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A LINGUAGEM MOVIMENTO E A ORGANIZAÇÃO DE AMBIENTES DE

APRENDIZAGEM: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NA FORMAÇÃO DE


PROFESSORES DE BEBÊS

Caroline Francye Rosa de Freitas Dvoiaski1


Viviane Aparecida Fuggi Lopes2

Instituição: Secretaria Municipal de Educação de Curitiba/PR

Eixo 4 - Práticas Pedagógicas: Culturas infantis e produção cultural para e com os bebês
e as crianças

Resumo: O presente texto tem como objetivo apresentar as discussões e reflexões


realizadas a partir da formação continuada com professoras de bebês que atuam nos
Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) e Centros de Educação Infantil
Conveniados (CEIs) da Rede Municipal de Ensino de Curitiba. Ao revelarem dificuldades
em planejar práticas de movimento específicas para a faixa etária de 0 a 2 anos, trouxemos
alguns questionamentos como ponto de partida: Quais atividades são mais adequadas para
os bebês? Como podemos organizar práticas que levem em consideração a potencialidade
de cada criança? Quais práticas podem auxiliar na construção da autonomia dos bebês?
Dessa forma, a organização de ambientes de aprendizagem com foco na Linguagem
Movimento, foi o eixo central desta formação e surgiu com o intuito de subsidiar essas
profissionais no planejamento de práticas que permeassem a concepção de criança
potente e produtora de cultura.
Palavras-chave: Educação Infantil; Linguagem Movimento; Ambientes de aprendizagem;
Bebês.

A proposta aqui apresentada surge a partir da formação continuada com


professoras3 de bebês, que demonstraram grande dificuldade em planejar práticas de
movimento para a faixa etária de 0 a 2 anos. Quais atividades são mais adequadas para os
bebês? Como podemos organizar práticas que levem em consideração a potencialidade
de cada criança? Quais práticas podem auxiliar na construção da autonomia dos bebês?

A formação continuada sobre a organização de ambientes de aprendizagem para


os bebês, surgiu com o intuito de subsidiar as profissionais4 da Rede Municipal de Ensino

1
Especialista em Políticas Públicas Educacionais, atua na formação continuada dos profissionais da
Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino de Curitiba.
2
Especialista em Educação Física Escolar, atua na formação continuada dos profissionais da Educação
Infantil da Rede Municipal de Ensino de Curitiba.
3
Utilizamos o termo professoras, no feminino, ao longo do texto, por ter sido este o nosso público no
curso aqui citado e por entendermos que, em sua grande maioria, as profissionais que atuam com bebês
são mulheres.
4
A proposta foi apresentada a um grupo de profissionais inscritos no curso "Linguagem Movimento no
Berçário" realizado no 1º semestre de 2015.Porém entendemos que, por trabalharem em grupos dentro
(RME) de Curitiba, que atuam nas turmas de berçário, com novas possibilidades de
planejar práticas de movimento mais diversificadas e significativas para esta faixa etária.
Percebemos então a necessidade de pensar em práticas pedagógicas específicas
para os bebês, que explicitassem a concepção de criança trazida pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), considerada como um “sujeito
histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia,
constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende,
observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade,
produzindo cultura.” (BRASIL, 2010, p. 12). Este é um grande desafio, pois de acordo
com Barbosa (2010, p. 2)
Durante muitos anos, os bebês foram descritos e definidos principalmente por
suas fragilidades, suas incapacidades e sua imaturidade. Nos últimos anos,
porém, as pesquisas vêm demonstrando as inúmeras capacidades dos bebês. [...]
Eles são dotados de um corpo no qual afeto, intelecto e motricidade estão
profundamente conectados, e é a forma particular como esses elementos se
articulam que vai definindo as singularidades de cada indivíduo ao longo de sua
história. Cada bebê tem um ritmo pessoal, uma forma de ser e de se comunicar.

As pesquisas no campo da Sociologia da Infância vêm reforçar a ideia de criança


potente e produtora de cultura. Corsaro, um importante sociólogo da infância, argumenta
que “as crianças apreendem criativamente informações do mundo adulto para produzir
suas culturas próprias e singulares”. (CORSARO, 2009, p. 31), e desta forma considera
as crianças como seres ativos, participantes da cultura em que estão inseridas, que tanto
são afetadas pela sociedade como contribuem para sua transformação. Contudo, esta visão
de criança é historicamente nova e muitas vezes restrita aos ambientes acadêmicos.
Culturalmente, os bebês ainda são considerados como alguém a quem tudo tem que ser
ensinado pelos adultos, ou pelo menos, alguém a quem os adultos precisam fazer exercitar
suas capacidades, segundo o que consideram importante para seu desenvolvimento, e "ao
mesmo tempo, não se dá suficiente importância às suas atividades, nem às suas
descobertas autônomas." (FALK, 2011, p. 41)
O desafio está em desenvolver práticas que considerem essas características e que
não transfiram o mesmo modelo pedagógico utilizado com as crianças maiores. O
ambiente disciplinador e de controle dos movimentos corporais, que predominava na
escola tradicional do XIX e XX, colocava a ordem e o conhecimento centrado no

de suas unidades, essa e outras propostas trazidas na formação continuada da RME acabam se
propagando para além das profissionais inscritas nos cursos.
professor como elemento principal, acima inclusive das necessidades e saberes das
crianças. Como este modelo foi vivenciado pela maioria das profissionais que atuam com
os bebês, este acaba sendo o parâmetro para organizarem suas práticas pedagógicas.
Para auxiliá-las a considerar as crianças como seres competentes, que desde o
nascimento são ativas por si próprias, ricas de iniciativas e de interesses por tudo que as
rodeiam e que em cada ação que realizam, vivem seriamente, envolvendo-se
completamente com todas as suas emoções, apresentamos a organização de ambientes de
aprendizagem para a faixa etária de 0 a 2 anos, tendo como foco o movimento dos bebês,
que propõe aguçar a curiosidade infantil e mobilizar a criança para expressar o seu
pensamento de forma autônoma e criativa.

O espaço como um rico ambiente de aprendizagem


No intuito de considerar a potencialidade dos espaços das instituições de educação
infantil, de descontruir uma concepção centrada apenas no professor e de construir
possibilidades de trabalho com as crianças bem pequenas, voltamos nosso olhar para esse
espaço enquanto um potente educador, pois como cita Neri e Vecchi (apud FORNEIRO,
1998, p. 241) “O ambiente é um educador (a) à disposição tanto da criança como do
adulto. Mas só será isso se estiver organizado de um certo modo. Só será isso se estiver
equipado de uma determinada maneira”.
Quando entramos em uma instituição de educação infantil, tudo o que está à volta
deste espaço, fala-nos sobre o tipo de atividades que ali realizam, as interações que
acontecem, as relações com o mundo externo, os desejos e interesses das crianças e dos
adultos. “O modo no qual o ambiente é organizado, e em especial o modo no qual as
crianças e os adultos se movimentam nesse espaço, nos dá a sensação de atividade e
serenidade.” (GANDINI, 1995, p. 240, tradução nossa) revelando assim, as concepções
dos adultos a respeito das crianças e do projeto pedagógico da instituição.
Além do termo espaço (que se refere às características físicas, com os diversos
materiais que o compõe como móveis, utensílios, objetos de decoração, entre outros)
encontramos na literatura, o termo ambiente que refere-se ao “conjunto do espaço físico
e às relações que se estabelecem no mesmo” (FORNEIRO, 1988, p. 232). Dessa forma é
importante pensar e organizar o espaço não somente em sua dimensão física, mas também
nas suas dimensões funcional, temporal e principalmente relacional, transformando-o em
um ambiente de aprendizagem que apoia os bebês na sua descoberta do mundo e nas
relações estabelecidas naquele contexto, onde suas ações podem ser potencializadas.
Se o espaço está organizado como um ambiente de aprendizagem, no qual os
bebês têm a oportunidade de explorar diferentes propostas de forma livre, escolhendo os
materiais e equipamentos que mais interessam, é possível que o professor possa se
envolver com outras ações como auxiliar uma criança em algum desafio corporal, trocar
fraldas, alimentar, brincar com um grupo de bebês, etc. enquanto as demais crianças
podem realizar suas ações de forma independente. Barbosa e Horn (2001, p. 68) reforçam
ainda que "é comum o entendimento, equivocado, que nestes momentos a professora se
livra da responsabilidade de intervir e acompanhar o que as crianças decidem fazer. Pelo
contrário, entendemos ser este momento adequado para interações e observações
significativas do adulto junto às crianças".
Essas observações, se forem atentas e sensíveis, quanto as necessidades e
interesses do grupo de crianças com o qual se está trabalhando, serão a base para planejar
o cotidiano dos bebês em um contexto de vida coletiva. Observar o que interessa às
crianças, quais são suas brincadeiras e brinquedos preferidos, o que gostam de fazer, quais
espaços preferem e como interagem com ele, faz com que a organização da rotina em
relação ao tempo, espaços e materiais, seja cada vez mais próximo ao que aquelas crianças
singulares necessitam.
A observação é então um primeiro passo para a transformação de um espaço em
ambiente, pois é durante este momento que se constatará o que as crianças já conseguem
fazer e quais as suas potencialidades.

A linguagem movimento e a autonomia corporal


O trabalho pedagógico na educação infantil deve trazer a possibilidade das
crianças se expressarem por diferentes linguagens. Destacamos aqui a importância do
movimento no desenvolvimento humano e segundo Garanhani e Nadolny (apud
GARANHANI; NADOLNY, 2015, p. 67) o corpo em movimento se constitui como
matriz básica do desenvolvimento infantil, possibilitando o conhecimento do mundo e a
expressão do pensamento da criança. Garanhani (2004) traz em sua tese os estudos de
Wallon que ressaltam que, "na pequena infância, o ato mental se desenvolve no ato motor,
ou seja, a criança pensa quando está realizando a ação e isso faz com que o movimento
do corpo ganhe um papel de destaque nas fases iniciais do desenvolvimento infantil.”
(GARANHANI, 2004, p.22) Assim, acreditamos ser urgente a valorização da
movimentação da criança pelos profissionais que atuam com a criança pequena, não
considerando este movimento somente como uma necessidade físico-motora do
desenvolvimento infantil, mas também como uma capacidade expressiva e intencional.
A RME de Curitiba, na sua organização curricular traz diferentes linguagens
expressivas da criança e entre elas, destacamos a Linguagem Movimento.
Desde que nascem, as crianças vivenciam experiências corporais e
progressivamente se apropriam de movimentos para a interação com o mundo.
Por meio do movimento, aprendem sobre si mesmas, relacionam-se com o
outro e com os objetos, desenvolvem suas capacidades e aprendem
habilidades (...). O movimento, para a criança, significa mais do que mexer
partes do corpo ou deslocar-se no espaço, o movimento é linguagem.
(CURITIBA, 2009).

Nesse sentido dizer que o movimento é uma linguagem da criança é ampliar as


possibilidades de práticas educativas que permitam que os bebês vivenciem novas
interações, brincadeiras e variadas possibilidades de experiências, despertando também a
curiosidade e a criatividade. É também pensar em práticas com as quais a criança tenha
tempo, espaço, materiais e equipamentos adequados para fazer suas explorações
corporais, aprender novas habilidades e desenvolver suas capacidades. Essas
aprendizagens auxiliam no desenvolvimento da autonomia e identidade corporal
infantil, sendo este um dos eixos do trabalho da Linguagem Movimento com a criança
pequena. Este eixo pensado por Garanhani "implica aprendizagens que envolvem o corpo
em movimento para o desenvolvimento físico-motor, proporcionando assim o domínio e
a consciência do corpo, condições necessárias para a autonomia e formação da identidade
corporal infantil." (GARANHANI, 2004, p. 27) Outros dois eixos fazem parte do trabalho
com o movimento na educação infantil: a socialização, que compreende os movimentos
do corpo como uma linguagem utilizada pela criança na interação com o meio e a
ampliação do conhecimento das práticas corporais infantis, que tem relação com as
aprendizagens sobre elementos da cultura infantil produzidos historicamente.
Destacamos aqui o eixo autonomia e identidade corporal por este ser o foco
principal quando se pensa na proposta de ambientes de aprendizagem para os bebês,
porém, é importante ressaltar que os três eixos sempre estão interligados entre si,
conforme nos diz Garanhani
Esses eixos deverão se apresentar integrados no fazer pedagógico da Educação
Infantil, embora na elaboração das atividades possa ocorrer a predominância
de um sobre o outro conforme as características e necessidades de
cuidado/educação presentes em cada idade da criança pequena. É necessário
ressaltar que um não exclui o outro, eles se complementam... (GARANHANI,
2004, p. 27-28).
Como se promove então o desenvolvimento da autonomia corporal dos bebês?
Uma das formas que acreditamos contribuir para o desenvolvimento desta
autonomia é o espaço organizado como ambiente de aprendizagem, propiciando a
movimentação ampla dos bebês. O Parecer 20/2009 destaca a importância de propostas
que possibilitem à criança "fazer deslocamentos e movimentos amplos nos espaços
internos e externos às salas de referência das turmas e à instituição, envolver-se em
explorações e brincadeiras com objetos e materiais diversificados [...]". (BRASIL, 2009,
p. 14)
Neste sentido, propusemos para as professoras de bebês que planejassem
ambientes de aprendizagem em diferentes espaços da instituição, como a sala de
referência, o solário, pátios ou outros espaços externos e com materiais e equipamentos
diversos. Para isso foi necessário que cada professora observasse as características do seu
grupo de bebês, bem como as diferenças de desenvolvimento de cada criança,
considerando que principalmente no berçário, essas diferenças são mais evidentes, pois
em uma mesma turma há crianças que ainda não se locomovem e outras que já andam e
correm. Isso exige que a professora desenvolva diversificadas propostas para contemplar
as diferentes necessidades individuais.
A partir dessas primeiras observações e da escolha do espaço onde seria
desenvolvida a proposta, as profissionais selecionaram materiais manipulativos e
equipamentos que sugerissem movimentações desafiadoras. Para que elas pudessem fazer
uma seleção adequada às necessidades das crianças, foi preciso explicitar o entendimento
do que são materiais manipulativos e equipamentos. Os materiais manipulativos são
objetos que possuem determinadas características as quais sugerem movimentos como
segurar, chacoalhar, lançar, chutar, girar, rolar, rebater, equilibrar, entre outros.
Consideramos os equipamentos como objetos de tamanho maior que um material
manipulativo, no qual a criança realiza diferentes movimentações corporais de forma
ampla como rolar, rastejar, engatinhar, andar, subir, descer, trepar, andar em uma
superfície de pequena amplitude, balançar-se, equilibrar-se, passar por dentro, entre
outras.
Para registrar esse planejamento as professoras fizeram um croqui desenhando o
espaço e os materiais manipulativos e equipamentos escolhidos, pensando na melhor
disposição destes. O uso do croqui foi um exercício importante para pensar na melhor
organização, considerando as características dos espaços de cada instituição, pois não há
como pensar em um modelo único de ambiente, visto que as unidades de educação infantil
da RME de Curitiba apresentam estruturas arquitetônicas diferentes umas das outras.
Além disso, se a dimensão mais importante do ambiente é a relacional não é possível
fazer um padrão para ser usado em qualquer realidade sem considerar as particularidades
de cada grupo.
Solicitamos que ao desenvolverem a proposta planejada com a turma ficassem
atentas às relações que as crianças estabeleciam com os objetos e outras crianças e que
registrassem em uma tabela própria o tempo de exploração, quais foram os materiais e/ou
equipamentos que mais interessaram o grupo de bebês e quais pesquisas individuais se
sobressaíram. A partir desses registros as professoras puderam refletir sobre a adequação
da proposta e os encaminhamentos que poderiam se originar dos interesses e necessidades
dos bebês.

Os desdobramentos da proposta
A partir das discussões e reflexões feitas com este grupo de professoras nesta
formação, percebemos certo receio delas em proporcionar atividades mais desafiadoras,
pois algumas têm a preocupação de que os bebês possam se machucar e por consequência
que os responsáveis por essas crianças cobrem delas uma postura mais cuidadosa. Isso
fica evidente na escolha de equipamentos que não proporcionam movimentos mais
complexos e até mesmo na dificuldade de transpor o ambiente da sala para espaços
externos. No entanto, tentamos mostrar a elas que,
A criança que pode mover-se com liberdade e sem restrições é mais
prudente, já que aprendeu a melhor maneira de cair; enquanto a criança
superprotegida e que se move com limitações tem mais riscos de acidente
porque lhe faltam experiências e desconhece suas próprias capacidades e
seus limites. (FALK, 2011, p. 18)

Obviamente isto não quer dizer que não se deve atentar para as questões de
segurança, mas é necessário ultrapassar o senso comum de que a criança que está sempre
em lugares ditos “seguros” sofrerá menos acidentes do que aquela que é exposta a mais
desafios corporais ou espaços diversos.
Mesmo com esses receios percebemos que a escolha dos materiais e equipamentos
foi bem variada e criativa, indo para além dos objetos convencionais. A ressignificação
de objetos e brinquedos deixaram os ambientes mais ricos de interações. Um exemplo
disso foi o berço, que é um mobiliário usado para proteção e contenção, mas que foi
ressignificado quando colocado em posições variadas e transformado em um
equipamento que pudesse proporcionar diferentes desafios. Outros materiais e
equipamentos utilizados nos ambientes apresentados pelas profissionais foram: bolas de
vários tamanhos e pesos; balões; móbiles de vai e vem, de bola e de arco; fitas; tecidos;
argolas; arcos; berços virados; caixas; estruturas de madeira ou PVC; espumados; pneus;
tecidos vazados; camas de gato; rolos; túneis, entre outros. Essa variedade de materiais
possibilitou uma diversidade de movimentos colaborando para o desenvolvimento da
autonomia corporal dos bebês.
Outra questão discutida foi a não necessidade de todos os bebês explorarem todos
os materiais e equipamentos do ambiente, assim como acontece na prática do circuito
tradicional. Para algumas professoras é imprescindível que todos os bebês interajam com
todos os objetos naquele momento, mesmo que não seja essa a vontade deles, e dessa
forma, acabam não respeitando os interesses das crianças. Ainda a respeito da exploração
dos materiais e equipamentos, tentamos desconstruir a ideia de que as crianças só podem
interagir com os mesmos da forma convencional, como, por exemplo, uma bola não
precisa servir apenas para lançar ou chutar, mas as crianças podem rolar em cima dela,
pular sentadas na bola, entre outras possibilidades. Porém, se a professora mostrar
previamente o que ela acha que os bebês devem fazer com o material e/ou equipamento
antes mesmo de deixá-los explorar a seu modo, ela poderá tirar a possibilidade de os
bebês usarem seus saberes e sua criatividade nesta exploração.
Quanto à exploração do ambiente pelos bebês percebemos que se os materiais e
equipamentos são desafiadores e adequados para o grupo de crianças a interação delas
com os objetos e com seus pares é mais rica, isso foi notado na diversidade de
movimentações e no interesse de outras crianças por imitarem um movimento que viram
um companheiro realizar. Também a disposição dos materiais e equipamentos no
ambiente fazia com que fossem menos ou mais explorados, por exemplo, uma cama de
gato feita em um berço virado no canto da sala não teve o interesse de nenhuma criança,
mesmo sendo um equipamento desafiador.
E por fim, a forma como as professoras relacionavam-se com as crianças fazia
grande diferença na qualidade da interação delas com os objetos e delas com seus pares.
As professoras que brincavam com as crianças não se colocando como detentoras do
conhecimento, mas como parceiras mais experientes na brincadeira, conseguiam reações
muito mais positivas e interessadas por parte das crianças. Já aquelas que interviam no
sentido de mostrar a forma “correta” de utilizar os materiais e equipamentos ou que
simplesmente se ausentavam completamente da ação dos bebês, não acolhendo seus
olhares e reações, tiveram bebês muito menos interessados no ambiente e em seus
colegas.

Considerações finais
A partir do relato dessas profissionais a respeito dos ambientes de aprendizagem
organizados com suas turmas, pudemos perceber uma mudança significativa no trabalho
com os bebês por meio de planejamentos mais interessantes e significativos para as
crianças. Como o ambiente de aprendizagem dá aos profissionais uma melhor condição
para que possam observar seu grupo de crianças, os registros realizados durante a
exploração livre dos bebês, auxiliaram a conhecê-los melhor e com isso proporcionar
situações que levassem em consideração as diferentes fases de desenvolvimento que cada
criança apresenta.
Algumas professoras aprenderam a não intervir diretamente nas brincadeiras e nos
movimentos experimentados pelas crianças, deixando-as explorar livremente os materiais
e equipamentos organizados em diferentes espaços da unidade. Com isso, muitas
profissionais compreenderam a importância da movimentação livre dos bebês, pois,
partindo sempre daquilo que conseguem fazer, na aquisição de novas experiências sobre
eles mesmos, bem como sobre seu entorno, os bebês têm a capacidade de agir de maneira
adequada e de aprender de forma independente. Falk (2011) nos diz que "Para o
desenvolvimento da independência e da autonomia da criança, é necessário - além da
relação de segurança - que ela tenha a experiência de competência pelos seus atos
independentes." (FALK, p. 35).
Observamos nas filmagens crianças brincando com seus corpos, com suas
movimentações, com seus pares, usando o movimento como linguagem e construindo sua
autonomia corporal ao realizarem conquistas significativas. Percebemos bebês
construindo aprendizagens sobre si e sobre o mundo em ambientes agradáveis e
favoráveis à exploração, provando que “na medida em que o educador, neste caso o
parceiro mais experiente, alia-se a um espaço que promova descentração de sua figura e
que incentive as iniciativas infantis, abrem-se grandes possibilidades de aprendizagens
sem sua intermediação direta” (HORN, 2014 p. 105).
Identificamos professoras entendendo o espaço como elemento central no
planejamento da docência com bebês, e este entendimento evita uma excessiva
homogeneização das práticas, considerando as singularidades no desenvolvimento de
cada criança. Conseguimos neste sentido construir coletivamente conhecimentos sobre
possibilidades de práticas pedagógicas significativas, tendo como foco a movimentação
ampla dos bebês, o que de certa forma tinha sido nosso objetivo inicial.
No entanto, existem ainda muitos desafios a serem enfrentados, pois estes ainda
sãos os primeiros passos para construção de propostas mais adequadas para a faixa etária
de 0 a 2 anos. Ainda precisamos encontrar o equilíbrio entre o fazer pelas crianças,
antecipando suas ações, e o se ausentar por completo, deixando-as abandonadas em suas
explorações. Precisamos ainda conhecer melhor esses bebês e reconhecer suas
competências, acolhendo os saberes infantis e construindo na prática novos significados
do que é a docência nos berçários e na educação infantil de uma forma geral.

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