FANTASIAS VAZIAS:
UM DESAFIO À CLÍNICA
PSICANALÍTICA
2006
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
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FANTASIAS VAZIAS:
UM DESAFIO À CLÍNICA PSICANALÍTICA
Rio de Janeiro
Janeiro / 2006
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Aprovada por:
______________________________________ - Orientadora
Presidente da Banca. Prof. Dra. Regina Herzog de Oliveira
______________________________________
Prof. Dra. Gilsa Freiblatt Tarre de Oliveira
______________________________________
Prof. Dra. Josaida de Oliveira Gondar
______________________________________
Prof. Dra. Maria Teresa da Silveira Pinheiro
______________________________________
Prof. Dra. Marta Rezende Cardoso
Rio de Janeiro
Janeiro de 2006
4
FICHA CATALOGRÁFICA
Salztrager, Ricardo.
Fantasias vazias: um desafio à clínica psicanalítica/Ricardo Salztrager. -
Rio de Janeiro: UFRJ/ PPGTP, 2006.
viii, 182f.; 29,7 cm.
Orientador: Regina Herzog
Tese (doutorado) – UFRJ/PPGTP/ Programa de Pós-graduação em Teoria
Psicanalítica, 2006.
Referências Bibliográficas: f. 176-182.
1. Psicologia. 2. Teoria Psicanalítica. I. Herzog, Regina. II. Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Teoria
Psicanalítica. III. Título.
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Resumo
estabelecemos uma analogia deste tipo de fantasia com o registro dos signos de
da interpretação e da construção.
psicanálise.
Rio de Janeiro
Janeiro de 2006.
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Résumé
établi une analogie de ce type de fantaisie avec le registre des signes de perception
presenté par Freud dans la « Lettre 52 ». Ensuite, nous avons fait appel à la notion
l’interprétation et de la construction.
Rio de Janeiro
Janeiro de 2006.
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Agradecimentos
toda semana, em muito contribuíram para que este trabalho assumisse a sua
versão final.
sempre se mostraram abertos para a discussão das questões expostas nesta tese.
Aos meus pais, Helena e Davi e ao meu irmão Márcio, pelo carinho,
Sumário
Introdução................................................................................................................ 09
Introdução
deve, em grande parte, pelo amplo campo de fenômenos que ela recobre e,
Do mesmo modo, suas ações e condutas são sempre atravessadas pela atuação de
uma fantasia.
analisando para associar livremente durante a sessão como uma convocação para
que ele relate ao analista suas formações fantasísticas. De acordo com a regra
satisfação. Desta forma, a fantasia merece ser considerada como uma espécie de
fio condutor do tratamento, pois é através do seu relato que o trabalho analítico se
desenvolve.
10
presente tese tem como objetivo analisar uma modalidade bastante peculiar de
discursivas: “fantasiei que estava num buraco negro”. O fator marcante neste tipo
devidamente justificada.
devido à observação clínica de que tais fantasias se mostram, antes de tudo, como
assinala Pinheiro (2002), elas também possuem uma relação bastante peculiar
história, não se reportam a uma idéia de continuidade temporal, na qual uma cena
partir de seus relatos, as associações livres produzidas são quase nulas, ou mesmo,
decorrência disto, a cena anestesiada não conduz a lugar algum, a nenhuma outra
1
Cabe ressaltar que, ao longo da tese, os termos “fantasma” e “fantasia” serão empregados sem
discriminação conceitual.
2
Para uma abordagem mais ampla acerca da temática do vazio no pensamento psicanalítico, ver
Herzog (1999).
12
psíquicas do sujeito.
repetem no discurso, mas sem que nenhum outro elemento lhes seja associado.
perpetuam na fala tal como relatadas pela primeira vez. Estas fantasias são
Esta é a característica que mais nos intriga, pois o fato do relato da cena vazia soar
instante do relato.
entender, é este o fator que explicaria a irredutibilidade dos fantasmas vazios aos
ao lado de outros fantasmas mais elaborados e frente aos quais, de certo modo, o
desejos. Deste modo, a única semelhança observada entre uma fantasia vazia e um
tratamento conceitual específico, mas que atraiu nossa atenção por comportar as
mesmas características por nós assinaladas. Trata-se da cena relatada por Hans a
respeito do cavalo que possuía um estranho objeto preto na boca, objeto que o
múltiplas tentativas de Freud e de seu pai, o menino dizia que o referido objeto
elemento. Com efeito, esta cena contrastava com suas outras produções
fantasias vazias, analisando em qual medida elas se diferem das demais estruturas
manifestas em suas concepções sobre o tema. Assim, veremos que, nestes textos,
a atividade fantasística se mostra sob diferentes roupagens, seja como aquilo que
modalidade fantasmática.
das cenas indizíveis, nossa atenção se voltará para os ensaios “Historia de uma
ao redor da boca do cavalo – com o propósito de examinar sua analogia com o que
que conduza à associação das fantasias vazias com o registro mnêmico dos signos
enquanto uma formação psíquica que escapa ao domínio significante, sendo, desta
tal como pensada por Freud e por Ferenczi. Com esta noção, pretendemos mostrar
destes autores. Trata-se, para eles, de uma estrutura situada para além dos jogos
em substitutos simbólicos de algo recalcado. Por estes fatores, será proposta sua
analogia com os fantasmas vazios. Com base nesta discussão, efetuaremos uma
levará a conclusão de ser justamente esta vertente que falta aos fantasmas vazios,
primeiros e vacila face aos segundos. Nesta medida, será discutido o artifício
discussão será ilustrada por uma releitura do caso clínico do Pequeno Hans
pode falar, por exemplo, sobre seus desejos, sua história de vida ou seus planos
fala e, por isso, merecem ser considerados como espécies de resíduos da atividade
fantasias vazias.
1998). Neste aspecto, a realidade psíquica deve ser associada àquilo que a língua
alemã designa por Wirklichkeit, ou seja, uma realidade efetiva e construída e que,
freudiana.
3
Para maiores detalhes acerca da distinção dos termos “Wirklichkeit” e “Realität” na língua alemã,
remeto a Garcia-Roza (1996).
22
uma marca mnêmica não dotada de significação traumática, até que uma segunda
recalcamento.
patogênico. Tal fator foi reforçado pelos resultados obtidos com o tratamento de
assim, a recordação não ocorria. Ademais, para que sua teoria tivesse consistência,
1897/1995, p. 310).
respostas motoras, tais como o choro e o agito dos membros. Estas respostas, no
realização de uma ação específica, neste caso, a mãe lhe fornecendo o alimento.
vivência de satisfação.
satisfação não é alcançada, pois a situação tem como resultado uma alucinação.
em denominada ich (eu), que tem por função a inibição da regressão, caso o
que, por sua vez, funciona como um signo de realidade para Assim, estes
4
Deste modo, tanto os processos primários quanto os processos secundários são inconscientes, por
estarem atrelados ao sistema de neurônios. Contudo, cabe ressaltar que numa revisão da
questão, apresentada no livro “A interpretação de sonhos”, Freud (1900/1995) relaciona as funções
de alucinação de rastreamento da realidade a dois sistemas psíquicos distintos, a saber, o
inconsciente e o pré-consciente/consciente, respectivamente.
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estaria, em toda a sua amplitude, a vida sexual de uma criança imersa em seus
passagem a seguir:
respeitável. Neste caso, um simples desejo infantil de morte dos seus semelhantes,
realidade psíquica, a atividade fantasmática vai sendo, cada vez mais, privilegiada
5
Para maiores detalhes a respeito desta questão, remeto a Herzog (2001).
28
princípio de prazer.
analista deve fazer com que o paciente fale acerca de si mesmo. Mas, nesta
perspectiva, cabe indagar: o que vem a ser este convite à livre associação senão a
fantasmatizações?
resistências oferecidas pelo sujeito em análise, resistências que teriam por função
trazidas à tona. Mas, pode-se dizer que, apesar desta diferença topográfica, todas
história do sujeito.
uma que impõe a fixação dos traços na memória consciente e outra que resiste a
tal propósito. Resulta deste conflito uma conciliação entre as duas exigências
primo e uma prima estão colhendo diversos ramos de flores amarelas. Quando,
num dado momento, Freud arranca as flores da mão da prima, esta se põe a chorar
um retorno à terra natal. Nesta viagem, ele se apaixona por uma jovem, passando
morando ao lado dela no campo, poderia provar diariamente o gosto do pão que é
produzido no interior. Entretanto, o que mais lhe chama atenção nesta viagem é a
vinte anos, quando volta novamente para o interior e reencontra a prima que
uma vez tomado por devaneios, agora concernentes a um plano de casamento com
qual Freud (1900/1995) esboça uma primeira distinção concernente à sua situação
psíquico são objetos de uma análise mais detalhada em alguns escritos posteriores
linhas gerais, como uma atividade imaginativa que visa à correção da realidade
proporciona.
prazerosa por outra. Ou seja, o homem adulto troca a satisfação que obtinha ao
ar, tomando suas fantasias como seus bens mais íntimos e investindo nelas uma
adulto faz questão de esconder seus fantasmas dos outros, e isto, em virtude dos
afirmação de que “a pessoa feliz nunca fantasia, somente a insatisfeita” (p. 137).
8
Principalmente, se tivermos em mente o fato de que, para o pensamento psicanalítico, não há
sujeito plenamente satisfeito.
35
vida. Assim, não haveria limites para a criança, bem como restrições às suas
modificado a seu bel prazer. De acordo com o desejo dos pais, é considerado que,
Por este viés, Freud (1908a/1995) indica que o devaneio nada mais é do
muitas vezes se imagina como um verdadeiro herói: ele parece estar protegido por
uma espécie de Providência especial; todas as atenções lhes são dirigidas; nada de
9
O modelo da “Sua majestade, o bebê” (FREUD, 1914b/1995) é de suma importância para esta
tese e será retomado adiante, na última seção do terceiro capítulo.
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este desejo fora realizado. Por fim, produz-se uma cena futura que representa,
passado, o presente e o futuro são entrelaçados pelo fio do desejo que os une”
torna-se indispensável e amado para o seu chefe que, assim, entrega-lhe a mão de
devaneio, o órfão revivenciaria o lar protetor que tivera na infância, bem como o
artigos desta mesma época. Nestes, ela é considerada, de modo geral, como uma
espécie de solo comum tanto à criação artística quanto à formação dos sintomas.
através das quais os artistas retiram a inspiração para a confecção de suas obras.
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tem seu início com o recalcamento de uma fantasia outrora construída pela criança
época de sua teorização, como uma espécie de satisfação substitutiva de uma série
dos padrões morais vigentes na cultura. De acordo com tal concepção, o neurótico
quanto a qual o objeto das fantasias de Dora – se seu próprio pai, ou o Sr. K. O elo
cócegas na garganta.
abdômen, por surgir exatos nove meses após a cena do lago, corrigira o desfecho
infeliz de suas relações com o Sr. K.: mediante a formação sintomática, Dora se
lamentava por não ter cedido às investidas do homem amado. Assim, uma fantasia
profusamente neste sistema psíquico e, nove meses depois, foi substituída por um
(1908c/1995) ainda concebe uma outra vicissitude para a sexualidade humana que
freudiano passa a considerar que os artistas retiram a energia necessária para suas
ensaios, Freud põe-se a analisar as obras de alguns de seus artistas prediletos, com
lábios por repetidas vezes. Em linhas gerais, tal fantasia consciente simbolizaria,
qual a mãe de Leonardo introduz seu pênis na boca da criança. Trata-se, portanto,
anos de sua infância apenas na companhia da mãe; ela, por sua vez, compensava a
analisadas ao longo dos quinze primeiros anos da obra freudiana, período no qual
vigorava a primeira tópica do aparelho psíquico. Cabe destacar, mais uma vez,
através das quais o paciente encontra os devidos meios para falar sobre seu
fantasmas inconscientes até então investigados. Isto porque elas não se ligam
sujeito falar sobre tais fantasias, percebemos que elas consistem em estruturas
uma espécie de limite à clínica psicanalítica, tal como concebida por Freud até
então.
por intermédio da fala. O conjunto destas tendências inacessíveis à fala podem ser
relacionadas com o lócus pulsional situado para além do princípio de prazer e que,
extrair o material que está a procura e reuni-lo, para uma posterior comunicação
43
situa-se, de certa forma, numa posição privilegiada, pois o material que lhe
Aos vinte e dois anos de idade, o Homem dos lobos foi se consultar com
inúmeros sintomas, tais como dependência extrema das outras pessoas e profunda
desadaptação social. Porém, sabe-se que não foi esta neurose o objeto de
se dirigiu para a construção de uma cena que justificasse a fobia do Homem dos
lobos. Para tal, foi tomado como ponto de partida um sonho, datado da noite de
10
Retomaremos adiante, ainda neste capítulo, o tema da construção em análise, com o propósito
de oferecer uma nova leitura para o tema.
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seu quarto aniversário, no qual haviam alguns lobos sentados sobre os galhos de
revivendo uma cena sucedida aos dezoito meses de idade, no qual testemunhara
uma relação sexual entre os pais. A cena em questão foi denominada de cena
primária.
primeiro momento, é levantada a hipótese da cena ter sido fruto de uma produção
ocasional de uma cena de cópula entre cães pastores. Todavia, não foi esta a
pelo viés da fantasia, para lançar mão da proposta de considerar a cena primária
trouxe para o pensamento freudiano uma concepção diversa da que, até então, se
neste momento, a fantasia como algo que não pode ser recordado e nem mesmo
11
Voltaremos a este tema na próxima seção.
45
torna inteligível quando nos voltamos para uma investigação minuciosa das
seu ciúme quanto de seus interesses egoístas. Trata-se, portanto, de uma fantasia
que o pai, por estar batendo na outra criança, ama apenas a ela.
fantasia “sou espancada pelo meu pai” deve ser encarada como uma substituta
qualquer outra pessoa que exerça algum tipo de autoridade. Há, na cena, muitas
lado, a figura do professor toma o lugar do pai e, por outro, as várias crianças
análise. Com efeito, não foi através de uma interpretação dos sintomas de seus
conduz para mais além desta situação, não dizendo respeito exatamente à força de
fato, algumas passagens do texto freudiano justificam o ponto de vista de que este
assumida por tal configuração fantasmática com algo que é da ordem do indizível.
De acordo com tal ponto de vista, mais uma vez, a atividade fantasmática
se apresenta como algo inacessível à fala e que, portanto, não pode ser
na clínica não como um cenário narrativo, mas como uma cena indizível, o
paradoxos não terminam neste ponto e que ainda há, no pensamento freudiano,
uma neurose oscilando, ora por considerar a cena primária como fruto de uma
fantasia de seu paciente, ora como algo realmente por ele vivido. O conflito
nossos ancestrais.
obtido uma maior importância no caso do Homem dos lobos, a primeira referência
ao tema data do artigo “Um caso de paranóia que contraria a teoria psicanalítica
trabalho. Certo dia, numa visita à casa do amante, ela é surpreendida por um
uma pequena caixa. A partir daí, a mulher constrói o delírio de que a pequena
cena na qual uma ameaça de castração é proferida à criança e, por fim, a cena de
50
sedução por um adulto. A escolha por examinar estas três cenas específicas, ao
de crianças que tenham realmente presenciado um ato sexual dos pais, quando
ainda não lhes era possível obter a exata compreensão da cena observada. Por
outro lado, considerando que, em vários casos, o ato é descrito como uma cena de
coito a tergo, Freud levanta a hipótese da cena em questão ser fruto da produção
ficção. Assim, caso estas cenas não encontrem apoio em dados factuais, elas são
12
Conforme a discussão apresentada no início deste capítulo.
52
uma cena originária, ou seja, algo que possui, na dinâmica psíquica, o valor de um
sujeitos.
predicados.
paterna.
o Pequeno Hans falava sobre uma “coisa preta” que o cavalo tinha na boca. De
fato, os cavalos que o menino mais temia eram aqueles com o estranho objeto
preto ao redor dos lábios; mas, no entanto, ele não sabia dizer que enigmático
objeto era este e nem associá-lo a coisa alguma. Sempre que o discurso de Hans
por mais que seu pai ou o próprio Freud insistissem em relacionar o objeto preto
na boca do cavalo com o bigode do pai, os esforços eram em vão. Hans respondia
apenas com reticências. Assim, ao que tudo indica, a estranha coisa preta na boca
13
Uma nova releitura para o caso do Pequeno Hans (FREUD, 1910a/1995) e que passa à margem
desta interpretação eminentemente edipiana será empreendida no último capítulo.
55
Este objeto enigmático é mencionado pela primeira vez por Hans pouco
antes da única consulta que teve com Freud. Este mesmo confessa que as
que, até então, se tinha da história de sua fobia. Segundo o relato de Freud:
quem associa o objeto preto com o bigode. A criança nada tinha a dizer sobre o
O assunto retorna uma semana depois, desta vez, numa conversa entre pai e
Eu: ‘O que você quer dizer? O pedaço de ferro que eles têm na boca?’.
Hans: ‘Não. Eles têm uma coisa preta na boca’. (E cobriu a boca com a mão).
Eu: ‘O quê? Talvez um bigode?’.
Hans: (rindo): ‘Oh, não!’.
Eu: ‘Eles todos têm essa coisa?’.
Hans: ‘Não. Só alguns deles’.
Eu: ‘O que é que eles têm na boca?’
Hans: ‘Uma coisa preta’.
Eu: (Na realidade, acho que deve ser aquela parte grossa do arreio que os cavalos
de tração usam por sobre o nariz)” (FREUD, 1910a/1995, pp. 50-51).
representação. Sempre que o menino falava sobre esta enigmática coisa preta,
um preto na boca, cena esta da qual nada mais conseguia dizer. O preto na boca
do cavalo não era um bigode, um pedaço de ferro e, muito menos, a parte mais
grossa de um arreio.
mais variados fenômenos presentes em seu mundo e anseios sobre o futuro, nada
disso pode ser observado na cena anestesiada do cavalo com o objeto preto na
não pode avançar. À nada o menino conseguia remeter o preto na boca do cavalo;
Assim, por tais fatores, podemos traçar uma correlação entre esta cena
esta cena do cavalo com o preto ao redor da boca. Todavia, dois fatores conduzem
pai de Hans afirmar nunca ter visto um cavalo com tal coisa preta ao redor dos
lábios e achar estranho que seu filho, algum dia, o tivesse visto – embora Hans
insistisse em dizer que tais cavalos realmente existiam. O outro fator remete à
seja, de acordo com o que foi estabelecido no início deste capítulo, pouco
importaria se o Pequeno Hans realmente viu algum cavalo com o objeto preto ao
redor da boca; relevante é a concepção de que, tendo visto ou não, a cena assume
14
Na segunda seção do próximo capítulo, produziremos nova visada para este tema que
responderá, de forma definitiva, pela decisão em considerar esta cena como fantasística.
58
discussão.
exprime seus romances, concepções de vida, teorias inventadas sobre sua história
e seu porvir, etc, foi estabelecido que tais fantasias se configuram como cenários
15
Cabe relembrar que esta também foi uma peculiaridade atribuída às fantasias inconscientes
quando trazidas à consciência pelo procedimento analítico.
59
conjunto destes enunciados fantasísticos, nos quais ele fala de si, dos seus
sujeito se articulam numa trama historicizada. Deste modo, num romance, relato
ou narrativa deste tipo, os elementos se articulam uns aos outros por intermédio de
repetir, por muitas vezes, no discurso do sujeito, sem que nenhum outro elemento
percebe que seus devaneios ou lembranças encobridoras não condizem uns com
com o propósito de trazer à tona o desejo inconsciente que lhes serve de base.
Para tal, conforme foi acima exposto, o trabalho analítico luta contra as
Hans: é sempre a mesma cena que se repetia e nenhum colorido ou predicado à ela
se acrescentava.
tais fantasias se apresentam como imunes à dúvida, sendo difícil para o analista
analista não consegue exercer a função hermenêutica daquilo que lhe é relatado.
produções devaneativas da criança aos seus desejos edipianos; mas, com respeito
16
Vale alertar que esta característica dos fantasmas vazios é de capital importância para a tese e
será o tema do próximo capítulo.
62
psicanalítica poderia, por sua vez, conduzir à uma analogia com a fantasia de cena
correlato latente.
bem como são diferentes os limites que elas impõem à interpretação. Ao contrário
durante a infância remota dos sujeitos. Conforme destacamos acima, elas foram
estatuto de uma ficção inventada para fornecer sentido às tendências psíquicas até
Com efeito, o artifício da construção em análise, pode ser relido como uma
espera de serem descobertos pela análise; foi só a partir do ato da construção que
psíquicas que não podem ser recordadas, posto que nem mesmo foram
fantasístico a ser desvelado, mas de uma fantasia a ser construída para preencher
Pequeno Hans, verificamos que ambas não precisam ser construídas em análise na
exatamente por isto que as fantasias vazias em nada parecem se assemelhar nem
fantasma de espancamento.
sujeito, não possuindo com elas quaisquer ligações. Com efeito, a cena do cavalo
com o objeto preto ao redor da boca não estava, de maneira alguma, relacionada
pelo pai de Hans ou pelo próprio Freud – jamais a elas se ligava: Hans hesitava
impasses de Freud para justificar a neurose seja pela realidade material, seja pela
originário de cena primária: como, muitas vezes, ela era descrita na forma de um
coito a tergo, Freud considerou que a cena primária era, de fato, uma fantasia
inventada pela criança a partir da visão de uma cópula entre animais. Nesta
“como se [a criança] tivesse deduzido que seus pais faziam a coisa do mesmo
uma substituta da cena de cópula entre os animais. Quanto aos fantasmas vazios,
estabelecido com respeito aos fantasmas vazios. Caso existisse um processo deste
66
tipo, eles não seriam produções psíquicas imunes aos esforços da associação livre
e, conseqüentemente, da interpretação.
Quanto à cena originária de castração, o que mais salta aos olhos, remete
ausência de pênis na mulher, visão esta que lhe causa angústia e abala as suas
Com efeito, nada disso é observado no domínio das fantasias vazias: elas
mesma forma, aparentemente, não há nada por detrás delas que justifique suas
Freud considera que a sedução pode, por vezes, dizer respeito a um fato real mas,
67
na maioria dos casos, tratava-se de uma cena inventada pela criança na tentativa
originária de sedução também parece não possuir o mesmo estatuto dos fantasmas
vazios.
balizada por uma série de referenciais discursivos. Por esta nomenclatura, nos
não cessa de reenviar a si próprio, possuindo uma significação clara, não ambígua
descrito por Freud (1896a/1995) na “Carta 52”. Trata-se de um texto central para
esta tese na medida em que ele traz consigo os germes de algumas temáticas que,
outros textos de Freud quanto em alguns dos escritos lacanianos. A partir deste
estudo, nossa atenção será voltada, na segunda parte do capítulo, para o contraste
cenários narrativos. Veremos, assim, que é por seu embasamento significante que
formações psíquicas deste tipo serem estranhas ao domínio dos fantasmas vazios.
à tona a noção de ligação (Bindung), tida por Herzog (2003) como uma figura
do princípio de prazer.
excitação seja forte o bastante para atravessar o envoltório. Assim, com respeito à
passagem abaixo:
“Seria tarefa dos estratos mais elevados do aparelho mental sujeitar a excitação
pulsional que atinge o processo primário. Um fracasso em efetuar essa sujeição
provocaria um distúrbio análogo a uma neurose traumática, e somente após haver sido
efetuada é que seria possível à dominância do princípio de prazer avançar sem
obstáculo. Até então, a outra tarefa do aparelho mental, a tarefa de dominar ou sujeitar
as excitações teria precedência, não, na verdade, em oposição ao princípio de prazer,
mas independentemente dele e, até certo ponto, desprezando-o” (FREUD, 1920/1995,
p. 46).
com que este seja suprimido por alguns instantes, até que a estimulação seja, de
ligações, por sua vez, fornecem os pontos de apoio necessários a um trabalho mais
73
a memória não seria armazenada no psiquismo de uma só vez; pelo contrário, ela
74
rearranjos.
mnêmico não sofre a devida retranscrição, ele continua a ser manejado de acordo
registro dos “signos de percepção” (Wz), cuja articulação dos traços se dá pelas
17
O termo “anacronismo” não está sendo por nós empregado para designar aquilo que se encontra
fora de moda ou ultrapassado, mas para explicar a perpetuação de determinadas formações
psíquicas no aparato que, de certo modo, contrastam com as outras.
75
Neste contexto, podemos traçar uma analogia entre o registro dos signos
I II III
W Wz Ub Vb Bews
X X X X X X X X X X
sua extremidade perceptiva (W). Cabe ressaltar que, para o pensamento freudiano,
o sistema encarregado da percepção não pode reter traço de memória algum, a fim
76
constituindo, deste modo, o primeiro registro mnêmico. Com isto, marca-se que o
aparato não registra a totalidade daquilo que fora percebido, mas apenas alguns
(LEJARRAGA, 1996).
marcas, ou seja, impressões que apenas afetam o aparato, ainda não inscritos
enquanto traços mnêmicos, articulados uns aos outros na forma de uma cadeia.
de todas as vivências que ele tivera com a prima, o tom amarelado do vestido da
18
O tema da exclusão mútua entre as funções de percepção e de memória já havia sido proposto
por Freud (1895/1995) no “Projeto para uma psicologia científica”. Contudo, ele receberá uma
maior atenção em alguns escritos posteriores, tais como “A interpretação de sonhos” (FREUD,
1900/1995), “Além do princípio de prazer” (FREUD, 1920/1995) e, principalmente, “Uma nota
sobre o ‘bloco mágico’” (FREUD, 1925/1995).
19
Pela expressão “mais aquém do processo de recalque” fazemos alusão ao mecanismo de
recalque propriamente dito, tal como concebido por Freud (1915a/1995 e 1915b/1995) nos escritos
metapsicológicos e que atuaria na fronteira entre os sistemas inconsciente e pré-
consciente/consciente. Um confronto teórico entre o conceito de recalque presente na “Carta 52” e
este referido à primeira tópica será objeto de análise da primeira seção do próximo capítulo.
20
Ver segunda seção do capítulo anterior.
77
corporais serão reinvestidas e repetidas, ainda que não associadas ao evento que as
substrato biológico fornecido a tal conceito, bem como relativizando o seu aspecto
21
Estas considerações de Braunstein (1990) são de suma importância para a tese e serão retomadas
em outros momentos da nossa argumentação.
78
e de causa, reinaria o caos – outra característica atribuída por Freud ao isso –, caos
(BRAUNSTEIN, 1990).
quantidade e a transmissão dos signos de realidade aos neurônios . Estes, por sua
pelo fato da resistência nas barreiras de contato entre os neurônios ser maior do
traço de memória – bem como na organização dos diversos traços nos moldes de
um traço vai sempre remeter a outro traço a ele encadeado, e assim por diante.
jogo de dados, podemos perceber que a imagem onírica do sol não remete
necessariamente à estrela solar, bem como os dados aos jogos e brincadeiras; pelo
contrário, as duas imagens unidas – uma remetida a outra – pode fazer referência à
um traço mnêmico ao outro que produz a significação, sem que haja relação entre
somente a partir deste elo, é que advém a significação22. Para Braunstein (1990),
22
Cabe destacar que o próprio Lacan (1959-1960/1997) já havia traçado uma analogia entre a
trama de facilitações neuronais e a cadeia significante.
81
produzindo determinadas significações que, por sua vez, não são compreendidas
destaca-se que, no caso dos sonhos, cada sonhador produz o seu próprio código e,
caso o mesmo elemento estivesse presente nos sonhos de duas pessoas distintas,
posteriori (Nachträglich).
arbitrária. Por fim, os números são postos em relação com uma matriz simbólica –
compreendido.
82
Braunstein (1990), por sua vez, recorre a uma analogia técnica para
são decodificadas por um raio laser que as transforma em impulsos elétricos. Por
música.
plausível o fato da criança ter presenciado uma cena de cópula entre cães pastores.
desenho do lobo no livro que sua irmã constantemente lhe mostrava; ao lobo
pulando pra dentro do quarto do alfaiate quando a janela se abre (como na história
que seu avô lhe contava); ou à visão de presentes de natal dispostos sobre os
galhos de uma nogueira – também foram inscritas, porém dissociadas umas das
outras. Na noite de seu quarto aniversário, tais imagens são articuladas dando
origem ao sonho dos lobos sentados nos galhos da nogueira, sonho este estranho
tanto ao Homem dos lobos quanto àquele que o possivelmente escutara. Enfim, o
numa construção discursiva coerente: quando criança, ele havia sido testemunha
de uma relação sexual entre os pais, e a posição destes no ato da cópula em muito
lembraria a postura dos lobos ilustrados nos desenhos que via constantemente.
seus domínios, os traços mnêmicos estarem articulados uns aos outros na forma
23
De fato, não cabe aqui uma análise minuciosa de como cada um destes fragmentos foi
entrelaçado aos outros na construção freudiana. Para tal, remeto o leitor ao quarto capítulo do texto
de Freud (1918/1995) intitulado “O sonho e a cena primária”.
24
Cabe ressaltar que estamos trabalhando com a hipótese do Homem dos lobos não ter realmente
presenciado a cena primária na infância. De acordo com a análise do capítulo anterior, preferimos
encará-la como algo que só teve existência a partir do ato de construção.
84
não se articulam como um todo; pelo contrário, estão desconectadas umas das
trama historicizada. Assim, tal como demonstrado com relação aos devaneios e às
entre elas. Dada a instituição dos nexos causais, também é possível à trama
suas mãos; para acalmá-la, lhe é oferecido um pedaço de pão; enfim, o próprio
Freud esconde suas flores para receber o pedaço de pão. Vale ressaltar que esta
85
significação:
“Se pode dizer que é na cadeia do significante que o sentido insiste, mas que
nenhum dos elementos da cadeia consiste na significação de que ele é capaz nesse
mesmo momento. Impõe-se, portanto, a noção de um deslizamento incessante do
significado sob o significante” (LACAN, 1957/1998, p. 506, grifo do autor).
formuladas pelo sujeito para compreender sua história de vida, seus sintomas e
por intermédio de elos causais, temporais, etc, com a finalidade de oferecer uma
está que tais fantasmatizações não possuem o estatuto de verdades; pelo contrário,
questão. Tais interpretações, por sua vez, são subjetivas e, portanto, não devem
ser confundidas com tentativas de desvendar o sentido oculto por detrás destes
fenômenos.
signo e nem sinal da coisa, Lacan (1957/1998) retira deste registro qualquer
não possui, de modo algum, uma significação intrínseca, perdendo a sua função
desta trama.
(LACAN, 1957/1998).
e não como algo já dado de antemão, perdido e à espera de alguém para desvendá-
significante.
da “Carta 52”. Conforme foi acima assinalado, Freud (1896a/1995) destaca que o
diz ser possível que haja vários outros rearranjos do material psíquico. Trata-se de
sua compreensão.
88
como algo passível de sofrer constantes rearranjos, de modo que o sentido dado
pelo sujeito para um elemento num determinado momento pode não ser o mesmo
entre o cavalo e a figura paterna: o pai, quando bravo, batia as pernas severamente
tal qual um cavalo. Ao longo da história clinica, verificamos também que o pai
não era substituído na fantasia de Hans apenas pelo cavalo pois, numa outra
amarrotada, a outra se põe a gritar, pois havia sido levada para longe da
25
Conforme argumentação da segunda seção do capítulo anterior.
89
Jakobson26. Segundo este autor, o discurso é orientado por dois eixos: o eixo
termo entre outros para construir nossa fala; e o eixo sintagmático, referido à
26
Para maiores detalhes acerca de como os conceitos em questão são trabalhados pelo lingüista,
remeto à Jackobson (1963).
90
de modo que um termo levaria ao outro pela similaridade entre eles existente; o
eixo sintagmático, por sua vez, está ligado às articulações dos elementos
uma relação de similaridade; a operação metonímica, por sua vez, seria aquela
que assume o lugar de um outro, fazendo com que este último passe para um
estado latente. Ou seja, nas cadeias fantasísticas de Hans, o significante “pai” irá
servir de suporte para uma série de operações metafóricas, fazendo erigir, a cada
“lumf” por intermédio de uma operação metafórica, na medida em que entre eles
91
existe uma relação de semelhança, pois os dois saem do corpo da mãe do mesmo
modo.
determinada fantasia vai estar sempre ligada à outra por contigüidade, numa
em relação aos sonhos. Ou seja, pelo discurso do sujeito estar entrelaçado por uma
ele se abra em direção a uma pluralidade de outros significantes que, por sua vez,
significante para outro significante, sem que nenhum deles consiga responder
o fato de um sempre se ligar a outro em cadeia, aquilo que torna possível tanto à
27
Com efeito, a fórmula em questão traz implicações bastante incisivas para a interpretação
psicanalítica, posto que o sujeito ao qual o axioma se refere é o sujeito do inconsciente (LACAN,
1964/1998).
28
Ver segunda seção.
93
1896a/1995), passemos, agora, à analogia dos fantasmas vazios com o registro dos
signos de percepção.
anestesiada.
registro da inconsciência. Deste modo, esta escritura elementar não seria tocada
últimos eram bastante ricos, servindo como cenários para a realização de desejos e
pois o tratamento sempre vacilava nas tentativas de descobrir qual o papel por ela
Entretanto, cabe assinalar, que nem por isso devemos classificá-las enquanto
encontra seus alicerces numa outra forma de escritura que não a significante.
escritura de signos. Com efeito, é necessário destacar que Lacan também faz
à economia do signo.
apoio na semiótica de Peirce, para quem o signo, de modo geral, remete a alguma
coisa que, aos olhos de alguém, está para outra coisa29. Assim, no “Seminário 7: A
forma: “o signo, segundo a expressão de Peirce, é o que está no lugar de algo para
29
Para maiores detalhes acerca da concepção semiótica do signo, remeto a Peirce (1897/2003).
96
signo, não é o que representa algo para alguém, é o que representa, precisamente,
que faz signo remete diretamente àquilo que é designado, enquanto que a palavra
medida, é justamente pela presença deste rudimento de laço natural que liga a
palavra que faz signo ao objeto designado que, por muitas vezes, Lacan foi avesso
recebe do mundo onde vive e às relações ditas naturais que desenvolve com os
“Radiofonia”:
30
Com efeito, são muitas as acepções que o conceito de signo recebeu ao longo do pensamento e,
para maiores detalhes acerca do tema, remeto a Deleuze e Guattari (1995). No entanto, não cabe
nesta tese um exame pormenorizado desta questão e, por isso, estamos sempre nos reportando à
concepção peirciana de signo que, em última instância, é a que o pensamento lacaniano utiliza para
diferenciá-la da abordagem do conceito de significante.
97
signo? Não se trata, no domínio dos fantasmas vazios, tal como ocorre no registro
estabelece uma série de críticas às concepções até então dominantes acerca das
afasias, concepções estas que, salvo algumas diferenças, convergiam para o que
fora denominado de teoria das localizações cerebrais. De acordo com esta teoria,
conduzida, da periferia ao córtex, por algumas fibras nervosas; estas, por sua vez,
diz respeito à sua recusa em aceitar a representação como uma cópia ou mero
imagem sonora, uma imagem visual da letra, uma imagem motora da linguagem e
representação-objeto não consiste num dado a priori; pelo contrário, ela só ganha
os objetos é mediada pelo universo da linguagem e, justamente por este fator, não
seria mais plausível destacar que, na linguagem manifesta nas fantasias vazias, a
postulação de que a realidade objetiva está para sempre perdida, sendo a realidade
abaixo:
“Freud vai poder dizer que a única realidade que interessa (...) é a realidade da
fantasia (...), a realidade psíquica por excelência. O que está implicado nesta
construção é que o objeto não está dado desde o início, mas deve ser produzido.
(...) A despeito da particularidade dos vários modos de se conceber o objeto, fica
patente uma diferença. Assim, no pensamento do século XIX, a questão da
objetividade se apresenta como possibilidade de um discurso totalizante e
universalizante que pretende enunciar um referente ou, no caso da impossibilidade
de tal pretensão (...) para preencher esta falta de referente, este vazio. Já Freud, em
sua fundamentação metapsicológica, descarta esta possibilidade para o sujeito. (...)
Após 1920, coloca-se (...) a proposta de uma ausência de referência (...), a idéia da
ausência de qualquer referência sobre a qual seria possível se apoiar” (HERZOG,
1999, p. 66-69).
32
Ver primeira seção.
103
enquanto um “fuero” e, deste modo, ainda não tocado pelo regime característico
discursivo que, no domínio das fantasias vazias, a linguagem torna-se exata e sem
cena anestesiada. Frente a esta cena, seu discurso vacilava e, de acordo com a
história clínica, tudo leva a crer que isto ocorria não por causa de uma resistência
simples fato da cena neutralizada já ser clara e, deste modo, nada ter a esconder. O
remeter a ele próprio, e não a um outro elemento, tal como ocorreria numa escrita
produções fantasísticas.
diversas. Nesta perspectiva, é justamente esta a crítica que estamos traçando: nem
pelo menos tal como pensado de acordo com a lógica apresentada em “A instância
ou predicados.
apresenta sempre de forma direta e crua. Com base nestes pressupostos, cabe
presentifica desta forma, como se não fosse tocado pelos processos metafóricos
jovem arqueólogo chamado Nobert Hanold que, certo dia, fora atraído por uma
caminhava pelas ruas. A figura da moça lhe parecia bastante viva, sendo a
cotidiano agitado de uma capital deduz que, apesar de sua origem grega, ela
figura de Gradiva, Hanold passa a observar o mundo, do qual havia retirado seus
de sua época possuía um modo de andar semelhante. Pouco depois, por algum
106
motivo que lhe era desconhecido, o cientista viaja para a cidade de Pompéia e se
depara com Gradiva a andar pelas ruas destruídas, percebendo então que se tratava
conversas entre Hanold e Gradiva, até que, num determinado momento, a moça
“Por trás da impressão de que a escultura era ‘viva’ e da fantasia de que o modelo era
grego, estava sua lembrança do nome Zoe que significa ‘vida’ em grego. ‘Gradiva’
(...) é uma tradução do sobrenome ‘Bertgang’ que quer dizer mais ou menos ‘alguém
que brilha ou esplende ao avançar’. (...) Sua fantasia transportou-a para Pompéia, não
porque ‘sua natureza serena e tranqüila’ assim o exigisse, mas porque em sua ciência
ele não pôde encontrar analogia mais apropriada para seu singular estado, no qual
tomou conhecimento de suas lembranças de uma amizade da infância, embora através
107
de obscuros meios de informação. Após ter feito sua própria infância coincidir com o
passado clássico (...), houve uma perfeita analogia entre o soterramento de Pompéia –
que fez desaparecer, mas ao mesmo tempo preservou o passado – e o recalque”
(FREUD, 1907/1995, pp. 52-53).
mnêmicos.
seja, foi em virtude destes que o nome “Gradiva” foi dado à estátua; do mesmo
modo, por causa destes mesmos desejos, traços gregos foram vistos em sua
devemos destacar que é o desejo recalcado aquilo que responde pela instauração
na forma de um referencial discursivo, justamente, por não ter sido tocado por
que esta escritura elementar se situa num espaço topográfico situado logicamente
recalcada, visto que esta só encontra seu espaço de ação no registro subseqüente.
associação34.
33
Ver primeira seção do capítulo anterior.
34
Vale lembrar que Freud (1896a/1995) qualificou o registro dos “signos de percepção” de
inconsciente e, de fato, isto poderia ser um fator contrário à nossa argumentação, posto que
sustentamos a hipótese das fantasias vazias serem fantasmatizações conscientes. No entanto,
conforme nossa releitura da “Carta 52”, estamos considerando os signos de percepção não como
resíduos mnêmicos do processo perceptivo mas, de acordo com a proposta de Braunstein (1990),
como uma escritura psíquica cifrada e alheia ao encadeamento significante. Nesta perspectiva, não
vemos motivos suficientes para acompanhar a proposta freudiana de conceber os signos de
percepção como inconscientes. Este ponto de vista só faria sentido se eles fossem tomados em suas
relações com o sistema perceptivo, pois percepção e memória são tidas como funções psíquicas
excludentes e que, portanto, devem ser associadas a sistemas distintos.
109
De acordo com a análise empreendida até então, vimos que os fantasmas vazios se
respondem pelo estranho fato das fantasias vazias retirarem de seus domínios a
35
Cabe alertar para o fato de o conceito de símbolo estar presente no pensamento de muitos
autores das mais diversas áreas científicas. No entanto, não estamos interessados nas múltiplas
acepções que este conceito recebeu ao longo da história do pensamento, limitando-nos apenas à
concepção propriamente freudiana do tema.
110
rei e da rainha como símbolos das figuras parentais; igualmente, uma espada, uma
livremente acerca dos elementos oníricos. Como exemplo desta atitude, podemos
símbolo, mas também num manejo clínico diferente. Nesta perspectiva, em outros
com esta concepção, podemos dizer, ainda com respeito ao caso Dora (FREUD,
formação simbólica foi erigida. Como nunca devemos esquecer que o contexto em
pode ser vista como um dado universal, posto ser o desejo do sujeito aquilo que a
112
poder criar seus próprios símbolos, para além daqueles disponíveis na cultura.
substituir um sentido por outro, fazendo com que o primeiro passe para um estado
Nesta medida, Rosolato (1988) define o símbolo como “uma metáfora que
se mantém fora de seu contexto, isto é, num significante que pode funcionar como
metáfora qualquer que seja seu emprego, preenchido pelo imaginário individual”
o advento deste novo sentido ligado ao imaginário individual. Isto porque este
pluralidade infinita de novos sentidos poderá advir. Com efeito, seria demasiado
na cadeia simbólica, concluímos que, para a psicanálise, algo jamais deve ser
processo simbólico. Esta afirmação seria justificada pelo fato delas escaparem às
inconsciente.
36
Vale ressaltar que este aspecto do símbolo foi bastante enfatizado por Abraham (1961/1995). No
entanto, tendo em vista os limites da presente tese, não cabe aqui analisar a totalidade de suas
concepções acerca do símbolo, o que nos desviaria da discussão.
115
neutralizada e sem hiatos ou lacunas. A este sistema, por sua vez, podemos fazer
37
De acordo com a discussão empreendida na seção precedente, podemos atrelar esta expressão
“signo do objeto a ser descrito” ao campo dos referenciais discursivos.
116
Com base nestes pressupostos, devemos agora trazer para o primeiro plano
mesmos daqueles apresentados pelo discurso científico, pelo menos se este último
se, nestes três domínios, de linguagens claras e que trazem consigo a pretensão de
manifestações do inconsciente.
38
Devemos assinalar que a argumentação de Rosolato (1988) considera que apenas os processos
metafóricos são retirados do discurso analógico. Segundo o autor, a modalidade discursiva em
questão ainda se articula com o registro metonímico na medida em que este seria o responsável
pela coerência intrínseca à linguagem. No entanto, não convém entrarmos nesta questão, visto que
o conceito de metonímia por ele utilizado diverge daquele empregado por autores que estamos
valorizando na tese, tais como Jakobson (1963) e Lacan (1957/1998). Assim, entrar numa
discussão acerca da divergência entre estes autores sobre o conceito de metonímia conduziria a
uma análise eminentemente lingüística, o que não caberia nos limites desta tese. Também devemos
destacar que a concepção de Rosolato sobre o significante de demarcação é igualmente mais
complexa do que estamos mostrando, pois abrange uma investigação sobre a sua função para o
desenvolvimento da linguagem na criança. Do mesmo modo, se nos debruçarmos mais sobre este
aspecto, estaríamos nos desviando da nossa proposta.
39
Cabe ressaltar que o discurso científico está sendo analisado aqui apenas em sua dimensão
eminentemente técnica. De fato, são vários os pensadores que já investigaram a temática do
discurso científico e, muitas vezes, suas análises são bastante contraditórias. Na presente tese,
estamos valorizando apenas as concepções de ciência que podem nos auxiliar na circunscrição do
estatuto metapsicológico dos fantasmas vazios.
117
linguagem, sejam eles prescritivos, interrogativos, etc. Isto porque no domínio das
assim, uma alienação dos usuários do saber, fazendo entrar em desuso o princípio
mesmo do sujeito.
“O desenvolvimento da ciência (...) produz um novo laço social, cujo motor (...)
não é mais a enunciação do mestre, seu dizer, mas um saber de enunciados, um
conjunto acéfalo de ditos. (...) O que é assim promovido é uma modalidade de laço
social que substitui a relação mestre-sujeito, uma relação saber (acéfalo)-sujeito”
(LEBRUN, 2004, p. 53).
aquele que não se autoriza a pensar e a sustentar o seu desejo em seu discurso
ficaria apto a produzir uma fala tecnicamente coerente, mas sem se engajar,
enquanto sujeito, em sua enunciação: como se lhe fosse possível ler o texto que
sujeito, mas este abre mão da formação de um saber que lhe é próprio, perdendo,
Lebrun (2004), “a técnica não pertence à ordem do símbolo, ela é, antes, seu
2004).
tal qual os fantasmas vazios, o discurso científico é situado como algo imune ao
transmitido pelo remetente. Assim, não seria possível exercer uma interpretação
eles possuem uma estrutura análoga ao dos signos de percepção. Ainda de acordo
quais eles não são assimilados pelo restante das produções fantasmáticas
subjetivas.
conforme veremos a seguir, ela instaura uma barreira na dinâmica psíquica entre
Torok, para também associá-la à noção de clivagem. Por fim, será traçada uma
de explicitar que é justamente desta vertente que as fantasias vazias carecem. Por
1896a/1995) apartados dos cenários fantasísticos narrativos e sem ser por eles
assimilados.
sua proposta, cada nova tradução inibe o registro anterior mas, no entanto, quando
defensivo e instituído para evitar o desprazer passível de ser sentido pela nova
pelo fato dos fantasmas vazios permanecerem no campo discursivo do sujeito sem
nos debruçar sobre esta concepção de recalque presente na “Carta 52” (FREUD,
40
Na “Carta 52”, Freud (1896/1995) também considera que o recalcamento pode se dar entre os
registros da inconsciência e da pré-consciência. Todavia, este fator não será abordado em nossa
argumentação, visto que estamos interessados apenas nos limites dos signos de percepção com as
outras retranscrições mnêmicas.
124
ser entendido como algo que aconteça uma só vez, produzindo um resultado
constante.
mnêmica estabelecida pelo recalque tal como circunscrito na “Carta 52” (FREUD,
possa ocorrer entre os dois registros em questão, mas também é destacado que o
do sujeito sempre da mesma maneira e sem que nenhum elemento lhes seja
impõe ao material psíquico uma dissimulação para que se obtenha o devido acesso
aos fantasmas vazios, afirmamos ser justamente de associação livre que eles
carecem, pois o sujeito em análise não consegue remeter seu enunciado a nenhum
outro elemento.
41
Cabe destacar que o termo em questão é empregado pelo próprio Freud (1915b/1995), no título
do capítulo 6.
126
assim, demonstrar que o recalque tal como pensado nos artigos sobre
(FREUD, 1896a/1995), também não se confunde com o que foi denominado nos
termos:
“Um recalque primevo, uma primeira fase do recalque, (...) consiste em negar
entrada no consciente ao representante psíquico (ideacional) da pulsão. Com isso,
estabelece-se uma fixação; a partir de então, o representante em questão continua
inalterado e a pulsão permanece ligada a ele” (FREUD, 1915/1995, p. 153, grifos
do autor).
mas de modo que isso não implique necessariamente na fixação deste elemento no
psíquica que funciona como uma espécie de matéria prima para sua constituição.
reportando a processos psíquicos que não chegam a se tornar conscientes mas que,
originário não remete à questão da emergência dos fantasmas vazios. Isto porque
recalque tal como concebido nos ensaios metapsicológicos e também com respeito
42
Também devemos reiterar que o recalque originário é, em última instância, um postulado
teórico, sendo jamais observado na clínica. Trata-se de uma delimitação conceitual da qual Freud
(1915a/1995 e 1915b/1995) se serviu para explicar como os primeiros elementos se inscrevem
num inconsciente adjetivado e, assim, funcionarem como pólos de atração para outros elementos a
serem posteriormente recalcados.
43
Ver discussão da última seção do primeiro capítulo.
44
Vale lembrar que alguns autores – tais como Laplanche e Pontalis (1988) – também
circunscrevem o recalque originário como o mecanismo fundante dos fantasmas originários.
128
o termo “clivagem” para designar o recalque tal como descrito na “Carta 52”.
analogia.
consciência moral. No entanto, esta noção só vai ganhar força, obtendo uma
aceita e rejeita a castração, o que promove uma clivagem psíquica entre um lado
que não a reconhece e outro que se ajusta à realidade. De acordo com a passagem
a seguir:
“Suponhamos, portanto, que (...) uma criança se encontra sob a influência de uma
poderosa exigência pulsional que está acostumado a satisfazer, e que é subitamente
assustado por uma experiência que lhe ensina que a continuação dessa satisfação
resultará num perigo real quase intolerável. O ego deve então decidir reconhecer o
perigo real, ceder-lhe passagem e renunciar à satisfação pulsional, ou rejeitar a
realidade e convencer-se de que não há razão para medo. (...) A criança não toma
nenhum desses cursos, ou melhor, toma ambos simultaneamente. (...) Ela responde
ao conflito por duas reações contrárias, ambas válidas e eficazes. Por um lado, (...)
rejeita a realidade e recusa-se a aceitar qualquer proibição; por outro, no mesmo
alento, reconhece o perigo da realidade. (...) Esse sucesso é alcançado ao preço de
uma fenda no ego. (...) As suas reações contrárias persistem como ponto central de
uma divisão (splitting) do ego” (FREUD, 1940/1995, p. 293).
recalque. Isto porque ele menciona, por vezes, que o próprio fetiche é tido
Ferenczi uma teorização diversa para o fenômeno da clivagem, sendo esta mais
(FERENCZI, 1933/1988).
a ser gerada quando há uma cena de sedução entre uma criança e um adulto, a
situação com uma linguagem de paixão. Sendo, neste caso, a diferença entre as
línguas bastante evidente, a culpa sentida pelo adulto após o ato de violência, se
não possui o menor entendimento e, ante este inacessível, a criança reage com um
entanto, este último, não suportando o relato, desmente a criança, dizendo que
defensiva da qual o sujeito se serve para sobreviver, mesmo que para isso lhe seja
necessário fragmentar-se.
o objetivo de que ele forneça um sentido para aquilo que ainda não o tinha; e,
46
Para maiores detalhes acerca deste ponto, remeto a Verztman (2002).
132
da clivagem. Mas, desta maneira, cabe indagar: por que a palavra do adulto é tão
incisiva?
inequívoca.
Desta forma, uma linguagem rígida não poderia, de forma alguma, ser
assimilada pela criança: o sujeito que ouve uma formação discursiva deste tipo
“As palavras, mesmo quando têm por objetivo descrever a realidade, só podem ser
investidas pelo sujeito quando guardam o caráter de multiplicidade dos sentidos.
Quando este caráter fica interditado, as palavras (...) são encerradas numa rigidez
que não permite ao psiquismo integrá-las. (...) A representação do traumatismo não
pode ser associada a outras representações. Nem pode, evidentemente, circular por
entre as idéias conscientes. (...) O que se passa no trauma é que o adulto interdita à
criança não apenas as palavras, como também a possibilidade de ambigüidade, de
múltiplos sentidos. (...) É devido à ambigüidade fornecida pelo adulto à criança que
133
esta pode produzir sentidos, construir registros psíquicos. (...) Se, ao invés disso, o
que recebe e o que fala é reduzido ao unívoco, então, a inscrição psíquica se torna
impossível” (PINHEIRO, 1995, pp. 76-78).
ocorre apenas numa situação de luto objetal, mas se manifesta como um processo
trazer a maior parcela do mundo externo para dentro do eu. Assim, trata-se, na
da criança para o mundo dos objetos. Este mecanismo, por sua vez, viabiliza a
objeto. Por este viés, pode-se definir a introjeção, de acordo com Torok
47
Pela expressão “conjunto de pulsões”, entende-se as representações e o mundo simbólico dos quais
o objeto é portador. Para maiores detalhes, ver Pinheiro (1995).
135
efetiva quando o vazio da boca da criança vai, aos poucos, sendo preenchido por
palavras. Em si, a passagem de uma boca farta de seio para uma boca repleta de
acordo com Abraham (1974/1995), a princípio, num período mítico no qual mãe e
filho viveriam de modo simbiótico, a criança não teria “outra consciência ou outro
inconsciente que não fosse os da mãe” (p.379). Nesta medida, o ato de separação
se consome pela introjeção desta relação inicial, sendo possível à criança, a partir
48
Este modelo foi descrito minuciosamente no primeiro capítulo desta tese.
136
sua relativa autonomização: pela palavra, ele poderá fornecer sua própria
nos sentidos que, outrora, foram fornecidos pela mãe. Trata-se, aí, de uma
ao trabalho de elaboração psíquica pois, por manter o objeto ainda vivo dentro de
1968/1995).
49
A relação entre os processos metafóricos e de formação simbólica foi abordada no capítulo
precedente, conforme a discussão da última seção.
137
espaço. Com efeito, o princípio de prazer passa a reinar soberano, posto que a
realidade é cegamente rejeitada pela não aceitação, por parte do sujeito, da perda
“Se estamos decididos a ver uma linguagem nos procedimentos que governam tal
fantasística, convém inventar uma nova figura da destruição ativa da figuração,
para a qual propomos o nome de antimetáfora. Precisemos que não se trata
simplesmente de voltar ao sentido literal das palavras, mas de fazer uso delas (...)
de modo que sua ‘figurabilidade’ seja como que destruída. (...) Ela [a
incorporação] implica a destruição fantasística, do ato mesmo pelo qual a
metáfora é possível: o ato de pôr em palavras o vazio oral original, o ato de
introjetar” (ABRAHAM & TOROK, 1972/1995, pp.250-251, grifo dos autores).
que uma introjeção deveria ter ocorrido” (ABRAHAM & TOROK, 1972/1995, p.
138
sempre que não for possível expor o objeto idealizado a uma certa tematização, a
Com efeito, Torok (2002) ressalta que as figuras parentais são verdadeiras
interação entre mãe e criança pode conduzir a duas vicissitudes distintas e opostas
É, pois, sobre este segundo aspecto que agora nos debruçaremos para tentar
aparelho psíquico.
nestas condições, eles transmitirão aos filhos uma lacuna já existente em suas
Com base nestes pressupostos, a cripta pode ser definida, em linhas gerais, como
autores:
“É esse elemento de Realidade tão dolorosamente vivido, mas que escapa em nome
de sua natureza indizível, a todo trabalho de luto, que imprimiu a todo o psiquismo
uma modificação oculta. Oculta sim, porque será preciso mascarar, denegar a
realização do idílio. (...) De tal conjuntura, resulta a instalação no seio do Ego de
um lugar fechado, de uma verdadeira cripta, e isso como conseqüência de um
mecanismo autônomo, espécie de anti-introjeção, comparável à formação de um
casulo em torno da crisálida” (ABRAHAM & TOROK, 1975/1995, p. 279, grifo
dos autores).
lhes são próprios para que a criança os assimile, dar-se-á uma identificação oculta
eu, usando-o como máscara para a realização de algo vergonhoso que não poderia,
objeto fará com que o sujeito abra mão de sua própria identidade em prol de uma
identificação endocríptica.
artificial não estabelece relações ou conflitos com os outros sistemas, o que nos
mecanismo de incorporação.
fantasias vazias.
como “uma formação que não foi, enquanto tal, o produto da autocriação do
sujeito pelo jogo dos recalcamentos e introjeções” (p.403). Ou seja, ela não
142
de incorporação e, portanto, como uma formação psíquica situada para além dos
simples tradução do processo psíquico, muito pelo contrário, é a prova (...) de que
fantasmas vazios e a fantasia tal como pensada por estes autores. Ou seja, a
vazias50.
anulado, de modo que o sujeito passa a tomar ao pé da letra aquilo que se pode
50
Vale marcar que o ponto de vista de Abraham e Torok acerca da fantasia é bem mais complexo
do que referimos. Estamos apenas nos servindo das características que conduzem à sua analogia
com os fantasmas vazios, mas temos em mente que não se trata de duas formações psíquicas que
se recobrem completamente.
145
incorporação.
estabelecer uma ressalva. Delimitamos que tanto o recalque, tal como pensado na
vazios não são aqui postulados como organizações defensivas, a presente análise
domínio muito mais amplo e não precisa necessariamente partir de uma cena de
“confusão de línguas” podem abranger todo o dinamismo que remete aos embates
pensamento freudiano, sendo possível encontrar, ao longo de sua obra, uma série
inferências acerca da atitude emocional dos pais para com seus filhos. Sua
situando-a enquanto “Sua majestade, o bebê”52. Com isto, fica marcado que,
para que a criança não encontre o menor obstáculo para a realização de seus
anseios.
51
Convém destacar que tal formulação lacaniana é bastante complexa. Tendo em vista os limites
da presente tese, não cabe aqui uma exposição minuciosa desta proposição.
52
Ver a discussão empreendida na segunda seção do primeiro capítulo.
148
favorável para que eles revivam suas tendências narcisistas há muito abandonadas,
quais os próprios pais se privaram ao longo de suas vidas. Nesta medida, Freud
destas tendências recalcadas. Deste modo, a perfeição narcisista dos pais estaria
para o processo de subjetivação e, sob este prisma, não cabe considerá-lo como o
53
Para maiores detalhes, remeto a Lacan (1953-1954/1979).
149
constante interação com as figuras parentais. Segundo este ponto de vista, os pais
e oculto por trás do choro e gestos da criança. Pelo contrário, o sentido é erigido
subjetividade.
por parte da criança. Nos termos do “Projeto para uma psicologia científica”
54
Uma descrição minuciosa acerca deste modelo foi empreendida na primeira seção do primeiro
capítulo.
150
sujeito a partir dos mais variados encontros com o mundo adulto, sendo estas
imbricadas tramas de facilitações algo que se forma à medida que se obtém êxito
vai “tomar um elemento no lugar onde ele se encontra e substitui-lo por outro” (p.
para aquilo que a ele se manifesta como enigmático. Esta seria, de fato, uma das
narrativo.
aceitação incrédula dos preceitos perpetrados pela figura divina. A idéia central do
assinalado que esta última abrange todo o saber adquirido pelo homem, ao longo
152
usufruto dos bens por ela fornecido. Nesta medida, o conhecimento cientifico teria
esta função de coibição, também é exposto que a ciência possui uma série de
coerção das leis naturais é algo impossível de ser efetivado. Assim, sempre que o
que regem seus fenômenos, de quais outros artifícios dispõe o sujeito para
nada mais lhes resta senão produzir algumas teorizações fantasmáticas a respeito
pensar sobre estes inacessíveis e assumir uma posição ativa frente a tal estado de
merece ser vislumbrado como uma construção fantasmática deste tipo: a figura
advento da atividade fantasística. Esta, por sua vez, é circunscrita como o artifício
através do qual o sujeito dispõe para tentar dar conta deste inacessível. Ou seja,
enigmático.
temática da adoção, sendo possível a ela, por este viés, fornecer algum sentido
para a diminuição da estima de seus pais: como ele foi adotado quando criança,
pertence na verdade a outra família e, por isso, não é digno de carinho algum
(FREUD, 1909/1995). Ou seja, temos, neste caso, uma mensagem advinda dos
pais, mensagem esta que envolve alguns indícios concernentes à perda de afeição
para com o filho. Este, por sua vez, sente o comportamento dos pais como algo
enigmático (“por que eles não são mais tão afetuosos comigo tal como antes se
irmão poderá trazer conseqüências irreversíveis para seus narcisismos. Para fazer
crianças saírem do corpo da mãe através do orifício anal. Tal como ocorre no caso
para decifrar os problemas do universo que são tão complexos para compreensão
origem55.
55
Vale lembrar que, de acordo com a discussão empreendida no primeiro capítulo, os fantasmas
originários podem, de certo modo, se incluir nestes cenários fantasísticos narrativos.
156
de forma a abrir espaço para sua singularização. Isto porque o sujeito introjeta não
sujeito construir uma fantasia a partir do discurso do outro, se este último chegar a
ele como algo enigmático. Ou seja, é pelo fato do discurso transmitido comportar
atividade fantasmática narrativa teria por função servir de mola mestra para o
56
Numa abordagem que privilegia a idéia da subjetivação como um processo, fica claro que a
atividade fantasmática – seja no registro dos cenários narrativos, seja no registro dos fantasmas
vazios – é concebida como produzindo a todo momento. Assim, utilizamos o termo “criança” em
conformidade com a obra dos autores que viemos trabalhando até então. Entretanto, no contexto
da tese, não nos referimos exclusivamente ao confronto do infante com o universo simbólico; pelo
contrário, consideramos que este processo se dá de forma permanente ao longo da vida do sujeito
e, por conseguinte, o processo de construção de fantasias também é visto como algo constante.
157
Pinheiro (1995) acerca dos fatores que respondem pela dificuldade do sujeito de
57
Ver a citação de Abraham e Torok (1972/1995) na página 125.
158
destinatário, de modo que seu sentido original não possa ser por outros
não dar margens à ambigüidade das palavras, fazendo com que o destinatário não
e sem ser por ela assimilados. Instaura-se, portanto, uma clivagem na dinâmica
psíquica de modo que o aparato fica cindido entre dois dinamismos discursivos
sua vez, não cessará de reenviar sempre a ele mesmo, tornando a linguagem
enigmas
que responde pelo fato destas fantasias permanecerem clivadas do restante das
ou, até mesmo, ausência dos processos introjetivos foi tida como a causa da
58
Ver segunda seção do capítulo 2.
161
significante.
para que este aceite, retifique ou mesmo rejeite o processo de nomeação. Por fim,
Com o propósito de oferecer uma visada clínica acerca do tema das fantasias
passam a estar atados a uma significação fixa, direta e já dada de antemão. Com
remete a um registro situado para mais aquém daquele no qual se faz sentir o
sua razão de ser neste domínio fantasístico, visto que não se trata, nas fantasias
59
Ver segunda seção do segundo capítulo.
163
de ressaltar que o elemento discursivo não se abre para outros significantes; pelo
contrário, ele se fecha numa significação bastante rígida, fixa e pronta no próprio
instante do relato. Este fenômeno, por sua vez, encerra com quaisquer
medida em que ela não parece remeter à uma força emanada do eu para impedir o
resistência não consiste em impulsos de origem egóica, sendo provável que esteja
processo que ocorre uma só vez; pelo contrário, ele exige um dispêndio constante
de energia por parte do aparelho psíquico que, caso cessasse, o recalque falharia.
do eu em reconhecer impulsos contrários ao dos padrões morais que ele criou para
si.
resistência pode ser consciente ou, até mesmo, inconsciente. Esta última abrange
passando a abranger cinco modalidades distintas que, por sua vez, emanam de três
direções diferentes. Teríamos então três resistências que emanam do eu, a saber, a
“Verificamos que mesmo após o eu haver resolvido abandonar suas resistências ele
ainda tem dificuldades em desfazer os recalques; e denominamos o período de
ardoroso esforço que se segue, depois de sua louvável decisão, de fase de
‘elaboração’ (...) Pode ser que depois de a resistência do eu ter sido removida, o
poder da compulsão à repetição – a atração exercida pelos protótipos inconscientes
sobre o processo pulsional recalcado – ainda tenha de ser superado. Nada há a dizer
contra descrever esse fator como a resistência do inconsciente. Não há qualquer
necessidade de se ficar desestimulado por causa dessas correções. Devem ser bem
acolhidas se acrescentarem algo ao nosso conhecimento. (...) A investigação (...) do
assunto revela que o analista tem de combater nada menos que cinco espécies de
resistência, que emanam de três direções – o ego, o id e o superego. O ego é fonte
de três, cada uma diferindo em sua natureza dinâmica. A primeira dessas (...) é a
resistência do recalque (...) sobre a qual há o mínimo a ser acrescentado. A seguir
vem a resistência da transferência, que é da mesma natureza mas que tem efeitos
diferentes (...) visto que consegue estabelecer uma relação com a situação analítica
ou com o próprio analista, reanimando assim um recalque que deve ser somente
lembrado. A terceira resistência (...) advém do ganho proveniente da doença e se
baseia numa assimilação do sintoma no ego. Representa uma não disposição de
renunciar a qualquer satisfação ou alívio que tenha sido obtido. A quarta variedade,
que decorre do id, é a resistência que, como acabamos de ver, necessita de
‘elaboração’. A quinta, proveniente do superego (...) é também a mais obscura,
embora nem sempre a menos poderosa. Parece originar-se do sentimento de culpa
ou da necessidade de punição, opondo-se a todo movimento no sentido do êxito,
166
questão dos fantasmas vazios, justamente, por dizer respeito a uma força oriunda
acordo com nossa proposta60, o isso está sendo tomado como uma escritura
60
Ver segunda seção do capítulo 2.
167
questão dos fantasmas vazios, e, então, ser circunscrita como a responsável por
manifesta na clínica merece ser vislumbrado como uma tensão entre, de um lado,
interpretação, faz-se necessário, pelo contrário, abrir espaço para que estas
61
Ver a terceira e a última seção do capítulo 1.
168
fantasias vazias, vimos que elas não necessitam ser construídas em análise, posto
fantasísticas do sujeito, sem se deixarem por elas afetar. Deste modo, teríamos, na
por elementos imaginários e simbólicos que não faria síntese com uma outra
que não veremos, mediante este exemplo, uma modalidade de intervenção que
importante nos determos no exame deste artifício, na medida em que isto poderá
contribuir para uma reflexão acerca de como deve se constituir uma modalidade
paciente estivesse em pane (p. 17). Com efeito, Didier empregava um discurso
inclusive, a pintura.
sensação de que ele parecia ignorá-la. Feita uma intervenção, Didier sempre
170
respondia: “Claro, é o que eu ia dizer, exato, foi o que pensei” (p.17) para, em
seguida, prosseguir em sua fala sem se deixar afetar pela analista. O discurso do
Deste modo, Kristeva (2002) destaca que era preciso encontrar, a partir da
paciente. Assim, ela percebe que, através de suas pinturas, ele poderia exprimir
paciente sobre suas pinturas era muito técnico e especializado, de forma que a
analista não conseguia visualizá-los, a analista sugere que Didier traga fotos de
estes pedaços fossem integrados numa figura única. Ao perceber o fato, a analista
Fica claro com isto que a analista se põe a transmitir suas próprias
fantasmas de Didier, para depois abrir espaço para que ele coloque em dúvida
algumas de suas vivências, bem como alguns aspectos relacionados à sua família
e à figura da analista.
Segundo Kristeva (2002), o recurso à “teorização flutuante” (p. 24) por parte do
analista, produz uma brecha num determinado discurso apático, permitindo que o
sujeito reencontre a palavra, onde se faz ressoar sua polifonia, sua dimensão
comutativa e sua afetação pelo desejo. Nesta medida, o discurso do sujeito vai,
Com base nesta discussão, devemos agora questionar acerca do fator que
pesquisas sexuais infantis, Hans era constantemente atraído pelo tema dos pipis
ver o pênis da mãe, da babá ou de suas amigas. O quadro clínico da criança – que,
visão de sua irmã Hanna tomando banho. Assim, durante à noite ele é despertado
por um sonho de angústia no qual a mãe ia embora, não podendo mais dormir
junto a ele. No dia seguinte, durante um passeio no parque com a babá, Hans
chora dizendo querer voltar para casa, a fim de ficar junto da mãe. Esta resolve,
então, levá-lo para passear e, quando retornam, ao lhe perguntar sobre o ocorrido
173
no parque, Hans retruca: “Eu estava com medo de que um cavalo me mordesse”.
Com base no relato do caso, Freud (1910a/1995) levanta a hipótese de, por
esta época, a afeição de Hans pela mãe ter se tornado bastante intensa. Assim, ele
combina com o pai para que este lhe explicasse que sua fobia não passava de uma
bobagem; Hans realmente desejava que sua mãe o levasse para a cama, pois
relacionada com o desejo do menino de ver o pênis da mãe. Deste modo, o pai
no quarto dos pais e a mãe – apesar das admoestações do pai – não resistia e
deixava o menino dormir com eles. Deste modo, o pai conclui que
62
Vale lembrar que esta fantasia já foi minuciosamente abordada na segunda seção do capítulo 2.
Ver páginas 76-77.
174
as conclusões tiradas por Freud ou pelo pai da criança. Com efeito, o fato da
criança sempre querer dormir com os pais não implica necessariamente que ele
almeje se deitar com a mãe e afastar o pai dela, como pretendiam as interpretações
edipianas. Neste contexto, a própria fantasia das girafas pode ser relida como a
simples reprodução da cena de briga familiar ocorrida pelas manhãs, mas sem que
brigava com a mãe quando esta cedia aos apelos de Hans e, nesta medida, a cena
das girafas pode ser considerada como uma transposição, para a esfera
fantasmática, da satisfação pelo triunfo por ele obtido sobre as resistências do pai.
primeira vez. Freud, a guisa de brincadeira, relaciona o estranho objeto preto com
o bigode do pai63 e, em seguida, comunica ao menino que “bem antes dele nascer
(...), já sabia que ia chegar um Pequeno Hans que iria gostar tanto de sua mãe que,
por causa disso, não deixaria de sentir medo de seu pai” (FREUD, 1910a/1995, p.
45). Portanto, devemos destacar que a fobia de Hans assumiu uma expressão
63
A transcrição da consulta de Hans com Freud já foi exposta no primeiro capítulo. Ver página 45.
64
A partir de uma releitura atenta do caso, constatamos que não havia nenhuma indicação que
possa vir a justificar a interpretação edipiana para a fobia de Hans. Ou sejam o colorido edipiano
para as formações discursivas da criança era sempre fornecido por Freud ou por seu pai, mas
nunca pelo menino.
175
ser punido por causa do desejo de infligir-lhe mal; ao mesmo tempo, encontrava-
mesma figura paterna. Com efeito, alguns extratos clínicos vêm a confirmar a
Por exemplo, dois dias depois da consulta, quando o pai se levanta da mesa para ir
trabalhar, Hans lhe implora: “Papai, não se afaste de mim nesse trote!” (FREUD,
1910a/1995, p. 47). Do mesmo modo, após a cena na qual o pai lhe assegura não
estar aborrecido por causa de sua afeição à mãe, o menino retruca: “Nem todos os
por vários dias, ao brincar de ser ele próprio um cavalo, Hans vinha correndo até o
pai, mordendo-o. Desta maneira, Freud (1910a/1995) ressalta que este fato
65
A descrição desta conversa também já foi exposta no primeiro capítulo. Ver páginas 45-46.
176
“Fui com Hans até a frente da casa, à tarde. Ao passar algum cavalo eu lhe
perguntava se ele via ‘o preto na boca do animal’; ele sempre dizia que ‘não’.
Perguntei-lhe com que se parecia de fato esse preto e ele respondeu que parecia
com um ferro preto. Portanto, não se confirmou a minha primeira idéia de que de
fato era a correia de couro que faz parte dos arreios nos cavalos de tração.
Indaguei-lhe se ‘a coisa preta’ lhe lembrava um bigode, e ele disse: ‘Só pela cor’.
De modo que ainda não sei o que realmente vem a ser” (FREUD, 1910a/1995, p.
54).
reportava o estranho objeto preto e Hans afirma que ele se parece com um
focinho. Mais uma vez, sem sucesso, o pai faz aludir o objeto em questão a um
bigode e, dois dias depois, o menino reage a tais observações da seguinte forma:
“Nesta manhã, Hans veio ver-me, enquanto eu me lavava e estava nu até a cintura.
Hans: ‘Papai, você é lindo! Você é tão branco’.
Eu: ‘Sim. Como um cavalo branco’.
Hans: ‘A única coisa preta é o seu bigode’. (continuando:) ‘Ou talvez seja um
focinho preto?’” (FREUD, 1910a/1995, pp. 54-55, grifo do autor).
suas fantasmatizações.
177
com o preto ao redor da boca, fazendo com que, a partir deste momento, o objeto
Freud; mas também, após estas fantasias edipianas terem sido instauradas na
anacronismo fantasmático presente, até então, em seu discurso. Com base nestes
pressupostos, consideramos que, para além das controvérsias que giram em torno
Hans, pois funcionaram como uma fonte de estimulação constante para o trabalho
elaboração psíquica dos fantasmas vazios. Para tal, devemos trazer para o domínio
178
da atividade fantasmática.
leitura edipiana para a fantasia do cavalo com o objeto preto ao redor da boca,
Didier não deve ter deixado de vivenciar o mesmo afeto face à fantasmatização
enigmático. Deste modo, ao abrir espaço para que o paciente se defronte com algo
ele possa ascender a uma compreensão de tal experiência, o psicanalista pode ter
66
Ver terceira seção do capítulo precedente.
67
Convém lembrar novamente que, no extrato clínico de Didier, não vislumbramos exatamente
aquilo que designamos de fantasias vazias, mas um discurso no qual se ausentavam as produções
devaneativas. No entanto, este caso clínico está nos servindo como exemplo na medida em que
demonstra, tal como o caso do Pequeno Hans, a função desempenhada pelo enigma para a
produção de um cenário fantasístico narrativo.
179
modo que o sujeito em análise possa se engajar numa problematização do que lhe
(FREUD, 1910a/1995), tal possibilidade pode ser evidenciada em sua fala irônica,
conversa com Deus? Parece que já sabe de tudo, de antemão!” (p. 45).
68
Conforme a discussão do capítulo anterior.
69
Ver citação de Pinheiro (1995) nas páginas 120-121.
180
criar uma realidade fantasmática própria, onde se faz ressoar suas formações
“A produção da fantasia, cerne do que institui a realidade psíquica, tem sua origem
no impulso desejante, ou seja, o desejo deve ser entendido como fonte da fantasia,
e é somente a partir da construção da fantasia que se institui o desejo como busca.
(...) Nessa configuração, a importância dada ao caráter impulsivo [do desejo]
confere relevo ao próprio ato de criação da fantasia, passando a ser valorizado
como possibilidade de produzir uma multiplicidade de modos de investimento, em
permanente devir” (HERZOG, 2003, p. 38).
Nesta medida, ao possibilitar o advento do desejo onde ele, até então, não se
fazia sentir, uma nova realidade fantasística é construída pelo sujeito em análise.
alcançar uma verdade própria ao sujeito, para produzi-la a partir de seu discurso
anestesiado. Claro está que esta nova cena fantasmática pode assumir um colorido
edipiano, tal como foi demonstrado a respeito do caso de Hans; mas também, em
infinitos sentidos que podem adquirir estes cenários narrativos. Com base nestes
pressupostos, o espaço analítico passa a ser visto como um lugar de criação, onde
discursiva.
Por fim, vale assinalar que, com esta discussão, não pretendemos atribuir
que muitas outras artimanhas analíticas possam ser eficazes, desde que cumpram
181
seu papel de trazer, para a cena clínica, uma variável enigmática que, assim, seja
fantasmática.
182
Considerações finais
interpretação serviu para demonstrar que a psicanálise não deve se constituir como
um saber acabado. Com efeito, as fantasias vazias são por nós vistas como um dos
descubra outros modos de manifestação dos processos psíquicos, para além dos
muitos que já foram estudados pelo pensamento freudiano. Ao agir desta maneira,
estas indissociáveis dos impasses com os quais nos defrontamos em nossa prática.
recalque não responderia pela totalidade dos fenômenos psíquicos manifestos nas
pesquisa. Vale apenas ressaltar que não pretendemos, com este estudo, esgotar o
tema das fantasias vazias, de forma que todas as conclusões por nós circunscritas
futuras discussões.
184
Referências bibliográficas
vol. 12.
Paris, P.U.F.
Minuit.
Rocco.
Martins Fontes.
Zahar Ed.
Fontes.
Revinter.
190
fantasia”, in Percurso de Lacan: uma introdução. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.
Perspectiva.
Escuta.
Escuta.
59-78.
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