NIKOLAI CHERNISHEVSKI (1828-1889) “Morto Bielinski (1848), abriu-se um vácuo na crítica russa. Mas durou o vasio apenas alguns anos: por volta de 1855, um dedicado seguidor do finado crítico, Nikolai Chernishevski, começou a escrever sobre teoria estética e crítica. Contudo, debruçou-se sobre tais estudos apenas uns poucoa abos, pois interesses políticos e econômicos cada vez mais o absorviam”. (pg. 226) “Quando Chernishevski e Dobrolyubov encerravam suas respectivas atividades literárias, Dmitri Pisarev iniciava as suas, também tragicamente interrompidas pela morte: suicidou-se na idade de 28 anos”. (pg. 226) “É evidente a continuidade entre esses críticos e seu mestre Bielinski. No entanto, diferem profundamente dele, por maior que fosse sua sinceridade ao julgarem desenvolver as ideias e concepções do último estágio de Bielinski. A atmosfera intelectual havia mudado muito, em curto espaço de tempo, desde a morte de Bielinski: este crescera no idealiamo alemão e jamais abandora suas doutrinas básicas sobre arte e história. Chernishevski, Dobrolyubov e Pisarev nada entendiam das posições românticas alemãs”. (pg. 226) “Eles devem, antes, ser descritos como monistas materialistas, profundamente influenciados por propagandistas da posição científica, como Vogt, Moleschott, e sobretudo Büchner, e pelos utilitaristas ingleses”. (pg. 226) “Chernishevski (...) deve, como crítico literário, ser colocado numa posição inferior, dentro do grupo. Parece ter sido um homem de bem pouca sensibilidade estética: um pensador rude, áspero, preocupado, mesmo o tratarde assuntos literários, com política imediata. Chernishevski não acredita nem no papel social da arte”. (pg. 227) “ele realmente considerava a literatura um mero substituto, um Ersarz para a vida, um passivo espelho da sociedade”. (pg. 227) “Argumenta contra a estética hegeliana, ou melhor, contra fórmulas hegelianas isoladas nos volumes de F. T. Vischer”. (pg. 227) “A arte é uma inferior reprodução da realidade. A única função da arte é a de propagar o conhecimento da realidade” (pg. 227) “O puramente estético é mero prazer sensual, trivial na melhor das hipóteses, repreensível no pior dos casos. A beleza é simplesmente vida” (pg. 227) “Suas opiniões acerca de artes individuais são igualmente rudes. A escultura é inútil” (pg. 227) “A pintura é ainda inferior à realidade” (pg. 227) “Chernishevski reconhece a música como a extensão direta de sentimento apenas na canção: mas então não é arte, e sim a própria natureza, como o canto dos pássaros. Toda música que se afasta do canto natural, especialmente a música instrumental, é um mero substituto para a canção, e, portanto, é inferior”. (pg. 227) “o homem valoriza o que ele mesmo fez, por causa de sua vaidade, ou porque a arte satisfaz sua tendência ao devaneio, sua sentimentalidade inata, ou simplesmente porque a arte reforça a memória”. (pg. 228) “O que é trágico?, pergunta ele, e responde: simplesmente qualquer sofrimento ou morte; mesmo um risco de morrer. O que é sublime? Tudo o que é mais amplo do que o que se espera de um dado contexto”. (pg. 228) “O conteúdo da arte é toda a realidade, por mais feia que ela seja segundo os velhos padrões”. (pg. 228) “Mas Chernishevski é muito sério ao exaltar a realidade, venerar o fato e o conhecimento, rejeitar tudo que é sensorial, artificial e inútil, afirmar a completa identidade entre a vida e a arte”. (pg. 229) “A resenha de Aristóteles recorre à rejeição da arte por Platão,mas encontra algum valor na teoria da imitação de Aristóteles, embora o critique por seu seco formalismo”. (pg. 229) “‘Uma obra dramática pode tão bem (ou melhor) ser dita numa forma épica’”. (pg. 229) “Estudos sobre a Época de Gogol mostram que Chernishevski tinha os dotes de um historiador intelectual”. (pg. 229) “Sublinha o fato de Bielinski ter sido o primeiro verdadeiro historiador da literatura russa que tinha claras concepções acerca da natureza da história literária”. (pg. 229 - 230) “Pushkin é elogiado como o fundador da literatura russa, o primeiro dentre nós que elevou a literatura a uma significação nacional”. (pg. 230) “O maior louvor é para Gogol, por ser ele o fundador da “tendência crítica” na literatura russa” (pg. 230) “Chernishevski não pode imaginar a arte pura senão como canções de bêbados e conversação erótica”. (pg. 231) “‘poesia é vida, ação, luta, paixão’, (...) a literatura não pode deixar de servir às tendências de uma época”. (pg. 232) “Seria um erro, no entanto, negar a Chernishevski toda sensibilidade literária e habilidade para a análise”.
NIKOLAI DOBROLYUBOV (1836 – 1861)
“Dobrolyubov tinha, decerto, tão pouco interesse pela arte quanto seu mestre, embora escrevesse muito mais exclusivamente sobre as belas letras. Mas aplicou com maior consistência, de maneira mais sistemática e consciente, o ponto de vista indicado por Chernishevski. Como teórico literário, foi o mais importante desses críticos, apesar de ter tão pouco gosto e sensibilidade literária, e de ser tão difuso e repetitivo quanto Chernishevski”. (pg. 233) “Dobrolyubov nunca se cansa de repetir a opinião de Chernishevski, segundo a qual a literatura é apenas um espelho da vida, que reflete, mas não pode mudar a realidade”. (pg. 233) “‘A literatura apenas reproduz a vida, nunca retrata o que não existe na realidade’”. (pg. 234) “A literatura é ‘um modo de saber o que é derrotado e o que é vitorioso, ou o que está começando a infiltrar-se e a predominar na vida moral da sociedade’”. (pg. 234) “‘A literatura é uma força auxiliar, cuja importância reside na propaganda, e cujo mérito é determinado pelo que ela propaga e como propaga’”. (pg. 234) “‘A literatura, diz ele, não pode antecipar a vida, mas pode antecipar as manifestações formais, oficiais dos interesses ativos na vida. Desde que uma ideia esteja apenas na mente do povo, desde que seja vista como realizável apenas no futuro, a literatura deve valorizá-la a partir de vários lados e a partir do ponto de vista de diferentes interesses. Mas, assim que a ideia se transforma em ação, é formulada e resolvida definitivamente, a literatura nada mais tem a fazer’”. (pg. 235) “Dobrolyubov deseja uma literatura inteiramente nacional, acima de partidos e facções, mas reconhece que a literatura tem ‘sempre expressado os interesses e opiniões daqueles cujo ofício era escrever livros ou daqueles que os favoreceram sempre tão pouco’”. (pg. 235) “Gogol chegou mais perto do ideal de Dobrolyubov, mas não o alcançou. Conseguiu um ponto de vista verdadeiramente nacional, mas conseguiu-o inconscientemente. Assim, a adequada fusão de literatura e nacionalidade é ainda um ideal de futuro”. (pg. 235) “Na maior parte das vezes, Dobrolyubov admite prazerosamente sua falta de interesse por assuntos literários”. (pg. 237) “A censura impede-o de escrever sobre a sociedade e a política: a literatura é apenas um pretexto”. (pg. 237) “Contudo, Dobrolyubov fez uma contribuição à teoria do estudo social da literatura. Pela primeira vez, ao que parece, considerou claramente os ‘tipos sociais’ como reveladores de uma visão do mundo de um autor, independentemente de suas intenções conscientes, ou até mesmo em oposição a elas. A verdadeira visão do mundo, de um escritor deve ser procurada nas imagens vivas que ele cria. Pois é nelas que ele concentra os fatos da vida real”. (pg. 237) “Achava que as imagens literárias, com seu clamoroso utilitarismo, ‘facilitavam a formulação de ideias corretas sobre coisas e a disseminação dessas ideias entre os homens’”. (pg. 238) “Tudo deve servir à causa, e se não serve deve ser manejado para servir”. (pg. 240) “Um artista, diz Dobrolyubov, não é uma ‘chapa fotográfica’. ‘Ele cria um todo, encontra um elo vital, funde e transforma os diversos aspectos da realidade viva’. A obra do poeta é ‘algo que deve ser assim, e não pode ser de outro modo’”. (pg. 241)
DMITRI PISAREV (1840 – 1868)
“Dmitri Pisarev destacou-se, a princípio, como rival de Dobrolyubov. Firmou sua reputação como crítico contradizendo e refutando as opiniões e interpretações de Dobrolyubov. Mas essa rivalidade não deve obscurecer o fato de que Pisarev fora também aluno de Chernishevski e de Bielinski, e que em assuntos de teoria literária e posição filosófica geral há pouca diferença entre Pisarev e Dobrolyubov”. (pg. 241) “De modo mais radical, cortou todas as ligações com o passado idealista romântico. Ridiculariza, por parecer-lhe uma piada de mau gosto, a profecia de Heine quanto a importância revolucionária da filosofia alemã, e rejeita os românticos alemães por serem figuras totalmente mortas. Ao discutir Bielinski, a quem reverencia como o pai do realismo, quer tirar-lhe a casca do hegelianismo. Rejeita a ideia de desenvolvimento orgânico como simples ilusão” (pg. 242) “Como seus colegas críticos, Pisarev deixara de compreender o papel da imaginação, a totalidade de uma obra de arte, a distinção entre vida e ficção. Ridiculariza a teoria da inspiração e toda a ideia de uma criação inconsciente. Um poeta pensa uma ideia, e depois a adapta a uma forma escolhida. Isto dá trabalho. Ele é como um alfaiate que corta sua roupa, ajusta-a, retalha cá e lá, muda isto ou aquilo. É possível tornar-se poeta, como é possível tornar-se advogado, professor, jornalista, sapateiro ou relojoeiro. Um poeta ou um artista é um artesão como outro qualquer”. (pg. 242) “Forma e fundo estão completamente divorciadas na mente de Pisarev. A forma é, quando muito, necessária para não obstruir o conteúdo. A linguagem é comunicação, que deve ser avaliada apenas como avaliamos os sinais do telégrafo”. (pg. 242) “A estética, para Pisarev, significa, portanto, a opinião segundo a qual a forma é mais importante que o conteúdo, ou seja, esteticismo, arte pela arte”. (pg. 243) “A atitude de Pisarev com relação à história, e particularmente à história literária, é, pois, completamente negativa. Todas as novelas históricas são inúteis. E também toda a história literária”. (pg. 244) “A definição dos novos homens totais na Rússia é a principal preocupação de Pisarev ao analisar a ficção russa”. (pg. 246) “Pisarev supõe que o autor, se é um bom escritor, reflete cuidadosamente a vida, e que suas atitudes e teorias são irrelevantes: intenções, esquemas lógicas não contam”. (pg. 249) “Analisando nossos três críticos, sentimos que os admiramos por sua devoção à causa. Devemos reconhecer que não estavam essencialmente interessados em literatura. Eram revolucionários, e a literatura era apenas uma arma para a luta. Não viram e não queriam ver que o homem depara com questões que ultrapassam as questões de seu tempo; que a compreensão, que a arte nos faculta do completo significado da existência não parte necessariamente de suas preocupações sociais imediatas. Como críticos, constantemente perdem de vista o texto, confundem (algumas vezes deliberadamente) vida e ficção, tratam personagens de romances como se fossem homens e mulheres reais ou transformam-nas em alegoria” (pg. 251) “Mas esta tendência, destrutiva da própria natureza da crítica literária e da arte em geral, não deve fazer-nos ignorar a contribuição real de Pisarev e seus companheiros para um estudo social da literatura. Sua análise de tipos sociais era algo novo e importante metodologicamente. É preciso, além disso, reconhecer que a Rússia, nessa época, estava realmente produzindo um romance social, a poesia era então derivativa, e o drama era mais um reflexo do romance. Nossos críticos ajudaram a definir e descrever a natureza do romance social, a obrigação do escritor para com a verdade social; sua percepção, consciente ou inconsciente, da estrutura e dos carateres típicos da sociedade. É uma pena que eles o tenham feito em estreitos termos locais, prejudicados por seu forte utilitarismo. O ruído da batalha os aturdiu”. (pg. 252)
OS CRÍTICOS RUSSOS CONSERVADORES
APOLLON GRIGORIEV (1822-1864) “Apollon Grigoriev foi um crítico de grande talento, que, em termos de conhecimento teórico e percepções literárias, se não em influencia histórica, parece sobrepujar os críticos radicais”. (pg. 253) “Grigoriev chama a atenção por sua principal posição: o que ele mesmo chamou ‘crítica orgânica’”. (pg. 253) “O conceito central é “Vida”, concebida como unidade biológica e psíquica. ‘A arte é a expressão ideal da Vida’. É onipresente em todas as nações, como Grigoriev insiste, citado Schelling: ‘Onde quer que haja vida, há poesia’. A arte cresce com a vida, espontaneamente, organicamente. Deve ser, pois, concreta, pessoal, sincera, mas também local e nacional. Está envolvida com a vida de uma nação, expressa suas ideias e aspirações, mas o faz de maneira inconsciente, natural”. (pg. 253) “A crítica orgânica encara a ‘arte como uma compreensão sintética, total, imediata, e talvez mesmo intuitiva, da vida’. (pg. 254) “Grigoriev rejeita o formalismo, a arte pela arte, como abstrato, negativo (no sentido de Schelling) e puramente técnico”. (pg. 254) “Grigoriev empenha-se na luta contra o que ele chama ‘crítica histórica’, isto é, relativismo e evolucionismo... histórico. Este nega as leis estéticas, não tem ‘nenhum critério, nenhuma ideia eterna’, e é, no fundo, ‘indiferentismo e fatalismo’. A crítica histórica é falsa se significa relativismo, que aceita e teria de aceitar qualquer bobagem em seu lugar histórico”. (pg. 254) “‘Tudo que é novo é trazido à vida pela arte apenas; ela corporifica em suas produções o que está invisivelmente presente no ar de uma época. Ainda mais: a arte muitas vezes sente o que está se aproximando no futuro, como os pássaros sentem a aproximação de bom ou mau tempo’”. (pg. 255)
FIODOR DOSTOIÉVSKI (1821 – 1881)
“Julgado pelo pensamento de hoje em dia, Grigoriev é totalmente eclipsado por Dostoiévski, que, depois de Tólstoi, é a maior figura da literatura russa na última metade do século”. (pg. 257) “ele venera com tanto ardor a beleza ideal, celebra de tal modo a beleza do mundo, o paraíso