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VAGINA CRIATIVA:
O caminho do amor
como caminho de religação ao nosso instinto criativo.
RESUMO
A vagina no início (cerca de 20000 anos a.C.) era vista como geradora, criadora, a
terra era o local pululante onde tudo nascia e se manifestava (WOLF, Vagina, 2013). Mas,
com o desenvolvimento da consciência humana, das civilizações, do patriarcado e
industrialização, a humanidade se distanciou dos instintos, da natureza, do corpo, dos
atributos do feminino. E a vagina foi sendo esquecida, marginalizada, culpabilizada, e
blasfemada. A valorização do logos sem conexão com o sentir, perceber, saberes do corpo,
difundiram uma série de exageros. O corpo é o continente limitador, no sentido de ancorar a
matéria, a experiência. O não contato com esta matéria, gera um perder-se no abismo
infindável sem chão, e no infinito céu sem teto, ou seja, não há consciência de um corpo para
conter e manter o que deve ser criado, o que foi pensado ou imaginado. Tudo passa e se esvai.
A vagina é um convite, para voltar as cavernas, as entranhas da terra, nas origens criativas do
âmago do ser, pulsar orgasticamente o movimento natural que é a vida. O presente trabalho
inicia sua jornada criativa nas origens da criatividade como aspecto feminino. Depois coloca
em observação o desenvolvimento histórico e psicológico que fez com que o ser se cindisse,
causando uma esterilidade. Posteriormente, coloca-se o movimento de resgate do feminino
como caminho da criatividade. A criatividade é aquilo que se põe em movimento, e o
movimento é imortal. A vagina criativa é o caminho da criatividade. O caminho do coração.
1
Psicóloga Especialista em Psicologia Analítica, Gineterapeuta, Artista Plástica e em Curso de Pós graduação
em Gineterapia pelo Instituto tecnológico de Educação (ITECNE).
INTRODUÇÃO
Antes de iniciar o trabalho peço a licença de escrevê-lo em primeira pessoa. Senti de
realizar em primeira pessoa para que o leitor possa entrar em contato com a minha própria
experiência vivida. Ao me aproximar do leitor, meu intuito é não de trazer uma teoria em que
o leitor sinta-se distanciado, mas compartilhar experiências humanas relatadas ao longo da
história sobre o universo criativo feminino. Optei por uma escrita em primeira pessoa para
que possa compartilhar a experiência pessoal e interpessoal que vivi ao longo de minha vida
ao resgatar o feminino sagrado em mim. Um dos pontos culminantes foi na formação de
Gineterapia. O quanto foi notável as mudanças em minha autotransformação, e relação
intrapessoal, bem como percebida por outras pessoas e por mim nas relações sociais. O intuito
é caminharmos juntos e compartilharmos com respeito e amor.
A vagina é uma palavra que nos causa muitas reações. Percebi que homens e
mulheres devido nossa história humana junto com a própria experiência pessoal terão reações
diferentes. A vagina parece conhecida e muito falada, mas ao mesmo tempo continua cheia de
mistérios e pré conceitos (WOLF, 2013).
Foi vivenciando em mim, observando no outro, lendo, pesquisando e conectando
com o corpo que pude perceber e compreender, que a criatividade e estados de confiança e o
florescer do verdadeiro eu (que Carl Jung chamou de SELF) estão intrinsecamente
conectados. Mas como comprovar isto? Como dizer que a vagina, coração e cérebro estão de
modo tão conectados, que a sexualidade e criatividade caminham juntos?
Ao conversar com muitas mulheres sobre esta sabedoria sagrada do corpo, pude
perceber que há conexão. Percebi que quando estamos amorosas e criando, ficamos excitadas.
E neste estado podemos ter orgasmos que aumentam nosso sentimento de capacidade e
religação com a espiritualidade (WOLF, 2013). Como também a relação sexual com parceiro
que traz o sentimento de amorosidade pode provocar orgasmos que nos conectam com nossa
criatividade, autoconfiança e espiritualidade (QUALLS-CORBETT, 2002).
Para compreensão deste processo da vagina criativa dividi o presente trabalho em
Criatividade, Vagina e a Dança pulsante e vibrante da Deusa. No primeiro capítulo:
“Criatividade” será abordado questões sobre a criatividade em si, suas definições e como a
criatividade é um instinto humano que procura se realizar.
Depois vamos resgatar a história da palavra vagina. Sua origem e etimologia.
Significados e evolução ao longo da história humana. Percebendo assim ao longo da história
como a vagina foi e é domesticada de várias formas, seja pelo controle com sua amputação e
medicalização; seja pela idéia de liberdade com a liberdade sexual e pornografia (WOLF,
2013).
Em seguida o segundo capítulo: “A dança pulsante e vibrante da Deusa” será
abordado o resgate da sacralidade e do vibrar. O retorno a Deusa (ao feminino em nós), ao
corpo, a natureza como necessário movimento de cura, de restabelecimento, de reconexão,
movimento que nos retorna a nossa natureza fértil e criativa (PENNA, 1992).
No entanto, para que a mulher seja criativa, ela precisa encontrar o ser feminino
dentro dela, para então unir ao seu masculino interior e realizar a criatividade inerente a nós
mulheres (QUALLS-CORBETT, 2002). No encontro do feminino e masculino ressoamos
amor. O Amor é o que liga e norteia. É o caminho de religação entre corpo e mente. Entre
vagina e cérebro. Em todos os mitos de criação, o amor permeia o caminho, o amor é a
energia em movimento. O Amor é a dança da vida.
Conectando a vagina e a criatividade, fazemos o caminho do resgate da imagem do
feminino, da mulher e da sacralidade. Tudo na vida vem através da criatividade. Tudo se
movimenta por ela. Tudo pulsa por ela. A criação é um ato da vagina e cérebro com o
coração. Ardente, desejoso, pulsante, vivo, com emoção e alma (PENNA, 1993).
I CRIATIVIDADE
A criatividade para mim sempre esteve atrelada ao corpo. Desde pequena, percebia
que quando eu permitia ser eu mesma, em estado amoroso, meu corpo excitado criava através
de minhas mãos. Sentia-me pulsante e vibrante. Já adulta me percebia neste ciclo também nos
orgasmos da relação sexual amorosa e durante minha primeira gravidez descobri que o útero e
a vagina pulsam como o coração. Então quando me via conectada, confiante, orgástica e
criativa passei a dizer: “minha vagina está vibrando”. Compartilhando com outras mulheres
elas também confidenciaram este estado criativo, confiante e espiritual. E guardam como
segredo, já que elas percebem que é um estado que parece estranho para uma sociedade
anestesiada de corpo.
Já mulheres e pacientes que haviam sofrido algum tipo de violência psicológica ou
física traziam a sensação oposta, de não confiança, perda de si mesma, e desconexão
espiritual. Além de um corpo marcado por dores ou anestesiado, e sem equilíbrio. O medo é
um estado presente, como também um não se sentir criativa (WOLF, 2013).
Mas o que é criatividade? No dicionário HOUAISS (2001) da língua portuguesa
coloca: “qualidade ou característica de quem ou do que é criativo. Inventividade, inteligência
e talento, natos ou adquiridos, para criar, inventar, inovar quer no campo artísticos, quer no
campo cientifico, esportivo”.
Já ARANHA e MARTINS (1993), trazem outras variantes sobre o criar: significa dar
existência, criar do nada; ou ainda dar origem a; gerar, formar, como também dar princípio a;
produzir, inventar, imaginar, suscitar. Enquanto que quem é criador é uma pessoa inventiva,
fecunda, criativa. Assim como OSTROWER, artista plástica e teórica das artes, em seu livro
“Criatividade e Processo de Criação” (1978, p.9) que a criatividade é “basicamente
formar”. O ato de formar na criatividade é dar um corpo, uma forma a algo. O ato de criar
abrange a compreensão, relacionar, ordenar, configurar, significar. Aqui aquele que dá forma,
é um ser criativo. Outra definição de criatividade segundo FROMM citado por GRAIG
(1995), “criatividade significa tornar ciente e reagir ou, prontidão para nascer novo a cada
dia”.
Ao estudar a etimologia da palavra criar, gerar chegamos a seguinte correlação, a
palavra “Koo” era um termo pré histórico que significava, orifício fértil, orifício que tudo
criava. Seu significado era o ato criar, de dar a luz, posteriormente tornou-se sabedoria.
Criatividade é dar existência a algo (WOLF 2013). Vagina e criatividade tem sua origem tão
atrelada, como observa-se no capitulo seguinte.
II VAGINA
O termo vagina só foi usado a primeira vez para designar como órgão sexual
feminino que vai do colo do útero até a entrada da vulva, por um anatomista Alemão Johann
Vesling (1598- 1649). A palavra vagina originou se do termo em latim vagina, que se referia
ao tecido, a bainha que cobria a lâmina, cobria a espada. Com alusão ao ato sexual, ou seja, o
pênis dentro da vagina (a espada dentro da bainha) (WOLF, 2013).
Anteriormente o órgão feminino não era definido pela palavra vagina. Era definido
por koo, ou cu, de origem pré histórica (20.000 a. C). Expressava o feminino fecundo, e outras
noções relacionadas. Então a terra com seus orifícios, o buraco era dito como sagrado e
fecundo, o mistério do qual se originava todas as coisas (WOLF, 2013). A humanidade
compreendia o mundo da perspectiva unificada com a terra, a terra era a divindade, e tudo que
nela se originava era sagrado. Ou seja, a humanidade não se via separada da terra sagrada
(WITHMONT, 1991). Terra, mulher, vagina e criatividade são a mesma coisa.
Segundo o lingüista Thomas Thorne (WOLF, 2013), aponta que cu na língua
protoindo-europeia era também cognato para termos femininos/ vaginais. Assim como
“cus”no hebreu; “cush” no árabe, e “kush” e “khunt”; “Kuni” (mulher) no nostratico;
“cuint” (cunt), no irlandês. Ainda temos os termos “cyn”, “kuni”, “kin”, abertura vaginal da
Deusa. Na língua tupi mulher é “ku-nã” (cunhã),menina adolescente é “cunhãtã” ou
“cunhataim”. A escrita cuneiforme, escrita Suméria de fazer vincos na argila era a criação
das palavras, representa bem a imagem do orifício sagrado. Todas demonstram uma raiz
profunda do feminino remetendo a imagem do orifício, do corpo de onde tudo surge
(PENNA, 1992).
Posteriormente esta mesma raiz deu origem as palavras conhecer, “cognescer”
(latim); “ken”, “can”, saber, dar a luz; “cuninng”, sábia. Transformando em outras variações
que traziam o sagrado, o feminino, sabedoria e o criar em suas representações. Cuniculus,
passagem; “cow”, vaca; “cowrie”, molusco; “cundy” e variações também se referindo a
água, canal de água subterrânea; “Quefen-t”, nome de uma Deusa (faraó Path-hotep), “Cunti-
Devi” se referindo a outra Deusa indiana. Assim, a vagina, era o orifício criativo, de onde
vem a vida, o ato de gerar, criar, dar a luz, conhecer, saber, a divindade.
Ao longo da história humana, quando a mulher foi deixando de ser socialmente e
culturalmente indivíduo, e passando a ser propriedade. A sociedade passou a olhar a terra e a
mulher como propriedade, bens a serem explorados. As imagens da Deusa foram sendo
colocadas como demoníacas, o corpo estava sendo renegado, o dilema entre corpo e mente
estava instaurado, a cisão estava ocorrendo (WITHMONT, 1991). A mulher e a vagina ao
longo desta história foram punidas, perseguidas, medicalizadas, controladas e marginalizadas
(PENNA, 1993).
Resumindo-se da divindade do período Paleolítico, os estudos de Marisa Gimbutas
(The Language of the Goddess, 1991), traz que a humanidade começou a fazer seus primeiros
artefatos representando os dons da Deusa de criar, gerar e nutrir. A deusa era louvada.
(ANEXO 1). Posteriormente com a separação entre feminino e masculino. Temos os cinco
livros de Moisés.que evidenciam seu horror à Deusa e ao comportamento sexual feminino. A
vagina e o clitóris eram amputados nas tribos como método de controle das mulheres
(PENNA, 1993).
Na antiguidade clássica, com Platão (427-347 a. C.), Hipócrates (c. 460-370 a. C.),
Aristóteles (384- 322 a. C.) culminando em Galeno (c. 129- 200 a.C), desenvolveram a idéia
que a mulher não era perfeita, e que a relação de um homem com ela era estritamente para
procriação, e que a mulher não precisa ter prazer ou excitamento para procriar. A vagina era
um pênis invertido, por isso não perfeita. Desta época usa-se a palavra buceta para designar a
vagina. Buceta, buc, box, caixa. Eta, pequena, pequena caixa que as mulheres usavam para
guardar pertences valiosos (WOLF, 2013). No entanto, na mesma época temos como tesouro,
Safo2 e suas poesias. Que celebra o erotismo feminino, e a excitação sexual (ANEXO 2),
utilizando metáforas para falar da vagina, a vagina eram as flores, a terra, as frutas, os
animais.
Foi com Paulo (século I d.C), o apóstolo que surge a idéia da mulher como impura.
Ele coloca veementemente a abstenção sexual como caminho da pureza e a mulher, como
pecado (WOLF, 2013). Ele também, difunde a idéia da realização da mulher residir na
procriação (ventre bendito x ventre seco). A mulher como pecadora com sua sexualidade. A
serpente antes um dos atributos das Deusas férteis, do amor, agora era colocado como
símbolo do mal. O sexo só era perdoado dentro do casamento, e para procriação. Como a
mulher é o mal ela é culpada no abuso e no estupro.
Na caça às bruxas (durante a inquisição dos séculos XIV e XV) as mulheres que
tinham conhecimento, prazer sexual e eram definidas como atraentes eram condenadas como
bruxas (Martelo das Feiticeiras, Introdução de psicólogos, 2004). Difundiu-se o uso do cinto
de castidade e tantos outros objetos para punir e controlar o corpo e a vagina. Entretanto, o
renascimento, com os proibidos estudos de anatomia, procurou olhar o corpo como ciência,
longe do pecado (ANEXO 3).
Na era Elisabeteana e Vitoriana, temos o desenvolvimento de métodos de controle,
da mulher e da vagina. As mulheres são definidas como “recatadas” e “promíscuas”. A
mulher e a vagina má deveriam ser controladas, medicalizadas, amputadas e internadas. Os
males mentais eram oriundos da vagina. No consultório médico, a “mulher de família”,
“recatada” poderia ser tratada com massagens vaginais para tratar histeria. Foi o berço do
nascimento da ginecologia como especialidade médica. O clitóris era visto como a causa da
corrupção moral. A centralização do saber estava nos homens, e a medicina, nos médicos
homens (WOLF, 2013).
Em 1860 a 1890 as práticas ginecológicas chegaram ao seu ápice de cirurgia de
retirada de clitóris, e o chicote contra masturbação sob a justificativa que, faziam ficarem
mais calmas. E que todo mal sexual devia ser combatido para não desvirtuar uma “boa moça”.
2
Safo em grego antigo: ώ. Foi membro da aristocracia e importante representante
feminina da lírica grega. Teria nascido em Lesbos por volta de 630 a. C. Nove livros de
poesia nos chegaram apenas, um poema completo e dezenas de fragmentos. Exilada por
divergências políticas na Sicília, posteriormente retorna a Lesbos. Se relacionou com outras
mulheres no culto a Deusa Afrodite. Fundou um colégio de meninas, onde aprendiam a serem
mulheres completas, segundo a idéia de feminilidade de Safo.
Com Freud temos desenvolvimento dos estudos sobre sexualidade e a repressão sexual, no
entanto a mulher ainda é classificada, entre orgasmos infantis e maduros (WOLF, 2013).
O movimento feminista (iniciado no século XIX), trouxe a luta da mulher por
direitos iguais, respeito e justiça. Contestou o julgamento moral sob as mulheres e sob a
vagina. O feminismo passou a questionar o agressor, de vilã a mulher tornou-se vítima. Neste
período inicia se as descobertas sobre o clitóris, e a vagina, esquecida. Somente em 2009,
ocorrem descobertas da região interna do clitóris (WOLF, 2013).
As modernistas e a contracultura no fim do século XIX, quebraram barreiras. A
vagina é falada de forma mais direta, em defesa da sexualidade feminina. O aconselhamento
conjugal começou a separar o sexo da procriação. O egoísmo infantil masculino era criticado.
Foram desenvolvidas técnicas e difundidas, para o prazer da mulher (o beijo genital,
cunilíngua, estimulação de clitóris, e o multiorgasmo). Nas artes o resgate da “língua de fogo”
de Safo (WOLF, 2013). No entanto, o movimento era aplaudido quando vindo de um homem,
a voz feminina ainda era abafada.
Em 1976, Shere Hite publicou The Hite Report: A Nationwide Study of Female
Sexuality, saiu da perspectiva de Freud, e trazia o novo. Os relatos de mulheres, com suas
próprias palavras falando sobre o que sentiam durante o ato sexual. Anteriormente os livros
antigos supunham o que as mulheres deveriam experimentar durante do sexo. No entanto, a
indústria pornográfica de teor patriarcal e alguns médicos ainda olhavam a mulher como mera
carne. Tudo era motivo de diversão, prazer, sem perceber o comportamento inconsequente
(WOLF, 2013).
A gama da experiência sexual como espiritual, criativa e florescimento da alma foi
anulado com a revolução sexual que trouxe uma falsa liberdade. A mulher continuava a ser
controlada ou pela idéia de “recatada”, ou pela idéia de “livre” com o uso da pílula. Somente
em 2010 verificou-se que a pílula causa danos ao corpo e ao cérebro feminino. A liberdade
imposta na revolução sexual e a medicalização afastaram a nós mesmas de nossos corpos e de
nossa sabedoria.
Ao desenvolver sobre a história da vagina, minha vagina se contorcia e doía. Para me
restabelecer, senti necessidade de estar com mulheres, conversar, fiar, pintar, meditar,
namorar, ter relações sexuais e contato afetivo mais prolongado. Minha alma, meu corpo
buscava meios de se curar, voltar a vibrar. A criatividade voltou a pulsar, minha vagina estava
feliz de volta. Sentia-me forte, corajosa, e criativa para seguir adiante.
No capítulo seguinte será abordada a potência da vagina, e como ela não é apenas um
órgão, mas uma rede complexa que traz um sentimento de completude feminino. Seja,
corporal, espiritual e psicológico.
O tantra procura fazer a conexão com a ponte criativa da mulher. Quando nós
mulheres estabelecemos a ponte com nossa criatividade, sistema vagina cérebro fluindo
positivo, nós nos tornamos sagradas novamente. O tantra é a dança que cura. O “ato de amor é
o mais elevado e oculto de todos os mistérios” (Apostila de Gineterapia- A Arte de Cuidar da
Mulher, Sexualidade Sagrada, 2010). O tantra fala do sexo e orgasmo não como sexo
desenfreado, ou do sexo como alívio de tensões. Mas quando estamos conectadas a nossa
espiritualidade, quando nos mantemos virginais e entendemos que a relação sexual é um ato
de reconectar com nossa potência através da ponte do Amor. E então através de técnicas e
rituais canalizo essa potência criativa transformadora (ANEXO 4). Ensina a elevar a energia
através dos caminhos “astrais do corpo” (GIRALDEZ, 2010), produzindo uma alquimia
interna, magnetizando a coluna espinhal, o fluido cerebroespinal e as propriedades elétricas
dele, são alteradas. O movimento desobstrui, flui a criatividade, o movimento é o Amor em
ação (ANEXO 5).
O fogo cósmico, a Shakti, inunda todo nosso corpo, ao fazer a subida da vagina,
coluna espinhal, cérebro e pineal e pituitária (Anexo 6). A energia flui, e a consciência se
modifica, não sou mais a mulher que era anteriormente, caminho para me autorrealizar, o que
Jung chamou de Processo de Individuação (ou tornar-se Si-mesmo). Na transformação
criativa, nossos sentidos se expandem, ocorre uma intensa vibração percorrendo todo o
sistema nervoso central. Os antigos mitos de criação trazem esta imagem, a da Deusa ficando
grávida e gerando um filho o qual se torna seu consorte (NEUMANN, 1999).
Ao participar de um curso de orgasmo com uma mulher aprendiz das “abuelas”(
velhas sábias), parteiras mexicanas, ela trouxe uma experiência do orgasmo, com conexão
espiritual incrível. Meu corpo vibrava e pulsava como se o cosmos todo estivesse em mim.
Lembro que sua fala principal era: limpar a mente e o corpo de qualquer julgamento,
definição, paradigma, lei ou ordem que tínhamos até aquele momento sobre nós, nosso corpo,
a vagina e o orgasmo. E ela foi cantando, conduzindo, e à medida que ela limpava, e nós
permitíamos adentrar somente no sentir, estávamos em orgasmo. Um orgasmo com visões.
corpo vibrando e pulsando. E falei:
“Bem-vinda, Deusa. Vibrando e pulsando. Minha vagina está sorrindo.”
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Caminhei das origens da palavra criatividade e vagina. Reconectei suas pontes e
associações. Conheci a história da mulher, do feminino e da vagina. Compartilhei imagens e
histórias com você. Do sagrado ao profano e marginalizado me levanta a seguinte questão
sobre a vagina e cérebro, criatividade, autoconfiança e espiritualidade: que temos que rever os
conceitos sobre, nós mesmas. Mulheres. Rever o que até o momento foi exigido de
comportamento nosso. Como fomos definidas e olhadas. Como nos relacionamos com nosso
corpo, vagina e ciclos. Como me relaciono com o outro. E como o outro se relaciona conosco.
Rever o modo como vemos o corpo, psique e alma. Estão tão conectados que um
olhar integral seja necessário. Que as reações não são causa e efeito, mas sincrônicas a alma,
corpo e psique. Que nós mulheres ao longo da história, como potencial criativo e
revolucionário fomos atacadas de modo sistemático. O que me faz questionar o conceito de
estupro. E o quanto ao longo da história humana, o ataque à mulher, foi um meio de controle
político, social e religioso. Para combater o livre movimento criativo, revolucionário. Para se
ter todo um povo manipulado e anestesiado. O estupro não seria um ato violento a uma parte
do corpo, mas a todo ele, cérebro, psique e espiritualidade. Seria um ato de violência a toda
uma comunidade, e eu afirmaria: global.
Rever o conceito de nós mesmas, como mulheres, e também o próprio conceito de
homem. Nos tornarmos livres para realizar o caminho de reconexão com nosso potencial
criativo. Romper com o que foi definido até o momento e permitir conhecer o novo, o
desconhecido (ANEXO 7).
Neste caminho, estamos vivendo uma ponte entre, ciência e antigos mistérios se
unindo. Um novo olhar sendo observado. A vagina, a mulher, reconectando com seu
potencial, a serviço da vida. O ato de Amar faz com que estejamos todos a serviço da vida. E
a mulher é a representação da vida. Ao nos conectarmos com este aspecto em nós. Podemos
curar o masculino e ensinar ao homem e a nós a sermos servos da vida. CAMPBELL
afirmava que o homem só entendia a vida ao conhecer uma mulher. E que a palavra conhecer,
saber, como vimos anteriormente remete à vagina, ou seja, conhecer e se relacionar de modo
íntimo, sexual. “A mulher representa a vida, o homem é o servo da vida” CAMPBELL (citado
por PENNA, 1992). E a mulher é a Vida e o Amor se ela estabelece a conexão com sua
natureza.
Desta caminhada percebi o quanto se faz necessário o caminho do Amor como
reconexão, como o Tantra traz. Para podermos nós mulheres reconectar com nossa essência
criativa, e realizarmos nossas almas. Percebi que o caminho nunca é só. Só nos
transformamos na arte do encontro, nas relações. O quanto o pulsar e vibrar da vagina não é
só sexual, é além daquilo que nossa sociedade entendeu por sexual. É criatividade, é realizar a
si mesmo, com confiança.
O hieros gamos acontece, a conunctio. Quando experimentamos a nossa conexão
com o Amor, Eros, nosso princípio feminino. Quando aceitamos a parte que desconhecíamos
em nós, projetada no outro que habita nosso inconsciente. A vagina, o graal, o recipiente, o
feminino encontra a espada que a faz ressoar. O amor, energia em movimento que liga e
conecta tudo. Faz do sexo divino. No entanto, quando nossa sociedade condenou a
sexualidade, condenou a ponte amorosa, o amor e sua expressão divina (PENNA, 1993).
De um jeito ou outro, ao longo da história a vagina mesmo marginalizada esteve
presente, e está a fazer seu retorno, não como antes, mas num novo padrão junto ao masculino
que se encontra num novo padrão. Para JUNG a psique obedece à lei da máxima da
autorrealização, como todo ser vivo. Assim como o coletivo Não temos como fugir de realizar
aquilo que somos. O desviar deste caminho nos traz como conseqüências, sintomas e doenças.
É como se toda atividade psíquica estivesse direcionada para este fim maior, ser o que somos,
uma atividade de criar a nós mesmos.
A necessidade é de cantarmos as nossas relações, como divinas. O respeito à mulher
e ao homem se estabelece a cada nova conexão oriunda da arte do encontro. Trazendo uma
nova consciência. O resultado é constante transformação. Livres de definições. Ressoando
Amor. Como na dança de Tara (dança e meditação realizada em aula de Gineterapia, ano
2016).
Para finalizar quero deixar um presente. Gostaria de compartilhar os nomes sagrados
da Deusa, da vagina, restabelecer seu sentido sagrado e criativo:
“Shácti, Yoni, Lótus de Ouro, Lugar Oculto, Sala Perfumada, Portão de Jade, Portões do Paraíso,
Porta de Jade, Perola Preciosa, Vale Misterioso, Portão Celestial, Portão Misterioso, Rosa Vermelha, Tesouro,
Bola Vermelha, Chitrini- Yoni (mulher elegante), Flor de Jade, Padmini (mulher Lótus), Shankini (fada ou
mulher concha), Lótus de Sua Sabedoria, Colo de Mel, Barco do Paraíso, Jardim Perfumado, Jardim
Sagrado.”(WOLF,2013).
Não racionalize, só sinta o que cada nome causa em seu corpo. Cada um sentirá de
seu jeito, a seu modo e a seu tempo. A ponte sendo reconectada, a vibração retornando.
REFERÊNCIAS
JUNG, Carl. Gustav.. Psicologia do Inconsciente. Vol VII/1. 13 ed. Petrópolis, Rio
de Janeiro: Vozes, 2001.
_____. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Vol IX/1. 2 ed. Petrópolis, Rio de
Janeiro: Vozes, 2002.
_____. O Espírito na Arte e na Ciência. Vol XV. 3 ed. Petrópolis, Rio de Janeiro:
Vozes, 1991.
ANEXO 1:
Há 5000 anos a vulva de Inana era sagrada e adorada, os hinos sumérios louvavam o
“colo de mel”, e a vulva era o “barco do paraíso”. Celebravam a abundância que brotava de
seu ventre.
“Quando Inana inclinou-se contra a macieira. Quando ela se inclinou contra a macieira sua vulva
era maravilhosa de se ver. Regozijando-se com sua maravilhosa vulva, a jovem mulher Inana aplaudiu a si
mesma. Ela disse, Eu, a Rainha do Paraíso, visitarei o Deus da Sabedoria(...)”. em A Prostituta Sagrada, Nancy
Qualls-Corbett).
ANEXO 2:
“Feliz quem junto de ti, só por ti suspira. Quem goza o doce prazer de te ouvir falar; quem merece um
só dos divinos sorrisos dos teus lábios. Nem os deuses na sua eternal felicidade podem igualar-te. Mal te vejo,
sinto correr de veia em veia uma chama subtil por todo o corpo, e nos doces...» (tradução em prosa de uma ode
de Safo, por Adelino Pereira da Silva; fragmento da poesia de Safo na Sackler Library, Oxford)
ANEXO 3:
AFRODITE
Eu amo e sou amada
Eu amo e sou amada.
Tomo banho de espumas,
Minha pele é dourada
Eu amo, Eu amo
Eu amo e sou amada
Chamam-me Afrodite
Vênus e Inana.
Eu amo, Eu amo
Eu amo e sou amada
ANEXO 5:
KUNDALINI
Kundalini é a força radiante
Que nasce do fundo da Terra.
ANEXO 6:
Fogo Sagrado
Saúdo o fogo criador
no homem e na mulher
A Força Vermelha da Paixão
no homem e na mulher
KUUNDALIINI-AT-OM
KUNDAALINI... ISIS
ANEXO 7:
Imagine uma mulher que acredita que é certo e bom ser mulher
Uma mulher que honra suas experiências e conta histórias,
Que se recusa a carregar pecados alheios no seu corpo e na sua vida.
Imagine uma mulher que acredita na sua bondade
Uma mulher que se respeita e confia em si mesma
Que ouve seus desejos, anseios e necessidades
E os realiza com ternura e graça.
Imagine uma mulher que acredita a pertencer ao mundo
Uma mulher que celebra a sua própria vida
Que é feliz por estar viva.
Imagine uma mulher que reconhece
A influência do passado sobre o presente,
Uma mulher que superou o seu passado
E o está curando no presente.
Imagine uma mulher que ama seu corpo,
Uma mulher que se contenta com seu corpo assim como ele é
Que celebra seus ritmos e fases como valiosos recursos.
Imagine uma mulher que honra a face da Deusa
No seu próprio rosto que muda,
Uma mulher que celebra a passagem dos anos e sua sabedoria
Que se recusa a usar sua energia vital para disfarçar as mudanças do seu corpo e de sua vida.
Imagine uma mulher que cria sua própria vida
Uma mulher que decide, age e se movimenta por si mesma
Que se entrega somente ao seu Eu verdadeiro e à sua sabia voz.
Imagine uma mulher que escolhe seus próprios deuses
Uma mulher que imagina o divino a sua própria imagem e semelhança,
Que define sua espiritualidade e se deixa por ela guiar na sua vida.
Imagine uma mulher que valoriza as outras mulheres
Uma mulher que senta ao lado delas em círculo
Que é por elas lembrada de suas próprias verdades,
Imagine uma mulher poderosa e segura de si mesma
Uma mulher corajosa que assumiu seu lugar, por direito ao lado dos homens
Um mulher sábia cujas as crenças se refletem nas suas relações.
-A God Who Looks Like Me, Patrícia Lynn Reilly. FAUR, Mirella. Círculos sagrados para mulheres
contemporâneas. São Paulo: Pensamento, 2012.