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ESTADO DO CEARÁ

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DESEMBARGADOR FERNANDO LUIZ XIMENES ROCHA

Processo: 0021021-37.2014.8.06.0151 - Apelação


Apelante: Município de Acopiara
Apelado: Gutemberg de Freitas Alves
Relator: Desembargador Fernando Luiz Ximenes Rocha.

EMENTA: ADMINISTRATIVO E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL.


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ACIDENTE
DE TRÂNSITO OCASIONADO POR MOTORISTA QUE DIRIGIA
MICRO-ÔNIBUS A SERVIÇO DO ENTE PÚBLICO. COLISÃO
TRASEIRA. IMPRUDÊNCIA. OFENSA AO ART. 29, INC. II, DO
CTB. PRESUNÇÃO DE CULPA DAQUELE QUE COLIDE NA
TRASEIRA DE OUTRO VEÍCULO. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA DO MUNICÍPIO DE ACOPIARA (ART. 37, § 6º, DA
CF/1988). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DAS EXCLUDENTES
DE RESPONSABILIDADE. PRESENÇA DO NEXO DE
CAUSALIDADE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE REPARAÇÃO.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
MAJORADOS PELO TRABALHO ADICIONAL EM GRAU DE
RECURSO. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Cinge-se a controvérsia a aferir a responsabilidade do ente público
municipal pelos danos materiais ocasionados ao apelado por acidente de
trânsito, em 26.09.2014, decorrente da colisão com veículo dirigido por
motorista que prestava serviço ao Município de Acopiara.
2. O artigo 37, § 6º, da CF/1988 prescreve a responsabilidade objetiva do
Estado pelos danos causados por seus agentes ou por particular a serviço
da Administração Pública. Nesse contexto, para a comprovação da
responsabilidade civil objetiva é preciso que se configurem os seguintes
requisitos: (a) dano, (b) ato danoso, e (c) nexo de causalidade entre a
conduta e o prejuízo. Ausente qualquer deles, não estará configurado o
direito à indenização.
3. Ao analisar o disposto no art. 29, II, do CTB, o Superior Tribunal de
Justiça firmou orientação no sentido de que "culpado, em linha de
princípio, é o motorista que colide por trás, invertendo-se, em razão
disso, o onus probandi, cabendo a ele a prova de desoneração de sua
culpa" (STJ. AgRg no REsp 1416603/RJ, Rel. Ministro PAULO DE
TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em
24/02/2015, DJe 03/03/2015).
4. In casu, vislumbra-se que o acidente e os consequentes danos foram
provocados exclusivamente pela conduta do motorista do micro-ônibus
que, ao tentar realizar manobra de ultrapassagem, colidiu na traseira do
veículo do autor, que perdeu o controle da direção, vindo a sair da pista e
a capotar algumas vezes. Ademais, denota-se que na ocasião do sinistro o

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motorista prestava serviço ao Município de Acopiara, referente ao


transporte de doentes e pacientes a consultas e exames médicos marcados
na cidade de Fortaleza. Desse modo, verificando-se a ocorrência do fato
danoso, a culpa do condutor e o nexo de causalidade, deve ser
reconhecida a responsabilidade objetiva do Município de Acopiara pelos
eventuais danos suportados pelo recorrido.
5. Não há falar em culpa exclusiva do autor, pois inexiste prova nos autos
de qualquer conduta inadequada de sua parte (art. 373, II, do CPC/2015).
6. Honorários advocatícios majorados para 12% (doze por cento) sobre o
valor da condenação.
7. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito


Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por uma de suas Turmas, à unanimidade,
em conhecer da apelação para negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator.

Fortaleza, 05 de fevereiro de 2018.

DESEMBARGADOR FERNANDO LUIZ XIMENES ROCHA


Relator

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RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível interposta pelo Município de


Acopiara em face de sentença (fls. 225-233) proferida pela Juíza de
Direito Ariana Cristina de Freitas, da 3ª Vara da Comarca de Quixadá,
que julgou procedente o pleito formulado por Gutemberg de Freitas
Alves, nestes termos:

Ante o exposto e por mais do que nos autos consta, julgo,


TOTALMENTE PROCEDENTE a sentença para condenar de
forma solidária os requeridos JR LOCAÇÕES DE MÁQUINAS E
EQUIPAMENTOS LTDA ME e MUNICÍPIO DE ACOPIARA/CE,
ao pagamento de danos materiais no valor de R$ 13.175,00
(treze mil, cento e setenta e cinco reais), referente às despesas
decorrentes do conserto do veículo, a ser corrigido
monetariamente, a partir da data do efetivo prejuízo, nos termos
da súmula 43 do STJ e com fluência de juros de mora a partir da
data do ato danoso, nos termos da súmula 54 do STJ.
Custas e honorários advocatícios a cargo da parte
sucumbente, estes arbitrados em dez por cento sobre o valor
atualizado da condenação, em conformidade com o mandamento
do art. 85 do NCPC. (fls. 232-233).

Na sentença recorrida, a Judicante singular observou: a) que


a demanda cinge-se a pedido de indenização por danos materiais
advindos de acidente de trânsito provocado pela colisão com o veículo,
conduzido por agente que estava prestando serviço ao Município de
Acopiara, de propriedade da empresa JR Locações de Máquinas e
Equipamentos LTDA; b) “a presunção da culpa é sempre daquele que
bate na parte traseira do outro veículo” (fl. 228); c) a responsabilidade
objetiva do ente público; d) a responsabilidade solidária da empresa ré,
consoante Súmula 492 do STF; e e) a presença do dano material.

Transcurso in albis do prazo para JR Locações de Máquinas


e Equipamentos Ltda. apresentar recurso (Certidão de fl. 244).

Nas razões recursais (fls. 247-257), o apelante aduz, em


síntese, que o fato narrado pelo autor não acarreta a sua

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responsabilidade objetiva, ante a culpa exclusiva da vítima, que dirigia o


veículo sem as cautelas necessárias. Subsidiariamente, pugna pelo
reconhecimento da culpa concorrente e pela redução do quantum
indenizatório.

Contrarrazões às fls. 271-274.

Em 17.10.2017, os autos foram a mim distribuídos por


sorteio no âmbito da 1ª Câmara de Direito Público (Termo de pág. 284).

Ausente o interesse público (art. 178 do CPC/2015), deixei


de remeter os autos à Procuradoria-Geral de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da


apelação.

A controvérsia recursal cinge-se em aferir a responsabilidade


do ente público municipal pelos danos materiais ocasionados ao
apelado Gutemberg de Freitas Alves por acidente de trânsito, em
26.09.2014, decorrente da colisão com veículo (micro-ônibus) de
propriedade da empresa JR Locações de Máquinas e Equipamentos
Ltda., na ocasião dirigido por João Paulo Teixeira Braga, que prestava
serviço ao Município de Acopiara.

O artigo 37, § 6º, da CF/1988 prescreve a responsabilidade


objetiva da Administração Pública pelos danos causados por seus
agentes, ao dispor que:

Art. 37, CF/1988. A administração pública direta e indireta de


qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também,
ao seguinte
[…]

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§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito


privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos
danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa. (negritei).

O Código Civil em vigor, em consonância com a Lei Maior,


dispõe:

Código Civil de 2002.


Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são
civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa
qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo
contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa
ou dolo.

Nesse diapasão, é cediço que para a comprovação da


responsabilidade civil objetiva requer-se a configuração dos seguintes
pressupostos ou requisitos: (a) ato danoso, (b) dano e (d) nexo de
causalidade entre a conduta e o prejuízo. Ausente qualquer deles, não
estará configurado o direito à indenização.

Especificamente quanto ao dever de cuidado na condução


de veículos, o art. 29, inciso II, do CTB estabelece que:

Art. 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à


circulação obedecerá às seguintes normas:
[...]
II - o condutor deverá guardar distância de segurança lateral
e frontal entre o seu e os demais veículos, bem como em
relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a
velocidade e as condições do local, da circulação, do veículo e as
condições climáticas;

Ao analisar referido dispositivo, o Superior Tribunal de


Justiça firmou orientação no sentido de que "culpado, em linha de
princípio, é o motorista que colide por trás, invertendo-se, em razão
disso, o onus probandi, cabendo a ele a prova de desoneração de
sua culpa" (STJ. AgRg no REsp 1416603/RJ, Rel. Ministro PAULO DE
TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/02/2015,

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DJe 03/03/2015).

Do STJ, cito ainda:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC/73) -


AÇÃO REGRESSIVA DA SEGURADORA CONTRA O
CAUSADOR DO DANO - ACIDENTE DE TRÂNSITO - COLISÃO
TRASEIRA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU
PROVIMENTO AO RECURSO. IRRESIGNAÇÃO DO REÚ. […] 2.
Abalroamento traseiro na condução de veículos
automotores. Aquele que sofreu a batida na traseira de seu
automóvel tem em seu favor a presunção de culpa do outro
condutor, ante a aparente inobservância do dever de cautela
pelo motorista, nos termos do inciso II do art. 29 do Código
de Trânsito Brasileiro. Precedentes. Tribunal de origem que
consignou a falta de atenção do motorista e a culpa pela colisão
traseira que ensejou o engavetamento. Impossibilidade de
revolvimento da matéria fática probatória dos autos. Incidência da
Súmula 7/STJ. […] 3. Agravo interno desprovido. (STJ. AgInt no
AREsp 483.170/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA
TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 25/10/2017, negritei)

Dito isso, passo ao caso concreto.

Da análise dos elementos constantes nos autos,


especialmente o certificado de registro de veículo (fl. 10), a declaração
policial (fl. 11), o boletim de ocorrência (fl. 12) e as fotos do carro do
autor (fls. 15-16), depreende-se que o acidente e os consequentes
danos foram provocados exclusivamente pela conduta de João Paulo
Teixeira Braga que, ao tentar realizar manobra de ultrapassagem, colidiu
na traseira do veículo do autor, que perdeu o controle da direção, vindo
a sair da pista e a capotar algumas vezes.

Ademais, denota-se que na ocasião do sinistro o motorista


prestava serviço ao Município de Acopiara, referente ao transporte de
doentes e pacientes a consultas e exames médicos marcados na cidade
de Fortaleza.

Para confirmar a conclusão acima apresentada, transcreve-


se, na parte que interessa, o depoimento prestado pelo motorista do
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veículo, armazenado em mídia digital, in verbis:

[…] Eu tava fazendo serviço de terceirização, eu estava


prestando serviço a uma empresa […] e essa empresa servia
à Prefeitura. […] A LOCUS [...] a locadora de veículos […] Eu
vinha de Fortaleza, sentido aqui interior, Acopiara. Fui fazer uma
ultrapassagem do próprio veículo, era a noite, quando eu fui
fazer a ultrapassagem, dei o sinal, vi que dava pra mim ir.
Quando eu fui fazer a ultrapassagem, dei um sinal de luz pra
ele ver que eu estava ultrapassando, quando eu puxei o carro
ele pisou no freio. […] quando eu fiz a procedência do carro
da direita para a esquerda para fazer a ultrapassagem. Ele,
não sei o que foi que aconteceu, pisou no freio. Quando ele
pisou no freio, o micro-ônibus deu um simples trisco nele.
Ele desgovernou na estrada, eu tive até medo na hora dele
chegar a colidir com o ônibus, porque eu vinha cheio de
pacientes. E consegui ficar e manter a distância dele e ele
chegou a sair fora da estrada. […] Desci do ônibus, parei o
ônibus e desci e socorri a vítima. […] Tirei ele de dentro do carro,
botei ele dentro do ônibus e levei ele até Quixadá, até o hospital.
[…] Quando chegou em Quixadá, foi feito o procedimento do
hospital. Lá os filhos dele chegaram e me pediram para ir até uma
delegacia mais próxima com eles e eu fui. Só que lá no exato
momento não tinha nenhum delegado e nem escrivão. Só o
policial e ele disse que não podia fazer nada. […] Vinha com os
pacientes dentro do micro-ônibus […] No dia eles fazem consulta
lá em Fortaleza. Esse micro-ônibus levava o pessoal para fazer
consulta lá em Fortaleza, sabe, ai eu não posso dar mais
detalhes porque não tenho acesso aos pacientes, mas o que eu
posso dizer é que a gente deixava eles nos hospitais e de lá, num
certo horário, a gente recolhia eles e trazia de volta para o seu
município de origem. […] (depoimento de João Paulo Teixeira
Braga, armazenado em mídia digital, consoante termo de
audiência de fl. 149, negritei)

Nesse contexto, afigura-se plausível concluir, como destacou


a Judicante singular, que a dinâmica do acidente foi ocasionada pela
conduta do agente a serviço do ente municipal, a ensejar o dever de
reparação.

Decerto, denota-se ainda serem descabidas as divagações

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recursais que tentam imputar ao autor a culpa exclusiva ou concorrente


no acidente, pois inexiste nos autos indício de qualquer conduta
inadequada de sua parte (art. 373, II, do CPC/2015).

Desse modo, constatando-se a ocorrência do fato danoso, a


culpa do condutor e o nexo de causalidade, deve ser reconhecida a
responsabilidade objetiva do Município de Acopiara pelos danos
materiais suportados pelo recorrido, consoante indica o orçamento de
conserto coligido às fls. 17-18.

Em face do exposto, conheço da apelação para negar-lhe


provimento.

Levando em consideração o trabalho adicional realizado em


grau de recurso, por força da sucumbência do recorrente majoro os
honorários advocatícios para 12% (doze por cento) sobre o valor da
condenação.

É como voto.

Desembargador FERNANDO LUIZ XIMENES ROCHA


Relator

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