisitar o leite
em pó fornecido, gratuitamente, pelo centro de saúde; as crianças comiam o que
queriam desregradamente, como por exemplo bolachas, sem rotinas estabelecidas para
refeições; d) cuidados inadequados com a higiene, saúde e vestuário (as crianças eram
expostas ao frio; apresentavam sinais de sujidade e maus cheiros; a casa não dispunha
de condições físicas para a realização dos cuidados de higiene pessoal; a meio do dia as
crianças andavam de pijama a brincar no quintal; tinham verificado episódio s de
infestação por parasitas intestinais; e) desorganização familiar. (Melo & Alarcão, 2008,
p.143) (microssistema / factor de risco – negligência nas condições de habitação,
higiene e segurança dos menores)
Uma vez que o processo já se arrastava há algum tempo e devido à idade dos
menores, foi por isso solicitado o acompanhamento do CAFAP, para avaliar as
possibilidades de intervenção com a família e sua capacidade de garantir condições para
a segurança e um adequado desenvolvimento das crianças e informar o tribunal do
resultado, para facilitar a tomada de decisão acerca da manutenção ou alteração das
medidas de promoção e protecção aplicadas. (Ibid., p.144). (macrossistema/ factor de
protecção – inserção da equipa para avaliar e modificar as necessidades da família)
Depois do conhecimento do caso por parte do CAFAP, foi a vez de começarem a
realizar o acolhimento com a família. A família manifestou vontade de ver as crianças
regressarem a casa, verbalizando interesse e disponibilidade para fazer o que fosse
necessário. (microssistema/ factor de protecção – vontade de verem as crianças a
regressar e vontade de modificar o que fosse necessário para que tal acontecesse)
Demonstraram que até ao momento não compreendiam o que lhes faltava fazer para que
as crianças regressassem, mencionando que os técnicos apenas lhes referiam que não
tinham ainda “condições” e que apontavam aspectos que consideravam poder acontecer

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em qualquer família. Demonstraram algum desconforto com as deslocações dos
técnicos a casa, uma vez que se deslocavam em horas em que realmente não se
conseguiam ter as coisas organizadas e sentiam-se invadidos no seu espaço pelos
técnicos (uma vez que não aguardavam autorização para entrarem). (macrossistema /
factor de risco – falta de explicação por parte dos técnicos sobre o sucedido e um tipo de
relacionamento distante não envolvendo e cativando a família) Verificou-se uma grande
tristeza por parte da mãe por não ter os seus filhos em casa. (microssistema/ factor de
protecção – a relação eu a mãe tem com os seus filhos que lhe causa tristeza no seu
afastamento)
A equipa procurou sublinhar e valorizar o sofrimento que se sentia na família e o
seu desejo de que a situação mudasse, procurando mostrar compreensão pelos
sentimentos negativos que decorriam da demora nas mudanças e manutenção das
crianças em situação de acolhimento. (Ibid. p.147) Assim a equipa disponibilizou-se
para ajudar a família a perceber o que tinha que ser alterado para que as crianças
pudessem regressar, referindo a necessária articulação com os técnicos encaminhadores
e o tribunal. (Ibidem). (exossistema / factor de protecção – equipa próxima que sabe
ouvir a família e pretende apoiá-la no que ela deixar, sem invadir demasiado e não
criticando a situação)
Posteriormente, ao acordo realizado entre o CAFAP e a família em prestar a
ajuda necessária começaram a ser realizadas várias sessões para se poder avaliar a
situação familiar e poder intervir-se adequadamente neste caso específico. Conhecendo
a sua verdadeira realidade e ajustando as estratégias num processo individualizado, de
modo a ser planificado tendo em conta os desejos e prioridades da família relativamente
aos seus filhos e à família no seu conjunto (Colôa, 2004, p.48). Deste modo, “esta
intervenção centrada na família, pretende facilitar as condições necessárias para que o
sistema familiar reforce as suas capacidades, de modo a acompanhar, com eficácia, as
várias etapas do desenvolvimento da criança”. (Ibid., p.49)
Apesar de todos os elementos terem aceitado a ajuda prestada pelo CAFAP, o
pai foi o único que não demonstrou muito interesse e não aceitou o acordo. (exossistema
/ factor de protecção – acordo da equipa com a família de modo a melhorar as
condições) Este acabou por sair uns dias antes de casa, mas os restantes familiares não
queriam referir esta situação com medo de prejudicar o apoio que iria ser realizado para
trazer de volta os filhos. A mãe demonstrou-se renitente ao regresso do marido a casa,
referindo que assim teria mais tranquilidade e disponibilidade para cuidar dos filhos,
contando com o apoio dos seus pais e que apenas os quer de volta em casa para se poder

20
dedicar a eles e ser feliz, afirmando mesmo o desejo de divórcio. (microssistema / factor
de protecção – divórcio que lhe causa mais tranquilidade, disponibilidade e confiança
para estar com os seus filhos) Ao longo do processo foram sempre proporcionando mais
momentos de interacção com a mãe para que ela se pudesse sobressair de modo a
reforçar e valorizar os pequenos momentos de competência percebidos e os esforços da
família. (microssistema / factor de protecção – valorizar-se a importância da mãe e as
suas competências para ser boa prestadora de cuidados) Valorizou-se a vontade de
aprendizagem sentida pela mãe e afirmou ser natural desconhecer um conjunto de
aspectos e procedimentos que, nos dias correntes, se consideravam importantes, uma
vez que nunca fizeram parte do dia-a-dia da família. (Melo & Alarcão, 2008, p.150) A
equipa procurava sempre utilizar termos que fossem conhecidos para a família,
principalmente para a mãe e avó, que apresentavam um vocabulário mais restrito.
(exossistema / factor de protecção – equipa que se pretende aproximar da família para
que esta compreenda as situações) As sessões individuais com a mãe permitiram dar-lhe
um maior destaque, valorizá-la e dar-lhe algum poder permitindo-lhe afirmar-se na
família no seu papel de prestadora de cuidados primários às crianças. É possível que a
falta de escolaridade da mãe, o facto de não saber ler, nem escrever e, de possuir um
vocabulário reduzido tenham contribuído para a colocar numa posição de inferioridade
na família. (Ibidem, p. 151) (microssistema / factor de risco – baixo nível de instrução
da mãe)
Mediante as dúvidas que a família ainda revelava devido aos motivos que
levaram à retirada das crianças e a incerteza do que tinham de realizar doravante, a
equipa agendou uma reunião com a família e a técnica do serviço local da segurança
social. Revelou-se neste encontro algum desconforto entre ambas as partes, uma vez que
a técnica se centrava no passado e na narração de situações problemáticas.
(mesossistema / factor de risco – a técnica apenas referência os aspectos negativos da
família, não lhes despertando as suas competências e o que podem vir a melhorar) Deste
modo, a equipa solicitou que agora apenas se centrassem no futuro e expusessem as
mudanças que seriam necessárias realizar. Assim referiram que era necessário e
importante que a família garantisse a supervisão das crianças, uma alimentação
adequada, bem como cuidados de higiene e saúde, o estabelecimento de regras e rotinas,
para além de garantir as condições de higiene e segurança de habitação e a
autonomização da mãe em termos de procura de emprego e/ou formação.
(macrossistema / factor de protecção – dar a conhecer à família os aspectos que devem
ter em consideração para melhorar o ambiente familiar e proporcionar o regresso dos

21
menores.)
A mãe também demonstrou algum desconhecimento na forma como era gerido o
dia-a-dia dos filhos no lar e, a preocupação com o seu bem-estar. Assim foi agendada
uma reunião com a Directora técnica do lar de modo a dar a conhecer essa realidade à
família, e partilhou ao mesmo tempo o que era necessário para garantir as crianças em
casa. (macrossistema / factor de risco – retirada dos menores do lar; factor de protecção
mediante a situação que estavam a vivenciar na altura e, onde agora a equipa dá a
conhecer o dia-a-dia dos filhos no Lar)
A equipa continuou com o processo de avaliação da família em sessões ao
domicílio, onde se pôde constatar a preocupação da mãe e avó em melhorarem os
aspectos da habitação. (microssistema / factor de protecção – reorganização das
condições habitacionais para o regresso das crianças) Com o dinheiro que ia recebendo
das jornadas de trabalho no campo foi adquirindo algumas mobílias adicionais para a
família, que esta foi restaurando e adaptando. Com o decorrer do processo a família
alertou ao CAFAP que o pai tinha sido preso por ilegalidades que tinha realizado no
passado, mostrando a mãe um certo alívio e sentindo-se desta forma mais segura,
estando a efectuar as diligências para o processo de divórcio.
O processo de avaliação estendeu-se para além do tempo que estava previsto
devido à complexidade da problemática. Depois passou a ser importante considerar a
qualidade da relação com os menores e da prestação de cuidados dos mesmos. Então foi
concedido pelo tribunal que a equipa levasse as crianças uma vez por semana, ao final
da tarde, levando-as de volta aos contextos de acolhimento depois do jantar.
(macrossistema / factor de protecção – o tribunal permitir a visita dos menores a casa
por períodos de tempo, para se avaliar a sua relação com os restantes familiares) Estas
sessões serviram para trabalhar com a família o treino de competências familiares.
Orientando-os para as melhores situações de protecção e cuidado com as crianças de
modo a que estivessem mais seguras, decidissem as tarefas domésticas que tinham de
ser realizadas, de modo a não ficar só a mãe sobrecarregada, criassem relações mais
próximas e se valorizassem uns aos outros. (microssistema / factor de protecção – a
equipa encorajar e capacitar a família para a progressiva autonomização na gestão dos
seus problemas) Para que se orientassem melhor com o que deveriam fazer desde que as
crianças chegavam, até ao momento de irem embora, foi proposto a criação de uma lista
de regras e de cada uma das tarefas a executar. Com tudo isto foram-se registando
melhorias significativas em todos os objectivos definidos com a família. Nos momentos
de reflexão, a família parecia capaz de reflectir sobre o processo de mudança, identificar

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as mudanças ocorridas em determinadas áreas e propor estratégias para a resolução de
problemas e ultrapassar de dificuldades (Ibid., p.158)
Ao longo das sessões procuraram trazer-se outras vozes para narrar e
documentar as mudanças da família, solicitando-se que a família partilhasse as
percepções dos outros familiares acerca das mudanças efectuadas. Foram vários os
momentos em que a família alargada as reforçou e notou. (Ibidem) (mesossistema /
factor de protecção – opinião sobre os restantes familiares e pessoas que conheciam
anteriormente a família para poderem verificar as melhorias que passaram a existir.)
Também as crianças foram elogiando os próprios progressos e afirmando que
“agora está diferente” e “melhor”. (microssistema / factor de protecção – os menores
reconheciam as alterações realizadas na família e estavam mais felizes)
Apesar das dificuldades que existam ou que possam surgir, nos momentos de
visita à família, a equipa sente estar na presença de uma família feliz. Foi sugerido aos
técnicos encaminhadores que efectuassem uma visita à família, considerando que seria
importante para esta apresentar o reforço do seu esforço. Estas visitas contribuíram para
validar o fortalecimento de uma família que apresentava muitos recursos dispersos e
adormecidos, à espera de serem activados. (Ibid., p.159) (exossistema / factor de
protecção – reconhecimento por parte dos técnicos anteriores que a família tinha
melhorado e que só precisava de alguns apoios para despertar todo o carinho, atenção e
cuidados que deveria ter para com os menores)
Entidades/pessoas responsáveis pela sinalização da situação de perigo
Estando envolvidas neste caso, uma Técnica da Segurança Social, da equipa
Multidisciplinar de Apoio aos Tribunais e por uma técnica de serviço social de um
núcleo local da segurança social.
CAFAP
Medidas de Protecção
Capacidade de garantir condições para a segurança e um adequado
desenvolvimento das crianças
Deste modo, esta intervenção centrada na família, pretende facilitar as condições
necessárias para que o sistema familiar reforce as suas capacidades, de modo a
acompanhar, com eficácia, as várias etapas do desenvolvimento da criança.
Estas sessões serviram para trabalhar com a família o treino de competências
familiares e de criar na família melhores condições para que os seus filhos regressassem
a casa sem correr perigo.

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Conclusão

Como conclusão deste trabalho, gostaríamos de destacar a importância que o


mesmo teve para nós na questão de consolidar os conteúdos abordados nas sessões. As
pesquisas que fomos efectuando tiveram como intuito o aprofundamento de
conhecimentos bem como a revisão de literatura. Apesar de a bibliografia consultada ser
pouco extensiva, havendo muito mais para se explorar nesta temática, o presente
trabalho permite tomar conhecimento da importância da Intervenção Precoce e todo o
processo que a ela se encontra associado na ajuda e prevenção de situações de risco nas
famílias.
Podemos dizer que para a realização deste trabalho bem como na recolha de
dados sobre a problemática da família pudemos contar com o apoio e o facultamento
dos dados por parte do CAFAP, em especial, a Psicóloga responsável Ana Melo. A
facilidade de obtenção destes dados deve-se ao facto de participar como voluntária há já
algum tempo nesta mesma instituição e ter também realizado alguns trabalhos em
conjunto com a mesma. Tendo em conta os dados apresentados e a pesquisa efectuada
temos a noção que ainda muito haveria para explorar e referenciar sobre esta temática.
Este trabalho fez com que pudessemos percepcionar melhor o trabalho destes
técnicos e as atitudes e comportamentos que devem ser apresentados perante famílias
que se encontram em situações semelhantes às da família apresentada, de modo a
poderem ganhar a sua confiança, se sentirem seguros e colaborarem de forma a
melhorar os seus relacionamentos. Tendo em conta que cada família é um caso, deve ser
estudada profundamente a sua problemática em diferentes contextos, aplicando-lhe
posteriormente a melhor solução.
Desta forma, é necessário intervir na família e proporcionar-lhe as aprendizagens
de modo a que possam evoluir nos seus relacionamentos e incentivar os aspectos
positivos que ainda têm para que funcionem como membros capazes de ultrapassar as
dificuldades da melhor forma.
Tal como nos refere Fernandes (1992), “a família não poderá viver sem o amor,
a união, o diálogo, a compreensão, o respeito, a aceitação, o carinho, a ternura, o
perdão, a amizade, a escuta, a ajuda, a partilha… só assim é possível existir uma família
bem edificada e resistente”.

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Referências Bibliográficas

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Editores. Lisboa. (2005)

BAIRRÃO, Joaquim. “Intervenção precoce: Mayday Mayday”. Jornal de Letras


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MELO, Ana. “Em busca do Tesouro das Famílias”. GAF – Gabinete de


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MELO, Ana, ALARCÃO, Madalena. “As Forças dos Profissionais e os Talentos


das Família na Protecção da Criança. Desenvolvimento e Avaliação de um Modelos de
Avaliação e Intervenção Familiar Integrada em Situações de Risco para os CAFAP”.
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(2008) (Investigação no âmbito do Doutoramento em Psicologia Clínica)

SORIANO, Victoria. “Intervenção Precoce na Infância – Análise das Situações


na Europa”. European Agency for Development in Special Needs Education. (2005)

Legislação:

Despacho Conjunto n.º891/99

Sites consultados:

Imagens retiradas de CORBIS – http://www.corbis.com acedido em 10 de Abril


de 2008.

http://www.coloaip.educacao.te.pt/ - acedido em 8 de Abril

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