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1 Sobre o “procedimento argumentativo dogmático” ver (FERRAZ JR., 2015, p. 292 – 296).
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Isso explica o fato de, mesmo com interpretações diferentes, os juristas sempre
produzirem documentos onde fazem menção às leis, doutrina e jurisprudência.
2 Bourdieu: “Entrar no jogo [dogmático], conformar-se com o direito para resolver o conflito, é
aceitar tacitamente a adoção de um modo de expressão e de discussão que implica a renuncia à
violência física e às formas elementares de violência simbólica. (...) os fatos jurídicos são produtos
da construção jurídica, uma verdadeira retradução de todos os aspectos do “caso” é necessária para
ponere causam como diziam os romanos, para constituir o objeto da controvérsia (...)” (2010, p.
229).
3 Sobre os “atos de petição”: “também denominados atos postulatórios, que consiste nos pedidos ou
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como instrumento de persuasão da autoridade julgadora e, em caso de decisão no
mesmo sentido, como instrumento de fortalecimento da decisão.
A decisão judicial é a resposta estatal ao problema que lhe foi apresentado pelo
profissional jurista no exercício do seu afazer profissional de “resolvedor” de
problemas5. (Isso, claro, no caso da jurisdição contenciosa).
Essa que é uma garantia constitucional é conhecida como a garantia do duplo grau
de jurisdição.
Isso significa que a decisão proferida por um juiz singular, pode, em caso de
provocação da parte descontente com a primeira ordem emitida pelo estado, ser
revista por um órgão colegiado.
4 Aqui se utiliza a expressão “decisão judicial” que é gênero, como sinônimo de “sentença”, que é
espécie. As decisões, em sentido lato, são todos os pronunciamentos do juiz resolvendo uma
controvérsia. (TEHODORO JR., 2012, p. 253).
5 A sentença, que é a decisão de um juiz singular, é definida normativamente no art.203, §1º.
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Retomando, a decisão judicial é o comando estatal emitido pelos juízes e
desembargadores. Em outras palavras, a decisão judicial é uma fala estatal emitida
com o objetivo de resolver um determinado conflito social.
Essas falas estatais são fixadas em documentos, faremos agora uma análise das
partes constitutivas desses documentos.
A palavra burocracia é percebida pela maioria das pessoas como algo negativo.
A decisão judicial, como vimos, é uma fala estatal. Essa fala é materializada em um
documento.
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(1) A identificação documental no aparato burocrático
O que o leigo chama de “justiça”, como quando utiliza a expressão “Vou levar você
para a justiça!” é na verdade o serviço público prestado pelo estado para a
resolução de conflitos sociais.
O número de causas postas para a resolução estatal nos dias de hoje é gigantesco.
Em 2014 eram mais de 70 milhões de problemas não resolvidos em tramitação no
judiciário brasileiro (fonte CNJ, justiça em números, 2015).
Como são muitas as causas e muitas as pessoas que trabalham para resolvê-las
(advogados, juízes, promotores, contadores, pessoal de secretaria, oficiais de
justiça, etc.) é necessário que haja uma clara identificação burocrática da questão
em tratamento burocrático.
A decisão judicial é uma fala do juiz registrada nesse imenso aparato burocrático
estatal.
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Autor: JHONY xxxxxxx
A elaboração de uma boa ementa é muito importante nos dias de hoje. Vimos que a
jurisprudência é uma fonte do direito contemporâneo. Como o número de casos
judicializados é muito grande a ementa acaba sendo uma ferramenta de
racionalização importante, apesar de ser um elemento formal não previsto
legalmente.
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OUTROSSIM, MACULADO PELA INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS
DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PRECEDENTES
JURISPRUDENCIAIS. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. EXTINÇÃO DO
PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INTELIGÊNCIA DO
ARTIGO 269, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
(3) O relatório
O relatório é item da sentença previsto no art. 489, I do CPC em vigor. Nele o juiz
deve relatar os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e
da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do
processo.
O direito processual trata das regras e princípios que orientam a atuação do Estado
na resolução desses conflitos.
Todos esses atores processuais têm as suas falas registradas. Essas falas
registradas formam o que se identifica como os autos processuais, ou seja, o
processo na sua dimensão física (hoje também como “forma” virtual).
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O que importa perceber, neste momento, é que antes da decisão do Estado-juiz
muita coisa acontece, muitas falas são registradas no aparelho burocrático estatal.
I - Relatório
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O autor pediu, ainda, a condenação do réu a Pagar ao requerente os
vencimentos e vantagens. Excluídos os descontos obrigatórios, com
juros e correção monetária, da data em que o requerente foi
exonerado até a data em for efetivamente reintegrado ao cargo de
Motorista "D", contando-se para todos os fins o período em que esteve
afastado (fl. 17).
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O Município de Senador Georgino Avelino, por sua vez, apresentou
alegações fi-nais, intempestivamente (fls. 190-193), pugnando pela
improcedência do pedido.
(4) A fundamentação
Em termos simples, o jurista deve dizer que determinado fato esta ou não de
acordo (ou ainda se é irrelevante para o direito) com o nosso ordenamento
jurídico e quais as consequências previstas pelo próprio ordenamento jurídico. Ele
faz a seleção dos fatos jurídicos.
É justamente por isso que na sua previsão legal (art. 489, II, CPC), a fundamentação
tem o objetivo de exigir que o juiz analise as questões de fato e de direito.
II - Fundamentação
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direito, desde a data de sua exoneração até o dia de sua efetiva
"reintegração" no cargo, "contando-se para todos os fins o período
em que esteve afastado" (fl. 17).
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administrativo descomplicado. 17ª ed, revista, atualizada e ampliada.
Rio de janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009, p. 362).
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apresenta qualquer documento nem tampouco noticia a instauração
de procedimento válido destinado à exoneração da impetrante. 5.
Segurança concedida. (STJ. MS 19.179/DF, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 04/02/2013,
DJe 14/02/2013).
(...)
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Frise-se que o autor é habilitado na categoria AD (fl. 28) e as
informações que te-riam sido prestadas pelo chefe imediato do autor,
mencionadas na decisão de fls. 42-53, pecam pela subjetividade,
deixando de apontar qualquer fato objetivo que pudesse aconse-lhar
a exoneração. O expediente (fls. 80 e seguintes), datado de
20/05/2010, em que João Batista Dantas Bezerra, então Secretário
de Obras e Serviços Urbanos, afirma que o autor não possui
capacidade técnica e a aptidão necessárias ao desempenho do cargo,
alémd e considerações subjetivas, faz referências às declarações dos
demais servidores, que, no entanto, negaram o seu conteúdo quando
ouvidos em juízo.
Importa dizer, ainda, que na CNH (fl. 28), consta a observação de que
o autor exerce atividade remunerada, sendo verdade, além disso, que
mesmo havendo notícia de que teria sido ele encaminhado para o
teste de aptidão no DETRAN, não foi feita qualquer referência ao
referido resultado, o que também causa uma certa perplexidade.
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devidas a data do afastamento do servidor dos quadros da
Administração (STJ. AgRg nos EmbExeMS 14081/DF, Rel. Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em
11/04/2012, DJe 17/04/2012).
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(5) O dispositivo
De acordo com o art. 489, III, CPC, o dispositivo é o trecho do documento intitulado
de “decisão judicial” onde o juiz “resolverá as questões principais que as partes lhe
submeterem.”.
III - Dispositivo
(...)
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Descrição fundada na análise de dois documentos: Agravo de Execução Penal nº 0075518-
11.2014.8.26.0000 (TJ/SP) e Agravo de Execução Penal nº 0076525-38.2014.8.26.0000 (TJ/SP)
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Na vida do preso e, portanto, na vida onde o problema aparece enquanto elemento
existencial, isso significa que a sua pena foi reduzida em alguns dias devido à
leitura de textos literários.
1. O artigo 126 da Lei de Execução Penal diz que “ O condenado que cumpre a
pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por
estudo, parte do tempo de execução da pena.”
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Acontece que poucos dias depois (07 de abril de 2015), outros desembargadores
do mesmo tribunal que compõem a 3ª câmara de direito criminal decidiram um
caso semelhante de maneira completamente diferente.
No caso concreto o pedido do Ministério Público de São Paulo era o mesmo: mudar
decisão de um juiz singular que havia garantido o direito a remição de pena de
apenado devido à realização de leitura.
7Para considerações sobre o nível de “determinação” do direito ver os textos reunidos em BIX,
2003.
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O que os juristas têm em comum é uma determinada maneira de encaminhar o seu
raciocínio. Vimos, por exemplo, que o jurista sempre faz menção à lei. É esta a
principal fonte do direito moderno.
Podemos nos perguntar, não é muito problemático isto de cada juiz poder decidir
de uma maneira específica e de todas elas serem consideradas jurídicas?
Sim isto é problemático, isso nos leva a uma situação de insegurança jurídica. Não
há, no entanto, uma forma de se resolver de maneira absoluta essa questão.
Há, por outro lado quem veja a interpretação jurídica de maneira pragmática. É
uma questão de poder, de definição de poder por parte do ordenamento jurídico.
Decide a autoridade competente para tal. Para Kelsen (2009, p. 394) “A
interpretação feita pelo órgão aplicador é sempre autêntica. Ela cria direito.”.
Partido de uma perspectiva desse tipo resta aos juristas definirem um sistema de
controle institucional hierarquicamente organizado. É o chamado sistema recursal.
Nele são definidas autoridades com competência de revisarem as decisões dos
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Exemplificativo desse contexto é o trabalho de Ana Paula de Barcellos (2005).
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juízes singulares (os tribunais estaduais de justiça, os tribunais regionais, os
tribunais superiores e o supremo tribunal federal).
Com o tempo essas decisões dos órgãos jurisdicionais de cúpula tendem a definir
um posicionamento geral do judiciário a cerca de determinada questão.
Veja que, mesmo tendo opiniões diferentes, e com isso gerando ordens estatais
diferentes, os juízes têm de argumentar dogmaticamente, ou seja, utilizando as
expressões e conceitos que começamos a aprender na disciplina de introdução à
ciência do direito.
Referências:
BIX, Brian. Law, language and legal determinacy. Oxford: University Press, 2003.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 14ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.
FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. 8ed. São Paulo: Atlas,
2015.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense,
2012.
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