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Posição do artigo  2 fev 2017 Folha De S.Paulo


LAURA   CARVALHO  COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre
Schwartsman; quinta:  Laura   Carvalho ; sexta: João Manoel Pinho de Mello; sábado: Marcos Sawaya Jank;

Fatos alternativos
O que causou a deterioração fiscal no governo Dilma foi a alta menor das receitas, e não a gastança desenfreada

OS DADOS de mercado de trabalho recém­divulgados pelo IBGE confirmam a profundidade da crise econômica
que caracterizou o biênio 2015­2016: a taxa de desemprego, que ainda caía até o fim de 2014, quase dobrou em
dois anos. O número de desempregados já chega a 12,3 milhões de pessoas —1,3 milhão a mais do que toda a
população da Grécia.
Diante dos fatos, o slogan “não pense em crise, trabalhe” parece cada vez mais uma piada de mau gosto.
Para a maior parte dos brasileiros desempregados, pensar na crise nunca foi tão necessário e encontrar trabalho
nunca foi tão difícil.
Mas, se atribuir o problema ao excesso de brasileiros pessimistas e preguiçosos não convence, responsabilizar
o primeiro governo Dilma e a tal gastança desenfreada por todos os males vividos em 2015 e 2016 ainda
encontra eco em boa parte das análises econômicas de botequim —e dos grandes jornais.
O editorial desta desta quarta (1º) concluiu, por exemplo, que a crise é “um preço altíssimo a pagar (...) pela
ilusão de que seria possível basear uma política de pleno emprego na expansão contínua dos gastos do governo”.
Como mostram os dados apresentados no “Texto para Discussão” nº 2.132, de Sergio Gobetti e Rodrigo Orair,
do Ipea, as despesas do governo federal cresceram em termos reais a taxas acima do PIB nos últimos quatro
mandatos presidenciais: em média, 3,9% no segundo mandato de FHC; 5,2% e 4,9% nos dois mandatos de Lula
e 4,2% no primeiro mandato de Dilma, já contabilizando as “pedaladas”.
Dentro desse total, os gastos com funcionalismo tiveram sua menor expansão (0,2%) justamente no
primeiro mandato de Dilma Rousseff. Já o total das despesas com benefícios sociais, incluindo aposentadorias e
pensões do INSS, seguro­desemprego, Bolsa Família e outros benefícios, cresceu 5,2% no governo Dilma, ante
5,9% no segundo mandato de FHC, por exemplo.
Os investimentos públicos, que certamente fariam parte de qualquer plano que visasse o pleno emprego,
passaram de uma expansão de 21,4% no segundo governo Lula para uma queda de 0,5% no primeiro mandato
de Dilma.
O que causou a deterioração fiscal foi, portanto, o crescimento menor de receitas, que passou de 6,5% no
segundo mandato de FHC para 5,2% e 4,9% nos dois governos Lula e apenas 2,2% no primeiro mandato de
Dilma.
Concluído o ano eleitoral de 2014 —o único marcado por uma maior expansão de despesas—, o governo
federal passou a se dedicar a solucionar o problema de falta de arrecadação tributária por meio do corte de gastos
e investimentos públicos.
O que vimos desde então foi a escalada do desemprego e a queda do rendimento médio dos trabalhadores. A
redução no consumo e o endividamento crescente das famílias, por sua vez, fizeram os lucros das empresas —
também endividadas— e os investimentos privados despencar. Como não poderia deixar de ser em tal cenário, a
arrecadação tributária passou a sofrer quedas sucessivas, tornando o quadro fiscal muito mais grave do que
aquele que deu origem à estratégia.
Em meio aos muitos erros que marcaram o primeiro governo Dilma —das manobras fiscais às desonerações
tributárias pouco criteriosas e o represamento exagerado de tarifas—, a gastança desenfreada, enquanto política
de pleno emprego, nem sequer aparece na foto. Em vez dos “fatos alternativos” à la Donald Trump, mais carinho
com os dados ajudaria no diagnóstico da crise e na busca das melhores saídas.  LAURA   CARVALHO ,
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