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29ª REUNIÃO BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA

NATAL, 03 A 06 DE AGOSTO DE 2014


“DIÁLOGOS ANTROPOLÓGICOS: EXPANDINDO FRONTEIRAS”
GT 14 – ANTROPOLOGIA, ARQUEOLOGIA, COLONIALISMO E LICENCIAMENTO AMBIENTAL

Arqueologia de Contrato, Colonialismo Interno e Povos Indígenas no Brasil1

Jorge Eremites de Oliveira2

“Que país é este?”: das considerações iniciais


Terceiro Mundo, se for
Piada no exterior
Mas o Brasil vai ficar rico
Vamos faturar um milhão
Quando vendermos todas as almas
Dos nossos índios num leilão
(Que País é Este? – Legião Urbana 1987)

Neste trabalho apresento um conjunto de reflexões críticas a respeito da relação entre


Arqueologia de Contrato, colonialismo interno e povos indígenas afetados por projetos
desenvolvimentistas no Brasil. A discussão vai ao encontro de uma Antropologia e
Arqueologia do Colonialismo, isto é, do estudo do colonialismo como um conjunto de
problemas inerente à produção de saberes e à prática nesses campos do conhecimento (Himes
1972; Dirks 1995; Pels 1997, 2008; Cooper 2005; Smith 2005; Atalay 2006; e outros). O
colonialismo interno, por sua vez, não tem a ver com o período colonial, mas com um
dinâmico sistema estruturante de relações sociais de dominação e exploração particular a cada
país, porém conectado a capilaridades transnacionais de um colonialismo global (González
Casanova 1963, 1995, 2002 [1969], 2006; Cardoso de Oliveira 1978 [1966]; Pacheco de
Oliveira 2006).
Cumpre ainda explicar que a Arqueologia de Contrato é aqui entendida como uma
modalidade da prática arqueológica que se apresenta como uma Arqueologia Empresarial.
Embora não seja uma Arqueologia voltada para o estudo das empresas, é produzida dentro de
uma lógica empresarial e de mercado. Por isso pressupõe a existência de complexas relações
entre sujeitos que atuam como contratantes/clientes/patrões e sujeitos que operam como
contratados/negociantes/empregados. Em casos assim o produto a ser vendido ou
comercializado é o próprio trabalho do arqueólogo. Este produto nada mais é do que um laudo

1
Os nomes dos itens que compõem este trabalho fazem referência a sucessos musicais da banda brasileira de
rock Legião Urbana, surgida em Brasília e em atividade no período de 1982 a 1996.
2
Licenciado em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul; mestre e doutor em História, na área
de concentração em Arqueologia, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; com estágio de
pós-doutorado em Antropologia Social pelo Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor
e pesquisador da Universidade Federal de Pelotas e bolsista de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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em seu sentido mais amplo – do latim laudare –, quer dizer, um parecer técnico-científico
cuja elaboração pressupõe algum tipo de estudo ou pesquisa. Normalmente está voltado para
o licenciamento ambiental, embora por meio do contrato seja possível produzir outros tantos
tipos de trabalhos. Exemplo disso são laudos administrativos sobre áreas ocupadas por povos
indígenas (povos originários) e comunidades tradicionais (quilombolas, ribeirinhas,
extrativistas, ciganos etc.), produzidos na esfera governamental3. Em casos assim também
tenho verificado a produção de contralaudos para defender sujeitos e organizações ligados ao
movimento ruralista, os quais se apresentam como contratantes e partes envolvidas em litígios
judiciais pela posse de terras indígenas4.
Para tratar do assunto recorro a observações que realizei entre 2003 e 2012 na região
Centro-Oeste do Brasil. Neste período participei, ora como arqueólogo, ora como antropólogo
social, de dois tipos de trabalhos relevantes para a compreensão do assunto. O primeiro diz
respeito à produção de um laudo administrativo e dois laudos judiciais ou periciais sobre
terras indígenas (Eremites de Oliveira & Pereira 2009a [2007], 2012 [2003]; Eremites de
Oliveira, Pereira & Barreto 2011). O segundo tem a ver com a realização de estudos
complementares a relatórios sobre impactos socioambientais de empreendimentos que afetam
comunidades indígenas: duas rodovias, uma linha de transmissão de energia e uma
mineradora de ouro (Eremites de Oliveira 2010 [2008]; Eremites de Oliveira & Pereira 2009b,
2011; Eremites de Oliveira, Pereira & Dambrós 2011). Acrescento ainda informações obtidas
a partir da interlocução mantida com estudantes de Arqueologia e colegas arqueólogos que
atuam em universidades, museus, órgãos do Estado, empresas e outras instituições que de
alguma forma estão ligadas à Arqueologia de Contrato.
Das experiências que tive até o momento, o trabalho como perito da Justiça Federal
para elaboração do laudo sobre uma terra indígena em 2003 foi das mais importantes. A partir

3
O termo quilombola é aqui usado para se referir a coletividades de origem afroamericana e, portanto, com um
passado ligado à escravidão de negros trazidos da África para o Brasil. São auto-identificadas e reconhecidas
como comunidades remanescentes dos quilombos, em observação ao Art. 68 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias da Lei Maior de 1988, bem como a outros dispositivos contidos na legislação
brasileira e internacional.
4
Laudos judiciais são estudos técnico-científicos feitos por profissionais designados como peritos pela Justiça,
os quais devem possuir expertise comprovada sobre assuntos ligados a questões litigiosas, como, por exemplo, a
posse sobre de determinada terra ou outro tema que envolve o trabalho do antropólogo social. Estudos assim
podem servir como provas para o esclarecimento dos fatos e a tomada de decisões, embora dependa da avaliação
e do entendimento de cada magistrado. Contralaudos são estudos feitos por assistentes técnicos, ou seja, expertos
contratados para defender pessoas ou instituições que são partes em processos judiciais. São trabalhos feitos por
profissionais que são parciais porque estão ligados à defesa das partes que os contrataram para o serviço. Apenas
os expertos do Juízo são peritos, auxiliares do magistrado, aqueles que devem atuar com imparcialidade, algo
que é atestado pelo rigor científico empregado na produção do laudo.

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daquele momento passei a aplicar com mais segurança e sofisticação o método etnográfico,
tão precioso na Antropologia Social, somando-o a experiências que havia tido com
Arqueologia Indígena, Etnoarqueologia e Etno-história. Trata-se de uma perícia de natureza
antropológica, arqueológica e histórica sobre a Terra Indígena Buriti, localizada nos
municípios de Sidrolândia e Dois Irmãos do Buriti, em Mato Grosso do Sul, onde à época
viviam cerca de 2.500 índios Terena (Eremites de Oliveira & Pereira 2012 [2003]). Soma-se a
esta experiência a produção de outro laudo judicial, concluído em 2007 para a Justiça Federal.
Desta vez o estudo tratou da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, localizada no município de
Antônio João, na fronteira do Brasil com o Paraguai, onde em 2013 viviam aproximadamente
1.000 índios Kaiowá, falantes da língua guarani (Eremites de Oliveira & Pereira 2009a
[2007]).
Além disso, em outras quatro ocasiões participei da elaboração de estudos
complementares para a avaliação dos impactos de empreendimentos sobre comunidades
indígenas estabelecidas em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Nesses casos atuei como
antropólogo social indicado ou aprovado por lideranças indígenas, atendendo a exigências do
órgão indigenista nacional, a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), ou a um pedido do
Ministério Público Federal. A primeira, em 2008, diz respeito aos impactos da pavimentação
asfáltica da Rodovia MS-384 sobre os Kaiowá da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, onde
havia trabalhado anteriormente (Eremites de Oliveira 2010 [2008]). A segunda, em 2009, foi
sobre uma mineradora de ouro que atinge os Katitaurlu (Nambikwara) da Terra Indígena
Sararé, no vale do rio Guaporé, municípios de Pontes e Lacerda e Vila Bela da Santíssima
Trindade, em Mato Grosso, onde à época viviam cerca de 130 índios (Eremites de Oliveira &
Pereira 2009b). A terceira, entre 2010 e 2011, tratou dos impactos da duplicação da Rodovia
MS-156, empreendimento que corta a Reserva Indígena de Dourados, onde há uma grande
população de famílias Guarani, Kaiowá e Terena, somando à época cerca de 13.500 pessoas
(Eremites de Oliveira, Pereira & Dambrós 2011). A quarta, também entre 2010 e 2011, diz
respeito a uma linha de transmissão de energia elétrica que afetou os Terena da Terra Indígena
Buriti e da Reserva Indígena Tereré, nos já citados municípios de Dois Irmãos do Buriti e
Sidrolândia. À época as duas áreas totalizavam uma população ao redor de 3.000 pessoas
(Eremites de Oliveira & Pereira 2011).
Acrescento a esta relação outra experiência significativa e mais conhecida pela
imprensa brasileira. Refiro-me ao laudo administrativo apresentado em 2011 sobre uma terra
indígena reivindicada pelos Fulni-ô da comunidade multiétnica do Santuário Tapuya dos

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Pajés, na época constituída por famílias Tuxá e Kariri-Xocó, totalizando umas 40 pessoas. A
área está situada no perímetro urbano de Brasília, precisamente na Asa Norte da Capital
Federal, e tem sido drasticamente afetada por um empreendimento imobiliário. Quando lá
estive constatei a existência de muitos conflitos assimétricos e uma forte oposição de pessoas
e instituições contrárias ao reconhecimento da área como terra indígena: a própria FUNAI, o
jornal Correio Brasiliense, a elite política ligada à especulação imobiliária local e o governo
do Distrito Federal, dentre outros aliados. Do outro lado, o da comunidade indígena, havia
estudantes universitários, indigenistas, ambientalistas, parlamentares e outros apoiadores.
Feita a explicação inicial, registro que minha intenção neste trabalho não é reduzir a
discussão a um binarismo maniqueísta do tipo “os que são a favor” versus “os que são contra”
a Arqueologia de Contrato. Proceder dessa maneira seria desconsiderar o que Rocha et al.
(2013: 132) chamaram de “dicotomização reducionista que cria uma oposição entre
pesquisadores ‘ingênuos e idealistas’ e pesquisadores ‘ambiciosos que venderam as almas ao
capital’”. Minha proposição é outra. Defendo o estímulo e a manutenção de uma postura
crítica sobre a realidade que é esta modalidade da prática arqueológica no Brasil.

“Índios”: do colonialismo interno a outros assuntos


Quem me dera, ao menos uma vez,
Explicar o que ninguém consegue entender
Que o que aconteceu ainda está por vir
E o futuro não é mais como era antigamente
(Índios – Legião Urbana 1986)

As origens do colonialismo interno remontam ao processo de independência de ex-


colônias europeias e à constituição dos Estados-nações nas Américas e em outros continentes.
Foi nesse momento que as elites criollas ascenderam ao poder central e passaram a ter
controle sobre o aparato estatal.
Para melhor compreensão do assunto, apresento o conceito de colonialismo interno
redefinido por González Casanova a partir da explicação que ele próprio elaborou na década
de 1960:
La definición del colonialismo interno está originalmente ligada a fenómenos de conquista, en que
las poblaciones de nativos no son exterminadas y forman parte, primero, del Estado colonizador y,
después, del Estado que adquiere una independencia formal, o que inicia un proceso de liberación,
de transición al socialismo o de recolonización y regreso al capitalismo neoliberal. Los pueblos,
minorías o naciones colonizados por el Estado-nación sufren condiciones semejantes a las que los
caracterizan en el colonialismo y el neocolonialismo a nivel internacional: habitan en un territorio
sin gobierno propio; se encuentran en situación de desigualdad frente a las elites de las etnias
dominantes y de las clases que las integran; su administración y responsabilidad jurídico-política
conciernen a las etnias dominantes, a las burguesías y oligarquías del gobierno central o a los

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aliados y subordinados del mismo; sus habitantes no participan en los más altos cargos políticos y
militares del gobierno central, salvo en condición de “asimilados”; los derechos de sus habitantes y
su situación económica, política, social y cultural son regulados e impuestos por el gobierno
central; en general, los colonizados en el interior de un Estado-nación pertenecen a una “raza”
distinta a la que domina en el gobierno nacional, que es considerada “inferior” o, a lo sumo, es
convertida en un símbolo “liberador” que forma parte de la demagogia estatal; la mayoría de los
colonizados pertenece a una cultura distinta y habla una lengua distinta de la “nacional”.
(González Casanova 2006: 410)
Esta categoria analítica foi difundida na Antropologia Brasileira desde a década de
1960, inicialmente por Cardoso de Oliveira (1978 [1966]). Suas ideias também tiveram
inspiração nos aportes de Balandier (1993 [1951]) e González Casanova (1963), dentre outros
autores. Em linhas gerais, suas análises chamam à atenção para outra maneira de observar,
descrever e interpretar os contatos interétnicos para compreender o Brasil Indígena. Em suas
palavras:
O estudo do colonialismo interno no Brasil teria, assim, o mérito de transformar a questão
indígena – que a muitos pode parecer irrelevante – num sensível microscópio através do
qual seriam conhecidos aspectos novos do Segundo Brasil, sua dinâmica expansionista, o
sistema de poder que lhe é inerente – e cuja primeira vítima é o Brasil Indígena. A
dialética das relações entre as classes (trabalhadoras e empresariais) e os grupos tribais,
como descrevi em O Índio e o Mundo dos Brancos5 e como fizeram Laraia & Da Matta
em Índios e Castanheiros6, constituiria o fulcro da investigação desse Terceiro Brasil.
(Cardoso de Oliveira 1978 [1966]: 81)
A referida categoria serviu de base para o antropólogo formular a sofisticada teoria da
fricção interétnica, uma ruptura com a abordagem culturalista e com o paradigma da
aculturação que influenciavam os estudos etnológicos da época. Ele fez isso ao mesmo tempo
em que se dedicava como um artífice para a consolidação de um padrão de excelência para o
ensino e a pesquisa antropológica (Amorim 2001). Foi um dos fundadores do primeiro
programa de pós-graduação em Antropologia Social no Brasil, criado em 1968 no Museu
Nacional, na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na época grande parte da Arqueologia Brasileira estava marcada pela influência
histórico-cultural do PRONAPA (Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas),
desenvolvido no período de 1965 a 1970, sob a coordenação do casal Betty J. Meggers e
Clifford Evans (Souza 1991; Prous 1992; Dias 1995)7. Em que pese não desconhecer ou

5
CARDOSO DE OLIVEIRA, R. 1964. O Índio e o Mundo dos Brancos: uma interpretação sociológica da
situação dos Tikúna. São Paulo: Difusão Européia do Livro.
6
LARAIA, Roque de Barros & DA MATTA, Roberto. 1967. Índios e castanheiros: a empresa extrativa e os
índios no médio Tocantins. Prefácio de Roberto Cardoso de Oliveira. São Paulo: Difusão Européia do Livro.
7
Além desses arqueólogos, outros pesquisadores estrangeiros e brasileiros também contribuíram para o
desenvolvimento da Arqueologia Brasileira: o casal francês Joseph Emperaire e Annette Laming-Emperaire, o
estadunidense Wesley R. Hurt Jr. e os brasileiros Luiz de Castro Faria, José Loureiro Fernandes e Paulo Duarte,
dentre outros.

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desprezar as contribuições do programa, o fato é que naquele tempo a abordagem histórico-


cultural era bastante criticada na Arqueologia Americana. As críticas mais conhecidas vieram
do movimento da Nova Arqueologia ou Arqueologia Processual, liderado por Lewis R.
Binford e aliados, cujas influências chegaram muito tardiamente ao Brasil, basicamente a
partir dos anos 1980. Para esse período também é atribuída a constituição de um
establishment que passou a controlar e influenciar a Arqueologia em várias regiões do país,
mantendo-a pouco aberta à inovação ou renovação (Funari 1989, 1994; Dias 1995; Eremites
de Oliveira 2002, 2008). A partir de então, por razões das mais complexas, a Antropologia
Social e a Arqueologia seguiram caminhos distintos em muitas instituições brasileiras: a
primeira mais ligada à Sociologia e à Ciência Política, aliança esta que é mais antiga, e a
segunda geralmente mais próxima da História. Ambos os campos, porém, foram como uma
“ilha de segurança” para a realização de estudos nos tempos do regime militar (1964-1985),
ao contrário do que aconteceu em outras ciências sociais8.
Anos mais tarde, nas décadas de 1990 e 2000, em tempos marcados pela
popularização da Internet e pluralismo teórico-metodológico da Arqueologia Pós-Processual,
liderada por Ian Hodder e outros, teve início uma (re) aproximação formal entre esses campos
do conhecimento no Brasil. Este acercamento também tem a ver com o protagonismo de uma
nova geração de arqueólogos, mais sintonizada com a Arqueologia Mundial e próxima dos
Outros, os “subalternos”. Transformações dessa natureza posteriormente tiveram reflexos na
abertura de novos cursos de graduação e programas de pós-graduação em que os dois campos
do conhecimento passaram a estar juntos e articulados (Eremites de Oliveira 2014).
O que quero dizer com tudo isso, ainda que muito resumidamente, é que a perspectiva
epistêmica adotada desde longa data na Antropologia Brasileira está ligada ao que alguns
chamam, de um ponto de vista sociológico, de nation-building ou projeto de “construção da
nação”. Trata-se da tradição de compromisso com os grupos com os quais trabalham os
antropólogos sociais, algo que também é percebido como um ativismo político voltado para a
garantia de direitos (Peirano 2000; Cabral 2004). No caso da Etnologia Indígena, a tradição
está ligada ao indigenismo dos tempos de Curt Nimuendaju (1883-1945), Darcy Ribeiro
(1922-1997) e outros, uma marca da própria institucionalização da Antropologia Social desde

8
Em entrevista realizada em 2011, João Pacheco de Oliveira assim explicou sobre a Antropologia Brasileira na
década de 1970: “A Antropologia nos anos 70 era uma espécie de ‘ilha de segurança’ para você fazer os estudos
na concepção dos militares. Eles perseguiam os sociólogos, cientistas políticos, mantinham sob suspensão
historiadores e eles achavam que os antropólogos faziam outros trabalhos” (Eremites de Oliveira & Sá Junior
2013: 139). A mesma leitura é válida, no meu entendimento, para a Arqueologia Brasileira.

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a primeira metade do século XX (Souza Lima 2006). Postura um tanto quanto diferente foi
adotada na Arqueologia, conhecida pela violência epistêmica construída em relação aos povos
indígenas, algo que não é patrimônio exclusivo do Brasil (Gnecco & Langeback 2006;
Gnecco 2009). É como se eles, os Outros vistos como subalternos, não tivessem direito à
palavra, à história e nada tivessem a ver com o passado pré-colonial e, portanto, com o campo
de atuação dos arqueólogos. O que se percebe, portanto, é que a Arqueologia Brasileira estaria
mais para um projeto de “construção do Estado” (State-building) do que para um projeto de
“construção da nação” (nation-building).
A diferença assinalada explica, ao menos em parte, a ruptura e o distanciamento
epistemológico existente entre a Arqueologia Pré-histórica em relação à Etnologia Indígena e
à Etno-história ou História Indígena no país. Por este e outros motivos ainda há relativamente
poucos estudos voltados à Etnoarqueologia, Arqueologia Indígena, Arqueologia Colaborativa
e Arqueologia Pública, embora avanços tenham sido crescentes, consistentes e registrados
aqui e acolá nos últimos anos. Exemplo disso são os trabalhos realizados por Silva (2009),
Silva et al. (2008, 2011), Bespalez (2009), Stuchi (2010), Bezerra (2011), Moraes (2012),
Pinto (2013), Wanderley (2013) e outros.
Com efeito, a noção de colonialismo interno torna-se relevante para analisar o papel de
profissionais e empresas ligadas à Arqueologia de Contrato em cenários marcados pela
violação de direitos dos povos indígenas. Este é o caso de situações históricas marcadas pelo
avanço das frentes de expansão e implantação de projetos desenvolvimentistas no Brasil atual.
Um sistema estruturante dessa grandeza é marcado por relações sociais e de poder, leis,
práticas, burocracias e saberes que caracterizam formas de dominação e manutenção de
assimetrias por parte das elites políticas nacionais, geralmente euroamericanas, contra grupos
étnica e culturalmente distintos em relação a elas ou à maioria da população. Exemplo disso é
o que ocorre com comunidades Guarani e Kaiowá confinadas em pequenas reservas ou
expulsas de suas terras e acampadas às margens de rodovias em Mato Grosso do Sul (Brand
1997; Cavalcante 2013).
Em casos assim, coletividades inteiras permanecem sitiadas e constrangidas por
diversos mecanismos de sujeição: tolhimento da liberdade de ir e vir em seus próprios
territórios; ameaças de morte e assassinato de lideranças indígenas; imposição do português
como língua oficial para se comunicar com autoridades do Estado; intolerância de missões
evangélicas que demonizam as religiões nativas e promovem outras formas de violência;
implantação de uma política de educação formal e assistência à saúde em desatenção às

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particularidades de cada comunidade; ação de setores da imprensa na construção de uma


imagem negativa sobre os índios; destruição de sítios arqueológicos mais recentes, como
cemitérios e antigos assentamentos do século XX; etc.
Mecanismos de sujeição também são impostos a povos indígenas quando da
implantação de projetos desenvolvimentistas, como é o caso da construção da Usina
Hidrelétrica de Belo Monte, maior obra do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Este é um caso emblemático em que comunidades indígenas não foram devidamente ouvidas
durante o licenciamento do empreendimento. Proceder dessa forma foi um ato de violação de
direitos assegurados na Constituição Federal de 1988 e na Convenção nº. 169 da OIT
(Organização Internacional do Trabalho). O erro chegou a ser assumido publicamente em
2013 pelo ministro da Justiça, embora no mesmo ano ele tenha sido autorizado o envio de
tropas da Força Nacional de Segurança Pública para a região. A decisão foi tomada com
vistas a garantir a ordem e a continuidade das obras do empreendimento hidrelétrico,
especialmente diante da ação do movimento indígena na região.
A implantação desses projetos também conta com o devido trabalho do arqueólogo
para o licenciamento dos empreendimentos, o que geralmente ocorre de maneira acrítica e em
um contexto maior, o da mundialização do capital. Neste cenário ocorre concomitantemente a
descentralização de operações produtivas e a centralização do capital, haja vista sua
necessidade de acumulação. Disso resulta a re-localização de investimentos e atividades
produtivas, gerando a polarização da riqueza a favor de potências situadas no hemisfério
Norte. Para países localizados no hemisfério Sul há a transferência de menos riquezas e
múltiplos impactos negativos. Nesta parte meridional do planeta estão países com jovens
democracias, economias em crescimento e uma história marcada por ditaduras e políticas
colonialistas, como é o caso do Brasil. É exatamente aqui que existem classes sociais e
minorias etnias em situação de maior vulnerabilidade social, as que mais sofrem com isso
tudo, principalmente quando expulsas de suas terras (Chesnais 1996; Zhouri & Oliveira
2007).
O quadro apresentado tem a ver com o colonialismo global, uma estrutura
transnacional de relações de poder, ligada à dominação e à exploração. É conhecido pela
existência de “um sistema ampliado de transferências de países ou populações pobres a países
ou populações ricas” (González Casanova 1995: 123).
O colonialismo interno e o colonialismo global estão relacionados ao atual modelo
desenvolvimentista adotado pelo governo brasileiro, baseado no paradigma do crescimento

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econômico a qualquer custo. Seguir um paradigma assim tem reflexos negativos na política
indigenista oficial. Trata-se de um modelo que sistematicamente viola os direitos elementares
dos povos indígenas e comunidades tradicionais, além de classes sociais em situação de
vulnerabilidade social. O resultado disso é a existência de crises estruturais, com
particularidades em cada região do país, dependendo da conjuntura local, como ocorre em
Mato Grosso do Sul, onde há muitos conflitos pela posse de terras indígenas. Daí
compreender a grande insatisfação dos povos originários para com o governo central e seus
aliados, seja por conta da construção de empreendimentos que geram exclusão social e outros
impactos negativos, seja por conta da não regularização de suas terras.
Nota-se, portanto, que a discussão até aqui feita tem a ver diretamente com o uso da
Arqueologia em cenários marcados por conflitos assimétricos entre comunidades indígenas,
Estado, segmentos empresariais, ruralistas etc. Em conjunturas assim o colonialismo
influencia a produção de conhecimentos e a prática dos arqueólogos.

“Será”: da Arqueologia de Contrato à Arqueologia pelas gentes


Será só imaginação?
Será que nada vai acontecer?
Será que é tudo isso em vão?
Será que vamos conseguir vencer?
(Será – Legião Urbana 1985)

O termo Arqueologia de Contrato, tradução livre da expressão em inglês Contract


Archaeology, largamente empregada nos Estados Unidos e em outros países anglo-saxônicos,
foi popularizado no Brasil a partir da década de 1990. Tal como aconteceu no âmbito da
Arqueologia Mundial, a ideia inicial era distinguir a nova modalidade de trabalho em relação
à Arqueologia praticada em universidades, faculdades e museus. Isso ocorreu dentro de um
contexto histórico mais amplo, marcado pelo processo de (re) democratização, retomada do
crescimento econômico e posterior expansão do ensino superior no país. A situação é mais
bem verificada após o fim do regime militar (1964-1985) e a promulgação da Constituição
Federal de 1988. Constituiu-se no âmbito de uma nova ordem internacional ligada à
globalização, à mundialização do capital e à permanência de um sistema político baseado na
presença do Estado-nação.
A nova Carta Constitucional oficializou o fim de uma ditadura implantada durante a
Guerra Fria e instalou o Estado Democrático de Direito no Brasil. Além disso passou a ser um
divisor de águas na reorientação das ações do Estado Nacional junto a amplos setores da

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sociedade brasileira. Nesse período houve ainda a aprovação de convenções internacionais


das quais o país é signatário, exigindo a adequação das ações públicas e privadas às novas
diretrizes políticas e legislativas predominantes no contexto mundial. Este é o caso da
Convenção nº. 169 da OIT (Organização Mundial do Trabalho), de 1989, ratificada por meio
do Decreto nº. 5.051, de 19/04/2004. Nesse período também passou a vigorar uma nova
legislação ambiental para o licenciamento de empreendimentos potencialmente degradantes
para o meio ambiente e os seres humanos, incluindo o patrimônio cultural.
Todas essas mudanças favoreceram a um aumento substancial das demandas pelo
trabalho do arqueólogo em todo o território nacional. Isso explica grande parte do crescimento
da Arqueologia de Contrato no Brasil, especialmente no que diz respeito ao uso da
Arqueologia para o licenciamento ambiental de diversos tipos de empreendimentos e seus
desdobramentos: desde obras em uma pequena praça pública, como a Praça dos Enforcados,
localizada na cidade de Pelotas, região pampeana do Rio Grande do Sul, até a construção de
uma mega usina hidrelétrica, como a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, situada na bacia
hidrográfica do rio Xingu, próxima à cidade de Altamira, região amazônica do Pará.
Consequentemente houve a necessidade da criação de novos cursos de graduação e programas
de pós-graduação (mestrados e doutorados) em Arqueologia nas universidades brasileiras,
com vistas a atender a essas e outras demandas (Eremites de Oliveira 2014).
Foi em um contexto assim que ocorreram as primeiras discussões nacionais sobre a
Arqueologia de Contrato. No começo, ainda na década de 1990, os debates recaíram mais
sobre questões práticas, como, por exemplo, o levantamento e o salvamento de sítios
arqueológicos em áreas afetadas por diversos empreendimentos (hidrelétricas, gasodutos,
rodovias etc.). Esta preocupação é verificada nos trabalhos apresentados em 1996 durante o
Simpósio sobre Política Nacional do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, realizado em
Goiânia, no Instituto Goiano de Pré-história e Antropologia, órgão da atual Pontifícia
Universidade Católica de Goiás (Caldarelli 1997). A mesma tendência é ainda notada em
outras publicações e também nas discussões realizadas em eventos promovidos pela SAB
(Sociedade de Arqueologia Brasileira) (ver Caldarelli 1999; Caldarelli & Santos 2000; Santos
2001).
Inicialmente havia bastante otimismo em relação à nova situação vivida na
Arqueologia Brasileira: maiores recursos à pesquisa e, consequentemente, à produção e
socialização de novos conhecimentos; geração de emprego e reconhecimento da importância
do trabalho do arqueólogo; preservação e valorização do patrimônio arqueológico; etc. Isso

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GT 14 – ANTROPOLOGIA, ARQUEOLOGIA, COLONIALISMO E LICENCIAMENTO AMBIENTAL

não significa que questões ligadas à ética estiveram ausentes desde os primeiros debates
nacionais, pelo contrário. Discussões a respeito da matéria, embora menores no começo,
tenderam a aumentar rapidamente, conforme observado no Simpósio Arqueologia no Meio
Empresarial, realizado em 2000 (SAB 2002). Este evento também aconteceu em Goiânia,
cidade que sediou, portanto, dois dos primeiros eventos nacionais sobre a Arqueologia de
Contrato9. Apenas para exemplificar, questões vinculadas à relação – não raramente
conflituosa – entre arqueólogos (contratados) e empreendedores (contratantes) e entre
arqueólogos e IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) fizeram parte
da pauta dos debates: prazos e condições para a realização dos trabalhos em todas as etapas do
licenciamento ambiental; autorização oficial para realização das pesquisas; recolhimento, uso
e conservação do material arqueológico proveniente dos estudos; necessidade de
regulamentação da profissão de arqueólogo, inclusive para saber quem poderia realizar
trabalhos dessa natureza; etc.
Dos anos 1990 até meados da década de 2010, a Arqueologia de Contrato cresceu
bastante e atualmente é muitíssimo praticada tanto na academia quanto em museus em todo o
território nacional, respondendo por 98% das pesquisas realizadas no país com autorização do
IPHAN (Zanettini 2009; Wichers 2010; Tega 2012; Ferreira 2013). Até onde tenho
conhecimento, são raros os casos de arqueólogos em atividade que nunca tiveram qualquer
envolvimento com trabalhos ligados ao contrato. Não obstante a esta realidade, os números
apresentados não possuem a mesma proporcionalidade no que diz respeito a publicações
científicas. Isso porque grande parte da produção intelectual na Arqueologia Brasileira,
especialmente publicações de maior impacto científico, ainda é feita por arqueólogos que
atuam mais como professores e pesquisadores em universidades do que como técnicos ou
empresários ligados exclusivamente ao contrato.
Por isso o termo Arqueologia de Contrato às vezes possui conotação pejorativa, como
se fosse algo menor. Alguns preferem usar outras expressões para denominá-la, como
Arqueologia Consultiva ou Arqueologia Preventiva, mas quase ninguém a considera uma
Arqueologia Empresarial. Também é praticamente desconhecida e ignorada a produção e

9
Na cidade de Goiânia existe um curso de graduação em Arqueologia, oferecido desde 2006 pela Pontifícia
Universidade Católica de Goiás, cujo perfil do egresso está voltado para atender demandas apresentadas à
Arqueologia de Contrato. Esta situação exemplifica a importância e a dimensão desta modalidade da prática
arqueológica no Brasil.

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comercialização de contralaudos e pareceres, inclusive os do tipo junk science10, usados na


Justiça para defender sujeitos e organizações contrários à regularização de terras indígenas e
quilombolas no país.

A respeito deste último e polêmico assunto, muitos arqueólogos pouco ou nada


conhecem, ou demonstram interesse em tomar conhecimento, diferentemente do que ocorre
entre os antropólogos sociais que atuam no Brasil (ver Silva, Luz & Helm 1994; Pacheco de
Oliveira & Santos 2003; Víctora 2004; Boaventura Leite 2005; Eremites de Oliveira 2007,
2010, 2012a; Eremites de Oliveira & Pereira 2009a, 2012; Paim 2010; Roberto de Paula
2010; Souza Lima 2012; e outros).
Por essas e outras razões, se no começo a Arqueologia de Contrato foi recebida com
entusiasmo por parte de alguns, na atualidade é vista como decepção por parte de muitos
arqueólogos e outros cientistas sociais. Há inclusive os que avaliam que estamos diante de
uma verdadeira tragédia na Arqueologia Brasileira, conforme pontuou Cristóbal Gnecco em
conferência proferida no evento Arqueologia, Memória e História Indígena, realizado em
Florianópolis, Santa Catarina, no ano de 2012. Avaliação semelhante tem sido feita por
colegas preocupados com a participação de arqueólogos e empresas ligadas ao contrato no
licenciamento ambiental de empreendimentos que afetam comunidades locais das mais
diversas. Foi o que aconteceu durante o evento Desvelando a Arqueologia de Contrato –
Inter-Congresso do WAC, realizado em 2013 na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul,
quando apresentei este trabalho. Na ocasião veio a público o documento Arqueologia pelas
gentes: um manifesto. Constatações e posicionamentos críticos sobre a Arqueologia
Brasileira em tempos de PAC, assinado por cinco arqueólogos brasileiros, que contou com o
meu e o apoio de dezenas de colegas presentes na ocasião (ver Rocha et al. 2013)11. Depois o
documento foi amplamente divulgado nas redes sociais e saiu publicado como artigo na
Revista de Arqueologia, o periódico oficial da SAB12.

10
Nos Estados Unidos, a expressão junk science é um termo usado desde a década de 1980 para indicar qualquer
produção científica considerada espúria ou fraudulenta, apresentada em processos para influenciar decisões
judiciais. Em situações assim, a pesquisa normalmente é conduzida por motivos políticos, ideológicos,
financeiros ou outra forma tida como sem valor científico.
11
O manifesto original foi publicado no dia 27/06/2013 no blog Combate ao Racismo Ambiental:
http://racismoambiental.net.br/2013/06/arqueologia-pelas-gentes-um-manifesto-constatacoes-e-posicionamentos-
criticos-sobre-a-arqueologia-brasileira-em-tempos-de-pac-imperdivel/ (acessado em 10/03/2014).
12
Uma empresa ligada à Arqueologia de Contrato defendeu-se formalmente das que críticas que lhe foram feitas
no documento, cuja resposta, um tanto quanto confusa e inconsistente em minha opinião, foi publicada no blog
Combate ao Racismo Ambiental no dia 24/08/2013: http://racismoambiental.net.br/2013/08/direito-de-resposta-

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Devido à importância da declaração, primeiramente apresento o resumo do texto:


A expansão desenfreada do grande capital pelo país segue deixando comunidades locais,
já marginalizadas, em situações ainda mais precárias. O presente artigo (Manifesto) traz
uma reflexão crítica sobre a atuação de arqueólogos enquanto cúmplices, sendo
coniventes e participantes de processos ilegais e ilegítimos de expropriação e de
espoliação de territórios tradicionais, bens culturais e recursos naturais. A atuação acrítica
da Arqueologia de contrato nas obras do PAC, como exemplo repetido ad nauseum do
conundrum em que nos situamos, não é uma inexorabilidade de nossa disciplina, é uma
escolha política. Outras arqueologias eram possíveis antes e continuam sendo, mas devem
ser retomadas e postas em prática com urgência. Nosso primeiro compromisso é com as
gentes, não o capital. (Rocha et al. 2013: 131)
Feito isso, cito o parágrafo constante na epígrafe do manifesto:
Viramos reféns de uma legislação que preza pela preservação do patrimônio, mas que
não conseguiu, até hoje, barrar um único empreendimento com base na legislação
vigente e argumentos de que o patrimônio arqueológico é mais importante do que o
próprio empreendimento e seus inúmeros impactos, irreversíveis no caso do patrimônio
cultural. Um agravo constitui-se no fato de que, em muitos casos, não há como mitigar
ou compensar a perda do meio de vida e de memória de populações atuais que têm em
marcos geográficos específicos ou mesmo em sítios arqueológicos – sobrepostos a locais
sagrados – a gravação de sua história que raramente está escrita. (Rocha et al. 2013:
132) [itálicos no original]
Os referidos colegas argumentam basicamente sobre dez questões referentes a
problemas relacionados à Arqueologia de Contrato no Brasil. Primeira, que a trajetória atual
da Arqueologia Brasileira destoa da agenda da Arqueologia Mundial promovida pelo WAC
(Word Archaeological Congress), especialmente no que se refere à mediação de interesses
entre comunidades locais, instituições públicas e empresas estatais e privadas. Segunda, que o
governo brasileiro assume uma postura autoritária e desenvolvimentista em relação aos povos
indígenas em todo o país, sistematicamente violando seus direitos. Terceira, que a maioria da
comunidade arqueológica é omissa e conivente diante da falta de conduta ética por parte de
arqueólogos e empresas ligados ao contrato, como ocorre nos casos de violação de direitos
dos povos indígenas e comunidades tradicionais afetados por projetos desenvolvimentistas.
Quarta, que muitos arqueólogos são cúmplices de processos ilegais de expropriação e
espoliação de territórios tradicionais, bens culturais e recursos naturais. Quinta, que os
arqueólogos devem contribuir para a promoção e valorização da diversidade sociocultural,
inclusive rompendo com a violência epistêmica observada em museus onde os povos
indígenas aparecem fossilizados e relegados a um passado distante dos dias atuais. Sexta, que
a Arqueologia quando feita por meio do contrato não deve ser resumida a conhecimentos

a-publicacao-arqueologia-pelas-gentes-um-manifesto-constatacoes-e-posicionamentos-criticos-sobre-a-
arqueologia-brasileira-em-tempos-de-pac-imperdivel/ (acesso em 10/03/2014).

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desconexos, não reflexivos e produzidos em prazos exíguos e sem a inclusão das


comunidades e instituições afetadas pelos empreendimentos. Sétima, que mesmo os
arqueólogos que atuam no sentido contrário às críticas apresentadas geralmente têm seus
direitos autorais violados e os dados de suas pesquisas manipulados para atender aos
interesses de contratantes e empreendedores. Oitava, que tem sido recorrente a violação do
patrimônio cultural de comunidades indígenas, como aconteceu com os Munduruku afetados
por projetos hidrelétricos na região amazônica. Nona, que o Código de Ética da SAB é
obsoleto – e ilegal e colonialista – no que se refere à relação dos arqueólogos com povos e
comunidades tradicionais, condicionando o reconhecimento de seus direitos sobre o
patrimônio cultural à comprovação de sua vinculação ancestral com o mesmo. Décima, que a
Arqueologia Brasileira está “sendo dominada por ‘buracólogos’ acríticos e autômatos”
(Rocha et al. 2013: 133). Esta última crítica configura, no meu entendimento, a indicação da
existência de um novo establishment na Arqueologia nacional, vinculado ao contrato.
E assim finalizam seu posicionamento:
Temos a obrigação de defender a vida e o direito à terra de inúmeras populações, reconhecidas ou
não pelos critérios postos pelo próprio governo como tradicionais, e alertamos o direito (e dever)
de sermos éticos. Índios, quilombolas, ribeirinhos, caiçaras, ciganos, povo de santo, sertanejos,
enfim, as populações tradicionais socioambientalmente diversas: cabe a nós arqueólogos, como
cientistas sociais e humanos, não esquecermos que é sobre o passado dessas populações que
empreendemos esforços de pesquisa.
Entendemos, por prática arqueológica, não somente o bem fazer dessa disciplina que envolve
reflexões teóricas e proposições metodológicas adequadas, mas aquilo que a torna uma disciplina
ética: sua posição política clara e aberta em relação a todos os atores sociais que possam estar
envolvidos e que reconstroem a si mesmos com base no historicizar e ressignificar suas
representações do próprio passado. A Arqueologia não se resume a simples contagem de cacos e
elaboração de laudos técnicos. Somos contra uma Arqueologia que intenta unicamente à liberação
de áreas, uma Arqueologia que desconsidera as populações do presente.
Somos a favor do nosso direito enquanto arqueólogos de sermos éticos, e não simplesmente
cumpridores de protocolos legais, porém ilegítimos, que muitas vezes nos são impostos como a
única forma de ganharmos nosso beijú e caxirí de cada dia. A atuação acrítica da Arqueologia de
contrato nas obras do PAC, como exemplo repetido ad nauseum do conundrum em que nos
situamos, não é uma inexorabilidade de nossa disciplina, é uma escolha política. Outras
arqueologias eram possíveis antes e continuam sendo, mas devem ser retomadas e postas em
prática com urgência. Nosso primeiro compromisso é com as gentes, não o capital. (Rocha et al.
2013: 137) [negritos meus]
À vista disso, avalio que o manifesto Arqueologia pelas gentes é a mais contundente,
ousada, corajosa e dura crítica à Arqueologia de Contrato e à Arqueologia Brasileira
elaborada nas últimas décadas. Um documento assim não poderia ter sido produzido por
colegas que desconhecem os Outros, muito pelo contrário. É exatamente a partir do encontro
com os Outros de carne e osso, da interlocução vis-à-vis com as vozes subalternas e da
ruptura com a violência epistêmica predominante na Arqueologia que nasceu o documento.
De mais a mais, ao criticarem abertamente a tragédia do contrato, apresentaram uma

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verdadeira declaração pela descolonização da Arqueologia e em defesa dos direitos das


pessoas e comunidades locais, quais que sejam elas.

“Metal Contra As nuvens”: de uma etnografia do contrato às considerações finais


Não sou escravo de ninguém
Ninguém, senhor do meu domínio
Sei o que devo defender
E, por valor eu tenho
E temo o que agora se desfaz
(Metal Contra As Nuvens – Legião Urbana 1991)

Meu interesse pela Arqueologia começou em fins dos anos 1980. Faço parte de uma
geração que, no âmbito da Arqueologia Brasileira chegou a ser apontada como a dos “jovens
arqueólogos”. Assim fomos chamados antes, durante e algum tempo depois do VIII
Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira, realizado em Porto Alegre no ano de
1995. Foi quando uma chapa de oposição ganhou a direção da associação com o apoio de
muitos de nós. Mas quando éramos estudantes de graduação e até mesmo durante o curso de
mestrado, chegávamos a nos autodenominar, em tom de brincadeira, de “carregadores de
balde de ouro”. Tínhamos curso superior, trabalhávamos com afinco, ganhávamos pouco,
estudávamos bastante e queríamos derrubar velhos paradigmas e propor outros novos. Isso foi
até parte da década de 1990, quando a Arqueologia de Contrato ainda não era responsável
pela quase totalidade dos projetos realizados no país com autorização do IPHAN.
Naquele tempo para se tornar arqueólogo no Brasil tínhamos que percorrer outros
caminhos, diferentes dos de agora. Afora os formados em Arqueologia pelo antigo curso de
graduação da Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, muitos profissionais faziam
graduação em campos afins, sobretudo na História. Era lá que trabalhavam vários arqueólogos
e onde havia como fazer iniciação científica em Arqueologia. Somente depois partíamos para
um curso de pós-graduação. Nas férias escolares, por exemplo, trabalhávamos em campo sem
receber quaisquer honorários provenientes de contratos. Tínhamos apenas uma bolsa de
estudos e estávamos lá para aprender o ofício de arqueólogo. No começo nem sabíamos o que
era Arqueologia de Contrato, tampouco quanto o nosso trabalho poderia valer nesta
modalidade da prática arqueológica.
Espelhávamos mais no exemplo de nossos mestres e muitos de nós tínhamos o projeto
de seguir a carreira de arqueólogo, atuando como pesquisador e professor em instituições de
ensino superior. Isso acontecia quando estávamos de fato e de direito respirando novos ares,

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os do processo de (re) democratização do país. Saíamos de um regime de exceção,


testemunhávamos um conjunto de mudanças positivas na política nacional e não sentíamos
saudade da ditadura militar. E ainda ouvíamos Legião Urbana e outras bandas de rock.
Foi neste contexto que a Arqueologia de Contrato apareceu e passou a crescer
vertiginosamente, mudando o perfil da maioria dos arqueólogos brasileiros. Se antes a
Arqueologia dispunha de poucos recursos e postos de trabalho, a partir de então passou a
contar com mais empregos e com um dos maiores orçamentos anuais destinados à pesquisa
entre as ciências humanas e sociais. Tais recursos financeiros provêm especialmente da
produção de laudos destinados ao licenciamento ambiental de empreendimentos públicos e
privados. Para isso foi necessário construir uma linguagem e um conjunto de procedimentos
rotineiros para estudos desta natureza. Criou-se um know-how voltado para a negociação,
elaboração e desenvolvimento de projetos, incluindo orçamentos, prazos, serviços e produtos.
É exatamente isso o que muitos estudantes de Arqueologia querem saber durante o curso de
graduação, como se houvesse uma fórmula mágica para abrir uma empresa e ser bem
sucedido no ramo da consultoria científica. Por isso a Arqueologia de Contrato tornou-se
matéria meramente técnica e acrítica no currículo de certos cursos de graduação.
Hoje em dia é comum sabermos da notícia de profissionais recém-formados em
Arqueologia ou em áreas afins, estudantes de graduação e até pseudo-arqueólogos que
trabalham sozinhos em campo, sem a supervisão de um profissional mais experiente. Às vezes
estão ali coordenando equipes de trabalhadores braçais em atividades bastante complexas.
Geralmente são contratados para fazer prospecções para o levantamento arqueológico de áreas
afetadas por projetos desenvolvimentistas. Chegam a ganhar por produtividade diária e têm
metas a cumprir, como em um sistema tayolorista ou fordista de trabalho fabril: quantidade de
sondagens a fazer, distâncias a percorrer em quilômetros, número de quadrículas a escavar,
relatórios a escrever e encaminhar etc. Isso também ocorre porque no Brasil há a máxima,
válida para alguns, de que “levantamento arqueológico é coisa para estudante”. Nada mais
leviano e equivocado.
Em outras ocasiões essas pessoas coordenam até mesmo equipes de escavação.
Quando estão nesta situação, muitos se sentem empoderados e prestigiados por participar de
trabalhos de grande responsabilidade e magnitude. Às vezes foram contratados por seus
próprios professores-empregadores, os quais realizam trabalhos de contrato através das
fundações de suas universidades e empresas particulares. Dessa maneira, ou mais ou menos
assim, desde cedo passam por um processo de alienação frente à lógica do capital e à mais-

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valia do seu próprio trabalho. Minimizam a responsabilidade social do ofício de arqueólogo,


reduzindo-o a uma mera técnica, como se o campo fizesse o profissional de Arqueologia. Por
isso mesmo reproduzem discursos voltados para a excelência técnico-científica de seus
trabalhos e sua relevância para o conhecimento, preservação e valorização do patrimônio
cultural. Ao fazerem isso, descortinam um posicionamento ideológico que vai ao encontro da
ideia de desenvolvimento a qualquer custo, diretriz bastante antiga das ações do governo
brasileiro, algo típico do intelectual colonizado criticado por Fanon (1968).
Soma-se a isso uma ingênua ideia de neutralidade científica, como se isso fosse
possível, especialmente quando se trata do licenciamento de projetos que afetam a dinâmica
da vida em sociedade e a reprodução física e cultural de comunidades inteiras.
No caso dos povos indígenas contemporâneos, cujos antepassados estavam aqui muito
antes dos primeiros conquistadores europeus cruzarem o Atlântico, os mesmos são quase que
desconhecidos pelos arqueólogos brasileiros. Sobre eles temos várias representações
estereotipadas, não raramente norteadas pela ideia de aculturação ou perdas culturais, produto
do evolucionismo construído a partir do Iluminismo do século XVIII. Chega-se a falar até
sobre um provável fim da Etnoarqueologia devido ao fato de haver poucos grupos que ainda
fazem vasilhas cerâmicas e produzem artefatos líticos. Isso atesta que muitos arqueólogos têm
mais interesse pelas coisas do que pelos seres humanos que as produziram. Sobre os
antepassados pré-coloniais desses povos originários, por outro lado, construímos um conjunto
de representações. Não raramente são reducionistas, fossilizadas, exóticas e essencialistas,
pensadas a partir de teorias importadas de outras latitudes, sem base etnográfica na América
do Sul. Na verdade, por décadas desprezamos a observação participante e a Etnologia
Indígena em nome de tipologias, classificações e estatísticas sobre o comportamento humano.
Negamo-nos deliberadamente a ter um encontro vis-à-vis com os Outros de carne e osso, os
subalternos sem direito à voz, história, território e dignidade.
No entanto, os conhecimentos produzidos pelos arqueólogos poderiam provocar
mudanças positivas para a construção de outra nação, haja vista três questionamentos
filosóficos básicos: Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Quanto a isso, registro
meu ceticismo no que se refere à incorporação de saberes produzidos no subcampo da
Arqueologia Pré-histórica à história nacional. Ocorre que se tais conhecimentos não servirem
para dar mais consistência, visibilidade e valorização a uma história indígena total e de longa
duração em termos espaço-temporais, tudo o mais ficará restrito ao essencialismo e ao
exotismo da academia e dos museus.

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A análise apresentada não pode ser generalizada a todos os arqueólogos e empresas


dedicadas ao contrato. Há, de fato, pessoas que buscam atuar com seriedade neste tipo de
trabalho. Por vezes estão desiludidas da academia, dos salários pagos ao magistério superior e
das contendas assimétricas que marcam muitas das relações pessoais entre colegas de trabalho
nas universidades. Mesmo pessoas assim encontram enormes dificuldades na relação com
empreendedores que apenas desejam se livrar, o mais rápido possível, do “problema” da
Arqueologia. Esta situação tende ainda a se agravar quando os arqueólogos são chamados em
cima da hora para certas tarefas que deveriam ter sido concluídas bem antes.
Seguindo esta linha de raciocínio, tenho observado dois grandes problemas
relacionados à dimensão aos trabalhos de Arqueologia de Contrato para ao licenciamento de
empreendimentos que afetam comunidades indígenas.
Primeiro, a existência de arqueólogos que realizam estudos sem qualquer interlocução
com as representantes das comunidades (lideranças políticas, xamãs, agentes de saúde,
professores, mulheres, crianças etc.). A situação torna-se gravíssima quando trabalhos são
realizados dentro ou no entorno de terras indígenas não regularizadas pelo Estado Nacional,
como é o caso de parte da Terra Indígena Buriti. Nessas áreas, paisagens humanizadas e sítios
arqueológicos mais recentes, como ocorre no Santuário dos Pajés, não são levados em
consideração diante de um essencialismo sobre a cultura material e sua temporalidade
pretérita. Isso ocorre porque o arqueólogo é quem em tese possui a autoridade para dizer o
que é e o que não é sítio arqueológico13. Há até empresas que orientam seus técnicos a
desconsiderar locais onde ocorrem até cinco fragmentos de vasilhame cerâmico ou a mesma
quantidade de lascas líticas. Além disso, quando há o salvamento de sítios mais antigos,
especialmente os do período pré-colonial, isso ocorre sem autorização e participação dos
indígenas. Não raramente arqueólogos profanam lugares que para os povos originários têm
grande significado dentro de suas tradições e cosmologias. Neste caso, entendo que proceder
dessa maneira fere diretamente os direitos conquistados na Convenção nº. 169 da OIT sobre
povos indígenas e tribais. Definitivamente não cabe ao arqueólogo valer-se de uma suposta
autoridade científica para dizer se determinado bem arqueológico está ou não diretamente
vinculado a este ou aquele povo. O que mais importa é o sentido que paisagens, lugares e
coisas possuem para as comunidades dentro do que consideram como tradicional. Situação
13
No campo da Arqueologia, sítios arqueológicos são comumente entendidos como quaisquer lugares, em
ambientes terrestres e aquáticos, onde ocorrem evidências materiais da presença humana pretérita. A definição
parece simples e objetiva, embora não haja consenso sobre o limite cronológico mais recente e por vezes até a
respeito da quantidade mínima de vestígios que possam caracterizá-los.

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semelhante ocorre com a educação patrimonial, confundida por muitos de nós como sinônimo
de Arqueologia Pública. Geralmente é reduzida a levar conhecimentos aos Outros – como se
nada tivessem a ensinar aos arqueólogos – e à distribuição de panfletos e cartilhas. Tudo isso
tem levado comunidades indígenas e aliados a denunciarem publicamente alguns arqueólogos
e certas empresas, conforme tem sido divulgado pela imprensa e nas redes sociais.
Segundo, ao trabalhar no licenciamento ambiental de projetos desenvolvimentistas,
arqueólogos tornam-se uma espécie de agentes de um colonialismo interno no contexto da
mundialização do capital e do colonialismo global. Isso ocorre à medida que seus trabalhos
também servem para ceifar direitos étnicos, sobretudo direitos territoriais. Exemplo disso é
quando o resultado de laudo arqueológico, produzido para o licenciamento ambiental, é usado
em juízo para corroborar a tese de que determinada área não seria terra indígena porque ali
não foram encontradas provas materiais de ocupação tradicional. Se uma situação desse tipo
pode ser considerada preocupante, a produção de contralaudos do tipo junk science é algo
simplesmente inadmissível.
Por isso se faz necessário tratar da questão dos contralaudos produzidos no âmbito da
Arqueologia de Contrato. Para isso valho-me aqui da experiência que tive na elaboração do
laudo pericial sobre a Terra Indígena Buriti (Eremites de Oliveira & Pereira 2012).
O referido laudo foi entregue à Justiça Federal em fins de 2003 e originalmente possui
334 páginas e 10 documentos anexos: partes do diário de campo do etnólogo Roberto Cardoso
de Oliveira (2002), quem esteve em Buriti no começo da década de 1950, documentos da
década de 1940 produzidos por funcionários do antigo SPI (Serviço de Proteção aos Índios) e
outros. No estudo constam dados sistematicamente obtidos por meio de pesquisas
etnoarqueológicas, etnográficas e etno-históricas, os quais comprovam que a área periciada é
terra tradicionalmente ocupada por comunidade indígena14. O estudo foi alvo de críticas
apresentadas em um parecer elaborado sob forma de contralaudo no começo de 2004,
contendo 16 páginas, ao menos tal como publicado nos anais do XIII Congresso da Sociedade
de Arqueologia Brasileira, realizado em 2005 na cidade de Campo Grande, Mato Grosso do

14
A Constituição Federal de 1988 em seu Art. 231 assim define o que são terras indígenas no Brasil: “§ 1º - São
terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para
suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar
e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. Esta definição em
nada tem a ver com terras ocupadas, ininterruptamente ou não, desde tempos pré-coloniais até os dias de hoje,
mas à maneira como grupos indígenas se relacionam em tempos recentes com seus territórios (ver Silva et al.
1994; Boaventura Leite 2005; Eremites de Oliveira 2007, 2012a; Eremites de Oliveira & Pereira 2009a, 2010;
Souza Lima 2012).

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Sul15. Não obstante ao direito de ampla defesa e do contraditório, trata-se de um contralaudo


repleto de inconsistências e impropriedades, espécie de junk science, cujo propósito maior é
construir a “verdade” que interessa aos patrões ou contratantes. Foi produzido por um
arqueólogo que à época estava empoderado na direção da SAB e no comitê de avaliação da
CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) para a área de
Antropologia/Arqueologia. No entanto, ele sequer foi à região de Buriti fazer algum estudo
arqueológico, etnológico ou etno-histórico que pudesse embasar com dados empíricos seu
parecer. Valeu-se basicamente do trabalho de terceiros que não são arqueólogos ou
antropólogos sociais, da autoridade científica e do poder que tinha em mãos para autorizar sua
própria fala e defender os ruralistas envolvidos no litígio pela posse da terra. O trabalho foi
uma “consultoria técnico-científica, neutra”, assim justificada pela própria autoria, como se
houvesse neutralidade científica na Arqueologia de Contrato ou em qualquer outra esfera
científica.
O contralaudo reproduz uma estratégia bastante conhecida entre antropólogos sociais
que prestam esse tipo de serviço ao poder judiciário. Inicialmente sua autoria desqualifica
profissionalmente e acusa de parcial o perito arqueólogo da Justiça Federal. Isso é feito com a
autoridade de ser “Presidente Nacional da Sociedade de Arqueologia Brasileira”. Depois
apresenta a tese de que a área em litígio teria sido ocupada concomitantemente pelos
indígenas e fazendeiros que se estabeleceram na região. Para isso ele despreza toda a pesquisa
etnográfica, etnoarqueológica e etno-histórica feita pelos peritos. Chega a fazer referência a
um trabalho de sua autoria, também feito por meio do contrato, sobre a ocupação indígena
pré-colonial de uma área próxima, cujo assunto não tem a ver diretamente com a presença dos
Terena na Serra de Maracaju16. Além disso, interpreta de maneira errada a legislação
indigenista sobre o assunto, propositalmente deturpando o conceito de terras indígenas como
áreas que deveriam ser ocupadas ininterruptamente desde tempos pré-coloniais até o presente
momento.

15
Embora publicado nos anais, o trabalho não foi apresentado publicamente durante o evento, quando seria
debatido com antropólogos sociais e arqueólogos presentes no congresso.
16
O Art. 231 da Constituição Federal de 1988 diz respeito a “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” e
não a terras ocupadas desde tempos imemoriais ou “pré-históricos”. Pensar o contrário denota equívoco, algo
que está presente como vício em laudos que o mesmo arqueólogo fez para a Justiça Federal no estado. Por isso
não raramente afirma que as áreas por ele periciadas não eram terras indígenas, tese que não se sustenta à luz do
Direito e da Antropologia Social, conforme demonstrei para o caso da Terra Indígena Sucuri’y (Eremites de
Oliveira 2007). Paradoxalmente, se era perito da Justiça em processos anteriores, no envolvendo a Terra
Indígena Buriti esteve como experto da parte dos ruralistas.

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GT 14 – ANTROPOLOGIA, ARQUEOLOGIA, COLONIALISMO E LICENCIAMENTO AMBIENTAL

Uma situação desse tipo seria percebida como desvio de conduta ética e teria grande
repercussão em várias categorias profissionais e associações científicas. No entanto, à época a
questão foi tratada como algo de menor importância por parte de muitos arqueólogos
associados à SAB que souberam do ocorrido. A situação atesta a violência epistêmica e o
distanciamento da Arqueologia Brasileira em relação à realidade contemporânea dos povos
indígenas no país.
Em suma, a Arqueologia de Contrato quando praticada dentro ou nas proximidades de
terras indígenas, regularizadas ou não pelo Estado Brasileiro, precisa ser acompanhada pelas
comunidades locais, sociedade civil organizada, Ministério Público Federal, FUNAI, IPHAN
e outros órgãos. No caso de relatórios produzidos para o licenciamento ambiental de
empreendimentos dos mais variados, os estudos devem ser previamente aprovados pelas
comunidades indígenas antes de seguir adiante, em atenção à Convenção nº. 169 da OIT e a
dispositivos constantes na legislação nacional. No caso de contralaudos sob forma de junk
science, faz-se imprescindível apurar os fatos garantindo o amplo direito de defesa e punir
exemplarmente os eventuais culpados. Portanto, devemos seguir com uma postura crítica
diante da Arqueologia de Contrato, o que remete a um contínuo (re) pensar sobre a própria
formação e a práxis dos arqueólogos no Brasil.

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