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Ardhanarishvara
Ardhanarishvara (Ardhanārīśvara) – a divindade indiana que combina em seu corpo tanto
Shiva quanto Parvati. O nome Ardhanarishvara pode ser decomposto em Ardha+nari+ishvara.
Ishvara é o título que significa “governante” ou “senhor”, dado a várias divindades hindus. Neste
caso em particular, Ishvara está sendo associado a Shiva. Nari significa mulher, assim como nara
significa homem, em sânscrito. Ardha significa metade. Assim, Ardhanarishvara é “o Senhor que é
metade mulher”.
Na iconografia de Ardhanarishvara, o lado esquero representa a Deusa Parvati, também
chamada Gauri; e o lado direito representa Shiva. Normalmente, nas imagens de Ardhanarishvara,
Parvati tem um corpo rosado e veste um sari vermelho e tem enfeites dourados; segura uma flor de
lótus em uma das mãos. Shiva tem um corpo cinza-azulado, veste uma pele de tigre que simboliza o
controle sobre a natureza animal, e está decorado com serpentes representando o controle do veneno
das paixões. Segura um tridente, fazendo com a outra mão o gesto de destemor (abhaya mudra).

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Ardhanarishvara é uma das formas prevalentes do Divino na arte indiana desde o início da era
cristã, ou um pouco antes. As primeiras imagens conhecidas de Ardhanarishvara são relatadas a
partir do período dos Kushanas (cerca de 187-90 d.C.). Alguns estudiosos descobriram uma figura
do tipo de Ardhanarishvara no verso de uma moeda bastante danificada, e acham que pode ser a
primeira imagem de Ardhanarishvara existente. A moeda parece ter o ícone Śiva, mas há dúvidas de
que represente Ardhanarishvara. Em vez da moeda, é uma escultura Kushana de meados do
primeiro século (ver abaixo), atualmente no Museu Público de Mathura, que é geralmente
considerado o primeiro exemplo de Ardhanarishvara na arte.

Uma das imagens antigas de Mathura

No Rigveda e no corpo posterior do pensamento indiano, há muitos elementos sugestivos da


união de elementos masculinos e femininos, como instrumentos de criação. No entanto, além dessas
dimensões simbólicas, a literatura vêdica não faz nenhuma alusão direta à forma de
Ardhanarishvara ou a qualquer termo sugestivo de uma forma andrógina. Assim, há estudiosos que
afirmam que a forma de Ardhanarishvara é uma percepção artística, um produto da estranha
imaginação do homem, uma anatomia singular buscando conciliar os elementos conflitantes
masculino e feminino em uma forma divina.

A UNIÃO BIOLÓGICA DA DUALIDADE EXTERIOR


É verdade que a literatura canônica e as prescrições iconográficas sobre Ardhanarishvara
apareceram muito depois que a imagem de Ardhanarishvara foi descoberta na arte, mas o conceito
de dois elementos – o macho e a fêmea, fundindo-se um ao outro para efetuar a criação – era antiga.
Essa aparente contradição visual da arte tem, assim, não só um profundo significado e importância
cósmica, mas também suas raízes relacionadas nos textos antigos e metafísicos da criação. Mais
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significativamente, a forma de Ardhanarishvara representa a unidade biológica da dualidade
externa, o que a mente indiana sempre percebeu em todas as coisas e em todo o processo criativo.
Os Vedas apreenderam essa unidade biológica em várias coisas existentes manifestadas em
dupla, por exemplo, Agni e Soma, Stri e Punam, Kumara e Kumari, Pita e Mata, Linga e Yoni,
Mahagna e Mahagni, Yama e Yami, Prana e Apana, Nara e Nari, da Terra e Céu, e assim por
diante. A percepção rigvêdica de Prana e Bhuta – da vida e da matéria – que o Ṛgveda chama de
Hiranyagarbha é, no entanto, mais explícita e mais bem definida. Em Hiranyagarbha, o ovo
doutrado de onde brota o universo, hiranya ou ouro é o prana, a vida; é garbha é bhuta, a matéria.
O Ṛgveda observa que ele (o cosmos? a existência?), era um único ovo, mas se dividiu em dois,
Prana e Bhuta. O Ṛgveda não elabora a questão mais além, mas seu simbolismo se move em duas
direções aparentes.

Hiranyagarbha

O ovo contém ambos, a vida e a matéria. Quando se divide, ambos se separam. Além da
matéria inanimada, o ovo igualmente produz a matéria com vida. O Ṛgveda os chama de aprana e
saprana. A matéria saprana tem vida, mas é apenas o ovo, o aspecto inerente ao sexo feminino, que
por si só não é capaz de ir mais distante do processo criativo e é, por conseguinte, apenas o inativo
Bhuta. É só depois de a energia masculina o fertilizar que ele se torna o Ovo dourado – o
Hiranyagarbha do Ṛgveda. E, agora, o Hiranyagarbha – o Bhuta combinado com Prana, a matéria
energizada pelo espírito – toma a sua própria forma e define a criação. A forma de Ardhanarishvara
é, portanto, o Ovo dourado – a percepção visual da analogia Ṛgvêdica do Hiranyagarbha.

ARDHANARISHVARA: A SEMENTE CÓSMICA


Ardhanarishvara é, portanto, a Semente Cósmica, que é ao mesmo tempo, o pistilo e a antera, o
Pita (pai) e o Mata (mãe), o Prana e o Apana, o Nara (homem) e a Nari (mulher), o Bhuta e o Prana,
a matéria e o espírito, Prakti e Purua e assim por diante, isto é, a percepção última da união da
dualidade exterior. É a afirmação do fato de que a criação é instrumentada apenas quando a
dualidade se funde como unidade absoluta. Mesmo quando ele é o poderoso Śiva, ou até mesmo os
dois, o macho e a fêmea, a menos que se fundam em uma unidade inseparável, não podem ser
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instrumento da criação. Para efetuar a criação, um é obrigado a se dividir em dois e os dois se
fundem num só. A forma de Ardhanarishvara é constante, o que afirma a continuidade e a
recorrência do processo criativo, como a fusão do pistilo e da antera cria as sementes dos ovos de
ouro e a semente se divide em pistilo e antera e, assim, o processo de procriação continua
indefinidamente.

Shiva Shakti

Para efetuar a criação, a fusão tem que ser absoluta, ou seja, não só os elementos masculinos e
femininos que se fundem em unidade, mas também o seu ato, o que as escrituras têm identificado
como a cópula, na qual todas as distinções, mesmo os agentes da feminilidade e a masculinidade,
desaparecem. No Matsya Purana e no Linga Purana, pode-se perceber Ardhanarishvara como a
forma composta de Linga e Yoni. Śiva e Parvati, sua consorte, também são percebidos como
exemplos da polaridade Linga e Yoni. Assim, a forma de Ardhanarishvara não é apenas a Semente
Cósmica, mas também representa o infinito ato procriador – o Casal Cósmico, em união.
Na filosofia Sankhya, os dois princípios cósmicos fundamentais são Purusha (que representa a
consciência, um princípio masculino) e Prakriti (que representa a natureza, um princípio feminino).
Todos os seres do universo contêm essa polaridade, ou seja, as forças naturais e o princípio
consciente. No entanto, ao contrário da visão apresentada no símbolo de Ardhanarishvara, no
Sankhya Purusha e Prakriti são dois princípios separados, que não provêm de uma unidade
primordial e que nunca se fundem totalmente. Essa concepção Sankhya é, assim, bem diferente do
conceito de uma fusão total, existente em outras correntes de pensamento indianas, embora também
apareça na iconografia o símbolo da união entre Purusa e Prakriti sob uma forma que lembra
Ardhanarishvara (ver abaixo). E devemos também nos lembrar que Shiva, sob o ponto de vista
filosófico, é o princípio consciente inativo, e Parvati é o princípio ativo, o poder cósmico
fundamental, que inclui o conceito de Prakriti – com a diferença de que Parvati, ou Shakti, não é
apenas um poder, é um ser divino, consciente.
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Purusha e Prakriti

ARDHANARISHVARA: COMBINAÇÃO DE DOIS OU EXTENSÃO DE UM?


Como já foi mencionado antes, o termo Ardhanarishvara é uma combinação de três palavras:
ardha, nari e ishvara, ou seja, respectivamente, metade, mulher e Senhor, isto é, Ardhanarishvara é
o Senhor que é metade mulher. Alguns estudiosos interpretam o termo como indicando “a metade
masculina”, que é Śiva e “a metade feminina”, que é Parvati. Tais interpretações são sugestivas de
dveta, a dualidade da existência, e, portanto, contradizem a posição vêdica sobre o assunto. Tais
afirmações também contradizem a filosofia Śaiva de adveta, que é muito enfática em sua afirmação
de que só Ele é a causa de toda a existência, pois é por sua vontade que dele surgiu o cosmo.

Ardhanarishvara

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No hino Śaiva Ekohum bahusyami, ou seja, “eu sou um, mas desejo ser muitos” (do Śiva
Pūraa), ecoa a percepção rigvêdica da divisão do ovo em Bhuta e Prana. Há uma unidade
primordial, e os Vedas também eram amplamente favoráveis ao princípio da existência monogênica.
Além de sua ênfase na unidade da dualidade externa, o gveda aclama: “Ele, que é descrito como
masculino, é também feminino; o olhar penetrante não poderá deixar de ver isso”. A afirmação
gvêdica é explicitamente definida. O homem é tanto masculino quanto feminino, e vice-versa, o
feminino é tanto feminino como masculino. A masculinidade e feminilidade são os atributos
contidos em uma estrutura única.
Este simbolismo vêdico reverbera também em vários Purāṇas. O mito apresentado no Skanda
Purāṇa apresenta-se bastante característico. Brahmā pede a Rudra (Śiva) para dividir-se, e logo a
seguir Rudra se divide em duas metades, uma do sexo masculino e outro do sexo feminino. Em
outro lugar, o Skanda Pūraa menciona que Parvati pede a Śiva, “Deixe-me viver em você o
tempo todo, abraçando você membro por membro”, isto é, Parvati se funde com Śiva, membro a
membro, e a dualidade é eliminada.
O Śiva Pūraa coloca a história de um modo um pouco diferente. Brahmā, no processo de
criação, cria pela primeira vez um certo número de machos, os Prajapatis, e os manda produzir
outros seres. Os Prajapatis, no entanto, falham em fazê-lo. E Brahmā então medita sobre
Maheshvara (Shiva, o Grande Senhor). Logo após, Maheshvara aparece diante dele. Ele tem a
forma composta de macho e fêmea e saindo desta forma composta, a criação surge com o ritmo
desejado.

A RELAÇÃO MASCULINO-FEMININO
A criação é essencialmente composta, e a forma de Ardhanarishvara é a sua melhor
manifestação. A imagem de Ardhanarishvara representa sua forma absoluta e, portanto, a mais
sagrada. Assim, mesmo no nível mundano, a forma de Ardhanarishvara é a percepção da unidade
dos elementos conflitantes macho-fêmea. Esta percepção é essencialmente diferente do mundo
ocidental, que percebe em Cupido e Psiquê, o deus do Amor e sua esposa, a união inseparável de
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macho e fêmea; no entanto, essa união ocorre entre duas entidades separadas. No pensamento
indiano, uma vez que se manifesta na forma Ardhanarishvara, esta união é uma entidade única, com
amplificação cósmica. A mitologia grega também apresenta uma forma hermafrodita. Salamacis,
uma ninfa, se apaixona por Hermophroditus, filho de Afrodite. Depois que Hermophroditus recusa
sua proposta, Salamacis reza aos deuses para colocá-la em seu corpo. E, assim, os dois se fundem,
membro a membro, dentro de uma única estrutura. Esta forma grega hermafrodita tem dimensões
míticas, mas não é nem divino nem cósmico ou procriativo, como é a forma Ardhanarishvara.

SHIVA COMO ARDHANARISHVARA

Vallabhavardham: Ardhanarisvara = Vishnu + Lakshmi

A maioria dos mitos de Ardhanarishvara, bem como a forma de Ardhanarishvara nas artes, está
centralizada em Shiva. Há, no entanto, algumas raras exceções Vaishnavas (associadas a Vishnu) de
Ardhanarishvara, como a menção do termo Vallabhavardham no Bhavishya Pūraa, ou algumas
miniaturas tardias do norte da Índia. Vallabhavardham, é um termo Vaiava sinônimo de
Ardhanarishvara (Vallabh: Viu; vardham: mulher), parece ter sido concebido por devotos de
Viu, que poderia ter inspirado a criação das miniaturas que procuram representar Viu em
forma de Ardhanarishvara. Essas miniaturas vêm primariamente da Kashmira, a faixa na região
norte, onde o Vaiavismo tinha maior predominância ante de se tornar um grande centro de
adoração ao deva Śiva. As formas Ardhanarishvara de Viu, além de serem uma raridade, são
quase insignificantes sob o ponto de vista mitológico.
A tradição percebe Ardhanarishvara principalmente como forma de Śiva, que é considerado
como Sadaśiva, Adiśiva ou Adipurua (o Shiva supremo, primordial, ou a consciência primordial).
Como já foi discutido até agora, Ardhanarishvara é a Semente Cósmica atemporal, o processo de
procriação infinita e da existência em seu caráter compósito, cujos aspectos são os atributos de Śiva,
que é o eterno Linga, o vivificante Prana e o inesgotável Bhuta. Como o gveda o apresenta,
Rudra, ou Śiva, é Agni (o fogo divino), que como Prana energiza todas as coisas. Ele é sem
começo, como também é sem fim. Como Bhuta – ou Prakti, a matéria – é apenas um dos seus
aspectos, ele é toda a existência. Ele cria a partir de si próprio e, portanto, é ele próprio é a criação.
Ele assim é do sexo masculino como também do sexo feminino.

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O mito Vaiava é diferente. É sugestivo de dualidade (dveta), pois Viu não é a criação, mas
o seu sustentáculo. O sustentador e aquilo que é sustentado são duas entidades. Ele é também
apenas o masculino. Ele tem o feminino como seu complemento – sua consorte, embora em união
inseparável, não se funde ao seu ser. Lakmi, como ela mesma ou como Sitā e Rādha, está com ele
como Rama ou Kna, mas eles não são inseparáveis, como Śakti é inseparável de Śiva. Cada um
dos nascidos é o único ovo – o masculino ou feminino – e assim são Brahmā e Viu. Śiva, ou
Maheśvara, é o total – Sakala e Nishkala (com partes e sem partes), o Linga e o Alinga (com
características e sem características), Rupa e Arupa (com forma e sem forma), o Atman e Maya, o
Sansara e Nirvana, tudo o que é cronometrado e tudo o que está além do tempo, os nascidos e os
não nascidos, o manifesto e o não-manifesto, o espírito e a matéria, o efêmero e o transcendental, o
masculino e o feminino. A doutrina Shaiva acredita que o Senhor Śiva é o primeiro de todos os
seres e a raiz de todos os elementos. Ele sempre foi e será o único. Sendo o primeiro, ele é o
Adiśiva, e sendo sempre, ele é o Sadaśiva. Tanto quanto o Adiśiva e o Sadaśiva, Śiva tem inerente
em seu ser o macho e a fêmea, o positivo e o negativo, e, portanto, sua forma de Ardhanarishvara.

FONTES DA IMAGEM DE ARDHANARISHVARA

A imagem de Śiva, tanto a antropomórfica como o simbólico Linga, tem manifestação pré-
vêdica. Escavações em sítios do vale do Indo revelaram imagens de Śiva como Mahayogi (o grande
Yogi) e Paupati (o senhor dos animais) e objetos que se parecem com o Linga são sugestivos da
manifestação de Śiva como Linga e o culto de adoração ao Linga. Também há imagens
antropomórficas com falo proeminente sugerindo a importância do Linga no seu culto. A imagem
posterior de Śiva como Urdhalinga (que sai de dentro do Linga) foi apenas um desenvolvimento
disso. Em dois de seus versos, o gveda critica o culto de adoração ao falo, o que sugere sua
prevalência nas tribos não arianas. Além disso, tal culto de adoração do falo era predominante
também em outras partes do mundo. Os restos da civilização helênica também revelam traços do
culto do falo. O antigo Egito concebeu o deus Osíris sob a forma de Linga e o adorou.
Essas antigas imagens de Śiva não revelam tanto uma percepção iconográfica dele, mas
revelam muito significativamente as suas dimensões divinas, das quais se desenvolveu
posteriormente sua forma de Sadaśiva e Maheśvara e, conseqüentemente, a forma de
Ardhanarishvara. Nessas primeiras imagens, ele é o Linga, a Semente Cósmica, a raiz da procriação
e, portanto, ele mesmo a criação; como Paupati, o guardião dos rebanhos, ele é o mantenedor dos
nascidos como também dos campos que os alimentou; como Mahayogi, ele é o Ser Cósmico, os
meios de transcendência, isto é, ele é o Sansara como também o Nirvana.
A iconografia propriamente Śaiva surge, no entanto, durante a era pós-vêdica. As primeiras a
surgirem foram as suas formas Sadaśiva e Maheśvara. A graciosa figura imponente de quatro
braços com peito largo e Jatajuta elegante caracteriza essas formas. O touro majestoso era o seu
veículo. Somado à sua iconografia, o touro deu-lhe uma nova dimensão. Agora, Maheśvara com seu
touro se torna Vraśavaha Śiva. A forma usual de dois braços de Vraśavaha Śiva tinha uma de suas
mãos repousando sobre o touro.
Paraśiva, Sadaśiva, Maheśvara e Vraśavaha Śiva são principalmente as formas de Saumya Śiva.
Estranhamente, sua consorte Parvatī não surge nesta fase inicial de imagens Śaivas, mas surge na
sua forma de Ardhanarishvara. Obviamente, mesmo nas artes, a forma Ardhanarishvara não era um
amálgama das duas formas, mas sim uma percepção independente de Śiva, que o representava na
sua totalidade. Na prática, a iconografia da parte feminina da Ardhanarishvara foi descoberta na
forma da Deusa Mãe, pois até então o panteão Brahmanico não possuía ícones das divindades
femininas. Inspirado pela percepção vêdico de Śiva como Rudra, o furioso arqueiro e o domador de
animais, há também o surgimento de Raudra Śiva, Śiva em suas formas violentas, mas a sua forma

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Ardhanarishvara não adotou qualquer uma de suas características a partir de Raudra Śiva, talvez
porque Raudra e a forma feminina não poderiam aparecer juntos. As imagens de Ardhanarishvara
encontraram sua iconografia masculina nas formas de Saumya Śiva, principalmente de Sadaśiva e
Maheśvara, e na forma feminina da grande Deusa-Mãe.

DIMENSÕES ICONOGRÁFICAS DE ARDHANARISHVARA

Śiva, o Senhor, cuja metade mulher (Ardhanarisvara)


Escola Mankot, Punjab ocidental, aprox. 1710-20

Salvo algumas poucas exceções, a metade direita das imagens de Ardhanarishvara é composta
por anatomia masculina e a esquerda pela feminina. Em algumas imagens, obviamente
influenciadas pelo culto Śakta, a colocação das partes masculinas e femininas é trocada, como na
figura acima.
No que respeita à perspectiva, estatura, dimensões do rosto e outras partes, nas esculturas
predominam aspectos masculinos, e nas pinturas, que contemplam os aspectos mais suaves, a
anatomia feminina é encontrada dominando a figura inteira.
Apesar de uma anatomia semelhante das duas partes, a parte feminina transmite a sensação de
suavidade e elegância. Um peito proeminente elegantemente modelado é a essencialidade da
anatomia feminina. A imagem de Ardhanarishvara pode ser dotada de dois, três, quatro, seis ou oito
braços. Um número de braços superior a oito é atributo de Raudra Śiva, que foi concebido como

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tendo até mil braços. A imagem de dois braços é o de Ardhanarishvara na postura de Lalita, a bela,
que está à vontade. A mão feminina carrega ou um espelho ou uma nilotpala, uma flor de lótus
azul. A mão masculina ou repousa sobre o touro ou está solta abaixo da coxa. Também pode
mostrar o abhaya-mudra, o gesto de transmissão de destemor. Quando tem três braços, um está no
lado feminino e dois no masculino.

Ardhanarishvara com Ganesha Ardhanarishvara

Nas figuras com quatro braços, uma das mãos masculinas mostra o gesto abhaya ou varada e
outro carrega um tridente ou vara; a segunda mão feminina carrega diversos objetos, tais como o
espelho, nilotpala ou um pote. Nas que têm seis ou oito braços, o lado masculino carrega, além do
abhaya e varada, várias armas tais como o tambor; e no lado feminino, além do espelho, lótus, um
jarro, e também o papagaio.
As imagens de Ardhanarishvara normalmente se apresentam em três posturas:
• Abhanga, o corpo uma postura reta, sem uma curva;
• Tribhanga, uma postura com três curvas suaves;
• Atibhanga, uma postura com curvas extremas;
Quatro dos gestos das imagens de Ardhanarishvara – abhaya, varada, vyakhyana e
katyavalambita, são os mais comuns. Em abhaya mudra, a mão superior direito é colocada na
postura que protege do temor. Em varada mudra, a mão inferior direita transmite o sinal de boas
vindas, compaixão, sinceridade. Em vyakhyana mudra, as pontas dos dedos polegar e indicador se
juntam em um nó circular e os outros dedos ficam estendidos, definindo o gesto de transmissão da

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sabedoria. E na postura de katyavalambita, o braço direito é colocado descansando e, às vezes,
suspenso sobre a cintura, katya.

Postura Abhanga de Ardhanarishvara Postura Tribhanga de Ardhanarishvara

Postura Atibhanga de Ardhanarishvara


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A distinção entre os dois aspectos, masculino e feminino, aparece mais no estilo dos trajes e
adornos. A parte masculina tem o cabelo enrolado sobre a cabeça, jatamukuta, enquanto a feminina
tem um penteado bem feito. A parte feminina usa em sua orelha um belo brinco, enquanto o lado
masculino não usa brinco, mas tem um escorpião ou uma serpente. A metade masculina da testa tem
a metade do terceiro olho e uma metade da marca feita com três linhas horizontais (tilaka). A
metade esquerda da figura, a parte feminina, veste um sari, enquanto que a metade direita está
coberta com o couro da pele de um elefante ou tigre, e em parte descoberta. Sua metade inferior, até
os joelhos, geralmente está coberta por uma tanga de pele de leão ou tigre. Há outras diferenças que
marcam as oposições entre os aspectos masculino e feminino do Ser Divino.

O Masculino Feminino - Unidade Divina


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FONTES CONSULTADAS:
Este texto foi traduzido e adaptado a partir de material disponível no site Exotic India:
“Ardhanarishvara in Art and Philosophy”, Article of the Month – June 2005, de autoria de Prof. P.
C. Jain e Dr. Daljeet.
http://www.exoticindia.com/article/ardhanarishvara/

Referências e leituras (indicados no artigo original)

• Rigveda: (ed.) Vishvabandhu: Vishveshvananda Vedic Research Institute, Hoshiyarpur.


• Bhavishya Purana: Venkateshvara Press, Bombay.
• Skand Purana: Venkateshvara Press, Bombay.
• Linga Purana: (ed.) J. L. Shashtri, Delhi.
• Neeta Yadav: Ardhanarishvara in Art and Literature: New Delhi.
• V. S. Agrawal: Shiva Mahadeva, The Great God : Varanasi.
• Ellen Goldberg: The Lord Who Is Half Woman: New York.
• Stella Kramrisch: The Presence Of Shiva: Delhi.
• O. P. Mishra: The Mother Goddess in Central India: New Delhi.
• C. Krishnamurthi and K. S. Ramchandran: Ardhanarishvara in South Indian Sculpture
(Indian Historical Quarterly): 36:69 - 74.

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