Introdução
O ordenamento jurídico brasileiro não estabelece um conceito próprio e
geral de bens públicos, limitando-se a caracterizar a sua abrangência geográfica
ou política o que impede uma demarcação mais clara quanto ao seu âmbito de
proteção e limitações de uso. Assim, no art. 98 do Código Civil, explicita que são
públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público
interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
1
Como já afirmado quanto ä legislação, também na dogmática brasileira, sequer se definem conceitualmente
tais bens, apenas sendo demarcados os seus âmbitos de titularidade. São bens públicos tanto aqueles
pertencentes à União Federal, Estados e Municípios, como aqueles pertencentes a autarquias, fundações
de direito público e associações públicas. Já os bens pertencentes às empresas públicas e sociedades de
economia mista são compreendidos como privados, inclusive em decorrência da previsão constitucional
de que as atividades dessas entidades regem-se, quanto ao direito civil e comercial, pelas mesmas regras
aplicáveis às empresas privadas (CARVALHO FILHO, 2008. p. 923 e 924).
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
2
Luigi Ferrajoli propõe uma definição teórica, puramente formal ou estrutural, de “direitos fundamentais”,
os quais são tidos como aqueles direitos subjetivos que dizem respeito universalmente a “todos” os seres
humanos enquanto dotados do status de pessoa, ou de cidadão ou de pessoa capaz de agir (2011, p. 9).
Nesse sentido, “direito subjetivo” é compreendido como “[...] qualquer expectativa positiva (ou prestação)
ou negativa (a não lesão) vinculada a um sujeito por uma norma jurídica, e por status a condição de um
sujeito prevista também esta por uma norma jurídica positiva qual pressuposto da sua idoneidade a ser
titular de situações jurídicas e/ou autos dos atos que estão em exercício” (FERRAJOLI, 2011, p. 9).
O objetivo do autor não é apresentar uma definição dogmática, formulada com referência às normas
de um ordenamento jurídico concreto. Sua meta se expande para que os direitos fundamentais possam
ser enquadrados em um ordenamento jurídico em referência a todos os indivíduos, enquanto humanos,
cidadãos ou capaz de agir (FERRAJOLI, 2011).
Para tanto, tem-se os direitos fundamentais consistentes em expectativas negativas ou positivas, às quais
correspondem deveres (de prestações) ou proibições (de lesões). Tais deveres e proibições são denominados
garantias primárias e o dever de reparar ou sancionar judicialmente as lesões dos direitos são chamadas de
garantias secundárias – isto é, por serem referentes às violações das suas garantias primárias (FERRAJOLI,
2011).
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
Por isso, sua definição é tida como estrutural, visto que dispensa a natureza dos interesses e das necessidades
tuteladas com o seu reconhecimento como direitos fundamentais. Além disso, prioriza o caráter universal
da sua imputação, este compreendido no sentido puramente lógico e avalorativo da qualificação universal
de classe de sujeitos que deles são titulares. Assim, essa definição é relevante à medida que releva
eventualidades e se torna válida para qualquer ordenamento (FERRAJOLI, 2011).
Isso também é pertinente por que a universidade dos direitos fundamentais não é absoluta. Ao contrário,
é relativa, em conformidade aos argumentos com referência aos direitos fundamentais que possam
ser excluídos. Nesse ponto, Ferrajoli (2011) alerta para o fato de que a questão da igualdade é a que
determinará a quantidade e da qualidade dos interesses protegidos como direitos fundamentais.
Pela definição de Ferrajoli, as classes de sujeitos podem ser identificadas, conforme a igualdade, “pelo
status determinado pela identidade de ‘pessoa’ e/ou de ‘cidadão’ e/ou de ‘capaz de agir’” (FERRAJOLI,
2011, p. 12). Em tal trilhar, mostram-se como parâmetros de igualdade e de desigualdade as condições
de titularidade dos direitos fundamentais, quais sejam a personalidade, cidadania e capacidade de agir.
Assim, “[...] a extensão de tais classes, ou seja, da supressão ou redução das diferenças de status das quais
elas são determinadas, que depende a extensão da igualdade, e, logo, o grau de democratização em
dado ordenamento” (FERRAJOLI, 2011, p. 12). Atualmente, contudo, a cidadania e a capacidade de agir
são as diferenças de status que delimitam a igualdade das pessoas humanas: aquela, referente direitos da
personalidade e direitos da cidadania, que é superável; e esta, insuperável, condizente aos direitos primários
(ou substanciais) e aos direitos secundários (ou instrumentais ou de autonomia), os quais, por sua vez,
dizem respeito a todos ou somente às pessoas capazes de agir.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
3
No entanto, há uma diferença entre a indisponibilidade dos direitos fundamentais e a dos bens fundamentais.
Enquanto a primeira é uma indisponibilidade conceitual lógica, e, portanto, inviolável, ligada à natureza de
generalidade, abstração e heteronomia das normas que estabelecem direitos fundamentais, a segunda é
uma indisponibilidade somente jurídica, e, portanto passível de violação, dado que os bens fundamentais,
de fato, são sempre materialmente disponíveis. Por isso, a garantia da indisponibilidade de tais bens
possui a forma de proibição, de fato violável, de disposição. Em suma, enquanto a indisponibilidade dos
direitos fundamentais é do tipo alético, de tal modo que uma eventual disposição deles é sabidamente
inexistente, aquela dos bens fundamentais é de tipo deôntico, pelo que uma sua eventual disposição seria
apenas um ato ilícito. Um ato de venda da liberdade de consciência ou de manifestação do pensamento,
por exemplo, seria irrealizável e sem sentido, dado que as normas que estabelecem tais liberdades são
normas heterônomas cuja existência é independente de qualquer coisa que possamos pensar ou fazer. Pelo
contrário, a venda ou a destruição de um bem fundamental são fatos que quando irreversíveis se resolvem
em perdas e danos, multas ou mesmo sanções de ordem penal e administrativa, vale dizer, o direito não
pode impedir a sua concreta comissão, mas somente proibi-la e puni-la como ilícita (FERRAJOLI, Luigi. Por
uma carta de bens fundamentais. Florianópolis, Revista Sequência, nº 60, p. 29-73, jul. 2010).
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
Tais bens são assim considerados por serem vitais e, por isso, são funda-
mentais à vida, protegidos com as garantia jurídicas de proibições de sua lesão
ou de obrigações de sua prestação. Acerca de sua constitucionalização, Ferrajoli
comenta que:
Nessa perspectiva, às muitas cartas e convenções internacionais e constitucionais
dos direitos fundamentais, deveriam ser acrescentadas Cartas constitucionais e
Cartas internacionais dos bens fundamentais, idôneas, por um lado, como garan-
tia dos bens personalíssimos e dos bens comuns para impor limites rigorosos
ao mercado e ao desenvolvimento industrial; por outro lado, como garantia dos
bens sociais, para vincular a política para torná-los acessíveis a todos. Tratar-se-ia
de normas téticas no sentido acima ilustrado: isto é, de normas que, diferen-
temente das normas hipotéticas que disciplinam a troca de bens patrimoniais,
constituiriam elas mesmas tais bens como fundamentais, não diversamente de
como fazem as atuais normas do código civil, que constituem tais bens como
“bens públicos”, como se verá mais adiante; somente que deveria tratar-se de
normas de nível constitucional e, se necessário, de nível internacional, donde os
limites e vínculos impostos ao mercado e à política para a tutela de tais bens são
resguardados das violações do legislador ordinário e por isso das maiorias contin-
gentes. (FERRAJOLI, 2011, p. 61)
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
4
Em realidade há que se distinguir entre direito de propriedade como típico direito patrimonial daquele
que já possui o domínio de um bem por já ter cumprido todas as condições de sua aquisição, do direito à
propriedade como direito fundamental inalienável de toda pessoa a aspirar ou conquistar tal direito, que,
ao ser consolidado, evidentemente torna-se direito patrimonial. A propósito desta discussão, Mario Jori,
em crítica a Ferrajoli, menciona o boxe e o uso voluntário de substâncias tóxicas como o cigarro, como
renúncia voluntária ao direito à saúde que, em princípio, seria um direito indisponível. Cita ainda o piercing
como exemplo de autolesão consentida e chama de paternalismo a intenção de fazer os outros adotar essas
ideias, ou seja, para ele a pessoa tem o direito de fazer o que quiser com sua vida, abrindo mão de sua
liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais. Assim, estes deveriam ser alienáveis. Entretanto,
Jori erra o alvo de sua crítica ao não perceber que o que é indisponível ao sujeito é o seu direito a ter tais
direitos protegidos pelo Estado. Sendo assim, o sujeito de tais direitos não pode impedir que aquele que os
lese em quaisquer âmbitos de proteção seja a sua saúde ou integridade física, por exemplo, seja julgado e
eventualmente condenado pela jurisdição estatal. Em síntese, o que se constitui como inalienável na esfera
de proteção dos direitos fundamentais é a proteção, através de diversas garantias, que o Estado de Direito
deve efetivar.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
5
A título ilustrativo, podem ser elencados bens mencionados em diversos dispositivos da Constituição Fede-
ral, como “os ‘bens’ do patrimônio histórico, cultural (artigos 30 e 216), artístico, turístico e paisagístico
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
insuficiência do conceito de bens públicos adotado pelo atual Código Civil afir-
mando tratar-se de concepção extremamente individualista. Segundo o autor,
“especialmente a partir da CF/1988, é necessário reconhecer a existência de uma
categoria de bens que é de titularidade, mas não de uso comum do povo. Trata-se
do meio ambiente e de outros recursos naturais, cujo uso e fruição podem ser
interditados ao povo em geral. É necessário reconhecer, então, a existência de
uma outra categoria específica de bens públicos, consistente nos bens públicos
comuns protegidos” (JUSTEN FILHO, 2013, p. 1111). O fato é que o conceito
adotado pelo atual Código Civil utiliza critério objetivo, despido de qualquer
conteúdo valorativo: definem-se os bens como públicos ou privados de acordo
com a pessoa que lhes detenha a propriedade (aqui entendida como a proprie-
dade pública, e não a propriedade privada): se a entidade possui personalidade
jurídica de direito público, seus bens são públicos por determinação legal. Dessa
forma, pela legislação vigente, a finalidade ou atribuição dada a um bem em
nada interfere quanto à sua classificação como bem público: pode haver bens
públicos sem qualquer finalidade (como muitos bens dominiais).
Topologicamente, esse dispositivo está incluído no Livro II (Dos Bens),
Título Único (Das diferentes classes e bens), Capítulo II (Dos Bens Públicos)
do Código Civil. Dessa forma, a definição abarca tanto bens móveis quanto bens
imóveis.
É um conceito ligado à noção de propriedade, mas o exercício dos direitos
típicos de propriedade (uso, gozo e disponibilidade da coisa) não se aplicam aos
bens públicos da mesma forma como se aplicam aos bens privados. Por exemplo,
no caso dos bens de uso comum, toda a coletividade usa e goza dos bens públicos
e não a pessoa jurídica de direito público que lhes titulariza a propriedade. Por
isso, é possível afirmar que as noções de propriedade são aplicáveis quando esse
regime não for derrogado pelas normas de direito público, tais como o direito
de reivindicação, exercido por meio dos interditos possessórios.
No que se refere às pessoas jurídicas detentoras de autonomia política que
integram a federação brasileira, fora os territórios, o art. 41 do Código Civil lista
quais destas pessoas jurídicas são de direito público interno:
a) a União;
b) os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;
c) os Municípios;
A seguir, o dispositivo, em total desarticulação com uma taxonomia ade-
quada a uma diferenciação entre descentralização política, referida às Pessoas
Jurídicas de direito público interno já enumeradas e descentralização adminis-
trativa, elenca:
(artigo 24), o patrimônio nacional (artigos 49, I e 219), bem como patrimônio social, tutelado pelo parquet
(artigo 129, III)”.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
6
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 780.401/DF. Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça. Relatora Ministra Nancy Andrighi. Julgado em 03.09.2009. Diário de Justiça Eletrônico divulgado
em DJe 21.09.2009.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
a) Inalienabilidade
Uma das características do bem público (tal como definido no art. 98) é a
chamada inalienabilidade. Um dos mais importantes atributos da propriedade
privada é o direito de dispor, de modo que a inalienabilidade implica justamente
em importante restrição ao direito de dispor. É, portanto, nota distintiva do que
se chama de propriedade pública contraposta, nesse contexto, à clássica noção de
propriedade privada.
Em primeiro lugar, convém explicar que a inalienabilidade atinge com
diferente intensidade cada categoria de bens públicos. Os bens públicos de uso
comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a
sua qualificação, na forma que a lei determinar (art. 100, CC/2002). Ou seja,
enquanto estiverem afetados a uma finalidade pública, não podem ser alienados.
Nesse particular, a inalienabilidade dos bens de uso comum configura situação
peculiar, sobretudo quando considerados, de uma forma geral, o meio ambiente,
os recursos naturais, a água, e outros bens ecológicos, independentemente da
classificação que lhes é atribuída pelo ordenamento nacional.
Isso porque, a proteção dos bens de uso comum, segundo a definição pro-
posta por Ferrajoli,7 constitui-se em interesse vital de todos, pro indiviso, como
patrimônio comum da humanidade, o que torna a sua proteção – e, consequen-
temente, a possibilidade de alienação – uma questão fundamental à organização
estatal. Bem por isso, o autor sugere que tais bens sejam submetidos à mesma
proteção normativa dispendida aos bens públicos e, “como tais, subtraídos à
apropriação e à negociação privada e confiados à tutela da autoridade admi-
nistrativa” (FERRAJOLI, 2011, p. 71/72). Diversamente, mas ainda no mesmo
sentido, os bens classificados pelo autor na categoria de bens sociais – a exemplo
da água, dos alimentos e medicamentos – para que sejam garantidos a todos
devem ser subtraídos à lógica do mercado e atribuídos à responsabilidade do
Poder Público, em termos de produção e distribuição. Ao contrário dos bens de
uso comum, tal categoria de bem pode ser interpretada sob a ótica patrimonial,
mas apenas quando não afetar os interesses vitais da humanidade.
Voltando à análise da legislação de regência nacional, como cediço, os
bens públicos dominicais podem ser alienados, desde que observadas as exi-
gências da lei (art. 101, CC/2002). Isso quer dizer que para a Administração
Pública poder alienar um bem, ela tem que primeiro torná-lo dominical, precisa
7
“[…] bens comuns: tais são os bens de todos – aqueles que os romanos chamavam de res communes
omnium – como o ar, o clima, a água, as órbitas dos satélites, as bandas do éter, os recursos minerais das
profundezas marinhas, a assim chamada biodiversidade e todos os outros bens do patrimônio ecológico da
humanidade” (FERRAJOLI, 2011, p. 67).
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
desafetá-lo de sua função pública. Dessa forma, pelo Código de 2002, é possível
defender uma alienabilidade nos termos da lei.
Na oportunidade, vale lembrar que a alienação de bens da Administração
Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será pre-
cedida de avaliação e obedece a normas específicas (art. 17, Lei n. 8.666/1993).
No caso de bem imóvel, a alienação depende de autorização legislativa
para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais.8
Além disso, para todos, inclusive as entidades paraestatais, a alienação depende
de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada a
concorrência apenas nas exceções arroladas no mesmo dispositivo legal (art. 17,
I, Lei n. 8.666/1993).
b) Impenhorabilidade
Os bens públicos são também impenhoráveis. Esse traço decorre do ante-
rior (a inalienabilidade), já que o curso lógico da penhora é a alienação em
praça pública. Por isso, parte da doutrina não distingue essas duas característi-
cas, entendendo que a impenhorabilidade é consequência da inalienabilidade
(CRETELLA JUNIOR, 1969, p. 32). Além de impenhoráveis, os bens públi-
cos também não podem ser embargados ou hipotecados, já que ambos os atos
podem levar à alienação do bem, a qual, como já visto, só pode ocorrer na forma
da lei.
Na verdade, a prerrogativa da impenhorabilidade subtrai os bens da
Administração Pública das vias executivas comuns, ou seja, o regime jurídico
de direito público preserva esses bens de qualquer ato que resulte de uma even-
tual alienação forçada. Na verdade, créditos contra a Administração Pública
são cobrados por via específica, qual seja, aquela dos precatórios, conforme a
regra do art. 100, CR (que, inclusive, sofreu recente modificação pela Emenda
Constitucional n. 62/2009),9 a qual estabelece que os pagamentos devidos pela
Fazenda Pública em decorrência de condenação judicial devem ser realizados na
ordem cronológica de apresentação dos precatórios. Assim, a garantia oferecida
aos credores é diversa daquelas do direito privado.
Os bens públicos mencionados pelo art. 98, CC/2002, podem ser móveis
ou imóveis. Como tanto bens móveis quanto bens imóveis são considerados bens
8
Toma-se como exemplo de autorização legislativa para a alienação de bens públicos imóveis, a Lei Federal
nº 9.491/1997, sancionada pelo ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que instituiu
o Programa Nacional de Desestatização, envolvendo empresas públicas, sociedades de economia mista,
bens e serviços elencados nos incisos do artigo 2º do referido diploma legal. O parágrafo 1º do artigo
2º da sobredita legislação conceituou como desestatização: “a alienação, pela União, de direitos que lhe
assegurem, diretamente ou através de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o
poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade” o que poderia ser perfectibilizado via leilão de
ações e, ainda, “a transferência ou outorga de direitos sobre bens móveis e imóveis da União”.
9
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais,
em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos
precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações
orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
c) Imprescritibilidade
No ordenamento jurídico atual, nenhum bem público é passível de pres-
crição aquisitiva, ou seja, nenhum deles pode ser usucapido. Essa vedação tem
amparo constitucional em dois dispositivos: a) não é possível a usucapião laboral
(sobre imóvel urbano ou rural, na forma do art. 191, caput e parágrafo único), nem
b) a usucapião de imóvel urbano com fins de garantir o direito à moradia (art.
183, caput e §3º, CR). Ademais, o Código Civil ecoa a vedação constitucional,
proibindo a sujeição de bens públicos – quaisquer bens públicos – à usucapião
(art. 102, CC/2002).
Na oportunidade, convém mencionar que, via de regra, os direitos reais
sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adqui-
rem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos
(art. 1.227, CC/2002). Por isso, no Registro de Imóveis, registram-se as senten-
ças declaratórias de usucapião (art. 167, I, 28, Lei n. 6.015/1973). Também os
bens imóveis públicos possuem matrícula no Registro de Imóveis e, a partir do
momento em que um bem passa a ser de propriedade de um ente público, o
registro seguinte jamais poderá ser de uma sentença de usucapião, justamente
por conta da característica da imprescritibilidade.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
Referências bibliográficas
ARAÚJO, Edmir Netto. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.
CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa –
Anotada. Vol 1, art. 1º a 107º. 4. ed. Rev. Coimbra: Coimbra Editora, 2007.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008.
FERRAJOLI, Luigi. Los fundamentos de los derechos fundamentales. Madrid: Trotta. 2001.
______. Por uma teoria dos direitos e dos bens fundamentais. Coleção Estado e Constituição – II.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. O direito de antena em face do direito ambiental no Brasil.
São Paulo: Saraiva, 2000.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2013.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 9. ed. São Paulo: Malheiros,
2001.
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Bens Públicos: função social e exploração econô-
mica: o regime jurídico das utilidades públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2009.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros,
2003.
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação Civil Pública. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação Civil
Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 18, n. 96, p. 43-60, mar./abr. 2016