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UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Departamento de Geografia

Consequências dos eventos de fortes chuvas no município do Rio de Janeiro


Anderson de Almeida Castro
Eugenio Tuorto de Moraes

Niterói
2019
Resumo
As chuvas têm acometido a cidade do Rio de Janeiro desde sua origem. No entanto,
nos últimos anos elas têm se intensificado devido a mudanças climáticas. Este
trabalho irá investigar quais foram os bairros dessa cidade que mais foram afetados
com as chuvas nos anos de 1996 e 2019, identificando-os espacialmente. Em
seguida, eles serão analisados por meio de dados obtidos da literatura e de órgãos
responsáveis dados sobre cobertura vegetal, tipo de rocha, tipo de solo,
geomorfologia, Índices pluviométricos, Notificações na Defesa Civil, fotos e de
ocupação. Nesse sentido, esses dados foram representados principalmente a partir
de mapas variados, com intuito de caracterizar aspectos físicos do município e de
localizar as áreas mais atingidas. Nossos resultados mostram que há uma correlação
entre o perfil de uso/cobertura do solo e os desastres naturais na cidade do rio de
janeiro; que o tipo de solo de cada localidade é crucial para o desencadeamento de
deslizamentos ou enchentes e que há uma conjunção de fatores climatológicos,
topológicos, geomorfológicos e de ocupação que facilitam as suas ocorrências.
Percebemos assim a importância de um planejamento urbano eficiente e consciente,
e de gestores preparados para lidar com crescente taxa e intensidade de eventos
extremos na cidade do Rio de Janeiro.

Introdução

O município do Rio de Janeiro possui características bastante peculiares.


Trata-se de uma cidade espremida entre o mar e a montanha que sofreu uma
ocupação desordenada durante décadas que ocasionou em uma alta densidade
populacional nos morros com risco geológico. Como conseguinte, as chuvas
torrenciais de verão provocam graves danos não apenas ambientais e materiais mas
principalmente Danos Humanos, entre os quais os óbitos, causados por
Deslizamentos de Encostas.
Eventos de chuva intensa, responsáveis por enchentes e deslizamentos de
terra, normalmente causam diversos transtornos à sociedade e acarretam prejuízos
sócio-econômicos. Tais eventos são comuns sobre o Sudeste do Brasil,
especialmente na estação chuvosa. Porém, a particularidade de alguns eventos está
no volume acumulado de chuva, que algumas vezes é considerado extremo. Nos anos
de 1996 e 2019 houve chuvas torrenciais, que ocasionaram diversos impactos na
cidade do Rio de Janeiro. Os deslizamentos de terra provocaram diversos danos
materiais e vítimas fatais. Segundo a Defesa Civil do Estado do Rio de Janeiro nesses
dois anos, houve mais de 60 mortos e mais de 5000 pessoas desabrigadas.
Geralmente esses episódios de chuvas estão associados aos sistemas
frontais, que junto com um clima bastante diversificado em virtude da topografia
acidentada, com morros, serras, vales, vegetação pluralizada, regiões de baixada e
baías, além da proximidade com o Oceano Atlântico fazem parte da dinâmica física
do Estado.
Neste contexto, o objetivo deste texto é analisar as consequências da alta
precipitação na cidade do Rio de Janeiro e a mobilização da defesa civil e da prefeitura
durante as fortes chuvas de 1996 e 2019.

Revisão de Literatura

1 - Características físicas do município do Rio de Janeiro

1.1 - Relevo
É constituído predominantemente por rochas gnáissicas, pré-cambrianas, de
constituição variada, geradas após a colisão dos continentes, América e África. São
gnaisses de origem orto e paraderivados, que ocorrem associados a migmatitos ou
que, frequentemente, gradam a migmatitos, conforme mostra a Figura 1. Estas rochas
são penetradas por intrusões graníticas que ocorreram, mais provavelmente, durante
o Cambriano e Ordoviciano (Heilbron et al., 1995). Todo este conjunto é cortado por
diques de rochas básicas e alcalinas, relacionadas ao magmatismo Meso-Cenozóico.
Com a erosão e soerguimento da crosta, as rocha gnáissicas que estavam a
mais de 20 km de profundidade, chegaram à superfície e passaram a sofrer os
processos intempéricos. O gnaisse facoidal, mais resistente ao intemperismo do que
os outros tipos formados no mesmo evento colisional, destaca-se na paisagem da do
município do Rio.
No relevo muito acidentado dos maciços da Tijuca e Pedra Branca, os pontões
são Afloramentos de Rocha e Neossolos Litólicos, solos rasos onde geralmente a
soma dos horizontes sobre a rocha não ultrapassa 50 cm, estando associados
normalmente a relevos mais declivosos, característica dos solos onde estão a
população de baixa renda no município do rio de janeiro e uma das consequências
dos movimentos de massas em encostas; da mesma forma os esporões e ilhas
rochosas.

figura 1- geologia 2004. Fonte: Universidade Federal do Rio de Janeiro 1999

1.2 Geomorfologia
O município do Rio de Janeiro possui características geográficas que
possibilitam a ocorrência de precipitações pluviométricas intensas. Sua topografia é
delineada por três maciços: Gericinó-Mendanha ao norte, maciço da Tijuca a leste e
o maciço da Pedra Branca a oeste. As demais áreas da cidade são planícies, com
uma altitude média de 20m, colinas e morros, conforme ilustra a figura 2.
O maciço da Pedra Branca apresenta um alto potencial de vulnerabilidade a
eventos de erosão e movimentos de massa. Tais eventos são desencadeados
também pela degradação da cobertura vegetal decorrente da forte pressão urbana a
que o maciço é submetido, principalmente em suas vertentes leste (expansão da
malha urbana de Jacarepaguá) e norte (expansão da malha urbana de Bangu e
Campo Grande) (DANTAS, 2001). Nesta, a cobertura florestal foi completamente
substituída por cobertura de gramíneas.
Figura 2- Geomorfologia do Município do Rio de Janeiro.

O maciço da Tijuca consiste também num maciço montanhoso imponente e


isolado, com picos elevados, próximo ao litoral. Apresenta-se em meio às baixadas
fluviomarinhas e o litoral e divide as zonas sul, norte e oeste do município do Rio de
Janeiro, atuando como zona dispersora de águas entre as baixadas da Guanabara e
de Jacarepaguá. Praticamente toda sua área foi devastado no início do século XIX,
para plantação de cafezais, e reflorestada por volta de 1860, devido a sérios
problemas ambientais decorrentes do desmatamento. Destacam-se, nesse contexto:
a erosão das encostas, o assoreamento dos rios e a subsequente escassez de água
para o abastecimento urbano. Tais estudos demonstram a importância da estrutura e
funcionalidade da cobertura florestal na regularização da hidrologia das encostas e no
controle dos movimentos de massa (Coelho Netto, 1992).
Devido ao fato da unidade estar junto ao núcleo histórico da metrópole carioca,
sofre uma intensa pressão urbana por todos os setores, resultando na degradação da
cobertura vegetal. Esse processo se desenvolve por meio de desmatamentos,
queimadas ou favelização, com maior intensidade na vertente norte (expansão da
malha urbana dos núcleos urbanos da Tijuca e do Méier) e, mais recentemente, na
vertente oeste (expansão da malha urbana de Jacarepaguá) (Fernandes et al., 1998).
O maciço Gericinó-Mendanha ao norte atua como zona dispersora de águas
entre a zona oeste do município do Rio de Janeiro e a Baixada Fluminense, alojando
as nascentes de importantes tributários das bacias dos rios Guandu e Cabuçu
(Dantas, 2001). Ele apresenta um alto potencial de vulnerabilidade a eventos de
erosão e movimentos de massa, sendo estes, diversas vezes, desencadeados,
semelhante aos outros maciços, pela degradação da cobertura vegetal decorrente da
forte pressão urbana a que o maciço é submetido.
Além dessas serras, há vários morros e colinas distribuídos pelo município,
que, consequentemente sofre com os mesmos problemas anteriores, ocupação das
encostas associada à expansão das atividades econômicas e urbana, alta
vulnerabilidade a eventos erosivos e movimentos de massa associados a declividade,
como mostra figura 3.

figura 3. Fonte: Adaptado - fundação Geo Rio

As áreas de planície fluvial e flúvio-marinhas consistem em importantes áreas


de acumulação resultado de uma sucessão de eventos de regressão e transgressão
do nível relativo do mar que modelaram sua morfologia original e que, posteriormente,
foi modificada pela intervenção humana (Amador & Amador, 1995). Elas consistem
em extensas áreas inundáveis ladeadas por colinas isoladas pela sedimentação
fluvial. A planície flúvio-lagunar de Jacarepaguá, devido à expansão urbana e sua
composição majoritariamente constituída por Gleissolos e Solos Orgânicos é
altamente suscetível a eventos de inundação, seus habitantes são compostos por
uma população de baixa renda, em decorrência de processos de segregação e
exclusão social, que serão os principais afetados por eventos de chuva.

1.2 - Solo
Os acentuados desnivelamentos relativos tornam comum a identificação de
toposseqüências segundo uma escala hipsométrica, influenciadas por diferenças do
material originário. São elas: Latossolos (Amarelo e Vermelho-Amarelo) e
Cambissolos nas cristas dos maciços com altitudes superiores a 300 m; Argissolos
(Amarelo e Vermelho-Amarelo) e Chernossolo Argilúvico/Luvissolo Háplico nas
encostas com altitudes entre 40 e 300 m; e Argissolos (Amarelo e Vermelho-Amarelo)
moderadamente drenados, Planossolos, com alta capacidade de retenção de água
disponível; Neossolos Flúvicos, solo pouco profundo suscetível à movimentos de
massa; Gleissolos, ocorre em ambientes de solo com exposição prolongada ou
permanente a água (baixadas, várzeas e depressões) drenagem deficiente, estrutura
maciça e baixa porosidade, fazendo com que haja acúmulo de água durante as
chuvas; e Organossolos em altitudes inferiores a 40 m, em obediência aos desníveis
dentro da baixada sedimentar, como demonstra a figura 4 (LUMBRERAS,1999).
figura 4- Mapa semidetalhado de solo do município do Rio de Janeiro. Fonte: Adaptado - Embrapa

1.3 - Clima
O clima no município do Rio de Janeiro é do tipo tropical, quente e úmido, com
variações locais, devido às diferenças de altitude, vegetação e proximidade do
oceano; a temperatura média anual é de 22º centígrados, com médias diárias
elevadas no verão (de 30º a 32º); as chuvas variam de 1.200 a 1.800 mm anuais.
Já nos maciços, segundo a classificação de Koppen é tropical de altitude (Cf)
com temperaturas variando de valores médios máximos em 25ºC em fevereiro e
mínimo de 19ºC em junho, resultando em uma média anual de 22º C. A temperatura
máxima pode atingir 35ºC durante o verão e o mínimo excedendo 10ºC durante o
período de inverno. A precipitação anual média oscila entre 2.000 e 2.500mm,
podendo atingir picos de 3.300mm em anos muito chuvosos e picos negativos de
1.600mm em anos mais secos. A maior parte das chuvas se concentra nos 4 primeiros
meses dos anos. A maior pluviosidade que ocorre no verão é uma resposta direta ao
impacto causado pela frente polar Atlântica, alterando a dinâmica habitual da
atmosfera. A orientação e a altitude do maciço faz com que o relevo funcione como
um anteparo aos ventos úmidos provenientes do Oceano Atlântico na sua vertente sul
determinando o surgimento de correntes convectivas de origem orográfica nas
escarpas montanhosas e fundos de vale. A vertente norte e noroeste, por sua vez,
apresentam condições climáticas desfavoráveis (mais seco), e uma ocupação urbana
mais intensa. A vegetação nessas áreas apresenta-se composta em grande parte, por
floresta degradada e gramínea, caracterizando uma crescente degradação. Zaú
(1995) estudando áreas submetidas a degradação na vertente norte do maciço da
Tijuca demonstra que essas áreas apresentam maiores taxas de erosão e condições
pouco desenvolvidas do subsistema de decomposição e estruturação do solo
(Negreiros, 2006).

1.4 - Vegetação
Baseado nas áreas de reservas, nos remanescentes de mata nativa e na
vegetação regional, caracterizou-se cinco tipos diferentes de agrupamentos vegetais:
as formações florestais (floresta tropical subperenifólia, floresta tropical
subcaducifólia, floresta tropical caducifólia, floresta perenifólia de várzea, floresta
subperenifólia de várzea), a campina de várzea, a campina halófila, a restinga e os
mangues (LUMBRERAS, 1999).
Ao longo do tempo com a aceleração da urbanização, a transformação de
florestas para vegetação rasteira e a retirada da vegetação, além do solo ficar mais
exposto e vulnerável à infiltração, existe também o fator do clima, pois este sofre
significativas alterações nas características com a falta da cobertura vegetal, essa
mudança pode ser observada no mapa de uso e cobertura do solo no período de 1996
e 2017 na figura 5 e 6 e a regressão dessas áreas na tabela 1. Através da
evapotranspiração o local pode sofrer alterações na mudança da temperatura.
Figura 5- Uso e cobertura da terra - município do Rio de Janeiro, 1996. Fonte: adaptado do Data Rio
Figura 6 - Mapeamento do Uso/Cobertura do solo da cidade do Rio de Janeiro - 2015. Fonte: Data Rio.

Tabela 1-Fonte: Adaptado do MAPBIOMAS

2 - Desastres no município do Rio de Janeiro e a atuação da Defesa Civil


Como visto anteriormente, o município possui características bastante
peculiares. Trata-se de uma cidade espremida entre o mar e a montanha que sofreu
uma ocupação desordenada durante décadas que ocasionou em uma alta densidade
populacional nos morros com risco geológico. Como conseguinte, as chuvas
torrenciais de verão provocam graves danos não apenas ambientais e materiais mas
principalmente Danos Humanos, entre os quais os óbitos, causados por
Deslizamentos de Encostas. Para diminuir esses danos ou até mesmo prevenir o
município conta com a ajuda da Defesa Civil.
A Defesa Civil, se organiza em sistemas abertos com a participação dos
governos locais e da população no desencadeamento das ações preventivas e de
resposta aos desastres, seguindo o princípio da Defesa Comunitária. O Brasil
começou a se estruturar em função de fortes chuvas que assolaram a região Sudeste
entre 1966 e 1967, provocando enchentes no Estado da Guanabara e deslizamentos
na Serra das Araras/RJ e Caraguatatuba/SP.
Objetivando a redução de perdas de vidas, danos e transtornos sócio-
econômicos ela elaborou diversos planos preventivos contra desastres naturais,
como: a organização dos Manuais de Planejamento em Defesa Civil, A criação de um
programa de capacitação em desastres, com o enfoque na preparação de gestores
nacionais, estaduais, municipais e de áreas setoriais para atuarem em todo o território
nacional; capacitação de agentes locais de defesa civil; Implantação do Plano
Nacional de Proteção e Defesa Civil; Construção do Banco de Dados de Registros de
Desastres; Confecção do Atlas Brasileiro de Desastres Naturais; Implantação do
sistema de informações e monitoramento de desastres; Capacitação dos Moradores;
Sistema de Alerta e Alarme Comunitário; e Defesa Civil nas escolas.
Além disso eles trabalham com Intervenções diretas nas comunidades, como
o Programa Morar Carioca (da Secretaria Municipal de Habitação), o Programa de
Reflorestamento (da Secretaria Municipal de Meio Ambiente), Obras de Estabilização
das Encostas (Geo Rio), Ações de Conservação e Limpeza (Secretaria Municipal de
Conservação e Serviços Públicos), Reassentamento de Moradores (Programa Minha
Casa Minha Vida - a Nível Federal), bem como a implantação de um novo Plano
Diretor da Cidade (com restrições a ocupação de encostas) também são essenciais
na Redução do Risco de Desastres (Defesa Civil, 2013).
Metodologia

Para este trabalho foram utilizados dados e mapas oferecidos pelo sistemas
de dados da prefeitura do Rio de Janeiro, do Data.Rio com informações estatísticas,
GEO-RIO, MapBiomas, INEA -RJ, UFRJ, Embrapa, Alerta Rio ( Dados de
pluviosidade). A partir deles, foram gerados mapas, gráficos, tabelas, estudos e
pesquisas com foco na Cidade do Rio de Janeiro. Os softwares utilizados na
confecção de mapas foram o ArcMap 10.4 e o QGIS 3.2.2. Em alguns mapas foi
utilizado um sistema de referência de coordenadas geográficas e em outros foram
utilizadas coordenadas projetadas UTM. Além disso, foi realizado o tratamento de
dados estatísticos no software Microsoft Excel 2016. Para a obtenção de informações
gerais sobre os eventos extremos na cidade do Rio de Janeiro, foram consultados
jornais eletrônicos de massa.

Resultados

Durante três dias de chuvas intensas no Estado do Rio de Janeiro de 13 a 16 de


fevereiro de 1996 a capital do rio entrou em estado de alerta. Essa chuva foi
ocasionada por uma frente fria que ao encontrar o maciço se chocou com uma
cúmulos-nimbus, a conjunção destes fatores fez com que as chuvas tivessem
intensidade acima do normal.
No dia 13/02/1996, de madrugada, após oito horas ininterruptas de chuva
intensa vários locais entraram em alerta. Nessas primeiras horas já aconteceram
diversos desastres como, deslizamentos, alagamentos, destruição, etc. que
acarretaram a morte de 21 pessoas em primeiro momento. Ao longo de todo esse
período chuvoso foram contabilizadas mais de 50 mortes e mais de 5000 pessoas
desabrigadas. Os bairros mais afetados por essa chuva foram: o Alto da Boa Vista,
Barra da Tijuca, Itanhangá, Jacarepaguá, Jardim botânico, Lagoa, Leme, Rocinha,
Tijuca e Vidigal.
O deslizamento de uma encosta sobre uma favela no Itanhangá, São Conrado
(zona oeste do Rio), resultou no soterramento de 19 pessoas. No morro do Vidigal
houve um deslizamento e o túnel Dois Irmãos foi tomado por pedras, árvores e terra,
e o jardim botânico, a gávea e o Leblon ficaram ilhados. Sete casas soterradas e sete
crianças mortas. A Rocinha sofreu com deslizamentos e o soterramento de barracos
resultante de morte de adultos e crianças no local. Em Jacarepaguá, na Cidade de
Deus, muitas pessoas perderam tudo que tinha e muitos perderam a vida, foi
registrado 20 mortos, por causa do alagamento e dos deslizamentos, no local foi
registrado 304,1 milímetros de chuva, o maior em toda a cidade. A Rocinha sofreu
com soterramento de barracos e morte de adultos e criança.

Figura 7 - A forte chuva interditou o túnel dos Dois Irmãos, também em 1996. fonte: Agência O Globo.

Na Área da Lagoa Rodrigo de Freitas ficou alagado e interditado. Jardim Santa


Cruz água de dois metros. No Leme várias ruas do bairro ficaram cobertas de lama
que deslizou do morro Chapéu Mangueira.

Já no ano de 2019 os bairros que mais sofreram com as chuvas intensas foram:
Guaratiba, com alagamento no Jardim Maravilha; Leme, com deslizamento no morro
da babilônia; Jardim Botânico e Gávea, que foram inundados. A precipitação média
desse mês foi de 244,9mm, 105,8mm menor que de 2010 (Alerta Rio). No entanto,
mesmo assim a chuva repercutir efeitos desastrosos.
O Jardim Maravilha está localizado na zona oeste da Cidade do Rio de Janeiro,
no bairro de Guaratiba. Apresenta vegetação de Mata Atlântica no maciço preservado
a oeste e fragmentos de vegetação ripária a leste. A partir da visualização de imagens
de satélites recentes, observou-se que o bairro é constituído de ruas com padrão
espacial regular e de casas de pequeno porte (figura 8). A figura 9 apresenta o mesmo
bairro alagado no ano de 2019.

Figura 8 - Padrão espacial da ocupação do Bairro Jardim Maravilha (RJ). Fonte: Site Pessoal de
Marcondes Lucena.

Figura 9 - Parte do Bairro Jardim Maravilha alagado. Fonte: Diário Carioca


Esse bairro também se instalou numa planície de aluvião (IPP) de solo do tipo
Gleissolo Háplico. O dia de maior pluviosidade no mês de abril em Guaratiba foi o dia
09/04/2019. Durante o período de 18:45 às 19:45 desse dia choveu 184,4 mm (Alerta
Rio) mais do que a drenagem do bairro podia suportar. Uma pessoa morreu afogada.
O morro da Babilônia está localizado na zona sul da Cidade do Rio de Janeiro
(Figura 10).

Figura 10 - Localização do Morro da Babilônia (Leme) Fonte: Crimes News


Apresenta 12 hectares de Mata Atlântica nativa - adaptada a costões rochosos
litorâneos, em excelente estado de conservação devido à ocupação restrita da área,
desde o século XVIII. Além disso, 16 hectares de vegetação está em processo de
reflorestamento pelo Projeto de Conservação Ambiental. Destacam-se nessa
vegetação os coqueiros jerivá e indaiá, figueiras, ipê amarelo, freijó, carrapeteira,
quaresmeira, paineira-das-pedras, bromélias, cactos e orquídeas. A geologia do local
é composta por Gnaisse Facoidal com Microclina, Quartzo, Plagioclásio, Biotita e
Granada (IPP). O local é composto por afloramentos de rocha e possui também
argissolos vermelho-amarelos. (Embrapa). O morro da babilônia faz parte dos
maciços pequenos e destacados de copacabana, com altitude de 235m. Eles são
formados, assim como os outros maciços maiores do município do rio, por um
conjunto de morros. As suas constituições sugerem que eles eram ligados aos
grandes maciços que estão próximos, mas por processos eustáticos e de
intemperismo eles se separaram. No entorno desses morros, os sedimentos são
datados do quaternário. No dia 09/04/2019, choveu 329,4 mm/24h no leme e
copacabana (Alerta Rio). Na parte baixa do morro foram construídas algumas ruas e
edificações. Uma encosta do morro deslizou (Figura 11), matando duas pessoas.

Figura 11 - Deslizamento no Morro da Babilônia (RJ). Fonte: O Globo

Moradores alegaram, após as chuvas intensas de abril de 2019, que as sirenes da


Defesa Civil não tocaram na região.
O Jardim Botânico também foi um local afetado pelas chuvas de abril de 2019
(Figura 12).

Figura 12 - Carros embaixo d’água no bairro Jardim Botânico (RJ). Fonte: G1 Globo.
À seu oeste e noroeste se situa o Parque Nacional da Tijuca, área composta
por floresta secundária advinda de ações de reflorestamento, promovida pelo Major
Archer em 1862. Além disso, é composta também por mata regenerada que data do
período do Brasil Império. (Conti, 2004; Conti, 2008). A geologia do local é de material
de Aluvião (áreas aterradas), com escarpa de morro próxima com o tipo de rocha
leptinito com microlina, quartzo, plagioclásio, granada e biotita (IPP). Além disso, os
solos do Jardim Botânico são argissolo vermelho-amarelo, principalmente nas
encostas (Embrapa). A geomorfologia da parte baixa é composta de uma planície
fluviomarinha e de uma encosta de maciço litorâneo. A ocupação é distribuída pela
parte baixa de planície e também pelo morro por onde passa a rua Pacheco Leão.
Num período de somente 4 horas, na noite do dia 8 de abril de 2019, choveu 13,6 mm
a mais do que a média de chuva para abril (136 mm), valor que corresponde a 110%
da média. (Alerta Rio). Pelo menos uma pessoa morreu nesse dia.

Discussão

Os deslizamentos de terra fazem parte da dinâmica de maciços costeiros e da


serra do mar. Porém, em 2019, as chuvas do dia 8 e nove de abril aumentou as suas
vulnerabilidades devido a uma conjunção de fatores, excedendo muito as médias de
pluviosidade registradas no mapa do anexo 3. Os fatores foram: a proximidade da
ZCAS (Zona de Convergência do Atlântico Sul) da cidade do rio de janeiro; a
aproximação de um sistema frontal, alto aquecimento do ar e principalmente do
oceano, num contexto de final de verão e final de tarde; temperaturas fora do normal
durante vários dias consecutivos anteriores aos eventos extremos e o fato de a
questão topológica de a maioria dos lugares afetados se situar na vertente sul dos
maciços, conforme se evidencia no anexo 1.
Percebe-se, segundo o anexo 2, que a área urbana aumentou
consideravelmente no período de 1985 até 2017 (Não foi possível obter dados mais
recentes que essa data), o que pode ter causado uma maior ocupação de áreas de
risco ao longo do tempo, propiciando deslizamentos. Além disso, o aumento da área
urbana aumentou a superfície impermeabilizada das cidades, podendo ter aumentado
a vulnerabilidade a inundações. No entanto, ao mesmo tempo, os níveis de área
florestada na cidade subiram sensivelmente (Tabela 1), o que sugere que estão sendo
realizados alguns projetos de reflorestamento bem sucedidos na cidade.
O fato de o bairro de Guaratiba, mais especificamente Jardim Maravilha, ter
sido construído sobre gleissolo háplico (solo facilmente encharcado, de má drenagem
e pegajoso), pode ter contribuído para as enchentes de abril de 2019, além do de a
área estar numa área muito plana entre morros (figura 2). O rio que corta o bairro,
chamado genericamente de “valão”, pode ter transbordado e ter sido mais um fator
para a inundação. Esse curso d’água provavelmente se encontrava assoreado devido
à grande carga orgânica e de sedimentos da sua bacia em boa parte desmatada,
tornando-o mais raso e impedindo-o de transportar toda a drenagem do bairro. Além
disso, o bairro provavelmente foi construído sem drenagem pluvial e sanitária
adequada, com um planejamento urbano ineficaz e que apresenta diversas falhas.
Tanto na Gávea e Jardim Botânico quanto no leme, as situações das encostas
são similares. Ambos os locais apresentam argissolo vermelho-amarelo, que
apresenta média profundidade. No entanto, em muitos pontos dessas encostas, o
solo é mais raso e a rocha intemperizada do embasamento chega perto de aflorar.
Assim, podem ocorrer deslizamentos de terra, dos quais os mais comuns nessa região
e na serra do mar são os escorregamentos translacionais. A vegetação desses locais,
como é oriunda de reflorestamento (mata secundária), pode ainda não ter
estabelecido bases firmes quanto as de uma floresta primária, facilitando a sua
instabilidade, especialmente durante eventos de chuva intensos.
Mesmo com esse histórico de vulnerabilidade na cidade, a geografia física e as
mudanças climáticas se tornando cada vez mais frequentes, as administrações
passadas e recente vêm negando a existência das mudanças globais e se recusando
a investir em adaptações de infraestruturas e a realocação das pessoas em áreas de
riscos. Nas chuvas de 2019 descobriu que o atual prefeito não tinha investido em nada
para conter os desastres naturais e com o passar do tempo ele diminuiu a verba
voltada para a melhoraria da infraestrutura da cidade para evitar os desastres. Se não
houver uma mudança imediata na forma de pensar, mais pessoas continuarão
morrendo por causas que poderiam ser evitáveis.

Referências

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LOTTERMANN, Anne. Chuvas dos dias 8 e 9 de abril bateu recorde, diz Alerta Rio.
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<https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/rio-de-janeiro/panorama> Acesso em: 20/05/19,
17:19.

Anexos

Anexo 1.
Anexo 2. Área medida em hectares (ha). Fonte: Adaptado do MAPBIOMAS

Anexo 3.

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