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Que todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes e têm certos
direitos inerentes, dos quais, quando entram em um estado de sociedade, não podem, por
qualquer pacto, privar ou despojar sua posteridade; ou seja, o gozo da vida e da liberdade,
com os meios de adquirir e possuir propriedade, e buscar e obter felicidade e segurança.1
Já a Declaração de Independência teve seu rascunho também criado por Thomas Jefferson
submetido à revisão de outros dois autores e entregue por um comitê de cinco notáveis ao
Congresso Americano (U.S. National Archives & Records Administration, 2018a). O trecho que
trata desta locução se localiza logo nos primeiros parágrafos deste documento histórico, conforme
excerto abaixo (U.S. National Archives & Records Administration, 2018b):
Acreditamos que estas verdades são evidentes por si mesmas, que todos os homens são
criados iguais, que são dotados por seu Criador com certos direitos inalienáveis, dentre os
quais se encontram Vida, Liberdade e a busca da Felicidade. (…) Que para assegurar estes
direitos, Governos são instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do
consentimento dos governados, que sempre que qualquer Forma de Governo se torne
destrutiva destes fins, é direito das pessoas alterá-lo ou aboli-lo e instituir novo governo,
amparando sua fundação nestes princípios e organizando seus poderes de forma tal que para
eles pareça mais possível resguardar sua Segurança e Felicidade. 2
O texto descreve a busca da felicidade como um direito inalienável, que deve ser assegurado
pelo ente estatal. Na declaração, o Estado existe não para servir aos interesses de uma divindade
apontada ou para uma classe comercial privilegiada, mas para garantir o direito de todas as pessoas
terem uma vida livre e satisfatória.
Cabe ser ressaltado que a Declaração de Independência não é lei, não pretende ser lei e não
se destina a ser lei. Os tribunais não a aplicam como lei. A maior parte dos juízes considera que a
Declaração expressa algumas “declarações gerais sobre direitos inalienáveis ou 'justiça
fundamental'”, mas diz “pouco sobre as prerrogativas de um indivíduo em situações factuais
concretas”. Em vez disso, o esmagador consenso dos juízes é que a Declaração sozinha, no todo ou
em parte, não contém nenhuma norma aplicável (Miller, 2015).
Isso não significa que não tenha valor jurídico. Sua linguagem passou a ser utilizada na
elaboração de doutrinas constitucionais específicas. Conforme Cosgrove (1998), estas seguem o
princípio do stare decisis, elaborando a Constituição por meio do atendimento à cadeia precedente
1 That all men are by nature equally free and independent and have certain inherent rights, of which, when they enter
into a state of society, they cannot, by any compact, deprive or divest their posterity; namely, the enjoyment of life
and liberty, with the means of acquiring and possessing property, and pursuing and obtaining happiness and safety.
2 We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with
certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness. (…) That to secure
these rights, Governments are instituted among Men, deriving their just powers from the consent of the governed,
that whenever any Form of Government becomes destructive of these ends, it is the Right of the People to alter or
to abolish it, and to institute new Government, laying its foundation on such principles and organizing its powers in
such form, as to them shall seem most likely to effect their Safety and Happiness.
de casos que delineiam o estado da lei. Segue-se que a única autoridade que a linguagem ou teoria
política da Declaração de Independência pode ter para a interpretação doutrinária da Constituição é
a que goza dentro da cadeia de precedentes.
Um exemplo prático do uso da expressão “busca da felicidade” na jurisprudência americana
é nos casos de julgamento “Slaughter-House” (ou “abatedouro”) na Suprema Corte Americana. Em
1869, o Poder Legislativo do estado da Louisiana aprovou um contrato de monopólio de vinte e
cinco anos para a “Crescent City Landing and Slaughterhouse Company” efetuar o abrigo e abate
de animais. O propósito extensível da norma legal era proteger a saúde. do público limitando o
abate de animais a uma única corporação e os locais limitados atribuídos a ele. No entanto um efeito
do ato foi que outros açougueiros na área de Nova Orleans não tiveram outra escolha a não ser
pagar pelo abate no matadouro com o monopólio. Apesar da Suprema Corte ter mantido a norma
por uma margem apertada, em um dos votos dissidentes, o Juiz Fields defendeu o direito dos
trabalhadores de praticar seu comércio, argumentando que a Quarta Emenda à Constituição
"pretendia dar um efeito prático à declaração de 1776", na qual "a busca da felicidade "parece um
desses direitos que " a lei não confere, mas apenas reconhece. Conforme este magistrado, a busca
pela felicidade, contém o direito de seguir qualquer uma das ocupações ordinárias da vida
(Cosgrove, 1998).
A busca da felicidade também surge na jurisprudência como um dos direitos individuais
protegidos pelo princípio do devido processo legal substantivo. Este princípio questiona se a
privação do governo da vida, liberdade ou propriedade de uma pessoa é justificada por um
propósito suficiente, examinando se há justificação substantiva suficiente, uma razão boa o
suficiente para tal privação (Chemerinsk, 1998).
De acordo com Leal (2013), o direito à busca da felicidade corresponde à necessidade de
abstenção, por parte do Estado ou do particular, de atuações que interfiram na execução dos
projetos racionais de realização de desejos ou preferências legítimas, sobre as quais, o titular,
enxerga chance de êxito.
No caso Meyer vs Nebraska, a Suprema Corte declarou que uma lei estadual que proibia o
ensino da língua alemã era inconstitucional. Na decisão a corte entendeu que a lei atacava a
liberdade dos pais de criar seus filhos, afirmando que esta liberdade (Chemerinsk, 1998, p. 1505):
Denota não apenas a liberdade da restrição corporal, mas também o direito do indivíduo de
contratar, de se engajar em qualquer das ocupações comuns da vida, adquirir conhecimento
útil, casar, estabelecer um lar e criar filhos, adorar a Deus de acordo com sua própria
consciência e, em geral gozar dos privilégios há muito reconhecidos no direito comum
como essenciais para a busca ordenada da felicidade por homens livres. 3
De acordo com Leal (2013), há inúmeros casos que mencionam o direito à busca da
felicidade na jurisprudência americana. Um caso por este citado foi o Olmstead v. EUA julgado
pela Suprema Corte, onde o voto vencido do juiz Brandeis rejeitou as provas obtidas por
escutas, compreendendo a busca da felicidade como o direito de ser deixado em paz.
No Direito pátrio, não há previsão legal expressa do princípio da busca da felicidade. Leal
(2013) utiliza os diversos dispositivos em que a expressão “bem-estar” é utilizada no texto
constitucional para aduzir que esta é expressão abraçada pela doutrina contemporânea – well-
being – para designar felicidade de forma mais neutra. O direito à busca da felicidade estaria
inserido no ordenamento jurídico constitucional brasileiro como um direito fundamental.
Conforme Ribeiro (2016), o STF tem utilizado o direito à busca da felicidade como
fundamento para suas decisões. Dentre os julgados, destacam-se a ADI 3.510, que tinha por objeto
o art. 5º da Lei 11.105/2005 (Lei de Biossegurança), e ADPF 132, que tratou do reconhecimento da
união estável homoafetiva.
3 Denotes not merely freedom from bodily restraint but also the right of the individual to contract, to engage in any of
the common occupations of life, to acquire useful knowledge, to marry, establish a home and bring up children, to
worship God according to the dictates of his own conscience, and generally to enjoy those privileges long
recognized at common law as essential to the orderly pursuit of happiness by free men.
Na ADI 3.510, a Suprema Corte analisou a constitucionalidade de utilização de células-
tronco embrionárias que vinha previsto no art. 5º da Lei de Biossegurança. Conforme o voto do
Ministro Celso de Mello:
REFERÊNCIAS