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Capítulo 1

O Palácio em Nitamu-ra

É tarde. O sol já começa o seu caminho de descida do alto dos céus. Uma grande comoção
envolve a cidade de Valkaria, o que não é necessariamente uma novidade.

A maior metrópole de Arton está mais do que habituada a receber aventureiros de todas as
sortes, povos de diferentes raças, bandos suspeitos, missões perigosas, brigas de bar e missões
diplomáticas. Mais um dia comum aos pés da massiva estátua da deusa da ambição. Contudo,
nossa história se inicia com um panfleto. Um simples anuncio que havia sido colado na fachada
de vários edifício centrais e em todos os lugares: “Precisa-se de aventureiros para uma missão
perigosa”. O que há de novo ? Como estes, tantos outros anúncios são colados todos os dias.
Contudo, uma coisa marca bem este anuncio: o selo e o endereço do Palácio de Nitamu-ra.

Um povo bastante recluso e orgulhoso de seus costumes, o tamurianos pouco convidam o


povo comum para dentro de sua região. Pelo contrário, cidadãos perdidos pelo bairro nipônico
com frequência são mal vistos, intimidados e, em algumas raras ocasiões, até mesmo
linchados por ultrapassar as fronteiras imaginárias. Mas, desta vez, foram os próprios
tamurianos que convidaram os cidadãos externos ao seu antro de paz. E pode-se dizer que
essa discreta mensagem foi ouvida.

No cair da noite, a audiência no palácio do Daimyô Shiro Nomatsu havia iniciado. Naquele
enorme aposento, caberiam mil pessoas simultaneamente, mas só não havia espaço para uma
coisa: dúvidas acerca da riqueza daquele lorde. Àqueles que notaram o piso, uma bela visão de
pedras coloridas formavam mosaicos no assoalho que retratava a cultura tamuriana e seu
perdido lar. Esta visão só era atrapalhada pela presença de tapetes magníficos com bordados
prateados, rosa e tons terrosos, representando um extenso campo de árvores de copas
rosadas. Nas paredes via-se vários retratos de guerra e conflitos, entremeados por símbolos da
língua tamuriana. Simbolos estes que apenas os mais peritos linguistas conseguiam traduzir,
mas não na sua totalidade, compreender. E, acompanhando a visão das paredes, nas duas
laterais do salão, uma fila de vários guerreiros samurais de armadura completa de cores preta
e acinzentada, com grandes glaives em punho, apoiadas ao chão. Os residentes de Valkaria já
sabiam, por experiência, que não eram guerreiros a serem desafiados. Não individualmente, e
muito menos naquele palácio, com aquela quantidade. No fim do extenso salão, um ressalto
no assoalho fazia um simulacro de palco, onde se viam dois guerreiros samurais de armadura
diferenciadas, com entalhes dourados, flanqueando um trono alto, vazio. Dezenas de
aventureiros diferentes esperavam a entrada do lorde feudal em um misto de burburinho e
agitação. Por fim, a espera acabou.

Ao contrário da expectativa da multidão que se acotovelava e discutia no centro do salão, o


lorde Shiro Nomatsu não foi anunciado. Não houveram cornetas, tambores ou sequer um
arauto. Apenas um grande guerreiro samurai entrou escoltando um homem jovem. Ele tinha
os cabelos negros presos em uma longa trança, a pele amarelada num tom que apenas cabia
aos tamurianos, vestia uma robe negro com detalhes dourados. Era de uma seda tão fina que a
mais leve brisa era capaz de agitar. Calçava tamancos de madeira que não eram feitos para
transitar em terrenos irregulares. Contudo, bastava olhar para sua postura e estatura para
notar que o Lorde definitivamente não era um homem de ficar sentado em sua palácio
enviando cartas.

O Daimyô sentou em seu trono e aos poucos, o burburinho diminui para então cessar. O salão
foi preenchido pelo silêncio, cortado apenas por respirações e pigarros. Por fim, o lorde se
levantou.

Com uma voz muito bem treinada para falar para multidões, aquele jovem e imponente lorde
falou em um sotaque carregado:
“Saudações, aventureiros e aventureiras. Me chamo Shiro Nomatsu e fui eu quem
convocou a todos. Conheço a fama dos desbravadores de Valkaria e gostaria de
contar com vocês nesta empreitada. Vejam bem, em minha última viagem diplomática
ao reino de Hongari, me vi obrigado a cruzar a floresta de Kalamar, onde minha
carruagem foi atacada por elfos negros. Meus valorosos samurais espantaram os
bandidos de nossa comitiva, mas não antes que estes desviassem uma de nossas
carruagens, contendo algumas de minhas posses. Dentre elas, um robe muito
especial que segue em minha família há muitas gerações. Haverá muito ouro e prata
para o grupo que trouxer meu robe de volta. Mas acima disso, haverá algo muito mais
valioso: a minha gratidão. O que me dizem ?”

Se já houvera silencio naquele salão, agora não podia mais se dizer. Objeções foram lançadas
ao ar, muitas mãos gesticulavam, preces eram entoadas enquanto outros já davam suas costas
para o lorde, buscando seu caminho à porta. Tudo isso cessou novamente quando o Daimyô
levantou sua mão, todos os samurais que flanqueavam o salão bateram simultaneamente suas
glaives ao chão, fazendo um grande estrondo sincronizado. Neste momento todos olharam
para frente e viram que, entre a massa de pessoas e o palco havia uma mulher distintivamente
bela. Tinha cabelos curtos, negros como a noite, uma pele bela e bem cuidada como apenas
princesas poderia ter tempo e serviçais para fazer. Contudo, vestia um manto de trapos e
retalhos, se apoiava em um cajado metálico comprido que brilhava refletindo as mil tochas
daquele salão e, como se já não bastasse seus trajes e arma distintos, uma venda vermelha
cobria seus olhos. Nenhuma palavra precisou ser dita para os mais atentos notarem: ela era
cega como um morcego.

“Ouro e prata, você disse ?” Falou a bela cega, dirigindo-se ao lorde, mas sem virar seu rosto a
ele “Eu aceito”, falou em meio ao silêncio e com um sorriso zombeteiro a despontar no rosto.
Um burburinho inundou o salão novamente e mais pessoas o deixavam. Contudo, desta vez
não durou. Uma mão se levantou da multidão e olhares acompanharam conforme um homem
de idade avançada saia do alvoroço. Ele vestia um longo casaco em couro de animal que descia
aos seus calcanhares e roupas leves por debaixo dele, bem como um circular chapéu de couro
com uma pluma empoleirada em cima, e tinha pele e cabelos curtidos pelo nítido tempo
exposto ao sol, mas o que mais marcava era sua postura, olhar e sorriso confiantes. “Como
poderia eu ficar de fora desta expedição na selva, quando até mesmo esta bela jovem cega
aceitou” se virou então aos aventureiros atrás dele “que coragem eu estaria demonstrando ?”.
Isso pareceu divertir o lorde na mesma proporção que aborreceu aos aventureiros atrás deles.
Principalmente os que haviam buscado o caminho da porta. Nesse momento outra voz se
ouviu. Feminina novamente, mas desta vez forte e altiva.
“Elfos Negros, você disse ?” falou uma mulher de longos cabelos ruivos, armadura de batalha e
uma comprida e pesada alabarda em mãos “Você colocou aquele anúncio para mim, não foi,
criança ? Sabe que eu não recusaria.”

Nesse momento, a multidão engoliu as palavras, respirações e até mesmo os pigarros.

“Perdoe-me. Eu estive muito absorto em minhas missões diplomáticas nos últimos


anos para poder conhecer o nome de cada aventureirozinho menor que surge esses
dias. Eu deveria saber quem você é ?” Disse o lorde, com um profundo sarcasmo na voz.

“Meça bem suas palavras de escárnio, menino, e eu não sujarei minha arma esta noite”

“HIWAINÁ” esbravejou o samurai ao lado de Lorde Shiro, dando um passo a frente e dirigindo
sua mão à Katana que repousava em sua cintura. O Daimyô, mais rápido que o samurai,
levantou a mão e parou o avanço dele. O silêncio era tangível no salão e todos os olhares se
voltaram à figura ruiva quase angelical que caminhava para junto dos dois aventureiros, ainda
empunhando a alabarda. O lorde olhou com seriedade a cena até que, enfim, quebrou a
tensão do salão com um sorriso alegre, um brilho no olhar e palavras num tom calmo.

“Existe um linha fina entre coragem e estupidez, minha querida. Não terei a
presunção de arriscar de que lado você está. O campo de batalha fará isso por mim.
Qual seu nome ?”

“Não vim aqui para me apresentar. Deves saber apenas que aceito a missão”

Um sorriso cresceu nos lábios de Lorde Shiro até mostrar seus dentes. Mas não durou muito.
Foi interrompido por outra voz que, desta vez, vinha do lado oposto do salão, próximo à saída.

“Meu lorde, mestre e senhor Nomatsu” disse um homem de feições nobres e baixa estatura,
vestindo um casaco negro “Será que meu lorde me daria a graça da permissão de aproximar-me de
vós ?”. Só então notou-se que este homem estava algemado e acompanhado de perto por um
samurai.

“SENSHI! Traga o prisioneiro para mais perto.”

Neste momento a o que sobrou da multidão abriu passagem para o samurai e o homem que
mais parecia um magro escrivão ou mensageiro do que um aventureiro. Conforme ele passava,
notava-se o bordado púrpura em forma de serpente que marcava as costas de seu casaco,
bem como as orelhas levemente ponteagudas que eram marca exclusiva da prole entre elfos e
humanos. Ao chegar em frente ao lorde, fez uma profunda reverência e falou

“Sou seu prisioneiro, meu lorde. Minha vida e meu destino são decididas através da sua vasta
sabedoria e de suas acertadas decisões. Minhas armas e minhas provisões foram apreendidas e eu
poderia muito bem já estar apodrecendo em seu calabouço, ou até minha cabeça já poderia estar
enfeitando seus muros para afastar meliantes e malfeitores. Entretanto, aqui estou, banhado,
vestindo meus próprios trajes limpos em vossa honrosa presença. Seria muita presunção de minha
parte acreditar que, nestas condições, meu lorde elaborou à mim um papel a ser desempenhado na
busca de seu valioso robe ?”
“Sim, cobra. Acredito que suas habilidades seriam úteis àqueles que viessem a se
desbravar na busca de meu robe”

“Ah, mas que maravilhoso! Estupendo, meu lorde! Sabia que poderia contar com sua sagacidade e
misericórdia. Contudo... devo ressaltar que pouco eu seria de utilidade sem meus pertences e ainda
algemado. Óbvio que apenas uma palavra sua teria poder de reverter esse leve infortúnio de minha
parte, não é ?” Disse o meio-elfo, com um sorriso malicioso no rosto, oferecendo as algemas ao
lorde.

“Claro, cobra. Assim o farei. Contudo, farei isso a uma distância segura. Só depois
que vocês já tiverem deixado a fronteira de Nitamu-ra” Disse o lorde, apagando o sorriso
da fronte do homem.

Nesse momento, o samurai que acompanhava o Daimyô saiu de sua formação, parou de frente
para seu lorde e então ajoelhou-se, desembainhando sua arma e pousando-a no chão entre
eles.

“HEIKÁ, seria de grande honra para mim oferecer minha vida para acompanhar esse grupo de
indignos e insolentes e garantir pessoalmente que seu valioso robe achará, em segurança, o
caminho de volta para Nitamu-ra” Disse o samurai, ainda com a testa grudada ao chão.

“Claro, Di-San. Jamais eu fecharia este grupo sem um emissário meu.” Disse o lorde
para, então, se levantar e se direcionar novamente ao centro do salão, onde apenas um
punhado de aventureiros haviam sobrado “Dou então por concluído o grupo de
aventureiros que irão em busca de meus tesouros. Aqueles que se incomodarem ou
tiverem alguma objeção, por favor, o façam a caminho de suas casas, estalagens e
tavernas. Estes quatro forasteiros serão bem vindos em meu palácio esta noite.
Comerão minha comida, beberão de meu saquê e dormirão sobre meu teto. Amanhã,
à primeira hora de luz, partirão. E qualquer outro forasteiro que for apanhado em
minhas dependências a partir de já, será tratado com a fúria de Lin-Wu” disse,
fazendo sinal ao portão aberto ao fundo do salão, e retirando-se antes que houvesse tempo de
qualquer coisa fosse dita.

Capítulo 2
A verdade sob a missão

A manhã em Nitamu-ra começa de forma bem pacata, como de costume. O sol fazia apenas
menção de nascer no horizonte e os ventos frescos já traziam cheiros diversos dos cafés da
manhã que estavam sendo preparados nas redondezas. Ensopados de vegetais, peixes frescos,
doces feitos de arroz... os cardápios eram variados na província. Nos campos do palácio, um
grupo de samurais treinava coordenadamente seus movimentos com suas katanas, falando
alto e sicronizadamente. Por fim, no meio pátio do palácio de Nitamu-ra estava, já de pé,
aquele grupo de desajustados.

Estavam todos enfileirados de frente para o palácio. A jovem cega se apoiava no cajado
metálico, com o rosto virado para baixo, ouvindo todos os sons da região. O homem de meia
idade com casaco e chapéu de couro amolava uma grande faca. A ruiva em armadura de
batalha de alabarda na mão fazia gestos e balbuciava palavras ininteligíveis com olhos
fechados, como quem roga à um deus. O meio-elfo de belas feições segurava uma espécie de
lança com ponta comprida e afiada e olhava inquietamente para todos os lados com um olhar
malicioso. Por fim, o samurai que havia se oferecido para missão, estava junto aos demais se
mantendo silencioso e rígido como uma estátua. Nesse momento o Daimyô aparece
novamente surpreendendo a todos.

“Bom dia, Lorde Shiro”, disse a jovem cega despontando um sorriso. Os demais aventureiros
se esticaram e procuraram a presença de um jovem lorde em roupas de seda, mas sem
sucesso. Por fim, por trás deles passou um jovem samurai de armadura dourada com capacete
na mão e katana atada à cintura. Era lorde Shiro. “Como foi seu treinamento matinal ?”, disse
ela.

“Nada bem”, disse ele limpando o suor da testa com as costas da luva de couro. “Não
importa o quanto eu corra, a idade insiste em me alcançar. Mas obrigado pela cortesia da
pergunta. Dormiram bem ? Foram bem acolhidos sob meu teto ?”.

“Maravilhosamente bem”, disse a cega

“Nunca havia feito uma refeição tão saborosa”, disse o senhor de chapéu

“Em meus sonhos mais longínquos, desejaria jamais perder sua hospitalidade gloriosa, meu lorde”,
falou o meio-elfo

Sem deixar transparecer o incômodo gerado pela incortesia da jovem de alabarda na mão, que
havia voltado para suas preces, ignorando-o

“Notei esta manhã que não conheço o nome de nenhum de vós. Acho pertinente que possa
saber o nome de cada para incluí-los em minhas preces a Lin-Wu-Sama”

“Chamo-me Sshidy, mestre” Disse o meio-elfo fazendo uma profunda reverência.

“Tânio Solo, ao seu dispor”, falou o homem vestido em couro levando a mão ao chapéu e
puxando-o para baixo, enquanto fazia um leve aceno com a cabeça e sorria educadamente.
“Eu sou Toff, alteza”, disse a jovem cega levando a mão ao peito, ainda agarrada ao cajado e
ainda com rosto virado para o chão.

“Joana”, disse a ruiva angelical, num tom seco, sem abrir os olhos. Logo em seguida voltou a
suas preces silenciosas.

“Ohayö Gozaymasu, a todos. Me chamo Dizaito Hatenshi. Mas todos aqui me chamam de Di-
San”, falou o samurai pela primeira vez essa manhã, direcionando aos demais aventureiros, de
forma amistosa.

“Toff, Tânio, Joana e Sshidy e Dizaito” repetiu o jovem Daimyô “estarão todos em
minhas preces. Não tomarei mais de seu tempo, assim como não posso perder mais do meu.
Vocês viajarão ao reino de Hongari, a Nordeste daqui. Naquela região há a floresta de
Kalamar. Lá vive um bando de bandidos elfos negros. Eles roubaram uma carruagem com
meus pertences. Tinha mais de seiscentos tibares de platina naquela carruagem. Mas não
me importo com o dinheiro que lá havia. O importante é que, junto do tesouro viajava um
robe que havia sido entreue à meus ancestrais pelo próprio Imperador Temaketsu. Essa
relíquia sobreviveu à Tormenta e é um dos orgulhos de minha dinastia. Desejo reavê-lo. Por
isso mando vocês”

“Se me perdoa a insolência, mestre” começou Sshidy. Ao ver que Shiro não o interrompeu,
continuou “Por quê enviar um grupo de desajustados ? Por que não enviar sua guarda real, um
pelotão de samurais ou ir a própria majestade em pessoa? Não seria muito mais seguro ? Não seria
muito mais eficaz ?”

“Claro, claro. O problema é que as relações com os hongarianos não é das melhores. A
incursão que eu fiz foi para tentar conquistar uma aliança. Contudo, o governante da região
não aceitou minhas ofertas e eu temo que marchar com tropas tamurianas pelas terras de
Hongari não seria bem interpretado por aquele macaco velho hongariano. Além disso, um
grupo de aventureiros não levanta suspeitas. Mesmo que acompanhado por um samurai
tamuriano como Di-San”.

“E como reconhecer seu robe quando encontrarmos, majestade ?” Perguntou Tânio

“Será difícil não reconhecer.” Disse Shiro “Aquele robe não é como os trapos velhos que
eu uso normalmente. É uma peça fina que demonstra o valor do império de jade. Leve como
uma pluma de ganso, o Robe de Tekametsu é um tecido feito dourado, todo em fios de
ouro. Em suas costas têm dois dragões tamurianos entrelaçados que se alongam até as
compridas mangas do robe. Um é prateado, também bordado em fios de prata. O outro é
verde, sendo feito com fios de seda imbuída na mais fina jade triturada da finada Tamu-ra.
Vale ressaltar que também é uma peça mágica, por isso é possível que, em reação à magia, ele
emane uma fina luz dourada. Como disse, é uma peça única”.

Essa descrição foi o suficiente para chamar atenção até mesmo de Joana, a descortês.
“E como faremos para encontrar os elfos negros, majestade ?” Perguntou, dessa vez Toff

“Isso vocês podem deixar a meu critério” retrucou Tânio “Encontrar rastros é uma das poucas
coisas das quais posso me vangloriar. Ou não me chamariam de Tânio Solo, caçador de feras”

“Não tendo mais perguntas, ofereço a todos porções de ração de aventureiro. Três para
cada deve bastar para viagem de ida e volta. Sacos de dormir da melhor qualidade e tochas,
uma para cada. Envio-os em nome de Lin-Wu-Sama. Que ele mantenha a audição de Toff
sempre viva. Que ele aguce a percepção de Tânio. Que ele potencialize a honra de
Dizaito. Que ele guie a perspicácia de Sshidy. E que ele... bem... Me mostre que Joana é,
por fim, corajosa e não estúpida. Vão. E me tragam meu robe, aventureiros.”
Capítulo 3
A fogueira dos segredos

“Que javali mais saboroso!” exclamou Toff ainda de boca cheia.

“Realmente, Tânio-Dono. Rastrear um Javali não é uma tarefa fácil. Mas caçá-lo, matá-lo,
Limpá-lo e prepará-lo com vegetais encontrados na beira da estrada... Isso já seria
surpreendente, mas você ainda fez com que tivesse um sabor maravilhoso! Como aprendeu
tudo isso ?” Perguntou Dizaito sentado de pernas cruzadas, próximo à fogueira.

Já estavam no sexto dia de viagem e ainda não tinham gastado uma única porção de ração.
Tânio havia matado a fome e sede de todos durante todo o percurso.

“Quando você vive a vida de um caçador, isso não deveria ser surpresa. Isso é sobrevivência”

“Uma forma saborosa de sobreviver” Disse Sshidy, aparecendo dentras as sombras, onde a
fogueira já não iluminava tanto, e arrancando um pacífico e educado sorriso de todos, com
exceção de Joana, que sentava de costas para fogueira, limpando sua alabarda.

“Bem que você poderia sentar conosco, Joana-Chan”, disse Dizaito “Vamos passar por mais
dias na estrada. Seria agradável que todos nos conhecêssemos”

“Não vim aqui para fazer amigos, samurai. Vim aqui para matar elfos. A não ser que sejas um,
não tenho interesse em nada de sua vida” retrucou Joana em tom seco, sem se virar.

“Você deveria ser mais educada conosco. Estamos no sexto dia de viagem, dormindo na beira
da estrada. Precisamos confiar uns nos outros. E eu não sinto nenhuma tranquilidade para
dormir e lhe deixar de guardar, Joana”, disse Toff falando mais alto do que o habitual, em tom
de desafio.

“Se ajuda em alguma coisa, também não sinto tranquilidade em dormir e lhe deixar de guarda,
garota. Você é cega. Além disso, com essa venda, nunca sei se você está acordada ou
dormindo até que alguém fala com você”, respondeu Joana, incomodando a todos.

“Na escuridão da noite, ela enxerga tão bem quanto você, Joana” Falou Tânio, sem tirar a
atenção de seu javali “Enxerga tão bem quanto todos nós. A não ser o Sshidy aqui” então
esticou o braço e deu um amistoso tapa nas pernas do meio-elfo, que ainda se punha de pé.

“Você não me conhece, caçador. Não sabe o valor que minha visão pode ter pra nossa
missão”, disse Joana se virando a todos com ar desafiador, mas sem largar a Alabarda no chão.

“Não sabemos nada sobre você, mulher! A não ser, é claro, que trata esta alabarda melhor do
que todos nós juntos” Exclamou Toff, elevando em um tom o volume da conversa.

“ÓBVIO! Esta alabarda já salvou minha vida diversas vezes. Quando fizerem o mesmo,
tornamos a conversar” Respondeu mais uma vez Joana, elevando sua voz para se equiparar à
Toff.

O silêncio abarcou os aventureiros após isso. Só se ouvia o crepitar do fogo e os sons da


natureza ao longe. Mas não durou.
“Se querem conhecer alguém, aconselho a todos que cessem de me interrogar e interroguem
o Cobra Negra de pé aí.” falou Joana com voz emburrada, como quem está cansada de ser
tratada com hostilidade “Perguntem o que ele faz toda noite, após acendermos a fogueira”.
Por fim, virou-se novamente de costas e retomou o trabalho com sua Alabarda.

“Como ‘o que ele faz’, sua ignorante ? Ele vai buscar lenha para que nós tenhamos uma noite
quente de sono!” Retrucou Toff, dando ênfase na palavra ‘nós’. Dando um sorriso, Sshidy
estende os braços e mostra a lenha que ainda repousa neles, “O que você tem feito por nós ?”

“Êpa, êpa, êpa... Cobra Negra é um insulto bem pesado, Joana. Acho que faria bem ao nosso
grupo se você se desculpasse ao Sshidy” Falou Tânio com cautela. “Ele pode usar palavras
bonitas, mas isso não faz dele um adorador de Sszzaas. E essa é uma acusação muito séria que
geralmente termina em morte. Ou do acusado ou do acusador”

“Quem ou O Quê é Sszzaas ?” Perguntou Dizaito

“O Deus serpente da trapaça. Seus clérigos são traiçoeiros e são caçados por todo Reinado, Di-
San” Respondeu, Toff

“Ah, não ?” Perguntou Joana, em tom de desafio, parando de tratar de sua alabarda e
pousando-a delicadamente sob o solo, mas ainda sem se virar “Então como vocês explicam o
familiar invisível em forma de cobra feito inteiramente de magia negra que vive enrolado em
seu corpo, por debaixo das roupas dele ?” Perguntou Joana

Nesse momento todos se voltaram para Sshidy, que estava nitidamente surpreso e incrédulo
com a acusação. Todos ficaram surpresos com a acusação da ruiva descortês. Até que o
primeiro a falar foi Dizaito, com uma voz bastante brincalhona.

“Acho que Joana-Chan está delirando! Por acaso você não confundiu com o bordado roxo em
forma de cobra que fica nas costas do casaco dele ? Ou você é assim supersticiosa ?”

“Não, não... calma. Agora que a rainha da terra do desgosto falou... eu pensei ter ouvido um
leve sibilo varias vezes durante nossa viagem. Isso faria algum sentido” Falou Toff, pensantiva.

“Vocês só podem estar insanas!” respondeu Tânio, levantando-se

“Tânio, meu caro. Não precisa se exasperar”. Disse então Sshidy, sentando-se de cabeça baixa.
Deixou a lenha que reuniu próxima à fogueira e, então levantou o rosto demonstrando em
malicioso sorriso comprido “As belas jovens tem razão. Fui descoberto. Não há razão para negar”

Tânio e Dizaito ficaram paralisados com a confissão. Toff, sem fazer alarde, estendeu sua mão
ao cajado metálico que jazia ao seu lado. Joana nem se moveu. Mais uma vez, o crepitar do
fogo foi o único som que ouviam.

“A anjinha ruiva está certa, pessoal. Não tenho mais razões para me esconder. Estamos longe das
cidades e em algum momento eu precisaria me revelar. Melhor agora do que durante um combate, não
é ? De fato, sou Sshidy, sacerdote de Lorde Sszzaas” falou Sshidy com tranquilidade.
“Está estampado em sua forma de falar, em seu casaco e até em seu nome! Como eu não
notei ?” Reclamou Toff para si mesmo, apertando firme a mão no cajado.

Dizaito levou levemente a mão a sua Katana, enquanto Tânio buscou sua faca dentro do
casaco.
“Não precisam sacar suas armas, amigos. Conheço a fama de Lorde Sszzaas e de todos os seus
sacerdotes, mas não tenho razões para traí-los. Shiro Daimyô conhece minha aparência, nome e
devoção. Estou atado à essa missão muito mais do que vocês. Caso aquele robe não retorne à posse de
Lorde Shiro, certamente meu rosto estará estampado em cartazes de procurado, e não só em Nitamu-
ra. E eu não seria estúpido a ponto de diminuir este já diminuto grupo de aventureiros.
Principalmente antes de derrotar os elfos. Além disso, eu não sou o único aqui com segredos, não é ?”,
falou então, olhando em volta.

“Talvez não. Mas o único com um segredo digno à condenação da justiça, sua cobra”, retrucou
Tânio, ainda desconfiado e com a mão atrás das costas, já segurando o caso da faca.

“Eu não teria certeza disso se fosse você, Tânio-dono. Toff-Chan tem algum envolvimento com
um Oni-Hiwainá. Como vocês chamam por aqui ? Ah... um demônio das profundezas. Isso não
é condenável na cultura de vocês ?” Falou Dizaito soltando a espada e sentando mais
tranquilamente. Sshidy sorriu com uma felicidade sádica.

“Estou cercado de imbecis” Falou Joana com desdém “Ela não tem traços de magia negra
consigo, seu estúpido. Ela é uma maga elemental! Isso é permitido.” Respondeu Joana,
virando-se a eles e gesticulando para Toff.

“Não reconheço auras e pouco sei sobre magias” Disse Dizaito “Mas sei ler lábios. E já observei
as preces que ela faz toda manhã. Arrepiaria a espinha de todos aqui se eu dissesse o que ela
roga. Acredito que o envolvimento com essa entidade que permitiu que ela tivesse o poder
que tem”. Retrucou Dizaito segura e calmamente, como se já soubesse dessa informação há
muito tempo.

Nesse momento todos olharam para Toff. Ela, por sua vez percebeu o silêncio que a assolava,
e então retrucou

“Vocês não sabem de nada! Não sabem como é crescer sendo uma mendiga cega em Valkaria.
Nas ruas ou você é forte, ou você não vive o próximo dia. Aceitariam ajuda do próprio Lorde da
Tormenta, se tivessem na minha pele” disse com emoção na voz. Pela primeira vez em seis
dias, soou como uma garotinha cega. “Além disso, não sou eu quem ando por aí com um
casaco cheirando a sangue humano e carne morta, não é Tânio ? Matador de Feras, você diz ?
Meu palpite é Matador de Aluguel” disparou palavras de ameaça, enquanto uma lágrima
disparava por debaixo de sua venda.

“Santa Naga Sszzazita! Onde fui me meter ?” deixou escapar Sshidy, levando uma mão à cabeça.

“Calma, cobra. Ela está certa, mas não precisa se preocupar. Certamente a gratidão de Shiro
Nomatsu é muito mais valorosa do que as poucas pratas que eu posso ganhar com a sua
cabeça” Disse Tânio, soando obscuro pela primeira vez.

“Agora ficou interessante” falou Joana com um sorriso no rosto, pela primeira vez
demonstrando interesse pelos seus companheiros.

“Não adianta ficar muito feliz, santinha do pau-oco. Ou devo dizer ‘anjinha’ ?” Direcionou-se
Sshidy à ela “Já estava sentindo cheiro de magia branca desde que deixamos o palácio. Primeiramente
achei que você era uma paladina. Mas paladina nenhuma enxergaria minha amada Sssunha.
Apostaria minha parte da recompensa de que você é uma youkai disfarçada. Ainda mais que você
alegou... como foi que disse mesmo ? ‘o valor de minha visão para nossa missão’, não é ?. Você é o que
? Uma celestial ?” Disparou então.
“Meia-Celestial, cobra imbecil” respondeu ela, revelando então quatro belas asas penosas
emitindo um belo brilho azul claro, que não tinham sido notadas por nenhum deles até então.
“Um celestial jamais seria capaz sequer de esconder suas asas sob a roupa, quanto mais de
deixá-las invisíveis como eu. Eles têm orgulho demais delas.” Retrucou Joana deixando todos
atônitos com a revelação.

“Preciso me preocupar quanto as minhas orações, Joana ?” Perguntou Toff receosa “Isso faz de
nós oponentes de alguma forma ?”

“Não tenho nada contra seres demoníacos, cega. São Elfos que eu caço” Respondeu em um
tom quase amistoso

“Ótimo” Falou Sshidy “Agora são dois”, revirando os olhos.

“Eu disse elfos, Sszzazita. Quero sangue puro. Não de um bastardo que nem você. Volte aos
seus esquemas e trapaças e não me amole”, retrucou Joana, agora quase brincalhona.

“Quem você está chamando de bastardo, meia-anja ?” respondeu Sshidy, abrindo um sorriso
desafiador

Então Tânio soltou uma grande gargalhada que ecoou pela escuridão. Disse logo em seguida
“Quer dizer então que somos todos desajustados! Isso nos une!”.

“Quase todos” respondeu Toff, agora mais tranquila “O Di-San aqui ainda é só um samurai.
Sem ofensa”, falou voltando-se a ele.

“Só um samurai” repetiu Joana. E então completou “Mas com uma Katana Mágica, não é ?”.

“Ela é mais poderosa contra meio-elfos Sszzazitas ? Porque só me falta essa” retrucou Sshidy, com
um sorriso brincalhão no rosto, arrancando uma leve risada de todos. Até Joana deixou
escapar um sorriso.

“Não, Hebi-Dono, minha arma foi forjada com mágica pelo meu bisavô, muitos e muitos anos
atrás. Ele era um ferreiro muito habilidoso em Tamu-ra. A fez para meu Oji-sama. Digo, meu
Avô. Nossa família era muito pobre e com essa arma, Oji-sama pôde entrar para o exercito
samurai de Tekametsu, e conquistar uma vida boa pra família. Meu pai, herdou-a dele,
tornando-se da guarda do imperador dragão futuramente. Após ele, eu mesmo a herdei. A
lenda de nossa família diz que cada vez que o antigo dono da Onigiri, da minha espada, morre,
seu espírito se aprisiona nela, garantindo poder adicional a ela. Bem como todos os inimigos
abatidos por ela”.

“Agora sim” Disse Tânio, após ouvir a história de Onigiri “Somos um perfeito grupo de
desajustados”

“Então brindemos juntos! E amanhã, mataremos alguns elfos-negros!” Disse Dizaito servindo
uma porção de saquê para cada um. E todos brindaram, até mesmo Joana.
Capítulo 4
A clareira na floresta

Quando todos despertaram, notaram mais uma vez Toff de joelhos ao chão balbuciando
algumas palavras ininteligíveis. Agora, contudo, já sabiam do que se tratava e então deixaram-
na em paz. Após guardar seus sacos de dormir e apagar os rastros deixados pela fogueira, se
puseram novamente à estrada para continuar a viagem.

O sol ainda não chegara a pinho quando avistaram a aglomeração de grandes arvores se
aproximar. O pacífico caminho de terra planta e vegetação rasteira, aos poucos, era marcado
por uma e outra árvore de tronco grosso, copa alta e densa. Até que as árvores se tornaram
cada vez mais próximas. Toff, que andava descalça sob a pesada túnica de trapos remendados
que caía ao chão, logo notou o terreno se tornar mais úmido e segregado. Não custou para
que pisassem nas primeiras folhas, gravetos e cogumelos e que o aroma da floresta abarcasse
à todos. Então, enquanto caminhavam mais para dentro em meio as arvores, cada vez menos
raios de sol conseguia alcançar o solo conforme as copas das árvores fechavam toda a visão do
céu, deixando apenas a iluminação indireta a guiá-los à frente. Cipós pendiam da copa das
árvores aos montes. Os sons da florestas eram muitos. Ouviam-se canários e outros pássaros a
cantar por dentre os galhos das copas densas. Ouvia-se o vento a farfalhar os galhos mais finos
das árvores. Era possível ouvir os passos dos aventureiros enquanto prosseguiam terreno
adentro e pisavam em galhos e folhas. Ao fundo, os mais atentos ouviam também o leve
zumbido de insetos a voar. Se existira algum perigo entre as árvores da floresta de Kalamar,
ele estava muito bem oculto. Entretanto, a vegetação passou a se tornar tão densa que a
estrada a qual eles prosseguiram toda a viagem se tornou um filete de caminho ao qual três
pessoas comuns caminhavam uma ao lado da outra. Quase um corredor ladeado pelas
árvores. E o caminho serpenteava a cada tantos metros, permitindo que só fosse possível
avistar pouco além do atirar de uma pedra.

“Ah, o cheiro de casa”, exclamou Tânio com um sorriso agradável e olhos fechado. Após uma
leve pauso, completou “Mas não se enganem pela aparência. Aqui não é lugar para abaixar a
guarda”.

Já havia algumas horas que o sol já deveria ter deixado o alto do céu, quando chegaram a uma
clareira. Naquele ponto, as árvores abriram um espaço, permitindo a iluminação alcançar o
solo. Seus olhos demoraram um tempo para se acostumar com a claridade.

“Aqui é um bom lugar para um breve descanso. Podemos ver com clareza nossos arredores.
Não seremos pegos de surpresa. O que acham de um descanso antes de continuar ? Acho que
pode demorar para encontrarmos outra clareira como essa” Declarou Tânio.

“Com toda certeza” Disparou Sshidy, já largando sua mochila ao chão e se deixando cair de
costas. Após ele, Toff e Joana sentaram-se calmamente, Dizaito nada disse, mas também não
sentou-se, olhando inquietamente aos arredores.
“Acho que deveríamos traçar uma estratégia de combate, pessoal” Respondeu Dizaito após
alguns instantes, quando todos já estavam sentados “Esses elfos não são para serem tratados
com levianidade”, logo completou.

“De fato, Dizaito” respondeu Tânio e, após alguns instantes rangeu alto e levantou-se, como
quem sente dores. Espreguiçou-se e alongou o pescoço. E então perguntou “O que você sabe
sobre esses bandidos ?”

“Bem...” Começou Dizaito um pouco desconcertado “eu não estava na expedição para
Hongari. Mas li o relatório do superior encarregado pela mis...”

“Eles nunca atacam sozinhos” Começou Joana levantando-se e interrompendo a ele “Até seus
patrulheiros e batedores andam em grupos de três. Elfos negros sempre têm animais que são
treinados para combate. Esses animais podem variar de terreno para terreno. Já cacei um
grupo que vivia escondido em uma caverna sob a montanha que usava aranhas-gigantes como
montaria”

“Santa Naga Sszzazita” Exclamou Sshidy, ainda deitado, mas bastante atento

“Eles não gostam de agir de dia. Sua visão fica ofuscada pela claridade, então caso não os
achemos de dia, podemos esperar uma emboscada a noite” Disse Joana

“Verdade. Os registros contam que a emboscada foi no meio da noite” Completou Dizaito.

“Diferente dos elfos comuns, os negros gostam de um combate cara-a-cara” Continuava Joana
séria e compenetrada olhando para os demais “Por isso caso sejamos alvo de tiros de flecha,
eles não devem estar muito distantes. Gostam de lutar com uma lâmina em cada mão, e não
se importam muito com sua defesa. Procuram finalizar seu alvo com agilid...”

“Á POSTOS TODOS!” Gritou Toff interrompendo Joana e pondo-se de pé em um movimento


ágil, já com cajado na mão.

Apenas Dizaito e Tânio, que já estavam de pé, conseguiram entender o que se aproximava
deles antes que alcançasse o meio da clareira. Os demais só observaram duas grandes bolas
negras a adentrar na clareira em uma altura pouco acima de um homem adulto, a se
aproximar rapidamente como que lançadas sob eles. Apenas os mais atentos conseguiram
notar que eram, na verdade, dois negros besouros gigantes, um levemente maior que o outro,
com quase 40 centimetros de altura e duas poderosas mandíbulas com diversos espinhos do
mesmo rígido material de suas carapaças.

Os instintos de Tânio dispararam como que respondendo à prece de Shiro. Ele alcançou uma
grande faca dentro de seu casaco e, com um movimento rápido nitidamente muito bem
treinado, lançou aquela faca no besouro menor logo que o viu. A faca rodou várias vezes no ar
enquanto traçava seu caminho direto ao besouro e o alcançou, afundando a lâmina no peito
do animal, onde a carapaça é mais fina. Uma chuva de gosma branco-leitosa caiu enquanto as
vísceras do besouro caíam abaixo dele.

“A CARAPAÇA É MAIS FINA NA PARTE DE BAIXO” gritou Tânio.

Dizaito sacou um Kyudo, um arco tamuriano curvo curto que pendia sob seu ombro, e
alcançou uma flecha na aljava que pendia em flanco, do lado oposto da katana, ao mesmo
tempo em que Joana levantou-se e suas asas se esticaram e ela voou com ímpeto contra os
besouros, de alabarda em punho.
Foi tempo suficiente para Sshidy e Toff, mais atrás, finalizassem suas preces. Uma estaca negra
se materializou na frente de Sshidy e foi arremessada a frente na direção do besouro maior,
enquanto que, com um aceno de cajado metálico, Toff conjurou uma saraivada de pedras
afiadas que foram projetas do chão em direção ao besouro menor já ferido.

Os projéteis voaram cruzando a clareira em um segundo, mas não acertaram seu alvo com
bastante afinco como a faca o fizera. As pedras acertaram o besouro menor, entretanto este já
estava mais atento e abaixou-se, fazendo com que todos os projéteis acertassem na parte mais
grossa de sua carapaça, ricocheteando nela, sem fazer efeito. A flecha de Sshidy, por sua vez,
apenas raspou a parte debaixo do besouro maior, sem causar dor ao mesmo.

Nesse momento Joana alcançou-os, com um movimento de baixo para cima, tentou acertar o
besouro maior com sua alabarda, mas sem sucesso. Observando-a se aproximar, ele voou mais
alto e saiu do raio de ação de sua arma, estando acima no nível das árvores. Vendo afastar-se,
Dizaito seguiu-o com sua pontaria e disparou uma flecha contra ele. O besouro subiu cada vez
mais alto tentando fugir do alcance da flecha, mas sem sucesso. Entretanto o kyudo do Dizaito
não foi feito para alvos à grandes distâncias e, quando a flecha acertou o besouro, sequer
penetrou na parte debaixo de seu tórax, acertando nele já sem velocidade e caindo logo em
seguida.

O besouro menor, mais próximo do solo, disparou contra Tânio, que o lançara uma faca que
ainda estava presa à seu tórax. Ele tentou rolar para fora do campo de ação, mas sem sucesso.
As longas presas negras do besouro o alcançaram antes que pudesse se afastar muito,
prendendo em seu ombro com uma força esmagadora. Elas afundaram atravessando o grosso
casaco de couro, atravessando a fina camisa de lã e até mesmo o colete de couro oculto que
Tânio vestia sob a camisa, até chegar na pele e então músculos do mesmo. Com um
movimento, o Besouro então rasgou casaco, camisa, colete, pele e músculos, o que os outros
logo notaram graças ao grito surdo e ao sangue de Tânio que escorria aos montes sobre ele.

Logo que Tânio foi alcançado, Toff notou um barulho singular entre as árvores como um urso
ou troll, arrendando os troncos por onde passa. Chamou novamente atenção de todos para
que vissem o terceiro besouro que tentava aparecer dentre as árvores, mas sem sucesso.

O terceiro besouro fazia os demais parecerem pequenos e inofensivos. Tinha pelo menos 1
metro de altura, era tão pesado que as suas asas não conseguiam tirá-lo da chão. Sua carapaça
negra refletia a luz do sol enquanto ele batalhava para passar por meio das árvores.

Enquanto todos notavam o monstro que havia pisado no campo de batalha, o besouro que
havia ascendido aos céus desceu com velocidade em direção a Joana. Alcançou-a com força e
velocidade, fechando suas presas sob seu tórax com força o suficiente para rasga-la ao meio,
se não fosse por ela ter notado tudo a tempo. Assim que a alcançou, ela segurou uma das
presas com sua mão esquerda, enquanto que afastava a outra com o antebraço direto, ainda
segurando a alabarda. A força foi o suficiente para arrastá-la ao chão. Logo que ouviu o
primeiro estalo vindo da manopla em seu antebraço, Joana fez uma finta com o tronco e
arremessou o grande besouro ao longe. Ele rodopiou algumas vezes no ar e acertou o chão,
levantando folhas caídas e terra, enquanto se arrastava e rolava, até recobrar o equilíbrio já
próximo de Dizaito, Sshidy e Toff.

Toff então entoou outra breve prece, dessa vez conjurando uma longa estaca de pedra do solo
e arremessando-a no besouro que ainda pendia sob o ombro de Tânio. Desta vez, este não
teve tanto reflexo assim. A estaca atravessou o besouro ao meio, lançando-o ao longe. Ele caiu
ao chão, sacolejando e guinchando, mas acabou pendendo de casco para baixo, até que as
pernas endureceram formando uma concha, e ficando estática, sinalizando o desfalecimento
do primeiro oponente.

Dizaito logo guardou seu kyudo, sacou sua Katana e enfiou-a buscando atravessar a carapaça
do besouro que havia sido arremessado até próximo dele. A espada tamuriana fez um buraco
na grossa carapaça, pergurando-a a se fincando no seu interior. Isso foi o suficiente para que
ele reagisse ao alvo mais próximo, que era o próprio Dizaito. Basto abrir suas presas para
alcançar o tronco do samurai que estava à sua frente. A força era suficiente para partir o
samurai ao meio, se não fosse sua armadura, que o salvou. Logo que se viu preso, o samurai
segurou com força o cabo da Katana e, buscando forças sabe-se lá onde, ergueu o besouro do
solo. Vendo essa abertura ímpar, Sshidy não ousou rogar nem uma palavra. Apenas deu um
passo atrás, colocando sua lança em posição de combate e, mirando na ponta da katana que
ficara então à mostra na extremidade inferior do besouro, fincou a lança no tórax do besouro
que já estava machucado.

Nessa hora, a armadura de Dizaito estalou, os espinhos das presas atravessaram a mesma e
cravaram-se na carne do samurai, que urrou de dor, enquanto tentava freneticamente se
libertar, mas sem sucesso.

Nesse instante, uma sombra caiu-se sobre eles e a alabarda acertou o animal. A lâmina de
pesado metal acertou em cheio na rachadura que havia sido aberta pela katana, quebrando a
carapaça e afundando profundamente na carne da fera e, rapidamente, encontrando o ar
abaixo dela. O golpe de Joana partiu o besouro ao meio como um lenhador parte um trecho de
lenha. As metades do besouro caíram ao chão, soltando instantaneamente o samurai, que se
largou ao chão, ferido. Nesse momento, o besouro maior se desvencilhou e se posicionou a
frente dos aventureiros.

“Essa não é uma luta para ganharmos, pessoal. Não há desonra em uma retirada estratégica”
falou Tânio, com uma mão segurando o ombro que pendia deslocado e sangrando, sob o
casaco rasgado.

“Não fui enviado aqui para fugir” falou Dizaito, levantando-se do chão, apertando mais forte o
cabo da katana e olhando com seriedade a fera que se aproximava.

“Acho que deveríamos ouvir o Tânio, Di-san”, retrucou Toff preocupada “Vocês não estão
bem”.

Nesse momento Sshidy, que estava concentrado desde então, terminou sua prece. As sombras
que a as árvores projetavam no solo pareceram aproximar-se de suas mãos em concha, onde
uma bola negra tomava forma. O ar no ambiente abaixou um ou dois graus. Assim que a
escuridão era total entre suas palmas, Sshidy lançou aquela esfera de trevas na direção do
besouro. Conforme aquele projétil negro avançava, mais sombra se juntavam a ele tomavam
uma nítida forma de um crânio feito de magia negra, emitindo um alto e agudo som que
parecia uma risada diabólica. O crânio voou e acertou o besouro alfa em cheio. Ele foi
arrastado alguns trechos para trás até acertar as árvores atrás deles, fazendo com que caísse
sobre o próprio peso. Todos ficaram felizes pela magia negra do clérigo de Sszzaas nesse
momento, visto que entenderam que mais ninguém teria uma magia tão poderosa quanto
aquela.
Mas essa felicidade se dissipou rapidamente quando o besouro tornou a levantar-se com
algum esforço. Logo notaram que a queda do besouro estava mais relacionada ao seu peso do
que com o efeito que a magia causara nele.

“Alguém quer tentar mais alguma coisa, ou podemos ir agora?” Perguntou Tânio

“Acho que devemos ir”, Respondeu Sshidy

Nessa hora o besouro atacou rumo aos aventureiros. Sshidy segurou a mão de Toff e puxou-a
para o lado, correndo na direção das árvores. Joana agarrou Dizaito como em um abraço e
ascendeu aos céus sobre eles. A ultima coisa que avistou foi Tânio atirando-se para fora do
caminho do besouro enquanto Toff e Sshidy encontravam seu caminho entre as árvores e a
clareira ficou cada vez menor e menor enquanto eles subiam e se afastavam.
No meio de tantas árvores de copas frondosas, já era difícil ver a luz do sol enquanto este
estava à pinho. Agora que se punha e a noite caía sobre a floresta, a escuridão reinava. Não
era possível enxergar um palmo após o nariz. Toff, a menos prejudicada com a escuridão, ouvia
ao longe os uivos de lobos da floresta, o zumbido das cigarras e os pios de coruja que o vento
trazia à eles. Aquele cheiro de mato molhado invadia a narina e ficava difícil até de sentir
outros aromas. Eles andavam a horas e não conseguiam chegar a lugar algum, e o senso de
direção de Toff havia se perdido por completo após ser carregada para fora da batalha. Então,
não sabiam bem para onde iam.

Se não fosse por uma pequena bola de luz mágica conjurada por Joana, ninguém poderia
enxergar o caminho a frente. E estariam tão perdidos quanto a maga cega que os
acompanhava.

“Tenho certeza que já passamos por essa pedra, Joana-chan” falou Dizaito à Joana, que
liderava o caminho dos aventureiros.

“Várias vezes” falou Sshidy, concordando com ele, enquanto andavam por outro caminho sem
rumo.

“Calem-se! É difícil se guiar pela floresta após ela escurecer. Deixem eu me concentrar!”
Ordenou a meio-celestial, tão cansada de andar a pé quanto os demais.

“Você não tem uma visão especial, ou algo do gênero, Joana ?” Perguntou Toff

“Tenho” Respondeu Joana, secamente.

“E não era pra isso estar nos levando para o caminho correto, então ?” Questionou novamente
Toff, enquanto Dizaito fazia-a se abaixar para desviar de um galho que ela não via.

“Não é tão simples assim, Cega. Posso enxergar bem na escuridão e enxergar focos de magia.
Mas isso não ajuda quando tudo o que temos pela frente são árvores, arbustos e mais árvores”
Retrucou Joana, sem desviar sua atenção do caminho.

“Existem animais na floresta, Joana” Disse Sshidy, corrigindo sua fala.

“Já venho notando-os há um bom tempo. Mas enquanto não forem mágicos ou feitos de
escuridão, não vejo como isso poder ajudar” Rebateu ela.

“COMO NÃO PENSEI NISSO ANTES!” Falou Sshidy mais alto e em um tom surpreso, e então
parou de caminhar. Os demais pararam logo em seguida. “Lembra de minha Ssunha ? Que
você viu enrolada em mim quando notou que eu era mago ?”, perguntou à Joana enquanto
tirava a mochila com os suprimentos das costas, e deixava-a no chão.

“Sim, o que tem sua cobra ?” Perguntou Joana confusa.

Nessa hora Sshidy esticou o braço direito em direção ao chão, curvando-se, e uma grande
cobra feita de pura trevas deslizou para fora de sua manga.

Toff e Dizaito se surpreenderam enquanto a cobra continuava a sair do clérigo de Sszzaas e


não parava. Por fim, quase onze metros de cobra depois, viram sua cauda terminar em um
chocalho. A serpente de sombras então se ergueu do solo e encarou o mago, agitando o
chocalho como um cachorro abanaria o rabo ao seu dono.

“Minha querida e amada Ssunha, faça-nos uma gentileza” Disse Sshidy “Por favor deslize
através dessa floresta terrível e nos traga alguma informação de direção. Uma cidade, vilarejo,
cabana, clareira... qualquer coisa que esteja próximo de nós. Certo ?”

A cobra então sibilou para ele, virou-se na direção contrário e deslizou lentamente para dentro
das sombras. Os aventureiros a fitaram por um tempo, enquanto seu comprido corpo se
movimentava e desaparecia. Após ficarem sozinhos, todos se sentaram lá mesmo. Não
precisaram discutir, apenas se olharam e viram que estavam cansados demais e teriam de
esperar a cobra voltar com notícias. Ou, seja lá como ela e seu conjurador se comunicavam.

Após alguns minutos sentados, foi Dizaito que quebrou o silêncio.

“Bem...” Disse a todos sem levantar a cabeça para olhá-los “Saímos de Valkaria na direção de
Hongari, no caminho em que Shiro teria tomado. Correto que nos perdemos no caminho, mas
se tivéssemos continuado deveríamos estar seguindo a noroeste, não é ?”

“Sim. E enquanto não tivermos uma bússola, essa informação não nos serve de nada sem
Tânio aqui” disse Joana.

“E ele estaria, se vocês tivessem ajudado-o a fugir como fizeram comigo e com Di-San” falou
Toff, com um pingo de ressentimento na voz.

“Dizaito estava machucado e ao meu lado. Seria imprudente deixa-lo” Respondeu Joana
encarando sua luz mágica, sem se dar ao trabalho de virar os olhos para Toff

“Assim como Tânio também estava machucado!” Rebateu Toff, um pouco acima do tom para
uma conversa amistosa “E não foi imprudente termos nos separado do único entre nós que
sabe se guiar na floresta?”

“Claro, Toff, claro. Mas você tem que entender que nós reagimos como pudemos. Eu também
não poderia deixa-la para trás. Já que você é...” A voz de Sshidy diminui ao pronunciar as
primeiras palavras da última frase, até morrer sem completá-la. Mas não restaram dúvidas no
ar, pois Toff continuou a frase de onde ela parou.

“CEGA?” Disse então em um tom nada amistoso, virando seu rosto na direção dele, como que
para encará-lo, mesmo sem enxerga-lo “ERA ISSO QUE IAS DIZER, NÃO É?” Disparou então.

Nesse momento Toff estendeu a mão ao chão, uma pequena pedra saltou dele e pousou
suavemente em sua palma, onde não se alongou muito, pois foi manualmente atirada,
cruzando os ares entre os aventureiros e atingindo Sshidy no meio de sua testa.

“AI!” Disse então o meio-elfo “Por que você fez isso?” perguntou, esfregando a mão esquerda
no ponto onde a pedra o acertara.

“Para mostrar pra vocês que a cega aqui não é uma garotinha indefesa. Eu tenho tanta
percepção dos arredores quanto cada um de vocês aqui. Talvez até mais...”

“Disso eu discordo” Respondeu Joana, mas dessa vez, em voz baixa, mantendo sua impaciência
só pra si.
“Se você não tivesse me ajudado, e sim ajudado o Tânio, não estaríamos perdidos na floresta
agora! E tudo porque me acharam a garotinha indefesa só por causa da minha condição” Falou
Toff, agora um pouco mais calma, mas ainda indignada com os demais.

“Anotado: Não ajudar mais a Toff” Resmungou Sshidy em voz baixa, mas ainda em um tom
que pudesse ser compreendido.

“KOREIJÖ!” Falou Dizaito, interpondo-se à eles “Não adianta mais discutir o destino de Tânio-
Dono. Nós nos perdemos dele! Agradeçam que Lin-We nos trouxe para perto uns dos outros,
senão estaríamos vagando sozinho por essa floresta na escuridão. E se continuarem assim,
logo, logo estaremos vagando separados.” Disse então com voz firme.

“QUE DROGA!” Esbravejou então Sshidy, deixando todos surpresos.

“Se vai zombar de meus costumes e meu deus, cobra...” começou Dizaito, levando a mão à
katana “...deverá fazê-lo de arma em punho.” Completou.

“Não, não era isso. Desculpe-me. Alguém ou alguma coisa achou Ssunha e a matou. Senti
agora sua energia se esvaindo e voltando para mim” Falou Sshidy.

“E as informações que ela continha? Por onde passou e o que viu?” Perguntou Toff.

“Perdidas com ela” Completou Sshidy, decepcionado com o fracasso de seu plano.

“Uma bela droga mesmo” Concordou Dizaito, recostando-se na árvore novamente.

Todos se entreolharam. Naquela escuridão, nada parecia ir bem. Eram quatro aventureiros.
Magos elementaristas, enganadores, soldados e guerreiros... marcharam ali para derrotar um
pequeno exército de elfos... mas parece que a floresta estava derrotando-os.

Nenhum deles estava particularmente à vontade para falar. Na beira da floresta, eram todos
amigos que a vida tratou de juntar para uma missão gloriosa. Agora, pareciam apenas mais um
bando de exploradores que a floresta trataria de apagar.

No meio deste sentimento de derrota que era comum a todos, algo sobressaiu Joana, que
levantou a cabeça rapidamente

“Você tem certeza disso, Sshidy?” Perguntou Joana, agora sobressaltada, levantado-se e
olhando fixamente para um ponto qualquer em meio às sombras “Certeza de que sua cobra foi
exconjurada ?”

“Absoluta. Por que ?” Perguntou o clérigo de Sszzaas, confuso, mas se levantando também
como ela o fez. Toff e Dizaito apenas olharam-nos.

“Porque tem um foco de magia negra correndo muito rápido até nós” Disse Joana olhando
fixo, com olhar perdido além da escuridão das sombras da noite “Correndo não,
serpenteando!”

“Rápido, Joana, agarre Toff e Di-San e voe para além dos galhos” Disse Sshidy com uma certa
preocupação no olhar “Aconteça o que acontecer, desça somente quando eu chamar. VÁ
AGORA!”

“Certo” Disse Joana. Toff e Dizaito se agarraram na meio-celestial. Então, suas asas brotaram
novamente, emitindo um leve brilho azulado que coloria as sombras das árvores. Então voou e
se afastou do solo.
Sshidy, agora sozinho, atou sua glaive às costas. Se o que vinha à frente era o que estava
pensando, estar armado só faria ameaçar sua vida. Ajoelhou-se, pôs ambas as mãos no solo
úmido abaixo dele e abriu a boca em um sorriso psicótico, colocando a língua para fora e
sibilando. Então, do meio das árvores irrompeu um clarão branco num sibilo ligeiro. Por muito
pouco, errou o rosto de Sshidy, desviando no último segundo. O meio-elfo virou-se
rapidamente, não dando as costas à grande serpente branca que havia saltado em meio às
trevas.

“Como vosssscê conhessssce nosssssa etiqueta, lanche?” Falou uma voz sibilante oriunda da
serpente.

“Adorado e temido seja Lorde Sszzaas...” começou Sshidy

“... Masss nunca confiado” Completou a cobra, agora virando-se devagar para encarar o
clérigo.

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