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25/01/2019

Compra e venda de bens de


consumo
Sandra Passinhas
Coimbra, 24 de Janeiro de 2019

Compra e venda de bens de


consumo

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25/01/2019

Directiva 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25


de Maio de 1999, relativa a certos aspectos da venda de bens de
consumo e das garantias a ela relativas

Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, alterado pelo DL n.º 84/2008,


de 21 de Maio

Caveat emptor Caveat venditor

A averiguação de que a coisa adquirida não tem


Cabe ao comprador aquando da
defeitos e é idónea para o fim a que se destina
celebração do contrato passa a ser objecto de uma garantia específica,
prestada pelo vendedor, cabendo-lhe o ónus da
assegurar que a coisa adquirida prova, segundo as regras gerais de ter cumprido

não tem defeitos e é idónea essa obrigação de garantia.

para o fim a que se destina (Ac. Rel. Porto, de 7 de Março de 2005)

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Artigo 1.º-A (Âmbito de aplicação)

1 - O presente decreto-lei é aplicável aos contratos de compra e venda


celebrados entre profissionais e consumidores.

2 - O presente decreto-lei é, ainda, aplicável, com as necessárias adaptações,


aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada
ou de outra prestação de serviços, bem como à locação de bens de consumo.

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Artigo 1.B Definições

Para efeitos de aplicação do disposto no presente decreto-lei, entende-se por:

a) «Consumidor», aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter
profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho;

b) «Bem de consumo», qualquer bem imóvel ou móvel corpóreo, incluindo os bens em segunda mão;

c) «Vendedor», qualquer pessoa singular ou colectiva que, ao abrigo de um contrato, vende bens de consumo no âmbito da sua actividade profissional;

d) «Produtor», o fabricante de um bem de consumo, o importador do bem de consumo no território da Comunidade Europeia ou qualquer outra pessoa que se apresente como produtor
através da indicação do seu nome, marca ou outro sinal identificador no produto;

e) «Representante do produtor», qualquer pessoa singular ou colectiva que actue na qualidade de distribuidor comercial do produtor e ou centro autorizado de serviço pós-venda, à
excepção dos vendedores independentes que actuem apenas na qualidade de retalhistas;

f) «Garantia legal», qualquer compromisso ou declaração assumida por um vendedor ou por um produtor perante o consumidor, sem encargos adicionais para este, de reembolsar o preço
pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de um bem de consumo, no caso de este não corresponder às condições enumeradas na declaração de garantia ouna respectiva
publicidade;

g) «Garantia voluntária», qualquer compromisso ou declaração, de carácter gratuito ou oneroso, assumido por um vendedor, por um produtor ou por qualquer intermediário perante o
consumidor, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de um bem de consumo, no caso de este não corresponder às condições enumeradas na
declaração de garantia

h) «Reparação», em caso de falta de conformidade do bem, a reposição do bem de consumo em conformidade com o contrato.

Artigo 4.º, n.º 6 - Os direitos atribuídos pelo presente artigo


transmitem-se a terceiro adquirente do bem.

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Artigo 2-º Conformidade com o contrato

1 - O vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda.

3 - Não se considera existir falta de conformidade, na acepção do presente artigo, se, no momento em que for celebrado o

contrato, o consumidor tiver conhecimento dessa falta de conformidade ou não puder razoavelmente ignorá-la ou se esta

decorrer dos materiais fornecidos pelo consumidor.

4 - A falta de conformidade resultante de má instalação do bem de consumo é equiparada a uma falta de conformidade do bem,

quando a instalação fizer parte do contrato de compra e venda e tiver sido efectuada pelo vendedor, ou sob sua responsabilidade,

ou quando o produto, que se prevê que seja instalado pelo consumidor, for instalado pelo consumidor e a má instalação se dever

a incorrecções existentes nas instruções de montagem.

Artigo 3.º Entrega do bem


1 - O vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de
conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue.
2 - As faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco
anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel,
respectivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for
incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de
conformidade.

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Artigo 4.º - Direitos do consumidor


Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos,

por meio de :

• reparação;

• Substituição;

• à redução adequada do preço;

• ou à resolução do contrato.

+ artigo 12.º LDC

5 - O consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos


números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir
abuso de direito, nos termos gerais.

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• Tratando-se de um bem imóvel, a reparação ou a substituição devem


ser realizadas dentro de um prazo razoável, tendo em conta a
natureza do defeito, e tratando-se de um bem móvel, num prazo
máximo de 30 dias, em ambos os casos sem grave inconveniente para
o consumidor.

4 - Os direitos de resolução do contrato e de redução do preço podem


ser exercidos mesmo que a coisa tenha perecido ou se tenha
deteriorado por motivo não imputável ao comprado.

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3. A expressão «sem encargos», utilizada no n.º 1, reporta-se às


despesas necessárias para repor o bem em conformidade com o
contrato, incluindo, designadamente, as despesas de transporte, de
mão-de-obra e material.

2 - Presume-se que os bens de consumo não são conformes com o contrato se se verificar
algum dos seguintes factos:
a) Não serem conformes com a descrição que deles é feita pelo vendedor ou não
possuírem as qualidades do bem que o vendedor tenha apresentado ao consumidor como
amostra ou modelo;
b) Não serem adequados ao uso específico para o qual o consumidor os destine e
do qual tenha informado o vendedor quando celebrou o contrato e que o mesmo tenha
aceitado;
c) Não serem adequados às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo
tipo;
d) Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo
tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e,
eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo
vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na
rotulagem.

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Prazos

Prazo de garantia – Artigo 5.º


• 1 - O comprador pode exercer os direitos previstos no artigo anterior quando a
falta de conformidade se manifestar dentro
de um prazo de dois ou cinco anos a contar da entrega do bem, consoante se trate,
respectivamente, de coisa móvel ou imóvel.

2 - Tratando-se de coisa móvel usada, o prazo previsto no número anterior pode ser
reduzido a um ano, por acordo das partes.

6 - Havendo substituição do bem, o bem sucedâneo goza de um prazo de garantia


de dois ou de cinco anos a contar da data da sua entrega, conforme se trate,
respectivamente, de bem móvel ou imóvel.
7 - O prazo referido no n.º 1 suspende-se, a partir da data da denúncia, durante o
período em que o consumidor estiver privado do uso dos bens.

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Prazo de denúncia – artigo 5.º-A, n.º 2

Para exercer os seus direitos, o consumidor deve denunciar ao


vendedor a falta de conformidade num prazo de doismeses, caso se
trate de bem móvel, ou de um ano, se se tratar de bem imóvel, a
contar da data em que a tenha detectado.

Artigo 5.º-A – Prazo para exercício de direitos


3 - Caso o consumidor tenha efectuado a denúncia da
desconformidade, tratando-se de bem móvel, os direitos atribuídos ao
consumidor nos termos do artigo 4.º caducam decorridos dois anos a
contar da data da denúncia e, tratando-se de bem imóvel, no prazo de
três anos a contar desta mesma data

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Responsabilidade directa do produtor – artigo 6.º


1 - Sem prejuízo dos direitos que lhe assistem perante o vendedor, o
consumidor que tenha adquirido coisa defeituosa pode optar por exigir
do produtor a sua reparação ou substituição, salvo se tal se manifestar
impossível ou desproporcionado tendo em conta o valor que o bem
teria se não existisse falta de conformidade, a importância desta e a
possibilidade de a solução alternativa ser concretizada sem grave
inconveniente para o consumidor.

2 - O produtor pode opor-se ao exercício dos direitos pelo consumidor verificando-se


qualquer dos seguintes factos:
• a) Resultar o defeito exclusivamente de declarações do vendedor sobre a coisa e sua
utilização, ou de má utilização;
• b) Não ter colocado a coisa em circulação;
• c) Poder considerar-se, tendo em conta as circunstâncias, que o defeito não existia no
momento em que colocou a coisa em circulação;
• d) Não ter fabricado a coisa nem para venda nem para qualquer outra forma de
distribuição com fins lucrativos, ou não a ter fabricado ou distribuído no quadro da sua
actividade profissional;
• e) Terem decorrido mais de dez anos sobre a colocação da coisa em circulação.
3 - O representante do produtor na zona de domicílio do consumidor é solidariamente
responsável com o produtor perante o consumidor, sendo-lhe igualmente aplicável o n.º 2
do presente artigo.

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Artigo 7.º - Direito de regresso


1 - O vendedor que tenha satisfeito ao consumidor um dos direitos previsto no artigo 4.º bem como a pessoa
contra quem foi exercido o direito de regresso gozam de direito de regresso contra o profissional a quem
adquiriram a coisa, por todos os prejuízos causados pelo exercício daqueles direitos.

2 - O disposto no n.º 2 do artigo 3.º aproveita também ao titular do direito de regresso, contando-se o respectivo
prazo a partir da entrega ao consumidor.

3 - O demandado pode afastar o direito de regresso provando que o defeito não existia quando entregou a coisa
ou, se o defeito for posterior à entrega, que não foi causado por si.

4 - Sem prejuízo do regime das cláusulas contratuais gerais, o acordo pelo qual se exclua ou limite
antecipadamente o exercício do direito de regresso só produz efeitos se for atribuída ao seu titular uma
compensação adequada.

Artigo 9.º - Garantias voluntárias


2 - A declaração de garantia deve ser entregue ao consumidor por escrito ou em qualquer outro suporte
duradouro a que aquele tenha acesso.
3 - A garantia, que deve ser redigida de forma clara e concisa na língua portuguesa, contém obrigatoriamente
as seguintes menções:
a) Declaração de que o consumidor goza dos direitos previstos no presente decreto-lei, e na demais legislação
aplicável, e de que tais direitos não são afectados pela garantia;
b) A informação sobre o carácter gratuito ou oneroso da garantia e, neste último caso, a indicação dos
encargos a suportar pelo consumidor;
c) Os benefícios atribuídos ao consumidor por meio do exercício da garantia, bem como as condições para a
atribuição destes benefícios, incluindo a enumeração de todos os encargos, nomeadamente aqueles relativos
às despesas de transporte, de mão-de-obra e de material, e ainda os prazos e a forma de exercício da mesma;
d) Duração e âmbito espacial da garantia;
e) Firma ou nome e endereço postal, ou, se for o caso, electrónico, do autor da garantia que pode ser utilizado
para o exercício desta.
4 - Salvo declaração em contrário, os direitos resultantes da garantia transmitem-se para o adquirente da coisa.

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Artigo 10.º - Imperatividade


1 - Sem prejuízo do regime das cláusulas contratuais gerais, é nulo o
acordo ou cláusula contratual pelo qual antes da denúncia da falta de
conformidade ao vendedor se excluam ou limitem os direitos do
consumidor previstos no presente diploma.

2 - É aplicável à nulidade prevista no número anterior o disposto nos


n.os 2 e 3 do artigo 16.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho.

Jurisprudência

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Reposição da conformidade sem


encargos
Indemnização pelo uso do bem

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Acórdão do Tribunal de Justiça, de 17 de Abril de 2008, no Processo C-404/06, Quelle


AG contra Bundesverband der Verbraucherzentralen und Verbraucherverbände

• Atendendo a todas as considerações que precedem, há que


responder à questão submetida que o artigo 3.° da directiva deve
ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação
nacional que permite que o vendedor, no caso de ter vendido um
bem de consumo não conforme, exija ao consumidor uma
indemnização pelo uso do bem não conforme até à sua substituição
por um novo bem.

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Os Factos
• Em Agosto de 2002, a Quelle entregou a S. Brüning, para seu uso pessoal, um «fogão». No início de 2004,
esta última verificou que o aparelho não estava em conformidade. Dado que a reparação se revelou
impossível, S. Brüning devolveu o aparelho à Quelle, que o substituiu por um aparelho novo. Todavia, esta
sociedade exigiu que S. Brüning lhe pagasse o montante de 69,97 euros a título de indemnização pelas
vantagens que tinha obtido com o uso do aparelho que inicialmente lhe tinha sido entregue.

• A Bundesverband, actuando na qualidade de mandatária de S. Brüning, solicitou que o referido montante


fosse reembolsado a esta última. Solicitou além disso que, em caso de substituição de um bem não
conforme com o contrato de venda (a seguir «bem não conforme»), a Quelle fosse condenada a deixar de
facturar montantes correspondentes ao uso do referido bem.

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A questão prejudicial
• O órgão jurisdicional de primeira instância julgou procedente o pedido de reembolso e indeferiu o pedido
requerendo que a Quelle fosse intimada a deixar de facturar montantes relativos à utilização de um bem não
conforme.

• Os recursos interpostos desta decisão, tanto pela Quelle como pela Bundesverband, foram julgados improcedentes.
Tendo-lhe sido submetido um recurso de «Revision», o Bundesgerichtshof observa que decorre das disposições
conjuntas dos §§ 439, n.° 4, e 346, n.os 1 e 2, ponto 1, do BGB que o vendedor tem direito, em caso de substituição
de um bem não conforme, a uma indemnização pelas vantagens que o comprador obteve com o uso desse bem
até à sua substituição por um novo bem.

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A Questão Prejudicial
• Exprimindo reservas sobre o ónus unilateral que é deste modo imposto ao comprador, o
Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão
prejudicial:

• «As disposições do artigo 3.°, n.° 2, em conjugação com os n.os 3, primeiro parágrafo, e
4, ou do artigo 3.°, n.° 3, terceiro parágrafo, da [d]irectiva […] devem ser interpretadas
no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que prevê que, em caso de
reposição da conformidade do bem por meio de substituição, o vendedor pode exigir
do consumidor o ressarcimento do valor do uso do bem inicialmente entregue, o qual
não era conforme com o previsto no contrato?»

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O Tribunal

• A título liminar, há que recordar que, segundo o artigo 3.°, n.° 1, da directiva, o
vendedor responde, perante o consumidor, em caso de falta de conformidade do bem
no momento da entrega.

• O artigo 3.°, n.° 2, da directiva enumera os direitos que o consumidor pode invocar
relativamente ao vendedor em caso de falta de conformidade do bem entregue. Num
primeiro momento, o consumidor tem o direito de exigir a reposição da conformidade
do bem. Não sendo possível repor essa conformidade, pode exigir, num segundo
momento, uma redução do preço ou a resolução do contrato.

• Relativamente à reposição da conformidade do bem, o artigo 3.°, n.° 3, da directiva


precisa que o consumidor pode exigir do vendedor a sua reparação ou substituição, em
qualquer dos casos sem encargos, a menos que o seu pedido seja impossível de
satisfazer ou desproporcionado. 32

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O Tribunal
• O Governo alemão alega que, tanto na Proposta de directiva 96/C 307/09 do Parlamento
Europeu e do Conselho relativa à venda e às garantias dos bens de consumo (JO 1996, C 307,
p. 8) como na Proposta alterada de directiva 98/C 148/11 do Parlamento Europeu e do
Conselho (JO 1998, C 148, p. 12) apresentadas pela Comissão, o texto apenas visava a
«reparação, sem encargos», ou a «substituição» do referido bem. Este silêncio quanto às
consequências financeiras de uma substituição atesta que não se previa que a directiva
regulasse a questão de uma eventual indemnização pela utilização.

• No entanto (…) foi efectivamente a expressão «em qualquer dos casos sem encargos»,
constante da Posição Comum (CE) n.° 51/98, adoptada pelo Conselho, em 24 de Setembro
de 1998, tendo em vista a adopção da directiva (JO C 333, p. 46), que foi acolhida no texto
definitivo, traduzindo assim a vontade do legislador comunitário de reforçar a protecção do
consumidor. 33

• A expressão «sem encargos», por sua vez, encontra-se definida no artigo 3.°, n.° 4, da directiva como
designando as «despesas necessárias incorridas para repor o bem em conformidade, designadamente as
despesas de transporte, de mão-de-obra e material». Resulta da utilização do advérbio «designadamente» pelo
legislador comunitário que esta enumeração tem carácter indicativo e não exaustivo.

• A circunstância, invocada pelo Governo alemão, segundo a qual o comunicado de imprensa C/99/77 do Comité
de Conciliação «Parlamento – Conselho», de 18 de Março de 1999, relativo ao acordo sobre as garantias dos
consumidores, dá uma definição limitativa da expressão «sem encargos» não é, a este respeito, pertinente.
Com efeito, é jurisprudência constante que, quando uma declaração inscrita num protocolo do Conselho não
encontrar expressão no texto de uma disposição de direito derivado, não pode ser considerada para a
interpretação dessa disposição (v., designadamente, acórdãos de 26 de Fevereiro de 1991, Antonissen,
C-292/89, Colect., p. I-745, n.° 18, e de 10 de Janeiro de 2006, Skov e Bilka, C-402/03, Colect., p. I-199, n.° 42).

• Resulta assim tanto da letra como dos trabalhos preparatórios pertinentes da directiva que o legislador
comunitário pretendeu fazer da gratuitidade da reposição em conformidade do bem pelo vendedor um
elemento essencial da protecção assegurada ao consumidor por esta directiva.
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• Esta obrigação de gratuitidade da reposição em conformidade do bem que incumbe


ao vendedor, sob a forma de uma reparação ou de uma substituição do bem não
conforme, visa proteger o consumidor contra o risco de encargos financeiros que
(…) o poderiam dissuadir de exercer os seus direitos caso essa protecção não
existisse. Esta garantia de gratuitidade pretendida pelo legislador comunitário leva a
excluir qualquer pretensão financeira do vendedor no âmbito da execução da sua
obrigação de reposição em conformidade do bem a que o contrato se refere.

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• Esta interpretação é corroborada pela vontade, manifestada pelo legislador comunitário no artigo
3.°, n.° 3, terceiro parágrafo, da directiva, de garantir ao consumidor uma protecção efectiva. Com
efeito, esta disposição precisa que a reparação ou substituição deve ser realizada não só dentro
de um prazo razoável mas também sem grave inconveniente para o consumidor.

• Esta interpretação é igualmente conforme com a finalidade da directiva que, como indicado no
seu primeiro considerando, consiste em garantir um nível elevado de defesa dos consumidores.
Como resulta do artigo 8.°, n.° 2, da mesma directiva, a protecção prevista nesta última é mínima
e, embora os Estados-Membros possam adoptar disposições mais estritas, não podem prejudicar
as garantias previstas pelo legislador comunitário.

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• O décimo quinto considerando da directiva, que permite uma tomada em consideração do uso
que o consumidor fez do bem não conforme, importa salientar que a primeira parte do referido
considerando se refere a um «reembolso» a pagar ao consumidor, ao passo que a segunda
parte visa «as disposições de pormenor mediante as quais a rescisão do contrato ganha efeito».
Estes termos são idênticos aos utilizados na posição comum do Conselho à qual o Governo
alemão também se refere.

• Desta terminologia resulta claramente que a hipótese visada pelo décimo quinto considerando
está limitada ao caso da resolução do contrato, prevista no artigo 3.°, n.° 5, da directiva,
situação na qual, em aplicação do princípio da restituição recíproca das vantagens recebidas, o
vendedor tem de reembolsar ao consumidor o preço de venda do bem. Contrariamente ao que
alega o Governo alemão, o décimo quinto considerando não pode, portanto, ser interpretado
como um princípio geral que habilita os Estados-Membros a tomarem em consideração,
sempre que o desejarem, incluindo numa situação de simples pedido de substituição
apresentado nos termos do artigo 3.°, n.° 3, da directiva, o uso que o consumidor fez de um
bem não conforme.
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• No que respeita, por outro lado, à afirmação do Governo alemão segundo a qual o facto de o
consumidor beneficiar, através da substituição de um bem não conforme, de um novo bem sem ter
de pagar uma compensação financeira constitui um enriquecimento sem causa, há que recordar que
o artigo 3.°, n.° 1, da directiva responsabiliza o vendedor, perante o consumidor, em caso de falta de
conformidade do bem no momento da entrega.

• Nos casos em que o vendedor entrega um bem não conforme, não executa correctamente a
obrigação à qual se tinha comprometido através do contrato de venda e deve, assim, assumir as
consequências dessa má execução do contrato. Ao receber um novo bem em substituição do bem
não conforme, o consumidor, que, por sua vez, pagou o preço de venda e, portanto, executou
correctamente a sua obrigação contratual, não beneficia de um enriquecimento sem causa. O
consumidor recebe apenas, com atraso, um bem conforme às estipulações do contrato, tal como o
deveria ter recebido desde o início.

• De resto, os interesses financeiros do vendedor estão protegidos, por um lado, pelo prazo de
prescrição de dois anos previsto no artigo 5.°, n.° 1, da directiva e, por outro, pela possibilidade que
lhe é dada no artigo 3.°, n.° 3, segundo parágrafo, da directiva de recusar a substituição do bem
quando essa forma de ressarcimento se revele ser desproporcionada na medida em que lhe impõe
custos não razoáveis. 38

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Substituição do bem defeituoso

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Acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Junho de 2011, nos Processos Apensos C-65/09 Gebr. Weber GmbH
contra Jürgen Wittmer, e C-87/09, Ingrid Putz contra Medianess Electronics GmbH

• J. Wittmer e a Gebr. Weber celebraram um contrato de compra e venda de mosaicos polidos pelo

preço de 1 382,27 euros. Após ter feito aplicar cerca de dois terços destes mosaicos na sua casa,

J. Wittmer constatou a presença, nestes mosaicos, de marcas escuras, visíveis a olho nu.

• 17 Por conseguinte, J. Wittmer apresentou uma reclamação, que a Gebr. Weber rejeitou após

concertação com o fabricante dos referidos mosaicos. Num processo de produção de prova

autónomo, iniciado pelo demandante, o perito designado concluiu que as referidas marcas

escuras constituíam vestígios finos do micropolimento impossíveis de remover, pelo que a

substituição integral dos mosaicos constituía o único modo possível de ressarcimento. O perito

estimou os custos desta operação em 5.830,57 euros.

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• 18 Não tendo obtido resposta à intimação que dirigiu à Gebr. Weber, J. Wittmer intentou uma
acção contra essa sociedade no Landgericht Kassel a fim de obter o fornecimento de mosaicos
isentos de defeitos e o pagamento da quantia de 5 830,57 euros. Esse órgão jurisdicional
condenou a Gebr. Weber no pagamento a J. Wittmer da quantia de 273,10 euros, a título de
redução do preço de venda, e julgou a acção improcedente quanto ao mais. Na sequência do
recurso interposto por J. Wittmer da decisão do Landgericht Kassel, o Oberlandesgericht
Frankfurt, por um lado, condenou a Gebr. Weber no fornecimento de novos mosaicos, isentos de
defeitos, e no pagamento a J. Wittmer da quantia de 2 122,37 euros para o levantamento e a
remoção dos mosaicos defeituosos e, por outro, negou provimento aos restantes pedidos.

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• 19 A Gebr. Weber interpôs recurso de «Revision» do acórdão do Oberlandesgericht Frankfurt para o


Bundesgerichtshof, o qual indica que a sua decisão depende da questão de saber se foi correctamente que o
órgão jurisdicional de recurso concluiu que J. Wittmer podia exigir o reembolso dos custos da remoção dos
mosaicos defeituosos. Uma vez que J. Wittmer não tem direito, ao abrigo do direito alemão, a esse reembolso, a
resposta a esta questão depende da interpretação do artigo 3.°, n.os 2 e 3, terceiro parágrafo, da directiva, em
conformidade com a qual haverá eventualmente que interpretar o § 439 do BGB.

• 20 O Bundesgerichtshof observa a este respeito que da utilização do termo «substituição» no artigo 3.°,
n.° 2, da directiva poderia ser deduzida a existência da obrigação não apenas de fornecer um bem conforme
como ainda de substituir o bem defeituoso e, portanto, de proceder à sua remoção. Acresce que a obrigação
de ter em conta a natureza e o destino do bem, enunciada no referido artigo 3.°, n.° 3, em conjugação com o
dever de reposição da sua conformidade, pode indicar que a obrigação do vendedor, no âmbito da substituição
do bem, comporta não apenas a entrega de um bem conforme mas também a remoção do bem defeituoso, a
fim de permitir uma utilização do bem de substituição em conformidade com sua natureza e o fim a que se
destina.
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• 21 O Bundesgerichtshof salienta que, porém, não será necessário decidir esta questão se a Gebr.
Weber puder licitamente recusar o reembolso dos custos de remoção dos mosaicos defeituosos
devido ao facto de esses custos serem desproporcionados. Esse órgão jurisdicional explica que, por
força do § 439, n.° 3, do BGB, o vendedor pode recusar a forma do cumprimento a posteriori escolhida
pelo comprador não apenas quando este modo de cumprimento lhe impuser custos
desproporcionados em comparação com o outro modo de cumprimento («desproporção relativa») mas
também quando o custo do modo escolhido pelo comprador, mesmo quando constitua o único modo
possível, for intrinsecamente desproporcionado («desproporção absoluta»). No caso em apreço, o
pedido de cumprimento a posteriori mediante o fornecimento de mosaicos conformes constituiria
um tal caso de «desproporção absoluta», uma vez que implicaria que a Gebr. Weber suportasse, para
além do custo deste fornecimento, estimado em 1 200 euros, os custos relativos à remoção dos
mosaicos defeituosos no valor de 2 100 euros, ou seja, um montante total de 3 300 euros, que excede
o limiar de 150% do valor do bem isento de defeitos, com base no qual é a priori avaliada a
proporcionalidade de tal pedido.
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• 22 Contudo, o Bundesgerichtshof entende que a possibilidade, conferida pelo direito


nacional ao vendedor, de recusar a cumprimento a posteriori devido a tal desproporção
absoluta dos respectivos custos pode ser incompatível com o artigo 3.°, n.° 3, da directiva, o
qual, como está formulado, parece referir-se unicamente à desproporção relativa. Porém, não
está excluído que uma recusa assente na desproporção absoluta possa ser abrangida pelo âmbito
do conceito de «impossibilidade», previsto no mesmo artigo 3.°, n.° 3, na medida em que não se
pode partir do princípio de que a directiva admite unicamente os casos de impossibilidade física e
pretende impor ao vendedor um cumprimento a posteriori absurdo do ponto de vista económico.

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Questão prejudicial
• 23 Nestas condições, o Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes
questões prejudiciais:

• «1) As disposições do artigo 3.°, n.° 3, primeiro e segundo parágrafos, da directiva [...] devem ser interpretadas no sentido de
que se opõem a uma legislação nacional nos termos da qual o vendedor, em caso de falta de conformidade do bem de consumo
entregue com o contrato, pode recusar o tipo de ressarcimento exigido pelo consumidor se este implicar custos para o vendedor
que, tendo em conta o valor que o bem teria se não existisse falta de conformidade e a importância da falta de conformidade,
não sejam razoáveis (absolutamente desproporcionados)?

• 2) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão: as disposições do artigo 3.°, n.os 2 e 3, terceiro parágrafo, da […] directiva
devem ser interpretadas no sentido de que, caso a conformidade do bem seja reposta através da substituição deste, o vendedor
deve suportar os custos de remoção do bem não conforme de [um local no] qual o consumidor tinha integrado o bem, de
acordo com a sua natureza e o fim a que o destina?»

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Acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Junho de 2011, nos Processos Apensos C-65/09 Gebr.
Weber GmbH contra Jürgen Wittmer, e C-87/09, Ingrid Putz contra Medianess Electronics GmbH

• I. Putz e a Medianess Electronics celebraram, através da Internet, um contrato de compra e venda de uma máquina de lavar loiça nova pelo preço de
367 euros, acrescido das despesas de entrega num montante de 9,52 euros. As partes acordaram que este bem seria entregue à porta do domicílio de
I. Putz. A entrega da máquina de lavar loiça e o pagamento do preço ocorreram como tinha sido acordado.

• 25 Depois de I. Putz ter a máquina de lavar loiça instalada em sua casa, verificou que esta tinha um defeito não atribuível às operações de
instalação do aparelho e que a sua reparação era impossível.

• 26 As partes puseram-se, assim, de acordo sobre a substituição da referida máquina de lavar loiça. I. Putz exigiu que a Medianess Electronics não
só entregasse uma nova máquina de lavar loiça mas que procedesse igualmente à remoção do aparelho defeituoso e instalasse o aparelho de
substituição ou suportasse os custos da remoção e da nova instalação, o que esta sociedade recusou. Não tendo a Medianess Electronics reagido à
intimação que esta lhe dirigiu, I. Putz rescindiu o contrato de compra e venda.

• 27 I. Putz demandou então a Medianess Electronics no Amtsgericht Schorndorf para obter o reembolso do preço de venda contra a restituição da
máquina de lavar loiça defeituosa.

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• 28 A decisão de reenvio esclarece que, segundo o direito alemão, a validade


da resolução do contrato de compra e venda depende da questão de saber se I.
Putz fixou em vão à Medianess Electronics um prazo útil para o cumprimento a
posteriori do contrato, limitando-se a exigir aquilo a que tinha direito. Por
conseguinte, é necessário, para a solução do litígio, saber se I. Putz tinha o
direito de exigir que a Medianess Electronics procedesse à remoção do
aparelho defeituoso e instalasse o novo aparelho ou tomasse a seu cargo as
despesas correspondentes a estas operações.

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• 29 O Amtsgericht Schorndorf salienta, a este respeito, que o direito alemão não prevê que o vendedor não
culposo esteja obrigado a suportar os custos da remoção do bem defeituoso ou da instalação do bem de
substituição, mesma na hipótese de o consumidor ter já instalado o bem defeituoso em conformidade com o fim
a que se destina antes de aparecer o defeito. Todavia, entende que tal obrigação pode decorrer da directiva, uma
vez que esta visa assegurar um elevado nível de protecção dos consumidores e prevê, no seu artigo 3.°, n.° 3,
terceiro parágrafo, que a substituição deve ser realizada sem grave inconveniente para o consumidor.

• 30 Esse órgão jurisdicional observa que, se o comprador não obtiver o reembolso das despesas de instalação do
bem de substituição, tem de as suportar duas vezes, a saber, uma primeira vez com a instalação do bem
defeituoso e uma segunda vez com a do bem de substituição. Ora, se a entrega tivesse sido conforme com as
estipulações contratuais, apenas teria de as suportar uma única vez. O Amtsgericht Schorndorf considera que é
efectivamente verosímil que o vendedor só esteja obrigado a tomar a seu cargo a instalação do bem de substituição
no caso de ter culpa. Porém, o facto de não poder ser imputada nenhuma culpa ao consumidor e de o defeito ser
imputável mais ao vendedor do que ao consumidor justifica que seja conferido a este último um direito
independente da culpa do vendedor, vendedor para o qual, além disso, é mais fácil exercer o direito de regresso
contra o fabricante.
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• 31 No tocante à remoção do bem defeituoso, o órgão jurisdicional de reenvio constata


que a conformidade com o contrato não apenas inclui a entrega de um bem isento de
defeitos mas implica igualmente que não fique no domicílio do comprador nenhum bem
defeituoso, o que milita a favor de uma interpretação segundo a qual incumbe ao
vendedor a remoção de tal bem. Acresce que a circunstância de o bem defeituoso
permanecer no domicílio do comprador pode constituir um grave inconveniente para
este. Por fim, o termo «substituição», ao qual o artigo 3.° da directiva faz referência,
parece indicar que a obrigação do vendedor não se limita à mera entrega de um bem de
substituição isento de defeitos, mas lhe impõe a sua troca pelo bem defeituoso.

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Questão prejudicial
32 Nestas condições, o Amtsgericht Schorndorf decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

• «1) As disposições do artigo 3.°, n.os 2 e 3, terceiro parágrafo, da directiva […] devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma
legislação nacional que prevê que o vendedor, em caso de reposição do bem de consumo em conformidade com o contrato, por meio da sua
substituição, não tem de suportar as despesas de instalação do bem de substituição no local onde o consumidor instalou o bem de consumo não
conforme ao contrato em consonância com a sua natureza e o fim a que se destina, quando a instalação não fosse originalmente devida nos termos
do contrato?

• 2) As disposições do artigo 3.°, n.os 2 e 3, terceiro parágrafo, da […] directiva devem ser interpretadas no sentido de que o vendedor, em caso de
reposição do bem de consumo em conformidade com o contrato, por meio da sua substituição, deve suportar as despesas de remoção do bem de
consumo não conforme do local onde o consumidor instalou o bem de consumo em consonância com a sua natureza e o fim a que se destina?»

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O tribunal:
• 43 A título liminar, há que recordar que, segundo o artigo 3.°, n.° 1, da directiva, o vendedor responde, perante o consumidor, em caso de falta de
conformidade do bem no momento da entrega.

• 44 O artigo 3.°, n.° 2, da directiva enumera os direitos que o consumidor pode invocar relativamente ao vendedor em caso de falta de conformidade do
bem entregue. Num primeiro momento, o consumidor tem o direito de exigir a reposição da conformidade do bem. Não sendo possível repor essa
conformidade, pode exigir, num segundo momento, uma redução do preço ou a rescisão do contrato.

• 45 Relativamente à reposição da conformidade do bem, o artigo 3.°, n.° 3, da directiva precisa que o consumidor pode exigir do vendedor a sua reparação
ou substituição, em qualquer dos casos sem encargos, a menos que o seu pedido seja impossível de satisfazer ou desproporcionado.

• 46 O Tribunal de Justiça já teve oportunidade de realçar que resulta, assim, tanto do teor do artigo 3.° da directiva como, de resto, dos trabalhos
preparatórios pertinentes desta última que o legislador da União pretendeu fazer da gratuitidade da reposição em conformidade do bem pelo vendedor um
elemento essencial da protecção assegurada ao consumidor por esta directiva. Esta obrigação de gratuitidade da reposição em conformidade do bem que
incumbe ao vendedor, sob a forma de uma reparação ou de uma substituição do bem não conforme, visa proteger o consumidor contra o risco de encargos
financeiros que o poderiam dissuadir de exercer os seus direitos caso essa protecção não existisse (v. acórdão de 17 de Abril de 2008, Quelle, C-404/06,
Colect., p. I-2685, n.os 33 e 34).

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• 47 Ora, impõe-se observar que, em caso de substituição de um bem não conforme, se o consumidor não pudesse
pedir ao vendedor que assumisse a sua remoção do local onde tinha sido instalado em conformidade com a sua
natureza e o fim a que se destina e a instalação do bem de substituição no mesmo local, essa substituição lhe
ocasionaria encargos financeiros suplementares que não teria de suportar se o vendedor tivesse executado
correctamente o contrato de compra e venda. Com efeito, se este tivesse entregue inicialmente um bem conforme
com o referido contrato, o consumidor só teria suportado as despesas de instalação uma única vez e não teria de
ter suportado as despesas de remoção do bem defeituoso.

• 48 O facto de interpretar o artigo 3.° da directiva no sentido de que não obriga o vendedor a assumir a remoção do
bem não conforme e a instalação do bem de substituição teria, assim, como consequência que o consumidor, a fim
de poder exercer os direitos que lhe são conferidos pelo referido artigo, teria de suportar estas despesas adicionais
que resultam da entrega pelo vendedor de um bem não conforme.

• 49 Nesta hipótese, a substituição deste bem não seria efectuada, contrariamente ao que prevê o artigo 3.°, n.os 2 e
3, da directiva, sem encargos para o consumidor.

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• 50 É certo que as despesas de remoção do bem não conforme e de instalação do bem de substituição não
figuram entre as enumeradas explicitamente no artigo 3.°, n.° 4, da directiva, o qual define a expressão «sem
encargos» como designando as «despesas necessárias incorridas para repor o bem em conformidade,
designadamente as despesas de transporte, de mão-de-obra e material». Todavia, o Tribunal de Justiça já
enunciou que resulta da utilização do advérbio «designadamente» pelo legislador da União que esta
enumeração tem carácter indicativo e não exaustivo (v. acórdão Quelle, já referido, n.° 31). Acresce que
estas despesas são agora necessárias para que se possa proceder à substituição do bem não conforme e
constituem, por conseguinte, «despesas necessárias incorridas para repor o bem em conformidade», na
acepção do dito artigo 3.°, n.° 4.

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• 54 No tocante ao termo «substituição», há que observar que o seu alcance exacto diverge nas várias versões
linguísticas. Ao passo que num certo número destas versões, como as em língua espanhola («sustitución»), inglesa
(«replacement»), francesa («remplacement»), italiana («sostituzione»), neerlandesa («vervanging») e portuguesa
(«substituição»), este termo se refere à operação no seu todo, no termo da qual o bem não conforme deve
efectivamente ser «substituído», impondo, pois, que o vendedor realize tudo o que for necessário para atingir esse
resultado, outras versões linguísticas, como designadamente a em língua alemã («Ersatzlieferung»), poderiam
sugerir uma leitura um pouco mais estreita. Porém, como referem os órgãos jurisdicionais de reenvio, mesmo
nesta última versão linguística, o referido termo não se limita à simples entrega de um bem de substituição e
pode, pelo contrário, indicar a existência de uma obrigação de o substituir em troca pelo bem não conforme.

• 55 Além disso, uma interpretação do artigo 3.°, n.os 2 e 3, da directiva no sentido de que este impõe, em caso
de substituição de um bem não conforme, que o vendedor tome a seu cargo a remoção deste bem do local onde
o consumidor o tinha instalado em conformidade com a sua natureza e o fim a que se destina, antes de ter
aparecido o defeito, e a instalação do bem de substituição corresponde à finalidade da directiva, a qual, como
indica o seu primeiro considerando, consiste em garantir um nível elevado de defesa dos consumidores.

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• 56 Importa realçar, neste contexto, que tal interpretação também não conduz a um resultado iníquo. Com
efeito, mesmo na hipótese de a não conformidade do bem não resultar de culpa do vendedor, a verdade é
que, tendo entregue um bem não conforme, este não executou correctamente a obrigação a que se tinha
comprometido através do contrato de compra e venda e deve, assim, assumir as consequências da má
execução do contrato. Em contrapartida, o consumidor, por sua vez, pagou o preço de venda e, portanto,
executou correctamente a sua obrigação contratual (v., neste sentido, acórdão Quelle, já referido, n.° 41).
Acresce que o facto de o consumidor, confiando na conformidade do bem entregue, ter instalado de boa-fé
o bem defeituoso, em conformidade com a sua natureza e o fim a que se destina, antes do aparecimento do
defeito, não pode constituir uma falta imputável ao referido consumidor.

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• 57

• Por conseguinte, numa situação na qual nenhuma das duas partes no contrato actuou de forma incorrecta,
justifica-se pôr a cargo do vendedor as despesas de remoção do bem não conforme e de instalação do bem de
substituição, uma vez que estas despesas suplementares, por um lado, teriam sido evitadas se o vendedor tivesse
desde o início executado correctamente as suas obrigações contratuais e, por outro, são agora necessárias para
repor o bem em conformidade.

• 58 De resto, os interesses financeiros do vendedor estão protegidos não apenas pelo prazo de prescrição de dois
anos previsto no artigo 5.°, n.° 1, da directiva e pela possibilidade que lhe é dada no artigo 3.°, n.° 3, segundo
parágrafo, da mesma de recusar a substituição do bem quando essa forma de ressarcimento se revele ser
desproporcionada na medida em que lhe impõe custos não razoáveis (v. acórdão Quelle, já referido, n.° 42) mas
também pelo seu direito, reafirmado no artigo 4.° da directiva, de regresso contra a pessoa ou pessoas
responsáveis da mesma cadeia contratual. O facto de a directiva responsabilizar o vendedor, perante o consumidor,
em caso de falta de conformidade do bem no momento da entrega (v. acórdão Quelle, já referido, n.° 40) é assim
compensado com o facto de o vendedor poder, nos termos das regras aplicáveis do direito nacional, exercer o seu
direito de regresso contra o produtor, um vendedor anterior da mesma cadeia contratual ou qualquer outro
intermediário.

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• 59 Esta interpretação do artigo 3.°, n.os 2 e 3, da directiva é independente da questão de saber se o vendedor
estava obrigado, nos termos do contrato de compra e venda, a instalar o bem entregue. Com efeito, embora seja
verdade que o contrato de compra e venda determina, segundo o artigo 2.° da directiva, a conformidade deste
bem e, portanto, designadamente, o que constitui uma falta de conformidade, não é menos certo que, caso exista
tal falta, as obrigações do vendedor decorrentes da má execução do contrato resultam não apenas deste mas
sobretudo das regras relativas à protecção dos consumidores, em especial do artigo 3.° da directiva, as quais
impõem obrigações cujo alcance é independente das estipulações do referido contrato e podem, eventualmente,
exceder as aí previstas.

• 60 Os direitos assim conferidos aos consumidores pelo artigo 3.° da directiva, os quais não visam colocar estes
últimos numa situação mais vantajosa do que aquela a que teriam direito ao abrigo do contrato de compra e
venda, mas simplesmente repor a situação que existiria se o vendedor tivesse entregue logo de início um bem
conforme, têm, por força do artigo 7.° da directiva, carácter vinculativo para o vendedor. Acresce que resulta do
artigo 8.°, n.° 2, da directiva que a protecção prevista neste diploma é mínima e que, embora os Estados-Membros
possam adoptar disposições mais estritas, não podem prejudicar as garantias previstas pelo legislador da União (v.
acórdão Quelle, já referido, n.° 36).

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• 61 Por último, na hipótese de não ser o próprio vendedor a proceder à remoção do bem não conforme e à instalação
do bem de substituição, incumbe ao juiz nacional determinar quais são as despesas necessárias às referidas remoção e
instalação, cujo reembolso o consumidor tem direito.

• 62 Resulta do conjunto das considerações precedentes que o artigo 3.°, n.os 2 e 3, da directiva deve ser interpretado
no sentido de que, quando um bem de consumo não conforme, que, antes de aparecer o defeito, foi instalado, de boa-
fé, pelo consumidor em conformidade com a sua natureza e o fim a que se destina, é colocado em estado conforme
através da sua substituição, o vendedor está obrigado a proceder ele próprio à remoção deste bem do local onde foi
instalado e a aí instalar o bem de substituição ou a suportar as despesas necessárias a essa remoção e à instalação do
bem de substituição. Esta obrigação do vendedor existe independentemente da questão de saber se este se tinha
comprometido, nos termos do contrato de compra e venda, a instalar o bem de consumo comprado inicialmente.

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Quanto à possibilidade de o vendedor se recusar a assumir as despesas de remoção do bem defeituoso e de instalação do bem de
substituição que sejam desproporcionadas:

• 66 A este respeito, importa lembrar que, nos termos do artigo 3.°, n.° 3, primeiro parágrafo, da directiva, o consumidor, num
primeiro momento, pode exigir do vendedor a reparação ou a substituição do bem, em qualquer dos casos sem encargos, a menos
que isso seja impossível ou desproporcionado.

• 67 O referido artigo 3.°, n.° 3, segundo parágrafo, esclarece que um modo de ressarcimento é considerado desproporcionado
se implicar para o vendedor custos que, em comparação com o outro modo, sejam irrazoáveis, tendo em conta o valor que o
bem teria se não existisse falta de conformidade, a importância da falta de conformidade e a questão de saber se o outro modo
de ressarcimento pode ser concretizado sem grave inconveniente para o consumidor.

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• 68 Assim, impõe-se concluir que, embora o artigo 3.°, n.° 3, primeiro parágrafo, da directiva esteja, em princípio, formulado de
modo suficientemente aberto para poder igualmente abranger casos de desproporção absoluta, o referido artigo 3.°, n.° 3,
segundo parágrafo, define o termo «desproporcionado» exclusivamente com referência ao outro modo de ressarcimento,
limitando-o assim aos casos de desproporção relativa. Resulta, aliás, claramente da redacção e da economia do artigo 3.°, n.° 3,
da directiva que este se refere aos dois modos de ressarcimento previstos em primeiro lugar, a saber, a reparação ou a
substituição do bem não conforme.

• 69 Estas conclusões são corroboradas pelo décimo primeiro considerando da directiva, o qual enuncia que um modo de
ressarcimento é desproporcionado se impuser custos excessivos em relação ao outro modo de ressarcimento e que, para que os
custos sejam excessivos, devem ser significativamente mais elevados que os do outro modo de ressarcimento.

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• 77 Por último, na hipótese de uma redução do direito ao reembolso das referidas despesas, há que dar ao consumidor a
possibilidade de exigir, em vez da substituição do bem não conforme, une redução adequada do preço ou a rescisão do contrato,
em conformidade com o artigo 3.°, n.° 5, último travessão, da directiva, dado que, para o consumidor, o facto de só poder obter a
reposição da conformidade do bem defeituoso suportando uma parte destas despesas constitui um grave inconveniente.

• 78 Resulta do conjunto das considerações precedentes que o artigo 3.°, n.° 3, da directiva deve ser interpretado no sentido de
que se opõe a que uma legislação nacional confira ao vendedor o direito de recusar a substituição de um bem não conforme,
único modo possível de ressarcimento, pelo facto de esta lhe impor, devido à obrigação de proceder à remoção deste bem do
local onde foi instalado e de aí instalar o bem de substituição, custos desproporcionados em relação ao valor que o bem teria se
fosse conforme e à importância da falta de conformidade. Todavia, esta disposição não se opõe a que o direito do consumidor
ao reembolso das despesas de remoção do bem defeituoso e de instalação do bem de substituição seja, em tal caso, limitado à
tomada a cargo, pelo vendedor, de um montante proporcionado.

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Acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Junho de 2011, nos Processos Apensos C-65/09 Gebr. Weber GmbH contra Jürgen Wittmer, e C-87/09,
Ingrid Putz contra Medianess Electronics GmbH

• Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:


• 1) O artigo 3.°, n.os 2 e 3, da Directiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio
de 1999, relativa a certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, deve ser
interpretado no sentido de que, quando um bem de consumo não conforme, que, antes de aparecer o
defeito, foi instalado, de boa-fé, pelo consumidor em conformidade com a sua natureza e o fim a que se
destina, é colocado em estado conforme através da sua substituição, o vendedor está obrigado a proceder
ele próprio à remoção deste bem do local onde foi instalado e a aí instalar o bem de substituição ou a
suportar as despesas necessárias a essa remoção e à instalação do bem de substituição. Esta obrigação do
vendedor existe independentemente da questão de saber se este se tinha comprometido, nos termos do
contrato de compra e venda, a instalar o bem de consumo comprado inicialmente.

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Redução do preço - oficiosamente?

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Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) 3 de outubro de 2013 , no processo C-32/12,


Soledad Duarte Hueros contra Autociba SA, Automóviles Citroën España SA

17 Em julho de 2004, S. Duarte Hueros comprou à Autociba um veículo equipado com uma capota amovível. No mês de agosto seguinte, após o
pagamento do veículo pela compradora por um preço de 14 320 euros, a Autociba fez a entrega desse veículo.

18 Uma vez que, quando chovia, a água se infiltrava pelo tejadilho para o interior do veículo, S. Duarte Hueros levou este à oficina da Autociba. Sendo
infrutíferas as várias tentativas de reparação, S. Duarte Hueros pediu a substituição deste veículo.

19 Na sequência da recusa da Autociba de proceder a essa substituição, S. Duarte Hueros intentou uma ação no Juzgado de Primera Instancia n.° 2 de
Badajoz em que pedia a rescisão do contrato de compra e venda e a condenação solidária da Autociba e da Citroën España SA – esta última, na qualidade
de fabricante do veículo – ao reembolso do preço de aquisição do veículo.

20 O Juzgado de Primera Instancia n.° 2 de Badajoz salienta, no entanto, que, sendo insignificante o defeito que deu origem ao litígio que lhe foi
submetido, improcede o pedido de rescisão do contrato de compra e venda, nos termos do artigo 3.°, n.° 6, da Diretiva 1999/44.

21 Neste contexto, embora S. Duarte Hueros tivesse direito a uma redução do preço de aquisição, com base no artigo 3.°, n.° 5, da referida diretiva, o
órgão jurisdicional de reenvio declara, todavia, que essa solução não pode ser acolhida devido às regras processuais internas, designadamente, o artigo
218.°, n.° 1, do Código de Processo Civil, relativo ao princípio da congruência entre o requerido pelas partes e o pronunciado pelos tribunais, uma vez que
nenhum pedido tinha sido formulado nesse sentido pelo consumidor, quer a título principal quer a título subsidiário.

22 Por outro lado, visto que S. Duarte Hueros tinha a possibilidade de reclamar tal redução do preço, ainda que a título subsidiário, no quadro do
processo principal, nenhum pedido judicial seria admissível num litígio posterior devido ao facto de, em direito espanhol, o princípio do caso julgado
abranger todas as reivindicações que teriam podido ser já formuladas num processo anterior.

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Questão prejudicial
• 23 Nestas condições, tendo dúvidas quanto à compatibilidade do direito
espanhol com os princípios decorrentes da Diretiva 1999/44, o Juzgado de
Primera Instancia n.° 2 de Badajoz decidiu suspender a instância e
submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

• «No caso de um consumidor, não tendo obtido a reposição do bem em


conformidade porque, embora a tenha pedido de forma reiterada, a
reparação não foi levada a cabo, pedir judicialmente com caráter exclusivo
a resolução do contrato e esta não for procedente por se estar perante
uma falta de conformidade insignificante, pode o tribunal conceder
oficiosamente ao consumidor uma redução adequada do preço?»
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• A Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de


maio de 1999, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e
das garantias a ela relativas, deve ser interpretada no sentido de que se
opõe à regulamentação de um Estado-Membro, como a que está em causa
no processo principal, que, quando um consumidor com direito a uma
redução adequada do preço de um bem estipulado no contrato de compra
e venda se limita a pedir judicialmente apenas a rescisão desse contrato,
quando esta não pode ser obtida devido ao caráter insignificante da falta
de conformidade desse bem, não permite ao juiz nacional incumbido de
apreciar o litígio conceder oficiosamente essa redução, e isto não
obstante o referido consumidor não estar autorizado a precisar o seu
pedido inicial nem a intentar nova ação para esse efeito.

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• http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/cfc
0d5782b6ae2eb802579290034b328?OpenDocument&Highlight=0,ve
nda,coisa,defeituosa

• http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/27
d70379a9f822b48025782c0041073c?OpenDocument&Highlight=0,ve
nda,coisa,defeituosa

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Falta de conformidade

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Acórdão do Tribunal de Justiça, no Processo 497/13, Froukje Faber


contra Autobedrijf Hazet Ochten BV, de 4 de Junho de 2015
• Em 27 de maio de 2008, F. Faber comprou ao stand Hazet um veículo em segunda mão. O

contrato de compra e venda celebrado entre as partes foi redigido num formulário

pré-impresso em papel timbrado do stand, intitulado «Contrato de compra e venda com um

particular».

• 18 Em 26 de setembro de 2008, o veículo em causa incendiou-se em movimento e ficou

completamente destruído. F. Faber, que conduzia o veículo, ia a caminho de um encontro

profissional acompanhada da sua filha.

• 19 O referido veículo foi rebocado para o stand Hazet e, posteriormente, a pedido desta,

para uma empresa de desmantelamento para aí ficarem guardados os salvados, em

conformidade com a regulamentação ambiental em vigor. F. Faber alega, mas o stand contesta,
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que, nessa altura, as partes falavam sobre o sinistro e a eventual responsabilidade do stand.

Acórdão do Tribunal de Justiça, no Processo 497/13, Froukje Faber


contra Autobedrijf Hazet Ochten BV, de 4 de Junho de 2015
• 20 No início de 2009, o stand Hazet contactou telefonicamente F. Faber, que
lhe indicou que aguardava o relatório da polícia relativo ao incêndio. Contudo, em
resposta a um pedido de F. Faber, a polícia informou-a de que não tinha sido
elaborado nenhum relatório técnico.

• 21 Em 8 de maio de 2009, o veículo em causa foi destruído, após o stand Hazet


ter sido previamente informado.

• 22 Por carta de 11 de maio de 2009, F. Faber informou o stand Hazet de que a


considerava responsável pelo prejuízo resultante do incêndio que destruiu o seu
veículo. Esse prejuízo, correspondente ao preço de compra desse veículo e ao
valor de diferentes objetos que nele se encontravam, foi estimado por F. Faber em
10 828,55 euros. 70

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• 23 No início de julho de 2009, F. Faber encarregou uma empresa de peritagens de realizar um exame
técnico sobre a causa do incêndio do veículo. Uma vez que foi entretanto desmantelado, não se pôde
efetuar a peritagem.

• 24 Em 26 de outubro de 2010, F. Faber demandou o stand Hazet no Rechtbank Arnhem (Tribunal de


Arnhem, Países Baixos).

• 25 Como fundamento de recurso, F. Faber alegou que o veículo não correspondia ao acordado e que,
por conseguinte, havia uma falta de conformidade na aceção do artigo 7:17 do BW. Todavia, não afirmava
ter efetuado a sua aquisição na qualidade de consumidora.

• 26 Em sua defesa, o stand Hazet contestou a existência de um caso de falta de conformidade e alegou
que F. Faber tinha apresentado a sua reclamação intempestivamente, de modo que, por força do artigo
7:23, n.° 1, do BW, tinha perdido todos os seus direitos.

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• 27 Por sentença de 27 de abril de 2011, o Rechtbank Arnhem julgou improcedentes os pedidos de F. Faber. Esse órgão
jurisdicional considerou que o stand Hazet podia validamente invocar o artigo 7:23, n.° 1, do BW, uma vez que o primeiro
contacto entre as partes só teve lugar, por telefone, no início de 2009, ou seja, mais de três meses após o incêndio do
veículo. O referido órgão jurisdicional considerou igualmente que já não era necessário examinar se F. Faber agira na
qualidade de consumidora.

• 28 Em 26 de julho de 2011, F. Faber recorreu da sentença do Rechtbank Arnhem para o Gerechtshof


Arnhem-Leeuwarden (Tribunal de Recurso de Arnhem-Leeuwarden, Países Baixos).

• 29 No âmbito do seu recurso, F. Faber invocou dois fundamentos, o primeiro formulado contra a apreciação do órgão
jurisdicional de primeira instância segundo a qual não tinha atuado nos prazos legais e o segundo baseado no facto de
que os bombeiros e os polícias que acorreram ao local do incêndio tinham evocado um defeito técnico que afetava o
veículo em causa.

• 30 Em contrapartida, F. Faber não formulou nenhuma alegação contra a apreciação do Rechtbank Arnhem segundo a
qual não havia que determinar se o contrato celebrado entre as partes dizia respeito a um bem de consumo. Também
não precisou se tinha adquirido o veículo em causa na qualidade de consumidora.

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• Nestas condições, o Gerechtshof Arnhem-Leeuwarden decidiu suspender a instância


e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

• «1) O órgão jurisdicional nacional, quer por força do princípio da efetividade, quer por força do elevado
nível de proteção do consumidor na União [Europeia] pretendido pela Diretiva 1999/44, quer ainda por
força de outras normas ou disposições legais do direito da União, é obrigado a determinar oficiosamente se
o comprador celebrou um determinado contrato na qualidade de consumidor na aceção do artigo 1.°, n.° 2,
alínea a), da Diretiva 1999/44?

• 2) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, o mesmo vale também no caso de os autos não
conterem factos (ou conterem factos insuficientes ou contraditórios) que permitam determinar a qualidade
do comprador?

• 3) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, o mesmo vale também no caso de um recurso em
que o comprador não apresenta fundamentos de recurso contra a parte da sentença do tribunal de primeira
instância em que este não efetuou o referido exame (oficioso) e deixou expressamente em aberto a questão
de saber se o comprador pode ser qualificado de consumidor? 73

• Nestas condições, o Gerechtshof Arnhem-Leeuwarden decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes
questões prejudiciais:

• 4) Deve o artigo 5.° da Diretiva 1999/44 ser considerado uma norma equivalente às regras nacionais que, na ordem jurídica
interna, são consideradas normas de ordem pública?

• 5) O princípio da efetividade ou o elevado nível de proteção do consumidor na União pretendido pela Diretiva 1999/44, ou outras
normas ou disposições legais do direito da União, opõem-se ao direito neerlandês quando este impõe ao comprador consumidor o
ónus de alegar e provar a prestação de informação (tempestiva), ao vendedor, do pretenso defeito de um bem entregue?

• 6) O princípio da efetividade ou o elevado nível de proteção do consumidor na União pretendido pela Diretiva 1999/44, ou outras
normas ou disposições legais do direito da União, opõem-se ao direito neerlandês quando este impõe ao comprador consumidor o
ónus de alegar e provar que existe uma falta de conformidade do bem e que essa falta de conformidade se manifestou nos seis
meses seguintes à data de entrega? O que significa a expressão ‘as faltas de conformidade que se manifestem’ no artigo 5.°, n.° 3, da
Diretiva 1999/44 e, em especial, em que medida deve o consumidor[,] comprador[,] alegar factos e circunstâncias relativas à (origem
da) falta de conformidade? É suficiente que o consumidor[,] comprador[,] alegue, e, em caso de contestação, prove que o bem
adquirido não funciona (bem), ou deve alegar e, em caso de contestação, também provar qual o defeito do bem adquirido que
provocou esse mau funcionamento?

• 7) Na resposta às questões anteriores, é relevante que F. Faber tenha sido assistida, em ambas as instâncias do presente processo,
por um advogado? 74

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• Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

• 1) A Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativa a certos


aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, deve ser interpretada no sentido de
que o órgão jurisdicional nacional chamado a pronunciar-se sobre um litígio relativo a um contrato suscetível
de ser abrangido pelo âmbito de aplicação desta diretiva está obrigado, sempre que disponha dos elementos
de direito e de facto necessários para tal ou deles possa dispor mediante mero pedido de esclarecimento, a
verificar se o comprador pode ser qualificado de consumidor na aceção da mesma diretiva, ainda que este
não tenha expressamente invocado essa qualidade.

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• 3) O artigo 5.°, n.° 2, da Diretiva 1999/44 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe
a uma regra nacional que prevê que o consumidor, para beneficiar dos direitos que a mesma
diretiva lhe confere, deve informar o vendedor da falta de conformidade num prazo razoável,
desde que esse consumidor disponha, para dar essa informação, de um prazo que não seja
inferior a dois meses a contar da data em que detetou essa falta, que a informação a prestar diga
respeito apenas à existência da referida falta e que não esteja sujeita a regras de prova que
tornem impossível ou excessivamente difícil, para o consumidor, o exercício dos seus direitos.

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4) O artigo 5.°, n.° 3, da Diretiva 1999/44 deve ser interpretado no sentido


de que a regra segundo a qual se presume que a falta de conformidade
existia no momento da entrega do bem
• se aplica quando o consumidor faça prova de que o bem vendido não está
em conformidade com o contrato e que a falta de conformidade em causa
se manifestou, isto é, se revelou materialmente, num prazo de seis meses a
contar da entrega do bem. O consumidor não está obrigado a provar a
causa dessa falta de conformidade nem que a origem da mesma é
imputável ao vendedor;
• só pode ser excluída se o vendedor demonstrar cabalmente que a causa ou
a origem da referida falta de conformidade reside numa circunstância
ocorrida depois da entrega do bem.

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Intermediário/vendedor

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Acórdão no Processo C-149/15, Sabrina Wathelet contra Garage Bietheres & Fils SPRL, de 9
de Novembro de 2016

• 45 Face ao exposto, o conceito de «vendedor», na


aceção do artigo 1.º, n.º 2, alínea c), da Diretiva 1999/44,
deve ser interpretado no sentido de que abrange também
um profissional que atua como intermediário por conta de
um particular e que não informou devidamente o
consumidor comprador do facto de que o proprietário do
bem vendido é um particular, o que incumbe ao órgão
jurisdicional de reenvio verificar tendo em conta todas as
circunstâncias do caso concreto. Esta interpretação não
depende da questão de saber se o intermediário é ou não
remunerado pela sua intervenção.

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