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O processo de institucionalização da

supremacia da ordem econômica e jurídica


na constituição do Estado democrático

Ruy dos Santos Siqueira

Sumário
Introdução; 1. O processo de produção e fal-
seamento ideológico da realidade na perspec-
tiva da teoria sociológica e semiológica; 2. O
dilema epistemológico e conceitualista da teo-
ria do Estado; 3. A limitação sistêmica do con-
ceito positivista e funcional da teoria do Esta-
do moderno; 4. Análise crítica do processo de
constitucionalização do Estado Democrático; 5.
Reflexão sobre o processo de judicialização do
Estado democrático: A República tomada pelo
Direito Positivista; Conclusão.

Introdução
No processo de fundamentação teórica e
de consolidação dos pensamentos econômi-
co-liberal-capitalista e jurídico-positivista,
tratou-se de incorporar o que tinham em co-
mum nos seus arcabouços ideológicos, ou
seja, o espírito e a crença na existência de
uma ordem natural, despojada da reflexão
metafísica e deôntica. Uma realidade con-
cebida enquanto normativista e providen-
cial, transmitida ao inconsciente coletivo,
Ruy dos Santos Siqueira é Secretário da como evento determinista e escatológico.
Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Entrementes, a crença na realidade en-
Câmara dos Deputados e Professor de Ética e quanto categoria e expressão de uma ordem
Cidadania no UniCeub. natural e inevitável, obriga a rever a trama
Trabalho final apresentado ao Curso de histórica e o discurso desta simbologia ideo-
Especialização em Direito Legislativo realiza- lógica e mítica, a doxa capitalista, fortemen-
do pela Universidade do Legislativo Brasilei-
te sedimentada no plano cultural e moral
ro – UNILEGIS e Universidade Federal do Mato
Grosso do Sul – UFMS como requisito para da sociedade democrática liberal.
obtenção do título de Especialista em Direito Dissecar o caráter simbólico e político do
Legislativo. Orientador: Prof. ALEXANDRE processo de institucionalização e domina-
PAIVA DAMASCENO. ção sobre o Estado moderno, torna-se um
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ato imperativo e imprescindível para bus- co e estatal, as demandas sociais, preteriza-
car a compreensão do enredo ideológico do das pela ideologia do Estado Mínimo, a par-
liberalismo mercadológico e do direito po- tir do fim da Guerra Fria.
sitivista, que de forma dogmática e funda-
mentalista, continuam a afirmar que o ca- 1. O processo de produção e falseamento
minho e o alcance do desenvolvimento ma- ideológico da realidade na perspectiva da
terial e moral do homem moderno passam
teoria sociológica e semiológica
pela aceitação de uma cultura disciplinada
pela divisão do trabalho e pela mística vi- O cidadão moderno, na sistemática
gente, da “ordem e do progresso”, propug- gramsciana e althusseriana, é um ser confi-
nada pela racionalidade tecno-burocrática gurado pelos aparelhos ideológicos de re-
e convalidada pela moral e ética calvinista, produção do Estado, que desde seu nasce-
da subcomissão e respeito à autoridade vi- douro até ao processo de aprendizagem ou
gente. existencialização, passa a incorporar a con-
Entender os meandros da temática pro- vicção de que o mundo, tal como se apre-
posta é de grande valia e pertinência, já que senta, é real e inconteste em si mesmo. Um
o novo quadro político internacional rede- mundo natural e auto-revelado.
senhado pela teoria do Estado Mínimo nos Absorvidos na condição de que a reali-
anos 90 do século XX, reduziu drasticamente dade é um fato natural, estratificado e irre-
a função estatal a mera defensora do patri- versível, cabe aos cidadãos subalternos ape-
mônio público e da economia de mercado. nas enquadrar-se dentro de sua funcionali-
A década de 90 caracterizou-se pela su- dade e dinamicidade, de um realismo dog-
premacia da política neoliberal como fio mático e escatológico, onde a crença no
condutor das demandas políticas e sociais. mundo revelado ou natural serve como uma
A ação dos Estados, sobretudo “emergen- espécie de moldura existencial acoplada ao
tes” passou a ser determinada pelo discur- inconsciente coletivo, com a finalidade ape-
so econômico e jurídico. Nunca antes na nas de traduzir e preservar as aspirações e
história da humanidade o fator econômico, interesses ideológicos da classe dirigente.
convalidado pelo ordenamento jurídico po- Peter Berger e Thomas Luckmann afir-
sitivista, se havia sobreposto à própria con- mam no intróito de sua clássica obra intitu-
dição e existência humanas. lada “A Construção social da realidade”, que:
Perplexos diante do autoritarismo deter- O homem da rua habitualmente
minista do discurso hegemônico da econo- não se preocupa com o que é real para
mia de mercado e do realismo jurídico libe- ele e nem com o que ‘conhece’, e a não
ral, desconstruir o discurso oficial tornou- ser que esbarre com alguma espécie
se imprescindível para buscar compreender de problema, dá como certa a sua ‘re-
a base material e teórica das razões que jus- alidade’ e o seu ‘conhecimento” 1
tificam a supremacia da ordem econômica e No desiderato de desnudar a linguagem
judicial nas constituições liberais e nos par- como instrumental do processo de falsea-
lamentos da Era Moderna. mento da realidade – realidade esta conso-
Por entender e considerar que a realida- lidada pelo binômio Estado burguês e de-
de é um constructo idealizado e materiali- mocrático de direito – deve-se observar que
zado na perspectiva da estratificação soci- se trata de um problema de desconstrução da
al, desmitificar o discurso oficial da dogmá- linguagem oficiante, ou na esteira marxista,
tica capitalista e jurídica positivista forma- do discurso ideológico de quem enuncia.
lista-normativista significa desnudar a fala O processo de concepção e construção
oficial, fala esta, nitidamente intencionada da realidade, como fruto de uma lei natural
a manter, via controle institucional, teológi- e de uma existência absoluta e inquestioná-

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vel, condiz com a função primordial de pro- certa representação de si, estabelece a dis-
duzir no imaginário social, a crença de que tribuição de papéis sociais, impõe sistemas
a apropriação do fato social é um imperati- de crenças teológicas e deônticas e, princi-
vo deontológico, e que sem esta “assimila- palmente, constrói códigos de conduta.
ção existencial e social”, a historicidade Destarte, é no campo do imaginário so-
humana experimentaria o caos ou a desor- cial que a elite idealiza e impõe aos subal-
dem civilizatória. ternos, os papéis sociais institucionalmen-
Para que a realidade concebida tenha sua te estabelecidos, como forma de garantir os
devida eficácia, a classe dominante trans- seus interesses privados e estatais.
formou o seu discurso político e econômico Estruturalmente sistematizado, dar-se-á
em produção simbólica2 e arquetípica3. O inicio ao processo de dominação. O campo
êxito do processo de convencimento e do- simbólico atuará como um campo de repro-
minância dando-se na formulação simbóli- dução do jogo de poder. Estrategicamente,
ca do discurso e em sua transposição para a um poder que não coage fisicamente, mas
consciência e o imaginário social. reverbera-se no interior dos indivíduos e do
Gilbert Durand nos fornece a devida fun- tecido social, com a finalidade de manter a
damentação teórica, formulando o pressu- realidade instituída.
posto de que: Buscando compreender o fenômeno soci-
A consciência dispõe de duas ma- al enquanto espetáculo produzido, Bronislaw
neiras de representar o mundo. Uma, Baczko, ressaltou que o imaginário social
direta, na qual a própria coisa parece informa acerca de uma determinada reali-
estar presente na mente, como na per- dade. Constituindo-se numa convocatória
cepção ou na simples sensação. A à ação da coletividade. A sociedade precisa
outra, indireta, quando, por qualquer imaginar e inventar a legitimidade que atri-
razão, o objeto não se apresentar à sen- bui ao poder, desse modo, o processo de in-
sibilidade ‘em carne e osso.4 teriorização é de fundamental importância
Na definição do significado de imaginá- e contará com os atributos do campo simbó-
rio social, o professor Denis Moraes subs- lico na constituição de um sistema de repre-
tancializa sua definição, descrevendo: sentação. Como indica Baczko:
O imaginário social é composto por A imaginação social, além de fator
um conjunto de relações imagéticas regulador e estabilizador, também é a
que atuam como memória afetivo- faculdade que permite que os modos
social de uma cultura, um substrato de sociabilidade existentes não sejam
ideológico mantido pela comunidade. considerados como definitivos e os
Trata-se de uma produção coletiva, já únicos possíveis, e que possam ser
que é o depositário da memória que a concebidos outros modelos e outras
família e os grupos recolhem de seus fórmulas.
contatos com o cotidiano.5 A rede imaginária possibilita-nos
Outro expoente dos estudos da semiolo- observar a vitalidade histórica das
gia, Bronislaw Baczko diz que a imagina- criações dos sujeitos – isto é, o uso
ção social é um aspecto muito significativo social das representações e das idéias.
da sociedade, através do qual os grupos so- Os símbolos revelam o que está por
ciais se percebem e projetam na elaboração trás da organização da sociedade e da
de uma imagem de suas realidades próprias própria compreensão da história hu-
e atribuem identidades sociais e institucio- mana. A sua eficácia política vai de-
nais a seus membros. pender da existência daquilo que
É desta forma que uma coletividade ou Baczko chama de comunidade de
civilização designa sua esfinge, planeja uma imaginação ou comunidade de senti-

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do. As significações imaginárias des- procuramos compensar uma insatis-
pertadas por imagens determinam re- fação vaga e difusa. Só a imaginação
ferências simbólicas que definem, permite à consciência humana adap-
para os indivíduos de uma mesma co- tar-se a uma situação específica ou
munidade, os meios inteligíveis de mobilizar-se contra a opressão.” 6
seus intercâmbios com as instituições. Diante das reflexões de Dênis Moraes
Em outras palavras: a imaginação é sobre a teoria do imaginário social de
um dos modos pelos quais a consci- Baczko, pode afirmar que o cidadão, rotini-
ência apreende a vida e a elabora. A zado pelos tempos modernos de individua-
consciência obriga o homem a sair de ção, de forma tácita e cadenciada, ao ser con-
si mesmo, a buscar satisfações que duzido e formatado pelo ideário e os inte-
ainda não encontrou. resses da classe dominante, tem a predispo-
O imaginário não é apenas cópia sição de naturalizar a vida cotidiana, como
do real; seu veio simbólico agencia espaço axiomático de manifestação da pró-
sentidos, em imagens expressivas. A pria realidade; mormente, prescindindo da
imaginação liberta-nos da evidência reflexão, da dúvida e da indagação acerca
do presente imediato, motivando-nos do modo em que se operou a construção da
a explorar possibilidades que virtual- realidade exposta.
mente existem e que devem ser reali- Ampliando à análise na perspectiva his-
zadas. O real não é só um conjunto de tórico-filosófica, a modernidade, ao despir-
fatos que oprime; ele pode ser recicla- se do temor e da mítica medieval, busca con-
do em novos patamares. Como nos sagrar uma realidade versada pelo espírito
propõe Ernst Bloch ao indicar um cartesiano, guiando-se pela lógica da hete-
nexo entre as potencialidades ‘ainda- ronomia burguesa.
não-manifestas’ do ser e a atividade Uma realidade que passa a ser decodifi-
criadora da ‘consciência antecipado- cada e determinada pela ação de um poder
ra’. A função utópica da consciência revestido por uma razão instrumentaliza-
antecipadora é a de nos convencer de da sob o signo da objetividade técnica, des-
que podemos equacionar problemas cartando quaisquer alusões subjetivas ou
atuais em sintonia com as linhas que indagação reflexiva sobre o que é a realida-
antecipam o futuro. de, apenas aceitando-a enquanto manifes-
O ‘ainda-não-ser’ – categoria fun- tação de si mesma e de um destino linear e
damental da filosofia blochiana da irreversível.
práxis – baseia-se na teoria das po- Corroborando com a critica sobre o con-
tencialidades imanentes do ser que ceito positivista de realidade, o professor
ainda não foram exteriorizadas, mas Ronald Ayres Lacerda, especialista em filo-
que constituem uma força dinâmica sofia e teologia do processo de Whitehead,
que projeta o ente para o futuro. Imagi- afirma:
nando, os sujeitos ‘astuciam o mundo’. Que a realidade social é um todo
O futuro deixa de ser insondável, para complexo, possuindo um caráter dis-
se vincular à realidade como expectati- tinto da realidade natural. Logo não
va de libertação e de desalienação. se pode pretender aplicar os métodos
Devemos distinguir, como Bloch, da física às ciências naturais, como
imaginação e fantasia: a primeira ten- numa certa tradição positivista.7
dendo a criar um imaginário alterna- Contudo, o desencantamento e a descren-
tivo a uma conjuntura insatisfatória; ça na construção de novas utopias a partir
a segunda nos alienando num con- da hegemonia do capitalismo, esboçados em
junto de ‘imagens exóticas’ em que tempos de civilização pós-moderna, não fo-

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ram capazes de sepultar a premissa de Karl pindo-se das vestes teológicas e da moral
Marx proferida no preâmbulo do Manifesto medieval, não abdicou da estrutura ritual e
Comunista, em 1848. mítica, uma vez que a presença da estrutura
Ao contrário, continua marcante e atual deu maior eficácia ao processo de manuten-
a sua assertiva de que a história/realida- ção da ordem eclesiástica vigente.
de/existência é ato contínuo de luta e con- Na estruturação e na hierarquização da
flito de classes. Mais atual, quando assisti- sociedade moderna, o fator lingüístico tor-
mos o fracasso da euforia e do triunfo do na-se viés de dialógica social e psicológica,
neoliberalismo dos anos 90 e, principalmen- calcada no suporte mítico e ritual.
te do seu poslúdio: o “fim da Historia”.8 A burguesia apropria-se do papel do
Parece-nos que o pensamento marxista ain- simbolismo, outrora sacro, colocando na
da será por muito tempo, a principal ferra- sua essência uma nova condição humana
menta de análise dos fenômenos civilizató- permeada de simbolismo “logocêntrico”. A
rios e sociais no mundo da divisão do tra- palavra, na integração e construção da rea-
balho e do exercício do poder. lidade ganha força transcendental dentro
Diante da contínua e atualizada sistê- do tecido social. Dessa forma, a elite tradicio-
mica marxista, pode-se inferir que a reali- nal, no processo de racionalização da lin-
dade e suas complexas estruturas institucio- guagem, não abstrairá do mito e do rito.
nais, dogmáticas e normativas é um ato ou Para assegurar a eficácia ideológica e
uma invenção intencionalizada, com foco simbólica da realidade vigente, fez-se neces-
dirigido e, especialmente manobrado por sário ritualizar e mitificar a cotidianidade
aqueles que detém as diversas formas de através do jogo da linguagem. A linguagem
exercício do poder e da dominação. deixa de ser mero formalismo de comunica-
A realidade é um espectro do processo ção e de integração e, transforma-se num
de ideologização vinculado às condições agir intencional, igualmente ao agir ideoló-
materiais de produção, processadas a par- gico.
tir do dinamismo das relações humanas. Terry Eagleton, em seu estudo sobre a
Marx objetiva e consolida a sua consis- correlação analítica entre linguagem e ideo-
tente análise, ao afirmar que a realidade/ logia relembra:
humanidade caracteriza-se pela produção A primeira teoria semiótica da ide-
material e espiritual e não por um estado de ologia foi desenvolvida pelo filosófi-
consciência puro ou metafísico. co soviético V. N. Voloshinov em ‘Mar-
Entretanto, para que a realidade simula- xismo e filosofia da linguagem’ (1929)
da tenha validade e eficácia, será exigida a – uma obra em que o autor audaciosa-
elaboração de um sistema de crença e dog- mente proclama que ‘sem signos não
ma. A ação mimética será primordial no pro- há ideologia’. Em sua visão, o domí-
cesso de passagem do mundo discursivo e nio dos signos e o da ideologia são
ideológico para a permanente realidade si- coextensivos à consciência, que só
mulacro. pode surgir na corporificação materi-
Neste sentido, a ritualização da condi- al dos significantes, e como esses
ção humana, pelo disciplinamento e pela significantes são em si mesmos, ‘lógi-
coação psicossocial, será pêndulo vital para ca da consciência’, que segundo
o processo de assimilação e de incorpora- Voloshinov, ‘é a lógica da comunica-
ção do simbolismo e do ideário da classe ção ideológica, da integração semióti-
dominante, detentora e produtora do espí- ca de um grupo social’. Portanto, se
rito da modernidade. privássemos a consciência de seu con-
No afã de alcançar e manter os seus inte- teúdo semiótico e ideológico, não lhe
resses, a burguesia capitalista, mesmo des- restaria absolutamente nada. A pala-

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vra é o ‘fenômeno ideológico par exce- mítico, é um poder de construção da reali-
llence’, e a própria consciência é ape- dade que tende a estabelecer uma ordem
nas a internalização de palavras, um gnoseológica, podendo incorrer no confor-
tipo de ‘discurso interior’. Em outras mismo social ou numa compreensão do real
palavras, a consciência é menos algo homogeneizante do tempo, do espaço e da
‘dentro’ de nós que algo ao redor de forma existencial.
nós e entre nós, uma rede de signifi- Na sociedade moderna, extremamente
cantes que nos constitui inteiramente.9 hierarquizada, o discurso oficiante será
Para tanto, a segurança e a manutenção sempre um discurso de poder de domina-
da realidade produzida logrará eficácia, re- ção. Será uma locução planejada visando a
correndo à linguagem mítica e ritual. Ob- controle social através da legitimação da
serva-se uma grande simetria entre o dis- investidura política, religiosa, midiática ou
curso religioso e o político, no transcurso econômica. O discurso acerca da realidade
da modernidade empírica. será intencional, dirigido e ideológico, per-
Convalidando a análise sobre esta sime- meado de forte conteúdo deontológico e teo-
tricidade, Ernest Cassirer afirmou: lógico; um enunciado composto de domi-
A consciência teórica, prática e es- nação.
tética, o mundo da linguagem e do Max Weber, refletindo sobre sociologia
conhecimento, da arte, do direito e da da dominação, diz:
moral, as formas fundamentais da Por dominação compreendemos,
comunidade e do Estado, todas elas então aqui, uma situação de fato, em
se encontram originariamente ligadas que uma vontade manifesta (manda-
à consciência mítico-religiosa.10 do) do dominador ou dos dominado-
A psicanálise, o estruturalismo e a feno- res quer influenciar as ações de ou-
menologia afirmam que para postular uma tras pessoas (do dominado ou dos
descrição sobre a realidade, é fundamental dominados), e de fato as influenciam
entender a função social do mito e do rito no de tal modo que estas ações, num grau
processo de consolidação da realidade, pro- socialmente relevante, se realizam
cessada pelo discurso e internalizada num como se os dominados tivessem feito
rito de passagem para o inconsciente cole- do próprio conteúdo do mandado, as
tivo. máximas de suas ações (obediência).12
Diante da relação simbiótica entre mito
e rito, elementos basilares de construção e 2. O dilema epistemológico e
legitimação da realidade, Paul Ricoeur, conceitualista da teoria do Estado
Ernest Cassirer e Saussure 11 deslocarão o con-
ceito de mito e o de rito, a partir da lingua- Há várias tentativas de se construir uma
gem. Ambos não serão mais compreendidos teoria do Estado. Não há dúvida que esta-
e tampouco interpretados pelo caminho teo- mos diante de um conceito polissêmico.
lógico, mas como fenômenos de linguagem. Gero Lenhardt e Claus Offe, precursores da
Roland Barthes afirmou que o mundo Escola Crítica Alemã, chamam a atenção que
fornece ao mito elementos da realidade his- as definições tipificadas nas diversas lite-
tórica, referindo-se à maneira como os seres raturas sociológicas e jurídicas, gravitam e
humanos a reproduzem. Em contrapartida, se orientam numa conceitualização formal
o mito devolve a realidade em imagem, mi- e procedimental, tornando assim, uma defi-
metismo lingüístico e comportamental. nição, meramente pragmática e positivada.
Contribuindo com a perspectiva crítica Ao refletir sobre teoria do Estado e polí-
de Barthes, o sociólogo francês Pierre tica social, advertem que em torno do estu-
Bourdieu ressalta que o poder simbólico/ do sociológico sobre teoria do Estado:

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A investigação do Estado e da po- soficamente, uma utopia civilizatória e do
lítica estatal se orienta nas ciências ser individual, tendo como finalidade a sua
sociais liberais por conceitualizações emancipação histórica e humana pelo do-
formais. Quando eventualmente en- mínio da razão. Entretanto, conforme
contramos definições sociológicas do Thomaz Hobbes este caminho não se pro-
Estado de direito parlamentar-demo- cessará pela determinação da história.
crático, essas definições se referem a Diante da constatação da experiência
formas e procedimentos, a regras e das constantes guerras no transcurso da
instrumentos da atividade estatal e história, a razão e o desejo humano só po-
não a suas funções, relações de inte- derão ser contidos pelo Estado. Pois, já di-
resse e resultados.13 zia Hobbes, que a história é uma constante
A fortiori, estes autores buscam desmiti- interação de guerra civil.
ficar o conceito esboçado pelo academicis- Reinhardt Koselleck, no seu comentário
mo positivista que, herdeiro da tradição jus- sobre o pensamento de Hobbes, expressou:
naturalista e dos textos clássicos de Hobbes, O Leviatã é, ao mesmo tempo, cau-
Leibnitz, Locke e Kant, deu sustentação à sa e efeito da fundação do Estado.
idéia de um Estado metafisicamente puro. Assim Hobbes acaba com a pretensa
Claus Offe oblitera ao tradicional con- prioridade das resoluções internas
ceito liberal e conservador, da crença de uma dos indivíduos e tenta demonstrar o
realidade permeada da idéia metafísica e condicionamento congênito de qual-
universalista, e de uma ordem existencial quer moral que se realize pela ordem
apriorística e determinista, onde o Estado é estatal. A conseqüente eliminação ab-
apenas a expressão desta sistematização solutista de qualquer dualidade entre
psicossocial e ideológica. estamentos e monarca, entre povo e
Diante desta definição tradicional, um soberano, se quisesse ser dotada de
estudo analógico e histórico sobre o proces- sentido, também interditava uma se-
so de transposição da estrutura simbólica e paração entre lei moral e legalidade
metalingüística das epocalidades Ociden- política. A guerra civil, que é vivida
tais revela, que se na Idade Média a Igreja como ameaça mortal, alcança a paz
era a representante natural da ordem divi- no Estado. Este Estado, como Estado
na e política, na modernidade, com o fim do terreno, é um deus mortal. Como deus
absolutismo e a consolidação dos ideais ilu- mortal, assegura e prolonga a vida
ministas, o Estado apropria-se deste cons- dos homens, mas ao mesmo tempo,
tructo, incorporando um estilo de autorida- permanece mortal, pois é uma obra
de autocrática, dotado de uma ordem hu- humana e pode sempre sucumbir ao
manística e tecno-burocrática. estado de natureza que marcou sua
Transformando-se numa “potência ins- origem, a guerra civil.14
titucional divinizada” pelo ideal calvinis- Diante da contradição entre o significa-
ta, o Estado passa a ser o legitimo mediador do e a objetividade do Estado, Norberto
do projeto de sociedade contratualista. Bobbio chama atenção da dificuldade exe-
Dentro do pressuposto junguiano de análi- gética e epistemológica de se formular um
se sobre arquétipo, houve apenas uma mu- conceito puro e preciso, uma vez que, em
dança de objeto, pois a base metafísica e boa parte dos compêndios e tratados socio-
material continuou vigente, ou seja, da lógicos, ficou adstrito ao viés liberal e pro-
obediência à Igreja e ao Estado racional e testântico.
disciplinador. Tratando-se de uma crítica teórica do
É verdade que um dos objetivos funda- Estado, deve-se ater ao parâmetro e ao sig-
mentais do Iluminismo foi sistematizar filo- nificado da influência do calvinismo, do li-

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beralismo e do positivismo moderno na ela- crença na igualdade, nos direitos humanos,
boração conceitual do Estado vigente no na liberdade individual, na propriedade, no
mundo contemporâneo. mercado livre e na democracia será a marca
Do pensamento calvinista, o Estado va- determinante deste Estado liberal.
leu-se da imunidade em suas ações contra- No Estado liberal-democrático, o impé-
ditórias. O processo de divinização da au- rio da lei precederá a própria existência. A
toridade foi uma das principais contribui- anterioridade existencial, sob a ótica e o es-
ções para a autonomia e soberania do Esta- pírito objetivista, não dará espaçamento
do moderno. para o espírito objetivo e racional. A máxi-
Calvino formulou a idéia de que Igreja e ma da modernidade liberal é transformar e
Estado procedentes do mesmo princípio e controlar o mundo, restringindo a sanção
simbolismo. Ambos, com funções específi- moral ao dever privado, libertando a econo-
cas, são instrumentos de Deus para a vinda mia de qualquer injunção teológica e ética.
e a preservação de seu Reino. Enquanto o Ao Estado cabendo apenas a tarefa de regu-
Estado tem a função de resguardar a ordem lar a moral privada. Assim:
circunstancial e histórica, a Igreja tem a ta- O iluminismo triunfa na medida
refa específica de orar pelas autoridades, em que expande o foro interior priva-
independentemente dos atos serem bons ou do ao domínio público. Sem renunci-
maus ou de provocarem a desumanização ar à sua natureza privada, o domínio
das pessoas e a injustiça social. público torna-se o fórum da socieda-
No pensamento político e ideológico de de que permeia todo o Estado. Por úl-
Calvino, as sociedades deveriam ser com- timo, a sociedade baterá à porta dos
postas de pessoas obedientes e distancia- detentores do poder político, para aí
das da atividade política. A exigência de também exigir publicidade e permis-
uma servidão cívica e teológica ao Estado são para entrar.16
foi uma das características de Calvino. A No entanto, Claus Offe ressalta que o
preservação da ordem estatal e social era processo de formulação de uma teoria do Es-
uma exigência incondicional para os discí- tado não pode continuar restrito a uma per-
pulos da Igreja Reformada. cepção normativa e formalista, uma vez que:
Vale destacar que, diante do processo de Quando eventualmente encontra-
protestantização do Estado que varria a mos definições sociológicas do Estado
Europa dos séculos XVI a XVIII, Karl Marx de direito parlamentar-democrático,
insurgiu-se contra este paradoxo que ainda essas definições se referem as formas,
afronta o espírito e propósitos do pensamen- procedimentos, a regras e instrumen-
to moderno. Críticando a religião que se es- tos da atividade estatal e não a suas
tabelece no processo de configuração do funções, relações de interesses e resul-
novo Estado, busca defende-lo da impostu- tados.17
ra religiosa, propondo em definitivo a secu- Assim, impulsionado pelo espírito de
larização do poder político e público. Claus Offe, de contraposição ao conceito
Chama a atenção para isso em seu clás- definição funcionalista e weberiano sobre
sico “A Questão Judaíca”, ao afirmar que a teoria do Estado, como detentor do mono-
“retirar a religião do Estado não significa pólio da violência, faz-se necessário pergun-
tirá-la da vida das pessoas”15, apenas ad- tar: Quem governa e quem exerce esta ação
vertia que o Estado deveria ser laico. coercitiva contra quem?
Com relação aos princípios do liberalis- Percebe-se na tradição liberal-funciona-
mo, o Estado herdou a crença fundamental lista, a tentativa da construção de uma con-
num ideal político em que os indivíduos são cepção linear, despindo-a da inquestioná-
livres para concretizar os seus objetivos. A vel indagação: Quem controla o poder esta-

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tal, uma vez que é portador de interesses Estado neutro, técnico e funcional. A escola
individuais, corporativos e de classe? marxista e a gramsciana explicitam o Esta-
Além disto, há de enfrentar outro dilema do como expressão da dominância da maio-
teórico acerca da condição do governante, ria pelo espectro de uma minoria que gover-
sobretudo, estabelecida no pressuposto de na e manipula os subalternos, impondo-
potência soberana de Jean Bodin18 . Seu lhes a ideologia da servidão predestinada.
postulado do tipo ideal de governante Portanto, é uma ilusão falar num Estado
transforma-se em mero exercício de abstra- contratualista, diante de um processo his-
ção, quando tenta sustentar a idéia de que o tórico que reflete claramente as interminá-
governante deve estar acima do bem e do veis lutas de classes.
mal, sem a sanção moral. Buscando ampliar a corrente marxista,
Este aparente delírio teórico de Bodin os protagonistas da Escola Crítica de
continua muito presente no inconsciente dos Frankfurt: Marcuse, Adorno e Habermas,
governantes. Recentemente no Brasil, mais contrapõem-se ao realismo jurídico-positi-
especificamente no governo de Fernando vista, afirmando que não há nenhuma vali-
Henrique Cardoso, foi enviada uma propos- dade na idéia de um Estado existente em si
ta ao Congresso Nacional no sentido de ga- mesmo, ou seja, um Estado em potência.
rantir foro privilegiado para ex-autoridades, Seguem afirmando que a formulação te-
numa clara semelhança e assimilação do órica de Estado é estritamente intencional e
ideário de Bodin. histórica, fadado que é, à impossibilidade
Os teóricos da racionalidade moderna, do estabelecimento de um espírito de neu-
principalmente nos séculos XVII e XVIII, tralidade frente à existência e à história dos
buscaram enquadrar o Estado, tirando-lhe conflitos no ambiente hostil e bélico da civi-
o caráter absolutista e reduzindo-o a mero lização Ocidental, expressão de seu princi-
mediador neutralista. pal empecilho, a impossibilidade de uma
No entanto, este ideário de neutralidade governabilidade neutra e isenta, na medida
estatal esbarrava na contradição principio- em que se cristaliza na lógica perversa da
lógica de um novo ethos humano formulado exploração humana.
pelos filósofos da natureza, os quais sus-
tentavam uma nova moralidade em que o 3. A limitação sistêmica do conceito
homem da modernidade é tido como possu- positivista e funcional da teoria do
ído por uma natureza perversa e devorado-
Estado moderno
ra de si mesma.
Diante deste conceito de demonização e O pensamento burguês Ocidental insis-
predestinação da condição humana, produ- te nos ensinamentos positivistas de que a
zido para justificar a teoria e a práxis liberal Idade Moderna significou o rompimento
do exercício do poder no controle social e com o modo de produção da economia feu-
moral, deve-se perguntar e refletir sobre dal e o destronamento do absolutismo ecle-
como é possível conciliar a utopia de um siástico e político-estatal. Depreendendo
Estado contratual, se a nova humanidade histórica e moralmente que a modernidade
propugnada por Calvino, Hobbes e outros significou o fim da tirania dos governantes
naturalistas, é dotada de uma natureza sub- e dos religiosos; o fim da intervenção filosó-
jugada moral e existencialmente? fica e teológica na esfera pública e política e,
Por esta razão, compreendemos que a por fim, a consagração do indivíduo en-
teoria marxista parece mais lógica e plausí- quanto sujeito protagonista da própria his-
vel. A idéia de que o Estado é um ente que tória e do destino humano.
representa os interesses de uma classe do- É verdade que a sociedade moderna teve
minante é muito mais compatível à idéia de a capacidade de sepultar todas as formas

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de absolutismo e intervencionismo da mol- nica e institucional sob o fio condutor de
dura medieval e feudalista. Não obstante, uma história linear e progressiva.
deve ficar atentos a que a secularização da A história e realidade, delineada pelos
vida, do poder e da esfera pública, não sig- intelectuais representantes da aspiração da
nificou a planificação do exercício do poder burguesia, transforma-se num desenvolver
político e econômico dentro do tecido social. direcionado pelos princípios da ordem e do
A alternância dos modelos civilizatórios, progresso. Sob o princípio de uma ordem
estatais e políticos, na trajetória e tradição natural a-histórica, onde qualquer mudan-
Ocidental, obedece rigorosamente ao ideal ça de percurso humano e político vai exigir
de um Estado proclamado no idealismo pla- uma transformação funcional ordenada,
tônico, agostiniano e calvinista, no qual se não comportando quaisquer transforma-
afirma que a essência do Estado seria, não ções violentas e abruptas.
um agrupamento de indivíduos semelhan- Esta mentalidade se faz presente na his-
tes e iguais, mas dessemelhantes, desiguais tória política e social, em especial, na cultu-
e de ações estratificadas, portanto, sendo ra das elites da América Latina. Nos anos
impossível atender-lhes as demandas de 80, durante o processo de democratização do
forma isonômica, dada a crença na realida- Continente, os representantes dos regimes
de predestinada e determinada. militares e das elites escravocratas, fiéis se-
O Estado moderno tornou-se uma repre- guidores da cartilha e da impostura positi-
sentação simbólica e institucional do pró- vista, exigiram que as transformações soci-
prio antagonismo e dualismo existencial do ais, institucionais e políticas, deveriam seguir
ser humano. Contudo este impasse concei- um ritmo “lento”, “gradual” e “consensual”.
tual se impõe diante do dilema de compre- A realidade do sujeito autônomo e histó-
ender que, ao mesmo tempo em que cede- rico, estampada no Iluminismo, na Refor-
mos e transferimos o nosso direito de gover- ma Protestante e nos tratados de direitos
nar, receamos deste mesmo Estado que, para humanos da história Ocidental, esvaziou-
garantir e assegurar a paz e a defesa comum, se na medida em que a ordem econômica e
passa usar da força e de todos os recursos, jurídica se sobrepôs e ocupou o lugar da
da maneira que considerar conveniente e centralidade existencial e histórica da hu-
providencial. manidade.
O dilema: quem governa quem? Sem con- O sujeito autônomo, perfilado pela mol-
siderar as contradições e a análise do estra- dura iluminista e pelos ideais do liberalis-
to social, sempre ronda e ameaça a nossa mo, foi deslocado da condição de centrali-
liberdade. dade do paradigma moderno, sendo subs-
A sociedade capitalista-liberal teve o tituído pela supremacia da ordem econômi-
mérito de demolir o palco da ontologia e do ca e jurídica positivista. Preterido deste eixo
estamento medieval e feudalista, mas pre- civilizacional, passou a incorporar na sua
servou para si o arquétipo estrutural destes psiquê e existencialidade, o novo modo de pro-
precedentes históricos. O Estado moderno dução econômica, tido como valor de referên-
não escapa a esta ação contraditória, ora cia na estruturação e eticidade humana.
benfeitor, ora malfeitor da historicidade e Recorrendo à historicidade da tradição
existencialidade humana. moderna, deve ser lembrada a importância
O Estado capitalista incorporou para si da Revolução Francesa e da Revolução
uma moralidade racional e tecno-científica Industrial, que marcaram e determinaram
que, sedimentada no espírito do positivis- os séculos XVIII e XIX, no plano político-
mo, continua a afirmar que a vida, a histó- ideológico e econômico.
ria e a existência, reverberam nas ações po- Enquanto a Revolução Francesa signifi-
líticas, econômicas e jurídicas, trilha orgâ- cou uma transformação e reelaboração da

316 Revista de Informação Legislativa


ontologia humana dentro da sociedade e do figurar o que é o Estado, e seu conteúdo den-
sistema estatal, a Revolução Industrial sig- tro do pensamento moderno, é uma tarefa
nificou um conjunto de transformações na contínua de desconstrução dos conceitos
força produtiva e econômica, abrindo-se o tradicionais.
terreno para a afirmação e consolidação do O próprio Max Weber ao definir o Esta-
capitalismo, como modo de produção do- do como detentor do “monopólio da violên-
minante, tendo a burguesia e o proletariado cia”, nada revela sobre a reflexão a respeito
como novos atores sociais desta nova dinâ- de quem a exerce e contra quem está dirigi-
mica de exploração. da. O conceito weberiano omite a questão
Vale mencionar que a partir da Revolu- das classes. O Estado weberiano é um Esta-
ção Industrial consagra-se, na modernida- do funcionalista com os traços e adornos da
de, o fenômeno da divisão social do traba- burguesia emergente.
lho. Saí da modernidade humanista, da cen- Deste modo, ultrapassando a falácia do
tralidade humana para a modernidade mer- ordenamento biológico e ideológico da teo-
cadológica marcada pelo fetiche dos objetos. ria liberal do Estado, e a mera abstração con-
Do ponto de vista da nova ordem econô- ceitual e epistêmica, finalmente, Karl Marx
mica, a burguesia vai impondo ao Estado e vai desmascarar o mito da neutralidade
a sociedade, o princípio do laissez-faire, se- política, ao confronta-lo, dizendo que o Es-
gundo o qual, a economia deve se desenvol- tado é uma expressão da vontade humana e
ver de acordo com leis naturais, sem inter- das classes dominantes e que a sua ação
venção do Estado. logra eficácia graças ao discurso do deter-
No entanto, o processo de consolidação minismo econômico e jurídico.
da economia capitalista é acompanhado de A confiabilidade e a legitimidade de uma
desorganização e enfraquecimento do pró- configuração consensual da teoria do Esta-
prio trabalhador e do Estado moderno. do moderno esbarram na dualidade insti-
Claus Offe afirma: tucional e nos desafios de compatibilizar a
Uma das características da or- complexidade social e a sua condição de re-
ganização do trabalho capitalista é presentativo e formalístico. Fernando Paulo
submeter a força de trabalho, tanto da Silva comprova esta contradição, argu-
quanto possível, a uma orientação mentando que:
externa e a um controle externo in- Toda esta extraordinária heteroge-
tegral.19 neidade civilizatória vem a ser reuni-
Pode ser afirmado, que o controle exter- da, controlada e dominada por um
no das atividades laborais e da vida priva- aparelho noológico (a religião de Es-
da na sociedade de classes ou hierárquica, tado). Este Estado centralizador, cons-
tem sua vitalidade e vitaliciedade garanti- trutor e repressor, constitui um novo
dos, graças à concepção liberal do Estado modo de organização da complexida-
moderno, conformado com precisão concei- de a partir de um aparelho central, o
tual e epistemológica por Claus Offe, que o qual vem a desenvolver-se segundo os
denomina Estado de direito parlamentar- princípios da hierarquia (a qual vem
democrático. O sistema político institucio- a ser imposta como um princípio ge-
nal da sociedade e do Estado capitalista ral de organização, o que ainda vem
caracteriza-se pela consagração do sistema aumentar mais o aparelho coercitivo
econômico como independente do Estado, e e repressivo do Estado) e a especiali-
pelo monopólio da classe economicamente zação do trabalho, contribuindo para
dominante, sobre o sistema político conva- a diferenciação da sociedade em clas-
lidado pelo ordenamento jurídico. ses, ao mesmo tempo que se molda na
Neste sentido, a tentativa de buscar con- hierarquia diferenciadora.20

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4. Análise crítica do processo de formalismo dicotômico entre Estado e Soci-
constitucionalização do Estado edade, isto porque o senso comum jurídico
Democrático e os discípulos da ciência normativa e dog-
mática jurídico-positivista, têm uma histó-
Ferdinand Lassalle em sua prédica e tese ria de íntima ligação com o status quo.
sobre o poder constitucional, apresentada Karl Marx afirmou que a ordem jurídica
na Associação Liberal-Progressista de Ber- é uma configuração determinante dos inte-
lim, em 1862, afirmou que questões consti- resses da burguesia, preconcebidos a ela, ou
tucionais não são questões jurídicas, mono- seja, à propriedade concretamente existente
pólio segmentado, mas sim, questões políti- e à necessidade de manter a dominação ob-
cas. jetiva e racional.
A Constituição, portanto, é uma expres- O ideário de neutralidade científica e
são da disputa pelo poder entre os atores humana, como critério de aplicabilidade da
sociais. Segundo Konrad Hesse, os atores lei, serve muito mais para a acomodação das
sociais são: relações macro e microfísicas do poder. Luiz
O poder militar, representado pe- Alberto Warat, numa releitura de Foucault
las Forças Armadas, o poder social, e sua obra “Vontade de Saber”, toma-o como
representado pelos latifundiários, o suporte da crítica ao saber e ao poder jurídi-
poder econômico, representado pela co neutro:
grande indústria e pelo grande capi- Coloque-se a bio-política como
tal, e finalmente, ainda que não se equi- quinta razão da desumanização do
pare ao significado dos demais, o po- homem moderno, isto é, desumaniza-
der intelectual, representado pela do desde que a vida natural começou
consciência e pela cultura em geral. a ser incluída nos mecanismos e nos
As relações fáticas resultantes da con- cálculos do poder estatal e no desen-
jugação desses fatores constituem a volvimento triunfante do capitalismo,
força ativa determinante das leis e das que precisa de corpos dóceis para ob-
instituições da sociedade, fazendo com ter esse triunfo genocida com que hoje
que estas expressem, tão-somente, a se apresenta. Parece-me que não se
correlação de forças que resulta dos fa- pode perder de vista, também no ter-
tores reais de poder; fatores esses que reno do direito, o valor da bio-política
formam a Constituição real do país. como acontecimento fundacional. To-
Esse documento chamado Constitui- das as categorias com as quais atual-
ção – a Constituição jurídica – não mente se intenta pensar o Direito, e
passa, nas palavras de Lassalle, de um que foram fundadas na política jurí-
pedaço de papel.21 dica moderna, são vinculadas ao ho-
Dessa maneira, a configuração e a sus- rizonte bio-político.23
tentabilidade da normatividade constitucio- Canotilho contradizendo ao conceitua-
nal, para além do fundamentalismo exegé- lismo cartesiano, afirma que o princípio deste
tico, caracteriza-se por seu estrito vínculo Estado constitucional estreita-se muito com
contextual com o espírito cientificista, com a teoria da supremacia do Direito, uma vez
o discurso liberal-individualista e com a que na era Moderna, a base teórica do Esta-
cultura normativista e tecno-industrial. do e da ação de seus governantes é a sujei-
A dogmática jurídica positivista 22, com ção ao império das leis, ao lado da preser-
a pretensão falaciosa da univocidade e uni- vação da vida e da propriedade privada.
versalismo dos seus códigos, sofre o proces- A era Moderna impõe-se politicamente
so de crise de legitimidade e esgotamento, através do princípio da inter-regulação en-
em razão de sua persistência na defesa do tre os Três Poderes, sempre observando aten-

318 Revista de Informação Legislativa


tamente as contradições da ação estatal e as utópico e irrealizável. A idealização da
intenções do príncipe, governante ou sobe- Constituição como princípio basilar da for-
rano. mação do Estado moderno, será um impe-
Deve-se reconhecer o mérito de que, con- rativo para o novo ordenamento antropoló-
tra a possibilidade da tirania e o despotis- gico e jurídico.
mo, fez necessário estabelecer um novo con- A Constituição será o instrumento ideo-
trato social, levando em conta a supremacia lógico, simbólico e material de equilíbrio, de
da lógica individualista e do dogma positi- correlação e de tentativa de controle do tri-
vista-constitucional. pé liberal: indivíduo-governante-Estado.
A elaboração do “Contrato Social”, ins- Pode afirmar que a modernidade promove-
pirado e idealizado por Locke, Rousseau, rá o processo de constitucionalização do
Montesquieu, Kant e outros importantes li- Estado e da esfera pública.
berais do século XIX, objetivou definir o Es- A Constituição torna-se a configuração
tado como guardião dos direitos e princípios político-ideológica de uma sociedade orga-
fundamentais, direitos estes, da tradição li- nizada. O Estado constitucionalista, por-
beral, da liberdade individual, da livre ex- tanto, consiste na divisão do poder, de modo
pressão política e da livre iniciativa econô- que se impeça todo arbítrio do tirano.
mica. Consagrando assim, o processo de Ressalta-se que o princípio constitucio-
estatização da sociedade através da consti- nal do Estado moderno, é o da pluralidade
tucionalização do Estado. nas decisões e nos poderes soberanos, inde-
O mundo das representações, de inspi- pendentes e harmônicos, que se caracteri-
ração burguesa liberal, corresponde a um zam na forma de governo. Porém, no enten-
determinado estágio do desenvolvimento dimento dos defensores da teoria do tripar-
social, oriundo da progressiva emergência tite, o equilíbrio constitucional não pode ser
e afirmação triunfante do capitalismo indus- mantido, sem a primazia da Constituição
trial moderno e ocidental, conjunto de fenô- como princípio da correlação entre os três
menos variados que teorizou a organização poderes.
social a partir da afirmação de concepções Contrapondo a este espírito conceitual
radicadas na defesa do individualismo con- positivista, o Estado constitucional, confor-
tratualista iluminista e que por interação me definido por Canotilho, deveria ser um
com o pensamento desse tempo, o cientifi- ente apriorístico que antecede ao letramen-
cismo, o legalismo e o formalismo, veio a to da Constituição, uma vez que é da cultu-
produzir o positivismo jurídico. ra particular que extrai prática permanente
Dessa forma, o Estado constitucional de ação constitucional entre povos.
funde-se com o próprio significado da teo- Canotilho, na sua refutação à falaciosa
ria do Estado contemporâneo, que se estru- argumentação da defesa do princípio dog-
tura sob o império do liberalismo e do senso mático e fundamentalista de que o Estado
comum jurídico positivista. Os direitos fun- constitucional é uma realidade empírica em
damentais, do status quo, são a garantia da si, afirma que não passa de um mito de ide-
sociedade burguesa, protegendo-a de qual- alidade, sem qualquer sustentação lógica e
quer ação autoritária do Estado e do dés- científica.
pota. O Estado, como formação histórica de
Entretanto, a eficácia deste novo Estado organização social, ética e jurídica, assume
constitucional não estará restrita si mesma. definitivamente, a partir do liberalismo mo-
Trata-se de impor uma nova moldura neste derno, a estrutura formalística e constitucio-
“ente” moderno. O Estado necessitará des- nal. Um Estado que definitivamente se or-
vencilhar-se da vontade do soberano e da dena conforme ao poder jurídico, do impe-
trans-racionalidade popular, o que o torna rativo categórico do dever ser e das leis.

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No entanto, Canotilho rompe com a con- popular, segundo o qual, todo o po-
cepção tradicional e formalística dos libe- der vem do povo, assegura e garante o
rais acerca do Estado constitucional, pro- direito à igual participação na forma
pondo condicionar a legitimidade deste Es- democrática da vontade popular. As-
tado à radicalidade do espírito da democra- sim, o princípio da soberania popu-
cia. Esta proposta impedirá quaisquer mei- lar concretizado segundo procedi-
os de manipulação e autoritarismo das eli- mentos juridicamente regulados, ser-
tes, no modo de governar. ve de ‘charneira’ entre o ‘Estado de
Qualquer tentativa de cristalização e direito’ e o ‘Estado democrático’, pos-
materialização do Estado constitucional de sibilitando a compreensão da moder-
direito obrigará a sociedade a considerar o na fórmula: ‘Estado de direito demo-
pluralismo cultural. O Estado constitucio- crático.24
nal de direito deve levar em conta a diversi-
dade, as circunstâncias históricas e deverá 5. Reflexão sobre o processo de
extrapolar a visão etnocêntrica Ocidental. judicialização do Estado democrático: a
Canotilho ao desconstruir a tradicional
República tomada pelo Direito Positivista
definição de Estado constitucional, tenta
ampliar o leque de sua existência, rompen- A judicialização do Estado democrático-
do com a abstração conceitual dos liberais. liberal representativo implica na sua apro-
Propõe ir além do formalismo moderno, ou priação pelo poder jurídico. O direito esta-
seja, o Estado constitucional não deve ser tal vai assumindo proporções dantescas de
apenas um Estado de direito formal. Ao con- controle absoluto de todo o aparato institu-
trário, deve ser modelado pela contínua ação cional.
humana e pela dinâmica social, devendo O Estado moderno passa a ter o controle
sua articulação existencial organizar-se e social e disciplinar pela normatividade do
exercer-se em termos democráticos. poder jurídico. O poder jurídico, na socie-
Neste sentido, Canotilho nos traz uma dade socialmente disciplinada e hieraqui-
enorme contribuição ao afunilar a máxima zada pela divisão do trabalho, vai desven-
conceitual de Estado constituicional, cilhando-se de qualquer possibilidade de
adicionando-lhe o elemento democracia, controle social.
como forma de travar os excessos e a tenta- O próprio funcionamento do Estado se
ção autoritária do poder instituído. De for- confunde com o funcionamento do Direito.
ma didática e imperativa, Canotilho enfati- O professor Ronald Ayres Lacerda em seu
za o risco da dogmatização do Estado cons- artigo sobre “A crise do conhecimento jurí-
titucional: dico na modernidade”, escudado na cita-
Se quisermos um Estado constitu- ção de Wolkmer, reafirma ao seu leitor que
cional assente em fundamentos não “a história do direito é a história de sua iden-
metafísicos, temos de distinguir cla- tificação com o poder do Estado, que visa
ramente duas coisas. Uma delas é a regulamentação e a manutenção da força de
legitimidade do direito, dos direitos uma formação social determinada, legiti-
fundamentais e do processo de legis- mando a ordem capitalista.” 25
lação no sistema jurídico; a outra é a O poder jurídico moderno transformou-
legitimidade de uma ordem de domí- se num certificado de legitimação da aspi-
nio e de legitimação do exercício do ração do Estado moderno burguês, sem
poder político. O Estado impolítico do qualquer temor de sanção coletiva. O sujei-
Estado de direito não dá resposta a to burocrático desta complexa feição jurídi-
este último problema: de onde vem o ca encontra-se frontalmente para além do
poder? Só o princípio da soberania controle externo, salvo o controle interpo-

320 Revista de Informação Legislativa


deres, que pouco resulta em eficácia institu- distante da sociologia jurídica, uma vez que
cional e ética. nesta esfera de análise, o objeto não é o pró-
O processo de judicialização significará prio Direito, mas os fenômenos ou aconteci-
a privatização do Estado democrático. O mentos circundantes ao Direito.
ideal de democracia representativa encon- Hans Kelsen tenta isolar o Direito de
tra-se ameaçado na medida em que o poder qualquer influência dos pressupostos filo-
jurídico toma o lugar das iniciativas dos sóficos ou sanções ético-morais. A autono-
movimentos sociais. mia do direito teve como objetivo, dar sus-
A burocratização e a estatização da esfe- tentação orgânica e burocrática a uma soci-
ra pública foi um dos grandes equívocos do edade que trilhava para a racionalidade e o
agir intencional dos ideólogos liberais pela empirismo dogmático.
modernidade. O processo de limitação da O pressuposto básico de Kelsen se as-
coisa pública à esfera estatal produziu um senta na idéia de norma por excelência, va-
grande fosso e distanciamento entre a soci- lorizando apenas a ordem jurídica auto-
edade e o Estado. aplicante, numa clara feição fundamenta-
Não resta dúvida de que a libertação do lista onde o texto é condutor da própria rea-
poder político e do poder econômico que lidade, acomodando a sociedade na pers-
caracterizou a ruptura com o feudalismo, pectiva da ordem textual-jurídica.
apontava para a divisão entre as esferas A dogmática jurídica de Kelsen se mani-
pública e privada. Num processo de deslo- festa na medida em que os seus pressupos-
camento da coexistência entre sociedade e tos teóricos fundamentaram-se no conheci-
Estado que favoreceria a emancipação do mento científico, especialmente, no postu-
poder judiciário. lado de que é possível fazer separação radi-
Considerando que o desenvolvimento e cal entre sujeito cognoscente e objeto cog-
a consolidação da sociedade moderna este- noscível.
ja marcado pela separação entre Estado e Kelsen defende que a ciência jurídica
sociedade, Nuria Cunill vai dizer que esta deve fornecer esquemas de interpretação
separação não é definitiva, uma vez que é especificamente jurídicos dos fatos, e restrin-
no âmbito privado-mercantil que a coisa gir-se a um juízo de valor objetivo desses fa-
pública encontra a originalidade da sua tos. O Direito buscando consolidar-se na es-
expressão. trutura estatal como feixe do universo lin-
A modernidade vive o momento da crise güístico e burocrático, hermético e fechado.
de seus próprios paradigmas. A propalada No entanto, Luiz Alberto Warat adverte
crise do valor jurídico é reflexo da crise dos que na “Teoria Pura”:
paradigmas científicos e histórico-sociais, Não se encontra devidamente es-
já que a teoria pura do direito kelseniano, clarecido o duplo papel significativo
determinante no âmbito jurídico, fundou-se que Kelsen atribui às normas jurídi-
no princípio da objetividade e do cartesia- cas. Por um lado, elas são o sentido
nismo, impulsionado pelo capitalismo avan- dos atos de vontade e, por outro, o
çado, tecnológico e informacional. objeto da ciência jurídica, que outor-
Para entender a pretensa imunidade do ga sentido objetivo às normas, vistas
poder jurídico como guardião do Estado como fatos empíricos do mundo do
democrático, é de fundamental importância ser. Essa duplicidade significativa
compreender um dos grandes ideólogos da poderia ser esclarecida no momento
produção do direito moderno: Hans Kelsen. em que aceitemos, em Kelsen, a dupla
Em seu tratado sobre a “Teoria Pura do dimensionalidade da noção de lín-
Direito”, Hans Kelsen afirma que a pressu- gua. As normas, como expressões dos
posta “ciência jurídica” deve manter-se eqüi- órgãos de autoridade, seriam um có-

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digo que operaria como condição de raro precedente ameaçador ao equilíbrio das
sentido do ato.26 atribuições dos Três Poderes.
O processo de judicialização do Estado A superposição do poder Judiciário no
se sucede na medida em que o Estado, ao controle do processo legislativo e constitu-
ser considerado a única fonte de poder legí- cional, significa restringir a capacidade de
timo, recorre exclusivamente à ordem jurí- atuação dos atores sociais no processo de
dica para a garantia de sua estrutura buro- participação do ideário de Estado democrá-
crática e institucional. A segurança do Es- tico. A ascensão da Justiça está diretamente
tado democrático não repousa mais na dia- ligada ao fim da Guerra Fria e à internacio-
lógica: Estado e sociedade, mas no ordena- nalização da economia de mercado.
mento jurídico, como nova fonte de sua con- Para empreender-se a devida compreen-
servação. são sobre a ascensão da Justiça como nova
O direito que se configura ao longo do centralidade do poder estatal, é impres-
processo civilizatório Ocidental é o direito cindível a recorrência às análises de
da defesa do Estado enquanto instituição Pachukants sobre a relação simétrica entre
pretensamente autônoma e imune. Não mais o discurso da circulação das mercadorias e
um Estado configurado no ideal democráti- a forma jurídica.
co, mas “juridisciocrático.” 27 Pachukants, na elaboração teórica, bus-
Por um lado, deve-se reconhecer que este ca desvendar a relação de determinadas for-
processo de judicialização do Estado ocor- mas do Direito com as formas da economia
re em razão do esvaziamento da participa- mercantil. Discorre sobre a relação entre
ção social na esfera pública, do declínio do Direito e capitalismo, que imediatamente
homem político e do desencantamento com pode ser desdobrada para a relação entre as
a política partidária e institucional. A de- instituições e o capital, e também entre o
manda da supremacia da justiça na aspira- Estado e a democracia.
ção societária vem do desamparo político e Ao estudar a relação lingüística entre o
da indiferença burocrática. O direito passa Direito e o capitalismo, Pachukants conclui
a tornar-se a última reserva moral comum que a forma jurídica é uma produção econô-
em uma sociedade que não mais a possui. mica e social resultante do princípio da di-
O enfraquecimento do Estado diante da visão do trabalho. Marcio Bilharinho Neves,
supremacia desproporcional da economia por sua vez, destaca:
internacional e do espírito globalitário, cir- Em tal sociedade mercantil, o cir-
cunda o planeta. Num flagrante desprezo cuito das trocas exige a mediação ju-
ao poder tutelar do Estado, multiplica-se a rídica, pois o valor de troca das mer-
recorrência jurídica. cadorias só se realiza se uma opera-
O crescente processo de aceleração da ção jurídica – o acordo de vontades
expansão jurídica não é conjuntural, mas equivalentes – for introduzida, esta-
associado à própria dinâmica e dilemas das belecendo uma forma que reproduz a
sociedades democráticas e à descrença nos equivalência, essa ‘primeira idéia pu-
poderes do Executivo e do Legislativo, por ramente jurídica’ a que ele se refere.28
sua incapacidade de operar e atender as Assim, a hipótese da consolidação de um
demandas sociais voltadas para a cidada- Estado moderno caricaturado pela ciência
nia. jurídica deve ser repelida, quando se sabe
Também vale alertar que a opção da so- que Michel Foucault em seu livro “Vigiar e
ciedade pela mediação do poder midiático Punir”, nos mostra a estreita relação entre
e econômico na condução da esfera público- justiça e punição, num autêntico processo
estatal, deixa em segundo plano o papel tra- de mera manutenção do poder e do isola-
dicional do poder político formal, num mento social. Quanto mais o Estado venha

322 Revista de Informação Legislativa


a apoiar-se na formalidade cartesiana e ju- co. As diferenças foram apenas de ordem
rídica positivista, mais se burocratizará e valorativa. A essência é a mesma, agiram
distanciará das aspirações do conjunto da em nome do povo (demós).
sociedade. Observa que as ações destes atores, dife-
Além desta advertência foucaultiana, renciaram-se apenas em adereços e estratégi-
deve ser relevado que a atual configuração cas políticas. O pano de fundo seguiu o mes-
do Estado democrático de direito e o Estado mo roteiro da teoria do Estado representati-
totalitário podem ser considerados idênti- vo. Todos seguiam a cartilha de Montesquieu.
cos, na proporção em que crêem numa ação Havia o tirano, o Parlamento e o Judiciário,
linear e unilateral de puro dogmatismo, re- e como sempre, a submissão ao Executivo,
sistindo a qualquer outra possibilidade, num autêntico jogo de simulação e simbo-
além da validade da verdade particular do lismo constitucional.
cientificismo vulgar e superado. Todos falavam em nome da população,
mas excluindo-a das opiniões e decisões
6. Conclusão governamentais. No sistema de Estado re-
presentativo, a população transformou-se
Ao propor o desenvolvimento analítico em mera marionete dos atos dos governantes.
e crítico de um tema extremamente comple- Percebemos no transcurso deste traba-
xo e polissêmico na sua concepção e inter- lho que a teoria do Estado representativo
pretação, fiz convictos de sua incompletu- encontra-se em questionamento nos deba-
de e da limitação de se formular um tratado tes acadêmicos e políticos, sobre como o seu
enciclópedico consensual. proceder frente à hegemonia do mercado e à
A crise dos paradigmas científicos das crescente onda de exclusão social que, no
utopias messiânicas, a socialista e a liberal; entendimento do senso crítico, não pode
o desencantamento com o modelo represen- continuar, sob pena de situar o Estado na
tativo da política tradicional e o fim da Guer- condição de impotente e omisso, diante da
ra Fria; culminando com a hegemonia da tirania da economia de mercado e do mono-
economia de mercado, provocaram o fenô- pólio jurídico.
meno da ascensão e supremacia do poder Foi de suma importância recuperar ana-
jurídico, como principal peça ontológica de liticamente a dimensão ética e política do
legitimação da nova ordem econômica glo- papel da democracia liberal que no passa-
balitária. do, deixou o legado da inserção do ser hu-
Este fenômeno é resultante da derroca- mano na centralidade da existência e dos
da dos diversos modelos de Estado totalitá- condicionamentos históricos, e que hoje se
rio durante e após as Grandes Guerras Tan- sente ameaçado pelo livre trânsito das mer-
to no Leste-Europeu quanto nas democraci- cadorias.
as européias, o mundo ficou horrorizado Foi importante entender que a decadên-
com a tirania de seus governantes. cia da democracia representativa, advinda
Da Alemanha de Hitler à América Lati- da ilusão do exercício do poder e do contro-
na dos generais, passando pelo comunis- le social através do burocratismo estamen-
mo estatal soviético, a sociedade moderna tal, não pode servir de pretexto à aceitação
vivenciou as contradições destes Estados do fim da história ou do fim das ideologias,
representativos, decantados nos ideais da como se fossem ícones do fatalismo e do
modernidade. determinismo existencial.
A tirania dos generais latinoamericanos, É através da reflexão e da ação político-
os déspotas do comunismo estatal e os agen- coletivista sobre a dimensão econômico-
tes operadores da democracia liberal, reve- jurídico-social do modelo atual do Estado
lam um profundo comportamento simétri- constitucional burguês, que vamos detectar

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a viabilidade de rever os postulados dos te- menos parecidas. Parece, portanto, que aquilo que
óricos tradicionais que mantém a ordem vi- se impregna no inconsciente é exclusivamente a idéia
de fantasias subjetivas provocadas pelo processo
gente, e abrir a possibilidade da construção físico. Logo, é possível supor que os arquétipos
de novos paradigmas de modelo, na pers- sejam as impressões gravadas pela repetição de
pectiva de superação da cultura da indife- reações subjetivas” (p. 61). Define também que “o
rença civilizatória que permeia o imaginá- inconsciente coletivo é uma figuração do mundo,
rio social pós-moderno. representando a um só tempo a sedimentação mul-
timilenar da experiência. Com o correr do tempo,
Reconhecemos que o Direito e a Econo- foram definindo-se certos traços nessa figuração,
mia transformaram o Estado em atividade que são denominados arquétipos ou dominantes –
minimalista, e que a sociedade encontra-se os dominadores sendo os deuses -, isto é, configu-
social e corporalmente refém do estrutura- rações das leis dominantes e dos princípios que se
lismo econômico e judiciário. repetem com regularidade à medida que se suce-
dem figurações, as quais são continuamente revivi-
No entanto, toda a descrição analítica das pela alma. Na medida em que essas figurações
neste trabalho reafirma nossa convicção de são retratos relativamente fiéis dos acontecimentos
que a doutrina jurídica positivista e o orde- psíquicos, os seus arquétipos, ou melhor, as carac-
namento econômico do mercado são ícones terísticas gerais que se destacam no conjunto das
construídos e determinados pelo modo de repetições de experiências semelhantes, também cor-
respondem a certas características gerais de ordem
produção de uma epocalidade. física.”(pp.86).
Não se pode perpetuá-los como se fos- 4
Durand, Gilbert. A imaginação simbólica. São
sem realidade irremediável e retilínea. Está Paulo, Editora Cultrix, 1995 p.11.
nas mãos da humanidade, com sua infinita 5
Moraes, Denis, 2004. Citação de referências e
capacidade de criar e inventar, produzir um documentos eletrônicos. Disponível em: http://
www.bpg.ufpr.br/normas1.html. Acessado em
novo modelo de Estado capaz de absorver a 13.03.2004.
dinâmica existencial impulsionada atual- 6
Baczko apud Moraes (2003).
mente pelos movimentos sociais e organi- 7
No seu texto, o professor Ronald menciona no
zações não-governamentais: o Terceiro Setor. rodapé que Michel Löwy apresenta uma boa análi-
se crítica do pensamento comteano. Para ele, “a
pressuposição fundamental do positivismo de
Augusto Comte é de que as leis naturais regulam o
7. Notas funcionamento da vida social, econômica e políti-
ca, sendo do mesmo tipo que as leis naturais, por-
Berger, Peter e Luckmann, Thomas. A cons-
1
tanto, o que reina na sociedade é uma harmonia
trução social da realidade, 12a edição. Rio de Janei- semelhante à da natureza, uma espécie de harmo-
ro, Petrópolis. Editora Vozes, 1973, p. 12.
nia natural. Disso decorrem as seguintes afirma-
2
Gilbert Durand afirma, no seu livro “A imagi- ções epistemológicas: 1) os métodos e procedimen-
nação simbólica”, que “o símbolo é uma represen- tos para conhecer a sociedade são exatamente os
tação que faz aparecer um sentido secreto, sendo a mesmos que são utilizados para conhecer a nature-
epifania de um mistério. A metade visível do sím- za; 2) se a sociedade é regida por leis de tipo natu-
bolo, o significante, estará sempre carregada do ral, a ciência que estuda essas leis naturais da soci-
máximo de concretude e, como diz muito bem Paul edade é do mesmo tipo que a ciência que estuda as
Ricoeur, todo símbolo autêntico possui três dimen- leis da astronomia, da biologia, etc; 3) da mesma
sões concretas: ele é ao mesmo tempo, cósmico (ou maneira que as ciências da natureza são ciências
seja, retira toda a sua figuração do mundo visível objetivas, neutras, livres de juízos de valor, de ide-
que nos rodeia), onírico (enraíza-se nas lembran- ologias políticas, sociais ou outras, as ciências soci-
ças, nos gestos que emergem em nossos sonhos e ais devem funcionar exatamente segundo esse mo-
constituem, como bem mostrou Freud, a massa delo de objetividade científica. A concepção positi-
concreta de nossa biografia mais íntima), e final- vista, portanto, afirma a necessidade e a possibili-
mente, poético, ou seja, o símbolo também apela dade de uma ciência social completamente desli-
para a linguagem, e à linguagem mais impetuosa, gada de qualquer vínculo com as classes sociais,
portanto, a mais concreta.” (p.16). com as posições políticas, os valores morais, as
3
Carl Gustav Jung define: “arquétipo é uma ideologias, as utopias e as visões de mundo. Todo
espécie de aptidão para reproduzir constantemen- esse conjunto ideológico, em seu sentido amplo,
te as mesmas idéias míticas, senão as mesmas, pelo deve ser eliminado da ciência social. São prejudici-

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ais, posto que são preconceitos; 4) Como não há laico e secular. A religião reduziria apenas ao es-
liberdade de consciência nem subjetividade na ma- paço da vida privada.
temática ou na astronomia, não pode haver tam- 16
Koselleck, Reinhardt. Op. Cit, p. 49.
bém em matéria de sociologia. Como os cientistas 17
Offe, Claus. Problemas Estruturais do Esta-
impõem seu veredito aos ignorantes e aos amado- do Capitalista. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro,
res em matemática e astronomia, devem logica- 19884, p. 10.
mente fazer o mesmo em sociologia e política. O 18
0 jurista francês Jean Bodin (1530-1596) pu-
que pressupõe que a sociologia possa determinar o blicou em 1576, o livro “De la Republique”, vasta
que é, o que será e o que deve ser. Há um determi- obra de teoria política, que se destacou pelos con-
nismo social equivalente ao determinismo natural. ceitos emitidos sobre a soberania e o direito divino
Portanto, Comte quer, como Bacon no século XVII, dos reis. A soberania foi definida como o poder
ao assentar um sistema de idéias fundamentais da absoluto que o chefe de Estado tem de fazer leis
evolução humana, descobrir um determinismo glo- para todo o país, sem estar, entretanto, sujeito a
bal que os homens pudessem, de certo modo, utili- elas nem às de seus predecessores, porque “não
zar para construir a ordem e o progresso. O que pode dar ordens a si mesmo.” A República (sinôni-
Comte faz na verdade é legitimar uma hierarquia e mo de Estado ou de comunidade política), sem o
uma elite, a própria exploração. Ele quer explicar a poder soberano não é mais República. Além de ab-
organização dessa hierarquia temporal, a posição soluta, a soberania é também perpétua e indivisí-
exata dos chefes, industriais e banqueiros.” (Ideo- vel. Bodin afirmou que a soberania deve ser exerci-
logia e ciência social: elementos para uma análise da por um príncipe (caracterizando uma monar-
marxista. 12a ed., São Paulo, Cortez Editora, 1985, quia), por uma classe dominante (caracterizando
pp. 35-40). uma aristocracia) ou pelo povo inteiro (seria uma
8
Influenciado pela euforia capitalista que to- democracia). Ao exercer a soberania, o governante
mava conta do mundo após a derrocada dos regi- deve criar órgãos, associações ou conselhos (como
mes estabelecidos nos países do Leste Europeu e os “Estados Gerais”, na França) que facilitem a
na extinta URSS, e pelo ufanismo da proposta do administração. Porém o poder de decisão em últi-
Consenso de Washington no campo econômico e ma instância é sempre do príncipe, sob pena de
político, o nipo-americano Francis Fukuyama, em desmoronamento da soberania, que é tão alta e tão
1992, em seu livro “O fim da história”, tentou elabo- sagrada. As noções de soberania de Bodin consti-
rar uma linha de abordagem histórica, indo de Pla- tuíram as bases da ciência política e do direito pú-
tão a Nietzche, passando por Kant e Hegel, objeti- blico durante o Antigo Regime e sua influência ul-
vando legitimar a tese de que o capitalismo e a trapassou as fronteiras da França.
democracia burguesa constituem-se na consagra- 19
Offe, Claus. Op. Cit, p. 19.
ção da história da humanidade, ou seja, de que a 20
Suordem, Fernando Paulo da Silva. O princí-
humanidade teria atingido, no final do século XX, o pio da separação de poderes e os novos movimen-
ponto culminante de sua evolução com o triunfo tos sociais. Portugal. Editora Almedina, 1995, p.
da democracia liberal Ocidental, sob todos os de- 27 e 28.
mais sistemas e ideologias concorrentes. 21
Hesse, Konrad. A força normativa da Consti-
9
Eagleton, Terry. Ideologia. São Paulo, Bomtem- tuição. Porto Alegre. Sérgio Antonio Fabris Editor,
po Editorial, 1991, p. 172. 1991, p. 9.
10
Cassirer, Ernest. Linguagem e mito. São Pau- 22
Termo usado pelo professor Luiz Alberto
lo, Editora Perspectiva, 1992, p. 18. Warat que define “a dogmática como atividade
11
Siqueira, Ruy. Revista Ethos. Da Ritualização que não só acredita produzir um conhecimento
da Modernidade ao Fetiche Consumogônico, Ano 1 neutralizado ideologicamente, mas também des-
no 1 – jan/jun/2000, p. 148. vinculado de toda preocupação, seja de ordem so-
12
Weber, Max. Economia e sociedade, vol 2, Bra- ciológica, antropológica, econômica ou política.”,
sília, Editora UNB, 1999, p. 191. p. 41.
13
Offe, Claus. Problemas estruturais do estado 23
Warat, Luiz Alberto. Educação, direitos hu-
capitalista. Rio de Janeiro, Edições Tempo Brasilei- manos, cidadania e exclusão social: Fundamentos
ro, 1984, p.10. preliminares para uma tentativa de refundação.
14
Koselleck, Reinhardt. Crítica e crise. Rio de Texto apresentado no Seminário Internacional “Edu-
Janeiro, Editora UERJ/Contraponto, 1999, p. 32. cação e diversidade”, em Brasília – promovido pelo
15
Marx em sua obra a Questão Judaica se in- Ministério da Educação e Cultura, 2003, p. 22.
surge contra o paradoxo do Estado moderno ger- 24
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito
mano que se insere no ambiente da modernidade, Constitucional 4a ed., Coimbra, Livraria Almeida,
mas mantendo-se debaixo da moralidade cristã. 1989.
Para Marx o Estado tinha que ser eminentemente 25
Lacerda, Ronald Ayres. Op. Cit., p. 57.

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Warat, Luiz Alberto. O direito e a sua lingua-
26
KOSELLECK, Reinhardt. Crítica e crise, Rio de
gem 2a ed. Aumentada, Porto Alegre, Sérgio Anto- Janeiro, Editora Contraponto,1999;
nio Fabris Editor,1995, p. 23.
MARCUSE, Herbert. Eros e civilização. Uma Inter-
27
Buscamos usar o neologismo: “juridisciocrá-
tico”, para tentar explicar a precisão da atual con- pretação filosófica do pensamento de Freud 8a ed.,
Rio de Janeiro, Editora Guanabara;
figuração do Estado moderno que não se traduz
mais na idéia clássica de democracia (poder do MELO, Adélio. A aventura moderna das Idéias.
povo), mas na do exercício do poder e da conserva- Descartes, Locke, Kant e Nietzsche, Portugal, Rés
ção estatal através do burocratismo jurídico. Fala- Editora, 2000;
se com bastante intensidade que a democracia e a
república foram privatizadas pela ordem jurídica. MIAILLE, Michel. Introdução crítica ao Direito,
O controle judiciário sobre a vida coletiva é um dos Lisboa, Editorial Estampa, 1994;
maiores fenômenos do processo civilizatório con- NAVES, Márcio Bilharinho. Marxismo e direito. Um
temporâneo. Enquanto os poderes Executivo e Le- estudo sobre Pachukants, São Paulo, Boitempo
gislativo submetem-se a referendo popular através Editorial, 2000;
do voto, o Judiciário caminha para a autonomiza-
ção absoluta dos seus atos e decisões corporativas. OFFE, Claus. Problemas estruturais do Estado ca-
28
Naves, Márcio Bilharinho. Marxismo e direi- pitalista, Rio de Janeiro, Edições Tempo Brasileiro,
to. Um estudo sobre Pachukants, São Paulo, 1999, 1984;
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