Para os psicanalistas, a razão pela qual repetimos os nossos erros deve ser
buscada em nosso inconsciente. Ele não se manifesta apenas por lapsos, atos
falhos ou sonhos, é algo vital e íntimo, em termos psicanalíticos, é uma estrutura
organizada como uma linguagem. Para J.D. Nasio, nele encontram-se nossas
pulsões, a força propulsora e soberana que está por detrás de nossas
conquistas, de nossas escolhas, de nossa vida “o inconsciente é a força
soberana que nos impele a escolher a mulher ou o homem com quem
compartilhamos nossas vidas. Ao contrário da opinião geral, a escolha de nosso
parceiro é menos o resultado de uma decisão raciocinada do que a cristalização
de um comprometimento amoroso cuja causa ignoramos. Mas o inconsciente é
igualmente a força que nos leva a escolher a profissão que exercemos e que
nos confere uma identidade social; ou mesmo a força que nos leva a escolher a
cidade ou a casa onde moramos. Não obstante, todas essas escolhas, que
julgamos deliberadas ou fortuitas, impõem-se a nós sem que saibamos
efetivamente por quê. “
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inconscius, termo psicológico com dois significados distintos. Em um sentido
amplo é o conjunto dos processos mentais que se desenvolvem sem
intervenção da consciência. O segundo significado, mais específico, provém da
teoria psicanalítica e designa uma forma específica de como o inconsciente
funciona. Ele define um complexo psíquico ou conjunto de fatos e processos
psíquicos praticamente insondáveis, misteriosos, obscuros, de onde brotariam
as paixões, o medo, a criatividade e a própria vida e a morte. Freud definiu o
inconsciente nos livros "Psicopatologia da vida cotidiana" e "A Interpretação dos
sonhos", mostrando que há um significado nos esquecimentos, atos falhos e nos
sonhos que não está definido de forma imediata. Esse significado oculto, ao
mesmo tempo que ele é transparente ao indivíduo, produz a imagem de que a
mente humana é como uma ponta de um iceberg, onde a parte submersa seria
então o inconsciente.
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sintoma aparece, e essa aparição inicial é decisiva para compreender a causa
do sofrimento. Tudo se joga no primeiro minuto porque é então que o impacto de
um sintoma é mais intrusivo e indelével. Como se a eclosão do sintoma fosse
mais reveladora de sua causa do que suas reincidências posteriores. ”
A origem da repetição
Ninguém sabe o que o outro já viveu realmente e que carrega algo no seu
recôndito ser. É preciso ter empatia: a primeira, estar consciente do que ocorre
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no momento em que um sintoma ou comportamento errático ocorre, a segunda
empatia, imaginar o que se passa no inconsciente, a fantasia inconsciente
responsável pelo sintoma que emerge no dia a dia. Ela não sabe se relacionar
com colegas? Não sabe lidar com limites? Não tem ideia do que fazer com
relação a uma autoridade? Encontra-se numa situação na qual se desespera? A
questão é que as reações têm motivos inconscientes, emergem porque o sujeito
está dominado por uma emoção que não reconhece.
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ao espaço do inconsciente. Nasio identifica duas formas de repetição nesse
momento: a temporal, horizontal, isto é, no tempo, as sucessivas crises,
manifestações do sintoma; e a espacial ou tópica da fantasia, vertical,
caracterizada pela superposição de ocorrências relacionadas ao mesmo motivo,
a mesma fantasia.
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Nossos gestos cotidianos, aquilo que nos torna insuportável para outras
pessoas, nossas manifestações fora da normalidade, tudo isso são significantes,
termo central no pensamento de Lacan que significa acontecimento, coisas que
podemos contabilizar, mas que é sempre a manifestação involuntária de um
sujeito que pode ser contada por ele ou por outro. Eu conto as várias vezes em
que um sujeito, servidor público, agiu grosseiramente com seu colega de sala;
eu conto sucessivamente, as vezes em que o comportamento de um colega em
relação a algo, alguém ou alguma coisa se tornou inconveniente. Diz Lacan; “um
significante representa o sujeito para outros significantes” (p.27). O ato de
bullyng de um colega para outro representa o inconsciente de um sujeito para
suas crises passadas e futuras, é o elo numa série repetitiva de significantes
semelhantes, não existe isolado, somente na repetição.
A repetição sadia:
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potencialidades e consolidar o sentimento de que somos o mesmo ontem e hoje”
(p.32).
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objeto de amor ou ódio, e em termos analíticos “amo-te não pelo que tu és, mas
por essa parte de mim que carregas em ti”, diz Nasio.
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são a repetição de um passado pressionado a ressurgir” (P.40). Nossas escolhas
atualizam nosso passado em atos que nos ligam ao objeto de amor original ou
nos afastam “Se vocês me perguntarem o que é que se repete em nossa vida do
ponto de vista psíquico, responderei que o que se repete é nossa maneira de
amar, nosso compromisso afetivo com a criatura amada” (p.41). Para Nasio, o
que repetimos são atos ligados a experiências de amor ou a experiências de
separação, cada instante acrescenta uma nova camada a este magma original,
ao nosso eu, em camadas que constituem nossa personalidade, ‘somos nosso
passado em ato”, mais, diz Nasio “somos nosso inconsciente atualizado”.
Resumo:
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repetição patológica é uma serie de pelo menos três ocorrências porque ela é
insistente e compulsiva, é uma emoção infantil, violenta, foracluida (isto é, não
compreendida pelo indivíduo na época) e recalcada que aparece, desaparecer,
reaparece e reaparece na idade adulta na forma de experiências perturbadoras.
Nasio pergunta: porque um sujeito adulto tende a repetir – a sua revelia – uma
experiência tão penosa quanto o trauma infantil que sofreu, ao passo que o bom
senso nos levaria a pensar que conviria antes esquece-lo? Porque o gozo deseja
ressurgir compulsivamente? Remos quatro respostas possíveis e
complementares: simbólica, econômica, clínica e genética:
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Em primeiro lugar, a resposta simbólica que acabamos de esboçar. A causa
da repetição compulsiva do gozo resume-se a três vocábulos: “defeito de
simbolização”, “o que excluído do simbólico” e “reaparece no real”. O que não
conseguimos compreender no passado aparece como sintoma, em nossas
ações descontroladas, está por trás de nossa obsessão em repetir gestões,
ações, comportamentos. Diz Nasio que nossa mente inconsciente tem certa
organização porque as representações ali se comunicam de alguma forma: mas
a emoção forte não enraizada e relegada ao inconsciente permanece isolada,
incapaz que é de descarregar sua tensão sobre outras representações. Nasio
ilustra: é como uma bola de fogo circulando no inconsciente que busca a primeira
oportunidade para voltar a superfície.
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O gozo não quer nada, não pede nada, não quer mudar nada, quer
obstinadamente continuar seu movimento e permanecer tal qual, idêntico a si
mesmo.
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As duas modalidades da repetição patológica: a repetição temporal e a
repetição tópica.
Bibliografia
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