Racionais MC’s é um grupo de rap brasileiro que foi fundado em 1988, composto
por Mano Brown, Edi Rock e Ice Blue, além do DJ KL Jay. A década de 1980, na leitura
de Luiz Claudio Barcelos, foi um período que ainda esteve na onda do movimento “black
soul”, que tomou forma principalmente a partir dos anos 1970.
O “black soul” foi um movimento de caráter principalmente cultural, que visava
garantir formas de lazer à população negra periférica da cidade de São Paulo naquele
período. Esse movimento foi lido como um movimento que conseguiu aglutinar um
grande contingente de pessoas, mas que, não obteve igual importância no campo político.
Ou seja, na década de 1970, em São Paulo, o movimento negro já se movimentava
culturalmente, mas ainda não tinha o que era necessário para instrumentalizar esse
movimento politicamente. (BARCELOS, 1996, p. 12)
Em contrapartida, nessa mesma década de 1970, mais precisamente em 1978, o
Movimento Negro Unificado fora criado, esse movimento, lido por Barcelos como o
“mais nítido projeto de político de mobilização racial contemporânea” (BARCELOS,
1996, p. 13). Essa organização, antes de vir a ser o MNU, era denominada como
Movimento Único Contra a Discriminação Racial. A troca de nome foi um marco no que
diz respeito ao quê se propunha o movimento. A adoção do caráter racial, entendido na
adição do “negro” e a ruptura com os demais movimentos de esquerda, que
necessariamente não tinham como pauta a questão racial, significou também uma menor
participação de diversos outros atores políticos nesse movimento.
Dois aspectos são fundamentais quando falamos no Movimento Negro Unificado:
primeiro, o MNU foi um movimento que entendeu as condições primarias que
perpassavam por seus quadros, todos eram negros e quase todos eram pobres. Ou seja, o
MNU fez a integração entre raça e classe; segundo, o MNU assim como diz o seu nome,
tentou fazer a junção de todos os movimentos negros do período, fossem eles de caráter
cultural, político, étnico ou o que quer que fosse. (BARCELOS, 1998, pp. 198-199)
Sales Augusto dos Santos (2008) coloca que até a década de 1990, os movimentos
negros clássicos, onde o MNU se encontrava, necessitavam de certa metodologia para o
combate ao racismo. O papel do movimento negro clássico foi esse, disseminar a
consciência, principalmente nas periferias dos grandes centros urbanos, que as relações
entre pretos e brancos são extremamente desiguais.
O trabalho que Santos coloca é que, a partir dessa movimentação inicial do
movimento negro na década de 1990 de construção da consciência, as formas de
resistência à discriminação racial por parte do movimento negro tiveram de ser
repensadas, pois essa resistência não encontrou êxito em transformar suas reivindicações
e denúncias em políticas publicas efetivas de combate à descriminação.
Se a admissão de que o sistema é racista não foi posta em pauta, podemos imaginar
como se seguiu o debate sobre as formas de combate ao racismo pelas instituições. Diante
dessa realidade, os Racionais MC’s chutam a porta das instituições e da sociedade, com
suas letras e postura dizendo “o sistema é racista, e eu vou denunciar!” a letra da música
Capitulo 4 Versículo 3 traduz um pouco dessa revolta:
REFERÊNCIAS
BARCELOS, Luiz Cláudio. Mobilização racial no Brasil: uma revisão crítica. Afro-Ásia.
N. 17. 1996. pp. 187-210.
MELO, Tarso de. Sobrevivendo no inferno: ainda e sempre. Cult, Nº 241, dez. 2018.
RACIONAIS MC’S. Sobrevivendo no Inferno. Cosa Nostra Fonográfica, 1997.
SANTOS, Sales Augusto dos. Os rappers e o ‘rap consciência’: novos agentes e
instrumentos na luta anti-racismo no Brasil na década de 1990. Sociedade e Cultura, v.
11, n. 2, jul/dez. 2008. Pp. 169-182.
Jornal Le Monde Diplomatique Brasil. Entrevista: Mano Brown – vídeo, música e texto.
Um sobrevivente no inferno. 08 de janeiro de 2018. Disponível em
http://diplomatique.org.br/um-sobrevivente-do-inferno/. Acesso em: 21/12/2018.