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1. Introdução
Não se pode questionar nem minimizar a importância do transporte rodoviário de cargas em
nosso país. A estratégia de desenvolvimento adotada no Brasil confere ao setor a
responsabilidade por 60,5% da movimentação das cargas, de acordo com dados publicados
pela Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes – GEIPOT (2001). Sem o transporte
rodoviário, produtos essenciais não chegariam às mãos dos consumidores, indústrias não
produziriam e o comércio externo seria mínimo. Qualquer nação fica literalmente paralisada
se houver interrupção dos serviços prestados pelo transporte por rodovias, além disso, trata-se
de um bem não importável. No caso de um país de dimensões continentais como o Brasil,
este risco se torna mais crítico.
Este setor pode ser caracterizado por suas amplas externalidades. Mais do que viagens e
deslocamentos, transporte é um serviço horizontalizado que viabiliza os demais setores,
afetando diretamente a segurança, a qualidade de vida e o desenvolvimento econômico do
país.
Lideranças ligadas à área queixam-se do baixo valor dos fretes e reivindicam do Governo
medidas de regulamentação e o estabelecimento de um tabelamento para o valor dos fretes,
como parte da solução para os problemas apontados. São muitas as reclamações. Apontam-
se, além da falta de regulamentação, uma maior fiscalização do transporte rodoviário,
inclusive através da maior efetividade do uso das balanças controladoras dos excessos de
carga por eixo e do peso bruto total dos veículos de carga.
Na verdade, existem poucas barreiras de entrada no setor. Quem quiser ser um transportador
basta possuir carteira de habilitação profissional e um caminhão. Por outro lado, existem
muitas dificuldades para sair, particularmente o transportador autônomo, pois é difícil uma
colocação no mercado de trabalho devido aos poucos anos de educação formal e à precária
formação técnica.
Para minimizar os efeitos da crise materializada pelo baixo valor dos fretes e pela
concorrência predatória, a maioria dos transportadores rodoviários de carga reduzem a
manutenção dos veículos e protelam a renovação da frota. Muitos se sentem motivados a
praticarem sobrejornada, trabalhando até 18 horas por dia e a trafegarem com excessos de
carga (Rodrigues, 2002).
Outros componentes da crise são os roubos de cargas e a precária situação das rodovias
brasileiras. Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT,
32,0% das rodovias federais apresentam condições regulares e 24,0% estão em más ou
péssimas condições (2002a). Por outro lado, a pesquisa CNT e COPPEAD (2002) indica
dados ainda piores: 78% das rodovias estão em situação péssima, ruim ou deficiente. A
mesma fonte informa que para acompanhar o crescimento econômico e o aumento da frota de
carga, atualmente com mais de 2,1 milhões de veículos (DENATRAN, 2004), o Governo terá
de investir mais de R$ 1bilhão/ano nas operações de manutenção.
Dados e informações sobre excessos de carga praticados no Brasil são muito escassos em
relação aos existentes em países desenvolvidos. Relatórios de pesagens nas balanças em
operação espelham simplesmente informações a respeito de amostras não aleatórias de
veículos carregados encaminhados para a pesagem para verificação de sobrecargas.
Uma das primeiras pesquisas para o levantamento de dados sobre pesagem da frota comercial
foi realizada pelo GEIPOT entre 1976 e 1981 e indica que nas rodovias brasileiras, os
caminhões trafegam com sobrecargas de 10 a 30% além dos limites (Fernandes Jr., 1994). A
mesma fonte, descreve que para o Brasil, a quantidade de veículos com excesso de carga e o
percentual de excesso constatado para cada tipo de conjunto de eixos podem ser visualizados
pela Tabela 1, apresentada a seguir:
Na BR/381, em Nepomuceno, Minas Gerais, 39,0% dos veículos de carga estão com
excessos (Neves, 2002);
No Estado da Bahia, 18% de veículos trafegam com excessos de carga (Neves, 2002);
Em Tocantins antes das pesagens 41,0% de veículos apresentaram excessos. Após a
aplicação de multas ocorreu uma redução para 6,0% (Neves, 2002);
As pesagens efetuadas em rodovias estaduais no Estado do Ceará indicam que foram
detectados 7,0% de veículos com excesso de carga. O valor do excesso é de 17,0% além
dos limites. Nas rodovias federais, cerca de 50,0% dos veículos apresentam excesso de
carga (Oliveira Jr. et al, 2001);
No Paraná, segundo a Secretaria Estadual dos Transportes, em março de 2002 os 19
postos de pesagem em operação autuaram 4,7 mil dos 246,8 mil veículos vistoriados
correspondendo a 1,9% do total (2002);
O Departamento Nacional de Infra-Estrutura em Transportes – DNIT (2002c), informa
que no segundo semestre de 2001, em Santa Catarina, a pesagem de 250,8 mil veículos no
trecho norte da BR-101 teve como conseqüência 4,2 mil (1,7%) notificações por excesso
de peso;
Soares e Motta (2001) relatam que uma série de pesagens realizada em Pernambuco
indicou as seguintes quantidades de veículos com excessos por conjuntos de eixos: ônibus
4,3%, caminhão médio 20,8%, caminhão pesado 16,3% Reboques e semi-reboques
49,1%;
Observações feitas em 2002 pelo pessoal do Laboratório de Sistemas de Transportes –
LASTRAN da UFRGS, no acompanhamento de pesagens na BR/290 em Gravataí, Rio
Grande do Sul, indicaram 30% de excessos na quantidade de veículos de carga. Após
algumas semanas este valor baixou para 3,0%.
O DNIT (2002b) apresenta um relatório (Tabela 2) com os dados relativos ao excesso de peso
de veículos nos escassos postos de pesagem fixos que operaram nas rodovias federais durante
o ano de 2000. O baixo percentual de veículos notificados pode ensejar uma conclusão errada
Pode-se entender que uma situação de crise no mercado pode motivar o tráfego de veículos
com excessos de carga para aumentar a produtividade dos fretes, porém não se pode esquecer
que a ganância e a falta de fiscalização também são agentes causadores deste sério problema
que preocupa órgãos públicos, concessionários e usuários de rodovias.
Com relação aos “modestos” 2,5% a mais na tolerância sobre a carga/eixo, de acordo com a
Resolução 102/99 (CONTRAN, 1999b), negociados entre o Ministério dos Transportes e os
caminhoneiros após a paralisação de julho de 1999, comprovou-se que a mesma provoca uma
redução entre 10 e 15%, na vida prevista dos pavimentos de acordo hipóteses de composição
de frota e cálculos desenvolvidos no LASTRAN.
O eng. Fábio Abrita Filho (2001) apresentou no Seminário sobre Pesagem em Rodovias, para
análise da comunidade técnica e dos órgãos do Governo, uma comparação entre dados de
pesagens realizadas entre junho e julho de 1999 e os dados levantados no mesmo período do
ano de 2001, após a Resolução 104/99 do CONTRAN (1999a) (Tabela 4).
No período junho e julho de 2001 foram detectados e não multados 7.577 veículos com
excesso de carga por eixo, totalizando 3.826t. Este caso permite calcular que o Governo
deixou de arrecadar R$ 20.000.000,00/ano com multas e a concessionária contabilizou um
custo maior de R$ 3.000.000,00/ano com despesas de conservação. Pergunta-se: porque é
multado somente excesso do PBT? Quem paga esta conta?
Quando as rodovias eram submetidas a um controle sistemático da carga por eixo, chegava-se
a ciclos de recapeamento três vezes maior do que rodovias sem controle de peso (em média
de quatro anos), de acordo com os padrões do DERSA. OLIVEIRA JR. et al. (1995)
informam que a Rodovia dos Bandeirantes, inaugurada em 1978, teve seu primeiro
recapeamento no ano de 1992, com 14 anos de vida útil sem manutenção corretiva. Citam
também a Rodovia dos Trabalhadores, inaugurada em 1981 com o primeiro recapeamento em
1994, resultando um período de 13 anos.
É evidente que outros fatores também contribuem para o surgimento de defeitos nos
pavimentos. Pode-se relatar os seguintes: insuficiência no dimensionamento, problemas com
materiais, técnicas executivas e de fiscalização inadequadas, ação exagerada do clima, falta
de manutenção, etc., porém o de maior severidade, sem dúvida, é o excesso de carga.
Assim, quando o estado de um pavimento passa de bom para ruim, condição comum nas
rodovias brasileiras, ocorrem inúmeros contratempos e prejuízos aos usuários e à economia
em geral. Estudos executados por Martins e Miranda (1995) para avaliar estas conseqüências
demonstram que há um aumento de 30% na depreciação da frota dos veículos de carga,
ocorre um consumo de combustível 60% maior, o tempo de viagem aumenta em média
100%, o número de acidentes aumenta em 50%, aumentam também o risco e a severidade
dos acidentes. Devem ser mencionados os maiores danos provocados sobre as estruturas de
pontes e viadutos.
4. Dimensões do problema
Todas as questões abordadas neste artigo referem-se aos 57,2 mil quilômetros de rodovias
federais, aos 94,8 mil quilômetros de rodovias estaduais e aos 20,9 mil quilômetros de
rodovias municipais pavimentadas distribuídas pelo país (DNIT, 2004). Apesar dos números,
não se pode afirmar que a disponibilidade de rodovias pavimentadas existentes é satisfatória.
Em 2002 o total de estradas existentes era de 1,75 milhão de km (DNIT, 2004), número que
comprova que ainda estamos muito longe de atingir a fronteira de rodovias pavimentadas
para o atendimento das necessidades de desenvolvimento econômico e social. Soma-se a este
fato, a baixa qualidade da infra-estrutura viária, cujo estado de conservação é avaliado como
péssimo, ruim ou deficiente em 78% da sua extensão, segundo estudo já mencionado (CNT e
COPPEAD, 2002).
A mesma pesquisa indicou que 77,2% dos motoristas entrevistados têm pouca ou nenhuma
desconfiança do funcionamento correto das balanças e 67,6% acreditam que há prejuízo ou
não há nenhuma vantagem em trafegar com excessos de cargas. Por este último dado, pode-se
concluir que aproximadamente 30,0% do universo dos motoristas consultados julgam que
existem vantagens em trafegar com sobrecargas.
A experiência com pesagem no Brasil ainda é pequena, porém, apresenta-se a seguir, uma
série de importantes pré-requisitos que devem ser considerados no planejamento de futuras e
necessárias ações nesta área:
A pesagem fixa deve durar 24 horas por dia, caso contrário os veículos carregados ficam
represados à montante da balança esperando o término da operação;
O planejamento de uma operação de pesagem deve levar em conta uma visão de rede,
pois os infratores agem racionalmente, ou seja, procuram rotas alternativas para fugir da
pesagem, destruindo outras rodovias federais, estaduais ou mesmo municipais e urbanas;
A correta localização dos postos de pesagem é fundamental para o sucesso do programa.
Os principais critérios de localização são: proximidade com a origem da carga,
eliminação das fugas e a menor quantidade de praças de pesagem;
Não podem ocorrer dúvidas dos usuários quanto à integridade dos resultados da pesagem
e,
A implementação de um programa ou plano de pesagem deve ser antecedida por uma
ampla discussão, pesquisa de opinião e divulgação dos principais objetivos aos
integrantes do sistema.
hora órgãos como alguns DER’s, DNIT, ANTT e empresas concessionárias de rodovias estão
tomando uma série de iniciativas quanto ao entendimento do problema, através de uma boa
mobilização dos quadros técnicos e do início de medidas no sentido de implementar a
fiscalização dos excessos de peso através da pesagem dos veículos comerciais.
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