Você está na página 1de 65

Cabrera, Julio e Alves, Rafael

Cartilha de Filósofos da América Latina :Pensamento desde América Latina e


Filósofos latino-americanos - 1a ed. - Brasília :FIBRAL, 2013.

65 p. ; 29x21 cm. - (FIBRAL)

ISBN 978-85-916170-0-5

Capa e editoração virtual: Léo Pimentel


Interior: Rafael Alves

Correção: Julio Cabrera

2013, textos de Julio Cabrera e Rafael Alves


2013, edição do FIBRAL.

http://fibral.blogspot.com
ÍNDICE

Introdução ...p. 05

Antiguidade: Pensamento indígena ...p. 10

Pensadores do período colonial (Séculos XVI a XVIII) ...p. 18

Pensadores do século XIX ...p. 29

Passagem do século XIX para o XX ...p. 34

Século XX – Primeira metade ...p. 40

Século XX – Segunda metade ...p. 49

Referências bibliográficas ...p. 63


INTRODUÇÃO

Oferecemos ao leitor brasileiro uma relação comentada de pensadores latino-


americanos, pouco ou nada conhecidos, por estarem quase sistematicamente excluídos
ou ignorados nos currículos de filosofia do Brasil, exclusivamente centrados em autores
europeus. A principal fonte de consulta foi o livro do espanhol Carlos Beorlegui,
Historia Del Pensamiento Filosófico Latino-americano (Universidad Del Deusto,
Bilbao, 2006), mas outras fontes foram consultadas, segundo consta na lista final de
referências.

Antes de passar para a relação de pensadores latino-americanos, alguns


esclarecimentos preliminares. O primeiro concerne à própria denominação “América
Latina”, que provém de uma reordenação do mundo colonial moderno (Cfr. Mignolo
Walter. La Idea de América Latina, capítulo 2). Melhor seria utilizar a denominação
“Ibero-americano”. Entretanto, nesta cartilha manteremos a expressão “latino-
americano” por ser um termo mais utilizado nas discussões sobre a temática.

Os outros esclarecimentos têm a ver com a noção mesma de “filosofia”.


FILOSOFIA

Já desde os primórdios do pensamento filosófico em América Latina, aparecem


dois tipos de reflexão, diferenciados, porém vinculados:

(a) O pensamento acadêmico das instituições de ensino, baseado


fundamentalmente na exposição do pensamento europeu dominante, a Escolástica, o
Aristotelismo, mais adiante o cartesianismo, depois o positivismo, a fenomenologia e
atualmente todas as correntes.

(b) O pensamento da emancipação, surgido não apenas dos livros, mas da


própria situação que estava sendo vivida pelos países latino-americanos: chegada dos
europeus, choque de culturas, colonização, conquistas, escravidão, resistências,
submissão de culturas a outras, etc, situação de dependência e exploração que atravessa
os tempos e chega até os dias de hoje.

O primeiro tipo de pensamento aceita a situação de colonização como um fato e


simplesmente tenta implantar e desenvolver o pensamento filosófico europeu tentando
inserir-se e destacar-se dentro dele; o segundo tipo de pensamento não aceita a situação,
desenvolve resistências e pensa a emancipação. Estas duas formas de filosofar se
mantêm até os dias de hoje, embora mais vinculados, já que a enorme maioria dos
filósofos que pensam na emancipação e tentam superar a condição de dependência, são
também catedráticos profissionais da filosofia e ensinam filosofia hegemônica.

Os pensadores aqui relacionados foram escolhidos pelo fato deles – escrevendo


sobre ética, lógica, estética, política ou metafísica – pertencerem ao segundo tipo de
reflexão filosófica, por refletirem sobre a situação de dependência e as condições da
emancipação, e também sobre as condições e possibilidades de um filosofar desde
América Latina. Não teria muito interesse elaborar uma listagem de profissionais
universitários latino-americanos especializados em pensamentos europeus (em filosofia
grega ou em Nietzsche ou Wittgenstein), por mais meritórios que sejam estes trabalhos.
6

O pensamento latino-americano terá que ser aquele que surja da circunstância latino-
Página

americana, mesmo que se utilize de pensamentos europeus para formular seus projetos.
Nesta relação, parte-se da convicção de não haverem filosofias universais não
situadas; o que hoje consideramos como sendo “problemas filosóficos universais”
constitui, na verdade, uma universalidade pensada desde Europa, e não algo universal
em sentido absoluto. Nesse sentido, não se considera aqui que existam “problemas
universais da filosofia” que comporiam um conjunto duro e objetivo de problemas, mas
que os pensamentos universais são sempre pensados desde algum lugar. O fato de hoje
considerar-se o universal como idêntico ao pensamento europeu, é o resultado de uma
ação política específica e não algo “natural”.

É claro que não existe uma lógica europeia ou uma lógica latino-
americana; existe, simplesmente, lógica. Mas um pensador uruguaio de início do século
XX, Carlos Vaz Ferreira, (que está presente na relação de autores), escreveu um livro de
lógica chamado “Lógica Viva”, uma apropriação originalíssima do tema das falácias
que um europeu dificilmente escreveria. Esse livro não é sobre “lógica uruguaia”, mas
simplesmente um livro de lógica escrito desde o Uruguai.

Muitas pessoas podem estar aguardando que os filósofos latino-americanos


apresentem teorias do conhecimento que possam competir com a teoria de Kant, teorias
éticas que possam confrontar-se com Spinoza ou Habermas, ou ontologias que possam
comparar-se com Heidegger. Bom, não existem tais teorias na história do pensamento
latino-americano, de maneira que será inútil esperá-las dos pensadores desta lista. Pois a
própria noção de “filosofia” tem que ser reformulada quando feita desde América
Latina, em lugar de adotar sem crítica a visão predominante e pensar que estamos
obrigados, para valer como filósofos, a apresentar “contribuições” à filosofia europeia.

Dada a sua inicial situação de dependência e de saber imposto, o problema da


emancipação plena pode ser um problema filosófico – teórico-prático – que tenha
prioridade sobre, por exemplo, o estudo da situação atual do pensamento kantiano na
Ética, ou o atual desenvolvimento das lógicas não clássicas, embora estas questões
possam continuar interessando. Filosofar desde América Latina nunca foi apenas pura
contemplação; praticamente a totalidade dos pensadores mencionados a seguir não
apenas escreveram obras filosóficas teóricas, mas foram também jornalistas, ou
desempenharam atividades políticas, desde a diplomacia até a militância direta; ao
escreverem seus textos, não procuravam uma “verdade” puramente objetiva que não
7
Página

estivesse vinculada com as análises da dependência e as lutas pela emancipação.


Contra uma “objeção” muito corriqueira – de que seria uma contradição pensar
contra o pensamento europeu utilizando pensamento europeu – trata-se de entender que
a filosofia europeia continuará sendo estudada; apenas o euro-centrismo e o
exclusivismo europeu será rejeitado, e a nossa própria relação com Europa deverá
mudar.

De todas maneiras, devemos trabalhar para que, num futuro próximo, não
tenhamos mais que aludir à nacionalidade dos filósofos. Infelizmente, ainda não chegou
esse momento, pois somente quando somos excluídos é que nos lembramos das nossas
origens. Enquanto vivermos numa comunidade que estuda a questão da vaidade dos
homens e conheça apenas os escritos de Hume sobre essa questão mas não tenha ouvido
falar de Matias Aires, teremos que continuar falando em nacionalidades.

ACERCA DA PRESENTE SELEÇÃO

Nesta cartilha introdutória, tentamos relacionar alguns dos marcos principais do


pensamento desde América Latina, começando com rudimentos do pensamento
indígena – onde ainda não existe a rigor a categoria de autor – focando depois os
pensamentos oriundos do choque cultural com o invasor europeu no período colonial,
de 1500 a 1820, aproximadamente; logo, o período de reação contra esse passado – de
1820 a 1940 aproximadamente - e finalmente o período contemporâneo.

Mas aqui tem que ter uma cautela; as “reações” contra a Escolástica do primeiro
período são constituídas, em América Latina, seguindo pautas europeias: por exemplo,
pela “modernidade” cartesiana, pelo “Iluminismo” alemão e escocês, pelo positivismo,
pela atual crítica contra a Metafísica, etc. Muitos destes referenciais europeus servem de
apoio teórico para as “independências formais” dos países latino-americanos, quase
todas acontecidas nas primeiras duas décadas do século XIX. Mas numa história do
pensamento filosófico desde América Latina, ainda deveriam ser descobertas as
8

genuínas reações contra a hegemonia do pensamento europeu colonizador, além das


Página

reações internas a esse pensamento.


Essas genuínas reações desde América Latina acontecem somente quase um
século depois das independências formais, na passagem do século XIX para o XX, com
o pensamento americanista (José Marti, de Cuba, José Enrique Rodó do Uruguai, José
Carlos Mariátegui, do Perú), logo depois com o pensamento da emancipação (Leopoldo
Zea, do México, Augusto Salazar Bondy, do Perú) e posteriormente na filosofia da
libertação (Enrique Dussel, Juan Carlos Scannonne, Horacio Cerutti Gulberg).

No Brasil, o pensamento da emancipação se da principalmente através das


ciências sociais: pela Antropologia (Darcy Ribeiro, Eduardo Viveiros de Castro), a
Sociologia (Gilberto Freyre), a história (Sérgio Buarque de Holanda), a Educação
(Paulo Freire), a teologia (Leonardo Boff) ou a literatura (Oswald de Andrade), mais do
que pela filosofia.

Uma última observação: embora os títulos das obras escritas em espanhol


estejam traduzidos para o português, para melhor entendimento do leitor brasileiro,
quase nenhuma delas foi nunca traduzida no Brasil. Além do mais, as obras latino-
americanas mencionadas, com raras exceções, nunca foram reeditadas, apenas sendo
encontradas em sebos em péssimo estado. Algumas exceções são a publicação em
português do clássico argentino do século XIX, “Facundo” de Domingo Sarmiento; as
obras do positivista argentino José Ingenieros, alguns livros do pensador mexicano
Leopoldo Zea, os de Enrique Dussel e algumas poucas mais. O resto permanece
desconhecido. Isto já é um fato político importante, indica para uma estratégia editorial
e uma lógica da visualização (e não visualização) da produção filosófica.

9
Página
PENSAMENTO INDÍGENA

Pensamento americano milenar

A inclusão das culturas indígenas na história do pensamento latino-americano


tem o efeito imediato de derrubar o conhecido argumento das nossas tradições serem
“recentes”, ao lado das tradições milenares da China, da Índia ou da Grécia. Isto decorre
de estabelecermos o início do pensamento latino-americano no século XIX ou inclusive
no XX, como querem as ideologias oficiais, que identificam filosofia com
“modernidade” ou com “filosofia profissional”; mas algumas culturas indígenas são
muito antigas; a suposta “brevidade” das tradições americanas não é, pois, um dado
“objetivo” ou cronológico, mas algo politicamente construído.

A história da filosofia não começa, desde América Latina, com os pré-


socráticos; é a cultura do dominador que começa com eles. O começo do filosofar desde
América Latina é o pensamento indígena milenar, a invasão, exclusão e destruição das
suas culturas e a imposição de uma cultura que começa com os pré-socráticos; os pré-
socráticos não fazem parte da circunstância latino-americana, a não ser como objetos
culturais inicialmente impostos pela força, e, hoje, junto com o resto do acervo europeu,
como objetos de interesse intelectual e eventual aproveitamento para um pensamento da
emancipação.

Existem três atitudes a respeito das culturas indígenas: (a) Pretender voltar a
essas culturas sem as mediações atuais; trata-se de uma postura romântica insustentável.
(b) Esquecer totalmente o passado indígena como culturas perdedoras e ultrapassadas;
esta parece uma postura conformista e superficial; (c) Estudar os pensamentos indígenas
em interação com nossa circunstância atual, tentando implantar uma relação de
igualdade e intercâmbio entre ambas (precisamente o que não houve no século XVI e
seguintes, e possivelmente não há até hoje). Esta terceira parece a atitude mais
adequada.
10
Página
Problemas metodológicos no estudo dos pensamentos indígenas.

Em primeiro lugar, não há algo como “o pensamento indígena”, mas


pensamentos indígenas em plural, muito diversificados em comunidades diferenciadas,
com culturas e línguas diversas. (O problema da DIVERSIDADE). Em segundo lugar, a
persistente tendência – mesmo nos indigenistas de mente aberta, como o mexicano
Miguel León Portilla - a definir “filosofia” da maneira ocidental europeia – como
indagação racional, teórica, argumentativa, objetiva - e ver os pensamentos indígenas
como não sendo “filosofia” em absoluto ou como sendo “quase filosofia”, no sentido de
“quase racional”, “não puramente mítica”, etc. (O problema do REDUCIONISMO). Em
terceiro lugar, as tremendas dificuldades no estudo das fontes de pensamentos que
foram e são ainda ignorados ou marginalizados, e que têm que ser desenterrados, até o
ponto de nunca termos a certeza de estarmos realmente estudando pensamentos
indígenas, e não alguma das suas muitas deturpações. (O problema do
ENTERRAMENTO). Quarto, o risco de, mesmo conseguindo dados razoavelmente
fidedignos sobre pensamentos indígenas, que eles representem para nós algo de
totalmente outro, dificilmente compreensível, ou talvez definitivamente inescrutável. (O
problema da ININTELIGIBILIDADE).

Por estes motivos, tudo o que se dizer sobre pensamento indígena será hoje
unilateral, incompleto e em muitos pontos incompreensível. Nestas condições precárias,
os pensamentos indígenas terão que entrar na perspectiva latino-americana aceitando-se
estas opacidades insuperáveis; jamais teremos acesso a esse pensamento tal como foi
existido pelos indígenas, mas já numa interação complexa com as culturas do
dominador e, no caso do Brasil, também com a cultura africana, que entra na
circunstância latino-americana num outro viés.

A abertura ao pensamento indígena não significa considerar o universo indígena


como uma espécie de “paraíso” que teria sido maculado pela invasão espanhola e
portuguesa; trata-se de sistemas simbólicos a serem considerados e estudados, mas não
de “milagres” a serem idealizados (no viés de um Montaigne ou, sobretudo, de um
Rousseau, visão criticada por Sérgio Buarque de Holanda em seu livro “Visão do
11

Paraíso”, de 1959) ou adotados atualmente sem mediações como sendo melhores que
Página

outros sistemas simbólicos.


Pensamentos indígenas

Existe uma boa dose de arbitrariedade na escolha oficial das “principais”


culturas indígenas como sendo as mesoamericanas (nahuas, maias) e as andinas (incas);
critérios como, por exemplo, as construções de pedra, o sedentarismo, ou mesmo a
escrita, não são absolutos, e muitas culturas indígenas consideradas “menores” podem
trazer elementos muito importantes para entender pensamento indígena. A presente
cartilha, pelas suas características introdutórias, limita-se a essa escolha padrão, com o
acréscimo de algumas culturas indígenas brasileiras (não tratadas no livro de Beorlegui
que em parte seguimos), mas deixando abertura para o estudo futuro de muitos
pensamentos indígenas considerados “de menor importância”.

Nahuas

Os nahuas são grupos de índios da América Central (mesoamericanas) que


falam a língua náhuatl, sendo os principais os aztecas ou mexicas. As primeiras
comunidades nahuas remontam a 2000 anos a.C., as mais notáveis sendo de
aproximadamente 1200 anos a.C. (cultura olmeca), do século XV a.C. (toltecas) e
finalmente os aztecas, que floresceram a partir do século XIV d.C, com a fundação de
Tenochtitlán (1325), nome que significa “Lugar das tunas sobre as pedras”. Os aztecas
foram submetidos por Hernan Cortez em 1521. A fonte principal de estudo da cultura
nahua são os escritos de Frei Bernardino de Sahagún (1499-1590), um missionário
franciscano que se ocupou com historiografia e etnografia mexicana.

1000 anos antes da invasão espanhola, predominava a cosmovisão tolteca, cujo


centro era Quetzalcóatl, a serpente emplumada, uma das principais deidades do panteão
nahua. Quetzalcoatl representa as energias telúricas que ascendem, a abundância da
vegetação, o alimento físico e espiritual para o povo. Durante a conquista, os indígenas
acreditaram que Hernán Cortez era Quetzalcóatl e essa parece ter sido uma das razões
12

pela qual os espanhóis dominaram tão facilmente estes povos. Estes indígenas tinham
Página

uma ideia do Ometéotl, que era um princípio dual, deidade que se inventa a si mesma e
não precisa nenhum outro fundamento ontológico; nele se reúnem os opostos e o caos,
mas também os princípios ordenadores; espírito/matéria, branco/preto, vida/morte,
masculino/feminino, criação/destruição. Teoltl é uma força vivificante e destruidora,
incansável, uma espécie de devir instável que não é agentiva, pessoal ou intencional;
Ela não é, ela devém, transforma-se e transforma; diferentemente da cultura ocidental,
que considera o essencial como imóvel, os nahuas consideram o essencial como em
perpétuo movimento. Segundo os nahuas, o mundo é um lugar muito perigoso para
humanos; o equilíbrio é facilmente perdido; a pergunta fundamental é: “Como podem
os humanos caminhar e florescer na terra?”.

Os sacrifícios humanos tinham a ver com tentativas de estabelecer certos


equilíbrios cósmicos e compensar os deuses. Há um forte sentimento de acabamento, do
risco de acabar de maneiras calamitosas. Muitas das práticas indígenas são maneiras de
demorar ou evitar essas calamidades, de maneira de estabelecer um elo entre o destino
do mundo e as ações dos homens. Uma preocupação básica é se todos os esforços
humanos conferem algum sentido à vida, ou se tudo é absurdo e não merece a pena,
dado que morremos. Três preocupações básicas dos nahuas: o destino humano, a
linguagem adequada aos deuses e a questão da morte e o além.

Os “tlamatinime” são os sábios nahuas, “aqueles que conhecem as coisas por


experiência”, capazes de enfrentar os problemas de acabamento e falta de sentido e
tentar orientar as ações para seu tratamento ou resolução em ações e atitudes. Algumas
das funções dos tlamatinime são: tornar sábios os rostos alheios, por um espelho diante
dos outros, humanizar o querer dos homens, confortar os corações. Bernardino de
Sahagun registrou uma interessante e intensa polêmica entre os sábios nahuas e os
frades conquistadores, se queixando aqueles de ter sua cultura devastada e pedindo
morrer uma vez que seus deuses foram mortos.

Maias

Os Maias são também mesoamericanos, ocupando os atuais territórios de


13

Honduras e El Salvador. Muito antigas; nascem em torno de 1000 a.C, sendo seu
Página

período clássico entre 300 e 900 d.C. Continuaram ao longo dos séculos, mas já não
eram florescentes na época da invasão espanhola. Para este povo, as forças da natureza e
as diversas vicissitudes da vida, esforçada e difícil, são vistas como ações e lutas entre
os deuses; a própria passagem do tempo, seu efeito demolidor, é também endeusada. Os
maias desenvolveram um pensamento sofisticado e complexo sobre a temporalidade;
organizaram o espaço da vida em 3 andares: deuses, mundo e homens. O próprio
conflito interior humano, entre seus desejos animais e sua inteligência superior, é vista
como uma luta entre forças favoráveis e desfavoráveis (não como bem ou mal,
conceitos ocidentais); a atitude dos maias diante dessas forças não é de amor ou
devoção, mas de reverência e temor, de incerteza e cautela. Aqui também aparece a
deidade da serpente emplumada, mas com outros nomes; como nos astecas e incas, o
Sol aparece como um deus (pela sua relação com o tempo, a luz, a vida, os ciclos); a
matemática maia, a sua medição do tempo e seus calendários, estão a serviço da lida
com a vida, do ameaçador e dos deuses protetores.

Os maias não falaram uma única língua, chegaram a ter até 28 línguas diferentes,
a diferença das culturas nahuas, que estiveram fortemente ligadas a uma única língua, a
nahuatl. Mas houve na cultura maia mais textos escritos importantes, que atravessaram
os tempos, em parte transmitidos oralmente, depois escritos e desaparecidos, e tornados
a escrever depois da invasão espanhola, alguns deles transcritos e protegidos pelos
próprios frades. O mais importante texto maia é o Popol Vuh (Livro do Conselho, ou da
Comunidade); foi primeiro desenhado, pintado, transmitido oralmente, reescrito no
século XVI, por um indígena, chegando às mãos de Francisco Ximenez, um padre da
Guatemala, no século XVII ou XVIII. O livro está perpassado por influências cristãs
frutos da invasão.

O Popol Vuh está escrito em língua quiché, e é um livro sobre o nascimento, do


mundo e dos humanos; contam-se 3 tentativas de criar o humano: de barro, de madeira e
de milho (maíz). Os deuses dispensam as duas primeiras tentativas porque esses seres
criados não têm memória nem capacidade de adorá-los e servi-los. “Nossa adoração é
imperfeita se vocês não nos invocais” (Popol Vuh, 3). Também temos os livros do
Chilam Balam, de tom profético, escrito muito tempo depois da invasão, durante o
século XVIII; as suas profecias são retrospectivas e alguns intérpretes consideram que
14

previram a invasão europeia; narram também um mito originário onde os deuses do


inframundo – que aparecem no Popol Vuh – dominavam e tinham o universo cativo; no
Página

viés apocalíptico típico de muitas culturas indígenas, este escrito relata a destruição e
renascimento dos níveis do inframundo, o desmoronamento do céu e o afundamento da
terra.

Incas

Os Incas são comunidades sul-americanas; viveram na região da Cordilheira dos


Andes nos atuais Peru, Chile, Bolívia, Argentina e Equador. No século XIII fundaram a
cidade sagrada de Cusco. Falavam a língua quechua. Foram submetidos por Francisco
Pizarro. Não conheceram a escritura, mas construíram os Kipú, espécies de contas
entrelaçadas que constituem uma espécie de registro. Não houve apenas incas na região
andina, de maneira que deveria falar-se de andinos incas e não incas; mas incas e não
incas partilham numerosos temas sobre o mundo, o humano e o não humano.

Tawatinsuyu era o nome da região inca; significa “as quatro partes juntas,
unificadas”. A realidade inca compõe-se de deus (Wiracocha), mundo (Pacha) e homem
(Runa). Os “amautas” eram os sábios incas, ou poetas filósofos, ou sacerdotes. Temas
muito semelhantes aos nahuas aparecem nas filosofias andinas: consideram o cosmos e
tudo o que há nele como vivificado por uma força vital única; tudo é dinâmico, em
fluxo e em constante circulação. Esta força assume a forma de dualidades
complementares, não de dualismos antagônicos de tipo ocidental, pois trata-se de forças
que se opõem mas não se excluem nem destroem. O cosmos consiste na contínua
alternância destas dualidades; às vezes, esta complementariedade rompe-se provocando
um desequilíbrio, uma desintegração cataclísmica (pachacuti), marcando etapas; o
cosmos tem passado já por quatro etapas, ou “soles”. Mas o cosmos andino é aberto, no
sentido de sujeito a ações humanas transformadoras, que contribuem a manter o mundo
funcionando; mesmo os deuses estão em constante mudança, e a participação humana é
absolutamente necessária; existe uma sabedoria em apreender a interagir com o mundo
ao qual se pertence.
15
Página
Indígenas brasileiros

Existe ainda um elevado número de tribos indígenas no Brasil, aproximadamente


128 comunidades espalhadas na Amazônia, Pará, Roraima, Rondônia, Mato Grosso,
Acre, Tocantins, Goiás, Maranhão, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa
Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro,Ceará, Alagoas, Amapá, Minas Gerais e Bahia. Há
outros censos que registram em torno de 200 tribos com quase 200 línguas diferentes.
As tribos brasileiras remetem a 4 troncos linguísticos fundamentais: tupi (litoral),
macro-jê (interior), karib e aruak. A denominação “tapuia” não indicava uma etnia, mas
um termo depreciativo, como “bárbaro”, que o grupo tupi utilizava para denominar
todas as outras tribos (o que prova que a discriminação e o etnocentrismo também
vigoravam entre indígenas). Os invasores espanhóis contribuíram para esta
simplificação entre tupis e tapuias, considerados rebeldes à evangelização e ao
“processo civilizatório”.

Afirma-se que não houve no Brasil grandes culturas indígenas comparáveis às


incas, maias e astecas, mas isto também é relativo a critérios controversos, como o
considerar “superiores” as culturas urbanas e edificadoras, portanto, sedentárias. Não
obstante, o antropólogo brasileiro Eduardo Viveiros de Castro escreve, no início de seu
texto “Xamanismo e sacrifício”, falando das práticas sacrificiais nos Araweté: “Eles não
diferem, enquanto a isso, da maioria dos povos das terras baixas sul-americanas, onde
se encontram aqui ou ali práticas que poderiam talvez ser ditas de „tipo sacrificial‟,
mas que jamais atingem a elaboração sociológica, a formalização ritual e a densidade
cosmológica alcançada, por exemplo, nos sistemas religiosos das culturas andinas ou
mesoamericanas” (Em: A inconstância da alma selvagem, p. 459).

Nas populações indígenas brasileiras, os sábios são os pajés (ou xamãs), que
poderiam ser postos ao lado dos tlamatinime nahuas, dos amautas incas e dos
philosophoi gregos; cada cultura possui algum tipo de sábio que lida com o
desconhecido que tem que se esclarecer, algum tipo de sacerdote, de líder espiritual
capaz de fornecer um domínio sobre as forças ameaçadoras, ou de colocar-se em
perspectivas diversas, ou de ver além das aparências, etc. Segundo Viveiros de Castro,
16

as culturas indígenas brasileiras estão caracterizadas por certa fragmentação, por uma
Página

rejeição de toda acumulação, de qualquer tentativa de centralização (na forma de um


Estado, por exemplo); em certa forma, cada humano, cada ser vivo, cada coisa, é um
Estado, uma perspectiva sobre o mundo; não há ponto privilegiado, mas uma
horizontalidade dispersa, uma destruição cerimonial do excedente a través da guerra
perpétua, da vitória sobre o inimigo não pela destruição mas pela incorporação de sua
perspectiva, nunca uma eliminação total, mas uma deglutição, uma assimilação ritual. A
metafísica tupinambá, por exemplo, é uma metafísica perspectiva, caleidoscópica,
múltipla e descentrada; não há nenhuma “fusão de horizontes”, nenhuma compreensão
universal das coisas, nenhuma verdade objetiva e única.

Para o ocidental, conhecer é despojar de subjetividade, des-subjetivizar, ver o


objeto nu como ele seria em si mesmo; é des-animar o objeto, tirar-lhe qualquer alma,
des-encantar. Para o indígena tupinambá, é o contrário, conhecer é atribuir uma
intencionalidade, uma perspectiva, é animar; algo impessoal lhe seria totalmente
ininteligível. Em certa forma, para eles tudo é humano, os animais já foram humanos,
ou podem ser alternadamente humanos e animais; e é por isso que tudo é perigoso, por
ser humano, por ter uma intencionalidade, em geral maligna; há um fundo comum que é
humano (a diferença do ocidental que pensa a humanidade como um desdobramento de
um fundo animal). Este perspectivismo fragmentado está intimamente ligado com os
rituais antropofágicos, como assimilação ritual de outras perspectivas, desvinculada da
função nutritiva. Morrer devorado era, por sua vez, uma morte digna e personalizada
para o tupinambá; não apenas devorar, mas ser devorado, acolhido pelo humano; morrer
“naturalmente” – de uma peste, por exemplo - interromperia a cadeia simbólica das
vinganças, e seria uma morte sem qualquer sentido.

Mapuches

Os Mapuches (que significa “gente da terra”) são um povo indígena da região


centro-sul do Chile e sudoeste da Argentina, também chamados araucanos, nome
possivelmente colocado pelos espanhóis ou pelos incas. Com os sucessivos fracassos de
submetê-los, os espanhóis se viram obrigados, no ano 1641, a firmar com eles o Tratado
17

de Quilín, declarando as terras austrais ao rio Bio-Bío “território autônomo Mapuche".


Página

Essa persistente resistência, que sacrificou três quartos da sua população, fez com que,
dentre todos os grupos indígenas de América Latina, os Mapuches fossem os únicos a
conseguir autonomia territorial frente ao império espanhol. Após a “independência”
chilena em 1818, embora o Estado chileno formalmente ratificasse o “território
autônomo Mapuche”, a existência deste povo era um obstáculo para o projeto de
“modernização” do país. A partir de ali, diversas políticas nacionais foram reduzindo
gradativamente os territórios mapuches, ocasionado a morte de milhares de indígenas e
o despojo de grande parte de seus territórios. A resistência mapuche persiste ainda hoje,
e é por isso que o estudo deste povo e sua cultura merece destaque especial.

Pensamento indígena hoje

Alguns dos pontos mais promissores para uma possível interação com as
culturas indígenas, através da mediação europeia, podem ser os seguintes: (a) A ideia de
um pensar não conceitual, ou conceitual através de imagens e narrativas, pensar fluído,
temporal, poético; (b) A ideia de um pensar como sobrevivência diante dos rigores e
agruras da natureza e da sociedade humana e animal; admiração, curiosidade ou dúvida
seriam tributárias de um sentimento mais básico, sem as transcendências puramente
teóricas e pretensamente “desinteressadas” do pensamento ocidental; (c) Aprender a ver
os próprios mitos sacrificiais das nossas culturas, tudo o que é sacrificado para a
“civilização” moderna continuar a se desenvolver; (d) Visualizar a espantosa
persistência da religiosidade e o sentimento do sagrado nos povos através das épocas até
hoje, o que sugere um vínculo profundo com os povos originários; (e) Visualizar o
sentido atual das resistências indígenas contra um sistema de organização da vida
humana que está levando o planeta a uma situação de inevitável destruição.
18
Página
PENSADORES DO PERÍODO COLONIAL (Séculos XVI a XVIII)

Observação preliminar: A visão americana da filosofia é aqui concebida como


um evento histórico-existencial, não como mero fato geográfico ou nacional. Isto
significa que quando europeus assumem, mesmo que de maneira limitada, o ponto de
vista americano, por exemplo, na questão da resistência indígena, não interessa que,
geograficamente, esses pensadores tenham nascido na Europa. Para os efeitos da relação
desta cartilha, pensadores do período colonial nascidos em Portugal ou na Espanha que
pensaram o problema americano, fazem parte do pensamento americano em sentido
histórico-existencial.

Fray Antón de Montesinos (1482, local desconhecido –


1540, Venezuela). Frei dominicano espanhol; chegou em
1510 à Espanhola (atual República Dominicana) junto com a
primeira comunidade de sua ordem. Em 1511 Montesinos fez
o primeiro sermão de denúncia dos abusos e crimes contra os
índios, diante dos colonos espanhóis, incluindo o governador
Diego Colombo, filho de Cristovam Colombo. Bartolomé de
Las Casas foi um dos ouvintes deste famoso sermão, ficando
profundamente impressionado. Montesinos foi acusado pelos
colonos e pelo próprio Diego Colón de professar uma
“doutrina nova” e colocar em perigo o governo espanhol nas
Índias. Acredita-se que foi envenenado por colonos na
Venezuela.
19
Página
Francisco de Vitoria (1483, Burgos – 1546, Salamanca), foi
um filósofo, teólogo católico e jurista espanhol que lecionou
na Universidade de Salamanca. Foi notável principalmente
por suas contribuições a teoria da “guerra justa”. Tem sido
considerado por alguns acadêmicos como o pai do direito
internacional e fundador da filosofia política global. Foi
educado em Paris no Collège Saint-Jacques e em 1504
tornou-se dominicano. Principais obras: De potestate civili,
1528, Del Homicidio, 1531, De potestate ecclesiae I and II,
1532, De Indis, 1532, De Jure belli Hispanorum in barbaros,
1532, Relectiones Theologicae, 1557, De Indis et De Jure
Belli (1917).

Bartolomé de las Casas (Sevilha, 1484 - Madri, 1566).


Sacerdote dominicano, cronista, teólogo, bispo de Chiapas.
Em 1510 foi ordenado primeiro padre das Américas. Em
1511, ouve um sermão de Antonio de Montesinos contra as
atrocidades contra os índios, mas só em 1514 convence-se da
injustiça das ações espanholas na colônia, começa a pregar
em defesa dos nativos e abdica de seus privilégios. Seus
posicionamentos levaram-no a ser perseguido pelos
colonizadores. Em 1527 começa a escrever a Historia de las
Índias, reportando seu testemunho dos anos da conquista. Em
1550-51, envolve-se num debate na cidade de Valladolid com
Juan Ginés de Sepúlveda, que defendia a tese de que os
indígenas deviam ser pacificados à força. Em 1552,
publica Brevísima relación de la destrucción de las Indias,
relatando as atrocidades cometidas nos primeiros anos da
conquista.
20
Página
Juan Ginés de Sepúlveda (Pozoblanco (Espanha), 1489 -
1573). Bacharel em Artes e Teologia. Membro da Ordem
Dominicana, conhecido por sua fluência em línguas clássicas.
Tradutor de Aristóteles, a passagem da Política onde o autor
discorre sobre a escravidão por natureza exerceria grande
influência em seu pensamento. Foi crítico das reformas
eclesiásticas e da ideia de livre-arbítrio defendida por Erasmo
e Lutero. Considerado o defensor oficial da conquista,
colonização e evangelização dos indígenas da América. Em
1550, participou da famosa Controvérsia de Valladolid com
Bartolomé de Las Casas a questão da humanidade dos
indígenas. Obras principais: De rebus hispanorum gestis ad
Novum Orbem Mexicumque, De justis belli causis apud
índios, Democrates, sive de justi belli causis.

Bernardino de Sahagún (Sahagún, Espanha, 1499 - México,


1590). Foi um frade franciscano que desembarcou na “Nova
Espanha” (México) em 1529, onde estudou por mais de 50
anos a história e cultura astecas, além de contribuir para o
conhecimento da língua nahuatl, sendo por isso considerado
como o primeiro etnógrafo. Sua obra principal é Historia
General de las Cosas de la Nueva España, escrita entre 1540
e 1585, célebre por apresentar a história do choque de
culturas na visão dos indígenas. Ajudou a fundar uma das
primeiras escolas europeias da América, o Colegio Imperial
de Santa Cruz de Tlatelolco, centro de recrutamento de
nativos para estudos do evangelho e lugar de estudo da
língua nahuatl.
21
Página
Manuel da Nóbrega (Sanfins do Douro (Portugal) 1517 –
Rio de Janeiro, 1570) foi um padre jesuíta português, o
primeiro provincial da sociedade de Jesus no Brasil colonial.
Ao lado de José de Anchieta, esteve muito presente no
começo da história do Brasil, participando da fundação de
muitas cidades, como Recife, Salvador, Rio de Janeiro e São
Paulo, e de vários colégios e seminários jesuíticos. Nóbrega
foi contra a escravização dos índios e essa postura gerou
graves confrontos com os habitantes e autoridades da nova
colônia. Principais obras: Cartas do Brasil (1549-70),
Diálogos sobre a Conversão do Gentio (1557), Caso de
Consciência sobre a Liberdade dos Índios (1567) e Tratado
Contra a Antropofagia (1559).

Pedro da Fonseca (Cortiçada, Portugal,1528 - Lisboa,


1599). Filósofo e teólogo jesuíta português, profundo
conhecedor da filosofia de Aristóteles, dedicou-se com afinco
aos c omentários pormenorizados deste filósofo,
especialmente em seus “Comentários à Metafísica de
Aristóteles”, obra que teve mais de 50 reedições. Também
escreveu “Instituições dialéticas”. Mas, como Suarez,
pensava que comentar Aristóteles não era suficiente, que
havia que adaptá-lo aos tempos novos. Também participou
das controvérsias sobre liberdade e graça divina. Em
Coimbra, promoveu a ideia de um Cursus Conimbricencis,
que depois foi realizado pelos jesuítas. Morando em Roma,
participou da elaboração da famosa Ratio Studiorum,
posteriormente adotada pela Companhia de Jesus.
22
Página
Felipe Guaman Poma de Ayala (San Cristóbal de Suntuntu,
1534 – Lima, 1615). Cronista peruano, de ascendência nobre,
autor da narrativa Nueva Crónica y Buen Gobierno, escrita
entre 1600 e 1615, considerada como o primeiro depoimento
da conquista espanhola feita desde a perspectiva de um
indígena. A obra está escrita numa língua mista, de espanhol
e línguas indígenas, ilustrada com desenhos do próprio autor,
na forma de uma carta ao rei da Espanha, Felipe II. O
manuscrito da obra foi perdido durante séculos e somente foi
encontrado em 1908 em Copenhague. O autor elogia as
formas de governo indígenas anteriores à invasão,
considerando-as mais adequadas ao espírito cristão. Junto
com Las Casas, Poma é um dos grandes representantes da
chamada “visão dos vencidos”.

Luis de Molina (Cuenca (Espanha), 1535 – Madri, 1600) foi


jesuíta, teólogo e jurista espanhol. Estudou Direito em
Salamanca e teologia em Coimbra. A doutrina defendida em
sua obra De Concordia é conhecida como molinismo. Nela,
procura conciliar a liberdade humana com a graça divina.
Defende a capacidade do homem, servindo-se de sua razão
natural, de realizar os atos de acordo com a fé cristã, sem
necessidade de revelação divina, Deus intervindo nas ações
humanas pela ciência media, que lhe garante conhecimento
prévio de todas as possíveis ações de cada indivíduo. As
ideias dessa obra geraram uma polêmica com os dominicanos
conhecida como Polêmica de auxiliis. Em De Iustitia et Iure,
Molina nega que a superioridade cultural e civilizacional
fossem justificativas para a dominação de outros povos, por
mais bárbaros que fossem.
23
Página
Francisco Suárez ( Granada, 1548 – Lisboa, 1617) foi um
padre jesuíta, filósofo e teólogo espanhol, tido como um dos
maiores escolásticos. Participou do famoso método da Ratio
Studiorum. Escreveu uma Defesa da fé católica e apostólica
contra os erros da seita anglicana que foi queimada em
público em Inglaterra e França. Participou da disputa de
auxiliis sobre o livre arbítrio e a graça divina, entre
dominicanos e jesuítas, iniciada por Molina. Suas posturas
jurídicas são avançadas, incluindo o direito de gentes de
derrocar o mal governante; criou um sistema filosófico coeso
magistralmente exposto nas célebres Disputações Metafísicas
de 1597. Outras obras: Disputatio ultima de bello (1584),
Quaestiones de iustitia et iure (1585), De homicidio in
defensionem propriae personae (1592), De Legibus tractatus
(1601-1603), De triplice virtute theologica (1621, obra
póstuma).

Antônio Rubio (La Roda, Espanha, 1548 – Espanha, 1615).


Estudou filosofia na Universidade de Alcalá, e, antes de
concluir o curso, entrou na Companhia de Jesus. Viaja ao
México na primeira leva de jesuítas às Américas em 1575. A
partir de então se dedica à docência. Foi grande admirador de
Aristóteles, tornando-se conhecido pelos seus volumosos
comentários a esse autor. Porém, sua maior contribuição à
filosofia se deu em lógica com seu livro “Lógica Mexicana”
de 1605, um livro tão importante que filósofos como
Descartes aprenderam lógica com ele. Escreveu também “De
Physico Auditu”, (1605), e comentários ao “De Ortu et
Interitu Rerum Naturalium”, (1609), ao “De Anima”, (1611),
e ao “De Caelo et Mundo”, (1615).
24
Página
Francisco Sanches (Tuy ou Braga, Espanha, 1550 - França,
1622). Filósofo e médico, judeu sefardita, nasceu na Espanha
mas foi batizado como cristão-novo em Braga (Portugal).
Aos 12 anos, mudou-se para Bordeaux e em seguida foi
estudar medicina em Roma. Em 1575, tornou-se professor de
filosofia e medicina em Toulouse, onde praticou durante 30
anos dedicando-se a investigar em cadáveres. Além de
médico, foi eminente filósofo, crítico declarado do
aristotelismo e da Escolástica, e defensor de um tipo de
ceticismo radical, pelo qual é considerado um precursor de
Hume. Em sua obra mais famosa Que nada se sabe (1581),
afirma que o conhecimento humano é meramente provável,
só alcançando aparências, nunca essências; contra a “dúvida
metódica” de Descartes, declara que os sentidos são o único
que pode nos dar algum tipo de conhecimento seguro.

Antônio Vieira (Lisboa, 1608 – Salvador, 1697). Jesuíta,


filósofo e orador luso-brasileiro. Aos 6 anos faz a sua
primeira viagem ao Brasil. De imediato impressionam seus
extraordinárias dotes de orador e pregador. Em 1661, teve
que enfrentar o Tribunal da Inquisição por causa de algumas
das suas teses. Foi autor de numerosos Sermões, que ele
muitas vezes elaborava de acordo com circunstâncias
específicas, textos notáveis por sua retórica, beleza e
contundência, versando sobre temas como a questão
indígena, a escravidão dos negros, a condição humana,
religião, moral e política. Também merecem destaque suas
obras proféticas, entre as quais a História do Futuro (iniciado
em 1649, mas publicado postumamente em 1718).
25
Página
Sor. Juana Inês de La Cruz (San Miguel Nepantla, México,
1651 – Cidade de México, 1695). Talvez a escritora mais
importante do século XVII, pensadora católica, poetisa e
dramaturga. Possuía um desejo insaciável de compreender
tudo; mesmo num meio adverso, acometeu estudos em
filosofia clássica e medieval, defendendo o direito da mulher
de fazer investigação. Parece ter escolhido a vida religiosa
mais para preservar seu espaço de estudo do que por genuína
vocação; sua cela se converteu em ponto de encontro de
intelectuais e até em lugar de experimentos científicos. Suas
reflexões estão perpassadas pela dúvida no poder dos
sentidos e do intelecto para atingir verdades profundas.
Grande parte da sua obra foi perdida; se conservam sua
Resposta a sor Filotea de la Cruz, sobre críticas que Sor Inés
tinha feito ao sermão do Mandato de Antonio Vieira; e o
poema filosófico Primer Sueño.

Nuno Marques Pereira (Bahia ou Portugal, 1652 - Lisboa,


em torno de 1733). Foi um padre e escritor luso-brasileiro de
cunho moralista. A única produção que nos deixou é uma
obra de moral religiosa, chamado Compêndio narrativo do
peregrino de América, escrito “contra os abusos introduzidos
pela malícia diabólica no Estado do Brasil”. Este livro teve
enorme sucesso editorial no século XVIII; trata-se de um
manual de educação piedosa incluindo narrativas, parábolas e
meditações filosóficas, escrito em forma de diálogo,
destacando a condição dos humanos no mundo como
peregrinos. Em muitos momentos da obra o tom é pessimista
e moralista, mas o escravagismo e anti-semitismo são
justificados usando categorias religiosas.
26
Página
Matias Aires (São Paulo, 1705 – Portugal, 1763) foi filósofo
luso-brasileiro, passando apenas os primeiros 11 anos da sua
vida no Brasil, tendo estudado com os jesuítas. Em 1716
mudou-se com a família para Portugal e nunca mais voltou
para o Brasil. Matias formou-se em direito em Coimbra e
morou um tempo em París. Levou uma vida de estudo e
reclusão. Autor de Reflexões sobre a vaidade dos homens e
Carta sobre a fortuna. A primeira obra teve muito sucesso no
Brasil. Nela, Matias faz uma análise sobre o comportamento
humano que se vê fundamentado na vaidade, paixão que
ganha status metafísico na sua fina reflexão de fundo cético e
pessimista.

Javier Clavijero (Veracruz, 1731 – Bolonha, 1787). Jesuíta,


historiador e pensador mexicano, figura eclética que cultivou
uma escolástica modernizada. Viveu em várias regiões quase
todas com forte presença indígena, chegando a aprender a
língua náhuatl ainda criança. Ensinou em México e Puebla
para alunos indígenas e em Valladolid e Guadalajara, até a
expulsão dos jesuítas em 1767. Depois refugiou-se na Itália,
onde faleceu. Pensou diversas questões sobre a sua pátria,
além de criticar o barroquismo na linguagem e preconizar a
modernização da escolástica. Escreveu uma Física
particular, parte de um Curso de Filosofia que tinha
projetado, uma Historia antigua de México, onde recupera o
passado indígena e os defende das acusações da historiografia
oficial, De las colonias de los tlaxcaltecas, Diálogo entre
Filaletes y Paeófilo, entre outros.
27
Página
Juan Benito Díaz de Gamarra (Zamora, México, 1745 -
1783). Figura representativa da ilustração no continente
americano. Sua obra mostra uma atitude científica e anti-
aristotélica, bom exemplo do ecletismo ilustrado hispânico –
de influência cartesiana e leibniziana - que tenta conciliar
sistemas aparentemente incompatíveis. Considerado
precursor das ideias da independência mexicana. Escreveu
Elementos de filosofía moderna e Academias filosóficas
(ambas de 1774), Errores del entendimiento humano (1781) e
Memorial ajustado (1790).

28
Página
PENSADORES DO SÉCULO XIX

Silvestre Pinheiro Ferreira (Lisboa, 1769 - 1848). Filósofo


e político português que ocupou importantes cargos. No
início do século XIX teve oportunidade de ir à Alemanha e
acompanhar o debate pós-kantiano e as conferências de
Fichte e Schelling. Foi figura importante para o Brasil, talvez
acidentalmente, pois acompanhou a família real na sua
viagem ao Brasil fugindo das invasões napoleônicas, e
acabou morando no Brasil entre 1810 e 1821, onde desen
volveu grande parte da sua obra mais importante, as
Preleções Filosóficas, publicadas em 1813, resultado de suas
lições de filosofia ministradas no Real Colégio de São
Joaquim, no Rio de Janeiro, obra de forte influência na
formação filosófica brasileira. Autor de Noções elementares
de filosofia e suas aplicações às ciências morais e políticas,
de 1839.

Andrés Bello (Caracas, 1781 – Santiago de Chile, 1865).


Filósofo, filólogo, pedagogo e jurista humanista venezuelano;
de formação fortemente autodidata, desenvolve reflexões de
estética, filosofia da linguagem e filosofia da lógica, e sobre
filosofia em Hispano-américa. Foi professor de Simón
Bolivar e precursor da independência. Morou em Londres por
muitos anos e depois no Chile, onde desenvolve intensa
atividade política e jornalística. Com seu apoio cria-se a
Universidade do Chile em 1842, da qual seria reitor. Obras:
Gramática de la lengua castellana destinada al uso de los
americanos y los esclavos españoles, Principios del derecho
29

de gentes e a Filosofia del entendimiento (publicação


Página

póstuma).
Juan Bautista Aberdi (Tucumán, Argentina, 1810 – França,
1884). Jurista, diplomata e pensador argentino, o primeiro a
utilizar o termo “filosofia americana” e a colocar o problema
de um pensar próprio. Em 1835 se ligou com o Salão
Literário, um grupo de jovens liberais, continuadores da
revolução de maio. Em 1837 redige o Fragmento preliminar
ao estudo do direito, onde faz um diagnóstico da situação
nacional. No início partidário de Rosas, o controverso
governador de Buenos Aires, mais tarde torna-se seu
opositor, o que o leva a exilar-se em Uruguai e mais tarde em
Paris. Após a queda de Rosas em 1852, Alberdi redige Bases
y Puntos de Partida para la Organización Política de la
República Argentina, que seria o esboço da constituição
argentina de 1853. Diante de um país despovoado,
popularizou a frase: “governar é povoar”. Teve polêmica
memorável com Sarmiento nas Cartas quillotanas. Sua obra
O crime da guerra foi publicada póstuma.

Nísia Floresta (Rio Grande do Norte, 1810, Rouen (França),


1885). Pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto, educadora,
escritora e poetisa potiguar. Uma importante representante do
positivismo no Brasil, amiga pessoal de Auguste Comte.
Considerada pioneira do feminismo no Brasil, Nísia Floresta
escreveu, em 1831, uma série de artigos de jornal sobre a
condição feminina numa publicação pernambucana
chamada Espelho das Brasileiras. Em 1853, vivendo na
França, escreveu Opúsculo Humanitário, uma coleção de
artigos sobre a emancipação da mulher que teria sido
elogiada pelo próprio Comte. Sua obra mais conhecida é
Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens (1832), tida
30

como a primeira obra feminista da América Latina. Também


escreveu Conselhos à minha filha (1842) e A lágrima de um
Página

Caeté (1849).
Domingos José Gonçalves de Magalhães (Rio de Janeiro,
1811 – Roma, 1882) Escritor, diplomata e filósofo,
conhecido por ter inaugurado o romantismo brasileiro com a
publicação de seus Suspiros poéticos e saudade (1836). Sua
obra poética trata de temas como a pátria, a religião e a
natureza e às vezes exprime um amargo pessimismo.
Enquanto filósofo e psicólogo escreveu obras como A alma e
o cérebro, Comentários e pensamentos, e sua obra mais
importante, Os fatos do espírito humano (1865), publicada
primeiramente em Paris e considerado o texto inaugural da
filosofia moderna no Brasil, dialogando com filósofos
europeus tais quais Descartes, Condillac e Locke.
Considerado um representante do ecletismo brasileiro, seu
pensamento é marcadamente espiritualista.

Domingo Faustino Sarmiento (San Juan (Argentina), 1811


– Asunción (Paraguai), 1888). Escritor e político argentino,
de origem humilde, foi autodidata e chegou a ser presidente
da Argentina. Durante o governo de Juan Manuel de Rosas,
de quem foi forte opositor, foi no exílio no Chile onde
escreveu sua obra mais famosa, Facundo: civilização e
barbárie (1845), uma biografia do caudilho Facundo Quiroga
mas que visava indiretamente Rosas, e onde coloca o
dualismo civilização (Europa) e barbárie (índios, gaúchos),
como categoria filosófica, sendo um dos propulsores da
ideologia “civilizatória”. Fez parte do Exército Grande que
derruba Rosas em 1852. Foi governador da sua cidade natal,
embaixador nos EEUU e presidente entre 1868 e 1874.
Durante sua presidência, abriu numerosas escolas públicas e
bibliotecas, incentivando a imigração. Recuerdos de
31

provincia (1850) é outra das suas obras mais notáveis, ao


lado de Las ciento y uma (1853), na sua famosa polêmica
Página

com Alberdi.
Francisco Bilbao (Santiago de Chile, 1823 – Buenos Aires,
1865). Filósofo espiritualista, teórico da filosofia hispano-
americana e militante político. Com um grupo de amigos
formou um movimento radical, a Sociedad de la Igualdad,
que foi depois fechada, obrigando Bilbao a trabalhar na
clandestinidade. Seus textos críticos contra a religião católica
lhe valeram uma excomunhão; em Paris, utilizou pela
primeira vez, numa de suas conferências, a expressão
“América Latina”. Autor de Sociabilidad chilena (1844),
onde criticava o sistema autoritário e a igreja, La ley de la
historia (1858), La América en peligro (1862), onde critica as
invasões europeias de Santo Domingo e México, e El
evangelio americano (1864).

Tobias Barreto (Vila de Campos, Sergipe, 1830 - 1899).


Jurista, filósofo e poeta, membro-fundador da Escola de
Recife; estuda o positi vismo na sua vertente teórica, sem os
elementos religiosos dos antecessores, transformando-se mais
tarde em crítico dessa corrente desde uma posição metafísica
de corte monista e evolucionista, influenciado pelo
espiritualismo francês e por Haeckel. Tobias era um orador
notável e estudioso autodidata da filosofia. Aprofundou seus
estudos de alemão para poder ler os filósofos em seus textos
originais. De fato, contribuiu para a difusão do pensamento
alemão no Brasil, redigindo inclusive um jornal em alemão, o
"Deutscher Kampfer" (O lutador alemão), e escrevendo
depois os Estudos alemães (1883). Autor de Estudos de
Filosofia (1868-1882), Menores e loucos (1884) e o Discurso
em mangas de camisa (1887), entre muitos outros discursos.
32
Página
José Martí (La Habana, Cuba, 1853 – Dos Ríos, Cuba,
1895). Político revolucionário, pensador, jornalista e poeta,
Partido Revolucionário Cubano e organizador da chamada
“guerra necessária” de 1895 contra a dominação espanhola.
Muito novo, foi preso e processado pelo governo espanhol
por distribuir panfletos revolucionários e condenado a 6 anos
de trabalhos forçados, dos que foi dispensado pela sua má
saúde, sendo deportado para Espanha; lá ele escreveu El
presídio político em Cuba, onde denunciava os horrores da
prisão. Seu estilo era predominantemente o ensaio, de estilo
vigoroso e idealista. Em 1895, comandando um grupo de
patriotas cubanos, foi atingido morrendo na hora. Com
apenas 42 anos de vida escreveu uma obra de 28 volumes,
contendo reflexões entre romantismo e positivismo e o
caráter prático e político da filosofia. Um dos principais
ensaios de Martí é Nuestra América.

33
Página
PASSAGEM DO SÉCULO XIX PARA O XX

Enrique José Varona (N. Camagüey, 1848 – La Habana,


1933). Nascido em Cuba, Varona exerceu grande influência
no pensamento da época, com obras e ensaios marcados pela
filosofia, política e pedagogia. É considerado um dos
principais representantes do positivismo cubano do período,
tendo alguns de seus trabalhos de juventude sido
caracterizados por uma influência do pessimismo.
Posteriormente, seus textos de maturidade passam a refletir
sobre educação e os movimentos estudantis contrários à
ditadura de Gerardo Machado. Dentre suas obras, podem ser
citadas: La metafísica en la Universidad de La Habana, De
la Colonia a la República e El imperialismo a la luz de la
sociología.

Alejandro Deustúa (Huancayo, Perú, 1849 – Lima, 1945). O


mais longevo dos pensadores americanos (96 anos), o que faz
com que atravesse várias faces do processo: de positivista a
antipositivista convicto e pensador espiritualista; educador e
diplomata; filósofo da liberdade, de forte influência no
pensamento peruano das três primeiras décadas do século
XX. Envolvido na discussão sobre o estatuto das ciências do
espírito; era em favor da educação das elites dirigentes e
contra a cultura popular, considerando as culturas indígenas
definitivamente derrotadas e ao índio como intelectualmente
inferior. Autor de As ideias de ordem e liberdade na história
34

do pensamento humano (1922), Filosofia moral, e de uma


importante Estética Geral (1923).
Página
Silvio Romero (Lagarto (Sergipe)- Brasil, 1851 – Rio de
Janeiro, 1914) Crítico, ensaísta, folclorista, filósofo e
historiador da literatura brasileira, fez parte da escola de
Recife junto com Tobias Barreto, que pretendia uma
renovação da mentalidade brasileira. Inicialmente se
identificou com o positivismo, porém se afasta da influência
de Comte e aproxima-se da filosofia evolucionista de Spencer
em seu propósito de construir uma análise crítica do texto
literário. Em 1878 publica Cantos, obra poética. Também
escreveu uma série de perfis políticos. Na obra
Zeverissimações Ineptas da Crítica polemiza com José
Veríssimo. Interessava-se pela cultura popular, e escreve em
1878 uma Filosofia no Brasil. Em 1882 publica sua obra
prima A História da Literatura Brasileira.

Miguel Lemos (Niterói (Brasil), 1854 – Petrópolis (Brasil),


1917). Filósofo brasileiro de orientação claramente
positivista. Criador, com Teixeira Mendes e Benjamin
Constant, da Sociedade Positivista de Rio de Janeiro em
1876. Em Paris relaciona-se com discípulos de Comte,
especialmente Émile Littré e Pierre Lafitte, que
representavam respectivamente a versão filosófica e a
religiosa do positivismo, e com o chileno Jorge Lagarrique.
No Brasil militou ativamente em favor do positivismo
religioso em questões sociais, políticas e religiosas, como o
abolicionismo, os direitos trabalhistas e o pacifismo,
transformando a sociedade positivista na igreja positivista do
Brasil. Autor do Resumo histórico do movimento positivista
no Brasil, a Ortografia positivista (1888) e o Apostolado
positivista no Brasil (junto com Teixeira Mendes).
35
Página
Raimundo Teixeira Mendes (Caxias (Brasil), 1855 – Rio de
Janeiro, 1927). Filósofo, matemático e ativista político de
orientação positivista; igual que seu colega Lemos, primeiro
aderiu apenas a versão filosófica do positivismo comtiano,
mas depois se envolveu na “religião da humanidade” e a
igreja positivista. Ambos tentaram uma interpretação da
realidade brasileira desde o positivismo, defendendo a
abolição da escravatura e a proclamação da república.
Teixeira apresentou ao novo governo um projeto de bandeira
nacional, com as palavras – de nítido corte positivismo –
“ordem e progresso”, que foi aceito. Envolveu-se em
questões sociais (separação da igreja e o Estado, limites
territoriais, legislação trabalhista, direitos da mulher). Autor,
com Miguel Lemos, dos livros Circulares anuais do
Apostolado positivista no Brasil (1881) e A nossa iniciação
no Positivismo (1889).

Alejandro Korn (San Vicente, Buenos Aires, 1860 – La


Plata (Argentina), 1936). Filósofo, médico psiquiatra e
político, pensador da reação antipositivista, o mais importante
filósofo argentino deste período. Graduou-se em medicina em
1882 com uma tese sobre Loucura e Crime, trabalhando em
diversos hospitais. Ocupou diversos cargos (intendente,
deputado provincial), afiliando-se ao partido socialista
argentino em 1931. Vinculou-se aos movimentos da reforma
universitária, feita dentro de uma reação contra o positivismo.
Reivindica o pensamento metafísico com influências
marcantes de Ortega y Gasset e Kant; reflete sobre a natureza
do filosofar e a situação da filosofia na Argentina e em
América. Autor de: A liberdade criadora (1922), Axiologia
36

(1930), Apuntes filosóficos, Filosofia argentina, Novas Bases


(alusão ao livro clássico Bases, de Alberdi) (1935), e Sistema
Página

filosófico (1959).
Raimundo de Farias Brito (São Benedito, Brasil, 1862 –
Rio de Janeiro, 1917). Jurista e filósofo, pensador
espiritualista, existencial, pessimista e anti-positivista, o mais
importante filósofo brasileiro deste período. Formou-se em
direito na Faculdade de Direito de Recife, onde foi aluno de
Tobias Barreto. Trabalhou como advogado e ocupou cargos
públicos. Venceu o concurso para a cátedra de Lógica no
Colégio Pedro II, mas o presidente da República escolheu o
segundo colocado, Euclides da Cunha; tendo este sido morto
num duelo, Farias Brito assumiu a cátedra. De forte espírito
religioso, combateu o materialismo e o evolucionismo, em
favor de um Deus fundamento da natureza. Autor da
ambiciosa obra Finalidade do Mundo (em 3 volumes
publicados em 1894, 1897 e 1905), A base física do espírito,
A verdade como regra e O mundo interior (1914).

Graça Aranha (São Luis de Maranhão (Brasil), 1865 – Rio


de Janeiro, 1931). Romancista, pensador da estética e
diplomata, graduou-se em direito em Recife, onde foi aluno
de Farias Brito. Nas suas viagens diplomáticas teve contato
com os movimentos vanguardistas europeus, sendo um dos
organizadores da famosa Semana da arte moderna de 1922,
onde proferiu a conferência “A emoção estética na arte
moderna”, rompendo logo depois (em 1924) com a Academia
brasileira de letras, à que acusou de passadismo e imobilismo
literário. Buscou inspiração em diversos municípios
brasileiros, especialmente em Espírito Santo, para escrever
seu romance mais famoso, Canãa, publicado em 1902,
apresentando nele uma visão filosófica peculiar. Autor de
Estética da vida (1921), um curioso livro de estética
37

metafísica e de Viagem maravilhoso (1929).


Página
José Enrique Rodó (Montevideu, Uruguai, 1871 – Palermo,
Itália, 1917). Escritor, historiador e político uruguaio,
desenvolveu atividades como jornalista e publica suas
primeiras obras. Apesar de ter vivido apenas 46 anos, escreve
volumosa obra literária e filosófica, sendo um dos autores
ibero-americanos indispensáveis. Retratou com estilo
modernista o mal-estar hispano-americano de passagem de
século, com forte inspiração clássica, num estilo
espiritualista. Embora não tendo acabado seus estudos
formais de literatura, sua fama lhe permitiu ser professor de
literatura na universidade de Montevidéu. Em seu clássico
Ariel (1900), obra literário-filosófica, muito lida na época e
ainda hoje, defende o americanismo e dirige uma crítica
poética contra o materialismo individualista, especialmente
norte-americano; a partir dessa obra cria-se o movimento
chamado “arielista” em todas as nações de Hispano-américa.
Outra obra importante de Rodó é Motivos de Proteu (1909).

Enrique Molina Garmendia (Chile, 1871 – 1956). Filósofo


espiritualista crítico do positivismo, mas ao mesmo tempo
pensador imanentista, atento à precariedade da vida humana.
Também pedagogo de vasta influência em seu país e em
América. Fundador da Universidad de Concepción, em 1919.
Sua filosofia é uma espécie de ontologia espiritualista onde
são estudadas as relações entre o ser e a consciência.
Escreveu: Do espiritual na vida humana (1936), Para os
valores espirituais (1939), Confissão filosófica (1941), A
filosofia em Chile na primeira parte do século XX (1951),
Tragédia e realização do espírito (1952).
38
Página
José Ingenieros (Palermo, 1877 – Buenos Aires, 1925).
Médico psiquiatra, psicólogo, filósofo e sociólogo, o mais
importante positivista argentino; desempenhou diversos
cargos em instituições médicas argentinas, completou seus
estudos em Paris, Genebra e Heidelberg, e proferiu muitas
conferências em universidades europeias. Em 1919 renuncia
a seus caros docentes e dedica-se plenamente à política
progressista e anti-imperialista, colaborando depois com
periódicos anarquistas. Autor da trilogia ético-sociológica, de
viés positivista: O homem medíocre, Para uma moral sem
dogmas e As forças morais. Escreve Proposições relativas ao
porvir da filosofia e Evolução das ideias argentinas, tendo
forte influência na reforma universitária ibero-americana.

39
Página
SÉCULO XX – PRIMEIRA METADE
Carlos Vaz Ferreira (Montevidéu, 1872 - 1958). Filósofo e
sociólogo uruguaio, formou-se em direito em 1903, ocupando
cargos inclusive de reitor da universidade da República. Como
pensador, se forma no positivismo dominante no Uruguai do
final do século XIX, mas depois recebe as influências de Henri
Bergson, William James e José Enrique Rodó, mudando de
orientação. Ocupa-se com questões de linguagem, lógica
informal e argumentação. Considera a filosofia como capaz de
cultivar um saber inclusivo inatingível para as ciências positivas.
Na ética, defende uma abordagem empírica e aplicada. Vaz tem
abundante produção filosófica, entre as principais obras estão:
Moral para intelectuais (1909), Lógica viva (1910), e Os
problemas da liberdade e o determinismo (1957).

José Vasconcelos (Oaxaca, México, 1882 – Cidade de México,


1959). Um dos mais importantes e prolíficos pensadores de
Ibero-américa. Filósofo, jurista e militante político, pensador
antipositivista, e grande escritor. Graduado em direito, foi
ministro de educação de seu país desenvolvendo vasta obra
pública (criação de escolas, bibliotecas). Em 1909 fundou o
Ateneo de la Juventud; foi partidário da revolução mexicana e
candidato a presidente da República mas foi derrotado pelo
candidato oficial; denunciou fraude nas eleições chegando a
organizar uma revolta armada, pelo qual foi preso exilando-se
mais tarde em Paris. Influenciado pelo pensamento de
Schopenhauer, lutou contra o positivismo e o utilitarismo. Autor
de Prometeu vencedor (1916), O monismo estético (1918), A
raça cósmica (1925), Tratado de Metafísica (1929), Lógica
40

Orgánica (1945). Esteve sempre preocupado com a questão da


Página

unidade ibero-americana, escrevendo textos históricos e


biográficos sobre Hernán Cortés e Simón Bolívar.
Antonio Caso (Cidade de México, 1883 - 1946). Fundador,
junto com Vanconcelos, de El Ateneo de la Juventud, em 1908,
grupo antipositivista propulsor dos estudos filosóficos no
México; defensor de uma filosofia espiritualista, voluntarista e
anti-racionalista. Participou da fundação da revista literária
Savia Moderna junto com Pedro Henriquez Ureña. Autor de A
pessoa humana e o estado totalitário, O perigo do homem, A
existência como economia, como desinterés e como caridad, o
Ensayo sobre la esencia del cristianismo e El peligro del
hombre (1942). Caso ocupou-se intensamente da questão do
americano, em obras como Discurso a la nación mexicana
(1922) e El problema de México y la ideologia nacional (1924),
temática que depois será desenvolvida por Samuel Ramos e
Leopoldo Zea.

Pedro Henriquez Ureña (Santo Domingo, República


Dominicana, 1884 – Buenos Aires, 1946). Filósofo e crítico
literário, fortemente influenciado por Eugenio Maria de Hostos,
reformador porto-riquenho do ensino, desenvolveu suas
atividades intelectuais em México, Argentina e EEUU. Jorge
Luis Borges considerou Henriquez Ureña injustiçado na
Argentina, onde nunca conseguiu ser professor titular. Vincula-
se especialmente com Alejandro Korn na Argentina e com
Vanconcelos no México. Pensador anti-intelectualista e vitalista,
realiza uma crítica interna ao positivismo. Sua obra crítica
abrange imenso universo de assuntos e está perpassada pela
preocupação pela unidade e independência cultural e espiritual
de América. Autor de Seis ensayos em búsqueda de nuestra
expresión (1928) e de As correntes literárias na América
41

hispana (1945).
Página
Coriolano Alberini (Milão, Itália, 1886 – Buenos Aires, 1960).
Nascido na Itália e criado na Argentina, onde passa toda a sua
vida, teve destacada labor docente e política na época da
reforma universitária. Estuda na Faculdade de Filosofia e Letras
e de Direito. Autor precoce de Amoralismo subjetivo (1908, com
22 anos), uma crítica contra o formalismo na ética e o
imperativo categórico. Apresenta seu exame de finalização, anti-
positivista, mostrando um pensamento da intuição influenciado
por Bergson e Meyerson (aos que conhecerá pessoalmente
depois na França), diante de uma banca toda ela composta de
positivistas (Korn, Ingenieros, Francisco Quesada, etc). Na
Europa, faz contato com Gentile, Hartmann, Gilson, Croce,
Husserl e Heidegger. Escreve Introdução à axiogenia (1921),
um livro de tendência vitalista sobre a origem dos valores, e
Problemas de la historia de las ideas filosóficas em la
Argentina.

Alfonso Reyes (Monterrey, México, 1889 – Cidade de México,


1959). Filósofo, crítico literário e diplomata, de estilo ensaísta.
Participa de El Ateneo de la Juventud, junto com Henriquez
Ureña, Caso e Vasconcelos. Em 1911, aos 21 anos, publica seu
primeiro livro Cuestiones estéticas. A revolução mexicana não
favorece a família Reyes, que tinha boas relações com o
presidente Porfírio Diaz. Alfonso exilou-se na Espanha, entre
1914 e 1924. Publica trabalhos sobre Góngora (Cuestiones
gongorinas), Sor Juana Inés de la Cruz, a sua breve obra-prima,
Visão de Anáhuac, e O suicida (1917). Escritor notável, a sua
candidatura ao Nobel de Literatura foi bloqueada pelo
movimento nacionalista mexicano que achava que Reyes
escrevia muito sobre os gregos e muito pouco sobre os aztecas.
42
Página
Oswald de Andrade (São Paulo, 1890 – 1954), escritor e
ensaísta brasileiro, um dos principais organizadores da Semana
de Arte Moderna de 1922, autor dos manifestos modernistas,
“Manifesto pau Brasil” (1924) e “Manifesto antropofágico”
(1928). Trabalha e polemiza com Mário de Andrade, outro
escritor importante da Semana (autor de Manunaíma). Ele se
interessa por filosofia em seus ensaios A crise da filosofia
messiânica e A marcha das utopias, e mesmo de maneira
diletante, Oswald estabelece um marco na constituição da
identidade cultural brasileira, na busca de formas de expressão
próprias que vinculam, de maneira criativa, o mais moderno e
inovador com o mais primitivo, a tecnologia e a antropofagia, no
que se chamou “vanguarda primitiva”. Esta atitude não teve
influência apenas na arte, mas também na filosofia, na medida
em que propõe uma nova relação do pensamento nacional com a
cultura europeia.

Jackson de Figueiredo (Aracaju, Sergipe (Brasil), 1891 –


1928). Pensador espiritualista cristão, de tendência fideísta,
estuda direito na Faculdade de Direito da Bahia. Publica seu
primeiro livro, Algumas reflexões sobre a filosofia de Farias
Brito (1916, com 25 anos). Depois de ler uma carta pastoral, se
converte ao catolicismo. Em 1922 funda o Centro Dom Vital,
irradiador do pensamento católico, onde participaram Alceu
Amoroso Lima, Gustavo Corção e outros. Jackson tinha uma
personalidade forte e avassaladora mostrando um envolvimento
vital em suas indagações metafísicas e religiosas. Entusiasmou-
se enormemente pela obra metafísica de Farias Brito. Morreu
afogado quando pescava junto com seu filho e um amigo. Em
apenas 37 anos de vida, publicou A questão social na filosofia
43

de Farias Brito, Humilhados e luminosos, Do nacionalismo na


hora presente e Pascal e a inquietação moderna (1922).
Página
Francisco Romero (Sevilla (Espanha), 1891 – Buenos Aires,
1962). Nascido na Espanha, mas radicado na Argentina,
influenciado por Alejandro Korn e Ortega y Gasset, ambos
interessados numa “razão histórica”, e pelo pensamento alemão,
sendo conhecedor profundo da língua alemã e tradutor muito
competente. Considerado um dos primeiros pensadores da toma
de consciência de um pensar desde América. Romero é autor da
ideia de uma evolução das atividades filosóficas latino-
americanas em etapas, superando o autodidatismo e chegando
numa filosofia profissional, “normalizada” como exercício
cultural pleno. Autor de: Sobre a filosofia em ibero-América
(1940), Filosofia de ontem e de hoje (1947), Filosofia da pessoa
(1944) e Teoria do homem (1952).

José Carlos Mariátegui (Moquegua (Peru), 1894 - Lima,


1930). Escritor, jornalista, sociólogo e ativista político,
destacou-se como um dos primeiros e mais influentes
pensadores do marxismo latino-americano. Em seu livro
conhecido internacionalmente, Sete Ensaios de Interpretação da
Realidade Peruana, traça uma história econômica do Peru sob a
perspectiva materialista. Também publicou A cena
contemporânea. Fundou em 1928 o Partido Comunista
Peruano e a Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru. Foi
um autodidata, rejeitando a educação formal, viajando pela
Europa com auxílio de bolsas e se vinculando de maneira direta
com escritores e políticos. Na sua atividade jornalística, fundou
em 1926 a revista El Amauta (em quechua, significa "sábio" ou
"professor"), por seu grande interesse pelos povos indígenas
peruanos. Por causa de uma antiga doença teve uma perna
amputada, mas continuou suas atividades políticas em cadeira de
44

rodas, falecendo aos 36 anos.


Página
Carlos Astrada (Córdoba, Argentina, 1894 – Buenos Aires,
1970). Pensador de tendência marxista dialética e existencial,
estudante presencial de Husserl, Heidegger, Scheler e
Hartmann durante os anos 20. Desenvolveu uma peculiar
filosofia da existência onde a noção de “jogo” é fundamental,
exposta em obras como O jogo metafísico: para uma filosofia
da finitude (1942), O jogo existencial (1933), Idealismo
fenomenológico e metafísica existencial (1936), Ser,
humanismo, existencialismo (1949) e A revolução
existencialista (1952). Em seu viés marxista dialético escreveu
Hegel e a dialética (1956), O marxismo e as escatologias
(1957), A dupla face da dialética (1962) e Dialética e história
(1969). De suas preocupações metafísicas com a questão
argentina e americana surge O mito gaúcho. Martin Fierro e o
homem argentino (1948).

Samuel Ramos (Zitácuaro, México, 1897 – Cidade de


México, 1959). Estudioso da situação da filosofia mexicana e
ibero-americana, influenciado por Ortega y Gasset e Antonio
Caso, fez parte do grupo Hiperion em torno de uma
investigação em torno da alma mexicana e os valores
nacionais, denunciando o “complexo de inferioridade” do
mexicano desde a conquista espanhola. Autor de O perfil do
homem e da cultura no México (1934), onde critica o
mimetismo cultural dos mexicanos diante do europeu. Outras
obras: Para um novo humanismo (1940), História da filosofia
em México (1943) e Filosofia da vida artística (1950).
45
Página
José Gaos (Gijón, Espanha, 1900 – Cidade de México, 1959).
Um dos importantes exilados (ou “transterrados”, em seus
próprios termos) espanhóis, radicado no México depois da
guerra civil espanhola. Obtém a nacionalidade mexicana em
1941. Sofreu influências de Husserl, Heidegger, Ortega y
Gasset, Hartmann, García Morente e Javier Zubiri. Autor de
uma copiosa obra filosófica, entre as quais: Da Filosofia,
Filosofia da filosofia (1947) (uma reflexão sobre a natureza da
filosofia diante do fato de cada filosofia apresentar-se como
verdade absoluta), Em torno da filosofia mexicana (1952), A
filosofia na universidade (1956), Confissões profissionais
(1958), além de traduzir ao espanhol mais de 70 obras
filosóficas, entre elas Ser e Tempo de Heidegger.

Mário Ferreira dos Santos (Tietê, 1907 – São Paulo, 1968).


Foi um filósofo brasileiro, criador de um sistema filosófico a
que chamou Filosofia Concreta. Escreveu muitos livros sobre
Filosofia, Psicologia, Oratória, Ontologia, Lógica, etc,
publicados com sua própria editora, muitos dos quais
compunham sua "Enciclopédia de Ciências Filosóficas e
Sociais". Mário nunca teve vínculos acadêmicos, mas se
dedicava inteiramente à filosofia, dando aulas particulares para
grupos pequenos. Teve enorme sucesso durante a década de
60. Algumas obras: Lógica e Dialética (1954), Análise
Dialética do Marxismo (1954), Tratado de Simbólica (1955),
Filosofia da Crise.(1955), Noologia Geral (1956), Filosofia
Concreta (3 volumes) (1956), Filosofias da Afirmação e da
Negação.(1957), Invasão Vertical dos Bárbaros (1967,) e A
Sabedoria das Leis Eternas (póstumo), 2001.
46
Página
Arturo Ardao (Minas, Lavalleja (Uruguai), 1912 –
Montevidéu, 2003). Pensador dedicado principalmente a
história do pensamento latino-americano, analisado naquilo
que tem de original, e a construção de uma filosofia própria,
em que concilia dois extremos antagônicos: a valorização dos
feitos e a valorização das ideias, entre razão e afetividade,
instituições e indivíduos. Promove esta tarefa não recorrendo
ao discurso estritamente argumentativo, mas por meio de uma
longa procura por documentos e testemunhos, que servem
como reveladores das circunstâncias culturais produtoras de
reflexões, ideias, sentimentos, juízos, desejos, valores,
aspirações, etc. Suas principais obras: Espaço e Inteligência,
Espiritualismo e Positivismo no Uruguai, Espanha na Origem
do Nome América Latina, e Lógica e Metafísica em Feijoo.

Vicente Ferreira Da Silva (São Paulo, 1916 - 1963).


Começou como estudioso da lógica matemática, publicando
um dos primeiros livros sobre a área, Elementos de lógica
matemática (1940), sendo o assistente de Willard Quine na sua
visita ao Brasil em 1942. Mas depois sofreu uma
transformação e se tornou um dos mais importantes pensadores
existenciais e metafísicos do Brasil, com uma reflexão em
torno de mitologias fundantes inspirada em Schelling e
Heidegger. Autor de: Exegese da ação (1949), Dialética das
consciências (1950), Introdução à filosofia da mitologia
(1955) entre outras. Morreu num acidente de automóvel antes
de fazer 50 anos. Vilém Flusser o considerou um grande
filósofo, ignorado em seu próprio país, e escreveu vários
ensaios sobre seu pensamento.
47
Página
Rodolfo Kusch (Buenos Aires, 1922 – 1979). Escritor e
filósofo argentino, desenvolveu trabalhos em torno do
pensamento indígena e popular. Foi importante pensador da
situação latino-americana. Estudou filosofia em Buenos Aires;
fez viagens de investigação no norte argentino e altiplano
boliviano; participou de muitos encontros americanistas,
interessado na sabedoria dos povos como lugar hermenêutico.
Escreveu obras teatrais e ensaios sobre estética, sempre de
forte inspiração poética americanista. Algumas obras: La
seducción de la barbarie: análisis herético de un continente
mestizo, (1953), América profunda, (1962), Indios, porteños y
dioses, (1966), De la mala vida porteña, (1966), El
pensamiento indígena y popular en América, (1971),
Geocultura del hombre americano, (1976), Esbozo de una
antropología filosófica americana, (1978) e as peças de teatro
La muerte del Chacho. (1960) e La leyenda de Juan Moreira.
(1960)

48
Página
SÉCULO XX - SEGUNDA METADE
Observação: No caso de filósofos vivos, apenas se menciona o país de origem.

José David Garcia Bacca (Pamplona, Espanha, 1901 – Quito,


Equador, 1992). Outro dos importantes emigrados espanhóis,
estuda filosofia e teologia na Espanha e se ordena sacerdote
claretiano em 1925. Foge da Espanha em 1936, se estabelecendo
primeiro em Paris e depois no Equador. Em 1946 se transfere a
Caracas, trabalhando na recentemente fundada Faculdade de
Filosofia e Letras, e se naturalizando venezuelano. Passa por
várias fases: marxismo, vitalismo; mas também se ocupa com
lógica e filosofia da ciência, sendo autor de uma Introdução á
Lógica moderna (1936) e de diversos “exercícios” de lógica.
Autor de: Filosofía en metáfora y parábolas. Introducción
literaria a la filosofía (1945), Siete modelos de filosofar (1950),
Metafísica natural estabilizada e problemática, metafísica
espontánea (1963), Antología del pensamiento filosófico
venezolano. (1964), Elogio da técnica (1968), Cosas y personas.
(1977), Vida, Muerte, inmortalidad (1983) e Sobre el Quijote
(1991).

María Zambrano (Málaga, 1904 – Madri, 1991). Foi uma


filósofa e escritora espanhola, uma das figuras capitais do
pensamento espanhol do século XX, mas que, por causa de seus
exílios, teve destacada influência no pensamento americano.
Exerceu seu magistério em Cuba, México e Porto Rico. Premiada
com o prêmio Príncipe das Astúrias (1981) e Cervantes (1988).
Seu pensamento vinculado às correntes vitalistas do século XX,
gira em torno da busca de princípios morais e formas de conduta
aplicáveis nos problemas cotidianos. Obras: Filosofía y
poesía (1939), La confesión, género literario y método (1943), La
agonía de Europa (1945), España, sueño y verdad (1965), El
49

sueño creador (1965), El nacimiento. Dos escritos


Página

autobiográficos (1981), e Los sueños y el tiempo (1992).


Miguel Reale (São Bento de Sapucaí, 1910 – São Paulo, 2006).
Jurista e filósofo brasileiro, autor da chamada teoria
tridimensional do direito ligando fato, valor e norma em torno do
conceito de Direito. Cofundador do Instituto de Filosofia
brasileira de Lisboa e do Instituto brasileiro de filosofia. Autor de
vasta obra filosófica, especialmente na área do Direito e a teoria
dos valores; entre as principais: Teoria Tridimensional do
Direito (1968), O Direito como experiência (1968), Lições
preliminares de Direito (1973), Experiência e Cultura (1977),
Estudos de Filosofia e Ciência do Direito (1978), A Filosofia na
Obra de Machado de Assis (1982), Verdade e Conjetura (1983),
Introdução à Filosofia (1988), Estudos de Filosofia
Brasileira (1994), Face Oculta de Euclides da Cunha (1993), Das
Letras à Filosofia (1998).

Leopoldo Zea (Cidade de México, 1912 - 2004). Um dos


mais importantes filósofos ibero-americanos, pensador da
circunstância americana. Fundador do grupo Hiperión, junto com
Luis Villoro e outros, grupo cuja preocupação central era a
indagação sobre a o ser do mexicano. Também investiga acerca
da integração americana e da significação de 1492 como um
“encobrimento” de América; mais tarde liga-se com a filosofia da
libertação sobre a qual tem influência. Algumas obras: En torno a
una filosofía americana, Esquema para una historia del
pensamiento en México, Conciencia y posibilidad del mexicano,
América como conciencia, América en la historia, La filosofía
americana como filosofía sin más, Colonización y
descolonización de la cultura latinoamericana, Latinoamérica:
Emancipación y neocolonialismo, Simón Bolívar: Integración en
50

libertad, e América como autodescubrimiento.


Página
Mário Vieira de Mello (Inglaterra, 1912 - 2006). Nascido na
Inglaterra, onde se encontrava seu pai diplomata, carreira que ele
mesmo depois seguiria, foi educado no Brasil, onde concluiu a
Faculdade de Direito. Como diplomata, serviu em vários postos
em países europeus, encerrando a sua carreira como embaixador
em Gana (África), Guatemala e Hungria. No Brasil exerceu
grande presença na discussão de temas de maior relevância da
cultura brasileira, especialmente na temática do desenvolvimento
econômico e a moralidade social. Principais obras:
Desenvolvimento e cultura: o problema do estetismo no Brasil
(1963), O conceito de uma educação da cultura (1986),
Nietzsche, o Sócrates de nossos tempos (1993), O humanista: a
ordem na alma do indivíduo (1996), e O homem curioso (2001).

Octavio Paz (Cidade de México, 1914 - 1998). Escritor premio


Nobel de Literatura 1990, considerado um dos grandes poetas
hispânicos de todos os tempos, embora difícil de classificar.
Combateu no bando republicano na guerra civil. Em 1941, com
27 anos, começa a escrever “Entre la piedra y la flor”, um poema
sobre a exploração dos campesinos de Yucatán. Na década de 40
escreve seu livro mais famoso, O labirinto da solidão, publicado
em 1950, sobre a situação da cultura e da questão da identidade
dos mexicanos. Sempre participou em atividades antifascistas,
mas quando foi preciso também denunciou os campos de
concentração soviéticos, o que lhe valeu a animosidade das
esquerdas latino-americanas. Também lhe interessaram as
questões existenciais, como a solidão, a temporalidade e a
incomunicação. Algumas obras: Libertad bajo palabra, (1949),
Pasado en claro (1975),El arco y la lira (1956),Posdata,
continuación de El laberinto de la soledad. (1969),Sor Juana Inés
51

de la Cruz o las trampas de la fe (1982).


Página
Francisco Miró Quesada (Lima, Perú). Ocupado com filosofia
analítica, lógica e pensamento ibero-americano, participa da
declaração de Morelia, junto com Dussel, Zea, Roig e outros.
Estuda filosofia e direito e desempenha atividades jornalísticas.
Participa durante muito tempo da Ação Popular peruana, um
partido que formulou sua doutrina em conexão com a tradição
indígena incaica. Se destacou por introduzir os estudos de lógica e
epistemologia no Perú. Miró se interessou pela elaboração de um
novo conceito de razão, em relação com seus estudos lógicos,
especialmente em suas obras Uma teoria de la razón (1963) e
Sobre el concepto de razón (1975); posteriormente diferencia
formas de racionalidade, uma mecânica, outra poética. Autor de:
Curso de lógica matemática (1946), Lógica jurídica (1956),
Despertar e projeto do filosofar latino-americano (1974) e
Projeto e realização do filosofar latino-americano (1981).

Vilém Flusser (Praga, 1920 – 1991). Ensaísta estudioso dos


novos meios de comunicação e de filosofia da cultura e da
linguagem. Nascido numa família judia numa Tchecoslováquia
recentemente independente, no decorrer da Segunda Guerra Mundial,
fugindo do nazismo, muda-se para Londres e depois para o Brasil, onde
posteriormente se naturaliza. Seus pais e irmãos são exterminados. No
Brasil, aprofunda seus estudos filosóficos, enquanto trabalha como
jornalista. Torna-se mem bro do Instituto Brasileiro de Filosofia e
leciona na Escola Politécnica da USP. Em 1970, quando todos os
professores de filosofia são agregados ao departamento de Filosofia,
Flusser não é contratado, talvez por ser visto como um conservador
político pelos seus pares e por falta de títulos acadêmicos. Obras:
Língua e realidade (1963), A História do Diabo (1965), Da
religiosidade: a literatura e o senso de realidade (1967),
Natural:mente (1979), Pós-história (São Paulo, 1982), Filosofia da
52

caixa preta(1983) Fenomenologia do brasileiro(1994), e Bodenlos.


Página

Uma autobiografia filosófica (2007, póstuma).


Paulo Freire (Brasil, 1921 - 1997). Pedagogo e pensador social,
possivelmente o pensador brasileiro com maior projeção
internacional da atualidade. Formado em Direito pela
Universidade de Recife, suas reflexões se centraram na educação,
propondo uma pedagogia libertadora voltada para a
conscientização da opressão e desenvolvendo um pensamento
pedagógico assumidamente político, contra a educação
“bancária”, burocrática, rotineira e sem compromisso. Dentre suas
principais obras estão: Educação como práxis da liberdade
(1967), Pedagogia do oprimido (1970), obra de enorme influência
mundial, Pedagogia da esperança (1992), Pedagogia da
autonomia (1996) e Pedagogia da indignação (2000, póstumo).

Arturo Andrés Roig (Mendoza, Argentina, 1922 - 2012). Um


dos mais importantes pensadores americanos. Se aproxima da
filosofia da libertação, participa da declaração de Morelia junto
com Zea, Villegas, Dussel e Miró Quesada. Obrigado a exilar-se
em 1975, residiu por muitos anos no Equador, onde funda o
Instituto de Estudos Latino-americanos e escreve Esquema para
una história de la Filosofía Ecuatoriana. Defendeu a tese de que
enquanto no século XIX o tema central do pensamento era a
“liberdade”, nos dias atuais a questão principal é a “libertação”.
Crítico do eurocentrismo, insistiu em que os latino-americanos
deveriam pensar “desde lo nuestro”, adequando as ferramentas da
filosofia europeia à realidade latino-americana. Sua obra mais
famosa é Teoría y Crítica del Pensamiento Latinoamericano.
Também autor de: Filosofia, Universidade e filósofos em América
Latina (1981) e O pensamento latino-americano e sua aventura
(1994), entre outros.
53
Página
Ernesto Mayz Vallenilla (Maracaibo, Zulia -Venezuela). Foi
fundador e reitor da Universidade Simón Bolivar, Caracas. Aluno
de Heidegger em Freiburg. Entre as suas obras, destacam-se:
Fenomenología del conocimiento (1956), Ontología del
Conocimiento (1960), El problema de la nada em Kant (1965),
Del hombre y su alienación (1966), Hacia um nuevo humanismo
(1970), Esbozo de una Crítica de la Razón Técnica (1974), El
Domínio del Poder (1982), e muitas outras sobre educação. Maiz
Vallenilla, na sua grande obra El problema de América (1959),
propõe a possibilidade de um pensamento filosófico original na
América Latina.

Luis Villoro (Barcelona - México). Nascido na Espanha e


instalado no México, foi fundador do importante grupo Hiperión.
Investigador do Instituto de Investigações Filosóficas da Unam.
Também desempenhou atividades como embaixador de México
na Unesco. Seu pensamento se ocupa com a questão da
racionalidade e da alteridade, a injustiça e a questão do poder, em
suas relações com o conhecimento. Escreveu: Los grandes
momentos del indigenismo en México (1950), El proceso
ideológico de la revolución de independencia (1953), Páginas
filosóficas (1962), Signos políticos (1974), Creer, saber, conocer
(1982), En México, entre libros. Pensadores del siglo XX (1995),
El poder y el valor. Fundamentos de una ética política (1997),
Estado plural, pluralidad de culturas (1998) e Los retos de la
sociedad por venir (2007).
54
Página
Augusto Salazar Bondy (Lima (Perú), 1925-1974). Filósofo,
político e reformador educativo. Esteve em vários países como
México, França e Alemanha, tendo no México travado contato
com José Gaos e Leopoldo Zea. Envolveu-se ativamente com a
política do Peru, ocupando diversos cargos em instituições de
ensino. Teve livros premiados em concursos e considerado um
dos mais importantes precursores da filosofia da libertação. Foi
influenciado pelo pensamento marxista, pelo existencialismo e
pela análise da situação peruana de Mariátegui. Iniciou em 1968
uma importante polêmica com Leopoldo Zea entorno da
existência de uma filosofia latino-americana com seu livro
¿Existe una filosofía de nuestra América?. Outras obras: Valor y
Estética, Bases para un socialismo humanista peruano, Historia
de las ideas en el Perú contemporáneo, La cultura de la
dominación, Filosofía de la dominación y filosofía de la
liberación, Bartolomé o de la dominación (póstuma).

Maria do Carmo Tavares de Miranda (Pernambuco, 1926 –


2012) foi filósofa, pedagoga e teóloga brasileira, de notável
erudição clássica e bíblica. Foi assistente de Heidegger em
Freiburg em 1955, e obteve seu doutorado na Sorbonne em 1957,
com o trabalho Théorie de la Verité chez Edouard Le Roy. Fez
parte de instituições como a Academia Pernambucana de Letras, a
Academia Internacional de Filosofia da Arte e o Instituto
Brasileiro de Filosofia. Escreveu obras como Educação no Brasil,
Os Franciscanos e a Formação do Brasil, Pedagogia do Tempo e
da História, O Ser da Matéria, Caminhos do Filosofar e Aventura
Humana.
55
Página
Newton Da Costa (Brasil) lógico de projeção internacional, com
publicações no Journal of symbolic logic e outras revistas de
primeira linha. Com formação em matemática e engenharia civil
pela Universidade Federal do Paraná, é criador das Lógicas
Paraconsistentes, sistemas que consegue trabalhar com
contradições sem trivializar o sistema, lógica empregada em
vários sistemas de computador. Escreveu Introdução aos
Fundamentos da Matemática, Ensaio sobre os Fundamentos da
Lógica e Lógica Indutiva e Probabilidade.

Ignácio Ellacuría (Espanha, 1930 – 1989). Pensador político,


integrou a Companhia de Jesus e atuou em El Salvador por volta
de quatro décadas, período em que fez parte da Universidade
Centro Americana (UCA) "José Simeón Cañas"; fundou o Centro
de Reflexión Teológica e assumiu a revista Estudios Centro
Americanos (ECA). Teve relevante contribuição para filosofia e
teologia da libertação latino-americana, sendo tema primordial de
seu pensamento suas constatações acerca das injustiças na
América Latina o que o levou a se dedicar a filosofia centrada na
realidade histórica e na prática da política. Algumas obras:
Filosofía y Política (1972), Universidad y Política (1980), El
objeto de la Filosofía (1981), Función Liberadora de la Filosofía
(1985) e Centroamérica como problema (1986). Foi assassinado
pelo exército de El Salvador junto com outros colegas jesuítas.
56
Página
Carlos Cirne-Lima (Porto Alegre, Brasil). Filósofo gaúcho; fez
seu doutorado na Universidade de Innsbruck na Áustria,
lecionando em Viena e Porto Alegre, e na Unisinos. É autor de
uma teoria dialético - neoplatônica a partir de uma crítica interna
à Hegel, na forma de um sistema que evita a anulação do
indivíduo pelo necessitarismo. Autor de Acerca da contradição
(1993), Dialética para principiantes (1996), e Depois de Hegel.
Uma reconstrução crítica do sistema neoplatônico (2006).

Luiz Sérgio Coelho de Sampaio (Rio de janeiro, 1933 – 2003).


Engenheiro e economista por formação, mas com extensa obra
filosófica na área da lógica. Criador do sistema lógico
hiperdialético, dedicou-se a fixar uma noção historicamente justa,
equilibrada e precisa do que seja a lógica, abrangendo diferentes
modos de pensá-la. Em sua obra filosófica, sustentou que a cada
lógica (seriam, ao todo, cinco) corresponde um modo específico
de ser e, portanto, toda verdade é verdade de um modo de pensar
e, por conseguinte, correlata a um modo de ser. Defendeu que o
dualismo brasileiro não é representado pelo par modernidade e
atraso, mas sim pela recusa de ingressar nessa modernidade. Seu
pensamento abriu caminho para o surgimento da antropologia
hiperdialética de Mércio Gomes, estudioso dos povos indígenas
brasileiros. Autor de: Lógica ressuscitada (2000), e A lógica da
diferença (2001).
57
Página
Juan Carlos Scannone (Argentina). Sacerdote jesuíta, um dos
pensadores ligado com a fundação da filosofia da libertação,
quando organiza com Enrique Dussel as Jornadas Filosóficas na
Universidade do Salvador (Argentina) em 1970, acontecimento
que dará origem a esse movimento. Professor da Universidad del
Salvador, Argentina, da Gregoriana de Roma, Frankfurt e
Salsburgo. Entre suas obras estão: Ser y encarnación (1968),
Teología de la liberación y praxis popular (1976), Teología de la
liberación y doctrina social de la Iglesia (1987), Evangelización,
cultura y teología (1990), Nuevo punto de partida en la filosofía
latinoamericana (1990), Sabiduría y liberación (1992) e mais de
duzentos artigos.

Enrique Dussel (Argentina). Fundador da filosofia da libertação,


radicado em México desde 1975. Influenciado por Lévinas e
Heidegger, apropria-se destes e outros filósofos para pensar a
questão crucial da emancipação dos povos a través de uma
reflexão ao mesmo tempo ontológica e política. Trata-se
possivelmente do pensador ibero-americano de maior projeção
internacional no momento atual, com obras traduzidas a muitas
línguas. Na década de 90 iniciou polêmicas com o filósofo
alemão Karl-Otto Apel sobre ética do discurso e ética da
libertação. Algumas obras: Método para uma filosofia da
liberação (1974), Para uma ética da liberação latino americana
(1979-80, em 5 volumes), Para um Marx desconhecido (1988),
1492. O encobrimento do outro (1992), As metáforas teológicas
de Marx (1993), e Ética da libertação na época da globalização e
a exclusão (1998).
58
Página
Ernildo Stein. (Brasil) Filósofo gaúcho, vem do pensamento
heideggeriano e elabora uma filosofia hermenêutica. Graduado em
Direito e em Filosofia, fez doutorado em Filosofia pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul e pós-doutorados pela Universidade de
Erlangen-Nürnberg, a Universidade de Freiburg e outras universidades
na Alemanha. Trabalha questões em torno de hermenêutica,
fenomenologia, antropologia filosófica, psicanálise e direito. Autor de
vasta obra filosófica, entre as quais: Melancolia, Mundo vivido,
Racionalidade e existência, Órfãos da utopia. A melancolia da
esquerda, Pensar é pensar a diferença, Inovação na filosofia, Nas
proximidades da antropologia. Autor de numerosos livros em torno de
diversos aspectos do pensamento de Heidegger num viés apropriativo.

Zeljko Loparić (Croácia - Brasil) Filósofo croata instalado no


Brasil desde a década de 60. Desenvolve pesquisas em torno da
lógica, ética, psicanálise, dialogando com autores tais como Kant,
Heidegger e Winnicott. Fez sua tese de doutorado sobre
"Scientific Problem-Solving in Kant and Mach" defendida em
Louvain. Tentou interpretar a analítica transcendental em termos
semânticos, na sua "A Semântica Transcendental de Kant"
(2000), onde afirma que a sua atitude diante da obra de Kant
nunca foi de comentador, mas de aprender formas de abordar a
ciência como atividade de solução de problemas. Desenvolveu
uma apropriação original da psicanálise e uma interpretação do
pensamento de Heidegger – de quem foi aluno presencial - como
uma ética existencial do deixar-ser e do cuidado, em obras como
Sobre a responsabilidade (2003) e Ética e Finitude (2004).
Também escreveu Heidegger réu (1990), uma defesa de
Heidegger diante das acusações de Victor Farias sobre o nazismo
do filósofo alemão.
59
Página
Walter Mignolo (Argentina- EEUU) Pensador político e
semiótico, professor na Duke University, publica sobre
pensamento pós-colonial, interculturalidade, semiótica e teoria
literária, refletindo sobre os diferentes aspectos do mundo
moderno e colonial, trabalhando conceitos como a colonialidade
global, as geopolíticas do conhecimento, transmodernidade,
pensamentos de fronteira e pluriversalidade. Dentre suas
principais obras estão: The Darker Side of Western Modernity:
global futures, decolonial options, La Idea de America Latina,
Histórias Locais/ Projetos Globais.

Carlos Cullen (Argentina). Professor titular das cátedras de


Filosofia da Educação e de Problemas Filosóficos em Psicologia
na Universidade de Buenos Aires, Carlos Cullen licenciou-se em
filosofia pela Universidad del Salvador em Buenos Aires e
doutorou-se na Universidade de Freiburg - Alemanha. Um dos
fundadores da filosofia da libertação, Cullen ocupa-se com
reflexões nos campos da ética e da educação e promove
numerosas atividades de capacitação docente. Preocupa-se,
notavelmente, com as mutações no sentido ético-político da
educação no contexto atual de crise da modernidade. Publicou,
entre outros títulos: Fenomenología de la crisis moral,
Reflexiones desde América, Autonomía moral, participación
ciudadana y cuidado del otro, Crítica de las razones de educar e
Perfiles ético-políticos de la educación.
60
Página
Raúl Fornet-Betancourt (Cuba). Filósofo cubano residente na
Alemanha, professor em Aachen, é diretor do departamento de
América Latina do Instituto de Missiologia, onde desenvolve uma
linha de investigações interculturais, numa tentativa de
descentralização do logos filosófico. A tese central de seu
pensamento é a superação do eurocentrismo em sua dimensão
epistêmica, defendendo que a filosofia deixe de ser puramente
uma atividade intelectual, para ser um conjunto de manifestações
simbólicas dos vários tipos de razão. Suas reflexões seguem
algumas linhas como: epistemologia pós-eurocentrica,
hermenêutica pluritópica, ética da libertação e antropologia
dialógica. Na década de 90, promoveu o diálogo Norte-Sul entre
Enrique Dussel e Karl-Otto Apel. Autor de Estudos de filosofia
latino americana (1992), Para uma filosofia intercultural latino
americana (1994), Filosofía Intercultural (1994),
Aproximaciones a José Martí (1998), Crítica intercultural de la
filosofía latinoamericana actual (2004).

Ofélia Schutte (Cuba – EEUU). Nascida em Cuba, mora nos


EEUU, professora nas Universidades da Florida e de Yale. Suas
pesquisas incluem feminismo, Niezsche, niilismo, filosofia latino-
americana e filosofia pós-colonial, Também estuda literatura
feminina cubana e o pensamento político do cubano José Marti.
Obras: Beyond Nihilism: Nietzsche without Masks (1984),
Cultural Identity and Social Liberation in Latin American
Thought (1993), “Cultural Alterity: Cross-Cultural
Communication and Feminist Thought in North-South Dialogue”
(1998), “Negotiating Latina Identities (2000), “Dependency
Work, Women, and the Global Economy,“Postcolonial
Feminisms: Genealogies and Recent Directions“ (2007). È
membro do corpo editorial das revistas feministas Hypatia (U.S.)
e Mora (Argentina).
61
Página
Horácio Cerutti Gulberg (Mendoza, Argentina). Radicado em
México e naturalizado mexicano. Estuda a filosofia da libertação
latino-americana numa visão crítica e avaliativa do movimento, e
inclusive a sua superação. Em suas críticas acentua o papel da
linguagem e os novos meios de comunicação. Investigador no
Centro de Investigações sobre América Latina e o Caribe. Autor
de Para uma metodologia da história das ideias filosóficas em
América Latina (1986). Filosofar desde nossa América. Ensaio
problematizador de seu modus operandi (2000), La utopía de
Nuestra América (2007), Filosofar desde Nuestra América.
Ensayo problematizador de su modus operandi (2000),
Configuraciones de un filosofar sureador. (2006), Democracia e
integración en Nuestra América (2008), Filosofías para la
liberación ¿liberación del filosofar? (2008), Doscientos años de
pensamiento filosófico Nuestroamericano (2011).

62
Página
REFERÊNCIAS

BEORLEGUI Carlos. Historia del pensamiento filosófico latinoamericano.


Universidad de Deusto, Bilbao, 2006 (2ª edição).
BUARQUE DE HOLANDA Sérgio. Visão do paraíso. Companhia das Letras,
São Paulo, 2010.
CASTRO Augusto. La filosofia entre nosotros. Cinco siglos de filosofia em el
Perú. Fondo editorial, Universidad Católica del Perú, Lima, 2009.
CURRUHUINCA – ROUX. Las matanzas de Neuquén – Crónicas mapuches.
Editorial Plus Ultra, Buenos Aires, 1993.
DEVES VALDEZ Eduardo, BOSIO Beatriz (Org). Pensamiento paraguayo del
siglo XX. Editora Intercontinental, Asunción, 2006.
FARRÉ Luis, LÉRTORA MENDOZA Celina. La filosofia em la Argentina.
Editorial Docencia, Buenos Aires, 1981.
GUY Alain. La filosofia em América Latina. Acento editorial, Madrid, 1998.
IBARGUENGOITIA CHICO Antonio. Suma filosófica mexicana. (Resumen de
historia de la filosofía en México). Editorial Porrúa, México, 1989 (2ª edição).
JAIME Jorge. História da filosofia no Brasil. Editora Vozes, Petrópolis, 2001 (4
volumes).
LEON PORTILLA. La filosofia Nahuatl estudiada en sus fuentes. Unam,
México, 2006 (10 a edição).
MIGNOLO Walter. La Idea de América Latina. La herida colonial y la opción
decolonial. Gedisa, Barcelona, 2007.
PAIM Antonio. História das ideias filosóficas no Brasil. Editorial Grijalbo, São
Paulo, 1967.
POPOL VUH . Iluminuras, São Paulo, 2011.
RABOSSI Eduardo e outros. La enseñanza, la reflexión y la investigación
filosóficas en América Latina y el Caribe. Técnos, Madrid, Unesco, 1990.

ROIG Arturo Andrés. Esquemas para una historia de la filosofía ecuatoriana.


Ediciones de la Universidad Católica de Quito, 1982.
63
Página
INFORMAÇÕES SOBRE OS ORGANIZADORES
Julio Cabrera (Argentina-Brasil). Nascido em Córdoba,
Argentina, radicado no Brasil desde 1979. Em seu período
argentino se dedica especialmente a filosofia da linguagem e
filosofia da lógica num viés crítico, tentando emancipar a
filosofia da linguagem do referencial exclusivamente
analítico, e endereçando críticas filosóficas à lógica formal,
em obras como A Lógica condenada (1987), e Inferências
lexicais e interpretação de redes de predicados (2007, escrita
em colaboração com o físico Olavo Da Silva filho). No
Brasil, desenvolve a sua teoria ética, a ética negativa, exposta
em livros como Projeto de Ética negativa (1989), Crítica de
la moral afirmativa (1996) e numerosos artigos. Seus estudos
de filosofia da linguagem se continuam numa filosofia da
linguagem do cinema, especialmente em sua obra Cine: 100
años de Filosofía (1999; tradução brasileira: O cinema
pensa). Mais recentemente, começa a interessar-se pela
situação da filosofia na América Latina, escrevendo o Diário
de um filósofo no Brasil (2010).

Rafael Alves Reis (Brasil). Formado em Filosofia pelo


Departamento de Filosofia da Universidade de Brasília. Se
interessa por filosofia ibero-americana e outros assuntos que
são excluídos das universidades. A presente cartilha tem
como base seu trabalho de Iniciação Científica (Pibic),
intitulado: A filosofia da América Latina. Nesse trabalho ele
faz um breve resumo da historia da filosofia da América
latina e reflete sobre a polemica entre a qualidade e a
autenticidade dos escritos filosóficos.

Agradecimentos especiais para: Aline Matos, Aristinete Bernardes, David


64

Wilkerson Silva, Éder Wen, Erivaldo Fernandes Neto, Gabriel Silveira, Léo
Página

Pimentel, Rodrigo Costa e Tiago Barros.

Você também pode gostar