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A lagosta boxeadora e seu impacto em futuras

tecnologias
Marco Aurélio Nunes Pereira Filho*
DRE: 116108613
Escola Politécnica(POLI) - UFRJ
12 e Julho, 2019

Professor: Luiz Eduardo Azambuja Sauerbronn

* Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: marco.aurel95@poli.ufrj.br


A lagosta boxeadora (peacock mantis shrimp ou
smasher mantis shrimp) é um animal que habita águas
tropicais e subtropicais dos oceanos Índico e Pacífico,
entre o leste da África e o Havaí. Eles são membros da
ordem dos estomatópodes e pertencem ao grupo taxonômico
dos crustáceos, assim como os caranguejos, camarões,
lagostas etc. Eles são belos animais, de cores vibrantes,
mas também criaturas mortais, capazes de atingirem suas
preses com a força de uma bala.

Figura 1:
Lagosta boxeadora

Tendo em média de 15 a 30 cm de comprimento,


ele é considerado um dos animais mais violentos do
planeta, extremamente agressivo, dotado do bote mais
rápido de todo o reino animal. Possuindo duas garras
super poderosas na parte dianteira de seu corpo, que
quando acionadas são capazes de proferir um golpe com
a mesma aceleração de um disparo de um arma calibre .22,
com um força de impacto de 60 kN/cm3, o movimento de
suas garras em forma de luva de boxe na hora de proferir
um golpe em direção à presa é quinze vezes mais rápido
que o nosso piscar de olhos. Se um ser humano pudesse
lançar uma bola baseball com 10% desse poder, ele seria
capaz de colocá-la em órbita ao redor da Terra. As suas
patas dianteiras, na hora do ataque, se movem tão
rapidamente que a água próxima ao mantis chega a entrar
em ebulição e, num fenômeno chamado “supercavitação”,
ele produz uma bolha de cavitação cuja temperatura é
próxima à da superfície do Sol e que quando se rompe
provoca uma onda de choque que por si só é capaz de
matar sua presa mesmo que a lagosta venha a errar o
golpe. Por essa razão, os aquários que abrigam essas
criaturas são feitos com vidro à prova de bala.
A lagosta boxeadora possui 34 apêndices, 2 pares
de antenas, 5 pares de pleópodes para nadar, 5 pares de
pernas para andar, 3 pares de pernas para se alimentar,
1 par de antenas e duas hastes oculares para sustentar
seus grandes globos oculares. Além disso, ela também
possui 1 par de patas cuja única função é limpar seus
olhos, e isso ocorre por uma boa razão, são seus olhos
que a distinguem de qualquer outro animal do planeta,
ela possui o sistema visual mais complexo de todas as
espécies conhecidas pelo ser-humano até o presente
momento. Para se ter uma noção, enquanto nós temos
apenas três receptores de cores em nossos olhos, essa
criatura tem incríveis doze receptores para cores e
quatro para diferenciar luz polarizada, ela consegue
ver tanto a luz infravermelha quanto ultravioleta do
espectro eletromagnético. Outra curiosidade é que
enquanto cada olho do ser humano forma uma imagem, o
que implica que nós somos organismos com visão binocular,
cada olho do mantis cria três imagens distintas. Ele é
também capaz de mover cada globo ocular de forma
independente em 270o, o que lhe permite perceber presas
e possíveis predadores se aproximando.

Figura 2: Receptores de cores de um ser humano x


receptores do mantis shrimp

A luz proveniente do Sol e do bulbo de uma lâmpada


é não polarizada, o que significa que a onda que essas
fontes luminosas produzem é uma superposição de várias
ondas, vibrando em vários planos diferentes. A luz não
polarizada, todavia, pode ser polarizada de diversas
maneiras, como fazendo a luz passar por um determinado
tipo de vidro.

É informação conhecida no mundo médico atual que


tecido cancerígeno reflete luz polarizada de uma
maneira distinta de tecido saudável e médicos utilizam
esse fator para detectar tumores utilizando complexos
sistemas de imagem, mas cientistas atualmente acreditam
e trabalham para aperfeiçoar tais sistemas, pois os
equipamentos que realizam esse exame são muito caros e
ocupam um grande espaço. Nossos olhos não são capazes
de perceber a diferença entre luz polarizada e não
polarizada. Já os olhos da lagosta boxeadora têm
sensores que a permitem, dentre outras coisas,
distinguir luz não polarizada de luz polarizada. No mar,
por exemplo, superfícies como escamas, que refletem luz
polarizada, se destacam fortemente da água do fundo do
mar. Saber essa diferença é importante para a
sobrevivência do mantis shrimp.

Figura 3: Polarização da luz

Além de saber “ler” a polarização da luz, o animal


também emite pulsos de luz polarizada. Como já
mencionamos, células tumorais malignas refletem esse
tipo de luz de um jeito diferente de células saudáveis.
A diferença, imperceptível para um ser humano, seria
facilmente percebida por uma lagosta boxeadora que
emitisse um pulso de luz polarizada no tecido suspeito.
Vários grupos de pesquisa ao redor do mundo estão
tentando imitar os olhos desses artrópodes para
detectar o câncer mais cedo do que nunca. Um dos estudos
precursores nesse sentido, ocorre no Queensland Brain
Institute, na Austrália, onde cientistas estão
desenvolvendo uma câmera inspirada na estrutura dos
globos oculares desse animal, capaz de emitir luz
polarizada enquanto fotos de tecidos humanos são
tiradas, sendo possível distinguir tecido maligno do
saudável a partir das imagens coletadas.

A ideia é também fazer que cirurgia de remoções de


tumores fiquem mais precisas. Se a luz polarizada revela
exatamente que parte do tecido foi afetada pelo câncer,
os médicos conseguiriam garantir que nenhum pedaço do
tumor maligno ficou para trás e não precisariam retirar
tecido saudável desnecessariamente.

Como já mencionado, por conta de tal habilidade,


o professor Justin Marshall, do Queensland Brain
Institute, e sua equipe desenvolveram o protótipo de
uma câmera baseada no modelo dos olhos da lagosta
boxeadora, traduzindo a luz polarizada refletida em
cores que podemos ver. Também já existem outros
protótipos de câmeras feitos pela universidade de
Illinois e de Washington, este último já utiliza o
equipamento desenvolvido para detecção de câncer de
mama por meio de exames de imagem.

Uma outro linha de pesquisa, diferente da voltada


para a área médica, vem sendo realizada, mas no campo
de ciência dos materiais. Já discutimos o quão poderoso
é o golpe dado pela lagosta boxeadora, mas a pergunta
que fica é “como um animal com míseros 15 cm profere um
golpe tão intenso sem danificar seu exoesqueleto?”. Nos
últimos anos, diversos cientistas ao redor do mundo têm
estudado sobre a estrutura corporal desse animal,
tentando entender como um impacto tão grande não causava
dano à própria criatura. Eles chegaram à conclusão que
há duas razões para isso:
- A casca da lagosta é composta por cálcio, o mesmo
material resistente encontrado em nossos ossos;
- A segunda, e mais importante, é que todo esse cálcio
está organizado de uma forma especial, uma estrutura
conhecida como “padrão espinha de peixe”, que absorve
o impacto e distribui a força recebida evitando que o
estomatópode se machuque. Uma estrutura como essa nunca
foi vista em nenhum outro animal na natureza.

Figura 4: Visão microscópica da garra do mantis shrimp


Pesquisadores das universidades da Califórnia,
Riverside, e da universidade de Purdue estão
desenvolvendo materiais baseados na estrutura do
exoesqueleto das garras da lagosta boxeadora, incluindo
um capacete que absorva impactos de forma mais eficiente
se comparado com os materiais existentes utilizados. O
time busca, dentro outras coisas, desenvolver outros
equipamentos, como coletes à prova de bala e semelhantes,
a partir desses estudos.

Referências Bibliográficas

[1] YORK, Timothy et al. Bioinspired polarization imaging


sensors: from circuits and optics to signal processing
algorithms and biomedical applications. Proceedings of the
IEEE, v. 102, n. 10, p. 1450-1469, 2014.

[2] CHIOU, Tsyr-Huei et al. Circular polarization vision in


a stomatopod crustacean. Current Biology, v. 18, n. 6, p.
429-434, 2008.

[3]https://www.spiedigitallibrary.org/conference-
proceedings-of-spie/9696/1/A-compact-bio-inspired-visible-
NIR-imager-for-image-
guided/10.1117/12.2214617.short?SSO=1#

[4]https://super.abril.com.br/ciencia/lagosta-boxeadora-
enxerga-cancer-antes-dos-sintomas-aparecerem/

[5]https://www.youtube.com/watch?v=Kx6cMniqMhE

[6]https://www.youtube.com/watch?v=3fFhsewo5oU

[7]https://www.youtube.com/watch?v=F5FEj9U-CJM

[8]https://www.youtube.com/watch?v=E0Li1k5hGBE

[9]https://www.youtube.com/watch?v=Qts264cpvfs

[10]https://www.youtube.com/watch?v=bpUyuM9fvis

[11]https://www.newsweek.com/secret-glass-cracking-mantis-
shrimp-465436

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