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FEIJÓ, Filipe1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro/RJ
Introdução
primeira definição do dicionário Aulete virtual:; "1. Que por direito de uso desfruta
alguma coisa". A definição acima atende a uma espécie de idéia geral que fazemos
dessa palavra, uma percepção que versa mais ou menos sobre o que o senso comum
concebe e esse respeito. Fazer uso de alguma coisa, utilizar, também nos remete, caso
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Doutorando do programa de pós-graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGCOM –
UERJ)
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insistamos na perspectiva comum, a uma dimensão prática dos usos que geralmente
está associada à mão. Utilizar a maçaneta, o mouse, um celular. Seja nas inúmeras
esse órgão têm um papel fundamental, a ponto de podermos utilizá-los como guia
manufatura alude a esse fazer em que mãos estão implicadas. Todavia, notamos
usuário é aquele que usufrui de algo e, portanto, logra, aproveita, dispõe, aprecia seja
objeto. Desse modo, essas práticas podem implicar diversas partes do corpo.
As mãos e as máquinas
primeira projeção pública paga apresentou uma série de dez filmes com duração de 40 a
imagem do trem, que parecia vir na direção do público, foi demasiado concreta para
as próprias modalidades sensoriais dos habitantes da metrópole. Por envolver esses três
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vetores fundamentais para o desenvolvimento do trabalho, será uma noção balizadora e
aquelas pessoas. Mas devemos encarar esses aspectos não como casuais ou efêmeros,
humanidade. Mas, afinal, o que caracteriza essa passagem que se convencionou chamar
de revolução?
ser divididas, e o emprego de pequenas máquinas não estava descartado. Mas de forma
geral a labuta era efetuada de maneira artesanal e manual (donde vem o termo
ambientes de trabalho.
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De póprio punho
para a escrita. Vejamos o que diz Walter Ong sobre esse meio;
refere-se a um espaço mudo, aponta para os atos da escrita e da leitura 2 que se utilizam
do silêncio como um fator de isolamento, ou seja, calam o mundo ao redor para que
possa surgir um mundo interior. Já o tal “presente vivo” é característico desse espaço
acústico e refere-se ao caráter pessoal da palavra falada nas culturas orais, que já não se
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Os autores Cavallo e Chartier ressaltam a coexistência das leituras oralizada e silenciosa desde a
antiguidade até a contemporaneidade. Entretanto, no período medieval a prática a leitura em voz alta,
herança do caráter performático das sociedades orais, ainda era muito comum. A leitura silenciosa é
notadamente mais típica da era moderna.
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insistência de Ong e Havelock na dimensão “natural” da comunicação oral oposta ao
caráter artificial da escrita, ou a própria idéia de culturas que nunca tiveram contato
questão central, nesse caso, é pensar uma ampla ênfase nos processos ligados à
que compõem esse tipo de sociedade. Para Havelock, a experiência poética na Grécia
antiga ou, mais precisamente, homérica, que consistia justamente na récita cercada de
adapta o “texto” que lhe vem a memória, num jogo de sonoridades e gestos que tornam
mais fácil, também para o público, a tarefa dea memorização. Viajando através do
tempo, do espaço e das mentes, a reconstituição dos eventos no ato narrativo oral além
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Amplamente estudados por Robert Darnton em “O grande massacre dos gatos e outros episódios da
história cultural francesa”.
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Numa direção que salienta a noção de suporte, notamos que a escrita “alivia” o
Introduzida paulatinamente no seio das grandes civilizações, esta, que surgiu há mais de
em que decodificado.
Harold Innis (referência?) aponta4, dando ênfase nos suportes materiais da escrita, que a
própria base material na qual a escrita é fundada numa determinada civilização gera
solidez de seus templos, marca desse tipo de organização religiosa. Já os hebreus com
seu alfabeto eficaz, posto que escrito mais dinamicamente nas superfícies flexíveis e
mobilidade geográfica. Temos outros exemplos nos fenícios que, voltados para o
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Esses estudos são relativos ao livro the bias of communication (1951).
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Moldada no barro e por isso mesmo considerada simples, já que o suporte não facilita sua fluidez, é
produzida com objetos em formato de cunha, daí o termo cuneiforme.
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alfabeto, nos gregos, hábeis na utilização do papiro egípcio para dar vazão à prosa e a
ocidente. Mas é com a invenção do papel pelos chineses e com seu monopólio pelos
restrito, uma série de tecnologias possibilita a impressão por tipos móveis de metal.
mundo mágico da audição. É claro que os outros sentidos continuam fazendo parte do
vivos, cedendo cada vez mais espaço ao significado, e a escrita fonética tem, por
dinâmica, mas sem ignorar algumas colocações efetuadas por Adriaen Johns no grande
trabalho The Nature of the Book. Nele, o autor questiona a uniformidade dos processos
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nível das pequenas operações cotidianas, o que importa são determinados atores sociais
gerais) desse aparato, que seria responsável por uma verdadeira revolução. O fato é que
texto impresso é progressivamente mais ágil que a do manuscrito, dado o seu caráter
Do humanismo ao pós-humano
pensamento propagado por uma classe letrada que retoma as bases platônicas do
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Termos de Marshall McLuhan
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referencial para esse tipo de sujeito cognoscente é a razão, seja ela expressa de maneira
observações, algo fundamental para o método científico. O século XIX, por exemplo, é
por demais evidente para ser ignorado por estudos mais abrangentes (colocar as
século XIX8 é a passagem de uma ótica geométrica para uma ótica fisiológica. Assim, a
materialidade corporal agregada aos estudos sobre a visão mostra que já não é possível
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Aparato inventado ainda na antiguidade capaz de projetar imagens que estão ao redor em seu interior
através de um feixe de luz. Muito utilizado para desenhos que requerem maior precisão de formas e
proporções.
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Jonhathan Crary situa um processo de reorganização da visão no início do século XIX, mais
precisamente nas décadas de 1820 e 1830, capazes de produzir um novo tipo e observador. Esse novo
regime, moderno e heterogêneo, redefiniu o status de um sujeito observador através de uma série de
relações entre corpo, de um lado, e formas de poder institucional e discursivo, do outro.
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óticas e sensoriais humanas. Elevados índices de atenção mostravam-se indispensáveis
que uma série de idéias poderia ser inserida seqüencialmente em cabeças juvenis num
nos trabalhadores, bem como eram requeridas, em sala aula e em relação aos alunos,
informações semelhantes.
momento em que a atenção e a visão ganham destaque nos estudos científicos. Esse
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zootrópio, caleidoscópio e estereoscópio (tão importante para os debates acerca da
que apresenta uma realidade ainda marcada pela sobrecarga de estímulos, mas também
mais amplo, os contextos sociais que envolvem essas relações. Para isso, buscaremos
operar no registro da cognição “ampliada” (RÉGIS, 2010), termo que designa um vasto
por Andy Clark, em que percepção, pensamento e ação agem ao mesmo tempo e de
seletiva. Um exemplo que abarca essas ordens é a atitude no usuário de jogos de video
seguida analisá-los e depois agir. Existe uma integração simultânea entre percepção e
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ação, fazendo com que seu aparelho sensório-motor aja antes que níveis cognitivos
se aplicam os esquemas mentais de Piaget que servem de base para a atenção selecionar
dados.
celular) potencializadas pelas TICs. Na verdade, vivemos numa época em que esse tipo
chats, games ou vídeos no youtube. Esse tipo de cognição encadeada funciona enquanto
uma rede cognitiva composta de fios (linhas) que correspondem à funções cognitivas
conversa com outros usuários em rede. Isso é viável, pois diferentes órgãos do sentido
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são ativados. Nas multitarefas concorrentes, certas tarefas como dirigir, utilizar um
tablet, comer com garfo e faca e tocar violão não podem ser efetuadas ao mesmo
porque todas necessitariam do uso das mãos que são apenas duas.
éticas se operam nos corpos, a partir da crescentes interações e jogos maquínicos, que
Usuário?
problema que, caso não fosse anunciado de antemão, teria sua presença afirmada de
modo sub-reptício. Como podemos chamar aquele que entra em contato com um meio?
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Aquele que, na relação com determinada mídia, tem seu corpo calibrado e afetado
nessas páginas, a palavra usuário não aparece para denominar quem faz uso das
tecnologias de comunicação até a parte final. Claro está que não podemos associar esse
termos às tecnologias digitais do século XXI, posto que já existem há muito usuários de
aparelhos telefônicos. Por que não chamamos quem desfruta de um livro ou quem
assiste televisão?
A princípio, temos plena consciência de que “soar mal”, “não combinar” são
termo usuário pode soar estranho para indicar o telespectador, mas não quem faz uso do
utilizado no emprego de alguma coisa. Desse modo, tanto faz se o usuário dessa
ferramenta. Para o produtor, um livro pode ser uma ferramenta para o sucesso
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literatura ou do cinema, podem ser chamados de público. Tudo parece bastante claro se
colocamos a questão desse modo, até que um invento do século XIX, apesar de
conjecturas, posto que até hoje toma aquele que o utiliza por usuário. O aparelho
comunicacional. Isso nos remete ao papel da interação, tão presente em smart phones,
usuário, ou seja, aquele usufrui, que faz uso de coisas pouco importa quais sejam,
Referências
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ONG, Walter. Oralidade e cultura escrita; a tecnologização da palavra. Campinas;
Papirus, 1998.
ZUMTHOR, Paul. A letra e a voz; a literatura medieval. São Paulo; Companhia das
Letras, 1993.
Faltaram as referências de Adrian Johns, Michel Foucault, Ben Singer, Regis, 2009,
Regis, 2010.
Filipe,
A redação do texto é fluida e com poucos erros ortográficos. Você leu os textos da
disciplina e o tema (embora muito amplo) é pertinente. Você demonstra domínio e
compreensão dos textos da disciplina e de outros que você traz para complementar.
Entretanto, é preciso aprimorar a estrutura de trabalho científico. O texto é um fluxo de
ideias que vão se encadeando, mas sem o aprofundamento devido de cada uma delas.
Você começa discutindo o termo usuário (de modo superficial, usando dicionário) e, ao
longo do texto, apresenta outros tópicos que ampliam o escopo do tema em vez de
ajudar em seu recorte, aprofundamento e problematização. No fim, o artigo não cumpre
o prometido. Alguns autores são citados sem as devidas referências. Nas referências
bibliográficas nota-se a ausência de 5 obras citadas no texto.
Abs,
Fátima
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