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Eixo 4 - Práticas Pedagógicas: Culturas infantis e produção cultural para e com os bebês
e as crianças
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Especialista em Políticas Públicas Educacionais, atua na formação continuada dos profissionais da
Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Curitiba.
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Especialista em Educação Física Escolar, atua na formação continuada dos profissionais da Educação
Infantil da Rede Municipal de Ensino de Curitiba.
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Utilizamos o termo professoras, no feminino, ao longo do texto, por ter sido este o nosso público no
curso aqui citado e por entendermos que, em sua grande maioria, as profissionais que atuam com bebês
são mulheres.
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A proposta foi apresentada a um grupo de profissionais inscritos no curso "Linguagem Movimento no
Berçário" realizado no 1º semestre de 2015.Porém entendemos que, por trabalharem em grupos dentro
(RME) de Curitiba, que atuam nas turmas de berçário, com novas possibilidades de
planejar práticas de movimento mais diversificadas e significativas para esta faixa etária.
Percebemos então a necessidade de pensar em práticas pedagógicas específicas
para os bebês, que explicitassem a concepção de criança trazida pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), considerada como um “sujeito
histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia,
constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende,
observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade,
produzindo cultura.” (BRASIL, 2010, p. 12). Este é um grande desafio, pois de acordo
com Barbosa (2010, p. 2)
Durante muitos anos, os bebês foram descritos e definidos principalmente por
suas fragilidades, suas incapacidades e sua imaturidade. Nos últimos anos,
porém, as pesquisas vêm demonstrando as inúmeras capacidades dos bebês. [...]
Eles são dotados de um corpo no qual afeto, intelecto e motricidade estão
profundamente conectados, e é a forma particular como esses elementos se
articulam que vai definindo as singularidades de cada indivíduo ao longo de sua
história. Cada bebê tem um ritmo pessoal, uma forma de ser e de se comunicar.
de suas unidades, essa e outras propostas trazidas na formação continuada da RME acabam se
propagando para além das profissionais inscritas nos cursos.
professor como elemento principal, acima inclusive das necessidades e saberes das
crianças. Como este modelo foi vivenciado pela maioria das profissionais que atuam com
os bebês, este acaba sendo o parâmetro para organizarem suas práticas pedagógicas.
Para auxiliá-las a considerar as crianças como seres competentes, que desde o
nascimento são ativas por si próprias, ricas de iniciativas e de interesses por tudo que as
rodeiam e que em cada ação que realizam, vivem seriamente, envolvendo-se
completamente com todas as suas emoções, apresentamos a organização de ambientes de
aprendizagem para a faixa etária de 0 a 2 anos, tendo como foco o movimento dos bebês,
que propõe aguçar a curiosidade infantil e mobilizar a criança para expressar o seu
pensamento de forma autônoma e criativa.
Os desdobramentos da proposta
A partir das discussões e reflexões feitas com este grupo de professoras nesta
formação, percebemos certo receio delas em proporcionar atividades mais desafiadoras,
pois algumas têm a preocupação de que os bebês possam se machucar e por consequência
que os responsáveis por essas crianças cobrem delas uma postura mais cuidadosa. Isso
fica evidente na escolha de equipamentos que não proporcionam movimentos mais
complexos e até mesmo na dificuldade de transpor o ambiente da sala para espaços
externos. No entanto, tentamos mostrar a elas que,
A criança que pode mover-se com liberdade e sem restrições é mais
prudente, já que aprendeu a melhor maneira de cair; enquanto a criança
superprotegida e que se move com limitações tem mais riscos de acidente
porque lhe faltam experiências e desconhece suas próprias capacidades e
seus limites. (FALK, 2011, p. 18)
Obviamente isto não quer dizer que não se deve atentar para as questões de
segurança, mas é necessário ultrapassar o senso comum de que a criança que está sempre
em lugares ditos “seguros” sofrerá menos acidentes do que aquela que é exposta a mais
desafios corporais ou espaços diversos.
Mesmo com esses receios percebemos que a escolha dos materiais e equipamentos
foi bem variada e criativa, indo para além dos objetos convencionais. A ressignificação
de objetos e brinquedos deixaram os ambientes mais ricos de interações. Um exemplo
disso foi o berço, que é um mobiliário usado para proteção e contenção, mas que foi
ressignificado quando colocado em posições variadas e transformado em um
equipamento que pudesse proporcionar diferentes desafios. Outros materiais e
equipamentos utilizados nos ambientes apresentados pelas profissionais foram: bolas de
vários tamanhos e pesos; balões; móbiles de vai e vem, de bola e de arco; fitas; tecidos;
argolas; arcos; berços virados; caixas; estruturas de madeira ou PVC; espumados; pneus;
tecidos vazados; camas de gato; rolos; túneis, entre outros. Essa variedade de materiais
possibilitou uma diversidade de movimentos colaborando para o desenvolvimento da
autonomia corporal dos bebês.
Outra questão discutida foi a não necessidade de todos os bebês explorarem todos
os materiais e equipamentos do ambiente, assim como acontece na prática do circuito
tradicional. Para algumas professoras é imprescindível que todos os bebês interajam com
todos os objetos naquele momento, mesmo que não seja essa a vontade deles, e dessa
forma, acabam não respeitando os interesses das crianças. Ainda a respeito da exploração
dos materiais e equipamentos, tentamos desconstruir a ideia de que as crianças só podem
interagir com os mesmos da forma convencional, como, por exemplo, uma bola não
precisa servir apenas para lançar ou chutar, mas as crianças podem rolar em cima dela,
pular sentadas na bola, entre outras possibilidades. Porém, se a professora mostrar
previamente o que ela acha que os bebês devem fazer com o material e/ou equipamento
antes mesmo de deixá-los explorar a seu modo, ela poderá tirar a possibilidade de os
bebês usarem seus saberes e sua criatividade nesta exploração.
Quanto à exploração do ambiente pelos bebês percebemos que se os materiais e
equipamentos são desafiadores e adequados para o grupo de crianças a interação delas
com os objetos e com seus pares é mais rica, isso foi notado na diversidade de
movimentações e no interesse de outras crianças por imitarem um movimento que viram
um companheiro realizar. Também a disposição dos materiais e equipamentos no
ambiente fazia com que fossem menos ou mais explorados, por exemplo, uma cama de
gato feita em um berço virado no canto da sala não teve o interesse de nenhuma criança,
mesmo sendo um equipamento desafiador.
E por fim, a forma como as professoras relacionavam-se com as crianças fazia
grande diferença na qualidade da interação delas com os objetos e delas com seus pares.
As professoras que brincavam com as crianças não se colocando como detentoras do
conhecimento, mas como parceiras mais experientes na brincadeira, conseguiam reações
muito mais positivas e interessadas por parte das crianças. Já aquelas que interviam no
sentido de mostrar a forma “correta” de utilizar os materiais e equipamentos ou que
simplesmente se ausentavam completamente da ação dos bebês, não acolhendo seus
olhares e reações, tiveram bebês muito menos interessados no ambiente e em seus
colegas.
Considerações finais
A partir do relato dessas profissionais a respeito dos ambientes de aprendizagem
organizados com suas turmas, pudemos perceber uma mudança significativa no trabalho
com os bebês por meio de planejamentos mais interessantes e significativos para as
crianças. Como o ambiente de aprendizagem dá aos profissionais uma melhor condição
para que possam observar seu grupo de crianças, os registros realizados durante a
exploração livre dos bebês, auxiliaram a conhecê-los melhor e com isso proporcionar
situações que levassem em consideração as diferentes fases de desenvolvimento que cada
criança apresenta.
Algumas professoras aprenderam a não intervir diretamente nas brincadeiras e nos
movimentos experimentados pelas crianças, deixando-as explorar livremente os materiais
e equipamentos organizados em diferentes espaços da unidade. Com isso, muitas
profissionais compreenderam a importância da movimentação livre dos bebês, pois,
partindo sempre daquilo que conseguem fazer, na aquisição de novas experiências sobre
eles mesmos, bem como sobre seu entorno, os bebês têm a capacidade de agir de maneira
adequada e de aprender de forma independente. Falk (2011) nos diz que "Para o
desenvolvimento da independência e da autonomia da criança, é necessário - além da
relação de segurança - que ela tenha a experiência de competência pelos seus atos
independentes." (FALK, p. 35).
Observamos nas filmagens crianças brincando com seus corpos, com suas
movimentações, com seus pares, usando o movimento como linguagem e construindo sua
autonomia corporal ao realizarem conquistas significativas. Percebemos bebês
construindo aprendizagens sobre si e sobre o mundo em ambientes agradáveis e
favoráveis à exploração, provando que “na medida em que o educador, neste caso o
parceiro mais experiente, alia-se a um espaço que promova descentração de sua figura e
que incentive as iniciativas infantis, abrem-se grandes possibilidades de aprendizagens
sem sua intermediação direta” (HORN, 2014 p. 105).
Identificamos professoras entendendo o espaço como elemento central no
planejamento da docência com bebês, e este entendimento evita uma excessiva
homogeneização das práticas, considerando as singularidades no desenvolvimento de
cada criança. Conseguimos neste sentido construir coletivamente conhecimentos sobre
possibilidades de práticas pedagógicas significativas, tendo como foco a movimentação
ampla dos bebês, o que de certa forma tinha sido nosso objetivo inicial.
No entanto, existem ainda muitos desafios a serem enfrentados, pois estes ainda
sãos os primeiros passos para construção de propostas mais adequadas para a faixa etária
de 0 a 2 anos. Ainda precisamos encontrar o equilíbrio entre o fazer pelas crianças,
antecipando suas ações, e o se ausentar por completo, deixando-as abandonadas em suas
explorações. Precisamos ainda conhecer melhor esses bebês e reconhecer suas
competências, acolhendo os saberes infantis e construindo na prática novos significados
do que é a docência nos berçários e na educação infantil de uma forma geral.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GANDINI, L. Uno spazio che riflette uma cultura dell' Infanzia. In: EDWARDS, C.;
GANDINI, L. & FORMAN, G. (orgs.) Cento Linguaggi dei Bambini. Bergamo:
Edizioni Junior, 1995.
_____ Sabores, cores, sons, aromas. A organização dos espaços na Educação Infantil.
Porto Alegre: Artmed, 2004.