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Ventriculomegalia – Protocolo de

Actuação Clínica (2ª versão)


APDPN
Protocolo elaborado por Nuno Montenegro & Teresa Loureiro, H.S.Joâo – F.M.Porto

Ventriculomegalia consiste na dilatação dos ventrículos cerebrais, independentemente da causa. O termo


Hidrocefalia é usado para casos de ventriculomegalias mais graves, cuja etiologia é habitualmente
obstructiva. A Ventriculomegalia é causada por malformações cranianas, cerebrais ou lesão destructiva; está
frequentemente associada a anomalias ou síndromes fetais, incluindo anomalias cromossómicas e infecções
e cursa com graus variáveis de morbilidade.

Critérios ecográficos
ƒ Medição do diâmetro transverso do atrio ventricular a nível do glomus do plexo coróide, colocando os
cursores na margem interna da parede do ventrículo (perpendicularmente ao seu eixo).
ƒ Os resultados de estudos efectuados no segundo trimestre mostram um valor médio do átrio de 7 mm e
um desvio standard de 1 mm. Os valores considerados normais no 3º trimestre são menos consensuais.
ƒ Um valor do diâmetro do átrio ventricular ≥ 10 mm (≥3 SD da média entre as 15 e 40 semanas) indica
um aumento do risco de malformações cerebrais e anomalias extracranianas.
ƒ Outros achados ecográficos úteis para diagnosticar ventriculomegalia são: separação do plexo coróide da
parede do ventrículo (separação ≥ 4mm); plexo coróide que baçoiça no ventrículo dilatado.

Definição

Ventriculomegalia ligeira: átrio ≥10 - 12 mm


Ventriculomegália moderada: átrio 12,1-15 mm
Ventriculomegalia grave: átrio > 15 mm
I. Ventriculomegália ligeira a moderada isolada (10-15 mm)

9 Prevalência: é incerta.

9 Patogénese: desconhecida; é provavelmente, na maioria dos casos, uma variante do normal (se após as 20
semanas, em feto do sexo masculino ou macrossómico, unilateral); mas noutros casos pode ser o único sinal
de anomalia fetal: Está associada a aneuploidias em 4% dos casos (habitualmente Trissomia 21)

9 Diagnóstico diferencial: excluir anomalias cerebrais complexas (ver quadro 1)

9 Orientação clínica:
1. Ecoanatomia detalhada (excluir outras malformações do SNC e extra-cerebrais). Devem utilizar-se
vários planos do cérebro fetal (axial, sagital e coronal), recorrendo se necessário à via TV. Realizar
uma avaliação detalhada de todo o tubo neural, visualização do corpo caloso, de ambos os
ventrículos e da fossa posterior / cerebelo.
2. Ecocardiografia fetal
3. Exclusão de infecções fetais (serologias maternas) – CMV (mais frequentemente associado),
toxoplasmose, rubéola
4. Pesquisa de infecções (PCR no LA); cariótipo < 24 semanas; ponderar > 24 semanas.
5. Exames ecográficos seriados, cada 4 semanas (avaliar desenvolvimento de macrocefalia,
agravamento da ventriculomegalia)
6. RMN cerebral (ponderar 1ª com IG ≥ 22 semanas; 2ª com IG ≥ 32 semanas)

9 Prognóstico: A evidência existente sugere que nos casos de ventriculomegalia isolada

1. Na maioria a evolução é normal,, apresentando um risco menor se:


- feto do sexo masculino (5% de mau desfecho, comparativamente com fetos do sexo feminino -
24%); unilateral; ventrículo ≤ 12 mm (93 % desenvolvimento nomal pós-natal, comparativamente
com 75% se ventrículo entre 12,1-14,9 mm); RMN normal no 3º trimestre
2.Mortalidade perinatal 3.7%
3. 4% dos casos apresentam anomalias do SNC
4. Associado a malformações não diagnosticadas ‘in utero’ em 8.6%
5. Atraso de desenvolvimento motor e cognitivo em 9-11.5%
6. Não há aumento do risco de recorrência
7. Pode haver resolução espontânea ‘in utero’ em 30%

II. Ventriculomegália grave isolada (>15 mm)

9 Prevalência: 0.3 a 1.5 por 1000 nascimentos. É uma doença heterogénea, podendo resultar de causas
genéticas (anomalias cromossómicas associadas em 11%), infecciosas (CMV, toxoplasmose, sífilis,
influenza), teratogénicas e neoplásicas. A Hidrocefalia ligada ao X constitui 5% dos casos.
9 Patogénese: a maioria resulta de causa obstructiva
9 Risco de recorrência: 4%; os casos de hidrocefalia ligada ao X apresentam uma recorrência de 50% em fetos
do sexo masculino
9 Anomalias associadas:
- anomalias extra-cranianas (30%)
- anomalias cromossómicas (6% se isolada; 25% se outras anomalias associadas)
- Hidrocefalia ligada ao X – associada a abdução dos polegares, anomalias da face e ausência do
septo pelucido
9 Diagnóstico diferencial: excluir outras anomalias complexas (ver quadro 1)
9 Exames em doentes de risco: em doentes com feto anterior afectado ou após infecção TORCH ou com
espectro hidrocefalia ligada ao X, uma ecografia normal no segundo trimestre não exclui esta condição
• Casais com um filho anterior afectado deverão receber aconselhamento genético, porque o
diagnóstico genérico de hidrocefalia congénita pode incluir anomalias mais complexas com
implicações genéticas significativas.
• Doentes em risco de hidrocefalia ligada ao X deverão realizar análise de DNA.

9 Orientação clínica:
1. Ecoanatomia detalhada (excluir outras malformações do SNC e extra-cerebrais), Devem utilizar-se
vários planos do cérebro fetal (axial, sagital e coronal), recorrendo se necessário à via TV. Realizar uma
avaliação detalhada de todo o tubo neural, visualização do corpo caloso, ambos os ventrículos e fossa
posterior/cerebelo
2. Ecocardiografia fetal
3. Exclusão de infecções fetais – CMV (mais frequentemente associado), toxoplasmose, rubéola, sífilis
4. Exame citogenético (cariótipo; em doentes de risco: análise de DNA); pesquisa de infecções
(realizar PCR no LA)
5. Antes das 24 semanas: considerar IMG
6. Exames ecográficos seriados, cada 2 semanas (avaliar desenvolvimento de macrocefalia,
agravamento da ventriculomegalia)
7. RMN cerebral – deve ser sempre realizada (1ª com IG≥ 22 semanas; 2ª com IG≥ 30 semanas)
8. Não está validada a cefalocentese in útero (associada a 90% de mortalidade)
9. Não há benefício em antecipar o parto
10. Feto sem macrocefalia e apresentação cefálica: é possível o parto vaginal
11. Deverá ser realizada colheita de sangue do cordão na altura do parto (se DNA não foi armazenado
previamente)

9 Prognóstico:
- a Ventriculomegalia >15 mm está associada a mau prognóstico (60% dos casos com anomalias do
SNC e de outros órgãos)
- Se isolada, apresenta 60% de sobrevivência pós-natal e cerca de 40% dos sobreviventes apresentam
desenvolvimento anormal.
- Num dos maiores estudos pediátricos excluindo casos de hidrocefalia ligada ao X e toxoplasmose
congénita, a sobrevivência foi de 62% aos 10 anos e 50% dos sobreviventes apresentavam um
quociente de desenvolvimento <60. A presença de macrocefalia ao nascimento, o tamanho da
dilatação ventricular e a idade em que foi realizado o tratamento cirúrgico não influenciaram o
desfecho.
- A hidrocefalia associada ao X: prognóstico grave, com défice neurológico grave e mortalidade
precoce
Diagnóstico diferencial nos casos de Ventriculomegália
(Quadro 1)

Anomalia Característica
1. Espinha bífida 9 Crânio deformado (lemon sign); apagamento
da cisterna magna (banana sign)
9 Defeito aberto da coluna vertebral
2. Cefalocele 9 Defeito do crânio (frequentemente occipital)
9 Obliteração da cisterna magna
9 Ocasionalmente presença de lemon sign
3. Holoprosencefalia 9 Linha média ausente ou incompleta
9 Única cavidade ventricular
9 Anomalias faciais
4. Complexo Dandy-Walker 9 Cisto da fossa posterior, na linha média
9 Defeito do vermis cerebeloso
5. Agenesia do corpo caloso 9 Ausência do cavo do septo pelúcido
9 Elevação do 3º ventrículo
9 Lipoma/cisto interhemisférico
6. Cisto aracnóide/glioependimário 9 Cisto intracraniano de contornos regulares
deslocando/ comprimindo o córtex
7. Porencefalia 9 Cisto intracraniano com contornos jagged
comunicando frequentemente com o ventrículo lateral
8. Esquizencefalia 9 Fendas na manta cortical

9. Hemorragia intracraniana 9 Massa ecogénica/complexa nos ventrículos laterais/


Parênquima cerebral
10. Microcefalia 9 PC < 3SD

11. Malformações vasculares 9 Lesão com fluxo de sangue ao exame Doppler

12. Craniostenose 9 Forma do crânio anómala

13. Lissencefalia 9 Ausência/redução das circunvalações cerebrais

14. Infecção 9 Ecogenicidade intracraniana/ periventriculares

Modificado de Nyberg et al. Cerebral malformations. In: Nyberg DA, Mahony BS, Pretorius DH, eds. Diagnostic ultrasound of fetal anomalies
1990; and McGahan J, Thurmond A. Diagostic obstetrical ultrasound,1994

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