Você está na página 1de 11

BREVES REFLEXÕES SOBRE A DUPLA FACE DA CATEGORIA

TRABALHO EM MARX

Mayra Ferreira Soares1

RESUMO

O presente estudo tem como objetivo refletir a cerca da


categoria trabalho como elemento central na relação
homem x natureza e fundante do ser social, resgatando
fundamentalmente as apreensões do pensamento
marxiano sobre o trabalho em seu sentido ontológico e
em sua forma alienada. Busca-se fazer uma abordagem
trazendo para o debate a dupla face da categoria
trabalho, onde por um lado se configura enquanto agente
que permite o homem transformar a natureza, ao mesmo
tempo em que transforma a si mesmo, explorando e
aprimorando suas capacidades. Por outro lado, engendra
o retrocesso, impossibilitando o pleno desenvolvimento da
humanidade.
Palavras Chave: Trabalho, ontologia, ser social e
alienação.

ABSTRACT

The present study aims to reflect about the work category


as a central element in the relationship between man and
nature and founding the social being, rescuing
fundamentally analysis of marxiano thinking about work in
your ontological sense and estranged form. The aim is to
make an approach bringing the debate about double-sided
work category, where on one side is configured as an
agent that allows the man to transform the nature, while at
the same time transforms himself, exploring and improving
its capabilities. On the other hand, produces the reverse,
making it impossible for the full development of mankind.
Keyworks: Work, ontology, being social and alienation.

1
Aluna do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social (PPGSS) da Universidade Federal
do Pará (UFPA). mayraf_soares@hotmail.com
1. INTRODUÇÃO

Marx do decorrer de seus estudos buscou como foco principal fazer uma
análise a cerca da nova ordem em ascendência do século XIX – a ordem burguesa.
O filósofo dedica a sua vida para estudar a ordem burguesa, porém em
meio aos seus estudos deixa traços de algo muito mais profundo que vai para além
daquela ordem até então ascendente na sociedade. Dessa maneira, Lukács
identificar nos escritos de Marx um estudo ontológico, uma análise voltada para o
ser, que trata da humanidade. Assim, para Lukács (1979 p. 14) “[...] Temos,
portanto, que no caminho do jovem Marx se delineia com clareza aquela orientação
no sentido de concretizar, cada vez mais, as formações, as conexões, etc. do ser
social [...]”.
Apesar de não revelar diretamente em sua obra, já que inicia seus
estudos a partir da crítica da filosofia de Hegel, é possível evidenciar a preocupação
de Marx com os homens, com as pessoas. Ele se interessa por entender como as
pessoas vivem e como pensam em um determinado momento histórico-social, de
uma determinada organização social que se traduz na organização da ordem
burguesa na sociedade do capital.
Em termos marxianos falar de ser social implica discutir sobre uma
categoria fundamental nos estudos de Marx: a categoria trabalho. Pois, para Marx o
trabalho se coloca como elemento fundamental na construção do ser social.
Historicamente, e em todas as formas de sociedade, o trabalho se
estabelece como eterno mediador entre o homem e a natureza, onde o ser humano
se constitui enquanto ser social e passa a ter o domínio sobre a natureza na medida
em que passa a transforma-la efetivando-se assim o trabalho. Dessa maneira, o
trabalho possui relação direta e inerente com o processo de desenvolvimento da
humanidade nos seus mais diversos aspectos – físicos, afetivos, criativos, entre
outros.
Assim sendo, o ato de trabalhar se inscreve como fato de maior
importância dentro da história da humanidade, pois, possibilita que a humanidade
amplie e aprimore as suas capacidades, no entanto, em sua forma alienada, que se
expressa no modo de produção capitalista, o trabalho passa a atuar como uma
barreira impedindo esse aprimoramento.
Nesse sentido, é que Marx parte para uma investigação buscando
entender como se estabelece essa alteração no sentido do trabalho e as novas
formas que este assume. Vale ressaltar que é no livro dos Manuscritos Econômicos
e Filosóficos que Marx se debruça sobre o trabalho alienado partindo da crítica a
Economia política, onde essa teoria social “oculta à alienação do trabalho” (MARX,
1989, p. 152). Destaca-se que a crítica de Marx a sociedade do capital tem sua base
pautada na discussão sobre o trabalho em sua forma alienada.
Portanto, partindo das análises deixadas por Marx, nos limites deste
estudo, buscamos traçar algumas reflexões a respeito das duas faces em que a
categoria trabalho se apresenta relacionando-o com o ser social em dois momentos:
primeiro em seu sentido ontológico, e segundo em sua forma alienada.

2. O SENTIDO ONTOLÓGICO DO TRABALHO: RELAÇÃO HOMEM E NATUREZA

Pensar a questão do trabalho supõe localizar o seu significado no


processo da existência humana, o ser humano no seu modo de ser e de se
reproduzir na sociedade e ainda, pensar na capacidade humana a qual nos
diferencia dos demais animais.
A partir do que está posto no plano da realidade o homem cria as suas
necessidades em meio ao contato com os elementos da natureza que o cerca e
procura dar respostas a essas necessidades. Segundo Netto (2004, p. 34), o
trabalho é “objetivo, ineliminável intercâmbio material da sociedade com a natureza”,
é um “processo matizador ontológico-primário da sociedade”. Isto é, o trabalho se
traduz na relação entre homem e natureza na medida em que atua como mediador
na satisfação das necessidades humanas através da transformação da natureza.
Dessa maneira, a satisfação de necessidades materiais de homens e mulheres que
fazem parte da sociedade é realizada através da relação dos mesmos com a
natureza, dessa maneira, os homens transformam os elementos da natureza, ou
seja, as matérias primas em produtos e objetos que venham a atender as suas
necessidades. Nesse contexto, é o trabalho enquanto atividade, o elemento
responsável pelo processo de transformação.
Nesse ponto, podemos inferir também que, em meio à busca de
satisfação das necessidades para a sobrevivência, todas as espécies animais
precisam sobreviver, configuram-se necessidades que se estabelecem biológica e
geneticamente. Entretanto, não é essa atividade genérica, que corresponde a todas
as espécies animais, que Marx vai chamar de trabalho. Marx aponta o trabalho como
uma atividade específica de uma determinada espécie e que só pode ser realizado
por essa espécie em particular.
Iamamoto (2006) apresenta algumas características do trabalho
propriamente humano, isto é, de uma determinada espécie e que ao longo da
historia se distancia daquela atividade genérica e natural. Assim, para a autora
acima citada, o trabalho é dotado de uma dimensão teleológica, onde o homem
projeta antecipadamente na sua consciência a finalidade que pretende alcançar no
processo de transformação da natureza. Outra característica do trabalho humano se
traduz no processo de uso e de criação de meios que irão servir como mediadores
entre o homem e o objeto a ser modificado, esses mediadores são os meios de
trabalho que também atuam como indicadores no que diz respeito as condições
sociais sobre as quais se efetiva o trabalho humano, assim como, indica da mesma
forma o grau de desenvolvimento da força de trabalho humana. Por último, a autora
aponta que o trabalho é um ato histórico, pois, também é criação de novas
necessidades sociais implicando, além disso, mudanças no próprio sujeito.
Netto (2007) concorda com a autora citada anteriormente no que diz
respeito ao atendimento de necessidades, argumentando que o trabalho visa
atender inúmeras necessidades e de forma variada o que leva a cada vez mais
surgirem novas necessidades, ou seja, o trabalho não opera de forma fixa e
invariável na satisfação das necessidades.
Assim, podemos observar que o trabalho tem sua particularidade pautada
em uma relação que se estabelece entre o sujeito e o seu objeto, este último se
traduz na natureza orgânica e inorgânica.
Nessa perspectiva de satisfação de necessidades, o homem se diferencia
dos outros animais a partir do momento em que o seu trabalho é dotado de
teleologia, que segundo Iamamoto (2006), traduz-se na capacidade de construir no
plano do pensamento uma intencionalidade a ser alcançada, ou seja, o homem pode
projetar na sua imaginação o produto do seu trabalho de forma antecipada, antes de
materializar no plano real. Para Netto (2004, p. 35), “é o por teleológico do trabalho
que institui o ser social”.
Logo, enquanto um modelo de práxis humana, o trabalho é dotado de
objetivação e teleologia, isto é, dentro do conjunto de objetivações humanas (práxis),
o trabalho envolve dois acontecimentos os quais estão intimamente relacionados e
são interdependentes: em primeiro, o pensamento prévio se coloca no momento em
que o homem consegue conscientemente prever a sua ação antes de materializa-lá.
Esse primeiro momento se constrói apenas no plano do abstrato. Em segundo, a
partir do pensamento prévio, o homem passa para a objetivação, ou seja, a
materialização do seu pensamento é o chamado pensamento em ação. Dessa
maneira:

[...] é importante ressaltar que o trabalho é uma atividade projetada,


teleologicamente direcionada, ou seja: conduzida a partir do fim proposto
pelo sujeito. Entretanto, se essa prefiguração (ou no dizer de Lukács, essa
prévia ideação) é indispensável à efetivação do trabalho, ela em absoluto o
realiza: a realização do trabalho só se dá quando essa prefiguração ideal se
objetiva, isto é, quando a matéria natural, pela ação material do sujeito, é
transformada. [...] (NETTO, 2007, P. 32)

Contudo, é através do trabalho, que ao transformar a natureza o homem


também transforma a si mesmo, já que cria outras necessidades e provoca
mudanças no sujeito desenvolvendo novas habilidades, assim com, também busca
conhecer mais profundamente a natureza que pretende transformar. Ou seja, a
realização do trabalho vai para além da transformação da natureza, pois, na
perspectiva ontológica marxiana o trabalho constitui o ser humano propiciando o seu
desenvolvimento e a produção da vida social e individual.
Portanto, o trabalho, conforme Lukács (1979, p. 16), “é uma condição de
existência do homem, independente de todas as formas de sociedade; [...]”.

2.1 Trabalho: fundamento do ser social

Conforme as análises de Marx em O Capital, o trabalho se coloca como


condição de existência da humanidade seja qual for a forma de sociedade ou a
forma de reprodução social vigente. O trabalho é o acontecimento fundamental da
existência humana, pois:

[...] foi mediante o trabalho que os membros dessa espécie se tornaram


seres que, a partir de uma base natural (seu corpo, suas pulsões, seu
metabolismo etc.), desenvolveram características e traços que os
distinguem da natureza. Trata-se do processo pelo no qual, mediante o
trabalho, os homens produziram-se a si mesmos (isto é, se autoproduziram
como resultado de sua própria atividade), tornando-se – para além de seres
naturais – seres sociais. (NETTO, 2007, P. 37).

Assim, o trabalho institui o ser social, é atividade objetivo criadora


expressando a especificidade do ser social. O ser social é constituído a partir de
elementos que são inerentes a efetivação do trabalho, desde o processo teleológico,
passando pela relação sujeito e objeto mediada pelos instrumentos de trabalho e a
própria constituição da linguagem como parte do processo de aprendizagem, onde o
homem, não de forma isolada e sim coletiva, se expressa frente à sociedade. Dessa
maneira, esses são elementos que diferenciam o homem da natureza.
Nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos, Marx afirma que o trabalho é
atividade vital do ser humano, se configura na própria produção e reprodução do ser
enquanto ser genérico. Logo, o trabalho em seu sentido ontológico, na relação
homem natureza enquanto elemento fundante do ser social é trabalho livre e criador
já que o homem encontra na natureza o seu objeto de trabalho, assim, pela prévia
ideação e através dos instrumentos de trabalho transforma a natureza, ou seja,
materializa o seu pensamento por meio da ideia objetivada produzindo valor de uso
diante do novo objeto resultado do processo de trabalho.
Em meio a esses aspectos, que vão se distanciando das vistas naturais, o
ser social vai cada vez mais criando possibilidades de desenvolver novas
objetivações e inúmeras potencialidades. Nessa perspectiva, vale ressaltar que
frente ao desenvolver-se do ser social o trabalho passa a se configurar enquanto um
modelo primário dentre o conjunto de objetivações humanas (práxis). Logo “A práxis
é reconstituída por Marx como a atividade objetivo-criadora do ser social – e o
trabalho é a sua forma, repita-se, ontológico-primária.” (NETTO, 2004, P. 36). Dessa
maneira, ao longo de inúmeros processos históricos o homem em sociedade surge a
partir do trabalho, mas não se esvazia nele - no trabalho, ou seja, ao se desenvolver
a partir do trabalho, o ser social permanece continuamente e historicamente se
desenvolvendo e ultrapassa o universo do trabalho.
Nesse contexto, Netto (2007), aponta que para além das objetivações
primarias do trabalho, o ser social desenvolvido se projeta e se realiza diante de
inúmeras objetivações que são tanto materiais como ideais, e a categoria de práxis é
quem admite compreender toda essa riqueza de capacidade do ser social. Todavia,
a práxis também pode se colocar como contrária às determinações do ser social. É
nessa perspectiva que “nessas condições, as objetivações, ao invés de se revelarem
aos homens como a expressão de suas forças sociais vitais impõe-se a eles como
exteriores e transcendentes. [...] Essa inversão caracteriza o fenômeno histórico da
alienação.” (NETTO, 2007, p. 44).
Assim, sob a égide de determinadas condições históricas e sociais o
trabalho, enquanto objetivação humana assume um caráter alienado provocando
alterações na relação homem e natureza.

3. O TRABALHO ALIENADO EM MARX

Conforme explicitado anteriormente, o trabalho em seu sentido ontológico,


que é livre e não alienado é concebido como produtor de valor de uso, além de ser
elemento propulsor do desenvolvimento humano a estágios a cada vez mais
avançados, isto é, tem seu sentido central pautado na satisfação das necessidades
humanas e na mediação do próprio desenvolvimento humano, assim como, das
relações sociais, através da transformação previamente idealizada da natureza.
Nessa perspectiva, o homem trabalha apenas para ter aquilo que é necessário para
sua vivência e sobrevivência, conforme afirma Marx nos Manuscritos Econômicos e
Filosóficos.
Entretanto, em sociedades constituídas pela divisão do trabalho e pela
propriedade privada o trabalho assume um caráter alienado. Assim, com o avanço
do modo de produção capitalista, a categoria trabalho passa por um processo de
mudança, onde a nova ordem social imposta pelo capital provoca alterações no
intercambio entre homem e natureza, consequentemente acarretando a perda do
trabalho enquanto agente central no processo de desenvolvimento do homem.
Em linhas mais gerais, podemos inferir que o fenômeno a alienação se
traduz em um processo de perdas que envolvem o trabalhador nas suas relações de
trabalho, mas que, para além do trabalho tem efeito no próprio modo de ser do
homem, na sua própria vivência.
Conforme citado anteriormente, a alienação é produto de um determinado
tipo de sociedade, manifesta-se em “sociedades nas quais o produto da atividade do
trabalhador não lhe pertence, nas quais o trabalhador é expropriado – quer dizer,
sociedades nas quais existem formas determinadas de exploração do homem pelo
homem.” (NETTO, 2007, p. 45).
Nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos primeira parte, Karl Marx trata
da alienação também como exteriorização do trabalhador. Ademais, neste momento
destacaremos dois aspectos fundamentais em Marx, que dizem respeito primeiro à
alienação considerada na relação entre o trabalhador e os produtos do seu trabalho
e segundo, a alienação que se manifesta na própria atividade do trabalho.
Destaca-se que entender esta temática por partes, não significa aqui
fragmentar a discussão e sim possibilitar melhor compreensão e abordagem sobre o
mesmo.
Discorremos agora sobre o primeiro aspecto abordado por Marx.
O homem, a partir do seu trabalho e dos instrumentos de trabalho produz
um resultado que é fruto do seu trabalho, porém no processo de alienação o
produto, resultado do trabalho, não pertence ao trabalhador que o produziu, se torna
exterior a ele.

Este fato nada mais expressa senão: o objeto que o trabalho produz, o seu
produto, se lhe defronta como um ser alheio, como um poder independente
do produtor. O produto do trabalho é o trabalho que se fixou num objeto, se
fez coisal, é a objetivação do trabalho. A realização efetiva do trabalho é a
sua objetivação. No estado econômico-político esta realização efetiva do
trabalho aparece como desefetivação do trabalhador, a objetivação como
perda e servidão do objeto, a apropriação como alienação, como
exteriorização. (MARX, 1989, p. 149).

Aqui o trabalho apresenta-se em uma relação de perda para com o seu


objeto, onde o trabalhador é privado do objeto que ora foi produto de seu trabalho.
Nesse sentido Marx continua, argumentando que:

[...] quanto mais o trabalhador se gasta trabalhando, tão mais poderoso se


torna o mundo objetivo alheio que ele cria frente a si. Tão mais pobre se
torna ele mesmo em seu mundo interior, tanto menos coisas lhe pertencem
[...] Portanto, quão maior essa atividade, tanto mais o trabalhador é sem-
objeto. [...] (MARX, 1989, p. 150).

Assim, a relação de exteriorização que se estabelece entre o trabalhador


e o produto do seu trabalho, quer dizer que, não cabe ao trabalhador o domínio
sobre o resultado do seu trabalho, ou seja, o trabalhador se depara com um objeto
que se torna exterior e independente voltando-se de forma adversária para o seu
criador. Para Marx, esta análise faz referencia somente a um dos aspectos da
alienação do trabalhador, pois “[...] a alienação não se mostra apenas no resultado,
mas no ato da produção, dento da atividade produtiva mesma. [...]” (MARX, 1989, p.
152).
O segundo aspecto pelo qual se manifesta a alienação do próprio trabalho
em si mesmo, diz respeito ao fato de que para o trabalhador o trabalho deixa de ser
satisfação de necessidades humanas para se tornar apenas um meio para atender
tais necessidades. Com isso, passa a se configurar enquanto alheio a vontade do
homem, se coloca como obrigação. Ainda nesse segundo aspecto, na medida em
que no sistema do capital o homem precisa vender a sua força de trabalho para
outro homem que irá comprá-la, o trabalhador não mais possui propriedade sobre o
seu trabalho, já que agora está sob a posse de outro.

Primeiro, que o trabalho é exterior ao trabalhador, ou seja, não pertence a


sua essência, que, portanto ele não se afirma, mas se nega em seu
trabalho, que não se sente bem, mas infeliz, que não desenvolve energia
mental e física livre, mas mortifica a sua physis e arruína a sua mente. [...] O
trabalho exterior, o trabalho no qual o homem se exterioriza, é um trabalho
de auto-sacrifício, de mortificação. Finalmente, a exterioridade do trabalho
aparece para o trabalhador no fato de que o trabalho não é seu próprio, mas
sim de um outro [...] é a perda de si mesmo. (MARX, 1989, p. 153).

Diante desse quadro, Marx nos apresenta o produto de todo esse processo,
que limita o trabalhador e o condiciona a uma vivência restritamente instintiva:

Por conseguinte chega-se ao resultado que de o homem (o trabalhador) se


sente livremente ativo só ainda em suas funções animais, comer, beber e
procriar, no máximo ainda moradia, ornamentos, etc., e em suas funções
humanas só se sente ainda como animal. Claro que comer, beber e
procriar, etc., também são funções genuinamente humanas. Porém, são
animais na abstração que as separa do círculo restante da atividade
humana e as faz fins últimos e exclusivos. (MARX, 1989, p. 154).

Por conseguinte, recorremos a uma citação de Iamamoto no sentido de


demonstrar o profundo contraponto no que se refere aos sentidos do trabalho.
Assim, conforme a autora acima citada “[...] O trabalho (e a linguagem, enquanto
exterioriza os resultados da produção intelectual) objetivação de forças essenciais
humanas (faculdades e necessidades), cria, pois, a possibilidade permanente de
evolução humana: a própria história.” (IAMAMOTO, 2001, p. 42).
Logo, os elementos essenciais que partem do trabalho em seu sentido
natural, oferecem a humanidade uma gama de possibilidades de objetivações, de
talentos. Entretanto, no processo de alienação, estimula a involução humana.
4. CONCLUSÃO

Com o advento do modo de produção capitalista, o trabalho passa por um


processo de mudança. A nova ordem social e econômica do capital provoca
alterações na relação homem e natureza, consequentemente nesse processo o
trabalho abandona o seu lugar enquanto elemento central no processo de
desenvolvimento do ser social, nesse contexto, o trabalho contrai novas
determinações que modificam a sua essência.
Dessa maneira, podemos inferir que na sociedade onde tem vigência o
modo de produção capitalista, o trabalho assume uma forma alienada que se
esforça para estimular o retrocesso do ser social no âmbito das suas capacidades.
Junto com esse determinado tipo de sociedade ergue-se o trabalho pago que
produz mercadorias que não pertencem ao trabalhador, além disso, o próprio
trabalho assume caráter de mercadoria enquanto produto que é vendido, comprado
e desprezado. Assim, a propriedade privada se apresenta como consequência do
trabalho alienado. Nessa perspectiva, o trabalhador não reconhece o produto do seu
trabalho, assim como, também não se reconhece enquanto trabalhador, já que
vende a sua força de trabalho pra outro alheio de si.
Todos esses aspectos revelam que na sociedade do capital, o trabalho
não mais se traduz na simples satisfação de necessidades de sobrevivência e
vivência humana, pois, tem como essência a produção de bens, mercadorias, de
riqueza sob a égide da exploração do trabalhador. Por isso, conforme as ideias de
Marx, quanto mais riqueza o trabalhador produz, ao invés de oferecer possibilidades
para a sua evolução, para melhorar a sua situação, pelo contrário, mas pobre ele se
torna.
Nesse sentido, sob as condições da sociedade burguesa o trabalho se
contrapõe a categoria em seu sentido ontológico elaborado por Marx. Portanto,
enquanto em seu sentido ontológico, historicamente o trabalho engendra o
enriquecimento humano. Ao se tornar alienado, quanto mais trabalhar e produzir
riqueza, mais vazio se torna, mais desumanizado se projeta.
Contudo, verificamos que a categoria trabalho, ora abordada neste
estudo, se apresenta sob duas faces, as quais são distintas e contrárias: a sua face
ontológica, natural e abstrata e sua face histórica, alienada e exteriorizada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

IAMAMOTO, Marilda Villela. Trabalho e indivíduo social no processo capitalista de


produção. In:______. TRABALHO E INDIVÍDUO SOCIAL. 2ª ed. São Paulo: Cortez,
2006. P. 31-99
LUKÁCS, George. Ontologia do ser social: os princípios ontológicos fundamentais
de Marx. São Paulo: Livraria Editora Ciências Humanas, 1979.
MARX, Karl. Trabalho alienado e superação positiva da auto-alienação humana
(Manuscritos econômicos e Filosóficos 1844). In: FERNANDES, Florestan (Org.)
Marx e Engels. História. São Paulo: Ática, 1989 (coleção Grandes Cientistas
Sociais).
NETTO, José Paulo; BRAZ, Marcelo. Trabalho, sociedade e valor. In:______.
Economia política: uma introdução crítica. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2007. P. 15-
52.
NETTO, José Paulo. Razão, ontologia e práxis. Revista Serviço Social e
Sociedade, n 44. Ano XV. São Paulo: Cortez, 2004.

Você também pode gostar