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Cartilha de Filà Sofos Da América Latina PDF
Cartilha de Filà Sofos Da América Latina PDF
ISBN 978-85-916170-0-5
http://fibral.blogspot.com
ÍNDICE
Introdução ...p. 05
O pensamento latino-americano terá que ser aquele que surja da circunstância latino-
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americana, mesmo que se utilize de pensamentos europeus para formular seus projetos.
Nesta relação, parte-se da convicção de não haverem filosofias universais não
situadas; o que hoje consideramos como sendo “problemas filosóficos universais”
constitui, na verdade, uma universalidade pensada desde Europa, e não algo universal
em sentido absoluto. Nesse sentido, não se considera aqui que existam “problemas
universais da filosofia” que comporiam um conjunto duro e objetivo de problemas, mas
que os pensamentos universais são sempre pensados desde algum lugar. O fato de hoje
considerar-se o universal como idêntico ao pensamento europeu, é o resultado de uma
ação política específica e não algo “natural”.
É claro que não existe uma lógica europeia ou uma lógica latino-
americana; existe, simplesmente, lógica. Mas um pensador uruguaio de início do século
XX, Carlos Vaz Ferreira, (que está presente na relação de autores), escreveu um livro de
lógica chamado “Lógica Viva”, uma apropriação originalíssima do tema das falácias
que um europeu dificilmente escreveria. Esse livro não é sobre “lógica uruguaia”, mas
simplesmente um livro de lógica escrito desde o Uruguai.
De todas maneiras, devemos trabalhar para que, num futuro próximo, não
tenhamos mais que aludir à nacionalidade dos filósofos. Infelizmente, ainda não chegou
esse momento, pois somente quando somos excluídos é que nos lembramos das nossas
origens. Enquanto vivermos numa comunidade que estuda a questão da vaidade dos
homens e conheça apenas os escritos de Hume sobre essa questão mas não tenha ouvido
falar de Matias Aires, teremos que continuar falando em nacionalidades.
Mas aqui tem que ter uma cautela; as “reações” contra a Escolástica do primeiro
período são constituídas, em América Latina, seguindo pautas europeias: por exemplo,
pela “modernidade” cartesiana, pelo “Iluminismo” alemão e escocês, pelo positivismo,
pela atual crítica contra a Metafísica, etc. Muitos destes referenciais europeus servem de
apoio teórico para as “independências formais” dos países latino-americanos, quase
todas acontecidas nas primeiras duas décadas do século XIX. Mas numa história do
pensamento filosófico desde América Latina, ainda deveriam ser descobertas as
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PENSAMENTO INDÍGENA
Existem três atitudes a respeito das culturas indígenas: (a) Pretender voltar a
essas culturas sem as mediações atuais; trata-se de uma postura romântica insustentável.
(b) Esquecer totalmente o passado indígena como culturas perdedoras e ultrapassadas;
esta parece uma postura conformista e superficial; (c) Estudar os pensamentos indígenas
em interação com nossa circunstância atual, tentando implantar uma relação de
igualdade e intercâmbio entre ambas (precisamente o que não houve no século XVI e
seguintes, e possivelmente não há até hoje). Esta terceira parece a atitude mais
adequada.
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Problemas metodológicos no estudo dos pensamentos indígenas.
Por estes motivos, tudo o que se dizer sobre pensamento indígena será hoje
unilateral, incompleto e em muitos pontos incompreensível. Nestas condições precárias,
os pensamentos indígenas terão que entrar na perspectiva latino-americana aceitando-se
estas opacidades insuperáveis; jamais teremos acesso a esse pensamento tal como foi
existido pelos indígenas, mas já numa interação complexa com as culturas do
dominador e, no caso do Brasil, também com a cultura africana, que entra na
circunstância latino-americana num outro viés.
Paraíso”, de 1959) ou adotados atualmente sem mediações como sendo melhores que
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Nahuas
pela qual os espanhóis dominaram tão facilmente estes povos. Estes indígenas tinham
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uma ideia do Ometéotl, que era um princípio dual, deidade que se inventa a si mesma e
não precisa nenhum outro fundamento ontológico; nele se reúnem os opostos e o caos,
mas também os princípios ordenadores; espírito/matéria, branco/preto, vida/morte,
masculino/feminino, criação/destruição. Teoltl é uma força vivificante e destruidora,
incansável, uma espécie de devir instável que não é agentiva, pessoal ou intencional;
Ela não é, ela devém, transforma-se e transforma; diferentemente da cultura ocidental,
que considera o essencial como imóvel, os nahuas consideram o essencial como em
perpétuo movimento. Segundo os nahuas, o mundo é um lugar muito perigoso para
humanos; o equilíbrio é facilmente perdido; a pergunta fundamental é: “Como podem
os humanos caminhar e florescer na terra?”.
Maias
Honduras e El Salvador. Muito antigas; nascem em torno de 1000 a.C, sendo seu
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período clássico entre 300 e 900 d.C. Continuaram ao longo dos séculos, mas já não
eram florescentes na época da invasão espanhola. Para este povo, as forças da natureza e
as diversas vicissitudes da vida, esforçada e difícil, são vistas como ações e lutas entre
os deuses; a própria passagem do tempo, seu efeito demolidor, é também endeusada. Os
maias desenvolveram um pensamento sofisticado e complexo sobre a temporalidade;
organizaram o espaço da vida em 3 andares: deuses, mundo e homens. O próprio
conflito interior humano, entre seus desejos animais e sua inteligência superior, é vista
como uma luta entre forças favoráveis e desfavoráveis (não como bem ou mal,
conceitos ocidentais); a atitude dos maias diante dessas forças não é de amor ou
devoção, mas de reverência e temor, de incerteza e cautela. Aqui também aparece a
deidade da serpente emplumada, mas com outros nomes; como nos astecas e incas, o
Sol aparece como um deus (pela sua relação com o tempo, a luz, a vida, os ciclos); a
matemática maia, a sua medição do tempo e seus calendários, estão a serviço da lida
com a vida, do ameaçador e dos deuses protetores.
Os maias não falaram uma única língua, chegaram a ter até 28 línguas diferentes,
a diferença das culturas nahuas, que estiveram fortemente ligadas a uma única língua, a
nahuatl. Mas houve na cultura maia mais textos escritos importantes, que atravessaram
os tempos, em parte transmitidos oralmente, depois escritos e desaparecidos, e tornados
a escrever depois da invasão espanhola, alguns deles transcritos e protegidos pelos
próprios frades. O mais importante texto maia é o Popol Vuh (Livro do Conselho, ou da
Comunidade); foi primeiro desenhado, pintado, transmitido oralmente, reescrito no
século XVI, por um indígena, chegando às mãos de Francisco Ximenez, um padre da
Guatemala, no século XVII ou XVIII. O livro está perpassado por influências cristãs
frutos da invasão.
viés apocalíptico típico de muitas culturas indígenas, este escrito relata a destruição e
renascimento dos níveis do inframundo, o desmoronamento do céu e o afundamento da
terra.
Incas
Tawatinsuyu era o nome da região inca; significa “as quatro partes juntas,
unificadas”. A realidade inca compõe-se de deus (Wiracocha), mundo (Pacha) e homem
(Runa). Os “amautas” eram os sábios incas, ou poetas filósofos, ou sacerdotes. Temas
muito semelhantes aos nahuas aparecem nas filosofias andinas: consideram o cosmos e
tudo o que há nele como vivificado por uma força vital única; tudo é dinâmico, em
fluxo e em constante circulação. Esta força assume a forma de dualidades
complementares, não de dualismos antagônicos de tipo ocidental, pois trata-se de forças
que se opõem mas não se excluem nem destroem. O cosmos consiste na contínua
alternância destas dualidades; às vezes, esta complementariedade rompe-se provocando
um desequilíbrio, uma desintegração cataclísmica (pachacuti), marcando etapas; o
cosmos tem passado já por quatro etapas, ou “soles”. Mas o cosmos andino é aberto, no
sentido de sujeito a ações humanas transformadoras, que contribuem a manter o mundo
funcionando; mesmo os deuses estão em constante mudança, e a participação humana é
absolutamente necessária; existe uma sabedoria em apreender a interagir com o mundo
ao qual se pertence.
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Indígenas brasileiros
Nas populações indígenas brasileiras, os sábios são os pajés (ou xamãs), que
poderiam ser postos ao lado dos tlamatinime nahuas, dos amautas incas e dos
philosophoi gregos; cada cultura possui algum tipo de sábio que lida com o
desconhecido que tem que se esclarecer, algum tipo de sacerdote, de líder espiritual
capaz de fornecer um domínio sobre as forças ameaçadoras, ou de colocar-se em
perspectivas diversas, ou de ver além das aparências, etc. Segundo Viveiros de Castro,
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as culturas indígenas brasileiras estão caracterizadas por certa fragmentação, por uma
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Mapuches
Essa persistente resistência, que sacrificou três quartos da sua população, fez com que,
dentre todos os grupos indígenas de América Latina, os Mapuches fossem os únicos a
conseguir autonomia territorial frente ao império espanhol. Após a “independência”
chilena em 1818, embora o Estado chileno formalmente ratificasse o “território
autônomo Mapuche”, a existência deste povo era um obstáculo para o projeto de
“modernização” do país. A partir de ali, diversas políticas nacionais foram reduzindo
gradativamente os territórios mapuches, ocasionado a morte de milhares de indígenas e
o despojo de grande parte de seus territórios. A resistência mapuche persiste ainda hoje,
e é por isso que o estudo deste povo e sua cultura merece destaque especial.
Alguns dos pontos mais promissores para uma possível interação com as
culturas indígenas, através da mediação europeia, podem ser os seguintes: (a) A ideia de
um pensar não conceitual, ou conceitual através de imagens e narrativas, pensar fluído,
temporal, poético; (b) A ideia de um pensar como sobrevivência diante dos rigores e
agruras da natureza e da sociedade humana e animal; admiração, curiosidade ou dúvida
seriam tributárias de um sentimento mais básico, sem as transcendências puramente
teóricas e pretensamente “desinteressadas” do pensamento ocidental; (c) Aprender a ver
os próprios mitos sacrificiais das nossas culturas, tudo o que é sacrificado para a
“civilização” moderna continuar a se desenvolver; (d) Visualizar a espantosa
persistência da religiosidade e o sentimento do sagrado nos povos através das épocas até
hoje, o que sugere um vínculo profundo com os povos originários; (e) Visualizar o
sentido atual das resistências indígenas contra um sistema de organização da vida
humana que está levando o planeta a uma situação de inevitável destruição.
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PENSADORES DO PERÍODO COLONIAL (Séculos XVI a XVIII)
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PENSADORES DO SÉCULO XIX
póstuma).
Juan Bautista Aberdi (Tucumán, Argentina, 1810 – França,
1884). Jurista, diplomata e pensador argentino, o primeiro a
utilizar o termo “filosofia americana” e a colocar o problema
de um pensar próprio. Em 1835 se ligou com o Salão
Literário, um grupo de jovens liberais, continuadores da
revolução de maio. Em 1837 redige o Fragmento preliminar
ao estudo do direito, onde faz um diagnóstico da situação
nacional. No início partidário de Rosas, o controverso
governador de Buenos Aires, mais tarde torna-se seu
opositor, o que o leva a exilar-se em Uruguai e mais tarde em
Paris. Após a queda de Rosas em 1852, Alberdi redige Bases
y Puntos de Partida para la Organización Política de la
República Argentina, que seria o esboço da constituição
argentina de 1853. Diante de um país despovoado,
popularizou a frase: “governar é povoar”. Teve polêmica
memorável com Sarmiento nas Cartas quillotanas. Sua obra
O crime da guerra foi publicada póstuma.
Caeté (1849).
Domingos José Gonçalves de Magalhães (Rio de Janeiro,
1811 – Roma, 1882) Escritor, diplomata e filósofo,
conhecido por ter inaugurado o romantismo brasileiro com a
publicação de seus Suspiros poéticos e saudade (1836). Sua
obra poética trata de temas como a pátria, a religião e a
natureza e às vezes exprime um amargo pessimismo.
Enquanto filósofo e psicólogo escreveu obras como A alma e
o cérebro, Comentários e pensamentos, e sua obra mais
importante, Os fatos do espírito humano (1865), publicada
primeiramente em Paris e considerado o texto inaugural da
filosofia moderna no Brasil, dialogando com filósofos
europeus tais quais Descartes, Condillac e Locke.
Considerado um representante do ecletismo brasileiro, seu
pensamento é marcadamente espiritualista.
com Alberdi.
Francisco Bilbao (Santiago de Chile, 1823 – Buenos Aires,
1865). Filósofo espiritualista, teórico da filosofia hispano-
americana e militante político. Com um grupo de amigos
formou um movimento radical, a Sociedad de la Igualdad,
que foi depois fechada, obrigando Bilbao a trabalhar na
clandestinidade. Seus textos críticos contra a religião católica
lhe valeram uma excomunhão; em Paris, utilizou pela
primeira vez, numa de suas conferências, a expressão
“América Latina”. Autor de Sociabilidad chilena (1844),
onde criticava o sistema autoritário e a igreja, La ley de la
historia (1858), La América en peligro (1862), onde critica as
invasões europeias de Santo Domingo e México, e El
evangelio americano (1864).
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PASSAGEM DO SÉCULO XIX PARA O XX
filosófico (1959).
Raimundo de Farias Brito (São Benedito, Brasil, 1862 –
Rio de Janeiro, 1917). Jurista e filósofo, pensador
espiritualista, existencial, pessimista e anti-positivista, o mais
importante filósofo brasileiro deste período. Formou-se em
direito na Faculdade de Direito de Recife, onde foi aluno de
Tobias Barreto. Trabalhou como advogado e ocupou cargos
públicos. Venceu o concurso para a cátedra de Lógica no
Colégio Pedro II, mas o presidente da República escolheu o
segundo colocado, Euclides da Cunha; tendo este sido morto
num duelo, Farias Brito assumiu a cátedra. De forte espírito
religioso, combateu o materialismo e o evolucionismo, em
favor de um Deus fundamento da natureza. Autor da
ambiciosa obra Finalidade do Mundo (em 3 volumes
publicados em 1894, 1897 e 1905), A base física do espírito,
A verdade como regra e O mundo interior (1914).
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SÉCULO XX – PRIMEIRA METADE
Carlos Vaz Ferreira (Montevidéu, 1872 - 1958). Filósofo e
sociólogo uruguaio, formou-se em direito em 1903, ocupando
cargos inclusive de reitor da universidade da República. Como
pensador, se forma no positivismo dominante no Uruguai do
final do século XIX, mas depois recebe as influências de Henri
Bergson, William James e José Enrique Rodó, mudando de
orientação. Ocupa-se com questões de linguagem, lógica
informal e argumentação. Considera a filosofia como capaz de
cultivar um saber inclusivo inatingível para as ciências positivas.
Na ética, defende uma abordagem empírica e aplicada. Vaz tem
abundante produção filosófica, entre as principais obras estão:
Moral para intelectuais (1909), Lógica viva (1910), e Os
problemas da liberdade e o determinismo (1957).
hispana (1945).
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Coriolano Alberini (Milão, Itália, 1886 – Buenos Aires, 1960).
Nascido na Itália e criado na Argentina, onde passa toda a sua
vida, teve destacada labor docente e política na época da
reforma universitária. Estuda na Faculdade de Filosofia e Letras
e de Direito. Autor precoce de Amoralismo subjetivo (1908, com
22 anos), uma crítica contra o formalismo na ética e o
imperativo categórico. Apresenta seu exame de finalização, anti-
positivista, mostrando um pensamento da intuição influenciado
por Bergson e Meyerson (aos que conhecerá pessoalmente
depois na França), diante de uma banca toda ela composta de
positivistas (Korn, Ingenieros, Francisco Quesada, etc). Na
Europa, faz contato com Gentile, Hartmann, Gilson, Croce,
Husserl e Heidegger. Escreve Introdução à axiogenia (1921),
um livro de tendência vitalista sobre a origem dos valores, e
Problemas de la historia de las ideas filosóficas em la
Argentina.
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SÉCULO XX - SEGUNDA METADE
Observação: No caso de filósofos vivos, apenas se menciona o país de origem.
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REFERÊNCIAS
Wilkerson Silva, Éder Wen, Erivaldo Fernandes Neto, Gabriel Silveira, Léo
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